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Braverman, Subjetividade e Função de Direção Na Produção Do Valor
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Cad. EBAPE.BR, v. 12, n. 4, Apresentao, Rio de Janeiro, Out./Dez. 2014. p.741755
Braverman, subjetividade e funo de direo na
produo do valor
Braverman, subjectivity and function of direction in the value production
Elcemir Pao Cunha1
Trabalho e capital monopolista, de Harry Braverman (1920-1976), desde 1974 segue sendo um texto de
referncia para o debate marxista (e no marxista) sobre o processo de trabalho e as formas complexas por
meio das quais o domnio do capital se desenvolve e se reproduz.
As palavras de Paul M. Sweezy (1977, p. 11) poca so vlidas para demarcar o livro em questo, mesmo
passados 40 anos de sua primeira publicao: [a] funo desta obra muito mais suscitar do que responder a questes. Esse o esprito da obra que cortou tantas dcadas, tendo por ponto de arranque um singular encontro entre a investigao dos textos fundamentais do marxismo, da experincia pessoal como
trabalhador e militante socialista, alm do senso de realidade que transborda das linhas que armam o texto.
Marxista de inclinaes trotskistas, deveu muito s anlises de Paul Baran e Paul Sweezy em Capital
monopolista, contribuindo indubitavelmente ao avanar no estudo sobre as consequncias que certos modos
de transformao tambm tecnolgica trouxeram ao processo de trabalho e classe trabalhadora.
O livro de Braverman importante por uma srie de questes alm daquelas j convencionais quando esse
o assunto. Com frequncia, exaltado por revigorar criticamente uma sociologia do trabalho estacionada nas
estatsticas e por lanar as bases de uma Teoria do Processo de Trabalho cuja crtica possibilitou o
desenvolvimento dos chamados Estudos Crticos da Gesto (Critical Management Studies). A despeito
dessa derivao, a chamada Teoria do Processo de Trabalho congrega muitos pesquisadores em todo o
mundo, gera publicaes e pauta eventos internacionais de grande expresso.
Entretanto, Braverman tambm memorvel pelo nexo que buscou desenvolver entre a produo do mais-
valor e a progressiva tendncia proletarizao da classe trabalhadora, seja do trabalho qualificado ou sem
qualificao, seja do gerente ou do operrio, no interior e externamente produo industrial. Esse
desenvolvimento serve ao combate tese lanada com frequncia, inclusive em poca recente no Brasil, de
um dito aburguesamento de muitas esferas da atividade humana. Braverman mostra, ao contrrio, a tendncia mais forte decada dos diferentes processos de trabalho, dentro e fora da indstria incluindo os escritrios , sob os mesmos efeitos que assolam os trabalhadores tradicionalmente ligados produo direta das mercadorias fsicas. Sob esse ngulo, a precarizao do trabalho, por exemplo, no seria uma
exclusividade da esfera diretamente econmica, nem do trabalho manual no interior dela. o que se pode
constatar (guardadas as diferenas) em diversas esferas do trabalho, dos canaviais brasileiros s
universidades norte-americanas. A iluso qual se prendeu a sociologia acadmica (e sua terminologia,
white-collars, blue-collars etc.) ao tempo de Braverman e qual tambm se agarra hoje, desesperadamente,
o discurso poltico, aquela que sustenta um crescimento da classe mdia. A argumentao de Braverman mostra, entre muitas outras coisas, que o fenmeno no se deve vontade poltica e, em especial, no a
Artigo submetido em 29 de setembro de 2014 e aceito para publicao em 12 de novembro de 2014.
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1679-395138853
1 Doutor em Administrao pela UFMG; Professor Adjunto do Departamento de Cincias Administrativas; Professor do Programa de
Ps-Graduao em Direito e do Programa de Ps-graduao em Servio Social da Universidade Federal de Juiz de Fora. Endereo:
Universidade Federal de Juiz de Fora, Campus Universitrio, s/n, Bairro Martelos, CEP: 36036-900, Juiz de Fora MG, Brasil. E-
mail: [email protected]
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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criao ou desenvolvimento do meio-termo, mas o crescimento progressivo da massa de trabalho improdutivo (que no cria valor, isto , trabalho nas esferas comercial, financeira e de escritrio, este ltimo
tambm dentro da prpria indstria) sob o comando do capital, se comparado aos trabalhos diretamente
produtivos (ligados ao capital produtivo) que adicionam novo valor2.
Por esses pontos, Braverman permanece importante para a discusso sobre a lgica do valor, questo
retirada de cena sempre que possvel em nome de abstraes que esfumaam as contradies reais.
importante, ainda, como trincheira diante do avano do irracionalismo e suas variadas manifestaes, que
pregam a indeterminao da realidade e um subjetivismo solipsista beira do niilismo derrotista, que negam
a contradio no movimento prprio das coisas e mistificam o existente, sobretudo em uma forma de
sociabilidade arqueada pelo poder do capital e seu impulso insacivel de autovalorizao. Todavia, a prpria
efetividade cobra seu preo do irracionalismo. O movimento dessa realidade concreta cria as condies e
tendncias de sua prpria transformao, cuja realizao, contudo, no se d sem a atuao efetiva dos
homens ao converterem, por meio da prxis histrica, as tendncias em efeitos postos conscientemente. O irracionalismo a forma que assume [...] a tendncia a esquivar a soluo dialtica de problemas dialticos, como sugeriu Lukcs (1958, p. 193). por esses e outros motivos que Braverman precisa ser lido e debatido,
inclusive para explicitar suas deficincias, com o rigor que o autor merece.
No sentido de contribuir para o debate de pontos importantes do livro em questo, seguem abaixo ao menos
dois que se mostram centrais, mas sem qualquer inteno de esgotar a discusso. Ao final, so indicados os
artigos profundamente instigantes, tanto no conjunto como de modo individual, que configuram esta edio
especial inestimvel.
Os dois pontos importantes giram em torno, de um lado, do problema da subjetividade, a partir do qual se
ergueram rios de pginas hostis a Braverman. preciso esclarecer alguns pontos a respeito. De outro lado,
tratamos do carter produtivo e improdutivo da funo de direo, isto , do trabalho do administrador na
produo do valor como trabalho de explorar exercitado por frao do trabalho explorado uma dimenso que Braverman mesmo no pde desenvolver suficientemente.
Subjetividade
Uma das maiores polmicas certamente gira em torno do problema da subjetividade. Em parte, Braverman
pode ser responsabilizado por uma dificuldade que cobra seu preo, mesmo depois de quarenta anos.
Entretanto, apenas em parte.
