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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 476 (ano VII) 06/11/2015) ISSN - - BRASÍLIA ‐ 2015 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – -

BOLETIM CONTEÚDO Boletim JURÍDICO N. 476 · Cumprimento de sentença. Honorários advocatícios. 1. Considerações iniciais Em 2005, com o advento da Lei n. 11.232, a execução

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 476

(ano VII)

06/11/2015)

 

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BRASÍLIA ‐ 2015 

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ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional.

Coordenador do Direito Internacional (AM/DF): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

06/11/2015 Alice Saldanha Villar 

» Novas Súmulas 517 e 519 do STJ: o regime de incidência dos honorários 

advocatícios no cumprimento de sentença

ARTIGOS 

06/11/2015 Maria Aracy Menezes da Costa » O testamento e a deserdação 

06/11/2015 Ederson Couto da Rocha 

» Mandado de Segurança contra Procurador da Fazenda Nacional em razão de débito inscrito em 

dívida ativa da União ‐ ato acoimado de ilegal anterior ‐ reflexos na legitimidade passiva 

06/11/2015 Tauã Lima Verdan Rangel 

» Da Concessão Florestal: Traços Caracterizadores à Lei nº 11.284/2006 

06/11/2015 Kenia Carvalho Barbosa 

» A responsabilidade civil dos pais de menores infratores 

06/11/2015 Maxuel Paulino Sousa 

» Responsabilidade civil dos advogados 

06/11/2015 Shirlei Maria da Silva Costa 

» Uma abordagem pedagógica das redes sociais 

MONOGRAFIA

06/11/2015 Robério Lopes de Aguiar Filho » O Sistema Interamericano de Direitos Humanos e o Direito Brasileiro: uma análise do caso Gomes 

Lund 

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NOVAS SÚMULAS 517 E 519 DO STJ: O REGIME DE INCIDÊNCIA DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

ALICE  SALDANHA  VILLAR:  Advogada,  autora  de  diversos artigos publicados em revistas jurídicas e das obras "Direito Sumular  ‐  STF"  e  "Direito  Sumular  ‐  STJ",  São  Paulo: JHMizuno, 2015. 

 

Resumo: O presente artigo se destina a examinar as novas Súmulas ns. 517 e 519 do STJ, de modo a compatibilizar o comando dos enunciados e esclarecer seus fundamentos. A Súmula 517 do STJ ganhou a seguinte redação: “São devidos honorários advocatícios no cumprimento de sentença, haja ou não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, que se inicia após a intimação do advogado da parte executada”. Por sua vez, a Súmula 519 STJ afirma o seguinte: “Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios”.

Sumário: Considerações  iniciais. 2. Fundamentos para  incidência de 

honorários  advocatícios  no  cumprimento  de  sentença.  3.  Regime  de 

incidência  dos  honorários  advocatícios  no  cumprimento  da  sentença. 

Conclusão. Referências.

Palavras‐chave: Direito Sumular. Jurisprudência do STJ. Cumprimento 

de sentença. Honorários advocatícios. 

1. Considerações iniciais

Em 2005, com o advento da Lei n. 11.232, a execução de sentença deixa de ser um processo autônomo e passa a figurar apenas como uma fase do processo de conhecimento, chamada “cumprimento de sentença”, não havendo mais ação autônoma.

Entretanto, a Lei 11.232, vigente desde 23 de junho de 2006, nada disse sobre os honorários advocatícios nessa nova etapa processual. Em razão disso, muitos debates surgiram na doutrina e

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na jurisprudência a respeito da incidência ou não dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença. A discussão era a seguinte: há incidência de honorários advocatícios no cumprimento da sentença? Em caso positivo, como estes honorários devem incidir?

Instado a se manifestar, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte 

Especial  (REsp  1.028.855  SC),  firmou  o  entendimento  de  que,  na  nova 

sistemática  instituída pela Lei n. 11.232⁄2005, é cabível a condenação a 

honorários advocatícios na fase do cumprimento de sentença. [1] 

2. Fundamentos para incidência de honorários advocatícios no cumprimento de sentença

Vejamos as razões que justificam a fixação de honorários advocatícios 

na fase de cumprimento de sentença:

a. É preciso se remunerar o advogado pela prática de atos processuais necessários à promoção ou à impugnação da pretensão executiva. Do contrário, o advogado trabalhará sem ser assegurado o recebimento da respectiva contraprestação pelo serviço prestado, caracterizando inclusive ofensa ao art. 22 da Lei n. 8.906⁄94 – EOAB, que garante ao causídico a percepção dos honorários de sucumbência.

Ora, vale lembrar que a verba honorária fixada na fase de cognição leva em consideração apenas o trabalho realizado pelo advogado até então - ou seja, até o trânsito em julgado da decisão que constitui o título executivo. E nem poderia ser diferente, já que, naquele instante, sequer se sabe se o sucumbente irá cumprir espontaneamente a sentença ou se irá opor resistência.[2]

b. O cumprimento de sentença atrai o art. 20, § 4º do CPC/73. Conforme afirmou a ilustre Ministra Nancy Andrighi, “a própria interpretação literal do art. 20, § 4º, do CPC não deixa

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margem para dúvidas. Consoante expressa dicção do referido dispositivo legal, os honorários são devidos “nas execuções, embargadas ou não”. De fato, "execução" é espécie de tutela judicial (e não de processo), sendo certo que a atividade estatal levada a efeito após a sentença - quer se instaure um processo autônomo, quer se desenrole de forma continuada à tutela anterior - não deixa de ser execução. [3]

Numa palavra: essa característica do cumprimento de sentença, qual seja, a de se tratar de verdadeira execução, é o bastante para fazer incidir o art. 20, § 4º, do CPC, porquanto tal dispositivo não se refere a "processo de execução", mas a "execução" apenas.

c. O cumprimento de sentença é um incidente processual, mas isso não impede a condenação em honorários. Conforme destacou a ilustre Ministra Nancy Andrighi, “o fato da execução agora ser um mero “incidente” do processo não impede a condenação em honorários, como, aliás, ocorre em sede de exceção de pré-executividade, na qual esta Corte admite a incidência da verba”. [4] Numa palavra: o fato da Lei n. 11.232⁄2005 ter extinguido o processo autônomo de execução de sentença, transformando-o no incidente de cumprimento de sentença, não impede a condenação em honorários.

3. Regime de incidência dos honorários advocatícios no cumprimento da sentença

Para  fins  de  incidência  dos  honorários  na  fase  de  cumprimento da 

sentença,  é  necessário  que  o  advogado  do  devedor  tenha  impetrado 

impugnação à execução?

Segundo o STJ, tendo em vista que o art. 475‐I do CPC dispõe que “o 

cumprimento de sentença se faz por execução” e que o art. 20, § 4º do 

CPC, por sua vez, prevê que “os honorários serão fixados nas execuções 

embargadas  ou  não”,  revela‐se  evidente  que  são  cabíveis  honorários 

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advocatícios no cumprimento de sentença, não importando se houve ou 

não impugnação do executado. 

Cumpre  então  indagar:  a  partir  de  que  momento  incidem  os 

honorários advocatícios no cumprimento de sentença? 

De acordo com o STJ, embora os honorários advocatícios possam ser 

fixados para a fase de cumprimento de sentença, a sua exigibilidade só é 

possível  se  o  devedor  não  efetuar  o  pagamento  ou  o  depósito  do 

montante da condenação no prazo de 15 dias previsto no artigo 475‐J do 

CPC,  que  somente  começa  a  correr  após  a  intimação  do  advogado  do 

devedor.[5] 

Este entendimento foi consolidado na Súmula 517 do STJ, verbis: “São 

devidos  honorários  advocatícios  no  cumprimento  de  sentença,  haja  ou 

não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, 

que se inicia após a intimação do advogado da parte executada”. 

Nesse ponto, é preciso observar que a Súmula  também solucionou 

dois pontos fundamentais, a saber: 

a. o termo de início do prazo previsto no artigo 475-J do CPC é a intimação do devedor. Ora, o STJ considerou que é necessária a intimação do advogado do executado para que não possa pairar dúvidas acerca da data do trânsito em julgado e também quanto ao valor atualizado da dívida, já que, em muitos casos, exige-se memorial de cálculos a ser apresentado pelo credor. Assim, somente após o prazo de 15 dias contados da intimação do devedor, na pessoa do seu advogado, pode-se falar em não cumprimento espontâneo da obrigação, caso o devedor, intimado, deixe de efetuar o pagamento. [6]

b. a exigibilidade dos honorários advocatícios no cumprimento de sentença só é possível se o devedor não efetuar o pagamento no prazo do art. 475-J do CPC. Vale dizer, a

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incidência de novos honorários (relativos à fase de cumprimento da sentença) pressupõe o esgotamento do prazo legal para o cumprimento espontâneo da condenação.

O entendimento fixado na Súmula 517 do STJ se estriba no princípio 

da causalidade, pelo qual quem deu causa ao aforamento da demanda é 

que  deve  responder  pelo  pagamento  das  custas  processuais  e  dos 

honorários advocatícios. Ou seja, arcará com as verbas de advogado quem 

deu causa à lide, deduzindo pretensão ilegítima ou resistindo a pretensão 

legítima.

Vale dizer, uma vez escoado o prazo de 15 dias previsto no art. 475‐J 

do  CPC  sem  pagamento  voluntário  da  condenação,  o  devedor dará 

causa à  instalação da nova  fase  (execução),  devendo portanto  incidir  o 

pagamento também de novos honorários a serem fixados de acordo com 

o art. 20, § 4º, do CPC. 

Cabe destacar que, obviamente, não se exigem honorários advocatícios se não há resistência no cumprimento da decisão judicial, isto é, quando o devedor paga espontaneamente o montante da condenação dentro do prazo de 15 dias previsto no artigo 475-J do CPC. [7] Isso porque, segundo o STJ, “no caso de pagamento espontâneo do devedor que, intimado, adimple a obrigação dentro dos 15 dias previstos no art. 475-J do CPC, fica descaracterizada a resistência ao cumprimento da sentença, sendo desnecessário trabalho advocatício que resulte na condenação em honorários”. [8]

Mas imagine-se que o devedor executado decidiu deixar escoar o prazo de 15 dias para pagamento espontâneo e ofereceu impugnação (defesa típica do executado). Cumpre indagar: se esta impugnação for posteriormente julgada improcedente, o devedor deverá arcar com novos honorários advocatícios (além daqueles que ele já deve pagar pelo fato do cumprimento de sentença ter sido deflagrado)?

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Segundo o STJ, na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis novos honorários advocatícios. Ou seja, o devedor não terá que pagar novos honorários advocatícios pelo fato da sua impugnação ter sido rejeitada. Neste caso, ele deverá arcar apenas com os honorários advocatícios decorrentes da deflagração do cumprimento de sentença.

Conforme explicou o ilustre Ministro Luis Felipe Salomão, “aviando o executado a sua impugnação, restando vencido a final, não se vislumbra nisso causa de instalação de nenhum outro procedimento novo, além daquele já aperfeiçoado com o pedido de cumprimento de sentença”.[9]

Esta orientação culminou na edição da Súmula 519 do STJ, verbis: “Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios”. Ora, apenas no caso de acolhimento da impugnação, ainda que parcial, serão arbitrados honorários em benefício do executado, com base no art. 20, § 4º, do CPC.

Ressalte‐se que em caso de acolhimento total da  impugnação, com 

extinção  do  feito  mediante  sentença  (art.  475‐M,  §  3º),  revela‐se  que 

quem  deu  causa  ao  procedimento  de  cumprimento  de  sentença  foi  o 

exequente,  devendo  ele  arcar  com  as  verbas  advocatícias.  Em  outras 

palavras: os honorários em favor do exequente deixam de existir em caso 

de  acolhimento  total  da  impugnação,  com  extinção  do  procedimento 

executório,  ocasião  em  que  serão  arbitrados  honorários  únicos  ao 

impugnante. [10]

CONCLUSÃO 

Os  honorários  advocatícios  podem  ser  fixados  para  a  fase  de 

cumprimento de sentença, devendo obedecer as seguintes regras: 

1) A exigibilidade dos honorários advocatícios na fase de cumprimento de sentença condiciona-se à ausência de

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tempestivo pagamento do débito no prazo de 15 dias previsto no art. 475-J do CPC, que começa a correr após a intimação do advogado do devedor. Este entendimento se estriba no princípio da causalidade.

2) Para fins de incidência dos honorários na fase de cumprimento da sentença, não é necessário que o advogado do devedor executado tenha impetrado impugnação à execução. Ora, o art. 475-I do CPC dispõe que “o cumprimento de sentença se faz por execução” enquanto o art. 20, § 4º do CPC prevê que “os honorários serão fixados nas execuções embargadas ou não”.

Este entendimento  foi  fixado na Súmula 517 do STF, verbis:  “São 

devidos  honorários  advocatícios  no  cumprimento  de  sentença,  haja  ou 

não impugnação, depois de escoado o prazo para pagamento voluntário, 

que se inicia após a intimação do advogado da parte executada”.

Porém, existem casos em que o devedor opta por não efetuar o 

pagamento dentro do prazo de 15 dias para pagamento espontâneo, e 

resolve oferecer  impugnação ao cumprimento de sentença. Neste caso, 

incidirão  honorários  advocatícios?  Sobre  o  tema,  o  STJ  distinguiu  as 

seguintes situações:     

· Se a impugnação é rejeitada: O executado não terá que pagar novos honorários, devendo arcar apenas com os honorários decorrentes da deflagração do cumprimento de sentença. Nesse sentido é a Súmula 519 do STJ (“Na hipótese de rejeição da impugnação ao cumprimento de sentença, não são cabíveis honorários advocatícios”.)

· Se a impugnação é acolhida: No caso de acolhimento da impugnação, ainda que parcial, serão arbitrados honorários em benefício do executado, com base no art. 20 , § 4º , do CPC. Ressalte-se que, se houver acolhimento total da impugnação, com extinção do feito mediante sentença (art. 475-M, § 3º), os honorários em favor do exequente deixam de

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existir, sendo arbitrados honorários únicos ao executado - nesse caso, fica claro que quem deu causa ao procedimento de cumprimento de sentença foi o exequente, devendo ele arcar com as verbas advocatícias.

REFERÊNCIAS

BUENO.  Cássio  Scarpinella  Bueno.  A  Nova  Etapa  da  Reforma  do 

Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2006, 2ª ed. p. 83.  

CÂMARA,  Alexandre  Freitas.  A  nova  execução  de  sentença.  Rio  de 

Janeiro: Lumen Juris, 2009, p.9.  

————. A Nova Execução de Sentença. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007, 3ª ed., p. 122-123.

CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento da Sentença Cível. Rio de 

Janeiro: Forense, 2007, p. 108.

MOREIRA.  José  Carlos.  Cumprimento  e  Execução  de  Sentença: 

Necessidade de Esclarecimentos 

Conceituais. In. Revista Dialética de direito Processual, n.º 42, p. 56. 

NERY  JUNIOR,  Nelson.  NERY,  Rosa  Maria  de  Andrade.  Código  de 

Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante: Atualizado até 1.º de 

março de 2006. 9ª  ed. rev.,  atual.e ampl.  São Paulo:  Editora Revisa dos 

Tribunais, 2006, p. 640. 

THEODORO  JÚNIOR,  Humberto.  As  Novas  Reformas  do Código  de 

Processo Civil, Editora Forense, 1ª Edição, p. 139. 

Notas:

[1] Esta  orientação  suplantou  a  divergência  doutrinária  antes 

existente, que havia inclusive conseguido a adesão da 1ª Turma do STJ, a 

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qual chegou a afirmar que "não é cabível, por ausência de disposição legal, 

novos honorários advocatícios pelo  fato de o exequente ser obrigado a 

requerer o cumprimento de sentença”. Sobre o tema, confira:  STJ ‐ REsp 

1025449 RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 1ª Turma, DJe 22/06/2009.

[2] Cf., destre tantos outros: STJ - AgRg no REsp 1198098 SP, Re. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, DJe 27/08/2012.

[3] Cf. STJ – Voto do Ministro LuisFelipe Salomão no REsp 664078 SP, Rel. Min. Luiz Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29/04/2011.

[4] Confira‐se,  nesse  sentido,  os  seguintes 

precedentes: REsp 1028855 SC,  Rel.  Min.  NANCY  ANDRIGH,  Corte 

Especial,  DJe  05/03/2009;  REsp  737767  AL,  3ª  Turma,  Rel. Min.  Castro 

Filho, Rel. p⁄ acórdão Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 22/05/2006; 

REsp 751400 MG, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 19.12.2005; e 

AgRg  no  REsp  631478  MG,  3ª  Turma,  Re.  Min.  Nancy  Andrighi,  DJ 

13/09/2004.

[5] Cf. STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.

[6] Cf. STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011; REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.

[7] Cf. dentre outros: STJ - REsp 1.084.484⁄SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 21⁄08⁄2009.

[8] Cf. STJ - AgRg no REsp 1131083 PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 09⁄10⁄2009.

[9] Cf. STJ – Voto do Ministro Luis Felipe Salomão (Relator), no AgRg no REsp 1170599 RS, 4ª Turma, DJe 02/10/2013.

[10] Cf. AgRg no REsp 1170599 RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma,, DJe 2⁄10⁄2013; STJ - REsp 1134186 RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.

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O TESTAMENTO E A DESERDAÇÃO

MARIA ARACY MENEZES DA COSTA: Advogada e juíza aposentada

Essa semana me deparei com uma situação que me causou profunda estranheza - para não dizer perplexidade. Meu escritório tinha dois testamentos a encaminhar, e os clientes fariam sua última vontade por instrumento público. Comentei o fato com pessoas cuja função deveria pressupor amplo conhecimento a respeito - apenas mencionando testamentos a concretizar, sem entrar na privacidade dos clientes, mantendo o segredo que envolve questões de família.

Um dos testamentos continha deserdação. Situação jurídica prevista em lei, pouco comum, mas com previsão legal. No entanto, qual foi a minha surpresa ao receber a manifestação dessa pessoa de que eu n?o poderia encaminhar o testamento com deserdaç?o porque “não se deserdava por Testamento”. Disse-me que isso seria uma providência judicial e não cartorária e que o titular da serventia não poderia se responsabilizar por deserdação.

Tentei explicar que, além da deserdação ser noticiada no testamento, ela somente se concretiza com uma sentença em processo judicial ordinário movido pelo herdeiro interessado na deserdação, no qual o deserdado poderá se defender. E que o tabelião não tem qualquer responsabilidade sobre a última vontade do testador. Observei que tudo posteriormente à morte será objeto de procedimento próprio judicial . Contudo, de nada adiantou.

Incrédula, argumentei citando o artigo 1814 do Código Civil que relata as causas da indignidade e que podem ser alegadas por qualquer herdeiro, seja legítimo (necessário ou facultativo) ou testamentário. E falei da deserdação, que é um ato privativo do testador que pretende afastar somente o herdeiro necessário da herança por uma das causas enumeradas nos Artigo 1962 e

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1963. De nada adiantou. Alegou esse interlocutor que qualquer titular de cartorário pode se recusar a praticar atos que entenda não serem de sua alçada, e que não poderia ser coagido.

Ainda sem crer, exemplifiquei com o inc. III do Art. 1.963: “Se o filho tem relações ilícitas com a madrasta, o pai pode deserdá-lo por testamento, mas se ele não é deserdado por testamento, esse comportamento censurável não pode ser alegado como ato de indignidade em ação do outro herdeiro após a morte desse pai porque não é causa de indignidade, mas sim de deserdação privativa do autor da herança”.

Também não adiantou. Mas não parou aí. Foi feito mais um contato com outro Bacharel em Direito e resposta foi parecida: “não se pode fazer testamento com deserdação”. Um terceiro interlocutor também não via essa possibilidade, mas se propunha a “estudar o assunto”. Pasmem! Isso aconteceu!

No entanto, fez-se a Luz! O quarto interlocutor conhecia o Código Civil. Por consequência, não via impedimento algum (e nem poderia) no testamento público com deserdação! E o quinto, profissional ativo da área, esclarecido, se mostrou ainda mais perplexo em relação ao desconhecimento de bacharéis que deveriam dominar esse assunto. Da minha parte, já encaminhei e agendei ambos os testamentos públicos, sendo um com deserdação. Amém!

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MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA PROCURADOR DA FAZENDA NACIONAL EM RAZÃO DE DÉBITO INSCRITO EM DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO - ATO ACOIMADO DE ILEGAL ANTERIOR - REFLEXOS NA LEGITIMIDADE PASSIVA

EDERSON COUTO DA ROCHA: Procurador da Fazenda Nacional; Especialista em Adminsitração Pública pela FGV; Especialista em Direito Constitucional pela Uniderp (LFG).

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo discutir uma questão que não é abordada com maior atenção pela doutrina. Trata-se de analisar a legitimidade passiva no mandado de segurança impetrado contra ato administrativo praticado com a finalidade de inscrever crédito tributário em Dívida Ativa da União (DAU), quando a pretensa ilegalidade está relacionada com ato administrativo anterior à própria inscrição do crédito em DAU. A problemática surge porque, como regra, o impetrante ajuíza o mandado de segurança contra o Procurador da Fazenda Nacional, o que é bastante lógico, tendo em vista que o crédito tributário questionado se encontra inscrito em DAU.Todavia, muitas vezes, a partir da análise dos elementos de fato delineados na inicial pelo impetrante, resta evidenciado que a ilegalidade apontada é anterior à inscrição do crédito em DAU, razão pela qual, no nosso entendimento, o legitimado para figurar no polo passivo do mandado de segurança seria do Delegado da Receita Federal do Brasil.

PALAVRAS-CHAVE: Mandado de Segurança. Legitimidade Passiva. Inscrição de Crédito Tributário em Dívida Ativa da União (DAU). Ato Ilegal Anterior. Procurador da Fazenda Nacional. Delegado da Receita Federal do Brasil.

1. INTRODUÇÃO

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A indicação da autoridade coatora para figurar no polo passivo do mandado de segurança, por vezes, não é uma tarefa simples, em virtude da complexidade da estrutura dos órgãos públicos, o que acarreta esta dificuldade em identificar qual a autoridade, efetivamente, pratica o ato acoimado de ilegal.

A controvérsia estabelecida neste artigo não decorre exatamente da premissa firmada no parágrafo anterior, mas em razão de situações legais que ao fim ao cabo levam o impetrante a indicar como autoridade coatora pessoa que, no mundo fático, não praticou o ato dito ilegal, logo, não teria a competência legal para corrigi-lo.

Esta hipótese ocorre justamente quando se discute aspectos legais de crédito tributário já inscrito em DAU, mas, em verdade, a ilegalidade apontada na inicial do mandado de segurança está relacionada a ato administrativo praticado em momento anterior.

Como se trata de crédito inscrito em DAU, a decorrência lógica é indicar como autoridade coatora a figurar no polo passivo domandamus o Procurador da Fazenda Nacional, ante à previsão legal de cabe a este o procedimento administrativo tendente à concretização da inscrição do crédito tributário de DAU.

De fato, em tese, esta é uma situação legal que não pode ser relegada, a partir de uma análise estritamente legal. Todavia, ao se verificar as circunstâncias fáticas, e estas indicarem que o ato ilegal é anterior à inscrição do crédito em DAU, a pessoa que deve figurar no polo passivo do mandamusé o Delegado da Receita Federal do Brasil, uma vez que é quem tem atribuição legal para corrigir o ato questionado.

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A inscrição do crédito em DAU é, por assim dizer, apenas uma consequência legal do ato, em tese, ilegal, praticado anteriormente.

2. DESENVOLVIMENTO

Em matéria tributária, a utilização do mandado de segurança é bastante comum por parte dos contribuintes, especialmente na forma preventiva, como meio de evitar a autuação fiscal e, por conseguinte, a constituição do crédito tributário.

O manejo do mandado de segurança em razão de crédito tributário já constituído definitivamente e, principalmente, inscrito em DAU, não é tão comum, tendo em vista que a defesa do contribuinte nesta circunstância é comumente realizada no âmbito dos embargos à execução fiscal, como regra, sendo o uso de outras espécies de ações mais esporádicas, quando do exercício do direito de defesa do contribuinte.

E, quando o contribuinte se utiliza do mandado de segurança para questionar a legalidade de determinado crédito tributário, automaticamente, surge a discussão acerca de quem é a autoridade coatora que possui legitimidade para compor o polo passivo do mandado de segurança.

Evidentemente, há outros pontos que surgem nesta situação, como, por exemplo, a adequação da via eleita pelo contribuinte para questionar eventual ilegalidade, na medida em que não há possibilidade de se produzir provas no âmbito do mandado de segurança, dado que estas devem ser pré-constituídas.

Como referido anteriormente, o objeto de discussão neste artigo limita-se a analisar a legitimidade passiva no mandado de segurança impetrado no intuito de questionar aspectos legais relacionados a crédito tributário inscrito em DAU.

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Pois bem, nos termos do art. 2º, § 3º, da Lei n.º 6.830/1980, “A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo”.

O órgão competente que interessa ao presente texto é a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e, em razão disso, ressai lógico, a partir da leitura do artigo mencionado, que o mandado de segurança impetrado para questionar crédito tributário inscrito em DAU deve ter como legitimado passivo o Procurador da Fazenda Nacional. Aliás, este o entendimento da jurisprudência[1].

Isso nos parece absolutamente indiscutível quando a ilegalidade apontada decorre de algum vício relacionado ao exercício da atribuição legal de inscrição do crédito tributário em DAU.

Contudo, em algumas situações fáticas, a ilegalidade apontada pelo impetrante não diz respeito a eventuais vícios formais ínsitos ao ato administrativo praticado pelo Procurador da Fazenda Nacional de inscrição do crédito tributário em DAU, mas relativos ao próprio lançamento do crédito.

E é este o ponto que merece uma análise mais aprofundada, porque na primeira situação – eventual vício na atividade de inscrição – não há dúvida de quem deve figurar no polo passivo do mandado de segurança.

Entretanto, quando a ilegalidade apontada tem origem em ato administrativo anterior à inscrição do crédito tributário, a questão da legitimidade passiva do mandado de segurança merece melhor estudo, porque há uma regra processual afeta à sistemática do mandamus que deve ser observada: a

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autoridade coatora indicada deve ser aquela que possui competência legal para corrigir o ato acoimado de ilegal, de modo a cumprir os termos da ordem emanada do mandado de segurança.

A fim de exemplificar as razões jurídicas pelas quais defendemos não ter o Procurador da Fazenda Nacional legitimidade para integrar o polo passivo em mandado de segurança objetivando atacar a legalidade de ato administrativo anterior à inscrição do crédito tributário em DAU, passamos a expor a seguinte situação fática.

Com efeito, determinado contribuinte obtém um provimento judicial que lhe assegura o direito de efetuar, perante a autoridade tributária competente, compensação de tributos recolhidos indevidamente (as razões jurídicas e legais não importam para o objeto do artigo).

Pois bem, levado a efeito o procedimento de compensação, a autoridade tributária a homologa de forma parcial, entendendo que a decisão judicial não possuía o alcance pretendido pelo contribuinte e, por conseguinte, há o lançamento do saldo em razão desta homologação parcial.

Ato contínuo, o débito remanescente é inscrito em DAU.

De outro lado, o contribuinte, discordando da não homologação do pedido de compensação (aqui desimporta se ele poderia ter apresentado qualquer espécie de inconformidade no âmbito administrativo), impetrada mandado de segurança contra o Procurador da Fazenda Nacional, ao fundamento de que o ato administrativo que não homologou o pedido de compensação não observou determinada decisão judicial, transitada em julgado.

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Ora, o crédito tributário encontra-se inscrito em DAU, mas resta claro que o ato acoimado de ilegal não foi praticado pelo Procurador da Fazenda Nacional, mas pela autoridade tributária competente pela análise do pedido de compensação.

Dessa forma, o ato, de fato, tido por ilegal pelo impetrante é o ato administrativo que não homologou o pedido de compensação que resultou no crédito tributário inscrito em DAU.

Porém, como se trata de crédito tributário inscrito em DAU, a lógica legal implicaria em dizer que o mandado de segurança deveria ser impetrado o Procurador da Fazenda Nacional, à vista de sua atribuição legal para inscrever o crédito, inscrição esta que é ato administrativo, o qual se constitui no ato de controle de legalidade.

E aqui reside um dos fundamentos usualmente alegados para sustentar a legitimidade do Procurador da Fazenda Nacional, qual seja, ser ele quem possui atribuição legal para exercer este controle de legalidade.

Assim, em uma conclusão singela, como ele deveria proceder ao controle de legalidade, havendo vício anterior, por consequência, automaticamente ele seria a autoridade coatora, uma vez que, com a ausência do controle, teria, por assim dizer, chancelado a ilegalidade.

Ocorre, no entanto, ser necessário determinar qual é a extensão deste controle de legalidade, de modo a verificar se a indigitada ilegalidade apontada pelo impetrante seria possível de ser revista pela Procuradoria da Fazenda Nacional.

Como se sabe, o controle de legalidade previsto no art. 2º, § 3º, da Lei n.º 6.830/1980, diz respeito aos aspectos legais e formais do lançamento, como, por exemplo, se houve notificação ou

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intimação regular do devedor, se estão indicados os fundamentos legais do lançamento e etc., mas de forma alguma implica em revisão do mérito da cobrança, nem, tampouco, rever as decisões finais dos órgãos ou autoridades competentes.

O controle de legalidade não se confunde com lançamento, mas em ato administrativo relacionado a apuração da certeza e liquidez de débito já constituído.

Em outras palavras, no exemplo citado, o Procurador da Fazenda Nacional não poderia rever o ato administrativo que não homologou o lançamento, porque o controle de legalidade não dá ensejo, como afirmado, a revisão do mérito da cobrança.

E, em não havendo fundamento jurídico para apontar o Procurador da Fazenda Nacional como autoridade coatora, porque não praticou o ato tido por ilegal, parece evidente que ele não deve compor o polo passivo do mandado de segurança no exemplo em comento, pois, o ato ilegal somente pode ser desfeito pela autoridade que o praticou.

Em suma, na hipótese trazida a este breve estudo, quem possui legitimidade passiva para ser indicada como autoridade coatora no mandado de segurança é o Delegado da Receita Federal, ainda que se trate de crédito tributário inscrito em DAU.

3. CONCLUSÃO

A indicação da autoridade coatora para figurar no polo passivo do mandado de segurança, por vezes, não é uma tarefa simples, tendo em vista a complexidade da estrutura dos órgãos públicos, o que acarreta esta dificuldade em identificar qual a autoridade, efetivamente, pratica o ato acoimado de ilegal.

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O manejo do mandado de segurança em razão de crédito tributário já constituído definitivamente e, principalmente, inscrito em DAU, não é tão comum, tendo em vista que a defesa do contribuinte nesta circunstância é comumente realizada no âmbito dos embargos à execução fiscal, como regra, sendo o uso de outras espécies de ações mais esporádicas, quando do exercício do direito de defesa do contribuinte.

Contudo, quando esta situação ocorre, é necessário analisar se a ilegalidade apontada pelo impetrante diz respeito a eventuais vícios formais ínsitos ao ato administrativo praticado pelo Procurador da Fazenda Nacional de inscrição do crédito tributário em DAU, ou, ao inverso, é relativo ao próprio lançamento do crédito, ou seja, quanto ao mérito da cobrança.

Isso é relevante porque há uma regra processual afeta à sistemática do mandamus que deve ser observada: a autoridade coatora indicada deve ser aquela que possui competência legal para corrigir o ato acoimado de ilegal, de modo a cumprir os termos da ordem emanada do mandado de segurança.

Assim, em sendo ato dito ilegal anterior à inscrição do crédito tributário em DAU, aliado ao fato de que este vício não estaria abrangido pelo controle de legalidade previsto no art. 2º, § 3º, da Lei n.º 6.830/1980, a legitimidade para figurar no polo passivo do mandado de segurança é do Delegado da Receita Federal, ainda que se trate de crédito tributário inscrito em DAU.

Nota:

[1] EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. IPI - IMPORTAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. LIMINAR. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. DESPROVIMENTO. 1. Cabe à Procuradoria da Fazenda Nacional a apuração e inscrição da Dívida Ativa da União, consoante art. 2º, § 4º, da Lei nº 6.830/80. Assim, o Procurador-Chefe da FN será

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parte legitimada para figurar no polo passivo do mandado de segurança que objetive afastar a exigibilidade dos créditos tributários já inscritos em Dívida Ativa 2. Não se verifica possibilidade de ineficácia da medida, se concedida quando da prolação da sentença, sobretudo em razão de ser a medida postulada estritamente econômica, inexistindo elementos que apontem para a possibilidade de quebra da empresa ou inviabilização da atividade econômica pelo recolhimento das quantias no curso do processo. 3. Agravo legal desprovido. (TRF4, AG 5015293-48.2015.404.0000, Segunda Turma, Relator p/ Acórdão Cláudia Maria Dadico, juntado aos autos em 10/07/2015)

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DA CONCESSÃO FLORESTAL: TRAÇOS CARACTERIZADORES À LEI Nº 11.284/2006

TAUÃ LIMA VERDAN RANGEL: Doutorando vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), linha de Pesquisa Conflitos Urbanos, Rurais e Socioambientais. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Especializando em Práticas Processuais - Processo Civil, Processo Penal e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário São Camilo-ES. Produziu diversos artigos, voltados principalmente para o Direito Penal, Direito Constitucional, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito Administrativo e Direito Ambiental.

Resumo: Inicialmente, cuida salientar que o meio ambiente, em sua acepção macro e especificamente em seu desdobramento natural, configura elemento inerente ao indivíduo, atuando como sedimento a concreção da sadia qualidade de vida e, por extensão, ao fundamento estruturante da República Federativa do Brasil, consistente na materialização da dignidade da pessoa humana. Ao lado disso, tal como pontuado algures, a Constituição de 1988 estabelece, em seu artigo 225, o dever do Poder Público adotar medidas de proteção e preservação do ambiente natural. Aliás, quadra anotar, oportunamente, que tal dever é de competência político-administrativa de todos os entes políticos, devendo, para tanto, evitar que os espaços de proteção ambiental sejam utilizados de forma contrária à sua função – preservação das espécies nativas e, ainda, promover ostensiva fiscalização desses locais. Neste aspecto, o presente visa analisar o instituto da concessão florestal, introduzido no ordenamento jurídico pela Lei nº 11.284/2006, bem como seus objetivos e aspectos caracterizadores.

Palavras-chaves: Meio Ambiente. Concessão Florestal.

Sumário: 1 Ponderações Introdutórias: Breves notas à construção teórica da Ramificação Ambiental do Direito; 2 Comentários à concepção de Meio Ambiente; 3 Singelos Comentários ao Meio Ambiente Natural: Tessituras Conceituais sobre o Tema; 4 Da Concessão Florestal: Traços

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Caracterizadores à Lei nº 11.284/2006; 4.1 Do Edital de Licitação e dos Critérios de Seleção; 4.2 Do Contrato de Concessão; 4.3 Dos Preços Florestais.

