Autobiografia e Formação Docente - Soares

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  • AUTOBIOGRAFIA E FORMAO DOCENTE: CAMINHOS E PERSPECTIVAS PARA PRTICA REFLEXIVA

    Antonina Mendes Feitosa Soares PPGEd/UFPI [email protected] Jos Augusto de Carvalho Mendes Sobrinho - PPGEd/UFPI - Professor Doutor da Universidade Federal do Piau (UFPI/DMTE/PPGEd). Bolsista de Produtividade do CNPq. [email protected]

    RESUMO

    Este artigo, parte da dissertao de Mestrado que desenvolvemos no Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal do Piau PPGEd/UFPI, tem como objetivo refletir sobre a pesquisa (auto) biogrfica na perspectiva da formao/autoformao docente, partindo de uma reviso bibliogrfica, bem como das discusses e das reflexes socializadas nas aulas das disciplinas Formao de Professores e Prtica Pedaggica cursadas no Mestrado em Educao. Portanto, foi a partir da que objetivamos escrever o presente artigo para evidenciar a pesquisa (auto)biogrfica, discutindo diversos conceitos, caminhos e perspectivas para prtica reflexiva inseridos neste tipo de abordagem. uma pesquisa de abordagem qualitativa, que tem como mtodo, a histria de vida ou mtodo (auto)biogrfico. Procuramos, portanto, estabelecer a diferena entre as diversas terminologias que vm sendo empregadas nos estudos que versam sobre a temtica em foco, entre outros, Nvoa (1995), Bolvar (2002), Josso (2002), Sousa (2006) e Chizzotti (2006). Detectamos que, o mtodo autobiogrfico o estudo de documentos pessoais narrados ou escritos e que inclui cartas, biografias, autobiografias, dirios e outros. A autobiografia expressa o escrito da prpria vida, caracterizando-se como oposta biografia, porque o sujeito desloca-se numa anlise entre o papel vivido de ator e autor de suas prprias experincias, sem que haja uma mediao externa de outros. As histrias de vida adotam e comportam uma variedade de fontes e procedimentos de recolha, podendo ser agrupadas em duas dimenses: os diversos documentos pessoais (autobiografias, dirios, cartas, fotografias e objetos pessoais), e as entrevistas biogrficas (orais ou escritas). A escrita narrativa mobiliza no sujeito uma tomada de conscincia, por emergir do conhecimento de si e das dimenses intuitivas, pessoais, sociais e polticas impostas pelo mergulho interior, remetendo a constantes desafios em relao s suas experincias e s posies tomadas. Portanto, se faz necessrio o aprofundamento dos estudos nesse campo, embora havendo hoje na literatura uma diversidade significativa de estudos e de aplicaes, porm, ele profcuo em possibilidades para se pensar a formao de adultos em geral e, particularmente, a formao de professores.

    Palavras-chave: Pesquisa autobiogrfica. Histria de vida. Formao de professores.

    1 Introduo

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    Pretendemos neste trabalho discutir questes de ordem metodolgica e conceptual, partindo de uma reviso bibliogrfica, evidenciando, portanto, a pesquisa (auto) biogrfica, discutindo diversos conceitos inseridos neste tipo de abordagem e as contribuies para formao docente na perspectiva de prtica reflexiva. Na verdade, esta discusso parte da dissertao de Mestrado que desenvolvemos junto ao Programa de Ps-Graduao da Universidade Federal do Piau PPGEd/UFPI.

    A priori, vale destacar que, para Bolvar (2002) a pesquisa biogrfico-cientfica, no contexto de formao de professores, possibilita compreender os modos como estes profissionais do sentido ao seu trabalho e atuam em seu universo docente. Na verdade, permite explicitar as dimenses do passado que pesam sobre as situaes atuais e sua projeo em formas desejveis de ao. De fato os professores, como pessoas, realizam o ensino com um conjunto particular de habilidades e conhecimentos pessoais, obtidos ao longo de sua histria de vida particular.

