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1 ALEXANDRE SANTANA HILEL AS TERAPIAS DE IMAGENS MENTAIS COMO RECURSO TERAP˚UTICO COMPLEMENTAR NA TIREOIDITE DE HASHIMOTO UM ESTUDO BIBLIOGR`FICO Dissertaªo apresentada a Banca Examinadora da Pontifcia Universidade Catlica de Sªo Paulo, como exigŒncia parcial para obtenªo do ttulo de MESTRE em Psicologia Clnica na Ærea de PsicossomÆtica e Psicologia Hospitalar sob orientaªo da Prof“. Dr“. Marlise A. Bassani PUC Sªo Paulo 2008

As Terapias de Imagens Mentais Como Recurso Terapeutico Complementar Na Tiroidite de Hashimoto

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Comentário sobre a utilização de terapia por imagens mentais como complemento terapeutico

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    ALEXANDRE SANTANA HILEL

    AS TERAPIAS DE IMAGENS MENTAIS COMO RECURSO TERAPUTICO COMPLEMENTAR NA TIREOIDITE DE HASHIMOTO

    UM ESTUDO BIBLIOGRFICO

    Dissertao apresentada a Banca Examinadora da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, como exigncia parcial para obteno do ttulo de MESTRE em Psicologia Clnica na rea de Psicossomtica e Psicologia Hospitalar sob orientao da Prof. Dr. Marlise A. Bassani

    PUC So Paulo

    2008

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    DEDICATRIA

    Qualquer maneira de amor vale a pena

    Qualquer maneira de amor valer!

    A minha querida me que sempre me incentivou nos caminhos do saber.

    A minha psicanalista Tnia Veiga Judar que tentou resignificar minhas somatizaes durante todo este processo e, em parte, conseguiu.

    A minha equipe de trabalho que na reta final me apoiou de diversas maneiras.

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    AGRADECIMENTOS

    Agradeo a todos os mestres, em especial ao Prof. Dr. Esdras Guerreiro

    Vasconcellos, cuja contribuio e iniciao neuro-cincias foram bastante incentivadoras. A Prof. Dr. Edna Peter Kahhale que no processo final mostrou sua

    cincia e tolerncia na metodologia deste trabalho. A Prof. Dr Mathilde Neder, um

    exemplo de vida e aprendizado e a . A Prof. Dr. Marlise Aparecida Bassani, pela

    sua pacincia e dedicao nesta reta final.

    Ao meu colega Fernando Maeda que sempre me apoiou em minhas incertezas e a

    todos os colegas de Mestrado que creditaram voto de confiana a esta Dissertao.

  • 4

    RESUMO

    Alexandre Santana Hilel: As Terapias de Imagens Mentais como recurso teraputico complementar na Tireoidite de Hashimoto um estudo bibliogrfico, 2008 Orientadora: Prof. Dr. Marlise A. Bassani Palavras-chaves: Imaginao; Mente-Corpo e Tcnicas de Relaxamento; Terapia Comportamental; Doena de Hashimoto; Auto-anticorpos; Aspectos Psicossomticos.

    Esta pesquisa enfoca um estudo bibliogrfico das Terapias de Imagens Mentais como uma proposta teraputica para abordagem da Tireoidite de Hashimoto. Teve sua origem atravs da observao emprica de resultados da atuao clinica do pesquisador, usando-se a imaginao dirigida na diminuio da contagem laboratorial de auto-anticorpos presentes na tireoidite. O presente trabalho organizado em um captulo de apresentao da Tireoidite de Hashimoto em seus aspectos prevalncia, fisiopatologia, diagnstico e quadro clnico. No captulo seguinte, enfoca-se a Terapia de Imagens Mentais, quanto a: histrico, definio, smbolos, arqutipos, mitologia coletiva, Imaginao Ativa, imaginao como tcnica diretiva. Aps, procedeu-se ao primeiro estudo bibliogrfico da Tireoidite de Hashimoto enfocando fatores etiolgicos, tratamentos existentes e prognstico, que demonstrou escassez de opes teraputicas frente inexistncia de um fator etiolgico especfico para a sua disfuno auto-imune. Utilizou-se o banco de dados Medline, Pubmed e Lilacs, no perodo entre 1997 a 2007. Um segundo estudo bibliogrfico foi feito, abordando as Terapias de Imagens Mentais, sem corte temporal definido para seu levantamento bibliogrfico, desde Jung at a atualidade, pesquisando-se sua aplicao em fenmenos laboratoriais e sua utilizao em pesquisas na rea da sade. Os resultados apontam para uma lacuna existente entre os fatores causais da

    Tireoidite de Hashimoto e os tratamentos existentes. Na terapia das imagens verifica-se que o emprego de tais tcnicas se torna mais presente, a partir do ano de 2000, com suas aplicaes em algumas reas da sade, em especial naquelas patologias que, como a Tireoidite de Hashimoto, no tem fator etiolgico definido, tais como a fibromialgia. Discutem-se os resultados, assinalando que, em se tratando da Tireoidite de Hashimoto, no existem trabalhos dessa natureza, mas cruzando-se os dados de aplicabilidade das Terapias de Imagens Mentais nas patologias estudadas, verifica-se a possibilidade de aplicao teraputica das mesmas terapias a essa patologia.

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    ABSTRACT

    Alexandre Santana Hilel: Imagetherapy as a complementar therapeutical resource in Hashimotos Thyroiditis- a bibliografic study, 2008 Orientadora: Prof. Dr. Marlise A. Bassani Key-words: Imagery, Mind-Body and Relaxation Techniques, Behavior Therapy; Hashimotos Disease; Antibodies; Psycossomatics Aspects.

    This research focused a bibliographic study of Imagetherapy as a therapeutic proposal to broach Hashimoto's disease. It has a start point in the results of a empirical noticed in the researcher clinical atuation, using directed imagination in a intention to low laboratorial score of auto--antibodies standed in auto-immune thyroiditis. This research has been organized in one presentation chapter oh Hashimoto's disease in her features: incidence, physiophatology, diagnosis and clinical board. In the following chapter, Imagetherapy is focused as heir history, definition, symbols, archetypes, collective mythology, active imagination, imagination as a directive technique. After, it is conducted to first bibliography study of Hashimoto's disease focusing ethyological factors, existing treatments and prognosis, that explain lack of therapeutical options in front of a nonexistence of specific ethyological factor to this auto-immune disfunction. It was applied Medline, Pubmed and Lilacs database, in a period between 1997 until 2007. A second bibliography research is done, boarding Imagetherapy, without a temporal section, since Jung until the present time, searching for her aplication in laboratorials phenomenons and her use in health research. The results shows for one hiatus that exist between ethyological factors of Hashimoto's disease and existing treatments. About Imagetherapy, it is verified that the use of these techniques become more present since 2000, with their applications in some health areas, in special on the pathologies that, as a Hashimotos disease, doesnt have ethyologicals factors defined, as a fybromialgia. The results are discussed, focusing that, about Hashimotos disease there arent researches envolving Imagetherapy, but crossing databases of applicability of other pathologies, verifies the possibility of therapeutical application of these same therapies in Hashimotos disease.

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    SUMRIO

    I - INTRODUO.......................................................................................................................1

    1. Trajetria Pessoal......................................................................................................2 2. Objetivos.....................................................................................................................7 Captulo 1 - Tireoidite de Hashimoto: a patologia em questo....................................8

    1.1 Prevalncia.......................................................................................9

    1. 2 Fisiopatologia................................................................................10

    1.3 Diagnstico...................................................................................12

    1.4. Quadro clnico (sinais e sintomas).................................................13 1.4.1 Sintomas psiquitricos.................................................................14

    1.4.2 Sinais e sintomas fsicos..............................................................17

    Captulo 2 - A Terapia de Imagens Mentais...............................................................18

    2.1 - Histrico do uso das imagens mentais.........................................18

    2.2 - Imagens mentais definio.......................................................21

    2.3 - Emoes, sensaes, sentimentos e imaginao.......................25

    2.4 - A imagem como smbolo..............................................................29

    2.5 - A imagem como arqutipo............................................................31

    2.6 - A imagem como mitologia coletiva...............................................35

    2.7 - A imaginao ativa........................................................................37

    2.8 - A Imaginao como tcnica diretiva.............................................47

    II - MTODO...........................................................................................................51

    III - ESTUDO BIBLIOGRAFICO I: PROVVEIS FATORES ETIOLGICOS DA

    TIREOIDITE DE HASHIMOTO...................................................................................53

    3.1 - Ingesto de iodo............................................................................53

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    3.2 - Intoxicao medicamentosa.........................................................55

    3.3 - Imunogentica..............................................................................55

    3.4 - Imunopatogenia............................................................................57

    3.5 - Transtornos psquicos e sua relao etiopatognica na Tireoidite

    de Hashimoto........................................................................................58

    3.6 - Tratamento convencional..............................................................61

    3.7 - Prognstico...................................................................................66

    IV - ESTUDO BIBLIOGRFICO II: A TERAPIA DE IMAGENS MENTAIS E SUAS

    APLICAES.............................................................................................................68

    4.1 - A Terapia das Imagens Mentais e sua aplicao em fenmenos

    corporais...............................................................................................68

    4.2 - A Terapia das Imagens Mentais e sua aplicabilidade em outras

    patologias..............................................................................................75

    V - DISCUSSO......................................................................................................83

    VI - CONCLUSES..................................................................................................88

    VII - REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS...................................................................90

  • 1

    I INTRODUO

    A idia de um estudo bibliogrfico acerca de a Tireoidite de Hashimoto deve-

    se a observao de vrios casos clnicos tratados empiricamente em minha atuao

    clnica com a Terapia de Imagens Mentais em seus recursos e aplicaes nos

    ltimos 11 anos.

    Na minha concepo a Terapia de Imagens Mentais surge como tcnica de

    forma a complementar o tratamento convencional de reposio com hormonioterapia

    sinttica em pacientes que apresentavam sintomas residuais de disfuno glandular

    e insatisfao teraputica.

    Inicialmente meu conhecimento sobre os fundamentos das terapias de

    Imagens Mentais era mnimo. Mas, necessitava criar recursos para que a patologia

    de Tireoidite de Hashimoto fosse abordada em seu aspecto psquico. Parti, ento,

    do pressuposto de que, no segmento neurolgico, endocrinolgico e imunolgico,

    diversas dvidas ainda pairam sobre o comportamento desta patologia, mediante

    falta de fator etiolgico definido.

    Na abordagem psquica da tireoidite pouco se sabe sobre o comportamento

    dessa doena nem dos provveis fatores emocionais envolvidos.

    Foi realizada uma introduo referente ao que a Tireoidite de Hashimoto:

    fisiopatologia, diagnstico e quadro clnico. Depois disso, abordamos a Terapia das

    Imagens Mentais em seu histrico e definio.

