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Comentário sobre a utilização de terapia por imagens mentais como complemento terapeutico
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ALEXANDRE SANTANA HILEL
AS TERAPIAS DE IMAGENS MENTAIS COMO RECURSO TERAPUTICO COMPLEMENTAR NA TIREOIDITE DE HASHIMOTO
UM ESTUDO BIBLIOGRFICO
Dissertao apresentada a Banca Examinadora da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, como exigncia parcial para obteno do ttulo de MESTRE em Psicologia Clnica na rea de Psicossomtica e Psicologia Hospitalar sob orientao da Prof. Dr. Marlise A. Bassani
PUC So Paulo
2008
id887640 pdfMachine by Broadgun Software - a great PDF writer! - a great PDF creator! - http://www.pdfmachine.com http://www.broadgun.com
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DEDICATRIA
Qualquer maneira de amor vale a pena
Qualquer maneira de amor valer!
A minha querida me que sempre me incentivou nos caminhos do saber.
A minha psicanalista Tnia Veiga Judar que tentou resignificar minhas somatizaes durante todo este processo e, em parte, conseguiu.
A minha equipe de trabalho que na reta final me apoiou de diversas maneiras.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo a todos os mestres, em especial ao Prof. Dr. Esdras Guerreiro
Vasconcellos, cuja contribuio e iniciao neuro-cincias foram bastante incentivadoras. A Prof. Dr. Edna Peter Kahhale que no processo final mostrou sua
cincia e tolerncia na metodologia deste trabalho. A Prof. Dr Mathilde Neder, um
exemplo de vida e aprendizado e a . A Prof. Dr. Marlise Aparecida Bassani, pela
sua pacincia e dedicao nesta reta final.
Ao meu colega Fernando Maeda que sempre me apoiou em minhas incertezas e a
todos os colegas de Mestrado que creditaram voto de confiana a esta Dissertao.
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RESUMO
Alexandre Santana Hilel: As Terapias de Imagens Mentais como recurso teraputico complementar na Tireoidite de Hashimoto um estudo bibliogrfico, 2008 Orientadora: Prof. Dr. Marlise A. Bassani Palavras-chaves: Imaginao; Mente-Corpo e Tcnicas de Relaxamento; Terapia Comportamental; Doena de Hashimoto; Auto-anticorpos; Aspectos Psicossomticos.
Esta pesquisa enfoca um estudo bibliogrfico das Terapias de Imagens Mentais como uma proposta teraputica para abordagem da Tireoidite de Hashimoto. Teve sua origem atravs da observao emprica de resultados da atuao clinica do pesquisador, usando-se a imaginao dirigida na diminuio da contagem laboratorial de auto-anticorpos presentes na tireoidite. O presente trabalho organizado em um captulo de apresentao da Tireoidite de Hashimoto em seus aspectos prevalncia, fisiopatologia, diagnstico e quadro clnico. No captulo seguinte, enfoca-se a Terapia de Imagens Mentais, quanto a: histrico, definio, smbolos, arqutipos, mitologia coletiva, Imaginao Ativa, imaginao como tcnica diretiva. Aps, procedeu-se ao primeiro estudo bibliogrfico da Tireoidite de Hashimoto enfocando fatores etiolgicos, tratamentos existentes e prognstico, que demonstrou escassez de opes teraputicas frente inexistncia de um fator etiolgico especfico para a sua disfuno auto-imune. Utilizou-se o banco de dados Medline, Pubmed e Lilacs, no perodo entre 1997 a 2007. Um segundo estudo bibliogrfico foi feito, abordando as Terapias de Imagens Mentais, sem corte temporal definido para seu levantamento bibliogrfico, desde Jung at a atualidade, pesquisando-se sua aplicao em fenmenos laboratoriais e sua utilizao em pesquisas na rea da sade. Os resultados apontam para uma lacuna existente entre os fatores causais da
Tireoidite de Hashimoto e os tratamentos existentes. Na terapia das imagens verifica-se que o emprego de tais tcnicas se torna mais presente, a partir do ano de 2000, com suas aplicaes em algumas reas da sade, em especial naquelas patologias que, como a Tireoidite de Hashimoto, no tem fator etiolgico definido, tais como a fibromialgia. Discutem-se os resultados, assinalando que, em se tratando da Tireoidite de Hashimoto, no existem trabalhos dessa natureza, mas cruzando-se os dados de aplicabilidade das Terapias de Imagens Mentais nas patologias estudadas, verifica-se a possibilidade de aplicao teraputica das mesmas terapias a essa patologia.
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ABSTRACT
Alexandre Santana Hilel: Imagetherapy as a complementar therapeutical resource in Hashimotos Thyroiditis- a bibliografic study, 2008 Orientadora: Prof. Dr. Marlise A. Bassani Key-words: Imagery, Mind-Body and Relaxation Techniques, Behavior Therapy; Hashimotos Disease; Antibodies; Psycossomatics Aspects.
This research focused a bibliographic study of Imagetherapy as a therapeutic proposal to broach Hashimoto's disease. It has a start point in the results of a empirical noticed in the researcher clinical atuation, using directed imagination in a intention to low laboratorial score of auto--antibodies standed in auto-immune thyroiditis. This research has been organized in one presentation chapter oh Hashimoto's disease in her features: incidence, physiophatology, diagnosis and clinical board. In the following chapter, Imagetherapy is focused as heir history, definition, symbols, archetypes, collective mythology, active imagination, imagination as a directive technique. After, it is conducted to first bibliography study of Hashimoto's disease focusing ethyological factors, existing treatments and prognosis, that explain lack of therapeutical options in front of a nonexistence of specific ethyological factor to this auto-immune disfunction. It was applied Medline, Pubmed and Lilacs database, in a period between 1997 until 2007. A second bibliography research is done, boarding Imagetherapy, without a temporal section, since Jung until the present time, searching for her aplication in laboratorials phenomenons and her use in health research. The results shows for one hiatus that exist between ethyological factors of Hashimoto's disease and existing treatments. About Imagetherapy, it is verified that the use of these techniques become more present since 2000, with their applications in some health areas, in special on the pathologies that, as a Hashimotos disease, doesnt have ethyologicals factors defined, as a fybromialgia. The results are discussed, focusing that, about Hashimotos disease there arent researches envolving Imagetherapy, but crossing databases of applicability of other pathologies, verifies the possibility of therapeutical application of these same therapies in Hashimotos disease.
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SUMRIO
I - INTRODUO.......................................................................................................................1
1. Trajetria Pessoal......................................................................................................2 2. Objetivos.....................................................................................................................7 Captulo 1 - Tireoidite de Hashimoto: a patologia em questo....................................8
1.1 Prevalncia.......................................................................................9
1. 2 Fisiopatologia................................................................................10
1.3 Diagnstico...................................................................................12
1.4. Quadro clnico (sinais e sintomas).................................................13 1.4.1 Sintomas psiquitricos.................................................................14
1.4.2 Sinais e sintomas fsicos..............................................................17
Captulo 2 - A Terapia de Imagens Mentais...............................................................18
2.1 - Histrico do uso das imagens mentais.........................................18
2.2 - Imagens mentais definio.......................................................21
2.3 - Emoes, sensaes, sentimentos e imaginao.......................25
2.4 - A imagem como smbolo..............................................................29
2.5 - A imagem como arqutipo............................................................31
2.6 - A imagem como mitologia coletiva...............................................35
2.7 - A imaginao ativa........................................................................37
2.8 - A Imaginao como tcnica diretiva.............................................47
II - MTODO...........................................................................................................51
III - ESTUDO BIBLIOGRAFICO I: PROVVEIS FATORES ETIOLGICOS DA
TIREOIDITE DE HASHIMOTO...................................................................................53
3.1 - Ingesto de iodo............................................................................53
7
3.2 - Intoxicao medicamentosa.........................................................55
3.3 - Imunogentica..............................................................................55
3.4 - Imunopatogenia............................................................................57
3.5 - Transtornos psquicos e sua relao etiopatognica na Tireoidite
de Hashimoto........................................................................................58
3.6 - Tratamento convencional..............................................................61
3.7 - Prognstico...................................................................................66
IV - ESTUDO BIBLIOGRFICO II: A TERAPIA DE IMAGENS MENTAIS E SUAS
APLICAES.............................................................................................................68
4.1 - A Terapia das Imagens Mentais e sua aplicao em fenmenos
corporais...............................................................................................68
4.2 - A Terapia das Imagens Mentais e sua aplicabilidade em outras
patologias..............................................................................................75
V - DISCUSSO......................................................................................................83
VI - CONCLUSES..................................................................................................88
VII - REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...................................................................90
1
I INTRODUO
A idia de um estudo bibliogrfico acerca de a Tireoidite de Hashimoto deve-
se a observao de vrios casos clnicos tratados empiricamente em minha atuao
clnica com a Terapia de Imagens Mentais em seus recursos e aplicaes nos
ltimos 11 anos.
Na minha concepo a Terapia de Imagens Mentais surge como tcnica de
forma a complementar o tratamento convencional de reposio com hormonioterapia
sinttica em pacientes que apresentavam sintomas residuais de disfuno glandular
e insatisfao teraputica.
Inicialmente meu conhecimento sobre os fundamentos das terapias de
Imagens Mentais era mnimo. Mas, necessitava criar recursos para que a patologia
de Tireoidite de Hashimoto fosse abordada em seu aspecto psquico. Parti, ento,
do pressuposto de que, no segmento neurolgico, endocrinolgico e imunolgico,
diversas dvidas ainda pairam sobre o comportamento desta patologia, mediante
falta de fator etiolgico definido.
Na abordagem psquica da tireoidite pouco se sabe sobre o comportamento
dessa doena nem dos provveis fatores emocionais envolvidos.
Foi realizada uma introduo referente ao que a Tireoidite de Hashimoto:
fisiopatologia, diagnstico e quadro clnico. Depois disso, abordamos a Terapia das
Imagens Mentais em seu histrico e definio.
Em seguida, realizamos um estudo bibliogrfico sobre os fatores etiolgicos
provveis da Tireoidite de Hashimoto com o tratamento convencional e o prognstico
no intuito de investigar: a) a falta de um diagnstico preciso do mecanismo auto-imune desta doena; b) os poucos recursos teraputicos existentes; c) o tratamento
2
da Tireoidite de Hashimoto ser focado em sua disfuno glandular (o hipotireoidismo), no em seu fator causal ou fisiopatologia inflamatria.
Posteriormente foi apresentado o estudo bibliogrfico das terapias de
Imagens Mentais como uma possibilidade teraputica de abordagem psquica.
