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eBookLibris
AS OCUPAES DE TERRA E APRODUO DO DIREITO
Carlos Alberto dos Santos Dutra
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As Ocupaes de Terra e a Produo do DireitoCarlos Alberto dos Santos Dutra
Verso para eBook
eBooksBrasil
Fonte DigitalDocumento do Autor
2002,2006 Carlos Alberto dos Santos [email protected]
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NDICEIntroduo
Captulo I A luta pela terra1. Luta de ontem e de hoje2. Sinal de riqueza e de pobreza
Captulo II A violncia no campo1. Os nmeros da violncia
2. A reao do latifndio
Captulo III A proteo jurdica da propriedade1. As ocupaes como caso de Polcia2. A Justia e a idolatria da Lei
Captulo IV A produo do Direito1. O Direito em construo2. Por um Direito democrtico
Consideraes FinaisReferncias Bibliogrficas
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Carlos Alberto dos Santos Dutra
As
Ocupaesde Terrae a Produo do Direito
Trs Lagoas-MS2001
Monografia apresentada Banca Examinadora do
Curso de Direito, como exigncia parcial para aobteno do grau de Bacharel em Direito pelaUniversidade Federal de Mato Grosso do Sul,
Campus de Trs Lagoas, sob a orientao da Profa.Rosemary Luciene Rial Pardo de Barros.
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Dedicatria:
Dedico esse trabalho a minha me LAURA
L se vai o tempo senhora e to pouco a conheo.Sei no sei se eu mereo tanto amor e esta cano.
Alma de menina, canto passarinho, mos depurpurina a me afagar no seu ninho.
Pois ainda sou menino.D-me tua mo segura, guarda-me em tua doura.
Uirapuru da alegria, reto e sbio o teu juzo.
Humanitria existncia, dar a vida se preciso.Mas como no sou sozinho, dividiste o teu carinho:ps o mundo em minhas mos.
Amorosa me-guerreira, devo a ti famlia e lar, meusirmo e o que sou.
Tenho razes para cantar, tens razes para estesonho embalar.
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AGRADECIMENTOS Yaveh,
Deus dos pobres e Deus libertador; minhas filhas Maria Anglica, Laura e Daline
pela alegria; minha esposa Vilma, historiadora,
pelos horizontes; minha orientadora,
Profa. Dra. Rosemary Luciene Rial Pardo de Barrospela dedicao;
Ao Prof. Dr. Jlio Cesar Cestari Mancini,pelo companheirismo;
Ao Dr. Jos Berlange Andrade, juiz de Direito,pela militncia e amizade;
Ao advogado Dr. Onofre da Costa Lima,pelas observaes,
Aos professores e colegas do Curso de Direito,
pelo lustro que trilhamos juntos
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SIGLAS
CC - Cdigo Civil BrasileiroCDDH - Centro de Defesa dos Direitos Humanos
CEDI - Centro Ecumnico de Documentao eInformaoCF - Constituio Federal de 1988CIMI - Conselho Indigenista MissionrioCLT - Consolidaes das Leis do TrabalhoCNBB - Conferncia Nacional dos Bispos do BrasilCP - Cdigo Penal Brasileiro
CPC - Cdigo de Processo Civil BrasileiroCPM - Cdigo Policial MilitarCPP - Cdigo de Processo Penal BrasileiroCPT - Comisso Pastoral da TerraDNER - Departamento Nacional de Estradas eRodagemDOJ - Dirio Oficial de JustiaETR - Estatuto do Trabalhador RuralFAMASUL - Federao da Agricultura de MatoGrosso do SulFARSUL - Federao da Agricultura do Rio Grandedo SulFUNRURAL - Fundo de Assistncia ao Trabalhador
RuralHC - Habeas CorpusIECLB - Igreja Evanglica de Confisso Luteranano BrasilINCRA - Instituto Nacional de Desenvolvimento eReforma AgrriaHC - Habeas Corpus
LICC - Lei de Introduo ao Cdigo Civil BrasileiroMASTES - Movimento dos Trabalhadores RuraisSem Terra do Oeste do Paran
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MNP - Movimento Nacional de ProdutoresMP - Ministrio PblicoMPF - Ministrio Pblico FederalMST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
terraONU - Organizao das Naes UnidasPNRA - Plano Nacional de Reforma AgrriaPUC - Pontifcia Universidade CatlicaPUR - Pacto de Unidade e Resposta RuralRT - Revista dos TribunaisSTF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Supremo Tribunal de JustiaSTR - Sindicato de Trabalhadores Rurais
TA - Tribunal de AladaTFP - Sociedade Tradio, Famlia e PropriedadeTJ - Tribunal de JustiaUDR - Unio Democrtica Ruralista
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INTRODUOConsuetudo est optima legum interpres
(O Costume o melhor intrprete das Leis).
(Direito Cannico, 1917).
A situao dos que sofrem por questes deterra em nosso pas extremamente grave.Ouve-se por toda parte o clamor de um povosofrido, ameaado de perder sua terra ou
impossibilitado de alcan-la (CNBB, 1980:3). Opresente trabalho se insere neste contexto de lutatravada por milhares de trabalhadores ruraissem-terra expulsos do campo e das cidades denorte a sul do pas. Busca valorizar,preferencialmente, o ponto de vista, o modo depensar e a experincia concreta dos que sofrem
por causa dos problemas da terra.Foi a partir da dcada de 70 (MEDEIROS,
1989: 136), com a expanso agropastorilcapitalista, que a chamada questo da luta pelaterra ganhou fora e vigor pelo Brasil afora. Asprimeiras aes de resistncia dos chamados
sem-terra que ganharam flego em meados dosanos 80 (Idem: 139), entretanto, no foramsuficientes para impor uma poltica dedistribuio de terra em grande escala no pas. Osurgimento do Movimento dos TrabalhadoresRurais Sem Terra-MST, responsvel, nos diasatuais, por centenas de conflitos na busca pela
posse da terra, por outro lado, tem semeado naesfera do Direito, situaes novas, verdadeiroespao instituintedo no legalizadoa conviver com
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o espao institudo da ordem jurdica vigente(CARTA, 1999).
Toda investigao, defende Maria do Pilar deArajo VIEIRA, pode surgir de duas maneiras:
primeiro, como resposta a inquietaes acadmicas,e segundo, como resposta a questes colocadas pelaprpria experincia (1991: 31-33). A presentemonografia identifica-se com esta ltimamotivao. Ela deita raiz na prpria experinciavivida pelo pesquisador na sua juventude esubseqente militncia no CDDH Maral de Souza
Tup-i, de Campo Grande-MS, do qual foi um deseus fundadores em 1987. O estudo da realidade,escreve Hilton JAPIASSU, supe um contato comela, no podendo permanecer no domnio da puraespeculao(1976: 23).
Motivado pela discusso acadmica ainda dos
tempos da Filosofia e Teologia, cursadas naPontifcia Universidade Catlica do Rio Grande doSul e seu engajamento na ento incipiente teologiada libertaodos anos 70, este trabalho brota danecessidade de se demonstrar que os conflitosagrrios, mormente as ocupaes de terra, nopodem ser tratados simplesmente como caso de
polcia. Em outras palavras, ele externa aindignao de milhares de trabalhadores ruraissem-terraque so levados diariamente s barrasdos Tribunais sob a acusao da prtica de crimecontra apropriedadeda terra.
Existe pouca reflexo sobre o tema das
ocupaes de terra promovidas pelo MST, naesfera do Direito. E isso por um duplo motivo. Porum lado, o assunto ainda recente na esfera
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acadmica e a produo terica em torno dapraxis desse movimento em particular, somenteagora toma corpo e ainda assim, em nvel deps-graduao, dissertaes de mestrado e
doutorado. De outro lado, o tema ainda encontradura resistncia entre os setores dominantes dasociedade, o que tem impedido a insero deavanos na doutrina jurdica, dado o fortecontedo ideolgico que permeiam essas aes.
Diante dessas dificuldades, o presentetrabalho limitar-se- a refletir, pelo olhar da
sociologia, sobre uma das alternativas encontradapor milhares de homens e mulheres, cidadosexcludos do direito fundamental terra que,atravs das ocupaes, tm conseguido abrirespaos institucionais na busca da tutela
jurisdicional para suas legtimas pretenses.
Elegendo como objeto de estudo o fenmenodas ocupaes, buscar refletir abrangentementesobre essa prtica do MST e sua relao com oDireito, indagando, na acepo lata do termo,sobre o valor e a funo das normas que governam avida social no sentido justo, sem, contudo,distanciar-se do sentido estrito, no estudo dos
pressupostos ou condies da experincia jurdicaaplicada a esses casos (REALE, 1987:285).
Na esteira da filosofia e da sociologia doDireito e, portanto, afastando-se da preocupaode natureza meramente dogmtica e normativa,sistematizada pela ordem jurdica vigente, esse
trabalho procurar perscrutar sobre osfundamentos ontolgicos do fenmeno dasocupaes vinculado-a juzos de valor e
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encarando-as como objeto passveis deinvestigao zettica - investigao concebida por
Theodor VIEHWEG, que privilegia o aspecto daperguntamantendo-se aberta dvida sobre as
premissas e os princpios que ensejam respostas(LAFER, 1988:17).
