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As interfaces entre o Urbanismo e o Direito na Produção de normas Jus- Urbanísticas: a necessidade do diálogo para a efetivação do direito à cidade Igor Sporch da Costa 1 Introdução A neutralidade e a completude científica fundamentaram a busca pela autonomia das Ciências Sociais, concebidas, cada uma delas, como sistemas fechados, incomunicáveis com o ambiente e sem relação com outras disciplinas que lhe eram conexas. Nesse panorama, o Urbanismo é idealizado como ciência cujo objeto de estudo é a cidade, compreendida apenas em seu aspecto físico, desconectada dos elementos sociais produtores do espaço, legitimando e exteriorizando, assim, a segregação espacial. Por sua vez, as normas jurídicas, devido à sua forma e à sua presunção de legitimidade, são utilizadas como meios de controle dos grupos excluídos, mantendo o status quo, ao restringir a titularidade de direitos a um determinado grupo de pessoas. Assim, o Direito e o Urbanismo são utilizados na construção de um verdadeiro “muro invisível” segregacionista de duas realidades. O paradigma do Estado Democrático de Direito, porém, pautado pela emancipação dos indivíduos e a sua habilitação à participação do processo dialógico, obriga sejam revistas não somente as teorias do Urbanismo e do Direito, mas também as interfaces entre estas ciências na produção normativa. Partindo, assim, de um raciocínio dedutivo-interpretativo pautado não somente por uma pesquisa bibliográfica e legislativa, mas também por uma análise de aspectos da morfologia urbana, ilustrar-se-á, inicialmente, a relação entre Direito e Urbanismo 1 numa perspectiva de cooptação e tentativa de legitimação de uma urbanização excludente, que será, posteriormente, substituída por uma percepção participativa do Urbanismo. Esta concepção fornecerá as bases para que se politize a questão urbana, compreendendo-a de forma 1 Note-se que foram realizadas generalizações quanto às várias correntes teóricas do Urbanismo, buscando apresentar os pontos comuns entre elas, dando-se prevalência aos postulados progressistas, porquanto foram os que mais influência tiveram na formação das demais gerações de urbanistas.

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As interfaces entre o Urbanismo e o Direito na Produção de normas Jus-

Urbanísticas: a necessidade do diálogo para a efetivação do direito à cidade

Igor Sporch da Costa

1 Introdução

A neutralidade e a completude científica fundamentaram a busca pela autonomia das

Ciências Sociais, concebidas, cada uma delas, como sistemas fechados, incomunicáveis com o

ambiente e sem relação com outras disciplinas que lhe eram conexas.

Nesse panorama, o Urbanismo é idealizado como ciência cujo objeto de estudo é a

cidade, compreendida apenas em seu aspecto físico, desconectada dos elementos sociais

produtores do espaço, legitimando e exteriorizando, assim, a segregação espacial. Por sua vez,

as normas jurídicas, devido à sua forma e à sua presunção de legitimidade, são utilizadas

como meios de controle dos grupos excluídos, mantendo o status quo, ao restringir a

titularidade de direitos a um determinado grupo de pessoas. Assim, o Direito e o Urbanismo

são utilizados na construção de um verdadeiro “muro invisível” segregacionista de duas

realidades.

O paradigma do Estado Democrático de Direito, porém, pautado pela emancipação

dos indivíduos e a sua habilitação à participação do processo dialógico, obriga sejam revistas

não somente as teorias do Urbanismo e do Direito, mas também as interfaces entre estas

ciências na produção normativa.

Partindo, assim, de um raciocínio dedutivo-interpretativo pautado não somente por

uma pesquisa bibliográfica e legislativa, mas também por uma análise de aspectos da

morfologia urbana, ilustrar-se-á, inicialmente, a relação entre Direito e Urbanismo1 numa

perspectiva de cooptação e tentativa de legitimação de uma urbanização excludente, que será,

posteriormente, substituída por uma percepção participativa do Urbanismo. Esta concepção

fornecerá as bases para que se politize a questão urbana, compreendendo-a de forma

1 Note-se que foram realizadas generalizações quanto às várias correntes teóricas do Urbanismo, buscandoapresentar os pontos comuns entre elas, dando-se prevalência aos postulados progressistas, porquanto foram osque mais influência tiveram na formação das demais gerações de urbanistas.

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multifacetada, para que a produção de normas jurídicas se volte para garantir aos citadinos o

acesso à cidade.

2 Um olhar sobre a morfologia urbana: das artes urbanas ao Urbanismo científico

A produção e a ordenação do espaço constituem preocupações humanas, desde que a

complexificação da vida social demonstrou a necessidade de centralização do poder, exigindo

que as formas de organização rural, caracterizadas pela pulverização de forças, fossem

substituídas por um sistema de organização espacial que reunisse em um só locus essas várias

fontes.

Percebe-se daí que a morfologia urbana, isto é, as formas assumidas no processo de

formação e organização das cidades, não se apresenta neutra: reflete os inúmeros aspectos

sociais2 vigentes em cada período. Assim, o Urbanismo também não se mostrará neutro, ainda

que tenha sido compreendido, em certo período de seu evoluir, como tal.

Logo, esta inter-relação situaria a cidade entre duas ordens: a próxima e a distante. A

primeira se caracterizaria no plano das relações individuais, dentro de grupos mais ou menos

amplos e por relações destes grupos entre si, contendo, portanto, as relações de produção,

posse e propriedade. A ordem distante, noutro plano, relacionar-se-ia às ideologias

compartilhadas na sociedade e provenientes de grandes instituições – como a Igreja e o

Estado – regidas por um código jurídico próprio – formalizado ou não – e por um conjunto

cultural com signos e significados próprios.3

É neste segundo plano que se situa a relação entre o Urbanismo e o Direito, utilizados

de forma a legitimar o processo de segregação espacial empreendida, porquanto presos a

discursos gerais e abstratos, inaptos a considerar o caso concreto, fixaram necessidades-tipo,

numa perspectiva estática e meramente física da produção do espaço, portanto, desconectadas

da realidade social que forma e é formada na e pela cidade.

Nessa perspectiva, não basta uma análise que parta da emergência do Urbanismo

como ciência, porquanto as formas anteriores à sua própria institucionalização constituem

fundamentos formadores da disciplina.

Dessa maneira, desconsiderar as formas urbanas da Antigüidade significaria não

atentar para o fato de que, embora a cidade nasça como criação rural, seu escopo era a

2 Compreendidos estes da forma ampla, abarcando, entre outros, os aspectos históricos, políticos, econômicos eculturais.3 LEFEBVRE, 1969, p. 47.

