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ANO 3 Nº 62 • 20 DE OUTUBRO DE 2017 ISSN 2446-7014 ESCOLA DE GUERRA NAVAL SUPERINTENDÊNCIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO NÚCLEO DE AVALIAÇÃO DA CONJUNTURA O Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal do Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC),vinculado à Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação (SPP) da Escola de Guerra Naval (EGN). O NAC possui o objetivo de acompanhar a Conjuntura Internacional sob o olhar teórico da Geopolítica, a fim de ampliar o conhecimento por meio da elaboração deste boletim, além de outros produtos que porventura venham a ser demandados pelo Estado-Maior da Armada. O Boletim tem como finalidade a publicação de artigos compactos tratando de assuntos da atualidade sobre as dez macrorregiões do globo, a saber: América do Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica, ademais, algumas edições contam com a seção “Temas Especiais”. O grupo de pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas do conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências proporciona uma análise ampla da conjuntura e dos problemas correntes internacionais. Assim, procura-se identificar os elementos agravantes, motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises em andamento, bem como, seus desdobramentos. NORMAS DE PUBLICAÇÃO Para publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do NAC e submeta seu artigo contendo, no máximo, 350 palavras ao processo avaliativo por pares. Os textos contidos nesse Boletim são de Responsabilidade única dos autores. Não retratando a opnião oficial da EGN ou da Marinha do Brasil. CORRESPONDÊNCIA Escola de Guerra Naval – Superintendência de Pesquisa e Pós- Graduação. Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Janeiro/RJ - Brasil TEL.: (21) 2546-9394 | E-mail: [email protected] Os textos do BOLETIM GEOCORRENTE poderão ser encontrados na home page da publicação: <https://www.egn.mar.mil.br/boletimgeocorrente.php> BOLETIM GEOCORRENTE

BOLETIM - asociacioncolegiosdefensaiberoamericanos.org · escalada de conflitos e crises em andamento, bem como, seus desdobramentos. NORMAS DE PUBLICAÇÃO Para publicar nesse Boletim,

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ANO 3 • Nº 62 • 20 DE OUTUBRO DE 2017

ISSN 2446-7014

ESCOLA DE GUERRA NAVALSUPERINTENDÊNCIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

NÚCLEO DE AVALIAÇÃO DA CONJUNTURA

O Boletim Geocorrente é uma publicação quinzenal do Núcleo de Avaliação da Conjuntura (NAC),vinculado à Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação (SPP) da Escola de Guerra Naval (EGN). O NAC possui o objetivo de acompanhar a Conjuntura Internacional sob o olhar teórico da Geopolítica, a fim de ampliar o conhecimento por meio da elaboração deste boletim, além de outros produtos que porventura venham a ser demandados pelo Estado-Maior da Armada.O Boletim tem como finalidade a publicação de artigos compactos tratando de assuntos da atualidade sobre as dez macrorregiões do globo, a saber: América do Sul; América do Norte e Central; África Subsaariana; Oriente Médio e Norte da África; Europa; Rússia e ex-URSS; Sul da Ásia; Leste Asiático; Sudeste Asiático e Oceania; Ártico e Antártica, ademais, algumas edições contam com a seção “Temas Especiais”.O grupo de pesquisa ligado ao Boletim conta com integrantes de diversas áreas do conhecimento, cuja pluralidade de formações e experiências proporciona uma análise ampla da conjuntura e dos problemas correntes internacionais. Assim, procura-se identificar os elementos agravantes, motivadores e contribuintes para a escalada de conflitos e crises em andamento, bem como, seus desdobramentos.

NORMAS DE PUBLICAÇÃOPara publicar nesse Boletim, faz-se necessário que o autor seja pesquisador do Grupo de Geopolítica Corrente, do NAC e submeta seu artigo contendo, no máximo, 350 palavras ao processo avaliativo por pares.

Os textos contidos nesse Boletim são de Responsabilidade única dos autores. Não retratando a opnião oficial da EGN ou da Marinha do Brasil.

CORRESPONDÊNCIAEscola de Guerra Naval – Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação. Av. Pasteur, 480 - Praia Vermelha – Urca - CEP 22290-255 - Rio de Janeiro/RJ - Brasil TEL.: (21) 2546-9394 | E-mail: [email protected]

Os textos do BOLETIM GEOCORRENTE poderão ser encontrados na home page da publicação:<https://www.egn.mar.mil.br/boletimgeocorrente.php>

BOLETIMGEOCORRENTE

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Os Mapuches e a questão securitária na Patagônia.....................................................Pág. 3Uruguai e China: o que está por trás da aproximação estratégica................................Pág. 3

O NAFTA e a Iniciativa Merida.......................................................................................Pág. 4

Merkel e Macron conseguirão relançar a União Europeia?............................................Pág. 5A promessa britânica de projeção de poder global.........................................................Pág. 5

‘Friendship 2017’ e a relação Rússia-Paquistão...........................................................Pág. 7

China e Coreia do Norte: fim da paciência?...................................................................Pág. 8Taiwan “observará de perto” a visita de Trump à China.................................................Pág. 8

Paquistão, Arábia Saudita e o tabuleiro geopolítico do Sul da Ásia...............................Pág. 8

As capacidades da JMSDF e sua importância geopolítica............................................Pág. 9

Reunião do Tratado Antártico atrai atenção de diversos países....................................Pág. 9

ÍNDICECONSELHO EDITORIALEDITOR RESPONSÁVELLeonardo Faria de Mattos (eGn)

EDITOR CIENTÍFICOFrancisco eduardo aLves de aLMeida (eGn)

EDITORES ADJUNTOSJéssica GerMano de LiMa siLva (eGn)Luciane noronha Moreira de oLiveira (eGn)noeLe de Freitas PeiGo (FacaMP)________________________________________________________

