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Às vezes você precisa criar o que você quer para ser parte ... · lhe o cigaruto. — não sabia ao certo se era correto dizer obrigadoµ para NÃO! — aquilo. Disse mesmo assim

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“Às vezes você precisa criar o que você quer para ser parte daquilo”

Geri Weitzman

Música referência:

Knights of Cydonia - Muse

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Parte A: “Come ride with me, through the veins of history”

— Então você não gosta de repolho, é?!

— NÃO!

— De vez em quando, umas três vezes por semana eles fazem! Teve

uma vez durante a Crise que, por falta de fornecimento de alimentos aqui

em Kyoki e na região, todos só comiam arroz, alga e repolho! Todo dia!

Todo dia santo! Você imagina?! Arroz, alga e repolho; alga, repolho e

arroz; repolho, arroz e alga todos os dias! Tinha gente vomitando pra tudo

que é lado! Foi bem nojento!

— POR QUANTO TEMPO ISSO?!

— Uns treze dias! Ou mais!

— HM. E VOCÊ?! CONSEGUIU AGUENTAR ARROZ, ALGA E REPOLHO

TODO DIA SANTO?!

— Eu?! Não, eu não estava no Centro naquela época!

— HM. ENTÃO COMO VOCÊ SABE DISSO?!

Nox olhou para Don Torino e deu um risinho de canto de boca:

— Ah! Eu sei! Eu venho e volto! Apareço nos lugares de vez em

quando e sei das coisas! — finalizou com o sorriso de dente canino

dourado esboçado.

Ambos corriam lado a lado; Nox em seu veloz alazão marrom-

cepo-de-madeira; Don num jipe/carrinho de golfe prata do Hospício.

Estavam gritando para poderem se ouvir em meio ao vento na cara e à

velocidade. Nox não exclamava tão alto quanto Torino; sua voz grave ia

diretamente aos tímpanos do ouvinte aparentemente sem esforço vocal

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intenso. Ele fumava dois cigarros. Jogou um fora. No toque do cigarro

com o solo, imediatamente surgiu o fogo, queimando parte do campo

verde gramado de atividades ao ar-livre do Centro: golfe, meditação,

ioga, tênis, peteca, etc. Algumas quadras, bandeirinhas de golfe e redes

de tênis se espalhavam pelo extenso campo.

— Ih. Talvez isso me dê problemas.

— O FOGO?

— É! Mas tanto faz!

Don aceitara o convite de Nox para “ir passear”, “se divertir” e

“caçar um pouco”, de acordo com estas exatas palavras, embora

desconfiasse dez por cento da veracidade de tais afirmações apenas

por observar o olhar enigmático e o comportamento suspeito de seu

recém-conhecido colega de hospício. “Vou dar uma chance pra ele,

sabe. Afinal, quem não tem comportamento anormal por aqui? ”, Don

raciocinou deste modo, seguindo o fluxo lógico de premissas obtidas a

partir da breve, porém intensa, experiência que teve nas últimas 28 horas

de estadia em Chryskylodon.

A briga no refeitório começara na fila. Quando um retirou a mão

do ombro direito do outro, muitos já foram sagazes para perceber que

algo estava errado. A discussão era em relação a algo com a sopa ou os

pratos. Promovida por, talvez, dois idiotas egoístas, inconsequentes,

ousados e depravados, aficionados por ter mais comida no próprio prato;

provavelmente com problemas de hiperatividade e transtorno

neuropsiquiátrico de déficit de atenção e impulsividade; com certeza

sádicos, psicopatas e loucos por ataques, e violência, e grandes

aglomerações conflituosas. Em instantes, a luta se tornou epidêmica,

pandêmica, disseminando a emoção vibrante de ação e ardor de

batalha nos arredores. Talheres e pratos e cadeiras e próteses e pedaços

de coisas voavam da direita para esquerda, de baixo para o teto e vice-

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versa. E os gritos, graves, trêmulos e agudos grunhidos. E gemidos. E risos.