1 Ponderações Introdutórias: Breves notas à construção teórica da Ramificação Ambiental do Direito

Inicialmente, ao se dispensar um exame acerca do tema colocado em tela, patente se faz arrazoar que a Ciência Jurídica, enquanto um conjunto multifacetado de arcabouço doutrinário e técnico, assim como as robustas ramificações que a integram, reclama uma interpretação alicerçada nos plurais aspectos modificadores que passaram a influir em sua estruturação. Neste alamiré, lançando à tona os aspectos característicos de mutabilidade que passaram a orientar o Direito, tornou-se imperioso salientar, com ênfase, que não mais subsiste uma visão arrimada em preceitos estagnados e estanques, alheios às necessidades e às diversidades sociais que passaram a contornar os Ordenamentos Jurídicos. Ora, infere-se que não mais prospera o arcabouço imutável que outrora sedimentava a aplicação das leis, sendo, em decorrência dos anseios da população, suplantados em uma nova sistemática.

Com espeque em tais premissas, cuida hastear, com bastante pertinência, como flâmula de interpretação o “prisma de avaliação o brocardo jurídico 'Ubi societas, ibi jus', ou seja, 'Onde está a sociedade, está o Direito', tornando explícita e cristalina a relação de interdependência que esse binômio mantém”[1]. Destarte, com clareza solar, denota-se que há uma interação consolidada na mútua dependência, já que o primeiro tem suas balizas fincadas no constante processo de evolução da sociedade, com o fito de que seus Diplomas Legislativos e institutos não fiquem inquinados de inaptidão e arcaísmo, em total descompasso com a realidade vigente. A segunda, por sua vez, apresenta estrutural dependência das regras consolidadas pelo Ordenamento Pátrio, cujo escopo primevo é assegurar que não haja uma vingança privada,

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afastando, por extensão, qualquer ranço que rememore priscas eras em que o homem valorizava a Lei de Talião (“Olho por olho, dente por dente”), bem como para evitar que se robusteça um cenário caótico no seio da coletividade.

Ademais, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, imprescindível se fez adotá-la como maciço axioma de sustentação do Ordenamento Brasileiro, precipuamente quando se objetiva a amoldagem do texto legal, genérico e abstrato, aos complexos anseios e múltiplas necessidades que influenciam a realidade contemporânea. Ao lado disso, há que se citar o voto magistral voto proferido pelo Ministro Eros Grau, ao apreciar a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF, “o direito é um organismo vivo, peculiar porém porque não envelhece, nem permanece jovem, pois é contemporâneo à realidade. O direito é um dinamismo. Essa, a sua força, o seu fascínio, a sua beleza”[2]. Como bem pontuado, o fascínio da Ciência Jurídica jaz, justamente, na constante e imprescindível mutabilidade que apresenta, decorrente do dinamismo que reverbera na sociedade e orienta a aplicação dos Diplomas Legais e os institutos jurídicos neles consagrados.

Ainda neste substrato de exposição, pode-se evidenciar que a concepção pós-positivista que passou a permear o Direito, ofertou, por via de consequência, uma rotunda independência dos estudiosos e profissionais da Ciência Jurídica. Aliás, há que se citar o entendimento de Verdan, “esta doutrina é o ponto culminante de uma progressiva evolução acerca do valor atribuído aos princípios em face da legislação”[3]. Destarte, a partir de uma análise profunda dos mencionados sustentáculos, infere-se que o ponto central da corrente pós-positivista cinge-se à valoração da robusta tábua principiológica que Direito e, por conseguinte, o arcabouço normativo passando a figurar, nesta tela, como normas de cunho vinculante, flâmulas hasteadas a serem adotadas na aplicação e interpretação do conteúdo das leis, diante das situações concretas.

Nas últimas décadas, o aspecto de mutabilidade tornou-se ainda mais evidente, em especial, quando se analisa a construção de novos que

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derivam da Ciência Jurídica. Entre estes, cuida destacar a ramificação ambiental, considerando como um ponto de congruência da formação de novos ideários e cânones, motivados, sobretudo, pela premissa de um manancial de novos valores adotados. Nesta trilha de argumentação, de boa técnica se apresenta os ensinamentos de Fernando de Azevedo Alves Brito que, em seu artigo, aduz: “Com a intensificação, entretanto, do interesse dos estudiosos do Direito pelo assunto, passou-se a desvendar as peculiaridades ambientais, que, por estarem muito mais ligadas às ciências biológicas, até então era marginalizadas”[4]. Assim, em decorrência da proeminência que os temas ambientais vêm, de maneira paulatina, alcançando, notadamente a partir das últimas discussões internacionais envolvendo a necessidade de um desenvolvimento econômico pautado em sustentabilidade, não é raro que prospere, mormente em razão de novos fatores, um verdadeiro remodelamento ou mesmo uma releitura dos conceitos que abalizam a ramificação ambiental do Direito, com o fito de permitir que ocorra a conservação e recuperação das áreas degradadas, primacialmente as culturais.

Ademais, há de ressaltar ainda que o direito ambiental passou a figurar, especialmente, depois das décadas de 1950 e 1960, como um elemento integrante da farta e sólida tábua de direitos fundamentais. Calha realçar que mais contemporâneos, os direitos que constituem a terceira dimensão recebem a alcunha de direitos de fraternidade ou, ainda, de solidariedade, contemplando, em sua estrutura, uma patente preocupação com o destino da humanidade[5]·. Ora, daí se verifica a inclusão de meio ambiente como um direito fundamental, logo, está umbilicalmente atrelado com humanismo e, por extensão, a um ideal de sociedade mais justa e solidária. Nesse sentido, ainda, é plausível citar o artigo 3°., inciso I, da Carta Política de 1988 que abriga em sua redação tais pressupostos como os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direitos: “Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária”[6].

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Ainda nesta esteira, é possível verificar que a construção dos direitos encampados sob a rubrica de terceira dimensão tende a identificar a existência de valores concernentes a uma determinada categoria de pessoas, consideradas enquanto unidade, não mais prosperando a típica fragmentação individual de seus componentes de maneira isolada, tal como ocorria em momento pretérito. Com o escopo de ilustrar, de maneira pertinente as ponderações vertidas, insta trazer à colação o entendimento do Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 1.856/RJ, em especial quando destaca:

Cabe assinalar, Senhor Presidente, que os direitos de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos, genericamente, e de modo difuso, a todos os integrantes dos agrupamentos sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem, por isso mesmo, ao lado dos denominados direitos de quarta geração (como o direito ao desenvolvimento e o direito à paz), um momento importante no processo de expansão e reconhecimento dos direitos humanos, qualificados estes, enquanto valores fundamentais indisponíveis, como prerrogativas impregnadas de uma natureza essencialmente inexaurível[7].

Quadra anotar que os direitos alocados sob a rubrica de direito de terceira dimensão encontram como assento primordial a visão da espécie humana na condição de coletividade, superando, via de consequência, a tradicional visão que está pautada no ser humano em sua individualidade. Assim, a preocupação identificada está alicerçada em direitos que são coletivos, cujas influências afetam a todos, de maneira indiscriminada. Ao lado do exposto, cuida mencionar, segundo Bonavides, que tais direitos “têm primeiro por destinatários o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta”[8]. Com efeito, os direitos de terceira

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dimensão, dentre os quais se inclui ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, positivado na Constituição de 1988, emerge com um claro e tangível aspecto de familiaridade, como ápice da evolução e concretização dos direitos fundamentais.

2 Comentários à concepção de Meio Ambiente

Em uma primeira plana, ao lançar mão do sedimentado jurídico-doutrinário apresentado pelo inciso I do artigo 3º da Lei Nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981[9], que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências, salienta que o meio ambiente consiste no conjunto e conjunto de condições, leis e influências de ordem química, física e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. Pois bem, com o escopo de promover uma facilitação do aspecto conceitual apresentado, é possível verificar que o meio ambiente se assenta em um complexo diálogo de fatores abióticos, provenientes de ordem química e física, e bióticos, consistentes nas plurais e diversificadas formas de seres viventes. Consoante os ensinamentos apresentados por José Afonso da Silva, considera-se meio-ambiente como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”[10].

Nesta senda, ainda, Fiorillo[11], ao tecer comentários acerca da acepção conceitual de meio ambiente, coloca em destaque que tal tema se assenta em um ideário jurídico indeterminado, incumbindo, ao intérprete das leis, promover o seu preenchimento. Dada à fluidez do tema, é possível colocar em evidência que o meio ambiente encontra íntima e umbilical relação com os componentes que cercam oser humano, os quais são de imprescindível relevância para a sua existência. O Ministro Luiz Fux, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N°. 4.029/AM, salientou, com bastante pertinência, que:

(...) o meio ambiente é um conceito hoje geminado com o de saúde pública, saúde de cada

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indivíduo, sadia qualidade de vida, diz a Constituição, é por isso que estou falando de saúde, e hoje todos nós sabemos que ele é imbricado, é conceitualmente geminado com o próprio desenvolvimento. Se antes nós dizíamos que o meio ambiente é compatível com o desenvolvimento, hoje nós dizemos, a partir da Constituição, tecnicamente, que não pode haver desenvolvimento senão com o meio ambiente ecologicamente equilibrado. A geminação do conceito me parece de rigor técnico, porque salta da própria Constituição Federal[12].

É denotável, desta sorte, que a constitucionalização do meio ambiente no Brasil viabilizou um verdadeiro salto qualitativo, no que concerne, especificamente, às normas de proteção ambiental. Tal fato decorre da premissa que os robustos corolários e princípios norteadores foram alçados ao patamar constitucional, assumindo colocação eminente, ao lado das liberdades públicas e dos direitos fundamentais. Superadas tais premissas, aprouve ao Constituinte, ao entalhar a Carta Política Brasileira, ressoando os valores provenientes dos direitos de terceira dimensão, insculpir na redação do artigo 225, conceder amplo e robusto respaldo ao meio ambiente como pilar integrante dos direitos fundamentais. “Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria de normas constitucionais, com elaboração de capítulo especialmente dedicado à proteção do meio ambiente”[13]. Nesta toada, ainda, é observável que ocaput do artigo 225 da Constituição Federal de 1988[14] está abalizado em quatro pilares distintos, robustos e singulares que, em conjunto, dão corpo a toda tábua ideológica e teórica que assegura o substrato de edificação da ramificação ambiental.

Primeiramente, em decorrência do tratamento dispensado pelo artífice da Constituição Federal, o meio ambiente foi içado à condição de direito de todos, presentes e futuras gerações. É encarado como algo

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pertencente a toda coletividade, assim, por esse prisma, não se admite o emprego de qualquer distinção entre brasileiro nato, naturalizado ou estrangeiro, destacando-se, sim, a necessidade de preservação, conservação e não-poluição. O artigo 225, devido ao cunho de direito difuso que possui, extrapola os limites territoriais do Estado Brasileiro, não ficando centrado, apenas, na extensão nacional, compreendendo toda a humanidade. Neste sentido, o Ministro Celso de Mello, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ, destacou que:

A preocupação com o meio ambiente - que hoje transcende o plano das presentes gerações, para também atuar em favor das gerações futuras [...] tem constituído, por isso mesmo, objeto de regulações normativas e de proclamações jurídicas, que, ultrapassando a província meramente doméstica do direito nacional de cada Estado soberano, projetam-se no plano das declarações internacionais, que refletem, em sua expressão concreta, o compromisso das Nações com o indeclinável respeito a esse direito fundamental que assiste a toda a Humanidade[15].

O termo “todos”, aludido na redação docaput do artigo 225 da Constituição Federal de 1988, faz menção aos já nascidos (presente geração) e ainda aqueles que estão por nascer (futura geração), cabendo àqueles zelar para que esses tenham à sua disposição, no mínimo, os recursos naturais que hoje existem. Tal fato encontra como arrimo a premissa que foi reconhecido ao gênero humano o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao gozo de condições de vida adequada, em ambiente que permita desenvolver todas as suas potencialidades em clima de dignidade e bem-estar. Pode-se considerar como um direito transgeracional, ou seja, ultrapassa as gerações, logo, é viável afirmar que o meio-ambiente é um direito público subjetivo. Desta feita, o ideário de que o meio ambiente substancializa patrimônio público a ser imperiosamente assegurado e protegido pelos organismos sociais e pelas

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instituições estatais, qualificando verdadeiro encargo irrenunciável que se impõe, objetivando sempre o benefício das presentes e das futuras gerações, incumbindo tanto ao Poder Público quanto à coletividade considerada em si mesma.

Desta feita, decorrente do fato supramencionado, produz efeito erga mones, sendo, portanto, oponível contra a todos, incluindo pessoa física/natural ou jurídica, de direito público interno ou externo, ou mesmo de direito privado, como também ente estatal, autarquia, fundação ou sociedade de economia mista. Impera, também, evidenciar que, como um direito difuso, não subiste a possibilidade de quantificar quantas são as pessoas atingidas, pois a poluição não afeta tão só a população local, mas sim toda a humanidade, pois a coletividade é indeterminada. Nesta senda de exposição, quadra apontar que o direito à integridade do meio ambiente substancializa verdadeira prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, ressoando a expressão robusta de um poder deferido, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas num sentido mais amplo, atribuído à própria coletividade social.

Salta aos olhos que, com a nova sistemática entabulada pela redação do artigo 225 da Carta Maior, o meio-ambiente passou a ter autonomia, tal seja não está vinculada a lesões perpetradas contra o ser humano para se agasalhar das reprimendas a serem utilizadas em relação ao ato perpetrado. Figura-se,ergo, como bem de uso comum do povo o segundo pilar que dá corpo aos sustentáculos do tema em tela. O axioma a ser esmiuçado, está atrelado o meio-ambiente como vetor da sadia qualidade de vida, ou seja, manifesta-se na salubridade, precipuamente, ao vincular a espécie humana está se tratando do bem-estar e condições mínimas de existência. Igualmente, o sustentáculo em análise se corporifica também na higidez, ao cumprir os preceitos de ecologicamente equilibrado, salvaguardando a vida em todas as suas formas (diversidade de espécies).

Por derradeiro, insta mencionar, ainda, que o quarto pilar é a corresponsabilidade, que impõe ao Poder Público o dever geral de se responsabilizar por todos os elementos que integram o meio ambiente,

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assim como a condição positiva de atuar em prol de resguardar. Igualmente, tem a obrigação de atuar no sentido de zelar, defender e preservar, asseverando que o meio-ambiente permaneça intacto. Aliás, este último se diferencia de conservar que permite a ação antrópica, viabilizando melhorias no meio ambiente, trabalhando com as premissas de desenvolvimento sustentável, aliando progresso e conservação. Por seu turno, o cidadão tem o dever negativo, que se apresenta ao não poluir nem agredir o meio-ambiente com sua ação. Além disso, em razão da referida corresponsabilidade, são titulares do meio ambiente os cidadãos da presente e da futura geração.

3 Singelos Comentários ao Meio Ambiente Natural: Tessituras Conceituais sobre o Tema

No que concerne ao meio ambiente natural, cuida salientar que tal faceta é descrita como ambiente natural, também denominado de físico, o qual, em sua estrutura, agasalha os fatores abióticos e bióticos, considerados como recursos ambientais. Nesta esteira de raciocínio, oportunamente, cumpre registrar, a partir de um viés jurídico, a acepção do tema em destaque, o qual vem disciplinado pela Lei Nº. 9.985, de 18 de Julho de 2000, que regulamenta o art. 225, §1º,incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências, em seu artigo 2º, inciso IV, frisa que “recurso ambiental: a atmosfera, as águas interiores, superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora”[16]. Nesta esteira, o termo fatores abióticos abriga a atmosfera, os elementos afetos à biosfera, as águas (inclusive aquelas que se encontram no mar territorial), pelo solo, pelo subsolo e pelos recursos minerais; já os fatores bióticos faz menção à fauna e à flora, como bem assinala Fiorillo [17]. Em razão da complexa interação entre os fatores abióticos e bióticos que ocorre o fenômeno da homeostase, consistente no equilíbrio dinâmico entre os seres vivos e o meio em que se encontram inseridos. Consoante Rebello Filho e Bernardo, o meio ambiente natural “é constituído por todos os elementos

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responsáveis pelo equilíbrio entre os seres vivos e o meio em que vivem: solo, água, ar atmosférico, fauna e flora”[18]. Nesta senda, com o escopo de fortalecer os argumentos apresentados, necessário se faz colocarem campo que os paradigmas que orientam a concepção recursos naturais como componentes que integram a paisagem, desde que não tenham sofrido maciças alterações pela ação antrópica a ponto de desnaturar o seu aspecto característico. Trata-se, com efeito, de uma conjunção de elementos e fatores que mantêm uma harmonia complexa e frágil, notadamente em razão dos avanços e degradações provocadas pelo ser humano. Ao lado do esposado, faz-se carecido pontuar que os recursos naturais são considerados como tal em razão do destaque concedido pelo ser humano, com o passar dos séculos, conferindo-lhes valores de ordem econômica, social e cultural. Desta feita, tão somente é possível à compreensão do tema a partir da análise da relação homem-natureza, eis que a interação entre aqueles é preponderante para o desenvolvimento do ser humano em todas as suas potencialidades. Patente se faz ainda, em breves palavras, mencionar a classificação dos recursos naturais, notadamente em razão da importância daqueles no tema em testilha. O primeiro grupo compreende os recursos naturais renováveis, que são os elementos naturais, cuja correta utilização, propicia a renovação, a exemplo do que se observa na fauna, na flora e nos recursos hídricos. Os recursos naturais não-renováveis fazem menção àqueles que não logram êxito na renovação ou, ainda, quando conseguem, esta se dá de maneira lenta em razão dos aspectos estruturais e característicos daqueles, como se observa no petróleo e nos metais em geral. Por derradeiro, os denominados recursos inesgotáveis agasalham aqueles que são “infindáveis”, como a luz solar e o vento. Salta aos olhos, a partir das ponderações estruturadas, que os recursos naturais, independente da seara em que se encontrem agrupados, apresentam como elemento comum de caracterização o fato de serem criados originariamente pela natureza. Nesta linha, ainda, de dicção, cuida assinalar que o meio ambiente natural encontra respaldo na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 225, caput e §1º, incisos I, III e IV.

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Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas [omissis]

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade[19].

Ora, como bem manifestou o Ministro Carlos Britto, ao apreciar a Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 3.540, “não se erige em área de proteção especial um espaço geográfico simplesmente a partir de sua vegetação, há outros elementos. Sabemos que fauna, flora, floresta, sítios arqueológicos concorrem para isso”[20]. Verifica-se, assim, que o espaço territorial especialmente protegido do direito constitucional ao meio ambiente hígido e equilibrado, em especial no que atina à estrutura

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e funções dos diversos e complexos ecossistemas. Nessa esteira de exposição, as denominadas “unidades de conservação”, neste aspecto de afirmação constitucional, enquanto instrumentos de preservação do meio ambiente natural, configuram áreas de maciço interesse ecológico que, em razão dos aspectos característicos naturais relevantes, recebem tratamento legal próprio, de maneira a reduzir a possibilidade de intervenções danosas ao meio ambiente.

Diante do exposto, o meio ambiente, em sua acepção macro e especificamente em seu desdobramento natural, configura elemento inerente ao indivíduo, atuando como sedimento a concreção da sadia qualidade de vida e, por extensão, ao fundamento estruturante da República Federativa do Brasil, consistente na materialização da dignidade da pessoa humana. Ao lado disso, tal como pontuado algures, a Constituição da República estabelece, em seu artigo 225, o dever do Poder Público adotar medidas de proteção e preservação do ambiente natural. Aliás, quadra anotar, oportunamente, que tal dever é de competência político-administrativa de todos os entes políticos, devendo, para tanto, evitar que os espaços de proteção ambiental sejam utilizados de forma contrária à sua função – preservação das espécies nativas e, ainda, promover ostensiva fiscalização desses locais. Verifica-se, portanto, que o escopo repousa em assegurar que, por meio da fiscalização, o indivíduo tenha acesso às formações naturais como elemento inerente à dignidade da pessoa humana.

4 Da Concessão Florestal: Traços Caracterizadores à Lei nº 11.284/2006

Inicialmente, a concessão florestal será autorizada em ato do poder concedente e formalizada mediante contrato, que deverá observar os termos desta Lei, das normas pertinentes e do edital de licitação. Os relatórios ambientais preliminares, licenças ambientais, relatórios de impacto ambiental, contratos, relatórios de fiscalização e de auditorias e outros documentos relevantes do processo de concessão florestal serão disponibilizados por meio da Rede Mundial de Computadores, sem prejuízo do disposto no artigo 25

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da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[21]. A publicação do edital de licitação de cada lote de concessão florestal deverá ser precedida de audiência pública, por região, realizada pelo órgão gestor, nos termos do regulamento, sem prejuízo de outras formas de consulta pública. São elegíveis para fins de concessão as unidades de manejo previstas no Plano Anual de Outorga Florestal (PAOF), proposto pelo órgão gestor e definido pelo poder concedente, conterá a descrição de todas as florestas públicas a serem submetidas a processos de concessão no ano em que vigorar.

Nos termos do artigo 10 da lei supramencionada, o PAOF será submetido pelo órgão gestor à manifestação do órgão consultivo da respectiva esfera de governo. A inclusão de áreas de florestas públicas sob o domínio da União no PAOF requer manifestação prévia da Secretaria de Patrimônio da União do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. O PAOF deverá ser previamente apreciado pelo Conselho de Defesa Nacional quando estiverem incluídas áreas situadas na faixa de fronteira definida no § 2o do art. 20 da Constituição Federal. O PAOF para concessão florestal considerará: (i) as políticas e o planejamento para o setor florestal, a reforma agrária, a regularização fundiária, a agricultura, o meio ambiente, os recursos hídricos, o ordenamento territorial e o desenvolvimento regional; (ii) o Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE nacional e estadual e demais instrumentos que disciplinam o uso, a ocupação e a exploração dos recursos ambientais; (iii) a exclusão das unidades de conservação de proteção integral, das reservas de desenvolvimento sustentável, das reservas extrativistas, das reservas de fauna e das áreas de relevante interesse ecológico, salvo quanto a atividades expressamente admitidas no plano de manejo da unidade de conservação; (iv) a exclusão das terras indígenas, das áreas ocupadas por comunidades locais e das áreas de interesse para a criação de unidades de conservação de proteção integral; (v) as áreas de convergência com as concessões de outros setores,

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conforme regulamento; (vi) as normas e as diretrizes governamentais relativas à faixa de fronteira e outras áreas consideradas indispensáveis para a defesa do território nacional; (vii) as políticas públicas dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.

Em observância ao §1º do artigo 11 da lei em comento, o PAOF da União considerará os PAOFs dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. O PAOF deverá prever zonas de uso restrito destinadas às comunidades locais. O PAOF deve conter disposições relativas ao planejamento do monitoramento e fiscalização ambiental a cargo dos órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, incluindo a estimativa dos recursos humanos e financeiros necessários para essas atividades. O poder concedente publicará, previamente ao edital de licitação, ato justificando a conveniência da concessão florestal, caracterizando seu objeto e a unidade de manejo. As licitações para concessão florestal observarão os termos desta Lei e, supletivamente, da legislação própria, respeitados os princípios da legalidade, moralidade, publicidade, igualdade, do julgamento por critérios objetivos e da vinculação ao instrumento convocatório. As licitações para concessão florestal serão realizadas na modalidade concorrência e outorgadas a título oneroso. Nas licitações para concessão florestal, é vedada a declaração de inexigibilidade prevista no art. 25 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. A concessão florestal terá como objeto a exploração de produtos e serviços florestais, contratualmente especificados, em unidade de manejo de floresta pública, com perímetro georreferenciado, registrada no respectivo cadastro de florestas públicas e incluída no lote de concessão florestal.

O objeto de cada concessão será fixado no edital, que definirá os produtos florestais e serviços cuja exploração será autorizada. A concessão florestal confere ao concessionário somente os direitos expressamente previstos no contrato de concessão. É vedada a outorga de qualquer dos seguintes direitos

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no âmbito da concessão florestal: (i) titularidade imobiliária ou preferência em sua aquisição; (ii) acesso ao patrimônio genético para fins de pesquisa e desenvolvimento, bioprospecção ou constituição de coleções; (iii) uso dos recursos hídricos acima do especificado como insignificante, nos termos da Lei no 9.433, de 8 de janeiro de 1997; (iv) exploração dos recursos minerais; (v) exploração de recursos pesqueiros ou da fauna silvestre; (vi) comercialização de créditos decorrentes da emissão evitada de carbono em florestas naturais. No caso de reflorestamento de áreas degradadas ou convertidas para uso alternativo do solo, o direito de comercializar créditos de carbono poderá ser incluído no objeto da concessão, nos termos de regulamento. O manejo da fauna silvestre pelas comunidades locais observará a legislação específica. Nos termos do artigo 17 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[22]. Os produtos de uso tradicional e de subsistência para as comunidades locais serão excluídos do objeto da concessão e explicitados no edital, juntamente com a definição das restrições e da responsabilidade pelo manejo das espécies das quais derivam esses produtos, bem como por eventuais prejuízos ao meio ambiente e ao poder concedente.

A licença prévia para uso sustentável da unidade de manejo será requerida pelo órgão gestor, mediante a apresentação de relatório ambiental preliminar ao órgão ambiental competente integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA. Nos casos potencialmente causadores de significativa degradação do meio ambiente, assim considerados, entre outros aspectos, em função da escala e da intensidade do manejo florestal e da peculiaridade dos recursos ambientais, será exigido estudo prévio de impacto ambiental - EIA para a concessão da licença prévia. O órgão ambiental licenciador poderá optar pela realização de relatório ambiental preliminar e EIA que abranjam diferentes unidades de manejo integrantes de um mesmo lote de concessão florestal, desde que as unidades se situem no mesmo ecossistema e no mesmo Estado. Os custos do relatório ambiental preliminar e

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do EIA serão ressarcidos pelo concessionário ganhador da licitação, na forma do art. 24 da lei em exame. A licença prévia autoriza a elaboração do PMFS e, no caso de unidade de manejo inserida no PAOF, a licitação para a concessão florestal. O início das atividades florestais na unidade de manejo somente poderá ser efetivado com a aprovação do respectivo PMFS pelo órgão competente do Sisnama e a consequente obtenção da licença de operação pelo concessionário.

O processo de licenciamento ambiental para uso sustentável da unidade de manejo compreende a licença prévia e a licença de operação, não se lhe aplicando a exigência de licença de instalação. Os conteúdos mínimos do relatório ambiental preliminar e do EIA relativos ao manejo florestal serão definidos em ato normativo específico. A aprovação do plano de manejo da unidade de conservação referida no inciso I do art. 4o da lei em destaque, nos termos da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, substitui a licença prévia prevista no caput do artigo 18, sem prejuízo da elaboração de EIA nos casos previstos no § 1o do artigo ora mencionado e da observância de outros requisitos do licenciamento ambiental. Além de outros requisitos previstos na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, exige-se para habilitação nas licitações de concessão florestal a comprovação de ausência de: (i) débitos inscritos na dívida ativa relativos a infração ambiental nos órgãos competentes integrantes do Sisnama; (ii) decisões condenatórias, com trânsito em julgado, em ações penais relativas a crime contra o meio ambiente ou a ordem tributária ou a crime previdenciário, observada a reabilitação de que trata o art. 93 do Decreto-Lei no2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal. Somente poderão ser habilitadas nas licitações para concessão florestal empresas ou outras pessoas jurídicas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sede e administração no País. Os órgãos do Sisnama organizarão sistema de informações unificado, tendo em vista assegurar a emissão do comprovante requerido no inciso I do caput do artigo 19 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[23].

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4.1 Do Edital de Licitação e dos Critérios de Seleção

O edital de licitação será elaborado pelo poder concedente, observados os critérios e as normas gerais da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, e conterá, especialmente: (i) o objeto, com a descrição dos produtos e dos serviços a serem explorados; (ii) a delimitação da unidade de manejo, com localização e topografia, além de mapas e imagens de satélite e das informações públicas disponíveis sobre a unidade; (iii) os resultados do inventário amostral; (iv) o prazo da concessão e as condições de prorrogação; (v) a descrição da infraestrutura disponível; (vi) as condições e datas para a realização de visitas de reconhecimento das unidades de manejo e levantamento de dados adicionais; (vii) a descrição das condições necessárias à exploração sustentável dos produtos e serviços florestais; (viii) os prazos para recebimento das propostas, julgamento da licitação e assinatura do contrato; (ix) o período, com data de abertura e encerramento, o local e o horário em que serão fornecidos aos interessados os dados, estudos e projetos necessários à elaboração dos orçamentos e apresentação das propostas; (x) os critérios e a relação dos documentos exigidos para a aferição da capacidade técnica, da idoneidade financeira e da regularidade jurídica e fiscal; (xi) os critérios, os indicadores, as fórmulas e parâmetros a serem utilizados no julgamento da proposta; (xii) o preço mínimo da concessão e os critérios de reajuste e revisão; (xiii) a descrição das garantias financeiras e dos seguros exigidos; (xiv) as características dos bens reversíveis, incluindo as condições em que se encontram aqueles já existentes; (xv) as condições de liderança da empresa ou pessoa jurídica responsável, na hipótese em que for permitida a participação de consórcio; (xvi) a minuta do respectivo contrato, que conterá as cláusulas essenciais referidas no artigo 30 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[24]; (xvii) as condições de extinção do contrato de concessão.

As garantias previstas no inciso XIII do artigo 20 da lei em comento: (i) incluirão a cobertura de eventuais danos causados ao

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meio ambiente, ao erário e a terceiros; (ii) poderão incluir, nos termos de regulamento, a cobertura do desempenho do concessionário em termos de produção florestal. O poder concedente exigirá garantias suficientes e compatíveis com os ônus e riscos envolvidos nos contratos de concessão florestal. São modalidades de garantia: (i) caução em dinheiro; (ii) títulos da dívida pública emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado pelo Banco Central do Brasil, e avaliados pelos seus valores econômicos, conforme definido pelo Ministério da Fazenda; (iii) seguro-garantia; (iv) fiança bancária; (v) outras admitidas em lei. Para concessão florestal a pessoa jurídica de pequeno porte, microempresas e associações de comunidades locais, serão previstas em regulamento formas alternativas de fixação de garantias e preços florestais. Quando permitida na licitação a participação de pessoa jurídica em consórcio, observar-se-ão, adicionalmente aos requisitos referidos no artigo 19 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[25], os seguintes requisitos: (i) comprovação de compromisso, público ou particular, de constituição de consórcio, subscrito pelas consorciadas; (ii) indicação da empresa-líder, que deverá atender às condições de liderança estipuladas no edital e será a representante das consorciadas perante o poder concedente; (iii) apresentação dos documentos de que trata o inciso X do caput do artigo 20 da lei em análise, por parte de cada consorciada; (iv) comprovação de cumprimento da exigência constante do inciso XV do caput do artigo 20 da lei em destaque; (v) impedimento de participação de empresas consorciadas na mesma licitação, por intermédio de mais de 1 (um) consórcio ou isoladamente.

O licitante vencedor ficará obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e registro do consórcio, nos termos do compromisso referido no inciso I do caput do artigo 22. A pessoa jurídica líder do consórcio é responsável pelo cumprimento do contrato de concessão perante o poder concedente, sem

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prejuízo da responsabilidade solidária das demais consorciadas. As alterações na constituição dos consórcios deverão ser submetidas previamente ao poder concedente para a verificação da manutenção das condições de habilitação, sob pena de rescisão do contrato de concessão. É facultado ao poder concedente, desde que previsto no edital, determinar que o licitante vencedor, no caso de consórcio, constitua-se em empresa antes da celebração do contrato. Os estudos, levantamentos, projetos, obras, despesas ou investimentos já efetuados na unidade de manejo e vinculados ao processo de licitação para concessão, realizados pelo poder concedente ou com a sua autorização, estarão à disposição dos interessados. O edital de licitação indicará os itens, entre os especificados no caput do artigo 24, e seus respectivos valores, que serão ressarcidos pelo vencedor da licitação. As empresas de pequeno porte, microempresas e associações de comunidades locais ficarão dispensadas do ressarcimento previsto no § 1o do artigo 24 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[26]. É assegurado a qualquer pessoa o acesso aos contratos, decisões ou pareceres relativos à licitação ou às próprias concessões.

No julgamento da licitação, a melhor proposta será considerada em razão da combinação dos seguintes critérios: (i) o maior preço ofertado como pagamento ao poder concedente pela outorga da concessão florestal; (ii) a melhor técnica, considerando: a) o menor impacto ambiental; b) os maiores benefícios sociais diretos; c) a maior eficiência; d) a maior agregação de valor ao produto ou serviço florestal na região da concessão. A aplicação dos critérios descritos nos incisos I e II do caput do artigo 27 será previamente estabelecida no edital de licitação, com regras e fórmulas precisas para avaliação ambiental, econômica, social e financeira. Para fins de aplicação do disposto no inciso II do caput do artigo 26, o edital de licitação conterá parâmetros e exigências para formulação de propostas técnicas. O poder concedente recusará propostas manifestamente inexequíveis ou financeiramente incompatíveis com os objetivos da licitação.

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4.2 Do Contrato de Concessão

Para cada unidade de manejo licitada, será assinado um contrato de concessão exclusivo com um único concessionário, que será responsável por todas as obrigações nele previstas, além de responder pelos prejuízos causados ao poder concedente, ao meio ambiente ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelos órgãos competentes exclua ou atenue essa responsabilidade. Sem prejuízo da responsabilidade a que se refere o caput do artigo 27, o concessionário poderá contratar terceiros para o desenvolvimento de atividades inerentes ou subsidiárias ao manejo florestal sustentável dos produtos e à exploração dos serviços florestais concedidos. As contratações, inclusive de mão-de-obra, feitas pelo concessionário serão regidas pelo direito privado, não se estabelecendo qualquer relação jurídica entre os terceiros contratados pelo concessionário e o poder concedente. A execução das atividades contratadas com terceiros pressupõe o cumprimento das normas regulamentares relacionadas a essas atividades. É vedada a subconcessão na concessão florestal. Ao lado disso, a transferência do controle societário do concessionário sem prévia anuência do poder concedente implicará a rescisão do contrato e a aplicação das sanções contratuais, sem prejuízo da execução das garantias oferecidas. Para fins de obtenção da anuência referida no caput do artigo 28, o pretendente deverá: (i) atender às exigências da habilitação estabelecidas para o concessionário; (ii) comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor. Nos contratos de financiamento, os concessionários poderão oferecer em garantia os direitos emergentes da concessão, até o limite que não comprometa a operacionalização e a continuidade da execução, pelo concessionário, do PMFS ou das demais atividades florestais. O limite previsto no caput do artigo 29 será definido pelo órgão gestor.

