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Nota de Advertência!
O presente texto foi desenvolvido como material de apoio da disciplina
“processo constitucional II”, ministrada no curso de Bacharelado em Direito da
FACEAR. Não tem a finalidade de substituir a presença do(a) aluno(a) em sala
de aula! Igualmente não se prescinde da leitura completar e estudo individual
para a realização das avaliações bimestrais.
AULA 01 – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO
(ADO)
1 – NOTAS INTRODUTÓRIAS
A ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) compõe o rol dos
mecanismos de controle concentrado-abstrato de constitucionalidade do qual
também fazem parte as ações direta de inconstitucionalidade por comissão (ADI), direta
de constitucionalidade (ADC) e a arguição de descumprimento de preceito fundamental
(ADPF).
Antes de ingressarmos propriamente no estudo da ADO, vamos fazer uma breve revisão
acerca da classificação da eficácia das normas constitucionais. Iremos adotar a
classificação proposta pelo Prof. José Afonso da Silva, uma vez que é a mais cobrada
em provas e concursos públicos. Vamos lá:
Segundo o Ilustre Mestre da USP, as normas constitucionais podem ser classificadas
quanto a sua eficácia nos seguintes tipos:
Normas de eficácia plena;
Normas de eficácia contida;
Normas de eficácia limitada.
As normas de eficácia plena são aquelas normas constitucionais que possuem
aplicabilidade direta, imediata e integral, ou seja, não dependem do legislador
ordinário para produzir os seus efeitos ditos essenciais (eficácia positivo e negativa).
Tais normas não podem sofrer restrição por parte do legislador infraconstitucional.
Desse modo, se uma norma constitucional estabelece uma determinada garantia
individual, por exemplo, as normas infraconstitucionais a ela decorrentes não podem
restringir seu alcance ou aplicabilidade.
Vale destacar que é franqueado ao legislador ordinário regular determinados
interesses nelas contidos. Como exemplo, podemos observar a garantia prevista no
inciso VIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 (CF/88):
“VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de
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obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação
alternativa, fixada em lei;”
A garantia estabelecida no inciso VIII do artigo 5º da CF/88 estabelece que qualquer
crença religiosa ou convicção filosófica ou política é apta a obstar a privação de direitos
por sua adesão ou simpatia. Todavia, o legislador infraconstitucional está autorizado,
pelo próprio constituinte, a estabelecer condições ou critérios regulamentares para
a hipótese de alguém invocar motivo de crença religiosa ou filosófica de cumprimento
de obrigação legal a todos imposta (v.g. prestação de serviço militar aos brasileiros do
sexo masculino).
Em um caso concreto, o cidadão tem a garantia constitucional de preservar sua
convicção filosófica antibelicista (não portar armas ou engajar-se em movimento
armando), desde que cumpra obrigação alternativa àquela que era obrigado (exemplo:
serviço militar obrigatório). Vale destacar que a obrigação alternativa deve ser
compatível com a filosofia ou crença religiosa que se opõe a obrigação legal que se
deseja desincumbir.
Podemos identificar os preceitos constitucionais que possuem feição de eficácia plena
quando os mesmos contêm proibições, vedações, quando conferem isenções ou
imunidades, prerrogativas. São exemplos:
Exemplo de proibição:
Art. 5º (...)
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou
degradante;
Exemplo de vedação:
Art. 14 (...)
§ 4º São inelegíveis os inalistáveis e os analfabetos.
Exemplo de isenção ou imunidade:
Art. 149 (...)
§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que
trata o caput deste artigo:
I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;
Exemplo de prerrogativa:
Art. 37 (...)
XXII - as administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do
Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos
prioritários para a realização de suas atividades e atuarão de forma
integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações
fiscais, na forma da lei ou convênio.
