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BES e BCP foramos mais lesadosno caso da burladas farmáciasinvestigação Compra de 30 estabe-lecimentos por Nuno Guerreiro é jáum dos maiores esquemas do sec-tor. Só aos bancos a dívida é supe-rior a 50 milhões. ATUAL págs. 2 E 3
BES e BCP mais aietadospor burla de farmáciasMedicamentos. Aquela que é considerada a maior burla do sector ascende a 85 milhõesde euros, mais de 50 milhões dos quais a bancos. Os restantes credores são distribuidorasde medicamentos que já pediram processos de insolvência a metade das cercade 30 farmácias de Nuno Guerreiro, que é um dos quatro constituídos arguidos esta semana
ANA MAIA e SÔNIA SIMÕES
O BES e o BCP foram lesados emmais de 51 milhões de euros só pormetade das farmácias de NunoGuerreiro, o homem constituídoarguido esta semana por ser o ale-
gado dono de cerca de 30 farmá-cias - a maior parte em processode insolvência. Segundo o Sindi-cato Nacional dos Profissionais deFarmácia e Paramédicos (SIFAP)esta é a maior burla alguma vezdescoberta no sector.
De acordo com fontes próximasdo processo, em 16 das 30 farmá-cias que Nuno Guerreiro terá ad-quirido em nome de outras pes-soas e que geria através de procu-rações, estão por cobrar 85milhões de euros. "Sem dúvida é amaior fraude do setor das farmá-cias. É inconcebível e uma confu-são tremenda", diz DiamantinoElias, presidente do SIFAP
Entre os principais credores es-tão o BCP, BES, outros bancos e
distribuidoras como a Udifar (le-sada em 16 milhões) e a AllianceHealthcare SA (em 18 milhões de
euros), cujos armazéns no Porto e
em Lisboa também foram alvos debusca. Suspeita-se que NunoGuerreiro teria a conivência de umelemento da Alliance, tambémconstituído arguido e já afastado.Contactados pelo DN, o BCP disse
que o assunto estava "sob sigilobancário". O BES não respondeuaté ao fecho da edição.
Destas 16 farmácias a serem ge-ridas por administradores de in-solvência, duas estão a ser explo-radas pelos proprietários originais- as farmácias Brito, em Olhão, e aPinheiro, em Loulé -, que assina-ram um contrato de compra e
venda com "testas de ferro" de Nu-no Guerreiro, e que não foi cum-prido. "Na farmácia Brito, quando
foi feito o contrato, havia um pas-sivo de 600 mil euros, após a ges-tão de Guerreiro há uma dívida de
5,5 milhões", disse uma fonte aoDN. "Aqui foram encontradas fa-turas de produtos que nunca che-
garam a entrar ali", acrescenta.As restantes 14 farmácias inte-
gram o "Grupo Progresso", de Bru-no Lourenço, através de contratosde cessão de exploração. "Assina-do o contrato, quem explora a far-mácia não é responsável por dívi-das anteriores", esclarece a fonte,adiantando que todas elas estãoem processos de insolvência - amaior parte pedidos pelas distri-buidoras Udifar e pela Alliance.
Os agora gestores das farmácias
já reuniram com os credores como objetivo de tentar negociar o
perdão de parte da dívida. A ideiaé manterem o negócio a funcio-nar, pagarem uma parte do passi-vo aos gestores de insolvência sob
a contrapartida de que ficam comdireito de preferência sob a farmá-cia. "É uma forma de os credoresreaverem o dinheiro", diz fonte do
Grupo Progresso.Algumas farmácias compradas
por Nuno Guerreiro em nome deoutros empresários acabaram porquebrar o contrato mal as dívidas
começaram a chegar. Foi o caso dafarmácia Almeida, em Rio Maior,nas mãos de Bárbara. "A farmáciade Rio Maior, ainda com NunoGuerreiro à frente, recebeu umafatura para pagar referente a umaobra de arte", exemplificou ao DNDiamantino Elias.
Segundo o dirigente sindical,"Bruno Lourenço apresentava-senas farmácias como sendo admi-nistrador, mas nuncamostrou ne-nhuma prova disso nem procura-ções. Recusou-se sempre a assu-mir as dívidas", denuncia. BrunoLourenço, pela voz de uma fontepróxima, defende-se. "Somos um
grupo de amigos que temos váriasfarmácias e ajudamo-nos uns aosoutros" (ver texto secundário).
