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RESUMO A fissura labiopalatina é considerada a malformação congênita da face mais comum. É desenvolvida durante o período embrionário e tem como fato- res etiológicos uma interação entre aspectos genéticos e ambientais. Esta revisão teve por objetivo fornecer ao periodontista uma visão geral acerca das características periodontais dos indivíduos fissurados, de maneira que conheça as distinções e as peculiaridades destes pacientes. Estudos rele- vantes foram identificados por meio de buscas às bases de dados PubMED (via Medline), Lilacs e Scielo. A literatura revisada apontou que indivíduos fissurados apresentam condição periodontal pouco diferente dos não fis- surados, com maior índice de recessão gengival em alguns dentes, vestí- bulo raso e com pouca faixa de gengiva inserida em função da diversidade de procedimentos cirúrgicos que estes pacientes são submetidos ao longo do tratamento reabilitador. Conhecendo as particularidades periodontais destes indivíduos, acredita-se que o especialista possa oferecer tratamento adequado, especialmente o de manutenção e suporte, a estes pacientes. Unitermos – Fenda labial; Fissura palatina; Periodontia. ASPECTOS PERIODONTAIS EM PACIENTES COM FISSURAS LABIOPALATINAS Periodontal aspects in patients with cleft lip/palate Eduardo Augusto Galbiatti Muncinelli* Guilherme Henrique Costa Oliveira* Luis Augusto Esper** Ana Lúcia Pompéia Fraga de Almeida*** *Alunos do Curso de Especialização em Periodontia – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo. **Professor do Curso de Especialização de Periodontia – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo. ***Professora doutora do Departamento de Prótese – Faculdade de Odontologia de Bauru da USP; Professora doutora do Programa de Pós-graduação – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da USP. Recebido em jan/2012 – Aprovado em jan/2012 Revisão da literatura Periodontia ABSTRACT Cleft lip/palate is considered the most common congenital malformation of the face. It is developed during the embryonic period and has as etiological factors an interaction between genetic and environmental aspects. This review aims to provide an overview to the periodontist about periodontal characteristics of cleft lip/palate patients so as to know the distinctions and peculiarities of these patients. Relevant studies were identified by searching the PubMED (via Medline), LILACS and SciELO databases. The reviewed literature shows that cleft lip/palate individuals have slightly different periodontal status than non cleft individuals, with gingival recessions in some teeth, shallow vestibule and low strip of keratinized tissue due to the several surgical procedures that these patients undergo along the rehabilitation treatment. Knowing the specific periodontal characteristics of these individuals, it is believed that the specialist is able to provide an appropriate treatment, especially those of maintenance and support, to these patients. Key Words – Cleft lip; Cleft palate; Periodontics. PerioNews 2012;6(4):359-63 359

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RESUMOA fissura labiopalatina é considerada a malformação congênita da face mais comum. É desenvolvida durante o período embrionário e tem como fato-res etiológicos uma interação entre aspectos genéticos e ambientais. Esta revisão teve por objetivo fornecer ao periodontista uma visão geral acerca das características periodontais dos indivíduos fissurados, de maneira que conheça as distinções e as peculiaridades destes pacientes. Estudos rele-vantes foram identificados por meio de buscas às bases de dados PubMED (via Medline), Lilacs e Scielo. A literatura revisada apontou que indivíduos fissurados apresentam condição periodontal pouco diferente dos não fis-surados, com maior índice de recessão gengival em alguns dentes, vestí-bulo raso e com pouca faixa de gengiva inserida em função da diversidade de procedimentos cirúrgicos que estes pacientes são submetidos ao longo do tratamento reabilitador. Conhecendo as particularidades periodontais destes indivíduos, acredita-se que o especialista possa oferecer tratamento adequado, especialmente o de manutenção e suporte, a estes pacientes.Unitermos – Fenda labial; Fissura palatina; Periodontia.

asPectOs PeriOdOntais em Pacientes cOm fissuras labiOPalatinas

Periodontal aspects in patients with cleft lip/palate

Eduardo Augusto Galbiatti Muncinelli*

Guilherme Henrique Costa Oliveira*

Luis Augusto Esper**

Ana Lúcia Pompéia Fraga de Almeida***

*Alunos do Curso de Especialização em Periodontia – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo.**Professor do Curso de Especialização de Periodontia – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo.***Professora doutora do Departamento de Prótese – Faculdade de Odontologia de Bauru da USP; Professora doutora do Programa de Pós-graduação – Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da USP.

