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Estava no meio de uma apresentação, teatro lotado, a platéia envolvida, o som da orquestra embalava os sonhos de todos que assistiam. No meio de muitos músicos, eis que surge uma voz fina, envolvente, belíssima, assim, entra em cena uma mulher, um sem- blante calmo, firme, concentrado. Seu vestido vermelho, com detalhes dourados, contrastava com a cor de sua pele. Pele muito branca, olhos grandes, castanhos da cor do mel, cabelos longos, dourados e cachea- dos. A proximidade com que me encontrava me permitia perceber em detalhes os traços de seu rosto. A beleza, tanto quanto sua voz encantava a todos. Era a magia dos espetácu- los, o romantismo dos teatros e a conveniência da noite. Em meio à grande emoção que envolvia todo o espetáculo, as mulheres soluçavam enquanto enxugavam as lágrimas dian- te da apresentação, e os homens, estes rendidos pela beleza da mulher olhavam-na sem esboçar nenhuma expressão que não fosse à admiração. A iluminação, o som, tudo era perfeito. Minha vida poderia ficar resumida somente aquele momento, me sentia feliz ali. A música entrava pelos meus ouvidos, invadia minha alma, preenchia meu coração. No espetáculo, aquela mulher de grande beleza, dava vida a uma personagem cha- mada Borgia Amaral, na história, se tratava de uma mulher de personalidade muito defini- da, a frente de seu tempo, protagonista de muitos romances em sua juventude, mas o dra- ma de sua vida atual era lutar contra a grande tristeza que fora perder seu marido na guer- ra. A personagem expressava grande sensibilidade em contar sua história através do canto. Quando as luzes se apagaram e as cortinas se fecharam, voltei para a vida real, e no final, a sensação que ficou foi uma grande curiosidade. Na vida real, ela ainda era uma completa desconhecida para mim, porém despertara um grande interesse em conhecer quem era a pessoa nos bastidores.

Bem, por fim chegou a hora, fui acompanhado até a porta ... · Talvés eu devesse mesmo ficar quieto e encarar aquela despedida como um verdadeiro ... quem seria à jovem que parecia

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Page 1: Bem, por fim chegou a hora, fui acompanhado até a porta ... · Talvés eu devesse mesmo ficar quieto e encarar aquela despedida como um verdadeiro ... quem seria à jovem que parecia

Estava no meio de uma apresentação, teatro lotado, a platéia envolvida, o som da orquestra embalava os sonhos de todos que assistiam. No meio de muitos músicos, eis que surge uma voz fina, envolvente, belíssima, assim, entra em cena uma mulher, um sem-blante calmo, firme, concentrado. Seu vestido vermelho, com detalhes dourados, contrastava com a cor de sua pele. Pele muito branca, olhos grandes, castanhos da cor do mel, cabelos longos, dourados e cachea-dos. A proximidade com que me encontrava me permitia perceber em detalhes os traços de seu rosto. A beleza, tanto quanto sua voz encantava a todos. Era a magia dos espetácu-los, o romantismo dos teatros e a conveniência da noite. Em meio à grande emoção que envolvia todo o espetáculo, as mulheres soluçavam enquanto enxugavam as lágrimas dian-te da apresentação, e os homens, estes rendidos pela beleza da mulher olhavam-na sem esboçar nenhuma expressão que não fosse à admiração. A iluminação, o som, tudo era perfeito. Minha vida poderia ficar resumida somente aquele momento, me sentia feliz ali. A música entrava pelos meus ouvidos, invadia minha alma, preenchia meu coração.

No espetáculo, aquela mulher de grande beleza, dava vida a uma personagem cha-mada Borgia Amaral, na história, se tratava de uma mulher de personalidade muito defini-da, a frente de seu tempo, protagonista de muitos romances em sua juventude, mas o dra-ma de sua vida atual era lutar contra a grande tristeza que fora perder seu marido na guer-ra. A personagem expressava grande sensibilidade em contar sua história através do canto. Quando as luzes se apagaram e as cortinas se fecharam, voltei para a vida real, e no final, a sensação que ficou foi uma grande curiosidade. Na vida real, ela ainda era uma completa desconhecida para mim, porém despertara um grande interesse em conhecer quem era a pessoa nos bastidores.

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Antes que houvesse o tumulto da saída encaminhei-me para o local onde seria pos-sível ter uma visão onde eu poderia encontrá-la, estava chegando aos bastidores. Pelo ca-minho havia muitas flores, um perfume muito agradável e alguns espelhos. Havia também muita gente, a agitação era grande, e então minha ansiedade havia se misturado com a curiosidade, comecei a perguntar às pessoas que eu encontrava pelo caminho sobre a mu-lher e, as mesmas, diziam que eu deveria seguir por esse corredor perfumado pelas flores, eu estava muito decidido naquela noite, e não pensava em nada, afinal o que havia de er-rado em querer conhecer a artista do espetáculo?

Queria conhecê-la, saber quem era, como se chamava... Então, eis que surge à ho-ra oportuna, encostado em uma das portas que dava acesso aos camarins estava um garo-to, parecia não ter pressa, observava a entrada e saída das pessoas, fui me aproximando com a intenção de obter informações mais precisas, depois de alguns minutos de conversa, sem muitos rodeios, descobri finalmente onde estava o que eu queria, ou melhor, quem eu procurava. Apenas dois números me davam a direção correta, 12 era o número que eu deveria procurar. Mais alguns passos e lá estava eu, em frente ao camarim 12. Sem nenhum medo, timidez, ou qualquer sentimento desse tipo, bati levemente na porta, sem obter nenhuma resposta tentei pela segunda vez, desta vez com um pouco mais de força e, finalmente pude ouvir o barulho das travas sendo rompidas e então a porta se abriu. Novamente eu estava diante dela, e naquele exato momento lembrei-me que não trazia nada nas mãos, não queria parecer indelicado. Respirei fundo, cumprimentei-a e, fui logo elogiando seu belo desempenho durante o espetáculo, pois o que eu não queria era ficar ali parado sem dizer uma palavra e correr o risco de passar por um inconveniente.

