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AS MODALIDADES ESPORTIVAS E OS JOGOS NO ÂMBITO ESCOLAR Brasília, 2011.

As modAlidAdes esportivAs e os jogos no âmbito escolAr · O jogo é “[...] uma simulação lúdica da realidade, ... uma atividade ou ocupação voluntária, ... é uma atividade

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As modAlidAdes esportivAs e os jogos no âmbito escolAr

Brasília, 2011.

elaboração

Alessandra Monteiro

produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração

Todos os direitos reservados.

W Educacional Editora e Cursos Ltda.Av. L2 Sul Quadra 603 Conjunto C

CEP 70200-630Brasília-DF

Tel.: (61) 3218-8314 – Fax: (61) 3218-8320www.ceteb.com.br

[email protected] | [email protected]

SUMÁRIO

ApresentAÇÃo ..................................................................................................................................... 5

orgAniZAÇÃo do cAderno de estUdos e pesQUisA ................................................................................. 6

introdUÇÃo ......................................................................................................................................... 8

UnidAde i

RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR .............................................. 9

cApítUlo 1

CONCEITOS BáSICOS DE jOgOS E ESPORTE. ESPORTE EDUCACIONAL, DE RENDIMENTO E DE PARTICIPAçãO 11

cApítUlo 2

CARACTERIzAçãO E COMPREENSãO DO ESPORTE DA ESCOLA. O PAPEL DA COMPETIçãO NA ESCOLA ......... 15

cApítUlo 3

ESCOLA DE ESPORTE NA ESCOLA. ASPECTOS DO TREINAMENTO ESPORTIVO NO âMBITO ESCOLAR ............. 18

cApítUlo 4

IDENTIfICAçãO DAS MODALIDADES ESPORTIVAS E DOS jOgOS COMO TRANSMISSãO CULTURAL NA ESCOLA 20

UnidAde ii

PROPOSTAS METODOLÓgICAS DO ESPORTE COMO TEMáTICA NAS AULAS DE EDUCAçãO fÍSICA ............................ 23

cApítUlo 5

ASPECTOS DIDáTICOS E CULTURAIS DA PEDAgOgIA DO ESPORTE ........................................................ 25

cApítUlo 6

CARACTERÍSTICAS DAS MODALIDADES ESPORTIVAS COLETIVAS ADEqUADAS A CADA fAIxA ETáRIA ............ 27

cApítUlo 7

CARACTERÍSTICAS DAS MODALIDADES ESPORTIVAS INDIVIDUAIS ADEqUADAS A CADA fAIxA ETáRIA ........... 30

UnidAde iii

OS jOgOS COMO POSSIBILIDADES NAS AULAS DE EDUCAçãO fÍSICA ............................................................... 33

cApítUlo 8

O fURTO DO LúDICO NA INfâNCIA CONTEMPORâNEA ....................................................................... 35

cApítUlo 9

O jOgO E O BRINCAR NA EDUCAçãO ............................................................................................ 37

cApítUlo 10

jOgO E CULTURA ..................................................................................................................... 39

cApítUlo 11

CLASSIfICAçãO DOS jOgOS ....................................................................................................... 40

cApítUlo 12

O jOgO E A EDUCAçãO fÍSICA .................................................................................................... 45

UnidAde iv

SITUAçÕES DE PRáTICAS PEDAgÓgICAS ADEqUADAS AOS CONTEúDOS DO jOgO DA ESCOLA .............................. 47

cApítUlo 13

SUgESTÕES DE ATIVIDADES ........................................................................................................ 50

pArA (nÃo) FinAliZAr ......................................................................................................................... 57

reFerênciAs ..................................................................................................................................... 58

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APRESENTAÇÃO

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade. Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

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ORGANIZAÇÃO DO CADERNO DE ESTUDOS E PESQUISA

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam a tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta, para aprofundar os estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação

Pensamentos inseridos no Caderno, para provocar a reflexão sobre a prática da disciplina.

Para refletir

Questões inseridas para estimulá-lo a pensar a respeito do assunto proposto. Registre sua visão sem se preocupar com o conteúdo do texto. O importante é verificar seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. É fundamental que você reflita sobre as questões propostas. Elas são o ponto de partida de nosso trabalho.

Textos para leitura complementar

Novos textos, trechos de textos referenciais, conceitos de dicionários, exemplos e sugestões, para lhe apresentar novas visões sobre o tema abordado no texto básico.

abc

Sintetizando e enriquecendo nossas informações

Espaço para você fazer uma síntese dos textos e enriquecê-los com sua contribuição pessoal.

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Sugestão de leituras, filmes, sites e pesquisas

Aprofundamento das discussões.

Praticando

Atividades sugeridas, no decorrer das leituras, com o objetivo pedagógico de fortalecer o processo de aprendizagem.

Para (não) finalizar

Texto, ao final do Caderno, com a intenção de instigá-lo a prosseguir com a reflexão.

Referências

Bibliografia consultada na elaboração do Caderno.

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INTRODUÇÃO

O jogo e o esporte são manifestações culturais que compõem o corpo de conhecimento próprio da Educação Física, seja a Educação Física ensinada nas escolas de Educação Básica seja aquela ensinada em outros ambientes que não o escolar.

O jogo pode aparecer como possibilidade para o ensino do esporte e, como o próprio tema a ser ensinado (jogos cooperativos, competitivos etc.). O esporte deve assumir um caráter diferenciado do que o que conhecemos atualmente. As diferentes modalidades esportivas (coletivas ou individuais) devem ser ensinadas de modo a “encantar” os alunos, mas sempre contemplando as diferentes categorias de conteúdos (atitudinais, conceituais, factuais e procedimentais).

Ao longo deste caderno didático apresentaremos discussões e reflexões acerca dessas manifestações no ambiente escolar, como conhecimento sistematizado e que deve ser ensinado aos alunos nos diferentes níveis de ensino.

Nosso objetivo é propor reflexões que contribuam para um entendimento diferente a respeito do jogo e do esporte como temas da Educação Física escolar, contribuindo para a mudança da prática pedagógica, tornando-a mais interessante e significativa para os alunos. Assim, também, podemos esperar uma mudança na relação dos alunos com a Educação Física na escola, suplantando a ideia de que esses conhecimentos existem apenas para “divertir e relaxar os alunos”, demonstrando que a Educação Física é uma prática pedagógica contextualizada e que tem, sim, conhecimentos a serem ensinados. Entre eles, o jogo e o esporte.

objetivos » Discutir o esporte como fenômeno sociopolítico contemporâneo.

» Discutir as possibilidades e as especificidades dos esportes coletivos e individuais.

» Apresentar estratégias para o ensino dos esportes coletivos e individuais.

» Contribuir para a compreensão dos princípios e dos fundamentos filosóficos, socioculturais e psicológicos que norteiam a prática dos jogos e das modalidades esportivas na escola.

» Contribuir para a compreensão dos elementos que caracterizam os jogos.

» Contribuir para a compreensão das diferentes manifestações do jogo e seu papel no processo de ensino e de aprendizagem da criança e do adolescente, além de sua importância no processo de desenvolvimento do ser humano.

UNIDADE IreconHecimento do esporte como Um bem cUltUrAl do Universo escolAr

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CAPíTUlO 1Conceitos básicos de jogos e esporte. Esporte educacional, de rendimento e de participação

O jogo e o esporte sempre estiveram presentes como conhecimentos a serem ensinados, trabalhados pela Educação Física, não apenas a que se desenvolve no ambiente escolar. O que se pretende neste primeiro capítulo é a apresentação, a discussão e a reflexão a respeito dos conceitos de jogo e esporte que permeiam o universo da Educação Física escolar, contribuindo para a compreensão desses fenômenos como patrimônio cultural, justificando sua presença no currículo e nas aulas de Educação Física escolar (NEIRA, 2009).

Segundo Huizinga (2010) o jogo se caracteriza por uma “[...] evasão da vida “real” (p. 11) e, é ao mesmo tempo, cultura e produtor de cultura, uma vez que é através dele “[...] que a sociedade exprime sua interpretação da vida e do mundo” (p. 53). Portanto, nossa reflexão e conhecimento sobre jogo e esporte deve se pautar em uma perspectiva histórica, uma vez que essas práticas corporais são consideradas integrantes do nosso acervo cultural.

O jogo esteve presente em todas as civilizações, acompanhando a evolução histórica da humanidade (KISHIMOTO, 1998b). Nas sociedades antigas, especialmente na Grécia e Roma antigas, o jogo era praticado pelas classes mais abastadas, pelos guerreiros, que o consideravam atividade nobre e de descanso, enquanto para a classe trabalhadora o ócio não era permitido. Às mulheres não era permitido nem participar, nem assistir aos jogos, que eram combativos e competitivos, atribuindo-lhes significados agonistas (CAILLOIS, 1990). Data desse período a origem de nossos Jogos Olímpicos.

O jogo é um fenômeno estudado por vários autores, entre os quais podemos citar Huizinga (2010), Caillois (1990), Brougére (1998), Freire (2005), Kishimoto (1993, 1998). O jogo existe em função de suas manifestações, porém, a palavra jogo abriga uma amplitude de significados (VENÂNCIO; FREIRE, 2005), tornando difícil a tarefa de defini-lo. Porém, o estudo do jogo não deve se limitar meramente à linguagem, uma vez que o tema é objeto de estudo de diversas áreas do conhecimento, tais como Psicologia, Filosofia, Educação Física etc. Assim, discutiremos a questão do jogo como Scaglia (2005), “nas mais diferentes manifestações de jogo que poderiam ser agrupadas pelas suas semelhanças além de levar em consideração suas diferenças” (p. 41). O jogo é “[...] uma simulação lúdica da realidade, que se manifesta, se concretiza quando as pessoas fazem esporte, quando lutam, quando fazem ginástica, ou quando as crianças brincam” (FREIRE; SCAGLIA, 2003, p. 33).

Ao estudarmos o fenômeno do jogo uma referência obrigatória é Homo Ludens: o jogo como elemento da cultura, de Johan Huizinga (2010. p. 33), considerada por muitos autores como a precursora nos estudos sobre o jogo. Nessa obra, o autor apresenta o jogo como

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[...] uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e de espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da vida quotidiana.

O jogo é uma atividade prazerosa, ou seja, crianças e adultos jogam pelo simples prazer de jogar, é uma atividade livre e sem compromisso com as regras sociais (CAILLOIS, 1990; HUIZINGA, 2010), que ultrapassa os limites temporais e espaciais, podendo ser interrompido a qualquer momento ou jogado até o fim. Todo jogo é regido por regras, que determinam o que vale ou não, podem ser implícitas ou explícitas, mas são obrigatórias e respeitadas por todos que participam do jogo, com exceção daquele que as ignora ou desrespeita, o chamado desmancha-prazeres (HUIZINGA, 2010). É importante ressaltar que todas as regras são previamente combinadas e aceitas por todos os jogadores, implicando o desenvolvimento e o resultado final da atividade; aliás, esse resultado final é o próprio fim do jogo, isto é, o jogo tem um fim em si mesmo.

Discutir e refletir sobre o fenômeno do esporte nos apresenta uma primeira dificuldade: a grande variedade de respostas para a pergunta “o que é esporte?”. Mais uma vez optamos trilhar o caminho histórico para responder a essa questão.

A relação entre o fenômeno esporte e a Educação Física remonta há muito tempo, mais uma vez, à Grécia e à Roma antigas; naquele período, qualquer exercício físico que apresentasse um vencedor ao final era considerado esporte e tinha grande valor na formação física e moral dos indivíduos; inclusive, a vitória era considerada uma homenagem aos deuses. Porém, quando se pensa em esporte moderno, tal como o vemos e vivemos na sociedade contemporânea, é preciso retomar sua história a partir da Inglaterra, no final do século XIX, com o advento da Revolução Industrial (DARIDO; RANGEL, 2005). É a partir desse momento de ascensão social e política da classe média que são propostas novas políticas educacionais e surgem novas escolas públicas, lugar ideal para a popularização dos esportes. A regulamentação dos jogos populares aconteceu nessas instituições públicas, pois, nesses locais, os jogos não eram considerados ameaça ao status quo da época, possibilitando que assumissem as características do esporte moderno (BRACHT, 2009). Também é nesse momento histórico que os clubes esportivos surgem e se fortalecem, uma vez que eram o local para as discussões políticas e onde se organizavam festas que, normalmente, apresentavam competições de caça, boxe, corridas etc. Portanto, surgem os primeiros entendimentos sobre os conceitos de esporte com fins educacionais, recreativos e sociais.

