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AULA 01 DIREITO PROCESSUAL CIVIL PROF. FREDIE DIDIER 24 de janeiro de 2012 RICARDO S. TORQUES 1 MATÉRIA INTRODUÇÃO AO DIREITO PROCESSUAL CIVIL Conceito de processo A palavra processo pode ser compreendida em três aspectos. Em qualquer um desses sentidos a definição de processo está correta. Devemos entender que são três maneiras diferentes de se definir processo, por perspectivas diversas. Pela primeira acepção, podemos vislumbrar PROCESSO NA TEORIA DA NORMA JURÍDICA, que significa o modo (método) de produção de uma norma jurídica. Toda norma jurídica é resultado de um processo que lhe antecede. A norma jurídica é precedida de um processo. Assim, para que uma lei surja é necessário um processo legislativo. Ora, uma norma administrativa é produto de um processo administrativo. Podemos incluir, nesse contexto, as normas jurisdicionais, que é produto do processo jurisdicional. O problema é que nos pensamos apenas em processo jurisdicional, seja ele civil, seja ele penal; de toda forma, por meio desta acepção podemos falar também em processo administrativo e processo legislativo. Assim: Atualmente, a doutrina fala em processos privados. Isso vem se difundindo sobre outros ramos jurídicos, como, por exemplo, ao se falar em processo obrigacional. Ao estudarmos direito civil, na parte referente às obrigações, os professores da matéria, de forma geral, mencionar um desmembrar de atos que se sucedem nas relações obrigacionais, de forma que é possível afirmar a existência de um processo obrigacional. Pela segunda acepção, PROCESSO É ENTENDIDO NA PERSPECTIVA DOS FATOS JURÍDICOS, que significa uma espécie de ato jurídico complexo. Processo é um conjunto de atos organizados em si para a produção de um ato final. Simboliza-se esta acepção pela figura de uma corrente: ato jurídico complexo ato jurídico •produto do processo legislativo leis •produto de um processo administrativo norma administrativa •produto de um processo jurisdicional (civil e penal) normas jurisdicionais

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AULA 01 – DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROF. FREDIE DIDIER

24 de janeiro de 2012

RICARDO S. TORQUES 1

MATÉRIA

INTRODUÇÃO AO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Conceito de processo

A palavra processo pode ser compreendida em três aspectos. Em qualquer um desses sentidos a definição de

processo está correta. Devemos entender que são três maneiras diferentes de se definir processo, por perspectivas

diversas.

Pela primeira acepção, podemos vislumbrar PROCESSO NA TEORIA DA NORMA JURÍDICA, que significa o modo

(método) de produção de uma norma jurídica. Toda norma jurídica é resultado de um processo que lhe antecede. A

norma jurídica é precedida de um processo.

Assim, para que uma lei surja é necessário um processo legislativo. Ora, uma norma administrativa é produto de um

processo administrativo. Podemos incluir, nesse contexto, as normas jurisdicionais, que é produto do processo

jurisdicional. O problema é que nos pensamos apenas em processo jurisdicional, seja ele civil, seja ele penal; de toda

forma, por meio desta acepção podemos falar também em processo administrativo e processo legislativo.

Assim:

Atualmente, a doutrina fala em processos privados. Isso vem se difundindo sobre outros ramos jurídicos, como, por

exemplo, ao se falar em processo obrigacional. Ao estudarmos direito civil, na parte referente às obrigações, os

professores da matéria, de forma geral, mencionar um desmembrar de atos que se sucedem nas relações

obrigacionais, de forma que é possível afirmar a existência de um processo obrigacional.

Pela segunda acepção, PROCESSO É ENTENDIDO NA PERSPECTIVA DOS FATOS JURÍDICOS, que significa uma espécie

de ato jurídico complexo. Processo é um conjunto de atos organizados em si para a produção de um ato final.

