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 UNIVERSIDADE DE LEÓN FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA IBEROAMERICANA MESTRADO EM GESTÃO E AUDITORIAS AMBIENTAIS ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS BRASILEIRAS Abordagem analítica e proposta de regulamentação GILBERTO DA SILVA Florianópolis, Brasil 2010

ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS BRASILEIRAS

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Neste trabalho, o antropólogo Gilberto da Silva discute a problemática apresentada nesta pesquisa é composta por dois temas discursivos que circulam no campo socioambiental, indigenista, político e cultural de maneira inter-relacionada: o ecoturismo e as terras indígenas brasileiras. A intenção foi demonstrar como certos impasses históricos, jurídicos e conceituais relacionados ao ecoturismo aparecem na arena política indigenista, ambiental e econômica como modelo de uma suposta inclusão social e incremento produtivo sustentável para os Povos Indígenas brasileiros.Gilberto da Silva

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UNIVERSIDADE DE LEÓN

FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA IBEROAMERICANA

MESTRADO EM GESTÃO E AUDITORIAS AMBIENTAIS

ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS BRASILEIRAS

Abordagem analítica e proposta de regulamentação

GILBERTO DA SILVA

Florianópolis, Brasil2010

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UNIVERSIDADE DE LEÓN

FUNDAÇÃO UNIVERSITÁRIA IBEROAMERICANA

MESTRADO EM GESTÃO E AUDITORIAS AMBIENTAIS

Gilberto da Silva

Atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras: abordagem analítica eproposta de regulamentação

Dissertação apresentadacomo requisito parcial para obtençãodo título de Mestre em Gestão eAuditoria Ambiental do Curso depós – graduação da Universidad deLeón.

Professora Orientadora: Dra.Naná Mininni Medina

Professora co-Orientadora:Dra. Alina Celi Frugoni

Florianópolis, Brasil 2010

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ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS BRASILEIRASABORDAGEM ANALÍTICA E PROPOSTA DE REGULAMENTAÇÃO

Gilberto da Silva

Dissertação submetida ao corpo docente do Programa de   Master en Gestión y Auditoría

  Ambientales da Universidad de León, fomentado pela Fundação Universitária

 Iberoamericana – FUNIBER, como parte dos requisitos necessários à obtenção do graude:

MESTRE EM GESTÃO E AUDITORIA AMBIENTAL

________________________________

 Dra. Naná Mininni MedinaOrientadora

_____________________________________ Msc. Alina Celi Frugoni

Co-orientadora

____________________________________ Dra. Naná Mininni Medina

Diretora FUNIBER/Brasil

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SUMÁRIO

 

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 81.1 Justificativa do tema no contexto conjuntural ................................................................. 10

1.2 Objetivos da pesquisa ...................................................................................................... 111.2.1 Objetivo geral ......................................................................................................... 111.2.2 Objetivos específicos .............................................................................................. 11

1.3 Marco teórico ................................................................................................................... 121.3.1 Indigenismo, índios, e terras indígenas .................................................................. 171.3.2 Turismo, ecoturismo em terras indígenas, turismo sustentável, turismo cultural,

turismo étnico ........................................................................................................ 201.3.3 Legislação ............................................................................................................... 221.3.4 Atividades turísticas em terras indígenas ................................................................ 24

1.4 Aspectos metodológicos .................................................................................................. 251.4.1 Realismo etnográfico ............................................................................................... 281.4.2 Análise documental.................................................................................................. 29

1.5 Estrutura do trabalho ....................................................................................................... 301.6 Análise de resultados ....................................................................................................... 31

2 ESTUDO DE CASOS ...........................................................................................................322.1 Antecedentes da temática no âmbito internacional.......................................................... 322.2 Terra Indígena Parque do Xingu ...................................................................................... 35

2.2.1 Projeto Kamayurá e Waurá ..................................................................................... 352.2.2 A Pousada Xingu Refúgio Amazônico ................................................................... 422.2.3 Evento Negócios de Turismo no estado de Mato Grosso ....................................... 48

2.3 A Reserva Pataxó da Jaqueira .......................................................................................... 502.4 Os Guarani de Paraty Mirim - Aldeia Ecoturística e Museu Vivo .................................. 552.5 Estudo de caso: a empresa Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda. e os impactos aos

Povos Indígenas Tenharim e Mura .................................................................................. 59

3 ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS................................................693.1 Aspectos jurídicos ............................................................................................................ 693.2 Segmentações do turismo com atrativos naturais e paisagísticos ................................... 773.3 Abordagem não dicotômica das ações correlacionadas ao turismo ................................. 83

3.3.1 Degradação ambiental ............................................................................................ 853.3.2 Biopirataria e pesquisa científica ............................................................................ 89

3.3.3 Sobreposições de unidades de conservação em terras indígenas ........................... 92

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4 CONCLUSÕES ..................................................................................................................... 964.1 As terras indígenas como categoria diferenciada ............................................................ 964.2 A importância de um sistema de informações sobre ecoturismo indígena ...................... 964.3 A responsabilidade da União, dos estados, municípios e sociedade civil ....................... 97

4.4 O paradigma do ecoturismo como atividade sustentável para os Povos Indígenas......... 99

5 RECOMENDAÇÕES ..........................................................................................................1015.1 Fórum permanente de discussões .................................................................................. 1015.2 A definição de propostas e o papel dos executores ........................................................ 1015.3 Regramento e operacionalidade..................................................................................... 1025.4 Normas preliminares de regulamentação de atividades turísticas nas terras indígenas

brasileiras ......................................................................................................................... 103

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................... 106

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RESUMO

A partir dos anos de 1990, a propagação de que o ecoturismo seria uma das mais

promissoras atividades econômicas mundiais tomou proporções no espaço territorial

brasileiro de tal forma que atingiu as áreas protegidas, em especial as terras indígenas. Este

fato vem exigindo reformulações tanto teórico-metodológicas em certas áreas disciplinares,

quanto na esfera de elaboração de intervenções no modo como os novos arranjos

socioculturais, políticos e ambientais são compreendidos sem que as suas especificidades

sejam negligenciadas. São conjuntos de relações que acomodam, conflituosamente, distintos

regimes de verdade, configurações institucionais e manifestações que implicam em novos

desafios interpretativos e práticos. Neste cenário, a problemática apresentada nesta pesquisa é

composta por dois temas discursivos que circulam no campo socioambiental, indigenista,

político e cultural de maneira inter-relacionada: o ecoturismo e as terras indígenas brasileiras.

Esta investigação tem como proposta analisar a articulação desses dois temas em

diferentes cenários no espaço pluriétnico nacional. De um lado, trata-se de discutir como as

problemáticas do ecoturismo e do indigenismo foram relacionadas aos debates sobre as

possíveis maneiras de serem adaptadas ao que se denomina ecoturismo nas terras indígenas

desde o início dos anos 90 de século passado até o atual contexto da conjuntura sociopolítica

brasileira. Por outro, analisar as representações a respeito do tema nos atuais debates sobre a

formulação de políticas públicas, incluindo uma proposta de regulamentação capaz de dirimir

as situações conflituosas.

A intenção foi demonstrar como certos impasses históricos, jurídicos e conceituais

relacionados ao ecoturismo aparecem na arena política indigenista, ambiental e econômica

como modelo de uma suposta inclusão social e incremento produtivo sustentável para os

Povos Indígenas brasileiros.

Palavras-chave: turismo, ecoturismo, indigenismo, terras indígenas, atividades turísticas em

terras indígenas, ecoturismo em terras indígenas, patrimônio cultural indígena, turismo

sustentável, turismo cultural, turismo étnico, legislação indigenista, antropologia.

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ABSTRACT

Since the 1990s the spread of ecotourism that would be one of the most promising

economic activities worldwide proportions took place in Brazilian territorial so it reached the

protected areas, especially indigenous lands. This fact has required both theoretical and

methodological reformulations in certain subject areas, as in the sphere of development

interventions on how the new arrangements sociocultural, political and environmental are

included only if their specificities are neglected. Are sets of relationships that can

accommodate, conflicting, different regimes of truth, institutional settings and demonstrations

involving new challenges and interpretive practice. In this scenario, the issue presented in this

research consists of two themes that circulate in the discursive field in the socio-

environmental, indigenous, political and cultural way of inter-related: ecotourism and

indigenous lands in Brazil.

This research is to analyze the relationship of these two themes in different settings

within multi-ethnic national. On the one hand, it is to discuss how the issues of ecotourism

and indigenous movement were related to discussions about possible ways to be adapted to

what is called ecotourism on indigenous lands since the early 90s of last century until the

current context of Brazilian sociopolitical situation. Second, consider the representations on

the subject in current discussions on the formulation of public policies, including a proposal

for legislation capable of resolving the conflict situations.

The intention was to demonstrate how certain impasses historical, legal and

conceptual appear related to ecotourism in the political arena for indigenous, environmental

and economic model as a supposed social inclusion and enhancing sustainable production for

Brazil's indigenous peoples.

Key words: tourism, ecotourism, indigenous movement, indigenous lands, tourism activities

in indigenous lands, ecotourism in indigenous lands, indigenous cultural heritage, sustainable

tourism, cultural tourism, ethnic, indigenous law, anthropology.

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1 INTRODUÇÃO

O turismo é considerado por alguns especialistas como uma das mais importantes e

promissoras atividades econômicas do início do século XXI, respondendo por

aproximadamente 12% do PBN mundial.

Segundo o presidente do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC), Jean-

Claude Baumgarten, o Brasil será um dos países que mais crescerá no mercado internacional

desse segmento de negócios. Em suas palavras: “o turismo é uma das maiores indústrias do

mundo e não tenho dúvidas de que o Brasil será, em um futuro próximo, um dos líderes

mundiais do setor ”.1 

Dados apresentados pelo Ministério do Turismo brasileiro2, levam a crer que há um

expressivo potencial para a exploração de produtos turísticos como forma de sustentabilidade,

geração de emprego e renda nacional. Além disso, a missão institucional das suas secretarias e

do Instituto Brasileiro de Turismo - Embratur é calcada nos itens de desenvolvimento,

crescimento, fomento, promoção e marketing.

O Brasil possui uma beleza cênica incomparável, além de contar com os elementos

culturais que colocam o país num patamar realmente agraciado pelo potencial para visitação e

conseqüente desenvolvimento de atividades turísticas. São centenas de roteiros oferecidos por

agências nacionais e internacionais, engendrando os mais distintos segmentos turísticos como

aventura, observação, lazer, histórico, religioso, negócios, entre outras tantas subcategorias.

O tema turismo remete o leitor a uma reflexão analítica mais profunda. Em primeiro

lugar, sobre a diversificação conceitual dos segmentos enquanto categorizados de forma

difusa e, não obstante, utilizados de forma equivocada ou propositadamente indutiva,

exclusivamente, para o mercado de compra e venda de produtos turísticos.

Outra situação passível de discussão refere-se à divulgação supervalorizada de dados

sobre turismo e os supostos benefícios sociais proporcionados. O economista Celso Furtado

deixou um legado teórico com fortes traços sobre a recusa em forçar a realidade para as

teorias pré-concebidas que se distanciam do mundo fático. Em alguns trabalhos e palestras

evidenciou sobre a facilidade na manipulação de dados em prol de uma conjuntura

governamental (2002, p. 79). Em palestra proferida na Universidade Federal do Rio de

1 Frase proferida por Jean-Claude Baumgarten, durante o encontro do WTTC em Florianópolis/SC, 2008.2 Considerando o período temporal de 2005 e 2006. Disponível em: <www.turismo.gov.br>.

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Janeiro, Furtado discursou sobre a realidade nacional enfatizando que o Brasil tem hoje (em

2002) uma renda dez vezes superior à renda da época em que ele dissertou sobre o

subdesenvolvimento e, nem por isso, as desigualdades sociais foram reduzidas. O país não foi

  bem sucedido no combate à pobreza e à miséria. “Cabe, pois, a pergunta: o Brasil se

desenvolveu? A resposta, infelizmente, é não. O Brasil cresceu. Modernizou-se. Mas o

verdadeiro desenvolvimento só ocorre quando beneficia o conjunto da sociedade, o que não se

viu no país”. Esta inferência teórica de Celso Furtado justifica-se a partir do momento no qual

existe uma retórica discursiva de que o turismo traz benefícios para a população residente nos

locais de visitação. Isso é uma inverdade e só acontece quando existem políticas sérias de

execução de atividades turísticas com base local. Um clássico exemplo são os mega-resorts

construídos no litoral brasileiro que proporcionam uma estratificação social, gerando

subempregos para uma minoria de pessoas, enquanto alguns empreendedores recebem a

maioria dos benefícios puramente econômicos.

Para que o turismo seja visto como uma das ferramentas capazes de promover o

desenvolvimento social de uma região ou de um país, deve-se repensar os conceitos

atualmente utilizados, bem como as formas que estão sendo aplicadas as políticas públicas

para o assunto. Segundo a Doutora Adyr Balastreri Rodrigues (2008), existem iniciativas

baseadas em sinergias locais com projetos turísticos modestos, no entanto, criativos einovadores que apresentam oportunidade para os diversos segmentos das comunidades,

hospedeiras, gerando benefícios de forma mais equânime apropriados localmente. Nas suas

  palavras: “[...] neste modelo de implantação turística que pode-se relacionar o turismo ao

patrimônio e à identidade cultural, uma vez que os recursos mobilizados ancoram-se no lastro

social” (RODRIGUES, 2008, p. 16).

Na abordagem do tema turismo, quando relacionado a terras indígenas, o foco central

deveria encontrar amparo nos conceitos de turismo de base local caracterizado pela inclusãodaqueles que recepcionam, pela garantia de uma sustentabilidade real e que respeite

diversidade cultural dos Povos Indígenas brasileiros, seu ambiente, sua cultura  –  respeito à

alteridade do visitado.

As comunidades tradicionais não podem continuar sendo vítimas de um processo de

degradação cultural e socioambiental em benefício de um crescimento desordenado,

disfarçado sob a máscara da expressão “turismo sustentável”. Além de reflexões teóricas é

preciso que os novos projetos estejam voltados para uma mudança nos atuais paradigmas de

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exploração turística, proporcionando ações e políticas públicas eficazes com o devido respeito

à alteridade, priorizando os benefícios para as populações locais.

A proposta deste trabalho de pesquisa é a apresentação de um diagnóstico sobre a

realização de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras que possa apresentar

subsídios para a elaboração de normas reguladoras sobre o tema.

1.1 Justificativa do tema no contexto conjuntural

O ecoturismo tem como objetivos compatibilizar as práticas turísticas com a

preservação das áreas naturais e, ao mesmo tempo, possibilitar a participação efetiva de todos

os segmentos atuantes no setor, a sua prática necessita ser incorporada pelas políticas públicas

em geral, associada aos anseios das comunidades locais.

Antes de ser entendido como um segmento do turismo que contribui para o

desenvolvimento local utilizando o patrimônio natural, histórico e cultural, incentivando sua

conservação e promovendo o bem estar das populações envolvidas, o ecoturismo vem se

estendendo e sendo ampliado para áreas protegidas que tem, em sua maioria, um uso turístico

desordenado comprometendo o ambiente natural e a qualidade de vida da população local,

principalmente nas áreas de populações tradicionais.A Fundação Nacional do Índio recebe uma expressiva demanda de interessados sobre

quais procedimentos devem ser adotados quando ocorre interesse na realização de projetos

ecoturísticos das comunidades indígenas, no entanto, ainda não existe ainda um diretriz

institucional sobre o tema.

Um dos principais motivos para a elaboração de um estudo dessa magnitude está

diretamente relacionado à possibilidade de elaboração de instrumentos reguladores e eficazes

para a exploração de atividades turísticas, objetivando dirimir os atuais problemassocioculturais e ambientais nas terras indígenas e, ao mesmo tempo, garantir os direitos

constitucionais desses Povos.

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1.2 Objetivos da pesquisa

1.2.1 Objetivo geral

O objetivo do trabalho consiste na produção de um diagnóstico sobre a viabilidade

para a realização de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras, apresentando

subsídios para a elaboração de normas reguladoras, dentro do princípio das garantias

constitucionais dos direitos dos Povos Indígenas brasileiros.

1.2.2 Objetivos específicos

1.  Realizar um diagnóstico de caráter ambiental e sociopolítico sobre a viabilidade para a

exploração de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras.

2.  Realizar uma proposta de operacionalização, estabelecendo parâmetros para uma

análise crítica dos projetos referentes à exploração de atividades turísticas nas terras

indígenas brasileiras.

3.  Realizar um diagnóstico sobre os principais elementos impactantes (positivos e

negativos) a partir da exploração de atividades turísticas nas terras indígenas

brasileiras.

4.  Apresentar uma proposta de gestão socioambiental nas terras indígenas cuja população

residente pretenda a exploração de atividades turísticas.

5. 

Apresentar subsídios para instrumentalizar as instituições públicas federaisresponsáveis pela execução das políticas ambientais e indigenista quando nas

propostas e nas fases de execução de atividades turísticas nas terras indígenas

brasileiras.

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1.3 Marco teórico

O processo de transformação cultural nos Povos Indígenas brasileiros ocorre há mais

de quinhentos anos, portanto, não se trata de uma abordagem visando uma suposta

preservação das tradições culturais, muito menos da conservação das espécies de fauna e flora

integrantes do seu modo de vida tradicional. A degradação ambiental, até por uma questão

conceitual da palavra ambiente, não se restringe às riquezas naturais, mas na sua interrelação

e interdependência com o homem. A degradação cultural, por sua vez, aparece de forma sutil

e inofensiva e pode levar comunidades indígenas a um processo acelerado e irreversível de

redução da auto-estima e trazendo conseqüências desastrosas para a sua reprodução física e

social.

A representação do projeto de vida dos indígenas é abordada, na maioria dos casos,

do ponto de vista etnocêntrico do não índio. São raras as demonstrações de preocupação com

as perspectivas futuras no que diz respeito a uma verdadeira proposta de sustentabilidade para

os indígenas e por eles gerenciada. Nas propostas e projetos turísticos para os indígenas, a

situação é semelhante, haja vista que incorrem numa imposição dos modelos dos não índios,

fundamentada numa massificação para o lucro destes, mantendo o indígena como principal

protagonista da cena, mas, sujeito passivo nas tomadas de decisões e, principalmente, na

participação dos lucros e benefícios.

Ocorre uma forte indução que se origina nos diferentes veículos de comunicação

sobre a percepção do modo de vida dos Povos Indígenas brasileiros estabelecendo uma

analogia com as unidades de conservação. É imprescindível a compreensão de que as terras

indígenas diferem completamente das demais áreas protegidas, especialmente no âmbito do

potencial para a exploração de atividades turísticas. As terras indígenas não são locais de

lazer, de passeio, “de pagar e usufruir”, são locais de moradia, trabalho e de interação socialde milhares de pessoas. Por mais redundante que seja essa exposição, faz-se necessária porque

no imaginário de muitas pessoas, não raro por influência de imagens televisivas, ocorre a

necessidade de “ver o exótico como lazer”, como um objetivo de roteiro turístico a ser

realizado. Só para exemplificar, no livro chamado “1000 Lugares Fantásticos no Brasil”, de

autoria do apresentador da rede Globo de televisão, Zeca Camargo, a Terra Indígena Parque

do Xingu é considerado como roteiro turístico sistemático. É preciso deixar claro que o fato

de se entrar numa aldeia pode ser considerado como um ato de invasão de privacidade e,inclusive, consistir em ilegalidade. Compete aos órgãos que executam a política indigenista

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estabelecer e fazer valer os direitos desses Povos que foram e continuam sendo vítimas de

exclusão, considerando os moldes da atual política social brasileira.

A partir do início dos anos 80 do século passado, o ecoturismo passou a ganhar

maior expressão no Brasil e, nos últimos anos, tornou-se um termo recorrente nos veículos de

comunicação de massa, publicações específicas e, principalmente, nos discursos relacionados

a alternativas econômicas de sustentabilidade, sendo considerado, às vezes, como uma

panacéia para resolver os graves problemas socioeconômicos de algumas comunidades

tradicionais. Destaca-se que o termo ecoturismo, na maioria dos casos, é empregado de forma

genérica e equivocada, fugindo da sua verdadeira definição e propósitos, como será

demonstrado mais adiante.

Os Povos Indígenas brasileiros sofrem um crescente assédio de empreendedores,

organizações não governamentais e, até mesmo, de instituições governamentais para que

realizem atividades turísticas no interior de suas terras, gerando expectativas econômicas

imediatas a determinadas comunidades.3 Algumas dessas propostas são tão economicamente

sedutoras que as lideranças indígenas interessadas pressionam a Fundação Nacional do Índio

e demais instâncias governamentais como: Secretarias Estaduais, Prefeituras Municipais,

Ministério Público Federal, Ministério do Turismo e o Ministério do Meio Ambiente para

uma anuência no sentido de fomentar tal exploração.Para se ter uma idéia da dimensão pelo interesse nesse “nicho de mercado”, a

superfície das 488 terras indígenas, cujos processos de demarcação estão minimamente na

fase delimitada, é de 105.673.003 hectares, perfazendo 12,41% do total do território

brasileiro, conforme informações da Fundação Nacional do Índio. Outras 123 terras ainda

estão por serem identificadas, não sendo suas possíveis superfícies somadas ao total indicado.

Registra-se, ainda, que há várias referências a terras presumivelmente ocupadas por índios e

que estão por serem pesquisadas, no sentido de se definir se são ou não indígenas. Apopulação indígena brasileira é composta por 220 etnias, 600 terras e 180 línguas, que coloca

o Brasil num status de possuir uma das mais ricas pluralidades étnicas e culturais do mundo.

Nos últimos dezessete anos4, foram promovidos seminários, oficinas, palestras,

workshops e reuniões com o patrocínio e apoio de instituições governamentais, empresas

privadas e organizações não governamentais, sem que se tenha chegado a um consenso ou

3 Dados fornecidos pela Fundação Nacional do Índio (2008).4 Ibidem.

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parecer conclusivo sobre os procedimentos para a realização de atividades turísticas no

interior das terras indígenas.

Dentro de uma expectativa de minimizar as dúvidas e apresentar uma proposta

adequada quanto à viabilidade na realização de atividades turísticas em terras indígenas, a

Fundação Nacional do Índio optou, no início do ano de 2006, pela criação de um Grupo de

Trabalho -GT com o propósito de avaliar esse polêmico e importante assunto.

Até o presente momento não foi possível o estabelecimento de critérios normativos e

diretrizes para a exploração de atividades turísticas nas terras indígenas. Enquanto isso, sob o

argumento ambíguo de proposta de ecoturismo, alguns Povos promovem diferentes atividades

turísticas no interior de suas terras, mormente, com fomentos e participação direta de

organizações empresariais que buscam obter o maior lucro, investindo o menor capital

possível. Os Povos Indígenas, que detém o usufruto exclusivo dos seus recursos naturais,

além de receber um ínfimo valor de contrapartida, sofrem com a degradação sociocultural

protagonizada pela falta de diretrizes e planejamento dessas atividades que deveriam ser

adequadas ao seu modo de vida.

Algumas propostas para a realização de atividades turística nas terras indígenas

abrem precedentes para outras situações de irregularidades, destacando-se: exploração de

material madeireiro e metais preciosos, pesquisas científicas sem autorização, tráfico deanimais silvestres e biopirataria.

Para exemplificar a asserção do parágrafo anterior, nos autos do relatório da

Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar o Tráfico de Animais e Plantas

Silvestres Brasileiros, a Exploração e Comércio Ilegal de Madeira e a Biopirataria no País,

observa-se a quantidade de denúncias e a abrangência dos assuntos: extração e transporte

ilegal de material madeireiro, tráfico de animais, tráfico de drogas, entre outras ilicitudes. O

tráfico de animais, por exemplo, movimenta cerca de 20 bilhões de dólares por ano, nomundo, sendo a terceira atividade ilegal mais lucrativa, desse total, 10% (dez por cento)

ocorrem no Brasil. Nessa ótica, outro importante fator é subsidiar políticas públicas que

permitam ao Estado brasileiro minimizar os ilícitos, no âmbito das terras indígenas.

Na perspectiva de se criar novas tendências para o desenvolvimento tradicional,

quando se fala na possibilidade de turismo nas terras indígenas, vem à baila certa tendência

discursiva de que se trata de um tema relativamente novo e promissor, fato que não procede.

As discussões são anteriores aos anos noventa do século XX e, além disso, o que é promissor

passa a ser observado, na prática, como potencial foco degradador.

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Os projetos5 e idéias que são apresentados para apreciação técnica desconsideram

boa parte de elementos abordados em propostas anteriores, dentro da esfera de competência

da Fundação Nacional do Índio, além das tentativas praticadas por organizações não

governamentais. Em face disso, torna-se de extrema importância um estudo complexo que

possa apresentar subsídios para a elaboração de novas propostas e uma reavaliação daquilo

que já foi insucesso em outras épocas, observando-se as mudanças conjunturais e seus

reflexos no campo de estudo.

A grande maioria das sociedades indígenas brasileiras transita entre as esferas da

sociedade envolvente e sociedades tradicionais, o que resulta na absorção dos hábitos sociais

e culturais advindos do contato entre as sociedades, ocasionando transformações no modo de

vida, hábitos alimentares, hábitos de consumo, entre outros. A sociedade não indígena, por

sua vez, assume um modo de economia capitalista, cuja estrutura ancora-se em hábitos

consumistas, industrialização e produção em massa. As populações indígenas adotam, em

grande parte do seu modo de vida, esses hábitos consumistas que demandam de renda para

adquiri-los, como a compra de utensílios domésticos, calçados, produtos de higiene (tanto

pessoal como doméstica), vestuário, eletrodomésticos, objetos de uso pessoal, entre outros

produtos manufaturados.

O acesso à geração de renda se constitui hoje num dos problemas mais agravantes àspopulações, ocasionando desigualdades sociais estendendo-se às populações indígenas, que

sofrem o impacto e o peso da dependência com as possibilidades de custeá-las. Desse modo,

esta pesquisa se propõe elencar diretrizes de forma que a realização de atividades turísticas

nas terras indígenas seja caracterizada pela sustentabilidade, respeito à alteridade e como uma

das formas menos injustas de geração de rendimentos aos Povos Indígenas.

Segundo a antropóloga Alcida Rita Ramos:

“Para os povos indígenas, a terra é muito mais do que simples meio desubsistência. Ela representa o suporte da vida social e está diretamente ligada aosistema de crenças e conhecimento. Não é apenas um recurso natural - é tãoimportante quanto este - é um recurso sócio-cultural.”(2001, p.26).

