137
CADERNOS DO LOGEPA Volume 7, Número 1, p. 1136, jan./jun. 2012 ISSN 22377522 Visualização topográfica da imagem gradiente. Fonte: SANTANA, E. F.; BATISTA, L. V.; SILVA, R. M. Técnicas de segmentação não‐supervisionada: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo. Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012. UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS LABORATÓRIO E OFICINA DE GEOGRAFIA DA PARAÍBA JOÃO PESSOA – PARAÍBA

CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

CADERNOSDOLOGEPA

Volume7,Número1,p.1‐136,jan./jun.2012 ISSN2237‐7522

Visualizaçãotopográficadaimagemgradiente.

Fonte:SANTANA,E.F.;BATISTA,L.V.;SILVA,R.M.Técnicasdesegmentaçãonão‐supervisionada: análise comparativa de mapeamentos do uso eocupaçãodo solo. CadernosdoLogepa, JoãoPessoa, v. 7, n. 1, p. 121‐136,jan./jun.2012.

UNIVERSIDADEFEDERALDAPARAÍBA

CENTRODECIÊNCIASEXATASEDANATUREZADEPARTAMENTODEGEOCIÊNCIAS

LABORATÓRIOEOFICINADEGEOGRAFIADAPARAÍBAJOÃOPESSOA–PARAÍBA

Page 2: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UNIVERSIDADEFEDERALDAPARAÍBACentrodeCiênciasExatasedaNatureza/DepartamentodeGeociênciasREITORRômuloSoaresPolariPRÓ‐REITORIADEPÓS‐GRADUAÇÃOIsacdeAlmeidaMedeirosPRÓ‐REITORIADEPÓS‐GRADUAÇÃOValdirBarbosaBezerraPRÓ‐REITORIADEEXTENSÃOEASSUNTOSCOMUNITÁRIOSLúciadeFátimaGuerraFerreiraDIRETORDOCENTRODECIÊNCIASEXATASEDANATUREZAAntonioJoséCreãoDuarteCHEFEDODEPARTAMENTODEGEOCIÊNCIASAnieresBarbosadaSilva

LABORATÓRIOEOFICINADEGEOGRAFIADAPARAÍBA

COORDENADORAProfa.Dra.MariadeFátimadeAlbuquerqueEQUIPEEDITORIALProf.Dr.RichardeMarquesdaSilva–EditorChefeProfa.Dra.EmiliaMoreira–EditorChefeProfa.Dra.MariadeFátimadeAlbuquerque–EditorGerenteCONSELHOEDITORIALAnaGlóriaCornélioMadruga,UniversidadeFederaldaParaíbaBernardoMançanoFernandes,UNESP–PresidentePrudenteEmiliaMoreira,UniversidadeFederaldaParaíbaJaneteLinsRodriguez,FundaçãoCasaJoséAméricodeAlmeida‐PBJoséBorzacchiellodaSilva,UniversidadeFederaldePernambucoMariadeFátimadeAlbuquerque,UniversidadeFederaldaParaíbaMariaGeraldaAlmeida,UniversidadeFederaldeGoiásMarildaAparecidadeMenezes,UniversidadeFederaldeCampinaGrandePedroCostaGuedesVianna,UniversidadeFederaldaParaíbaRichardeMarquesdaSilva,UniversidadeFederaldaParaíbaRosaEsterRossini,UniversidadedeSãoPauloRuyMoreira,UniversidadeFederalFluminenseARevista"CADERNOSDOLOGEPA"fazpartedoprogramadeeditoraçãodoLaboratórioeOficinadeGeografiadaParaíba(LOGEPA)edoDepartamentodeGeociênciasdaUniversidadeFederaldaParaíba. Seu objetivo é a publicação, de artigos técnico‐científicos e de ensaios teóricos, quecontribuam,sobretudo,paraoaprofundamentodoconhecimentodarealidadeestadualeregional.A publicação da revista é semestral e, atualmente, está classificada pela CAPES com Qualis B4Interdisciplinar,B5paraGeografiaeHistória.ISSN–2237‐7522

Page 3: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SUMÁRIO UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOSTERRITORIAISEMÁREASPROTEGIDASDONORDESTEBRASILEIRO (1998‐2011)(AnevaluationofthefiredotsandtheterritorialconflictsinprotectedareasofBrazilianNortheast(1998‐2011))……………………………..................................

3‐24

LuizRenatoVallejo

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOSSTAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTOANTÔNIO,ESTADODEALAGOAS,BRASIL(Touristification,participationanddevelopmentofStakeholdersintourismtheBarradeSantoAntônio,AlagoasState)…….............................................................................................….…..........................................

25‐39

AnderssonPontesBarbosa

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA:clivagenseconsensos(SpainandBrazilintheconstructionofthedemocraticparticipation:cleavagesandconsensuses)...........................................................................

40‐71

RodrigoAlbertoToledo

POTENCIALNATURALEANTRÓPICODEEROSÃONABACIAEXPERIMENTALDO RIACHO GUARAÍRA (Anthropic and natural potential of erosion in theGuaraíraBasinExperimental)………..........................................................................................

72‐91

SamirFernandesGonçalves,RichardeMarquesSilva

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DETRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL(Evidenceonthecontributionofprogramstransferofincomeforreductionofchildlabour)........................................................................................................................................

92‐120

MariaCarolinaCostaMadeira,IvanTarginoMoreira

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativade mapeamentos do uso e ocupação do solo (Unsupervised segmentationtechniques: comparative analyze of land use and covermapping)..............................................................................................................................................

121‐136

EduardoFreireSantana,LeonardoVidalBatista,RichardeMarquesSilva

Page 4: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

UMAAVALIAÇÃOSOBREOSFOCOSDECALOREOSCONFLITOSTERRITORIAISEMÁREASPROTEGIDASDONORDESTEBRASILEIRO(1998‐2011) 

 Artigo recebido em: 26/03/12  Revisado em: 11/04/12 Aprovado em: 08/06/12 

    

Luiz Renato Vallejo¹ 

 

                  

¹ Departamento de Geografia Universidade Federal Fluminense ldzƛȊNJŜƴŀǘƻ@ƛŘΦdzŦŦΦōNJ  

 

     Correspondência:  Luiz Renato Vallejo  Programa de Pós Graduação em Geografia, Universidade Federal Fluminense.  Av. Litorânea, s/n ‐ Campus da Praia Vermelha, 5º andar, Boa Viagem, Niterói ‐ RJ ‐ CEP:24.210‐340, Brasil.   

RESUMOO estudo avaliou conflitos territoriais em unidades de conservaçãofederais e estaduais de proteção integral nordestinas, considerandoregistroshistóricosdefocosdecalor(1998‐2011).Foram9.496focosem24UC’s federais e4.169em9UC’s estaduais, totalizando13.665focos em 33 UC’s. As UC’s no Maranhão, Piauí e Bahia tiveram osmaiores números de focos. Houve um aumento progressivo entre osperíodosde1998‐2000a2011,variandode500atémaisde1800.Osanosde2007e2010foramosmaiscríticos,registrando2075e2399,respectivamente.Asmenoresocorrências acontecementreoutubro eabril,aumentandofortementedejulhoasetembro.Foramrelacionadasas8UC’scomosmaioresvalores,sendo5parques,1reservabiológica,1 estação ecológica e 1 refúgio de vida silvestre, que totalizaram13.150 focos. O uso do fogo no interior e entorno das UC’s acontececom diferentes motivações: manejo de pastos; expansão de frentesagropastoris; represália à existência das UC’s; caça e incêndiosacidentais. Todas as UC’s têm problemas fundiários desde a suacriação.AinfraestruturaéprecáriaenãodiferedasituaçãodeoutrasUC’speloBrasil.Palavras‐chave: Unidades de conservação, focos de calor, conflitosterritoriais.

AN EVALUATION OF THE FIRE DOTS AND THETERRITORIALCONFLICTS INPROTECTEDAREASOFBRAZILIANNORTHEAST(1998‐2011)ABSTRACTThestudyevaluatedtheterritorialconflictsinprotectedareas(federaland state) in the Northeast region from Brazil. Were considered aserial of records of fire dots obtained by satellites (1998‐2011). Thedata showed9,496 firedots in24 federal areas and4,169 in9 stateareas,totaling13,665dots.TheprotectedareasfromMaranhão,PiauíandBahiahadthehighestnumberoffiredots.Therewasaprogressiveincrease after 1998, ranging from 500 (1998‐2000) to greater than1,800(2011).Theyears2007(2,075dots)and2010(2,399dots)werethemostcritical.ThelowestoccurrenceshappenbetweenOctoberandApril,increasingsharplyfromJulytoSeptember.Eightprotectedareaswererelatedwithhighervalues:fiveparks,onebiologicalreserve,oneecological station and one wildlife refuge, totalized 13,150 fire dots.Thefireinandoutofprotectedareashappenedwithdifferentreasons:pasturemanagement,expansionofagropastoralfronts;reprisalfortheexistenceofprotectedareas;huntingandaccidentalfires.Allprotectedareas have land problems since its inception. The territorialinfrastructure is deficient anddoes not differ from several protectedareasinBrazil.Keywords:Protectedareas,firedots,territorialconflicts.

    

Page 5: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

4

INTRODUÇÃO

Oestabelecimentodeáreasprotegidaséaprincipal iniciativapolíticade

conservação da biodiversidade, dos ecossistemas e dos serviços ambientais

associados. No Brasil, a Lei no 9.985, de 18/07/2000 que instituiu o Sistema

Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, se destaca como

referência legal na criação e gestão de áreas protegidas, nacionalmente

denominadasdeunidadesdeconservação(UC’s).NumplanomaisgeralasUC’ssão

classificadascomodeproteçãointegral(PI)edeusosustentável(US).Asprimeiras

são mais restritivas1, enquanto as demais podem contemplar atividades

sustentáveis e de baixo impacto2. Em qualquer um destes casos, a competência

administrativapodeestarsobosdomíniosfederal,estadualoumunicipal.

Um dos aspectos mais complexos e polêmicos sobre este tema é a

efetividadedagestãodasUC’s,particularmentenotocanteàsdeproteçãointegral,

poisrequeremummaiorníveldecontrolesobreoterritórioatravésdadefiniçãoe

operacionalização de planos demanejo compatíveis comos objetivos de criação

das UC’s. Neste contexto, há de se destacar a importância das iniciativas de

regularizaçãofundiáriadaáreaaserprotegida,assimcomoaadoçãodemedidas

administrativasefetivasdecontroleegestãoterritorial.NoBrasil,assimcomoem

muitas outras partes pelo mundo, a grande polêmica está no fato de que os

governos têmpromovido a criação deUC’s,mas não conseguem consolidá‐las e,

desse modo, sofrem todo tipo de pressão decorrente de atividades extrativas,

invasões e ocupações (legais e ilegais) que trazem prejuízos à conservação da

biodiversidade(VALLEJO,2002).

Aocorrênciadequeimadaseincêndios3emgrandestrechosdoterritório

nacional, incluindo as áreas legalmente protegidas, tem chamado a atenção de

1 Estações Ecológicas (ESECs), Monumentos Naturais (MONATs), Parques, Reservas Biológicas(REBIOs)eRefúgiosdaVidaSilvestre(RVS)

2 Área de Proteção Ambiental (APA), Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), FlorestaNacional(FLONA),ReservaExtrativista(RESEX),ReservadeFauna,ReservadeDesenvolvimentoSustentável(RDS)eReservaParticulardoPatrimônioNatural(RPPN).

3Asqueimadasestãoassociadasaossistemasdeproduçãomaisprimitivoscomoacaçaecoletaindígenasetambémnaagriculturamaisintensivaemoderna,comoadacana‐de‐açúcar,algodãoecereais.Nocasodos incêndios,emgeral, acontecemnoambiente florestal sendodenaturezaacidental,indesejadosededifícilcontrole.

Page 6: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

5

pesquisadoresedopúblicoemgeral,particularmenteduranteosmesesdemenor

índicepluviométrico.Aexpansãodas fronteirasagrícolaseaspráticasdemanejo

depastagenscomusodo fogoestãoentreasprincipaiscausasdos incêndiosque

acabamadentrandopeloslimitesdemuitasáreasprotegidasnoBrasil (VALLEJO,

2010, p. 179). Os impactos negativos dos incêndios recorrentes podem afetar

intensamenteossolos(perdadenutrientes,compactaçãoeerosão)eopatrimônio

biológico(KLINKeMACHADO,2005,p.150‐151).Outrosautoresdestacamtambém

os impactos associados à poluição atmosférica que afetam áreas imediatamente

vizinhas,alémdeseexpandiremregionalmente(FREITASetal.,2005;INDRIUNAS,

2008).

Desde 1987 o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE),

subordinadoaoMinistériodeCiênciaeTecnologia,promovemonitoramentodas

queimadasnoterritórionacional.Em1998,apósumgrandeincêndionoEstadode

Roraima4, houve um aperfeiçoamento do trabalho em parceria com o Instituto

Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). O

instituto disponibiliza informações diárias georreferenciadas dos focos de calor,

alémdealertaspore‐maildasocorrênciasemáreasdeinteresseespecial,riscode

fogo, estimativas de concentração de fumaça, entre outras. A partir de junho de

1998,osfocosdecalorpassaramaserregistradosnasUC’s(federaiseestaduais)e

em terras indígenas comapoiodevários satélitese respectivos sensores (NOAA,

AQUA,GOES,TERRA,METEOSATeATSR).

Este artigo tem como objetivo principal apresentar as informações

pertinentesaosfocosdecaloremUC’s(federaiseestaduais)deproteçãointegral

localizadasnosestadosdaregiãoNordeste,noperíodocompreendidoentrejunho

de 1998 até dezembro de 2011. A pesquisa, originalmente realizada emUC’s de

todo o território brasileiro, detectou que alguns estados do Nordeste, como o

Maranhão,PiauíeBahia,apresentaramregistrosmuitoelevadosdefocosdecalor.

Trata‐sedeumaavaliaçãoquantitativainicialdosregistrosdefocosdecalor,mas

quepodecontribuirnaindicaçãodospossíveismotivosdesuaocorrência,ouseja,

os conflitos territoriais decorrentes das deficiências administrativas e das

4Emmarçode1998,oestadodeRoraimatevecercade40milkm²suprimidospelofogodevido,supostamente,àsqueimadasirregularesenãocontroladas.

Page 7: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

6

atividades que impactam negativamente a conservação da biodiversidade. Os

resultadosdopresente estudo integramaspesquisasdoNúcleode Pesquisasde

ÁreasProtegidas(NUPAP)doDepartamentodeGeografiadaUniversidadeFederal

Fluminense/RJ5.

MATERIALEMÉTODOS

Para atender os objetivos da pesquisa, foram selecionados dados dos

satélites NOAA‐12 (sensor AVHRR/noite6) e AQUA (sensor MODIS/tarde7) para

montagem de séries temporais. Entre 1998 e 2006 utilizamos os registros do

sistema NOAA‐12/AVHRR. A partir de agosto de 2007, o NOAA‐12 deixou de

operar,sendosubstituídopeloNOAA‐15.Apartirde2007,optou‐sepelosregistros

dosistemaAQUA‐MODIS,consideradomaisprecisoqueoanterior,poisnãosofre

tantasinterferênciasatmosféricas.

Acaptaçãodasimagensporestessensoresébaseadanoprincípiofísicode

que as chamas emitem energia, principalmente, na faixa termal‐média de

comprimento de onda entre 3,7 e 4,1 µm do espectro ótico. Em algumas

circunstânciasexistemimpedimentosouprejuízosàdetecçãodasqueimadas,tais

como: a) frentes de fogo em áreas menores de 1 km²; b) fogo rasteiro numa

florestadensa,semafetaracopadasárvores;c)nuvenscobrindoaregião,apesar

dequeasnuvensde fumaçanãoatrapalham;d)queimadasdepequenaduração,

ocorrendo entre as imagens disponíveis; e) fogo em uma encosta demontanha,

enquantoqueosatélitesóobservouooutrolado;ef)imprecisãonalocalizaçãodo

focodequeima,quenomelhorcasoédecercade1km,maspodechegara6km.

Cada foco de calor detectado pelos satélites não está diretamente

relacionado com o número de queimadas e/ou incêndios. Um foco indica a

existênciadefogoemumelementoderesoluçãodaimagem(pixel),quevariade1

5Disponívelem:http://www.uff.br/degeografia/nupap.6AVHRR ‐AdvancedVeryHighResolutionRadiometeréumtipodesensorquegera imagensdedetecçãoderadiaçãopodendoserusado,remotamente,paradeterminaracoberturadenuvenseatemperaturadeumasuperfície.

7MODIS ‐Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer ‐ opera em 36 canais espectrais emcomprimentos de onda que variam de 0,4 a 14,4 µm e resolução espacial entre 250 a 1.000metros.

Page 8: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

7

×1kmaté5×4km.Nestepixelpodehaverumaouváriasqueimadasdistintas,

masoregistroindicaráapenasumúnicofoco.Seumaqueimadaformuitoextensa,

ela será detectada em vários pixels vizinhos, ou seja, vários focos estarão

associadosaumaúnicaegrandequeimada.Mesmoconsiderandoqueossensores

atuaisnão conseguemelucidaroque estáqueimandoequantoqueimou,podem

ser constatadas tendências espaciais e temporais nas ocorrências de fogo

(FERREIRAetal.,2005;PANTOJAeBROWN,2007;PIROMALetal.,2008).

Os registros mensais de focos de calor foram tabulados em planilhas

eletrônicas para produção de gráficos ilustrativos das séries de dados. As

informaçõesmaisdetalhadassobreasáreasdeconservação federaise estaduais,

incluindooanodecriação,aextensão(emkm²),osdadosgeorreferenciadoseos

municípiosocupados,resultaramdepesquisasnoCadastroNacionaldeUnidades

de Conservação doMinistério doMeioAmbiente, Secretaria deBiodiversidade e

Florestas.Também forampesquisadas informaçõesdoObservatóriodeUnidades

deConservaçãoWorldWildlifeFund–Brasil8.

RESULTADOSEDISCUSSÕES

AsUC’sdeProteçãoIntegralNordestinas

Inicialmente será apresentada uma avaliação geral sobre as UC’s

nordestinas em relação aos aspectos formais de localização, número, área e os

biomas protegidos. Estas informações foram resumidas e sistematizadas no

Quadro1.

Emtodaextensãoterritorialnordestina(1.554.387,73km²)existem41UC’s

federaise43estaduais,totalizando46.210,26km²,oquerepresentaapenas2,97%

da região. A maior extensão de áreas legalmente protegidas se refere às UC’s

federaiscom39.244,41km²,ouseja,2,53%.AsUC’sestaduaisperfazem6.965,85

km²oqueequivalea0,44%doespaço regional.OEstadodaBahia temomaior

númerodeUC’s(16 federaise9estaduais),masnãoapresentaamaiorextensão

territoriallegalmenteprotegidacom14.609,86km²(2,59%),ocupandoasegunda 8Disponívelem:http://www.observatorio.wwf.org.br.

Page 9: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

8

posição.OEstadodoMaranhãocontabilizaamaiorextensãocom18.063,63km²,

equivalendoa5,44%doterritório.Paraefeitodeavaliaçãodopresentetrabalho,

consideramos a área do PN das Nascentes do Rio Parnaíba (Cerrado) como

territóriomaranhense9.

Quadro1–InformaçõessobreasUC’sdeproteçãointegral(federaiseestaduais)doNordestebrasileiro

UC’sFederais UC’sEstaduaisEstado‐Área(km²) Nº Área(km²) Nº Área(km²)

Fed+Est(%)

Biomasprotegidos

Alagoas‐27.779,34

3 366,10 1 10,88 1,36CaatingaeMata

Atlântica

Bahia‐564.830,86

16 13.454,76 9 1.155,10 2,59

Cerrado,Caatinga,MataAtlânticaeMarinho

Ceará‐148.920,54

4 389,86 5 426,24 0,55CaatingaeMarinho

Maranhão‐331.935,51 4 13.120,36 4 4.943,27 5,44

Cerrado,AmazôniaeMarinho

Paraíba‐56.469,47

1 40,52 5 15,30 0,10MataAtlântica,CaatingaeMarinho

Pernambuco‐98.146,32

5 781,51 13 79,84 0,88Caatinga

MarinhoeMataAtlântica

Piauí‐251.576,64

410.592,75

1 246,03 3,76

CerradoeCaatinga

RioGrandedoNorte‐

52.810,702 363,10 3 58,82 0,80

Marinho,CaatingaeMata

AtlânticaSergipe‐21.918,35

2135,47

2 30,37 0,76

CaatingaeMataAtlântica

41 39.244,41 43 6.965,85Nordeste‐1.554.387,73 2,53% 0,44%

46.210,26‐2,97%

Fonte:DadosMMA/ICMBIO<http://www.mma.gov.br>.

O Estado do Piauí possui 4 UC’s federais e 1 estadual, totalizando

10.592,75km²(3,76%).Énesteestadoqueseencontra,integralmente,amaior

UC nordestina, o PN da Serra das Confusões com 8.238,37 km² (Caatinga). O

9OPNdasNascentesdoRioParnaíbaéasegundamaiorUCnordestinacom7.243,21km²eocupaos estados doMaranhão, Piauí,Bahia e Tocantins. Encontra‐se localizadomajoritariamente noestadodoMaranhão(>40%).

Page 10: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

9

EstadodaParaíbatemamenorextensãoterritorialprotegidacomapenas55,81

km²,ouseja,0,10%daáreaestadual(1reservabiológicafederale5pequenos

parques estaduais). Mesmo no caso do menor Estado nordestino (Sergipe)

existem165,84km²deáreasfederaiseestaduaisprotegidas,oquerepresenta

0,76%daáreaestadual.

Das 84 áreas protegidas doNordeste, apenas 11 (13,1%) sãomaiores

que 1.000 km². A grandemaioria (50UC’s) pode ser consideradade pequena

extensão,poissãomenoresque100km²(59,5%);20UC’spossuemáreasentre

100 e 500 km² (23,8%); e somente 3 (3,6%) com extensão entre 500 e 1.000

km².AmaiorabrangênciaespacialdeproteçãopelasUC’srecaisobreobioma

doCerrado,seguidopelaCaatinga,MataAtlânticaeAmazônia.Osecossistemas

marinhos estão legalmente protegidos na maioria dos estados nordestinos:

P.N.M.dosAbrolhos/BA;P.E.MdaPedradoRiscodoMeio/CE;P.N.doLençóis

Maranhenses/MA e P.E.M. do Parcel de Manuel Luís/MA; P.E.M. Areia

Vermelha/PB;eP.N.M.deFernandodeNoronha/PE.

A Figura 1mostra a distribuição das áreas legalmente protegidas nos

diversosestadosdaregiãonordeste.AsFiguras2e3mostramopercentualde

ocupação das 5 categorias deUC’s de proteção integral em todo oNordeste e

tambémnos estados.Nota‐se que as áreas dos parques (federais e estaduais)

prevalecememrelaçãoàsdemaiscategorias(65,5%).

Figura1–DistribuiçãodasáreasdeUC’sdeproteçãointegralporestadonordestino.Fonte:MMA/ICMBIO:http://www.mma.gov.br.

0

2.000

4.000

6.000

8.000

10.000

12.000

14.000

16.000

18.000

20.000

Alagoas Bahia Ceará Maranhão Paraíba Pernambuco Piauí Rio Grande do Norte

Sergipe

Área (km²)

UCs Federais    UCs Estaduais  

Page 11: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

10

Parques65,5%

ESEC21,5%

REBIO7,5%

RVS4,3%

MONAT1,2%

Figura2–DistribuiçãodasáreasdeUC’sporcategoriadeproteçãointegral‐

EstaçõesEcológicas(ESEC),MonumentosNaturais(MONAT),Parques,ReservasBiológicas(REBIO)eRefúgiosdaVidaSilvestre(RVS).

Fonte:DadosMMA/ICMBIO<http://www.mma.gov.br>

Figura3–DistribuiçãodasáreasdediferentescategoriasdeUC’sporestado.Fonte:DadosMMA/ICMBIO<http://www.mma.gov.br>

0

2.000

4.000

6.000

8.000

10.000

12.000

14.000

16.000

18.000

20.000

Alagoas Bahia Ceará Maranhão Paraíba Pernambuco Piauí Rio Grande do Norte

Sergipe

Área (km²)

ESEC MONAT Parque REBIO RVS

Page 12: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

11

Sobre o período de criação das UC’s os dados indicam que a grande

maioria originou‐se depois de 1999 (58 UC’s – 69,1%). Desse total, 32 UC’s

(38,1%)foramcriadasposteriormentea2006.Antesde1998,jáexistiam26UC’s

(31,0%).AmaisantigadasUC’snordestinaséoPNdeSeteCidades/PI,criadoem

05/06/1961 através do Decreto nº 50.744 (63,04 km² ‐ Caatinga). Em seguida

aparecem a ESEC Uruçuí‐Una/PI (1981 – 1.372,86 km²) e o PN dos Lençóis

Maranhenses/MA(1981‐1.565,84km²).

OsregistrosdefocosdecaloremUC’snordestinas

Entre junho de 1998 e dezembro de 2011 foram contabilizados 9.496

focosem24UC’s federais e4.169 focosem9UC’s estaduais, totalizando13.665

focosem33UC’s.OsdadosnuméricostotaisanuaisestãodisponíveisnaFigura4.

Figura4–TotaisanuaisdefocosdecaloremUC’snordestinas.Fonte:DadosCPTEC/INPE<http://www.dpi.inpe.br/proarco/bdqueimadas/bduc.php>

Noperíodoconsiderado,observa‐seumaumentoprogressivononúmero

de focosde calor.Até2000,osvalores se situavamabaixode500; entre2001e

2006,elevaram‐separaumafaixaentre500e1000.De2006até2011,osvalores

superaramopatamarde1000,comdestaqueparaosanosde2007(2.075),2010

Page 13: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

12

(2.399)e2011(1.806).OsmaioresregistrosanuaisaconteceramnasUC’sfederais.

Em princípio pode‐se considerar que este aumento acompanhou a elevação do

númerodeáreasprotegidas,pois,comojáassinalado,32novasUC’sforamcriadas

depoisde2006.Entretanto,umaamplamaioriadefocosdecalorocorreuemUC’s

maisantigascomonoPNdasNascentesdoRioParnaíba(criadoem2002–4.770

focos), no PE do Mirador (criado em 1980 – 4.060 focos), na REBIO do Gurupi

(criado em1988 – 1.799 focos), na ESECdeUruçuí‐Una (criado em1981 – 987

focos), entre outros. Observa‐se que somente nestas 4 UC’s foram registrados

11.616 focos, equivalendo a 85,0% do universo de análise. Portanto, não é

conveniente atribuir o crescimento dos registros em função da elevação do

númeroetamanhodasáreaslegalmenteprotegidas.

Emrelaçãoaosestados(Figura5),observa‐sequeasUC’sdoMaranhãose

destacaram commaiores registros (11.182), seguido pelo Piauí (1.260) e Bahia

(1.059).Nosdemaisestados,osvaloresforammuitoreduzidos(abaixode140)ou

nãoforamdetectados(EstadodeSergipe).

Figura5–DistribuiçãoanualdosfocosdecaloremUC’sporestado.Fonte:DadosCPTEC/INPE<http://www.dpi.inpe.br/proarco/bdqueimadas/bduc.php>

AFigura6apresentaosregistrosmensaisdetodooperíododeanálise.O

gráficoevidenciaumanítidaoscilaçãosazonaldonúmerode focos,sendoqueas

menores ocorrências se deram entre os meses de outubro e abril, aumentando

0

500

1.000

1.500

2.000

2.500

3.000

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Focos de calor

AL BA CE MA PB PE PI RN SE

Page 14: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

13

fortemente no trimestre julho‐setembro. Confirmando o que já foi assinalado

anteriormente, as UC’s localizadas noMaranhão, Piauí e Bahia concentraram os

maioresregistros.

Figura6–RegistrosmensaisdefocosdecaloremUC’snordestinas(1998–2011)Fonte:DadosCPTEC/INPE<http://www.dpi.inpe.br/proarco/bdqueimadas/bduc.php>.

Preliminarmente, constata‐se que a elevação dos registros de focos de

caloracompanhaasazonalidadepluviométricaexistentenaregiãoNordeste,que

se divide em quatro mesorregiões geográficas: Zona da Mata, Sertão, Agreste e

Meio‐Norte.Ovolumetotaldechuvas,assimcomoasdemaiscondiçõesclimáticas

acompanhamasdiferenciaçõesproporcionadaspelorelevoeproximidadedacosta

litorânea.AZonadaMataéamesorregiãomais chuvosa, enquantonoSertãoas

chuvassãoirregulareseescassas,comlongosperíodosdeestiagem(mesorregião

maisinteriordoNE).OAgresteficanatransiçãoentreasduasanteriores(altodo

planaltodaBorborema)eoMeio‐Norte faz contatoentreaAmazôniaeoSertão

(estadosdoMAePI).Nestaúltimaaprecipitaçãomédiaanualpodechegara2.000

mmpróximoaolitoralnorte,decrescendoparavaloresemtornode1.500mm/ano

paranadireção lestee interior.Ao suldoEstadodoPI, asmédias sãobemmais

baixas,oscilandoos700mm/ano.

Segundo os dados de Silva et. al. (2011, p. 134‐135), com base em 600

sériespluviométricasdiárias(30anos)dosnoveestadosdaregião,aschuvasmais

intensas ocorrem entre janeiro e junho, decaindo entre julho e setembro e

0

100

200

300

400

500

600

700

800

j 1999 j 2000 j 2001 j 2002 j 2003 j 2004 j 2005 j 2006 j 2007 j 2008 j 2009 j 2010 j 2011 j

Focos de calor

AL BA CE MA PB PE PI RN SE

Page 15: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

14

voltando a crescer entre outubro e dezembro. Além dos totais mensais, as

variações foram verificadas no número de dias chuvosos, onde as médias mais

baixastambémsãoregistradasnotrimestrejulho‐setembro.

Tendo como referência as informações contidas noQuadro 2 (ilustradas

naFigura8),foramdestacadasasoitoUC’scomoosmaioresregistrosdefocosde

calor.Elasse localizamnosestadosdoMaranhão,PiauíeBahia, sendoquecinco

delas estão namesorregiãoMeio Norte, umano Agreste e duasmais ao sul, no

Sertão da Bahia. A Figura 7 destaca as informações dasmédias de pluviosidade

mensal(A)enúmerodediasdechuva(B)nosrespectivosestados.

Figura7–Médiaspluviométricas(A)enúmerodediaschuvosos(B)mensaisemtrêsestadosnordestinos.

Fonte:DadosdeSilvaetal.,2011(adaptadopeloautor)

0

50

100

150

200

250

300

350

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez

Precipitação média (mm)

(A)MA PI BA

0

5

10

15

20

jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez

Nº médio de dias chuvosos

(B)

Page 16: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

15

Em ambos os gráficos fica evidente a sazonalidade pluviométrica nos

valores totais e no número de dias de chuva no trimestre julho‐setembro.

Simultaneamenteàdiminuiçãodovolumetotalprecipitado,háreduçãodonúmero

dediasdechuva.AsinformaçõessobreoEstadodoPiauí,comparativamenteaos

demais,indicamqueoperíododeestiagemémaispronunciado.

Arelaçãoentreaestiagemeoaumentodosregistrosdefocosdecalorse

explicapeloacúmulodematériasecavegetal,aumentandoosriscosdecombustão

natural (raios) e/ou pelos incêndios (acidentais e provocados). As altas

temperaturastambémcontribuemparaelevarosriscosdecombustão,assimcomo

amaiorinsolaçãoeosventosintensos.Osefeitostendemasepronunciarnosdois

últimos meses do período de estiagem, ou seja, em agosto e setembro, fato

confirmadoemtodasasavaliaçõesanuais.

