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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS
LILIAN DE OLIVEIRA COSER
AVALIAÇÃO DAS SUBPOPULAÇÕES DE LINFÓCITOS T CD8+ EM PACIENTES COM
PARACOCCIDIOIDOMICOSE
CAMPINAS
2019
LILIAN DE OLIVEIRA COSER
Avaliação das Subpopulações de Linfócitos T CD8+ em Pacientes com
Paracoccidioidomicose
Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos
exigidos para a obtenção do título de Mestra em Ciências na
área de concentração de Patologia Clínica.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Heloisa de Souza Lima Blotta
ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO
FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA
ALUNA LILIAN DE OLIVEIRA COSER, E ORIENTADO PELA
PROFA. DRA. MARIA HELOISA DE SOUZA LIMA BLOTTA.
Campinas 2019
COMISSÃO EXAMINADORA DA DEFESA DE MESTRADO
LILIAN DE OLIVEIRA COSER
ORIENTADORA: PROFA. DRA. MARIA HELOISA DE SOUZA LIMA BLOTTA
MEMBROS:
1. PROFA. DRA. MARIA HELOISA DE SOUZA LIMA BLOTTA
2. PROFA. DRA. MARIÂNGELA RIBEIRO RESENDE
3. PROFA. DRA. ANGELA MARIA VICTORIANO DE CAMPOS SOARES
Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas da Faculdade de Ciências
Médicas da Universidade Estadual de Campinas.
A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no
SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da FCM.
Data de Defesa: 26/06/2019
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Francisca e Claudio, por todo apoio e incentivo durante toda minha
trajetória. Pela compreensão na minha ausência e por todos os ensinamentos que tive
desde o início dos meus estudos, se hoje estou finalizando essa etapa, isso é fruto do
esforço e dedicação de vocês. Muito obrigada.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer primeiramente à Deus, por toda sabedoria e força que eu
recebi durante toda a minha trajetória até a finalização do meu mestrado.
Aos meus pais, Francisca e Claudio, por todo incentivo e dedicação que sempre
tiveram comigo, pela compreensão nos momentos que eu estive ausente e por sempre me
apoiar em minhas decisões, sem vocês esse trabalho não teria sido concluído.
Ao pessoal do laboratório por todos os ensinamentos e aprendizados que obtive
desde o estágio obrigatório da graduação até a finalização desse trabalho. Em especial, a
Lívia Genaro, Juliana e a Mariana, por todos os ensinamentos durante todo esse mestrado,
desde ensinar uma técnica até estar no laboratório às 6hrs da manhã para iniciar um
experimento, vocês foram essenciais para a finalização do meu mestrado.
A Luzia do Laboratório de Microbiologia do HC-UNICAMP pelo cultivo dos fungos.
Aos meus pacientes, por aceitarem participar da minha pesquisa, vocês foram
essenciais para o melhor entendimento da resposta imunológica na paracoccidioidomicose.
Ao Departamento de Estatística da FCM-UNICAMP pela realização da análise
estatística dos dados presentes na dissertação.
A Dra. Luciana Pereira Ruas, por todo aprendizado desde o meu estágio da
graduação até o término desse projeto, por todo apoio nas decisões profissionais e por me
mostrar o melhor caminho a seguir. Além disso, por me ajudar durante todas as etapas do
meu mestrado, desde ensinando uma técnica, discutindo resultados e até mesmo na
finalização da versão final dessa dissertação. Você foi essencial para a conclusão desse
trabalho.
A minha orientadora Profa. Dra. Maria Heloisa de Souza Lima Blotta, pela
oportunidade de desenvolver meu mestrado em seu laboratório, por ter aberto as portas
para mim desde o meu estágio da graduação. Por todo o ensinamento e apoio que recebi
durante toda a trajetória.
E o presente trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela concessão da Bolsa de Mestrado –
Código de Financiamento :165822/2017-1.
EPÍGRAFE
"Em algum lugar, alguma coisa incrível
está esperando para ser descoberta.”
Carl Sagan
RESUMO
As células T CD8+ são caracterizadas pela sua capacidade citotóxica, mediada pela
liberação de grânulos citotóxicos ou por meio da ligação da molécula FasL, que resulta na
apoptose da célula alvo. Além da função citotóxica, essas células também secretam
citocinas, principalmente IFN- e TNF-, que contribuem para a ativação de células efetoras
capazes de eliminar patógenos. As células T CD8+ foram recentemente classificadas em
subpopulações, de acordo com as citocinas que produzem, a saber IFN- (Tc1), IL-4 (Tc2),
IL-10 (Tc10), IL-17 (Tc17), IL-21 (Tc21) e IL-22 (Tc22). Com o objetivo de avaliar a
participação das subpopulações de células T CD8+ na paracoccidioidomicose (PCM)
humana determinamos a frequência e o perfil destas células em pacientes com as formas
aguda (FA) e crônica (FC) da doença. Além disso, verificamos a capacidade de leveduras
de P. brasiliensis em induzir a diferenciação de subpopulações de células T CD8+ in vitro.
Foi realizada a coleta do sangue periférico de pacientes com PCM e controles saudáveis,
seguida do isolamento das células mononucleares, estimulação in vitro para
ativação/expansão dos linfócitos e posterior análise fenotípica em citômetro de fluxo. O
plasma dos doadores foi utilizado para dosagem de citocinas pela técnica de ELISA. Para
os experimentos in vitro realizamos ensaios de cocultura com células dendríticas obtidas a
partir de monócitos do sangue periférico de doadores saudáveis, pulsadas in vitro com
leveduras de P. brasiliensis e posteriormente cocultivadas com linfócitos T autólogos. A
avaliação da polarização das células T CD8+ foi realizada por citometria de fluxo e as
citocinas no sobrenadante foram quantificadas por ELISA. As análises realizadas
mostraram uma maior frequência de células Tc1 e Tc10 no sangue periférico de pacientes
com a FA da PCM. Por outro lado, em pacientes com a FC encontramos uma maior
frequência de células T CD8+IFN-+ (Tc1) e CD8+IL-21+(Tc21). Não foram observadas
diferenças quanto a expressão de grânulos citotóxicos entre pacientes e controles. A
quantificação das citocinas no plasma, mostrou maiores concentrações de TNF- e IL-10
em pacientes com a FA em comparação aos controles e pacientes com a FC. Por outro
lado, os pacientes com a FC apresentaram menores níveis de IL-22. Nos experimentos de
polarização in vitro verificamos que células dendríticas pulsadas com P. brasiliensis foram
capazes de induzir subpopulações de células T CD8+ produtoras de IL-17 e IL-22. Além
disso, a análise das citocinas no sobrenadante mostrou um aumento na concentração de
IFN- acompanhada de uma diminuição de IL-4 em resposta a estimulação com o fungo.
Em conjunto os resultados obtidos indicam que na paracoccidioidomicose, a maior
contribuição das T CD8+ fica no âmbito da produção de citocinas, com um perfil misto
Tc1/Tc10 na FA e Tc1/Tc21 na FC. Embora componham uma população minoritária em
relação às células T CD4+, as células T CD8+ com fenótipo Tc10 poderiam ter, juntamente
com as células Th2, uma participação na inibição da resposta celular observada nos
pacientes com a forma aguda da PCM. Por outro lado, o perfil Tc1/Tc21 também está de
acordo com o padrão predominante da resposta Th1/Th17 em pacientes com a forma
crônica da PCM, que representam mais de 90% dos casos da doença. Na mesma linha, os
ensaios in vitro evidenciaram que leveduras de P. brasiliensis são capazes de induzir a
polarização de subpopulações Tc17/Tc22. Desta forma, podemos presumir que a
disponibilidade de células T CD8+ capazes de responder prontamente a estímulos
antigênicos com a produção de citocinas contribui para resposta mediada por células T
CD4+, além de conferir ao hospedeiro um sistema de defesa alternativo para situações de
depleção ou incapacidade das células T CD4+ como ocorre na AIDS e outros quadros de
imunodeficiência.
