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TIL (1872), DE JOSÉ DE ALENCAR

Aula 2 Til 1872 de José de Alencar

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  • TIL (1872), DE JOS DE ALENCAR

  • JOS DE ALENCAR (1829-1877)

    Escritor cearense, filho do senador Jos

    Martiniano de Alencar

    Estuda por alguns anos Direito em So

    Paulo (mesma poca dos byronianos)

    Escreve Crnicas para o Jornal no Rio

    Escritor de romances e peas teatrais

    Polmica da Confederao dos Tamoios

    Rixas com D. Pedro

    Conservador, Escravocrata, Nacionalista,

    latifundirio

    Morre aos 48 anos de Tuberculose

  • PROJETO DE ALENCAR

    FUNDAR A LITERATURA NACIONAL

  • ALENCAR E O ROMANCE FOLHETINESCO

  • PUBLICAO DO LIVRO

    Publicado em Folhetim no Jornal A Repblica

    Novembro de 1871 a maro de 1872

  • Til possui caractersticas do Romance Folhetinesco:

    Captulos curtos

    Suspense ao fim dos captulos

    Pouca anlise psicolgica

  • PROJETO REGIONALISTA

    REVELAR O BRASIL AOS BRASILEIROS

  • REGIONALISMO DE ALENCAR

  • AMBIENTAO DA NARRATIVA

    Narrativa ambientada no interior de SP

    Tipos sociais da regio:

    Escravos,

    Capangas,

    Valentes

    Latifundirio,

    Assassinos etc

  • CONTRASTE DA AMBIENTAO

    Mundo Patriarcal:

    Intrigas

    Vinganas

    Violncia

    Mundo Idealizado:

    Amor

    Caridade

    Beleza

  • ESTRUTURA DA NARRATIVA

    NARRADOR:

    3 pessoa, onisciente

    Funo: Gerenciar os ncleos narrativos, apresentando as

    personagens e os hbitos do interior paulista

  • NARRADOR QUE EXPRESSA SUAS CONVICES

    Compreende-se quanto devia custar a D.

    Ermelinda, ciosa em extremo da morigerao

    de seus filhos, o receber no ntimo seio da

    famlia um menino at certo ponto estranho, e

    no s baldo de toda a educao, como incapaz

    de receb-la. Mas compenetrara-se a digna

    senhora que seu marido, recolhendo o sobrinho

    rfo e servindo-lhe de pai, cumpria um

    rigoroso dever; e tanto bastou para que no

    suscitasse a menor objeo

  • ESPAO

    REGIO DE SANTA BRBARA / CAMPINAS

    IDEALIZAO:

    -FAUNA

    FLORA

    DESCRIO DAS LOCALIDADES

    POUSADAS

    FAZENDAS

    ESTRADAS

  • OS HABITANTES E SEUS COSTUMES

    DESCRIO DE FESTAS

    VESTIMENTAS

    COMPORTAMENTOS DOS HABITANTES

    NARRADOR: RELATO DE PRTICAS LOCAIS

  • TEMPO

    NARRADOR CONDUZ DIFERENTES NCLEOS

    NARRATIVOS

    USO DE PEQUENOS FLASHBACKS

    HISTRIAS QUE VO SE ENTRELAANDO

    NARRATIVA NO LINEAR

  • ENREDO

  • DIVISO

    PRIMEIRA PARTE 31 CAPTULOS

    SEGUNDA PARTE 31 CAPTULOS

  • 1 PARTE

    Um jovem (Miguel) e uma menina na mata

    Idealizao da natureza e personagens

    Encontro com Jo Fera / Iminente luta entre os homens

    Uso abundante de comparaes

  • CAPANGA

    Eram dois, ele e ela, ambos na flor da beleza e da mocidade.

    O vio da sade rebentava-lhes no encarnado das faces, mais aveludadas

    que a aucena escarlate recm aberta ali com os orvalhos da noite. No

    fresco sorriso dos lbios, como nos olhos lmpidos e brilhantes, brotava-

    lhes a seiva dalma. Ela, pequena, esbelta, ligeira, buliosa, saltitava sobre a relva, grrula e

    cintilante do prazer de pular e correr; saciando-se na delcia inefvel de

    se difundir pela criao e sentir-se flor no regao daquela natureza

    luxuriante.

    Ele, alto, gil, de talhe robusto e bem conformado, calcando o cho sob o

    grosseiro soco da bota com a bizarria de um prncipe que pisa as ricas

    alfombras, seguia de perto a gentil companheira, que folgava pelo campo,

    a volutear e fazendo-lhe mil negaas, como a borboleta que zomba

    dos esforos inteis da criana para a colher.

  • NATUREZA

    O cu, essa imensa tela azul, que foi cpula de um bero, o da luz,

    e ser mais tarde vu de um leito, o da vida; a alma s o procura,

    s o contempla, quando a dor a prostra. Mas para aquela que sorri

    e folga, o firmamento uma terra por descobrir e debuxa-se

    vagamente na imaginao, como a montanha azul desse vale de

    lgrimas.

  • MIGUEL X JO FERA

    Ouviu-se um fungar, como o das narinas da ona

    quando bufa, e arrepia ao mais bravo caador,

    que sente lhe estar ela tomando faro ao sangue

    tpido. De um pulo achou-se o facnora a rosto com o

    rapaz, que armara intrepidamente a espingarda,

    preparado a morrer com dnodo

  • NOTAR: USO DE COMPARAES COM ANIMAIS RECURSO PRESENTE EM O CORTIO E EM

    VIDAS SECAS

    Captulos encerrados com suspense

  • Interveno da menina: o capanga parte

    Miguel acha que o capanga seduzido por ela (cimes)

    Descrio das vestimentas da jovem (reg.) / O assovio na mata (J. Fera?)

    Miguel tem cimes de Afonso. A menina quer ir com o jovem para

    que veja linda

  • OS CIMES

    Deixe-se desses brinquedos, Inh. por isso mesmo que eu no vou

    mais fazenda e tambm para... no ver certas coisas.

    O que?... Mec, diga; por favor! acudiu a menina para bulir com o rapaz.

    Cuida que eu no reparo como Afonso brinca tanto com mec? Mec, hein?... Que me importa! Hei de dizer mec. Est disfarando! No quer que se fale dos segredinhos com o Afonso?

    E faz mal isso? perguntou a menina com sincera surpresa. Aumentou-se o vexame de Miguel, que mordia os beios com o desejo de

    soltar uma palavra, e se continha pelo receio do desagrado da menina.

    Mas no v que Afonso gosta de voc.

  • Descrio da fazenda / casamento de Lus Galvo / melhorias na fazenda

    Encontro entre o escravo Monjolo, o feitor Faustino e um desconhecido:

    preparao de uma emboscada na Ave-Maria

    Jo Fera encontra o desconhecido na mata. Barroso, de Sorocaba

    que contratara o capanga para assassinar um homem. O negcio estava

    demorando para ficar pronto. O capanga hesita em executar o servio.

  • MONJOLO E O DESCONHECIDO

    No tarda. Cavalo j est selado; capanga s vai um, mofino como o qu!

    Os outros, Faustino arranjou, como branco sabe.

    Ento s leva duas pessoas? Duas s, sim senhor. Paje e capanga. Est bom; toma l, para o pito, disse o cavaleiro atirando-lhe um pataco de prata. Agora v se vais dar com a lngua nos dentes.

  • PALMAS

    Cerca de uma lgua abaixo da confluncia do Atibaia com o Piracicaba, e

    margem deste ltimo rio, estava situada a fazenda das Palmas.Ficava no

    seio de uma bela floresta virgem, porventura a mais vasta e frondosa, das

    que ento contava a provncia de So Paulo, e foram convertidas a ferro e

    fogo em campos de cultura. Daquela que borda as margens do Piracicaba, e

    vai morrer nos campos de Ipu, ainda restam grandes matas, cortadas de

    roas e cafezais. Mas dificilmente se encontram j aqueles gigantes da

    selva brasileira, cujos troncos enormes deram as grandes canoas, que

    serviram explorao de Mato Grosso. Da partiam pelo caminho dgua as expedies que os arrojados paulistas levavam s regies desconhecidas

    do Cuiab, descortinando o deserto, e rasgando as entranhas da terra

    virgem, para arrancar-lhe as fezes, que o mundo chama ourn e comunga

    como a verdadeira hstia.

  • COBRANAS DE BARROSO

    Neste caso vou por a afora, at a venda do Chico Tingu. L o espero,

    homem; e com o resto da chelpa. Duas onas, das suuaranas, bem

    amarelinhas, ou trs canrios, vontade do amigo, contanto que desta

    feita acabe-se o negcio. J o diabo podia Ter comido muita terra, se c o

    camarada fosse mais decidido. s ltimas palavras de barroso o capanga

    abaixou o olhar, e um repentino enleio atou aquela organizao robusta e

    audaz, que difundia em torno de si a plenitude da sua pujana. Alguma

    fibra vital fora dolorosamente pungida, que o confrangia, amortecendo o

    natural orgulho e arrojo do carter. S tenho uma palavra, sr. Barroso! disse afinal com a voz firme e grave. Mas est custando a cumpr-la; confesse-se!..

  • Apresentao das personagens do ncleo da

    fazenda:

    Mandu: funcionrio da fazenda

    Rosa: a formosa escrava

    Faustino: funcionrio da fazenda

    A Famlia:

    D. Ermelinda: educao refinada

    Lus Galvo: Patriarca

    Linda e Afonso: filhos de refinada postura

    Brs: o idiota

  • Filha de um capitalista de Campinas, D. Ermelinda recebera em um

    colgio ingls da corte educao esmerada, que desenvolveu a natural

    distino de seu esprito. (...) Aquela esfera que recebia a influncia

    imediata da dona da casa, no era paulista, mas fluminense; e no

    fluminensepura, seno retocada j pelo apuro escocs e pela graa

    francesa.

    direita de D. Ermelinda estava o dono da casa, Lus Galvo, cujo

    aspecto franco e jovial granjeava a simpatia ao primeiro acesso. Era um

    bonito homem, de fisionomia inteligente e regular estatura, que revelava

    em sua compostura digna a conscincia do prprio mrito. Do

    comedimento do modo prazenteiro, bem como do alinho do traje,

    transpirava o influxo da suprema distino do esprito de sua mulher

    Fora por uma lenta filtrao moral, que ela conseguira transmitir ao

    marido um toque do seu garbo nativo, embotando as asperezas de uma

    educao grosseira e extirpando hbitos da infncia descurada.

    esquerda da me ficava o filho, como direita do pai a filha, ambos na

    flor da juventude. Chamava-se o primeiro Afonso, como o av. Segunda

    tratavam todos pelo apelido, seno diminutivo, de Linda, formado das

    ltimas slabas de seu nome, que era o mesmo da me.