Focosdecaloreosconflitosterritoriais

OQuadro2sistematizaalgumas informaçõesdasUC’sondeaconteceram

os maiores registros de focos de calor entre 1998 e 2011. Das oito áreas

relacionadas, cinco são parques (4 federais e 1 estadual), uma REBIO (federal),

umaESEC(federal)eumaRVS(federal).Juntasperfizeram13.150focos(96,2%)

deumtotalde13.665registradosem33UC’sdaregião.Todaselastêmextensão

territorialsuperiora1.000km².

Nacolunarelativaaosfocos,observarqueforamdiscriminadososvalores

nas áreas internas e nos respectivos “buffers” que abrangem uma extensão de

cercade10km10apartirdoperímetrolegal,comexceçãodoPEdoMirador11.Os

registrossobreos focosnos“buffers”dasUC’ssão indicativosdeusos, taiscomo

pastoseagricultura,quepodeminfluirdiretaeindiretamentenointeriordasáreas

protegidas, incluindo os riscos de propagaçãode fogo. Pode‐se observar que em

10 Baseado na Resolução nº 013 de 06 de dezembro de 1990 do Conselho Nacional do MeioAmbiente(CONAMA),“Art2º‐NasáreascircundantesdasUnidadesdeConservação,numraiodedez quilômetros, qualquer atividade que possa afetar a biota, deverá ser obrigatoriamentelicenciadapeloórgãoambientalcompetente”.UmanovaResoluçãodenº428de17dedezembrode2010,revogouaResol.013/1990,passandoadefinirem3kmazonadeamortecimentoparafinsdelicenciamento.

11OsregistrosdoCPTEC/INPEnãofazemreferênciaaosfocosdecalordealgumasUC’s,comonocasodoPEdoMirador(MA).

Page 17: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

16

todas as UC’s, com exceção do PE do Mirador (dados não contabilizados pelo

CPTEC/INPE), tiveram registros de focos em suas vizinhanças, na maioria dos

casos em quantidade bem superior ao que ocorreu internamente. O PN das

Nascentes do Rio Parnaíba teve a maior quantidade de focos internamente e

também no seu entorno. O PN das Serra das Confusões teve menores valores

internos,entretantoonºdefocosnoentornofoi265%maior,indicandointensas

açõesexternas.

Quadro2–UC’scomosmaioresregistrosdefocosdecaloresíntesedosprincipaisconflitosterritoriais

NºdefocosUC’s Área(km²)

Interior Buffer*Frequência(%)** Conflitosterritoriais

PNdasNascentesdoRioParnaíba

(MA/PI/BA/TO)

7.243,21 4.770 2.979 58,0

Pecuária;fogo;desmatamentos;

extrativismodocapimdourado;caça

PEdeMirador(MA) 4.467,47 4.060 ‐‐ 54,9

Pecuária;fogo;agricultura;tráficode

animais

REBIOdoGurupi(MA) 2.711,80 1.799 1.826 41,4

Extraçãodemadeira;pecuária;agricultura;

fogo;plantiodemaconha;desmontedecarros;

assentamentos;invasões;pistolagem

ESECdeUruçuí‐Una(PI)

1.372,86 987 1.118 42,0 Caça;pecuária;fogo;agricultura

PNdaChapadadasMesas(MA) 1.599,52 473 737 61,1

Caça;extraçãodemadeira;fogo;

agricultura;pecuária;pesca;turismo

PNdaChapadaDiamantina

(BA)1.519,95 463 804 30,9

Caça;coletadeprodutosnãomadeireiros;fogo;garimpo;pecuária;

turismo

RVSdasVeredasdoOesteBaiano

(BA)

1.280,49 347 697 19,2

Extraçãodemadeira;pecuária;construçãoeoperaçãodeinfra

estrutura;fogo;caça;despejoderesíduos

PNdaSerradasConfusões(PI)

8.238,37 251 916 23,5 Turismo;invasãodeespéciesexóticas;fogo

*Faixacom,aproximadamente,10kmapartirdolimitedaUC**Relação entre o número de meses com registros de focos de calor e o total de meses demonitoramento.Fonte:DadosCPTEC/INPE<http://www.dpi.inpe.br/proarco/bdqueimadas/bduc.php>;WWF‐BRASIL–ObservatóriodeUnidadesdeConservação<http://www.observatorio.wwf.org.br>

Page 18: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

17

Osvaloresde frequência (%)apresentadosna5ªcolunadoQuadro2,se

referemaosmeses emquehouve registrode focos, independentementedo total

mensalassinalado.Opercentualfoicalculadotendocomobaseonºtotaldemeses

de monitoramento das UC’s. Quanto maior o percentual, maior é a taxa de

recorrênciadoproblema.AmaiorfrequênciafoiregistradanoPNdaChapadadas

Mesas(MA)com61,1%.Esteparqueéomaisnovodasáreasrelacionadas,tendo

sido criadoem2006 (Decreto s/nºde31/01/2006).OPNdasNascentesdoRio

Parnaíba (2002) com 58,0% e o PE do Mirador (1980) com 54,9% também se

destacarampelaaltafrequênciaderegistros.

A6ªcolunadoQuadro2apresentaumasíntesedosconflitos territoriais

maisrelevantes.Observarqueousodo fogoaparececomodenominadorcomum

emtodososcasos,emáreasinternase/ounoentornodasUC’s.Osrelatossobreo

emprego do fogo nestas áreas indicam diferentes motivações, destacando‐se: a)

manejodepastagensparalimpezadeáreaseplantiodegramíneascomerciais;b)

queimadas para supressão da vegetação original a favor de interesses de

pecuaristas e agricultores; c) queimadas por parte da população local em

represália à existência das próprias UC’s e às limitações de uso impostas pelos

órgãosambientais;d)queimadasassociadasàspráticas tradicionaisdecaça;ee)

incêndios acidentais decorrentes do turismo e circulação de pessoas no interior

das UC’s. Como já demonstrado anteriormente, as queimadas e incêndios

aumentam significativamente no trimestre de maior estiagem (julho‐setembro).

Em 2007, por exemplo, não foi registrado um únicomm de chuva entremaio e

setembronaEstaçãodePluviométricadeBalsas/MA12,localizadanaregiãocentral

do Estado. Isto pode ter contribuído decisivamente na elevação dos registros de

focos de calor. Nos anos de 2010 e 2011, o número de focos também foimuito

elevado(Figuras5e6)paralelamenteaausênciatotaldechuvaspor2e3meses,

respectivamente.

Asuscetibilidadeaosincêndiosemfunçãodaestiageméapenasumfator

quecontribuiparaelevarosriscosdesuaocorrência.Deve‐sedestacartambéma

faltadeaçõesgovernamentaisnocampodagestãoterritorialdasáreasprotegidas. 12DadosAgênciaNacionaldeÁguas(ANA)<http://hidroweb.ana.gov.br/>

Page 19: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

18

Todas as UC’s relatadas no Quadro 2 apresentam problemas de consolidação

territorial, tais como: a) o desconhecimento por parte dos gestores públicos da

realidade fundiária; b) a falta de políticas públicas e recursos para promover

desapropriações; e c) deficiências orçamentárias e administrativas para

fiscalizaçãoeprevençãodeaçõesimpactantes,incluindoaproblemáticadofogo.A

resultante desta escassez traz implicações diretas nos conflitos com populações

que vivem tradicionalmente nas áreas (interior e entorno), além de invasões,

grilagens,açõesespeculativas,insegurançaeoportunismopolítico.

Grandes projetos de características fortemente expansionistas, como no

caso do agronegócio da soja, podem contribuir nos impactos das UC’s. Das oito

áreas protegidas relacionadas no Quadro 2, cinco estão localizadas numa região

sob forte influência deprocessos de expansão populacional e do agronegócioda

soja(PNdaChapadasMesas,ESECdeUruçuí‐Una,PNdaSerradasConfusões,PN

dasNascentesdoRioParnaíbaePEdoMirador),conformemostradonaFigura8.

Elas estão situadas exatamente na linha de expansão denominada por

determinados autores como “arco de fogo” e “arco do desmatamento” (Becker,

2005;Ferreiraetal.,2005).

UmadasUC’semsituaçãomaiscríticaéaREBIOdoGurupi,situadaaoeste

doMaranhãoepróximoàdivisacomoEstadodoPará,sendoconsideradaumadas

últimas áreas remanescentes da Floresta Amazônica Maranhense. Segundo

avaliação feita pela ONG Conservação Internacional Brasil, ostenta o título de

“unidadedeconservaçãoempiorsituaçãodoBrasil”,pois,desdeasuacriaçãoem

1988, enfrenta problemas com a extração ilegal demadeiras, invasões, pecuária,

agriculturaefogo.TaisproblemassãocomunsàsdemaisUC’s,entretantohádese

destacarasações criminosas sobo signodapistolagem(plantiodemaconhaeo

desmonte de carros, entre outras). Os assentamentos promovidos pelo governo

estadual na área da REBIO federal, também indicam o descompasso na gestão

territorialdaUC.

Em todas as UC’s avaliadas neste estudo, assim como acontece

nacionalmente,existemconflitosterritoriaisdesdeasuaorigem.Acondiçãolegal

deterritóriodeconservaçãodanaturezarestringiuatividadestradicionaise/ouse

defrontou com frentes de expansão da pecuária e agricultura, muitas vezes

Page 20: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

19

viabilizadas pela abertura e pavimentação de estradas. Neste contexto, as

autoridades ambientais não conseguem proteger, com a eficiência desejada, os

limites territoriaisdasUC’s.Osconflitossão indicativosda ineficiênciae/oufalta

de interesse político dos governos na consolidação das áreas de conservação do

patrimônionatural.

Figura8‐PosicionamentodasUC’snordestinascommaioresregistrosdefocosdecalor

CONCLUSÕES

A região do Nordeste brasileiro é dotada de importantes atributos

naturais,particularmentepelapresençadosbiomasdaCaatinga eCerrado, além

daspaisagensdaFlorestaAmazônicaedos remanescentesdeMataAtlântica. As

zonas litorâneas e seus ecossistemas associados têm papel preponderante no

crescimento e consolidação do turismo, tornando a região uma importante

referência de atratividade em escala nacional e internacional. Desse modo,

acreditamos na importância de se investir em políticas públicas associadas à

criação e gestão de áreas protegidas, enquanto estratégia de desenvolvimento

socialeconservaçãodanatureza.

Legenda: 1 – PN das Nascentes do Rio Parnaíba 2 – PE do Mirador 3 – REBIO do Gurupi 4 – ESEC Uruçuí-Una 5 – PN da Chapada das Mesas 6 – PN da Chapada Diamantina 7 – RVS Veredas do Oeste Baiano 8 – PN das Serra das Confusões

Page 21: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

20

O presente estudo tem a pretensão de contribuir na avaliação sobre as

grandes áreas protegidas doNordeste, que estão sofrendo impactos decorrentes

da falta de atenção e investimentos para sua consolidação territorial. Emoutras

palavras, não adianta apenas criá‐las, mas é preciso dar a devida prioridade

política ao tema. A utilização dos registros de focos de calor deve ser entendida

comouma estratégia auxiliar de avaliação dos conflitos territoriais, tendo como

base séries temporais obtidas a partir do ano de 1998. Estes registros não nos

capacitam a ter plena certeza sobre a ocorrência dos incêndios e nem sobre a

extensãodosprejuízos.OssatélitesesensoresdereferênciadoINPEsãoeficientes

na detecção de médios e grandes eventos, entretanto, eles não conseguem

identificar os focos de calor num contexto de resolução espacial inferior a 1 km

(PANTOJAeBROWN,2007;PIROMALetal.,2008;TOMZHINSKILetal.,2011).Para

avaliaçõesemáreasmenores,comonocasodeUC’smunicipais,serãonecessários

outrosmétodoserecursosdemonitoramentodosfocosdecalor.

Baseadonosestudossobrefocosdecalorproduzidosemescalanacional,

pode‐seafirmarquediversasUC’saquicitadas,comooPNdasNascentesdoRio

Parnaíba,aREBIOdoGurupi,aESECUruçuí‐Una,oPNdaChapadadasMesas,oPN

daChapadaDiamantinaeoPEdoMirador,aparecemcomdestaquenorankingdas

que mais queimaram ao longo da última década. Os números apresentados se

igualam e, às vezes, superam os valores registrados em UC’s de outras regiões

intensamenteimpactadasnoCentro‐Oeste(MTeTO)enoNorte(PA,TOeRO)13.

O incremento dos focos de calor em UC’s acompanhou a sazonalidade

climática,comumnúmerosubstancialmentemaiornoperíodoquevaidejunhoa

setembro.Agostoesetembrosãoosmesescommaiorregistrodefocos.Até2005o

nº totalde focosanuaisera inferiora1.000, superandoestepatamarapartirde

2006. Os anos de 2007, 2010 e 2011 apresentaram a maior quantidade de

registros, sempre acima de 1.800. Portanto, o problema do fogo nas UC’s

nordestinas,assimcomoemmuitasoutraspeloBrasil,vemseagravandoaolongo

dosúltimosanos.MesmotendoconhecimentodequeforamcriadasnovasUC’s,a

13DadosdisponíveisemartigoenviadoparaoVIICongressoBrasileirodeUnidadesdeConservação(Vallejo, L.R, 2012 ‐ Avaliação geográfica dos incêndios em unidades de proteção integral noBrasil‐1998‐2011)Noprelo.

Page 22: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

21

maiorpartedos focosocorreuemáreasmaisantigas.A influênciaclimáticapode

tercontribuídopara isso,assimcomoa intensificaçãodosconflitos territoriais.A

avaliaçãodopesodecadaumadessasvariáveisprecisa ser investigadade forma

mais particularizada, já que o presente estudo apresenta uma visão geral do

problema.

AsUC’sdos estadosdoMA,PI eBA registraramosmaioresnúmerosde

focos de calor. Entre as causas que antecederam a ocorrência dos incêndios, a

precariedade da gestão territorial nas unidades criadas deve ser destacada. Sem

consolidaçãopelosgovernos,asUC’sconvivemcomafaltaregularizaçãofundiária,

fiscalização e outros investimentos de controle do território. Entende‐se que os

conflitos associados às práticas agrícolas, pastagens, exploração de recursos

vegetais e animais, turismo descontrolado, entre outros, resultam da falta de

comprometimentogovernamentalnoestabelecimentodaterritorialidadenasUC’s.

Dessa forma, o emprego do fogo nas suas diversas formas de motivação

(criminosa, expansionista ou prática cultural) deve ser considerado como um

elementoindicadordosconflitos.

Parafinalizar,destaca‐sequeem1989foiimplantadooSistemaNacional

dePrevençãoeCombateaosIncêndiosFlorestais–PREVFOGO(Decreto97.635de

10/04/1989eregulamentadopeloDecreto2.661de08/07/1998).OPREVFOGO

atua em treinamento e divulgação da queima controlada, na orientação às UC’s

paraaimplantaçãodeplanosdemanejodefogoepromovecampanhaseducativas

visando à conscientização das populações rurais e urbanas sobre os riscos e

problemas provocados pelos incêndios florestais. A efetividade das ações do

PREVFOGOjuntoàsUC’s,mesmotendoevoluídonoperíodode2000a2010,ainda

carecedeinvestimentosquemelhoremascondiçõesoperacionais(Vallejo,2010,p.

194).JáexistembrigadasdeincêndioqueatendemdeterminadasUC’sdoNordeste

(PNdasNascentesdoRioParnaíba,PNdaChapadadasMesaseESECdeUruçuí‐

Una).Entretanto,agrandeextensãodasáreasaliadaàsdificuldadesoperacionais,

aindadificultamaprevençãoeocombatediretoaosincêndiosdemaiorproporção.

Dessemodo,espera‐sequeasinformaçõesapresentadasestimulemainda

mais o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema e ampliem a consciência

pública, em geral. É urgente empreender esforços por ações político‐

Page 23: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

UMA AVALIAÇÃO SOBRE OS FOCOS DE CALOR E OS CONFLITOS TERRITORIAIS EM ÁREAS PROTEGIDAS DO NORDESTE BRASILEIRO (1998‐2011) 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

22

administrativas coerentes e necessárias à proteção do patrimônio natural

nordestinoebrasileiro.

REFERÊNCIAS

BECKER, Bertha Koiffmann – Geopolítica da Amazônia. Estudos Avançados, SãoPaulo,v.19,n.53,p.71‐86,2005.

CPTEC/INPE – Monitoramento de focos de queimadas. Disponível em:<http://www.dpi.inpe.br/proarco/bdqueimadas/bduc.php>

FERREIRA, Daniel Assumpção Costa; TRANCOSO, Ralph; NOGUERA, SantiagoPalácios eCARNEIROFILHO,Arnaldo ‐Ouso dos focosde calor imageadospelosatélite NOAA‐AVHRR para identificação das áreas em processo dedesflorestamento. ANAIS XII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SENSORIAMENTOREMOTO,Goiânia,Brasil,16‐21abril2005,INPE,p.2145‐2152.

FERREIRA, Leandro Valle; VENTICINQUE, Eduardo; ALMEIDA, Samuel. Odesmatamento na Amazônia e a importância das áreas protegidas. EstudosAvançados,SãoPaulo,v.19,n.53,2005.

FREITAS, Saulo R.; LONGO, Karla M.; DIAS, M. A. F. SILVA e DIAS, P. L. SILVA ‐EmissõesdequeimadasemecossistemasdaAméricadoSul.EstudosAvançados,SãoPaulo,v.19,n.53,p.167‐185,2005.

INDRIUNAS,Luís ‐ "HowStuffWorks ‐Como funcionamasqueimadas".Publicadoem 02/10/2008. Disponível em:<http://ambiente.hsw.uol.com.br/queimadas.htm>Acessoem16/05/2011

KLINK, CarlosA. eMACHADO,RicardoB. ‐ A conservação do CerradoBrasileiro.Megadiversidade,2005,Volume1,nº1:147‐155.

MMA/SecretariadeBiodiversidadeeFlorestas‐CadastroNacionaldeUnidadesdeConservação. Disponível em:http://www.mma.gov.br/sitio/index.php?ido=conteudo.montaeidEstrutura=119

MMA/IBAMA‐Planooperativodeprevençãoecombateaos incêndios florestaisdoParqueNacionaldasNascentesdoRioParnaíbaSituaçãoFundiária.Setembrode 2007. Disponível em: <www.ibama.gov.br/phocadownload/category/44‐p?download=2345>.Acessoem15/05/2012

_____________‐Planooperativodeprevençãoecombateaos incêndios florestaisnoParque Nacional da Chapada das Mesas – MA. Março/2007. Disponível em: <

Page 24: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

VALLEJO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 

23

http://www.ibama.gov.br/phocadownload/prevfogo/plano_operativo_parna_da_chapada_das_mesas.pdf>Acessoem15/05/2012

______________‐PlanooperativodeprevençãoecombateaosincêndiosflorestaisdaEstação Ecológica de Uruçuí‐Una – PI. Outubro de 2006. Disponível em: <www.ibama.gov.br/phocadownload/category/44‐p?download=2343 > Acesso em15/05/2012

PANTOJA, Nara Vidal e BROWN, Irving Foster ‐ Acurácia dos sensores AVHRR,GOES e MODIS na detecção de incêndios florestais e queimadas a partir deobservaçõesaéreasnoestadodoAcre,Brasil. ANAISXIII SIMPÓSIOBRASILEIRODE SENSORIAMENTO REMOTO, Florianópolis, Brasil, 2007, 21‐26 abril, INPE, p.4501‐4508.

PIROMAL, Rodrigo Alexandre Sbravatti; RIVERA‐LOMBARDI, Roberto Javier;SHIMABUKURO, Yosio Edemir; FORMAGGIO, Antonio Roberto e KRUG, Thelma ‐Utilização de dados MODIS para a detecção de queimadas na Amazônia – ActaAmazônica,v.38,n.1,2008.

SILVA,Vicente P.R.da; PEREIRA,EmersonR. R.;AZEVEDO,PedroV.de; SOUSA,FranciscodeA.S.deeSOUSA,InajáF.de‐Análisedapluviometriaediaschuvososna região Nordeste do Brasil. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola eAmbiental,2011,v.15,n.2,CampinaGrande,PB.p.131–138,

TOMZHINSKIL, Gustavo Wanderley; COURA, Pedro Henrique Ferreira eFERNANDES, Manoel do Couto ‐ Avaliação da detecção de focos de calor porSensoriamento Remoto para o Parque Nacional do Itatiaia. BiodiversidadeBrasileira,2011,anoI,Nº2,201‐211

VALLEJO,LuizRenato‐Adimensãopolíticadaconservaçãoambientalnocentro‐oeste brasileiro. In: Carlos Alberto Franco da Silva e Luciano Bomfim doNascimento.(Org.).Redespolíticasdoagronegóciodasoja:interesse,estratégiaeresistências.1ªed.RiodeJaneiro:LivreExpressão,2010,v.1,p.167‐199.

________________ ‐ Unidades de Conservação: uma discussão teórica à luz dosconceitos de território e políticas públicas. GEOgraphia,2002, Vol. 4, No 8.Disponível em:<http://www.uff.br/geographia/ojs/index.php/geographia/article/view/88>

WWF‐BRASIL – Observatório de Unidades de Conservação. Disponível em:<http://www.observatorio.wwf.org.br>.

Page 25: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO EPARTICIPAÇÃODOS STAKEHOLDERSDO TURISMONO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO,ESTADODEALAGOAS,BRASIL 

 Artigo recebido em: 21/04/12  Revisado em: 25/05/12 Aprovado em: 10/06/12 

    

Andersson Pontes Barbosa¹ 

 

                  

¹ Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia [email protected]    

      Correspondência:  Andersson Pontes Barbosa  Av. 1º de Maio, 720, Jaguaribe, João Pessoa, Paraíba, Brasil CEP: 58.015‐430    

RESUMOA participação de stakeholders no planejamento turístico tende atrazer benefícios para todos os envolvidos. Omunicípio de Barra deSanto Antônio, localizado a aproximadamente 45 km de Maceió, nolitoral norte alagoano, é um lugar conhecido turisticamente a pelomenos duas décadas. Em geral o crescimento do turismo na zonacosteira nordestina tem sido alvo de preocupação entre estudiosos,organizaçõesnãogovernamentais,emembrosdaprópriacomunidade,devido ao vários tipos de impactos ambientais que a atividade temcausado na região. Como uma das formas de evitar taisproblemas econtribuirparaodesenvolvimentosustentáveldoslugaresturísticos,ogoverno federal criou diversas políticas públicas, nas quais aparticipaçãodacomunidadenoplanejamentoturísticoéumprincípioa ser observado. A metodologia deste estudo incluiu revisão deliteratura,levantamentofotográfico,entrevistasabertaseentrevistadegrupofocal,incluindodiversosstakeholderslocaisdodesenvolvimentoturístico.OestudoconcluiqueoturismotemsedesenvolvidoemBarrade Santo Antônio de forma espontânea, e que não há participaçãosignificativados stakeholders locaisnoprocessodeplanejamentodoturismo.Palavras‐chave:Turismo,participação,desenvolvimentolocal.

TOURISTIFICATION, PARTICIPATION ANDDEVELOPMENTOFSTAKEHOLDERSINTOURISMTHEBARRA DE SANTO ANTÔNIO, ALAGOAS STATE,BRAZILABSTRACTStakeholder participation in tourism planning brings benefits to allinvolved.BarradeSantoAntônio,whichislocatedatapproximately45kmfromMaceió,ontheAlagoasnorthcoast,isatouristplaceknownassuchforatleasttwodecades.Ingeneral,tourismgrowthonthecoastof the Brazil’s northeast region has been amatter of concern amongscholars, non‐governmental organizations, and members of thecommunities, given the severe environmental impacts tourism hascausedintheregion.Inordertoavoidtheseproblemsandcontributeto sustainable development, the federal government enacted severalpublic policies in which community participation is a planningprinciple.Thestudymethodsincludedliteraturereview,photographicsurvey,open interviews,and focalgroup interviewwithdiverse localtourismstakeholders.ThestudyconcludesthattourismhasdevelopedinBarradeSantoAntônioinaspontaneousway,andthattherehasnotbeenanysignificantparticipationoflocalstakeholdersintheplanningprocessoftourism.Keywords:Tourism,stakeholders,participation,localdevelopment.

    

Page 26: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

26

INTRODUÇÃO

Oturismoéumdossetoresdaeconomiaquemaiscrescenaatualidade,já

tendo atingido o status de uma das principais atividades socioeconômicas no

mundo, e vem superando setores tradicionais como a indústria automobilística,

eletrônicaeapetrolífera.DeacordocomdadosdoConselhoMundialdeViagense

Turismo (WTTC), o turismomovimenta cerca de US$ 3,4 trilhões (10% do PIB

mundial)eemprega204milhõesdepessoas(10%daforçadetrabalhoglobal).O

turismo possui um número muito grande de outras atividades que direta ou

indiretamenteseconectamàsuacadeiaprodutiva(DIAS,2003,p.9).

As atividades turísticas têm se diversificado com o passar do tempo,

tendo‐setornadocadavezmaisimportanteparapaíses,regiõesemunicípiosonde

essaatividadeseinsere.Emmuitospaísesoturismosetornouumaalternativade

desenvolvimento(ARAÚJO,2009).EsseéocasodoBrasilqueem2003criouum

ministério exclusivamente para cuidar do setor turístico do país. O Brasil conta

hoje com grande número de políticas voltadas para explorar o turismo

economicamenteeparacontribuircomodesenvolvimentolocal.

Entretanto,quandoaatividadesedesenvolvedeformaespontânea,istoé,

sem planejamento, frequentemente o turismo causa muitos problemas

socioambientais. Alternativamente, o turismopode ser planejado para ser usado

como uma alternativa de desenvolvimento, buscando‐se tirar o máximo de

benefíciosparaoslugaresenvolvidos.

Entre vários aspectos relacionados ao planejamento do turismo, a

participaçãodestakeholders1noprocessodeplanejamentopodeajudararedefinir

a identidade local, fazendo com que possam existir perspectivas reais de

desenvolvimento, criando, assim, de forma positiva, o comprometimento dos

atores envolvidos nas destinações turísticas (DIAS, 2003). O processo de

participação de stakeholders no planejamento turístico pode trazer muitos

aspectos positivos em relação à forma pela qual uma destinação turística se

desenvolve,contribuindoparaamelhoriadaqualidadedevidadosresidentes.

1 De acordo com FREEMAN (1984) “stakeholders são elementos essenciais ao planejamento estratégico de negócios”.  

Page 27: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

27

Por exemplo, a participação pode proporcionar benefícios para as

comunidades envolvidas a exemplo do controle e gestão dos seus recursos

(naturais, sociais, culturais e ambientais), muitas vezes explorados de forma

irracional ou sem levar em conta os interesses de todos os stakeholders

relacionados a tais recursos, mais precisamente representantes da própria

comunidadelocal.

No estado de Alagoas nas ultimas décadas o turismo vem ganhando

bastante espaço, crescendo de forma abrangente e acelerada, principalmente na

zonacosteira,aondevemcausandoproblemasambientaisesociais.

Adestinaçãovempassandoporumprocessodeturistificação,oqualjáse

estende por mais ou menos três décadas. Há localmente uma variedade de

stakeholders que de forma direta ou indireta estão relacionados ao

desenvolvimento turístico local. Entretanto, há uma separação entre esses

stakeholders no que diz respeito ao planejamento turístico local, com grupos

economicamentemaisfortestomandodecisõesdeformaindependentedosdemais

stakeholders.

Considerando os estudos relacionados à falta de planejamento e gestão

nasdestinaçõesnoestadodeAlagoas,esteprojetodepesquisatevecomoobjetivo

estudaroprocessodeparticipaçãodosstakeholders locaisnomunicípiodebarra

deSantoAntônio.

AdestinaçãoturísticaBarradeSantoAntônio

OmunicípiodeBarradeSantoAntônio(Figura1)estálocalizadonolitoral

nortedeAlagoasaaproximadamente45kmdeMaceió,àsmargensda fozdorio

SantoAntônio,limitando‐seaoNortecomosMunicípiosdeSãoLuizdoQuitundee

PassodoCamaragibe,aoSulcomomunicípiodeParipueira,aolestecomooceano

AtlânticoeaoOestecomomunicípioMaceió.

ConformedadosdoInstitutoBrasileirodeGeografiaeEstatística(IBGE),a

áreadomunicípiodeBarradeSantoAntônioéde137,98km²,inseridanaMeso‐

RegiãodoLesteAlagoanoenaMicro‐RegiãodeMaceió.Asededomunicípioestá

localizada a uma altitude média de aproximadamente 10m, na coordenada

Page 28: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

28

geográfica 09º24’18” de latitude sul e 35º30‟25,2” de longitude oeste ‐

coordenadas de centro. O acesso ao município se dá a partir de Maceió, pela

rodoviaAL‐101‐Norte.

Figura 1. Município de Barra de Santo Antônio (Fonte: Laboratório deGeoprocessamentoAplicado–LGA/UFAL).

Page 29: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

29

MATERIAISEMÉTODOS

A pesquisa teve como principal objetivo estudar se há participação no

planejamento turístico em Barra de Santo Antônio, compreendendo como o

processo ocorre na prática. Foram realizadas cinco visitas ao município,

inicialmente com o objetivo de familiarização com a área. As visitas de campo

também tiveram como objetivo a realização de levantamento fotográfico,

identificação dos stakeholders locais da atividade turística e a realização de

entrevistasabertas.

Durante as visitas de campo se informou às pessoas contatadas sobre a

futurarealizaçãodeumareuniãodegrupofocalnacomunidadeparaaqualforam

convidados a participar. As entrevistas abertas foram realizadas com nove

stakeholders, a saber: Secretário Municipal de Saúde, Secretário Municipal de

Turismo,RestauranteEstrelaAzul,ColôniadePescadores (Z‐14),Associaçãodos

Jangadeiros,BardoPiu,EscoladeEnsinoFundamental7deSetembro,Restaurante

AlmiranteAraújoeumresidenteantigo.

Na reunião deGrupoFocal participaram stakeholders consideradosmais

relevantesparaosobjetivosdoestudo, tendosidoconvidadososqueseseguem:

ColôniadosPescadores,AssociaçãodosJangadeiros,BardoPiu,DiretoradaEscola

deEnsinoFundamental7deSetembro,eumamoradora.Adotou‐seprocedimento

qualitativodeanálisedosdados,priorizando‐seosdadoseinformaçõesrelevantes

paraaosobjetivosdapesquisa.

RESULTADOSEDISCUSSÃO

Ausênciadopoderpúblico edeparticipaçãonoplanejamento turísticodeBarradeSantoAntônio

OturismonomunicípiodeBarradeSantoAntôniovemsedesenvolvendo

unicamentecombasenassuascaracterísticasnaturais(praias,sol,mar,rioSanto

Antônio,manguezais,piscinasnaturaisefalésias).Esseconjuntodecaracterísticas

naturaisatrainãosóturistasbrasileiros,mastambémturistasestrangeiros.

Page 30: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

30

Naopiniãodosentrevistados,houveumareduçãono fluxode turistasa

Barra de Santo Antônio nos últimos anos. Provavelmente, esse fenômeno é

resultado de vários problemas, dentre os quais podem ser citados: falta de

investimentosporpartedopoderpúblicoedainiciativaprivada,deficiênciasnos

meiosdetransporteatéomunicípioedecirculaçãonolugar,erosãocosteira,falta

deinfra‐estruturadesaneamento(especialmentelixoeesgoto),edeterioraçãoou

sub‐utilizaçãodemeiosdehospedagem(Figura2).

