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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X AS REPRESENTAÇÕES DO FEMININO NOS RITUAIS DA ASHURA E SEUS REFLEXOS NA SOCIEDADE LIBANESA: ENTRE A PASSIVIDADE E A MOBILIZAÇÃO POLÍTICA NO LÍBANO Flávia Abud Luz 1 Resumo: Na esteira das discussões acerca do papel da mulher nas sociedades de maioria muçulmana, entre as décadas de 1960 e 1970, as leituras feitas dos rituais da Ashura e das personagens envolvidas na narrativa da Batalha de Karbala (680 E.C.), sobretudo da centralidade do Iman Hussein e de sua irmã Sayyida Zaynab, se desenvolveram como uma tentativa de resgatar o protagonismo de Zaynab com o propósito de mobilização social e política, como foi observado primeiramente no Irã pré-revolucionário (com o intuito de engajar as massas contra governo vigente) e no Líbano, entre as décadas de 1970/1980 e no contexto da mobilização política das massas xiitas sob a égide de grupos sociais e políticos como o Hezbollah (DEEB, 2005 e 2009; EL-HUSSEINI, 2008). Tendo em vista as influências social e política em que se desenvolveu o movimento de construção do gênero feminino nos rituais religiosos e na sociedade de forma geral, a comunicação propõe a analisar, a partir do caso libanês, o referido movimento de novas leituras e apresentar as discussões e as alterações na atuação da mulher muçulmana xiita na sociedade. Palavras-chave: Gênero. Rituais religiosos. Mobilização política Introdução Em 680 D.C., acompanhado de um grupo de seguidores, composto por setenta e dois homens com suas esposas e filhos, o Iman Hussein saiu de Meca e voltou-se para Cufa, onde encontraria as massas populares que eram contrárias à legitimação do poder de Yazid como sexto Califa, e consequentemente da dinastia hereditária dos Omíadas, posicionando-se contra o governo de Yazid no intuito de conduzir a comunidade muçulmana a uma prática considerada mais autêntica dos valores islâmicos, sobretudo no que diz respeito à condução religiosa e política da referida comunidade (SATUREN, 2005, p.24). No entanto, após a forte repressão aos manifestantes da cidade de Cufa, o cerco ao grupo do Iman Hussein e a recusa deste a aceitar uma espécie de acordo que legitimaria o poder dos Omíadas em detrimento das reivindicações de parcelas xiitas, o pequeno grupo do Iman foi morto após violentos ataques conduzidos no décimo dia do cerco, o Iman martirizado e as mulheres e crianças que acompanhavam o mesmo foram conduzidos como prisioneiros até Yazid, em Damasco (Síria). A reivindicação de Hussein, quando de sua ida à Cufa e posteriormente cerco e morte em Karbala, era observada pelos xiitas não apenas como um ato 1 Mestranda em Ciências da Religião, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), especialista em Política e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e bacharel em Relações Internacionais pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP). Filiada à Associação Brasileira de História das Religiões (ABHR) e Membro do Núcleo de Estudos Multidisciplinar de Relações Internacionais (NEMRISP). São Paulo, Brasil.

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Seminrio Internacional Fazendo Gnero 11 & 13th Womens Worlds Congress (Anais Eletrnicos),

Florianpolis, 2017, ISSN 2179-510X

AS REPRESENTAES DO FEMININO NOS RITUAIS DA ASHURA E SEUS

REFLEXOS NA SOCIEDADE LIBANESA: ENTRE A PASSIVIDADE E A

MOBILIZAO POLTICA NO LBANO

Flvia Abud Luz1

Resumo: Na esteira das discusses acerca do papel da mulher nas sociedades de maioria muulmana, entre as dcadas

de 1960 e 1970, as leituras feitas dos rituais da Ashura e das personagens envolvidas na narrativa da Batalha de Karbala

(680 E.C.), sobretudo da centralidade do Iman Hussein e de sua irm Sayyida Zaynab, se desenvolveram como uma

tentativa de resgatar o protagonismo de Zaynab com o propsito de mobilizao social e poltica, como foi observado

primeiramente no Ir pr-revolucionrio (com o intuito de engajar as massas contra governo vigente) e no Lbano, entre

as dcadas de 1970/1980 e no contexto da mobilizao poltica das massas xiitas sob a gide de grupos sociais e

polticos como o Hezbollah (DEEB, 2005 e 2009; EL-HUSSEINI, 2008). Tendo em vista as influncias social e poltica

em que se desenvolveu o movimento de construo do gnero feminino nos rituais religiosos e na sociedade de forma

geral, a comunicao prope a analisar, a partir do caso libans, o referido movimento de novas leituras e apresentar as

discusses e as alteraes na atuao da mulher muulmana xiita na sociedade.

