of 12 /12
1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA SOFRIDA PELA MULHER: NOTAS SOBRE O ESTADO DO CONHECIMENTO 1 Iara Oliveira Meireles 2 Zaira de Andrade Lopes 3 Gabriel Luis Pereira Nolasco Resumo: Este estudo tem como objeto a violência de gênero dirigida à mulher, com recorte para violência psicológica e apresenta como objetivo analisar as pesquisas realizadas, no período de 2010 a 2015 que trataram das representações sociais da violência de gênero. Trata-se de uma pesquisa de caráter bibliográfico, a coleta das informações foi realizada nos seguintes bancos de dados: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), Scielo e periódico da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), os dados encontrados foram organizados em categorias que identificam o tipo de estudo realizado, bem como abordagens utilizadas e resultados alcançados. Buscou-se também identificar os tipos de violência mais frequente nos estudos; o caráter da denúncia e os dados epidemiológicos. Os resultados preliminares indicam exígua produção científica sobre a violência de gênero com recorte para a violência psicológica, sob a perspectiva da Teoria das Representações Sociais e dos estudos de gênero, que por sua vez, trata não só o fenômeno, mas as relações nas quais se constituíram a violência. Os resultados mostram três eixos temáticos: eixo I: aspectos gerais da violência, tipologias e manifestações; eixo II: voltado para as questões da Lei Maria da Penha; eixo III: aponta para a temática da violência contra mulher sob a ótica da teoria das representações sociais e dos estudos de gênero. Palavras-chave: Violência de gênero. Violência psicológica. Representações sociais. 1 introdução O fenômeno da violência cresce cada vez mais, é considerado um problema de ordem biopsicossocial, pois afeta o sujeito em todos os âmbitos. Nos últimos anos o tema se destacou devido ao alto índice de criminalidade e atos violentos que vem ocorrendo de forma assustadora. Para Minayo (2004) a violência é uma questão social e está ligada à saúde, pois também envolve aspectos da qualidade de vida, causando impacto na vida do sujeito, seja por uma lesão física, 1 Artigo entregue para fins de avaliação da disciplina da linha de pesquisa Psicologia e Processos Educativos Mestrado da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). 2 Discente do Programa de Pós Graduação em Psicologia Mestrado da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). 3 Professora Doutora docente e orientadora no Programa de Pós Graduação em Psicologia Mestradoda Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA … · 2018-01-17 · 1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis,

  • Author
    others

  • View
    0

  • Download
    0

Embed Size (px)

Text of AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA … · 2018-01-17 · 1 Seminário...

  • 1

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DA VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA

    SOFRIDA PELA MULHER: NOTAS SOBRE O ESTADO DO

    CONHECIMENTO1

    Iara Oliveira Meireles2

    Zaira de Andrade Lopes3

    Gabriel Luis Pereira Nolasco

    Resumo: Este estudo tem como objeto a violência de gênero dirigida à mulher, com recorte para

    violência psicológica e apresenta como objetivo analisar as pesquisas realizadas, no período de 2010

    a 2015 que trataram das representações sociais da violência de gênero. Trata-se de uma pesquisa de

    caráter bibliográfico, a coleta das informações foi realizada nos seguintes bancos de dados: Biblioteca

    Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), Scielo e periódico da Coordenação de

    Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), os dados encontrados foram organizados

    em categorias que identificam o tipo de estudo realizado, bem como abordagens utilizadas e

    resultados alcançados. Buscou-se também identificar os tipos de violência mais frequente nos

    estudos; o caráter da denúncia e os dados epidemiológicos. Os resultados preliminares indicam exígua

    produção científica sobre a violência de gênero com recorte para a violência psicológica, sob a

    perspectiva da Teoria das Representações Sociais e dos estudos de gênero, que por sua vez, trata não

    só o fenômeno, mas as relações nas quais se constituíram a violência. Os resultados mostram três

    eixos temáticos: eixo I: aspectos gerais da violência, tipologias e manifestações; eixo II: voltado para

    as questões da Lei Maria da Penha; eixo III: aponta para a temática da violência contra mulher sob a

    ótica da teoria das representações sociais e dos estudos de gênero.

