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AS UNIDADES MORFOESTRUTURAIS DO ESTADO DO CEARÁ. INTRODUÇÃO A interação entre os processos tectônicos, as mudanças climáticas e os fluxos de matéria e energia que ocorreram ao longo de milhões de anos é de fundamental importância para a composição de modelos evolutivos do relevo. Abordando esses parâmetros e integrando-os com os processos morfogenéticos advindos desta conjunção, SOUZA (1988 e 2003) elaborou a mais completa classificação morfoestrutural para o Ceará, a qual iremos utilizar no decorrer desse estudo. Foi compartimentada em três domínios: i) DOMÍNIO DOS DEPÓSITOS SEDIMENTARES CENOZÓICOS (planícies fluviais, formas litorâneas e tabuleiros); ii) DOMINIO DAS BACIAS SEDIMENTARES PALEO-MESOZÓICAS (Chapada do Araripe, Chapada do Apodi e Planalto da Ibiapaba); iii) DOMINIO DOS ESCUDOS E MACIÇOS ANTIGOS (Planaltos Residuais e Depressões Sertanejas); representados por formas de acumulação, estruturais e erosivas (dissecadas e conservadas), respectivamente. A Figura 1a, representa, em linhas gerais, as principais unidades morfoestruturais do Estado do Ceará. É importante denotar a necessidade da aplicação de dados básicos, principalmente os relacionados à dinâmica evolutiva do relevo, na elaboração de medidas adequadas de uso e ocupação do território. A presença do homem quando da utilização dos recursos naturais evidenciou a delimitação de potencialidades, vulnerabilidades e potencialidades das unidades morfológicas. Os estudos geomorfológicos para a delimitação em escala de detalhe das unidades de relevo, deverão ainda produzir as bases para o monitoramento e avaliação dos agentes morfogenéticos perante as diversas formas de uso do solo. Os impactos ambientais derivados deverão ser sistematizados de modo a assegurar ações que elevem a diversidade biológica, o manejo das unidades de conservação e a qualidade ambiental das áreas protegidas, aliadas às necessidades socioeconômicas e culturais da população local. GEOMORFOLOGIA E EVOLUÇÃO DO RELEVO O objeto de dedicação em Geomorfologia é a camada mais externa da crosta terrestre, a qual se deve entender como um meio ou subsistema que se inter-relaciona com os restantes presentes na Terra: o biótico, o líquido, o gasoso e o antrópico, constituindo-se agentes que tomam parte na morfogênese. Portanto, segundo GILSANZ (1996), a superfície terrestre atual ou topográfica, pode considerar-se a síntese ou simplificação de outras que foram sucedendo-se ao longo da história geológica do Planeta. Desta forma, o objetivo fundamental da Geomorfologia é deduzir os antecedentes da superfície terrestre e, em seu caso, predizer possíveis configurações futuras.

As Unidades Morfoestruturais Do Ceará

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Texto sobre a morfologia do estado do Ceará.

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I DOMINIO DOS DEPSITOS SEDIMENTARES CENOZICOS

AS UNIDADES MORFOESTRUTURAIS DO ESTADO DO CEAR.

INTRODUO

A interao entre os processos tectnicos, as mudanas climticas e os fluxos de matria e energia que ocorreram ao longo de milhes de anos de fundamental importncia para a composio de modelos evolutivos do relevo. Abordando esses parmetros e integrando-os com os processos morfogenticos advindos desta conjuno, SOUZA (1988 e 2003) elaborou a mais completa classificao morfoestrutural para o Cear, a qual iremos utilizar no decorrer desse estudo. Foi compartimentada em trs domnios: i) DOMNIO DOS DEPSITOS SEDIMENTARES CENOZICOS (plancies fluviais, formas litorneas e tabuleiros); ii) DOMINIO DAS BACIAS SEDIMENTARES PALEO-MESOZICAS (Chapada do Araripe, Chapada do Apodi e Planalto da Ibiapaba); iii) DOMINIO DOS ESCUDOS E MACIOS ANTIGOS (Planaltos Residuais e Depresses Sertanejas); representados por formas de acumulao, estruturais e erosivas (dissecadas e conservadas), respectivamente. A Figura 1a, representa, em linhas gerais, as principais unidades morfoestruturais do Estado do Cear.

importante denotar a necessidade da aplicao de dados bsicos, principalmente os relacionados dinmica evolutiva do relevo, na elaborao de medidas adequadas de uso e ocupao do territrio. A presena do homem quando da utilizao dos recursos naturais evidenciou a delimitao de potencialidades, vulnerabilidades e potencialidades das unidades morfolgicas. Os estudos geomorfolgicos para a delimitao em escala de detalhe das unidades de relevo, devero ainda produzir as bases para o monitoramento e avaliao dos agentes morfogenticos perante as diversas formas de uso do solo. Os impactos ambientais derivados devero ser sistematizados de modo a assegurar aes que elevem a diversidade biolgica, o manejo das unidades de conservao e a qualidade ambiental das reas protegidas, aliadas s necessidades socioeconmicas e culturais da populao local.GEOMORFOLOGIA E EVOLUO DO RELEVOO objeto de dedicao em Geomorfologia a camada mais externa da crosta terrestre, a qual se deve entender como um meio ou subsistema que se inter-relaciona com os restantes presentes na Terra: o bitico, o lquido, o gasoso e o antrpico, constituindo-se agentes que tomam parte na morfognese. Portanto, segundo GILSANZ (1996), a superfcie terrestre atual ou topogrfica, pode considerar-se a sntese ou simplificao de outras que foram sucedendo-se ao longo da histria geolgica do Planeta. Desta forma, o objetivo fundamental da Geomorfologia deduzir os antecedentes da superfcie terrestre e, em seu caso, predizer possveis configuraes futuras.