Palavras-chave: Gnero. Rituais religiosos. Mobilizao poltica

Introduo

Em 680 D.C., acompanhado de um grupo de seguidores, composto por setenta e dois

homens com suas esposas e filhos, o Iman Hussein saiu de Meca e voltou-se para Cufa, onde

encontraria as massas populares que eram contrrias legitimao do poder de Yazid como sexto

Califa, e consequentemente da dinastia hereditria dos Omadas, posicionando-se contra o governo

de Yazid no intuito de conduzir a comunidade muulmana a uma prtica considerada mais autntica

dos valores islmicos, sobretudo no que diz respeito conduo religiosa e poltica da referida

comunidade (SATUREN, 2005, p.24). No entanto, aps a forte represso aos manifestantes da

cidade de Cufa, o cerco ao grupo do Iman Hussein e a recusa deste a aceitar uma espcie de acordo

que legitimaria o poder dos Omadas em detrimento das reivindicaes de parcelas xiitas, o

pequeno grupo do Iman foi morto aps violentos ataques conduzidos no dcimo dia do cerco, o

Iman martirizado e as mulheres e crianas que acompanhavam o mesmo foram conduzidos como

prisioneiros at Yazid, em Damasco (Sria). A reivindicao de Hussein, quando de sua ida Cufa e

posteriormente cerco e morte em Karbala, era observada pelos xiitas no apenas como um ato

1 Mestranda em Cincias da Religio, pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), especialista em Poltica e Relaes Internacionais pela Fundao Escola de Sociologia e Poltica de So Paulo (FESPSP) e bacharel em Relaes

Internacionais pela Fundao Armando Alvares Penteado (FAAP). Filiada Associao Brasileira de Histria das

Religies (ABHR) e Membro do Ncleo de Estudos Multidisciplinar de Relaes Internacionais (NEMRISP). So

Paulo, Brasil.

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poltico, relacionado restaurao do direito sucessrio da linhagem do Profeta e resistncia ao

poder sunita, mas como um ato religioso motivado pela busca de restaurar os valores religiosos

mais autnticos, tendo em vista a percepo de que os califas teriam ao longo do tempo os ideais de

justia e verdade propagados pelo Profeta Muhammad foram substitudos por interesses materiais e

polticos. O martrio do Iman Hussein (neto do Profeta Muhammad) ocorrido na Batalha de Karbala

(680 d.c., no deserto de Karbala, Iraque) deu origem a uma srie de praticas rituais dedicadas ao

luto e memria do Iman e a uma narrativa a narrativa de Karbala que constituem um pilar

fundamental da construo do pensamento poltico-religioso dos xiitas do duodcimo.

De forma simplificada, a genealogia das aes coletivas e individuais que compem a

Ashura descrita da seguinte maneira: primeiro, um recitador (mullah) narra de forma emotiva a

tragdia da morte de Hussein e lamenta os eventos ocorridos em Karbala, tendo como base os

relatos contados de maneira oral que depois foram resgatados e re-significados por Vaiz Kashifi no

livro Rawzat al-shuhada (O Jardim dos Mrtires) escrito no sculo XVI, enquanto os ouvintes

renem-se para lamentar os eventos e batem de forma ritmada em seu peito (prtica conhecida

como latmiyyat). Depois, os fiis realizam uma espcie de procisso funeral pelas ruas, em que o

caixo coberto de Hussein carregado por homens vestindo preto enquanto outros homens cantam e

se autoflagelam utilizando correntes, espadas ou facas at que seu sangue fique evidente. Por

ltimo, ocorre a encenao teatral dos eventos ocorridos em Karbala a chamada Taziyeh em

que o momento no qual Hussein e seus seguidores foram cercados na plancie de Karbala contado

ao pblico com uma grande quantidade de detalhes, algo que s vezes comparado com a

encenao da Paixo de Cristo realizada em pases cristos. Ainda neste sentido, uma referncia

dimenso poltica de Karbala pode ser observada nos rituais, visto que em algumas das encenaes

feitas existe uma nfase nas qualidades dos lderes xiitas, que por sua vez so contrastadas com a

conduta antitica e vil dos lderes sunitas que teriam usurpado o poder poltico ao retirarem de

Hussein (e consequentemente dos xiitas) o comando da comunidade muulmana (AFARY e

ANDERSON,2011,p.83-84).

