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    Atelis do VII Seminriodo Projeto Integralidade:

    saberes e prticasno cotidiano das

    instituies de sade

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    UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIROReitor: Ricardo Vieiralves de Castro

    Vice-reitora: Maria Christina Paixo Maioli

    INSTITUTO DE MEDICINA SOCIALDiretor: Cid Manso de Mello Vianna

    Vice-diretor: Michael Eduardo Reichenheim

    LABORATRIO DE PESQUISAS SOBRE PRTICAS DE INTEGRALIDADE EM SADECoordenadora: Roseni Pinheiro

    Coordenador adjunto: Ruben Araujo de Mattos

    CENTRO DE ESTUDOS E PESQUISA EM SADE COLETIVAPresidente: Cid Manso de Mello Vianna

    ASSOCIAO BRASILEIRA DE PS-GRADUAO EM SADE COLETIVAPresidente: Jos da Rocha Carvalheiro (USP)

    Conselho EditorialAluisio Gomes da Silva Jnior (UFF)

    Andrea Caprara (UECE)

    Isabel Brasil Pereira (Fiocruz)

    Jos Ricar do de C. M. Ayres (US P)

    Kenneth Rochel de Camargo Jr. (UERJ)

    Lilian Koifman (UFF)

    Madel Therezinha Luz (UERJ)

    Maria Elisabeth Barros de Barros (UFES)

    Mary Jane Spink (PUC-SP)

    Paulo Henrique Novaes Martins de Albuquerque (UFPE)

    Roseni Pinheiro (UERJ)Ruben Araujo de Mattos (UERJ)

    Yara Maria de Carvalho (USP)

    Editora do Centro de Estudos e Pesquisa em Sade ColetivaRua So Francisco Xavier, 524 7 andar bl. E

    Maracan - Rio de Janeiro RJ CEP 20550-900

    Telefones: (xx-21) 2587-7303 ramais 252 e 308

    Fax: (xx-21) 2264-1142

    URL:www.lappis.org.br / www.ims.uerj.br/cepesc

    Endereo eletrnico: [email protected]

    O CEPESC scio efetivo do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL)

    ORGANIZADORESRoseni Pinheiro

    Ruben Araujo de Mattos

    Atelis do VII Seminriodo Projeto Integralidade:

    saberes e prticasno cotidiano das

    instituies de sade

    1 Edio

    CEPESC IMS/UERJ ABRASCO

    Rio de Janeiro2008

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    SUMRIOAteli do Cuidado - VII Seminrio do Projeto Integralidade:saberes e prticas no cotidiano das instituies de sade

    Roseni Pinheiro e Ruben Araujo de Mattos (Orgs.)

    1 edio / setembro 2008

    Copyright 2008 dos organizadores

    Todos os direitos desta edio reservados aos organizadores

    Capa: Mauro Corra Filho

    Reviso e preparao de originais: Ana Silvia Gesteira

    Editorao eletrnica: Mauro Corra Filho

    Superviso editorial: Ana Silvia Gesteira

    Esta publicao contou com apoio de CEPESC-IMS/UERJ, que tem resultados de pesquisas

    realizadas com auxlio de CNPq e Faperj.

    Indexao na base de dados LILACS.

    APRESENTAORoseni Pinheiro

    SERVIO

    Projeto Visitao: uma proposta de aproximao e dilogo entre os diferentesatores de uma comunidadeElza Barboza de Jesus Alves

    Ressignificao do lixo em mobilizao social em uma comunidadeassistida pela Estratgia de Sade da Famlia no municpio do Rio de Janeiro:relato de experinciaNeyla Duraes Fernandes, rsula Lopes Neves e Mauro Cezar Silva Xavier

    Tenda educativa como instrumento de educao em sade para preveno deDST/Aids em adolescentes de uma rea coberta pela Estratgia de Sade daFamlia no municpio do Rio de Janeiro: relato de experinciaKarlla Assad da Silva, Neyla Duraes Fernandes e rsula Lopes Neves

    A valorizao do conhecimento e opinies dos trabalhadores sobre o uso e abuso

    de lcool visando o cuidado integralFernanda Ferreira da Fonseca

    Avaliao para melhoria da qualidade na Estratgia Sade da Famlia: reflexessobre a integralidade do cuidado em sadeFabiane Minozzo, Clarice Magalhes Rodrigues dos Reis, vila Teixeira Vidal, MarcelinaZacarias Ceolin e Iracema de Almeida Benevides

    Cartografia do atendimento ao louco na emergncia de um hospital quase geralFtima Cristina Alves de Arajo

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    Caminhos do acolhimento: relato de experincia em uma Unidade de Sade daFamlia no Municpio do Rio de JaneiroKarlla Assad da Silva, Neyla Duraes Fernandes e Mauro Cezar Silva Xavier

    O cuidador integrado na promoo de sade da pessoa idosa hospitalizadaPatrcia Santoro, Mrcia Nascimento e Simone Bastos

    PESQUISA

    A construo do cuidado num programa de atendimento

    domiciliar em Porto Alegre, RSIvani Bueno de Almeida Freitas e Stela Nazareth Meneghel

    Residncia integrada em sade: uma das alternativaspara alcanar a integralidade de ateno em sadeAgnes Olschowsky e Silvia Regina Ferreira

    O valor da escuta como cuidado na assistncia ao partoAna Vernica Rodrigues

    Levantamento do perfil dos sujeitos responsveispelo cuidar de idosos dependentesVanessa Maria Sangalli Black Pereira e Cristina Lavoyer Escudeiro

    Integralidade e sade da populao: a construo da EstratgiaSade da Famlia em distrito brasileiroSelma Maria da Fonseca Viegas e Cludia Maria de Mattos Penna

    Integralidade nas aes cotidianas de gestores e trabalhadores do setor sade:um estudo de caso no municpio de Belo HorizonteCludia Maria de Mattos Penna, Maria Jos Menezes Brito e Ana Paula Azevedo Hemmi

    Me acode!: itinerrios teraputicos de uma usuria com hipertenso arterialem busca pelo cuidado. Um convite reflexo sobre integralidade em sadePriscilla Shirley Siniak dos Anjos, Roseney Bellato e Phaedra Castro

    Encontros e desencontros nos servios de sadeMaria Isabel Borges Moreira Sade e Silvana Martins Mishima

    Redes sociais, rede de sade e integralidade do cuidado: experinciade trabalho e investigao na ateno a pacientes com cncerSilvia Maria Santiago e Maria da Graa Garcia Andrade

    A construo do ser mdico e a morte: significados eimplicaes para a humanizao do cuidadoGergia Sibele Nogueira da Silva e Jos Ricardo de Carvalho Mesquita Ayres

    ENSINO

    A integralidade do cuidado sustenta o novo currculodo curso de Enfermagem do UNIFESOKtia Cristina Felippe, Vernica Santos Albuquerque, Suzelaine Tanji e Carmen Maria dosSantos Lopes Monteiro Dantas da Silva

    Relato de experincia de estgio do curso de graduao em EnfermagemEleide Margarethe Pereira Farhat, Maria Denise Mesadri Giorgi, Maria Joceli de Oliveira eMaria Izabel de Col Jorge Rebelo

    Alguns desafios para a insero do profissional psi nocontexto do Programa de Sade da FamliaClever Manolo Coimbra de Oliveira, Cynthia Perovano Fernandes e Maristela Dalbello deArajo

    O sentido da aprendizagem reflexiva na formao do enfermeiro:a construo da integralidade em sadeMara Quaglio Chirelli, Alecsandra Paula Rosa Argerton e Andria Guilhem Rodriguez

    Integralidade na formao mdica: relato de experincias naCoordenao de Aids do HUAPLilian Koifman, Rafael Mendona de Paula e Thiago de Oliveira e Alves

    O ensino-aprendizagem do envelhecimento: inciopara uma formao crtica e contextualizadaNoely Cibeli dos Santos

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    APRESENTAO

    ROSENI PINHEIRO

    RUBEN ARAUJO DE MATTOS

    A presente publicao contm os trabalhos completos apresentadosno Ateli do Cuidado, ocorrido no mbito do VII Seminrio do ProjetoIntegralidade: saberes e prticas no cotidiano das instituies de sade,sobre o tema Razes pblicas da integralidade em sade: o cuidadocomo valor, realizado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro,de 28 a 30 de novembro de 2007.

    O principal objetivo do evento foi discutir o cuidado em sade comoum constructo de discursos e aes que exige o reconhecimento do ethoscultural de quem cuidado e de quem cuida, mediante a revalorizaodo dilogo entre diversidade e pluralidade. Nesse sentido, problematizaro conhecimento em sade, sobretudo no que concerne ao modo comotratamos a questo do valor dos valores da sade na sociedade contem-

    pornea e as solues de investigaes a ela destinadas, torna-se uma

    tarefa constitutiva da compreenso do cuidado como a principal razopblica da integralidade em sade.

    Para tanto, elegemos os temas responsabilidade coletiva, epistemologiada prtica, escuta no cuidado, redes sociais e humanizao como dis-

    positivos de reflexo capazes de alargar o pensar e agir em sade nosentido da revalorizao do cuidado e do exerccio da cidadania.Apostamos no debate crtico sobre as experincias de ensino, pesquisae servio como espaos-cotidianos de operacionalizao desses dispo-sitivos como potncia transformadora das prticas dos sujeitos envol-vidos na oferta do cuidado em sade, e dos saberes que as sustentam.

    Diferentemente das edies anteriores, em que realizamos rodas deexperincias com apresentao de trabalhos na modalidade de pster

    ATELI DO CUIDADOVII Seminrio do Projeto Integralidade:saberes e prticas no cotidiano dasinstituies de sade

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    Roseni Pinheiro e Ruben Araujo de Mattos

    12 ATELI DO CUIDADO

    SERVIO

    comentado, neste seminrio o Ateli do Cuidado teve como objetivoaprofundar o tema central do evento em trs eixos de discusso, noexcludentes entre si, quais sejam: ensino, pesquisa e servios. Foramenviados 50 trabalhos, sendo selecionados 8 para o eixo Servio, 10 paraPesquisa e 6 para Ensino. Os critrios utilizados na escolha foram:originalidade, consistncia argumentativa, articulao com a temtica doseminrio e da integralidade, relevncia, contribuio do trabalho para a

    produo do conhecimento e novos questionamentos sobre a integralidadeem sade. A comisso avaliadora dos trabalhos foi composta pelosseguintes membros e colaboradores do LAPPIS: Alusio Gomes da Silva Jnior (ISC-UFF); Andrea Caprara (CCS-UECE); Ana Heckert (PPGPSI-UFES); Csar Favoreto (FCM-UERJ); Llia Maria Madeira (EENF-UFMG/ Hospital Sofia Feldman); Llian Koifman (ISC-UFF); Maria Elizabeth Barros de Barros (PPGPSI-UFES); Regina Monteiro Henriques (Fac. Enfermagem-UERJ); Roseni Pinheiro (IMS-UERJ); Ruben Araujo de Mattos (IMS-UERJ); Octvio Bonet (UFJF); Paulo Henrique Martins (DCS-UFPE/NUCEM); Tatiana Gerhardt (Escola de Enfermagem- UFRGS.