    Em seguida, realizamos um estudo bibliogrfico sobre os fatores etiolgicos

    provveis da Tireoidite de Hashimoto com o tratamento convencional e o prognstico

    no intuito de investigar: a) a falta de um diagnstico preciso do mecanismo auto-imune desta doena; b) os poucos recursos teraputicos existentes; c) o tratamento

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    da Tireoidite de Hashimoto ser focado em sua disfuno glandular (o hipotireoidismo), no em seu fator causal ou fisiopatologia inflamatria.

    Posteriormente foi apresentado o estudo bibliogrfico das terapias de

    Imagens Mentais como uma possibilidade teraputica de abordagem psquica.

    Discutiu-se os resultados dos estudos bibliogrficos estabelecendo-se uma relao

    entre a Tireoidite de Hashimoto e seus mecanismos etiolgicos propostos de forma a

    relacionar o diagnstico pouco preciso com os tratamentos existentes e o

    prognstico.

    As Terapias de Imagens Mentais foram apresentadas como possibilidade

    teraputica complementar na abordagem da Tireoidite de Hashimoto a partir das

    pesquisas existentes com essa tcnica e observaes de sua atuao no eixo psico-

    neuro-endcrino-imunolgico e patologias correlatas.

    1 Trajetria Pessoal

    Em minha atuao mdica, na dcada de 1990 recebia em meu consultrio

    muitos casos clnicos diagnosticados previamente como hipotireoidismo, valendo-me

    aqui da observao de que, tanto o hipotireoidismo (hipofuno da glndula tireide)

    como o hipertireoidismo (hiperfuno da mesma glndula) no significa um diagnstico de uma patologia definida e sim apenas uma disfuno glandular. Ou

    seja, tanto para o hipo como para o hiper existem numerosas patologias que podem gerar essa disfuno, como por exemplo, a doena de Graves, o

    hipertireoidismo primrio, a tireotoxicose, o hipotireoidismo primrio (hipofuno

    direta da tireide) ou o secundrio (hipofuno por falta de estmulo via hipfise por

    baixa do TSH hormnio tireo-estimulante) e a Tireoidite de Hashimoto que, como

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    veremos, pode em sua fase inicial gerar um padro hiperestimulatrio

    (hipertireideo), mas que sempre evolui para uma hipofuno tireoidiana caracterizada como hipotireoidismo auto-imune.

    A Tireoidite de Hashimoto, por muitas vezes, revelada ao paciente por seu

    mdico como sendo uma hipofuno da tireide por baixa produo, principalmente

    do hormnio T4.

    Tanto na bibliografia consultada quanto na pratica mdica cotidiana parece

    no haver interesse em se avaliar devidamente o processo inflamatrio da Tireoidite

    de Hashimoto como um dos seus fatores patognicos que o processo inflamatrio

    auto-imune e nem sequer os procedimentos propeduticos adequados para que se

    submeta o paciente aos mtodos de diagnsticos de imagem, como o ultras-som da

    tireide, a avaliao laboratorial da contagem dos anticorpos Anti-tireoglobulina e

    Anti-peroxidase que podem ou no confirmar o diagnstico desta patologia auto-

    imune.

    Ainda pude observar em minha experincia clnica que, na maioria dos casos,

    estes indivduos no tiveram uma propedutica investigativa adequada antes de se

    instituir a terapia proposta de reposio sinttica de hormnios tireoidianos e, em

    relao sua eficcia, apresentavam sintomas e sinais residuais da patologia em

    questo, inclusive a observao da permanncia do padro inflamatrio ao ultras-

    som ou um padro de involuo (diminuio volumtrica da glndula) nos casos

    crnicos.

    Ao reavaliar os dados clnicos laboratoriais e diagnsticos de imagem pude

    detectar nestes pacientes o mesmo padro de insatisfao teraputica e alguns

    sintomas residuais, entre eles, a depresso, a desmotivao e o estresse gerado

    pela evoluo da doena.

  • 4

    Chamou-me a ateno, a semelhana dos padres psquicos destes

    indivduos, com alteraes no eixo hipotlamo-hipfise-tireide assim como no eixo

    hipotlamo-hipfise-suprarrenais, de onde surgiam explicaes para os fatores

    estressantes da tireoidite em questo e o comportamento emocional de seus

    portadores.

    Na relao deontolgica criada com meus pacientes durante as avaliaes

    clnicas pude perceber, alm do estresse emocional, o desconhecimento de cada

    paciente sobre o que era tal processo auto-imune da Tireoidite de Hashimoto e de

    como e o por que seu organismo iniciara a produo de auto-anticorpos, fossem

    eles contra a enzima peroxidase (anti-TPO) que permeava a formao do hormnio ativo, o T4, ou contra a protena carreadora que transportava tal hormnio para as

    clulas, a tireoglobulina (anti-tireoglobulina). Tinha em mente que, se um organismo pode criar anticorpos contra seus

    prprios rgos, deveria o mesmo saber o caminho para impedir a evoluo desse

    processo, pois nele havia sido iniciado e gerado at ento.

    Em busca de mecanismos que impedissem a evoluo de tal patologia pude

    ento conhecer as Terapias das Imagens Mentais. Inicialmente, de uma forma

    emprica, comecei com abordagem psquica de alguns desses indivduos, sem

    abandonar o tratamento convencional medicamentoso, que, a meu ver, deixava a

    desejar pelos sintomas residuais que os meus pacientes se queixavam. O primeiro caso da abordagem psquica atravs das Terapias por Imagens

    Mentais se deu com uma paciente do sexo feminino, 45 anos, com queixas residuais

    de alopecia (queda de cabelos), unhas quebradias, pele ressecada, constipao intestinal, reteno hdrica e aumento progressivo de peso, alm de baixa motivao

    profissional e sonolncia durante o dia.

  • 5

    Utilizei-me desses sinais e sintomas residuais como marcadores para

    evoluo do mtodo de tais Terapias de Imagens, j que se constitua nas queixas remanescentes de tal paciente. Mantendo-se a teraputica convencional de

    hormonioterapia sinttica, agreguei exerccios de imagens mentais.

    A esta primeira paciente pedi que, pelo menos uma vez ao dia ela dedicasse

    alguns minutos de seu tempo para iniciar um relaxamento: fosse com msica ou o

    prprio silncio, em um ambiente isolado e sem interferncias e, aps sentir seu

    corpo e mente relaxados, que ela pudesse imaginar a sua glndula tireide em seu

    tamanho e anatomia usual.

    Em seguida, pedi que ela imaginasse um inchao na mesma glndula

    acompanhada pela presena de auto-anticorpos na forma de bidentes grudados

    glndula e que eles eram os causadores desta inflamao. Essas imagens

    propostas foram fornecidas a paciente durante a explicao da tcnica, atravs de

    planilhas de anatomia que consiste numa tireide normal e outra planilha onde a

    tireide encontrava-se aumentada e com a presena de anticorpos representados

    simbolicamente por bidentes. Essa simbologia a mesma empregada pela

    Conveno Internacional na rea cientfica e mdica.

    A partir das imagens propostas pedi que a paciente destacasse ou

    arrancasse anticorpo por anticorpo com as mos em seu exerccio de visualizao

    dirio. O objetivo era fornecer recursos psquicos para o enfrentamento de tal condio auto-imune. Padres visuais de anatomia da tireide e da simbologia

    cientfica universal de bidente dos anticorpos foram fornecidos previamente a esta

    paciente para uso em domiclio.

    Contudo, um fato marcante neste caso clnico foi que, aps sessenta dias de

    exerccio, sendo que o retorno previsto para avaliao clnica seria de quinze dias, a

  • 6

    paciente relatou-me que, por medo de no conseguir praticar o exerccio proposto

    ela criou a imagem de um rato. Essa imagem era a responsvel por ir ao encontro

    de tais anticorpos e com-los vorazmente.

    Na avaliao clnica, melhor do que o relato pela paciente da remisso parcial

    de seus sintomas residuais era a comprovao laboratorial de que seus anticorpos

    do tipo Anti-Peroxidase, medidos anteriormente em torno dos 1.350, haviam baixado

    para valores abaixo dos 400.

    Isso me levou a perceber que dentro das tcnicas de terapias das imagens

    mentais poderamos nos utilizar de imagens do universo onrico do paciente para

    estabelecer diretrizes para os mtodos de emprego de visualizao. Isso facilita

    suas possibilidades de enfrentamento e de melhores resultados e traz tona a

    importncia da imaginao em seus contedos na construo e elaborao das

    Terapias de Imagens Mentais.

    A relao causal na produo desses anticorpos com o padro inflamatrio da

    glndula, sem que houvesse um fator imunolgico definido para esse padro atpico

    da Tireoidite de Hashimoto, fez emergir, em meu senso clnico, as perguntas: 1)

    como um organismo poderia criar anticorpos contra seus prprios rgos ou a

    funo nele contidos?; 2) Estaria esse mau funcionamento imunolgico relacionado

    com contedos inconscientes, j que o sistema imunolgico faz parte de nossos

    mecanismos de autopreservao?.

    Minha busca terica teve incio pelos caminhos da psicanlise, atravs do

    curso de psicanlise transpessoal do Prof. Andr Kepp, no ano de 2000. A incurso

    na pesquisa das doenas e sua relao psico-neuro-endcrino-imunolgica

    prosseguiu com o incio do mestrado no Ncleo de Psicossomtica e Psicologia

  • 7

    Hospitalar, do Programa de Estudos de Ps-Graduao em Psicologia Clnica, da

    PUC-SP.

    2 Objetivos

    O objetivo do presente trabalho, ento, realizar uma reviso bibliogrfica da produo mdica sobre Tireoidite de Hashimoto, a fim de avaliar os provveis

    fatores etiolgicos e analisar os tratamentos propostos. Busca-se determinar a

    lacuna existente entre a bibliografia publicada sobre a etiopatogenia e o tratamento

    da patologia em questo nos ltimos dez anos. Tambm se procura propor as

    Terapias de Imagens Mentais como recurso teraputico na Tireoidite de Hashimoto,

    atravs de imaginao ativa, visualizao dirigida ou tcnicas afins.

    Os objetivos do presente trabalho podem ser sintetizados, como segue: 1) Analisar os fatores etiopatognicos da Tireoidite de Hashimoto sua

    relao com os tratamentos existentes para tal patologia, na literatura

    de 1997 a 2007;

    2) Analisar as Terapias de Imagens Mentais como recursos teraputicos nas patologias do eixo psico-neuro-endcrino-imunolgico.

    A fim de subsidiar a compreenso dos captulos referentes ao estudo

    bibliogrfico foram apresentados os captulos referentes s conceituaes sobre

    Tireoidite de Hashimoto e sobre Terapia de Imagens Mentais.

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    Captulo 1 - Tireoidite de Hashimoto: a patologia em questo

    Em 1912, o mdico japons Hakura Hashimoto descreveu pela primeira vez a

    quatro mulheres na qual a glndula tireide estava aumentada de volume e parecia

    ter-se transformado em tecido linfide, um padro inflamatrio no observado nas

    outras disfunes da tireide, mas comum em certas patologias auto-imunes. Essa

    doena recebeu o nome de Tireoidite de Hashimoto em sua homenagem.