Gargalhadas ferozes e profundas. Depois o choro. Gente brigando com

os próprios amigos. Gente brigando consigo mesma. Bastou Nox olhar

para Don que ambos concluíram de um modo silente que a melhor

opção era sair dali, tanto para evitarem danos físicos, quanto evitar se

envolverem em situações que viriam a comprometê-los com

consequências piores... eles foram dois dos poucos que tomaram uma

decisão sensata daquelas. “Coisas piores já ocorreram” foi o que Nox

comentou. Don Torino não tinha as menores dúvidas acerca disso.

Em alta velocidade iam em direção ao leste. O sol os

acompanhava, descendo em seu trajeto rumo ao pôr. O alazão

musculoso não demonstrava nenhum sinal de cansaço. O painel do

carrinho/jipe apresentava o estado da bateria em 71%. O vento batia

mais forte a cada milha. Talvez estivessem chegando próximo ao litoral.

Afinal, o país de Akira era, antes de tudo, uma ilha. “Se acabarmos numa

praia, vai ser bom ver o pôr-do-sol no mar”, ansiou Torino, esperançoso

para um ambiente natural de descanso e relaxamento do estresse

infeccioso.

O terreno verde de grama oscilava mais; os ângulos inclinavam-se,

obtusos, ondulantes. Árvores à frente em contraste com o horizonte.

Verde e azul. E mais verde. Escuro. E branco de nuvens. Claro, à frente.

Cinza atrás.

— Você sabe que eu venho pra cá! E quase sempre chove! Chuva

grossa! Pingão daqueles. Tempestade! Daquelas violentas! Que

arrancam árvores! Destelham casas! Fazem um estrago brilhante!

Devastadoras! Cabulosas! Terríveis mesmo!

— SEI!

Torino assentiu, esperando uma resposta de Nox, a qual não surgiu.

— MAS POR QUE VOCÊ TÁ FALANDO ISSO?

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— Porque hoje não está chovendo! Nenhum sinal de chuva! Quero

dizer: tirando aquelas nuvens cinzas antipáticas lá atrás! — e apontou as

cumulus nimbus distantes de onde vieram, acima de Centro de

Reabilitação — Ainda bem que estão longes demais! Não é uma

maravilha?! Incrível!

Don concordou sorrindo. Nox jogou fora o outro cigarro. Tirou as

mãos das rédeas, puxou do bolso da camisa um cigarro do tamanho de

um charuto. Não, leitor(a). Não era um charuto. Era um cigarro. Só que

do tamanho de um charuto. Riscou-o no cavalo uma vez. Duas vezes. Na

terceira o bagulho acendeu. Então, tragou o troço num trago sutil.

Degustando a fumaça exalada.

— ESSE CAVALO TEM UMA PELE CASCUDA, HEIN?

— Ah, meu amigo! Esse cavalo faz milagres — como se não

bastasse a velocidade.

Nox sugou novamente o cigarro-que-era-do-tamanho-de-um-

charuto, para então expelir uma nuvem branca e densa de seus pulmões

resistentes.

— VOCÊ GOSTA DE CIGARROS, HEIN?

— É! Fumo desde que me conheço! Haha! Você quer? — estendeu-

lhe o cigaruto.

— NÃO! — não sabia ao certo se era correto dizer “obrigado” para

aquilo. Disse mesmo assim — OBRIGADO!

— Ah! Pega mesmo assim!

E jogou-o para Don, que o capturou no ar com desajeito, largando

as mãos do volante do carrinho/jipe, o que o fez oscilar

temporariamente.

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— Você devia experimentar! Tem uns que preferem outras coisas!

Balas, pó, ácido, folha... coisas mais estranhas! Mais coloridas! Mas o

cigarro é o mais simples! O clássico! O eficaz! Não precisa de elástico,

nem agulha, nem de todo um ritual de enrolar papel ou aquecer líquido!

Já vem pronto e empacotado! É o melhor que tem! Haha!

Don Torino não soube ao certo como responder àquilo. Para evitar

constrangimento, apenas guardou o cigarro no bolso e exclamou:

— É! É MESMO!

O trote e o ronco de motor preenchiam o espaço e os

acompanhavam naquela corrida até além dos campos verdes. Don

estava apreciando seu passeio. Nunca fora um excelente motorista,

porém o jipe era fácil de manobrar, com seu câmbio automático e

volante sensível. Só pecava na segurança. “Nenhum sinal de presença

de airbag ou coisa do tipo, pelo que vi”. Não possuía nem cinto de

segurança ou suporte “puta-merda”.