Figura2–ProblemasapresentadosnomunicípiodeBarradeSantoAntônio: (a)Esgoto a céu aberto, proveniente da falta de saneamento básico, (b) Erosãomarinha provocada por construções irregulares, (c) Meio de hospedagem paraalugar defasados por falta de investimentos e parcerias entre poder público einiciativa privada, e (d) Estradas sempavimentação, dificultando a circulação deresidenteseturistas.(Fonte:LTTD/IGDEMA/UFAL–04/04/2009.Autor:LindembergMedeirodeAraújo)

Outro fator importantenessesentidoéa faltade iniciativasporpartedo

poderpúblicolocalemrelaçãoaoplanejamentoturísticoeafaltadeparticipação

dos stakeholders locais no planejamento turístico, que ocorre basicamente com

baseemaçõesdainiciativaprivada,eaausênciadeparceriasentreosstakeholders

locais.

a

c d

b

Page 31: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

31

É preciso haver um envolvimento direto dos gestores públicos no

planejamento e gestão do turismo, de tal forma que ele possa ter alguma

possibilidade de contribuir para o desenvolvimento em Barra de Santo Antônio.

Isto é fundamental para que o turismo contribua efetivamente para o

desenvolvimento,articulando‐seaoconjuntodaeconomia.Atravésdareuniãocom

osstakeholderspresentesnessemunicípiooturismonãocontacomainiciativado

poderpúblicolocalparaoplanejamentoturístico,quersejacomparticipação,quer

sejadeformaindividual,ouinvestimentosfinanceiros.

Nessesentido,umexemploligadoàscaracterísticasnaturaisdomunicípio

écitadoporumdosparticipantesdareuniãodegrupofocal,arespeitodaspiscinas

naturaisexistentesnomunicípioeque,navisão,nãosãoexploradaspeloturismo,

segundooentrevistadoporfaltadeiniciativadopoderpúblico.Esseparticipante

dogrupofocalafirmou:“Nuncafoiexploradaapiscina;quemvaiéopessoaldaqui

mesmo,(21/05/2009)”.

Dessemodo,oturistavemaomunicípio,masnãosabeoqueodestinotem

aoferecer (comexceçãodos turistasquevêmatravésdeagênciasdeviagens).A

faltade infraestruturaedeopçõesde lugaresaseremfrequentadossãotambém

aspectos falhos no município. Investimentos nesses aspectos poderiam trazer

melhorias para a própria rede de bares, restaurantes, pousadas meios de

hospedagemlocais.

Verificou‐sequeinvestimentosprivadosqueforamrealizadosnopassado

vêm diminuindo. Muita gente está indo embora por falta de melhorias na

infraestrutura,deficiênciasnasegurançapúblicaeporcausadaerosãomarinha,o

quetemprovocadodestruiçãoeperdasparaosmoradoresquepossuemcasasno

local.Nãohouvecontrolenaocupaçãodoespaçolitorâneo,nãoserespeitandoas

áreas próximas ao mar, tendo‐se construído nos Terrenos de Marinha, sem

qualquerformadeplanejamento.

Seguetranscritaaopiniãodeummoradorarespeitodesseproblema:

Opessoal tãovendoaBarramuitoparada,nãotemaquelemovimento que tinha. Talvez daqui pra frente ela semovimente, mas com essa parada que deu por causa da

Page 32: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

32

administraçãopassada,opovobotouacasapravender,temmuitagenteindoembora,(21/05/2009).

Os problemas ambientais ocorrem por todo o município. Outro ponto

abordado pelos moradores na entrevista foi à falta de opções de lazer para o

turistaeoprópriomorador.

Comooplanejamentoturísticoadotadonomunicípioexisteapreocupação

porpartedosgestoresdequeoresidentesejaalvodosinvestimentosrelacionados

àdestinação,ouseja,comodefendeYázigi(1999),aocomentarsobreapreparação

doslugaresquepretendeminvestirnasatividadesturísticas.

A opção de lazer no município inclui durante o dia, a exploração das

belezasnaturais.Ànoite, entretanto,nãoexistequalquer formadedivertimento,

como, por exemplo, casas noturnas, shows e lugares para recreação. A eventual

existência de opções relacionadas a esses itens seria importante para fazer com

que o turista visitasse o município e permanecesse por mais tempo no lugar,

contribuindo assim para o desenvolvimento local, especialmente através da

geraçãodeempregoerenda,alémdemovimentaraeconomiadomunicípio.

O turismo ganha grande visibilidade em Barra de Santo Antônio apenas

durante o período de carnaval, quando a cidade é ‘invadida’ por milhares de

pessoas à procura de diversão. Por outro lado, esse evento tira o sossego dos

moradores. Dois participantes do grupo focal mostraram sua indignação em

relaçãoaesseproblema:

Carnaval aqui, como eu gostaria que fosse tranquilo. Se aBarra pudesse, ela gritava: ‐ “Tira esse povo daqui”,(21/05/2009).Elesachamquepagamcaroporumacasa,botamosomnasua porta e fica de seis da manhã até o outro dia,(21/05/2009).

Essetipode fenômenoestáemparteassociadoaochamado“turismode

segunda residência” que é definido por Tulik (2000, p.196), “Como alojamentos

turísticos particulares, utilizados temporariamente, nos momentos de lazer, por

Page 33: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

33

pessoasquetêmseudomíniopermanenteemoutro lugar[...]”.Dessemodo,esse

tipo de turismo, que predomina na alta estação nomunicípio, se desenvolve no

município semnenhumestudoapropriadoouplanejamento, visandoestabelecer

condiçõesderelacionamentoentreosvisitanteseosmoradores,oquemaisuma

vez fornece indíciosdaausênciadeparticipaçãonadefiniçãodecomoexploraro

turismo no município. Caso houvesse a participação dos stakeholders locais no

planejamentoegestãodoturismo,problemascomoessepoderiamserenfrentados

deformamaisadequada.

O grande afluxo de visitantes a um lugar turístico em determinados

períodos do ano é um fenômeno comum à maior parte dos lugares turísticos.

Normalmente,issoocorreduranteaaltatemporada,quandoapopulaçãovisitante

pode superar em número a população residente, um fenômeno previsto pelo

modelo de Butler (apud ARAUJO; MOURA, 2007), denominado Ciclo de Vida da

ÁreaTurística(CVAT),(Figura3).

Figura3.CiclodeVidadaÁreaTurística.Butler(ARAUJOeMOURA,2007).

Page 34: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

34

Segundo essemodelo,os lugares turísticos surgem e evoluempassando

por cindo fases ou estágios evolutivos: exploração, envolvimento,

desenvolvimento,consolidaçãoeestagnação,apartirdoqualolugarpodeentrar

em declínio ou passar por um rejuvenescimento, isto é, o número de turistas

voltariaacrescer.DeacordocomoCVAT,quandoolugaratingeafasedenominada

“desenvolvimento”,onúmerodeturistasultrapassaapopulaçãoresidentedurante

aaltatemporada.Nocasoemquestão–BarradeSantoAntônio–,assimcomoem

outras cidades do litoral alagoano,o Carnaval caracteriza umperíodo de grande

concentraçãodepessoas,semelhanteàaltaestação.

Aplicando‐seomodelodeButleraomunicípiodeBarradeSantoAntônio,

pode‐sesugerirqueograndeafluxodevisitantesaesselugarduranteocarnavalé

semelhanteaoqueocorreriadurantea fase “Desenvolvimento”.Excetuando‐seo

períododealta temporadaeo carnaval, levando‐seemconsideraçãoasopiniões

dos participantes do grupo focal de uma forma geral Barra de Santo Antônio

encontra‐senafasede“Estagnação”.Porexemplo,essemunicípionãotemmaiso

glamour de alguns anos atrás, não atrai mais tantos turistas como em anos

anterioreseapresentasériosproblemasambientais,sociaiseeconômicos.

Alémdisso,levando‐seemconsideraçãocomentárioscolhidosduranteas

entrevistasabertasenogrupofocal,pode‐selevantarahipótesedequeBarrade

SantoAntônioapresentatambémsinaisdepós‐estagnação,ouseja,areduçãono

fluxo turístico e a existência de um grande número de imóveis – geralmente

segunda residência – à venda. Os entrevistados identificaram dois aspectos

explicativos desse problema, ou seja, o avanço da erosão marinha, destruindo

casaseoutrasemrisco;eproblemasdefaltadesegurança,oqual,navisãodeles,

tenderáaseagravarcomoresultadodaconstruçãodeumapontesobreorioSanto

Antônio,ligandoaparteantigadacidadeàáreamaisrecente,aIlhadaCrôa.Eles

acreditamqueafacilidadedeacessocomaponte,atrairámaiscriminososaolugar,

prostituiçãoepoluição.

Podemos destacar a opinião de alguns moradores a respeito da

construçãodessaponte(Figura4).

Page 35: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

35

Figura4–PonteemconstruçãonomunicípiodeBarradeSantoAntônio.Fonte:LTTD/IGDEMA/UFAL–14/11/2008.Autor:LindembergMedeirodeAraújo.

EupreferiaaBarra com trêsbalsasboase comcanoasdoqueaponte.

Também se dependesse de mim, essa ponte não existirianão. Teria melhorias pra comunidade, vai trazer renda,emprego, mas também com ela vai vir o crescimento daprostituição,aumentonoíndicededrogaepoluição.

Como não se encontrou evidências de participação da comunidade no

planejamento ou gestão do turismo em Barra de Santo Antônio, constatando‐se

umagrandeausênciadopoderpúblicoemrelaçãoàquestão,verifica‐sequenão

existeumambienteinstitucionalouorganizacionalquepermitaqueacomunidade

expresseseuspontosdevistaemrelaçãoacomooturismodevasedesenvolverno

município, o que limita muito as possibilidades de o turismo contribuir para o

desenvolvimentolocal.

Page 36: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

36

Os dados coletados para este trabalho não foram suficientes para uma

análisedoprocessodeturistificaçãodomunicípiodeBarradeSantoAntônio,isto

é, quais os acontecimentos e como eles se sucederam ao longo do tempo, até os

diasatuais,caracterizandocadaestágiodoseuCVAT.Assim,aanálisedofenômeno

daparticipaçãonoplanejamentoturísticonessemunicípiofoirealizadacombase

nos comentários colhidos durantes as entrevistas abertas e na reunião de grupo

focal.Ficouclaroquedeumaformageralnãohouveenvolvimentodacomunidade,

sejanoplanejamentoounagestãodoturismonessemunicípioaolongodotempo,

comoturismoocorrendobasicamentedeformaespontânea.

Entretanto, os participantes do grupo focal informaram que as ações de

recuperaçãodoHotelCaptainNikolas2, localizadona restingada sedemunicipal,

antes dele ser arrendado, envolveu discussões com a comunidade. Entretanto,

essas discussões surgiram com base na ação de membros da comunidade

(pescadores)quequestionaramcertosaspectosdoprojeto,aspectoqueéilustrado

pelatranscriçãoabaixo:

Aquele hotel ali, na verdade, ele ia modificar muito aquestãodomeioambiente.Logonocomeço, foiumabrigamuitograndequeagentepegoucomessepessoal,queelesiamfechartodaaquelapraiaondepertenceaesseCapitão.Aí a gente entrou na questão, discutimos com ele sobre aquestãodapesca.Emeles fecharemaquilo tudodeestaca,ospescadoresiamparardepescarporali,indomodificaromeioambiente.

Esseeventomostraumapré‐disposiçãoda comunidade (pescadores)de

lutar por seus interesses, com base na sua auto‐mobilização. Outro fato

interessante relacionado à mobilização da comunidade de pescadores frente a

açõesassociadasaoturismonomunicípiodeBarradeSantoAntôniodizrespeitoa

umprojetovisandoaimplantaçãodeumresort,nafazendaMorrosdeCamaragibe,

localizadanasproximidadesdafozdorioCamaragibe,aaproximadamente13km 2 O Hotel Captain Nikolas, inicialmente de propriedade de um grego, e que havia fechado, foi adquirido por outro grupo, que o re‐abriu com o nome D’Aldeia Village Hotel. 

Page 37: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

37

dasedemunicipal,nosentidonordeste.Aosaberemquehaveriaumareuniãocom

osórgãosambientaisparadiscutiroprojetodesseresort,reuniãoessaparaaqual

os pescadores não foram convidados, eles se mobilizaram e conseguiram a

participaçãodeumrepresentantedeles.Osentrevistadosinformaram,nareunião

de grupo focal, que eles sugeriram a realização de uma audiência pública com

ampla participação dos pescadores, pleito que foi atendido. Informaram que

participaram mais de 200 pescadores nessa audiência, o que permitiu uma

discussão detalhada do projeto, resultando inclusive namodificação de aspectos

queconflitavamcomos interessesdospescadores,particularmenteemrelaçãoà

iluminaçãodapraia,emfrenteaoresort,oque,segundoosentrevistados,afastaria

ospeixesdomarpróximoaessaárea.

Essesdoisfatosrelacionadosàcapacidadedeauto‐mobilizaçãoporparte

dospescadoressãosugestivosdequeacomunidadelocalapresentaalgumnívelde

capitalsocial.CasohouvesseemBarradeSantoAntônioalgumainiciativadopoder

públiconosentidodecriarumplanejamentoegestãodoturismoparticipativo,as

informações e articulações dos pescadores locais poderiam ser utilizadas como

objetivodeaperfeiçoarodesenvolvimentolocalcombasenoturismo.

CONSIDERAÇÕESFINAIS

De acordo com o estudo realizado, os stakeholders do planejamento e

desenvolvimento turístico do município de Barra de Santo Antônio são muito

numerosos, envolvendo os moradores antigos e os mais recentes, a iniciativa

privada, as Organizações Não‐Governamentais (ONGs) e a sociedade civil.

Entretanto,apenasumapequenapartedesses stakeholdersdemonstrou interesse

emdiscutirosproblemasrelacionadosàquestãododesenvolvimentoturísticodo

lugar:ColôniadePescadores(Z‐14),AssociaçãodosJangadeiros,BardoPiu,Escola

deEnsinoFundamental7deSetembro.

O município de Barra de Santo Antônio possuie sua oferta turística

baseada exclusivamente nos aspectos naturais. Apesar disso, foram identificados

problemasambientaisqueoscolocamemrisco,principalmentelixo,tibornanorio

SantoAntônio,esgotosemtratamento,eerosãomarinha.Dopontodevistasocial,

Page 38: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TURISTIFICAÇÃO, DESENVOLVIMENTO E PARTICIPAÇÃO DOS STAKEHOLDERS DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS, BRASIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

38

verifica‐se a existência de inúmeras áreas subnormais, com barracos e casas de

taipasemamenorcondiçãodemoradia.

De fato, faltaumamobilizaçãoporpartedopoderpúblicoeda iniciativa

privada para uma discussão com a comunidade relacionada em planejar e

desenvolver o turismo no município. Verificou‐se que em apenas dois casos, e

como resultado de auto‐mobilização por parte dos pescadores em relação à

recuperação do hotel Capitão Nikolas e um resort planejado para o município,

denominadoOndazul,nasproximidadesdapraiadeMorrosdeCamaragibe.

O processo de turistificação do município de Barra de Santo Antônio

ocorreu de forma espontânea, ou seja, sem um planejamento integrado,

envolvendotodososstakeholdersdoturismonomunicípio.Alémdisso,apesarde

constardaspolíticaspúblicasfederaisdeturismocomoumprincípioaserseguido,

em Barra de Santo Antônio não tem havido participação da comunidade no

planejamentoturístico.

REFERÊNCIAS

ARAUJO, LindembergMedeiros de. Planejamento turístico regional: participação,parceriasesustentabilidade.Maceió:Edufal,2009.

________. Análise de stakeholders para o turismo sustentável. Caderno Virtual deTurismo,v.8,n.1,p.91‐99,2008.

________. Participação sociopolítica no planejamento turístico. Turismo – Visão eAção,v.8,n.1,p.153‐164,2006.

ARAUJO;MOURA.Aexpansãodoturismonazonacosteiranordestina:crescimentoeconômico,degradaçãoambientaleerosãocultural.In:BENI,MárioCarlos.PolíticaeplanejamentodeturismonoBrasil.SãoPaulo:Aleph,2006.–(SérieTurismo)

CORIOLANO, L.N.M.T.; VASCONCELOS, F.P. O turismo e a relação sociedade‐natureza:realidades,conflitoseresistências.Fortaleza:Eduece,2007,p.94‐114.

DIAS,Reinaldo.Planejamentodo turismo:políticaedesenvolvimentodo turismonoBrasil/ReinaldoDias.–SãoPaulo:Atlas,2003.

MENDONÇA,TerezaCristinadeMiranda; IRVING,MartadeAzevedo:Turismodebase comunitária: a participação como prática no desenvolvimento de projetosturísticos noBrasil ‐ Prainha do CantoVerde, Beberibe (CE). CadernoVirtualdeTurismo,v.8,n.1,p.12‐22,2008.

Page 39: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

BARBOSA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 25‐39, jan./jun. 2012 

39

PITMAN(1984)

FREEMAN,R.Edward.StrategicManagement:AStakeholderApproach(eminglês).[S.l.:s.n.],1984.

FREEMAN, R. Edward; REED, David L. Stockholders and Stakeholders: A newperspective on Corporate Governance (em inglês). 3ed. [S.l.]:CaliforniaManagementReview,Spring83,1984.p.88‐106.vol.25.

TULIK, Olga. Residências Secundárias no Estado de São Paulo: Identificação decentros emissores de demanda. In: LAGE, B. H.; MILONE, P. C. (Orgs). Turismo:teoriaeprática.SãoPaulo:Aleph,2000.

YÁZIGI, Eduardo. Turismo: uma esperança condicional. 2 ed. São Paulo: Global,1999

INSTITUTOBRASILEIRODEGEOGRAFIAESTATÍSTICA‐ IBGE.Cidades–Alagoas:Barra de Santo Antônio, 2007. Disponível em:<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/link.php?uf=al>.Acesso:24de Julhode2011às20h43min.

Site A Tribuna de União. Disponível em:<http://www.tribunauniao.com.br/?p=2&id=12276>. Acesso em: 25 de Julho de2011às12h06min.

Site Correio do Povo. Disponível em: <http://www.correiodopovo‐al.com.br/v3/municipios/14195‐Mais‐100‐famlias‐esto‐desabrigadas‐Barra‐Santo‐Antnio.html>.Acessoem:25deJulhode2011às12h13min.

Site Léo Villanova Blog. Disponível em:<http://leovillanovablog.blogspot.com/2008/10/de‐longe‐tudo‐perfeito.html>.Acessoem:25deJulhode2011às12h33min.

Page 40: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DAPARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS ECONSENSOS 

 Artigo recebido em: 21/02/12  Revisado em: 05/06/12 Aprovado em: 21/06/12 

    

Rodrigo Alberto Toledo¹ 

 

                  

¹ Universidade Estadual Paulista ro‐[email protected]  

 

      Correspondência:  Rodrigo Alberto Toledo  Rua Padre Duarte, 989, Apto 12 Centro – Araraquara, São Paulo, Brasil CEP: 14801‐310  

RESUMOO artigo busca lançar algumas análises e indagações sobre o alcancehistórico de processos participativos engendrados na Espanha e noBrasil. Evidentemente, ambos os processos se desenrolaram emcontextos históricos, sociais, econômicos e políticos distintos, mas,mesmo assim, guardam algumas aproximações às quais pretendemosdardestaquenopresenteartigo.QuantoaodesmantelamentodoEstadode bem‐estar social, apresentamos ainda que, no caso da Espanha,provocou reflexos no modus operandi do processo de formulação eimplementaçãodepolíticaspúblicas.Ocorreu,emoutraspalavras,umadescentralização de seu arranjo decisório formulador de políticaspúblicas, que passou a contar com a participação de atores sociais nodenominadomunicípiorelacional(BECERRA,2011).NocasodoBrasil,o período ditatorial (1964‐1985), o rápido crescimento urbano e ageraçãodeperiferiasprecáriasnasprincipais cidades, adistensão e aConstituinte(1986‐1988)geraramasforçasdepressãosuficientesparaque, paulatinamente, incorporasse‐se o arranjo participativo noprocessodecisório.Palavras‐chave:Democraciaparticipativa,políticaspúblicas,processodecisório,Estadodebem‐estarsocial,BrasileEspanha.

SPAINANDBRAZIL INTHECONSTRUCTIONOFTHEDEMOCRATIC PARTICIPATION: CLEAVAGES ANDCONSENSUSESABSTRACTThearticlesearchestolaunchsomeanalysesandinvestigationsonthehistorical reach of produced participative processes in Spain andBrazil. Evidently, both the processes if had uncurled in historical,social, economic contexts and distinct politicians, but, exactly thus,keep some approaches that we intend to give prominence in thepresentarticle.HowmuchtothedismantlementoftheStateofsocialwelfare, we present, still, that in the case of Spain occurred adecentralization of its formulator power to decide arrangement ofpublicpoliticsthatstartedtocountontheparticipationofsocialactorsinthecalledrelationalcity(BECERRA,2011).InthecaseofBrazil,thedictatorial period (1964‐1985), the fast urban growth and thegenerationofprecariousperipheriesinthemaincities,thedistensionandtheConstituent (1986‐1988)hadgenerated theenough forcesofpressure so that, gradually, if it incorporated the participativearrangementinthepowertodecideprocess.Keywords: participative democracy, public politics, power to decideprocess,Stateofsocialwelfare,BrazilandSpain.

    

Page 41: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

41

INTRODUÇÃO

DemocraciaeparticipaçãonaEspanha

O debate sobre a administração dos municípios vem de longa data. No

séculoXVIII,JeremyBenthan(2012)1sereferiaaosmunicípioscomoorganizações

funcionais que contribuíam e eram protagonistas da descentralização

administrativa do Estado e, por conseguinte, melhoravam as ações públicas. Já

Stuart Mill (2012)2 descrevia‐os como escolas de cidadania, como espaços de

proximidades entre governantes e governados. Mill (2012) entendia‐os como

instrumentos destinados a favorecer a dispersão do poder político sobre o

território. Os municípios, desde essa época, não se justificavam por seu

comprometimento com a eficiência administrativa, mas por sua capacidade de

impulsionarefavorecerademocracia.Osmunicípioseram,então,compreendidos

como, simultaneamente, administraçõesegovernos locais.Nesse sentido, tantoa

tradição anglo‐saxã quanto a espanhola, na avaliação da eficiência dos governos

locais,consideravamoespíritodemocráticocomoprincipalcritério.

ParaBecerra(2011,p.26),“podríamosafirmarqueelhabermosdecantado

por el espíritu eficientista nos coloca en un escenario dominado pela lógica de la

democraciarepresentativa,mientrasalosidealesdelademocraciaparticipativa.”

A democracia representativa poderia ser interpretada como um

mecanismodelegitimaçãoquepermitiriaselecionaraquelaselitesdegovernantes

que, a partir de sua efetivação em um processo eleitoral, assumiriam as

responsabilidades de governo. Ao contrário, o conceito de democracia

participativasupõequea inclusãodoscidadãosnastarefasdegovernonãopode

serapenaseletiva(limitadaàeleiçãodosrepresentantes),masquesejacanalizada

rotineiramentenasdecisõesgovernamentais.

Entretanto, segundo Becerra (2011, p.16), o fortalecimento do modelo

democráticorepresentativoouparticipativoserelacionacom“[...] la tradiciónde

cada nación, pero tambiénde la conyuntura y delmomentohistórico donde nos

1 Consultar: BENTHAN, J.Um fragmentosobreelgobierno. Borrador de umprefacio previstoparalasegundaedición.Salamanca:EditoraTecnos,2012.(Colecciónclássicosdelpensamento).

2 Consultar:MILL,J.S.Filosofíayteoriadelderecho.Salamanca:EditoraTecnos,2012.

Page 42: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

42

encontremos;esdecir,losayuntamientosbritánicosolosayuntamientosfranceses

secaracterizanporotorgaracadaunodesusespíritusunpesodeltiempodentre

decadapaís.”

Essaobservaçãoéimportantejáquenospermitenotarcomotêmevoluído

osgovernoslocaisecomo,emparalelo,estãoredefinindoasvisõessobreoqueée

comofuncionaademocracianosmunicípios.

No entanto, para compreendermos em mais profundidade como a

democraciavemse transformandoao longodosanos,principalmenteduranteas

décadasde1980e1990nosmunicípioscatalães,temosqueutilizaroconceitode

bem‐estar social e seu posterior desmantelamento, a partir da política

“thatcherista”,3originandopressõesqueimpulsionaramoredimensionamentodas

práticasdemocráticasnosmunicípiosespanhóis.

O termo bem‐estar é utilizado para referirmos a uma combinação de

elementoseconômicos,tecnológicos,produtivosepolíticosque,umavezsomados

eoportunamentecombinados,geraramumasituaçãodecrescimentoeconômicoe

estabilidade social sem precedentes. Nesse arranjo, também denominado de

Estado‐providência,oEstadoassumeopapeldeagentedapromoção(protetore

defensor) social e organizador da economia em parceria com sindicatos e

empresas privadas. Os estados de bem‐estar social se desenvolveram

principalmente na Europa, onde seus princípios foram defendidos pela social‐

democracia, e foram implementados com maior intensidade nos Estados

Escandinavos (ou países nórdicos) tais como Suécia, Dinamarca, Noruega e

Finlândia, sobaorientaçãodoeconomistae sociólogo suecoKarlGunnarMyrdal

(SCHUMPETER,1908).

Como pano de fundo desse crescimento e dessa estabilidade social

espanhola, que foram chancelados pelo Estado de bem‐estar pós meados da

década de 1970, tivemos um pacto entre governantes e governados, segundo o

qualosprimeiros se comprometiamaoferecerumvolumecrescentede serviços 3 Becerra (2011) faz referência à Margaret Hilda Thatcher, Baronesa Thatcher, (nascida emLincolnshire,Inglaterra,em13deoutubrode1925),primeira‐ministrabritânicade1979a1990.AoliderarogovernodoReinoUnido,Thatcherimpôsumapolíticadereversãodoqueviacomoodeclínionacionaldeseupaís.Suaspolíticaseconômicasforamcentradasnadesregulamentaçãodo setor financeiro, na flexibilização do mercado de trabalho e na privatização das empresasestatais.

Page 43: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

43

em troca de que os segundos limitassem sua participação política somente ao

momento do voto.Ditode outra forma, tratava‐se de umapermuta de eficiência

porpassividadepolítica,quefoiajustamedidadomodelodedemocraciaelitistae

representativanaEspanhapósredemocratizaçãoapartirdemeadosdadécadade

1970. Nesses termos, o Estado de bem‐estar veio acompanhado por dinâmicas

democráticas caracterizadas tanto por uma condição de depressão do possível

dinamismodasociedadecivil,quantoporumapotencializaçãodaacumulaçãode

responsabilidadespúblicasnasmãosdeelitespolíticaseburocráticas.Oresultado

desseprocesso foi a apariçãodeumademocracia instrumental,umademocracia

útil para eleger líderes dentre as elites governantes,mas longe do debate sobre

aquiloqueestasfazemoudeixamdefazernogoverno.Nessearranjodemocrático,

aparticipaçãoda sociedade civil sevê seriamente limitada, já que seupapel fica

absorvidopelosetorpúblico.

Estemodelo,doEstadoqueocupatodooespaçopolíticoeadministrativo,

encontra suamanifestaçãomais clara no âmbitomunicipal, já que a arquitetura

institucionalquedá formaaoEstadodebem‐estarnosmunicípiostemassumido

umpapeleminentementeexecutor,pois“losayuntamientos–entantoqueparte

del Estado – acaparan actividades administrativas y marginan el potencial

participativodelaciudadaníaaunsegundoplano”(BECERRA,2001,p.17).Essaéa

situaçãoquemaiscaracterizaomunicipalismocatalãodosanos1980,umaépoca

em que se construiu o Estado de bem‐estar, pois foi nesse período que os

municípios democráticos se impuseram a necessidade de superar o déficit e o

raquitismo herdado dos anos franquistas.4 Em consequência desse raquitismo,

floresceram administrações locais centradas em tarefas de construção dos

principais equipamentos, infraestruturas e serviços municipais. Essas

características foram determinantes para a sedimentação de uma lógica

eficientista,jáqueoimportanteerareconstruirosmunicípios,poishaviamsofrido

umdesmonteduranteosanosfranquistas.Nãoéestranho,portanto,queoespírito

democrático fique limitadoaoexercícioperiódicodovoto,poisasassociaçõesda

4 FranquismofoiumregimepoliticoaplicadonaEspanhaentre1939e1975,duranteaditaduradoGeneralFranciscoFranco(falecidoem1975).Apósasuamorte,oregimefoisucedidonachefiadoEstadoespanholpeloatualReiJuanCarlos IqueinstaurouumaMonarquiaConstitucionaleconduziuumlongoprocessoderedemocratizaçãodopaís.

Page 44: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

44

sociedadecivilpassamdeumpapelreivindicativo–centralnosprimórdiosdeuma

democraciamunicipal–aumasituaçãodedesativaçãoe,inclusive,domesticação.

Durante a transição democrática, as associações possuíam um papel muito

dinâmico,representandooespaçoondeapopulaçãomanifestavasuasinquietudes

e suas demandas acumuladas.Nesse período, as associações se converteram em

refúgio de ativistas e de pessoas comprometidas com a transformação da

comunidade.Asassociaçõesda sociedadecivil, emdefinitivo, representavamum

panorama marcado por altos níveis de atividade e participação política dos

cidadãos.

Adesarticulaçãoe adomesticaçãodessasassociaçõesestão relacionadas

com as práticas das próprias prefeituras municipais, as quais esvaziavam as

associações tanto de conteúdo (a administração municipal assumia as

reivindicações e suas propostas), como de líderes (os quais passaram a formar

quadrosdeequipesmunicipais).

Poroutrolado,tambémháacompreensãodequeasassociaçõesestavam

emoutromomento dematuridade, pois nãonecessitavammais fazer ouvir suas

queixas e reivindicações para estabelecer novas relações de colaboração comos

poderespúblicos.Assim,asnovasrelaçõescomopoderpúbliconãosebaseavam

mais no confronto de opiniões e na exigência de responsabilidades, mas, na

coprodução de serviços e das subvenções. O resultado disso é uma nova

desativaçãodotradicionalpotencialparticipativodasassociaçõescatalãs,asquais

seconverteramemumtipodepseudo‐administração(BECERRA,2011).

Portanto o domínio da lógica eficienticista de uma visão estritamente

representativa e institucionaldademocracia impregnanasdinâmicasmunicipais

queseproduzemnomarcodaconstruçãodoEstadodebem‐estarespanhol.

Entretantoosanos1980trarãooutroimpactoparaoEstadodebem‐estar,

o “thatcherismo”. A política conservadora da primeira ministra britânica se

orientava para o desmonte do Estado de bem‐estar e, com esse objetivo,

concentravaseusesforçosemdoisâmbitos:1)nadestruiçãodossindicatos,seus

principais defensores; 2) na destruição dos governos locais, seus principais

executores.Édessecontextoquesurgeaorientaçãoqueasprefeiturasmunicipais

espanholasnãodeviamdedicar‐seàprovisãodebenseserviços,massimhabilitar,

Page 45: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

45

coordenar, contratar ou capacitar outros para que realizassem essas atividades

(RIDLEY,1988;STOKER,1988).