Em consonância com a disposição contida na redação do artigo 30 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[27], São cláusulas essenciais do contrato de concessão as relativas: (i) ao

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objeto, com a descrição dos produtos e dos serviços a serem explorados e da unidade de manejo; (ii) ao prazo da concessão; (iii) ao prazo máximo para o concessionário iniciar a execução do PMFS; (iv) ao modo, à forma, às condições e aos prazos da realização das auditorias florestais; (v) ao modo, à forma e às condições de exploração de serviços e prática do manejo florestal; (vi) aos critérios, aos indicadores, às fórmulas e aos parâmetros definidores da qualidade do meio ambiente; (vii) aos critérios máximos e mínimos de aproveitamento dos recursos florestais; (viii) às ações de melhoria e recuperação ambiental na área da concessão e seu entorno assumidas pelo concessionário; (ix) às ações voltadas ao benefício da comunidade local assumidas pelo concessionário; (x) aos preços e aos critérios e procedimentos para reajuste e revisão; (xi) aos direitos e às obrigações do poder concedente e do concessionário, inclusive os relacionados a necessidades de alterações futuras e modernização, aperfeiçoamento e ampliação dos equipamentos, infraestrutura e instalações; (xii) às garantias oferecidas pelo concessionário; (xiii) à forma de monitoramento e avaliação das instalações, dos equipamentos, dos métodos e práticas de execução do manejo florestal sustentável e exploração de serviços; (xiv) às penalidades contratuais e administrativas a que se sujeita o concessionário e sua forma de aplicação; (xv) aos casos de extinção do contrato de concessão; (xvi) aos bens reversíveis; (xvii) às condições para revisão e prorrogação; (xviii) à obrigatoriedade, à forma e à periodicidade da prestação de contas do concessionário ao poder concedente; (xix) aos critérios de bonificação para o concessionário que atingir melhores índices de desempenho socioambiental que os previstos no contrato, conforme regulamento; (xx) ao foro e ao modo amigável de solução das divergências contratuais.

No exercício da fiscalização, o órgão gestor terá acesso aos dados relativos à administração, contabilidade, recursos técnicos, econômicos e financeiros do concessionário, respeitando-se os limites do sigilo legal ou constitucionalmente previsto. Sem

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prejuízo das atribuições dos órgãos do Sisnama responsáveis pelo controle e fiscalização ambiental, o órgão gestor poderá suspender a execução de atividades desenvolvidas em desacordo com o contrato de concessão, devendo, nessa hipótese, determinar a imediata correção das irregularidades identificadas. A suspensão de que trata o § 2o do artigo 30 não isenta o concessionário do cumprimento das demais obrigações contratuais. As obrigações previstas nos incisos V a IX do caput do artigo 30 são de relevante interesse ambiental, para os efeitos do art. 68 da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Incumbe ao concessionário: (i) elaborar e executar o PMFS, conforme previsto nas normas técnicas aplicáveis e especificações do contrato; (ii) evitar ações ou omissões passíveis de gerar danos ao ecossistema ou a qualquer de seus elementos; (iii) informar imediatamente a autoridade competente no caso de ações ou omissões próprias ou de terceiros ou fatos que acarretem danos ao ecossistema, a qualquer de seus elementos ou às comunidades locais; (iv) recuperar as áreas degradadas, quando identificado o nexo de causalidade entre suas ações ou omissões e os danos ocorridos, independentemente de culpa ou dolo, sem prejuízo das responsabilidades contratuais, administrativas, civis ou penais; (v) cumprir e fazer cumprir as normas de manejo florestal, as regras de exploração de serviços e as cláusulas contratuais da concessão; (vi) garantir a execução do ciclo contínuo, iniciada dentro do prazo máximo fixado no edital; (vii) buscar o uso múltiplo da floresta, nos limites contratualmente definidos e observadas as restrições aplicáveis às áreas de preservação permanente e as demais exigências da legislação ambiental; (viii) realizar as benfeitorias necessárias na unidade de manejo; (ix) executar as atividades necessárias à manutenção da unidade de manejo e da infraestrutura; (x) comercializar o produto florestal auferido do manejo; (xi) executar medidas de prevenção e controle de incêndios; (xii) monitorar a execução do PMFS; (xiii) zelar pela integridade dos bens e benfeitorias vinculados à unidade de manejo concedida; (xiv) manter atualizado o inventário e o registro dos bens

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vinculados à concessão; (xv) elaborar e disponibilizar o relatório anual sobre a gestão dos recursos florestais ao órgão gestor, nos termos definidos no contrato; (xvi) permitir amplo e irrestrito acesso aos encarregados da fiscalização e auditoria, a qualquer momento, às obras, aos equipamentos e às instalações da unidade de manejo, bem como à documentação necessária para o exercício da fiscalização; (xvii) realizar os investimentos ambientais e sociais definidos no contrato de concessão.

As benfeitorias permanentes reverterão sem ônus ao titular da área ao final do contrato de concessão, ressalvados os casos previstos no edital de licitação e no contrato de concessão. Como requisito indispensável para o início das operações de exploração de produtos e serviços florestais, o concessionário deverá contar com o PMFS aprovado pelo órgão competente do Sisnama. Findo o contrato de concessão, o concessionário fica obrigado a devolver a unidade de manejo ao poder concedente nas condições previstas no contrato de concessão, sob pena de aplicação das devidas sanções contratuais e administrativas, bem como da responsabilização nas esferas penal e civil, inclusive a decorrente da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. O PMFS deverá apresentar área geograficamente delimitada destinada à reserva absoluta, representativa dos ecossistemas florestais manejados, equivalente a, no mínimo, 5% (cinco por cento) do total da área concedida, para conservação da biodiversidade e avaliação e monitoramento dos impactos do manejo florestal. Para efeito do cálculo do percentual previsto no caput do artigo 32, não serão computadas as áreas de preservação permanente. A área de reserva absoluta não poderá ser objeto de qualquer tipo de exploração econômica. A área de reserva absoluta poderá ser definida pelo órgão gestor previamente à elaboração do PMFS.

Para fins de garantir o direito de acesso às concessões florestais por pessoas jurídicas de pequeno porte, micro e médias empresas, serão definidos no PAOF, nos termos de regulamento, lotes de concessão, contendo várias unidades de manejo de

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tamanhos diversos, estabelecidos com base em critérios técnicos, que deverão considerar as condições e as necessidades do setor florestal, as peculiaridades regionais, a estrutura das cadeias produtivas, as infraestruturas locais e o acesso aos mercados. Sem prejuízo da legislação pertinente à proteção da concorrência e de outros requisitos estabelecidos em regulamento, deverão ser observadas as seguintes salvaguardas para evitar a concentração econômica: (i) em cada lote de concessão florestal, não poderão ser outorgados a cada concessionário, individualmente ou em consórcio, mais de 2 (dois) contratos; (ii) cada concessionário, individualmente ou em consórcio, terá um limite percentual máximo de área de concessão florestal, definido no PAOF. O limite previsto no inciso II do caput do artigo 34 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[28] será aplicado sobre o total da área destinada à concessão florestal pelo PAOF e pelos planos anuais de outorga em execução aprovados nos anos anteriores. O prazo dos contratos de concessão florestal será estabelecido de acordo com o ciclo de colheita ou exploração, considerando o produto ou grupo de produtos com ciclo mais longo incluído no objeto da concessão, podendo ser fixado prazo equivalente a, no mínimo, um ciclo e, no máximo, 40 (quarenta) anos. O prazo dos contratos de concessão exclusivos para exploração de serviços florestais será de, no mínimo, 5 (cinco) e, no máximo, 20 (vinte) anos.

4.3 Dos Preços Florestais

O regime econômico e financeiro da concessão florestal, conforme estabelecido no respectivo contrato, compreende: (i) o pagamento de preço calculado sobre os custos de realização do edital de licitação da concessão florestal da unidade de manejo; (ii) o pagamento de preço, não inferior ao mínimo definido no edital de licitação, calculado em função da quantidade de produto ou serviço auferido do objeto da concessão ou do faturamento líquido ou bruto; (iii) a responsabilidade do concessionário de realizar outros investimentos previstos no edital e no contrato; (iv) a indisponibilidade, pelo concessionário, salvo disposição contratual,

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dos bens considerados reversíveis. O preço referido no inciso I do caput do artigo 36 será definido no edital de licitação e poderá ser parcelado em até 1 (um) ano, com base em critérios técnicos e levando-se em consideração as peculiaridades locais. A definição do preço mínimo no edital deverá considerar: (i) o estímulo à competição e à concorrência; (ii) a garantia de condições de competição do manejo em terras privadas; (iii) a cobertura dos custos do sistema de outorga; (iv) a geração de benefícios para a sociedade, aferidos inclusive pela renda gerada; (v) o estímulo ao uso múltiplo da floresta; (vi) a manutenção e a ampliação da competitividade da atividade de base florestal; (vii) as referências internacionais aplicáveis. Será fixado, nos termos de regulamento, valor mínimo a ser exigido anualmente do concessionário, independentemente da produção ou dos valores por ele auferidos com a exploração do objeto da concessão. O valor mínimo previsto no § 3o do artigo 36 integrará os pagamentos anuais devidos pelo concessionário para efeito do pagamento do preço referido no inciso II do caput do dispositivo ora mencionado. A soma dos valores pagos com base no § 3o do artigo 36 não poderá ser superior a 30% (trinta por cento) do preço referido no inciso II do caput do dispositivo ora mencionado.

O preço referido no inciso II do caput do artigo 36 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[29]compreende: (i) o valor estabelecido no contrato de concessão; (ii) os valores resultantes da aplicação dos critérios de revisão ou de reajuste, nas condições do respectivo contrato, definidos em ato específico do órgão gestor. A divulgação do ato a que se refere o inciso II do caput do artigo 37 deverá preceder a data de pagamento do preço em, no mínimo, 30 (trinta) dias.O contrato de concessão referido no artigo 27 da legislação em comento poderá prever o compromisso de investimento mínimo anual. Os recursos financeiros oriundos dos preços da concessão florestal de unidades localizadas em áreas de domínio da União serão distribuídos da seguinte forma: (i) o valor referido no § 3o do artigo 36 será destinado: a) 70% (setenta por

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cento) ao órgão gestor para a execução de suas atividades; b) 30% (trinta por cento) ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, para utilização restrita em atividades de controle e fiscalização ambiental de atividades florestais, de unidades de conservação e do desmatamento; (ii) o preço pago, excluído o valor mencionado no inciso I do caput do artigo 39, terá a seguinte destinação: a) Estados: 30% (trinta por cento), destinados proporcionalmente à distribuição da floresta pública outorgada em suas respectivas jurisdições, para o apoio e promoção da utilização sustentável dos recursos florestais, sempre que o ente beneficiário cumprir com a finalidade deste aporte; b) Municípios: 30% (trinta por cento), destinados proporcionalmente à distribuição da floresta pública outorgada em suas respectivas jurisdições, para o apoio e promoção da utilização sustentável dos recursos florestais, sempre que o ente beneficiário cumprir com a finalidade deste aporte; c) Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF: 40% (quarenta por cento).

Quando os recursos financeiros forem oriundos dos preços da concessão florestal de unidades localizadas em florestas nacionais criadas pela União nos termos do art. 17 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000, serão distribuídos da seguinte forma: (i) o valor referido no § 3o do artigo 36 será destinado ao órgão gestor para a execução de suas atividades; (ii) o preço pago, excluído o valor mencionado no inciso I do caput do artigo 39, terá a seguinte destinação: a) Instituto Chico Mendes: 40% (quarenta por cento), para utilização restrita na gestão das unidades de conservação de uso sustentável; b) Estados: 20% (vinte por cento), destinados proporcionalmente à distribuição da floresta pública outorgada em suas respectivas jurisdições, para o apoio e promoção da utilização sustentável dos recursos florestais, sempre que o ente beneficiário cumprir com a finalidade deste aporte; c) Municípios: 20% (vinte por cento), destinados proporcionalmente à distribuição da floresta pública outorgada em suas respectivas jurisdições, para o apoio e promoção da utilização sustentável dos recursos florestais, sempre

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que o ente beneficiário cumprir com a finalidade deste aporte; d) FNDF: 20% (vinte por cento).

O repasse dos recursos a Estados e Municípios previsto no artigo 39 será condicionado à instituição de conselho de meio ambiente pelo respectivo ente federativo, com participação social, e à aprovação, por este conselho: (i) do cumprimento das metas relativas à aplicação desses recursos referentes ao ano anterior; (ii) da programação da aplicação dos recursos do ano em curso. Os recursos financeiros oriundos dos preços de cada concessão florestal da União serão depositados e movimentados exclusivamente por intermédio dos mecanismos da conta única do Tesouro Nacional, na forma do regulamento. O Tesouro Nacional, trimestralmente, repassará aos Estados e Municípios os recursos recebidos de acordo com o previsto nas alíneas a e b do inciso II do caput e nas alíneas b e c do inciso II do § 1o, ambos do artigo 39 da Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006[30]. O Órgão Central de Contabilidade da União editará as normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos recursos financeiros oriundos da concessão florestal e à sua distribuição.

Referência:

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

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__________. Lei nº 9.985, de 18 de Julho de 2000. Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

__________. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

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RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Disponível em: <www.tjrs.jus.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional Ambiental: Constituição, Direitos Fundamentais e Proteção do Ambiente. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

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NOTAS:

[1] VERDAN, Tauã Lima. Princípio da Legalidade: Corolário do Direito Penal. Jurid Publicações Eletrônicas, Bauru, 22 jun. 2009. Disponível em: <http://jornal.jurid.com.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

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[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão emArguição de Descumprimento de Preceito Fundamental Nº. 46/DF. Empresa Pública de Correios e Telégrafos. Privilégio de Entrega de Correspondências. Serviço Postal. Controvérsia referente à Lei Federal 6.538, de 22 de Junho de 1978. Ato Normativo que regula direitos e obrigações concernentes ao Serviço Postal. Previsão de Sanções nas Hipóteses de Violação do Privilégio Postal. Compatibilidade com o Sistema Constitucional Vigente. Alegação de afronta ao disposto nos artigos 1º, inciso IV; 5º, inciso XIII, 170, caput, inciso IV e parágrafo único, e 173 da Constituição do Brasil. Violação dos Princípios da Livre Concorrência e Livre Iniciativa. Não Caracterização. Arguição Julgada Improcedente. Interpretação conforme à Constituição conferida ao artigo 42 da Lei N. 6.538, que estabelece sanção, se configurada a violação do privilégio postal da União. Aplicação às atividades postais descritas no artigo 9º, da lei. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Marcos Aurélio. Julgado em 05 ag. 2009. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[3] VERDAN, 2009, s.p.

[4] BRITO, Fernando de Azevedo Alves. A hodierna classificação do meio-ambiente, o seu remodelamento e a problemática sobre a existência ou a inexistência das classes do meio-ambiente do trabalho e do meio-ambiente misto. Boletim Jurídico, Uberaba, ano 5, n. 968. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[5] MOTTA, Sylvio; DOUGLAS, Willian. Direito Constitucional – Teoria, Jurisprudência e 1.000 Questões 15 ed., rev., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2004, p. 69.

[6] BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[7] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) - Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa

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- Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98, ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna – Inconstitucionalidade. .Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[8] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 21 ed. atual. São Paulo: Editora Malheiros Ltda., 2007, p. 569.

[9] BRASIL. Lei Nº. 6.938, de 31 de Agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[10] SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores, 2009, p.20.

[11] FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 13 ed., rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 77.

[12] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 4.029/AM. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Federal Nº 11.516/07. Criação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Legitimidade da Associação Nacional dos Servidores do IBAMA. Entidade de Classe de Âmbito Nacional. Violação do art. 62, caput e § 9º, da Constituição. Não emissão de parecer pela Comissão Mista Parlamentar. Inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput e parágrafos 1º e 2º, da Resolução Nº 1 de 2002 do Congresso

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Nacional. Modulação dos Efeitos Temporais da Nulidade (Art. 27 da Lei 9.868/99). Ação Direta Parcialmente Procedente. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Luiz Fux. Julgado em 08 mar. 2012. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[13] THOMÉ, Romeu. Manual de Direito Ambiental: Conforme o Novo Código Florestal e a Lei Complementar 140/2011. 2 ed. Salvador: EditoraJusPodivm, 2012, p. 116.

[14] BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

[15] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Acórdão proferido em Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 1.856/RJ. Ação Direta De Inconstitucionalidade - Briga de galos (Lei Fluminense Nº 2.895/98) - Legislação Estadual que, pertinente a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa - Diploma Legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga - Crime Ambiental (Lei Nº 9.605/98, ART. 32) - Meio Ambiente - Direito à preservação de sua integridade (CF, Art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Proteção constitucional da fauna (CF, Art. 225, § 1º, VII) - Descaracterização da briga de galo como manifestação cultural - Reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada - Ação Direta procedente. Legislação Estadual que autoriza a realização de exposições e competições entre aves das raças combatentes - Norma que institucionaliza a prática de crueldade contra a fauna – Inconstitucionalidade. .Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgado em 26 mai. 2011. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

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[16] BRASIL. Lei Nº. 9.985, de 18 de Julho de 2000.Regulamenta o art. 225, §1º, incisos I, II, III e VII daConstituição Federal, institui o Sistema Nacional deUnidades de Conservação da Natureza e dá outrasprovidências. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015

[17] FIORILLO, 2012, p. 78.

[18] REBELLO FILHO, Wanderley; BERNARDO,Christianne. Guia prático de direito ambiental. Rio deJaneiro: Editora Lumen, 1998, p. 19.

[19] BRASIL. Constituição (1988). Constituição (da) República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[20] BRASIL. Supremo Tribunal Federal.Acórdão proferido na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade N° 3.540. Meio Ambiente -Direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225)- Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade - Necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio da coletividade, conflitos intergeneracionais – Espaços territoriais especialmente protegidos (CF, art. 225, §1º, III) - Alteração e supressão do regime jurídico a eles pertinente - Medidas sujeitas ao princípio constitucional da reserva de lei - Supressão de vegetação em área de preservação permanente - Possibilidade de a administração pública, cumpridas as exigências legais, autorizar, licenciar ou permitir obras e/ou atividades nos espaços territoriais protegidos, desde quer espeitada, quanto a estes, a integridade dos atributos justificadores do regime de proteção especial -Relações entre economia (CF, art. 3º, II, c/c o art. 170,VI) e ecologia (CF, art. 225) - Colisão de direitos fundamentais - Critérios de superação desse estado de tensão entre valores constitucionais relevantes – Os direitos básicos da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos (RTJ164/158, 160-161) - A questão da precedência do direito à preservação do meio ambiente: uma limitação constitucional explícita à atividade econômica (CF, art.170, VI) - Decisão não referendada – Consequente indeferimento do pedido de medida cautelar. A preservação da integridade do meio ambiente: expressão

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constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Trata-se de um típico direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que assiste a todo o gênero humano (RTJ 158/205-206). Incumbe, ao Estado e à própria coletividade, a especial obrigação de defender e preservar, em benefício das presentes e futuras gerações, esse direito de titularidade coletiva e de caráter transindividual (RTJ 164/158-161). O adimplemento desse encargo, que é irrenunciável, representa a garantia de que não se instaurarão, no seio da coletividade, os graves conflitos intergeneracionais marcados pelo desrespeito ao dever de solidariedade, que a todos se impõe, na proteção desse bem essencial de uso comum das pessoas em geral. Doutrina. A atividade econômica não pode ser exercida em desarmonia com os princípios destinados a tornar efetiva a proteção ao meio ambiente. - A incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida por interessesempresariais nem ficar dependente de motivações deíndole meramente econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele que privilegia a "defesa do meio ambiente"(CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral. Doutrina. Os instrumentos jurídicos de caráter legal e de natureza constitucional objetivam viabilizar a tutela efetiva do meio ambiente, para que não se alterem as propriedades e os atributos que lhe são inerentes, oque provocaria inaceitável comprometimento da saúde, segurança, cultura, trabalho e bem- estar da população, além de causar graves danos ecológico sao patrimônio ambiental considerado este em seu aspecto físico ou natural. A questão do desenvolvimento nacional (CF, art. 3º, II) e a necessidade de preservação da integridade do meio ambiente (CF, art. 225): O princípio do desenvolvimento sustentável como fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia. - O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia, subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos

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mais significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações. O art. 4º do Código Florestal e a Medida Provisória Nº 2.166-67/2001: Um avanço expressivo na tutela das áreas de preservação permanente. -A Medida Provisória nº 2.166-67, de 24/08/2001, na parte em que introduziu significativas alterações no art.4o do Código Florestal, longe de comprometer os valores constitucionais consagrados no art. 225 da Lei Fundamental, estabeleceu, ao contrário, mecanismos que permitem um real controle, pelo Estado, das atividades desenvolvidas no âmbito das áreas de preservação permanente, em ordem a impedir ações predatórias e lesivas ao patrimônio ambiental, cuja situação de maior vulnerabilidade reclama proteção mais intensa, agora propiciada, de modo adequado e compatível com o texto constitucional, pelo diploma normativo em questão. - Somente a alteração e a supressão do regime jurídico pertinente aos espaços territoriais especialmente protegidos qualificam-se, por efeito da cláusula inscrita no art. 225, § 1º, III, da Constituição, como matérias sujeitas ao princípio da reserva legal. - É lícito ao Poder Público - qualquer que seja a dimensão institucional em que se posicione na estrutura federativa (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) - autorizar, licenciar ou permitira execução de obras e/ou a realização de serviços no âmbito dos espaços territoriais especialmente protegidos, desde que, além de observadas as restrições, limitações e exigências abstratamente estabelecidas em lei, não resulte comprometida a integridade dos atributos que justificaram, quanto a tais territórios, a instituição de regime jurídico de proteção especial (CF, art. 225, § 1º, III). Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgado em 01 set. 2005. Publicado no DJe em 03fev. 2006, p.14. Disponível em: .Acesso em 26 ago. 2015..

[21] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

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[22] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[23] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[24] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[25] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de

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1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[26] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[27] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[28] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[29] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal

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Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

[30] BRASIL. Lei nº 11.284, de 02 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015, de 31 de dezembro de 1973; e dá outras providências. Disponível em: <www.plamalto.gov.br>. Acesso em 26 ago. 2015.

A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS DE MENORES INFRATORES

KENIA CARVALHO BARBOSA: Graduanda no Curso de Direito.

RESUMO: A Responsabilidade Civil dos pais de menores infratores se dá na reparação como obrigação solidária em indenizar aquele que sofreu um dano causado culposamente ou não pelo menor. Sabendo que o prejudicado tem direito de ser ressarcido, porém em consciência de que o menor é inimputável seus pais passam a ser responsáveis pela indenização. Existem fatores que tornam a responsabilidade uma obrigação também do Estado e da Sociedade para com a criança e o adolescente, devendo considerar-se ainda um julgamento adequado.

Palavras-chave: responsabilidade civil; reparação de danos; incapacidade; inimputabilidade; obrigação.

INTRODUÇÃO

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Este artigo tem por objetivo esclarecer sobre a responsabilidade civil dos pais de menores infratores, esta que se trata de reparar os danos causados por alguém que prejudica outra pessoa. Neste sentido há inquietações, então na tentativa de solucioná-las serão analisados fatores que podem trazer a responsabilidade aos pais e responsáveis, e por fim quais suas participações subjetivas nas atitudes e comportamentos dos filhos.

Para compreender tal situação analisaremos os artigos do Código Civil que falam da pessoa natural, da capacidade jurídica, das incapacidades e da proteção ao menor incapaz. Além de observar a Constituição Federal nos pontos referentes às crianças e adolescentes quanto à responsabilidade ou dever do Estado e da família em proporcioná-los condições para ter uma vida digna. Empenharemos também atenção ao Estatuto da Criança e do Adolescente para entender melhor a condição do menor infrator em comparação com os dispositivos do referido estatuto.

Todas estas questões servirão para entender melhor a situação problema escolhida a qual trata de um caso em que os pais de um menor foram negligentes ao permitir que este dirigisse o automóvel da família, causando um acidente que resultou em prejuízos ao dono do imóvel em que o referido carro colidiu. Assim os pais deverão se responsabilizar pelos prejuízos, ressarcindo os danos sofridos.

Esperamos ao final do trabalho compreender a responsabilidade civil dos pais de menores por atos cometidos pelos filhos infratores, em razão do direito da pessoa, a qual o dano foi causado, em ser indenizada.

1 RESPONSABILIDADE CIVIL

A responsabilidade civil se dá numa obrigação de reparar o dano que alguém causa a outra pessoa, este dano pode ser de cunho moral, físico ou até mesmo de prejuízo aos bens. Já a reparação é de caráter patrimonial, onde se paga uma indenização ao prejudicado.

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Historicamente a responsabilidade civil tem como caráter a justiça em ressarcir o prejuízo causado, onde já atuava nas primeiras civilizações, quando aqueles que foram prejudicados buscavam por conta própria se “vingar”. Segundo José de Aguiar Dias, “vingança primitiva, selvagem talvez, mas humana, da reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal” (2006, p.26).

Foi depois de algum tempo que o homem tornou-se mais capitalista, e então percebeu que o dano causado poderia ser ressarcido economicamente, e é por essa razão que a responsabilidade civil tem característica patrimonial.

Existem duas teorias acerca da prova de que determinada pessoa causou o dano, para que a mesma cumpra com sua responsabilidade civil. A primeira teoria é a subjetiva, sendo mais clássica, onde não tem importância classificar o dano em culposo ou doloso, pois o que se considera é o fato causado, outra é a teoria do risco, sendo esta objetiva, para tal concepção a pessoa causadora do dano, assume a responsabilidade de causar prejuízo a outra pessoa, mesmo que sua ação não seja de culpa.

Para a existência de se cumprir obrigatoriamente a responsabilidade civil deve haver a lei que estabeleça esta obrigação, sendo a lei fonte da obrigação. Para confirmar isto, a Constituição Federal afirma no artigo 5º, II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

A pessoa que vai ser responsabilizada pelo dano é aquela que o causou, podendo responder também pelo ato praticado por outra pessoa ou até mesmo por um acontecimento natural. Na primeira situação o responsável é aquele que causou o dano, como, por exemplo, o motorista é responsável no caso de o atropelamento tiver ocorrido por culpa ou dolo próprio, a segunda opção de responsabilidade que é aquela em que o responsável não é de quem causou o dano, como no caso dos pais que são responsáveis pelos atos de infração de seus filhos menores e por último

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existe a possibilidade da responsabilização por dano causado por um acontecimento natural, como a queda de um raio num poste de energia, que pode causar a perda de eletrodomésticos de uma casa, então a companhia de energia elétrica será a responsável pelo prejuízo.

2 A CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUANTO À PROTEÇÃO AO MENOR: DEVER DO ESTADO E DA FAMÍLIA

Ao falar em maioridade grande parte da sociedade cita a redução, entendendo que deve ser considerado maior aquele que tem 16 anos, um dos pontos para justificar esse pensamento é que a partir dos 16 anos se inicia a vida eleitoral, mesmo que de forma relativa. No sentido de que os jovens infratores cumpram pena do mesmo modo que os adultos.

Entretanto aqueles que defendem tal ideia talvez desconheçam a Constituição Federal quanto a seu tratamento com a criança e ao adolescente brasileiro. A Constituição traz de maneira abrangente direitos à criança e ao adolescente, como forma de garanti-los o que está disposto no Art. 1º, III- a dignidade da pessoa humana; todos têm direito a uma vida digna.

Assim como o Estado os pais são os principais responsáveis pela criação dos filhos, e em muitos casos, esta criação influencia na personalidade dos filhos, tendo então uma relação intrínseca com seu comportamento, por isso algumas vezes os pais sãos culpados mesmo que subjetivamente pelos atos ilícitos cometidos por seus descendentes menores, já que os mesmo são considerados absoluta ou relativamente incapazes. Segundo Rodrigues, “O mero fato de o menor ter praticado o ato ilícito talvez demonstre que ou não foi educado convenientemente ou não foi vigiado como era preciso” (2003, p. 66).

O relacionamento familiar é um fator que possui grande poder na formação moral e caráter de cada cidadão, os valores humanos como solidariedade e respeito são basilares que devem estar presentes em cada família, e por tanto presentes na criação dos filhos, para que os mesmos cresçam tendo consciência de direitos, deveres e principalmente de respeito

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para com o outro. Infelizmente a modernidade trouxe outras formas de convívio familiar e outros valores, que em muitos momentos não são capazes de moldar o caráter do menor.

O ordenamento jurídico busca através de seus dispositivos assegura a devida proteção à criança e ao adolescente, mas não deixa de determinar suas responsabilidades, assim como as obrigações de seus cuidadores, cada qual com a devida observação à matéria afetada.

2.1 O Estado, a Família e a Sociedade como principais responsáveis pela criança e adolescente

No sentido de promover a dignidade da criança e do adolescente a Constituição Federal de 1988 trouxe alguns dispositivos que tratam do tema, e trazem como principais responsáveis o Estado, a Família e a Sociedade:

Art. 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta propriedade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Assim como o Estado e a Família, a Sociedade também é responsável pela criança e adolescente, neste propósito todos devem se preocupar com os problemas enfrentados por estes já citados, mesmo que muitas vezes sejam decorrentes de fatos sociais como a discriminação, onde muitas crianças por viverem na rua são tratadas como animais e vistas por uma óptica preconceituosa, onde não lhes são proporcionadas educação, saúde e principalmente alimentação.

O abandono social é um dos motivos que fazem a marginalização alcançar altos níveis, além de vícios como álcool e drogas, que para serem

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sustentados levam ao roubo, e outros atos ilícitos, daí parte uma concepção de responsabilidade geral tanto do Estado, da Sociedade como civilmente da Família.

A responsabilidade do Estado é verifica também quanto à prestação jurisdicional, onde o ordenamento jurídico estabelece tratamento diferenciado às infrações cometidas por menores, assim diminuindo ou excluindo sua punição. O magistrado, que é representante do Estado em sua atividade jurisdicional deve agir com total imparcialidade e baseado na total legalidade. Contudo observa-se que as relações processuais, até mesmo as que envolvem adolescentes, são tidas como um jogo, onde o juiz é o julgador supremo, e as partes são os jogadores, ocorrendo, por vezes, jogadas desleais e arbitrarias. Na obra “Teoria dos Jogos”, o autor Alexandre Morais da Rosa, infere que,

Embora toda decisão se sujeite às suas contingências, o jogo processual penal possui regras (normatividade) às quais nem aos jogadores e nem ao julgador é dado trapacear. O jogo a ser jogado que aqui se fala é o jogo democrático. O devido processo legal, como diretriz, nada mais é do que a exigência da observância das regras do jogo, isto é, atribuir sentidos autênticos dentro de uma tradição na qual tanto os jogadores quanto o julgados estão inseridos. É o que veremos no capítulo a seguir. (p.45)

É imprescindível que o menor seja considerado em sua situação de incapacidade e de necessária proteção em todos os âmbitos, não sendo admissível que sejam sujeitos a processos dotados de irregularidades.

3 DA CAPACIADDE CIVIL DOS MENORES DE 18 ANOS

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Para compreender melhor sobre a responsabilidade civil dos pais em relação a seus filhos, vamos observar o Código Civil no que diz respeito à capacidade e incapacidades, nesta intenção perceberemos que aqueles menores de 18 anos possuem capacidade de direito, assim como todas as pessoas, pois para isso não há distinções de idade, nem em relação às deficiências mentais e desenvolvimento intelectual, como está previsto no Código Civil, art. 1º - Toda pessoa a é capaz de direito e deveres na ordem civil.

Para ser considerada capaz a pessoa deve ter ao mesmo tempo a capacidade de direito e a de fato, ou seja, a capacidade para exercer por si só os atos da vida civil, então entendemos que não é esta a capacidade que os menores de 18 anos têm, pois de acordo com o Código Civil:

Art. 3º – São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I- os menores de dezesseis anos.

Entretanto existe uma capacidade relativa que de acordo com o referido Código:

Art.4º - São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.

Estes possuem um maior desenvolvimento mental e intelectual, por isso podem praticar algumas atitudes da vida civil, como votar.

A incapacidade foi conferida às crianças e adolescentes, no sentido de protegê-las, já que as mesmas se encontram em desenvolvimento mental e intelectual, portanto deixá-las exercer os atos da vida civil seria prejudicial tanto para as mesmas quantos para as outras pessoas. E para explicitar a idade em que as pessoas se tornam absolutamente capazes, trata o art. 5º - A menoridade cessa aos dezoitos anos completos, quando a pessoa fica habilitada à pratica de todos os atos da vida civil.

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4 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS DE MENORES INFRATORES

Já vimos no presente artigo que a responsabilidade civil se trata na reparação de danos causados a alguém, para compreender a situação da família do menor analisaremos o Código Civil no art. 927- Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Neste artigo ao citar ato ilícito, refere-se à atitude de praticar uma ação que viole um direito garantido, portanto sua violação é considerada um ato ilícito. Para afirmar o Código Civil dispõe:

Art. 186 – Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Essa reparação obrigatória consiste numa indenização, que é estabelecida por uma obrigação solidária, que tem caráter patrimonial. Para Gelson Amaro de Souza “Sempre que os filhos causarem prejuízos a alguém, os pais são responsáveis pelos danos e seus patrimônios responderão pelo ressarcimento dos prejuízos causados” (1998, p.184). Para esclarecer acerca da responsabilidade dos pais, dispõe o art. 933 – As pessoas indicados nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos. Tal art. refere-se ao disposto no art. 932 – São também responsáveis pela reparação civil: I- Os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia.

Responsabilizar os pais pelos atos ilícitos cometidos por seus filhos menores, não significa apenas punir na tentativa de corrigir o erro, porém tem como principal função garantir o direito de a pessoa que sofreu o dano seja ressarcida. Trata-se de uma obrigação solidária pelo fato de que os pais, conjuntamente são devedores solidários nesta obrigação de ressarcimento. Na Concepção de Rodrigues “Se o infante causou dano a outrem, as pessoas

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por ele responsáveis devem ser compelidas a indenizar. E, no caso, as pessoas por ele responsáveis são os pais”. (2003, p.67)

Muitos pensam que fazer com que os pais respondam civilmente pelos danos causados por seus filhos é algo injusto, já que não foram os mesmos que cometeram as infrações, contudo não se trata de uma questão de punição injusta e sim de reparação justa, já que aqueles que sofreram têm todo e completo direito a serem indenizados. Para Joaquim José Calmon de Passos,

Essa especificidade da ação põe necessariamente o problema da responsabilidade. A partir do momento em que a ação é confrontada com uma situação de indeterminação, na qual alternativas são possíveis, a decisão por uma delas vincula o resultado ao querer do agente. A indeterminação deixou de existir em virtude de iniciativa que só dependeu do agente. O que quer que ele tenha feito, qualquer que seja o critério utilizado em sua decisão, poderemos dizer que se tal efeito se produziu foi porque tal iniciativa foi tomada. Neste sentido, a responsabilidade se relaciona com as ações que já foram realizadas (refere-se ao passado). (P. 15)

Assim entende-se que a partir do momento em que uma ação ou omissão produziu determinado dano, este deve ser reparado, não podendo os responsáveis eximir-se desta obrigação.

5 DA OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS PAIS

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Ter um filho ultrapassa as barreiras emocionais, o dever para com este abrange também uma responsabilidade em relação a tudo, ou quase tudo, que o envolve. Por isso no atual momento social, muitas pessoas ponderam quanto a esta possibilidade. Isto pois, além das diversas obrigações quanto ao âmbito familiar, referente ao poder inerente aos genitores pela guarda e educação social, cultural para o correto desenvolvimento dos filhos, existem também deveres patrimoniais, como o que se refere à responsabilidade de arcar com despesas referentes aos tributos.

A criação de um ser abrange inúmeras responsabilidades, isto, pois como se sabe trata-se de uma pessoa em formação que é dependente em quase todos os aspectos. Sabe-se que em matéria penal os pais não são responsabilizados punitivamente com restrição de sua liberdade por infração cometida pelo filho menor, tendo em vista o corolário principio da individualização e pessoalidade da punição.

No ponto quatro entendemos que os pais são devedores solidários na obrigação de reparar os danos causados por seus filhos menores, se tratando então de uma responsabilidade civil. Sabe-se que, obrigação é uma relação jurídica na qual o devedor deve cumprir uma prestação em favor do credor, este tendo direito a exigi-la judicialmente executando o patrimônio do devedor, por isso é economicamente apreciável.

Obrigação solidária é uma classificação de um tipo de obrigação em que se tem sujeitos múltiplos, os quais podem ser sempre mais de um devedor ou mais de um credor, e até mesmo devedores e credores de uma mesma obrigação. O Código Civil nos artigos referentes à obrigação solidária tratam destas especificações referentes aos sujeitos.

Art. 264 – Há solidariedade, quando numa mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda. Então os pais são devedores solidários na

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obrigação de indenizar o credor do dano que é o prejudicado.

Entendendo então que a solidariedade é a forma de garantir ao credor o cumprimento da obrigação, e sabendo também que não se presume a solidariedade, esta deve vir da vontade das partes, ou da lei, e é desta ultima que vem a obrigação solidária dos pais, pois o Código Civil no art. 932, inc. I, indica que “os pais”, ou seja, tanto o pai quanto a mãe são responsáveis pela reparação.

O fato de o menor não possuir condições próprias para pagar sua dívida referente ao dano causado, estabelece que os pais como responsáveis tenham de cumprir solidariamente a obrigação de ressarcir o prejudicado, o que faz aumentar as possibilidades de a vítima receber o pagamento, sendo uma forma de assegurar o cumprimento da obrigação.

6 O MENOR INFRATOR E SUA PROTEÇÃO LEGAL

O Estatuto da Criança e do Adolescente traz assim como a Constituição Federal no art. 227, deveres do Estado, da Sociedade e da Família em proporcionar aos menores condições para uma vida digna, com educação de qualidade, lazer, alimentação e saúde.

De acordo com o art. 228 da Constituição Federal, art. 104 do ECA e art. 27 do Código Penal, os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis. Porém aqueles que cometem infrações estão sujeitos às medidas dispostas nos art. 101, incisos I a VI, e art. 112 do ECA. Estes dispositivos têm objetivo de “educar” os menores infratores quanto aos erros cometidos, como as medidas socioeducativas.

Tendo em vista não só a responsabilidade civil dos pais dos menores, mas também a realidade do tratamento de toda a sociedade - sendo esta uma responsável - quanto à criança e adolescente infrator, visto que na maioria dos casos os mesmos pertencem a uma classe social menos favorecida, onde aqueles direitos garantidos pela Constituição Federal e pelo Estatuto

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da Criança e Adolescente pouco são aplicados efetivamente e com o absolutismo necessário.

A proteção ao menor infrator deve se dar também na prestação jurisdicional, isto quer dizer que no processo em que é apurada a conduta deste, prezar ainda mais pelo respeito aos princípios processuais constitucionais. Quanto à observação e aplicação de tais fundamentos basilares, mister a concepção de Marcelo Martins Altoé, que assim entende “É bem de ver que, ao lado do princípio do contraditório, a garantia a ampla defesa é um princípio decorrente do devido processo legal, sendo-lhe uma exigência indissociável. ” (p.69)

Entendemos ser a união do Estado com uma melhor política de educação, saúde, lazer, reabilitação e ressocialização do menor infrator, com proteção da família e por fim apoio da sociedade que as crianças e adolescentes terão realmente aquilo que está previsto na Constituição Federal, como um princípio no art. 1º, III- a dignidade da pessoa humana.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Podemos entender que a responsabilidade civil se dá numa obrigação que deve sempre está prevista numa lei, para ser judicialmente apreciável. Onde o causador do dano responderá pelo prejuízo em favor da vítima.

No caso da responsabilidade civil dos pais que está prevista no Código Civil, art. 932, I, temos uma obrigação solidária, e como tal tem caráter patrimonial. Esta obrigação serve como uma garantia para vítima, que tem mais chances de ser indenizado, mesmo que o causador do dano, que no caso é um menor, portanto, incapaz e inimputável.

Tem-se os pais como principais responsáveis pelos filhos menores por serem a família, mas sabendo também que o Estado tem grande importância na “criação” destes, pois tem de disponibilizar condições dignas de crescimento e desenvolvimento aos menores, como educação,

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saúde e lazer. Por fim temos toda a sociedade como um dos responsáveis tendo que respeitar, ajudar e auxiliar os menores.

Outra hipótese além da incapacidade civil e inimputabilidade do menor, é que se o mesmo cometeu o ato que causou dano culposamente, indiretamente à culpa é de seus pais que têm o dever de educá-lo e protegê-lo. A Constituição Federal no art. 229 cita: “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores...”, ao dispor isto quer dizer que os pais são responsáveis pela educação que dão a seus filhos, e conseqüentemente por seus atos, já que se os filhos são educados pelos pais, assistidos e criados pelos mesmos, suas atitudes são reflexos da educação que receberam.

REFERÊNCIAS:

ALTOÉ, Marcelo Martins. Direito versus dever tributário: colisão de direitos fundamentais.

Temas fundamentais de direito v. 9. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009;

DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil.11º Edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2006;

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil esquematizado, volume I. São Paulo: Saraiva, 2011;

PASSOS, José Joaquim Calmon de. Direito, poder, justiça e processo: julgando os que nos julgam. – Rio de Janeiro: Forense, 2003;

RODRIGUES, Silvio. Direito civil v. 4. Responsabilidade civil. 20ª Ed, revista e atualizada de acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406. de 10-1-2002). São Paulo: Saraiva, 2003;

ROSA, Alexandre Morais da. Guia compacto do processo penal conforme a teoria dos jogos. – 1. Ed. – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013;

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SARAIVA, Editora. Vade Mecum Compacto. 5ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011;

SOUZA, Gelson Amaro de. Responsabilidade dos pais pelos danos causados pelos filhos. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos, Bauru, n. 23, p. 167-217, ago./nov. 1998.

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RESPONSABILIDADE CIVIL DOS ADVOGADOS

MAXUEL PAULINO SOUSA: Bacharelando do curso de direito.

Introdução

A responsabilidade civil pode se manifestar como resultado de muitas situações que advém do cotidiano social, das várias formas de o sujeito praticar atos da sua vida civil. Cita-se aqui a responsabilidade advinda de alguma atividade, ações, atribuições, encargos, ou serviços desempenhados por uma pessoa, mais precisamente a atividade profissional, que se caracteriza como aquela em que há uma sequência de ações praticadas por um determinado sujeito em decorrência de seu oficio, seja ele autônomo ou não.

Advocacia se insere no campo da responsabilidade civil decorrente de atividade profissional. Muita discussão há em torno de ser esta uma atividade que gera responsabilidade civil somente na esfera subjetiva, ou se a esta pode ser aplicada a teoria do risco trazendo a possibilidade de ser também de natureza objetiva.

A regra geral é que a responsabilidade decorrente de atividade profissional é de natureza contratual. Aqui a atividade realizada pelo profissional é previamente ajustada entre ele e a outra parte, há nesse sentido a formação de um negócio jurídico, e como sabemos a responsabilidade que não é consequência de um ato ilícito é de natureza contratual, por exclusão.

Desenvolvimento

Advogado é um profissional liberal. Este possui capacidade postulatória para estar em juízo. É o bacharel em ciências jurídicas que fora aprovado no exame de ordem dos advogados do Brasil e possui seu registro junto ao órgão.

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Muito mais que uma profissão o advogado exerce uma função social de ordem pública exerce uma função essencial ao andamento da justiça. Sua tarefa é aplicar princípios e regras pré-estabelecidas nos vários aspectos do ordenamento jurídico para equilibrar e solucionar conflitos. Visto ser de tamanha importância suas atividades, deve-se tratar com ponderação com respeito aos danos que este venha a causar tanto na esfera do particular que se utilizada dos seus serviços, como na esfera pública em geral onde o Estado se encontra inserido.

Fundamento e configuração da responsabilidade

Ao mandato é o meio legal pelo qual o advogado celebra um contrato com seu cliente, gerando assim responsabilidades para aquele.

Uma importante questão, dentro da responsabilidade contratual na qual se encontra a do advogado, diz respeito a esta ser de meio ou de fim. De fim, é aquela em que o profissional tem a obrigação de garantir o resultado firmado no contrato respondendo pela ocasião de não atingir tal resultado. A obrigação de meio é aquela em que o profissional se obriga a agir com toda a cautela e diligência que esteja ao seu alcance para se atingir o resultado, mas por ser apenas de meio e não de fim, o resultado diverso do pretendido não responsabiliza este, a menos que haja ele com dolo ou culpa.

Muito importante é frisar quem embora sua responsabilidade se de forma tão acentuada, o profissional do direito assume uma responsabilidade, em princípio, de meio. Ele é o meio que têm os demais entes para se chegarem ao juízo de resolução de conflitos. Sem sua capacidade de postular perante órgão judicial, ninguém poderá acionar o judiciário para que se tenha a solução de sua demanda, salvo algumas ressalvas legais.

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O advogado não pode garantir o resultado de suas atividades deve ele, apenas desenvolve-las com a diligência e competência que lhe cabe. Ele assim apenas conduz seu cliente por meio de conselhos e apresenta-lhe a forma que existe na lei que pode ser utilizada para se tentar resolver do melhor modo possível sua lide de acordo com o resultado que este pretende atingir. Tal resultado apenas dependerá do julgador a quem cabe a decisão final do conflito aonde este não poderá interferir visto ser esta uma função pública somente desempenhada pelo juiz natural aquele que representa o estado na solução dos conflitos e na busca pela paz social.

Apesar de em regra ser de meio a responsabilidade dos advogados, estas poderão em determinados casos serem de fim, aonde estes deverão garantir o resultado de sua atuação. São exemplos de imperícia profissional de advogado segundo Fabio Ulhoa coelho:

Perder o prazo da contestação ou recurso; deixar de protestar títulos que lhe foram confiados à cobrança, sustentar a conclusão de parecer em dispositivo de lei revogado, caso vigore outro com comando em sentido oposto; não propor a discussão de cláusula essencial aos interesses do cliente no transcurso de negociações dum contrato; não advertir, oralmente ou por escrito, o cliente acerca do risco, quando houver, de determinadas condutas ou decisões serem consideradas ilegais (cf. Dias, 1954,1: 328/338).

Para se caracterizar tal responsabilidade deverá ser feito um exame de cada caso concreto para só assim se apurar se realmente este agiu com alguma parcela de culpa ou até mesmo de dolo,

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podendo assim se definir a extensão da sua responsabilidade. Este responde assim, pelos erros de fato e de direito que venha a causar.

Deve agir esse com zelo e cautela. A atividade advocatícia hoje requer um cuidado extremo, pois, por melhor que seja o direito do cliente este pode vir a sofrer os efeitos da sucumbência por ocasião da propositura de ações que não se amoldem aos termos do caso concreto apresentado. Requer-se para toda ação que se vá levar a juízo, um estudo prévio das possibilidades e formas de adequar estas ao direito processual, nunca de forma esporádica, mas com a certeza de que esta seja o melhor caminho a percorrer para se chegar a procedência a seu favor. É fora de dúvida que o profissional deve ser responsabilizado pelos resultados se não agir de tal forma. Se este, por um exemplo, estiver incumbido de uma ação de difícil êxito, que vá contra jurisprudência e doutrina dominante, recusar um acordo que a parte contrária ofereça indo contra a vontade até mesmo de seu próprio cliente, apenas por simples capricho em tentar a qualquer modo vencer a demanda ou para auferir um valor maior de honorários e acaba sofrendo os efeitos da sucumbência, como tudo anteriormente já indicava, poderá ser responsabilizado pelo valor que aquele poderia vir a ganhar caso o acordo tivesse sido aceito.

Sendo assim, o advogado deve respeitar a vontade de seu cliente, e se não concordando poderá renunciar o mandato. O que não se admite é agir de forma livre no que se refere a direito de outrem do qual é apenas condutor dentro da esfera judicial.

Há responsabilidade também por ato de terceiros associados. Neste caso os associados responderão perante seus clientes por atos de seus colegas se comprovados erros grosseiros e graves cometidos por estes, somente comprovados que os erros se deram por questões inevitáveis poderão se eximir da responsabilidade caso contrário todos poderão ser responsabilizados.

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Os atos de advogados em princípios se sujeitam apenas a sansões disciplinares impostas por leis específicas como o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o código de ética profissional, mas podem ser estendidas tanto a esfera do direito civil como do direito penal de acordo com a extensão e gravidade do ato por ele praticado.

Frise-se, pois, que a responsabilidade civil por qualquer que seja o grau de culpa (leve, grave ou gravíssima), impõe o dever de indenizar, não há aqui a possibilidade de que o advogado se isente de responsabilidade arguindo erro mínimo sem intenção, a responsabilidade estará caracterizada. Esse dano se estende a esfera patrimonial, naquilo que o cliente poderia ganhar na demanda ou aquilo que efetivamente tenha gasto, como custas processuais por um exemplo, como se estende também a esfera do dano moral pela insatisfação de ter perdido uma causa em relação a um direito porventura, certo e bom do qual não poderá mais pleitear diante da figura judicial e não poderá ter sua pretensão atendida perante este.

Responsabilidade pela perda de uma chance

A responsabilidade decorrente de tal instituto decorre geralmente de uma omissão por parte do advogado. Age este assim sem a diligência que lhe é imputável ao manejar o direito de seu cliente. A perda de uma chance se caracteriza quando o profissional deixa de ajuizar no tempo hábil uma ação, por um exemplo, fazendo com que o cliente, que representa perante o juízo de resolução de conflitos, nem mesmo tenha a chance de tentar sair-se vitorioso em seu direito. O profissional que deixa transcorrer o prazo legal sem recorrer de decisão, deixa de produzir provas necessárias, deixa de interpor pedidos dentro do processo, some com autos do processo sem explicação, deixa de formular contrarrazões em recurso, enfim deixa de prover a defesa do seu cliente que lhe é devida age com irresponsabilidade no seu oficio. O advogado assim no seu dever

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de zelo pelo patrimônio de seu cliente deve sempre mantel tal informado sobre mudanças, sobre possibilidades e decisões que podem mudar o rumo do processo, pois, se da sua decídua o cliente vier a perder a chance de conseguir algo a seu favor por conta de um mau conselho de seu advogado, pela orientação em desistir ou fazer um mau acordo poderá responsabilizar o profissional independente de este agir com culpa ou mesmo com dolo, visto ser o zelo e o cuidado essência da prestação de serviços advocatícios.

A indenização oriunda desses casos é regulada pelo arbítrio e pelo bom senso do juiz, sendo que este primeiro analisa se ouve realmente a perda da chance e em seguida se entender que sim arbitra a indenização. É impossível quantificar objetivamente o montante de indenização de tal natureza. Não se perde aqui uma ação com valores reais e concretos se perde uma chance. Tal chance se firma em possibilidades, em algo que poderia acontecer ou não. Imagine, pois, que sobre determinados julgados tiverem jurisprudências fortes a favor do direito em questão, se houvesse súmulas que já eram aplicadas em casos semelhantes seria fácil deduzir que possivelmente essa demanda seria julgada procedente sendo que foi apenas a omissão do advogado que impediu a possibilidade de o julgado ser analisado e por ventura se obter o direito pretendido. “Mera possibilidade não é passível de indenização, pois a chance deve ser séria e real para ingressar no domínio do dano ressarcível” (ROBERTO GONÇALVES).

A doutrina tem entendimento de que o valor da indenização não deverá ultrapassar o que poderia ser ganho pelo cliente caso tivesse sido vitorioso na demanda. Assim na proporção de seu direito poderá ser arbitrada a indenização.

O que realmente importa aqui é que entre o resultado e a conduta do advogado haja um nexo de causalidade e o dano devidamente comprovados, para que haja sua responsabilização.

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Inviolabilidade profissional

O advogado possui no desenvolvimento de suas atividades inviolabilidade profissional nos moldes do art. 142, I, do código penal, “Não constituem injúria ou difamação punível: I - ofensa irrogada em juízo, na discussão da causa, pela parte ou seu procurador”. A Lei n. 8.906/94 em seu § 2.° do art. 7° reforça tal entendimento, definindo que a imunidade do profissional da área da advocacia assegura que não constitui injúria, difamação ou desacato puníveis, qualquer manifestação apresentada por ele, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, observando que poderá ser responsabilizado disciplinarmente perante a OAB, pelos excessos cometidos.

Tal imunidade a lei apresenta apenas para os advogados não podendo tal entendimento ser estendido aos juízes, membros do Ministério Público, as partes e aos cidadãos em geral. Tal imunidade, porém não se apresenta de forma absoluta, só é aplicável aos atos que pratica de forma lícita e dentro dos autos do processo não se permitindo que fuja destes e traga para dentro da discussão fatos diversos dos discutidos em juízo que difamem ou atinjam a honra e dignidade das partes integrantes do litígio. Sendo assim não há que se falar em dano moral se o advogado age dentro dos limites que a lei lhe assegura.

Conclusão

Conclui-se assim pelo presente exposto que, profissionalmente a advocacia possui um caráter diferenciado, com suas próprias regras e exceções. Seu regulamento, meios de atuação, modos de se apresentar em juízo seu diferencial é notável no grande ramo dos profissionais liberais que se encontra no mercado. Não poderia ser assim, diferente quanto a sua responsabilidade que também se diferencia. Esta é, em regra, como visto de meio. Aquilo que o profissional busca é atingir um resultado

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positivo, pois, assim o benefício será mútuo para ele e seu cliente já que sua remuneração na maior parte das demandas depende de sua boa atuação e de resultados favoráveis, porém não obrigatórios. Na razoabilidade de sua atividade é dever observar a obrigação de diligência, substancial da profissão, pois, é a partir daí, da sua diligência e de seu cuidado, que se fundamenta a sua responsabilidade quanto a resultado diverso do pretendido. A lei busca assim, atribuir a responsabilidade civil por dano causado a cliente na ideia de culpa ou mesmo de dolo do advogado. O prejudicado, para responsabilizar o advogado, terá assim que demonstrar o nexo de causalidade e a culpa de seu representante, ai será gerada uma responsabilidade que pode ser mais leve apenas com penalidade disciplinar ou civil e em casos mais graves responsabilidade penal.

Referencias

Coelho, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, volume 2: obrigações : responsabilidade civil / Fábio Ulhoa Coelho. – 5. ed. – São Paulo : Saraiva, 2012.

Gonçalves, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 4: responsabilidade civil / Carlos Roberto Gonçalves. — 7. ed. — São Paulo : Saraiva, 2012.

Gagliano, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 3: responsabilidade civil / Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. — 10. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2012.

http://jus.com.br/artigos/8324/conceito-e-caracteristicas-da-advocacia

UMA ABORDAGEM PEDAGÓGICA DAS REDES SOCIAIS

SHIRLEI MARIA DA SILVA COSTA: Acadêmica da Faculdade Ages, do curso de Letras.

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RESUMO: A demanda de fatores externos, bem como, da aplicação 

dos hipertextos em sala de aula, fazendo com que, esse gênero textual, 

contribua  consideravelmente  para  o  desenvolvimento  da  qualidade  do 

ensino. Essa  interação entre o uso da rede social e o ambiente escolar, 

demonstra  que  a  clientela  vem  se  renovando  à  medida  que  o  tempo 

decorre, sendo para isso, necessária a adaptação do corpo administrativo 

e pedagógico afim da  resolução dessas novas aptidões estudantis.  Esse 

interesse pelas redes sociais é perceptível na juventude atual, pelo fato, 

de proporcionar a interação entre pessoas de locais distintos em tempo 

real. Desse modo, a comunicação entre estes mesmos indivíduos torna‐se 

evidente, possibilitando a construção de variadas línguas, dentro de um 

mesmo  idioma,  isso  porque,  as  variedades  linguísticas  são  marcas 

importantes entre as pessoas e seus dialetos. 

PALAVRAS–CHAVE: redes  sociais  em  sala  de  aula;  transformação 

social; mudança escolar. 

1. INTRODUÇÃO

As  redes  sociais  surgem  como  uma  ferramenta  que  possui  por 

finalidade  a  interação  virtual  entre  os  indivíduos.  Haja  vista  que,  o 

processo  global  que  se  vivencia  na  atualidade,  necessita  de  um 

instrumento que possibilite a relação mais próxima entre as pessoas.

Assim, inclusão das redes sociais no âmbito escolar é importante, 

pois,  une  as  transformações  da  sociedade  ao  processo  que  perpassa  o 

sistema  da  educação.  É  preciso,  porém,  que  se  analise  a  prática  do 

docente  em  sala,  haja  vista,  que  muitos  dos  professores  de  Língua 

Portuguesa que atuam na rede estadual ou municipal de ensino, aplicam 

métodos  já  ultrapassados  na  finalidade  de  transmitir  o  “conteúdo” 

estabelecido nos planos de  curso, mas que de nada valem a pena  se a 

prática não for condizente com os fatores da aprendizagem. Desse modo, 

os alunos, a partir do uso da rede social como método educacional, são 

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encaminhados  por  um  processo  de  criticidade  permeado  pela 

comunicação na internet, tornando‐se perceptível a partir do meio virtual. 

2. A RELAÇÃO COMUNICATIVA E AS TRANSFORMAÇÕES

VIRTUAIS

A  escrita  e  a  linguagem  são  algumas  das  artes  mais  belas  que 

expressam naturalidade e emoção. Não há homem, nem povo que possa 

viver sem comunicação, pois ela faz uma conexão com toda a história e a 

essência do ser humano em sua trajetória durante seu processo da escrita, 

fala e expressão entre a linguagem. Numa variação que atropela o modo 

habitual da comunicação, surge um processo de virtualização, mostrando 

que  a  arte,  não  conseguiria  viver  sem  comunica‐se,  provavelmente, 

chegaria à loucura por não interagir com o seu meio. Pierre Levy corrobora 

com esse pensamento ao afirmar: “a comunicação só se distingue da ação 

porque visa mais diretamente ao plano de representações” (LEVY, 1996, 

p. 21).

O uso da comunicação se manifesta nas Redes Sociais a partir do 

momento  em  que  o  dos  hipertextos  postos  à  disposição  nas  mídias 

possibilitando  a  inter‐relação  entre  as  pessoas,  através  das  redes. “Ao 

entrar em um espaço interativo e reticular de manipulação, de associação 

e  de  leitura,  a  imagem  e  o  som  adquirem  um  estatuto  de  quase 

textos” (LEVY,  1996,  p.  32).  Manuel  Castells  (2003,  19),  afirma  que  a 

comunicação é um ato biológico e com a interação a partir da internet essa 

comunicação  transforma‐se  em  uma  forma  social  perante  a  interação 

comunicativa.  

A  linguagem  virtual  surgiu  para  que  as  pessoas  pudessem  se 

comunicar desenvolvendo a interação social. Os sinais dos problemas no 

que  tange  o  ensino  de  língua  começam  a  surgir  a  partir  do  ensino 

fundamental,  onde  a  comunicação  transforma‐se  em  escrita  e  então, 

instrumento de ensino. 

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As mudanças educacionais acontecem à medida que a sociedade 

se  transforma  porque  precisam  atender  às  necessidades  da  nova 

demanda  de  alunos.  Seria  desastroso  se  a  escola  parasse  no  tempo  e 

aplicasse somente uma metodologia. 

A mudança mais evidente no que tange os processos educacionais 

corresponde  ao  uso  das  mídias  sociais  no  sistema  de  ensino 

aprendizagem.  Valente  (1993),  utilizar  o  computador  na  educação  de 

maneira inteligente implica num processo de entender a tarefa na qual o 

computador será empregado. Não somente de utilizar um mecanismo que 

facilite  o  processo  do  ensino  tradicional,  onde  o  professor  administra 

essas informações e avalia o aluno, mas sim, com o intuito de transformar 

o sistema atual de ensino, a fim de levar o aluno a construir o seu próprio 

conhecimento,  a  raciocinar  sobre  o  processo  dos  acontecimentos  e  a 

manipular a informação. 

Esse processo se verifica, principalmente, pelo frequente uso das 

redes sociais, entre os adolescentes, estudantes do ensino fundamental II. 

No argumento de Pierre Levy é evidente a afirmativa, haja vista, o qual, 

mensura, “o hipertexto retoma e transforma interfaces da escrita”. (LEVY, 

1996, p. 34) 

Assim  pode‐se  perceber  que  o  indivíduo  que  usa  a  linguagem 

como  ferramenta  comunicativa  e  compreende  o  processo  evolutivo  da 

linguagem, consegue transformar seu modo de pensar e agir, pelo fato de 

ter  acesso  a  informações  e,  consequentemente  elementos 

argumentativos. 

3. CONCLUSÃO

Fica  estabelecido,  portanto,  que  o  contexto  sociocultural  do 

discente é de profunda importância para a formação como agente crítico 

e  motivador  de  transformação  na  sociedade.  Isso  porque,  a  partir  do 

momento que é estimulado pelo uso de textos globais para a construção 

de seu próprio conhecimento, o discente vê o mundo como um horizonte 

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a  ser  descoberto  por  ele,  pois  percebe  que  o meio  que  cerca  está  em 

convívio encontra‐se interligado às percepções que o sistema educacional 

busca transmitir, quebrando então o velho paradigma correspondente ao 

aspecto que a educação se faz na escola.

Por fim, fica caraterizado que as redes sociais são grande aliado do 

corpo docente em prol do processo educativo, havendo, porém, um sério 

entrave,  quanto  seu  uso  em  sala  de  aula,  pela  falta  de  formação  do 

professor  o  que  acomete  a  função  da  atividade,  influenciando 

negativamente o seu uso e a “abertura” no ambiente educacional. 

4. REFERÊNCIAS

CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. Trad. Rosineide Venancio Majer; atualizada 6ª ed.: Jussara Simões. – São Paulo: Paz e Terra, 1999.

________________. A Galáxia da Internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a sociedade.Trad. Maria Luiza X. de A. Borges; rev. Paulo Vaz. – Rio de Janeiro: Zahar, 2003.

LEVY, Pierre. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. São Paulo: Ed. 34, 1996.

___________. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999. VALENTE, José Armando. Por Quê o Computador na

Educação? In: Computadores e Conhecimento: Repensando a Educação, 1993.

VIEGAS, Lilian Mara; OSÓRIO, Alda Maria Dela Cruz. A transformação da educação escolar e sua influência na sociedade. Disponível em:http://www.intermeio.ufms.br/revistas/26/Intermeio_v13_n26_Lilian%20Mara.pdf

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FACULDADE FARIAS BRITO CURSO DE DIREITO

O SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS E O DIREITO BRASILEIRO: UMA ANÁLISE DO CASO GOMES LUND

Robério Lopes de Aguiar Filho

FORTALEZA-CE

2014

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FACULDADE FARIAS BRITO CURSO DE DIREITO

O SISTEMA INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS E O DIREITO BRASILEIRO: UMA ANÁLISE DO CASO GOMES LUND

Robério Lopes de Aguiar Filho Monografia apresentada ao curso de Direito da Faculdade Farias Brito como critério parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Professora Me. Renata Neris Viana

FORTALEZA-CE 2014

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Esta monografia foi submetida ao curso de Direito da Faculdade Farias

Brito como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau Bacharel em

Direito. Na avaliação da banca este trabalho obteve o conceito _________________

conferido pelos avaliadores da banca e outorgada pela referida Faculdade.

A citação de qualquer trecho desta monografia é permitida, desde que seja

feita de acordo com as normas científicas.

_____________________________________

Robério Lopes de Aguiar Filho

Banca examinadora:

_____________________________________

Prof.ª Me. Renata Neris Viana

ORIENTADORA

_____________________________________

Prof.ª Me. Débora Barreto Santana de Andrade

EXAMINADORA

_____________________________________

Prof.ª Me. Ana Luisa Demoraes Campos

EXAMINADORA

Monografia avaliada em 07 de novembro de 2014.

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À minha família. Aos meus amigos.

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AGRADECIMENTOS

A Deus por tudo que representa em minha vida e também por ter me dado a

força necessária para a conclusão do presente trabalho.

Aos meus pais, Robério e Gorete,que desde a escolha do curso de Direito

me incentivaram e me apoiaram para que eu pudesse ter a formação mais completa

possível, além do que sempre acreditaram no meu potencial.

Ao meu irmão que também sempre esteve ao lado. À minha tia França, que

me tem como filho e ao seu modo sempre soube me agradar de um jeito muito especial.

Aos meus avós paternos, Aguiar e Socorro, e aos avós maternos, Calisto e

Crismar, pelo exemplo e pelos princípios que ensinaram aos meus pais que foram

passados a mim, fazendo com que eu me tornasse um cidadão mais humano e coerente

nas minhas atitudes.

À querida Solange, que desde há muito cuida do meu lar com muito esmero,

propiciando um ambiente familiar afável, o que muito contribui para os estudos.

Aos amigos Hernandes, Jader, Lara, Lucianne, Marlon e Walessa, que são

de longas datas e até hoje continuam a deixar minha vida mais agradável.

Aos fraternos amigos que conquistei na Faculdade, em especial, à

queridaamiga Liana e seus familiares, que sempre estiveram presentes desde o início da

graduação, acompanhando e vibrando com os meus resultados, desta maneira,

permitindo a criação de um vínculo fraternal contagiante.

À querida amiga Marina, que com o seu entusiasmo, me fez acreditar que

sempre posso ir mais longe.

Aos amigos Alysson, Adélia e Paula, que tive a satisfação de conhecer por

termos em comum os mesmos ideais de mundo e também pela honra de tê-los ao lado

naatividade acadêmica que considero de maior aprendizado, intitulada “Concurso

Nacional Sistema Interamericano de Direitos Humanos”.

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À diretora da Faculdade Farias Brito, querida FernandaDenardin, pela

postura isonômica admirável e por sempre acreditar no desempenho dos acadêmicos da

instituição de ensino, desta forma, também me incentivando.

A todo o corpo docente da Faculdade, em especial, aos estimados

professores Ana Luisa, Débora Santana, Elisabeth Catunda, Helena Sampaio, Lídia

Valesca, Renata Neris, Rodrigo Uchôa, Rosa Júlia Plá e Talita Dal Lago, pela conduta

humana, ética e cordial, desta maneira, me inspirando e me fazendo acreditar que vale a

pena tentar fazer a diferença.

Aos queridíssimos colegas de trabalho da Secretaria da Educação do Estado

do Ceará, que sempre estiveram dispostos a me ensinar a colocar o Direito na prática.

Por fim, meus agradecimentos às outras pessoas que não foram citadas, mas

que de alguma forma, talvez, a mais singela e sutil possível, também foram

responsáveis pelo êxito da minha formação.

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“A cidadania é o direito a ter direitos, pois a igualdade em dignidade e direitos dos seres humanos não é um dado. É um construído da convivência coletiva, que requer o acesso ao espaço público. É este acesso ao espaço público que permite a construção de um mundo comum através do processo de asserção dos direitos humanos.” (Hannah Arendt) 

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RESUMO

Afigura-se a evolução dos direitos humanos, sendo entendidos como direitos dinâmicos que vão se delineando em virtude de acontecimentos históricos relevantes. O pós Segunda Guerra instaurou uma nova era na seara dos direitos humanos com o surgimento da Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945. Apesar dos esforços evidenciados no tocante a salvaguarda dos direitos humanos, vê-se, portanto, que tais direitos ainda são comumente violados no cenário hodierno. Nesse sentido, tem-se arquitetado vários sistemas de proteção e promoção dos direitos humanos.O Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH) é abordado com maior afinco. O principal documento normativo do SIDH é a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), que estabelece a Comissão e a Corte. O Estado brasileiro foi condenado recentemente pela Corte, no caso Gomes Lund, encontrando o Estado dificuldade em implementar as decisões emanadas pelo Tribunal, haja vista que a Lei de Anistia absolveu os envolvidos. Referida lei, inclusive, foi legitimada pelo STF, quando da improcedência da ADPF nº 153, desta maneira, conflitando com o entendimento da CADH.

Palavras-chave: Direito Internacional dos Direitos Humanos – DIDH.Sistema Interamericano de Direitos Humanos – SIDH. Caso Gomes Lundvs. Brasil.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 09 1. NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE DIREITOS HUMANOS ................................. 13 1.1 Características dos direitos humanos ......................................................................... 14 1.1.1Essencialidade........................................................................................................14 1.1.2Universalidade........................................................................................................15 1.1.3Inerência.................................................................................................................15 1.1.4Indivisibilidade.......................................................................................................15 1.1.5Interdependência....................................................................................................16 1.1.6Exigibilidade...........................................................................................................16 1.2 Precedentes históricos do processo de internacionalização e universalização dos direitos humanos .............................................................................................................. 17 1.2.1Direito Humanitário ................................................................................................ 18 1.2.2 Liga das Nações ..................................................................................................... 21 1.2.3Organização Internacional do Trabalho –OIT ....................................................... 22 1.3 O período pós 1ª. Guerra Mundial.............................................................................24 1.4 O Período pós 2ª. Guerra Mundial.............................................................................25 1.5 Organização das Nações Unidas – ONU .................................................................. 26 1.5.1Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH........................................28 1.5.2 A controvérsia em torno da força vinculante da DUDH........................................31 2. SISTEMAS DE PROTEÇÃO E PROMOÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS ......................................................................................... 34 2.1 Sistema Global de proteção e promoção dos direitos humanos ................................ 34 2.1.1Pactos Internacionais de 1966 ................................................................................ 40 2.2Sistemas Regionais de proteção e promoção dos direitos humanos ........................... 40 2.2.1Sistema Interamericano de Direitos Humanos – SIDH........................................... 42 2.2.2 Convenção Americana de Direitos Humanos – CADH.......................................... 46 2.2.2.1 Comissão IDH ..................................................................................................... 49 2.2.2.2CorteIDH .............................................................................................................. 55 3. CASO GOMES LUND E OUTROS VS. BRASIL .................................................... 60 3.1 Do contexto histórico: a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985) ............................. 60 3.2 Da análise do caso perante a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos .......................................................................................................................... 62 3.3 Da Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79) .......................................................................... 67 3.4 Da eficácia da decisão prolatada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos contra o Estado Brasileiro no caso Araguaia ................................................................... 71 CONCLUSÕES ............................................................................................................... 73

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 76 

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho monográfico é dividido em 3 (três) capítulos, os quais

todos abordam a temática dos direitos humanos.

O primeiro capítulo começa abordando as noções preliminares de direitos

humanos e, nesse contexto, fala-se da estreita relação existente entre esses direitos e o

princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB/88).

Em seguida, os direitos humanos são interpretados à luz de suas

características, tais como: essencialidade, universalidade, inerência, indivisibilidade,

interdependência e exigibilidade.

Posteriormente, apresentam-se os precedentes históricos do processo de

internacionalização e universalização dos direitos humanos: o Direito Humanitário, a

Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho. Foi a partir desses ícones

históricos que os direitos humanos começaram a tomar outra dimensão, tornando-se

cada vez mais notórios.

Em continuidade aos acontecimentos históricos, também se encontra no

trabalho a análise do pós-guerra, tanto da 1ª como da 2ª Guerra, evidenciando, desta

maneira, os novos meandros dos direitos humanos a partir desses fatos. Foram inúmeras

as atrocidades cometidas durante as mencionadas guerras, principalmente no período da

2ª Guerra Mundial. Sendo assim, diversos países do globo se uniram com o objetivo de

formular uma Organização que fosse capaz de manter a paz e a segurança

internacionais, em que todas as nações pudessem compartilhar um ideal de cultura da

dignidade humana. É nessa perspectiva que surge a Organização das Nações Unidas

(ONU), em 1945.

A ONU é analisada à luz da sua relevância no seio global, visto que

desenvolve diversos projetos humanitários em diferentes países, principalmente

naqueles mais remotos e também nos que detêm baixo Índice de Desenvolvimento

Humano (IDH). Em virtude de suas ações, tal organização internacional delineou a

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chegada de uma nova ordem internacional, fazendo surgir sob os seus auspícios a

Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em 1948.

A DUDH também encontra guarida neste trabalho, pois ela estabelece em

seus breves artigos condições mínimas necessárias ao desenvolvimento da

personalidade humana, já que busca albergar o ser humano com a devida atenção que

lhe é peculiar, observando-se em seu conteúdo direitos fundamentais inerentes a todo e

qualquer indivíduo do mundo.

Desta maneira, pode-se dizer que a DUDH trouxe relevante contribuição ao

cenário atual, haja vista que foi elaborada através de um consenso multilateral,

respeitando traços culturais de diferentes povos e, além disso, tal Declaração já inspirou

e continua a influenciar na elaboração de diversos tratados que versam sobre a temática

dos direitos humanos.

Pode-se dizer, com isso, que a aludida Declaração apresenta-se como um

código de ética comum a todas as nações, pois prioriza os direitos elementares do ser

humano, visando o seu bem estar, através do reconhecimento universal dos seus

atributos.

No entanto, apesar da singular relevância da DUDH, há controvérsias em

relação ao seu caráter vinculante. Nesse sentido, o presente trabalho aborda os

diferentes posicionamentos em relação à questão.

O segundo capítulo versa sobre os sistemas de proteção e promoção do

direito internacional dos direitos humanos, abordando, por conseguinte, tanto o sistema

global como os sistemas regionais (europeu, americano e africano).

O sistema global prevê instrumentos normativos que visam à proteção do

ser humano. Tais instrumentos classificam-se como: gerais e especiais. Os gerais são

aqueles que se destinam a todos de forma indistinta, enquanto que os especiais

protegem uma determinada categoria de pessoas.

Em continuidade ao assunto, tal capítulo também fala dos Pactos

Internacionais de 1966, que foram elaborados sob o comando da ONU e que trouxeram

uma abordagem mais concreta e ampla do conteúdo previsto na DUDH, já que os

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Pactos junto aos seus Protocolos foram responsáveis pelo acréscimo de outros direitos e

também pelo surgimento demecanismos de monitoramento em relação à

implementaçãodos direitos constantes nos citados documentos, lhes conferindo, desta

forma, um caráter técnico-jurídico, no qual, tal prerrogativa, se estendeuà própria

DUDH.

Posteriormente, este trabalho aborda com maior profundidade o Sistema

Interamericano de Direitos Humanos (SIDH), sistema este encabeçado pela

Organização dos Estados Americanos (OEA), que prima pela proteção dos direitos

humanos em plano regional, no continente americano.

Em seguida também são apontados e explicados os principais diplomas

normativos deste sistema regional, quais sejam: a Declaração Americana dos Direitos e

Deveres do Homem (DADDH), a Carta da Organização dos Estados Americanos, a

Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) e o Protocolo de San Salvador.

Nesse prisma, este trabalho tem dado um enfoque maior a CADH, pois foi a

partir dela que o SIDH tornou-se mais presente. Tal CADH (popularmente conhecida

como Pacto de San José da Costa Rica) estabelece a Comissão Interamericana de

Direitos Humanos (Comissão IDH) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos

(Corte IDH), que são órgãos utilizados para a salvaguarda dos direitos humanos.

Já o terceiro capítulo, que é o último deste trabalho, versa sobre o Caso

1552, referente à Guerrilha do Araguaia, que foi encaminhado à Comissão em 1997.

Posteriormente, em 26 de março de 2009, a Comissão submeteu o caso envolvendo o

Estado brasileiroà apreciação da Corte.

Ao analisar tal caso, a Corte, em 24 de novembro de 2010, entendeu pela

condenação do Brasil perante o SIDH, já que se conseguiu provar que o Estado

brasileiro cometeu inúmeras atrocidades contra a dignidade de seu povo, afrontando,

desta forma, os diferentes tratados que compõem o SIDH, dentre os quais, a CADH.

Em virtude da pesquisa deste trabalho observou-se a contextualização

histórica do mencionado caso, que ocorreu durante a ditadura militar (1964-1985),

sendo assim, foram constatadas violações brutais, dentre elas, a prática do

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desaparecimento forçado, que ensejou a violação do direito à vida, à integridade pessoal

e à liberdade pessoal, à proteção judicial, dentre outros.

Ao final da ditadura militar, foi promulgada a Lei de Anistia(Lei nº

6.683/79), que surgiu com a intenção de efetuar uma Justiça de Transição eficaz, já que

o país estava saindo de um regime político de Estado Totalitário e ingressando em

outro, o de Estado de Direito.

Logo se percebeu que a referida Lei não estava apta à realização de uma

Justiça de Transição adequada, pois tal documento legal veio a impedir a

responsabilização penal dos envolvidos que perpetraram graves violações de direitos

humanos, desta forma, inviabilizando o direito à memória e o direito à verdade dos

representantes das vítimas e de toda a sociedade brasileira.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal (STF) recentemente declarou a

improcedência da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF nº 153),

desta maneira, legitimando e fortalecendo o conteúdo da Lei de Anistia, que soou como

um obstáculo a investigação penal dos fatos ocorridos no país, dificultando a

implementação da decisão prolatada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos

contra o Estado brasileiro no caso Araguaia.

A temática do direito internacional dos direitos humanos está cada vez mais

em evidência na atual conjuntura mundial. Nesse sentido, não há como falar em direitos

humanos de forma isolada no contexto da globalização, já que os principais anseios das

sociedades revelam-se verdadeiramente compreendidos e interpretados de forma mais

completa à luz do diálogo das ideias/fontes de diferentes culturas, sendo assim, o

contencioso em questão discutido no último capítulo é analisado conforme o que

preceitua a doutrina mais abalizada do Direito Internacional Público.

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1. NOÇÕES PRELIMINARES SOBRE DIREITOS HUMANOS

É certo que a história dos direitos humanos se confunde com a própria

história da humanidade. A existência do ser humano enseja concomitantemente razão

óbvia de direitos que os proporcionemo mínimo existencial necessário para o viver em

harmonia tanto no plano individual como no âmbito da coletividade.A convicção de que

todos os seres humanos têm o direito a serem igualmente respeitados pelo simples fato

de sua humanidade é a ideia central do movimento em prol dos direitos humanos.

(CORREIA, 2005, p. 98).

É possível identificar preocupação com os direitos humanos desde os

tempos mais remotos, como por exemplo: no Código de Hamurabi, XVIII a.C., o qual

já trazia a ideia de proporcionalidade sob o prisma do brocardo “olho por olho, dente

por dente”, influenciado pela Lei de Talião.

Os direitos humanos estão intrinsecamente relacionados ao princípio da

dignidade da pessoa humana, já que tratam e buscam tutelar o que há de mais precioso

no Direito, por exemplo, direito a vida, a liberdade, a segurança, a propriedade e

“muitos outros com seus inúmeros desdobramentos”.Sob essa ótica, os direitos

humanos são aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser

humano, por sua própria natureza e pela dignidade que a ela é inerente.(CORREIA,

2005, p. 99).

Ainda nessa perspectiva de tentar explicar os direitos humanos à luz da

dignidade da pessoa humana, convém assinalar as seguintes considerações em relação à

temática: a manutenção da dignidade humana constitui o cerne dos direitos humanos,

pois é por meio deles que serão asseguradas as múltiplas dimensões da vida humana e

garantida a realização integral da pessoa.(CORREIA, 2005, p. 100).

Destaque-se que a história dos direitos humanos é dinâmica e que vai se

moldando conforme as situações que lhes são colocadas, o que permite ao Homem uma

constante mudança de mentalidade e de perspectiva em relação a novos anseios, novos

direitos.

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Sendo assim, pode-se afirmar que a história e a evolução dos direitos

humanos estão atreladas a lutas políticas, bem como a diferentes contextos históricos.

Nesse sentido, assevera Theresa Rachel Couto Correia:

Ademais, além dos aspectos normativos, os direitos humanos são produto de lutas políticas e dependem de fatores históricos e sociais que refletem os valores e aspirações de cada sociedade, sendo que também requerem um ambiente propício para que sejam respeitados. Por isso, os direitos humanos devem ser examinados sistematicamente a partir de uma perspectiva interdisciplinar que considere todos os seus aspectos e não perca de vista o contexto histórico e social em que estão inseridos. (CORREIA, 2005, p. 99).

Com base no exposto, observe-se que esses direitos vão adquirindo

características que lhes são peculiares justamente pelos motivos que levam ao seu

surgimento. A fim de que se tenha uma melhor compreensão do tema, mencionem-se

algumas características consideradas como relevantes desses direitos, quais sejam:

essencialidade, universalidade, inerência, indivisibilidade, interdependência e

exigibilidade.

1.1 Características dos direitos humanos

1.1.1 Essencialidade

Mazzuoli (2010, p.753) posiciona-se sobre esta característica, fazendo uma

explanação breve e elucidativa.

Os direitos humanos são essenciais por natureza, tendo por conteúdo os valores supremos do ser humano e a prevalência da dignidade humana (conteúdo material), revelando-se essencial, também, pela sua especial posição normativa (conteúdo formal), permitindo-se a revelação de outros direitos fundamentais fora do rol de direitos expresso nos textos constitucionais.

Tais direitos são providos de essencialidade justamente pela sua natureza, na

medida em que têm no seu escopo os valores supremos do indivíduo, que a este confere

a dignidade. Além do que, situam-se em uma posição normativa privilegiada,

influenciando no surgimento e no aperfeiçoamento de outros direitos.

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1.1.2 Universalidade

Em relação à universalidade, marca registrada dos direitos humanos, pode-

sedizer que são: normas gerais que se destinam a todas as pessoas como seres humanos

quer sejam nacionais ou estrangeiros.(CORREIA, 2005, p. 100).

Nesse enfoque, pode-se dizer que todas as pessoas indiscriminadamente são

titulares de direitos, bastando à condição de humano para que se possa reivindicar a

tutela dos mesmos.

1.1.3 Inerência

No que tange à inerência, ressalte-se o que alega Weis (1999, p. 109) em sua

obra:

A noção de que os direitos humanos são inerentes a cada pessoa, pelo simples fato de existir, decorre do fundamento jusnaturalista racional adotado pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos. Assim é que o ‘Preâmbulo’ da Declaração Universal dos Direitos Humanos, logo no primeiro parágrafo, reconhece que ‘a dignidade inerente a todos os membros da família humana e seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo’.

A inerência dos direitos humanos é evidenciada na medida em que tal

característica é inata (natural) ao ser. Este, naturalmente, apresenta-se imbuído dessa

prerrogativa jusnaturalista.

1.1.4 Indivisibilidade

Atente-se, por conseguinte, a indivisibilidade dos referidos direitos, dando

enfoque ao seu conteúdo, bem como citando a Conferência no qual essa característica

dos direitos humanos foi aclarada.

A indivisibilidade, então, está ligada ao objetivo maior do sistema internacional de direitos humanos: a promoção e a garantia da dignidade do ser humano. Ao se afirmar que os direitos humanos são indivisíveis se está a dizer que não existe meio-termo: só há vida verdadeiramente digna se todos os direitos previstos no Direito Internacional dos Direitos Humanos estiverem sendo respeitados, sejam civis e políticos, sejam econômicos, sociais e culturais. Trata-se de uma característica do conjunto das normas, e não de cada direito individualmente considerado. (WEIS, 1999, p. 118).

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A indivisibilidade dos direitos humanos está relacionada com a compreensão integral desses direitos os quais não admitem fracionamentos. São os direitos econômicos, sociais e culturais que sofrem as maiores críticas relacionadas a esse respeito. Essa questão foi tratada por ocasião da I Conferência Mundial de Direitos Humanos de 1968 realizada em Teerã e também ratificada na II Conferência de Viena de 1993.(CORREIA, 2005, p. 101).

Assimos direitos humanos não admitem fracionamentos, ou seja, o direito é

um só, não aceitando meio-termo. Nesse sentido, são respeitados tanto os direitos civis

e políticos, bem como os econômicos, sociais e culturais.

1.1.5 Interdependência

Em relação àinterdependência, outra característica importante, o

posicionamento é o seguinte: o entendimento predominante é de que todos os direitos

humanos são interdependentes e indivisíveis, cabendo aos direitos civis e políticos

importante papel na consecução do desenvolvimento.(CORREIA, 2005, p. 101).

A interdependência diz respeito aos direitos humanos considerados em espécie, ao se entender que um certo direito não alcança a eficácia plena sem a realização simultânea de alguns ou de todos os outros direitos humanos. E essa característica não distingue direitos civis e políticos ou econômicos, sociais e culturais, pois a realização de um direito específico pode depender (como geralmente ocorre) do respeito e promoção de diversos outros, independentemente de sua classificação. (WEIS, 1999, p. 118).

Os direitos humanos, em geral, são verdadeiramente contemplados quando

conjugados com os demais direitos. Registre-se, por conseguinte, que a indivisibilidade

e a interdependência andam lado a lado na busca incessante da plena eficácia dos

direitos humanos.

1.1.6 Exigibilidade

Por fim, constate-se com base nos escritos abaixo, os direitos humanos

frente ao Estado, ou seja, tais direitos como prerrogativa de todos os indivíduos perante

os órgãos do poder público. Ademais, o Estado também não deve agir de modo a

intervir na vida individual de seus cidadãos.

Pode-se, então, [...] definir os direitos humanos como prerrogativas que tem todo indivíduo frente aos órgãos do Poder para preservar sua dignidade como ser humano e cuja função é excluir a interferência indevida do Estado em áreas específicas da vida individual e assegurar

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a prestação de determinados serviços por parte do Estado para satisfazer as necessidades básicas que reflitam as exigências fundamentais de cada ser humano.(CORREIA, 2005, p.102). Esta definição proposta faz referência tanto ao conteúdo material quanto ao elemento formal inerentes ao conceito de direitos humanos e alude ao caráter universal desses direitos; também ressalta o caráter histórico-valorativo dos direitos humanos sugerindo que possuem um caráter aberto, fluido e dinâmico.(CORREIA, 2005, p.102).

Vê-se, portanto, a inegável importância desses direitos, haja vista que estará

sempre acompanhando o ser humano ao longo de sua existência e até mesmo ao fim

desta. Certifique-se que são direitos que albergam todos de forma indistinta, visto que

são direitos inerentes e universais.

1.2Precedentes históricos do processo de internacionalização e universalização dos

direitos humanos1

Ainda hoje, encontram-se questionamentos acerca do fundamento e da

natureza dos direitos humanos. Alguns os veem como direito natural e inerente ao

Homem, outros idealizam esse direito sob a ótica do positivismo, mas há quem diga que

são, na verdade, direitos históricos, bem como os que defendem esses direitos como

decorrentes de um sistema moral. Vê-se, portanto, que há um impasse em torno do

tema. (PIOVESAN, 2011).

Ao considerar os direitos humanos como naturais, subtende-se, por

conseguinte, que estes são direitos inatos, portanto, sua origem coincidiria com o

surgimento do ser humano. Em relação aos direitos humanos: verifica-se que o

conteúdo material tem como referência a dignidade inerente a todo ser humano,

independentemente da controvérsia entre positivistas e jusnaturalistas. (CORREIA,

2005, p.102).

Ademais, cumpre ressaltar que a denominação “Direito Internacional dos

Direitos Humanos” adveio por conta de alguns precedentes históricos, que foram os

principais responsáveis pelo processo de internacionalização e universalização dos

direitos humanos. (PIOVESAN, 2011).

                                                            1Nomenclatura dada pela Professora Flávia Piovesan.

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Nesse sentido, já existe um consenso acerca dos principais marcos históricos

do processo de internacionalização dos direitos humanos, quais sejam: o Direito

Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho.

(PIOVESAN, 2011).

Além disso, observe-se o que Mazzuoli (2010, p.757) dispõe sobre o

assunto:

O ‘Direito Internacional dos Direitos Humanos’ (InternationalHumanRights Law), fonte da moderna sistemática internacional de proteção de direitos, tem como o seu primeiro e mais remoto antecedente histórico os tratados de paz de Westfália de 1648, que colocaram fim à Guerra dos Trinta Anos. Mas pode-se dizer que os precedentes históricos mais concretos do atual sistema internacional de proteção desses mesmos direitos são o Direito Humanitário, a Liga das Nações e a Organização Internacional do Trabalho, situados pela doutrina como os marcos mais importantes da formação do que hoje se conhece por arquitetura internacional dos direitos humanos.

Ante o exposto, faz-se necessário explicar o porquê da origem dos

precedentes supracitados, analisando a realidade fática e o contexto da época de cada

um.

1.2.1 Direito Humanitário

Em primeiro lugar, convém assinalar o Direito Humanitário, ramo do

Direito Internacional Público, que visa tutelar direitos daqueles que estão envolvidos em

guerra. Tal direito é fundamentado e se pretende assegurado conforme o que preceitua a

Convenção de Genebra de 1864 e também as Convenções de Genebra celebradas em

1949.

Mencione-se o posicionamento de autores especialistas no assunto. Thomas

Buergenthal(1988 apud PIOVESAN, 2011, p.169) preleciona que o Direito

Humanitário é o ramo do Direito dos Direitos Humanos que se aplica aos conflitos

armados internacionais e, em determinadas circunstâncias, aos conflitos armados

nacionais.

Celso Lafer(1994 apud PIOVESAN, 2011, p.169) também traz uma

contribuição relevante ao dizer:

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Este direito(direito humanitário) trata de um tema clássico de Direito Internacional Público – a paz e a guerra. Baseia-se numa ampliação do jus in bello, voltada para o tratamento na guerra de combatentes e de sua diferenciação em relação a não combatentes, e faz parte da regulamentação jurídica do emprego da violência no plano internacional, suscitado pelos horrores da batalha de Solferino, que levou à criação da Cruz Vermelha.

Como se vê, o direito humanitário, que surgiu no século XVIII e que

começou a ser sistematizado a partir do século XIX, apresentou-se em consonância aos

anseios da época, servindo como instrumento do Direito Internacional Público, tanto é

que os princípios do direito humanitário serviram de base para fundamentar o

casoNicarágua v. Estados Unidos2, que chegou a Corte Internacional de Justiça (CIJ).

(COMPARATO, 2010).

Comparato (2010, p. 186) traz à baila sua contribuição no que diz respeito

ao direito humanitário, bem como menciona o caso que chegou a CIJ.

A violação dos princípios e normas do direito humanitário, durante uma conflagração armada, pode por conseguinterepresentar, ela também, um crime de guerra. No julgamento de 27 de junho de 1986 do caso Nicarágua v. Estados Unidos, de resto, a Corte Internacional de Justiça reconheceu a plena vigência dos ‘princípios gerais de base do direito humanitário’.

É oportuno acrescentar que, apesar das citadas Convenções de Genebra que

legitimam e auferem caráter jurídico ao direito humanitário, existe uma corrente que

reprova sobremaneira, o reconhecimento de um direito (humanitário) em casos de

guerra.

Desta forma, esclarece Comparato (2010, p. 185) em sua obra:

A evolução posterior (do termo direito humanitário), no entanto, levou ao reconhecimento da injuridicidade objetiva da guerra como solução de conflitos internacionais, quaisquer que sejam as razões de seu desencadear. O direito contemporâneo, a partir da Carta de São Francisco, instituidora das Nações Unidas, restringiu sobremaneira o conceito de guerra justa, elaborado pelos doutores da Igreja da Idade Média.

                                                            2 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Direito Internacional dos Direitos Humanos, Direito Internacional Humanitário e Direito Internacional dos Refugiados: Aproximações ou Convergências. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/dih/didh.html>. Acesso em: 29 de agosto de 2014.

 

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Com base nisto, tem-se insistido ultimamente na tese de que o direito do estado de guerra (ius in bello) já não poderia existir, por ser uma contradição nos termos: se a guerra constitui em si mesma um ilícito e, mais do que isso, um crime internacional, não faz sentido regular juridicamente as operações bélicas – o Direito não pode organizar a prática de um crime [...].

Apesar da aparente lógica dos escritos apresentados acima, tal entendimento

não é aceitável, já que a concepção a qualencontra um maior número de simpatizantes é

a que se apresenta a seguir:

Assim, a proteção humanitária visa proteger, em caso de guerra, militares fora de combate (feridos, doentes, náufragos, prisioneiros etc.) e populações civis em geral, devendo os seus princípios ser hoje aplicados quer às guerras internacionais, quer às guerras civis ou a quaisquer outros conflitos armados. (MAZZUOLI, 2010, p. 758).

O direito humanitário, ao seu modo, representou um avanço incontestável

na seara do direito internacional público, encontrando óbice no tocante a limitação dos

Estados, que podem ter sua autonomia diminuída frente a alguma guerra que venha a ter

em seu território, já que ficou claro, desde a Convenção de Genebra de 1864, acordos

que estabelecem como o Estado deve agir em caso de guerra.

Diante do exposto, alega Piovesan (2011, p. 170) queo Direito Humanitário

foi a primeira expressão de que, no plano internacional, há limites à liberdade e à

autonomia dos Estados, ainda que na hipótese de conflito armado.

Contudo, importante salientar que tanto a Convenção de 1864, como as

demais Convenções de Genebra de 1949, foram acordadas soberanamente pelos

Estados, no caso da de 1864, em geral, foram Reinos que a ratificaram.

Ainda com base neste mesmo tema e a título de informação, a comissão

genebrina que esteve diretamente relacionada à elaboração da Convenção de 1864, foi a

responsável, posteriormente, em 1880, pela formação do Comitê Internacional da Cruz

Vermelha, que hoje é conhecido no mundo todo. (COMPARATO, 2010).

O estudo deste tema tem revelado o quão atual é assunto, visto que ao ler os

noticiários que se apresentam, encontra-se com facilidade, ainda no século XXI,

conflitos armados no Oriente Médio, mais especificamente na Faixa de Gaza, bem como

no Leste Europeu (Ucrânia x Rússia), por exemplo, que poderiam se valer dos preceitos

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do Direito Humanitário na tentativa de minimizar o que vem ocorrendo em seus

territórios.

1.2.2 Liga das Nações

A Liga das Nações (ou Sociedade das Nações), outro marco histórico

importante que contribuiu para a noção do que se entende hoje por Direito Internacional

dos Direitos Humanos, foi uma organização internacional criada após a 1ª Guerra

Mundial, no qual se visava promover a cooperação, a paz e a segurança internacional,

condenando, conforme explica Piovesan (2011, p. 170), agressões externas contra a

integridade territorial e a independência política dos seus membros.

A mesma autora, ao falar sobre o assunto, também revela as previsões

presentes na Convenção da Liga das Nações, de 1920, bem como apresenta o conceito

de soberania, que veio ganhando novos meandros desde o Direito Humanitário e que a

Liga das Nações ajudou a desenvolver. Nesse sentido:

A Convenção da Liga das Nações, de 1920, continha previsões genéricas relativas aos direitos humanos, destacando-se as voltadas ao mandate system oftheLeague, ao sistema das minorias e aos parâmetros internacionais do direito ao trabalho – pelo qual os Estados se comprometiam a assegurar condições justas e dignas de trabalho para homens, mulheres e crianças. Esses dispositivos representavam um limite à concepção de soberania estatal absoluta, na medida em que a Convenção da Liga estabelecia sanções econômicas e militares a serem impostas pela comunidade internacional contra os Estados que violassem suas obrigações. Redefinia-se, desse modo, a noção de soberania absoluta do Estado, que passava a incorporar em seu conceito compromissos e obrigações de alcance internacional no que diz respeito aos direitos humanos. (PIOVESAN, 2011, p. 170-171).

Evidencia-se no texto acima uma preocupação ainda que genérica com os

direitos humanos, no sentido de programar no âmbito dos Estados-membros uma

política voltada à proteção das minorias e a parâmetros mínimos de condições de

trabalho, além do que também se permite visualizar da leitura do texto supra a

relativização da soberania dos países que se propuseram estar presentes a Liga. Nessa

toada, Mazzuoli (2010, p. 758) esclarece:

O segundo (o primeiro: Direito Humanitário) reforço à concepção da necessidade de relativização da soberania dos Estados foi a criação, após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), da Liga das Nações.

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A noção de soberania absoluta evidenciava, já à época, um retrocesso, tendo

em vista que os Estados poderiam se valer desseseu componente para justificar

violações de direitos humanos.

A redefinição do instituto da soberania, as previsões genéricas que dizem

respeito ao direito das minorias, de condições dignas de trabalho, dentre outras

preocupações atinentes à temática de direitos humanos marcaram de forma positiva a

Liga das Nações.

No entanto, viu-se que a Liga não perdurou por muito tempo e nem atendeu

de forma contundente às suas expectativas, tendo seu fim com o início da 2ª Guerra

Mundial.

1.2.3 Organização Internacional do Trabalho – OIT

Seguindo o mesmo entendimento dos marcos históricos anteriores, quais

sejam: o do Direito Humanitário e o da Liga das Nações, a Organização Internacional

do Trabalho – OIT (InternationalLabour Office, agora conhecida por

InternationalLabourOrganization) também mostrou sua relevância ao processo de

internacionalização dos direitos humanos.

A OIT, organização internacional que objetiva a justiça social3,foi criada

através do Tratado de Versailles e integrava a Liga das Nações (ou Sociedade das

Nações). Mazzuoli (2010, p. 586)dispõe:

Trata-se de organização internacional criada pelo Tratado de Paz de 1919 (Tratado de Versailles), como parte da Sociedade das Nações (art. 6º), da qual recebia a receita necessária à satisfação de suas atividades. Nasceu como uma forma de anexo à Liga das Nações, não obstante dotada de total autonomia. Anos mais tarde, em outubro de 1946, a organização incorporou a Declaração de Filadélfia, de 1944, como anexo à Constituição da OIT.

                                                            3 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Disponível em: <http://www.onu.org.br/onu-no-brasil/oit/>. Acesso em: 10 de setembro de 2014.

 

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Frise-se que, atualmente, a OIT não mais integra a Liga das Nações, mas

sim a Organização das Nações Unidas – ONU, sendo classificada comoorganismo

internacional de cooperação social de louvável atuação e que detém uma significativa

autonomia dentro das Nações Unidas.

Boa parte da doutrina, inclusive, classifica a OIT, que surgiu ao final da

Primeira Guerra Mundial, como sendo um dos antecedentes históricos mais importantes

para a formação do Direito Internacional dos Direitos Humanos.

De fato, não é difícil discordar de tal entendimento, haja vista que a OIT

estabeleceu parâmetros mínimos de condições de trabalho a todos os trabalhadores lhes

conferindo direitos.

Não se está mais discutindo direito dos trabalhadores em âmbito doméstico

(do Estado), mas sim em âmbito internacional. AntonioCassesse (1990 apud

PIOVESAN, 2011, p. 171) explica:

Imediatamente após a Primeira Guerra Mundial, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi criada e um de seus objetivos foi o de regular a condição dos trabalhadores no âmbito mundial. Os Estados foram encorajados a não apenas elaborar e aceitar as Convenções internacionais (relativas à igualdade de remuneração no emprego para mulheres e menores, à jornada de trabalho noturno, à liberdade de associação, dentre outras), mas também a cumprir estas novas obrigações internacionais.

A contribuição deste organismo internacional de cooperação social – OIT é

inegável, haja vista que, desde a sua fundação, em 1919, a OIT já conta com quase

duas centenas de convenções internacionais promulgadas, às quais os Estados-partes,

além de aderir, viram-se obrigados a cumprir e respeitar. (MAZZUOLI, 2010, p. 758).

A adesão a preceitos básicos de condições mais adequadas de trabalho por

parte dos Estados representava a evolução de uma época, já que estava havendo a

conscientização coletiva de uma classe, a dos trabalhadores.

O Brasil foi um dos membros fundadores da OIT, em 1919, e é tido como

membro nato da instituição, fazendo parte da mesma desde 1945, conforme dispõe o§

1º do art. 1º da Constituição da OIT.

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O texto em vigor da Constituição da OIT foi aprovado na 29ª reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Montreal, em 1946, em substituição ao texto original adotado em 1919 e emendado em 1922, 1934 e 1945. A versão atual da Convenção tem como Anexo a Declaração Referente aos Fins e Objetivos da Organização, aprovada na 26ª reunião da Conferência, na Filadélfia, em 1944, mais conhecida como Declaração de Filadélfia. (MAZZUOLI, 2010, p. 907).

Além de todo esse apanhado histórico acerca deste organismo especializado

da ONU, a OIT, cumpre ressaltar o modo como o Brasil vem se colocando, a seguir:

Otexto de 1946 em vigor sofreu emendas em 1953, 1962 e 1972, todas em vigor no âmbito internacional e ratificadas pelo Brasil. O Brasil ratificou o instrumento de emenda da Constituição da OIT em 13 de abril de 1948, por meio do Decreto 25.696, de 20.10.1948. (MAZZUOLI, 2010, p. 907).

Vê-se, portanto, que o país não está alheio a essa discussão, tendo em vista

que ratificou as alterações provenientes do texto de 1946. Isso demonstra que, apesar

das diversas formas de violações de direitos humanos ainda presentes no Estado, no seio

do trabalho, a política externa vigente está em harmonia com os preceitos

internacionais.

1.3 O período pós 1ª. Guerra Mundial

A história testemunhou no período anterior e posterior a Primeira Guerra

Mundial experiências de progresso, ainda que tímidas, na seara dos direitos humanos,

em que conferiram maior atenção aos indivíduos, experiências estas que se

consubstanciaram no Direito Humanitário, na Organização Internacional do Trabalho

ena Liga das Nações, que tinha como um de seus principais objetivos a promoção da

paz, a cooperação entre os Estados e a segurança internacional.

Pode-se dizer que os desfechos das experiências supracitadas lograram êxito

em alguns quesitos, tendo em vista que se passou a discutir o ser humano não só como

objeto do Direito Internacional, mas também como sujeito do mesmo.

Aos poucos, emerge a ideia de que o indivíduo é não apenas objeto, mas também sujeito de Direito Internacional. A partir dessa perspectiva, começa a se consolidar a capacidade processual internacional dos indivíduos, bem como a concepção de que os direitos humanos não mais se limitam à exclusiva jurisdição

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doméstica, mas constituem matéria de legítimo interesse internacional. (PIOVESAN, 2011, p. 174-175).

No entanto, não está errada a afirmação que diz que a Liga das Nações

fracassou, já que não conseguiu evitar outra grande guerra, qual seja: a 2ª Guerra

Mundial, na qual se viram inúmeras atrocidades, onde o ser humano foi totalmente

aviltado, tendo todos os seus direitos básicos violados.

1.4 O período pós 2ª. Guerra Mundial

A Segunda Guerra Mundial foi um dos acontecimentos mais vergonhosos

que a Terra testemunhou. Foram inúmeras as barbáries contra a dignidade da pessoa

humana.

A catástrofe foi tão monstruosa que mesmo durante a mencionada guerra, a

comunidade internacional já havia percebido a necessidade da criação de uma

organização internacional eficaz, com o fito de evitar anormalidades semelhantes

àquelas vivenciadas naquele período. Sidney Guerra (2008, p. 4) aclara:

Após a 2ª Grande Guerra Mundial, houve uma profunda alteração no plano das relações internacionais em razão da criação da Organização das Nações Unidas. A ideia de se criar a ONU surgiu durante a 2ª Guerra Mundial pelos Estados que estavam em luta contra o eixo nazista formado pela Alemanha, Itália e Japão, e que apresentavam grandes preocupações em relação à proteção dos direitos da pessoa humana como se verifica logo no preâmbulo da Carta.

Logo após esse contexto histórico, a comunidade internacional resolveu se

unir, com a intenção de formular um projeto robusto capaz de disseminar ações em prol

dos direitos humanos, eis que surge a Organização das Nações Unidas – ONU, em

1945, com propósitos fundamentais e de extrema relevância para o mundo, tais como:

promover a paz e a segurança internacional, desenvolver relações amistosas entre as

nações pautadas nos princípios da igualdade de direitos e de autodeterminação dos

povos, cooperação internacional.

Nessa perspectiva, Sidney Guerraversa sobre alguns dos episódios que

serviram como justificativa para o extermínio de incontáveis indivíduos durante a 2ª

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Guerra Mundial, além deexplicar de forma objetiva o que veio a marcar o século XX.

Desta forma, trazendo à baila as seguintes considerações:

O século XX foi marcado pelas trágicas consequências para a humanidade advindas da eclosão de grandes conflitos mundiais sendo correto afirmar que numa violação de direitos humanos sem precedentes, a segunda guerra tornou-se um marco de afronta à dignidade da pessoa humana. (GUERRA, 2008, p. 5). Foi então no pós-guerra que os direitos da pessoa humana ganharam extrema relevância, consagrando-se internacionalmente, surgindo como resposta às atrocidades cometidas durante a 2ª Guerra Mundial, especialmente aos horrores praticados nos campos de concentração da Alemanha nazista. (GUERRA, 2008, p. 5). A doutrina racista sobre a ‘pureza ariana’ serviu de justificativa para perseguições, cárceres e execuções em massa de judeus, eslavos e outras populações pelo exército de Hitler, tendo resultado no extermínio de milhões de pessoas. (GUERRA, 2008, p. 5).

Tendo como base o conteúdo das premissas acima, que muito assustou a

humanidade, haja vista que morreram milhões de pessoas durante o século XX e

também levando em consideração que a comunidade internacional não tem a intenção

de que esses fatos venham a se repetir, foi que o ser humano passou a ser colocado em

primeiro plano na esfera global, sendo editados diversos documentos internacionais na

busca de sua proteção.

1.5 Organização das Nações Unidas – ONU

É nesse cenário que vem à tona a Carta das Nações Unidas (ou Carta de São

Francisco), documento este assinado em 26 de junho de 1945, na cidade de São

Francisco – EUA, após o fim da Conferência das Nações Unidas sobre Organização

Internacional, passando a entrar em vigor no dia 24 de outubro daquele mesmo ano.

A Carta das Nações Unidas foi o documento internacional que inaugurou o

surgimento da ONU, organização internacional que trabalha em prol da paz e do

desenvolvimento mundial 4 . Em sua concepção tal organização trouxe propósitos

                                                            4 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Disponível em: <http://www.onu.org.br/>. Acesso em: 10 de setembro de 2014.

 

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fundamentais e de extrema relevância para o mundo, além do que delineou a chegada de

uma nova ordem internacional. Piovesan (2011, p. 184) esclarece:

A criação das Nações Unidas, com suas agências especializadas, demarca o surgimento de uma nova ordem internacional, que instaura um novo modelo de conduta nas relações internacionais, com preocupações que incluem a manutençãoda paz e segurança internacional, o desenvolvimento de relações amistosas entre os Estados, a adoção da cooperação internacional no plano econômico, social e cultural, a adoção de um padrão internacional de saúde, a proteção ao meio ambiente, a criação de uma nova ordem econômica internacional e a proteção internacional dos direitos humanos.

É nessa perspectiva que a ONU vem se moldando a cada dia, na tentativa de

atender aos anseios da comunidade internacional, haja vista ser uma Organização que

agrega variados Estados com diferentes concepções de direitos.

Note-se, portanto, que a referida organização internacional tem contribuído

positivamente para o avanço das sociedades, embora tenha muito ainda a ser feito.É

uma Organização relativamente nova, mas que já mostrou sua importância desde seu

surgimento, quando da tentativa de reconstrução dos direitos humanos, já que o mundo

tinha acabado de sair de uma guerra extremamente abominável. Nesse sentido:

Como se fazia urgente a necessidade da reconstrução dos direitos humanos após a Segunda Guerra Mundial, pôde-se observar neste período o surgimento de diversas organizações internacionais com o objetivo de promover a cooperação internacional. Dentre estas, pode-se destacar como a mais importante a Organização das Nações Unidas (ONU). (LIMA JUNIOR, 2002, p. 7).

Pode-se afirmar, inclusive, que a consolidação do movimento de

internacionalização dos direitos humanos, adveio com a Carta da ONU de 1945. Desta

forma, atente-se aos seguintes termos:

A Carta das Nações Unidas de 1945 consolida, assim, o movimento de internacionalização dos direitos humanos, a partir do consenso de Estados que elevam a promoção desses direitos a propósito e finalidade das Nações Unidas. Definitivamente, a relação de um Estado com seus nacionais passa a ser uma problemática internacional, objeto de instituições internacionais e do Direito Internacional. Basta, para tanto, examinar os arts. 1º (3), 13, 55, 56 e 62 (2 e 3), da Carta das Nações Unidas. (PIOVESAN, 2011, p. 189).

[...] contribuiu ela (a Carta) com os seus preceitos, pioneiramente, para a ‘universalização’ dos direitos da pessoa humana, na medida em

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que reconheceu que o assunto é de legítimo interesse internacional, não mais estando adstrito tão-somente à jurisdição doméstica dos Estados. Estes, ao ratificarem a Carta – que é um tratado multilateral aberto – reconhecem que têm obrigações relativas à proteção e promoção dos direitos humanos, tanto em relação a si mesmos (e, obviamente, aos indivíduos que habitam seus territórios) quanto em relação a outros Estados. (MAZZUOLI, 2010, p. 801).

Frise-se que, apesar de a Carta ter consolidado o movimento de

internacionalização dos direitos humanos através do que dispõe os seus artigos no

tocante a “direitos humanos e as liberdades fundamentais”, a mesma Carta não soube

definir tais direitos com exatidão, deixando uma lacuna que foi suprida com a

Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948. Desta maneira, observe-se o que

Piovesan (2011, p. 190) coloca:

Embora a Carta das Nações Unidas seja enfática em determinar a importância de defender, promover e respeitar os direitos humanos e as liberdades fundamentais – como demonstram os dispositivos destacados –, ela não define o conteúdo dessas expressões, deixando-as em aberto. Daí o desafio de desvendar o alcance e significado da expressão ‘direitos humanos e liberdades fundamentais’, não definida pela Carta. Três anos após o advento da Carta das Nações Unidas, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, veio a definir com precisão o elenco dos ‘direitos humanos e liberdades fundamentais’ a que faziam menção os arts. 1º (3), 13, 55, 56 e 62 da Carta.

Ao longo da explanação, no que se refere à consolidação dos direitos

humanos em virtude da ONU, certifique-se que esta abriu uma grande possibilidade

para o contínuo avanço dos direitos humanos em escala global, fazendo surgir poucos

anos depois a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e também outros

documentos internacionais, tais como os Pactos de 1966. (LIMA JUNIOR, 2002).

1.5.1 Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH

Eis que nasce, decorridos 3 (três) anos da Carta da ONU de 1945, a tão

esperada Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), documento

internacional composto de 30 artigos elaborados sob os auspícios da ONU,com

propósitos louváveis em prol dos direitos humanos, que aborda de forma clara em seus

dispositivos o elenco dos “direitos humanos e liberdades fundamentais”.

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A DUDH, de 1948, como se percebe da leitura de seu preâmbulo, foi

redigida sob o impacto das atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial.

(COMPARATO, 2010, p. 238).

Mazzuoli (2010), ao escrever sobre o tema, evidencia o modo como foi

concebida a referida Declaração Universal, mostrando a sua repercussão quando da

aprovação por 48 Estados, à época. Note-se, por conseguinte, que também houve a

abstenção por parte de 8 (oito) países.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada e proclamada em Paris, em 10 de dezembro de 1948, pela Resolução 217 A-III, da Assembleia-Geral da ONU. Dos 56 países representados na sessão da Assembleia, 48 votaram a favor e nenhum contra, com oito abstenções (África do Sul, Arábia Saudita, Bielo-Rússia, Iugoslávia, Polônia, Tchecoslováquia, Ucrânia e União Soviética). Tendo como fundamento a dignidade da pessoa humana, a Declaração Universal nasce como um código de conduta mundial para dizer a todo o planeta que os direitos humanos são universais, bastando a condição de ser pessoa para que possa vindicar e exigir a proteção desses direitos, em qualquer ocasião e em qualquer circunstância. Consubstancia-se na busca de um padrão mínimo para a proteção dos direitos humanos em âmbito mundial, servindo como paradigma ético e suporte axiológico desses mesmos direitos. Assim, por ter afirmado o papel dos direitos humanos, pela primeira vez e em escala mundial, a Declaração de 1948 ‘pode ser considerada um evento inaugural de uma nova concepção da vida internacional’. (MAZZUOLI, 2010, p. 803).

Ante o exposto, percebe-se a intenção da DUDH em querer estabelecer

parâmetros mínimos de condições adequadas para que o ser humano possa desenvolver

suas habilidades físicas, psíquicas e intelectuais em qualquer ponto do globo,

amparando o indivíduo para que possa ser tratado com mais dignidade e respeito, e

assim, permitindo aflorar as suas capacidades, de modo que não sofra restrições,

independentemente de sua raça, sexo, religião ou nacionalidade.

É com esse ideal nobre e singular que a referida Declaração vem a aclarar a

mentalidade de uma geração, que até então, vivia sob os auspícios de guerras horrendas,

que se viessem a continuar com a intensidade com que vinham acontecendo nos últimos

tempos, a própria vida na Terra poderia deixar de existir.

[...] ao término da mais desumanizadora guerra de toda a História, percebeu-se que a ideia de superioridade de uma raça, de uma classe social, de uma cultura ou de uma religião, sobre todas as demais, põe

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em risco a própria sobrevivência da humanidade. (COMPARATO, 2010, p. 240).

Dando continuidade ao assunto, mas também remetendo aos atos finais da

Segunda Guerra Mundial, o mesmo autor traz outras considerações, quais sejam:

Ademais, o ato final da tragédia – o lançamento da bomba atômica em Hiroshima e Nagasaki, em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente – soou como um prenúncio de apocalipse: o homem acabara de adquirir o poder de destruir toda a vida na face da Terra. (COMPARATO, 2010, p. 226).

Com base nas informações supracitadas, tornou-se possível absorver muito

claramente a importância da DUDH na era atual, já que sua criação adveio justamente

com o fito de evitar atrocidades dessa natureza.

É um documento internacional valoroso, repleto de significados e que foi

editado com muita cautela, buscando albergar o ser humano da forma mais adequada

possível, de modo a intervir minimamente nos costumes, na cultura ou na religião de

um povo. Sendo assim, Piovesan(2011, p. 195) afirma: a Declaração consolida a

afirmação de uma ética universal ao consagrar um consenso sobre valores de cunho

universal a serem seguidos pelos Estados.

O que se pretende, na verdade, é a proteção do ser humano justamente pelo

fato de sua existência, portanto, não há que se falar aqui em uma cultura superior a

outra, por exemplo. Nesse sentido:

Assim sendo, o indivíduo é protegido pelo simples fato de ser um ser humano, portanto, sujeito de Direito Internacional. Afinal, antes de ser cidadão de seu país, ele é cidadão do mundo, e dessa condição decorrem direitos universalmente protegidos, que não devem ser violados nem mesmo pelo Estado do qual ele é um nacional, sob pena de responsabilização daquele pelo mal sofrido. Em suma, basta a condição de pessoa para que se possua a titularidade desses direitos, pois desde o nascimento todos os homens são livres e iguais em direitos. (LIMA JUNIOR, 2002, p. 8).

Como se vê, a DUDH é balizada em ideais de liberdades e igualdades e, por

este motivo, tornou-se um símbolo marcante no século XX e até hoje vem a aprimorar a

defesa dos direitos humanos em âmbito mundial, tendo papel preponderante no

arcabouço global de proteção de direitos.

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A Declaração Universal representa a consciência histórica que a humanidade tem dos próprios valores fundamentais na segunda metade do século XX. É uma síntese do passado e uma inspiração para o futuro: mas suas tábuas não foram gravadas de uma vez para sempre. (BOBBIO, 1992, p. 34).

A referida Declaração veio a influenciar toda uma geração, servindo como

parâmetro para a elaboração deoutros documentos internacionais, bem como servindo

de inspiração para o fundamento de sentenças mundo a fora.

São significativas as referências à Declaração Universal nos preâmbulos de inúmeros tratados internacionais de direitos humanos, tanto do sistema global como dos sistemas regionais de proteção, de que são exemplos as Convenções Europeia (1950) e Americana (1969) sobre Direitos Humanos e a Carta Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos (1981). São incontáveis, também, as referências à Declaração Universal nas sentenças de tribunais internacionais e internos. Isso demonstra que a Declaração Universal de 1948 tem se tornado constante fonte de inspiração dos instrumentos internacionais de proteção e das decisões judiciárias internacionais e internas, o que aumenta sobremaneira a sua importância como instrumento, de fato, utilizado no Direito Internacional Público. (MAZZUOLI, 2010, p. 803-804).

Apesar de ser a Declaração uma constante no meio jurídico internacional na

pretensão de servir como fundamento para embasar determinadas decisões em tribunais,

há quem diga que a Declaração não possui força vinculante, haja vista que foi concebida

com o viés declaratório, servindo, desta forma, como recomendação. No entanto, há

também entendimento de que a DUDH alcançou o jus cogens, tendo, por isso, força

vinculante.

1.5.2 A controvérsia em torno da força vinculante da DUDH

A DUDH, que foi adotada através da Resolução 217 A-III da Assembléia

Geral das Nações Unidas, apresentou-se como recomendação a ser feita pela citada

Assembléia aos países membros da ONU, ou seja, tecnicamente, tal Declaração não

vincula, pois não foi concebida como tratado.

Como falado anteriormente, há quem diga que a Declaração Universal não

possui força vinculante, no entanto, tal posicionamento não vem mais encontrando eco

no seio global e há vários fatores e questionamentos que apontam nesse sentido. Então,

observe-se como o tema é abordado, a seguir:

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Já se reconhece, aliás, de há muito, que a par dos tratados ou convenções, o direito internacional é também constituído pelos costumes e os princípios gerais de direito, como declara o Estatuto da Corte Internacional de Justiça (art. 38). Ora, os definidos na Declaração de 1948 correspondem, integralmente, ao que o costume e os princípios jurídicos internacionais reconhecem, hoje, como normas imperativas de direito internacional geral (jus cogens). A própria Corte Internacional de Justiça assim tem entendido. Ao julgar, em 24 de maio de 1980, o caso da retenção, como reféns, dos funcionários que trabalhavam na embaixada norte-americana em Teerã, a Corte declarou que ‘privar indevidamente seres humanos de sua liberdade, e sujeitá-los a sofrer constrangimentos físicos é, em si mesmo, incompatível com os princípios da Carta das Nações Unidas e com os princípios fundamentais enunciados na Declaração Universal dos Direitos Humanos’. (COMPARATO, 2010, p. 239-240).

Ante o exposto, restou claro o caráter vinculante da Declaração, já que

serviu, inclusive, como objeto de fundamentação ao caso conhecido por: Crise dos

Reféns do Irã5, que chegou a Corte Internacional de Justiça (CIJ), que julgou o conflito

pautando-se no artigo 38 do próprio Estatuto da referida Corte.

A CIJ6, com base no art. 92 da Carta da ONU de 1945, apresenta-se como o

principal órgão judicial da Organização das Nações Unidas, então, por este motivo, há

que se levar em consideração as ponderações desta Douta Corte frente a um caso, por

exemplo.

Além do que, como falado anteriormente, a ONU, bem como seus

propósitos juntamente com seus órgãos e suas agências especializadas foram frutos de

acordos consensuais entre Estados, não restando dúvidas da credibilidade, em geral, dos

trabalhos desempenhados.

Ainda sobre a controvérsia no tocante a força jurídica da Declaração

analisada, mencione-se o seguinte posicionamento:

Todavia, sob um enfoque estritamente legalista (não compartilhado por este trabalho), a Declaração Universal, em si mesma, não

                                                            5LEWIS, Bernard. ACrise do Islã: Guerra Santa e Terror Profano/ tradução, Maria Lúcia de Oliveira. – Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004. p. 86-88. 6 ‘A Corte Internacional de Justiça, nos termos do art. 92 da Carta, é o principal órgão judicial das Nações Unidas, composto por quinze juízes. Seu funcionamento é disciplinado pelo Estatuto da Corte, que foi anexado à Carta. Dispõe a Corte de competência contenciosa e consultiva. Contudo, somente os Estados são partes em questão perante ela (art. 34 do Estatuto).’ PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 12ª edição, revista e atualizada. São Paulo. Editora Saraiva, 2011. p. 185-186.  

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apresenta força jurídica obrigatória e vinculante. Nessa visão, assumindo a forma de declaração (e não de tratado), vem a atestar o reconhecimento universal de direitos humanos fundamentais, consagrando um código comum a ser seguido por todos os Estados. (PIOVESAN, 2011, p. 215).

No intuito de complementar o raciocínio do trecho citado acima, a mesma

autora explica o processo de juridicização da citada Declaração, apresentando de forma

clara e concisa o entendimento e os instrumentos que fizeram com que os dispositivos

da DUDH viessem a ter caráter juridicamente obrigatório e vinculante na seara no

Direito Internacional.

À luz desse raciocínio e considerando a ausência de força jurídica vinculante da Declaração, após a sua adoção, em 1948, instaurou-se larga discussão sobre qual seria a maneira mais eficaz de assegurar o reconhecimento e a observância universal dos direitos nela previstos. Prevaleceu, então, o entendimento de que a Declaração deveria ser ‘juridicizada’ sob a forma de tratado internacional, que fosse juridicamente obrigatório e vinculante no âmbito do Direito Internacional. (PIOVESAN, 2011, p. 215-216).

Dando seguimento ao estudo, atente-seaos seguintes Pactos Internacionais

que passaram a constituir elementos fundamentais na arquitetura internacional de

proteção dos direitos humanos.

Esse processo de ‘juridicização’ da Declaração começou em 1949 e foi concluído apenas em 1966, com a elaboração de dois tratados internacionais distintos – O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais – que passaram a incorporar os direitos constantes da Declaração Universal. Ao transformar os dispositivos da Declaração em previsões juridicamente vinculantes e obrigatórias, os dois pactos internacionais constituem referência necessária para o exame do regime normativo de proteção internacional dos direitos humanos. (PIOVESAN, 2011, p. 216).

Finda a discussão em torno da DUDH, ressalte-se que o capítulo seguinte

aborda às peculiaridades dos sistemas de proteção e promoção do direito internacional

dos direitos humanos. E, em momento oportuno, serão destacados os Pactos de New

York, de 1966, que contribuíram e continuam a contribuir para a operacionalidade da

Declaração Universal, dando a esta força jurídica, sem olvidar o processo de

nacionalização dos referidos documentos normativos no ordenamento jurídico

brasileiro.

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2. SISTEMAS DE PROTEÇÃO E PROMOÇÃO DO DIREITO

INTERNACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS

O pós Segunda Guerra trouxe consigo uma atenção prioritária aos

direitos humanos, já que foram constatadas diversas violações à dignidade humana,

sendo assim optou-se por criar um sistema global de proteção de direitos, sistema

este encabeçado pelas Nações Unidas, que busca a proteção do ser humano em

escala mundial e que tem como objetivo maior a paz. Nesse sentido, faz-se oportuno

mencionar:

Estuário de aspirações coletivas de muitos séculos, a paz é o corolário de todas as justificações em que a razão humana, sob o pálio da lei e da justiça, fundamenta o ato de reger a sociedade, de modo a punir o terrorista, julgar o criminoso de guerra, encarcerar o torturador, manter invioláveis as bases do pacto social, estabelecer e conservar, por intangíveis, as regras, os princípios e cláusulas de comunhão política. (BONAVIDES, 2011, p. 590).

Com o fito de tentar resguardar os direitos humanos de forma mais

eficaz também se evidenciou ao longo do tempo a criação de sistemas regionais que

primam pela paz, cooperação entre os países e observância de tais direitos.

2.1Sistema Global de proteção e promoção dos direitos humanos

Dando seguimento ao assunto estudado, ora exposto, pode-se afirmar que

existe um sólido sistema global de proteção do direito internacional dos direitos

humanos (essa sistemática de criação de instrumentos de proteção, monitoramente e

controle desses direitos, pode ser chamada de internationalaccountability), que

conforme preconiza a boa doutrina, consubstancia-se esse sistema global na Carta

Internacional dos Direitos Humanos – International Bill ofRights(formada pela

Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, bem como pelo Pacto

Internacional dos Direitos Civis e Políticos e pelo Pacto Internacional dos Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais).

A Carta Internacional dos Direitos Humanos inaugura, assim, o sistema global de proteção desses direitos, ao lado do qual já se delineava o sistema regional de proteção, nos âmbitos europeu, interamericano e, posteriormente, africano. (PIOVESAN, 2011, p.216).

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Além deste arcabouço internacional de proteção dos direitos humanos,

convématentar também a tratados internacionais que complementam os ideais da Carta

referida acima, desta forma, ampliando o sistema universal de proteção de direitos.

Esses tratados se consubstanciam em Convenções que objetivam combater a

discriminação contra grupos que ao logo da História foramvulnerabilizados e também se

consubstanciam em Convenções que proíbem e criminalizam condutas que são

contrárias aos preceitos da dignidade da pessoa humana7. (SDH-PR, 2013).

Diversamente dos tratados internacionais tradicionais, os tratados internacionais de direitos humanos não objetivam estabelecer o equilíbrio de interesses entre os Estados, mas sim garantir o exercício de direitos e liberdades fundamentais aos indivíduos. (PIOVESAN, 2011, p. 217).

O sistema global, por sua vez, viria a ser ampliado com o advento de diversos tratados multilaterais de direitos humanos, pertinentes a determinadas e específicas violações de direitos, como o genocídio, a tortura, a discriminação racial, a discriminação contra as mulheres, a violação dos direitos das crianças, entre outras formas específicas de violação. (PIOVESAN, 2011, p. 216-217).

No que concerne aos tratados que objetivam ao combate a discriminação

contra grupos que historicamente foram violados, convém citar alguns instrumentos que

se enquadram nesta categoria, quais sejam: a Convenção Internacional sobre a

Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, a Convenção Internacional

sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a Convenção sobre a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, a Convenção sobre os Direitos da

Criança. (SDH-PR, 2013).

No tocante aos tratados que proíbem e criminalizam condutas que violam a

dignidade da pessoa humana, pode-se também citar alguns desses instrumentos que se

enquadram nesta outra categoria, quais sejam: a Convenção Contra a Tortura e Outros

Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes e o Estatuto de Roma do

Tribunal Penal Internacional, sendo este último o responsável pela codificação de

crimes contra a humanidade. (SDH-PR, 2013).

                                                            7 Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República SDH-PR. Guia de Estudos Concurso Nacional Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Brasília, 2013, 87p. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/atuacao-internacional/concurso-sidh/guia-de-estudos-do-concurso>. Acesso em: 12 de setembro de 2014.

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Muitos desses tratados, que foram citados acima, por exemplo, criam

comitês que têm a finalidade monitorar eimplementaros respectivos tratados. Esses

comitês, que são órgãos colegiados, recebem reclamações de violações de direitos

humanos, sendo assim, tais comitês podem assumir uma postura de órgãos quase-

judiciais, desta forma, efetivando um controle, ainda que tímido.

Já que os referidos tratados criam seus próprios comitês no objetivo de que

estes lhes monitorem, então resta explicada a mesma denominação a que é atribuída

tanto às Convenções como aos Comitês. Por exemplo: a Convenção sobre os Direitos da

Criança prevê o Comitê sobre o Direito das Crianças; a Convenção Internacional sobre

os Direitos das Pessoas com Deficiência prevê o Comitê sobre os Direitos das Pessoas

com Deficiência. É dessa forma que a nomenclatura e os órgãos se organizam.

Cabe salientar que os comitês, que são mecanismos criados também por

tratados, não são os únicos no monitoramento do Direito Internacional dos Direitos

Humanos. Frise-se que existe também, em âmbito mundial, um Conselho de Direitos

Humanos, que é um importante órgão intergovernamental que integra a Organização das

Nações Unidas, e que desenvolve inúmeros trabalhos em prol dos direitos da pessoa

humana.

O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas também cria outros

mecanismos, objetivando também a implementação de tais direitos. Nesse sentindo,

atente-se ao seguinte trecho:

O Conselho é um órgão intergovernamental colegiado responsável pela promoção e proteção dos Direitos Humanos ao redor do mundo. Uma de suas atribuições é conduzir o Mecanismo de Revisão Periódica Universal, que através de uma revisão por pares permite maior transparência, troca de experiência sobre a situação de Direitos Humanos dos 193 países membros da ONU. Não é um mecanismo judicial, e sim um mecanismo cooperativo onde cada membro do Conselho faz comentários, críticas, recomendações e elogios ao Estado que estiver sob avaliação.(SDH-PR, 2013, p. 15).

Além do mecanismo citado acima, qual seja: Mecanismo de Revisão

Periódica Universal, que é adotado pelo Conselho de Direitos Humanos, este mesmo

órgão adota outro mecanismo, que é o de procedimentos especiais. Estes mecanismos

classificam-se como sendo extraconvencionais.

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Os procedimentos especiais são mecanismos extraconvencionais que contribuem para a elucidação, codificação, desenvolvimento e apontamento de padrões em violações de Direito Internacional dos Direitos Humanos. Os procedimentos especiais podem ser relatores especiais, especialistas independentes ou grupos de trabalho, apontados pelo Secretário Geral das Nações Unidas. Exemplos de relatores são: a Relatoria especial sobre uma moradia adequada como elemento integrante do direito a um nível de vida adequado, a Relatoria especial sobre o direito à água potável e ao saneamento, a Relatoria especial sobre a promoção e proteção do direito à liberdade de opinião e expressão, e a Relatoria especial sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias, a Relatoria especial sobre o direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas, e a Relatoria especial sobre a situação dos defensores de Direitos Humanos.(SDH-PR, 2013, p. 15-16).

Complementando o estudo colocado acima, também pode-se dizer que a

atuação dos relatores evidencia-se de forma diversificada, como por exemplo:

realizando visitas in loco nos Estados, conduzindo estudos temáticos, atuandoem casos

específicos, chamando a atenção de países que supostamente violam os Direitos

Humanos, produzem relatórios, realizam consultas, dentre uma série de outras

atividades.

Ademais, apesar da existência desses diversos instrumentos normativos

protetivos da dignidade humana, é importante destacar que referidas normas não têm o

condão de substituir o ordenamento jurídico nacional, atuando em caráter subsidiário e

suplementar.

Atente-se que o Direito Internacional dos Direitos Humanos, com seus inúmeros instrumentos, não pretende substituir o sistema nacional. Ao revés, situa-se como direito subsidiário e suplementar ao direito nacional, no sentido de permitir sejam superadas suas omissões e deficiências. No sistema internacional de proteção dos direitos humanos, o Estado tem a responsabilidade primária pela proteção desses direitos, ao passo que a comunidade internacional tem a responsabilidade subsidiária, constituindo garantia adicional de proteção dos direitos humanos, quando falham as instituições nacionais. Os tratados de proteção dos direitos humanos consagram, ademais, parâmetros protetivos mínimos, cabendo ao Estado, em sua ordem doméstica, estar além de tais parâmetros, mas jamais aquém deles. (PIOVESAN, 2011, p. 217).

Com o intuito de finalizar o entendimento sobre o sistema global de

proteção do Direito Internacional dos Direitos Humanos de forma didática, far-se-á uma

breve consideração acerca dos principais instrumentos normativos e também dos

principais organismos e mecanismos do sistema global.

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O sistema das Nações Unidas é formado por instrumentos normativos gerais

e especiais. Os instrumentos gerais são aqueles que integram a Carta Internacional dos

Direitos Humanos (formada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos e pelos

Pactos Internacionais de 1966). São ditos gerais porque atendem a todos de forma

indistinta.Os instrumentos especiais possuem certas peculiaridades e especificidades,

sendo formados por convenções internacionais (elencadas no começo deste capítulo II),

que conferem direitos e protegemos mais vulneralibizados.

O Sistema da ONU é integrado por instrumentos normativos gerais e especiais e por organismos e mecanismos de vigilância, supervisão, monitoramento e fiscalização dos direitos humanos. Os instrumentos normativos geraissão principalmente aqueles que integram a chamada Carta Internacional de Direitos Humanos, que é composta pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e pelo Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. São chamados de gerais porque endereçados a toda e qualquer pessoa humana, indistintamente. Além destes, também compõem o conjunto normativo do Sistema Global as diversas Convenções Internacionais, estas consideradas como instrumentos normativos especiais, portanto não gerais, porque voltadas, fundamentalmente, à prevenção da discriminação ou à proteção de pessoas ou grupos de pessoas particularmente vulneráveis, que merecem tutela especial8.(BORGES, 2011).

Para além dos principais instrumentos normativos, há também os

organismos e mecanismos (de vigilância, monitoramento e fiscalização) que almejam o

cumprimento dos referidos instrumentos normativos do sistema global, quais sejam: os

mecanismosextraconvencionais (por exemplo: os que foram vistos neste capítulo e que

são elaborados pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU) e os mecanismos

convencionais (por exemplo: os comitês, que monitoram o cumprimento dos direitos

que estão previstos em convenções internacionais).

Apesar dos inúmeros instrumentos normativos de proteção do sistema

global, bem como dos seus diversos mecanismos de monitoramento e fiscalização, que

                                                            8BORGES, Alci Marcus Ribeiro; BORGES, Caroline Bastos de Paiva. Breves considerações sobre o sistema global de proteção dos direitos humanos. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 93, out 2011. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?artigo_id=10503&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em: 29 de agosto de 2014.

 

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objetivam o fiel cumprimento do que está contido nos instrumentos normativos, há que

ser colocada a seguinte questão:osistema global não é dotado de função jurisdicional

para receber denúncias de direitos humanos violados, que foram encaminhados por

indivíduos contra os Estados. (FREITAS, 2014, p. 46-47).

Contudo, como o próprio nome sugere, o sistema global possui uma maior

capacidade de alcance, albergando todos os Estados (juntamente com seus indivíduos)

que estão inseridos no contexto das relações internacionais. Sendo assim:

Como o próprio nome enfatiza, o sistema global possui um grande poder de alcance, atuando assim em qualquer Estado que faça parte da ordem internacional, ficando apenas dependente do consentimento desse Estado no que se refere aos instrumentos internacionais de proteção.(FREITAS, 2014, p. 47).

Ante o exposto, evidencia-se a real dimensão do sistema global, que busca

envolver todos os indivíduos, conferindo-lhes direitos através de documentos ratificados

por Estados soberanos.

Em âmbito mundial, tais direitos são resguardados com dificuldade por

inúmeros motivos, sendo um deles a inexistência de órgão judicial global que tenha

competência para receber denúncias de direitos humanos violados.

Em outras palavras, a ONU não conta com uma Corte de Direitos Humanos.

Existem críticas em torno do tema justamente pela complexidade de definição de

direitos humanos, no qual cada cultura possui sua concepção de direitos, restando aos

sistemas regionais o nobre papel de desenvolver um arcabouçoprotetivo jurídico mais

eficaz na proteção dos direitos da pessoa humana.

Considerando todo o exposto desde o começo deste capítulo, resta agora

analisar com maior precisão os Pactos de 1966, que, como já dito anteriormente, foram

os documentos internacionais que vieram a contribuir com a operacionalidade da

Declaração Universal.

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2.1.1 Pactos Internacionais de 1966

Os Pactos Internacionais de 1966, quais sejam: o Pacto Internacional dos

Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e

Culturais, foram elaborados no âmbito das Nações Unidas.

Os Pactos foram concebidos apartados, sob a alegação de que defendiam

direitos de categorias diferentes e também por forte influência dos países ocidentais, que

objetivavam a criação dos referidos pactos em separado. Nesse sentido, leciona

Piovesan:

Não obstante a elaboração de dois pactos diversos, a indivisibilidade e a unidade dos direitos humanos eram reafirmadas pela ONU, sob a fundamentação de que, sem direitos sociais, econômicos e culturais, os direitos civis e políticos só poderiam existir no plano nominal, e, por sua vez, sem direitos civis e políticos, os direitos sociais, econômicos e culturais também apenas existiriam no plano formal. (PIOVESAN, 2011, p. 218-219).

Houve outras alegações que fizeram com que os referidos pactos fossem

elaborados em separado, quais sejam: levantou-se a ideia de que os direitos civis e

políticos eram autoaplicáveis e sua cobrança poderia ser imediata, ao passo que, os

direitos sociais, econômicos e culturais, eram vistos como programáticos e de realização

progressiva. (PIOVESAN, 2011)

Embora tenha existido toda essa celeuma em torno da elaboração desses

documentos internacionais, resta entender que os dispositivos desses tratados, bem

como de seus protocolos, vieram a conferir um caráter técnico-jurídico aos direitos

previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948. Ademais, os pactos

alargaram o rol de direitos humanos e implementaram os direitos já previstos na

Declaração Universal.

2.2 Sistemas Regionais de proteção e promoção dos direitos humanos

Além do sistema global de proteção dos direitos humanos, há também os

sistemas de proteção regional dos direitos humanos no cenário internacional.

Povos que vivem relativamente próximos, certamente, compartilham de

valores similares, bem como tendem a ter um patrimônio cultural não muito diferente, o

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que aponta para uma maior integração, fazendo com que Estados próximos possam ter

anseios e preocupações em comum.

Povos geograficamente próximos frequentemente compartilham valores, seja pelo patrimônio cultural comum, seja pela facilidade de migração de ideias. Assim, os Estados tendem a agrupar-se em organizações regionais com objetivos diversos, inclusive, a proteção dos Direitos Humanos. Os níveis de proteção tendem a ser, em diferentes aspectos, mais avançados que aqueles consolidados em âmbito global. (SDH-PR, 2013, p. 16).

É nessa perspectiva que surgem os sistemas regionais de proteção dos

direitos humanos, quais sejam: europeu, interamericano e africano. Adicionalmente,há

um incipiente sistema árabe e a proposta de criação de um sistema regional asiático.

(STEINER apud PIOVESAN, 2011, p. 307).

Em relação aos sistemas de proteção europeu, interamericano e africano,

cumpre salientar que cada um possui um arcabouço jurídico próprio. Nesse sentido:

O sistema interamericano tem como principal instrumento a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, que estabelece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana. Já o sistema europeu conta com a Convenção Europeia de Direitos Humanos de 1950, que estabeleceu originariamente a Comissão e a Corte Europeia de Direitos Humanos. Com o Protocolo n. 11, em vigor desde novembro de 1998, houve a fusão da Comissão com a Corte, com vistas à maior justicialização do sistema europeu, mediante uma Corte reformada e permanente. Por fim, o sistema africano apresenta como principal instrumento a Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos de 1981, que, por sua vez, estabelece a Comissão Africana de Direitos Humanos; posteriormente foi criada a Corte Africana de Direitos Humanos, mediante um Protocolo à Carta, em 1998. Note-se que, dos três sistemas regionais, o europeu é o mais antigo e o mais avançado. (PIOVESAN, 2011, p. 307-309).

É certo que todos os citados sistemas regionais de proteção dos direitos

humanos têm dado sua importante contribuição ao tentar proteger a dignidade do ser

humano ao seu mais elevado grau. Além disso, contribuem esses sistemas regionais

para a evolução do direito internacional público, já que o direito internacional dos

direitos humanos, embora autônomo, figura como ramo daquele.

[...] faz-se preclaro afirmar que a OEA, junto aos demais sistemas regionais Europeu e Africano, têm o propósito de complementar o sistema global, tornando internacionalmente relevante a esfera regional por meio da facilitação do tratamento das normas e o seu

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monitoramento, não deixando de atender da melhor maneira as necessidades locais. (CIDRÃO, 2010, p. 25-26).

Reconhecendo que todos os sistemas regionais têm seu devido valor no

cenário internacional, convém salientar que o estudo em torno do sistema regional

interamericano será mais detalhado, por ser objeto de estudo do presente trabalho.

2.2.1 Sistema Interamericano de Direitos Humanos – SIDH

O Sistema Interamericano de Direitos Humanos é um sistema regional de

proteção e promoção dos direitos humanos no âmbito no continente americano. Tal

sistema, que é dirigido pela Organização dos Estados Americanos (OEA), possui

diversos instrumentos internacionais acordados entre países membros da organização

supracitada. Tais instrumentos, que têm por objetivo a salvaguarda do ser humano,

serão apresentados no decorrer deste tópico. No que concerne ao SIDH:

Seu objetivo (SIDH), que é a salvaguarda dos direitos humanos na região, desdobra-se em duas vertentes: uma direcionada ao avanço do direito internacional dos direitos humanos no âmbito interno dos Estados e outra voltada à prevenção de retrocessos no sistema de proteção de direitos. (CEIA, 2013, p. 113).

A OEA (Organização dos Estados Americanos) é uma organização internacional criada pelos Estados do continente americano para conseguir uma ordem de paz e justiça, promover sua solidariedade e defender sua soberania, sua integridade territorial e sua independência (artigo 1 da Carta da OEA). Desde sua criação, os Estados americanos adotaram um conjunto de instrumentos internacionais que se converteram na base normativa de um sistema regional de promoção e proteção dos direitos humanos, ao reconhecerem esses direitos, estabelecerem obrigações para a sua promoção e proteção e criarem órgãos para zelar por sua observância. (SDH-PR, 2013, p. 17-18).

Pode-se afirmar que a atual conjuntura do sistema interamericano foi

idealizada pela OEA (organismo internacional acolhidoconforme o que preceitua o

artigo 52 da Carta das Nações Unidas), sendo esta organização a interessada, desde a

sua concepção, pelos temas atinentes a integração dos países, cultura de paz,

desenvolvimento econômico, promoção e proteção dos direitos humanos, entre outros.

Convém assinalar, portanto, os propósitos essenciais que norteiam a OEA,

quando do cumprimento de suas obrigações frente ao sistema interamericano de

proteção dos direitos humanos. Nesse sentido, estabelece o artigo 2 da Carta da OEA,

inverbis:

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Para realizar os princípios em que se baseia e para cumprir com suas obrigações regionais, de acordo com a Carta das Nações Unidas, a Organização dos Estados Americanos estabelece como propósitos essenciais os seguintes: a) Garantir a paz e a segurança continentais; b) Promover e consolidar a democracia representativa, respeitado o princípio da não-intervenção; c) Prevenir as possíveis causas de dificuldades e assegurar a solução pacífica das controvérsias que surjam entre seus membros; d) Organizar a ação solidária destes em caso de agressão; e) Procurar a solução dos problemas políticos, jurídicos e econômicos que surgirem entre os Estados membros; f) Promover, por meio da ação cooperativa, seu desenvolvimento econômico, social e cultural; g) Erradicar a pobreza crítica, que constitui um obstáculo ao pleno desenvolvimento democrático dos povos do Hemisfério; e h) Alcançar uma efetiva limitação de armamentos convencionais que permita dedicar a maior soma de recursos ao desenvolvimento econômico-social dos Estados membros.

Além do artigo 2 da referida Carta, frise-se também a importância do seu

artigo 3, já que traz os princípios que devem reger os Estados, bem como as relações

entre eles. Convém assinalar alguns desses princípios, quais sejam: da boa-fé, da

cooperação econômica, da solidariedade.

Com o fito de proteger os direitos fundamentais da pessoa humana, foi que a

OEA elaborou quatro instrumentos normativos principais, quais sejam: a Declaração

Americana dos Direitos e Deveres do Homem – DADDH (assinada em 30 de abril de

1948, na cidade de Bogotá, Colômbia), a Carta da Organização dos Estados

Americanos, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e por último, o Protocolo

de San Salvador, que versa sobre direitos econômicos, sociais e culturais.

Os quatro diplomas normativos, que foram mencionados acima, figuram

como os principais instrumentos do sistema interamericano. Convém elencar,

contudo,outros instrumentos não menos importantes, e que também fazem parte deste

arcabouço regional de proteção e promoção dos direitos humanos. André de Carvalho

Ramos (2001, p. 62) informa:

Quanto aos demais instrumentos internacionais do sistema interamericano de direitos humanos, cite-se, entre outros, a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir o Crime de Tortura, adotada(onde se lê: adotada, leia-se: aprovada) em 1985 e ratificada pelo Brasil em 1989; o Protocolo Adicional à Convenção Americana de Direitos Humanos relativo à Abolição da Pena de Morte,

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adotadoem 1990 e ratificado pelo Brasil em 1996; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, adotadaem 1994 em Belém do Pará (Brasil) e ratificada pelo Brasil em 1995 e a Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas adotadaem 1994 [...].

Além dos citados instrumentos internacionais de proteção de direitos, frise-

se que existem também os seguintes: a Convenção Interamericana para a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação contra Pessoas Portadoras de Deficiência, esta

aprovada em 07 de junho de 1999; a Carta Democrática Interamericana, aprovada em 11

de setembro de 2001, sendo esta Carta a responsável pela reafirmação dos propósitos de

proteção e promoção dos direitos humanos no âmbito da OEA; a Declaração de

Princípios sobre Liberdade de Expressão, sendo esta aprovada pela Comissão

Interamericana de Direitos Humanos (Comissão IDH) em seu 108º período ordinário de

sessões, celebrado de 2 a 20 de outubro de 2000; os Princípios de Boas Práticas para a

Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas, sendo estes princípios

aprovados pela Comissão IDH em seu 131º período ordinário de sessões, em março de

2008. (SDH-PR, 2013).

Oportuno acrescentar a título de informação, que a Declaração Americana

de Direitos e Deveres do Homem – DADDH, assinada em Bogotá no dia 30 de abril de

1948, mostrou-se como instrumento internacional de vanguarda, tendo em vista que foi

o primeiro diploma internacional de natureza geral. Após foi que surgiu a Declaração

Universal dos Direitos Humanos – DUDH, assinada em Paris no dia 10 dezembro de

1948, oito meses depois, sob os auspícios das Nações Unidas.

Note-se, portanto, que o sistema interamericano foi iniciado formalmente

com o advento da DADDH, tendo sido esta Declaração aprovada na Nona Conferência

Internacional Americana, em 1948, onde na mesma ocasião foi adotada também a

própria Carta da OEA, que elege “direitos fundamentais da pessoa humana” como

fundamento principiológico da Organização.

Cabe salientar, também, que a DADDH, além do Preâmbulo, contém 38

artigos em que são definidos os direitos protegidos e os deveres correspondentes. Dessa

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forma, a Declaração encerra tanto catálogo de direitos civis e políticos quanto de

direitos econômicos, sociais e culturais9.

Apesar da importância da DADDH, no seio da OEA, com o passar do tempo

houve a necessidade da criação de um órgão que fosse responsável pelo monitoramento

dos progressos e também dos retrocessos dos direitos humanos em nosso continente. É

nesse contexto, que em 1959, no Chile, em meio a Quinta Reunião de Consulta dos

Ministros das Relações Exteriores, através da Resolução que tratava sobre “Direitos

Humanos”, em sua Parte II, que surge a Comissão IDH.

Frise-se que, atualmente, a Comissão IDH integra tanto a OEA, como

também a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – CADH. Em momento

oportuno, tal Comissão IDH será analisada de forma mais detalhada. Contudo, faz-se

necessário o breve comentário:

Neste contexto, a Comissão Interamericana surge como relevante instância internacional competente para examinar comunicações ou petições individuais que denunciem violação a direito internacionalmente assegurado – no caso, direito assegurado pela Convenção Americana de Direitos Humanos ou por outro tratado do sistema interamericano. (PIOVESAN, 2011, p. 369). A Comissão tem como característica o aspecto bifronte, pois, ela é tanto um órgão da OEA, onde todos os Estados-membros podem se apresentar a ela; como também é um órgão da Convenção Americana de Direitos Humanos. Ou seja, podemos entender que a Comissão é uma entidade autônoma da OEA, regida pelas normas da Carta da OEA e da Convenção Americana. (FREITAS, 2014, p. 73).

A Comissão IDHapresentou-se inicialmente como propósito principal de

velar pela observância e defesa dos direitos humanos no âmbito do sistema

interamericano. Desta forma,mediante a criação da Comissão os Estados americanos

resolveram o problema da falta de órgãos especificamente encarregados de velar pela

observância dos direitos no sistema10.

                                                            9 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/a.Introd.Port.htm>. Acesso em: 04 de setembro de 2014.  10______. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/a.Introd.Port.htm>. Acesso em: 04 de setembro de 2014.

 

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Contudo, observou-se com o tempo, que as funções e os poderes da

Comissão IDH tinham de ser ampliados, para que, desta forma, a mesma pudesse

atender de modo mais eficaz a observância e a defesa dos direitos humanos. É nesse

contexto que:

Mais adiante, na VIII Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, através de outra Resolução [n. IX], o Conselho da OEA sugeriu a ampliação das funções e poderes da Comissão. Foi então que na II Conferência Interamericana Extraordinária em 1965 por meio da Resolução XXII a Comissão teve seus poderes ampliados para inclusive receber petições ou comunicações sobre violações de direitos humanos.(FREITAS, 2014, p. 72). Apesar de haver, entre os membros da OEA, inúmeros países que violam os direitos humanos, esta organização, ainda sim, trabalha para garantir que cada vez mais o direito humano internacional progrida, tornado-se mais resistente as demandas por meio de medidas preventivas para proteger o gozo e o exercício dos direitos humanos. (CIDRÃO, 2010, p. 25).

O tópico seguinte traz a Convenção Americana sobre Direitos Humanos –

CADH, instrumento que aprimora a defesa dos direitos humanos dentro do SIDH. Na

ocasião, a Comissão IDH é apresentada tanto com órgão da OEA, bem como sendo

órgão da CADH.

2.2.2 Convenção Americana de Direitos Humanos – CADH

A CADHveio a fortalecer o Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

Tal Convenção representou um avanço no desenvolvimento dos direitos humanos,

sendo, por isso, considerada o tratado mais importante do sistema analisado. Pode-se

afirmar, inclusive, que o mencionado sistema ganhou maior visibilidade com o

surgimento, em 1969, da Convenção Americana. Tal tratado internacional entrou em

vigor em 1978, contudo, a adesão por parte do Estado brasileirosó foi concretizada em

1992, por meio do Decreto Legislativo n. 27, datado de 28 de maio 1992 e pelo Decreto

Executivo 678, datado de 6 de novembro 1992. A CADH tem em sua estrutura a Parte I,

que contempla os deveres dos estados e direitos protegidos, e a Parte II, que versa sobre

os meios de proteção (no caso, a Comissão IDH e a Corte IDH).

O instrumento de maior importância no sistema interamericano é a Convenção Americana de Direitos Humanos, também denominada Pacto de San José da Costa Rica. Foi assinada em San José, Costa Rica, em 1969, entrando em vigor em 1978. Apenas Estados-membros

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da Organização dos Estados Americanos têm o direito de aderir à Convenção Americana, que, até março de 2010, contava com 25 Estados-partes. (PIOVESAN, 2011, p 311-312).

A entrada em vigor da Convenção ocorreu em 18 de julho de 1978, constituindo um passo fundamental no fortalecimento do sistema de proteção e permitiu aumentar a efetividade da Comissão, estabelecer uma Corte Interamericana de Direitos Humanos e modificar a natureza jurídica dos instrumentos em que se baseia a estrutura institucional11.

A CADH reconhece e assegura, de forma substancial, uma série de direitos

civis e políticos que se assemelham aos direitos constantes no Pacto Internacional de

Direitos Civis e Políticos de 1966. Nesse sentido, destacam-se os seguintes direitos

previstos na Convenção: o direito à personalidade jurídica (artigo 3º), o direito à vida

(artigo 4º), o direito a não ser submetido à escravidão (artigo 6º), o direito à liberdade

(artigo 7º), o direito a um julgamento justo (artigo 8º), o direito à indenização (artigo

10), o direito à privacidade (artigo 11), o direito à liberdade de consciência e religião

(artigo 12), o direito à liberdade de pensamento e expressão (artigo 13), o direito de

retificação ou resposta (artigo 14), o direito de reunião (artigo 15), o direito à liberdade

de associação (artigo 16), o direito ao nome (artigo 18), o direito à nacionalidade (artigo

20), o direito de circulação e residência (artigo 22), direitos políticos (artigo 23), o

direito à igualdade perante a lei (artigo 24) e o direito à proteção judicial (artigo 25).

Além dos direitos de cunho civil e político mencionados, há que se destacar

também os direitos de cunho econômico, social e cultural, que foram introduzidos de

forma mais objetiva na CADH, a partir do Protocolo Adicional à Convenção Americana

em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (popularmente chamado de

Protocolo de San Salvador), que entrou em vigor em 1999.

A Convenção Americana não enuncia de forma específica qualquer direito social, cultural ou econômico; limita-se a determinar aos Estados que alcancem, progressivamente, a plena realização desses direitos, mediante a adoção de medidas legislativas e outras que se mostrem apropriadas, nos termos do art. 26 da Convenção. Posteriormente, em 1988, a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos adotou um Protocolo Adicional à Convenção, concernente aos direitos sociais, econômicos e culturais (Protocolo de San Salvador, que entrou em vigor em novembro de 1999, por ocasião

                                                            11______. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/a.Introd.Port.htm>. Acesso em: 12 de setembro de 2014.

 

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do depósito do 11º instrumento de ratificação, nos termos do art. 21 do Protocolo). (PIOVESAN, 2011, p. 313).

Tal instrumento, inclusive, reconhece a interdependência que há entre os

direitos civis e políticos e os direitos sociais, econômicos e culturais. Pode-se afirmar

que o direito da pessoa humana é alcançado em sua completude quando há a conjugação

dos referidos direitos. Tanto é assim que no próprio preâmbulo do aludido Protocolo

segue o entendimento de que os Estados-partes da CADH reconhecem esta estreita

relação.

Sendo assim, convém informar os direitos conquistados quando da adesão

do Protocolo em comento, quais sejam:

Este instrumento reconhece o direito ao trabalho e às condições de trabalho, aos direitos sindicais, o direito à previdência social, à saúde, a um meio ambiente sadio, à alimentação, à educação, aos benefícios da cultura, o direito à família e os direitos das crianças e dos idosos e das pessoas portadoras de deficiência12.

Ademais, sabendo que os direitos humanos integram rol exemplificativo e

não exaustivo, a CADH ainda confere, com base no seu artigo 77, a possibilidade de

inclusão progressiva de direitos em seu arcabouço de proteção.

Art. 77 1. De acordo com a faculdade estabelecida no artigo 31, qualquer Estado-Parte e a Comissão podem submeter à consideração dos Estados-Partes reunidos por ocasião da Assembleia Geral, projetos de protocolosadicioais a esta Convenção, com a finalidade de incluir progressivamente no regime de proteção da mesma outros direitos e liberdades. 2. Cada protocolo deve estabelecer as modalidades de sua entrada em vigor e será aplicado somente entre os Estados-Partes no mesmo.

Ainda em relação aos direitos protegidos pela CADH, saliente-se o seguinte:

Esse Pacto de San José visa à proteção de todo ser humano sem distinção de qualquer espécie; consagra o direito à vida, mas não proíbe a pena de morte; e permite a prisão cível apenas no caso do devedor de alimentos, não sendo permitido a qualquer outro tipo de prisão tampouco a do depositário infiel. (FREITAS, 2014, p. 69).

                                                            12 ______. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/a.Introd.Port.htm>. Acesso em: 12 de setembro de 2014.

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Com fundamento nas explanações deste texto, percebe-se que a CADH

buscou albergar o maior número possível de direitos,elencado-os de modo satisfatório

na redação de seus artigos. Nesse sentido, tal convenção integrou dois mecanismos de

proteção e monitoramento dos direitos humanos, que foram a Comissão Interamericana

de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos. (CIDRÃO, 2010,

p. 26).

Note-se, portanto, que a CADH tem buscado primar pelo cumprimento de

seus dispositivos através dos instrumentos que a mesma estabelece: a Comissão

Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos.

2.2.2.1 Comissão IDH

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos – Comissão IDH ou

simplesmente Comissão (com sede em Washington, D.C. – artigo 16 do Estatuto da

Comissão), órgão autônomo que figura tanto no âmbito da OEA, bem como integra a

CADH, foi criada para promover a observância e a defesa dos direitos humanos (artigo

1 do Estatuto da Comissão) na Organização. Saliente-se que, embora a Comissão seja

parte em dois institutos distintos, o órgão é o mesmo.

[...] Cabe assinalar que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos possui duplo tratamento normativo: o primeiro deles, perante a Carta da OEA e o segundo, perante a Convenção Americana de Direitos Humanos. (RAMOS, 2001, p. 72). Todavia, o órgão é o mesmo, variando apenas as atribuições quando age como órgão da OEA ou quando age como órgão da Convenção Americana de Direitos Humanos. De fato, a Comissão é o órgão principal da própria OEA e órgão também da Convenção Americana de Direitos Humanos. (RAMOS, 2001, p. 72).

Pode-se dizer que a Comissão detém uma competência que abrange todos os

Estados-partes da CADH, no tocante aos direitos humanos nela preconizados. Abrange

também todos os Estados-membros da OEA, no tocante aos direitos preconizados na

DADDH de 1948.

É relevante mencionar ainda que, a Comissão, um órgão fundamental da OEA, prioriza a observância e a defesa dos direitos humanos no recinto das atividades de caráter promocional, consultivo e de proteção dos direitos humanos. Deste modo, possui competência para divulgar temas relacionados aos direitos humanos por meio de

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informações, elaboração de estudos e relatórios, palestras, conferências e seminários configurando um papel educativo, Esta pode, também, aconselhar aos Estados a tomarem medidas progressivas a mercê dos direitos humanos e pôr em prática, com a anuência do Estado, investigações no país acerca da situação do respeito aos direitos humanos. Além disso, proporciona aos Estados assessoria para promover a consciência sobre o grande valor dos direitos humanos entre os povos americanos. (CIDRÃO, 2010, p. 27).

A Comissão se apresenta como órgão fundamental dentro do SIDH por uma

série de motivos, já que a mesma exerceum papel educativo relevante na promoção e

proteção dos direitos humanos no âmbito OEA, promovendo e incentivando atividades

de conscientização, o desenvolvimento de estudos, seminários, palestras, conferências, a

elaboração de relatórios anuais à Assembleia Geral, dentre outras atividades, na busca

de um efetivo monitoramento e de uma cultura de direitos humanos.

A Comissão vai exercer um papel de monitoramento entre os países no que diz respeito aos direitos humanos. Logo, entende-se o porquê dela ser vista como uma espécie de órgão quase judicial pelo fato de possuir funções de caráter político-diplomático [...]. (FREITAS, 2014, p. 73).

Quando nossos direitos, previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, não são amparados pela Justiça brasileira, temos possibilidade de recorrer à Comissão Interamericana, que passa a ser uma espécie de ‘5ª instância’. Todas as violações de direitos humanos não amparadas pelo Judiciário brasileiro podem (e devem) ser levadas ao conhecimento da citada Comissão, que resolve o assunto (tal como fez no caso Maria da Penha) ou o encaminha para a Corte (assim foi feito no Caso Araguaia)13.

Tendo em vista que a Comissão também atua no monitoramento dos países

da OEA, no que tange aos direitos humanos, pode-se dizer com isso que a mesma é

vista como um órgão quase judicial, desempenhando também suas atividades com um

viés político-diplomático.

A Comissão é composta de7 (sete) membros14, que devem possuir elevado

prestígio moral, bem como aprimorado saber na seara dos direitos humanos. Tais

membros serão escolhidos a título pessoal, através da Assembléia Geral da

                                                            13GOMES, Luiz Flávio. A Lei de Anistia viola convenções de direitos humanos. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-mar-10/coluna-lfg-lei-anistia-viola-convencoes-direitos-humanos>. Acesso em: 16 de setembro de 2014. 14Observe-se que todas essas informações colocadas acima são encontradas nos artigos 34, 35, 36 e 37 da CADH (em sua Parte II – Meios de Proteção), artigos 2, 3, 6 e 7 do Estatuto da Comissão, bem como nos artigos 1 e 2 de seu Regulamento. 

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Organização, que irá receber uma lista de candidatos, sendo estes indicados pelos

Governos dos Estados-membros da OEA.

Cada Governo pode sugerir até 3 (três) candidatos, que podem ser nacionais

do Estado que tenha proposto, bem comonacionais de outros Estados membros da OEA.

No entanto, sendo mesmo a lista tríplice, daí deve conter, pelo menos, um candidato de

outra nacionalidade, que não a do Estado proponente. O mandato dos membros da

Comissão é de 4 (quatro) anos, sendo possível apenas uma recondução por igual

período.

Cabe salientar que os integrantesda Comissão não representam o Estado-

membro que os indicou, mas sim todos os Estados-membros da OEA. Ademais, é

vedada expressamente a composição da Comissão por mais de um nacional de um

mesmo Estado (artigo 7 do Estatuto da Comissão).

No tocante às atribuições e funções da Comissão, há que se falar que a

mesma possui relevantes funções no seio do SIDH, inclusive, já foram citadas algumas

delas neste trabalho. Contudo, insta observar a literalidade do artigo 41 da CADH, que

estabelece:

A Comissão tem a função principal de promover a observância e a defesa dos direitos humanos e, no exercício do seu mandato, tem as seguintes funções e atribuições: a.estimular a consciência dos direitos humanos nos povos da América; b.formular recomendações aos governos dos Estados membros, quando o considerar conveniente, no sentido de que adotem medidas progressivas em prol dos direitos humanos no âmbito de suas leis internas e seus preceitos constitucionais, bem como disposições apropriadas para promover o devido respeito a esses direitos; c.preparar os estudos ou relatórios que considerar convenientes para o desempenho de suas funções; d.solicitar aos governos dos Estados membros que lhe proporcionem informações sobre as medidas que adotarem em matéria de direitos humanos; e.atender às consultas que, por meio da Secretaria-Geral da Organização dos Estados Americanos, lhe formularem os Estados membros sobre questões relacionadas com os direitos humanos e, dentro de suas possibilidades, prestar-lhes o assessoramento que eles lhe solicitarem; f.atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, de conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51 desta Convenção; e g.apresentar um relatório anual à Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos.

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Muitos dos dispositivos colocados acima são de fácil compreensão, além do

que, já foram explorados anteriormente, no entanto, faz-se necessário explicar com

maior cautela o procedimento processual que garante ao indivíduoou a organizações

não-governamentaisa possibilidade de ingressar no sistema interamericano através de

uma petição dirigida à Comissão.

Percebe-se, desta forma, que a Comissão pode representar a última

instânciade proteção dos direitos humanos ao aceitar a petição que lhe foi dirigida.

Contudo, para que tal petição venha a ser admitida, a mesma deve ser interposta

obedecendo aos critérios de admissibilidade (artigo 46 da CADH), quais sejam:

esgotamento dos recursos na jurisdição doméstica, estando esse critério em

conformidade com os princípios de direito internacional; que a petição seja

encaminhada à Comissão decorridos 6 (seis) meses da data da decisão definitiva no

plano interno; que o processo em questão não esteja sendo objeto de análise em outra

instância internacional.

Há exceção no caso dos requisitos do esgotamento dos recursos internos,

bem como em relação ao prazo de 6 (seis) meses da notificação da decisão final. Tais

exceções são evidenciadas quando o presumido prejudicado não puder contar com a

legislação interna de seu país, não tendo essa legislação previsão de proteção do direito

que foi violado; quando não houver sido assegurado o devido processo legal ao

presumido prejudicado, ocorrendo ou a impossibilidade de recursos em âmbito

doméstico ou a demora injustificada sobre a decisão dos recursos mencionados. Em

relação ao critério de admissibilidade no tocante ao esgotamento dos recursos da

jurisdição interna, Antônio Augusto Cançado Trindade (1991 apud PIOVESAN, 2011,

p. 317-318) traz a seguinte contribuição:

Como se sabe, estamos diante da regra de Direito Internacional em virtude da qual se deve dar ao Estado a oportunidade de reparar um suposto dano no âmbito de seu próprio ordenamento jurídico interno, antes que se possa invocar sua responsabilidade internacional, trata-se de uma das questões que, com maior frequência, é suscitada no contencioso internacional, concernente tanto à proteção diplomática de nacionais no exterior, como à proteção internacional dos direitos humanos.

Saliente-se que sendo atendidos todos os requisitos de admissibilidade para

a petição, a Comissão irá solicitar informações ao Governo denunciado. Tendo a

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Comissão recebido as informações do Governo ou não recebendo findo o prazo, a

mesma verifica se realmente houve ou subsistem as alegações contidas na petição ou

comunicação. Daí, atente-se para as seguintes hipóteses: não havendo ou não

subsistindo tais alegações, a Comissão pode arquivar o expediente. Havendo ou

subsistindo a possibilidade real de direito violado, a Comissão realizará um exame

aprimorado do assunto, procedendo quando necessário, a investigação dos fatos.

(PIOVESAN, 2011).

Feito o exame aprimorado do assunto, a Comissão irá se esforçar na busca

de uma solução amistosa entre as partes, quais sejam: denunciante e Estado. Alcançando

a solução amistosa, será elaborado um informe pela própria Comissão, que será

encaminhado ao peticionário, bem como aos Estados-partes da Convenção, e,

posteriormente, também à Secretaria da Organização dos Estados Americanos para

publicação. O informe irá trazer a exposição dos fatos, bem como a solução alcançada.

Não sendo alcançada nenhuma solução amistosa, a Comissão ficará

responsável por redigir um relatório, que irá apresentar os fatos com as conclusões

atinentes ao caso e, eventualmente, irá fazer recomendações ao Estado-parte. Tal

recomendação, que figura como de terceira fase do procedimento, é de caráter

mandatório, devendo constar na conclusão da Comissão se houve ou não violação da

CADH por parte do Estado.

Concluído o relatório,o mesmo será encaminhado de maneira confidencial

aoEstado-parte, para que cumpra, no prazo de 3 (três) meses as recomendações lá

colocadas. O referido prazo é contado da data da remessa do relatório ao Estado

denunciado15.É durante esse período que o caso pode ser resolvido pelas partes ou

encaminhado à Corte IDH. Cabe salientar que o indivíduo não tem legitimidade para se

dirigir diretamente à Corte. Apenas a Comissão Interamericana e os Estados-partes

podem submeter um caso à Corte Interamericana16, conforme dispõe o artigo 61 da

CADH.

Cabe observar, contudo, que o caso só poderá ser submetido à Corte se o Estado-parte reconhecer, mediante declaração expressa e

                                                            15 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 12ª edição, revista e atualizada. São Paulo. Editora Saraiva, 2011. p. 320. 16 ______. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 12ª edição, revista e atualizada. São Paulo. Editora Saraiva, 2011. p. 320.

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específica, a competência da Corte no tocante à interpretação e aplicação da Convenção – embora qualquer Estado-parte possa aceitar a jurisdição da Corte para determinado caso. (PIOVESAN, 2011, p 321).

Ao longo dos três meses, o caso também pode não ser solucionado pelas

partes e nem ser encaminhado a Corte IDH. Em geral, isso ocorre pelo fato de o Estado

em causa não ser parte na Convenção Americana ou, caso o seja, por não ter ainda

reconhecido a competência contenciosa da Corte17.Desta feita, a Comissão, através da

maioria absoluta de votos, poderá emitir seu posicionamento. Assim, fixando um prazo

ao Estado-parte para que cumpra as medidas necessárias no sentido de remediar a

situação examinada. Findo o prazo estabelecido, a Comissão decidirá, através de

maioria absoluta de votos, se as recomendações foram acatadas pelo Estado, bem como

se publicará o informe por ela concebido no relatório anual de suas atividades.

Em primeiro lugar, é necessário inquirir sobre a natureza dos Informes da Comissão: seriam meras ‘recomendações’ sem força vinculante, ou, ao contrário, seriam deliberações internacionais vinculantes, devendo os Estados obedecê-las de boa-fé. (RAMOS, 2001, p. 83).

Nesta última análise, em que o caso não foi solucionado pelas partes nem

tampouco encaminhado à Corte, mesmo a Comissão tendo reconhecido a não adoção de

medidas por parte do Estado, e sabendo que o caso não será submetido à Corte em

hipótese alguma, já que, em geral, como falado anteriormente, o Estado encontra-se

nessa situação justamente por não ter reconhecido a competência contenciosa da Corte,

há que se invocar, nessas circunstâncias, o princípio da boa-fé para que as

recomendações venham a ser cumpridas. Nesse sentido é importante o seguinte

posicionamento:

[...] a Corte sustentou que o princípio da boa-fé, consagrado também na Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, obriga os Estados contratantes da Convenção Americana de Direitos Humanos a realizar seus melhores esforços para cumprir as deliberações da Comissão, que é também órgão principal da OEA, organização que tem como uma de suas funções justamente promover a observância e a defesa dos direitos humanosno continente americano. (RAMOS, 2001, p. 84).

                                                            17 GOMES, Luiz Flávio; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos. 3ª edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 279.

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Além de todas as funções da Comissão discutidas ao longo do trabalho,

ressalte-se que a mesma pode atuar, inclusive, por conta própria, em casos de gravidade

e urgência, quando a vítima está em situação de perigo real ou iminente.

Por fim, em casos de gravidade e urgência, e toda vez que resulte necessário, de acordo com as informações disponíveis (por exemplo, na hipótese em que a vida ou a integridade pessoal da vítima encontrar-se em perigo real ou iminente), a Comissão poderá, por iniciativa própria ou mediante petição da parte, solicitar ao Estado em questão a adoção de medidas cautelares para evitar danos irreparáveis, como prevê o art. 25 do novo Regulamento da Comissão. Pode ainda a Comissão solicitar à Corte Interamericana a adoção de medidas provisórias, em casos de extrema gravidade e urgência, para evitar dano irreparável à pessoa, em matéria ainda não submetida à apreciação da Corte (art. 74 do novo Regulamento). (PIOVESAN, 2011, p. 321-322).

O caso do Presídio Urso Branco18(ocorrido em Porto Velho, Rondônia) em

face do Estado brasileiro, deu causa a adoção de medidas provisórias por parte do

Brasil.

Ante todo o exposto, tornou-se possível observar as funções e atribuições da

Comissão, bem como o modo como a mesma pode atuar frente aos Estados, atribuindo-

lhes responsabilidades na defesa dos direitos humanos. Tornou-se possível também

visualizar os meios pelos quais a Comissão submete um caso à Corte, desta maneira,

deixando o suposto Estado violador suscetível a condenação na esfera internacional.

2.2.2.2 Corte IDH

A Corte Interamericana de Direitos Humanos – Corte IDH(ou simplesmente

Corte ou Tribunal), criada 1978 com a entrada em vigor da CADH, é um órgão

jurisdicional autônomo e que tem sua sede em São José da Costa Rica. Além disso, a

mesma integra a CADH, mas independe da OEA.

                                                            18KOSTER, Julia Impéria. Caso Presídio Urso Branco e a Corte Interamericana de Justiça– Direitos

Humanos. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XII, n. 68, set 2009. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=6784>. Acesso em: 16 de setembro de 2014.

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Tal instituição judicial foi criada com o fito de solucionar casos de violação

de direitos humanos no âmbito do continente americano. Isto é, a Corte delibera em

casos de afronta aos dispositivos da CADH, no entanto,somente podem passar pelo seu

crivo os Estados-partes da CADH que tenham praticado violação de direitos humanos e

também que tenham reconhecido expressamente sua jurisdição. A competência

contenciosa da Corte foi reconhecida pelo Estado brasileiro somente em 10 de

dezembro de 1998, por meio do Decreto Legislativo n. 89. Frise-se que a Corte tem um

procedimento contencioso, este iniciado após a Comissão ter esperado que o Estado

descumprisse com as recomendações contidas no relatório. (CIDRÃO, 2010, p. 31).

O Decreto Legislativo 89 apenas autorizou o Poder Executivo a aceitar a jurisdição da Corte. Logo, não inovou o ordenamento jurídico interno, sendo desnecessário um novo Decreto Executivo. Esse entendimento, endossado pelo [...] Consultor Jurídico do Itamaraty Antônio Cachapuz de Medeiros, imprimiu rapidez na adesão brasileira à jurisdição da Corte. (RAMOS, 2001, p. 61). A Corte tem jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado-parte violou direito protegido pela Convenção. Se reconhecer que efetivamente ocorreu a violação, determinará a adoção de medidas que se façam necessárias à restauração do direito então violado. A Corte pode ainda condenar o Estado a pagar uma justa compensação à vítima. (PIOVESAN, 2011, p. 327).

As decisões da Corte têm caráter vinculante e obrigatório, devendo ser

cumpridas de imediato pelo Estado violador de direitos. Desta forma,leciona Piovesan:

Note-se que a decisão da Corte tem força jurídica vinculante e obrigatória, cabendo ao Estado seu imediato cumprimento. Se a Corte fixar uma compensação à vítima, a decisão valerá como título executivo, em conformidade com os procedimentos internos relativos à execução de sentença desfavorável ao Estado. (PIOVESAN, 2011, p. 327-328).

Diante do exposto, pode-se afirmar que a Corte apresenta-se como um meio

de proteção que prima pela defesa dos direitos humanos, buscando soluções adequadas

e condizentes pautando-se na realidade do caso.

A Corte é composta de7 (sete) juízes, sendo escolhidos dentre juristas de

elevado prestígio moral, bem como aprimorado saber na seara dos direitos humanos. O

mandato dos juízes da Corte é de 6 (seis) anos, sendo possível apenas uma recondução

por igual período.

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Conforme estabelece o artigo 4 (2) do Estatuto da Corte Interamericana de

Direitos Humanos, não deve haver mais de um juiz da mesma nacionalidade. Destaque-

se, ainda, a título de informação, o que consta no capítulo IV, artigo 15 do Estatuto da

Corte, abaixo transcrito:

Artigo 15. Imunidades e privilégios Os juízes gozam, desde o momento de sua eleição e enquanto durarem os seus mandatos, das imunidades reconhecidas aos agentes diplomáticos pelo Direito Internacional. No exercício de suas funções gozam também dos privilégios diplomáticos necessários ao desempenho de seus cargos.

Pode-se afirmar que tais privilégios revelam-se de extrema importância à

atuação dos juízes da Corte, conferindo-lhes maior independência quando da análise de

um determinado caso.

No que concerne à competência e funções da Corte, pode-se dizer que a

mesma possui tanto competência contenciosa como competência consultiva. Esta

competência abrange todos os Estados-membros da OEA, enquanto que aquela abrange

apenasos Estados-partes da CADH que ratificaram a competência jurisdicional da

Corte.Destaquem-se os seguintes dispositivos da CADH, abaixo transcritos:

Art. 62 1. Todo Estado Parte pode, no momento do depósito do seu instrumento de ratificação desta Convenção ou de adesão a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatória, de pleno direito e sem convenção especial, a competência da Corte em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação desta Convenção.

Art. 64

1.Os Estados membros da Organização poderão consultar a Corte sobre a interpretação desta Convenção ou de outros tratados concernentes à proteção dos direitos humanos nos Estados americanos. Também poderão consultá-la, no que lhes compete, os órgãos enumerados no capítulo X da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires. 2.A Corte, a pedido de um Estado membro da Organização, poderá emitir pareceres sobre a compatibilidade entre qualquer de suas leis internas e os mencionados instrumentos internacionais.

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A Corte não é exclusivamente judicial, podendo ser consultada por qualquer

Estado-membro da OEAno que tange a interpretação da CADH ou de qualquer outro

documento internacional de proteção dos direitos humanos no âmbito da OEA. No que

concerne ao caráter jurisdicional da Corte, destaque-se o seguinte em relação ao

primeiro caso brasileiro que ingressou na Corte.

O Estado brasileiro foi réu em cinco processos julgados pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, até o momento. A primeira demanda foi o Caso Nogueira de Carvalho e Outros versus Brasil, submetido à Corte em janeiro de 2005, na qual o Brasil foi absolvido. A sentença foi proferida em 28 de novembro de 2006. Diferentemente do Caso Ximenes Lopes versus. Brasil, que gerou a primeira condenação do Estado brasileiro no sistema interamericano19.

Note-se que o Estado brasileiro já foi condenado por quatro vezes por ter

violado a CADH. A primeira sentença, referente ao caso Ximenes Lopes vs. Brasil20,

ocorreu no dia 4 de julho de 2006; a segunda, referente ao caso Escher e outros vs.

Brasil 21 , ocorreu no dia 6 de julho de 2009; a terceira, referente ao caso Sétimo

Garibaldi vs. Brasil 22 , ocorreu dia 23 de setembro de 2009 e a quarta e última

condenação até o momento, referente ao caso Gomes Lund e outros vs. Brasil23, ocorreu

no dia 24 de novembro de 2010.

O capítulo seguinte, terceiro e último deste trabalho, apresenta de forma

elucidativa o caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, que deu causa a mais recente

                                                            19 ALGAYER, KélinKássia; NOSCHANG, Patrícia Grazziotin. O Brasil e o Sistema Interamericano de Direitos Humanos: Considerações e Condenações. Revista Espaço Jurídico. Joaçaba. v. 13, n. 2, p. 211-226, jul./dez. 2012. 20 SILVA, Saulo Medeiros da Costa.A condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso “Ximenes Lopes” e a postura do Estado brasileiro no processo de garantia de direitos humanos. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/21056/a-condenacao-do-brasil-na-corte-interamericana-de-direitos-humanos-no-caso-ximenes-lopes-e-a-postura-do-estado-brasileiro-no-processo-de-garantia-de-direitos-humanos>. Acesso em: 16 de setembro de 2014. 21MASI, Carlo Velho. O caso Escher e outros vs. Brasil e o sigilo das comunicações telefônicas. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/24469/o-caso-escher-e-outros-vs-brasil-e-o-sigilo-das-comunicacoes-telefonicas>. Acesso em: 16 de setembro de 2014. 22 CASO GARIBALDI VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.sdh.gov.br/assuntos/atuacao-internacional/sentencas-da-corte-interamericana/sentenca-garibaldi>. Acesso em: 16 de setembro de 2014. 23 CASO GOMES LUND VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.  

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condenação do Estado brasileiro, desencadeando uma série de questionamentos no

ordenamento jurídico pátrio, sendo, por isso, considerado o caso mais paradigmático de

todos.

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3. CASO GOMES LUND E OUTROS VS. BRASIL

O presente capítulo tem como objeto de análise o caso Gomes Lund e outros

vs. Brasil (ou caso Araguaia), que deu ensejo à última condenação do Estado brasileiro

perante o SIDH. No caso ora analisado, foi provado que o Estado praticou inequívocas

violações de direitos humanos em seu território, ferindo frontalmente muitos dos

dispositivos constantes na CADH, os quais serão especificados no decorrer da

explanação.

3.1 Do contexto histórico: a Ditadura Militar no Brasil (1964-1985)

Antes de adentrar no mérito do caso, faz-se necessário uma breve

contextualização histórica do ocorrido com o fito de que se tenha uma compreensão

mais ampla sobre o assunto em tela.

O Brasil, entre os anos de 1964 e 1985, vivenciou uma terrível ditadura

militar comandada pelas Forças Armadas, período no qual diversos direitos foram

restringidos, tais como: o direito ao voto,à participação popular, à liberdade de

pensamento e de expressão. Sendo estes últimos reprimidos com violência brutal pelo

Estado contra aqueles cidadãos que discordavam do então sistema vigente.

Em abril de 1964, um golpe militar depôs o governo constitucional do Presidente João Goulart. A consolidação do regime militar baseou-se na Doutrina da Segurança Nacional e na promulgação de sucessivas normas de segurança nacional e normas de exceção, como os atos institucionais, ‘que funcionaram como pretenso marco legal para dar cobertura jurídica à escalada repressiva’. Esse período foi caracterizado ‘pela instalação de um aparelho de repressão que assumiu características de verdadeiro poder paralelo ao Estado’, e chegou ao seu ‘mais alto grau’ com a promulgação do Ato Institucional nº 5 em dezembro de 1968. Entre outras manifestações repressivas nesse período, encontra-se o fechamento do Congresso Nacional, a censura completa da imprensa, a suspensão dos direitos individuais e políticos, da liberdade de expressão, da liberdade de reunião e da garantia do habeas corpus. Também se estendeu o alcance da justiça militar, e uma Lei de Segurança Nacional introduziu, entre outras medidas, as penas perpétua e de morte24.

                                                            24 CASO GOMES LUND VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 31-32.  

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É nesse contexto de total desrespeito aos direitos humanos por parte do

Estadoque vem à tona a Guerrilha do Araguaia, movimento contrário ao regime militar,

que começou no fim dos anos 1960, tendo persistido até meados dos anos 1970.O

referido movimento ocorreu na região amazônica (sudeste do estado do Pará), próximo

ao rio Araguaia, daí o motivo do seu nome25.

Denominou-se Guerrilha do Araguaia ao movimento de resistência ao regime militar integrado por alguns membros do novo Partido Comunista do Brasil. Esse movimento propôs-se a lutar contra o regime, ‘mediante a construção de um exército popular de libertação’. No início de 1972, às vésperas da primeira expedição do Exército à região do Araguaia, a Guerrilha contava com cerca de 70 pessoas, em sua maioria jovens26.

Destaque-se que a aludida guerrilha apresentou-se como uma tentativa dos

dissidentes do Partido Comunista do Brasil (PC do B), na busca de fomentar uma luta

armada, proveniente do campo, com o intuito de enfrentar o governo ditatorial que

comandava o país à época. Em relação a sua composição, a guerrilha era formada, em

geral, por integrantes do PC do B, estudantes ex-universitários, bem como por

profissionais liberais e camponeses da região.

Entre 1969 e 1974, produziu-se ‘uma ofensiva fulminante sobre os grupos armados de oposição’. O mandato do Presidente Médici (1969-1974) representou ‘a fase de repressão mais extremada em todo o ciclo de 21 anos do regime militar’ no Brasil. Posteriormente, durante ‘os três primeiros anos do governo do Presidente Geisel [1974-1979], o desaparecimento de presos políticos, que antes era apenas uma parcela das mortes ocorridas, torna-se a regra predominante para que não ficasse estampada a contradição entre discurso de abertura e a repetição sistemática das velhas notas oficiais simulando atropelamentos, tentativas de fuga e falsos suicídios’. Como consequência, a partir de 1974, ‘oficialmente não houve mortes nas prisões, todos os presos políticos mortos ‘desapareceram’ e o regime passou a não mais assumir o assassinato de opositores27’.

Note-se que o Estado, que repreendia de forma truculenta qualquer

liberdade de pensamento contrária a seu regime, não iria deixar a guerrilha ganhar

                                                            25 MANIFESTAÇÃO DO GRUPO TORTURA NUNCA MAIS, 2011. Disponível em: <http://ibccrim.jusbrasil.com.br/noticias/2515453/caso-araguaia>. Acesso em: 23 de setembro de 2014. 26 CASO GOMES LUND VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 32-33. 27 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 32. 

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corpo, já que havia receio de que o movimento oposicionista pudesse ser um empecilho

ainda maior posteriormente.Sendo assim, o Estado resolveu acabar com a guerrilha,

conforme segue:

Entre abril de 1972 e janeiro de 1975, um contingente de entre três mil e dez mil integrantes do Exército, da Marinha, da Força Aérea e das Polícias Federal e Militar empreendeu repetidas campanhas de informação e repressão contra os membros da Guerrilha do Araguaia.Nas primeiras campanhas, os guerrilheiros detidos não foram privados da vida, nem desapareceram.Os integrantes do Exército receberam ordem de deter os prisioneiros e de ‘sepultar os mortos inimigos na selva, depois de sua identificação’; para isso, eram ‘fotografados e identificados por oficiais de informação e depois enterrados em lugares diferentes na selva’. No entanto, após uma ‘ampla e profunda operação de inteligência, planejada como preparativo da terceira e última investida de contra-insurgência’, houve uma mudança de estratégia das forças armadas. Em 1973, a ‘Presidência da República, encabeçada pelo general Médici, assumiu diretamente o controle sobre as operações repressivas e a ordem oficial passou a ser de eliminação’ dos capturados28.

No final de 1974, não havia mais guerrilheiros no Araguaia, e há informação de que seus corpos foram desenterrados e queimados ou atirados nos rios da região. Por outro lado, ‘o governo militar impôs silêncio absoluto sobre os acontecimentos do Araguaia e proibiu a imprensa de divulgar notícias sobre o tema, enquanto o Exército negava a existência do movimento29’.

É por essa conjuntura de total descaso do Estado, ao não respeitar os direitos

de seus nacionais, que os representantes das vítimas ingressam no SIDH na busca de um

amparo necessário que venha a dirimir o sofrimento causado pelas violações.

3.2 Da análise do caso perante a Comissão e a Corte Interamericana de

Direitos Humanos

O caso foi admitido pela Comissão e esta fez as devidas recomendações ao

Brasil. No entanto, o país não as atendeu de forma satisfatória, tendo sido o caso

submetido à Corte. Ainda no mesmo raciocínio, posicionou-se a Comissão da seguinte

maneira:

[...] a demanda se refere à alegada ‘responsabilidade do Estado pela detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado de 70 pessoas,

                                                            28______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 33. 29______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 33. 

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entre membros do Partido Comunista do Brasil […] e camponeses da região, […] resultado de operações do Exército brasileiro empreendidas entre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia, no contexto da ditadura militar do Brasil (1964–1985)’. A Comissão também submeteu o caso à Corte porque, ‘em virtude da Lei nº 6.683/79 […], o Estado não realizou uma investigação penal com a finalidade de julgar e punir as pessoas responsáveis pelo desaparecimento forçado de 70 vítimas 30[…]. A Comissão solicitou ao Tribunal que declare que o Estado é responsável pela violação dos direitos estabelecidos nos artigos 3 (direito ao reconhecimento da personalidade jurídica), 4 (direito à vida), 5 (direito à integridade pessoal), 7 (direito à liberdade pessoal), 8 (garantias judiciais), 13 (liberdade de pensamento e expressão) e 25 (proteção judicial), da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, em conexão com as obrigações previstas nos artigos 1.1 (obrigação geral de respeito e garantia dos direitos humanos) e 2 (dever de adotar disposições de direito interno) da mesma Convenção. Finalmente, solicitou à Corte que ordene ao Estado a adoção de determinadas medidas de reparação31.

Apesar do estudo apurado e fundamentado da Comissão, ao examinar as

supostas práticas de violações de direitos humanos citadas acima, o Estado retrucou tal

entendimento, posicionando-se, entre outras, perante a Corte da seguinte forma:

[...] o Brasil solicitou ao Tribunal que reconheça ‘todas as ações empreendidas no âmbito interno’ e ‘julgue improcedentes os pedidos da Comissão e dos representantes, uma vez que está sendo construída no país uma solução, compatível com suas particularidades, para a consolidação definitiva da reconciliação nacional32’.

O Estado, portanto, não tem dado a devida prioridade que o caso requer,

haja vista que, além de não ter atendido dentro prazo e nem executado de forma eficaz

as recomendações da Comissão, também se apresentou perante o Tribunal como um

país que não reconhece as violações praticadas em seu território, ao solicitar que a Corte

julgue improcedente os pedidos da Comissão.

O Estado alegou a incompetência da Corte Interamericana para examinar supostas violações que teriam ocorrido antes do reconhecimento da competência contenciosa do Tribunal. Esse reconhecimento foi realizado ‘sob reserva de reciprocidade e para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998’. Não obstante, o Brasil reconheceu a jurisprudência da Corte, no sentido de que pode

                                                            30______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 3-4. 31 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 4. 32 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 5. 

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conhecer das violações continuadas ou permanentes, mesmo quando iniciem antes do reconhecimento da competência contenciosa do Tribunal, desde que se estendam além desse reconhecimento, mas enfatizou que é inequívoca a falta de competência da Corte para conhecer das detenções arbitrárias, atos de tortura e execuções extrajudiciais ocorridas antes de 10 de dezembro de 199833.

Odesaparecimento forçado de pessoas ocasionado pelo Estado brasileiro, à

época, figura como ato de caráter contínuo ou permanente, desta maneira,

permanecendo o fato até quando não se conheça o local da pessoa desaparecida. Além

disso, há posicionamento no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos que

assegura tal prerrogativa à Corte de decidir em relação ao rumo do caso brasileiro em

estudo, conforme se verifica abaixo:

[...] em sua jurisprudência constante, este Tribunal estabeleceu que os atos de caráter contínuo ou permanente perduram durante todo o tempo em que o fato continua, mantendo-se sua falta de conformidade com a obrigação internacional. [...] a Corte recorda que o caráter contínuo ou permanente do desaparecimento forçado de pessoas foi reconhecido de maneira reiterada pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos,no qual o ato de desaparecimento e sua execução se iniciam com a privação da liberdade da pessoa e a subsequente falta de informação sobre seu destino, e permanecem até quando não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida e os fatos não tenham sido esclarecidos. A Corte, portanto, é competente para analisar os alegados desaparecimentos forçados das supostas vítimas a partir do reconhecimento de sua competência contenciosa efetuado pelo Brasil34. Desde sua primeira sentença [Caso Velásquez Rodríguez], esta Corte destacou a importância do dever estatal de investigar e punir as violações de direitos humanos. A obrigação de investigar e, se for o caso, julgar e punir, adquire particular importância ante a gravidade dos crimes cometidos e a natureza dos direitos ofendidos, especialmente em vista de que a proibição do desaparecimento forçado de pessoas e o correspondente dever de investigar e punir aos responsáveis há muito alcançaram o caráter de jus cogens35.

Considerando todo o exposto até o momento, pode-se concluir que a Corte,

ao apreciar o caso, decidiu pela condenação do Estado brasileiro, já que as alegações

das partes e as provas apresentadas mostraram-se relevantes, confirmando desta

maneira, a existência real dos fatos que deram ensejo ao desaparecimento forçado dos

                                                            33______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 8. 34 ______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 10. 35 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 51.

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integrantes da Guerrilha, não restando dúvidas em relação à responsabilidade

internacional do Brasil.

Reitere-se que, com base no que foi apurado através de testemunhos,

registros, arquivos do Estado (ainda que ínfimos), parecer pericial, dentre outros meios

de provas, não há controvérsia quanto ao desaparecimento forçado dos integrantes do

movimento ocorrido próximo ao rio Araguaia. O Tribunal, pautando-se no que foi

alegado, decide:

[...] a Corte Interamericana conclui que o Estado é responsável pelo desaparecimento forçado e, portanto, pela violação dos direitos ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal, estabelecidos, respectivamente, nos artigos 3, 4, 5 e 7, em relação ao artigo 1.1, da Convenção Americana36[...].

Além dos artigos mencionados acima, a Corte também determinou que

houve, como consequência do desaparecimento das pessoas, oimpedimento destas às

suas garantias judiciais, consubstanciando-se a violação do artigo 8º da CADH. O

Tribunal, ao reconhecer que os familiares das vítimas não obtiveram êxito quando da

busca de informações perante o Estado, no que concerne ao referido caso, concluiu

também que o Estado violou o artigo 13 da CADH.Houve, por conseguinte, violação do

direito à proteção judicial (artigo 25 do Pacto de São José), tendo em vista a falta de

investigação, julgamento e puniçãodos responsáveis pelas violações cometidas em

nosso território. (CEIA, 2012).

No mesmo raciocínio, entendeu-se que o Estado desrespeitou o artigo 2º do

Pacto por não adequar seu direito interno à CADH, já que aplicou a Lei de Anistia, que

soou de forma a impedir a investigação penal dos fatos.

Sendo assim, após a conclusão da Corte no que atine aos artigos violados,

tal Tribunal pode detectar e impor medidas de reparação a serem cumpridas e

executadas pelo Estado brasileiro, a fim de que este possa compensar os equívocos do

passado.

                                                            36 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 46. 

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Consubstanciam-se as medidas de reparação, inter alia, em obrigações de

investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis, e de determinar o

paradeiro das vítimas; Medidas de reabilitação, de modo que o Estado venha a adotar

um sistema de saúde de qualidade para auxiliar os familiares das vítimas; Medidas de

satisfação, quais sejam: pedido oficial de desculpas por parte do Estado, divulgação da

sentença deste caso em jornal de grande circulação; Garantias de não repetição, por

exemplo: educação em direitos humanos no seio das Forças Armadas, tipificação do

delito de desaparecimento forçado; Indenizações (materiais e imateriais), custas e

gastos.

Em sintonia com o que foi decidido pela Corte, o Estado brasileiro

referendou e cumpriu, em parte, algumas medidas de reparação, por exemplo,

realizando expedições à região do Araguaia, no intuito de encontrar os desaparecidos;

Indenizando as vítimas em pecúnia; Assegurando atos simbólicos e educativos;

Reformulando a Comissão da Verdade, com o objetivo deresgatara memória eexpor a

verdade dos fatos. Nesse sentido, mencione-se:

O Estado ressaltou que reconheceu oficialmente sua responsabilidade pelas mortes e desaparecimentos forçados ocorridos durante o período do regime militar, inter alia, por meio da Lei nº 9.140/95 e do relatório ‘Direito à Memória e à Verdade’ da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o qual foi apresentado em um ato público com a presença do Presidente da República, de diversas autoridades e de familiares das vítimas do regime militar. Também o Ministro da Justiça, em nome do Estado, realizou um pedido oficial de desculpas mediante um ato público realizado em 18 de junho de 2009, em que foram concedidos os benefícios de uma anistia política a 44 camponeses da região, os quais foram perseguidos para prestar informações sobre a Guerrilha do Araguaia37. O Estado destacou que, ademais das indenizações pecuniárias pagas no marco da Lei nº 9.140/95, foram realizados diversos atos de natureza simbólica e educativa que promoveram o resgate da memória e da verdade dos fatos ocorridos durante o período do regime militar38.

Contudo, dada como prolatada a sentença, resta ao Estado cumprir

integralmente e não parcialmente o que foi decidido pela Corte, tendo em vista que o

                                                            37 ______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 101. 38______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 110. 

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Brasil, por decisão soberana, já entendeu ao reconhecer a jurisdição do Tribunal, que a

última palavra em matéria de direitos humanos emana do aludido órgão.

No entanto, o aparente rigor lógico não vem sendo compreendidopelo

ordenamento jurídico pátrio, encontrando o Estado brasileiro dificuldade em aceitar o

que outrora foi acordado.Destaque-se, por conseguinte, que a referida dificuldade de

implementação da sentença é ocasionada, em parte, por causa da Lei nº 6.683/79 (ou

Lei de Anistia).

3.3 Da Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79)

A Lei em questão, que surgiu no contexto final da ditadura militar, foi

promulgada em nome da conciliação nacional e assegurou a absolvição de todos os

envolvidos no que tange aos crimespolíticos ou conexo com estes, cometidos no país

entre 1961 e 1979 (vide artigo 1º da Lei).

A aprovação do citado documento legal permitiu o retorno ao país de

exilados políticos e também conferiu o perdão àqueles militares que provocaram graves

violações de direitos humanos, tais como torturas, mortes e desaparecimentos forçados,

ocasionando assim, a impunidade dos repressores.

Ainda em relação ao documento supra, atente-se respectivamente ao

posicionamentodos (a.) representantes das vítimas, que coincidiu com o entendimento

da Comissão; (b.) da Corte, que corroborou a favor dos peticionários e, por fim, ao

destaqueconferido pelo (c.)Estado em relação à citada lei.

a. [...] salientaram a irrelevância do contexto de criação da Lei de Anistia para o Direito Internacional, pois consideraram que, na medida em ela impeça a persecução dos responsáveis por graves violações de direitos humanos, será contrária às obrigações internacionais do Estado. A Lei de Anistia não foi o resultado de um processo de negociação equilibrada, já que seu conteúdo não contemplou as posições e necessidades reivindicadas por seus destinatários e respectivos familiares. Desse modo, atribuir o consentimento à anistia para os agentes repressores ao lema da campanha e aos familiares dos desaparecidos é deformar a história39.

                                                            39 ______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 48.

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b. [...] o Brasil deve adotar todas as medidas que sejam necessárias para assegurar que a Lei de Anistia e as leis de sigilo não continuem a representar um obstáculo para a persecução penal contra graves violações de direitos humanos. Além disso, solicitou que se publiquem os resultados dessa investigação, para que a sociedade brasileira possa conhecer esse período de sua história40. c. O Estado não se pronunciou particularmente a respeito da investigação dos fatos e limitou-se a destacar que a análise da Lei de Anistia não pode separar-se do tempo em que a referida lei foi elaborada, nem do fundamento em que se encontra assentada.Por outro lado, lembrou que a decisão do Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 153 considerou legítima integralmente a Lei de Anistia, em vista do novo ordenamento constitucional41.

O Estado brasileiro, que aderiu soberanamente ao SIDH, tem demonstrado

reiteradas inconsonâncias frente ao que preceitua o Sistema Interamericano, pois o

Brasil não tem se manifestado como deveria no sentido de investigar e punir penalmente

os responsáveis pelas violações de direitos humanos, acreditando estar respaldado pela

Lei de Anistia, que foi recepcionada pela Constituição da República Federativa do

Brasil de 1988 – CRFB/88.

[...] este Tribunal pronunciou-se sobre a incompatibilidade das anistias com a Convenção Americana em casos de graves violações dos direitos humanos relativos ao Peru (Barrios Altos e La Cantuta) e Chile (AlmonacidArellanoe outros)42. No Sistema Interamericano de Direitos Humanos, do qual Brasil faz parte por decisão soberana, são reiterados os pronunciamentos sobre a incompatibilidade das leis de anistia com as obrigações convencionais dos Estados, quando se trata de graves violações dos direitos humanos43. Dada sua manifesta incompatibilidade com a Convenção Americana, as disposições da Lei de Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos carecem de efeitos jurídicos. Em consequência, não podem continuar a representar um obstáculo para a investigação dos fatos do presente caso, nem para a identificação e punição dos responsáveis, nem

                                                            40 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 95. 41 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 95. 42______. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 54. 43 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 54. 

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podem ter igual ou similar impacto sobre outros casos de graves violações de direitos humanos consagrados na Convenção Americana ocorridos no Brasil44.

A Lei nº 6.683/79, embora recepcionada pela Constituição Federal,

conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal - STF, figura como

inconvencional, haja vista que viola a CADH, e inválida, por afrontar o jus cogens

(normas imperativas do direito internacional)45.

O posicionamento do Estado em relação à Lei de Anistia foi legitimado

recentemente quando da declaração de improcedência pelo STF da Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF nº 153.

Em 29 de abril de 2010, o Supremo Tribunal Federal, por sete votos a dois, declarou a improcedência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, interposta pela Ordem dos Advogados do Brasil, e afirmou a vigência da Lei de Anistia e a constitucionalidade da interpretação do parágrafo 1º do seu artigo 1º (pars. 44 e 58 supra). Essa decisão tem eficácia erga omnes e efeito vinculante e contra ela não cabe nenhum recurso.Entre outros fundamentos, o voto do Ministro Relator destacou que a Lei de Anistia foi ‘uma lei-medida’,não uma regra para o futuro e, como tal, deve ‘interpretar-se em conjunto com o seu texto, a realidade do momento histórico no qual foi criada e não a realidade atual’. Nesse sentido, a Lei implementou ‘uma decisão política do momento da transição conciliada de 1979’, uma vez que ‘foram todos absolvidos, uns absolvendo-se a si mesmos’. A lei, efetivamente, incluiu na anistia os ‘agentes políticos que praticaram crimes comuns contra opositores políticos, presos ou não, durante o regime militar46’.

Observe-se, portanto, que o Brasil, ao adotar o entendimento supracitado,

tem-se colocado, lamentavelmente, cada vez mais distante do que preconiza a doutrina

mais abalizada do direito internacional. Tanto o sistema global, como os três principais

sistemas regionaisde proteção e promoção do DIDH têm demonstrado notória aversão

às diversas figuras de anistias presentes no mundo, pois tais sistemas comungam da

                                                            44 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 65. 45GOMES, Luiz Flávio. A Lei de Anistia viola convenções de direitos humanos.Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2011-mar-10/coluna-lfg-lei-anistia-viola-convencoes-direitos-humanos>. Acesso em: 23 de setembro de 2014.

46 CASO GOMES LUND VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 50-51.

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ideia de que essas medidas representam um retrocesso na seara dos direitos humanos e

não o tão desejado progresso almejado pela comunidade internacional.

As anistias ou figuras análogas foram um dos obstáculos alegados por alguns Estados para investigar e, quando fosse o caso, punir os responsáveis por violações graves aos direitos humanos. Este Tribunal, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, os órgãos das Nações Unidas e outros organismos universais e regionais de proteção dos direitos humanos pronunciaram-se sobre a incompatibilidade das leis de anistia, relativas a graves violações de direitos humanos com o Direito Internacional e as obrigações internacionais dos Estados47. Nesse mesmo sentido, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos concluiu que as anistias e outras medidas análogas contribuem para a impunidade e constituem um obstáculo para o direito à verdade, ao opor-se a uma investigação aprofundada dos fatos,e são, portanto, incompatíveis com as obrigações que cabem aos Estados, em virtude de diversas fontes de Direito Internacional48.

O Estado brasileiro tem, de fato, adotado uma postura contrária ao que

preceitua o direito internacional no que concerne a anistias, pois a Constituição Federal

recepcionou a Lei nº 6.683/79, que nega a possibilidade de responsabilização pelas

violações cometidas aos direitos humanos com base nos institutos da prescrição e da

anistia 49 , dificultando a responsabilização, no âmbito penal, dos agentes que

cometeramgraves violações de direitos humanos (ou crimes de lesa-humanidade)50.

Contudo, é necessária a adequação das normas brasileiras aos parâmetros

internacionaismais conceituados, em especial a CADH, no que atine a matéria ora

analisada para que se tenha no país a verdadeira supremacia dos direitos humanos.

No presente caso, o Tribunal observa que não foi exercido o controle de convencionalidade pelas autoridades jurisdicionais do Estado e que, pelo contrário, a decisão do Supremo Tribunal Federal confirmou

                                                            47 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 54. 48 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 56. 

49CEIA. Eleonora Mesquita. A Jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e Desenvolvimento da Proteção dos Direitos Humanos no Brasil. Revista EMERJ Rio de Janeiro v. 16 n.61 p. 1-256 jan.-fev.-mar, 2013.p. 134.

50GOMES, Luiz Flávio. Crimes contra a Humanidade: Conceito e Imprescritibilidade (Parte II). Disponível em: <http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/1633577/crimes-contra-a-humanidade-conceito-e-imprescritibilidade-parte-ii>. Acesso em: 23 de setembro de 2014.

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a validade da interpretação da Lei de Anistia, sem considerar as obrigações internacionais do Brasil derivadas do Direito Internacional, particularmente aquelas estabelecidas nos artigos 8 e 25 da Convenção Americana, em relação com os artigos 1.1 e 2 do mesmo instrumento. O Tribunal estima oportuno recordar que a obrigação de cumprir as obrigações internacionais voluntariamente contraídas corresponde a um princípio básico do direito sobre a responsabilidade internacional dos Estados, respaldado pela jurisprudência internacional e nacional, segundo o qual aqueles devem acatar suas obrigações convencionais internacionais de boa-fé (pacta sunt servanda). Como já salientou esta Corte e conforme dispõe o artigo 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969, os Estados não podem, por razões de ordem interna, descumprir obrigações internacionais. As obrigações convencionais dos Estados Parte vinculam todos seus poderes e órgãos, os quais devem garantir o cumprimento das disposições convencionais e seus efeitos próprios (effetutile) no plano de seu direito interno51. Portanto, em prol da garantia da supremacia dos Direitos Humanos, especialmente quando degradados por crimes de lesa-humanidade, faz-se mister reconhecer a importância dessa sentença internacional e incorporá-la de imediato ao ordenamento nacional, de modo a que se possa investigar, processar e punir aqueles crimes até então protegidos por uma interpretação da Lei de Anistia que, afinal, é geradora de impunidade, descrença na proteção do Estado e de uma ferida social eternamente aberta, que precisa ser curada com a aplicação serena mas incisiva do Direito e da Justiça52.

3.4 Da eficácia da decisão prolatada pela Corte Interamericana de Direitos

Humanos contra o Estado brasileiro no caso Araguaia

A implementação da decisão da Corte tem encontrado obstáculo não só por

causa dos institutos da prescrição e da anistia, mas também por conta de fatores de

naturezas distintas, tais como: falta de infraestrutura do poder Judiciário brasileiro, que

dispõe de poucos servidores levando-se em consideração o número de demandas e,

somado a isso, falta de integração dos entes federativos, bem como a falta de interesse

dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário)que, geralmente,não se importam em

querer operacionalizar de forma coordenada as ações em prol dos direitos humanos.

(CEIA, 2013).

É certo que a decisão da Corte frente ao Caso Gomes Lund não foi

implementada de forma ideal pelo Estado brasileiro, no entanto, há que se deixar claro

                                                            51 CASO GOMES LUND VERSUS BRASIL. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014. p. 65-66. 52 ______.Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_219_por.pdf>. Acesso em: 20 de setembro de 2014.p. 120. 

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que o Brasil desde a transição democrática tem desenvolvido uma crescente inserção no

regime internacional dos direitos humanos, ratificando tratados (mencionados no

capítulo II deste trabalho), tanto em âmbito global como em âmbito regional, que

absorvem o conteúdo da dignidade da pessoa humana, desta maneira, criando uma

cultura de direitos humanos cada vez mais presenteno país, o que evidencia uma política

externa em consonância com o princípio da prevalência dos direitos humanos.

(BERNARDES, 2011).

Por um lado, há no país um consenso formal em torno da ideia de direitos humanos, tornado evidente pela promulgação de nossa constituição cidadã e pelos diferentes tratados internacionais de que fazemos parte, por outro lado, rotineiras práticas de agentes estatais e de particulares, tanto interna quanto internacionalmente, contradizem esse consenso. (BERNARDES, 2011, p. 136).

Note-se que o Brasil, Estado Democrático de Direito, detém uma

constituição considerada por muitos como uma das mais belas e modernas do mundo. A

CRFB/88, chamada de Constituição Cidadã, que representa o maior símbolo de

redemocratização e estabilidade política, contempla os direitos fundamentais em todas

as suas dimensões, sendo também regida por princípios (vide artigo 4º, CRFB)

louváveis que consagram a verdadeira sintonia da Lei Maior com os principais anseios

mundiais53.

No entanto, o processo de redemocratização vem se dando paulatinamente,

haja vista que recentemente o Estado vivenciou21 anos de uma terrível ditadura. Talvez,

por isso, não raro seja possível encontrar ainda hoje resquícios ditatoriaisna conduta de

agentes estatais e de particulares.

Faz-se necessário destacar que, apesar dos descasosno cenário hodierno e

das grandes violações cometidas pelo Estado no passado, não se pode deixar de

evidenciar as conquistas e os compromissos internacionais alcançados pelo país na seara

do DIDH, especialmente no que se refere ao respeito e cumprimento das decisões

prolatadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, exigência da sociedade

brasileira,no caso Gomes Lund e outros versus Brasil.                                                             53 O STF E OS 25 ANOS DA CONSTITUIÇÃO, 2013. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=250119>. Acesso em: 23 de setembro de 2014.

 

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CONCLUSÕES

Evidenciou-se ao longo da explanação a evolução dos direitos humanos,

sendo destacados os principais acontecimentos históricos responsáveis por isso, desta

forma, permitindo a compreensão da atual conjuntura desses direitos.

Tendo em vista as atrocidades perpetradas durante a Segunda Guerra

Mundial, constatou-se a necessidade da criação de um organismo internacional para

salvaguardar o ser humano.

Nesse contexto, eis que surge através da Carta de São Francisco a

Organização das Nações Unidas (ONU), organização esta formada consensualmente por

193 Estados e que veio a consolidar o movimento de internacionalização dos direitos

humanos.

Após, em 1948, sob o comando da ONU, vem à tona a Declaração

Universal dos Direitos Humanos (DUDH), documento este que tem como base a

dignidade da pessoa humana e que veio com o propósito de assegurar o respeito à

essência do ser humano, tratando-o assim, como sujeito de Direito Internacional, no

qual, através dessa prerrogativa, resultam-se direitos universalmente albergados.

Consolida-se, desta maneira, a afirmação de uma ética universal, já que a

DUDH retrata os valores da comunidade internacional, tendo sido editada através de um

acordo entre Estados.

A DUDH, embora seja a representação de uma consciência histórica em

relação aos valores da humanidade, ela não conseguiu gravar seus preceitos de uma vez

para sempre, persistindo ainda no cenário hodierno, atrocidades de toda ordem.

Nesse sentido, vão se estruturando os sistemas de proteção e promoção do

direito internacional dos direitos humanos. Existindo, atualmente, um sistema global

(sob a batuta da ONU) e três sistemas regionais (europeu, interamericano e africano), os

quais prevêem diplomas jurídicos próprios que albergam o ser humano.

O Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH), objeto de análise

deste trabalho, evidencia-se à luz dos preceitos da Organização dos Estados Americanos

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(OEA), buscando proteger o ser humano neste continente. Tal sistema regional

estabelece inúmeros instrumentos normativos que visam à tutela do ser humano, sendo

o mais importante deles a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH).

Foi a partir da CADH que o SIDH passou a ficar mais notório, haja vista

que tal Convenção estabeleceu dois órgãos: a Comissão Interamericana de Direitos

Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que funcionam como meios

de proteção do indivíduo.

Considerando que o Brasil é signatário do Pacto de San José da Costa Rica,

vê-se que existe, portanto, quando da violaçãodos dispositivos da Convenção pelo

Estado brasileiro, a possibilidade de uma investigação pela Comissão de um caso fático

envolvendo supostas violações de direitos humanos ocorrido no país, isto é, caso o

Estado não tenha buscado solucionar o litígio no âmbito interno.

Nesse sentido, em razão do desaparecimento de integrantes da guerrilha do

Araguaia no contexto da ditadura militar, evidenciou-se de forma incontestável que o

Estado brasileiro cometeu graves violações de direitos humanos em seu território,

sendo, por isso, condenado em 2010 no caso Gomes Lund pela Corte IDH, já que houve

afronta direta aos tratados norteadores do SIDH, no qual se inclui a CADH.

Apesar da sentença prolatada pela Corte IDH contra o Estado brasileiro em

relação ao caso em tela, constatou-se que o país não efetivou de forma contundente a

decisão daquele Tribunal.

Percebeu-se assim, entre outros motivos, que o Estado acreditou estar

respaldado pela Lei de Anistia (Lei nº 6.683/79), que inclusive foi recepcionada pela

atual ordem constitucional. Ressalte-se que, embora esteja em conformidade com o

ordenamento pátrio, tal Lei é incompatível com a CADH, bem como com os diversos

tratados internacionais que versam sobre o DIDH.

Certificou-se, portanto, do estudo deste trabalho, que apesar do Estado

brasileiro não estar em conformidade com o que prevê o direito internacional no tocante

a anistias, o Brasil tem buscado inserir-se no regime internacional de proteção dos

direitos humanos. Tanto é assim que o Estado desde a transição democrática tem

ratificado inúmeros tratados norteados pelo princípio da dignidade da pessoa humana,

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além de assegurar constitucionalmente o princípio da prevalência dos direitos humanos

(artigo 4º, II, CRFB/88).

Pode-se concluir, nesse sentido, que apesar dos inúmeros instrumentos

normativos de proteção e promoção dos direitos humanos previstos no mundo e dos

grandes esforços das sociedades na busca da efetivação dos direitos humanos, ainda é

evidente o desrespeito a esses direitos, sendo assim, não se deve olvidar o que ocorreu

no Estado brasileiro durante a ditadura, haja vista que a ocultação da verdade

proporcionada pela Lei de Anistia configura, per se, uma grande violação.

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