Outros importantes objetivos da geomorfologia so: i) qualificar e quantificar a geometria do terreno (morfometria); ii) delimitar fisionomias segundo suas relaes com outros componentes da paisagem (fisiografia); iii) analisar o sistema de relaes entre formas do terreno e aes devidas aos agentes da dinmica terrestre (morfognese) e, iv) estabelecer as seqncias ou sucesses que ocorreram at o relevo adquirir sua configurao atual. Esses objetivos esto relacionados aos fatores dinmicos, os quais definem o tipo de processo e sua maior ou menor incidncia em um territrio. Relacionam-se ao sistema fluvial, ao clima, tectnica e ao vulcanismo. Os agentes geomorfolgicos, que so os meios para a transferncia de energia (rios, glaciao-deglaciao, vento, gravidade, placas litosfricas, magma, entre outros) refletem a dinmica da geosfera, produzindo um conjunto de aes relacionado com o arranque-eroso dos materiais (rochas e sedimentos), translado-transporte-denudao, sedimentao-agradao, decomposio-desagregao, deformao, deposio, compactao. Desta forma, ara compreender a evoluo do relevo, de fundamental importncia determinar as relaes que se estabelecem entre as aes desenvolvidas pelos agentes da dinmica terrestre e os produtos (morfologias) derivados.Os estudos de sistematizao da Geomorfologia como cincia iniciaram a partir da afirmao de que a superfcie da terra constituda por uma grande diversidade de formas diferentes que, descritas e interpretadas adequadamente, podem ser individualizadas e classificadas de maneira coerente. Evidencia a interao entre os processos endgenos (tectnicos, energia geotrmica, ) e exgenos (processos erosivos de destruio, energia solar), como as energias fundamentais para a compreenso da evoluo do modelado.

importante salientar que no final do sculo XX, se comemorou uma das mais importantes datas para a geomorfologia. Faz exatamente 100 anos que W.M. Davis publicou o seu clebre ensaio O Ciclo Geogrfico, cujas idias iriam dominar a pesquisa geomorfolgica durante meio sculo nos paises de lngua inglesa e francesa. Muitos autores consideraram ainda que Davis foi o verdadeiro fundador da geomorfologia, ao dot-la de um objeto e mtodos de investigao, que a diferenciava claramente da geologia (FERREIRA, 1999). Um dos aspectos mais marcantes da teoria de Davis a noo de ciclo na evoluo do relevo, constituindo uma das leis da eroso normal, juntamente com o perfil de equilbrio e o nvel de base.

Poderemos resumir as aportaes de Davis como sendo o relevo fruto da evoluo dos processos morfogenticos, a partir de um impulso tectnico inicial, evoluindo pela ao da eroso fluvial, segundo fases irreversveis (juventude, maturidade e senilidade), at ao seu completo arrasamento, formando-se uma superfcie quase plana, a peneplancie. Implicava fases curtas de deformao tectnica e fases longas (dezenas de milhes de anos) de estabilidade, durante as quais se processava o rebaixamento generalizado das vertentes. Essa interpretao foi contestada por Walter Penck (1924), que apresentou um modelo alternativo que levava em conta a atuao permanente da tectnica e da eroso. KING (1962), no seu modelo de pediplanao, conserva ainda da concepo devisiana a idia de ciclo e tambm a de alternncias de fases curtas de levantamento tectnico e fases longas de estabilidade, advogando um recuo generalizado das vertentes (ver Figura 1). Um grande passo para a Geomorfologia de Processos foi dado por BDEL (1982), com a teoria da dupla superfcie de eroso, atribuindo uma importncia fundamental alterao geoqumica na origem das superfcies de aplainamento. Considerou que nas regies de savana, isto , de clima tropical com alternncias de estao mida e estao seca, existem duas superfcies que evoluem independentemente: a superfcie topogrfica, que evolui por ao mecnica, devido essencialmente ao do escoamento superficial e, a superfcie basal ou superfcie basal de alterao, que corresponde ao contato do regolito com a rocha s e que evolui por alterao qumica.

Inspirado nos estudos realizados por W. Penck, em seu modelo sobre interao dinmica, o russo Gerasimov em 1946, introduz o termo morfoestrutura, quando estudava relevos complexos, gerados por impulsos tectnicos regionais, varias etapas de aplainamento e ao fluvial com fortes encaixamentos. Desta forma, a Geomorfologia Estrutural trata do estudo de todas aquelas fisionomias nas quais a tectnica, ao consolidar uma geoestrutura, atuou direta ou indiretamente como mais um fator geomorfolgico. Atualmente j se utilizam subdivises, como por exemplo Geomorfologia Litolgica e Tectnica, dependendo da primazia dos agentes do modelado (que caracteriza o processo), na configurao do tipo de relevo (GILSANZ, 1996). A Geomorfologia Climtica, que inclui tanto a anlise dos processos, como as formas associadas a uma zona ou regio climtica, fundamental para a composio integrada da origem e evoluo das formas de relevo.

CHORLEY (1962) e CHORLEY & KENNEDY (1971), apresentaram uma srie de postulados para a aplicao da Teoria Geral de Sistemas nos estudos geomorfolgicos, especialmente com as relaes dos processos morfogenticos, superfcies de aplainamento e as geoformas derivadas. Acrescentaram conceitos termodinmicos, formularam novas hipteses, como a de considerar que o sistema geomorfolgico aberto e que nele no cabe o conceito de estado final. Tambm introduziram conceitos de inestabilidade permanente e definiram o equilbrio segundo seja a tendncia a uma nova mudana ou estado. Aqui destacamos que estes foram os primeiros passos para a renovao da geomorfologia contempornea (MEIRELES & RUBIO, 1999).

