22
8 INTRODUÇÃO Denominado “GULA”, este trabalho de conclusão de curso seguiu dois eixos: um mais subjetivo e psicanalítico por ser de estilo surrealista, e outro mais político e social por sua temática antropofágica, no desejo guloso do ser humano de ser incorporado no patamar mais alto do sistema hierárquico capitalista. Com tema canibalista, o seguinte trabalho mostra o desejo do ser humano de incorporar o outro, de digerir ou deglutir seu companheiro. Uma fusão utópica que mostra a luta de um guerreiro capitalista que “devora” 1 seus rivais em determinada empresa, tentando, a qualquer custo, ser digerido pelo mercado de trabalho (aqui representado por plantas carnívoras 2 ). Desenvolvido em um projeto experimental anteriormente, a linguagem expressiva escolhida foi o desenho. Sem alcançar bons resultados, decidiu-se uma mudança para a linguagem expressiva escultural, apesar do impasse causado por pouca verba disponível. Por todo o mundo, são poucos os países socialistas ou comunistas como a China, a Coréia do Norte e Cuba. Como na grande maioria, o sistema político do Brasil é o capitalismo. Portanto, capitalizar é preciso. Bueno (1992) em seu minidicionário da língua portuguesa acusa “capital” como essencial. Esse adjetivo decreta no sistema hierárquico uma corrida ao topo da cadeia: seja qual for a forma de aquisição financeira, todos procuram sempre prosperar e atingir um patamar mais alto para melhorar suas condições _______________________________________________________________ Devora 1 : Neste projeto, entender-se-á o verbo devorar como uma metáfora, significando obter o conhecimento de algo ou alguém e, através deste, vencê-lo no mercado de trabalho. Seguem também com sentido semelhante os verbos digerir e deglutir. Plantas Carnívoras 2 : Plantas carnívoras são, como consta na Nova Enciclopédia Barsa (1999), aquelas capazes de digerir pequenos animais. Suas presas são insetos capturados por engenhosas armadilhas e urnas, constituídas por folhas modificadas. Para essa captura, algumas espécies de plantas carnívoras emitem secreções viscosas em que os insetos ficam grudados, outras possuem cavidades para onde as presas são levadas por aspiração, e há ainda aquelas com um atrativo perfume.

Cadamuro; justyne afonso gula

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Cadamuro; justyne afonso   gula

8

INTRODUÇÃO

Denominado “GULA”, este trabalho de conclusão de curso seguiu dois

eixos: um mais subjetivo e psicanalítico por ser de estilo surrealista, e outro

mais político e social por sua temática antropofágica, no desejo guloso do ser

humano de ser incorporado no patamar mais alto do sistema hierárquico

capitalista.

Com tema canibalista, o seguinte trabalho mostra o desejo do ser

humano de incorporar o outro, de digerir ou deglutir seu companheiro. Uma

fusão utópica que mostra a luta de um guerreiro capitalista que “devora”1 seus

rivais em determinada empresa, tentando, a qualquer custo, ser digerido pelo

mercado de trabalho (aqui representado por plantas carnívoras2).

Desenvolvido em um projeto experimental anteriormente, a linguagem

expressiva escolhida foi o desenho. Sem alcançar bons resultados, decidiu-se

uma mudança para a linguagem expressiva escultural, apesar do impasse

causado por pouca verba disponível.

Por todo o mundo, são poucos os países socialistas ou comunistas

como a China, a Coréia do Norte e Cuba. Como na grande maioria, o sistema

político do Brasil é o capitalismo. Portanto, capitalizar é preciso.

Bueno (1992) em seu minidicionário da língua portuguesa acusa “capital”

como essencial. Esse adjetivo decreta no sistema hierárquico uma corrida ao

topo da cadeia: seja qual for a forma de aquisição financeira, todos procuram

sempre prosperar e atingir um patamar mais alto para melhorar suas condições

_______________________________________________________________ Devora1: Neste projeto, entender-se-á o verbo devorar como uma metáfora, significando obter o conhecimento de algo ou alguém e, através deste, vencê-lo no mercado de trabalho. Seguem também com sentido semelhante os verbos digerir e deglutir. Plantas Carnívoras2: Plantas carnívoras são, como consta na Nova Enciclopédia Barsa (1999), aquelas capazes de digerir pequenos animais. Suas presas são insetos capturados por engenhosas armadilhas e urnas, constituídas por folhas modificadas. Para essa captura, algumas espécies de plantas carnívoras emitem secreções viscosas em que os insetos ficam grudados, outras possuem cavidades para onde as presas são levadas por aspiração, e há ainda aquelas com um atrativo perfume.

Page 2: Cadamuro; justyne afonso   gula

9

de vida, mesmo que a vida já esteja boa o bastante. Há ainda os mais vorazes,

que, para atingir seus objetivos, estão dispostos a devorar o companheiro mais

próximo.

GULA tem o intuito de mostrar, metaforicamente, esse deglutir humano.

Por meio de plantas carnívoras, que aqui representam o mercado de trabalho,

este projeto mostra o vale-tudo em função dos interesses do ego e o desejo

antropofágico de ser digerido pelo sistema engolidor.