Simboliza-se esta acepção pela figura de uma corrente:

ato jurídico complexo

ato jurídico

•produto do processo legislativo leis

•produto de um processo administrativo norma administrativa

•produto de um processo jurisdicional (civil e penal) normas jurisdicionais

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Esta é a forma mais simples de se observar o processo. Cada um desses atos – representados graficamente pelos

anéis em separados –, são organizados, são encadeados num conjunto de atos maior. Contudo, cada ato em

separado do processo tem vida própria. Quando eles se juntam, se organizam, eles formam um outro ato, que é

denominado de ato complexo. Nesta acepção, processo é igual a procedimento.

Finalmente, pela terceira acepção, temos PROCESSO COMO RELAÇÃO JURÍDICA, que significa o feixe de relações

jurídicas, formadas pelos sujeitos processuais.

São vários sujeitos processo que estabelecem entre si relações dentro do processo, que passam a se relacionar

juridicamente em razão dos atos processuais. Essas relações jurídicas, são relações jurídicas processuais.

Notemos que o processo serve tanto para designar tanto um conjunto de atos jurídicos, quanto um feixe de relações

jurídicas. Tanto é que aparece nas doutrinas que o processo é o procedimento mais relação jurídica. Graficamente:

Quando se fala que o processo é uma relação jurídica, devemos compreender isso como uma figura de linguagem,

que quer expressar um feixe de relações jurídicas.

Em suma:

Três vetores metodológicos para a compreensão do direito processual

A compreensão do direito processual moderno exige a compreensão das três perspectivas. O exame do direito

processual deverá ser sempre o resultado de uma abordagem em três dimensões. Contudo o estudo de tais vetores

são interdisciplinares, o que torna o estudo pouco estranho à temática processual, ao menos, agora de início. Com o

desenvolver da matéria perceberemos que esses vetores estarão irradiados em todos os institutos processuais civis.

procedimento relação jurídica

PROCESSO

PROCESSO NA TEORIA DA NORMA JURÍDICA:

• significa o modo de produção da norma jurídica (processo administrativo, processo legislativo, processo jurisdicional)

PROCESSO NA PERSPECTIVA DOS FATOS JURÍDICOS

• significa espécie de ato complexo, pelo encademanto de uma série de atos (corrente);

• este conceito aproxima o processo do da ideia de procedimento.

PROCESSO COMO RELAÇÃO JURÍDICA:

• significa um feixe de relações jurídicas, formadas pelos sujeitos processuais.

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O primeiro vetor exige o estudo da relação entre processo e direito material. Inicialmente, devemos compreender

que o processo existe para a solução de um problema, para a solução de um caso, para a resolução de questões de

direito material. Não existe um processo oco, ele precisa ter conteúdo, qual seja: um caso, um problema.

Este problema – conteúdo do processo – definirá como o processo se organizará. Por exemplo, a parte leva ao juiz o

problema: necessidade de despejo de alguém. Todo o aparato judiciário irá se amoldar àquele problema que irá ser

solucionado, ou seja, a demanda será proposta perante a vara cível, pelo procedimento ordinário (regra) etc.

Atentemos: o problema levado ao judiciário é o direito material: direito à posse do bem, segundo nosso exemplo. O

processo, por sua vez, nasce em função (vinculado, correlacionado) ao direito material.

O direito material afirmado em juízo dá sentido ao processo. Somente podemos estudar processo, tendo em vista o

direito material relacionado. Por exemplo, as intervenções de terceiro somente fazem sentido quando se sabe o

direito material discutido, ele é imprescindível para saber a modalidade de intervenção de terceiros envolvida.

Isso significa dizer que o processo está numa posição inferior ao direito material? Não, porque é o processo que

efetiva o direito material, ele o processo que realiza o direito material. O direito material, portanto, precisa do

processo para ser concretizado. A relação entre direito material e processo é uma relação semelhante entre um

arquiteto e um engenheiro. O arquiteto imagina algo, que será concretizado pelo engenheiro.

Assim:

Essa relação entre processo e direito material é de simbiose, de complementariedade, consiste na

instrumentalidade do processo. A instrumentalidade no processo é a forma de compreender o processo a partir do

direito material.