    Os 24 trabalhos completos inditos buscaram responder s perguntaspropostas no escopo do seminrio, constituindo um guia importante paraas narrativas dessas experincias, cujo compartilhamento constitui umatarefa inevitvel e fundamental para tratar de questes candentes querepercutem na gesto dos servios de sade, nos conhecimentos e pr-ticas dos trabalhadores e nos percursos teraputicos dos usurios emdistintos espaos pblicos na sade.

    Pensar o cuidado como valor requer pensar o ensino como umadeclarao pblica da pesquisa, cujos servios de sade conferem legi-timidade para sua forma de expresso e responsabilidade sobre as inves-tigaes que visem afirmao da vida e dos princpios universais doSistema nico de Sade, entre os quais destacamos aqui a integralidade.

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    Projeto Visitao: uma proposta deaproximao e dilogo entre os diferentes

    atores de uma comunidade

    ELZA BARBOZA DE JESUS ALVES1

    IntroduoO municpio de Embu Guau conserva vegetao natural, como

    manacs, angicos, jacars, bromlias, tfias, pau-incenso, araucrias,cedros, ips e outras. Possui remanescentes da Mata Atlntica, paisa-gens belssimas e diversidade tanto na fauna quanto na flora. Apre-senta 100% de seu territrio (171 Km2) inserido em rea de Pro-teo de Mananciais (Leis Estaduais ns 898/75, 1172/76 e 9866/97), integrando tambm a Reserva da Biosfera da Mata Atlntica(Programa Man and Biosphere, da UNESCO), estando ainda subme-tida ao Decreto Federal n 750/93, bem como a outros instrumen-tos da legislao ambiental brasileira. O Rio Embu Guau serve Represa de Guarapiranga, com volume aproximado de 30% da suacapacidade. Embu Guau, juntamente com os municpios deItapecerica da Serra, So Loureno da Serra e Juquitiba, pleiteiam aclassificao como Estncias Hidrominerais.

    A economia de Embu Guau possui indstrias cuja prevalnciaso as de transformao e minerais no-metlicos (caulim, mica efeldspato), seguindo-se as metalrgicas em geral. Ainda sua econo-

    mia calada na atividade rural, integrando o Cinturo Verde naGrande So Paulo. Como limites territoriais, h So Paulo, Itanham,

    1 Enfermeira. Especialista em Sade Coletiva Universidade de So Paulo (USP).Gerente da Unidade Bsica de Sade da Famlia do Sapateiro. Embu Guau SP.Endereo eletrnico: [email protected]

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    Elza Barboza de Jesus Alves Projeto Visitao: uma proposta de aproximao e...

    ATELI DO CUIDADO 1716 ATELI DO CUIDADO

    Juquitiba, So Loureno e Itapecerica da Serra, e esta a 42 km dedistncia do marco zero da capital, localizado na Praa da S. Sua

    populao de 72.160 habitantes, segundo o Instituto Brasileiro deGeografia e Estatstica (ref. 01/07/2006).

    O municpio conta com uma Secretaria de Sade, uma unidademista (UMS) com 10 leitos para internao, um CAPS, um ambula-trio mdico de especialidades (AME), trs Unidades Bsicas de Sa-de e trs unidades Bsicas de Sade da Famlia, com cinco equipes dePSF. Realizou, em 2007, a III Conferncia Municipal de Sade quecontou a participao expressiva da comunidade. As discusses foram

    organizadas nos moldes da educao permanente, sendo orientadaspor um roteiro de problematizao acerca dos seguintes eixos: direitohumano em sade, pacto pela sade e participao social.

    O municpio ainda conta com conselho municipal e conselhosgestores de unidades atuantes. Uma das trs unidades bsicas deSade da Famlia a Unidade Bsica de Sade do Sapateiro, loca-lizada no extremo leste do municpio, que faz divisa com o muni-cpio de So Loureno da Serra. Inaugurado h 20 anos, h sendoUnidade de PSF passou por reforma recente e atualmente contacom trs consultrios, uma sala de enfermagem, uma sala de vacina,

    no contando com espao para grupos. Portanto, utiliza espaoscedidos pelos parceiros (bares, escolas, igrejas, residncias, quadra(descoberta ainda) para jogos. O bairro possui duas escolas, nenhu-

    ma creche e trs microempresas.Como patrimnio humano, a unidade bsica conta com um

    mdico clnico, um pediatra e um ginecologista e uma enfermeiraque do suporte uma vez por semana, uma enfermeira, uma tcnicade enfermagem, trs auxiliares de enfermagem, trs dentistas, umaauxiliar de consultrio dentrio, seis agentes comunitrias de sade,duas recepcionistas e uma zeladora.

    Essa unidade h quinze meses trabalhava como pronto-atendimen-to, no realizando acompanhamento regulares de pacientes portadoresde doenas crnicas, estes ainda sem classificao quanto gravidadede suas patologias no aspecto biolgico. Devido ao difcil acesso, jque possui apenas uma estrada asfaltada e todas as outras de terra esem transporte pblico, nem mesmo os nibus escolares circulam poralgumas delas. Em dias de chuva o acesso fica mais reduzido.

    Os usurios com mais chances de comparecer unidade eramjustamente os que moravam prximos estrada asfaltada. Os demaiseram visitados esporadicamente em suas residncias, normalmente,em caso de agravamento de condio patolgica. A partir doaprofundamento da implantao da Estratgia Sade da Famlia etendo a equipe notado a necessidade de intervenes e cuidados maissistemticos, foram propostos agendamentos de consultas mdicas ede enfermeira para acompanhamentos dos usurios da rea adscrita.

    A populao, num primeiro momento, compreende como perdae manifesta-se contrria ao uso de agendas e inicia-se assim uma fase

    de intensa discusso e negociao com a comunidade, com o auxliomuito significante das agentes comunitrias de sade. Este movi-mento de aproximao entre equipe, lideranas do bairro, ACS eusurios favorece a ampliao dos olhares para a realidade a queestavam expostas as pessoas moradoras deste lugar, na maioriacaseiros de chcaras cujos donos moram em So Paulo, com baixaescolaridade, desenvolvendo subempregos, portanto com subsalrios,

    muitos filhos e poucas expectativas.Pactuar a garantia de atendimento quando os pacientes acreditas-

    sem ser necessrio, independentemente de agendas, foi fundamentalpara estabelecer um principio de confiana e responsabilizao entreequipe e comunidade. Hoje a equipe tambm se percebe comocomunidade tambm, ento afetada pelas mesmas foras que opri-

    mem e revigoram os moradores. A maioria dos profissionais moramuito prximo unidade.

    Na ocasio acontecia no municpio o curso de capacitao parafacilitadores da educao permanente, do qual a autora deste traba-lho participava, e props na unidade realizar rodas de discussocom membros da equipe e populao adscrita. Tais encontros esti-

    mularam a maioria dos profissionais para implantar o ProjetoVisitao. Aqueles que no aderiram com entusiasmo tambm noofereceram resistncia, apenas demonstravam descrdito na propos-ta de melhorar a partir de discusses como as que se sucedem nessesencontros ou ainda que no seja papel dos trabalhadores da sadediscutir necessidades como transporte coletivo, creches, acesso aalimentos, moradias salubres, violncia, entre outros temas no focados

    no aspecto biolgicos do ser ou da sua patologia.

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    Elza Barboza de Jesus Alves Projeto Visitao: uma proposta de aproximao e...

    ATELI DO CUIDADO 1918 ATELI DO CUIDADO

    Aps as discusses nas microreas, realizamos avaliao oral sobreas atividades realizadas. Algumas falas so realmente marcantes: Esta

    noite no dormi bem pensando no que as pessoas iriam pedir, nosaber o que elas esperam, o que vo trazer de problemas deixa agente aflita. (A, Tcnica de Enfermagem).

    O comentrio acima emitido por um membro da equipe ilustraa dificuldade do trabalhador da sade em assumir o papel de co-adjuvante na construo de solues para os problemas, principal-

    mente quando estes so colocados de forma livre pelos usurios,no levando em conta apenas o ndice de bens de consumo dispo-

    nveis no servio (sade: valor de uso valor de troca).Justificativa

    O Projeto Visitao tem origem na busca por maior aproxima-o entre os diferentes atores da comunidade e a equipe de sade.Pretende-se ampliar as chances de atuao na realidade local a partirdas trocas de diferentes saberes e a reflexo a cerca das necessida-des referidas.

    Objetivos Criar e reforar vnculos entre a equipe de sade e a comunidade; Conhecer e vivenciar a realidade de vida na rea de abrangncia

    da USF; Possibilitar a atuao no territrio reconhecendo pontos positivos

    e negativos que podem interferir na realidade local; Possibilitar a troca de conhecimentos (tcnicos / empricos); Possibilitar a reflexo sobre os diferentes papis a serem assumi-

    dos pelos atores sociais daquela comunidade.

    MetodologiaAs visitas so programadas com auxlio das agentes comunit-

    rias entre a equipe interna e comunidade em locais cedidos pelapopulao (domiclios, bares, sales, etc.). Antes do incio das dis-cusses, acontece a apresentao das pessoas, normalmente comdinmicas de grupo que promovam descontrao e entrosamentoentre os participantes.

    Os disparadores da discusso geralmente so perguntas abertassobre como a vida de quem mora naquele local, quais as

    potencialidades e dificuldades percebidas e como esto relacionadascom sade. A prpria reflexo favorece a construo de propostasde interveno. Um dos grandes ganhos nesses encontros a

    pactuao de aes por parte dos envolvidos.Em encontro subseqente ocorre um resgate do que ficou com-

    binado e a possibilidade de continuidade das atividades. Desta for-ma, existe uma histria sendo contada, com a participao da equipede profissionais e da populao adscrita. Outras orientaes e aes

    so realizadas em resposta s necessidades do grupo e aos proto-colos do Ministrio da Sade como: atividades educativas e buscaativa (tuberculose, hipertenso arterial, diabete, doena sexualmentetransmissveis, planejamento familiar, sade bucal, entre outras), con-sulta de mdicos e enfermeiras, dispensao (de medicamento, esco-vas e creme dental, preservativos quando necessrio), controle desinais vitais, deteco de fatores de risco.

    Avaliao avaliao com populao durante o encontro; criao de instrumentos de avaliao;

    Atualmente estamos discutindo a avaliao do Projeto Visitao.Este o maior desafio para o projeto: construir um instrumento.

