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Ativismo Judicial - 1ª Edição

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Ativismo Judicial - 1ª Edição

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Sumário

AberturaCréditosDedicatóriaPREFÁCIOOBSERVAÇÕES PROPEDÊUTICASINTRODUÇÃO

1 Justifıcação temática, objeto e fınalidades2 Considerações epistemológicas e metodológicas

CAPÍTULO I - PRESSUPOSTOS TEORÉTICOS

SEÇÃO I - TEORIA DO DIREITO E MODELO DOGMÁTICO

3 O positivismo jurídico em suas linhas gerais4 As críticas à teoria positivista5 Por um positivismo reflexivo e integral

SEÇÃO II - HERMENÊUTICA JURÍDICA

6 Subsunção mecânica e reducionismo interpretativo7 Dos fatos à norma: ceticismo interpretativo8 A moderna Teoria da Interpretação9 Moralismo jurídico e jurisprudência dos valores10 Espaço de interpretação: pluralismo exegético criativo

SEÇÃO III - CONCEITO DE ATIVISMO JUDICIAL

11 O ativismo e o Direito Comparado12 Ativismo e Estado de Direito Democrático: o princípio da separação dos Poderes13 Discricionariedade legislativa e judicial. Interpretação e discricionariedade14 Passivismo, interpretação criativa e ativismo judicial

CAPÍTULO II - O ATIVISMO JUDICIAL À LUZ DO DIREITO CONSTITUCIONALBRASILEIROSEÇÃO I - CARACTERIZAÇÃO DOGMÁTICA DO ATIVISMO

15 Aplicação da Constituição e ativismo16 A categoria retórica das questões políticas17 Os diversos graus de controle judiciário em matéria constitucional18 A vinculação da interpretação ao texto-base19 As exigências sistêmicas: princípios implícitos e nexos funcionais20 A necessária intervenção legislativa para o desdobramento de princípios constitucionais21 A limitação eficacial das normas constitucionais22 Aspectos específicos do controle abstrato de normas

SEÇÃO II - O ATIVISMO NA RECENTE JURISPRUDÊNCIA DO STF

23 Antecedente: a “doutrina brasileira do habeas corpus”24 A aplicação irrefletida da modulação de efeitos temporais25 A construção pretoriana da perda de mandato por desfiliação partidária26 A restrição à nomeação de parentes para cargos de confiança27 A implementação de direitos sociais veiculados por normas de eficácia limitada

SEÇÃO III - OS FATORES DE IMPULSÃO DO ATIVISMO JUDICIÁRIO NO BRASIL

28 O modelo de Estado intervencionista29 A expansão do controle abstrato de normas30 O neoconstitucionalismo e sua fragilidade teorética31 Dilemas institucionais do constitucionalismo brasileiro32 Atividade normativa atípica do STF

CONCLUSÃOBIBLIOGRAFIA

Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira César — São Paulo — SPCEP 05413-909PABX: (11) 3613 3000SACJUR: 0800 055 7688De 2a a 6a, das 8:30 às 19:[email protected]: www.saraivajur.com.br

FILIAISAMAZONAS/RONDÔNIA/RORAIMA/ACRE Rua Costa Azevedo, 56 — Centro Fone: (92) 3633-4227 — Fax: (92) 3633-4782 — ManausBAHIA/SERGIPE Rua Agripino Dórea, 23 — Brotas Fone: (71) 3381-5854/3381-5895 Fax: (71) 3381-0959 — SalvadorBAURU (SÃO PAULO) Rua Monsenhor Claro, 2-55/2-57 — Centro Fone: (14) 3234-5643 — Fax: (14) 3234-7401 — BauruCEARÁ/PIAUÍ/MARANHÃO Av. Filomeno Gomes, 670 — Jacarecanga Fone: (85) 3238-2323/3238-1384 Fax: (85) 3238-1331 — FortalezaDISTRITO FEDERAL SIA/SUL Trecho 2 Lote 850 — Setor de Indústria e Abastecimento Fone: (61) 3344-2920/3344-2951 Fax: (61) 3344-1709 — BrasíliaGOIÁS/TOCANTINS Av. Independência, 5330 — Setor Aeroporto Fone: (62) 3225-2882/3212-2806 Fax: (62) 3224-3016 — GoiâniaMATO GROSSO DO SUL/MATO GROSSO Rua 14 de Julho, 3148 — Centro Fone: (67) 3382-3682 — Fax: (67) 3382-0112 — Campo GrandeMINAS GERAIS Rua Além Paraíba, 449 — Lagoinha Fone: (31) 3429-8300 — Fax: (31) 3429-8310 — Belo HorizontePARÁ/AMAPÁ Travessa Apinagés, 186 — Batista Campos Fone: (91) 3222-9034/3224-9038 Fax: (91) 3241-0499 — BelémPARANÁ/SANTA CATARINA Rua Conselheiro Laurindo, 2895 — Prado Velho Fone/Fax: (41) 3332-4894 — CuritibaPERNAMBUCO/PARAÍBA/R. G. DO NORTE/ALAGOAS Rua Corredor do Bispo, 185 — Boa Vista Fone: (81) 3421-4246 — Fax: (81) 3421-4510 — RecifeRIBEIRÃO PRETO (SÃO PAULO) Av. Francisco Junqueira, 1255 — Centro Fone: (16) 3610-5843 — Fax: (16) 3610-8284 — Ribeirão PretoRIO DE JANEIRO/ESPÍRITO SANTO Rua Visconde de Santa Isabel, 113 a 119 — Vila Isabel Fone: (21) 2577-9494 — Fax: (21) 2577-8867/2577-9565 — Rio de JaneiroRIO GRANDE DO SUL Av. A. J. Renner, 231 — Farrapos Fone/Fax: (51) 3371-4001/3371-1467/3371-1567 Porto AlegreSÃO PAULO Av. Antártica, 92 – Barra Funda Fone: (11) 3616-3666 — São Paulo

ISBN : 9788502098800

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Ramos, Elival da SilvaAtivismo judicial : parâmetros dogmáticos / Elival da Silva Ramos. — São Paulo : Saraiva, 2010.Bibliografia.1. Brasil. Supremo Tribunal Federal 2. Controle da constitucionalidade das leis 3. Jurisdição (Direito constitucional) 4. Poder Judiciário I. Título.

09-07342CDU-342 (81)Índice para catálogo sistemático:1. Brasil: Ativismo judicial: Direito constitucional 342 (81)

Diretor editorial Antonio Luiz de Toledo PintoDiretor de produção editorial Luiz Roberto CuriaAssistente editorial Rosana Simone SilvaProdução editorial Ligia AlvesClarissa Boraschi MariaPreparação de originais Maria Lúcia de Oliveira GodoyArte e diagramacão Cristino Aparecida Agudo de FreitasTavares Produção Gráfica

Revisão de provas Rita de Cássia Queiroz GorgatiAna Maria L. F. BenficaServiços editoriois Ana Paula MazzocoVinicius Asevedo VieiraCapa Ana Dobón

Data de fechamento da edição: 15-1-2010Dúvidas?Acesse www.saraivajur.com.br

Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da Editora Saraiva.A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

DEDICATÓRIA

Frequento a Faculdade de Direito do Largo de São Francisco há mais de trinta e sete anos. Primeiro, na condição dealuno de graduação; depois, na de aluno de pós-graduação; e, finalmente, na de professor de Direito Constitucional.Ao dedicar esta obra à “velha e sempre nova Academia”, destaco-lhe, talvez, a mais importante de suas características:o PLURALISMO. Esse autêntico princípio institucional tem permitido a convivência, sob seu abrigo, de pessoas cominteresses intelectuais distintos, mas, sobretudo, de estudiosos que, tendo o Direito como objeto principal de análise,aprenderam a respeitar as diferentes percepções do fenômeno jurídico.

Partícipes ativos da construção da democracia brasileira, sem abdicar em nenhum instante do ideal de JUSTIÇA, aliinsistimos em estudar seriamente o DIREITO!

PREFÁCIO

A interpretação integra o léxico fundamental do Direito. É no direito em ação — na “law in action”, para falar comRoscoe Pound — que o intérprete se ocupa e se preocupa com a passagem das verba legis para a sententia legis. Estapassagem tem a sua complexidade própria, pois como já observava o jurista romano Celso, entender as leis (scire legis)não é conhecer-lhes as palavras mas sim a sua força e poderio (vim ac potestatem) (Digesto 1.3.17). Por isso mesmo odesafio da interpretação é um tema recorrente da Teoria Geral do Direito, que se renova numa interação entrecontinuidade e mudança, pois a hermenêutica jurídica acaba adquirindo novas configurações por obra dos processosde transformação da sociedade e do Estado. É por esta razão, como aponta Miguel Reale, que cada época “fixa asnormas e os limites da sua exegese do Direito, em função dos valores culturais dominantes” (Miguel Reale, Estudos deFilosofia e Ciência do Direito, São Paulo: Saraiva, 1978, p. 72).

Uma das características do Direito contemporâneo é a crescente complexidade da estrutura normativa dasConstituições. Estas, ao deixarem de ser clássicas Constituições-garantia – que limitavam a matéria constitucional “aoslimites e atribuições respectivas dos Poderes Políticos e aos Direitos Políticos, e individuais dos cidadãos”, pararecorrer à linguagem do art. 178 da nossa primeira Constituição, a Constituição do Império de 1824 — passaram acolocar novos desafios para a interpretação constitucional.

Estes desafios estão ligados à introdução, como matéria constitucional, de princípios, e à diferença que cabe fazerentre princípios e regras. Como explica Zagrebelsky, que integrou e presidiu a Corte Constitucional italiana, e por issotem, neste campo, a experiência da law in action, regras são normas que proporcionam critérios específicos sobrecomo devemos, não devemos ou podemos atuar. Princípios, em contraste, são normas que proporcionam critérios parase tomar uma posição diante de situações concretas. Estas, no entanto, “a priori” são indeterminadas, só adquirindosignificado operativo no momento da sua aplicação a um caso concreto, a elas não se podendo atribuir umadeterminação em abstrato (Gustavo Zagrebelsky, Il diritto mitte, nova ed., Torino: Einaudi, 1992, p. 149). Daí a aberturaao mundo dos fatos e dos valores que os princípios favorecem na passagem, pela interpretação, das verba legis para asententia legis. Isto vem levando a reavaliações críticas do positivismo jurídico, como aponta Carla Faralli ao traçar omapa dos temas com os quais se confronta a Filosofia do Direito Contemporânea. Alexy e Dworkin são exemplos destapostura nas teorias constitucionalistas do Direito (cf. Carla Faralli, A Filosofia Contemporânea do Direito, temas edesafios, São Paulo: Martins Fontes, 2006, cap. I).

Uma das consequências da expansão dos princípios na estrutura normativa das constituições é a de a elas conferir acaracterística de constituições com uma vis directiva. Esta tem como objetivo buscar responder à função promocionaldo Direito contemplada nos princípios. É por conta desta função promocional que o controle da constitucionalidade e aguarda da Constituição deixaram de cingir-se ao paradigma do controle da constitucionalidade dos atos do legislativoe do executivo e das atribuições dos entes federativos. Passaram, igualmente, a ocupar-se da tarefa de promover arealização dos valores positivados nos princípios constitucionais. Como a esfera da aplicação dos princípios daConstituição de 1988 e de outras constituições contemporâneas é relativamente indeterminada e dúctil e não se cingeà dimensão da validade, a interpretação dos critérios para a tomada de posição do juiz diante do caso concreto passapelo balancing das ponderações. Deste modo a interpretação constitucional vem abrindo espaço no Brasil e em outrospaíses para o ativismo judicial e, por via de consequência, para a expansão do poder judiciário e para a interpretaçãosempre mais extensiva da Constituição (cf. Pier Paolo Portinaro, Para além do Estado de Direito — tirania dos juízes ouanarquia dos advogados, in Pietro Costa e Danilo Zolo, org., O Estado de Direito, História, Teoria, Crítica, São Paulo:Martins Fontes, 2006, p. 465-488).