Recebido em jan/2012 – Aprovado em jan/2012

revisão da literatura Periodontia

ABSTRACTCleft lip/palate is considered the most common congenital malformation of the face. It is developed during the embryonic period and has as etiological factors an interaction between genetic and environmental aspects. This review aims to provide an overview to the periodontist about periodontal characteristics of cleft lip/palate patients so as to know the distinctions and peculiarities of these patients. Relevant studies were identified by searching the PubMED (via Medline), LILACS and SciELO databases. The reviewed literature shows that cleft lip/palate individuals have slightly different periodontal status than non cleft individuals, with gingival recessions in some teeth, shallow vestibule and low strip of keratinized tissue due to the several surgical procedures that these patients undergo along the rehabilitation treatment. Knowing the specific periodontal characteristics of these individuals, it is believed that the specialist is able to provide an appropriate treatment, especially those of maintenance and support, to these patients.Key Words – Cleft lip; Cleft palate; Periodontics.

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PerioNews 2012;6(4):359-63

Introdução

Com prevalência em torno de 1:650 nascimentos no Brasil1-2,

as fissuras labiopalatinas representam um grupo de anomalias que

acometem uma parcela considerável da população. Originam-se na

vida intrauterina e se estabelecem até a 12a semana de gestação,

sendo possível diagnosticá-las precocemente durante os exames

pré-natais. Referem-se a uma condição congênita multifatorial em

que a predisposição genética representa o fator etiológico mais

importante, determinado por um padrão de herança mono ou

poligenético. Fatores ambientais e teratogênicos também contri-

buem para o aparecimento dessas malformações, as quais podem

se apresentar de maneira isolada ou em associação com algum

quadro sindrômico, como Síndrome de Piérre-Robin, Treacher-

Collins e Patau. Devido à ausência da fusão intrauterina do palato

primário com os processos palatinos secundários, compromete-se

a formação das estruturas centrais do terço médio da face e do

palato, que podem ser acometidas tanto unicamente como em

combinação com outras e compreendem: lábio, columela nasal,

osso alveolar, palato duro e palato mole2. As Figuras 1 elucidam a

classificação e a morfologia de alguns tipos de fissura, tomando-se

como ponto de referência o forâmen incisivo3.

Indivíduos com este tipo de anomalia necessitam de tera-

pia extensa e complexa, que vai desde o nascimento até a idade

adulta. Assim, a presença de uma equipe multidisciplinar envol-

vendo médicos, cirurgiões-dentistas, fonoaudiólogos, psicólogos

e enfermeiros representa uma condição sine qua non para que a

devida reabilitação física, mental e social destes pacientes possa

ser alcançada. Dessa forma, é necessário salientar a importância

de centros especializados capazes de atender às necessidades dos

indivíduos e familiares acometidos, como é o caso do Hospital de

Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São

Paulo (HRAC-USP), considerado um centro de excelência pela Or-

ganização Mundial de Saúde. Entretanto, os profissionais da saúde

não vinculados a estes centros devem conhecer as peculiaridades

do tratamento destes indivíduos, para que possam oferecer aten-

dimento especializado e qualificado quando necessário.

No que concerne à Odontologia, características como atresia

maxilar, com severas discrepâncias maxilomandibulares, mal posi-

cionamento dentário, dentes supranumerários, hipodontia, anor-

malidades no formato dos dentes e alterações mucogengivais são

comuns de serem encontradas4-5. Além disso, destacam-se o pro-

longado tratamento ortodôntico até a completa reabilitação e o

enxerto ósseo alveolar secundário (EOAS) realizado nos casos com

acometimento do rebordo alveolar, para o adequado irrompimen-

to do canino permanente6.

Sob o ponto de vista periodontal, devido à extensa manipula-

ção de tecidos moles na região da fissura, pode ser observado um

vestíbulo bastante raso, presença de bridas cicatriciais, quantidade

inadequada de mucosa queratinizada e recessões gengivais nos

dentes adjacentes a fissura4,7. Além disso, alguns estudos sugerem

maior acúmulo de biofilme dental, inserção conjuntiva mais longa,

mobilidade dentária e fatores predisponentes à recessão gengival

e à doença periodontal8-9. Entretanto, apesar da prevalência e da

importância significativa das fissuras labiopalatinas, a literatura ainda

carece de evidências que visem correlacioná-las com a Periodontia.