    Palavras-chave: Violência de gênero. Violência psicológica. Representações sociais.

    1 introdução

    O fenômeno da violência cresce cada vez mais, é considerado um problema de ordem

    biopsicossocial, pois afeta o sujeito em todos os âmbitos. Nos últimos anos o tema se destacou devido

    ao alto índice de criminalidade e atos violentos que vem ocorrendo de forma assustadora.

    Para Minayo (2004) a violência é uma questão social e está ligada à saúde, pois também

    envolve aspectos da qualidade de vida, causando impacto na vida do sujeito, seja por uma lesão física,

    1Artigo entregue para fins de avaliação da disciplina da linha de pesquisa Psicologia e Processos Educativos – Mestrado

    – da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). 2Discente do Programa de Pós Graduação em Psicologia – Mestrado – da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

    (UFMS). 3Professora Doutora docente e orientadora no Programa de Pós Graduação em Psicologia – Mestrado– da Universidade

    Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).

  • 2

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    psíquica, moral e tantas outras formas de violência que requer cuidados e atenção dos serviços de

    saúde.

    Segundo Saffioti (2004) a violência de gênero pode ser perpetrada por um homem contra outro

    ou por uma mulher contra outra, mas o tipo mais difundido é do homem contra a mulher. Os estudos

    sobre as relações de gênero descrevem que neste tipo de violência há uma hierarquização de poder, a

    forma mais comumente encontrada é do homem exercer dominação e controle sobre a mulher.

    A violência psicológica é a forma mais subjetiva de agressão, perpassando por todos os outros

    tipos de violação, sendo muitas vezes, o primeiro sinalizador de que a mulher está sendo vítima de

    violência. É evidente que as causas da violência contra mulher são multifatoriais e compreender esta

    realidade, requer elementos plurais. Dessa forma, este estudo tem como base a Teoria das

    Representações Sociais que permite compreender como o conhecimento se constrói e é utilizado para

    um determinado grupo e/ou organização social. Por meio do compartilhamento das representações

    acerca de fatos, fenômenos, objetos, símbolos.

    Nota-se que apesar dos inúmeros estudos produzidos pela academia, esta temática não está

    superada e requer novos estudos que levem à compreensão mais profunda com a finalidade de

    provocar inquietações que permitam o surgimento de mudanças efetivas na forma como a questão é

    vista na sociedade.

    2 caminhos científicos necessários para compreensão do fenômeno da violência contra mulher

    Foi realizado um levantamento nos principais bancos de dados virtuais, utilizando a

    combinação dos descritores: representações sociais e violência contra mulher; representações sociais

    e violência psicológica; representações sociais e relações de gênero; violência contra mulher e

    violência psicológica; violência contra mulher e relações de gênero; violência psicológica e relações

    de gênero, a fim de tornar a busca mais detalhada. A escolha dos descritores foi definida após estudos

    sobre a temática, inferindo-se que essas combinações de palavras trariam conteúdos relevantes para

    o presente estudo.

    Para as buscas nos bancos virtuais foi utilizado um único filtro de pesquisa, delimitando os

    anos de publicações entre 2010 a 2015. Por meio da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e

    Dissertações (BDTD)4 , Acervo de periódicos da CAPES5, Banco de dados do ScientificElectronic

    4 www.bdtd.ibict.br 5www..periodicos.capes.gov.br

  • 3

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Library Onlyne (Scielo)6, foram encontrados um número significativo de produções científicas sobre

    o tema, entretanto, apenas algumas estabelecem interfaces entre representações sociais e estudos

    sobre gênero. A seguir será apresentado o quadro que contém os números obtidos a partir da pesquisa

    realizada nos referidos bancos de dados, assim como a classificação dos trabalhos em Teses,

    Dissertações, Artigos Científicos e Periódicos.

    Quadro 1- Número de Teses, Dissertações, Artigos e Periódicos encontrados na pesquisa do Estado

    do Conhecimento e seus respectivos bancos de dados.

