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IX ENABED
Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa
06 a 08 de julho de 2016 – Florianópolis / Santa Catarina
Área Temática: AT1 - Ciência, Tecnologia, Indústria e Gestão de Defesa
AVALIAÇÃO DO PROGRAMA KC-X:
A AERONAVE KC-390 COMO UMA RESPOSTA ÀS NECESSIDADES DA FORÇA
AÉREA BRASILEIRA
CESAR CASTELLO BRANCO MARTINS
PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM ESTUDOS ESTRATÉGICOS DA DEFESA E DA
SEGURANÇA – INSTITUTO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS – UNIVERSIDADE FEDERAL
FLUMINENSE
Resumo:
Este artigo objetiva avaliar se a aeronave KC-390 da Embraer preenche todas as
necessidades estabelecidas pela Força Aérea Brasileira (FAB) no Programa KC-X. Este
Programa é entendido como uma resposta à um problema de política pública, na área de
Defesa, então percebido pela FAB. Assim, este artigo investiga como o Programa foi
implementado, quais são os principais atores envolvidos e quais os seus interesses, quais
os objetivos finais e intermediários identificados no Programa, e qual o arcabouço normativo
que sustenta e permite a realização de um programa de defesa pública como este. O
Modelo “Input-Output” organiza a estrutura desta avaliação, bem como os Modelos de
“Stakeholders” e de Relevância.
Também, é dada voz à discussão sobre como lidar com os frequentes
contingenciamentos no orçamento público, uma vez que esta prática impacta de maneira
negativa o sucesso dos Programas Estratégicos de Defesa. No fim, fazem-se considerações
sobre a conclusão alcançada, sobre alguns dos efeitos colaterais percebidos e alguns
instrumentos de política pública utilizados na intervenção.
Palavras Chaves: Programa KC-X; aeronave KC-390; Necessidades; Força Aérea
Brasileira; FAB; Embraer.
2
Sumário:
1. Introdução ............................................................................................................... 03
2. Contexto .................................................................................................................. 05
2.1 Arcabouço Normativo ...................................................................................... 05
2.2 História do desenvolvimento do KC-390 ........................................................ 06
2.3 A aeronave KC-390 ........................................................................................... 08
3. Avaliação e Descrição dos Modelos de Avaliação ....………………….
……………………....................................................................…….. 09
4. Descobertas ………………………….…….………………….…………………………. 14
5. Discussões ..……………………………………………………………..……………….. 18
6. Considerações Finais …………………………………………………………………... 19
7. Referências Bibliográficas .……………………………………………………………. 20
3
1. Introdução
Entre os dias 12 e 15 de julho de 2009, foi realizado o 1º Workshop Operacional do
Projeto KC-X, nas instalações da Embraer, em São José dos Campos/SP. Empreendido
pelo Comando da Aeronáutica, e sob coordenação da Gerência Executiva do Projeto, o
evento teve por finalidade o refino dos requisitos operacionais para o desenvolvimento de
nova aeronave de transporte e reabastecimento em voo da Força Aérea Brasileira – KC-X1.
Após este, se seguiram outros workshops dedicados aos detalhamentos técnico-
operacionais de missões em diferentes áreas, como evacuação aeromédica, transporte,
reabastecimento em voo, e busca e salvamento (SAR – seach and rescue). As fases do
desenvolvimento do avião prosseguiram com ensaios em ambiente de realidade virtual e a
utilização de modelo da cabine da aeronave - mock up – em tamanho real, onde embarques
e desembarques de tropas, viaturas e cargas foram experimentados.
Até a entrega dos dois primeiros protótipos, foram investidos R$ 4,9 bilhões para o seu
desenvolvimento, e outros R$ 7,2 bilhões para a aquisição de 28 aeronaves pela Força
Aérea Brasileira. Assim, totalizando R$ 12,1 bilhões em investimentos, e gerando mais de
15 mil e 600 empregos diretos e indiretos, segundo as previsões da EDS – Embraer Defesa
e Segurança, quando da apresentação do primeiro protótipo da aeronave multimissão.
O KC-390, como batizado pela Embraer, objetiva se tornar a espinha dorsal da aviação
de transporte tático da FAB. Projetado para operar em pistas pequenas, não-asfaltadas, e
mesmo no continente antártico, o KC-390 foi preparado para suportar as condições de frio e
calor de regiões hostis como a Antártica ou a Amazônia. Seu caráter multimissão atende
aos diversos propósitos exigidos pela FAB, e juntamente com seu avançado nível
tecnológico, no estado-da-arte, tornam este avião ímpar tanto para a indústria de defesa
nacional, quanto para a capacitação e qualificação material das Forças Armadas Brasileiras.
Segundo o Brigadeiro do Ar José Augusto Crepaldi Affonso, ex-presidente da COPAC -
Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate, em 2014, “O KC-390
representa para a Força Aérea Brasileira e para a indústria nacional o ápice, o coroamento
da nossa capacidade de emitir requisitos e principalmente a capacidade da nossa indústria
nacional de desenvolver um produto aeroespacial de última geração”2.
1 Página acessada em 22/01/2016: http://fab.mil.br/noticias/mostra/3418/FAB-realiza-semin?rio-sobre-Projeto-KC-X
2 Página acessada em 22/01/2016: http://www.fab.mil.br/noticias/mostra/20377/REAPARELHAMENTO-%E2%80%93-KC-390,-a-maior-e-mais-sofisticada-aeronave-brasileira-ser%C3%A1-apresentada-em-SP
4
Deste modo, diante da importância deste Programa, este trabalho se preocupou em
analisar se a aeronave KC-390 preenche todas as necessidades da Força Aérea Brasileira
determinadas no Programa KC-X. Ao reconhecer estas necessidades como um problema de
política pública, buscou-se identificar como este problema foi solucionado, isto é, de que
maneira o Programa foi implementado, quais os seus impactos, os principais atores e
interessados nesta implementação, que discussões este programa despertou na área de
política pública, e através de qual arcabouço normativo ele se sustentou.