Dessa forma, o objetivo deste estudo foi revisar a literatu-

ra relacionada às características periodontais dos indivíduos com

fissuras labiopalatinas e possibilitar que clínicos não inseridos em

centros especializados conheçam as distinções e as particularida-

des deste grupo de indivíduos.

Revisão da Literatura

Para a realização desta revisão da literatura foram consulta-

das as bases de dados eletrônicas PubMED (via Medline), Lilacs e

Scielo, para identificação de artigos publicados entre 1980 e 2011,

além de outros veículos de publicação pertinentes na área das fis-

suras de lábio e palato. Todos os estudos foram discutidos entre os

autores e os principais tópicos foram estabelecidos.

susceptibilidade à doença periodontalUm conceito bem estabelecido na literatura refere-se ao papel

do biofilme dental no desenvolvimento da doença periodontal (DP).

Figuras 1 – A. Fissura pré-forâmen incisivo. B. Fissura pós-forâmen. C. Fissura transforâmen incisivo.

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Periodontia

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Sabe-se que a presença de uma placa dentobacteriana específica

associada à resposta do hospedeiro e aos fatores locais e sistêmicos

contribui significativamente para que a DP se estabeleça. Dessa for-

ma, determinados indivíduos tornam-se mais susceptíveis que outros

e se encaixam em um grupo de maior risco para o desenvolvimento da

doença, a qual pode manifestar-se de forma localizada ou generalizada.

Alguns estudos sugerem que indivíduos com fissuras labio-

palatinas apresentam maior susceptibilidade em desenvolver DP,

especialmente nos dentes adjacentes a fissura8,10-12. Isto parece

ser relacionado a diversos fatores como suporte ósseo reduzido,

condições anatômicas que dificultam a higiene bucal adequada,

prolongado tratamento ortodôntico e reabilitações protéticas.

Um clássico estudo se destaca por ser um dos pioneiros em re-

lacionar as fissuras labiopalatinas com índices clínicos periodontais8.

Os autores avaliaram longitudinalmente 80 indivíduos com diversos

tipos de fissuras. Os dentes adjacentes à fissura foram considera-

dos como grupo teste e os dentes contralaterais ou distantes como

grupo controle. Os resultados sugeriram que não houve diferenças

significativas entre os tipos de fissura e entre os sítios teste e con-

trole quanto à profundidade de sondagem (PS) e ao nível clínico de

inserção (NCI). Radiograficamente, a altura do osso alveolar se mos-

trou reduzida nos dentes adjacentes à fissura, porém, sem diferenças

na PS e no NCI, o que sugeriu uma inserção conjuntiva mais longa.

Após oito, 14 e 25 anos de acompanhamento, parte destes pacientes

foi novamente avaliada e os autores9,11-12 concluíram que as regiões

acometidas pela fissura mostraram tendência maior a apresentar

destruição periodontal. O prolongado tratamento ortodôntico e a

reabilitação protética parecem ter contribuído para tais resultados.

Conclusões semelhantes também foram reportadas por outros auto-

res10,13. A literatura ainda relata14 que apesar de indivíduos fissurados

apresentarem, em alguns casos, PS maior na região da fissura, os va-

lores encontraram-se dentro dos padrões de normalidade.

Outro estudo relevante4 objetivou determinar se os dentes

adjacentes à fissura apresentavam maior severidade de DP com-

parando o sextante da fissura com os demais sextantes da cavida-

de bucal. Para tanto, avaliaram 9.676 elementos dentários de 400

indivíduos, os quais nunca haviam sido submetidos à terapia pe-

riodontal prévia. Os autores sugeriram que os indivíduos que pos-

suíam perda de inserção na região da fissura também possuíam

em outros locais e concluíram que a DP não possui maior prevalên-

cia e severidade na região da fissura comparada a outras regiões.

Um achado muito comum na literatura diz respeito ao ele-

vado índice de placa e índice gengival nos indivíduos com fissura.

A maioria dos trabalhos também atribui estas características ao

prolongado tratamento ortodôntico necessário para a completa

reabilitação10,15-16. Entretanto, ainda relata-se que estes índices são

mais elevados antes e durante a terapia ortodôntica, tendendo a

se normalizar após a fase reabilitadora14. De modo semelhante, ou-

tro estudo17 sugeriu que o periodonto de indivíduos com fissuras

labiopalatinas está apto a receber uma terapia ortodôntica de lon-

go prazo e que o resultado promissor justifica todo o tratamento.