Esse trabalho não pretende responder a perguntas, quer apenas

representar a realidade de uma forma curiosa, sem criticá-la. É um espelho, no

qual todos nos enxergamos em maior ou menor grau, talvez não na prática,

mas com certeza incluída nas entrelinhas dos pensamentos de planos futuros.

Não há perguntas a serem respondidas, pois é fato que todos estão satisfeitos

com o atual sistema, caso contrário, indícios de mudança já teriam sido

apresentados, já que a única questão que aflige a nós capitalistas é se

alcançaremos o status financeiro que desejamos.

Alcançar a compreensão do público em geral em relação aos conceitos

discutidos nas obras, e propor uma aceitação por parte deles da realidade

exposta metaforicamente, são os objetivos propostos neste trabalho, além de

executar com êxito a parte prática, também a fim de aperfeiçoar a cada

trabalho a técnica explorada e estudada.

Com essas peças, é desejado, além de sua imagem e sua real

interpretação, que o observador volte seu olhar e entendimento para o seu

interior, criando uma interpretação individual de acordo com sua própria visão,

suas alucinações e vivências.

O trabalho tem de certa forma uma semelhança teórica com a Pop Arte

dos Estados Unidos, que identificava a realidade tipicamente norte-americana,

talvez criticando, mas assumindo seu gosto por fazer parte disso,

representando seu nacionalismo. Ao contrário dos artistas Pop europeus, que

tomaram o assunto como reflexão e crítica.

A estética surrealista empregada é um retrato dos sonhos, segredos e

mistérios que envolvem o trabalho. Influenciado pelas teorias psicanalíticas de

Sigmund Freud, o surrealismo é psicológico, desprendido da lógica e da razão,

indo além da consciência. Forma um perfeito encaixe com a temática

metafórica.

Page 3: Cadamuro; justyne afonso   gula

10

O tema antropofágico proposto foi escolhido pela curiosidade que

provoca, por ser um assunto interessante, e também por se encaixar bem na

representação metafórica deste projeto. Também pela curiosidade, as plantas

carnívoras foram escolhidas, e é claro, pelo fato de serem denominadas

carnívoras, ou seja, aquelas que se alimentam de carne, já que o assunto aqui

apresentado é o banquete antropofágico. O capitalismo entra como o conector

das partes, é o tema não explícito que deve ficar subentendido na voracidade

da planta e no desejo de ser devorado do ser humano.

Essa composição de temas e ícones mostra a facilidade de interfaces

em apenas um trabalho. O assunto proposto de início, mais tarde pode ser

adicionado a outros, caso novos interesses surjam. E essa facilidade de

integração segue também com a linguagem expressiva, que foi definida em

escultura, mas antes treinada em outros meios, fato que mostra claramente a

possibilidade de viabilizar o trabalho em diversos suportes práticos.

Embora o tema antropofágico permita trabalhar coisas e linguagens

diferentes, o tema é de difícil aquisição e distinção por ser pouco explorado e

por ter inúmeros significados que são do conhecimento geral:

• Para os índios tupi, a idéia de antropofagia vem ao devorar os

guerreiros inimigos, absorvendo-os à química da alma;

• Nos anos 30, a antropofagia ganha um sentido não literal no Brasil. O

Movimento Antropofágico extrai e reafirma a fórmula ética de relação com o

outro no terreno da cultura, sendo Tarsila do Amaral uma referência desse

movimento;

• Segundo Bueno (1992), antropofagia, similar a androfagia, é a

condição do indivíduo que come carne humana. Canibalismo na espécie

humana.

Inicialmente o projeto experimental foi, como dito anteriormente,

desenvolvido em desenho. Por não satisfazer as expectativas, definiu-se como

linguagem expressiva a escultura, pelo grande impacto que imagens em relevo

total são capazes de causar. A dificuldade em escultura apresenta-se no alto

orçamento, mas com o programa orçamental, foi possível executar o exercício

artístico.

Este trabalho está dividido em dois capítulos. No primeiro capítulo foi

feita uma abordagem de cada item que diz respeito ao projeto: a escultura, a

Page 4: Cadamuro; justyne afonso   gula

11

estética surrealista, o tema antropofágico, e, por fim, a mistura de todos esses

temas em “GULA”. No capítulo seguinte são explicados os procedimentos

metodológicos utilizados na execução das peças e é feita a análise das obras

produzidas.

Page 5: Cadamuro; justyne afonso   gula

12

CAPÍTULO 1

COMPOSIÇÃO DE GULA

Através da linguagem expressiva e do tema abordado, define-se um

segmento de obras. Portanto, no presente suporte teórico, serão discutidos

separadamente itens importantes que situam este trabalho:

1. Escultura;

2. Surrealismo;

3. Antropofagia;

4. Gula.

1.1 ESCULTURA

Ao decorrer dos séculos, a arte, mais precisamente a escultura, sofre

alterações com a evolução do homem. Da Pré-História até a Arte

Contemporânea, passando pelo Surrealismo que aqui ganhará ênfase, a

escultura caminha com a sociedade representando suas devidas

necessidades, sendo uma parte da identidade dos povos.