Apesar de tais detalhes sentia-se vivo. Dopamina. O perigo o

lembrava de valorar positivamente o presente. Adrenalina. E, embora

sentisse certas saudades da vida pacata em Machi como escrivão, num

escritório de consultoria administrativa que cheirava à batata doce

queimada e com o barulho do guinchar de um papagaio chato de seu

chefe na gaiola, começava a pensar que os momentos em Chryskylodon

seriam, no mínimo, interessantes. “É. Acho que vale a pena ficar e tentar

curtir um pouco. E descobrir o que teremos...”.

Seu companheiro de viagem se espreguiçava. Estava agora com

óculos de sol.

— VOCÊ SEMPRE CAVALGA POR AQUI, ENTÃO!?

— Uhum! Sempre! Vinha mais com alguns dos outros antes do

hospício e antes dele sumir! Agora nem tanto! Meu parça Válio é brother

pra tudo. Vem aqui de vez em quando comigo. Aliás, tenho que voltar a

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falar com ele, bem lembrado. Até podia ter convidado o Válio pra vir

com a gente... Enfim. Mas é só ele também. Os outros se perderam por

aí! Um ou outro dos outros eu vi em Chryskylodon! É difícil encontrar todos!

Nunca mais vi todos juntos! Uns tão trabalhando, em emprego comum,

uns se aventurando pelas cidades. A Viktória que decidiu isso, pelo que

sei. Louquinha. Heh. Eu gosto disso. Sempre foi uma garota teimosa.

“Danatchinha”, como diria o Válio. Haha. O Abraão virou pai e tá na

labuta. Enfim. Cada um no seu canto. É... Mas agora sempre falta “ele”,

sabe! O reles e fake Todo Poderoso. Foi passear longe demais. Sumido. Ai,

ai. Bons tempos.

Após Nox finalizar sua divagação saudosista, Don Torino boiava

completamente:

— DE QUEM DIABOS VOCÊ TÁ FALANDO? QUEM É VÁLIO? QUEM É

“ELE”? QUEM SÃO “OS OUTROS”?

— Hã? É uma longa história. Você não sabe! Haha! Ah, claro que

não sabe! Muita gente não sabe! Mesmo se tendo algumas histórias por

aí. Algumas são exageradas! Outras histórias que passam de boca em

boca tem um quê de verdade. Tipo aquela do kaiju. Só que eu viajei aqui

na minha cabeça, mesmo. Esquece. — deu uma piscada com o olho

direito.

Don Torino sentiu-se um completo ignorante. Isso o coçava e

atiçava uma curiosidade, uma sensação intrigante, de certa forma.

— QUEM É ESSE “fake Todo Poderoso”?

Novamente o risinho de Nox.

— Sem precocidade. Você vai saber, meu amigo! Você vai saber!

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Parte B.1: “No one is gonna take me alive, time has come to make things

right”

— HAHA! AATIRA AMIGO! AATIRA!

Parados, escondidos atrás das árvores agora eles se viam.

Respiração pesada e coração bombeando. Don olhou para a

kalashnikov em seus braços e pensou: “Como diabos eu fui aceitar o

convite desse psicopata? ”. Don Torino sempre fazendo burradas.

— É EMOCIONANTE, NÃO? HAHA! — Agora era Nox que falava

deste jeito.

Manejava sua minigun com potência. Gritava muito mais alto do

que antes. Embora Don o escutasse perfeitamente.

— ESSES SELVAGENS ATACAM FAMÍLIAS INOCENTES! SÃO

VÂNDALOS! CRIMINOSOS! E AINDA OUSAM ATACAR O HOSPÍCIO! VOCÊ

NÃO SABE AS BARBARIDADES QUE ESSES BICHOS FAZEM!

Sons de disparos mesclaram-se com a voz de Nox. Don encolheu-

se. “Deus... o que eu fiz pra merecer isso? ”, lamentos de Don. Você fez

muita coisa de errado nessa vida. Quer que eu liste? Já tenho um

pergaminho preparado aqui. “Eh, dispenso. Quer dizer, eu fiz coisas ruins,

e sei disso. Confesso. Já roubei, já menti, já chutei gatinhos indefesos, não

ajudei velhinhas a atravessar a rua, quebrei janela da casa do vizinho

quando tava jogando golfe-pedra com a bengala do meu vô... Mas não

foram coisas a ponto de merecer isso!”.