Isso não implica subordinação ou hierarquia entre ambos. Cada um exerce sua função:

Direito material Direito Processual: o direito material serve ao processo, dando a ele sentido, dando-lhe a razão

de ser.

Direito material Direito Processual: o direito processual serve ao direito material, dando a ele concreção,

conferindo efetividade ao direito material.

A isto entendemos por relação circular entre direito processual e direito material. Graficamente:

arquiteto direito material

engenheiro direito processual

direito processual

direito material

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O processo serve ao direito material ao tempo em que é servido por ele.

O segundo vetor consiste na relação entre o processo e a teoria do direito. O direito processual não é uma ilha que

fica imune à teoria do direito. A abordagem mais moderna do direito processual é abordagem da ciência do processo

à luz da ciência do direito (da Teoria do Direito).

Nos últimos anos, a Teoria do Direito sofreu enormes mudanças, que acabaram por impactar a ciência do processo.

Vamos analisar em que ponto as alterações na Ciência do Direito trouxeram implicações ao direito processual civil.

São seis as mais importantes. Essas transformações podem ser subdividas em dois grupos: 1º) grupo de mudanças na

teoria das fontes do direito; e 2º) grupo de mudanças hermenêutica jurídica. São dois nichos da Teoria do Direito,

vejamos:

1º) mudanças na teoria das fontes

1. reconhecimento da eficácia normativa dos princípios

Hoje é cediço na doutrina que o princípio é espécie de norma jurídica. É possível decidir com base nos

princípios. O juiz decide com base no direito, que comporta não apenas regras, mas princípios.

É importante desmistificar, inicialmente alguns conceitos inadequados. Cotidianamente, tratamos como

princípios todas as normas importantes de determinado ordenamento jurídico. Isso está incorreto. Por exemplo, há

uma norma que estabelece que toda decisão deve ser motivada. Isso, na realidade, é regra, não é princípio; ainda

assim, boa parte dos aplicadores do direito dizem-no princípio da motivação. Outro exemplo é a proibição de prova

ilícita, que se constitui em regra. Não é princípio. Outro equívoco é compreender que toda norma que consta da

Constituição é princípio. Isso é um erro, pois a Constituição é um conjunto de normas que comportam tanto

princípios quanto regras. Um terceiro erro, é a compreensão de que todo princípio está na Constituição, ou tem no

texto constitucional marco definidor. Isto não é verdade, pois existem princípios, tal como o princípio da menor

onerosidade da execução, que está fundado no CPC, não na Constituição. Por fim, é equivocado a ideia de que, em

eventual conflito entre princípios e regras, aquele deve prevalecer.

Em suma, são equívocos que devemos, desde logo, afastar para a correta compreensão do estudo dos

princípios e sua força normativa diante do processo civil (e da Teoria do Direito):

o fato de serem normas importante não implica dizer que constituem princípios (pode até ocorrer,

mas não é a regra);

o fato de a norma estar na Constituição Federal não implica dizer que constitui princípio;

o fato de que todo princípio está cunhado expressa ou implicitamente no texto da Constituição; e

o fato de que em eventual conflito entre regras e princípios este deverá prevalecer.

Todas as ideias acima são equivocadas!

Os princípios, atualmente, são encarados como normas. No Projeto do CPC, para denotar a importância e a

presença cada vez mais marcante no direito processual civil, o primeiro capítulo é “Dos princípios processuais”1.

1 Para este assunto recomenda-se a leitura do livro de Humberto Ávila, intitulado Teoria dos Princípios, publicado pela Editora Malheiros.

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2. reconhecimento da eficácia normativa da jurisprudência.

A jurisprudência deixa de ser vista como uma fonte auxiliar do direito. A jurisprudência pela atual teoria das

fontes está ao lado da lei, como fonte do direito. Atualmente, as decisões judicias constituem normas jurídicas. No

Projeto do Novo CPC essa ideia fica bem clara, havendo, inclusive, capítulo para tratar da eficácia da jurisprudência.