A Geomorfologia adquiriu carter de cincia global a partir de sua estreita vinculao com a tectnica de placas. H mais de 30 anos, os estudos regionais esto aportando elementos fundamentais para a compreenso dos problemas de evoluo do relevo da Terra. A geodinmica global associada origem dos oceanos (a velocidade de expanso dos oceanos vai desde 1 cm/ano cerca de 20 cm/ano, ou seja 10 a 200 km/milhes de anos), se relaciona diretamente com a formao de grandes montanhas e cordilheiras (cordilheiras dos Andes, dos Alpes, do Himalaia, Pirineus, entre outras). importante salientar que as dorsais ocenicas (cordilheiras submarinhas) estendem suas ondulaes ao longo de 75.000 km - que debaixo das dorsais existem cmaras magmticas (magmas a mais de 1.000C) com altura de 3 km e somente a dois quilmetros abaixo do fundo ocenico; sabe-se que essas mesmas dorsais e seus flancos se esfriam por uma circulao de gua do mar que filtra o total da gua dos oceanos em alguns milhes de anos (NICOLAS, 1993) - e que a reconstruo destas macroestruturas fundamentaram os caminhos geodinmicos das placas continentais, a partir de um supercontinente (Pangea) que existiu h 200 milhes de anos A origem das principais superfcies de aplainamento, como por exemplo as grandes depresses sertanejas, nas quais o Cear encontra-se instalado em grande parte, indissocivel da prpria evoluo de grandes cadeias de montanhas. Atravs da ao dos processos morfogenticos, foram quase que totalmente arrasadas, depois de fases tectnicas, flutuaes climticas, mudanas do nvel de base regional, formao de bacias sedimentares, reativaes tectnicas e reajustamentos isostticos. importante ressaltar que o intemperismo e a pedognese so fatores muito ativos e intermedirios entre o embasamento e a eroso superficial. O papel do intemperismo de desagregao, com transformao isovolumtrica da rocha, sem afetar as caractersticas e as propriedades do relevo. A pedognese, por sua vez, ocorre por meio dos mecanismos de dissoluo, hidrlise e lixiviao que so muito intensos prximos superfcie e promovem a transformao dos produtos do intemperismo. A pedognese , ento, o motor dos fenmenos de aplainamento em zonas de desequilbrio pedobioclimtico, por meio da separao entre o plasma e o esqueleto no interior da cobertura pedolgica, preparando os horizontes superficiais para a ao da eroso superficial e o conseqente aplainamento do relevo (MILLOT, 1983, in VITTE, 2001). A complexidade dos processos e os tipos de relevos resultantes da ao conjunta dos fatores climticos aliados aos estruturais para a origem de superfcies aplainadas, esto relacionados com a teoria da etchplanao, a qual enfatiza a importncia do intemperismo qumico para a morfognese nas regies tropicais quentes e midas. Observando a Figura 2, que mostra a distribuio dos principais lineamentos da Regio de Dobramento Nordeste, segundo SCHOBBENHAUS et al. (1984), verifica-se que os eventos tectnicos foram importantes e que orientaram a formao de antigas cadeias de montanhas e bacias sedimentares. Observa-se, por exemplo, que o domnio Mdio Corea caracterizado por um sistema de falhas paralelas de direo NE-SW, destacando-se o lineamento Sobral-Pedro II. No Domnio Cearense, so caractersticos os falhamentos de mesma direo (p.ex. Senador Pompeu) e os de direo N-S ou NNW-SSE (Tau, Rio Groaras, Ors e Jaguaribe). importante afirmar que o relevo atual do Cear est diretamente vinculado aos eventos tectnicos regionais, caracterizados pela regio de dobramentos Nordeste ou provncia Borborema, tratando-se de um evento tectono-orogentico desencadeado no final do Proterozico Superior (h aproximadamente 570 milhes de anos) denominado de Evento Geodinmico Brasiliano. A Figura 3 evidencia parte dos lineamentos representados no mapa da figura anterior, atravs de uma imagem de satlite (no centro da imagem o aude de Ors). A dinmica topogrfica, a complexidade das estruturas geofsicas e a diversidade de lineamentos, sintetizam a relao do estado atual do relevo a partir da ao conjunta dos processos denudacionais perante a tectnica e as mudanas climticas

A evoluo do relevo do Cear est basicamente associados a regimes tectnicos e climticos diversos, relacionados com eventos que geraram as condies morfoestruturais para a origem de cadeias de montanhas (grandes reas que foram submetidas a processos de soerguimento). As regies topograficamente mais elevadas foram erosionadas e o material derivado foi utilizado para entulhar de sedimentos as reas que sofreram movimentos tectnicos negativos (origem de seqncias de rifts e grabens) ou ajustes isostticos que favoreceram a origem de bacias sedimentares. A ao do clima, como fator dinmico modelador do relevo, foi fundamental para a origem de camadas intemperizadas, as quais foram mobilizadas, em grande parte pelos agentes fluviais, para o fundo dos vales, alcanando as bacias sedimentares, a plancie costeira (nvel de base regional) e o mar.

Os indicadores morfoestruturais, litolgicos e climticos, controlados por fatores dinmicos (clima, tectnica, petrognese) e estticos (litologia, estrutura, morfologias pretritas), foram responsveis por uma complexa seqncia morfolgica, representada ao longo de nosso estado por diversas formas de relevo: i) megaformas como as depresses sertanejas; macroformas representadas pelo domnio das bacias sedimentares, relevos testemunhos e macios residuais; ii) mesoformas como os meandros, terraos fluviais e marinhos, inselbergs, setores contnuos de falsias vivas e mortas, delta de mar, campos de dunas e, iii) microformas evidenciadas pela presena de bancos de areia no leito dos rios, trechos de falsias vivas, plancies fluviomarinhas, arrecifes de corais, plataformas de abraso, entre outras.

importante denotar que os fenmenos ambientais que provocaram mudanas nas condies atmosfricas globais, originaram uma complexidade de reaes ambientais que interferiram nos processos morfogenticos. Promoveram mudanas bruscas dos agentes intempricos e de transporte de sedimentos, em diferentes dimenses e escalas variadas, em regies distintas do planeta. Possibilitaram a formao de fluxos de energia e materiais que transitaram por grandes reas do territrio, envolvendo intensidade e volume diferenciados. Processados de acordo com a dinmica climtica - a passagem de condies climticas midas para semi-ridas e ridas (perodo de transio), que processa a remobilizao de espessas camadas de material intemperizado (durante as condies de climas temperados) e, as reativaes tectnicas dos grandes lineamentos que cortam a crosta cearense em diversas direes.