Em primeiro lugar, descrevem-se brevemente o contexto normativo e institucional sob o
qual o Programa KC-X está inserido, o processo de desenvolvimento, e as características,
da aeronave militar. Em segundo lugar, usa-se o Modelo “Input-Output” para estruturar a
implementação do Programa. Assim, determinam-se as leis e instituições fundamentais para
a sua execução, e os atores envolvidos e os instrumentos utilizados em sua realização.
Também, foi possível identificar as consequências desta implementação e observar o que
de concreto se realizou, em termos de objetivos finais e intermediários alcançados.
No terceiro capítulo, procura-se apresentar, através do Modelo de “Stakeholders”, quais
os atores interessados na realização deste Programa e de que maneira eles participaram
deste processo. Em seguida, recorre-se ao Modelo de Relevância para concluir se os
resultados encontrados foram relevantes à questão colocada, entendendo-se que, se o
avião KC-390 atende os requisitos da FAB no Projeto KC-X, então o projeto foi bem-
sucedido, e a Política Pública satisfatória. Antes das considerações finais, abre-se espaço
para expor o debate sobre a necessidade de tornar os gastos com os projetos estratégicos
de defesa como não contingenciáveis no orçamento do governo federal, uma vez que os
seguidos contingenciamentos têm acarretado atrasos que trazem danos à própria indústria
de defesa, o que ameaça a concretização dos próprios objetivos estratégicos definidos.
Por último, são descritos alguns dos efeitos colaterais do Projeto KC-X, alguns tipos de
instrumentos de política pública que foram utilizados, e a conclusão deste trabalho, sob a
lógica de um modelo baseado em um problema percebido, quanto ao alcance dos objetivos
subjacentes ao Programa. Ressalta-se que a não possibilidade de observar o conteúdo dos
contratos assinados, podem desviar a conclusão do trabalho. O entendimento das
necessidades exigidas pela FAB no Programa KC-X é, por sua vez, assumido como aquelas
apresentadas pela própria FAB através de seus diversos meios de comunicação. Deste
modo, a análise de política pública aqui apresentada se define como um tipo de avaliação
de processo e de impacto, uma vez que aborda o processo de implementação da política
pública, e o impacto da sua realização, na busca em atender os requisitos da FAB.
5
2. Contexto
A fim de fundamentar esta avaliação com informações mais precisas, é apresentado o
arcabouço normativo e institucional sob o qual o Programa KC-X está inserido, e que será
útil ao Modelo “Input-Output”, desenvolvido no próximo capítulo. O histórico do processo de
desenvolvimento da aeronave de transporte tático militar KC-390 e as suas características
também são apresentadas nos dois subcapítulos seguintes.
2.1 Arcabouço Normativo
Em 09 de junho de 1999, a Lei Complementar nº 97 estabeleceu a competência do
Ministério da Defesa (MD) para a implantação do Livro Branco da Defesa Nacional. Este
documento contém os dados estratégicos, orçamentários, institucionais e materiais das
Forças Armadas, e aborda tópicos como a Política Nacional de Defesa (PND), a Estratégia
Nacional e Defesa (END), e a modernização das Forças Armadas (FFAA), entre outros.
A Política Nacional de Defesa é o documento de mais alto nível do planejamento das
ações de defesa nacional, e pressupõe a defesa do País de maneira inseparável de seu
desenvolvimento, pois este tem a capacidade de garantir meios para a capacitação da
Defesa Nacional. A PND prevê a atualização permanente e o aparelhamento das Forças
Armadas, com ênfase ao apoio à ciência e tecnologia para o desenvolvimento da base
industrial de defesa (BID). A fim de reduzir a dependência tecnológica e superar restrições
externas ao acesso às tecnologias sensíveis, e alcançar, assim, a autonomia de tecnologias
indispensáveis, o desenvolvimento da BID é, então, estabelecido como um objetivo nacional
de defesa.
Por sua vez, a Estratégia Nacional de Defesa, aprovada em 2008, reafirma a
necessidade de se modernizar as FFAA, enfatizando que esta é inseparável da Estratégia
Nacional de Desenvolvimento. A END reorganiza e reorienta as Forças Armadas, tendo na
reorganização da Base Industrial de Defesa um de seus eixos estruturantes, na busca de
assegurar que o atendimento às necessidades de produtos militares por parte das FFAA
seja apoiado por tecnologias sob domínio nacional, reduzindo a dependência externa destes
produtos. A END dá especial atenção à capacidade das FFAA quanto à sua mobilidade
estratégica e tática, definindo-a como uma diretriz para a defesa nacional, por permitir
pronta resposta à uma agressão, qualidade, esta, atendida por um avião como estabelecido
no Programa KC-X.
A Força Aérea Brasileira define, na END, o complexo tecnológico e científico sediado em
São José dos Campos como o sustentáculo da Força Aérea e de seu futuro. E a partir
deste, busca priorizar a formação de quadros técnico-científicos, militares e civis, que
6
permitam alcançar a independência tecnológica, e desenvolver projetos tecnológicos que se
distingam por sua fecundidade tecnológica e por seu significado transformador.
