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0 BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 656 (Ano VIII) (19/7/2016) ISSN - - BRASÍLIA 2016 Boletim Conteúdo Jurídico - ISSN – 1984-0454

BOLETIM CONTEÚDO Boletim JURÍDICO N. 656 · prova, investigar, buscar a tal "verdade real", que largue a Magistratura e siga a carreira do Ministério Público. Aliás, eles nem

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BOLETIM CONTEÚDO JURÍDICO N. 656

(Ano VIII)

(19/7/2016)

 

ISSN- -  

 

 

 

 

 

 

 

 

BRASÍLIA ‐ 2016 

Boletim

Conteú

doJu

rídico-ISSN

–1984-0454

 

 

 

 

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Boletim Conteúdo Jurídico n. 656 de 19/07/2016 (ano VIII) ISSN

 ‐ 1984‐0454 

ConselhoEditorial 

COORDENADOR GERAL (DF/GO/ESP) - VALDINEI CORDEIRO COIMBRA: Fundador do Conteúdo Jurídico. Mestre em Direito Penal Internacional Universidade Granda/Espanha.

Coordenador do Direito Internacional (AM/Montreal/Canadá): SERGIMAR MARTINS DE ARAÚJO - Advogado com mais de 10 anos de experiência. Especialista em Direito Processual Civil Internacional. Professor universitário

Coordenador de Dir. Administrativo: FRANCISCO DE SALLES ALMEIDA MAFRA FILHO (MT): Doutor em Direito Administrativo pela UFMG.

Coordenador de Direito Tributário e Financeiro - KIYOSHI HARADA (SP): Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP.

Coordenador de Direito Penal - RODRIGO LARIZZATTI (DF/Argentina): Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino - UMSA.

País: Brasil. Cidade: Brasília – DF. Contato: [email protected] WWW.CONTEUDOJURIDICO.COM.BR

   

BoletimConteudoJurıdico

Publicação

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SUMÁRIO

COLUNISTA DO DIA

 

19/07/2016 Rômulo de Andrade Moreira 

» O que temos que aprender com o Chile

ARTIGOS  

19/07/2016 Amanda Expósito Tenório de Araújo » A subordinação estrutural como elemento da relação de emprego 

19/07/2016 Daniel Leão Carvalho 

» Parto anônimo e sua consonância com o moderno Direito de Família 

19/07/2016 Larissa Padilha Roriz Penna 

» Parceria público‐privada na moderna gestão pública brasileira: arenas da Copa do 

Mundo de 2014 

19/07/2016 Clóvis dos Santos Andrade 

» Defensor legis a qualquer preço? 

19/07/2016 Ailk de Souza Pinheiro 

» Noções gerais sobre os princípios que regem o Direito Ambiental 

19/07/2016 Ueveny Valina de Araújo 

» As garantias constitucionais frente o acesso à Justiça 

MONOGRAFIA 

19/07/2016 Priscila Maia Barreto » Mandado de injunção: evolução na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal 

 

 

 

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O QUE TEMOS QUE APRENDER COM O CHILE 

RÔMULO  DE  ANDRADE  MOREIRA:  Procurador  de  Justiça  do 

Ministério  Público  do  Estado  da  Bahia.  Professor  de  Direito 

Processual  Penal  da  UNIFACS.  Pós‐graduado,  lato  sensu,  pela 

Universidade  de  Salamanca/Espanha  (Direito  Processual  Penal). 

Especialista em Processo pela UNIFACS. 

Estivemos semana passada, eu e outros Professores de Direito

Processual Penal do Brasil, em Santiago do Chile. Foi uma grande

experiência proporcionada pelos Centro de Estudios de Justicia de la

Américas - CEJA, Instituto Baiano de Direito Processual Penal - IBADPP,

Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM e Instituto Brasileiro de

Direito Processual Penal - IBRASPP. Participamos do "Programa de

Herramientas para la Implementación de un Sistema Acusatorio en Brasil."

Foi uma grande oportunidade para todos nós aprendermos com os Chilenos.

Tivemos, inicialmente, acesso a um panorama geral da reforma na

Justiça Penal na América Latina, especialmente desde a experiência da

reforma processual penal no Chile. Neste primeiro momento, privilegiou-se

estudar o Sistema Acusatório na América Latina, a partir de suas raízes

histórico-políticas até os principais desafios a serem enfrentados na

atualidade.

Conhecemos também a função do Ministério Público e da Defensoria

em um Sistema Acusatório, identificando, para além do Processo Penal,

métodos de trabalho, controle de gestão, relação com a Polícia, sistema de

contratação dos profissionais, etc. Também sob este enfoque, vimos a

organização dos Tribunais Chilenos e a gestão judicial, tais como a

abrangência do papel do Administrador do Tribunal ou Diretor do Escritório

Judicial (que não são Magistrados) e as principais características do modelo

de gestão dos novos Tribunais na América Latina.

 

 

 

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Foi demonstrado, de maneira teórica e prática, como se estrutura um

Processo Penal mediante audiências, inteiramente oral e se caracterizando

por três etapas: a audiência de formulação de imputação (que seria a nossa

audiência de custódia); a de controle de acusação (equivalente a um juízo

de admissibilidade da acusação) e a do julgamento do mérito (denominada

"Juicio Oral").

Também foram abordados os principais problemas na prisão

preventiva na América Latina, propondo-se uma agenda de trabalho, a fim

de, por exemplo, identificar as vantagens de possuir uma vara de

acompanhamento de medidas cautelares, também conhecidos como

"escritórios de serviços prévios ao juízo."

Por fim, ficou demonstrada a importância da capacitação dos

profissionais em uma reforma processual penal, especialmente no uso de

metodologias inovadoras destinadas a servir como ferramentas para

conseguir a mudança cultural que é preciso para uma reforma substancial

do Processo Penal em um País. Sem esta visão, torna-se impossível que

nós, atores processuais, assumamos as novas funções exigidas pela

reforma.

No início do curso, nos primeiros relatos, alguns ressabiados (como

eu), até que ousamos discordar de um ponto ou de outro. Mas, não tardou

para que compreendêssemos quão atrasados estávamos.

Os Chilenos foram muito corajosos: passaram de uma estrutura

inquisitorial, como a nossa, e hoje têm um sistema acusatório invejável (nada

obstante algumas falhas detectadas). Houve muita resistência, porém, com

inteligência e estratégia, souberam transpor este obstáculo. Por exemplo: os

Juízes que queriam continuar “velhos” seguiram trabalhando sob a égide do

Sistema Inquisitivo, enquanto os demais submeteram-se a uma reciclagem

para que pudessem aprender as novas regras pertinentes aos princípios do

Sistema Acusatório. Os novos Juízes, obviamente, já iniciavam as suas

funções cientes e imbuídos das reformas. Os “velhos”, claro, sucumbiram,

como tem que ser ("velhos", aqui, no sentido de atrasados intelectual e

culturalmente, pois não tão "velho" como um jovem que não quer aprender

o novo e enfrentar desafios; e não tão jovem como um alguém, ainda que

 

 

 

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velho na idade, porém que aceita desafios e não se amedronta com o

amanhã).

Ora, qual a conclusão, pelo menos minha, ao final e ao cabo do curso

em Santiago: no Brasil, antes mesmo da reforma (e, fundamentalmente,

depois dela) os Magistrados "velhos" têm que se reciclar. Não dá para

continuar pensando como se estivessem na Idade Média, como salvadores

da Pátria.

No Chile, o Juiz é Juiz e ponto. Isso foi dito para nós muito claramente

algumas vezes. Se algum Magistrado tem o pendor para acusar, produzir

prova, investigar, buscar a tal "verdade real", que largue a Magistratura e

siga a carreira do Ministério Público.

Aliás, eles nem entendem como isso é possível em um Estado

Democrático de Direito e em um Sistema Acusatório. Não conseguem,

sequer, compreender algumas perguntas que eram feitas, simplesmente

porque soavam impertinentes ou incompreensíveis.

O Juiz brasileiro precisa passar umas férias no Chile. Mas, aproveitar

umas duas semanas e estudar (na teoria e na prática) como funciona a

Justiça Criminal e como se lida quando alguém comete um crime e o Estado

tem que o punir, desde o início da persecução penal. Tudo muito natural,

"dentro da lei", sem ódio, com imparcialidade, sabendo o papel do Ministério

Público e respeitando a defesa.

Sim, no Chile o Ministério Público tem uma responsabilidade: a

investigação criminal e o ônus da prova no "Juicio Oral" (basicamente,

óbvio!). Só ele. O Juiz nem quer saber disso. Dane-se a acusação (não o

réu). Acusação e defesa ocupam o mesmo espaço (inclusive nas salas das

três audiências). Não há essa coisa de Promotor e Procurador ficarem ao

lado do Magistrado. Como? Eles são partes? Ah, lá também não se usa toga

e todos, nada obstante, respeitam-se. O pronome de tratamento é muito

cortês. Não é esnobe, como aqui.

A oralidade é algo especialmente privilegiado. Os debates dão-se

imediatamente, entre o Ministério Público e a Defesa, sem deslealdades e

frente aos Juízes. Tudo é decidido na mesma audiência. Não há pedido de

 

 

 

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vistas. Todos estão preparados para resolverem quaisquer questões

jurídicas surgidas durante a audiência. O contraditório estabelece-se na

audiência de maneira muito transparente. O Ministério Público respeita a

Defesa, compartilhando a prova, inclusive. Não há ocultação de provas,

tampouco espaço para vaidades. Tudo é muito sereno e respeitoso. Cada

um cumpre o seu dever.

O acusado é muitíssimo respeitado, aliás. Sabem qual é a última

pergunta que o Juiz faz antes dos debates? Se o réu tem algo a dizer? Sim,

claro, afinal de contas, o acusado tem que ser o último a falar, ou não? Seja

o que for.

Como também foi dito no Chile, muitas vezes, não adianta mudar a

lei se não mudamos a cultura. A nossa cultura é inquisitiva, porque a nossa

colonização é portuguesa, europeia. Os nossos Juízes são inquisidores e o

nosso Ministério Público tem uma visão inteiramente distorcida do

garantismo penal. Assim, será que uma mera reforma processual penal no

Brasil vai mudar algo? Bem, eu que não creio peço a Deus que mude.

Para concluir, um recado de um Chileno:

"Cuántas cosas quisiera decir, hoy, brasileños, cuántas historias,

luchas, desengaños, victorias que he llevado por años en el corazón para

decirlos, pensamientos y saludos. Saludos de las nieves andinas, saludos

del Océano Pacífico, palabras que me han dicho al pasar los obreros, los

mineros, los albañiles, todos los pobladores de mi patria lejana. (...)Voy a

decirles que no guardas odio. Que sólo quieres que tu patria viva. Y que la

libertad crezca en el fondo del Brasil como un álbol eterno. Yo quisiera

contarte, Brasil, muchas cosas calladas, llevadas estos años entre la piel y

el alma, sangre, dolores, triunfos, lo que deben decirse los poetas y el

pueblo: será otra vez, un día." (Pablo Neruda, Canto General, Chile: Pehuén

Editores, 2014, p. 174).

 

 

 

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A SUBORDINAÇÃO ESTRUTURAL COMO ELEMENTO DA RELAÇÃO DE EMPREGO

AMANDA EXPÓSITO TENÓRIO DE ARAÚJO: Auditora Fiscal do Trabalho. Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-graduada em Direito Civil e Empresarial pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós-graduada em Novas Questões de Direito Penal e Processo Penal pela Faculdade Damas.

Resumo: Os elementos da relação de emprego, diante das mudanças sociais ocorridas, sofreram uma releitura necessária, de modo a não deixar desprotegido o empregado, parte hipossuficiente da relação. O objetivo deste artigo visa essencialmente tratar da nova interpretação do elemento da subordinação, demonstrando a possibilidade de expansão deste conceito, sem que reste desnaturada a ideia originária trazida pela própria Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com base na análise do empregado dentro da estrutura produtiva do empregador.

Palavras-chaves: Relação de Emprego. Elemento. Subordinação Jurídica. Subordinação Estrutural.

1. Introdução

O ordenamento brasileiro apresenta clara diferenciação entre a relação de trabalho e a relação de emprego, considerando aquela um gênero do qual esta é espécie. A relação de trabalho englobaria não apenas a relação de emprego, mas também aquelas relações que abarcassem serviços prestados por profissionais autônomos, prestados através de cooperativas, entre outros.

A consequência da relação de emprego é a existência de um contrato de emprego, conforme previsão do caput do art. 442[1] da

 

 

 

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Consolidação das Leis do Trabalho - adiante denominada simplesmente de CLT. Isso não significa dizer que, acaso não haja formalização ou reconhecimento do contrato de trabalho pelo empregador, haverá qualquer obstáculo ao reconhecimento da relação de emprego, pois, no direito do trabalho, prevalece preceito favorável ao trabalhador que considera a realidade em detrimento da formalidade (princípio da primazia da realidade), além de previsão da nulidade de atos tendentes a fraudar os direitos trabalhistas, conforme previsão do art. 9[2] da CLT. Feito esta breve introdução, imprescindível compreender os contornos legais e doutrinários da relação de emprego, conforme adiante exposto.

2. Da Identificação Dos Elementos Caracterizadores Da Relação De Emprego

Os elementos necessários ao reconhecimento da relação de emprego são esquematizados pela doutrina de forma distinta, mas é possível apontar um núcleo comum reconhecido por todos e também trazido nos conceitos legais existentes na Consolidação das Leis do Trabalho.

Assim, preceituam os art. 2 e 3 da Consolidação das Leis do Trabalho:

Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob adependência deste e mediantesalário.

Como se verifica do texto legal, é possível apontar, no mínimo, os seguintes requisitos: subordinação, pessoalidade, onerosidade e

 

 

 

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não eventualidade. A subordinação será adiante detalhada em tópico próprio.

A pessoalidade explicita a exigência por parte do empregador de que o trabalho seja realizado por empregado certo e definido, transparecendo a natureza intuitu personae do contrato de trabalho. Alguns doutrinadores acrescentam ainda como requisito da relação empregatícia a exigência do empregado ser pessoa física, por conta da previsão legal. Com a devida vênia, esta característica já está incutida no próprio conceito de pessoalidade, de modo que, a princípio, não seria necessário elencá-la como elemento distinto.

Saliente-se ainda que a pessoalidade não impede a substituição excepcional do empregado, desde que, de forma excepcional, e com aquiescência do empregador, não descaracterizando a relação de emprego esta ocorrência especial, caso presente os demais elementos[3].

A não eventualidade significa que a prestação do serviço ocorre de forma periódica, mesmo que não seja diária. Aqui é importante distinguir a não eventualidade, exigida para reconhecimento de qualquer relação de emprego, da habitualidade ou da continuidade, exigida para relações específicas, tais como o empregado doméstico. A não eventualidade se relaciona à teoria dos fins e consiste no atendimento permanente das necessidades do empreendimento[4]. Já a continuidade consiste na prestação de serviços diariamente.

A onerosidade, por sua vez, impõe alguma forma de remuneração pelo trabalho prestrado, ou seja, o salário. Saliente-se que, apesar desta remuneração ser comumente feita em pecúnia, o fato da vantagem ser indireta, não desnatura a onerosidade da relação, podendo-se reconhecer a existência do chamado salário in natura.

3. Subordinação - conceito tradicional

 

 

 

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A subordinação já recebeu várias classificações, sendo concebida de modo isolada ou conjunta como elemento da relação de emprego.

A subordinação econômica caracterizava-se pela condição econômica superior que o empregador deveria ter sobre o empregado. Este elemento foi importado do direito alemão e falhou por ter considerado de forma exclusiva um elemento extrajurídico. Assim, apesar de costumeiramente o empregado se encontrar nesta posição, servindo tal critério inclusive para complementar o conceito da relação de emprego, quando da análise do conjunto fático, o mesmo não tem o poder de desnaturar a caraterística original da relação jurídica.

A subordinação conhecida como técnica, atribuída à Sociedade de Estudos Legislativos da França, defendia que o empregador deveria, para fins de comandar o serviço prestado, deter a competência técnica. Atualmente, existem várias empresas que adotam modelo que importa, justamente, o know how (o saber fazer) da atividade econômica. Assim, facilmente, verifica-se que este critério, tomado de forma solitária, descaracterizaria várias relações de emprego merecedoras da proteção celetista, motivo pelo qual ela hoje é considerada como uma das possíveis características da subordinação jurídica, não tendo sua (in)existência o efeito de transmudar a natureza da relação jurídica.

A subordinação social, por sua vez, resulta da conjugação dos critérios técnico e econômico, mas é criticada por apenas considerar o aspecto social analisado sob a ótica do empregado, de modo que hoje esta característica não se afigura imprescindível ao reconhecimento da relação de emprego.

Hodiernamente, a classificação mais adotada é a subordinação jurídica, podendo-se conceituá-la como um estado de dependência real criado por um direito do empregador de comandar, de ordenar, e que corresponde a obrigação de

 

 

 

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submissão do empregado. Em suma, os polos da subordinação jurídica são direção e fiscalização.

4. Subordinação Estrutural

Apesar de ainda pacificamente aceita a subordinação jurídica como elemento da relação de emprego, o seu conceito clássico ou tradicional foi expandido para englobar as novas formas de organização laboral. Saliente-se que o poder diretivo do empregador é a face oposta a subordinação do empregado, sendo esta uma das características mais importante para reconhecimento da relação de emprego.

A heterodireção (determinação pelo empregador do uso da energia laborativa do empregado) não se verifica tão somente pela emissão de ordens diretas e controle efetivo e regular sobre a atividade do obreiro. Atualmente, é possível reconhecimento do poder diretivo, inclusive de forma potencial, e, mesmo que não haja seu exercício efetivo, poderá ser reconhecido o vínculo empregatício.

Estas teorias expansionistas são imprescindíveis especialmente no caso dos trabalhadores que laboram no seu próprio domicílio, nos trabalhadores intelectuais e nos empregados que ocupam postos de alta hierarquia, além de modalidade atualmente muito comum, o denominado teletrabalho, no qual o trabalhador pode realizar sua função de qualquer local e em qualquer horário.

Saliente-se que atividades de alto nível técnico afastam ainda mais a necessidade de controle direto sobre a prestação pessoal dos serviços ou geram outro tipo de controle, às vezes não percebido pelo trabalhador, que, por vezes, pode se enxergar como “autônomo”, apesar de submetido a todas as regras determinadas pelo tomador de serviços. Por isso, a subordinação há de ser analisada não pela quantidade ou intensidade de ordens diretas do empregador, mas pela relação de dependência dos profissionais à estrutura organizacional, à não responsabilidade pelos riscos da

 

 

 

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atividade econômica, à não propriedade dos meios de trabalho, etc. Estes aspectos conjugados permitirão concluir pela existência ou não da modalidade atualmente denominada de subordinação estrutural.

Também a remuneração baseada em produtividade, apesar de aparentar maior liberdade ao trabalhador, na verdade incorpora o poder diretivo do tomador de serviços, tornando-o menos visível. Isto não significa, contudo, que o mesmo perdeu suaintensidade ou mesmo desapareceu, pois a subordinação do trabalhador permanece pela sua dependência econômica com aquele serviço, de modo que ele deve dar o máximo de si, mesmo que se comportando como se fosse um trabalhador autônomo.

Alguns ordenamentos, como o italiano trazem previsão expressa da subordinação estrutural, a exemplo do art. 2094, que entende que:

“o trabalhador subordinado deve ser interpretado no sentido de que a essência da subordinação consiste na ‘colaboração na empresa”[5] .

Antigamente, refutava-se o elemento da subordinação a algumas categorias de trabalhadores, tais como médicos. Isto se baseava no conceito restrito de subordinação, que compreendia a autonomia técnica do médico como autonomia na própria relação com o tomador de serviços. Esta concepção já foi há muito ultrapassada, não havendo qualquer limitação pré-concebida sobre o reconhecimento da relação de emprego.

Outro critério para aferir a subordinação estrutural relaciona-se com a dependência econômica do empregado em relação ao tomador. Deve-se atentar, porém, que isto não significa que o empregado deve ter condição financeira mais desfavorável, mas sim que a contraprestação financeira obtida pelo serviço prestado deve guardar importância no sustento daquele. Não precisa haver, todavia, exclusividade de fonte de renda, sendo esta, caso

 

 

 

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existente, apenas mais um fator a ser considerada na análise do contexto fático. Deste modo, a simples ausência de dependência econômica não implica em inexistência da relação de emprego, desde que presentes os demais elementos hábeis a configuração da subordinação. Neste mesmo raciocínio, lição de Lorena Vasconcelos Porto:

“Desse modo, embora rejeitado como critério definidor do contrato de trabalho, a dependência econômica foi adotada, em várias situações concretas, como indício de subordinação jurídica, contribuindo, assim, para ampliar a interpretação desta última, sobretudo para abranger situações novas”[6].

Saliente-se ainda que, mesmo que não haja registro formal de jornada, com ausência de marcação do ponto, ainda assim será possível verificar a existência do poder diretivo do empregador e consequentemente a subordinação estrutural do empregado. O controle pode se ocorrer pelo controle da produção, no qual o empregador exige o atendimento de metas, e, de forma indireta, controla o tempo dispendido. Ressalte-se que, mesmo quando não existir quantitativo mínimo de produção, será possível reconhecer o poder diretivo, quando a dependência econômica do empregado, de modo que haja obrigatoriedade, de forma transversa, na consecução dos trabalhos pelo significado que aquela remuneração representa no sustento do trabalhador.

5. Conclusão

Verifica-se, portanto, que várias relações de trabalho atualmente existentes estão mascaradas sob o manto do conceito tradicional da subordinação jurídica, consistindo em fraude a efetivação dos direitos trabalhistas e importando em diminuição da dignidade do trabalhador.

Não se faz necessário qualquer alteração legislativa para completa adoção da ideia encampada pelo presente artigo, sendo

 

 

 

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possível adoção deste papel pela jurisprudência que, com fundamento nas correntes hermenêuticas mais modernas, podem aplicar uma interpretação histórico-evolutiva[7].

Conclui-se, então, que a adoção de interpretação expansiva, para considerar subordinado aquele trabalhador que se insira na atividade do empregador de forma necessária, implica na aplicação direta dos preceitos constitucionais e das previsões legais da CLT, com valorização do trabalho como ferramenta de crescimento pessoal do empregado na sociedade.

Bibliografia

Barros, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho, 10 edição. São Paulo. LTr: 2016, 904 páginas.

Martins, Sergio Pinto. A Terceirização e o Direito do Trabalho. 11 edição. São Paulo. Editora Atlas S/A: 2011, 183 páginas.

Porto, Lorena Vasconcelos. A Subordinação no Contrato de Trabalho: uma releitura necessária. 1 edição. São Paulo. LTR: 2009, 280 páginas.

Villela, Fabio Goulart. Manual de Direito do Trabalho: teoria e questões. Rio de Janeiro. Elsevier: 2010, 479 páginas.

Notas:

[1] Art. 442 - Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.

[2] Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

[3] Barros, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho, 10 edição. São Paulo. LTr: 2016, p. 174.

[4]Villela, Fabio Goulart. Manual de Direito do Trabalho: teoria e questões. Rio de Janeiro. Elsevier: 2010, p. 110.

 

 

 

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[5] Porto, Lorena Vasconcelos. A Subordinação no Contrato de Trabalho: uma releitura necessária. 1 edição. São Paulo. LTR: 2009, p. 63.

[6] Porto, Lorena Vasconcelos. A Subordinação no Contrato de Trabalho: uma releitura necessária. 1 edição. São Paulo. LTR: 2009, p. 63.

[7] Porto, Lorena Vasconcelos. A Subordinação no Contrato de Trabalho: uma releitura necessária. 1 edição. São Paulo. LTR: 2009, p. 268.

 

 

 

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PARTO ANÔNIMO E SUA CONSONÂNCIA COM O MODERNO DIREITO DE FAMÍLIA

DANIEL LEÃO CARVALHO: Advogado da União, atual Coordenador Regional do Juizado Especial Federal da Procuradoria Regional da União da 1ª Região, Substituto, aprovado também nos concursos de Procurador da Fazenda Nacional, Procurador do Município de Maceió, Oficial de Justiça.

RESUMO: 1. A nova feição do Direito Civil – constitucionalização e repersonalização; 2. O moderno Direito de Família – na esteira desse novo Direito Civil; 2.1. Nova Principiologia do Direito de Família; 2.2. O princípio do melhor interesse da criança/adolescente; 3. O instituto do Parto Anônimo: conceituação; 3.1. Parto Anônimo: um instituto em consonância com os modernos princípios do Direito de Família; 3.2. Parto anônimo: uma opção frente ao desgastado debate acerca do aborto; 4. Ponto merecedor de destaque para o efetivo sucesso do parto anônimo: o necessário discernimento entre a diferença do direito ao estado de filiação frente ao direito de conhecer a origem genética; Conclusões; Referências.

Palavras-chave: Moderno Direito de Família – Afetividade – Aborto – Parto Anônimo.

1.INTRODUÇÃO A nova feição do Direito Civil – constitucionalização e repersonalização.

Diante da passagem do Estado Absolutista para o Estado Liberal burguês, desenvolvem-se, como mecanismos necessários ao resguardo do indivíduo contra os arbítrios típicos do anterior

 

 

 

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modelo estatal, os processos conhecidos como constitucionalismo e codificação.

A origem formal do constitucionalismo está ligada às Constituições escritas e rígidas dos Estados Unidos da América, em 1787, e da França, em 1791, a partir da Revolução Francesa. Teve como característica fundamental o caráter delimitador da ação do Estado (assinalando o chamado Estado mínimo), restituindo iniciativa regulatória prioritária aos particulares. Esse perfil de atuação mínima do Estado, determinado constitucionalmente, costuma ser definido, modernamente, como a instituição de direitos e garantias fundamentais de primeira geração. É, no dizer de Celso de Mello, o realce do princípio da liberdade clássica, negativa e formal[1].

Em paralelo, o processo de codificação, notadamente dentro do Direito Civil, sobrelevou o critério patrimonial e a propriedade privada, assegurando o mais amplo espaço de autonomia aos indivíduos.

Diante de um panorama histórico de privilégios e excessos estatais, o papel do constitucionalismo do pós Revoluções burguesas foi, pois, o de assegurar as liberdades, seguindo, o plano da codificação, o estabelecimento de marcos regulatórios estritamente mínimos ao disciplinamento da liberdade privada.

O direito civil continuou o seu desenvolvimento conservando, durante muito tempo, o seu status de “locus normativo privilegiado do indivíduo”, mantendo-se, como nenhum outro ramo do direito, a considerável distanciamento do Direito Constitucional[2].

Todavia, nas últimas décadas, tem, o Direito Civil, “perdido a sua função de Direito Comum, exercendo um papel supletivo diante de uma nova realidade constitucional. A ‘chamada constitucionalização do Direito Civil’ foi assumida, definitivamente, pela doutrina”[3]. Passou, a Constituição, a normatizar, diretamente e com eficácia plena, uma série de aspectos antes deixados ao legislador infraconstitucional.

 

 

 

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No que pertine ao Direito Civil nacional, principalmente após a Constituição de 1988, a doutrina e a jurisprudência passaram a adotar, como artifício efetivo de hermenêutica, a supremacia constitucional, utilizando-a como elemento balizador e interpretativo para a aplicação das variadas normas ao caso concreto; ademais, tal prevalência constitucional quedou por determinar um processo de maior especialização de ramos dentro do Direito, notadamente dentro do Direito Civil, criando subsistemas mais flexíveis e atentos à nova realidade multidisciplinar (daí o surgimento do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente; do CDC – Código de Defesa do Consumidor etc.). Destarte, se a Constituição apresenta um corpo normativo/principiológico acerca de matérias antes examinadas à luz exclusiva do Direito Civil, deve o operador do Direito, quando da criação/aplicação/interpretação da norma do referido corpo legal, ou de qualquer outra área de especialização, ficar atento aos princípios constitucionais/garantias fundamentais, assegurando sua supremacia.

Em consonância com a prevalência moderna de atenção aos marcos regulatórios constitucionais, perde, outrossim, destaque, dentro do Direito Civil, o valor propriedade/patrimônio, transmudando-se o centro de atenção para a pessoa, num verdadeiro processo de repersonalização. “É certo que as relações civis têm um forte cunho patrimonializante, bastando recordar que seus principais institutos são a propriedade e o contrato (modo de circulação da propriedade). Todavia, a prevalência do patrimônio, como valor individual a ser tutelado nos códigos, submergiu à pessoa humana, que passou a figurar como pólo de relação jurídica, como sujeito abstraído de sua dimensão real”[4]; é, pois, tendência que transparece a incompatibilidade entre a patrimonização absoluta das relações civis e o valor constitucional da dignidade da pessoa humana (previsto na Constituição de 1988 em seu artigo 1o, III).

Poder-se-ia dizer, assim, que os institutos básicos do direito civil não apresentam a mesma configuração decorrente do liberalismo e individualismo burguês. Perde espaço o indivíduo-

 

 

 

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proprietário, para revelar-se enquanto pessoa humana (repersonalização). “Despontam a afetividade, como valor essencial da família; a função social, como conteúdo e não penas como limite, da propriedade; e o princípio da equivalência material e a tutela do contratante mais fraco, no contrato”[5].

É, pois, diante dessa perspectiva constitucional de valorização do indivíduo, desse processo de constitucionalização do Direito Civil, que devem ser relidos todos os institutos a ele pertencentes, tendo por premissa o fato de que a dignidade da pessoa humanaé o núcleo essencial dos direitos fundamentais, o “valor que atrai a realização dos direitos fundamentais”[6].

2. O moderno Direito de Família – na esteira desse novo Direito Civil.

Diante desse processo de constitucionalização do Direito Civil, determinando sua releitura através dos princípios e garantias fundamentais albergados constitucionalmente, também o Direito de Família, como não poderia ser diferente, sofre profunda transformação em suas características. No atual contexto, adquire, a família, um novo sentido: relativiza-se sua função procracional; desapareceram suas funções política, econômica e religiosa, para as quais era necessária a origem biológica; e reaparece/renova-se dentro da experiência familiar o sentido de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de vida. Nesse cenário, passa a família a ser instituto que exige tutela jurídica mínima, que respeite a liberdade de constituição, convivência e dissolução; a auto-responsabilidade; a igualdade irrestrita de direitos, embora com reconhecimento das diferenças naturais e culturais entre os gêneros; a igualdade entre irmãos biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, como pessoas em formação; o forte sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo prevalecimento de interesses patrimoniais[7]. É, pois, a consideração do afeto como principal fundamento/característica das relações familiares.

 

 

 

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Cabe destacar, outrossim, que as relações familiares receberam atenção especial do legislador constituinte, que inseriu, dispersos por todo o texto da Carta Maior, uma série de dispositivos sobre o tema, sendo de razoável consenso, dentro da doutrina/jurisprudência, que, mesmo tendo assento em variadas partes do texto constitucional, ou mesmo residindo em textos de tratados internacionais, a natureza dos direitos que tutelam as relações familiares deve ser interpretada à luz da teoria dos direitos fundamentais[8].

Destarte, disposições como “a proteção do Estado à união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” – art. 226, § 3º, da CF, “o planejamento familiar, fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, como livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas” – art. 226, § 7º, da CF, “a equiparação de filhos e a vedação de designações discriminatórias relativas à filiação” –art. 227 § 6º, da CF) entre tantas outras, devem ser encarados/aplicados dentro da ótica dos direitos fundamentais.

Diante da constatação de que necessária é a releitura do Direito Civil sob o prisma da Constituição Federal, os antigos princípios do Direito de Família (ainda embasados em aspectos de uma cultura machista, patrimonialista, calcada no estabelecimento de privilégios em virtude de pertença à determinada família, nas diferenças entre “tipos” de filho – filho consangüíneo, filho adotivo, filho decorrente de relação extraconjugal etc.) foram desfeitos, emergindo uma nova principiologia para as relações familiares.

2.1. Nova Principiologia do Direito de Família.

Não é pacífico, dentro da doutrina, quantos e quais deveriam ser os princípios necessários para um correto manuseio do Direito de Família. Paulo Lôbo, em termos mais gerais, considerou em

 

 

 

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número de três os mais importantes princípios constitucionais regentes das relações familiares (o da liberdade, o da igualdade, o da dignidade da pessoa humana)[9]; Flávio Tartuce, por sua vez, em artigo dedicado especificamente ao tema, desdobra em número de 9 os princípios (princípio de proteção da dignidade da pessoa humana, princípio da solidariedade familiar, princípio da igualdade entre os filhos, princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, princípio da igualdade na chefia familiar, princípio da não-intervenção ou da liberdade, princípio do melhor interesse da criança, princípio da afetividade, princípio da função social da família)[10]; ter-se-á em vista, neste tópico, de forma mais próxima, todavia, a obra do Rodrigo da Cunha Pereira[11], que desdobra em sete os princípios fundamentais norteadores do Direito de Família, a seguir, ainda que de forma resumida, explanados.

O primeiro dos princípios seria o da dignidade da pessoa humana. É ponto de partida para a análise de qualquer questão dentro das relações familiares o sentido de dignidade, de justiça humana. Pressupõe, este princípio, uma noção de sujeito não subordinado ao desejo de outrem, livre, respeitado em suas singularidades. Por isso, poder-se-ia dizer que a dignidade da pessoa humana é valor que atinge/influencia todos os demais princípios do Direito de família, correspondendo, efetivamente, e em virtude do processo de constitucionalização acima tratado, ao valor que atrai a realização dos direitos fundamentais. É através dele que todas as categorias de famílias e filhos puderam ser inseridas na ordem jurídica (ou que ainda estão em processo de inserção).

O princípio da monogamia. Toda atenção deve ser despendida neste ponto para não se criar a falsa impressão de que, com a observância desse princípio, estar-se-ia negando importância às famílias surgidas de relações extra-matrimoniais ou “extra-uniões-estáveis”; no dizer de Rodrigo Pereira, apesar do princípio funcionar como conexão moral, deve ser aqui interpretado como interdito proibitório para o estabelecimento de várias famílias paralelas.

 

 

 

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O princípio da igualdade dos gêneros e o respeito às diferenças. “O princípio da igualdade, formal e material, relaciona-se à paridade de direitos entre os cônjuges ou companheiros e entre os filhos. Não há cogitar de igualdade entre pais e filhos, porque cuida de igualar os iguais. A conseqüência mais evidente é o desaparecimento de hierarquia entre os que o direito passou a considerar pares, tornando perempta a concepção patriarcal de chefia. A igualdade não apaga as diferenças entre os gêneros, que não pode ser ignorada pelo direito”[12]. É desse princípio que decorre a igualdade entre filhos (art. 227, § 6º, da Constituição Federal: “os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”), a igualdade entre cônjuges e companheiros e a igualdade na chefia familiar.

O princípio da autonomia e da menor intervenção estatal. É princípio de previsão expressa no Código Civil, art. 1513: “é defeso a qualquer pessoa de direito público ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família”. Destarte, a constituição ou extinção das relações familiares, o planejamento familiar, os valores religiosos/culturais/educacionais, a administração do patrimônio familiar são uma liberalidade dos integrantes da família. Necessária é, todavia, uma ponderação desse princípio com as questões do “melhor interesse da criança” e a “dignidade da pessoa humana”, em virtude de todo o processo de constitucionalização do Direito Civil/Direito de Família supracitado.

O princípio da afetividade. Apesar de ser o mais novo princípio jurídico do Direito de Família, passou a ocupar lugar de destaque entre os demais. É, junto com o princípio da dignidade da pessoa humana, base para a leitura/interpretação de todos os demais. Com a superação do patrimonialismo ínsito ao antigo Direito Civil e o estabelecimento de um processo de repersonalização, passa a afetividade a ocupar seu verdadeiro lugar, ou seja, lugar de essencialidade dentro da constituição/manutenção das relações familiares. É em virtude dela, também, que se pode pensar na

 

 

 

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constituição de diferentes tipos de família (a seguir trabalhado); é, outrossim, através da observância da afetividade, que será possível o crescimento dentro da doutrina e da jurisprudência da “mitigação do endeusamento ao biologismo nas relações de filiação, passando-se a enxergar a filiação socioafetiva como gênero, na qual passam a ser espécies a adoção, o filho de criação e as havidas por inseminação artificial heteróloga”[13].

A jurisprudência, ademais, já começa a considerar o princípio da afetividade quando do regramento de situações nas relações familiares. Direito de visita ao menor por parte de ex-companheiros, determinação da existência de outras formas de família a ser tutelada pelo Direito, despatrimonialização das relações familiares, dando ênfase efetividade à necessária existência de afetividade para sua caracterização e a prevalência da filiação socioafetiva sobre o biologismo são algumas das posições recentemente adotadas pelos julgados.[14]

O princípio da pluralidade das formas de família. Em artigo bastante esclarecedor sobre o tema, Paulo Lôbo[15] aponta para o necessário reconhecimento e disciplinamento normativo de novas estruturas parentais/conjugais. Esclarece que são encontradas, na experiência brasileira, variadas formas de constituição de entidade familiar, a saber: 1– par andrógino, sob regime de casamento, com filhos biológicos; 2– par andrógino, sob regime de casamento, com filhos biológicos e filhos adotivos, ou somente com filhos adotivos, em que sobrelevam os laços de afetividade; 3– par andrógino, sem casamento, com filhos biológicos (união estável); 4– par andrógino, sem casamento, com filhos biológicos e adotivos ou apenas adotivos (união estável); 5– pai ou mãe e filhos biológicos (comunidade monoparental); 6– pai ou mãe e filhos biológicos e adotivos ou apenas adotivos (comunidade monoparental); 7– união de parentes e pessoas que convivem em interdependência afetiva, sem pai ou mãe que a chefie, como no caso de grupo de irmãos, após falecimento ou abandono dos pais; 8– pessoas sem laços de parentesco que passam a conviver em caráter permanente, com laços de afetividade e de ajuda mútua, sem finalidade sexual ou

 

 

 

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econômica; 9– uniões homossexuais, de caráter afetivo e sexual; 10– uniões concubinárias, quando houver impedimento para casar de um ou de ambos companheiros, com ou sem filhos; 11– comunidade afetiva formada com "filhos de criação", segundo generosa e solidária tradição brasileira, sem laços de filiação natural ou adotiva regular.

Ademais, assevera, Paulo Lôbo, que todos esses diferentes formatos de entidade familiar são albergados pela disciplina constitucional, superando a envelhecida visão de que as entidades familiares teriam previsão taxativa. É, pois, uma postura de inclusão, em consonância com os demais princípios do Direito de Família, especialmente o da dignidade da pessoa humana e o da igualdade.

O último princípio, por se tratar de matéria com íntima ligação ao instituto a ser posteriormente analisado no presente artigo (o parto anônimo), será tratado a seguir, em tópico específico e melhor pormenorizado.

2.2. O princípio do melhor interesse da criança/adolescente.

Entre os princípios que ganharam posição de destaque, recentemente, dentro do Direito de Família, está o princípio do melhor interesse da criança/adolescente. Em artigo clarificador sobre o tema, Tânia da Silva Pereira[16] estabelece como marco originário do princípio em exame seria o instituto inglês chamado parens patrie, do século XIII, representando uma prerrogativa do Rei em proteger aqueles que não poderiam fazê-lo em causa própria, vinculando-se à guarda de incapazes e a sua proteção. Assim, também no caso de proteção de menores seria o princípio aplicado, assegurando-se amparo aos seus interesses. Somente em 1836, todavia, tornou-se efetivo o princípio na Inglaterra.

Ademais, teria sido o princípio recepcionado, outrossim, pela jurisprudência norte-americana, em 1813, no caso Commowealth vs. Addicks, onde a Corte da Pensilvânia afirmou a prioridade dos

 

 

 

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interesses da criança em relação a seus pais, determinado a concessão da guarda à mãe, mesmo sendo esta considerada adúltera, vislumbrando, justamente, o melhor interesse do menor (best interest).

Foi com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989, todavia, que o princípio do melhor interesse da criança ganhou contornos mais precisos[17]. Em seu art. 3.1 fica estabelecido que: “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança”. Deve-se entender, outrossim, como criança, também a figura do adolescente (entre 12 e 18 anos), denominando corretamente o princípio como “melhor interesse da criança/adolescente”.

No Brasil, com a Constituição de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90) adotou-se a chamada “Doutrina Jurídica da Proteção Integral” no que concerne à infância e juventude.

O art. 227 da Constituição Federal prescreve “prioridade absoluta” ao menor, determinando sua condição de “sujeito de direitos fundamentais”, estabelecendo, ademais, a necessária realização de todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes propiciar um adequado desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. É norma dirigida não só ao Estado ou à sociedade como um todo, mas especialmente aos integrantes da família.

O ECA, por sua vez, destaca a situação do menor como sujeito em “condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”[18]. Neste prisma, passa a opinião do menor a ser considerada importante fator de orientação/convencimento para o magistrado na busca pelo melhor interesse da criança no caso concreto, devendo, no processo, ser, a criança, assistida, sempre que necessário, por profissionais capacitados para lidar com a situação (psicólogos,

 

 

 

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pedagogo etc). É o que consta precisamente do art. 28 do ECA, a saber: “art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei. § 1º Sempre que possível, a criança ou adolescente deverá ser previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada”. Na jurisprudência, outrossim, é clara a aplicação do princípio, como no exemplo a seguir colacionado:

MENOR - GUARDA - AUSÊNCIA DE ACORDO ENTRE OS PAIS – PREVALÊNCIA DO MENOR. Na solução do conflito entre os pais, quanto à guarda dos filhos menores, o Juiz deve dar primazia ao interesse dos menores. Não havendo possibilidade de acordo entre os pais, o interesse do menor deve ser auferido, pelo Juiz, sobretudo, através da análise dos sentimentos expressados pelas crianças e pela pesquisa social, desenvolvida por psicólogos e assistentes sociais, que, com as demais provas trazidas aos autos, permitem avaliar a qualidade das suas relações afetivas, o seu desenvolvimento físico e moral, bem como a sua inserção no grupo social (TJ-PR - Ac. unân. 3658 da 6.ª Câm. Cív. julg. em 23-6-99 - Ap. 77.373-7- Ponta Grossa - Rel. Des. Accácio Cambi; in Apase Paraná).

Destarte, o que se percebe é a tentativa do legislador de definir terreno adequado para que a criança para nascer em condições dignas de saúde e convivência familiar, possa se desenvolver cultural-emocial-academicamente de maneira apropriada, gozando de ambiente que lhe franqueie liberdade, oportunidade de ser ouvida e, sobretudo, afetividade.

3. O instituto do Parto Anônimo: conceituação.

Após a análise de todo o curso de reestruturação do Direito de Família, com seu processo de constitucionalização e

 

 

 

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reformulação de princípios, despontando a prevalência da dignidade da pessoa humana, da liberdade e, principalmente, da afetividade, é possível tratar do instituto conhecido como parto anônimo.

Aída Kemelmajer de Carlucci, ao trata do tema, assevera que o referido instituto é figura quase incompreensível para um leitor latino-americano, em virtude da inexistência de regulação nessa região. A referida autora conceitua o instituto como sendo a outorga a mulher que haja dado a luz a um filho do direito de manter em segredo sua identidade; ou seja, a lei asseguraria a mãe a sua decisão de manter sua identidade em anonimato, de modo que a pessoa que ela gerou não só estaria impedida de iniciar uma ação de filiação, como também de saber, algum dia, quem fora sua genitora. Destarte, automaticamente, o filho havido através da caracterização do parto anônimo estaria habilitado para adoção[19]. É, pois, situação que corta, por completo, os vínculos jurídico-familiares com o recém-nascido, isentando, a mãe, de qualquer responsabilidade civil ou criminal.

O instituto tem suas origens no mecanismo chamado “roda dos expostos”, quando era permitida a entrega de recém-nascidos em Conventos: as crianças eram colocadas, em segurança, numa espécie de porta giratória, tendo a partir daí o resguardo ao direito à vida e a uma possível convivência familiar por adoção (costuma-se considerar a prática como criação de São Vicente de Paulo, que, para evitar uma situação de aborto ou abandono, franqueava à mãe a entrega da criança na torre da Igreja, anonimamente, tocando, logo em seguida, a campanhinha do Convento).

Tem por finalidade maior, por conseguinte, o instituto, prevenir o infanticídio, o aborto (especialmente o aborto tardio e o aborto realizado em clínicas clandestinas extremamente precárias) e o abandono de recém-nascidos – deixados, na maior parte das vezes, em condições degradantes.

 

 

 

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O parto anônimo já é adotado em países como a França, Luxemburgo, Itália, Bélgica, Holanda, Áustria e em alguns estados dos EUA. No Brasil, por sua vez, o debate começa a se acentuar com a tramitação, na Câmara dos Deputados, de um Projeto de Lei com o objetivo de regulamentar o referido instituto.

Com a regulamentação do parto anônimo, as mães interessadas poderiam deixar os bebês nos hospitais ou postos de saúde para a posterior adoção sem ter de registrar a criança em seu nome e sem precisar se identificar. O procedimento de adoção a ser posteriormente realizado seria menos burocrático por não envolver o pretérito registro de pai e mãe nos documentos (sem a necessidade de fazer a destituição do poder familiar).

Apesar de ainda ser bastante intenso o debate acerca da utilidade/necessidade de legalização do parto anônimo, e de, por conseqüência, ainda não existir consenso dentro da doutrina, crer-se ser possível afirmar que o instituto em exame coaduna-se com os modernos princípios do direito de família, constituindo medida de extrema serventia e proficuidade na busca por uma regulação das relações familiares de forma justa. É o que se passa, então, a tratar.

3.1. Parto Anônimo: um instituto em consonância com os modernos princípios do Direito de Família.

Pelo acima exposto, pode-se concluir que o instituto do parto anônimo encontro respaldo na Constituição Federal e no moderno Direito de Família.

É expresso, na CF, a observância do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III), o direito à vida (art. 5o, caput) e a proteção à criança (art. 227). Os contornos do instituto em exame demonstram, justamente, o esforço estatal de, através do tratamento adequado da situação da gestante (tanto em termos físicos quanto em termos psicológicos), possibilitar seu discernimento para uma maternidade madura e sadia. O objetivo do legislador, registre-se, não é estimular o abandono de crianças para adoção; do contrário: o que se pretender é evitar, justamente, o

 

 

 

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abandono de crianças em situações subumanas, retirando-lhes qualquer expectativa de vida.

Diante do novo panorama do Direito Civil/Direito de Família, com a necessária releitura de seus institutos através dos ditames constitucionais, inseri-se, o parto anônimo, como verdadeiro instrumento de realização da dignidade da pessoa humana (promovendo a manutenção do direito à vida e do sadio desenvolvimento da criança, que, do contrário, estaria em condições piores). É, pois, expressão da tendência de repersonalização do Direito de Família.

Ademais, o próprio ECA, em seu art. 7o, estabelece a necessária efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e desenvolvimento sadio, em condições dignas de existência.

Ademais, seguindo a interpretação trazida pelos novos princípios do Direito de Família, desponta, a afetividade, como elemento imprescindível para a configuração da entidade familiar. Não bastam apenas os vínculos biológicos; necessário é que a entidade familiar guarde entre seus integrantes o afeto como verdadeiro liame de ajuntamento. Destarte, no parto anônimo, potencializa-se a existência de uma futura relação familiar (por adoção), esta sim preenchida de afeição/afeto. Registre-se, entretanto, que não se quer com a presente afirmativa generalizar a negativa de possibilidade da parturiente, que, em tese se submeteria ao parto anônimo, de voltar atrás em sua decisão (observados os prazos legais a serem definidos) e desempenhar adequadamente sua função de mãe, estando presente a afetividade. É, pois, instituto que funciona como válvula de escape para os casos em que a mãe tem discernimento definido de que não pretende ficar com a criança. Daí ser tão importante o acompanhamento psicológico quando da realização do parto anônimo.

 

 

 

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Por sua vez, como observado em item específico supra-trabalhado, coaduna-se, o parto anônimo, com o princípio do melhor interesse da criança. Prescreve, o referido princípio, a observância do regime de “Proteção Integral”, devendo a sociedade, o Estado e a família atentarem, por primeiro, para o interesse da criança. O parto anônimo, ao potencializar o direito do nascituro à vida com dignidade, nada mais faz que transparecer o melhor interesse do menor, evitando abandonos, partos clandestinos ou futuras rejeições.

Cabe frisar, em certa medida já exposto no presente artigo, que deve ser encarado, o parto anônimo, como medida supletiva, como válvula de escape, e não como direito à negação da maternidade de forma absoluta. Somente assim estar-se-á atentando para o princípio do melhor interesse da criança.

3.2. Parto anônimo: uma opção frente ao desgastado debate acerca do aborto.

É tema recorrente, dentro do Direito Penal e do Direito de Família, a possível descriminalização do aborto. E, ínsito a esta discussão, acompanhando-a de forma insuperável e muitas vezes tomando completamente seu espaço, o debate sobre qual deve ser considerado o marco inicial da vida (se a partir da concepção; se somente após o processo de “nidação”; se somente a partir do nascimento com vida etc.).

O que se percebe, todavia, é que tal debate encontra-se sobremaneira desgastado, sem consenso aparentes. Atualmente, a questão do marco inicial da vida foi posta em evidência em virtude do exame da Ação Direta de Inconstitucionalidade junto ao STF, questionando a validade da Lei de Biosegurança, ainda sem definição em virtude da suspensão do julgamento pelo pedido de vistas do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.

O parto anônimo, em termos de convencimento argumentativo no processo legislativo, seria medida mais rápida e de mais fácil acordo de vontades. Diversas frentes contrárias ao

 

 

 

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aborto, como a Igreja Católica, mostram-se mais abertas à instituição do instituto em exame. O próprio Catecismo da Igreja Católica (CEC nº 2270) prescreve que “a vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da concepção. Desde o primeiro momento de sua existência, o ser humano deve ver reconhecidos os seus direitos de pessoa, entre os quais o direito inviolável de todo ser inocente à vida.”

Destarte, fica claro que um consenso na instituição do parto anônimo seria mais fácil e menos desgastante, ao passo que, a partir daí, poder-se-ia, em certa medida, tratar de maneira um pouco mais justa às questões de saúde pública ligadas à gestação indesejada, efetivando-se uma medida que, sem dúvida, protegeria os interesses do menor contra eventuais abandonos.

4. Ponto merecedor de destaque para o efetivo sucesso do parto anônimo: o necessário discernimento entre a diferença do direito ao estado de filiação frente ao direito de conhecer a origem genética.

Paulo Lobô, em artigo específico sobre o tema[20], prescreve o necessário discernimento entre o direito ao estado de filiação e o direito à origem genética. Defende, o referido autor, que, em virtude da prevalência, nas relações familiares, da afetividade, deve ser afastado o biologismo absoluto. Destarte, em havendo choque entre o estabelecimento de vínculos familiares formais entre critérios de afetividade e biológicos, o primeiro deve prevalecer. Todavia, deve ser preservado o direito de conhecimento do patrimônio genético, garantido, então, como direito fundamental. Poder-se-ia pensar, através dessa conclusão, na hipótese de uma ação intentada contra suposto pai biológico apenas para conhecimento da origem genética, sem necessária cumulação com reconhecimento de paternidade, em virtude de anterior relação familiar já instituída e com experiência de afetividade.

O perigo, todavia, no que pertine ao parto anônimo, seria a permissão da aplicação desse entendimento, o que geraria

 

 

 

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inutilidade do instituto, já que seria, a questão do sigilo, comprometida.

Com efeito, deve-se entender que, se o direito ao estado de filiação não é absoluto, também o direito ao conhecimento da origem biológica não o é. É imprescindível, para o sucesso do instituto, que o sigilo seja efetivamente mantido; caso contrário, haveria um elemento ínsito de desestímulo no parto anônimo, em virtude do perigo inerente do nascido através de parto anônimo conhecer sua genitora, mesmo que sem nenhum intuito patrimonialista ou de estabelecimento de filiação, causando extremo desgaste psicológico para ambos.

Daí ser tão importante o trabalho psicológico prévio e, sobretudo, a possibilidade de registro, no Hospital, de características genéticas básicas, a fim de suprir esta necessidade de procura posterior.

Conclusões

1. Passou, o Direito Civil e, conseqüentemente, o Direito de Família, por profundas modificações em sua estrutura. Além do processo de constitucionalização e repersonalização de ambos, as relações familiares tiveram sua estrutura ampliada, para albergar novos tipos de família, acompanhadas de nova regulação por modernos princípios mais condizentes com a realidade/interpretação constitucional.

2. Nesse caminho, aspectos como afetividade e o princípio do melhor interesse da criança, enquanto manifestações diretas do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da liberdade, ganharam força na regulação do ambiente familiar.

3. O parto anônimo, neste panorama, desponta como medida em consonância com os modernos princípios do direito de família. Ao prescrever a possibilidade de

 

 

 

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colocação do recém-nascido para adoção, com quebra de vínculos familiares e isenção de responsabilização civil e criminal, mantendo-se o sigilo (inclusive relativizando-se o direito ao conhecimento da origem genética), o referido instituto nada mais faz que realizar o princípio da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da criança, dando ênfase ao aspecto afetividade, ao potencializar um futura convivência familiar.

4. Ademais, representa, o parto anônimo, uma opção legislativa de mais fácil consenso frente ao desgastado debate do aborto, possibilitando uma conformação/acordo de vontades mais equilibrado entre os diversos setores da sociedade, dotando o Poder Público de novas armas que facilitariam as políticas públicas relativas à proteção a gestação não desejada, evitando os abortos clandestinos e os abandonos de menores recém-nascidos em condições degradantes.

Referências

ALBUQUERQUE, Fabíola Santos. Adoção à Brasileira e a Verdade do Registro Civil. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/anais_download.php?a=14>. Acesso em: 30 mar. 2008.

 

 

 

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de filiación. A propósito de la decisión del Tribunal Europeo de

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NOTAS:

[1] STF – Pleno – MS no 22.164/SP – Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 17 nov. 1995. p. 39.206.

[2] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[3] PEREIRA, Tânia da Silva. O Direito de Família e os desafios do novo Código Civil. Disponível em: <http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_publicacao_divulgacao/doc_gra_doutrina_civel/civel%2053.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[4] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto.Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

 

 

 

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[5] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto.Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[6] SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia. In: Anais da XV Conferência Nacional da OAB. Foz do Iguaçu: OAB, 1994. p. 549.

[7] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto.Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[8] Cf. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 45.

[9] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto.Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[10] Cf. TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>. Acesso em: 01 abr. 2008.

[11] Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Uma Principiologia para o Direito de Família. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/anais_download.php?a=40>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[12] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto.Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.

[13] Cf. ALBUQUERQUE, Fabíola Santos. Adoção à Brasileira e a Verdade do Registro Civil. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/anais_download.php?a=14>. Acesso em: 30 mar. 2008.

 

 

 

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[14] A título de exemplo da observância do princípio da afetividade dentro da regulação das relações familiares, registre-se a seguinte jurisprudência do STJ: REsp 124621/SP. Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA. DIREITO CIVIL. PÁTRIO PODER. DESTITUIÇÃO. PAIS BIOLÓGICOS CONDENADOS CRIMINALMENTE. CARÊNCIA DE RECURSOS. IRRELEVÂNCIA. HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ART. 395 DO CÓDIGO CIVIL C/C ART. 22 DO ESTATUTO. INTERESSES DO MENOR. PREVALÊNCIA. ORIENTAÇÃO DA TURMA. PRECEDENTES. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. RECURSO DESACOLHIDO. (...) II - Nos termos do artigo 23 do referido Estatuto, “a falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder”. E a destituição, como efeito da condenação criminal, nos termos do art. 92-II, Código Penal, só é automática quando se tratar de crime doloso, sujeito à pena de reclusão, cometido contra filho. III - Por outro lado, na linha de precedente desta Corte, “a legislação que dispõe sobre a proteção à criança e ao adolescente proclama enfaticamente a especial atenção que se deve dar aos seus direitos e interesses e à hermenêutica valorativa e teleológica na sua exegese”. IV - Assim, “apesar de a condenação criminal, por si só, não constituir fundamento para a destituição do pátrio poder, nem a falta de recursos materiais constituir motivo suficiente para essa conseqüência grave, o certo é que o conjunto dessas circunstâncias, somadas ao vínculo de afetividade formado com a família substituta, impossibilita que se modifique o status familae, no superior interesse da criança”. (grifos nossos)

[15] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 53, jan. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2552>. Acesso em: 01 abr. 2008.

[16] PEREIRA, Tânia da Silva. O princípio do melhor interesse da criança: da teoria à prática. Disponível em: <http://www.gontijo-familia.adv.br/novo/artigos_pdf/Tania_da_Silva_Pereira/MelhorInteresse.pdf> Acesso em: 30 mar. 2008.

[17] Apesar de, em outros instrumentos internacionais, já ter havido a iniciativa de proteção especial à infância, a saber: a Declaração de Genebra de 1924, a Declaração Universal de

 

 

 

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Direitos Humanos das Nações Unidas de 1948 e a Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959.

[18] Arts. 4º e 6º do ECA: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

(...)

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

[19] Cf. CARLUCCI, Aída Kemelmajer de. El derecho humano a conocer el origen biológico y el derecho a establecer vínculos de filiación. A propósito de la decisión del Tribunal Europeo de Derechos Humanos del 13/2/2003, en el caso Odièvre c/ France. In: CARAVACA, Alfonso Luis Calvo; RUIZ, Esperanza Castellanos (Coords.). El derecho de familia ante el siglo XXI : aspectos internacionales. Espanha: Editorial Constitución y Leyes, 2004. p. 511-530.

[20] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética: uma distinção necessária. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 194, 16 jan. 2004. Disponível em:

 

 

 

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<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4752>. Acesso em: 02 abr. 2008.

 

 

 

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PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA NA MODERNA GESTÃO PÚBLICA

BRASILEIRA: ARENAS DA COPA DO MUNDO DE 2014

LARISSA PADILHA RORIZ PENNA: Advogada. Qualificação: Especialista em Direito Público pela UFC. Especialista em Direito Penal e Processo Penal pela FAERPI.

RESUMO: O presente trabalho tem por escopo apresentar o instituto das Parcerias

Público-Privadas, regulamentada pela Lei nº 11.079/2004. Faz-se uma abordagem

acerca da gestão pública brasileira e da inserção das parcerias entre o setor público e

o privado nos projetos de desenvolvimento socioeconômico. Serão destacados os

investimentos realizados na Copa do Mundo de 2014, especialmente na construção

de estádios de futebol.

PALAVRAS-CHAVE: Gestão pública. Parceria público-privada. Copa do Mundo.

INTRODUÇÃO

As Parcerias Público-Privadas visam, principalmente, contribuir com a

Administração Pública para aumentar os investimentos nacionais mediante parcerias

e recursos privados na infraestrutura estatal, evitando a redução do crescimento

econômico.

As PPPs podem representar uma saída para o setor público brasileiro na

realização dos investimentos necessários ao desenvolvimento econômico e social do

país. Para o setor privado, uma alternativa de negócio com risco minimizado,

 

 

 

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considerando as expressivas garantias apresentadas e a contraprestação da

Administração Pública em complemento às tarifas cobradas dos usuários.

A definição legal do instituto da parceria público-privada consta no art. 2º

da Lei Federal nº. 11.079/2004: "é o contrato administrativo de concessão na

modalidade patrocinada ou administrativa". No mesmo dispositivo ainda constam

os conceitos de concessões patrocinadas e administrativas.

No Brasil, as PPPs foram bastante utilizadas para as obras da Copa do Mundo

2014. Das 12 arenas da Copa do Mundo, 9 são públicas e as outras 3 pertencem a

Atlético-PR, Corinthians e Internacional. Dentre as públicas, 5 foram

construídas/reformadas e estão sendo geridas em regime de PPP e 4 delas foram

erguidas por meio das tradicionais formas de contratação do setor público

Faz-se imprescindível a criação de mecanismos que favoreçam a atuação

eficaz do controle e o acompanhamento da execução dos contratos celebrados para

que as PPP possam representar uma forma eficiente de gestão do patrimônio público.

EVOLUÇÃO DO ESTADO E A MODERNA GESTÃO PÚBLICA NO

BRASIL

1.1 A formação histórica do Estado moderno

Inicialmente, faz-se necessária uma abordagem acerca da evolução da

participação do Estado na gestão pública, com o objetivo de observar as diferenças

na postura estatal em relação à intervenção na economia e, consequentemente, o

estudo do instituto formalizado conhecido como parceria público-privada.

Em relação aos modelos de Estado, Paulo Bonavides (2010, p. 30), coloca a

seguinte ordenação: primeiro, o Estado liberal; a seguir, o Estado socialista; depois,

o Estado social das Constituições pragmáticas, assim batizadas ou caracterizadas

 

 

 

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pelo teor abstrato e bem-intencionado de suas declarações de direitos; e de último, o

Estado social dos direitos fundamentais, este, sim, por inteiro capacitado da

juridicidade e da concreção dos preceitos e regras que garantem estes direitos.

Na concepção de Estado moderno, historicamente, tem-se as fases do Estado

autoritário e patrimonial (séculos XVI a XVIII), liberal e democrático (século XIX e

início do século XX) e social-democrático (segunda parte do século XX).

Para melhor compreensão do processo de modernização do Estado brasileiro

nos últimos 150 anos, será utilizado como modelo básico o trabalho “Do estado

patrimonial ao gerencial”, publicado em 2001, pelo ex-ministro e economista Luiz

Carlos Bresser Pereira. Embora analisando especificamente as mudanças no plano

administrativo, Bresser Pereira o faz em uma perspectiva mais ampla, levando em

consideração mudanças na Sociedade e no Estado como ente político.

Pereira (2001), analisa as mudanças ocorridas no Brasil em três planos:

Sociedade, Estado (política) e Estado (administração). O autor enfatiza a

interdependência dos três planos e dedica uma especial atenção ao processo de

mudança do Estado Patrimonial para o Estado Gerencial.

Quadro nº 1. Formas históricas do Estado e Sociedade no Brasil. (Pereira, 2001, p.

3).

Bresser Pereira afirmava: “A terceira fase e seus respectivos nomes são

imprecisos. A reforma gerencial do Estado está apenas começando; a formação social

continua capitalista embora seja crescentemente pós-industrial, dada a enorme classe

média profissional ou tecnoburocrática já existente.” (Pereira, 2001, p. 3).

 

 

 

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1.2 O Estado oligárquico-patrimonial

Mudanças econômicas importantes ocorreram com a vinda da Família Real Portuguesa ao Brasil em 1808. Dom João VI, cumprindo compromissos com a Inglaterra, decretou, logo após seu desembarque em Salvador, em 28 de janeiro, a abertura de nossos portos ao comércio com as demais nações e, em 1 de abril do mesmo ano, através de alvará, a liberdade industrial do Brasil Foram medidas que repercutiram positivamente entre nossos produtores e comerciantes.

Em 1821, pressionado pela situação política portuguesa, Dom João VI retornou para Portugal deixando como substituto seu filho, Dom Pedro I, nomeado Príncipe Regente do Brasil.

Em 07 de setembro de 1822, D. Pedro I decretou a independência do Brasil e, em 7 de abril 1831, abdicou do trono em favor de seu filho, D. Pedro II, menor de idade, nascido e criado em terras brasileiras. O país passou a ser uma Monarquia Parlamentar Constitucional.

O país foi regido provisoriamente por três autoridades, Regência Trina Provisória, eleitos um representante dos liberais, dos conservadores e dos militares, até a convocação de eleições para uma Regência Trina Permanente. Em 1834, o Padre Diogo Feijó, Ministro da Justiça, conseguiu a aprovação de um Ato Adicional instituindo a Regência Uma e, através de processo eleitoral, o próprio padre Feijó é eleito o único regente.

O Imperador D. Pedro II, em 1847, criou o Conselho de Ministros, órgão encarregado da direção das políticas, interna e externa do país, além da administração civil e militar. A nomeação dos ministros era da alçada do presidente do Conselho e ao monarca competia, além da nomeação do presidente do Conselho, o exercício do poder moderador.

Segundo Pereira (2001, p. 4), a “análise clássica”, desse período histórico considera que o regime político era dominado por uma oligarquia “de senhores de terra: em uma primeira fase, os senhores de engenho do Nordeste e os coronéis de gado do sertão; em uma segunda, os primeiros plantadores de café do Vale do Paraíba; e finalmente os cafeicultores do Oeste paulista.” em sintonia com a burguesia mercantil.

Pereira (2001, p. 4) cita, ainda, o sociólogo e historiador Raymundo Faoro que, mesmo considerando o papel da burguesia mercantil e da oligarquia rural, considera como o poder político nesse período um extrato social aristocrático-burocrático. “Para Faoro o poder político do Estado está concentrado em um

 

 

 

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estamento aristocrático-burocrático de juristas, letrados, e militares, que derivam seu poder e sua renda do próprio Estado.”

A Monarquia parlamentar constitucional, fundamentada na separação dos poderes, delegava ao monarca funções do Executivo, que para cumpri-las necessitava do estamento e de um corpo de auxiliares significativo. Nessa época, é conhecido o papel de empregador do Estado para todas as classes sociais, mesmo para a classe média pobre.

O modo como o Estado estabeleceu suas relações recebeu grande influência dos proprietários rurais. Estes estabeleceram fortes vínculos com a classe média pobre, por meio de casamento ou de apadrinhamento, e por não ter como lhes assegurar o provimento de suas necessidades, forçaram o Estado à absorção de seus indicados em cargos públicos, o que viria a se constituir atribuição própria deste ente. Com o tempo a composição deste estamento foi diversificando. A ideia do Estado empregador atravessa todas as fases da história do Brasil, muito menos nos dias atuais, e hoje com outros laços além do casamento ou apadrinhamento.

Com o desenrolar desta teia de relacionamentos, ocorreu o surgimento de um segmento na classe média que adquiriu com certa autonomia, além da garantia de seu sustento, um imenso poder político decorrente de sua relação com o Estado.

Essa elite patrimonialista estabeleceu alianças com a burguesia mercantil, senhores de terra e os grandes comerciantes, e dessa aliança começou a se diversificar e a ganhar autonomia. A elite dirigente era constituída de burocratas patrimonialistas. Burocratas porque sua renda derivava essencialmente do Estado, não mais da terra ou do mercantilismo e patrimonialistas porque os critérios de sua escolha “não são racional-legais” (Pereira, 2001, p. 6).

Assim, neste período o Brasil era dominado por uma elite política instruída e conservadora, que definia, de forma oligárquica, os rumos do País. Em decorrência, não havia democracia e as eleições não correspondiam à opinião da população. O povo, em sua maioria sem instrução, não tinha oportunidade de ascensão. Um grande hiato educacional contrapunha a maioria da população e os membros da elite política, que viam no Estado patrimonial o único empregador possível para recrutá-los e absorvê-los, sendo beneficiados, sobretudo, pela desconsideração de qualquer tipo de critério impessoal de seleção e de perspectiva de sua contribuição para o funcionamento da máquina estatal.

A gestão patrimonialista origina-se do patriarcalismo e, com ele, do poder doméstico organizado nas sociedades medievais. Caracteriza-se por uma gestão estritamente firmada pela tradição onde o gestor toma decisões conforme seu prazer, sua simpatia ou sua antipatia, e de acordo com pontos de vista puramente pessoais, sobretudo suscetíveis de se deixarem influenciar por preferências também pessoais. A administração do Estado e suas instituições, sob o princípio do patrimonialismo é

 

 

 

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uma questão puramente pessoal do gestor público, inexistindo, por este motivo, uma clara diferenciação entre as esferas pública e privada (Weber, 1989).

Numa gestão do tipo patrimonialista, o quadro administrativo é constituído de dependentes pessoais do gestor (familiares ou funcionários pessoais) ou de parentes, amigos, ou ainda por pessoas que lhe estejam ligadas por um vínculo de fidelidade (troca de favores). As relações que dominam o quadro administrativo não são as do dever ou a disciplina objetivamente ligada ao cargo, mas à fidelidade pessoal do servidor ao gestor. Neste modelo de gestão, a separação entre assuntos públicos e privados, entre patrimônio público e privado, desaparecem com a difusão do sistema de apropriações.

Em importantes instituições, como o clero e as forças militares, emergiram novas correntes ideológicas defendidas por integrantes que não partilhavam da mesma origem aristocrática e que começaram a forçar a adoção de novos padrões de conduta. Já não se tratava do mesmo estamento de outrora, mas, segundo Bresser Pereira: “É a administração pública burocrática que está surgindo, é o autoritarismo burocrático-capitalista que está emergindo através principalmente dos militares e das revoluções que promovem em nome de uma abstrata “razão”, cujas fontes capitalistas e burocráticas clássicas são claras.” (Pereira, 2001, p. 7).

1.3 O Estado autoritário-burocrático

Após a proclamação da República no Brasil, em 15 de novembro de 1889, através de um golpe militar, instala no país um regime com as seguintes características: republicana, federativa e presidencialista. Foi um período conturbado e de curta duração, com o governo de Deodoro da Fonseca, líder do movimento, e posteriormente Floriano Peixoto, ambos Marechais.

As perspectivas advindas do novo regime no curto período dos Presidentes militares não se concretizaram e, em 1894, a eleição do político e advogado paulista Prudente de Morais, primeiro civil eleito para esse cargo, restabeleceu a aliança do antigo estamento burocrático-aristocrático com a oligarquia, de predominância cafeeira. Como em todo processo dialético, o novo sempre mantém uma parte do anterior. No entanto, este retorno do estamento burocrático se sucedeu com a permanência significativa de militares do Exército na estrutura do poder. (Pereira, 2001, p. 8).

Foram esses militares, agora aliados ao poder e presentes na administração pública com seus representes da classe média tecnoburocrática, insatisfeitos com a falta de avanços no desenvolvimento econômico social e reformas na estrutura do poder, fundamentais ao ideário positivista dominante no seio do oficialato que intervirão em outros três momentos da história brasileira: Começo da Era Vargas

 

 

 

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(Governo Provisório: 1930-1934); 1945 (Término da Era Vargas) e 1964 (ditadura militar).

O período Vargas é um período de significativos avanços sociais, como a Consolidação das Leis Trabalhistas CLT, e avanços econômicos que exigiram além de uma moderna burocracia capacitada para assumir as grandes empresas, estatais ou privadas, uma burguesia industrial que surge no âmbito da burguesia mercantil. Outra característica do período diz respeito ao papel do Estado como provedor do “bem comum”.

O processo de transição histórica da Sociedade e do Estado, político ou administrativo, não ocorre linear e tranquilamente como as divisões didáticas aparentam. Ao contrário, são permeadas de avanços e recuos. O primeiro sinal de administração público gerencial ocorre no Brasil em 1938, quando o governo, através do Decreto-Lei nº 579, cria sob a forma de autarquia o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). Em 1945, Getúlio é deposto e o órgão perde a maioria de suas atribuições.

O período do governo Jânio Quadros, 31de janeiro de 1961 a 25 de agosto de 1961, foi mais um curto e conturbado período da história do Brasil. Jânio, eleito com uma votação significativa, não respondeu aos desafios que o momento exigia. Suas medidas econômicas e leis não tiveram o impacto esperado e, em plena Guerra Fria, assume uma política externa autônoma contrariando importantes setores conservadores internos, comprometidos com o capital nacional e internacional, além dos militares – o Presidente recebeu o cubano Ernesto Che Guevara no Palácio, condecorando-o com a maior honraria brasileira, e na mesma ocasião enviou seu Vice-presidente, João Goulart, à China com o objetivo de estreitar laços de cooperação.

As pressões e críticas da imprensa comprometida com grupos de direita aumentaram e, no dia 25 de agosto, Jânio renuncia ao governo. Em carta entregue ao seu Ministro da Justiça assim se justificou: “Fui vencido pela reação (...) Forças terríveis levantam-se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração”.1

A posse do vice Jango Goulart não foi pacífica, houve grande resistência principalmente dos ministros militares. A reação aos que obstruíram o cumprimento da Constituição foi organizada pelo Governador do Rio Grande do Sul.

                                                              

1 Brasil. Presidente (1961). Discursos selecionados do Presidente Jânio Quadros. 

Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009. Acessado em 01 de junho de 

2013, no site: 

http://www.funag.gov.br/biblioteca/dmdocuments/Discursos_janio_quadros.pdf

 

 

 

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O Congresso Nacional, através de Emenda à Constituição nº 4, aprovou o regime Parlamentarista, reduzindo o poder do Presidente e os militares recuaram. Em 7 de setembro de 1961, Jango, finalmente, assume a Presidência do Brasil. Após, mais um governo conturbado, em 31 de março de 1964, os militares pela quarta vez intervêm depondo o Presidente e encerrando o breve período democrático iniciado após as eleições de 1946. O governo militar permanecerá até 1985 quando teve início o gradativo retorno ao sistema democrático.

Em 1967, com significativa participação de civis, os militares iniciaram uma reforma administrativa pioneira com o Decreto-Lei 200. A proposta de desconcentração do poder proposto ocorreu paralela a uma maior centralização do poder político federativo na União. Os principais beneficiados desse processo de desconcentração foram as fundações de direito privado – embrião para as Organizações Sociais criadas a partir de 1995, as autarquias, as empresas de economia mista e as empresas públicas. (Pereira, 2001, pp. 14).

A reforma permitiu a viabilização do projeto industrial com a consolidação das grandes empresas estatais: companhia Siderúrgica Nacional, Petrobrás, Eletrobrás Telebrás e Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) e novas agências reguladoras como o Banco Central.

Em 1985, após a fase de transição, o país retorna ao regime democrático com o poder sendo novamente descentralizado para os estados, incluindo os municípios. Dois fatos são fundamentais para o entendimento desse período: primeiro, as eleições de 1982, conduzidas por partidos políticos populistas, cujos resultados representaram um significativo avanço das forças de oposição e, segundo, a crise do modelo de Estado intervencionista e desenvolvimentista.

Em meio a grandes mudanças no cenário da economia internacional, o governo não deu a devida atenção à crise da dívida externa – consequência do alto nível de endividamento externo do país para financiar o desenvolvimento na década de 70. A crise da dívida e a crise fiscal incapacitavam o Estado para a execução das políticas públicas. Em 1990 o Brasil convivia com um processo de hiperinflação – índice acumulado do ano 1.764,86%.2

Após o impeachment do Presidente Fernando Collor de Mello e a posse de seu vice-presidente Itamar Franco, em 29 de dezembro de 1992, o Ministério da Fazenda elabora o Plano de Estabilização Econômica que, associado com outras medidas, retoma o processo de reformas com uma perspectiva modernizadora.

                                                              

2 Passarelli, H. Inflação: um problema que não pode ser esquecido.  O Estadão de 

São Paulo.  Economia & Negócios. 07 de setembro de 2011. Acessado em 05 de 

abril de 2013, no site: http://economia.estadao.com.br/noticias/economia‐

brasil,inflacao‐um‐problema‐que‐nao‐pode‐ser‐esquecido,83215,0.htm

 

 

 

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1.4 A reforma no aparelho estatal do Brasil

Oportuno destacar que a crise econômica dos anos 80, que compreende a crise do Estado, é caracterizada em três vertentes: a crise fiscal, a crise do modo estatizante de intervenção do Estado, e a crise do modelo burocrático de gestão pública, segundo Bresser (2006, p. 239): “[...] a causa fundamental da crise econômica foi a crise do Estado- uma crise que ainda não está plenamente superada, apesar de todas as reformas já realizadas. [...] crise que se caracteriza pela perda da capacidade do Estado de coordenar o sistema econômico de forma complementar ao mercado. Crise que se define como fiscal, como uma crise do modo de intervenção do Estado, como uma crise da forma burocrática pela qual o Estado é administrado, e, em um primeiro momento, também como uma crise política.”

A crise fiscal é caracterizada pela perda do crédito público e pela poupança negativa, tornando o Estado incapaz de realizar suas políticas públicas. O conflito relacionado à intervenção do Estado, por sua vez, foi acelerado pelo processo de Globalização da economia mundial, ocasionando a crise do welfare state no primeiro mundo, o esgotamento da industrialização por substituição de importações na maioria dos países em desenvolvimento, e o colapso do estatismo nos países comunistas.

A crise do modelo burocrático de gestão pública refere-se principalmente à questão da eficiência dos serviços públicos. A Administração Pública burocrática não corresponde às necessidades das demandas dos serviços públicos orientados para os cidadãos. No desenvolvimento das atividades exclusivas do Estado, sobretudo nos serviços sociais de educação e saúde, este modelo burocrático evidencia-se como impotente e incapaz de oferecer um serviço de qualidade para atender as demandas dos cidadãos (clientes), assim, o Estado Social tem a necessidade de ser substituído por uma Administração Pública gerencial (Bresser, 1997).

Nesse contexto, é imposta ao Estado a redução do seu papel como executor ou prestador direto dos serviços públicos, para assumir o papel de regulador, com a função de coordenar e regular a prestação dos serviços orientados para os cidadãos.

Bresser Pereira (1997, p. 18) apresenta quatro processos básicos da reforma do Estado dos anos 90: a) delimitação das funções do Estado, reduzindo o seu tamanho, principalmente de pessoal, por meio de programas de privatização, terceirização e publicização; b) redução da interferência estatal, ficando apenas ao efetivamente necessário, convertendo o Estado em um promotor da capacidade de competição do país a nível internacional, e não mais de protetor da economia nacional contra a competição internacional; c) aumento da governança do Estado, tornando efetivas as decisões do governo, por meio do ajuste fiscal, devolvendo autonomia financeira ao Estado, da reforma administrativa dirigida a uma

 

 

 

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administração pública gerencial (ao invés de burocrática), e, por fim, d) aumento da governabilidade, isto é, a existência de instituições políticas que garantam uma melhor intermediação de interesses e tornem mais legítimos e democráticos os governos, aperfeiçoando a democracia representativa e abrindo espaço para o controle social ou democracia direta.

Em 1995, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, é criado o Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado – MARE -, e lançado um planejamento que tinha por objetivo modificar o modelo de administração pública no Brasil. Desse planejamento constava um plano diretor e uma emenda constitucional, a de nº 19/1998.54.

O Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE) era embasado em experiências de países europeus, principalmente o Reino Unido, e a estratégia usada pelo então ministro de Estado, Luiz Carlos Bresser-Pereira, era a de atacar a administração pública burocrática e ao mesmo tempo defender as carreiras de Estado e o fortalecimento da capacidade gerencial do Estado.

A Reforma Gerencial de 1995 baseia-se em um modelo que implica mudanças estruturais e de gestão. A reforma não estava interessada em discutir o grau de intervenção do Estado na economia, uma vez que hoje já se chegou a um razoável consenso sobre a inviabilidade do Estado mínimo e da necessidade da ação reguladora, corretora, e estimuladora do Estado.

A reforma na Administração Pública brasileira possuía cinco diretrizes: a) Institucionalização – por meio da reforma da própria Constituição; b) Racionalização – aumento da eficiência por corte de gastos sem perda da “produção”, fazer mais com menos; c) Flexibilização – maior autonomia aos gestores públicos de recursos humanos; d) Publicização – transferência para organizações públicas não estatais de serviços não exclusivos do Estado, principalmente na saúde, educação, cultura, ciência, tecnologia, e meio ambiente; e) Desestatização – privatização, terceirização e desregulamentação.

A emenda constitucional mencionada acima traça a ideia principal de tornar mais flexível o sistema existente de estabilidade total aos servidores públicos, bem como eliminar o regime único para a contratação de pessoal do Estado. Assim, quanto ao pessoal do Estado, a reforma objetivava uma gestão pública mais eficiente, motivando profissionais competentes e punindo aqueles “incompetentes”; uma política remuneratória; recrutamento e seleção de servidores para as “carreiras de Estado”; e a eliminação de privilégios indevidos.

Há em andamento a construção de um modelo de gestão pública voltada para uma maior participação da sociedade. Trata-se da gestão pública compartilhada. A gestão pública compartida se traduz em uma alternativa viável ao modelo de gestão pública gerencial, principalmente em virtude da crise de legitimidade enfrentada pelo Estado contemporâneo.

 

 

 

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A reforma do Estado sugerida consiste em um Estado que promova a justiça social, em conjunto com a proteção das garantias individuais, como o contrato e a propriedade, além do desenvolvimento nacional. O estabelecimento de parcerias da Administração Pública com a iniciativa privada aparece como uma das primeiras alternativas para a superação da crise. As estatísticas governamentais apontam para o aumento da demanda dos serviços públicos, que faz crescer o chamado setor público não-estatal a fim de somar forças com a Administração Pública, que já se demonstrou incapaz de solucionar toda a demanda sozinha.

Assim, verificar-se que, a partir dos anos 80, o Estado entra em crise econômica. A crise econômica, compreendida nas vertentes de crise fiscal, crise do modo estatizante de intervenção do Estado e crise do modelo burocrático de gestão pública, fundamenta a Reforma do Estado. A Reforma do Estado tem a finalidade de repensar o papel fundamental do Estado, inclusive no que diz respeito às suas funções. As ideias trazidas pela Reforma do Estado indicam a redução do papel estatal executor ou prestador direto dos serviços públicos, para um Estado coordenador e regulador das atividades públicas. A mudança traz em seu bojo o ápice do princípio da eficiência dos serviços públicos, com significativa redução de custos.

Essa administração pública gerencial, que é influenciada em grande parte pelo modelo de eficiência em que o setor privado se baseia, surge como resposta à necessidade de um novo modelo de administração estatal, em virtude do crescimento dos anseios sociais no mundo ocidental. Os países onde essa revolução mais se acentuou foram o Reino Unido, a Nova Zelândia e a Austrália.

1.5 O modelo gerencial do Estado

No modelo gerencial o cidadão é visto como um cliente dos serviços públicos, e a satisfação do “cidadão-cliente” é um dos principais objetivos a serem alcançados. A reestrutura do Estado preconizado pela Reforma indica uma mudança no aparelho estatal no que diz respeito à satisfação positiva da demanda nos serviços básicos à população.

Todavia, não há um rompimento total com o paradigma burocrático, pois o modelo gerencial se apoia em vários princípios daquele, como a admissão por mérito (concurso público); um sistema de servidores públicos estruturado (plano de carreira); o treinamento contínuo e avaliação de desempenho dos funcionários públicos.

A profissionalização da administração pública ainda é um ponto em comum de ambos os modelos (burocrático e gerencial). No modelo gerencial há os princípios da descentralização de decisões, da confiança no servidor, da flexibilização de gestão, de estruturas horizontalizadas e incentivos à criatividade. Foram somadas a avaliação sistemática, permanente capacitação e gratificação por desempenho, características do modelo burocrático, ao controle por resultados e a satisfação do cidadão-cliente, princípios do paradigma gerencial.

 

 

 

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O enfoque gerencial da administração pública emerge na Grã-Bretanha e nos EUA, após a assunção de governos conservadores, em 1979 (Thatcher) e com Reagan em 1980 (Bresser-Pereira, 2001). Na Grã-Bretanha, uma série de programas foi implantada (Unidades de Eficiência; Próximo Passo e Direitos do Cidadão), tornando o serviço público mais flexível, descentralizado, eficiente e mais voltado para o cidadão, perdendo seus traços burocráticos e ganhando características gerenciais.

Nos EUA, é estabelecida a meta de reformar a administração pública norte-americana por critérios gerenciais, quando o presidente Clinton converteu a ideia “reinventar o governo” (reinventing government) em programa de governo: a National Performace Reiview (Revisão do Desempenho Nacional). Na França, reformas semelhantes começaram em 1989, no governo de Michel Roccard (Bresser-Pereira, 2001).

A reforma gerencial do Estado tem de ser compreendida no âmbito de duas grandes forças que moldaram a sociedade contemporânea do século XX, a globalização e a democracia social. De um lado, a globalização, o fato de o capitalismo haver-se tornado dominante em nível mundial, e os mercados terem sido todos abertos para a competição capitalista. De outro lado, a democracia social, o fato de que na segunda metade do século XX, principalmente na Europa, o Estado passou a garantir também os direitos sociais. Para isso criou grandes serviços sociais e científicos de educação, saúde, pesquisa, previdência e assistência social, que exigiram que a administração pública fosse efetiva e eficiente (cumulando aspectos da Administração burocrática e gerencial).

No Brasil, após o fim da ditadura militar, no governo do presidente Sarney, foi criada a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP), que tinha o objetivo de formar novos dirigentes públicos. Isso se deu em meio à reforma denominada Nova República, na qual se buscava como fim a racionalização da estrutura administrativa e dos gastos com a máquina estatal.

Com o advento da Constituição da República de 1998, ficaram explícitos os princípios da administração pública (art. 37, caput), bem como a obrigatoriedade de concurso público para a investidura em cargo ou emprego público (art. 37, inc. II).

Ainda, na Constituição Federal, houve a transformação de mais de 400 mil funcionários celetistas (das fundações a autarquias) em estatutários, garantindo a aposentadoria por tempo de serviço e com valor 120 (cento e vinte) por cento maior que o último salário, agravando a crise fiscal.

A partir de 1990, no governo do presidente Collor, surge um movimento tendente a romper com a herança varguista, por meio da abertura comercial, desestatização, desregulamentação socioeconômica, quebra de monopólios, reformas previdenciária e administrativa. Todavia, essas medidas não se

 

 

 

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concretizaram firmemente na estrutura sociopolítica do país, o que define, na visão de Lustosa da Costa (2010, p. 78), uma “era Vargas contra Vargas”.

Em seguida, inicia-se a implantação efetiva da reforma do aparelho do Estado no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso.

1.6 O Estado do bem-estar social

O Estado do bem-estar (Welfare state), ou Estado Assistencial, pode ser definido, à primeira análise, como Estado que garante “tipos mínimos de renda, alimentação, saúde, habitação, educação, assegurados a todo cidadão, não como caridade mas como direito político” (H. L. Wilensky, citado em Bobbio, 1986, p. 416).

Segundo Sànchez (1999, p. 241), o núcleo histórico do Estado de Bem-estar, no âmbito do qual surgiram as Parceria Público-Privadas, tem sua origem no momento em que as providências da família, iniciativa privada e as instituições religiosas de caridade do Estado moderno, são substituídas pela providência pública. Substituições que foram implantadas, gradativamente, com o objetivo de atender as situações de absoluta pobreza, crescente, consequente ao desenvolvimento da Revolução Industrial.

A concretização do conceito de segurança socioeconômica, do Estado contemporâneo, reflete na substituição do princípio caritativo-paternalista pelo princípio assegurador-contributivo e esse momento é referido por alguns autores como a “liberal break”, ruptura liberal (Sànchez, 1999, p. 241).

Em sua forma moderna as PPPs surgiram na Inglaterra na década de 70, com o nome PFI Private Finance Iniciative, em meio a um cenário de crise. Coincide com o momento do Estado inglês em que se agrava o descompasso entre a disponibilidade de recursos para a manutenção das estruturas e serviços necessários à manutenção do Estado de Bem-estar (Welfare state).

Para uma melhor compreensão daquele momento temos que nos reportar à década de 40, momento em que o Estado inglês consolida o princípio de que: “independentemente de sua renda, todos os cidadãos, como tais têm direito de ser protegidos” (Bobbio, 1986, p. 417). Os motivos pelos quais o Estado inglês, e em pouco tempo outros países, que assumiram políticas assistenciais – nas áreas de educação, saúde, habitação e principalmente previdência social (assistência ao desempregado, ao doente, a velhice etc.) – depende da ótica de quem formula a opinião.

Sànchez, (2001) considera três fatores como participantes no processo de concretização do Estado de Bem-estar: a) tradição de criar associações de

 

 

 

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trabalhadores à margem do Estado; b) o aparecimento da absoluta pobreza nos aglomerados humanos urbanos e c) e a crise do princípio de responsabilidade compartilhada entre empresa e trabalhadores no que diz respeito aos acidentes de trabalho.

Durante os governos militares várias políticas comuns aos Estados de Bem-estar foram implementadas: o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRARAL); a inclusão de novas categorias profissionais no sistema previdenciário; trabalhadores domésticos em 1972, trabalhadores por conta própria em 1973, trabalhadores temporários de empresas em 1974; a concessão de renda mensal vitalícia para os idosos acima de 70 anos e deficientes em 1974 etc. (Benevides, 2011, p. 63).

O início da Nova República, 1985, motivou uma maior participação popular na definição dos rumos políticos do Estado através do processo eleitoral e na elaboração da Constituição de 1988. A nova Constituição introduz o termo “(...) “Seguridade Social”, como um conjunto de ações integradas envolvendo Saúde, Assistência e Previdência Social.”

No Brasil, portanto, houve um esboço de implantação do Estado de Bem-Estar Social nas décadas de 1970 e 1980. Todavia, o modelo não seria aplicado como investimento produtivo para sociedade, mas de forma assistencialista. Logo, o que se verificou foi a manutenção da acentuada desigualdade social, os elevados índices de pobreza e o insucesso no Índice de Desenvolvimento Humano.

O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, 1994-2002, assumiu o modelo Neoliberal como direcionador do Estado, fazendo a contraposição. Seu sucessor, Luís Inácio “Lula” da Silva, recuperou as ideias do Estado Providência, investindo em policiais sociais que resultaram na diminuição dos índices de pobreza. No entanto, os investimentos em políticas sociais ainda são pequenos e mal administrados no Brasil.

1.7 O Estado Democrático de Direito e gestão pública moderna

Analisando a formação do Estado e suas modificações, pode-se identificar o Estado Liberal de Direito, o Estado Social de Direito e, então, o surgimento de um modelo novo, o Estado Democrático de Direito. Esse novo modelo formou-se a partir dos conceitos neoliberais e pós-intervencionistas, restando um Estado regulador, garantidor e planejador do desenvolvimento econômico e social.

José Afonso da Silva (2012, p. 126) indica a tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito: “A tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social.” A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi promulgada com evidências claras voltadas à democracia e ao

 

 

 

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social, sendo considerada a Carta Cidadã do Brasil e, o Estado Democrático de Direito está fortemente organizado no seu texto.

A expressão “Estado Democrático de Direito” está consagrada no Preâmbulo da Constituição como princípio basilar. O artigo 1º, caput, da Constituição Federal, utiliza a referida expressão, enunciando como seus “fundamentos a soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político” – todos supõe a participação democrática dos membros da coletividade popular brasileira.

São princípios concretizadores do Estado Democrático de Direito: a) princípio da supremacia da Constituição Federal, emanada da vontade popular; b) princípio democrático exigindo funções democráticas, sociais e de garantia do Estado democrático de direito; c) sistema de direitos fundamentais determinando os direitos individuais, coletivos, sociais e culturais; d) princípio da justiça social, como princípio da ordem econômica e da ordem social; e) princípio da igualdade, f) princípios da divisão de poderes e da independência do juiz; g) princípio da legalidade da administração; h) princípio da segurança jurídica, conduzindo à consecução do princípio de determinabilidade das leis (José Afonso da Silva, 2012, p. 120).

Um princípio básico de uma gestão democrática é a separação plena do quadro administrativo e os meios administrativos e de produção. Isto significa dizer, que os funcionários, empregados e trabalhadores a serviço de uma organização pública não são proprietários dos meios materiais de administração e produção, mas remunerados em espécie ou dinheiro, e estão sujeitos à prestação de contas (Weber, 1989). Numa gestão baseada no princípio democrático, a relação entre o funcionário público e o gestor se dá por meio de um contrato com regras fixas, claras e universais.

Nesta relação o trabalho profissional se dá em virtude do dever objetivo do cargo. Seu ideal é proceder sem a menor influência de motivos pessoais e sem influências sentimentais de espécie alguma, livre de arbítrio e capricho e, particularmente, sem consideração da pessoa, segundo regras racionais ou, quando elas falham, segundo pontos de vista de convivência objetiva. A base do funcionamento técnico é a disciplina do serviço. Existe neste caso, uma separação completa entre o patrimônio público (do cargo) e o patrimônio privado e, entre o trabalho e o lar (Weber, 1989, p. 129).

A concepção de Estado Democrático de Direito tem por finalidade o aprofundamento da democracia participativa, na obediência do princípio da igualdade real entre todos os cidadãos. Esse modelo objetiva a melhora das condições sociais de existência dos indivíduos, efetivando os valores da igualdade material, solidariedade e justiça social. O Estado Democrático de Direito nos remete à ideia de Estado Subsidiário ou Estado Regulador, o que significa dizer que o Estado deve ter sua atuação limitada.

 

 

 

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O Estado deve fomentar a economia, fiscalizar e coordenar a iniciativa privada em suas atividades econômicas, o que não significa o retorno do Estado Mínimo, pois o Estado exercerá, além das atividades essenciais típicas do Poder Público, também as atividades sociais e econômicas que a iniciativa privada não desenvolver ou não atender satisfatoriamente; enquanto que, no Estado Mínimo, há uma delegação total das atividades econômicas à iniciativa privada.

Este modelo caracteriza-se pela forte onda de privatizações, pelo crescimento das técnicas de fomento e pelas várias ferramentas de parcerias celebradas entre a Administração Pública e a iniciativa privada.

1.8 Administração pública e gestão compartida

Hodiernamente, o conceito de administração pública é entendido como um conjunto de ações e regras jurídicas inerentes à realização dos fins que o Estado objetiva. Ainda, como ensina Rogério Gesta Leal (2006, p. 38): “De certa forma, o conceito de Administração Pública, assim, tem-se sintetizado como um conjunto harmônico e sistêmico de princípios, regras e ações jurídicas que regem os órgãos, os agentes e as atividades públicas, tendentes a realizar concreta, direta e imediatamente os fins desejados pelo Estado.”

Consoante o entendimento de Rogério Gesta Leal (2006, p. 42), a compreensão do perfil social do povo brasileiro, a partir da Constituição de 1988, é essencial para se pensar em qualquer forma de Administração Pública Democrática de Direito que se pretenda legítima e eficaz, na modalidade de compartilhamento de competências, deveres e direitos. Pode-se afirmar, portanto, que a partir da Carta Política de 1988 tem-se um redesenho mais saliente para um modelo de gestão compartida onde, fundamentadamente, o papel que a sociedade assume nessa questão é muito importante, tanto na direção de uma participação ativa, quanto no sentido de sujeito de direitos.

De acordo com Jorge Amaral dos Santos (2012), os modelos de democracia representativa ou participativa institucionais não mais satisfazem às necessidades de participação social na administração da coisa pública. O sistema de representação político-institucional, tanto no Brasil como na maioria dos países de democracia liberal, vive uma crise de legitimidade. Essa crise se dá em virtude de várias causas, entre as quais: administração pública burocratizada e autoritária; inexistência de ferramentas de controle, por parte do cidadão, sobre o político eleito; sistema eleitoral desvirtuado da vontade do eleitor; a prática do eleito não coaduna com seu discurso de campanha; trocas de partido, ao abrigo da lei; sistemas eleitorais como instrumento de desigualdade e exploração social.

A soberania popular, com algumas exceções, tem oportunidade de exercício além dos pleitos eleitorais periódicos, o que, sabe-se, serve apenas para

 

 

 

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aprofundamento da exclusão social vivida em nossa sociedade contemporânea. A gestão pública é, por vezes, voltada muito mais ao interesse privado que ao público.

Não é, todavia, essa a Administração Pública que consegue atender o algo grau de complexidade das demandas sociais que se proliferam, vez que está muito mais preocupada em desenvolver estratégias de gestão concentrada nos corredores do poder e em projetos privados transformados em públicos, do que propriamente em atender os reclamos oriundos da matriz associativa que deu causa à sua própria existência. (Rogério Gesta Leal, 2012).

Como resposta alternativa ao modelo contemporâneo de gestão pública se nos apresenta a gestão compartida, onde a participação social tem um viés mais significativo, corporificada através de subsistemas privados, traduzidos em associações, organizações civis e toda espécie de representação popular, pautadas por interesses comunitários que desaguam no efetivo cumprimento dos anseios sociais.

O Estado vem procurando novas formas de relacionamento entre os setores público e privado, tendo em vista a escassez de recursos públicos para fazer frente a investimentos em setores de responsabilidade do poder público, mormente nas áreas de transportes (rodovias, ferrovias, portos e aeroportos) saneamento (água e esgotos), sistema penitenciário, setor energético e obras de infraestrutura. Diversos países têm buscado modelos de gestão, onde a participação do setor privado em investimentos de grande interesse público e social tende a se tornar mais ativa.

No Brasil, as parcerias público-privadas foram normatizadas em nível federal com a Lei nº 11.079/2004, que instituiu as normas gerais para licitação e contratação de parceria público-privada no âmbito da Administração Pública. No capítulo seguinte, será tratada a importância desse instituto, na tentativa de se estabelecer condições e possibilidades para uma efetiva utilização de parceria público-privada no Estado do Ceará, objeto último desse trabalho, especialmente na construção da Arena Castelão, um dos estádios que irão sediar a Copa 2014 no país.

1.9 Parceria público-privada: o modelo contemporâneo de Gestão Pública

Conforme Miranda (2004), a sociedade brasileira, após décadas de uma forte presença do Estado no domínio econômico, deparou-se com o esgotamento da capacidade de financiamento deste modelo. A partir do meio da década de 1980, como visto, o Estado mostrava-se ineficiente para suprir, com excelência, todos os serviços demandados pela sociedade.

Posteriormente, constatou-se que a iniciativa privada poderia assegurar desenvolvimento e mudanças positivas a uma maior velocidade ou a um alto nível de excelência, superiores aos esforços individuais do governo, viabilizando projetos

 

 

 

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que não seriam possíveis sem a entrada das empresas, especialmente no financiamento de infraestrutura e, também, de pesquisa e prestação de serviços em geral.

Um ponto facilitador para a entrada do ator iniciativa privada é a reforma gerencial que vem ocorrendo na administração pública, não apenas no Brasil, mas também em vários países. O novo modelo gerencial que vem sendo adotado tem como inspiração as transformações organizacionais ocorridas no setor privado, as quais têm alterado a forma burocrático-piramidal de administração, flexibilizando a gestão, diminuindo os níveis hierárquicos e, por conseguinte, aumentando a autonomia de decisão dos gestores públicos (Gouveia, Abdalla e Calvosa, 2013).

O êxito de um determinado projeto de desenvolvimento nacional regional ou local não depende apenas da capacidade do Estado em cumprir com o seu papel, pois apesar de existirem iniciativas restritas aos limites de atuação do Estado, existem diversas ações que dependem de outros atores, como empresas, organizações não governamentais e demais entidades. Assim, o desafio, além de realizar os esforços internos, é articular, negociar e pactuar compromissos com estes atores externos de forma a assegurar os resultados pretendidos.

Atualmente, a norma que regula em âmbito federal as parcerias público-privadas é a Lei no. 11.079/2004, que foi sancionada após um ano de intenso debate político e civil. A doutrina diverge no tocante à origem das PPPs no Brasil. No entanto, apurou-se que o cenário é o de redução da participação do Estado na economia. Esta redução está ligada à escassez de recursos públicos e à ampliação de ofertas de atividades públicas para a atuação da iniciativa privada.

Alguns doutrinadores afirmam, inclusive, que as relações entre o setor público e o setor privado sempre existiram, com o objetivo de concretizar empreendimentos de relevante interesse social. As parcerias entre Administração Pública e particulares estão presentes em todas as fases históricas governamentais. O capital privado, em sintonia com as necessidades do povo, sempre teve sua importância nas gestões públicas.

A crise do Estado constata insucesso da Administração Pública como gestora, e a parceria público-privada, objeto do presente estudo, é uma das alternativas encontradas para a redução do aparelho administrativo estatal. Outras formas de parcerias também são identificadas no ordenamento pátrio, podendo ser citadas a permissão, a autorização e a concessão tradicional de serviços públicos. A parceria público-privada é uma modalidade de concessão, com muitas peculiaridades a serem estudadas e, atualmente, tem sido bastante aplicada nos projetos de infraestrutura necessários à realização da Copa 2014, no Brasil.

2. Das concessões comuns às parcerias público-privadas

 

 

 

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Diante da incapacidade do Estado de cumprir eficientemente com suas obrigações na aplicação de recursos públicos, realidade decorrente de políticas intervencionistas excessivas, havia de ser aprimorado e difundido um sistema eficiente de descentralização e delegação de atividades tradicionalmente estatais à iniciativa privada, para desonerar o Estado e possibilitar sua atuação eficiente nas tarefas indispensáveis.

Atualmente, a Administração deve descentralizar e delegar as atividades que possam ser executadas por particulares, por isso todos os países passaram a ter um sistema de prestação de serviços públicos e investimentos em infraestrutura por meio de concessões com a iniciativa privada. Esse novo modelo de gestão tem uma importância crescente e exige um posicionamento construtivo e sistemático do legislador, tanto no plano federal quanto estadual e municipal.

A concessão comum, de acordo com a lição de Celso Antonio Bandeira de Mello (2012, p. 659), é o instituto através do qual o Estado atribui o exercício de um serviço público a alguém que aceita prestá-lo em nome próprio, por sua conta e risco, nas condições fixadas e alteráveis unilateralmente pelo Poder Público, mas sob garantia contratual de um equilíbrio econômico financeiro, remunerando-se pela própria exploração do serviço, em geral e basicamente mediante tarifas cobradas diretamente dos usuários do serviço.

A leitura do conceito oferecido revela que, nesta espécie de delegação, a condição que norteia a prestação de serviços ou exploração de obra pelo agente particular reside justamente na aceitação de o mesmo prestá-lo ou explorá-lo por sua conta e risco. Isso quer dizer que, na concessão comum, é necessário que o concessionário busque sua remuneração, para a amortização do capital investido, custeio da operação e lucro empresarial, na própria exploração do serviço público ou obra, através, básica e primordialmente, da cobrança direta de tarifas do usuário

Convém ressaltar que a delegação por concessão comum norteia-se pela rentabilidade e sustentabilidade econômica da exploração do serviço. Essas atividades, por guardarem natureza comercial ou industrial, podem ser economicamente exploradas pela lógica mercadológica comum.

Excluem-se da possibilidade de delegação por concessão comum os serviços próprios e exclusivos do Estado, que não podem ser delegados por fazerem referência a atividades que devem, necessariamente, ser prestadas pelo Ente político, e os serviços de natureza predominantemente social, em que, embora se pudesse identificar o tomador do serviço, dado seu caráter de generalidade e gratuidade não comportam exploração econômica.

2.1 Conceito de parceria público-privada no Brasil

 

 

 

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A Comissão Europeia, no documento CE (2004, p. 3) afirma que as parcerias público-privada não estão definidas a nível comunitário: “É uma expressão que se refere, em geral, a formas de cooperação entre as autoridades públicas e as empresas, tendo por objectivo assegurar o financiamento, a construção, a renovação, a gestão ou a manutenção de uma infra-estrutura ou a prestação de um serviço”.

Para a CE as principais características das PPP são: a) o longo tempo de relação e cooperação entre os parceiros público e privado; b) o modo de financiamento assegurado pelo parceiro privado através de complexas montagens jurídico-financeiras; c) o importante papel do agente econômico que participa em diferentes estágios do processo, enquanto ao setor público compete definir objetivos a alcançar, definir qualidade dos serviços prestados, política de preço e controle do cumprimento dos objetivos; d) distribuição dos riscos entre parceiros, privado e público, definida caso a caso (CE, 2004, p. 3).

A Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE) segundo Fernandes (2012) define PPP como:

“(...) um contrato entre um governo e um ou mais parceiros privados (que podem incluir os operadores ou financiadores), de acordo com o qual o parceiro privado presta um serviço de maneira tal que os sejam respeitados os objectivos do governo e alinhados com o objectivo do parceiro privado (o lucro), sendo estes objectivos dependentes de uma transferência considerável de risco para os parceiros privados. Os elementos essenciais desta definição são quatro: transferência de risco; prestação de um serviço; objectivos gerais definidos pelo parceiro público; e remuneração ao sector privado”.

Decreto-Lei do Ministério das Finanças de Portugal (Decreto-Lei n.º 111/2012 de 23 de maio) em seu Art. 2.º item 1, interpreta PPP como: “(...) o contrato ou a união de contratos, por via dos quais entidades privadas, designadas por parceiros privados, se obrigam, de forma duradoura, perante um parceiro público, a assegurar o desenvolvimento de uma actividade tendente à satisfação de uma necessidade colectiva, e em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem, no todo ou em parte, ao parceiro privado”

Ainda em Portugal, Santos et ali. (2004, p. 195) definem PPPs incluindo características fundamentais da modalidade: “uma relação por um prazo determinado entre duas ou mais organizações – uma ou mais de natureza pública e uma ou mais de natureza privada ou social – baseada em expectativas e valores mútuos, com o objectivo de alcançar objectivos negociais específicos, através da maximização da eficácia dos recursos de ambas as partes. As PPPs são, portanto, caracterizadas pelo

 

 

 

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facto de partilharem investimento, risco, responsabilidade e resultados (Santos et al., 2004: 195)”. (Citado em Gomes et ali. 2007, p. 10).

Segundo Gomes et ali. (2007, p. 11) as definições de vários autores apresentam alguns pontos comuns: a) é um contrato entre parceiros públicos e privados; b) a longo prazo; c) objetivando provisão de serviços públicos; d) abrangendo várias etapas, do planejamento ao fornecimento dos serviços; e) visando “valor acrescentado mútuo”: para o setor público VFM e lucro para o setor privado; f) com divisão de “custos, riscos e proveitos” entre os parceiros e g) contra renumeração ao parceiro privado, pelo Estado e/ou usuários, condicionado aos resultados.

Fernandes (2012), após contextualizar teoricamente e analisar alguns conceitos de PPP em diferentes países – Portugal, Reino Unido, Estados Unidos, Brasil e Austrália, e organizações internacionais, OCDE, Banco Europeu de Investimento (BEI) e Fundo Monetário Internacional (FMI) –, propõe uma definição abrangente para PPP: “Parcerias Público-Privadas são contratos ou uma união de contratos entre uma entidade pública, por um lado, e uma entidade privada, por outro, para a prestação de serviços, infra-estruturas ou outros bens de utilidade pública, a ser realizada em conjunto e financiada predominantemente pelo parceiro privado, seguindo objectivos definidos pelo parceiro público, por um período de longa duração, no qual existe uma partilha de riscos entre os parceiros e devendo o parceiro privado ser remunerado pela sua participação”.

Segundo Carlos Ari Sundfeld (2012), a parceria público-privada, em sentido amplo, deve ser compreendida como “múltiplos vínculos negociáveis de trato continuado estabelecidos entre a Administração Pública e particular para viabilizar o desenvolvimento, sob a responsabilidade destes, de atividades com algum coeficiente de interesse geral.”

Igualmente Diógenes Gasparini expõe acerca do conceito de parcerias, nos sentidos amplo e restrito: Em sentido amplo, a parceria público-privada é todo ajuste que a Administração Pública, em qualquer de seus níveis, celebra com um particular para viabilizar diversos programas voltados ao desenvolvimento socioeconômico do país e ao bem-estar da sociedade, como são as concessões de serviços, as concessões de serviços precedidas de obras públicas, os convênios e os consórcios públicos.

Em sentido estrito, ou seja, com base na Lei federal das PPPs, pode-se afirmar que é um contrato administrativo de concessão por prazo certo e compatível com o retorno do investimento privado, celebrado pela Administração Pública com certa entidade particular, remunerando-se o parceiro privado conforme a modalidade de parceria adotada, destinado a regular a prestação de serviços públicos ou a execução de serviços públicos precedidos de obras públicas ou, ainda, a prestação de serviço em que a Administração Pública é usuária direta ou indireta, respeitado sempre o risco assumido.

 

 

 

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A parceria público-privada é reconhecida como nova espécie de delegação de atividades de satisfação de interesse público, cujas diferenças principais, em relação às concessões comuns, residem no valor econômico dos projetos que se pretendem viabilizados, na duração do ajuste e na disciplina jurídica da remuneração ao particular, dentre outras.

Com efeito, a identificação do conceito jurídico de parceria público-privada leva em consideração o texto da própria Lei n° 11.079, de 30 de dezembro de 2004, que fornece ao intérprete importantes subsídios. A Lei de Parcerias Público-Privada conceitua o instituto no caput de seu artigo 2º, referindo-se a contrato administrativo de concessão, em duas modalidades: patrocinada ou administrativa.

A natureza jurídica da relação entre a Administração Pública e a iniciativa privada, no âmbito das parcerias público-privadas, é de natureza contratual, Em relação aos prazos de validade contratual, a Lei dispõe expressamente que o prazo de vigência do contrato não pode ser inferior a 5 (cinco) anos e nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, e que ainda este prazo deve ser compatível com a amortização dos investimentos realizados.

Os princípios inerentes aos contratos de parcerias público-privadas, como o princípio da equidade, da razoabilidade, da continuidade, da indisponibilidade do interesse público, entre outros, sugerem um equilíbrio econômico-financeiro entre as partes contratantes. O artigo 5º, III e IV da Lei Federal, prevê que os riscos inerentes ao contrato são repartidos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e a álea econômica extraordinária.

Aplica-se à disciplina contratual de concessão o regime jurídico de direito público, tendo em vista que a concessão é ato administrativo formal e solene por meio do qual o poder concedente outorga ao particular o direito de explorar determinada atividade econômica (Celso Antonio Bandeira de Melo, 2012).

2.2 Modalidades de parcerias público-privadas no Brasil

No Brasil, a Lei nº 11.079, de 30 de Dezembro de 20043, em seu Art. 2º define parceria público-privada: “Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na modalidade patrocinada ou administrativa”. Em seus incisos detalha as modalidades de contratação e estabelece algumas condições para as contratações:

                                                              

3 Lei nº 11.079, (204). Câmara dos Deputados. Acesso em XX de março de 2012: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2004/lei-11079-30-dezembro-2004-535279-ublicacaooriginal-22998-pl.html

 

 

 

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“§ 1º Concessão patrocinada é a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.

§ 2º Concessão administrativa é o contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens.

§ 3º Não constitui parceria público-privada a concessão comum, assim entendida a concessão de serviços públicos ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, quando não envolver contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.

§ 4º É vedada a celebração de contrato de parceria público-privada: I - cujo valor do contrato seja inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais);

II - cujo período de prestação do serviço seja inferior a 5 (cinco) anos; ou

III - que tenha como objeto único o fornecimento de mão-de-obra, o fornecimento e instalação de equipamentos ou a execução de obra pública”.

A modalidade patrocinada corresponde, de acordo com o art. 2º, §1º da Lei n° 11.079/04, à outorga à iniciativa privada da exploração de serviço ou obra pública, em que, ao lado das tarifas cobradas diretamente do usuário, a contraprestação pecuniária do parceiro público compõe a remuneração do parceiro privado.

A modalidade de concessão administrativa de parceria público-privada, por sua vez, nos termos do art. 2º, §2º da Lei n° 11.079/04, consiste “no contrato de prestação de serviços de que a Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva a execução de obra ou o fornecimento e instalação de bens”. Nesta espécie de concessão não se fala em serviço público em sentido estrito, nos termos contemplados pela modalidade patrocinada, justamente por se pretender delegados serviços públicos em sentido amplo, em que a Administração faz o papel de usuário para efeito de custeio integral da atividade.

Assim, enquanto que na modalidade patrocinada a remuneração do parceiro privado é composta, simultaneamente, de tarifas pagas diretamente pelos usuários e de contraprestação pecuniária do parceiro público, na modalidade administrativa quem remunera integralmente o parceiro privado é o parceiro público.

Ao lado da diferença quanto às fontes de remuneração observadas em suas espécies já sucintamente identificadas nas modalidades patrocinadas e administrativas, e do reconhecimento do regime jurídico aplicável, outro importante subsídio para a composição do conceito jurídico da parceria público-privada está no tratamento dado ao risco. Com efeito, o tratamento do risco nas parcerias público-privadas pode ser apontado como um de seus traços mais importantes.

 

 

 

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Ainda com amparo no próprio texto da Lei n° 11.079/04, acaba revelando-se de extrema utilidade entender o art. 2o, § 4o, do mesmo diploma normativo, que prescreve: “Art. 4o Na contratação de parceria público-privada serão observadas as seguintes diretrizes: [...] VI – repartição objetiva de riscos entre as partes. Art. 5o As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: [...] III – a repartição de riscos entre as partes, inclusive os referentes a caso fortuito, força maior, fato do príncipe e álea econômica extraordinária limitações à aplicação do contrato de parceria público-privada. De acordo com o dispositivo em comento, veda-se a utilização da parceria público-privada para projetos cujo: a) valor seja inferior a vinte milhões de reais; b) período de prestação do serviço seja inferior a cinco anos; c) objeto único seja o fornecimento de mão-de-obra, instalação de equipamentos ou a simples execução de obra pública.

Atribui-se, consequentemente, ao parceiro privado, ao lado da necessidade de um aporte considerável de recursos, um razoável lapso contratual capaz de possibilitar a amortização do capital investido a médio e longo prazo. E, ressalte-se, impede o uso de parcerias público-privadas aos casos de simples fornecimento de mão-de-obra, instalação de equipamentos ou execução de obra, situações já consagradas pela Lei n° 8.666/93.

Pedro de Menezes (2007), em resumo, afirma que:

a) as modalidades de parceria público-privada são admitidas por Lei como espécies de concessão, em que, diferentemente das concessões comuns ou tradicionais, o parceiro privado obtém do parceiro público contraprestação que lhe remunera integralmente ou em adição às tarifas cobradas do usuário;

b) nesta forma de delegação de serviços ou obras públicas, e de outras atividades destinadas à satisfação de interesses públicos, sublinha-se o compartilhamento de parte dos riscos entre os parceiros, operado através da repartição objetiva dos riscos entre as partes;

c) as parcerias são aplicáveis a projetos de vultoso valor econômico (de, no mínimo, vinte milhões de reais), com estendido prazo de duração (de cinco a trinta e cinco anos), para situações que não configurem simples fornecimento de mão-de-obra, instalação de equipamentos ou execução de obra, já abrangidas pela disciplina da terceirização.

Desse modo, parceria público-privada é espécie de contrato administrativo de delegação de atividades destinadas à satisfação de interesses públicos ou exploração de obra pública, com, pelo menos, a repartição - entre os parceiros - dos riscos inerentes à atividade, de prazo de duração prolongado e de vultoso valor econômico, em que se sublinha a existência de contraprestação pública ao parceiro privado para a remuneração da atividade, de modo integral quando, para efeito de

 

 

 

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seu custeio, o tomador da atividade for o parceiro público, ou em adição à tarifa, quando o serviço ou obra pública comportar cobrança direta dos usuários.

2.3 Argumentos favoráveis e desfavoráveis das parcerias público-privadas

De acordo com a Comissão Europeia, seis são as vantagens fundamentais que justificam a realização de uma PPP: • A transferência de riscos; • Natureza de longo prazo; • Uso das especificações baseadas no resultado; • Concorrência; • Avaliação de performance e incentivos; e • Habilidades gerenciais do setor privado (Comissão Europeia apud BORGES, 2005, p.22).

As justificativas a favor da utilização deste novo modelo se sustentam em dois principais argumentos: as PPPs serviriam como a) uma solução para um problema conjuntural de escassez de recursos para a viabilização de investimentos em infraestrutura e b) uma solução para um problema estrutural, a notória ineficiência do setor público frente às atividades de produção e gestão de serviços.

Segundo Pasin e Borges (2003, p. 9) duas das justificativas para o uso da PPP na Irlanda foram a possibilidade de realização de um maior número de projetos e a liberação de recursos públicos para outros projetos prioritários sem condições de retorno financeiro e sem capacidade de serem realizados via PPP. A segunda justificativa se traduz na possibilidade de o setor privado participar da provisão de serviços tradicionalmente sob responsabilidade do setor público, e se sustenta na ideia de que o primeiro domina técnicas de financiamento, design, operação e gerenciamento mais refinadas, ou mais eficientes.

Em síntese, o segundo argumento para a utilização de Parcerias Público-Privadas se sustenta na geração de value for money (ganhos de produtividade ou eficiência), com a introdução do ente privado na provisão dos serviços, restando ao Estado a definição das metas e o monitoramento de seu cumprimento uma vez que o setor privado, naturalmente orientado para a maximização de lucros, não teria em mente o melhor atendimento do interesse público.

A Nota Técnica nº 87 do INESC, intitulada “Contra o vale-tudo da PPP”, foi uma das primeiras publicações a apontar severas críticas a essa nova modalidade de contratos, caracterizando-a como “[...] um 'cheque em branco' para que, sem necessidade de aprovação prévia pelos Legislativos, os governos federal, estaduais e municipais possam realizar privatizações e concessões em [praticamente] qualquer área” (NUNES, 2004, p.2).

A nota levantava aproximadamente 33 questões críticas sobre o projeto, à época, da Lei das PPPs no Brasil. Assim, dentre as principais críticas estavam: que as parcerias permitem maior discricionariedade e dão margem à corrupção; transferem para o setor público os riscos do setor privado; contrariam princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal e abrem as portas para o endividamento futuro, inviabilizando mandatos subsequentes.

 

 

 

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Apontam-se como pontos desfavoráveis o comprometimento das finanças públicas, o que remete diretamente às possibilidades de conflitos entre a legislação que trata das PPP e a Lei de Responsabilidade Fiscal. O estudo do BNDES atenta para o fato de que a PPP “corre o risco de se tornar apenas uma forma de deslocar gastos presentes para uma necessidade de fluxo de desembolsos futuros” (PASIN e BORGES, 2003, p.8).

Por outro lado, maior discricionariedade implica maior margem para comportamentos que violam o interesse público, como a possibilidade de se privilegiar determinado concorrente, contrariando o princípio da impessoalidade. A preocupação com a maior discricionariedade do agente público frente aos contratos do tipo PPP relaciona-se com as alterações que viriam a ser feitas nos procedimentos das licitações, concessões e permissões dos serviços públicos.

. AsPPPsdasArenasdaCopadoMundo

No Brasil, as PPPs foram bastante utilizadas para as obras da Copa do Mundo 2014. Das 12 arenas da Copa do Mundo, 9 são públicas e as outras 3 pertencem a Atlético-PR, Corinthians e Internacional. Dentre as públicas, 5 foram construídas/reformadas e estão sendo geridas em regime de PPP e 4 delas foram erguidas por meio das tradicionais formas de contratação do setor público. O Maracanã, apesar de a operação ser formalmente considerada uma PPP (mesmo sem a existência de contraprestações públicas), foi reformado em um regime de empreitada tradicional e somente a sua gestão por 35 anos é que foi objeto de concessão - que inclusive só se iniciou após o jogo inaugural.

Castelão: A PPP do Castelão foi avaliada em R$518.606.000,00 à época da sua assinatura (nov/11). Este valor considera a soma dos investimentos e das máximas contraprestações mensais a serem pagas pelo Governo do Ceará ao parceiro privado, no valor de R$407 mil (a preços da época da licitação).

Itaipava Arena Pernambuco: O valor da PPP da Itaipava Arena Pernambuco foi divulgado como R$379.263.314,00, à época da assinatura do contrato (jun/10). Este valor diz respeito ao Valor Presente Líquido (VPL) que considera as contraprestações mensais devidas pelo Governo de Pernambuco à concessionária (cujo valor máximo à época da assinatura do contrato era de R$332.850,00) e os R$388.981.146,00 pagos a título de ressarcimento dos investimentos na obra. Somando-se nominalmente o valor máximo de desembolso do Governo de Pernambuco, chega-se a um valor próximo de R$510 milhões, para os 33 anos da concessão.

Arena das Dunas: A PPP da Arena das Dunas, quando da assinatura do contrato (abr/11), teve o seu valor estimado em R$400 milhões, sem muita explicação sobre a métrica deste cálculo. O contrato previa uma contraprestação mensal de R$9,125 milhões, a partir da disponibilização da infraestrutura, sendo que 85% deste valor seria fixo e existiria por 9 anos. A partir do 9º ano, 30% deste pagamento fixo se extinguiria e, a partir do 12º ano, deixaria de existir por completo.

 

 

 

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Paralelamente, durante todo esse período e por todo o restante da concessão, os 15% restantes da contraprestação estariam vinculados a desempenho.

Mineirão: A PPP do Mineirão teve o valor do seu contrato estimado em R$677.353.021,85, calculado com base na soma do teto das contraprestações mensais pagas pelo Governo de Minas Gerais ao parceiro privado, trazidas ao valor presente, considerando a época da assinatura do contrato (dez/10).

CONCLUSÃO

As parcerias público-privadas são contratos que estabelecem vínculo obrigacional entre a Administração Pública e a iniciativa privada visando à implementação ou gestão, total ou parcial, de obras, serviços ou atividades de interesse público, em que o parceiro privado assume a responsabilidade pelo financiamento, investimento e exploração do serviço, observando, além dos princípios administrativos gerais, os princípios específicos desse tipo de parceria.

O contrato administrativo de parcerias público-privadas é considerado um meio eficaz na obtenção de recursos da iniciativa privada destinados a serviços públicos e setores de pouca viabilidade econômica quando prestados exclusivamente pelo Poder Público. Países como Inglaterra – no qual as parcerias público-privadas são denominadas Private Finance Initiative –, Portugal, Chile, além de outros países, já comprovaram a eficiência econômica da parceria e cooperação entre o particular e o ente da Administração Pública na prestação de serviços.

No Brasil, há muito já ocorria a associação entre Estado e particular visando à satisfação de interesses públicos; isso significa que, em relação à experiência jurídica brasileira, o instituto da parceria público-privada não importou substancial alteração. De consequência, as inovações apresentadas pela Lei Federal nº. 11.079/04 limitam-se à formação do conceito legal de contrato de parceria público-privada, à definição das respectivas modalidades e à previsão de características peculiares do instituto.

A concessão de rodovias é uma das principais experiências brasileiras na efetivação de contratos de parceria público-privada. Mais recentemente, o instituto das PPP’s foi bastante utilizado para permitir as obras de infraestrutura da Copa do Mundo de 2014, especialmente para a construção dos estádios de futebol.

 

 

 

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Da interação entre os setores público e privado são gerados diversos benefícios como o aumento da qualidade e eficiência nos serviços prestados, maior transparência dos gastos públicos e redução da pressão orçamentária. Deve-se ter cuidado, principalmente, com a troca de gastos presentes por gastos futuros que comprometam o orçamento público.

A realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil foi um evento que demandou vultosos investimentos em infraestrutura, tendo representado a oportunidade para a utilização de parcerias em diversos projetos necessários, como nos casos das arenas para os jogos estaduais, conforme se verificou.

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DEFENSOR LEGIS A QUALQUER PREÇO?

CLÓVIS DOS SANTOS ANDRADE: Advogado e jornalista. Formado, em ambos os casos, pela Universidade Católica de Pernambuco. Ex-editor-assistente de Brasil/Internacional do Jornal do Commercio. Atualmente exerce a advocacia.

Introdução

O presente texto visa a abordar o desempenho da função de defensor legis pelo Advogado-Geral da União no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade de leis e atos normativos pelo Supremo Tribunal Federal, mais especificamente no procedimento da ADI. Atribuição esta prevista pelo art. 103, § 3º, da CF/88, bem como pelos arts. 4º, IV, da LC 73/93 e 8º da Lei 9.868/99.

Para além da simples previsão legal e constitucional, porém, pretende-se analisar de forma crítica a ideia da obrigatoriedade da defesa das normas impugnadas, máxime quando em confronto com outras atribuições igualmente conferidas ao AGU.

O Advogado-Geral da União no ordenamento pátrio:

Como todo produto da atuação do poder constituinte originário, a Carta de 1988 promoveu diversas reformas no aparelho do Estado brasileiro. Dentre elas, a criação da Advocacia-Geral da União, responsável, segundo o art. 131, por representar judicial ou extrajudicialmente a União, cabendo-lhe ainda as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo Federal.

No organograma da instituição, o papel de maior destaque é dado, pelo § 1º do mesmo dispositivo constitucional, ao Advogado-

 

 

 

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Geral da União. Figura, aliás, interessante, por guardar características que a tornam peça única no vigente arcabouço jurídico pátrio.

Tem status de Ministro de Estado, conferido pelo art. 25, parágrafo único, da Lei 10.683/2003, sendo de livre nomeação e exoneração pelo Presidente da República (art. 84, XVI, da CF/88). Como integrante do primeiro escalão do Executivo, também é julgado, em crimes comuns, pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, “c” da CF/88) e pode receber delegação de certas atribuições privativas do chefe do Executivo (art. 84, VI, XII e XXV).

Entretanto, não se trata de um ministro comum. A começar pelos pré-requisitos de nomeação exigidos pelo já citado § 1º do art. 131 da CRFB: idade mínima de 35 anos, além de notável saber jurídico e reputação ilibada. Outra peculiaridade é que, em se tratando de crimes de responsabilidade, a competência para julgá-lo será do Senado Federal, ainda que não os tenha cometido de forma conexa aos do presidente (art. 52, II, da CF).

Isso sem contar com a própria natureza da “pasta” por ele chefiada. Afinal, muito mais que um ministério, a Advocacia-Geral da União é órgão cumpridor de função essencial à Justiça, merecendo, por esse motivo, mais destaque na Carta Magna do que qualquer outro órgão diretamente subordinado à Presidência da República.

É também o único “ministério” regulado por uma lei complementar, a de número 73/1993, que ratifica o status de ministro do Advogado-Geral em seu art. 3º,caput e § 1º, recebendo deste último o posto de mais alto assessor jurídico do presidente.

Ao mesmo tempo em que não é um ministro comum, fica claro também que o AGU tampouco é um advogado da União qualquer. Não só por chefiar a instituição, mas principalmente por não fazer parte, necessariamente, da carreira, podendo o chefe do Executivo escolhê-lo dentre quaisquer juristas.

 

 

 

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O papel de defensor legis em conflito com outras funções do AGU

Por ocupar cargo de confiança do Presidente e, ao mesmo tempo, chefiar a Advocacia-Geral da União, a maior parte das atribuições dadas pelo art. 4º da LC 73/93 ao Advogado-Geral têm relação com o assessoramento jurídico direto ao chefe do Executivo ou com o desempenho do mais alto cargo administrativo da AGU. Uma delas, contudo, torna-o ainda mais um personagem sui generis no ordenamento jurídico-constitucional pátrio: a de “defender, nas ações diretas de inconstitucionalidade, a norma legal ou ato normativo, objeto de impugnação” (inciso IV).

Trata-se da função de defensor legis, prevista, em primeiro plano, pelo art. 103, § 3º, da CF/88, devendo ser exercida, segundo o art. 8º da Lei 9.868/99 (que regulamenta o procedimento da ADI), no prazo de 15 dias, logo após a prestação de informações pelo órgão ou autoridade dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, e antes da manifestação do Procurador-Geral da República.

Perceba-se que, neste mister, o AGU não atua como assessor do presidente, ou como chefe da Advocacia-Geral da União, mas como patrono da lei ou ato normativo. O que pode ocasionar algumas incongruências.

Primeiramente, vale uma leitura atenta do § 3º do art. 103: “§ 3º Quando o Supremo Tribunal Federal

apreciar a inconstitucionalidade, em tese, de norma legal ou ato normativo, citará, previamente, o Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou texto impugnado”.

Note-se que, numa interpretação literal do dispositivo, o Advogado-Geral parece ter a obrigação de defender a norma impugnada, seja ela federal ou estadual (também atacável por ADI). Afinal, trata-se de uma redação imperativa (“defenderá”). Contudo,

 

 

 

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é necessário ir além do texto para compreender melhor referido papel por ele desempenhado.

É sabido que, diferentemente do que ocorre nos processos subjetivos, em que o Estado-juiz é instado a solucionar um conflito de interesses, a ADI não se presta a resolver uma lide. O objetivo último da ação direta é, em verdade, assegurar a força normativa da Constituição, extirpando do ordenamento uma norma que lhe é contrária, caso julgada procedente, ou dando à lei uma presunção absoluta de constitucionalidade, se for considerada improcedente pelo STF.

Logo, por se tratar de um processo no qual o “réu” é uma norma, não há, ao menos numa abordagem direta, direitos processuais subjetivos a serem resguardados no polo passivo da contenda. E não raras vezes, no mérito da questão, a lei atacada é eivada de inconstitucionalidade evidente. Nesses casos, corre-se o risco de, sendo o art. 103, § 3º, constitucional compreendido ao pé da letra, obrigar-se o Advogado-Geral a “defender o indefensável”.

Esse inconveniente fica ainda mais notório em ocasiões nas quais a tese versada na ADI já teve sua inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal, ainda que em sede de controle difuso.

Também é de se recordar que o Presidente da República, a quem o Advogado-Geral responde diretamente, é listado no inciso I do art. 103 da CF/88 como um dos legitimados a propor a Ação Direta de Inconstitucionalidade. Não se ignora que, para tanto, o chefe do Executivo é detentor de capacidade postulatória, não necessitando estar representado por advogado para ajuizá-la. Porém, o que ocorre na prática é que, nesse caso, a petição inicial é redigida e aviada pelo próprio AGU. Assim, careceria de qualquer sensatez obrigá-lo a atuar em defesa da norma por ele mesmo impugnada.

Ademais, como a ADI, segundo o art. 102, I, da CF/88, pode versar sobre leis estaduais, a inconstitucionalidade nelas apontada

 

 

 

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poderá ser de natureza formal orgânica, na qual um Estado-membro usurpa competência legislativa privativa da União listada no art. 21 da Carta. Em dada circunstância, como poderá o Advogado-Geral socorrer referido texto normativo sem entrar em conflito com seu papel de defensor-mor dos interesses do ente político central?

As hipóteses citadas, em verdade, são teratológicas, mas servem de ponto de partida para o que se defenderá no presente texto.

É de se ressaltar que o próprio Supremo é vacilante em relação ao tema. Conforme observa Pedro Lenza, em sua obra Direito Constitucional Esquematizado (14ª Edição, Editora Saraiva, 2014), em um primeiro momento a Corte, no julgamento das ADIs 72 (22/03/1990), 242 (20/10/1994), 3.522 (20/10/1994), 1.254-AgR (14/08/1996) e 1.434-MC (29/08/1996), posicionou-se pela obrigatoriedade da defesa da constitucionalidade da norma pelo AGU, “não lhe cabendo admitir a invalidez da norma impugnada” (pág. 968).

Dando um passo adiante, ao apreciar as ADIs 1.616 (24/05/2001), 2.101 (18/04/2001), 3.121 (17/03/2011) e 4.270 (14/03/2012), o Pretório Excelso passou a admitir que o Advogado-Geral da União não é obrigado a defender a norma, caso já haja precedente do STF pela sua inconstitucionalidade, ainda que exarado em controle difuso.

Por fim, em questão de ordem resolvida no bojo da ADI 3.916 (07/10/2009), ainda segundo Lenza, “com base em interpretação sistemática, o STF entendeu que o AGU tem o direito de manifestação, não necessariamente a favor da lei, mas na defesa da Constituição e, assim, dos interesses da União” (pág. 969). Em suma, para o Supremo, o Advogado-Geral exerceria o contraditório, no procedimento, em defesa da presunção de constitucionalidade do texto normativo editado pelos representantes do povo, mas apenas quando e nos trechos em que isso for possível.

 

 

 

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Porém, nas ADIs 3.413, 2.376, 2.906 e 3.674, todas da relatoria do ministro Marco Aurélio e julgadas em 01/06/2011, o tribunal, num aparente retrocesso, voltou a se posicionar pela obrigatoriedade da atuação do AGU em defesa do texto impugnado.

É válido destacar que, embora o art. 103, § 3º, da CF seja imperativo quanto à defesa do ato normativo pelo Advogado-Geral, não se pode chegar ao extremo de constranger um homem do Direito, possuidor de notório saber jurídico, a atentar contra sua consciência e, o que é mais grave, contra a própria Constituição, ao defender a qualquer custo a permanência no ordenamento de uma norma que sabe ser inconstitucional.

Caso contrário, sob o argumento de se ressalvar a observância literal de um dispositivo da Constituição, estar-se-ia ferindo diversos outros, como o art. 131, § 1º, que atribui ao AGU o dever primordial defender os interesses da União, além do princípio da força normativa da Constituição, só para ficar nos mais evidentes.

Conclusão

Assim, conclui-se ser dever do Supremo Tribunal Federal reconhecer a ocorrência de mutação constitucional para, debruçando-se de maneira mais decisiva sobre a matéria, fincar, sob os olhos de sua atual composição, o posicionamento segundo o qual, em verdade, o Advogado-Geral da União, diferentemente de uma obrigação, tem o “direito de manifestação” no procedimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (como, aliás, infere-se da leitura do art. 8º da Lei 9.868/99). Possui, portanto, a oportunidade, quando se lhe parecer correto, de pleitear a declaração de constitucionalidade da lei ou ato normativo objeto de controle concentrado, mas não a ponto de ser forçado a defender o indefensável.

Isto é, não feriria o texto magno o defensor legis que se abstivesse de socorrer norma antijurídica no procedimento da ADI, ou mesmo que opinasse pela sua extirpação do ordenamento. Ao

 

 

 

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contrário, estaria assegurando a prevalência dos preceitos constitucionais.

Referências

Direito Constitucional Esquematizado. Pedro Lenza. Editora Saraiva, 18ª Edição, 2014.

 

 

 

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Noções gerais sobre os princípios que regem o Direito Ambiental

AILK DE SOUZA PINHEIRO: Servidor do Ministério Público da União. Graduado em Direito pela Fundação Universidade Federal do Tocantins - UFT. Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera - Uniderp.

RESUMO: Este trabalho científico se propõe a trazer aos leitores, de forma objetiva e simplória, aspectos gerais sobre os princípios que regem o direito ambiental. Partiu-se, inicialmente, do conceito de princípios, em seguida, buscou-se enumerar os voltados à preservação do meio ambiente e explicá-los. Utilizou-se como metodologia para criar o presente artigo da leitura de livros, notadamente de Direito Ambiental, bem como de pesquisa sobre o tema em leis, artigos e revistas especializadas. Outrossim, importante mencionar que a presente pesquisa se justifica pelo fato de que o planeta passa por sérios problemas oriundos da degradação ambiental. Os princípios aplicados ao direito ambiental surgem como escudo em face de possível devastação.

Palavras-chave: Noções gerais. Princípios. Direito ambiental.

1 CONSIDEAÇÕES INICIAIS

Este trabalho cientifico se propõe, de forma objetiva e simplória, a trazer uma análise acerca dos princípios que regem o direito ambiental, tendo em vista constantes degradações que vem prejudicando o planeta e impedindo seus habitantes de viver de forma digna, harmônica e saudável.

 

 

 

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Primeiramente, partiu-se de uma abordagem acerca do conceito de princípios, em seguida, buscou-se enumerar os voltados à preservação do meio ambiente e explicá-los.

Utilizou-se de metodologia de pesquisa qualitativa, com método dedutivo, para se fazer a citada análise de pesquisa.

Assim, foi realizada a leitura de livros, notadamente de Direito Ambiental, bem como pesquisa sobre o tema em leis, artigos e revistas especializadas.

Outrossim, importante mencionar que a presente análise acerca dos princípios que regem o direito ambiental se justifica pela constante dificuldade que os operadores do direito possuem quando se deparam com a matéria na aplicação dos casos em concreto.

2 PRINCÍPIOS DO DIREITO AMBIENTAL

Preliminarmente, impende ressaltar que, com o advento do pós-positivismo, os princípios passaram de meras fontes de integração a espécie de normas jurídicas, dotados, assim, de conteúdo normativo.

Pode-se afirmar que os princípios são normas jurídicas que fundamentam o sistema jurídico, com maior carga de abstração, generalidade e indeterminação que as regras, não regulando situações fáticas diretamente, carecendo de intermediação para a aplicação concreta. Devem ser pesados com outros princípios em cada caso concreto, à luz da ponderação casual (Princípio da Proporcionalidade). Ou seja, inexiste princípio absoluto.

Eles se distinguem das regras por ter maior grau de abstração, de indeterminabilidade, pela condição de standart e função morfogenética. Em que pese inexistir hierarquia jurídica entre princípios e regras, os primeiros são axiologicamente superiores, tendo as funções dimensional ou morfogenética (os princípios são fundamentos das regras), interpretativa, limitadora e integrativa.

 

 

 

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O conflito entre regras se resolve com os critérios da hierarquia, especialidade e revogação, ao contrário dos princípios. Enquanto as regras valem ou não (tudo ou nada), os princípios pesam ou não

Nesse sentido, diante da devastação ambiental que vem passando o planeta, importante elaborar um estudo sobre os princípios ambientais, englobando tanto os explícitos quanto os implícitos.

Explícitos são aqueles que estão claramente escritos nos textos legais e, fundamentalmente, na Constituição da República Federativa do Brasil, notadamente no seu artigo 225 (BRASIL, on line), e implícitos são os princípios que decorrem do sistema constitucional, ainda que não se encontrem escritos.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

 

 

 

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IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

VI - promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

§ 2º - Aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei.

§ 3º - As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

§ 5º - São indisponíveis as terras devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias, necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.

 

 

 

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§ 6º - As usinas que operem com reator nuclear deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não poderão ser instaladas.

2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana

Esse princípio é também denominado por alguns doutrinadores, de forma não muito correta, de “princípio do direito humano fundamental”, pois princípio jurídico, de acordo com ANTUNES (2006, p. 25), serve de base para a constituição de um denominado direito, mas ele próprio não é um direito.

Ainda de acordo com esse autor (2006, p. 25), com base em determinados princípios jurídicos (constitucionais ou não) tem-se um direito assegurado em lei. E mais, em determinadas situações, mesmo a inexistência de uma lei não servirá de obstáculo para que se possa exercer um direito que decorra de uma adequada aplicação de um princípio jurídico.

Em termos constitucionais, o princípio da dignidade da pessoa humana é a base capaz de dar sustentação ao caput do art. 225 da Carta Magna que, do primeiro recebe toda a sua inspiração. Deste princípio decorrem todos os demais sub-princípios constitucionais, ou princípios setoriais e do Direito Ambiental.

Segundo os ensinamentos de ANTUNES (2006, p. 26), o reconhecimento internacional do princípio que ora se examina pode ser verificado, por exemplo, nos princípios 1 e 2 da Declaração de Estocolmo, proclamada em 1972[1], esse princípio foi proclamado em Estocolmo e foi reafirmado pela Declaração do Rio[2], proferida na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, Rio 92, cujo princípio 1 afirma;

Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva em harmonia com o meio ambiente (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, on line)

 

 

 

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Esse princípio, de acordo com os ensinamentos desse doutrinador (2006, p. 27):

Precisa ser reafirmado com veemência, pois é cada vez mais freqüente a tentativa de estabelecimento de uma igualdade linear entre as diferentes formas de vida existentes sobre o planeta Terra, gerando situações extremamente cruéis que, sempre - e não tenho medo de o afirmar de forma peremptória – prejudicam os setores mais pobres e desprotegidos da sociedade. A relação com os demais animais deve ser vista de uma forma caridosa e tolerante, sem que se admita a crueldade, o sofrimento desnecessário e a exploração interesseira de animais e plantas. Mas, evidentemente, não se pode perder de vista o fato de que o Homem é a medida de todas as coisas, como já nos ensinaram os gregos. A compaixão pelos animais é uma imposição para todos aqueles que se acreditam frutos da criação de um Poder Superior que a todos deu origem.

2.2 Princípio do desenvolvimento sustentável

O princípio do desenvolvimento sustentável, de acordo com GRANZIERA (2009, p. 53), originou-se no início da década de 70, quando uma equipe de cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachustts (MIT) encaminhou ao Clube de Roma, em 1974, o relatório denominado The limits to growth[3]. Esse documento, também conhecido como Relatório Meadows, nome da chefa da comissão que o elaborou, Donella Meadows, teve grande repercussão internacional.

Esse relatório foi muito criticado em seus cálculos e prognósticos, considerados muito radicais, no entanto, influenciou a elaboração dos estudos preliminares para a Conferência de Estocolmo, em que, inicialmente, os conceitos de meio ambiente e desenvolvimento eram tidos como antagônicos.

A conferência de Estocolmo sobre Meio Ambiente, realizada em 1972, de acordo com GRANZIERA (2009, p. 53), estabeleceu, em seus princípios, o planejamento racional e a adoção, pelos Estados,

 

 

 

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de uma concepção integrada e coordenada do planejamento de seu desenvolvimento, para compatibilizar a necessidade de proteger e de melhorar o ambiente, no interesse de sua população.

O princípio 13 dessa conferência assim preconizou.

A fim de lograr um ordenamento mais racional dos recursos e, assim, melhor as condições ambientais, os Estados deveriam adotar um enfoque integrado e coordenado da planificação de seu desenvolvimento, de modo a que fique assegurada a compatibilidade do desenvolvimento com a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente humano, em benefício da população. (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE HUMANO, on line)

A conferência da ONU, segundo os ensinamentos de GRANZIERA (2009, p. 54), deflagrou o alerta, pois mostrou ao mundo os efeitos do desenvolvimento e da industrialização sem um planejamento e uma cautela especial na preservação dos recursos naturais.

Há quem entenda, de acordo com SIRVINSKAS (2009, p. 58):

que a dicotomia desenvolvimento/preservação ambiental está superada. Precisa-se, segundo estes críticos, conciliar sustentabilidade com tecnologia, em benefício do meio ambiente. Toda decisão (seja ela política, econômica ou social) deverá ter um viés ambiental. Assim, não devemos buscar mais a conciliação ou a compatibilização do desenvolvimento econômico com proteção ambiental. A questão ambiental deve ser parte integrante da decisão econômica, por exemplo.

2.3 Princípio da prevenção

O termo prevenir, de acordo com GRANZIERA (2009, p. 55), significa dispor antecipadamente, preparar, precaver, avisar ou informar com antecedência, realizar antecipadamente, dizer ou fazer com antecipação, evitar, acautelar-se contra.

 

 

 

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Ainda de acordo com essa doutrinadora (2009, p. 55):

os vocábulos prevenção eprecaução, na língua portuguesa, são sinônimos. Todavia, a doutrina jurídica do meio ambiente optou por distinguir o sentido desses termos, consistindo o princípio da precaução em um conceito mais restritivo que o da prevenção. A precaução tende à não-autorização de determinado empreendimento, se não houver certeza de que ele não causará no futuro um dano irreparável. A prevenção versa sobre a busca da compatibilização entre a atividade a ser licenciada e a proteção ambiental, mediante a imposição de condicionantes ao projeto. Essa distinção será mantida neste livro.

O princípio da prevenção segundo os ensinamentos de ANTUNES (2006, p. 39):

É um princípio muito próximo do princípio da precaução, embora não se confunda com aquele. O princípio da prevenção aplica-se a impactos ambientais já conhecidos e dos quais se possa, com segurança, estabelecer um conjunto de nexos de causalidade que seja suficiente para a identificação dos impactos futuros mais prováveis. Com base no princípio da prevenção que o licenciamento ambiental e, até mesmo, os estudos de impacto ambiental podem ser realizados e são solicitados pelas autoridades públicas. Pois, tanto o licenciamento, quanto os estudos prévios de impacto ambiental são realizados com base em conhecimentos acumulados sobre o meio ambiente. O licenciamento ambiental, na qualidade de principal instrumento apto a prevenir danos ambientais, age de forma a evitar e, especialmente, minimizar e mitigar, os danos que uma determinada atividade causaria ao meio ambiente, caso não fosse submetida ao licenciamento ambiental.

Havendo, de acordo com o princípio da prevenção, uma análise prévia dos impactos que um determinado empreendimento possa causar ao meio ambiente, é possível, adotando-se medidas compensatórias e mitigadoras, e, mesmo alterando-se o projeto em análise, se for o caso, assegurar a sua realização, garantindo-se os

 

 

 

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benefícios econômicos dele decorrentes, sem causar nenhum dano ao meio ambiente.

Seguindo os ensinamentos de GRANZIERA (2009, p. 55) o reflexo mais evidente do princípio da prevenção, no campo normativo brasileiro, é o Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA). O EPIA foi fixado na Lei nº 6.938/81 como um dos instrumentos de da Política Nacional do Meio Ambiente e posteriormente alçado à categoria de norma constitucional, no art. 225, inciso IV, que dispõe sobre “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto ambiental, a que se dará publicidade”.

2.4 Princípio da Precaução

O Princípio da Precaução, de acordo com a autora, anteriormente mencionada (2009, p. 57), apresenta-se como o fulcro do direito ambiental. São seus elementos que compõem exatamente o que se chama de proteção ao meio ambiente, para as atuais e futuras gerações.

Quando pairar dúvida, é mais correto que se adotem providências drásticas, para evitar danos futuros. Como uma posição além do desenvolvimento sustentável e do princípio da prevenção, o princípio em foco determina que não se licencie uma atividade, toda vez que não se tenha certeza de que ela não causará danos irreversíveis ao ambiente.

Imperioso destacar os questionamentos de ANTUNES (2006, p. 37) acerca desse princípio

Em termos práticos, como se deve proceder diante de uma fundada incerteza quanto aos efeitos que uma determinada intervenção sobre o meio ambiente pode acarretar? Como deve ser aplicado o princípio da precaução? Em primeiro lugar, há que se consignar que o princípio da precaução encontra uma expressão concreta nos sete incisos do § 1º do artigo 225 da Constituição

 

 

 

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Federal, ou seja, naqueles incisos existem determinações para que o Poder Público e o legislador ordinário definam meios e modos para que a avaliação dos impactos ambientais seja realizada e que sejam evitados – tanto quanto possível – danos ao meio ambiente. Fora destas circunstâncias, aplicação do princípio da precaução não pode ocorrer de forma imediata e sem uma base legal que a sustente.

A implementação do princípio da precaução, segundo MACHADO (2009, p. 69), não tem por finalidade imobilizar as atividades humanas. Não se trata de precaução que tudo impede ou que em tudo vê catástrofes ou males. O princípio da precaução visa à durabilidade da sadia qualidade de vida das gerações humanas e à continuidade da natureza existente no planeta.

2.5 Princípio da reparação integral

A reparação integral do dano ambiental é prevista na declaração do Rio/92, Princípio 13:

Os Estados irão desenvolver legislação nacional relativa à responsabilidade e à indenização das vítimas de poluição e de outros danos ambientais. Os Estados irão também cooperar, de maneira expedita e mais determinada, no desenvolvimento do direito internacional no que se refere à responsabilidade e à indenização por efeitos adversos dos danos ambientais causados, em áreas fora de sua jurisdição, por atividades dentro de sua jurisdição ou sob seu controle (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, on line).

Essa reparação, de acordo com GRANZIERA (2009, p. 60-61), constitui uma obrigação que complementa o direito constitucional ao meio ambiente ecologicamente equilibrando; havendo degradação ambiental ou poluição, isso é, desequilíbrio no conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas

 

 

 

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formas, seu autor fica obrigado a reparar o dano ocorrido, pois não se admite que a degradação ambiental permaneça no ambiente.

Esse princípio está previsto na Lei nº 6.938/81, em seu artigo 4º, VII (BRASIL, on line), que introduz, como um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, a imposição ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados, e ao usuário, de contribuição pela utilização de recursos ambientais com fins econômicos.

A mencionada norma, em seu artigo 14, § 1º (BRASIL, on line), obriga o poluidor, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. Essa lei, em seu artigo 3º, IV, traz o conceito de poluidor como a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.

2.6 Princípio da informação

A Declaração do Rio de Janeiro/92, em uma das frases do seu art. 10, traz que, no nível nacional, cada indivíduo dever ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas condutas (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, on line).

A informação, como bem elucidada por GRANZIERA (2009, p. 61), constitui a base para qualquer tomada de decisão, seja no âmbito dos governos, seja na iniciativa privada, seja nas movimentações sociais; é do conhecimento e da análise dos fatos que se podem propor medidas atinentes à busca de caminhos adequados às necessidades. Isso se aplica, também, ao meio ambiente.

Vale mencionar ainda, que a Constituição Federal em vigência, ao estabelecer as regras atinentes à Administração Pública, em seu artigo 37 caput, submeteu-a, entre outros, ao princípio da

 

 

 

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publicidade, como forma de dar transparência às atividades do Poder Público e garantindo o acesso da população às informações relativas às atividades administrativas.

2.7 Princípio do poluidor pagador

O Princípio do Poluidor Pagador (PPP), de acordo ANTUNES (2006, p. 42), parte da constatação de que os recursos ambientais são escassos e que o seu uso na produção e no consumo acarreta a sua redução e degradação. Ora, se o custo da redução dos recursos naturais não for considerado no sistema de preços, o mercado não será capaz de refletir a escassez. Assim sendo, são necessárias políticas públicas capazes de eliminar a falha de mercado, de forma a assegurar que os preços dos produtos reflitam nos custos ambientais.

Ainda de acordo com esse autor (2006, p. 43)

O elemento que diferencia o PPP da responsabilidade é que ele busca afastar o ônus do custo econômico das costas da coletividade e dirigi-lo diretamente ao utilizador dos recursos ambientais. Ele não pretende recuperar um bem ambiental que tenha sido lesado, mas estabelecer um mecanismo econômico que impeça o desperdício de recursos ambientais, impondo-lhes preços compatíveis com a realidade.

Esse princípio foi objeto da Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento de 1992, cujo princípio 16 estabelece:

As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais, (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, on line)

 

 

 

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É o caso, de acordo com GRANZIERA (2009, p. 65), de construção da estação de efluentes industriais, da adoção de tecnologias limpas, do reuso de água, da disposição de efluentes industriais em aterros licenciados, especialmente construídos e dotados de níveis de segurança que impeçam a contaminação do solo e dos recursos hídricos. Cabendo ao empreendedor investir em tecnologia e outros meios, com vistas a evitar a ocorrência da poluição. Ainda assim, ocorrendo a poluição, fica o poluidor sujeito às responsabilidades e sanções fixadas na legislação.

Sendo assim, essa doutrinadora (2009, p. 65), ensina que:

O princípio poluidor pagador incide em duas órbitas: (1) no conjunto de ações voltadas à prevenção do dano, a cargo do empreendedor, e (2) na sua responsabilidade administrativa, penal e civil pela eventual ocorrência de dano, responsabilidade administrativa, penal e civil pela eventual ocorrência de dano, conforme determina o § 3º do artigo 225 da constituição Federal e legislação infraconstitucional.

3 PONDERAÇÕES FINAIS

Com o aumento da degradação ambiental, buscou-se mecanismos para contê-la.

Nesse cenário, surgiram os princípios aplicados ao direito ambiental, os quais tem como preceito primário sua preservação. Entre eles, pode-se citar: a) dignidade da pessoa humana; b) desenvolvimento sustentável; c) prevenção; d) precaução; e) reparação integral; f) informação e g) poluidor pagador.

Esse o quadro, foram demonstradas, de forma objetiva e simplória, o conceito, bem como a importância de cada princípio para contenção da devastação do meio ambiente.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

 

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ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental. 9. ed,. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: informação e documentação, referências, elaboração. Rio de Janeiro, 2002.

______. NBR 10520: informação e documentação – citações em documentos – apresentação. Rio de janeiro, 2002.

______. NBR 14724: informação e documentação – trabalhos acadêmicos – apresentação. Rio de Janeiro, 2005.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, de 5 de outubro de 1988. Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20 jun. 2016.

CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. 1992, Rio de Janeiro. Declaração do Rio sobre meio ambiente e desenvolvimento. 1992. Disponível em <http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.monta&idEstrutura=18&idConteudo=576>. Acessado em 20 de maio de 2010.

GRANZIERA, Maria Luiza Machado. Direito ambiental. São Paulo: Atlas, 2009.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7.ed. São Paulo. Saraiva, 2009.

NOTAS:

6 Princípio 1 - “O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas, em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna, gozar de bem-estar; e é portador solene de obrigação de melhorar o meio ambiente, para as gerações presentes e futuras [...]

 

 

 

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“ Princípio 2 – “Os recursos naturais da Terra, incluídos o ar, a água, o solo, a flora e a fauna e, especialmente, parcelas representativas dos ecossistemas naturais, devem ser preservados em benefício das gerações atuais e futuras [...]”. ANTUNES (2006, p. 26)

[2] [...]Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, tendo se reunido no Rio de Janeiro, de 3 a 14 de junho de 1992, reafirmando a Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, adotada em Estocolmo em 16 de junho de 1972, e buscando avançar a partir dela, com o objetivo de estabelecer uma nova e justa parceria global mediante a criação de novos níveis de cooperação entre os Estados, os setores-chaves da sociedade e os indivíduos, trabalhando com vistas à conclusão de acordos internacionais que respeitem os interesses de todos e protejam a integridade do sistema global de meio ambiente e desenvolvimento, reconhecendo a natureza integral e interdependente da Terra, nosso lar[...] (CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, on line).

[3] Os limites para o crescimento

 

   

 

 

 

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AS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS FRENTE O ACESSO À JUSTIÇA

UEVENY VALINA DE ARAÚJO: Acadêmico do curso de Direito pelo Centro Universitário AGES (UniAGES) da cidade de Paripiranga, Bahia. Foi Presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente no município de Adustina/BA no ano de 2014 à 2015. Agente Administrativo na Prefeitura Municipal de Adustina.

RESUMO: O presente artigo tem como finalidade possibilitar ao cidadão o conhecimento das garantias que nasceram com a promulgação da Constituição de 1988. Tais garantias lhes possibilitam lutarem por seus direitos e enfrentarem as injustiças que lhes são causadas. O fator socioeconômico é um dos principais responsáveis pela falta de acesso efetivo aos direitos que lhes foram dados, principalmente ao direito fundamental que é o acesso a justiça. Esse direito mesmo com toda segurança jurídica que garante a todos a possibilidade de conduzi-los, não passa de uma utopia, uma vez que é destinada somente a uma pequena parte da sociedade e não a um todo integrado, excluindo aqueles que não têm condições de se chegarem a ela. Mesmo com a criação de mecanismos que visam alterar esta realidade, tal fato demonstra ainda o quão distante estamos para alcançar a igualdade disciplinada na Carta Magna e possibilitar à todos, sem distinção de quaisquer naturezas, o acesso amplo a tutela do Poder Judiciário com a participação conjunta dos mais diversos entes sociais.

PALAVRAS-CHAVE: Constituição Federal. Direitos Sociais. Acesso à Justiça. Utopia. Descasos.Participação Conjunta.

1 INTRODUÇÃO

O acesso a justiça é um dos direitos sociais que, assim como os demais, é indispensável para os homens usufruírem de uma vida

 

 

 

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digna e igualitária perante a tamanha desigualdade existente na sociedade. Por ser um direito social, caracteriza-se como um direito fundamental na vida do indivíduo, parte integrante da sociedade, possibilitando àqueles que não têm condições socioeconômicas buscarem no Poder Judiciário um meio de proteger, garantir e efetivarem seus direitos.

Por ser um país Democrático, a Constituição prevê no caput do artigo 5º, a igualdade perante a lei, sem distinção de cor, raça, religião, classe social ou quaisquer outros meios de discriminação e desigualdade. No entanto, o mesmo Estado que visa assegurar tais direitos é o próprio que põe em evidência a falta de respeito e a violação a estes. Em um país que se diz democrático são necessários meios mais eficazes que possibilitem a todos uma vida digna e igualitária.

Dessa forma, pretende-se nesse trabalho entender o acesso à justiça enquanto um direito fundamental para efetivar os direitos sociais previstos na Carta Magna, possibilitando compreender a atuação do Estado e sua obrigação em amparar àqueles que lhes confiaram o poder de reger suas vidas por meio do contrato social, ao tempo em que buscar compreender as causas que impedem ou dificultam a efetivação desses direitos.

Partindo do pressuposto de que a sociedade está em constante mudança, busca-se compreender os métodos necessários e eficazes, que possam atender não somente um, mas todos os indivíduos que fazem parte efetiva e indispensável para a evolução social que integram o meio. Investigando-se inicialmente, a partir da revisão bibliográfica e fazendo uso das legislações pertinentes, a utopia do acesso à justiça enquanto um direito que é na essência democrático, mas que não o é na prática. Com a posterior abordagem dos descasos dos operadores do direito que não agem empenhadamente em prol da justiça. Apontando, por fim, a necessidade da atuação conjunta entre instituições, leis e princípios para a efetivação da justiça.

 

 

 

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1 A UTOPIA DO ACESSO À JUSTIÇA

Por mais que a Constituição garanta em seu texto constitucional o acesso amplo e gratuito a todos que comprovem sua hipossuficiência, como afirma o artigo 5º e inciso LXXIV, a classe que realmente necessita da interferência do Estado nas relações entre os particulares, muitas das vezes é negada, e quando dispõem do amplo e gratuito acesso à justiça, encontram diversas dificuldades na busca de obter uma justiça efetiva que venha resolver seus problemas, anseios e que lhe proporcione o real sentimento do justo. Somente àqueles que têm condições econômicas de arcar com as despesas que um litígio processual exige, são os que terão a acessibilidade à tutela jurisdicional efetivamente garantida, enquanto os demais ficarão a mercê do Poder Judiciário por não possuírem outra forma de concretizar seus direitos.

Um direito que é assegurado e favorecido somente a uma parte da sociedade não pode ser intitulado como um direito social, nem muito menos fundamental, pois o mesmo não atende a sua real finalidade democrática, que é proporcionar a todos o acesso amplo e gratuito à justiça.

Szafir demonstra sua repleta insatisfação com o Poder judiciário ao questionar sobre “quantos mais serão abandonados, presos apenas porque são pobres demais para contratar advogado e porque ninguém por eles se interessa?” (2010, p.20), esta é a face da lei que a mídia não mostra, esta é a realidade que insistentemente é forçada a se esconder através de utopias que visam amenizar o descontentamento da população, enquanto muitos que dela necessitam sofrem no silêncio ou aceitam (sem mais alternativas) o pouco que lhe são atribuídos.

2 A DEFICIÊNCIA DOS OPERADORES DO DIREITO

Essa utopia que tanto intriga a sociedade que necessita da justiça para viver pacificamente e reger suas relações é consequência daqueles que não exercem o papel ao qual foram

 

 

 

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designados. Estes são os operadores do direito que em sua maioria não aplicam a justiça de modo efetivo, nem se importam com os menos favorecidos, pois como afirma Szafir (2010,), “Há juízes que acabam confundindo a autoridade que o cargo lhe confere com uma suposta superioridade sobre os demais mortais. Quando isso acontece, os julgadores já se afastaram tanto de sua condição humana que é inútil esperar deles um mínimo de bom senso”. (p. 39).

Tamanho é o descaso que é atribuído aos menos favorecidos por parte daqueles que por obrigação foram designados para atender aos seus anseios. Vê se, portanto, a precariedade do atual sistema e a deficiência dos operadores que fecham os olhos perante a bruta realidade vivenciada pelos excluídos. É graça a pessoas com tais características que o atual sistema está indo de mal a pior. Szafir ao expor seu descontentamento cita o exemplo da falta de respeito dos operadores com àqueles que ela intitula de excluídos, por não possuírem meios para obter a justiça. “O réu ficou preso durante um ano e oito meses naquele local infecto porque o oficial de justiça não procurara seu endereço direito e prestara uma informação errada ao juiz. (...). Mas de uma coisa não resta dúvida: ele foi preso por ser pobre” (2010, p. 25).

É evidente a falta de preparo e a deficiência de homens que se mostram superiores e não se importam com os demais. A convicção da sociedade no Poder judiciário está cada vez mais abalada por conta destes seres que não agem em prol da justiça e muito menos em prol da tutela dos anseios dos indivíduos sociais como um todo. Tão somente pessoas com senso de justiça, amor e humanidade para amenizar e reforçar a crença social perante a justiça.

3 OS DIREITOS DOS PENITENCIÁRIOS

Muitos que estão presos não têm, ou até mesmo não sabem quais são seus direitos. Desprezados e maltratados pelo Judiciário esperam pela sorte de um dia serem lembrados. Aqueles que

 

 

 

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cometeram um “simples” ato criminoso compartilham a mesma cela dos que agiram com constante perigo e grave ameaça, sendo jogados e esquecidos sem direito ao acesso à justiça. Nessa perspectiva Martins (1999) afirma ser a prisão um mal necessário, mas que deve servir apenas para criminosos que demonstrem uma real perniciosidade à sociedade e perante a manutenção da paz social, pois uma vez inseridos com indivíduos com tal característica, passarão de um simples ladrão de galinhas para tornarem-se doutores do crime.

É necessário que haja uma mudança na maneira de punir os infratores sem transformá-los em monstros. Não basta somente puni-los com privação da sua liberdade, sem que haja métodos específicos para sua ressocialização. É preciso meios como afirma Martins (1999) que previnam à reincidência destes e que possibilitem o amplo acesso a justiça, a fim de evitar casos em que não haja necessidade da prisão privativa de liberdade, aplicando-lhes penas alternativas.

4 OS PRINCÍPIOS COMO FORMA DE GARANTIR A PROTEÇÃO AO DIREITO DO TRABALHO

O trabalho sempre teve grande importância para o desenvolvimento da sociedade, sendo visto como uma forma do homem mostrar suas habilidades e se desenvolver. Por meio deste, busca a todo momento transformar o mundo que o cerca e colaborar de forma efetiva para a sua inserção no meio social.

Segundo Marques (2008), o Direito Trabalhista surgiu da necessidade de assegurar o respeito, a dignidade e melhores condições de trabalho submetidas aos empregados, protegendo-os da usurpação dos seus direitos e tutelando as relações entre o empregado e o empregador, almejando assim a igualdade entre este vínculo empregatício.

Mesmo com a criação de um corpo de leis que protegem o trabalhador, tornou-se necessário a atuação dos princípios que servem de base do Direito Trabalhista. O princípio protetor é um

 

 

 

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mecanismo utilizado pelo Estado para defender a classe trabalhista da usurpação dos seus direitos como afirma o artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. No entanto, em um mundo globalizado e capitalista, é visto cada vez mais a flexibilização e desregulamentação das normas trabalhistas devido a influência das variáveis socioeconômicas ao qual como afirma Marques (2008, p.03), transgride “o valor da dignidade humana”, almejando através do capitalismo os interesses de mercado.

Desta forma, o Direito do Trabalho juntamente com os princípios protetores que segundo Marques (2008, p. 04) “espargem claridade sobre o entendimento das questões jurídicas, por mais complicadas que estas sejam no interior de um sistema de normas”, deve assegurar a preservação da dignidade do trabalhador e evitar a violação dos seus direitos, sejam elas sociais, econômicas ou políticas, possibilitando-lhe o acesso judicial para resolver os conflitos trabalhistas e protege-los das constantes usurpações pelos empregadores, haja vista ser o elo mais fraco desta relação.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A justiça nasce do atendimento da insatisfação do clamor de cada indivíduo, sua busca é o termo essencial entre o paradigma que a rodeia no que se refere a sua insatisfação. Mais do que promover a justiça, deve-se fechar as saídas das mazelas sociais e jurídicas que o sistema jurídico enfrenta, entendendo e promovendo o acesso rápido e igualitário ao senso democrático que se busca.

É necessário que o Estado juntamente com toda sociedade defenda os interesses e direitos dos esquecidos pela justiça, buscando a todo momento reparar as injustiças a estes causadas. Do mesmo modo, o povo deve aprender a lutar pelos seus direitos, correr atrás daquilo que lhes pertencem desde seu nascimento, e a lutarem por seus ideais, formando um pensamento baseado no compromisso de fazer valer a justiça.

 

 

 

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São necessários mecanismos que atendam todos de forma igualitária, baseando-se principalmente no princípio da igualdade de direitos, possibilitando o amplo e gratuito acesso a justiça como prevê a atual Constituição Federal de 1988. Uma real democracia deve estar fixada e baseada nos princípios que regem a vida em sociedade e que buscam assegurar e proteger o indivíduo da usurpação dos seus direitos, tutelando suas relações e proporcionando-lhes a igualdade perante a lei.

REFERÊNCIAS

MARQUES, Ana Maria Almeida. Notações sobre o princípio protetor no Direito do Trabalho na contemporaneidade e a precarização do labor humano. Revista jurídica, Brasília, v. 10, n. 91. P. 01-31. Junho/Setembro, 2008.

MARTINS, Jorge Henrique Schaefer. Penas alternativas. 1 ed. Curitiba: Juruá, 1999.

SZAFIR, Alexandra Lebelson. Descasos: uma advogada às portas com o direito dos excluídos. 1 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA-UNIFOR CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS-CCJ Curso de Direito

MANDADO DE INJUNÇÃO: EVOLUÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Priscila Maia Barreto Matrícula nº 0812784

Fortaleza-CE Maio, 2013

PRISCILA MAIA BARRETO

MANDADO DE INJUNÇÃO: EVOLUÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação de conteúdo do Professor Francisco Lisboa Rodrigues e orientação metodológica da Professora Simone Trindade da Cunha.

Fortaleza-Ceará 2013

PRISCILA MAIA BARRETO

MANDADO DE INJUNÇÃO: EVOLUÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Monografia apresentada à banca examinadora e à Coordenação do Curso de Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade de Fortaleza, adequada e aprovada para suprir exigência parcial inerente à obtenção do grau de bacharel em Direito, em conformidade com os atos normativos do MEC, regulamentada pela Res. n° R028/99, da Universidade de Fortaleza.

Fortaleza (CE), 10 de maio de 2013.

Francisco Lisboa Rodrigues, Ms. Prof. orientador da Universidade de Fortaleza Croaci Aguiar, Esp. Prof. examinador da Universidade de Fortaleza Helton Heládio C L Sales, Esp. Prof. examinador da Universidade de Fortaleza Simone Trindade da Cunha, Dra. Profa. Orientadora de Metodologia Profa. Núbia Maria Garcia Bastos, Ms. Supervisora de Monografia Coordenação do Curso de Direito

Aos meus pais, que me proporcionaram mais essa conquista. Aos meus familiares e amigos que me incentivaram neste trabalho científico.

AGRADECIMENTOS

Ao professor Francisco Rodrigues Lisboa, pela aceitação da tarefa de orientação e pelo

apoio prestado na realização deste trabalho.

À professora Simone Trindade da Cunha, pela imensa colaboração no desenvolvimento

metodológico que deu forma a este trabalho.

À Universidade de Fortaleza (UNIFOR), pelo amplo acesso à educação, cultura e justiça,

contribuindo para uma completa formação profissional, superando desigualdades e construindo

uma sociedade mais justa e solidária.

Quando vou a um país, não examino se há boas leis, mas se as que lá existem são executadas, pois boas leis há em toda parte. Montesquieu

RESUMO

A pesquisa tem como objetivo analisar o instituto do mandado de injunção e a evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca do tema. No Brasil, o mandado de injunção surgiu com a promulgação da Constituição Federal de 1988, porém ele já era conhecido em outros países. O mandado de injunção visa extirpar do ordenamento jurídico qualquer ausência legislativa que impeça os indivíduos de usufruírem seus direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais. O controle de constitucionalidade incide sobre as omissões inconstitucionais, que ocorrem quando o legislador se omite, nascendo a lacuna legislativa. Assim, existem dispositivos na Constituição Federal que não conseguem produzir seus efeitos, por faltar uma norma infraconstitucional que as regulamente. Caso o poder público competente não o faça, o indivíduo prejudicado poderá ingressar com o mandado de injunção no Poder Judiciário. A doutrina e a jurisprudência ainda divergem sobre o alcance e efeitos de sua decisão. Há um enfoque na evolução jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, ficando ultrapassada sua postura mais conservadora e não concretista, para que prevaleçam decisões mais concretistas e efetivas, garantindo assim, a efetivação dos direitos constitucionais.

Palavras–chave: Mandado de injunção. Omissão inconstitucional. Controle de Constitucionalidade. Supremo Tribunal Federal.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................................... 9

1 O MANDADO DE INJUNÇÃO .......................................................................................... 12

1.1 Conceito ............................................................................................................................. 12

1.2 Origem ............................................................................................................................... 14

1.3 Direito comparado ............................................................................................................. 15

1.3.1 Direito Americano............................................................................................................15

1.3.2 Direito Inglês....................................................................................................................16

1.3.3 Direito Alemão.................................................................................................................16

1.3.4 Direito Francês.................................................................................................................17

1.3.5 Direito Português.............................................................................................................17

1.4 Pressupostos ...................................................................................................................... 18

1.5 Finalidade .......................................................................................................................... 19

1.6 Da ação .............................................................................................................................. 20

2 DA OMISSÃO INCONSTITUCIONAL ............................................................................. 23

2.1 Efetividade das normas constitucionais .............................................................................. 23

2.1.1 Influência da Doutrina Estrangeira..................................................................................23

2.1.2 No Direito Brasileiro........................................................................................................25

2.2 Omissão Inconstitucional .................................................................................................. 27

3 DA DECISÃO DO MANDADO DE INJUNÇÃO ............................................................... 32

3.1 Decisão do Mandado de Injunção na doutrina .................................................................. 32

3.2 Da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal .............................................................. 35

3.2.1 Posição Não Concretista..................................................................................................36

3.2.2 Posição Concretista..........................................................................................................37

3.2.2.1 Casos Emblemáticos.....................................................................................................40

4 INOVAÇÃO LEGISLATIVA: LEI 13.300/2016 ................................................................. 46

CONCLUSÃO .......................................................................................................................... 50

REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 52

APÊNDICE...............................................................................................................................57

INTRODUÇÃO

Na Constituição Federal foram estipulados diversos direitos e garantias para serem

usufruídos pelos indivíduos. No entanto, existem normas constitucionais que não conseguem

produzir todos seus efeitos, são as chamadas normas de eficácia limitada. Essas normas

precisam que uma lei infraconstitucional as regule para que possam ter eficácia total. Só assim

poderão produzir todos os seus efeitos.

Acontece que no cenário atual, existem diversos direitos que estão pendentes de

regulamentação, ocasionando assim, prejuízo aos administrados, pois eles ficam

impossibilitados de gozarem esses direitos. Caso ocorra uma omissão legislativa que traga

prejuízo aos indivíduos, a Constituição Federal traz a ação constitucional intitulada de mandado

de injunção, que visa precipuamente afastar a inércia legislativa e garantir aos indivíduos seus

direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais.

É função precípua do Poder Legislativo a criação de normas, no entanto, por vezes, esse

órgão se mantém inerte e não legisla. Nasce então, a inconstitucionalidade legislativa.

Inconstitucionalidade é uma contraposição à Constituição Federal. Se há um comando na

Constituição para que um órgão legisle, este deverá fazê-lo, sob pena de caracterizar uma

inconstitucionalidade legislativa por omissão. Caso o Poder Público mantenha-se inativo,

surgirá a possibilidade para o titular de direito constitucional buscar a concretização do direito,

ainda que pendente de lei regulamentadora. Diante disso, buscar-se-á, pois, desenvolver

pesquisa monográfica que responda aos seguintes questionamentos:

1 O que é o instituto do mandado de injunção?

2 Como o Supremo Tribunal Federal tem se posicionado acerca do julgamento desta

ação?

A justificativa para esse trabalho é a evolução no entendimento da jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal sobre o mandado de injunção. Por ser um assunto que sofreu grandes

alterações no decorrer dos anos, é essencial o estudo de todo o seu instituto e de como a mais

alta Corte do país tem se posicionado acerca do instituto em destaque. A análise do mandado

de injunção traz à tona tema como a efetivação dos direitos constitucionais, objetivando garantir

o bem estar de todos. Por essa razão, o Supremo Tribunal Federal vem alterando seu

entendimento e adotando uma postura mais concretista, em busca da efetivação dos direitos

constitucionais. Caso a Corte Maior não atue desta forma, a inércia do Poder Legislativo

atingirá milhares de brasileiros que estarão impedidos de usufruírem de seus direitos. Diante

deste cenário, em que os indivíduos estão sendo abruptamente prejudicados, revela-se a

importância do controle de constitucionalidade por omissão e de seus mecanismos, como o

mandado de injunção.

Temos, então, como objetivo geral analisar o estudo do mandado de injunção, mas,

sobretudo, a evolução da orientação do Supremo Tribunal Federal ao julgar essas ações, com

base em fundamentos doutrinários, legislativos e jurisprudenciais.

A metodologia a ser utilizada basear-se-á em estudo descritivo-analítico, desenvolvido

através de pesquisa bibliográfica dos doutrinadores: José Afonso da Silva, André Ramos

Tavares, Sérgio Reginaldo Bacha, Rachel Bruno Anastacio, Roberto Augusto Catellanos

Pfeiffer, Ingo Wolfgang Sarlet, entre outros. Quanto à abordagem é qualitativa, mediante

contato direto ou interativo com a situação de estudo. Quanto aos objetivos é descritiva, posto

que buscará definir, explicar e esclarecer o problema apresentado.

No primeiro capítulo será feita uma análise sobre o mandado de injunção, acerca de sua

definição, origem, direito comparado, pressupostos, finalidade e o estudo da referida ação.

Assim, surge na Constituição Federal de 1988, o instituto do mandado de injunção, que é o

mecanismo que irá afastar a ausência de lei regulamentadora, e tem o objetivo de garantir a

máxima efetividade dos direitos e liberdades fundamentais de todos. Então, quando houver

ausência de norma regulamentadora, de modo a tornar impossível o exercício de direito e

liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à

cidadania, poderá ser impetrado o mandado de injunção no Poder Judiciário.

No segundo capítulo será abordado o tema relativo à eficácia das normas constitucionais

e à omissão legislativa inconstitucional. Todas as normas constitucionais possuem eficácia,

mesmo que mínima. No entanto, existem normas que para alcançarem a sua total produção de

efeitos, é imprescindível a edição de uma lei regulamentadora. Essas são as chamadas normas

de eficácia limitada. Até que essa lei ulterior seja criada, a aplicação da norma é inviável, não

podendo os titulares desses direitos usufruí-los.

No terceiro capítulo desta pesquisa será analisada a evolução da jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal acerca da decisão do mandado de injunção. Até o ano de 2007, o

Supremo Tribunal Federal julgava os mandados de injunção adotando uma posição mais

conservadora, pois apenas declarava formalmente a ausência da legislação regulamentadora.

Porém, o mecanismo estava se tornando ineficaz, pois esse tipo de decisão era meramente

declaratória e não tinha o condão de obrigar o Poder Público a editar a norma faltante. Com

isso, o órgão legislador não obedecia à decisão do Supremo Tribunal Federal, e mantinha-se

inerte.

No quarto capítulo serão feitas considerações sobre a nova lei do mandado de injunção.

Por essa razão, o Supremo Tribunal Federal, com sua nova composição de ministros,

alterou seu entendimento em relação às decisões no mandado de injunção. Sua nova postura é

dirigida à concretização da Constituição, buscando a total efetividade dos direitos

constitucionais.

1 O MANDADO DE INJUNÇÃO

Neste capítulo, pretende-se examinar os conceitos essenciais para a compreensão do

remédio constitucional conhecido por mandado de injunção, iniciando-se pelo estudo

conceitual do instituto, sua origem histórica, seus requisitos essenciais, sua finalidade precípua

e o órgão competente para o julgamento da ação.

1.1 Conceito

O mandado de injunção é um mecanismo de garantia da eficácia da Constituição Federal.

É o remédio constitucional que visa preservar a máxima efetividade dos direitos e liberdades

fundamentais dos indivíduos. O mandado de injunção tem previsão na Constituição Federal de

1988, cuja redação dispõe que o referido instrumento poderá ser utilizado quando houver

ausência de norma regulamentadora de modo a tornar inviável o exercício de direitos e

liberdades constitucionais, bem como o exercício de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à

soberania e à cidadania, conforme preleciona o art. 5º, LXXI, da CRFB/88: “conceder-se-á

mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício

dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à

soberania e à cidadania.”

Assim, o mandado de injunção é uma das novidades trazidas pela Constituição Federal

de 1988, sendo cabível sempre que a falta de norma reguladora dificulte ou torne impossível o

exercício de direitos constitucionais. A Constituição Federal de 1988 trouxe esse mecanismo

para garantir a eficácia das normas constitucionais. Consoante José Afonso da Silva (2010, p.

448):

O mandado de injunção constitui um remédio ou ação constitucional posto à disposição de quem se considere titular de qualquer daqueles direitos, liberdades ou prerrogativas inviáveis por falta de norma regulamentadora exigida ou suposta pela Constituição. Sua finalidade principal consiste assim em conferir imediata aplicabilidade à norma constitucional portadora daqueles direitos e prerrogativas, inerte em virtude de ausência de regulamentação. Revela-se, neste quadrante, como um instrumento de realização prática do art. 5º, § 1º, da Constituição Federal.

A Constituição Federal dispõe que as normas que definem direitos e garantias

fundamentais deverão ser de eficácia imediata, em razão da sua relevância ao ordenamento

jurídico. Assim, dispõe o art. 5º, § 1º da Carta Magna:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

Quando se verifica a inexistência ou omissão de lei, que inviabiliza a plenitude da eficácia

de direitos e garantias assegurados pela Constituição, o Poder Judiciário será acionado por meio

do exercício do direito de petição, através da ação de mandado de injunção, para que recomende

ao Poder competente que edite a norma que irá conferir eficácia total aqueles direitos.

O fundamento legal do mandado de injunção se encontra na Lei 8.038/90. Essa norma

disciplina normas procedimentais em relação aos processos ajuizados perante o Supremo

Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça. O parágrafo único do artigo 24 desta lei

dispõe que, no mandado de injunção serão observadas, no que couberem, as normas do

mandado de segurança, enquanto não editada legislação específica. Por muito tempo não havia

uma lei que regulamentasse o mandado de injunção. Dessa forma, era aplicada por analogia a

lei 12.016/2009, que se refere à Lei do Mandado de Segurança. Para extirpar essa lacuna, foi

criada a lei 13.300/2016 que regula o procedimento do mandado de injunção.

Gilmar Mendes (2012, p. 495) lembra que o mandado de injunção é um instrumento do

processo constitucional voltado para a defesa de direitos subjetivos em face de omissão do

legislador ou de outro órgão incumbido do poder regulatório. André Ramos Tavares (2010, p.

1007) assinala que:

O mandado de injunção é uma ação judicial, de berço constitucional, com caráter especial, que objetiva combater a morosidade do Poder Público em sua função legislativa-regulamentadora, entendida em sentido amplo, para que viabilize, assim, o exercício concreto de direitos, liberdades ou prerrogativas constitucionalmente previstos.

Desta forma, o mandando de injunção é um remédio constitucional que objetiva proteger

os interesses dos indivíduos. Os remédios constitucionais, que estão previstos no art. 5º da Carta

Magna, buscam proteger os cidadãos dos avanços do Estado sobre a pessoa, que tem como

consequência a ocorrência de lesão ou ameaça a direitos.

1.2 Origem

O mandado de injunção surgiu da necessidade, no Estado Contemporâneo, de existir um

instrumento capaz de afastar as omissões inconstitucionais. Diverge a doutrina acerca da origem

do mandado de injunção, principalmente no que concerne sobre sua fonte inspiradora, ou seja,

a forma que este remédio constitucional surgiu para o Direito. Conforme ensina Alexandre de

Moraes (2012, p. 178), há certa dissonância entre alguns doutrinadores a respeito da origem do

mandado de injunção. É considerado um assunto controvertido entre os doutrinadores. Segundo

ele,

alguns doutrinadores apontam a sua origem no writ of injunction do Direito norte-americano, que representa um remédio utilizado, frequentemente, com base na chamada jurisdição de equidade, aplicando-o sempre quando a norma legal se mostra insuficiente ou incompleta para solucionar, com justiça, determinado caso concreto. Por outro lado, outros doutrinadores apontam raízes do mandado de injunção nos instrumentos existentes no velho Direito português, com a única finalidade de advertência do Poder competente omisso. (MORAES, 2012, p.178)

A origem do mandado de injunção é duvidosa, gerando diversas correntes. Alguns

doutrinadores asseveram que o referido instituto tem influência anglo-americana, outros que

sua origem é tipicamente brasileira e, outros entendem que houve forte influência do direito

português. Rachel Bruno Anastácio (2003, p. 3) dispõe que:

Pelo fato de não possuir precedentes no direito constitucional brasileiro, surgiram basicamente três entendimentos doutrinários acerca da origem do tema sob exame: os que sustentam ser o instituto uma recepção do direito anglo-americano; uma criação ou singularidade do direito brasileiro, e, ainda, resultado de influência do direito português, variante da ação de inconstitucionalidade por imissão alemã.

O mandado de injunção pode ser considerado um instituto novo, pois surgiu no

ordenamento pátrio brasileiro apenas com a Constituição Federal de 1988. Com isso, razão

assiste a Roberto Pfeiffer (1999, p. 31) ao assinalar que o mandado de injunção da Constituição

de 1988 é instituto tipicamente nacional, sendo as semelhanças com outros institutos de Direito

estrangeiro insuficientes para destes pretender decorrer o writ brasileiro em sua específica

formatação.

J. J. Gomes Canotilho (1993, p. 367), ao analisar sobre as perspectivas do mandado de

injunção e da inconstitucionalidade por omissão, observa que:

Se um mandado de injunção puder, mesmo modestamente, limitar a arrogante discricionariedade dos órgãos normativos, que ficam calados quando a sua obrigação jurídico-constitucional era vazar moldes normativos regras atuativas de direitos e liberdades constitucionais; se, por outro lado, através de uma vigilância judicial que não extravase da função judicial, se conseguir chegar a uma proteção jurídica sem lacunas; se, através de pressões jurídicas e políticas, se começar a destruir o ‘rochedo de bronze’ da incensurabilidade do silêncio, então o mandado de injunção logrará seus objetivos.

Na criação da Constituição Federal de 1988, através da Assembleia Constituinte, já

havia a preocupação de tentar afastar a inércia legislativa. O Anteprojeto de Constituição

elaborado pela Comissão Afonso Arinos previa mecanismo que pudesse assegurar a produção

de efeitos de todo o texto constitucional, tentando sanar omissões inconstitucionais e o

fenômeno da ineficácia das normas constitucionais.

1.3 Direito Comparado

Independente da corrente doutrinária que se aborde quanto à origem do mandado de

injunção, sabe-se que esse instituto nunca fora ventilado no ordenamento jurídico brasileiro, até

a Carta Cidadã de 1988. Por essa razão, é interessante analisar o mandando de injunção na visão

de outros países.

1.3.1 Direito Americano

Com relação ao Direito Americano, este deu alguns passos para garantir direitos que

não estivessem previstos na lei, no entanto seria necessária a produção de provas para

comprovar o prejuízo ou injustiça ao impetrante. Rachel Bruno Anastacio (2003, p. 14-15)

ensina que,

introduzido por volta de 1870 nos EUA, preservando seu caráter de equidade, o writ of injuction foi, inicialmente, uma medida utilizada para defender direitos subjetivos, mas, não obstante tenha se iniciado no campo do direito privado, foi ampliado gradualmente seu campo de atuação para abraçar também questões de direito público. [...] Sendo a injunção uma ordem judicial que pode ser expedida por qualquer tribunal, dependendo apenas da consciência do magistrado, caso se convença de sua necessidade. Além disso, tal remédio extraordinário serve para qualquer pessoa reivindicar direitos que não estejam previsto na lei, devendo o impetrante, para que tal se dê, produzir provas, que podem abranger até mesmo o perigo de prejuízo ou injustiça.

Assim, o mandando de injunção no direito americano possuía ampla extensão, pois

ficava a cargo do magistrado, em qualquer instância, decidir sobre o provimento de um direito

subjetivo que não detinha eficácia plena.

1.3.2 Direito Inglês

O direito inglês obedece um sistema não codificado, pois a lei é não escrita. A

Constituição Inglesa tem como fundamento decisões jurisprudenciais, sendo assim, se trata de

uma constituição costumeira ou consuetudinária. O direito inglês é um direito judiciário, pois é

resultado das decisões dos juízes e tribunais. José Afonso da Silva (1989, p. 9-52) assinala que:

A Equity fundamenta a outorga de direito mediante a atuação discricionária de um juízo especial, tanto na falta de regulamentação quanto na ausência de proteção satisfatória por parte do sistema da Commom Law, do direito da pessoa. Tendo em vista que se baseia na valoração judiciária do caso para que dela advenha uma decisão pautada em valores jurídicos sempre atrelados aos princípios gerais do direito, aos costumes, às tradições etc., pode-se afirmar que consiste numa decisão pela qual o juiz constrói uma norma para a proteção de um direito. É, então, um direito criado pelo juiz a fim de satisfazer dispositivos constitucionais não regulamentados, assemelhando-se, em muito, ao mandando de injunção brasileiro.

No direito inglês, o direito postulado pelos cidadãos era decidido pelo juiz, que

analisaria o caso, e de forma discricionária, julga o caso concreto, em que ocorra a falta de

regulamentação ou uma proteção insatisfatória aos indivíduos. Como o direito inglês é

consuetudinário, o juiz irá fundamentar sua decisão nos costumes, tradições, valores daquele

povo e nos princípios.

1.3.3 Direito Alemão

Com relação ao direito alemão, pode-se observar que já existia um mecanismo para

evitar atos omissivos das autoridades, pois, por muitas vezes, tratavam os cidadãos de maneira

distinta, privilegiando uns aos outros, violando de forma latente o Princípio da Isonomia. Nesse

caso, era necessária a prova da lesão ao requerente. A ação era chamada de

Verfassungsbeschwerde, que era utilizada por aqueles indivíduos que sofreram a lesão. Roberto

Augusto Castellanos Pfeiffer (1999, p. 34) dispõe que,

a ação constitucional alemã vem sendo admitida para a impugnação tanto de comportamentos omissivos como comissivos de autoridades, desde que fique demonstrado que acarretaram lesões a direito do queixoso. Quanto aos comportamentos omissivos, tem sido utilizada sobretudo para indicar a omissão legislativa, notadamente quando se trata de omissão parcial, ou seja, quando a lei, violando o princípio da isonomia, reconheça certo privilégio apenas a determinadas pessoas, grupos, categorias ou segmentos sociais, não mencionando outros indivíduos, grupos, categorias ou segmentos sociais em situação semelhante.

O regime alemão tratava de maneira diferenciada a população, por essa razão, a figura

do mandado de injunção tem natureza ampla, pois abrange atos comissivos e omissivos, com o

escopo de trazer maior isonomia aos cidadãos alemães. Aqui, pode ser reconhecida a omissão

total ou parcial da norma.

1.3.4 Direito Francês

No direito francês ocorre a figura da injonction. O poder da injunção na França está

previsto em leis específicas, que dão autorização para as autoridades emitirem ordens aos

indivíduos ou intimá-los. Consoante Rachel Bruno Anastacio (2003, p. 22),

assim é que no direito administrativo francês traduz-se a injunção em uma ordem de fazer, expedida por juiz contra uma pessoa pública; no direito civil francês, é uma ordem dada às partes em certas circunstâncias, inclusive a advogados e procuradores da Corte de Apelação, a fim de provocar a pontualidade dos mesmos. Ainda, quando utilizada no processo civil francês, tem por finalidade a cobrança de pequenos crédito civis e comerciais, obrigando o devedor a pagar por meio de um procedimento bastante simplificado. Pode-se verificar, novamente, a semelhança deste último procedimento não com o mandado de injunção, mas com processo monitório pátrio.

O modelo francês se contrapõe ao direito brasileiro, pois se traduz como uma ação de

cobrança e não como um mecanismo para afastar a omissão legislativa. No direito brasileiro, a

função precípua do mandado de injunção é garantir os direitos, liberdades e prerrogativas

constitucionais dos indivíduos que estão pendentes de uma norma regulamentadora.

1.3.5 Direito Português

Alguns constitucionalistas acreditam que o mandado de injunção brasileiro buscou

inspiração no direito português. Em Portugal, o objetivo principal da decisão que reconhece a

omissão legislativa é apenas dar conhecimento ao órgão competente da inconstitucionalidade

por omissão. O real destinatário da decisão é o legislador. O instituto português se assemelha

bastante com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Nas palavras de Carlos

Alcântara Machado (1999, p. 55):

Recorde-se que atual art. 283º/2 da Constituição portuguesa é menos diretivo do que o art. 279º em sua redação primitiva, pois, como aduz o autor lusitano, a dicção anterior do dispositivo possibilitava ao Conselho da Revolução efetuar ‘recomendações’ (“Quando a constituição não estiver a ser cumprida por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais, o Conselho da Revolução poderá recomendar aos órgãos legislativos competentes que as emitam em tempo razoável”). Hoje a redação é mais singela (“Quando o Tribunal Constitucional verificar a existência de inconstitucionalidade por omissão, dará disso conhecimento ao órgão legislativo competente”).

O direito português muito se assemelha ao brasileiro em relação à busca pela extinção

da omissão ou mora legislativa do ordenamento jurídico. Desta forma, existe a busca de garantir

a máxima efetividade das normas. Em Portugal, o instituto tem como finalidade apenas declarar

a existência de inconstitucionalidade por omissão, tendo uma atuação conservadora.

Após a realização do estudo comparado, vislumbra-se que não houve total reprodução

pelo direito brasileiro de nenhum instituto estrangeiro de forma integral. O legislador

constituinte procurou se inspirar no modelo anglo-saxão para a criação do mandado de injunção

brasileiro. Assim, percebe-se que o mandado de injunção brasileiro mais se assemelha com os

institutos correlatos americanos, ingleses e portugueses.

1.4 Pressupostos

Para que haja a correta impetração do remédio constitucional em questão, devem ser

preenchidos os requisitos necessários, que são: a ausência de uma norma reguladora de uma

previsão constitucional, podendo a omissão ser total ou parcial; e o prejuízo ao indivíduo, que

é a impossibilidade de exercer seus direitos e liberdades constitucionais. De acordo com José

Afonso da Silva (2010, p. 449):

Os pressupostos do remédio são: a falta de norma regulamentadora do direito, liberdade ou prerrogativa reclamada; ser o impetrante beneficiário direto do direito, liberdade ou prerrogativa que postula em juízo. O interesse de agir, mediante mandado de injunção, decorre da titularidade do bem reclamado, para que a sentença que confira tenha direta utilidade para o demandante.

Acerca do tema, existem várias correntes, a primeira tem caráter limitado, pois aduz que o

mandado de injunção deverá garantir direitos e prerrogativas inerentes apenas à nacionalidade,

à soberania, e à cidadania. Já a segunda corrente, os direitos protegidos pela referida ação são

os direitos e garantias previstos no Título II da Constituição Federal de 1988. A última corrente

tem uma visão mais ampla, pois garante aos indivíduos a possibilidade de impetrarem mandado

de injunção para salvaguardar não somente os direitos e garantias que estão previstos no Título

II da Carta Magna, mas todos os direitos, liberdades e prerrogativas previstas ao longo do texto

constitucional, em razão do que dispõe o art. 5º, LXXI.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal corrobora o entendimento da última corrente, pois

de acordo com os julgados dos MI 232/RJ e 283/DF, a Corte Suprema analisou os dispositivos

que se situavam fora do Título II da Constituição Federal, como ocorreu com o art. 195, § 7º e

do art. 8º, § 3º, do ADCT. Excertos extraídos do julgamento do Mandado de Injunção nº 232/RJ:

Portanto, deixou assente o Supremo Tribunal Federal que, consoante a sua própria natureza, o mandado de injunção destinava-se a garantir os direitos constitucionalmente assegurados, inclusive aqueles derivados da soberania popular, como ao direito ao plebiscito, o direito ao sufrágio, a iniciativa popular legislativa popular (art. 14, I e III), bem como os chamados direitos sociais (Constituição, art. 6º), desde que o impetrante estivesse impedido de exercê-lo em virtude da omissão do órgão legiferante. A partir do precedente firmado no MI nº 107/DF, de relatoria do Min. Moreira Alves, o STF constatou que o mandado de injunção afigurava-se adequado à realização de direitos constitucionais que dependiam da edição de normas de organização, sob pena do esvaziamento do significado desses direitos. Assim, no

caso relativo à omissão legislativa quanto aos critérios de indenização devida aos anistiados (art. 8º do ADCT), o Tribunal entendeu que, em face da omissão, os eventuais afetados poderiam dirigir-se diretamente ao juiz competente que haveria de fixar o montante na forma do direito comum (Cf., nesse sentido, MI nº 562-DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 24.6.2003; e MI nº 543-DF, Rel. Min. Octavio Gallotiti, DJ 24.5.2002). Em outro precedente relevante, considerou-se que a falta de lei não impedia que a entidade beneficente gozasse da imunidade constitucional expressamente reconhecida (CF. MI nº 679, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.12.2002 (Jurisprudência do STF (MI 708, Relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 Divul. 30-10-2008 Public. 31-10-2008 Ement. Vol-02339-02 PP-00207 RTJ Vol-00207-02 PP-00471)

Concordando com o entendimento da Suprema Corte, Luís Flávio Gomes (apud

BACHA, 1998, p. 48-49), explicita que os direitos amparados pelo mandado de injunção estão

além dos previstos no art. 5º, da Constituição Federal de 1988.

Direitos e liberdades constitucionais são os direitos individuais, coletivos e sociais previstos sobretudo no Título II, Capítulo I e II da Constituição Federal, cujas normas têm aplicação imediata, sem prejuízo de outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados. Em suma: abrange qualquer direito constitucional. Direitos infraconstitucionais (instituídos em legislação infraconstitucional), não regulamentados, não ensejam o mandado de injunção.

Assim, cabe visualizar que o campo de atuação do mandado de injunção é bastante amplo,

podendo alcançar direitos que estejam localizados em todo o corpo da constituição, direitos

estes que não podem ser exercidos, em razão da ausência de norma que os regulamente.

1.5 Finalidade

O mandado de injunção tem como finalidade precípua dar a concreção a direito abstrato

previsto na Constituição Federal, relacionados a direitos e liberdades constitucionais e

prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Ou seja, a ideia é a

transformação de um direito abstrato em concreto. Desta forma, é uma ação de caráter

constitucional, que contém uma pretensão que pode ser alcançada através da tutela jurisdicional.

Esta ação visa defender os direitos fundamentais da omissão do ente legiferante, evitando

também, a conhecida “mora legislativa”.

Havendo a previsão de um direito na Carta Magna, não há razão plausível de este direito

não poder ser usufruído pelos indivíduos. A inexistência de lei que regulamente algum

dispositivo constitucional não pode impedir o pleno gozo dos direitos individuais

constitucionais. Por essa razão, o remédio constitucional em destaque tem como finalidade

tornar aquele direito individual que está pendente de regulamentação em um direito plenamente

eficaz. Com isso, o referido remédio constitucional visa afastar toda ineficácia que paire sobre

direito previsto na Constituição Federal.

O objeto do mandado de injunção, na feliz expressão de Manoel Jorge e Silva Neto

(2009, p. 807), é transformar o direito abstrato em concreto, resultando tal providência “da

histórica ausência de efetividade de diversos direitos consagrados em Constituições brasileiras

precedentes, fato que decorreu da inércia legislativa”. De acordo com Rachel Bruno Anastácio

(2003, p. 56), “pode-se dizer, em síntese, que o mandado de injunção visa o interesse do

impetrante ou impetrantes, à obtenção de normas viabilizadoras do exercício de seus direitos.”

1.6 Da Ação

O mandado de injunção é uma ação que objetiva tornar um direito individual

constitucional que era abstrato em concreto, para que ele possa produzir todos seus efeitos

jurídicos, ainda que não exista norma que o regule.

No que concerne à legitimidade ativa da ação, esta pode ser impetrada por qualquer

pessoa, física ou jurídica, nacional ou estrangeira, quando o exercício de seu direito ou liberdade

constitucional estiver impedido, em razão da ausência de regulamentação. De acordo com

André Ramos Tavares (2012, p. 1008), “qualquer pessoa é parte legítima para ajuizar a ação

injuncional, desde que atendidas as condições constitucionais específicas.”

Ainda que não haja previsão expressa na Constituição Federal sobre o mandado de

injunção coletivo, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já admitiu a legitimidade ativa

das associações de classe devidamente constituídas e das confederações sindicais. Essa

possibilidade foi permitida em razão da aplicação analógica da Lei do Mandado de Segurança,

que permite a impetração de mandado de segurança coletivo.

Mandado de injunção coletivo – impetração deduzida por confederação sindical – possibilidade – natureza jurídica do writ injuncional – taxa de juros reais (cf, art. 192, §3º) – omissão do congresso nacional – fixação de prazo para legislar – descabimento, no caso – writ deferido. Mandado de injunção coleivo – admissibilidade. Entidades sindicais dispõem de legitimidade ativa para a impetração do mandado de injunção coletivo, que constitui instrumento de atuação processual destinado a viabilizar, em favor dos integrantes das categorias que essas instituições representam, o exercício de liberdades, prerrogativas e direitos assegurados pelo ordenamento constitucional. (STF – Tribunal Pleno – MI nº 472/DF – rel. Min. Celso de Mello, DJU, 02.03.2001, p.3)

No que concerne à legitimidade passiva do mandado de injunção, a ação deve ser

impetrada em face da entidade estatal que é competente para legislar sobre aquele assunto. Se

a iniciativa legislativa for do Presidente da República, a ação injuncional terá em seu polo

passivo o Presidente da República, da mesma forma ocorre quando a iniciativa legislativa

pertencer ao Congresso Nacional. Como a função legiferante pertence aos órgãos públicos,

torna-se impossível a impetração de mandado de injunção em face de particulares, ainda que

em litisconsórcio passivo. Alexandre de Moraes (2012, p. 182) ensina que:

O sujeito passivo será somente a pessoa estatal, uma vez que no polo passivo da relação processual instaurada com o ajuizamento do mandado de injunção só aquelas podem estar presentes, pois somente aos entes estatais pode ser imputável o dever jurídico de emanação de provimento normativos. Os particulares não se revestem da legitimidade passiva ad causam para o processo injuncional, pois não lhes compete o dever de emanar as normas reputadas essenciais ao exercício do direito vindicado pelos impetrantes. Somente o Poder Público é imputável o encargo constitucional de emanação de provimento normativo para dar aplicabilidade à norma constitucional.

Em relação à competência para julgar a ação, esta é fixada pelo órgão que tem a atribuição

para editar a norma regulamentadora. O artigo 102, I, q, da Constituição Federal dispõe que,

Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe, processar e julgar originariamente o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição do Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, das mesas de umas dessas Casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal.

Já o art. 105, I, h, da Constituição Federal, traz a competência do Superior Tribunal de

Justiça para julgar a ação:

Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar originariamente o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.

Finalmente, a constituição federal traz em seu artigo 121, §4º, V, a competência do

Tribunal Superior Eleitoral para julgar, em grau de recurso, o mandado de injunção que tiver

sido denegado pelo Tribunal Regional Eleitoral.

Em relação ao procedimento da ação, devem ser observadas as normas que estão previstas

na Lei do Mandado de Injunção, que é a Lei nº 13.300/2016, no que couber. Apesar disso, José

Afonso da Silva (2010, p. 449) entende que a norma que prevê o mandado de injunção no texto

constitucional é norma de eficácia plena, não sendo necessária a edição de norma

regulamentadora.

Cumpre esclarecer que o disposto no art. 5º, LXXI, não depende de regulamentação para ser aplicado. O texto possui todos os elementos suficientes à sua imediata aplicação, reforçada essa aplicabilidade direta com o disposto no § 1º do mesmo artigo, o que significa que os juízes não poderão deixar de atender a toda e qualquer demanda que lhes for dirigida, e não poderão deixar de decidir também, dado o monopólio jurisdicional.

O artigo 24, § 1º da Lei 8.038/1990 traz disposição que indica que devem ser observadas,

no que couber, as normas do mandado de segurança, enquanto não editada legislação específica

que regulamente o procedimento do mandado de injunção. Esse procedimento foi seguido por

muito tempo até a edição da lei do mandado de injunção. De acordo com o Regimento do

Superior Tribunal de Justiça, o mandado de injunção tem prioridade de julgamento sobre os

demais atos judiciais, salvo o habeas corpus, o habeas data e o mandado de segurança.

Já é pacífico o entendimento que cabe mandado de injunção em âmbito estadual. Em

razão do Princípio da Simetria, os Estados-membros, podem estabelecer em suas próprias

constituições, o órgão competente para julgar as ações de mandado de injunção e o seu

processamento, em virtude do poder constituinte derivado decorrente.

2 DA OMISSÃO INCONSTITUCIONAL

Neste tópico será analisada a eficácia das normas constitucionais, especialmente sua

classificação e sua extensão de efeitos. Também será abordado o tema relativo à omissão

inconstitucional, pois é em razão desta, que nasce o interesse de propor a ação constitucional

do Mandado de Injunção no direito brasileiro.

A classificação das normas constitucionais quanto a sua eficácia sempre foi perquirida

pela doutrina constitucionalista. Não obstante essa busca, o referido tema é próprio da teoria do

Direito. No entanto, existem algumas peculiaridades nas normas constitucionais, que fazem

com que seja imprescindível a classificação quanto à eficácia para o completo entendimento do

instituto do mandado de injunção.

2.1 Efetividade das normas constitucionais

Inicialmente, impende destacar que todas as normas constitucionais tem força normativa,

ou seja, todas possuem alguma eficácia. Ocorre que é importante informar que nem todas as

normas constitucionais tem idêntico grau de eficácia, por essa razão se torna importante a

organização de ideias por meio da classificação das normas constitucionais quanto a sua

aplicabilidade.

2.1.1 Influência da doutrina estrangeira

O assunto eficácia das normas constitucionais tem sido bastante discutido pela doutrina

pátria, desde a Constituição de 1891. A partir de então, a doutrina que dominou foi a de Ruy

Barbosa, que foi um dos idealizadores da ordem constitucional republicana. A concepção de

Ruy Barbosa foi baseada no direito norte americano, principalmente nas obras de grandes

doutrinadores americanos, assim como nas decisões da Suprema Corte e de outros tribunais dos

Estados Unidos. A doutrina americana separa as normas constitucionais em dois grupos, as

normas self-executing e as not self-executing. As primeiras são as normas auto-aplicáveis, pois

estão aptas a produzir todos os seus efeitos, já que seu conteúdo é totalmente determinado, não

sendo necessária a edição de uma lei posterior. Ruy Barbosa (1933, p. 488), baseado na lição

de George Tucker:

São, portanto, as determinações, para executar as quaes, não se haja mister de constituir ou designar uma autoridade, nem criar ou indicar um processo especial, e

aquellas onde o direito instituído se ache armado, por si mesmo, pela sua própria natureza, dos meios de execução e preservação. Uma disposição constitucional é executável por si mesma, quando completa no que determina, lhe é supérfluo o auxílio supletivo da lei, para exprimir tudo o que intenta e realizar tudo o que exprime.

Em relação às normas não-auto-aplicáveis, Ruy Barbosa (1933) salienta que essas

normas indicam princípios, não estabelecem normas, desta forma, requerem a ação do

legislador para que garanta a sua efetividade. O entendimento de Ruy Barbosa foi diretamente

importado da doutrina norte americana, e foi adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro por

muitas décadas. Diversos doutrinadores clássicos brasileiros seguiram a doutrina de Ruy

Barbosa, tal como Pontes de Miranda.

Thomas Coleey entendeu que as normas do texto constitucional não devem servir como

meros conselhos, pois ele percebeu que algumas normas eram incapazes de produzir seus

efeitos imediatamente. Baseando-se nesse apontamento, dividiu as normas constitucionais em

dois grupos formados pelas normas exequíveis e não exequíveis. Thomas Cooley (1890, p.99)

entende:

Uma norma constitucional afigura-se como self-executing ou autoexequível se prover (ao destinatário) todos os meios necessários para que o direito ou comendo previsto seja aproveitado e protegido. Caso contrário, ter-se-á uma norma autoexequível ou not selfexecuting, a qual, em razão da inexistência de meios (referências normativas) suficientes para a sua efetiva aplicação, quedará em um estado de dormência, no máximo, quiçá, como uma força moral, até a legislação infraconstitucional lhe conceda as provisões capazes de torna-la aplicável, fruível.

A partir da década de cinquenta, com a Constituição de 1934, a doutrina de Ruy Barbosa

e a doutrina norte-americana sofreram críticas, pois sua concepção clássica anunciava que a

maior parte das normas do texto constitucional não possuía eficácia plena, sendo necessária a

intervenção do legislador infraconstitucional. Já a doutrina atual, em discordância, dispõe que

a maior parte das normas constitucionais tem eficácia plena e diretamente aplicável. Uma

segunda crítica se referia ao conceito norte-americano das normas não-auto-aplicáveis, pois a

doutrina americana entende que esse tipo de norma não produzia efeito algum, pois são

totalmente destituídas de eficácia ou aplicabilidade.

Um dos primeiros autores brasileiros a discordar da corrente de Barbosa foi José

Horácio Meirelles Teixeira (apud SARLET, 2011, p. 246), que ensinava “toda e qualquer

norma constitucional alcança algum tipo de eficácia, de tal sorte que a eficácia das normas

constitucionais pode ser considerada de natureza gradual, isto é, variando entre um mínimo e

um máximo.”

2.1.2 No Direito Brasileiro

José Afonso da Silva (2010) tentou resolver o problema da eficácia e aplicabilidade das

normas constitucionais. Assim, criou uma teoria tricotômica de eficácia, na qual dividiu as

normas constitucionais em três grupos, normas de eficácia plena, normas de eficácia contida e

normas de eficácia limitada.

José Afonso da Silva (2010) aduz que no texto constitucional existe a previsão de que

todos os direitos e garantias fundamentais tem eficácia imediata. No entanto, vislumbra-se que

existem diferentes tipos de eficácia dentre os direitos constitucionais. Alguns direitos têm

eficácia total, não necessitando de lei posterior para que consiga produzir seus efeitos; outros

têm eficácia imediata, ou seja podem ter seus efeitos contidos em razão de outra lei; e há outros

que tem eficácia limitada, pois só conseguem produzir seus efeitos, quando nasce uma norma

que os regulamente.

A eficácia e a aplicabilidade das normas que contêm os direitos fundamentais dependem muito do seu enunciado, pois se trata de assunto que está em função do Direito Positivo. A Constituição é expressa sobre o assunto, quando estatui que as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Mas certo é que isso não resolve todas as questões, porque a Constituição mesma faz depender de legislação ulterior a aplicabilidade de algumas normas definidoras de direitos sociais, enquadrados dentre os fundamentais. Por regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata, enquanto as que definem os direitos econômicos e sociais tendem a sê-lo também na Constituição vigente, mas algumas, especialmente as que mencionam uma lei integradora, são de eficácia limitada, de princípios programáticos e de aplicabilidade indireta, mas são tão jurídicas como as outras e exercem relevante função, porque, quanto mais se aperfeiçoam e adquirem eficácia ampla, mais se tornam garantias da democracia e do efetivo exercício dos demais direitos fundamentais. (SILVA, 2010, p. 180)

O presente autor afirmou que não é fácil fixar regras gerais para diferenciar cada grupo.

Destarte, as normas de eficácia plena são as normas que possuem aplicabilidade direta, imediata

e integral, não precisam do legislador infraconstitucional para que a norma surta efeitos. São de

aplicabilidade imediata porque possuem os elementos indispensáveis à sua executoriedade.

Essas normas trazem consigo conduta jurídica positiva ou negativa com comando certo e

definido. Assim, explicou quais são as normas de eficácia plena:

Completa, nesse sentido, será a norma que contenha todos os elementos e requisitos para a sua incidência direta. Todas as normas regulam certos interesses em relação à determinada matéria. Não se trata de regular a matéria em si, mas de definir certas situações, comportamentos ou interesses vinculados à determinada matéria. Quando essa regulamentação normativa é tal que se pode saber, com precisão, qual a conduta positiva ou negativa a seguir, relativamente ao interesse descrito na norma, é possível afirmar-se que esta é completa e juridicamente dotada de plena eficácia, embora possa

não ser socialmente eficaz. Isso se reconhece pela própria linguagem do texto, porque a norma de eficácia plena dispõe peremptoriamente sobre os interesses regulados. (SILVA, 2003, p. 99)

No que concerne às normas de eficácia contida, essas normas se assemelham às normas

de eficácia plena, no quesito da aplicabilidade, pois possuem aplicabilidade imediata. No

entanto, se afastam dela, pois pode haver uma legislação futura que restrinja o âmbito de seus

efeitos. Conforme José Afonso da Silva (2003, p. 103), “a legislação futura, antes de completar-

lhes a eficácia, virá impedir a expansão da integridade de seu comando jurídico.”. José Afonso

da Silva (2003, p. 104) assinala sobre as normas de eficácia contida:

São normas que, em regra, solicitam a intervenção do legislativo ordinário, fazendo expressa remissão a uma legislação futura; mas o apelo ao legislador ordinário visa a restringir-lhes a plenitude de eficácia, regulamentando os direitos subjetivos que delas decorrem para os cidadãos, indivíduos ou grupos. Enquanto o legislador ordinário não expedir a normação restritiva, sua eficácia será plena; nisso também diferem das normas de eficácia limitada, de vez que a interferência do legislador ordinário, em relação a estas, tem o escopo de lhe conferir plena eficácia e aplicabilidade concreta e positiva. São de aplicabilidade imediata, visto que o legislador constituinte deu normatividade suficiente aos interesses vinculados à matéria de que cogitam.

A norma de eficácia contida tem sua aplicabilidade imediata, ou seja, já produz de

pronto seus efeitos, mas pode ter sua eficácia reduzida por lei futura. Esta norma já possui todos

os elementos para sua total produção de efeitos, porém o poder público poderá, de forma

discricionária, restringir seus efeitos.

A possibilidade de delimitação da eficácia das normas de eficácia contida existe em

razão dos fins gerais e sociais do Estado moderno. Assim, visa à proteção da coletividade em

geral, para evitar que o direito de um indivíduo prejudique os direitos do restante das pessoas.

Desta forma, se perfaz o Estado Democrático de Direito, no qual se preocupa mais com os

interesses coletivos em detrimento dos interesses individuais.

Finalmente, as normas de eficácia limitada são aquelas que possuem aplicabilidade

indireta, mediata ou reduzida, pois só conseguirá alcançar seus efeitos, após a criação de uma

lei infraconstitucional que a regulamente. Isso não quer dizer que esse tipo de norma seja

desprovida de eficácia, isso não é verdade, porque toda norma constitucional é dotada de

eficácia, por menor que seja. De acordo com André Ramos Tavares (2010, p. 118),

as normas de eficácia limitada são aquelas que dependem de regulamentação futura, na qual o legislador infraconstitucional vai dar eficácia à vontade do constituinte. Não produzem, com a simples entrada em vigor da Constituição todos os efeitos essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer motivo, não estabeleceu sobre a matéria uma normatividade para isso bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão do Estado.

Ainda, José Afonso da Silva (2003, p. 123) faz uma subdivisão nas normas de eficácia

limitada, em normas declaratórias de princípios institutivos ou organizativos e as normas

declaratórias de princípios programáticos. Os primeiros são regidos por uma legislação futura

que irá lhe garantir eficácia e aplicabilidade. Afirma que “contêm esquemas gerais, um como

que início de estruturação de instituições, órgãos ou entidades.”

Já as normas programáticas são as normas que trazem programas que deverão ser

implantados, necessitando da vontade do legislador infraconstitucional. São normas que

estabelecem o que os governantes deverão ou poderão fazer em relação a certos assuntos. São

normas que trazem programas a serem concretizados pelo Estado, necessitando de uma norma

posterior que desenvolva tais orientações. Pontes de Miranda (apud SILVA, 2003, p. 137)

explica:

Regras jurídicas programáticas são aquelas em que o legislador, constituinte ou não, em vez de editar regra jurídica de aplicação concreta, apenas traça linhas diretoras, pelas quais se hão de orientar os Poderes Públicos. A legislação, a execução e a própria Justiça ficam sujeitas a esses ditames, que são como programas dados à sua função.

Vale destacar que existem outros autores que apresentam diferentes classificações quanto

à aplicabilidade e eficácia das normas constitucionais, no entanto José Afonso da Silva traz sua

classificação clássica que é seguida por outros doutrinadores.

Diante da classificação exposta, impende mencionar que as normas que serão objeto do

mandado de injunção são as normas de eficácia limitada, pois não havendo regulamentação,

tais normas não terão aplicabilidade na prática, abstendo-se de fruir seus efeitos. Pedro Lenza

(2008, p. 651) afirma que “o mandado de injunção surge para curar uma doença denominada

síndrome da inefetividade das normas constitucionais”. É importante afastar toda situação que

possa impedir a fruição de direitos constitucionais.

2.2 Omissão Inconstitucional

Inconstitucionalidade pode ser entendida como a incompatibilidade entre atos ou normas

e a Constituição Federal. Ou seja, há uma desconformidade entre uma lei e o texto

constitucional.

Impende destacar que existe no ordenamento jurídico brasileiro um sistema hierarquizado

de normas, logo existem normas que possuem hierarquia superior às outras. A

inconstitucionalidade só existe porque no ordenamento jurídico brasileiro a Constituição

Federal é hierarquicamente superior às outras normas. Para que se possa analisar a

inconstitucionalidade, deve-se ter como pressuposto o Princípio da Supremacia da

Constituição, que dispõe que qualquer norma que desrespeitar direta ou indiretamente a

Constituição Federal será considerada inconstitucional. A Constituição é o parâmetro a ser

seguido pela legislação infraconstitucional.

O Princípio da Supremacia da Constituição está intimamente associado ao conceito de

constituição rígida. A Constituição Federal de 1988 é considerada rígida por possuir um

processo de alteração mais rigoroso que o da lei ordinária. Isso não significa que a Constituição

é imutável, pois ela pode ser alterada, devendo observar regras mais criteriosas para sua

modificação. Através do Poder Constituinte Reformador são criadas as emendas à Constituição,

que para serem promulgadas, devem ser aprovadas por três quintos dos congressistas, em

votação em dois turnos, nas duas casas legislativas. José Afonso da Silva (2010, p. 42) classifica

as constituições quanto à estabilidade em rígida, flexível e semi-rígida:

Rígida é a constituição somente alterável mediante processos, solenidades e exigências formais especiais, diferentes e mais difíceis que os de formação das leis ordinárias ou complementares. Ao contrário, a constituição é flexível quando pode ser livremente modificada pelo legislador segundo o mesmo processo de elaboração das leis ordinárias. Na verdade, a própria lei ordinária contrastante muda o texto constitucional. Semi-rígida é a constituição que contém uma parte rígida e outra flexível, como fora a Constituição do Império do Brasil.

Assim, com a rigidez constitucional nasce o Princípio da Supremacia, que é a

conformidade das normas do ordenamento jurídico com o texto constitucional, pois tem como

parâmetro a Constituição. Por tratar de matéria relevante, pode haver uma fiscalização dessa

compatibilidade, que será feita por meio do controle de constitucionalidade. Por essa razão, a

Constituição de 1988, cuidou de trazer mecanismos para garantir a eficácia e aplicabilidade de

suas normas, tais como o mandado de injunção e a ação direita de inconstitucionalidade por

omissão. Assim, para que a haja a preservação dessa supremacia, deve haver uma fiscalização

e posteriormente, uma invalidação de todas as normas que violem à Constituição.

Lucio Bittencourt (1968, p. 71) aduz que existem vários tipos de inconstitucionalidade,

que ocorrem em várias situações: “1ª) Desrespeito à forma prescrita; 2ª) Inobservância de

condição estabelecida; 3ª) Falta de competência do órgão legiferante; 4ª) Violação de direitos

e garantias fundamentais”. Essa divisão corresponde à inconstitucionalidade formal nas 1ª, 2ª e

3ª situações, que é o vício na forma da norma, e a 4ª situação trata da inconstitucionalidade

material que ocorre quando há vício no conteúdo da norma. André Ramos Tavares (2010, p.

2216) faz essa distinção:

Basicamente, duas são as possíveis ocorrências da inconstitucionalidade. Numa primeira, há incongruência entre o conteúdo da lei e o conteúdo da Constituição. Numa segunda modalidade, há o desatendimento do modelo previsto para a laboração da lei. Nesse caso, o conteúdo da lei não está em desacordo com o da Constituição: apenas seu procedimento de formação não obedeceu ao procedimento previsto na Constituição. A primeira ocorrência recebe a denominação de inconstitucionalidade material, substancial ou intrínseca. A segunda, por seu turno, é denominada inconstitucionalidade formal, ou extrínseca.

Assim, destaca-se que a inconstitucionalidade legislativa é apenas um tipo de

inconstitucionalidade, pois esta se desdobra de muitas formas. Importante esclarecer que a

Constituição pode ser violada tanto por atos comissivos, como por atos omissivos. A ausência

de legislação também pode ser considerada inconstitucional. Nesse sentido, José Joaquim

Gomes Canotilho e Vittal Moreira (1991, p. 263):

O princípio da constitucionalidade não diz respeito apenas às acções do Estado; abrange também as omissões ou inacções do Estado. A Constituição não é somente um conjunto de normas proibitivas e de normas de organização e competência (limite negativo da atividade do Estado): é também um conjunto de normas positivas que exigem do Estado, ou seja, por falta total de medidas (legislativas e outras), ou pela sua insuficiência, deficiência ou inadequação, traduz-se igualmente numa infracção da Constituição: inconstitucionalidade por omissão.

A omissão legislativa é consequência da inércia na função típica do legislador, que é a

edição de normas. O poder legislativo tem o dever de garantir total eficácia e aplicabilidade às

normas da Constituição Federal. Esse dever nasce da própria Carta Magna, pois há previsão

expressa em seu texto, trazendo uma ordem de legislar. Assim, quando ocorre a omissão

legislativa, há o descumprimento de um comando constitucional, trazendo manifesto prejuízo

à sociedade.

Nesta concepção, a presente omissão inconstitucional é o não atuar do Poder Legislativo,

quando a própria Constituição Federal traz em seu texto uma ordem concreta e explícita para

que haja criação de uma legislação a posteriori, para que finalmente as normas dependentes de

regulamentação possam produzir seus efeitos. No dizer de J. J. Canotilho (1993, p. 354-355):

A omissão legislativa só é autônoma e juridicamente relevante quando se conexiona com uma exigência constitucional de ação, não bastando o simples dever geral de legislador para dar fundamento a uma omissão constitucional. Um dever jurídico-constitucional de ação existirá quando as normas constitucionais tiverem a natureza de imposições concretamente impositivas. [...] poderá, de uma forma geral, falar-se de uma inconstitucionalidade por omissão quando a Constituição consagra normas sem suficiente densidade para se tornarem exequíveis por si mesmas, reenviando para o legislador a tarefa de lhe dar exequibilidade prática.

A Constituição Federal prevê em seu texto normas que apontam expressa necessidade de

regulamentação, desta forma o dever do Poder Legislativo de regulamentar é inequívoco, para

que essas normas alcancem sua eficácia plena. Nesse mesmo sentido, para se constatar uma

omissão legislativa, o dever de legislar deve ser originário de uma norma constitucional e não

de uma norma ordinária. Ou seja, a ordem deve surgir de uma norma da Carta Maior. Diante

disso, a inconstitucionalidade por omissão se manifesta em razão de normas constitucionais de

eficácia limitada que ainda não tiveram uma legislação posterior que as regulamente.

Outro fator que ocorre com a inércia legislativa é a mutação constitucional, que é o

processo de alteração da constituição de maneira informal, ensejando graves consequências ao

ordenamento jurídico, e consequentemente, à vida dos administrados. Anna Cândida da Cunha

Ferraz (1986, p. 217-218) explicita:

A inércia dos órgãos estatais, que deixam de exercer a obrigação de emanar normas, determinada em preceitos constitucionais, traduz verdadeiro processo informal de mudança da Constituição. Configura inegável processo de mudança constitucional, embora não altere a letra constitucional, altera-lhe o alcance, na medida em que paralisa a aplicação constitucional. Tal paralisação, não desejada ou prevista pelo constituinte, é de ser tida como inconstitucional [...]. Como modalidade de mutação constitucional, a inércia é processo pernicioso, que acarreta consequências desastrosas à vida constitucional dos Estados.

Desta forma, conclui-se que a omissão legislativa inconstitucional se encontra entre a

discricionariedade para legislar outorgada ao Poder Legislativo e o dever de legislar que

algumas vezes é imposto pela Constituição Federal. O Poder Legislativo é órgão competente

para editar essas normas, e quando não o faz, ocasiona prejuízo aos administrados, que estarão

impossibilitados de exercer alguns direitos constitucionais.

No ordenamento jurídico brasileiro, desde sua história, resta configurada a inércia dos

órgãos competentes para legislar, ora em sua totalidade, ora de maneira parcial. A omissão será

total se o legislador se mantiver inerte e não editar a lei, será parcial quando o legislador agir,

porém de maneira insuficiente, com isso a norma não consegue produzir seus efeitos totalmente.

A verdade é que a sociedade brasileira sempre conviveu com omissões legislativas, tornando

seus direitos tolhidos, ou muitas vezes, até inexistentes. Na Constituição de 1946 previa a

edição de uma lei que regulamentasse as diretrizes e bases da educação, no entanto, essa lei

demorou quinze anos para que fosse criada e promulgada. E também, como exemplo, a ausência

de lei que regulamentasse o direito de greve dos servidores públicos, previsto na Constituição

Federal de 1988, situação que ensejou a impetração de inúmeros mandados de injunção.

Torna-se uma situação crítica, pois como o Poder Legislativo se abstém de fazer sua

atividade típica que é legislar, o Poder Executivo fica em uma situação desconfortável em razão

de não poder aplicar as normas ao caso concreto, em consequência, os indivíduos se sentem

lesados, e decidem ajuizar ações no Poder Judiciário, para que um magistrado tente resolver de

alguma maneira sua demanda, para garantir ao final, seu direito subjetivo. No entanto, o Poder

Judiciário se encontra em situação delicada, pois tem obrigação de agir e julgar o presente

litígio, mas simultaneamente, sofre o risco de usurpar função de outro Poder.

3 DA DECISÃO DO MANDADO DE INJUNÇÃO

Nesta etapa, será abordado um ponto relevante deste trabalho, que é a natureza da decisão

do julgamento do mandado de injunção. É um assunto bastante controvertido na doutrina,

merecendo destaque o seu estudo, em razão da atual discussão jurisprudencial sobre o tema.

Em um segundo momento, será explicitada a evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal, desde seu posicionamento inicial, que fora mais conservador, até os dias atuais,

deflagrando relevante evolução.

Vale destacar que a decisão do mandando de injunção acarreta grandes discussões

jurídicas, tais como o ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal e a violação ao princípio

constitucional da separação dos poderes. Desta forma, cabe analisar as consequências jurídicas

desta decisão.

3.1 Decisão do Mandado de Injunção na Doutrina

Quando a ação constitucional mandado de injunção é julgada, o Poder Judiciário emana

uma decisão. A doutrina encontra obstáculos na definição da natureza desta decisão. Assim, o

referido tema ainda é bastante controvertido.

Parte da doutrina defende que a decisão é meramente declaratória, pois quando a ação é

julgada procedente, o magistrado comunica ao órgão competente para editar àquela norma

regulamentadora e declara a mora legislativa. Ou seja, o Poder Judiciário noticia o órgão

competente da norma faltante para que tome as medidas cabíveis e declara que realmente não

existe a norma necessária para tornar um direito eficaz em sua plenitude. Destarte, a decisão do

mandado de injunção muito se assemelharia à decisão da ação direta de inconstitucionalidade

por omissão feita em sede de controle de constitucionalidade concentrado.

Concordando com essa corrente, Manoel Gonçalves Ferreira Filho (1995, p. 277) aduz

que o alcance da decisão do mandado de injunção deve ser análogo ao da ação de

inconstitucionalidade por omissão. Ou seja, o poder judiciário dará conhecimento ao poder

competente da ausência da norma regulamentadora que torna inviável o exercício de direito

constitucional. No entendimento do autor, se o magistrado editasse a norma reguladora que é

ausente, ele estaria violando o ordenamento jurídico constitucional, pois estaria em desacordo

com o princípio da separação dos poderes. Explicita ainda, que o referido princípio é cláusula

pétrea, logo não pode sofrer qualquer limitação.

Assim, um forte argumento dessa corrente era que a decisão do mandado de injunção não

pode ultrapassar os limites da decisão da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, pois

nesta última, a ação era julgada pelas mais altas cortes do país e elas não poderiam editar leis.

Logo, na decisão do mandado de injunção deveria acontecer o mesmo.

Foram tecidas críticas a essa corrente. A primeira delas é que a ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e o mandando de injunção estavam sendo tratados de

maneira idêntica, em razão de possuírem a obrigação de terem a mesma decisão judicial. Isso

foi bastante questionado, porque não haveria sentido de a Constituição Federal ter criado dois

institutos distintos, se eles possuem o mesmo objetivo. Assim, ambos os institutos poderiam ser

tratados de forma desigual, pois a constituição federal não cria palavras inúteis, muito menos

instrumentos inúteis.

É importante mencionar que esses dois institutos possuem diferenças bastante delimitadas

no texto constitucional, como sua abrangência e a legitimidade ativa para propor a demanda,

pois a ação direta de inconstitucionalidade por omissão visa eliminar qualquer ausência em todo

o texto da Constituição, já o mandado de injunção se refere especialmente aos direitos

fundamentais. O rol de legitimados para ingressarem com a ação direta de inconstitucionalidade

é taxativo, assim a ação só poderá ser interposta pelas pessoas previstas no artigo 103 da

Constituição Federal de 1988; já em relação ao mandado de injunção, qualquer pessoa que tiver

seu direito fundamental violado poderá impetrar a ação.

A segunda crítica a primeira corrente se refere à inefetividade da decisão declaratória. O

estado possui a obrigação de oferecer aos administrados uma tutela realmente efetiva. A própria

Constituição criou mecanismos de defesa para que os indivíduos possam ter seus direitos

efetivados. Assim, a simples declaração de mora do órgão competente para legislar torna-se

insuficiente para alcançar o real objetivo das normas constitucionais. Celso Agrícola Barbi

(1988, p. 9) aduz que:

Essa solução deixaria de lado um elemento importante, que é o caráter impositivo do mandado de injunção como o seu nome está a mostrar. Injunção significa imposição, o que não existe em uma sentença que seja apenas declaratória da omissão do Poder Legiferante. Essa fórmula porque inócua e não condizente com o caráter impositivo do mandado de injunção, não merece apoio.

A segunda corrente, que é mais rigorosa, defende que os direitos previstos na Constituição

Federal devem ser concretizados. Assim, o Poder Judiciário, ao verificar uma omissão

legislativa, deve formular preceitos que devem ser obedecidos para que a norma constitucional

possua sua total eficácia. No entanto, essa decisão tem efeito inter partes, só alcança as partes

envolvidas no processo, ou seja, essa decisão não pode alcançar outros casos análogos.

Dentro desta segunda corrente, nasceu uma divergência, pois existia uma subcorrente que

defendia que o órgão julgador iria formular uma regulamentação supletiva para o caso concreto,

no entanto, o poder judiciário não poderia obrigar que a regulamentação fosse aceita pelo

obrigado. A segunda subcorrente aduz que o poder judiciário tem que obrigar que o impetrado

satisfaça o direito do impetrante, havendo nesse caso, uma obrigatoriedade.

As críticas mais relevantes à segunda corrente pairam na questão da violação ao princípio

da isonomia, pois aquela decisão só alcança as partes envolvidas no processo, podendo ocorrer

tratamento diferenciado pelos juízes em processos idênticos; e também, é complicado

compatibilizar essa corrente com função exercida pelo Supremo Tribunal Federal. José Carlos

Barbosa Moreira (1989, p. 117) discorda da crítica concernente à violação ao princípio da

isonomia:

É claro que haverá possibilidade de normas discrepantes, porém cada qual com seu efeito limitado ao caso concreto que foi objeto daquele Mandado de Injunção. Dir-se-á: mas não é bom que apliquem normas diferentes a casos semelhantes. Realmente, não. Mas é um fenômeno que ocorre a todo o momento. E por isso é que existem mecanismos conhecidíssimos de uniformização de jurisprudência. Mesmo quando não falta a norma, é muito comum que órgãos diferentes interpretem, de modo também diferente, a norma que existe, de sorte que o fenômeno tampouco apresenta qualquer cor de ineditismo ou de novidade. A todo o momento acontece. E o ordenamento contém, todos nós o conhecemos, instrumentos destinados a remediar, na medida do possível, esses inconvenientes, promovendo a uniformização de jurisprudência.

Outros doutrinadores defendem que esta decisão tem natureza mandamental, assim, caso

a decisão não fosse obedecida pelo órgão legislativo competente, poderia ensejar uma ação

penal, por tratar-se de crime de desobediência. Com isso, caso a omissão legislativa acarrete

danos ao indivíduo, ele pode ingressar com uma ação para requerer indenização, em razão da

responsabilidade estatal, utilizando-se da sentença do mandado de injunção como título

executivo.

Uma terceira corrente afirma que os efeitos da decisão do órgão julgador devem

ultrapassar aquele caso concreto, devendo ter efeito erga omnes, para alcançar todos os casos

semelhantes. Dessa corrente advêm três consequências distintas, a primeira é conceder ao

impetrante o direito pleiteado no mandado de injunção, a segunda é o poder judiciário editar a

norma ausente, e terceiro, ordenar que o órgão competente legisle.

3.2 Da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

Inicialmente, quando começou a julgar os mandados de injunção, o Supremo Tribunal

Federal adotava uma postura mais conservadora, mais comedida. Entendia que esta ação

deveria ser julgada da mesma forma da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Ou

seja, a consequência da decisão no mandado de injunção era apenas à comunicação do Poder

competente para legislar, para suprir a ausência da norma faltante. O excerto da decisão

prolatada no MI nº 107-3/DF:

O mandado de injunção é ação outorgada a titular de direito, garantia ou prerrogativa dos quais o exercício está inviabilizado pela falta de norma regulamentadora; é ação que visa obter do Poder Judiciário a declaração de inconstitucionalidade desta omissão se estiver caracterizada a mora em regulamentar por parte do Poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa, com a finalidade de que se lhe dê ciência dessa declaração, para que adote as providências necessárias, à semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, parágrafo 2º, da Carta Magna). (STF, MI nº 107-3/DF, DJU, Seção I, 21/9/1990, p. 9.782, rel: min. Moreira Alves.)

Durante quase vinte anos, esse foi o entendimento predominante do STF, que julgou de

forma semelhante vários mandados de injunção. No entanto, o instituto estava se tornando

obsoleto, pois os titulares de direito permaneciam sem ter seus direitos garantidos, devido à

ausência de norma regulamentadora. O instituto estava se tornando ineficaz para o ordenamento

jurídico brasileiro.

Diante desta situação, com o decorrer dos anos, este tema se tornou bastante controvertido

dentro do próprio Supremo Tribunal Federal, nascendo diversos entendimentos entre os

ministros da mais alta corte. Assim trouxe o Ministro Néri da Silveira às várias posições da

Corte Maior:

Há, como sabemos, na Corte, no julgamento dos mandados de injunção, três correntes: a majoritária que se formou a partir do Mandado de Injunção nº 107, que entende deva o Supremo Tribunal Federal, em reconhecendo a existência da mora do Congresso Nacional, comunicar a existência dessa omissão, para que o Poder Legislativo elabore a lei. Outra corrente, minoritária, reconhecendo também a mora do Congresso Nacional, decide, desde logo, o pedido do requerente do mandado de injunção e provê sobre o exercício de direito constitucionalmente previsto. Por último, registro minha posição, que é isolada: partilho do entendimento de que o Congresso Nacional é que deve elaborar a lei, mas também tenho presente que a Constituição, por via do mandado de injunção, quer assegurar aos cidadãos o exercício de direitos e liberdades, contemplados na Carta Política, mas dependentes de regulamentação. Adoto posição que considero intermediária. Entendo que se deva, também, em primeiro lugar, comunicar ao Congresso Nacional a omissão inconstitucional, para que ele,

exercitando a sua competência, faça a lei indispensável ao exercício do direito constitucionalmente assegurado aos cidadãos. Compreendo entretanto, que, se o Congresso Nacional não fizer a lei, em certo prazo que se estabeleceria na decisão, o Supremo Tribunal Federal pode tomar conhecimento de reclamação da parte, quanto ao prosseguimento da omissão, e, a seguir, dispor a respeito do direito in concreto. (Pronunciamento do Ministro Néri da Silveira. Ata da 7ª (sétima) sessão extraordinária do Supremo Tribunal Federal, realizada em 16 de março de 1995 e publicada no Diário da Justiça, 4 abr. 1995, Seção I, p. 8.265)

A partir do ano de 2007, a Corte contava com uma nova composição de ministros, com

isso, o entendimento sobre o tema sofreu relevantes mudanças. A corte se afastou da posição

mais conservadora e tímida, partindo para uma postura mais concretista e atuante. Em razão da

grande divergência de entendimentos dentro da Suprema Corte em relação à decisão do

mandado de injunção, dividiu-se em duas correntes, a concretista e não concretista.

3.2.1 Posição Não Concretista

Foi a posição adotada por muito tempo pelo Supremo Tribunal Federal, que consiste em

reconhecer formalmente a inércia do poder competente em legislar. Assim, essa decisão declara

a mora legislativa do Poder Público, mas não cria condições que viabilizem a efetivação dos

direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais. Ela apenas dá ciência ao Poder Público da

ausência da norma regulamentadora para que ele elabore a mesma. Esta posição foi adotada no

julgamento do Mandado de Injunção nº 107/DF, rel. Ministro Moreira Alves, em 1989.

Mandado de injunção. Questão de ordem sobre sua auto-aplicabilidade, ou não. - em face dos textos da constituição federal relativos ao mandado de injunção, e ele ação outorgada ao titular de direito, garantia ou prerrogativa a que alude o artigo 5., LXXI, dos quais o exercício esta inviabilizado pela falta de norma regulamentadora, e ação que visa a obter do poder judiciário a declaração de inconstitucionalidade dessa omissão se estiver caracterizada a mora em regulamentar por parte do poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa, com a finalidade de que se lhe de ciência dessa declaração, para que adote as providências necessárias, a semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (artigo 103, par-2., da carta magna), e de que se determine, se se tratar de direito constitucional oponível contra o estado, a suspensão dos processos judiciais ou administrativos de que possa advir para o impetrante dano que não ocorreria se não houvesse a omissão inconstitucional. - assim fixada a natureza desse mandado, e ele, no âmbito da competência desta corte - que esta devidamente definida pelo artigo 102, i, 'q' -, auto-executável, uma vez que, para ser utilizado, não depende de norma jurídica que o regulamente, inclusive quanto ao procedimento, aplicável que lhe e analogicamente o procedimento do mandado de segurança, no que couber. Questão de ordem que se resolve no sentido da auto-aplicabilidade do mandado de injunção, nos termos do voto do relator. (MI 107 qo, relator(a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em 23/11/1989, dj 21-09-1990 pp-09782 ement vol-01595-01 pp-00001)

Essa posição é bastante criticada por alguns doutrinadores, porque nessa posição, o

mandado de injunção muito se assemelha à ação direta de inconstitucionalidade por omissão E

já que são institutos diferentes, suas decisões podem produzir efeitos diferentes. Também

criticam que a decisão não concretista se torna muitas vezes sem eficácia alguma, pois o poder

público permanece inerte e a o impetrante continua sem poder usufruir de seus direitos.

Essa corrente está baseada no princípio da Separação dos Poderes, previsto no texto

constitucional, em seu artigo 2º, nestes termos: “São Poderes da União, independentes e

harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Esse princípio explicita que

haverá três funções estatais, que são legislar, julgar e administrar, e serão distribuídas em três

poderes distintos, que são o Poder Legislativo, Judiciário e Executivo, respectivamente.

Assim, de acordo com a posição não concretista, o Poder Judiciário não poderá suprir a

lacuna legislativa, nem garantir ao impetrante da ação o seu direito perquirido, tampouco

obrigar o Poder Legislativo que edite a norma ausente. E por essa razão, defendia-se que esse

princípio deve ser respeitado para evitar que um Poder prevaleça sobre o outro, pois a própria

Constituição separou as funções típicas e atípicas de cada Poder. Cada um deverá ter uma

atividade preponderante que é a chamada função típica. Para revelar essa harmonia, cada Poder

deve fiscalizar o outro Poder.

3.2.2 Posição Concretista

Esta posição é mais recente e inovadora, pois entende que o Poder Judiciário irá prolatar

uma decisão constitutiva, que declarará a mora legislativa e irá implementar o exercício de

direito, liberdade, ou prerrogativa constitucional até que o órgão legislativo competente edite a

norma regulamentadora ausente. A posição concretista se subdivide em concretista geral e

concretista individual.

A posição concretista geral refere-se à uma decisão que tem efeito erga omnes, ou seja,

tem alcance geral. Desta forma, o poder judiciário irá implementar o direito, liberdade ou

prerrogativa constitucional até que seja criado pelo órgão competente a norma regulamentadora

faltante; e essa decisão terá normatividade geral, alcançando todos os indivíduos que estejam

em situação semelhante. Essa posição é bastante criticada pela doutrina, pois alguns

doutrinadores afirmam que o Poder Judiciário estaria usurpando a função do legislador e que

não seria adequado que este órgão editasse norma geral e abstrata, quando estivesse julgando

um caso concreto.

Já na posição concretista individual, os efeitos da decisão proferida pelo Poder Judiciário

se restringirão as partes envolvidas no processo. Apenas o autor da ação poderá gozar o direito,

liberdade e prerrogativa concedida na decisão judicial. Canotilho (1993, p. 88) assevera:

O mandado de injunção não tem por objeto uma pretensão a uma emanação, a cargo do juiz, de uma regulação legal completadora com eficácia ‘erga omnes’. O mandado de injunção apenas viabiliza, num caso concreto, o exercício de um direito ou liberdade constitucional perturbado pela falta parcial de lei regulamentadora. Se a sentença judicial pretendesse ser uma normação com valor de lei ela seria nula (inexistente) por usurpação de poderes.

Paulo Bonavides (2003, p. 551) coaduna com a posição concretista individual,

afirmando que a decisão tem efeito inter partes, alcançando apenas os litigantes daquele

processo. Assim, dispõe:

Havendo, por conseguinte, um direito subjetivo constitucional, cujo exercício se ache tolhido pela privação de norma regulamentadora, o titular desse direito postulará, perante o Judiciário, por via do mandado de injunção, a edição de norma saneadora da omissão é provisoriamente do Judiciário e não do Legislador, concretizando-se graças àquela garantia, a satisfação do direito subjetivo constitucional cujo exercício ficará paralisado, à míngua da regra regulamentadora por parte do órgão competente para elaborá-la.

A posição concretista individual subdivide-se em concretista individual direta e

concretista individual intermediária. Na primeira, quando o órgão julgador decidir pela

procedência do mandado de injunção, haverá a implementação do direito previsto na

Constituição Federal ao autor da ação. Essa postura visa impedir a síndrome da inefetividade

das normas constitucionais. Assim, o STF consegue garantir a efetividade das normas

constitucionais ainda que o poder legislativo permaneça inerte.

Já na posição concretista individual intermediária, ao julgar o mandado de injunção, o

Poder Judiciário fixa um prazo para o Congresso Nacional editar a norma faltante. Caso se

expire o prazo sem a atuação do Congresso Nacional, o Poder Judiciário adotará condições para

efetivar o direito do autor da ação.

Alguns doutrinadores tecem críticas a respeito da posição concretista individual em

virtude desta posição ser incompatível com o Princípio da Separação dos Poderes. O referido

princípio está previsto no art. 2º da Constituição Federal de 1988. O ministro Marco Aurélio,

em seu voto, no mandado de injunção nº 721/DF discorda dessas críticas e dispõe que:

Não se há de confundir a atuação no julgamento do mandado de injunção com atividade do Legislativo. Em síntese, ao agir, o Judiciário não lança, na ordem jurídica, preceito abstrato. Não, o que se tem, em termos de prestação jurisdicional, é a viabilização, no caso concreto, do exercício do direito, do exercício da liberdade constitucional, das prerrogativas ligadas à nacionalidade, soberania e cidadania. O pronunciamento judicial faz lei entre as partes, como qualquer pronunciamento em processo subjetivo, ficando, até mesmo, sujeito a uma condição resolutiva, ou seja, ao suprimento da lacuna regulamentadora por quem de direito, Poder Legislativo. (MI 721, Relator(a): Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2007, DJe-152 DIVULG 29-11-2007 PUBLIC 30-11-2007 DJ 30-11-2007 PP-00029 EMENT VOL-02301-01 PP-00001 RTJ VOL-00203-01 PP-00011 RDDP n. 60, 2008, p. 134-142)

O ex-ministro Eros Grau, no julgamento do Mandado de Injunção nº 712-8 Pará,

defendeu que a decisão concretista da Suprema Corte não viola o Princípio da Separação de

Poderes:

O argumento de que a Corte estaria então a legislar, que se afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2º da Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60, § 4º, III] é insubsistente. Pois é certo que este Tribunal exercerá, ao formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece o art. 37, VII da Constituição, função normativa, porém não legislativa. [...] Ademais, não há que falar em agressão à “separação dos poderes”, mesmo porque é a Constituição que institui o mandado de injunção e não existe uma assim chamada “separação de poderes” provinda do direito natural. Ela existe, nas Constituição do Brasil, tal como nela definida. Nada mais. No Brasil vale, em matéria de independência e harmonia entre os poderes e de “separação dos poderes”, o que está escrito na Constituição, não esta ou aquela doutrina em geral mal digerida por quem não leu Montesquieu no original. De resto, o Judiciário está vinculado pelo poder-dever de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora faltante. Note-se bem que não se trata de simples poder, mas de dever-poder, ideia já formulada por JEAN DOMAT no final do século XVII, após a retomada por LEÓN DUGUIT e, entre nós, por RUI BARBOSA, mais recentemente por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO. A este Tribunal incumbirá – permito-me repetir – se concedida a injunção, remover o obstáculo decorrente da omissão, definindo a norma adequada à regulação do caso concreto, norma enunciada como texto normativo, logo sujeito a interpretação pelo seu aplicador. (MI 712, Relator(a): Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 Divulg 30-10-2008 Public 31-10-2008 Ement Vol-02339-03 PP-00384)

Atuando desta forma, o Poder Judiciário não está criando normas abstratas para regular

a Constituição Federal, em razão de não ser essa sua função típica; em contrapartida, o Poder

Judiciário está exercendo sua atividade principal que é resguardar os direitos e garantias

fundamentais dos indivíduos.

3.2.2.1 Casos Emblemáticos

Para exemplificar esse novo entendimento da Suprema Corte que é mais concretista,

ocorreu o julgamento do MI 721/DF, rel. Min. Marco Aurélio, no dia 30.08.2007. Na referida

ação, a impetrante era uma servidora pública federal que laborou por mais de vinte e cinco anos

em condições especiais que prejudicavam sua saúde e integridade física, pois sua atividade era

considerada insalubre, por essa razão, pleiteou o seu direito à aposentadoria especial, com fulcro

no art. 40, § 4º, III, da Constituição Federal.

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores:

III - cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

No entanto, não há lei complementar que regulamentasse o instituto da aposentadoria

especial. Desta forma, quando o STF se pronunciou sobre o tema, decidiu julgar a ação

parcialmente procedente, para que a autora possa ter direito à aposentadoria especial, devendo

a lei do regime geral de previdência social ser aplicada analogicamente a seu caso concreto, em

face da inexistência de lei infraconstitucional regulamentadora. Excertos do julgado do MI nº

721, relatoria Ministro Marco Aurélio:

Mandado de injunção - natureza. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da constituição federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. Mandado de injunção - decisão - balizas. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. Aposentadoria - trabalho em condições especiais - prejuízo à saúde do servidor - inexistência de lei complementar - artigo 40, § 4º, da constituição federal. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da lei nº 8.213/91. (MI 721, relator(a): min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 30/08/2007, dje-152 divulg 29-11-2007 public 30-11-2007 dj 30-11-2007 pp-00029 ement vol-02301-01 pp-00001 rtj vol-00203-01 pp-00011 rddp n. 60, 2008, p. 134-142)

Com essa ação, torna-se evidente a natureza mandamental da decisão do Supremo

Tribunal Federal em sede de mandado de injunção, pois garantiu o direito à impetrante. Neste

caso, o STF adotou a posição concretista individual direta, pois o direito só poderá ser exercido

pelo impetrante do mandamus. Já em um julgado mais recente em 2011, no MI 1231 agr, rel.

Min. Ricardo Lewandowski, o STF confirmou sua posição concretista em relação aos

servidores públicos federais que laboram em condições especiais e estão pleiteando a

aposentadoria especial.

Agravo regimental. Mandado de injunção. Aposentadoria especial do servidor público. Artigo 40, § 4º, III, da constituição da república. Aplicação do art. 57 da lei 8.213/1991. Precedentes. Legitimidade passiva. Agravo improvido. I - A orientação do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que apenas a autoridade, órgão ou entidade que tenha o dever de regulamentar a norma constitucional dispõe de legitimidade passiva ad causam no mandado de injunção. Precedentes. II - A jurisprudência desta Corte, após o julgamento dos Mandados de Injunção 721/DF e 758/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, passou a adotar a tese de que o mandado de injunção destina-se à concretização, caso a caso, do direito constitucional não regulamentado, assentando, ainda, que com ele não se objetiva apenas declarar a omissão legislativa, dada a sua natureza nitidamente mandamental. III - Agravo regimental a que se nega provimento. (MI 1231 agr, Relator(a): Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, julgado em 16/11/2011, Acórdão Eletrônico dje-228 DIVULG 30-11-2011 PUBLIC 01-12-2011)

Em um segundo caso, o Supremo Tribunal Federal continuou adotando esta posição em

relação aos servidores públicos civis que pleiteavam seu direito à greve. O direito de greve dos

servidores públicos é um direito constitucional e faz parte do rol dos direitos fundamentais. É

necessária uma norma que estabeleça os limites e regras para o exercício do referido direito.

No entanto, o legislador infraconstitucional não editou a norma que regulamenta o direito de

greve dos servidores públicos, ainda que haja previsão constitucional no seu art. 37, VII.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;

Até então, as greves realizadas por servidores públicos eram consideradas ilegais, pois

não havia norma específica regulamentadora. Por essa razão, o dispositivo constitucional

referente a esse direito começou a ser deveras questionado.

Assim, quando este caso chegou à Corte Maior, por meio da ação de mandado de

injunção, esta declarou a mora legislativa e decidiu que seria aplicada temporariamente a lei de

greve do setor privado até que seja criada lei ulterior pelo órgão competente. Neste caso, foi

adotada a posição concretista geral, pois alcança a todos em situação idêntica. Desta forma,

ocorreu no julgamento do MI 708, com relatoria do Ministro Gilmar Mendes, no dia

25.10.2007:

Mandado de Injunção. Garantia fundamental (CF, art. 5º, inciso LXXI). Direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 37, inciso VII). Evolução do tema na jurisprudência do supremo tribunal federal (STF). Definição dos parâmetros de competência constitucional para apreciação no âmbito da justiça federal e da justiça estadual até a edição da legislação específica pertinente, nos termos do art. 37, VII, da CF. Em observância aos ditames da segurança jurídica e à evolução jurisprudencial na interpretação da omissão legislativa sobre o direito de greve dos servidores públicos civis, fixação do prazo de 60 (sessenta) dias para que o congresso nacional legisle sobre a matéria. Mandado de injunção deferido para determinar a aplicação das leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989. 1. Sinais de evolução da garantia fundamental do mandado de injunção na jurisprudência do supremo tribunal federal (STF). (MI 708, relator(a): Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, dje-206 divulg 30-10-2008 public 31-10-2008 ement vol-02339-02 pp-00207 rtj vol-00207-02 pp-00471)

Assim também foi julgado o mandado de injunção nº 712, relatoria do ex-Ministro Eros

Grau, impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário do Estado do Pará:

Mandado de Injunção. Art. 5º, LXXI da Constituição do Brasil. Concessão de efetividade à norma veiculada pelo artigo 37, inciso VII, da Constituição do Brasil. Legitimidade ativa de entidade sindical. Greve dos trabalhadores em geral [art. 9º da Constituição do Brasil]. Aplicação da Lei Federal n. 7.783/89 à greve no serviço público até que sobrevenha lei regulamentadora. Parâmetros concernentes ao exercício do direito de greve pelos servidores públicos definidos por esta corte. Continuidade do serviço público. Greve no serviço público. Alteração de entendimento anterior quanto à substância do mandado de injunção. Prevalência do interesse social. Insubssistência do argumento segundo o qual dar-se-ia ofensa à independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da constituição do brasil] e à separação dos poderes [art. 60, § 4o, iii, da constituição do brasil]. Incumbe ao poder judiciário produzir a norma suficiente para tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos, consagrado no artigo 37, VII, da constituição do brasil. (mi 712, relator(a): min. Eros grau, tribunal pleno, julgado em 25/10/2007, dje-206 divulg 30-10-2008 public 31-10-2008 ement vol-02339-03 pp-00384)

Em outro caso, que lidava com a questão dos juros reais fixados pela própria Carta

Cidadã na margem de 12% ao ano. O STF asseverou que essa norma não era auto-aplicável,

sendo necessária a edição de uma lei infraconstitucional que a regulamentasse. Apesar de haver

no Congresso Nacional projetos de lei tramitando sobre o sistema financeiro nacional, o STF

entende que a mora legislativa persiste.

Outra questão que fora suscitada no STF se referia à proteção do direito constitucional

previsto no art. 195, §7º, que se trata da isenção de contribuição para a seguridade social às

entidades beneficentes de assistência social que atendam as exigências legais. A lei

regulamentadora não foi criada, então, a Suprema Corte decidiu declarar o estado de mora

legislativa do Congresso Nacional, e fixou o prazo de 6 (seis) meses para que a lei fosse editada,

pois caso contrário, a impetrante poderia gozar da imunidade requerida. Excerto do MI nº

232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves:

Mandado de injunção. - Legitimidade ativa da requerente para impetrar mandado de injunção por falta de regulamentação do disposto no par. 7. do artigo 195 da Constituição Federal. - Ocorrência, no caso, em face do disposto no artigo 59 do ADCT, de mora, por parte do Congresso, na regulamentação daquele preceito constitucional. Mandado de injunção conhecido, em parte, e, nessa parte, deferido para declarar-se o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que, no prazo de seis meses, adote ele as providencias legislativas que se impõem para o cumprimento da obrigação de legislar decorrente do artigo 195, par. 7., da Constituição, sob pena de, vencido esse prazo sem que essa obrigação se cumpra, passar o requerente a gozar da imunidade requerida. (MI 232, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 02/08/1991, DJ 27-03-1992 PP-03800 EMENT VOL-01655-01 PP-00018 RTJ VOL-00137-03 PP-00965)

Casos como esses demonstram a evolução da jurisprudência do Supremo Tribunal

Federal, transformando o STF em um órgão mais atuante, pois ele é o guardião da Constituição,

e deve buscar sempre afastar a inconstitucionalidade das normas.

A evolução da jurisprudência do STF foi muito importante, pois o Judiciário deve

acompanhar as mudanças na sociedade. O estado não pode ser um tirano e retirar dos indivíduos

direitos que lhes são assegurados constitucionalmente. André Ramos Tavares (2010, p. 1014)

assevera:

De qualquer sorte, a mudança da jurisprudência recalcitrante foi uma grande conquista para a cidadania brasileira, especialmente por se tratar de um país cujo compromisso constitucional é constantemente relegado a segundo plano, e a ideia de “fraude à Constituição” uma prática rotineira de governos democraticamente eleitos, com o que a Justiça Constitucional estaria a auxiliar decisivamente na operatividade das normas constitucionais. O efeito didático (indireto) dessas decisões, para outras situações semelhantes, também não é desprezível.

Por essa razão, o Poder Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal vêm se

distanciando do conservadorismo judicial e partindo para a luta na máxima efetividade da

Constituição Federal.

INOVAÇÃO LEGISLATIVA: LEI 13.300/2016

Após vários anos de omissão legislativa, foi editada a Lei 13.300/2016, que regula o

procedimento do mandado de injunção. Dessa forma, caso a lei não traga solução para

determinado caso, o intérprete deverá aplicar subsidiariamente as regras pertencentes à Lei do

Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/2009) e ao novo Código de Processo Civil (Lei nº

13.105/2015)

No que toca à petição inicial do mandado de injunção, esta deve preencher os requisitos

contidos nos artigos 319 e 320 do CPC/2015. Se a inicial não cumprir os requisitos legais ou

apresentar defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, o juiz ou

Relator deverá determinar que o impetrante, no prazo de 15 (quinze) dias, emende-a ou

complete-a, devendo o magistrado indicar com precisão o que deve ser corrigido ou completado

(art. 321 do CPC/2015). Se o autor não cumprir a diligência, a petição inicial será indeferida.

O autor deve indicar na petição inicial não apenas o órgão impetrado, mas também a

pessoa jurídica que ele integra ou está vinculado, conforme o artigo 4º da Lei do Mandado de

Injunção (LMI). Essa regra também é prevista na Lei do Mandado de Segurança.

A petição inicial do mandado de injunção deverá ser desde logo indeferida quando a

impetração for manifestamente incabível ou manifestamente improcedente. A petição inicial

pode ser considerada incabível no caso de faltar algum pressuposto processual. Será

considerada manifestamente improcedente quando o mérito do pedido for claramente

improcedente, como no caso de a lei omissa já haver sido editada.

Se o indeferimento da petição inicial for realizado pelo juiz (em 1ª instância), será feito

por meio de sentença, cabendo apelação, admitindo-se até que o magistrado faça juízo de

retratação, caso deseje (art. 331 do CPC/2015). Já se o indeferimento ocorrer por decisão

monocrática do relator (em processos de competência originária do Tribunal), o recurso cabível

é o agravo interno.

Vale destacar que a própria lei nº 13.300/2016 trata do agravo interno dessa situação,

logo não se aplica o art. 1.021 do CPC/2015. Assim, o prazo fixado na lei específica é de 5

(cinco) dias e não de 15 (quinze) dias conforme o CPC/2015.

O demandante deverá apresentar a petição inicial e os documentos que a instruem

acompanhados de tantas cópias quantos forem os impetrados. Se a petição for transmitida por

meio eletrônico, não serão necessárias as cópias. O artigo 4º da LMI prevê que, quando o

documento necessário à prova do alegado encontrar-se em repartição ou estabelecimento

público, em poder de autoridade ou de terceiro, havendo recusa em fornecê-lo por certidão, no

original, ou em cópia autêntica, será ordenada, a pedido do impetrante, a exibição do documento

no prazo de 10 (dez) dias, devendo, nesse caso, ser juntada cópia à segunda via da petição. Se

a recusa em fornecer o documento for do impetrado, a ordem será feita no próprio instrumento

da notificação.

Após terminar o prazo para o impetrado prestar as suas informações, tendo ele

apresentado ou não, será ouvido o Ministério Público, que deverá oferecer parecer no prazo de

10 (dez) dias. Esgotado o prazo para manifestação do MP, com ou sem parecer, os autos serão

conclusos para decisão (sentença ou acórdão).

A Lei nº 13.300/2016 não prevê a possibilidade de concessão de medida liminar. Antes

da regulamentação, o STF já possuía precedentes afirmando não ser cabível liminar.

Um dos pontos mais polêmicos a respeito do mandado de injunção diz respeito aos

efeitos da decisão que julga esta ação. Sobre o tema, existem diversas correntes que já foram

abordadas anteriormente. A Lei nº 13.300/2016 tratou sobre o tema, aplicando a corrente

concretista individual intermediária. Logo, caso o magistrado reconheça a omissão legislativa,

será emitida a ordem para que o órgão competente edite a norma regulamentadora em um prazo

razoável determinado pelo julgador.

Após esse prazo, no caso de o impetrado não suprir a omissão, o juiz ou Tribunal deverá

estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das

prerrogativas reclamados; ou se for o caso, as condições em que poderá o interessado promover

ação própria visando a exercê-los.

O juiz ou Tribunal não precisará fixar prazo pra suprir a lacuna e já poderá passar direto

para a segunda etapa, estabelecendo as condições, caso fique comprovado que já houve outro(s)

mandado(s) de injunção contra o impetrado e que ele deixou de suprir a omissão no prazo que

foi assinalado nas ações anteriores.

Nesse sentido, em regra, a Lei nº 13.300/2016 determina a adoção da corrente

concretista intermediária (art. 8º, I, LMI). Caso o prazo para a edição da norma já tenha sido

dado em outros mandados de injunção anteriormente propostos por outros autores, o Poder

Judiciário poderá veicular uma decisão concretista direta (art. 8º, parágrafo único, LMI).

Quanto à eficácia subjetiva, a lei nº 13.300/2016 adotou, em regra, a corrente individual.

No mandado de injunção individual, em regra, a decisão terá eficácia subjetiva limitada às

partes (art. 9º, LMI). No mandado de injunção coletivo, em regra, a sentença fará coisa julgada

limitadamente às pessoas integrantes da coletividade, do grupo, da classe ou da categoria

substituídos pelo impetrante (art. 13, LMI).

A Lei nº 13.300/2016 afirma que, excepcionalmente, poderá ser conferida eficácia ultra

partes ou erga omnes à decisão, quando isso for inerente ou indispensável ao exercício do

direito, da liberdade ou da prerrogativa objeto da impetração (art. 9º, § 1º, LMI). Essa

possibilidade se aplica tanto para o MI individual como para o coletivo (art. 13, LMI).

A Lei nº 13.300/2016 prevê a possibilidade de ser proposta ação de revisão da decisão

concessiva do mandado de injunção. Sem prejuízo dos efeitos já produzidos, a decisão poderá

ser revista, a pedido de qualquer interessado, quando sobrevierem relevantes modificações das

circunstâncias de fato ou de direito. A ação de revisão observará, no que couber, o procedimento

estabelecido nesta Lei.

CONCLUSÃO

O mandado de injunção é um instrumento que visa garantir a eficácia da Constituição

Federal. É o remédio constitucional que objetiva assegurar a máxima efetividade dos direitos e

liberdades fundamentais dos indivíduos. No ordenamento jurídico brasileiro, o mandado de

injunção teve sua primeira previsão constitucional na Constituição Federal de 1988, cuja

redação dispõe que o referido instrumento poderá ser utilizado quando houver ausência de

norma regulamentadora de modo a tornar inviável o exercício de direitos e liberdades

constitucionais, bem como o exercício de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania

e à cidadania, conforme preleciona o art. 5º, LXXI, da CRFB/88.

O mandado de injunção visa combater a síndrome da ineficácia das normas

constitucionais. Ao longo do texto constitucional, existem diversos direitos que para serem

efetivados dependem de uma norma regulamentadora infraconstitucional. Caso esta lei não

exista, os cidadãos ficam impedidos de gozar seus direitos assegurados pela própria

Constituição. Por essa razão, a Carta Magna previu mecanismos para garantir a total efetividade

de seus dispositivos, exemplo disso é o remédio constitucional conhecido por mandado de

injunção.

O presente mandamus é uma ação que objetiva tornar um direito individual

constitucional que era abstrata em concreto, para que ele possa produzir todos seus efeitos

jurídicos, agora havendo norma que o regule.

Vale destacar que todas as normas constitucionais tem força normativa, ou seja, todas

possuem alguma eficácia. Ocorre que o grau de eficácia das normas pode variar. Existem

normas com eficácia plena, que são as normas que possuem aplicabilidade imediata e não

precisam de outra norma que as regulamente; normas de eficácia contida, que são as normas

que possuem eficácia imediata, porém podem ter seus efeitos reduzidos por outra lei; e as

normas de eficácia limitada, que é a norma que tem aplicabilidade mediata e para que produza

seus efeitos, é imprescindível a edição de uma lei regulamentadora. Esta última é a mais

explorada neste trabalho, em razão dela ser objeto do mandado de injunção.

O mandado de injunção surgiu da necessidade, no Estado contemporâneo, de existir um

instrumento capaz de afastar as omissões inconstitucionais. Assim, inconstitucionalidade é a

desconformidade com a Constituição. Pelo princípio da supremacia, todas as normas devem

coadunar com princípios e dispositivos constitucionais. A inconstitucionalidade legislativa é

apenas um tipo de inconstitucionalidade, e pode ocorrer em atos comissivos ou omissivos.

Desta forma, a ausência de norma regulamentadora prevista na Constituição, caracterizada pela

inércia do Poder competente para legislar, é uma inconstitucionalidade por omissão.

Diante das considerações apresentadas neste trabalho, a jurisprudência brasileira tem

buscado encontrar subterfúgios para garantir o maior alcance da efetividade do direito material.

O Supremo Tribunal Federal, inicialmente, assumia uma posição conservadora, conhecida por

não concretista, em que, ao decidir o mandado de injunção, apenas declarava a mora do

legislativo, tornando esta decisão muitas vezes ineficaz. Assim, essa decisão da Corte não

garantia um resultado concreto ao autor da ação.

No entanto, recentemente, a Suprema Corte tem avançado no seu entendimento, e

adotado uma posição concretista, para garantir a efetividade dos direitos invocados, tentando

sanar a ausência da norma regulamentadora. Ademais, os recentes julgados do Supremo

Tribunal Federal demonstram que a função precípua do mandado de injunção está sendo

atingida, que é tornar viável o exercício de direitos, liberdades e prerrogativas constitucionais.

Finalmente, com esse novo posicionamento, pode-se concluir que os preceitos

constitucionais estão prevalecendo na ordem jurídica. Percebe-se uma maior preocupação com

a efetividade dos direitos e liberdades constitucionais, proporcionando uma vida mais digna aos

cidadãos. Desta forma, a sociedade em geral se beneficia, uma vez que seus direitos que

anteriormente estavam minguados, agora poderão ser realmente concretizados.

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