O trnsito de materiais com diferentes constituies mineralgicas e granulomtricas, aliado ao tempo geolgico, tambm contriburam para a contnua transformao do relevo. Um gro de areia que se desloca ao longo da rede de drenagem, origina novas formas de relevo por todo seu trajeto, desde quando se desprende da rocha (ao intemprica), durante o transporte pelos rios (ao fluvial) at seu destino final, o mar e as plancies costeiras (ao dos ventos, ondas e mars). Ocorreram movimentos generalizados de massa (aes gravitacional e pluvial) nas encostas e vertentes dos vales, aportando materiais para a morfognese das reas topograficamente mais baixas e provocando o recuo das escarpas, que tenderam ao aplainamento durante os sucessivos ciclos de mudanas climticas. As coberturas de gelo que envolveu grandes reas continentais, por exemplo, no ltimo perodo glacial (por volta de 18.000 anos AP Antes do Presente), parte dos continentes americano e europeu estavam cobertos por camadas de gelo que alcanaram at 4 km de espessura. Quando submetidas a mudanas climticas (perodo interglacial atual), provocam mudanas eustticas (variao da quantidade de gua nos oceanos glcio-eustasia) e nas latitudes mais baixas os rios elevaram seu potencial erosivo (inciso vertical) e de transporte de sedimentos.

Como foi visto anteriormente, para a delimitao das unidades morfoestruturais do Cear, importante ter em conta que o relevo evoluiu de maneira integrada, tendo como elementos de interligao as energias modeladoras, impulsionadas pelos eventos tectnicos e mudanas climticas. A seguir sero apresentadas as principais unidades morfoestruturais do Cear, fruto da composio dessas foras que co-evolucionam de modo a originar um dos mais completos conjuntos de relevo do Brasil.AS UNIDADES MORFOESTRUTURAIS.I DOMNIO DOS DEPSITOS SEDIMENTARES CENOZICOS

As formas que representam essas unidades, seus diferentes nveis topogrficos, bem como um diversificado contedo litolgico, mineralgico, palinolgico (polens) e de estruturas geofsicas, mostraram-se como importantes geoindicadores de mudanas climticas, do nvel do mar e de eventos tectnicos. Este domnio constitudo pelas exposies Trcio-quaternrias da Formao Barreiras (relevo tabular) e pelas ocorrncias sub-atuais e atuais das paleodunas, rampas de colvios, terraos fluviais e marinhos, sedimentos de aluvies e de praia.

No Estado do Cear, os tabuleiros pr-litorneos foram tratados inicialmente por MORAIS (1980) e SOUZA (1975, 1978, 1981 e 1988). So constitudos tanto por rochas sedimentares de variada composio mineralgica e compactao, como por materiais inconsolidados. Nas proximidades da linha de costa, formam as falsias vivas, as quais foram delimitadas de acordo com os afloramentos destes materiais e quando representados na forma de escarpas em contato com a linha de praia. importante salientar que a ocorrncia deste geoelemento pode estar relacionada com fatores tectnicos. Assumpo (1989) relaciona a presena de afloramentos da Formao Barreiras na costa nordestina, com reas representantes de baixos estruturais. Em locais onde no afloram, o autor refere-se a um sistema de falhamentos que originou altos estruturais. Esses pontos foram mais atingidos pelos processos denudacionais, sendo praticamente erodidos ou rebaixados at alcanarem o plano de base regional. Desta forma, as falsias atuais podem ser tratadas como morfologias em pleno processo denudacional, pois, em vrios pontos do litoral, encontram-se topograficamente elevadas em relao ao nvel de base regional (a linha de costa). As falsias existentes nas praias de Icapu, Aracati, Beberibe, entre outras, demonstram que esses depsitos alcanaram regies onde atualmente ocorre a plataforma continental, indicando que os sedimentos desta Formao, atingiram, durante os eventos geolgicos relacionados com a origem do depsito, regies onde atualmente encontra-se a plataforma continental interna.

Os nveis altimtricos variam desde 80-100m no interior, at o nvel do mar. Mergulham de modo quase imperceptvel para o litoral, com declives no superiores a 5. A morfologia tem um aspecto rampeado, apresentando-se como tpico glacis de acumulao. importante entender que o termo glacis se aplica a qualquer superfcie de inclinao suave que descende desde uma escarpa de articulao at um nvel mais ou menos plano (Figura 4). Em nosso caso, partem de substratos representados pela superfcie de eroso definida como depresso sertaneja e bordas dos macios residuais pr-litorneos e alcanam a faixa de praia na forma de falsias. No extremo leste do estado esto sobre sedimentos cretceos da Bacia Potiguar. Litologicamente, o pacote sedimentar apresenta material de textura areno-argilosa de cor creme-amarelada ou vermelha, com nveis conglomerticos e concrees de xido de ferro (lateritas).

Os sedimentos coluviais esto localizados na base dos relevos escarpados. Derivam da remobilizao, em ocasies de deslizamentos, que sofrem os materiais das encostas devido s rupturas, deformaes e movimentos de massa, em geral, associados fora da gravidade e a incidncia de chuvas (acentuados pelo desmatamento das encostas). O controle destas aes so exercidos normalmente por fatores climticos e litolgicos, porm, a mobilidade especfica est relacionada segundo os diversos tipos de materiais constituintes e superfcie topogrfica prvia ao fenmeno. Sua composio equivalente ou idntica ao material originrio (fruto do intemperismo da rocha que origina a superfcie topogrfica que originou o material coluvionar).

Os terraos fluviais (Fotografia 1) so feies associadas aos sistemas fluviais. Encontram-se normalmente dispostos ao longo dos rios, originando um conjunto de formas particulares, relacionadas basicamente com o aporte de sedimentos, energia de transporte e fluxo de materiais. Os processos geomorfolgicos esto vinculados s mudanas do nvel de base regional ou local, provocadas por fatores climticos que alternaram climas midos e secos, como por efeitos tectnicos. Em nosso estado freqentemente podem ser encontrados ao longo dos maiores rios, entre os mdio e baixo curso, alargando-se consideravelmente no baixo curso fluvial. Podem alcanar altitudes, a partir do canal principal, de at 35m, escalonados em patamares relacionados com a inciso vertical ou movimentaes neotectnicas. Geologicamente do origem aos depsitos de aluvio, com litologias representadas por areias que variam desde muito finas a grossa, podendo estar presente tambm argilo-minerais, cascalho e blocos de rocha. Os materiais mais grossos tendem a serem depositados no alto curso, quando diminui a energia de transporte, originando zonas de cascalheira associadas a terraos fluviais estritos. No mdio curso fluvial os terraos so constitudos por uma mescla de sedimentos arenosos e argilosos, principalmente quando esto presentes os diques marginais e plancie de inundao. Ocorre um predomnio de minerais argilosos no baixo curso e desembocadura, quando a combinao dos fluxos fluvial e das mars provoca a deposio de materiais de colorao escura, reflexo de matria orgnica decomposta e intensas atividades bioqumicas.

