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Ordem Strigiformes Família Strigidae BUFO-REAL Bubo bubo (Linnaeus, 1758) de Uhu es Búho real en Eurasian eagle owl fr Hibou grand-duc it Gufo reale Catalão Duc Galego Bufo real Basco Hontza handia Texto de Rui Lourenço 1 , João Rodrigues 2 & Sérgio Godinho 3 Principais contribuidores (ordem alfabética): Alexandre Leitão, Andreia Dias, António Mira, Artur Vaz Oliveira, Carlos Carrapato, Carlos Godinho, Carlos Moreira, Edgar Gomes, Eduardo Barrento, Eduardo Realinho, Fábia Azevedo, Gonçalo Rosa, Inês Henriques, Inês Roque, João Paulo Lopes, João Tiago Marques, João Tiago Tavares, Jorge Vicente, José Aleixo, José Vítor Cavaco, Luís Filipe Oliveira, Luís Venâncio, Luísa Catarino, Magnus Robb, Marco Mirinha, Marco Correia, Nuno Mota, Nuno Ventinhas, Paulo Alves, Paulo Catry, Pedro Salgueiro, Ricardo Brandão, Ricardo Tomé, Rita Ferreira, Rúben Rodrigues, Rui Caratão, Sara Santos. Agradecemos a todos os colaboradores do GTAN-SPEA. 1 LabOr - Laboratório de Ornitologia, ICAAM - Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais, Universidade de Évora 2 Bafari, Associação Científica para a Conservação da Aves de Rapina 3 ICAAM - Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais, Universidade de Évora & Associação Amigos da Natureza de Cabeção Data de publicação: 01-06-2015 Citação: GTAN-SPEA (2015). Bufo-real Bubo bubo. GTAN – Grupo de Trabalho sobre Aves Nocturnas, SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Lisboa. (www.spea.pt) NOMES VERNÁCULOS Bufo-real, mocho-real, corujão, ujo, martaranho DESCRIÇÃO O bufo-real é uma espécie polítipica, ou seja, tem subespécies distintas morfologicamente. Na Península Ibérica ocorre a subespécie Bubo bubo hispanus, bastante semelhante à espécie nominal B. b. bubo embora apresente tons mais pálidos e manchas pretas mais definidas (Cramp 1985). O bufo-real é uma ave de grande porte cuja envergadura varia entre 138 e 188 cm, enquanto o comprimento oscila entre 59 e 75 cm, sendo a maior ave de rapina nocturna da Europa (Cramp 1985). Esta espécie apresenta um dimorfismo sexual invertido, ou seja, as fêmeas atingem dimensões maiores e são igualmente mais pesadas. O peso das fêmeas pode variar entre os 2300 e os 4200 g, enquanto que nos machos pode variar entre 1600 g e 2800 g (Cramp 1985). Existe uma variação na dimensão dos indivíduos consoante as subespécies, sendo a subespécie que ocorre em Portugal (B. b. hispanus) das menores. Segundo dados para Espanha, o peso das Bufo-real Bubo bubo 1

Bubo bubo (Linnaeus, 1758) - spea.pt · nocturna da Europa (Cramp 1985). Esta espécie apresenta um dimorfismo sexual Esta espécie apresenta um dimorfismo sexual invertido, ou seja,

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Ordem Strigiformes Família Strigidae

BUFO-REALBubo bubo (Linnaeus, 1758)

de Uhu

es Búho real

en Eurasian eagle owl

fr Hibou grand-duc

it Gufo reale

Catalão Duc

Galego Bufo real

Basco Hontza handia

Texto de Rui Lourenço1, João Rodrigues2 & Sérgio Godinho3

Principais contribuidores (ordem alfabética): Alexandre Leitão, Andreia Dias, António Mira, Artur VazOliveira, Carlos Carrapato, Carlos Godinho, Carlos Moreira, Edgar Gomes, Eduardo Barrento, EduardoRealinho, Fábia Azevedo, Gonçalo Rosa, Inês Henriques, Inês Roque, João Paulo Lopes, João Tiago Marques,João Tiago Tavares, Jorge Vicente, José Aleixo, José Vítor Cavaco, Luís Filipe Oliveira, Luís Venâncio, LuísaCatarino, Magnus Robb, Marco Mirinha, Marco Correia, Nuno Mota, Nuno Ventinhas, Paulo Alves, PauloCatry, Pedro Salgueiro, Ricardo Brandão, Ricardo Tomé, Rita Ferreira, Rúben Rodrigues, Rui Caratão, SaraSantos. Agradecemos a todos os colaboradores do GTAN-SPEA.