As normas de eficácia contida são aquelas que possuem aplicabilidade direta,
imediata e não integral, ou seja, dependem do legislador ordinário para atingirem ou
não seu alcance pleno. Por esse motivo podem sofrer restrições: a) por parte do
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legislador infraconstitucional; b) por outras normas constitucionais; ou c) pela aplicação
dos chamados “conceitos éticos-jurídicos consagrados” (aqueles que possuem um
determinado grau de indeterminação), como podemos citar os conceitos de ordem
pública, segurança nacional, bons costumes, utilidade pública, perigo iminente etc.
Nesses casos, a atuação do legislador ordinário ocorre para restringir a plenitude da
eficácia da norma constitucional carente de regulamentação (regulamentação dos
direitos subjetivos nelas contidos).
Para sua melhor compreensão, vamos a um exemplo. Considere o teor do inciso XIII do
artigo 5º da CF/88:
Art. 5º (...)
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas
as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
A CF/88 garante que todo e qualquer trabalho, ofício ou profissão pode ser exercido
livremente, desde que se preencham os requisitos estabelecidos em lei. Caso a
regulamentação ainda não tenham sido editar pelo legislador ordinário, ninguém pode
ser impedido de exercer aquela atividade. Vamos a um exemplo prático:
Até a edição da Lei Federal nº 12.867/2013, não era considerada atividade
profissional a figura do árbitro de futebol. Isso não quer dizer que a figura do árbitro de
futebol nunca existiu! O que havia era a plena e irrestrita liberdade para o exercício
remunerado desta atividade.
A partir da edição da supra referida norma infraconstitucional, pode o legislador ordinário
estabelecer restrições ao exercício da profissão de árbitro de futebol, como fixar uma
idade mínima e máxima, requisitos mínimos de escolaridade, obrigatoriedade de
inscrição em um conselho de fiscalização profissional, entre outras disposições.
Por fim, as normas de eficácia limitada. São aquelas que possuem aplicabilidade
indireta, mediata e reduzida. Sua eficácia está condicionada a atuação do legislador
ordinário. Podem ser divididas em: a) definidoras de princípio institutivo ou organizativo;
e b) definidoras de princípio programático.
As normas de princípio institutivo ou organizativo são aquelas que traçam
esquemas gerais de estruturação de órgãos, entidades ou institutos. Podemos citar
como exemplo, o parágrafo 5º do artigo 130-A da CF/88:
Art. 91 (...)
§ 5º Leis da União e dos Estados criarão ouvidorias do Ministério Público,
competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer
interessado contra membros ou órgãos do Ministério Público, inclusive
contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho
Nacional do Ministério Público.
Já as normas de princípios programáticos são as que se limitam a traçar os princípios
e diretrizes a serem cumpridos pelos órgãos integrantes dos poderes constituídos.
Exemplificando, vejamos o que dispõe o parágrafo 4º do artigo 173 da CF/88:
Art. 173 (...)
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§ 4º - lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos
mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.
2 – ASPECTOS GERAIS DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR
OMISSÃO (ADO)
Vamos agora analisar os principais aspectos relacionados a ação direta de
inconstitucionalidade por omissão (ADO).
As violações à Constituição Federal podem se dar de duas formas: na modalidade
comissiva (prática de condutas por parte de um dos Poderes do Estado) e na
modalidade omissiva (ausência de ação prevista no texto constitucional).
A própria Constituição Federal prevê mecanismos de controle dessas violações: a ação
direta de inconstitucionalidade por ação ou omissão e o mandado de injunção
(exclusivamente para a forma omissiva de violação).
A finalidade precípua da ADO é a defesa da ordem constitucional objetiva, isto é, da
sua supremacia e força normativa no que diz respeito a concretização das normas de
eficácia limitada).
A ADO está prevista na CF/88 no parágrafo 2º do artigo 103, conforme transcrevemos
abaixo:
Art. 103 (...)
§ 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar
efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a
adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão
administrativo, para fazê-lo em trinta dias.