No Ministério da Defesa, o PAED - Plano de Articulação e Equipamento da Defesa, é o
instrumento pelo qual se planeja e executa as compras dos produtos estratégicos de defesa,
organizando e sustentando através dos investimentos públicos a indústria de defesa do
país. Para tanto, os projetos deverão integrar a estrutura programática orçamentária dos
sucessivos Planos Plurianuais da União. Já a Secretaria de Produtos de Defesa (SEPROD)
é a responsável por executar as diretrizes fixadas pelo MD, e, com base nelas, formular e
dirigir a política de obtenção de produtos de defesa. No âmbito da Força Aérea Brasileira, é
a COPAC, a Comissão Coordenadora do Programa de Aeronaves de Combate, subordinada
ao Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), a responsável pelos seus
projetos de reequipamento. A unidade é responsável por 80% da verba de investimento do
Comando da Aeronáutica.3
Por último, a Lei 12.598/2012, sancionada em março de 2013, é o marco legal e
regulatório para as compras, as contratações e o desenvolvimento de produtos e sistemas
de defesa no país. A norma diminui o custo de produção de companhias classificadas como
estratégicas e estabelece incentivos ao desenvolvimento de tecnologias fundamentais ao
Brasil, trazendo a possibilidade de homologar Produtos Estratégicos de Defesa (PED),
credenciar Empresas Estratégicas de Defesa (EED) e mapear as cadeias produtivas do
setor. A lei ainda permite fomentar o conteúdo nacional da Base Industrial de Defesa,
estimular as Compensações Tecnológicas, Industriais e Comerciais, e incrementar a pauta
de exportações de produtos de defesa.
2.2 História do desenvolvimento do KC-390
Em 2005, a Embraer iniciou estudos para o desenvolvimento de um avião cargueiro,
baseado no modelo civil Embraer 190, e revelado durante a LAAD 2007 como C-390. Este
avião teve boa aceitação no mercado e teria capacidade para transportar 19 toneladas, a
uma velocidade de cruzeiro de 0,8 mach e alcance superior a 6000 km, com teto
operacional de 36000 pés. Já em 2008, muitas melhorias foram feitas e o projeto não mais
derivaria dos E-Jets, sendo, então, um projeto novo. A envergadura do cargueiro tinha sido
aumentada, assim como a capacidade de carga, agora para 23 toneladas. Uma cauda em
“T”, o Sistema Fly-by-Wire e pods de respostas foram adotados, bem como alterações na
cabine. Ao mesmo tempo, o Ministério da Defesa lança a Portaria MD 1.585/2008
estabelecendo responsabilidade ao Chefe da COPAC, o Brigadeiro Dirceu Tondolo Nôro, ao
3 Página acessada em 29/01/2016: http://www.fab.mil.br/noticias/mostra/21891/COMANDO---FAB-tem-novo-respons%C3%A1vel-por-projetos-de-reequipamento;
7
Programa de Desenvolvimento de Cargueiro Tático Militar, de 10 a 20 toneladas, o
Programa KC-X. Ainda, em outubro de 2008, o Congresso Nacional aprova o uso de R$ 800
milhões pela Embraer para o desenvolvimento da aeronave, verba a ser liberada pela FAB,
com o aval do Executivo.
Durante a LAAD 2009, em abril do mesmo ano, foi assinado o contrato de
desenvolvimento do agora KC-390, este com capacidade de reabastecimento aéreo e
multifunção. O projeto passou a ser da Força Aérea Brasileira e a Embraer se tornou a
empresa contratada para o seu desenvolvimento, sob custo estimado de 2 bilhões de
dólares. O contrato de nº 0000000002/2009 visava o “Fornecimento de 02 (dois) protótipos
da aeronave de transporte militar e reabastecimento (Aeronave KC-X), incluindo a prestação
de serviços para o gerenciamento da produção e montagem das Aeronaves, entrega da
documentação do projeto, relatórios de desenvolvimento e certificação, relatórios de voos de
teste e de avaliação operacional e um pacote de dados de produto.”4
Pouco mais de um ano depois, em 21 de julho de 2010, durante a 47ª Farnborough
International Airshow, Inglaterra, a FAB e a Embraer anunciaram a intenção de compra
futura de 28 aviões KC-390 por parte da FAB. E em 2011, a contratada já anunciava durante
o Salão Le Bourget, de Paris, seus principais fornecedores. Também naquele ano foram
anunciadas as participações das empresas argentina, FAdeA, e Tcheca, Aero Vodochody,
na produção do avião, e a intenção de compra de 06 aeronaves por parte do governo
argentino e de 02 aeronaves por parte do governo tcheco. Importante acordo de cooperação
entre as empresas Embraer e Boeing Company, visando troca de conhecimentos técnicos
específicos e pesquisa conjunta de mercados para o estabelecimento de estratégias de
vendas do avião, o que viria a ser um importante aliado para a empresa brasileira, pois esta
pôde entrar em mercados que tradicionalmente compram produtos militares americanos, foi
assinado em 2012.
Em 25 de março de 2013, FAB e Embraer concluíram a Revisão Crítica do Projeto (CDR
– Critical Design Review) do avião, confirmando suas estruturas e a arquitetura definitivas, e
permitindo o início da produção dos protótipos. Em 03 de fevereiro de 2015, ocorreu, com
sucesso, o primeiro voo do KC-390, permitindo que a Embraer iniciasse a campanha de
testes a fim de obter a certificação civil e militar da aeronave multimissão, junto ao DCTA
(Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial), ao IFI (Instituto de Fomento e
4 Página acessada em 29/01/2016: http://www3.transparencia.gov.br/TransparenciaPublica/jsp/contratos/contratoExtrato.jsf?consulta=3&CodigoOrgao=52111&idContrato=486346
8
Coordenação Industrial) e à ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil). A entrega da
primeira unidade do KC-390 está prevista para o segundo semestre de 2016.
2.3 A aeronave KC-3905
Segundo a Embraer, o “KC-390 é uma aeronave de transporte militar desenvolvida para
estabelecer novos padrões de capacidade e desempenho na sua categoria, ao mesmo
tempo em que apresenta o menor custo de ciclo de vida do mercado.”6 Seu principal
concorrente é a aeronave C-130 da Lockheed Martin, porém, o KC-390 é multimissão, tem
maior autonomia de voo, suporta mais carga, voo mais alto e mais rápido. O KC-390 foi
desenvolvido para transportar e lançar cargas e tropas, realizar evacuação aeromédica,
busca e resgate, combater incêndio florestal, reabastecer outras aeronaves durante o voo
(REVO), e é capaz de pousar em pistas semipreparadas e suportar o calor da Amazônia e o
frio da Antártida. A aeronave também pode ser equipada com um avançado sistema de
autodefesa e possui proteção balística de áreas críticas, o que aumenta sua capacidade de
sobrevivência em ambientes hostis.