Becerra (2011) classifica essa nova administração municipal como

relacional,ouseja,umanovaformadeadministrarquenãodeveriaserobcecada

em ser administrativamente eficiente, já que são outros atores que se

responsabilizariampelaexecuçãodeboapartedosserviçosmunicipais.Entretanto

omunicípio relacional abrepossibilidadesparaa sociedadee suasorganizações.

Estas podem despertar do longo estado de hibernação a que foram submetidas

peloEstadodebem‐estarereencontrarumnovoespaçodeparticipaçãonagestão

dosserviçosmunicipais.Emoutraspalavras,omunicípiorelacionalabreasportas

para uma ampla constelação de atores e, por consequência, possibilita a sua

incorporação na gestão dos serviçosmunicipais. O que não está claro, poroutro

lado, é se esta participação de caráter funcional chega ao âmbito da tomada de

decisões.Dequalquer forma,existeumconsensodequealgotransformadorestá

ocorrendonosgovernos locais, apassagemdademocracia representativapara a

umanovaformadedemocraciaparticipativa.

Oataque“thatcherista”aogoverno local,paraalémdeseusêxitoseseus

fracassos,teveacapacidadedecolocaremxequeofervortécnicoeadministrativo

das últimas décadas, anos 1980 e 1990.Nesse período, ocorreu umprocesso de

politizaçãodosmunicípios,ouseja,oaprofundamentodeumavertenterepletade

instrumentosvariadosdeinovaçãodemocráticaparticipativa.

É necessário, antes de continuarmos nossas reflexões, buscarmos

definições conceituais de participação. Para Gyford (1991), não existe um único

tipo de participação, mas sim escalas de participação. Em um nível mais baixo,

estãoos instrumentosparticipativosquesóobjetivamoferecer informações,com

intenções manipuladoras, a um cidadão eminentemente passivo.

Intermediariamente, está o tipo que conta commecanismos que pretendem dar

vozaos cidadãos e às suasorganizações,mas somentepara saberoqueopinam

sem compromisso de implementação.No nívelmais alto de participação, omais

potente,estáaquelequepermitetrasladaropodere,portanto,acapacidadepara

tomardecisõesparaasociedadecivil.

Page 46: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

46

Nomunicípiodebem‐estar,ondeépredominantealógicarepresentativa,

aparticipaçãodiretado cidadãonoprocessodecisórionãoconsegue ir alémdos

primeirosdoispassosouníveis,ouseja,nãorompecomodireitoaserinformadoe

ser ouvido. Gyford (1991) reforça que o pacto de bem‐estar supervaloriza a

passividadedoscidadãos,umavezqueestesnecessitamestarapenasinformados

da oferta de serviçosmunicipais. Na atualidade, o direito a ser informado já foi

superado, especialmente quanto a politização do âmbito local desperta fortes

questionamentos não somente sobre como se fazem as coisas (perspectiva

tecnocrática),massobrequecoisassehãodefazer(perspectivapolítica).Estáem

curso a sedimentação de uma perspectiva que defende um aprofundamento

democrático participativo, em que o próprio cidadão exerça a capacidade para

tomar decisões, e que critica os rituais baseados apenas na atenção dada às

demandassemocompromissodeimplementá‐las.

Gyford (1991) aponta que os governantes aumentariamo seu aporte de

legitimidadepolíticaemelhorariamaqualidadedesuasdecisões,seestasfossem

tomadas após a consulta de múltiplas vozes e opiniões, não somente porque

seriam incorporados mais pontos de vista, mas porque o próprio consenso

rebaixariaasresistênciaseaumentariaaspossibilidadesdeêxitodadecisãoaser

tomada.

Segundo Brugué e Gallego (2001, p.25), “Es decir, la participación tiene

como objetivo directo escuchar a los ciudadanos, aunque inderectamente sirve

también para otra cosa, quizás inclusomás importante: generar el capital social

quehadegarantizarelbuenfuncionamientodenuestrasociedad.”

Desde que Putman (1993) popularizou o conceito de capital social,

entendido como um conjunto de características intangíveis de uma comunidade

(densidade associativa, níveis de confiança interna etc.), úteis para explicar seu

rendimento institucional, econômico e social, o questionamento tem sido

precisamente como fomentar esse capital social. Não existem respostas claras a

respeito, mas a própria participação cidadã parece ser um fator chave no

desenvolvimentodascomunidades.Ocapitalsocial,portanto,fazreferênciaauma

cidadaniaqueadquirematuridadedemocráticaedinamismosocioeconômicopor

meiodaprópriaparticipaçãonosassuntoscoletivos.

Page 47: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

47

Os suspeitos dessa dita participação são cidadãos mais ativos, mais

exigentes e suas relações com as instâncias político‐administrativas. Inglegart

(1991) apresenta a aparição de uma cidadania mais preparada e sofisticada.

Somadoaesse cenário,nosmunicípiosespanhóis, osgovernantes tambémestão

mais dispostos a ativar suas relações com os governados nas mais diferentes

dimensõeseconômicas,políticaseadministrativas.

Os cidadãos estão fartos de serem tratados como usuários passivos que

recebemserviçose,comoconsequência,queremservistoscomoclientesecomo

consumidores que exigem da administração aquilo que querem e em quais

condições.

Gyford(1991,p.27)afirmaque

Finalmente,losciudadanosyanoseconformaríanconemitirun voto, cada equis año, sino que querrían asumir sucondición de ciudadanos con opiniones que se quierenexpresar y proyectar en el día a día de las actuacionespublicas (ámbito político). Por tanto, existe un nuevoproceso participativo en que el individuo posuí voluntad ycapacidad para fortalecer sus relaciones con las instanciaspolítico‐administrativasquehande canalizar lasdemandasy las opiniones de una ciudadanía más exigente ysensibilizada.

Esseprocessodeativaçãodasparticipaçõesindividuaisdoscidadãoseas

pressões produzidas geraram um tipo de participação democrática em que o

cidadão se vê no direito de tomar parte do processo decisório. A participação

democrática, para Fox e Millar (1995) deve superar as fazes de monólogo

(tipologiaquesegueosritosdeumdiscursodominantedeumaelitequetransmite

mensagens a uma cidadania apática e sem capacidade para emitir opiniões

próprias).Devetambémsuperarafasedemagógica(palabrería)(tipologiaemque

osatoressociaissemanifestam,masnãoháumprocessoinstitucionalizadocapaz

de canalizarasdemandasparaaobtençãodeumresultadoconcreto).Por fim,o

nível ideal diálogo é aquele instituído a partir de conflitos bemdefinidos com a

presença de cidadãos bem informados e interessados nos assuntos objeto do

Page 48: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

48

debate. O diálogo focaliza a atenção dos participantes emuma gama limitadade

temas,clarificaassuasposiçõesarespeitoe,atravésdeescutasedebates,permite

chegaraconclusõeseresultadosoperativos.

Aparticipaçãonosmunicípiosespanhóisapareceofuscadapelaintrodução

deumconjuntode instrumentosdemasiadamente formalistas, comoospróprios

regulamentos de participação cidadã, os conselhos consultivos e os planos

estratégicos.

As primeiras experiências espanholas possuíam uma forte tendência ao

monólogo.Entretantoforamcriadasaçõesparaimpulsionarespaçosparticipativos

fortementedominadospelosdiscursosepela agendadosatorespolíticosqueos

haviam criado. Em uma segunda etapa, apareceu um conjunto de novos

instrumentosvinculadosaodiscursodainovaçãodemocrática.

Para Becerra (2011, p.31) tratam‐se de “Los nucleos de intervención

participativa, los consejos ciudadanos, los planes comunitarios, los presupuestos

participativos,etc.Setratadeunconjuntodeherramientasdestinadasatrasladar

unpoderefectivoalosciudadanos.”

Odesenvolvimentodaparticipaçãoedademocracialocalreclamaparasi

umafortesintoniaentreas justificativas(os“porquês”),osprotagonistas(osque

estãoenvolvidos)eosinstrumentos(comoaparticipaçãoéestruturada).Becerra

(2011) sintetiza, no quadro a seguir, as formas participativas existentes nos

municípiosespanhóis.

Asdiferentesfórmulasdeparticipaçãoqueforamsistematizadasno

quadro1apresentamtrêsbasesdistintasqueapontamparaoprocessodeatuação

pública na canalização das demandas sociais. A primeira, denominada base

asociativa(baseassociativa),ocorrequandoaparticipaçãoéconduzidapormeio

daparticipaçãodegruposorganizadosdecidadãos.Asegunda,basemixta,ocorre

de duas formas: por meio da participação de indivíduos que representam

instituições/associações ou de indivíduosmovidos por interesses particulares. A

terceira base, a personal, ocorre quando os cidadãos participam sem vínculo

institucionalizado,movidospelointeresseemmanifestardemandaspessoais.

Page 49: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

49

Quadro1–Tipologiadefórmulasparticipativas

Baseasociativa Basemixta BasepersonalSectorial Territorial Intensiva Intensiva

Eneldiagnóstico

Forumsymesas

sectoriales

Planesestratégicos,procesos

participativostemáticos(agendas21,

planeseducativosdeciudad,etc.)

Planesestratéficos,procesos

participativostemáticos(agenda21,planes

educativosdeciudade,etc.)

Forumstemáticos,círculosdeestudio,

conferenciasdeconsenso

Asambleas,audiencias,

teledemocracia

Enlasdecisiones

Consejos,comisiones

yponenciassectoriales

Consejosmunicipalesdebarrioodistrito,planes

integrales

Consejos,territorialesmixtos,jurados

ciudadanosmixtosGestión

compartidadeservicios

Presupuestosparticipativos,

juradosciudadanos,panelesdeciudadanos,encuestas

deliberativas

Referéndum,consultaspopulares,

teledemocracia

Enlagestión

Gestiónasociativa

deservicios

GestiónasociativadeCentrosCívicos

Gestióncomparativadeconjunto

Gestiónconvoluntariadodeserviciosoprogramasmunicipales

Co‐producciónpersonalizadadeservicios.

Fonte:GomàeFont(2001,p.70).

No entanto a participação de base associativa pode dividir‐se entre

aquela que corresponde a uma lógica setorial e aquela que se articula

territorialmente. A de base personal, por sua vez, pode ser intensiva (quando

exigedeumgrupodecidadãosumafortededicaçãonoprocessoparticipativo)ou

extensiva (quando envolve um amplo número de pessoas, mas não exige uma

participaçãointensadasmesmas).

Já quanto ao segundo critério, a basemixta, Becerra (2011) diferencia

entreadeparticipaçãoquesedirigeaodiagnósticodosproblemaseaformaçãoda

agenda local; a que se ocupa de influenciar nas decisões e na formulação de

políticaseaquelaqueseconcentranagestãodosequipamentosedosserviços.

Procuramos, nessas notas preliminares sobre a participação nos

municípios espanhóis, apresentar o confronto entre o denominado modelo de

Page 50: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

50

município de bem‐estar com o atualmunicípio relacional. Em contraste com as

diversasvisõessobreomunicipalismo,destacamos,emprimeirolugar,suarelação

com determinadas conjunturas históricas e, em segundo lugar, suas implicações

sobreademocracialocal.

Passemos agora para a análise do contexto de introdução de

procedimentos participativos no processo decisório das realidades municipais

brasileiras.

Partiremos de uma análise de teóricos a respeito da inevitabilidade da

burocracia,comoresultadodacrescente complexibilizaçãodoprocessodecisório

das democracias representativas para, posteriormente, enfocarmos suas

implicações em um novo arranjo democrático participativo que se incorpora no

discurso dos movimentos sociais a partir da redemocratização brasileira de

meadosdadécadade1980.

DEMOCRACIAEPARTICIPAÇÃONOBRASIL

Ao longo do século XX,mais precisamente na sua segundametade, essa

discussão sobre complexidadee inevitabilidadedaburocracia foi se fortalecendo

na medida em que as funções do Estado foram crescendo com a instituição do

welfare state nospaíses europeus.OEstadocresceu em funções ligadasaobem‐

estarsocial,comodemonstramosnocasodosmunicípiosespanhóis.Esseenfoque

levouàconstituiçãodeumateoriahegemônicadedemocraciaqueprivilegiasseo

papeldossistemaseleitoraisnarepresentaçãodoeleitorado(LIPJART,1984).No

entanto a concepção hegemônica de democracia, ao contemplar o problema das

tendênciasdoeleitoradoemescalaampliada,ignorasuastrêsdimensõesasaber:a

autorização, a identidade e a prestação de contas (recentemente introduzida no

debatedemocrático).

Nesse sentido, o pessimismo de Weber (1978) sofre uma mudança de

perspectiva,ouseja, a inevitabilidadedocrescimentodaburocracia foimudando

detom,assumindoumaconotaçãopositiva.

Bobbio (1986) sintetizou a mudança de perspectiva em relação à

desconfiançaweberianacomoaumentodacapacidadedecontroledaburocracia.

Page 51: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

51

Oautorconstruiuumainterpretaçãoqueconsideraastransformaçõespelasquais

as sociedades passam como fundamentais para o surgimento de competências

técnicas.Segundoele,

[...] à medida que as sociedades passaram de umaeconômicafamiliarparaumaeconomiademercado,deumaeconomia de mercado para uma economia protegida,regulada e planificada, aumentaramos problemas políticosquerequeremcompetênciastécnicas.Osproblemastécnicosexigem, por sua vez, expertos, especialistas... Tecnocracia edemocracia são antitéticas: se o protagonista da sociedadeindustrial é o especialista, impossível que venha a ser ocidadãocomum.(BOBBIO,1986,p.33‐34).

Há, nesse trecho, uma clara radicalização do conceito weberiano de

burocracia. Bobbio (1986) compreende que, a partir do momento em que o

cidadãooptouporfazerpartedasociedadedeconsumodemassaedoEstadode

bem‐estar social, está abrindo mão do controle sobre as atividades políticas e

econômicasporeleexercidasemfavordeburocraciasprivadasepúblicas.

Háaindaumterceiroelementoqueconstituiaconcepçãohegemônicada

democracia. Essa concepção afirma ser a representatividade a única solução

possível nas democracias de grande escala. Dahl (1998, p.110) defende essa

posiçãocommaiorênfaseafirmandoque

[...]quantomenorforumaunidadedemocráticamaiorseráopotencial para a participação do cidadão e menor será anecessidade para os cidadãos de delegar as decisões dogoverno para os seus representantes. Quanto maior for aunidade, maior será a capacidade de lidar com problemasrelevantesparaoscidadãosemaiorseráanecessidadedoscidadãosdedelegardecisõesparaosseusrepresentantes.

Ofundamentodarepresentaçãopelateoriahegemônicadedemocraciaé

a autorização. Nesse sentido, constituem‐se dois pilares que sustentam a

autorização. O primeiro, que diz respeito ao problema do consenso dos

Page 52: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

52

representantes, surge dentro da teoria democrática clássica, em contradição às

formasde rodízionoprocessode tomadade decisão característicoàs formasde

democraciadireta(MANIN,1997).Nocontextodessaconcepção,oexercíciodireto

da gestão própria das antigas cidades‐estado ou das repúblicas italianas estava

envoltopelafaltadeautorizaçãoaqualerasubstituídapelaideiadoigualdireitoà

ocupação dos cargos de decisão política. Quando surge a noção de consenso no

interiordosdebatessobreumateoriaracionaldapolítica,osorteio,oconceitode

exercício direito deixa de fazer sentido e é substituído pelo consenso, que se

constituienquantoummecanismoracionaldeautorização.

Mills (1977) trará a segunda forma de justificação da questão da

representação juntamente com a questão da capacidade das formas de

representação de se refletirem as opiniões no âmbito da sociedade. Para Mills

(1977), a assembleia é uma miniatura do eleitorado e toda assembleia

representativa é capaz de expressar as principais tendências do eleitorado. Esse

enfoque levou à constituição de uma teoria hegemônica de democracia que

privilegiasse o papel dos sistemas eleitorais na representação do eleitorado

(LIPJART, 1984). No entanto a concepção hegemônica de democracia, ao

contemplaroproblemadas tendênciasdoeleitoradoemescalaampliada, ignora

suastrêsdimensões,a saber:a autorização,a identidadeeaprestaçãodecontas

(recentemente introduzidanodebatedemocrático).Seporumlado,comoafirma

Dahl(1998),aautorizaçãoviarepresentaçãopossibilitaoexercíciodademocracia

em escala ampliada, por outro lado dificulta a prestação de contas e a

representaçãodemúltiplasidentidades,ouseja,arepresentação,pelométododa

tomada de decisão pelamaioria, não contempla as identidadesminoritárias que

nãoterãoexpressãonoparlamento.Noquedizrespeitoàprestaçãodecontas,ao

diluí‐la no processo de reapresentação no interior de um bloco de questões,

comprometeadesagregaçãodoprocessodeprestaçãodecontas.Énessemomento

quesedesenhaumterceirolimitedateoriademocráticahegemônica:limitaçãoem

apresentaragendaseidentidadesespecíficas.

Dessaforma,osmarcoshistóricos“fimdaguerrafria”e“aprofundamento

doprocessodeglobalização”reabremodebateentredemocraciarepresentativae

democracia participativa o qual se aprofunda mais nos países em que a

Page 53: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

53

diversidadeétnicaémaior.Neles,formaram‐segruposquetêmmaiordificuldade

paraterosseusdireitosbásicosreconhecidos(BENHAIBIB,1996;YOUNG,2000),

oqueocorre,emcertamedida,pelaquestãodeadiversidadedeinteresseschocar‐

secomoparticularismodeeliteseconômicas(BÓRON,1994).

Esse contexto abre uma reinterpretação da teoria democrática

hegemônica, denominada por Santos (2003) de concepções não hegemônicas da

democracia. Na segunda metade do século XX, surgirá uma concepção que

reconhecerá que a democracia não constitui ummero acidente ou uma simples

obra de arquitetura institucional. Essa percepção é formatada em resposta ao

arcabouço teórico construído pela teoria democrática hegemônica que vincula

procedimentocomformadevidaecompreendeademocraciacomomecanismode

aperfeiçoamento da convivência humana (SANTOS, 2003). Nessa concepção,

encontrada nas obras de autores como Lefort (1986), Castoriadis (1986) e

Habermas (1995), Lechner (1988), Bóron (1994) e Nun (2000), a democracia

assumeumagramáticadeorganizaçãodasociedadeedarelaçãoentreoEstadoea

sociedade.Asconcepçõesnãohegemônicasapresentamasmesmaspreocupações

queashegemônicas:comoreconhecerapluralidadehumana,nãoapenasapartir

da suspensão da idéia de bem comum,mas a partir dos critérios que, primeiro,

enfatizamacriaçãodeumanovagramáticasocialeculturale,emsegundo,buscam

a compreensãoda inovação social articulada coma inovação institucional coma

procuradeumanovainstitucionalidadedademocracia(SANTOS,2003).

Nessa concepção, Castoriadis (1986, p.274) fornece elementos críticos à

teoriadedemocraciahegemônica:“[...]algunspensamhojequeademocraciaoua

investigaçãoracionalsãoautoevidentes,projetando,assim,demaneira ingênuaa

excepcionalsituaçãodaprópriasociedadeparaahistóriaemseuconjunto.”

Castoriadis (1986)apontaque ademocracia sempre indicaumaruptura

com tradições estabelecidas e, portanto, a tentativa de instituição de novas

determinações,novasnormasenovas leis.Dessa forma,a indeterminaçãonãose

refereapenasaoocupantedaposiçãodepoder,masàsdimensões societáriasde

discussão dos procedimentos democráticos. Essa discussão rompe com o

procedimentalismo produzido pela teoria hegemônica de democracia. Habermas

(1995) foi o autor que abriu espaço para se pensar o procedimentalismo como

Page 54: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

54

prática social e não como método de constituição de governos. Para tanto, ele

propôsumelementonodebatedemocráticocontemporâneo:apluricidade,capaz

degerarumagramáticasocietária.Aesferapúblicaéumespaçonoqualindivíduos

podem problematizar, em público, uma condição de desigualdade no âmbito

privado.Oprincípio“D”deHabermas(1995)permitediscutirasaçõesempúblico

dos indivíduos excluídos de arranjos políticos através de um princípio de

deliberaçãosocietária.Paraoautor,apenassãoválidasaquelasnormas‐açõesque

contamcomoassentimentodetodosos indivíduosparticipantesdeumdiscurso

racional. Ao discutir um princípio de deliberação amplo, Habermas (1995)

recoloca, no interior do debate democrático, um procedimentalismo social e

participativo.Essedebateétributáriodapluralidadedasformasdevidaexistentes

nassociedadescontemporâneas,pois,paraserplural,apolíticatemdecontarcom

o assentimento desses atores emprocessos racionais de discussão e deliberação

(SANTOS,2003).Emoutraspalavras,oprocedimentalismodemocráticodeBobbio

(1986) não pode ser visto como um método de autorização de governos. Ao

contrário,temdeser,comoafirmaCohen(1997),umaformadeexercíciocoletivo

dopoderpolíticocomumabasepertencenteaumprocessolivredeapresentação

de razão entre iguais. Assim, a conexão entre procedimentalismo e participação

residenopluralismoenasdiferentesexperiênciasdedemocracia representativa

comprocedimentosparticipativos.

Háoutroelementoque,segundoSantos(2003),deveserlevadoemconta

ao analisar a questão das teorias não hegemônicas de democracia: refere‐se ao

papel de movimentos sociais na institucionalização da diversidade cultural. O

autor constrói uma análise dessa vertente partindo de Williams (1981), o qual

entende que cultura compreende uma dimensão de todas as instituições –

econômicas,sociaisepolíticas–queenvolvemumadisputasobreumconjuntode

significações culturais. Os movimentos sociais estariam envolvidos em uma

contendapelaampliaçãodocampopolíticooqual,porsuavez,engendrariauma

disputa pela ressignificação de práticas (ALVAREZ et al., 1998). A ampliação do

campopolíticotemumarelaçãodiretacomaatuaçãodosmovimentossociaisque,

no limite, possibilitaram a transformação de práticas dominantes, o aumento da

cidadaniaeainserçãopolíticadeatoressociaisexcluídos.

Page 55: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

55

ParaDagnino (2002), a construçãodademocraciabrasileira,nasúltimas

duas décadas, tem se configurado na possibilidade de trânsito de projetos

formatadosnointeriordasociedadecivilparaoâmbitodoEstado,endereçadosà

democratização das políticas públicas, às premissas de inclusão, cidadania e

equidade,sobretudonaesferalocal.

Assim, no Brasil, as interseções entre as questões tematizadas e as

proposições construídas no âmbito da sociedade civil organizada e os avanços

institucionaisrelativosaosmarcosjurídico‐institucionaisdaspolíticasurbanasno

país, bem como os processos de formulação e implementação destas políticas,

pressupõem transformações que indicam um aumento da democratização do

processodecisório.

Portanto,paracompreendermosasexperiênciasconcretasdeaumentodo

cânonedemocráticonoBrasil, focalizaremosopadrãode intervençãourbanano

decursodoséculoXX.Paraelaborarumaanálisedesseprocesso,podemosutilizar,

comoreferência,ospadrõestradicionaiseanterioresde intervençãoestatal ede

relações entre Estado e sociedade. Nesse sentido, as características que se

destacamsãoacentralizaçãodasdecisõeserecursos,afragmentaçãoinstitucional,

a segmentação no atendimento dos serviços públicos, a atuação de cunho

estritamente setorial, a impermeabilidade das políticas e agências públicas aos

cidadãos, a penetração dos interesses privados na esfera estatal e a ausência do

controlepúblicoedeavaliaçãodaspolíticas,dentreoutrosaspectos.

Esses padrões são utilizados como referência por Farah (1997, p.3) ao

interpretar as possibilidades de inflexão e de inovação, no que se refere à

ampliaçãodaofertaetipologiadaspolíticasedeseu

[...] conteúdo substantivo; ao seu formato e as suascaracterísticasinstitucionais;eaosprocessosdeformulaçãoe de gestão, os quais envolvem a incorporação de novosatores, apontando, portanto, para a democratização daspolíticas públicas e para as possibilidades de inclusãosociopolítica.

Page 56: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

56

Opadrãotradicionaldeintervençãonaáreaurbana,porexemplo,podeser

caracterizadopelofortecunhotecnocráticoemsuaspráticas,apresençamarcante

dos interesses imobiliários e vinculados à acumulação urbana, e à ausência de

possibilidades de participação cidadã na cunhagem das políticas produzidas e

ofertadas. O quadro socioespacial brasileiro também se precarizou,

principalmente, em virtude da ineficiência e omissão do poder público no

enfrentamento da problemática urbana no curso da urbanização brasileira. Essa

ineficiênciaeaomissãoresultaramemdesigualdadeseprocessosdeexclusão,pela

magnitudedodéficithabitacional eda informalidadedeocupação,dentreoutros

aspectos.

O direito à cidade, as políticas mais justas e includentes e a

democratização das relações entre Estado e sociedade apresentam‐se em três

eixosdeavanços: apossibilidadedademocratizaçãodas relaçõesentreEstadoe

sociedadepormeiodacriaçãode instânciasparticipativas;mudançasnas lógicas

de planejamento, principalmente em relação ao instrumento do PlanoDiretor; a

sedimentaçãodo conceitodedireitoà cidadepormeioda inclusão socioespacial

dasáreasinformaisedeseusmoradores.

AsanálisesdeRibeiroeCardoso(1996)confirmamqueaquestãourbana

não chega a se constituir como objeto de intervenção e de reforma social

incorporado à agenda governamental. Apresentam uma análise do processo

histórico de como a questão urbana foi utilizada como um instrumento de

construçãodecidades,masnãodecidadãos.

No curso do século XX, as intervenções nas cidades brasileiras ocorrem

sob o rótulo de urbanismo em sua versão higienista. Para Pechman (1994), o

urbanismoselegitima,noambientebrasileiro,comosabercientíficosobreacidade

à margem de qualquer debate político e da possibilidade de colocar em foco a

questãodacidadaniaedodireitoàcidade.

Do pós segunda guerra até 1964, segundo ciclo socioeconômico, as

estratégiasdemodernizaçãoprodutivaatreladasàestratégiade substituiçãodas

importações são as tônicas do período. O molde keynesiano‐desenvolvimentista

sedimenta ummodelo de desenvolvimento econômico ancorado nomercado de

bens de consumo duráveis. O Estado assume uma postura de investidor em

Page 57: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

57

produção pública de infraestruturas endereçadas ao desenvolvimento do setor

privadodaeconomia.

No governode JuscelinoKubstichek (1955‐1960), dematriz populista, o

planejamento transforma‐se em instrumento para a resolução dos problemas

brasileiros.Aquestãourbanapassaaserestruturadasobabalizadoobjetivismo

tecnocrático,dirigidoaoprojetonacionaldesenvolvimentistaeàprimaziadoeixo

econômico(RIBEIRO;CARDOSO,1996).

No entanto as políticas urbanas voltadas para a equidade e com viés

redistributivonãocomparecemaessecenário,aindaque,especialmentenoinício

dos anos 1960, a questão habitacional configure‐se como objeto emergente de

tematizaçãoemespaçosdasociedadecivil.

Entre o finaldos anos 1960 e início dos anos1980, como aumento dos

fluxos migratórios campo‐cidade, ocorre o ápice do processo de crescimento

urbano e metropolização revelador da problemática socioespacial atual: a

expansão urbana, por meio da constituição de periferias precárias e distantes,

conformadaspelasdinâmicasespeculativasquesealimentamdaprovisãopública

de infraestruturas, e a multiplicação de favelas e de outras tipologias de

informalidade,destituídasdasmínimascondiçõesdehabitabilidade.

O ambiente demodernização conservadora e centralizadora do governo

militar impõe novos arranjos administrativos e burocráticos, tais como:

intervenção do Estado nas cidades nas áreas de saneamento, transporte e

habitação; implantação de novas estruturas governamentais federais e

subnacionais, voltadas para as políticas urbanas, como o Serviço Federal de

HabitaçãoeUrbanismo(SERFHAU),criadoem1964eextintoem1974,eoBanco

NacionaldaHabitação(BNH),damesmaépoca.

Em meados da década de 70 são criadas iniciativas que podem ser

configuradas como ensaios na direção de uma política urbana de cunho

compreensivo,comoacriaçãodaComissãoNacionaldeRegiõesMetropolitanase

PolíticaUrbana,decomposiçãomultissetorial,e,adiante,suareconfiguraçãocomo

Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano. De qualquer forma, essas

iniciativasdecriaçãodeestruturasnãorevelamapresençamaisatuantedaUnião

nas atividades urbanas e não implicam na formatação de uma política urbana

Page 58: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

58

integrada.Maricato (2000) afirma que a questão urbana, sob total influência do

urbanismo modernista‐progressista e dos determinantes do contexto fordista‐

keinesiano, imputa ao Estado o papel central do desenvolvimento e considera‐o

portadorprivilegiadoderacionalidade.

Chega‐seaumaestruturaestratégicaespacialdedesenvolvimentourbano

dentro do contexto de uma política de desenvolvimento econômico regional

centrado,principalmente,emtrêsaspectos.

Primeiramente, o planejamento regional, referente às diretrizes voltadas

para o fortalecimento dos polos nacionais e regionais de desenvolvimento. Em

segundo,comapromoçãodoplanejamentointegradonoâmbitolocal,realiza‐seo

financiamento dos planos locais integrados e a assistência técnica para sua

elaboração.

Os planos locais integrados recodificam o planejamento urbano em

pressupostos racionalista‐compreensivos e produzem extensos diagnósticos

multissetoriais que abrangem todos os aspectos das cidades. No entanto

apresentam pontos de disjunção entre os planos da realidade em que visam

intervir, desconsiderando o tecido informal. Outra disjunção está localizada na

relaçãoentreplanejamentoegestãoquejuntamentecomasobredeterminaçãoda

capacidade estatal efetiva no âmbito local e subdeterminação da atuação dos

agentes privados e dos fatores institucionais e burocráticos resultam no

descompromissoquantoàimplementação.

O terceiro aspecto remete ao centralismo decisório e à valorização da

concepçãotecnocráticadoplanejamento.

Oquadroderecessãodofinaldadécadade1970eascrescentestensões

entreoEstadoeasociedadebrasileiradesembocarãonagradualaberturapolítica

e na redemocratização do país. O rompimento com o ciclo autoritário,marcado

pela restriçãoàparticipaçãopolíticaea repressãoàorganizaçãoeàação social,

constitui o terreno do qual emergem os movimentos sociais, voltados para

reivindicaçõesrelativasàesferadoconsumocoletivoecondiçõesdevida.

OMovimentoNacionaldeReformaUrbana (MNRU)destaca‐seenquanto

articuladordeatorescoletivos,atuantesnocontextodaconstituinte,elaboradores

de propostas de intervenção urbana que se solidificarão em alguns artigos da

Page 59: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

59

Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, no Estatuto das Cidades. O

contexto de elaboração de uma nova carta constitucional iniciada em 1986

solidifica a atuação da sociedade civil como uma plataforma de cunho

democratizanteevoltadaparaainclusãoeampliaçãodosdireitossociais.