As escolas públicas inglesas, no final do século XIX, começaram a introduzir e a utilizar os jogos populares em uma perspectiva pedagógica, proposta pela primeira vez por Thomas Arnold, considerado o pai do esporte moderno (KORSAKAS; ROSE JUNIOR, 2002), uma vez que foi o primeiro a entender o esporte como meio de educação. Esse processo contribuiu para que o esporte alcançasse outras classes sociais, impulsionando o movimento esportivo inglês no final do século XIX e início do século XX, difundindo o fenômeno para todo o mundo e, gradativamente, incluindo-o como parte dos programas de Educação Física. Além disso, a retomada dos Jogos Olímpicos pelo barão Piérre de Coubertin (TUBINO, 2007) consolidou o esporte moderno, fortalecendo, principalmente, a perspectiva do rendimento, apesar de seu ideário estar pautado nas funções pedagógicas do esporte. A ideia de esporte amador, formada no século XIX, transformou-se, tornando o esporte objeto de interesses políticos e um negócio rentável. Como consequência desse processo, os ideais olímpicos originais foram deixados de lado pela necessidade de

UNIDADE I | RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR

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vitória a qualquer preço (doping, corrupção), ao mesmo tempo, em que contribuiu para que as classes menos abastadas pudessem ter acesso às práticas esportivas, antes privilégio da elite. Surgem, então, as primeiras reações para que o ideal olímpico não desaparecesse completamente, propondo que o esporte fosse discutido e tratado além do rendimento, em uma compreensão mais ampla, social e cultural.

Atualmente o esporte tem sido estudado pelas mais diferentes instituições e áreas do conhecimento, inclusive a partir de diferentes conceitos do que é o esporte, como, por exemplo, Betti (1991, p. 25) que apresenta o esporte como

[...] uma ação social institucionalizada, convencionalmente regrada, que se desenvolve com base lúdica, em forma de competição entre duas ou mais partes oponentes ou contra a natureza, cujo objetivo é, através de uma comparação de desempenhos, designar o vencedor ou registrar o recorde; seu resultado é determinado pela habilidade e pela estratégia do participante, e é para este gratificante tanto intrínseca como extrinsicamente.

Com a mudança de valores e o fortalecimento das relações sociais construídas a partir do fenômeno do esporte, que, no século XX, passa a integrar a vida cotidiana das pessoas, inclusive com forte influência nos mais diversos campos da sociedade, como trabalho, lazer, educação, política e saúde. Surgem discussões e críticas acerca dos aspectos que envolvem a prática esportiva, como, por exemplo, o uso de drogas para melhora da performance, a importância política do fenômeno esportivo, especialização precoce, esporte amador e esporte profissional, entre outros. A partir dessas discussões, amplia-se o conceito de esporte com o Movimento Esporte para Todos e a Carta Internacional de Educação Física e Esportes (UNESCO, 1974), apresentando o esporte além da dimensão do alto rendimento, avançando no sentido de que a prática esportiva deveria ser um direito de todos, na forma de esporte-lazer e esporte educacional.

As manifestações do esporte em nosso país, regulamentadas pela Lei Pelé (no 9.615/1998), segundo Tubino (1992) são: esporte de rendimento ou esporte-performance, esporte-lazer ou esporte-participação e esporte-educação ou esporte educacional.

Esporte-performance: é a denominação que se dá aos grandes eventos esportivos, aos “espetáculos” esportivos. É organizado sob regras institucionalizadas internacionalmente, com objetivo de alcançar êxitos nacionais ou internacionais. Também pode ser denominado de esporte de rendimento e sua profissionalização contribuiu para o desenvolvimento de diferentes áreas, direta ou indiretamente relacionadas ao fenômeno do esporte, tais como Medicina do Esporte, Direito Esportivo, Gestão Esportiva, Fisioterapia, Nutrição Esportiva etc.

Esporte-participação: favorece a participação de quaisquer pessoas, relacionando a prática esportiva aos princípios do lúdico e do prazer. As práticas de esporte-participação, também conhecido como esporte-lazer ocorrem de maneira voluntária, contribuindo para a melhoria das relações sociais de seus praticantes. Como exemplo, podemos citar as peladas, as corridas no parque aos finais de semana etc.

Esporte-educação: de acordo com a Lei Pelé (no 9.615/1998) é aquele praticado

[...] nos sistemas de ensino e em formas assistemáticas de educação, evitando-se a seletividade, a hipercompetitividade de seus praticantes, com a finalidade de alcançar o

RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR | UNIDADE I

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desenvolvimento integral do indivíduo e a sua formação para o exercício da cidadania e a prática do lazer.

De acordo com Korsakas (2002), para que o esporte possa se constituir em ação educacional, é necessário pautar-se nos seguintes princípios: totalidade, emancipação, coeducação, regionalismo, cooperação e participação. Além disso, deve, obrigatoriamente, estar vinculado a três áreas de atuação pedagógica: integração social, desenvolvimento psicomotor e atividades físicas educativas. A seguir, apresentamos uma breve reflexão acerca de cada termo apresentado anteriormente.

Quando praticado sob a égide da totalidade, o esporte educacional deve compreender o ser humano como um ser uno, com emoções, pensamentos e ações. Dessa forma, contribui para que o aluno compreenda e respeite os colegas, favorecendo o convívio harmonioso das diversidades, sejam elas culturais, sejam sociais, sejam étnicas etc. O conceito da coeducação apresenta-se intimamente relacionado à compreensão e ao respeito às diferenças, sendo um dos pilares dos processos de ensino e de aprendizagem. Assim, todos os alunos têm as mesmas oportunidades durante a prática das modalidades esportivas.

A melhora das relações sociais e a inclusão de todos os alunos favorece o princípio da cooperação entre todos os sujeitos envolvidos com o esporte-educacional, desde alunos até professores. Outra forma de incentivar a cooperação entre os envolvidos no processo esportivo é a elaboração de situações-problema em que as crianças precisam solucionar o problema proposto e o professor possa atuar como mediador na busca dessas soluções, caracterizando um processo de solução conjunta (KORSAKAS, 2002). A resolução coletiva de situações-problema possibilita a participação de todos os alunos como sujeitos dos processo de ensino e de aprendizagem, favorecendo, inclusive, sua emancipação como cidadãos, uma vez que o esporte-educação deve ensinar além da técnica e da tática, além da habilidade motora, deve ensinar os conteúdos conceituais, factuais e atitudinais pertinentes ao fenômeno esportivo (ROSSETTO JUNIOR et al., 2006).

Uma questão fundamental para o envolvimento dos alunos na prática do esporte-educacional é o estímulo oferecido por essa prática. Para que isso não seja um problema, é preciso considerar os conhecimentos prévios dos alunos que, com certeza, foram influenciados pelo ambiente em que vivem. Portanto, para tornar os processos de ensino e de aprendizagem dos diferentes conteúdos significativos, é preciso conhecer a cultura da região, estimulando o respeito à diversidade cultural, unindo o conhecimento novo ao já existente, valorizando os aspectos do regionalismo.

BRACHT, V. Sociologia crítica do esporte: uma introdução. 3. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2009.

HUIZINGA, J. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. 6. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 2010.

NEIRA, M. G. Em defesa do jogo como conteúdo cultural do currículo da Educação Física. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. v. 8. n. 2. p. 25-41, 2009.

VENÂNCIO, S.; FREIRE, J. B. O jogo dentro e fora da escola. Campinas: Autores Associados, 2005.

UNIDADE I | RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR

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CAPíTUlO 2Caracterização e compreensão do esporte da escola. O papel da competição na escola

Uma das relações mais controversas no universo da Educação Física escolar é sua estreita relação com o fenômeno do esporte. Nos últimos trinta anos, talvez mais, o esporte tem sido um dos temas mais privilegiados nas aulas de Educação Física nas escolas, tornando-se parte essencial dos planejamentos dos professores. No entanto, essa relação remonta a tempos mais distantes, aproximadamente em meados do século XIX quando surgem as primeiras escolas públicas inglesas. Para entendermos como se dá esse processo de aproximação entre escola e esporte, não podemos deixar de lado as questões políticas, econômicas e sociais. Enquanto o esporte se torna um importante sujeito para a reprodução de práticas culturais e sociais, não podemos esquecer que a escola, muitas vezes, parece estar alheia ao que acontece fora de seus domínios, como se não fosse parte fundamental da sociedade em que está inserida, furtando-se ao papel de produzir e reproduzir aspectos da cultura, seja ela local ou não. Dessa forma, é preciso compreender a escola e as aulas de Educação Física como um espaço para a resolução de conflitos.

Quando refletimos e discutimos sobre o papel do esporte na escola, devemos considerar todos os aspectos que envolvem o fenômeno, entre eles a competitividade, geradora de grande parte das discussões acaloradas entre os estudiosos da área (SANTOS et al., 2006). Muitas vezes a escola entende que o papel da Educação Física é a detecção de talentos, propondo aulas que enfatizem o rendimento motor e técnico por meio de jogos e atividades direcionados para o desempenho e para o alto rendimento e, consequentemente, contribuindo para a especialização precoce, especialmente após o sexto ano do Ensino Fundamental (antiga 5a série). Porém, não podemos esquecer dos aspectos educativos do esporte educacional, uma vez que

[...] à medida que o esporte escolar se desenvolva, ele permitirá ao aluno o exercício de sua cidadania, na qual o trabalho e o lazer são fundamentais para uma boa qualidade de vida. Com isso, a cidadania significa participação e para participar do esporte é preciso saber, conhecer, analisar e refletir a prática esportiva. (SANTOS et al., 2006)

Nesse sentido, é fundamental compreender que não devemos negar o esporte como temática de trabalho da Educação Física escolar, não se pode retomar “uma visão maniqueísta: ou se é favor, ou se é contra o esporte. A Educação Física foi dividida por esse raciocínio tosco [...]” (BRACHT, 2000, p. 16). Ainda, segundo esse autor, é preciso tratar pedagogicamente o esporte, mas a partir de uma perspectiva crítica, que trilhe um caminho diferente do que é oferecido pela perspectiva conservadora da área. Assim, quando se propõe o trato crítico ao esporte na escola, não se trata de abolir o ensino das técnicas esportivas necessárias à prática, mas trata-se de acrescentar à prática do fenômeno a reflexão coletiva, visando à compreensão de que o esporte praticado na escola precisa ser reconstruído, muitas vezes a partir dos conhecimentos prévios e dos anseios dos alunos. Dessa maneira é possível oferecer o esporte, como

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temática escolar, prática que atribui menos valor ao rendimento e à competitividade, permitindo aos alunos “vivenciar também formas de prática esportiva que privilegiem antes o rendimento possível e a cooperação” (BRACHT, 2000, p. 19).

Portanto, é importante que as atividades propostas sejam sempre significativas (tenham sentido para os alunos) e que, as vivências oferecidas valorizem os conteúdos conceituais, atitudinais e factuais, além dos procedimentais (BRASIL, 1998). Para muitos autores, uma alternativa para o ensino e a prática dos esportes são os jogos, que surgem como elemento estratégico nas aulas de Educação Física escolar, uma vez que não possuem regras institucionalizadas (como as modalidades esportivas) e apresentam uma forte característica lúdica. Além disso, para outros autores, a presença da ludicidade no jogo é o que garante a apreensão do conhecimento e a mudança de atitudes, já que

[...] quem joga coopera (atua junto), tem a oportunidade de rever pontos de vista e atitudes, de reconhecer o esforço próprio, coletivo e alheio, de compartilhar espaços, ideias, projetos, de concentrar-se, de criar estratégias para mais bem interagir com os desafios impostos pela disputa, de se aproximar de outras pessoas, de conviver com as diferenças, com a vitória e a derrota, de aprender a lidar com estas últimas, de colocar-se disponível, de socializar habilidades, de expressar sentimentos, de solidarizar-se. (SANTANA; REIS, 2006, p. 137).