Uma das propostas deste estudo é responder a um questionamento que intriga os

responsáveis pela execução da política indigenista nacional, antropólogos e demais

estudiosos, desde o início da década de 1990: - É possível realizar atividades turísticas no

interior das terras indígenas sem colocar em risco a sua reprodução física e cultural?

5 Dados fornecidos pela Fundação Nacional do Índio (2008).

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Apesar de parecer uma simples dúvida com resposta dicotômica, a questão é

extremamente complexa porque envolve uma série de fatores que vão desde os aspectos

sociais até a questão legal da garantia de reprodução física e cultural dos Povos Indígenas

brasileiros. O efeito sinérgico de uma atividade turística pode levar a uma seqüência

degradadora tanto ambiental como sociocultural. Além dos efeitos negativos que pode gerar

para as comunidades locais, citam-se alguns exemplos de problemas gerados pelo turismo e

que dilapidam o patrimônio nacional como: a biopirataria, pesca predatória, exploração

madeireira, tráfico de animais, entre outros que serão abordados mais adiante. Por outro lado,

em algumas comunidades indígenas, a realização de atividades turísticas, pode contribuir para

o desenvolvimento local como alternativa econômica, desde que cumpra preceitos legais6 e

seja caracterizado pelo respeito à alteridade dos residentes.

Ao longo dos séculos, e principalmente das últimas décadas, o turismo passou a

ganhar maior espaço na vida das pessoas, tanto como necessidade relacionada ao descanso e

lazer quanto meio de status social, dentre outros. Esse crescimento da indústria do turismo é

oriundo de uma maior disponibilidade de renda, principalmente da classe média; progressos

tecnológicos aeronáuticos; automóveis mais acessíveis; aumentos adicionais nas horas de

lazer; motivos educacionais; ascensão das operadoras de viagens e de pacotes de excursão

cada vez mais acessíveis.Segundo o Ministério do Turismo (2007), 845,5 milhões de pessoas viajaram em

2006, gerando uma receita de US$ 732,8 bilhões em todo o mundo. No Brasil, a atividade

emprega cerca de 2.092 mil pessoas em empresas cuja atividade principal está associada aos

segmentos característicos do turismo (meios de hospedagem, restaurantes e similares, serviços

de transportes, agências e operadoras turísticas, serviços desportivos e outros serviços de

lazer). Isso representa 2,47% do total de pessoas economicamente ativas no Brasil (IBGE,

2006).Na perspectiva de criar definições e estimular o setor, o governo brasileiro sancionou

a Lei nº 11.771, de 17 de setembro de 2008, que dispões sobre a Política Nacional de

Turismo. Essa norma legal é agregada às demais políticas públicas que norteiam o turismo no

Brasil que devem ser dotadas de amplo planejamento e formuladas por quem possui noção da

dimensão do fenômeno turístico e de suas implicações nas mais distintas em localidades

brasileiras.

6 Existe um pressuposto legal vetando a exploração das riquezas naturais nas terras indígenas por pessoasestranhas à comunidade: Lei nº 6.001, art. 18.

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O foco central da pesquisa está na tentativa de conciliar esse conjunto de elementos

criados a partir de uma corrente paradigmática conceitual entre o proibido e o permitido,

superar esses conceitos e apresentar respostas concretas sobre a possibilidade de realizar

atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras e a forma pela qual os programas devem

ser efetivados..

Com tantos trabalhos escritos sobre turismo e suas segmentações, nota-se que há uma

carência de produção intelectual sobre a realização de atividades turísticas nas terras

indígenas brasileiras. Dessa forma, os marcos teóricos emergem de diferentes campos do

conhecimento e serão associados de maneira que sejam capazes de atender ao problema

proposto. Indigenismo, turismo e legislação são as três principais vertentes desse desafio em

estabelecer uma harmonia, intercalando as correntes teóricas a seguir apresentadas.  

1.3.1 Indigenismo, índios, e terras indígenas

Segundo o dicionário Michaelis7, a palavra indigenismo é atribuída ao caráter ou

qualidade de indígena e, indigenista ou indianista é aquela pessoa especializada nos estudos

sobre índios. No caso brasileiro, Cândido Mariano da Silva Rondon, o Marechal, fez de sua

vida uma luta pela aceitação dos índios como legítimos brasileiros, sendo considerado como

um dos precursores do indigenismo nacional.

Uma das primeiras noções que se torna fundamental para a compreensão dos termos

deste item está na parte morfológica da gramática, especificamente na categoria de variação

em número. Índios brasileiros empregado no plural em virtude da multiplicidade de etnias e

não somente pelo quantitativo populacional. Há uma forte tendência, principalmente dos

veículos de comunicação de massa (rádio e televisão) e, até mesmo em informativos mais

específicos, numa generalidade aplicada quando na utilização da expressão “índio”, como se

fosse um único Povo. Ao entrar no assunto, devemos ter presente que são “220 etnias, 600

terras e 180 línguas, formando um país com uma das mais ricas pluralidades étnicas e

culturais do mundo”. 

A julgar pelo foco abordado neste trabalho, não haverá um aprofundamento dos

conceitos específicos de indigenismo, no entanto, para se estabelecer as inter-relações com o

7 Disponível no domínio http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues

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tema central, os referenciais teóricos utilizados partem das seguintes obras de Darcy Ribeiro:

“O povo brasileiro e o sentido do Brasil”, “A política indigenista brasileira”, “O indigenismo

de Rondon”, “Culturas e línguas indígenas do Brasil”, “Diários Índios”, “Os Urubus-Kaapor”.

Além de Egon Schaden na coletânea de ensaios “Leituras de Etnologia Brasileira” e dos trinta

pesquisadores envolvidos na produção da obra organizada por Manuela Carneiro da Cunha,

denominada “História dos Índios no Brasil”. Incluindo, evidentemente, a legislação

indigenista e a experiência de campo do autor desta pesquisa, ao longo de quatro anos de

trabalho na Fundação Nacional do Índio.

Nos anos 50 do século passado, Darcy Ribeiro descrevia sobre as visões de mundo

da civilização não indígena no início do século XX, de acordo com as diferentes situações que

poderiam assumir em detrimento da ganância pelo potencial de riqueza, sob a égide do

expansionismo territorial.

“A sociedade nacional apresenta-se aos índios com faces profundamentediversas, conforme assuma a forma de economia extrativa, pastoril ou agrícola. Cadauma delas é movida por interesses diversos na exploração do ambiente, organiza-sesegundo princípios estruturais próprios e impõe compulsões diferentes aos grupostribais com que se defronta.[...] Aí eles atuam como bandos móveis que devassam asmatas à procura de produtos de valor mercantil onde o acaso da natureza osespalhou” (RIBEIRO, 1957, p. 23).

Passados todos esses anos, ainda existem certas semelhanças protagonizadas poratores sociais diretamente envolvidos no que podemos chamar de neo-expansionismo.

Investidores de determinados segmentos turísticos, quando encontram fronteiras para sua

“expansão mercantilista”, buscam fórmulas para que se torne ambientalmente viável e

classificado como atividade benéfica e sustentável. Os luxuosos hotéis de selva, encontrados

nas regiões próximas a Manaus, no estado do Amazonas, são clássicos exemplos disso. Locais

onde o ambiente natural possuía características necessárias ao desenvolvimento das

comunidades tradicionais são tomados por centenas de equipamentos tecnológicos, poluentes

e degradantes e, mesmo que não atinjam o limite do que a legislação ambiental denomina de

potencialmente poluidor, causa impactos irreversíveis, principalmente dos aspectos

socioculturais para as populações tradicionais.

Darcy Ribeiro, sem dúvida, um dos maiores intelectuais brasileiros, na tentativa de

responder, em sua célebre obra, “O povo brasileiro - a formação e o sentido do Brasil”, “por 

que o Brasil ainda não tinha dado certo?”, abordou elementos históricos que deve riam ser

apreciados obrigatoriamente por estudantes do ensino fundamental e médio de nossas escolas.

Os índios brasileiros ainda são estigmatizados, de acordo com a visão de mundo do

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observador podem ser: exóticos, no sentido de diferente do convencional; “empecilhos”, para

uma grande maioria de investidores neoliberais; atrasados, para evolucionistas; arredios,

preguiçosos, bêbados, bóias-frias e toda uma gama de adjetivos depreciativos possíveis.

Vivemos ainda, sob uma falsa “democracia racial” (1995, p. 20), com os abismos que

separam as categorias sociais. Um dos desafios é desmistificar a suposta incapacidade desses

Povos em empreender atividades que permitam a sua inserção social nesse contexto

conjuntural estratificante.

A demarcação das terras indígenas nunca ocorreu de forma passiva. Se hoje existem

instâncias deliberativas como o Supremo Tribunal Federal, outrora a luta era com a força de

armas, do poder de coerção dos ocupantes e da resistência dos Povos Indígenas que

conquistaram o direito a míseros 13% do território nacional. Referenciado anteriormente, o

positivista militante Cândido Mariano da Silva Rondon, seguidor dos postulados de Augusto

Comte, foi o precursor do pacifismo na ocupação do interior brasileiro, utilizando o exército

como elemento de proteção aos indígenas, conseguiu naquele período harmonizar o interesse

expansionista do governo, principalmente nas obras de infraestrutura, sem que fosse

necessário dizimar populações tradicionais. A proposta de Rondon culminou com a criação do

Serviço de Proteção aos Índios, o já mencionado SPI. Esse “processo de política indigenista

 brasileira” é o tema central desta outra obra de Darcy Ribeiro com o mesmo nome. Conformeseus relatos, no período posterior à Proclamação da República e nos vinte anos seguintes a

questão indígena (os massacres, dizimações) não tinha tanta visibilidade e as obras públicas e

privadas aconteciam na base da força, do poder beligerante, dominante. Dos anos 1910 em

diante (ano da criação do SPI) a situação começava a mudar, por força de entidades

filantrópicas, academias científicas e Assembléias Legislativas (RIBEIRO, 1956, p. 7). A

proteção das terras e dos índios brasileiros é um fator preocupante quando nas propostas de

parcerias empreendedoristas. O risco de ocorrer arrendamentos é presente e, normalmenteacontece em grandes áreas de terras nas quais o prejudicado é o índio e o beneficiário é o

produtor rural ou especulador.

Índios, indigenismo e terras indígenas são palavras que permeiam obras literárias,

propostas de ações de organizações não governamentais, políticas públicas, legislação, enfim,

são termos que apresentam dificuldades interpretativas nos mais diversos campos do

conhecimento. Desta forma, a multidisciplinaridade é uma característica dos grupos de estudo

para demarcações de terras, avaliação de impactos ambientais, entre outros estudos

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necessários na tomada de decisões para ações que atinjam direta ou indiretamente os Povos

Indígenas brasileiros.

Outro trabalho importante sobre Povos Indígenas é a obra “H istória dos Índios no

Brasil”, organizada por Manuela Carneiro da Cunha que se constitui numa das grandes

contribuições intelectuais para um melhor entendimento das relações dos indígenas entre si,

seu ambiente e com a sociedade envolvente.

1.3.2 Turismo, ecoturismo em terras indígenas, turismo sustentável, turismo cultural,

turismo étnico

A idéia de desenvolvimento sustentável está vinculada ao processo de transformação

e modificação do espaço geográfico e que, ao longo dos últimos anos incorpora novas visões

políticas e sociais, além dos valores relacionados diretamente à qualidade de vida e a

conservação ambiental. Novas propostas vão surgindo em um modelo alternativo de

desenvolvimento sustentável, buscando-se um sistema de distribuição menos desleal dos

benefícios socioeconômicos.

As propostas e projetos que se utilizam dos princípios do desenvolvimento

sustentável devem ser direcionados ao alcance da autosuficiência das nações e comunidades

autóctones, levando-se em consideração os limites e capacidades dos mesmos, dentro de uma

política de cooperação e solidariedade.

A atividade turística, como outros setores da economia necessita incorporar esses

novos valores e concepções de desenvolvimento sustentável que precisam entrar em harmonia

com as tradições, valores culturais, potencialidades e limitações ambientais das comunidades

e suas populações.

O ecoturismo tem como objetivos compatibilizar as práticas turísticas com a

preservação das áreas naturais e, ao mesmo tempo, possibilitar a participação efetiva de todos

os segmentos atuantes no setor, a sua prática necessita ser incorporada pelas políticas públicas

em geral, pela política nacional de turismo e em especial pela política de educação ambiental

associada aos anseios das comunidades locais.

Alexandre Panosso Netto e Marília Gomes dos Reis Ansarah, lançaram, no final do

ano de 2008, a obra intitulada “Segmentação do Mercado Turístico: estudos, produtos e

 perspectivas”. Olha que a referência da obra seja completa podes colocar nome de autores e

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nome da obra no texto como faz, e em nota de rodapé editorial, cidade e ano São artigos de

trinta renomados turismólogos brasileiros que abordam diferentes segmentos turísticos a partir

da análise de novas propostas e adaptações aos desejos e necessidades dos viajantes e

promotores de turismo. A introdução dessa edição apresenta um excerto do professor Mário

Carlos Beni, o primeiro professor brasileiro a receber um parecer do MEC para lecionar a

disciplina “Planejamento e Organização do Turismo”, que traduz um conceito abrangente de

turismo.

“Viajar é abrir novos horizontes, conhecer novas culturas, lugares epaisagens. A viagem rompe a rotina do cotidiano, revela novos cenários e traz para avivência dos turistas expectativas surpreendentes. [...] A viagem exerce nos turistasmuitas influências, eis que no aspecto subjetivo liberará o conteúdo de seus sonhos,seus desejos, sua imaginação projetiva e aumentará suas experiências existenciais.

No aspecto material, por outro lado, crescerá seu acervo de conhecimentosprofissionais e seus negócios poderão expandir-se ou transformar-se em novosempreendimentos” (NETTO e ANSARAH, 2009, p. 12). 

Na sua forma conceitual, o ecoturismo teve origem na década de 60 do século XX,

quando foi utilizado para “explicar o intricado relacionamento entre turistas e o meio

ambiente e culturas nos quais eles interagem” (HETZER, 1965 apud FENNELL, 2002, p. 42).

Hetzer ainda identificou quatro questões básicas a serem seguidas no processo de criação de

uma estratégia ecoturística, sendo:

“(1) impacto ambiental mínimo; (2) impacto mínimo às culturas anfitriãs; (3)máximos benefícios econômicos para as comunidades anfitriãs; e (4) satisfação"recreacional" máxima para os turistas participantes” (HETZER, 1965 apud  FENNELL, 2002, p. 56).

Segundo o conceito estipulado pela Embratur/Ibama, ecoturismo pode ser:

“O turismo desenvolvido em localidades com potencial ecológico, de formaconservacionista, procurando conciliar a exploração turística com o meio ambiente,harmonizando as ações com a natureza, bem como oferecer aos turistas um contato

íntimo com os recursos naturais e culturais da região, buscando a formação de umaconsciência ecológica.(EMBRATUR, 2005)” 

É pertinente lembrar o conceito de ecoturismo utilizado pelo Instituto de Ecoturismo

do Brasil, de 1996:

“[...] a prática de turismo de lazer, esportivo ou educacional, em áreasnaturais, que se utiliza de forma sustentável do patrimônio natural e cultural,incentiva a sua conservação, promove a formação de consciência ambientalista egarante o bem estar das populações envolvidas.( IEB, 1996, p. 30)” 

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Somente com essas duas definições é possível perceber uma prolixidade

interpretativa na abrangência da palavra ecoturismo. Por exemplo: como definir exatamente o

que seria um “contato íntimo com a natureza? Como se caracteriza a sustentabilidade e para

quem? O que é considerado bem estar das populações envolvidas?”. Nesse universo de

conceitos, Paulo dos Santos Pires (2000, p. 119) pesquisou trinta deles e identificou alguns

pontos de convergência, tendo como principal a conscientização ecológica através da

educação ambiental.

O Dr. Giovani Seabra, organizador do trabalho “Turismo de Base Local: identidade

cultural e desenvolvimento regional”, aborda, profundamente, a questão da absorção do

mercado turístico pelas comunidades locais como fundamento necessário ao próprio

desenvolvimento regional. Segundo Seabra (2007, p. 255), a proposta de turismo que pretende

desenvolver no nordeste brasileiro – campo de sua pesquisa – origina-se no modelo sistêmico

apontado pelo professor Beni (1997, p. 120) cuja sustentação se dá através dos elementos

naturais, socioeconômicos, culturais e locais. Esta integração que permite novos serviços na

economia local impulsiona a cadeia produtiva e promove a melhoria do padrão de vida da

população residente.

1.3.3 Legislação

A análise jurídica deveria ser realizada por especialistas, no entanto, a questão

indígena extrapola os limites do direito civil e deve ser considerado num trabalho que

pretenda apresentar, entre outras informações, uma proposta de regulamentação.

Cabe apresentar alguns argumentos jurídicos que também motivaram a discussão

sobre os direitos dos Povos Indígenas referentes à exploração de atividades turísticas. Essas

considerações surgiram a partir de encontros com Procuradores Públicos Federais e técnicos

da área.

A Constituição Federal de 1988, no Capítulo VIII, corrobora a exclusividade para os

índios no usufruto das riquezas naturais de suas terras e acrescenta, ainda, a nulidade de

qualquer ato que tenha por objeto a exploração dessas riquezas. Evidencia-se a inexistência de

amparo legal para a exploração de qualquer atividade realizada por pessoas estranhas às

comunidades indígenas. Salienta-se, também, sobre a legitimidade do direito às terras,

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independente de ato homologatório, sendo reconhecido aos Povos Indígenas o direito às áreas

por eles tradicionalmente habitadas.

No inciso segundo, do artigo nº 58, da Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, é

considerado crime a utilização do índio ou da comunidade indígena como objeto de

propaganda turística ou de exibição para fins lucrativos. Infere-se o fato de que a propaganda

não se restringe a uma simples reprodução fotográfica, ela abrange toda e qualquer forma de

difusão que semeie idéias a respeito de pessoas, instituições, locais, causas ou objetos. No

caso da imagem, além das garantias exaradas no artigo 5º da Carta Magna. Recentemente foi

editada a Portaria nº 177/PRES, de 16 de fevereiro de 2006, a qual regulamenta o

procedimento administrativo de autorização pela Funai de entrada de pessoas em terras

indígenas interessadas no uso, aquisição e ou cessão de direitos autorais e de direito de

imagens indígenas e orienta procedimentos afins, com o propósito de respeitar os valores,

criações artísticas e outros meios de expressão cultural indígenas e proteger sua organização

social, costumes, línguas, crenças e tradições.

A regulamentação de atividades turísticas no interior das terras indígenas implicaria

na alteração na atual legislação indigenista brasileira, não só na circunstância do ingresso de

pessoas estranhas à comunidade, mas, também, na garantia dos direitos de usos, costumes e

tradições culturais dos Povos Indígenas, pois, a simples presença de um indivíduo estranhodiante de uma pessoa ou grupo indígena pode ser caracterizada como causa de

constrangimento e violar a privacidade em seus aspectos tradicionais de convivência,

incorrendo em crime, se considerarmos o disposto no inciso I, do artigo nº 58, da Lei nº 6.001,

de 19 de dezembro de 1973.

Compete ao Poder Público, em suas diferentes esferas, a execução de ações de

proteção, conforme o disposto na Convenção nº 169 da Organização Internacional do

Trabalho (OIT) sobre os Povos Indígenas e Tribais, promulgada pelo Decreto nº 5.051, de 19de abril de 2004, que exara, no artigo 2º, que os governos deverão assumir a responsabilidade

de desenvolver, com a participação dos Povos interessados, uma ação coordenada e

sistemática com vistas a proteger os direitos desses Povos e a garantir o respeito pela sua

integridade.

Esta norma reafirma a responsabilidade do Estado sobre a adoção de medidas que

objetivem a garantia da integridade dos Povos Indígenas, em consonância com as

prerrogativas lavradas na Constituição Federal de 1988. Determina ainda, a participação

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diligente dos Povos interessados em todas as situações legislativas ou administrativas que

possam atingi-los diretamente.

Além da legislação indigenista, deve-se considerar a questão ambiental e, neste caso,

a observação da Resolução do CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997. Estão sujeitos

ao licenciamento ambiental, entre outros empreendimentos e atividades, conforme o anexo I

da mencionada Resolução, os complexos turísticos e de lazer. No caso específico das terras

indígenas e entorno, é salutar a preocupação com os possíveis impactos ambientais e

socioculturais, haja vista a necessidade de consultar a Funai nos estudos ambientais

relacionados à localização, instalação, operação e ampliação de uma atividade ou

empreendimento, apresentado como subsídio para a análise da licença requerida, tais como:

relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar,

diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise

preliminar de risco.

A simples (no sentido de somente) interpretação jurídica não é suficiente para

deliberar sobre uma matéria tão complexa. Deve-se refletir sobre a necessidade de uma

avaliação multidisciplinar e essa é a linha de pesquisa que se pretende neste trabalho.

1.3.4 Atividades turísticas em terras indígenas

Um dos principais motivos para a produção de um estudo abordando o tema em

questão está diretamente relacionado à elaboração de instrumentos reguladores eficazes para a

exploração de atividades turísticas, objetivando dirimir os atuais problemas socioculturais e

ambientais nas terras indígenas e, ao mesmo tempo, garantir os direitos constitucionais desses

Povos.

A partir das três correntes teóricas anteriormente citadas, é possível, então,

estabelecer novo referencial teórico específico para o tema em questão, sem deixar de

observar o que já foi produzido por outros autores. Conforme veremos nos trabalhos a seguir,

nota-se certo antagonismo nas raras produções intelectuais sobre turismo em terras indígenas

brasileiras, embora existam outras produções que não foram aqui referenciadas e apresentam

um elevado grau de importância.

A Dra. Ivani Ferreira de Faria (2007), em seu artigo denominado “Ecoturismo

Indígena como princípio de autonomia e afirmação cultural”, aborda sobre a necessidade que

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haja uma regulamentação e que sejam desenvolvidas políticas públicas para este segmento.

Numa linha de raciocínio semelhante, a Dra. Luíza Luíndia Azevedo (2008) produziu o livro

“Ecoturismo Indígena”, no qual discute a questão da necessidade de políticas públicas e

apresenta dados quantitativos sobre algumas experiências na América Central, inclusive no

caso brasileiro, Reserva Pataxó da Jaqueira.

Por outro lado, segundo Suzanne York, autora do artigo denominado “Promessas

incertas do ecoturismo”, incluído no livro Guerra dos Paradigmas “Resistencia de los Pueblos

Indígenas a la Globalización Econômica”, editado por Jerry Mander e Victória Tauli Corpuz,

a realização de atividades turísticas nas comunidades tradicionais é uma alavanca para a

degração cultural, socioambiental e econônica. A abordagem introduz os elementos referentes

ao patrimônio cultural que destaca, entre outros elementos, sobre os efeitos mais degradantes

do ecoturismo cujo foco está na comercialização do patrimônio, da identidade cultural e os

rituais sagrados dos Povos Indígenas.

1.4 Aspectos metodológicos

A formulação do problema, segundo Furasté (2004, p. 32), “é a formulação da

  problemática que será explorada a partir da delimitação do tema”. Devem ser elaborados

questionamentos ou dúvidas a que o trabalho se proporá a responder. O trabalho em tela

possui uma dúvida bem definida que originou a escolha do tema, fundamentada na

possibilidade ou não de se realizar atividades turísticas nas terras indígenas e, caso positivo,

como pode ser feito de forma a não prejudicar os Povos Indígenas e seu ambiente.

O modelo de pesquisa apresentado foi construído a partir de associação de teoria e

prática, fundamentada na avaliação conjuntural que o tema proporciona, principalmente, na

sua dimensão sociopolítica. A pesquisa é essencialmente qualitativa, buscando elementos

intrínsecos que não são facilmente perceptíveis no qual o foco da antropologia clássica exerce

um papel fundamental nesse olhar etnográfico.

A pesquisa qualitativa por amostragem, de acordo com os conceitos do sociólogo

Antonio Carlos Gil subdivide-se em:

a) Observação participante junto aos internos, em horários e dias diferenciados:

“A observação participante, ou observação ativa, consiste na participação real

do conhecimento na vida da comunidade, do grupo ou de uma situação determinada.Neste caso, o observador assume, pelo menos até certo ponto, o papel de um

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membro do grupo. Daí porque se pode definir observação participante como atécnica pela qual se chega ao conhecimento da vida de um grupo a partir do interiordele mesmo” (1999, p 113). 

b) Entrevista informal, abordando os aspectos essenciais do problema em questão:

“Este tipo de entrevista é o menos estruturado possível e só se distingue dasimples conversação porque tem como objetivo básico a coleta de dados. O que sepretende com entrevistas deste tipo é a obtenção de uma visão geral do problemapesquisado, bem como a identificação de alguns aspectos da personalidade doentrevistado” (1999, p. 119). 

O fato de ser servidor da Fundação Nacional do Índio poderia ocasionar algumas

dificuldades durante a pesquisa, sendo a principal delas o ato de conseguir manter o

estranhamento necessário diante daquilo que é familiar. Assim, o investigador deve tomarprecauções, utilizando o registro de todos os elementos observados em diário de campo que

deve ser o referencial para a análise posterior. Isto se fez necessário para evitar algum tipo de

viés ou alguma tendência de que as pré-noções superem as situações em análise.

O antropólogo Gilberto Velho, em seu artigo “Observando o familiar”, refere sobre a

capacidade de percepção dos elementos cotidianos nas dimensões familiares ou exóticas.

Escreve ele:

“Posso estar acostumado, como já disse, com certa paisagem social onde adisposição dos atores me é familiar, a hierarquia e a distribuição de poder permitem-me fixar, grosso modo, os indivíduos em categorias mais amplas. No entanto, istonão significa que eu compreenda a lógica de suas relações. O meu conhecimentopode estar seriamente comprometido pela rotina, hábitos, estereótipos. Logo, possoter um mapa mas não compreendo necessariamente os princípios e mecanismos queo organizam. O processo de descoberta e análise do que é familiar pode, sem dúvida,envolver dificuldades diferentes do que em relação ao que é exótico” (In: NUNES,1978, p. 41).

A presença do pesquisador nas terras indígenas enquanto trabalho remunerado ocorrecom regularidade. O que deve mudar é o viés no olhar etnográfico durante essas atividades, de

forma que possam contribuir para que o estranhamento seja eficaz para o estudo proposto.