    Durante as discusses, o projeto foi-se transformando, a cada diasofrendo um ajuste segundo a necessidade de qualquer um que dele

    participe. Ento uma construo coletiva.A preocupao e inteno, atualmente, criar um instrumento

    dinmico de avaliao que aponte as necessidades de aes, ou seja,poderia indicar polticas pblicas? Poderia nortear aes em outrasesferas, poderia conduzir aes de sade para fora do enfoque dadoena? provvel que sim.

    E certamente eventos como o VIII Seminrio de Integralidadeem Sade favorecem a troca de idias e refora o nimo daquelesque buscam formas mais intensas e verdadeiras de ser, sentir e fazero trabalho e o trabalhador em sade.

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    Elza Barboza de Jesus Alves

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    IntroduoEntre os diversos atores que compem e caracterizam o setor

    sade, gestores, gerentes, trabalhadores e usurios do sistema, h umentendimento bastante decantado de que o modelo de ateno sade vigente, que privilegia a assistncia curativa e individual com

    priorizao do cuidado hospitalar, no consegue transformar a situ-ao de sade da populao, por considerar a prioria doena em si,em detrimento dos determinantes sociais e epidemiolgicos, queimplicam o processo sade doena (BUSS, 2002).

    Assim, ao entender que a sade fundamentalmente, de acordocom Kickbusch (1996), resultante de diversos fatores, marcadamentesociais, e impulsionadora de desenvolvimento, a implantao do

    novo modelo de assistncia sade, no contexto do Sistema nicode Sade (SUS), implicou grande nfase no referencial da promooda qualidade de vida. importante ressaltar que este um desafiode natureza estrutural, porque a bandeira dessa nova orientaoimplica desospitalizar e desmedicalizar aes de ateno sade,

    Ressignificao do lixo em mobilizaosocial em uma comunidade assistida pela

    Estratgia de Sade da Famlia no municpiodo Rio de Janeiro: relato de experincia

    NEYLA DURAES FERNANDES1

    RSULA LOPES NEVES2

    MAURO CEZAR SILVA XAVIER3

    1 Psicloga. Aluna do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldes daResidncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).2 Nutricionista. Aluna do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldesda Residncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).3 Enfermeiro. Aluno do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldesda Residncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).Endereo eletrnico: [email protected]

    RefernciasCUNHA, G. T. A Const ru o da cln ica ampli ada na aten o bsic a. So Paulo:Hucitec, 2007.

    CONFERNCIA MUNICIPAL DE SADE DE EMBU GUAU, 3. 2007, SoPaulo. Relatrio Final: Sade e Qualidade de Vida, 2007.

    VASCONCELOS, Eymard M. Redefinindo as prticas de sade a partir da edu-cao popular nos servios de sade. In: VASCONCELOS, Eymard M.(org.). ASade nas palavras e nos gestos: reflexes da rede popular e sade: So Paulo:Hucitec, 2001.

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    Neyla Duraes Fernandes, rsula Lopes Neves e Mauro Cezar Silva Xavier Ressignificao do lixo em mobilizao social...

    ATELI DO CUIDADO 2322 ATELI DO CUIDADO

    marcadamente no contexto contemporneo dirigidas doena, re-alizadas no ambiente hospitalar e centradas do desenvolvimento deaes biologicistas e tecnocrticas.

    Desta forma, tornou-se fundamental reorganizar a assistncia sade partindo da Ateno Bsica, valorizando as prticas de pro-

    moo e preveno e corroborando para a organizao do SUS.Como formar de lograr xito neste desenvolvimento o Ministrioda Sade implantou em 1994, a Estratgia de Sade da Famlia(ESF), mais conhecida como Programa Sade da Famlia (PSF) aqual, segundo Mendes (1996, p. 45):

    [...] deseja criar, no primeiro nvel do sistema, verdadeiros centrosde sade, em que uma equipe de sade da famlia, em territrio deabrangncia definido, desenvolve aes focalizadas na sade; dirigidass famlias e ao seu hbitat; de forma contnua, personalizada e ativa;com nfase relativa no promocional e no preventivo mas sem des-cuidar do curativo-reabilitador; com alta resolutividade; com baixoscustos diretos e indiretos, sejam econmicos, sejam sociais e articu-lando-se com outros setores que determinam a sade.

    Um dos principais objetivos da ESF gerar prticas de sadeque possibilitem a integrao das aes individuais e coletivas. Paratanto, utiliza o enfoque de risco como mtodo de trabalho, o quetem favorecido o aproveitamento ideal dos recursos e a adequaodestes s necessidades apontadas pela populao.

    Em 1994, o Ministrio da Sade implementou o PSF recorrendo combinao de dois fatores presentes em poucas experincias, masque constituam novidade no contexto geral das prticas de sade:

    territrio como unidade geogrfica e populao adscrita por fam-lias. O produto deste somatrio, unidade de natureza coletiva, agre-gou-se a outro elemento diferencial no contexto das prticas emsade no pas: o trabalho de uma equipe multiprofissional, atuandoem perspectiva do desenvolvimento de aes de cuidado de quali-dade em sade, at ento sem precedentes (BRASIL, 1994).

    Desta forma, essa nova prtica exige um profissional com visosistmica e integral do indivduo, da famlia e da comunidade na qualesta famlia est inserida, com capacidade de reconhecimento de riscos

    nesta unidade geogrfica. Como conseqncia, exige tambm currcu-los e programas de capacitao orientados para as necessidades/rea-lidades municipais. Neste contexto se insere o Curso de Especializao

    em Sade da Famlia nos moldes da Residncia (ENSP/FIOCRUZ),no qual o grupo de profissionais que organizou este relato de expe-rincia se insere e desempenha suas atividades. E ao desenvolver asatividades no territrio, que constitui uma comunidade do Municpiodo Rio de Janeiro, o grupo pode, em conjunto com a equipe de sadeem que nos inseramos, identificar necessidades, potencialidades e ris-cos referentes sade das pessoas que compunham a rea deabrangncia da referida equipe de Sade da Famlia.

    Segundo a orientao programtica do Ministrio (70), cada Equipede Sade da Famlia (ESF) constituda por um mdico, um enfer-

    meiro, um auxiliar de enfermagem e de quatro a seis Agentes Co-munitrios de Sade (ACS), coletivo profissional responsvel porum grupo de 600 a 1.000 famlias. Cada ACS acompanha 150 fa-

    mlias. No contexto da assistncia direta prestada pelas ESF, outroselementos foram incorporados ao processo de trabalho, dentre osquais se destacam a anlise da situao de sade da populao emcolaborao com lideranas comunitrias e profissionais de outrasreas, e a organizao da oferta dos servios de acordo com o perfilde sade especfico daquela populao.

    Dentre os problemas observados, o que despertou maior preo-cupao por parte da equipe de residentes e tambm que encontravaeco nas necessidades de alguns profissionais era o problema dodestino inadequado de lixo em alguns pontos da comunidade. Esta

    preocupao se explicava pelos problemas diretamente e indireta-mente ligados a problemtica. Em visitas comunidade, os mora-dores chamavam a ateno para a proliferao de insetos e roedo-res, alm do mau cheiro causado pela deteriorao destes materiais,j que os locais deste destino se localizavam em terrenos muito

    prximos s casas. Diante de toda essa problemtica e tambm dasqueixas apontadas moradores, surgiram vrias questes que tentva-

    mos responder, tais como: a quem o problema de direito? Quemso os culpados pela problemtica? E talvez a questo mais im-

    portante como se resolve tal problema?Apesar dessas indagaes, a equipe de residentes estava certa de

    que a equipe de sade da famlia tinha responsabilidade pela proble-mtica, pois, fazendo parte de seu territrio de interveno, reaadscrita, constitua um risco ambiental importante e que impactava

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    Neyla Duraes Fernandes, rsula Lopes Neves e Mauro Cezar Silva Xavier Ressignificao do lixo em mobilizao social...

    ATELI DO CUIDADO 2524 ATELI DO CUIDADO

    decisivamente na sade das pessoas daquela comunidade. Entretan-to, a equipe tambm apontava naquele momento que era um desafiocomplexo e que deveria envolver vrios esforos.

    Referencial tericoO conceito acerca de territrio essencial para o trabalho das

    equipes de sade da famlia, pois uma das diretrizes fundamentaisda ESF a adscrio de clientela, ou seja, a vinculao de uma po-

    pulao a uma unidade de sade da famlia a partir do estabeleci-mento de uma base territorial.

    Segundo Mendes e colaboradores (1995) existem duas grandescorrentes de pensamento que conceituam territrio de maneiras bemdistintas: territrio-solo - como um espao fsico, naturalizado eacabado, definido exclusivamente por critrios geopolticos; e terri-trio-processo - como um espao em permanente construo,produto de uma dinmica social onde se tencionam sujeitos sociais

    postos na arena poltica, que alm de territrio solo tambmterritrio econmico, cultural e epidemiolgico.

    A concepo de territrio-processo permite delinear a realidadede sade da populao que em dinmica constante.

    Isto , uma situao de sade determinada pela dinmica dasrelaes sociais, econmicas e polticas que se reproduzem histo-ricamente, entre indivduos e grupos populacionais existentes noterritrio, reproduo esta condicionada pela sua insero no con-junto da sociedade. (MENDES et al., 1995).

    As doenas e os agravos sade no se distribuemhomogeneamente nem respondem, em qualquer situao, as mesmasaes (SOUZA, 1992). A organizao mais especfica do territriocontribui para orientar a interveno, uma vez que as micro-reas,entendidas como reas homogneas de condies de vida, so fun-damentalmente unidades de interveno, com propsito operacional.Entende-se, desta forma, que as prticas de Sade Coletiva e deVigilncia objetivam garantir sade s pessoas. Para isto atuam sobreo territrio, sobre instituies e sobre a coletividade. Agemsobre o contexto e, especificamente, sobre algum grupo vulnervel.O objeto sobre a qual trabalha tem, portanto, trs dimenses: oambiente, a organizao social e as pessoas. (CAMPOS, 2000).

    Neste contexto se insere a problemtica identificada pela equipede residentes em uma comunidade assistida pelo Programa de Sa-de da Famlia no Municpio do Rio de Janeiro, que constitui um

    problema ambiental importante na comunidade e tambm proble-ma a ser enfrentado por toda a sociedade ao passo. Segundo Shiraiwa(2007), o processo migratrio em busca de melhorias um dosfatores do aumento da produo de lixo urbano, comprometendotodo o planejamento urbano. Em apenas trs dcadas, o Brasilreverteu a relao entre populao urbana e populao rural; en-quanto at o final da dcada de 1960, havia 30% das pessoas morando

    nas cidades e as demais na zona rural, hoje temos 70% de nossoshabitantes vivendo em zonas urbanas.Chaffun (1997) mencionou que nas cidades onde se concentra

    a maior parte das atividades econmicas, onde se consome a mai-oria dos recursos e onde se gera maior parte da poluio. Segundoo CEMPRE (2000), as cidades acumulam riquezas.... Entretanto, sotambm imensas consumidoras de recursos naturais e geram signi-ficativas quantidades de lixo que precisam ser dispostas de maneirasegura e sustentvel.