3. desenvolvimento de uma técnica legislativa das cláusulas gerais2

Na estrutura de uma norma jurídica temos a hipótese e um consequente normativo, ou seja, o legislador

prevê uma hipótese em abstrato, que se amoldar-se à situação em concreto – implicará o consequente. A hipótese

dirá quando a consequência irá ocorrer. O ideal é que a hipótese seja bem clara e o consequente normativo seja

bem definido, como é, por exemplo, a regra do art. 121, do CP:

Art 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

Contudo, o legislador não tem a capacidade de prever todas as possibilidades do mundo contemporâneo, da

vida em sociedade; nem mesmo consegue definir a melhor solução a ser tomada em razão da dinâmica da vida. Em

razão disso, a técnica das cláusulas gerais ganha importância cada vez maior em nosso ordenamento jurídico.

Por exemplo, todos devem comportar-se de acordo com a boa-fé. Esse excerto não explica o que é

comportar-se de acordo com a boa-fé, ou seja, a hipótese é indeterminada. E se a pessoa não se comportar de

acordo com a boa fé? O CPC nada diz também; o consequente também está em aberto. Temos um texto normativo

que é aberto na hipótese e aberto no consequente normativo. A cláusula geral é indeterminada nos extremos.

Portanto, cláusulas gerais são normas com diretrizes indeterminadas, que não trazem expressamente o

conceito do próprio termo (a hipótese), não se estabelece a priori o significado do termo, tampouco as

consequências jurídicas da norma (a consequência)3.

As cláusulas gerais nasceram e se desenvolveram no direito civil. Atualmente, todavia, as cláusulas gerais se

disseminaram pelos diversos ramos jurídicos, dentre eles, o processo civil. No Projeto do Novo CPC, dos onze

primeiros artigos, seis deles são cláusulas gerais. Isso evidencia o rumo que o direito processual civil está tomando

em relação às cláusulas gerais.

São exemplos de cláusulas gerais processuais presentes no ordenamento processual civil atual:

devido processo legal (é a mais importante), conforme o art. 5º, LIV, da CF:

(...)

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

(...)

cláusula geral executiva, conforme §5º, do art. 461, do CPC:

2 Sobre o tema recomendamos a leitura do texto de Judith Martins-Costa, presente na Revista de Legislação Informativa do Senado, intitulado

“O Direito Privado como Sistema em Construção”. Além disso, recomendamos a leitura do texto do Professor (fredie Didier), sobre o assunto: cláusulas gerais, presente em seu site: www.frediedidier.com.br. 3 Diferencia-se conceito indeterminado de cláusula geral. O conceito jurídico indeterminado é um termo, enquanto que a cláusula geral é um

conceito completo. Os conceitos jurídicos indeterminado são expressões vagas ou imprecisas que está presente no texto legal, cuja discussão se dá em torno do seu significado, não sobre sua hipótese e consequência. Por exemplo, o art. 927,do CC, fala em “atividade de risco”. Este termo é indeterminado, não se está aqui a discutir qual é a hipótese ou a consequência, até porque sabe que se a atividade for considerada de risco, as consequências estão expressamente previstas. Discute-se, apenas, o significado do termo. Outro exemplo: “havendo prova inequívoca, concede-se tutela antecipada”. Não há cláusula geral, mas há um conceito indeterminado. A consequência está determinada (concessão da tutela antecipada), entretanto, o que constitui prova inequívoca? Este é o conceito indeterminado.

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(...)

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de

ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de

atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade

nociva, se necessário com requisição de força policial.

(...)

cláusula geral de adequação da jurisdição voluntária, conforme o art. 1.109, do CPC;

Art. 1.109. O juiz decidirá o pedido no prazo de 10 (dez) dias; não é, porém, obrigado a observar critério de

legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou oportuna.

Atualmente, as cláusulas gerais não são mais um assunto específico do direito civil, mas um assunto que

circunscreve todo o direito.

