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As desigualdades sociais perante a escola A teoria dos dons: a escola existe num vazio social Inicialmente a escola era vista como um espaço que permitia revelar as capacidades dos alunos, bastava organiza-la para que os alunos assimilassem as regras e os valores em que assentavam a vida em sociedade e o funcionamento da própria escola. O fatalismo social: a escola é impotente em relação ás desigualdades sociais A escola, nos anos 60, era vista como o grande instrumento de que a sociedade dispunha para assegurar a igualdade de oportunidades entre os seus cidadãos. Nesta perspetiva a escola era vista não só como o local onde se poderia assegurar uma igualdade de oportunidades de aprendizagem, mas também como um sector de atribuição de recursos. A escola deve ser estudada como realidade social, noutros termos a escola é uma «instituição social» que existe pelas interações que se verificam entre os seus membros. As interações que vão marcar a diferença têm a ver com as regras de jogo, a forma como os seus membros funcionam com os constrangimentos, o espaço de ação que cada um e os grupos usam e a forma como apropriam e recriam o significado da atividade escolar. Representações de sucesso e aspirações em relação á educação Umas das primeiras constatações que se impõe são que a sobrevivência escolar é fortemente marcada pela origem social dos alunos. Qualquer leitura desta realidade associa este facto às melhores prestações académicas dos alunos dos grupos socias favorecidos. Existem dois sistemas de valores muito distintos em relação á escola, para as classes mais baixas o trabalho escolar não é valorizado, para as classes mais altas o sucesso escolar é valorizado e determina a realização pessoal e o futuro profissional. Num extremo encontramos os indivíduos que creem, relativamente á escola, que o esforço compensa, que vale a pensa investir no trabalho escolar, que estão habituados a fazer – ou a ver fazer

As Desigualdades Sociais Perante a Escola

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Page 1: As Desigualdades Sociais Perante a Escola

As desigualdades sociais perante a escola

A teoria dos dons: a escola existe num vazio social

Inicialmente a escola era vista como um espaço que permitia revelar as capacidades dos alunos, bastava organiza-la para que os alunos assimilassem as regras e os valores em que assentavam a vida em sociedade e o funcionamento da própria escola.

O fatalismo social: a escola é impotente em relação ás desigualdades sociais

A escola, nos anos 60, era vista como o grande instrumento de que a sociedade dispunha para assegurar a igualdade de oportunidades entre os seus cidadãos. Nesta perspetiva a escola era vista não só como o local onde se poderia assegurar uma igualdade de oportunidades de aprendizagem, mas também como um sector de atribuição de recursos.

A escola deve ser estudada como realidade social, noutros termos a escola é uma «instituição social» que existe pelas interações que se verificam entre os seus membros. As interações que vão marcar a diferença têm a ver com as regras de jogo, a forma como os seus membros funcionam com os constrangimentos, o espaço de ação que cada um e os grupos usam e a forma como apropriam e recriam o significado da atividade escolar.

Representações de sucesso e aspirações em relação á educação

Umas das primeiras constatações que se impõe são que a sobrevivência escolar é fortemente marcada pela origem social dos alunos. Qualquer leitura desta realidade associa este facto às melhores prestações académicas dos alunos dos grupos socias favorecidos.

Existem dois sistemas de valores muito distintos em relação á escola, para as classes mais baixas o trabalho escolar não é valorizado, para as classes mais altas o sucesso escolar é valorizado e determina a realização pessoal e o futuro profissional.

Num extremo encontramos os indivíduos que creem, relativamente á escola, que o esforço compensa, que vale a pensa investir no trabalho escolar, que estão habituados a fazer – ou a ver fazer – planos a médio e a longo prazo e para quem o sucesso é formulado em termos de desenvolvimento e realização pessoal.

Noutro extremo encontramos aqueles para quem o esforço pessoal não tem uma relação evidente com o sucesso, que não vislumbram de forma clara o que tem a escola a ver com um eventual sucesso social, que não formula projetos a médio e a longo prazo, e para quem o sucesso tem sobretudo contornos de segurança e aumento de conforto.

Cada aluno vai, «definir a situação» em que vive, o lugar que a escola pode eventualmente ter nela, as suas aspirações e os seus quadros interpretativos da realidade em relação ao grupo de referência. É muito frequente o grupo e referência ser o grupo ao qual o individuo pertence, mas não o é necessariamente. Acresce ainda que a inserção social dos indivíduos é caraterizada por uma pluralidade de pertenças, pelo que, por veres, o individuo pode tomar um dos grupos a que pertence como grupo de referência em detrimento de outros.

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A escola influencia: o emprego do tempo da família (do horário quotidiano ao tempo de estudos); a relação com o espaço (habitat e mobilidade); o orçamento (despesas diretas e indiretas); as tarefas (enquadramento do trabalho escolar, apresentação de si, etc); o controlo social que exerce sobre os filhos; a atividade educativa; o controlo do desenvolvimento dos seus filhos; a vida quotidiana; a imagem de si (em função das avaliações escolares); a proteção da vida privada; a relação ao futuro e estratégias perante as armadilhas escolares e a inserção social em diversas redes de relações.

Sem uma os fatores extra escolares têm mais influência no sucesso escolar que os fatores escolares.

Para resolver esta questão a escola deve ter um novo papel. A escola não deve ser o árbitro que assiste á corrida desigual, de que falamos há pouco, em posição neutra. A escola deve pôr em execução práticas pedagógicas compensadoras que permitam atenuar as desvantagens dos mais desfavorecidos á entrada. Deve tratar dos que estão em desvantagem de modo especial. Ser justo não é tratar a todos formalmente do mesmo modo, mas atender às necessidades de cada um.