1LabOr - Laboratório de Ornitologia, ICAAM - Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais, Universidade de Évora2Bafari, Associação Científica para a Conservação da Aves de Rapina3ICAAM - Instituto de Ciências Agrárias e Ambientais, Universidade de Évora & Associação Amigos da Natureza deCabeção

Data de publicação: 01-06-2015Citação: GTAN-SPEA (2015). Bufo-real Bubo bubo. GTAN – Grupo de Trabalho sobre AvesNocturnas, SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Lisboa. (www.spea.pt)

NOMES VERNÁCULOSBufo-real, mocho-real, corujão, ujo, martaranho

DESCRIÇÃOO bufo-real é uma espécie polítipica, ou seja, tem subespécies distintasmorfologicamente. Na Península Ibérica ocorre a subespécie Bubo bubo hispanus,bastante semelhante à espécie nominal B. b. bubo embora apresente tons mais pálidose manchas pretas mais definidas (Cramp 1985).

O bufo-real é uma ave de grande porte cuja envergadura varia entre 138 e 188cm, enquanto o comprimento oscila entre 59 e 75 cm, sendo a maior ave de rapinanocturna da Europa (Cramp 1985). Esta espécie apresenta um dimorfismo sexualinvertido, ou seja, as fêmeas atingem dimensões maiores e são igualmente maispesadas. O peso das fêmeas pode variar entre os 2300 e os 4200 g, enquanto que nosmachos pode variar entre 1600 g e 2800 g (Cramp 1985). Existe uma variação nadimensão dos indivíduos consoante as subespécies, sendo a subespécie que ocorre emPortugal (B. b. hispanus) das menores. Segundo dados para Espanha, o peso das

Bufo-real Bubo bubo 1

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fêmeas varia entre 1750 e 2490 g (n = 25) e dos machos entre 1220 e 2490 g (n =37), enquanto a envergadura varia entre 151 e 168 cm (n = 9) nas fêmeas e entre 131e 159 cm (n = 8) nos machos (Martínez et al. 2002, Penteriani and Delgado 2010).

O bufo-real é a maior das aves de rapina nocturnas que ocorrem na Europa. Temuma aparência compacta, com uma cabeça grande. O dorso tem um aspecto malhadocom tons castanho escuro e pretos, enquanto o peito e ventre são amarelados compequenas manchas pretas. As asas são largas permitindo voos planados fáceis e acauda é curta. Na cabeça destacam-se dois tufos de penas auriculares que lhe conferema silhueta característica. Os olhos são grandes com a íris laranja e a pupila preta. Temuma mancha branca na garganta que é exposta quando está a vocalizar.

O desenvolvimento dos juvenis encontra-se bastante detalhado em Penteriani etal. (2004). As crias eclodem com uma plumagem branca fina (protóptilo), que ésubstituída a partir dos 15 dias de idade por uma plumagem de cor bege (mesóptilo) eque lhes confere um aspecto listado. A partir desta idade apresentam marcas brancasevidentes em torno da boca e à volta do bico. A partir dos 35 dias é evidente a manchapreta por cima dos olhos e começam a surgir os tufos auriculares. É igualmente a partirdesta idade que as penas de voo (remiges) se tornam visíveis. Com 60 dias os juvenisjá apresentam uma plumagem bem desenvolvida. Começam a partir daí a assemelhar-se bastante mais aos adultos, embora retenham sempre algum mesóptilo e apresentemtufos auriculares mais pequenos.

Apesar de ser de observação pouco frequente, o bufo-real é facilmenteidentificado pelas suas dimensões e silhueta. O bufo-pequeno Asio otus é a espécie maissimilar que ocorre em Portugal, no entanto, este apresenta um tamanho visivelmentemenor, com envergadura entre 86 e 98 cm e comprimento entre 31 e 37 cm, bem comouma expressão facial distinta.

HABITATO bufo-real pode ocupar uma grande diversidade de habitats, incluindo florestas deconíferas, desertos, zonas húmidas, planícies, áreas urbanas ou zonas montanhosas,denotando uma ampla tolerância climática (Mikkola 1983, Cramp 1985, Penteriani &Delgado 2010). Na Europa ocorre desde o nível do mar até altitudes acima dos 2000 m(Cramp 1985, Penteriani & Delgado 2010). Os principais factores que condicionam aocorrência do bufo-real parecem ser a disponibilidade de presas e a presença de locaispropícios à nidificação (Mikkola 1983, Penteriani & Delgado 2010). A presença humanapode ter algum efeito negativo, embora esta espécie se mostre por vezes bastantetolerante a viver em zonas urbanas. Os substratos de nidificação mais comuns são osafloramentos rochosos em escarpas, vertentes inclinadas e cumeadas, mas podenidificar também em ninhos de outras espécies em árvores, em caixas-ninho, no solo ouem edifícios (Cramp 1985, Mikkola 1982, Penteriani & Delgado 2010). O bufo-real éuma espécie residente, ocupando o mesmo território durante todo o ano (Cramp 1985,Penteriani & Delgado 2010).