7
Segundo critérios do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES),
o Índice de Nacionalização do KC-390 é estimado em 60%, podendo-se chegar em 80% se
desconsiderar os motores, para os quais não há produção nacional, e representam um terço
do custo total da aeronave.8 Países como Argentina, Chile, Colômbia, Portugal e República
Tcheca são signatárias de cartas de intenções de compra, e a Suécia também já manifestou
o interesse em comprar quatro aeronaves KC-390 no longo prazo. Alguns dos fornecedores
selecionados são Rockwell Collins, Liebherr, Cobham, Selex Galileo, BAE Systems, DRS,
Messier-Bugatti-Dowty, Goodrich Corp, e International Aero Engines AG (IAE).
3. Avaliação e Descrição dos Modelos de Avaliação
5 Página acessada em 29/01/2016: https://pt.wikipedia.org/wiki/Embraer_KC-3906 Página acessada em 29/01/2016: http://www.embraerds.com/portugues/content/cargo/overview.asp7 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesanet.com.br/kc390/noticia/13504/Exclusivo---Entrevista-com-Paulo-Gastao--Diretor-do-Programa-KC-390/8 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesanet.com.br/aviacao/noticia/3239/KC-390---Workshop-busca-mais--Empresas-Brasileiras
9
Este artigo se propõe a avaliar a política pública que foi o desenvolvimento do Programa
KC-X pela FAB, e que teve a Embraer como contratada. Para tanto, é utilizada a Teoria de
Intervenção ou Modelo “Input-Output”, baseada nos problemas que o Programa KC-X
buscou enfrentar. Assim, busca-se verificar se estes problemas foram enfrentados, através
do encontro de soluções às necessidades demandadas pela FAB, em seus anseios por uma
aeronave multimissão de transporte tático militar e reabastecimento em voo. Também é
desenvolvido um estudo preocupado em encontrar os Stakeholders envolvidos neste
programa, ou seja, aqueles interessados na realização desta política pública, enfatizando
aqueles agentes principais, bem como o motivo e abrangência dos seus interesses.
As fontes de pesquisa recorridas foram os trabalhos encontrados com temas
semelhantes, como monografias e dissertações, livros publicados que abordam temas de
avaliação de política pública, e publicações nos diversos sites governamentais, revistas que
abordam temas de defesa, e da empresa contratada para o desenvolvimento do avião
objeto de pesquisa, a Embraer.
O início desta investigação se dá por meio do melhor entendimento do que é uma
avaliação. Avaliar significa dar algum valor a algo, e no caso da avaliação de políticas
públicas, olhar as consequências destas. Se a implementação é ruim, então a política é
ruim. Ala-Harja e Helgason9 definem avaliação de políticas públicas afirmando que “o termo
compreende a avaliação dos resultados de um programa em relação aos objetivos
propostos”. E é neste sentido que se procura avaliar, aqui, o Programa KC-X da FAB.
A Modelo “Input-Output”, que estrutura a lógica deste trabalho, é definido através de
suposições empíricas e normativas subjacentes à uma intervenção do setor público, e é
permeada por uma relação lógica, causal de raciocínio. É deste modo que se conclui que se
a implementação da política pública é ruim, então esta política é também ruim. Pois esta não
atende ao objetivo idealizado, uma vez que a implementação não foi bem-sucedida.
O processo de intervenção, como exemplificado no quadro abaixo, ocorre a partir do
surgimento da iniciativa de uma política pública, seguida da tomada de decisão do agente
público e da própria intervenção pública. É após este período de formação da política
pública, os “inputs”, que se segue uma segunda etapa de implementação, realizada pela
administração pública e materializada através dos “outputs” gerados, isto é, aqueles
9 Em Trevisan P.A. e Van Bellen M. H., Avaliação de políticas públicas: uma revisão teórica de um campo em construção; pág. 535, Revista de Administração Pública – RAP. 2008
10
primeiros resultados da formulação e decisão de política pública, que ocorrem de maneira
normativa, como uma lei, um decreto, ou uma portaria, por exemplo.
Por fim, após os “outputs” que garantem a realização da intervenção, chega-se aos seus
resultados finais, os “outcomes”, isto é, aqueles resultados verificados após a aplicação da
política pública. São os “outcomes” que permitem que se chegue à conclusão sobre a
eficiência ou não da política pública. Este processo de intervenção é, também,
continuamente permeado por um processo de avaliação e feedback, para que possa ser
continuamente aprimorado pelos próprios agentes públicos e privados envolvidos.
Assim, ao aplicar o Modelo de Intervenção para avaliar a se o avião KC-390 responde as
necessidades estabelecidas pela Força Aérea Brasileira no Programa KC-X, consegue-se
identificar o passo a passo deste processo de intervenção. Em primeiro lugar, há um
arcabouço normativo que organiza e sustenta o início de um programa de intervenção
pública como este. Este arcabouço é o conjunto de leis e procedimentos estabelecidos na
área de Defesa Nacional. O Livro Branco da Defesa Nacional, a Política Nacional de Defesa,
a Estratégia Nacional de Defesa, o Plano de Articulação e Equipamento da Defesa e a Lei
12.598/2012 são os principais instrumentos normativos relativos à regulamentação da
aquisição e desenvolvimento de produtos militares, e já foram brevemente descritos no item
2 deste trabalho. Estes instrumentos normativos formam juntamente com a Portaria 1.585
do Ministério da Defesa, de 25 de novembro de 2008, os “Inputs” do processo de
intervenção. Esta Portaria determinou ao então chefe da COPAC, o Brigadeiro Dirceu
Tondolo Nôro, a responsabilidade de gerenciar desenvolvimento do Programa KC-X.