    A doena de Hashimoto ou Tireoidite de Hashimoto atualmente considerada

    como uma das formas de tireoidite crnica auto-imune. Vrias classificaes tm

    sido propostas para a doena auto-imune da tireide (DAIT) que compreende um

    espectro de condies, sendo os dois extremos o hipertireoidismo da doena de

    Graves e o hipotireoidismo auto-imune. No caso desta ltima, duas formas clnicas

    podem ocorrem, com bcio ou sem bcio (tireoidite atrfica), mas ambas

    apresentando o mesmo padro inflamatrio auto-imune.

    A Tireoidite de Hashimoto caracteriza-se por vrios graus de disfuno

    tireoidiana, com a presena de anticorpos circulantes contra antgenos tireoidianos

    e infiltrao da glndula por clulas mononucleares e fibrose.

    Nesta reviso bibliogrfica poderemos notar uma preocupao relevante

    pelos vrios autores que estudam a Tireoidite de Hashimoto em se estabelecer uma

    etiologia provvel para esta patologia partindo-se do pressuposto de que, sendo

    uma doena auto-imune as possibilidades etiolgicas so complexas e ainda pouco

    esclarecedoras do mecanismo auto-imune e, desconhecendo-se o fator causal,

    torna-se mais difcil estabelecer um tratamento direcionado aos aspectos

    inflamatrios auto-imunes provocados pela Tireoidite de Hashimoto e,

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    consequentemente, a obteno de melhores resultados em sua abordagem

    teraputica.

    Dissertaremos, inicialmente, sobre sua incidncia, fisiopatologia, sintomas,

    mtodos de diagnstico para que possamos entender como a Tireoidite de

    Hashimoto abordada na atualidade, no que se refere ao tratamento, podendo

    assim demonstrar-se a lacuna existente entre a falta de um fator etiolgico e um

    tratamento mais especfico e a real abordagem teraputica utilizada, sendo essa

    direcionada a tratar mais a disfuno hipotireoidea da glndula e seus sintomas do

    que o processo fisiopatolgico gerado pelo mecanismo auto-imune da Tireoidite de

    Hashimoto.

    1.1 Prevalncia

    A incidncia maior em mulheres e idosos, sabendo-se que a freqncia dos

    anticorpos chega a 33% em mulheres com 70 anos ou mais. A taxa de

    hipotireoidismo franco e subclnico sete vezes maior em mulheres do que em

    homens e duas vezes maior em brancos do que em negros (Medeiros et al., 2006). A patognese das doenas auto-imunes como a Tireoidite de Hashimoto

    ainda um mistrio. Contudo, consenso geral que fatores tanto genticos quanto

    ambientais e psquicos tm papel importante na expresso da doena, como

    veremos no captulo sobre os fatores etiolgicos.

    Medeiros et al. (2006) demonstra que, nos ltimos anos, a incidncia de doenas tireoidianas tem se elevado por inmeras razes. Entre elas o aumento do

    nmero de idosos (ampliao da expectativa de vida), mais agilidade quanto ao

    diagnstico e mudanas no teor de iodo da alimentao.

  • 10

    A carga gentica associada alta ingesto de iodo fator importante para

    desencadeamento da doena, como ser apresentado no estudo bibliogrfico desta

    patologia.

    Uma vez que a manifestao mais comum do hipotireoidismo auto-imune

    atinge cerca de 9,3% de toda a populao feminina sua observao de extrema

    relevncia, pois essa estatstica mostra que so altos os ndices de prevalncia nas

    mulheres, quando comparado a outras patologias femininas. Mesmo na fase em que

    considerada sub-clnica, isto , no momento em que a doena apresenta pouco ou

    quase nenhum sintoma, pode ser identificada por meio de exames de anlises

    clnicas e de imagens, o que melhora seu prognstico, baseado na preveno e

    diagnstico precoce (Soares e Vaisman, 2001). Quando se utilizava a avaliao da tireide pela palpao, apenas 4% a 7%

    da populao apresentavam ndulos. Hoje, o uso da ecografia (ultras-som da tireide) detecta ndulos em at 50% da populao com tireoidite, estabelecendo

    critrios mais avanados para seu diagnstico e preveno (Medeiros et al., 2007).

    1. 2 Fisiopatologia

    A predisposio gentica associada a fatores ambientais promovem a

    chamada quebra da auto-tolerncia imunolgica, dando origem a ativao de clulas

    T especficas auto-reativas que so responsveis pela doena auto-imune da

    tireide (Barbesino et al., 2001). Este desequilbrio imunolgico ser analisado no captulo que trata do estudo

    bibliogrfico dos fatores etiolgicos, onde vrios so os mecanismos que colaboram

    para o desenvolvimento da produo de auto-anticorpos, entre eles o pesquisado

  • 11

    antgeno de histocompatibilidade, que visa mostrar o ponto em comum entre a

    Tireoidite de Hashimoto e outras patologias auto-imunes (vide estudo bibliogrfico I). Na Tireoidite de Hashimoto o prprio organismo desenvolve anticorpos anti-

    tireoidianos, sendo os mais importantes o anti-tireoperoxidase (Anti-TPO), onde anticorpos so produzidos contra uma enzima de converso do T4 em hormnio

    ativo, a peroxidase, produzida internamente pela glndula tireide; e o anticorpo

    anti-tireoglobulina, na qual os anticorpos atacam uma protena responsvel pelo

    transporte e distribuio do hormnio T4 para todo o corpo e clulas. Em sua fase

    inicial, o processo inflamatrio leva a uma ruptura dos folculos tireoidianos

    causando um hipertireoidismo transitrio; com o cessar do processo, o indivduo

    retorna a um estado de eutireoidismo ou at mesmo hipotireoidismo, dependendo do

    grau da leso folicular. A cronicidade dessa reao auto-imune determinar a

    instalao da hipofuno tireoidiana com o processo inflamatrio auto-imune

    mediado por clulas linfocitrias que determina a fase crnica da tireoidite (Soares e Vaisman, 2001).

    Esta cronicidade tem a ver com a falta de abordagem do processo auto-imune

    devido ao fato de que na anlise do tratamento observamos a preocupao em se

    tratar a disfuno da glndula tireide, seja hiper ou hipofuncionamento por

    reposio hormonioterpica e no a preocupao em se tratar os complexos auto-

    imunes que se formam muito menos o padro inflamatrio que deixa a glndula em

    estado de desequilbrio e constante estado patolgico.

  • 12

    1.3 Diagnstico

    Como demonstram Valente et al. (1998) o diagnstico feito pela medio dos hormnios T4 livre, TSH e anticorpos anti-peroxidase e anti-tireoglobulina. Esses

    ltimos responsveis pela comprovao de mecanismo auto-imune presente na

    glndula. Apenas alteraes nos nveis de T4 e TSH no denotam a presena de

    patologia auto-imune, mas sim de disfuno glandular, a saber, quando o TSH

    encontra-se em nveis altos com T4 normal, poderemos supor que a disfuno

    glandular encontra-se em sua fase inicial, onde a glndula est bloqueada em sua

    funo, mas consegue manter ainda os nveis normais de T4, custa de um hiper-

    estmulo da hipfise sobre a tireide, atravs de seu hormnio tireo-estimulante ou

    TSH. Quando os nveis de TSH encontram-se altos e os nveis de T4 baixos,

    significam que, apesar do estmulo pela hipfise atravs do TSH, a glndula no se

    encontra responsiva e a produo de T4 cai. Nesse caso a disfuno

    hipotireoidismo encontra-se instalada e o aparecimento de sinais e sintomas dessa

    disfuno j pode ser notado.

    Porm, para se comprovar o dano auto-imune como causador dessas

    disfunes necessrio a dosagem dos anticorpos anti-peroxidase e anti-

    tireoglobulina. No se faz necessrio o aumento nos nveis desses dois anticorpos

    simultaneamente, visto que na Tireoidite de Hashimoto padres diferentes de

    mecanismo auto-imune so observados, ora com o ataque a enzima conversora de

    T4, a peroxidase, ora o ataque a protena carreadora de T4, a tireoglobulina, ora aos

    dois com a presena de nveis elevados de anti-peroxidase e anti-tireoglobulina

    (Besson e McDermott, 1975; Chirino, 2001).

  • 13

    Pesquisas nessa rea no mostram nenhuma correlao entre qual anticorpo

    encontra-se aumentado ou os dois simultaneamente e a gravidade do quadro clnico

    da Tireoidite de Hashimoto, como demonstra Soares e Vaisman (2001). Em uma pequena percentagem de pacientes com Tireoidite de Hashimoto,

    aproximadamente 10% a 15% poderemos encontrar a pesquisa dos anticorpos como

    negativas, de acordo com Sylvester e Steven (2006). A ultra-sonografia da tireide trouxe a possibilidade de um diagnstico mais

    precoce do processo inflamatrio auto-imune e a monitorao do grau de evoluo

    da Hashimoto, onde observamos que, no estgio inicial da doena, a glndula

    encontra-se aumentada, custa de ndulos, cistos tireoidianos ou o prprio

    processo inflamatrio desencadeados pela resposta auto-imune.

    Em seu estgio mais avanado podemos observar uma reduo volumtrica

    da glndula tireide, custa de um processo fibrtico que acontece em sua

    evoluo. O processo auto-imune no abordado pelo tratamento convencional,

    gerando uma atrofia progressiva da glndula, devido ao padro linfocitrio de

    inflamao que resulta em uma reao cicatricial com alteraes heterogneas

    difusas na tireide, decorrente desse infiltrado linfocitrio.

    1.4 Quadro clnico (sinais e sintomas)

    Como citado por Medeiros et al. (2006) a Tireoidite de Hashimoto evolui quase sempre para a hipofuno da tireide podendo em sua fase inicial apresentar-

    se como hiperfuno ou hipofuno, mas o padro inflamatrio inevitavelmente ir

    causar danos histolgicos que iro gerar o mau funcionamento da glndula e,

    conseqentemente o hipotireoidismo.

  • 14

    O hipotireoidismo uma condio na qual a tireide se encontra trabalhando

    menos do que deveria (hipoativa) e a produo de hormnio tiroideano baixa. Na Tireoidite de Hashimoto a tireide freqentemente se encontra aumentada e o

    quadro completo de hipotireoidismo pode se manifestar anos mais tarde. Nesses

    casos a glndula vai sendo destruda gradualmente (Besson e McDermott, 1975).

    O hipotireoidismo pode gerar entre outros sintomas, desnimo, apatia e

    depresso, alm de fraqueza, diminuio da memria, aumento de peso, pele seca,

    queda de cabelos, intestino preso, entre outros. Reciprocamente, a depresso, por

    sua vez, tambm pode levar ao hipotireoidismo (Ballone, 2007).