Na Península Ibérica ocupa desde bosques euro-siberianos a zonas semi-desérticas, embora as tipologias de habitat mais comuns sejam os afloramentosrochosos (em vales ripícolas ou terrenos montanhosos) associados sobretudo commatagais ou bosques de quercíneas (sobreiro, azinheira, outros carvalhos) não muitodensos, onde exista pouca perturbação humana (Rufino 1989, Lourenço et al. 2002,Martínez & Zuberogoitia 2003, Equipa Atlas 2008). Evita de forma geral as florestasmono-específicas de produção (pinheiro ou eucalipto), sobretudo quando apresentamuma estrutura muito fechada (Penteriani & Delgado 2010). No entanto, pode utilizarpinhais e eucaliptais maduros, nidificando no chão ou em ninhos de outras aves, comoacontece no parque nacional de Doñana, em Espanha (Penteriani et al. 2012). No Sul dePortugal, os territórios conhecidos ocorrem entre os 10 m e os 570 m acima do nível domar (Rui Lourenço, dados não publicados).

Bufo-real Bubo bubo 2

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HABITAT DE NIDIFICAÇÃOO bufo-real não constrói ninho, limitando-se a escavar um pequeno buraco no solo ouaproveitando reentrâncias ou plataformas rochosas (Mikkola 1983, Cramp 1985). Porvezes esta espécie ocupa ninhos em árvores ou escarpas construídos por aves de rapinadiurnas ou cegonhas. No Sul de Portugal, foram analisados 58 locais de nidificação (RuiLourenço, dados não publicados). Destes, 83% localizavam-se em afloramentosrochosos naturais (escarpas fluviais ou cumeadas rochosas); 5% localizavam-se emninhos de outras espécies em afloramentos rochosos (nomeadamente águia de BonelliAquila fasciata e cegonha-preta Ciconia nigra); 2% em ninhos de outras espécies emárvore (nomeadamente cegonha-branca Ciconia ciconia); 2% em edifícios; 3% no soloem encosta; e 5% em paredes artificiais de pedreiras. Relativamente à tipologia doninho quando localizado em escarpa, 20% estavam em reentrâncias; 59% emplataformas com cobertura de vegetação arbustiva; 9% em plataformas sem vegetaçãoe 13% em cavidades cobertas por uma rocha. Relativamente à posição na escarpa, 27%localizam-se no terço superior, 67% no terço médio e apenas 6% no terço inferior. Asorientações dos ninhos variam sobretudo entre NW e SE, correspondendo a 88% doscasos (Figura 1).

Figura 1. Orientação dos ninhos de bufo-real no Sul dePortugal (n = 49; Rui Lourenço, dados nãopublicados). N – 2%; NW – 18%; W – 10%; SW –16%; S – 22%; SE 18%; E – 6%; NE – 6%.

Na região de Cabeção e Mora (Alto Alentejo; Sérgio Godinho & José Aleixo, dadosnão publicados), de quatro ninhos conhecidos, três localizavam-se em escarpa (emreentrâncias) e outro no solo em encosta. Destes quatro ninhos, três estavam no terçosuperior da encosta e um no terço inferior. Dois ninhos estavam orientados a sudeste,um a este e outro a noroeste.

No centro de Portugal, foram analisados nove locais de nidificação (JoãoRodrigues, Nuno Mota, Luís Filipe Oliveira, José Vítor Cavaco, Rúben Rodrigues,Associação Bafari, dados não publicados; 1996-2012). A maioria localizava-se no soloem encosta (78%, n = 7), enquanto os outros substratos utilizados foram escarpa (n =1) e ninho de outra espécie em escarpa (n = 1). A tipologia mais frequente foi umaplataforma com cobertura arbustiva (67%, n = 6), seguido de uma reentrância (n = 2)e de uma plataforma sem arbusto (n = 1). Relativamente à posição na escarpa ouencosta, 33% dos ninhos encontravam-se no terço superior, 44% no terço médio e 22%no terço inferior. A orientação da encosta foi bastante variável, sendo mais comum aexposição do ninho a noroeste (33%).

Em resumo, a maioria dos ninhos de bufo-real localizam-se em reentrâncias ouplataformas em escarpas, frequentemente protegidos por um arbusto, e localizados noterço médio ou superior da encosta. As orientações preferenciais dos ninhos (SE, S, SWe NW) são as que permitem maior exposição solar no início da reprodução (Janeiro –Abril), o que poderá estar relacionado com termo-regulação da fêmea em incubação edos juvenis.

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DISTRIBUIÇÃO E POPULAÇÃOA distribuição mundial do bufo-real abrange praticamente toda a Europa, grande parteda Ásia e o Norte de África. Ocorre na maioria dos países europeus, estando ausenteapenas na Islândia, Irlanda, e grande parte da Grã-Bretanha (onde se estabeleceu umapopulação a partir de indivíduos fugidos de cativeiro; Holling 2007). Não ocorre ou éraro nas regiões norte e oeste de França, em grande parte das terras baixas dos paísescentro-europeus, e nas ilhas Baleares, Sardenha, Córsega e Sicília (Hagemeijer & Blair1997, BirdLife International 2004a).