A abordagem jurídica fundamentou-se na legislação ambiental e indigenista e das

produções intelectuais da Dra. Julliana Santilli (2004) e livro “Direito ambiental brasileiro”

do Dr. Paulo Affonso Leme Machado (2006).

O trabalho de pesquisa foi realizado de maneira amostral nos locais onde existe ou se

pretende realizar a exploração de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras comouma das formas de geração de renda. Além disso, considerando a complexidade do trabalho e

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a sistemática a seguir apresentada, a análise documental e algumas entrevistas informais

foram realizadas na sede da Fundação Nacional do Índio, na cidade de Brasília/DF, nas

unidades descentralizadas da Funai, além de instituições governamentais e não

governamentais que possuem interface com o tema.

As atividades de campo foram realizadas de forma concomitante às atividades

laborais do pesquisador. Sendo técnico antropólogo cujo ofício exige a permanência em

aldeias indígenas localizadas geograficamente em vários municípios brasileiros, houve

facilidade no acesso aos locais onde existe potencial ou interesse nos projetos turísticos.

Assim, durante o período compreendido entre o ano de 2006 e 2009, nos intervalos

dos trabalhos ordinários, nas diferentes terras indígenas, foi possível a realização da coleta de

informações para este propósito.

As entrevistas informais ocorreram de maneira mais espontânea, uma vez que os

indígenas que contribuíram para o trabalho não tinham como prioridade as respostas

referentes a seus planos e idéias com atividades turísticas, pelos menos nos momentos em que

falavam sobre o tema. Situação análoga quando nas entrevistas com representantes de órgãos

governamentais e não governamentais.

A análise documental foi possível pela quantidade de informações coletadas e

apontadas nos trabalhos de campo, além do farto número de relatórios existentes no centro dedocumentação Antonio Pereira Neto da Fundação Nacional do Índio. Esses dados foram

organizados, em ordem cronológica e sistematizados no Processo 08620.0668/06, com mais 7

(sete) volumes, cada qual com mais de 200 páginas de informações e documentos.

A partir da sistematização desses dados foi possível a realização deste trabalho que é

um diagnóstico capaz de subsidiar as instituições públicas federais responsáveis pela

execução das políticas ambientais e indigenista na execução de uma política sobre as

propostas de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras.

1.4.1 Realismo etnográfico

A técnica chamada de realismo etnográfico foi utilizada pelo antropólogo Oscar

Lewis em seu trabalho chamado “Antropología de la   pobreza”, no qual investigou cinco

famílias de comunidades pobres no México. Este método era composto de quatro partes,

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abordando os aspectos particulares, sociais, emocionais, as situações de crises inesperadas e a

observação detalhada, como se fosse membro de cada família por um dia. Lewis passou

quinze anos construindo seu trabalho de pesquisa nestas comunidades.

“En mis estudios de las familias en México durante los pasados quince años,he empleado cuatro formas de acercamiento diferentes, pero relacionadas entre sí,que al combinarse proporcionan un estudio redondo e integral de la vida familiar. Elprimero, o sea el studio local, aplica la mayor parte de las categorías conceptualesutilizadas en el estudio de una comunidad completa a una sola familia. Los datossobre la familia se organizan y presentan bajo encabezados de cultura material, vidaeconómica, relaciones sociales, vida religiosa, relaciones interpersonales, y así sucesivamente. De una gran cantidad de información basada en la vida con lafamilia, las entrevistas y las observaciones extensivas, se reconstruyen los aspectosvariados de la familia y de los miembros individuales de la misma. Este estudio esanalítico y tiene la ventaja de permitir las comparaciones entre la cultura de la

familia y la gran cultura fuera de la familia” (1985, p. 18).  

O primeiro enfoque se dá então, em relação à coleta do maior número de dados

possíveis através de entrevistas e observações na família e nas suas relações com a

comunidade a qual está inserida: seus ideais, crenças, valores econômicos. Enfim, é tudo

aquilo que faz parte deste contexto de forma a reconstruir os aspectos variados da família e de

seus membros.

Um segundo enfoque é a partir da visão individual de cada um de seus membros, ou

seja, como ele percebe a sua própria família através de seus próprios olhos, que pode servir detestagem da veracidade e confiabilidade nos dados. Oscar Lewis faz uma analogia ao filme

“Rashomon”, de Akira Kurosawa (1950), que trata sobre dois crimes que são narrados pelo

ponto de vista individual de seis indivíduos, cada um de acordo com uma percepção diferente:

“Un segundo acercamiento es la técnica al estilo Rashomón, que consiste enver la familia a través de los ojos de cada uno de sus miembros. Esto se hace pormedio de largas e intensas autobiografías de cada uno de los miembros de la familia.Ello proporciona un conocimiento más íntimo de la psicología del individuo y de sutono sentimental, así una visión indirecta e subjetiva de la dinámica familiar. Estetipo de material será tal vez de mayor utilidad para el psicólogo. Su ventajametodológica deriva de las versiones independientes sobre accidentes similares en lavida familiar que contribuyen a testificar la validez y confiabilidad de los datos”(1985, p. 18-19).

O terceiro enfoque é sobre uma situação em particular a qual envolve toda a família.

Como os membros reagem frente a uma crise comum ou problema, na tentativa de superação

ou assimilação:

“El tercer enfoque estriba en seleccionar, para su estudio intensivo, aquelproblema o suceso especial o aquella crisis a la que reacciona toda la familia. La

forma en que una familia se enfrenta a situaciones nuevas es particularmentereveladora de muchos aspectos latentes de la psicodinámica familiar; también señala

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las diferencias individuales” (1985, p. 19). 

E o quarto enfoque é a observação detalhada de cada família em suas

particularidades mais íntimas. Como o caso de passar um dia inteiro, inclusive a noite, comuma família específica observando cada detalhe, mesmo que pareça insignificante na

trivialidade familiar, mas que tem um profundo sentido quando combinado com os três

enfoques anteriores.

“Un cuarto enfoque al estudio de una familia como un todo se hace por 

medio de la observación detallada en un día típico de la vida familiar. Para darle

profundidad y significado, este acercamiento ha de combinarse con los otros tres.

[...] La selección de un día como unidad de estudio ha sido un recurso común del

novelista. Sin embargo, rara vez ha sido empleado antes y ciertamente nunca se

había explotado por el antropólogo. En realidad tiene tantas ventajas para la ciencia

como para literatura, y proporciona un medio para combinar los aspectos científicos

y humanísticos de la antropología. [...] El estudio de los días aquí presentados

pretende dar lo inmediato e integral de la vida que el novelista retrata. Su mayor

penetración, sin embargo, está en la ciencia social, con todos sus poderes y

debilidades. Cualquier parecido entre estos retratos familiares y la ficción es

puramente accidental. Es ciertamente difícil clasificar estos retratos. No son ficción,

ni antropología convencional. Por necesidad de un término mejor yo los llamaríarealismo etnográfico en contraste con el realismo literario. Estos días no están

compuestos; son días reales… Y los individuos no son tipos imaginados, sino gente

verdadera” (1985, p. 19).

1.4.2 Análise documental

A técnica de análise documental deve ser utilizada pela riqueza das informações que

foram acumuladas sobre o assunto ao longo dos anos e, também, para uma demonstração da

quantidade de produções intelectuais elaboradas a partir das primeiras discussões sobre

turismo em terras indígenas.

A investigação confere um valor histórico ao documento à medida que o pesquisador

é capaz de superar os limites inerentes ao próprio material com que trabalha e, ao mesmo

tempo, reconhece serem sua postura e experiência de vida compostas por uma bagagem que é

histórica. Sobre tais aspectos, comenta a psicóloga Marina Massimi:

“O objeto da pesquisa histórica é constituído por documentos que transmitemao historiador a realidade do passado de uma forma parcial, proporcionando um

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conhecimento que é "mutilado", segundo Paul Veyne. De fato, o documentorepresenta já uma interpretação de fatos reais elaborada por seu autor e, portanto,não deve ser encarado como uma descrição objetiva e neutra dos fatos. Por outrolado, o valor heurístico e a significação do documento dependem também daacuidade da leitura e do esforço interpretativo do historiador. Este sabe extrair de

uma fonte de informações algum conhecimento útil para a compreensão de umaspecto da história humana, sob o ângulo que corresponde ao seu objeto deinteresse. É esse interesse que move e orienta continuamente o pesquisador na buscade documentos” (1984, p. 21-2).

1.5 Estrutura do trabalho

Esta pesquisa não seguiu o rigor dos métodos utilizados na antropologia clássica cujo

foco é, via de regra, uma área restrita e pesquisa de longa duração. A dimensão do trabalho

exigiu um viés sociológico, principalmente no campo da sociopolítica sem, no entanto, se

distanciar do referencial antropológico. Deve – se ter presente que o assunto abordado é um

tanto quanto difuso: diferentes enfoques por especialistas de distintos campos do

conhecimento o que exige uma abordagem voltada para uma visão de mundo mais holística.

Fundamentado na dialética hegeliana, na qual as contradições se transcendem dando origem a

novas contradições que passam a requerer solução, a base metodológica exige a interpretação

dinâmica e totalizante da realidade, a sistemática utilizada considera que os fatos não podem

ser considerados fora de um contexto social, político, econômico e, nesse caso, mais

propriamente socioambiental.

O estudo não se restringiu às populações indígenas, neste caso, de maneira amostral,

nas diferentes regiões bioclimáticas do Brasil, observando-se as peculiaridades socioculturais

dos Povos residentes. As tarefas de campo exigiram a participação de outros atores, como:

servidores das unidades descentralizadas da Funai, representantes do governo federal,

governos estaduais e municipais, membros de organizações não governamentais, especialistas

e demais interessados. A pesquisa de campo abarcou ainda, como forma de análise

comparativa, outros locais de visitação pública: unidades de conservação (parques nacionais,

estações ecológicas, florestas nacionais, áreas de preservação ambiental e RPPNs), parques

temáticos, comunidades tradicionais não indígenas e locais turísticos diversos.

A análise documental foi utilizada pela riqueza das informações que foram

acumuladas sobre o tema ao longo dos últimos anos e, também, para uma demonstração da

quantidade de produções intelectuais elaboradas a partir das primeiras discussões sobre

turismo em terras indígenas.

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1.6 Análise dos resultados

A partir da sistematização dos resultados foi possível verificar sobre a viabilidade

para a realização de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras, respeitando-se as

peculiaridades socioculturais dos Povos Indígenas e com um enfoque nos elementos

impactantes que essas atividades podem representar para as comunidades em estudo.

Considerando o criterioso trabalho qualitativo da pesquisa, seus resultados

apresentaram elementos norteadores para novas pesquisas e projetos, além disso, podem

servir de fundamento para a elaboração de políticas públicas, incluindo uma proposta

normativa.

Todos os resultados foram formatados e apresentados de forma que possam ser

apreciados tanto pelo campus acadêmico quanto por todas as pessoas interessadas no tema e,

acima de tudo, a acessibilidade aos dados deve atingir o maior interessado, os Povos

Indígenas brasileiros.

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2 ESTUDO DE CASOS

Este trabalho de pesquisa não deve ser interpretado de forma impositiva, limitando-

se a um determinado quantitativo de situações específicas e finitas no sentido de se chegar a

uma proposta conclusiva. A escolha de cinco casos justifica-se pelo fato de resumirem

algumas situações mais próximas da problematização do foco central relacionado ao objeto de

estudo em diferentes áreas do conhecimento, principalmente no turismo e indigenismo. Como

apresentado na parte metodológica, o trabalho de campo abarcou as diferentes terras indígenas

existentes no contexto nacional e, por vezes, fora do país, na forma de entrevistas ou in loco,

nas regiões fronteiriças. Também foram realizadas visitações em unidades de conservação,

parques temáticos e áreas afins. Este projeto de pesquisa terá continuidade no doutoramento

deste pesquisador, ou seja, existe um constante aprimoramento nas observações de campo,

especialmente nos seus aspectos qualitativos, contemplando a relação com a sociedade

envolvente, focado no turismo de base local.

A proposta de estudar a viabilidade para a realização de atividades turísticas nas

terras indígenas não pode ser resumida ao maniqueísmo de existência ou não de impactos

negativos. Além dos cinco casos apresentados, existem dezenas de situações que, apesar de

não especificadas na íntegra, forma inseridas no texto e formaram as conclusões deste

trabalho.

2.1 Antecedentes da temática no âmbito internacional

No período de 20 a 31 de março de 2006, ocorreu a oitava Conferência das Partes da

Convenção sobre Diversidade Biológica - COP 8, na cidade de Curitiba/PR. Nesse evento,

foram discutidos temas de extrema relevância para os Povos Indígenas como, por exemplo: a

proteção dos conhecimentos tradicionais, biodiversidade e acesso e repartição de benefícios

oriundos do uso de recursos genéticos, programas de preservação ambiental, proteção e

valoração do patrimônio cultural, garantias constitucionais aos Povos tradicionais, entre

outros. Temas que possuem interface direta com a missão institucional da Fundação Nacional

do Índio e com os projetos a serem desenvolvidos nas terras indígenas.

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Durante os doze dias de conferência ocorreram inúmeras reuniões paralelas ao

evento oficial  – discussão do artigo 8J da CDB  – que contribuíram de forma enriquecedora

aos participantes, tanto nas palestras, oficinas e seminários quanto nas discussões diretas com

representantes de diferentes Povos Indígenas, membros de governos e de organizações não

governamentais de outros países.

Houve uma rara oportunidade para se trocar informações e escutar relatos de outros

Povos a respeito de suas experiências sobre a exploração de atividades turísticas nas mais

distintas comunidades indígenas pertencentes aos 188 países signatários da CDB. Nessas

discussões a tendência no posicionamento dos indígenas e representantes de ONGs foi em

desfavor à realização de atividades ecoturísticas, sem a antecedência de uma ampla discussão

com os Povos Indígenas, governo e sociedade. A seguir, algumas informações críticas sobre o

tema.

  No texto “Promessas Incertas do Ecoturismo”8, de Suzanne York, observa-se um

resumo das percepções de diferentes grupos indígenas a respeito dos impactos na realização

de atividades turísticas nas terras indígenas, especialmente sobre ecoturismo que, segundo o

texto, está conceituado como uma versão mais sustentável do turismo, sendo desejado por um

segmento do mercado turístico sensível à ecologia e que aprecia a aventura. Entretanto, para

os Povos Indígenas, o ecoturismo não é mais do que outra forma de desenvolvimentofreqüentemente não desejado, uma violação de suas terras, geralmente, sem seu

consentimento e uma nova ameaça aos seus direitos, meios de subsistência, sua cultura,

territórios e meio ambiente.

Segundo a Sociedade Internacional de Ecoturismo (TIES - The International

Ecotourism Society), a definição de ecoturismo, também chamado de turismo de natureza é:

“viagens responsáveis para áreas naturais que conservam o meio ambiente e sustentam o bem

estar das comunidades locais”. Estimativas apresentadas pelo Programa das Nações Unidaspara o Meio Ambiente demonstram que, somente nos Estados Unidos e Canadá, as empresas

de ecoturismo movimentam cerca de um bilhão de dólares ao ano (dados de 2002) e não

deixam dúvida quanto ao crescimento desse mercado que atinge mais de 20% ao ano.

Na abordagem crítica sobre efeitos do turismo de natureza em terras indígenas, ficou

evidenciado que o ecoturismo não é benéfico para o meio ambiente na maioria dos casos. As

8

  Artigo do livro “Guerra dos Paradigmas: resistencia de los pueblos indígenas a la globalización económica”,editado por Jerry Mander y Victória Tauli Corpuz, o qual reúne uma coletânea de artigos sobre globalizaçãoeconômica, produção industrial, choques culturais e as ameaças aos povos indígenas.

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grandes quantidades de combustíveis que consomem todos os meios de transporte, a afluência

de um grande número de turistas em áreas virgens cria um problema de população flutuante,

porém constante nesses destinos turísticos, com relevantes conseqüências negativas sobre o

meio ambiente. Independente de quão sensíveis sejam os turistas, inevitavelmente afetam às

Terras e aos Povos Indígenas que vivem ali há milhares de anos.

A promoção do turismo pelos governos, numa perspectiva, de obtenção de melhores

empregos, desenvolvimento de infraestrutura e ingresso de divisas, não pode ser confirmada,

pois, até agora (ano de 2006), não tem gerado nenhum desenvolvimento sustentável

significativo. A maioria das populações indígenas difillmente recebe benefícios do turismo,

incluindo o ecoturismo e, em troca disso, estão expostas aos seus impactos negativos. A

degradação ambiental, a perda do acesso e controle sobre os recursos naturais locais, a

degradação social, as violações aos direitos humanos e a comercialização de suas culturas são

os resultados mais habituais. E, se ocorre a geração de empregos, estes são os de menor valor

dentro do sistema de trabalho: serviço domésticos, mensageiros, porteiros, carregadores de

malas, entre outros.

Dentre os impactos degradantes do ecoturismo está a banalização dos elementos

tradicionais, ou seja, comercialização do patrimônio, da identidade cultural e os rituais

sagrados dos Povos Indígenas à indústria ecoturística. Além disso, devido a falta de umaavaliação adequada da natureza dessa indústria e seus efeitos ao meio ambiente proporciona a

destruição das economias locais devido ao abandono das atividades que antes serviam para

gerar um desenvolvimento sustentável, o aumento dos danos ao meio ambiente e às

comunidades locais à medida que cresce o ecoturismo, aumento da usurpação das terras, a

mineração, o corte ilegal de madeiras e o saque aos recursos biológicos. Os governos não

estão preparados para o ecoturismo porque não possuem parâmetros adequados para

monitorar e controlar o seu desenvolvimento.O texto apresenta uma importante reflexão sobre a realização de atividades turisticas

nas terras indígenas em distintos locais, fora do Brasil e, praticamente, resume as discussões

sobre o tema com as lideranças e representantes indígenas durante a conferência.

Alguns dos argumentos apresentados foram corroborados em narrativa da

representante do Povo Umaguaca, da Argentina, Viviane Figueiroa. Ela considerou, durante

uma conversa, que: “não é somente a soberania dos Povos Indígenas que está sendo

ameaçada, mas também a própria vida [..] as decisões políticas estão sempre voltadas para o

 benefício dos grandes empreendedores.” 

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Olga Timofava-Toreshina, do Povo Dolgan, da Rússia, afirmou sobre o desejo dos

Povos Indígenas em “participar efetivamente dos esboços, recomendações e decisões nos

processos da Convenção, especialmente, com relação ao uso dos conhecimentos tradicionais,

às áreas protegidas e à biodiversidade florestal”, as populações são cada vez mais

pressionadas a ceder espaço à exploração econômica. O turismo, segundo ela, tem sido uma

das ferramentas de destruição sociocultural dos Povos Indígenas, deixando-os como simples

sujeitos para a satisfação da curiosidade alheia, considerando a desvalorização que

proporciona na medida em que banaliza as culturas tradicionais e impõe uma relação

puramente comercial.

Representantes indígenas de fora do país foram questionados sobre o assunto, com

destaque para: Tatyana Degai, liderança do Povo Kamchatka, região russa ao norte do

Pacífico; Gunn-Britt Retter, representante dos Saami, grupo indígena que envolve os países da

Noruega, Suíça e Finlândia; entre outros ligados ao Comitê Intertribal. Estes, manifestaram

concordância com o teor do texto anterior, evidenciando que a prática de atividades turísticas

nas terras indígenas fere o respeito à alteridade, sendo caracterizado pela observação do

exotismo de suas relações sociais, como forma de lazer prazeroso aos não índios, sem falar na

degradação ambiental gerada pelo afluxo de pessoas às terras indígenas, com forte tendência à

massificação.

2.2 Terra Indígena Parque do Xingu

2.2.1 Projeto Kamayurá e Waurá

A Terra Indígena Parque do Xingu (antigo Parque Nacional Indígena do Xingu) foi

reconhecida formalmente em 1961, pelo então presidente Jânio Quadros, e foi a primeira

Terra Indígena homologada pelo governo federal. Seus principais idealizadores foram os

irmãos Villas-Bôas. Está localizada entre os Municípios de São José do Xingu, São Félix do

Araguaia, Canarana, Paranatinga, Marcelândia e Vera, ao norte de estado de Mato Grosso e

possui uma área de aproximadamente 27.000 quilômetros quadrados. A população é de

aproximadamente 5.000 indígenas de diferentes etnias, entre elas: Waurá, Kayabi, Ikpeng,

Yudja, Trumai, Suiá, Matipu, Nahukwa, Kamayurá, Yawalapiti, Mehinako, Kalapalo, Aweti e

Kuikuro.

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A seguir um mapa da região com a plotagem das aldeias mais conhecidas:

Figura 1: Mapa da Terra Indígena Parque do Xingu (Fonte: ISA, 2002).

A primeira solicitação para se estudar a possibilidade de exploração de atividades

turísticas na Terra Indígena Parque do Xingu, especificamente nas Aldeias Kamayurá e

Waurá ocorreu no início do ano de 1997, através de um pedido do proprietário da Pousada

Xingu Refúgio Amazônico, encaminhado à Funai. Posteriormente, no mês de janeiro de 2005,

o presidente da Associação Indígena Mavutsinin - AIM, Kotok Kamayurá entregou uma carta

para a presidência da Funai.

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Em janeiro de 2006, o documento denominado proposta de ecoturismo foi reiterado

pela unidade descentralizada da Funai, Administração Executiva Regional do Xingu que

manifestava preocupação a respeito do assunto.

O projeto da AIM tratava de uma proposta de parceria com a empresa Backcountry

Travel que seria encarregada de executar as obras de infraestrutura, divulgação e

agenciamento para o ingresso dos turistas. Evidentemente, que uma significativa parte dos

lucros seria para a empresa. O projeto mostrava ainda um quadro financeiro com os supostos

benefícios econômicos que seriam recebidos pela comunidade Kamayurá.

É importante destacar sobre a pluralidade étnica existente na Terra Indígena Parque

do Xingu e o fato de que esses Povos, de diferentes troncos lingüísticos como: Jê, Aruak,

Karibe e Tupi dividem o mesmo espaço territorial, respeitando as peculiaridades culturais de

cada um. No caso de um projeto que envolvesse a permanência constante e regulamentada de

estranhos, necessariamente teria que passar pelo crivo de todos aqueles que residem na Terra

Indígena e, certamente, cada aldeia deveria receber uma contrapartida, pois, acima de tudo,

dividem os mesmos recursos naturais os quais poderão sofrer impactos ainda desconhecidos.

As intervenções de organizações não governamentais9 e o assédio de empresas internacionais

para algum tipo de exploração no interior da Terra Indígena Parque do Xingu são constantes.

Sob a justificativa de ajudar aos Povos Indígenas, algumas organizações ou pessoas físicasexecutam projetos, levam pesquisadores e interessados na rica sociobiodiversidade existente

na região. Os projetos são os mais variados, vão desde uma visita cultural até pesquisas sobre

o potencial comercial com base na bioprospecção. Além disso, são muitas as dissertações de

mestrado, teses de doutorado, publicações, documentários, entre outras atividades as quais

seus protagonistas utilizaram os Povos Indígenas como foco e “objeto” de algum tipo de

ganho financeiro ou status quo.

A representação dos Povos Indígenas é abordada, na maioria dos casos, do ponto devista etnocêntrico do “branco ocidental”. Ocorre um notório descaso sobre as perspectivas a

médio e longo prazo no que diz respeito a um verdadeiro projeto de sustentabilidade “do índio

e para o índio”. O que se percebe é o aumento da dependência dos indígenas dos míseros

9  Existem muitas organizações que desenvolvem excelentes trabalhos em parceira com instituições

governamentais. O foco aqui é para algumas ONGs que não respeitam as normas legais e atuam deliberadamentenas Terras Indígenas. 

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recursos oriundos de empresas e algumas organizações não governamentais que, através do

escambo, se projetam e conquistam seu espaço nas distintas sociedades indígenas.

Os infinitos sonhos de consumo de uma exígua e privilegiada parcela da população

mundial são impostos aos Povos Indígenas, de uma forma inconseqüente e irresponsável,

transgredindo, desta maneira, o processo de transformação cultural natural de suas

comunidades, ou seja, ocorre um grave desrespeito à alteridade desses Povos. As

conseqüências são desastrosas. Um exemplo está no documento chamado “Relato sobre

mudança cultural em comunidades do Parque Indígena do Xingu”, divulgado no Boletim de

Pesquisa e Desenvolvimento, nº 50, da Embrapa, de novembro de 2003, o qual apresenta uma

interessante narrativa sobre a percepção dos técnicos Fábio de Oliveira Freitas e Joana Zelma

Figueiredo Freitas.

O foco do trabalho destes autores está na rápida transformação social e cultural dos

Povos residentes na Terra Indígena Parque do Xingu.

Atraídas pelo exótico, pelas festas, curiosidade, estudo, reportagem, entre outros

fatores, houve um grande afluxo de pessoas não indígenas para o interior das comunidades e,

de maneira análoga, ocorreu o deslocamento dos índios para fora do Parque.

Narram que, em meados da década de 80, ficavam, às vezes, mais de cinco meses,

sem ver outra pessoa na cidade. O contato ocorria esporadicamente quando algum pilotovinha retirar um doente da aldeia. Nesses momentos é que tinham alguma notícia do que

estava ocorrendo no mundo fora da terra Indígena.

Hoje, há uma rotação muito grande de pessoas, alguns, inclusive, morando dentro do

Parque e outras levas que vem em determinadas datas de festividades, sendo muitos

estrangeiros e, até mesmo, autoridades do governo brasileiro e embaixadas estrangeiras.

Essa movimentação de pessoas acarreta em grandes transformações culturais nas

aldeias, das quais se destacam:- a introdução do dinheiro: os turistas chegam querendo levar lembranças e, o que

antigamente era feito a base de trocas, hoje é feito a base de dinheiro;

- os sonhos de consumo: o turista traz uma série de utensílios que despertam o

interesse do índio, fomentando o interesse em consumir, como lanterna, canivete, linha de

nylon, anzol, máquina fotográfica, filmadora, rádio, entre tantos outros produtos

manufaturados;

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- mudança em festas e ritos: o turista visita a região, principalmente atrás de festas,

sendo que a mais procurada é do Kuarup, a qual é a última homenagem da família ao morto.

Esta festa ocorre, normalmente, entre julho e setembro, em diversas aldeias do alto Xingu.

Nem todas as aldeias que fazem a festa recebem turistas. Atualmente, a que mais

permite a entrada desses visitantes é a Aldeia Kamayurá, a qual explora economicamente este

fato, cobrando uma taxa de permanência.