Nocampourbano,oMNRUintroduzosprincípiosdodireitoàmoradiaeà

cidade bem como o da função social da propriedade. A articulação desse

movimento, conectado às demandas oriundas de uma rede de organizações,

constitui‐secomoumanovidadenoqueserefereàsformasdeorganizaçãoeação

coletiva. Os pilares da plataformade reformaurbana do período são o direito à

moradiaeàcidadeeoplanejamentoeagestãodemocráticadascidades.Quantoà

questãourbana,podemserapontadosavançose inflexões significativosno texto

constitucional(MARICATO,2000):

a) ampliação das competências municipais e o papel central reservado aos

municípiosnoenfrentamentodaquestãourbana,garantindo‐lhesautonomialegal,

ressalvadas competências e responsabilidades para os demais níveis de governo

relativas à produção de normais gerais de cooperação conjunta na oferta de

políticaspúblicas;

b) possibilidades de participação cidadã, inclusive no âmbito da política urbana,

assinaladas no art. 29, que prevê a cooperação de associações no planejamento

municipal e a iniciativa popular de projetos de leis e programas; e, mais

genericamente no art. 5º, que trata do reconhecimento dos direitos difusos, nos

quaissepoderemeteràquestãourbano‐ambiental;

c)osartigos182e183,quepodemsertomadoscomomarcojurídicoparaodireito

urbano,namedidaemqueexplicitamoprincípiodafunçãosocialdapropriedadee

da cidade e o vinculam às exigências dos planos diretores, obrigatórios para

municípios de mais de 20 mil habitantes e reservam aos governos locais a

faculdadedeelaboraçãodelegislaçãoparadisciplinarousoeaocupaçãodosoloe

garantirocumprimentodafunçãosocialdacidade;

Page 60: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

60

d)oartigo183 reconheceodireitoàocupação informal,pormeiodousucapião

urbano,inclusivecoletivo,apóscincoanos.

Entretanto a ausência da legislação complementar, que se estende até a

promulgaçãodoEstatutodaCidadeem2001,implicouumobstáculoexpressivoà

autonomiadosgovernoslocaisquantoàaplicaçãodedispositivosconstitucionaise

aodescompromissodasesferasdegovernonocasodascompetênciaseatribuições

compartilhadas.

O Estatuto da Cidade aprofunda os avanços constitucionais, dotando de

conteúdooprincípioda funçãosocialdapropriedade,poispermitiu(MARICATO,

2000):

a)aregulamentaçãodeinstrumentosdedesenvolvimentourbanovoltadosparao

controleeacoibiçãodaespeculaçãoimobiliáriaedacapturadamais‐valiadosolo

urbano;

b)aregulamentaçãodeinstrumentosvoltadosparaaregularizaçãofundiáriadas

áreas informais, especificamente o usucapião urbano e, adiante, por meio de

medidaprovisória, a concessãodeusoespecialpara finsdemoradia, ao ladoda

identificaçãodeoutrosinstrumentosquejávinhamsendoempregadosnoâmbito

local,comoasZonasEspeciaisdeInteresseSocial(ZEIS);

c) o reconhecimento da participação social no planejamento e na elaboração de

planos diretores, bem como a previsão da criação de canais de participação –

órgãos colegiados, gestão participativa do orçamento, conferências, audiências e

debates públicos, dentre outros – em seu capítulo de gestão democrática das

cidades;

d) a recomendação de articulação do plano diretor com instrumentos

orçamentáriosbemcomoaprevisãode suarevisãoperiódica,nomáximoacada

dezanos.

Page 61: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

61

O Estatuto da Cidade reenquadra os modelos de planos diretores

anteriores, colocando como requisito a participação e a gestão democrática por

compatibilização com o planejamento orçamentário ou por meio da

disponibilização dos instrumentos mencionados. Assim, o novo paradigma de

planejamento reconecta o planejamento e a gestão, bem como as dimensões

técnica e política. Villaça (1978, p.235‐236), afirma que essa “[...] politização

imprime, à década de 90, o caráter de umpossívelmarco divisor na história do

planejamento brasileiro, ancorado na superação dos modelos tradicionais”.

(VILLAÇA,1999,p.15).

Comessaspremissas,oPlanoDiretordefine‐seapartirdeumaleiturada

cidadeconcretacomoumconjuntoderegrasorientadasparaaaçãodosagentes

que constroem e utilizam o espaço urbano e aponta para a dimensão política e

pactuadadoplanejamentoedagestãourbana.

SegundooInstitutoPólis(2001,p.40),

Asnovaspráticassubstituemoplanoquepriorizatudo–ouseja,nãopriorizanada–pelaideiadeplanocomoprocessopolítico,pormeiodoqualopoderpúblicocanalizaesforços,capacidade técnica e potencialidades locais em torno dealgunsobjetivosprioritários.

Ribeiro e Cardoso (2003) exploram as mesmas premissas por meio do

conceito de “planejamento politizado” como ferramenta de análise do processo

iniciadopelomovimentodareformaurbana . Segundoeles,adimensãodepacto

territorial é influenciada pelos direitos urbanos, pelo enfrentamento das

desigualdades socioespaciais e por parâmetros de qualidade de vida e de

preservaçãoambiental.Asforçassociaiseosinteressesgravitamemtornodanova

estrutura do PlanoDiretor que assumeuma feição politizada. Para os autores, o

planejamentopolitizado

[...]pressupõeumanovaconcepçãodeplanoegestão,umanovametodologiadeelaboraçãoenovosinstrumentos.Paratantoé fundamentalpartir‐sedeumquadrode referênciasque coloque a cidade comopalco e objeto dos conflitos no

Page 62: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

62

centro do ‘diagnóstico dos problemas urbanos’ e daformulação das ‘diretrizes de desenvolvimento urbano’. Oplano constituir‐se‐á no mapeamento dos interesses e dopalcoterritorialeservirádebaseparaagestãodemocráticadacidade.(RIBEIRO;CARDOSO,2003,p.111).

Noentantoessesavançosnãodeixamescaparograudecomplexidadedos

instrumentosregulamentadospeloEstatutodaCidade.Essegraudecomplexidade

torna‐seumabarreiraparaalgunsgovernoslocais,assimcomoparaatoressociais

envolvidos nos processos de participação. O discurso técnico‐especializado

converte‐se em uma barreira de difícil transposição pelos atores sociais que

clamamporumarranjoinstitucionalparticipativo.

AsprincipaisinflexõesnaatuaçãofederaldogovernoLulaforamacriação

doMinistério das Cidades, o ciclo de Conferências das Cidades e o Conselho das

Cidades.OMinistériodasCidades significou redefiniçõese reformulaçõesparao

escopodaspolíticas federais.OciclodeConferênciasdasCidades,promovidoem

2003,tevecomopressupostoaparticipaçãodosdiversosatoressociaisevisouao

estabelecimentodediretrizesdeatuaçãogovernamental,apartirdarealizaçãode

conferências municipais e estaduais, finalizando na realização da conferência

nacional. O Conselho das Cidades, regulamentado em 2006 pelo Decreto

5790/2006, não possuiu caráter deliberativo mais amplo, mas consultivo para

alguns temas. Mesmo assim, o ConCidades vem produzindo um conjunto de

resoluçõesrelativasàspolíticasurbanasehabitacionais,queconstituemavanços

normativos.

Farah (1997, p.18) argumenta que “os governos locais não apenas têm

ampliado sua esfera de ação,mas têm atuado de forma distinta em relação aos

padrões anteriores e produzido inovações em seus diversos campos de

intervenção”. Segundo o autor, a partir das experiências locais, é possível

identificar algumas vertentes de inovações às mudanças nas características

institucionaisedesenhodaspolíticas,programaseprojetos,taiscomo:

1.Ocunhointersetorial;

2.Ainclusãodenovosatoresnosprocessosdeformulaçãoegestão;

3.AdemocratizaçãodasrelaçõesentreEstadoesociedade.

Page 63: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

63

Nessa concepção de democratização das relações entre o Estado e a

sociedade, o autor ainda aborda três tendências mais gerais de inovação

observadas no contexto brasileiro, a saber: 1. a criação de instâncias de

participação voltadas para as políticas urbanas; 2. as novas lógicas e processos

envolvidos na elaboração dos planos diretores; 3. a incorporação da “cidade

informal” comoobjetodeplanejamentoede políticasurbanas;3.1. as instâncias

institucionaisdeparticipaçãocidadãnaspolíticasurbanas.

A participação cidadã nos governos locais constitui umponto central de

tematização no campo das políticas urbanas, pois contempla a perspectiva de

publicitação de conflitos, a negociação de interesses distintos dos segmentos

sociaiseaafirmaçãoe(re)construçãodeidentidadescoletivas.

Podemos interpretar que a participação tem sido entendida como um

ponto de partida para a democratização das políticas públicas e possibilita a

garantiadosdireitossociaiseareduçãodasdesigualdades.

Portanto,acriaçãodeespaçosdeparticipaçãotemsidoelementonuclear

nareformulaçãodarelaçãoentreEstadoesociedade,configurandoumquadrode

avançosnaspolíticaspúblicasurbanasquevãodoconteúdoàdemocratizaçãodos

processosdeformulaçãoegestão.

Há iniciativas autônomas de criação de espaços de participação de

governos locaiscomoocorremnoscasosdosConselhosdePolíticaUrbanaoude

DesenvolvimentoUrbano,presentesem6%dosmunicípiosem2001(IBGE,2003).

Entendemos que existe uma mudança na condução do processo de

elaboração do Plano Diretor, no final do século XX, a partir da consolidação do

princípio da função social da terra, da previsão dos novos instrumentos

urbanísticos e dos preceitos de gestão democrática das cidades. O caráter

participativo de sua elaboração também revela uma lógica distinta de

planejamentoemrelaçãoàspráticasanteriores.

Nessesentido,épossívelidentificarmosqueoprocessodeelaboraçãodo

plano diretor não sofreu uma simples renovação metodológica, mas rupturas

conceituais com formatos pretéritos imprimindo novas lógicas de formulação e

gestão, assentadas na participação cidadã. Portanto o núcleo das inflexões

Page 64: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

64

presentesnosplanosdiretoresdeváriascidadesbrasileirasnosanos90ancora‐se,

principalmente,nademocratizaçãodoplanejamentoenagestãodascidades,oque

jáseanunciavanoconteúdodasLeisOrgânicasMunicipais.

Portanto,oprocessodedemocratizaçãoedeconstituiçãodenovosatores

comunitários surgiu de modo semelhante à concepção do direito a ter direitos

(SADER,1988;DAGNINO,1994),comocomponentedaredefiniçãodenovosatores

sociais.

Aquestãourbanaestáumbilicalmente conectadaaodesenvolvimentode

um procedimento democrático‐participativo de elaboração de políticas públicas

urbanas. Tanto o desenvolvimento quanto a aplicação de instrumentos que

normatizem o uso e a ocupação do solo estão inseridos em um padrão de

intervenção estatal e de relações entre Estado e sociedade que precisam ser

compreendidos. O padrão de intervenção estatal urbana noBrasil foi desenhado

pelo processo de construção de instrumentos de planejamento urbano que, ao

longo do século XX, variaram em centralização das decisões e recursos, em

fragmentação institucional e, principalmente, em sua impermeabilidade das

políticas e agências públicas criadas para o atendimento das demandas dos

cidadãos. O caráter impermeável aos cidadãos das políticas contribuiu para a

penetraçãode interessesprivadosnaesferaestataleparaaausênciadecontrole

público. Em muitos casos, o poder público, pressionado por atores sociais de

relevânciaeconômica,acaboucedendonaconcessãodebenessescomoperdõesde

dívidasgeradaspelatributaçãoterritorialurbana.

CONCLUSÕES

As análises do processo de instituição de democracias participativas na

Espanha, mais especificamente na Província da Catalunha, apontaram que a

superaçãodomunicípiodebem‐estarcomachegadadomunicípiorelacionaltem

valorizado o papel dos atores sociais no âmbito local. A participação cidadã

representouumaformadesuperarosdéficitsadministrativosepolíticosquetêm

acompanhadoacrisedoEstadodebem‐estarpormeiodo impulsodacogestãoe

docapitalsocial.

Page 65: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

65

Portanto o fim do Estado de bem‐estar é um marco histórico‐teórico

importante para analisarmos a guinada de uma democracia fortemente

representativaparaasuaformaparticipativaduranteasdécadasde1980e1990

naEspanha.

O desenvolvimento de uma democracia participativa local passa, em

primeiro lugar, pela ativação dos interesses individuais dos cidadãos e, em

segundolugar,porumprocessodedotaçãodesentidocoletivoeintensificaçãodas

relaçõesentregovernantesegovernados.

Arevalorizaçãodaparticipaçãonoâmbito localencontradificuldadesno

momento da identificação dos instrumentos que levarão à prática participativa.

Mesmo assim, a proliferação de experiências nos últimos anos nos municípios

catalães mostra que alguns caminhos estão alcançando êxito no despertar dos

interessesindividuaisparaparticiparativamentededebates.

O papel da equidade e da honestidade na comunicação entre os que

impulsionamprocessosdeparticipaçãocidadãeosatoressociaisé fundamental,

pois sem isso muitos dos processos podem ficar opacos ou simplesmente

tendenciosos. Semesses requisitos, aspolíticasdeparticipaçãoeasexperiências

podemdegeneraremsimplesencontrosquechancelamdecisõestomadasapriori.

As análises da instituição dos processos democráticos participativos no

Brasil,assimcomonaEspanha,tambémpartemdasegundametadedoséculoXX,

coma instituiçãodoEstadodoWelfareState nospaíseseuropeus.Esseprocesso

também é apontado por Bobbio (1986) como umamudança de perspectiva em

relação à desconfiançaweberiana com o aumento da capacidade de controle da

burocracia.Nocasoespanhol,issosedegenerouparaofortalecimentodocaráter

representativoetécnicodaburocracia,queatuoueficientementenoatendimento

dasdemandassociaisdosmunicípioscatalãesoque,porseuturno,contribuiupara

o fortalecimentodoqueBobbio (1986)denominoude concepçãohegemônicade

democracia, uma tipologia em que o cidadão abre mão do controle sobre as

atividades políticas e econômicas por ele exercidas em favor de burocracias

privadasepúblicas.

Portantoosprocessosdeaprofundamentodademocraciaparticipativaem

ambos os casos, Brasil e Espanha, estão ligados aos marcos históricos “fim da

Page 66: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

66

guerra fria” e aprofundamento do processo de “globalização”, sobretudo com as

gestões de Margaret Thatcher, na Inglaterra, e de Ronald Reagan, nos Estados

UnidosdaAméricadoNorte,dedesmantelamentodoEstadodebem‐estarsocial.

Esse debate se aprofundamais nos países emque a diversidade étnica émaior,

poisneleshágruposque têmmaiordificuldadepara teros seusdireitosbásicos

reconhecidos,casodoBrasiledaEspanha.

A instituição de uma democracia de caráter participativo no Brasil,

guardando as devidas proporções, parece ter seguido as mesmas intempéries

espanholas.AssimcomonaEspanha–queviveuumlongoperíodosobaégideda

ditadura franquista (1939‐1975) –, o recente processo de democratização pelo

qualoBrasilpassou,apósumtambémlongoperíododitatorial (1964‐1985),não

lheconduziuimediatamenteaumprocessoderadicalizaçãodademocracia.

No caso brasileiro, o processo de democratização e de constituição de

novosatoressociaisbeneficiou‐sedomomentodaconstituinteem1986,quando

diversasdemandassociaisreprimidasseorganizaramnoformatodemovimentos,

comoporexemplo,oMovimentoNacionalpelaReformaUrbana(MNRU).

A diferença entre os dois processos de aprofundamento democrático‐

participativo, o espanhol e o brasileiro, reside, principalmente, no fato de, na

Espanha, ter sido instituído um período de Estado de bem‐estar social pós‐

ditadura e, como seu posterior desmanche, influenciado pela política neoliberal

“thatcherista”, ocorreu um aprofundamento democrático participativo com o

surgimentododenominadomunicípiorelacional.

O Estado de bem‐estar social instituído nos municípios espanhóis e o

consequente recrudescimento da democracia representativa foram a mola

propulsora para o desmantelamento da possibilidade de instituição de uma

radicalização da democracia participativa imediatamente após o término do

regimefranquista(1975).

NoBrasil, o padrão de intervenção estatal e das relações entre Estado e

sociedade fundadas na centralização das decisões e recursos, a fragmentação

institucional, a segmentação no atendimento dos serviços públicos, a

impermeabilidadedaspolíticaseagênciaspúblicasaoscidadãos,apenetraçãodos

interessesprivadosnaesferaestatal e a ausênciado controlepúblico somadosà

Page 67: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

67

supressãodoEstadodeDireitodemocrático,noperíodode1964‐1985, foramas

forçasqueatuaramna implantaçãode instrumentosparticipativosnaelaboração

do texto constitucional de 1988. Esse painel do período ditatorial conduziu o

Estado para um padrão de intervenção, principalmente na área urbana,

tecnocráticoemsuaspráticas,vinculadoaosinteressesimobiliáriosdeacumulação

urbana e impermeável à instituição de possibilidades de participação cidadã na

cunhagemdaspolíticaspúblicas.

Entretanto o processo de aprofundamento democrático no Brasil com

indíciosderompimentoda lógicaacimadescrita,diferentementedoqueocorreu

naEspanha,estárelacionadocom,principalmente,comtrêsforças.Primeiramente

comanecessidadedeimplantaçãodepolíticasurbanasvoltadasparaaequidadee

com o viés redistributivo especialmente com a emergente questão habitacional

comoobjetode tematizaçãoda sociedadecivil.Emsegundo, comoaumentodos

fluxosmigratórioscampo‐cidade,eseureflexonoprocessodecrescimentourbano

eaformaçãodeperiferiasprecáriasdeinfraestruturas.

Em terceiro, pelo ambiente de modernização conservadora e

centralizadora do governo militar que impôs novos arranjos administrativos e

burocráticos.Essastrêsforças,comorompimentodocicloautoritárioem1985e

comaconstituinteapartirde1986,dãoaamplitudedoterrenonoqualemergem

os movimentos sociais que pressionam para a formação de um novo arranjo

democrático no processo de formulação e implementação de políticas públicas

participativas em alguns municípios brasileiros. Destacamos o já citado MNRU

comoumarticuladordeatorescoletivos,noperíododaConstituinte,elaboradorde

propostas de intervenção urbana. O Estatuto da Cidade que, em certa medida,

aprofundaosavançosobtidospeloMNRUnaConstituinte,principalmentenoque

dizrespeitoàregulamentaçãodeinstrumentosvoltadosparaocontroleecoibição

daespeculaçãoimobiliária.

ComoatestaFarah (1997), asexperiências locais inovamseusprocessos

dedesenhodaspolíticas,programaseprojetos sociais inéditosnosprocessosde

formulação e gestão após esse período da Constituinte. Portanto, no Brasil, a

questão de fundo que promoveu a base e a substância da reformulação dos

processosparticipativosdegeração,implementaçãoegestãodepolíticaspúblicas,

Page 68: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

68

é urbana. No caso da Espanha, a crise do Estado de bem‐estar e o consequente

surgimento do município relacional, gerido a partir de um contexto de

amplificação da participação cidadã na formulação, implementação e gestão das

políticas públicas, impulsionou uma reconfiguração desse processo. Os cidadãos

espanhóisseviramaleijadosdeumconjuntodeserviçospúblicos,antesoferecidos

comoumamoedadetrocapeloseuenvolvimentoapenas formalcomoprocesso

democrático.Emquepesemasexplicaçõestradicionais,essecontextoimpulsionou

oscidadãosasemobilizaremparacanalizarseusinteresseseassimtentarsuperar

odéficitadministrativoepolíticoqueacompanhouacrisedoEstadodebem‐estar.

Claraestá,emambososprocessos,queainstauraçãodeumcenáriocrítico

desupressãoouaausênciadepolíticaspúblicasfocadasfoiamolapropulsoradas

transformações operadas no arranjo democrático que rompe seu caráter formal

representativo e oxigena‐se com a proposta participativa na construção de

políticaspúblicas.

REFERÊNCIAS

ALVAREZ,S.;DAGNINO,E.;ESCOBAR,A.Culturesofpolitics,politicsofcultures:revisioningLatinAmericansocialmovements.Boulder:WestviewPress,1998.

BECERRA, C. A. B. (Coord.). Presupuesto participativo: herramienta para lademocracia.CongressodelEstadode Jalisco.Guadalajara: InstitutoElectoraledeParticipaciónCiudadanadelEstadodeJalisco,2011.

BENHABIB, S. Toward a deliberative model of democcratic legitimacy. In:BENHABIB,S.(Org.).Democracyanddifference.Princeton:PrincetonUniversityPress,1996.p.67‐94.

BENTHAN,J.Umfragmentosobreelgobierno.Borradordeumprefacioprevistoparalasegundaedición.Salamanca:EditoraTecnos,2012.(Colecciónclássicosdelpensamento).

BOBBIO,N.Ofuturodademocracia.SãoPaulo:PazeTerra,1986.

BÓRON,A.Estado,capitalismoedemocracianaAméricaLatina.SãoPaulo:PazeTerra,1994.

BRASIL. Assembleia Nacional Constituinte. Recife: Companhia Editora dePernambuco,1989.

Page 69: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

69

BRUGUÉ, Q. El gobierno local en Catalunya: construcción y reconstrucción delmunicipio de bienestar. In: AAVV. La nova Europa social e els municipis.Barcelona:PatronatFlordeMaig,1997.

BRUGUÉ, Q.; GALLEGO, R. Una administración pública democrática? In: FONT, J.(Ed.).Ciudadanosydecisionespúblicas.Barcelona:Ariel,2001.p.43‐58.

BRUGUÉ,Q.;GÓMA,R. (Ed.).Gobiernos localesypolíticaspúblicas.Barcelona:Ariel,1998.

CASTORIADIS,C.Asencruzilhadasdolabirinto.SãoPaulo:PazeTerra,1986.

COHEN, J. Procedure and substance in deliberative democracy. Cambridge:MIT,1997.

DAGNINO, E.Osmovimentos sociais ea emergênciadeumanovanoçãodecidadania.Osanos90:políticaesociedadenoBrasil.SãoPaulo:Brasiliense,1994.

______. (Org.). Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. São Paulo: Paz eTerra,2002.

DAHL,R.Umprefácioàteoriademocrática.RiodeJaneiro:Zahar,1998.

FARAH,M.F.S.EstadoehabitaçãonoBrasil:ocasodosInstitutosdaPrevidência.Espaço&Debates,n.16,a.5,p.73‐82,1985.

FOX,C.;MILLER,H.Posmodernpublicadministration.Londres:Sage,1995.

GOMÀ, R. El estado de bienestar y los gobiernos locales. In: AAVV. La nuevaEuropasocialielsmunicipios.Barcelona:PatronatFlordeMaig,1997.p.20.

GOMÀ,R.;FONT,J.Lademocracialocal:unmapadeexperienciasparticipativas.In:FONT,J.(Ed.).Ciudadanosydecisionespúblicas.Barcelona:Ariel,2001.p.61‐76.

GOSS,S.Makinglocalgovernancework.Londres:Palgrave,2001.

GYFORD,J.Citizens,consumersandcouncils.Londres:Macmillan,1991.

HABERMAS, J. O Estado‐nação europeu frente aos desafios da globalização: opassadoeo futurodasoberaniaedacidadania.NovosestudosdoCEBRAP,SãoPaulo,n.43,p.87‐101,1995.

IBGE.Dadosdosmunicípiosbrasileiros:bancodedadoscidades.Disponívelem:<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>. Acesso em: 21 mar.2012.

INGLEGART,R.Elcambioculturalen las sociedades industrialesavanzadas.Madrid:CIS,1991.

Page 70: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

ESPANHA E BRASIL NA CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: CLIVAGENS E CONSENSOS 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

70

LECHNER,N.Lospatiosinterioresdelademocracia.México:FondodeCulturaEconomica,1988.

LEFORT,C.Pensandoopolítico.SãoPaulo:PazeTerra,1986.

LIJPHART,A.Democracies.Patternsofmajoritarianandconsensusgovernmentintwenty‐onecontries.NewHaven:YaleUniversityPress,1984.

MANIN, B. The principles of representative government. Cambridge:CambridgeUniversityPress,1997.

MARICATO, E. As ideias fora do lugar e o lugar fora das ideias. Planejamentourbano no Brasil. In: ARANTES, O.; VAINER, C.; MARICATO, E. A cidade dopensamento único: desmanchando consensos. Petrópolis: Vozes, 2000. p.121‐192.

MILL,J.S.Filosofíayteoriadelderecho.Salamanca:EditoraTecnos,2012.

MILLS, C. W. A sociedade de massas. In: FORACCHI, M. M.; MARTINS, J. S.Sociologiaesociedade:leiturasdeintroduçãoàsociologia.SãoPaulo:LTC,1977.p.307‐325.

NUN, J.Democraciagobiernodelpuebloogobiernode lospolíticos?BuenosAires:FondodeCultura,2000.

PECHMAN,R.M.Olharessobreacidade.RiodeJaneiro:EditoradaUFRJ,1994.

POLIS.Estatutodacidade:guiaparaimplementaçãopelosmunicípiosecidadãos.Brasília:CâmaradosDeputados,2001;Glasgow:Fontana,1981.

PUTMAN, R. Making democracy word. Princeton: Princeton University Press,1993.

RIBEIRO, L. C. Q.; CARDOSO, A. L. Da cidade à nação: gênese e evolução dourbanismo no Brasil. In: RIBEIRO, L. C. Q.; PECHMAN, R. (Org.).Cidade,povo enação:gênesedourbanismomoderno.RiodeJaneiro:CivilizaçãoBrasileira,1996.p.53‐78.

______.Oestatutodacidadeeaquestãourbanabrasileira.In:______;______.Reformaurbanaegestãodemocrática.RiodeJaneiro:Revan,2003.p.11‐26.

RIDLEY, N.The local rigth enablingnotproviding. Londres: Centre for PolicyAnalysis,1998.

SADER, E. Quando novos personagens entraram em cena. São Paulo: Paz eTerra,1988.

SANTOS, B. S. Democratizar a democracia: os caminhos da democraciaparticipativa.2.ed.RiodeJaneiro:CivilizaçãoBrasileira,2003.

Page 71: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TOLEDO 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 40‐71, jan./jun. 2012 

71

SCHUMPETER, J. E. On the concept of social value. Quarterly Journal ofEconomics,v.23,1908‐1909,p.213‐232.

STEWART, J.; STOKER, G. (Ed.). The future of local government. Londres:Macmillan,1989.

STOKER,G.(Ed.).Thepoliticsoflocalgovernment.Londres:Macmillan,1988.

SUBIRATS,J.Nousmecanismosparticipatiusidemocracia:promesesiameaces.Londres:Macmillan,1998.

SUBIRATS, J. et al. Experiències de participació ciutadana en lesmunicipiscatalans.Barcelona:Escolad’AdministracióPúblicadeCatalunya,2001.

VILLAÇA, F. A estruturação demetrópole sul‐brasileira. 1978. 120 páginas.Tese (Doutorado em Geografia) – Faculdade de Filosofia, Letras e CiênciasHumanas,UniversidadedeSãoPaulo,SãoPaulo,1978.

______.Espaço intra‐urbanonoBrasil. São Paulo: Studio Nobel/Fapesp/LincolnInstitute,1999.

WEBER,M.Os fundamentosdaorganizaçãoburocrática:umaconstruçãodo tipoideal.In:CAMPOS,E.Sociologiadaburocracia.RiodeJaneiro:Zahar,1978.p.15‐28.

WILLIAMS, E. On the notion “lexically related” and “head of aWord”.LinguisticInquiry,n.12,p.245‐74,1981.

YOUNG,I.M.InclusionandDemocracy.Oxford:OxfordUniversityPress,2000.

Page 72: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

POTENCIALNATURALEANTRÓPICODEEROSÃONABACIAEXPERIMENTALDORIACHOGUARAÍRA

 Artigo recebido em: 01/02/12  Revisado em: 05/05/12 Aprovado em: 25/05/12 

    

Samir G. Fernandes Costa ¹ 

Richarde Marques da Silva² 

                  

¹

²

Universidade Federal da Paraíba Bolsista IC/Pibic/CNPq [email protected] 

 Universidade Federal da Paraíba [email protected]  

     Correspondência:  Richarde Marques da Silva Departamento de Geociências Cidade Universitária João Pessoa‐PB, Brasil CEP 58051‐900   

RESUMOA intensificação das práticas agrícolas e expansão urbana em baciashidrográficas têm acelerado os processos de erosão. Dessa forma, háuma necessidade de estudos que estimem e analisem perdas de soloatravés do uso de modelos empíricos de perdas de solo acoplados aSistemasdeInformaçõesGeográficas.EstetrabalhoanalisouaevoluçãodasperdasdesoloatravésdaUSLEeidentificaasáreasmaissuscetíveisaos processos erosivos na Bacia Experimental do Riacho Guaraíra emdoisperíodos(1974e2011).Comosvaloresdosfatoresantrópicosfoiestimada a expectativa de erosão. As perdas de solo acima de 20ton/ha/ano se concentraram nas regiões com presença de cana‐de‐açúcaresoloexposto,alémdisso,sãoáreas derelevoonduladoedetipodesoloArgissoloVermelhoAmarelo.Pode‐seconcluirque autilizaçãointegradaentreaUSLEeaferramentaSIGsemostrouumaferramentaeficazepromissoranarepresentação espacialdasperdasdesoloenaidentificaçãodasáreasmaisvulneráveisàerosão.Palavras‐chave:Modelagem,perdadesolo,SIG.

ANTHROPICANDNATURALPOTENTIALOFEROSIONINTHEGUARAÍRABASINEXPERIMENTALABSTRACTThe intensification of agricultural practices and urban sprawl inwatershedshasacceleratederosionprocesses.Thus,thereisaneedforstudies that estimate and analyze soil losses through the use ofempirical models of soil loss coupled with Geographic InformationSystems. This paper analyzed the evolution of soil loss by USLE andidentifies the areasmostsusceptible to erosion in theGuaraíraRiverExperimentalBasin in twoperiods(1974and2011). In addition, thevaluesofanthropicfactorsforerosionexpectationwereestimated.Soilloss above 20 t/ha/year it is concentrated in the regions with thepresence of sugarcane and bare land,moreover, these areas possesssteep slope andsoil typeAcrisolYellow‐Red.Thus, canbe concludedthattheintegrateduseoftheUSLEandGIStoolprovedaneffectiveandpromising tool in the spatial representation of soil losses and toidentifyareasmostvulnerableforsoilerosion.Keywords:Modeling,soilloss,GIS.

    

Page 73: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

72

INTRODUÇÃO

Aocupaçãoemanejoinadequadosembaciashidrográficasvêmatingindo

níveis críticosem todoomundo, refletindoemgrandesprejuízosparaa fauna e

flora, dependendo das características físicas e da capacidade de recomposição

vegetaldessesambientes.

ParaBertonieLombardiNeto(1999)oprocessoderetiradadacobertura

vegetal,alémdemodificaraspectosdapaisagem,diminuiaestabilidadedosoloe

ocasiona a produção de sedimentos impulsionados pela erosão laminar,

impermeabilizandoereduzindoafertilidadedosolo.Vanzelaetal.(2010)afirmam

quealémdessesimpactosocorretambémoassoreamentoderiosereservatórios,

deteriorandoaqualidadedaáguaereduzindoadisponibilidadehídrica.

Nesse sentido, Mello et al. (2005) discorrem que a introdução de

geotecnologiasqueresultememinformaçõesespaciaissobreaevoluçãohistórica

do uso e ocupação do solo diante de seu quadro atual, é primordial não apenas

para a quantificação das perdas de solo e identificação de áreas críticas, mas

também para o planejamento conservacionista. Segundo Carvalho (2006), a

utilização de Sistemas de Informação Geográfica (SIG) aliados a técnicas de

SensoriamentoRemotoemodelagemmatemáticapossibilitaobterinformaçõesde

maneirarápidaecombaixocustoeconômicoeservemnaelaboraçãodeaçõesde

planejamento emanejo adequado do solo. Integrando‐se essas geotecnologias, é

possível estimar e analisar perdas de solo a partir de fatores que exercem forte

influência nos processos de erosão de solos. Essas estimativas em análise de

perdasdesolosãorealizadaspormodelosdeprediçãoqueaoseremaplicadosem

ambiente SIG produzemdados espaciais valiosos na identificação e avaliação da

suscetibilidadeàerosãoemdiferentestiposdesolo.