Residente em praticamente toda a sua distribuição europeia, estima-se aexistência de 19000 a 39000 casais reprodutores, encontrando-se a maioria dos seusefectivos europeus nos países escandinavos (Finlândia, Suécia e Noruega), Rússia,Turquia e Espanha (BirdLife International 2004a). A maioria das populações europeiasde bufo-real sofreram um declínio acentuado durante a primeira metade do século XX(Cramp 1985, Mikkola 1983, Tucker & Heath 1994), embora no período 1970-1990 atendência nos países da União Europeia fosse positiva (BirdLife International 2004b).Nas últimas duas décadas a situação do bufo-real na Europa encontra-se aparentementeestável (BirdLife International 2004a).

A distribuição em Espanha é ampla embora irregular, sendo mais abundante naszonas mediterrânicas (Martínez & Zuberogoitia 2003). A estimativa mais recente paraEspanha indica a existência de uma população mínima de 2345 casais reprodutores(2.500-10.000) que tem registado um aumento nos últimos anos (Martínez &Zuberogoitia 2003, BirdLife International 2004a).

Em Portugal, o bufo-real ocorre de norte a sul do território continental, estandoausente dos arquipélagos dos Açores e da Madeira (Equipa Atlas 2008, Lourenço et al.2014; figura 2). A sua ocorrência parece sobretudo condicionada pela presença dehabitats favoráveis com disponibilidade de alimento, substrato de nidificação viável ereduzida perturbação. Estes factores conjugam-se principalmente nas áreas menoshumanizadas, nomeadamente nas regiões interiores, onde esta espécie é maisabundante. Os vales do rio Guadiana e seus principais afluentes estão entre os habitatsmais favoráveis para o bufo-real em Portugal. A revisão da distribuição do bufo-real combase na informação disponível para o período 2005-2013, mostra um aumento da áreade distribuição face à informação disponível em Rufino (1989). Este aumento resulta emparte de um maior esforço de amostragem, de estudos específicos e número deobservadores. Ainda assim subsistem algumas falhas de informação no interior norte dePortugal, onde existem vales e serras com habitat potencial para a espécie mas para asquais não há registo da sua presença. O aumento da área de distribuição poderá poroutro lado dever-se também a um crescimento populacional que levou à ocupação deáreas de distribuição histórica e eventualmente alguns locais novos, facilitadonomeadamente pela existência de pedreiras.

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Figura 2. Distribuição do bufo-real Bubo bubo em Portugal: esquerda - primeiro atlasnacional (Rufino 1989); centro - segundo atlas nacional (Equipa Atlas 2008); direita -período 2005-2013, resultante da conjugação da informação do atlas nacional (EquipaAtlas 2008) e do GTAN-SPEA (Lourenço et al. 2014).

A estimativa populacional do primeiro atlas de aves (1978-1984) estabelece osefectivos reprodutores entre 100 a 1000 casais (Rufino 1989). No livro vermelho dosvertebrados de Portugal é apresentada uma estimativa entre 250 a 500 casais (Cabralet al. 2005). A estimativa mais recente, realizada pelo GTAN-SPEA para o período 2005-2013, aponta para que a população reprodutora de bufo-real em Portugal estejacompreendida entre 380 e 580 casais.

A densidade populacional em Portugal é bastante variável, dependendo emgrande medida da disponibilidade de habitat de nidificação, maioritariamenteafloramentos rochosos que apresentam uma disposição ao longo de vales ou cordilheirasmontanhosas (e espacialmente não-uniforme). Para o Parque Natural da Serra de SãoMamede, em 1997, foram detectados 6 casais, com uma densidade estimada em 0,01casais/km2 (Santos 1998). Na região da albufeira de Alqueva, em 1999-2000, adistância média ao ninho mais próximo foi 5,1 km (máx.: 20,8 km; mín.: 0,7 km; n =20; Pinheiro 2003), tendo a densidade sido estimada em 0,02 casais/km2 para os 33casais detectados no período 1999-2003 (Palma et al. 2004). Esta população de bufo-real foi parcialmente afectada pelo enchimento da albufeira de Alqueva, que teve inícioem 2002. Na região do nordeste algarvio, em 1999-2000, estimou-se a existência de 27a 30 casais, correspondendo a uma densidade mínima de 0,03 casais/km2 (Lourenço etal. 2002). No Vale do Côa poderão existir entre 5 e 10 casais numa área de 20628hectares, correspondente a uma densidade entre 0,02 e 0,05 casais/km2 (Tomé & Catry2008). Segundo estes autores a espécie terá sido mais abundante no passado. Em2007-2008, Aguiar et al. (2010) apenas conseguiram confirmar 1 casal no ParqueNacional Peneda-Gerês, o que poderá apontar para um declínio populacionalrelativamente à situação anteriormente apresentada por Pimenta & Santarém (1996),com uma estimativa de 10 casais. Com base na informação existente para as áreasimportantes para as aves (IBA's), compilada pela SPEA, a densidade do bufo-real nasdiversas IBA's varia entre 0,02 e 0,04 casais/km2 (tabela 1).