11
Em 2008, o Congresso Nacional aprovou o uso de R$ 800 milhões pela Embraer para o
desenvolvimento da aeronave KC-390, que a esta altura já tinha sofrido diversas melhorias
no seu projeto, e significou o início de um novo avião da companhia. O processo de
implementação do Programa KC-X prosseguiu com a assinatura do Contrato entre o
Comando da Aeronáutica, através da COPAC, e a Embraer para a produção dos dois
primeiros protótipos da aeronave KC-390. Em de julho de 2010, durante a 47ª Farnborough
International Airshow, Inglaterra, ambas as instituições anunciaram a intenção de compra
futura de 28 aviões KC-390 por parte da Força Aérea Brasileira.
Em março de 2013, FAB e Embraer concluíram a Revisão Crítica do Projeto do novo
avião, confirmando suas estruturas e a arquitetura definitivas, e permitindo o início da
produção dos protótipos, e seu consequente primeiro voo do KC-390, em 03/02/15, o que
encerrou o processo de implementação do Programa KC-X.
Assim, a Embraer iniciou a campanha de testes a fim de obter a certificação civil e militar
da aeronave multimissão, junto aos órgãos responsáveis, DCTA, IFI e ANAC. A necessária
certificação do KC-390, bem como todas as informações emitidas a respeito da aeronave,
como a documentação do projeto, relatórios de desenvolvimento e certificação, relatórios de
voos de teste e de avaliação operacional e um pacote de dados de produto, por exemplo,
são, neste caso, os “outputs” da intervenção, ou seja, os resultados primários da decisão de
política pública.
12
Os “outcomes” desta intervenção, isto é, aqueles resultados verificados após a aplicação
da política pública, são os objetivos que foram alcançados neste caso. Com a entrega da
primeira unidade do KC-390 prevista para o segundo semestre de 2016, e diante do fato que
houve um desenvolvimento em conjunto da aeronave entre a FAB e a Embraer, pode-se
afirmar que o objetivo último do Programa KC-X, isto é, o atendimento das necessidades da
FAB para um avião multimissão de transporte e reabastecimento aéreo, foi alcançado.
Outros objetivos intermediários também podem ser verificados, como a autonomia
tecnológica da FAB, uma vez que esta se tornou a proprietária intelectual do projeto, o
desenvolvimento da indústria aeronáutica de defesa brasileira, e sua consequente evolução
tecnológica.
A partir do entendimento do processo de desenvolvimento da aeronave KC-390 Embraer
e do Programa KC-X da FAB, pode-se observar e mapear os principais agentes
interessados na realização desta política pública. O Modelo de “Stakeholders” esquematiza
a relação entre estes diversos atores e o desenvolvimento da aeronave militar, colocando-a
no centro do Modelo. É importante ressaltar que a relação entre o desenvolvimento do
Programa KC-X/aeronave KC-390 com os diversos Stakeholders é uma via de mão dupla,
onde ambos mantêm entre si interesses mútuos e distintos.
Se, por sua vez, o desenvolvimento do KC-390 dependeu das instituições do Estado
Brasileiro, como o Ministério da Defesa e as Forças Armadas, em especial o Comando da
Aeronáutica, para ser gerido e financiado, bem como do Governo e Sociedade que o
priorizam em seus Planos Plurianuais, e do Ministério de Relações Exteriores, para com sua
diplomacia comercial promover este novo produto militar brasileiro, por outro lado, este
desenvolvimento também teve fundamental relação com o setor privado. Foi através da
Embraer, com sua mão-de-obra e tecnologia qualificada, que o Programa KC-X se
materializou no formato da aeronave KC-390. Isto não seria possível sem suas estimativas
de produzir mais de 100 aeronaves em 10 anos, e substituir os velhos C-130 da Lockheed
Martin, o principal concorrente do KC-390, num mercado estimado de 2.400 unidades em 70
países. A Embraer desenvolveu enorme capacidade de coordenar um projeto de
desenvolvimento de aeronave de médio porte em escala global, isto é, tendo 40% dos seus
fornecedores internacionais e 60% com sede no Brasil.
Apesar de haver indiscutível dependência do Programa KC-X com estes diversos atores,
há, também, uma relação de interesse destes mesmos atores com o Programa. Cabe ao
Ministério da Defesa dar as respostas necessárias para a garantia da Defesa Nacional, e o
Programa KC-X visa atender à uma demanda estratégica das Forças Armadas – o
transporte tático militar e o reabastecimento em voo. Como o KC-390 traz ganhos
13
tecnológicos e desenvolve a indústria nacional de defesa e aeroespacial, o Ministério da
Defesa tem interesse na autonomia tecnológica e no fortalecimento da Base Industrial de
Defesa, que reduz a dependência material do exterior. As Forças Armadas têm interesse no
Programa, pois este qualifica e capacita as mesmas para diversas funções militares, sendo
a preponderante entre elas, o transporte tático de tropas, diante da enorme extensão do
território sob responsabilidade nacional. Já o Ministério de Relações Exteriores, manifesta
interesse através de suas funções inerentes ao órgão, como o exercício da diplomacia
comercial e política, no âmbito da defesa e segurança nacional, regional e internacional.
O Governo Brasileiro tem no Programa KC-X grande interesse, uma vez que este tem
enorme integração com a indústria nacional, cria mais de 15 mil empregos diretos e
indiretos, sendo muitos deles qualificados e de altos salários, e fortalece a Defesa Nacional.
Estes dois últimos objetivos atendem aos interesses gerais da sociedade, que manifesta seu
apoio através do Congresso Nacional, como, por exemplo, o financiamento de R$ 800
milhões deste Programa, em 2008, verba disponibilizada pela FAB.