PEQUISADORES DO NÚCLEO DE AVALIAÇÃO DA CONJUNTURA

adriana escosteGuy Medronho (ehess)andré FiGueiredo nunes (eceMe)ariane dinaLLi Francisco (universität osnabrück)beatriz Mendes Garcia Ferreira (uFrJ)beatriz victória aLbuquerque da siLva raMos (eGn)carLos henrique Ferreira da siLva Júnior (uFrJ)catharine siMões (uerJ)danieL santos kosinski (universidade de PraGa)doMinique Marques de souza (uFrJ)eLy Pereira da siLva Júnior (uerJ)Franco naPoLeão aGuiar de aLencastro GuiMarães (Puc - rio)GabrieLa Mendes cardiM (uFrJ)GabrieLa da conceição ribeiro da costa (uerJ)GabrieLe Marina MoLina hernandez (uFF)GiuLianna bessa reis anveres (Puc-rio)Jéssica Pires barbosa barreto (uerJ)João victor Marques cardoso (unirio)José GabrieL de MeLo Pires (uFrJ)karine Fernandes santos (uFrJ)Lais de MeLLo rüdiGer (uFrJ)Larissa Marques da costa (uFrJ)Louise Marie hureL siLva dias (London schooL oF econoMics - Lse)Luciane noronha Moreira de oLiveira (eGn)LuMa teixeira dias (uFrJ)MarceLLe siqueira santos (uerJ)MarceLLe torres aLves okuno (ibMec)Matheus souza GaLves Mendes (eGn)Pedro aLLeMand Mancebo siLva (uFrJ)Pedro eMiLiano kiLson Ferreira (universidade de santiaGo)Pedro Mendes Martins (uerJ) PhiLiPe aLexandre Junqueira (uerJ) rebeca vitória aLves Leite (uFrJ)rita de cássia oLiveira FeodriPPe (eGn)steFany Lucchesi siMões (unesP)taynara rodriGues custódio (uFrJ)thaïs abyGaëLLe dedeo (uFrJ) thayná Fernandes aLves ribeiro (uFrJ)victor eduardo kaLiL GasPar FiLho (Puc-rio)vinícius de aLMeida costa (eGn)vinicius GuiMarães reis GonçaLves (uFrJ)vivian de Mattos Marciano (uFrJ)

AMÉRICA DO NORTE & CENTRAL

ÁFRICA SUBSAARIANA

EUROPA

ORIENTE MÉDIO & NORTE DA ÁFRICA

Curdistão Iraquiano: uma colcha de retalhos geopolítica...............................................Pág. 6 Autoridade Nacional Palestina deve retomar o controle da Faixa de Gaza...................Pág. 6

RÚSSIA & EX-URSS

LESTE ASIÁTICO

OCEANIA & SUDESTE ASIÁTICO

ÁRTICO & ANTÁRTICA

Referências...........................................................................Pág. 12

AMÉRICA DO SUL

SUL DA ÁSIA

BOLETIMGEOCORRENTE

Artigos Selecionados & Notícias de Defesa..........................Pág. 11

O separatismo para além da Europa: a questão camaronesa......................................Pág. 4

Um discurso e a 72ª Sessão da Assembleia Geral da ONU...........................................Pág. 10

TEMAS ESPECIAIS

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Recentemente, representantes dos governos chileno e argentino firmaram um inédito acordo de cooperação

e segurança. Uma das principais competências do plano relaciona-se às medidas de fiscalização, sobretudo ao controle do tráfico ilegal de armas na fronteira.

A motivação para tal acordo se dá pelo recrudescimento das ações de grupos ligados ao povo Mapuche, na região da Patagônia, fato que obteve ampla repercussão na imprensa dos dois países ao longo deste ano. A dificuldade de ambos os governos ao lidar com essas ações estimulou uma série de protestos em solidariedade aos Mapuches, o que gerou um grave transtorno político para ambos, apontando para a problemática da delimitação dos direitos dos povos originários na região.

A disputa está centrada na reinvindicação histórica do povo Mapuche pela Patagônia. A parte territorial exigida abrange a maior porção da Patagônia chilena e argentina, em uma faixa que se estende do Oceano Pacífico para o Atlântico. Essa reinvindicação, aliada à radicalização do modus operandi do grupo revela a dimensão geopolítica da questão, levando em consideração a importância estratégica da região.

A relevância para o Chile se concentra, principalmente, na porção sul, onde há a conexão bi oceânica e a proximidade com a Antártica. A Patagônia argentina possui uma relevância ainda maior para o país platino, sobretudo pela região de Vaca Muerta, que detém uma das maiores reservas de petróleo e gás de xisto do planeta. A presença de diversas

empresas petrolíferas estrangeiras em Vaca Muerta aumenta a apreensão com os ataques dos indígenas na região.

Somando-se à relevância da disputa e à ameaça aos interesses estatais na Patagônia, deve ser considerada da mesma forma, a capacidade da questão tomar proporções maiores, aumentando as instabilidades do governo Macri, assim como o peso na sucessão presidencial no Chile, que ocorrerá em novembro próximo. Ademais, o que está em jogo é a própria sobrevivência da integridade territorial dos dois países.

O ano de 2018 marcará os 30 anos das relações diplomáticas entre o Uruguai e a China, mas

não é preciso esperar a sua chegada para constatar o andamento de acordos importantes: em setembro de 2017 foi assinado um Memorando de Entendimento pelas autoridades aeronáuticas chinesas e uruguaias, o qual prevê o estabelecimento de novos serviços aéreos internacionais entre os dois países. As negociações bilaterais para conectividade aérea contam com o aumento das operações de transporte de passageiros, mas também preveem a possibilidade de facilidades comerciais

Ademais, desde o ano passado, o Chanceler do país latino-americano, Rodolfo Nin Novoa, anunciou o andamento das negociações para um Tratado de Livre-

Comércio (TLC) com a China: este projeto seria um desdobramento da viagem diplomática que o presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez, fez à China em 2016 para assinar um Acordo de Parceria Estratégica. Vale ressaltar que, como se trata de um acordo bilateral, sua validade teria de passar pela aprovação do Mercosul, do qual o Uruguai é membro pleno desde 1991; no entanto, Argentina e Brasil já se declararam contrários à concretização de uma parceria fora do bloco nestas proporções.

Recentemente, presenciou-se até mesmo o surgimento da expressão “Uruexit”, em referência à vontade dos uruguaios de expandirem o mercado consumidor, livrando-se da barreira imposta pelo Mercosul à abertura do país ao mundo.