Sem sombra de dvida, a esmagadora maioriados operadores do Direito sai das escolas, pode-sedizer, com conhecimentos apenas decorados,totalmente desvinculados da realidade. Com rarase honrosas excees encontramos advogados, via
de regra, com grande dificuldade em ligaraquiloque aprenderam na faculdade com a vida social. Adificuldade passa a ser maior, ainda, quando esteprofissional se depara com situaes prticas decunho mais critico sobre essa realidade.
Todos sabemos, no existe outra forma de se
tornar advogado a no ser cursando a faculdadede Direito. Igualmente no existe outra forma deconcluir o curso que no seja submetendo-se arezara cartilha dos currculos oficiais, digerir asregras, os artigos, as normas e as doutrinas, agrande maioria das vezes, sem qualquer reflexo.O resultado, j dizia o falecido advogado do
Instituto Jurdico Popular, Nilson MARQUES, nopoderia ser outro: uma instruo fora da vida real,
fora dos conflitos; uma formao acadmica voltadapara o mundo do discurso(1988: 6).
Para superar o problema e escapar desseDireito nefelibtico que chamado de puro, ainda
que irreal e fora do tempo, preciso entoar emalto e bom tom que o fenmeno jurdico se modulano somente com as grandes evolues sociais
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(TEUBNER, 1982:64), mas tambm se transformaquando acontecem transformaes na base dasociedade(MARQUES, Idem).
O Estado, por estar investido das funes de
administrar a Justia atravs do Poder Judicirio,e de regulament-la atravs do Legislativo, escrevea Prof Luciene Rinaldi COLLI, deve chamar parasi:
a tutela dos conflitos sociais e a responsabilidade de dirimi-los sob os esteiosda lei e da ordem, constitudas para a
mantena da paz social. Este fim, todavia, nos alcanado atravs da interveninciaEstatal, mas tambm atravs de revolues da
prpria sociedade quando o Estado, noexerccio de suas funes, se demonstraincapaz de promov-la(2001: Introd.).
nesse sentido que o presente trabalhocaminha. Ensejando o dilogo com outras formasde pensar o Direito, quer demonstrar que asocupaesde terra, promovidas em particular peloMST, na medida em que expressam, por parte dostrabalhadores excludos do direito constitucionalde propriedade, aspiraes legtimas,configuram-se como autntica fonte material dodireito, com a mesma importncia das fontes formais(CARTA, 1999).
David HARVEY, em uma pesquisa sobre asorigens da mudana cultural afirma que nunca
fcil elaborar uma avaliao crtica de uma situao
avassaladoramente presente(1989: 301). O mesmopodemos afirmar em relao temtica abordadapor esta monografia. O professor Aquiles Crtes
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GUIMARES, dirigindo suas lies de filosofia aosamadurecidos mestres-advogados, promotores,
procuradores e detentores da mobilssima funo dejulgar, lembra que:
toda norma emana da conscincia (...) quesurgiu no conjunto das demais conscincias(...) doadoras de sentido: nica fonte de todaa articulao da vida social e histrica(...) abuscar o melhor na convivncia humana. Todaexistncia humana se caracteriza,originalmente, por ser coexistncia. O homem
um ser-com: diz da sua insero no processosocial(1997: 13-16).
Ainda que os Tribunais possam ser entendidoscomo verdadeiros teatros dos desencontroshumanos, das mtuas recusas, das imensas
frustraes, das misrias como subproduto da
humana condio (GUIMARES, 1997:23), a aoconsciente do ser humano na vida coletiva (e seureflexo na funo jurisdicional do Estado),depende exclusivamente de como essa realidade encarada e apreendida. Em outra palavras,depende do conhecimento que dela tem, dessa vidaque o seu meio social, o seu mundo (SILVEIRA,
1977:13).Pois a partir dessa sensibilidade e
preocupao em melhorar a lei positivaquando elano justa, que vrios juzes de primeirainstncia, Tribunais de Justia de Estados, e
jurisprudncia confirmada pelo Supremo Tribunal
de Justia, tm se posicionado favoravelmente socupaes de terra. Enquanto mecanismo depresso pela realizao da Reforma Agrria, elas
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tm sido entendidas, em vrios casos, comolegtimas.
So essas razes que nos alentam aperscrutar em nosso intento. Nas palavras de
Ademar BOGO:de nada valeria analisarmos a questo agrriaatravs de profundos estudos, se no nos
propusermos intervir sobre ela para fazeracontecer a Reforma Agrria. Natural interpretar a realidade; extraordinrio
formular mtodos e empenhar-se ativamente
para transform-la, conferindo contedo smudanas(1999: 106).
A partir da tica da funo social dapropriedadee sua proteo jurdica, este trabalhoalmeja igualmente semear luzes sobre umaquesto por demais controversa: a questo da
propriedade e da posse vista sob o aspectopoltico-ideolgico.
Buscando deslocar o entendimento do regimejurdico da propriedade privada, via de regrasubordinado ao Direito Civil, para o ponto de vistae esfera do Direito Constitucional, pretendecaminhar essa pesquisa no sentido da superaoda tica individualista e reguladora de relaescivis. Pretende, com isso, fornecer aos operadoresdo Direito (magistrados, promotores, procuradorese advogados), subsdios tericos e jurdicos maisamplos e que lhes permitam tomar posies quesuperem a mera classificao conceitual e a
simples rotulao de uma questo por demaiseivada de preconceitos.
A pesquisa valeu-se da bibliografia que versa
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sobre Direito Constitucional, Direito Civil, DireitoPenal, Direitos Humanos, Direito Agrrio,Sociologia e Filosofia do Direito, alm dabibliografia alternativa disponvel sobre o assunto
em stios na internet, como owww.mst.org.br/setores/dhumanos, monografias,dissertaes de mestrado e teses de doutorado, eperidicos relacionados ao tema, procurandosempre relativisar seus contedos filtrando-os doselementos da ideologia a que pertencem econsiderando o contexto de onde foram
produzidos.Nosso objeto de pesquisa, portanto, situa-se
no campo das ocupaes (como defendem ossem-terra) ou das invases (como preferem osproprietrios) da terra, procurando explicitar aforma como a maioria dos autores e a doutrina em
geral retratam essa situao anmala e como elafigura no nosso Direito.
Atravs da influncia da ideologia dominante eda jurisprudncia conservadora, via de regrafavorvel ao grande proprietrio, o Direito acaboupor distanciar-se do real vivido, olvidando de quetoda a estrutura normativa deve refletir o impulso
e esforo intencional de conscincias no sentidode buscar o melhor para a convivncia humana.
A partir desse entendimento, o de que aleitura jurdica da vivncia social dever seriluminadora dos sentidos das relaesintersubjetivas, caso contrrio, empobrecer-se-
no massacre das disposies normativas ditadaspelo Estado, o presente trabalho pretendesuscitar o debate em torno de uma indagao que
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pode ser apresentada nos seguintes termos:
At que ponto as ocupaes de terrapromovidas pelo MST configuram espaoinstituinte de produo do Direito? At que
ponto os ganhos oriundos do embatesociopoltico concreto da luta pela terra podemser incorporados ao poder jurisdicional doEstado?
Este trabalho, portanto, tem o escopo decolaborar para a produo de um pensamento
jurdico novo que responda aos anseios sociais de
parcela significativa de brasileiros. Atravs doexerccio do direito de resistnciados movimentossociais, em particular do MST e suas orientaesna promoo das ocupaes de terra que nocumprem sua funo social, podemos j deantemo vislumbrar que eles esto a denunciar a
discordncia e o descontentamento de milhes demarginalizados da terra.
Movimentos que no seu conjunto dizem mais,escreve COLLI. As ocupaes, como manifestaesde
desobedincia civil aos preceitos juridicamenteestabelecidos constituem-se em pretenses
juridicamente firmadas e garantidas, o quenos d suporte a afirmao de que as aesdesta natureza so lcitas, na medida em quevisam a garantia de direitos sociais,historicamente negados(2001: Ibidem).
No primeiro captulo desse trabalho
abordamos a luta pela terra em seus aspectoshistricos. Procuramos demonstrar que a luta pelaterra no um fato novo na histria do Brasil e
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que a terra pode significar riqueza e pobreza, vidaou morte, poder poltico ou marginalizao dohomem ou de grupos sociais. No segundo captuloabordamos a questo da violncia no campo, os
nmeros dessa violncia bem como a reaoorganizada e a violncia seletiva praticada pelolatifundirio contra os marginalizados da terra.
No terceiro captulo falamos sobre a proteojurdica da propriedade, do fenmeno dasocupaes e a organizao do Estado paracombat-las, tendo frente os senhores da lei.