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Tabela 1. Informação sobre bufo-real Bubo bubo nas áreas importantes para as aves (IBA's) (SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves).

IBA Área (km2) Ano Mín. Máx.Densidade

(casais/100 km2)

PT002 Serras da Peneda e Gerês 629,22 1996 10 10 1,59

PT003 Serras de Montesinho e Nogueira 1080,94 1997 11 50 1,02 – 4,63

PT004 Sabôr e Maçãs 506,74 2002 11 20 2,17 – 3,95

PT005 Douro Internacional e Vale do Águeda 507,44 2001 11 50 2,17 – 9,85

PT006 Vale do Côa 237,27 2001 5 10 2,11 – 4,21

PT008 Serra da Malcata 163,61 1998 1 2 0,61 – 1,22

PT012 Serra de Penha Garcia e Campina de Toulões 157,33 2001 5 8 3,18 – 5,08

PT013 Tejo Internacional 257,64 2001 6 10 2,33 – 3,88

PT027 Mourão Moura Barrancos 805,64 1996 6 10 0,74 – 1,24

PT037 Portas de Ródão e Vale Mourão 42,15 2001 3 6 7,12 – 14,23

PT041 Cabo Espichel 34,15 2001 1 1 2,93

PT049 Serras do Alvão e Marão 587,88 2001 3 6 0,51 – 1,02

PT051 Serra do Caldeirão 704,45 2000 27 30 3,83 – 4,26

Total/média 100 213 2,33 – 4,47

Com base na informação recolhida entre 1999 e 2013 para 123 quadrículas 10x10 kmonde a presença do bufo-real foi confirmada, localizadas maioritariamente no sul dePortugal, obteve-se o valor médio de 0,02 casais/km2 (Lourenço et al. 2014). Em 50territórios localizados em áreas bem estudadas do Sul de Portugal, a distância média aovizinho mais próximo foi 3,5 km (Rui Lourenço, dados não publicados).

Algumas das regiões em Espanha com maior densidade registam até 0,40casais/km2 (Penteriani & Delgado 2010) e 0,46 casais/km2 (Pérez-Garcia et al. 2012).

A tendência populacional do bufo-real em Portugal é pouco conhecida devido àfalta de estudos que monitorizem os efectivos reprodutores ao longo de um períodosuficientemente longo. Rufino (1989) refere que a extensão da área de reproduçãosofreu uma redução substancial desde os anos 40. Com base nesta informação Tucker &Heath (1994) apontam para uma tendência negativa da população portuguesa.Posteriormente, no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal considera-se que apopulação se encontrará estável (Cabral et al. 2005). Na região da albufeira de Alqueva,dos 33 casais conhecidos entre 1999 e 2003, cerca de 40% desapareceram devido àperda de habitat aquando do enchimento da barragem (Palma et al. 2004, Rui Lourenço,dados não publicados). No Parque Nacional da Peneda-Gerês parece ter havido umdeclínio acentuado da população reprodutora (Aguiar et al. 2010). A informação de 5anos de seguimento do programa NOCTUA-Portugal aponta para uma tendência positiva(Lourenço et al. 2014). A informação existente não permite tirar conclusões muitoseguras sobre tendência populacional da população reprodutora do bufo-real emPortugal. No entanto, com base no máximo de informação disponível, a tendência amédio-curto prazo parece ser positiva (Lourenço et al. 2014). Este aparente aumentoparece resultar de uma recuperação das populações de bufo-real após vários anos deperseguição, que levaram ao seu declínio durante o século XX (Catry et al. 2010). Apresente situação em Portugal é coincidente com a tendência positiva registada emEspanha (SEO/BirdLife 2013).

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ALIMENTAÇÃOO bufo-real é uma espécie generalista e oportunista que se alimenta de presasabundantes e de fácil captura (Mikkola 1983, Cramp 1985). Esta característica faz comque tenha uma alimentação muito variada e dependente da diversidade de presasdisponíveis, havendo registos de diversos grupos animais incluídos na dieta comoinsectos, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos. O bufo-real é igualmente umsuper-predador, ou seja, pode alimentar-se de outras espécies de predadores. Entre asespécies mais comuns encontram-se alguns mamíferos carnívoros, como a raposa e adoninha, mas também aves de rapina nocturnas e diurnas (Lourenço & Rabaça 2006,Lourenço et al. 2011). Na Península Ibérica, o bufo-real tende a seleccionar presasrentáveis, com peso entre os 200g e os 1500g, cujo ganho energético compensa oesforço despendido na sua captura. Assim, as suas presas principais são os lagomorfos,os roedores de grande dimensão e as aves de dimensão média (Hiraldo et al. 1975,Donázar 1989, Penteriani & Delgado 2010).