Os Mapuches e a questão securitária na PatagôniaBeatriz Mendes

Uruguai e China: o que está por trás da aproximação estratégica Luma Dias

AMÉRICA DO SUL

Fonte: ELPAIS

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A despeito do andamento da cooperação comercial com os chineses, é preciso atentar para o fato de que a efetivação de acordos bilaterais abarca, para além de uma questão econômica, uma indagação geopolítica. Sabe-se que um maior acesso ao Uruguai permite,

consequentemente, um maior acesso a toda a região-chave representada pela América do Sul: não por acaso, a China investe massivamente nos setores de infraestrutura, já que esta é a porta de entrada para uma maior autonomia na exploração de recursos naturais e energéticos.

Na semana em que os Estados Unidos anunciam sua retirada da UNESCO, o futuro do North American

Free Trade Agreement (NAFTA), que entrou em vigor em 1994, também encontra-se em risco. O Presidente Donald Trump já expôs por diversas vezes sua preferência por acordos bilaterais e pouco interesse em sustentar o tratado tripartite.

O Ministro da Economia mexicano, Ildefonso Guajardo e o das Relações Exteriores, Luis Videgaray, já manifestaram as sérias consequências para a segurança da fronteira com os Estados Unidos caso não haja diálogo sobre a devida manutenção do NAFTA. O Governo Mexicano não dissociaria o livre-comércio de outras pautas e pouco faria para conter fluxos migratórios que cruzam o México em direção aos Estados Unidos. Neste cenário, cessaria também a cooperação no combate aos grupos criminosos e no controle do tráfico de drogas fronteiriço.

A Iniciativa Merida, coordenada pelos EUA e México, tem como objetivos combater o crime organizado, fortalecer as instituições mexicanas, administrar de forma mais eficaz a fronteira e auxiliar comunidades vítimas

do crime organizado. Durante sua atuação, a Iniciativa conseguiu combater ondas de violência, mas, desde o início da Administração Trump, ocorreu o afastamento dos dois atores. Como resultado, junho de 2017 foi o mês mais violento dos últimos 20 anos no México e os Estados Unidos enfrentam a maior onda de mortes por overdose desde 2000.

No início de outubro, em seminário ocorrido no México, o Embaixador estadunidense Anthony Wayne foi enfático sobre como deve ser fortalecida a cooperação entre os dois países, apontando o mercado gerado pelo comércio ilícito de drogas, em cerca de US$ 30 bi por ano. Para tanto, apontou diretrizes, que envolvem o reajuste das instituições de ambos os países; o compartilhamento de inteligência, cooperação policial e judicial; o combate aos carteis; a erradicação dos campos de ópio e laboratórios no México; a interceptação de importações de fentanil e outros químicos relacionados; a criação de uma estratégia de desestabilização do financiamento do crime; a cooperação com o setor bancário e com outros parceiros da região; e o incremento dos programas de reabilitação dos dependentes químicos nos Estados Unidos.

O NAFTA e a Iniciativa MeridaVictor Gaspar

ÁFRICA SUBSAARIANA

AMÉRICA DO NORTE & CENTRAL

A República de Camarões enfrenta, há pelo menos um ano, o ressurgimento das pautas separatistas e federalistas,

de maneira incisiva, em sua região anglófona. No último dia primeiro, duas províncias – noroeste e sudoeste - foram palco de protestos populares e forte repressão, levando à morte de pelo menos 17 pessoas, segundo a Anistia Internacional.

As razões para a emergência das manifestações no país remontam ao período colonial. Consequência das decisões do imediato pós-Primeira Guerra Mundial, a administração dos territórios camaroneses – antes sob jugo alemão – foi outorgada à França e ao Reino Unido. Em outubro de 1961, um referendo determinou a reunificação da região anglófona à República dos Camarões e, desde então, a cisão

entre as áreas francófonas e anglófonas não foi superada, já que estas acreditam ser marginalizadas e prejudicadas pela administração centralizadora do país.

Em outubro do ano passado, uma greve de advogados e professores pelo respeito ao sistema jurídico britânico Common Law e à educação em inglês, desencadeou grande reação popular. Entre os que pedem pela volta ao federalismo, existente durante onze anos no país (1961-1972), e os que querem a criação de um novo Estado – Ambazonia -, os manifestantes unem-se em torno do descontentamento com a brutalidade e arbitrariedade do governo. Nas duas províncias anglófonas, mais de cem já foram presos, o trânsito intrarregional de pessoas foi

O separatismo para além da Europa: a questão camaronesaGabriela Cardim

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No último dia 24 de setembro, Angela Merkel (da “União Democrata Cristã”) conquistou seu 4º mandato como

chanceler, entretanto, foi criticada pelo pior resultado de seu partido desde 1949. Em sua oposição estava o ex-presidente do Parlamento Europeu Martin Schulz, do “Partido Social Democrata”, cujas defesas de antiamericanismo e anti-OTAN ficaram com 20% dos votos. E o partido “Alternativa para a Alemanha” (extrema-direita e anti-imigração), que havia ficado fora do Parlamento nas últimas eleições, desta vez alcançou 13,5% dos votos, muito provavelmente devido a incertezas e medos que a política de abertura aos refugiados causou em certa parcela da população. Agora, Merkel deverá governar com uma coligação de quatro partidos de projetos e vertentes diferentes.

Enquanto isso, no dia 26 de setembro, o Presidente francês Emmanuel Macron fez um discurso em Paris sobre a refundação da União Europeia (UE) na área econômica, agrária e de segurança e defesa. Neste, defendeu a construção de uma capacidade de defesa autônoma europeia, de um orçamento de defesa conjunto e mencionou a carência

de uma doutrina estratégica comum. Também propôs a criação de uma “Academia Europeia de Inteligência” e de um “Escritório Europeu de Combate ao Crime Organizado e ao Terrorismo”. Segundo Macron, a fim de lidar com o desengajamento dos Estados Unidos em questões de segurança europeia e com o crescimento das economias emergentes, a Europa tem que se manter unida.

Este discurso foi recebido com otimismo, pois fazia tempo que não se via uma fala audaciosa para relançar a Europa. O eixo franco-alemão seria a força motriz dessas transformações, com uma possível liderança securitária francesa e uma liderança econômica alemã a partir da atualização do Tratado do Eliseu (responsável pela dinâmica franco-alemã) proposto por Macron para 2018, porém, o novo governo alemão pode vir a dificultar as negociações devido a sua diversidade. A questão é: até que ponto Berlim e Paris se comprometeriam em tal empreitada? E a Alemanha apoiaria uma defesa europeia liderada pela França?