    1.4.1 Sintomas psiquitricos

    Oliveira et al. (2001) cita que quando o hipotireoidismo de intensidade mdia a sintomatologia predominantemente dominada por um quadro depressivo

    ao qual se associam lentificao da fala, diminuio do rendimento intelectual,

    fadiga, diminuio do apetite e apatia, criando-se o primeiro elo entre a Tireoidite de

    Hashimoto e o psiquismo do indivduo.

    Como se desenvolve um quadro depressivo no hipotireoidismo ainda no est

    bem esclarecido. Em ratos o hipotireoidismo associado extirpao cirrgica da

    tireide afeta o sistema noradrenrgico (neurotransmissor importante na regulao

    do humor), sendo aventada possvel ligao entre esta ocorrncia e alterao em funes neuropsquicas, como demonstra Jackson et al. (1999). A mesma disfuno na regulao do humor de seres humanos poderia ser observada, se afetado fosse

    tambm sua produo de noradrenalina.

  • 15

    Outra possibilidade aventada pelos autores seria de que o hipotireoidismo se

    associa com uma reduo na atividade da serotonina (outro neurotransmissor

    importante na regulao do humor).

    Com a reposio medicamentosa de tiroxina observam-se melhora dos

    sintomas depressivos e melhora da atividade serotoninrgica em todos eles. Esses

    achados sugerem que a neurotransmisso serotoninrgica afetada pelo

    hipotireoidismo e pode ser revertida com reposio de T4. Esta observao abre

    novo campo para anlise da relao entre a Tireoidite de Hashimoto e as funes

    psquicas do paciente com tireoidite e sua relao psico-neuro-endcrino-

    imunolgica.

    Oliveira et al. (2001) destacam os achados de alto nmero de pacientes hipotiroideanos com sintomas sugestivos de transtornos depressivos, sugerindo que

    muitos desses pacientes poderiam ser beneficiados com avaliao e atendimento

    psiquitrico adequados, concomitante ao tratamento endcrino. Ao analisar as bases

    das disfunes geradas pelo hipotireoidismo, no que diz respeito baixa metablica

    causada pela baixa produo de T4, hormnio ativo da tireide, podemos supor que

    o baixo metabolismo basal resultante poderia colocar o indivduo em estado de

    predisposio metablica com baixa temperatura corporal e alteraes na dinmica

    fisiolgica do funcionamento de seu corpo e at mesmo, na neurotransmisso

    cerebral, o que correlacionaria a tireoidite com os estados depressivos apresentados

    em alguns casos.

    A forma mais grave de alterao emocional decorrente do hipotireoidismo

    chamada de loucura mixedematosa (mixedema um quadro de edema geral de origem tireoideano) que se caracteriza por um quadro verdadeiramente psictico, do tipo confusional, delirante e alucinatrio ou, quando no, por um profundo estado

  • 16

    melanclico, com freqncia estuporoso. Algumas outras raras vezes a alterao do

    humor se d por um quadro de hipomania. Nos idosos essas alteraes podem

    lembrar um quadro demencial (Ballone, 2007). Segundo Camargo et al. (2006) at o raciocnio fica mais lento na falta de hormnio da tireide. Depresso, ganho de peso, dificuldade para engravidar e at

    queda de cabelo. Apesar de mais casos estarem sendo descobertos hoje em dia, devido ao aprimoramento dos meios de diagnstico, a prpria incidncia tambm

    tem sido cada vez maior, segundo Medeiros et al. (2006). O hipotireoidismo na populao geral, antes de 1994, era em torno de 9%.

    Agora 15% a 20% da populao apresentam tireoidite, que uma das principais

    causas do hipotireoidismo. Esse assunto deve preocupar, sobretudo, as mulheres.

    Elas so muito mais propensas a disfunes na tireide, tendo uma incidncia de

    dez mulheres para cada quatro homens com o problema (Medeiros et al., 2006). de bom senso nos casos de m resposta da depresso a um tratamento

    antidepressivo realizar um exame do funcionamento da tireide. Camargo et al.

    (2006) acreditam que o hipotireoidismo estaria presente em 8% a 17 % das pessoas deprimidas. Essa incidncia estaria diretamente relacionada ao fato do

    hipotireoidismo ser auto-imune.

    A par do que se sabe, concretamente, das alteraes da tireide na

    depresso e vice-versa, tambm nos casos de estresse, o funcionamento da

    glndula est alterado. H uma diminuio da produo de TSH pela hipfise e uma

    inibio da converso de T4 em T3. Trata-se de um mecanismo fisiolgico de defesa

    e proteo no estresse, provocado pelos corticsterides liberados no fenmeno do

    estresse, com objetivo de conservar a energia durante a reao de alarme.

  • 17

    1.4.2 Sinais e sintomas fsicos

    Os sintomas comeam paulatinamente no incio com aumento do peso,

    hipersensibilidade ao frio, pele seca, infiltrao pseudo-edematosa do rosto e dos

    membros (inchao), cabelo seco e fino, freqncia cardaca lenta (bradicardia) e irregularidades do ciclo menstrual (Ballone, 2007).

    Em geral, os sinais fsicos e psiquitricos, sobretudo se o hipotireoidismo

    diagnosticado precocemente, melhoram com o tratamento hormonal substitutivo,

    porm, calcula-se que 10% dos pacientes continuam a apresentar sintomas

    neuropsiquitricos residuais (Ballone, 2007). Os sintomas clssicos do hipotireoidismo so os seguintes:

    Bcio (papo);

    Aumento de peso;

    Cansao crnico;

    Depresso;

    Dificuldade de concentrao;

    Lapsos de memria;

    Pele ressecada;

    Cabelos speros e quebradios;

    Constipao intestinal (priso de ventre); Anemia;

    Dificuldade para engravidar e abortamentos;

    Inchao de tornozelos e face;

    Colesterol elevado;

    Dor e fraqueza muscular;

    Dores nas juntas (Ballone, 2007).

  • 18

    Captulo 2 - A Terapia de Imagens Mentais

    2.1 - Histrico do uso das imagens mentais

    Como relata Simo (2004) as imagens desenhadas e expressas em qualquer

    local sempre foram produzidas ao longo da evoluo da humanidade em qualquer

    cultura.

    Podemos lembrar que na poca das cavernas os homens desenhavam cenas

    que representavam a sua caa: o urso, o leo, o cervo, cenas de batalhas e

    caadas. Naquela poca, assim como em vrias outras, algumas destas

    representaes estavam associadas ao pensamento mtico-religioso de que ao

    desenhar voc poderia influenciar aspectos da caada, ajudando assim o homem

    primitivo a melhorar o desempenho nesta tarefa e triunfar frente ao temido animal,

    supostamente mais forte. A importncia do desenho possua mais que uma funo

    psicolgica - uma possibilidade de um pensamento de antecipao - planejamento, permitindo o desenvolvimento daquilo que se chama de funes psquicas

    superiores, pois ao representar nas paredes a cena futura, o homem poderia se

    preparar para possveis contratempos; medir distncia e tamanho, entre ele e o

    animal, mensurar a fora necessria, para atingi-lo assim como preparar grupos

    existente para o aspecto social presente, neste ato - o de sobrevivncia do grupo e o

    da caada - que daria comida para os prximos tempos (Simo, 2004).

    Em outras instncias, o desenho era a representao de projetos de guerra,

    batalhas contra inimigos, etc. Em outras, ocasies era o mapeamento das

    propriedades, vilas, cidades, pases e continentes. E sob outro enfoque analtico, a

  • 19

    influencia do psquico nas atitudes resultantes desse modo de pensar (Simo,

    2004). A partir desses dados podemos observar que a imagem antecede como meio

    de comunicao a linguagem escrita e at mesmo a linguagem falada,

    principalmente em seu contedo imagtico e as vrias possibilidades de

    interpretao e uso, abrindo, tambm, possibilidades para a aplicao das Terapias

    de Imagens Mentais na rea da sade.

    Como exemplo, Epstein (1990) cita que a utilizao mdica de imagens comum h sculos em muitas culturas de todo o mundo, como no Tibete, ndia,

    frica, entre os esquims e os ndios, em alguns casos durante milnios. Ainda para

    ele no mundo ocidental medida que a prtica mdica evolua de suas antigas

    origens no Egito durante tempos, as imagens eram uma tcnica essencial e por

    vezes o tratamento mdico indispensvel para males fsicos, at aproximadamente

    1650, quando a cincia natural e o pensamento mdico moderno comearam a ser

    predominantes. Mais recentemente, enquanto a psicoterapia freudiana se espalhava

    pela maior parte da Europa, Inglaterra e, depois, Estados Unidos, a tendncia

    utilizao de imagens passou praticamente desapercebida, criando uma nova lacuna

    entre as Terapias de Imagens Mentais e suas aplicaes.

    Para Goleman (1997) relatam que o uso de vises interiores para auxiliar o processo de cura era usado pelos budistas tibetanos desde o sculo XIII ou at

    antes. A abordagem budista normalmente envolve a meditao com base na

    imagem de uma divindade no ato de cura de um sintoma. As prticas xamanstas em

    culturas presentes no mundo inteiro usaram uma abordagem semelhante. Cita que,

    entretanto, s recentemente as imagens foram usadas no ocidente por mdicos e

    profissionais da sade.

  • 20

    Porm, o uso das imagens mentais como recurso teraputico sob o enfoque

    da psicanlise data de 1899, quando Freud, a figura mais influente na psicologia do

    sculo XX, foi bem sucedido ao usar imagens no tratamento de um menino de 14

    anos que sofria de um tique fsico. Este caso, tratado por meios no-analticos, foi

    bem-sucedido, porm no citado em nenhum dos 25 volumes publicados de sua

    obra; esse foi o nico tratamento concludo com sucesso mencionado nestes

    volumes e a nica vez em que Freud, o homem que inventou a terapia pela fala,

    usou imagens mentais como tcnica teraputica. Este o caso, tal como foi

    reportado por Freud em 1899, no livro Interpretao dos sonhos:

    Um garoto de 14 anos veio a mim para tratamento psicanaltico sofrendo de espasmo hemifacial, vmito histrico, dores de cabea etc. Iniciei o tratamento assegurando-o de que se ele fechasse os olhos veria figuras ou teria ideias, as quais ento deveria comunicar a mim. Ele respondeu por meio de figuras. Sua ltima lembrana antes de vir a mim foi revivida visualmente em sua memria .Ele estivera jogando damas com seu tio e viu o tabuleiro sua frente. Ele pensou nas diversas posies, favorveis ou desfavorveis, e nos movimentos que no se devem fazer. Ele viu ento uma adaga sobre o tabuleiro, um objeto que pertencia a seu pai, mas que sua imaginao colocava sobre o tabuleiro. Ento havia uma foice sobre o tabuleiro e, depois, uma segadeira. E ento apareceu afigura de um velho campons aparando a grama na frente da casa distante do paciente com uma segadeira (Freud, 1999).