    Desta forma, o professor encontra-se num cenrio em que pertinente refletir sobre si, como profissional e como pessoa, dado que so dimenses inseparveis. Diante desse contexto, compreende-se que as autobiografias podem auxiliar na identificao dos novos sentidos que os professores atribuem ao seu pensar, fazer e sentir.

    Portanto, o campo da investigao e da produo do conhecimento tem procurado como esses profissionais vm desenvolvendo sua profisso e, para isso, se faz necessrio pesquisar a vida cotidiana com suas emoes e lutas que acabam por constituir o processo identitrio de cada docente, pois cada um tem seu modo de organizar suas aulas, de utilizar os meios pedaggicos, de resolver problemas, de enfrentar o imprevisvel do cotidiano. Esta maneira prpria de ser e de se constituir de cada profissional da educao , no entender de Nvoa (1995, p. 16-17) o que se constitui uma espcie de segunda pele profissional e, desta forma, [...] a literatura pedaggica foi invadida por obras e estudos sobre a vida dos professores, as carreiras e os cursos de formao, as biografias e autobiografias docentes ou o desenvolvimento pessoal e profissional [...].

    Face ao exposto, na realizao deste estudo, tomamos como referncias terico-conceptuais vrias contribuies de autores que abordam a temtica em foco, tais como: Bolvar (2002), Nvoa (1988, 1995), Olinda (2008), Sousa (2006), Chizzotti (2006) e Dominic (1988).

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    2 Autobiografias, Biografias, Histrias de Vida e Narrativas: uma perspectiva de formao

    Na abordagem (auto) biogrfica, o objeto de estudo o indivduo, na sua singularidade. Tem seu uso intensificado na dcada de 80 do sculo XX, com o objetivo de renovar, metodologicamente, a pesquisa em cincias humanas, contrapondo-se ao paradigma dominante, que tem como pilares a objetividade e a intencionalidade nomottica (FERRAROTI, 1988, p. 19 apud OLINDA, 2008, p. 93). Essa oposio evidencia-se na medida em que a construo da experincia centra-se na singularidade/subjetividade do sujeito e na proximidade entre pesquisador e sujeito da pesquisa. A partir dessa dcada h uma diversidade de teorias e prticas pedaggicas que caracterizam uma mudana de eixo que supera a racionalidade tcnica, para uma diversidade de concepes que valorizam a experincia vivida. Os docentes passam a ser reconhecidos como portadores de um saber plural, crtico e interativo. Colocar a pessoa do professor como uma das centralidades do processo formativo fundamental uma vez que permite entender o significado do desenvolvimento pessoal no processo profissional do trabalho docente. Na concepo de (NVOA, 1995. p. 25) [...] urge por isso (re) encontrar espaos de interao entre as dimenses pessoais e profissionais, permitindo aos professores apropriar-se dos seus processos de formao e dar-lhes um sentido no quadro das suas histrias de vida.

    Nesse contexto, constatamos uma nova relao entre investigador e investigado, na qual no h lugar para neutralidade e distanciamento. (OLINDA, 2008, p. 94). A autobiografia no apenas descreve a trajetria de vida do sujeito como tambm pode ajudar a selecionar e orientar a busca de oportunidades de desenvolvimento profissional. Quando se refere a uma formao que queira incidir significativamente sobre a vida, no se pode ficar alheia ao trajeto de cada ser. Neste sentido, a autobiografia, que se centra no passado profissional do professor e no seu mundo pessoal, fonte de compreenso das respostas e aes no contexto presente. (BOLVAR, 2002, p. 175-176).