Mais do que uma crtica a essa situao,pretende-se imprimir um olhar novo sobre oconhecimento jurdico em vista de uma lei justa.No ltimo captulo abordamos a questo daproduo do Direito propriamente dita, buscandoatravs dos aspectos tericos valorar a experincia
das ocupaescomo espao social de produo doDireito. Conclama, por fim, luzes sobre aperspectiva da democratizao da Justia nosentido de uma leitura mais constitucional emenos civilistada realidade e dos conflitos.
Mais do que cumprir uma exignciaacadmica para a obteno do grau de bacharel
em Direito, esse trabalho postula referenciaismais amplos: quer ajudar a pensarquestes quese colocam tanto para os operadores do Direito,como para proprietrios e lideranas do MST. um convite aos advogados para deixarem de lado ateoria dos empoeirados livros da Universidade, e
se debruarem sobre as teorias e lies de vidaexperimentadas por aqueles que verdadeiramenteconstrem a histria deste pas.
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Os advogados, escreve o professor MiguelPRESSBURGER,
no so os principais agentes dastransformaes sociais, mas podem dar uma
inestimvel contribuio no avano das lutas ena consolidao de conquistas(1988: 4) quedizem respeito grande maioria do povobrasileiro.
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Captulo IA LUTA PELA TERRA
Das necessidades fundamentais da sociedade,
deriva o contedo comum da composio do Direito(Djacir Menezes, 1964)
1. LUTA DE ONTEM E DE HOJEA luta pela terra no um fato novo na
histria do Brasil. No decorrer dos sculos, ela
tem sido a expresso das contradies de regimesque historicamente se sucederam, mormente oregime de propriedadeque deu sustentao poltica maioria dos governos desde o tempo do Imprio.Daniel RECH, assessor jurdico da ComissoPastoral da Terra-CPT, rgo ligado IgrejaCatlica, chega a dizer que os conflitos
relacionados terra comearam desde que ocorreu anotcia do chamado descobrimento do Brasil(1985:7).
Um rpido retorno ao passado nos permiteconfirmar as palavras da Professora TerezinhaDAQUINO que afirma nunca ter havido no pas
rupturas ou saltos no anseio por terra(1991: 111).As lutas, portanto, foram permanentes eremontam o perodo colonial, onde negros e ndioslutaram pela terra desde os confins dos quilombosat os movimentos das chamadas revoltasespontneas(AZEVEDO, 1982: 12).
Para a citada Professora, essas lutas, emboraantigas,
s se configuraram enquanto luta por Reforma
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Agrria a partir de 1950 at 1964, poca emque teve incio a organizao dostrabalhadores rurais em seus rgos declasse a partir das ligas camponesas e do
subsequente movimento sindical propriamentedito(Idem: 110).
Desde o Brasil colnia diversas propostas deReforma Agrria foram apresentadas porpensadores reformistas, como padre Joo Daniel(1770), Jos Arouche de Toledo Rendon (1788),Lus dos Santos Vilhena (1798-1802) e Jos
Antnio Gonalves Chaves (1817). A esses homensque pretendiam transformar a estrutura fundiriabrasileira, entretanto, a Coroa nunca deu ouvidos(JOBIM, 1983: 8).
Desde Canudos, que acabou em 1897, aagitao pela terraapareceu tanto no Contestado,
em Santa Catarina, de 1912 a 1916, como noJuazeiro do Padre Ccero, em 1913. Movimentosdesse tipo, em zonas miserveis do pas, escreveAntnio CALLADO:
a princpio criam esperana, criam empregos,criam at esmolas, por isso atraem toda aespcie de gente de reas extensas do
interior, e acabaram por originar umacoletividade(...). Depois de uma abolio que
foi a ltima do mundo, no partiu o Brasilpara um programa intensivo, nem dedistribuio de cultura, nem de distribuio deterra(1976: 67).
Foi somente a partir do decreto deemancipao dos escravos, em 1888, que seinicia, no plano jurdico-poltico, o ordenamento
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das relaes de trabalho no campo. Osdecretos-lei n 979, de 1903 e n 1637, de 1907,so os principais instrumentos legais do sistemasindical criados para ordenar as relaes de
produo no campo. Anos mais tarde, a Lei n1299-A, de 1911, escreve Octavio IANNI, cria, noestado de So Paulo, o Patronato Agrcola,instituio que se inseriu na base do regime decolonato ento vigente na cafeicultura(1984: 225).
Em 1922, no estado de So Paulo chegaram aser criados os Tribunais Rurais para solucionar
dvidas e interpretar questes relativas aoscontratos entre trabalhadores e proprietrios. Trsanos antes havia sido sancionada uma lei deacidentes de trabalho agrcola, dando algunsbenefcios aos trabalhadores, mas apenas aosacidentados que empregassem instrumentos
motorizados (MORAES & SILVA, apud. DUTRA,1996: 171). Em 1933, atravs do decreto n22789, foi criado o Instituto do Acar e do lcool(IAA), porm nada acrescentando quanto scondies de trabalho de moradores e assalariados(IANNI, 1984:225).
Em 1940, no meio urbano, foi institudo o
salrio mnimo e trs anos depois, criada a CLT,atravs do Decreto-Lei n 5452 que deixava claroem seu artigo stimo, que seus preceitos no seaplicavam aos trabalhadores rurais. SegundoValentin CARRION essa discriminao do art. 7foirevogada tacitamente pelo extinto Estatuto do
Trabalhador Rural (1998: 49). O Estatuto daLavoura Canavieira, criado pelo Decreto-Lei n3855, de 1941, surge para garantir as relaes
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entre proprietrios e usineiros de cana. Somentetrs anos depois, o Decreto-Lei n 6969, de 1944,iria se preocupar com os direitos dessestrabalhadores (IANNI, Idem).
Finalmente em 1963, atravs da Lei n 4214, que foi criado o Estatuto do Trabalhador Rural(ETR), que dizia respeito s condies de oferta edemanda da fora de trabalho no campo: instituiua carteira de trabalho; o contrato de trabalho; osdireitos e os deveres das partes contratantes; odescanso remunerado; as frias; o trabalho do
menor e da mulher, e outros aspectos das relaesde produo no campo. O ETR e a Lei dosSafristas seriam revogados seis anos mais tarde,atravs do Decreto-Lei n 761/69 (CARRION,1998: 49), j no rigor do regime de exceo de1964.
O chamado Estatuto da Terra (Lei n 4.504, de30 de novembro de 1964), decretado no regimemilitar, viria transformar a Reforma Agrria, dequesto poltica (j que envolvia interesses econflitos da sociedade), em problema tcnico.Alvaro de VITA registra que um dos primeirospassos para a efetivao desse Estatuto:
consistiu em eliminar todas as lideranaspolticas e sindicais comprometidas de algumaforma com as lutas dos trabalhadores rurais,atravs de cassaes, prises, expulses do
pas(...),torturas e assassinatos(1989: 104).
Toda essa histria, escreve Octavio IANNI fica
pela metade, ou pelo menos incompleta,se no descobrimos as idias que expressam,simbolizam ou amarram a trama dos
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interesses, contraponto das foras sociais emjogo. H uma argamassa ideolgica quecimenta os blocos de poder, ajuda aconstru-los, reconstru-los, explicar as suas
mudanas. H sempre construes ideolgicasorganizando (por exemplo) a ndole pacficado povo brasileiro (...) para evitar-se umarevoluo social(1984: 255).
O processo de apropriao da terra, polarizadoentre o uso e a propriedade, entre a posse e odomnio, sempre foi palco de litgios e ocasio de
conflitos. Para o citado professor Otvio IANNI, asleis de terras surgidas ao longo da histria doBrasil, principalmente as que tratavam de terrasindgenas, devolutas, pblicas, de colonizaooficial e particular, todas elas
indicavam a maneira pela qual o poder estatal
era levado a acomodar ou favorecer econtrariar, interesses das mais diversascategorias sociais envolvidas na luta pela
posse e acesso terra: ndios, ex-escravos,camaradas, imigrantes, moradores, colonos,agregados, assalariados, sitiantes, posseiros,
parceiros, meeiros, arrendatrios, grileiros,
latifundirios, fazendeiros, empresas (1984:175).
A falncia do sistema sesmarial(LARANJEIRA,1981:30) consubstanciada pela suasuspenso atravs da Resoluo n 76, de 1822,determinou que a nica maneira de aquisio do
domnio territorial no Brasil passou a ser a possepor ocupao. Com o advento da Lei de Terras (Lein 601, de 18 de setembro de 1850), que extinguiu
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o princpio da doao e inaugurou o da comprapara a aquisio de terras devolutas, o acesso terra foi paulatinamente dificultado ao homemcomum. Essa Lei estabelecia, por outro lado,
obrigaes para o dono de sesmaria. Se essasobrigaes no fossem cumpridas, a doao ficavaanulada e a terra devia ser devolvida, da o nomedevolutas, passando as mesmas a fazer parte dapropriedade dos Estados e da Unio (AJUP/FASE,1986: 4).