As formas litorneas (Fotografias 2 a 5) foram originadas atravs da ao das ondas, mars, correntes marinhas, fluxos fluviomarinhos e ventos. Esses processos, durante o Quaternrio, foram submetidos a eventos relacionados com mudanas climticas e flutuaes do nvel do mar (transgresses e regresses marinhas). As variaes do nvel do mar foram responsveis pela origem de uma srie de morfologias ao longo da plancie cearense, identificadas e correlacionadas com as demais unidades ambientais (MEIRELES, 1991 e MEIRELES e SERRA, 2002). Foram posicionadas dentro de uma ordem de eventos, destacando-se os seguintes: i) Penltima transgresso, durante o Pleistocno, em que o nvel do mar atingiu cotas superiores a 8m acima do nvel atual. Falsias mortas existentes na plancie de Icapu foram modeladas durante esse evento. Essa transgresso tambm possibilitou a formao de extensas plataformas de abraso, dispostas em vrios pontos do litoral. Falsias mortas em outras localidades, como por exemplo nas plancies de Paracur, Acara e Jericoacoara, podem tambm serem associadas aos eventos de mudanas do nvel relativo do mar durante o pleistocno; ii) regresso subseqente originou terraos marinhos pleistocnicos. Esto posicionados no interior da plancie de Icapu, nas proximidades das falsias mortas. Registros de nveis do mar de at 100m abaixo do atual, na costa leste e nordeste brasileira, favoreceram a formao de uma larga plancie pleistocnica, onde os rios da regio tinham seus vales encaixados na atual plataforma continental; iii) A ltima transgresso, holocnica, em que o nvel do mar alcanou uma cota de aproximadamente 4m acima do nvel do mar atual, foi responsvel pelo retrabalhamento dos terraos originados na regresso anterior. No litoral cearense os terraos pleistocnicos foram praticamente erodidos. Essa transgresso tambm originou falsias mortas distribudas ao longo da plancie; iv) A regresso subseqente foi responsvel pela origem dos terraos marinhos holocnicos e, segundo SUGUIO et al.(1985), teve incio por volta de 5.100 anos A.P. Esses depsitos so constitudos por areias marinhas (ricas em fragmentos de conchas e restos de antigos corais), com largura mdia de at 4km, como na plancie costeira de Icapu. A ocorrncia de depsitos de mangue na zona de estirncio e a presena de camadas de rochas coralinas (com espessura de at 30cm), aflorando sobre plataforma de abraso disposta na linha de praia atual, evidenciaram eventos regressivos e transgressivos, respectivamente, em uma curva regional descendente, e v) Formao de lagunas, lagoas, eolianitos, geraes de dunas e paleomangues, durante a fase em que a regresso alcana nveis mais baixos que a linha de praia atual).

As diversas geraes de dunas esto relacionadas com mudanas climticas, aporte de sedimentos, ventos e morfologia da linha de costa. A fonte de sedimentos para a formao de extensos campos de dunas, por exemplo, os depsitos elicos existentes na plancie costeira dos estados do Rio Grande do Norte, Cear, Piau e Maranho, certamente est relacionada com perodos regressivos (disponibilidade de areia na plataforma interna descoberta) e climas ridos a semi-ridos (ventos, insolao, pluviosidade reduzida e baixa umidade), condies ambientais ideais para a remobilizao dos sedimentos arenosos. No litoral cearense foram definidas 4 geraes de dunas (MEIRELES, 2001; MEIRELES e MAIA, 1998), destacando as dunas denominadas de eolianitos (informalmente como reliquiares ou fsseis), que somente foram encontradas no litoral oeste. Esse tipo de duna foi formado pela cimentao dos sedimentos arenosos ricos em material carbontico, proveniente da plataforma interna. As dunas mveis, quando relacionadas aos promontrios ou quando migram na direo dos canais estuarinos, os sedimentos so novamente lanados para a praia, atuando como reguladoras da quantidade ideal de areia na faixa de praia. So morfologias fundamentais para evitar a instalao de processos erosivos.

Estudos mais detalhados relacionados com a evoluo do litoral cearense, com a sistematizao dos indicadores morfolgicos de flutuaes do nvel relativo do mar (arenitos de praia, paleoplataformas de abraso marinha, paleomangue, dataes radiomtricas, entre outros) podem ser encontrados em MEIRELES (2001 e 2003) e AQUASIS (2003). Dados sobre os aspectos geolgicos e ecossistemas costeiros foram publicados por MORAIS (1980), BRANDO (1995), MEIRELES (1997); VICENTE da SILVA (1998), MEIRELES e MAIA (1998), MEIRELES e SERRA (2002 e 2003) AQUASIS (2003), entre outros.

II O DOMNIO DAS BACIAS SEDIMENTARES PALEO-MESOZICAS.Chapada do Araripe.

Apresenta-se como uma superfcie tabuliforme, cujo eixo maior se dispes de este para oeste com extenso da ordem de 170-180km (Fotografia 6). De norte para sul, a largura no ultrapassa os 70km. Os nveis altimtrico da Chapada esto em torno de 850-900m. Os arenitos da Formao Exu funcionam como mantenedores do relevo que exibe feies planas e dissecao particularmente nula. Abrange a poro meridional do estado, fazendo limites com os estados de Pernambuco e do Piau (SOUZA, 1975).