Palavras-chave: Células T CD8, IFN- IL-17, IL-21, IL-22, Paracoccidioides brasiliensis.
ABSTRACT
CD8+ T cells are characterized by their cytotoxic capacity, mediated by the release of
cytotoxic granules or by the binding of the FasL molecule, which results in cellular target
apoptosis. In addition to cytotoxic function, these cells also secrete cytokines, mainly IFN−
and TNF-, which contribute to the activation of effector cells capable of eliminating
pathogens. CD8+ T cells have recently been classified into subpopulations, according to the
cytokines they produce, as IFN- (Tc1), IL-4 (Tc2), IL-10 (Tc10), IL-17 (Tc17), IL-21 (Tc21)
and IL-22 (Tc22). Our work aimed to verify the participation of CD8+ T cells and their
subpopulations in human paracoccidioidomycosis (PCM), in which we determined the
frequency of this cells in patients with acute form (AF) and chronic form (CF). Furthermore,
we verified the capacity of P. brasiliensis yeasts to induce CD8+ T cells subpopulation
polarization in vitro. We collected peripheral blood from patients and healthy donors,
isolated the mononuclear cells and stimulated it in vitro for lymphocyte activation/expansion
and subsequently assessed it phenotype by flow cytometer. Patients and healthy donor’s
plasma was used for cytokine quantified by ELISA. For in vitro experiments we performed a
coculture assay with dendritic cells from monocytes from healthy donors, pulsed in vitro with
yeasts of P. brasiliensis and later cocultivated with autologous T lymphocytes. The
polarization of the cells stimulated in vitro was analyzed by flow cytometry and the cytokine
production in the supernatant was quantified by ELISA. Our data showed a higher frequency
of Tc1 and Tc10 cells in the peripheral blood of patients with the AF of PCM. Diversely, in
patients with the CF, we found a higher frequency of CD8+ T cells IFN-+ (Tc1) and CD8+ IL-
21+ (Tc21). No differences were found in the expression of cytotoxic granules between
patients and healthy donors. The quantification of cytokines in plasma demonstrated an
increase of TNF- and IL-10 in patients with AF and a decrease in the concentration of IL-
22 in patients with CF. The in vitro polarization experiments verified that dendritic cells
pulsed with P. brasiliensis were able to induce the polarization of the CD8+ T cells producing
IL-17 and IL-22. Along with this data, we detected higher concentrations of IFN-γ following
by lower concentration of IL-4 in cells stimulated with P. brasiliensis in the supernatants of
the cultures. In a summarized way our data demonstrated that in paracoccidioidomycosis,
CD8+ T cells have a major contribution in cytokines production, with mixed profile Tc1/Tc10
in AF and Tc1/Tc21 in CF. Although compose a minority population when compared to CD4+
T cells, CD8+ T cells with Tc10 phenotype could, along with Th2 cells, have a role in inhibiting
the cellular response observed in patients with the acute form of PCM. Contrarily, the Tc1 /
Tc21 profile goes along to the predominant pattern of the Th1/Th17 response seen in
patients with the chronic form of PCM, which represent more than 90% of the cases of the
disease. Similarly, the in vitro assays showed that P. brasiliensis yeasts are able to induce
the polarization of Tc17/Tc22 subpopulations. Thus, we can assume that the availability of
CD8+ T cells capable of responding promptly to antigenic stimuli with cytokine production
contributes to a CD4+ T cell-mediated response, in addition to giving the host an alternative
defense system for situations of depletion or CD4+ T cells as in AIDS and other
immunodeficiency conditions.
Keywords: CD8 T cells, IFN- IL-17, IL-21, IL-22, Paracoccidioides brasiliensis.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Delineamento Experimental................................................................................25
Figura 2. Subpopulações de linfócitos T CD8+. .................................................................30
Figura 3. Avaliação das subpopulações de células T CD8+ em pacientes com PCM.........34
Figura 4. Avaliação da expressão de grânulos citotóxicos..................................................35
Figura 5. Avaliação da polarização de subpopulações de células T CD8+ in vitro...............37
Figura 6. Concentração de citocinas no sobrenadante das coculturas...............................38
Figura 7. Avaliação da expressão de grânulos citotóxicos..................................................39
Figura 8. Concentração plasmática dos pacientes com PCM............................................41
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Painel de anticorpos utilizados para a caracterização das subpopulações de
células T CD8+ por citometria de fluxo.............................................................................. 29
Tabela 2. Dados clínicos dos pacientes com paracoccidioidomicose................................32
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
DPOC – Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica
PCM - Paracoccidioidomicose
FA – Forma Aguda
FC – Forma Crônica
DTH – Reação de Hipersensibilidade do tipo tardia
NK – Natural Killer
HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana
CMSP – Células mononucleares do sangue periférico
DCs – Células Dendríticas
IFN- − Interferon gama
IL-1b – Interleucina -1 beta
IL-4 – Interleucina - 4
IL-5 – Interleucina - 5
IL-6 – Interleucina – 6
IL-7 – Interleucina - 7
IL-9 – Interleucina - 9
IL-13 – Interleucina - 13
IL-10 – Interleucina - 10
IL-17 – Interleucina - 17
IL-21 – Interleucina - 21
IL-22 – Interleucina - 22
GM-CSF - Fator Estimulador de Colônias de Granulócitos e Macrófagos
TNF- – Fator de Necrose Tumoral alfa
TNF- − Fator de Necrose Tumoral beta
Th1 – Linfócito T helper 1
Th2 – Linfócito T helper 2
Th9 – Linfócito T helper 9
Th17 – Linfócito T helper 17
Th22 – Linfócito T helper 22
Tregs – Linfócito T regulatório
SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 18
1.1. Células T CD8+ ............................................................................................................................. 18
1.2. Células T CD8+ nas infecções fúngicas ................................................................................ 19
1.3. Células T CD8+ na paracoccidioidomicose .......................................................................... 20
2. OBJETIVOS ........................................................................................................................................... 23
2.1. Objetivo Geral ............................................................................................................................... 23
2.2. Objetivos Específicos ................................................................................................................. 23
3. DELINEAMENTO EXPERIMENTAL .................................................................................................. 24
4. MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................................................... 26
4.1. Casuística ...................................................................................................................................... 26
4.2. Cultivo das leveduras do fungo P. brasiliensis ................................................................... 26
4.3. Separação das células mononucleares do sangue periférico (CMSP) e obtenção do
plasma ........................................................................................................................................................ 26
4.4. Estimulação/ Expansão dos linfócitos obtidos das CMSP .............................................. 27
4.5. Purificação dos linfócitos T CD3+ ........................................................................................... 27
4.6. Purificação de monócitos CD14+ e diferenciação em células dendríticas (DC) ........ 28
4.7. Ensaio de cocultura .................................................................................................................... 28
4.8. Marcação Extracelular e Intracelular para análise por citometria de fluxo .................. 28
4.9. Dosagem das Citocinas por ELISA ......................................................................................... 30
5. ANÁLISE ESTATÍSTICA ..................................................................................................................... 31
6. RESULTADOS ....................................................................................................................................... 32
6.1. Avaliação das subpopulações de células T CD8+ em pacientes com PCM ................ 33
6.2. Avaliação da polarização de células T CD8+ de doadores saudáveis estimuladas com
DCs pulsadas com leveduras de P. brasiliensis ............................................................................. 36
7. DISCUSSÃO .......................................................................................................................................... 42
8. CONCLUSÃO ........................................................................................................................................ 46
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................. 47
10. ANEXO ................................................................................................................................................... 51
18
1. INTRODUÇÃO
1.1. Células T CD8+
Células T CD8+ contribuem para a resistência à patógenos intracelulares como vírus,
bactérias, protozoários e fungos por meio de dois mecanismos principais: citotoxicidade
direta de células infectadas, mediada pela liberação de granzimas e perforinas, e pelo
aumento da expressão de FasL (CD95L), indutor da apoptose através de sua ligação à
molécula Fas (CD95) na célula alvo (1).