Merkel e Macron conseguirão relançar a União Europeia?Dominique Marques e Thaïs Dedeo

O Reino Unido lançou, no dia 4 de outubro, a 5ª edição da sua Doutrina Conjunta voltada ao Poder Marítimo

do país. O documento surge em meio a um período de mudanças: na área militar, o lançamento de seus dois novos navios aeródromos e a renovação do seu sistema de defesa nuclear; na área político-econômica, a saída britânica da União Europeia (UE).

O documento se divide em 4 capítulos, situando a posição britânica no mundo: o primeiro faz uma introdução ao poder marítimo e o define, bem como as forças marítimas e o ambiente marítimo; o segundo contextualiza esse poder dentro de suas dimensões (econômica, física, legal, política e militar), relembrando os Objetivos da Estratégia Nacional contidos em documentos anteriores; o terceiro aborda as

fundações do poder marítimo, trazendo conceitos clássicos e princípios gerais de sua aplicação, utilizando-se da literatura de estratégia marítima para embasar as novas e revistas definições acerca do tema; por fim, o último capítulo refere-se ao emprego desse poder pelas forças marítimas britânicas, bem como a promoção de operações conjuntas.

Apesar de ser bastante rico em definições e exemplos da história da Marinha britânica, o enfoque do documento reside em sua ação conjunta, sobretudo com a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e outros parceiros naturais. Há também uma frase do atual Ministro da Defesa, Michael Fallon, o qual indica o rumo que o governo deseja adotar: “... 2017 é o começo de uma nova era de poder marítimo, projetando a influência britânica globalmente e entregando

A promessa britânica de projeção de poder globalMatheus Mendes

proibido e o acesso à internet foi cerceado durante três meses no início deste ano.

Diante do panorama atual, é preciso ressaltar a relevância de Camarões para o Brasil. Primeiro, por ser um país dentro de nosso Entorno Estratégico e numa das regiões mais ricas de petróleo (o Golfo da Guiné). Em segundo lugar, caso o Brasil envie tropas à Missão Integrada das Nações Unidas para a Estabilização na República Centro-Africana

(MINUSCA), uma boa interlocução com o governo camaronês será importante. O país é o principal destino dos refugiados centro-africanos, o maior recebedor de auxílio financeiro do Programa da ONU para Refugiados da República Centro-Africana (RCA). Além disso, não se pode desconsiderar a logística necessária para o acesso à RCA, país mediterrâneo, em que o porto camaronês de Douala deve ser avaliado como opção.

EUROPA

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A longa busca pela autodeterminação incentivou os curdos iraquianos a convocarem um referendo de

independência no último dia 25 de setembro. Na ocasião, a opção pela insubmissão ao Iraque foi a mais votada, acumulando 92% dos votos válidos. O referendo em questão era meramente consultivo e legalmente não vinculativo, o que significa que, apesar da indubitável prevalência da opção pelo “sim”, ele não poderá fazer do Curdistão um Estado independente.

O objetivo mais imediato de lançar o referendo para consulta popular está longe de representar apenas o vívido anseio de consolidar as fronteiras curdas no Norte do Iraque, mas, sim, parece ser a alternativa encontrada pela liderança curda para fortalecer seus argumentos de reinvindicação de áreas geoestratégicas no Norte do Iraque. Chegam a incluir territórios que hoje não são oficialmente parte da região autônoma do Curdistão, e que, se anexadas, fariam ser possível o Governo Regional do Curdistão (KRG, sigla em inglês) ascender no ranking dos principais produtores de petróleo no mundo.

O território historicamente disputado por Erbil e Bagdá é a área correspondente à província de Kirkuk, que abriga

importantes campos de petróleo, dos quais três deles, Baba Dome, Jambur e Kabbaz, são administrados pelo KRG e controlados pela empresa North Oil Co.

Além do envolvimento direto do Iraque na questão, há de se considerar outros envolvimentos externos. O primeiro é a Turquia, que, além de possuir o controle do oleoduto Ceyphan – pelo qual o petróleo curdo é comercializado –, também tradicionalmente rejeita a causa curda e afirma ser a integridade territorial do Iraque indispensável para sua própria segurança nacional. De outro lado, outro importante ator estatal inserido na controvérsia é a Rússia, que atua por meio da empresa estatal de petróleo Rosneft e, atualmente, vem consolidando seu papel em apoio ao KRG por meio de um projeto de colaboração energética. O envolvimento russo traz outra dimensão a esta disputa territorial, permitindo que o Kremlin contrarie os interesses turcos e também iranianos. Ao lado da Rússia e defendendo a autodeterminação curda está Israel, que compartilha preocupações sobre o poder crescente do Irã e pretende continuar garantindo seu abastecimento de petróleo advindo da região curda do Iraque.

Curdistão Iraquiano: uma colcha de retalhos geopolítica

Taynara Custódio

segurança em casa”. O discurso é condizente com a prática, uma vez

que o país está em fase final de entrega dos dois navios aeródromos, o que indica um interesse britânico de projeção de poder em terra a partir do mar, reafirmando seu caráter global e utilizando a retórica de defesa do país e de seus territórios ultramarinos ao redor do mundo. Com relação às operações conjuntas, o uso das novas belonaves enquanto navios capitais em grupos-tarefa denota o interesse britânico em liderar operações navais de grande monta, assim como

o uso de embarcações anfíbias para projeção de poder no litoral, cuja definição foi modificada neste documento.

O grande questionamento que permanece é de ordem econômica: o Reino Unido conseguirá realizar todas essas mudanças no momento em que enfrenta uma litigiosa saída da UE? A renovação de sua esquadra (Boletim 61), bem como a promessa do governo de devolver ao país seu caráter “verdadeiramente global”, ainda gera dúvidas quanto a sua capacidade de ação, o que só poderá ser verificado ao longo dos próximos anos.

ORIENTE MÉDIO & NORTE DA ÁFRICA

O Hamas e o Fatah estão no centro de conflitos e desentendimentos que duram mais de três décadas

na região palestina. O primeiro é o mais forte movimento fundamentalista islâmico da Palestina e, o segundo, partido do presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, é essencialmente nacionalista e laico. Porém, no último dia 12 de outubro, os dois grupos pareceram ter encontrado um caminho.