O problema detectado pelos autores é de que a pessoa que está pagando, muitas

vezes, não tem a consciência de onde está entrando e como deve se comportar, sendo que

alguns muitas vezes pensam que, se estão pagando, tem mais é que desfrutar, encarando o

índio como um bem de consumo, não se importando se o seu comportamento está influindo

ou não naquela cultura. Muitos turistas, inclusive, imaginam que ali é uma área livre, onde

tudo pode, praticando o nudismo, por exemplo, o que deixa os próprios índios constrangidos.

Como o dinheiro permite que eles comprem bens de consumo almejados, forma-se um ciclo

vicioso no qual, cada vez mais espaços vão abrindo para os novos turistas.

Além disso, com o grande movimento de embarcações, ocorrem os problemas

logísticos e ambientais. São mais barcos poluindo as águas, maior volume de peixes que os

índios têm que pescar para a alimentação dos visitantes, causando pressão na ictiofauna da

região, a pressão ambiental em relação aos dejetos deixados pelos turistas, tanto fisiológicoscomo do lixo industrializado, que antes não existia, causando poluição ao ambiente,

principalmente plástico e pilhas, as quais levam muito tempo para se decompor e contaminam

com metais pesados o solo; é o resíduo de protetor solar e repelente de insetos que acabam

sendo deixados na lagoa ou rio na hora do banho, contaminando a água que os índios bebem e

os próprios peixes; é uma doença que o turista passa para os índios, entre outros fatores.

O projeto da Associação Indígena Mavutsinin requer, a priori, uma avaliação dos

possíveis impactos socioculturais e ambientais em toda a Terra Indígena Parque do Xingu,considerando a pressão antrópica já existente com a permanência de estranhos na região,

como organizações não governamentais, empresas, pesquisadores, entre outros.

É uma difícil tarefa a tentativa de conciliar os interesses dos quatorze Povos ali

residentes. Por exemplo: o polêmico caso da exploração ilegal de madeiras. O cacique

Ararapan Trumai10, da Aldeia Nova, alegou que: “se o Kotok pode trazer turistas e ganhar 

dinheiro, sem o consentimento de todas as comunidades então, porque eu não posso vender

10 Entrevista concedida em 14 jun. 2007.

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um pouco de madeira?” Situação análoga ocorre nos Povos Waurá que participam das

atividades da Pousada Xingu Refúgio Amazônico, caso apresentado ainda neste capítulo.

Há uma recente proposta do Povo Kayabi, residente numa aldeia localizada no limite

do rio Arraias e próxima (acesso por linha seca) ao pólo madeireiro da cidade de

Marcelândia/MT para um projeto de “ecoturismo fiscalizatório”, associado ao manejo

florestal. No entanto, a economia das pequenas cidades localizadas a noroeste da Terra

Indígena é baseada na atividade madeireira, não obstante, o comércio ilegal. Dezenas de

metros cúbicos de madeira são retirados ilegalmente da Terra Indígena através de estradas

irregulares e levadas para as serrarias das cidades de Marcelândia, Vera, Feliz Natal, Peixoto

de Azevedo, Gurantã do Norte, Sorriso e União do Sul, no estado de Mato Grosso. Conforme

dados da Secretaria da Fazenda de Mato Grosso11, somente em março de 2009, durante uma

operação de fiscalização, das 636 madeireiras visitadas no norte do estado, 389 estavam

irregulares e tiveram suas inscrições suspensas.

11 Disponível em: < http://www.affemat.com.br/TNX/conteudo.php?sid=44&cid=471>. Acesso em 03 abr. 2009.

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Figura 2: Estrada irregular nos limites da Aldeia Terra Nova e cidade de União do Sul/MT.

Como caso ilustrativo de um efeito sinérgico negativo que o ecoturismo pode gerar

nas terras indígenas, durante o ano de 2006 a organização não governamental Amazon

Corporation Time ACT - Brasil protagonizou situações que colocaram em risco a integridade

e os direitos constitucionais das comunidades residentes na Terra Indígena Parque do Xingu.

Em maio de 2005, durante trabalho de campo realizado na mencionada Terra Indígena, houve

uma informação da presidência da Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX) sobre o

assédio da ONG ACT  – Brasil às comunidades indígenas, incluindo promessas de pagarem

uma grande soma financeira (proposta de dois milhões de reais) para ingressarem na Terra

Indígena. Em janeiro de 2006, a referida ONG fretou um veículo para transportar indígenasaté a cidade de Canarana/MT, local onde seria realizada mais uma reunião, motivada pelo fato

de que já possuíam uma proibição judicial de ingressarem na Terra Indígena. Nas

proximidades do Posto Indígena Kurisevo ocorreu um acidente, causando graves danos físicos

aos indígenas Konoé Kamayurá e Tacumã Kamayurá. Situação que foi encaminhada ao

Departamento de Polícia Federal de Cuiabá/MT para investigações. O processo sobre o caso

não foi arquivado e a Polícia Federal está apurando responsabilidades.

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2.2.2 A Pousada Xingu Refúgio Amazônico

O projeto Xingu Refúgio Amazônico foi entregue à Funai em 23 de junho de 2000, e

forma o Processo nº 8620.1473/2000. No documento é apresentada uma proposta cujo

objetivo geral é desenvolver um programa de visitação turística orientada, de curta estadia

(sete dias), com pernoite em área limítrofe à Terra Indígena Parque do Xingu, aliada às

atividades de hotelaria e interação cultural com indígenas residentes nas aldeias do interior da

Terra Indígena. O projeto apresenta também uma projeção, detalhando quantitativamente os

valores que os turistas supostamente gastariam na compra de artesanatos, incluindo o

pagamento por sua permanência (pernoites) nas das aldeias.

Esse projeto contextualiza que as atividades turísticas “resolverão o paradigma da

sustentabilidade econômica e a preservação da natureza” e afirma que o turismo será

diferenciado através da estratificação socioeconômica do turista, relacionando o nível de

escolaridade do visitante à capacidade de conscientização para a preservação dos recursos

naturais.

Em novembro de 2005, durante uma atividade de campo específica para solucionar

uma situação de conflito na Aldeia Trumai  –  Terra Indígena Parque do Xingu, devido a

logística do trabalho e às condições de tempo para o deslocamento aéreo, houve a

oportunidade de conhecer as instalações e atividades desenvolvidas pelos arrendatários da

pousada Xingu Refúgio Amazônico, localizada no interior da Fazenda Von Dein Steinen, de

propriedade dos Srs. João Ismael Vicentini e Fernando Vicentini. A expressão arrendatários

foi utilizada pelos empreendedores da pousada que assumiram os negócios no início do ano

de 2005 e afirmaram que possuem contatos com agências de turismo no exterior as quais

formatam e comercializam os pacotes turísticos.

Durante o período de permanência nas dependências da pousada foram realizadasentrevistas informais com os dirigentes do negócio que estava em plena operação, entretanto,

nesse dia, a pousada não tinha hóspedes, por ser considerado um período de baixa temporada.

A seguir, as observações, apresentadas pontualmente, no intuito de proporcionar uma

apreciação reflexiva sobre o caso:

Foi constatado um número significativo de funcionários (camareiras, cozinheiras e

serviços auxiliares) que proporcionam um atendimento personalizado a turistas estrangeiros.

Os alojamentos foram edificados de forma semelhante às habitações indígenas(figuras 4 e 5) e, segundo as informações, foram os próprios índios que ajudaram na

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construção. Os grafismos utilizados na decoração e as peças artesanais foram todas

confeccionadas pelos grupos indígenas Waurá e Kamayurá residentes em aldeias próximas à

pousada.

A oferta para a visitação e hospedagem é feita a um público com elevado poder

aquisitivo e, em sua maioria, residente em países europeus. Os pacotes são oferecidos por

agências no exterior e os valores das diárias são de aproximadamente U$ 500,00 (quinhentos

dólares) por pessoa.

A pousada oferece um sofisticado cardápio, serviço a la carte. No restaurante (figura

3), observou-se uma variedade de bebidas alcoólicas à disposição dos hóspedes. Pode-se

também degustar alguns pratos tipicamente indígenas.

Os indígenas deslocam-se até a pousada e possuem alojamentos específicos para sua

permanência (figuras 10 e 11). Eles realizam uma encenação de como seria o cotidiano nas

suas respectivas aldeias: as mulheres ficam nuas, realizando algumas atividades culinárias e

artesanais e os homens, com poucas roupas, simulam uma preparação para caça e pesca, além

de acompanhar os turistas nos passeios de barco. Nestas encenações ocorrem registros

fotográficos e os indígenas recebem em torno de R$ 100,00 (cem reais) por dois, três ou mais

dias de atividades.

Existe a possibilidade de uma visitação e, até mesmo pernoitar nas aldeiaslocalizadas no interior da Terra Indígena Parque do Xingu, para isso, é necessário um

pagamento extra e os turistas são acompanhados por guias indígenas.

O proprietário da Fazenda Von Dein Steinen manifestou, em entrevista, sobre a

necessidade de legalizar suas atividades junto aos órgãos competentes. Ele foi informado

sobre as prerrogativas legais para esse tipo de empreendimento que, antes de tudo, exige o

Licenciamento Ambiental expedido pelo órgão ambiental competente. Além disso, foi

explicado sobre os condicionantes necessários ao ingresso de pessoas nas terras indígenasbrasileiras, bem como sobre outros aspectos legais exarados na Constituição Federal de 1988,

na Lei nº 6001, de 19 de dezembro de 1973, legislação ambiental e normas correlatas.

A seguir, alguns registros fotográficos que apresentam detalhes da Pousada Xingu

Refúgio Amazônico:

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Figura 3: Local onde são realizadas as refeições, à margem do rio Steinen.

Figura 4: Vista dos dormitórios, dispostos em cabanas. São divididos em dois cômodos com capacidade paraduas ou três pessoas.

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Figura 5: Detalhe de um alojamento.

Figura 6: No primeiro plano a sacada com vista para o rio e, ao fundo, uma unidade flutuante com bar e piscinade lazer protegida com tela.

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Figura 7: Detalhe na parede de um dormitório - pintura produzida por indígenas Waurá.

Figura 8: Quadro confeccionado por indígenas Waurá.

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Figura 9: Detalhes dos grafismos utilizados na “decoração” da pousada. 

Figura 10: Local utilizado para encenação aos turistas.

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Figura 11: Alojamento para indígenas.

Figura 12: Vista interna de um dormitório.

Antes do encerramento deste trabalho, no início de 2009, foi publicada na imprensa

nacional uma matéria sobre a prisão do proprietário da pousada Xingu Refúgio Amazônico,

Sr. João Ismael Vicentini e outros envolvidos, acusados de exploração madeireira nas terras

indígenas, durante uma operação da Polícia Federal denominada Mapinguari.

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2.2.3 Evento Negócios de Turismo no estado de Mato Grosso

Em abril de 2006, a presidência da Funai foi convidada para participar da 13ª Festa

Internacional do Pantanal e do IV Encontro de Negócios de Turismo do Mato Grosso, na

cidade de Cuiabá/MT. O evento reúne, anualmente, empresários, expositores, investidores,

representações governamentais e demais pessoas interessadas no desenvolvimento de

atividades turísticas no estado de Mato Grosso.

Durante o evento foi possível participar de uma reunião com a então secretária

estadual de turismo e com os secretários municipais de turismo do estado de Mato Grosso,

tendo como pauta principal o tema: turismo em terras indígenas, incluindo a apresentação do

projeto da Pousada Xingu Refúgio Amazônico, o qual foi reconhecido pela secretária estadual

como exemplo ótimo de um projeto de turismo.

Nessa reunião, os secretários municipais manifestaram-se sobre o interesse de suas

prefeituras e parceiros empresários para a exploração de atividades turísticas nas terras

indígenas como forma de desenvolvimento de suas respectivas cidades e procederam a uma

sequência de questionamentos sobre a viabilidade de suas propostas. O principal argumento

dos proponentes foi sobre o “potencial econômico” que o turismo (notou-se uma recorrência

no uso do termo genérico da palavra turismo) apresenta na região mato-grossense,

evidentemente, nas terras indígenas e adjacências. Na verdade, o que foi chamado de

“potencial” refere-se exclusivamente às belezas naturais – ponto de vista dos proponentes - do

patrimônio existente nas terras indígenas e os benefícios que esse tipo de exploração pode

trazer para os municípios. A expectativa não foi fundamentada ou relacionada a nenhum

estudo que possa comprovar a existência de tal potencialidade: interesse de turistas em visitar

a região. Foi evidenciado, ainda, o interesse econômico exclusivo para os municípios e uma

carência de propostas para os Povos Indígenas  – neste caso, como foco principal da atividadeturística.

A partir da coleta de dados sobre a pousada e da reunião, foi possível elencar alguns

aspectos relevantes para os casos:

A intenção de se utilizar as terras indígenas como atrativo turístico na região do

estado de Mato Grosso tem sua origem nos investidores e órgãos governamentais.

As argumentações dos representantes dos órgãos governamentais são de que as

atividades turísticas proporcionarão um crescimento econômico exclusivo para seusrespectivos municípios.

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Observou-se um desconhecimento a respeito das normas legais necessárias aos

pretensos empreendimentos no entorno e interior das terras indígenas.

As propostas de ecoturismo indígena possuem como principal atrativo o “exotismo”

dos Povos, deixando para um segundo plano os aspectos contemplativos das belezas naturais.

Os lucros provenientes dos investimentos nas atividades turísticas não seriam

distribuídos de forma equitativa, cabendo aos índios uma ínfima parcela desse montante, a

exemplo da pousada Xingu Refúgio Amazônico.

Alguns proponentes apresentaram-se como “defensores dos recursos naturais”, no

entanto, não demonstraram preocupação com uma avaliação sobre impactos ambientais ou

socioculturais nas terras indígenas.

Ficou evidente que a única contrapartida para os Povos Indígenas é a retribuição

financeira (justificando que somente o dinheiro determina uma melhor qualidade de vida),

associado a inexistência de programas de sustentabilidade e preservação e a impossibilidade

de que a gestão dos empreendimentos seja exclusivamente dos indígenas.

A expectativa dos empreendedores e representantes das prefeituras e governo do

estado de Mato Grosso é de que o patrimônio da União, usufruído exclusivamente pelos

Povos Indígenas, na forma constitucional, pode ter utilização para o benefício de alguns

empreendedores, reproduzindo, desta forma, o modelo global de um sistema econômicoexcludente e gerador de desigualdades sociais o qual denominaram de “perspectivas de

crescimento para que o estado de Mato Grosso possa atrair mais investimentos”. 

2.3 A Reserva Pataxó da Jaqueira

A primeira coleta de dados sobre as atividades ecoturísticas desenvolvidas na Terra Indígena

Coroa Vermelha, no estado da Bahia, ocorreu no início do mês de maio de 2006. Posteriormente, emsetembro de 2006, durante o Seminário Franco-Brasileiro sobre Gestão Territorial e Desenvolvimento

Sustentável em Mosaicos de Áreas Protegidas, realizado no município de Porto Seguro/BA,

promovido pelo Ministério do Meio Ambiente - MMA, houve a possibilidade de revisitar e observar

mais detalhes do Projeto Turístico Reserva Pataxó da Jaqueira, executado pelo Povo Indígena Pataxó.

Durante as entrevistas realizadas em setembro de 2006 com a presidente da Associação

Pataxó de Ecoturismo - ASPECTUR e lideranças indígenas Pataxó, houve uma narrativa a respeito

dos principais problemas enfrentados na manutenção do projeto de visitação dirigida à Reserva e o

histórico de como iniciou todo o processo até a consolidação do projeto.

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A Terra Indígena de Coroa Vermelha está regularizada em uma área total de 1.493 ha.,

distribuída em duas partes não contínuas: glebas “A” e “B”. A primeira é porção territorial de 77 ha.,

localizada na beira da praia, onde existe a aldeia , parte residencial. A segunda dista 6 km da primeira,

com seus 1.416 ha., subdivide-se na Reserva Pataxó da Jaqueira (827 ha.), destinada à conservaçãoambiental e exploração do ecoturismo; e mais outra área adjacente, utilizada para a agricultura e para a

extração de matéria-prima para o artesanato, com, aproximadamente, 589 ha.

A exploração turística na Reserva da Jaqueira teve início no dia 1º de agosto de 1998,

ocasião na qual os índios recepcionaram estudantes de uma escola do município de Teixeira de

Freitas/BA. A iniciativa de continuar a atividade de maneira comercial foi tomada por cerca de 30

indígenas e, em 25 de janeiro de 1999, foi fundada a Associação Pataxó de Ecoturismo - ASPECTUR.

As atividades desenvolvidas pelos guias e por toda a equipe que trabalha na ASPECTUR são

caracterizadas pela educação ambiental e o incentivo ao respeito pelos costumes e tradições do Povo

Pataxó. Desse modo, o ecoturismo praticado na Reserva da Jaqueira não permite uma maior interação,

além da contemplação das riquezas naturais da floresta e dos rituais apresentados.

Essa ressalva torna-se oportuna face às diversas propostas de ecoturismo que foram

apresentadas no Seminário Franco-Brasileiro (entre outros eventos sobre o tema) as quais

compartilham com outras atividades, justificando a pretensão de preservar o meio ambiente, inclusive

nos locais nunca antes visitados. Algumas atividades esportivas ou recreativas, quando associadas ao

ecoturismo interativo, exigem certa infraestrutura para recepcionar os turistas, como: estacionamento,

restaurante, sanitários, energia elétrica, entre outras. Aqui reside um paradoxo: como é possível

afirmar que a afluência de uma grande quantidade de pessoas para um local com baixo índice

antrópico proporcionará benefícios para a preservação do ambiente natural? A quantidade de

monóxido de carbono, os resíduos alimentares e outros poluentes contribuirão significativamente para

a degradação ambiental. Portanto, é necessário refletir sobre qual o segmento de ecoturismo que causa

menor impacto e, ao mesmo tempo, proporciona uma qualidade de vida ideal, na perspectiva das

populações tradicionais.

Durante uma palestra proferida pelos indígenas Pataxó, foi informado aos visitantes que a

Reserva da Jaqueira é um espaço territorial indígena utilizado exclusivamente para a atividade

ecoturística de contemplação, sendo que a residência dos Povos Indígenas localiza-se na gleba “A” da

Terra Indígena Coroa Vermelha, próxima à praia. Outra peculiaridade12 a ser considerada é o fato de

que o projeto foi idealizado, concebido e executado pelos próprios indígenas fundadores da

ASPECTUR, com o apoio do Povo Pataxó e sem a intervenção de pessoas estranhas à comunidade

indígena.

12

O detalhamento das atividades desenvolvidas pelos Pataxó estão descritas no relatório de campo e namonografia, “Turismo em Terra indígena: o caso da Reserva Pataxó da Jaqueira”, de autoria do sociólogoVictor Ferri Mauro.

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Apesar de todo o esforço empreendido pelos membros da Aspectur na manutenção do

projeto, algumas outras dificuldades relatadas pelas lideranças referem-se diretamente ao crescimento

 populacional dos Pataxó. A população residente na gleba “A” (praia) é de aproximadamente 5.000

(cinco mil) pessoas, numa área de terra de 77,2 hectares. Segundo as informações da presidente daAssociação, nas últimas reuniões, alguns indígenas manifestaram sobre o déficit habitacional e que

isso pode ser o fato gerador para a ocorrência de uma ocupação forçada e significativa na Reserva da

Jaqueira (gleba “B”). 

Numa conjuntura na qual as propostas para exploração de atividades turísticas no território

brasileiro são unilaterais, que beneficiam somente os detentores do capital para o investimento e, ao

mesmo tempo, excludentes para as comunidades tradicionais, o Povo Pataxó apresenta um modelo

diferenciado de gestão territorial participativa que inclui a preservação ambiental e a sustentabilidade

de muitas famílias.

A seguir, algumas fotos da Reserva Pataxó da Jaqueira:

Figura 13: Pórtico entrada da Reserva.

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Figura 14: Kijame: pequena casa construída sob os moldes da arquitetura tradicional Pataxó.

Figura 15: Guia turístico Pataxó.

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Figura 16: Viveiro de plantas. Ao fundo observa-se mudas de Jacarandá e Pau-Brasil.

Figura 17: Turistas portugueses comprando artesanato.

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Figura 18: placas explicativas.

A proposta da Associação Pataxó de Ecoturismo apresenta os principais elementos

favoráveis à idealização do desenvolvimento de atividades turísticas nas terras indígenas. A

saber: a) inexiste a exploração dos recursos naturais exógena aos Povos Indígenas; b) o

espaço para o desenvolvimento das atividades é exclusivo para este fim e não causa

interferência no local de residência; c) existe a concordância de todos os indígenas residentesna Aldeia Coroa Vermelha; d) a cidade de Porto Seguro/BA é um pólo turístico consolidado;

e) acontece um trabalho de intensa fiscalização; f) não há riscos de biopirataria; entre outros

aspectos econômicos, ambientais e socioculturais que trazem benefícios reais para a

comunidade local.

2.4 Os Guarani de Paraty Mirim - Aldeia Ecoturística e Museu Vivo

A proposta deste trabalho de pesquisa caracteriza-se por uma mínima abordagem nas

especificidades étnicas, em primeiro lugar, para não criar outros subtemas que poderiam fugir

do foco central e, em segundo lugar, pelo extenso material que deveria ser escrito. Nesse

propósito, será feita uma breve introdução com os principais elementos que caracterizam a

forte presença do Povo Guarani no Brasil.

Os Guarani ocupam o litoral dos Estados do Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Rio

de Janeiro, São Paulo, Paraná e Santa Catarina, no Brasil. Além de áreas na Argentina, no

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Paraguai e na Bolívia. Estas regiões estão associadas ao seu território tradicional e outras, a

exemplo do litoral de São Paulo, do Rio de Janeiro e do Espírito Santo constituem áreas de

reocupação recente, decorrente de um fluxo migratório iniciado no século XIX. Segundo

Schaden (1974), os Guarani podem ser classificados em três grupos, tomando-se por base

suas diferenças culturais e lingüísticas: os Nhandéva, os Kaiowa e os Mbyá.

Dos três, os Kayowa são citados por Schaden (1974) como não utilizando, em face

de estranhos, a autodenominação Guarani. Ocupam aldeias do Mato Grosso do Sul e regiões

próximas ao Paraguai.

Os Nhandéva, registrados por Nimuendaju como Apapokuva, Tañyguá e Oguauíva

são apelidados pelos Mbyá de Xiripá, referem-se a si mesmos como Tupi-Guarani. Conforme

aponta a literatura, iniciaram o processo migratório para o Leste, a partir do Rio Iguatemi, sua

região de origem, no início do século passado (LADEIRA e AZANHA, 1988, p. 13). Schaden

menciona a presença Guarani no litoral paulista a partir de migrações realizadas em 1927,

1934 e 1946. Herbert Baldus relata que, em 1927, encontrara em Itanhaém um grupo Guarani

expulso de suas terras, em 1926, e que estava residindo na aldeia do Bananal em Peruíbe.

Itariri e o Posto Indígena de Peruíbe foram fundados no século passado. A aldeia do Bananal,

como ficou conhecido o Posto de Peruíbe, originou-se a partir de um grupo que migrou por

volta de 1885, de uma região de fronteira entre o Mato Grosso e o Paraguai. Os Nhandévaeram maioria em Itariri e Bananal, e os Mbyá nas aldeias próximas do Rio Branco, em

Itanhaém (LADEIRA e AZANHA, 1988, p. 30). Bananal, 240 alqueires, é uma aldeia que

abriga Mbyá, Xiripá e não índios com intensa presença de casamentos interétnicos, não sendo

raras as referências à existência de confrontos entre os grupos.

A partir das primeiras décadas do século XX, os Nhandéva do litoral de São Paulo

passam a receber o reforço de outro grupo Guarani, denominado Mbyá, constituindo, a partir

da década de 50, a população dominante no litoral.Estudos apontam que os Mbyá atuais descendem dos grupos que não se submeteram

nem aos encomenderos espanhóis nem às missões jesuíticas, refugiaram-se nos montes e

matas da região do Guairá e dos Sete Povos (LADEIRA e AZANHA, 1988, p. 16). Cadogan

menciona que a presença Mbyá no Brasil é mais remota do que se supõe a partir da coleta de

mitos sobre a travessia da grande água para atingir a Terra sem Males. As duas rotas

migratórias dos Mbyá em território brasileiro indicam a entrada de um grupo da Argentina

através do Rio Grande do Sul (que formará os aldeamentos de Rio Branco/SP, Boa

Esperança/ES e Boa Vista/SP) e outra entrada que, a partir do Paraguai, atinge o Paraná

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formando os aldeamentos de Palmeirinha e Rio das Cobras compondo, mais tarde, a maioria

da população dos aldeamentos de São Paulo e Rio de Janeiro (LADEIRA e AZANHA, 1988,

p. 16).

Em 1996, as três terras indígenas existentes no Rio de Janeiro - a Terra Indígena

Guarani de Bracuí, localizada no município de Angra dos Reis, a Terra Indígena Araponga e a

Terra Indígena Parati-Mirim localizadas no município de Paraty - tiveram o processo de

demarcação concluído e foram homologadas pelo governo federal. O Presidente da República,

seguindo a Constituição brasileira, reconheceu-as oficialmente como terras tradicionais do

povo Guarani e fez publicar no Diário Oficial da União os decretos que dão direito aos

Guarani a posse permanente dessas terras. Residem nas três aldeias aproximadamente, 450

pessoas. A Terra Indígena Guarani de Bracuí é a que tem a maior população, cerca de 320

indivíduos. Mais da metade é constituída por crianças menores de 14 anos.

O subgrupo Mbyá , em Angra dos Reis, vive no alto da serra em meio à Mata

Atlântica, de onde podem avistar o mar. Atravessar o mar e encontrar a Terra Sem Mal, o

paraíso mítico, é o sonho dos Guarani. Na busca incessante desse paraíso, que segundo a

tradição pode ser alcançado em vida, eles precisam cumprir e respeitar um conjunto de regras

e conduta divina que lhes são transmitidas pelos xamãs. São elas que norteiam as relações que

mantêm com a natureza, com todos os seres humanos e com os espíritos.Em março de 2006, o Secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico do Rio

de Janeiro, apresentou à Fundação Nacional do Índio a proposta de criação de uma Aldeia

Ecoturística na região de Paraty/RJ. Os detalhes do projeto foram apresentados no município

de Paraty/RJ em dois locais. O primeiro, numa Área de Preservação Ambiental Estadual e, o

segundo local, no centro histórico de Paraty.