Desde o Brasil-Colnia, escreve o Dr. Robert
Weaver SHIRLEY, o nosso ordenamento jurdicoesteve distante de ter no povo o seu principalinteresse.
Portugal no tencionava trazer justia ao povoou mesmo prestar os servios maiselementares sua colnia. Essa
desvinculao entre o Estado e a populao um tema constante na histria brasileira. ODireito que existia era o dos coronis, as leisda elite agrria(1987: 80).
Ao mesmo tempo em que favoreceu amonopolizao da propriedade da terra porfazendeiros e latifundirios, a Lei de Terras, em
seus 23 artigos, bloqueou a propriedadeimobiliria aos imigrantes trabalhadores e aosescravos alforriados (PRESSBURGER, 1989: 4), einduziu os trabalhadores rurais a venderem suafora de trabalho nos engenhos de cana-de-acar, nas plantaes de caf, na criao de gado
e em outras atividades ao longo dos cicloseconmicos que se sucederam.
Para a professora Maria Stela Lemos
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BORGES, a Lei de Terras acabou mesmo porresolver a contradio existente entre posse epropriedade, decidindo-se em favor da propriedadefundiria capitalista da terra. Defende ela,
entretanto, que a lei supracitada:determinava que o dinheiro arrecadado navenda das terras deveria ser empregado naimportao de colonos, para atender demanda de mo-de-obra para as lavouras decaf, substituindo o escravo(1997: 45)
O certo mesmo que a luta pela terra, seja
pela sua posse, seja pela sua propriedade, congnita no Brasil, e tem se apresentado dediversas formas e modalidades conforme omovimento social a que esteve vinculada.
Prenhe de pendncias, brigas, emboscadas,tocaias, enfrentamento, conflitos armados de
maior proporo, baseiam-se, na maioria doscasos, em alguma reao grupal ou coletivamais ampla. Mobilizam foras, experincias,valores, ideais, reivindicaes de alguns ou demuitos(IANNI, 1984: 183).
2. SINAL DE RIQUEZA E DE POBREZAA terra pode significar riqueza e pobreza, vida
ou morte, poder poltico e posio social oumarginalizao. Para cada pessoa ou grupo social,ela tem um valor (GANCHO, 1995:5). A histria daluta pela terra, sua organizao social e conflitosdela advindos, contudo, nem sempre tm sidoanalisado do ponto de vista da posse da terra.
Valendo-se da estratgia dos posseiros que
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introduzem a chamada legitimidade alternativadaposse, instrumento que contorna a legalidade da
propriedade (MARTINS, 1985:103), as ocupaesde terra, organizam-se, via de regra, em torno de
princpios que privilegiam sobremaneira a posseeo usoda terra.
A origem do MST, pode-se dizer, revela essapreocupao de agregar valor em torno da funosocial da propriedade. As ocupaes de terrapermitem ao movimento dar visibilidade aoagravamento das condies de vida e trabalho dos
que vivem no campo. Tambm reflexo dodesemprego crescente no meio rural e na cidade, edo processo de pauperizao vivido por expressivaparcela da populao brasileira. A no realizaoda Reforma Agrria, prometida pela Lei n4.504/64, o Estatuto da Terra, e a colonizao
oficial no realizada no pas, fizeram crescer umaondade ocupaes, j a partir de 1983, com aposse da fazenda Annoni, no estado do RioGrande do Sul (VIANNA, 1988 e DUTRA, 1998a).
Para Jacques Tvora ALFONSIN, tanto operodo que antecede o surgimento do MST comotambm o que se sucedeu, a partir de suas aes
organizadas, revelam uma viso nova noenfrentamento dos problemas relacionados terra. Momento em que
a iniciativa de conquista de liberdade e deespao-terra, pelos necessitados, est sendo
feita margem dos rigores jurdicos
assentados pelo Estado. Espao alcanadosob a gritante e aberta contrariedade ehostilidade do Direito legislado, no faltando
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aqueles preocupados em extinguir a utopia doDireito inventado pelos oprimidos(1989: 23).
A questo agrria intensamente discutida nocontexto histrico do projeto desenvolvimentista
brasileiro sofreu profundas modificaes, com opassar dos anos, porm, o velho latifndiopermaneceu. Mais do que uma grande propriedaderural, pertencente a um proprietrio normalmenteausente(JUSTIA E PAZ, 1998: 8), e transformadonuma entidade poltica, ainda o latifndio quenorteia as relaes de propriedade
predominantemente. Se ontem, no intervinhadiretamente no processo produtivo, hoje ele o
pomo da discrdia.
Csar BENJAMIN identifica na base doprocesso histrico que deu origem ao nossoDireito Agrrio, a excluso:
Diversas e novas regies foram ocupadas pelagrande propriedade muito antes de suaocupao produtiva, o que gerou padro sociale econmico excludente a milhares detrabalhadores rurais. Registre-se ainda que agrande propriedade rural tornou-se tambmreserva de valor para empresas industriais e
bancrias sem vocao agrcola(1998: 82).A presso exercida pelos movimentos sociais
na atualidade, tem exigido dos cidados esobretudo da elite brasileira, a reviso de muitosconceitos e pr-conceitos em relao questoagrria. Uma verdadeira onda de reatualizaoem
torno desse tema est em curso no pas, pois,alm de interessar sociedade como um todo, aquesto mexe diretamente com interesses
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fundamentais de dois conjuntos sociais.
De um lado, esto os que utilizam apropriedade como instrumento para diversasformas de explorao, rentismo, especulao e
poder discricionrio, inclusive no que dizrespeito ao acesso privilegiado a recursospblicos. De outro, esto os trabalhadoressem terra, os pequenos produtores deslocados
para reas marginais ou espremidos pelocapital comercial e financeiro, os migrantes eos que sobrevivem no garimpo ou nas
periferias urbanas(Idem: 84).Visto como processo civilizatrio, o capitalismo
e sua praxis neoliberal tm revolucionado ascondies de vida dos sem-terra e at doslatifundirios. As relaes e as estruturas quedinamizam a globalizao que a todos envolve,
simplesmente dissolvem o mundo agrrio dosmoldes antigo, fazendo com que haja
o surgimento de um novo imaginrio do espaoe do tempo sob influncia de novos
paradigmas: o mundo agrrio transforma-seem conformidade com as exigncias daindustrializao e da urbanizao. A cidade
no s venceu como absorveu o campo, oagrrio, a sociedade rural(IANNI, 1997: 53).
At mesmo porque no Brasil, a democracianunca conseguiu chegar ao campo, nem como ensaio(IANNI, 1984:155), apenas como promessa. Opouco que se fez em 112 anos de Repblica em
favor da democracia no campo, foi e continua aser, nos dias atuais, to-somente o resultado daluta dos trabalhadores rurais sem-terra, do
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operariado rural e das chamadas minoria tnicas.Os dois primeiros, se somam no movimento dasocupaesde terras; os segundos, no movimentodas chamadas retomadas, verso indgena da
ocupao de seus territrios tradicionais(PAULETTI, 2000: 46).
Essa nova realidade trouxe reflexos sobre osmovimentos em prol da Reforma Agrria, bandeiramaior no processo da luta pela terra, nos diasatuais defendida at mesmo pelo Governo noenfrentamento dafora de um latifndio,
ainda capaz de impedir qualquer passoconcreto no sentido da efetivao de aesque, de fato, pudessem mudar o historicamente injusto panorama fundirionacional(JUNGMAN, 1998).
Se as medidas legais adotadas para apressar a
Reforma Agrria, estabelecendo metas recordes dedesapropriaes e assentamentos, por um lado,tinham o propsito de atender s reivindicaesdos movimentos sociais interessados numamodificao profunda do quadro fundirionacional, por outro lado, transformaram edistorceram os horizontes da Reforma Agrria,
reduzindo-a s pretenses do Estado.
o professor Jos de Souza MARTINS que nosalerta para o fato de que nos moldes em que aReforma Agrria tem sido apresentada, elato-somente
traduz a luta pela terra na lngua das alianas
de classe, dos pactos polticos e da defesapoltica da forma de propriedade que temos(1986: 67-8).
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Em outras palavras, a luta pela terra, de perfile configurao popular, acabou transformada emelemento mediadorda luta pela Reforma Agrria,ao que se processanos limites do quadro das
instituies polticas como sindicatos, partidospolticos, e o Estado(Idem: 68).
Assim entendida, tal concepo de ReformaAgrria perde seu carter de luta popular e ganhacarter de luta poltica. Transfigura-se a luta pelaterra edescaracteriza-se a ao dos movimentospopulares, impondo-lhes limites. Para Ademar
BOGO, a luta pela terra, ao passar do estgio daconquista econmica para luta poltica (contra oEstado e no simplesmente contra o latifundirio),superou o estgio da negociao individualizada(1999: 37), pois somente com presso de massapossvel negociar com o Estado, defende ele.