Discutiu-se os resultados dos estudos bibliogrficos estabelecendo-se uma relao
entre a Tireoidite de Hashimoto e seus mecanismos etiolgicos propostos de forma a
relacionar o diagnstico pouco preciso com os tratamentos existentes e o
prognstico.
As Terapias de Imagens Mentais foram apresentadas como possibilidade
teraputica complementar na abordagem da Tireoidite de Hashimoto a partir das
pesquisas existentes com essa tcnica e observaes de sua atuao no eixo psico-
neuro-endcrino-imunolgico e patologias correlatas.
1 Trajetria Pessoal
Em minha atuao mdica, na dcada de 1990 recebia em meu consultrio
muitos casos clnicos diagnosticados previamente como hipotireoidismo, valendo-me
aqui da observao de que, tanto o hipotireoidismo (hipofuno da glndula tireide)
como o hipertireoidismo (hiperfuno da mesma glndula) no significa um diagnstico de uma patologia definida e sim apenas uma disfuno glandular. Ou
seja, tanto para o hipo como para o hiper existem numerosas patologias que podem gerar essa disfuno, como por exemplo, a doena de Graves, o
hipertireoidismo primrio, a tireotoxicose, o hipotireoidismo primrio (hipofuno
direta da tireide) ou o secundrio (hipofuno por falta de estmulo via hipfise por
baixa do TSH hormnio tireo-estimulante) e a Tireoidite de Hashimoto que, como
3
veremos, pode em sua fase inicial gerar um padro hiperestimulatrio
(hipertireideo), mas que sempre evolui para uma hipofuno tireoidiana caracterizada como hipotireoidismo auto-imune.
A Tireoidite de Hashimoto, por muitas vezes, revelada ao paciente por seu
mdico como sendo uma hipofuno da tireide por baixa produo, principalmente
do hormnio T4.
Tanto na bibliografia consultada quanto na pratica mdica cotidiana parece
no haver interesse em se avaliar devidamente o processo inflamatrio da Tireoidite
de Hashimoto como um dos seus fatores patognicos que o processo inflamatrio
auto-imune e nem sequer os procedimentos propeduticos adequados para que se
submeta o paciente aos mtodos de diagnsticos de imagem, como o ultras-som da
tireide, a avaliao laboratorial da contagem dos anticorpos Anti-tireoglobulina e
Anti-peroxidase que podem ou no confirmar o diagnstico desta patologia auto-
imune.
Ainda pude observar em minha experincia clnica que, na maioria dos casos,
estes indivduos no tiveram uma propedutica investigativa adequada antes de se
instituir a terapia proposta de reposio sinttica de hormnios tireoidianos e, em
relao sua eficcia, apresentavam sintomas e sinais residuais da patologia em
questo, inclusive a observao da permanncia do padro inflamatrio ao ultras-
som ou um padro de involuo (diminuio volumtrica da glndula) nos casos
crnicos.
Ao reavaliar os dados clnicos laboratoriais e diagnsticos de imagem pude
detectar nestes pacientes o mesmo padro de insatisfao teraputica e alguns
sintomas residuais, entre eles, a depresso, a desmotivao e o estresse gerado
pela evoluo da doena.
4
Chamou-me a ateno, a semelhana dos padres psquicos destes
indivduos, com alteraes no eixo hipotlamo-hipfise-tireide assim como no eixo
hipotlamo-hipfise-suprarrenais, de onde surgiam explicaes para os fatores
estressantes da tireoidite em questo e o comportamento emocional de seus
portadores.
Na relao deontolgica criada com meus pacientes durante as avaliaes
clnicas pude perceber, alm do estresse emocional, o desconhecimento de cada
paciente sobre o que era tal processo auto-imune da Tireoidite de Hashimoto e de
como e o por que seu organismo iniciara a produo de auto-anticorpos, fossem
eles contra a enzima peroxidase (anti-TPO) que permeava a formao do hormnio ativo, o T4, ou contra a protena carreadora que transportava tal hormnio para as
clulas, a tireoglobulina (anti-tireoglobulina). Tinha em mente que, se um organismo pode criar anticorpos contra seus
prprios rgos, deveria o mesmo saber o caminho para impedir a evoluo desse
processo, pois nele havia sido iniciado e gerado at ento.
Em busca de mecanismos que impedissem a evoluo de tal patologia pude
ento conhecer as Terapias das Imagens Mentais. Inicialmente, de uma forma
emprica, comecei com abordagem psquica de alguns desses indivduos, sem
abandonar o tratamento convencional medicamentoso, que, a meu ver, deixava a
desejar pelos sintomas residuais que os meus pacientes se queixavam. O primeiro caso da abordagem psquica atravs das Terapias por Imagens
Mentais se deu com uma paciente do sexo feminino, 45 anos, com queixas residuais
de alopecia (queda de cabelos), unhas quebradias, pele ressecada, constipao intestinal, reteno hdrica e aumento progressivo de peso, alm de baixa motivao
profissional e sonolncia durante o dia.
5
Utilizei-me desses sinais e sintomas residuais como marcadores para
evoluo do mtodo de tais Terapias de Imagens, j que se constitua nas queixas remanescentes de tal paciente. Mantendo-se a teraputica convencional de
hormonioterapia sinttica, agreguei exerccios de imagens mentais.
A esta primeira paciente pedi que, pelo menos uma vez ao dia ela dedicasse
alguns minutos de seu tempo para iniciar um relaxamento: fosse com msica ou o
prprio silncio, em um ambiente isolado e sem interferncias e, aps sentir seu
corpo e mente relaxados, que ela pudesse imaginar a sua glndula tireide em seu
tamanho e anatomia usual.
Em seguida, pedi que ela imaginasse um inchao na mesma glndula
acompanhada pela presena de auto-anticorpos na forma de bidentes grudados
glndula e que eles eram os causadores desta inflamao. Essas imagens
propostas foram fornecidas a paciente durante a explicao da tcnica, atravs de
planilhas de anatomia que consiste numa tireide normal e outra planilha onde a
tireide encontrava-se aumentada e com a presena de anticorpos representados
simbolicamente por bidentes. Essa simbologia a mesma empregada pela
Conveno Internacional na rea cientfica e mdica.
A partir das imagens propostas pedi que a paciente destacasse ou
arrancasse anticorpo por anticorpo com as mos em seu exerccio de visualizao
dirio. O objetivo era fornecer recursos psquicos para o enfrentamento de tal condio auto-imune. Padres visuais de anatomia da tireide e da simbologia
cientfica universal de bidente dos anticorpos foram fornecidos previamente a esta
paciente para uso em domiclio.
Contudo, um fato marcante neste caso clnico foi que, aps sessenta dias de
exerccio, sendo que o retorno previsto para avaliao clnica seria de quinze dias, a
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paciente relatou-me que, por medo de no conseguir praticar o exerccio proposto
ela criou a imagem de um rato. Essa imagem era a responsvel por ir ao encontro
de tais anticorpos e com-los vorazmente.
Na avaliao clnica, melhor do que o relato pela paciente da remisso parcial
de seus sintomas residuais era a comprovao laboratorial de que seus anticorpos
do tipo Anti-Peroxidase, medidos anteriormente em torno dos 1.350, haviam baixado
para valores abaixo dos 400.
Isso me levou a perceber que dentro das tcnicas de terapias das imagens
mentais poderamos nos utilizar de imagens do universo onrico do paciente para
estabelecer diretrizes para os mtodos de emprego de visualizao. Isso facilita
suas possibilidades de enfrentamento e de melhores resultados e traz tona a
importncia da imaginao em seus contedos na construo e elaborao das
Terapias de Imagens Mentais.
A relao causal na produo desses anticorpos com o padro inflamatrio da
glndula, sem que houvesse um fator imunolgico definido para esse padro atpico
da Tireoidite de Hashimoto, fez emergir, em meu senso clnico, as perguntas: 1)
como um organismo poderia criar anticorpos contra seus prprios rgos ou a
funo nele contidos?; 2) Estaria esse mau funcionamento imunolgico relacionado
com contedos inconscientes, j que o sistema imunolgico faz parte de nossos
mecanismos de autopreservao?.
Minha busca terica teve incio pelos caminhos da psicanlise, atravs do
curso de psicanlise transpessoal do Prof. Andr Kepp, no ano de 2000. A incurso
na pesquisa das doenas e sua relao psico-neuro-endcrino-imunolgica
prosseguiu com o incio do mestrado no Ncleo de Psicossomtica e Psicologia
7
Hospitalar, do Programa de Estudos de Ps-Graduao em Psicologia Clnica, da
PUC-SP.
2 Objetivos
O objetivo do presente trabalho, ento, realizar uma reviso bibliogrfica da produo mdica sobre Tireoidite de Hashimoto, a fim de avaliar os provveis
fatores etiolgicos e analisar os tratamentos propostos. Busca-se determinar a
lacuna existente entre a bibliografia publicada sobre a etiopatogenia e o tratamento
da patologia em questo nos ltimos dez anos. Tambm se procura propor as
Terapias de Imagens Mentais como recurso teraputico na Tireoidite de Hashimoto,
atravs de imaginao ativa, visualizao dirigida ou tcnicas afins.
Os objetivos do presente trabalho podem ser sintetizados, como segue: 1) Analisar os fatores etiopatognicos da Tireoidite de Hashimoto sua
relao com os tratamentos existentes para tal patologia, na literatura
de 1997 a 2007;
2) Analisar as Terapias de Imagens Mentais como recursos teraputicos nas patologias do eixo psico-neuro-endcrino-imunolgico.
A fim de subsidiar a compreenso dos captulos referentes ao estudo
bibliogrfico foram apresentados os captulos referentes s conceituaes sobre
Tireoidite de Hashimoto e sobre Terapia de Imagens Mentais.
8
Captulo 1 - Tireoidite de Hashimoto: a patologia em questo
Em 1912, o mdico japons Hakura Hashimoto descreveu pela primeira vez a
quatro mulheres na qual a glndula tireide estava aumentada de volume e parecia
ter-se transformado em tecido linfide, um padro inflamatrio no observado nas
outras disfunes da tireide, mas comum em certas patologias auto-imunes. Essa
doena recebeu o nome de Tireoidite de Hashimoto em sua homenagem.
A doena de Hashimoto ou Tireoidite de Hashimoto atualmente considerada
como uma das formas de tireoidite crnica auto-imune. Vrias classificaes tm
sido propostas para a doena auto-imune da tireide (DAIT) que compreende um
espectro de condies, sendo os dois extremos o hipertireoidismo da doena de
Graves e o hipotireoidismo auto-imune. No caso desta ltima, duas formas clnicas
podem ocorrem, com bcio ou sem bcio (tireoidite atrfica), mas ambas
apresentando o mesmo padro inflamatrio auto-imune.