Ela com toda a simpatia, um sorriso meigo no rosto agradeceu pelos elogios que eu havia feito e convidou-me para entrar e acompanhá-la em uma taça de vinho. Ela servindo-me de uma taça, fomos até o terraço conferir o clima da noite que estava muito agradável, pude comprovar de perto o quanto sua beleza era real. Ela perguntou meu nome, depois de responder- lhe, descobri finalmente que aquela bela mulher se chamava Simone. Contei a ela sobre o “tamanho da curiosidade” que havia me levado até ali, e mais uma vez ela sorriu, nossa conversa seguiu em clima muito des-contraído, agradável até o último momento. Apesar de estar totalmente encantado, não ou-sei nenhum tipo de galanteio, mesmo porque esse tipo de atitude logo de início poderia estragar tudo. Eu sentia que Simone não era apenas mais uma num cenário de grandes talentos, era especial e muito amável. Sempre conduzira a conversa, não parecia do tipo que esperava que o homem conduzisse os assuntos, sempre tinha algo a dizer, algo inte-ressante, descrevendo um pouco de sua vida, suas experiências profissionais.

Foram alguns minutos de conversa, e para mim tinha sido um dos momentos mais envolventes até aqui. No final, nos despedimos com um singelo aperto de mão e enquanto eu olhava mais uma vez em seu rosto pensei que talvés aquele momento não fosse aconte-cer duas vezes. Ali, naquele instante tive pensamentos comparados a um adolescente no primeiro encontro, as perguntas iniciadas com “será” começaram a invadir minha mente. Será que eu deveria convidá-la para sair? Ou será que eu não deveria ser muito ousado a tal ponto?

Talvés eu devesse mesmo ficar quieto e encarar aquela despedida como um verdadeiro adeus.

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Bem, por fim chegou a hora, fui acompanhado até a porta, na saída disse até mais, ela me respondeu com a mesma frase acompanhada de um sorriso e agradecimentos pela visita. A noite continuava muito bonita, noite agradável de lua cheia, e eu preferi voltar para casa caminhando, não era tão longe assim. Fui apreciando o clima pelo caminho, os casais de namorados pelas praças, ouvia música animada, pessoas conversando, se divertindo, era possível caminhar com tranqüilidade até minha casa. Depois de alguns minutos, havia chegado ao meu lar doce lar. Eu dividia a casa com meu pequeno mascote, Luck, meu gato de estimação. Luck sabia de tudo, de todas as minhas aventuras, conhecia praticamente todas as namoradas que eu tinha, escutava minhas lamentações sempre que queria conversar com alguém. E é claro que também contei a ele sobre a minha ousadia em conhecer Simone, pena que não havia nenhum tipo de comentário por parte dele. Literalmente se Luck falasse eu estaria perdido.

Preparei um banho relaxante e depois fui deitar mais cedo do que de costume, meu pensamento ainda estava “preso” á ela, e ela parecia tão calma, ainda conseguia sentir o frescor de seu perfume. Em meio às lembranças adormeci. No dia seguinte, acordei de ótimo humor, decidi ir à praia, caminhar um pouco, sentir a brisa do mar, pegar um pouco de sol, olhar uma paisagem nova, aproveitar o fim de semana e minha liberdade como um homem solteiro. Voltei pra casa somente no final da tarde, e agora queria ficar sossegado na tranqüilidade do meu lar. Enquanto preparava uma comida rápida liguei a TV para acom-panhar algumas notícias e para minha surpresa, estavam comentando sobre o espetáculo da noite passada e comunicando que possivelmente nos meses seguintes, durante a

programação de eventos culturais da cidade teríamos apresentações de músicas clássicas, confesso que meus pensamentos foram longe. E uma das atrações era a cantora lírica Simone. Eu já sabia que teria que estar presente nesse evento, não restava dúvidas. Nada seria mais conveniente no momento. Iniciei minha semana como um ritual de costume, com o pé direito, sempre de bom humor, deixando qualquer preocupação em casa. Fui para o trabalho, um escritório de ad-vocacia no centro da cidade, onde dali fora possível construir a maioria dos meus bens, minha especialidade eram os direitos trabalhistas. Minha vida profissional sempre foi muito bem organizada, desde pequeno planejava uma vida assim, independente e dono das mi-nhas vontades.

Cedo, decidi que enfrentaria o mundo em busca de um espaço só meu, minha vida afetiva se limitou a muitos romances, muitas aventuras e nada de compromisso, mas de um tempo pra cá, vinha sentindo falta de algo, uma conversa no final de um dia de trabalho que não seja com meu gato de estimação. A possibilidade de ter uma pessoa ao lado para co-mentar algumas coisas, ter um pouco de carinho, dormir juntos sem pensar na desculpa que teria que dar para a pessoa em questão evitando qualquer envolvimento no dia seguin-te, deixar esse conceito de lado seria muito bom. E é sempre assim, no meio de tanto pen-sar e pensar que eu acabo me distraindo. Algumas pessoas que trabalhavam comigo tam-bém me diziam que seria bom um envolvimento mais sério, talvés eu estivesse ficando ve-lho.

Depois do fim do expediente, fui direto pra casa, em dia de semana levava meu tra-balho a sério, portanto nada de bebidas ou festas, deixava tudo para o fim de semana.

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A campainha toca, fico meio surpreso, pois não é de costume aparecer visitas no meio da semana, mas ainda durante a noite, quando abri a porta me deparei com uma jo-vem morena de olhos castanhos, cabelos cacheados, fui logo observando como seu sorriso era encantador, ela me disse um “boa noite” parecendo que me conhecia há anos e eu fi-quei no vazio esperando algum argumento que explicasse tão belo sorriso, e então ela diz: - Olá Lorenzo, tudo bem? Eu ainda atordoado pela situação, fiquei olhando em seus olhos buscando lembrar quem seria à jovem que parecia saber tanto de mim, e em poucos minutos para alivio meu, lembrei que, a aquela morena simpática era uma amiga da faculdade, e se chamava Flávia, afinal não nos víamos há anos e esse era o motivo da minha demora em lembrar, fiquei mais admirado ainda. Convidei-a para entrar, os assuntos não faltaram, e antes que tirem conclusões precipitadas, eu jamais havia tido algum envolvimento com ela que não fosse amizade.