Entre os elementos centrais da narrativa dos eventos ocorrido em Karbala figuram as idias

de sofrimento, compaixo, justia e at mesmo de sacrifcio por um bem maior (traduzido atravs

da noo de martrio).

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A conduta dos xiitas do duodcimo ao desenvolverem e participarem, ao longo dos sculos,

dos rituais em memria do martrio de Hussein e dos eventos da Batalha de Karbala2 oscilou entre

duas formas: a nfase na ativa mobilizao poltica com o anseio de alcanar a justia social e a

efetivao de governos justos que para os xiitas eram representados no desenvolvimento do poder

religioso e poltico por parte dos Imans e a nfase nas circunstncias da derrota militar de Hussein

e do seu martrio. Entre os xiitas do duodcimo, observou-se com maior freqncia a nfase nas

circunstncias da derrota de Hussein e a conduo de uma postura de notria passividade poltica,

que buscou a compreenso da tragdia em termos msticos, lricos e emocionais (RAM, 1996).

Como exemplo da primeira forma, uma verso mais poltica e voltada para a clssica

questo de quem deveria governar a umma, as formas mais rudimentares dos rituais de lamentao

baseados nos eventos de Karbala, compostas por elegias populares aos mrtires, foram utilizadas

pelos xiitas ao longo da dinastia Omada (680-750 D.C.) at os dois primeiros governos da dinastia

Abssida (750-920 D.C.), em rebelies que tinham o intuito de contestao do poder dos

governantes que os xiitas no reconheciam como legtimos, sendo que no caso especfico da queda

dos Omadas, os smbolos e as formas rituais da narrativa de Karbala foram particularmente

eficazes para que outro ramo da famlia do Profeta, cujos membros se declaravam como os

descendentes de seu tio al-Abbas, desafiasse e posteriormente derrotasse os Omadas, dando incio

dinastia Abssida (AGHAIE, 2009; HOURANI, 2006, p.56-57). No entanto, o uso estatal dos

referidos smbolos religiosos alcanou maior relevncia quando do estabelecimento do Estado

Safvida (no Ir) no sculo XVI, momento em que os safvidas originalmente da ordem sufi

(corrente mais esotrica do Isl) estabeleceram sua dinastia, tomaram o xiismo duodcimo como

religio oficial do Estado e passaram a utilizar-se de smbolos e rituais xiitas para garantir sua

legitimidade frente aos oponentes sunitas e demais adversrios polticos. Neste sentido, os rituais

em memria ao martrio do Iman Hussein, que tinham sido desenvolvidos nos sculos anteriores,

passaram a ser realizados de forma pblica, ou seja, sem o risco de que uma atitude contra seus

participantes fosse tomada, visto que naquele momento os xiitas no eram uma minoria que temia

expressar suas crenas religiosas e convices poltica. Alm disso, os rituais se tornaram mais

elaborados e outros, como a realizao de sermes que detalham a trgica Batalha de Karbala,

passaram a integrar as comemoraes do ms Muharan3 (AGHAIE, 2009).

2 De acordo com AGHAIE (2009) o luto por Hussein, pela tristeza dos sobreviventes da famlia do Profeta e pelos

demais mrtires da Batalha de Karbala, tiveram incio quase que imediato, em meio tristeza dos parentes das vtimas,

mas os rituais desenvolveram-se e espalharam-se do Iraque para os demais pases ao longo do sculo VIII. 3 Cabe ressaltar que, embora a genealogia dos principais rituais desenvolvidos em memria do martrio do Iman

Hussein (em 680 D.C., na Batalha de Karbala, Iraque) guarde um ncleo comum composto por procisses, a

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Em sentido oposto, a nfase dos crentes xiitas nas circunstncias da derrota militar do Iman

Hussein e nos detalhes que envolveram seu martrio ao invs de servir como elemento simblico

para a contestao do poder dos governantes, como anteriormente mencionado, conduziu os xiitas

ao desenvolvimento de uma verso passiva dos acontecimentos vivenciados em Karbala (salvo

excees observadas durante a dinastia Omada em que parcelas xiitas utilizaram-se dos smbolos

de Karbala para questionarem a legitimidade dos califas) e teve como base a apreenso religiosa dos

referidos smbolos e mensagem, fato este que contribuiu para deslocar a um segundo plano a

questo poltica que fora anteriormente enfatizada e inserir no centro das reflexes e prticas rituais

aspectos como o sofrimento humano (e a relao com a noo de redeno como salvao) e o

misticismo religioso.