Diamantino Elias diz, no entan-to, que foram aparecendo empre-sas com "nomes estranhos". É o ca-so da Astros Parados, a empresaque gere a farmácia de Queijas -alvo de busca da PJ - cujo sócio-
gerente é Eduardo Viegas, que porsua vez é sócio-gerente da Cross-
bridge - a empresa de Bruno Lou-
renço que funciona como arma-zém do Grupo Progresso, tambémvisitado pela PJ.
Segundo a lei da propriedadedas farmácias, "nenhuma pessoasingular ou sociedade comercialpode deter ou exercer, em simul-tâneo, direta ou indiretamente, a
propriedade, a exploração ou a
gestão de mais de quatro farmá-cias" (ver caixa).
O sindicato adianta que o Infar-med chegou a ser informado de al-
gumas situações. "Mas soubemos
que a PJ estava a investigar e espe-ramos pelos resultados." No anopassado a Autoridade Nacional doMedicamento aplicou multas, quepodem ascender ao meio milhãode euros, a 34 farmácias e distri-buidores por exportação ilegal demedicamentos.
Suspeita-se que Nuno Guerrei-ro poderá estar envolvido em algosemelhante e será este um dos
pontos da investigação. Algumasdas farmácias recebiam enco-mendas que não eram ali vendi-das e que muitas vezes não chega-vam a entrar no stock. "Há farmá-cias que não se percebe comoforam compradas porque não ti-nham o perfil, nem os valores queforam pagos pelas mesmas quan-do tinham uma faturação tão pe-quena", refere fonte próxima do
processo, que acredita haver inte-resse de mais alguém.
PERFIS
NUNO GUERREIRO> 45 anos, licenciado emFarmácia, vive em Oeiras> Filho de uma farmacêutica,terá aberto 30 farmácias,usando nomes de outras pes-soas. É casado com AnaAlexandre Pintor (de dupla na-cionalidade portuguesa e an-golana) que dá nome à empre-sa "Alguer" - antes em nomedos sogros de Nuno. A sededesta empresa é a mesma deuma das suas farmácias, emCastro Marim, alvo da PJ. Umavez, em conversa com um fun-cionário de uma farmácia,disse ter comprado doisMercedes iguais, por engano. APJ apreendeu-lhe um Porsche,um Lamborghini e um iate. 0DN telefonou-lhe para dois nú-
meros, nunca atendeu.
BRUNO LOURENÇO> 35 anos, mestre em Economiada Saúde, Licenciado emFarmácia
> Começou por trabalhar aobalcão da farmácia do pai, emBenf ica, até ficar com ela e
comprar uma outra na Graça,em Lisboa. É ainda dono do
complexo farmacêuticoGuerra Junqueira e a mulher,Carla Lourenço, proprietáriade outra farmácia. Há algunsanos decidiu criar um grupo(ver texto), a que chamou"Progresso", para unir váriasfarmácias e conseguir medica-mentos mais baratos. Travouconhecimento com NunoGuerreiro em setembro passa-do por intermédio de uma dis-tribuidora quando este estavaem dificuldades financeiras.
PROPRIEDADE
Lei impede maisde quatro espaços> A alteração ao regime legalem vigor desde os anos 60 doséculo XX foi levada a cabo
pelo então ministro da SaúdeCorreia de Campos, em 2007."Esta reforma modifica umregime jurídico desadequadoe limitador do acesso à pro-priedade", lê-se no prefácio.Assim, a Lei 307/2007, de 31de agosto, veio alargar a pro-priedade das farmácias a ou-tras pessoas que não só far-macêuticos. No entanto, seantes era permitida apenasuma farmácia por farmacêu-tico, hoje qualquer um (à ex-ceção de profissões incompa-tíveis, como médicos)podeter até quatro farmácias.
0 ESQUEMA
Como Nuno Guerreiro teráconstruído um império
> Farmacêutico usava esquema de en-comendas e devoluções e atrasos nos
pagamentos para ter dinheiro em caixae comprar mais farmácias. Contornavaa lei usando nomes de outras pessoas.