A certa altura da introduo de Trabalho e capital monopolista, nosso autor explicou que no intentava
cuidar do estudo da moderna classe trabalhadora no nvel de sua conscincia, organizao ou atividades. Este livro [disse ele] trata da classe trabalhadora como classe em si mesma e no como classe para si mesma (BRAVERMAN, 1977, p. 33-34, grifo do autor). No h lugar para longas digresses que lidem com uma
das grandes questes do marxismo, isto , a diferenciao entre classe em si e classe para si. Digamos,
brevemente, que a segunda refere-se ao estgio em que a classe j tem esclarecida sua misso histrica,
reconhece-se como classe e empreende ato social e poltico com o intuito de transformar a realidade social e
superar as relaes de classe. A primeira, por sua vez, refere-se existncia da classe em suas condies
objetivas, mas ainda incapaz (por diferentes razes) de converter essa condio em movimento histrico. Ao
se concentrar na classe em si, Braverman tem em mente um quadro da classe trabalhadora tal qual existe, com a forma dada populao trabalhadora pelo processo de acumulao primitiva do capital (BRAVERMAN, 1977, p. 34). O autor americano estava bastante esclarecido dos problemas dessa
alternativa analtica. Como ele mesmo explica:
2 Essas categorias (valor, trabalho produtivo e improdutivo) sero discutidas mais adiante em certo detalhe.
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Esta limitao autoimposta ao contedo objetivo de classe e a omisso do sujeito, receio
que comprometer irremediavelmente este estudo aos olhos daqueles que flutuam na
corrente convencional da cincia social. Para eles, por longo hbito e insistente teoria, a
classe no existe realmente fora de suas manifestaes subjetivas. Classe, status,
estratificao, e at mesmo o assunto da moda [hobby horse] dos ltimos anos, que foi
tomado a Marx sem a mnima compreenso de seu significado, alienao tudo isto so
para a cincia social burguesa artefatos de conscincia que s podem ser estudados na
medida em que se manifestam nas mentes da populao em foco. Pelo menos duas geraes
de sociologia acadmica elevaram este enfoque de tal modo categoria de dogma que s
raramente se sente necessidade de substantiv-lo (BRAVERMAN, 1977 p. 34; 1998, p.
19)3.
Como uma espcie de antecipao das crticas que viriam, Braverman sugere uma das marcas mais decisivas
do marxismo, a de que a realidade opera de maneira independente da conscincia dos homens que vivem
essa mesma realidade o que no significa que a conscincia no desempenharia qualquer papel. Talvez nosso autor no tenha dedicado palavras suficientes para uma explicao mais acabada dessa questo,
deixando ao menos aludido que as condies sociais da existncia de uma classe seguem existindo de modo
independente da elaborao consciente dos indivduos que compem essa classe. Nosso autor explicitou, na
antecipao da crtica, que para aqueles que flutuam na corrente convencional da cincia social, a classe, o status, a alienao etc. so incompreensveis seno como artefatos de conscincia, coisas que s existem nas mentes dos grupos que compem o objeto da pesquisa sociolgica. Embora no tenha desenvolvido
suficientemente seu argumento, o autor americano coerente com seus fundamentos e almeja avaliar as
condies de classe e no os movimentos histricos da classe para si. o que lemos, muitas pginas depois,
ao afirmar que a existncia de uma classe trabalhadora como tal no depende das diversas formas concretas de trabalho que lhe cabe desempenhar, mas, isto sim, de sua forma social (BRAVERMAN, 1977, p. 347). E completou, pargrafos depois: a variedade de determinadas formas de trabalho pode influir na conscincia, coeso ou atividade econmica e poltica da classe trabalhadora, mas no afeta a existncia dela como
classe (BRAVERMAN, 1977, p. 347). Era disso que se tratava para o autor nova-iorquino em 1974.
Braverman no fazia ideia de que seus crticos iriam muito mais longe do que pde antecipar. Como
comentou ODoherty (2009, p. 5-6), Braverman tipicamente lido e associado a uma forma monocausal e teleolgica da historiografia marxista qual falta nuance histrica, sutileza dialtica e sofisticao terica. As crticas de outra qualidade vieram, primeiro, a partir de uma inclinao gramsciana pelas mos de
Michael Burawoy e, depois, por leituras da derivadas, mas em um corte mais diverso e, por vezes, avesso ao
marxismo. Contudo, mesmo essas crticas guardam limitaes. Vejamos.
Burawoy (1983) no se restringe a Braverman; apresenta um Marx no dialtico, como portador de uma
descrio do regime fabril restrito ao momento coercitivo. Supe-se que Marx teria visto apenas esse
momento da produo historicamente determinada. Por diferena, no contemporneo, em que a dependncia
do trabalho em relao ao capital alegadamente menor, o mtodo no pode ser outro seno a produo
ideolgica. Essa posio de Burawoy em relao produo a mesma que muitos gramscianos sustentam
em relao ao Estado, posio segundo a qual em Marx vigeria uma concepo restrita do Estado (COUTINHO, 1996; 2012), estacionado no momento coercitivo. Existem provas, porm, que colocam em
dvida este ltimo entendimento (PAO CUNHA, 2014), tendo tambm em mente que o modo coercitivo do
Estado impossvel como a forma poltica normal da sociedade, insuportvel mesmo para a massa das classes mdias (MARX, 2011a, p. 171). Existem provas, ainda, no que tange produo (cf. PAO CUNHA, 2010, p. 310-326), uma vez que Marx demonstrou que no lugar do chicote surge o manual de
penalidades: um tipo de regulao social do processo de trabalho nesse momento do desenvolvimento da
produo capitalista que dista de uma mera coero. Dito de outra forma, Marx j apreendia em seu tempo a
3 As passagens que aparecem com dupla referncia constituem traduo de nossa autoria derivada de cotejamento com a traduo
para o portugus da edio de 1977.
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transio da coero mais direta e violenta durante o processo de gnese do capitalismo s formas mais sutis
de exerccio do poder de direo [Regierungsgewalt] (MARX, 1985, p. 484), na medida em que, inclusive, no evolver da produo capitalista desenvolve-se uma classe de trabalhadores que, por educao, tradio e hbito, reconhece as exigncias desse modo de produo como leis naturais e evidentes por si mesmas (MARX, 2013, p. 808). Qual a participao das relaes imediatas na produo nesse processo de criao
do hbito, por exemplo? No est a explcito que o momento da produo no encerra apenas coero
virulenta?
Com isso, possvel avaliar que as crticas ao Braverman tambm ecoam sobre Marx. Se as crticas no
procedem em relao a Marx, o que dizer sobre as que recaem diretamente sobre o autor americano?
Vejamos:
[] os problemas bsicos: Braverman assume que os aspectos objetivo e subjetivo do
processo de trabalho possam ser separados e analisados independentemente um do outro.
[] seus crticos argumentam que uma compreenso do controle do capital [] no pode
ser localizado sem a devida ateno aos componentes subjetivos do trabalho
(BURAWOY, 1985, p. 24) (WILLMOTT, 1990, p. 337).
preciso esclarecer que Braverman no parece ter assumido que os aspectos objetivos e subjetivos do processo de trabalho podem ser separados e analisados independentemente um do outro, como lemos acima. Vimos antes que nosso autor pretendia tratar da classe em si, isto , como ela surge nas condies da
produo do capital independente da elaborao consciente que a classe faa dessas condies. A
determinao bastante objetiva de que a realidade possui movimento prprio, independente da conscincia,
converte-se, para os crticos de Braverman (e tambm para os de Marx4) em uma separao entre
objetividade e subjetividade no processo de trabalho. Alis, Braverman seria o ltimo a discordar de que uma
compreenso do controle do capital no pode ser alcanada sem a ateno devida aos componentes subjetivos do trabalho, como sugerem seus crticos acima. E o que o autor americano tem a dizer diretamente a respeito?