A competição inserida na escola, por muito tempo esteve relacionada a posições contraditórias, o que impedia o diálogo e a reflexão sobre o tema, provocando uma série de questionamentos, que refletiam e ainda refletem nas ações dos professores de Educação Física, negando ou aceitando essa característica inerente ao esporte e ao ser humano. Os defensores da competição destacam que esta é “[...] elemento fundamental do esporte, que dá sentido à sua existência, e é nela que a manifestação do esporte se realiza em sua plenitude” (REVERDITO et al., 2008). Portanto, qualquer opção pelo ensino do esporte na escola, não está desvinculada da competição, desde que ela não tenha um fim em si mesma, que professores e alunos compreendam sua função pedagógica, contextualizada de acordo com os interesses dos alunos. Por outro lado, a negação da competição no ambiente escolar, fundamenta-se principalmente no discurso de que a supervalorização da vitória contribui para a prática excludente, favorecendo apenas os alunos mais habilidosos ou que têm maior afinidade com determinadas modalidades esportivas.

O termo competição pode ser definido como uma situação em que se compara o desempenho, seja ele esportivo ou não, de uma pessoa ou grupo, com um padrão já existente. Muitas vezes o padrão é a vitória, apresentando-se como objetivo principal, ou único, dos alunos envolvidos no processo, provocando o afastamento natural daqueles que encontram maiores dificuldades na realização das atividades propostas. Quando o mais importante é a vitória, valoriza-se apenas o desempenho dos mais talentosos, dos vitoriosos, deixando-se de lado os que foram derrotados, que se classificaram em segundo, terceiro ou até em último lugar e, em muitas vezes, são os que mais necessitam da atenção do professor.

É nesse sentido, que se ressalta a importância de um olhar mais cuidadoso, mais criterioso por parte do professor de Educação Física, haja vista que o perdedor da competição pode se sentir desestimulado, caso vivencie sempre a situação da derrota. Segundo Ferreira (2000), as primeiras experiências com o esporte exercem grande influência nos alunos ao longo da vida, sendo, por isso, necessário, que o professor defina o espaço e a importância atribuídos à competição nos processos de ensino e de aprendizagem da Educação Física. A competição não deve ser compreendida como um problema, devendo ser extinta da

UNIDADE I | RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR

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escola e das aulas de Educação Física, principalmente porque isso significaria o fim da prática esportiva na escola. O que se pretende é o uso pedagógico da competição, um novo sentido para sua existência no âmbito escolar, permitindo que o desempenho individual e as diferenças entre os alunos não sejam fatores que desestimulem a participação nas aulas de Educação Física escolar. Assim, a vitória deixa de ser o objetivo principal do esporte, do jogo e, como critério de avaliação, não se utiliza o resultado final, mas o processo pelo qual o aluno passou.

Portanto, no que tange ao esporte como temática da Educação Física, cabe ao professor sistematizá-lo e apresentá-lo aos alunos como possibilidades de vivências corporais, adequando as atividades de modo que os alunos sejam capazes de realizá-las e de refletirem sobre essas práticas, valorizando o pensamento crítico e as mudanças de atitudes, características apresentadas pelos alunos considerados emancipados, capazes de praticar, apreciar e criticar o fenômeno esportivo do ponto de vista histórico, social, cultural, político e econômico.

BRACHT, V. Esporte na escola e esporte de rendimento. Revista Movimento. n. 12. 2000.

KORSAKAS, P.; ROSE JUNIOR, D. Os encontros e desencontros entre esporte e educação: uma discussão filosófica-pedagógica. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. n. 1. p. 83-93, 2002.

SANTOS et al. As diferenças entre o esporte da escola e o esporte na escola. Revista Treinamento Desportivo. v. 7. n. 1. p. 21-28, 2006.

RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR | UNIDADE I

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CAPíTUlO 3Escola de esporte na escola. Aspectos do treinamento esportivo no âmbito escolar

Desde que o esporte se destacou como uma das temáticas mais importantes e trabalhadas pela Educação Física escolar tem sido objeto de inúmeras discussões, principalmente no que concerne a respeito de seu papel na escola, considerada por muitos, o espaço ideal para sua prática, principalmente porque envolve um grande número de pessoas, podendo influenciá-las sobremaneira durante a vida.

No entanto, é preciso distinguir o esporte na escola do esporte da escola e, para isso, faz-se necessária a compreensão da escola como instituição que deve proporcionar diferentes vivências corporais, entre elas o esporte e, como local para o aprimoramento de certas habilidades motoras, no caso aquelas necessárias à prática esportiva.

O termo esporte na escola define a prática tradicional do esporte, aquela em que se trabalha primeiramente os fundamentos (parte técnica do movimento esportivizado), para depois integrá-los ao jogo, causando inúmeros problemas aos alunos, uma vez que diante de situações-problema que possam acontecer durante uma partida, eles encontram dificuldades para solucioná-las apenas com os fundamentos aprendidos. Ainda, durante a prática do esporte na escola, a prioridade é o desenvolvimento técnico e o desempenho do aluno, o que pode contribuir para que os alunos se afastem das aulas de Educação Física e até mesmo de toda prática esportiva. Contrapondo-se a essa perspectiva, o esporte da escola propõe a prática esportiva fundamentada na abordagem da compreensão dos jogos, em que a resolução de situações-problema acontece por meio do desenvolvimento do jogo, mediante habilidades táticas (SANTOS et al., 2006). Abaixo, segue um quadro com as principais diferenças entre o esporte na escola e o esporte da escola proposta por SANTOS et al.(2006, p. 26).

ESPORTE NA ESCOLA ESPORTE DA ESCOLA

Reprodução de regras já existentes e rígidas.Regras flexíveis e modificáveis de acordo com o interesse e necessidade dos alunos.

Busca pela melhoria do gesto técnico. Busca pela participação coletiva, sem se importar com o gesto técnico.

Sempre tem de haver de um campeão. O importante é a participação coletiva.

Há exclusão dos não aptos ou menos habilidosos. Há inclusão, já que não prioriza o melhor nem o mais capaz.

Os jogos já existem predeterminados. Os jogos são criados e idealizados pelos alunos.

Existe um profissional tecnicista.O profissional é um mediador das atividades, podendo intervir quando necessário.

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ESPORTE NA ESCOLA ESPORTE DA ESCOLA

Necessidade de materiais específicos. Não há necessidade de materiais, já que podem ser utilizadas sucatas.

Não há criatividade na construção das atividades. Existe criatividade na construção dos jogos.

Realização podendo ou não ser prazeroso (sem ludicidade).

Sempre existe lúdico.

Separação por sexo. Não há separação por sexo.

Aumenta a complexibilidade das habilidades motoras. Diminui a complexibilidade das habilidades motoras.

O treinamento esportivo, entendido como a prática sistemática do esporte, visando à participação em competições, tem sua origem na Grécia antiga. Durante os treinamentos esportivos não há a preocupação com a iniciação e o aprendizado da modalidade esportiva, mas com o desenvolvimento de habilidades motoras específicas para a prática do esporte. Esse momento do esporte se faz presente, também, nas escolas, nas chamadas turmas de treinamento, normalmente em horários fora da grade regular de aulas, com tratamento pedagógico diferente daquele da aula de Educação Física, tanto nas instituições públicas quanto nas privadas.

As turmas de treinamento escolar são criadas com vários objetivos, principalmente, a participação dos alunos em competições escolares com bons resultados. É nesse momento que as concepções que norteiam o esporte de rendimento passam a integrar e a nortear a prática esportiva presente na escola. No entanto, segundo Souza Junior (2000/2001, p. 24), a escola não é o local ideal para o que nos acostumamos a chamar de detecção de talentos, pois

A escola hoje possui princípios que se tornam incompatíveis com os princípios do esporte moderno, a saber: a escola procura democratizar suas ações, o esporte procura selecionar; a escola busca o desenvolvimento de uma cultura geral, o esporte exige especialidade; a escola deve lidar com a diversidade dos alunos, o esporte procura padronizar [...]

É preciso explicitar que criticar a prática do esporte na escola não significa negá-la, mas entendê-la em toda sua plenitude educacional, uma vez que além de proporcionar as vivências em diferentes modalidades esportivas, é responsabilidade do professor de Educação Física, em especial daquele que atua na Educação Básica, contribuir para a reflexão crítica sobre o contexto do esporte em nossa sociedade. Ainda, segundo Bracht (2000), tratar criticamente o esporte não é negar o ensino da técnica, mas compreender que ela é um meio para atingir determinados fins.

SOUZA JUNIOR, M. A Educação Física no currículo escolar e o esporte: (im)possibilidade de remediar o recente fracasso esportivo brasileiro. Pensar a Prática. v. 4. p. 19-30, jun./jul. 2000/2001.

RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR | UNIDADE I

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CAPíTUlO 4Identificação das modalidades esportivas e dos jogos como transmissão cultural na escola

A Educação Física surge nas escolas brasileiras no século XIV e, no ano de 1971, sob a égide da LDB no 5.692 é caracterizada como atividade curricular, sem nenhuma preocupação com um corpo de conhecimento sistematizado; o que se via nas escolas era algo próximo das práticas militares, inclusive, muitas vezes, ministrado por militares.

Com a LDB no 9.394, de 1996, a Educação Física escolar deixa de ser considerada atividade curricular para avançar (pelo menos no papel) para o status de componente curricular. Com essa mudança de condição, reconhece-se que a Educação Física tem, sim, um corpo de conhecimento próprio e que esse conhecimento deveria ser ensinado por meio de práticas contextualizadas, que ultrapassassem o simples “fazer por fazer”; era preciso dar significado ao novo status da Educação Física escolar.

Atualmente, os conteúdos/conhecimentos trabalhados na Educação Física escolar envolvem as diferentes manifestações corporais criadas pelo homem ao longo da história. Entre esses conhecimentos, os que ocupam lugar de destaque no planejamento escolar estão os jogos e as modalidades esportivas, especificamente as coletivas, sendo que as mais usuais são o que chamamos de “quarteto fantástico”: futebol, voleibol, basquetebol e handebol. Além de jogos e de esportes, também são temas das aulas de Educação Física escolar as brincadeiras, as ginásticas, as danças, as lutas, as atividades circenses etc. A esse conjunto de manifestações/conhecimentos alguns autores, como, por exemplo, Daolio, atribuem o nome de cultura corporal e, tratando-se dessa riqueza e diversidade de manifestações, a escola e, principalmente, a Educação Física, deveria ser a responsável pela transmissão desses conhecimentos. Para que esse processo se estabeleça e se fortaleça, há a necessidade de sistematizar os conhecimentos pertinentes à cultura corporal, não com um planejamento inflexível, mas com uma programação elaborada com a participação dos alunos e que esteja relacionada ao projeto pedagógico da escola. Ainda, as vivências das diferentes manifestações corporais que integram o corpo de conhecimento da Educação Física escolar devem ser trabalhadas em práticas que tenham significado para os alunos, uma vez que o que dá sentido ao movimento humano é o contexto em que ele se realiza (DAOLIO, 2007).

A escola é um dos espaços que entendemos como responsáveis pela transmissão dos conhecimentos construídos e acumulados pelo homem ao longo do tempo, destarte, a escola desempenha um papel fundamental na sociedade. Para o cumprimento desse papel, a escola organiza os diferentes conhecimentos em componentes curriculares, entre eles a Educação Física e, como tal, sua prática deve se consolidar como um espaço de diálogo entre as diferentes manifestações culturais. Essas diferentes manifestações corporais, são, em primeiro lugar, culturais, posto que tudo que é realizado e produzido pelo ser humano é cultural; assim, as aulas de Educação Física escolar devem privilegiar as práticas corporais e a cultura

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dos alunos, uma vez que “os movimentos corporais que os alunos possuem extrapolam a influência da escola, são culturais e têm significados”(DAOLIO, 2006, p. 32).

Entre essas práticas corporais estão os jogos e os esportes, objetos de estudo desse caderno didático.

Os jogos sempre fizeram parte dos conhecimentos ensinados pela Educação Física, e são caracterizados como uma atividade livre, sem regras sociais, em que os jogadores jogam pelo prazer que a prática proporciona. O jogo deve ser entendido como conhecimento cultural a ser ensinado na escola, mas para isso, muitas de suas características foram modificadas, visando a atender os “objetivos” propostos nos planejamentos e projetos pedagógicos. Por exemplo, destina-se um lugar específico para o jogo, escolhe-se o melhor horário e o tempo de duração, determina-se até como as crianças devem jogar. Dessa maneira não existe jogo, mas práticas escolares determinadas para exercer o controle sobre os alunos.