1Compra> Através das farmácias das quais
era proprietário, Nuno Guerreiro
fazia notas de encomenda à AUiance
Helathcare de medicamentos que vendia
nas farmácias. Beneficiaria de prazos alar-
gados de pagamento, que chegariam aos
dez meses, e que Lhe permitiam manter na
caixa o vaLor dos remédios vendidos.
2 Exportação> ParaLeLamente, fazia encomendas
de medicamentos mais apetecíveis
para exportação a outros fornecedores,
como a Udifar. 0 processo passava porfazer pedidos em pequenas quantidadesatravés de todas as farmácias, para passardespercebido e no final juntar todas as en-
comendas.
3 Devoluções> Esses medicamentos eram então
entregues à AUiance como se fosse
uma devoLução, fazendo esta uma nota de
crédito a farmácia. VaLor esse que permitia
pagar uma parte do vaLor em atraso aos
distribuidores e ao mesmo tempo engros-sar o dinheiro disponível com o quaL avan-
çaria para a compra de outra farmácia.
4 Créditos aos bancos
> Eram feitos créditos com os ban-
cos. As garantias dadas seriam as
farmácias anteriormente adquiridas. O es-
quema terá sido repLicado até chegar às
30. Como a Lei permite apenas quatro pordono, nas restantes eram apresentadosnomes de outros proprietários que seriam
testas de ferro de Nuno Guerreiro.
5 Fim do fornecimento> Apercebendo-se de que Nuno
Guerreiro estava associado a várias
farmácias e que os atrasos nos pagamen-tos eram cada vez maiores, a ALliance sus-
pendeu o fornecimento. A Udifar passou a
vender medicamentos com o objetivo de
recuperar parte da dívida anterior, masacabou por parar com o fornecimento.
6 Novo grupo> Foi em setembro de 2011 queNuno Guerreiro foi apresentado a
Bruno Lourenço, quando faLhou a comprade uma farmácia no ALgarve e este último
assumiu a gestão. O contacto terá sido
promovido pela Udifar, que esperava desta
forma que parte da dívida pudesse ser re-
cuperada, o que não aconteceu.
7 Insolvência
> A cada pedido de insoLvência feito
pelas distribuidoras, estas eramconfrontadas com a mudança de respon-sável. Parte das farmácias que antes eram
geridas por Nuno Guerreiro passaram a
ser geridas por Bruno Lourenço ou por
pessoas associadas ao Grupo ProgressoSaúde.
Em Almada até paracetamol faltoualmada fórum Uma das far-mácias adquirida por NunoGuerreiro chegou a ficarsem remédios. Mas haviaencomendas de milhares
Abriu em 2002 com um alvará defamília de 1934, mas a farmácia"Castro Rodrigues", no Almada Fó-rum, esteve longe de ter uma ges-tão de sucesso. Facto que levou a
proprietária, Catarina G., a vendê-la a Nuno Guerreiro, por interpos-ta pessoa. As encomendas atin-giam os milhares de euros, masnas prateleiras chegou a faltar omais básico: paracetamol. Hojeesta é uma das farmácias que es-
capou à busca da PJ e está nasmãos de um administrador de in-solvência, integrada no GrupoProgresso, de Bruno Lourenço.
Segundo fonte farmacêutica,Catarina G. terá criado uma socie-dade para exploração da farmáciaapós o divórcio, aproveitando o al-vará da farmácia da avó, em Alma-da. Apesar de terem chegado a fa-turar 1 00 mil euros num dia, a ren-da de mais de dez mil euros e as
dívidas a fornecedores levaram aproprietária a aceitar, em 2008, aproposta de Nuno Guerreiro, queconhecera na faculdade: um con-trato de compra e venda.
De acordo com a certidão per-manente da empresa de CatarinaG., a que o DN teve acesso, foi poresta altura que Catarina saiu doconcelho de Administração paradar lugar a Luís N. e à mulher. Cu-riosamente, Luís N. é dono da em-presa "Gel-Expresso", em socieda-de com a mãe de Nuno Guerreiro .
Este seria um dos seus "testas deferro", enquanto o nome da mãeterá sido levado para estas empre-sas sem o seu conhecimento (amãe tem estado muito abaladacom a descoberta do processo) .