A Tireoidite de Hashimoto caracteriza-se por vrios graus de disfuno
tireoidiana, com a presena de anticorpos circulantes contra antgenos tireoidianos
e infiltrao da glndula por clulas mononucleares e fibrose.
Nesta reviso bibliogrfica poderemos notar uma preocupao relevante
pelos vrios autores que estudam a Tireoidite de Hashimoto em se estabelecer uma
etiologia provvel para esta patologia partindo-se do pressuposto de que, sendo
uma doena auto-imune as possibilidades etiolgicas so complexas e ainda pouco
esclarecedoras do mecanismo auto-imune e, desconhecendo-se o fator causal,
torna-se mais difcil estabelecer um tratamento direcionado aos aspectos
inflamatrios auto-imunes provocados pela Tireoidite de Hashimoto e,
9
consequentemente, a obteno de melhores resultados em sua abordagem
teraputica.
Dissertaremos, inicialmente, sobre sua incidncia, fisiopatologia, sintomas,
mtodos de diagnstico para que possamos entender como a Tireoidite de
Hashimoto abordada na atualidade, no que se refere ao tratamento, podendo
assim demonstrar-se a lacuna existente entre a falta de um fator etiolgico e um
tratamento mais especfico e a real abordagem teraputica utilizada, sendo essa
direcionada a tratar mais a disfuno hipotireoidea da glndula e seus sintomas do
que o processo fisiopatolgico gerado pelo mecanismo auto-imune da Tireoidite de
Hashimoto.
1.1 Prevalncia
A incidncia maior em mulheres e idosos, sabendo-se que a freqncia dos
anticorpos chega a 33% em mulheres com 70 anos ou mais. A taxa de
hipotireoidismo franco e subclnico sete vezes maior em mulheres do que em
homens e duas vezes maior em brancos do que em negros (Medeiros et al., 2006). A patognese das doenas auto-imunes como a Tireoidite de Hashimoto
ainda um mistrio. Contudo, consenso geral que fatores tanto genticos quanto
ambientais e psquicos tm papel importante na expresso da doena, como
veremos no captulo sobre os fatores etiolgicos.
Medeiros et al. (2006) demonstra que, nos ltimos anos, a incidncia de doenas tireoidianas tem se elevado por inmeras razes. Entre elas o aumento do
nmero de idosos (ampliao da expectativa de vida), mais agilidade quanto ao
diagnstico e mudanas no teor de iodo da alimentao.
10
A carga gentica associada alta ingesto de iodo fator importante para
desencadeamento da doena, como ser apresentado no estudo bibliogrfico desta
patologia.
Uma vez que a manifestao mais comum do hipotireoidismo auto-imune
atinge cerca de 9,3% de toda a populao feminina sua observao de extrema
relevncia, pois essa estatstica mostra que so altos os ndices de prevalncia nas
mulheres, quando comparado a outras patologias femininas. Mesmo na fase em que
considerada sub-clnica, isto , no momento em que a doena apresenta pouco ou
quase nenhum sintoma, pode ser identificada por meio de exames de anlises
clnicas e de imagens, o que melhora seu prognstico, baseado na preveno e
diagnstico precoce (Soares e Vaisman, 2001). Quando se utilizava a avaliao da tireide pela palpao, apenas 4% a 7%
da populao apresentavam ndulos. Hoje, o uso da ecografia (ultras-som da tireide) detecta ndulos em at 50% da populao com tireoidite, estabelecendo
critrios mais avanados para seu diagnstico e preveno (Medeiros et al., 2007).
1. 2 Fisiopatologia
A predisposio gentica associada a fatores ambientais promovem a
chamada quebra da auto-tolerncia imunolgica, dando origem a ativao de clulas
T especficas auto-reativas que so responsveis pela doena auto-imune da
tireide (Barbesino et al., 2001). Este desequilbrio imunolgico ser analisado no captulo que trata do estudo
bibliogrfico dos fatores etiolgicos, onde vrios so os mecanismos que colaboram
para o desenvolvimento da produo de auto-anticorpos, entre eles o pesquisado
11
antgeno de histocompatibilidade, que visa mostrar o ponto em comum entre a
Tireoidite de Hashimoto e outras patologias auto-imunes (vide estudo bibliogrfico I). Na Tireoidite de Hashimoto o prprio organismo desenvolve anticorpos anti-
tireoidianos, sendo os mais importantes o anti-tireoperoxidase (Anti-TPO), onde anticorpos so produzidos contra uma enzima de converso do T4 em hormnio
ativo, a peroxidase, produzida internamente pela glndula tireide; e o anticorpo
anti-tireoglobulina, na qual os anticorpos atacam uma protena responsvel pelo
transporte e distribuio do hormnio T4 para todo o corpo e clulas. Em sua fase
inicial, o processo inflamatrio leva a uma ruptura dos folculos tireoidianos
causando um hipertireoidismo transitrio; com o cessar do processo, o indivduo
retorna a um estado de eutireoidismo ou at mesmo hipotireoidismo, dependendo do
grau da leso folicular. A cronicidade dessa reao auto-imune determinar a
instalao da hipofuno tireoidiana com o processo inflamatrio auto-imune
mediado por clulas linfocitrias que determina a fase crnica da tireoidite (Soares e Vaisman, 2001).
Esta cronicidade tem a ver com a falta de abordagem do processo auto-imune
devido ao fato de que na anlise do tratamento observamos a preocupao em se
tratar a disfuno da glndula tireide, seja hiper ou hipofuncionamento por
reposio hormonioterpica e no a preocupao em se tratar os complexos auto-
imunes que se formam muito menos o padro inflamatrio que deixa a glndula em
estado de desequilbrio e constante estado patolgico.
12
1.3 Diagnstico
Como demonstram Valente et al. (1998) o diagnstico feito pela medio dos hormnios T4 livre, TSH e anticorpos anti-peroxidase e anti-tireoglobulina. Esses
ltimos responsveis pela comprovao de mecanismo auto-imune presente na
glndula. Apenas alteraes nos nveis de T4 e TSH no denotam a presena de
patologia auto-imune, mas sim de disfuno glandular, a saber, quando o TSH
encontra-se em nveis altos com T4 normal, poderemos supor que a disfuno
glandular encontra-se em sua fase inicial, onde a glndula est bloqueada em sua
funo, mas consegue manter ainda os nveis normais de T4, custa de um hiper-
estmulo da hipfise sobre a tireide, atravs de seu hormnio tireo-estimulante ou
TSH. Quando os nveis de TSH encontram-se altos e os nveis de T4 baixos,
significam que, apesar do estmulo pela hipfise atravs do TSH, a glndula no se
encontra responsiva e a produo de T4 cai. Nesse caso a disfuno
hipotireoidismo encontra-se instalada e o aparecimento de sinais e sintomas dessa
disfuno j pode ser notado.
Porm, para se comprovar o dano auto-imune como causador dessas
disfunes necessrio a dosagem dos anticorpos anti-peroxidase e anti-
tireoglobulina. No se faz necessrio o aumento nos nveis desses dois anticorpos
simultaneamente, visto que na Tireoidite de Hashimoto padres diferentes de
mecanismo auto-imune so observados, ora com o ataque a enzima conversora de
T4, a peroxidase, ora o ataque a protena carreadora de T4, a tireoglobulina, ora aos
dois com a presena de nveis elevados de anti-peroxidase e anti-tireoglobulina
(Besson e McDermott, 1975; Chirino, 2001).
13
Pesquisas nessa rea no mostram nenhuma correlao entre qual anticorpo
encontra-se aumentado ou os dois simultaneamente e a gravidade do quadro clnico
da Tireoidite de Hashimoto, como demonstra Soares e Vaisman (2001). Em uma pequena percentagem de pacientes com Tireoidite de Hashimoto,
aproximadamente 10% a 15% poderemos encontrar a pesquisa dos anticorpos como
negativas, de acordo com Sylvester e Steven (2006). A ultra-sonografia da tireide trouxe a possibilidade de um diagnstico mais
precoce do processo inflamatrio auto-imune e a monitorao do grau de evoluo
da Hashimoto, onde observamos que, no estgio inicial da doena, a glndula
encontra-se aumentada, custa de ndulos, cistos tireoidianos ou o prprio
processo inflamatrio desencadeados pela resposta auto-imune.
Em seu estgio mais avanado podemos observar uma reduo volumtrica
da glndula tireide, custa de um processo fibrtico que acontece em sua
evoluo. O processo auto-imune no abordado pelo tratamento convencional,
gerando uma atrofia progressiva da glndula, devido ao padro linfocitrio de
inflamao que resulta em uma reao cicatricial com alteraes heterogneas
difusas na tireide, decorrente desse infiltrado linfocitrio.
1.4 Quadro clnico (sinais e sintomas)
Como citado por Medeiros et al. (2006) a Tireoidite de Hashimoto evolui quase sempre para a hipofuno da tireide podendo em sua fase inicial apresentar-
se como hiperfuno ou hipofuno, mas o padro inflamatrio inevitavelmente ir
causar danos histolgicos que iro gerar o mau funcionamento da glndula e,
conseqentemente o hipotireoidismo.
14
O hipotireoidismo uma condio na qual a tireide se encontra trabalhando
menos do que deveria (hipoativa) e a produo de hormnio tiroideano baixa. Na Tireoidite de Hashimoto a tireide freqentemente se encontra aumentada e o
quadro completo de hipotireoidismo pode se manifestar anos mais tarde. Nesses
casos a glndula vai sendo destruda gradualmente (Besson e McDermott, 1975).
O hipotireoidismo pode gerar entre outros sintomas, desnimo, apatia e
depresso, alm de fraqueza, diminuio da memria, aumento de peso, pele seca,
queda de cabelos, intestino preso, entre outros. Reciprocamente, a depresso, por
sua vez, tambm pode levar ao hipotireoidismo (Ballone, 2007).
1.4.1 Sintomas psiquitricos
Oliveira et al. (2001) cita que quando o hipotireoidismo de intensidade mdia a sintomatologia predominantemente dominada por um quadro depressivo
ao qual se associam lentificao da fala, diminuio do rendimento intelectual,
fadiga, diminuio do apetite e apatia, criando-se o primeiro elo entre a Tireoidite de
Hashimoto e o psiquismo do indivduo.