Com a mediação do governo do Egito, representantes do Hamas e do Fatah assinaram, na cidade do Cairo, um

acordo preliminar que pretende dar fim à divisão política e ideológica, além da notória divisão territorial, que dificultam a condução do Estado da Palestina sob o controle da ANP. Neste acordo, o Hamas, que controla a Faixa de Gaza desde 2007, aceita devolver o controle da região e de suas fronteiras à ANP até 1º de dezembro deste ano

Ainda é cedo para celebrar o acordo, visto que este ainda é preliminar e tentativas anteriores de reconciliação dos dois grupos acabaram não sendo efetivadas. Mas sendo o acordo consolidado, podemos esperar que a ANP reforce sua força

Autoridade Nacional Palestina deve retomar o controle da Faixa de Gaza

Gabriela Ribeiro

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em Gaza e que isso se reflita em uma melhoria na vida da população da região, sobretudo com a entrada de bens e a chegada de eletricidade que há alguns meses havia sido restringida por Israel.

Ao mesmo tempo, o Hamas garantiu que está disposto a formar um governo de coalizão para realizar eleições,

China e Coreia do Norte: fim da paciência?Philipe Alexandre

LESTE ASIÁTICO

No dia 5 de outubro, encerrou-se o exercício intitulado “Friendship 2017 Russian-Pakistani Exercise”, que

envolveu tropas russas e paquistanesas no Distrito Militar Sul da Federação Russa, cuja área de atuação abrange o Cáucaso russo. Essa foi a segunda edição do treinamento entre os dois países, tendo sido o primeiro realizado em 2016, e marca uma possível mudança na política externa paquistanesa e russa.

O Paquistão sempre foi um tradicional parceiro dos Estados Unidos, desde a sua independência em 1947, tendo usado suas forças militares para monitorar a atividade soviética na região. Atualmente, contudo, o país sofre um relativo isolamento diplomático devido a acusações de que estaria abrigando grupos terroristas em seu território. Esse isolamento tem dificultado os planos de Islamabad de renovar a sua Força Aérea, que adota os F-16 norte-americanos. Dadas as dificuldades impostas por Washington para a compra de equipamento militar estadunidense, o governo paquistanês tem se interessado pelo JF-17, caça chinês sendo desenvolvido em parceria com a Rússia.

Por outro lado, a Federação russa sempre teve um bom

relacionamento com a Índia. No entanto, a aproximação do atual governo indiano, sob liderança do Primeiro-Ministro Narendra Modi, com os Estados Unidos tem sido alvo de preocupação russa, que busca equilibrar a situação ao se aproximar do Paquistão. Outro motivo para o atual status do relacionamento entre Moscou e Islamabad é a presença no país de grupos terroristas oriundos da Ásia Central responsáveis por atacar tropas da OTAN no Afeganistão e as Forças Armadas paquistanesas na região Norte do país. A expansão de suas atividades na região e nas respectivas comunidades na Federação Russa tem sido motivo de preocupação de Moscou.

Desse modo, a segunda edição do exercício militar conjunto entre a Rússia e o Paquistão pode ser um símbolo da mudança na agenda da política externa dos dois países. Para a Rússia, esta é motivada pela preocupação com grupos terroristas na Ásia Central e como um esforço para contrabalançar o relacionamento EUA-Índia; já para o Paquistão, ela representa uma forma de romper o isolamento diplomático que o país tem vivenciado.

‘Friendship 2017’ e a relação Rússia-Paquistão

Pedro Martins

No dia 28 de setembro, a China deu um prazo de 120 dias para o fechamento das empresas norte-coreanas

que operam no país. Tais medidas vieram semanas após o Banco Central do país ter solicitado às instituições financeiras chinesas que aplicassem rigorosamente as sanções da ONU contra a Coreia do Norte. Muitos analistas assinalam que este anúncio simboliza a mais significativa sanção de Pequim contra Pyongyang.

Apesar de a China ter votado a favor das últimas sanções – aprovadas por unanimidade no Conselho de Segurança – o governo encontra-se em uma posição sensível com relação à Coreia do Norte: por um lado, critica as ações do

país, por terem elevado as tensões globais e pressionado a China a agir, por conta das ameaças de sanções dos EUA aos bancos chineses. Por outro lado, estrangular o governo de Kim Jong-un poderia resultar no colapso do regime, o que deixaria a China cercada por aliados dos EUA.

O anúncio de 120 dias para a interrupção de operações das empresas norte-coreanas pode indicar uma pressão de Pequim para que Kim Jong-un negocie. A ousadia dos testes nucleares e dos lançamentos de mísseis balísticos gerou descontentamento por parte do governo chinês, fazendo com que a retaliação econômica fosse utilizada para evitar o escalar de um possível conflito na região. Essa medida pode

RÚSSIA & EX-URSS

mas este tema ficou fora do acordo e voltará a ser discutido em uma nova reunião em novembro. Como sabemos, as divergências entre o Hamas e o Fatah vão muito além do controle da Faixa de Gaza, mas espera-se que este seja o início de um caminho sem volta em direção ao bem-estar, não apenas da Palestina, mas de toda região.

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Taiwan “observará de perto” a visita de Trump à China

Giulianna Anveres

A primeira visita do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump à Ásia, mais especificamente a Pequim

em novembro, suscitou receios em Taiwan. A presidente Tsai Ing-Wen disse que se preocupa com a possibilidade de a Ilha ser usada como moeda de barganha entre as duas superpotências, e afirmou que pediu uma análise aos membros de seu governo sobre como a visita de Trump poderia impactar a complexa relação triangular entre China, EUA e Taiwan.

As maiores preocupações envolvendo o cenário descrito pela presidente envolvem questões delicadas como comércio, segurança regional e a questão norte-coreana. Além disso, Donald Trump continua se esquivando das demandas chinesas acerca do respeito à política da “China Única” que foram, a princípio, ignoradas quando os EUA venderam armas para Taiwan, conforme já comentado no Boletim 57.