    Nessa perspectiva, definimos mtodo autobiogrfico como sendo o estudo de documentos pessoais narrados ou escritos e que inclui cartas, biografias, autobiografias, dirios e necrolgios. marcado por uma caracterstica: explora a relao entre a experincia social e o carter pessoal. Na verdade, [...] por meio deste mtodo o indivduo visto como uma articulao decididamente singular e complexa da dimenso cultural; por isto, a pesquisa

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    utiliza e desenvolve-se pelo modo dedutivo e no pelo modo indutivo. (ERBEN, 1996, p. 73 apud BARRENECHE-CORRALES, 2008).

    Souza (2006), fundamentado em Pineau (1999), no que se refere terminologia apresentada no seu texto Experincias de Aprendizagem e Histrias de Vida, onde o autor faz uma anlise de diferentes trabalhos desenvolvidos na dcada de 80 com abordagem biogrfica, evidencia quatro diferentes categorias: a biografia, a autobiografia, os relatos orais e a histrias de vida.

    O mtodo biogrfico surge como resultado de consideraes epistemolgicas e tericas na perspectiva de por em prtica uma tomada de conscincia dos processos pelos quais os adultos se formam. E, nessa perspectiva, Finger (1988, p. 84) enfatiza que este mtodo [...] se justifica pelo fato de este mtodo valorizar uma compreenso que se desenrola no interior da pessoa, sobretudo em relao a vivncias e a experincias que tiveram lugar no decurso da sua histria de vida.

    Para Souza (2006), apoiado em Pineau (1999), biografia um escrito da vida do outro, inscrevendo numa abordagem denominada abordagem biogrfica. Por sua vez, Dominic (1988) define como biografia educativa, por fazer entrada na trajetria educativa dos sujeitos; Josso (1988) reconhece como biografia formativa, pressupondo que o sujeito no pode entender o sentido da autoformao se no perceber as lgicas de apropriao e transmisso de saberes que viveu ao longo da vida, atravs de suas aprendizagens pelas experincias. Ou seja, [...] narrar a histria de nossa vida uma auto-interpretao do que somos, uma encenao atravs da narrao [...]. (BOLIVAR, 2002, p. 111).

    Na concepo de Chizzotti (2006, p. 102), [...] a biografia a narrativa de vida de uma pessoa, feita por outrem, que, com base em documentos, hipteses e orientaes tericas, reconstri a vida do biografado. Por sua vez, para este mesmo autor, [...] a autobiografia uma histria de vida escrita pela prpria pessoa sobre si mesma, ou registrada por outrem, concomitantemente com a vida descrita, na qual o narrador esfora-se para exprimir o contedo de sua experincia pessoal. (2006, p. 102).

    Para Souza (2006) as abordagens biogrfica e autobiogrfica das trajetrias de escolarizao e formao, tomadas como narrativas de formao inscrevem-se nesta abordagem epistemolgica e metodolgica, por compreend-la como processo formativo e autoformativo, atravs das experincias dos atores em formao.

    Especificamente sobre as histrias de vida e do mtodo (auto) biogrfico, Nvoa (1988, p. 116) deixa claro que a discusso sobre estes conceitos objetiva[...] repensar as

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    questes da formao, acentuando a idia que ningum forma ningum e que a formao inevitavelmente um trabalho de reflexo sobre os percursos da vida [...].

    Na acepo de Josso (2002) e Dominic (1998), a abordagem biogrfica, configura-se como investigao porque se vincula produo de conhecimentos experienciais dos sujeitos adultos em formao. Por outro lado, formao porque parte do princpio de que o sujeito toma conscincia de si e de suas aprendizagens experienciais quando vive, simultaneamente, os papis de ator e investigador da sua prpria histria.

    Dessa forma, entendemos que preciso pensar a formao do professor como um processo, cujo incio se situa muito antes do ingresso nos cursos de formao inicial, ou seja, desde os primrdios de sua escolarizao e at mesmo antes, e que depois destes tem prosseguimento durante todo percurso profissional do docente. A respeito dessa situao, Dominic (1998, p. 140) em uma das suas reflexes sobre o uso das histrias de vida enfatiza bem esta concepo, expondo que a histria de vida [...] outra maneira de considerar a educao. [...] A histria de vida passa pela famlia. marcada pela escola. [...] a educao assim feita de momentos que s adquirem o seu sentido na histria de uma vida.