As subpopulações de linfócitos T CD8+, em analogia com os linfócitos T CD4+,
podem ser classificadas em Tc1, Tc2, Tc10, Tc17, Tc21 e Tc22, de acordo com as citocinas
que produzem (2, 3). As células Tc1 são importantes na defesa contra vírus, tendo em vista
a sua capacidade de produzir IFN- e TNF-, e de exercer atividade citolítica contra células
infectadas. Além da participação na defesa contra alguns vírus, também atuam na resposta
imunológica em várias doenças autoimunes como artrite reumatoide, esclerose múltipla,
tireoidite de Hashimoto, diabetes mellitus, dentre outras (4-6).
As células Tc2, são caracterizadas por um perfil regulador, com produção de IL-4,
IL-5 e IL-13 e atividade citotóxica reduzida. A citocina IL-4 é importante para a diferenciação
desta subpopulação, assim como ocorre com as células Th2 (7). As células Tc10
apresentam atividade supressora e reguladora por meio da produção de IL-10. Além disso,
têm função citolítica especialmente em infecções virais (8, 9).
As células Tc17, ao contrário das células T CD8 clássicas, apresentam baixa
capacidade citotóxica e baixa expressão de grânulos citotóxicos (10). Entretanto, de forma
semelhante às células Th17, produzem IL-17, IL-21 e IL-22 e expressam o fator de
transcrição RORt (11), sendo diferenciadas na presença das citocinas IL-1β, IL-6, IL-23 e
TGF-β (3). Em contato com as citocinas produzidas pelas células Tc17, ocorre também a
diferenciação em células Tc21 e Tc22, produtoras de IL-21 e IL-22, respectivamente. Esse
conjunto de células exerce atividade na imunidade de mucosas e na produção de peptídeos
antimicrobianos (12, 13).
Assim, as células T CD8+ têm sido alvo de estudos em doenças inflamatórias sendo,
por exemplo, encontradas em grande número nas placas desmielinizadas presentes no
19
tecido cerebral de pacientes com esclerose múltipla. De fato, estudos mostraram a
presença de um número elevado de células Tc1 e Tc17 na fase de surto da doença,
confirmando a importância da citocina IL-17 na patogênese da esclerose múltipla. Por outro
lado, na fase de melhora, ocorre um aumento das células Tc21 em pacientes com a forma
remitente-recorrente (14).
Pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) possuem elevado
número de células T CD8+ circulantes e no escarro, principalmente na fase de exacerbação
aguda da doença (15, 16). Estudos mais detalhados mostraram haver um desequilíbrio no
número de células Tc1, Tc2 e Tc17 nestes pacientes, atribuído a falta de células Tc10 e ao
mau funcionamento das células Tregs CD8+ (CD8+FoxP3+) (15).
1.2. Células T CD8+ nas infecções fúngicas
A participação das células T CD8+ na resposta imunológica em infecções fúngicas,
especialmente das células produtoras de IL-17, foi demonstrada em modelo experimental
de pneumonia fúngica letal. Neste trabalho foi caracterizada uma população de células T
CD8+ (Tc17) indispensável para a imunidade protetora vacinal em camundongos
imunossuprimidos, proporcionando resistência contra Histoplasma capsulatum e
Blastomyces dermatitidis (17). De maneira oposta às células T CD4+IL17+, que apresentam
vida média curta, as células Tc17 distinguem-se por terem uma vida média mais longa, fato
que lhes confere um papel de potencial alvo para estratégias vacinais contra fungos em
indivíduos imunocomprometidos.
A presença de células Tc1 com função protetora foi demonstrada em camundongos
com pneumocistose (18). A produção de fatores citotóxicos e citocinas pró-inflamatórias por
células TCD8+, como IFN- e TNF-, também foi descrita como protetora na
coccidioidomicose (19, 20), assim como na histoplasmose, contribuindo para o clearance
de macrófagos infectados com H. capsulatum (21).
Além disso, alguns estudos tem demonstrado a participação das células T CD8+ na
produção de vacinas utilizadas em casos de infecções fúngicas invasivas em pacientes
imunossuprimidos (13). Os autores demonstraram que dependendo do tipo do candidato
vacinal utilizado, poderia ter a ativação de uma via das células T CD8+, sendo com uma
função citotóxica ou através da produção de citocinas. As subpopulações de células T CD8+
20
foram demonstradas em estudos envolvendo algumas infecções fúngicas como a
blastomicose, coccidioidomicose e a criptococose (17, 19, 20, 22, 23).
1.3. Células T CD8+ na paracoccidioidomicose
A paracoccidioidomicose (PCM) é uma micose sistêmica e endêmica na América
Latina, causada pelos fungos dimórficos Paracoccidioides brasiliensis e Paracoccidioides
lutzii (24). Esses fungos são normalmente encontrados em área rural, especialmente em
lavouras de café, atingindo assim profissionais que trabalham com manejo de solo, como
terraplenagem, preparo de solo, práticas de jardinagem e entre outros. Fatores de risco
como o tabagismo e o etilismo estão frequentemente associados à infecção pelo P.
brasiliensis e P. lutzii em pacientes adultos (24, 25).
Na natureza, o P. brasiliensis e P. lutzii são encontrados em sua forma filamentosa
produtora de propágulos infectantes, que podem ser inalados. Já no hospedeiro, essas
estruturas se transformam em leveduras que constituem as formas parasitárias. O primeiro
foco infeccioso é o pulmão, a partir do qual ocorre o acesso à circulação sanguínea podendo
ocorrer disseminação fúngica para outros órgãos, como linfonodos, baço, fígado e pele (26-
28)
A PCM pode se apresentar sob duas formas clínicas principais, a forma aguda (FA),
que afeta normalmente crianças e jovens adultos, com evolução rápida, linfonodomegalia
localizada ou generalizada, aumento de baço e fígado, acometimento osteoarticular e
raramente, envolvimento pulmonar. A forma crônica (FC) que atinge adultos com idade
geralmente superior a 25 anos, caracteriza-se pelo acometimento pulmonar e pela
presença de lesões em mucosa e pele, sendo uma forma mais branda da doença (29, 30).
Ambas as formas clínicas podem apresentar acometimento de apenas um (forma unifocal)
ou de vários órgãos e tecidos (forma multifocal).
Indivíduos que residem em zonas endêmicas para PCM, entram em contato com o
fungo, mas não desenvolvem doença, são caracterizados como portadores de PCM-
infecção (31). A imunopatologia desses indivíduos mostra um predomínio da resposta Th1,
importante para a ativação de macrófagos garantindo a resistência ao fungo (32). A forma
aguda, caracterizada por uma resposta do tipo Th2 e Th9, apresenta supressão da resposta
21
celular, ocasionando uma doença mais grave e disseminada (32, 33). Nestes pacientes é
comum o aumento do número de eosinófilos e altos títulos de anticorpos específicos, como
IgE e IgG4 (34, 35). Em contrapartida, a forma crônica da doença é caracterizada por um
resposta mais protetora, com presença de células do tipo Th1 e Th17, contribuindo para
uma doença mais branda (33).