O desdobramento e as consequências do ativismo judicial — seja no que diz respeito ao papel constitucional dadivisão dos poderes, seja no que tange ao valor da segurança jurídica num estado de direito — suscita a preocupaçãocom os limites objetivos do processo hermenêutico. Esta preocupação está voltada para conter os riscos de ainterpretação extrapolar a desejável congruência normativa de uma Constituição, como expressão axiológica do méritodo “governo das leis” e das inconveniências do “governo dos homens”, inclusive o dos magistrados.

É no contexto desta problemática voltada para lidar com os limites objetivos do processo hermenêutico que se situaeste livro do prof. Elival da Silva Ramos, Ativismo Judicial — parâmetros dogmáticos. O livro é a tese com a qualconquistou, em 2009, o cargo de professor titular de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da USP. Tive oprazer de participar da Banca Examinadora do seu concurso — banca integrada pela profa Maria Sylvia Zanella DiPietro e pelos professores Jorge Miranda, Cezar Saldanha de Souza Junior e Pedro Paulo Almeida Dutra, que, porunanimidade, o indicaram para o cargo.

Antes de indicar, neste prefácio, as linhas mestras do seu trabalho e depois de o ter situado no âmbito daproblemática dentro da qual se insere, creio que vale a pena lembrar que o tema dos princípios — como o dainterpretação — não é uma novidade no léxico do Direito. Bobbio, resenhando o livro de Roberto Ago, Scienza giuridicae diritto internazionale, aponta a relevância da contribuição dos internacionalistas à teoria do direito, pois estudam umdireito em movimento. Por isso, têm melhores condições para repensá-lo sem os hábitos mentais provenientes dasconsiderações que provêm, exclusivamente, do direito estatal (cf. Rivista trimestrale di diritto e procedura civile, v. VI, n.2, giugno 1952, p. 479-483).

Os internacionalistas vêm se confrontando, na sua prática, com o tema dos princípios gerais desde o momento emque o Estatuto da então Corte Permanente de Justiça Internacional, no primeiro pós-Guerra Mundial, no seu artigo 38,inseriu no mesmo plano que as convenções e os costumes, como fonte do Direito Internacional, “os princípios gerais doDireito reconhecidos pelas nações civilizadas”. No momento inicial, imaginou-se, numa época de grande presença do

direito consuetudinário de não muitas convenções, que o papel dos princípios a serem recepcionados no ordenamentointernacional, com lastro em direitos nacionais, seria o de impedir o non liquet e assegurar a inteireza, a unidade e acoerência de um direito incompleto. Daí, por meio de processos legalmente autorizados de heterointegração aexpansão lógica do ordenamento internacional em especial em matéria de processo (prescrição, estoppel, ônus daprova, coisa julgada, igualdade das partes etc.).

Nem todos os princípios invocados pela jurisprudência internacional foram e são de natureza processual, e a própriacaracterística da dúctil indeterminação dos princípios foi propiciando, no correr dos tempos, a expansão axiológica doordenamento internacional. Neste sentido, os princípios também acabaram desempenhando um papel de fontematerial com características de fonte formal voltada para lidar, por meio da autointegração, com as aspiraçõesnormativas da agenda internacional. Daí a identificação, pela jurisprudência internacional, de obrigações erga omnes,e de normas de jus cogens, voltadas para completar o ordenamento internacional. Daí, igualmente, no campo dajurisprudência internacional dos direitos humanos e do meio ambiente (por exemplo, por via do princípio deprecaução) o empenho em prol do ativismo judicial da interpretação extensiva. A esta tendência se contrapõe, noplano internacional, o compromisso na interpretação estrita, juridicamente prevista, por exemplo, no sistema desolução de controvérsias da OMC, das normas do seu ordenamento (cf. Norberto Bobbio, Contributi ad un dizionariogiuridico, Torino: Giapichelli, 1994, verbete “Principi genenerali di diritto”, p. 217- 279; G. Strozzi, “I ‘principi’ dellordinamento internazionale”, in I Principi Generali del Diritto, Atti dei Convegni di Lincei 96, Roma: Academia Nazionaledi Lincei, 1992, p. 199-216).

Em síntese, o que estou querendo apontar, com esta digressão sobre o Direito Internacional como um direito emmovimento, é que os princípios inicialmente imaginados como um meio para a expansão lógica e coerente de umordenamento jurídico, pelas suas próprias características normativas, promovem a expansão axiológica do Direito.Propiciam, assim, a interpretação extensiva e criam, por isso mesmo, incertezas normativas. Estas incidem num DireitoInternacional que hoje tem como nota a fragmentação que singulariza os seus múltiplos regimes e provém daheterogeneidade dos valores e das assimetrias do poder num sistema internacional descentralizado no qual operamatores governamentais e não governamentais. É por esse motivo que o livro do prof. Elival da Silva Ramos, emboraancorado com rigor no Direito Constitucional brasileiro e nas discussões das teorias do constitucionalismo jurídico,tem um interesse que vai além do seu objeto específico, em função da sua preocupação com o valor da segurançajurídica. É uma contribuição aos temas da teoria geral do direito contemporâneo e do significado da rule of law,inclusive no plano internacional, em função de “une montée en puissance des juges” realçada com muita acuidade porMireille Delmas-Marty.

Com efeito, esta montée en puissance des juges coloca em questão o equilíbrio dos poderes e suscita o tema dasegurança jurídica em função do papel próprio que os juízes vêm exercendo na administração do processo deglobalização. Isto vem acontecendo, seja porque os juízes nacionais se internacionalizaram, em função das matériasque decidem, inclusive dialogando com a jurisprudência internacional e a jurisprudência de outros países, seja porconta da “jurisdicionalização” do Direito Internacional proveniente da multiplicação de jurisdições regionais einternacionais. Na medida em que não existe uma ordenação legislativa deste pluralismo jurídico, fica aberta a clássicapergunta “quem controlará os controladores”, se esta dimensão da pilotagem da globalização permanecer, semparâmetros apropriados, na “jurisdictio” de um crescente ativismo judicial (cf. Mireille Delmas-Marty, La Refondationdes Pouvoirs, Paris: Seuil, 2007, em especial p. 38, 41-43, 67).

Faço estas observações na perspectiva de um internacionalista que é, igualmente, professor de Filosofia do Direito,porque entendo que esta, enquanto Filosofia do Direito dos juristas, para falar com Bobbio, é o fruto de um “pararpara pensar” numa época de universais fugidios, como diria Hannah Arendt, os problemas da experiência jurídica quenão encontram adequado encaminhamento no âmbito estrito do Direito Positivo (cf. Celso Lafer, Filosofia do Direito ePrincípios Gerais: considerações sobre a pergunta “O que é a Filosofia do Direito”, in Alaor Caffé Alves et al., O que é aFilosofia do Direito?, Barueri, SP: Manole, 2004, p. 53-73). Por esse motivo o livro do prof. Elival da Silva Ramos trata, demaneira abrangente, para voltar à citação de Miguel Reale evocada no início deste prefácio, das normas e limites daexegese do Direito em função dos valores culturais que vêm prevalecendo no contexto da aplicação, pelo judiciáriobrasileiro, da Constituição de 1988.

A nota identificadora deste livro do prof. Elival da Silva Ramos é uma análise crítica do ativismo judicial em matériaconstitucional. Caracteriza-se por uma rigorosa contraposição ao pós-positivismo e muito especificamente aosneoconstitucionalistas brasileiros que, no seu entender, não são pós-positivistas, mas antipositivistas. Este confrontoestá baseado, na linha de Bobbio, numa defesa dos méritos de um positivismo jurídico moderado, numa acepção amplae não estrita, que reconhece que a interpretação da Constituição pelo Judiciário na passagem das verba legis para asententia legis não é um procedimento puramente lógico. Esta defesa de um positivismo jurídico moderado estálastreada na moderna teoria da interpretação e, por isso, o livro traz à colação as reflexões de Betti e Gadamer, quemetodologicamente permitem lidar, no seu entender, com a interação entre princípios e regras. Leva em conta, aomesmo tempo, importantes contribuições à teoria geral do Direito como as de Engish e Larenz. O objetivo do percursodo livro é o de delimitar o espaço da interpretação a partir de uma preocupação com a discricionariedade judicial. Daía busca dos parâmetros dogmáticos que devem, na avaliação do prof. Elival da Silva Ramos, circunscrever ainterpretação, pelo judiciário, dos princípios da Constituição de 1988, para assegurar o “governo das leis” e nãofavorecer o “governo dos homens”.

Na tessitura do livro do prof. Elival da Silva Ramos estão presentes o tema da divisão constitucional dos poderes e arelevância de diferenciar e não confundir o momento da legislação e o momento da jurisdição. Estão igualmentepresentes o tema da segurança jurídica e as virtudes da coerência jurídica — o respeito ao princípio do “pacta suntservanda” do momento da criação das normas — que o ativismo judicial, destituído de parâmetros objetivos, podecolocar em xeque (cf. Norberto Bobbio, Contribuición a la Teoría de Derecho, org. Alfonso Ruiz Miguel, Valencia:Fernando Torres Ed., 1980, Formalismo Jurídico y Formalismo Ético, p. 105-117).

Na condição de professor de Filosofia do Direito permito-me ir concluindo este prefácio, lembrando que Bobbio —tantas vezes invocado e bem invocado pelo prof. Elival da Silva Ramos —, ao tratar de relações entre Razão e Direito,explora as dificuldades que esta relação suscita apontando, em primeiro lugar, que o universo jurídico não éhomogêneo — muito pelo contrário. A heterogeneidade no universo jurídico vem aumentando com a crescentepresença dos princípios nos textos constitucionais que adiciona novas dificuldades no trato da criação das normas eda sua aplicação. Entende Bobbio, na discussão da relação Direito/Razão, que cabe a distinção entre leis da razão —razão aí entendida no sentido forte, como a capacidade humana de captar a natureza das coisas — e razão jurídica,razão aí concebida mais moderadamente como capacidade de racionar, de argumentar, de dar razões para sustentaruma posição (cf. Norberto Bobbio, Contributi ad un dizionario giuridico, cit., verbete “Ragione e diritto”, p. 295-297).

O livro do prof. Elival da Silva Ramos contesta os defensores de um ativismo judicial que conferem ao magistrado-intérprete a competência de desvendar as leis da razão e esclarecer a natureza das coisas da Constituição de 1988.Vale-se da razão jurídica para fazer um vigoroso arrazoado da sua posição. Esta, na minha avaliação, inaugura emnosso meio, com pleno domínio do Direito Positivo, uma consistente elaboração doutrinária, articuladora do valor dogarantismo jurídico em matéria de interpretação constitucional.

O garantismo jurídico é uma expressão do positivismo jurídico e do princípio da legalidade e, por isso, como dizBobbio, contrapõe o momento da legislação, que é, por excelência, o momento do poder, no qual prevalecem os juízospolíticos de valor, e o momento da jurisdição, no qual cabe a ênfase no saber jurídico, e seus componentes dedutivos(cf. Norberto Bobbio, Contributi ad un dizionario giuridico, cit., verbete “Ragionamento giuridico”, p. 283-284; prefácio aLuigi Ferrajoli, Direito e Razão — Teoria do Garantismo Penal, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 9 e 11). Aelaboração dos parâmetros dogmáticos que devem circunscrever o ativismo judicial — a que se dedicou neste livro — éum empenho na veritas que deve nortear a passagem das verba legis à sententia legis, na interpretação da Constituiçãode 1988, no atual momento da vida do Direito Constitucional brasileiro.