Segundo Cápua (2006), a escultura tem início já na Pré-história e

corresponde à chamada arte móvel, abrangendo objetos religiosos, artísticos e

utensílios. A temática seguia conceitos pictóricos com animais e figuras

humanas, e foram também numerosas as imagens gravetianas (figuras

femininas com volumes corporais anatomicamente desproporcionais),

principalmente no período Paleolítico Superior, devido à sua clara relação com

o culto à fecundidade.

Cápua (ibidem) relata que mais à frente, no Antigo Egito, a cultura do

povo era determinada por esculturas que pretendiam eternizar o homem, parte

da crença na vida após a morte. Já na Grécia Antiga, a arte grega começa a

formar um estilo próprio original, com maior destaque para a era Helenística, na

Page 6: Cadamuro; justyne afonso   gula

13

qual a escultura era uma das mais importantes formas de expressão, sendo a

fusão de uma variedade de influências e representando a grande tradição do

auge do classicismo, criando obras perfeitamente modeladas e dando início ao

retrato ideal.

Prosseguindo com a evolução artística, a autora observa que a escultura

romana teve origem na escultura grega, revelando-se uma espécie de discípula

grega, porém, com introdução de características originais que as distinguem.

Mas o mesmo não acontece com a escultura primitiva cristã, pós-romana, que

praticamente não existiu: são encontrados nesse período as estatuárias e os

baixos relevo, símbolos cristãos, executados por artesãos. Porém, segue a

linha artística o período românico que também se dedica à religião,

exclusivamente à Igreja Católica, no qual a escultura assume uma forma

complementar da arquitetura, geralmente como relevo.

Seguindo a linha escultórica, o período gótico já engaja a busca pelo

naturalismo, que será rigorosamente seguido no período posterior. A escultura

gótica surge associada à arquitetura das catedrais. Em termos de linguagem

expressiva, a linguagem plástica gótica segue com algumas tendências ao

longo do seu desenvolvimento: idealismo, com figuras estilizadas e ausência

de expressividade dos respectivos rostos; hieratismo, caracterizado pela

ausência de movimento e proporção anatômica, com planejamentos rígidos

que acentuam a verticalidade; naturalismo, em que a estatuária ganha vida e

movimento, com acentuada expressão e detalhes minusciosos conferindo um

caráter mais humano às personagens divinas representadas; e realismo, com

acentuação da expressividade das estátuas.

De acordo com Cápua (2006), segue então o Renascimento, período em

que a arte se inspirou diretamente nos moldes clássicos, com características

de equilíbrio entre as faculdades intelectuais e as emocionais. Sentimento e

imaginação eram controlados e disciplinados pela reflexão intelectual com

ciência e geometria na composição.

Mais tarde, relata Cavalcanti (1978), tem início a Arte Barroca, na qual

desaparece o equilíbrio entre sentimento e razão, que os renascentistas

souberam tão bem realizar. Predominam agora os valores emocionais sobre os

intelectuais, modificando a técnica e a expressão da obra de arte. A escultura

alia-se à intensa expressão, movimentação das formas e forte realismo de

Page 7: Cadamuro; justyne afonso   gula

14

inspiração popular. As figuras têm movimento dramático expressando emoções

violentas.

Naturalmente desenvolvido do Barroco, o período Rococó, segundo o

autor (ibidem), tem característica decorativa e ornamental, expressando

fragilidade e graça. A escultura suaviza as rigorosas massas barrocas com

flexíveis arabescos, com menos energia e mais leveza.

Pouco depois, substituindo o Rococó, a Arte Neoclássica ou Acadêmica

restaura as artes da antiguidade clássica greco-romana e renascentista

italiana, tendo como estética o ideal do Belo presente no espírito do homem. A

escultura de preferência era a estatuária clássica grega, com harmonia nas

proporções, regularidade ideal das formas e serenidade da expressão. Logo

depois, durante um curto período, entra em vigor a estética romântica, que se

contrapõe às convenções e preceitos do período anterior. Agora surge o

sentimento e a imaginação na criação, visando a personalidade do artista, sem

limitações. O individualismo participa dessa estética negando o Belo e

afirmando moldes mais científicos, realistas e dinâmicos.

De acordo com Cavalcanti (1978), após o Romantismo, entra o Realismo

como uma reação ao neoclássico idealista e à exacerbação emocional

romântica. Agora, os escultores realistas buscam a verdade e o caráter, sem

idealizações. Fazem escultura social, tendo destaque imagens de

trabalhadores e tipos populares.

Entrando no século XX, escreve Cavalcanti (ibidem), os processos

técnicos e valores expressivos das artes plásticas refletem as transformações

da sociedade moderna causadas pela industrialização. Surge a chamada Arte

Moderna, na qual a escultura passa a expressar novos conceitos estéticos e

valores plásticos como: novos materiais, espaço como elemento escultórico,

formas abstratas, movimento, luz e som. Foi nesse século, e em meio às várias

vertentes ligadas ao modernismo, que surgiu o surrealismo.