, entretanto, graas a esse pacto polticoqueenvolve diversos setores das classes sociaisurbanas (que se apresentam como intermediriosno processo), que os grandes proprietrios deterras (que constituem a base de sustentao doEstado) e o pas convivem pacificamente com aviolncia de uma distribuio desigual da
propriedade, que chega a extremos.Csar BENJAMIN, j citado, pergunta de onde
vem o sentimento de que os grupos dominantes soto fortes? Ele mesmo responde:
simples, eles tm muito: propriedades,dinheiro, estaes de rdio e televiso,
partidos cartoriais, meios de todo o tipo, gentea seu servio. Compram o que precisam,inclusive conscincias. Mas justo por terem
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demais, podem vir a ser irremediavelmentefracos: so poucos. (1998: 16).
Um deputado federal oligrquico, completa Josde Souza MARTINS essa idia de hegemonia, ele
tem tentculos que se capitalizam pelosministrios e agncias governamentais,atravessam governos estaduais e prefeiturase chegam poderosamente ao balo de serviosgovernamentais ao lado da casa do eleitor(1997: 26).
nesse contexto que o Direito se insere.Contexto distante do aspecto ontolgicoda relaodo homem com a terra, que a apresenta comocho de alimento, trabalho, descanso e moradia.Nesta concepo, no se vive apenasnaterra edaterra, mas vive-seaterra. esta relao, nos diasatuais desfigurada e distante dos arrazoados
dominantes dos Tribunais, que urge serresgatada.
A compreenso da questo terra, hoje, noolhar civilista de 1916, est dividida entre terra
para trabalhar e terra para cercar. O destino daterra foi mudado. Os donos expulsam os pobresda terra no prprio momento em que eles fazem aroa, no prprio ato do trabalho. Tomam a terrabrocadaou a roa e, neste sentido, se apropriamdo trabalho do pobre. O posseiro invasor setransforma, por assim dizer, em obstculo ao usocapitalista da terra.
Nas palavras do professor Jos de Souza
MARTINS, a terra foi convertida em equivalente demercadoria,
seu uso j est antecipadamente regulado
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pela necessidades do capital e no pelasnecessidade do trabalhador. a reproduodo capital que est em jogo e no areproduo do trabalhador e sua famlia
(1997: Idem).A questo fundiria brasileira e a exclusosocial, entretanto, longe esto de seremsolucionadas pela via da composio amigvel ouatravs de processos de desapropriaes de terra,isso porque, nos alerta JONES:
eles culminam em extorquir o patrimnio
pblico, uma vez que, a terra, em sua origem pblica e sua propriedade, em suaconstituio, na maioria das vezes, ilegal(1997:5).
O surgimento do movimento dos Sem Terra,escreve MARTINS, representou um passo maduro
em direo reformulao das estratgias da lutapela terra, e a um Direito de propriedade diverso(1993: 89). De certa forma a luta proposta peloMST desorganiza as bases polticas dasoligarquias. Por isso, recebeu resposta organizadae seletiva do latifndio j a partir do processoConstituinte em 1987 (SILVA, 1989).
pblico e notrio que os sem terrano estoreivindicando simplesmente terra. Esto atuandoem cima de um direitoque consideram certo. Oprofessor MARTINS chega a dizer que eles noesto pedindo a ningum para que produzam umDireito paraeles (1993: 90). Por outro lado, querem
mais do que o simples reconhecimento dalegitimidade da sua presena sobre a terra:querem reformulao das relaes sociais e
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ampliao dos direitos sociais(Idem).
Face ao discurso dominante da produoe daconcepo de terra produtiva, os militantes semterra refutam dizendo que esse o argumento do
proprietrio e no o argumento dos trabalhadoresque lutam pela terra. Para os sem terra, esse no o argumento da transformao poltica. Naavaliao de seus lderes, as teses da ReformaAgrria foram derrotadas dentro de seus prpriosgrupos de apoio e mediadores (INCRA, MIRAD).
Em outras palavras, o MST sinaliza que o
problema do Brasil no o de fazer uma ReformaAgrria distributivapara resolver seus problemaseconmicos; a questo fundamental a de que necessrio mexer no direito de propriedade, paramexer na existncia das oligarquias monopolistasdo campo.
Ainda que nos lugares onde subsistemcondies inquas e de extrema pobreza, aReforma Agrria represente no s uminstrumento de justia distributiva e decrescimento econmico, mas tambm um ato degrande sabedoria poltica, porque minimizadora deconflitos, ela (a Reforma Agrria) largamente
apontada como a nica resposta concretamenteeficaz e possvel da Lei ao problema das ocupaesde terra(MST, 2000).
Ainda assim e lamentavelmente, continuamas ocupaes de terras, a ser entendidas, nocampo do Direito, como um ato no conforme aos
valores e s regras de uma convivnciaverdadeiramente civil.
So essas situaes intolerveis e deplorveis
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no plano moral um sinal que est a exigirposicionamento e atuao do Direito. Tal realidadede permanente conflito, que invade o tecido socialdo direito de propriedade, da posse e do uso da
terra, est a exigir urgentes transformaes noquadro jurdico vigente, de modo a garantir aestabilidade do cidado e sua famlia, enquantosujeito de direitos.
o quadro da violncia, entretanto, quedesnuda a face mais perversa da atual polticafundiria brasileira. Os trabalhadores rurais tm
sido reprimidos violentamente em suas lutas, nos porque ocupam terras ociosas e improdutivas,mas porque:
ao ocupar terra ou se manter na terra invademtambm o espao poltico do poder local, edessa forma escapam da dominao pessoal e
do medo do potentado do lugar, violam asbases do poder (MARTINS,1993: 91).
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Captulo IIA VIOLNCIA NO CAMPO
S h uma fora capaz de fazer com que alguns
seres se submetam vontade de outros e esta fora a violncia(Leon Tolstoi, 1900)
1. OS NMEROS DA VIOLNCIAA violncia no campo tem sido contnua e
crescente nos ltimos anos. O processo daschamadas ocupaesde propriedades rurais tmdesencadeado, por conseguinte, forte represso doaparelho estatal, constituindo-se em permanentefoco de tenso. Por todos os Estados daFederao, de distintas formas, surgem conflitosentre, de um lado, grandes empresas nacionais e
multinacionais, grileiros e fazendeiros e, de outro,posseiros, sem terra, pequenos lavradores eindgenas (CNBB, 1980: 11-2). Violncia de toda aordem se comete contra esses ltimos paraexpuls-los da terra. Violncia que envolve
desde jagunos e pistoleiros profissionais at
foras policiais, oficiais de justia e at juizes.No raro observa-se a anomalia gravssima dacomposio de foras de jagunos e policiais
para executar sentenas de despejo(MARTINS, 1982: 48).
At hoje bastante arraigada a idia de que oprocesso histrico brasileiro ocorreu de formapacfica, sem rupturas violentas ou gravesconfrontos sociais. Esse mito, apontado pelo
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professor lvaro de VITA, que identifica asociedade brasileira com a imagem daquela emque tudo ocorre de forma no-violenta,
no resiste, porm, a um confronto com o
processo histrico real. Quando analisamosfenmenos sociais como a dominao pessoal,os movimentos messinicos, as reaes declasses dominantes e do Estado quesuscitaram, e o cangao, o que se revela algooposto: a violncia como um dos marcosdistintos do mundo social brasileiro (1989:
85).Nos anos 80, sob os resqucios do regime
militar de exceo, a cada trs dias, os grandesjornais do Sudeste brasileiro publicavam umanotcia de conflito pela posse da terra. Nessapoca isso correspondia a menos de 10% dos
conflitos reais. Um levantamento realizado pelaCPT, o nmero de vtimas que sofreram violnciasfsicas nesse perodo, mais de 50% dessas mortesocorreram em confrontos. Em 1984 o nmero detrabalhadores rurais assassinados foi de 130, oque permite dizer que a cada 3 dias foiassassinado um trabalhador rural no Brasil
(CNBB, 1986: 21).A extrema violncia com que a chamada luta
pela terraassume em determinados momentos nonosso pas tem revelado contornos ecaractersticas de uma guerra de extermnio, ondeas baixas mais pesadas, via de regra, esto do
lado dos sem terra. Situao que chega a nveisinsustentveis no momento em que ela
rompe com o limite que separa a ao
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repressiva do Estado contra os trabalhadores,da pistolagem sustentada por latifundirios.Em outras palavras: no se conseguedeterminar onde termina a ao legal, e onde
comea o banditismo(CPT, 1989:12).Diariamente tomamos conhecimento demortes, violncia e prises na luta pela ReformaAgrria. Dados da CPT e do MST revelam que de1988 at 2000, cerca de 1.517 trabalhadoresrurais foram assassinados no Brasil. De janeiro anovembro de 2000, ocorreram 12 assassinatos.
Entre 1989 e 2000, o total de trabalhadores ruraispresos chegou a 1.898 (CPT & MST, 2000).