O seu livro está na ordem do dia do debate jurídico brasileiro. Dele o leitor sairá, pela qualidade, rigor e vigor da suaexposição, amplamente esclarecido do que está em jogo na dinâmica da exegese constitucional no Brasil. É o que mepermito realçar na conclusão deste prefácio, com o mais alto apreço intelectual pelo A., e presidente da BancaExaminadora que o consagrou como professor titular de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da USP.

CELSO LAFER

Dezembro de 2009

OBSERVAÇÕES PROPEDÊUTICAS

No intuito de privilegiar a clareza e de facilitar a leitura, as citações de trabalhos de autores estrangeiros, semtradução para o português, que tenham importado na transcrição de excertos doutrinários, foram feitas medianteversão para o vernáculo, da exclusiva responsabilidade do autor. De modo correlato, trechos de obras de autoresnacionais, anteriores à ortografia em vigor, sofreram adaptação aos atuais padrões ortográficos.

As obras ou os artigos que tenham sido citados apenas por interessarem a um aspecto específico e marginal dotrabalho não foram incluídos na bibliografia final, na qual, por outro lado, estão presentes obras e artigos consultadose de íntima conexão com a temática desenvolvida, não obstante, eventualmente, não tenham sido objeto de referênciaao longo do texto.

Em relação às indicações bibliográficas, serviram de parâmetro os padrões formais utilizados na edição de obrasjurídicas pelas principais editoras nacionais.

No que concerne às abreviaturas, deixou-se de apresentar um glossário porque foram utilizadas de modo a nãogerar dúvida quanto ao significado, sendo que, relativamente a medidas de natureza processual, empregou-se asimbologia constante do sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal.

INTRODUÇÃO

1 Justifıcação temática, objeto e fınalidadesEm manifestação veiculada por prestigioso órgão de imprensa1, o Presidente do Senado e do Congresso Nacional

expressou o desconforto institucional do Poder Legislativo brasileiro diante de práticas adotadas pelos outros Poderesque lhe ameaçam a primazia no desempenho de uma de suas funções primordiais, a de legislar. De fato, não se ignoraque o Congresso se encontra pressionado, de um lado pelo Poder Executivo, mercê da edição desenfreada de medidasprovisórias com força de lei, desde a entrada em vigor da Constituição de 1988, e, de outro, por recentes decisões doSupremo Tribunal Federal, que teriam transposto os limites da lídima atividade jurisdicional que lhe compete exercer.Daí a exortação que culminou por fazer aquela autoridade em relação a esse último fenômeno, no sentido de quecaberia “definir com precisão os limites da intromissão do Judiciário na seara parlamentar”.

Entendo que se trata de questão de fundamental importância para os ulteriores desdobramentos do EstadoConstitucional de Direito e da democracia no Brasil, podendo vir a se constituir, se bem equacionada, em elementofacilitador ao desenvolvimento socioeconômico do País ou em poderoso obstáculo, na hipótese inversa. Por certo aatuação harmônica dos Poderes, preconizada em termos principiológicos pelo Constituinte2, depende, em boa medida,de um sábio e prudente exercício das competências constitucionais que lhes foram assinaladas. Entretanto, a precisaidentificação dos limites a que se sujeita o Poder Judiciário no exercício da jurisdição, dada a natureza eminentementejurídica dessa função estatal, assume contornos técnicos inafastáveis, razão pela qual avulta a responsabilidade dadoutrina constitucional na busca de resposta adequada ao problema posto.

A concepção de um Estado submetido ao direito, como anota Manoel Gonçalves Ferreira Filho, articula-se em tornodos princípios da legalidade, da isonomia e da justicialidade3. Ademais, o controle da legalidade e do tratamentoisonômico dispensado pelo legislador (e pela Administração Pública) por meio da função jurisdicional pressupõe oarquétipo da separação dos Poderes, com a distinção básica entre a expedição de textos normativos contendoparâmetros de ação e a atuação devotada, precipuamente, a propiciar a sua observância, condição para aespecialização funcional dos órgãos de poder incumbidos de uma e outra atividade4. Logo, a transposição dos marcosque asseguram a tipicidade da função jurisdicional se faz com evidente prejuízo à construção conceitual do Estado deDireito, requisito para a existência de um sistema político democrático, sem o qual, por seu turno, se faz impossível opleno atendimento às exigências da dignidade humana.

Observa-se da literatura dedicada à temática do ativismo judicial em sentido amplo, vale dizer, à tensão entre osPoderes provocada pelo desempenho da função jurisdicional, que com grande frequência se associa o fenômeno aocontrole de constitucionalidade das leis e atos normativos, bem como da omissão legislativa5. Não é difícil entenderporque isso ocorre. A censura imposta por Cortes Constitucionais6 aos atos legislativos é algo extremamente delicadono contexto das relações entre os Poderes, em face do caráter redentor assumido pela lei na esteira das revoluçõesque puseram fim ao absolutismo monárquico7. Tanto assim que Hamilton, em O Federalista, se ocupou de justificarcabalmente a competência dos juízes e tribunais estadunidenses para declarar nulas as leis contrárias à Constituição8, lançando as bases do que, depois da decisão de Marbury v. Madison, em 1803, viria a ser conhecido como doutrinado judicial review. Se assim é em sede de controle incidental, com eficácia restrita às partes, o que dizer então docontrole de constitucionalidade exercido em abstrato, a título principal, com ampla eficácia subjetiva (efeitos ergaomnes), manifestamente distante de práticas ordinárias da jurisdição. Mas, há um outro aspecto da denominadajurisdição constitucional que atrai para ela a polêmica em torno do ativismo judiciário e que tem relação direta com ascaracterísticas fluídas da linguagem que permeia o texto das Constituições9. Na falta de um parâmetro claro e precisopara a aferição da constitucionalidade dos atos normativos objeto de impugnação, as soluções encontradas pelasCortes Constitucionais tendem a ser mais discutíveis sob o ponto de vista técnico-jurídico, com o que avultam assuspeitas de haver o órgão de controle extrapolado dos limites de seu mister. Na medida em que esses tribunais estãosituados em posição cimeira no aparato judiciário ou ocupam posição isolada e externa em relação à Justiça ditaordinária suas decisões não são passíveis de revisão por outros órgãos jurisdicionais, o que só faz crescer adesconfiança em relação a possíveis abusos de poder.

Pode-se assentar a legitimidade do exercício do controle jurisdicional de constitucionalidade das leis e omissõeslegislativas em justificativas dotadas de autonomia com referência à argumentação dogmática, como seria o caso dalegitimidade fundada em razões de ordem moral10 ou na necessidade de preservação do ritual democrático11. A longaduração do debate sobre o tema da legitimidade do judicial review nos Estados Unidos12, que não dá sinais dearrefecer, indica, para quem adota uma visão pragmática na matéria, em que sobressaem os inquestionáveis ganhostrazidos pelo instituto em todas as dimensões da vida social (jurídica, política, socio-econômica etc.), a preferência poruma abordagem dogmática, a qual situa o controle de constitucionalidade como decorrência necessária do princípioda supremacia da Constituição13. Ou seja, a jurisdição constitucional é a consequência natural da adoção deConstituições rígidas, dotadas de superioridade hierárquica, sendo consagrada expressamente por suas disposiçõesou meramente deduzida dessa característica formal, utilizada como critério para solução de conflitos entre normaslegais e constitucionais no exercício ordinário da jurisdição14.

Por conseguinte, a questão da legitimidade (axiológica) do controle jurisdicional de constitucionalidade, que éexterna à argumentação estritamente dogmática (juízo de validade formal e de eficácia jurídica), passa a ter por foconão a jurisdição constitucional em si e sim a própria Constituição que a consagra: em suma, o que caberia discutir é se

o modelo de Estado Constitucional de Direito escolhido pelo Constituinte seria o mais adequado para implantar umademocracia. Sucede, porém, que controlar a constitucionalidade dos atos emanados do Poder Legislativo ou do PoderExecutivo não é atividade que se possa exercer com total liberdade, pois a própria missão que lhe é assinalada (apreservação da Constituição) já aponta para a existência de limites. Como bem salientou Rubén Hernández Valle, “olimite do poder interpretativo dos tribunais constitucionais é um pressuposto da função de racionalização,estabilização e limitação que lhe é deferida pela Constituição”, para acrescentar que “se é certo que a referida funçãoadmite a possibilidade de mudança constitucional por meio da interpretação, também exclui a violação constitucional,ou seja, o desvio do texto em um caso concreto e a reforma da Constituição por meio da interpretação”15.

Ao trabalhar a ideia de limites ao exercício da jurisdição constitucional, como visto, envolve-se o investigador,necessariamente, no tema da interpretação constitucional, o que exige que a análise dogmática se escore,consistentemente, no plano da Teoria do Direito16. Por conseguinte, o estudo do ativismo judicial em matériaconstitucional permite um produtivo diálogo entre a Dogmática Jurídica e a Teoria (Geral) do Direito, com intensidaderaramente observável no trato de institutos e categorias do Direito Constitucional.

Finalmente, importa destacar as repercussões institucionais do assunto sob exame, mormente no sistema políticobrasileiro. Desde o seu nascedouro, a Constituição de 1988 tem convivido com profundas desconfianças em relação aoarranjo institucional por ela veiculado17. Nos últimos anos, parece mesmo haver se formado um consenso em relação àpremência de uma ampla reforma política, que permita ao Estado brasileiro cumprir eficientemente com a sua missãoconstitucional, muito embora exista dissenso em relação à natureza e extensão das medidas a serem adotadas. Ora, seé certo, por um lado, que o Supremo Tribunal Federal há de ocupar lugar de destaque em qualquer reestruturaçãodos Poderes estatais que se pretenda promover, haja vista a centralidade da função de guardião da Constituição quelhe compete exercer no modelo de Estado Constitucional de Direito, de outra parte, não há como torná-lo imune acríticas deslegitimadoras da parte dos Poderes por ele fiscalizados se não forem claramente estabelecidos os marcosdentro dos quais sua atuação é constitucionalmente autorizada.

Creio que mais não é preciso dizer para realçar porque o tema escolhido é de grande interesse para o DireitoConstitucional brasileiro, não obstante não venha merecendo a atenção devida dos constitucionalistas pátrios, aomenos em termos de trabalhos monográficos. As abordagens acerca do ativismo judiciário encontráveis na literaturanacional, de modo não muito diverso do que ocorre no estrangeiro, se circunscrevem ao plano da Teoria do Direito, daHermenêutica Jurídica, da Filosofia Política ou mesmo da Sociologia Jurídica18. Ressente-se, pois, a matéria daausência de um tratamento predominantemente dogmático, conquanto assentado, como não poderia deixar de ser, empressupostos teóricos mais gerais que sempre devem ser explicitados.

Pretendo fazê-lo ao longo de dois capítulos: o primeiro, em que serão expostos os pressupostos teoréticos daabordagem e, o segundo, inteiramente dedicado ao exame do ativismo judicial sob o enfoque do Direito Constitucionalbrasileiro.

O Capítulo I será, por seu turno, subdividido em três seções. Na Seção I, evidenciarei que a reflexão teórica quetenho desenvolvido em cerca de três décadas de estudos constitucionais se vincula ao modelo dogmático genérico dopositivismo e, mais especificamente, a uma visão de Teoria do Direito estritamente positivista, conquanto comportandoreflexão crítica sobre seus próprios postulados básicos, a partir da consideração de outros enfoques teóricos, bemcomo aberturas zetéticas ao conhecimento complementar de outras Ciências Jurídicas. Em seguida, na Seção II dessecapítulo, procurarei demonstrar que a filiação a um positivismo renovado não é, de modo algum, incompatível com osprincipais postulados alcançados pela reflexão mais atualizada acerca da interpretação de textos jurídicos.Finalmente, na derradeira seção (III) do Capítulo I, centrarei meus esforços na elaboração de um conceito de ativismojudicial, que, ao contrário da enunciação dos parâmetros que permitem a identificação de uma prática ativista, situa-seno plano da Teoria do Direito, não sendo válido apenas para um determinado sistema normativo.