Já os fornecedores do KC-390 não são apenas clientes da companhia aérea brasileira,
mas também codesenvolvedores da aeronave, e estão, assim como a Embraer,
interessados num mercado global de milhares de unidades. Segundo o Stockholm
International Peace Research Institute, em seu estudo Top 100 de Indústrias de Defesa10, a
Embraer passou da posição 101, em 2010, para a 60ª, em 2014, e seu faturamento evoluiu
de 810 milhões de dólares para 1470 milhões de dólares neste período11. Desta forma, a
produção do KC-390 deve fazer com que a empresa brasileira evolua ainda mais no ranking
global de empresas de defesa.
10 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesanet.com.br/bid/noticia/21093/SIPRI---TOP-100-EMBRAER-e-a-60%C2%BA-Empresa-de-Defesa/11 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesanet.com.br/bid/noticia/21093/SIPRI---TOP-100-EMBRAER-e-a-60%C2%BA-Empresa-de-Defesa/
14
4. Descobertas
Políticas Públicas podem ser definidas como o nexo entre teoria e ação do Estado e têm
por conteúdo, entre outros, a análise do processo de governo, a análise da participação e
influência de grupos e representantes do povo na formulação e implementação dos
programas de governo, e o exame da distribuição de recursos escassos, conjugando
conceitos de eficiência, justiça e equidade12. Por sua vez, Programas são definidos como
intervenções públicas estatais que reúnem conjuntos de projetos e ações destinadas a
promover alguma área específica onde carências e necessidades foram detectadas13.
Assim, torna-se pertinente a avaliação sobre uma intervenção de governo, que requer
grande volume de recursos, tem grande impacto sobre a economia nacional, e está inserida
em uma área fundamental ao Estado, a sua Defesa, como o Programa KC-X.
Descobrir se o KC-390 da Embraer é uma resposta satisfatória às necessidades da
Força Aérea Brasileira estabelecidas no Programa KC-X, é o objetivo deste trabalho. E para
tanto, busca-se aqui responder como o Programa KC-X foi implementado, quais os
principais atores em torno do programa, e quais seus interesses, os objetivos finais e
intermediários do Programa, e a estrutura normativa que o sustenta.
Para Vedung, existem 8 questões fundamentais da avaliação de uma política pública: o
propósito da avaliação; o avaliador responsável pela avaliação e como esta deveria ser
organizada; o modo como o objeto de avaliação deve ser avaliado e caracterizado; a
questão da implementação; os resultados intermediários e finais alcançados; o impacto e os
fatores que melhor explicam os resultados; os méritos da intervenção, seus valores e
critérios de performance para julgar a intervenção; e a utilidade da avaliação14. Deste modo,
a partir destas oito questões, e através da Teoria da Intervenção, do Modelo de
“Stakeholders” e do Modelo de Relevância é que se busca responder as questões
colocadas. No entanto, por ser uma avaliação externa ao Programa, este trabalho não tem o
compromisso com os feedbacks, isto é, os retornos pós avaliação a fim de aprimorar o
desenvolvimento do Programa, que uma avaliação interna teria. E, ao mesmo tempo, é
12 Página acessada em 29/01/2016: PEDONE, L. Formulação, Implementação e Avaliação de Políticas Públicas. 1986.13 Em: PEDONE, Luiz. Análise de Políticas Públicas de Defesa. UFF, Instituto de Estudos Estratégicos,disciplina optativa PPGEST. 2º Semestre 2015, Niterói: PPTs.
14 Em: VEDUNG, Evert UFF, Public Policy and Program Evaluation: Concept, Intervention Theories,Models. UFF, Instituto de Estudos Estratégicos, Mini-Course. Out. 12-23, 2015, Niterói: PPTs.
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prejudicado pela ausência de informações oficiais que um contrato de compra e de
desenvolvimento implica.
Esta avaliação é organizada a partir do esclarecimento do conjunto de normas que
sustentam um Programa de desenvolvimento de uma aeronave militar de porte médio e
multimissão como o KC-390, seguido do histórico do desenvolvimento da aeronave, e de
suas características, da introdução da Teoria da Intervenção para analisar as etapas deste
processo, e do Modelo de “Stakeholders”, para mapear os atores e seus interesses no
Programa KC-X. Por fim, conclui com o uso do Modelo de Relevância, para diagnosticar o
alcance e satisfação dos objetivos subjacentes ao programa de desenvolvimento. Desta
forma, esta é uma avaliação de processo e de impacto, uma vez que aborda o processo de
implementação da política pública, e o impacto da sua realização.
Como visto no item 3, a execução da política pública é explicada a partir do Modelo
“Input-Output”, onde as normas gerais da área de defesa, como o Livro Branco da Defesa
Nacional, a Política Nacional de Defesa, a Estratégia Nacional de Defesa, o Plano de
Articulação e Equipamento da Defesa e a Lei 12.598/2012 regulamentam a aquisição e
desenvolvimento de produtos militares, e permitem a formação da intervenção. Estes,
juntamente com a Portaria 1.585 do Ministério da Defesa, de 25 de novembro de 2008, que
determina a responsabilidade pelo gerenciamento do Programa KC-X, foram os “Inputs”
deste processo de intervenção. Em seguida, a etapa de implementação é realizada a partir
da concessão, por parte do Congresso Nacional, de financiamento para o desenvolvimento
da aeronave, e da assinatura do contrato entre a FAB e a Embraer para a produção dos
seus dois primeiros protótipos do cargueiro KC-390. O que teve por consequência o anúncio
da intenção de compra futura de 28 aviões pela FAB. A conclusão da Revisão Crítica do
Projeto (RCP) do novo avião, que confirma suas estruturas e a arquitetura definitivas e
permite o início da produção dos protótipos, encerrou este processo.