Sua regulamentação infraconstitucional está prevista nos artigos 12-A à 12-H da Lei
Federal nº 9.868/99 (incluído pela Lei Federal nº 12.063/2009).
Vamos analisar os principais tópicos relativos aos elementos estruturais da relação
processual (legitimados ativos e passivos, competência, objeto da ação (causa de
pedir) e pedido), bem como a uma breve exposição do procedimento adotado.
2.1. Legitimados ativos
O artigo 12-A, da Lei nº 9.868/99, assim dispõe acerca dos legitimados ativos para a
ADO:
Art. 12-A. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade por omissão
os legitimados à propositura da ação direta de inconstitucionalidade e da
ação declaratória de constitucionalidade.
Por uma questão de técnica legislativa, optou-se pela remissão aos legitimados para a
ADIN e ADC, observando que o rol atualmente vigente se encontra no artigo 103 da
CF/88, o qual transcrevemos:
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Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação
declaratória de constitucionalidade:
I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito
Federal;
V o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.
Destacamos que entre os legitimados ativos estão os chamados legitimados
universais e os legitimados especiais (incisos IV, V, IX). Esses últimos exigem a
chamada pertinência temática entre o objeto da ação (causa de pedir) e o seu papel
institucional.
2.2. Legitimados passivos
Em relação aos legitimados passivos, a ADO se dirige ao Poder Legislativo (destinatário
principal) ou ao órgão ou autoridade administrativa (destinatário secundário), este último
no caso de a omissão ser de ato administrativo de conteúdo normativo.
No caso de ser necessária a observância de iniciativa no projeto de lei objeto da ADO
(v.g. art. 61, § 1º, CF/88), se faz necessária a ciência ao poder competente para
apresentação do mesmo, por meio de simples requerimento na petição inical.
2.3. Competência
Nos termos do parágrafo 2º do artigo 103 da CF/88, compete ao Supremo Tribunal
Federal processar e julgar as ADO quando o parâmetro violado for a Constituição
Federal.
No caso de a violação ter por parâmetro a Constituição de um Estado-membro, a
competência passa a ser do respectivo Tribunal de Justiça (desde, é claro, que haja
previsão de ADO na respectiva Carta Constitucional estadual).
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2.4. Objeto da ação (causa de pedir)
A ADO tem por objeto exclusivo as normas constitucionais de eficácia limitada, posto
que estas não podem produzir efeitos concretos (positivos e negativos) sem que haja
uma regulamentação infraconstitucional por parte do legislador ordinário.
A causa de pedir se resume em demonstrar a omissão inconstitucional total (abstenção
do poder público destinatário do comando da norma) ou parcial (incompletude na
regulação ou no ato normativo). Na última hipótese, o STF tem admitido fungibilidade
entre a ADIN e a ADO (ADI 3.243/MT).
Vale lembram que o STF não admite a propositura de ADO em relação a ato
administrativo sem conteúdo normativo.
É necessário demonstrar a existência da chamada mora legislativa, ou seja, que o
poder competente para sua edição tenha extrapolado o prazo tido como razoável para
sua edição. Segundo o STF, a mera existência de projeto de lei sobre o tema atacado
na ADO não afasta a alegação de mora legislativa.
Se após o ajuizamento da ADO ocorrer a edição da norma infraconstitucional ou ato
administrativo reclamado, a ação perde seu objeto.
3 – PROCEDIMENTO DA ADO
Podemos fixar o procedimento da ADO em 6 etapas: petição inicial, análise da petição
inicial, deferimento da petição inicial, concessão de medida liminar (optativo), prazo para
apresentação de informações e apresentação de voto para julgamento pelo pleno do
STF.
A petição inicial da ADO deve observar, além dos requisitos previstos no CPC, o que
dispõe o artigo 12-B da Lei nº 9.868/90:
Art. 12-B. A petição indicará:
I - a omissão inconstitucional total ou parcial quanto ao cumprimento de
dever constitucional de legislar ou quanto à adoção de providência de índole
administrativa;
II - o pedido, com suas especificações.