Estudos mais recentes sobre a origem da Bacia do Araripe foram realizados por NEUMANN (1999), evidenciando os processos geolgicos, geomorfolgicos e paleoclimticos. A Figura 6 mostra um esboo geomorfolgico da bacia, contendo as camadas sedimentares que apresentam diferentes respostas aos processos erosivos, o que originou patamares escalonados e a presena de brejos de encosta e de p-de-serra. Segundo SOUZA (1988), a Chapada do Araripe constitui, em suma, uma superfcie de relevo tabuliforme desenvolvida em estruturas concordantes horizontais e sub-horizontais, seccionadas por superfcie de eroso. importante ressaltar que o recuo vertical das encostas representa um importante processo morfogentico, representado por evidencias de setores de blocos de arenitos e calcrios dispersos na depresso perifrica e afastados, em alguns setores, mais de 40 km da escarpa atual. Chapada do Apodi Abrange a poro norte oriental do Cear, limitando-se com o Estado do Rio Grande do Norte. Apresenta superfcie bem conservada at um nvel de aproximadamente 250m. capeada por calcrios pertencentes Formao Jandara que forma pequena cornija responsvel pelo desnvel com o arenito da Formao Au. O topo levemente rampeado para Norte, conferindo ao relevo um aspecto cuestiforme. As reas que o circundam, constituem patamares dissecados de modo incipiente, posicionados pouco acima da plancie fluvial do baixo Jaguaribe (SOUZA, 19878).

Segundo SCHOBBENHAUS (1984) o esboo estrutural da bacia apresenta as seguintes feies: Plataforma oeste: uma estrutura monoclinal rasa, com mergulhos suaves, em torno de 2, para NNE-E, limitada a oeste e sudeste pelo embasamento cristalino; Graben central: uma fossa tectnica relativamente rasa, limitada a leste e oeste pelas plataformas monoclinais. Ao sul defronta com o embasamento e mergulha em direo ao mar e, Plataforma leste: uma monoclinal rasa, suavemente inclinada para o norte, limitada ao sul pelo embasamento e a oeste por uma zona de falha.Planalto da Ibiapaba/Serra Grande.

Segundo a descrio de SOUZA (op cit.), abrange toda a poro ocidental do Cear nos limites com o Estado do Piau. Dispe-se de sul para norte atravs de um escarpamento contnuo, abrupto e bastante festonado (Fotografia 7). Esta continuidade s rompida na rea de superimposio do Rio Poti. Representa o rebordo oriental da bacia do Maranho-Piau, de cuja base se estende a depresso perifrica ocidental do Cear. Para sudoeste , os pedimentos que se espraiam a partir da escarpa, coalescem com aqueles que partem da Chapada do Araripe, constituindo a depresso perifrica meridional. Trata-se de um relevo dissimtrico, cujo front (declives variveis entre 25 e 30), com desnvel entre a cimeira do planalto e as depresses em torno de 600m), escarpado, contrasta, para oeste, com um revesso de caimento topogrfico suave, configurando a morfologia de cuesta. A espessura da cornija arentica variada de norte para sul. Prximo cidade de Tiangu, o arenito repousa de modo discordante sobre quartzitos. De tiangu para Viosa do Cear, nota-se um adelgaamento da cornija e em alguns pontos a exumao do embasamento cristalino. O relevo dissecado em lombadas, cristas e colinas rasas. A escarpa perde altura para o norte, restringindo-se a um front disseminado. Transposto o rebordo escarpado, atinge-se a cimeira do planalto num nvel mdio de 750m. O mergulho estratigrfico passa ento a comandar as caractersticas morfolgicas. Para oeste, a superfcie apresenta um caimento topogrfico quase imperceptvel, no superior a 3-5. H estrita correlao entre estrutura geolgica e a morfologia. Tais relaes s perduram cerca de 30-35 km para oeste.

Na medida que os processos degradacionais tornam-se mais incisivos, desenvolve-se na direo do Piau uma vasta depresso monoclinal, a partir de rebordos interiores, cujos declives se assemelham ao front externo. O reverso imediato, ao norte, sulcado por pequenos cursos dgua conseqentes que formam estritas plancies fluviais.

importante salientar que os processos morfogenticos, relacionados com chuvas orogrficas e desmatamento das encostas e vertentes de interflvios tabuliformes, esto gradativamente contribuindo para a eroso do solo e a origem de voorocas. As reas com atividades agrcolas e pastoris, nas proximidades das vertentes e encosta da rea mais mida da Chapada, que ainda conservam espcies arbreas, favorecem a manuteno das capas de solo.

III DOMNIO DOS ESCUDOS E MACIOS ANTIGOS.PLANALTOS RESIDUAIS

Dispersam-se pelas depresses sertanejas apresentando-se como compartimentos ilhados e contribuindo para diversificao fisiogrfica e ecolgica do semi-rido cearense. Exibem diferenas do ponto de vista altimtrico, quanto composio litolgica, feies de dissecao e abrangncia espacial. Normalmente so constitudos por rochas do embasamento cristalino e essencialmente por litologias metamrficas; apresentam-se dissecados em feies convexo-aguadas onde se desenvolvem solos da classe de podzlicos vermelho-amarelos e litlicos; tm drenagem com padres dendrticos e subdendrticos, revelam certa instabilidade nas encostas dotadas de declives mais acentuados. Seguindo a classificao de SOUZA (1988), foram individualizados os seguintes compartimentos:Serra de Baturit

Constitui um dos mais expressivos compartimentos de relevos elevados situados perto do litoral, de onde dista pouco mais de 50km. Desenvolve-se em litologias do complexo gnassico-migmattico, com orientao NNE-SSW e altitudes que variam de 500 a 800m.

A disposio do relevo, face ao deslocamento dos ventos, condiciona a formao de chuvas orogrficas na vertente oriental e nas cimeiras (prevalecendo solos podzlicos vermelho-amarelos revestidos principalmente por floresta plvio-nebular). Por conta de maior umidade, predomina a morfognese qumica, com vales dissecados em formas de topos convexos, lombadas, e, mais raramente, cristas. A forte capacidade erosiva da drenagem, evidente pela maior disponibilidade de gua para a escorrentia, define vales em forma de V. Em alguns pontos esses vales se alargam, o que origina plancies alveolares, colmatadas por depsitos colvio-aluvionares. O contato de vertente de barlavento com os terrenos das depresses sertanejas se faz atravs de pedimentos dissecados.