É improvável que Pequim aceite a proposta da Presidente Tsai de um novo modelo para lidar com as

relações entre o continente e a Ilha, devido à líder ter se recusado a aceitar a política de “China Única”, e agora com o premiê taiwanês William Lai Ching-te se tornando o primeiro nesta posição a se identificar publicamente como apoiador da independência de Taiwan. Em pronunciamento ao parlamento do país, no final de setembro, “pro-China, loving Taiwan”. Embora a presidente seja a responsável pela diplomacia com a China continental, a declaração de Lai causou imediata resposta por parte das autoridades em Pequim. “Aqueles que dividem a China sofrerão as consequências. A China Continental e Taiwan pertencem a uma só China.”, declarou o porta-voz Ma Xiaoguang, no dia seguinte ao pronunciamento do premiê taiwanês.

A opinião de estudiosos taiwaneses é de que os Estados Unidos não aceitariam Taiwan independente, e usarão o posicionamento do premiê como forma de maximizar seus interesses nas negociações com a China. Com isso, as tensões entre a Ilha e Pequim tendem a aumentar nas próximas semanas.

ser revista futuramente, mas, para isso, os norte-coreanos precisariam oferecer algo em troca.

Percebe-se, portanto, que o governo chinês busca mostrar à Comunidade Internacional que a China está realmente preocupada e atuante na questão da Península, a fim de satisfazer à demanda do presidente norte-americano

e mostrar a Kim a finitude da paciência chinesa. O pleito diplomático para evitar possíveis conflitos entre os EUA e a Coreia do Norte, por si só, não mais é suficiente. A China está sendo pressionada a agir de facto conforme a sua relevância no cenário internacional.

No dia 2 de outubro, foi realizado um exercício militar conjunto entre os exércitos do Paquistão e da Arábia

Saudita, na região noroeste do Reino. Este fato teve como objetivo a troca de conhecimentos militares, de forma a aprimorar a prontidão das forças no campo de batalha. A atividade ocorre no contexto em que o Paquistão busca alternativas para sua política externa.

A cooperação bilateral é constituída de estreitos laços militares e de defesa, principalmente ligados ao treinamento de oficiais. Cabe ressaltar que o Paquistão se juntou à Aliança Militar Islâmica (IMA, sigla em inglês), liderada pela Arábia Saudita, e nomeou o ex-chefe do exército paquistanês como Comandante da Força-Tarefa conjunta. Economicamente, o Paquistão é um grande importador do petróleo bruto saudita, enquanto que Riad tem sido um mercado-chave para produtos primários paquistaneses.

Nesse sentido, é possível analisar tal aproximação a

partir de dois aspectos: a forma como o Paquistão tenta se desvencilhar do isolamento diplomático; e usar a aproximação com a Arábia Saudita para contrabalançar a relação entre Índia e Irã. No primeiro caso, há o esforço de Islamabad em garantir o convívio cordial com parceiros significativos para sua segurança e economia.

Paquistão, Arábia Saudita e o tabuleiro geopolítico do Sul da ÁsiaRebeca Leite

SUL DA ÁSIA

Fonte: Alchemy IAS

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A Secretaria do Tratado Antártico lançou, ao final de agosto, o documento final do Quadragésimo Encontro

Consultivo do Tratado Antártico (ATCM 40), realizado em Pequim, na China. Vinte e nove membros consultivos e dezesseis membros não consultivos compareceram ao encontro, entre os dias 23 de maio e 1º de junho, a fim de trocarem informações, considerações e recomendações para medidas governamentais referentes ao Tratado.

Enquanto país-sede, a China sustentou seu apoio ao sistema de governança antártico baseado no consenso e nos princípios do Tratado, destacando a cooperação e a interação

entre os países como princípio político adotado na região.A reunião priorizou conduzir uma revisão no Sistema

Digital de Troca de Informações, banco de dados exclusivo para os membros do Tratado acessarem as atualizações acerca de todas as estações presentes no continente e suas atividades. Foi apontado que apenas as instalações governamentais receberam inspeções periódicas reportadas no sistema, excluindo aquelas voltadas para o turismo.

A cooperação entre os países foi mais uma vez enfatizada, especialmente nas áreas científicas que visam à adaptação das estações no atual contexto da mudança climática – outro

Reunião do Tratado Antártico atrai atenção de diversos paísesGabriele Hernández

OCEANIA & SUDESTE ASIÁTICO

ÁRTICO & ANTÁRTICA

O continente asiático vem sendo marcado, gradativamente, a partir da década de 1970, pela

escalada de tensões geopolíticas. Os mares do Sul e do Leste da China apresentam os maiores graus de tensões, por colocarem em lados opostos países de elevado PIB e poder militar, como Japão e China.

Assim, a Força Naval Japonesa (JMSDF, sigla em inglês) constitui um dos principais meios de ação nos referidos espaços. Com um total de 114 navios e efetivo de 45.800 militares, sua esquadra é composta de contratorpedeiros (CT), submarinos diesel-elétricos (SSK), navios de assalto anfíbios e possui capacidades comparáveis às principais marinhas do mundo, apesar dos limites constitucionais do Japão.

Os 46 contratorpedeiros e Fragatas são seus principais meios, inventário maior do que do Reino Unido e da França, combinados. Os 4 CT da Classe “Kongo” de mísseis guiados são a ponta de lança dessa força naval. Empregando o sistema norte-americano Aegis, podem rastrear e engajar alvos aéreos simultâneos, e fazem parte

do sistema nacional de defesa contra mísseis balísticos por sua grande capacidade de cobertura de área, podendo cobrir quase todo o território japonês.

A Força de Submarinos do Japão é outro dos principais componentes navais. Projeta-se uma Força com 20 SSK, principalmente, para lidar com o crescente poderio naval chinês. A Classe “Soryu”, a mais nova e capacitada, desloca 4.100 toneladas submersas e constituem os maiores SSK em operação, no mundo. Equipados com sistemas AIP Stirling, operam submersos, ininterruptamente, por até duas semanas.

Ainda que constitucionalmente limitada, é um fato que a JMSDF apresenta consideráveis capacidades de operação, em especial na região em análise. A possível mudança constitucional japonesa, que vem sendo discutida pelo governo do primeiro ministro Shinzo Abe, no que tange à questão militar, bem como os interesses econômicos de Tóquio no Mar do Sul da China, podem afetar diretamente os chineses e serem letais para a (re)nascente esquadra de Pequim.