Em maio de 2006, ocorreu o primeiro trabalho de campo em Paraty/RJ, incluindo

reuniões com instituições governamentais e não governamentais sobre o projeto AldeiaEcoturística  –  Museu Vivo da Cultura Indígena e Casa do Artesanato Indígena. Entre os

convidados, estavam representados: Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (IPHAN),

Prefeitura Municipal de Paraty/RJ, Associação dos Índios Tupi-Guarani e Guarani Awá

Ropedjú, Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico do Rio de Janeiro,

Universidade Estácio de Sá/RJ, Instituto Estadual de Florestas (IEF/RJ) e o Instituto de Terras

do Estado do Rio de Janeiro (ITERJ).

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Os trabalhos incluíram visitas nas aldeias de Paraty Mirim, reuniões com lideranças

indígenas da região e a visitação nos locais previstos para a edificação da Aldeia Ecoturística

e da Casa de Cultura. Na foto a seguir, o local onde seria edificada a Aldeia Ecoturística :

Figura 19: Vista parcial da APA Estadual Paraty-Mirim – RJ.

O projeto foi idealizado pela antropóloga Dinah Guimarães Papi, da Universidade

Estácio de Sá e pelo presidente da Associação dos Índios Tupi-Guarani e Guarani Awá

Ropedjú, Tobi Itaúna. A proposta inicial possui duas etapas.

Resumidamente, a primeira fase consiste na construção da Aldeia Ecoturística numa

Área de Preservação Ambiental (APA) do Estado do Rio de Janeiro, limítrofe à Terra

Indígena Paraty-Mirim e, a segunda fase, é a adequação de um prédio, situado no centro

histórico de Paraty, que seria cedido aos Guarani para sua utilização como espaço de

comercialização de artesanatos.

Observou-se que as atividades pretendidas apresentam certo grau de semelhança com

o projeto executado na Reserva da Jaqueira, tendo como diferencial a utilização de uma APA

no Estado do Rio de Janeiro e a doação de um prédio no centro histórico de Paraty/RJ.

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Figura 20: Centro histórico de Paraty – próximo ao prédio a ser cedido pelo governo estadual do Rio de Janeiro.

Um fato interessante neste projeto é o distanciamento do local de realização da

atividade turística  –  aldeia cenográfica  –  dos locais de residência, garantindo o direito à

privacidade dos seus modos de vida. Não ocorre intervenção nas aldeias, ingresso nas terras e

demais situações que poderiam ser caracterizadas como negativas do ponto de vista dorespeito à alteridade.

No final do mês de outubro de 2006, o assessor do Secretário de Estado de

Desenvolvimento Econômico do Rio de Janeiro, José Lerer, entrou em contato com a

Fundação Nacional do Índio, informando sobre a continuidade dos trabalhos, incluindo a

conquista de recursos orçamentários para a execução do projeto. Foi deliberado, então, para a

realização de outra reunião. Infelizmente, o projeto não seguiu adiante em face das mudanças

conjunturais no governo do estado do Rio de Janeiro.

2.5 Estudo de caso: a empresa Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda. e os impactos

aos Povos Indígenas Tenharim e Mura

A exposição deste estudo de caso é caracterizada pela forma escrita muito parecida

com o relatório técnico apresentado à Fundação Nacional do Índio. Buscou-se, de maneira

proposital, deixar a originalidade para que haja uma melhor percepção de como um projeto

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aparentemente simples no início, pode se tornar num caso concreto de conflito e de impacto

negativo aos Povos envolvidos.

A Amazônia brasileira possui uma das mais ricas biodiversidades do planeta13,

posição importante para o povo brasileiro, mas, ao mesmo tempo, é um fator preocupante no

que se refere a programas e políticas públicas necessárias a sua conservação, preservação,

proteção e utilização de maneira sustentável para as futuras gerações. Essa riqueza natural é

cobiçada por indivíduos dos mais diferentes campos sociais, empresariais, de pesquisa, de

turistas, etc.

Existe um ramo de lazer competitivo denominado pesca esportiva que é considerado,

no âmbito de políticas públicas governamentais, como turismo e/ou esporte. Alguns autores, e

eu me incluo neste grupo, caracterizam como maus tratos a animais, além de colocar em risco

as espécies e a segurança alimentar das populações que dependem da caça, coleta e pesca

como garantia de reprodução física e cultural.

A pesca esportiva do Tucunaré, em virtude da abundância na região amazônica, atrai

pessoas de diferentes locais, especialmente, de pescadores estadunidenses, sendo um nicho de

exploração econômica apropriado por agências e empresas turísticas criadas para este fim. A

incidência dessa espécie de peixe ocorre, também, com farta abundância na região dos rios

que cruzam as Terras Indígenas Tenharim Marmelos e Cunhã Sapucaia, respectivamente,onde residem os Povos Tenharim e Mura.

Nesse contexto, em agosto de 2005, a Empresa Liga de Eco Pousadas da Amazônia

Ltda., na época, com a razão social de N. G. Turismo, celebrou um acordo de cooperação com

a Associação do Povo Indígena Tenharim Moragita (Apitem) cujo objeto foi a exploração de

atividades turísticas na Terra Indígena Tenharim Marmelos. O acordo previa, entre outras

situações, a permissão para que a empresa explorasse atividades de pesca esportiva no interior

da Terra Indígena, com uma contrapartida financeira aos indígenas. Aliás, a essência daatividade é a pesca no interior da Terra Indígena. O denominado “projeto piloto” seria

avaliado no prazo de um ano, podendo ser prorrogado. Esse acordo, com o aval da Fundação

Nacional do Índio, foi o fato gerador de uma grave situação de discórdia para outros Povos

Indígenas e, conseqüente, descontentamento de algumas lideranças Tenharim com a Funai

porque no ano de 2006, em função de divergências, houve a necessidade de cancelamento do

acordo de cooperação pelo período de um ano.

13  Dados da revista Veja, edição especial “Amazônia”, set. 2009. 

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O primeiro item do artigo 2º da Convenção nº 169 da Organização Internacional do

Trabalho - OIT sobre os Povos Indígenas e Tribais exara que os governos deverão assumir a

responsabilidade de desenvolver, com a participação dos Povos interessados, uma ação

coordenada e sistemática, com vistas a proteger os direitos desses Povos e a garantir o

respeito pela sua integridade.

Essa responsabilidade de garantia de integridade é muito complexa, porque envolve

as mais de 220 etnias e suas relações entre si e com a sociedade envolvente.

O caso apresentado envolve dois Povos Indígenas localizados na região amazônica

que residem em locais distantes e jurisdicionados a dois estados da federação: Amazonas e

Rondônia. O chamado projeto piloto de pesca esportiva ocorreu na Terra Indígena Tenharim

Marmelos. O mesmo empreendedor descobriu o potencial para a mesma atividade na Terra

Indígena Cunhã Sapucaia e propôs aos índios um projeto análogo. Alguns indígenas de etnia

Mura decidiram, então, solicitar a anuência da Funai para desenvolver a pesca esportiva nos

mesmos moldes do outro grupo.

Em entrevista realizada nos dias 25, 26 e 27 de julho de 2006, as lideranças Mura,

Pedro Marques de Souza e Simão Marques de Souza Tuxana, acompanhados do ex-tesoureiro

da Organização Indígena Mura do Município de Novo Aripuanã e Borba - OIMNB,

Germilson Dias Chaves apresentaram denúncias contra o coordenador da OIMNB esolicitaram que a Funai, através de uma portaria presidencial, conferisse ao responsável pela

unidade administrativa da Funai em Manaus/AM, poderes para assinar um acordo de

cooperação de turismo (exclusivamente pesca esportiva) com a Empresa Liga de Eco

Pousadas da Amazônia Ltda.

As denúncias foram ratificadas em documento e entregues a diferentes órgãos

governamentais e não governamentais, referindo-se a problemas gerenciais na OIMNB, além

de solicitar a saída do então coordenador Zenilton Ferreira de Souza, evidenciando que acomunidade indígena Mura, na Terra Indígena Cunhã Sapucaia, está em situação de

desentendimento. Tal assunto foi discutido e o encaminhamento, acatado pelas lideranças, foi

que os problemas internos da OIMNB devem ser dirimidos em assembléias gerais, conforme

o estatuto da própria organização.

Com o objetivo de minimizar a situação conflitante, foi explicado às lideranças Mura

sobre o Grupo de Trabalho constituído para implementar estudos com vistas à viabilidade na

realização de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras, conforme Portaria nº

179/PRES, de 20 de fevereiro de 2006. Foi deliberado que este pesquisador participaria das

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reuniões na cidade de Borba/AM e nas aldeias da Terra Indígena Cunhã Sapucaia planejadas

para os dias 11, 12 e 13 de agosto de 2006, incluindo, a referida Terra Indígena no roteiro das

atividades de pesquisa de campo, em consonância com a metodologia de trabalho do GT-

Turismo.

No dia 10 de agosto de 2006, ocorreu o deslocamento para o início dos trabalhos de

campo. A chegada na cidade de Borba/AM deu-se em 11 de agosto de 2006. Neste mesmo

dia, foram realizadas três reuniões, sendo a primeira com os Tuxauas, Pedro Marques de

Souza, Simão Marques de Souza e o ex-tesoureiro da OIMNB, Germilson Dias Chaves; a

segunda com o coordenador da OIMNB, Zenilton de Souza Ferreira e, finalmente, uma

reunião com todas as pessoas relacionadas além do Tuxaua Pedro Passo Souza para

planejarmos, em conjunto, sobre a logística do trabalho a ser realizado nas aldeias.

Notou-se uma situação de descontentamento entre algumas lideranças Mura com a

coordenação da OIMNB. Nesta reunião, foi informado, também, que os Tuxauas, Pedro e

Simão, haviam convidado os representantes da Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda. para

acompanhar o grupo (como ouvintes), sendo eles, César Augusto Duarte Pinheiro (sócio-

gerente), Nestor Macelino (advogado) e Cleverton Andrade (auxiliar de campo). Foi

combinado que as reuniões nas aldeias teriam como objetivo principal a coleta de dados para

subsidiar o trabalho do GT-Turismo e, além disso, todos os encontros contariam com aparticipação integral dos membros da equipe.

As atividades de campo tiveram início na tarde do dia 11 de agosto de 2006,

incluindo a visita nas dez (10) aldeias existentes na Terra Indígena Cunhã Sapucaia, a seguir

relacionas:

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ALDEIA TUXAUANº DE

FAMÍLIASPOPU

LAÇÃONova

Esperança Manuel Antonio Marques 06 42Jutaí Elias do Nascimento 18 200

IgarapéGrande

Alonso dos Santos 08 66

PacovãoManuel dos Santos

Vasconcelos14 145

Forno Edinor Ferreira Góz 08 63Vila Nova Pedro Passo Souza (Bodó) 12 62

PiranhaPedro Marques de Souza

(Xeré)10 70

Sapucaia Simão Marques de Souza 12 80Tapagem João de Souza Mar 07 35Correio Antonio Fabriciano Lindoso 04 30

Figura 21: Quadro demonstrativo das aldeias: lideranças e população residente

Os dados quantitativos foram informados pelos próprios residentes, totalizando 99

famílias, com uma população aproximada de 793 pessoas. Existe uma 11ª aldeia a qual não

foi visitada porque, segundo os Tuxauas Pedro Marques, Pedro Souza e Simão Marques, não

fazem parte da comunidade Mura, além de apresentarem problemas (álcool e brigas) e, poressa razão, está sendo solicitada a sua saída da Terra Indígena.

O detalhamento das atividades desse trabalho de campo:

No segundo dia de trabalho, durante um intervalo para refeição, foi possível discutir

com os representantes da empresa proponente, Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda., para

alguns esclarecimentos, pontualmente descritos a seguir.

Segundo eles, a pro posta da empresa é de “ajudar” os indígenas e preservar o meio

ambiente.

Os valores dos pacotes turísticos variam entre U$ 2.500,00 e U$ 5.000,00 (dois mil e

quinhentos e cinco mil dólares), conforme o tipo de atendimento desejado pelo cliente.

As atividades são de pesca esportiva fotográfica, no entanto, caso ocorra o desejo de

degustar algum peixe, podem solicitar aos empregados do hotel flutuante o preparo para

alimentação.

Os representantes demonstraram plena clareza sobre a proibição de pesca dentro das

terras indígenas brasileiras, no entanto, argumentaram que já possuem um convênio em

andamento no rio Marmelos, localizado no interior da Terra Indígena Tenharim Marmelos.

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O sócio-gerente, César Pinheiro, afirmou que as atividades de pesca são realizadas na

Terra Indígena Cunhã Sapucaia há cinco (5) anos e efetua depósitos financeiros na conta

bancária de indígenas para que seja dividido entre as famílias.

Prometeram depositar R$ 46.800,00 (quarenta e seis mil e oitocentos reais) no início

de setembro e igual valor ao término da temporada, no mês de outubro, num total de R$

93.600,00 (noventa e três mil e seiscentos reais).

Os folders e materiais publicitários enviados a empresas internacionais conveniadas

contêm informações sobre a pesca esportiva, incluindo mapas que registram atividades em

pontos dentro das Terras Indígenas.

Durante a permanência na Terra Indígena Cunhã Sapucaia e na cidade de Borba/AM,

foram realizados questionamentos, observações e entrevistas informais no intuito de se buscar

elementos de estudo, tanto para o trabalho do GT-Turismo, quanto para uma análise

específica do caso que envolve a proposta da mencionada empresa. A seguir relaciono

algumas constatações:

A atividade pleiteada é, na verdade, uma concessão dos indígenas residentes na Terra

Indígena Cunhã Sapucaia para que a Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda. explore a

atividade de pesca esportiva, com a possibilidade de interação com os indígenas.

Os pescadores são, em sua maioria, estrangeiros e permanecem uma semana, emgrupos de 8 (oito) pessoas, além da tripulação dos bangalôs que é composta por oito

funcionários. O período varia de dois a três meses e são aproximadamente oitenta (80)

pessoas que freqüentam semanalmente cada área durante a chamada temporada de pesca

(agosto, setembro e outubro).

Os pescadores são acomodados nos bangalôs, contando com um serviço de hotel

flutuante e não há restrição quanto ao uso de bebidas ou acompanhantes femininas.

A contrapartida da empresa é a retribuição financeira na qual os indígenas recebemR$ 93.600,00 (noventa e três mil e seiscentos reais), divididos em duas parcelas iguais.

Os indígenas manifestaram posições antagônicas quanto à aceitação desse tipo de

atividade. Dentre as manifestações contrárias às atividades de pesca, destacam-se as

seguintes:

Segundo os indígenas, desde que começou o “turismo”, iniciou-se um período de

discórdia entre os Povos residentes nas diversas aldeias, antes disso, viviam em harmonia.

O dinheiro que é ofertado pela empresa causa sérios problemas relacionais entre os

índios como: brigas, discussões, ameaças, dívidas não pagas, entre outros.

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Com a presença de estranhos dentro da área, os indígenas ficam restritos de suas

atividades de pesca de subsistência vetados de acessar os locais de permanência dos bangalôs,

sendo privados de usufruir de sua própria terra.

Manifestaram-se conscientes sobre a ilegalidade na atividade de pesca e não querem

continuar sendo cooptados para a conivência com atos ilícitos.

Manifestaram a preferência por outros projetos de atividades produtivas semelhantes

a programas governamentais e não governamentais desenvolvidos junto às comunidades,

incluindo programas de proteção territorial.

Mencionaram que a concessão para a pesca esportiva contribui para a desvalorização

cultural, além de proporcionar desestímulo para trabalharem na terra, ficando assim

dependentes do Sr. César Pinheiro.

Houve relatos sobre a existência de equipamentos de mergulho e outros objetos

estranhos junto aos bangalôs.

Houve alegação de que estão sendo explorados, tendo em vista que a empresa recebe

uma quantia vultosa e eles recebem menos de R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais) por pessoa,

ao ano.

Comentaram que o dinheiro nunca foi distribuído de forma equitativa e muitos

indígenas sequer receberam algum valor.Acusaram a Liga de Eco Pousadas de suborná-los para que permitam a realização de

atividades turísticas sem relatar aos órgãos de fiscalização.

Dentre as manifestações favoráveis às atividades de pesca, destacam-se as seguintes:

Manifestações de que o Sr. César Pinheiro é um grande amigo e sempre os ajuda,

seja nas aldeias ou quando precisam deslocar-se até as cidades de Borba/AM e/ou

Manaus/AM.

Comentaram que foi graças a essas atividades de pesca que conseguiram comprarbarcos e motores, além disso, o dinheiro é fundamental para aquisição de gêneros

alimentícios, vestuário e outros bens duráveis.

Houve a alegação de que o verdadeiro fato gerador da discórdia entre os indígenas

foi o Programa de Proteção Territorial na Amazônia Legal - PPTAL que é um programa

desenvolvido em parceria com recursos de fundos internacionais, objetivando a proteção e

desenvolvimento de atividades produtivas.

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Manifestaram que o PPTAL não lhes proporciona ajuda significativa e, no entanto, o

Sr. César Pinheiro contribui em todos os momentos, demonstrando grande preocupação com o

bem estar dos Povos Indígenas.

Acusam a coordenação da OIMNB de desviar recursos e não fiscalizar a área, mas,

com a pesca esportiva, eles possuem melhor vigilância e controle de suas terras.

Ficou caracterizada a existência de uma disputa de poderes na Terra Indígena Cunhã

Sapucaia associada a uma grave situação de discórdia que ainda continua tomando maiores

proporções. Vale lembrar que o deslocamento dos tuxauas até Brasília/DF, no final do mês de

 julho, foi patrocinado pela empresa, sem a anuência da OIMNB. Nesse contexto, o PPTAL é

acusado por algumas lideranças de prejudicar, segundo eles, a qualidade de vida dos Povos

Indígenas. Ocorre, então, uma aparente divisão entre os indígenas: um grupo apóia o projeto

PPTAL e não concorda com as atividades de pesca e, por outro lado, existe um grupo que

admite a situação inversa, ou seja, são contrários ao PPTAL e a favor da pesca esportiva.

A Terra Indígena Cunhã Sapucaia possui um cenário rico em biodiversidade, no

entanto, atualmente não apresenta potencial de interesse para a exploração de atividades

turísticas de caráter contemplativo dos recursos naturais ali existentes. Nessa região ocorre

uma grande incidência de espécies de peixe de espécie Cichla monoculus, o Tucunaré.

Conforme dados do Portal Amazônia14

, este peixe é muito popular na pesca esportiva, sendoeste o principal motivo do interesse da mencionada empresa na tentativa de investir em tal

atividade.

Aspectos conclusivos desse trabalho de campo:

Conforme os relatórios e documentos apresentados pelo coordenador da OIMNB, o

assunto turismo (pesca esportiva) foi exaustivamente discutido com as comunidades indígenas

que, inclusive, realizaram uma assembléia deliberativa, na qual foi decidida, por todos os

votantes, a proibição dessa atividade na Terra Indígena Cunhã Sapucaia.Numa das entrevistas informais, na cidade de Borba/AM, o auxiliar de campo da

Liga de Eco Pousadas relatou que muitas empresas do ramo, inclusive a deles, operam de

forma ilegal, em locais não permitidos. Disse, ainda, que possuem informantes que avisam,

com a devida antecedência, sobre algum tipo de operação a ser realizada pelo Departamento

de Polícia Federal e/ou Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis - IBAMA, desta forma, eles possuem tempo suficiente para navegar com seus

14 Informações obtidas pelo Portal Amazônia  –  Rede Globo de Televisão, através do correio eletrônico:<televisã[email protected]>.

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barcos de pesca para outros locais, sem correr o risco de serem flagrados. Também relatou

que o nome “N. G. Turismo” estaria maculado por envolvimento em supostos ingressos em

áreas protegidas e, por isso, foi substituído pelo nome atual, Liga de Eco Pousadas da

Amazônia Ltda.

Foi observado, durante uma reunião entre alguns Tuxauas favoráveis às atividades de

pesca, que eles realizariam o acordo com ou sem a anuência da Funai. Esta informação foi

corroborada, em entrevista informal, pelo auxiliar de campo da mencionada empresa. Por sua

vez, o coordenador da OIMNB alertou que executará a fiscalização e, caso ocorra o ingresso

de pescadores, ele adotará as providências legais. Houve uma manifestação de afrontamento,

evidenciando, mais uma vez, o potencial para a ocorrência de graves conflitos na Terra

Indígena Cunhã Sapucaia.

Nos trabalhos de campo desenvolvidos para a pesquisa utilizam-se outras

metodologias para a coleta de dados, no entanto, considerando a desconfortável situação

encontrada e a aparente discórdia entre os indígenas de etnia Mura, houve certa flexibilidade

para não agravar mais ainda os problemas já existentes.

É importante acrescentar que a Procuradoria da República no estado do Amazonas,

Ministério Público Federal questionou a Fundação Nacional do Índio sobre o respaldo dos

convênios com a empresa N. G. Turismo e de como fazia valer o disposto no art. 18, parágrafo 2º, que diz ser, em terras indígenas “vedada a qualquer pessoa estranha aos grupos

tribais ou comunidades indígenas a prática de caça, pesca ou coleta de frutos, assim como de

atividade agropecuária ou extrativa”. Após longas discussões e acordos, o tema ainda

continua polêmico e sem uma solução definitiva.

Em setembro do mesmo ano, ocorreu outro trabalho de campo na Terra Indígena

Cunhã Sapucaia. Desta vez, o objetivo era de participar de reuniões nas aldeias para ouvir

formalmente as decisões das aldeias sobre o assunto.Foram realizadas reuniões em todas as aldeias da Terra Indígena Cunhã Sapucaia,

versando sobre a atividade de pesca esportiva pretendida pela empresa Liga de Eco Pousadas

da Amazônia Ltda., aspectos legais e a avaliação do projeto do PPTAL em curso na região.

No encontro realizado na aldeia Jataí houve uma situação tensa e de iminente

conflito. Os Tuxauas, Pedro Marques de Souza, Pedro Passo Souza e Elias Nascimento,

formaram um grupo disposto a permitir a pesca dentro da Terra Indígena Cunhã Sapucaia,

mesmo ciente da ilegalidade e em desacordo com as demais lideranças. Insuflaram alguns

indígenas contra a OIMNB e deliberaram que iniciariam as atividades de pesca no dia

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seguinte, mesmo que houvesse enfrentamento. Durante a reunião houve a presença dos

representantes da Liga de Eco Pousadas da Amazônia Ltda., César Augusto Duarte Pinheiro

(sócio-gerente), Nestor Macelino (advogado) e Cleverton Andrade (auxiliar de campo), fato

que culminou o término da reunião. Neste momento, alguns indígenas tentaram tomar posse, à

força, dos barcos que transportavam os membros da OIMNB e os servidores da Funai. Após

muita discussão, a situação foi controlada e os servidores da Funai e os membros da OIMNB,

foram liberados sem maiores danos.

Dos trabalhos de campo, esta foi a situação mais conflitante e desgastante,

evidenciando que o impacto socioambiental pode anteceder um projeto. As atividades

produtivas e de promoção social, antes de serem propostas nas terras indígenas, devem ter o

pressuposto básico de uma avaliação preliminar de viabilidade social e cultural.

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3 ATIVIDADES TURÍSTICAS NAS TERRAS INDÍGENAS

3.1 Aspectos jurídicos

Não se trata de uma aventura ou divagações no campo jurídico, até porque é dever de

todos, especialmente dos servidores públicos que subsidiam tecnicamente os dirigentes da

administração pública na tomada de decisões. Outra premissa é de que ninguém pode se

eximir ao cumprimento da Lei, alegando seu desconhecimento. Um trabalho de pesquisa

dessa magnitude deve abordar as esferas da legalidade e do respeito à alteridade, envolvendo

os Povos Indígenas brasileiros, os quais possuem uma legislação específica e normas

correlatas, além da interface com a legislação ambiental.

Cabe apresentar alguns argumentos jurídicos que também motivaram a discussão

sobre os direitos dos Povos Indígenas no que se refere à exploração de atividades turísticas.

Essas considerações surgiram a partir de encontros e com procuradores públicos federais e

técnicos da área.

A Constituição Federal de 1988, no Capítulo VIII, rege:

“Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas,crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmenteocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seusbens.

§ 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas emcaráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveisà preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias asua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

§ 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse

permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e doslagos nelas existentes.

§ 3º - O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, apesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivadoscom autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.

§ 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitossobre elas, imprescritíveis.

§ 5º - É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad  referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua

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população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do CongressoNacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse orisco.

§ 6º - São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham porobjeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou aexploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes,ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser leicomplementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a açõescontra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupaçãode boa fé.

§ 7º - Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.” 

Observa-se que a Constituição Federal corrobora a exclusividade para os índios no

usufruto das riquezas naturais de suas terras e acrescenta, ainda, a nulidade de qualquer atoque tenha por objeto a exploração dessas riquezas. Evidencia-se a inexistência de amparo

legal para a exploração de qualquer atividade realizada por pessoas estranhas às comunidades

indígenas e destaca-se sobre a legitimidade do direito às terras, independente de ato

homologatório, sendo reconhecido aos Povos Indígenas o direito às áreas por eles

tradicionalmente habitadas.

No inciso segundo, do artigo nº 58, da Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, é

considerado crime a utilização do índio ou da comunidade indígena como objeto depropaganda turística ou de exibição para fins lucrativos. Infere-se o fato de que a propaganda

não se restringe a uma simples reprodução fotográfica, ela abrange toda e qualquer forma de

difusão que semeie idéias a respeito de pessoas, instituições, locais, causas ou objetos. No

caso da imagem, além das garantias exaradas no artigo 5º da Carta Magna, existe a Portaria nº

177/PRES, de 16 de fevereiro de 2006, a qual regulamenta o procedimento administrativo de

autorização, pela Funai, de entrada de pessoas em terras indígenas interessadas no uso,

aquisição e ou cessão de direitos autorais e de direito de imagens indígenas e orienta

procedimentos afins, com o propósito de respeitar os valores, criações artísticas e outros

meios de expressão cultural indígenas, além de proteger sua organização social, costumes,

línguas, crenças e tradições.

A regulamentação de atividades turísticas no interior das terras indígenas

sugestionaria uma alteração na atual legislação indigenista brasileira, não só na circunstância

do ingresso de pessoas estranhas à comunidade, mas, inclusive, na garantia dos direitos de

usos, costumes e tradições culturais dos Povos Indígenas, pois, a simples presença de um

indivíduo estranho diante de uma pessoa ou grupo indígena pode ser caracterizada como

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causa de constrangimento e violar a privacidade em seus aspectos tradicionais de convivência,

incorrendo em crime, se considerarmos o disposto no inciso I, do artigo nº 58, da Lei nº 6.001,

de 19 de dezembro de 1973.