    Para o setor sade, esse novo cenrio representa um desafiocomplexo que o leva a se preocupar, de forma constante, comsituao de deteriorao ambiental e suas conseqncias sobre aqualidade de vida das comunidades. Sem dvida, uma das pautas

    principais da sade pblica para o prximo milnio ser a necessi-dade de que se adotem novas aes capazes de envolver tcnicas e

    estratgias sob uma perspectiva ambiental muito mais contundente.As principais organizaes internacionais apontam esta necessida-

    de ao estabelecerem diretrizes e afirmarem a Ateno PrimriaAmbiental (APA) como elemento fundamental neste processo. As-sim, a OPAS (1999) afirma que:

    Atravs da implementao da Ateno Primria Ambiental, espera-se conservar e melhorar a qualidade do ambiente de modo apromover uma melhor sade e melhor qualidade de vida. Junta-mente com a participao ativa dos indivduos, famlias e comu-nidades procura-se o fortalecimento dos organismos estatais res-ponsveis pela sade e ambiente e, por sua vez, propiciar melhorcomunicao e dilogo com o nvel local e com a sociedade civil.

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    ATELI DO CUIDADO 2726 ATELI DO CUIDADO

    Esta definio estabelece a promoo da sade ambiental comum enfoque holstico ao nvel local, desenvolvendo uma estratgiade participao da sociedade civil e das organizaes locais atravsdo conhecimento, identificao e soluo dos problemas ambientais

    primrios que atingem sade, limitando a qualidade de vida. Issocorrobora com o pensamento de Cerda (1993), que destaca que:

    A APA uma estratgia para a proteo do meio ambiente dacomunidade que enfatiza o bem-estar das comunidades humanase est estreitamente vinculada com sade do ambiente. A APAvincula os objetivos de sade para todos com sade total para omeio ambiente.

    A ateno primria ambiental resguarda tambm a essncia daecologia social, a qual expressa que o desenvolvimento e o progres-so das sociedades devem assentar-se sobre um manejo adequado do

    meio ambiente. Tal manejo e cuidado no podem ser exercidossomente pelo Estado, atravs de seus organismos fiscalizadores, nemtampouco pelas empresas e suas associaes, porque carece, princi-

    palmente, da iniciativa da cidadania, da democracia e do poder local.Neste cenrio, a ateno primria ambiental deve avanar na buscade solues integradoras, multi-setoriais e com uma ampla incorpo-rao da cidadania e das autoridades locais.

    Entendemos que a ESF, como estratgia de reorganizao daAteno Primria, com atuao em um territrio definido, e tendocomo principais princpios a responsabilidade sanitria potente

    para desenvolver a Ateno Primria Ambiental, tendo como prin-cipal objetivo buscar solues atravs de um processo de construocompartilhada de conhecimento com a populao local.

    Tambm entendemos que esta ao centrada na interveno noambiente e nos riscos do ambiente e com participao da comuni-dade afirma um princpio norteador do SUS, expresso como aten-dimento integral, com prioridade para s atividades preventivas, sem

    prejuzo dos servios assistenciais (BRASIL, 1988, art. 198). Porisso, desde o incio, a proposta de interveno gira em torno do

    princpio da integralidade (MATTOS, 2002), que remete ao sentidode articular as aes de promoo da sade, de preveno de riscose agravos e assistenciais em todos os nveis organizacionais do sis-tema de servios de sade.

    MetodologiaA metodologia aqui escrita foi sendo construda na equipe de

    sade da famlia e com a comunidade, portanto guarda o traomarcante de estar comprometida com o diagnstico da realidade afim de gerar um envolvimento de todos os setores envolvidos di-retamente ou indiretamente na possvel resoluo do problema quefoi definido, ou seja, o destino inadequado de lixo na comunidadeatendida por esta equipe. Assim, a equipe de residentes buscou dis-cutir com a equipe o tema, identificado inicialmente por uma ACS,e que encontrou grande repercusso na equipe de residentes.

    Assim, o que um tema? Segundo Campos (2002), tema umassunto, uma coisa que incomoda, um problema, uma situao queprovoca riscos sade. O tema deve emergir, ser construdo poralgum coletivo.

    Para que o tema fosse discutido na equipe, e que emergisse comoum problema factvel e que necessitasse do envolvimento de todos,usamos a Metodologia das Rodas desde o incio. Comear pela Roda,

    portanto, que, segundo Campos (2002), um espao coletivo, umarranjo onde existam oportunidades de discusso e de tomada dedeciso. Que pode ser formal (uma comisso ou conselho oficial), ouinformal (reunio para enfrentar o tema do lixo, temas ambientais, da

    produo ou consumo de alimentos, da violncia etc) e tem o poten-cial de transformar num lcus onde circulam afetos e onde vnculosso estabelecidos e rompidos durante todo o tempo.

    Aps a discusso, podemos identificar melhor o tema, suaspossveis causas e possveis meios de resoluo, mas a discussoapontou no sentido de envolvimento efetivo da comunidade, pois,segundo a avaliao da equipe, era um problema recorrente e neces-sitaria de um entendimento melhor da populao a respeito da

    problemtica e de suas conseqncias e impactos no seu ambiente.Desta forma, o segundo passo foi ampliar a discusso com a

    comunidade. Assim inicialmente com o auxlio dos ACS, identifica-mos usurios que se identificassem diretamente como problema eque queriam intervir de alguma forma no problema. Este passo da

    metodologia emergiu da complexidade que envolvia o tema, mastambm seguiu as orientaes da Declarao do Rio sobre o MeioAmbiente e o Desenvolvimento (1992), que em seu Princpio n 10

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    ATELI DO CUIDADO 2928 ATELI DO CUIDADO

    proclamou a participao de todas as pessoas e o direito delas, informao, quando assinala que:

    O melhor modo de tratar as questes ambientais com a parti-cipao de todos os cidados interessados, no nvel correspondente.No plano nacional, toda pessoa dever ter acesso adequado informao sobre o meio ambiente de que disponham as autorida-des pblicas, inclusive a informao sobre os materiais e as ativi-dades que encerram perigo em suas comunidades, assim como aoportunidade de participar nos processos de adoo de decises.

    Nessa reunio podemos estabelecer critrios importantes para adiscusso do tema levantado. Segundo os critrios apontados porCampos (2002), foram identificadas com a comunidade repercus-ses negativas sobre a sade (magnitude do problema) e formas deenfrent-lo (viabilidade tcnica, jurdica, financeira e poltica). E ain-da, que possivelmente o tema levantado tivesse a potencialidade deestimular a participao de outras pessoas da comunidade, j queenvolvia toda a comunidade indiretamente.

    Como estratgia de interveno, pactuamos em roda que haveriaa necessidade de um esclarecimento mais abrangente do tema, ampli-ando a discusso para outros usurios daquela comunidade, mas queo processo educativo deveria dar voz a todos os usurios que parti-cipassem. Assim, foram definidos trs encontros com periodicidadesemanal nas casas de alguns moradores para discusso do problema.

    Evidenciou-se a potencialidade que o processo educativo poderiatrazer, pois a partir do tema, com a Metodologia da discusso emRoda os problemas de sade relacionados ao lixo seriam desperta-

    dos e poderiam gerar uma identificao coletiva e, portantoengajamento dos usurios para a resoluo do problema. Esta estrat-gia segue um preceito ressaltado por Campos (2000), segundo oqual a Educao em Sade tambm um instrumento de trabalho,

    mais til quando se objetiva a fazer circular informaes, de trans-formar hbitos, valores ou a subjetividade de grupos. A organizao,segundo a Metodologia da Roda, tem sua fora na construocompartilhada de tarefas e, posteriormente, na anlise das dificulda-des de lev-las prtica. A Educao em Sade, mais do que difun-dir informaes procura ampliar a capacidade de anlise e de inter-veno das pessoas, tanto sobre o prprio contexto quanto sobreo seu modo de vida, e sobre sua subjetividade.

    A expectativa a partir destes grupos de discusso seria produzirpropostas de interveno com responsabilizao dos envolvidos,prazos e formas de interveno que teriam a potncia de criar meiospara que a resoluo do problema fosse duradoura.

    Resultados A partir das discusses nos trs grupos, foram produzidos sen-

    tidos a respeito da problemtica e o coletivo de pessoas assinalouatravs de uma pauta nica que:

    O principal ponto de acmulo de lixo era prximo ao antigo

    reservatrio de gua, que atualmente est desativado. O problema envolvia toda comunidade. O acmulo de lixo perto do reservatrio se devia no s s

    pessoas da comunidade mais acima, que tinham como trajetoaquele local e que assim passavam e depositavam os seus saqui-

    nhos de lixo no local, mas tambm porque muitos moradoresda comunidade aproveitavam o acmulo de lixo e tambmdepositavam o seu lixo domstico naquele lugar.

    O lixo gerava muito mau cheiro e tinha colaborado para o aumen-to de mosquitos, moscas e ratos principalmente nas proximidades.

    Seria necessria uma parceria com a COMLURB (Empresa Mu-nicipal de Coleta de lixo) para retirar o lixo, pois o montante delixo era grande e somente os moradores no teriam como en-frentar o problema.

    Seria organizado um Mutiro com participao de todos osenvolvidos na discusso para retirar o lixo corroborando para otrabalho da COMLURB j que havia uma dificuldade de retiradade acesso, pois o lugar era inclinado e irregular.

    Haveria a necessidade da ao conjunta com o Programa de Con-trole de Endemias para aplicar raticida nas proximidades do lixo

    para combater os ratos que haviam se proliferado enormemente. Aps a retirada do lixo, seria necessrio ocupar esses espaos de

    alguma forma, para que no se iniciasse novamente o destino dolixo naquele local.

    Deveria haver a disposio de contineres de lixo em locais acessveise que a coleta fosse peridica. Elegeu-se no grupo uma calada

    prxima a praa para disposio de dois destes equipamentos.

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    ATELI DO CUIDADO 3130 ATELI DO CUIDADO

    Aps a produo desta pauta pelo coletivo, o mesmo entendeuser necessria a formao de uma comisso que, conjuntamentecom equipe de sade da famlia, buscariam reivindicar COMLURBa colaborao para a retirada do lixo e o fornecimento de continerese definio do dias da semana em que haveria a coleta do lixo dessesequipamentos. Ao Programa de Controle de Endemias reivindicari-am a desratizao das proximidades do lugar onde era depositadoo lixo.