    Combinação dos

    Descritores Nível Bancos de dados (2010 – 2015)

    BDTD SCIELO CAPES Total de

    Trabalhos

    Representações sociais e

    violência contra mulher

    Dissertações 18 - - 18

    Teses 11 - - 11

    Artigos - 05 - 05

    Periódicos - - 09 09

    Representações sociais e

    violência psicológica

    Dissertações 14 - - 14

    Teses 03 - 03

    Artigos - 03 03

    Periódicos - - 02 02

    Representações sociais e

    relações de gênero

    Dissertações 31 - - 31

    Teses 19 - - 19

    Artigos - 15 15

    Periódicos - - 20 20

    Violência contra mulher e

    violência psicológica

    Dissertações 82 - - 82

    Teses 19 - - 19

    Artigos - 09 - 09

    Periódicos - - 21 21

    Violência contra mulher e

    relações de gênero

    Dissertações 81 - 81

    Teses 38 - 38

    Artigos - 05 05

    Periódicos - - 16 16

    Violência psicológica e

    relações de gênero

    Dissertações 41 - - 41

    Teses 08 - - 08

    Artigos - 06 - 06

    Periódicos - - 02 02

    Total de

    Dissertações 267

    Total de

    Teses 98

    Total de

    Artigos 88

    Total de

    periódicos 70

    Fonte: a autora, 2017.

    6 www.scielo.org

  • 4

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Durante o levantamento nos bancos virtuais, de teses e dissertações, foi apontado um número

    elevado de produções científicas referentes ao tema da violência contra mulher, em diversas áreas do

    conhecimento.

    Ao delimitar a busca, no âmbito teses e dissertações, notou-se que há prevalência de estudos

    sobre as representações sociais dos profissionais que prestam atendimento a mulher vítima de

    violência, em sua maioria, do campo de estudo da enfermagem, assim como, também foram

    encontradas muitas produções relacionadas às representações sociais da mulher vítima de violência,

    destacando os estudos das Ciências Sociais, Filosofia, Serviço Social, Jornalismo e do Direito.

    Sobre os artigos e periódicos encontrados, verificou-se que a maioria das produções sobre a

    temática da violência contra mulher são produções científicas do campo da enfermagem, que tratam

    a questão da violência contra mulher, sob a ótica dos atendimentos emergenciais realizados às vítimas

    nas unidades de pronto atendimento, hospitais e demais unidades de saúde.

    Ressalta-se que os estudos do campo da Psicologia, discutem o fenômeno da violência contra

    mulher sob diferentes olhares, foram encontrados estudos na perspectiva sócio histórica, das

    representações sociais e no referencial Foucaultiano.

    Neste levantamento, foi utilizada a perspectiva da teoria das representações sociais e das

    relações de gênero. Notou-se que há muitas produções sobre as representações sociais da mulher

    vítima de violência e/ou das representações sociais da violência contra mulher, todavia, o presente

    estudo pretende trazer como diferencial a discussão sobre as representações sociais da violência de

    gênero, estabelecendo um recorte para violência psicológica. Tendo em vista, que as produções que

    foram levantadas pelos bancos de dados, trazem em sua maioria, a ênfase para a violência física e

    sexual. Durante o levantamento dos dados, observou-se que há predominância de pesquisas de caráter

    descritivo e exploratório.

    Ao estabelecer perfis, pode-se correr o risco de realizar o enquadramento do sujeito,

    considerado uma linha muito tênue, seja do agressor e/ou da vitima, pois cada um deve ser visto a

    partir do meio em que está inserido, de suas vivências e cultura, que variam de sujeito para sujeito.

    Assim, fica evidente que o fenômeno da violência se manifesta de formas distintas na vida

    das vítimas, cada mulher vivenciará de modo diferente e cabe a compreensão dos sentidos e

    significados para cada sujeito e identificar as representações sociais que as vítimas têm acerca da

    violência sofrida é uma tarefa importante, não só no âmbito científico, mas também para buscar meios

    de modificar esta realidade.

  • 5

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    2.1 A violência em sua pluralidade

    Esta seção discorrerá sobre a temática do eixo I: Aspectos gerais da violência; tipologias e

    manifestações. A violência contra mulher é um fenômeno histórico, demarcado pelas desigualdades

    das relações de gênero, que ocorrem independentemente das questões socioeconômicas, cor, raça e

    credo.