O professor deve incorporar os conhecimentos que os alunos possuem sobre os jogos, dando novos sentidos aos conteúdos curriculares da Educação Física e contribuindo para que os alunos tenham uma melhor compreensão do mundo em que vivem (NEIRA, 2009).

Já as práticas esportivas são práticas determinadas culturalmente e devem fazer parte do repertório motor a ser contemplado nas aulas de Educação Física, não limitadas às execuções corretas das técnicas, mas valorizando a experiência dos alunos e permitindo a expressão corporal de outros movimentos. Para que isso ocorra, é preciso ultrapassar o simples ensino das regras, dos gestos técnicos e contextualizar a modalidade esportiva ou jogo, adequando-o às necessidades dos alunos e à realidade social e cultural em que professor e alunos estão inseridos. Além disso, o ensino diferenciado das modalidades esportivas, sejam elas individuais sejam coletivas, deve ser crítico sem afastar os alunos da prática esportiva, permitindo diferentes manifestações, mas também deve se preocupar com o gesto técnico. Enfim, é preciso que o conhecimento adquirido pelos alunos ultrapasse a simples prática, e sirva para criticar e compreender o fenômeno do esporte (KUNZ, 2010).

DAÓLIO, J. Da cultura do corpo. 11. ed. Campinas: Papirus, 2007.

KUNZ, E. Transformação didático-pedagógica do esporte. 7. ed. Ijuí: Editora Unijuí, 2010.

RECONHECIMENTO DO ESPORTE COMO UM BEM CULTURAL DO UNIVERSO ESCOLAR | UNIDADE I

UNIDADEIIpropostAs metodolÓgicAs do

esporte como temÁticA nAs AUlAs de edUcAÇÃo FísicA

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CAPíTUlO 5Aspectos didáticos e culturais da pedagogia do esporte

Para dar início às nossas reflexões, aproprio-me da questão apresentada por Santana e Reis (2006) “Para que ensinar esporte na infância?”. A resposta a essa questão não é tão simples quanto parece. Antes de qualquer coisa é preciso lembrar que o esporte é uma prática social que deve estar ao alcance de todos e, consequentemente, é dever dos professores ensinar o esporte a partir de uma perspectiva pedagógica, contribuindo para tornar os alunos “mais cooperativos, autônomos, participativos, solidários, críticos, criativos, reflexivos, generosos, felizes, aproximando-se, cada vez mais, de uma vida emancipada” (SANTANA; REIS, 2006, p. 134).

A Pedagogia do Esporte teve sua origem no final da década de 1960, na antiga Alemanha Ocidental, e, por muito tempo, seus pressupostos teóricos caminhavam em direção da prática esportiva tecnicista, que valorizava o ensino da técnica separado do contexto do jogo. A palavra pedagogia tem sua origem na Grécia Antiga, e significa “conduzir a criança”, pois, naquele período histórico, uma das funções dos escravos era levar a criança até o local onde ela seria ensinada. Esse escravo era conhecido como “paidagogo” (MONTEIRO, 2009). Nos dias de hoje, a Pedagogia do Esporte pode ser entendida como uma linha de estudos das Ciências do Esporte e que, segundo Paes (2002), entre suas funções, podemos citar, organizar, sistematizar, aplicar e avaliar procedimentos metodológicos.

O fenômeno “esporte” como o conhecemos na contemporaneidade está em constante mudança e, apenas isso, já seria suficiente para prestarmos mais atenção ao esporte como instrumento da educação e da formação do ser humano. Nesse sentido, é preciso que o tratamento dado ao esporte avance além dos procedimentos técnicos e metodológicos, é preciso trabalhar o esporte à luz da Pedagogia do Esporte. Como conhecemos hoje, o esporte é objeto de estudo de diferentes áreas, tais como Medicina, Psicologia, Fisioterapia, Nutrição e outras, mas, muitas vezes, o entendimento a respeito desse fenômeno é reducionista e utilitarista, atribuindo-lhe apenas o objetivo de tornar as pessoas mais fortes, mais saudáveis, ou atletas melhores. Estudar o esporte sob a perspectiva da Pedagogia do Esporte requer a compreensão do fenômeno em toda sua complexidade e, apesar das diversas áreas que o estudam, ainda se faz necessária uma construção transdisciplinar do conhecimento acerca do esporte.

Nesse sentido, a Pedagogia do Esporte tenta relacionar diferentes campos do conhecimento com o objetivo de

[...] observar a realidade da prática esportiva e dos processos de ensino e de aprendizagem do esporte, a fim de analisar a relevância e adequação das práticas realizadas, apontando novas propostas de intervenção pedagógica, potencializando e otimizando o desenvolvimento esportivo do aluno e/ou atleta [...] considerando, ainda,

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as possibilidades de educação por meio do Esporte, contribuindo para a formação plena do cidadão (GALATTI, 2006).

Atualmente, muito se discute a respeito da presença do esporte como tema da Educação Física escolar, porém, o que propomos, aqui, é a busca da ressignificação das modalidades esportivas na escola. Para Daolio (2007), o que dá sentido ao movimento humano é o contexto em que este está inserido e é construído, e é função do professor encontrar estratégias que possibilitem novos significados às práticas corporais, entre elas as modalidades esportivas, sejam individuais sejam coletivas. Só assim, será possível ultrapassar o pré-conceito de que o esporte nas aulas de Educação Física escolar tem como objetivo principal a busca por atletas, de que ele é apenas o primeiro passo para o esporte de rendimento.

Retomando a pergunta inicial deste capítulo “Para que ensinar esporte na infância?” afirmamos que o esporte, independentemente do local em que será ensinado, deve sempre buscar a participação de todos os alunos, a cooperação, o prazer da prática vivenciado numa perspectiva lúdica, e a reflexão do seu significado. O esporte na infância deve ser um elemento facilitador para a conquista da autonomia (FREIRE; SCAGLIA, 2003), para o desenvolvimento de atitudes e para o aprendizado da democracia (D’ÂNGELO, 2001). Ainda, no âmbito da Educação Física escolar, o esporte deve seguir o princípio da não exclusão, em que todos os alunos participam das atividades propostas. Para que isso ocorra, a seleção de estratégias por parte do professor deve possibilitar que as crianças “aprendam mais sobre si mesmas e sobre como melhor conviver com os outros”(SANTANA; REIS, 2006, p. 149). Não podemos esquecer que antes de sermos professores de Educação Física, somos professores de crianças.

FREIRE, J. B.; SCAGLIA, A. J. Educação como prática corporal. São Paulo: Scipione, 2003.

SANTANA, W. C.; REIS, H. H.B. A pedagogia do esporte e o desafio de educar para a autonomia. In: MOREIRA, E. C. (Org.). Educação Física Escolar: desafios e propostas 2. Jundiaí: Fontoura Editora, 2006.

UNIDADE II | PROPOSTAS METODOLÓGICAS DO ESPORTE COMO TEMÁTICA NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

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CAPíTUlO 6Características das modalidades esportivas coletivas adequadas a cada faixa etária

O esporte pode ser considerado, nos dias de hoje, a temática mais presente nas aulas de Educação Física, especialmente no Ensino Médio, o que não significa que ele não deva ser ensinado nos outros níveis de ensino. Porém, o que podemos observar é a prática esportiva escolar estar delineada em duas vertentes: ou o esporte como recreação, ou como iniciação esportiva precoce, com seus objetivos voltados ao alto rendimento. Nesse sentido, é evidente que a prática do esporte na escola precisa ser repensado e ressignificado.

Quando pensamos em escola e na sua relação com o esporte, quase imediatamente nos vem à cabeça a imagem das modalidades esportivas coletivas e, às vezes, as modalidades esportivas individuais. Também é preciso ressaltar que, para os alunos, é importante que o aprendizado das modalidades esportivas não se resuma apenas à repetição dos gestos técnicos, pois o aluno deve ter liberdade para agir e criar novas formas de movimento, ressignificando a prática esportiva escolar. Nem sempre esse tipo de atividade foi realizada no ambiente escolar com essa preocupação; vale lembrar que, por muito tempo, algumas políticas educacionais voltadas à Educação Física reforçavam o caráter seletista do esporte, incentivando desde a competitividade exacerbada até a formação das chamadas turmas de treinamento, em que apenas os melhores alunos de cada modalidade tinham oportunidades de representar a escola em competições esportivas.

Quando as modalidades esportivas são ensinadas na instituição escolar, é preciso apresentar sua história, discutir seu papel na sociedade contemporânea, estabelecer relações com temas polêmico da atualidade (violência, dopping, investimento privado), além das questões técnicas e táticas. Essa mudança de atitude pedagógica faz com que a aula deixe de ser o simples “jogar por jogar” e permite aos alunos melhor compreensão sobre o fenômeno esporte. Porém, é preciso cuidado para que a aula de Educação Física não se transforme em um momento de discussão teórica sobre o tema, deixando de lado o que é específico da nossa área: a exploração e o aperfeiçoamento do movimento.

Neste capítulo vamos refletir sobre as modalidades esportivas coletivas (MEC) e sua adequação aos diferentes níveis de ensino (diferentes faixas etárias). Essas práticas se caracterizam pelo confronto entre duas equipes, que se alternam em situações de ataque e defesa, com o objetivo de vencer o jogo. Como exemplos dessas modalidades, podemos citar desde aquelas que formam o que conhecemos por “quarteto fantástico” (basquetebol, futebol, handebol e voleibol) até outras menos conhecidas do grande público, tais como hóquei, rugby e corfebol.

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Todas as MEC têm alguns pontos em comum, entre eles:

» o uso de um objeto durante o jogo, geralmente uma bola;

» praticadas em um campo/quadra/área delimitado por linhas onde acontece o jogo;

» uma meta para atacar e/ou defender;

» companheiros de equipe e adversários, que se enfrentam nesse jogo;

» além das regras, que devem ser respeitadas por todos.

Ainda, existem quatro tarefas que os jogadores dessas modalidades precisam realizar: atacar no campo do adversário, defender seu campo, apresentarem oposição aos adversários e cooperar com os outros jogadores de sua equipe. Essas relações entre o ataque e a defesa e entre cooperação e oposição compõem a estrutura fundamental das modalidades esportivas coletivas.

A aprendizagem das MEC pode ser estruturada em nove diferentes fases ao longo da vida, de acordo com as características específicas dos praticantes e das tarefas a serem realizadas (SILVA; ROSE JR, 2005). Para o nosso estudo, apresentaremos apenas as quatro primeiras que tratam do período em que o aluno frequenta a escola de Educação Básica:

» Fase pré-escolar (4 a 6 anos): deve possibilitar uma vivência diversificada de movimentos.

» Fase universal (6 a 12 anos): a preparação deve ser geral, possibilitando uma vivência lúdica e variada dos movimentos.

» Fase de orientação (12 a 14 anos): automatização de grande parte dos movimentos.

» Fase de direção (14 a 16 anos): aperfeiçoamento e especialização em uma determinada modalidade esportiva.

Para o desenvolvimento das MEC, é fundamental compreender o desenvolvimento motor, cognitivo e afetivo do aluno, uma vez que as técnicas e as táticas necessárias à prática esportiva estão diretamente relacionadas ao desenvolvimento global da criança. Ao final da fase universal e início da fase de orientação está o momento em que a criança pode escolher entre as mais variadas modalidades esportivas e, por isso, é importante compreender as características dessa faixa etária ( 10 a 12 anos) (SILVA; ROSE JR, 2005).

Nesse período da vida, a criança encontra-se em um estágio do desenvolvimento motor em que é capaz de combinar e aplicar habilidades motoras fundamentais nos jogos. Segundo Gallahue e Ozmun (2001), a experiência é muito importante para o desenvolvimento motor e, a criança que pratica MEC utiliza as habilidades motoras de diferentes maneiras e em diferentes situações, o que contribui para ampliar seu repertório motor. Em relação ao desenvolvimento cognitivo, a criança está saindo do estágio das operações concretas e entrando no estágio das operações formais. Destarte, é necessário que o professor tenha cuidado acerca das exigências táticas que fará, pois pode ser que o aluno apresente dificuldade para entender os princípios do jogo. Por último, mas não menos importante, no desenvolvimento afetivo, a criança passa por uma fase de socialização e cooperação, que é muito importante para as modalidades

UNIDADE II | PROPOSTAS METODOLÓGICAS DO ESPORTE COMO TEMÁTICA NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

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coletivas, uma vez que um de seus princípios é a cooperação. Além disso, as MEC sempre são uma experiência de convivência com outras pessoas, dando-lhes uma característica socializadora, uma vez que a criança, além de compreender e respeitar as regras, precisa discutir e aceitar outros pontos de vista a respeito de diversos aspectos do jogo (SILVA; ROSE JR, 2005).