    Freud ento ofereceu ao jovem uma interpretao dos smbolos. Mas o ponto

    importante neste contexto foi a tcnica utilizada por Freud, uma tcnica de imagens

    mentais. Aps esta nica sesso, afirma Freud, o tique do garoto e outros sintomas

    cesaram. Junto com esse desfecho, Freud cessa tambm suas incurses na

    utilizao de imagens dentro das terapias analticas, visto que defendia o uso da

    terapia da fala e no era um entusiasta pela terapia das imagens.

  • 21

    Permaneceu uma lacuna no uso dessas tcnicas at que Jung (1986) demonstra seus interesses iniciais no estudo dos sonhos e das imagens a partir da

    Psicologia Analtica e a partir de suas relaes compensatrias e simblicas

    apresentadas por essa tcnica , como se observa no texto abaixo:

    (...) h a possibilidade de que, no inconsciente, ocorram determinados processos que compensam, com o seu smbolismo, as deficincias e os desnorteamentos da atitude consciente. Quando as compensaes inconscientes se tomam conscientes por meio da tcnica analtica, provocam uma mudana to grande na atitude consciente, que podemos falar de um novo nvel de conscincia. Mas o mtodo em si no capaz de produzir o processo propriamente dito da compensao inconsciente. (...) o processo inconsciente em si quase nunca atinge a conscincia, sem a ajuda da tcnica. Quando trazido tona, revela contedos que formam um contraste notvel com a orientao geral das ideias e dos sentimentos cons-

    cientes. Se assim no fosse, tais contedos no teriam efeito compensatrio ( Jung, 1986).

    Tal efeito compensatrio traz a possibilidade de anlise das vrias aplicaes

    das Terapias de Imagens Mentais na rea da sade, em especial na rea da

    psicologia e na rea mdica.

    2.2 - Imagens mentais - definio

    Glikin (2001) define imagem mental como todo fenmeno visual que se apresenta em nossa conscincia e que no est referido a uma percepo atual,

    seja originariamente vindo do mundo externo e evocado a partir da memria, seja surgindo das profundidades da conscincia, naquele limite impreciso entre o

    psquico e o fsico,entre o pessoal e o arquetpico, entre o sistema nervoso central e

    o autnomo.

  • 22

    A imagem mental apresentaria-se com uma simplicidade fenomenolgica que

    no poderamos ignorar. Jung (1986) demonstra sua importancia na forma como a

    conscincia percebe, filtra ou decodifica as imagens e nos mostra sua importncia

    como moduladora de comportamentos e da personalidade. Ela participa da

    capacidade de visualizar ou no as consequncias das aes, dos projetos e

    objetivos lanados para futuro e das formas de serem realizados. As imagens promovem com igual eficcia os delrios do manaco, as projees ameaadoras do

    paranico, ou a impulsividade da personalidade anti-social. Tambm sustentam a

    beleza da criatividade e da inveno em todas as reas da atividade humana.

    Essa ao moduladora das imagens teriam o significado de compensao,

    como j citado por Jung (1986) e reafirmado por Glikin (2001) onde compensar significa equilibrar, ajustar, suplementar. A atividade compensatria do inconsciente como equilbrio de qualquer tendncia para a unilateralidade por parte da

    conscincia corresponde s funes auto-reguladoras (homeostticas) do organismo, presentes na esfera fisiolgica. O objetivo do processo compensatrio seria o de ligar, como uma ponte, dois mundos psicolgicos. Essa ponte o smbolo;

    embora os smbolos, para serem eficazes, devam ser reconhecidos e

    compreendidos pela mente consciente, ou seja, assimilados e integrados. Essa funo compensatria poderia ser usada, ento, tanto na esfera psquica, como na

    fisiolgica, j que suas funes auto-reguladoras esto presentes no eixo psico-neuro-nedcrino-imunolgico.

    A partir desse presssuposto o efeito compensatrio do psquico sobre o

    fisiolgico reafirma as inmeras possibilidades de se tratar molstias fsicas a partir

    da reorganizao e replanejamento do psiquismo do indivduo a ser terapeutizado

    por esse mtodo.

  • 23

    Jung (1987) exemplifica essa viso compensatria pela observao da relao do sonho com a conscincia. A consciencia, devemos lembrar, a moradia

    dos aspectos fisiolgicos de manifestao das emooes, sensaes e sentimentos:

    O ponto de vista de que os sonhos so mera satisfao de desejos reprimidos j est superado h muito tempo. Sonhos representando clara-mente receios ou desejos realizados tambm existem, no resta a menor dvida, mas no so os nicos. H muitos outros. Por exemplo, os sonhos podem exprimir verdades implacveis, sentenas filosficas, iluses, desenfreadas fantasias, recordaes, planos, antecipaes, e at vises telepticas, experincias irracionais e sabe Deus o que mais. No podemos deixar de lembrar que passamos quase a metade de nossa vida em estado mais ou menos inconsciente. O modo especfico de o inconsciente se comunicar com a conscincia o sonho. Da mesma forma que a alma tem seu lado diurno, que a conscincia , ela tambm tem o seu lado notumo, seu funcionamento psquico inconsciente, que poderia ser concebido como o fantasiar onrico. Assim como no existem apenas desejos e medos no consciente, mas uma infinidade de outras coisas, tambm sumamente provvel que a nossa alma onrica tenha uma riqueza semelhante de contedos e formas de vida ou, quem sabe, muito superiores s da vida

    consciente, cuja natureza essencialmente concentrao, limitao e excluso (Jung, 1987).

    Analisando esses aspectos de concentrao, limitao e excluso, teremos

    poderosas ferramentas para o uso das imagens mentais na reverso de padres de

    sade e doena. (...) se o indivduo conseguir enquadrar harmonicamente na vida da conscincia os fragmentos oferecidos ou forados pelo inconsciente, resultar

    ento uma forma de existncia psquica que corresponde melhor personalidade

    individual e, por isso, tambm elimina os conflitos entre a personalidade

    consciente(...)(Jung, 1986). Imagens, smbolos e fantasias poderiam ser designadas, ento, como

    linguagem do inconsciente. E assim, Jung (1986) descreve ento o processo da imagem:

  • 24

    Suponhamos que ouvimos um som indistinto cujo efeito inicial se reduz a um estmulo para escutarmos mais atentamente, para descobrirmos o 'que ele significa.

    Neste caso, o estmulo acstico desencadeia no crebro toda uma gama de

    representaes de imagens, que se associam ao estmulo acstico. Parte delas se

    converte em imagens acsticas, parte em imagens visuais e parte em imagens

    sensoriais. Emprego a palavra imagem, aqui, simplesmente no sentido de

    representao. Uma entidade psquica s pode ser contedo consciente, isto , s

    pode ser representada quando representvel, ou seja, precisamente quando

    possui a qualidade de imagem. Por isto chama-se de imagens a todos os contedos

    conscientes porque so reflexos de processos que ocorrem no crebro (Jung, 1984). Nesse sentido, podemos observar que o psiquismo do indivduo,muitas vezes,

    responsvel pela somatizao de fenmenos fsicos, poderia aqui ser trabalhado,

    eliminando fatores de inicializao das alteraes psicossomticas, trabalhando-se

    com esses contedos conscientes.

    Para Jonhson (1989) torna-se claro o quanto tolo denegrir o poder da imaginao. O homem depende da imaginao e de seus smbolos para as suas

    representaes poticas, literrias, da pintura, escultura e de todas as atividades

    artsticas, filosficas e religiosas. No poderamos desenvolver a inteligncia

    abstrata, a cincia, a matemtica, o raciocnio lgico e mesmo a linguagem, se no

    tivssemos a capacidade de gerar estas imagens-smbolos. E cita Neumann, em

    seu livro Great Mother para exemplificar a linguagem simblica como as imagens do

    inconsciente como fonte criativa do esprito humano em todas as realizaes. Sendo

    o processo formador dos smbolos do inconsciente a fonte do esprito humano, a

    linguagem - cuja histria quase idntica gnese e ao desenvolvimento da conscincia humana - sempre comea como uma linguagem simblica.

  • 25

    Novamente o psiquismo est presente como uma linguagem criativa do

    inconsciente levada a elaborao simblica pelo consciente.

    2.3 - Emoes, sensaes, sentimentos e imaginao

    Para Epstein (1989) as emoes esto intimamente ligadas as imagens. Toda emoo pode se manifestar por uma imagem. E assim descreve:

    H um modo fcil de provar isto: simplesmente tente 'ver", seus sentimentos. Se estiver feliz, pergunte-se com que sua felicidade se parece; se voc se diverte com esportes, pergunte-se com que seu divertimento se parece; se voc no gosta de estupidez, pergunte-se com que a estupidez se parece. Garanto que em todos os casos uma imagem lhe ocorrer. Esta imagem sua. Ningum mais no mundo v esta imagem com a mesma preciso: ela o correspondente visual de seus sentimentos. As imagens do forma s emoes (...) Uma imagem a expresso mental de um sentimento. Mas h tambm uma expresso fsica, as sensaes. Um sentimento tem certas sensaes fsicas associadas a ele. Quando estamos zangados, experimentamos, com frequncia, um aperto no peito. Quando estamos felizes, experimentamos, tambm com frequncia, uma sensao de leveza por todo corpo. Assim como um sentimento tem sensaes fsicas associadas a ele, o mesmo acontece com uma imagem. No existem imagens sem sensaes que as acompanhem (Epstein, 1989).

    E se as imagens geram sensaes fsicas que podem ser positivas ou

    negativas, aqui se percebe a possibilidade de se trabalhar com as imagens no

    sentido de resignificar os contedos negativos de determinadas patologias que esto

    intimamente ligadas ao psiquismo. Por que no utilizarmos as imagens mentais em

    patologias onde o psiquismo no o fator predisponente, mas por vezes o fator

    precipitante, como no caso do diabetes, onde o estado emocional do paciente

    influencia em muito na dosagem da glicemia de seu sangue.

  • 26

    Outro exemplo seria o da popularmente conhecida gastrite nervosa, onde os

    fatores estressores esto intimamente ligados manifestao da dor gstrica, pela

    descarga adrenrgica como fator precipitante. Poder-se-ia ento resignificar-se

    esses fatores estressores, antes que estimulassem tal descarga, podemos supor.

    Em estudos clssicos sobre psicossomtica se aceita definitivamente o

    componente emocional das doenas e a importncia da psicoterapia, como faz

    Alexander (1989): O conhecimento, cada vez maior, das relaes entre as emoes e as funes do corpo normais e alteradas exige que o mdico moderno considere os conflitos emocionais como sendo to reais e concretos como os microorganismos visveis A principal contribuio da psicanlise para a medicina tem sido a de acrescentar ao microscpio ptico um microscpio psicolgico - isto uma tcnica psicolgica por meio da qual a vida emocional do paciente pode ser submetida investigao detalhada, (Alexander, 1989).