Como se desenvolve um quadro depressivo no hipotireoidismo ainda no est
bem esclarecido. Em ratos o hipotireoidismo associado extirpao cirrgica da
tireide afeta o sistema noradrenrgico (neurotransmissor importante na regulao
do humor), sendo aventada possvel ligao entre esta ocorrncia e alterao em funes neuropsquicas, como demonstra Jackson et al. (1999). A mesma disfuno na regulao do humor de seres humanos poderia ser observada, se afetado fosse
tambm sua produo de noradrenalina.
15
Outra possibilidade aventada pelos autores seria de que o hipotireoidismo se
associa com uma reduo na atividade da serotonina (outro neurotransmissor
importante na regulao do humor).
Com a reposio medicamentosa de tiroxina observam-se melhora dos
sintomas depressivos e melhora da atividade serotoninrgica em todos eles. Esses
achados sugerem que a neurotransmisso serotoninrgica afetada pelo
hipotireoidismo e pode ser revertida com reposio de T4. Esta observao abre
novo campo para anlise da relao entre a Tireoidite de Hashimoto e as funes
psquicas do paciente com tireoidite e sua relao psico-neuro-endcrino-
imunolgica.
Oliveira et al. (2001) destacam os achados de alto nmero de pacientes hipotiroideanos com sintomas sugestivos de transtornos depressivos, sugerindo que
muitos desses pacientes poderiam ser beneficiados com avaliao e atendimento
psiquitrico adequados, concomitante ao tratamento endcrino. Ao analisar as bases
das disfunes geradas pelo hipotireoidismo, no que diz respeito baixa metablica
causada pela baixa produo de T4, hormnio ativo da tireide, podemos supor que
o baixo metabolismo basal resultante poderia colocar o indivduo em estado de
predisposio metablica com baixa temperatura corporal e alteraes na dinmica
fisiolgica do funcionamento de seu corpo e at mesmo, na neurotransmisso
cerebral, o que correlacionaria a tireoidite com os estados depressivos apresentados
em alguns casos.
A forma mais grave de alterao emocional decorrente do hipotireoidismo
chamada de loucura mixedematosa (mixedema um quadro de edema geral de origem tireoideano) que se caracteriza por um quadro verdadeiramente psictico, do tipo confusional, delirante e alucinatrio ou, quando no, por um profundo estado
16
melanclico, com freqncia estuporoso. Algumas outras raras vezes a alterao do
humor se d por um quadro de hipomania. Nos idosos essas alteraes podem
lembrar um quadro demencial (Ballone, 2007). Segundo Camargo et al. (2006) at o raciocnio fica mais lento na falta de hormnio da tireide. Depresso, ganho de peso, dificuldade para engravidar e at
queda de cabelo. Apesar de mais casos estarem sendo descobertos hoje em dia, devido ao aprimoramento dos meios de diagnstico, a prpria incidncia tambm
tem sido cada vez maior, segundo Medeiros et al. (2006). O hipotireoidismo na populao geral, antes de 1994, era em torno de 9%.
Agora 15% a 20% da populao apresentam tireoidite, que uma das principais
causas do hipotireoidismo. Esse assunto deve preocupar, sobretudo, as mulheres.
Elas so muito mais propensas a disfunes na tireide, tendo uma incidncia de
dez mulheres para cada quatro homens com o problema (Medeiros et al., 2006). de bom senso nos casos de m resposta da depresso a um tratamento
antidepressivo realizar um exame do funcionamento da tireide. Camargo et al.
(2006) acreditam que o hipotireoidismo estaria presente em 8% a 17 % das pessoas deprimidas. Essa incidncia estaria diretamente relacionada ao fato do
hipotireoidismo ser auto-imune.
A par do que se sabe, concretamente, das alteraes da tireide na
depresso e vice-versa, tambm nos casos de estresse, o funcionamento da
glndula est alterado. H uma diminuio da produo de TSH pela hipfise e uma
inibio da converso de T4 em T3. Trata-se de um mecanismo fisiolgico de defesa
e proteo no estresse, provocado pelos corticsterides liberados no fenmeno do
estresse, com objetivo de conservar a energia durante a reao de alarme.
17
1.4.2 Sinais e sintomas fsicos
Os sintomas comeam paulatinamente no incio com aumento do peso,
hipersensibilidade ao frio, pele seca, infiltrao pseudo-edematosa do rosto e dos
membros (inchao), cabelo seco e fino, freqncia cardaca lenta (bradicardia) e irregularidades do ciclo menstrual (Ballone, 2007).
Em geral, os sinais fsicos e psiquitricos, sobretudo se o hipotireoidismo
diagnosticado precocemente, melhoram com o tratamento hormonal substitutivo,
porm, calcula-se que 10% dos pacientes continuam a apresentar sintomas
neuropsiquitricos residuais (Ballone, 2007). Os sintomas clssicos do hipotireoidismo so os seguintes:
Bcio (papo);
Aumento de peso;
Cansao crnico;
Depresso;
Dificuldade de concentrao;
Lapsos de memria;
Pele ressecada;
Cabelos speros e quebradios;
Constipao intestinal (priso de ventre); Anemia;
Dificuldade para engravidar e abortamentos;
Inchao de tornozelos e face;
Colesterol elevado;
Dor e fraqueza muscular;
Dores nas juntas (Ballone, 2007).
18
Captulo 2 - A Terapia de Imagens Mentais
2.1 - Histrico do uso das imagens mentais
Como relata Simo (2004) as imagens desenhadas e expressas em qualquer
local sempre foram produzidas ao longo da evoluo da humanidade em qualquer
cultura.
Podemos lembrar que na poca das cavernas os homens desenhavam cenas
que representavam a sua caa: o urso, o leo, o cervo, cenas de batalhas e
caadas. Naquela poca, assim como em vrias outras, algumas destas
representaes estavam associadas ao pensamento mtico-religioso de que ao
desenhar voc poderia influenciar aspectos da caada, ajudando assim o homem
primitivo a melhorar o desempenho nesta tarefa e triunfar frente ao temido animal,
supostamente mais forte. A importncia do desenho possua mais que uma funo
psicolgica - uma possibilidade de um pensamento de antecipao - planejamento, permitindo o desenvolvimento daquilo que se chama de funes psquicas
superiores, pois ao representar nas paredes a cena futura, o homem poderia se
preparar para possveis contratempos; medir distncia e tamanho, entre ele e o
animal, mensurar a fora necessria, para atingi-lo assim como preparar grupos
existente para o aspecto social presente, neste ato - o de sobrevivncia do grupo e o
da caada - que daria comida para os prximos tempos (Simo, 2004).
Em outras instncias, o desenho era a representao de projetos de guerra,
batalhas contra inimigos, etc. Em outras, ocasies era o mapeamento das
propriedades, vilas, cidades, pases e continentes. E sob outro enfoque analtico, a
19
influencia do psquico nas atitudes resultantes desse modo de pensar (Simo,
2004). A partir desses dados podemos observar que a imagem antecede como meio
de comunicao a linguagem escrita e at mesmo a linguagem falada,
principalmente em seu contedo imagtico e as vrias possibilidades de
interpretao e uso, abrindo, tambm, possibilidades para a aplicao das Terapias
de Imagens Mentais na rea da sade.
Como exemplo, Epstein (1990) cita que a utilizao mdica de imagens comum h sculos em muitas culturas de todo o mundo, como no Tibete, ndia,
frica, entre os esquims e os ndios, em alguns casos durante milnios. Ainda para
ele no mundo ocidental medida que a prtica mdica evolua de suas antigas
origens no Egito durante tempos, as imagens eram uma tcnica essencial e por
vezes o tratamento mdico indispensvel para males fsicos, at aproximadamente
1650, quando a cincia natural e o pensamento mdico moderno comearam a ser
predominantes. Mais recentemente, enquanto a psicoterapia freudiana se espalhava
pela maior parte da Europa, Inglaterra e, depois, Estados Unidos, a tendncia
utilizao de imagens passou praticamente desapercebida, criando uma nova lacuna
entre as Terapias de Imagens Mentais e suas aplicaes.
Para Goleman (1997) relatam que o uso de vises interiores para auxiliar o processo de cura era usado pelos budistas tibetanos desde o sculo XIII ou at
antes. A abordagem budista normalmente envolve a meditao com base na
imagem de uma divindade no ato de cura de um sintoma. As prticas xamanstas em
culturas presentes no mundo inteiro usaram uma abordagem semelhante. Cita que,
entretanto, s recentemente as imagens foram usadas no ocidente por mdicos e
profissionais da sade.
20
Porm, o uso das imagens mentais como recurso teraputico sob o enfoque
da psicanlise data de 1899, quando Freud, a figura mais influente na psicologia do
sculo XX, foi bem sucedido ao usar imagens no tratamento de um menino de 14
anos que sofria de um tique fsico. Este caso, tratado por meios no-analticos, foi
bem-sucedido, porm no citado em nenhum dos 25 volumes publicados de sua
obra; esse foi o nico tratamento concludo com sucesso mencionado nestes
volumes e a nica vez em que Freud, o homem que inventou a terapia pela fala,
usou imagens mentais como tcnica teraputica. Este o caso, tal como foi
reportado por Freud em 1899, no livro Interpretao dos sonhos:
Um garoto de 14 anos veio a mim para tratamento psicanaltico sofrendo de espasmo hemifacial, vmito histrico, dores de cabea etc. Iniciei o tratamento assegurando-o de que se ele fechasse os olhos veria figuras ou teria ideias, as quais ento deveria comunicar a mim. Ele respondeu por meio de figuras. Sua ltima lembrana antes de vir a mim foi revivida visualmente em sua memria .Ele estivera jogando damas com seu tio e viu o tabuleiro sua frente. Ele pensou nas diversas posies, favorveis ou desfavorveis, e nos movimentos que no se devem fazer. Ele viu ento uma adaga sobre o tabuleiro, um objeto que pertencia a seu pai, mas que sua imaginao colocava sobre o tabuleiro. Ento havia uma foice sobre o tabuleiro e, depois, uma segadeira. E ento apareceu afigura de um velho campons aparando a grama na frente da casa distante do paciente com uma segadeira (Freud, 1999).
Freud ento ofereceu ao jovem uma interpretao dos smbolos. Mas o ponto
importante neste contexto foi a tcnica utilizada por Freud, uma tcnica de imagens
mentais. Aps esta nica sesso, afirma Freud, o tique do garoto e outros sintomas
cesaram. Junto com esse desfecho, Freud cessa tambm suas incurses na
utilizao de imagens dentro das terapias analticas, visto que defendia o uso da
terapia da fala e no era um entusiasta pela terapia das imagens.