Discutidos ao longo das dcadas de 1960 e 1970 por clrigos e estudiosos dos crculos de

estudos centrais do xiismo, respectivamente Najaf (Iraque) e Qom (Ir), a mensagem e os smbolos

presentes na narrativa de Karbala passaram por um processo de reinterpretao que reforou a

percepo de Keddie (1995) de que a referida narrativa guardava um componente de acomodao

e/ou aceitao do status quo e outro componente relacionado a um impulso revolucionrio e

questionador do poder poltico-religioso vigente, que lhe permitiram uma ampla gama de posturas

polticas que poderiam ser utilizadas, de acordo com o contexto poltico, social e religioso, ou seja,

trouxe aos xiitas a possibilidade de uma justificativa religiosa para uma extraordinria versatilidade

poltica, visto que as atitudes que enfatizam a passividade poltica e a nfase no sofrimento ou uma

atitude ativista so igualmente desejadas e recomendadas, possvel para aqueles que quiserem

liderar as massas xiitas encontrarem inspirao e racionalizao para suas atitudes em ambos os

modelos.

Neste contexto de releitura da narrativa central do xiismo alguns aspectos principais

surgiram para ampliar o debate entre os clrigos de ambos os crculos. So eles, quatro de acordo

com Aghaie (2001, p.152-157): a) a relativizao da nfase na dimenso soteriolgica da narrativa

de Karbala, b) a problematizao acerca do momento e da forma pela qual seria possvel aos xiitas

se rebelarem contra governantes considerados injustos, como os Pahlavi no caso iraniano, c) a

reinterpretao das percepes do eu e do outro; e d) a construo e propagao de diferentes

concepes dos papeis de gnero na sociedade. O foco da presente comunicao neste ltimo

ponto, as leituras que trouxeram a centralidade da Sayyida Zaynab e se desenvolveram como uma

encenao teatral dos eventos ocorridos no campo de batalha, o luto (s vezes seguido por aes de autoflagelo) e a

utilizao de vestimentas de cor preta os rituais sofreram alteraes que refletiram, como foi no caso do Ir e do

Lbano, os aspectos sociais e polticos dos pases em que as comunidades xiitas integram a sociedade.

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tentativa de resgatar o protagonismo da mesma com o propsito de mobilizao social e poltica,

como foi observado primeiramente no Ir pr-revolucionrio (com o intuito de engajar as massas

contra governo vigente) e no Lbano, entre as dcadas de 1970/1980 e no contexto da mobilizao

poltica das massas xiitas sob a gide de grupos sociais e polticos como o Hezbollah (DEEB, 2005

e 2009; EL-HUSSEINI, 2008).

Tradicional Narrativa de Karbala e sua reinterpretao no sculo XX

Na verso clssica e popularizada da narrativa de Karbala, apresenta no livro Rawdat ash-

shuhada (O Jardim dos Mrtires) escrito no incio do sculo XVI, o estudioso Waiz Kashif,a

personagem feminina que foi descrita com detalhes devido a compreendida a sua importncia para a

formao do Iman Hussein foi sua me, Fatima Zahra. Embora Fatima no esteve fisicamente nos

eventos da Batalha de Karbala que culminaram no martrio de seu filho, Fatima inserida e

apresentada na narrativa de Kashif como a nica mulher a partilhar da inefabilidade dos Imans e

Profetas, tendo em vista que na viso de mundo dos xiitas, ou seja,na religio popular, Fatima

vista como membro dos Quatorze Puros e por sua proximidade de Deus poderia mediar a relao

entre o aquele e os fiis, alm de servir como um modelo de conduta e carter a ser seguido. Esta

crena na Fatima e a disponibilidade dos fiis de tomarem-na como um modelo de conduta fez com

que sua figura fosse utilizada para a construo de um modelo feminino a ser seguido, porm no

debate moderno tambm trouxe a possibilidade de um debate acerca dos papeis de gnero na

sociedade (AGHAIE, 2001, p.156-157).