A alimentação do bufo-real é razoavelmente bem conhecida no Sul de Portugal,não havendo muito informação para a região norte. Para as regiões do Alentejo eAlgarve existe informação de 9612 presas relativas aos período entre 1997 e 2012(tabela 2). Nestas regiões as presas principais são o coelho-bravo Oryctolaguscuniculus, que em média representa um terço do total de presas, a lebre Lepusgranatensis, a perdiz-vermelha Alectoris rufa, as ratazanas Rattus spp., o rato-de-águaArvicola sapidus, os pombos Columba spp., a galinha-d'água Gallinula chloropus, oouriço-cacheiro Erinaceus europaeus, e os corvídeos (sobretudo gaio Garrulusglandarius, pega-rabuda Pica pica e charneco Cyanopica cyanus).

A informação relativa ao norte de Portugal diz respeito um estudo realizado em1987, na serra de Montesinho (Tavares et al. 1989), no qual foram identificadas 33presas. Os lagomorfos representaram cerca de metade das presas, incluindo aindaoutras presas como o ouriço-cacheiro, perdiz-vermelha, aves de rapina diurnas enocturnas, cobras, micromamíferos e um noitibó (Caprimulgus sp.).

Na região centro de Portugal, algumas presas frequentemente observadas nosninhos e poisos de bufo-real são o coelho-bravo, o ouriço-cacheiro, e entre as avesaparecem perdizes, pombos, gralhas, gaivotas e por vezes aves de rapina (JoãoRodrigues, Nuno Mota, Luís Filipe Oliveira, José Vítor Cavaco, Rúben Rodrigues,Associação Bafari, dados não publicados).

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Tabela 2. Informação sobre a alimentação do bufo-real em Portugal no sul de Portugal(percentagem de cada grupo de presas). Fontes: (1) Lourenço 2006, Rui Lourenço &Sara Santos, dados não publicados; (2) Pinheiro 2003.

NEAlentejano1997-2010

(1)

Alentejocentral

2004-2012(1)

AltoGuadiana

1998-1999(2)

AltoGuadiana

2002-2012(1)

Rio Ardila2002-2012

(1)

NE Algarvio2000-2010

(1)

Nº territórios 6 2 20 16 7 10

Nº total presas 1907 196 692 3196 1902 1719

Mamíferos 62,04 64,76 79,62 64,49 69,48 73,64

Insectívoros(sobretudo ouriço-cacheiro)

8,95 16,19 5,49 3,34 2,21 3,54

Carnívoros 0,44 0,00 0,00 0,23 0,21 0,25

Roedores(ratazanas, rato-de-água e outros)

6,64 9,41 6,94 15,98 11,53 12,79

Coelho 27,22 23,54 48,41 30,92 36,30 27,79

Lebre 18,76 15,62 14,02 14,01 19,00 29,28

Aves 35,85 33,63 19,80 32,78 28,78 23,99

Mergulhões (Podicipediformes) 1,03 4,13 0,14 0,80 0,12 0,26

Garças (Ciconiiformes) 0,24 0,46 0,58 0,50 0,06 0,10

Patos (Anseriformes) 0,46 0,00 1,01 2,27 0,44 0,00

Aves de rapina diurnas (Falconiformes) 0,26 0,46 0,29 0,47 0,10 0,10

Perdizes e codornizes (Galliformes) 4,36 6,54 3,32 5,24 7,44 13,15

Galinhas-de-água e sisões (Gruiformes) 3,16 2,98 1,88 4,22 2,57 0,82

Alcaravões e outras aves limícolas (Charadriiformes)

2,02 1,49 0,58 1,11 0,70 0,36

Pombos e rolas (Columbiformes) 11,27 7,00 4,05 4,75 3,12 1,11

Aves de rapina nocturnas (Strigiformes) 5,89 7,00 2,17 2,65 1,09 0,78

Pica-paus (Piciformes) 0,07 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Aves Passeriformes 6,44 2,07 4,48 10,07 12,88 7,00

Pegas e gaios (Corvidae) 2,86 1,49 3,47 3,82 7,68 3,03

Répteis 0,00 0,57 0,14 0,00 0,00 0,05

Anfíbios 0,74 0,00 0,00 0,88 1,51 0,97

Peixes de água doce 0,04 0,00 0,00 0,34 0,06 0,82

Invertebrados (sobretudo coleópteros) 1,32 1,03 0,43 1,26 0,17 0,52

REPRODUÇÃOA época de reprodução do bufo-real tem início após a dispersão dos juvenis doterritório-natal. A partir de Setembro é possível ouvir os primeiros duetos entre macho efêmea do casal, e que assinalam o início da reprodução (Penteriani & Delgado 2010). Afêmea geralmente só realiza uma postura, embora existam registos de duas posturas(Martínez et al. 2003, Ortego 2004). Em caso de perda da primeira postura (ovos oujuvenis pequenos) pode realizar uma postura de reposição. Na Península Ibérica asposturas mais precoces ocorrem em Dezembro (Penteriani & Delgado 2010).