Um dos métodos mais utilizados na estimativa de perdas de solos por

erosão laminar é aplicando a USLE – Equação Universal de Perda de Solo

(Wischmeier e Smith, 1978), desenvolvida nos Estados Unidos. Os primeiros

trabalhosempregandoessaequaçãonoBrasilforamdesenvolvidosporLombardi

NetoeBertoni(1975),noEstadodeSãoPaulo.NaParaíbapodemsercitadosos

trabalhos de Albuquerque et al. (2004) em uma área representativa a

Page 74: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

73

suscetibilidadenaturaleoriscodeerosãoeSilvaetal. (2007)utilizandoaUSLE

modificada(RUSLE)noestudodaBaciaGuaraíra.

Estetrabalhotemporobjetivoanalisarosimpactosdamudançanousodo

solo nas perdas de solo na Bacia Experimental do Riacho Guaraíra em dois

períodos (1974 e 2011), visando assim fornecer subsídios para um manejo

adequado do uso e ocupação dos solos e dos recursos hídricos em bacias

hidrográficas.

MATERIALEMÉTODOS

LocalizaçãoecaracterizaçãodaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra

ABacia Experimental RiachoGuaraíra possuiuma área de drenagemde

5,73km²eestá localizadaentreascoordenadas9.191.000mNa9.195.000mNe

275.000mEa276000mE,entreosmunicípiosdeAlhandraePedrasdeFogo,na

MicrorregiãoLitoralSuldoEstadodaParaíba.

Essa bacia faz parte da Bacia Hidrográfica do Rio Gramame, uma das

baciasmaisimportantesporseramatrizfornecedoradeáguaparaosmunicípios

de João Pessoa, Conde, Santa Rita, Bayeux e Cabedelo que compõem a Região

MetropolitanadenominadadeGrandeJoãoPessoa.Deacordocomaclassificação

deKöppenabaciaestáemumazonaAs’,oqueindicaumclimatropicalchuvoso.O

regime de chuvas ocorre principalmente nosmeses deMaio Junho e Julho, com

precipitaçãomédiaanualde1615,45mm/ano.

Na década de 70 com a crise do petróleo o governo brasileiro

implementouumprogramadeincentivoaproduçãodacana‐de‐açúcaremtodoo

país, o Proálcool (Programa Nacional do Álcool), esse programa apareceu como

umaalternativadesubstituirocombustívelgasolina.

NaParaíbao cultivoda canaveioa transformarprincipalmenteasáreas

ruraislitorâneascomaedificaçãodeusinasdeaçúcareálcool,recobrindotantoa

faixanortequantoafaixasuldaZonadaMataParaibana.Antesdainstalaçãodeste

programa,apenas477estabelecimentosruraisutilizavamadubosquímicosnessa

região. Em 1985, após dez anos de vigência do Proálcool, esse número já era

superior a 5.000. As despesas com fertilizantes também crescerammuito nesse

Page 75: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

74

período. Em1970, elas perfaziam apenas 6,6% do total das despesas realizadas

pelos estabelecimentos agrícolas, passando a representar 14,5% em 1985.

(MOREIRAetal.,1997).

Figura1.LocalizaçãodaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra.

No caso específico do litoral sul paraibano, onde está inserida a Bacia

Experimental Riacho Guaraíra, a cultura da cana‐de‐açúcar nos últimos 30 anos

implicou em grandes alterações na paisagem. A intensificação dessa prática

agrícola comomonocultura, não oferece cobertura vegetal eficiente ao solo, que

ficadesprotegido,podendoocasionararetiradadohorizontesuperficialpelaação

daságuasdachuva.Alémdessesimpactosháosimpactosquímicos,poraplicação

decorretivosdesolos,quepodeminfiltrareimpactarolençolfreático.Destemodo

Page 76: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

75

a reconstituir a evolução douso e ocupação do solo possibilitou acompanhar as

transformações associadas às atividades existentes na bacia, que podem ser

problemáticas,principalmenteemtermosambientais.

Utilizaçãodegeotecnologiasnaanálisedousoeocupaçãodosolo

Os estudos envolvendo o uso e ocupação do solo por imagens orbitais

geradas de satélites surgiram com as primeiras tecnologias de Sensoriamento

Remotonocomeçodadécadade1970comolançamentodoLANDSAT1em1972

atémeadosdadécadade1980.

Segundo Almeida (2010), o Brasil foi pioneiro em termos de ciência

espacial, pois apenas os Estados Unidos e Brasil dispunham de antenas para

recepção dos dados, quando em 1972, foi lançado o primeiro satélite civil

comercial de observação da Terra, o ERS (Earth Resources Satellite), que

posteriormente veio a se chamar de LANDSAT1. A partir do final da década de

1980foramcriadosmuitosmodeloscomacapacidadedeutilizartodoopotencial

do SIG comoArcViewSpatialAnalyst,ArcView3DAnalyst,ErMapper,Sprinter e

principalmenteoSWAT(SoilandWaterAssessmentTool)(SILVA,2010).

Com a evolução dos sistemas computacionaisadquirida nas últimas três

décadas no que se refere à disponibilização de imagens com alta resolução

espacial, a integraçãodebases físicasemambientesSIGganhougrande impulso,

proporcionandoumaanáliseespacialdosprocessosnaturaisemqualquerpartedo

planeta.Aproduçãocientíficaaumentouconsideravelmentenosúltimosanosno

Brasilaoquesereferedaanalisedosprocessosdeerosãodossolosemodelagem

hidrossedimentológicapormeiodeumSIG(SistemadeInformaçãoGeográfica).

Osavançosnessesestudostêmdifundidoumasériedemétodosetécnicas

quevemestabelecendouma importante formade se conhecero comportamento

hidrossedimentológico de bacias. Para Silva e Santos (2008) as aplicações de

modelos hidrossedimentológicos incorporadas a Sistemas de Informações

Geográficas(SIG),possibilitamarepresentaçãoespacialdosresultadosobtidosda

modelagem,principalmentenaelaboraçãodemapas temáticos,oqueauxilianas

Page 77: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

76

análises espaciais e no cruzamento de dados tabulares e de informações

geográficas.

Essas informações permitem produzir um banco de dados das

informações de uso e ocupação do solo; perda do solo; dinâmica hídrica; entre

outros dados de base física. Assim, um sistema integrado de análise ambiental

acoplado a um SIG torna‐se extremamente vantajoso e pode ser utilizado para

planejamentoegestãodousoeocupaçãodosoloedosrecursoshídricos.

Para a BaciaGuaraíra omapeamento da evolução do uso eocupaçãodo

solodafoirealizadoemambienteSIGutilizadoprimeiramenteacartatopográfica

do RioMamuaba na escala de 1: 25.000 (SB‐25‐Y‐C‐II‐4‐NE) de 1974. Já para o

mapeamentode2011utilizou‐seimagenspancromáticasdealtaresoluçãoespacial

do satélite QuickBird. O uso do solo foi vetorizado em ambas as imagens, e de

acordoFitz(2008),esseprocessoérealizadopormeiodaidentificaçãovisualem

tela de computador, utilizando uma imagem previamente tratada, a qual será

desenhada com auxílio de um mouse com. Por meio das representações

matemática da distribuição dos fenômenos espacial existentes criaram‐se

estruturas de representação, onde os valores dos atributos foram obtidos por

procedimentos de interpolação a partir do conjunto de amostras do Modelo de

Elevação do Terreno (MDE). Em seguida as classes foram fotointerpretadas

manualmenteemtela,proporcionandooagrupamentodasmesmas.

Segundo Florenzano (2008) esse método de interpretar fotografias ou

imagensorbitais é identificarobjetosnelas representadosedarumsignificadoa

essesobjetos.Quantomaiorforaresolução,emaisadequadaaescala,maisdireta

efáciléaidentificaçãodosobjetosemumaimagem.Essasimagensorbitaisalém

possibilitaremafotointerpretação,tiveramgrandeimportâncianosmapeamentos,

pois permitiram analisar as classes que pertenciam aos usos mais recentes da

baciaGuaraíra.

AplicaçãodaUSLE

Osmodelosempíricosbaseiam‐seemexperiênciasouemconhecimentos

obtidos por percepção dos fenômenos ambientais. Em geral são formulados por

Page 78: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

77

regressões cujos coeficientes são definidos experimentalmente. Através das suas

respostas há um melhor entendimento dos processos hidrossedimentológicos

favorecendo uma maior proximidade de como é o processo do ciclo

hidrossedimentológico. A consideração da variação espacial da bacia e espaço‐

temporal da precipitação faz com que os mesmos possam ser utilizados para a

análise dos impactos causados pelo uso da terra sobre os processos erosivos. O

significado físicodos parâmetros permite analisar a variação do comportamento

dosistemadevidoàvariaçãoemalgumcomponentedomesmo(SANTOS,2009).

ParaanálisedasperdasdesolonaBaciaGuaraírafoiutilizadaaEquação

UniversaldePerdadeSolodeWischmeiereSmith(1978),aplicandoosfatoresque

exercem influência na área de estudo. O cálculo foi realizado totalmente em

ambienteSIGapartirdetécnicasdegeoprocessamento.

PCLSKRA (1)

sendoAasperdasdesolo(t/ha/ano),Rofatordeerosividade(Mj.mm/ha/h/ano),

K o fator de erodibilidade dos solos (t.h/Mj/mm), LS (fator topográfico) e os

fatoresadimensionaisCeP (Manejoeusodo soloePráticas conservacionistas),

foramgeradosmapastemáticos,queserviramdebaseparaanálisedasperdasde

soloeidentificaçãodasáreasmaissuscetíveisaosprocessoserosivos.

FatorR(erosividade)

SegundoBertoni&LombardiNeto(1999),oFatorRéumíndicenumérico

que expressa a capacidade da precipitação em causar erosão em uma área sem

proteção (Equação 2). Para compor essa equação foram utilizados dados

pluvioméricos diários dos últimos 30 anos, obtidos de três postos de coleta que

estão localizadosnasproximidadesdabacia, apresentadosnaTabela2.Osdados

foram interpolados utilizando o método do Inverso do Quadrado da Distância

(IDW), essemétodo de interpolação global utiliza se baseia no principio de que

quantomais próximo estiver um ponto do outro,maior deverá ser a correlação

entreseusvalores.

Page 79: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

78

0,759212

1

89,823 m

i a

PR

P

(2)

sendoRofatordeerosividade(MJ.mm/h/ha),Pmprecipitaçãomédiamensal(mm)

ePaaprecipitaçãomédiatotalanual(mm).

Tabela1–Localizaçãogeográficaeperíododedadosdasestaçõespluviométricas

Postos Latitude(m) Longitude(m) Períododosdados

FazendaMamuaba 9.196.187 276.378 1969–1989Imbiribera 9.196.257 273.659 1969–1989

RiachodoSalto 9.190.734 275.524 1969–1989

FatorK(erodibilidadedosolo)

Ofatorerodibilidadepodeserdefinidocomoàsusceptibilidadedosoloa

erosão. Esse fator foi obtido por meio da associação do mapa de solos da

EMBRAPA (1999)edaatribuiçãodevaloresdeerodibilidadecorrespondentes a

cadaclassedetiposdesolo,conformeométodopropostoporFarinasso(2006).

FatorLS(fatortopográfico)

Paraobtençãodofatortopográfico(fatorLS),querepresentaoparâmetro

de comprimento da encosta e o grau de declividade, este fator foi obtido pela

equação desenvolvida por Moore e Burch (2006) e utilizada por Zhang et al.

(2009).

3.14.0

0896.0sin

13.22

VLS (3)

sendoVaacumulaçãodefluxopelotamanhodacélulaeθoângulodadeclividade

emgraus.

Page 80: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

79

FatoresCeP(usoemanejodosoloepráticasconservacionistas)

Segundo Bertoni e Lombardi Neto (1999), o fator uso emanejo do solo

expressaarelaçãoesperadaentreperdasdesolosemáreascomculturasagrícolas

evegetação,comáreascontinuamentedescobertas.Comoaanálisedasperdasde

soloébaseadaemumasérieespacialhistórica,foirealizadoumaanálisedosusos

dosolopara1974e2011.Quantoofatorpráticasconservacionistas,Wischmeiere

Smith(1978)explicaqueexpressaumarelaçãoentrea intensidadedeperdasde

solocomumadeterminadapráticaconservacionistaeasperdasquandoacultura

estaplantadanosentidododeclive,ouseja,morroabaixo.

Os valores para os dois fatores foram estipulados adotando os valores

encontradosnaliteratura,ondeestesforamintegrados,umavezquenãosepode

identificar em campo práticas conservacionistas na área de estudo diante da

dificuldade em tabular tais informações. Os valores são adimensionais e estão

descritosnaTabela2.

Tabela2–UsosdosolonabaciaerespectivosvaloresdosFatoresCeP

Usosdosolo FatoresCePCana‐de‐açúcar 0,0012

Cerrado 0,01Mata 0,019

SoloExposto 1,0Fonte:AdaptadodeBertonieLombardiNeto(1990).

RESULTADOSEDISCUSSÕES

AquantificaçãodasperdasdesolonaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra

possibilitou estimar a produção de sedimentos e gerar mapas temáticos de

Erosividade, Erodibilidade, topografia, uso e ocupação do solo e práticas

conservacionistas,dosquaisseobteveosmapasdeperdasdesolode1974e2011.

Já para a estimativa do PotencialNatural de Erosção foramutilizados os fatores

físicosqueexerceminfluêncianabacia(R,K,LS),apartirdosquaisserealizoua

espacializaçãodasestimativasdeperdadesolo.

Page 81: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

80

ErosividadedasChuvas

Os resultados da análise da erosividade das chuvas (fator R) na bacia

revelamqueovalormédioanualparaaárea foide7.739Mj.mm/ha/h/ano,com

umdesviopadrãode686,44Mj.mm/ha/h/ano.Asestimativasapresentaramuma

variaçãode7.485a8.516Mj.mm/ha/h/ano,osmaioresvaloresestiveramentrea

classede7.486a8.516Mj.mm/ha/h/ano.

Com base na classificação propostas por Carvalho (2008), os valores

estimadosdeerosividadeforamdispostosemclassesdeerosividadeefragilidade,

comopode servistonaTabela3.Os resultados revelamquepara a classe7.485

Mj.mm/ha/h/anoafragilidadefoiconsideradacomomédiaforte,jáaclasse8.516

foiconsideradacomoalta.

Tabela3–RelaçãoentreasclassesdeErosividadeefragilidadedossolosdabacia

Classesdeerosividade(Mj.mm/ha/h/ano)

Classesdefragilidade

7.485 MédiaForte8.516 Alta

Fonte:AdaptadodeCarvalho(2008).

Figura2.MapadaErosividadedaBaciaGuaraíra.

Page 82: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

81

ErodibilidadedosSolos

Nabaciaforamidentificadosdoistiposdesolos,otipoArgissoloVermelho

Amarelo e o Podzol Hidromórficos. De acordo com a classificação de solos da

EMBRAPA(1999),essessolostêmporcaracterísticaumaconsiderávelresistência

à erosão, sendo que o tipo Podzol Hidromórfico é ainda mais resistente aos

processos erosivos. A partir dos tipos de solo encontrados na bacia, a Tabela 3

apresenta os valores do fator k associados aos solos existentes, sendo estes

divididosemduasclasses.

Tabela4–SoloserespectivosvaloresdeErodibilidadedabacia

Classes TiposdeSolo Área(km²)

Erodibilidade(t.h/Mj/mm)

Pv19 ArgissoloVermelhoAmarelo 4,68 0,044HP3 PodzolHidromórfico 1,05 0,014

Osvaloresdeerodibilidadeencontradosparaosdoistiposdesolorevelam

queotipoArgissoloAmarelovermelho(classePv19)apresentamaiorvalorcom

0,044 t.h/Mj/mm, enquanto que o tipo Podzol Hidromórfico (classe Pv19)

apresentamenor valor com0,014 t.h/Mj/mm.Dos resultados obtidos do fator k

verificou‐se que o tipo de solo Argissolo Vermelho Amarelo apresenta uma

suscetibilidadeerosivasuperioremrelaçãoaotipodesoloPodzolHidromórfico.

Na espacialização dos dois tipos de solo encontrados (Figura 3), foi

possível verificar que o tipo Argissolo Vermelho Amarelo ocupa quase que toda

extensão da bacia, enquanto que o tipo Podzol Hidromórficos ocorre apenas na

porçãosudeste.

Page 83: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

82

Figura3.MapadeErodibilidadedesolosdaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra.

FatorTopográfico

A partir do fator topográfico (LS) identificou‐se que nas áreas onde há

convergênciadeacumulaçãodefluxo,ouseja,ondeossedimentosseacumulame

asdeclividadessãomaisacentuadas,ovalordeLStendeuasermaior.

Conforme a tabela 4, os menores valores obtidos do fator LS

compreendemaclassequevariade0a1,048,estaclasseocupaumaáreade4,70

km²,oque representa80,6%dabacia.Osmaioresvaloresvariaramde11,003a

23,745,oquecorrespondea0,03km²,ouseja,0,5%daáreatotaldabacia.

Tabela5–ClassesdoFatorTopográficonabacia

ClassedeLS Área(km²) %0–1,048 4,70 80,6

1,049–2,933 0,55 9,62,933–5,446 0,29 6,3

5,447–11,002 0,16 3,011,003–23,745 0,03 0,5

Page 84: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

83

Na espacialização do fator topográfico verificou‐se que as classes cujos

valores forammaisexpressivos, localizam‐senaporçãonortedabacia, emáreas

íngremespróximasaocursodorio.Osresultadosdadeclividaderepresentadosna

tabela7demonstrarambaixaamplitude,comvariaçãode0a12,3.Relacionandoas

declividades da bacia Guaraíra com a classificação da Embrapa (1999), a bacia

apresenta classes de relevo de plano a ondulado, havendo um predomínio da

classe0a3,3,queocupa4,65km²(81%)deárea,oquedemonstraqueabacianão

apresentagrandesoscilaçõesderelevo.

Tabela6–Distribuiçãodasclassesdedeclividadeseáreascorrespondentes

Declividade Relevo Área(km²) %0–3,3 Plano 4,65 81,03,4–8,7 Suavementeondulado 0,62 11,08,8–12,3 Ondulado 0,46 8,0

Fonte:Adaptado,EMBRAPA(1999).

Figura4–MapadoFatorLSparaaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra.

Page 85: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

84

EvoluçãodoUsoeOcupaçãodoSolo

Conforme a Tabela 7, no mapeamento para o ano de 1974 foram

encontradas as classes cana‐de‐açúcar, cerrado e mata. Já para o ano de 2011

foram encontradas as classes cana‐de‐açúcar, cerrado, mata e solo exposto. A

composição vegetal representada pelas classesmata e cerrado recobriam juntas

umaáreabastanteconsideráveldabaciaem1974,ocupando5,29km²(92,5%)da

área total. Para o ano de 2011, as classes: mata e cerrado, juntas, ocupam

atualmenteumaáreade3,61km²(63,1%).

Noqueserefereàclasse soloexposto foiobservadooseuaparecimento

apenasparaoanode2011ocupando0,22km²(3,80%),talocorrênciapodeestar

relacionadoàausência totalda coberturavegetalporaçãoerosivaou comáreas

preparadasparaoplantiodaculturacana‐de‐açúcar.

As espacializações das classes de uso e ocupação representadas nas

Figuras7e8possibilitarama identificaçãodasatividadesexistentesnabaciaem

1974e2011,alémdecontribuirparaaanalisedoprocessodeevoluçãodasáreas

maisvulneráveisaerosão.

Tabela7–Usoeocupaçãodosoloparaosperíodosde1974e2011emkm²

1974 2011ClasseÁrea(km²) % Área(km²) %

Cana‐de‐açúcar 0,44 7,5 1,90 33,1Cerrado 3,80 66,8 2,69 46,8Mata 1,49 25,7 0,92 16,3

SoloExposto – – 0,22 3,80TOTAL 5,73 100,0 5,73 100,0

EstimativadasPerdasdeSolo

Osresultadosobtidosdasperdasdesolodabaciaestãorepresentadosna

tabela 8 e foram distribuídos em 6 classes de perda de solo, cujos intervalos

variaramde0a>20ton/ha/ano,tantoparaoperíodode1974quantoparaode

2011

No que se refere às perdas de solo para o ano de 1974 os resultados

sugeremqueaproduçãodesedimentosrepresentadapelaclassede0a5t/ha.ano

Page 86: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

85

compreendiaquasetodabacia,ocupandoumaáreade5,29km²(91,8%),enquanto

queaclassede>20t/ha.anotinhaumaproduçãodesedimentosreferenteauma

área de apenas 0,13 km² (2,5%). Para o ano de 2011 houve um aumento

considerávelnaproduçãodesedimentosnoqueserefereàclassecomperdasde

solo > 20 t/ha.ano, correspondendo a 5,6 % da bacia. Não foram encontradas

perdasdesolosuperioresa50ton/ha/anoemambososperíodos.

Figura5.Classesdeusoeocupaçãodo

soloem1974.

Figura6.Classesdeusoeocupaçãodo

soloem2011.

Emconcordânciacomomapeamentodousoemanejodossolosdabacia,

na análise evolutiva das classes de perdas de solo verificou‐se que houve um

aumentoem5vezesda classede>20 t/ha.anode1974a2011. Issopodeestar

relacionado ao aumento do desmatamento em faixas que possuem declividades

maisacentuadas,próximasaocursodorioquecortaabacia.

Nas Figuras 7 e 8 é representada a distribuição espacial das perdas de

solodabaciaGuaraíranosdoisperíodosestudados.Naespacializaçãodasclasses

verificou‐sequeasaltasperdasdesolo(acimade20ton/ha/ano),concentraram‐

se nas regiões com cana‐de‐açúcar e solo exposto. Esses setores são

Page 87: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

86

potencialmentemaissuscetíveisaosprocessosdeerosão,devidooconjugadodas

característicaserosividade, erodibilidade,edeclividade,alémdisso, temoagravo

dainfluênciadaaçãoantrópicacomocultivodacananessasparcelas.

Tabela8–Perdasdesolode174e2011poráreaocupada

1974 2011Classes(t/ha.ano) Área(km²) % Área(km²) %

0‐5 5,29 91,8 4,94 86,66‐10 0,12 2,4 0,18 3,211‐15 0,10 1,7 0,15 2,416‐20 0,09 1,6 0,12 2,2>20 0,13 2,5 0,34 5,6

Figura7.MapadasPerdasdesolosem1974.

Page 88: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

87

Figura8.MapadasPerdasdesoloem2011.

Comrelaçãoàsperdasdesolossegundoostiposdesolos,verificou‐seque

as maiores perdas de solo ocorrem onde estão presentes os solos Argissolo

Vermelho Amarelo e onde também se concentra a classe cana‐de‐açúcar. Na

porçãoondeseencontraotipoPodzolHidromórficoosmaioresvaloresdeperdas

desoloforamencontradosnasáreascomsolosexpostossomenteparaoperíodo

de2011.

Aoanalisarosresultadosdosdoisperíodosebaseando‐senaclassificação

deFAO(1967),conformeatabela9,osvaloresdeperdasdesolonabacia foram

consideradosdebaixosamoderados.

Page 89: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

88

Tabela9–PerdadesoloporGraudeerosão

Perdadesolo(t/ha.ano) Graudeerosão<10 Baixo

10–50 Moderado50–200 Alto>200 Muitoalto

Fonte:AdaptadodeFAO(1967).

CONSIDERAÇÕESFINAIS

AutilizaçãointegradaentreSIGeaUSLEsemostrouumatécnicaeficazna

representaçãoespacialdasperdasdesolonaBaciaExperimentalRiachoGuaraíra

enaidentificaçãodasáreasmaissuscetíveisaerosão.

Osvaloresestimadosdeperdasde soloparaosdoisperíodosestudados

sugerem que houve um aumento considerável do desmatamento durante os

últimos30anos.Apesardeos tiposdesoloencontradosnabaciaoferecemcerta

resistência à erosão, a influência da ação antrópica com o plantio de cana‐de‐

açúcarveminterferindonasperdasdesolodabacia.Nasáreasdemaioresvalores

deperdadesolo,foramasqueconcentravamintensainfluênciadaaçãoantrópica,

alémdepossuíremosmaioresvaloresdedeclividadeseondeosolotinhapoucaou

nenhumaproteção.

Osdadosanalisadosevidenciamtambémqueparaocontroledoprocesso

erosivolaminarnabaciaénecessárioumreordenamentodousodosolo,quepode

ser efetivado adotando‐se coberturas que sejam capazes de proteger o solo de

forma apropriada e/ou adotando práticas conservacionistas por maquinais que

rescindam o comprimento da rampa e diminuam o espaço de escoamento

superficialdaágua.Asinformaçõescoletadasqueresultaramnaconstruçãodeum

Sistema Geográfico de Base de Dados – SGBD poderá servir de base nessas

aplicaçõesdegestãodabacia.

Alémdisso,hápossibilidades futurasdecompactaçãodosolonaáreada

Bacia Guaraíra, caso continue com um manejo inadequado do solo e,

consequentementeaisso,provoqueimpactosnaregiãodaBaciadoRioGramame,

devido à produção de sedimentos e suas associações com agrotóxicos quando

carreados pela ação das chuvas. Portanto, verifica‐se a importância de novos

Page 90: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

89

trabalhos relacionados com a temática apresentando alternativas a esses

problemas.

AGRADECIMENTOS

OsautoresagradecemaoCNPq–ConselhoNacionaldeDesenvolvimento

Científico e Tecnológico pela concessão da bolsa de pesquisa de IC do primeiro

autor. Os autores agradecem ainda ao Laboratório de Recursos Hídricos e

EngenhariaAmbiental–LARHENAeaoLaboratóriodeEnsino,PesquisaeProjetos

emAnáliseEspacial–LEPPAN,ambosdaUFPB,peladisponibilizaçãodedadose

equipamentosutilizadosnestetrabalho.

REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE,A.W.;MOURAFILHO,Gilson;SANTOS,JoséRoberto;COSTA,JoséPaulo Vieira da ; SOUZA, J. L. Determinação de fatores da equação universal deperda de solo nas condições de Sumé, PB. Revista Brasileira de EngenhariaAgrícolaeAmbiental,CampinaGrande‐PB,v.09,n.02,p.180‐188,2004.

ALMEIDA,C.M.AplicaçãodosSistemasdeSensoriamentoRemotoporImagenseoPlanejamento Urbano e Regional. Arq.Urb ‐ Revista Eletrônica de Arquitetura eUrbanismo(USJT),v.3,p.98‐123,2010.

BERTONI, J.; LOMBARDINETO,F.Conservaçãodos solos.4. ed. SãoPaulo: Ícone,1999,335p.

CARVALHO, N. O. Hidrossedimentologia prática. 2. ed. Rio de Janeiro: EditoraInterciência,2008.600p.

CARVALHO,E.M.;PINTO,AndréLuiz;SILVA,PriscilaVargesda.AevoluçãodousoeocupaçãodosolonabaciadoCórregoPorteira,Aquidauana/MS.In:IºSimpósiode Geotecnologias no Pantanal, 2006, Campo Grande. Iº Simpósio deGeotecnologias no Pantanal/Uso da terra e educação ambiental. Campinas :EmbrapaInformáticaAgropecuária,2006.p.438‐446.

EMBRAPA. Sistema Brasileiro de Classificação de Solos. Centro Nacional dePesquisadeSolos.RiodeJaneiro:EmbrapaSolos,1999.

F.A.O.1967.Laerosióndelsueloporelágua.Algunasmedidasparacombatirlaenlastierrasdecultivo.CuadernosdefomentoagropecuáriodaOrg.deLasNacionesUnidas‐FAO,Roma,n.81,207p.

Page 91: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

POTENCIAL NATURAL E ANTRÓPICO DE EROSÃO NA BACIA EXPERIMENTAL DO RIACHO GUARAÍRA 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

90

FARINASSO, M.; CARVALHO JÚNIOR, O. A.; GUIMARÃES, R. F.; GOMES, R. A. T.;RAMOS, V. M. Avaliação qualitativa do potencial de erosão laminar em grandesáreaspormeiodaEUPS–EquaçãoUniversaldePerdasdeSolosutilizandonovasmetodologiasemSIGparaoscálculosdosseusfatoresnaregiãodoAltoParnaíba–PI‐MA.RevistaBrasileiradeGeomorfologia,v.7,n.2,p.73‐85,2006.

FITZ,P.R.Geoprocessamentosemcomplicação.1.ed.SãoPaulo:OficinadeTextos,2008.160p.

FLORENZANO,T.G.IniciaçãoemSensoriamentoRemoto,2ªediçãodeImagensdeSatéliteparaEstudosAmbientais.2ª. ed.SãoPaulo:OficinadeTextos,2007.v.1.102p.

LOMBARDI NETO, F.; BERTONI, J. Tolerância de perdas de terras para solos doEstadodeSãoPaulo.Campinas:InstitutoAgronômico,1999.12p.(BoletimTécnico,28).

LOMBARDI NETO, F.; BERTONI, J. Erodibilidade desolos paulistas. Campinas :InstitutoAgronômico,1975.12p.(BoletimTécnico,27).

MELLO,G.;BUENO,C.R.P.;PEREIRA,G.T.Variabilidadeespacialdeperdasdesolo,dopotencialnaturaleriscodeerosãoemáreas intensamentecultivadas.RevistaBrasileiradeEngenhariaAgrícolaeAmbiental,v.10,n.2,p.315–322,2005.

MOREIRA, E.; IVAN TARGINO; PEREIRA, M. P. B.; SOUZA, L. M.; PENHA, JoãoPereira da . Crise do Proalcool e EmpregoRural na Zona Canavieira da Paraíba,1997.

MOORE,I.D.;BURCH,G..Physicalbasisofthelength‐slopefactorintheUniversalSoil Loss Equation. Soil Science Society of America Journal, n. 50, p. 1294‐1298,1986.

PINHEIRO,L.S.;CUNHA,C.M.L.UtilizaçãodoFatorTopográfico(Ls)daEUPSparaprediçãodeProcessosErosivos.In:1ºSimpósiodePós‐GraduaçãoemGeografiadoEstadodeSãoPaulo,2008,RioClaro.1ºSimpósiodePós‐GraduaçãoemGeografiado Estado de São Paulo. Rio Claro: Programa de Pós‐Graduação em Geografia,2008.p.1182‐1192.

SANTOS, L. L. Modelos Hidráulico‐Hidrológicos: Conceitos e Aplicações. RevistaBrasileiradeGeografiaFísica,v.2,p.1/3‐19,2009.

SILVA,V.deA.AutilizaçãodetécnicasdeGeoprocessamentoparamodelagemdecenáriosdeusoeperdadeSolonaBaciaHidrográficadorioColônianoLitoralSuldaBahia(Brasil).VISeminárioLatinoAmericanodeGeografiaFísicaeIISeminárioIberoAmericanodeGeografiaFísicaUniversidadedeCoimbra,Maiode2010.

SILVA,R.M.;SANTOS,C.A.G.EstimativadaproduçãodesedimentosmedianteusodeumequaçãohidrossedimentológicoacopladoaumSIG.v.12,n.5,p.520‐526,2008.

Page 92: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

COSTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 72‐91, jan./jun. 2012 

91

____________.;SANTOS,C.A.G.;SILVA,L.P.;SILVA,J.F.C.B.C.SoillosspredictioninGuaraíra river experimental basin based on two erosion simulation models.RevistaAmbiente&Água,v.2,p.19‐33,2007.