    O número de mulheres mortas em decorrência da violência sofrida é estarrecedor, as causas

    são inúmeras. O alto índice de violência contra mulher emergiu nas mídias e passou a ser pauta de

    discussões acadêmicas, movimentos sociais e criação de medidas como promoção de políticas

    públicas à mulher.

    A figura feminina tem sido alvo de violência desde muitos anos, por meio do sistema

    patriarcal, a qual a mulher deveria ser submissa primeiramente ao pai e após o casamento, ao seu

    cônjuge, conforme explica Cunha (2014):

    A violência contra a mulher é um fenômeno antigo e, também por isso, muito banalizado.

    Ele se encontra justificado por pressupostos biológicos bem duvidosos, mas infelizmente

    comuns, que apontam a mulher como ser mais frágil, de menor força física e capacidade

    racional, que por sua própria natureza domesticável tem tendência a ser dominada, pois

    necessita de alguém para protegê-la e orientá-la [...]. A agressão, nesta perspectiva infundada,

    se justificaria, portanto como controle da irracionalidade feminina. Este discurso naturaliza

    a violência de gênero. É preciso, assim, desconstruir esta naturalização e, para isso,

    compreender inicialmente o que se quer dizer com “violência contra a mulher” (CUNHA,

    2010, p.150).

    A autora salienta que é necessário primeiramente compreender o que é o fenômeno da

    violência contra mulher, que está relacionado “a restrição de liberdade de uma pessoa ou grupo,

    ofendendo fisicamente, emocionalmente e moralmente” (Teles, 2010, p. 15).

    Cunha (2010) chama atenção para a diferença entre as terminologias violência contra mulher

    e violência de gênero, destaca:

    Violência de gênero, entretanto, não significa necessariamente violência contra a mulher.

    Estes conceitos passaram a ser utilizados como sinônimos a partir do movimento feminista

    da década de 70, que na luta contra a violência de gênero, passou a afirmar a expressão

    “violência contra a mulher”, já que esta é o alvo principal daquela. Violência de gênero,

    portanto, pode ser compreendida como categoria mais ampla, compreendendo os homens

    também como vítimas da construção dos papéis sociais específicos a cada sexo. (CUNHA,

    2010, p. 152).

    Segundo Fonseca, Ribeiro e Leal (2014) a violência doméstica pode ocorrer entre pessoas que

    não pertencem ao núcleo familiar, mas que vivem parcialmente ou integralmente no domicílio do

    agressor, são regidas pela “extensão simbólica do território da casa”.

  • 6

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Conforme o artigo 7 da Lei nº 11. 340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, há cinco

    tipos de manifestações da violência, são elas: física, sexual, psicológica, patrimonial e moral.

    Compreende-se por violência física qualquer conduta que ofenda a integridade ou a saúde corporal

    da mulher.

    A violência psicológica ou emocional se caracteriza por condutas como: humilhar, ameaçar,

    discriminar, isolar de amigos, parentes, controlar e oprimir. Tavares et al (2013) revela os efeitos

    devastadores da violência psicológica sofrida pela mulher e ressalta a importância de estudos

    específicos sobre este tipo específico de violência:

    Para as mulheres, o pior da violência psicológica não é a violência em si, mas a tortura mental

    e a convivência com o medo e o terror. Por isso, este tipo de violência deve ser analisado

    como um grave problema de saúde pública e, como tal, merece espaço de discussão,

    ampliação e prevenção e criação de políticas públicas específicas para o seu enfretamento

    (TAVARES, 2012,p.99)

    Para Souza (2010, p. 41) “a violência psicológica pode ser considerada como a mais perversa,

    entre os outros tipos de violência, ocorrida no âmbito doméstico, em decorrência das marcas

    irremediáveis que deixa”. Conforme Silva, Coelho e Caponi (2010) a violência psicológica é uma

    categoria de violência negligenciada. Mediante ao forte impacto da mídia que destacam somente a

    violência doméstica em suas manifestações mais agudas, ou seja, nos casos em que ocorrem os danos

    físicos.Outro fator importante é de que a propagação midiática reitera que a violência urbana é

    superior a violência doméstica, em quantidade e gravidade. As autoras chamam atenção para as

    produções acadêmicas acerca da violência psicológica:

    Esta aparente indiferença dos pesquisadores em escrever sobre este fenômeno é o segundo

    pilar referido anteriormente, que reforça a afirmação inicial sobre a prioridade dada para a

    violência que provoca conseqüências físicas graves em detrimento das graves conseqüências

    psicológicas. Tem-se, assim, uma dupla omissão da violência psicológica: a falta de

    referência ao fato na mídia e os poucos estudos existentes sobre o tema (SILVA, COELHO

    e CAPONI, 2010, p. 98).

    Vale ressaltar que a violência psicológica também é capaz de atingir não só a vítima, mas

    também outras pessoas são atingidas indiretamente por presenciarem as agressões no âmbito violento,

    para as autoras os filhos também são atingidos e reproduzem padrões violentos com os outros

    irmão/ãs, namoradas/os.

    Segundo Tavares (2013) a violência sexual, por sua vez, é definida por qualquer conduta que

    obrigue a mulher a manter relações sexuais com o agressor e que constranja a vítima a presenciar a

    conduta de terceiros, sem o seu desejo.

    O inciso IV, art. 7 da Lei nº 11.340/2006 define a violência patrimonial como “qualquer ato

    que implique retenção, subtração, destruição parcial ou total de bens, valores, documentos, direitos e

  • 7

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    recursos econômicos sobre os quais a vitima possua titularidade”. Esses direitos estão assegurado no

    Código Penal brasileiro entre os delitos considerados contra o patrimônio, como furto, dano,

    apropriação indevida.

    E por fim, a violência moral, entrelaçada à violência psicológica, corresponde a qualquer ação

    desabone a mulher e que configure injúria, difamação e calúnia. Os crimes de calúnia e difamação

    também são descritos no Código Penal, artigos 138 -140.

    Conforme Tavares et al (2013) apesar das mulheres estarem assegurados pelas leis, muitas

    mulheres são mortas em decorrência da violência, por encontrarem dificuldades no rompimento deste

    ciclo, por dependência financeira, emocional ou até mesmo pelo desconhecimento da lei e de seus

    direitos. Outras mulheres acabam denunciando o agressor e são fortemente interpeladas pelo medo,

    ameaça e pelo preconceito e discriminação por parte da sociedade, sendo inúmeras vezes

    responsabilizadas pelas agressões sofridas.

    Dessa forma, considera-se relevante a produção de novos estudos sobre a temática, que requer

    novas investigações, tendo em vista o número crescendo de violência contra mulher. O assunto não

    está superado, requer novas contribuições, para a inserção de novas propostas efetivas na luta contra

    a violência.

    2.2 A Lei Maria da Penha e suas contribuições no combate a violência

    Apesar da violência contra mulher ser um fenômeno antigo, o reconhecimento social da

    violência doméstica e familiar contra mulher é recente, com pouco mais de trinta anos, sendo o mesmo

    período que a temática da violência contra mulher tornou-se alvo de estudos da academia pelas

    ciências sociais em interface com os estudos feministas. Foi a partir da criação e promulgação da Lei

    Maria da Penha 11.340/2006 que este assunto deixou de ser apenas um debate da academia e dos

    movimentos feministas e tornou-se legislação nacional, conforme salienta Pasinato (2015):

    A aprovação dessa legislação decorreu de um longo processo de discussão nacional. Iniciado

    nos anos 1990, quando o movimento de mulheres alertava para a necessidade de leis e

    políticas especializadas no enfrentamento da violência doméstica e familiar [...]. A entrada

    em vigor dessa legislação representa um marco político nas lutas pelos direitos das mulheres

    no Brasil e no reconhecimento da violência contra as mulheres como problema de políticas

    públicas. É também um importante divisor de águas na abordagem jurídica da violência

    baseada no gênero, uma vez que estabelece novos patamares para o enfrentamento da

    violência contra as mulheres no país (PASINATO, 2015, p. 534).