A partir de então, já se pôde observar os resultados primários da implementação do
Programa KC-X. A certificação da aeronave, e as informações oficiais emitidas a respeito da
mesma, como documentação do projeto, relatórios de desenvolvimento e certificação,
relatórios de voos de teste e de avaliação operacional e um pacote de dados de produto,
são, assim, os “outputs” da intervenção. Por sua vez, os resultados verificados após a
aplicação da política pública, são os “outcomes” da implementação, isto é, os objetivos
alcançados pelo Programa. A entrega da primeira unidade do KC-390, prevista para o
segundo semestre de 2016, é objetivo último do Programa KC-X, uma vez que esta foi
desenvolvida em conjunto entre a FAB e a Embraer, permitindo o atendimento das
necessidades da Força Aérea para um avião multimissão de transporte de carga e
16
reabastecimento aéreo. Objetivos intermediários do Programa também podem ser
observados. A autonomia tecnológica da FAB, uma vez que esta se tornou a proprietária
intelectual do projeto, o desenvolvimento da indústria aeronáutica de defesa brasileira, e a
sua consequente evolução tecnológica, são os objetivos intermediários percebidos.
O Modelo de “Stakeholders” permitiu, ainda, identificar aqueles atores interessados na
implementação da política pública, bem como seus objetos de interesse. Estes interesses
são uma “via de mão dupla” entre o Programa e os Stakeholders, pois ambos interagem em
busca de proveito e vantagem. O desenvolvimento do KC-390 dependeu das instituições do
Estado brasileiro para ser gerido e financiado, do Governo e Sociedade para priorizá-lo no
orçamento, e Ministério de Relações Exteriores para promovê-lo. O Programa também teve
fundamental relação com a Embraer, com sua mão-de-obra e tecnologia qualificada, e sua
capacidade de coordenar um projeto de desenvolvimento de aeronave de médio porte em
escala global, tendo 40% dos seus fornecedores internacionais e 60% com sede no Brasil.
Por outro lado, cabe ao Ministério da Defesa dar as respostas necessárias para a
garantia da Defesa Nacional, e o Programa KC-X visa atender à uma demanda estratégica
das Forças Armadas – o transporte tático militar e o reabastecimento em voo. O KC-390 traz
ganhos tecnológicos e desenvolve a indústria nacional de defesa e aeroespacial. O
Ministério da Defesa tem interesse na autonomia tecnológica e no fortalecimento da Base
Industrial de Defesa, reduzindo a dependência material externa, e das Forças Armadas. O
Governo Brasileiro, com preponderante visão desenvolvimentista desde 2002, tem
manifesto interesse na indústria nacional e nos ganhos políticos com a criação de novos
empregos gerados a partir do Programa, o que também atende aos interesses da sociedade
em geral. E, por fim, o mercado de defesa se beneficia com o aquecimento de um nicho de
mercado que estava há muito tempo dominado por uma única aeronave, o avião C-130 da
Lockheed Martin, e, uma vez que o KC-390 Embraer tem uma cadeia de valor global, tem
em grandes empresas internacionais de defesa novos clientes e parceiros no
codesenvolvimento da aeronave, o que permite à Embraer disputar este mercado, e
aumentar seu market share no competitivo mercado internacional de defesa.
O Modelo de Relevância é o modelo escolhido para avaliar os resultados da intervenção.
O Modelo utiliza como critério de relevância a resolução, pela intervenção efetuada, dos
problemas subjacentes à questão. Este modelo é muito similar ao modelo de efetividade
(goal attainment model), porém, enquanto o último procura constatar se o objetivo pré-
estabelecido foi alcançado, o modelo de relevância procura descobrir se os objetivos
subjacentes, ou seja, ocultos, foram atendidos. Neste caso, em realidade, o objetivo do
Programa KC-X, de fato, não era produzir a aeronave KC-390, mas sim atender as
17
necessidades da Força Aérea Brasileira quanto à uma aeronave de transporte militar tático,
multimissão, e capaz de efetuar reabastecimento em voo. Estas são as características que a
aeronave KC-390 deve ter para ser uma resposta efetiva à intervenção.
O resultado do programa de desenvolvimento de aeronave de transporte militar,
multimissão, e reabastecimento em voo, foi a aeronave KC-390 Embraer. Porém, como
esquematizado no quadro abaixo, estes resultados são relevantes para responder às
questões subjacentes à intervenção? A conclusão que se chega é que, diante da assinatura
do contrato, em 2009, onde o desenvolvimento da aeronave passou a ser da FAB e a
Embraer a contratada, e da conclusão da Revisão Crítica do Projeto, em 2013, que
confirmou estruturas e arquitetura definitivas do avião, e permitiu o início da produção dos
protótipos, a FAB se mostrou oficialmente satisfeita com a aeronave, que oferece todas as
características demandadas por ela, encontradas até aqui. Objetivos intermediários do
Programa, expressos no Livro Branco de Defesa Nacional, como a autonomia tecnológica, e
o desenvolvimento da indústria de defesa brasileira também são percebidos, dado que 60%
dos fornecedores do KC-390 têm sede no Brasil. O alcance destes resultados pode ser
explicado pelo fato do Programa KC-X ter encontrado na Embraer uma empresa capaz de
desenvolver e coordenar um programa de desenvolvimento de aeronave de médio porte
com uma cadeia de valor em escala global, permitindo, portanto, o desenvolvimento de um
produto tecnológico no estado-da-arte.
Assim, a intervenção tem entre seus méritos os valores da eficiência, pois tem no KC-
390 um custo menor do que o seu rival C-130, a segurança, uma vez que responde as
necessidades estabelecidas, a liberdade de escolha e de ação do governo, a justiça nos
deveres e benefícios da intervenção, e a democracia, ao atender a necessidade de
segurança do cidadão.
Deste modo, esta avaliação se faz pertinente ao explicar, a partir de modelos de política
pública, o processo e o impacto da intervenção, e deve ser utilizada de maneira reflexiva e
questionadora, considerando as dificuldades encontradas no acesso às informações oficiais
quanto às reais exigências da FAB para o desenvolvimento do avião de transporte militar,
multimissão e reabastecimento aéreo.