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centralização do poder. Assim, não obstante a inexistência de uma oposição inicial entre

campo e cidade, esta se apresentaria como uma ilha de civilidade, circundada pela rusticidade

do modo de vida campestre, o domínio da racionalidade e da harmonia, ao derredor do qual

imperava a tensão do incontrolável.4 A cidade representaria, portanto, o local por excelência

das decisões públicas.

É nesse sentido que a morfologia urbana grega e o empirismo de sua organização

espacial demonstram uma nítida repartição, em que os muros das residências simbolizavam a

separação entre o espaço público, considerado o mais importante, e o privado, marcado pela

simplicidade e pela modéstia das áreas residenciais, formando, assim, um conjunto uniforme.

A assimetria, a distância entre os prédios e os espaços vazios tinham o condão de valorizar as

edificações, ressaltando a primazia do centro, formado a partir do santuário, estando a ágora e

os edifícios públicos em suas redondezas. Os templos eram construídos de forma a valorizar

sua monumentalidade, o que explica sua localização nos pontos mais altos da cidade, cujo

acesso se dava por vias sinuosas, permitindo a contemplação por diversos ângulos.5

Em Roma, por sua vez, o caráter religioso se apresentou mais arraigado, já que a

cidade fora construída em conformidade com as normas religiosas, no sentido do nascer ao

pôr-do-sol. Aliadas a esse fator estavam necessidades de ordem prática, como a falta de

espaço físico, água e defesa, que levaram ao surgimento e desenvolvimento das normas

urbanísticas. O poder político se manifestava nas obras públicas, tanto na magnitude das

construções destinadas ao divertimento público quanto na sua distribuição espacial, refletindo

a hierarquização social. Dessa forma, diversamente do exemplo helênico, em Roma, os

sentidos de monumentalidade e grandiosidade apresentavam-se pela saturação espacial com

construções comprimidas num espaço delimitado, e não por sua

continuidade/complementaridade.6

Todavia, a queda de Roma e a pulverização do poder, típica da organização feudal,

levaram à substituição da agregação monumental por edificações mais intimistas. As ruas e as

construções eram sinuosas, representando os lugares dos encontros e as extensões dos

mercados, o que também se pode verificar pela multiplicidade de usos dos prédios.

Começava-se a esboçar a dicotomia cidade/campo, tendo as muralhas função limitadora do

exercício do poder de tributar, numa perspectiva mais política do que de produção de víveres.7

4 LEFEBVRE, 1999, p. 100.5 LAMAS, 1992, p. 139-140.6 LAMAS, 1992, p. 144-150.7 LAMAS, 1992. p. 151-152.

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No final desse período, ter-se-á a inserção do elemento técnico na ordenação do

espaço urbano, privilegiando-se as formas geométricas, em cujo cerne estava a praça do

mercado. As obras de embelezamento visavam a reafirmar o poder da Igreja, do Estado e da

nobreza. Assim, as normas urbanísticas atendiam aos interesses de uma pequena parcela da

população, segregando os logradouros habitados pelas pessoas de renda inferior. O empirismo

e a religiosidade na produção do espaço urbano são substituídos, na Renascença, por uma

acepção do Urbanismo como Arte Urbana, em que a ordenação do espaço deveria propiciar a

felicidade e o desenvolvimento das potencialidades humanas8, por meio de alternativas para a

vida comunitária, as quais passavam pela construção de uma cidade ideal, que atendesse aos

anseios públicos captados e interpretados pelo arquiteto, a quem caberia a ordenação da

cidade e de suas funções.9

Logo, o homem comum não era visto como o sujeito deste processo, mas como o

espectador, cabendo-lhe aprender a conviver de forma virtuosa. Assim, a cidade não

simbolizava sequer uma concepção majoritária e compartilhada do que aquela população era

ou gostaria de ser, mas a forma como a aristocracia gostaria de ser vista pelos excluídos da

decisão política e pelas demais cidades, justificando-se, assim, a pesquisa histórica em busca

de uma ancestralidade heróica e a construção de monumentos que imprimissem às gerações

futuras as marcas dessa magnitude do passado.10

Percebe-se, portanto, algumas das bases que constituirão o Urbanismo em sua acepção

científica: a cidade como fruto de um exercício racional e não divinal, que influirá na fixação

dos padrões estéticos; a idéia de planejamento das intervenções de modo a fazê-las durar, para

que se tornassem realizáveis e utilizáveis pelos indivíduos11; a concepção de uma cidade

ideal, um projeto com uma predefinição de bem pela coletividade, contraposta à real, tida por

objeto. Entretanto, a cidade da realidade não é inanimada, mas dinâmica e mutável. Essa

distância tornou-se, com o tempo, tão aguda, que as cidades passaram a ser concebidas e

planejadas não com base nos habitantes, mas em suas funções, portanto imaginadas em seus

aspectos espaciais e morfológicos, contrapostas à realidade, repleta de variados modos de

vida.12

8 LAMAS, 1992. p. 172-198; RAMINELLI, 1997, p. 193.9 Assim, ao serem filtradas as diversas concepções de felicidade, estas seriam reduzidas a algumas alternativas,levando, portanto, à homogeneização do pluralismo social. Essa última nota ganha mais relevo quando se atentapara o fato de que os idealizadores de cidade consideravam que cabia à aristocracia o governo da cidade, ou seja,a determinação do que seria compreendido por felicidade.10 BRANDÃO, 2003, p. 1 e 18.11 BRANDÃO, 2003, p. 3-4.12 BRANDÃO, 2003, p. 13-15.