    Desta forma, aps a pactuao com a COMLURB e com Pro-grama de Controle de Endemias, elegeu-se o dia para a ao. Neste

    dia, que contou com a participao de 61 pessoas da comunidade,o lixo foi todo retirado e as proximidades foram desratizadas. Nasproximidades do local, numa rea plana que no era utilizada devido contaminao do ambiente e ao mau cheiro produzido pela de-composio do lixo, foram construdas duas traves destinadas

    prtica de futebol pelos moradores.

    Consideraes finaisPodemos avaliar que o cenrio inicial era complexo, pois carecia

    de consolidao de processos democrticos, onde havia pouca par-ticipao social, a pobreza seguia como uma das prioridades no-resolvidas, uma comunidade densamente povoada e ocupadadesordenadamente. Mas ficou claro que a possibilidade de interven-o no problema apenas seria possvel com a participao da comu-

    nidade, deciso que rompe com a postura tradicionalmente aplicadaao setor sade Em geral, segundo Campos (2000), faz-se VigilnciaSanitria (Promoo e Preveno) sobre os usurios e no coma participao ativa deles. Ao sobre as pessoas e no com oenvolvimento delas. H duas expresses semelhantes, mas um abis-

    mo entre elas: agir sobre ou agir com as pessoas? Em conse-qncia, os programas perdem eficcia ao tentar manipular e con-trolar o desejo, o interesse e os valores das pessoas, em funo de

    necessidades oriundas de normas estabelecidas pela epidemiologia,ou pela lgica poltica ou administrativa.

    Ao inserir a comunidade no projeto de interveno, podemospotencializar o processo gerando um produto alm da necessidadeinicialmente identificada que era a retirada do lixo. Com a participa-

    o da comunidade, o produto se tornou mais consistente e dura-douro, j que gerou uma transformao no entendimento sobre

    problemas relacionados ao lixo e tambm mudana na postura dacomunidade em relao resoluo de um problema que diz res-

    peito a todos, gerando acima de tudo autonomia.Como desdobramento desta ao, a comunidade reivindicou outros

    pontos de coleta de lixo na comunidade, props a discusso em outrasreas da comunidade, para formular aes de interveno em relaoao destino inadequado do lixo, e com ajuda de alguns moradores

    potencializou o uso do espao antes destinado ao lixo, com a criao

    de uma rea de recreao e tambm com cultivo de plantas e ervas.Tornou-se evidente a importncia que a ESF desempenhou nesseprocesso, a partir de uma postura acolhedora dos problemas dacomunidade e uma valorizao de suas reivindicaes e estabeleci-

    mento de uma relao horizontal. Essa postura criou condies parauma discusso ampla e possibilitou a formao de bases para quea populao local pudesse se organizar e criar posteriormente emconjunto com a ESF um Conselho Gestor para discutir os proble-

    mas presentes na comunidade.A equipe de residentes assinala como principal produto dessa

    interveno o desenvolvimento de uma organizao coletiva nacomunidade, que atravs de um projeto de interveno poderessignificar o seu modo de estar e viver naquela comunidade.

    RefernciasBRASIL. Ministrio da Sade. Guia Prtico do Programa Sade da Famlia. Braslia:

    MS, 2001.______. Programa de Agentes Comunitrios de Sade. Avaliao Qualitativa do PACS.Brasilia: MS, 1994.

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    Neyla Duraes Fernandes, rsula Lopes Neves e Mauro Cezar Silva Xavier

    32 ATELI DO CUIDADO

    Introduo/JustificativaA Estratgia de Sade da Famlia, adotada pelo Ministrio da

    Sade como reorganizador da ateno bsica em sade, tem comofundamentos possibilitar o acesso universal e contnuo aos serviosde sade, a integralidade do cuidado e relaes de vnculo eresponsabilizao entre as equipes e a populao adscrita garantindoa continuidade das aes de sade e a longitudinalidade do cuidado(BRASIL/MS, 2006).

    O grupo que organizou esse trabalho constitudo por uma

    equipe de Residentes do segundo ano (R2) em Sade da Famlia.Temos como campo de prticas uma Unidade de Sade da Famliano municpio do Rio de Janeiro. O curso tem durao de dois anose, desde o incio do curso (abril de 2006) estamos desenvolvendoatividades prticas na unidade de sade.

    Tenda educativa como instrumento deeducao em sade para preveno de

    DST/Aids em adolescentes de uma reacoberta pela Estratgia de Sade da

    Famlia no municpio do Rio de Janeiro:relato de experincia

    KARLLA ASSAD DA SILVA1

    NEYLA DURAES FERNANDES2

    RSULA LOPES NEVES3

    1 Cirurgi-Dentista. Aluna do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldesda Residncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).2 Psicloga. Aluna do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldes daResidncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).3 Nutricionista. Aluna do Curso de Especializao em Sade da Famlia nos Moldesda Residncia - Escola Nacional de Sade Pblica Sergio Arouca (ENSP/FIOCRUZ).Endereo eletrnico: [email protected]

    CAMPOS, G. W. S. Vigilncia sanitria: responsabilidade pblica na proteo epromoo da sade. Revista Interface, 2000.

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    Karlla Assad da Silva, Neyla Duraes Fernandes e rsula Lopes Neves Tenda educativa como instrumento de educao em sade...

    ATELI DO CUIDADO 3534 ATELI DO CUIDADO

    A unidade de sade em que estamos lotados possui cinco equipesde Sade da Famlia, entre mdicos, enfermeiros, auxiliares de en-fermagem, agentes comunitrios de sade, alm de trs equipes desade bucal (trs cirurgies-dentistas, duas atendentes de consultriodentrio e uma tcnica em higiene bucal).

    Ao chegarmos unidade de sade, nos deparamos com situaesque nos remeteram a observaes sobre como se configurava oacesso aos servios de sade. Tendo em vista este fator e a observa-o emprica de que os adolescentes pouco participavam das ativida-des desenvolvidas na Unidade de Sade da Famlia em questo, fez-

    se necessrio lanar mo de algum instrumento que viabilizasse umamaior aproximao desta parcela da populao adscrita s equipes desade da famlia locais, garantindo seu acesso e vnculo unidade.

    Optou-se por utilizar como atrativo a elaborao de uma tendade sade na comunidade, com distribuio de preservativo e expli-cao sobre sua utilizao, pois era possvel que esse tipo de assuntoatrasse a curiosidade do pblico jovem, principalmente do pblico

    masculino, que aquele menos participativo e menos includo nasatividades da Unidade de Sade da Famlia. Atravs dessa atividade,buscamos captar adolescentes para constituio de um grupo paradiscusses de questes de sade e outras, procurando construir vn-culo e garantir acesso e escuta a esse grupo por vezes negligenciado.

    Reviso de literaturaA adolescncia uma categoria sociocultural, historicamente

    construda a partir de critrios mltiplos que abrangem tanto a di-menso biopsicolgica, quanto a cronolgica e a social. O fato queestar na adolescncia viver uma fase em que mltiplas mudanasacontecem e se refletem no corpo fsico, pois o crescimento somticoe o desenvolvimento em termos de habilidades psicomotoras seintensificam e os hormnios atuam vigorosamente, levando a mu-danas radicais de forma e expresso. No que tange ao aspecto

    psicolgico, muitas so as transformaes, principalmente as relaci-onadas labilidade no humor. Surgem dvidas e questes de vriasordens, desde sobre como viver a vida, os modos de ser, de estarcom os outros, at a construo do futuro com as escolhas profis-sionais (FERREIRA et al.,2007).

    No entanto, apesar de a adolescncia ser vigorosamente marcadapor processos psicobiolgicos, esta fase no deve ser tomada comoum conjunto de fenmenos universais implicados no crescimento edesenvolvimento somtico-mental, uma vez que as transformaes

    pelas quais passam os adolescentes tambm resultam de processosinerentes aos contextos sociais (histricos, polticos e econmicos)

    nos quais os sujeitos adolescentes esto imersos. Neste sentido, pen-sar a sade do adolescente implica pensar nos diversos modos deviver a adolescncia e de viver a vida. Por sua vez, implica um

    movimento de repensar as prticas de sade e de educao em

    sade que se voltam para esta parcela significativa da sociedade, osadolescentes (RAMOS, 2001).Ao propor uma ao de promoo sade do adolescente na

    comunidade, a responsabilidade de execuo, no mbito da sade,recai sobre as equipes de aes bsicas. Admite-se que trs gruposso importantes na compreenso dos elementos associados a uma

    proposta dessa natureza: as famlias com adolescentes, os profis-sionais de sade da famlia e os prprios adolescentes. Quando setrata de uma proposta de elaborao de aes de promoo sade, fundamental uma aproximao com os contedos subje-tivos dos atores sociais envolvidos. Primeiro, como forma de al-canar as impresses, opinies, sentimentos e saberes dos diferen-tes grupos; depois, porque interessa conhecer quais os recursos eas dificuldades de cada um desses segmentos (pais, adolescentes e

    profissionais) em promover a sade dos adolescentes na comuni-dade (JEOLAS; FERRARI, 2003).

    Um olhar mais aprofundado sobre a Aids indica que h participa-o intensa de homens jovens na dinmica da epidemia. Paradoxal-

    mente, a despeito de tal fato, esse grupo se encontra praticamente margem de uma ateno adequada no mbito do Sistema nico deSade (SUS). De um modo geral, verifica-se que as aes realizadas

    no nvel da ateno bsica voltam-se distribuio espordica depreservativos masculinos por unidades bsicas de sade, podendo-seafirmar que tal abordagem no considera, com propriedade, as ques-tes que envolvem sua sade sexual e reprodutiva. Dessa forma, faz-se necessrio que a assistncia sade dos homens jovens tenha como

    princpio que so atores com necessidades de sade, sexualidade e

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    ATELI DO CUIDADO 3736 ATELI DO CUIDADO

    reproduo a serem consideradas, tanto na suas relaes com o outro,como em sua especificidade, conforme sugeriu Figueroa-Perea (1998).