21
Permaneceu uma lacuna no uso dessas tcnicas at que Jung (1986) demonstra seus interesses iniciais no estudo dos sonhos e das imagens a partir da
Psicologia Analtica e a partir de suas relaes compensatrias e simblicas
apresentadas por essa tcnica , como se observa no texto abaixo:
(...) h a possibilidade de que, no inconsciente, ocorram determinados processos que compensam, com o seu smbolismo, as deficincias e os desnorteamentos da atitude consciente. Quando as compensaes inconscientes se tomam conscientes por meio da tcnica analtica, provocam uma mudana to grande na atitude consciente, que podemos falar de um novo nvel de conscincia. Mas o mtodo em si no capaz de produzir o processo propriamente dito da compensao inconsciente. (...) o processo inconsciente em si quase nunca atinge a conscincia, sem a ajuda da tcnica. Quando trazido tona, revela contedos que formam um contraste notvel com a orientao geral das ideias e dos sentimentos cons-
cientes. Se assim no fosse, tais contedos no teriam efeito compensatrio ( Jung, 1986).
Tal efeito compensatrio traz a possibilidade de anlise das vrias aplicaes
das Terapias de Imagens Mentais na rea da sade, em especial na rea da
psicologia e na rea mdica.
2.2 - Imagens mentais - definio
Glikin (2001) define imagem mental como todo fenmeno visual que se apresenta em nossa conscincia e que no est referido a uma percepo atual,
seja originariamente vindo do mundo externo e evocado a partir da memria, seja surgindo das profundidades da conscincia, naquele limite impreciso entre o
psquico e o fsico,entre o pessoal e o arquetpico, entre o sistema nervoso central e
o autnomo.
22
A imagem mental apresentaria-se com uma simplicidade fenomenolgica que
no poderamos ignorar. Jung (1986) demonstra sua importancia na forma como a
conscincia percebe, filtra ou decodifica as imagens e nos mostra sua importncia
como moduladora de comportamentos e da personalidade. Ela participa da
capacidade de visualizar ou no as consequncias das aes, dos projetos e
objetivos lanados para futuro e das formas de serem realizados. As imagens promovem com igual eficcia os delrios do manaco, as projees ameaadoras do
paranico, ou a impulsividade da personalidade anti-social. Tambm sustentam a
beleza da criatividade e da inveno em todas as reas da atividade humana.
Essa ao moduladora das imagens teriam o significado de compensao,
como j citado por Jung (1986) e reafirmado por Glikin (2001) onde compensar significa equilibrar, ajustar, suplementar. A atividade compensatria do inconsciente como equilbrio de qualquer tendncia para a unilateralidade por parte da
conscincia corresponde s funes auto-reguladoras (homeostticas) do organismo, presentes na esfera fisiolgica. O objetivo do processo compensatrio seria o de ligar, como uma ponte, dois mundos psicolgicos. Essa ponte o smbolo;
embora os smbolos, para serem eficazes, devam ser reconhecidos e
compreendidos pela mente consciente, ou seja, assimilados e integrados. Essa funo compensatria poderia ser usada, ento, tanto na esfera psquica, como na
fisiolgica, j que suas funes auto-reguladoras esto presentes no eixo psico-neuro-nedcrino-imunolgico.
A partir desse presssuposto o efeito compensatrio do psquico sobre o
fisiolgico reafirma as inmeras possibilidades de se tratar molstias fsicas a partir
da reorganizao e replanejamento do psiquismo do indivduo a ser terapeutizado
por esse mtodo.
23
Jung (1987) exemplifica essa viso compensatria pela observao da relao do sonho com a conscincia. A consciencia, devemos lembrar, a moradia
dos aspectos fisiolgicos de manifestao das emooes, sensaes e sentimentos:
O ponto de vista de que os sonhos so mera satisfao de desejos reprimidos j est superado h muito tempo. Sonhos representando clara-mente receios ou desejos realizados tambm existem, no resta a menor dvida, mas no so os nicos. H muitos outros. Por exemplo, os sonhos podem exprimir verdades implacveis, sentenas filosficas, iluses, desenfreadas fantasias, recordaes, planos, antecipaes, e at vises telepticas, experincias irracionais e sabe Deus o que mais. No podemos deixar de lembrar que passamos quase a metade de nossa vida em estado mais ou menos inconsciente. O modo especfico de o inconsciente se comunicar com a conscincia o sonho. Da mesma forma que a alma tem seu lado diurno, que a conscincia , ela tambm tem o seu lado notumo, seu funcionamento psquico inconsciente, que poderia ser concebido como o fantasiar onrico. Assim como no existem apenas desejos e medos no consciente, mas uma infinidade de outras coisas, tambm sumamente provvel que a nossa alma onrica tenha uma riqueza semelhante de contedos e formas de vida ou, quem sabe, muito superiores s da vida
consciente, cuja natureza essencialmente concentrao, limitao e excluso (Jung, 1987).
Analisando esses aspectos de concentrao, limitao e excluso, teremos
poderosas ferramentas para o uso das imagens mentais na reverso de padres de
sade e doena. (...) se o indivduo conseguir enquadrar harmonicamente na vida da conscincia os fragmentos oferecidos ou forados pelo inconsciente, resultar
ento uma forma de existncia psquica que corresponde melhor personalidade
individual e, por isso, tambm elimina os conflitos entre a personalidade
consciente(...)(Jung, 1986). Imagens, smbolos e fantasias poderiam ser designadas, ento, como
linguagem do inconsciente. E assim, Jung (1986) descreve ento o processo da imagem:
24
Suponhamos que ouvimos um som indistinto cujo efeito inicial se reduz a um estmulo para escutarmos mais atentamente, para descobrirmos o 'que ele significa.
Neste caso, o estmulo acstico desencadeia no crebro toda uma gama de
representaes de imagens, que se associam ao estmulo acstico. Parte delas se
converte em imagens acsticas, parte em imagens visuais e parte em imagens
sensoriais. Emprego a palavra imagem, aqui, simplesmente no sentido de
representao. Uma entidade psquica s pode ser contedo consciente, isto , s
pode ser representada quando representvel, ou seja, precisamente quando
possui a qualidade de imagem. Por isto chama-se de imagens a todos os contedos
conscientes porque so reflexos de processos que ocorrem no crebro (Jung, 1984). Nesse sentido, podemos observar que o psiquismo do indivduo,muitas vezes,
responsvel pela somatizao de fenmenos fsicos, poderia aqui ser trabalhado,
eliminando fatores de inicializao das alteraes psicossomticas, trabalhando-se
com esses contedos conscientes.
Para Jonhson (1989) torna-se claro o quanto tolo denegrir o poder da imaginao. O homem depende da imaginao e de seus smbolos para as suas
representaes poticas, literrias, da pintura, escultura e de todas as atividades
artsticas, filosficas e religiosas. No poderamos desenvolver a inteligncia
abstrata, a cincia, a matemtica, o raciocnio lgico e mesmo a linguagem, se no
tivssemos a capacidade de gerar estas imagens-smbolos. E cita Neumann, em
seu livro Great Mother para exemplificar a linguagem simblica como as imagens do
inconsciente como fonte criativa do esprito humano em todas as realizaes. Sendo
o processo formador dos smbolos do inconsciente a fonte do esprito humano, a
linguagem - cuja histria quase idntica gnese e ao desenvolvimento da conscincia humana - sempre comea como uma linguagem simblica.
25
Novamente o psiquismo est presente como uma linguagem criativa do
inconsciente levada a elaborao simblica pelo consciente.
2.3 - Emoes, sensaes, sentimentos e imaginao
Para Epstein (1989) as emoes esto intimamente ligadas as imagens. Toda emoo pode se manifestar por uma imagem. E assim descreve:
H um modo fcil de provar isto: simplesmente tente 'ver", seus sentimentos. Se estiver feliz, pergunte-se com que sua felicidade se parece; se voc se diverte com esportes, pergunte-se com que seu divertimento se parece; se voc no gosta de estupidez, pergunte-se com que a estupidez se parece. Garanto que em todos os casos uma imagem lhe ocorrer. Esta imagem sua. Ningum mais no mundo v esta imagem com a mesma preciso: ela o correspondente visual de seus sentimentos. As imagens do forma s emoes (...) Uma imagem a expresso mental de um sentimento. Mas h tambm uma expresso fsica, as sensaes. Um sentimento tem certas sensaes fsicas associadas a ele. Quando estamos zangados, experimentamos, com frequncia, um aperto no peito. Quando estamos felizes, experimentamos, tambm com frequncia, uma sensao de leveza por todo corpo. Assim como um sentimento tem sensaes fsicas associadas a ele, o mesmo acontece com uma imagem. No existem imagens sem sensaes que as acompanhem (Epstein, 1989).
E se as imagens geram sensaes fsicas que podem ser positivas ou
negativas, aqui se percebe a possibilidade de se trabalhar com as imagens no
sentido de resignificar os contedos negativos de determinadas patologias que esto
intimamente ligadas ao psiquismo. Por que no utilizarmos as imagens mentais em
patologias onde o psiquismo no o fator predisponente, mas por vezes o fator
precipitante, como no caso do diabetes, onde o estado emocional do paciente
influencia em muito na dosagem da glicemia de seu sangue.
26
Outro exemplo seria o da popularmente conhecida gastrite nervosa, onde os
fatores estressores esto intimamente ligados manifestao da dor gstrica, pela
descarga adrenrgica como fator precipitante. Poder-se-ia ento resignificar-se
esses fatores estressores, antes que estimulassem tal descarga, podemos supor.
Em estudos clssicos sobre psicossomtica se aceita definitivamente o
componente emocional das doenas e a importncia da psicoterapia, como faz
Alexander (1989): O conhecimento, cada vez maior, das relaes entre as emoes e as funes do corpo normais e alteradas exige que o mdico moderno considere os conflitos emocionais como sendo to reais e concretos como os microorganismos visveis A principal contribuio da psicanlise para a medicina tem sido a de acrescentar ao microscpio ptico um microscpio psicolgico - isto uma tcnica psicolgica por meio da qual a vida emocional do paciente pode ser submetida investigao detalhada, (Alexander, 1989).
Esse microscpio psicolgico seria uma ferramenta importante nesse
processo de resignificao, mudando a relao entre as emoes e as funes
normais do corpo.
o que o faz Epstein (1989) no trabalho com imagens utilizando-as para mudar as emoes ou sensaes e usando-as para criar e afetar a experincia de
seus pacientes. Para ele, ao trabalhar com as imagens e modific-las, estaremos
atuando sobre as sensaes e emoes que as acompanham. Uma vez que a
imagem muda, a emoo tambm muda, assim como as sensaes a ela
associadas.