As posturas são geralmente de 2 ou 3 ovos, podendo variar entre 1 e 6 ovos(Mikkola 1983, Cramp 1985). A postura é assíncrona, com um intervalo de 2 a 5 diasentre cada ovo (Penteriani & Delgado 2010). A incubação dos ovos é realizadamaioritariamente pela fêmea e demora entre 32 e 36 dias (Mikkola 1983, Cramp 1985).Após eclodirem os juvenis são dependentes dos progenitores durante cerca de cincomeses, iniciando a dispersão definitiva com 150 a 160 dias de idade (Penteriani et al.

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2004). No primeiro mês, a fêmea permanece junto das crias, ficando a alimentação acargo do macho. Após o primeiro mês, apesar de ainda não conseguirem voar, osjuvenis podem por vezes abandonar o ninho (Mikkola 1983, Penteriani et al. 2004). Osucesso reprodutor é bastante variável, dependendo sobretudo da disponibilidade depresas e dos factores de perturbação (Mikkola 1983, Penteriani & Delgado 2010). Obufo-real é uma espécie bastante sensível à perturbação durante a incubação eprimeiras semanas dos juvenis (Mikkola 1983, Penteriani & Delgado 2010), não sendorecomendada a visita dos locais de nidificação durante este período, que em Portugalcorresponde geralmente aos meses de Dezembro a Março. Para fins científicos,recomenda-se que as visitas aos territórios ocorram apenas a partir de Abril, epreferencialmente após a segunda quinzena.

Para o Sul de Portugal, existem dados sobre a biologia da reprodução do bufo-realem resultado de 163 visitas a 56 territórios (Rui Lourenço, Sérgio Godinho & SaraSantos, dados não publicados; 1997-2014). Em 82% das ocasiões (n = 133) o territórioestava ocupado, enquanto em 18% (n = 30) observou-se que territórios anteriormenteocupados estavam nesse ano desocupados (ausência de adultos ou vestígios da suapresença regular). Das 133 visitas onde foi detectada a ocupação do território, foipossível averiguar a reprodução em 84 ocasiões. Em 27% dos casos (n = 23) oterritório estava ocupado mas não ocorreu reprodução, enquanto que em 73% doscasos (n = 61) houve início da reprodução, ou seja, o casal efectuou a postura. A datade postura foi estimada tendo em consideração a idade dos juvenis. A data média depostura foi 4-Fev, variando entre 31-Dez e 19-Mar (n = 44). As posturas de reposiçãopor perda da postura ou juvenis ocorreram sobretudo em Março e Abril. A dimensão dapostura foi estimada considerando o número de juvenis e os ovos não eclodidos, sendoo seu tamanho médio de 2,3 ovos (n = 49), variando entre 1 e 4 ovos. O sucessoreprodutor dos casais que efectuaram postura foi de 1,80 juvenis/casal reprodutor (n =60). A produtividade da população reprodutora foi de 1,30 juvenis/território ocupado (n= 83), sendo que em 40% das ocasiões o casal não se reproduziu ou perdeu atotalidade da postura ou juvenis (n = 33).

Para o Centro de Portugal, existem dados relativos a 31 visitas a territóriosocupados e que iniciaram a reprodução (João Rodrigues, Nuno Mota, Luís Filipe Oliveira,José Vítor Cavaco, Rúben Rodrigues, Associação Bafari, dados não publicados; 1996-2012). A data média de postura foi 24-Jan, variando entre 6-Dez e 12-Mar. O tamanhomédio da postura foi de 2,26 ovos (n = 31), variando entre 1 e 3 ovos. O sucessoreprodutor dos casais que efectuaram postura foi de 1,65 juvenis/casal reprodutor. Em77% das ocasiões com postura não houve qualquer juvenil voador.

Na área de Cabeção e Mora (Alto Alentejo; Sérgio Godinho & José Aleixo, dadosnão publicados), de 10 controlos da reprodução, em sete houve reprodução e nosrestantes três não houve. O tamanho médio das posturas foi 3,0 ovos. A data maisprecoce foi 27 de Fevereiro e a mais tardia 16 de Março. A produtividade média foi de1,8 juvenis por casal territorial.

Na região de implementação da barragem de Alqueva, a reprodução foi estudadaem 25 territórios nos anos de 1999 e 2000 (Pinheiro 2003). Em 4 das 42 visitas (10%)o casal estava presente mas não se reproduziu, sendo possível confirmar o início dareprodução em 31 casos (74%). As posturas realizaram-se entre meados de Dezembroe meados de Março (n = 31). O tamanho médio da postura foi 2,87 ovos (n = 31),variando entre 2 e 4 ovos. O sucesso reprodutor dos casais que efectuaram postura foide 1,65 juvenis/casal reprodutor (n = 31). A produtividade da população reprodutora foide 1,46 juvenis/território ocupado (n = 35).