A literatura aponta para uma alta incidência de satisfação ao final

do tratamento, onde aproximadamente 85% dos pacientes consi-

deraram seus sorrisos esteticamente agradáveis18.

Quanto à composição da microbiota em áreas adjacentes

às fissuras, um estudo14 da literatura não observou diferenças

na microbiota de dentes distantes e adjacentes à fissura e res-

saltou que espécies comensais como P. intermedia, P. micros e

C. rectus foram frequentemente detectadas. Resultados seme-

lhantes também foram encontrados em outro trabalho19, o qual

constatou que nos sítios adjacentes às fissuras, microrganismos

gram-positivos facultativos representaram a categoria dominante

e que Aggregatibacter actinomycetemcomitans e Porphyromonas

gingivalis não foram encontrados.

Outro aspecto de extrema importância refere-se ao impacto

que o EOAS desempenha na reabilitação desses indivíduos e no ga-

nho de suporte periodontal. Em linhas gerais, seus principais obje-

tivos são: permitir o irrompimento do canino permanente na área

da fissura, estabilizar os segmentos maxilares especialmente em

fissuras bilaterais, dar suporte ao osso da base alar do nariz e sim-

plificar e eliminar futuras próteses dentais6. As condições perio-

dontais na região da fissura foram monitoradas, em um estudo20,

previamente ao EOAS até o completo irrompimento do canino.

Foi observado aumento do osso marginal dos dentes adjacentes

à fissura, leve ganho de gengiva inserida e mucosa queratinizada,

e reversibilidade da recessão gengival na maioria dos casos. Estes

dados estão de acordo com outro relevante trabalho6 que, após

um controle radiográfico de cinco anos, observou que, em 88%

dos casos, os caninos irrompidos possuíam níveis ósseos normais.

alterações mucogengivaisAs alterações mucogengivais de indivíduos com fissura labiopa-

latina são semelhantes às encontradas em indivíduos não fissurados,

como por exemplo, ausência de mucosa queratinizada, presença de

freios, bridas e recessão gengival; entretanto, apresentam algumas

peculiaridades decorrentes do próprio processo reabilitador.

O indivíduo fissurado é submetido a diferentes procedimen-

tos cirúrgicos ao longo do tratamento reabilitador (cirurgias plásti-

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cas, EOAS). Como consequência, pode ser observada a presença de

cicatrizes e tecido fibroso na região anterior, desencadeando um

vestíbulo raso com pouca faixa de gengiva inserida e mobilidade

da margem gengival4,7 (Figuras 2). Estas características em associa-

ção com a tensão do lábio podem interferir na expressão facial,

na fonética, no tratamento ortodôntico, na reabilitação protéti-

ca e no cuidado com a higiene oral. A técnica da vestibuloplastia

associada ao enxerto gengival livre tem sido muito utilizada para

solucionar essa alteração21-22.

Outro aspecto de extrema relevância refere-se à frequên-

cia de recessões em dentes adjacentes à fissura (Figura 3). Estes

dentes chegam a apresentar dez vezes mais recessões que nos

mesmos dentes de indivíduos não fissurados e merecem atenção

especial durante o tratamento odontológico23. A maior prevalência

em uma população brasileira foi encontrada nos caninos superio-

res direitos4. Tem sido observada alta incidência de recessões em

primeiros molares superiores, o que pode ser explicado pela pre-

sença de bandas ortodônticas desde a infância até a vida adulta5.

Discussão

A reabilitação de indivíduos com fissuras labiopalatinas repre-

senta um desafio para os clínicos, tanto do ponto de vista funcio-

nal como estético, e necessita da participação de equipes inter e

multidisciplinares para obter os resultados esperados. Esta revisão

da literatura objetivou apontar as principais características perio-

dontais relacionadas aos indivíduos com fissura de lábio e palato

e possibilitar que clínicos não inseridos em centros especializados

conheçam as particularidades deste grupo de pacientes.