A represso ao MST, promovida pelo forapblica do Estado, que na maioria das vezes temse apresentado como defensor da ordem dos
poderosos o exemplo mais assustador(DUTRA,
1998b: 47). Toda essa violncia praticada,por suas polcias, ou mesmo atravs dasposturas adotadas pelos membros dojudicirio, na utilizao de prticasjurisdicionais como prises semfundamentao, violaes de institutosjurdicos, prticas frontalmente contrrias
ordem democrtica e constitucional, comohomicdios, leses corporais, dentre muitasoutras, constituem-se em flagrante violaodas garantias mnimas aos direitos humanos(COLLI, 2001: 7).
No ltimos anos, o Paran foi o Estado que
mais se destacou em arbitrariedades e violnciacontra trabalhadores rurais sem terra. Segundodados do MST, desde 1995 registrou-se 16
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assassinatos de trabalhadores rurais, 31tentativas de assassinato, 7 casos de tortura, 322trabalhadores feridos e 470 prises, queocorreram em 130 aes de despejo (MENDONA,
2001:14).Em maio de 2000, mais de 1.500trabalhadores rurais, incluindo mulheres ecrianas, foram brutalmente reprimidos pela PMna BR-277, quando se aproximavam de Curitiba.Os policiais utilizaram gs lacrimogneo, cestreinados e balas de borracha para reprimir a
manifestao pacfica dos trabalhadores.Utilizaram tambm balas de chumbo, o queresultou na morte do lavrador Antnio TavaresPereira, assassinado com um tiro no abdmen(como veremos adiante). Estima-se que o nmerode feridos chegou a 180 (MST, 2000a).
O Estado do Par tambm tem concentradoum grande nmero de violaes contratrabalhadores rurais. O advogado Luiz EduardoGREENHALGH afirma que de 1980 aos primeirosmeses de 2001, foram mortos no Par 714trabalhadores rurais, 534 deles nas regies Sul eSudeste daquele Estado.
Em meio a esse genocdio, praticado porcentenas de pistoleiros, intermedirios,mandantes e policiais, apenas 4 condenaes-s um est preso. A histria de nosso pasest permeada de julgamentos esprios e pelararidade de justia na defesa dos menos
favorecidos(2001: 3).Em junho de 2000, o fazendeiro Jernimo
Alves Amorim foi condenado a 19 anos de priso
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em razo do assassinato de Expedito RibeiroSouza, presidente do Sindicato dos TrabalhadoresRurais de Rio Maria, no Sul do Par, ocorrido emfevereiro de 1991. Este julgamento representou
um marco importante contra a impunidade noPas: um momento histrico. a primeira vez noBrasil que um mandante de crime contra trabalhadorrural condenado, disse o assistente de acusaono processo, Luiz Eduardo GREENHALGH(2000:12).
Por ocasio do julgamento do massacre de
Corumbiara ocorrido em 1995, observou-se quedurante os 23 dias de julgamento, em Porto Velho,Rondnia, nove policiais militares foramabsolvidos. Ao mesmo tempo, dois trabalhadoressem terra e trs policiais militares foramcondenados em razo deste massacre. Na ao de
despejo das 600 famlias da Fazenda Santa Elina,morreram nove sem terra e dois policiais(MENDONA, 2001:15).
Durante o julgamento acima citado, registra odocumento elaborado pelo Centro de JustiaGlobal, CPT e MST, o promotor de justia TarcisoLeite de Mattos chamou os agricultores de
nazistase afirmou que ou o Brasil acaba com ossem-terra ou eles acabam com o Brasil. Essepromotor foi, posteriormente, afastado do casopela Procuradoria Geral de Rondnia, por pressode entidades religiosas e de Direitos Humanos(MST, 2000a).
Em relao ao massacre de Eldorado dosCarajs, o TJ do Estado do Par decidiu anular aprimeira sesso do julgamento, quando os trs
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principais comandantes das tropas da PolciaMilitar que participaram da operao foramabsolvidos, entre eles o coronel Mrio ColaresPantoja. O massacre ocorreu em abril de 1996,
durante uma operao da Polcia Militar do Parpara desobstruo da rodovia que liga Marab aParaupebas, resultando na morte de 19trabalhadores rurais sem terrae deixando mais de70 feridos (FRENETTE, 1999).
A avaliao que o MST faz dessa situao que esses assassinatos significam o fim do Estado
Democrtico de Direito.O Estado perdeu o controle e no garantemais o direito elementar do ser humano: avida. O nmero crescente da violnciato-somente denuncia a ineficincia doGoverno Federal na execuo das polticas
agrcolas e a principal causa a impunidade(MST, 2000a).
Os nmeros da violncia so apenas o reflexoda histrica vocao militar do latifndio: aqui olatifndio sempre viveu de armas na mo. Depois decaar e subjugar o ndio, destruindo-lhes seushbitos e sua cultura, e vigiar a escravaria negra
dando proteo s fazendas do contgio dosquilombos (...) era natural que as oligarquiascontinuassem a impor suas vontades atravs dasarmas (AKCELRUD, 1987:24)
Dados do MST (2000a) apontam outros casosde violncia ocorridos no ano de 2000. Em
Alagoas, no dia 2 de fevereiro o trabalhador JosLenilson da Silva, 27 anos, foi morto com disparosde arma de fogo nas proximidades da sede da
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fazenda que ocupava. O acusado da morte ofilho do fazendeiro, que se encontra foragido. NoParan, no dia 2 de maio o lavrador Antonio
Tavares Pereira, 38 anos, participava com outros
1.500 trabalhadores rurais sem terra de umamanifestao nas proximidades de Curitiba. APolcia Militar impediu a caminhada que serealizava de forma pacfica e ordeira, e passou adisparar as armas contra os trabalhadores.
Durante essa manifestao, registra o MST,um policial apontou sua arma contra o abdmen
de Antnio Tavares Pereira e disparou. Socorridopelas pessoas que passavam na Rodovia, oagricultor foi levado para o hospital porm noresistiu aos ferimentos e veio a falecer.Inicialmente a Polcia Militar negou a autoria, mascom os exames de balstica ficou provado que o
disparo foi efetuado pela PM que obedecia ordensexpressas para que todos os meios fossemempregados para reprimir a manifestao. At adata da publicao do documento do MST, opolicial identificado como autor do disparocontinuava exercendo suas atividades nasegurana pblica do Paran (MST, 2000a).
Em Pernambuco, no dia 25 de julho (dia dotrabalhador rural), o militante do MST JosMarlucio da Silva, estava participando de umprotesto contra o Governo Federal porque haviaum navio carregado com milho transgnicoancorado no porto de Recife. Naquele dia os
trabalhadores tambm realizaram protestos emfrente ao Banco do Brasil, porque o crdito para oplantio estava atrasado. Em frente da agncia do
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Banco do Brasil a PM recebeu ordens paraimpedir a manifestao e passou a dispararbombas, utilizar cachorros, cavalos e um policialmilitar disparou sua arma contra o lavrador. Jos
Marlucio morreu no hospital. O policial que omatou continuava a desempenhar suas funesna segurana pblica de Pernambuco (Idem).
No dia 6 de outubro, o militante RibamarGodim foi assassinado em Caruar, Pernambuco.Sua morte est ligada a sua militncia no Partidodos Trabalhadores e nos movimentos de
trabalhadores rurais. O crime foi praticado pordois homens que dispararam vrias vezes,acertando quatro tiros em sua cabea. Nenhumdos pistoleiros tinha sido preso.
No Mato Grosso do Sul, no dia 30 de agosto,os trabalhadores rurais Silvio Rodrigues e Ronilso
da Silva foram mortos no municpio de RioBrilhante. Segundo as investigaes da polcia, ocrime foi encomendado pela proprietria dafazenda Beco do Sossego e executado peloproprietrio da empresa de segurana Coes,Cludio Penhavel. O proprietrio da empresa desegurana e os pistoleiros encontravam-se presos
(Idem).No interior paulista, no dia 7 de outubro, no
municpio de Suzano, o lder sindical, militantehistrico do MST Manuel Neto foi barbaramenteassassinado com um tiro enquanto dormia em suacasa. Manuel Neto era militante das causas
populares no interior de So Paulo, ajudou aorganizar ocupaes de terras no municpio deSo Jos dos Campos e sua ltima atividade foi
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coordenar a campanha do candidato do PT Prefeitura do municpio de Suzano. At o final de2000, ainda no havia pistas dos assassinos emandantes do crime.
Em Rondnia, o adolescente EversonRodrigues dos Santos, 12 anos, foi morto no dia19 de agosto no acampamento Novo Amanhecer,municpio de Ariquemes. O pai do adolescente um dos coordenadores do acampamento e,segundo informaes, este homicdio foi praticadopara dar uma lio nos sem terras que esto
acampados, na tentativa de amedrontar edesarticular o acampamento.
No Rio de Janeiro, no dia 10 de junho, otrabalhador Wanderley Bernardo Ferreira, 31anos, foi morto com trs tiros calibre 38 e um tirocalibre 12. O homicdio ocorreu no acampamento
Zumbi dos Palmares e o acusado o fazendeiroJos Azeredo, que j havia ameaado de mortevrios integrantes do acampamento, inclusiveWanderley.