O captulo seis, denominado A habituao do trabalhador ao modo capitalista de produo, (por acaso?) repleto de indicaes sobre esses processos mediados pela subjetividade, muito prximas, alis, daquela
considerao marxiana de antes a respeito da formao da classe trabalhadora. Existem muitos outros pontos
no texto que tambm trazem essa questo para o primeiro plano. Entretanto, fiquemos apenas com o captulo
seis. O ponto de partida bastante ilustrativo: [...] a habituao dos trabalhadores ao modo capitalista de produo deve ser renovada a cada gerao (BRAVERMAN, 1977, p. 124). E completou:
[...] a necessidade de ajustar o trabalhador ao trabalho em sua forma capitalista, de superar a
resistncia natural intensificada pela tecnologia mutvel e alternante, relaes sociais
antagnicas e a sucesso de geraes, no termina com a organizao cientfica do
trabalho, mas se torna um aspecto permanente da sociedade capitalista (BRAVERMAN,
1977, p. 124).
Como possvel afirmar que a habituao socialmente posta no resultado histrico mediado pela
subjetividade?
Braverman estende consideravelmente a anlise sobre o desenvolvimento das pesquisas de inclinaes
psicolgicas e, depois, sociolgicas. A crise de 1929 fez com que a fbrica aparecesse
4 Para uma discusso sobre a relao entre objetividade e subjetividade em Marx e resposta aos problemas postos por
autores dos chamados Estudos Crticos da Gesto e outros mais, ver Bicalho (2014).
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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[...] subitamente no como um sistema de organizao burocrtica formal no modelo
weberiano, no como um sistema de relaes de grupo informal, como na interpretao de
Mayo e seus seguidores, mas antes como um sistema de fora, de antagonismos de classe
(BRAVERMAN, 1977, p. 129).
Nosso autor considerava que tais pesquisas no foram to aptas no desenvolvimento de medidas
imediatamente prticas que atendessem s necessidades reais da produo se comparadas ao taylorismo e,
por isso, tiveram pouca influncia sobre a habituao dos trabalhadores produo do capital. Talvez o autor
americano tenha subestimado tais influncias, mas sua considerao serve de base para lanar uma questo
decisiva: Se a adaptao do trabalhador ao modo capitalista de produo deve pouco aos esforos dos manipuladores prticos e ideolgicos, como de fato ela se realiza? (BRAVERMAN, 1977, p. 129). Braverman reconhece na histrica econmica e poltica do mundo capitalista o papel principal no processo de ajustamento, dos conflitos e revoltas que o acompanham (BRAVERMAN, 1977, p. 129) e como poderiam encaminhar conflitos e revoltas sem a mediao da subjetividade? Ao destacar o fordismo, o
autor nova-iorquino pretende mostrar o carter preponderante no mecnico, no nico, no unidirecional das condies e foras socioeconmicas se comparadas com a manipulao ou bajulao (BRAVERMAN, 1977, p. 129-30) promovida pelos estudos psicolgicos e sociolgicos.
O ponto central para Braverman que, com o desenvolvimento do fordismo e com o espraiamento dessa
lgica da produo para virtualmente todas as demais esferas econmicas, ilustra-se a
[...] regra de que a classe trabalhadora est progressivamente submetida ao modo capitalista
de produo, e s formas sucessivas que ele assume, apenas medida que o modo
capitalista de produo conquista e destri todas as demais formas de organizao do
trabalho, e com elas, todas as alternativas para a populao trabalhadora
(BRAVERMAN, 1977, p. 132, grifo do autor).
Em outros termos, trata-se de tornar objetivamente todos os outros meios de vida impossveis (BRAVERMAN, 1977, p. 133).
Essa constatao, entretanto, no ndice de desconsiderao dos aspectos subjetivos no processo de
trabalho, como seus crticos sugeriram (a despeito do fato de haver alguma perda na excessiva concentrao
nesses padres produtivos, como taylorismo, fordismo). Como o prprio Braverman (1977, p. 133) explica:
Se as mnimas manipulaes dos departamentos de pessoal, a Psicologia e Sociologia da
indstria no desempenharam papel mais importante na habituao do trabalhador ao
trabalho, consequentemente isto no significa que o ajustamento do trabalhador est
isento de elementos manipulativos. Pelo contrrio, como em todo funcionamento do
sistema capitalista, a manipulao vem em primeiro lugar e a coero mantida na reserva
exceto que esta manipulao o produto de foras econmicas poderosas, polticas de
emprego e barganha, e a atuao e evoluo ntimas do prprio sistema capitalista, e no
primacialmente dos hbeis esquemas de peritos em relaes trabalhistas.
Seja pela considerao do papel principal das condies e foras socioeconmicas, seja pela indicao do
carter progressivamente manipulativo do capitalismo com vistas ao ajustamento, isto , constituio do hbito, ambos os movimentos (complementares, diga-se de passagem) so impensveis sem a mediao da
subjetividade dentro e fora dos muros que cercam a produo. um devaneio considerar o contrrio. E, como possvel ver, Braverman (assim como Marx) no recusou, como no poderia mesmo recusar, a
mediao da subjetividade. Para alm da constatao de que nosso autor no desenvolveu razoavelmente tal
problema de grande magnitude, poderamos questionar se a histria real autoriza uma desconsiderao to
radical dos problemas da conscincia de classe. Poderamos, ainda, perguntar se Braverman no teria
subestimado demasiadamente os efeitos dos estudos manipulativos na produo do valor e fora dela, em
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esferas de domnio do capital comercial, financeiro, ou mesmo para alm do complexo econmico imediato.
Outra coisa, porm, afirmar que Braverman teria desconsiderado por inteiro o momento subjetivo no
processo de trabalho, que teria cindido tal momento de seu necessrio complemento, o momento objetivo.
Parece que, desse ngulo, aquela derivao (os chamados Estudos Crticos da Gesto), engendrada tendo por
base essa considerao sobre Braverman, possui um problema de fundamento. No se deve questionar
Braverman por meio de falsos problemas.
Ao final dessa considerao sobre a subjetividade, possvel ver as mazelas que esses mal-entendidos
histricos provocam e que transcendem os limites de Trabalho e capital monopolista. Tenhamos em mente,
por exemplo, a to frequentemente evocada distino entre mecanismos de controle objetivo e subjetivo.
Segundo se conta, o capitalismo de estgio anterior se fundou no controle objetivo do trabalho e, no
posterior, no controle subjetivo. Com frequncia, tambm se ligam os pontos, associando taylorismo a
controle objetivo e os padres posteriores a controle subjetivo. Ora, de supor que os trabalhadores na virada
do sculo XIX para o XX vendiam-se sem suas cabeas! Basta uma leitura dos Princpios de administrao
cientfica, de Taylor, para apreciar o momento subjetivo; Schmidt que o diga (cf. TAYLOR, 1953, p. 44-47). Qualquer explicao que obstrua as conexes entre a objetividade e a subjetividade no movimento
concreto-prtico no uma explicao. No to fcil ignorar, por exemplo, que a apropriao da vontade alheia o pressuposto da relao de dominao (MARX, 2011b, p. 411). Nem mesmo nas formas mais coercitivamente explcitas de dominao a subjetividade est ausente. Ela momento ineliminvel do
movimento prtico dos homens. O captulo seis de Braverman prova que ele tinha isso muito bem claro, a
despeito das leituras de seus crticos ou dos limites intrnsecos no tratamento do tema5.