A subdivisão do segundo capítulo também se fará em três seções. Na primeira delas reside o ponto nuclear destetrabalho, qual seja, a resposta à questão inicialmente posta sobre os limites a que o Poder Judiciário se sujeita aoexercer a jurisdição constitucional em sentido amplo19, vinculando-se a elaboração em torno do assunto ao direitoconstitucional positivo brasileiro. Além de serem assentados os parâmetros para se aquilatar se um juiz ou tribunalincidiu em ativismo, terei o ensejo de desenvolver reflexão sobre os diversos graus em que se manifesta o controlejudiciário em matéria constitucional, algo que não me parece ser conscientemente percebido em nível doutrinário eoperacional, muito embora resulte da prática jurisprudencial brasileira. Já a Seção II estará voltada a um exercício deDogmática da Decisão20, mediante análise crítica de algumas decisões recentes do Supremo Tribunal Federal,denotadoras de um sensível incremento do ativismo no âmbito daquela Excelsa Corte, o que também me permitirátestar a adequação dos parâmetros caracterizadores da prática nefasta anteriormente estabelecidos. Por último, naSeção III, examinarei os fatores que têm impulsionado o ativismo judiciário após o advento da Constituição de 1988,discutindo em que medida são eles controláveis por meio da mera neutralização doutrinária do ativismo ou sedemandam enfrentamento específico no plano teórico-pragmático (doutrina e jurisprudência) ou mediantereformulação normativa.

As conclusões alcançadas ao longo da empreitada serão elencadas ao final, na forma de síntese, evocando, em itemderradeiro, a grave responsabilidade que cabe à doutrina constitucional brasileira quanto ao esforço de modernizaçãodemocrática que nossa sociedade vem empreendendo sob os auspícios da Carta de 1988.

As finalidades que se pretende atingir com o presente estudo transparecem da própria justificação temáticaanteriormente desenvolvida. O objetivo fundamental é a identificação de parâmetros jurídico-dogmáticos consistentesque permitam qualificar de ativista, isto é, de contrário à Constituição e ao direito, o exercício da função jurisdicionalem matéria constitucional. Com isso, estar-se-á sedimentando entendimento doutrinário que poderá contribuir paraaplacar a tensão entre os Poderes, inerente ao desempenho da jurisdição constitucional, e que, em um sistema de

controle complexo, como atualmente se configura o brasileiro, com variado instrumental à disposição do órgão defiscalização, atinge dimensões relevantes. Em última análise, ao se preconizar a adoção de critérios que favoreçam àmanutenção do Supremo Tribunal Federal no âmbito estrito de suas atribuições constitucionais, o que se pretende é ofortalecimento do Estado Democrático de Direito, sem o qual nenhum projeto político para o País poderá vingar, aomenos sob a moldura da Constituição de 5 de outubro de 198821.

2 Considerações epistemológicas e metodológicasUma vez estabelecido o objeto da investigação (o que se estuda), a sua razão de ser (porque se estuda) e as suas

finalidades (para que se estuda), cabe, agora, voltar a atenção para o modo pelo qual se desenvolverá a pesquisa(como se estuda).

O ativismo judicial pode ser examinado pelo cientista do direito como um mero fenômeno social, o qual, portanto,existe no plano fático, independentemente, do juízo de valor que se possa fazer a seu respeito ou da conformação ounão da prática ao direito vigente. É essa a abordagem dos que adotam concepções do direito similares às do realismojurídico, que vicejou nos Estados Unidos a partir da década de vinte do século passado. Como bem mostra Denis deCastro Halis, “o realismo é fundamentalmente antiformalista (no sentido de não priorizar o estudo da estrutura formaldo direito)”. Daí por que “os seus adeptos tinham por principal objetivo desmistificar o processo formal de aplicaçãodo direito positivo pelos juízes, tentando pensar realisticamente os problemas legais”22. Não é difícil perceber que setrabalha aqui no campo da Sociologia do Direito23, perspectiva que facilita a compreensão de alguns dos fatoresdesencadeadores do ativismo24, mas que não permite o seu enquadramento em face das prescrições de umdeterminado ordenamento jurídico-constitucional, que é o que pretendo realizar. Aliás, aqueles que se debruçamsobre o tema do ativismo judicial sob um prisma sociológico, frequentemente, apontam como uma das dificuldades quese lhes antepõem a ausência de uma clara delimitação conceitual da matéria no plano da Dogmática e da Teoria doDireito25.

Por seu turno, conforme precisa observação de Habermas, “a controvérsia dos constitucionalistas americanos emrelação à legitimidade da jurisprudência constitucional (aí compreendido o tema do ativismo) segue mais na linhapolitológica do que na da metodologia do direito”26 e 27. Constata-se que o ativismo judicial é, nessa polêmicacentenária, avaliado à luz de exigências da ideologia democrática, privilegiando-se o aspecto ético ou procedimental dademocracia, conforme o caso.

Hércules, o juiz idealizado por Dworkin, é autorizado a praticar o ativismo (no sentido amplo de criação do direito) emnome de uma concepção de direito como integridade, que procura conciliar o direito com a ética, vinculada aoprocesso histórico do constitucionalismo estadunidense, de índole sabidamente democrática28. Como bem sintetizaJavier Dorado Porras, “Ronald Dworkin procura justificar a jurisprudência das cortes Warren e Burger através de uminterpretativismo moderado – que se baseia na defesa da teoria substantiva dos valores -, defendendo a ideia de que aConstituição tem um significado unívoco, e a necessidade de um tribunal ativista para determinar ou descobrir essesignificado”29.

O procedimentalismo de J. H. Ely, de outra parte, não deve ser compreendido como uma concepção cética dajurisprudência, que o situaria na prestigiosa corrente do pragmatismo estadunidense, e sim como a defesa de umativismo moderado, que se limite à complementação do projeto democrático desenhado pelos Founding Fathers,voltado apenas à organização de um quadro institucional que favoreça o livre exercício da competição política30. Parte-se, portanto, da elaboração de uma teoria da democracia para se concluir em que condições seria legitimamenteexercido o ativismo dos juízes e tribunais, mesmo que importando em interpretação e aplicação do direito descoladados textos constitucionais ou legais de referência31.

Muito embora Dworkin, Ely, Michael J. Perry32 e outros constitucionalistas estadunidenses seguramente estruturemo seu pensamento a partir de uma determinada concepção de direito, não abordam o tema do ativismo judicial sob oviés jurídico-dogmático, deixando, assim, amplo espaço a ser preenchido por trabalhos como este que ora seapresenta.

A peculiaridade deste estudo, em termos dogmáticos, é que não tem ele por objeto um instituto ou mesmo umacategoria conceitual resultante de disposições normativas. O que se vai examinar é a violação ao direito (e não a suaconfiguração), qual seja, o afastamento do Poder Judiciário dos limites de sua competência para aplicar a Constituição.A aplicação de normas constitucionais, como restou assentado pela Hermenêutica filosófica, não pode ser apartada,salvo em termos lógico-conceituais, da tarefa de interpretar, de fixar o sentido dos textos de que emanam33. Por outrolado, a Teoria da Interpretação é o aspecto mais evidente da diferenciação que se faz entre as vertentes doutrináriasda Teoria do Direito atual. Daí por que, ao menos em nível de pressupostos teoréticos, há a necessidade de seconstruir o conceito de ativismo judicial de um modo mais amplo, assentado em determinada maneira de entender odireito e de proceder à interpretação-aplicação de seus preceitos normativos34.

Contudo, mesmo uma conceituação ampla de ativismo não se revela minimamente funcional se não for conectada aosgrandes sistemas jurídicos contemporâneos, porquanto são notórias, embora nem sempre levadas na devida conta, asdiferenças entre os parâmetros que se impõem a um juiz do common law e do civi/ law no tocante ao exercício dajurisdição35. Além disso, não resta dúvida de que a discussão sobre os limites a serem observados pelos aplicadoresoficiais do direito no desempenho de sua atividade judicante, como já se fez notar no item precedente, somente fazsentido em ordenamentos constitucionais estruturados sob a fórmula da separação dos Poderes36.

Porém, se o ativismo pode ser conceituado em termos bem genéricos, próprios de uma Teoria do Direito, não serevela viável a especificação dos parâmetros que permitem caracterizar o exercício da jurisdição como desbordante deseus limites institucionais, sem adentrar o campo do direito positivo. São muitas as variáveis a serem aquiconsideradas, sendo certo que, além do balizamento normativo, se deve ter presente a própria prática jurisprudencial,que com aqueles parâmetros há de manter relação dialética, interferindo sobre a sua configuração e sendo instada adeles não se desviar.

E se é na jurisdição constitucional, entendida no sentido amplo de aplicação judicial da Constituição, que se faz maisforte a polêmica em torno do ativismo, se justifica a opção pelo tratamento da matéria apenas no âmbito do DireitoConstitucional positivo. Tenho para mim que o alargamento da pesquisa, em termos interdisciplinares, não trariaresultados muitos distintos dos que ora se espera alcançar, sem embargo das dificuldades que se anteporiam a talempreitada de natureza enciclopédica.

A metodologia que será empregada, pois, vincula-se ao modelo dogmático de investigação, comportando,fundamentalmente, o raciocínio dedutivo, não obstante certa utilização de raciocínio indutivo, haja vista que opluralismo metodológico também acabou por se impor ao mundo do direito37. É o que justifica a avaliação dajurisprudência mais recente do Supremo Tribunal Federal à luz do conceito de ativismo judicial. Não se trata de umsimples exercício de subsunção, objetivando a mera constatação da aplicabilidade ou não da conceituação previamenteobtida em situações concretas de exercício da jurisdição constitucional. Mais do que isso, o que se pretende, naverdade, é completar a construção conceitual, analisando que elementos característicos estão presentes em julgadosdo STF que provocaram fortes reações no meio jurídico e na sociedade em geral, justamente por produzirem asensação de que teria a Corte Suprema excedido os limites de suas competências. Portanto, a utilização, nesse passo,de método parcialmente indutivo é propiciar a confrontação dialética entre a conceituação abstrata e o mundo dosfatos38.

CAPÍTULO I

PRESSUPOSTOS TEORÉTICOS

SEÇÃO I

TEORIA DO DIREITO E MODELO DOGMÁTICO

3 O positivismo jurídico em suas linhas gerais4 As críticas à teoria positivista5 Por um positivismo reflexivo e integral

3 O positivismo jurídico em suas linhas gerais

Nesta última década, difundiu-se entre os constitucionalistas brasileiros a retórica da superação do positivismo,enquanto modelo de compreensão do fenômeno jurídico. O Direito, na qualidade de Ciência que tem por objeto normasdisciplinadoras do agir humano, repele o vazio, pois, ao contrário do que ocorre nas Ciências da Natureza, a ausênciade um modelo aglutinador do conhecimento jurídico interfere no próprio desempenho das normas estudadas39.Destarte, no lugar desse “superado” positivismo, propõe-se que a Dogmática Constitucional se assente em um assimdenominado “pós-positivismo”, entendido como “a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual seincluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos da chamada nova hermenêutica e a teoriados direitos fundamentais”40. Conforme denunciou Dimitri Dimoulis, o veredicto antipositivista compõe uma retóricatautológica e permeada de argumentos emocionais41 e, portanto, de reduzido valor científico42, mas com gravesconsequências no plano da disfunção sistêmica examinada no presente trabalho, como adiante se verá.

É saudável que os cultores do Direito Constitucional brasileiro tenham finalmente se ocupado de questionar omodelo dogmático43 predominante desde meados do século XIX, para verificar se continua funcional, quanto aométodo, e válido quanto aos conceitos de Teoria do Direito que o estruturam. Todavia, para isso, importa assentar demodo claro e fundamentado as principais características do positivismo jurídico.