A narrativa de Kashif apresenta aspectos do carter de Fatima, tais como sua lealdade

famlia e ao legado de seu pai (o Profeta), alm de seu sofrimento frente opresso imposta a ela,

porm, as mulheres que faziam parte do grupo de seguidores do Iman Hussein eram representadas

como espectadoras passivas e vtimas dos eventos da Batalha de Karbala, tendo em vista que de

aps o massacre dos homens no campo de Karbala as mulheres foram levadas como prisioneiras

pelas tropas do governador de Cufa, Ubaydullah ibn Ziyad, at a presena do califa Yazid, em

Damasco (Sria). A irm do Iman Hussein, a Sayyida Zaynab, embora seja a personagem feminina

central no desenvolvimento do xiismo e que esteve presente nos eventos da Batalha de Karbala

(680d.c.), na verso tradicional da narrativa de Karbala era descrita como uma pessoa devido ao

sofrimento vivenciado e assistido estava enfraquecida pela tristeza e incapaz de conter-se, uma

representao que reforou noo de passividade que persistiu at meados do sculo XX e

refletiam, sobretudo no caso do xiismo, uma concepo conservadora do papel das mulheres na

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sociedade que enfatizavam a atuao da mulher no mbito domstico e a excluam da atuao na

esfera pblica (HAMDAR, 2009).

Outra caracterstica da referida narrativa a presena de temas ou caractersticas definidos

por gnero: liderana, disponibilidade para lutar e o martrio eram consideradas atividades

masculinas, enquanto que o apoio aos homens e as crianas, e as demonstraes de luto pelos

martirizados eram atividades femininas. Desta forma, nas prticas rituais realizadas ao longo do

ms Muharan e sobretudo no dcimo dia (Ashura) as mulheres estavam presentes nas cerimnias de

luto, como as reunies de lamento (privadas ou pblicas) em que a histria do martrio do Iman

Hussein contada (majles), e das procisses de luto (masirat) pelas ruas em que um caixo coberto

simboliza o Iman morto carregado por homens vestindo preto, porm era incomum que as

mulheres desenvolvessem prticas mais agressivas com seus corpos, como o autoflagelo utilizando

correntes, espadas ou facas at que o sangue fique evidente (latam), prtica que ficou mais restrita

aos homens e era realizada durante a masirat.

Ao longo das dcadas de 1960 e 1970 a mensagem e os smbolos presentes na narrativa de

Karbala passaram por um processo de reinterpretao desenvolvida por clrigos e estudiosos dos

crculos de estudos centrais do xiismo, respectivamente Najaf (Iraque) e Qom (Ir). Entre os temas

debatidos, tais como a relativizao da nfase na dimenso soteriolgica da narrativa de Karbala e a

reinterpretao das percepes do eu e do outro, figurou o reposicionamento dos temas

relacionados aos papeis de gnero presentes na narrativa de Karbala que passou a enfatizar a

coragem das mulheres em meio tragdia por elas presenciadas, alm de ligar a manuteno do

xiismo (e suas crenas) caractersticas positivas da atuao das mulheres no aps a Batalha de

Karbala. A reinterpretao da narrativa no se desenvolveu ao acaso, mas esteve relacionada a uma

srie de processos que ocorreram em pases como o Iraque e o Ir , tais como polticas de cunho

secular sob a bandeira da modernizao dos Estados, o surgimento de movimentos polticos de

orientaes diversas e de movimentos reformistas islmicos, o aumento da conscincia de gnero e

a nfase em ideais nativos (que no se inseriam nos valores ocidentais), alm dos desenvolvimentos

sociais e polticos (como a oposio aos governos institudos, e no caso do Lbano a existncia de

movimento de resistncia ocupao do territrio nacional por foras estrangeiras).

Na dcada de 1970 Ali Shariati e o Ayatollah Morteza Motahari desconstruram a

associao anteriormente estabelecida entre as mulheres presentes nos eventos da Batalha de

Karbala e a sua dita postura passiva, inclusive rotularam tal acepo da narrativa como uma prtica

errnea, e buscaram enfatizar a imagem das mulheres de Karbala como ativas, e em particular

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passaram a falar das atitudes da irm do Iman Hussein, Sayyida Zaynab. Conforme Aghaie (2004,

p.122) discute em sua anlise sobre o emergente discurso de gnero com base na narrativa de