É importante mencionar, por fim, que as cláusulas gerais não são normas, mas apenas texto legal. É meio a

partir do qual se estrai, por meio do processo interpretativo, a norma aplicável ao caso concreto, tendo em vista

as circunstâncias do caso concreto.

2º) mudanças na hermenêutica jurídica

A hermenêutica como ramo do pensamento jurídico autônomo nasceu a 50 anos aproximadamente. A abordagem

científica do assunto é recente, em razão da revolução do pensamento filosófico, nos temas de semiótica,

linguagem, dentre outros. Vejamos as mudanças:

1. distinção indispensável entre texto e norma

A norma não se confunde com o texto. Aquele é resultado da interpretação da lei. A lei é apenas um veículo

para a construção da norma. Esse entendimento é considerado trivial dentro do meio acadêmico.

Vejamos, existe norma sem texto? Sim, por exemplo, onde está o texto do princípio da segurança jurídica.

Na realidade, é uma norma sem lastro em texto, que é extraída da sistemática da Constituição.

Por outro lado, existe texto sem norma? Sim, o exemplo mais fácil é o preâmbulo constitucional, que

embora texto normativo, dele não se extrai norma alguma.

Além disso, um texto legal pode produzir normas diversas a depender do contexto.

2. constatação de que quem interpreta cria

A interpretação é uma atividade criativa. O problema que exsurge é o controle do processo interpretativo.

De acordo com a doutrina, o processo é meio civilizatório que serve de controle do processo hermenêutico, tendo

em vista que é possível à parte interpretar desde que dentro das regras estabelecidas em lei.

3. máximas da proporcionalidade e da razoabilidade

Portanto, graficamente, temos:

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O terceiro vetor, e último, é a relação entre o processo e o direito constitucional. A Constituição de 1988 possui

inúmeras normas processuais. Boa parte do direito processual está previsto no texto constitucional, além de a

própria Constituição determinar como o processo deve ser nos seus aspectos gerais.

Assim, de um lado a Constituição incorpora texto, do outro ela determina como o processo deve ser.

A Teoria Constitucional do Direito ganhou força nos últimos 15 anos. Tudo, hoje, envolve a Constituição. O direito

constitucional passou por inúmeras mudanças, vamos analisar as três principais:

1. reconhecimento da força normativa da Constituição

Vejamos, por exemplo, a decisão do STF que reconheceu como família a união entre pessoas do mesmo

sexo, com base no princípio constitucional da dignidade, sem qualquer lastro infraconstitucional. Essa decisão nada

mais é do que o reconhecimento da força normativa da Constituição.

2. aprimoramento da jurisdição constitucional

É tranquilo dizer que o juiz faz controle de constitucionalidade das leis. O processo teve que ser remodelado

para atender à jurisdição constitucional, ao processo constitucional de controle de constitucionalidade. Tanto que os

processualistas modernos estão dedicando em seus manuais, capítulo sobre controle de constitucionalidade.

O primeiro dispositivo do Projeto do Novo CPC prevê a interpretação do Código a partir da Constituição. Isso

é símbolo de que não é possível compreender o direito constitucional sem entender a Constituição

3. teoria dos direitos fundamentais (alteração mais importante)

relação entre processo e teoria do direito

mudanças na teoria das fontes

reconhecimento da eficácia normativa dos

princípios;

reconhecimento da eficácia normatiba da

jurisprudência; e

desenvolvimento de uma técnica

legislativas das cláusulas gerais.

mudanças na hermenêutica jurídica

distinção indispensável entre texto e norma;

constatção de que quem interpreta cria; e

máximas da proporcionalidade e da

razoabilidade.

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A Teoria dos Direitos Fundamentais promoveu enormes mudanças no Direito como um todo. Os direitos

fundamentais são entendidos como conteúdo mínimo do qual não se pode descurar. O legislador deve respeitar o

mínimo ético que são os direitos fundamentais.

Não há como iniciar o estudo do direito processual sem perpassar pelos direitos fundamentais, tanto é que

várias regras do direito processual são expressões, por perspectivas diversas, dos direitos fundamentais.