O positivismo parte da premissa metodológica de que o direito deve ser estudado enquanto fato social,independentemente das considerações valorativas que se possa fazer a seu respeito44. O objeto da Dogmática Jurídicapara os positivistas são as normas vigentes em determinado Estado, em uma determinada época, pouco importando seessas normas correspondem ou não ao ideal de justiça de quem as examina. Nas palavras de Norberto Bobbio, dessaatitude frente ao fenômeno jurídico “deriva uma particular teoria da validade do direito, dita teoria do formalismojurídico, na qual a validade do direito se funda em critérios que concernem unicamente à sua estrutura formal (valedizer, em palavras simples, o seu aspecto exterior), prescindindo do seu conteúdo”45 e 46.

Observe-se que essa objetividade metodológica não importa, necessariamente, na aceitação passiva do direito posto(legislado ou costumeiro), pela completa desconsideração dos juízos de valor nele encarnados. Os positivistas sabemque as normas jurídicas prescrevem condutas e, portanto, intrinsecamente são juízos de valor (dever-ser). Todavia, “oato com o qual é posta uma norma jurídica positiva é – tal como a eficácia da norma jurídica – um fato da ordem doser“47. Essa dimensão factual, inerente ao processo de formação do direito, importa em atitude de mera constataçãoem relação ao direito existente (não se podem ignorar as normas em vigor). Porém, na compreensão, interpretação eaplicação das normas que integram o ordenamento jurídico, a dimensão valorativa do direito jamais deixará de estarpresente, assumindo maior ou menor importância dependendo da teoria hermenêutica que se venha a adotar e doscorrespondentes métodos interpretativos, que propiciarão ao intérprete-aplicador maior ou menor autonomia namodelagem do material normativo preexistente48.

Em seu aspecto metodológico, pode-se afirmar que o positivismo jurídico identifica-se com a Dogmática Jurídica damodernidade, que sucedeu ao modelo do Jusnaturalismo. Portanto, nesse sentido amplo, não apenas o positivismo nãoestá superado, como participa da base comum a todas as correntes doutrinárias que, a partir da metodologiapositivista, se digladiam quanto a aspectos mais específicos de Teoria do Direito, como é o caso, por exemplo, daTeoria da Interpretação. Ou seja, no veredicto preciso de Bobbio, “como a ciência consiste na descrição avaliatória darealidade, o método positivista é pura e simplesmente o método científico e, portanto, é necessário adotá-lo se se querfazer ciência jurídica ou teoria do direito”. Ao contrário, se for descartado o método positivista, “não se fará ciência,mas filosofia ou ideologia do direito”49. Assiste inteira razão a Dimitri Dimoulis quando afirma que “o êxito teórico daabordagem positivista lato sensu é ignorado pela maioria dos autores nacionais que insistem em indicar os ‘fracassos’do positivismo jurídico, sem levar em consideração que quase todos os estudiosos modernos admitem a positividade dodireito e sua mutabilidade no tempo, de acordo com decisões dos detentores do poder, rejeitando a possibilidade deum direito paralelo, independentemente da vontade política dos legisladores humanos“50.

Entretanto, pode-se aludir à existência de um positivismo jurídico em sentido estrito, que, partindo do pressupostometodológico já exposto, compõe uma certa visão teórica do direito em função de alguns elementos-chave.

Em primeiro lugar, aponta-se a presença da coação, como um aspecto indissoluvelmente relacionado ao fenômeno

jurídico. Entretanto, no âmbito do positivismo jurídico, a chamada doutrina da coatividade do direito passou porimportante reformulação. Com efeito, a visão tradicional em que a coação é parte integrante do próprio conceito dedireito, permitindo a identificação de uma norma como jurídica ou não, foi substituída por uma abordagem moderna,segundo a qual a força física é objeto de regulação pelo direito, que pode dela prescindir e continuar existindo51.

No tocante às fontes do direito, o positivismo estrito afirma a predominância da legislação sobre as demais fontes,como o costume e a jurisprudência. A meu juízo, por vezes não se tem compreendido adequadamente o legalismopositivista. A racionalização do exercício do poder que acompanhou o surgimento do Estado moderno importou nadomesticação das fontes de produção do direito52. Em outras palavras, o Estado assumiu o controle do processo decriação de normas jurídicas, anteriormente difuso no meio social, e estabeleceu um rígido escalonamento hierárquicoentre as diversas fontes, situando em primeiro plano a lei em sentido formal, ou seja, o ato normativo editado “peloórgão legislativo mediante o procedimento correspondente, com total independência em relação ao seu conteúdo”53.Todavia, a tônica dessa característica do positivismo está na preponderância do direito estatal (direito posto peloEstado, direito positivo) em relação ao direito não estatal, como o originário do costume. Quanto ao direito estatal emsi, parte-se da constatação de que os ordenamentos contemporâneos, além de complexos (várias fontes), sãohierarquizados, isto é, “suas fontes se dispõem em planos diversos, hierarquicamente subordinados um ao outro”54.Por conseguinte, a predominância do ato decorrente do exercício da função legislativa sobre as demais fontes não é,propriamente, um traço tipificador das proposições positivistas, em sentido estrito, tendo aparecido nos escritos dospositivistas europeus do século XIX e das primeiras décadas do século XX pela circunstância de se viver, então, noVelho Continente o período do Estado Legal55. Com a definitiva consolidação do sistema europeu de controle deconstitucionalidade, principalmente após a segunda metade do século passado, a Constituição, e não a lei, passou aassumir a primazia das fontes de produção do direito estatal, sem que isso venha a representar alteração significativanos marcos do positivismo teórico.

O terceiro elemento-chave da construção teórica positivista diz respeito à teoria da imperatividade do direito,construída a partir da ideia segundo a qual a norma jurídica teria a estrutura de um comando dirigido aos súditos pelosoberano, com indisfarçável vínculo à concepção legalista-estatal do direito, “isto é, com a concepção que considera oEstado como única fonte do direito e determina a lei como expressão do poder normativo do Estado”56. Essaformulação clássica da teoria da imperatividade, alcunhada por Bobbio de “imperativismo ingênuo”57, sofreu fortescríticas no âmbito da própria Dogmática positivista, as principais delas advindas de Kelsen que associou a estruturadas normas jurídicas ao elemento coatividade. Para o mestre da Escola de Viena, a ordem jurídica pode ser descritacomo um conjunto de “proposições enunciando que, sob pressupostos determinados (determinados pela ordemjurídica), devem ser aplicados certos atos de coerção (determinados igualmente pela ordem jurídica)” 58. Portanto,volta-se a atenção para a estrutura lógico-formal da norma jurídica, apresentada como a de um imperativo hipotético,imperativo esse que não seria dirigido aos nacionais (os súditos da monarquia) e sim aos operadores oficiais do direito(os magistrados). Norberto Bobbio, em sua Teoria da norma jurídica, mostra que a revisão ocorrida na teoria daimperatividade prendeu-se às especificidades desse elemento da doutrina positivista e não à sua base comum, por eledivisada na “pertinência das normas jurídicas, sejam elas comandos propriamente ditos ou imperativos impessoais ouimperativos hipotéticos ou normas técnicas e assim por diante, à categoria das proposições prescritivas”59.

Porém, como assinalado pelo jusfilósofo italiano, o elemento mais importante para a caracterização do positivismo esua contribuição mais original à Teoria do Direito consiste no conceito de ordenamento jurídico, vale dizer, na ideia deque o direito objetivo compõe-se de um conjunto de normas que não se encontram meramente justapostas e simintegradas, logicamente, em um único sistema60. Essa concepção foi elegantemente exposta por Hans Kelsen, naTeoria pura do Direito, pondo o fecho da unidade sistêmica do ordenamento em um pressuposto lógico-transcendental,por ele intitulado de norma fundamental61, e contornando, com isso, a evidência de que a ordem jurídica se origina dealgo que é externo ao direito, qual seja, a aceitação pela sociedade de uma Constituição ou de alguma sorte de normade re conhecimento62, da qual derive a força cogente de atos normativos emanados do Parlamento ou de normascostumeiras.

Da unidade sistêmica antes referida decorrem outras duas características atribuídas pelo positivismo aoordenamento jurídico, a coerência, isto é, nele não haveria normas incompatíveis entre si e a completude. Esse últimoelemento da Teoria do Direito positivista constitui, para Bobbio, “o coração do coração (se é lícita uma tal expressão)do positivismo jurídico”, pois está “estreitamente ligada ao princípio da certeza do direito, que é a ideologiafundamental deste movimento jurídico”. E prossegue invocando a observação de Radbruch no sentido de que “oprincípio da completitude do direito se apresenta necessário para conciliar entre si dois outros temas juspositivistasfundamentais: aquele segundo o qual o juiz não pode criar o direito e aquele segundo o qual o juiz não pode jamaisrecusar-se a resolver uma controvérsia qualquer”63.

A coerência do ordenamento jurídico é assegurada pelo estabelecimento dos chamados critérios de solução deantinomias, a saber, o hierárquico (lex superior derogat inferiori), o cronológico (lex posterior derogat priori) e daespecialidade (lex specialis derogat generali). Entretanto, não há como negar a insuficiência dos três critérios emalgumas situações, ou seja, “quando há um conflito entre os próprios critérios, no sentido de que a uma mesmaantinomia se possa aplicar dois critérios, cada um deles levando a um resultado diverso” e “quando não é possívelaplicar nenhum dos três critérios”, “visto que há duas normas antinômicas que são contemporâneas, paritárias egerais”64.

De igual modo, sem que se aparte do positivismo jurídico em sentido estrito, a tese da completude do ordenamentofoi submetida a severas críticas, que culminaram em certa relativização do conceito, como se verifica da rica exposiçãoda matéria feita por Karl Engisch65. Ao sumariar o pensamento do autor germânico, Maria Helena Diniz, em obramonográfica dedicada ao tema das lacunas no direito, anota que se admite “dessa forma a existência de autênticaslacunas na ordem jurídica que devem ser colmatadas pelo poder competente, mediante o emprego de mecanismos

jurídicos, a fim de que se mantenha como princípio a completude do sistema jurídico”66.O último elemento do edifício teórico positivista, considerado, como se advertiu de início, em seu sentido estrito, diz

respeito ao modo pelo qual se desenvolve a atividade de interpretação dos textos normativos. Em razão daimportância da matéria e de sua íntima conexão com o objeto da investigação que ora se desenvolve, dedicar-se-ámaior espaço ao assunto na Seção II do presente capítulo, em que se examinará a Teoria da Interpretação preconizadapelo positivismo clássico e a crítica a que foi dura-mente submetida, tanto pelas correntes dissidentes que seformaram sob o agasalho do positivismo metodológico, quanto por aqueles juristas que não se apartaram dopensamento positivista stricto sensu.

Sob influência do positivismo filosófico, o positivismo jurídico (estrito) buscou de todas as formas construir umateoria puramente cognoscitiva, isto é, que compreendesse o direito como ele é, não o submetendo a uma avaliaçãovalorativa ou ideológica. No entanto, pode-se afirmar que o objetivo não foi plenamente atingido, pois, visto de ummodo abrangente, o movimento positivista “parece não só um certo modo de entender o direito (de destacar-lhe oscaracteres constitutivos), como também um certo modo de querer o direito; parece, portanto, não somente uma teoria,mas também uma ideologia”67. Nas vertentes jurídicas e filosóficas que confluíram para a formação do positivismoalemão no século XIX percebe-se, facilmente, a presença da ideologia positivista, que culminou em autêntico culto aodireito estatal. Conforme ensina Karl Larenz, a Ciência Jurídica germânica do século XIX, “sob as vestes dohistoricismo, ocultava quase sempre uma índole racionalista e que (embora inconfessadamente), na medida em queconsiderava o Direito positivo como um organismo racional e assim o procurava compreender, alguma coisa conservavado pensamento jusnaturalista”68. Essa tendência ideológica, como atesta Bobbio, recebeu influência direta daconcepção hegeliana de Estado, que não lhe atribui mero valor técnico, não sendo o Estado “um simples instrumentode realização dos fins dos indivíduos (como é no pensamento liberal), mas um valor ético, é a manifestação suprema doEspírito no seu devir histórico e portanto é ele mesmo o fim último ao qual os indivíduos estão subordinados” 69. Essadivinização do direito estatal, que floresceu no idealismo jurídico alemão, caracteriza o que o jusfilósofo peninsulardenominou de versão “extremista” ou “forte” do positivismo ético, a qual recebeu críticas inflamadas da parte dos nãopositivistas, por haver contribuído, segundo eles, para a instalação de sistemas totalitários na Alemanha e na Itália naprimeira metade do século XX.