Karbala, enquanto os homens foram responsveis por participar do movimento do Iman e

demonstrarem sua oposio ao califa Yazid, as mulheres foram essenciais porque atuaram como

porta-voz, protetoras e transmissoras da mensagem de do Iman Hussein. Ali Shariati por exemplo,

investiu, em um primeiro momento, na figura de Fatima Zahara com o intuito de redefinir o modelo

feminino na sociedade iraniana, como uma forma de rejeitar o que o intelectual acreditava ser a

uma concepo ocidental do papel feminino representada pelas mulheres que aderiram aos

padres impostos pelas reformas realizadas ao longo da dinastia Pahlavi, e ao mesmo tempo

questionava o ideal tradicional representado pela leitura de Kashif, que embora enfatizasse

caractersticas positivas do carter de Fatima Zahara, ainda mantm a representao das mulheres a

uma postura passiva. Desta forma, Shariati clamou por uma concepo alternativa do modelo

feminino que mantivesse caractersticas como a devoo religiosa e o apoio aos familiares, mas que

assim como Sayyida Zaynab fosse capaz de levar e questionar de forma direta qualquer percepo

de opresso.

As representaes do feminino na reconfigurao dos rituais da Ashura no Lbano

No Lbano os rituais que compem a Ashura (dcimo dia do ms Muharan) foram

conduzidos at meados da dcada de 1970 no meio rural e nos subrbios da regio sudeste de uma

forma tradicional, que de acordo com a antroploga Lara Deeb (2009) descrita por seus

interlocutores como uma prtica antiquada que para os xiitas libaneses trouxe a tona a concepo

de que aqueles seriam menos desenvolvidos e modernos do que as demais comunidades que

compem o pas. Neste contexto processos poltico-sociais relevantes ocorreram tais como o

desenvolvimento de um discurso nacional alternativo modernidade secular, a mobilizao poltica

das comunidades confessionais que compem o pas, o impacto da ideologia da Revoluo Islmica

no Ir (1979), o incio da guerra civil libanesa (1975-1990), as invases externas feitas por tropas de

Israel (1978 e 1982) e a continuidade da ocupao de territrios foram determinantes para que as

comunidades xiitas libanesas revisitassem a narrativa de Karbala e os rituais de memria e luto da

Ashura como formas de inspirar a atuao poltica e religiosa das comunidades. Tal processo de

releitura da prtica e do significado da narrativa e dos rituais trouxe alteraes na representao do

feminino nos rituais e teve reflexos na sociedade libanesa.

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A narrativa de Karbala tinha no Lbano, assim como em outros pases muulmanos, como

caracterstica geral uma mensagem de busca pela reorientao dos valores islmicos da sociedade,

mas a nfase nas circunstncias da derrota militar do Iman Hussein conduziram a uma postura de

notria passividade poltica, que buscou a compreenso da tragdia em termos msticos, lricos e

emocionais. Desta forma, os rituais da Ashura enfatizavam experincias individuais dos fiis com

relao ao luto que traziam tona emoo que demonstrava o apoio ao Iman martirizado e a

convico da salvao na ps-morte do paraso. A partir da liderana de Musa al-Sadr e depois pela

atuao de grupos islmicos xiitas como o Amal e o Hezbollah ocorreu uma alterao no

significado da narrativa de Karbala que produziu alteraes nas prticas rituais (NORTON, 2005).

Primeiro, a nfase tradicionalmente conferida a aspectos como tristeza e a busca pela

salvao sofreu uma alterao e a narrativa do martrio do Iman Hussein passou a ser compreendida

como um exemplo revolucionrio, sobretudo no contexto libans marcado por conflitos internos e

invaso externa em que os xiitas buscaram se organizar e se mobilizar de forma social e militar.

Neste contexto a personagem da irm do Iman Hussein, Sayyida Zaynab, teve sua atuao e

comportamento (antes e aps a Batalha de Karbala) reinterpretados e trs principais caractersticas

passaram a ser enfatizadas, a saber: a sua fora mental e intelectual, a sua compaixo e dedicao

aos outros, e sua atuao em prol da causa xiita e coragem de questionar abertamente a dinastia dos

Omadas. As transformaes no significado da narrativa de Karbala trouxeram um novo ideal de

feminino assim:

[...] ocorreu uma decrscimo da nfase anteriormente conferida Sayyida Fatima,

acompanhado pelo aumento da nfase na irm de Hussein, Sayyida Zaynab. Nos

testemunhos de mulheres devotas sobre a influncia destas figuras em suas vidas, Fatima

possui um papel secundrio, embora sua fora e religiosidade ainda sejam enfatizadas por

estudiosos religiosos. No entanto, para as mulheres leigas o foco recai sobre Zaynab como a

figura feminina dominante nos rituais da Ashura, enfatizando sua presena na batalha e seu

papel como lder da comunidade aps o martrio de Hussein. Observou-se a reformulao,

nos ritual que recita os eventos de Karbala, do comportamento de Zaynab durante a batalha.