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A funcionalização, na verdade, agravou-se pela inserção da indústria na cidade, uma

vez que se transpôs a estrutura fabril e a moderna divisão do trabalho para a própria divisão

espacial. Assim, os planos de ordenação do solo urbano, quando aplicados, acabavam por

suprimir o direito de as pessoas escolherem onde viveriam, pois deviam integrar-se numa

estrutura racional, reflexo da exploração do operariado.13

É nesse período que o intuito de Napoleão III de fazer de Paris a mais bela capital do

mundo foi alcançado por meio da reforma empreendida por Haussmann na Paris da segunda

metade do século XIX, uma referência para os urbanistas em todo o mundo, devido à

magnitude das obras empreendidas como forma de solucionar os problemas viários, de

adensamento populacional, de abastecimento de água e coleta de esgotos.14 A

“haussmannização” de Paris levou à ampliação da cidade e dos serviços de abastecimento, à

reengenharia administrativa, à criação de parques e jardins, à arborização urbana e à

construção de unidades habitacionais e avenidas.15 Apesar das inúmeras melhorias advindas

da sanitarização e do embelezamento da capital francesa, é inegável que foram os

industriários e os financistas os maiores beneficiários das intervenções, pois o proletariado e a

pequena burguesia expropriada tiveram o modo de vida e a identidade substancialmente

alterados.16

A partir daí, inicia-se a separação entre as Artes e o Urbanismo, institucionalizando-se

este a partir da garantia de sua cientificidade, decorrente da aceitação do seu discurso: “Em

suma, o urbanismo se institucionaliza quando se conforma como um sistema coerente de

idéias para atuar na cidade, apoiado em uma concepção particular do problema, de acordo

com o que serão definidas as diretrizes desse modo de atuar”17. Assim, o Urbanismo é dotado

de um caráter reflexivo e crítico, com pretensões científicas de uma dada verdade preexistente

e, portanto, universalizável.18 Tem-se, assim, a prevalência de um caráter utópico, em que a

cidade é vista como um objeto reprodutível, extraída da categoria tempo, desvinculada da

13 POSADA, 1936, p. 70-85.14 BERGEROT, 2005, p. 62-63.15 BERGEROT, 2005, p. 64.16 A suburbanização explicita essa situação. Os bairros residenciais construídos nas franjas parisiensesdestinavam-se às camadas abastadas, que viviam num misto entre a tranqüilidade campestre e os benefícios dacidade. Já o deslocamento da indústria para o subúrbio, obviamente localizado distante dos bairros anteriormentecitados, levou consigo as camadas populares para os arrabaldes da cidade, segregando-as dos benefíciosencontrados no centro e nos setores privilegiados da cidade, onde se concentrava a maior parte das melhoriasrealizadas (LAMAS, 1992, p. 210).17 BRAGOS, 1993, p. 40-44.18 CHOAY, 1979, p. 1-3.

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realidade e destinada a substituir as estruturas urbanas antigas por outras adequadas ao

homem de seu tempo.19

O postulado da substituição, no entanto, reforçava o caráter utópico do Urbanismo.

Afinal, a partir do momento em que se substitui uma realidade por outra, a primeira passa a

ser vista como o modelo, esquecendo-se totalmente os seus defeitos e as suas vantagens,

conforme o caso, vendo-a como a ordem ou a desordem, que deve ser mantida ou substituída,

enquanto a realidade que substitui passa a ser vista como o seu antônimo, que deve ser

buscado ou evitado. Olvida-se que, no contexto urbano, a substituição somente faz sentido

quando compreendida como convivência de modelos num processo dialético.

Junto com a cientificidade do Urbanismo, teve-se o estabelecimento do mito da

industrialização como uma ruptura na linha temporal, cujo efeito seria o processo de

urbanização, reduzindo-se a cidade a mero objeto estético, em que as intervenções propostas

dotavam-se de uma forte imagem plástica, o que, por um lado, reforçava o caráter autônomo e

neutro do Urbanismo, e, por outro, alienava a sociedade, incapaz de solucionar os problemas

de suas cidades, construindo, assim, dois outros mitos: o espaço planejado como preferível a

qualquer outro e o de que os indivíduos não teriam como mensurar a importância das

intervenções, autorizando-se a sua alienação em face das propostas dos urbanistas. Estas, por

sua vez, refletirão o sobredito postulado da substituição, calcado, porém, na figura de um

homem padrão, que, imune às interferências do meio ou do tempo, apresentaria uma série de

necessidades-tipo, dedutíveis cientificamente.

Dessa forma, ao se distanciarem do caso concreto, as propostas do Urbanismo

passaram a constituir um único arquétipo aplicável em diversas cidades espalhadas pelo

globo, prescindindo das especificidades locais. Para a realização das substituições e a

implementação dos padrões, à cientificidade e neutralidade das propostas do Urbanismo,

agregar-se-á a presunção de veracidade e legitimidade do discurso jurídico, dotando os

padrões urbanísticos de coercibilidade e contribuindo para a sua obrigatoriedade.

Reduz-se a cidade, portanto, a mero objeto estético e de consumo turístico, sem

vinculação com as relações e as diferenças sociais de que é palco e agente. O Urbanismo

concebido nos moldes neutrais, longe de ser o mediador dos interesses público e privado, será

cooptado por este, contribuindo, nos países em desenvolvimento, para que a maioria da

população seja afastada da gestão das cidades e da sua apropriação.20 Reforçada a alienação

política dos citadinos, tem-se a sua segregação espacial, uma vez que o centro é concebido

19 CHOAY, 1979, p. 4 e 15.20 LEFEBVRE, 1969, p. 98.

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não como uma realidade socioeconômica, cuja ocupação varia conforme o poder aquisitivo

dos habitantes, mas meramente como uma localização geográfica.21

Morfologicamente, essa relativização exterioriza a discrepância entre as edificações e

os equipamentos urbanos, reforçando as diferenças sociais. A segregação espacial, a

morfologia urbana e a relativização da relação espaço-tempo explicam, ainda, a atribuição de

um valor de troca ao tempo e ao solo, a mais-valia urbana e a especulação imobiliária. Daí

vislumbrar-se uma racionalidade excludente, em que padrões arquitetônicos e estéticos, a

distribuição e a localização das habitações e as normas de ocupação do solo funcionam como

estratégias na construção de um “muro invisível” capaz de segregar e dividir, em castas, a

população urbana.

3 Urbanismo e paradigma democrático: o Urbanismo participativo

Uma análise mais acurada demonstra que a neutralidade científica e o caráter apolítico

do Urbanismo nada mais foram do que alegoria pós-Revolução Industrial, tanto que, ainda na

primeira metade do século XX, principiaram-se as discussões acerca da questão fundiária, por

meio de debates em torno do próprio direito e acesso à propriedade imobiliária em face das

ideologias democráticas e sociais, culminando na inserção da temática no discurso capitalista

de minoração dos efeitos negativos do sistema.22 Para dizer o mínimo, o Urbanismo foi

adaptado às ideologias políticas dos governos partidários das mais diversas correntes.