Tal como os lados de uma equao, emoo e imagem se equivalem; so
duas expresses da mesma realidade, e a sensao est ligada a ambas. Quando
mudamos a imagem, modificamos toda a equao. E ento poderemos perceber
27
que as imagens so realmente um caminho para a boa sade, tanto fsica quanto
mental.
Para Jung (1984), porm, a superposio e tenso entre os elementos pessoais e coletivos leva a uma elaborao tendenciosa da psique em fragmentar-
se, dividir-se e personificar-se. Mas a psique, como a maioria dos sistemas naturais,
luta para se manter em equilbrio. Far isso mesmo suscitando sintomas
desagradveis, sonhos assustadores ou problemas de vida aparentemente
insolveis; tambm se o desenvolvimento de uma pessoa foi unilateral, a psique
contm em si todo o necessrio para retificar essa condio. Aqui, podemos
observar o enorme potencial que a imagem tem em reverter quadros patolgicos,
mesmo que inicialmente unilateralizados. Jung (1984) ressalta: (...) porque nossa imagem do mundo contm alguma coisa que no est in-teiramente certa, ou seja: na teoria nos recordamos muito pouco, e na prtica, por assim dizer, quase nunca, de que a conscincia no tem uma relao direta com qualquer objeto material. Percebemos apenas as imagens que nos so transmitidas indiretamente, atravs de uma aparato nervoso complicado. Entre os terminais dos nervos dos rgos dos sentidos e a imagem que aparece na conscincia se intercala um processo inconsciente que transforma o fato psquico da luz, por ex., em uma "luz" -imagem. Sem este complicado processo inconsciente de transformao, a conscincia incapaz de perceber qualquer coisa material (Jung, 1984).
A elaborao a racionalizao consciente desse mundo imagtico onde o
contedo, antes imaginrio, torna-se real e material como numa somatizao. O que
parece impedir a adequada elaborao desse contedo imagtico so os nossos
bloqueios, parte integrante de qualquer mtodo de terapeutizao que em sua fase
inicial necessita de uma abordagem direta no sentido de se quebrar as couraas
para que o contedo inconsciente possa emergir em todas suas possibilidades.
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Jung (1984) exemplifica esses bloqueios quando diz que vivemos protegidos por muralhas racionalistas contra a eternidade da natureza. Demonstra que a
Psicologia Analtica procura justamente romper com estas muralhas ao desenterrar
as imagens fantasiosas do inconsciente que a nossa mente racionalista havia
rejeitado. Em uma anlise de Glikin (2001) Jung demonstra que da coliso entre as
duas foras opostas (consciente e inconsciente) a psique inconsciente tende a criar uma terceira possibilidade. Esta tem uma natureza irracional inesperada e
incompreensvel para a mente consciente. Ser o smbolo, ambguo e paradoxal que
ser capaz de atrair sobre si a ateno e, eventualmente, reconciliar as duas. A
situao de conflito, que no apresenta nenhuma soluo racional ao dilema a
situao na qual a oposio dos opostos produz uma terceira que irracional,
representada pelo smbolo. O significado do smbolo pode ser expresso em termos
nicos e individuais e, ao mesmo tempo participa de imagens universais. Aparece
como uma espcie de inveno inconsciente em resposta a uma contestao
consciente. Ou de uma linguagem emergente frente a um conflito psquico.
Aqui podemos observar os primeiros indcios de que se esse smbolo for
direcionado ou trabalhado o embate poder fazer surgir resultados positivos
mediante uma interveno psicoteraputica dirigida.
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2.4 - A imagem como smbolo
Jung demonstra que a imagem existe como smbolo, mesmo antes da cincia
tomar conhecimento dessa investigao:
(...) A Cincia e estas imagens primordiais so incomensurveis entre si. Trata-se de dados irracionais, condies a priori da imaginao que simplesmente existem e cujos objetivos e justificao a Cincia s pode in-vestigar a posteriori, como aconteceu, por exemplo, com a funo da tireide, que era considerada como um rgo sem sentido, antes do sculo XIX. Para mim, as imagens primordiais so como que rgo psquicos, que eu trato com o mximo cuidado.
Por isto alguma vezes preciso dizer a algum de meus pacientes mais idosos: sua imagem de Deus ou sua ideia de imortalidade atrofiou-se, e. conseqentemente, o seu metabolismo psquico caiu fora dos eixos. (Jung, 1984).
Jung (1984) demonstra, ento, a possibilidade de se tratar imagens primrias como rgos psquicos em benefcio de seus pacientes.
Para Johnson (2003) as imagens simblicas do inconsciente so as fontes criativas do esprito humano em todas as suas realizaes. No s a conscincia e
os conceitos de entendimento filosfico do mundo surgiram a partir do smbolo, mas
tambm a religio, o rito e o culto, as artes e os costumes. E porque o processo
formador dos smbolos do inconsciente a fonte do esprito humano, a linguagem -
cuja histria quase idntica a gnese e ao desenvolvimento da conscincia humana - sempre comea como uma linguagem simblica. Quando vivenciamos o
smbolo, simultaneamente vivenciamos o complexo, o arqutipo, a entidade psquica
interior que representada por esse smbolo. Quando a imagem fala, com uma
das nossas prprias vozes interiores.
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Quando respondemos a parte interior invisvel de ns mesmos que escuta e
registra. Ela se coloca diante de ns na forma de figura imaginria.
Em uma abordagem mais contempornea Simo (2004) mostra que os
smbolos so aqueles que no contexto psicoteraputico so solicitados ao paciente
ou que pessoalmente podem ser conhecidos para trazer luz de resoluo de
conflitos e dificuldades. O paciente cria uma representao de um determinado tema
focalizando a sua queixa em sua conscincia. Ao colocar a ateno e percepo em
uma questo especfica, o inconsciente associa com algum smbolo construdo para
tal fim. Aspectos fsicos, emocionais, sensoriais, mentais e comportamentais podem
ser solicitados para a construo destas imagens.
Nos aspectos fsicos exemplos, como dores, queimaes, ardncias,
desvitalizao. Aspectos emocionais: medos, angstias, raivas, rancor, tristezas,
nostalgias. Aspectos comportamentais: fuga, evitao, agressividade, entre outros
(Simo, 2004). Exemplifica: Um indivduo que deseja melhorar sua insegurana frente ao sexo oposto, porm no possui conhecimento do que sente, do que representa tal dificuldade e como pode melhor-la, identifica atravs de um desenho proposto pelo terapeuta uma forma simblica de falar sobre sua dificuldade, expressando um garoto acuado em um canto de uma sala com um monstro enorme que vai devor-lo. Neste momento ao identificar e reconhecer o medo, o terapeuta facilita o desenvolvimento de recursos saudveis de enfrentamento e resignificao, realizando pontes com elaboraes de aprendizagens feitas no passado e idealizao de novos comportamentos mais funcionais e adaptativos para o futuro (Simo, 2004).
Novamente podemos perceber aqui as possibilidades de resignificao e
redirecionamento das imagens como recurso teraputico eficaz.
31
2.5 - A imagem como arqutipo
Em grego, arche significa "o primeiro" e typos significa arca", "cunho" ou
"modelo". Os arqutipos psicolgicos demonstram ento os "modelos iniciais" pr-
existentes que formam o esboo fundamental dos principais componentes
dinmicos da personalidade humana. No sentido real, quando olhamos para estes
tipos, percebemos que so eles, combinados, que nos tornam humanamente
identificveis. So inatos em ns; parte de nossa herana como membros da raa
humana (Johnson, 2003). O termo arqutipo" vem do tempo de Philo Judaeus, com referncia Imago
Dei (imagem divina) no homem. Pode tambm ser encontrado em Irinaeus quando diz: "O criador do mundo no formou estas coisas diretamente de si mesmo, mas as
copiou de arqutipos exteriores.
Como est implcito na prpria palavra, os arqutipos se relacionam aos tipos,
no sentido de um trao caracterstico da personalidade ou de um conjunto de
qualidades que parecem surgir juntas e que se repetem espontaneamente em modelos identificveis.
A idia dos arqutipos antiga. Est relacionada com o conceito de Plato
acerca das formas ideais - padres j existentes na mente divina que determinam de
que forma o mundo material passar a existir. Mas devemos a Jung o conceito dos
arqutipos quando em 1919, Jung faz uso pela primeira vez do termo arqutipo, a
fim de evitar qualquer sugesto de que era o contedo, no esboo ou padro
inconsciente e irrepresentvel, que era fundamental. Jung examinara grande parte
de seus sonhos e encontrara em muitos deles uma particularidade que os distinguia
dos outros sonhos (Jung, 1984).
32
(...) Esta particularidade est presente tambm nos sonhos do processo de individuao. Estes sonhos contm os chamados motivos mitolgicos ou mitologemas, que chamei de arqutipos. Este termo designa formas especficas e grupos de imagens que se encontram, sob formas coincidentes, no s em todas as pocas e em todas as latitudes, mas tambm nos sonhos individuais, nas fantasias, nas vises e nas ideias delirantes. Tanto sua apario frequente nos casos individuais como sua ubiqidade tnica provam que alma humana singular, subjetiva e pessoal apenas por um lado, mas coletiva e objetva quanto ao mais (Jung, 1984).
E a partir da teoria dos arqutipos tece sua viso sobre o inconsciente
coletivo: o que lhe aparece na viso, com efeito uma imagem do inconsciente
coletivo, a saber, da estrutura inata e peculiar dessa psique que constitui a matriz e a
conduo prvia da conscincia (Jung, 1975). Para ele as influncias decisivas emanam do inconsciente
independentemente da tradio garantem a cada ser uma semelhana e at uma
uniformidade de experincia e tambm do modo pelo qual representada
imaginativamente. Uma das principais provas deste fato o paralelismo quase
universal entre os temas mitolgicos, os quais, de acordo com sua condio de
imagens primordiais, ele denomina de arqutipos.
Justifica que, para nossos propsitos, este termo conveniente e til
porque nos diz que estamos tratando com tipos arcaicos ou - melhor dizendo -
primordiais, isto , imagens universais que existem desde os tempos mais remotos.