Os retratos de Zaynab como enterrada pelo sofrimento ou derramando lgrimas copiosas

sobre os mortos deu espao a representaes que enfatizavam sua coragem, fora,

resilincia e seu papel de liderana. Esta reinterpretao da figura de Zaynab passou a ser

observada no aumento da participao das mulheres nos rituais da Ashura e no novo

modelo de participao pblica das mulheres na comunidade de froma geral (DEEB, 2006,

p.32)

Os rituais, desta forma, passaram a representar o feminino (a partir da Sayyida Zaynab) de

maneira mais positiva, alinhando-o aos ideais autnticos do xiismo e que estavam no cerne da

revoluo de atitude proposta pelo movimento do Iman Hussein , tais como a busca pela verdade e a

luta contra a opresso e a injustia (HAMDAR, 2009; DEEB, 2006). Dois rituais tiveram alteraes

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principais, so eles as cerimnias ou reunies de lamento (majles) em que a histria do martrio do

Iman Hussein contada aos fiis, e as procisses de luto (masirat).

As cerimnias ou reunies de lamento (majles) autenticadas pelos novos discursos acerca

da narrativa de Karbala no contexto libans criticavam a representao da Sayyida Zaynab como

uma pessoa enfraquecida com sua impossibilidade de lidar com seu luto, alm da prtica

estritamente emocional com que os fiis praticavam os rituais da Ashura. Em contrapartida,

apresentavam Sayyida Zaynab como uma mulher forte que mesmo aps ter assistido ao martrio de

seu irmo e de seus companheiros manteve-se forte e firmou posio em criticar o opressor, o

recm-chegado califa Yazid(o sexto califa), e foi considerada vitoriosa em seu jihad de palavras

(na terminologia de Hamdar, 2009, p.89) e tornou-se a porta-voz e protetora da causa e crena xiita.

As procisses de luto (masirat) tiveram duas alteraes principais: uma na forma com que

os homens e garotos passaram a praticar os rituais de autoflagelo (latam) e na atuao das mulheres

nas procisses. Na forma tradicional dos rituais de autoflagelo observava-se o uso de correntes,

espadas ou facas para o flagelo at que o sangue daqueles que faziam o ritual ficasse evidente,

conforme assinalou Norton(2005), e as mulheres eram apenas espectadoras de tal ao. Na forma

autenticada do ritual, sobretudo nas praticas realizadas no sul do Lbano em que o partido

islmico Hezbollah, a prtica de tais rituais de autoflagelo passou a ser compreendida como anti-

islmica por gerar ferimentos fsicos de forma intencional e trazer uma imagem negativa ao Isl,

assim ao invs de flagelo os fiis relacionados ao Hezbollah passaram a clamar que as pessoas

doassem sangue (DEEB, 2009). A segunda alterao foi a participao ativa das mulheres e

meninas que passaram a integrar as procisses e enquanto os homens e meninos cantavam frente e

realizavam novas formas de latam (que no incluam sangue) as mulheres cantavam e encenavam

alguns momentos da narrativa de Karbala.

Consistente com o contexto scio-poltico e com a alterao na representao do feminino

nos rituais, reflexos na sociedade libanesa foram observados na prtica, como o aumento da

participao das mulheres nos rituais, inclusive sua na liderana de cerimnias de lamento(majles),

e a atuao das mesmas na esfera pblica, sobretudo pelo elevado nmero de mulheres que

tornaram-se voluntrias em organizaes islmicas sociais e de sade (jamiyyat), em uma atitude

que descrita como um jihad social e desempenhada pelo bem-estar e interesse da comunidade.

Alm de incentivar a participao das mulheres nas atividades da comunidade, a personagem da

Sayyida Zaynab traz a inspirao e a fora para lidar com as situaes por elas vivenciadas

cotidianamente, tais como o martrio de familiares em meio s atividades de resistncia armada

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desenvolvidas por participantes do brao militar do Hezbollah ou como conseqncia de confrontos

relacionados s reas ocupadas na regio sul do Lbano, sobretudo at o ano de 2000.