Flávia era o tipo de colega conquista a todos com sua alegria e simpatia, além de ser muito inteligente. Fiz a ela uma série de perguntas, como por exemplo, como ela tinha me achado depois de tanto tempo, pensei que o tempo apagasse velhas lembranças, assim também como velhas amizades de faculdade. E então, ela contou-me que estava de volta a cidade por se tratar de assuntos familiares, tinha vindo visitar uma prima que se casaria em poucos dias. E já que eu costumava não me mudar com tanta freqüência não foi difícil me encontrar. Desejei um bom casamento à prima em questão e ela perguntou se eu já havia me casado, e eu disse que essa era a pergunta que não queria calar, então rimos juntos. Expliquei a ela minha atual situação, e então descobri que Flávia já havia se casado, mas, infelizmente o relacionamento não tinha dado certo, ela estava a quase um ano divor-

Ciada, não teve filhos, contou-me também que o casamento aconteceu muito rápido, num ímpeto de uma paixão ardente que por alguns anos pensou que duraria a vida toda. Mas a situação estava superada completamente, segundo ela. Conversamos bastante, sem preocupações com horas, mas, mesmo assim as horas pareci-am voar, não podia esquecer que ainda estávamos no meio da semana, e que eu precisava estar descansado para conduzir bem os assuntos de trabalho, mas mesmo assim, queria continuar a conversar com minha querida amiga. Disse a ela que a visitaria na noite seguin-te assim que me desocupasse do trabalho, ela concordou em dar uma volta comigo, pela praça, apreciando o clima agradável das noites na cidade.

- - Então meu amigo, está combinado, nos vemos amanhã à noite. Trocamos números de telefone e então nos despedimos, a casa da prima de Flávia não ficava tão longe da minha, na verdade, isso foi o que eu podia chamar de sorte, eu teria uma companhia para conversar por esses dias, estava gostando muito da idéia. Apesar de termos estudado juntos, Flávia ainda era bem mais jovem que eu, ela vinha de uma família que possuía bons poderes aquisitivos e como tal havia iniciado os estudos de advocacia muito cedo seguindo os passos da mãe. Mas apesar de boas condições era uma pessoa simples, de boa conversa e essa era uma das grandes qualidades que eu admirava.

No dia seguinte, iniciei normalmente com meu ritual de todas as manhãs, chegando ao trabalho cumprimentei a todos, e assim começamos mais um dia. No intervalo do almo-ço aproveitei para escutar um pouco de música enquanto estávamos relaxados nos delici-ando com um bom prato de comida caseira quentinha, não havia muitos assuntos, todos estavam quietos, até mesmo duas amigas que eram conhecidas por usar das palavras

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sem nenhuma economia. O dia havia sido calmo, ao contrário de alguns dias anteriores, mas estava tudo em ordem, eu ainda tinha no pensamento aquela bela mulher, Simone. Após o término do expediente, fui para casa, comprei um jantar, uma garrafa de vinho para abrir o apetite, depois me preparei para encontrar Flávia, fui até o endereço onde morava a sua prima, quando cheguei por lá, Flávia já estava a minha espera, pude conhecer um pou-co mais a prima que iria casar,a prima se chamava Cissa, não pude deixar de reparar que a casa era bonita e que a simpatia era de família. Então, saímos como combinado, fomos à praça, passeamos, olhamos as pessoas que passavam pra lá e cá enquanto se exercita-vam em suas caminhadas, alguns se divertiam na companhia dos amigos, outros eram os casais que pareciam estar muito apaixonados, as crianças que corriam uma atrás das ou-tras, sorridentes enquanto seus pais temiam alguns tombos.

Tomamos um sorvete, e fomos procurar um lugar bem tranqüilo para conversar. Contei a ela de como eu sentia falta de uma companhia, ultimamente eu não tinha compa-nhias tão boas assim, era a verdade. E assim foram minhas noites tendo a minha doce ami-ga ao meu lado, aquela solidão tinha me deixado por esses dias.Finalmente, o grande dia esperado por todos da família de Flávia havia chegado, era o dia do casamento de Cissa, a essas alturas eu já era convidado, a cerimônia do casamento aconteceria a partir das 17:30 hs, contando com o atraso de costume por parte da noiva, a cerimônia deu inicio as 20:00 horas, a noiva estava belíssima e o noivo bem apresentado, apenas uma palavra para des-crever toda a cerimônia era a emoção que estava estampada nos olhos da maioria.

Flávia também estava linda como madrinha de casamento, terminada a cerimônia os convi-dados foram encaminhados para onde seria o salão de recepções, por fim de tudo a festa

tinha sido bem planejada. Depois de esperar algumas horas, pude ter de volta a companhia de Flávia que estava muito feliz pelo casamento da prima. Bebemos, comemos, rimos mui-to um do outro, de nossas brincadeiras, e fomos dançar, por um instante senti algo diferen-te, me senti envolvido. Não estava nos meus planos, me envolver agora, mas realmente já era tarde para essa opinião, já estava envolvido e dessa vez era algo mais do que simples-mente amizade. Durante a dança, olhei pela primeira vez bem perto a seu rosto, seus olhos meigos, seus lábios macios e carnudos, sua pele morena. Fiquei sem jeito e sem palavras, e pela falta de palavras, aconteceu nosso primeiro beijo. Foi assim tão natural, e foi bom demais, jamais passou pela minha cabeça conquistá-la, na verdade eu jamais tinha essa intenção, mas isso não quer dizer que não estava contagiado pela felicidade do novo acon-tecimento. Nem ligamos para mais nada, no salão era apenas nós dois, não havia mais barulho que nos distraísse do carinho um do outro, não queria que aquele momento acabasse nunca mais. Flávia me beijava com tanto carinho que sem pensar duas vezes, me entreguei ao que sentia.