Importa advertir, já de início, que o vínculo entre o positivismo ideológico radical e o nazismo ou o fascismo estálonge de ser comprovado, até porque, no âmbito do positivismo, o culto à lei se faz (quando se faz) em um quadroinstitucional típico do Estado de Direito liberal, sabidamente incompatível com o modelo de Estado totalitário70. Osarautos do “novo Direito Constitucional brasileiro”, todavia, não se pejaram de utilizar o argumento emocional dareductio ad Hitlerum71, em seu firme intento de demonstrar a superação do positivismo (em sentido estrito, emboranão admitam que continuam vinculados à metodologia positivista)72.

De toda sorte, como demonstra Norberto Bobbio, “na história não se encontra um acordo permanente entrepositivismo jurídico e positivismo jurídico ético extremista”. Ao contrário, o que parece frequentar o modelo dogmáticopositivista é a versão moderada do positivismo ético, que “não se limita a considerar o direito como meio necessáriopara realizar a ordem, mas sustenta que a lei seja a forma mais perfeita de direito”, em face da generalidade eabstração que qualificam a lei em seu sentido material, traços peculiares esses que “faltam às normas jurídicasproduzidas pelas outras fontes”73.

4 As críticas à teoria positivista

Desde a sua consolidação enquanto proposta doutrinária de compreensão do fenômeno jurídico e de estruturaçãoda Dogmática, o positivismo foi submetido a intensas críticas. Algumas delas, como já se viu no item anterior,importaram na revisão de certos aspectos da doutrina positivista, porém sem o abandono da perspectiva teórica,mesmo em seu sentido estrito. Em outras situações, ainda que sem um retorno ao jusnaturalismo, sob o prismametodológico, houve um afastamento de tal ordem de postulados básicos do positivismo que se pode falar emconcepções do direito alternativas ao positivismo stricto sensu. Muitas dessas propostas teóricas conflitantes nãoresistiram à passagem do tempo, constituindo um mero “modismo” intelectual, logo superado pela evidência de suainadequação à realidade do sistema jurídico que pretendem explicar. Certas vertentes de Teoria do Direito,entretanto, se colocam no cenário atual como autênticas alternativas ao positivismo jurídico, chegando mesmo a lheroubar a primazia teorética, conquanto, em termos de funcionamento efetivo do sistema jurídico, nada pareçaameaçar-lhe a predominância.

A valorização excessiva do formalismo abstrato e do raciocínio dedutivo, típico da Jurisprudência dos Conceitos,escola que marcou a ascensão do positivismo na Alemanha do século XIX, foi verberada pela Jurisprudência dosInteresses de Jhering e Philipp Heck. Releva notar que a principal discrepância entre as duas tendências teoréticas sedeu no plano da aplicação judicial do direito e do uso dos métodos de interpretação. Destarte, “enquanto ‘a orientaçãoantiga, a jurisprudência dos conceitos’, limita o juiz ‘à subsunção lógica da matéria de facto nos conceitos jurídicos’ - e,nessa conformidade, concebe o ordenamento como um sistema fechado de conceitos jurídicos, promovendo assim ‘oprimado da lógica’ no trabalho científico do Direito —, a jurisprudência dos interesses tende, ao invés, para o ‘primadoda pesquisa vital e da valoração vital”’. Para a formulação crítica em destaque, a lei continua a ocupar posiçãopredominante no plano das fontes do direito, porém passa a ser vista não como um produto da razão abstrata e sim deinteresses concretos dos membros da comunidade. Daí o cerne da proposta teórica da Jurisprudência dos Interessesestar na exigência dirigida aos órgãos incumbidos da aplicação oficial do direito de conhecerem “com rigor,historicamente, os interesses reais que causaram a lei e de tomar em conta, na decisão de cada caso, os interessesque assim se descobriram”74. Para tanto a metódica adequada há de ser fundada na interpretação histórico-

teleológica, conforme propugnou Heck, em obra clássica dedicada à Hermenêutica75. Importa ter pre-sente, noentanto, que Jurisprudência dos Interesses não liberou a função jurisdicional de seu compromisso com os limitesimpostos pelo legislador, embora a tenha conectado à realidade social, configurando antes uma revisão crítica internaao positivismo jurídico do que a sua negação76.

Um aprofundamento da crítica formulada pela Jurisprudência dos Interesses conduziu, também na Alemanha, a umacorrente teórica que, efetivamente, rompeu com o positivismo. Trata-se do Movimento do Direito Livre, a que seassocia, principalmente, o nome de Eugen Ehrlich, por ter se valido da expressão “Teoria do Direito Livre” emconferência proferida em 190377. Na verdade, partem os adeptos do movimento da crítica à atividade de subsunçãomecânica, propugnada pelo positivismo no século XIX. Todavia, ao invés de apenas ampliarem a esfera de liberdade dointérprete-aplicador, acabam por instaurar o subjetivismo, ao eliminar por completo a vinculação do juiz ànormatividade legal, pois “é a vontade de chegar a uma decisão já antecipadamente conhecida que preside à escolhados lugares da lei que permitem fundamentar essa decisão”78. É flagrante, pois, a diferença de abordagem comrelação à Jurisprudência dos Interesses, que, fiel ao positivismo, influenciou significativamente a Dogmática Jurídica,ao passo que o Direito Livre não passou de “uma ventania romântica que assolou os domínios da Jurisprudência”79.

Uma visão panorâmica das correntes que se apartaram do positivismo jurídico em sentido estrito e que continuamexercendo influência nos domínios da Teoria do Direito permite a identificação de duas tendências diversas. De umlado a vertente sociológica, que, em oposição ao normativismo positivista, desloca o foco de análise para os elementosfáticos do fenômeno jurídico, principalmente para a contribuição das decisões judiciais na conformação pragmática dodireito. E, de outro lado, a vertente filosófica ou axiológica, que tenta recuperar, conquanto de modo restrito, o antigopostulado jusnaturalista de identificação entre direito e moral.

Na matriz sociológica, deve-se mencionar o realismo jurídico, de Karl Llewellyn e Jerome Frank, modelo dogmáticoque, a partir da década de 20 do século passado, passou a exercer grande influência teórica e prática nos EstadosUnidos. O realismo rompe com o pensamento positivista em um ponto importante, concernente ao posicionamentohierarquizado das fontes do direito, tendo a lei ou a Constituição como o escalão máximo. Na conhecida frase do juiz daSuprema Corte Charles Evans Hughes, ele mesmo um não realista80, nota-se a influência do movimento na primeirametade do século XX. Disse ele que nos Estados Unidos se vivia sob uma Constituição, “mas a Constituição é o que osjuízes dizem que é”81. Portanto, em autêntica inversão de sentido, a fonte do direito por excelência passa a ser ajurisprudência, consubstanciando as decisões judiciais, enquanto fatos normativos (criadores do direito) primários, oobjeto central da Dogmática, restando em segundo plano os atos legislativos e as construções doutrinárias. Explora-se, pois, uma dicotomia, que se tornou usual na doutrina estadunidense, entre o “direito formal, aquele queoficialmente deve prevalecer, expresso nos textos legais e nas compilações jurisprudenciais (o /aw in books)” e o“direito vivo ou ‘em ação’, que se constrói na prática (o /aw in action)”82.

A rejeição à exposição conceitual das estruturas normativas (provenientes das leis e precedentes judiciais) era tãogrande entre os realistas que se pode mesmo questionar se faziam eles ou não Teoria do Direito83. Por certo estavammais preocupados em refutar “a ‘teoria oficial’ do common /aw de então, no que diz respeito, especialmente, ao dogmada não construção do direito pelo juiz”. Afinal, segundo o entendimento doutrinário predominante, os magistradosdeveriam se limitar a aplicar as normas (legais ou advindas de precedentes) preexistentes, o que foi refutado pelorealismo sob o argumento da impossibilidade prática, sendo, portanto, necessário “abandonar as ficções doutrinais ereconhecer o papel decisivo do juiz no funcionamento do sistema jurídico”84. O realismo jurídico termina, desse modo,por rejeitar a própria estrutura normativa (dever-ser) do ordenamento jurídico, realçada pelo positivismo, aoconsiderar o direito um mero “conjunto de fatos, isto é, de decisões efetivamente tomadas (ou condutas assumidas) emrelação a um caso e empiricamente constatáveis”85.

Não se deve confundir o realismo jurídico com a chamada Jurisprudência Sociológica que se desenvolveu emparalelo, praticamente no mesmo período, nos Estados Unidos, tendo como seus dois maiores expoentes o juiz daSuprema Corte Benjamin Cardozo e o decano de Harvard, Roscoe Pound. Embora tendo diversos pontos em comumcom o realismo, mormente a crítica ao formalismo exacerbado e a priorização do estudo das decisões judiciais, aJurisprudência Sociológica não chegou a se apartar do positivismo jurídico em sentido estrito, não obstante tenhaavançado bastante sobre as deficiências do positivismo clássico. Com efeito, no campo da Teoria da Interpretação,Cardozo e Pound enxergam o exercício da jurisdição como uma atividade essencialmente criadora (e não meramentereprodutiva), orientada pelas “exigências da vida”, razão pela qual preconizam a opção preferencial pelo métodoteleológico. No entanto, como aponta Denis de Castro Halis, em artigo dedicado ao legado teórico de Benjamin N.Cardozo, aceitava ele a existência de limites ao exercício da criatividade jurisprudencial, pois “o juiz deve atuarcriativamente suprindo as fontes formais e, mesmo nesse âmbito, não pode, por exemplo, ‘restringir os princípiosgerais da organização judiciária, explícita ou implicitamente consagrados, nem formular uma regulamentaçãopormenorizada para o exercício de certos direitos, estabelecendo dilatações de prazo, de formalidades, de regras depublicidade’”86. Vale destacar, de outra parte, que o realismo jurídico, “com sua concepção instrumental de Direito foiretomado na década de oitenta, porém então renomeado para pragmatismo jurídico”, contando, dentre seuspropagadores, diversos integrantes da Suprema Corte, tais como Brandeis, Frankfurter, Jackson, Douglas, Brennan,Powell, Stevens, White e Breyer87.

Cabe, finalmente, examinar as propostas teóricas que, sem defender um retorno à Dogmática jusnaturalista,afastaram-se do positivismo ao postularem, em alguma medida, a coincidência entre o direito e a moral. Essacorrespondência não será necessária como no jusnaturalismo, que condicionava a existência do direito positivo à suaconformação ao direito natural, fazendo coincidir validade formal e validade ética (legalidade e legitimidade). Todavia,será vista como um objetivo a ser perseguido ou como uma tendência irrefreável. Não se pode aqui identificar umaescola ou movimento que tenha aglutinado os autores que adotam essa percepção do fenômeno jurídico, havendosignificativas diferenças entre eles, até porque alguns trabalham com sistemas filiados ao common law, ao passo queoutros se vinculam à tradição romano-germânica. No entanto, tomando como referência o antipositivismo ético que os

une, permito-me adotar a terminologia propugnada por Miguel Reale ao denominar essa alternativa teórica aopositivismo estrito de “moralismo jurídico”88.