    FAMLIA IDEAL

  • BRS, O IDIOTA

    Finalmente, no segundo lugar da esquerda defronte da moa via-se

    um menino de 15 anos de idade, cuja figura destoava de todo o

    ponto, no quadro daquela famlia, que respirava a graa e a

    inteligncia. Era feio, e no s isso, porm mal amanhado e

    descomposto em seus gestos. Tinha um ar pasmo que embotava-

    lhe a fisionomia; e da pupila baa coava-se um olhar morno, a

    divagar pelo espao com expresso indiferente e parva. Curvado

    como um arco sobre a mesa, com as vestes em desalinho e os

    cabelos revoltos, abraava uma xcara de almoo, que lhe ficava

    abaixo do queixo; e escancarando a boca enorme para sorver de um

    bocado a grande broa de milho, ensopada no caf, mastigava a

    tenra massa a fortes dentadas e sofregamente como se estivesse

    rilhando um couro.

  • Pressentimentos de D. Ermelinda / notcia de Jo Fera nas redondezas

    Partida e volta misteriosa de Galvo (Pegar documentos Despertar curiosidade do leitor )

    Linda e Afonso encontram Miguel e Berta na fazenda: Pares?

    Os jovens escondem os encontros da me (Impedimento?)

  • Berta parte assim que sabe dos pressentimentos de D. Ermelinda:

    Vai em busca de Jo Fera dissuadi-lo do crime

    Conversa com o assassino. Ele informa que no como pagar o dinheiro j gasto

    pelo crime encomendado Berta doa seu relicrio. O assassino parte

  • LUMINOSIDADE DE BERTA MUDANA EM FERA

    Jo Fera, reconhecendo a menina atravs da nuvem de sangue que lhe

    inflamava o olhar, e vendo-a afrontar-lhe os mpetos, no abateu logo de

    todo o fero senho, mas foi-se aplacando a pouco e pouco. A ira que se

    arrojava do seu aspecto, retraiu-se e de novo afundou pelas rugas do

    semblante, como a pantera que recolhe jaula, rangendo os dentes.

    Sua alma se impregnava do fluido luminoso dos olhos de Berta, e

    ele sentia-se trespassado pelo desprezo que vertia no sorriso

    acerbo esse corao nobre e puro, sublevado pela indignao. De

    repente comearam a tremer-lhe os msculos da face, como os ramos do

    pinheiro percutidos pela borrasca; e as plpebras caram-lhe, vendando-

    lhe a pupila ardente e rbida.

  • DOAO DO RELICRIO

    Toma, vende e desempenha a tua palavra! E estendeu-lhe a mo com o cordo de outro que tirara do pescoo e ao qual estava preso o amuleto e a

    cruz.

    O que! disse Jo abaixando a cabea para distinguir o objeto, to cedo estava da agonia daquele transe.

    O relicrio de minha me! Estalou com um grito horrvel e bravio o peito de Jo Fera, que

    arremessando-se longe, desapareceu nas brenhas.

  • LUMINOSIDADE DE BERTA AJUDA AOS DESVALIDOS

    Humilde casa de Nh Tudinha, onde vivia Berta. Ajuda a

    Sura sem as pernas rodas por um rato

    Ajuda ao burro acidentado

    Visita escrava enlouquecida Zana, moradora de uma casa em runas

  • CAMINHO SIMBLICO DE BERTA

    PERCURSO DO AMOR LUMINOSO

    DOAR DE SI AO OUTRO

  • AJUDA SURA

    Apenas afastou Berta a faxina que servia de porta ao cercado, saiu

    debaixo de sua palhoa uma galinha sura e muito arrepiada. No tinha

    ps a pobre, que lhos havia rodo noite os ratos; andavam aos trancos,

    sobre os cotos que mal a ajudavam a saltar, e incapazes de sust-la, a

    deixavam cair a cada passo, cobrindo-a de terra, o que a fazia mais feia

    ainda. Tanto que a avistou, correu a menina a seu encontro e tomando-a

    ao colo, deu-lhe a comer um punhado de milho que tirou do saco. Farta a

    galinha da sua pitana, levou-a Berta bica, para matar-lhe a sede e

    lavar-lhe as penas sujas de poeira e cisco.

  • AJUDA AO BURRINHO

    Coitado do cot! Ainda est muito magricela?... disse a menina com um carinho compassivo. E tirou do saco meia dzia de espigas de milho,

    que o animal devorou com uma gana de convalescncia. Debulhado o

    ltimo sabugo, farejou o burro o saco, donde se escapavam umas

    exalaes que lhe pruiam agradavelmente o olfato.

    Rindo, outra vez meteu Berta a mo no seu inesgotvel saco e trouxe um

    punhado de farinha que o burro lambeu-lhe das palmas. Dando ento um

    ligeiro tapa na belfa do animal, deitou a correr pelo campo fora seguindo

    a mesma vereda. Atrs de um fraguedo, cuja fralda

  • AJUDA ZANA

    Esperou Berta com a maior pacincia que Zana acabasse de cantar; e

    ento mostrando-lhe as provises conseguiu que ela comesse alguns

    bocados dados por sua mo. Para que a doida abrisse a boca, porm, era

    necessrio que a menina estivesse a repetir de momento a momento duas

    palavras que pronunciadas por sua voz carinhosa produziam sobre esse

    esprito enfermo um efeito mgico. Zana, beb!...

  • Barroso se aproxima da casa da escrava / Zana se assusta

    Brs tenta esganar a negra / Berta a salva

    Nh Tudinha, me de Miguel, nunca escondera que a menina era

    enjeitadinha

  • No dia em que estamos no acabou Zana a pantomima de sua viso

    diria.Quando se aproximava p ante p da janela da alcova, em

    atitude de quem espreita, os olhos da negra esbarraram com os de um

    homem. Era o Barroso que assomara de dentro do mato, pouco antes,

    e dirigiu-se passo a passo para as runas. Estremeceu a doida, e to

    violenta foi a propulso, que a fez saltar sobre si. Com os olhos

    esbugalhados, a boca escancarada e os beios arregaados, ficou banza

    um instante; mas logo, espancada pelo terror, precipitou-se para fora

    to desastradamente que errou a porta e bateu em cheio na taipa. De

    novo arremeteu, e rechaada pelo choque, andou aos embates contra a

    parede, at que acertando com o vo da porta fugiu estremunhada de

    pavor. Advertida pelo primeiro sintoma de estupefao da louca, Berta

    seguindo-lhe a direo do olhar, avistara tambm o Barroso, que nesse

    momento parado em face da janela, a alguns passos apenas, a

    encarava com uma expresso de profundo rancor. Teve medo a

    menina, e recuou instintivamente. Estava acostumada a correr s os

    campos vizinhos, onde freqentemente encontrava caipiras e toda a

    casta de gente malfazeja, de quem alis nunca se receara. Esse

    homem, porm, inspirava-lhe uma indefinvel repugnncia e terror.

    HORROR DE ZANA E REPUGNNCIA DE BERTA

  • Pousada entre S. Brbara e Campinas (regionalismo)

    Chico Tingu: dono preguioso da pousada

    Nhanica: sua esposa

    Chega Gonalo Suuarana: Falam sobre o Bugre (Jo Fera)

    Chegada de um grupo de caadores Filipe: chefe do grupo

    Informa ao Suuarana que esto atrs do Bugre: Prmio do Aguiar

    Cena cmica: o dono da estalagem correndo atrs do Bacorinho

    Gonalo (rival do Bugre por inveja da fama) combina delatar o

    esconderijo do Fera por dinheiro

  • A POUSADA

    Quem transitava pela estrada de Campinas via, meia lgua antes de Santa

    Brbara, dois casebres unidos por uma espcie de rancho ou telheiro.

    Um dos edifcios era bem velho, o outro novo, porm ambos de grosseira

    fbrica, sem reboco nas paredes mal emboadas, que mostravam entre os

    torres de barro as varas atadas com cip aos frechais. O cho despido de

    ladrilho, ou qualquer espcie de soalho, estava cheio de buracos e poas; de

    pintura no havia traos, nem mesmo de uma simples caiao. Na

    extremidade da casa velha, as duas portas abriam para uma espcie de

    taberna, a julgar pelo balco de pau que dividia o aposento a meio, e por

    duas ou trs ordens de prateleiras, onde se viam alguns rolos de fumo em

    corda, rapaduras envolvidas com palha de milho, e uma dzia de garrafas

    arrumadas em fila.

  • INVEJA DE SUUARANA E O TRATO COM FILIPE

    J ele teria dado cabo do rival, se pudesse, mas como no se atrevesse a

    atac-lo de frente, espreitava ocasio de atirar-lhe o bote certeiro, e desde

    muito rondava disfaradamente pela venda do Chico Tingu, que

    suspeitavam de ser o inculca e espia do capanga foragido. Tais eram as

    disposies do Gonalo quando chamou o Filipe para dizer-lhe em

    particular:

    O patrcio quer mesmo pilhar o Jo Fera? perguntou ele. Mas decerto, homem! E no sabe onde ele se encafua? Que esperana! Pois ainda estava aqui? E se eu lhe ensinasse a toca do bicho? Abra o preo, amigo. Duzentos bicos? Topado.