A referida Lei nº 6.001, no Título III, capitulo II, o caput do artigo 18 e o parágrafo

1º regem que as terras indígenas não poderão ser objetos de arrendamento ou atos restritivos

ao pleno exercício da posse sobre ela, estabelecendo a impossibilidade de que qualquer pessoa

estranha aos grupos indígenas pratique a caça, a pesca, coleta ou atividades agropecuárias.

“Art. 22. Cabe aos índios ou silvícolas a posse permanente das terras que habitam eo direito ao usufruto exclusivo das riquezas naturais e de todas as utilidadesnaquelas terras existentes.

Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que, deacordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerceatividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil.

Art. 24. O usufruto assegurado aos índios ou silvícolas compreende o direito àposse, uso e percepção das riquezas naturais e de todas as utilidades existentes nasterras ocupadas, bem assim ao produto da exploração econômica de tais riquezasnaturais e utilidades.

§ 1° - Incluem-se, no usufruto, que se estende aos acessórios e seus acrescidos, o usodos mananciais e das águas dos trechos das vias fluviais compreendidos nas terrasocupadas.

§ 2° - É garantido ao índio o exclusivo exercício da caça e pesca nas áreas por eleocupadas, devendo ser executadas por forma suasória as medidas de polícia que emrelação a ele eventualmente tiverem de ser aplicadas.” 

Compete ao Poder Público, em suas diferentes esferas, a execução de ações de

proteção, conforme o disposto na Convenção nº 169 da Organização Internacional do

Trabalho (OIT) sobre os Povos Indígenas e Tribais, promulgada pelo Decreto nº 5.051, de 19

de abril de 2004, que exara:

“Artigo 2º. Os governos deverão assumir a responsabilidade de desenvolver, com aparticipação dos povos interessados, uma ação coordenada e sistemática com vistasa proteger os direitos desses povos e a garantir o respeito pela sua integridade (grifomeu).

[...]

Artigo 4º. Deverão ser adotadas as medidas especiais que sejam necessárias parasalvaguardar as pessoas, as instituições, os bens, as culturas e o meio ambiente dospovos interessados (grifo meu).

[...]

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Artigo 6º. Ao aplicar as disposições da presente Convenção, os governos deverão:

a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e,particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam

previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente(grifo meu);

b) estabelecer os meios através dos quais os povos interessados possam participarlivremente, pelo menos na mesma medida que outros setores da população e emtodos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismosadministrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas quelhes sejam concernentes (grifo meu);

c) estabelecer os meios para o pleno desenvolvimento das instituições e iniciativasdos povos e, nos casos apropriados, fornecer os recursos necessários para esse fim.” 

Esta norma reafirma a responsabilidade do Estado no que tange a adoção de medidas

que objetivem a garantia da integridade dos Povos Indígenas, em consonância com as

prerrogativas lavradas na Constituição Federal, de 1988. Determina ainda, a participação

diligente dos povos interessados em todas as situações legislativas ou administrativas que

possam atingi-los diretamente.

Além da legislação indigenista, deve-se considerar a questão ambiental e, neste caso,

a observação da Resolução do Conama nº 237, de 19 de dezembro de 1997, que rege:

“Art. 4º - Compete ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos RecursosNaturais Renováveis (IBAMA), órgão executor do SISNAMA, o licenciamentoambiental, a que se refere o artigo 10 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, deempreendimentos e atividades com significativo impacto ambiental de âmbitonacional ou regional, a saber:

I - localizadas ou desenvolvidas conjuntamente no Brasil e em país limítrofe; no marterritorial; na plataforma continental; na zona econômica exclusiva; em terrasindígenas ou em unidades de conservação do domínio da União (grifo meu).

[...]

§ 1º - O IBAMA fará o licenciamento de que trata este artigo após considerar oexame técnico procedido pelos órgãos ambientais dos Estados e Municípios em quese localizar a atividade ou empreendimento, bem como, quando couber, o parecerdos demais órgãos competentes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dosMunicípios, envolvidos no procedimento de licenciamento” (grifo meu).  

Estão sujeitos ao licenciamento ambiental, entre outros empreendimentos e

atividades, conforme o anexo I da mencionada Resolução, os complexos turísticos e de lazer.

No caso específico das terras indígenas e entorno, é salutar a preocupação com os possíveis

impactos ambientais e socioculturais, haja vista a necessidade de consultar a Funai nos

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estudos ambientais relacionados à localização, instalação, operação e ampliação de uma

atividade ou empreendimento, como subsídio para a análise da licença requerida, tais como:

relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar,

diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise

preliminar de risco.

O Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990, que regulamenta a Lei nº 6.902, de 27

de abril de 1981, e a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõem, respectivamente,

sobre a criação de Estações Ecológicas e Áreas de Proteção Ambiental e sobre a Política

Nacional do Meio Ambiente, e dá outras providências não abre precedentes na previsão dos

três tipos de licença (Licença Prévia – LP; Licença de Instalação – LI; e, Licença de Operação

 –  LO). Ou seja, esta norma jurídica, evidencia que, em qualquer tipo de empreendimento,

inclusive os mais simples, o processo de licenciamento constituirá na obtenção sucessiva de

LP, LI e LO, nos termos dos artigos 17, 18 e 19 do referido Decreto. Os Estados que não

aplicavam estas normas devem, portanto, adaptá-las, em consonância com o disposto no

Artigo 1º, do Decreto nº 99.274, que assim determina:

“Art. 1º. Na execução da Política Nacional do Meio Ambiente cumpre ao PoderPúblico, nos seus diferentes níveis de governo:

I - manter a fiscalização permanente dos recursos ambientais, visando àcompatibilização do desenvolvimento econômico com a proteção do meio ambientee do equilíbrio ecológico;

II - proteger as áreas representativas de ecossistemas mediante a implantação deunidades de conservação e preservação ecológica;

III - manter, através de órgãos especializados da Administração Pública, o controlepermanente das atividades potencial ou efetivamente poluidoras, de modo acompatibilizá-las com os critérios vigentes de proteção ambiental” (grifo meu). 

O instrumento legal para dar início ao processo de licenciamento ambiental é oEstudo Prévio de Impacto Ambiental estabelecido pelo inciso IV, do § 1º, do artigo 225 da

Constituição Federal de 1988, que determina:

“§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público: (...).

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmentecausadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impactoambiental, a que se dará publicidade.” 

O artigo 3º da resolução Conama 237, de 19 de dezembro de 1997, corrobora a

norma constitucional. Diz o texto:

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“A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva oupotencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévioestudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meioambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização deaudiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.” 

Observa-se que a expressão “significativa” é um elemento gerador de controvérsias

interpretativas tão complexas que a referida Resolução nº 237 outorga a decisão sobre o fato

do empreendimento ou atividade ser (ou não) potencialmente causador de significativa

degradação do meio ambiente ao órgão ambiental competente.

Na formação do Processo 8620.0668/06, o documento primário foi o Ofício nº

091/CPTI/CGPIMA/2006, 15 de fevereiro de 2006, que trata de uma solicitação para que a

Advocacia Geral da União – Procuradoria Geral Especializada junto à Funai se manifestasse arespeito do assunto. A resposta inicial se deu através da importante fundamentação exarada na

Informação nº 095/CAA/PGF-PFE-FUNAI/2006, de autoria da Procuradora Federal, Diana

Ribeiro Rocha.

Dentro dessa lógica argumentativa, transcreve-se um trecho do jurista José Afonso

da Silva, que consta no trabalho da Dra. Juliana Santilli denominado “Avaliação Jurídica

so bre os Direitos Indígenas”: 

“Essas considerações, por si só, mostram que a relação entre o indígena e

suas terras não se rege pelas normas do Direito Civil. Sua posse extrapola a órbitapuramente privada, porque não é e nunca foi uma simples ocupação da terra paraexplorá-la, mas base do seu habitat, no sentido ecológico de interação do conjuntode elementos naturais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado davida humana. Esse tipo de relação não pode encontrar agasalho nas limitaçõesindividualistas do direito privado.” (SANTILLI, 2004, p. 35),

Deve-se refletir sobre a necessidade de uma avaliação multidisciplinar e, essa é a

linha de pesquisa que se pretende neste trabalho. A simples (no sentido de somente)

interpretação jurídica não é suficiente para deliberar sobre uma matéria tão complexa,

considerando-se a quantidade de normas legais que regulam a questão ambiental e indígena,

algumas já discutidas e outras apresentadas a seguir.

A Convenção sobre Diversidade Biológica15 estabelece que dentre as medidas para a

conservação e utilização sustentável da biodiversidade, as Partes devem:

“a) desenvolver estratégias, planos ou programas para a conservação e a utilização

sustentável da diversidade biológica ou adaptar para esse fim estratégias, planos ou programas

existentes que devem refletir, entre outros aspectos, as medidas estabelecidas nesta

15 Tema abordado no item 3.4.2. que trata de biopirataria e pesquisa científica

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Convenção concernentes à Parte interessada; e b) integrar, na medida do possível e conforme

o caso, a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica em planos,

 programas e políticas setoriais ou intersetoriais pertinentes.” 

O Código Florestal, instituído pela Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e

alterações posteriores define, entre outras determinações, os conceitos de Áreas de

Preservação Permanente - APP e Reserva Legal, bem como sobre os espaços que devem ser

garantidos próximos a cursos d’água; ao redor de lagos, lagoas e reservatórios; topos de

montanhas e morros. Dessa norma destaca-se a preocupação em manter um ambiente

necessário à vida das populações silvícolas, além de assegurar condições do bem-estar

público.

Outro importante marco legal é a Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, que cria o

Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza  – SNUC. O estabelecimento e a

gestão das Unidades de Conservação, seus conceitos, objetivos, diretrizes e estrutura estão

previstos nessa norma. Pelo SNUC, as Unidades de Conservação são divididas em dois

grupos de proteção compostos por diferentes categorias de manejo. O primeiro grupo são as

Unidades de Proteção Integral que incluem as Estações Ecológicas; as Reservas Biológicas;

os Parques Nacionais; os Monumentos Naturais e os Refúgios da Vida Silvestre. No segundo

grupo, estão Unidades de Uso Sustentável, como: as Áreas de Proteção Ambiental; as Áreade Relevante Interesse Ecológico; as Florestas Nacionais; as Reservas Extrativistas; as

Reservas de Fauna; as Reservas de Desenvolvimento Sustentável e as Reservas Particulares

do Patrimônio Natural. A forma de gestão das diferentes unidades está esclarecida no SNUC,

conforme as especificações de cada categoria de manejo.

No que se refere à responsabilidade dos órgãos ambientais federais, responsáveis

pelas políticas ambientalista e indigenista, o SNUC prevê a instituição de grupos de trabalho

para propor diretrizes a serem adotadas com vistas à regularização de sobreposições entreterras indígenas e unidades de conservação.

A gestão do SNUC é realizada pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente  –  

CONAMA, enquanto órgão consultivo e deliberativo no qual o órgão indigenista possui uma

participação indireta através do Ministério da Justiça; pelo Ministério do Meio Ambiente que

é o órgão que coordena do Sistema; e pelos órgãos executores, como o Instituto Brasileiro do

Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis  –  IBAMA, e os órgãos estaduais e

municipais, com a função de implementar o Sistema, subsidiando as propostas de criação e

administração das unidades de conservação.

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O Decreto nº 5.092, de 21 de maio de 2004, define regras para identificação de áreas

prioritárias para a conservação, utilização sustentável e repartição dos benefícios da

biodiversidade, no âmbito das atribuições do Ministério do Meio Ambiente. Estabelece que

essas áreas serão definidas por portaria ministerial, considerando-se os seguintes conjuntos de

biomas: Amazônia; Cerrado e Pantanal; Caatinga; Mata Atlântica e Campos Sulinos; e Zona

Costeira e Marinha. Segundo esse Decreto, as áreas prioritárias devem fundamentar-se nas

áreas identificadas no "Projeto de Conservação e Utilização Sustentável da Diversidade

Biológica Brasileira  – PROBIO" e serem discriminadas em mapa das áreas prioritárias para

conservação e utilização sustentável da diversidade biológica brasileira. Essas áreas

prioritárias devem ser consideradas para o estabelecimento de unidades de conservação.

A Portaria MMA nº 134, de 7 de junho de 2004 que institui o Fórum Nacional de

Áreas Protegidas, é um espaço de diálogo, articulação e participação da sociedade civil e das

comunidades tradicionais, em especial representantes das comunidades indígenas, que são

fundamentais nas tomadas de decisões para as definições das áreas prioritárias que afetam

direta ou indiretamente as terras indígenas.

O Decreto nº 1.141, de 19 de maio de 1994 é um instrumento que dispõe sobre as

ações de proteção ambiental, saúde e apoio às atividades produtivas para os Povos Indígenas.

A norma jurídica deixa evidente sobre a responsabilidade da União nas ações voltadas àproteção ambiental das terras indígenas e seu entorno as quais se destinam a garantir a

manutenção do equilíbrio necessário à sobrevivência física e cultural das comunidades

indígenas. Garante a manifestação das populações indígenas nas discussões sobre atos que

possam afetar suas terras de forma direta e indireta.

Devem ser observados os direitos exclusivos de todo o patrimônio cultural imaterial

das populações indígenas, em conformidade com o Decreto nº 5.753, de 12 de abril de 2006,

que promulga a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial, adotada emParis, em 17 de outubro de 2003, e o Decreto nº 6.177, de 1º de agosto de 2007, que promulga

a Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, em vigor

desde 18 de março de 2007.

A promoção e o apoio a conservação da biodiversidade no interior das terras

indígenas e entorno deve ter princípios de respeito à alteridade e considerar o ambiente como

um ecossistema complexo de uso exclusivo pelos seus ocupantes, de forma a garantir a sua

reprodução física e cultural.

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3.2 Segmentações do turismo com atrativos naturais e paisagísticos

Diferentes princípios sociais, econômicos e ambientais estão explicitados no Código

Mundial de Ética do Turismo (Assembléia Geral da ONU – Resolução 56/12 de novembro de

2001), aprovado por unanimidade pelos membros da Organização Mundial de Turismo. Os

seus dez princípios estão assim relacionados:

  Contribuição do turismo ao entendimento e ao respeito mútuo entre homens e

sociedades;

  O turismo, instrumento de desenvolvimento pessoal e coletivo;

  O turismo, fator de desenvolvimento sustentável;

  O turismo, fator de aproveitamento e enriquecimento do patrimônio cultural da

humanidade;

  O turismo, atividade beneficiosa para os países e as comunidades de destino;

  Obrigação dos agentes do desenvolvimento turístico;

  Direitos ao turismo;

  Liberdade de deslocamentos turísticos;

  Direitos dos trabalhadores e dos empresários do setor turístico;

  Aplicação dos princípios do Código Mundial Ético para o Turismo.

Esses princípios relacionados pelo Código Ético buscam identificar diretrizes para

que o turismo possa contribuir para a diminuição da pobreza, a conservação dos recursos

paisagísticos naturais e a proteção do patrimônio cultural, dentro de uma ótica onde o

desenvolvimento sustentável seja prioridade.

Algumas divergências são bastante acentuadas quando se discute os conceitos de

sustentabilidade aplicados ao turismo, uma vez que esse possui diferentes vertentes, desde o

turismo em massa, de praia e sol, até o ecoturismo, em sua modalidade menos impactante.

Pode-se relacionar alguns principais tipos de exploração de atividades turísticas:

turismo de praia e sol, turismo cultural, turismo rural, turismo desportivo e o ecoturismo. Há

outros segmentos turísticos de menor impacto e desenvolvimento, como os turismos de

congresso e eventos, religioso, de balneários, de cruzeiros, etc.

A atividade turística vincula-se diretamente a dois principais atrativos, os naturais e

os socioculturais. Entre os naturais, destacam-se as distintas formas de paisagem com suas

características, mar e praia, cursos d’água, serras e montanhas, vegetação e fauna. Já os

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atrativos socioculturais relacionam-se com as formas de manifestações das populações locais,

suas tradicionalidades, sua cultura específica expressada pela dança, música, culinária,

indumentária, bebidas, religiosidade, artes, artesanato, arquitetura, etc.

A importância de cada um dos atrativos e seus componentes pode ter maior ou menor

destaque em função do tipo de turismo que se deseja ou seja possível fazer. Os produtos

turísticos devem satisfazer as necessidades dos grupos de visitantes interessados em distração,

vinculados aos possíveis atrativos naturais e culturais, dessa forma ocorre uma relação direta

entre a necessidade e os serviços turísticos.

A Organização Mundial de Turismo16 e o Conselho da Terra definem o turismo

sustentável como aquele que atende às necessidades dos turistas e as regiões hóspedes, ao

mesmo tempo em que preserva e fomenta oportunidades para o futuro. Em princípio, gestiona

todos os recursos de tal forma que as necessidades econômicas, sociais e estéticas podem

satisfazer-se sem deixar de conservar a integridade cultural, os processos ecológicos

essenciais, a diversidade biológica e os sistemas de suporte de vida.

É fundamental que a construção de modelos para um turismo sustentável leve em

consideração as peculiaridades paisagísticas naturais de cada comunidade local do destino

turístico. As capacitações dos profissionais que trabalham com atividades de planejamento

turístico devem estar calcadas na transdisciplinaridade, haja vista que os atores envolvidosprecisam aplicar conhecimentos de distintas áreas científicas.

Sobre o Ecoturismo:

Existem diferentes conceitos e interpretações sobre o ecoturismo, sendo, muitas

vezes, confundido com a concepção de turismo sustentável. Para Caballos-Lascurain (1987) o

ecoturismo está relacionado com a viagem responsável a áreas relativamente pouco alteradas

para desfrutar e apreciar a natureza, ao mesmo tempo em que promove a conservação, tem um

baixo impacto ambiental e proporciona um benefício socioeconômico à população local.Para Medina e Santamarina (2004), o ecoturismo deve basear-se em alguns

princípios fundamentais que são:

  Duplo papel de seus produtos, uma vez que vem funcionar como um serviço

especializado voltado para ambientes naturais/conservados e, ao mesmo tempo,

complementar outros produtos, como os turismos de sol, de praia, náutico e de saúde.

16 Disponível em: <http://www.unwto.org>.

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  Ordenamento territorial: deve basear-se em um rigoroso trabalho de planejamento

territorial integral, levando em conta as potencialidades e restrições dos lugares e

cenários. Nesse sentido, deve ter como objetivos, o uso racional dos recursos naturais,

aproveitar otimamente os espaços e propiciar equidade social. Assim como, prever

para mitigar os impactos ambientais.

  Sustentabilidade: necessita basear-se e respeitar os seus critérios dentro de uma visão

integral, onde se inclui os parâmetros ambiental, econômico e social.

Diferentes autores, em consonância com o conceito estabelecido pela Embratur17,

consideram que o ecoturismo é a modalidade que mais se aproxima de uma exploração

realmente equilibrada, em seus três elementos básicos para um turismo sustentável. Afirma-se

que o ecoturismo se mantém sobre os três principais pilares da sustentabilidade:

- Ambiental: porque necessita e busca a conservação dos recursos paisagísticos e

naturais;

- Econômico: porque procura melhorar as condições de vida das populações das

localidades de destino;

- Social: porque deve ajudar e aproveitar os valores e patrimônios culturais das

comunidades envolvidas, estimulando sua ativa participação.

É necessário não confundir o ecoturismo com turismo de natureza, que é exploradoem massa. O ecoturismo deve seguir uma série de normas éticas e conservacionistas junto às

comunidades e ao meio local. Ambos exploram áreas que estejam com elevado estágio de

conservação natural, porém, a ótica e os procedimentos de suas atividades são diferenciadas, o

ecoturismo preza por aplicar medidas e ações de sustentabilidade.

O ecoturismo mantém uma relação simbiótica e direta com a educação ambiental,

com seus diferentes procedimentos metodológicos, de formalidade e informalidade. As

orientações pedagógicas de como relacionar as atividades turísticas com a natureza, devemenvolver desde os agentes promotores de excursões, integrantes e moradores das

comunidades, guias ecoturísticos e os próprios turistas. Para isso, a educação ambiental é um

instrumento fundamental no desenvolvimento de atividades turísticas realmente sustentáveis.

Dentre as atividades a serem desenvolvidas no ecoturismo, é possível relacionar diferentes

modalidades, por exemplo:

17 Disponível em: <http://www.turismo.gov.br/turismo/home.html>: “é a prática de turismo de lazer, esportivo

ou educacional, em áreas naturais, que se utiliza de forma sustentável dos patrimônios natural e cultural,incentiva a sua conservação, promove a formação de consciência ambientalista e garante o bem estar das populações envolvidas”.  

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  Ecotrilhas: percursos a pé, relativamente curtos, com até um grau médio de

dificuldade, conhecendo os ecossistemas e paisagens de grande riqueza cênica e

interpretativa;

  Montanhismo: recorridos a pé em áreas montanhosas, com até um grau médio de

dificuldade;

  Caminhadas: passeios geralmente de grande percurso, para apreciação cênica de

ecossistemas e paisagens;

  Espeleoturismo leve: percursos em grutas e cavernas com baixo a nenhum nível de

dificuldade;

  Ciclismo: passeios ciclísticos de longos e médios trajetos, recorridos por estradas ou

caminhos de pouco movimento e de elevada beleza cênica;

  Equitação e cavalgadas: ensino e práticas de equitação em ambientes apropriados,

podendo ser de média ou longa distância;

  Observação de aves: em áreas conservadas onde se possam constatar a presença de

avifauna;

  Turismo científico: dedicado a especialistas e estudiosos do meio natural, com

observações in situ;

  Mergulho contemplativo: a partir de centros de mergulho, com equipamentos e

técnicas apropriadas, em áreas de mar litorâneo, banco de corais e arrecifes, rios e

lagoas;

  Snorkeling: mergulho de superfície com utilização de snorkel com respiração aérea;

  Navegação naturalista: passeio em jangadas, canoas, botes e outras pequenas

embarcações movidas a remo, vento ou motor silencioso.

As Áreas Protegidas, em suas diferentes categorias, quando permitidos, são destinos

turísticos que favorecem e se beneficiam do ecoturismo. Para uma exploração realmente

sustentável é necessária a incorporação de alternativas de turismo comunitário, onde as

populações locais se envolvam nos planos de gestão e, também, incorporem os benefícios

resultantes dessa atividade econômica.

O Dr. Giovani Seabra, organizador do trabalho “Turismo de base local: identidade

cultural e desenvolvimento regional”, aborda profundamente a questão da absorção do

mercado turístico pelas comunidades locais como fundamento necessário ao próprio

desenvolvimento regional. Segundo Seabra (2007, p. 255), a proposta de turismo que pretende

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desenvolver no nordeste brasileiro – campo de sua pesquisa – origina-se no modelo sistêmico

apontado por pelo professor Beni (1997, p. 120) cuja sustentação se dá através dos elementos

naturais, socioeconômicos e cultural-econômicos e locais. Esta integração que permite novos

serviços na economia local, impulsiona a cadeia produtiva e promove a melhoria do padrão de

vida da população residente.

Existe certa confusão conceitual na realização de atividades turísticas que, por vezes,

transformam atividades de lazer em turismo ecológico, dada a sua localização geográfica ou

contexto temático. Um hotel fazenda, por exemplo, pode ser considerado como um programa

de ecoturismo, da mesma forma que a permanência em alguma pousada no bioma Pantanal ou

balneários em locais de difícil acesso.

Para fins desta avaliação, serão considerados aqueles conceitos mais próximos do

objeto da pesquisa, sem distanciar o elemento cultural da beleza cênica, numa tentativa de se

adequar às terminologias mais conhecidas e suas peculiaridades:

  Pesca esportiva: atividade de prazer para o homem no ato de fisgar, maltratar e soltar

espécies de peixes. No caso da Empresa Liga de Ecopousadas a pesca do Tucunaré é

associada a outros tipos de lazer (comidas, bebidas, entre outros) é o ecoturismo

proposto. Já foi referido neste trabalho sobre a vedação legal para a pesca no interior

de terras indígenas e as inconseqüências da proposta, haja vista a despreocupação comos elementos socioambientais e culturais.

  Turismo ecológico de lazer: caracteriza-se pela proximidade com a beleza cênica

natural e a possibilidade de interação. O turismo oferecido na pousada Xingu Refúgio

Amazônico, e todos os seus componentes, no requintado hotel, com a possibilidade de

observar o “exótico selvagem”, destacou-se negativamente pela exploração e

expropriação de patrimônio cultural e ambiental dos Povos Indígenas.

  Turismo étnico ou etnoturismo local: atividade na qual o indivíduo conhece outraspessoas e suas características socioculturais na dinâmica do espaço coletivo da

comunidade, atraídos pela identidade do outro. Esse tipo de turismo pode ser

exemplificado como uma visita a uma determinada cidade, com a apreciação das

comidas típicas, participação em festas tradicionais (quando permitidas), interação

social nos locais públicos, enfim, conhecer a maneira como vivem ou como aparentam

viver. No caso das comunidades locais residentes em cidades, os espaços territoriais

são constitucionalmente definidos. As praças, as ruas, prédios públicos são benscoletivos de acesso a qualquer cidadão brasileiro. Também o comércio local não pode

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impor restrição aos consumidores, sob pena de discriminação. As terras indígenas, por

sua vez, possuem, antes de tudo, um regime jurídico especial que garante as diferenças

dos mais de 220 Povos residentes no Brasil. Esta garantia se estende além da

territorialidade, pois, é distinta dos conceitos espaciais não indígenas. O limite de uma

residência, no caso de uma cidade, compreende, normalmente, uma edificação e a área

de lazer ou serviço (quintal, sacada, pátio) e são locais invioláveis. Nas terras

indígenas esses conceitos variam, conforme a etnia, podendo uma residência

compreender diferentes limites. Os locais de privacidade, das relações interpessoais,

de trabalho não podem ser submetidos as mesmas bases conceituais. Além disso,

existem situações como na Terra Indígena Parque do Xingu que residem 14 etnias

distintas.