Na Alemanha, o moralismo jurídico está intimamente associado à implantação de um sistema de controleconcentrado de constitucionalidade das leis com o advento da Lei Fundamental de Bonn e ao esforço doBundesverfassungsgericht em identificar uma ordem objetiva de valores, a partir do texto constitucional, servindo deanteparo a qualquer tentativa dos Poderes políticos de desvirtuamento do sistema democrático, pelo uso abusivo desuas franquias. Não é difícil surpreender na doutrina e jurisprudência germânicas posteriores à Segunda Guerra arevivescência do pensamento jusnaturalista, sem que isso implique, no entanto, o retorno à Dogmática do direitonatural89. Nesse sentido, Habermas é peremptório ao afirmar que “para o Tribunal Constitucional Federal, a LeiFundamental da República Federal da Alemanha não constitui um sistema de regras estruturado através deprincípios, mas uma ‘ordem concreta de valores’”90. Não é diferente a apreciação de García de Enterría, asseverandoque “se tornou usual falar, desde a promulgação da Lei Fundamental, de uma substituição do Estado de Direito emsentido formal por um Estado de Direito em sentido material, que justamente integra na própria legalidade os valoressuperiores e, paralelamente, por uma autêntica decisão constitucional pelo Direito Natural, ainda que isso já seja maisquestionável”91. Essa mesma concepção, qual seja, a da existência de uma ordem de valores externa que serve dereferência ao direito positivo está implícita na teoria dos direitos fundamentais de Alexy, pois, muito embora tenhatido o cuidado de precisar que os direitos fundamentais sempre emanam de normas jurídicas (positivas), sejam elasprincípios ou regras, essas normas são por ele equiparadas a valores, compondo um quadro de preferências dotado deum mínimo de objetividade e que, como tal, se impõe ao próprio Constituinte originário92.

O pressuposto teórico da existência de uma ordem objetiva de valores, com a pretensão de se impor ao direitopositivo, provoca consequências diretas no tocante à atividade de interpretação-aplicação de textos normativos. Nãopor outra razão, os moralistas jurídicos se empenham ao máximo em corrigir aquilo que identificam como desvios daordem de valores por eles idealizada. Como não negam a existência do direito positivo imperfeito (na sua visão), o seutrabalho será facilitado na medida em que a estrutura dos dispositivos objeto de interpretação conceda maiorliberdade ao exegeta-aplicador, como sucede com os textos normativos que se utilizam de conceitos indeterminados ouque veiculam normas principiológicas (comuns no âmbito constitucional). Essa liberdade de movimentação, por certo,não é incompatível com a teoria positivista, sendo, ao contrário, convertida no postulado da discricionariedade ouliberdade de escolha do aplicador por muitos de seus mais renomados adeptos93. No caso do moralismo jurídico,porém, acaba sendo convertida no fetiche da única solução correta. Ademais, sendo o intérprete-aplicador guiado peloobjetivo de aproximar o direito da moral, não se incomodará de ultrapassar as barreiras que o próprio direito positivose lhe antepõe, o que restará evidenciado mais adiante94.

Mas, “a adaptação do direito à moral pode ocorrer de forma ainda mais direta, admitindo que as normas quecontradizem as exigências morais percam sua validade”95, tal qual preconizava o jusnaturalismo. A esse propósito,Alexy professa o que Alfonso García Figueroa intitula de um jusnaturalismo fraco ou debilitado, com forte inspiraçãona obra de G. Radbruch. Parte o constitucionalista germânico da distinção entre quatro modalidades de normasjurídicas positivas: as moralmente indiferentes, as justas, as injustas e as extremamente injustas, sendo que a estasúltimas, e apenas a elas, deveria ser negada validade jurídica. Essa manobra, como bem observou o referido autorespanhol, “permite manter certa vinculação conceitual do Direito à moral, ao mesmo tempo em que evita a indesejávelconsequência de ter que afirmar que as normas jurídicas são necessariamente justas”96.

Ainda no contexto do moralismo jurídico, merece especial referência a construção teórica de Ronald Dworkin,sucessor de Hart no ensino da Filosofia do Direito em Oxford e que com ele travou intensa polêmica teorética. Dworkinestruturou uma proposta teórica de compreensão do direito extremamente complexa e original, mas que, por seconfessar peculiar a uma determinada cultura jurídica (a do direito anglo-americano), demonstra extrema fragilidadeem termos de Teoria do Direito, que se pressupõe geral97. O jusfilósofo em questão expressamente rejeita tanto opositivismo jurídico (em sentido estrito), por ele ora incluído no rol das teorias semânticas do direito (positivismoclássico), ora convertido em corrente intitulada de convencionalismo (positivismo interpretativo), quanto opragmatismo jurídico. E tal rejeição está fundada na diferente maneira de dar resposta a três questões tidas comocruciais à elaboração de um conceito de direito que melhor se adapte aos sistemas inglês e estadunidense, razão pelaqual formula a teoria do direito como integridade:

“Primeiro, justifica-se o suposto elo entre o direito e a coerção? Faz algum sentido exigir que a força pública sejausada somente em conformidade com os direitos e responsabilidades que ‘decorrem’ de decisões políticas anteriores?Segundo, se tal sentido existe, qual é ele? Terceiro, que leitura de ‘decorrer’ – que noção de coerência com decisõesprecedentes – é a mais apropriada? A resposta que uma concepção dá a essa terceira pergunta determina os direitose responsabilidades jurídicos concretos que reconhece.

(...)Do ponto de vista da minha sugestão conceitual, o pragmatismo jurídico é uma concepção cética do direito.

Responde negativamente à primeira pergunta que coloquei: nega que uma comunidade assegura alguma vantagemreal ao exigir que as decisões de um juiz sejam verificadas por qualquer suposto direito dos litigantes à coerência comoutras decisões políticas tomadas no passado.

(...)Como o convencionalismo, o direito como integridade aceita sem reservas o direito e as pretensões juridicamente

asseguradas. Contudo, responde à segunda pergunta de modo muito diferente. Supõe que a vinculação ao direitobeneficia a sociedade não apenas por oferecer previsibilidade ou equidade processual, ou em algum outro aspectoinstrumental, mas por assegurarem (sic), entre os cidadãos, um tipo de igualdade que torna sua comunidade maisgenuína e aperfeiçoa sua justificativa moral para exercer o poder político que exerce. A resposta da integridade àterceira pergunta – sua descrição da natureza da coerência com as decisões políticas do passado, exigida pelo direito –

apresenta uma diferença correspondente com a resposta dada pelo convencionalismo. Sustenta que direitos eresponsabilidades decorrem de decisões anteriores e, por isso, têm valor legal, não só quando estão explícitos nessasdecisões, mas também quando procedem dos princípios de moral pessoal e política que as decisões explícitaspressupõem a título de justificativa“98.

De modo diverso do moralismo jurídico alemão, Dworkin não concebe uma ordem objetiva de valores que sirva dereferência para correções e, em situações de injustiça extrema, para a validação formal do direito positivo. O própriosistema jurídico por ele tomado como referência (o dos Estados Unidos) é considerado a encarnação histórica dessaordem de valores, razão pela qual a coincidência entre direito e moral não se põe como objetivo a ser alcançado e simcomo um dado ou como uma tendência necessária99. Não se trata, é bem de ver, de nenhuma forma de determinismohistórico e sim da obediência ao pressuposto metodológico estabelecido por Dworkin, qual seja, o de que “o direitocomo integridade fornece tanto uma melhor adequação quanto uma melhor justificativa” da prática jurídicaestadunidense100.

5 Por um positivismo reflexivo e integral

Não é possível tratar de um tema como o dos limites ao poder criativo da jurisdição constitucional (em sentido amplo)e dos parâmetros ao correspondente ativismo judiciário sem explicitar os pressupostos de que se parte em termos deTeoria da Interpretação, a qual, por seu turno, se vincula, necessariamente, a determinado modo de compreender odireito, vale dizer, a determinada Teoria do Direito. O entrosamento desta com os saberes específicos da DogmáticaJurídica é muito mais intenso e profundo do que imaginam os operadores do direito e mesmo alguns juristas de perfilpragmático. Como adverte Habermas, a Teoria do Direito, “ao contrário das teorias filosóficas da justiça, movimenta-senos limites de ordens jurídicas concretas”, extraindo “os seus dados do direito vigente, de leis e casos precedentes, dedoutrinas dogmáticas, de contextos políticos da legislação, de fontes históricas do direito etc.”. Daí por que, “unindo-se à dogmática jurídica, privilegia a perspectiva jurídica”101.

Após uma breve resenha dos principais modelos dogmáticos que gozam de prestígio na atualidade, ou seja, opositivismo (em sentido estrito), o realismo (pragmatismo) e o moralismo jurídicos, cabe, agora, um posicionamentopessoal diante dessas vertentes teoréticas, assumindo-se a perspectiva de que não se cuida apenas de compreender ofenômeno jurídico, mas, igualmente, de influir na sua conformação.

De modo coerente com o perfil de minhas investigações passadas, importa deixar explícitos os pressupostospositivistas que orientam o presente trabalho.

Quanto à adoção do positivismo metodológico, que toma como objeto de estudo o direito vigente, não haveria comonão o praticar, salvo com prejuízo à cientificidade do discurso doutrinário subsequente. Mesmo os que constatam aperda de vigor do positivismo jurídico nas últimas duas ou três décadas, reconhecem que “não parece possível pensaruma teoria do direito que não seja em alguma medida positivista” 102.

Refiro-me, contudo, à convicção de que, com os ajustes por que passou ao longo de quase dois séculos depredomínio teórico, adicionados a outros que estão em curso, as bases do positivismo estrito continuam sólidas.

Não se registram controvérsias relevantes sobre a relação necessária existente entre coação e ordenamentojurídico, vista essa característica de uma perspectiva sistêmica103. O mesmo se diga quanto à imperatividade dodireito, registrando-se razoável consenso doutrinário em torno da configuração das normas jurídicas como proposiçõesprescritivas hipotéticas104.

A concepção sistêmica do direito imanente ao positivismo jurídico subsiste, conquanto as características decorrentesda coerência e da completude tenham sido relativizadas a partir de reflexões já absorvidas pela própria teoriapositivista. Assim, no veredicto de Bobbio, “um ordenamento jurídico não é necessariamente coerente, porque podemexistir no âmbito do mesmo ordenamento duas normas incompatíveis e serem ambas válidas la compatibilidade não éum critério de validade)”, do mesmo modo que “um ordenamento não é necessariamente completo, porque acompletitude deriva da norma geral exclusiva, ou norma de clausura, que na maior parte dos casos – excluído o direitopenal – não existe”105.

Sem que se possa falar em rompimento com o positivismo, Claus-Wilhelm Canaris trouxe importante contribuição àteoria do ordenamento, ao assentar que a regra estrutural106 da unidade do sistema jurídico não se reduz a um meropostulado lógico-jurídico, apresentando direta imbricação com o princípio da igualdade. No seu aspecto negativo, opostulado da unidade constitui “uma emanação do princípio da igualdade, enquanto procura garantir a ausência decontradições da ordem jurídica (...) e por outro – no seu componente positivo – ela não representa mais do que arealização da ‘tendência generalizadora’ da justiça, que exige a superação dos numerosos aspectos possivelmenterelevantes no caso concreto, a favor de uns poucos princípios, abstractos e gerais”107 . Esclareça-se, no entanto, que acaracterização do sistema jurídico como ordem axiológica se dá a partir de uma concepção formal do princípio daisonomia:

“A esse propósito deve-se, por fim, focar expressamente uma especificidade: quando se fala aqui, constantemente,da adequação dos valores, pretende-se significar isso mesmo. Não se trata, portanto, da ‘justeza material’, mas apenasda ‘adequação’ formal de uma valoração – na qual ‘formal’ não se deve, evidentemente, entender no sentido de ‘lógico-formal’ mas sim no sentido em que também se fala do caráter ‘formal’ do princípio da igualdade. Por outras palavras:não é tarefa do pensamento teleológico, tanto quanto vem agora a propósito, encontrar uma qualquer regulação‘justa’, a priori no seu conteúdo – por exemplo no sentido do Direito Natural ou da doutrina do ‘Direito justo’ – masapenas, uma vez legislado um valor (primário), pensar todas as suas consequências até ao fim, transpô-lo para casos

comparáveis, solucionar contradições com outros valores já legislados e evitar contradições derivadas doaparecimento de novos valores“108.