A vertente ocidental, com chuvas mais escassas, apresenta condies ambientais que guardam semelhanas com as depresses sertanejas. As feies so mais conservadas, com camadas de alteraes menos espessas. Devido a menores precipitaes pluviomtricas, comparado com a vertente oriental, a inciso fluvial pouco marcante, justificando pequena amplitude altimtrica entre o fundo dos vales e os interflvios. O contato entre as depresses sertanejas nos sertes de Caridade-Canind tambm atravs de pedimentos. Eles constituem rampas suaves, sem indcios de dissecao e so recobertos por paleopavimentos de granulao mais grossa. De modo geral prevalecem condies de morfognese mecnica (SOUZA, 1981).Os processos erosivos atuais, aliados com as formas de utilizao das vertentes, esto promovendo a perda de solo (Fotografia 8). O desmatamento das encostas e nascentes, as queimadas, a agricultura de sequeiro e a irregularidade das chuvas, promovem a remobilizao de solos os quais, antes, eram associados a uma mata arbrea e com elevados ndices de umidade. Este material remobilizado est assoreando os pequenos riachos e acelerando o assoreamento dos audes. Macios centrais e ocidentais

Alinham-se na direo preferencial SSW-NNE. Compem-se de um conjunto de relevos residuais elevados, com nveis em torno de 600m, que abrigam litologias pertencentes aos complexos litolgicos pr-Cambrianos. As serras do Machado, Basties Aimor, Maia, So Vicente e So Jos representam os compartimentos mais destacveis. Os efeitos da dissecao se produzem na ocorrncia de relevos de cristas , hog-backs, colinas rasas e encostas de declives superiores a 15. Alguns setores do relevo como na serra do Machado, os dobramentos antigos trazem influncia na morfologia atravs da ocorrncia de cristas e vales alinhados, dispostos paralelamente, a exemplo de modelos Apalacheanos. Na serra dos Basties, a originalidade geomorfolgica conferida aos extensos alinhamentos de hog-backs, intercalados por vales profundos. Nas encostas mais ngremes h uma concentrao acentuada de mataces. As alteraes superficiais so espessas nas vertentes orientais onde se desenvolvem podzlicos vermelho-amarelos recobertos por matas ou caatinga arbrea. Nas encostas de sotavento, h primazia de solos rasos, litlicos, com caatingas revestindo-os (SOUZA, 2003).Serra da Meruoca-RosrioSitua-se a oeste do rio Acara, prximo s cidades de Sobral e Massap. Apresenta uma forma retangular com comprimento e largura de 25 e 20km, respectivamente. Estruturalmente corresponde a um stock grantico. limitada por prolongamentos de falhas, o maior dos quais, dispondo-se na direo SW-NE, constitui o limite ocidental do graben Jaibaras (CPRM, 1973, in SOUZA 1988). Pela localizao e disposio do relevo, as encostas oriental e norte oriental, alm do topo da serra, situado ao nvel de 750m, so submetidos a um regime de precipitaes elevadas e mais regularmente distribudas durante a estao chuvosa. Desenvolvem-se condies propcias ao surgimento de um brejo de cimeira, revestido originalmente por floresta. Na Serra do Rosrio revela-se uma diminuio progressiva das precipitaes, denunciado pela disperso da caatinga. As condies morfoclimticas mais de perto se assemelham s vigorantes nas depresses sertanejas. Os nveis suspensos de pedimentao foram em parte desmontados, constituindo-se uma paisagem dissecada em cristas. base de suas encostas, formam-se pequenas depresses intermontanas que tm caractersticas anlogas aos cones de detritos coalescentes. O material que as recobre heterogneo em termos granulomtricos e morfoscpicos, indicando pequena capacidade seletiva das correntes de escoamento torrenciais. Serra das MatasApresenta-se como um bloco elevado, com altitudes mdias 550-600m. constitudo por litologias do complexo migmattico-grantico. Mostra evidncias de eventos ligados ao tectonismo plstico (dobramentos) e ruptural (falhamentos). Algumas cristas se ressaltam sobre o plat, em nveis superiores a 750m. Na poro central e sub-oriental, o relevo menos acidentado e os interflvios tm topos convexos e tabulares. Nos demais setores as feies de cristas e vales so predominantes. A vegetao de caatinga tem porte arbustivo (SOUZA, 1981 e 1988).MACIOS PR-LITORNEOSConstituem compartimentos de relevos prximos ao litoral. Dentre os de maior destaque se assinalam as serras de Uruburetama, Maranguape e Aratanha. A serra de Uruburetama apresenta-se como um bloco compacto de quase 1.000 km2 de rea, formada em rochas do complexo migmattico. Em inmeros setores o padro de drenagem retangular, com forte controle estrutural. A regra, porm, a primazia de padres dendrticos e subdendrticos na rede hidrogrfica. Nas encostas que limitam o macio comum observar-se passagens de pedimentao que se posicionam ao nvel das depresses sertanejas, isolando espores de inselbergs (Fotografia 9). As serras de Maranguape e Aratanha apresentam caractersticas morfolgicas e ambientais semelhantes aos demais macios midos e submidos do Cear. importante salientar que as intervenes antrpicas, relacionadas com desmatamento das encostas e chuvas torrenciais, originou movimentos de massa em diversos pontos das vertentes, provocando a remobilizao do solo, deslizamentos e desmoronamentos.PEQUENOS MACIOS SERTANEJOSSegundo SOUZA (1988), dispersam-se por todo o territrio estadual, rompendo a continuidade das depresses sertanejas. Posicionam-se como nveis intermedirios entre os planaltos elevados cristalinos e sedimentares e as depresses sertanejas. De suas bases, a exemplo do que se verifica nos nveis cimeiros, partem as superfcies pedimentadas que coalescem para formar a superfcie de piso regional. A altimetria no supera a cota de 600m, o que, de certo modo, limita a incidncia de chuvas mais abundantes. Os processos da morfodinmica atual derivam da morfognese mecnica e o topo de alguns residuais so aplainados, como se nota nas serras de Carnutim, Quincoc, da Baixa, etc. Outros exibem uma dissecao incipiente com algumas formas aguadas, se destacando sobre os nveis de plat.

Os processos denudacionais esto fortemente relacionados com a ao do homem. Estes setores do relevo cearense foram intensamente desmatados e a eroso proporcionou, de forma quase generalizada, o afloramento de blocos de rocha. O material resultante da eroso dispersou-se sobre a superfcie sertaneja e foi carreado para as bacias hidrogrficas.