  • OS CUIDADOS DE BERTA PARA COM BRS

    Chama o idiota para corta-lhe as unhas e almoar e, com carinho, ensina-o a

    rezar

    Com afinco, tenta ensinar o menino a ler

    A origem de Brs: sobrinho de Galvo / desgraa refinada Ermelinda

    Pedagogia do mestre Domingo: pancada para aprender

    X

    Pedagogia de Berta: Da luminosidade, do afeto

  • ORIGEM E PROBLEMAS GERADOS POR BRS

    Era Brs filho de uma irm de Lus Galvo, a qual falecera trs anos antes,

    ralada pelos desgostos que lhe dera o marido, e pelo suplcio incessante de ver

    reduzido ao lastimoso estado de um sandeu o nico fruto de suas entranhas.

    Quando morreu, j era de muito viva a infeliz senhora; e, pois, com a sua

    perda, ficou Brs sem outro arrimo, a no ser por Lus Galvo, seu tio e mais

    prximo parente, que o trouxe imediatamente para casa e desvelou-se como

    pode, pela sorte da msera criana. Compreende-se quanto devia custar a D.

    Ermelinda, ciosa em extremo da morigerao de seus filhos, o receber no

    ntimo seio da famlia um menino at certo ponto estranho, e no s baldo de

    toda a educao, como incapaz de receb-la. Mas compenetrara-se a digna

    senhora que seu marido, recolhendo o sobrinho rfo e servindo-lhe de pai,

    cumpria um rigoroso dever; e tanto bastou para que no suscitasse a menor

    objeo. Resignada ao mal inevitvel, socalcou sua repugnncia. Somente

    exigiu de Lus Galvo, e isso o fez com autoridade de me, que, recebido Brs e

    tratado como filho da casa, se evitasse contudo seu ntimo contato com Afonso e

    Linda, conservando-os, quanto possvel, alheios existncia do primo, e

    impedindo o menor trato e convivncia com ele.

  • FINA EDUCAO DE DOMINGO / O TIL

    Fiel s tradies da antiga profisso, entendia ele l de si para si que um

    bom processo de ferrar bestas devia ser por fora excelente mtodo de

    ensinar a leitura e a tabuada: e fossem tir-lo dessa idia! Assim

    encaixava o abec na cachola do menino com a mesma limpeza e

    prontido com que metia um cravo na ferradura. Era negcio de dois

    gritos, um safano e trs marteladas. Tal era o professor, a quem foi

    incumbida a tarefa de ensinar a ler ao Brs. Depois dos trs primeiros

    dias de indulgncia, ps o ferrador em prtica o seu mtodo repentino,

    que desta vez, com pasmo seu, falhou completamente. "Nunca, em sua

    vida, dizia ele, tinha encontrado um jumento de casco to rijo". Debalde o

    Domingo brandiu a pesada palmatria de guarant, e ferrou uma chuva

    de formidveis carolos na cabea do Brs; no conseguiu dele em um ms

    que repetisse o nome das trs primeiras letras. Quando lhe puseram nas

    mos a carta pregada em uma tbua, o menino percorreu todos aqueles

    hierglifos com olhos pasmos e botos, e s deu sinal de ateno, em

    descobrindo o til. Ento expandiu-se-lhe o estpido semblante com um

    riso alvar, que estertorou na gorja, e, tomado por sbita alacridade, ele,

    de ordinrio soturno e pesado, comeou a fazer trejeitos e gatimonhas ao

    pequeno sinal ortogrfico, procurando imit-lo a uma com os dedos, com

    a boca, e at com todo o corpo nos saltos extravagantes que dava pela

    casa.

  • Miguel traz uma cotia que foge / chateado por ser correspondido por Berta

    Encontro de Barroso e Fera: quebra do trato

    Fera pede para Chico Tingu, o da pousada, dar ao capanga 50 mil para que

    possa se entregar

    Fera encontra a menina e feliz pelo acordo que fizera (no matar Galvo)

    pede para beijar o santinho que a moa traz consigo

  • JO FERA NO MAIS MATAR GALVO

    Jo Fera encolheu os ombros com um ar desdenhoso.

    Escuta, Chico, isto negcio srio. Hs de ir agora mesmo fazenda do tal Aguiar. Diz-lhe que ele perde seu tempo em estar oferecendo contos de

    ris a quem me agarrar. Se quiser, que te entregue cinquenta mil ris, e sou

    capaz de ir l fazenda uma tarde que ele marcar depois de So Joo. Dou

    minha palavra. Olhou-o Chico espantado e quis objetar.

    Vai ou no? Atalhou Jo com o tom decisivo. O vendeiro abaixou a cabea e partiu. Vendo-o desaparecer, dirigiu-se o capanga para a casa de nh

    Tudinha, e j a pedao oculto entre a ramada, estava de longe observando

    Berta, quando Miguel se retirou despeitado, deixando s a colaa. Nessa

    ocasio animou-se ele a transpor a orla da mata; a menina o viu e

    adivinhando que lhe queria falar, foi a seu encontro. O olhar de Berta era

    uma interrogao instante e cheia de inquietao. No se encontrara com o

    capanga, desde que este fugira de volta da Ave-Maria, sem fazer-lhe a

    promessa que ela exigia. Agora posso desempenhar minha palavra, e no me importarei mais com o Galvo; disse o capanga cabisbaixo e humilde.

  • Monjolo, Faustino e Barroso se encontram: preparativos para o plano de

    matar Galvo depois da festa de So Joo

    Preparativos para festa de So Joo. Linda acha que Miguel prefere Berta.

    A amiga dissuade a outra desse pensamento

    Brs ouve a conversa. Dissipa a cabea de gafanhotos (seus inimigos)

    simbolicamente

    Atira uma cascavel sobre a cama de Linda. Pai Quic, um escravo,

    informa a Berta que faro uma tocaia Fera. A moa parte para o quarto de

    Linda para pegar seu chapu e partir com escravo

  • A TRAMA

    Quando estiverem bem seguros s dar o sinal, que o fogo rebenta c no

    canavial. O diabo corre para acudir; e a voc, rapaz, tranca tambm a

    gente da casa, a mulher e os filhos, e espera, que eu no tardo, para

    arranjar a histria. Ouviram vem?...

    No tem dvida! disse o Faustino. Voc que mais ladino, explica bem quele pai. Riu-se o Monjolo, com uma expresso bestial que parecia confirmar o dito.

    Mas... replicou o Faustino. Eu c com a condio que o senhor sabe. Eu frro; a Rosa, para mim; e o mulato surrado como canhambola.

    Pois est entendido! disse o Barroso. Foi o ajuste. Fuzilou uma chispa na rbida pupila do africano.

    E tu, paizinho? Monjolo no quer nada, seno gimbo muito para comprar fumo e cachaa.

    Fica descansado. Separaram-se os cmplices. O pajem voltou casa, Monjolo roa, e Barroso foi juntar-se a pouca

    distncia ao Gonalo Pinta, que o esperava com dois animais destra.

    Apenas se desvaneceu o rumor dos passos, que um galho murcho atirado

  • BRS ATIRA UMA CASCAVEL NA CAMA DE LINDA

    Chegando que foi junto casa, trepou a uma jabuticabeira para alcanar o

    peitoril da janela, cuja vidraa estava erguida, mostrando entre as

    cortinas de cassa uma linda cama de mogno coberta por colcha de damasco

    azul, um toucador, guarda-vestidos e outros mveis da recmara de uma

    senhora. Era a alcova de Linda. A mo perversa do idiota arremessou a

    cobra, que foi cair justamente sobre a cama e depois de aplacada a fria,

    encolheu-se entre as rendas dos travesseiros, com a pupila em sangue

    e o bote armado. Acabava o idiota de preparar assim o primeiro ato da

    obra de extermnio, que ele ruminava em sua feroz estultcia, quando o fez

    estremecer a voz de Berta que se encaminhava para a alcova.

  • PARTE II

  • FLASHBACK O ENTRECRUZAMENTO DOS NCLEOS NARRATIVOS

    Bugrezinho: Histria de Jo Fera

    Aparecimento na fazenda de Afonso Galvo/ mitos sobre seus pais / Proteo

    do aventureiro Lus Galvo / Paixo de Lus por Besita

    O amor do Bugre pela jovem Besita / A percepo da moa de que L. Galvo

    era aventureiro / Proposta de casamento de Ribeiro / Rompimento de Bugre

    com a famlia Galvo / Casamento de Besita / Partida de Ribeiro para Itu

  • PAIXO IMPEDIDA: BUGRE POR BESITA

    Tinha Jo por Besita uma dessas paixes veementes que se

    afrontam com o impossvel e arcam para subjug-lo.

    As pujanas de sua alma se revoltaram contra a adorao fervida e

    respeitosa que o trazia submisso; mas o carter indomvel estava

    enervado pela fascinao que exercia em natureza to ardente a sedutora

    beleza da moa.

    Quantas vezes no pensou que bastava-lhe um momento de resoluo

    para arrebatar a mulher a quem amava, e leva-la ao deserto onde ele no

    se envergonharia de seu amor, e talvez sentisse orgulho de o inspirar to

    possante e extremoso.

    Mas ele que no temia o mundo e zombava dos perigos, assustava-se s

    com a idia de um ressentimento de Besita; e no era preciso mais para

    espancar de seu esprito a tentao que em si produziam os encantos da

    menina.

  • LUS DESISTE DE CASAR

    Besita tornou-se plida e respondeu com a voz trmula:

    - Mas Lus no se casar comigo!

    - Tu pensas?

    - Tenho a certeza.

    - Pois havemos de ver.

    tarde apareceu Lus Galvo. Contou-lhe o Guedes a pretenso do

    Ribeiro, e pediu-lhe conselho. O filho do fazendeiro demudou-se; mas

    recobrando-se sugeriu dvidas sobre os haveres do pretendente,

    alegando ser pessoa desconhecida no lugar.

    Esperou o Guedes quinze dias, decorridos eles, disse filha:

    - Tu adivinhaste, um peralta!... Aceita a mo do Ribeiro, e sers feliz.

    - O que meu pai ordenar, eu o farei de boa vontade! respondeu a

    menina com doce resignao.

    Aceitava ela esse casamento como um sacrifcio, para salvar sua

    virtude, embora custa dos sonhos fagueiros de sua alma.

  • MOTIVOS PARA A PARTIDA DO BUGRE

    - Ento ele no quer bem a Nhazinha?

    - Quer, mas como tem querido a outras antes de mim: no mereo ser

    sua mulher!

    Partiu-se Jo a galope e foi ter em casa com o patro:

    - Nh Lus, ela lhe quer bem!... case com ela!

    - Qual, Jo!... O velho no admite!

    No quis ouvir mais o Bugre; arrecadou em um leno o que tinha de

    seu, to pouco era, e despediu-se do patro com estas palavras:

    - Pode procurar outro camarada; eu no conto mais com o senhor.

  • Equvoco de Zana, escrava de Besita / Lus possui a jovem e foge / Morte

    do pai / Gravidez / Zana, Besita e Fera compartilham do segredo /

    Batizado da filha / Casamento de Lus / Um vulto na mata / Zana pinta a

    criana com carvo / Ribeiro estrangula a esposa

    Bugre est a ponto de matar Ribeiro / A me moribunda pede pela filha/

    Fera tira a criana do colo de Zana, em transe/ Ribeiro foge para Portugal.

    (flashback: Histria em Curitiba / Gastos / Lembrana da mulher /

    Desconfiana/ assassinato). Zana enlouquece. Nh Tudinha cuida da rf

  • ESTUPRO DE BESITA

    J todos dormiam na casa, quando ela, deixando a janela, deitou-se. Nesse

    instante ouviu sobressaltada bater porta. Quem seria, quela hora?

    Soaram os passos de Zana no corredor e logo depois a voz da preta a trocar

    perguntas e respostas com a pessoa que batia. Afinal rangeu a chave na

    fechadura.

    - Nhazinha, sinh!

    Ia Besita levantar-se precipitadamente para receber o marido, quando

    sentiu no escuro que dois braos a cingiam e uma carcia atalhava-lhe a

    palavra nos lbios.

    Ao bruxulear da madrugada, Zana acudindo ao chamado da moa foi ach-la

    debulhada em pranto, na maior consternao.

    - Tu me perdeste, Zana! No era meu marido!

    - Quem era ento, Nhazinha? perguntou a preta espantada.

    - Olha! disse a moa mostrando-lhe o vulto de Lus Galvo que se afastava.

    - Meu Jesus do cu! exclamou Zana caindo de joelhos aos ps da senhora.

    Felizmente o velho no ouvira bater; e nunca soube da desgraa da filha.

    Morreu meses depois crente de que a deixava no mundo feliz e amparada.

    Uma pessoa, porm, suspeitou do que havia ocorrido. Foi Jo Bugre, que na

    sua indignao quis matar Lus Galvo; e o teria feito, se Besita no o

    proibisse.

  • CASAMENTO DE LUS GALVO

    Um dias s ocultas, levou o capanga nos braos a criancinha a Campinas, a

    fim de a batizar o vigrio dessa vila, pondo-lhe o nome de Berta, que tinha

    sua me. Havia ajuntamento na igreja para assistir a um casamento: era o

    de Lus Galvo com D. Ermelinda

  • VIAGEM DE BUGRE. VISO DE RIBEIRO

    Seu prazer, nos momentos que lhe deixava a criao, era enfeitar a filha, e

    fazer bonito o seu Beb, arranjando-lhe ora toucas de rendas, ora roupas.

    Lembrou-se um dia de bordar-lhe um cinto com signo-saimo, zodacos,

    figas e outras figurinhas de prata, como se usava ento para livrar do

    quebranto.

    No havendo por perto ourives capaz de lavrar os emblemas, mandou

    Besita o Bugre a Itu, a fim de os encomendar. Com repugnncia, e um

    inexplicvel constrangimento, ausentou-se Jo por alguns dias dessa casa

    onde vivia quanto amava neste mundo e sobre a qual velava como um co

    fiel e dedicado.

    Foi isto em uma tera-feira. Na quinta seriam oito horas da manh, e

    Besita fazia saltar sobre os joelhos o seu lindo Beb, sentada na alcova,

    com uma rtula aberta a meio. Eis que derramando a vista pelo arvoredo,

    ficou transida, como se lhe surgisse em face um espectro.

    Enxergara o rosto de Ribeiro, que se ocultou entre a folhagem. Seria

    apenas uma alucinao de seu esprito, ou atremenda realidade, cuja idia

    tantas vezes a enchera de terror, nas longas noites no dormidas?

  • ASSASSINATO

    No meio do aposento, o Ribeiro, plido e medonho como um espectro,

    agarrando a mulher pelo pescoo, estrangulava-a com as longas tranas de

    cabelos.

    IV

    Um grito espantoso retumbou, que estremeceu o assassino e o lanou

    espavorido fora do aposento.

    Antes de sumir-se, porm, viu assomar no quadro da janela o vulto

    pavoroso de Jo, que de um arremesso atirou-se a ele para despeda-lo.

    Nesse instante trespassou a alma do Bugre uma voz exausta, que se

    desprendia a custo do arquejante soluo:

    - Jo!...

    Prostrou-se o rapaz aos ps da moa, que o Ribeiro deixara agonizante, com

    o corpo atirado sobre um ba, e a cabea pendida como o lrio, cuja haste o

    vento partiu.

  • FLASHBACK E FUGA DE RIBEIRO

    Havia cerca de dois anos que esse homem partira de Santa Brbara, deixando

    sua esposa no dia seguinte ao do casamento, para Itu, salvar avultados

    interesses comprometidos. Apesar da pronta determinao, o negociante, seu

    devedor, j se tinha ausentado; e suspeitava-se que se dirigia a Curitiba.

    Foi-lhe no encalo o Ribeiro; e to feliz que obteve cobrar boa parte da soma.

    Vendo-se rico de repente, no resistiu o moo tentao de gozar dos prazeres

    com que o seduziam a cada instante as gabolices dos tropeiros e marchantes.

    Afinal, ao cabo de dois anos, lembrou-se da mulher que deixara ainda noiva, no

    dia seguinte ao do casamento; e dirigiu-se a Santa Brbara. Remordia-lhe a

    conscincia; como era natural encheu-se de desconfianas.

    s ocultas aproximou-se da casa; e ficou espreita. Viu Besita com a filha ao

    colo; e suspeitou de uma traio. Ao cair da tarde, quando a moa cismava com

    os olhos engolfados no cu, ergueu-se diante dela irado e ameaador.

    A infeliz prostrou-se de joelhos a seus ps e confessou-lhe tudo, o engano fatal

    de que fora vtima, e a desgraa irreparvel que a separara para sempre dele e

    do mundo.

    A resposta foi um escrneo.

    - Ele j era teu amante!

  • Tomado por um acesso de fria, deitou as mos ao alvo colo da

    moa, e enleando-o com a madeixa, a estrangulara. Acabava essa

    cruel vingana e pensava em imolar tambm ao seu rancor a

    inocente criana, quando o bramido do Bugre o estremeceu de

    horror.

    Sem hesitar ganhara o mato pelos fundos da casa, e embarcando

    na canoa que o esperava, desceu o Piracicaba com a rapidez que

    dava a enchente correnteza das guas.

    Pressentindo que o perseguia o dio profundo e implacvel de

    Jo, ou talvez acossado apenas por um remorso dilacerante, no

    descansou o Ribeiro enquanto no transps o oceano, colocando-o

    entre si e a terra onde exercera sua vingana.

    O Bugre o procurou por toda a parte, mas debalde: o homem

    estava em Portugal.

  • Transformao na alma de Jo Fera / Volta de Ribeiro (Barroso) / Contato

    com Chico Tingu / Contratao de Fera (os dois no se reconhecem) /

    Plano: matar Galvo na noite de So Joo e assumir seu lugar na famlia /

    Depois do encontro com Monjolo e Faustino, Barroso v Fera sair da mata

    e devolver o dinheiro.

    Funo dos captulos iniciais da 2 parte: Unir os ncleos narrativos ao de

    Berta e Fera

  • 15 ANOS DEPOIS: VOLTA DE RIBEIRO (BARROSO)

    Ao cabo de quinze anos voltara o Ribeiro a So Paulo.

    No se animaria contudo, se os anos, e mais ainda uma irrupo no

    rosto, no lhe tivessem alterado completamente as feies. Em

    Portugal o chamavam de Barroso, apelido que substituiu ao seu para

    maior segurana.

    J estava h meses na provncia, quando resolveu ir a Santa

    Brbara. Com a vista daqueles lugares acendeu-se o dio sopitado;

    um pensamento de serdia vingana despontou em seu esprito e

    medrou.

    Ouvira falar do Chico Tingu como inculca de um sujeito que se

    incumbia, mediante boa esprtula, de arranjar esses negcios. Tocou

    no ponto ao vendeiro; este expediu o bacorinho a Jo Fera, que no

    tardou no rancho, onde se fechara o ajuste, mediante o sinal de vinte

    pataces.

  • PLANO DE BARROSO

    Por estranhos que paream estes pensamentos, de tal modo se imburam no

    esprito do Ribeiro, que ele acabou rindo-se de seu primeiro projeto. Matar

    apenas Lus Galvo numa emboscada, como pretendia, era uma vingana

    brutal e estril que afagava o seu dio e nada mais. Fazer porm desaparecer o

    fazendeiro, e tomar o seu lugar, como fizera ele outrora; essa era uma desforra

    de mestre, que no s ajustava as contas do passado, como garantia o futuro.

    Aplicando ao sedutor a pena de talio, fazia ele, Ribeiro, ainda por cima um

    bom negcio. Desde ento empregou toda sua atividade em levar ao cabo a

    obra, cuja realizao fora marcada para a noite de So Joo. Ao recolher, se

    manifestar no canavial das Palmas um incndio que se h de atribuir a algum

    foguete desgarrado. Lus Galvo naturalmente acudir para acautelar maior

    estrago. Nem os escravos da roa, fechados nos quartis por Monjolo, nem os

    pajens trancados por artes do Faustino, podero acompanhar o senhor.

    Gonalo Pinta, emboscado no caminho, derrubar Lus Galvo com uma

    cacetada e o lanar nas chamas, para acreditar-se que foi vtima do incndio,

    e no de uma trama prfida e covarde. Ento Ribeiro ou Barroso, que figura

    passar casualmente pela estrada, acode e extinguindo com o auxlio dos

    camaradas o incndio, j de antemo cortado por largo aceiro, conduzir o

    corpo do Galvo casa e oferecer viva seus servios. Eis o plano, em

    virtude do qual esperava Barroso estar casado com D. Ermelinda e senhor das

    Palmas, antes de findo o ano do luto.

  • ENCONTRO DE BARROSO E BUGRE

    Depois de fazer ao Faustino e a Monjolo as ltimas recomendaes,

    voltava ele acompanhado pelo Pinta, quando inesperadamente saiu-lhe ao

    encontro, de dentro do mato, Jo Fera.

    O Barroso vacilou na sela; e o Gonalo Suuarana ficou ainda mais rajado,

    com a palidez que lhe afulou o semblante. Todavia no fizera o Bugre o

    menor gesto de ameaa; apenas lhes tomara a frente, postando-se no meio

    do caminho.

    - hoje vspera de So Joo. Seu dinheiro aqui est; no lhe devo mais

    nada.

    Estas palavras foram ditas pelo capanga na sua voz arrastada e mansa,

    estendendo ao Barroso um mao de notas, que ele recebeu maquinalmente

    com a mo bamba.

    - Agora passe bem. Havemos de encontrar-nos! continuou o Bugre, cujo

    olhar despediu uma chispa.

  • Fim do flashback: Retorno ao ncleo de Berta / A cascavel e a menina

    (encantamento) / Brs leva a cobra / Partida de Quic e Berta / os

    porcos selvagens / o salvamento espetacular do velho escravo e de Berta

    por Fera

  • SEDUO MTUA: CASCAVEL E BERTA

    Encontrando-se o olhar da serpente e o seu, cravaram-se de modo, ou antes se

    imburam e penetraram tanto um no outro, que no pode mais a vontade

    separa-los e romper o vnculo poderoso. Parecia que entre a brilhante pupila

    negra da menina e a lvida retina da cascavel se estabelecera uma corrente de

    luz na qual fazia-se o fluxo e refluxo das centelhas eltricas.

    A mesma cambraia que retraiu o dorso flexuoso da boicininga espasmou o

    talhe grcil de Berta, como se uma fora nica regera a vida nessas duas

    organizaes. A estava produzida ao vivo a misteriosa identificao da mulher

    e da serpente, que deu tema ao potico mito da tentao.

    Lentamente a cascavel afrouxava os anis em que enroscara o toro, at que se

    espreguiou ao longo pelo pavimento, pousando lnguida sobre a tbua a

    cabea chanfrada. Recolheu-se a lngua dentro da bainha, e esta desapareceu

    por baixo do focinho, que se abatera flacidamente sobre a mandbula.

    Toda a fora vital da boicininga se concentrava no olhar, donde coava-se uma

    flama trepida, por entre as titilaes da membrana sutil, que reveste a retina

    da serpente. Encadeada por esse fio luminoso ao olhar cintilante de Berta, o

    medonho rptil parecia como deslumbrado por sbito lampejo.

    Tambm a menina sofria a repercusso dessa influncia.

  • ENCANTAMENTO DA COBRA

    Afinal, com um movimento hirto estendeu Berta o brao direito para a

    cascavel, aberta a mo e crispados os dedos, no mpeto de tocar o rosto do

    rptil, ao qual tornou-se mais viva a trepidao do olhar.

    Confrangendo-se, a boicininga propulsou de leve a cabea, como se arrastara

    um fio invisvel, e foi lentamente rojando para Berta. Nesse instante havia

    Afonso enxergado o rptil; e se precipitara horrorizado para despedaar a

    porta,

    Entretanto Berta, proporo que avanava para ela a boicininga, ia-se

    retraindo; erigia-se o busto, e ressurgia-lhe nalma essa elao que a desfere ao cu e que imprime na criatura humana a majestade do porte. Assumia a

    menina outra vez a fina tmpera de seu carter altivo e inflexvel.

    Quando a cabea da cascavel roou-lhe a ponta dos dedos, um choque ntimo

    percutiu-lhe o corpo, e estorceu o toro da serpente. Mas passou

    instantaneamente; o rptil elando-se pelo brao mimoso, veio cingir-lhe as

    espduas, formando colar.

    Com o toque desse brando serpear sentiu Berta a doura de uma carcia; a

    boicininga titilava de volpia ao tpido calor da ctis acetinada; e escondendo

    a monstruosa cabea na conchinha da mo que a menina recolhera ao seio,

    caiu no letargo.

  • PORCOS SELVAGENS

    Surpresa com o estampido e assustada pela expresso de terror que viu no

    semblante de Quic, perguntou Berta:

    - O que ?

    - Queixada, respondeu o preto com a voz sumida.

    Com efeito, da orla da selva rompia um bando de porcos do mato. Mais de cem

    desses animais selvagens, com a pupila chamejante, ouriando as ruivas

    cerdas e afiando os longos colmilhos nos queixais chocalhados pela sanha,

    trotavam em fila, e figuravam na relva da campina a verga combusta do

    imenso arco de algum tamoio gigante.

    Assim avanavam os ferozes queixadas, rompendo selvas, estraalhando

    quando encontram com os cutelos das presas, ou esmagando-o sob a ngula

    bissulca das cem patas cadentes que batem o cho. Se o inimigo resiste ao

    primeiro mpeto do centro, ou se receiam lhes fuja, as pontas do arco se

    estorcem e a vara fatal cinge o msero, que tomba em pedaos, como a isca

    flor de tanque piscoso.

    Era medonho o aspecto daquela serra navalhada a se estender pelo campo

    afora com extrema rapidez.

  • HEROSMO DE FERA

    Resignada ao martrio, Berta erguera os olhos ao cu, pedindo-lhe asilo para sua

    alma pura prestes a desamparar a terra. Os porcos, removendo os queixos, j

    tocavam com as cerdas do focinho o babado da saia, aflado pela brisa.

    Retiniu, porm, um brado espantoso, que reboou pelas crastas e penetrais da

    floresta como o berro medonho do sucuri quando surge flor do imenso lago.

    Pvidos estancaram os queixadas, erguendo a tromba ao ar para conhecer donde

    provinha aquela ameaa.

    Devorando a distncia na corrida veloz, saltando por cima dos magotes que

    encontrava em seu caminho, e s vezes fazendo do prprio lombo das feras cho

    onde pisar, Jo precipitou-se enfim no lugar onde Berta e o negro velho

    aguardavam a morte contritos.

    Suspendendo a menina com o brao esquerdo, enquanto brandia o direito a

    longa faca apunhada, o vigoroso capanga, aproveitando-se do espanto das feras

    ante sua audcia, arrojou-se para a rvore mais prxima, onde poderia colocar a

    menina a salvo de perigo.

    J ele transpunha a distncia, quando ouviu-se um grito dilacerante: o negro

    velho agitando convulsivamente os braos debateu-se no meio dos queixadas,

    como um nufrago no torvelinho das ondas, e estrebuchou.

    - Jo! exclamou Berta angustiada, mostrando o corpo do africano que tombava.

    - No!

    .

  • Jo leva a menina para uma caverna (esconderijo) / Estrutura frgil

    do local (desejo de morte de Fera) / Tentao de possuir Berta

    Na iminncia do crime / Um bacorinho nas pernas de Fera / O

    capanga est cercado por Gonalo Suuarana e outros / O estado de

    transe do capanga (lembranas de Besita) / Fuga com Berta

  • A TENTAO DE JO FERA

    A terra abrasada pelo sol exalava o bafo incandescente de uma fornalha;

    e contudo sentia Jo Fera correr-lhe pela medula um calafrio. O contato

    do corpo gentil de Berta queimava-lhe ainda o peito amplo; mas era a

    lava que ferve no meio dos pncaros gelados dos Andes.

    Tinha mpetos de atirar-se a Berta e s por um esforo inaudito

    conseguira conter o veemente anelo. Sua pupila fulva devorava as formas

    encantadoras; mas ele abaixava a cabea para no encontrar os olhos

    lmpidos da menina, onde irradiava uma alma to pura.

    Finalmente arfou o Bugre, sacudindo as robustas espduas como um

    homem que dum arranco extremo rompe as cadeias que o prendem.

    Depois fechou os olhos e avanou.

  • BACORINHO (SINAL DE PERIGO)

    Ao dar o primeiro passo, voltou-se o Bugre rapidamente, para ver o que

    lhe fossava o calcanhar. Era o bacorinho ruivo, que chegando naquele

    instante, esbaforido pela rpida corrida, focinhava os ps do capanga,

    estirando a tromba para o lado do campo, e soltando um grunhido

    particular, se no era antes um burburinho. No hesitou Jo, vista

    destes sinais. Tomando Berta nos braos outra vez, galgou aos saltos por

    cima dos calhaus e barrocos, agrupados na falda do rochedo, como os

    degraus de uma escada em espira; e sumiu-se com a menina no bojo da

    caverna.

  • TRANSE DE FERA

    O toque suave do corpinho mimoso de Berta produzira nele uma

    embriaguez maior, do que no tivera quando pela primeira vez tomara o

    gosto cachaa, ou aspirara o fumo do sangue.

    Ele tinha sede; sede imensa, ardente, abrasadora, mas era sede de fogo: s

    chamas poderiam aplaca-la.

    Um turbilho de pensamentos perpassava-lhe rapidamente pelo esprito

    sombrio, como nuvens de borrasca se acastelam em cu chumboso. A terra

    seca espera as primeiras gotas que a devem embeber; assim a alma de Jo

    buscava em cada um desses pensamentos blsamo para a dor cruciante que

    o dilacerava.

    A imagem de Besita, que invocara do fundo de seu corao, para amparar a

    filha, contra sua loucura, e subtra-la raiva que se apoderara dele, essa

    imagem querida, que adorara sempre, como uma santa, lhe aparecia agora,

    por um incompreensvel delrio, excitante e provocadora.

    Depois lembrando-se como Besita fora arrebatada a seu amor por um crime,

    sem que ele a pudesse nem defender, nem vingar, associava esse horroroso

    acontecimento ao perigo que tinha pouco antes corrido Berta e ao qual

    sucumbiria se por uma casualidade no chegasse a tempo de socorr-la.

  • MEDO DE MORRER DE BERTA: SALVAO

    Continuava Berta a olhar pela fresta, atenta s ameaas do Gonalo; e Jo,

    pasmo, sombrio, abatido, avanava lentamente aos trancos. J ele tocava o

    seixo, e curvava-se.

    Nesse momento Berta soltou um pequeno grito, e correu a esconder-se junto

    do Bugre:

    - Eles vo atirar, Jo! exclamou ela.

    - Nhazinha tem medo de morrer? perguntou o capanga.

    - Tenho, sim! respondeu a menina assustada.

    A expresso de receio, que se desenhava em sua fisionomia, a salvou. Jo

    ergueu-se de um salto, arrastou o calhau que obstrua uma solapa do

    rochedo, por onde a caverna se comunicava com a prxima encosta, e fugiu

    horrorizado, levando consigo Berta.

    Foi ento que vendo-o passar de relance pelo desfiladeiro, a gente de Filipe

    desfechou as armas; e o capanga urrou de sanha e furor.

    Por atalhos s dele conhecidos, Jo ganhou a floresta e conduziu a menina

    at as plantaes da fazenda; a despediu-se dela com estas palavras,

    proferidas em profunda entonao:

    - Nunca mais, Nhazinha, ande s por estes matos.

  • Afonso e Berta na mata / Beijo no rosto do jovem / Flagra de Miguel

    Miguel triste fala de seus sentimentos / Berta imita o jeito doce da amiga /

    Seduzido pelo jeito de Berta, Miguel confessa gostar de Linda / a moa e

    seu irmo ouvem a confisso (estavam escondidos ouvindo a conversa) /

    Partem para festa de So Joo

  • DEPOIS DA TRAQUINAGEM, O BEIJO

    - Est; no fique zangado!

    Estremeceu Afonso. A fronte reclinando com o enlevo da carcia repousou

    lnguida sobre a formosa cabea da menina, cujos cabelos anelados

    amaciava com a mo trmula. Assim o cedro alterneiro, se o cortam pela

    raiz, entrelaa as ramas da copa frondosa s grinaldas do cip florido.

    Quanto a Berta, conchegada ao seio do mancebo, ria-se maliciosamente

    para disfarar o rubor; e lanava de esguelha um olhar brejeiro ao

    semblante do camarada.

    De chofre repeliram-se um ao outro.

    Miguel estava em face deles.

  • A CONFISSO DE MIGUEL

    - Escute, Miguel, disse Inh pousando a mo carinhosa no ombro do moo

    para ret-lo. Voc h de gostar de Linda!... Me promete, sim? Voc j gosta

    dela... H quem possa resistir queles olhos to doces, que esto bebendo a

    alma da gente. E a boquinha?... um torrozinho de acar escondido em

    uma rosa! Quando ela ri-se, faz ccegas no corao! Do corpinho, nem se

    fala. Que cinturinha de abelha! E um ar to engraado, um andar to

    faceiro, que encanta!

    Este esboo, Inh o fazia ao vivo, e no s com a palavra cintilante, mas com

    o gesto animado, e o requebro do talhe esbelto. Era ela a prpria cera, da

    qual a sua mmica ia esculpindo a esttua famosa de Linda, com as doces

    inflexes das formas, o terno volver dos olhos e o desbroche do mimoso

    sorriso.

    Miguel fascinado, rendido, j no resistia com efeito; e nesse momento, pelo

    menos, ele sentia que amava Linda; mas essa Linda que ali tinha diante dos

    olhos, e no a outra que vira ao natural, tmida, com as plpebras cerradas,

    o lbio trmulo, e o gesto constrangido.

    .

  • A mulher que ele adorava nos sonhos de sua juventude, o tipo de sua

    ardente imaginao, realizava-se naquela moa que vazara a inefvel

    ternura de Linda na graa e gentileza de Berta; e no era uma nem

    outra, mas a transfuso dessas duas almas em uma beleza sedutora.

    Preso dos olhos ao lindo semblante da menina, e suspenso de seu lbio

    gazil e mimoso, foi Miguel seguindo-a, sem conscincia do que fazia.

    Prximo casa ouviu Berta uns risos e cochichos por trs da

    folhagem; e disfarando para no despertar as suspeitas de Miguel,

    aproximou-se da ramada, donde ela pressentira que a estavam

    espreitando

  • Descrio de brincadeiras da festa de So Joo e do

    comportamento de jovens e adultos / O Pau de Sebo / Miguel e

    Berta: O Cravo Branco (simbologia do casamento / Miguel beija a

    flor) / Berta v tristemente a cena

    As razes da tristeza de Berta / Incompatibilidades entre Miguel

    (caipira) e Linda (refinada) / Berta descobre o amor por Miguel, na

    iminncia de perd-lo. Brs pensa que Berta sofre pelo mimo que

    est sobre o pau de sebo e sai em disparada.

  • O PAU DE SEBO

    No era pequena faanha essa; pois alm da altura, o pau fino e rolio

    no dava jeito a que os rapazes se escorassem bem sobre os joelhos para

    com o impulso dos braos se irem iando guisa dos marujos. Este

    folguedo, reminiscncia de antigos jogos de nossos avs, e ainda em voga

    em outros pases com o nome de mastro de cocanha, divertia muito os

    rapazes, pelo seu chiste e novidade. Se sucedia algum, apesar de seus

    esforos, escorregar de repente pelo pau abaixo quando estava j bem

    prximo de atingir a meta; ou se outro mais lorpa no conseguia

    suspender-se do cho, e ficava a patinar ao p do mastro, tentando

    debalde sungar-se; eram chascos e risadas estrepitosas, que festejavam o

    malogro da porfia.

  • MIGUEL E BERTA: O CRAVO COMO SMBOLO DO CASAMENTO

    Miguel embebeu-se na adorao dessa beleza, que se revelava pela

    primeira vez sua alma; e o enlevo durava ainda no momento em que se

    trocava com Linda frases truncadas. A moa havia tirado do seio o cravo

    branco e respirava-lhe o aroma, roando-o pelos lbios.

    No disse o que significa? insistiu Miguel. O senhor sabe. Eu no! respondeu o moo com um sorriso. Sabe sim! Houve uma pequena pausa, durante a qual a palavra adejou nos lbios de

    Miguel, enquanto na alma de Linda j ressoava a sua doce melodia.

    Casamento? balbuciou uma voz submissa. Linda velou-se em uma nuvem de rubor. Com a confuso, naturalmente

    escapou-lhe a flor, que Miguel apanhou, e quis restituir; mas a mo

    trmula da moa no recebeu seno a doce presso.

    Quebrou-se o talo! disse ela rapidamente. Era um motivo para rejeitar a flor, que no podia mais prender no decote, e

    o pretexto para d-la ao moo em penhor de sua ternura. Fechando na

    palma o cravo, Miguel levou-o aos lbios e o beijou com efuso.

  • RAZES DA TRISTEZA DE BERTA

    Que passava na alma da menina? No fora ela quem aproximara Miguel

    de Linda, e com admirvel pacincia durante meses urdira a teia

    delicada que envolvia os dois namorados? No era obra sua esse amor,

    que ela prpria embalara como um filho querido, nutrindo-o de suas

    carcias, enfeitando-o com seus encantos, vivendo e sorrindo-se nele?

    Como agora, obtido o xito de seus desvelos incessantes, em vez da

    satisfao de ver realizado um voto querido, confrangia-se-lhe o corao

    com o quadro suave do mtuo afeto, que ainda naquela manh luzia-lhe

    na imaginao qual doce esperana? Parecer excntrica e at

    incompreensvel esta situao da alma de Berta naquele instante:

    entretanto nada mais lgico e natural. Tinha a menina por Miguel uma

    dessas afeies de infncia, puras, calmas e serenas, primeiros botes,

    dos quais ningum sabe que flor vai sair, se uma doce amizade, se uma

    paixo ardente.

  • D. Ermelinda ouve a conversa sobre Besita e a juventude de Lus

    Galvo / Tristeza / Reflexes da senhora sobre o destino da filha /

    Brs salta da janela sobre o pau de sebo / D o presente Berta /

    Proibio: Linda deve ficar em casa (impedimento amoroso)

    O Samba:

    A descrio da festa

    Briga entre Rosa e Florncia

    Disputa entre escravos e feitores

  • LGRIMAS DE ERMELINDA

    E a filha do Guedes, lembra-se? A que o marido abandonou? A Besita, sim! Essa no! exclamou involuntariamente Galvo contrariado. Ora negue! Antes e depois. Do parto? Do casamento! Que tal o cujo? exclamaram diversos. Uma risada geral acolheu a pilhria, que perturbou o fazendeiro.

    Mudemos de conversa! disse ele com algum vexame. D. Ermelinda que se tinha aproximado da janela vizinha, procura da

    filha, apanhara aquele trecho

    de conversa; e teve um aperto de corao. Esquecendo-se do que a

    trouxe janela, submergiu-se em uma triste cogitao, com a face

    apoiada na palma da mo; nem viu mais o que se passava no terreiro,

    ali quase em face dela.

  • AMOR DE BRS

    O aborto humano; a figura estrambtica e ridcula; o monstrengo, cara como

    o disfarce do arlequim, e descobrira a feio mais nobre da criatura. O que

    Berta viu foi um corao, e maior ainda e mais sublime, no seio da

    brutalidade que o constringia. Abraou a menina com veemncia ao pobre

    sandeu, e sentindo mida a face, enxugou nos pelos speros da ruiva melena

    uma gota que empanara o brilho de seus olhos cintilantes. Outras havia

    chorado, mas foram bolhas dgua: lgrima, era aquela a primeira. Depois comeou ela a enfeitar-se com as flores que lhe trouxera o idiota, prendendo-

    as pelo talho do vestido e entrelaando-as nos cabelos. No trocaria nesse

    momento os arroubos que, havia pouco, invejara a Linda, pelo jbilo dessa

    tosca demonstrao de um amor, que no tinha para exprimi-lo seno os

    esgares de um parvo, e cujo sorriso era um repulsivo engrimano.