As células T CD8+ também participam da resposta de defesa contra o P. brasiliensis.
No modelo de infecção pulmonar em camundongos demonstrou-se que a depleção seletiva
de células T CD8+ prejudica o clearance do fungo e aumenta a sua disseminação para
fígado e baço, contribuindo para a gravidade da doença (34). Em outro estudo os autores
verificaram que a carga fúngica nos pulmões é controlada primordialmente pelas células T
CD8, de forma independente da genética do hospedeiro, enquanto a produção de
anticorpos e as respostas de hipersensibilidade do tipo tardio são controladas por células T
CD4+ (43)
Estudos anteriores de nosso grupo confirmam os achados experimentais ao detectar
células T CD8+IFN-+ no sangue periférico de portadores de formas mais localizadas da
PCM, bem como em indivíduos com PCM-infecção, sugerindo um papel protetor para esta
população celular (32). Entretanto, pacientes portadores da doença em atividade
apresentam linfócitos T CD8+ pouco ativados e com baixa expressão de grânulos
citotóxicos, o que poderia impactar a capacidade fungicida e citotóxica (36). Análises
imunohistoquímicas de lesões de pele e de mucosa de pacientes com PCM mostram a
presença de infiltrados de células T CD8+ e células NK, associadas a granzima B, indicando
a participação da resposta citotóxica na defesa contra o fungo (37). Adicionalmente, células
T CD8+ são encontradas em número elevado no lavado broncoalveolar de pacientes com
a forma pulmonar da paracoccidioidomicose, estando associadas a quimiocinas
inflamatórias como MIP-1 (38).
Em pacientes portadores da PCM e coinfectados com o vírus da imunodeficiência
humana (HIV), os quais apresentam números extremamente baixos de células T CD4+, a
resposta efetiva ao tratamento antifúngico foi associada a presença de granulomas
compostos por células epiteliais, células gigantes, plasmócitos e linfócitos T CD8+ (39).
Recentemente, Loures e colaboradores (2015) mostraram que o P. brasiliensis é
capaz de induzir a diferenciação de células T CD4+ e T CD8+ produtoras de IL-17,
denominadas Th17 e Tc17, respectivamente (40), ambas apresentando um importante
22
papel na defesa contra o fungo (41). Em camundongos knockout para o receptor de -
glucanas (dectina-1) infectados pelo P. brasiliensis, verificou-se a expansão de células T
regulatórias e uma redução na diferenciação das células T produtoras de IL-17,
prejudicando a migração de células T CD8+IL-17+ e de polimorfonucleares para o tecido
infectado, resultando assim em uma doença mais grave. Estes achados associaram a
dectina-1 ao controle da resposta inata e adaptativa mediada por células TCD8+IL-17+ na
PCM pulmonar (42).
Tendo em vista a nova classificação das subpopulações de células T CD8+ de acordo
com as citocinas que produzem, o objetivo do nosso trabalho foi avaliar a frequência destas
células e de seus produtos na infecção fúngica causada pelo fungo P. brasiliensis.
23
2. OBJETIVOS
2.1. Objetivo Geral
Avaliar a participação das subpopulações de células T CD8+ em pacientes com
paracoccidioidomicose.
2.2. Objetivos Específicos
1. Avaliar a frequência das subpopulações de células T CD8+ no sangue periférico de
pacientes com FA e FC da PCM e comparar com doadores saudáveis.
2. Avaliar o perfil citotóxico das subpopulações de células T CD8+ a partir da análise da
expressão de granzima A, granzima B, granulisina e perforina.
3. Avaliar a polarização das subpopulações de células T CD8+ a partir de ensaio de
cocultura após estimulação com leveduras do fungo P. brasiliensis.
4. Avaliar a concentração de citocinas no sobrenadante do ensaio de cocultura e no plasma
de pacientes e comparar com doadores saudáveis.
24
3. DELINEAMENTO EXPERIMENTAL
25
Figura 1. Delineamento Experimental. Técnicas utilizadas para a caracterização das subpopulações de células T CD8+ no sangue periférico de
pacientes e de doadores saudáveis. (A) Metodologia utilizada para análise das subpopulações de células T CD8+ no sangue periférico de pacientes
com PCM. (B) Ensaio de cocultura utilizado para análise da polarização das células T CD8+ estimuladas com leveduras de P. brasiliensis.
26
4. MATERIAL E MÉTODOS
4.1. Casuística
Amostras de sangue periférico foram coletadas de pacientes com diferentes formas
clínicas da PCM, atendidos no Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas
(HC-UNICAMP). O grupo controle (n=12) foi constituído de doadores saudáveis, alunos e
familiares. Os pacientes com PCM (n=19), foram selecionados no ambulatório de Moléstias
Infecciosas do Hospital de Clínicas (Hospital Dia) e do Ambulatório de Pediatria da
UNICAMP. Foram utilizados como fatores de exclusão a presença de doenças
infecciosas/inflamatórias e/ou uso de medicamentos para o grupo controle, e a presença
de outras doenças infecciosas/inflamatórias para o grupo de pacientes. Cada indivíduo foi
informado sobre sua participação na pesquisa, assinando um termo de consentimento pós-
informação, de acordo com as normas estabelecidas pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
UNICAMP (CAAE: 68012716.9.0000.54041111110).
4.2. Cultivo das leveduras do fungo P. brasiliensis
Para experimentos in vitro, foi utilizada a cepa Pb18 de P. brasiliensis. As células
leveduriformes foram cultivadas em meio Fava-Netto à 37ºC, repicada semanalmente e
utilizada após 5 dias de cultivo. As células foram ressuspendidas em PBS e
homogeneizadas com pérolas de vidro para dissociação de grumo e consequente obtenção
de células individuais. A viabilidade das células do fungo foi avaliada utilizando o corante
azul de tripan, sendo utilizadas somente suspensões de leveduras com mais de 85% de
viabilidade.
4.3. Separação das células mononucleares do sangue periférico (CMSP) e obtenção do plasma
Para a obtenção das CMSP foram coletados 36 ml de sangue periférico em tubos de
heparina sódica, de um mesmo doador. Em um fluxo laminar, foram adicionados uma
solução de Ficoll-PaqueTM PLUS (d=1,077 g/mL - GE Healthcare, EUA) em tubos Falcon e,
em seguida foi colocado todo volume de sangue dos tubos coletados. Os tubos foram
27
centrifugados à 2133 rpm durante 30 min à 25ºC. Após a centrifugação, o plasma foi
estocado para dosagem das citocinas pela técnica de ELISA e o anel de células formado
por CMSP foi coletado e transferido para outro tubo. As células foram lavadas com RPMI
1640 por centrifugação a 300 x g durante 10 minutos a 4ºC para retirada do Ficoll. A
contagem das CMSP foi realizada em câmara de Neubauer.
4.4. Estimulação/ Expansão dos linfócitos obtidos das CMSP
Após contagem das CMSP, 2x106 células/mL foram plaqueadas em placa de 48
poços com meio RPMI 1640 suplementado com soro bovino fetal 10%, gentamicina 100
U/mL, L-glutamina 2mM e piruvato de sódio 1mM (todos da Sigma-Aldrich, EUA). As células
foram estimuladas com kit de expansão e ativação de células T (beads recobertas com
anticorpos anti-CD3, anti-CD2 e anti-CD28 - MACS Mylteni Biotec, Alemanha) durante 3
dias, de acordo com as recomendações do fabricante, em estufa de CO2 (5%) à 37ºC.