  Turismo étnico ou etnoturismo extra-local: ocorre em situação semelhante ao que foi

anteriormente explicado, com a diferença básica de que o espaço territorial não

determina a aproximação cultural. Esse tipo de atividade ocorre em local adverso ao

da comunidade. Via de regra, são eventos locais, regionais, nacionais e internacionais,

nos quais uma ou várias comunidades expõem seus aspectos culturais (gastronomia,

indumentária, objetos, folclore), de forma permanente ou por períodos limitados. Um

exemplo, são as propostas e idealizações de aldeias ecoturísticas ou cenográficas quesão locais eleitos para a realização de encenações sobre o seu modo de vida. Os

indígenas empenhados nessas tarefas como forma alternativa de rendimentos,

deslocam-se espontaneamente de suas residências para outro local, para apresentar

suas tradições, gastronomia, enfim, tudo aquilo que poderia ser visto na aldeia, sem,

no entanto, invadir a privacidade dos demais residentes. Os exemplos são da Reserva

Pataxó da Jaqueira, a proposta da Aldeia Ecoturística na cidade de Paraty/RJ. Inclui-

se, ainda, os encontros regionais, jogos indígenas e outros eventos ocorridos fora dasáreas residenciais indígenas.

  Turismo de observação ou contemplação: é o tipo de turismo que apresenta ao

visitante beleza cênica natural como forma de apreciação, tal qual uma obra de arte.

Ocorre o máximo de interação visual como garantia de preservação do local. A Gruta

Azul, no município de Bonito/MS, um dos exemplos. No caso indígena, a experiência

dos Paresi, estado do Mato Grosso, apresenta um potencial de sucesso como essa

alternativa (há uma cachoeira, numa área distante do local residencial, aberta àvisitação limitada sob o pagamento de uma taxa e monitorada pelos indígenas).

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Outras categorias de ecoturismo implicam na interação dos indivíduos com o meio,

em maior ou menor escala, os indígenas de etnia Javaé, por exemplo, permitem passeios

turísticos de barco no interior de suas terras, mediante uma contrapartida financeira. Os

impactos negativos foram abordados neste trabalho.

3.3 Abordagem não dicotômica das ações correlacionadas ao turismo

Um dos principais motivos para a produção de um estudo abordando o tema em

questão está diretamente relacionado à elaboração de instrumentos reguladores eficazes para a

exploração de atividades turísticas, objetivando dirimir os atuais problemas socioculturais e

ambientais nas terras indígenas e, ao mesmo tempo, garantir os direitos constitucionais desses

Povos.

A partir das três correntes de pensamento, anteriormente citadas, é possível, então,

estabelecer um novo referencial teórico específico para o tema em questão, sem deixar de

observar o que já foi produzido por outros autores. Conforme veremos nos trabalhos a seguir,

nota-se certo antagonismo nas raras produções intelectuais sobre turismo em terras indígenas

brasileiras. Evidentemente que existem outras produções que não foram aqui referenciadas e

apresentam um elevado grau de importância.

A Dra. Ivani Ferreira de Faria (2007), em seu artigo denominado “Ecoturismo

indígena como princípio de autonomia e afirmação cultural”, aborda sobre a necessidade que

haja uma regulamentação e que sejam desenvolvidas políticas públicas para este segmento.

Numa linha de raciocínio semelhante, a Dra. Luíza Luíndia Azevedo (2008), produziu o livro

“Ecoturismo indígena”, no qual aborda a questão da necessidade de políticas públicas e

apresenta dados quantitativos sobre algumas experiências na América Central, inclusive, no

caso brasileiro, Reserva Pataxó da Jaqueira.

Por outro lado, segundo Suzanne York, autora do artigo denominado “Promessas

incertas do ecoturismo”, incluído no livro “Guerra dos Paradigmas: resistencia de los pueblos

indígenas a la globalización económica”, editado por Jerry Mander e Victória Tauli Corpuz, a

realização de atividades turísticas nas comunidades tradicionais é uma alavanca para a

degração cultural, socioambiental e econônica. A abordagem introduz os elementos referentes

ao patrimônio cultural, resumido no parágrafo a seguir.

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Entre os efeitos mais degradantes do ecoturismo está a comercialização do

patrimônio, da identidade cultural e os rituais sagrados dos Povos Indígenas. Essa atividade

reduz rapidamente as culturas antigas a um produto exótico mais adequado a publicidade e

comercialização. Os rituais, as danças e os cerimoniais religiosos são esvaziados de seu valor

espiritual tradicional mais profundo, perdendo seu significado. Os artefatos indígenas são

valorados somente baseados em seu potencial como recordações e, até mesmo os Povos

Indígenas tendem a ser valorizados simplesmente como uma oportunidade de registro

fotográfico. Os comerciantes locais de artesanato, aos poucos, são excluídos do mercado,

considerando que as empresas copiam e reproduzem de forma massiva os objetos de arte, os

artesanatos, as roupas tradicionais, deixando os artesãos locais à margem da comercialização

e substituindo-os por mão-de-obra barata em outros países. Na Malásia e Indonésia, por

exemplo, a fina arte do batik , um processo de tingir e encerar que cria lindas imagens

impressas sobre fibras naturais, é produzido, agora massivamente, sobre telas sintéticas em

centenas de fábricas do sudeste asiático. Os desenhos tradicionais vão sendo substituídos por

uma arte popular.

O processo histórico das discussões sobre turismo nas terras indígenas, no âmbito da

Fundação Nacional do Índio, teve início no princípio da década de 1990 e limitava-se a

  procedimentos do tipo “despachos para parecer”, ou seja, o encaminhamento para umdetalhamento técnico de coordenações específicas. Alguns indigenistas, como Antônio

Pereira Neto, antes de encaminhar os documentos, escreviam que a avaliação deveria ser

muito criteriosa e posicionava-se contrário às propostas apresentadas. Não muito distante

dessa linha de raciocínio, o indigenista Sidney Ferreira Possuelo, em entrevistas, manifestava

publicamente, sua contrariedade, sob a argumentação de prejuízos futuros às populações

indígenas. Um interessante destaque diz respeito à inexistência de uma abordagem conclusiva

ou algum parecer que, pelo menos, tivesse mais de três ou quatro laudas.O evento mais importante, ocorrido no período em análise, foi o “World Ecotour 97”

no qual foi elaborada a cartilha “Manual Indígena de Ecoturismo”. Esse manual apresenta, de

forma didática, regras e procedimentos para a execução de atividades turísticas nas terras

indígenas, no entanto, sem observar a complexidade jurídica, tampouco a pluralidade étnica

dos Povos Indígenas nas diferentes regiões brasileiras. O manual teve como objetivo nortear

as atividades ecoturísticas nas terras indígenas, a partir de uma visão de mundo limitada

(perspectiva etnocêntrica), criando uma generalidade reducionista aos Povos Indígenas. Os

registros documentais são de grande valia para aqueles que procuram uma melhor acuidade na

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elaboração de propostas ou, até mesmo, para a construção de um trabalho acadêmico

informativo ou que possa subsidiar políticas públicas sobre o assunto.

A dimensão da discussão sobre atividades turísticas nas terras indígenas transpõe os

limites conceituais do pesquisador, chegando ao limiar da privacidade das pessoas residentes

nas aldeias, ou seja, as abordagens resumem-se à quantificação. Observa-se uma grande

dificuldade de consenso, justificado pela desconectividade entre o idealismo daqueles que

elaboram propostas ecoturísticas e maioria dos indígenas residentes nas aldeias. Por um lado

subsiste a dúvida associada ao receio, por outro, a aventura por caminhos desconhecidos que

aportarão numa autonomia financeira. Esta ideologia financeira é a principal força motivadora

para a exploração turística.

3.3.1 Degradação ambiental

Do ponto de vista legal brasileiro, a preocupação com o ambiente natural transcende

a nossa contemporaneidade. A primeira Constituição do Brasil, de 1824 - Constituição

Imperial Brasileira - apresentava vários princípios os quais davam garantias aos proprietários

possibilitando, com isso, um maior rigor na questão ambiental. Em 1830 foi promulgado o

Código Penal do Império, reservando o artigo 178 para a repreensão a danificação dos bens e

ambientes públicos de lazer. Neste mesmo período monárquico, o Código Comercial, Lei nº

601/1850, estabelecia sanções administrativas e penais para quem derrubasse árvores e

realizasse queimada ilegal. Foi a primeira Lei de Terras que assegurou uma maior proteção

ambiental ao país, já que tratou do princípio da responsabilidade por dano ambiental. Instituiu

poderes aos delegados e subdelegados de polícia a fim de que estes realizassem o trabalho de

fiscais e conservadores das matas.

Em nossa atualidade, a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, dispõe sobre a Política

Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação e dá outras

providências. É a legislação que estabelece os princípios, objetivos e diretrizes sobre a

Política Nacional de Meio Ambiente, incluindo penalidades pelo descumprimento das

medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental.

No artigo terceiro dessa norma há uma definição de degradação da qualidade

ambiental sendo caracterizada pela alteração adversa das características do meio ambiente e,

de forma a prevenir esses danos ou minimizar, o artigo 10 estabelece a necessidade de estudos

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dos impactos ambientais sobre o uso econômico dos recursos naturais, com a clara

regulamentação dada pela Resolução nº 237/Conama, de 19 de dezembro de 1997.

O atual modelo de desenvolvimento desigual, excludente e limitante dos recursos

naturais, tem levado à produção de níveis alarmantes de poluição do solo, ar e água,

destruição da biodiversidade animal e vegetal e ao rápido esgotamento das reservas minerais e

demais recursos não renováveis em praticamente todas as regiões do globo. Esses processos

de degradação têm sua origem em um modelo complexo e predatório de exploração e uso dos

recursos disponíveis, onde conceitos como preservação, desenvolvimento sustentável,

igualdade de acesso aos recursos naturais e manutenção da diversidade das espécies vegetais e

animais estão longe de serem realmente assumidos como princípios básicos norteadores das

atividades humanas.

Nas áreas urbanas, os resíduos provenientes da queima do petróleo, fonte principal

de energia para mover veículos, máquinas e equipamentos, e gases provenientes da atividade

industrial, podem ser liberados para a atmosfera, com riscos de poluir o ar com substâncias

potencialmente nocivas aos seres humanos e demais seres vivos. Resíduos industriais, águas

servidas (aquela que foi utilizada em residências) e os esgotos domésticos ainda são

despejados diretamente nos cursos de água em grande parte do país. Apesar das medidas

mitigadoras de impactos ambientais introduzidas nas últimas décadas, os resíduos sólidosainda se acumulam em lixões em grande parte das cidades.

No meio rural, o uso indiscriminado de agrotóxicos coloca em risco a vida de

agricultores, seus familiares, consumidores dos produtos agrícolas, solo, água e toda a cadeia

de organismos vivos que habitam esses meios. Fertilizantes utilizados nas áreas agrícolas

podem potencialmente provocar processos de eutrofização (elevação da quantidade de

nutrientes presentes na água) dos mananciais e a contaminação do meio ambiente, como um

todo, por metais pesados. Dejetos provenientes da produção animal contaminam os rios ecórregos, quando neles descarregados diretamente.

A destruição da cobertura vegetal, a erosão dos solos, as queimadas, a superlotação

das pastagens e o conseqüente processo de assoreamento dos cursos d’água são problemas

comuns.

Mesmo considerando os avanços tecnológicos em relação à preservação do meio

ambiente, os problemas ambientais ainda existentes colocam para a geração atual algumas

questões de solução bastante complexas que comprometem a sobrevivência das futuras

gerações.

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O termo degradação ambiental, entre outras denotações, abarca qualquer tipo de

destruição, destituição, infâmia ou dano ao patrimônio material e imaterial, neste caso, dos

Povos Indígenas.

Foi exemplificado, anteriormente, no boletim nº 50 da Embrapa, sobre as

degradações em razão da visitação nas terras indígenas de forma desordenada e sem o devido

controle sobre suas conseqüências. Além desses impactos, outros podem ocorrer, por

diferentes razões, entre elas a facilidade de acesso a locais que há, como já foi dito, uma

riquíssima biodiversidade, entre elas: atividades madeireiras ilegais, pesca predatória,

apropriação de conhecimentos tradicionais (rituais, pinturas, grafismos, etc.), apropriação de

toda a espécie de riqueza natural, banalização nas tradições dos Povos Indígenas, drogas,

bebidas, doenças (incluindo as ocasionadas pelos hábitos alimentares), entre outras, as quais

merecem o devido destaque em face de sua direta relação com o tema.

O processo de transformação cultural nas terras indígenas brasileiras ocorre há mais

de quinhentos anos, portanto, não se trata de uma abordagem preservacionista. O retrospecto

das experiências anteriores mostram que uma aceleração nesse processo de adaptação cultural

traz conseqüências desastrosas e irreversíveis. Pode-se inferir o estudo de caso dos índios

Kayapó, estado do Pará, especificamente na região da Aldeia Kikretum, que viveu o apogeu

da exploração garimpeira na década de 1980, momento no qual foi injetada uma significativaquantidade de capital. Em 2007, pouco tempo depois, a Aldeia apresenta fortes sinais de

degradação: doenças, como cárie dentária, obesidade e alcoolismo; auto-estima negativa;

referencial de capitalização sobrepondo a potencialidade de suas atividades outrora

tradicionais, entre muitas situações degenerativas.

A degradação cultural, aparentemente sutil e inofensiva, pode levar comunidades

indígenas ao limite do inesperado, como o exemplo de Cunhã-Sapucaia, Terra Indígena que

quase foi palco de uma guerra interna que teve como fato gerador o assédio financeiro de umempresário do ramo turístico feito a algumas lideranças.

É importante lembrar que a degradação ambiental, até por uma questão conceitual de

ambiente, não se restringe às riquezas naturais, mas pela sua interrelação e interdependência

com o homem. Ocorre uma perceptível insensibilidade de boa parte dos turistas quando nos

grandes centros de visitação nas diferentes regiões do Brasil (praias, monumentos, prédios

históricos, balneários, etc.). O rastro de poluição exige do poder público um grande esforço,

visando à conservação e limpeza dos locais. O comportamento dos consumidores do turismo

está diretamente relacionado a sua diversão e lazer e ele paga por isso. Estratificando-se a

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categoria de turismo (aventura, observação, etc.) pode-se mensurar a tolerância do meio ao

número de visitantes e, conseqüentemente, viabilizar os instrumentos necessários para sua

realização. Por exemplo, um passeio no Parque Nacional de Foz do Iguaçu, estado do Paraná,

exige uma equipe de trabalhadores que são encarregados da limpeza, conservação, logística,

fiscalização e monitoramento. Neste caso, o Estado brasileiro, através de seu órgão federal

responsável pelos parques nacionais, terceiriza a visitação como forma de atender a demanda

de mais de um milhão de visitantes/ano. Mesmo assim, observa-se a dificuldade em educar os

visitantes para um comportamento ideal, com a devida responsabilidade ao ambiente. Em

locais como Bonito, no estado do Mato Grosso do Sul, onde existe maior rigidez na

fiscalização e educação, pequenos detalhes passam desapercebidos, como uma “bituca” de

cigarro, uma lata ou garrafa, uso de bebidas alcoólicas, alimentação aos animais, papel e

demais resíduos sólidos, além do uso de produtos químicos (protetores solares, maquiagens e

outros cosméticos). Numa simples passada de mão, se destrói quinhentos anos que levaram

para a formação de uma estalagmite, por exemplo.

O cenário das terras indígenas é completamente diferente. É impossível comparar

uma visita numa aldeia com o turismo convencional, até naquele denominado turismo étnico.

Essa diferença não se resume ao componente antrópico, mas, essencialmente nas relações que

são estabelecidas do residente com seu meio. Esse meio é a vida do indígena em toda suaplenitude, do despertar ao adormecer, é a intimidade do ser que estaria sendo violada, nos

seus aspectos mais subjetivos e imperceptíveis. Mesmo que ocorra o consentimento das

lideranças, ele não expressará o sentimento individual ou do núcleo familiar. Não se pode

“limpar” um desafeto, uma palavra, uma perspectiva criada. Aqui reside o grande risco de

degradação cultural e socioambiental que pode ser irreversível. Como foi dito antes, não é

uma ideologia objetivando preservar a cultura tradicional, mas a garantia dos direitos

individuais – o verdadeiro respeito à alteridade.

3.3.2 Biopirataria e pesquisa científica

As questões referentes ao acesso a recursos genéticos e de proteção aos

conhecimentos tradicionais vêm sendo discutidas no âmbito internacional desde a inserção

brasileira no contexto da Convenção sobre Diversidade Biológica  –  CDB que foi assinada

pelo Presidente da República durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente

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e Desenvolvimento - CNUMAD, em junho de 1992, e promulgada através do Decreto nº

2.519, de 17 de março de 1998. Sendo um tratado internacional do qual o Brasil é signatário,

tendo acatado seus princípios e determinações, deve segui-los e implementá-los. O Artigo 8(j)

da CDB obriga os países participantes à "respeitar, preservar e manter o conhecimento,

inovações e práticas das comunidades locais e populações indígenas com estilos de vida

tradicionais relevantes à conservação e utilização sustentável da diversidade biológica", bem

como "encorajar a repartição justa e eqüitativa dos benefícios oriundos da utilização desse

conhecimento, inovações e práticas".

Uma das grandes preocupações na exploração de atividades turísticas é a

possibilidade involuntária de se abrir precedentes para atividades ilícitas, especialmente a

biopirataria. É importante destacar alguns marcos legais sobre a proteção da biodiversidade,

inclusive aqueles assumidos pelo governo brasileiro em tratados internacionais como o

Cartagena, celebrado em Montreal, em janeiro do ano de 2000.

O Protocolo de Cartagena foi promulgado pelo Governo brasileiro através do

Decreto 5.705, de 16 de fevereiro de 2006. O texto desse Decreto reconhece e incorpora para

que seja executado integralmente no âmbito da legislação nacional o importante tratado,

resultado de discussões anteriores, que trata da Biossegurança da Convenção sobre a

Biodiversidade Biológica.Os princípios e as diretrizes para implementação da Política Nacional da

Biodiversidade já haviam sido instituídos através do Decreto nº 4.339, de 22 de agosto de

2002, considerando os compromissos assumidos pelo Brasil na Convenção da Diversidade

Biológica, as demais normas vigentes relativas à biodiversidade e o desenvolvimento de

estratégias, políticas, planos e programas nacionais de biodiversidade enquanto um dos

principais compromissos assumidos pelo país enquanto membro da CDB. Esse Decreto abriga

em documento anexo o texto integral da Política Nacional da Biodiversidade, explicitandoseus princípios, diretrizes e objetivos, além de dispor sobre seus componentes e respectivos

objetivos específicos.

O segundo componente da Política Nacional da Biodiversidade especifica as

diretrizes e objetivos específicos para conservação das áreas protegidas. Seu objetivo geral é

promover a conservação, in situ e ex situ, dos componentes da biodiversidade, incluindo

variabilidade genética, de espécies e de ecossistemas e dos serviços ambientais mantidos pela

 biodiversidade. A primeira diretriz é a “conservação de ecossistemas”, através da “promoção

de ações de conservação in situ da biodiversidade e dos ecossistemas em áreas não

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estabelecidas como unidades de conservação, mantendo os processos ecológicos e evolutivos

e a oferta sustentável dos serviços ambientais”. Nessa perspectiva, são objetivos específicos

dessa diretriz, dentre outros, promover e apoiar estudos de melhoria dos sistemas de uso e de

ocupação da terra, assegurando a conservação da biodiversidade e sua utilização sustentável,

em áreas fora de unidades de conservação de proteção integral e inclusive em terras indígenas,

quilombolas e de outras comunidades locais, com especial atenção às zonas de amortecimento

de unidades de conservação.

O Programa Nacional da Diversidade Biológica – PRONABIO, instituído no âmbito

do Decreto nº 4.703, de 21 de maio de 2003, possui o objetivo principal de promover parceria

entre o Poder Público e a sociedade civil na conservação da biodiversidade, utilização

sustentável dos seus componentes e repartição justa e eqüitativa dos benefícios decorrentes

dessa utilização. É um importante instrumento na implementação da CDB. A CONABIO tem

um relevante papel na discussão com a sociedade civil, através de debates e consultas públicas

visando alcançar o principal objetivo da Política Nacional de Biodiversidade, que é a

promoção da efetiva conservação da diversidade biológica brasileira.

Mesmo com o significativa quantidade de normas legais, por várias razões, entre elas

a dimensão de nossas fronteiras, a dificuldade na execução de políticas de fiscalização, a

biopirataria é um fato inegável que ocorre, principalmente na região da Amazônia brasileira.Conforme reportagem jornalística18 que narra entrevista realizada, no mês de

novembro de 1998, com o Coordenador da Coordenação das Organizações Indígenas da

Amazônia Brasileira - COIAB, o processo de ingresso de pesquisadores e biopiratas estava

fora de controle. Segundo Sebastião Machineri, “ocorre roubo de material genético de plantas,

animais e fungos”. Ainda na referida reportagem, há uma lista de medicamentos patenteados

por empresas estrangeiras cujos princípios ativos são derivados de plantas e animais da região

amazônica.Em outra matéria divulgada no Jornal do Brasil, em fevereiro de 2006, o pesquisador

Adalberto Val, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), informa que 78%

(setenta e oito por cento) dos estudos na região amazônica são produzidos por estrangeiros.

De acordo com as informações do presidente da CPI da biopirataria, Antônio Carlos Mendes

Thame, em entrevista ao Jornal do Brasil de março de 2006, “os estrangeiros entram no país,

coletam material e vão embora, sem serem importunados”. Cita o caso da ACT, cujo pai do

18 - Cópia da entrevista publicada em jornal, anexada ao Processo Funai 08620.0668/06. 

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representante da empresa no Brasil é um biólogo que registrou princípio ativo do Captoril (o

nome comercial do medicamento no Brasil é Capotem), utilizado para controle de pressão

arterial. O princípio ativo é retirado do veneno da jararaca. O laboratório estadunidense

Squibb se apropriou da patente e chega a faturar 4 bilhões de dólares/ano (comparando, isso

significa oitenta vezes o orçamento anual da Funai) com o medicamento. A ACT foi proibida

de ingressar somente na Terra Indígena Parque do Xingu, conforme solicitação do Procurador

Federal Mario Lúcio Avelar, acusada pela prática de biopirataria e de receber financiamento

de empresas ligadas à produção de medicamentos e cosméticos.

Nos autos do relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar o

tráfico de animais e plantas silvestres brasileiros, a exploração e comércio ilegal de madeira e

a biopirataria no país, observa-se a quantidade de denúncias e a abrangência do tema: extração

e transporte ilegal de material madeireiro, tráfico de animais, tráfico de drogas, entre outras

ilicitudes. Só para se ter uma idéia, o tráfico de animais silvestres movimenta cerca de 20

bilhões de dólares por ano, no mundo, sendo a terceira atividade ilegal mais lucrativa. Desse

total, 10% ocorrem no Brasil.

As populações indígenas residentes na região amazônica estão geograficamente mais

vulneráveis a esse tipo de situação, tendo em vista a dificuldade das instituições públicas em

manter um programa eficaz de fiscalização e proteção.Recentemente, a Funai recebeu o Memorando nº 110/SEAS, de 9 de agosto de 2006,

da Administração Executiva de Manaus para manifestação a respeito do pedido de ingresso de

  pessoas no projeto “Turismo científico e a etno-conservação da Bacia do Rio Negro”. O

projeto, entre outras situações propõe atividades de pesquisa, sem cumprir as prerrogativas da

Instrução Normativa nº 001/95, a qual disciplina o ingresso em terras indígenas com a

finalidade de desenvolver pesquisa científica. Situação análoga, estava ocorrendo na região

norte do estado de Roraima, com um grupo de oito pesquisadores estrangeiros que estavam hámais de seis meses na região da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, na tentativa de executar

um projeto de pesquisa, para isso estavam oferecendo R$ 30,00 (trinta reais) para cada

indígena que colaborasse no mapeamento de uma espécie de fauna. Neste último caso,

inexistia pedido formal à Funai e, graças à distância, poderiam permanecer no local por muito

tempo. Na Terra Indígena Yanomami foram encontrados pesquisadores de diferentes países

que, a convite de missões religiosas, permanecem na região. É possível adquirir, pela Internet,

amostras sanguíneas de indígenas Yanomami, oferecida por uma empresa estrangeira.

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3.3.3 Sobreposições de unidades de conservação em terras indígenas19 

Segundo o levantamento do Instituto Socioambiental (Ricardo, 2000) existem 55

(cinqüenta e cinco) sobreposições entre unidades de conservação e terras indígenas no Brasil.

Destas, 39 (trinta e nove) são de interesse unidades de conservação federais, 18 (dezoito)

unidades de conservação estaduais, sendo que 2 (duas) envolvem uma tripla sobreposição:

Terra Indígena, unidade de conservação federal e UC estadual. O órgão ambiental federal

reconhece a existência de uma sobreposição nos casos onde a unidade de conservação se

sobrepõe a uma terra indígena homologada. Nos outros casos a eficácia jurídica da

demarcação da terra indígena é contestada com base na falta do decreto de homologação:

assim, pela hierarquia das fontes jurídicas, o decreto de criação da unidade de conservação,

assinado pelo Presidente da República, prevaleceria sobre a Portaria de demarcação da Terra

Indígena, assinada pelo Ministro da Justiça.

A questão da sobreposição entre unidades de conservação e terras indígenas na

legislação brasileira é controversa e ainda não foi solucionada. Em muitos casos ela tem

proporcionado conflitos no que se refere às reivindicações territoriais dos Povos Indígenas e a

implementação de políticas de conservação. Entre os casos mais conhecidos está o do Parque

Nacional do Monte Pascoal e dos índios de etnia Pataxó, no estado da Bahia. Decorridos 38

anos da criação do Parque Nacional Monte Pascoal, os indígenas Pataxó, reivindicando

direitos territoriais tradicionais, depois de vários anos de lutas políticas e legais, ocuparam a

área do Parque Nacional, na tentativa de forçar as instituições nacionais a reconhecerem

aqueles que consideram seus direitos territoriais garantidos pela constituição.

A figura jurídica de dupla afetação determina a gestão territorial compartilhada pelos

Povos Indígenas, Ibama e Funai. Este termo é recorrente nos Decretos homologatórios como

os da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e Terra Indígena Inawébohonã. A controversaproposta apresentada nos atos homologatórios exige um enorme custo para as instituições

governamentais. A operacionalização das gestões compartilhadas compreende, entre outras

situações, a realização de inúmeras reuniões, apresentações e fórum de discussões com

elevadas despesas para os cofres da União.

19 Sobre os conceitos e a problemática do tema, sugere-se a leitura do artigo disponível no domínio

<http://www.socioambiental.org/pib/portugues/quonqua/ondeestao/ucs.shtm>, do Instituto Socioambiental(Isa) e da publicação “Terras Indígenas e Unidades de Conservação da Natureza” –  o desafio dassobreposições, organizado por Fany Ricardo (São Paulo, p. 2004).