O Urbanismo foi, pois, colocado diante de suas próprias limitações, porquanto, se a

sua cientificidade fundava-se na neutralidade científica, então, dificilmente, poderia ser

considerado ciência. Daí a sua concepção como um sistema sujeito a influências exteriores,

capaz de oferecer respostas parciais aos problemas urbanos, caracterizados por seus múltiplos

aspectos, em que respostas meramente urbanísticas ser-lhe-ão, no máximo, paliativos.

O objeto de estudo do Urbanismo, nesse sentido, é ampliado para abarcar, além da

cidade, o território que a circunda, impedindo sua concepção somente como arte, ciência ou

técnica. Ele passa a ser visto como um misto dessas definições, tendente a transformar a

realidade em algo que se concebe como preferível ao status quo. A definição dessa situação

tida por ideal e os meios necessários para se chegar a ela decorrem de uma decisão, ou seja,

21 CARLOS, 1997, p. 24-30 e 78.

Na verdade, o espaço pode ser concebido de três formas. No primeiro caso, é geográfico. No segundo, éconsiderado no tocante aos custos de otimização, ou seja, a sua utilização passa a ser regulada em razão dotempo. No último caso, há o planejamento do espaço em razão das proximidades e das distâncias que se desejamestabelecer (LEFEBVRE, 1999, p. 110-118 e 50).

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de um ato de poder.23 Dessa forma, afirmar que o Urbanismo fundamenta um ato de poder,

porquanto contribui para a tomada de uma decisão, não exclui o seu caráter científico, mas o

aclara, na medida em que traz para o seio de seu conceito a discussão política, afastando-o de

uma pretensa neutralidade científica.24

Compreender o Urbanismo nestes termos implica perquirir a quem caberia tomar a

decisão. Poder-se-ia pensar que esse ato seria, meramente, o desejo do técnico. Isso não é de

todo verdade, pois, se abstratamente as propostas se constituíram em modelos científicos,

pragmaticamente a sua realização decorria de uma decisão estatal, que, considerando os

inúmeros interesses legítimos existentes no Estado, concretizasse os ideais prescritos

constitucionalmente:

Deve-se admitir que só pode se tratar de uma arbitragem política e não de ummétodo racional, o que não quer dizer que se deva eliminar qualquer dado racionalda preparação da arbitragem. Isso significa em termos concretos que as decisões deurbanismo não poderão satisfazer ao mesmo tempo os proprietários de terrenos e oscandidatos às casas, os automobilistas e os pedestres, os corretores imobiliários eos ecologistas, os jovens esportistas e as pessoas idosas etc e que o método deestudos de urbanismo mais refinado nada poderá fazer além de identificar comprecisão as vantagens e os inconvenientes que resultarão das decisões consideradaspara cada uma das categorias de cidadãos envolvidos.25

Não se está advogando a impossibilidade de negociação entre o setor público e o

privado nas questões relativas ao Urbanismo, mas que essa negociação somente é possível

quando o interesse do empreendedor coincida com o público, sob pena de o Estado agir sem

legitimidade, o que, nessa hipótese, configuraria desvio de finalidade. Conquanto o

Urbanismo motivado por interesses exclusivamente privados seja um acinte, conforme se viu

alhures, a sua prática era usual, e a sua cientificidade aliada à coercibilidade própria das

normas jurídicas eram utilizadas como justificativas para esse modo de intervenção.

Nesse quadro, associações locais e urbanistas iniciaram uma série de críticas fundadas

na falta de transparência dos motivos determinantes para a escolha de dada proposta e na falta

de maleabilidade dessas, responsável pelo pouco comprometimento dos cidadãos na execução

das ações. Propunha-se, pois, viabilizar o acompanhamento do processo de tomada das

decisões urbanísticas, permitindo o exercício de um controle social ex ante e ex post.

22 LAMAS, 1992, p. 306.23 LACAZE, 1993, p. 10-17.24 Exemplo disso é que os diagnósticos e estudos de soluções bem como as críticas às medidas implementadasconstituem um dos pilares de sua cientificidade, que somente tem sentido quando postos a dialogar com outrasciências e com as formas utilizadas para que se chegasse à decisão final em matéria de Urbanismo.25 LACAZE, 1993, p. 17.

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A crítica popular parte de um ponto totalmente concreto, mas que assume comclareza a forma de uma reivindicação de poder. Os habitantes do bairro a quese destina um projeto declaram não querer admitir que as decisões queinfluenciam diretamente seu contexto de vida possam ser tomadas por “eles”longínquos e inacessíveis, sem que se pense em lhes pedir a opinião.26

Nesse contexto, a cidade não mais é vista como um simples objeto, mas como uma

estrutura viva, espaço das relações dos seus habitantes entre si e com o meio. O espaço físico

é, assim, um conjunto de signos apropriados pelos indivíduos de formas diversas, exigindo

que esses mesmos indivíduos que dão significado à cidade participem do seu processo de

ordenação.

A racionalidade econômica e científica, portanto, passa a dividir espaço com a esfera

simbólica, ou seja, a percepção que cada habitante tem da cidade e a forma como se dá a sua

apropriação, implicando na quebra da hierarquização entre o conhecimento científico e o

senso comum. Ora, é exatamente o argumento de autoridade dado ao Urbanismo que camufla

as relações e os interesses que atuam na cidade, encobrindo o domínio do espaço, a luta pelo

lucro advinda da apropriação do solo urbano e da mais-valia, reduzindo os citadinos à

condição de meros compradores de espaço.27 Daí a importância da cooperação entre senso

comum e Urbanismo, que se poderia exemplificar numa relação dialógica, complementar e

dialética entre estes dois campos de conhecimento, a qual enriqueceria a ambos.28

Da sobredita abreviação, duas conclusões saltam aos olhos. A primeira e mais evidente

é que a informação, tanto para o técnico quanto para a população, tem um papel central em

todo o processo, pois um dos elementos para uma tomada de decisão com pretensões de

efetividade é a existência de dados confiáveis que fundamentem a escolha. A segunda

conclusão se refere à organização da população em grupos de pressão que viabilizem a defesa

dos interesses de seus membros.29 Dessa forma, os habitantes internalizam e se conscientizam

26 LACAZE, 1993, p. 58.Tem-se, assim, a adequação das ações urbanísticas ao paradigma do Estado Democrático de Direito, uma vezque o sistema político representativo se apresentou inábil para produzir o apoio necessário às soluções deordenação territorial, seja por sua cooptação, seja pela falta de informações. Dessa forma, a co-responsabilidadepor estas ações se apresenta como forma de apoio e coleta de dados para elaboração das propostas.LUHMANN, 1980, p 169.