Após a expansão dos linfócitos, as células foram estimuladas com ionomicina ou
ionóforo de Cálcio (250ng/mL – Sigma, EUA), PMA (50ng/mL – Sigma, EUA) e brefeldina
A (1µg/mL – Sigma, EUA) durante 4 horas em estufa de CO2 (5%) à 37ºC. Em seguida,
foram marcadas com anticorpos específicos e analisados por citometria de fluxo.
4.5. Purificação dos linfócitos T CD3+
Para a purificação dos linfócitos T CD3+, as CMSP foram separadas por Ficoll como
descrito no item 4.4, no qual beads imunomagnéticas foram adicionadas à suspensão de
células, utilizando o sistema de seleção imunomagnética positiva MACs (CD3 MicroBeads
- Miltenyi Biotech, Alemanha) conforme instruções do fabricante. Os linfócitos foram
utilizados para o ensaio de cocultura, no qual foram plaqueados 5x106 células em placas
de 6 poços com RPMI 1640 suplementado e a citocina recombinante IL-2 (10 ng/mL,
Peprotech, Brasil) em estufa de CO2 (5%) à 37ºC durante 5 dias.
28
4.6. Purificação de monócitos CD14+ e diferenciação em células dendríticas (DC)
Monócitos CD14+ foram isolados a partir das CMSP por seleção positiva utilizando
beads imunomagnéticas (CD14 MicroBeads - Miltenyi Biotech, Alemanha), conforme
instruções do fabricante. Uma vez isolados, os monócitos foram distribuídos em placas de
6 poços e estimulados com citocinas recombinantes GM-CSF (50 ng/mL; Biolegend, São
Diego, EUA) e IL-4 (50 ng/mL; Peprotech, Ribeirão Preto, Brasil) em meio RPMI 1640
suplementado, por 5 dias em estufa de CO2 (5%) a 37ºC, com nova adição de citocinas
após 48h de cultura. Após este período, a diferenciação em células dendríticas foi
confirmada por citometria de fluxo (43).
4.7. Ensaio de cocultura
As DCs derivadas de monócitos foram estimuladas com leveduras de P. brasiliensis
na proporção 1:1, sendo 0,5 x 106 DCs para 0,5 x 106 leveduras do fungo, durante 2 horas
em estufa de CO2 (5%) a 37ºC.
Em seguida, as DCs foram cultivadas juntamente com linfócitos T CD3+ autólogos
na proporção 1 DC : 10 linfócitos durante 5 dias a 37ºC em estufa de CO2 (5%). Nas últimas
4 horas as células foram estimuladas com ionomicina ou ionóforo de cálcio (250ng/mL –
Sigma, EUA), PMA (50ng/mL – Sigma, EUA) e brefeldina A (1µg/mL – Sigma, EUA). Ao
final do período de incubação, os linfócitos foram marcados com os anticorpos específicos
(tabela 1) e analisados por citometria de fluxo.
4.8. Marcação Extracelular e Intracelular para análise por citometria de fluxo
Os linfócitos oriundos dos pacientes e dos doadores saudáveis, assim como aqueles
obtidos a partir do ensaio de cocultura foram ressuspendidos em solução de lavagem PBS-
BSA-A (PBS 1x – Soro Bovino Fetal 0,1% - Azida Sódica 0,2 mM). As células foram
adicionadas em uma placa de microtitulação, juntamente com um conjunto de anticorpos
para marcação extracelular anti-CD3-PE-Cy7 e CD8-PE-Cy5 (R&D e BD, EUA,
29
respectivamente) diluídas em PBS-BSA-A, conforme descrito na tabela 1. As células foram
incubadas durante 20 minutos a 4ºC no escuro.
Em seguida, as células foram lavadas com a solução de lavagem e centrifugadas a
300 x g durante 10 minutos a 4ºC, e o sobrenadante foi desprezado por inversão.
Posteriormente, para a fixação da marcação extracelular, foi adicionado 150µL de
formaldeído a 2% seguido de incubação a 4ºC por 20 minutos.
Em seguida foi iniciada a marcação intracelular. Para tal, a placa foi centrifugada a
300 x g durante 10 minutos a 4ºC, com posterior retirada do formaldeído e lavagem com
PBS-BSA-A. Em seguida, foram adicionados 120µL de tampão de permeabilização PBS-
S-BSA (PBS 1x – Soro Bovino Fetal 0,1% - saponina 0,5%) em cada cavidade e a placa
foi incubada durante 15 minutos à 4ºC no escuro. Após incubação e retirada do tampão de
permeabilização por centrifugação, o pellet foi ressuspendido seguido pela adição dos
anticorpos anti-IFN--PE, anti-granzima A-FITC e anti-perforina-PE da marca BD
Bioscience (EUA); anti-IL-4-PE (R&D system, EUA); anti-IL-10-PE, anti-IL-17-PE, anti-IL-
21-PE, anti-IL-22-PE, anti-granzima B-FITC da marca Biolegend (EUA) e anti-granulisina
(eBioscience, EUA) como descrito na Tabela 1, diluídos em tampão de permeabilização e
incubação durante 30 minutos a 4ºC.
Tabela 1. Painel de anticorpos utilizados para a caracterização das subpopulações de células T CD8+
por citometria de fluxo.
Subpopulação FITC PE PercP/ PE-Cy5 PE-Cy7
Tc1 IFN- CD8 CD3
Tc2 IL-4 CD8 CD3
Tc10 IL-10 CD8 CD3
Tc17 IL-17 CD8 CD3
Tc21 IL-21 CD8 CD3
Tc22 IL-22 CD8 CD3
Perfil Citotóxico Granz. A Granul. CD8 CD3
Granz. B Perforina CD8 CD3
Granz. – Granzima; Granul. – Granulisina
30
Em seguida, foram realizadas duas lavagens com tampão de permeabilização e
tampão de lavagem, respectivamente, e adicionado 200µL de formaldeído a 2% em cada
cavidade para fixação da marcação intracelular, sendo transferido para um tubo de
citometria de fluxo. A leitura foi realizada no equipamento FASCVerse (BD Bioscience –
EUA) e os resultados foram analisados pelo programa FlowJo, LLC, versão 10 (Ashland,
EUA). A determinação das subpopulações foi realizada conforme representado na figura 2.
Figura 2. Subpopulações de linfócitos T CD8+. Estratégia utilizada para análise das
subpopulações de células T CD8+. (A) Gráfico do tipo dot-plot evidencia o gate da população de
linfócitos com base no tamanho (FSC) e granulosidade (SCC); (B) A partir desse gate, foi gerado
outro dot-plot, no qual as populações de linfócitos foram separadas de acordo com a marcação para
anticorpos anti-CD3 e anti-CD8, sendo delimitada a população de linfócitos T CD8+ (CD3+CD8+);
(C) A partir do gate CD3+CD8+ foi determinada a porcentagem de células duplo positivas para a
citocina correspondente a cada subpopulação analisada.
4.9. Dosagem das Citocinas por ELISA
Os sobrenadantes das coculturas e os plasmas foram armazenados em freezer a -
20oC até o momento do uso. A dosagem das citocinas IL-10, IL-17, IL-22, IL-4, IFN- e TNF-
foi realizada pela técnica de ELISA, de acordo com as instruções do fabricante (Duo-Set,
R&D system e Biolegend – EUA).