No Cear, no dia 25 de julho, o trabalhador emilitante do MST Francisco Aldenir, foi morto nomunicpio de Ocara. Segundo as investigaes, a
fazendeira Jacinta Abreu de Souza, 78 anos, aprincipal acusada de contratar pistoleiros paramatar o lavrador. A fazendeira e o capataz dafazenda foram presos. Aps alguns dias na cadeia,foram colocados em liberdade.
No ano de 2000, tambm foi registrado o
crescimento do nmero de prises contratrabalhadores rurais sem terra. O MST registraque at o ms de setembro foram presos 258
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trabalhadores. A todo momento chegam notciasda existncia de trabalhadores presos. Na suamaioria so considerados presos polticos porqueforam acusados de participarem do movimento dos
sem terra. Os motivos alegados para toda essarepresso, so sempre os mesmos: a acusao deque suas aes so polticas em torno dasocupaes de terra(MST, 2000a.).
2.A REAO DO LATIFNDIO
Muito j se escreveu sobre a violncia nocampo porm muito ainda precisa ser dito edenunciado. No podemos nos acostumar com umestado de coisas violento, conclamava a CPT, j em1988: Os assassinatos e despejos no nos podemser indiferentes. A violncia seria vitoriosa caso asdenncias no encontrassem eco e solidariedade
entre as pessoas.Observa-se j h algum tempo que a
sociedade brasileira est amadurecendo a convicode que a questo do Poder Judicirio no (s)
problema de juzes, promotores pblicos ouadvogados, mas um tema de interesse amplo da
sociedade, um desafio para a cidadania(MACHADO, 1996:13).
Ampliar espaos junto sociedade envolvente,entretanto, configura-se um desafio. Isso porque,denuncia Ademar BOGO,
o sentimento que existe (...) em torno dapropriedade privada est to arraigado naconscincia das pessoas que muitas vezes,at os que no possuem terra, se colocam
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contra as ocupaes, achando que isto estferindo o direito de propriedade(1999: 157).
E no para menos. Do lado dos que tmterra, o Movimento Nacional dos Produtores
Rurais-MNP, reclama da ao dos sem terra aomesmo tempo em que mobiliza a entidade paradefender os proprietrios: orientamos os
produtores, tcnica e juridicamente, na preveno deinvases. A cantilena antiga. Em 1986, o mdicoRonaldo Caiado, ento presidente da UnioDemocrtica Ruralista-UDR, afirmou em
Dourados, Mato Grosso do Sul, quese o poder pblico no dispuser de elementosnecessrios para garantir as propriedades deseus associados, por exemplo, no caso deuma invaso, dispomos de um estatuto gil,que permite, num rpido perodo de tempo,
mobilizarmos uma fora de presso com ointuito de garantir as propriedades(DUTRA,1998c:106).
Chega-se ao ponto, nessa mesma poca, de oento presidente do Congresso Nacional, senador
Jos Nicolau Fragelli, do PMDB do Mato Grosso doSul, verbalizar pedido estarrecedor. Secundado
por outro colega, tambm senadorsul-matogrossense, recomenda aos grandesproprietrios o uso de armas para combater asinvases. A sinalizao alastra-se como plvora.No Rio Grande do Sul, surge o PUR, umasociedade civil formada por fazendeiros
latifundirios do Alto Uruguai contando com oapoio da FARSUL e da no menos poderosa TFP,organizao ultra-nacionalista de extrema direita
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muito conhecida por sua atuao reacionria eviolenta contra os movimentos populares (DUTRA,1998d: 64).
Os anos 80 foram anos de chumbo para os
sem-terra face reao do latifndio a semearvtimas por todos os cantos do Brasil. No Par,fazendeiros instalados na regio da rodovia Belm-Braslia, procuram oficiais da ativa da PolciaMilitar e da reserva das Foras Armadas paraorganizar e comandar grupos de segurana paraatuar em suas propriedades contra posseiros
invasores.A exemplo das milcias utilizadas nesta pocano garimpo de Serra Pelada, onde oficiais dareserva do Exrcito ex-agentes da PolciaFederal e policiais civis controlam asatividades do garimpo, tambm os fazendeiros
daquele estado recorrem s armas. O prpriodirigente da Associao Rural do Par e dosCriadores de Cavalos Marajoara declarou queesta era a nica maneira de evitar esbulhos(Idem: 65).
Sob o signo da violncia, expande-se, a partirdo estado de Gois, a UDR, sob o respaldo
ideolgico e financeiro dos postulados do Sr. PlnioCorreia de Oliveira, dirigente nacional da TFP, queadquire status de entidade dos latifundirios. Oservio de Imprensa dessa entidade chega apublicar em nvel nacional, duas consultas feitasa dois renomados juristas, professores Dr.
Orlando Gomes e Dr. Silvio Rodrigues, sobre alegalidade dessas medidas de segurana extremasadotadas pelos fazendeiros.
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Em ambos os pareceres, eles foramafirmativos: a lei autoriza os fazendeiros aresistncia mo-armada. Ou seja, eles tm odireito de organizar preventivamente sua defesa
armada com o concurso de homens residentes nafazenda ou especialmente engajados para tal(Idem).
Por ocasio da ocupao da Fazenda Annoni,ocorrida em 1986, no Rio Grande do Sul, o
fazendeiros Vali Albrecht declarou: mesmoque eles cheguem desarmados e rezando,
nossas milcias esto prontas para receb-los(Idem: 66).
A respeito da UDR, Ren DREIFUSS escreveque ela surge com o objetivo de lutar com todas asarmas, da intimidao ao poder econmico (...)contra as tentativas de desapropriao de terras
(1989: 69). O primado da lei foi to fortalecido nodecorrer dos tempos que tornou-se comum a letrada lei se sobrepor a direitos fundamentais dosindivduos, especialmente, dos de condio maispobre. FARIAS & LOPES atribuem cultura
jurdicabrasileira essa tendncia que se estendeDireito dentro, qual seja:
a de fundir legitimidade com legalidade,substituindo a questo da justia pela davalidade formal das leis, e concebendo o
jurista (...) como o guardio de um sistemajurdico tido como completo e sem contradies(1987: 11).
As leis, nem sempre so Direito, nos alertaTarso Fernando GENRO, o que nos faz deduzirque o fundamento ontolgico do Direito deve ser
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buscado, no atravs de valores e da capacidadelegal de coero,
mas atravs da histria das relaes sociais.Dominao no uma categoria da metafsica,
mas uma categoria histrica que existeindependentemente da vontade dos homenssingulares. Ela est entranhada na prpriaorganizao da sociedade (...), consensoconseguido atravs de uma dominao edireo poltico-ideolgicas(1979: 17).
A Justia, bem escreveu Michel FOCAULT,
no foi produzida nem pela plebe, nem pelocampesinato, nem pelo proletariado, e sim,totalmente pela burguesia (1984: 8). Isso paraentender que o aparato judicial, ainda que tenda aconstituir um corpo separado,
uma zona de poder separada da sociedade e
consequentemente das tenses que se geramna mesma, ele no independente: enquantoaparato de poder, constitui sempre umaarticulao do que dominante na sociedade(SENESSE, 1984:12).
Os homens da lei, cujo raciocnio formado pelaescola positivista, escreve MARCONDES FILHO,no esto nenhum pouco preocupados em resolvero problema. To-pouco com
as causas dos fenmenos. Simplesmenteatacam suas manifestaes, partindo do
pressuposto que o povo brasileiro ordeiro equalquer desordem caso de anomalia,
estranha sociedade, razo para valerem-sede solues prticas e precisas, para liquidarde forma simblica com as aes dos
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movimentos sociais (1986: 85).
No quadro dos conflitos pela terra, a violncia,igualmente, acomete no s trabalhadores rurais elderes sindicais. Segundo o ex-presidente da
Ordem dos Advogados do Brasil-OAB, HermanBaeta, entre os anos de 1984 e 1986 foramassassinados mais de 30 advogados, sendo que 19foram vtimas de atentados em funo do exercciode suas profisses (DUTRA, 1998d: 64). Desde hmuito denunciado que a violncia cada vez mais organizada e seletiva, colecionando suas vtimas
pela ordem de importncia e influncia juntoqueles que buscam um pedao de terra paraviver e produzir.
Em 1987 o pastor luterano Werner Fuchs foicondenado com base no artigo 219 do CPM a seismeses de priso por ter participado de uma
ocupao em terras do Exrcito. O pastor vinhaacompanhando desde 1970 da luta dos atingidospela barragem de Itaipu binacional tendo ajudadoos trabalhadores rurais na formao do MST doOeste Paranaense. Na poca, a sentena tevemuita repercusso no meio jurdico queconsiderou inadmissvel o julgamento poltico de
civis por tribunais militares. O presidente daIECLB, pastor Gottfried Brakemeier, que interpsrecurso na esperana de reviso da sentena,referindo-se s palavras do pastor Werner,proferidas na qualidade de representante da CPT eque foram entendidas como injuriosas honra
das Foras Armadas, disse ser a denncia dainjustia dever de todo o cidado e particularmentedo cristo(DUTRA, 1998e: 61).