    Garcia, Freitas e Höfelmann (2015) trazem uma estimativa sobre o feminicídio no Brasil entre

    os anos de 2009 a 2011, os dados apontam números expressivos e alarmantes:

  • 8

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Uma mulher é morta de maneira violenta a cada hora e meia no país. As vítimas foram

    mulheres de todas as faixas etárias, etnias e níveis de escolaridade. Todavia, as principais

    vítimas foram mulheres jovens, negras e com baixa escolaridade, residentes nas regiões

    Centro-Oeste, Nordeste e Norte (GARCIA, FREITAS, HÖLFEMANN, 2015, p.253).

    Estes dados sinalizam que a temática da violência contra mulher não está superada, tem sido

    alvo de violência, preconceito, discriminação e machismo, requer estudos, investigações e análises

    sobre este fenômeno. Salienta-se a importância dos processos educativos formas e informais, voltados

    para uma educação não sexista, tendo em vista que, a maioria dos assassinatos é de mulheres jovens,

    negras e de baixa escolaridade.

    Madureira et al (2014) dedicou-se ao estudo dos perfis de homens autores de violência contra

    mulher detidos em flagrantes no período de implantação da Lei Maria da Penha 11.340/2006, no

    estado do Paraná, a qual pode-se concluir que os agressores detidos em flagrantes pela prática da

    violência contra mulher era predominantemente do sexo masculino, adulto jovens, casados, com

    baixa escolaridade e trabalho remunerado.

    Ao comparar os dados encontrados sobre os perfis da vítima e do agressor, observaram-se

    pontos comuns como a faixa etária, predominantemente em adultos jovens e baixa escolaridade.

    Dessa forma, destaca-se a importância dos processos educativos formais e informais, visto que, tais

    processos irão moldar a constituição do sujeito.

    2.3 A violência psicológica como condição da violência de gênero: realidades e representações

    sociais

    Analisar o fenômeno da violência contra mulher sob a ótica das representações sociais e dos

    estudos de gênero é buscar compreender como o fenômeno é interiorizado e quais os impactos

    causados pela violência sofrida na vida da mulher, na sociedade e no cotidiano.

    Moscovici (2003) pontua que as Representações Sociais se caracterizam como um conjunto

    de explicações, crenças e ideias que permitem evocar um acontecimento, um fato, um fenômeno. São

    constituídos por meio do compartilhamento de ideias e opiniões de diferentes grupos. É relevante

    conhecer as representações sociais que as mulheres têm acerca da violência de gênero, estabelecendo

    um recorte para violência psicológica, pois, por meio veio desta problematização é possível verificar

    como estes conhecimentos são compartilhados, como os sujeitos se apropriam e elaboram

    determinados conceitos, criando uma realidade prática e cotidiana.

  • 9

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Arruda (2002) realiza um diálogo entre a teoria das representações sociais e as teorias de

    gênero. A autora salienta que ambas as teorias têm como ponto em comum a proposta de

    conhecimento que passa pela crítica do pensamento binário, do reducionismo, da crença na

    neutralidade da ciência. Ambas as teorias não separam o sujeito social e o seu saber concreto do seu

    contexto, assim como, a subjetividade também não pode ser analisada de forma isolada do sujeito e

    da cultura que está inserido.

    No final dos anos 80 ocorre uma reconfiguração de conceituações teóricas nos estudos

    feministas, a qual emerge a terminologia “gênero” utilizado para designar a construção social sobre

    a categoria “mulher”. Entretanto, este conceito passa por novas modificações, sendo empregado para

    compreensão das relações sociais, e dos diferentes masculinos e femininos na sociedade. Sendo

    considerado, portanto, uma categoria de análise, pois investiga a construção social das relações das

    diferentes denominações, Silva (2011) destaca:

    A compreensão das relações de gênero implica que sejam entendidas como construção social

    baseada na diferenciação biológica dos sexos, expressa através de relações de poder e

    subordinação, representada pela discriminação de funções, atividades, normas e condutas

    esperadas para homens e mulheres em cada sociedade (SILVA, 2011, p. 05).

    O termo violência de gênero é utilizado para designar as relações hierárquicas entre os

    gêneros, pelas diferentes formas de poder e desigualdade (SAFFIOTI, 1995). Salienta-se que a

    violência de gênero pode ocorrer entre pessoas do mesmo sexo, entretanto, o vetor mais comum é do

    homem contra mulher.