27 LEFEBVRE, 1999, p. 143.28 Nesse diapasão, ao urbanista caberia o diagnóstico não somente técnico, mas também das percepções populares

sobre a realidade. Em seguida, a formulação de propostas caberia tanto aos técnicos quanto aos citadinos,analisando-se a viabilidade de cada uma delas. Por fim, os citadinos democraticamente tomam a decisão quemelhor lhes aprouver e acompanham a execução das ações tendentes a concretizá-la.29 COSTA, 2007, p. 131-144.

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sobre a cidade que têm, a cidade que querem e a forma que elegeram para transformar aquela

nesta, o que os torna sujeitos do planejamento.

Além dos aspectos práticos, a reflexão sobre os métodos participativos abriu novasperspectivas ao papel respectivo dos diversos campos disciplinares no domínio dourbanismo. Ele torna explícito o papel das ciências humanas como domínio culturalcujo conhecimento é indispensável a todos os especialistas, qualquer que seja suaformação inicial, a partir do momento em que se decide renunciar à utopiatecnocrático que consiste em tentar fazer a felicidade dos habitantes sem pedir suaopinião.30

O Urbanismo participativo é um meio para atender às necessidades da sociedade

urbana. Ele não se vincula a modelos prefixados, está em constante mutação e adaptação,

avançando junto com a realidade, para acompanhar o dinamismo dessa sociedade no qual foi

delineado.31 Exatamente por depender da sociedade urbana, eminentemente plural, o

Urbanismo participativo não apresenta um conceito único, mas múltiplas definições, que, em

comum, têm o caráter decisório, nos termos expostos.

4 Urbanismo, política urbana e Direito: o diálogo para a efetivação do direito à cidade

Numa síntese apertada, pode-se dizer que o Urbanismo é, ao mesmo tempo, arte,

ciência e técnica, dirigidas à tomada de decisões pela sociedade, referentes à organização do

território, com o escopo de ordená-lo de modo a proporcionar qualidade de vida aos homens.

Essa definição traz em seu bojo duas noções: a primeira é referente a um arcabouço de

conhecimentos técnicos, científicos e artísticos incidentes sobre um dado objeto – no caso, o

território; a segunda evidencia o caráter decisório presente nas propostas do Urbanismo, ou

seja, o conjunto de medidas estatais para a organização do território, de modo a propiciar a

consecução de um fim.

Tomando-se a segunda acepção, pode-se definir a Política Urbana, segundo a

Constituição da República, como um conjunto de ações programadas e planejadas no âmbito

estatal, fruto de um processo dialógico entre o Estado e a sociedade, o qual objetiva efetivar o

direito à cidade, compreendido na díade acessibilidade e participação.32

30 LACAZE, 1993, p. 71.31 LEFEBVRE, 1969, p. 97.32 Apesar de definida no âmbito estatal, isso não significa que ela se restrinja às ações do Estado. Ao contrário, asua execução pode-se efetivar por uma miríade de formas jurídicas, como leis, atos unilaterais, processos, alémda transferência, para o setor privado, por meio de contratos de gestão ou parecerias, por exemplo (LEAL, 2001,p. 35-110).

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O direito à cidade implica que os munícipes participem das decisões referentes à

produção e ordenação do espaço, conferindo-lhes a possibilidade de, numa dimensão

simbólica, apropriar-se desse espaço, dotando-o de significados, de modo a se sentirem

membros da comunidade que vive nesse espaço, de se sentirem retratados na paisagem

urbana. Logo, deve haver acessibilidade aos bens, à infra-estrutura, aos serviços públicos33 e

às condições sociais existentes, de modo a possibilitar que os homens lhe dêem um

significado.

Dito de outra forma, o direito à cidade visa a integrar os indivíduos no espaço público,

compreendido tanto no seu aspecto espacial quanto como local privilegiado das relações

dialógicas, já que são relações que conferirão sentido ao espaço.

Nesse sentido, os indivíduos se conscientizam, por um lado, de sua, até então,

exclusão deste processo, e, por outro, de seus direitos, ampliando a sua atuação pública na

busca de melhoria em sua qualidade de vida.34 Deixam de ser meros coadjuvantes para

tomarem o papel central no processo decisório, o que gera a ampliação da própria concepção

de direito, que passa a se aproximar da noção de solidariedade, compreendida como a reunião

de todos para a consecução de um fim, que, apesar de não beneficiar, num primeiro momento,

um grupo de indivíduos, alcançará esse desiderato de forma mediata, quando melhorar a

qualidade de vida dos mais carentes.35

Há, assim, uma simbiose entre os aspectos técnicos e políticos, na medida em que se

propõe a repartição dos avanços tecnológicos a todos os indivíduos tomadores da decisão e

sua integração no permanente processo de construção desse espaço.

A percepção do acesso à cidade como um direito de praticá-la, vivenciá-la,ultrapassa a sua condição de unidade social complexa, nos moldes da gestão urbanaconvencional. Na verdade, o uso social da cidade impõe a dominância de práticasparticipativas capazes de permitir situações que conduzam a um processo deintercâmbio entre sua base administrativa, a respectiva sociedade nela existente e ainfra-estrutura construída (...)36

33 Como objetivo buscado pela política urbana, o direito à cidade é a expressão da dignidade da pessoa humana na

produção do espaço ou, conforme Liana Portilho de Mattos, “(...) um compromisso com a dignidade da pessoahumana e com a garantia dos direitos humanos fundamentais: moradia, trabalho, saúde, educação, lazer, acesso àjustiça, segurança, entre tantos outros” (MATTOS, 2002, p. 86).34 CAPILONGO, 2002, p. 80.

35 MORAES, 2001, p. 167-190.36 SILVA, 2001, p. 11.

Note-se, entretanto, que, apesar da amplitude conferida à noção de direito à cidade, é equivocado pensar que osproblemas urbanos serão solucionados, tão-somente, pela política urbana. Para isso se exige um delineamento depolíticas públicas, em que cada uma, dentro de seu âmbito de atuação, dirija-se para solucionar essaproblemática, reduzindo, assim, o abismo social existente (SANTOS, 1994, p. 113).