Assim, a escola tem que desenhar estratégias que permitam atenuar e contrariar o efeito das variáveis extraescolares que, á partida, põem em desvantagem certos alunos em relação a outros.

Tipos de Igualdade

Tipos de Igualdade Fatores de desigualdade Medidas igualitárias de politica educativa

Igualdade formal de oportunidades de sucesso escolar

Acesso a escolas desigualmente equipadas em recursos materiais e/ou humanos. Fugas ao cumprimento da escolaridade obrigatória.

Implementação da politica de igualdade real e de uso de acesso á escola básica.

Igualdade real de oportunidades de sucesso escolar

Desigual grau de adaptação á vida escolar na entrada na escola básica.

Generalização da educação pré- escolar

Seleção escolar precoce por escolha prematura de vias escolares ou de ensino ou pré-profissionais

Adiamento do momento da escolha de vias escolares diferenciadas

Falta de oportunidades escolares pós obrigatórias para os alunos que não seguem para as vias de acesso ao ensino superior

Criação em maior número de escolas vocacionais ou pré profissionais

Menor qualidade dos recursos educacionais nas zones pobresPadrões de aprovação/ reprovação anual que prejudicam a aprendizagem

Criação de zonas de atuação educacional compensatória prioritária.

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dos alunos mais desfavorecidosFalta de atendimento às necessidades especiais de alunos desfavorecidos

Promoção automática ou promoção por fases

Desigual apoio familiar á instrução dos alunos mais desfavorecidos

Pedagogias compensatórias como criação de professores especiais para o acompanhamento académico, salas de estudo

Falta de preparação dos professores para lidar com a nova população escolar da escola de massas.

Formação profissional de professores para a escola de massas.

Igualdade de uso no sucesso escolar (igualdade de resultados escolares)

As diferenças de educação familiar informal refletem-se nas possibilidades de sucesso escolar dos alunos das classes desfavorecidas.

Políticas sociais de apoio familiar através da escola

O relativo insucesso das politicas educativas de igualização das oportunidades de sucesso escolar derivam do facto dos alunos de estratos sociais mais elevados, devido a uma educação familiar mais consonante com os valores e estilo de aprendizagem escolar, aproveitarem melhor as oportunidades de êxito que as politicas de sucesso de aplicação generalizada oferecem e, assim, se manterem ou aumentarem as desigualdades.

A diferença está na educação familiar informal que os alunos levam para a escola. É que o chamado problema de “igualdade de oportunidades educacionais” tem sido reduzido ao da igualdade de oportunidades de educação escolar.

Ora a maior parte das oportunidades educacionais das nossas vidas ocorre fora da escola – na família, através dos amigos e dos pais, através dos meios de comunicação social, através das organizações profissionais e das associações de que fazemos parte.

Sendo assim, igualizar estas oportunidades educacionais, neste sentido amplo, é uma questão de programa politico e social que tem a ver com o tipo de sociedade que se tem e com o que se quer construir.

De forma resumida o insucesso escolar tem a ver com o aluno: indisciplina, comportamentos de risco, absentismo, desvalorização das aprendizagens, inexistência de hábitos de trabalho, baixo envolvimento nas atividades escolares (curriculares ou outras).

Tem a ver com a família: fraco envolvimento da família na vida da escola, baixo rendimento económico, baixo capital social e cultural (os níveis de qualificação escolar dos portugueses adultos são ainda relativamente baixos)

Tem a ver com os professores: absentismo, falta de vocação e de aptidão pedagógica, insuficientes conhecimentos científicos, baixas expetativas em relação aos alunos

Page 4: As Desigualdades Sociais Perante a Escola

Tem a ver com a escola: instabilidade do corpo docente, ausência de lideranças, gestão pouco profissional, falta de qualidade das instalações e inexistência ou insuficiência de estruturas de apoio escolar e educativo (biblioteca, laboratórios, centros de estudo, materiais de suporte informático, etc.), insegurança, horários desadequados, baixa concretização de projectos de enriquecimento curricular, insuficiente oferta de variantes educativas de natureza profissionalizante

Tem a ver com o desenvolvimento económico do país (por vezes da região) e com o seu mercado de trabalho, que continua a contar com um importante segmento pouco exigente quanto á qualificação da mão-de-obra, em especial jovem, apesar do impacto da educação na redução do risco do desemprego

Tem a ver com a politica educativa: por exemplo em Portugal desde 1974 já houve 31 ministros da educação.

Tem a ver com o ambiente sociocultural: corporativismo profissional, fraca atribuição de um sentido de utilidade social á escola e ás aprendizagens, desvalorização do retorno dos estudos (nomeadamente na perceção do risco de desemprego, o que é falso, pois, na verdade, o risco de desemprego é tanto maior quanto menor for a qualificação escolar).

Aluno Familia Professores Escola Politica Educativa

País

. Indisciplina

.Comportamentos de risco.Absentismo.Desvalorização das aprendizagens.Inexistência de hábitos de trabalho.Baixo envolvimento nas atividades escolares

.Fraco envolvimento na vida da escola. Baixo rendimento económico. Baixo capital social e cultural

.Absentismo

. Falta de vocação e de aptidão pedagógica. Insuficiência de conhecimentos científicos. Baixas expetativas em relação aos alunos

.Horários desadequados

. Baixa concretização de projetos de enriquecimento curricular. Insuficiente oferta de variantes de ensino profissional. Instabilidade do corpo docente. Ausência de lideranças. Gestão pouco profissional.Falta de qualidade das instalações. Insegurança. Inexistência/ insuficiência de estruturas de apoio escolar e educativo (bibliotecas, laboratórios, centros de estudo, materiais de suporte informativo)

.Instabilidade governativa. Cultura e diagnóstico

.Desenvolvimento económico. Mercado de trabalho. Ambiente sociocultural