    A violência de gênero é capaz de produzir marcas, muitas vezes invisíveis na vida da vítima

    e para a sociedade. Neste contexto, considera-se que há outras formas de violações imbricadas na

    violência de gênero. A violência psicológica, por exemplo, repercute em todas ás áreas da vida da

    vítima e refletindo no social. Considerado um problema de saúde pública, conforme salienta Souza

    (2010):

    A violência contra a mulher, nos dias atuais, é vista como um problema de saúde pública,

    mas nem sempre foi assim. Anteriormente à discussão de gênero, durante séculos, a mulher

    em condição de violência, não possuía auxilio e/ou socorro de quem quer que fosse,

    submetendo-se e conformando-se com seu destino. Historicamente e, até décadas atrás,

    muitas mulheres achavam que padecer pela violência imputada pelo seu cônjuge e/ou

    companheiro era uma coisa normal, já que sua mãe também sofria pelo marido (SOUZA,

    2010, p. 40).

    A mulher vítima de violência de gênero sofre inúmeros impactos, dentre eles, a violência

    psicológica, que por sua vez, são capazes de refletir não só no âmbito pessoal, mas principalmente no

    social, onde são tecidas essas relações.

  • 10

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    Por ser considerado um problema de saúde pública, requer maior visibilidade sobre a temática.

    Apesar dos avanços ocorridos com a implantação da Lei Maria da Penha e das produções acadêmicas

    referentesà violência contra mulher, observa-se que requer novas explorações sobre a temática,

    capazes de viabilizar propostas de identificação e prevenção da violência psicológica, como formas

    de antepor a violência física e o feminicídio.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    O estado do conhecimento é uma das etapas primordiais de um estudo científico, pois dará

    subsídios ao/a pesquisador/a para realização de sua pesquisa, apontando a viabilidade de seu objeto

    de estudo, à luz de um referencial teórico.

    Durante este processo, os resultados obtidos foram articulados com a intencionalidade da

    pesquisadora em sua pesquisa em andamento no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da

    Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, curso de Mestrado. Percebeu-se que os/as

    pesquisadores/as, de forma geral, buscam compreender o fenômeno da violência contra mulher e

    como este tipo de violação tem crescido nos últimos anos.

    Os resultados das pesquisas apontam um número crescente de estudos que tratam a questão

    da violência contra mulher, com base nos dados epidemiológicos e análises de perfis, como perfil do

    agressor e perfil da vítima. É evidente que os números são indicativos para a compreensão de

    determinado fenômeno, entretanto, deve-se levar em consideração um conjunto de fatores, sendo que

    os dados estatísticos não podem ser analisados de forma isolada e nos diferentes contextos e

    realidades.

    Desta forma, diante da proporção histórica das questões de gênero, e da violência praticada

    contra a mulher, percebe-se que apesar dos inúmeros estudos produzidos pela academia, este tema

    não está superado e requer novos estudos que levem à compreensão mais profunda do fato estudado

    com a finalidade de provocar inquietações que permitam verdadeiras mudanças na forma como a

    questão é vista na sociedade.

    REFERÊNCIAS

    AZEVEDO, D. COSTA, R. MIRANDA, F. Uso do Alceste na análise de dados qualitativos:

    contribuições na pesquisa em enfermagem. Rev enferm UFPE on line., Recife, 7(esp):5015-22,

    jul., 2013

  • 11

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    ASSIS, S.G, AVANCI, J.Q, Santos. N. C. Violência e representação social na adolescência no

    Brasil. Rev Panam Salud Publica; 2004.

    BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: edições 1977.

    BRASIL, Lei n. 11.340. Lei Maria da Penha. Brasília, DF: Presidência da República, 2006.

    CUNHA, B. Violência contra a mulher, direito e patriarcado: perspectivas de combate à

    violência de gênero. Curso de Direito. UFPR, 2014.