VANZELA, L. S.; HERNANDEZ, F. B. T.; FRANCO, R. A. M. Influência do uso eocupação do solo nos recursos hídricos do Córrego Três Barras, Marinópolis.Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental (Online), v. 14, p. 55‐64,2010.

WISCHMEIER, W.H.; SMITH, D.D. Predicting rainfall erosion losses: a guide toconservation planting. Washington: USDA, 1978. 58 p. (Agriculture Handbook,537).

ZHANG,Y.etal.IntegrationofModifiedUniversalSoilLossEquation(MUSLE)intoaGISframeworktoassesssoilerosionrisk.LandDegradation&Development,IowaCity,v.20,n.1,p.84‐91,2009.

Page 93: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOSPROGRAMASDETRANSFERÊNCIADERENDAPARAAREDUÇÃODOTRABALHOINFANTIL 

 Artigo recebido em: 01/04/12  Revisado em: 05/06/12 Aprovado em: 15/06/12 

    

Maria Carolina Costa Madeira¹ 

Ivan Targino² 

                  

¹

²

Universidade Federal da Paraíba [email protected] 

 Universidade Federal da Paraíba [email protected]  

     Correspondência:  Ivan Targino  Departamento de Economia Cidade Universitária João Pessoa‐PB, Brasil CEP 58051‐900   

RESUMOO texto objetiva identificar as características determinantes para aoferta de trabalho de crianças na Paraíba, como também gerarevidências sobre a contribuição dos programas de transferência derenda para a redução do trabalho infantil no estado. A base dedadosescolhida para este estudo é a Pesquisa Nacional por Amostra deDomicílios (PNAD) de 2004. Através do modelo probit, verificou‐secomo a participação no PETI e nos outros programas sociais e ascaracterísticasindividuaisefamiliarescontribuemparaaocorrênciadetrabalho infantil. Para comparar com os resultados encontrados naParaíba, realizaram‐se regressões para o Brasil e para o Nordeste. AsestimaçõesparaoBrasileoNordesteindicaramqueapenasoPETIfoicapazdereduziraincidênciadetrabalhoinfantil.Porém,osresultadospara Paraíba mostraram que tanto a participação do PETI, como nosdemaisprogramas sociais, diminuemapossibilidadedeocorrênciadofenômeno.Palavras‐chave:TrabalhoInfantil.PETI.ProgramasSociais.Paraíba.

EVIDENCE ON THE CONTRIBUTION OF PROGRAMSTRANSFER OF INCOME FOR REDUCTION OF CHILDLABOURABSTRACTThe objective of this paper is to identify the characteristicsdetermining the labor supply of children in Paraiba, but also togenerateevidenceonthecontributionofincometransferprogramstoreduce child labor in the state.Thedatabase chosen for this study isthePNAD2004.Throughtheprobitmodel,itwasliketoparticipateinthe PETI and other social programs and individual and familycharacteristicscontribute to the incidenceof child labor.To comparewith the results founds in Paraiba, regression were performed forBrazil and Northeast. The estimates for Brazil and the NortheastindicatedthatonlythePETIwasabletoreducetheincidenceofchildlabor. However, results for Paraíba showed that the participation ofPETI,asinothersocialprograms,reducethepossibilityofoccurrenceofthephenomenon.Keywords:ChildLabor.PETI.SocialPrograms.Paraíba.

    

Page 94: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

93

INTRODUÇÃO

Os programas de transferência de renda criados na segundametade da

décadadenoventasurgiramparaproporcionarumefeitoimediatoaumconjunto

da população que vivia em situações de carência aguda de recursos, em face a

situação de pobreza e de insuficiência de renda existente no Brasil nas últimas

décadas.

As propostas desses programas utilizam critérios de rendimento para a

escolhadeseupúblico‐alvo,exigindocomocontrapartidadobenefíciorecebido,o

respeito a algumas regras. Em geral, as condicionalidades propostas aos

beneficiários são voltadas ao cuidado das crianças e adolescentes, como a

obrigatoriedade de atendimento médico, da freqüência escolar dos filhos e da

retiradadotrabalhodosmesmos.

Emfunçãodaimportânciadestesprogramasdetransferênciaderenda,em

termos de cobertura e de dispêndio público, observou‐se o surgimento de

pesquisas voltadas à análise do impacto de suas ações em âmbito nacional. No

entanto, verifica‐se a falta de estudos específicos dos resultados alcançados em

nívelregionaloulocal.

OProgramadeErradicaçãodoTrabalhoInfantil(PETI),lançadoem1996,

tornou‐se uma importante política de combate ao trabalho de crianças e

adolescentes e de contribuição à redução da pobreza, por combinar o aspecto

compensatório – a transferência de renda para as famílias como forma de

substituirorendimentoobtidocomotrabalhodeseus filhos‐,comoincentivoà

educaçãoeàfocalizaçãodosgastos.

DototaldascriançaseadolescentescadastradosnoPETI,55%encontram‐

senosestadosdoNordeste,regiãocommaiorincidênciadetrabalhoinfantilecom

ospioresindicadoressócio‐econômicos.AParaíbaéumdosestadosnoNordeste

commaiorincidênciadetrabalhoinfantil,e,em2010,foiosextomaiorrecebedor

derecursosdoPETI.

Mesmo sendo o único programa com a meta de combater o trabalho

infantil,elepossuialgumaslimitações,comomenorcoberturadebeneficiárioseo

pequeno valor concedido às bolsas, pelo menos, se comparado aos programas

Page 95: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

94

BolsaFamíliaeoBenefíciodePrestaçãoContinuada(BPC‐LOAS).Poroutro lado,

osestudosexistentessobreo impactodessaspolíticas informamque,apesardos

resultadospositivosdeprogramas,comodoBolsaFamília,ematenderasfamílias

mais pobres e em elevar o atendimento escolar das crianças, os resultados com

relação ao combate ou redução do trabalho de crianças sãomenos significantes.

Issoocorre,especialmente,pelofatodocombateaotrabalhoinfantilnãoseralvo

direto desse programa. (CARDOSO e SOUZA, 2004; FERRO e KASSOUF, 2005;

CACCIAMALI,TATEI,FERREIRA‐BATISTA,2008).

Oobjetivodesteartigoéidentificarascaracterísticasdeterminantesparaa

oferta de trabalho de crianças e adolescentes na Paraíba, como também gerar

evidências sobrea contribuiçãodosprogramasde transferênciade rendapara a

reduçãodotrabalhoinfantilnoestado.Oquestionamentoseria,portanto,desaber

qualaprobabilidadedeumacriançatrabalharounãocasoseusfamiliaresestejam

participandodoPETIoudeoutrosprogramasdetransferênciaderenda.

A base de dados escolhida para este estudo é a Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílios (PNAD) de 2004, porque além de fornecer informações

sobreotrabalhorealizadoporindivíduosentrecincoenoveanos,oIBGEincluiu

na pesquisa suplemento especial sobre o acesso a oito programas sociais de

transferênciasderenda.

Dessa forma, será estimado ummodelo probit para determinar como a

participação no PETI e nos outros programas sociais e as características

individuais e familiares contribuem para a ocorrência de trabalho infantil na

Paraíba.Paracompararcomosresultadosencontradosnoestado,serãorealizadas

regressõesparaoBrasileparaoNordeste.

O presente artigo está organizado nas seguintes seções: um breve

levantamentodosprincipaisfatoresrelacionadosàocorrênciadotrabalhoinfantil

e dos programas de transferência de renda; a descrição da situação do trabalho

realizado pelas crianças e adolescentes e do número dos beneficiários de

programas sociais na Paraíba; os procedimentos metodológicos utilizados; a

apresentaçãodosresultadose,porfim,asconclusões.

Page 96: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

95

LevantamentodosprincipaisfatoresrelacionadosaotrabalhoinfantiledosprogramasdetransferênciaderendanoBrasil

A escolha do indivíduo entre trabalhar ou continuar estudando inicia‐se

dentro do ambiente familiar. Está condicionada à situação de pobreza e ao

tamanhodafamília,àscondiçõesdetrabalhodospaisouresponsáveiseseugrau

de escolaridade, entre outras variáveis. Sabe‐se que muitos pais colocam seus

filhospara trabalhar como formade complementara renda,porque seusganhos

são poucos, ou então, para que não faltem recursos em caso de desemprego ou

doençadoresponsável.

Emrazãodestasevidências,originou‐seumaextensabibliografiasobreo

tema, a qual se direcionou em duas vertentes complementares de análise: na

formulação demodelos teóricos de decisão familiar para explicar a alocação de

tempodosfilhosentreaescola,olazereotrabalho;enarealizaçãodepesquisas

empíricas, na maioria, utilizando microdados, no intuito de descrever as

características do trabalho realizado pelas crianças e adolescentes e verificar a

correlação entre a ocorrência do trabalho e as características domiciliares e

familiares.

OsmodelosdedecisãofamiliarsãobastanteinfluenciadospelaTeoriado

CapitalHumano,deTheodorSchultz (1973)eGaryBecker (1975).Aeducaçãoé

considerada um investimento, que gera custos presentes e benefícios futuros

(BASU,1998;KASSOUF,2001).A famíliadeverealizarumatrocaentrerenunciar

aoconsumopresente(nestemomentoacriançanãotrabalhaeospaistêmcustos

com a escola) e, se beneficiar no futuro, em decorrência dos ganhos dos filhos

obtidos pelo nível de instrução mais elevado. Qualquer fato que modifique os

custos ou benefícios com a educação ou as restrições orçamentárias da família

poderáafetarotempodisponívelvoltadoparaaeducaçãoeaquantidadedehoras

gastascomtrabalho.

ParaCacciamalieTatei(2008),osmodelosquetêmcomobaseaofertade

trabalhoinfantil,consideramqueadistribuiçãodotempodacriançaentreescola,

atividadesdomésticasetrabalho,ocorredeacordocomotamanhoeaestruturada

Page 97: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

96

família,aprodutividadedacriançaedospais,eograudesubstituiçãonotrabalho

entreeles.

O trabalho realizado na infância gera benefícios imediatos na forma de

renda (mesmo que seja pequeno), no entanto, poderá causar prejuízos ao

desenvolvimento das potencialidades da criança, por afetar sua saúde física e

psicológica, por tomar o tempo e os recursos que poderiam ser melhores

dedicados à acumulação de conhecimentos através da educação formal

(FERNANDESeSOUSA,2003).

Ograudeescolaridadedospais,alémdarendafamiliar,éumimportante

determinantedosanosdeestudosdeseusfilhos,nestesentido,“aeducaçãoéum

elementofundamentalnatransmissãointer‐geracionaldacaracterísticaquantoao

nível de rendimento, consistindo em um elemento explicativo chave da

perpetuaçãodapobreza”(LAM,1992apudROCHA,2003:64).

Kassouf (2002) analisou o efeito da entrada precoce no mundo laboral

sobreosrendimentosdosindivíduosnafaseadultadavida,utilizandoaPNADde

1999,everificouquequantomaioraidadedeingressodoindivíduonoprocesso

produtivo,maiorseráasuaescolaridadetantoparahomensquantoparamulheres.

Tais constatações estão de acordo ao que Emerson e Sousa (2003 apud

Kassouf,2005)chamamde“armadilhadapobreza”:paisquetrabalharamquando

criançasenxergamcommaisnaturalidadeotrabalhoinfantilesãomaispropensos

acolocarosfilhosparatrabalhar.

Os dados da PNADde 2002, relativos às crianças entre 10 e 16 anos de

idade,mostramque o status ocupacional do chefe da família, combinado ao seu

nível de educação e o gênero, pode alterar o uso do trabalho dos membros da

família,oqueincluiosfilhos(CACCIAMALIeTATEI,2008).Osautoresverificaram

que as famílias chefiadas por trabalhadores por conta própria apresentaram

probabilidade superiores de trabalho infantil do que as famílias chefiadas por

assalariadoscomcarteiradetrabalho.Alémdisso,observaramqueaelevaçãoda

educaçãodospais refletiu‐seemreduçõesbastanteacentuadasdaprobabilidade

deincidênciadotrabalhoinfantil.

Dentreasprincipaisconseqüênciasdotrabalho,estáoefeitonegativona

educaçãoda criança edoadolescente. Schwartzman (2007) informaqueobaixo

Page 98: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

97

rendimentoescolarestárepresentadoemdoisindicadoresescolares:freqüênciaàs

aulas e defasagem idade e série. Ao utilizar dados da PNAD de 2001, o autor

observouqueaos12anosdeidade,adiferençanafreqüênciaàescolaentreosque

trabalhameosquenãotrabalhamépequena,doisatrêspontospercentuais.Nas

idadesseguintes,adiferençatendeaaumentarchegandoa10pontospercentuais

apartirdos14anos.Aos17anos,idadeemqueépermitidootrabalho,32%dos

adolescentesocupadosjáestãoforadaescola.

Outraspesquisasempíricaschegaramaconclusõessemelhantesquantoàs

conseqüências do trabalho sobre a escolaridade de crianças e adolescentes

(BEHRMAN e WOLFE, 1984; KASSOUF, 1997, 2005; ROCHA, 2003; KRUGER e

BERTHELON, 2007; WAHBA, 2005). Este déficit educacional contribuirá

negativamente para o nível salarial ao se tornarem adultas. A falta de educação

formaltorna‐se,portanto,uminstrumentoparaadesigualdadederendaentreos

trabalhadoreseparaaformaçãodociclointer‐geracionaldepobreza.

ProgramasdetransferênciaderendanoBrasil

No intuito de dar uma resposta às pressões sociais e de respeitar a lei,

durante a década de 1990, as três esferas do governo, em parceria com órgãos

internacionais,comoaOrganizaçãoInternacionaldoTrabalho(OIT)1eUnicef,eda

sociedade civil organizada, passaram a desenvolver projetos voltados para a

universalizaçãoemelhoriadoensinopúblico,paraareduçãodapobrezaeparao

combateeaerradicaçãodotrabalhoinfantil.

Duranteadécadade1990,ganharambastantevisibilidadeprogramasde

municípiosbrasileiros,comodeIcapuí(CE),queconseguiuuniversalizaroensino

básico e melhorar os índices educacionais através de ações integradas com as

secretariasdaPrefeituraecomacomunidade,eparceriascomuniversidadeseo

Unicef (LOTTA e MARTINS, 2003); ou as experiências de Campinas (SP) e do

Distrito Federal (na região do Paranoá), que desenvolveram, a partir de 1995,

1AOITcriouem1992,oProgramaInternacionalparaEliminaçãodoTrabalhoInfantil(IPEC),quetem servido comomodelo para vários países elaborarem programas e projetos de ação para aprevençãoeaerradicaçãodotrabalhoinfantil.OBrasil,aÍndia,aIndonésia,aTailândia,oQuêniaeaTurquiaforamosprimeirospaísesescolhidosparainiciarasatividadesdoIPEC.

Page 99: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

98

programasderendamínimavinculadosàpermanênciaescolardascrianças.

Baseando‐se nos resultados obtidos das experiências municipais, o

governo federal implementou os programas Bolsa Escola Federal2 e o Bolsa

Alimentação,amboscriadosem2001;oAuxílioGás(2002)eoCartãoAlimentação

(2003)3, eo ProgramadeErradicaçãodoTrabalho Infantil –PETI, instituídoem

1996.

O PETI é uma política pública social do Governo Federal, implantada a

partir de 1996 em parceria com estados e municípios brasileiros. O Programa

objetivaretirarcriançaseadolescentesentresetee15anosdeidadeinseridosno

trabalho,demodoagarantirasuaescolaridadecomatransferênciadeumarenda

mensal (bolsa Criança‐Cidadã), bem como reforçá‐la através de atividades

socioeducativas em complemento ao horário escolar. As famílias atendidas

caracterizam‐se pela situação de pobreza e de exclusão social, com renda per

capitadeatémeiosaláriomínimo(MDS,2010).

Mesmo sendo o único programa com a meta de combater o trabalho

infantil,elepossuialgumaslimitações,comomenorcoberturadebeneficiárioseo

pequeno valor concedido às bolsas, pelos menos, se comparado aos programas

BolsaFamíliaeoBenefíciodePrestaçãoContinuada(BPC‐LOAS),oqualtransfere

valormensaldeumsaláriomínimoaosidososepessoascomdeficiência.

PROCEDIMENTOSMETODOLÓGICOS

Quanto aos meios de investigação, as fontes utilizadas referem‐se à

pesquisabibliográficaeàutilizaçãodosdadosdaPNAD2004.

A pesquisa bibliográfica consistiu no levantamento das publicações

disponíveis sobre o tema em estudo, como em livros, artigos, revistas, teses,

relatórios,legislaçãoespecífica,dissertações,entreoutros.

APNADfoiutilizadaparalevantardadosacercadotrabalhorealizadopor

crianças e adolescentes na Paraíba e dos beneficiários de programas sociais,

2ApartirdaLeinº10.219,de11deabrilde2001,foiinstituído,emâmbitonacional,oProgramaNacionaldeRendaMínimavinculadaàEducação‐BolsaEscolaFederal.3Em2004,osprogramasBolsaEscola,BolsaAlimentação,CartãoAlimentaçãoeAuxílioGásforamunificadosemumúnico,originandooProgramaBolsaFamília‐PBF.

Page 100: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

99

incluindo o PETI. Foi escolhida a PNAD de 2004 porque além de fornecer

informaçõessobreasatividadesprodutivasdeindivíduosentrecincoanoveanos,

o IBGE incluiunapesquisa suplementoespecial sobreoacessoaoitoprogramas

sociais de transferências de renda: Auxílio‐gás, Bolsa‐escola, Bolsa‐alimentação,

Cartão‐alimentação do Fome Zero, Bolsa Família, PETI, Benefício Assistencial de

PrestaçãoContinuada ‐BPC–LOAS, eoutrosgeridosporgovernosestaduaisou

municipais.

Aprimeiraetapadapesquisavoltou‐seadarprosseguimentoàbuscade

informações e de conhecimentos prévios acerca do problema, de forma a

complementarabaseteóricaeinformacionalsobreoobjetodeestudo.Nasegunda

etapa realizou‐seaanáliseda situaçãodo trabalho infantilnoestadodaParaíba,

pormeiodautilizaçãodosmicrodadospresentesnaPNAD2004.

Ointuitodessaanáliseéidentificarascaracterísticasdeterminantesparaa

oferta de trabalho de crianças e adolescentes na Paraíba, como também gerar

evidências sobrea contribuiçãodosprogramasde transferênciade rendapara a

reduçãodotrabalhoinfantilnoestado.

Paraisso,foiestimadoummodeloprobitparasabercomoaparticipação

noPETIenosoutrosprogramassociaiseascaracterísticasfamiliaresrelacionadas

à pessoa de referência do domicílio (ou chefe de família) e dos seus filhos,

contribuemparaaocorrênciadetrabalhoinfantilnaParaíba.Paracompararcom

osresultadosencontradosnoestado, foramrealizadasregressõesparaoBrasil e

paraoNordeste.

Emmodelos comoo probit, a probabilidade de um eventoocorrer – um

indivíduomenorde17anos(nacondiçãodefilho)trabalhar–estácondicionadaa

um vetor de variáveis explicativas. Emprega‐se, neste caso, uma função de

distribuiçãoacumuladadeumavariávelnormalpadronizada, istoéZ~N(0,σ²).

(GUJARATI,2006).

OModeloprobitadmiteaseguintehipótese:

ii XI 21 (1)

Page 101: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

100

emqual IiéumíndicenãoobservadodependentedavariávelXi,de talmodoque

quantomaiorovalordoíndiceIi,maioréaprobabilidadedoeventoocorrer.

Supõe‐seumnívellimiar(oucrítico)doíndice,chamadodeIi*,talque,se

Ii*≤ Ii, o indivíduopossui a característicade interesse (trabalha), caso contrário,

nãopossuiestacaracterística.

Admitindoahipótesedanormalidade,ahipótesedequeIi*≤ Iipodeser

apresentadadoseguintemodo:

iiiiii XFXZPIIPXYPP *|1 (2)

Afunçãoprobitapresenta‐se,portanto:

2Z / 2

,X 1 dz, , iF(X ) (X ) ei i 2

(3)

sendoΦ(.)representaafunçãodedensidadenormal.

Nos modelos binários, os coeficientes estimados medem o impacto de

cadavariávelexplicativanoíndicelatente,enãonavariávelexplicada.Comisso,o

impactodecadavariávelexplicativanavariáveldependenteéchamadodeefeito

marginal.

Oefeitomarginalémostradoaseguir:

kiiik

XXx

)()( ,,

(4)

Aequaçãoutilizadaparaestetrabalhoédadapor:

iiXY ,

(5)

Avariáveldependenteéumadummyqueapresentavalor1,casoacriança

trabalha,e0(zero),senãotrabalha.

Page 102: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

101

OvetordevariáveisexplicativasXi incluidadossobreochefeda família,

que na PNAD é indicada como pessoa de referência, sobre os filhos e sobre a

participaçãodosmoradoresdosdomicíliosemprogramassociaisdetransferência

derenda.

A amostra selecionada para este trabalho é composta por indivíduos na

condiçãodepessoadereferência,acimade10anosdeidade,eporindivíduosna

condiçãodefilho,entrecincoeaté16anosdeidade.Oconjuntodedadosutilizado

foitratadocomoamostracomplexa.

Asdefiniçõesdasvariáveisexplicativasestãoapresentadasabaixo:

a)Variáveisreferentesàpessoadereferência:

‐Idade:Anosdevidadoindivíduo.

‐ Idade que começou a trabalhar (idtrab): Informa em que idade o

indivíduocomeçouatrabalhar.

‐Corouraça(db):Dummyqueassume1paracorbrancaezeroparaas

demais(preta,parda,amarela,indígena).

‐ Gênero ou sexo (dh): Dummy que assume 1 se o chefe da família for

homem,ezeroseformulher.

‐ Escolaridade (anosdeestudo): Assume valores entre 1 e 16. O valor 1

indica nenhuma instrução ou menos de um ano de estudo. Valores de 2 a 15

mostramqueonúmerodeanosdeestudodo indivíduovariaentre1a14anos,

respectivamente.Eovalor16,significa15anosdeestudooumais.

‐Condiçãodeocupação:Variávelbinária,assumevalor1,seestáocupado

emalgumaatividadeprodutiva,ezero,seestádesocupado,oumelhor,ausênciade

trabalho.

‐Setorocupacional:Utilizou‐sevariáveisdummiesparasaberseochefe

está ocupado no setor formal (dsf) ou no setor informal (dsi). A variável de

comparação utilizada foi a dsf, pois os pais ocupados no setor formal são os

empregados comcarteiraassinadae assalariados registrados.O setor informalé

formadoporindivíduossemcarteiraassinadaeporcontaprópria.

‐Atividadedetrabalho:Criaram‐setrêsvariáveisbináriaspara informar

se o chefe trabalha na indústria (dind), em atividades agrícolas (dagri) ou nos

serviços (dserv). A variável de comparação foi a dind. No setor industrial, estão

Page 103: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

102

contidas as áreas da indústria de transformação e de construção, no de serviços

estão incluídos comércio, alimentação e alojamento, transporte, e comunicação,

educação, saúde e o trabalho doméstico. O setor agrícola inclui as atividades

agropecuárias.

‐Situaçãododomicílio(durb):Variávelbináriaqueassumevalorunitário

paraomeiourbanoevalorzeroparaomeiorural;

‐ Variáveis de migração: O deslocamento familiar de uma determinada

área, sejaummunicípioouestado,paraoutra, éumaalternativa feitapelospais

paramelhorar a sua condição de vida e de seus filhos. No intuito de verificar a

importânciadessefenômenoparaaocorrênciadotrabalhoinfantil,selecionaram‐

seasvariáveis:

NasceunaUF(dest):Variávelbináriaqueassumevalorunitáriono

casodoindivíduoresidirnoestadoemquenasceu,ezeroparaocasocontrário.

Nasceunomunicípio(dnasmun):Variávelbináriaqueassumevalor

unitárionocasodoindivíduoternascidonomunicípioemqueresideezeroparao

casocontrário.

b)Variáveisreferentesaosfilhos:

Deformaanálogaàpessoadereferênciaforamcriadasasvariáveis:corou

raça (dbf), gênero ou sexo (dhf), nasceu na UF (dest), nasceu no município

(dnasmunf); idade da criança (idadef), que varia entre cinco a 16 anos de vida;

escolaridade(anosdeestudo):valoresentre1a15;efreqüênciaàescola(dfrescf):

variável binária de valor 1, se a criança freqüenta a escola, e valor zero, se não

freqüenta.

c)Variáveisreferentesàfamília:

‐ Número de moradores do domicílio (totalmora): indica o número de

membrosdafamília;

‐ Localização:Dummies que informam as regiões em que a família está

presente:Norte(regno),Nordeste(regne),Centro‐oeste(regco),Sudeste(regse)e

Sul (regsu).A região sudeste foi consideradaavariávelde comparação.Também

foramcriadasasdummiesMA,PI,CE,RN,PB,PE,AL,ALeSE,pararepresentaros

Page 104: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

103

estadosnordestinosemquesituao indivíduoesua família.Nestecasoavariável

omitidafoiaquerepresentaoestadodaParaíba.

‐ Renda (renddomcipcap): Refere‐se ao valor da renda domiciliar per

capita.

‐ Beneficiário de programas sociais de transferência de renda (pt):

Dummiecomvalor iguala1(um)seomoradorrecebeAuxílio‐gás,Bolsa‐escola,

Bolsa‐alimentação, Cartão‐alimentação do Fome Zero, Bolsa Família, Benefício

Assistencial de Prestação Continuada (BPC – LOAS), ou em outros geridos por

governos estaduais ou municipais, e valor zero se não recebe algum desses

benefícios.

‐BeneficiáriodoPETI (dpeti):Variávelbinária comvalorunitário sehá

moradorquerecebePETI,ezero,casonãoreceba.

Serãoconstruídasduasequações,umaemqueseincluiarendadomiciliar

percapita,eoutra,levandoemconsideraçãoosanosdeescolaridadedapessoade

referência. Para comparar com os resultados encontrados na Paraíba, foram

realizadas,previamente,regressõesparaoBrasileparaoNordeste.

Antesdeseapresentarosresultadosobtidospelomodelo,oqueseráfeito

na sessão 4, faz‐se uma contextualização do trabalho infantil no Nordeste e na

Paraíba.

O trabalho de crianças e adolescentes na Paraíba e a participação emprogramasdetransferênciaderenda

OsdadosdaPNADinformamquenoBrasilhavia2,8milhõesdecriançase

adolescentesentre5e16anostrabalhandonoanode2004,emumtotalde30,1

milhões,oquerepresenta7%dapopulaçãonestafaixaetária.Nafaixaetáriaentre

5e9anos,foramencontrados203milmeninosemeninasemsituaçãodetrabalho.

Entreas regiõesbrasileiras,oNordesteapresentaamaior incidênciade

trabalho infantil, pois 10%de sua populaçãoentre 5 e 16 anos trabalhavam em

algumaatividade,nasemanadereferência,seguidapelaregiãoSul(9%)4.

4AregiãoSuléconsideradaumasdasmaisricas,detémosmenoresníveisdepobreza,contudo,sedestacapelasegundamaiorincidênciadetrabalhoinfantil,emdecorrência,emoutrosmotivos,pela

Page 105: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

104

Do total de indivíduos nessa faixa etária que trabalhava no país, 42%

encontram‐senosestadosnordestinos.Esseelevadopercentualpodeseratribuído

aofatodestaregiãodeterospioresíndicessócio‐educacionais,esertambémaque

possuiomaiornúmerodepobres,importantesdeterminantesdotrabalhoinfantil

(KASSOUF,2004;SILVAJÚNIOR,2006).

TABELA1–Brasil:númeroepercentagemdecriançasde5a16anostrabalhandosegundoregiões–2004

LOCAL TOTALOCUPADOS (%)Brasil 2.873.111 7Norte 337.676 8

Nordeste 1.195.581 10Centro‐oeste 179.922 6Sudeste 632.828 4Sul 527.104 9

Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Conforme o gráfico 1, entre os estados da região Nordeste, a maior

incidênciadetrabalho infantil foiencontradanoPiauí(17%)eMaranhão(13%),

seguidospelaParaíbaepelaBahia,empatadoscom12%.Osmenorespercentuais

foramencontradosemSergipeenoRioGrandedoNorte.

NaregiãoNordeste,otrabalhoinfantilconcentra‐senazonarural(64%)e

entre indivíduos do sexo masculino (85%), de acordo com a tabela 2. Alagoas

apresenta maior percentual de indivíduos trabalhando nomeio rural, 78%. Por

outro lado, Sergipe apresentou distribuição distinta, com maior número de

trabalhadoreslocalizadonasáreasurbanas,55%.

Comrelaçãoàdistribuiçãoporgênero,emtodososestadosapresençado

trabalho realizado por meninos foi superior ao das meninas. O Rio Grande do

Norte detém maior percentual de crianças do sexo masculino (92%), enquanto

Sergipeapresentouamenorocorrênciademeninosemsituaçãodetrabalho.

importânciadaagriculturafamiliar,umfortetraçoculturaldascolôniasdeimigranteseuropeuseasiáticos.

Page 106: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

105

Gráfico1–Nordeste:distribuiçãoporestadosdoníveldeocupaçãodascriançasentre5e16anosdeidade–2004

Maranhão13%

Piauí17%

Ceará11%

Rio Grande do Norte

8%

Paraíba12%

Pernambuco10%

Alagoas11%

Sergipe6%

Bahia12%

Maranhão

Piauí

Ceará

Rio Grande do Norte

Paraíba

Pernambuco

Alagoas

Sergipe

Bahia

Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Tabela 2 – Número de crianças e adolescentes de 5 a 16 anos trabalhando, porgêneroeporsituaçãododomicílio,emcadaestadodonordeste–2004

ESTADOS TOTAL MENINOS % MENINAS % URBANO % RURAL %Nordeste 1.195.581 1.017.753 85 177.828 15 433.733 36 761.848 64Maranhão 175.342 153.026 87 22.316 13 62.965 36 112.377 64Piauí 108.658 89.852 83 18.806 17 39.703 37 68.955 63Ceará 189.901 161.397 85 28.504 15 82.193 43 107.708 57

RioG.doNorte 44.472 40.727 92 3.745 8 18.725 42 25.747 58Paraíba 91.762 79.558 87 12.204 13 38.422 42 53.340 58

Pernambuco 162.612 133.183 82 29.429 18 63.844 39 98.768 61Alagoas 69.516 60.885 88 8.631 12 15.447 22 54.069 78Sergipe 25.090 20.407 81 4.683 19 13.714 55 11.376 45Bahia 328.228 278.718 85 49.510 15 98.720 30 229.508 70

Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Como foi verificado no Gráfico 1, a Paraíba possui um dos maiores

percentuais de trabalho infantil na região Nordeste. Com relação ao sexo e à

localizaçãodascriançastrabalhadoras,oestadoseguiuatendênciaapresentadana

região – é realizado, em sua maioria, em áreas rurais e por indivíduos do sexo

masculino.

AodesagregarosdadosporidadeparaaParaíba,verifica‐seoaumentodo

trabalhoconformeaidadeavança.Paraosindivíduosdosexomasculino,aosoito

anos, o percentual de trabalho era 1,7%, e aos 16 anos, idademínima que a lei

Page 107: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

106

brasileira permite o trabalho, o nível aumenta para 19,89%. Com relação às

meninas,osmaiorespercentuaisencontram‐senasidadesde13e15anos.