Ela não era mais aquela garotinha da faculdade, era uma mulher madura, decidida e não tinha porque temer nada, eu podia sentir na forma como me tocava que ela me queria com muito desejo e eu correspondia da mesma forma. A festa do casamento terminaria ao amanhecer, mas a nossa festa estava somente começando, e discretamente fomos sain-do, levei- a pra minha casa e, aquela havia sido uma noite cheia de novas descobertas, nos entregamos um ao outro, com muito desejo e bastante carinho.

Algumas horas depois, Flávia, havia adormecido ao meu lado na cama, eu já podia ver os raios do sol aos poucos entrando no quarto pelos espaços entre as persianas

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nas janelas, mas não havia pressa, e muito menos desculpas dessa vez. Não poderia ter conquistado companhia melhor, aproveitei-me do momento para continuar olhando seu cor-po enquanto dormia, mal podia acreditar no que via, e menos ainda no que sentia, até Luck havia se apaixonado por ela. Meus movimentos eram precisos ao me levantar da cama, não queria acordá-la, tomei um banho e desci, fui até a cozinha preparar um reforçado café da manhã, tinha certeza que ela acordaria com fome. Depois de alguns minutos, a mesa estava posta, eu pude escutar os passos dela descendo a escada, seu rosto denunciava uma noite muito boa, logo me abraçou, nos demos bom dia, e eu disse: - Imagino que esteja com fome, preparei um café da manhã reforçado, então fique a vonta-de e aproveite que hoje eu estou sendo cavalheiro heim! Ela riu;

Não havia nada programado para aquele domingo, pensei em assistir um filme em casa, na verdade, nem sabia direito o que eu pretendia depois do café. - Ah! Lorenzo seria uma boa idéia assistirmos um filme, podemos preparar algo para acom-panhar e pronto, fica tudo resolvido, o que acha? - Acho boa idéia, na verdade hoje nem tenho muita vontade de sair pelo menos por hora. Flávia disse: - Só vou passar na casa de Cissa mais tarde, o casal não estará por lá mesmo, imagino a bagunça que os outros primos estão fazendo por lá, então a melhor opção é ficar com o filme. Eu não queria mostrar a ela meus dotes culinários, ela podia se interessar, por alguns minutos eu esquecia que Flávia se tratava de uma amiga de longa data e que por isso co-nhecia um pouco mais de mim e sabia que eu não tinha problemas com a cozinha, na ver-dade, eram os velhos hábitos que me faziam querer esconder certas situações das mulhe-res com quem eu dormia, isso para não ter que dizer que, dormir juntos não significava es-tar namorando sério no dia seguinte, mas dessa vez, era diferente.

O dia seguiu da forma como havíamos planejado, ficamos em casa, preparamos nos-so almoço, eu comprei uns filmes e assim ficamos aproveitando a companhia um do outro, tudo tranqüilo, eu estava tão a vontade com a companhia de Flávia que aqueles velhos pensamentos nem passavam perto, nem importavam mais. Assim, depois do acontecimen-to do casamento, Flávia ainda ficou na cidade mais uma semana, depois teria que voltar para sua casa, para sua vida, sua realidade, que ainda era longe de mim. Flávia morava com os pais em outra cidade, que ficava longe de onde eu morava, a semana passou e, chegou o dia de sua partida, não queria demonstrar, mas eu estava ficando triste, pela pri-meira vez na vida eu estava à vontade na minha casa com uma mulher, foi uma semana inesquecível. Fui até a casa de Cissa buscar Flávia, eu fiz questão de levá-la ao aeroporto, e claro, Cissa e os primos foram juntos. Chegando a hora do embarque, e como sempre havia emoção na despedida, Cissa não conseguia conter as lágrimas, eu estava imensamente triste, mas nada podia fazer para que Flávia ficasse, prometemos não nos afastar tanto tempo de novo, continuaríamos a nos falar, essa foi a única proposta que achamos no momento, então, nos abraçamos mais uma vez, esse abraço transmitia muito sentimento e por isso ele foi forte, mais alguns minutos e ela se foi. Semanas depois, eu já um pouco mais recuperado com a falta que Flávia fazia em minha vida, tentava continuar com minha vida, sempre que podíamos ligávamos um para o outro, mas a distancia era real entre nós, não sabia o que esperar pela frente, só nos restava se-guir com nossas vidas. Numa noite enquanto chegava em casa, Luck veio ao meu encon-tro, e as conversas continuavam, pelo menos de minha parte, eu sempre falando do meu dia pra ele, falava do que eu sentia e até do que eu não sentia. Resolvi assistir um pouco de TV, esperaria mais alguns minutos e já iria dormir, estava cansado. De repente, um a-núncio me chamou a atenção, estava sendo divulgado na TV que na semana seguinte,

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seria a semana de artes na cidade, e teria apresentação de música clássica, logo veio a minha mente “SIMONE”. Com todos os acontecimentos da última semana eu havia esque-cido, fiz uma pequena revisão em minha agenda, confirmando se neste dia eu estaria livre para acompanhar o evento, para minha sorte eu estaria, tinha certeza que valeria a pena cada minuto. No dia seguinte, compraria os ingressos com antecipação. E enquanto comprava os ingres-sos, passou pela minha mente aquela noite em que fui até o camarim de Simone para co-nhecê-la, ocorreu-me que eu deveria ser um louco para ter tido tamanha ousadia, um pou-co mais e eu pediria o numero do telefone dela. Eu deveria ser louco mesmo, certamente uma mulher tão linda teria algum homem à espera em algum lugar. Bem, o fato é que eu já estava com um lugar garantido neste evento, e o coração ansioso para revê-la.