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Ora, é inegável que, devido ao princípio da legalidade, expressão do Estado de Direito,

todas as ações do poder público devem emanar de normas jurídicas, o que demonstra a

correlação entre o Direito e as políticas públicas.37 Estas normas, portanto, devem-se adequar

às especificidades do substrato material sobre o qual pretendem atuar, sob pena de ser-lhes

retirado o mínimo de eficácia necessária para que sejam efetivas.38

Há, portanto, uma íntima relação entre a Política Urbana e o Urbanismo. Aquela

define o que se compreende por direito à cidade, e este fornece os conceitos, parâmetros e

meios que, junto com os estudos de outras áreas do saber também preocupadas com o mesmo

fenômeno, fornecerão subsídios para que os tomadores da decisão política escolham os

instrumentos que, adaptados à sua realidade, efetivarão o escopo da Política Urbana.

Assim, o Urbanismo é dotado de um instrumental que, organizado e estruturado com

base no desenvolvimento intelectivo humano, possui a pretensão de resolubilidade dos

problemas urbanísticos. Estes, devido à sua dinamicidade, obrigam sejam tomadas novas

decisões no âmbito da Política Urbana, as quais se baseiam numa escolha popular fundada nas

várias possibilidades fornecidas pelo Urbanismo e pelas demais ciências parcelares.

Dessa forma, a Política Urbana, constitucionalmente prescrita, não se mostra estática,

mas se apresenta mutável, para abarcar as alterações no plano fenomênico, redirecionando as

ações estatais para a concretização do direito à cidade. Isto obriga que, diante de mudanças na

decisão urbanística, devem-se buscar outras soluções, não prescritas pelo modelo técnico

aplicado, fazendo-se necessário, portanto, buscar subsídios em outras ciências. Daí o caráter

interdisciplinar da Política Urbana.

Enfim, como função pública, as ações urbanísticas não podem ser concebidas como

tendo origem somente na opinião dos técnicos, mas devem ser compreendidas como uma

decisão produzida pela sociedade num processo dialógico. Todavia, uma vez tomada a

decisão, os instrumentos são transpostos para o Direito, devido à necessidade de torná-los

obrigatórios para o Estado e para os cidadãos. Assim, adquirem um status jurídico, a partir de

sua tradução para o código da licitude/ilicitude – as condutas lícitas seriam aquelas que, em

última análise, concretizarão o direito à cidade, o fim da Política Urbana, ao passo que as

ilícitas obstarão que esse objetivo seja alcançado.39 Portanto, os textos normativos produzidos

37 MADER, 1991. p. 44.38 SOARES, 2004, p. 36.39 Segundo o professor Washington Peluso Albino de Souza, “Já, então, a análise desloca-se grandemente para avisão especializada e retorna, em seguida, ao conceito global. As conquistas urbanísticas, arquitetônicas, osavanços das ciências ambientais, correm em socorro da cidade. E o direito é chamado a instrumentalizarconceitos e medidas dirigidos no intuito de humanizá-la ou, quando não, de evitar que a vida se descaracterize atal ponto em seu interior, que fiquem sem respostas todas as questões relacionadas com as próprias razões de

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nesse processo de tradução para o código jurídico não buscarão simplificar a complexidade do

fenômeno urbano, mas fornecerão formas de com ela trabalhar.40

Tais textos normativos, portanto, não constituem normas aplicáveis ao Urbanismo,

com o intuito de tornar a temática mais palatável aos aplicadores do Direito. Isto significaria,

por um lado, uma restrição aos instrumentos urbanísticos, olvidando-se daqueles fornecidos

pelos demais ramos do conhecimento41, e, por outro, escamotearia o fato de que os referidos

textos não são instrumentos exclusivamente jurídicos, mas também instrumentos dos demais

campos, que, de alguma forma, relacionam-se com a questão da produção do espaço.42

Conclui-se, pois, que se está diante de um ramo jurídico próprio, que, objetivamente,

caracterizar-se-ia como um conjunto normativo cujo objeto são as relações jurídicas

decorrentes da produção do espaço dirigidas à concretização do direito à cidade.43

Dessa forma, o direito à cidade tem papel central na linha argumentativa tecida,

demonstrando uma das facetas das normas jus-urbanísticas, o seu caráter prospectivo.

Esclareça-se, contudo, que a prospecção não autoriza seja o direito à cidade esvaziado de sua

juridicidade e pensado sempre no plano do porvir. Na verdade, a prospecção se apresenta

como norte na produção normativa, o que não significa que, nas lides apresentadas ao

Judiciário, o direito à cidade seja desprovido de caráter normativo, pois numa perspectiva

“fragmentária, própria de quem examina o problema nos limites da lide proposta pelas

partes”, o direito à cidade se apresenta exigível como direito subjetivo.44

O tema da prospecção como orientação da atividade legiferante na seara jus-

urbanística faz com que a efetividade normativa, isto é, o câmbio da realidade decorrente e em

conformidade com o escopo das normas45, ganhe relevo. É nessa perspectiva que se pode

afirmar que as normas jurídicas, individualmente consideradas, possuem um fim imediato e

sobrevivência do homem e da sociedade. A cidade passa a exigir um tratamento cuja falta levou às megalópolesprenhes de problemas que conduziram a um tipo de vida massacrante” (SOUZA, 1996, p. 211).40 LUHMANN, 1980, p. 152-155.41 Basta notar que os estudos relativos ao fenômeno da metropolização e das cidades organizadas em redes sãomuito mais desenvolvidos na Geografia e na Economia, o que exigirá que os legisladores lancem mão dessesestudos no momento de criarem leis que visem a regular as relações jurídicas decorrentes dessa realidade.42 CAMPILONGO, 2002, p. 95.43 Esta especificidade dotaria, portanto, o Direito Urbanístico, em sua acepção científica, de autonomia,porquanto a produção normativa se desenvolveu a tal ponto, que gerou princípios e conceitos próprios –autonomia dogmática – tendo esta produção inspirado a elaboração de institutos e figuras jurídicas próprias,além da apropriação de elementos pertencentes a outros ramos do direito, relidos sob a ótica jus-urbanística.44 CAPILONGO, 2002, p. 104-105.Ilustra-se esta afirmação por meio do direito subjetivo à moradia que autoriza o seu titular a requerer o título depropriedade de imóvel particular por meio da usucapião especial de imóvel urbano, conforme os artigos 9° a 14,da Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001, ou a requerer, administrativa ou judicialmente, o título de concessão deuso especial para fins de moradia no caso de ocupação de bens públicos, possibilitando, assim, sua segurança naposse, conforme prescreve a Medida Provisória n. 2.220, de 4 de setembro de 2001.45 COSTA, 2007, p. 181-186.