De acordo com a doutrina, os direitos fundamentais podem ser interpretados por duas frentes:

como situações jurídicas de vantagem que as pessoas possuem em relação às demais (direito a

propriedade, direito a alimentos, etc.). Essa dimensão dos direitos fundamentais é denominada de

dimensão subjetiva dos direitos fundamentais; e

como normas que determinam como o direito positivo deve ser construído, prescrevendo como o

direito positivo deve ser construído. Essa dimensão dos direitos fundamentais é denomina de

dimensão objetiva dos direitos fundamentais.

Relacionando os direitos fundamentais com o direito processual:

pela dimensão OBJETIVA, qualquer norma processual deve estar em CONFORMIDADE COM AS NORMAS

DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS; e

pela dimensão SUBJETIVA, o processo é um instrumento de realização dos direitos fundamentais, devendo O

PROCESSO ESTAR ADEQUADO PARA A TUTELA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS.

Esquematizando:

•os direitos fundamentais são situações jurídicas de vantagem

Dimensão obejtiva:

•os direitos fundamentais são normas que se impõe ao direito positivo.

Dimensão subjetiva:

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reconhecimento da força normativa da Constituição;

aprimoramento da jurisdição constitucional; e

teoria dos direitos fundamentais (divide-se em

duas frentes)

dimensão objetiva - direito fundamental como norma;

dimensão subjetiva - direito fundamental como situação

jurídica de vantagem.

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Em suma, podemos dizer que nos últimos anos podem ser identificadas nove transformações na Teoria do Direito,

hoje aceitas com tranquilidade pelos meios acadêmicos, que impactaram o direito processual civil. São elas:

1. reconhecimento da força normativa da Constituição;

2. aprimoramento da jurisdição constitucional;

3. teoria dos direitos fundamentais;

4. reconhecimento da eficácia normativa dos princípios;

5. reconhecimento da eficácia normativa da jurisprudência;

6. mudanças na hermenêutica jurídica;

7. distinção indispensável entre texto e norma;

8. constatação de que quem interpreta cria; e

9. máximas da proporcionalidade e da razoabilidade.

Outras transformações são identificadas, mas essas são as principais, tendo acontecido numa conjunção histórica:

nos últimos 50 ou 60 anos aproximadamente. São alterações recentes que colocarão, como veremos adiante, em

xeque a instrumentalidade do processo por seu aspecto tradicional. A esse conjunto de transformações do

pensamento jurídico deu-se um nome: NEOCONSTITUCIONALISMO.

Há, ainda, uma indefinição sobre esses pontos, que ainda estão se estruturando e se consolidando seja no meio

acadêmico, seja na jurisprudência.

Além disso, há parte da doutrina que entende que o termo “neoconstitucionalismo” é inapropriado, pois houve uma

transformação no próprio positivismo jurídico, que transcendeu o ramo do direito constitucional para chegar a todos

os ramos do direito. Defendem esses autores o termo NEOPOSITIVISMO, cuja significação é, em essência a mesma

do Neoconstitucionalismo. Outra definição tentada pela doutrina é “POS-POSITIVISMO”. Está, na realidade, recebe

críticas porque não explica nada, apenas diz que estamos em fase posterior ao positivismo.

Assim:

NEOCONSTITUCIONALISMO = NEOPOSITIVISMO = POS-POSTIVISMO

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QUESTÕES

QUESTÃO 01 - CESPE - 2011 - AL-ES - Procurador

Acerca dos princípios do processo civil na doutrina e na jurisprudência do STF e do STJ, assinale a opção correta.

a) A dispensa de publicação prévia de pauta de julgamento viola o devido processo legal.

b) O desentranhamento da petição de contestação, em caso de decretação da revelia, ofende o princípio da ampla

defesa.

c) Os prazos diferenciados para a fazenda pública, para o MP e para a defensoria pública ofendem o princípio da

igualdade processual.

d) A concessão de medidas liminares sem a oitiva da parte contrária (inaudita altera pars) ofende o princípio do

contraditório e da ampla defesa.

e) Se, na fundamentação da sentença, o juiz adotar como razão de decidir apenas o parecer do membro do MP

como fiscal da lei, então essa conduta ofenderá o princípio da motivação das decisões judiciais.