Essas imagens coletivas facilitariam seu uso teraputico em trabalho de grupos que
apresentassem uma mesma temtica de abordagem. Mas, sob outro ngulo de
anlise, poderia justificar e suprir as Terapias de Imagens Mentais em sua
proposio com imagens arquetpicas de patologias, trabalhadas a partir de imagens
coletivas, como na abordagem da Tireoidite de Hashimoto num exerccio como o da
imaginao diretiva, onde a figura (smbolo) de uma tireide normal e a figura
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(smbolo) de uma tireide afetada por um processo auto-imune com a formao de anticorpos, simbolizados universalmente por bidentes, como citado na trajetria pessoal (vide introduo). Nada mais significa que a representao arquetpica dessa patologia para a elaborao de estratgias na tentativa de buscarem-se
melhores resultados.
De acordo com Glikin (2001) os arqutipos podem ser considerados ligando o corpo (instintos) e a psique (imagem). Instintos e imagens possuem a mesma raiz psicide. Quando Jung aplicava a noo de arqutipo ao inconsciente psicide, o elo
psquico/orgnico era expresso na forma de uma conexo mente/corpo. Um
arqutipo pode ser representado como um espectro, estendendo-se de um plo
instintivo, fisiolgico, para um plo espiritual ou imagtico. O arqutipo abarca os
dois plos e pode ser experimentado e apreendido atravs de um ou de outro. As
abordagens biolgicas ou etiolgicas do arqutipo so um extremo e no outro
extremo esto as abordagens mitolgicas ou imaginais. Observamos aqui a ntima
relao entre a imagem e sua capacidade em gerar estmulos fisiolgicos instintivos.
Poderamos gerar ento, estmulos fisiolgicos positivos para o bom funcionamento
de nosso corpo humano e, at mesmo, buscar o equilbrio desses estmulos.
De acordo com Jonhson (1989) uma vez que os arqutipos so universais, estariam eles todos presentes no inconsciente de cada um. Mas eles se combinam
em variaes infinitas para criar a psique individual humana. Podemos compar-los
com o corpo humano fsico. De muitas formas, nossos corpos so semelhantes aos
demais.
Temos braos, pernas, corao, fgado e pele, de um ou outro feitio. So
caractersticas universais da espcie humana. Entretanto, se comparo minhas
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impresses digitais ou fios de meu cabelo com os de outras pessoas, percebo que
dois corpos humanos no so exatamente iguais.
Nesse processo de combinao surge o processo de individuao. Da mesma
forma as energias e as capacidades psicolgicas universais, na raa humana, esto
combinadas diferentemente em cada um de ns, cada pessoa tem uma estrutura
psicolgica distinta. s pela vivncia desta estrutura inerente que descobrimos o
que significa ser um indivduo.
Se trabalharmos na individuao comea-se a perceber a diferena entre as
idias e os valores que vm de nosso self e as opinies que absorvemos do mundo
nossa volta (arquetpicas). Podemos parar de ser mero apndice da sociedade,
pessoas estereotipadas: aprendemos que temos nossos prprios valores, nossa
prpria maneira de viver, que procedem naturalmente de nossas naturezas inatas.
Analisando-se esse processo de individuao aplicado as imagens mentais,
podemos, como exemplo, citar o caso da introduo (vide trajetria pessoal) em que
a individuao do paciente comentado, uma mulher portadora de Tireoidite de
Hashimoto, faz em seu exerccio de Imaginao Dirigida, uma individualizao da
tcnica, quando cria um rato para poder destacar tais anticorpos, produzidos na
tireoidite, onde a proposta inicial era a de que ela mesma destacasse anticorpo por
anticorpo.
Desenvolve-se um grande senso de segurana nesse processo de
individuao. Comeamos a entender que no necessrio lutar para sermos iguais
a outrem, pois sermos ns mesmos a base mais firme em que podemos nos
apoiar. Percebemos que conhecer-nos a ns mesmos completamente e desenvolver
todas as foras que esto dentro de ns uma tarefa para a vida inteira. No
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precisamos imitar a vida de ningum. No precisamos de outras pretenses, pois o
que j temos a riqueza suficiente e bem mais do que jamais esperamos.
2.6 - A imagem como mitologia coletiva
Estas imagens primitivas pertencem, na verdade, humanidade em geral e
podem reaparecer em qualquer cabea de modo "autctone", independentes do
tempo e do espao. Para seu renascimento necessitam apenas de circunstncias
propcias onde poderemos acess-las em nosso contedo inconsciente, fazendo-as
imergir para o consciente para sua elaborao, interpretao e uso .
O momento mais oportuno para isso sempre quando uma viso do mundo
desmorona e arrasta consigo todas aquelas formas e estruturas que outrora valiam
como resposta definitiva para todos os grandes enigmas da vida e do mundo. Isto,
alis, corresponde inteiramente regra psicolgica. Quando todos os deuses
desenraizados se recolhem para cair sobre o homem fazendo-o exclamar Ipse
philosophus, daemon. heros, deus et omnia (Ele mesmo filsofo, gnio, heri, deus e tudo o mais), e quando uma religio que glorifica o esprito comea a desaparecer, ento surgir em seu lugar, bem no fundo da alma uma imagem primitiva da matria
criadora (Jung, 1985). Demonstra-se aqui a possibilidade de se trabalhar com o ciclo criador da
imagem como uma fonte inesgotvel do indivduo de sempre estar mudando,
evoluindo, aprendendo e se equilibrando.
Glikin (2001) disserta sobre o reconhecimento por Jung da existncia de um profundo reservatrio de imagens irrepresentveis chamadas arqutipos na psique,
sua definio de smbolo como a melhor expresso possvel de um fato com
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significao at ento no revelado, sua insistncia em que a interpretao deveria
permanecer fiel e to prxima quanto possvel da imagem onrica, sua aproximao
do funcionamento psquico do self com uma imagem de Deus e sua afirmao de
que, o significado, antes que o tratamento, que alivia o sofrimento induzido por
uma neurose. Tudo isso est baseado na suposio de que a psique raciocina
imageticamente e de que o equivalente racional mais prximo a analogia ou a
metfora.
Para exemplificar essa analogia Johnson (2003) demonstra que nos sonhos e mitos a mente consciente frequentemente simbolizada por uma ilha. Como os
habitantes de uma ilha, dentro do seu ambiente isolado, o ego constri um pequeno
mundo todo seu - um sistema de regras e um conjunto de suposies acerca da realidade. O ego no percebe que, alm dos limites de suas ilhotas, fora do estreito
campo de sua viso, existe um universo inteiro de realidades e verdades contido no
vasto mar do inconsciente que ele no consegue perceber.
No fundo deste oceano invisvel de energia, imensas foras esto
trabalhando. Reinos mticos, simbolizados pelas lendas da Atlntida, existem l, nas
profundezas e desenvolvem vidas paralelas vida cotidiana de nossa mente
consciente. Centros de conscincia alternativa, de atitudes, idias e valores
alternativos, l esto como outras ilhas no grande mar. Esperam ser descobertos e
reconhecidos pela mente consciente em sua busca do desconhecido.
Se trabalhadas voluntariamente o reconhecimento pela mente consciente
pode trazer a tona recursos psquicos inesgotveis.
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2.7 - A imaginao ativa
Como o prprio nome diz, a imaginao ativa implica em tudo, menos seguir
passivamente a fantasia. Pelo contrrio, Jung (1975) sempre faz questo de frisar este ponto, o que distingue a imaginao ativa do mero devaneio que, neste
ltimo, a conscincia desempenha um papel passivo, deixando as imagens se
desenrolar livremente, ao passo que, na imaginao ativa, a conscincia dialoga
com as imagens, seja literalmente, conversando com os personagens que emergem do inconsciente, seja interagindo com as cenas. Jung bastante enftico ao dizer que somente essa interao faz com que a conscincia se amplie, integrando os
contedos arquetpicos.
Simplesmente registrar qualquer fantasia mental no conduziria a qualquer
resultado digno de ser analisado que dir a uma transformao to radical da
conscincia quanto a que preconizada por alquimistas e magos.
Jung utiliza o termo imaginao ativa pela primeira vez em 1935 para
descrever um processo de "sonhar com os olhos abertos", em sua obra, Tipos Psico-
lgicos. Mostra um paralelo das emoes e as imagens que nela se ocultam e a
importancia de torn-las conscientes:
Na medida em que conseguia traduzir as emoes em imagens, isto , ao
encontrar as imagens que se ocultavam nas emoes, eu readquiria a paz interior.
Se tivesse permanecido no plano da emoo, possivelmente eu teria sido dilacerado
pelos contedos do inconsciente. Ou, talvez, se os tivesse reprimido, seria
fatalmente vtima de uma neurose e os contedos do inconsciente destruir-me-iam
do mesmo modo. Minha experincia ensinou-me o quanto salutar, do ponto de
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vista teraputico, tornar conscientes as imagens que residem por detrs das
emoes (Jung, 1975). Em nossa proposta das Terapias de Imagens Mentais como recurso
teraputico, o tornar consciente as imagens, seria descobrir os vrios sentidos que
essas imagens traduzem e trabalhar com as emoes contidas nelas de uma
maneira positiva, antes que possam emergir delas contedos reprimidos ou mal
direcionados. Quanto mais o indivduo se concentra em tomo de seus contedos -
este um fato psicolgico indiscutvel - tais contedos so vivificados, iluminados
como que a partir de dentro e por assim dizer convertidos numa espcie de
realidade substitutiva. Na psicologia analtica ns nos utilizamos metodologicamente
deste fenmeno. Denominei a este mtodo de "imaginao ativa". Incio de Loyola
utilizou-se tambm da imaginao ativa em seus exerccios (Jung, 1991).
H indcios seguros de que a filosofia alquimista faz emprego de semelhante
processo (Jung, 1986). Jung se apresenta aqui como crtico do mtodo redutivo freudiano que
procura revelar as bases ou razes primitivas, instintivas, infantis da motivao
psicolgica. Considera que desse modo o significado pleno do produto inconsciente,
sintoma, sonho, imagem, lapso de fala, no desvendado. Ligando um produto
inconsciente ao passado, seu valor presente para o indivduo pode se perder. Uma
outra objeo a tendncia em supersimplificar atravs da reduo, omitindo o que ele via como implicaes mais profundas.
O homem satisfaz necessidade da expresso mtica quando possui uma
representao que explique suficientemente o sentido da existncia humana no
cosmos, representao que provm da totalidade da alma, isto , da cooperao do
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consciente e do inconsciente. A carncia do sentido impede a plenitude da vida e
significa, portanto, doena (Jung, 1975). J Johnson (2003) descreve que, por causa da noo popular de que a
imaginao fictcia, muitas pessoas reagem automaticamente achando que tal
experincia com a imaginao no tem qualquer sentido. Elas pensam: "Estarei
somente conversando comigo mesmo". Mas, se trabalhamos com a imaginao
ativa, logo confirmamos que dialogamos com partes interiores, verdadeiras, de ns
mesmos. Ns nos confrontamos com personalidades poderosas que vivem
dentro de ns, ao nvel inconsciente, e que esto, comumente, em conflito com
nossas idias e comportamento conscientes. Entramos de fato na dinmica do
inconsciente: viajamos por uma regio aonde a mente consciente no sabia como penetrar.