    Para Queiroz (1988), a histria de vida posta no quadro amplo da histria oral que tambm inclui depoimentos, entrevistas, biografias, autobiografias. Ainda entende que toda histria de vida encerra um conjunto de depoimentos e, embora, tenha sido o pesquisador a escolher o tema, a formular as questes ou a esboar um roteiro temtico, o narrador que decide o que narrar. A mesma autora v na histria de vida uma ferramenta valiosa exatamente por se colocar justamente no ponto no qual se cruzam vida individual e contexto social.

    Corroborando com as reflexes de Queiroz, Souza enfatiza que as histrias de vida adotam e comportam uma variedade de fontes e procedimentos de recolha, podendo ser agrupadas em duas dimenses: os diversos documentos pessoais (autobiografias, dirios, cartas, fotografias e objetos pessoais), e as entrevistas biogrficas (orais ou escritas). Para este mesmo autor, as pesquisas biogrficas partem do princpio de que a educao caracteriza-se como uma narratividade intersubjetiva, recolocando a subjetividade como categoria heurstica e fenomenolgica de tal abordagem.

    De acordo com Spndola e Santos (2003, p. 121) o mtodo histria vida ressalta o momento histrico vivido pelo sujeito e aponta as seguintes caractersticas:

    [...] necessariamente histrico (a temporalidade contida no relato individual remete ao tempo histrico), dinmico (apreende as estruturas de relaes sociais e os

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    processos de mudanas) e dialtico (teoria e prtica so constantemente colocados em confronto durante a investigao).

    Mais especificamente sobre a escrita da narrativa, como uma atividade metarreflexiva, Souza (2006) pontua que esta mobiliza no sujeito uma tomada de conscincia, por emergir do conhecimento de si e das dimenses intuitivas, pessoais, sociais e polticas impostas pelo mergulho interior, remetendo a constantes desafios em relao s suas experincias e s posies tomadas. Diversos questionamentos surgem na tenso dialtica entre o pensamento, a memria e a escrita, os quais esto relacionados arte de evocar, ao sentido estabelecido e investigao sobre si mesmo, construdos pelo sujeito, como um investimento sobre a sua histria, para ampliar o seu processo de conhecimento e de formao a partir das experincias.

    Evocando os pensamentos de Cipriani (1983 apud SPNDOLA; SANTOS, 2003, p. 122), descobrimos que, atravs das narrativas de sua vida,

    [...] o indivduo se preenche de si mesmo, se obrigando a organizar de modo coerente as lembranas desorganizadas e suas percepes imediatas: esta reflexo do si faz emergir em sua narrao todos os microeventos que pontuam a vida cotidiana, do mesmo modo que as duraes, provavelmente comuns aos grupos sociais, mas que dentro da experincia individual contribui para a construo social da realidade. (CIPRIANI, 1983 apud SPNDOLA; SANTOS, 2003, p. 122).

    Neste sentido, Delory-Momberger (2008), pontua que, a narrativa de formao fundamenta o modelo que, desde o sculo XVIII, inspira nossas representaes biogrficas e a maneira como narramos nossa vida: h, com efeito, desde essa poca, uma espcie de evidncia segundo a qual fazer a narrativa de vida consiste em trazer as etapas de uma gnese, o movimento de uma formao em ato, em outras palavras, contar como um ser tornou-se o que ele . O princpio dinmico da narrativa de formao deu origem, durante o sculo XVIII, a dois gneros prximos, que se influenciaram mutuamente, mas que se distinguem entre-si: por um lado, pela relao que mantm com o real e a fico e , por outro lado, pelo pacto de leitura que os une aos seus leitores. O primeiro, a autobiografia, realiza-se por um narrador-autor como narrativa retrospectiva da prpria vida na primeira pessoa; o segundo, o romance de formao, realiza-se na primeira ou terceira pessoa como narrativa retrospectiva da vida de um personagem de fico. Frente ao exposto, consideramos ainda pertinente enfatizar que:

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    [...] autobiografia ou romance, a narrativa de formao, que serve de princpio comum construo e ao desenvolvimento desses dois gneros, encontra sua origem nas prticas espirituais da escrita pessoal, das quais ela se afastar no final de um lento processo de secularizao. (DELORY-MOMBERGER, 2008, p. 40).

    Isto posto, entendemos que o ato de narrar a prpria histria atravs do texto escrito, possibilita ao sujeito organizar sua narrativa num constante dilogo interior a partir dos momentos de formao e de conhecimentos; pois o sujeito pe em evidncia os recursos experienciais acumulados e transformaes identitrias que construiu ao longo da vida.

    3 Formar e Autoformar-se: um caminhar para prtica reflexiva

    Para Bolvar (2002), no relato o sujeito repensa e reinventa sua vida, tomando conscincia dos fatos e, portanto, podendo imaginar possibilidades de atuaes futuras diferentes. Alm disso, a escrita narrativa tem efeito formador por si prprio, porque coloca o ator num campo reflexivo de tomada de conscincia sobre sua existncia, sentidos e conhecimentos que foram adquiridos ao longo da vida e sendo assim, vislumbrar possibilidades formativas construdas a partir das experincias de vida.

    A esse respeito, Souza (2006) compreende que as pesquisas pautadas nas narrativas de formao contribuem para a superao da racionalidade tcnica como princpio nico e modelo de formao. Tambm porque a pesquisa narrativa de formao funciona como colaborativa, na medida em que, quem narra e reflete sobre sua trajetria abre possibilidade de teorizao de sua prpria experincia e amplia sua formao atravs da investigao-formao de si. Por outro lado, o pesquisador que trabalha com narrativas interroga-se sobre suas trajetrias e seu percurso de desenvolvimento pessoal e profissional, mediante a escuta e a leitura da narrativa do outro.

    A racionalidade tcnica como concepo da atuao profissional revela uma incapacidade para resolver e tratar tudo o que imprevisvel, tudo o que no pode ser interpretado como um processo de deciso e atuao regulado segundo um sistema de raciocnio infalvel, a partir de um conjunto de premissas. Na verdade, Contreras (2002, p. 105) sinaliza que:

    [...] a rigidez com que se entende a razo da perspectiva positivista o que provoca essa incapacidade para entender todo o processo de atuao que no se proponha aplicao de regras definidas para alcanar os resultados j previstos. Por isso, deixa

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    fora de toda considerao aqueles aspectos da prtica que tm a ver com o imprevisto, a incerteza, os dilemas e as situaes de conflito.

    Desta forma, a prtica reflexiva tem sido amplamente divulgada no campo das discusses sobre formao de professores, e incorporada a textos e documentos de forma quase integral e totalizadora, o que remete a algumas preocupaes, j expressadas por Zeichner (1993) e Alarco (1996), uma vez que se trata de um processo complexo em sua operacionalizao.

    Conceituando prtica na perspectiva dialtica de prxis (VAZQUEZ,1968), entendemos que por meio da prtica reflexiva que a articulao teoria e prtica pode ser explicitada. Soma-se a isso a idia de reflexo como o uso do pensamento como atribuidor de sentido (ALARCO, 1996) e como uma postura de questionamento. Assim, os conceitos propostos por Schn (1995), de reflexo na ao, sobre a ao e sobre a reflexo na ao deixam de ser slogans e passam a ser estratgias que possibilitam que teoria e prtica se articulem.