    Esse microscpio psicolgico seria uma ferramenta importante nesse

    processo de resignificao, mudando a relao entre as emoes e as funes

    normais do corpo.

    o que o faz Epstein (1989) no trabalho com imagens utilizando-as para mudar as emoes ou sensaes e usando-as para criar e afetar a experincia de

    seus pacientes. Para ele, ao trabalhar com as imagens e modific-las, estaremos

    atuando sobre as sensaes e emoes que as acompanham. Uma vez que a

    imagem muda, a emoo tambm muda, assim como as sensaes a ela

    associadas.

    Tal como os lados de uma equao, emoo e imagem se equivalem; so

    duas expresses da mesma realidade, e a sensao est ligada a ambas. Quando

    mudamos a imagem, modificamos toda a equao. E ento poderemos perceber

  • 27

    que as imagens so realmente um caminho para a boa sade, tanto fsica quanto

    mental.

    Para Jung (1984), porm, a superposio e tenso entre os elementos pessoais e coletivos leva a uma elaborao tendenciosa da psique em fragmentar-

    se, dividir-se e personificar-se. Mas a psique, como a maioria dos sistemas naturais,

    luta para se manter em equilbrio. Far isso mesmo suscitando sintomas

    desagradveis, sonhos assustadores ou problemas de vida aparentemente

    insolveis; tambm se o desenvolvimento de uma pessoa foi unilateral, a psique

    contm em si todo o necessrio para retificar essa condio. Aqui, podemos

    observar o enorme potencial que a imagem tem em reverter quadros patolgicos,

    mesmo que inicialmente unilateralizados. Jung (1984) ressalta: (...) porque nossa imagem do mundo contm alguma coisa que no est in-teiramente certa, ou seja: na teoria nos recordamos muito pouco, e na prtica, por assim dizer, quase nunca, de que a conscincia no tem uma relao direta com qualquer objeto material. Percebemos apenas as imagens que nos so transmitidas indiretamente, atravs de uma aparato nervoso complicado. Entre os terminais dos nervos dos rgos dos sentidos e a imagem que aparece na conscincia se intercala um processo inconsciente que transforma o fato psquico da luz, por ex., em uma "luz" -imagem. Sem este complicado processo inconsciente de transformao, a conscincia incapaz de perceber qualquer coisa material (Jung, 1984).

    A elaborao a racionalizao consciente desse mundo imagtico onde o

    contedo, antes imaginrio, torna-se real e material como numa somatizao. O que

    parece impedir a adequada elaborao desse contedo imagtico so os nossos

    bloqueios, parte integrante de qualquer mtodo de terapeutizao que em sua fase

    inicial necessita de uma abordagem direta no sentido de se quebrar as couraas

    para que o contedo inconsciente possa emergir em todas suas possibilidades.

  • 28

    Jung (1984) exemplifica esses bloqueios quando diz que vivemos protegidos por muralhas racionalistas contra a eternidade da natureza. Demonstra que a

    Psicologia Analtica procura justamente romper com estas muralhas ao desenterrar

    as imagens fantasiosas do inconsciente que a nossa mente racionalista havia

    rejeitado. Em uma anlise de Glikin (2001) Jung demonstra que da coliso entre as

    duas foras opostas (consciente e inconsciente) a psique inconsciente tende a criar uma terceira possibilidade. Esta tem uma natureza irracional inesperada e

    incompreensvel para a mente consciente. Ser o smbolo, ambguo e paradoxal que

    ser capaz de atrair sobre si a ateno e, eventualmente, reconciliar as duas. A

    situao de conflito, que no apresenta nenhuma soluo racional ao dilema a

    situao na qual a oposio dos opostos produz uma terceira que irracional,

    representada pelo smbolo. O significado do smbolo pode ser expresso em termos

    nicos e individuais e, ao mesmo tempo participa de imagens universais. Aparece

    como uma espcie de inveno inconsciente em resposta a uma contestao

    consciente. Ou de uma linguagem emergente frente a um conflito psquico.

    Aqui podemos observar os primeiros indcios de que se esse smbolo for

    direcionado ou trabalhado o embate poder fazer surgir resultados positivos

    mediante uma interveno psicoteraputica dirigida.

  • 29

    2.4 - A imagem como smbolo

    Jung demonstra que a imagem existe como smbolo, mesmo antes da cincia

    tomar conhecimento dessa investigao:

    (...) A Cincia e estas imagens primordiais so incomensurveis entre si. Trata-se de dados irracionais, condies a priori da imaginao que simplesmente existem e cujos objetivos e justificao a Cincia s pode in-vestigar a posteriori, como aconteceu, por exemplo, com a funo da tireide, que era considerada como um rgo sem sentido, antes do sculo XIX. Para mim, as imagens primordiais so como que rgo psquicos, que eu trato com o mximo cuidado.

    Por isto alguma vezes preciso dizer a algum de meus pacientes mais idosos: sua imagem de Deus ou sua ideia de imortalidade atrofiou-se, e. conseqentemente, o seu metabolismo psquico caiu fora dos eixos. (Jung, 1984).

    Jung (1984) demonstra, ento, a possibilidade de se tratar imagens primrias como rgos psquicos em benefcio de seus pacientes.

    Para Johnson (2003) as imagens simblicas do inconsciente so as fontes criativas do esprito humano em todas as suas realizaes. No s a conscincia e

    os conceitos de entendimento filosfico do mundo surgiram a partir do smbolo, mas

    tambm a religio, o rito e o culto, as artes e os costumes. E porque o processo

    formador dos smbolos do inconsciente a fonte do esprito humano, a linguagem -

    cuja histria quase idntica a gnese e ao desenvolvimento da conscincia humana - sempre comea como uma linguagem simblica. Quando vivenciamos o

    smbolo, simultaneamente vivenciamos o complexo, o arqutipo, a entidade psquica

    interior que representada por esse smbolo. Quando a imagem fala, com uma

    das nossas prprias vozes interiores.

  • 30

    Quando respondemos a parte interior invisvel de ns mesmos que escuta e

    registra. Ela se coloca diante de ns na forma de figura imaginria.

    Em uma abordagem mais contempornea Simo (2004) mostra que os

    smbolos so aqueles que no contexto psicoteraputico so solicitados ao paciente

    ou que pessoalmente podem ser conhecidos para trazer luz de resoluo de

    conflitos e dificuldades. O paciente cria uma representao de um determinado tema

    focalizando a sua queixa em sua conscincia. Ao colocar a ateno e percepo em

    uma questo especfica, o inconsciente associa com algum smbolo construdo para

    tal fim. Aspectos fsicos, emocionais, sensoriais, mentais e comportamentais podem

    ser solicitados para a construo destas imagens.

    Nos aspectos fsicos exemplos, como dores, queimaes, ardncias,

    desvitalizao. Aspectos emocionais: medos, angstias, raivas, rancor, tristezas,

    nostalgias. Aspectos comportamentais: fuga, evitao, agressividade, entre outros

    (Simo, 2004). Exemplifica: Um indivduo que deseja melhorar sua insegurana frente ao sexo oposto, porm no possui conhecimento do que sente, do que representa tal dificuldade e como pode melhor-la, identifica atravs de um desenho proposto pelo terapeuta uma forma simblica de falar sobre sua dificuldade, expressando um garoto acuado em um canto de uma sala com um monstro enorme que vai devor-lo. Neste momento ao identificar e reconhecer o medo, o terapeuta facilita o desenvolvimento de recursos saudveis de enfrentamento e resignificao, realizando pontes com elaboraes de aprendizagens feitas no passado e idealizao de novos comportamentos mais funcionais e adaptativos para o futuro (Simo, 2004).

    Novamente podemos perceber aqui as possibilidades de resignificao e

    redirecionamento das imagens como recurso teraputico eficaz.

  • 31

    2.5 - A imagem como arqutipo

    Em grego, arche significa "o primeiro" e typos significa arca", "cunho" ou

    "modelo". Os arqutipos psicolgicos demonstram ento os "modelos iniciais" pr-

    existentes que formam o esboo fundamental dos principais componentes

    dinmicos da personalidade humana. No sentido real, quando olhamos para estes

    tipos, percebemos que so eles, combinados, que nos tornam humanamente

    identificveis. So inatos em ns; parte de nossa herana como membros da raa

    humana (Johnson, 2003). O termo arqutipo" vem do tempo de Philo Judaeus, com referncia Imago

    Dei (imagem divina) no homem. Pode tambm ser encontrado em Irinaeus quando diz: "O criador do mundo no formou estas coisas diretamente de si mesmo, mas as

    copiou de arqutipos exteriores.

    Como est implcito na prpria palavra, os arqutipos se relacionam aos tipos,

    no sentido de um trao caracterstico da personalidade ou de um conjunto de

    qualidades que parecem surgir juntas e que se repetem espontaneamente em modelos identificveis.

    A idia dos arqutipos antiga. Est relacionada com o conceito de Plato

    acerca das formas ideais - padres j existentes na mente divina que determinam de

    que forma o mundo material passar a existir. Mas devemos a Jung o conceito dos

    arqutipos quando em 1919, Jung faz uso pela primeira vez do termo arqutipo, a

    fim de evitar qualquer sugesto de que era o contedo, no esboo ou padro

    inconsciente e irrepresentvel, que era fundamental. Jung examinara grande parte

    de seus sonhos e encontrara em muitos deles uma particularidade que os distinguia

    dos outros sonhos (Jung, 1984).

  • 32

    (...) Esta particularidade est presente tambm nos sonhos do processo de individuao. Estes sonhos contm os chamados motivos mitolgicos ou mitologemas, que chamei de arqutipos. Este termo designa formas especficas e grupos de imagens que se encontram, sob formas coincidentes, no s em todas as pocas e em todas as latitudes, mas tambm nos sonhos individuais, nas fantasias, nas vises e nas ideias delirantes. Tanto sua apario frequente nos casos individuais como sua ubiqidade tnica provam que alma humana singular, subjetiva e pessoal apenas por um lado, mas coletiva e objetva quanto ao mais (Jung, 1984).

    E a partir da teoria dos arqutipos tece sua viso sobre o inconsciente

    coletivo: o que lhe aparece na viso, com efeito uma imagem do inconsciente

    coletivo, a saber, da estrutura inata e peculiar dessa psique que constitui a matriz e a

    conduo prvia da conscincia (Jung, 1975). Para ele as influncias decisivas emanam do inconsciente

    independentemente da tradio garantem a cada ser uma semelhana e at uma

    uniformidade de experincia e tambm do modo pelo qual representada

    imaginativamente. Uma das principais provas deste fato o paralelismo quase

    universal entre os temas mitolgicos, os quais, de acordo com sua condio de

    imagens primordiais, ele denomina de arqutipos.

    Justifica que, para nossos propsitos, este termo conveniente e til

    porque nos diz que estamos tratando com tipos arcaicos ou - melhor dizendo -

    primordiais, isto , imagens universais que existem desde os tempos mais remotos.