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outro mediato. Assim, quando se analisam as normas de Direito Urbanístico, verifica-se que

elas se dirigem a tutelar, imediatamente, um dado bem juridicamente relevante e,

mediatamente, a concretizar o direito à cidade.46 Por exemplo, os rodízios de carros,

implementados em algumas capitais nacionais, visam a facilitar o trânsito em dado dia,

reduzindo os engarrafamentos. Contudo, indiretamente, visam, também, a reduzir o tempo

gasto nos deslocamentos, principalmente para as pessoas que residem nos locais mais

afastados, ou seja, objetiva garantir-lhes melhor acesso aos serviços de transporte urbano,

concretizando o direito à cidade.

A complexidade da parcela da realidade sobre a qual esses textos normativos incidem

aliada ao seu caráter prospectivo, à busca da efetividade das medidas urbanísticas e à sua

utilização por variados grupos e campos para a tomada de suas decisões, exigem novas figuras

ou formas jurídicas, que, sem retirar a juridicidade, possibilitem a efetivação do desiderato

jus-urbanístico, seja unilateralmente, seja de forma pactuada.47 Assim, esses textos não

admitem uma compreensão estática, universalista e neutral dos textos normativos.

A abstração e a indeterminação, portanto, longe de serem um “defeito da norma” ou

reproduzirem a hermenêutica combatida na seção 2 deste trabalho, apresentam-se como

recursos legislativos cujo escopo é ampliar o raio de abrangência da norma, possibilitando-lhe

a aplicação a inúmeros casos48 bem como a sua permanente atualidade ou mutabilidade, isto

é, a variação espaço-temporal dos conceitos que lhes possibilitaria abarcar as mudanças

sociais, sem se fazerem necessárias alterações legislativas.49 Assim, afastasse o fetichismo da

lei50, porquanto é na atividade de aplicação dos textos normativos a um caso que o sentido

semântico será preenchido, resolvendo-se a indeterminação/abstração.51

46 Dessa forma, discorda-se de José Afonso da Silva, quando este diz que um dos princípios do DireitoUrbanístico seria a coesão dinâmica compreendida como a particularidade das normas jus-urbanísticas que asdotaria de sentido e eficácia somente quando compreendidas em conjunto, porquanto isoladamente nãoofereceriam o sentido prospectivo (SILVA, 2006, p. 54).A coesão dinâmica, nos termos expostos, seria uma característica das normas jurídicas, no sentido de que estas,por um imperativo de coerência lógica, não se isolam, mas se ligam para produzir um todo harmônico, isto, é umsistema (BOBBIO, 2006, p. 75).Daí ser a coesão dinâmica inerente ao Direito ou, pelo menos, àqueles ramos destinados a concretizar algumapolítica pública, fazendo-se perceber mais claramente no Direito Urbanístico brasileiro em razão de seu objetivo,a efetivação do direito à cidade, poder extraído da Constituição da República.47 É por isso que António Francisco de Sousa afirma que os temas relacionados com o planejamento, no casourbanístico, nem sempre poderem adequar-se às figuras jurídicas tradicionalmente concebidas. Afinal, os planosse dirigem para uma concretização futura, o que pode ocorrer por meio de inúmeras manifestações volitivas,passíveis de reorientação constantes e sujeitas a um processo de constante avaliação de efetividade (SOUSA,1994, p. 129-132).48 ENGISH, 1983, p. 206-207.49 DI PIETRO, 2001, p. 98.50 BOBBIO, 2006, p. 121.51 MÜLLER, 2005, p. 48.

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Tal preenchimento de sentido não retira a coerência sistêmica, mas redireciona as

normas, para possibilitar a efetivação do direito à cidade. Destarte, as inovações técnicas do

Urbanismo e das ciências parcelares ou os efeitos da Política Urbana nem sempre significarão

uma alteração do próprio texto, pois a abertura e a indeterminação possibilitarão a sua

atualidade.

Longe de constituir uma atividade criativa, essa possibilidade demonstra a

intensificação do diálogo entre Direito, Política Urbana, Urbanismo e as demais ciências

parcelares, numa perspectiva interpretativa e atualizadora, sem que isto signifique que um dos

campos usurpa as atividades dos outros.52

Assim, por vezes, devido às inúmeras nuances da realidade, exigir-se-ão soluções

normativas adequadas às especificidades locais, devendo o processo de escolha realizar-se

também na aplicação do texto ao caso, que, sem macular o sistema legiferante, aproxima os

interessados da produção da solução adequada à situação verificada.53 Neste caso, o

preenchimento de significados dependerá de uma decisão dos próprios atingidos pela

medida.54

Em outras situações, porém, a aludida comunicação se dará pelo preenchimento de

significados técnicos, decorrentes da evolução técnica e científica, sendo tais conceitos

determináveis ou atualizáveis por meio da discricionariedade técnica, que, sem inovar no

ordenamento, atualizá-lo-ia.55

Em outras hipóteses, porém, devido à não-efetividade de alguma medida ou ao

necessário redirecionamento, tornar-se-á preciso alterar o texto normativo, podendo esta

medida ser, de antemão, prevista56 ou, então, informada pelo Urbanismo, pelas demais

ciências parcelares, pela Política Urbana ou pelo Direito.57 Todavia, para a mudança

normativa, nesta hipótese, dever-se-á observar todo o processo descrito para a tomada da

decisão, voltando-se, assim, ao ponto de partida, expresso no início desta seção.

52 LUHMANN, 1980, p. 134-135 e 174-175.53 LUHMANN, 1980, p. 158.54 Exemplo do exposto ocorre na implantação de empreendimentos com potenciais efeitos danosos sobre aambiência urbana ou nas operações urbanas consorciadas ou, ainda, na produção de normas orçamentárias,conforme prescrevem os artigos 2°, XIII; 32 a 34 e 43 a 45, da Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001.55 Imagine-se que dada lei prescreva a exigência de se reservar uma área de permeabilidade de dada metragemnos lotes objeto de construções, possibilitando, dessa forma, o escoamento e a absorção das águas das chuvas.Quando foi criada tal norma, inexistia revestimento apto a permitir a referida absorção, razão pela qual não sepoderia admitir cobertura na sobredita área. Todavia, por meio de pesquisas das técnicas construtivas, cria-se oreferido revestimento, autorizando-se o revestimento das áreas que anteriormente deveriam ficar descobertas,sem prejuízo do equilíbrio urbano. Nesta hipótese, as inovações tecnológicas autorizariam uma atualização dotexto normativo, sem que isto significasse a sua alteração.56 Tem-se como ilustração o direito de preempção e a revisão decenal do plano diretor, conforme prescrevem osartigos 25, § 1° e 40, § 3°, da Lei n. 10.257, de 10 de julho de 2001.