Parágrafo único. A petição inicial, acompanhada de instrumento de
procuração, se for o caso, será apresentada em 2 (duas) vias, devendo
conter cópias dos documentos necessários para comprovar a alegação de
omissão.
Na etapa de análise da petição inicial o relator da ADO (no caso do STF, Ministro
Relator) irá proceder a uma análise dos requisitos extrínsecos e intrínsecos da petição
inicial e proferir o despacho de deferimento ou indeferimento da peça preambular.
Cabe o destaque que, assim como a ADIN e a ADC, a ADO não cabe desistência após
ser proposta.
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As razões para o indeferimento são: a inépcia da inicial (art. 330, I, CPC/15), ausência
de fundamentação ou manifestação improcedência do pedido. O recurso cabível é o
agravo ao pleno do STF (art. 12-C, parágrafo único, Lei nº 9.868/90).
Art. 12-C. A petição inicial inepta, não fundamentada, e a manifestamente
improcedente serão liminarmente indeferidas pelo relator.
Parágrafo único. Cabe agravo da decisão que indeferir a petição inicial.
Uma vez deferida a petição inicial, o relator irá pedir informações ao Poder Legislativo
ou a autoridade responsável pela edição do ato administrativo normativo para resposta
no prazo de 30 dias (art. 6º, parágrafo único, Lei nº 9.868/90).
Pode, igualmente, serem solicitadas informações a Advocacia Geral da União, neste
caso o prazo será de 15 dias (art. 12-E, § 2º, Lei nº 9.868/90).
A manifestação do Procurador Geral da República (custos constitutionis), nos casos em
que não for o autor da ADO, será no prazo de 15 dias contados do término do prazo
relativo a manifestação do demandado (art. 12-E, § 3º, Lei nº 9.868/90).
A concessão de medida cautelar será apreciada quando a presença de um dos
requisitos autorizadores: excepcional urgência ou relevância da matéria (art. 12-F,
Lei nº 9.868/90).
O parágrafo 1º do artigo 12-F traz os objetos possíveis da cautelar a ser apreciada
pelo Ministro Relator:
§ 1º A medida cautelar poderá consistir na suspensão da aplicação da lei
ou do ato normativo questionado, no caso de omissão parcial, bem como
na suspensão de processos judiciais ou de procedimentos
administrativos, ou ainda em outra providência a ser fixada pelo
Tribunal.
Nesse caso, poderá o Ministro Relator facultar a oitiva do Procurador Geral da República
no prazo de 3 dias (art. 12-F, § 2º, Lei nº 9.868/90)
A sustentação oral dos representantes judiciais do requerente e das autoridades ou
órgãos responsáveis pela omissão inconstitucional é facultativa, nos termos do
parágrafo 3º do art. 12-F, da Lei nº 9.868/90.
Uma vez concedida a medida cautelar, a decisão será publicada nos Diários Oficiais da
União e da Justiça da União no prazo de 10 dias (art. 12-g, Lei nº 9.868/90).
Prosseguindo o julgamento do mérito, o Ministro Relator apresentará voto em seção do
pleno do STF, desde que estejam presentes e aptos a votar no mínimo 8 ministros da
Corte. Assim, a votação da ADO será por maioria absoluta (mais de 2/3 do total de
Ministros do STF – 11 Ministros).
Finalizando nosso estudo, os efeitos da decisão de mérito que julga procedente a
ADO resulta na ciência ao poder ou órgão competente para que adote as
providências cabíveis. Trata-se de uma decisão de efeito meramente político. Não é
possível a fixação de multa ou astreintes pelo STF.
O prazo para elaboração do ato administrativo regulamentar é de 30 dias contados da
ciência da decisão. Para o Poder Legislativo não há prazo para a adoção das
providências.