Segundo Oliveira (2008), a escultura surrealista faz uso de objetos

retirados do seu contexto. Os surrealistas se dedicaram conscientemente a

reunir os objetos mais díspares, privados de sua funcionalidade, para

expressar as necessidades mais íntimas do homem. No começo, chegaram

inclusive a falar de dois tipos de objetos: os naturais (vegetais, animais e

minerais) e os de uso cotidiano. No entanto, deve-se destacar que os objetos

Page 8: Cadamuro; justyne afonso   gula

15

surrealistas, no limite entre a ironia e a perversão, tentavam abrir a imaginação

do espectador para a multiplicidade de relações existentes entre as coisas.

Pós modernismo, entra a atual Arte Contemporânea, período em que

linguagens, temas, estilos e suportes se misturam e se transformam a todo

momento, fazendo com que o artista esteja sempre criando propostas e

buscando soluções.

1.2 SURREALISMO

De acordo com Nadeau (1985), o grupo surrealista é fundado em Paris

pelo poeta e crítico André Breton em 1924. O movimento se agrega em torno

de Breton, único capaz de lhe dar sua carta: Manifesto Surrealista, onde,

segundo Klingsöhr-Leroy (2007:6), ele define através de dicionários e

enciclopédias o que é surrealismo:

SURREALISMO, substantivo. Automatismo puramente físico através do qual se pretende expressar, verbalmente, por escrito, ou de outra forma, a verdadeira função do pensamento. Pensamento ditado na ausência de qualquer controlo manifestado pela razão, e fora de quaisquer preocupações estéticas ou morais. ENCICLOPÉDIA, filosofia. O surrealismo baseia-se na crença na realidade superior de certas formas de associação até agora negligenciadas, na omnipotência do sonho, e no jogo desinteressado do pensamento. Ele conduz à destruição permanente de todos os outros mecanismos físicos e à sua destruição na solução dos problemas principais da vida.

Contextualizando melhor o movimento surrealista, Klingsöhr-Leroy

(ibidem) conta que, no início dos anos 1920, juntaram-se em Paris alguns

artistas que tinham em comum a desconfiança na degenerada sociedade

burguesa materialista, responsável, segundo eles, pela Primeira Guerra

Mundial. Para combatê-la, somente uma nova anti-arte revolucionária. Nova,

porque o dadaísmo já havia tentado impor suas idéias anarquistas.

Conforme Nadeau (1985) explica, embora em pequeno grau precursor

do Surrealismo, o Dadaísmo era um sistema oposto. Pouco antes de o

Movimento Surrealista ter início, o Dadá catalisava as tendências

revolucionárias que animavam o grupo de pensadores em Paris, até que

Breton rompe com esse estilo, acusando-o de anárquico e pouco eficaz. O

Page 9: Cadamuro; justyne afonso   gula

16

Dadá produziu trabalhos de anti-arte que deliberadamente desafiavam a razão,

já o Surrealismo dá ênfase não na negação, mas sim na expressão positiva.

Porém, historicamente, um tinha necessidade do outro para crescer, embora

também tivesse a mesma necessidade de abandonar para viver. Para Oliveira

(2008), “assim como o Dadaísmo, o Surrealismo enfatizou o papel do

inconsciente na atividade criativa, mas empregou o inconsciente psíquico mais

ordenadamente e de maneira mais séria”.

Klingsöhr-Leroy (2007) relata que Breton ligou e adaptou ao movimento

surrealista as idéias de Sigmund Freud, que fez descobertas sobre o poder dos

sonhos e da imaginação, que, para Breton, se escondia atrás da opinião, mas

agora não mais, libertando a mente da razão, da civilização e do progresso.

Oliveira (2008) afirma que o Surrealismo foi um movimento literário e

artístico do século XX que tenta expressar o funcionamento do subconsciente

por imagens fantásticas e justaposição incongruente de temas. O estilo

floresceu na Europa entre a I e II Guerra Mundial, por isso, de acordo com

Nadeau (1985), devemos considerar o surrealismo sob dois aspectos: a

situação política e social que o alimentou em seu período entre guerras, e seu

aspecto herdeiro e continuador de movimentos artísticos que o precedem.

Nadeau (ibidem) diz que os principais nomes do Surrealismo foram

profundamente marcados pela guerra, e em meio a essa catástrofe, esses

artistas rompem com a civilização que perdeu suas razões de ser, pois o que

anima esses pensadores vai além da arte e atinge todas as manifestações da

sociedade.

O movimento representou uma reação contra a cultura européia e a

frágil condição humana diante de um mundo cada vez mais complexo. O

Surrealismo (Naudeau, 1985) era um meio de reunir o consciente e o

inconsciente experimental, tão inteiramente que um mundo de sonho e de

fantasia seria unido ao mundo racional cotidiano em uma realidade absoluta,

que por eles foi chamada surrealista.

Utilizando teorias adaptadas de Sigmund Freud, Breton viu o

inconsciente como a origem da imaginação. Ele definiu o gênio como alguém

que extrai deste reino sua inspiração, o que, como acreditou, poderia ser

conseguido por artistas especiais. Nadeau (1985) ainda prossegue afirmando

que a gama de riquezas do inconsciente é infinita, e que se essa libertação do

Page 10: Cadamuro; justyne afonso   gula

17

inconsciente não é a inspiração, esta não é igual para a mesma pessoa em

todos os momentos de sua vida.