No entanto, cabe ressaltar que embora o partido poltico Hezollah e as parcelas da populao

que o seguem, bem como muulmanas xiitas leigas, tomem os novos discursos acerca da Sayyida

Zaynab como um modelo poltico e religioso a ser seguido pelas mulheres xiitas libanesas, entre os

clrigos a adoo de tais discursos no era um consenso. Conforme apresenta EL-HUSSEINI (2008,

p.215), entre os seguidores dos Ayatollahs Muhammad Husayn Fadlallah e Muhammad Mahdi

Shams al-Din, por exemplo, existe uma tentativa de apresentar aos xiitas libaneses a Fatima Zahra,

me de Zaynab e Hussein, como o modelo feminino a ser seguido por conta de trs aspectos

principais, so eles: dissociar os xiitas libaneses da influncia iraniana; a concepo de que Fatima

Zahra seria o modelo ideal s xiitas libanesas porque representaria um exemplo de responsabilidade

e de como desafiar situaes de injustia e de conduo da vida privada (principalmente seu

compromisso com a educao dos filhos) e, por ltimo mas no menos relevantes a tentativa de

estabelecer atravs de modelos alternativos a legitimidade dos Ayatollah libaneses em um ambiente

de competio entre os religiosos para estabelecer sua autoridade.

Consideraes Finais

A representao da personagem da Sayyida Zaynab teve uma mudana qualitativa

significativa no contexto libans que esteve em sintonia com processos poltico-sociais relevantes

ocorreram tais como o desenvolvimento de um discurso nacional alternativo modernidade

secular, a mobilizao poltica das comunidades confessionais que compem o pas, o impacto da

ideologia da Revoluo Islmica no Ir (1979), o incio da guerra civil libanesa (1975-1990), as

invases externas feitas por tropas de Israel (1978 e 1982) e a continuidade da ocupao de

territrios foram determinantes para que as comunidades xiitas libanesas revisitassem a narrativa

de Karbala e os rituais de memria e luto da Ashura como formas de inspirar a atuao poltica e

religiosa das comunidades. A partir da liderana de Musa al-Sadr e depois pela atuao de grupos

islmicos xiitas como o Amal e o Hezbollah ocorreu uma alterao no significado da narrativa de

Karbala que produziu alteraes nas prticas rituais (NORTON, 2005).

A nfase tradicionalmente conferida a aspectos como tristeza e a busca pela salvao sofreu

uma alterao e a narrativa do martrio do Iman Hussein passou a ser compreendida como um

exemplo revolucionrio, sobretudo no contexto libans marcado por conflitos internos e invaso

externa em que os xiitas buscaram se organizar e se mobilizar de forma social e militar. Neste

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contexto a personagem da irm do Iman Hussein, Sayyida Zaynab, teve sua atuao e

comportamento (antes e aps a Batalha de Karbala) reinterpretados e trs principais caractersticas

passaram a ser enfatizadas, a saber: a sua fora mental e intelectual, a sua compaixo e dedicao

aos outros, e sua atuao em prol da causa xiita e coragem de questionar abertamente a dinastia dos

Omadas.

Nos rituais da Ashura, as alteraes observadas de maneira prtica foram o aumento da

participao das mulheres nos rituais, inclusive sua na liderana de cerimnias de lamento(majles),

e a atuao das mesmas na esfera pblica, sobretudo pelo elevado nmero de mulheres que

tornaram-se voluntrias em organizaes islmicas sociais e de sade (jamiyyat).

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The representation of feminine in Ahura rituals and its reflections in lebanese society:

between the passivity and the political mobilization

Astract: In the wake of the discussions about the role of women in muslim majority societies

between the 1960s and 1970s, readings of the Ashura rituals and the characters involved in the

narrative of Battle of Karbala (680 CE), especially the centrality of Iman Hussein and his sister

Zaynab, developed as an attempt to rescue Zaynabs role for the purpose of social and political

mobilization, as was first observed in pre-revolutionary Iran (with the aim of engaging the masses

against prevailing government) and in Lebanon, between 1970s and 1980s in the context of political

mobilization of shiite masses under the aegis of social and political groups such as Hezbollah

(DEEB, 2005 e 2009; EL-HUSSEINI, 2008). Taking into account the social and political influences

in which it developed and the movement of gender construction in religious rituals and a society,

the communication proposes to analyze, from the lebanese case, discussions and changes in the

performance of the shiite muslim woman in society.

Key-words: Gender. Religious rituals. Political mobilization