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5 Conclusão

A cidade não pode ser reduzida a palco do desenvolvimento da sociedade; ela é,

também, um produto social. Concebida nessas bases, não é uma mera grandeza física e

estática. Ao contrário, é dinâmica, refletindo as contradições inerentes à organização social.

Essa dinamicidade permite verificar, numa análise das formas urbanas, um iter que, ao longo

dos tempos, mostrou-se, concomitantemente, inclusivo de novas funções – como a política, a

comercial, a industrial –, mas excludente dos indivíduos que, não tendo acesso às benesses

decorrentes da agregação de funções, foram alienados desses processos, tendo seu papel

reduzido a um plano secundário.

A ordenação espacial nascida da religião, do empirismo e do casuísmo, tendente a

proteger e a dignificar o centro de poder, demarcando a cidade como locus da civilidade,

passou a ser considerada arte, geratriz da felicidade por meio da geometria das formas, sem

perquirir, contudo, o conceito de felicidade que deveria ser implementado. Fundado, portanto,

na idealidade, o Urbanismo ganha ares científicos por meio de uma pretensa universalidade e

neutralidade, o que o afastou dos aspectos sociais que, ao mesmo tempo, determinam e são

determinados por seu objeto de estudo. Neste panorama, o Direito se apresentou como

legitimador de um processo perverso, que não se fundamenta na apropriação privada do solo,

mas na exclusividade dos interesses proprietários, em oposição ao sujeito passivo universal,

identificado como toda a sociedade. Em vez de buscar uma redução da desigualdade social, a

produção jurídica se voltou a justificá-la.

Todavia, ao abrir os olhos para a complexidade da produção do espaço e o caráter

segregacionista verificado, os postulados de neutralidade e completude das diversas ciências

parcelares que cuidam dos fenômenos citadinos caem por terra. O Urbanismo é obrigado a

revisar-se e, compreendendo a cidade como inserta num território, passa a se orientar para um

processo dialógico entre todos os envolvidos na produção desse espaço, agregando, pois, suas

facetas técnica, científica e artística aos aspectos políticos tendentes à tomada de uma decisão

urbanística que reflita os anseios da população, em obediência à regra da maioria e aos limites

impostos pela Constituição.

Dessa forma, tal decisão deve buscar definir a Política Urbana constitucionalmente

prescrita, que, no caso brasileiro, refere-se ao atendimento do direito à cidade, compreendido

57 CAPILONGO, 2002, p. 79.

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como acesso aos bens urbanos e participação popular no processo de tomada de decisões,

referentes à ordenação espacial. Propicia-se, assim, numa dimensão simbólica, que os

indivíduos se apropriem e atribuam significados a esse espaço.

Para alcançar, portanto, a efetivação do direito à cidade, exige-se a revisão dos

dispositivos normativos e a criação de novas formas e figuras jurídicas aptas às situações

apresentadas incidentes sobre a matéria. Estabelece-se, assim, uma relação: a Política Urbana

define o que se compreende por direito à cidade; ao Urbanismo cabem os conceitos,

parâmetros e meios, que se agregarão aos de outras ciências, que fornecerão o substrato para a

tomada de decisão adequada à realidade local; e o Direito traduz para o código da

licitude/ilicitude tais resoluções. Nesse intrincado encadeamento, está o Direito Urbanístico,

compreendido, objetivamente, não como legislação aplicável ao Urbanismo, mas como o

conjunto de normas de direito cujo objeto são as relações jurídicas decorrentes da produção

do espaço e dirigidas à concretização do direito à cidade.

O direito à cidade apresenta-se, pois, tanto como direito subjetivo dos munícipes –

autorizando-os a se socorrer do Poder Judiciário – quanto como norteador da atividade

legiferante, que, afastando-se de uma perspectiva monista, escamoteadora da realidade

complexa, passa a exigir uma postura interdisciplinar dos produtores dos textos normativos.

As normas produzidas, assim, não são instrumentos unicamente jurídicos, mas

também passam a interessar as inúmeras ciências parcelares que tratam da produção e

ordenação do espaço, como, por exemplo, o Urbanismo. Nessa perspectiva, exige-se que esses

vários campos passem a se comunicar não somente porque, embora existam novas fórmulas

normativas, o código jurídico é limitado e, por vezes, inábil para solucionar os casos que se

apresentam, mas outrossim para gerar o feedback necessário para reorientar as próprias ações

urbanísticas e, por decorrência, as próprias normas produzidas.

Dessa forma, além das normas jus-urbanísticas, interessarão ao Direito as informações

fornecidas no processo dialógico estabelecido entre os campos temáticos que tratam dessa

seara. Estes trarão a lume dados que importarão ao Direito, seja na análise da legalidade de

dado programa urbanístico, seja na tomada de decisão acerca de algum direito subjetivo

garantido por normas de Direito Urbanístico, seja no auxílio às atividades de produção

normativa.

A relação dialógica entre o Urbanismo e as demais ciências parcelares, a Política

Urbana e o Direito não se resume, portanto, ao momento da produção dos textos normativos.

Vai além, pois passa a exigir constante comunicação entre os campos, que, por um lado,

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garantem a juridicidade do direito à cidade e, numa perspectiva prospectiva, possibilitam-lhe

a efetividade.

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RESUMO

Este é um artigo que objetiva apresentar as relações de comunicação entre o Direito e o Urbanismo,que, longe de considerarem o espaço como realidade meramente física e imutável, comprometem-secom a emancipação dos indivíduos por meio da produção de normas voltada para a efetivação dodireito à cidade, compreendido como acessibilidade aos bens urbanos e participação no processodecisório.

Palavras-chave: Direito, Urbanismo, interfaces, produção de normas jurídicas, direito à cidade.

ABSTRACT

This is an article that objective to present the relations of communication between Law and Urbanismthat, far from considering the space as physical and mere invariant reality, are committed to theemancipation of the individuals, by means of the production of rules directed to the effectiveness ofthe right to the city, understood as accessibility to the urban possessions and participation in thedecision process.

Keywords: Law, Urbanism, interfaces, production of juridical rules, right to the city.