COMPORTAMENTOAve tipicamente nocturna, o bufo-real começa a sua actividade ao crepúsculo,prolongando-a durante a noite e regressando então ao poiso diurno com a primeira luz

Bufo-real Bubo bubo 9

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do dia (Mikkola 1983, Cramp 1985). A visão e sobretudo a audição são os sentidosutilizados para caçar, localizando as presas através dos seus movimentos.

Esta espécie é residente e territorial, defendendo uma área definida durante todoo ano. O território deverá ter uma dimensão que lhe permita manter alguns locais denidificação seguros, bem como área de caça de modo a obter alimento suficiente. Aestimativa da dimensão dos territórios são muito variáveis, entre 1 e 40 km2 (Cramp1985). No sul de Espanha, a área vital varia entre sexos e com a fenologia, com valoresdesde 0,1 km2 até mais de 4 km2 (Penteriani & Delgado 2010).

O bufo-real é uma ave monogâmica e fiel, tendo geralmente apenas um parceiro,que mantém ao longo dos anos (Cramp 1985, Penteriani & Delgado 2010). Se um dosindivíduos morre, a ave que permanece no território tentará atrair outro parceiro paraacasalar.

É por vezes mais conhecido pela sua vocalização, que emite a partir de poisos decanto ou em voo, sobretudo ao anoitecer (Penteriani & Delgado 2010). Cada casalpossui vários poisos, sobretudo em pontos altos, de onde vocaliza e que servem paradefender o seu território. A vocalização territorial é a mais conhecida, consistindo numpio monótono u-U-uuu, em que a terceira nota é arrastada. Ambos os sexos emitemesta vocalização embora o pio da fêmea seja um tom mais agudo.

As aves vocalizam sobretudo nos três meses que antecedem a incubação, sendo apartir daí mais silenciosas (Penteriani & Delgado 2010). O período de maior actividadevocal em Portugal coincide aproximadamente com os meses de Novembro, Dezembro eJaneiro.

ESTATUTOS DE CONSERVAÇÃOPortugal: Quase ameaçado - NT (Cabral et al. 2005).Europa: SPEC 3, favorável (2004, EU25), desfavorável (pan-europeu) – BirdLifeInternational 2004b.

FACTORES DE AMEAÇASegundo Cabral et al. (2005), os principais factores de ameaça na actualidade são: (1)a destruição do habitat, em consequência sobretudo da construção de barragens; (2) aperseguição directa pelo Homem, com abate a tiro, destruição e roubo de ninhos; (3) adiminuição das populações de coelho-bravo devido a epizootias; (4) a mortalidade porelectrocussão em linhas eléctricas e o envenenamento.

Segundo a informação do centro de recuperação CERVAS (Ricardo Brandão,CERVAS-ALDEIA, dados não publicados), entre 2006 e 2014, as causas de entrada debufos-reais foram: electrocussão (10); colisão com estrutura (7); debilidade/desnutrição(6); tiro (4); atropelamento (3); trauma (2); afogamento (1); desconhecida (2). Destes35 indivíduos, 24 eram adultos. A informação fornecida pelo centro de recuperação RIAS(Fábia Azevedo, RIAS-ALDEIA, dados não publicados), entre 2009 e 2013, refere que ascausa de entrada foram: trauma (4); electrocussão (3); cativeiro ilegal (2); colisão comestrutura (2); queda do ninho (2); atropelamento (1); debilidade/desnutrição (1); tiro(1); desconhecida (2).

As entradas de bufos-reais em centros de recuperação reforçam que aelectrocussão (25% dos casos), é uma causa de mortalidade frequente. A colisão comestruturas e outros traumas representam 28% das causas de entrada, aos quais sejunta o atropelamento (8%). Aliás, os registos de atropelamento são frequentes,resultado também da sua detectabilidade e do aumento do esforço de compilação dainformação (GTAN-SPEA, dados não publicados).

Os estudos realizados em linhas de média e alta tensão em Portugal entre 2003 e2013 (Infante et al. 2005, 2013, Costa & Infante 2011, Costa et al. 2012, Neves &Infante 2009) mencionam a electrocussão de 29 indivíduos (1692 km; 11 anos), o queresulta numa taxa de mortalidade estimada em 0,0016 ind/km/ano.

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MEDIDAS DE CONSERVAÇÃOComo principais medidas de conservação foi proposto (Cabral et al. 2005): (1)campanhas de sensibilização e diálogo com proprietários, caçadores, guardas e gestoresde caça, pastores, agricultures e público em geral; (2) recuperar e fomentar aspopulações de coelho-bravo; (3) monitorizar a mortalidade em linhas eléctricas ecorrigir os troços perigosos; e (4) aumentar o conhecimento sobre a espécie.

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(BirdLife Conservation Series No. 3).

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