Passados alguns dias, chegara o inicio da semana de arte. Enquanto chegava no Teatro Municipal pude ver um numero considerável de pessoas ali presentes para acompanhar a semana de espetáculos, aquele cheirinho de pipoca no ar lembrou-me de Flávia, onde estaria ela naquele momento, resolvi não entrar no Teatro logo que cheguei, ali em frente tinha uma pracinha muito agradável, fiquei por ali mesmo, ob-servando as pessoas que chegavam e outras que só esperavam como eu. A noite estava muito estrelada, eu sempre ia a esses eventos sozinho, não que eu reclamasse, mas às vezes fazia falta uma pessoa para comentar sobre alguma coisa, compartilhar uma opinião.

Já haviam se passado quinze minutos, agora era hora de entrar, eu adorava ir ao Teatro, sentia logo na entrada que era tomado pela sensação de bem estar, subindo as escadarias é como se estivesse entrando em mundo diferente, muito diferente da realidade, onde nossos sonhos ganhavam vida, nossas emoções falavam por nós, nos dominavam por completo.

As luzes aos poucos foram se apagando, as pessoas já acomodadas em seus lugares, o silêncio era pleno, ao fundo ecoando devagar, era possível ouvir um som de violino muito suavemente, as cortinas foram se abrindo, os músicos estavam posicionados prontos para mostrar ao público como é mágico o dom da música, que chega a ser divino, tantos talentos reunidos fazia com que as pessoas da platéia ficassem quase inertes, pois todos queriam prestigiar cada momento, e assim o foi. O espetáculo estava lindo como sempre, já havia se passado meia hora desde o inicio e nada de Simone, eu realmente estava curioso, será que ela apareceria nesta primeira noite?

Felizmente o ingresso valeria pelas três noites que os eventos aconteceriam. O espetáculo da primeira noite terminara com uma voz masculina que dominara todo o ambiente, com toda a sua desenvoltura e poder de dramatização, no fim todos o aplaudiram. Infelizmente naquela noite, eu voltaria para casa sem ter a visão daquela bela mulher de pele tão clara, mas não estava decepcionado, isso era importante. Na noite seguinte, a segunda noite de eventos, havia mais pessoas esperando a hora de começar, dessa vez eu cheguei e fui logo entrando, queria ficar aguardando no meu lugar, estava pensativo e até um pouco cansado, e estar ali era ótimo para me ajudar a relaxar, então, mais alguns instantes e o espetáculo começou, as cortinas foram se abrindo e eu pude escutar uma voz feminina, devia ser ela, a ansiedade tomava conta de mim, quando as cortinas se abriram eu pude ter a visão que esperava, finalmente era Simone, encanta-doramente linda, dessa vez ela trajava um vestido negro, aveludado, com adornos que bri-lhavam dando mais beleza a cada movimento, seus cabelos estavam levemente presos, usava uma tiara que a deixava como uma verdadeira rainha, e a sua pele, já havia esqueci-do de como era branca , a maquiagem sempre valorizando o olhos redondos que possuía,

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sem falar nos lábios, que aparentavam ser tão macios e perfeitos que mais pareciam dese-nhados.

Sem nenhuma dúvida, quando Simone se apresentava era unanime como ela conseguia prender a atenção de todos, tanto pelo seu talento quanto pela sua beleza. Não me distraia um minuto sequer, fora uma hora de espetáculo e pareciam apenas alguns minutos, apesar de cansado estava feliz, me sentia confortado com a apresentação. Ao final, todos a aplau-diram de pé, Simone transmitia muito bem toda a emoção na hora de cantar e dramatizar o tema do espetáculo, parecia nascer com aquele dom, a emoção era tão verdadeira que era possível notar algumas lágrimas rolando sutilmente pelo seu rosto.

Então, as cortinas se fecharam, as luzes se apagaram , era hora de voltar pra casa. Hoje não era aquela noite em que eu estava cheio de coragem para procurá-la novamente, ainda achava que eu tinha sido ousado até demais da ultima vez em que a vi, dessa vez o melhor a fazer era voltar pra casa. Enquanto esperava diminuir o alvoroço da saída, perma-neci sentado, afinal ninguém me aguardava contando as horas em casa. Quando o alvoroço passou, levantei-me e fui caminhando para saída do Teatro. Enquanto descia as escadarias, escutei de longe uma voz pequena chamando pelo meu nome;

-Senhor, Lorenzo! Senhor Lorenzo! Virei-me surpreso, pois era aquele garoto que havia me passado a informação sobre o ca-marim em que Simone estava, mais surpreso ainda eu fiquei quando o garoto aproximou-se de mim e entregou –me um bilhete em nome dela. Não sabia o que pensar, e então o garo-to disse; Leia Senhor, ela aguarda por uma resposta.

Então abri o bilhete e pude comprovar que se tratava mesmo de um bilhete enviado pela própria Simone. Céus! Estava completamente sem ação, jamais imaginaria algo do tipo,

nem nos melhores sonhos imaginei que uma coisa dessas acontecesse comigo, no bilhete estava escrito o seguinte:

Senhor Lorenzo, como vai? Durante a apresentação eu pude notar sua presença no meio da platéia, e gosta-ria de lhe dizer que nosso último encontro fui muito agradável, gostei de sua pos-tura, fiquei feliz com sua atitude de vir até meu camarim para me conhecer, e fica-ria feliz se pudesse aceitar meu convite para tomarmos uma boa taça de vinho daqui a dez minutos. Se aceitar meu convite, me espere em frente à porta de saí-da do Teatro na parte posterior. De qualquer modo, mande a resposta pelo garo-to. Um abraço.

Simone Em primeiro momento eu estava surpreso, agora eu estava literalmente nervoso. Mas já que tinha que responder, disse que sim, e o garoto saiu com uma velocidade tama-nha. Tantas coisas se passaram em minha mente, coisas do tipo como ela me enxergaria em meio a tantas pessoas! Será que realmente o último encontro havia sido especial a tal ponto de fazê-la não esquecer de mim! Enfim, era melhor eu ir para o local combinado, não podia correr o risco de perder a chance de vê-la mais de perto.