Foi possível observar que os trabalhos são quase unânimes em

relatar um elevado índice de placa, principalmente devido à extensa

terapia ortodôntica10,15-16. Além disso, problemas mucogengivais as-

sociados podem dificultar a higienização, agravando, dessa forma,

a condição clínica. Quase a totalidade dos estudos ressalta a impor-

tância de controles periodontais periódicos e constante motivação

dos pacientes para que o tratamento seja concluído em um tempo

hábil e reduza o risco de destruição periodontal24.

Nos indivíduos com fissuras labiopalatinas, o mecanismo de for-

mação da DP em nada se diferencia do indivíduo sem esta anomalia4. O

início da colonização bacteriana até a destruição dos tecidos periodon-

tais acontece pelos mesmos mecanismos já conhecidos, entretanto,

ainda não é clara a epidemiologia desta doença nesta população. Gran-

de parte dos autores comparou a região da fissura com outra região

não acometida e deixou de avaliar os demais sítios ou sextantes. Além

disso, muitos estudos utilizaram uma amostra pequena com ampla

diferença de idade, o que difere dos estudos epidemiológicos da DP,

consagrados na literatura25-26, em indivíduos não fissurados. Deve-se

considerar que uma das principais características da DP é ser sítio de-

pendente; o que sugere que em muitos estudos, ela pode ter sido

subestimada ou superestimada. Ao que tudo indica, a fissura não pre-

dispõe o desenvolvimento da DP dos dentes adjacentes.

A realização de cirurgias mucogengivais em pacientes com

fissura labiopalatinas como vestibuloplastia, enxerto gengival livre

para aumento e/ou ganho de faixa de gengiva queratinizada e

Figura 3 – Recessão gengival em canino superior

adjacente a fissura.

Figuras 2 – A. Brida cicatricial decorrente da cirurgia de EOAS ocasionando dificuldade de higienização por parte do paciente. B. Brida cicatricial decorrente de cirurgia de EOAS, ausência de mucosa queratinizada, inflamação de tecido marginal. C. Ausência de mucosa queratinizada, profundidade de vestíbulo diminuída, mobilidade da margem gengival decorrentes de cirurgias anteriores.

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Periodontia

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procedimentos para recobrimento radicular são muito frequen-

tes. Este protocolo terapêutico tem sido rotineiramente aplicado

no setor de Periodontia do HRAC-USP, apresentando altas taxas de

sucesso, proporcionando ao paciente melhores condições de ma-

nutenção da higienização e favorecendo a saúde gengival/bucal

que impacta em sua qualidade de vida.

Dessa forma, acreditamos que cirurgiões-dentistas não inse-

ridos em centros especializados devem fornecer tratamento a pa-

cientes fissurados quando necessário, especialmente de manutenção

periodontal, que em nada se diferencia de um indivíduo sem fissura.

Conclusão

• Dentro das limitações desta revisão acredita-se que o conhe-

cimento dos aspectos periodontais encontrados nos pacientes

com fissura de lábio e palato é trivial para o periodontista pro-

porcionar um plano de tratamento adequado e bem indicado.

• Os trabalhos sugerem que populações com fissuras labiopalati-

nas possuem condições periodontais semelhantes a pacientes

não fissurados. Terapias periodontais de suporte devem ser for-

temente instituídas para assegurar o sucesso do tratamento.

• Em acréscimo, é importante destacar que um planejamento te-

rapêutico multidisciplinar e multiprofissional é fundamental e

determinante para o sucesso em longo prazo do tratamento e

a satisfação do paciente.

Nota de esclarecimentoNós, os autores deste trabalho, não recebemos apoio financeiro para pesquisa dado por organizações que possam ter ganho ou perda com a publicação deste trabalho. Nós, ou os membros de nossas famílias, não recebemos honorários de consultoria ou fomos pagos como avaliadores por organizações que possam ter ganho ou perda com a publicação deste trabalho, não possuímos ações ou investimentos em organizações que também possam ter ganho ou perda com a publicação deste trabalho. Não recebemos honorários de apresentações vindos de organizações que com fins lucrativos possam ter ganho ou perda com a publicação deste trabalho, não estamos empregados pela entidade comercial que patrocinou o estudo e também não possuímos patentes ou royalties, nem trabalhamos como testemunha especializada, ou realizamos atividades para uma entidade com interesse financeiro nesta área.

Endereço para correspondência:Ana Lúcia Pompéia Fraga de Almeida (Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais ‑ Periodontia)Rua Silvio Marchione, 3-20 – Vila Universitária17012-230 – Bauru – [email protected]

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