O surrealismo foi por excelência a corrente artística moderna da

representação do irracional e do subconsciente. De acordo com Oliveira

(2008):

Este movimento artístico surge todas as vezes que a imaginação se manifesta livremente, sem o freio do espírito crítico, o que vale é o impulso psíquico. Os surrealistas deixam o mundo real para penetrarem no irreal, pois a emoção mais profunda do ser tem todas as possibilidades de se expressar apenas com a aproximação do fantástico, no ponto onde a razão humana perde o controle.

Em 1924, o Departamento para Pesquisa Surrealista foi fundado em

Paris (responsável pela publicação do jornal surrealista) com o intuito de

relacionar tudo o que estava ligado com a expressão inconsciente da mente, e

não só com a literatura, a poesia e as belas-artes. Distribuíam papillons

(borboletas), que eram pequenos folhetos brilhantes com mensagens a seu

favor: “pais, contem vossos sonhos aos vossos filhos”, “se amas o amor, amas

o surrealismo”, como conta Klingsöhr-Leroy (2007).

O autor ainda afirma que todos os membros surrealistas apoiavam as

idéias de Karl Marx3, mas alguns apoiavam revolucionariamente o movimento

comunista. Porém, os surrealistas defendiam a individualidade, já que os

artistas trabalham independentemente e privam a expressão espontânea,

embora o grupo surrealista necessitasse de uma organização central e uma

posição intelectual oficial. Breton afirmou que o comunismo brilhou aos olhos

porque qualquer um ficaria feliz ao ver o poder ser passado das mãos

burguesas para o proletariado, porém, era preciso continuar dando prioridade

às experiências interiores, sem controle do exterior, nem mesmo do marxismo.

No Segundo Manifesto Surrealista (1930), Breton dá início à uma

_______________________________________________________________

Karl Marx3: intelectual e revolucionário alemão, fundador da doutrina comunista moderna, que idealizava uma sociedade com distribuição de renda justa e equilibrada, denominada comunista. Segundo este economista, o capitalismo era o principal responsável pela desorientação humana. Como relata Klingsöhr-Leroy (2007).

Page 11: Cadamuro; justyne afonso   gula

18

mudança de direção do tema surrealista quando integra seu texto à alquimia4,

com misticismo e especulação. Fazendo então com que os surrealistas

integrassem uma última fase em busca da “pedra filosofal” que permitiria aos

artistas que o inanimado ganhasse vida.

Em pintura, Oliveira (2008), replicando Breton, acusa que há dois

métodos artísticos: o automatismo rítmico (pelo qual se pintava seguindo o

impulso gráfico com livre associação de formas) e o automatismo simbólico (a

fixação das imagens oníricas ou subconscientes de maneira natural). Assim,

surgiram grupos diferentes de pintores: Miró, Hans Arp e André Masson, por

exemplo, representaram o surrealismo orgânico (automatista), enquanto Dalí,

Magritte, Tanguy, Chagall e Marx Ernst, desenvolveram o surrealismo

simbólico.

Como demonstram suas obras, os surrealistas tentaram objetivar seu

mundo interno, e não representar subjetivamente a realidade. Na América

Latina, esse estilo foi representado por Frida Kahlo e Wilfredo Lam, com

pinturas cheias de aspecto telúrico e quase ingênuo que tanto interesse

despertara nos surrealistas europeus, apesar de apresentar características

expressionistas.

Como afirma Cavalcanti (1978), no Brasil, a arte moderna surgiu em São

Paulo, o Estado mais industrializado, com a Semana da Arte Moderna, no ano

de 1922, período em que as idéias surrealistas são absorvidas pelos artistas

brasileiros. Podemos observar características surrealistas em algumas pinturas

de Ismael Nery e da artista Tarsila do Amaral.

Quanto à escultura, destaca Oliveira (2008), ganham força os ready

mades, no qual objetos são retirados do seu contexto original compondo outras

formas, como produziu o francês Marcel Duchamp, que também foi membro do

movimento. Os surrealistas reuniam inconscientemente objetos diferentes,

infuncionais, expondo-os às necessidades íntimas humanas. A autora afirma:

_______________________________________________________________

Alquimia4: segundo Bueno (1992), tradição antiga que combina elementos de química, física, astrologia, arte, metalurgia, medicina, misticismo, e religião. Existem três objetivos principais na sua prática: transmutação dos metais inferiores em ouro, a obtenção do Elixir da Longa Vida e criar vida humana artificial. Todos estes objetivos poderiam ser atingidos ao obter a pedra filosofal, uma substância mística que amplifica os poderes de um alquimista.

Page 12: Cadamuro; justyne afonso   gula

19

Exemplo claro do culto ao objeto, iniciado por este movimento, foi a Exposição de Objetos Surrealistas de 1936. Nela se representaram as mais extravagantes combinações, produto das associações inconscientes de seus autores. Alguns podiam ser interpretados quase automaticamente pelo público, de tão simples que eram em sua composição, enquanto outros se mantinham dentro de um hermetismo simbólico poético, no melhor estilo das esculturas dadaístas.Oliveira(2008)

As esculturas surrealistas tinham o intuito de trabalhar com a imaginação

do observador para que este fizesse a associação entre os objetos, livre de

condicionamentos, como o “Telefone Lagosta” (1936) (figura 1), de Salvador

Dalí, e as combinações de objetos de Miró.