    FONSECA, D. RIBEIRO, C. LEAL, N.Violência doméstica contra a mulher: realidades e

    representações sociais. Psicologia & Sociedade; 24 (2), 307-314, 2012

    GARCIA, L. FREITAS, L. HÖLFMANN, D. Estimativas corrigidas de feminicídios no Brasil,

    2009 a 2011. .Rev Panam Salud Publica. 2015, p. 253.

    MACHADO, I. Da dor do corpo à dor da alma: o conceito de violências psicológicas da Lei

    Maria da Penha. Universidade Estadual de Maringá. Estudos Feministas Florianópolis.

    Maio/Agosto 2015.

    MADUREIRA, A. RAIMONDO, M. FERRAZ, A. MARCOVICZ. G. LABRONCINI, L.

    MANTOVANI, A. Perfil de homens autores de violência contra mulheres detidos em flagrante:

    contribuições para o enfrentamento. Escola Anna Nery Revista de Enfermagem 18(4) Out-Dez.

    2014

    MOSCOVICI, S. Representações sociais e sociedades: a contribuição de Serge Moscovici. Revista

    de Estudos de Sociologia, da UFPE, 2003.

    MINAYO, M. C. A difícil e lenta entrada da violência na agenda do setor de saúde. Cadernos de

    Saúde pública, 20, 3, 646-647, 2007.

    PASINATO, W. Oito anos de Lei Maria da Penha: entre avanços, obstáculos e desafios. Estudos

    Feministas, Florianópolis, 23(2): 352, maio-agosto,2015.

    RIBEIRO, C. G. COUTINHO, M. L. L. Representações sociais de mulheres vítimas de violência

    doméstica na cidade de João Pessoa-PB. Psicologia e Saúde, 3(1), 52-59. 2011.

    SÁ, C. P. Núcleo central das representações sociais. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2002.

    SAFFIOTI, H. I. B. Gênero, Patriarcado, Violência. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo,

    2004.

    SOARES, C. Em torno do pensamento social e do conhecimento do senso comum. A aplicação da

    metodologia ALCESTE em contextos discursivos distintos. Perspectivas teórico-metodológicas

    em representações sociais. João Pessoa: UFPB/Ed Universitária; 2005. p. 541-68.

    SOUZA, H. Feridas que não se curam: A violência psicológica cometida à mulher pelo

    companheiro. Anais do I Simpósio sobre Estudos de Gênero e Políticas Públicas, ISSN 2177-8248

    Universidade Estadual de Londrina, 24 e 25 de junho de 2010

    SILVA, L. COELHO, E. CAPONI, S. Violência silenciosa: violência psicológica como condição

    da violência física doméstica. Interface- comunic, saúde, educ. V11, N 21, P. 93-103, jan/abr 2007.

  • 12

    Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

    Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

    TAVARES, C. Pereira, G. Reflexos da dor: Contextualizando a situação das mulheres em

    situação de violência doméstica. Revista Textos & Contextos, 6(2), 410-424. 2013.

    TELES, M.A.A. O que é Violência contra a Mulher. São Paulo: Editora Brasiliense, 2010.

    Abstract: This study aims at gender violence directed at women, with a cut for psychological

    violence, and aims to analyze the surveys conducted during the period from 2010 to 2015 that dealt

    with the social representations of gender violence. It is a bibliographical research, the information

    collection was carried out in the following databases: Brazilian Digital Library of Theses and

    Dissertations (BDTD), Scielo and periodical of the Coordination of Improvement of Higher

    Education Personnel (CAPES), the Data were organized into categories that identify the type of study

    carried out, as well as the approaches used and results achieved. It was also sought to identify the

    types of violence most frequent in the studies; The nature of the complaint and the epidemiological

    data. Preliminary results indicate a limited scientific production on gender violence with a cut in

    psychological violence, from the perspective of Theory of Social Representations and gender studies,

    which in turn treats not only the phenomenon, but the relationships in which Constituted violence.

    The results show three thematic axes: axis I: general aspects of violence, typologies and

    manifestations; Axis II: focused on the issues of the Maria da Penha Law; Axis III: points to the

    theme of violence against women from the point of view of the theory of social representations and

    gender studies.

    Key-Words: Social representations; violence against women; psychological violence; Gender

    relations.