Quanto ao, por assim dizer, “legalismo positivista”, já restou esclarecido que não é característica elementar dopositivismo jurídico a afirmação da primazia da lei, em sentido formal, sobre as demais fontes do direito. Antes, se deveapontar como um postulado positivista o predomínio das fontes estatais do direito, com o que se deveria aludir a um“estatismo positivista”, ainda assim com a nota de que certos autores, como Kelsen, subordinam o ordenamentointerno ao direito internacional público109, parte dele oriundo da prática dos Estados e organizações internacionais110

e não da vontade dos Estados propriamente dita. Incidem, pois, em rematado equívoco os autores nacionais,usualmente adeptos do “neoconstitucionalismo”, que afirmam estar superada a concepção positivista de fontes dodireito por situar a lei (formal) no ápice da hierarquia sistêmica111. A suplantação da lei pela Constituição, no planodas fontes do direito (interno), dando ensejo ao chamado Estado Constitucional de Direito, em nada afetou aDogmática positivista, por não dizer respeito a um elemento essencial e sim meramente acidental ou conjuntural dessavertente teorética, presente na obra de autores europeus que produziram trabalhos anteriormente à consolidação dajurisdição constitucional na Europa, em meados do século passado. Tanto é assim que Hans Kelsen, um dos maisrepresentativos juristas filiados ao positivismo, posicionou a Constituição, e não a lei, no topo de sua pirâmidehierárquica, desconsiderado o pressuposto lógico-transcendental da norma fundamental112. Bem por isso, AlfonsoGarcía Figueroa observa que “o impacto do constitucionalismo se faz mais sensível onde representa uma verdadeiranovidade, isto é, na cultura jurídica estatalista e legicêntrica do continente”113. Na mesma linha, Luis Prieto Sanchísdemonstra que, sob o prisma descritivo, “o legalismo que se desenvolve na ciência jurídica europeia ao longo do séculoXIX é substancialmente correto”, porém, sob o prisma prescritivo, entendido como a defesa da “soberania da lei, porreunir esta uma série de condições que a fazem legítima, em particular seu fundamento democrático”, parece duvidoso“que o legalismo seja uma tese positivista”114.

No que se refere à Teoria da Interpretação não há problema algum em se reconhecer que era esse o “calcanhar deAquiles” do positivismo jurídico. Todavia, não tanto por se constituir a subsunção mecânica dos fatos concretos àsprescrições legais um dogma positivista, como usualmente se afirma, e sim pela pouca dedicação do positivismo aobinômio interpretação-aplicação, bem como a seus desdobramentos no plano da teoria da argumentação115. Assim,desde que se possam completar as lacunas teoréticas do positivismo nesse campo, sem comprometer a sua identidadeenquanto proposta de compreensão do direito, estará assegurada a validação do positivismo jurídico, em sentidoestrito, enquanto modelo dogmático, pouco importando a constatação de que um número crescente de autores,mormente no âmbito do Direito Constitucional, se diz antipositivista ou pós-positivista. É o que pretendo fazer napróxima seção, toda ela dedicada às questões envolvidas na concretização do direito.

Não penso que o positivismo jurídico produza, necessariamente um saber autocentrado e, por conseguinte, estéril,por se desvincular em demasia da realidade social e das aspirações valorativas da sociedade. A afirmação daDogmática Jurídica como Ciência autônoma voltada ao estudo do fenômeno jurídico sob o ângulo normativo e tendo porobjeto um determinado sistema jurídico ou a comparação intersistêmica trazia embutido o risco de alheamento domundo real, que, efetivamente, veio a se materializar, como bem atesta a Jurisprudência dos Conceitos ou oreducionismo normativista kelseniano116 . Entretanto, sem abrir mão de sua especificidade no plano epistemológico, épossível desenvolver um conhecimento dogmático que não perca a capacidade de refletir sobre si próprio e, o que éfundamental no caso de uma Ciência que lida com normas prescritivas, a capacidade de avaliar a sua funcionalidade,tendo em vista que participa da conformação do direito que estuda e, portanto, deve participar da busca dos objetivossócio-regulatórios desse mesmo ordenamento jurídico. Nesse sentido, é de vital importância a fundamentação daquiloque se constrói no âmbito dos setores específicos da Dogmática (os vários ramos do Direito) em termos de Teoria doDireito, tornando explícitos os pressupostos desse conhecimento setorial, no tocante ao conceito de direito, apercepção estrutural da ordem jurídica, o modo de construção de suas categorias lógicas, os métodos de trabalho como material normativo e seu substrato material etc. Não se pode perder de vista, de outra parte, as aberturas que aprópria faticidade do sistema jurídico oferece ao conhecimento dogmático. De todo o conjunto das CiênciasDogmáticas do Direito, o Direito Constitucional é o que melhor explora essa abertura, por permitir a visualização doprocesso de formação do sistema jurídico, o que juridiciza na forma da teoria do Poder Constituinte. Mas, a atençãoaos elementos genéticos do sistema jurídico, como proficuamente reivindicou a Jurisprudência dos Interesses, é deextrema importância para todos os setores da Dogmática, atenuando, sobremaneira, a neutralidade que okelsenianismo atribuiu ao operador do direito e aos seus estudiosos. Não se nega que os magistrados ou os juristasexerçam suas respectivas atividades (operacionais ou científicas) de modo diverso dos representantes políticos, emrelação ao direito. Estes últimos praticam a política legislativa, com acentuada liberdade de opção entre as diretrizesem disputa, ao passo que aqueles outros devem respeitar as opções feitas, sendo-lhes facultada apenas amovimentação permitida pela normatização das escolhas políticas primárias117. Essa abertura à faticidade justifica aimportância do conhecimento agregado por Ciências Jurídicas de perfil zetético, como a Sociologia, a Filosofia doDireito e a História do Direito118, que não devem permanecer distantes das preocupações de quem lida com o saberdogmático em primeiro plano119.

Além de um positivismo reflexivo, propugno por um positivismo integral, isto é, que leve em conta a tríplice estruturado fenômeno jurídico, tão bem caracterizada na obra filosófica de Miguel Reale. Ao cuidar da nomogênese jurídica, oMestre das Arcadas associou os elementos fáticos e axiológicos à interferência necessária do poder, prelecionandoque “o aparecimento de cada regra jurídica marca o momento culminante de uma experiência jurídica particular, aqual é solidária das demais, através de conexões múltiplas, umas aparentes e facilmente identificáveis, outrassubentendidas ou ocultas nas tramas das relações sociais”. Daí por que se pode “dizer que os valores são como quefachos luminosos que, penetrando na realidade social, se refrangem em um sistema dinâmico de normas, cada umadelas correspondente a uma decisão”120. Ao contrário do que se lê com frequência na literatura jurídica nacional, nãoé inerente ao positivismo jurídico a completa abstração dos aspectos fáticos e axiológicos do fenômeno jurídico, que a

ele se associa por força do prestígio da obra de Kelsen, tomada como uma autêntica “bíblia” positivista. Aliás, comoobservou Miguel Reale, sequer a teorização do fundador da Escola de Viena se mostra totalmente refratária àcomposição tricotômica do direito, porquanto nela está implícita, professando Kelsen um “liberalismo cético, afinalista,porque aberto igualmente a todos os fins”121.

No que concerne à matéria fática de que se compõe ordenamento jurídico, a sua importância, que já houvera sidosalientada pela Jurisprudência dos Interesses, se tornou ainda maior com o advento da moderna Teoria daInterpretação. Com efeito, a partir da premissa gadameriana de que todo ato de interpretação é também um ato deaplicação da norma interpretanda, não se pode mais subestimar a relação entre os elementos semânticos postos pelanorma em sua expressão textual e a realidade fática assim recortada e que, em um processo de interação dinâmicoconduzido pelo intérprete-aplicador, acabarão por se converter na norma jurídica propriamente dita (de conduta ou dedecisão)122. E, mais do que isso, de há muito se consolidou, ainda sob o influxo da Hermenêutica clássica, construídasob os auspícios do positivismo jurídico, a ideia de que o direito deve guardar relação de funcionalidade comreferência à vida social que pretende regular, o que fica patente diante do prestígio adquirido pelo métodoteleológico-evolutivo123.

Mas, também, no plano axiológico, creio ser possível permanecer trabalhando dentro dos marcos do positivismoteórico, sem que se tenha que partilhar do ceticismo ou do relativismo ético de alguns renomados positivistas. Tanto ojusnaturalismo clássico, quanto a forma enfraquecida com que se apresenta hodiernamente, aqui intitulada demoralismo jurídico, trazem embutido um certo ontologismo axiológico, encarando os valores como objetos ideais,“anteriores a qualquer processo histórico, porque eternos”, sendo a história “uma tentativa incessante de atingir essemundo transcendente (...), através de intuições124, que seriam as únicas vias de acesso até as realidadesestimativas”125. Daí o idealismo em que incidem ao analisar o fenômeno jurídico, chegando, no limite, a recusarvalidade formal (vigência) a normas jurídicas positivas, por inadequação ao modelo de direito que tomam porreferência, correspondente a um ideal de justiça dotado de objetividade direta ou ontológica. Tal idealismo sim seopõe claramente ao postulado positivista de separação entre direito e moral, enquanto conjuntos distintos deimperativos prescritivos. Para o positivismo, o direito positivo é dotado de objetividade direta, que decorre daformalização de seus mandamentos em textos dotados de existência comprovável. Ao contrário, os valores morais são“algo que o homem realiza em sua própria experiência e que vai assumindo expressões diversas e exemplares, atravésdo tempo”. Isso não significa, contudo, que os valores não tenham objetividade indireta, radicada na demonstração deque determinadas manifestações históricas da consciência ética, depuradas com o uso da razão, melhor exprimem anatureza humana, sem prejuízo do desenvolvimento contínuo desse processo de avaliação crítica da objetividade dosvalores fundamentais da pessoa humana, mediante interação dialética 126 entre o mundo do ser e o mundo do dever-ser127. Muito embora reconheça ser muito frequente entre os adeptos do positivismo jurídico o relativismo moral deperfil liberal, não partilho desse ponto de vista, sem, entretanto, refutar o postulado metodológico da separação entredireito e moral128. A crítica à orientação axiológica do direito vigente é feita, como se sabe, por meio da PolíticaLegislativa ou Política do Direito, Ciência de caráter zetético que combina a investigação de todos os aspectos(sociológicos, axiológicos e de técnica legislativa) que confluem na nomogênese jurídica. Entretanto, mesmo partindoda realidade do direito vigente pode-se postular que, observados certos limites e condicionamentos, os espaçosdeixados em aberto pelo legislador sejam completados ou supridos por meio de processos interpretativos queconsiderem os valores fundamentais da pessoa humana aceitos por determinada sociedade, aceitação para a qualtambém contribuem os operadores do sistema jurídico e os seus construtores teóricos.

Em suma, com algumas importantes correções de rota, creio que o positivismo jurídico possa satisfazer à“necessidade do discurso científico integral”, ressaltada por António Menezes Cordeiro129, bem como à ponderação deAlfonso García Figueroa, para quem “o que se pede ao positivista certamente é um maior compromisso com a filosofiamoral e com a teoria da argumentação jurídica”130.

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