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5. Discussões
Assim como outros projetos estratégicos de defesa definidos pelo Ministério da Defesa,
a produção do KC-390 também tem sofrido com atrasos. Diante da redução do orçamento
do Governo Federal para o setor de defesa, devido à necessidade de ajuste fiscal que se
encontram as contas públicas, a Embraer anunciou a revisão para baixo da sua previsão de
receita para 2015, e espera entregar as primeiras unidades do KC-390 no primeiro semestre
de 2018, dois anos depois do originalmente estabelecido. Os testes com as novas
aeronaves duram de 18 a 24 meses, o que também atrasa a sua certificação, agora
esperada para o final de 201715. Ainda em 2015, o Ministro da Defesa, Jacques Wagner,
admitiu dívida do governo com a Embraer, e o risco de descontinuidade do Programa.16.
Alguns impactos negativos da possível descontinuidade dos Programas Estratégicos da
Defesa podem ser previstos. Em 10/12/2015, o Senador Ricardo Ferraço, em Relatório da
Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional sobre as Políticas Públicas
relacionadas à Indústria de Defesa Nacional do Senado Federal, destacou algumas delas.
As consequências de maior relevância são: o comprometimento na qualidade e nos prazos
de entrega dos produtos; a perda da capacidade de investimento na Base Industrial de
Defesa; a perda na abertura de mercados para as Empresas Estratégicas de Defesa; e a
extinção de empregos diretos e indiretos em tecnologia e infraestrutura.17
Diante deste quadro de restrição orçamentária, e dos riscos manifestos, algumas
discussões ganharam proeminência na área de Defesa. Entre elas, a aprovação de uma lei
de programação militar plurianual mandatória, em que um planejamento de investimentos
seria traçado no início da legislatura, e onde os programas ali selecionados na categoria de
prioritários não poderiam ter suas verbas contingenciadas18. Esta ideia foi promovida, em
2010, pelo então Ministro da Defesa Nelson Jobim, e prossegue sendo promovida no meio
acadêmico.
15 Página acessada em 29/01/2016: http://www.aereo.jor.br/2015/07/30/embraer-cortes-no-kc-390-e-na-modernizacao-de-cacas/16 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesanet.com.br/kc390/noticia/18976/Jaques-Wagner-%E2%80%93-Governo-deve-500-Milhoes-a-EMBRAER/17 Página acessada em 29/01/2016: http://www19.senado.gov.br/sdleg-getter/public/getDocument?docverid=e7d08594-8f63-49cf-b5fb-fef7e7a16f64;1.0
18 Página acessada em 29/01/2016: http://www.defesa.gov.br/index.php/noticias/3604-16122010-defesa-palestra-do-ministro-nelson-jobim-na-sae-qpolitica-de-defesa-do-governo-lulaq
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6. Considerações Finais
Este trabalho apresentou uma avaliação sobre uma intervenção governamental, o
Programa KC-X do Ministério da Defesa. Descobrir se o KC-390 da Embraer é uma resposta
satisfatória às necessidades da Força Aérea Brasileira estabelecidas neste Programa é o
objetivo subjacente no desenvolvimento do KC-390. Através dos Modelos “Input-Output”, de
“Stakeholders” e de Relevância procurou-se explicar o processo de implementação, o
arcabouço normativo que sustenta o Programa, os atores envolvidos em sua realização, e
seus interesses individuais, e a relevância do objetivo alcançado. O que caracteriza esta
análise como uma avaliação de processo e impacto.
A conclusão que se chegou é que com o término da Revisão Crítica do Projeto (RCP),
em 2013, que confirmou a estrutura definitiva do avião, e permitiu o início da produção dos
protótipos, a FAB mostrou-se oficialmente satisfeita com a aeronave. Esta conclusão é
reafirmada a partir da ideia de utilidade de se definir algo a partir do que ele não é. De modo
que, se não se pode afirmar completamente que a RCP é um fato marcante que comprova
que o KC-390 atende os requisitos do Programa KC-X, pois não foi possível ter acesso ao
conteúdo dos contratos da FAB com a Embraer, apesar de forte indicação do mesmo, por
outro lado, pode-se afirmar que a partir da RCP, não se verifica uma rejeição da aeronave
quanto ao atendimento dos requisitos da FAB no Programa. Ao contrário, há a reafirmação
da necessidade de compra de novas 28 unidades KC-390. Objetivos intermediários do
Programa, como a autonomia tecnológica, e o desenvolvimento da indústria de defesa
brasileira também são percebidos após a intervenção pública. Deste modo, apesar dos
efeitos do contingenciamento público orçamentário, a implementação foi positiva.
A intervenção trouxe diversos efeitos-colaterais positivos ao país. Entre eles, destacam-
se a exportação de produto com alto conteúdo tecnológico, a diversificação da pauta de
exportação nacional, a inversão da lógica comercial entre países desenvolvidos e em
desenvolvimento, onde os últimos vendem bens intermediários e compram bens finais; a
criação de mais de 15 mil empregos, muitos destes qualificados e com melhores salários; e
a busca, pela Embraer, por fornecedores em diversos países, permitindo que a empresa
nacional coordene esta cadeia global de valor, e construa parcerias industriais com outros
países. Entre os instrumentos de política pública utilizados na implementação do Programa,
destacam-se o investimento público para o desenvolvimento e compra de 28 aeronaves KC-
390 Embraer, considerado um incentivo econômico positivo e significante para a realização
do Programa, e as exigências da FAB para o desenvolvimento do KC-390, consideradas
uma prescrição positiva, que regulamenta e ordena o seu desenvolvimento.
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7. Referências Bibliográficas
VEDUNG, EVERT - “Six Models of Evaluation” - in Eduardo Araral Jr., Scott Fritzen, Michael
Howlett, M Ramesh, Xun Wu (editors) - Routledge Handbook od Public Policy. London &
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DEFESANET. Jornalismo online especializado. Disponível em:
<http://www.defesanet.com.br/>. (Acesso em: 25 de janeiro de 2016).
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