    Essas imagens coletivas facilitariam seu uso teraputico em trabalho de grupos que

    apresentassem uma mesma temtica de abordagem. Mas, sob outro ngulo de

    anlise, poderia justificar e suprir as Terapias de Imagens Mentais em sua

    proposio com imagens arquetpicas de patologias, trabalhadas a partir de imagens

    coletivas, como na abordagem da Tireoidite de Hashimoto num exerccio como o da

    imaginao diretiva, onde a figura (smbolo) de uma tireide normal e a figura

  • 33

    (smbolo) de uma tireide afetada por um processo auto-imune com a formao de anticorpos, simbolizados universalmente por bidentes, como citado na trajetria pessoal (vide introduo). Nada mais significa que a representao arquetpica dessa patologia para a elaborao de estratgias na tentativa de buscarem-se

    melhores resultados.

    De acordo com Glikin (2001) os arqutipos podem ser considerados ligando o corpo (instintos) e a psique (imagem). Instintos e imagens possuem a mesma raiz psicide. Quando Jung aplicava a noo de arqutipo ao inconsciente psicide, o elo

    psquico/orgnico era expresso na forma de uma conexo mente/corpo. Um

    arqutipo pode ser representado como um espectro, estendendo-se de um plo

    instintivo, fisiolgico, para um plo espiritual ou imagtico. O arqutipo abarca os

    dois plos e pode ser experimentado e apreendido atravs de um ou de outro. As

    abordagens biolgicas ou etiolgicas do arqutipo so um extremo e no outro

    extremo esto as abordagens mitolgicas ou imaginais. Observamos aqui a ntima

    relao entre a imagem e sua capacidade em gerar estmulos fisiolgicos instintivos.

    Poderamos gerar ento, estmulos fisiolgicos positivos para o bom funcionamento

    de nosso corpo humano e, at mesmo, buscar o equilbrio desses estmulos.

    De acordo com Jonhson (1989) uma vez que os arqutipos so universais, estariam eles todos presentes no inconsciente de cada um. Mas eles se combinam

    em variaes infinitas para criar a psique individual humana. Podemos compar-los

    com o corpo humano fsico. De muitas formas, nossos corpos so semelhantes aos

    demais.

    Temos braos, pernas, corao, fgado e pele, de um ou outro feitio. So

    caractersticas universais da espcie humana. Entretanto, se comparo minhas

  • 34

    impresses digitais ou fios de meu cabelo com os de outras pessoas, percebo que

    dois corpos humanos no so exatamente iguais.

    Nesse processo de combinao surge o processo de individuao. Da mesma

    forma as energias e as capacidades psicolgicas universais, na raa humana, esto

    combinadas diferentemente em cada um de ns, cada pessoa tem uma estrutura

    psicolgica distinta. s pela vivncia desta estrutura inerente que descobrimos o

    que significa ser um indivduo.

    Se trabalharmos na individuao comea-se a perceber a diferena entre as

    idias e os valores que vm de nosso self e as opinies que absorvemos do mundo

    nossa volta (arquetpicas). Podemos parar de ser mero apndice da sociedade,

    pessoas estereotipadas: aprendemos que temos nossos prprios valores, nossa

    prpria maneira de viver, que procedem naturalmente de nossas naturezas inatas.

    Analisando-se esse processo de individuao aplicado as imagens mentais,

    podemos, como exemplo, citar o caso da introduo (vide trajetria pessoal) em que

    a individuao do paciente comentado, uma mulher portadora de Tireoidite de

    Hashimoto, faz em seu exerccio de Imaginao Dirigida, uma individualizao da

    tcnica, quando cria um rato para poder destacar tais anticorpos, produzidos na

    tireoidite, onde a proposta inicial era a de que ela mesma destacasse anticorpo por

    anticorpo.

    Desenvolve-se um grande senso de segurana nesse processo de

    individuao. Comeamos a entender que no necessrio lutar para sermos iguais

    a outrem, pois sermos ns mesmos a base mais firme em que podemos nos

    apoiar. Percebemos que conhecer-nos a ns mesmos completamente e desenvolver

    todas as foras que esto dentro de ns uma tarefa para a vida inteira. No

  • 35

    precisamos imitar a vida de ningum. No precisamos de outras pretenses, pois o

    que j temos a riqueza suficiente e bem mais do que jamais esperamos.

    2.6 - A imagem como mitologia coletiva

    Estas imagens primitivas pertencem, na verdade, humanidade em geral e

    podem reaparecer em qualquer cabea de modo "autctone", independentes do

    tempo e do espao. Para seu renascimento necessitam apenas de circunstncias

    propcias onde poderemos acess-las em nosso contedo inconsciente, fazendo-as

    imergir para o consciente para sua elaborao, interpretao e uso .

    O momento mais oportuno para isso sempre quando uma viso do mundo

    desmorona e arrasta consigo todas aquelas formas e estruturas que outrora valiam

    como resposta definitiva para todos os grandes enigmas da vida e do mundo. Isto,

    alis, corresponde inteiramente regra psicolgica. Quando todos os deuses

    desenraizados se recolhem para cair sobre o homem fazendo-o exclamar Ipse

    philosophus, daemon. heros, deus et omnia (Ele mesmo filsofo, gnio, heri, deus e tudo o mais), e quando uma religio que glorifica o esprito comea a desaparecer, ento surgir em seu lugar, bem no fundo da alma uma imagem primitiva da matria

    criadora (Jung, 1985). Demonstra-se aqui a possibilidade de se trabalhar com o ciclo criador da

    imagem como uma fonte inesgotvel do indivduo de sempre estar mudando,

    evoluindo, aprendendo e se equilibrando.

    Glikin (2001) disserta sobre o reconhecimento por Jung da existncia de um profundo reservatrio de imagens irrepresentveis chamadas arqutipos na psique,

    sua definio de smbolo como a melhor expresso possvel de um fato com

  • 36

    significao at ento no revelado, sua insistncia em que a interpretao deveria

    permanecer fiel e to prxima quanto possvel da imagem onrica, sua aproximao

    do funcionamento psquico do self com uma imagem de Deus e sua afirmao de

    que, o significado, antes que o tratamento, que alivia o sofrimento induzido por

    uma neurose. Tudo isso est baseado na suposio de que a psique raciocina

    imageticamente e de que o equivalente racional mais prximo a analogia ou a

    metfora.

    Para exemplificar essa analogia Johnson (2003) demonstra que nos sonhos e mitos a mente consciente frequentemente simbolizada por uma ilha. Como os

    habitantes de uma ilha, dentro do seu ambiente isolado, o ego constri um pequeno

    mundo todo seu - um sistema de regras e um conjunto de suposies acerca da realidade. O ego no percebe que, alm dos limites de suas ilhotas, fora do estreito

    campo de sua viso, existe um universo inteiro de realidades e verdades contido no

    vasto mar do inconsciente que ele no consegue perceber.

    No fundo deste oceano invisvel de energia, imensas foras esto

    trabalhando. Reinos mticos, simbolizados pelas lendas da Atlntida, existem l, nas

    profundezas e desenvolvem vidas paralelas vida cotidiana de nossa mente

    consciente. Centros de conscincia alternativa, de atitudes, idias e valores

    alternativos, l esto como outras ilhas no grande mar. Esperam ser descobertos e

    reconhecidos pela mente consciente em sua busca do desconhecido.

    Se trabalhadas voluntariamente o reconhecimento pela mente consciente

    pode trazer a tona recursos psquicos inesgotveis.

  • 37

    2.7 - A imaginao ativa

    Como o prprio nome diz, a imaginao ativa implica em tudo, menos seguir

    passivamente a fantasia. Pelo contrrio, Jung (1975) sempre faz questo de frisar este ponto, o que distingue a imaginao ativa do mero devaneio que, neste

    ltimo, a conscincia desempenha um papel passivo, deixando as imagens se

    desenrolar livremente, ao passo que, na imaginao ativa, a conscincia dialoga

    com as imagens, seja literalmente, conversando com os personagens que emergem do inconsciente, seja interagindo com as cenas. Jung bastante enftico ao dizer que somente essa interao faz com que a conscincia se amplie, integrando os

    contedos arquetpicos.

    Simplesmente registrar qualquer fantasia mental no conduziria a qualquer

    resultado digno de ser analisado que dir a uma transformao to radical da

    conscincia quanto a que preconizada por alquimistas e magos.

    Jung utiliza o termo imaginao ativa pela primeira vez em 1935 para

    descrever um processo de "sonhar com os olhos abertos", em sua obra, Tipos Psico-

    lgicos. Mostra um paralelo das emoes e as imagens que nela se ocultam e a

    importancia de torn-las conscientes:

    Na medida em que conseguia traduzir as emoes em imagens, isto , ao

    encontrar as imagens que se ocultavam nas emoes, eu readquiria a paz interior.

    Se tivesse permanecido no plano da emoo, possivelmente eu teria sido dilacerado

    pelos contedos do inconsciente. Ou, talvez, se os tivesse reprimido, seria

    fatalmente vtima de uma neurose e os contedos do inconsciente destruir-me-iam

    do mesmo modo. Minha experincia ensinou-me o quanto salutar, do ponto de

  • 38

    vista teraputico, tornar conscientes as imagens que residem por detrs das

    emoes (Jung, 1975). Em nossa proposta das Terapias de Imagens Mentais como recurso

    teraputico, o tornar consciente as imagens, seria descobrir os vrios sentidos que

    essas imagens traduzem e trabalhar com as emoes contidas nelas de uma

    maneira positiva, antes que possam emergir delas contedos reprimidos ou mal

    direcionados. Quanto mais o indivduo se concentra em tomo de seus contedos -

    este um fato psicolgico indiscutvel - tais contedos so vivificados, iluminados

    como que a partir de dentro e por assim dizer convertidos numa espcie de

    realidade substitutiva. Na psicologia analtica ns nos utilizamos metodologicamente

    deste fenmeno. Denominei a este mtodo de "imaginao ativa". Incio de Loyola

    utilizou-se tambm da imaginao ativa em seus exerccios (Jung, 1991).

    H indcios seguros de que a filosofia alquimista faz emprego de semelhante

    processo (Jung, 1986). Jung se apresenta aqui como crtico do mtodo redutivo freudiano que

    procura revelar as bases ou razes primitivas, instintivas, infantis da motivao

    psicolgica. Considera que desse modo o significado pleno do produto inconsciente,

    sintoma, sonho, imagem, lapso de fala, no desvendado. Ligando um produto

    inconsciente ao passado, seu valor presente para o indivduo pode se perder. Uma

    outra objeo a tendncia em supersimplificar atravs da reduo, omitindo o que ele via como implicaes mais profundas.