O Surrealismo, diferente dos outros movimentos de vanguarda da

mesma época, ia além da imagem e sua função, como afirma Klingsöhr-Leroy

(2007), pois estava voltado para uma visão de interior, sendo, portanto,

resultado da voz interior, alucinação visual e sonhos. Os surrealistas

valorizavam o processo de obtenção da obra e não precisamente a obra de

arte perfeita e autônoma.

Nadeau (1985) adverte que o comportamento surrealista é eterno,

entendido como predisposição não a transmitir o real, mas a aprofundá-lo,

devendo ser superado e ultrapassado por seus continuadores.

O surrealismo, em sua experiência coletiva, teve fim em 1939, com a

Segunda Guerra Mundial e com o surgimento do fascismo, quando muitos

artistas formam exilados.

1.3 ANTROPOFAGIA

Fig. 1. Salvador Dalí. Telefone Lagosta ou Telefone Afrodisíaco, 1936. Telefone com lagosta de gesso pintada, 18 X 12,5 X 30,5 cm. Frankfurt a.M., Museum für Kommunikation (Fonte:Klingsöhr-Leroy, 2007: p.16)

Page 13: Cadamuro; justyne afonso   gula

20

De acordo com Braga e Rego (1998), em 1928, quando Tarsila do

Amaral pintou Abaporu, a artista não imaginava quão polêmica e

transformadora seria essa obra no campo da arte brasileira. Foi uma

reinvenção das histórias na pintura. Relatam ainda:

Em 1926, Tarsila e Oswald se casaram. A partir da união “Tarsiwald” (sic), carinhoso apelido dado ao casal pelo amigo e escritor Mário de Andrade, desenvolveu-se a fase mais polêmica da pintura de Tarsila: a Antropofagia. (Braga e Rego, 1998:24)

Nessa fase, a artista transforma a arte européia que desenvolveu fora do

país em algo tipicamente brasileiro, muitas vezes de forma surrealista. Temos

como exemplo desta brasilidade (Braga e Rego, 1998) as obras: Abaporu

(1928) (figura 2), inovadora ao quebrar o idealismo da figura humana; Urutu

(1928) (figura 3), onde Tarsila representou as imagens de pureza e de

liberdade guardadas de sua infância; O Lago (1928) (figura 4), formas e cores

delicadas que compõem uma paisagem de sonho e de segredo; A Lua (1928)

(figura 5), que une realidade e fantasia sem perder a ligação com a terra; e Sol

Poente (1929) (figura 6), que faz dia e noite acontecerem no mesmo momento.

Fig. 2. Tarsila do Amaral. Abaporu, 1928. Óleo sobre tela, 85 X 73 cm. Coleção Eduardo Constantini, Argentina. (Fonte: Braga e Rego, 1998: p. 02.)

Page 14: Cadamuro; justyne afonso   gula

21

Fig. 3. Tarsila do Amaral. Urutu ou O ovo, 1928. Óleo sobre tela, 60 X 72,5 cm. Coleção Gilberto Chateaubriand/MAM, Rio de Janeiro. (Fonte: Braga e Rego, 1998: p. 26.)

Fig. 4. Tarsila do Amaral. O lago, 1928. Óleo sobre tela, 75,5 X 93 cm. Coleção Sérgio S. Fadel, Rio de Janeiro. (Fonte: Braga e Rego, 1998: p. 26.)

Fig. 5. Tarsila do Amaral. A lua, 1928. Óleo sobre tela, 110 X 110 cm. Coleção particular. (Fonte: Braga e Rego, 1998: p. 27.)

Page 15: Cadamuro; justyne afonso   gula

22

O Movimento Antropofágico brasileiro foi escrito, lido e publicado na

Revista de Antropofagia em 1928 por Oswald de Andrade, onde o escritor

ironizava a submissão da elite brasileira aos países desenvolvidos, propondo a

deglutição cultural das técnicas exteriores reelaborando-as com autenticidade

(Braga e Rego, 1998). Mas é válido afirmar que a cultura importada não

deveria ser ignorada, apenas transformada.

Segundo Rolnik (1998), vem dos índios tupi-guarani a noção de

antropofagia: devorar seus bravos guerreiros inimigos, absorvendo-os no

corpo, para que partículas de sua virtude se integrassem à química da alma e

promovessem seu refinamento. O que parece bastante diferente do sentido

não-literal que a palavra ganhou no Modernismo, mas há ligação: do mesmo

modo que os índios absorviam a força dos seus inimigos e refinavam seu

conhecimento, o Movimento Antropofágico visava absorver os movimentos

europeus e juntá-los aos modos brasileiros, criando uma arte característica do

Brasil.

A antropofagia se mostra ambivalente e polêmica, já que se encaixa

conceitualmente em diversos campos de estudo da cultura, da literatura e da

música. A antropofagia e suas relações com o canibalismo estimulam e abrem

um leque de interpretações, o que demonstra sua riqueza cultural.