QUESTÃO 02 - FCC - 2011 - TCE-SP – Procurador

O princípio geral do processo que atribui às partes toda a iniciativa, seja na instauração do processo, seja no seu

impulso, é o princípio

a) do devido processo legal.

b) inquisitivo.

c) dispositivo.

d) da eventualidade.

e) da verdade real.

QUESTÃO 03 - TRT 23ª REGIÃO (MT) - Juiz

Segundo o art. 5° , inciso XXXV, da Constituição Federal, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou

ameaça a direito. Esta regra consagra o princípio:

a) da indelegabilidade da jurisdição;

b) da inafastabilidade da jurisdição;

c) do juiz natural;

d) da inevitabilidade da jurisdição;

e) da indeclinabilidade.

Gabarito

QUESTÃO 01- B QUESTÃO 02 – C QUESTÃO 03 - B

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QUADROS

1) Conceito de Processo

2) Vetores metodológicos para a compreensão do direito processual civil

Isso evidencia a...

RELAÇÃO CIRCULAR ENTRE DIREITO PROCESSUAL E DIREITO MATERIAL

PROCESSO NA TEORIA DA NORMA JURÍDICA:

• significa o modo de produção da norma jurídica (processo administrativo, processo legislativo, processo jurisdicional)

PROCESSO NA PERSPECTIVA DOS FATOS JURÍDICOS

• significa espécie de ato complexo, pelo encademanto de uma série de atos (corrente);

• este conceito aproxima o processo do da ideia de procedimento.

PROCESSO COMO RELAÇÃO JURÍDICA:

• significa um feixe de relações jurídicas, formadas pelos sujeitos processuais.

1º vetor: relação entre processo e direito material

DIREITO PROCESSUAL

efetiva o direito material

realiza o direito material

DIREITO MATERIAL:

define como o processo se organizará

dá sentido ao processo

o direito material serve ao processo, dando a ele sentido, dando-lhe a razão de ser

Direito material Direito Processual

Direito material Direito Processual o direito processual serve ao direito material, dando a ele concreção, conferindo efetividade

ao direito material

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O processo serve ao direito material ao mesmo tempo em que é servido por ele.

Alterações na Teoria do Direito:

Teoria das Fontes; e

Hermenêutica Jurídica.

Relação entre processo e direito constitucional

direito processual

direito material

relação entre processo e teoria do direito

mudanças na teoria das fontes

reconhecimento da eficácia normativa dos

princípios;

reconhecimento da eficácia normatiba da

jurisprudência; e

desenvolvimento de uma técnica legislativas

das cláusulas gerais.

mudanças na hermenêutica jurídica

distinção indispensável entre texto e norma;

constatção de que quem interpreta cria; e

máximas da proporcionalidade e da

razoabilidade.

três

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reconhecimento da força normativa da Constituição;

aprimoramento da jurisdição constitucional; e

teoria dos direitos fundamentais (divide-se em

duas frentes)

dimensão objetiva - direito fundamental como norma;

dimensão subjetiva - direito fundamental como situação

jurídica de vantagem.

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Transformações na Teoria do Direito, que impactaram o direito processual civil (Neoconstitucionalismo):

10. reconhecimento da força normativa da Constituição;

11. aprimoramento da jurisdição constitucional;

12. teoria dos direitos fundamentais;

13. reconhecimento da eficácia normativa dos princípios;

14. reconhecimento da eficácia normativa da jurisprudência;

15. mudanças na hermenêutica jurídica;

16. distinção indispensável entre texto e norma;

17. constatação de que quem interpreta cria; e

18. máximas da proporcionalidade e da razoabilidade.

NEOCONSTITUCIONALISMO = NEOPOSITIVISMO = POS-POSTIVISMO