Cada modalidade esportiva coletiva tem sua especificidade, mas também apresenta semelhanças com outras modalidades, o que permite ao professor elaborar situações que concedam aos alunos a assimilação de princípios comuns, principalmente, no que concerne à técnica. Essa prática é conhecida como prática transferível, em que o aluno por meio de uma prática construída com vivências variadas evita a especialização precoce e garante a possibilidade de transferência de aquisições de uma modalidade para outra. Assim, podemos concluir que, nas fases iniciais de aprendizado das MEC, é adequado que as situações de jogo propostas pelos professores favoreçam “a assimilação de princípios comuns às MEC estrutural e funcionalmente semelhantes” (SILVA; ROSE JR, 2005, p. 87).

SILVA, T. A. F.; ROSE JR, D. Iniciação nas modalidades esportivas coletivas: a importância da dimensão tática. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. n. 4. p. 71-93, 2005.

PROPOSTAS METODOLÓGICAS DO ESPORTE COMO TEMÁTICA NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA | UNIDADE II

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CAPíTUlO 7Características das modalidades esportivas individuais adequadas a cada faixa etária

Nesse capítulo vamos refletir sobre as modalidades esportivas individuais que, quando aparecem nas escolas, surgem por meio do atletismo, da natação, das ginásticas ou das lutas. A principal característica dessas modalidades é exatamente a expressa pelo seu nome, pois o aluno/atleta/jogador atua sozinho durante toda a ação esportiva. Além disso, os esportes individuais ainda podem ser classificados como aqueles em que há interação com um adversário e aqueles em que não há interação com adversário. No quadro abaixo apresentamos algumas possibilidades para ambas as classificações:

COM INTERAÇÃO SEM INTERAÇÃO

Badminton Atletismo (saltos, arremessos, lançamentos)

Judô Ginástica Artística

Peteca Natação

Tênis Saltos Ornamentais (classe individual)

Squash Skate

Esgrima Arco e flecha

Tênis de mesa Surf

Boxe Halterofilismo

Luta greco-romana Iatismo (classe Finn)

Ciclismo

Canoagem

Para a classificação apresentada acima, ainda é possível uma subcategorização, em função dos objetivos que se deseja alcançar com a prática esportiva. Para as modalidades em que há interação com o adversário, normalmente, utiliza-se como critério o objetivo tático da ação, isto é, o propósito final da prática esportiva (ponto, menor tempo). Para as modalidades sem interação com o adversário, adota-se como critério o desempenho motor para estabelecer marcas e, dessa forma, designar o vencedor da prática esportiva.

Assim, para os esportes sem interação, podemos classificá-los em esportes de marca (registro do melhor tempo, distância ou peso), esportes estéticos (resultado definido segundo padrões estéticos dos movimentos definidos previamente) e esportes de precisão (resultado definido pela capacidade de atingir um alvo). Para os esportes com interação, podemos classificá-los em esportes de combate ou luta (o adversário deve ser subjugado), esportes de campo e taco (têm como objetivo colocar a bola longe do

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jogador adversário) e esportes de rede (têm como objetivo colocar o implemento em locais da quadra/campo em que o adversário não consiga chegar).

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), um dos objetivos da Educação Física escolar é formar cidadãos críticos e capazes de refletir sobre a cultura de movimento. Esse posicionamento vai desde a apreciação do esporte até a capacidade de reivindicar espaços públicos para a prática esportiva, de atividade física ou de lazer. Para isso, as aulas de Educação Física devem oferecer conteúdos e organizar estratégias que permitam a participação de to dos os alunos, pois diferentemente do esporte profissional, outro objetivo da Educação Física escolar é permitir que os alunos desenvolvam todas as suas potencialidades (BETTI; ZULIANI, 2002). Segundo os mesmos autores, os conteúdos devem ser ensinados de maneira progressiva, sempre considerando interesses, capacidades e características dos alunos. E, em relação às fases da Educação Básica, entre o primeiro e o quinto ano do Ciclo I (antigo Ensino Fundamental I), as habilidades motoras básicas devem ser exploradas em jogos e brincadeiras que estimulem o desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo e social. A partir do sexto ano (antiga quinta série), o esporte em suas diferentes manifestações, inclusive as modalidades individuais, deve ser inserido no cotidiano dos alunos, além da dança e das ginásticas. Também é importante ressaltar que a questão da técnica não pode ser confundida com tecnicismo, mas, mesmo assim, não deve ser prioridade nesse momento. Nos anos finais do ciclo (7o e 8o anos) pode-se iniciar o aperfeiçoamento das habilidades específicas. Espera-se que o professor consiga inserir no seu planejamento práticas diferenciadas, possibilitando aos alunos uma vivência mais ampla da cultura de movimento.

BETTI, M; ZULIANI, L. R. Educação Física escolar: uma proposta de diretrizes pedagógicas. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. n. 1. p. 73-81, 2002.

PROPOSTAS METODOLÓGICAS DO ESPORTE COMO TEMÁTICA NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA | UNIDADE II

UNIDADE IIIos jogos como possibilidAdes nAs AUlAs de edUcAÇÃo FísicA

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CAPíTUlO 8O furto do lúdico na infância contemporânea

Uma das características do ser humano é sua capacidade de brincar, ou o que Venâncio e Costa (2005) apresentam como impulso lúdico. Essa característica é tão forte, que Huizinga utiliza o termo homo ludens para definir o homem.

Atualmente os termos lúdico e ludicidade têm sido constantemente utilizados em discursos “pedagógicos”, porém, vários autores já apresentam escritos sobre o assunto há muito tempo (CHATEAU, 1987; CALLOIS, 1990; FREIRE, 2005; KISHIMOTO, 1998; HUIZINGA, 2010), sendo que Callois e Huizinga estruturaram seus escritos relacionando o lúdico ao jogo.

Quando a criança brinca, ela descobre as pessoas e o mundo ao redor, ela se comunica com o contexto em que está inserida, ela desenvolve suas capacidades motoras, cognitivas, afetivas e sociais de maneira espontânea e divertida (PRODÓCIMO; NAVARRO, 2008).

No entanto, parece que na sociedade contemporânea não há mais espaço para a ludicidade, para a brincadeira, para o jogo, até mesmo para as crianças não é mais permitido o brincar pelo simples prazer de brincar. Até quando o brincar faz parte das proposições da escola, como ocorre com frequência na Educação Infantil, parece haver a necessidade de explicar e justificar sua presença nas aulas. Isso ocorre pela pouca valorização das manifestações oriundas dos jogos e das brincadeiras, uma vez que tais atividades, aos olhos dos adultos, parecem pouco produtivas e sem sentido no ambiente escolar. Nesse sentido, para algumas pessoas, o brincar é perda de tempo (ROMERA et. al., 2007).

Muitas vezes, a criança é entendida como uma promessa de “alguém de futuro” e, para que isso aconteça, seu cotidiano deve ser repleto de atividades que contribuam para esse futuro de sucesso; quando pensam assim, os jogos e as brincadeiras não servem para isso. Além de promessa para o futuro, muitas vezes a criança tem de trabalhar, ajudando a compor, ou mesmo sendo a única fonte de renda da família. Mais uma vez, brincar pode significar perder tempo. Tal situação nos leva a repensar o papel da escola e da Educação Física em relação ao brincar... simplesmente pelo prazer de brincar! Portanto, de acordo com Carvalho, Alves e Gomes (2005, p. 218)

[...] a inserção do brincar livre, espontâneo, no currículo educacional e, consequentemente, nos projetos pedagógicos das instituições educativas, é um processo de transformação política e social em que crianças são vistas pelos educadores como cidadãs [...]

Percebe-se, nas escolas, que, talvez, o único momento em que a criança brinca livremente seja o recreio, principalmente nos dias em que não há aulas de Educação Física, nas quais, nem sempre, estão tão livres assim. Ao contrário, preocupa-nos a maneira como o período do dia em que a criança está na escola

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tem sido utilizado pelas crianças. Para refletirmos sobre essa questão, proponho algumas inquietações: “Como o recreio é utilizado nas escolas de Educação Básica? O recreio é, verdadeiramente, um momento para e das crianças? Como as crianças brincam ou jogam durante o recreio?”.

CARVALHO, A. M.; ALVES, M. M. F.; GOMES, P. L. D. Brincar e Educação: concepções e possibilidades. Psicologia em Estudo. Maringá, v. 10. n. 2. p. 217-226, mai./ago. 2005

PRODÓCIMO, E.; NAVARRO, M. S. Reflexões sobre o brincar: uma visita a um parque público em São Paulo. Revista Iberoamericana de Educación. n. 47. p. 1-10, 2008.

VENÂNCIO, S.; COSTA, E. M. B. O movimento humano e o brincar. In: VENÂNCIO, S.; FREIRE, J. B. O jogo dentro e fora da escola. Campinas: Autores Associados, 2005.

UNIDADE III | OS JOGOS COMO POSSIBILIDADES NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

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CAPíTUlO 9 O jogo e o brincar na educação

Brincadeira e jogo são a mesma coisa? A resposta mais comum é sim, e podemos citar alguns autores que corroboram nossa afirmativa (FREIRE, 2005; FREIRE; SCAGLIA, 2003). A semelhança entre jogo e brincadeira reside, principalmente, em seu caráter lúdico, o que torna o termo jogo mais abrangente ainda (FREIRE, 2005). Contudo, as demais características do jogo (HUIZINGA, 2010) revelam uma complexidade maior: voluntariedade, limites, regras, emoções e diferenciação do cotidiano. Além disso, existem vários tipos de jogos, como, por exemplo, os jogos cooperativos, os jogos vertiginosos, os jogos aleatórios, entre outros. Também podemos classificar os jogos conforme Kishimoto (2008): jogos educativos, de construção, tradicionais, jogos simbólicos e de regras. Entre os termos jogos e brincadeiras são muitos os aspectos parecidos, mas também são muitas as controvérsias.

A importância do jogo e do brincar para o desenvolvimento humano é evidente, mas quando atribuímos essa mesma importância para os processos de ensino e de aprendizagem nosso trabalho se torna mais árduo. O jogar e o brincar são as atividades mais importantes durante a infância e, também na escola, deveriam assumir um caráter essencial em todo o processo educativo; pois, Segundo Freire (2005, p. 87) o jogo é “uma das mais educativas atividades humanas... Ele educa não para que saibamos mais matemática ou português ou futebol: ele educa para sermos mais gente, o que não é pouco”.

Porém, muitas vezes não é isso que podemos observar nas aulas escolares! Infelizmente percebemos uma ruptura entre as propostas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental (Ciclos I e II). Na primeira, encontramos práticas dedicadas ao jogo e ao brincar, mas, no segundo nível de ensino já não há espaço para o jogo, para a brincadeira. Quando as crianças chegam ao Ensino Fundamental, encontram-se em um momento que deve ser dedicado à apreensão de conhecimentos, principalmente, os de cunho cognitivo, que privilegiem o raciocínio lógico-matemático e a competência leitora e escritora. No entanto, o jogo e o brincar têm papel decisivo nos processos formativos da criança, ultrapassando as questões da educação escolarizada, pois contribuem, de maneira fundamental, para o desenvolvimento da imaginação humana, das representações mentais.

É uma pena que as escolas e os professores não se apropriem desse conhecimento, já que estruturam o currículo escolar de forma a desprestigiar, e até marginalizar, práticas dos jogos e das brincadeiras. É uma pena que a escola, quando se apropria do jogo, o faz apenas de forma utilitária, deixando de contemplar outras possibilidades, tais como o jogo como temática de aprendizagem, como contributo para a formação da criatividade e como um fim em sim mesmo. Essa forma utilitária do jogo na escola, normalmente se dá em função de outras exigências pedagógicas, que não as do próprio jogo, sem que este “sirva apenas de veículo para suavizar a dureza das tarefas escolares” (FREIRE, 2005, p. 85).