Em poucos minutos, saindo do estacionamento do Teatro, pára perto de mim, um carro preto, a porta se abre e o motorista me convida a entrar, e imediatamente eu entro. Após entrar, olho para trás e lá está ela, me olhando de uma forma muito terna, aproximou- se de mim, tocou-me o ombro e agradeceu por eu ter aceitado o convite. Dali mais alguns minutos e estaríamos no local desejado. Um apartamento de luxo no centro da cida-de,quando entramos no apartamento, reparei na quantidade de flores que enfeitavam o local, a meia luz dava um clima tranqüilo e quase romântico, mas não sabia o que esperar,

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ela lançava sobre mim um olhar que parecia querer me contar muito mais do que eu esperava. Então, ela colocou uma música, e enquanto pegava as taças e a garrafa do vi-nho, me perguntou:

E então, como você está? Já faz um tempinho da última vez que conversamos. Hoje quero saber um pouco mais sobre você, sobre o que faz.

Então eu respondi tentando mostrar-me mais calmo do que realmente eu estava. -Estou bem, porém bastante surpreso com a situação, ou melhor, com seu convite. Então ela riu e continuou a perguntar: - Me conte como foi seu dia. - E eu com poucas palavras tentei resumir: -Meu dia foi cansativo, mas nada que pudesse me impedir de estar em sua compa-

nhia. Contei a ela um pouco mais sobre mim, sobre meu trabalho como ela havia pedido.

Ela nos serviu com um pouco de vinho e fomos para a sacada, de lá era melhor para sentir a brisa da noite, depois de alguns goles de vinho, posso dizer que aquela ousadia tinha voltado e talvés fosse o momento de tentar. Ela usava um vestido preto de tecido leve, to-mara que caia, um colar que realçava em seu pescoço, possuía uma altivez suave e natural em sua postura, ela estava sempre muito cheirosa.

Então disse a ela que queria saber quem era Simone como mulher, em que situação afetiva ela se encontrava, dei a ela liberdade para me perguntar o mesmo, e foi assim que inicia-mos mais um noite de conversas.

- Sou uma mulher como qualquer outra, de carne e osso, eu sempre me dediquei ao meu trabalho que é uma coisa que adoro fazer, adoro cantar, ser reconhecida pelo talento

pelo trabalho, mas não consigo viver um relacionamento amoroso com ninguém, pois a car-reira me exige bastante e por isso sigo minha vida sem fixar raízes. Mas, digo a você que sou feliz, um pouco solitária ao mesmo tempo, mas sou feliz ao meu modo. E agora, você já descobriu todo o meu segredo, espero que não vá correndo contar para os jornais, - ri-mos juntos. Desde o primeiro momento eu sentia algo naquele olhar, mas não imaginei que fosse soli-dão. Eu disse a ela: - Eu também vivo algo parecido, depois de muitos anos, não consegui manter um relaciona-mento com ninguém, minha vida é um pouco solitária no que se refere a relacionamentos amorosos, mas procuro não pensar muito nessa questão e talvés você devesse fazer o mesmo. Não me contive em perguntar: - O que levou você a confiar em mim para levar uma conversa tão particular? Então ela respondeu: - Vi em você algo diferente, sua postura, parece ser um homem discreto e eu gosto disso. Meu trabalho não me permite certas liberdades, preciso ter um olhar mais atento na hora de escolher. Diante das palavras dela eu já fiquei convencido. -Então quer dizer que essa noite eu sou o escolhido? Depois de minha pergunta ela deu uma gargalhada muito gostosa. - É claro que sim, e sinta-se privilegiado. O clima entre nós estava muito bom, eu queria beijá-la, mas não sabia se seria à hora cer-ta, então eu preferi comentar, talvés fosse melhor, e foi o que fiz. - Tenho uma vontade enorme de beijar você agora, será que eu posso? E ela respondeu:

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- Pensei que você não fosse perguntar, na realidade eu só estava esperando. E foi assim que pela primeira vez nos beijamos.

A noite estava sendo muito especial, eu estava completamente envolvido pelos en-cantos de Simone. De repente o olhar doce deu lugar a um olhar fortemente sedutor, uma mulher cheia de desejos, no seu toque havia muito calor, sua pele me seduzia a cada ins-tante. Eu ainda sentado no sofá com a taça de vinho na mão ganhei mais um beijo, um bei-jo ardente, e aos poucos ela veio se aproximando, muito levemente sentou-se no meu colo, de frente para mim, olhando-me bem dentro dos olhos, e tornou a beijar-me. Tentei ser um bom homem até onde eu pude, mas no fim de tudo, acabamos transformando a noite em uma noite acalorada, ambos cheios de desejos. Naquela noite entreguei-me po­­r inteiro aquela mulher, deixara todo o domínio sobre mim nas mãos dela...

Horas depois, despertei com os raios do sol refletindo no meu rosto por entre os vi-dros das janelas, os raios batiam direto no meu rosto, passei a mão pela cama, macia e fria, Simone não estava mais ao meu lado. Tive aquela sensação de quando eu acordava com uma mulher e de imediato procurava uma desculpa para dar a ela para que nada fosse além de uma noite. Talvés agora eu fosse a vitima. Não queria ter aquela experiência.

Levantei-me ainda despido, olhei em volta procurando alguma pista que me indicas-se o paradeiro dela, e nada, a verdade é que eu ainda estava bastante atordoado com tudo que tinha acontecido, e agora Simone não estava ali comigo.

Só havia uma coisa a fazer, tomar um banho, vestir as roupas e sair. Então comecei a ficar triste, as velhas perguntas de sempre, será que eu tinha feito algo errado na noite anterior? Ou será mesmo que eu tinha sido apenas uma diversão em mais uma noite solitá-ria?