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Como exemplo, o caso mais recente sobre o tema que foi cenário na mídia nacional.

O Parque Nacional do Monte Roraima possui uma área de 116.000 hectares e foi criado

durante o Governo José Sarney, através do decreto n° 97.887, de 28 de junho de 1989. Seu

território abrange uma área de floresta tropical e uma parte do cerrado do nordeste do estado

de Roraima, ao extremo norte da Amazônia brasileira, na fronteira com a Guiana e a

Venezuela. A área do Parque é situada integralmente dentro dos limites da Terra Indígena

Raposa Serra do Sol, demarcada Terra Indígena pelo Ministério da Justiça, através da portaria

n° 820, de 11 de dezembro de 1998. Com uma área total de 1.678.800 hectares, a Raposa-

Serra do Sol è uma área continua habitada pelos Povos Indígenas Macuxi, Wapichana,

Ingarikó, Taurepang e Patamona.

Após 30 anos de conflitos, de um lado os movimentos e organizações pró-indígenas,

inclusive do órgão federal indigenista, a Funai e, de outro, os latifundiários e fazendeiros,

criadores de gado, agricultores e garimpeiros, além de outros setores políticos e econômicos,

entre os quais o próprio Governo do estado de Roraima, a Terra Indígena Raposa Serra do Sol

foi homologada em 15 de abril de 2005, conforme a Portaria Presidencial em 15 de abril de

2005, nos termos do Decreto nº 534 de 13 de abril de 2005. Inconformados com a

determinação, os grupos contrários às decisões governamentais ingressaram com vários

pedidos judiciais. A disputa terminou no dia 19 de março de 2009 com a decisão do SupremoTribunal Federal que deu parecer favorável a manutenção da demarcação da Terra Indígena

em área contínua, mantendo-se a proposta de gestão compartilhada.

Durante a primeira reunião realizada na Comunidade Ingarikó, Terra Indígena

Raposa Serra do Sol, no extremo norte do estado de Roraima, foram utilizados mais de R$

50.000,00 (cinquenta mil reais) somente para uma apresentação no ano de 2005. Desde então,

outras reuniões já foram realizadas, deslocamentos de indígenas para Brasília e técnicos e

consultores ao Parque Nacional Monte Roraima com vultosos gastos públicos. Na prática degestão, não houve alteração e apenas uma expectativa da população Ingarikó de que algo

mudará em suas práticas sociais.

O que se pretende colocar em discussão é o objetivo na criação e/ou existência de

uma Unidade de Conservação, sua categoria e forma de gestão. Nos casos de Parques

Nacionais sobrepostos, além das situações divergentes sobre o uso da terra, depara-se em

alguns casos especiais, como o fomento de propostas ecoturísticas como forma de

preservação ambiental. Já foi abordado aqui sobre o termo ambiente e sua abrangência. Um

fato como esse gera uma situação complexa de ser gerenciada, pois, os Povos Indígenas

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podem usufruir de todas as riquezas naturais (caça, pesca, plantio e atividades tradicionais),

conforme seus direitos constitucionais.

Não há dúvida de que os Povos Indígenas apresentam um potencial muito superior de

habilidades e conhecimentos para a preservação ambiental, conforme registro em renomadas

publicações científicas nacionais e internacionais. Mas como conciliar esse potencial com

função “gestora compartilhada”? 

Um outro recorte para essa análise poderia ser o Parque Nacional Monte Pascoal, no

sul do estado da Bahia, que foi palco de sérias divergências, principalmente na sua retomada

pelo Povo Pataxó. Durante a gestão do Ibama, o Parque recebia visitações. Com a retomada e

a estrutura montada, os indígenas permitem o ingresso de visitantes, também mediante

cobrança de ingresso. Existe um Grupo de Trabalho (GT) interinstitucional de gestão

ambiental participativa do Parna Monte Pascoal e Terras Indígenas do seu entorno, desde o

ano de 2005. Mas, para conciliar os interesses gerais na tentativa de uma gestão harmônica,

elevam-se os custos operacionais que poderiam ser utilizados para a realização de atividades

inerentes ao objetivo do Parque. Situação semelhante tende a ocorrer no Monte Roraima

sobreposto à Terra Indígena Raposa Serra do Sol e, também, no Parque do Araguaia na Terra

Indígena Inãwébonona, Ilha do Bananal.

A necessidade de discussão, neste trabalho, sobre as áreas sobrepostas ocorre a partirda existência ou propostas de exploração turística, sob o argumento da preservação ambiental.

Novamente subsiste a incompatibilidade, mesmo com o nome de gestão compartilhada.

Se há espaço para encaminhamentos mais práticos e econômicos para o erário

público, a maneira mais viável de preservar as unidades, em consonância com as prerrogativas

 jurídicas da legislação ambiental e garantindo os direitos constitucionais dos Povos Indígenas,

no que se refere ao usufruto exclusivo sobre as riquezas naturais existentes em suas terras, a

proposta mais coerente seria de delegar a função gestora das áreas sobrepostas às própriascomunidades indígenas, incluindo as funções remuneradas de chefia da Unidade de

Conservação e demais cargos e instrumentos (material permanente e consumo) necessários à

execução das atividades inerentes a esse trabalho. Chefias que, evidentemente, contariam com

o devido apoio logístico dos órgãos ambientais e indigenistas. Ou seja, seriam

instrumentalizados para a gestão de sua terra a qual cumpriria, simultaneamente, a função

conservacionista.

Existe um exemplo prático de gestão territorial executado exclusivamente pelos

indígenas na Terra Indígena Waimiri Atroari, região norte do Brasil, especificamente no

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subprograma de proteção ambiental, como ação mitigadora de um empreendimento da

empresa Eletronorte.

O quadro de servidores da Funai abriga uma quantidade significativa de indígenas

(cerca de 30%) de diferentes etnias, em muitos casos, ocupando funções comissionadas. De

forma semelhante, não há impedimento legal para que o Ibama, Instituto Chico Mendes de

Conservação da Biodiversidade e o MMA tenham indígenas em seus quadros de servidores.

Essa proposta organizacional não suprime o elemento jurídico de dupla afetação e da

gestão compartilhada, ou seja, não implica na criação de novas normas legislativas. Além

disso, proporcionará uma redução substancial nos custos de gerenciamento das unidades de

conservação sobrepostas, o objetivo da Unidade será cumprido de uma forma mais harmônica

e eficaz do que as atuais propostas de gestão. A disposição geográfica das aldeias no território

nacional, principalmente em áreas de difícil acesso, permite um elevado grau de superioridade

na abrangência das ações de proteção.

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4 CONCLUSÕES

4.1 As terras indígenas como categoria diferenciada

É imprescindível a compreensão de que as terras indígenas diferem completamente

das demais áreas protegidas, especialmente sobre o potencial para a exploração de atividades

turísticas. Essa percepção deve estar presente em todos momentos em que se projete alguma

idéia que envolva comunidades tradicionais, pois, mesmo com a quantidade de normas legais,

existem elementos sutis os quais não são perceptíveis na análise jurídica que é fundamentada.

A caracterização do que é do outro, no que se refere a elementos imateriais é algo que exige

profundos estudos, com o foco da abordagem na antropologia e sociologia.

As terras indígenas não são locais de lazer, de passeio, “de pagar e usufruir”, são

locais de moradia, trabalho e de interação social de milhares de pessoas. Por mais redundante

que seja essa exposição, faz-se necessária porque no imaginário de muitas pessoas,

principalmente por influência de imagens televisivas, ocorre a necessidade de ver o exótico

como um objeto de lazer, como mais um objetivo turístico a ser realizado. Só para

exemplificar, no livro chamado “1000 Lugares Fantásticos no Brasil”, de autoria do

apresentador da TV Globo, Zeca Camargo, a Terra Indígena Parque do Xingu é

genericamente considerado como roteiro turístico sistemático. É preciso deixar claro que o

fato de se entrar numa aldeia pode ser considerado como um ato de invasão de privacidade e,

por vezes, pode consistir em ilegalidade. Compete aos órgãos que executam a política

indigenista estabelecer e fazer valer os direitos desses Povos que foram e continuam sendo

vítimas de exclusão, considerando os moldes da atual política social brasileira.

4.2 A importância de um sistema de informações sobre ecoturismo indígena

Durante a pesquisa, observou-se a inexistência de consenso entre as comunidades

indígenas sobre a realização de atividades turísticas, inclusive dentro das mesmas aldeias,

além disso, percebeu-se, entre outros fatores, a existência de muitas dúvidas e receios quanto

à possibilidade de regulamentação de atividades turísticas.

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A incerteza a respeito da temática do turismo quando nas terras indígenas não é um

sentimento unilateral dos grupos tribais, mas, principalmente das instituições que apresentam

projetos sem uma avaliação mais criteriosa, através de estudos analíticos e transversais no

campo do conhecimento científico.

Por um lado há o receio de que ao se fazer uma abertura generalizada para a

realização de atividades ecoturísticas pode-se incorrer num caminho sem volta para uma série

de expropriações dos recursos naturais dos indígenas e do próprio patrimônio da União, como

no caso da extração ilegal de madeiras e o garimpo. Além disso, outras situações são

possíveis, como: a retirada de materiais minerais; uso da terra nas áreas de fronteira para

descaminho de combustível, tráfico de armas e drogas; uso de material genético; uso de

imagens para fins indevidos; pesquisas diversas para fins comerciais; entre tantos cenários

negativos que podem colocar em risco a integridade física, social e cultural. Por outro lado,

não se pode tolher a possibilidade dos Povos Indígenas em obter recursos para a satisfação de

suas necessidades. Foi possível a observação de empreendimentos de sucesso que são

  justamente aqueles onde existe o controle do uso dos recursos naturais, com a intervenção

governamental e sociedade civil, que trazem benefícios sociais e, ao mesmo tempo,

resguardam os seus direitos exclusivos.

A sistematização dos dados coletados na formação do Processo Funai 08620.0668/06e a análise documental possibilitaram, entre outras coisas, o resgate de um quantitativo de

material sobre o tema turismo em terras indígenas brasileiras que apresenta-se como um

instrumento fundamental para o início de trabalhos e pesquisas sobre o tema. Esses

documentos são uma rica fonte de informações, além de estudo de casos que relatam a

complexidade do assunto e a forma como foi abordado ao longo dos últimos anos pela

Fundação Nacional do Índio, indígenas, órgãos governamentais e não governamentais.

4.3 A responsabilidade da União, dos estados, municípios e sociedade civil

Como foi mencionado anteriormente, as terras indígenas são propriedades do Estado

brasileiro e o dever de zelar pelo patrimônio nacional não é exclusividade desta ou daquela

instituição. Um dos gargalos observados na pesquisa trata essencialmente da definição de

papéis quando se refere a propostas sobre a execução de projetos de ecoturismo nessas Áreas

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Protegidas. Tanto os grupos tribais quanto organizações privadas e governamentais

interessadas em discutir o assunto ou em apresentar propostas passam por uma experiência

desagradável de percorrer um verdadeiro “circuito” de repartições como: órgãos ambientais

locais, prefeituras, secretarias de turismo, organizações indígenas e indigenistas, enfim,

inexiste um ponto de partida claro e definido como num processo de licenciamento ambiental,

por exemplo, que o interessado tem um órgão licenciador e procedimentos definidos,

conforme o caso.

A Fundação Nacional do Índio é o órgão do governo brasileiro que estabelece e

executa a política indigenista no Brasil, dando cumprimento ao que determina a Constituição

de 1988. Compete à Funai promover a educação básica aos índios, demarcar, assegurar e

proteger as terras por eles tradicionalmente ocupadas, estimular o desenvolvimento de estudos

e levantamentos sobre os grupos indígenas. A Fundação tem, ainda, a responsabilidade de

defender as comunidades indígenas, de despertar o interesse da sociedade nacional pelos

índios e suas causas, gerir o seu patrimônio e fiscalizar as suas terras, impedindo as ações

predatórias de garimpeiros, posseiros, madeireiros e quaisquer outras que ocorram dentro de

seus limites e que representem um risco à vida e à preservação desses Povos.

No entanto, a realização de atividades voltadas para a execução da política

indigenista brasileira não é prerrogativa somente da Funai. São mais 16 Ministérios quediretamente ou através de órgãos descentralizados, possuem orçamentos20 destinados a

questões que envolvem os Povos Indígenas e participam dessas ações, destacando o Instituto

Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais, o recém criado Instituto Chico Mendes

de Conservação da Biodiversidade, o Ministério do Turismo, a Embratur, o Ministério do

Desenvolvimento Agrário, o Ministério da Cultura, O Ministério de Minas e Energia, o

Ministério da Educação, o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, a

Polícia Federal, entre outros.Observou-se que o modelo de ecoturismo que apresentou características de

sustentabilidade para a população local indígena obedeceu a diretrizes que, mesmo sem uma

norma legal regulamentada, partiram dos indígenas interessados para o órgão local da Funai e

assim, de forma sucessiva, estabelecendo parcerias, dentro da esfera de ação de cada

instituição participante. A definição de papéis, especialmente dos órgãos públicos, é de

fundamental importância para que a responsabilidade passe de uma esfera de exclusividade

20 Dados disponíveis no domínio do Governo Federal brasileiro na world wide web: Plano Plurianual  – PPA

2009/2011. 

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para o coletivo, permitindo a contribuição técnica e científica da sociedade civil, em todas as

fases do processo, inclusive no que se refere a denúncias sobre ilícitos que tenham como pano

de fundo a associação da imagem dos indígenas e suas comunidades tradicionais.

4.4 O paradigma do ecoturismo como atividade sustentável para os Povos Indígenas

A demanda pela realização de atividades turísticas nas terras indígenas brasileiras,

quando sugerido por empreendedores não indígenas, fundamenta-se, essencialmente, na

lógica capitalista brasileira, ou seja, obter o maior lucro com o menor custo. O caso dos Povos

Tenharim e Mura e a situação de denúncias contra a exploração da imagem de indígenas

divulgadas em domínio da world wide web, foram dois claros exemplos que colocaram em

xeque sobre o que ocorre quando o empreendedorismo exógeno, sem a devido regramento,

pode causar de danos sociais e culturais a determinadas comunidades indígenas.

Sob o prisma do paradigma do desenvolvimento sustentável, o ecoturismo nas terras

indígenas deve ser uma prática que possa compatibilizar as reais necessidades dessa atividade

para a comunidade local, ao mesmo tempo equilibrar o uso do ambiente natural, considerando

a dimensão ecológica, social, cultural e econômica.

A prática de atividades ecoturísticas nas terras indígenas não pode abrir mão dos

princípios da dinâmica social da comunidade receptora que inclui o uso dos recursos naturais

que serão o ponto focal do visitante. Nos casos observados, muito além da beleza cênica dos

ambientes das aldeias, esse foco, essa curiosidade pelo diferente está justamente no modo de

vida das populações indígenas.

No estudo de caso do grupo indígena envolvido no projeto Xingu Refúgio

Amazônico a situação é mais delicada e com um foco nada sustentável, pelo contrário,

proporciona a degradação social uma vez que o executor do projeto é não indígena e vende a

imagem com um diferencial de que os índios são selvagens, andam completamente nus, e

vivem exclusivamente da caça e coleta. O empresário mantém um pequeno grupo de

indígenas na sua propriedade, pagando uma pequena quantia em dinheiro pelo trabalho de

exibição a turistas estrangeiros. Esse projeto vai na contramão dos princípios de

sustentabilidade, do respeito à alteridade e da dignidade do Povo Indígena enquanto cidadão

brasileiro.

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Por outro lado, o caso da Reserva da Jaqueira, propõe, na sua essência, arranjos

produtivos que contribuem para o dinamismo econômico local da comunidade indígena

participante do trabalho e da sinergia econômica para o município no qual está inserido, sem

ter prejuízos de qualquer ordem. A sustentabilidade ecológica está garantida, uma vez que a

proposta dos indígenas fundamenta-se na manutenção e conservação do ambiente onde são

realizadas as práticas ecoturísticas que são distantes geograficamente do local onde residem.

Recebem os benefícios socioeconômicos para essa comunidade enquanto receptora de um

segmento de trilha ecológica e etnoturismo, sem a interferência interna do não indígena, pois,

as relações econômicas se resumem ao trajeto da cidade até o acesso na Aldeia que foi

construída pelos índios, exclusivamente para esse fim.

A hipótese de que o turismo apresenta-se genericamente como uma ótima forma de

sustentabilidade econômica para as comunidades indígenas carece de um aprofundamento nas

investigações, visando uma quantificação temporal que demonstre realmente, a longo prazo,

ser uma opção benéfica, uma vez que este trabalho não comprovou tal proposição em todos os

casos.

Evidenciou-se que a superação do paradigma da sustentabilidade reside em

elementos que possam evitar as discrepâncias entre um empreendedor ganancioso para a

verdadeira face de um projeto social, sustentável, de base local e com a equitativa distribuiçãodos benefícios, sem a interferência direta negativa no modo de vida das populações locais.

A prática sustentável de ecoturismo nas terras indígenas requer a manutenção dos

recursos naturais e deve engendrar a necessidade de se controlar o consumismo exacerbado da

população visitante de forma a não colocar em risco a explotação desses recursos ambientais.

Isso requer uma mudança nos processos de produção do produto ecoturístico para as

comunidades indígenas para que sejam obtidos produtos mais duradouros, garantindo o

respeito ao que pertence à comunidade receptora.É possível a realização de atividades ecoturísticas nas terras indígenas, desde que o

projeto seja precedido de um profundo diagnóstico do potencial econômico, incluindo

projeções valorativas e quantitativas, informando sobre os riscos econômicos e socioculturais

a curto, médio e longo prazo, devidamente discutidos e esclarecidos aos interessados

residentes nas comunidades locais. Os projetos devem ainda ser caracterizados pelo respeito

às peculiaridades das distintas sociedades indígenas brasileiras, considerando a intervenção do

órgão indigenista federal em todos os casos, principalmente quando houver risco para a

comunidade indígena.

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5 RECOMENDAÇÕES

5.1 Fórum permanente de discussões

Observou-se que desde as primeiras discussões sobre a possibilidade na realização de

atividades turísticas nas terras indígenas, no início dos anos de 1990, a restrição e pouca

ênfase no tema, considerado-se a quantidade de terras indígenas e unidades descentralizadas

da Fundação nacional do Índio. Ou seja, o assunto permaneceu sutilmente velado.

Foi percebido que os trabalhos das oficinas cumpriram um papel limitado a um

determinado momento ou demanda específica e que não conseguiram atingir objetivos a

médio prazo. A qualificação técnica sistemática de um grupo especializado que possa exercer

a função de multiplicadores para as demais unidades descentralizadas da Funai, em parceria

com órgãos ambientais e de turismo é uma proposta que pode superar os desafios anteriores e

tratar o tema com a propriedade técnica necessária, em todas as fases do processo, desde a

avaliação de viabilidade até o monitoramento dos projetos.

Assim, de forma análoga que foi o Grupo de Trabalho instituído pela Fundação

Nacional do Índio, cujo propósito foi o de realizar estudos sobre a viabilidade de atividades

turísticas nas terras indígenas brasileiras, deve ser constituído um fórum ou setor específico e

permanente para a abordagem sobre o tema, que possa funcionar como um referencial na

Funai para esclarecer aos interessados e estudiosos, além de estabelecer as necessárias

interfaces com os demais órgãos governamentais e não governamentais.

5.2 A definição de propostas e o papel dos executores

Foi discutido sobre a quantidade de instituições que possuem ações voltadas para as

populações indígenas e que isso pode ser uma ótima situação do ponto de vista de recursos

orçamentários e financeiros, pode também se concretizar numa série de divergências em

virtude das distintas missões institucionais dos órgãos federais. No intuito de se evitar a

superposição de ações, entre outros problemas, a Fundação Nacional do Índio deve ser local

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de centralização das propostas ecoturísticas para os Povos Indígenas, devendo assumir o papel

de órgão avaliador e articulador.

Nem todas as propostas de atividades produtivas podem ser consideradas viáveis.

Deve-se considerar a possibilidade de estudo em toda a gama de alternativas de projetos de

sustentabilidade existentes ou que venham a ser criados, os quais poderão conter um maior

grau de benefícios para as comunidades indígenas, com um menor risco de contingência na

sua aplicabilidade e nos resultados esperados. Assim a Fundação Nacional do Índio, em

parceria com órgãos interessados, deve avaliar o contexto socioambiental antes de apresentar

as propostas ás comunidades indígenas

A atual estrutura organizacional da Fundação Nacional do Índio possui três diretorias

e suas respectivas coordenações gerais subordinadas. Após as criteriosas avaliações dos

projetos, sendo a atividade ecoturística considerada como sustentável e potencial fonte de

recursos para a comunidade indígena interessada, as ações e projetos devem ser apropriadas

para execução pela atual Coordenação Geral de Etno-desenvolvimento da Funai.

5.3 Regramento e operacionalidade

O marco legal estabelecido pela Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973, não deixa

dúvidas quanto ao usufruto exclusivo dos Povos Indígenas sobre suas terras e recursos. Esses

direitos exclusivos sobre todas as riquezas naturais existentes nas terras indígenas devem ser

garantidos pelo Estado brasileiro de forma que não haja qualquer tipo de restrição ao pleno

exercício da posse pelos indígenas.

As terras indígenas representam quase 13% da área total do território nacional e

existe uma grande e visível dificuldade de se manter um sistema de fiscalização e proteçãocontra as tentativas de degradação ambiental e usurpação dos recursos desses Povos. Situação

que exige uma série de normas e regras de uso, estabelecidas em Lei e executadas pela Funai,

órgãos ambientais e policiais, não obstante com a intervenção do Ministério Público Federal.

No caso de regulamentação de projetos de caráter ecoturísticos nas terras indígenas é

necessário que se proponha um regramento, uma norma suficientemente clara e que possa ser

cumprida pelos órgãos responsáveis.

Considerando o grau de responsabilidade para a efetivação e respeito às regras quefuturamente venham a ser estabelecidas e que possibilitem a exploração de atividades

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turísticas nas terras indígenas, sugere-se que as normas sejam editadas através de uma

Instrução Normativa Interministerial: Ministério da Justiça, Ministério do Meio Ambiente e

Ministério do Turismo.

No próximo item serão apresentados alguns elementos que são imprescindíveis para

uma normatização: uma minuta de Instrução Normativa.

5.4 Normas preliminares de regulamentação de atividades turísticas nas terras indígenas

brasileiras

1º.  Para fins de normatização, deve-se definir um recorte sobre o que se entende por

atividade turística no interior das terras indígenas, deixando de forma clara, as

categorias de turismo que podem ser realizadas. Como exemplo, o ecoturismo de

observação, no qual o visitante se limita a contemplar as belezas cênicas,

condicionando os registros de imagens às normas estabelecidas na Portaria Funai nº

177, de 16 de fevereiro de 2006, e o material iconográfico deve se sujeitar aos

preceitos estabelecidos nas normas jurídicas referentes aos direitos autorais e uso da

imagem;

2º.  Toda e qualquer exploração de atividades turísticas nas terras indígenas devem ser

propostas e encaminhadas exclusivamente pelos indígenas, sem a intervenção,

participação ou fomento de pessoas estranhas às comunidades, salvo as entidades

governamentais que, após considerar a viabilidade, deverão fornecer os subsídios

necessários à execução dos projetos, sempre acompanhadas pelo órgão federal

executor da política indigenista brasileira – a Funai;

3º.  Devem ser priorizados os projetos idealizados fora das terras indígenas, seguindo-se

os modelos de “aldeias cenográficas”, em parceria com órgãos da União; 

4º.  Todo e qualquer projeto de atividades turísticas só poderá ser viabilizado quando se

localizar significativamente distante da área residencial (incluindo as áreas utilizadas

para atividades culturais, pesca, caça e produção agrícola) das populações indígenas,

em região delimitada e exclusiva pra esse fim;

5º.  Todo e qualquer projeto de atividades turísticas nas terras indígenas só poderá ser

viabilizado após um prévio estudo de impactos ambientais e se enquadrar nos

procedimentos de licenciamento adotados pela Funai exclusivamente para esta

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finalidade, em consonância com a legislação ambiental vigente;

6º.  Todo e qualquer projeto de atividades turísticas nas terras indígenas só poderá ser

viabilizado após um prévio estudo do potencial econômico, incluindo projeções

valorativas e quantitativas (informando sobre os riscos econômicos e sócio-culturais) a

curto, médio e longo prazo, devidamente discutidos e esclarecidos às comunidades por

técnicos qualificados, servidores ou contratados por instituições governamentais,

acompanhados pela Funai;

7º.  No âmbito regimental da Fundação Nacional do Índio, os projetos de atividades

turísticas deverão ser encaminhados para apreciação da Coordenação Geral de Etno-

desenvolvimento (CGEtno/Funai) que, após fundamentar a viabilidade econômica,

deverá encaminhá-lo a Coordenação De Gestão Ambiental (CGGAM/Funai) para os

devidos procedimentos de estudos de avaliação de impacto socioambiental, em

parceria com o órgão licenciador federal;

8º.  Quando o projeto de atividades turísticas envolver mais de um Povo residente na

mesma Terra Indígena, deverão ser procedidas consultas públicas para toda a

população residente, tantas vezes quantas forem necessárias, até o pleno conhecimento

e consentimento das comunidades;

9º.  As terras indígenas submetidas ao regime jurídico de dupla afetação, em virtude dasobreposição de unidades de conservação, as quais subsiste a exploração turística de

visitação, deverão ser adequadas às normas estabelecidas nesta proposta;

10º.  As terras indígenas submetidas ao regime jurídico de dupla afetação, em

virtude da sobreposição de unidades de conservação, as quais se pretende projetos de

exploração de atividades turísticas, deverão cumprir as prerrogativas estabelecidas

nesta Portaria;

11º.  Os projetos de atividades turísticas deverão incluir propostas de garantia aosdireitos individuais e coletivos dos Povos Indígenas, bem como de proteção às

riquezas naturais de usufruto exclusivo das populações indígenas;

12º.  No caso da execução do projeto, todos os visitantes deverão ser

obrigatoriamente cadastrados (nome, endereço, procedência, documentos, entre outros

dados de identificação) antes do ingresso nas terras indígenas, e essa relação deverá

ser disponibilizada à Funai e aos órgãos governamentais de proteção ambiental e

policial. Além disso, deverão assinar um termo de responsabilidade semelhante ao

utilizado na ocasião de estudos para avaliação de impactos ambientais.

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