— HALULU!!!

Nox atirava furiosamente, fumando três cigarros, pronunciando seu

grito de guerra, ou seja lá o que tal berro queria dizer. Torino sabia que

vários morriam, mesmo assim não olhou os tantos que caíam metralhados

no solo, sem esperança, sem chance, sem vida, mudos, telepáticos,

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cegos, inexatos. Tremia e suava; havia utilizado armas antes, contudo nas

ocasiões anteriores sabia exatamente o porquê de usar. Matar aquelas

pessoas, homens, mulheres, jovens, era simplesmente... sem sentido.

Senseless. Insensé. Mesmo com a suposta acusação grave de seu

“parceiro de passeio”.

— HALULU!!!

“Então essa é a ‘caça’? Ah merda! Será que ele vem fazer essa

‘caça’ todo fim de semana? Merda! Merda!”. Só era capaz de propagar

estes pensamentos ali. Com a adrenalina do momento, a transpiração, o

medo e o nervosismo. Aquela vontade de agir retornava, lentamente,

porém em um crescente, forte e sedento. Tinha certeza de que não

possuía nenhuma pílula de pare, Enéias não havia lhe dado a mais, nem

roubara de alguém. Ainda assim procurou em seus bolsos, com mãos

trêmulas como uma flanela ao vento sul. Rangia os dentes, sua cabeça

fervia, a ânsia de fugir em derrocada e o descontrole cresciam. Observou

seu companheiro entregue àquela insanidade sanguinária e o pavor

começou a se transformar em fúria. Em raiva por aquelas pessoas. Por

aquele maníaco que metralhava e recarregava em loop. Pelo tal maldito

Chryskylodon que existiu e, com certeza, influenciou a criação do Centro

e cultivo dessa mórbida cultura de insanidade.

Ódio. De tudo.

“Mas por que justo comigo? ”

Eu sei lá, Don. Você também desconhece o motivo pelo qual ser

justo com você. Se é que existe – ou precisa existir – algum motivo.

— HALULU!!!

Você também não sabe de nada, leitor.

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Interlúdio: A nicotina e seus efeitos

A nicotina é um alcalóide policíclico sendo o composto ativo do

tabaco. É uma variação do composto chamado de pirrolidina. Esse

composto consiste em um ciclopentano com um de seus carbonos

substituídos por um nitrogênio.

“...por que você está colocando isso aí? ”.

Cala a boca, Don. Você sabe muito bem porquê.

Alcaloides por sua vez são compostos cíclicos formados

primordialmente por carbono, nitrogênio, oxigênio e hidrogênio.

Encontrados geralmente em plantas. Alcaloides são geralmente

conhecidos por afetar o sistema nervoso de alguma maneira. Alguns dos

mais conhecidos são: a Atropina (conhecida também como beladona,

um sonífero e calmante natural), Codeína e Tebaína (ambos presentes

no composto conhecido como ópio, capaz de relaxar os músculos e até

causar alucinações leves) e a própria nicotina.

[...]

O efeito euforizante da nicotina faz com que ela seja altamente

viciante. Causando sérios problemas quando se tenta parar de

administrar essa droga. Sintomas como dificuldade em se concentrar,

aumento de peso, taquicardia entre outros são observados em pessoas

que tentam parar de fumar. Para servir de ajuda, foram lançados no

mercado adesivos e chicletes que contêm componentes não viciantes,

mas que se ligam a sítios semelhantes do sistema nervoso e ajudam o

fumante a largar aos poucos a necessidade pela nicotina. Outro auxílio

também é o cigarro com menor teor de nicotina, mas esse não se torna

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muito efetivo, já que a pessoa acaba tragando a fumaça mais fundo e

ele não ajuda a diminuir o gesto de levar o cigarro à boca[1].

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Parte B.2 (não o das bananas de pijamas): “You and I must fight for our

rights. You and I must fight to survive”

Apreensão, temor, trêmulo. Fumava agora o cigarro que Nox lhe

oferecera. Nem sabia ao certo como o tinha acendido.