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FREIRE, J. B. O jogo: entre o choro e o riso. 2. ed. Campinas: Autores associados, 2005.

UNIDADE III | OS JOGOS COMO POSSIBILIDADES NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA

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CAPíTUlO 10 jogo e cultura

Os jogos e as brincadeiras são manifestações corporais, fundamentalmente lúdicas, da cultura em que estamos inseridos. Nesse sentido, devem ser parte integrante dos processos de ensino e de aprendizagem, pois, por meio deles, podemos conhecer e interagir com o mundo. Huizinga (2010) diz-nos que jogo é e produz cultura. Agora, uma pergunta: “o que é cultura?”. Para respondermos a essa inquietação, apropriaremo-nos da afirmação de Jocimar Daolio (2007, p. 09) que diz:

[...] cultura é o principal conceito para a Educação Física, porque todas as manifestações corporais humanas são geradas na dinâmica cultural, desde os primórdios da evolução até hoje, expressando-se diversificadamente e com significados próprios no contexto de grupos culturais específicos.

Também é importante lembrar que o conceito de cultura do qual nos apropriamos atualmente, não é o mesmo do século XIX, em que cultura significava o produto das realizações humanas (língua, expressões artísticas etc.). Esse conceito, ampliou-se de tal forma, que cultura, também, passou a ser sinônimo de civilização. Apenas no século XX, a cultura passou a ser entendida como algo inerente ao ser humano, deixando de ser privilégio de determinadas sociedades (DAOLIO, 2006).

Assim, faz-se necessário que o professor de Educação Física se aproprie de um outro conceito de cultura, daquele que trata o ser humano em suas diferentes manifestações culturais relacionadas ao movimento, ou seja, das práticas corporais historicamente definidas, o jogo, o esporte, a dança, a luta, a ginástica e outros. É preciso que, a partir desse novo conceito de cultura, as práticas pedagógicas sejam ressignificadas, é preciso compreender que “[...] aquilo que dá sentido ao movimento humano é o contexto em que ele se realiza” (DAOLIO, 2006, p. 96), sem negar o aspecto biológico inerente às manifestações corporais, sem reforçar a dicotomia histórica biológico/cultural.

O jogo apresenta características próprias e nossa compreensão a seu respeito deve ultrapassar a simples possibilidade de estratégia nas aulas de Educação Física. Devemos compreender e propor os jogos inseridos em um contexto social, mais uma vez atribuindo-lhes significado, permitindo a transformação do próprio jogo e, talvez, da visão de mundo e de sociedade dos alunos que jogam. Para que isso ocorra de maneira mais tranquila, é preciso que o professor, por meio de uma investigação inicial, conheça a cultura de movimento dos alunos e da comunidade, privilegiando os conhecimentos prévios e, ainda assim, apresentando novas possibilidades para o tema.

DAOLIO, J. Da cultura do corpo. 11. ed. Campinas: Papirus, 2007.

_____. Cultura: Educação Física e futebol. 3. ed. rev. Campinas: UNICAMP, 2006.

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CAPíTUlO 11 Classificação dos jogos

Como apresentado, vários foram os autores que, a partir dos textos de Huizinga, avançaram seus estudos sobre os jogos, discutindo desde outras características até as mais diferentes categorias.

Caillois (1990), nos diz ainda, que a personalidade humana é fortemente influenciada pelas atividades lúdicas, consideradas instrumentos importantes da cultura e da sociedade. Para tanto, o autor afirma que em quaisquer atividades lúdicas, está presente um sistema de relações sociais, permitindo a compreensão das características dos jogos. Abaixo, apresentamos um quadro com algumas características dos jogos apresentadas por Huizinga (2010) e Caillois (1990):

HUIZINGA CAILLOIS

Manipulação da realidade Demonstração de superioridade

Voluntário Desafio

É jogado em um campo delimitado e imaginário Implica risco e perigo

Regras previamente combinadas, construídas e obrigatórias Opõe-se a seriedade da vida

Cativante, tenso e imprevisível Exige habilidade e inteligência

Promove alegria e sensação de liberdade Estimula a vontade de ganhar

Fenômeno cultural Apresenta regras arbitrárias e inapeláveis

Limitado no tempo e no espaço É fonte de alegria e divertimento

Apresenta valores éticos É livre e voluntário

Ambiente instável O jogo é o sentido dele mesmo

Características lúdicas Características lúdicas

Quadro adaptado de Freire (2005).

Para Huizinga (2010), o jogo apresenta quatro características fundamentais das quais não podemos esquecer:

1. O jogo é uma atividade voluntária, isto é, o jogo é livre.

2. O jogo não é vida real, representa uma evasão, trata-se de um “faz de conta” temporário.

3. O jogo caracteriza-se por seu isolamento e limitação.

4. O jogo cria ordem e é ordem (suas regras são absolutamente obrigatórias, pois, se não cumpridas, determinam o fim do jogo).

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Callois (1990), a partir das características apresentadas no quadro, propôs a organização do jogo em quatro categorias diferentes, determinadas pela competição, sorte ou interpretação. As categorias propostas são: Agôn, Alea, Mimicry e Ilinx.

» A primeira categoria Agon significa competição, disputa, conflito. Agrupa os jogos que garantem condições de igualdade a todos os participantes, sendo determinante para a vitória as habilidades exigidas pelo jogo. Sua origem está nas competições realizadas na Grécia antiga e, como exemplo, podemos citar os esportes.

» A segunda categoria Alea tem seu significado relacionado à sorte; é formada pelos jogos que representam oposição aos jogos Agon. Para vencer o adversário, é preciso vencer o destino, que determina a vitória ou a derrota. Nessa categoria de jogo a habilidade dos jogadores não determina o resultado final e, muitas vezes, não são interessantes às crianças, pois seus desafios não podem ser vencidos por suas habilidades. Como exemplo de um jogo praticado pelas crianças podemos apresentar o Jockey Po.

Agon e Alea são, ao mesmo tempo, contrários e simétricos, pois ambos são controlados pela mesma lei, a que garante igualdade de condições a todos os jogadores.

» A terceira categoria Mimicry seduz facilmente as crianças, garantindo sua adesão. É formada pelos jogos de ilusão, relacionados ao mimetismo dos animais (capacidade de se disfarçar para enganar os predadores ou as presas). Nesses jogos os participantes vivenciam situações associadas à imaginação, representam personagens e se apropriam de outras realidades. Esses jogos são facilmente verificados na infância, são os “jogos de faz de conta”. Normalmente, nos jogos Mimicry também encontramos características do Agôn. Um exemplo de jogos Mimicry é o “Acorda urso”.

» A quarta e última categoria proposta por Callois (1990) é a Ilinx, palavra de origem grega que significa “turbilhão de águas” e é formada pelos jogos que proporcionam a sensação de vertigem. O objetivo desses jogos é quebrar os padrões de estabilidade do corpo humano. Os exemplos para esses jogos podem ser o “joão bobo” e o “currupio”.

Estas quatro categorias podem estar presentes nos jogos, de forma individual ou coletiva, aumentando a complexidade das regras e do jogo, ou simplesmente buscando diversão.

Além das categorias propostas por Callois (1990), é preciso apresentar a classificação proposta por Kishimoto (2008), que organiza os jogos em cinco categorias, a saber: educativos, de construção, tradicionais, simbólicos e de regras. Além disso, a autora apresenta alguns critérios semelhantes entre os jogos: predomínio da realidade interna, se joga pelo prazer e com alegria, o jogo deve ser escolhido de forma livre e espontânea pelos jogadores, entre outros.

» Os jogos educativos trabalham o papel pedagógico do jogo, superando sua função lúdica e utilizado como estratégia de aprendizagem na busca de outro objetivo que não o próprio jogo. No entanto, a autora aponta uma contradição para essa categoria

OS JOGOS COMO POSSIBILIDADES NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA | UNIDADE III

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de jogo. Uma vez que o jogo apresenta características de liberdade e ação voluntária, ele não poderia ter como objetivo o resultado do processo educacional. Caso isso aconteça, não há mais jogo, apenas o ensino.

» Os jogos de construção estão relacionados aos jogos de fantasia, aos jogos de faz de conta (Alea). As crianças constroem cenários e/ou estruturas podendo ser utilizados em outros jogos e brincadeiras.

» Os jogos tradicionais são aqueles que fazem parte da cultura popular, do cotidiano de várias gerações de crianças em um determinado país ou região. Esses jogos estão sempre em transformação e são transmitidos entre as gerações por meio da oralidade. Uma de suas principais características é o anonimato e tem como função maior a transmissão da cultura infantil e o desenvolvimento da convivência social. Como exemplos podemos citar a cabra-cega, a queimada, o barra manteiga, a amarelinha, o jogo de pião, entre outros.

» Os jogos simbólicos são uma possibilidade de solução para os conflitos vividos pelas crianças ou para satisfação de desejos não contemplados na vida real. São os jogos preferidos das crianças entre dois e seis anos. Assim, essa categoria de jogos é fundamental para a manutenção ou reestabelecimento afetivo da criança. São exemplos de jogos simbólicos o brincar de viagem (para o espaço, para a praia, para a selva).

» Os jogos de regras contribuem para o desenvolvimento das relações sociais e começam a se manifestar a partir dos cinco anos de idade, mas, é entre sete e doze anos de idade que a criança joga plenamente nessa categoria. É nessa categoria de jogos que as regras têm aplicação efetiva e que a cooperação entre os jogadores é determinante para o resultado final. O conjunto de regras do jogo normalmente é acordado entre os participantes, que devem cumprir fielmente o combinado, com o risco de serem penalizados caso não o façam.

Além da categorização dos jogos apresentada anteriormente, existem duas formas de jogar: o jogar com o outro (cooperação) e o jogar contra o outro (competição). No que tange às aulas de Educação Física na escola, a competição não pode ser entendida como um aspecto essencialmente negativo. Quando bem discutida e contextualizada pelo professor, pode tornar-se um importante agente educativo, pois exige dos participantes o entendimento e a aceitação do sentimento de vitória e/ou derrota.

O jogo pode ser competitivo, pode ter como resultado final esperado a vitória de um dos participantes, ou de uma das equipes, mas, ao mesmo tempo, pode e deve ensinar aos alunos que é necessário respeitar as regras para solucionar os problemas da melhor maneira possível. Às vezes, esses problemas surgem na forma de conflitos e, para resolvê-los, espera-se que o professor consiga mediar a situação, propondo que os próprios alunos encontrem a solução mais adequada para o momento e para o jogo; reforçando, inclusive, o fato de que nem sempre a solução encontrada pelo grupo vai levá-los à vitória no final do jogo. Aí reside a importância capital da mediação do professor, não como aquele que apenas “passa a mão na cabeça dos perdedores”, mas como aquele que consegue vislumbrar e discutir com todos os alunos (vencedores e perdedores) os valores incutidos na situação.

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Partindo do pressuposto acima, é comum que os alunos comparem, comentem e brinquem com os resultados obtidos nos jogos. Não há mal nisso, desde que essa atitude não seja supervalorizada, nem por vencedores, nem por perdedores. Uma possibilidade para resolver esse problema é demonstrar mais interesse sobre o processo (o que foi feito e como foi feito para ganhar o jogo), demonstrando aos outros alunos que o jogo foi jogado em condições de igualdade, tanto no que se refere às capacidades e às habilidades motoras, quanto aos aspectos determinados pelo destino (sorte ou falta de sorte).

É preciso cuidado para não reforçar atitudes como sempre ser o melhor, sempre ter com foco o resultado final. A supervalorização da competição em ambiente escolar diminui a autoestima, possibilita a comparação entre os alunos e aumenta a exclusão nas aulas. Quando isso acontece, sem perceber, o professor deixa de valorizar todo o caminho percorrido pelos alunos na prática do jogo, deixa de valorizar atitudes como tolerância e solidariedade.