Relacionando antropofagia com Surrealismo, Herkenhoff (1998) observa

que há na história desse movimento um vasto repertório de imagens de

canibalismo, provando que desde os primórdios os surrealistas tinham o desejo

de devorar. O canibalismo é retratado por Salvador Dalí, em suas metáforas de

guerra, e por René Magritte, que através de sua característica singular do

Fig. 6. Tarsila do Amaral. Sol poente, 1929. Óleo sobre tela, 54 X 65 cm. Coleção Geneviève e Jean Boghici, Rio de Janeiro. (Fonte: Braga e Rego, 1998: p. 27.)

Page 16: Cadamuro; justyne afonso   gula

23

estranhamento, desafia e canibaliza o olhar do espectador influenciando

fantasias mentais, e assim superando a razão, tratando de metáforas políticas

e psicológicas de devoração.

Dalí, segundo Ades (1998), segue seus impulsos no contexto da Guerra

Civil Espanhola, como em Canibalismo de outono (1936) (figura 7), onde duas

figuras estranhas, de aparência rochosa, se devoram simultaneamente, mas

sem brutalidade: o casal usa talheres para fatiar e comer educadamente. Um

ser veste camisa vermelha e o outro uma camisa branca, simbolizando as

facções de direita e de esquerda que se confrontavam na guerra. Mas há

também a dilaceração de um único corpo, como em Construção mole com

feijão cozido: premonição da Guerra Civil (1936) (figura 8).

Para Herkenhoff (1998), o canibalismo não é uma dieta, é sempre

simbólico, possibilitando o entendimento de relações de alteridade, sendo uma

metáfora filosófica e reflexiva sobre a violência e envolvendo o desejo e a fusão

dos indivíduos. Lembrando que nos torna capazes de cometer qualquer

atrocidade.

Fig. 7. Salvador Dalí. Canibalismo de outono, 1936. Óleo sobre tela. Tate galery, Londres. (Fonte:http://www.ciencias.com.br/pagina_bedaque/dali/quadros.htm)

Page 17: Cadamuro; justyne afonso   gula

24

1.4 GULA

Este trabalho, metaforizado como um banquete antropófago, é feito dos

pedaços mais saborosos do capitalismo. Para Rolnik (1998), a subjetividade

antropofágica jamais aderiu absolutamente a qualquer sistema de referência e

funciona segundo algumas características essenciais: ver o outro em si; tolerar

pressão; ter opostos tipos de relação com a alteridade; um narcisismo

hedonista já que a relação com o outro é pelo gozo de si mesmo; o

nomadismo, desejo que dá liga para formar um “em casa” orientada pelo corpo

vibrátil; e singularidade impessoal, que é aberto ao desejo.

Essa subjetividade se dá por alianças e contágios, e não por filiação

como a descendência. A chamada “baixa antropofagia” (id, ibid) é ausente de

critério ético, substituído por um critério narcísico. É um vale-tudo em função

dos interesses do ego.

Para o autor (ibidem), há distinção entre fome e gula e essa diferença é

ignorada pelos ocidentais. Segundo as religiões orientais (principalmente o

budismo) comer significa alimentar a fome, e não matá-la, por isso mata-se a

gula jejuando, já que a fome é um desejo e desejos crescem quando

satisfeitos. No ocidente, confunde-se fome com gula: nós matamos a fome

comendo.

Flusser (1998), referindo-se ao marxismo, afirma que a humanidade

avança pelo estômago. A gula expele os detritos da natureza apreendida,

Fig. 8. Salvador Dalí. Construção mole com feijão cozido: premonição da Guerra Civil ,1936. Óleo sobre tela, 51 X 78 cm. The Philadelphia Museum of Art, Filadélfia. (Fonte: Klingsöhr-Leroy, 2007: p 41.)

Page 18: Cadamuro; justyne afonso   gula

25

compreendida e subjugada: evacua instrumentos. A gula transforma a natureza

progressivamente no excremento chamado “parque industrial”, que também é

devorado pela gula, que devora ainda a sociedade humana e até a alma

humana. A gula é um pecado, uma perversão da fome.

O autor (ibidem) diz ainda que a gula estaria, com relação à fome,

subdesenvolvida. Quanto mais o homem devora, tanto mais e mais depressa

precisa devorar, e esse devorar insaciável e geometricamente acelerado é

chamado de progresso.

A gula afasta o homem da engrenagem da vida, adiante o homem

servirá de alimento aos seus próprios excrementos. Como afirmaram os sábios,

a gula é uma ilusão, surge, portanto, uma “filosofia da gula”.

E é dentro de todo esse contexto (escultura, surrealismo, antropofagia e

gula) que este trabalho seguiu, com o intuito de representar o desejo guloso do

ser humano de incorporar seu companheiro para, consequentemente,

incorporar-se no topo do sistema hierárquico capitalista.

Esse segmento artístico compõe-se de tema canibalista, mostrando o

desejo do trabalhador de digerir seu companheiro, na luta de um guerreiro

capitalista que devora seus rivais no mercado de trabalho, tentando, custe o

que custar, ser digerido pelo capitalismo, que aqui é representado por plantas

carnívoras, pela denominação que significa alimentar-se de carne humana.