    Adivinhava-lhe o instinto que no havia afeto mais puro, extreme e sincero

  • PROIBIO DE D. ERMELINDA

    Linda, que observava sorrindo a faceirice de Berta e a ajudava a prender

    as flores nos cabelos, voltou-se voz de sua me:

    Faa o favor de no sair mais da sala, minha filha, disse D. Ermelinda. Velava o olhar e a voz da senhora um ressumbro de triste severidade, que

    anuviou o corao deLinda.

  • O SAMBA

    No furor causado pelo remexido infernal, alguns negros arremetiam contra a

    fogueira e sapateiam em cima do borralho ardente, a escorrer do braseiro.

    Entre estes o primeiro e o mais endiabrado, foi Monjolo; tomando por sua

    parceira de batuque a prpria fogueira, atirou-lhe tais embigadas, que a

    pilha de lenha derreou e foi esboroando-se. Entretanto o negrinho, a

    requebrar-se, abria o queixo e atroava os ares com esta cantiga:

    Candonga, deixa de partes

    melhor desenganar,

    Que este negro da carepa

    No h fogo pra queimar.

  • BRIGA ENTRE ROSA E FLORNCIA

    Essa preta a Florncia: uma esttua de Juno, toscamente lavrada em

    mrmore negro, e coberta com um cabeo de renda que lhe mostra o colo, e

    uma saia de riscado cada at o meio da perna musculosa.

    As duas rivais se afrontaram com o olhar, por diante da cara desfaada do

    mulato. Os alvos dentes de Rosa brilharam engastados em um riso de

    escrneo, que lhe arregaava os lbios carnudos, e dentre as fendas dos

    incisores partiu um rpido esguicho, que bateu em cheio na cara da outra. Foi

    pronta a rplica de Florncia. Vibrando no ar o brao habituado a manejar a

    enxada espalmou a mo na bochecha da mucama, que titubeou e decerto iria

    ao cho a no ampara-la o mulato. Amncio vista do bofeto decidiu-se pela

    Rosa, e atirou Florncia uma cabeada. Mas a preta agarrou-o pelos cabelos;

    e ele apertou-lhe as goelas a fim de livrar-se das garras daquela fria.

    Entretanto a Rosa ferrava os dentes no ombro da rival, que defendia-se aos

    pontaps. Os pretos da roa acudiram sua parceira, insultada pela cambada

    de pajens e mucamas. Os capangas tomaram o partido de Amncio por uma

    espcie de coleguismo; e assim tornou-se geral o banz.

  • Incndio no canavial

    D. Ermelinda v seu marido sendo atacado

    Gonalo vai jogar o corpo de Galvo no fogo

    Jo Fera aparece / Salva o dono da fazenda

    Afirma que no o mata por causa de Berta

    Fera mata os traidores: Monjolo e Faustino

    Miguel vem enfrentar Fera: Berta impede

  • EMBOSCADA: LUS GALVO EM PERIGO

    O fazendeiro lanou-se na direo do incndio, pensando que toda a gente da

    fazenda no tardaria a segui-lo, e ansioso por avaliar da intensidade do fogo

    como de sua marcha. Lembrara-se que o tanque ficava sobranceiro ao

    canavial, a arrombando-o podia arrojar sobre o foco do incndio uma

    formidvel manga dgua que o extinguisse. Enganara-se, porm, Galvo.

    Desmaiara D. Ermelinda ao ver, no canavial, surgir da sobra um homem,

    que, brandindo um cacete sobre a cabea de Lus Galvo, o prostrou ao cho

    como um corpo morto. Era o Gonalo Suuarana.

  • FERA: O HERI

    Quando Gonalo se curvava para soerguer o corpo do fazendeiro e arremessa-

    lo no meio das chamas, um vulto emergiu da sombra. Jo Fera estava em face

    dele. Recuou o Suuarana de um salto, e sacou da cinta a pistola que

    desfechou sobre o inimigo queima roupa. No acertando o primeiro e

    segundo tiro, puxou da catana; e comeou a esgrimi-la cortando o ar. O

    capanga avanava lento, mudo, sombrio, sem arma em punho, nem sequer um

    gesto de ameaa; e, todavia, era ele Gonalo, apesar de armado, quem recuava

    diante daquele vulto impassvel. Afinal, o pulso do Suuarana, fatigado de

    cutilar o vento, afrouxou. No teve ele tempo de pressentir o perigo; colhido

    pelas espduas girou no ar e foi abater-se no canavial abrasado onde o

    arrojara o brao pujante de Jo Fera, que antes de arremessar o corpo, o havia

    estrangulado.

  • Barroso (3 dias depois) vem matar Berta. Zana o v e grita

    Fera se entrega ao Aguiar. Quebra do combinado

    Fera fulmina Barroso (Ribeiro)

    A menina v o furor com que Fera mata o antagonista

    A moa aoita o rosto do facnora

  • VINGANA DE BARROSO

    Ao passar por Campinas, soube que o Bugre fora preso na vspera por

    gente do Aguiar, e ento animou-se a voltar a Santa Brbara. Seu

    primeiro pensamento foi Berta. Lembrando-se que ia matar a pobre

    menina, sentia um prazer brbaro. Parecia-lhe que Besita revivia na

    pessoa da filha, e que assim podia ele assassina-la outra vez, saciando o

    seu imenso rancor. Ele, que a princpio nem se apercebera da semelhana

    de Berta com a me, to apagada estava em sua memria a imagem da

    mulher a quem amara alguns dias para odi-la tantos anos com um

    rancor de alm-tmulo, agora que o dio lhe avivara a reminiscncia, via

    surgir a sombra viva de Besita.

  • TRATO ESTABELECIDO POR FERA NA RENDIO

    Os senhores sabem se eu tenho palavra. Estou aqui por minha vontade; e

    do mesmo modo irei para onde quiserem. O ajuste foi entregar-me; e me

    entrego mesmo. Mas se algum me puser a mo, est tudo perdido.

    Retraiu o Bugre o p esquerdo; e os ombros agitaram-se com uma ligeira

    contrao, enquanto nos olhos torvos fuzilava um relmpago. Os capangas

    hesitaram; e a um aceno do fazendeiro, que do sobrado assistia cena,

    Filipe acomodou a coisa.

    A sua gente rompeu o ajuste; minha palavra est livre. Passe bem; mas fique descansado que eu lhe darei o pago deste desaforo. H de ver se

    bom ser amarrado como um negro fugido! Deixando a fazenda encaminhou-

    se Jo Fera para Santa Brbara, donde sara aquela manh, cuidando que

    nunca mais voltaria queles lugares.

  • SALVAO DE BERTA / MORTE DE RIBEIRO

    Quando, porm, o Ribeiro j estendia o brao para tocar a menina, tal repercusso

    ele sentiu, que pulou arremessado como uma pela, e chofrou o inimigo com o

    arremesso da guia quando arrebatada a presa. Sufocando na boca do miservel o

    grito que lhe escapava, arrastou-o para o mais espesso da mata. Foi este rumor que

    Berta ouvira de envolta com a gargalhada estridente de Zana, a qual por uma sbita

    lucidez reconhecera o capanga, e adivinhara nele o vingador de Besita e o salvador

    da filha. Entretanto, Jo Fera, embrenhado na espessura, atirava ao cho o corpo do

    Ribeiro, quase desfalecido pelo terror e pela constrio formidvel dos braos que o

    arrochavam. O capanga sacara a faca da cinta, e com o golpe suspenso procurou

    sofregamente um lugar para ferir, mas de modo que reanimasse com a mais intensa

    dor, aquele corpo desmaiado sem contudo lhe tirar a vida, que ele queria conservar

    como um avaro, para sua vingana. Ao cabo de um instante de hesitao arremessou

    de si a arma; arquejante aos arrancos daquela sanha. Agachando-se ento como um

    tigre que prepara o salto, com os dentes rangidos e os lbios espumantes, se

    arremessou em cima do Ribeiro e tripudiou sobre o corpo em um frenesi de selvagem

    ferocidade. Quem o visse dilacerando a vtima com as mos transformadas em

    garras, pensaria que a fera de vulto humano ia devorar a presa e j palpitava com o

    prazer de trincar as carnes vivas do inimigo. Soou perto um brando de horror.

    Transido e estpido, Jo Fera viu Berta fugindo espavorida daquele stio, ao qual a

    guiara o Brs, por uma estulta malignidade. O idiota espreitar a cena anterior, e

    forjara no seu bestunto aquela vingana.

  • O TAPA DE BERTA

    De cabea baixa, o Bugre, rechaado por aquele mpeto de indignao,

    afastara-se dois passos; mas apenas desviou-se o olhar cintilante da menina,

    retrocedeu:

    Perdoe, Nhazinha! Vai embora! gritou Berta. Brs, que se agachara aos ps da menina, soltou um grunhir de escrnio.

    Teve Jo Fera um mpeto

    de revolta. Queria suplicar seu perdo.

    No vou! disse rispidamente. O talhe de Berta vibrou como uma seta brandida nos ares. Sua mozinha

    delicada partiu rpida a haste de um cip, e com essa vergasta fustigou o

    rosto de Jo Fera. Duas lgrimas sulcaram as faces do facnora, e lavaram

    uma gota de sangue que a borbulhava.

  • Pssimo clima na casa de Galvo

    Encontro de Linda e Miguel / Flagrante de D. Ermelinda

    Despedida

    Festa do Congo (Piracicaba) Fera na priso Fuga de Fera

    Encontro entre Afonso / Berta e um ndio

    De volta, Zana pula na frente do cavalo de Galvo:

    Lus promete contar a verdade esposa

  • ENCONTRO DE MIGUEL E LINDA

    Ali, defronte, um do outro, os dois amantes no se animavam a quebrar o

    silncio, nem mesmo a se olhar.