A escola e, particularmente, a aula de Educação Física, são os locais ideais para uma prática pedagógica diferenciada em relação à categoria atitudinal dos conteúdos. Uma possibilidade concreta para essa mudança são os Jogos Cooperativos, propostos inicialmente por Terry Orlick, principal referência sobre o assunto, na década de 1970. A principal característica desse estilo de jogar é justamente a cooperação, pois não existe um único vencedor ao final, todos ganham com o desenvolvimento do jogo. Nesse estilo de jogo, jogar bem não é vencer, mas é aprender a cooperar para resolver as situações-problemas que surgem ao longo do jogo.

Segundo Brotto (2001), o jogo é uma oportunidade de nos encontrarmos com os outros, conosco e com o todo e, por essa razão, é consequência de nossas ações e reflexões. Os jogos cooperativos reforçam a confiança do aluno em si mesmo, elimina o medo e o sentimento de fracasso. Sua principal diferença dos jogos competitivos é que todos os jogadores cooperam e todos ganham durante e ao final dos jogos. Abaixo apresentamos uma tabela com as principais características dos dois estilos de jogar:

JOGOS COMPETITIVOS JOGOS COOPERATIVOS

São divertidos para alguns São divertidos para todos

Joga-se contra o outro Joga-se com o outro

A maioria tem sentimento de derrota Todos têm sentimento de vitória

Alguns são excluídos por sua falta de habilidade Não há exclusão. Existe um ambiente de aceitação mútua

Os perdedores ficam de fora do jogo e simplesmente observam

Todos jogam o tempo todo e aprendem a compartilhar o sucesso

O jogo é possível só para poucos O jogo é para todos

Pouca tolerância à derrota e sentimento de desistência perante a dificuldades

A habilidade de perseverar é fortalecida diante das dificuldades

Poucos se tornam bem-sucedidos Para cada um o jogo é um caminho coletivo de evolução

Apresenta valores éticos É livre e voluntário

Ambiente instável O jogo é o sentido dele mesmo

Características lúdicas Características lúdicas

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Os jogos cooperativos ainda podem ser classificados em jogos cooperativos sem perdedores, jogos de resultado coletivo, jogos de inversão e jogos semicooperativos.

» Jogos cooperativos sem perdedores: são considerados os verdadeiros jogos cooperativos, pois todos jogam juntos, não há perdedores e o desafio a ser vencido é comum a todos.

» Jogos de resultado coletivo: os jogadores são organizados em duas ou mais equipes, mas todos executam uma ação conjunta para alcançar um objetivo comum.

» Jogos de inversão: não existem equipes fixas, pois os jogadores trocam de equipes a todo instante, dependendo da situação do jogo, reforçando o entendimento de que todos jogam em uma equipe única, na busca do mesmo objetivo.

» Jogos semicooperativos: a estrutura desses jogos fortalece a cooperação entre os jogadores de uma mesma equipe. É indicado para alunos que tiveram pouco ou nenhum contato com os jogos cooperativos.

Acreditamos que todas as categorias de jogo apresentadas deveriam estar na escola, hora cumprindo seu papel pedagógico, hora pelos simples prazer de jogar. Sempre levando em consideração a cultura das crianças e seus conhecimentos prévios, valorizando a inserção desse tema da Educação Física no ambiente escolar. Dessa forma, o tempo destinado ao brincar na escola não ficaria restrito ao recreio ou às aulas de Educação Física.

BROTTO, F. O. Jogos Cooperativos: se o importante é competir, o fundamental é cooperar. 5. ed. Santos: Projeto Cooperação, 2001.

CAILLOIS, R. Os Jogos e os Homens: a Máscara e a Vertigem. Lisboa, Portugal: Cotovia, 1990.

HUIZINGA, J. Homo Ludens: O jogo como elemento da cultura. 6. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 2010.

KISHIMOTO, T. M. O jogo e a educação infantil. 2. ed. São Paulo: Editora Pioneira, 2008.

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CAPíTUlO 12O jogo e a Educação física

O jogo, como conteúdo da Educação Física, aparece na obra Metodologia do Ensino de Educação Física (COLETIVO DE AUTORES, 2002) e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998). Na primeira obra, o jogo é apresentado como uma invenção do homem, que por meio do processo criativo é capaz de modificar, no campo imaginário, a realidade e o presente de quem o joga, além de integrar o campo de conhecimento da área, como um dos conteúdos a serem ensinados na escola. Nos PCN, também aparece como conteúdo da Educação Física escolar, mas integrado aos Esportes, Lutas e Ginásticas, compondo um bloco temático de conhecimento a ser ensinado na escola.

O uso do jogo como recurso pedagógico já aparecia nos escritos de Platão e que, desde a Antiguidade, o jogo faz parte das manifestações corporais, inclusive registrado por algumas civilizações em forma de desenhos nas paredes. Porém, foi a partir do movimento escolanovista que seu caráter pedagógico permitiu sua inserção no ambiente escolar (NEIRA, 2009). A partir de então, a Educação Física escolar, começa a substituir os métodos ginásticos europeus pelos jogos, já que, em função de sua característica competitiva, se apresentava como uma proposta inovadora e contemplava os objetivos de formação dos cidadãos aptos para o trabalho industrial. A partir da segunda metade do século XX, atribuiu-se aos jogos a responsabilidade pelos desenvolvimentos motor, cognitivo, afetivo e social, sempre sob a ótica do ensino tecnicista. Assim, os professores passaram a utilizar os jogos como estratégias para as mais diversas aprendizagens.

Ainda nos dias de hoje, é possível encontrarmos professores que acreditam que a prática e o ensino dos jogos deve se limitar aos alunos da Educação Infantil. Contrariando esse falso pressuposto, afirmamos que todas as pessoas, independentemente de estarem na escola ou não, podem jogar. O que determinará a participação dos jogadores será o nível de exigência do jogo e o nível de habilidade dos jogadores, assim como ocorre com qualquer prática corporal (DARIDO; RANGEL, 2005).

Os jogos sempre estiveram presentes no ambiente escolar, principalmente sob a forma dos jogos pré-desportivos, fato facilmente verificado nas últimas décadas do século XX. No entanto, essa presença e sua prática, estava marcada fundamentalmente sob a perspectiva do saber-fazer, do como fazer, privilegiando a categoria procedimental dos conteúdos. Nesse sentido, toda atividade proposta era isenta de significados e intenções, oferecendo aos alunos uma prática esvaziada, uma prática do simples “fazer pelo fazer”. Na contramão dessa constatação, as aulas de Educação Física

[...] não podem atingir apenas a dimensão procedimental dos conteúdos, o fazer puro e simples, mas, sim, um fazer repleto de sentidos formativos, que potencializem todas as dimensões do desenvolvimento infantil. Então, é a partir desse fazer, desse

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envolvimento corporal que as dimensões atitudinais e conceituais precisam ser alcançadas. (MOREIRA; PEREIRA; LOPES, 2009, p. 123)

Assim, todas as categorias de conteúdo devem ser contempladas nos planejamentos dos professores de Educação Física. Valores, atitudes, normas, conceitos, fatos, procedimentos... todos devem ter o mesmo nível de importância! Inclusive no ensino e na prática dos jogos. Por exemplo:

» Na categoria atitudinal: os jogos devem contemplar cooperação, solidariedade, questões de gênero, ética. Essa categoria se manifesta nos jogos a partir das regras e do envolvimento voluntário dos participantes. Desse modo, as regras são aceitas espontaneamente, o que significa que elas devem ser compreendidas e contextualizadas. Esse entendimento deve ser explícito nas aulas, discutido com os alunos, pois, embora a atribuição de significados seja pessoal, deve ser objeto de discussão e reflexão coletiva, buscando uma melhor adequação às necessidades do grupo. Exemplos de jogos: Queimada e suas variações, Base Quatro, Pique-Bandeira.

» Na categoria conceitual: conhecer o repertório de jogos dos familiares, da comunidade, conhecer as diferentes formas de jogar o mesmo jogo, conhecer as variações do jogo. Os alunos devem conhecer as características básicas dos jogos e também suas classificações. Exemplo: Jogo de Taco, também conhecido como Betty.

» Na categoria procedimental: reproduzir, transformar ou modificar as formas conhecidas dos jogos. Envolve a execução das habilidades requeridas no jogo, em variados níveis de dificuldade, que correspondem ao esforço necessário para o aluno adquirir ou melhorar uma habilidade motora específica. Exemplo: Jogos com corda (Um homem bateu em minha porta, Salada, saladinha).

» Na categoria factual: conhecer e compreender as regras dos jogos, respeitando-as (categoria atitudinal) e modificando-as quando necessário. Exemplos: jogos pré-desportivos (futebol da escola, basquetebol da escola).

O aprofundamento da compreensão dos jogos só acontece quando professores e alunos têm consciência do que são essas temáticas e de como elas se relacionam com as diversas possibilidades de intervenção na realidade.

MOREIRA, E. C.; PEREIRA, R. S.; LOPES, T. C. Considerações, reflexões e proposições para a Educação Física na Educação Infantil e séries iniciais do Ensino Fundamental. In: MOREIRA, E. C.; NISTA-PICCOLO, V. L. O quê e como ensinar Educação Física na escola. Jundiaí: Fontoura, 2009.

MOREIRA, E. C.; NISTA-PICCOLO, V. L. O quê e como ensinar Educação Física na escola. Jundiaí: Fontoura, 2009.

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UNIDADEIVsitUAÇÕes de prÁticAs pedAgÓgicAs

AdeQUAdAs Aos conteÚdosdo jogo dA escolA

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UNIDADEsitUAÇÕes de prÁticAs

pedAgÓgicAs AdeQUAdAs Aos conteÚdos do jogo dA escolA

O objetivo desta unidade é apresentar algumas possibilidades práticas para os jogos, em suas diferentes categorias e estilos, no ambiente escolar. Vale ressaltar que cada escola apresenta realidades e possibilidades diferentes e ricas para o melhor aproveitamento e aprendizagem desses temas tão caros à Educação Física escolar.

Outro ambiente bastante favorável à prática dos jogos são os acampamentos, tão apreciados pelas crianças em idade escolar. Esse ambiente também merece atenção, justamente pelas múltiplas possibilidades que oferece. Os principais jogos praticados e ensinados nos acampamentos são os competitivos e os cooperativos, muitas vezes utilizados com finalidades pedagógicas.

No nosso entender, os acampamentos não têm essa função.

Na escola, os professores de Educação Física podem ser privilegiados por terem à sua disposição diferentes locais para suas aulas, mas, ao mesmo tempo, também podem enfrentar sérios problemas quando não têm sequer uma quadra ou um pátio como espaço de aula. De qualquer maneira, o que sugerimos é que os jogos sejam apresentados e explicados, rapidamente, na sala de aula, para que os alunos possam fazer anotações sobre os aspectos mais importantes do jogo ou sobre situações-problema que eles tenham que resolver durante o jogo. No entanto, é preciso que as orientações sobre a dinâmica e sobre os objetivos do jogo sejam repetidas no ambiente em que o jogo for acontecer, facilitando a compreensão e a localização dos alunos no espaço destinado à prática.

IV

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CAPíTUlO 13Sugetões de atividades

jogos e competições

Os jogos competitivos podem ser classificados como Agôn e demandam sempre uma disputa. Como exemplos podemos citar os jogos pré-desportivos e as próprias modalidades esportivas da escola.

» Pique-Bandeira: os alunos são organizados em duas equipes diferentes e ocupam o espaço da quadra de handebol (apenas um professor e uma única turma na quadra). Os alunos devem criar, pensar estratégias com o objetivo de pegar a bandeira da equipe adversária e, ao mesmo tempo, proteger a sua bandeira. Algumas regras iniciais para o jogo: delimitar a área da bandeira (pode ser a área do goleiro do handebol), definir se a bandeira pode ser lançada da área ou não, combinar se o aluno que for capturado pode ser salvo por um de seus companheiros.

Variações do pique-bandeira: pode ser jogado com mais de duas equipes, para isso, o professor deve organizar sua quadra em mais de um espaço para o jogo, ou ainda, organizar os alunos em equipes menores e a quadra em mais espaços. É possível modificar as regras conforme os desafios se tornem fáceis para resolver, ou conforme a solicitação dos alunos. Por exemplo: quando um aluno “invadir” a quadra adversária ele não pode retornar para o seu próprio espaço de jogo, ficando obrigado a prosseguir ou será pego. Aproveitando a situação, também é possível “salvar” os companheiros que foram capturados durante a invasão, permitindo o seu retorno ao jogo.