As capacidades da JMSDF e sua importância geopolíticaVinícius Costa

TEMAS ESPECIAIS

Por outro lado, estreitar relações com a Arábia Saudita significa, para o Paquistão, equilibrar a atual aproximação entre Índia e Irã. Ambos estão desenvolvendo o porto iraniano em Chabahar (Boletim 48), no qual Nova Délhi desvia geograficamente do Paquistão em busca de acesso à região do Golfo e à Ásia Central. Observa-se como Islamabad se volta mais incisivamente para o Reino, no momento em que a relação com o Irã, rival saudita, passa por grande instabilidade, devido às disputas fronteiriças

e questões relativas à intolerância religiosa ao longo da fronteira.

Dessa forma, as iniciativas supracitadas decorrem da percepção paquistanesa de como o Irã colabora com os esforços indianos para supremacia regional; como também demonstram que está cada vez mais difícil manter o paradigma de jogo pendular entre Riad e Teerã para conquistar objetivos estratégicos, bastante usado em outrora.

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ÁRTICO & ANTÁRTICA

TEMAS ESPECIAIS

No dia 19 de setembro, em seu primeiro discurso na Assembleia Geral da ONU como presidente dos

Estados Unidos, Donald Trump fez algumas observações sobre as relações econômicas entre a Organização e seu país. Ao enfatizar o fato de que os EUA são responsáveis por 22% de toda a contribuição que a ONU recebe, torna-se interessante questionar qual seria o futuro da Organização se, não só os EUA, mas também outros países doadores, levassem a cabo os cortes orçamentários que vêm sendo discutidos internamente.

As contribuições para as Nações Unidas são feitas por todos os seus Estados-membros. A partir de um orçamento aprovado pela Assembleia Geral, a contribuição de cada país é calculada, tendo como base o Produto Nacional Bruto (PNB), a dívida externa e a renda per capita de cada país. De acordo com documentos da ONU, a contribuição para

o orçamento em 2017 dos EUA foi de US$ 611 milhões (22% do orçamento), seguido de Japão (9,7%), China (7,9%), Alemanha (6,4%), França (4,9%) e Reino Unido (4,5%). A contribuição brasileira, de US$ 106 milhões, segue na 7ª posição, correspondendo a 3,8% do orçamento da instituição.

Importante lembrar que a participação brasileira vai além de sua contribuição financeira. Atualmente, o Brasil participa de 8 das 15 Operações de Paz no âmbito das Nações Unidas, com mais de 1.200 militares, além de policiais e especialistas militares. Com o fim da MINUSTAH (Haiti), missão que teve o Brasil como líder da operação desde seu início, o país se prepara para assumir outras responsabilidades, possivelmente, na MINUSCA (República Centro Africana) ou na própria UNIFIL (Líbano), onde comanda a Força Naval e mantém uma Fragata atuando como navio-capitânia.

Um discurso e a 72ª Sessão da Assembleia Geral da ONUAriane Francisco

tema de suma importância para o Tratado. Desse modo, foi reforçada a colaboração entre a instituição e o Comitê para Proteção Ambiental, a fim de ajustar as pautas das reuniões aos problemas ambientais mais recorrentes.

Dentre as novidades do ano, o Cazaquistão, atualmente apenas membro-aderente, indicou a possibilidade de estabelecer, futuramente, uma base científica automatizada no continente, tendo realizado três expedições polares nos últimos seis anos. Os Estados Unidos, por sua vez,

apresentaram seu plano para modernização da Estação McMurdo, a maior estação na região.

A oportunidade de participar do processo de tomada de decisões no continente atrai um número considerável de Estados, sejam os já engajados em atividades estáveis no continente, como Rússia e China, sejam outros distantes e menos vocais no Sistema Internacional, como Mônaco e Islândia. Mesmo de forma discreta, na verdade, a Antártica atrai atenção do mundo todo.

Map No. 4259 Rev. 24(E) UNITED NATIONSOctober 2017

Department of Field SupportGeospatial Information Section (formerly Cartographic Section)

UNFICYPCyprus

UNDOFSyria

UNTSOMiddle East

UNIFILLebanon

UNMOGIPIndia and Pakistan

MINURSOWestern Sahara

MINUSCACentral AfricanRepublic

UNMIKKosovo

UNAMIDDarfur

UNMISSSouth Sudan

UNISFAAbyei

MONUSCODem. Rep. of the Congo

UNMILLiberia

MINUSMAMali

MINUJUSTHHaiti

established: 1991established: 2014

established: 2013established: 2017established: 2010established: 2007established: 1974established: 1964established: 1978established: 2011established: 1999established: 2003established: 2011established: 1949established: 1984

United Nations Mission for the Referendum in Western SaharaUnited Nations Multidimensional Integrated Stabilization Mission in theCentral African RepublicUnited Nations Multidimensional Integrated Stabilization Mission in MaliUnited Nations Mission for Justice Support in HaitiUnited Nations Organization Stabilization Mission in the Dem. Republic of the CongoAfrican Union-United Nations Hybrid Operation in DarfurUnited Nations Disengagement Observer ForceUnited Nations Peacekeeping Force in CyprusUnited Nations Interim Force in LebanonUnited Nations Interim Security Force for AbyeiUnited Nations Interim Administration Mission in KosovoUnited Nations Mission in LiberiaUnited Nations Mission in South SudanUnited Nations Military Observer Group in India and PakistanUnited Nations Truce Supervision Organization

MINURSOMINUSCA

MINUSMAMINUJUSTHMONUSCOUNAMIDUNDOFUNFICYPUNIFILUNISFAUNMIKUNMILUNMISSUNMOGIPUNTSO

UNITED NATIONS PEACEKEEPING OPERATIONS

Fonte: UNITED NATIONS

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• MOHAMED BIN ALI “Enemies” Of God: Extremists’ Perception Of The Religious Other

• BRAHMA CHELLANEY A New Front in Asia’s Water War

• GEORGE FRIEDMAN Iran and North Korea Demonstrate the Trouble with International Agreements

• JAN MARTÍNEZ AHRENS La paciencia de la región con Venezuela tiene un límite

• CHRISTOPHER K. JOHNSON, SCOTT KENNEDY E MINGDA QIU Xi’s Signature Governance Innovation: The Rise of Leading Small Groups

• FLORIAN KRAMPE Climate change, food security and sustaining peace

• RICHARD A. BITZINGER Does Japan Really Want To Go Nuclear?