A B C
31
5. ANÁLISE ESTATÍSTICA
A análise estatística foi realizada utilizando o programa GraphPad Prism versão 6
(São Diego, EUA). A distribuição das variáveis foi avaliada para normalidade, utilizando
o teste de Kolmogorov-Smirnov (KS test). Para a comparação de um mesmo parâmetro
em grupos diferentes foi utilizado o teste de Mann Whitney para 2 grupos e o teste de
Kruskal Wallis com pós teste de Dunn para 3 ou mais grupos. Para a avaliação de
diferentes condições para um mesmo grupo foi utilizado o teste de Wilcoxon para 2
grupos. Valores de p menor que 0,05 foram usados como critério de significância
estatística.
32
6. RESULTADOS
Em nosso estudo foram incluídos 31 indivíduos sendo 19 pacientes com PCM e 12
controles. Os pacientes com PCM foram separados em dois grupos de acordo com a forma
clínica da doença, sendo 9 com a FA e 10 com a FC. Todos os pacientes foram recrutados
no momento do diagnóstico, antes do início do tratamento. As características demográficas
e clínicas dos grupos estudados estão descritas na tabela 2.
O grupo com a FA incluiu crianças e adultos jovens com idade entre 3 e 26 anos,
enquanto adultos com idades entre 32 a 62 anos formaram o grupo FC. A relação
homem:mulher foi semelhante nos dois grupos, com aproximadamente o dobro de homens.
Em relação aos órgãos acometidos pela PCM, os pacientes com a FA apresentaram
uma forma mais grave da doença, com o envolvimento de linfonodos (principalmente
cervicais e mesentéricos), enquanto que os pacientes com a FC apresentaram uma forma
mais branda, com envolvimento pulmonar e de mucosas, e em alguns casos de linfonodos.
Tabela 2. Dados clínicos dos pacientes com paracoccidioidomicose
C FA FC
Indivíduos n 12 9 10
Idade (anos, média ± DP) 27,7 ± 6,2 15,11 ± 12,69 43,8 ± 13,14
Sexo (M/F) 3/9 6/3 7/3
Órgãos afetados n (%)
Linfonodos 0 8 (88,8) 2 (20)
Pulmão 0 2 (22,2) 8 (80)
Pele 0 2 (22,2) 9 (90)
Fígado 0 2 (22,2) 0 (0)
Baço 0 1 (11,1) 0 (0)
C: Controles; FA: Forma Aguda; FC: Forma Crônica; DP: Desvio Padrão; M: Masculino; F:
Feminino
33
6.1. Avaliação das subpopulações de células T CD8+ em pacientes com PCM
As subpopulações de células T CD8+ foram analisadas a partir do isolamento das
CMSP de pacientes com PCM e controles saudáveis.
Como observado na figura 3, tanto os pacientes com a FA como com a FC da PCM
apresentaram uma maior frequência de células T CD8+ produtoras de IFN- (Tc1)
comparados aos controles (Figura 3A). Diferenças também foram observadas em relação
a IL-10 com uma maior porcentagem de células positivas para esta citocina em pacientes
com a FA em relação a FC e controles (Figura 3C). Finalmente, observamos uma maior
frequência de células produtoras de IL-21 (Tc21) em pacientes portadores da FC em
relação aos controles (Figura 3E). Para as demais subpopulações não foram observadas
diferenças significativas entre os grupos.
34
F A F C C o n tro le
0
5
1 0
1 5
Cé
lula
s T
c1
% C
D3
+ C
D8
+ I
FN
-y+
p = 0 ,0 0 5
p = 0 ,0 3
F A F C C o n tro le
0
1
2
3
4
Cé
lula
s T
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D3
+ C
D8
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F A F C C o n tro le
0
1
2
3
Cé
lula
s T
c1
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D3
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+ I
L-1
0+
p = 0 ,0 4
F A F C C o n tro le
0
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Cé
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c1
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F A F C C o n tro le
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2
3
4
Cé
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D8
+ I
L-2
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p = 0 ,0 2
F A F C C o n tro le
0
1
2
3
Cé
lula
s T
c2
2
% C
D3
+ C
D8
+ I
L-2
2+
A B
C D
E F
Figura 3. Avaliação das subpopulações de células T CD8+ no sangue periférico de pacientes
com PCM. Frequência das subpopulações de células T CD8+produtoras de IFN- (A), IL-4 (B), IL-
10 (C), IL-17 (D), IL-21 (E) e IL-22 (F), em pacientes com a forma aguda (FA) e a forma crônica
(FC) da PCM e controles saudáveis (Controle). CMSP dos pacientes com diferentes formas clínicas
e controles foram isoladas, marcadas com anticorpos específicos para as diferentes populações de
linfócitos T CD8 e analisadas por citometria de fluxo. As barras horizontais representam a mediana.
Teste Kruskal-Wallis, com pós teste de Dunn.
35
Considerando que a principal função das células T CD8+ é a produção de grânulos
citotóxicos, avaliamos a frequência de células T CD8+ produtoras de granzima A, granzima
B, granulisina e perforina em pacientes com PCM e comparamos a doadores saudáveis.
Não foram observadas diferenças em relação a expressão de grânulos citotóxicos
nos grupos estudados (figura 4).
% C
D3
+ C
D8
+ G
ra
nz
. A
+
F A F C C o n tro le
0
5
1 0
1 5
2 0
2 5
% C
D3
+ C
D8
+ G
ra
nz
. B
+
F A F C C o n tro le
0
5
1 0
1 5
% C
D3
+ C
D8
+ G
ra
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l.+
F A F C C o n tro le
0
5
1 0
1 5
% C
D3
+ C
D8
+ P
erf.
+
F A F C C o n tro le
0
2
4
6
8
A B
C D
Figura 4. Avaliação da expressão de grânulos citotóxicos - Frequência de células T CD8+
produtoras de granzima A (A), granzima B (B), granulisina (C) e perforina (D) em pacientes com a
forma aguda (FA) e a forma crônica (FC) da PCM comparado com controles saudáveis (Controle).
CMSP dos pacientes com diferentes formas clínicas e controles foram isoladas, marcadas com
anticorpos específicos para linfócitos T CD8 e para grânulos e analisadas por citometria de fluxo.
As barras horizontais representam a mediana. Teste Kruskal-Wallis, com pós teste de Dunn.
36
6.2. Avaliação da polarização de células T CD8+ de doadores saudáveis estimuladas com DCs pulsadas com leveduras de P. brasiliensis
Os próximos experimentos tiveram por objetivo avaliar se leveduras de P. brasiliensis
eram capazes de induzir diferentes subpopulações de células T CD8+ in vitro. Para tal
células dendríticas de doadores saudáveis obtidas a partir de monócitos do sangue
periférico foram pulsadas com leveduras de P. brasiliensis e posteriormente cultivadas com
linfócitos autólogos. Os resultados mostraram que a presença do fungo levou a um
aumento significativo da frequência de células T CD8+ produtoras de IL-17 (Tc17) e IL-22
(Tc22) em relação às células não estimuladas (SE) (Figura 5D e 5F). Não foram observadas
diferenças significativas entre os grupos quanto as demais subpopulações (Figuras 5A, 5B,
5C e 5E).