» Queimada tradicional: os alunos organizam-se em duas equipes diferentes e ocupam o espaço da quadra de voleibol (apenas um professor e uma única turma na quadra). O objetivo do jogo é eliminar o maior número de jogadores da equipe adversária e, para isso, eles devem ser queimados (apenas as mãos são consideradas “frias”, pois dessa forma as crianças ficam mais atentas ao jogo e conseguem se defender ou desviar das bolas que são lançadas na direção da cabeça). O aluno que for queimado, deve se dirigir ao espaço conhecido como cemitério e ele será o “coveiro” da sua equipe. Esse aluno não está fora do jogo, pois também pode eliminar os adversários com as bolas que recebe fora dos limites da quadra.

Variações da queimada tradicional: uma possibilidade é a chamada queimada coringa. Cada equipe terá um jogador escolhido que será o “coringa”. O objetivo do

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jogo é queimar o coringa da equipe adversária, mas os jogadores não sabem quem foi escolhido (apenas o professor). Toda a dinâmica do jogo permanece a mesma, mas o jogo só termina quando o coringa for queimado. É interessante observar as estratégias criadas pelas crianças para proteger o coringa e, até mesmo, para “enganar” a equipe adversária.

Outra possibilidade é o retorno dos coveiros para seu espaço de jogo original. Caso o coveiro consiga queimar alguém da outra equipe, ele retorna ao seu campo, participando, normalmente, das jogadas. Também é possível que o jogador queimado não se transforme em coveiro, e sim passe a integrar a outra equipe.

jogos cooperativos

» Pega-Pega do abraço: o jogo começa com todos os alunos espalhados pela quadra, mas, no início, apenas um pegador. Esse aluno/pegador deve correr atrás dos outros com uma bexiga cheia e só pode pegar os amigos encostando a bexiga no peito. Para salvar os colegas que foram pegos, os outros devem abraçá-los fortemente. Aos poucos, podemos aumentar o número de pegadores.

» João Bobo (categorizado como um jogo Ilinx): os alunos organizam-se em trios e, inicialmente, um de frente para o outro experimentam o desequilíbrio. Para que não caiam, devem apoiar-se no colega, utilizando as mãos na altura do peito como apoio. Conforme os alunos adquirem confiança nos companheiros do trio, podemos sugerir que trabalhem todos juntos e que, aos poucos, aumentem a distância entre eles. O aluno que segura o João Bobo precisa apoiá-lo com cuidado e depois colocá-lo no centro do trio.

Variações do João Bobo: pode-se aumentar o número de jogadores, jogando com cinco ou sete alunos no mesmo grupo. Isso exige dos alunos uma relação de confiança maior e bem estabelecida.

» Futpar: as equipes são compostas por duplas que devem jogar de mãos dadas o tempo todo. O espaço do jogo deve ser maior do que o da quadra convencional, e, também, retiram-se os goleiros para melhorar a dinâmica do jogo. O objetivo do jogo é o mesmo do futebol convencional: marcar gols!

» Variações do Futpar: podemos aumentar o número de bolas em função do número de duplas que jogam e aumentar a quantidade de gols na quadra.

Outra possibilidade é a mudança de equipe (jogo de inversão) pela dupla que marcou o gol. Quando questionados sobre quem venceu o jogo, não se surpreendam ao ouvirem a resposta: “Todos! Jogamos nas duas equipes!”.

SITUAÇÕES DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ADEQUADAS AOS CONTEÚDOS DO JOGO DA ESCOLA | UNIDADE IV

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brincadeiras tradicionais

A proposta é apresentar jogos e brincadeiras tradicionais indistintamente, sempre lembrando que essa proposta é defendida por vários autores da área. No entanto, é preciso que cada um aprofunde suas leituras para se apropriar das definições que considerarem mais adequadas.

» Brincadeiras com corda: “um homem bateu em minha porta”, “Salada, saladinha, casamento”. Todas essas brincadeiras podem ser realizadas com apenas um aluno na corda e, gradativamente, aumentar o número de crianças que jogam. Assim, aumenta-se o nível de dificuldade do jogo, mas também é preciso que os alunos cooperem entre si para que a brincadeira “dure” mais tempo.

» Jogo do Gavião: as crianças se organizam em filas, que têm seus tamanhos determinados pela quantidade de crianças e devem segurar no corpo de quem está à frente. Uma criança fica de fora da fila e será o Gavião. O jogo tem início com o gavião dizendo que está com fome e a fila responde a ele: “o que você quer? Uma perna? Um braço? E a pergunta se repete até chegar no último da fila. Quando isso acontece o gavião tenta apanhar o último da fila, e os demais tentam impedir que isso aconteça. Caso o gavião consiga pegar o último aluno da fila, este também se transforma e gavião.

Variações do Jogo do Gavião: o gavião não precisa ser um aluno de fora da fila, pode ser o primeiro de cada fila que terá que pegar o último. Quando isso acontecer aquele que era gavião passa a ser o segundo da fila. A dinâmica do jogo permite que isso aconteça várias vezes, até que todos tenham sido gavião.

» Gato e Rato: os alunos formam um círculo e outros dois ficam de fora da formação inicial. Esses dois serão gato e rato. O rato fica dentro do círculo e o gato do lado de fora. O objetivo do jogo é que o gato consiga apanhar o rato (dentro ou fora do círculo). O papel dos alunos que estão no círculo é dificultar a entrada do gato e facilitar a saída do rato de dentro do círculo. Quando o rato for pega invertem-se os papéis e trocam-se os jogadores até que todos os alunos tenham vivenciado as posições de gato e rato.

Variações do jogo do Gato e Rato: o rato quando for apanhado se transforma em gato e escolhe outro jogador para assumir seu lugar. Também é possível jogar com mais de dois gatos e dois ratos.

jogo simbólico: aula historiada

Essas propostas de atividades têm uma excelente aceitação dos alunos da Educação Infantil, mas também podem ser utilizadas, com sucesso, para as turmas dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental (1o ao 5o ano). Mais uma vez, a apresentação dos jogos deve ser feita em sala de aula, de maneira breve.

UNIDADE IV | SITUAÇÕES DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ADEQUADAS AOS CONTEÚDOS DO JOGO DA ESCOLA

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» A Bruxa e o Mago: os alunos correm livremente pela quadra, mas a bruxa e o mago devem ser definidos de comum acordo com a turma. Podemos utilizar uma forma de sorteio para definir as funções. A bruxa recebe uma varinha colorida (confeccionada pelas crianças e cada criança tem a sua) e o mago tem uma varinha de cor diferente da bruxa. A bruxa deve correr atrás das crianças e, ao encostar a varinha, a criança que foi pega ficará congelada. Apenas o mago pode salvar o colega congelado, encostando sua varinha nele. É preciso deixar claro às crianças que basta encostar a varinha no colega, não é preciso bater!

Variações do jogo da Bruxa e o Mago: mudar o contexto da história. Em vez da bruxa congelar os súditos do mago ela os transforma em bruxos e todo aquele que for pego devo correr atrás dos colegas também. Outra variação do jogo é transformar o súdito em bruxa e este correr apenas atrás do mago, dificultando o trabalho de salvamento do mago.

» Brincadeira do Agostinho: o jogo começa com uma roda, ficando uma criança no meio e outra do lado de fora, que serão respectivamente “Agostinho” e “Sinhô”. Os dois conversam:

› Agostinho, cadê meu gado?

› Tá no campo, sinhô...

› Falta um boi maiado!

› Num falta, num sinhô...

› Olha que eu te pego Agostinho! Ao dizer isso, o “Sinhô”, sem interromper a conversa, tenta romper a roda que, entretanto, não lhe permite a entrada:

› Num pega num sinhô...

Finalmente os alunos que formam a roda soltam as mãos e permitem que o sinhô entre nela. Ao mesmo tempo, Agostinho está fugindo por outro lado. Depois de correr bastante Agostinho tenta voltar à roda; se os alunos acharem que ele merece proteção, deixam que ele entre e fecham a roda. Caso contrário, o sinhô, ao pegá- lo, deixa-o de castigo e depois escolhe outro Agostinho.

Variação: quando Agostinho for pego ele pode ajudar o sinhô a capturar outros Agostinhos. Também podemos aumentar o número de sinhôs.

o jogar fora da escola (acampamentos)

O jogo é uma manifestação cultural que pode e deve ser praticada em qualquer ambiente, desde as ruas do bairro até nos espaços da escola. Apresentaremos dois jogos que se adequam muito bem ao ambiente de recreação dos acampamentos.

SITUAÇÕES DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ADEQUADAS AOS CONTEÚDOS DO JOGO DA ESCOLA | UNIDADE IV

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» Futebol de cegos: as crianças são organizadas em duas equipes numerosas e o jogo desenvolve-se em um campo ou quadra. As equipes são reorganizadas para que metade de cada uma fique com os olhos vendados e a outra metade sem vendas e em um espaço delimitado anteriormente; os jogadores vendados devem ficar no centro do campo ou da quadra. Ao início do jogo os participantes vendados serão orientados (sem ser tocados), pelos participantes sem vendas, para caminharem em direção a um dos gols. O jogo deve ter uma duração combinada previamente e, a equipe vencedora, será aquela que conseguir colocar mais jogadores vendados para dentro do gol da equipe adversária.

» Meia-Noite (Mimicry): um dos alunos assume o papel de coruja e os outros serão morcegos. A coruja deve ficar em um lugar marcado (sua caverna) e os morcegos correm livremente pelo espaço do jogo. Ao se aproximarem da coruja, perguntam a ela “que horas são?”. A coruja pode responder qualquer horário e, nesse caso, os morcegos continuam seu passeio tranquilamente. Porém, se ela responder “meia-noite”, os morcegos devem fugir. Os morcegos que forem pegos são levados para a caverna e ficam lá até o final do jogo.

Variações da Meia-Noite: os morcegos que forem capturados se transformam em corujas e passam a correr atrás dos morcegos que sobraram. Também, pode-se trocar a coruja pelo morcego que ela capturou, invertendo-se os papéis.

» Volençol (jogo cooperativo): os alunos são organizados em duplas e cada dupla recebe um pequeno lençol (pode ser uma toalha fronha etc.). Depois são organizadas em duas equipes. A dinâmica é a mesma do voleibol tradicional, mas as crianças só podem tocar a bola com o lençol.

UNIDADE IV | SITUAÇÕES DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS ADEQUADAS AOS CONTEÚDOS DO JOGO DA ESCOLA

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PARA (NÃO) FINAlIZAR

Neste Caderno de Estudos você obteve informações, análises e reflexões acerca de temáticas pertencentes ao corpo de conhecimento da Educação Física escolar. A ideia principal deste material é orientá-los na busca de mais conhecimento, pois seria muita pretensão acreditar que o que discutimos nestes textos seja conhecimento suficiente para atender às suas necessidades. É preciso buscar e apropriar-se do conhecimento o tempo todo. Que este tenha sido o primeiro passo para a compreensão desse universo tão amplo das práticas corporais que compõem a cultura de movimento.

Acreditamos que as reflexões apresentadas neste material possam despertar mais interesse sobre o fenômeno esporte e sobre as práticas dos jogos no ambiente escolar. Oferecer vivências contextualizadas e significativas das práticas corporais é um dever do professor, mas como fazer isso quando não temos conhecimento sobre o assunto? Busque sempre um aperfeiçoamento, não pare!

Lembre-se de que a prática de jogos e das modalidades esportivas na escola não deve se limitar ao “rolar a bola”, ao separar a turma em dois grupos e esperar a aula acabar. Essa prática é fundamental para a formação global dos alunos e o professor de Educação Física precisa estar preparado para atender as expectativas não só de seus alunos, mas de toda comunidade escolar. Só assim, com práticas pedagógicas diferenciadas e significativas é que a Educação Física escolar conseguirá se consolidar como um componente curricular como os outros: forte, importante e determinante para a vida do aluno.

Esperamos que, ao final do curso, você seja o professor de Educação Física que sabe o que faz, como faz e porque faz, que saiba defender suas opções pedagógicas e metodológicas, contribuindo para a mudança da Educação Física mediante alunos, professores, equipe gestora e toda a comunidade escola.

Sucesso!

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REFERêNCIAS

BETTI, M. Educação Física e sociedade. São Paulo: Movimento, 1991.

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