Furioso. Crescia a ira.

“Será verdade...? ”, refletia Don sobre as palavras de Nox em

relação aos que ali morriam. Perfurados por projéteis cegos, que acertam

sem ver cor, idade ou religião. Baleados tontos, quedando no chão para

nunca mais levantar. Desgraçados presos naquela cena, num vermelho

que borrifava.

Sugada no trago. E se estivesse sendo apenas ludibriado? Se

seguisse ordens de um psicopata, que provavelmente jogava muitos

games de tiro em primeira pessoa, e sempre perdia, e agora estava se

vingando na realidade? Um neurótico viciado em morte? Mal conhecia

aquele cara de canino de ouro, nem o havia chamado para jantar,

embora já tivessem almoçado juntos, fugido juntos, corrido juntos, rido

juntos sob uma linda tarde ensolarada e céu azul... “Tá. Deu. Isso aqui não

é um anime yaoi. Os leitores já entenderam”. Ok, Don. Voltando:

— SAI DAÍ E ATIIIIRA AMIGO! ATIIIRA!

Expeliu fumaça dos órgãos respiratórios. Tremendo.

Fincava as unhas na parte de madeira da arma marrom em suas

mãos. Rápida. Fatal. Automática. Seria automática sua reação aos tiros

também? Conseguiria se manter humano mesmo após estar ali, de pé,

puxando o gatilho, presenciando corpos desabarem, gritos ecoarem,

ganidos de jovens com sonhos perdidos.... Por sua causa?

— VAI LOGO, CAAABRA! A GENTE TEM QUE LUTAR! — Nox gritava

raivoso — SEI QUE VOCÊ DEVE ESTAR FILOSOFANDO SOBRE O CERTO E O

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ERRADO! SOBRE QUEM É BONZINHO OU MAU. MAS AQUI NÃO É QUESTÃO

DE JUSTIÇA! É QUESTÃO DE HONRA! É INQUESTIONÁVEL A QUESTÃO! É

QUESTÃO DE SOBREVIVÊNCIA! É QUESTÃO DE PREVALÊNCIA DO MAIS

FORTE!

Largou o cigarro.

Don Torino, ar tomou. “Tomara”.

Ar tomara e coragem, e saiu da proteção do tronco da árvore.

“Que seja o que EU quiser”.

Mas não foi.

No exato momento em que se expôs, algo o picou no pescoço.

Levou a mão até o local da picada. Fora atingido por um tranquilizante.

“Merda”, foi o que pensou. A ira, o desespero, a força, a vontade se

esvaíram. “mêêêêrda...” A arma no chão caiu, os sentidos

adormecendo. “mêêêrda...” alguém vinha, berrava ao lado.

“Mêêããouuu? ”

(Desculpa por rir da sua desgraça, Don, mas essa parte foi bem

tosca para você). “Ok. Fique à vontade. Seu, seu. Insensível”

Os “selvagens-vítimas” vinham. Três deles. Levantaram-no.

Carregavam-no. Para onde...?

“Não façam isso! Seus desgraçados! Selvagens ignorantes. Deixem-

me em paz, seus putos. Larguem! Saiam! É um crime assassinar as pessoas

sem consentimento. Ou levar como reféns. Isto está previsto no nosso

Código de Conduta e Leis da Cidadania. Vocês não sabem! Eu sei! Não

sou nenhum advogado ou doutor, mesmo assim fui escrivão e sei das leis!

Vocês não sabem! Claro que não sabem. Ah, são ignorantes demais.

Bem que o Nox disse que vocês são uns selvagens ignorantes”. Pensou

em tudo isso.

— Nm... nã... nã...

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Disse isso tudo.

Balbuciava incapaz.

— Nmnããá...

Seus olhos se fecharam.

Enquanto isso Nox atirava e berrava, ensanguentado.

— HALULU! HALULU! HALULU!

Nem percebendo as balas que o perfuravam...

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Referência:

[1] INFOESCOLA. Nicotina. Disponível em:

<http://www.infoescola.com/compostos-quimicos/nicotina/>. Acesso

em 16 jul. 2017.

“Olha só. Teve até referências no padrão certinho...”

Pois é, Don. Tantos anos na escola devem ter valido para alguma coisa.

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