37
Cé
lula
s T
c1
% C
D3
+ C
D8
+ I
FN
- +
S E P . b ra s ilie n s is
0
5
1 0
1 5
Cé
lula
s T
c2
% C
D3
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L-4
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S E P . b ra s ilie n s is
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1
2
3
4
Cé
lula
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0
% C
D3
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L-1
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S E P . b ra s ilie n s is
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1
2
3
Cé
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p = 0 ,0 4
Cé
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Cé
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D8
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S E P . b ra s ilie n s is
0
1
2
3
4
5p = 0 ,0 2
A B
C D
E F
Figura 5. Avaliação da polarização de subpopulações de células T CD8+ in vitro. Frequência
de células T CD8+ produtoras de IFN- (A), IL-4 (B), IL-10 (C), IL-17 (D), IL-21 (E) e IL-22 (F), após
cocultura na presença (P. brasiliensis) ou não (SE) de leveduras de P. brasiliensis. Células T CD3+
de doadores saudáveis foram separadas, cocultivadas com DCs previamente pulsadas com P.
brasiliensis e, posteriormente, avaliadas quanto a polarização para subpopulações de células T
CD8+ produtoras de citocinas por citometria de fluxo. As barras horizontais representam a mediana.
Teste Wilcoxon.
38
A partir do ensaio in vitro, coletamos o sobrenadante das culturas para a dosagem
de citocinas produzidas após a estimulação com o fungo P. brasiliensis.
Observamos um aumento significativo na produção da citocina IFN- (Figura 6A) nas
células estimuladas com fungo em comparação às células não estimuladas.
IFN
- (
pg
/ml)
S E P . b ra s ilie n s is
0
1 0 0 0
2 0 0 0
3 0 0 0
4 0 0 0 p = 0 ,0 3
IL-1
7A
(p
g/m
L)
S E P . b ra s ilie n s is
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2 0 0
4 0 0
6 0 0
8 0 0
1 0 0 0
IL-1
0 (
pg
/ml)
S E P . b ra s ilie n s is
0
5 0 0
1 0 0 0
1 5 0 0
IL-2
2 (
pg
/mL
)
S E P . b ra s ilie n s is
0
5 0 0
1 0 0 0
1 5 0 0
IL-4
(p
g/m
L)
S E P . b ra s ilie n s is
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2 0 0
4 0 0
6 0 0
8 0 0
TN
F-
(p
g/m
L)
S E P . b ra s ilie n s is
0
2 0 0
4 0 0
6 0 0
1 2 0 0
1 5 0 0
1 8 0 0
A B
C D
E F
Figura 6. Concentração de citocinas no sobrenadante das coculturas. Concentração das
citocinas IFN- (A), TNF- (B), IL-4 (C), IL-17 (D), IL-10 (E) e IL-22 (F) (pg/mL) no sobrenadante da
cultura de células T CD8+ estimuladas in vitro com DCs pulsadas (P. brasiliensis) ou não (SE)
com leveduras de P. brasiliensis. As barras horizontais representam a mediana. Células T CD3+ de
39
doadores saudáveis foram separadas, cocultivadas com DCs previamente pulsadas com P.
brasiliensis e, posteriormente, avaliadas quanto a produção de citocinas pela técnica de ELISA.
Teste de Wilcoxon.
O mesmo ensaio de cocultura foi utilizado para avaliar a expressão de grânulos
citotóxicos pelas células T CD8+ após estimulação com DCs pulsadas com P. brasiliensis.
Não foram observadas diferenças quanto a expressão de granzima A, granzima B,
granulisina e perforina por células estimuladas ou não com P. brasiliensis (Figura 7 A-D).
% C
D3
+ C
D8
+ G
ra
nz
. A
+
S E P . b ra s ilie n s is
0
2
4
6
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% C
D3
+ C
D8
+ G
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l.+
S E P . b ra s ilie n s is
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1
2
3
4
5
% C
D3
+ C
D8
+ G
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nz
. B
+
S E P . b ra s ilie n s is
0
5
1 0
1 5
% C
D3
+ C
D8
+ P
erfo
r.+
S E P . b ra s ilie n s is
0
2
4
6
8
A B
C D
Figura 7. Avaliação da expressão de grânulos citotóxicos. Frequência de células T CD8+
positivas para granzima A (A), granulisina (B), granzima B (C) e perforina (D) após cocultura na
presença (P. brasiliensis) ou não (SE) de leveduras de P. brasiliensis. Células T CD3+ de doadores
saudáveis foram separadas, cocultivadas com DCs previamente pulsadas com P. brasiliensis e,
posteriormente, avaliadas quanto a frequência de células T CD8+ positivas para grânulos
citotóxicos, por citometria de fluxo. As barras horizontais representam a mediana. Teste Wilcoxon.
40
Tendo em vista a disponibilidade do plasma quando realizamos a separação das
CMSP dos pacientes e indivíduos controle para os experimentos relatados nas Figuras 3 e
4, decidimos avaliar a concentração de citocinas.
Observamos uma maior concentração de TNF- e IL-10 (Figura 8B e 8C) em
pacientes com a FA em comparação com os controles e a FC. Por outro lado, pacientes
com FA apresentaram menores concentrações de IL-22 em relação ao grupo controle
(Figura 8F). Não foram detectadas diferenças significativas nas concentrações das demais
citocinas nos grupos avaliados (Figuras 8A, 8D, 8E).
41
IFN
- (
pg
/ml)
F A F C C o n tro le
0
5 0 0
1 0 0 0
1 5 0 0
TN
F-
(p
g/m
L)
F A F C C o n tro le
0
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1 0 0
1 5 0
5 0 0
1 0 0 0
1 5 0 0p = 0 ,0 0 8 4
p = 0 ,0 0 0 4
IL-1
0 (
pg
/ml)
F A F C C o n tro le
0
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1 0 0
1 5 0
2 0 0
4 0 0
6 0 0
8 0 0
1 0 0 0
p = 0 ,0 0 1 6
p = 0 ,0 0 0 9
IL-4
(p
g/m
L)
F A F C C o n tro le
0
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2 0 0 0
3 0 0 0
4 0 0 0
IL-1
7A
(p
g/m
L)
F A F C C o n tro le
0
1 0
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3 0
IL-2
2 (
pg
/mL
)
F A F C C o n tro le
0
2 0 0
4 0 0
6 0 0
8 0 0
1 0 0 0p = 0 ,0 0 0 5
A B
C D
E F
Figura 8. Concentração plasmática dos pacientes com PCM. Concentração plasmática de IFN-
(A), TNF- (B), IL-10 (C), IL-4 (D), IL-17 (E) e IL-22 (pg/mL) em pacientes com forma aguda (FA)
e forma crônica (FC) da PCM e controles saudáveis (Controle). Plasma de pacientes com PCM foi
utilizado para dosagem de citocinas pela técnica de ELISA. As barras horizontais representam a
mediana. Teste Kruskal-Wallis, com pós teste de Dunn.
42
7. DISCUSSÃO
Nosso trabalho teve como objetivo verificar a frequência de subpopulações de
linfócitos T CD8+ em pacientes com paracoccidioidomicose. Observamos uma maior
frequência da população Tc1 no sangue periférico de pacientes, tanto com a forma aguda
como com a forma crônica. Pacientes com a FA também apresentaram maior porcentagem
da população Tc10, enquanto que os com a FC apresentaram maior frequência da
população Tc21.
Estudos anteriores que avaliaram a resposta mediada por células T CD4+
caracterizaram a FA com um perfil supressor, com resposta mista Th2 e Th9 (33, 44). Do
ponto de vista das células T CD8+, os nossos achados indicam que um desequilíbrio entre
as subpopulações Tc1 e Tc10 poderia, de certa forma, impedir a ativação plena de
macrófagos pela citocina IFN-, evento crucial na resposta de defesa ao fungo.