Com a entrada de Nuno Guer-reiro, diz a mesma fonte ao DN,começaram a haver milhares deeuros em encomendas destinadasa outras farmácias deste empresá-rio, nomeadamente a farmáciaCentral, de Queijas (alvo de buscada PJ) . Chegou ao ponto de "a far-mácia colocar na montra que "pormotivos técnicos não tinha deter-minados medicamentos, nem se-
quer havia paracetamol", denun-ciou a fonte.
As dívidas de Guerreiro em to-das as farmácias que adquiriunum esquema em espiral come-çaram a acumular, as distribuido-ras deixaram de conceder créditose não houve dinheiro para subsí-dios deferias.
Em Outubro, Nuno Guerreiroapresenta Bruno Lourenço a Cata-rina G. (que permaneceu na far-mácia e hoje está de baixa psiquiá-trica sem ter recebido o valor totalda compra) , que põe um homemda sua confiança a gerir a farmá-cia. Em Fevereiro último, a distri-buidora Alliance Healthcare pedea insolvência da empresa proprie-tária da "Castro Rodrigues" e da"Higiénica" no Barreiro.
Desde então, o Grupo Progres-so paga 4% sobre as vendas ao ges-tor de insolvência e tenta negociarcom os credores parte do perdãoda dívida. Os funcionários que játrabalhavam com Catarina, desde
2002, mantiveram-se, apenas comalgumas saídas pontuais. Mas re-cusaram baixas salariais.
gestão Sistema permitecomprar medicamentos a
preços mais baixos. 16 far-mácias estiveram ligadasa Nuno Guerreiro
O "Grupo Progresso Saúde" nas-ceu há seis anos. Fundado porBruno Lourenço em parceria comvários amigos, a maioria farma-cêuticos e gestores, funciona co-mo uma espécie de marca que dáa todas as farmácias associadas amesma imagem. O grupo funcio-na igualmente como uma centralde compras, que negoceia com oslaboratórios e os grossistas a com-pra de medicamentos e outrosprodutos para todas as farmácias,conseguindo preços mais baixosdo que conseguiriam individual-mente.
O grupo começou com no-ve farmácias associadas - quatrodas quais propriedade de Bru-no Lourenço (Imperial, Benfica,Tagus Park e Graça) -, tendo nes-te momento 23. Destas, 16 esti-veram associadas a Nuno Guer-reiro. Algumas sua proprieda-de, outras através de procurações.Todas terão pedidos de insolvên-cia feitos pelas distribuidoras
Alliance Healthcare e Udifar.De acordo com fonte próxima
de Bruno Lourenço, "duas das 16farmácias estão a ser geridas pelosproprietários, enquanto que asrestantes são-no através de con-tratos de cessão de exploração",que funcionam como uma espé-cie de aluguer. Tal como acontececom a propriedade, em que cadapessoa pode ter apenas quatro far-mácias, a mesma regra é aplicadanos contratos de exploração.
A lógica do grupo será seme-lhante à de uma empresa, emboranão esteja constituída como tal."Cada pessoa tem a seu cargo umafunção, como a comunicação, as
compras..." adianta fonte do gru-po, permitindo por isso que umapessoa possa pagar ordenados,mesmo não sendo nem proprietá-ria nem exploradora do espaço. Oscontratos de cessão de exploração,na sua maioria feitos a partir deoutubro do ano passado, "têm va-lidade de dez anos". Implicam o
pagamento de renda aos proprie-tários ou gestores de insolvência,nos casos em que os processos jáavançaram em tribunal, de 4% so-bre as vendas. No final dos dezanos há direito de preferência pelacompra.
23 associadas noGrupo Progresso Saúde
INVESTIGAÇÃO
PJ sem provas paraarguidos irem ao juiz
> A investigação já durava háalguns meses, mas a opera-ção levada a cabo terça-feiraem vários locais do País ser-viu para procurar mais provae acabou apenas com quatroarguidos entre os oito suspei-tos visados e nenhum detido."Ainda é tudo muito embrio-nário", disse fonte daUnidade Nacional deCombate à Corrupção, queconta com a colaboração daAutoridade Tributária por es-tarem em causa crimes de
falsificação de documentos,burla qualificada, fraude fis-cal qualificada, branquea-mento de capitais e associa-
ção criminosa.