    Coincidindo com a escassa presena dos homens jovens prin-cipalmente os adolescentes como foco das aes de ateno sade reprodutiva e sexual, observa-se que os estudos que tomamcomo referncia tal grupo tm procurado conhecer e descrever

    prticas sexuais e comportamentais que possam agregar riscos deinfeco ou transmisso do HIV. No entanto, as experincias afetivo-amorosas que, na maior parte das vezes, antecedem o incio da vidasexual e ocorrem, pela primeira vez, na adolescncia, como beijar,

    ficar e namorar, vm sendo pouco abordadas e exploradas porestudiosos do campo da sade coletiva (BORGES; SCHOR, 2007).No Brasil, as polticas pblicas para adolescentes, criadas e regu-

    lamentadas na dcada de 80, desenvolvem-se de forma fragmentadae desarticulada, cada setor do governo desenvolve suas polticas,estratgias e aes isoladamente [...] no representando um trabalhointersetorial expressivo dirigido integralidade da ateno ao ado-lescente (RUA, 1998). Em face dessa realidade, em outra perspec-tiva, a poltica de sade que pode mudar a situao atual dos ado-lescentes no pas a Estratgia da Sade da Famlia (ESF), por seaproximar mais das condies socioculturais e assim cumprir os

    princpios que norteiam o SUS (BRASIL, 1998).A idia de utilizao de tendas educativas sobre DST e Aids como

    forma de aproximao dos adolescentes com a Unidade de Sade daFamlia tenta responder necessidade de reestruturao das prticasde sade voltadas para adolescentes. Alm disso, propicia um terrenofrtil para a promoo da sade, to valiosa na prtica da ESF. Contudo,certos cuidados devem ser tomados antes de se iniciar uma atividadecom o recorte etrio aqui definido, para se evitar uma classificaorgida e limitada dos indivduos que esto passando por este ciclo devida. Muitas vezes estas classificaes se do atravs de idias precon-cebidas, dificultando o dilogo franco e aberto com os adolescentes.No contexto de homogeneizao de comportamentos e estilos devida que caracteriza a sociedade contempornea, ser jovem significa

    mais do que uma delimitao etria: ser jovem ser novo e inovador,projetado para o futuro; juventude beleza, leveza, humor, respon-sabilidade, coragem, ousadia e... sexo (VILLELA; DORETO, 2006).

    No entanto, nem todos os jovens se expem igualmente a essaconcepo de juventude, pois as informaes se difundem de mododistinto pelas camadas sociais e so elaboradas contextualmente,fazendo com que a idia de juventude, do que adequado ou noa esse perodo, ou mesmo a sua durao, seja vivenciada de maneira

    particular nos diversos grupos. Se hoje uma jovem inicia sua carreirareprodutiva entre 15 e 20 anos, como suas avs e bisavs, h osentimento de que est deixando de aproveitar as oportunidades queo mundo lhe oferece, em especial em termos de escolarizao etrabalho. O mesmo ocorre em relao aos rapazes, que, frente a

    uma gravidez da parceira, devem parar de estudar para trabalhar esustentar a famlia. Em alguns casos, as trajetrias se constroemexatamente como foi descrito, mas essa no uma regra. Nemtodos os jovens interrompem definitivamente a sua formao pro-fissional pelo fato de terem filhos, nem todos os jovens que tmfilhos tinham interesse, capacidade e chance de maior de escolarizaoe insero qualificada no mercado de trabalho. O mesmo pode serdito em relao infeco pelo HIV que, embora cada vez mais setransforme em uma doena crnica com a qual possvel (com)viver, ainda entendida por muitos como uma sentena de morte(VILLELA; DORETO, 2006).

    A epidemia pelo HIV uma ameaa real, e no apenas para osjovens. As gestaes no planejadas tambm, em qualquer idade.Assim, so necessrias polticas pblicas de sade e de educao que

    minimizem os riscos relacionados ao exerccio da sexualidade pelaspessoas em qualquer idade (VILLELA; DORETO, 2006).

    Todos esses fatores foram considerados na elaborao da abor-dagem aos adolescentes na comunidade atravs das tendas de sade,a fim de se evitar generalizaes castradoras do processo educativoconstrutivo e compartilhado.

    MetodologiaOs profissionais participantes da tenda educativa foram treinados

    pelo enfermeiro residente, a fim de homogeneizar o discurso sobrepreveno e tratamento de DST/Aids. Durante o treinamento foramabordadas, alm das questes biolgicas as dimenses psicossociais datemtica a ser desdobrada durante a atividade educativa.

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    Karlla Assad da Silva, Neyla Duraes Fernandes e rsula Lopes Neves Tenda educativa como instrumento de educao em sade...

    ATELI DO CUIDADO 3938 ATELI DO CUIDADO

    A escolha do local, horrio e dia destinados a fixao da tendalevou em conta o trnsito dos adolescentes pela comunidade e aviabilidade dos mesmos dispensarem momentos de ateno aoevento. Esta seleo tomou como base o conhecimento dos ACSacerca do territrio. Escolheu-se um dia da semana para montagemda tenda e a atividade ocorreu no perodo da manh e tarde.Apesar de a atividade ter sido planejada visando a atingir os ado-lescentes da rea, outras pessoas, adscritas ou no ao territrio, ao

    passarem pelo local, tambm visitaram a tenda.Todas as pessoas que visitaram a tenda tiveram seus dados pesso-

    ais (nome, idade e endereo) registrados, visando a quantificar ejustificar a distribuio dos preservativos. Os materiais utilizadosforam: lbum seriado e cartazes sobre DST/AIDS, preservativos

    masculinos, prteses dos rgos sexuais femininos e masculinos. Osmateriais foram utilizados como ferramentas para explicao e es-clarecimento de dvidas em relao ao assunto. Tambm foramdistribudos preservativos masculinos aos que visitaram a tenda.

    As etapas abaixo, para abordagem dos adolescentes, foram pre-viamente construdas e pactuadas pelos profissionais. Deixou-se cla-ro que o roteiro era apenas um norte para o rompimento da inrciada atividade, devendo a particularidade e dvidas de cada partici-

    pante ser respeitada. O roteiro seguia as seguintes etapas:1. abordagem ao adolescente convidando-o a participar da tenda;2. registro dos dados do adolescente(nome, endereo e idade);3. Perguntar se ele desejava receber preservativos. Em caso de res-

    posta afirmativa, perguntava-se ao adolescente por que se deve

    usar o preservativo e como. Estas perguntas possibilitaram oincio de um dilogo sobre o uso de preservativo e todas asquestes envolvidas nesta ao. Em caso de resposta negativa,

    partia-se para a etapa 4, que tambm foi realizada com aquelesque responderam afirmativamente a questo anterior;

    4. perguntar ao adolescente se ele desejava participar da construode um grupo voltado para adolescentes com contedo totalmen-te selecionado pelos prprios participantes. Em caso de respostaafirmativa, entregava-se o convite para um encontro com os

    profissionais de sade e outros adolescentes, respeitando a dispo-nibilidade de horrio do indivduo a ser convidado. Em caso deresposta negativa, registrava-se a recusa;

    ResultadosA tenda contou com a participao de 73 indivduos. Destes,

    4,1% (3) eram de reas no cobertas pela ESF, 82,2% (60) eramadolescentes e dos adolescentes participantes 70% (42) eram do sexo

    masculino e 30% (18) eram do sexo feminino. Todos os adolescen-tes do sexo masculino desejaram levar preservativos para casa, pormapenas metade das meninas pegou os preservativos. Todos os ado-lescentes demostraram interesse em participar ativamente da cons-truo de um grupo para jovens na unidade de sade. Durante aatividade, uma usuria solicitou a criao de um grupo de discusso

    para mulher sobre sexualidade.Concluso

    A dinmica das relaes de gnero impe s moas o recato emrelao ao sexo, enquanto que, para os rapazes, esperado que nohaja muito pudor ou embarao em relao ao tema (VILLELA;

    DORETO, 2006).Por isso, a maior participao dos adolescentes do sexo mascu-

    lino j era previsvel e at mesmo desejada, tendo em vista que estegrupo compe a parte da populao cadastrada que menos interagecom o Sade da Famlia, at mesmo porque inexistem atividadesvoltadas para este pblico. Contudo, as atividades em que as ado-lescentes esto envolvidas na Unidade de Sade da Famlia so ainda

    muito incipientes e mais voltadas para a sade reprodutiva, o quejustifica a incluso de algum atrativo para o pblico feminino emuma prxima oportunidade de execuo da tenda educativa.

    Mesmo com esta ressalva, a tenda educativa mostrou ser um ins-trumento pertinente para a aproximao dos profissionais de sade dafamlia aos adolescentes. As perguntas formuladas no roteiro de fatoforam teis para se iniciar uma discusso sobre o tema em voga.Foram despertadas curiosidades para alm das perguntas feitas, pro-

    piciando um momento de troca e intercesso de conhecimentos ni-cos. O material utilizado, sobretudo a distribuio de preservativosforam importantes atrativos para que as pessoas se aproximassem.

    Alm disso, a presena dos profissionais na rua proporcionouum momento de oportunidade de comunicao com pessoas deoutras faixas etrias, que tambm verbalizaram o interesse em par-

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    ATELI DO CUIDADO 4140 ATELI DO CUIDADO

    ticipar de grupos de discusso sobre sade. Esta oportunidade foidevidamente aproveitada e espera-se que resulte na criao de umgrupo de discusso voltado para mulheres. Houve tambm a opor-tunidade de solucionar dvidas acerca do funcionamento da Unida-de de Sade da Famlia e a distribuio regular de preservativos.

    Dados os resultados proveitosos gerados pela ao educativa,justifica-se aplic-la junto a outras equipes de sade da famlia etorn-la uma ao sistemtica. Contudo, necessrio que a mesmaseja dinmica, apresentando sempre novos atrativos para o pblicoe aproveitando as oportunidades surgidas das demandas apresenta-

    das pelos usurios, mesmo que estes no sejam adolescentes. Estadinmica pode contar com os prprios adolescentes participantesdos grupos agendados na Unidade de Sade, a partir do momentoem que os grupos estiverem acontecendo regularmente. A modifi-cao dos atrativos da tenda pode possibilitar seu uso para outrosfins, como a integrao dos profissionais com outros grupos da

    populao alm dos adolescentes, bastando para isto identificar umponto de interesse comum daqueles para quem se deseja dirigir prtica educativa.

    RefernciasBORGES, A. L. V.; SCHOR, N. Homens adolescentes e vida sexual: heterogeneidadesnas motivaes que cercam a iniciao sexual. Cad. Sade Pblica, Rio de Janeiro, v. 23,n. 1, 2007. Disponve l em: . Acesso em: 24 Out 2007.

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    IntroduoO presente estudo tem como objetivo analisar o conhecimento,

    opinies e expectativas dos trabalhadores acerca do uso e abuso delcool, visando ao cuidado integral atravs da elaborao de um

    programa de promoo da sade no trabalho e preveno de riscosrelacionados ao uso abusivo dessa substncia.

    O crescente consumo de lcool e suas devastadoras conseqn-cias tornaram-se um dos problemas mais graves dos dias atuais. O

    nmero de pessoas que se tornam dependente s e que sogradativamente destrudas por essa substncia aumenta assustadora-

    mente a cada dia. O abuso de lcool verificado nos ltimos anos esuas conseqncias na vida do indivduo e da sociedade conside-rado hoje um problema de sade pblica (CALDEIRA, 1999).