• NICHOLAS NICHOLAIDES Russia needs Novorossiya

• RICHARD N. HAASS The US Cannot Go It Alone On Iran

• MERCY A. KUO Kim Jong-un’s Political Psychology Profile

ARTIGOS SELECIONADOS E NOTÍCIAS DE DEFESA

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Artigos selecionados e notícias de DefesaREFERÊNCIAS

• Os Mapuches e a questão securitária na PatagôniaDINATALE, Martín. La Argentina y Chile acordaron un plan para frenar la violencia mapuche. Infobae, Buenos Aires, 29 set. 2017. Acesso em: 12 out. 2017.PAGNI, Carlos. Mapuches: Los derechos indígenas ocupan, de repente, el centro de la escena en Argentina y Chile. El País, 04 set. 2017. Acesso em: 14 out. 2017.

• Uruguai e China: o que está por trás da aproximação estratégica

Ministerio de Transporte y Obras Publicas, Uruguay y China firman acuerdo de conectividad aérea. MARTÍNEZ, Magdalena. ‘Uruexit’: o Uruguai se afasta do Mercosul. El País, 2016.

• O NAFTA e a Iniciativa MeridaFORBES. U.S. Endangers Fight Against Mexican Drug Trade With NAFTA Hardball. Acesso em 14 out. 2017 REUTERS. Mexican official says migration, security at stake in NAFTA talks: report. Acesso em 14 out. 2017.

• O separatismo para além da Europa: a questão camaronesa

CRISIS GROUP. Cameroon`s Anglophone Crisis at the Crossroads. Bruxelas, 2017.. Acesso em: 10 de outubro de 2017.SIXTUS, Mbom. Cameroon Anglophone activists call for month of “Ghost towns” before arrests and internet shutdown. 18 jan. 2017. Acesso em 10 out. 2017.

• Merkel e Macron conseguirão relançar a União Europeia?

DEMPSEY, Judy. The Misery of Germany’s Election Campaign: Germany’s main political parties have no new ideas about the country’s role in Europe and don’t even debate reforms at home.2017. Acesso em: 29 ago. 2017.KEOHANE, Daniel. Macron’s European Defense Doctrine. Carnegie Europe. 28 de setembro de 2017.

• A promessa britânica de projeção de poder globalREINO UNIDO. Joint Doctrine Publication 0-10: UK Maritime Power. 2017. SEAWAVES MAGAZINE. Joint Doctrine Publication 0-10: UK Maritime Power (5th Edition). 2017. Disponível em: <http://seawaves.com/2017/10/04/joint-doctrine-publication-0-10-uk-maritime-power-5th-edition/>. Acesso em: 18 out. 2017

• Curdistão Iraquiano: uma colcha de retalhos geopolítica

JAFFE, A. M. (s.d.). Unraveling the Oil Geopolitics Intertwined in the Kurdish Independence Referendum. Council of Foreign Relations.FANTAPPIE, Marie. How to Mitigate the Risks of Iraqi Kurdistan’s Referendum. International Crisis Group.

• Autoridade Nacional Palestina deve retomar o controle da Faixa de Gaza.

BEAUMONT, Peter. Hamas and Fatah sign deal over control of Gaza Strip.The Guardian. Londres, 12 de outubro de 2017.

COOK, Jonathan. Will Hamas-Fatah reconciliation deal succeed?Al-Jazeera. Nazaré, 13 de outubro de 2017. Disponível em: <>• ‘Friendship 2017’ e a relação Rússia-Paquistão.ALAM, Kamal. Growing Pakistan–Russia Military Ties Reflect Central Asia’s Changing Geopolitics. The Royal United Services Institute, Londres.Acessoem: 12 out. 2017.CLOSING ceremony of the Friendship 2017 Russian-Pakistani exercise took place in Karachay-Cherkessia. Russian Ministry OfDefese, [s.i]. . Acesso em: 05 out. 2017

• China e Coreia do Norte: fim da paciência?CALAMUR, Krishnadev. China Gets a Little Tougher With North Korea. The Atlantic. Acesso em: 05/10/2017.DAVIES, Gareth. Beijing orders North Korean businesses in China to shut down by January as part of the latest UN sanctions against Kim Jong-un. Mail Online. Acesso em: 08/10/2017.

• Taiwan “observará de perto” a visita de Trump à ChinaCHUNG, Lawrence. Taiwan keen to avoid becoming a bargaining chip between US and China during Trump’s Asia visit. Disponível em < > Acesso em 8 de outubro de 2017.OPINION COLUMN. Trilateral Axis? Why Taiwan Will Keep an Eagle Eye on Trump’s Talks With Beijing. Acesso em 8 de outubro de 2017.

• Paquistão, Arábia Saudita e o tabuleiro geopolítico do Sul da Ásia

YUSUF, Huma. Pakistan in the Middle East: A Cautious Balance. The Diplomat. Acesso em: 12 de outubro de 2017.Saudi Arabia and Pakistan hold join-military exercises. Al Arabiya English. Acesso em: 12 de outubro de 2017.

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• Reunião do Tratado Antártico atrai atenção de diversos países

Antarctic Treaty Consultative Meeting (40th : 2017 : Beijing) Final Report of the Fortieth Antarctic Treaty Consultative Meeting. Beijing, China, 22 May – 1 June 2017. Buenos Aires: Secretariat of the Antarctic Treaty, 2017. Acesso em: 12 de outubro de 2017.MFA, China. Remarks by H.E. Zhang Gaoli Vice Premier of the State Council of the People’s Republic of China At the Opening Session of the 40th Antarctic Treaty Consultative Meeting. Acesso em: 12 de outubro de 2017.

• Um discurso e a 72ª Sessão da Assembleia Geral da ONU

NaçõesUnidas. Assessment of Member States’ contributions to the United Nations regular budget for the year 2017. UN website, s.d. Acesso em: 08 out. 2017.Roberts, Megan. U.S. Funding for the United Nations: More Than Anybody Realizes? Council on Foreign Relations Blog, 28 set. 2017. Acesso em: 08 out. 2017.