A imaginao ativa , em si, um mtodo de assimilao de contedos do
inconsciente (sonhos, fantasias, etc.) onde estes se investem espontaneamente atravs de uma forma de auto-expresso nas vrias personificaes (pessoas
conhecidas e desconhecidas, animais, plantas, lugares, acontecimentos). E como define Johnson (2003):
(...) um dilogo que travamos com as diferentes partes de ns mesmos que vivem no inconsciente. Ela consiste em relacionarmo-nos com nossos sentimentos, pensamentos, atitudes e emoes atravs dos vrios personagens que aparecem em nossos sonhos e interagir ativamente com eles, isto , discordando, quando for o caso, opinando, questionando e at tomando providncias com relao ao que tratado, isso tudo pela imaginao (Johnson, 2003).
Esse relacionamento e essa interao ativa fazem da imaginao ativa uma
proposta teraputica mpar, no que diz respeito aos recursos por ela apresentadas.
Para Johnson (2003) na Imaginao Ativa no estou exatamente "falando comigo
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mesmo", mas sim conversando com uma das minhas personalidades. Nessa troca
entre o ego e as vrias personalidades que afloram do inconsciente e aparecem na
imaginao que comeo a juntar as peas fragmentadas de mim mesmo em uma
unidade.
Comeo a conhecer as partes de mim mesmo que nunca conheci antes e
com elas comeo tambm a aprender. Aprender a lidar com nossos conflitos
internos e reconhec-los como autnticos e resultantes de um ego, ora fragmentado,
ora reconstitudo pelo aprendizado constante desse exerccio.
O objeto da imaginao ativa dar voz aos lados da personalidade (em particular ao animus/anima e a sombra) que normalmente no so ouvidos, estabelecendo assim uma linha de comunicao entre a conscincia e o
inconsciente.
De acordo com Raff (2000) durante o exerccio da imaginao ativa o ego experimenta contedos do inconsciente que podem assumir a forma de uma
imagem, voz, emoo ou mesmo sensao fsica. Tendo concentrado sua ateno
no inconsciente o ego deve abdicar de todo pensamento crtico e estar aberto a
qualquer coisa que aquele apresente. Estando receptivo ele deixa que o
inconsciente se manifeste. O ego trabalha a imagem que percebe a voz que ouve ou
aquilo que se sente, expressando tal manifestao da maneira mais completa
possvel.
O 'Eu' precisa entrar no ato imaginativo to intensamente quanto o faria se
estivesse numa experincia exterior, fsica. Embora seja uma experincia simblica, , mesmo assim, uma experincia verdadeira que envolve sentimentos verdadeiros
e gera sensaes tambm verdadeiras. A habilidade de ver e perceber a figura
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interior combinada com a capacidade de ouvi-la colocar o indivduo em posio de
realizar um trabalho bem profundo de imaginao ativa.
Johnson (2003) alega que os eventos se sucedem em um ponto de confluncia entre o consciente e o inconsciente, caminhando um para o outro como
dois rios que se fundem.
(...) praticamente impossvel produzir qualquer coisa na imaginao que no seja uma representao autntica de alguma coisa do inconsciente. A
funo integral da imaginao trazer o material do inconsciente, vesti-lo com imagens e transmiti-lo mente consciente. (...) Mesmo que uma pessoa seja leviana e, deliberadamente, tenta inventar algo, forjar alguma coisa boba e estpida, imaginar uma mera fico, o material que vem atravs da imaginao ainda representa alguma parte escondida desse indivduo (Johnson, 2003).
Vestir essas imagens com um contedo consciente pode trazer-nos a
possibilidade de elaborar em cima dessas imagens mecanismos de equilbrio
neurovegetativo e , por conseguinte, processos de resoluo de patologias onde o
psiquismo impera.
E sabemos que as imagens mentais tm uma funo importante dentro da
dinmica psquica, independentemente das consideraes tericas que as validam
ou fundamentam como fenomenos mentais, como demonstra Kast (1997): Sendo a imaginao uma habilidade humana fundamental para o proces-samento de informaes e. assim, tambm uma possibilidade de orientao, de sentir e de lidar com emoes, acredito que essa tcnica deva ser relevada em toda e qualquer prtica teraputica, ou melhor, em todo trabalho teraputico que tenha por objetivo deixar as pessoas mais autnticas e mais autnomas, aproxim-las de seus inconscientes e das pessoas com quem vivem e, por fim. ensin-las a lidar consigo e com o mundo de forma mais emptica e criativa (Kast, 1997).
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A imaginao torna-se ento uma possibilidade de terapeutizao onde os
contedos trabalhados so originariamente do indivduo e representam a explorao
dos contigentes do inconsciente em seu processo de individuao onde o indivduo
aprende com seus prprios mecanismos e, portanto, aprende a se conhecer e toda a
fisiologia que acompanha esse conhecimento para seu equilbrio Esse auto-
conhecimento oferece a possibilidade de trabalho com as imagens mentais na busca
de um equilbrio psquico e fsico, proposta desse estudo bibliogrfico.
Johnson (2003) relata que a raiz da palavra imaginao a palavra latina imago, que quer dizer "imagem"; a imaginao a capacidade formadora de
imagens da mente, o rgo que tem o poder de vestir os seres do mundo interior
com imagens mentais para que possamos v-los. A imaginao gera os smbolos
que o inconsciente usa para se expressar.
Glikin (2001) cita que as imagens mentais tm uma plasticidade muito grande dentro da vida psquica e devem cumprir uma funo muito importante na medida
em que podemos dizer que participam de muitos processos psquicos e que
interferem definitivamente no comportamento e nas atitudes. As imagens parecem
ter vida prpria e reconhecemos que em grande parte os rumos dos seus
movimentos so determinados pelo inconsciente, inclusive revelia da conscincia e
fora do mbito do seu controle. As imagens mentais so um tipo de pensamento
usado para fazermos contato com nossa realidade subjetiva interna, como j citado anteriormente.
Em sua abordagem Jung (1975) utiliza-se desse contedo das imagens do universo onrico j como uma possibilidade de enfrentamento e racionalizao do
inconsciente, ao invs de deix-las suscitarem como efeitos negativos deste mesmo
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inconsciente. Mais uma vez, a Terapia de Imagens Mentais demonstra seus
benefcios nos processos psicoterpicos.
Epstein (1990) sustenta que os efeitos fsicos benficos das imagens mentais so como os dois lados de um espelho ao qual chama de corpo, e que esse
problema deriva da dicotomia corpo/mente ocorrido desde a era cartesiana at os
dias de hoje. Reconhece que a medicina ocidental tem comeado a explorar conexo entre a mente e o corpo, citando a medicina comportamentalista e a
psiconeuroimunologia, como exemplos, juntamente com os trabalhos de hipnose que mostram diretamente o impacto do mental no fsico.
Ressalta que a medicina ocidental aceita sem problemas a ao do fsico
sobre o mental, utilizando amplamente essa conexo atravs de todo tipo de
tranquilizantes, antidepressivos e anestsicos (via corpo-mente). Considera como lgico que, aceitando o poder do corpo sobre a mente seria
bvio aceitar o inverso, que o poder mental tal como a vontade ou as imagens,
podem afetar o corpo ( via mente-corpo). Da, porque no aceitar os benefcios do trabalho com as imagens na melhoria de certas disfunes fisiopatolgicas, por
vezes freqentemente observados nos processos de psicossomatizao?
E prope j que considera que a pesquisa cientfica ainda no examinou o fenmeno de cura de forma minuciosa e metdica e que nem definio de sade e
doena foram estabelecidas de forma concreta que poderamos nos valer de nossas
prprias experincias clnicas, de nossas prprias vidas e dos ensinamentos de
outras culturas para compreender o processo de criao de imagens. O trabalho
com imagens se daria fora do mbito mecanicista de causa e efeito porque ele
realizado no "eixo vertical" que o universo humano diferente do universo da fsica,
j que um mundo fsico, emocional e psicologicamente criado por ns.
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Epstein (1990) conclui que o trabalho com imagens sempre tende a colocar as pessoas sobre o eixo vertical, o qual isento de gravidade permite a pessoa
escapar s restries comuns da vida presa a terra, desatando as amarras e
derrubando as couraas que no nos deixam enxergar nosso potencial de se curar
pelo nosso processo de auto-conhecimento.
O modo como funciona o imaginrio mental pode ser entendido atravs de uma analogia cientifica. As clulas no corpo tm um potencial eltrico e elas oscilam em vrias frequncias. Estas frequncias eltricas so invisveis, mas para o olho nu so visveis em forma de cores. As cores diferentes, portanto, representam a presena de luz permitindo que o invisvel seja visto. Todas as clulas do corpo emitem luz, um reflexo de suas vibraes oscilatrias. Uma mudana na frequncia oscilatria das clulas produz uma mudana na luz -esta fica presa na clula e no consegue ser emitida. Quando a frequncia oscilatria perturbada pode ser regulada novamente e a razo vibracional pode ser equilibrada, o resultado o funcionamento de uma clula sadia. Esta a hiptese de trabalho para o campo da medicina vibracional ou eltrica que agora est surgindo nos Estados Unidos (Epstein, 1998).
Epstein (1990) define que o modelo para a funo curativa "tornar-se inteiro". E localiza-o no mito de Osiris, que depois de assassinado foi desmembrado
e voltou vida quando sua mulher sis recomps seus pedaos.
Esse "rememorar" significa, para ele, literalmente, reconectar um pedao
corpo ao outro. O corpo significando o fsico, o mental e o emocional unidos. O fim
da dicotomia da era cartesiana mente-corpo para o incio de uma nova era de
conscientizao de nossos prprios recursos interiores, atravs dessa leitura
simblica das imagens que emergem de nosso inconsciente, vestindo-as com
contedos e significados conscientes em prol de nossa sade e integridade fsica ,
mental e emocional.
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Para ele, cada parte do corpo fsico tem sua contrapartida emocional. Ao nos
darmos conta dessa inter-relao, ampliamos o contexto dentro do qual iremos lidar
com nossos corpos. Isso significa que cada sintoma ou sndrome tem uma fonte
para a qu