    O uso abusivo de lcool constitui, na atualidade, uma ameaa humanidade e estabilidade das estruturas do Estado e da socieda-de. Suas conseqncias afetam a todos os espaos geogrficos, in-cluindo todos os indivduos, independentemente da classe social eeconmica (BRASIL/MJ, 2001). Isso faz com que haja uma preo-cupao cada vez maior por parte das famlias, profissionais desade, de educao e autoridades governamentais quanto ao cres-cente nmero de alcoolistas no pas. O problema tem-se espalhado

    A valorizao do conhecimento e opiniesdos trabalhadores sobre o uso e abuso de

    lcool visando ao cuidado integral

    FERNANDA FERREIRA DA FONSECA1

    1 Professora substituta no Departamento de Sade Pblica da EEAN / UFRJ. Endereoeletrnico: [email protected].

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    Fernanda Ferreira da Fonseca A valorizao do conhecimento e opinies dos trabalhadores...

    ATELI DO CUIDADO 4544 ATELI DO CUIDADO

    nas sociedades industrializadas atingindo dimenses epidmicas, trans-formando-se num sintoma inquietante de um novo e profundo

    mal-estar na civilizao, trazendo srias conseqncias no s no quediz respeito sade, como tambm gerando grandes gastos finan-ceiros para os governos.

    O alcoolismo e as doenas orgnicas associadas ao lcool cons-tituem uma das principais causas de internao no Brasil. Tambm

    nos hospitais psiquitricos, o alcoolismo tem sido apontado comoa causa mais freqente de internao, com nmeros variando entre19% e 50 %, dependendo do estudo (FERREIRA, 2000).

    Trata-se de uma questo que acomete principalmente os gruposmais jovens e tambm os adultos que trabalham, nos quais as con-seqncias podem ser fatais, dada a possibilidade dos acidentes detrabalho. Alm disso, afetam tambm a produtividade das empresas.Seus graves efeitos se estendem tambm questo social e familiar,esta ltima tendo em vista a desestruturao da famlia, inclusive noaspecto econmico, uma vez que grandes quantias de dinheiro sogastas pelos trabalhadores no consumo de bebidas.

    Em 1948, a Organizao Mundial da Sade incluiu o alcoo-lismo como um item diferenciado da intoxicao alcolica e

    psicoses alcolicas, na Classificao Internacional de Doenas(CID). Atualmente, o alcoolismo encontra-se classificado pelaCID na sua 10 reviso, no captulo referente aos transtornos

    mentais e de comportamento.O trabalho considerado um dos fatores psicossociais de risco

    para o alcoolismo crnico (BRASIL/MS, 2001). O consumo cole-tivo de bebidas alcolicas associadas a situaes de trabalho podeser decorrente de prtica defensiva, como meio de garantir incluso

    no grupo. Tambm pode ser uma forma de viabilizar o prpriotrabalho, em decorrncia dos efeitos farmacolgicos prprios dolcool: calmante, euforizante, estimulante, relaxante, indutor do sono,anestsico e antissptico. O uso de lcool existe cada vez mais entre

    pessoas incorporadas vida produtiva, trazendo como conseqn-cias a diminuio da produtividade, alteraes das relaes na or-dem laboral, interpessoal, familiar, social e da sade.

    O estmulo para discutir essa temtica emergiu da prtica na con-dio de Enfermeira inserida na Estratgia Sade da Famlia (ESF) no

    municpio de So Pedro da Aldeia, no Rio de Janeiro. Nesse contextotenho acompanhado, atravs da consulta de enfermagem, um nmerocada vez maior de trabalhadores que fazem uso abusivo de lcool e,

    no raro, tornam-se vtimas de acidentes de trabalho.A ESF um novo modelo de assistncia sade que visa

    reorganizao da Ateno Bsica no pas, de acordo com os prin-cpios do SUS. Uma das caractersticas do processo de trabalho dasequipes de Ateno Bsica comum ESF o desenvolvimento deaes focalizadas sobre grupos de risco e fatores de riscocomportamentais, com a finalidade de prevenir o aparecimento ou

    a manuteno de doenas e danos evitveis. A partir deste enfoque,o presente estudo tem como objetivo analisar o conhecimento,opinies e expectativas dos trabalhadores acerca do uso e abuso delcool, visando elaborao de um programa de promoo dasade no trabalho e preveno de riscos relacionados ao uso abusivodessa substncia.

    A pesquisa torna-se relevante uma vez que se apia na necessida-de de produzir conhecimento cientfico e prtico relacionado aofenmeno uso e abuso de lcool no trabalho. Alm disso, oestudo pretende trazer para a comunidade cientfica novos conte-dos sobre essa temtica, atravs do levantamento de informaessobre o conhecimento e opinies dos trabalhadores acerca da temticacitada. Pretende-se contribuir tambm com o prprio trabalhador,buscando fortalecer a participao do mesmo na elaborao de umprograma participativo, trazendo-lhe maior segurana profissionale valorizao pessoal.

    Teorizando sobre o alcoolismo e o trabalhadorO alcoolismo refere-se a um modo crnico e continuado de usar

    bebidas alcolicas, caracterizado pelo descontrole peridico daingesto ou por um padro de consumo de lcool com episdiosfreqentes de intoxicao e preocupao com o lcool e seu uso,apesar das conseqncias adversas desse comportamento para a vidae a sade do usurio (BRASIL/MS, 2001).

    Segundo a Organizao Mundial de Sade, a Sndrome de De-pendncia do lcool um dos problemas relacionados ao trabalho.A Sociedade Americana das Dependncias, em 1990, considerou o

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    ATELI DO CUIDADO 4746 ATELI DO CUIDADO

    alcoolismo como uma doena crnica primria que tem seu desen-volvimento e manifestaes influenciadas por fatores genticos,

    psicossociais e ambientais, freqentemente progressiva e fatal.O lcool considerado a substncia de uso mais comum tanto

    na perspectiva da Sade Pblica como, particularmente, na Sade doTrabalhador. No Brasil, a Associao dos Estudos do lcool eOutras Drogas estimou, em 1990, que o alcoolismo o terceiro

    motivo de absentesmo no trabalho, sendo a causa mais freqente deaposentadoria precoce e acidentes de trabalho, e a oitava causa paraconcesso de auxlio doena pela Previdncia Social.

    Hoje o trabalho tem papel fundamental para os indivduos nomundo. Contribui para a formao da sua identidade e permite queos indivduos participem da vida social como elemento essencial

    para a sade (MENDES; DIAS, 1999), da a necessidade de seconhecer os fatores que interferem na qualidade de vida e no tra-balho. Cada categoria profissional tem suas especificidades ligadasao seu passado histrico, ao nvel de organizao e combatividade

    nas conquistas incorporadas legislao, ao sistema repressivo expl-cito que est sujeita e aos fatores nocivos envolvidos especifica-

    mente na atividade laboral(HAAG et al., 2001). importante salientar, no conjunto de fatores de risco associa-

    dos etiologia multicausal do alcoolismo crnico, que a prpriaocupao desenvolvida pelo trabalhador pode ser considerada comofator de risco. As profisses de maior risco so aquelas em que osindivduos trabalham por muitas horas seguidas, trabalhos noturnosou que exijam constante vigilncia e profissionais que atuam emambiente de grande estresse (MONTEIRO, 2000). Tambm os tra-balhadores de sade se enquadram na questo do risco devido a umalto ndice de ansiedade, relacionado ao prprio trabalho, o que osleva a buscar mecanismos compensatrios. Alm disso, h uma grandefreqncia de casos (individuais) de alcoolismo observada em ocu-

    paes que se caracterizam por serem socialmente desprestigiadas emesmo determinantes de certa rejeio, como as que implicamcontatos com cadveres, lixo ou dejetos em geral, apreenso e sa-crifcio de ces; atividades em que a tenso constante e elevada; detrabalho montono em que a pessoa trabalha em isolamento doconvvio humano (vigias) e situaes de trabalho que envolvem afas-

    tamento prolongado do lar (viagens freqentes, plataformas marti-mas, zonas de minerao) (BRASIL/MS, 2001).

    No entanto, estudos mais recentes indicam que no Brasil, atualmen-te o maior consumo de lcool ocorre no primeiro escalo das em-

    presas (dirigentes e altos executivos) tendo como justificativas a neces-sidade de reduzir o estresse decorrente da competitividade (DONATO,2002). Devido extenso do problema e suas graves conseqncias,as autoridades governamentais recomendam prioridade nas aes decombate ao alcoolismo, com o objetivo de diminuir os agravos sade do trabalhador e os acidentes de trabalho. Destacam-se os

    programas de preveno e promoo da sade que tm por objetivoidentificar situaes de alcoolismo ou tendncias para ele.Priorizar a preveno do uso indevido de drogas e lcool no

    setor de trabalho uma interveno eficaz e de menor custo paraa sociedade. Nesse contexto, a equipe de enfermagem, como parteda equipe de sade, desenvolve papel importante para ajudar osindivduos a manter sua sade. A equipe de enfermagem deverestar empenhada em promover, manter e restabelecer a sade dotrabalhador, onde a promoo de sade desenvolve estratgias nosentido de valoriz-la, visando a reduzir os riscos relacionados comsua sade e, conseqentemente, preservar a integridade e satisfao

    no trabalho alm da mais alta produtividade (ROGERS, 1994).De acordo com o Programa Nacional Antidrogas [PNAD] (BRA-

    SIL/MJ, 2001), no ambiente de trabalho as doenas relacionadascom o uso e abuso de lcool e drogas trazem como conseqnciao absentesmo, custos diretos e indiretos decorrentes do uso dessassubstncias, acidentes e/ou aumento do risco de acidentes, diminui-o da produtividade, aumento de conflitos de grupo e problemasinterpessoais com os companheiros de trabalho.

    Nesta realidade complexa em que, de um dia para o outro, otrabalhador incapacitado ou limitado por um acidente ou poroutros motivos de sade para desempenhar suas funes na empre-sa, torna-se uma questo de grande relevncia. Se o trabalhador seausenta freqentemente do trabalho ou quando retorna no podelevar adiante as funes adequadamente, ou no atende s exignciasde produtividade, esses fatos provocam transtornos e perdas paraa organizao e devem ser esclarecidos para serem tratados.