Funo de direo na produo do valor
Braverman tambm abre outras questes importantes, largamente deixadas em segundo plano pela
elaborao mais desenvolvida na grande rea dos chamados Estudos Organizacionais. Trata-se da lgica do
valor e seus condicionantes sobre a vida social, inclusive sobre a funo de direo na produo econmica,
isto , o trabalho de administrar.
Uma das coisas mais interessantes o destaque que distingue a anlise de Braverman daquelas mais abstratas
como, por exemplo, a demarcao do trabalho do administrador como tomada de decises, resoluo de
problemas ou, ainda, como a realizao das etapas de um ciclo administrativo, muito bem conhecido por
todos que passaram pelos cursos de Administrao. O autor americano, munido de seu profundo sentido de
realidade, destaca que o problema tal como se apresenta aos homens que administram a indstria, o comrcio e as finanas muito diferente do problema como aparece nos mundos acadmicos ou
jornalsticos (BRAVERMAN, 1977, p. 41). E completou:
[...] o administrador est habituado a conduzir processos de trabalho num ambiente [setting]
de antagonismo social e, de fato, jamais o conheceu de outro modo. Os gerentes de empresa
no tm nem esperana nem expectativa de alterar essa circunstncia por um nico golpe;
ao contrrio, eles esto ocupados com a melhoria apenas quando interfere no
funcionamento ordenado de suas fbricas, escritrios, armazns e lojas. Para o gerente
corporativo isso um problema nos custos e nos controles, no na humanizao do
trabalho. Exige sua ateno porque manifesta-se no absentesmo, na rotatividade de
pessoal [turnover] e nos nveis de produtividade que no se conformam com seus clculos e
expectativas. As solues que aceitaro so apenas aquelas que promovem melhorias nos
5 Sem mencionar o captulo 1, sobre Trabalho e fora de trabalho, que revela o momento subjetivo no trabalho humano como algo
consciente e proposital (BRAVERMAN, 1977, p. 50) e, logo, o lugar decisivo da subjetividade em todo e qualquer processo de
trabalho humano.
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custos do trabalho e nas posies competitivas nos mercados domstico e mundial
(BRAVERMAN, 1977, p. 41; 1998, p. 25).
Demarcar o trabalho do administrador que opera na dimenso econmica como atividade que se resolve no
interior do antagonismo social tem a vantagem de explicitar de maneira concreta, no abstrata, os reais
imperativos que nascem das prprias relaes sociais de produo capitalistas. Desse modo se vai raiz do
problema e, para lembrar um ilustre florentino a respeito de outra ordem de questes, verit effecttuale
della cosa. Braverman abre, assim como outros autores importantes que remontam a Marx, a possibilidade e
a necessidade de considerar tal atividade de direo a partir da lgica do valor.
Considerando que seria impossvel explicitar sequer as nuances centrais dessa lgica, no seria um grande
desservio determinar o valor como tempo de trabalho socialmente necessrio, sob condies histricas
particulares, produo das mercadorias, sendo elas prprias forma de valor. Escreveu nosso autor que
todos os produtos do trabalho na produo capitalista carregam as marcas invisveis da propriedade e que, para alm de sua forma fsica, h sua forma social como valor (BRAVERMAN, 1977, p. 256, grifo do autor). Esse ponto de partida de Braverman, de uma teoria do valor-trabalho (BRAVERMAN, 1977, p. 54), ilumina o propsito da produo de mercadorias, isto , um processo para a expanso do capital (BRAVERMAN, 1977, p. 55-56; 1998, p. 36). Como a produo capitalista no mero processo de trabalho
na feitura de coisas teis, j que tambm processo de criao de valor, de valorizao, o movimento dessa
unidade respeita a trama posta pelo valor de troca que domina seu pressuposto objetivo, o valor de uso. Essa
marca central implica, para Braverman (1977, p. 56; 1998, p. 37), compreender a maneira pela qual o processo de trabalho dominado e modulado pela acumulao do capital, isto , compreender como o valor domina as necessidades reais dos homens. Braverman (1977, p. 217) apreende a relao entre o movimento do valor e o movimento do trabalho, inspirado na exposio de Marx sobre a lei geral da acumulao capitalista, porm importante dizer conforme desenvolvida por Baran e Sweezy em Capital monopolista. Esses condicionantes da produo do valor podem ser apreendidos, seguindo Braverman, nas
esferas imediatamente econmicas e para alm delas. O progressivo movimento do capital, escreveu
Braverman (1977, p. 218):
[...] reorganizou totalmente a sociedade, e ao criar a nova distribuio do trabalho criou a
vida social amplamente diferente daquela de apenas setenta ou oitenta anos passados. E esta
incansvel e insacivel atividade do capital continua a transformar a vida social quase que
diariamente diante de nossos olhos, sem cuidar em que ao assim fazer est criando uma
situao na qual a vida social torna-se cada vez mais impossvel.
Descontando o tom apocalptico ao final da passagem, o ponto central que o excedente do trabalho distribudo em novas formas de produo ou no produo incorreu no fato de que a estrutura ocupacional e portanto a classe trabalhadora foi transformada (BRAVERMAN, 1977, p. 218). Com palavras mais incisivas, explicou Braverman que a fora de trabalho, como a parte viva do capital, sua estrutura ocupacional, modos de trabalho e distribuio pelas atividades da sociedade [...] so determinados pelo
processo em curso de acumulao do capital. Essa fora, completou, captada, liberada, arremessada pelas diversas partes da maquinaria social e expelida por outras, no de acordo com sua prpria vontade ou
atividade prpria, mas de acordo com os movimentos do capital (BRAVERMAN, 1977, p. 320). Ou, ainda, uma sociedade que se baseia na forma do valor submete mais e mais de sua populao trabalhadora s complexas ramificaes das exigncias da propriedade do valor (BRAVERMAN, 1977, p. 258).
Se existe nexo entre o movimento do valor e o movimento do trabalho, a atividade de direo exercida
frequentemente por administradores (atividade de direo) na produo do valor (ou mesmo fora dela)
tambm deve receber condicionamentos complexos. Isso procedente porque, por um lado, o motivo que impulsiona e a finalidade que determina o processo de produo capitalista a maior autovalorizao
possvel do capital, isto , a maior produo possvel de mais-valor e, portanto, a mxima explorao
possvel da fora de trabalho pelo capitalista (MARX, 2013, p. 406). Por outro lado:
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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O comando do capitalista no apenas uma funo especfica, proveniente da natureza do
processo social de trabalho e, portanto, peculiar a esse processo, mas, ao mesmo tempo,
uma funo de explorao de um processo social de trabalho, sendo, por isso, determinada
pelo antagonismo inevitvel entre o explorador e a matria-prima de sua explorao
(MARX, 2013, p. 406).
Agora ele [o capitalista individual ou coletivo, depois do crescimento do seu capital]
transfere a funo de superviso direta e contnua dos trabalhadores individuais e dos
grupos de trabalhadores a uma espcie particular de assalariados [...] que exeram o
comando durante o processo de trabalho em nome do capital (MARX, 2013, p. 407).
Ao mesmo tempo em que a atividade de direo realizada pelo administrador efetivada da tica do capital,
esses homens e mulheres no so outra coisa seno trabalhadores assalariados. Braverman desenvolve esse
ponto de partida considerando as alteraes provocadas na fase monopolista do capitalismo. verdade que
desenvolve mais o primeiro lado da equao (o motivo e a finalidade do processo), deixando apenas algumas
indicaes sobre o carter assalariado do administrador o que tentaremos desenvolver adiante , porque tendeu a obscurecer o problema pela total incluso dessa atividade na categoria do trabalho improdutivo.
No obstante, trata-se de apreender o considervel crescimento na escala de operaes gerenciais (BRAVERMAN, 1977, p. 222). Disso resulta que:
A funo especial de administrao exercida no mais por um nico gerente, nem mesmo
por uma equipe de gerentes, mas por uma organizao de trabalhadores sob o controle
de gerentes, assistentes de gerentes, supervisores etc. Assim, as relaes de compra e
venda da fora de trabalho, e, em consequncia, de trabalho alienado, tornou-se parte
do aparelho gerencial em si mesmo (BRAVERMAN, 1977, p. 228, grifo do autor).
As anlises de Braverman so originais porque buscam, como dissemos antes, abarcar os condicionantes
gerais da lgica do valor inclusive em esferas no imediatamente produtivas, no industriais, por assim
dizer. Ele se ocupa em larga medida dos efeitos sobre os trabalhadores dos escritrios, inclusive com a
gerncia do escritrio como um produto do perodo monopolista do capitalismo (BRAVERMAN, 1977, p. 259). Um dos elementos importantes dessa anlise a distino entre trabalho produtivo e improdutivo,
questo qual Braverman dedicou um captulo.
Em termos sintticos, o autor americano aceita, e com razo, a posio de Marx de que o trabalho produtivo no capitalismo aquele que produz valor de mercadoria [commodity value], e, por conseguinte, mais-
valor6 para o capital. Isto exclui todo o trabalho que no trocado por capital (BRAVERMAN, 1977, p.
348; 1998, p. 285). Com o desenvolvimento do capitalismo, vrias outras modalidades do trabalho caem na
categoria do trabalhador produtivo. V-se que a transformao do trabalho improdutivo em trabalho produtivo que , para os fins do capitalista de extrair mais-valor, o prprio processo da criao da sociedade
capitalista (BRAVERMAN, 1977, p. 249; 1998, p. 286). Onde quer que se desenvolva o capitalismo, mais difcil a existncia de trabalhos improdutivos fora do domnio do capital. Isso significa que nem todo
trabalho que cai sob seu domnio converte-se necessariamente em trabalho produtivo, porque isso depende
do momento da produo total em que tal trabalho se realiza. Por isso, Braverman (1977, p. 351, grifo do
autor) escreveu que enquanto o trabalho improdutivo declinou fora do alcance do capital, aumentou dentro do seu mbito. Isso o leva importante distino entre o que ele denomina funes adicionais, alm da produo imediata do valor: realizao do valor e apropriao do valor. Enquanto a primeira se
liga circulao das mercadorias no mercado, a segunda expressa a luta de capitais em concorrncia pelo
6 Braverman utiliza a expresso surplus value, que correspondente a mais-valia ou, melhor ainda, a mais-valor, conforme a nova
edio de O capital, publicada pela editora Boitempo em 2013. A traduo de Trabalho e capital monopolista optou por valor
excedente (com exceo do ttulo do captulo 11, onde se l mais-valia e trabalho excedente), mas isso retira o trao decisivo do
processo de valorizao que o termo consagrado reserva.
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
Cad. EBAPE.BR, v. 12, n 4, apresentao, Rio de Janeiro, Out./Dez. 2014. p. 749755
valor, e sua transferncia e redistribuio de acordo com exigncias individuais, especulaes e os servios do capital sob a forma de crdito etc. (BRAVERMAN, 1977, p. 351). Essas funes, explica Braverman (1977, p. 350), mobilizam enormes volumes de trabalho que, embora necessrio para o modo capitalista de produo, em si improdutivo, visto que no amplia o valor ou o mais-valor. Nosso autor, aqui, busca seguir Marx (2013, p. 238), para quem a circulao ou a troca de mercadorias no cria valor nenhum, lembrando, porm, que o capital no pode ter origem na circulao, tampouco pode no ter origem na circulao. Ele tem de ter origem nela e, ao mesmo tempo, no ter origem nela (MARX, 2013, p. 240), isto , o processo total da produo do capital tem na circulao das mercadorias ponto de passagem necessrio,
mas esse momento do movimento total no adiciona novo valor.
O trabalho realizado, pois, no escritrio trabalho improdutivo, uma vez que no cria novo valor e est mais
ligado realizao e apropriao do valor j criado. A despeito disso, o mercado de trabalho para as duas principais variedades de trabalhadores, escritrio e fbrica, comea a perder algumas de suas distines de
estratificao social, instruo, famlia e coisas semelhantes (BRAVERMAN, 1977, p. 298). Trata-se, e este o ponto, da criao de um vasto proletariado sob forma nova (BRAVERMAN, 1977, p. 299-300).
A atividade do administrador se confirma tanto na produo imediata como naquilo que Braverman chamou
de realizao e apropriao que, no obstante, ocorrem tanto distantes do processo de produo das
mercadorias como no interior da prpria produo imediata. Como apreender esse conjunto, produtiva ou
improdutivamente? E os efeitos, tambm so muito semelhantes? Braverman pouco desenvolve, diretamente,
esses dois pontos, porm, de modo comparativo, confere nfase ao segundo. esse desenvolvimento,
entretanto, que o permite colocar as questes importantes. Com efeito, Braverman (1977, p. 352-353)
explicou que:
Nas primitivas empresas capitalistas o trabalho improdutivo empregado em pequenas
quantidades era, de modo geral, um estrato privilegiado, intimamente associado com o
empregador e detentor de favores especiais. Os que trabalhavam com ele na realizao de
vendas, contabilidade, funes especulativas e manipulativas representavam para ele scios
na guarda e expanso de seu capital enquanto capital, distintamente daqueles na produo,
que representavam seu capital apenas em sua forma temporria como trabalho. [...].
Aqueles que ajudavam o capitalista na circulao de seu capital, na realizao do seu lucro,
e na administrao do seu trabalho, obtinham privilgios, segurana e status na funo
exercida, e assim, ser um trabalhador improdutivo era em si uma felicidade que contrastava
com a desgraa do trabalhador na produo.
Braverman informa diretamente que as atividades tpicas de escritrio (vendas, contabilidade, especulao)
surgem como trabalho improdutivo. Em meio a essas atividades, o autor sugere, ainda, as atividades
manipulativas as quais, como vimos antes no tratamento da questo da subjetividade, expressam o ato
administrativo muito ligado direo da fora de trabalho. Sob esse ponto de vista, o trabalho do
administrador, mesmo aquele ligado produo imediata, tambm seria trabalho improdutivo? Aguardemos
momento oportuno para retomar essa questo. O importante destacar que muitas mudanas ocorreram no
modo de produo capitalista de tal maneira que o processo de trabalho produtivo tornou-se, mais do que nunca, um processo coletivo (BRAVERMAN, 1977, p. 353) e o resultado do processo (o conjunto das mercadorias) no pode ser atribudo a qualquer trabalhador singular. Entretanto, Braverman (1977, p. 353)
destaca com maior nfase que do lado do trabalho improdutivo foi criada uma massa que partilha da sujeio e opresso que caracteriza as vidas dos trabalhadores produtivos. Assim, o processo de proletarizao assume escala universal para o modo de produo capitalista:
As funes improdutivas, tendo evoludo de ocupaes especiais e privilegiadas
intimamente associadas com o capital nas divises da atividade empresarial ou mesmo nas
indstrias capitalistas distintas e completas em si mesmas, produziram agora seus
exrcitos de assalariados cujas condies so em geral semelhantes s daqueles exrcitos de
trabalho organizado na produo (BRAVERMAN, 1977, p. 353).
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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Nessas funes improdutivas, como vimos, esto includas as atividades de realizao e apropriao. Tudo
indica que, para Braverman, a atividade do administrador, em seu bojo, concentra-se nessas funes
improdutivas. Mesmo o exerccio das funes manipulativas na produo imediata determina tal atividade
como trabalho improdutivo, embora Braverman, como dito antes, no tenha desenvolvido suficientemente
esse aspecto importante.
Isso se explica pelo fato de que nosso autor estava concentrado em explicitar os efeitos da lgica do valor
sobre os trabalhadores produtivos e, inclusive, sobre os trabalhadores de escritrio, circunscritos sob o
domnio do capital comercial (realizao) e financeiro (apropriao). Muito embora restem diferenas na
forma concreta desses trabalhos comparados ao trabalho produtivo direto no processo de valorizao que implica o grau de qualificao, nveis salariais etc. , o ponto que se destaca que cada vez mais o trabalho realizado no escritrio progressivamente igualado s formas simples do assim chamado trabalho manual de colarinho azul (BRAVERMAN, 1977, p. 276; 1998, p. 225), isto , no so mais procedentes as distines de fundamento entre o trabalho manual e o trabalho de escritrio porque este tendencialmente
reduzido cada vez mais s formas simples de trabalho. Trata-se, como antes, no da identificao de uma
atribuio social tpica da classe mdia, mas da proletarizao dessas funes desempenhadas sob o domnio
do capital. Dessa maneira:
O trabalho improdutivo contratado pelo capitalista para ajud-lo na realizao ou
apropriao do mais-valor , ao ver de Marx, semelhante ao trabalho produtivo em todos os
sentidos, exceto um: ele no produz valor e mais-valor, e por conseguinte aumenta no
como causa, mas muito pelo contrrio, como consequncia da expanso do mais-valor
(BRAVERMAN, 1977, p. 357; 1998, p. 292).
O trabalho improdutivo do administrador nesse contexto do escritrio, no interior da prpria produo
imediata, informou-nos Braverman, no passa ileso a esse processo de proletarizao. A relao, posta pelo
autor, de progressiva identificao (guardadas as diferenas na forma concreta) entre o processo de trabalho
administrativo e o processo de trabalho na produo imediata do valor implica uma relao de espelhamento:
A gerncia veio a ser administrao, que um processo de trabalho efetuado para fins
de controle no seio da empresa, e efetuado, alm do mais, como um processo de trabalho
rigorosamente anlogo ao processo da produo, embora ele no produza artigo algum que
no seja a operao e coordenao da empresa.
Desse ponto em diante, examinar a gerncia significa tambm examinar esse processo de
trabalho, que contm as mesmas relaes antagnicas contidas no processo da produo
(BRAVERMAN, 1977, p. 228).
So processos anlogos, porm cindidos, segundo o entendimento de Braverman. Embora demarque o
espelhamento (de identidade por vezes exagerada) e o antagonismo que se manifesta, ainda, no trabalho da
gerncia, Braverman separa a produo do valor, de um lado, e o processo de trabalho da coordenao dessa
produo, de outro. Essa uma dificuldade que teremos de retomar adiante. Por agora, basta-nos reforar o
espelhamento posto pelo autor a partir de sua constatao dada pela proletarizao, tambm, do trabalho
gerencial:
Em todas essas atividades, o desenvolvimento do capital transformou a funo operante do
capitalista de uma atividade pessoal a um trabalho de uma multido de pessoas. A funo
do capitalista representar o capital e ampli-lo. Isso feito ou pelo controle da produo
do mais-valor nas indstrias e atividades produtivas, ou pela apropriao dele de fora
daquelas indstrias e atividades. O capitalista industrial, o fabricante, um exemplo do
primeiro; o banqueiro exemplifica o segundo. Essas funes gerenciais de controle e
apropriao tornaram-se por si mesmas processos de trabalho. So conduzidas pelo capital
do mesmo modo como ele realiza os processos de trabalho da produo: com trabalho
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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assalariado comprado em larga escala no mercado de trabalho e organizado em imensas
mquinas de produo de acordo com os mesmos princpios que governam a organizao
do trabalho na fbrica (BRAVERMAN, 1977, p. 255-256; 1998, p. 208).
Ao reforar o espelhamento explicita-se o carter assalariado dos trabalhadores que realizam essas funes
gerenciais, cujo processo de trabalho , alm da realizao e da apropriao, controle na produo imediata
do mais-valor. Esse trabalho assalariado, porm improdutivo, que desempenha o controle, sofre dos mesmos
efeitos que os trabalhadores produtivos e que os tambm improdutivos que se situam fora da produo
imediata do valor. Ao passo que ajuda a revelar que o trabalho da administrao a representao do capital
no interesse condicionante de maior valorizao possvel, mostra, ainda, que esse trabalho improdutivo cai
na categoria de trabalho explorado, j que tambm constitui capital varivel junto a todos os demais
trabalhos assalariados aglutinados e necessrios produo do valor. Se todos esses trabalhos so
amalgamados em um trabalho coletivo imprescindvel produo do valor, como seriam improdutivos de
modo pleno? Essa dificuldade advm da abstrao relativamente forada que Braverman se v obrigado a
fazer para traar o espelhamento entre o processo de produo do valor e o processo de trabalho da gerncia
quando, no movimento da realidade concreta, essa desconexo no existe. Vejamos isso, enfim, mais de
perto.
Alguns pontos so importantes, mas no inteiramente suficientes, dados os limites das pginas.
O primeiro que a funo de direo, a administrao, no se realiza to somente no escritrio. Na verdade,
a funo de direo assume muitas formas e manifesta-se em diferentes pontos do conjunto organizado da
produo, isto , no interior do trabalhador coletivo. O engenheiro, por exemplo, administra, desempenha a
funo de direo sobre o trabalho. At mesmo alguma parte de seu trabalho poderia ser considerada
administrativa, no sentido mais restrito, como trabalho burocrtico. O trabalho do engenheiro no apenas
numrico e burocrtico, mas, tambm, social, manipulativo como sugeriu Braverman. Muitos outros tipos de
trabalho podem apresentar caractersticas semelhantes a essas, a depender das circunstncias singulares em
anlise. Importa destacar que existe, portanto, um risco na abstrao radical do processo de trabalho
gerencial como algo desconectado por completo do processo da produo do valor. H uma passagem de
Marx que Braverman possivelmente no conhecia e que muito esclarecedora a esse respeito. Nela, Marx
(1988, p. 443-444; 1969, p. 65-66, grifo do autor) diz:
Com o desenvolvimento da subsuno real do trabalho sob o capital ou o modo de
produo especificamente capitalista no o trabalhador individual, mas uma
capacidade de trabalho socialmente combinada que mais e mais o executor real
[wirkliche Funktionr] do processo de trabalho em sua totalidade, e j que diferentes
capacidades de trabalho as quais cooperam conjuntamente para formar uma mquina
produtiva total contribui de diferentes meios para o processo direto pelo qual a mercadoria,
ou, mais apropriadamente aqui, o produto, formado, com um trabalhando mais com suas
mos, outro mais com seu crebro, como gerente, engenheiro ou tcnico, etc., outro como
supervisor, um terceiro diretamente como um trabalhador manual, ou ainda como mero
servente, mais e mais funes da capacidade de trabalho so includas no imediato
conceito de trabalho produtivo, diretamente explorados pelo capital e subordinados em
geral ao seu processo de valorizao e de produo.
Quer dizer, quanto mais se desenvolve o modo de produo capitalista mais decisivo se torna o trabalhador
coletivo. Braverman capturou esse ponto, sem dvida. O problema est em no apreender que a funo de
direo, ou ao menos parte considervel dela, no est fora do trabalho combinado que produz valor, como
pareceu supor Braverman. E precisamente o fato dessa funo se realizar em meio s atividades produtivas
na criao da mercadoria o que a torna uma forma de trabalho produtivo. Entretanto, a distino que
Braverman realiza til para a constatao de que nem todo trabalho que se inclui no trabalhador coletivo
necessariamente produtivo. Basta, para isso, ter em mente o escritrio em que se confirmam as funes de
realizao e apropriao no interior da prpria produo imediata e que tambm requerem uma funo
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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particular de direo. O trabalhador coletivo, na verdade, formado por trabalhos improdutivos e produtivos
nos quais a funo de direo se manifesta em distintos pontos, tanto produtiva como improdutivamente,
cortando de modo considervel o amplo conjunto. Talvez seja til, pois, fazer distino entre a parcela da
funo de direo que cai na categoria do trabalho produtivo e aquela que permanece ligada realizao e
apropriao (na classificao de Braverman). Desse modo, obtemos a vantagem de avaliar que parte
considervel desse trabalho gerencial , ao mesmo tempo, trabalho assalariado e tambm produtivo, porque
no s participa (como os trabalhadores assalariados improdutivos) do trabalho coletivo como, ainda,
adiciona valor, como a passagem de Marx acima explicita. Disso resulta que no devemos abstrair por inteiro
o processo de trabalho que se confirma como comando sobre o trabalho em relao ao processo global de
valorizao porque parte relevante do trabalho de administrao explorada, ainda, de modo produtivo nesse
processo.
Essas consideraes so importantes para destacar que o salrio que remunera essa fora de trabalho especial
se d fora da ordem dos chamados ganhos empresariais. Desse modo, no se deve confundir o trabalho que realiza a funo de direo com capital, o que faria com que perdssemos de vista o carter produtivo de
parte do trabalho gerencial, sem mencionar seu carter antagnico efetivo:
O trabalho de superintendncia e gerncia erigido como tal a partir do antagonismo, da
supremacia do capital sobre o trabalho e sendo, assim, comum a todos os modos de
produo baseados nas contradies de classe como o modo de produo capitalista,
conectado direta e inseparavelmente, tambm sob o sistema capitalista, com as funes
produtivas as quais todo trabalho social combinado atribui aos indivduos como suas tarefas
especiais. Os salrios de um epitropos, ou rgisseur como era chamado na Frana feudal,
so inteiramente divorciados do lucro e assumem a forma de salrios para trabalho
qualificado sempre que a atividade operada sobre uma escala suficientemente ampla para
garantir o pagamento de tal MANAGER, embora nossos capitalistas industriais estejam
longe de atender aos assuntos do Estado ou dedicados ao estudo da filosofia (MARX,
1998, p. 384).
A funo de direo (superintendncia, gesto) no modo de produo capitalista no nasce simplesmente por
efeito do trabalho combinado, mas, antes, em razo do carter antagnico do processo. Com isso, destacamos
que, independente do carter produtivo ou improdutivo, o trabalho de homens e mulheres no desempenho da
funo de direo cai na categoria do trabalho explorado e sofrem efeitos semelhantes, os quais marcaram a
longa histria de lutas dos trabalhadores na ponta do processo de produo do valor, como bem notou
Braverman.
Contudo, aqui, tambm se revela uma contradio importante que relativamente escapou ao autor nova-
iorquino. Ao passo que so trabalho explorado como componentes do trabalhador coletivo que se realiza de
modo estranhado sob o domnio do capital, representam, em grande parte, o interesse do capital de maior
valorizao possvel. claro que o trabalho de explorar distinto do trabalho explorado, mas os dois
aspectos se manifestam em conjunto na funo de direo que se realiza diretamente como trabalho
produtivo no processo de valorizao. Trata-se do movimento complexo do trabalho de explorar exercitado
pelo trabalho explorado, uma forma diretamente contraditria de exerccio da dominao pela prpria classe
dominada sobre ela mesma; ou, ao menos, exercida por uma frao dominante cada vez mais dominada da
classe dominada.
Esta ltima constatao acerca do movimento complexo ajuda a trazer de volta o problema da subjetividade
que abordamos antes, e tambm serve de encaminhamento para o final dessas curtas consideraes. Ora, no
geraria qualquer espanto considerar que o processo de formao do hbito na classe trabalhadora abarca,
ainda, sua frao que exercita o trabalho de explorar. No factvel, aqui, um longo desenvolvimento. Para
nossos intentos, basta destacar que as variadas individualidades que desempenham as funes de direo
como trabalho assalariado (produtivo ou improdutivo) foram recrutadas em maior parte na prpria classe que
vive do trabalho, pois, do contrrio, no precisariam vender sua fora de trabalho para viver. Essa frao
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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teve, ainda, de ser habituada ao exerccio da funo, posio social subjetivamente elaborada que da
deriva. Sua habituao, no entanto, comporta o processo de identificao com os interesses do capital; algo
necessrio para o exerccio da prpria funo. A condio de pertencer de modo objetivo classe
trabalhadora no se reflete de modo ideal, isto , como membros da classe do trabalho, mas como algo
puramente externo, bastante diferente. A prpria prtica concreta dessa funo se encarrega de criar as
condies bsicas que emperram o autorreconhecimento como frao da classe trabalhadora ou ao menos
como frao dominante da classe dominada. Todavia, essa habituao certamente no seria completa sem a
participao tambm da educao formal nos bancos escolares, sobretudo nos cursos universitrios de
administrao em que a chamada profisso considerada no s diferente, mas, ainda, apresentada como
oposta ao trabalho. Essa oposio, no entanto, tomada como no contraditria, isto , no se revela a raiz
da questo. Em suma, no se mostra que essa oposio dada pelo carter antagnico do processo de
produo que pe parcelas da prpria classe do trabalho em relao contraditria consigo mesma.
Subjetivamente, essa contradio no se mostra pronta. Trata-se da contradio em movimento na qual o
trabalho explorado tambm se realiza como trabalho de explorar; expresso desenvolvida da concorrncia no
interior da prpria classe do trabalho.
Por fim, cabe dizer que esses pontos no tm a menor pretenso de forar uma crtica a Braverman, mas de
apresentar algum desenvolvimento possvel a partir das questes que ele mesmo abriu ao longo da exposio
de Trabalho e capital monopolista. E, se podemos promover algum andamento das questes, deve-se
qualidade do material que Braverman legou a pelo menos duas ou trs geraes de pesquisadores inquietados
com a crtica e a transformao da sociedade para alm dos limites da pr-histria da humanidade.
*
Nesse sentido, os trabalhos que compem esta edio comemorativa aos 40 anos da publicao de Trabalho
e capital monopolista tambm exploram diferentes questes abertas por Braverman, inclusive, elaboram
anlises crticas sobre diferentes pontos do texto ou at adotam uma literatura bastante diversa em relao
aos pilares que o autor norte-americano sustentou.
O artigo que abre esta edio, assinado por Fabiane Santana Previtali e Clson Csar Fagiani, intitulado
Organizao e controle do trabalho no capitalismo contemporneo: a relevncia de Braverman. O texto
prope uma revisita s teses centrais do livro seminal de Braverman, buscando analisar a problemtica
introduo das inovaes tcnicas no estgio de desenvolvimento do capitalismo no sculo XXI. Os autores
apresentam consideraes que ajudam a revelar a intensificao, a flexibilizao e a precarizao das
condies de trabalho sob a celebrao contempornea acerca da qualificao e recombinao do trabalho
mental e manual.
Na esteira dessas questes que tocam a precarizao do trabalho, o segundo artigo, de Maria Beatriz
Rodrigues, intitulado Trajetrias de vida e de trabalho flexveis: o processo de trabalho ps-Braverman,
busca apresentar as alteraes promovidas no capitalismo a partir da dcada de 1980 e, entre elas, o processo
de flexibilizao como parte do desenvolvimento do capitalismo em sua fase ps-fordista. Captura, a partir
dos casos italiano e brasileiro, os complexos efeitos da flexibilizao ainda em operao sobre as condies
de vida e de trabalho, incluindo os impactos sobre o potencial de mobilizao de classe dos trabalhadores.
O problema das classes sociais no capitalismo o tema do terceiro artigo, Revisiting the issue of class
structure in Labor and monopoly capital, contribuio internacional assinada por Bruno Tinel. Alm da
retomada dessa problemtica central que corta todo o livro de Braverman, o texto aponta determinados
enlaces no resolvidos pelo autor nova-iorquino a respeito da polarizao de classes no desenrolar do
desenvolvimento do capitalismo. Entre a polarizao de classes e a variabilidade no espectro da estrutura de
classes, Tinel situa as tendncias e contratendncias identificadas por Braverman como muito mais incertas
do que pde sugerir o prprio autor de Trabalho e capital monopolista.
O debate sobre as classes sociais nunca seria explicitado suficientemente sem a atuao do Estado capitalista.
O artigo Braverman, o Estado e a administrao consensual, de Claudio Roberto Marques Gurgel, aborda os desdobramentos do papel do Estado a partir de Braverman, os quais culminam em novas formas de
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
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atuao estatal por mediao das crises dos anos de 1970-80 e da crise de 2008. A pesquisa bibliogrfica e os
dados secundrios sugerem que, nessa nova fase de atuao estatal, minguam as fronteiras entre o pblico e o
privado (administrao pblica consensual) e fortalece-se o processo de mercantilizao de outras dimenses
sociais, criando as condies para um Estado servidor plenamente compatvel com o movimento
gerencialista.
O quinto artigo desta edio especial assinado por Eduardo Sartelli e Marina Kabat, constituindo outra
contribuio internacional, intitulada Where did Braverman go wrong? A Marxist response to the politicist
critiques. Ele traz o instigante argumento de que as deficincias da elaborao de Braverman sobre o
processo de trabalho podem ser encontradas no em seus fundamentos marxistas, mas por ter renunciado
propriamente a tais fundamentos, sobretudo s categorias marxistas (cooperao simples, manufatura e
grande indstria) em favor de conceitos regulacionistas (taylorismo, fordismo e toyotismo). Em defesa da
superioridade das categorias marxistas para a compreenso dos conflitos no processo capitalista de trabalho,
o texto enfrenta criticamente as posies politicistas de David Montgomery e Michael Burawoy, dado que
tm dificuldades na apreenso do momento da produo do valor como despotismo do capital e
supervalorizam tal momento como se fosse aberto s iniciativas tanto do capital como dos trabalhadores. O
ngulo central que o processo de trabalho no imediatamente poltico, como sugerem as posies
politicistas. As foras decisivas so tcnicas e econmicas, sobretudo pela unidade entre processo de
produo e processo de valorizao.
O ltimo artigo desta edio, Experimentao do tempo e estilos de vida em contexto de trabalho imaterial,
de Jonas Cardoso e Carmem Ligia Iochins Grisci, contribui com a discusso sobre as condies de trabalho
nos processos contemporneos. Sobretudo porque o texto analisa o tempo de vida e o tempo de trabalho de
professores horistas do Ensino Superior privado em Porto Velho-RO. Chama a ateno no texto o fato de
que, mesmo por outras vias analticas, explicitam-se ressonncias de uma das constataes mais fortes de
Braverman: os impactos da lgica do valor tambm sobre trabalhadores externamente esfera econmica
imediata. O texto revela que os estilos de vida so estabelecidos a partir dos ditames do capital, isto , uma
dada forma do processo de trabalho que condiciona a maneira como os homens vivem para alm do prprio
trabalho. Sobretudo, o artigo chama a ateno para o fato de que o trabalho imaterial do professor (esse
proletrio da educao) exige, por mediao das tecnologias informacionais, sua total disponibilidade,
intensificando o trabalho e dominando todo o tempo de vida.
Na seo Opinio, os leitores encontraro a contribuio de Claudio Katz, intitulada Discusiones del control
patronal, numa avaliao das teses centrais presentes em Braverman acerca de uma teoria do controle
patronal, tendo em vista o desenvolvimento atual do capitalismo. Nesse sentido busca explicitar a
consistncia de uma teoria marxista contida em Braverman em contraste com as posies da viso
neoclssica e da teoria da regulao. Destacam-se as consideraes de Katz acerca dos limites da tese de
Braverman sobre desqualificao absoluta do trabalho no capitalismo, bem como as consideraes de que no
autor nova-iorquino persiste uma perspectiva de centralidade do trabalho em contraste com o fim do trabalho.
importante registrar o agradecimento aos avaliadores nacionais e estrangeiros que dedicaram muito de seu
tempo na elaborao da presente edio, bem como ao professor Fernando Tenrio pelo incentivo e
Fabiana Braga Leal pela competente assistncia.
Por fim, esperamos que os leitores do Cadernos EBAPE.BR aproveitem os textos aqui apresentados. A
expectativa suscitar debates sobre os problemas acerca do processo de trabalho contemporneo, inclusive
incentivar o surgimento de outras edies e publicaes que acionem as temticas importantes que no
eliminam as contradies do mundo concreto nem a necessidade social de sua transformao efetiva.
Braverman, subjetividade e funo de direo na produo do valor Elcemir Pao Cunha
Cad. EBAPE.BR, v. 12, n 4, apresentao, Rio de Janeiro, Out./Dez. 2014. p. 755755
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