Fotografia 8 Setor sul da serra de Baturit, nas proximidades de Aratuba (Foto de J.Meireles).

DEPRESSES SERTANEJAS

Esto situadas em nveis altimtricos inferiores a 400m, englobando cerca de 100.000km2, quase 70% do territrio estadual. Dispem-se na periferia dos grandes planaltos sedimentares ou embutidas entre esses e os macios residuais. So marcadas pela primazia de topografias planas ou levemente onduladas, quando os nveis altimtricos tm altitudes mdias entre 130-150m. Nas altitudes superiores a 300m a dissecao mais evidente isolando interflvios de feies colinosas, tabuliformes ou lombadas. Os aspectos morfolgicos das depresses sertanejas se expem atravs dos pedimentos que se inclinam desde a base dos macios residuais, dos planaltos residuais e dos inselbergs. O caimento topogrfico feito no sentido dos fundos de vales e do litoral.

Dentre as caractersticas que individualizam estes compartimentos podem ser destacadas as seguintes: i) acentuadas variaes litolgicas; ii) truncamento indistinto das litologias por processos de morfognese mecnica; iii) revestimento generalizado por caatinga que possuem pequena capacidade para deter ou atenuar a ao de desgaste; iv) pequenos encraves de cerrado nas bacias sedimentares; v) pequena espessura do manto de alterao das rochas; vi) ocorrncia freqente de pavimentos e paleopavimentos; vii) deficiente capacidade de eroso linear face a intermitncia sazonal dos cursos dgua, justificando a pequena amplitude trmica entre os interflvios e os fundo de vales; viii) ocorrncia de inselbergs e cristas residuais em setores de maior resistncia e; ix) desenvolvimentos de reas de acumulao inundveis jusante das rampas pedimentadas.

Diante das relaes mtuas que se verificam entre os componentes do ambiente natural, impossvel discernir a respeito de setores que possuem caractersticas fisiogrficas e ecolgicas mais homogneas. Isso se deve s variaes litolgicas, aos eventos tectnicos remotos evoluo paleoclimtica e morfodinmica atual. Afirma ainda que, dentre estes setores, podem ser considerados em uma compartimentao preliminar os seguintes: depresso perifrica ocidental; depresso perifrica meridional; e depresso perifrica oriental (SOUZA, op cit.).

Normalmente, as reas pediplanizadas prximas aos planaltos sedimentares e macios residuais, so recobertas por sedimentos provenientes das reas mais elevadas, o que origina um relevo cncavo, constitudo por uma grande diversidade granulomtrica, e muitas vezes representado por vrios pulsos de movimentos de massa, que vo recobrindo os anteriores (coalescncia), e gradando para uma superfcie aplainada. Podem estar associados a mudanas climticas, com a remobilizao mais generalizada ser correlacionada aos eventos de transio entre climas mais midos para mais secos.CONCLUSOAs unidades morfoestruturais do Cear foram apresentadas de modo a comporem um conjunto de formas originadas pelos processos tectnicos pretritos e mudanas climticas que ocorreram ao longo dos perodos Tercirio e Quaternrio. A figura 7 mostra a interao das principais energias modeladoras do relevo, as quais foram relacionadas direta e indiretamente com a origem e desenvolvimento dos processos morfogenticos que atuaram para a composio morfoestrutural do relevo cearense.

Com os primeiros passos para a interpretao conjugada, levando em conta os vrios estgios tectnicos e climticos ao longo do tempo geolgicos, demonstramos que ainda estamos no incio da caminhada para a composio de um modelo detalhado e representativo da complexidade que envolve os fatores e agentes modeladores do relevo.

Para dar continuidade aos estudos relacionados aos aspectos morfolgicos do relevo cearense, estudantes, pesquisadores e profissionais, devero levar em conta a interao entre os processos morfogenticos endgenos e exgenos, para a composio de um modelo evolutivo com as diversas formas de uso dos recursos naturais. Neste caso, para aprimorar o modelo geomorfolgico apresentado neste captulo, passa, fundamentalmente, pela elaborao de estudos multidisciplinares, com a confeco de zoneamento ambiental integrado e participativo, essencial para o planejamento e gesto do territrio.

Figura 7 Fluxograma que representa a interao entre as principais energias modeladoras do relevo, as quais foram relacionadas com a origem e desenvolvimento dos processos morfogenticos que atuaram para composio morfoestrutural do relevo cearense.Fotografia 7 Planalto da Ibiapaba. Evidencia a rede de drenagem e o front, com os sedimentos da bacia sedimentar repousando sobre o embasamento cristalino (Foto de J.Meireles).

Fotografia 6 Escarpa da Chapada da Ibiapaba. Vertentes abruptas, recobertas por vegetao arbrea e mostrando festonamento caracterstico. Escapa vertical associada a depsitos coluviais e material originado por movimentos de massa (Foto de J.Meireles).

Fotografia 8 Inselgergs na depresso sertaneja de Quixad (Fotografia de J.Meireles)

Figura 6 Bloco diagrama do setor lesta da Bacia do Araripe, segundo NEUMANN (2001).

Fotografia 5 Arenito de praia (beachrocks) sem evidencias de fraturas (neotectnica), sobre plataforma de abraso marinhas intensamente fraturada (Foto de J.Meireles).

Fotografia 3 Terrao marinho holocnico na plancie costeira de Camocim. Tratam-se de antigas praias suspensas em relao praia atual. Repousam sobre plataformas de abraso marinha (Foto de J.Meireles).

Fotografia 2 Falsia viva na plancie costeira de Icapu . Ao fundo o promontrio de Ponta Grossa (Foto de J.Meireles).

Fotografia 1 Terrao fluvial associado ao canal principal do rio Batateira, regio do Cariri (Foto de J.Meireles).

A Figura 5 mostra uma seqncia de terraos fluviais originados atravs da ao do fluxo fluvial e as mudanas no aporte sedimentar, flutuaes do nvel de base regional e efeitos tectnicos.

Fotografia 4 Campo de dunas mveis. Migram na direo do esturio do Rio Munda. Ao atingirem o canal, os sedimentos formam bancos de areia que so transportados para a linha de costa, os quais iro contribuir para manter as praias com um aporte regular de areia (Foto de J.Meireles).