    O homem satisfaz necessidade da expresso mtica quando possui uma

    representao que explique suficientemente o sentido da existncia humana no

    cosmos, representao que provm da totalidade da alma, isto , da cooperao do

  • 39

    consciente e do inconsciente. A carncia do sentido impede a plenitude da vida e

    significa, portanto, doena (Jung, 1975). J Johnson (2003) descreve que, por causa da noo popular de que a

    imaginao fictcia, muitas pessoas reagem automaticamente achando que tal

    experincia com a imaginao no tem qualquer sentido. Elas pensam: "Estarei

    somente conversando comigo mesmo". Mas, se trabalhamos com a imaginao

    ativa, logo confirmamos que dialogamos com partes interiores, verdadeiras, de ns

    mesmos. Ns nos confrontamos com personalidades poderosas que vivem

    dentro de ns, ao nvel inconsciente, e que esto, comumente, em conflito com

    nossas idias e comportamento conscientes. Entramos de fato na dinmica do

    inconsciente: viajamos por uma regio aonde a mente consciente no sabia como penetrar.

    A imaginao ativa , em si, um mtodo de assimilao de contedos do

    inconsciente (sonhos, fantasias, etc.) onde estes se investem espontaneamente atravs de uma forma de auto-expresso nas vrias personificaes (pessoas

    conhecidas e desconhecidas, animais, plantas, lugares, acontecimentos). E como define Johnson (2003):

    (...) um dilogo que travamos com as diferentes partes de ns mesmos que vivem no inconsciente. Ela consiste em relacionarmo-nos com nossos sentimentos, pensamentos, atitudes e emoes atravs dos vrios personagens que aparecem em nossos sonhos e interagir ativamente com eles, isto , discordando, quando for o caso, opinando, questionando e at tomando providncias com relao ao que tratado, isso tudo pela imaginao (Johnson, 2003).

    Esse relacionamento e essa interao ativa fazem da imaginao ativa uma

    proposta teraputica mpar, no que diz respeito aos recursos por ela apresentadas.

    Para Johnson (2003) na Imaginao Ativa no estou exatamente "falando comigo

  • 40

    mesmo", mas sim conversando com uma das minhas personalidades. Nessa troca

    entre o ego e as vrias personalidades que afloram do inconsciente e aparecem na

    imaginao que comeo a juntar as peas fragmentadas de mim mesmo em uma

    unidade.

    Comeo a conhecer as partes de mim mesmo que nunca conheci antes e

    com elas comeo tambm a aprender. Aprender a lidar com nossos conflitos

    internos e reconhec-los como autnticos e resultantes de um ego, ora fragmentado,

    ora reconstitudo pelo aprendizado constante desse exerccio.

    O objeto da imaginao ativa dar voz aos lados da personalidade (em particular ao animus/anima e a sombra) que normalmente no so ouvidos, estabelecendo assim uma linha de comunicao entre a conscincia e o

    inconsciente.

    De acordo com Raff (2000) durante o exerccio da imaginao ativa o ego experimenta contedos do inconsciente que podem assumir a forma de uma

    imagem, voz, emoo ou mesmo sensao fsica. Tendo concentrado sua ateno

    no inconsciente o ego deve abdicar de todo pensamento crtico e estar aberto a

    qualquer coisa que aquele apresente. Estando receptivo ele deixa que o

    inconsciente se manifeste. O ego trabalha a imagem que percebe a voz que ouve ou

    aquilo que se sente, expressando tal manifestao da maneira mais completa

    possvel.

    O 'Eu' precisa entrar no ato imaginativo to intensamente quanto o faria se

    estivesse numa experincia exterior, fsica. Embora seja uma experincia simblica, , mesmo assim, uma experincia verdadeira que envolve sentimentos verdadeiros

    e gera sensaes tambm verdadeiras. A habilidade de ver e perceber a figura

  • 41

    interior combinada com a capacidade de ouvi-la colocar o indivduo em posio de

    realizar um trabalho bem profundo de imaginao ativa.

    Johnson (2003) alega que os eventos se sucedem em um ponto de confluncia entre o consciente e o inconsciente, caminhando um para o outro como

    dois rios que se fundem.

    (...) praticamente impossvel produzir qualquer coisa na imaginao que no seja uma representao autntica de alguma coisa do inconsciente. A

    funo integral da imaginao trazer o material do inconsciente, vesti-lo com imagens e transmiti-lo mente consciente. (...) Mesmo que uma pessoa seja leviana e, deliberadamente, tenta inventar algo, forjar alguma coisa boba e estpida, imaginar uma mera fico, o material que vem atravs da imaginao ainda representa alguma parte escondida desse indivduo (Johnson, 2003).

    Vestir essas imagens com um contedo consciente pode trazer-nos a

    possibilidade de elaborar em cima dessas imagens mecanismos de equilbrio

    neurovegetativo e , por conseguinte, processos de resoluo de patologias onde o

    psiquismo impera.

    E sabemos que as imagens mentais tm uma funo importante dentro da

    dinmica psquica, independentemente das consideraes tericas que as validam

    ou fundamentam como fenomenos mentais, como demonstra Kast (1997): Sendo a imaginao uma habilidade humana fundamental para o proces-samento de informaes e. assim, tambm uma possibilidade de orientao, de sentir e de lidar com emoes, acredito que essa tcnica deva ser relevada em toda e qualquer prtica teraputica, ou melhor, em todo trabalho teraputico que tenha por objetivo deixar as pessoas mais autnticas e mais autnomas, aproxim-las de seus inconscientes e das pessoas com quem vivem e, por fim. ensin-las a lidar consigo e com o mundo de forma mais emptica e criativa (Kast, 1997).

  • 42

    A imaginao torna-se ento uma possibilidade de terapeutizao onde os

    contedos trabalhados so originariamente do indivduo e representam a explorao

    dos contigentes do inconsciente em seu processo de individuao onde o indivduo

    aprende com seus prprios mecanismos e, portanto, aprende a se conhecer e toda a

    fisiologia que acompanha esse conhecimento para seu equilbrio Esse auto-

    conhecimento oferece a possibilidade de trabalho com as imagens mentais na busca

    de um equilbrio psquico e fsico, proposta desse estudo bibliogrfico.

    Johnson (2003) relata que a raiz da palavra imaginao a palavra latina imago, que quer dizer "imagem"; a imaginao a capacidade formadora de

    imagens da mente, o rgo que tem o poder de vestir os seres do mundo interior

    com imagens mentais para que possamos v-los. A imaginao gera os smbolos

    que o inconsciente usa para se expressar.

    Glikin (2001) cita que as imagens mentais tm uma plasticidade muito grande dentro da vida psquica e devem cumprir uma funo muito importante na medida

    em que podemos dizer que participam de muitos processos psquicos e que

    interferem definitivamente no comportamento e nas atitudes. As imagens parecem

    ter vida prpria e reconhecemos que em grande parte os rumos dos seus

    movimentos so determinados pelo inconsciente, inclusive revelia da conscincia e

    fora do mbito do seu controle. As imagens mentais so um tipo de pensamento

    usado para fazermos contato com nossa realidade subjetiva interna, como j citado anteriormente.

    Em sua abordagem Jung (1975) utiliza-se desse contedo das imagens do universo onrico j como uma possibilidade de enfrentamento e racionalizao do

    inconsciente, ao invs de deix-las suscitarem como efeitos negativos deste mesmo

  • 43

    inconsciente. Mais uma vez, a Terapia de Imagens Mentais demonstra seus

    benefcios nos processos psicoterpicos.

    Epstein (1990) sustenta que os efeitos fsicos benficos das imagens mentais so como os dois lados de um espelho ao qual chama de corpo, e que esse

    problema deriva da dicotomia corpo/mente ocorrido desde a era cartesiana at os

    dias de hoje. Reconhece que a medicina ocidental tem comeado a explorar conexo entre a mente e o corpo, citando a medicina comportamentalista e a

    psiconeuroimunologia, como exemplos, juntamente com os trabalhos de hipnose que mostram diretamente o impacto do mental no fsico.

    Ressalta que a medicina ocidental aceita sem problemas a ao do fsico

    sobre o mental, utilizando amplamente essa conexo atravs de todo tipo de

    tranquilizantes, antidepressivos e anestsicos (via corpo-mente). Considera como lgico que, aceitando o poder do corpo sobre a mente seria

    bvio aceitar o inverso, que o poder mental tal como a vontade ou as imagens,

    podem afetar o corpo ( via mente-corpo). Da, porque no aceitar os benefcios do trabalho com as imagens na melhoria de certas disfunes fisiopatolgicas, por

    vezes freqentemente observados nos processos de psicossomatizao?

    E prope j que considera que a pesquisa cientfica ainda no examinou o fenmeno de cura de forma minuciosa e metdica e que nem definio de sade e

    doena foram estabelecidas de forma concreta que poderamos nos valer de nossas

    prprias experincias clnicas, de nossas prprias vidas e dos ensinamentos de

    outras culturas para compreender o processo de criao de imagens. O trabalho

    com imagens se daria fora do mbito mecanicista de causa e efeito porque ele

    realizado no "eixo vertical" que o universo humano diferente do universo da fsica,

    j que um mundo fsico, emocional e psicologicamente criado por ns.

  • 44

    Epstein (1990) conclui que o trabalho com imagens sempre tende a colocar as pessoas sobre o eixo vertical, o qual isento de gravidade permite a pessoa

    escapar s restries comuns da vida presa a terra, desatando as amarras e

    derrubando as couraas que no nos deixam enxergar nosso potencial de se curar

    pelo nosso processo de auto-conhecimento.

    O modo como funciona o imaginrio mental pode ser entendido atravs de uma analogia cientifica. As clulas no corpo tm um potencial eltrico e elas oscilam em vrias frequncias. Estas frequncias eltricas so invisveis, mas para o olho nu so visveis em forma de cores. As cores diferentes, portanto, representam a presena de luz permitindo que o invisvel seja visto. Todas as clulas do corpo emitem luz, um reflexo de suas vibraes oscilatrias. Uma mudana na frequncia oscilatria das clulas produz uma mudana na luz -esta fica presa na clula e no consegue ser emitida. Quando a frequncia oscilatria perturbada pode ser regulada novamente e a razo vibracional pode ser equilibrada, o resultado o funcionamento de uma clula sadia. Esta a hiptese de trabalho para o campo da medicina vibracional ou eltrica que agora est surgindo nos Estados Unidos (Epstein, 1998).

    Epstein (1990) define que o modelo para a funo curativa "tornar-se inteiro". E localiza-o no mito de Osiris, que depois de assassinado foi desmembrado

    e voltou vida quando sua mulher sis recomps seus pedaos.

    Esse "rememorar" significa, para ele, literalmente, reconectar um pedao

    corpo ao outro. O corpo significando o fsico, o mental e o emocional unidos. O fim

    da dicotomia da era cartesiana mente-corpo para o incio de uma nova era de

    conscientizao de nossos prprios recursos interiores, atravs dessa leitura

    simblica das imagens que emergem de nosso inconsciente, vestindo-as com

    contedos e significados conscientes em prol de nossa sade e integridade fsica ,

    mental e emocional.

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    Para ele, cada parte do corpo fsico tem sua contrapartida emocional. Ao nos

    darmos conta dessa inter-relao, ampliamos o contexto dentro do qual iremos lidar

    com nossos corpos. Isso significa que cada sintoma ou sndrome tem uma fonte

    para a qu