O projeto foi desenvolvido em escultura, porém, não fez uso de ready

mades (como na escultura surrealista), mas penetrou no campo irreal,

aproximando-se do fantástico, talvez se assemelhando mais à estética

surrealista apresentada na pintura.

Page 19: Cadamuro; justyne afonso   gula

26

CAPÍTULO 2

A MATERIALIZAÇÃO DE GULA

2.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O processo de elaboração das obras surgiu a partir da teoria, a primeira

a ser trabalhada e estudada. A partir daí, o pensamento foi posto na criação

das imagens que representam o tema, a linguagem e os suportes escolhidos.

Foram então elaborados croquis bidimensionais em forma de desenho,

posteriormente manuseados em argila já no tamanho final para a elaboração

das quatro esculturas originais em tamanho grande.

As esculturas foram produzidas com a técnica da fôrma perdida em

gesso e a peça final em massa plástica, pois de acordo com os volumes, as

proporções, ou até mesmo as sensações que pretendem ser transmitidas ao

espectador, esse material se encaixou melhor. Produziu-se então a modelagem

em argila, sobre uma estrutura de ferro, as fôrmas foram feitas através da

técnica da fôrma perdida e a finalização das peças em massa plástica com

pintura de tinta esmalte sintético fosco branco.

1. Estrutura de sustentação interna:

Antes da modelagem em argila, para que todo o peso desse material

fosse sustentado, foi necessária a criação de uma base de madeira onde ferros

firmemente pregados e moldados já davam uma estrutura interna inicial para a

peça que ali surgiria, por isso, desde o princípio, foi necessário cautela para a

criação da peça na proporção desejada.

2. Modelagem em argila:

A modelagem das peças foi, inicialmente, pensada e montada a partir de

fotografias das partes em questão em rascunhos de desenho desenvolvidos à

mão, para então ganharem vida tridimensionalmente. Todas as peças seguem

uma modelagem fiel às imagens reais pesquisadas, embora a temática seja

Page 20: Cadamuro; justyne afonso   gula

27

surrealista e a proporção entre as partes que formam cada composição não

seja possível.

3. Fôrma perdida:

A técnica da fôrma perdida em gesso foi escolhida devido à melhor

adaptação dessa técnica às formas criadas em argila e também devido ao

baixo custo e praticidade.

Após o término da modelagem, a peça em argila é divida com pedaços

de radiografias inseridas, parte internamente no material e parte externamente,

e pregadas umas às outras com fitas adesivas, pensadas de maneira que

resulte uma fôrma de boa qualidade, e com cautela para que não haja retenção

entre as partes de gesso. Após a colocação das radiografias, o gesso é

preparado e aplicado em volta de toda a escultura certificando-se de que todas

as partes negativas foram preenchidas e que não tenham se formado bolhas.

Várias camadas são sobrepostas para que a fôrma não fique fina e quebre a

qualquer descuido.

Após seco o gesso, as radiografias que separam as partes são retiradas

e, cuidadosamente, os pedaços vão sendo forçados para fora e a fôrma com a

imagem negativa da escultura vai se abrindo conforme a argila vai de

despedaçando. Depois desse processo, os restos de argila são retirados e as

partes de gesso são lavadas e postas para secar.

4. Escultura em massa plástica:

Depois de limpas e secas, as fôrmas de gesso recebem uma fina

camada de vaselina nas partes negativas, de onde surgirá a escultura final. A

massa plástica é vertida preenchendo as partes de interesse. Depois da massa

seca, as partes de gesso preenchidas da peça são encaixadas umas às outras,

bem amarradas para que fiquem firmes, e então são feitas emendas com a

própria massa para que as partes se colem e componham novamente a forma

da escultura modelada inicialmente. Assim que as emendas secam, todo o

gesso que envolve a massa é quebrado cuidadosamente, por isso o termo

fôrma perdida, e dalí respira a escultura montada.

5. Finalização:

Para finalizar, as esculturas recebem um tratamento com lixas d´agua

que vão da lixa número 80 até a lixa 600, passando por aproximadamente 10

lixas que tiram as imperfeições, alisam e lustram a massa plástica. Depois de

Page 21: Cadamuro; justyne afonso   gula

28

prontas, todas as peças ainda recebem uma pintura de tinta esmalte verniz na

cor branco fosco (serviço feito em funilaria) para que a série toda fique com

uma cor homogênea, pois a massa plástica branca pode apresentar diferentes

tonalidades vindas já de fábrica ou dependendo da quantidade de catalisador

aplicado.

6. Base:

Todas as peças recebem como base um pedaço de madeira cortado em

formato orgânico revestido com massa plástica e igualmente lixado e pintado. A

sustentação das esculturas nas bases é feita por meio de buracos em ambos,

nos quais ferros encaixados e cobertos com massa plástica conectam as

partes.

Todo o processo prático pode ser analisado nas figuras em anexo.

2.2 ANÁLISE DAS OBRAS

2.2.1 Nepenthes

Page 22: Cadamuro; justyne afonso   gula

ERROR: ioerrorOFFENDING COMMAND: image

STACK: