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44ª RAPV REUNIÃO ANUAL DE PAVIMENTAÇÃO E 18º ENACOR ENCONTRO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO RODOVIÁRIA ISSN 1807-5568 RAPv Foz do Iguaçu, PR de 18 a 21 de Agosto de 2015 AVALIAÇÃO COMPUTACIONAL DA RIGIDEZ DA FIXAÇÃO PANDROL E-CLIP PARA UTILIZAÇÃO EM SIMULAÇÕES DO PAVIMENTO FERROVIÁRIO George Wilton Albuquerque Rangel 1 ; Francisco Thiago Sacramento Aragão 2 ; Laura Maria Goretti da Motta 3 RESUMO Em simulações computacionais correntes do comportamento mecânico do pavimento ferroviário, o conjunto de fixação é substituído por uma mola com rigidez que define o tipo da fixação, podendo esta ser rígida ou elástica. No entanto, esta simplificação pode não ser adequada e gerar resultados incompatíveis com o comportamento real do pavimento. Este trabalho avalia a fixação elástica Pandrol e-Clip, que está sendo utilizada em mais de 5.600 km de linhas férreas construídas pela VALEC no Brasil (nas estradas de ferro EF-151 e EF-334), entre outros 5.490 km de linhas em operação. Para obter a rigidez , os ensaios estáticos definidos nas normas europeias EN 13146-9 (2009) e EN 13146- 4 (2002) foram simulados utilizando um modelo em método dos elementos finitos (MEF) no software Abaqus, sendo também proposto o ensaio de elevação da fixação (fastener uplift test) preconizado pela norma Arema (2013). Já para avaliar a influência de , utilizando como parâmetro a variação do deslocamento vertical no topo do trilho, simulações do pavimento ferroviário utilizando os programas Ferrovia 3.0, Abaqus 6.12 e Ftool 3.0 foram realizadas alterando a rigidez entre 10 MN/m, 70 MN/m, 100 MN/m, 200 MN/m, 1000 MN/m e 2000 MN/m. Como principal conclusão, a utilização de molas em substituição da fixação deve ser aplicada com cautela pois pode influenciar o comportamento do pavimento. Deve-se utilizar valores de rigidez diferentes entre tração e compressão, principalmente em análises onde se deseja obter os esforços nas camadas sob o dormente como lastro, sublastro e subleito. Palavras-chave: fixação, rigidez, simulação, elementos finitos, ferrovias ABSTRACT In current computer simulations of the mechanical behavior of the railway track, the fastening assembly is replaced by a spring with stiffness that defines the type of fastening, which may be rigid or elastic. However, this simplification may not be adequate and may generate results inconsistent with the real behavior of the track. This study evaluates the elastic Pandrol e-Clip fastening, which is being used in more than 5,600 km of railway lines built by VALEC in Brazil (on the railways EF-151 and EF-334), among other 5,490 km of lines in operation. To obtain the stiffness, static tests defined by the BSI standards EN 13146-9 (2009) and EN 13146-4 (2002) were simulated using a model applying the finite element method using Abaqus software. Also proposed is a fastener uplift test according to the AREMA (2013) standard. For evaluation of the influence of , using as parameter the vertical variation on top of the rail, track simulations using the programs Ferrovia 3.0, Abaqus 6.12 and Ftool 3.0 were performed by changing the stiffness to 10 MN/m, 70 MN/m, 100 MN/m, 200 MN/m, 1,000 MN/m and 2,000 MN/m. As the main conclusion, the use of springs in replacement of fastenings should be applied with caution because it can influence the behavior of the track. Different values of stiffness between tension and compression should be used, especially in analyses where strain in layers under the sleepers (ballast, subballast and subgrade) is examined. Keywords: fastening, stiffness, simulation, finite elements, railway 1 Doutorando e Eng. da VALEC, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (62) 9942-7259, e-mail: [email protected] 2 Professor Adjunto, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (21) 3938-7192, e-mail: [email protected] 3 Professora Associada, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (21) 3938-7197, e-mail: [email protected]

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44ª RAPV – REUNIÃO ANUAL DE PAVIMENTAÇÃO

E

18º ENACOR – ENCONTRO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO RODOVIÁRIA

ISSN 1807-5568 RAPv

Foz do Iguaçu, PR – de 18 a 21 de Agosto de 2015

AVALIAÇÃO COMPUTACIONAL DA RIGIDEZ DA FIXAÇÃO PANDROL

E-CLIP PARA UTILIZAÇÃO EM SIMULAÇÕES DO PAVIMENTO

FERROVIÁRIO

George Wilton Albuquerque Rangel1; Francisco Thiago Sacramento Aragão

2; Laura Maria

Goretti da Motta3

RESUMO

Em simulações computacionais correntes do comportamento mecânico do pavimento ferroviário, o conjunto de fixação

é substituído por uma mola com rigidez que define o tipo da fixação, podendo esta ser rígida ou elástica. No entanto,

esta simplificação pode não ser adequada e gerar resultados incompatíveis com o comportamento real do pavimento.

Este trabalho avalia a fixação elástica Pandrol e-Clip, que está sendo utilizada em mais de 5.600 km de linhas férreas

construídas pela VALEC no Brasil (nas estradas de ferro EF-151 e EF-334), entre outros 5.490 km de linhas em

operação. Para obter a rigidez , os ensaios estáticos definidos nas normas europeias EN 13146-9 (2009) e EN 13146-

4 (2002) foram simulados utilizando um modelo em método dos elementos finitos (MEF) no software Abaqus, sendo

também proposto o ensaio de elevação da fixação (fastener uplift test) preconizado pela norma Arema (2013). Já para

avaliar a influência de , utilizando como parâmetro a variação do deslocamento vertical no topo do trilho, simulações

do pavimento ferroviário utilizando os programas Ferrovia 3.0, Abaqus 6.12 e Ftool 3.0 foram realizadas alterando a

rigidez entre 10 MN/m, 70 MN/m, 100 MN/m, 200 MN/m, 1000 MN/m e 2000 MN/m. Como principal conclusão, a

utilização de molas em substituição da fixação deve ser aplicada com cautela pois pode influenciar o comportamento do

pavimento. Deve-se utilizar valores de rigidez diferentes entre tração e compressão, principalmente em análises onde se

deseja obter os esforços nas camadas sob o dormente como lastro, sublastro e subleito.

Palavras-chave: fixação, rigidez, simulação, elementos finitos, ferrovias

ABSTRACT

In current computer simulations of the mechanical behavior of the railway track, the fastening assembly is replaced by a

spring with stiffness that defines the type of fastening, which may be rigid or elastic. However, this simplification

may not be adequate and may generate results inconsistent with the real behavior of the track. This study evaluates the

elastic Pandrol e-Clip fastening, which is being used in more than 5,600 km of railway lines built by VALEC in Brazil

(on the railways EF-151 and EF-334), among other 5,490 km of lines in operation. To obtain the stiffness, static tests

defined by the BSI standards EN 13146-9 (2009) and EN 13146-4 (2002) were simulated using a model applying the

finite element method using Abaqus software. Also proposed is a fastener uplift test according to the AREMA (2013)

standard. For evaluation of the influence of , using as parameter the vertical variation on top of the rail, track

simulations using the programs Ferrovia 3.0, Abaqus 6.12 and Ftool 3.0 were performed by changing the stiffness to 10

MN/m, 70 MN/m, 100 MN/m, 200 MN/m, 1,000 MN/m and 2,000 MN/m. As the main conclusion, the use of springs in

replacement of fastenings should be applied with caution because it can influence the behavior of the track. Different

values of stiffness between tension and compression should be used, especially in analyses where strain in layers under

the sleepers (ballast, subballast and subgrade) is examined.

Keywords: fastening, stiffness, simulation, finite elements, railway

1 Doutorando e Eng. da VALEC, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (62) 9942-7259, e-mail: [email protected]

2 Professor Adjunto, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (21) 3938-7192, e-mail: [email protected]

3 Professora Associada, UFRJ/COPPE, Brasil. Tel: +55 (21) 3938-7197, e-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO

As fixações ferroviárias são elementos utilizados com o objetivo principal de prender o

trilho ao dormente, mantendo a bitola, sendo divididas em rígidas ou elásticas. As rígidas, como

pregos e tirefonds, com o passar do tempo deram espaço às elásticas (Deenik, Pandrol, Vosloh, RN,

Fast Clip, etc) que são mais eficientes contra o esforço de arrancamento e possibilitam uma melhor

estabilização do trilho, atenuando as vibrações.

Segundo Steffler (2013), a principal vantagem da fixação Pandrol é sua capacidade de torcer

no raio da sua largura. Com um pequeno braço de alavanca, este tipo de fixação geralmente possui

grande resistência e vida útil prolongada.

A fixação Pandrol e-Clip, conforme Pandrol (2014), fornece ainda capacidade de retenção

de aproximadamente 10 kN, sendo utilizada no Brasil em mais de 5.490 km de linhas em operação,

em vias como Estrada de Ferro Carajás (890 km e 20 anos de experiência), Vitória-Minas (1200 km

e 30 anos de experiência), Ferrovia Norte-Sul (1800 km e 10 anos de experiência) e na MRS (1600

km e 10 anos de experiência), todas com carga por eixo acima de 300 kN.

Conforme pode ser visto na Figura 1, a fixação Pandrol e-Clip é versátil e pode ser utilizada

tanto em dormentes de madeira como de concreto.

Figura 1. Fixação Pandrol e-Clip em dormente de madeira (esquerda) e concreto (direita)

Fonte: disponível em <http://en.wikipedia.org/wiki/Pandrol>. Acesso em 19 Mai. 2014

Em virtude da quantidade e complexidades geométricas de componentes que compõe o

conjunto de fixação (grampo, placa-de-apoio ou palmilha amortecedora, shoulder, tirefonds etc), os

autores que trabalham com simulações computacionais do pavimento ferroviário geralmente

substituem-nos por uma mola, que deve possuir rigidez equivalente ao conjunto de fixação real. A

Figura 2 mostra um esquema representativo de estruturas de pavimento ferroviário tipicamente

simuladas em programas computacionais utilizando molas.

Figura 2. Configuração padrão do pavimento ferroviário no programa Kentrack

Fonte: Huang et al. (1984)

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A substituição dos conjuntos de fixação por molas é geralmente uma opção em simulações

numéricas devido ao grande custo computacional relacionado ao cálculo de variáveis como tensões

e deformações em uma fixação real, que é intensificado quando se pretende analisar um segmento

do pavimento ferroviário com repetidos conjuntos de fixação. O conhecimento do comportamento

real da fixação, na tração e compressão, e a representação das suas características mecânicas a partir

do uso de valores de rigidez representativos é de fundamental importância para tornar simulações

do comportamento mecânico do pavimento ferroviário mais confiáveis e realistas.

Assim, o objetivo principal desse trabalho é simular o conjunto da fixação Pandrol e-Clip

em sua geometria real, tanto para o dormente de madeira, quanto para o dormente de concreto,

comparando o valor do deslocamento vertical, convertido em rigidez ( ), com aqueles encontrados

na literatura, que substituem o conjunto por uma mola. Uma vez simulado é possível determinar a

contribuição do apoio do trilho, seja a placa metálica no caso dos dormentes de madeira ou a

palmilha amortecedora, no caso dos dormentes de concreto.

Para avaliar a alteração de , foram realizadas simulações do pavimento em três programas

computacionais diferentes: Abaqus 6.12, Ferrovias 3.0 e Ftool 3.0; alterando a rigidez da mola em

10 MN/m, 70 MN/m, 100 MN/m, 200 MN/m, 1000 MN/m e 2000 MN/m. O intuito é analisar o

impacto que a alteração da rigidez da mola ocasiona na deflexão do pavimento ferroviário, medido

no topo do trilho.

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Definição e valores de

Considerando o modelo de apoio discreto, como apresentado por Fernandes (2011) e

Berggren (2009), a rigidez da fixação mencionada nesse trabalho equivale a , conforme

equação 1, sendo que equivale a um segmento de via entre dois dormentes, dada a grande

diferença entre elementos do pavimento em segmentos maiores. Qualquer variação em um dos

componentes do pavimento ferroviário causará impacto na rigidez total, sendo essa realmente

experimentada pelo veículo, o que geralmente torna cada segmento da estrada único.

(1)

A variação de encontrada na literatura é grande. Spada (2003) simulou pavimentos

ferroviários utilizando o software Ferrovia, considerando 70 MN/m a rigidez adequada para

fixações em dormentes de madeira, 170 MN/m para dormentes de concreto monobloco e 253

MN/m para dormente de concreto bi-bloco, ambas como mola. O valor pode ser obtido a partir de

um gráfico que relaciona força de compressão e deslocamento, determinando-se então a rigidez para

a carga de roda que esteja sendo considerada, ou seja, o valor de é influenciado pela carga

aplicada.

Selig e Waters (1994) consideraram que os dormentes e trilhos comportam-se como vigas

elásticas lineares e os acessórios de fixação como molas, que podem ser tracionadas ou

comprimidas. Em simulação utilizando o software GEOTRACK, consideraram a rigidez de mola

igual a 1230 MN/m como valor nominal, tanto para dormente de madeira quanto para concreto. Já

em análises paramétricas, utilizaram de 18 MN/m, 879 MN/m e 176 MN/m, no entanto também

variando outros parâmetros do pavimento, o que não levou a uma conclusão do impacto de , mas

mostrando o quão amplo esse parâmetro pode ser.

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Outros autores consideram apenas o amortecimento da palmilha como a rigidez do conjunto

de fixação. Em análises dinâmicas, Feng (2011) aplicou = 239 MN/m, já Esveld (2001),

utilizando o GEOTRACK considerou rigidez da palmilha igual a 1,42 MN/m. Em simulações

numéricas, Skoglund (2002) considerou a rigidez da palmilha para dormentes de concreto igual a 70

MN/m. Ferreira e Teixeira (2012) utilizaram uma rigidez de 100 MN/m e Fortunato et al. (2013)

utilizaram o valor de 500 MN/m.

Rives et al. (1977) apresentaram um estudo em palmilhas amortecedoras para dormentes de

concreto com espessura de 4,5 mm, onde para 20 kN de força de compressão há um deslocamento

de aproximadamente 0,1 mm ( = 200 MN/m) e para 100 kN aproximadamente 0,4 mm ( = 250

MN/m).

Em ensaios do conjunto completo de fixação, Pandrol (2014) apresentou valores de rigidez

que variam de 60 MN/m a 150 MN/m em ensaios estáticos, subindo para 100 MN/m a 300 MN/m

em ensaios dinâmicos, todos seguindo a norma EN 13146-9 (2009).

Corroborando com Fernandes (2011), não existe um consenso sobre qual rigidez é a mais

adequada, apresentando diversos valores para palmilha, variando de 27 MN/m a 500 MN/m, que

alteram conforme tipo de fixação, tipo de via, país etc.

Na maioria das referências consultadas os valores de foram simplesmente adotados e/ou

referenciados pelos pesquisadores, indicando a necessidade de uma metodologia que permita sua

determinação, o que será proposto nesse estudo.

Considerações normativas

Para a determinação da rigidez da fixação, deve-se seguir os procedimentos descritos nas

normas europeias EN 13146-9 (2009) e EN 13146-4 (2002). No Brasil, não existe normalização

específica para a determinação de tal propriedade e a norma Norte Americana AREMA até 2013

também não menciona procedimento específico para tal.

Nas simulações realizadas nesse estudo, seguindo as normas europeias para determinação da

rigidez do conjunto de fixação, o sentido de aplicação do carregamento comprime o trilho em

relação ao dormente e resultou em valores de da ordem de 2000 MN/m, acima do encontrado na

literatura e especificações de fabricantes, como apresentado anteriormente, que variou de 27 MN/m

a 1230 MN/m.

Como será demonstrado nas análises adiante, a magnitude de em simulações do

pavimento ferroviário também influencia as regiões onde há deslocamento do trilho no sentido

vertical em relação ao dormente, ou seja, onde há tração do grampo de fixação. Tal análise leva ao

questionamento se apenas o ensaio de compressão é o ideal para a determinação da rigidez da

fixação, levando a crer que um ensaio de tração também é necessário para a determinação da rigidez

na região entre o trilho e dormente, como é o caso do fastener uplift test (teste de levante da

fixação), definido pela AREMA (2013).

De fato, a fixação Pandrol e-Clip não tem como objetivo principal reter parte dos esforços

verticais de compressão e sim longitudinais (evitando o escorregamento do trilho), transversais

(mantendo a bitola) e verticais de tração (para que o trilho não saia da posição). A atenuação dos

esforços verticais de compressão na região da fixação ocorre pela palmilha amortecedora polimérica

no caso dos dormentes de concreto ou placa de apoio metálica no caso dos dormentes de madeira, o

que sugere a consideração de mais uma camada do pavimento nas simulações computacionais e não

a substituição dessa por uma mola.

A norma europeia EN 13146-9 (2009) descreve além do ensaio para determinação da rigidez

do conjunto de fixação, o ensaio para determinação da rigidez apenas do dispositivo de apoio do

trilho, o que parece mais coerente no caso em que o pavimento se encontra em compressão.

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Obtenção da rigidez estática do conjunto de fixação, conforme EN 13146-9 (2009) e EN 13146-

4 (2002)

Considerando o conjunto completo de fixação para a determinação da rigidez estática,

conforme a norma EN 13146-9 (2009), basicamente aplica-se uma força normal de compressão à

base do trilho, medindo-se o deslocamento vertical. Para a instalação do conjunto de fixação é

permitida a utilização de dormente inteiro, meio dormente ou bloco de concreto, conforme o tipo de

fixação e material do dormente.

A força é aplicada na linha de centro do trilho acima da linha de centro longitudinal do

dormente, gravando-se o deslocamento vertical do trilho. A rigidez vertical é calculada utilizando a

equação 2 (reta secante), onde d é o deslocamento quando a força aplicada varia de P1 para P2.

Nesse procedimento é importante observar que o deslocamento do dormente também é considerado.

(2)

As forças aplicadas são encontradas na EN 13146-4 (2002). A uma taxa de 50 kN/min os

deslocamentos são medidos no sexto ciclo de carga, P1 vale 5 kN e P2 vale 80 kN.

Apesar de não preconizado nas normas EN 13146-4 (2002) e EN 13146-9 (2009), nesse

estudo será simulado também o esforço de tração, levantando o trilho em relação ao dormente, com

os mesmos níveis de carga que no ensaio à compressão.

Obtenção da rigidez estática do apoio do trilho conforme EN 13146-9 (2009)

Nesse ensaio, mede-se o deslocamento (d) variando a força vertical de compressão de P1

igual a 18 kN (força que a fixação exerce sobre o trilho, considerando cada grampo igual a 9 kN) e

P2 igual a 96 kN. O esquema de ensaio é apresentado na Figura 3. A rigidez também é calculada

conforme a equação 2.

1 – Placa metálica;

2 – Placa de distribuição superior com largura

igual à do trilho e comprimento de 21 cm;

3 – Apoio a ser testado;

4 – Tecido coesivo;

5 – Placa de distribuição inferior (se necessário)

6 – Base rígida.

Figura 3. Esquema de ensaio para obtenção da rigidez do apoio do trilho

Fonte: EN 13146-9 (2009)

Neste trabalho essa análise será aplicada somente à palmilha amortecedora, para sanar as

dúvidas sobre a real influência do dormente de concreto quando é realizado o ensaio do conjunto.

No dormente de madeira é claro a influência significativa da placa de apoio metálica, como será

visto adiante.

Teste de levante da fixação, conforme AREMA (2013)

O objetivo desse ensaio é determinar a resistência de retenção entre o trilho e o dormente

pelo conjunto de fixação, conforme esquema apresentado na Figura 4. Por natureza, o ensaio não

tem o objetivo de obter a rigidez da fixação e sim a resistência de retenção. A sugestão da utilização

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desse ensaio para a determinação da rigidez à tração, parte do princípio de aproveitar um ensaio já

existente.

Figura 4. Teste de levante da fixação (fastener uplift test)

Fonte: AREMA (2013)

A força Pmax = 44,45 kN é aplicada e a rigidez seria determinada a partir da equação 3,

onde d é o deslocamento vertical da base do trilho em relação ao dormente.

(3)

METODOLOGIAS DE SIMULAÇÃO

Determinação de a partir de simulação utilizando MEF/Abaqus

Para essa análise, foram realizadas simulações conforme a Tabela 1. A nomenclatura

definida para a simulação se dará da seguinte forma e sequência:

a) E ou A = norma europeia (E) ou AREMA (A);

b) M ou C = dormente de madeira (M) ou concreto (C);

c) C ou T = força de compressão (C) ou tração (T);

d) 190, 200 ou 210 = módulo de elasticidade do aço do grampo elástico em GPa.

Tabela 1. Esquema de simulações para determinação de

Simulação Norma Dormente Esforço

vertical Força aplicada

Módulo de elasticidade do

grampo (GPa)

EMC200 EN 13146-4 (2002)

EN 13146-9 (2009)

rigidez estática

Madeira Compressão 5 kN e 80 kN

(-) compressão

(+) tração

200 EMT200 Madeira Tração

ECC200 Concreto Compressão

ECT200 Concreto Tração

AMT200

AREMA (2013)

fastener uplift test

Madeira Tração

44,45 kN

(+) tração

200

ACT190 Concreto Tração 190

ACT200 Concreto Tração 200

ACT210 Concreto Tração 210

Além da determinação de , o principal intuito da combinação é verificar a diferença de

rigidez obtida entre os procedimentos das duas normas, uma vez que o ensaio da AREMA que

aplica tração não é específico para a determinação da rigidez, diferente da norma europeia que para

esse fim aplica compressão.

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A avaliação da influência do módulo de elasticidade do grampo torna-se interessante pela

grande variação das ligas metálicas encontradas no mercado, formas diferentes de fabricação ou

reaproveitamento de grampos refugados.

Os componentes das fixações de cada dormente possuem características simuladas conforme

a Tabela 2. O número de elementos finitos entre dormentes de madeira e concreto são diferentes em

virtude da compatibilização geométrica necessária dos acessórios de fixação, assim como o calço

isolador. A quantidade de elementos utilizada em cada componente foi suficiente para uma boa

convergência da malha. O modelo aplicado considerou um comportamento constitutivo

simplificado (elástico linear) para os materiais, cujas propriedades fundamentais foram assumidas

com base na literatura pesquisada, não sendo determinadas em laboratório.

Tabela 2. Características dos componentes das fixações simuladas

Componente Dimensões Módulo de

elasticidade

Coeficiente de

poisson

Elementos

finitos

Fixação pandrol e-Clip para dormente de madeira (total de 58480 elementos finitos)

Dormente 25 x 18 cm (transversal) 13 GPa 0,3 9216

Placa de apoio 2 x 46 x 18 cm 205 GPa 0,3 17712

4 Tirefonds Ø 22 mm 205 GPa 0,3 5336

2 Grampos Ø 22 mm 190, 200 e 210 GPa 0,3 5608

Trilho UIC-60 15 cm de patim, 17,2 cm de

altura 210 GPa 0,3 20518

Calço isolador Variável para encaixe 4,45 GPa 0,4 90

Fixação pandrol e-Clip para dormente de concreto (total de 35741 elementos finitos)

Dormente 19 x 21 cm

(transversal) 40 GPa 0,25 2821

Palmilha

amortecedora 0,5 x 194 x 190 cm 1 GPa 0,3 3512

2 Shoulders 7,2 x 6,6 (base) x 4,2 cm 205 GPa 0,3 2802

2 grampos Ø 22 mm 190, 200 e 210 GPa 0,3 5608

Trilho UIC-60 15 cm de patim, 17,2 cm de

altura 210 GPa 0,3 20518

Calço isolador Variável para encaixe 4,45 GPa 0,4 480

Seguindo o apresentado na Figura 5, no dormente de madeira os tirefonds foram

considerados totalmente aderidos à madeira, o que na prática pode ser uma inverdade. No dormente

de concreto o shoulder foi considerado perfeitamente aderido ao dormente pela sua base.

Em ambas as análises foi considerada uma força de pressão do grampo igual a 9 kN,

aplicada na área do calço isolador em forma de tensão. O trilho possuiu total liberdade de

movimento vertical, transversal e longitudinal, sendo retido apenas pelo grampo elástico.

Para a geometria dos componentes da fixação, tentou-se seguir ao máximo os desenhos

técnicos conforme especificação VALEC (2014).

Figura 5. Fixação pandrol e-Clip simulada. Dormente de madeira (esquerda), dormente de concreto (direita)

Tirefond

Placa de apoio Grampo

Shoulder

Palmilha

Dormente Trilho

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Determinação de da palmilha amortecedora para dormentes de concreto a partir de

simulação utilizando MEF/Abaqus

Essa simulação segue o procedimento da EN 13146-9 (2009), como foi descrito

anteriormente. Foram considerados módulo de elasticidade e coeficiente de Poisson da palmilha

iguais a 1,0 GPa e 0,3, respectivamente (Candian, 2007). A base e o atuador foram considerados

perfeitamente rígidos para não influenciarem nos resultados, medindo, respectivamente, 30x30 cm e

21x15 cm (Figura 6). Variou-se a espessura da palmilha entre 5 mm e 10 mm, seguindo as

considerações de Profillidis (2006). As dimensões em planta estão conforme VALEC (2014).

Figura 6. Exemplo de simulação, achatamento da palmilha amortecedora aumentado 100x

Análise da fixação como mola utilizando modelo em MEF/Abaqus

Nessa análise foram utilizados 25 dormentes de madeira, espaçados em 60 cm, totalizando

um comprimento total de 15 m. A via férrea possuiu bitola de 1,6 m e foi dividida ao meio com o

intuito de reduzir o esforço computacional necessário ao cálculo, procedimento possível graças à

simetria da via, como explica Profillidis (2006), que também adotou o mesmo conceito. Uma força

de 160 kN (equivalente a uma roda de um trem de carga) foi aplicada ao trilho sobre o dormente

central, restando então 7,5 m para cada lado, comprimento suficiente para a estabilização do

deslocamento vertical do trilho, conforme Schramm (1977). Não foi considerada restrição de

deslocamento vertical para o trilho além das molas. Para os materiais do lastro, sublastro e subleito

foram utilizadas as propriedades elásticas conforme Ferreira e Teixeira (2012). Para os dormentes

de madeira, foram utilizadas a geometria e as propriedades elásticas conforme ABNT NBR 7511

(2013). Ao todo, foram necessários 36.665 elementos finitos para uma boa convergência do

modelo, como indicado na Tabela 3.

Figura 7. Pavimento completo deformado (esquerda), grade (direita)

Tabela 3. Propriedades dos materiais utilizados na simulação em MEF/Abaqus

Material Dimensões Módulo de

elasticidade Poisson

Elementos

finitos

Trilho UIC-60 15 cm de patim. 17,2 cm de altura 210 GPa 0,3 18361

Dormente de

madeira

18 x 25 x 140 cm (metade do

dormente) 13 GPa 0,3 900

Lastro 30 cm 130 MPa 0,2 4900

Sublastro 20 cm 200 MPa 0,3 1200

Subleito 500 cm 80 MPa 0,3 11304

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Análise da fixação como mola utilizando o Ferrovia 3.0

O programa Ferrovia foi desenvolvido em 1994 pelo Dr. Regis Martins Rodrigues, sendo

bastante utilizado no Brasil em análises de pavimentos ferroviários, desde então. Em sua atual

versão 3.0, possui uma malha com um total de 176 elementos finitos, sendo 10 por dormente (ao

todo 11 dormentes) e 22 para cada trilho, conforme apresentado Figura 8. A ligação entre o trilho e

o dormente é realizada por uma mola, definindo-se então uma rigidez , que varia de zero até uma

ligação perfeitamente rígida que não permite nenhum tipo de movimento.

Figura 8. Malha em elementos finitos do programa Ferrovia 3.0, vista em planta

Fonte: Rodrigues (1993)

Para a análise foram utilizadas as mesmas propriedades dos materiais apresentados na

Tabela 2, com a adição de ângulo de atrito igual a 45° para o lastro, 35° para sublastro e subleito, e

coesão zero para todas as camadas (Ferreira e Teixeira, 2012). Uma força vertical para baixo de 160

kN foi aplicada nos nós 133 e 156, nos trilhos sobre o dormente central da malha.

Análise da rigidez da mola utilizando o Ftool 3.0

O software Ftool é usualmente utilizado para a análise de esforços em estruturas reticuladas.

No entanto, para essa análise, foi considerada uma viga com seção transversal e momento de inércia

semelhante ao trilho UIC-60, apoiada sobre 25 molas espaçadas em 60 cm, solicitada por uma força

vertical de 160 kN para baixo ao centro (Figura 9).

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Figura 9. Exemplo da simulação no Ftool 3.0 para = 10 MN/m. De cima para baixo: esforços cortantes; momentos

fletores; configuração deformada e reações de apoio

A rigidez das molas variou de 10 MN/m a 200 MN/m. O intuito foi verificar como apenas a

alteração da rigidez do apoio influencia na deflexão do trilho. A partir da base rígida da mola não é

mais considerado deslocamentos.

SIMULAÇÕES E RESULTADOS

Os resultados das simulações para a determinação de são apresentados na Tabela 4. Na

compressão dois tipos de deslocamentos foram medidos. O primeiro desconsiderando o

deslocamento do dormente e o segundo considerando-o. Os deslocamentos verticais foram obtidos a

partir da base do trilho, em um ponto abaixo do ponto de aplicação de força. Quando

desconsiderado o dormente, também foram obtidos em um ponto no topo do dormente, no eixo de

aplicação de força, que subtraído do deslocamento sob o trilho, resulta na consideração mais

acentuada da influência apenas o dispositivo de apoio do trilho, como ilustrado na Figura 10.

Tabela 4. Resultados das simulações para determinação de

Simulação Força aplicada

Desconsiderando o dormente Considerando o dormente

Deslocamento vertical

(mm)

(MN/m)

Deslocamento vertical

(mm)

(MN/m)

EMC200 - 5 kN e - 80 kN - 0,0001 774553,34 - 0,0358 2095,69

EMT200 + 5 kN e + 80

kN 11,0411 6,79 Não aplica

ECC200 - 5 kN e - 80 kN - 0,0200 3740,96 - 0,0426 1760,70

ECT200 + 5 kN e + 80

kN 12,9236 5,80

Não aplica AMT200

+ 44,45 kN

4,7595 9,34

ACT190 5,7311 7,76

ACT200 5,5608 7,99

ACT210 5,4099 8,22

Figura 10. Deslocamento vertical para cima do trilho (tracionado) em relação ao dormente. Vista frontal dos pontos

nodais (esquerda), vista lateral dos pontos nodais sem placa de apoio (direta)

Na determinação de a partir das simulações em MEF, a rigidez obtida para o sistema de

fixação foi aproximadamente 300 vezes maior na compressão do que na tração, deixando claro que

não se deve utilizar o mesmo valor de rigidez nas regiões onde há levante do trilho, ou seja, tração.

Pontos nodais

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O valor exagerado de 774553,34 MN/m na simulação EMC200 pode ser explicado pela não

consideração do deslocamento do dormente de madeira, assim como a elevada rigidez da placa de

apoio metálica, não condizente com um ensaio real, que consideraria a deformação do dormente,

reduzindo significativamente para 2095,69 MN/m.

Na compressão, seguindo as normas europeias, a magnitude dos valores considerando

também o deslocamento do dormente corroboraram melhor com a literatura pesquisada, resultando

em 2095,69 MN/m para o dormente de madeira e 1760,70 MN/m para o dormente de concreto. Na

literatura verificou que os valores de rigidez para o dormente de concreto geralmente são

considerados maiores daqueles utilizados para dormentes de madeira. No entanto, entende-se que a

rigidez da placa de apoio metálica tem forte influência no resultado para uma rigidez maior.

Na tração, a metodologia da AREMA resultou em valores de 37 % maiores do que a

metodologia das normas europeias. Apesar de maiores, aconselha-se a utilização da metodologia

AREMA para o teste de tração, por ser mais simples, representar apenas o grampo de fixação e

apresentar valores mais próximos dos mínimos encontrados nas referências pesquisadas.

Os resultados da determinação de , considerando apenas a palmilha amortecedora para

dormentes de concreto são apresentados na Tabela 5. A variação de elementos finitos justifica-se

em virtude da variação da espessura, mantendo-se uma boa convergência.

Tabela 5. Resultado da determinação da rigidez da palmilha amortecedora para dormentes de concreto

Espessura da palmilha Força (kN) Deslocamento (mm) (MN/m) Elementos da palmilha

5 mm

18 a 96

0,0123 7808,20 1730

0,0023

7,5 mm 0,0186

5151,41 3458 0,0035

10 mm 0,0248

3877,79 3466 0,0046

A grande rigidez encontrada em relação ao valor da simulação ECC200 (3740,96 MN/m)

pode ser explicada pela consideração isolada da palmilha, sem a influência do restante do conjunto

de fixação, do dormente, além da consideração de contornos rígidos perfeitos. Tal análise é

interessante para se ter uma ideia da real rigidez do dispositivo de apoio, que na prática é ensaiado

com influência de outros materiais, passíveis de deformação.

Em seguida, procurou-se analisar a variação da rigidez das molas, substituindo a fixação em

um pavimento completo. No caso do modelo MEF/Abaqus, os resultados das simulações são

apresentados na Figura 11 e Tabela 6.