Tentei não pensar em mais nada, pois só estava piorando. Enquanto caminhava pelo apartamento em direção a porta de saída, passei pela sala de estar e parei em frente a uma mesa, reparei em um pedaço de papel que me chamou atenção:

Era um bilhete que dizia: Caro Lorenzo, adorei a noite, você foi ótimo, mas enquanto você dor-

mia tive que seguir meu caminho, você dormia tão tranquilamente que não quis acordá-lo. Quando você estiver lendo este bilhete eu já estarei seguin-do para outra cidade, por favor, não pense nada de mais sobre a minha partida, pense apenas que minha vida é assim, vou aonde a música me levar. Junto com este bilhete deixo para você um cd com a faixa de abertu-ra do espetáculo que nos encontramos pela primeira vez, quero que escute com muito carinho e lembre-se que não esquecerei de você. É para você também esta rosa, veja como um agradecimento por me fazer tão bem. Um beijo muito carinhoso.

Simone E assim, eu voltei para minha casa, com o coração desolado, ainda sentia o perfume

dela em minha pele, em minha roupa. Sentia-me vazio, meio perdido, sem rumo. Ainda era cedo, não tinha vontade de comer nem beber nada. Eu estava estarrecido,

sem saber como me comportar diante do abandono que acabara de experimentar. Eu sei, sou adulto, mas isso não me impede de sentir o que estou sentindo agora. Simone tivera sobre mim uma “força” que me envolvera completamente e me fazia esquecer de todos aqueles conceitos de homem boêmio aos quais eu vivi durante muito tempo.

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Sem ânimo para nada, preferi ficar em casa. Não tinha vontade de conversar com ninguém, talvés eu estivesse me comportando como um adolescente, talvés não fosse o encanto feminino que me dominava quando estava diante de Simone, e sim a sua forma de vida, seu jeito todo particular, uma mulher do mundo, sem apegos amorosos. Olhando para ela, eu conseguia me ver, mais jovens, minha ambição pela conquista e jamais em ser con-quistado.

Definitivamente eu estava ficando velho, sentia no meu íntimo que não tinha mais clima para continuar me portando como um Dom Ruan, acabara de ser conquistado e a-bandonado por uma bela mulher, estava magoado. A semana que se seguiu não foi nada boa, nunca havia me sentido tão sozinho. Estava vivendo de lembranças, me sentia muito afetado pelos últimos acontecimentos.

O inverno tinha chegado, as chuvas eram intensas, então não tinha saído mais, so-mente do trabalho pra casa, durante as noites eu ficava na varanda, com uma xícara de chocolate quente na mão, olhando a chuva e esperando que o sono chegasse para cair na cama e no dia seguinte começar tudo de novo, e assim foi durante duas semanas.

Durante umas das noites chuvosas, eu já estava deitado, quase chegando no sono dos justos, quando escutei o barulho do meu celular tocando, vi um número desconhecido, mesmo assim decidi atender, do outro lado uma voz feminina:

-Lorenzo, será que eu te acordei? Se te acordei peço desculpas, mas se for possível vou tirá-lo da cama por algumas horas, posso?

Para meu espanto, era Flávia, poderia imaginar tantas coisas, menos que Flávia me ligaria a essa hora.

- Claro que sim, na verdade que bom que você ligou, estava mesmo precisando ouvir sua voz.

Flávia disse: - Estou no aeroporto, venha me buscar, está tão frio aqui. Nem podia imaginar que ela estaria de volta à cidade. -Por que você não me ligou avisando que viria? Eu já estaria aí com você. -Oh! Lorenzo, você parece ter esquecido que eu adorava fazer surpresas para você, queria saber se ainda funcionaria, acho que deu certo não foi? Então eu sorri, sentia uma alegria muito sutil crescer dentro do peito novamente e disse: - Já estou saindo para lhe buscar, jamais seria capaz de deixá-la no frio, deixei de ser per-verso há muito tempo, hoje eu sou um homem bom. Rimos juntos e desliguei o telefone, peguei o carro e fui buscá-la.

Em poucos minutos estava no aeroporto, entrei no estacionamento e não a vi logo de imediato, então parei em frente ao portão principal, peguei o celular e liguei para ela, mas antes que completasse a ligação, eu vi saindo pelo portão, à jovem morena, de estatura mediana, aparentando realmente muito frio, baixei o vidro do carro, e a chamei. Depois que ela entrou no carro nos abraçamos calorosamente. Então seguimos para casa. Durante a noite, enquanto Flávia dormia, minha mente trabalhava. Estava pensando em tirar uns dias de folga, precisava cuidar mais de mim. Me permitir viver algo mais intenso, afinal, Flávia era uma pessoa que valia a pena correr o risco.

Depois que ela partiu após o casamento de sua prima, Cissa, nos falamos umas du-as vezes pelo telefone, a distância às vezes é a grande vilã dos relacionamentos, mas Flá-via havia adivinhado seu tempo certo, não poderia ser melhor. Então, pela manhã fui ao trabalho para resolver sobre o meu tempo de folga, e como havia pensado na noite anterior assim o fiz.

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Quando cheguei em casa, pude sentir o cheirinho de comida, a casa estava arrumada e perfumada, achei diferente, mas gostei. Fui recepcionado por ela com alegria, com a mes-ma alegria que conquistava a todos, com um belo sorriso no rosto. Flávia era uma mulher simples, e batalhadora, não se apoiava em conceitos de grandeza, o que fazia dela uma grande mulher. Depois de muitos beijos, perguntei a ela sobre os dias que passaria comigo, o trabalho , o que acontecera afina. - Eu simplesmente vim curtir as minhas férias, esse é o lado bom da vida quando se traba-lha muito o reconhecimento de que se precisa de umas férias, e então, aqui estou eu, e se você não gostou meu bem, acho bom ser franco comigo, por que caso não esteja satisfeito eu saio num piscar de olhos. -Eu para não ficar por baixo disse-lhe: -Ainda continua muito abusada, mas não tenho pressa, bastam alguns dias e esse quadro vai mudar, me aguarde viu! Ela sorriu e eu tomei-a nos braços e a beijei.