    Linda!... murmurou o moo afinal. O senhor no sabe? interrompeu a voz trmula da menina. Vamos para o Rio de Janeiro.

    A senhora?... exclamou o rapaz sucumbido. Linda soltou uma exclamao de susto. D. Ermelinda, vendo a filha passar, a

    acompanhara e surpreendera os dois amantes. No se irritou a senhora, que

    viu a aflio pintada no rosto da filha. Ao contrrio, abraando-a com ternura,

    chamou a Miguel, o qual procurava esconder-se sua vista. Aproximou-se o

    moo, plido e confuso, para ouvir estas palavras pronunciadas com um tom

    de meiga severidade:

    Diga adeus a Linda, Miguel; mas para sempre! Ela no pode pertencer-lhe!...

    O moo abraou Linda e partiu soluando. A menina escondeu o pranto no

    seio da me, que a furto enxugava os olhos.

  • O MISTERIOSO NDIO / ZANA E O PEDIDO

    Nesse instante um caiap de alto porte e compleio robusta, separado do

    bando que j ia longe de envolta com a cavalgata, atravessando a rua,

    parou defronte dos dois moos e afincou-se a observa-los. De repente saltou

    em frente de Afonso e ouviram-se estas palavras, que rompiam da croa

    espessa, como da brenha escapa o rugido da fera:

    Teu pai matou a me dela; tu queres matar a filha; duas vezes!

    beira da estrada via-se um vulto negro, que de longe afigurava-se urna de

    algum bugre, esquecida flor da terra. Ao tropel dos animais o vulto ergueu a

    cabea. Era Zana. Soltando um grito de espanto, arrojou-se frente do cavalo de

    Afonso, e estendeu as mos splices:

    Pelo amor de Deus, nh Lus!... No faa mal a Nhazinha!... Da outra vez ela chorou tanto! E depois veio o marido e matou Nhazinha!... Por vida de seu pai,

    nh Lus!... Eu lhe peo de joelhos! A msera negra, na sua alucinao,

    remontava o curso da existncia, e revivia o tempo j passado, quando Lus fora

    mancebo que representava agora seu filho Afonso.

  • Galvo conta tudo esposa

    Falsa narrativa Tudinha / Recusa de Berta em morar com Galvo

    Promessa de Fera: no matar mais ningum

    Verdadeira histria de Berta

    Reconhecimento de Fera como pai

    Pedido para no impedir o romance entre Linda e Miguel

  • RECONCILIAO ENTRE D. ERMELINDA / GALVO

    D. Ermelinda chegou-se com um triste, porm meigo sorriso, e apertando a

    mo do marido, murmurou-lhe ao ouvido:

    Meu amigo, preciso reconhecer a sua... a nossa filha!... Arrasaram-se de lgrimas os olhos de Lus, que apertou estremecidamente

    a mulher ao corao, erguendo os olhos ao cu.

    Que santa me deste tu, meu Deus, a mim que no mereo! Logo depois do almoo, D. Ermelinda foi casa de nh Tudinha e pediu-lhe

    que preparasse Berta para a revelao que o pai ia fazer-lhe de seu

    nascimento. Com o tato de mulher e me quis a boa senhora poupar

    enjeitada a dor que havia de curtir se viesse a conhecer a desgraa de

    Besita. Imaginou pois um meio delicado de revelar a lgubre histria.

    Besita casara com Lus s ocultas, por causa da oposio do velho Galvo.

    Morrendo a moa, e casando Lus pela segunda vez, acanhou-se de

    confessar a D. Ermelinda que era vivo e tinha uma filha. Por esse motivo

    fora Berta criada como uma

    estranha em casa alheia.

  • RECONHECIMENTO DE FERA COMO PAI

    Quando terminou essa dolorosa narrao, Berta que a ouvira com um

    respeitoso silncio, apenas cortado pelo contnuo soluo que fazia arfar-

    lhe o seio, alou ao cu os olhos cheios de lgrimas.

    E ele meu pai!... Depois erguendo-se de um mpeto, e apertando as mos grosseiras do

    Bugre:

    No! No!... exclamou ela. Meu pai s tu, que me recebeste dos braos de minha pobre me, com seu ltimo suspiro. s tu, que a adoravas,

    como a uma santa; e quando ela deixou este mundo, no tiveste no

    corao outro sentimento mais, seno dio a todos, menos a mim, que te

    lembrava ela. Oh! Eu compreendo agora, Jo, o que te fez mau!... Mas

    fiquei eu neste mundo, em lugar dela, para fazer-te bom!...

  • PEDIDO DE BERTA A GALVO

    Muitas vezes Lus Galvo insistia em reconhecer a filha e leva-la para a

    sua casa, onde acharia em D. Ermelinda uma terna e boa me:

    Me, dizia Berta, no quero outra seno aquela que me est esperando no cu. Mas h uma coisa que me faria muito feliz. Esse

    lugar que no pode ser meu, eu dou a Miguel. Ele quer tanto bem

    Linda!... No teve Lus Galvo coragem para resistir ao pedido de Berta.

    Parecia-lhe que assim cumpria um voto de Besita. D. Ermelinda

    condescendeu prontamente com o desejo do marido, ansiosa por v-lo

    restitudo sua tranqilidade e arrependida da confisso que provocara.

    Combinou-se que Miguel iria estudar a So Paulo; e dois anos depois se

    efetuaria o casamento naquela cidade para onde a famlia devia partir

    logo.

  • Amor por Miguel x Amor Sror

  • MIGUEL E BERTA

    Houve um novo e longo silncio. Foi Miguel quem outra vez rompeu:

    Meu sonho era viver aqui nesta casa onde nasci, com minha me e voc, Inh. Por muito tempo sorriu-me esta doce esperana; mas voc no

    quis!

    No diga isto, Miguel! exclamou Berta com a voz afogada em lgrimas. Quem me separa destes lugares e talvez para sempre? Curvou Berta a cabea e balbuciou:

    Lembre-se de Linda! Lembro-me daquela que foi companheira de minha infncia, com quem folguei os primeiros anos da vida, e cuidei que havia de repartir minha

    pobreza e humildade. Quantas vezes supliquei a Deus que nos

    conservasse unidos sempre, e esquecidos aqui neste canto do mundo. Mas

    ela tomou para si unicamente a existncia tranquila e feliz que eu pedia

    para ambas, e aparta-me de si para longe!

    Miguel!... Olhares ansiosos seguiam Berta, que afastava-se lentamente de Miguel

    na direo das Palmas.

  • VITRIA DO AMOR SORR

    Afinal o moo enlaou com o brao a cintura da menina, e a atraiu sem que

    ela lhe opusesse a mnima resistncia. Pousando a cabea trmula no

    ombro de seu companheiro de infncia, deixou-se Berta levar, embalada

    por um sonho fagueiro. Cortou os ares um grito de angstia. Brs cara ao

    cho como fulminado, e estrebuchava em uma violenta convulso, soltando

    uivos estridentes. Berta desprendeu-se dos braos do moo:

    No, Miguel. L todos so felizes! Meu lugar aqui, onde todos sofrem. E rompendo o doce enlevo que a prendia um momento antes, soluou:

    Adeus!... Correu ento para o msero idiota e sentando-se na grama para deita-lo ao

    colo, ocupou-se em afag- lo

  • Nesse instante Miguel voltou-se alm, na extrema do caminho onde ia sumir-

    se, e a brisa trouxe um eco de sua voz:

    Adeus, Inh!... Os lbios de Berta murmuraram frouxamente:

    Para sempre! Jo de p em face dela esmagava com os punhos as bagas que lhe saltavam dos

    olhos; enquanto o peito lhe estertorava com o pranto que tentava sufocar.

    Berta pousou nele o seu brando olhar e disse-lhe com um sorriso:

    Vai trabalhar, Jo!... Entrou em casa para consolar nh Tudinha; e instantes depois se restabeleceu

    a cena plcida e melanclica do comeo da tarde.

    Quando o sol escondeu-se alm, na cpula da floresta, Berta ergueu-se ao doce

    lume do crepsculo, e com os olhos engolfados na primeira estrela, rezou a ave-

    maria, que repetiam, ajoelhados a seus ps, o idiota, a louca e o facnora

    remido. Como as flores que nascem nos despenhadeiros e algares, onde no

    penetram os esplendores da natureza, a alma de Berta fora criada para

    perfumar os abismos da misria, que se cavam nas almas, subvertidas pela

    desgraa. Era a flor da caridade, alma sror.

    AMOR LUZ (CARIDADE)

  • TEMAS PARA O VESTIBULAR

    IDEALIZAO DA NAO

    A EDUCAO DE DOMINGO X BERTA

    (Recuperao das ideias de Rosseau)

    ESCRAVIDO

    (Alencar foi contra a Lei do Ventre Livre, 1871)

    NOO DE TRABALHO PARA FERA (INICIALMENTE)

    (Associado escravido)

  • ALENCAR E A ESCRAVIDO

    Novas Cartas Polticas de Erasmo

    Seu argumento geral nessas cartas era de oposio

    interveno do Estado num assunto que deveria permanecer

    na esfera privada, o fim da escravido no deveria ser

    mediado por uma lei que poderia desestruturar a sociedade.

    Medo de Alencar: Revoltas dos escravos aps a libertao dos

    seus filhos

    (Smbolo na obra: Insubordinao de Monjolo)

  • JO FERA E O TRABALHO

    O trabalho, ele o tinha como vergonha, pois o poria ao nvel do

    escravo. Prejuzo este, que desde tempos remotos dominava a

    caipiragem de So Paulo, e se apurava nesse homem, cujo esprito de

    sobranceira independncia havia robustecido a luta que travara

    contra a sociedade.

    Era a enxada para ele um instrumento vil: o machado e a fouce ainda

    concebia que os pudesse empunhar a mo do homem livre; mas em

    seu prprio servio, para abater o esteio da choa ou abrir caminho

    atravs da floresta