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    ATELI DO CUIDADO 4948 ATELI DO CUIDADO

    Alguns fatores contribuem para que o consumo de bebida al-colica venha aumentando significativamente nos ltimos anos.

    possvel destacar a valorizao do lcool reproduzida pela mdiacomo objeto intermedirio nas relaes sociais, onde so exibidosaltos executivos tomando um drinque para relaxar aps umaimportante reunio, ou aqueles grandes amigos que aps o traba-lho sentam-se mesa de um bar para comemorar algum evento,ocasio na qual no pode faltar a bebida alcolica para intermediara alegria daquele momento. Alm disso, os prprios atrativos na-turais do lcool, como o sabor e o efeito euforizante, quando

    consumido em pequenas doses, facilita a insero do indivduo nacultura consumidora desta substncia.Algumas culturas seguem regras predeterminadas para o consu-

    mo do lcool ou tm rituais estabelecidos de onde, quando e comobeber. Assim sendo, tm menores taxas de uso abusivo de lcoolquando comparadas com outras que no seguem quaisquer padres.No entanto, no Brasil, o indivduo abstmio pode chegar a serdiscriminado diante da recusa na parceria nas rodadas alcolicascom amigos. Isso faz com que a bebida seja dificilmente dissociadada vida das pessoas, inclusive dos trabalhadores (DONATO, 1999).

    Podemos ainda identificar fatores psicossociais negativos relacio-nados ao trabalho como determinantes de risco ao desenvolvimentodo alcoolismo, dentre eles Donato (1999, p. 25) destaca:

    [...] o inadequado desenvolvimento e aproveitamento dos poten-ciais, a sobrecarga de trabalho, a insegurana profissional, a desi-gualdade no salrio, os erros dos supervisores, as relaes conflituosas

    no trabalho, a falta de reconhecimento profissional, a frustraoquanto realizao de projetos de vida e ao aumento da qualidadede vida, o trabalho executado em turnos e o perigo fsico.

    Diante da complexidade e da diversidade de fatores de risco quepodem levar o trabalhador ao alcoolismo, acredito que programasdevem ser desenvolvidos com a finalidade de atendimento aos tra-balhadores que fazem uso abusivo de lcool e de preveno visandoqueles que no consomem a substncia. Esses programas devemser criados sob um olhar amplo, de forma que sejam analisados osfatores multicausais que podem levar ao alcoolismo. Atravs desseolhar, sero mais fceis compreenso da doena e a adeso do

    paciente aos programas, tornando a preveno do risco de acidentede trabalho uma meta a ser alcanada mais facilmente.

    MetodologiaTrata-se de estudo descritivo-exploratrio, sendo desenvolvido e

    fundamentado na abordagem qualitativa, por melhor adequar-se anlise do objeto e alcance dos objetivos. A pesquisa qualitativa aquela em que se trabalha com o universo de significados, motivos,aspiraes, crenas, valores e atitudes, o que corresponde a umespao mais profundo das relaes, dos processos e dos fenmenos

    MINAYO, 2004). Por esse motivo, tal abordagem veio perfeitamen-te ao encontro perspectiva de alcanar os objetivos da pesquisa.Os sujeitos da pesquisa foram trabalhadores que buscaram aten-

    dimento mdico e que passaram pela consulta de enfermagem emuma Unidade de Sade da Famlia no municpio de So Pedro daAldeia, Regio dos Lagos, Rio de Janeiro. Totalizaram um nmerode 15 trabalhadores entrevistados, sem haver planejamento prvioquanto ao nmero de participantes.

    O interesse da pesquisa qualitativa no est focalizado em contaro nmero de vezes que a varivel aparece, mas sim que qualidadeelas apresentam, no sendo necessrio definir previamente o nmerode entrevistados. A deciso de encerrar a coleta de dados tomadaquando o pesquisador percebe que as informaes colhidas at o

    momento so suf icientes para atender os intuitos do estudo(LEOPARDI, 2001).

    Ressalto que nessa ocasio os sujeitos procuraram a Unidadecom queixas diversas e foram escolhidos aleatoriamente conformeaceitavam participar da entrevista. Os depoimentos foram obtidos

    por meio de entrevista semi-estr uturada, com o uso de gravador.Dessa forma, entendo que foi possvel permitir ao sujeito pensare produzir respostas livres, alm de oportunizar o estabelecimentode uma relao dialgica com o entrevistado.

    A coleta de dados tomou por base trs questes norteadoras:Que informaes os trabalhadores tm acerca do fenmenouso e abuso de lcool?, Quais os fatores de risco relacionadosao abuso de lcool no trabalho? e Como o conhecimento,opinies e expectativas dos trabalhadores acerca do uso e abuso

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    ATELI DO CUIDADO 5150 ATELI DO CUIDADO

    do lcool podem contribuir para a elaborao de um programade preveno ao alcoolismo?.

    Os trabalhadores foram esclarecidos quanto aos objetivos dapesquisa e assegurados de que teriam sua identidade preservada.Todos assinaram um termo de comprometimento livre e esclareci-do, respeitadas as determinaes que constam na Resoluo n 196/96, do Comisso Nacional de tica em Pesquisa, que dispes sobrediretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo sereshumanos. Alm disso, houve aprovao e liberao para realizaoda pesquisa, emitida pelo ento gestor municipal de sade.

    A coleta de dados iniciou-se aps obter o consentimento dosparticipantes. Cabe ressaltar que, ao iniciar as entrevistas, esclareceu-se aos participantes a necessidade do uso do gravador para facilitaro registro, na ntegra, dos depoimentos e sua posterior transcrio.As informaes foram trabalhadas por meio de anlise temtica, aqual propicia conhecer uma realidade por meio das comunicaesde indivduos que tenham vnculo com a mesma. Como resultado,emergiram cinco unidades temticas, denominadas: o alcoolismocomo um problema dos outros; busca dos efeitos atrativos dolcool; alcoolismo como fator de risco no trabalho; alcoolismo comodoena e sentimentos confessados: a dependncia ao lcool.

    Apresentao e discusso dos dadosO alcoolismo como um problema dos outros

    Durante as entrevistas, alguns sujeitos reconheceram que o alco-olismo um problema, porm o vem como algo que no os

    prejudicaria apesar de fazerem uso de bebida alcolica.[...] esse negcio de alcoolismo para gente fraca que no sabebeber. Eu sempre bebi e nunca fiquei ruim, pelo contrrio, ficoat mais alegre. (E1)

    Conheo um cara que alcolatra. Ele j acorda bebendo cachaa[...]. No o meu caso. Eu bebo s pra descontrair [...] (E8)

    De acordo com essas falas, pode-se observar que existe certabanalizao do tema. Os entrevistados parecem ver o alcoolismocomo algo distante de si, apesar de fazerem uso da substncia comalguma freqncia. Alm disso, pode-se perceber distores do pen-samento, em alguns casos evidenciando a negao, isto , o bebedor

    alcolico tende a no reconhecer que faz uso abusivo do lcool. Maisda metade dos pacientes com problemas relacionados ao lcool noso identificados. Somando-se o subdiagnstico, o preconceito eobstculos em motivar o paciente para o processo de mudana decomportamento, o resultado a enorme dificuldade no diagnsticoe tratamento (DONATO, 1999). Outro discurso que revelou o usodo lcool pelo sujeito e seu conhecimento acerca disto:

    No tenho o hbito de beber todos os dias, mas no final de semanatem que ter uma cervejinha para relaxar [...] tem gente que noconsegue parar, acho que isso que alcoolismo [...] mas eu sei ahora de parar. (E5)

    Neste relato observamos que o sujeito demonstra conhecer queo uso do lcool leva dependncia, porm no reconhece em si

    mesmo o risco, embora tambm faa uso da substncia.Atualmente, 84% da populao brasileira apresentam crescente

    consumo ocasional do lcool e, no mnimo, 3 a 10% destes teroincio de cronificao pela bebida. importante lembrar que oconsumo de lcool em quaisquer volumes deve sempre ser evitadoao mximo como medida preventiva, pois tnue o limite quesepara o uso do abuso e suas graves conseqncias, e tambm se forlevado em conta o fato de que o alcoolismo uma doena insidiosa,de evoluo lenta e quase desapercebida (DONATO, 1999).

    O indivduo que faz uso de bebida alcolica, at chegar depen-dncia, passa por um processo de evoluo da doena que possuivrias fases, e uma delas exatamente aquela em que a pessoa temo primeiro contato com o lcool. medida que o uso espordicodessa substncia vai-se tornando uma rotina, aos poucos a bebida

    passa a fazer parte de sua vida. Ela est presente nas comemoraes,nas reunies com os amigos, enfim, lentamente o lcool vai-se tor-nando parte indissocivel da vida das pessoas. A partir da, o riscopara dependncia vai se tornando gradativamente maior.

    Portanto, no reconhecer em si mesmo que o uso da bebidaalcolica, mesmo que espordico a princpio, pode levar depen-dncia, uma sria questo, pois grande parte esses usurios setornaro alcoolistas com o tempo. E em se tratando de trabalhado-res, ressalto a questo do risco para acidentes de trabalho como umfato que deve ser levado em considerao.

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    Fernanda Ferreira da Fonseca A valorizao do conhecimento e opinies dos trabalhadores...

    ATELI DO CUIDADO 5352 ATELI DO CUIDADO

    Alcoolismo como fator de risco no trabalho

    Alguns sujeitos fizeram colocaes expressivas quanto ao riscoque o alcoolismo representa para o trabalhador durante o desenvol-vimento de suas funes:

    Acho que se o cara estiver trabalhando alcoolizado ele corre o riscode cometer erros [...] dependendo do trabalho que ele faz, isso podeat representar risco de vida [...] risco de vida dele e s vezes deoutras pessoas tambm (E11).

    A afirmativa deste trabalhador corresponde a uma realidade. Deacordo com dados do Programa Nacional Anti Drogas 2001, o

    uso de drogas e lcool aumenta em cinco vezes as chances deacidentes de trabalho, relacionando-se com 5 a 13% das ocorrncias.Sabe-se que no sistema nervoso dos alcoolistas ocorre perda daidentidade total ou parcial e do domnio dos prprios movimentos

    na embriaguez. Isso quer dizer que o risco aumenta significativamen-te nesse estado. Trabalhadores que atuam diretamente operando

    mquinas ou dirigindo carros, nibus ou caminhes, por exemplo,colocam no s suas vidas em risco, mas tambm a de outras

    pessoas que possam com ele estar envolvidas naquele momento.Pra falar a verdade eu mesmo tive um problema [...] eu dirigianibus e um final de semana eu exagerei na cerveja [...] era umaniversrio [...] perdi o controle do coletivo e bati. No era pramim beber naquele dia, eu assumo o meu erro.

    De acordo com esse relato, possvel perceber que o trabalha-dor se exps ao risco, mesmo tendo conscincia dele. Os trabalha-

    dores podem at desafiar o perigo e construir o que chamado deideologia defensiva, como mecanismo coletivo de proteo con-tra o medo (DEJOURS, 1992). Esta uma estratgia segundo aqual, diante de atividades reconhecidamente arriscadas,