A FA da PCM tem uma apresentação grave e disseminada, com acometimento de
linfonodos, fígado, baço e ossos (31, 33). Tendo em vista que a porcentagem de células T
CD4+ no sangue periférico é maior em relação às células T CD8+, podemos supor que a
atividade imunossupressora oriunda das células T CD4+ prevalece, reforçada pelo
desbalanço Tc1/Tc10, levando a um quadro clínico mais grave.
Por outro lado, nos pacientes com a FC da PCM verificamos que as células T CD8+
apresentam um perfil semelhante ao encontrado nas células T CD4+, com a presença de
células produtoras de IFN- (Tc1) e IL-21 (Tc21), característico de uma resposta pró-
inflamatória, fato esse que correlaciona com um quadro clínico mais brando da doença.
Células T CD8+ produtoras de IFN- e TNF- (Tc1) são cruciais para a ativação de
macrófagos, que resulta no clearance de fungos, e na produção de fatores citotóxicos, como
granzimas, granulisinas e perforinas (45). A IL-21 participa tanto na resposta imunológica
inata quanto adaptativa. Em associação com a IL-23, a IL-21 induz a diferenciação e a
manutenção de células Th17, com importante ação na resposta de defesa nas mucosas
(46).
As células T produtoras de IL-17 (Tc17/Th17) atuam na resposta de defesa contra
fungos por meio da ativação de neutrófilos (47). Porém, a ativação excessiva de neutrófilos
compromete a eliminação das células fúngicas e resulta em lesão tecidual (41, 48-51). Em
43
nosso estudo, observamos um aumento nas células Tc17, embora não significativo, em
pacientes com a FA da PCM, o que poderia estar relacionado com a atividade imunológica
pró-inflamatória na indução de neutrófilos para o controle da infecção. Em estudos prévios
de nosso grupo, verificamos uma predominância de células Th17 e Th1 nos pacientes com
a forma crônica da PCM. (33).
Em relação a expressão de moléculas citotóxicas não encontramos diferenças
significativas na frequência de células T CD8 positivas para granzima A, granzima B,
granulisina e perforina de pacientes com PCM e controles saudáveis.
Diferenças quanto a citotoxicidade também não foram observadas nos experimentos
in vitro, nos quais células de controles saudáveis foram estimuladas com leveduras de P.
brasiliensis. Estes achados estão de acordo com trabalho anterior de nosso grupo, no qual
verificamos que pacientes com PCM têm níveis basais de grânulos citotóxicos, o que
poderia estar associado a capacidade fungicida deficiente (36). Esses achados poderiam
indicar que na PCM as células T CD8+ atuam preferencialmente por meio da produção de
citocinas ao invés da produção de grânulos.
A análise das citocinas no plasma mostrou que pacientes com a FA da PCM
apresentam níveis circulantes mais elevados de TNF- e IL-10 em relação aos controles
saudáveis. Esses dados confirmam aqueles obtidos na análise da frequência das
subpopulações de células T CD8+ em pacientes com PCM, nos quais foi verificada uma
maior frequência das subpopulações Tc1 e Tc10, produtoras de IFN-/TNF- e IL-10,
respectivamente. Vale ressaltar que a detecção plasmática reflete a produção de citocinas
por vários tipos de células, não somente as células T CD8.
Além disso, observamos uma diminuição na concentração de IL-22 no plasma de
pacientes com a FC da PCM em relação ao grupo controle. Considerando que esta citocina
atua na imunidade de mucosas, a sua diminuição poderia contribuir para a maior
prevalência de lesões de pele e mucosas em pacientes com essa forma clínica (52, 53).
Em modelo experimental de infecção pulmonar aguda por Aspergillus fumigatus foi
demonstrado que a deficiência ou neutralização da IL-22 prejudica o clearance do fungo
(54). Os autores também verificaram que a falta de IL-22 resulta na produção diminuída de
citocinas inflamatórias e quimiocinas e é dependente de IL-7 e IL-21 (55, 56). Entretanto,
44
até o momento não há trabalhos relacionando essa citocina com a doença provocada pelo
P.brasiliensis, tanto experimental quanto humana.
Paralelamente aos ensaios em que utilizamos células de pacientes com PCM,
realizamos ensaios in vitro, onde avaliamos como a estimulação com leveduras de P.
brasiliensis poderia influenciar a polarização das subpopulações de células T CD8+.
Observamos que o fungo induz a polarização de subpopulações de células produtoras de
IL-17 (Tc17) e IL-22 (Tc22).
As células Tc1 e Tc17 contribuem de maneira essencial na resposta antifúngica por
meio da produção de citocinas, como IFN-, TNF-, IL-17 e GM-CSF, da ativação de
células da imunidade inata, e da produção de grânulos, especialmente perforinas,
granulisinas e granzima K, que atuam promovendo a apoptose de macrófagos infectados
com fungos (17, 21, 22). Com base nas análises realizadas, pudemos observar que em
contato com o fungo houve um aumento nas subpopulações de células T CD8+ produtoras
de IL-17 (Tc17) e IL-22 (Tc22). Em relação a subpopulação Tc1, também encontramos um
aumento da frequência na presença do fungo, embora os dados não tinham atingido
significância estatística.
Em relação as citocinas presentes no sobrenadante das coculturas, encontramos
uma maior produção de IFN- em células estimuladas com as leveduras de P. brasiliensis.
Essa citocina pró-inflamatória ativadora de macrófagos pode ser produzida por células T
CD4+ (Th1) e CD8+ (Tc1) e além de outras células do sistema imunológico. Também
verificamos a presença de concentrações mais elevadas de TNF- nos sobrenadantes de
células estimuladas pelo fungo, embora sem diferença estatística.
Níveis aumentados das citocinas IFN- e TNF- podem indicar que em contato com
o fungo há uma polarização para um perfil Th1/Tc1. Esse tipo de resposta, como já descrito
anteriormente, é capaz de ativar células da imunidade inata, como os macrófagos, que
auxiliam na eliminação do fungo.
Em conjunto os resultados obtidos indicam que na paracoccidioidomicose, a maior
contribuição das T CD8+ se dá no âmbito da produção de citocinas, com um perfil misto
Tc1/Tc10 na FA e Tc1/Tc21 na FC. Embora componham uma população minoritária em
relação às células T CD4+, as células T CD8+ com fenótipo Tc10 poderiam ter, juntamente
45
com as células Th2, uma participação na inibição da resposta celular observada nos
pacientes com a forma aguda da PCM. Por outro lado, o perfil Tc1/Tc21 também está de
acordo com o padrão predominante da resposta Th1/Th17 em pacientes com a forma
crônica da PCM, que representam mais de 90% dos casos da doença. Na mesma linha, os
ensaios in vitro evidenciaram que leveduras de P. brasiliensis são capazes de induzir a
polarização de subpopulações Tc17/Tc22.
Desta forma, podemos presumir que a disponibilidade de células T CD8+ capazes
de responder prontamente a estímulos antigênicos com a produção de citocinas contribui
para resposta mediada por células T CD4+, além de conferir ao hospedeiro um sistema de
defesa alternativo para situações de depleção ou incapacidade das células T CD4+ como
ocorre na AIDS e outros quadros de imunodeficiência.
46
8. CONCLUSÃO
Os resultados permitem concluir que na paracoccidioidomicose as subpopulações de
células T CD8+ comportam-se de maneira semelhante àquela previamente descrita para
células T CD4+. Este comportamento semelhante garante uma resposta de defesa
alternativo ao hospedeiro, inclusive em situações de depleção ou incapacidade das células
T CD4+, como ocorre na AIDS e em outros quadros de imunodeficiência.
47
9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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51
10. ANEXO
52
53
54
55
56