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De 1964 a 1985, identificou Isaac AKCELRUD,haviam sido assassinados 1.100 trabalhadoresrurais no Brasil. Mal sabia ele que nos dez anosseguintes este nmero se repetiria(de 1988 a 2000
foram assassinados 1.517 trabalhadores rurais):A guerra uma realidade cotidiana noscampos, matas, fazendas, povoados. Mas nascapitais, apenas um rumor, um retratodesbotado da violncia no campo. Alm deescassas as denncias so quase em vozbaixa (...). o clima mais conveniente s
classes dominantes interessadas em manterno limbo essa guerra secreta: ocultam-secadveres, nega-se e sonega-se informao,esconde-se a prpria existncia do conflito,enquanto o latifndio acoita milcias
paramilitares ilegais, recruta mercenrios e
monta arsenais clandestinos(1987: 21).A carncia de juzes e promotores pblicos,tambm pode ser apontada como uma das causasda incapacidade de se assegurar justia ao povo. Eisso tem se mostrado mais grave nas comarcas dointerior, onde a ausncia do magistrado e domembro do MP, tem estimulado o arbtrio policial,
poltico e a justia privada. Pesquisas revelam, porexemplo, que apenas um tero dos conflitos
judiciveis so levados Justia. Dos 4 milhesde processos iniciados em 1990, apenas poucomais da metade chegou ao seu final. Entre osquase dois milhes de processos sem soluo
esto,por igual, preferencialmente, aqueles de menorvalor, em defesa de interesses menos
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influentes, assistidos por patronos de menorremunerao, portanto, aqueles com menor
potencial motivador de uma deciso(MACHADO, 1996:13).
No toa que popularmente criou-se a idia,alimentada por juzes e promotores, de que Direito coisa de advogado. Despesas de uma ao
judicial muito elevadas para os pobres e a demoraem obter uma deciso, tm levado o povo aconcluir mesmo, que mais vale um mau acordo doque uma boa demanda. Isso quer dizer que melhor
ganhar alguma coisa do que sustentar um direito(DALLARI, 1994: 83).
Com razo reclamam os sem terrada violnciacom que o aparelho policial do Estado procede asdesocupaes e a rapidez com que a Justia,normalmente morosa, atende s postulaes dos
proprietrios rurais. Como se no bastasse, odiscurso dominante tem jogado duro atravs damdia contra o MST. Entre os ataques maiscomuns est aquele que acusa os sem terra deestarem ligados elite intelectual vermelha daesquerda, semelhante laboratrios pensantes,capazes de elaborarem planos astutos e
mirabolantes para a indstria da invaso (MELOFILHO, 1998: 49-51).
Outra acusao contra o MST a de formarem seus quadros lideranasforjadase nutri-las deideologias que pretendem derrubar o estadodemocrtico de direito (LETTERIELLO, 2000), ou
ainda de ministrarem cursos de tticas deguerrilha para que seus militantes (extensivotambm a grupos indgenas em suas retomadas)
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obtenham xito nas invases(FAMASUL, 1999).
No obstante, a histria no se apaga pelasbotas dos coronis ou generais ignorantes (RECH,1989: 43). Qualquer pesquisador que se debruce
seriamente pelos meandros da histria da lutapela terrano Brasil, encontrar muito sangue, muitaopresso, mas tambm, muita vontade de mudana(Idem), igualmente no campo do Direito.
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Captulo IIIA PROTEO JURDICA DA PROPRIEDADE
Luta pelo Direito.
Mas quando encontrares o Direito em confronto coma Justia, luta pela Justia(Eduardo Couture, 1974)
1. AS OCUPAES COMO CASO DE POLCIADesde o advento da Lei de Terra, aos
proprietrios de terras, foi-lhes atribudo umpapeldestacado na organizao social e poltica do Estadoimperial e republicano (SILVA, 1996). Aconcentrao de propriedade, por conseguinte, mero reflexo dessa influncia que engendravigorosas relaes de poder (GARCIA, 2000:150).Com as cores do interesse geral e porque
submetido dominao de grupos sociaishegemnicos, como no poderia ser diferente, oDireito, no raras vezes, se transforma, narealidade, em instrumento de dominao (NETO,1989: 33).
Nos ltimos dois anos, mais de uma dezena
de juzes no quis assumir o processo criminalque apurava a morte dos 19 trabalhadores ruraissem-terra resultante do conflito com a PM em1996 no Par. Motivo: por se tratar de conflito
possessrio ou por profundo respeito PolticaMilitar (GREENHALGH, 2001:3). Havidas comoilegaise anti-jurdicas, as atividades envolvendo o
fenmeno das ocupaes de terra promovidas pormilitantes do MST, via de regra, tm sidorecebidas e reprimidas pelo Estado e sua tutela
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legal, com extremo rigor.
A questo da imputao criminal s aespraticadas por integrantes de movimentos sociais,escreve Luciene Rinaldi COLLI,
envolve a aceitao de razes muito alm danecessidade da aplicao do direito de punirdo Estado. (...) se faz representar pela aode resistncia ordem instituda avessa aos
princpios constitucionais. Em recusa a estaordem, crescem os movimentos sociaisdelatores desta situao de excluso (2001,Introd.).
Representantes da chamada elite brasileira,denuncia o MST, alardeiam atravs dos jornais
falados e escritos, que os trabalhadores rurais semterra deveriam ser condenados e colocados nacadeia por crimes contra a propriedade de terra
(MST, 2000b). Na maioria das vezes, o tratamentoque o Poder Pblico tem dispensado paraminimizar o conflito das ocupaes depropriedades rurais, impor-lhes suas polciascivis e militares, o Judicirio, e o Ministrio Pblico,
atravs de inquritos, aes penais, prises edenncias, frmulas utilizadas paracham-los ordem, em razo de prtica que,se no juridicamente correta, socialmentenecessria(COLLI, 2001: 5).
O posicionamento de alguns juzes epromotores de percepo turva e caolha sobre oque seja movimento popular, (e que)pisam no direito
de liberdadede fracos e oprimidos, acusa o MST(2000b), ao decretarem prises de lideranasdesses movimentos, sob a acusao de formao
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de bando ou quadrilha (Artigo 188 do CP), revelamto-somente seu apego ao velho corolrio atribudoao Direito Penal: ele o direito dos pobre, no
porque os tutele e os proteja, mas sim porque sobre
eles, exclusivamente, faz pesar a sua fora e seurigor(CNBB, 1976).
Contrariamente ao que afirmam osproprietrios que os trabalhadores seorganizaram para o fim de cometer crimes, entreeles, o esbulho possessrio , observemos queestes senhores da lei e da ordem, representantes
do latifndio atrasado(MST, 2000b), esquecem-sede que a finalidade do ordenamento jurdico penal reeducar o criminoso e dar uma satisfao para asociedadeaplicando o Direito com eqidade.
O Direito Penal, esttico e rgido, escreveRoberto DELMANTO JNIOR,
h que estar sempre em sintonia com arealidade, humana, e por isso, mutvel, bemcomo com os direitos e garantias
fundamentais que vo, continuamente e aospoucos, se revelando no tempo -da no seremtaxativos os direitos e garantias fundamentaiselencados em nossa Magna carta, a teor do
seu art. 5, 2 (2000: 318).Em certas situaes, o Poder Judicirio
analisa os conflitos dando-lhes um carterindividual e singular, separando-o das condiessociais, polticas e econmicas que os produziram.Reverter esse quadro, portanto, configura-se
rdua tarefa para os Tribunais. Ou seja, devemprocurar adaptar a lei ordinria nova realidadeinstitucional e, tambm, aos direitos sociais e
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individuais revelados na prtica, respeitando aomesmo tempo, os primados da segurana jurdica.(Idem).
evidente que as ocupaes de terra no
podem ser tratadas como caso de polcia. Naavaliao do MST, ao contrrio daquelesindivduos considerados criminosos comuns, quepor sua vez reconhecem o comando jurdicoviolado, os trabalhadores rurais sem terra queparticipam da luta pela Reforma Agrria, agem porconvico poltica ou social. Em outras palavras,
rejeitam o comando jurdico.Portanto, a pena no poderia alcana-los comuma superioridade tica capaz de atingir os
fins de educar, retribuir ou corrigir. Destarte,quando o ordenamento penal utilizado narepresso s manifestaes populares, na
maioria das vezes tem prestado como arma nadefesa de uma ordem estatal, que se converteem tirania(MST apud. COLLI, 2001:81).
A experincia do MST tem demonstrado quealguns magistrados, ao aplicarem a lei, em setratando de conflitos coletivos, analisaro-no, viade regra, sob a tica de classe. Isso na prtica, temresultado em concesso de liminar de reintegraode posse, onde o causdicodo fazendeiro no estobrigado a cumprir com as exigncias do CdigoCivil e Cdigo de Processo Civil, e para aexpedio de decreto de priso preventiva noprecisar observar os preceit