Os dias pareciam leves e mais ensolarados. Uma simples passada ao supermercado esta-va sendo bem mais interessante, durante as manhãs aproveitávamos o dia em casa, lá pe-las cinco da tarde íamos caminhar pelo calçadão, olhando a praia que não ficava tão longe de casa, afinal, esse era um dos motivos para eu não me mudar daquela casa, que era tão cômoda, e perto de tudo. O cair da tarde, e o inicio da noite a beira da praia era maravilho-so, Flávia estava adorando Quando estávamos na faculdade, sempre que o clima era ten-so, devido as dificuldades apresentadas em provas pelos nossos mestres, Flávia caminha-va para os fundos da Faculdade, lá tinha um rio, então ela ficava sentada horas e horas, olhando para esse rio, concentrada em seus pensamentos e assim, quando ela sumia nos

intervalos entre uma aula e outra, era sempre neste lugar que a encontrávamos.

Depois do segundo dia que Flávia estava em minha casa, ela decidiu ir visitar a pri-ma recém casada, pela parte da tarde, chegamos até a casa de Cissa, ela estava sozinha, o marido ainda estava no trabalho, tomamos um chá enquanto conversávamos, e ela esta-va radiante. Ela reparou que estávamos juntos, e gostou da idéia, mas Flávia reforçou a frase de que ainda estávamos em fase de descobertas, e que estava sendo muito bom. Ela nos con-vidou para o jantar, olhei para Flávia e concordamos que ficaria para uma próxima vez, a visita foi bem agradável, e quando já estávamos nos despedindo, Bruno, o marido de Cissa, chegou.Trocamos algumas palavras, ele também sempre muito simpático, insistiu que fi-cássemos para o jantar, mas eu e Flávia reforçamos nossa posição, que marcaríamos em uma outra ocasião um jantar, e então saímos. Duas semanas já haviam se passado e, eu e Flávia ainda estávamos juntos, já está-vamos mais do que acostumados com a presença um do outro, Flávia tinha bom gosto mu-sical então mostrei a ela o cd que havia ganhado de Simone, e ela apreciou a música, mas nada contei sobre aquela noite. As noites ainda continuavam bastante frias, mas agora eu não sentava mais na varanda, durante a noite, com uma xícara de chocolate quente na mão olhando a chuva, e pensando no grande vazio que havia se tornado minha vida, final-mente eu sentia que tudo isso tinha ficado no passado. Na manhã seguinte acordei com uma mensagem no celular, Flávia também dormia tranqui-lamente ao meu lado, depois que li a mensagem, nem pensei mais em voltar a dormir, pois assim dizia a mensagem:

Meu querido Lorenzo, Estou retornando para sua cidade,não esqueci de você. Simone

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Naquele momento olhei para o lado, e meus olhos ficaram “presos” a Flávia, de re-pente, me senti em um imenso tabuleiro, como se estivesse sendo transformado em uma peça de um grande jogo, a minha vida. A única coisa que conseguia pensar é que Flávia não poderia jamais saber da mensagem e muito menos do que acontecera nestes dias de ausência.

A razão me dizia para responder a mensagem, mostrando que todo o encanto que ela tinha sobre mim havia se acabado e dessa forma, colocaria um ponto final a toda histó-ria. Mas, por outro lado, não conseguia enganar a mim mesmo, Simone mexia comigo, ti-nha algo naquela mulher que me fazia mudar, não era somente a beleza física, havia algo muito forte que me atraia como se fosse um grande imã. Aquela noite não tinha se apagado pra mim, ainda era forte, e ainda lembrava do quanto fiquei machucado com sua partida.. Aquela mensagem e todas aquelas palavras começavam a “martelar” em minha mente.

Resolvi apagar a mensagem, seria melhor assim, evitaria o risco de Flávia descobrir, e deixaria tudo quieto. Era melhor esquecer.

Naquela manhã Flávia acordou-se muito disposta, e enquanto chegava na cozinha e eu lia o jornal e tomava meu café, ela dizia:

- Já que estamos de férias então vamos fazer diferente hoje, quero sair agora pela manhã, aproveitar um pouco o sol, tomar uma água de coco na beira da praia, depois pas-sear entre as lojas, olhar as vitrines, fazer umas compras básicas, e então, vamos amor?

Eu olhando por cima do óculo, pensei um pouco e respondi:

- Tirando a parte de fazer umas compras básicas eu gostei, por que as mulheres gostam tanto de lojas heim?! Na verdade mulher só muda de endereço, mas o gosto em consumir e consumir ainda é o mesmo em qualquer lugar.

Flávia me olhou com aquele olhar de ironia e não deixou por menos foi logo devol-vendo o trocadilho dizendo:

-E vocês homens sempre reclamando das compras básicas das mulheres, mas a verdade é que vocês adoram quando damos o toque feminino quando vocês não sabem resolver certas coisas não é meu bem?

Eu preferi ficar quieto, ainda queria continuar com minha postura de homem bonzi-nho. Apenas dei um meio sorriso, daqueles que se mexe somente um lado dos lábios pra tentar mostrar o que parecia ser um sorriso. Mas terminei dizendo o trivial:

- O que você não me pede que eu não faça minha morena? Então naquela manhã fizemos tudo como foi o combinado, fomos à praia, tomamos

água de coco, passeamos pela beira da praia, aproveitamos a manhã ensolarada, pois os dias eram chuvosos e no final terminamos olhando mesmo as vitrines que ela tanto queria, até que essa parte não estava sendo tão chata como imaginei que seria, estávamos indo bem. Depois de comprar algumas coisinhas básicas como ela mesma dizia, ela quis ir a uma praçinha mais próxima, então aproveitei que estávamos perto de uma praça muito a-gradável, e que, aliás, ficava em frente ao Teatro.

Flávia não conhecia essa parte da cidade, então aproveitei para contar-lhe algumas algumas histórias sobre a cidade, sobre o Teatro que, infelizmente naquele horário estava fechado, mas quem sabe talvés marcássemos uma noite para olhá-lo por dentro, tinha cer-teza que Flávia ficaria encantada com a toda aquela beleza.

Continua...