Figura 11. Resultados da simulação em MEF/Abaqus

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Tabela 6. Resultados da simulação em MEF/Abaqus

Distância longitudinal (m) Deslocamento vertical em mm (positivo para baixo)

Sem mola 10 MN/m 70 MN/m 100 MN/m 200 MN/m 1000 MN/m 2000 MN/m

0,0 (sob carga) 1,69 1,69 1,68 1,68 1,68 1,68 1,68

0,6 (1 dormente) 1,28 1,28 1,27 1,27 1,27 1,26 1,26

1,2 (2 dormentes) 0,84 0,84 0,84 0,84 0,84 0,84 0,83

1,8 (3 dormentes) 0,42 0,45 0,47 0,47 0,48 0,48 0,48

2,4 (4 dormentes) 0,01 0,07 0,14 0,14 0,16 0,18 0,17

3,0 (5 dormentes) -0,41 -0,30 -0,17 -0,16 -0,14 -0,11 -0,11

3,6 (6 dormentes) -0,82 -0,65 -0,47 -0,45 -0,42 -0,38 -0,38

4,2 (7 dormentes) -1,24 -1,00 -0,76 -0,73 -0,69 -0,65 -0,66

4,8 (8 dormentes) -1,66 -1,34 -1,04 -1,01 -0,96 -0,92 -0,93

5,4 (9 dormentes) -2,07 -1,68 -1,32 -1,29 -1,24 -1,19 -1,20

6,0 (10 dormentes) -2,49 -2,02 -1,60 -1,56 -1,51 -1,46 -1,48

6,6 (11 dormentes) -2,91 -2,35 -1,88 -1,84 -1,79 -1,74 -1,76

7,2 (12 dormentes) -3,32 -2,69 -2,16 -2,12 -2,07 -2,02 -2,05

O deslocamento vertical no topo do trilho foi avaliado sobre cada dormente, longitudinalmente à

via, a partir do dormente central onde a força foi aplicada. Os valores negativos correspondem ao

levante do trilho, natural, a partir do ponto de aplicação de carga, o mais relevante na análise. Dada

a rigidez do trilho e a não consideração de restrição vertical é percebido um levante significativo no

último dormente, que deve ser desconsiderado, uma vez que não foram aplicadas restrições nesse

sentido. As molas, quando aplicadas, foram consideradas juntamente com as placas de apoio, com o

intuito de avalia-las como grampos elásticos, que têm maior influência à tração.

Verificou-se que nas regiões onde há compressão entre o trilho e o dormente, mesmo

variando a rigidez da mola de 10 MN/m a 2000 MN/m, a diferença do deslocamento vertical não

chega a 5 %, ao passo que nas regiões onde há tração a diferença ultrapassa os 50 %. Tal condição

prova que a maior influência das molas como fixação ocorre quando há levante do trilho,

inviabilizando a utilização da mesma em regiões de compressão, caso possível.

As simulações em Abaqus também apresentaram um deslocamento total do pavimento da

ordem de 1,7 mm, o que corrobora com alguns autores, como Correia (2007) e Fortunato et al.

(2013).

Os resultados da análise da fixação como mola utilizando o Ferrovia 3.0 estão apresentados

na Tabela 7 e Figura 12.

Tabela 7. Resultados da simulação no Ferrovia 3.0

Distância (m) Deslocamento vertical em mm (negativo para baixo)

10 MN/m 70 MN/m 100 MN/m 200 MN/m 1000 MN/m 2000 MN/m

0 -5,10 -1,94 -1,75 -1,52 -1,32 -1,30

0,3 -4,84 -1,77 -1,59 -1,37 -1,18 -1,16

0,6 -4,19 -1,38 -1,22 -1,04 -0,88 -0,86

0,9 -3,40 -0,97 -0,84 -0,69 -0,58 -0,56

1,2 -2,58 -0,60 -0,51 -0,41 -0,33 -0,32

1,5 -1,83 -0,33 -0,27 -0,21 -0,16 -0,16

1,8 -1,16 -0,15 -0,12 -0,09 -0,07 -0,07

2,1 -0,60 -0,04 -0,03 -0,02 -0,02 -0,02

2,4 -0,11 0,02 0,02 0,01 0,00 0,00

2,7 0,32 0,06 0,04 0,02 0,00 0,00

3 0,73 0,07 0,05 0,02 0,00 0,00

3,3 1,13 0,09 0,06 0,02 0,00 0,00

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Figura 12. Resultados da simulação no Ferrovia 3.0

O Ferrovia 3.0 não discretiza qualquer elemento do conjunto de fixação como foi realizado

no Abaqus. No Ferrovia 3.0, verificou-se a influência da variação da rigidez da mola na deflexão do

pavimento. A utilização de = 10 MN/m mostrou-se inconsistente com os demais valores (5 mm),

evidenciando que o programa considera a fixação como uma das principais retentoras do

deslocamento vertical do pavimento, o que na prática pode ser uma inverdade e é contrário ao

resultado encontrado utilizando o Abaqus, considerado aqui mais realista. Vale ressaltar que Spada

(2003) em análises reais do pavimento ferroviário utilizando Viga Benkelman, encontrou valores de

deflexão da ordem de 5 mm, evidenciando que a baixa rigidez pode ser utilizada para simular os

gaps (vazios sob os dormentes). Essa análise ainda necessita de mais estudos.

Semelhantemente, Correia (2007) variou de 50 MN/m a 90 MN/m, encontrando uma

variação no deslocamento vertical da via em torno de 36 %.

Para a análise da rigidez da mola utilizando o Ftool 3.0, os resultados são apresentados na

Tabela 8 e Figura 13. Quando altera-se a rigidez da mola de 10 MN/m para 70 MN/m, há uma

variação de aproximadamente 77 % do deslocamento vertical no ponto de aplicação da força. Essa

diferença cai para 55 % quando altera-se a rigidez de 70 MN/m para 200 MN/m, mostrando que

deslocamento vertical do trilho é mais sensível a baixos valores de rigidez do restante do

pavimento. Isso explicaria o resultado obtido no Ferrovia 3.0, no entanto o resultado do Ftool 3.0

não avalia as demais camadas do pavimento.