    Zeichner (1993), em seu texto A formao reflexiva de professores: idias e prticas discute a perspectiva dos professores como prticos reflexivos que, por meio de reflexo na e sobre a sua prpria experincia, desempenham importantes papis na produo de conhecimento sobre o ensino, voltando-se para as idias de practicum e de escolas de desenvolvimento profissional.

    Alarco (1996), ao descrever uma proposta de superviso no modelo reflexivo de formao de professores, considera que objeto de reflexo tudo aquilo que se relaciona com a ao do professor durante o ato educativo: contedos, mtodos e objetivos de ensino, conhecimentos e capacidades a serem desenvolvidas nos alunos, fatores relacionados aprendizagem, o processo de avaliao, a razo de ser do professor.

    Sobre essa problemtica, Schn (1995) prope uma formao profissional baseada na epistemologia da prtica, ou seja, na valorizao da prtica pedaggica como momento de construo do conhecimento atravs da reflexo, anlise e problematizao desta, e o reconhecimento do conhecimento tcito, presente na soluo que os profissionais encontram em ato. Desta forma, Pimenta (2006), critica os currculos de formao de profissionais colocando que estes deveriam propiciar o desenvolvimento da capacidade de refletir.

    Nesse contexto, enfatizamos que nas reas das cincias as pesquisas com autobiografias tm utilizado terminologias diferentes e embora considerem os aspectos metodolgicos e tericos que as distinguem como constituintes da abordagem biogrfica que

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    utilize fontes orais delimitam-se na perspectiva da histria oral. Desta forma, autobiografias, biografias, relato oral, depoimento oral, histrias de vida, histria oral temtica, relato oral de vida e as narrativas de formao so modalidades tipificadas da expresso polissmica Histria oral.

    Consideraes finais

    O presente texto teve como fio condutor o desejo de esclarecer melhor as teorizaes em torno do uso da pesquisa autobiogrfica, como metodologia de formao e autoformao, que vem sendo bastante utilizada nos trabalhos acadmico-cintficos nos ltimos anos, de modo particular no PPGEd/UFPI. No entanto, achamos pertinente discutir os conceitos que foram propostos no artigo: mtodo (auto)biogrfico, biografia, histria de vida e narrativas de formao, buscando repensar as apropriaes de sentido que envolvem os mesmos.

    Compreendemos que as histrias de vida so, atualmente, utilizadas em diferentes reas das cincias humanas e da formao, atravs da adequao de seus princpios epistemolgicos e metodolgicos a outra lgica de formao do adulto, a partir dos saberes tcitos ou experienciais e da revelao das aprendizagens construdas ao longo da vida como uma matacognio ou metareflexo do conhecimento de si.

    Para Bolvar (2002), as propostas autoformativas, ainda que complementares a outras, devem ser valorizadas e defendidas tendo em vista o predomnio e a extenso que os cursos escolarizados tiveram para os professores adultos e, conseqentemente, contribui para dar um novo significado prtica docente habitual e ajuda, ainda, como instrumento gerador de novos saberes profissionais. Portanto, o formador deixa de exercer o papel de transmissor de um saber externo e passa a ser um mediador entre a pessoa, o objeto de aprendizagem e a anlise de situaes vividas. Isso implica compreender que, segundo Bolvar, a aprendizagem e a troca se produzem pela interao de narrativas, valorizando a reflexo sobre a experincia onde os sujeitos possam falar e escutar, compartilhando propsitos em relaes de colaborao entre professores e formadores/pesquisadores.

    Salientamos, assim, a necessidade de aprofundamento dos estudos nesse campo, uma vez que, mesmo j havendo a uma diversidade de significativa de estudo e de aplicaes, ele profcuo em possibilidades para se pensar a formao de adultos em geral e,

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    particularmente, a formao de professores. Parafraseando Nvoa (1998), importante que, ao lidar com a formao do outrem, o professor compreenda como ele prprio se formou.

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