Tabela 8. Resultados da simulação utilizando Ftool 3.0

Distância longitudinal (m)

Molas do centro para esquerda

Deslocamento vertical em mm (positivo para baixo)

10 MN/m 70 MN/m 100 MN/m 200 MN/m

0,0 (sob força) 4,3000 0,9941 0,7586 0,4467

0,6 (1 mola) 3,4430 0,5857 0,4085 0,1934

1,2 (2 molas) 1,9880 0,1404 0,0691 0,0062

1,8 (3 molas) 0,8196 -0,0268 -0,0299 -0,0184

2,4 (4 molas) 0,1442 -0,0388 -0,0235 -0,0056

3,0 (5 molas) -0,1351 -0,0161 -0,0060 0,0004

3,6 (6 molas) -0,1849 -0,0019 0,0008 0,0007

4,2 (7 molas) -0,1398 0,0018 0,0013 0,0001

4,8 (8 molas) -0,0760 0,0013 0,0004 0,0000

5,4 (9 molas) -0,0305 0,0004 0,0000 0,0000

6,0 (10 molas) -0,0034 0,0000 0,0000 0,0000

6,6 (11 molas) 0,0096 -0,0001 0,0000 0,0000

7,2 (12 molas) 0,0165 0,0000 0,0000 0,0000

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Figura 13. Resultados da simulação utilizando o software Ftool 3.0

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para uma melhor definição da rigidez do conjunto de fixação a ser utilizado em simulações

do pavimento ferroviário, recomenda-se a execução do ensaio fastener uplift test da AREMA

(2013) para valores à tração. Já para a rigidez à compressão o ensaio da EN 13146-9 (2009), que

considera apenas o dispositivo de apoio do trilho.

Verificou-se que a rigidez da fixação utilizada por diversos autores depende principalmente

do deslocamento da placa de apoio e do dormente de madeira ou da palmilha amortecedora e do

dormente de concreto. Nesse caso, recomenda-se não considerar o dispositivo de apoio como uma

mola e sim como mais uma camada do pavimento, possuindo espessura e propriedades elásticas

bem definidas. Essa consideração ainda teria a vantagem da não influência direta do carregamento

aplicado no valor de considerado, uma vez que para o mesmo conjunto de fixação, diferentes

valores de rigidez são encontrados para diferentes magnitudes de carregamentos, dado a

metodologia de obtenção de nas normas vigentes.

A utilização de mola como substituição da fixação deve estar restrita apenas nas regiões

onde há levante do trilho, o que geralmente não é relevante, pois costuma-se analisar a deflexão do

pavimento. De fato, não há porque utilizar mola em simulações do pavimento onde há apenas

compressão entre o trilho e dormente, e sim uma camada apenas sob o trilho e sobre o dormente,

com espessura e propriedades elásticas que simulem o dispositivo de apoio do trilho.

Caso não seja possível a adição de mais uma camada, recomenda-se mola com rigidez

diferente para regiões com tração e compressão. Compressão para a mola representando o

dispositivo de apoio e tração para a mola representando o grampo elástico.

Caso ainda não seja possível definir uma rigidez diferente, recomenda-se um estudo

específico com valores de que não tenham grande influência na absorção das deformações

verticais, principalmente nas regiões em compressão, dependendo do software utilizado. Dar

preferência para menores valores de , até um limite que não apresente grande influência, pode ser

uma opção a fim de evitar a retenção de grande parte das deformações pelas molas que representam

a fixação no modelo.

Geralmente procura-se estudar a influência das camadas do pavimento sem dar tanta

importância para a influência do conjunto de fixação na deflexão do pavimento. Assim, deve-se

tomar cuidados para que a influência da mola não impacte de forma significativa nos resultados

almejados.

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É importante reforçar que qualquer sistema de apoio solicitado à tração, sem o grampo

elástico ou qualquer outra forma que prenda o dormente ao trilho não apresenta rigidez e não

haveria impedimento ao movimento de tração. Portanto não considerar molas ou qualquer outra

união em regiões onde há o levante do trilho também seria um erro. Definir uma união entre o trilho

e a placa de apoio, e entre a placa de apoio e o dormente pode ser uma solução para esse problema

de simulação do grampo.

Na determinação de , considerando apenas a palmilha amortecedora, utilizou-se apoio e

atuador rígidos, o que resultou em maior do que o encontrado na simulação da fixação completa.

Isso ocorreu porque na simulação completa, assim como no ensaio real, há também a deformação

do dormente o que influencia no resultado final. Tal fato também foi explicado por Spada (2003,

pág. 116),

a rigidez da fixação é o parâmetro que expressa a compressão entre o topo

do trilho e a base do dormente. Para dormentes de madeira, a principal

contribuição é a compressão do próprio dormente, enquanto que em

dormentes de concreto a principal contribuição é da almofada posicionada

entre o trilho e o dormente.

No entanto, tal ponderação deve ser adotada com cautela em simulações numéricas, pois na

maioria dos casos há a consideração individual da deformação do dormente, discretizado em

elementos finitos. Considerar a deformação do dormente e definir a rigidez da fixação como mola,

obtida também levando em conta a deformação do dormente é um erro.

Deve-se então aplicar a rigidez individual do sistema de fixação, independente do material

do dormente, quando este é discretizado. Isso implica na necessidade de uma pesquisa mais

aprofundada que resulte na geração de uma metodologia que agrupe rigidez com tipo de fixação e

não rigidez com tipo de dormente, ou ambos. Existem fixações específicas para dormentes de

madeira como o prego de linha, mas o Pandrol e-Clip é empregado em dormentes de madeira e

concreto. O material do dormente por si só já possui sua rigidez. Ou considera-se o conjunto ou

cada elemento de forma separada.

Por fim, sugere-se a continuidade da análise numérica com a validação experimental dos

ensaios simulados, tentando separar a influência de cada um dos componentes envolvidos.

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