Tabela 3 – Paraíba: Distribuição percentual de crianças e adolescentestrabalhadoresporgênerosegundoaidade‐2004

IDADE MENINOS MENINAS5 1,14 ‐6 1,14 ‐7 1,14 ‐8 1,70 3,79 1,14 ‐10 5,68 7,4111 7,95 7,4112 9,09 11,1113 14,20 22,2214 19,32 7,415 17,61 22,2216 19,89 18,52

Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Na tabela 4, estão apresentados os principais ramos de atividades das

criançasedos respectivospais.Observa‐se queos filhos tendema trabalharnas

mesmas atividades dos seus responsáveis. A principal atividade realizada no

estado,pelascriançaseseus familiares, éaagricultura.Emseguida,aparecemos

ramosdecomércioereparaçãoedeserviçosdomésticos.

Tabela4–Paraíba:ramosdeatividadesemqueascriançasentre5a16anoseosrespectivospaisestãoinseridos‐2004

RAMOSDEATIVIDADE PAIS(%) FILHOS(%)Agrícola 54,62 63,35Indústria 9,72 11Construção 6,65 0,52Comércioereparação 12,38 13,61Alojamentoealimentação 3,33 2,62Transporte,armazenagemecomunicação 2,9 1,67Administraçãopública 2,77 ‐Educação,saúdeeserviçossociais 2,08 ‐Serviçosdomésticos 4,01 5,76Outros 1,83 1,57Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Page 108: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

107

Quanto à situação ocupacional dos pais das crianças trabalhadoras, a

maiorpartedosindivíduosencontra‐senainformalidade–56,38%consideraram‐

se trabalhador por conta própria ‐, seguido por 21,81%, que anunciaram ser

empregados sem carteira. Apenas 9,5% afirmaram ser empregados com carteira

assinada(vertabela5).

TABELA5–Paraíba:Distribuiçãopercentualdospaisdascriançastrabalhadorassegundoposiçãonaocupaçao–2004

POSIÇÃONAOCUPAÇÃO %Empregadocomcarteira 9,57Funcionáriopúblicoestatutário 1,06OutrosEmpregadossemcarteira 21,81Trabalhadordomésticosemcarteira 2,66Contaprópria 56,38Trabalhadornaproduçãoparaopróprioconsumo 3,72Outros 4,79Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Adistribuiçãodecrianças,trabalhandoounão,deacordocomosanosde

estudodapessoadereferênciapodeservistanatabela6.Demaneirageral,onível

deescolaridadedosindivíduosdaamostraébaixo.Mesmoassim,observa‐seque

osanosdeestudodoschefesdefamíliaquenãotêmfilhostrabalhandoésuperior

àquelescomfilhosnotrabalho.Nadistribuiçãopor faixasdeestudoentrechefes

de famíliaqueapresentamalgum filhoemsituaçãode trabalho,maisdametade,

55,67%,épraticamenteanalfabeta,enenhumdelesapresentamaisde12anosde

estudo.

Outracaracterísticafamiliarconsideradaimportanteparaaincidênciado

trabalhoéonúmerodemoradoresdodomicílio.Atabela7comparaosdomicílios

comcriançasquetrabalhamcomaqueles semcriançastrabalhando.Observou‐se

queopercentualdedomicílioscomatécincomoradoresémaiornasresidências

semcriançastrabalhadoras.

Nos domicílios com seismoradores oumais, a situação se inverte, pois

29,56% dizem respeito àqueles contendo crianças que trabalham, enquanto em

apenas 11,57% residem crianças que não trabalham. O resultado anterior

permanece entre domicílios de baixa renda, o que induz ao entendimento que

Page 109: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

108

famíliasgrandeseemsituaçãodepobrezalevamosseusfilhosatrabalhar,como

umaalternativadesobrevivênciadeseusmembros.Conformeaamostrapresente

naPNAD2004,12,2milhõesdemoradores receberamalgumdosoitobenefícios

indicadosnapesquisa.

TABELA6–Paraíba:númerodeanosdeescolaridadedoresponsáveldascriançasde5a16anostrabalhandoounãotrabalhando–2004

ANOSDEESTUDODORESPONSÁVEL

CRIANÇASQUETRABALHAM(%)

CRIANÇASQUENÃOTRABALHAM(%)

Seminstruçãoemenosde1ano

55,67 33,00

1‐3 14,28 21,684‐8 24,63 27,109‐11 5,42 14,0212‐16 ‐ 5,20

Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Tabela7–Paraíba:distribuiçãodosdomicílioscomcriançasquetrabalhamenãotrabalhampornívelderendamensalfamiliar,segundoonúmerodemoradores–2004

TOTALDEDOMICÍLIOS

DOMICÍLIOSCOMRENDADOMICILIARMENSALIGUALOUINFERIORAR$400,00

Númerodemoradores

Domicílioscomcrianças

quetrabalham

(%)

Domicílioscomcriançasquenãotrabalham

(%)

Domicílioscriançasquetrabalham

(%)

Domicílioscomcriançasquenãotrabalham

(%)2 0,99 1,81 1,10 2,163 7,88 13,49 10,99 13,424 12,81 30,32 13,19 30,095 18,72 23,66 16,48 23,056 19,70 13,26 26,37 13,96

7oumais 29,56 11,57 21,98 10,17Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

Na Paraíba, cerca de 586 mil indivíduos estavam cadastrados em pelo

menos um dos programas sociais (aproximadamente 15% da população do

Estado). O gráfico 2 apresenta a distribuição dos beneficiários paraibanos nos

programas.

Page 110: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

109

OmaiornúmerodebeneficiáriosdeprogramassociaisnaParaíbaestava

cadastradonosprogramasBolsaEscola(28%),AuxílioGás(26%)eBolsaFamília

(23%).OPETIrespondepor4%debeneficiáriosdeprogramassociaisnoestado.

1%4%7%

11%

23%

26%

28%

0%BPC

PETI

Bolsa alimentação

Cartão alimentação

Bolsa Família

Auxílio gás

Bolsa escola

Outros programas

Gráfico2–Paraíba‐distribuiçãodosbeneficiáriosdosprogramassociais–2004.Fonte:PNAD2004–Elaboraçãoprópria.

ANÁLISEDERESULTADOS

Seguem abaixo os resultados obtidos pelo modelo probit para o Brasil,

paraaregiãoNordesteeparaoestadodaParaíba.

RegressãoparaoBrasil

ATabela8apresentaoresultadoestimadopeloprobitparaaamostrado

Brasil. Os parâmetros presentes nas duas estimações apresentaram‐se

estatisticamente significativos. Os resultados encontrados nas estimações 1 e 2

para o Brasil não obtiveram grandes diferenças entre si (veja tabela 8). Na

estimação 1, quando se omitiu os anos de estudo dos pais, verificou‐se que o

aumento renda per capita do domicílio reduz a probabilidade de trabalho dos

filhos.Naestimação2,avariávelanosdeescolaridadedoresponsável,obtevesinal

negativo.

Page 111: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

110

A variável idade de ingresso no trabalho obteve coeficiente negativo,

indicando que, quantomais tarde os pais começarem a trabalhar,menor será a

probabilidade que seus filhos se ocupem durante o período da infância e

adolescência.

Sinalnegativotambémfoiverificadoseapessoadereferênciafordosexo

masculino,eestiverocupadaemalgumaatividadeprodutiva.Comooesperado,o

trabalhonosetorinformaleematividadesligadasàagricultura(emcomparaçãoà

atividadenaindústria)contribuipositivamenteparaofenômeno.

Quanto às características do filho, o fato dele ser do gênero masculino

aumentaapossibilidadede trabalharprecocemente, enquanto serda corbranca

reduz tal possibilidade. A freqüência à escola mostrou‐se relevante para a

probabilidadedereduçãodotrabalho.Poroutrolado,osanosdevidacompletados

pelacriançacolaborampositivamenteparaainserçãonotrabalho.

Sinalpositivo, tambémapresentouavariável anosde estudodo filho.O

mesmoresultadonestasduasúltimasvariáveisindicaqueasatividadestrabalhoe

estudonãosãomutuamenteexclusivasparaascrianças,podendoserrealizadasao

mesmotempo.

As variáveis de migração indicaram que se o filho e o seu responsável

residirem no estado onde nasceram, pode contribuir negativamente para a

ocorrênciadetrabalhoinfantil.Mesmosinalfoiverificadoquandoofilhomorano

municípioemquenasceu.

Mas, quando o responsável da família não reside no município onde

nasceu, aprobabilidadedosseus filhostrabalharempodeaumentar. Issosedeve

ao fato da ausência do pai levar a uma maior utilização da força de trabalho

familiar no processo produtivo como forma de complementar a renda familiar,

principalmentenocasodafamíliaresidirnazonarural.

Emtermosgeográficos,o fatodea famíliaresidir foradaregiãoSudeste

ampliaapossibilidadedosfilhostrabalharem.Igualmente,alocalizaçãodafamília

emáreasurbanascontribuiparaanãoocorrênciadotrabalhoinfantil.

Page 112: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

111

Tabela8–EstimaçãoProbitdasvariáveis indicadorasdetrabalho infantilparaoBrasil–2004

Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente P>|t| Coeficiente P>|t|

Idade ‐0,0013903(0,0000482) 0,00 ‐0,0025084(0,0000479)

0,00

Idtrab ‐0,0506606(0,0001409)

0,00 ‐0,04753(0,0001419)

0,00

db 0,0490465(0,0010663) 0,00 ‐0,0554114(0,0010673) 0,00

dh ‐0,133327(0,0011156) 0,00 ‐0,1355501(0,0011165)

0,00

anosdeestudo ‐0,0209476(0,0001216)

0,00

docup ‐0,109342(0,0021847)

0,00 ‐0,1044726(0,0021877)

0,00

dsi 0,223741(0,0009067) 0,00 0,2107931(0,0009093)

0,00

dagri 0,3833635(0,0011701) 0,00 0,3626508(0,0011705)

0,00

dserv 0,081784(0,0010645) 0,00 0,0909341(0,0010699)

0,00

durb ‐0,4854637(0,001001) 0,00 ‐0,4742958(0,0009986)

0,00

dest ‐0,017247(0,0011729) 0,00 ‐0,0086958(0,0011774)

0,00

dmun 0,0461528(0,0011238) 0,00 0,0595607(0,0011307) 0,00

renddomcipcap ‐00000906(1.21e‐06) 0,00

idadef 0,2234256(0,0001962)

0,00 0,2197804(0,0001967)

0,00

Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente P>|t| Coeficiente P>|t|

dhf 0,4692721(0,0008044) 0,00 0,4725255(0,0008055) 0,00

dbf ‐0,0362564(0,0010812) 0,00 ‐0,0280435(0,0010796) 0,00

anosdeestudof 0,0132164(0,0002237)

0,00 0,0191659(0,0002269) 0,00

destf ‐0,0301075(0,0018091) 0,00 ‐0,0270893(0,0018114) 0,00

dmunf ‐0,0620113(0,0015531 0,00 ‐0,0603698(0,0015558) 0,00

dfrescf ‐0,2376765(0,0012342) 0,00 ‐0,2215374(0,0012328) 0,00

totalmora 0,0262503(0,0002105) 0,00 0,0243446(0,0002095) 0,00

pt 0,0332175(00008708) 0,00 0,0195356(0,0008703) 0,00

dpeti ‐0,091733(0,0022361) 0,00 ‐0,099185(0,0022312) 0,00

regno 0,240902(0,0014273) 0,00 0,2460695(0,0014286) 0,00

Page 113: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

112

regne 0,2413773(0,0010832) 0,00 0,2327846(0,0010878) 0,00

regco 0,1279146(0,0016291) 0,00 0,339535(0,001632) 0,00

regsu 0,3765636(0,0011812) 0,00 0,3775434(0,0011839) 0,00

constante ‐3.503232(0,0040904) 0,00 ‐3,706939(0,0076523) 0,00

Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

Tabela 9 – Efeitomarginal das variáveis indicadoras de trabalho infantil para oBrasil–2004

Estimação1 Estimação2 Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente Coeficiente

VariáveisCoeficiente Coeficiente

idade ‐0,0000368 ‐0,0000654 dbf ‐0,0009587 ‐0,0007301idtrab ‐0,0013408 ‐0,0012384 dhf 0,0127505 0,0126481db 0,0013045 0,0014519 anosdeestudof 0,0003498 0,0004994dh ‐0,0039471 ‐0,0039595 destf ‐0,0007753 ‐0,0006886

anosdeestudo ‐0,0005458 dmunf ‐0,0017235 ‐0,0016499docup ‐0,0032486 ‐0,0030409 dfrescf ‐0,0072913 ‐0,0066237dsi 0,0059096 0,0054792 totalmora 0,0006948 0,0006343dagri 0,0130465 0,0119857 pt 0,0008926 0,0005135dserv 0,0022185 0,0024356 dpeti ‐0,0021925 ‐0,0023139durb ‐0,0180954 ‐0,0172798 regno 0,0080361 0,0081278dest ‐0,0004531 ‐0,0002257 regne 0,0072439 0,0068475dmun 0,0012282 0,0015631 regco 0,0038442 0,0039888

renddomcipcap ‐2,40e‐06 regsu 0,0137109 0,0135588idadef 0,0059134 0,0057265

Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

Os coeficientes apresentados pelas variáveis relacionadas à participação

em programas sociais indicaram que ser beneficiário deles eleva as chances de

incidência de trabalho infantil5. Resultado distinto apresentou a variável

participação no PETI, o coeficiente negativomostrou que estar integrado a este

programadiminuiapossibilidadedetrabalhoentrecriançaseadolescentes.

Umaexplicaçãoplausíveléqueosprogramassociais,excetuandooPETI,

o combate ao trabalho das crianças não faz parte, diretamente, das metas

estabelecidas, além disso, a maioria das famílias participantes dos programas é

pobre e, acabam por ainda necessitar da renda oriunda do trabalho de suas

criançasparagarantirsuasobrevivência.(CACCIAMALI,TATEIeBATISTA,2008).

5 Essa constatação não deve ser entendida como a inserção da família como beneficiária dessesprogramasestariaestimulandootrabalhoinfantil.Deveserantesentendidacomorelacionadacomapobrezaquefazasfamíliasseinseriremnessesprogramas.

Page 114: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

113

Na tabela9estãoorganizadosos resultadosdosefeitosdos coeficientes

estimados nas variáveis explicativas na regressão probit para oBrasil. Todos os

coeficientestambémapresentaramsignificânciaestatística.

De acordo com a tabela 9, se o chefe da família for homemdiminui em

0,4%aprobabilidadedeo filhotrabalhar,emambasestimações.Casoochefeda

famíliaestiverocupado,reduz‐seem0,3%apossibilidadedetrabalhoinfantil,nas

estimações1e2.

RegressãoparaoNordeste

Os resultados das estimações do modelo probit para a região Nordeste

estãoorganizadosnatabela10.Osresultadosapresentadosnasestimações1e2,

emgeral,forammuitosimilaresaosencontradosnasregressõesparaoBrasil.

No Nordeste, o tamanho da família, a ocupação do chefe da família em

atividadesagrícolasenosetorinformalcolaboramdiretamenteparaaocorrência

do trabalho das crianças. Similarmente ao ocorrido em nível nacional, tanto a

escolaridadedospaisquantoarendapercapitadomiciliarinfluenciamdemaneira

negativaaincidênciadetrabalhoinfantil.

Diminuiaprobabilidadedeinserçãonotrabalhoquandoosfilhosresidem

noestadoounomunicípioemquenasceram.Poroutrolado,quandoospaisnão

moram tanto no município quanto no estado de origem, aumenta‐se a

possibilidadedosfilhostrabalharem.

Quantoàsdummiesdelocalização,emcomparaçãoaoestadodaParaíba,o

fatodafamíliaresidirnosestadosdoMaranhão,Piauí,Ceará,PernambucoeBahia

contribuipositivamenteparaaocorrênciadetrabalhodascriançaseadolescentes.

JáaresidêncianoRioGrandedoNorteefetuaefeitocontrário.AvariávelAlagoas

nãoapresentoucoeficientesignificante.

Com relação à participação nos programas sociais, a integração ao PETI

diminui a probabilidade de trabalho das crianças, enquanto a participação nos

outrosprogramasdetransferênciaatuaemsentidoinverso.

Page 115: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

114

Tabela10–EstimaçãoProbitdasvariáveisindicadorasdetrabalhoinfantilparaaregiãoNordeste–2004

Estimação1 Estimação2Variáveis

Coeficiente P>|t| Coeficiente P>|t|

Idade ‐0,001461(0,0000482)

0,00 ‐0,0026147(0,0000479)

0,00

Idtrab ‐0,0519407(0,0001415)

0,00 ‐0,0488033(0,0001424)

0,00

Db 0,0698108(0,0010419)

0,00 0,0760962(0,0010429)

0,00

Dh ‐0,1306947(0,0011109)

0,00 ‐0,132756(0,0011121)

0,00

anosdeestudo ‐0,0212367(0,0001216)

0,00

Docup 0,1097747(0,002174)

0,00 ‐0,1051963(0,0021765)

0,00

Dsi 0,2401531(0,0008994)

0,00 0,2278552(0,0009022)

0,00

Dagri 0,3883491(0,0011725)

0,00 0,3671511(0,0011731)

0,00

Dserv 0,0797403(0,0010574) 0,00 0,0886437

(0,0010625) 0,00

Durb ‐0,509773(0,0010029)

0,00 ‐0,4986214(0,0010003)

0,00

Dest 0,0191081(0,0011429)

0,00 0,0273696(0,0011469)

0,00

Dmun 0,067916(0,0010969)

0,00 0,0809615(0,0011038)

0,00

renddomcipcap ‐0,000096(1,20e‐06) 0,00

anosdeestudof 0,0110336(0,0002246) 0,00 0,0169406

(0,0002273) 0,00

Destf ‐0,022388(0,0018017)

0,00 ‐0,0192128(0,0018041)

0,00

Idadef 0,2231586(0,0001965)

0,00 0,2195011(0,0001969)

0,00

Estimação1 Estimação2Variáveis

Coeficiente P>|t| Coeficiente P>|t|

dbf ‐0,0156163(0,0010524)

0,00 ‐0,007849(0,0010511)

0,00

dhf 0,4662774(0,0008007)

0,00 0,4694694(0,0008018)

0,00

dmunf ‐0,064689(0,0015492)

0,00 ‐0,0630659(0,0015517)

0,00

dfrescf ‐0,2427658(0,0012305)

0,00 ‐0,2264607(0,0012292)

0,00

totalmora 0,0233926(0,0002082) 0,00 0,0231782

(0,0002115) 0,00

pt 0,0380733(0,0008732)

0,00 0,0240982(0,0008739)

0,00

dpeti ‐0,0592777(0,0022663)

0,00 ‐0,067206(0,0022619)

0,00

Ma 0,1121373(0,0017833)

0,00 0,1079401(0,0017865)

0,00

Page 116: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

115

Pi 0,2683317(0,0024835)

0,00 0,2629279(0,0024771)

0,00

Ce 0,0682051(0,0017199)

0,00 0,0552109(0,0017246)

0,00

Rn ‐0,1002409(0,0032722)

0,00 ‐0,1087393(0,003274)

0,00

Ba 0,0600753(0,0013743)

0,00 0,049384(0,0013786)

0,00

Pe 0,0603428(0,0018088)

0,00 0,0519962(0,0018078)

0,00

Al ‐0,0018585(0,0026322)

N.S. ‐0,023813(0,0026349)

0,00

Se ‐0,2023333(0,0038848)

0,00 ‐0,2099639(0,0038815)

0,00

constante ‐3,334465(0,0039982)

0,00 ‐3,222149(0,0039911)

0,00

Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

ATabela11apresentaoefeitomarginalparaasvariáveisdomodelopara

oNordeste.OsresultadosforammuitosimilaresaosdaestimaçãoparaoBrasil.

TABELA11–EfeitomarginaldasvariáveisindicadorasdetrabalhoinfantilparaoNordeste–2004

Estimação1 Estimação2 Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente Coeficiente

VariáveisCoeficiente Coeficiente

Idade ‐0,0000402 ‐0,0000708 anosdeestudof 0,0003035 0,000459Idtrab ‐0,0014287 ‐0,0013222 destf ‐0,0006035 ‐0,0005115Db 0,0019341 0,002078 dmunf ‐0,0018718 ‐0,0017953Dh ‐0,0040089 ‐0,0040191 dfrescf ‐0,0077565 ‐0,007055

anosdeestudo ‐0,0005753 totalmora 0,0006933 0,0006338docup ‐0,0033882 ‐0,0031836 pt 0,0010655 0,00066Dsi 0,0065955 0,006161 dpeti ‐0,001527 ‐0,00169Dagri 0,0137539 0,0126313 Ma 0,0034806 0,003286Dserv 0,0022461 0,0024664 Pi 0,0099824 0,0095841Durb ‐0,0200481 ‐0,0191778 Ce 0,0020157 0,0015854Dest 0,00053 0,0007504 Rn ‐0,0024662 ‐0,0026095Dmun 0,0018835 0,0022155 Ba 0,001753 0,0014046

renddomcipcap ‐2,65e‐06 Pe 0,0017689 0,0014883Idadef 0,0061384 0,0059467 Al N.S. ‐0,0006282Dbf ‐0,0004294 ‐0,0002126 Se ‐0,0044434 ‐0,0045011Dhf 0,0131537 0,0130529

Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

RegressãoparaaParaíba

Osvaloresencontradosdosparâmetrosnosdoistiposdeestimação,uma

omitindoosanosdeestudodapessoadereferência,easegunda,emqueseexclui

a renda domiciliar per capita, foram bastante similares entre si, nos modelos

Page 117: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

116

construídos para o Brasil e para o Nordeste. Contudo, vale ressaltar que, na

estimação 1, a variável renda per capita do domicilio apresentou significância

apenasa10%.

Naestimação2,oscoeficientesdasvariáveisnascidonaUF(dest)paraa

pessoa de referência e anos de estudo para filho (anosdeestudof) foram não

significantes. Isto implicaafirmarqueaocorrênciade trabalho infantilnãopode

serexplicadapelo fatodospaisresidiremounãonoestadodeorigem,ou,então,

pelosanosdeestudoparaas criançase adolescentes.Naestimação1, avariável

destapresentousignificâncianosparâmetrosapenasa5%.

Outra particularidade presente nas estimações para a Paraíba foi com

relaçãoaoresultadoparaaspolíticasdetransferênciarenda:tantoaparticipação

no PETI, quanto nos outros programas reduzem a probabilidade de ocorrer

trabalhoinfantil.

Como verificado nacional e regionalmente, na Paraíba o fato de os pais

estaremocupadoscolaboraparaqueos filhosnãotrabalhem.Aprobabilidadede

ocorrência do trabalho infantil aumenta com o tamanho da família e se o

responsávelestiverinseridonosetorinformal.

Quantoàscaracterísticasdofilho,aidade,serdogêneromasculinoenão‐

branco influenciam positivamente para a entrada no trabalho. Já a freqüência

escolarealocalizaçãododomicilioemáreasurbanasreduzemessapossibilidade.

Tabela12–EstimaçãoProbitdasvariáveisindicadorasdetrabalhoinfantilparaoEstadodaParaíba–2004

Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente P>|t| Coeficiente P>|t|

idade ‐0,0056259(0,0002756)

0,00 ‐0,00593210,000277

0,00

idtrab ‐0,0630805(0,0009534)

0,00 ‐0,05756270,0009706

0,00

db 0,0422676(0,0059756) 0,00 0,049921

0,0059764 0,00

dh ‐0,1572887(0,0076353)

0,00 ‐0,17013520,0076652

0,00

anosdeestudo ‐0,02687630,0007877

0,00

docup ‐0,4984531(0,0111636)

0,00 ‐0,51726220,010886

0,00

dsi 0,3905334(0,0063548)

0,00 0,37102170,0063537

0,00

Page 118: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

117

dagri 0,1485306(0,0064866)

0,00 0,13101090,0064886

0,00

dserv 0,3553018(0,0069445)

0,00 0,36848610,0069726

0,00

durb ‐0,6784435(0,0060929)

0,00 ‐0,66019420,0060808

0,00

dest 0,0343998(0,0127978)

0,007 ‐0,0018560,0125658

N.S

dmun 0,2189494(0,0133307)

0,00 0,18484030,0130422

0,00

renddomcipcap ‐0,0000323(0,0000132)

0,015

idadef 0,2077286(0,000942) 0,00 0,20229950,0009369

0,00

dbf 0,0598601(0,0060759)

0,00 0,07482390,0060786

0,00

dhf 0,7451367(0,0053252) 0,00 0,7571028

0,0053373 0,00

anosdeestudof ‐0,010924(0,0013603)

0,00 0,0008570,0013749

N.S.

destf ‐0,1384833(0,0122097)

0,00 ‐0,15864820,0123004

0,00

dmunf ‐0,0841975(0,0102132)

0,00 ‐0,09903220,010196

0,00

dfrescf ‐0,2526897(0,0072889)

0,00 ‐0,23037230,007263

0,00

totalmora 0,0906846(0,0010804) 0,00 0,0883221

0,0010898 0,00

pt ‐0,1556036(0,0057856)

0,00 ‐0,18196220,005709

0,00

dpeti ‐0,1482594(0,011416)

0,00 ‐0,17902760,0115135

0,00

constante ‐2.709552(0,0244091)

0,00 ‐2,5600840,0240526

0,00

Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

Conformeatabela13,participarnoPETIdiminuiem0,7%(estimação1)

e0,8%(estimação2)apossibilidadedeocorrênciadofenômeno.Jáainclusãoem

outrosprogramasdetransferênciaderenda(pt)areduçãofoide0,9%e1%,nas

estimações1e2respectivamente.

Tabela13–Efeitomarginaldasvariáveis indicadorasde trabalho infantilparaaParaíba–2004

Estimação1 Estimação2 Estimação1 Estimação2VariáveisCoeficiente Coeficiente

VariáveisCoeficiente Coeficiente

idade ‐0,0003298 ‐0,0003401 renddomcipcap ‐1.89e‐06** idtrab ‐0,0036978 ‐0,0033 idadef 0,012177 0,0115974db 0,0025132 0,0029107 dbf 0,0035668 0,004379dh ‐0,0104178 ‐0,0111403 dhf 0,0461194 0,0459547

anosdeestudo ‐,0015408 anosdeestudof ‐0,0006404 N,S,

Page 119: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

118

docup ‐0,0441248 ‐0,00455976 destf ‐0,0072513 ‐0,0079873dsi 0,0209996 0,0195717 dmunf ‐0,005234 ‐0,006086dagri 0,0091875 0,0078757 dfrescf ‐0,0168525 ‐0,0148614dserv 0,0244208 0,024952 totalmora 0,0053159 0,0050633durb ‐0,0539079 ‐0,0509702 pt ‐0,0094735 ‐0,0109126dest 0,0020474 N.S. dpeti ‐0,0076207 ‐0,0087516dmun 0,0121515 0,0101085

*significativoa1%**significativoa5%Fonte:IBGE–PNAD2004.Elaboraçãoprópria.

CONSIDERAÇÕESFINAIS

O objetivo geral do presente trabalho foi identificar as características

determinantes para a oferta de trabalho de crianças e adolescentes na Paraíba,

como também gerar evidências sobre a contribuição dos programas de

transferência de renda para a redução do trabalho infantil no estado. O estudo

mostrou que a participação no Programa contribui para a redução da

probabilidadedeocorrênciadotrabalhoinfantil.Issofoiobservadonostrêsníveis

espaciaisdeobservação:Paraíba,regiãoNordesteeBrasil.

Nas estimações realizadas para o Brasil e o Nordeste os resultados

indicaramqueapenasoPETIfoicapazdereduziraincidênciadetrabalhoinfantil.

Poisaparticipaçãonosoutrosprogramascontribuiupositivamenteparaainserção

das crianças no trabalho. A explicação para este resultado na literatura é que o

combate ao trabalho infantil não é uma das metas diretas do programas de

transferência, e como as famílias beneficiadas possuem, em geral, rendas

extremamentebaixas,necessitamdos rendimentosprovenientesdo trabalhodos

filhosparaasobrevivênciadelesedeseusfamiliares.

Porém, para o estado da Paraíba os resultados mostraram que tanto a

participação do PETI, como nos demais programas sociais, incluindo o Bolsa‐

família, diminuem a possibilidade de ocorrência do fenômeno. Os resultados

mostraramque o PETI,mesmo commenor cobertura de beneficiários, consegue

atingir um de seus objetivos fundamentais – retirar crianças da situação de

trabalho,noterritórionacional,incluindooestadodaParaíba.

Emrazãodadiferençaderesultadoquantoàparticipaçãoemprogramas

detransferênciaderendaentreosmodelos,seriamnecessáriasanálisesadicionais

Page 120: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

MADEIRA e TARGINO

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

119

para descobrir porque tais programas são capazes de reduzir a incidência de

trabalhoinfantilnaParaíba.

REFERÊNCIAS

BASU,K.ChildLabor:cause,consequenceandcure,withremarksoninternationallabor standards. 1998. Disponível em: <http://www‐wds.worldbank.org/servlet/WDSContentServer/WDSP/IB/2000/02/24/000094946_99031911111649/Rendered/PDF/multi_page.pdf >. Acesso em: 23 de jun.2008.

BECKER, Gary S. Human Capital: A Theoretical and Empirical Analysis, withSpecialReferencetoEducation.2ed.NewYork:ColumbiaUniversityPress,1975.

BEHRMAN, J.R.; WOLFE, B.L. The socioeconomic impact of schooling in adeveloping country.TheReviewofEconomicsand Statistics, v.66, n.2, p.296‐303,May1984.

CACCIAMALI, M. C.; TATEI, F. Trabalho infantil e o status ocupacional dos pais.RevistadeEconomiaPolítica,v.28,p.269‐290,2008.

CACCIAMALI,M.C.;TATEI,F.;FERREIRA‐BATISTA,N.ImpactosdoProgramaBolsaFamília Federal sobre o Trabalho Infantil e a Frequência Escolar. In: Anais IPrêmioNacionaldeEstudossobreoBolsaFamília,2008,Brasília,DF.

CARDOSO, E.; SOUZA, A.P. The impact of cash transfers on child labor andschool attendance in Brazil, 2004. Disponível em:<http://ideas.repec.org/p/van/wpaper/0407.html>Acessoem:29deabr2009.

FERNANDES, R.; SOUSA, A.P.A redução do trabalho infantil e o aumento dafreqüência a escola: uma análise de decomposição para o Brasil dos anos 90.2003. Disponível em: <http://www.econ.fea.usp.br/seminarios/artigos/portela.pdf>. Acesso em: 12 dejul.2008.

FERRO,A.R.;KASSOUF,A.L.AvaliaçãodoimpactodosprogramasdeBolsaEscolasobre o trabalho infantil noBrasil.PesquisaePlanejamentoEconômico, v.35,p.417‐437,dezembro,2005.

GUJARATI,D.Econometriabásica.4.ed.RiodeJaneiro:Elsevier,2006.

INSTITUTOBRASILEIRODE GEOGRAFIAE ESTATISTICA.Pesquisanacionaldeamostrapordomicílios:2004.RiodeJaneiro:IBGE,2005.

Page 121: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

EVIDÊNCIAS SOBRE A CONTRIBUIÇÃO DOS PROGRAMAS DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA PARA A REDUÇÃO DO TRABALHO INFANTIL 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 92‐120, jan./jun. 2012 

120

KASSOUF,A.L.Returns toeducationand trainingprogram in thebrazilianurbanand rural sectors.Revista de Economia e SociologiaRural, v.35, n.2, p.60‐76,abr./jun.1997.

______________. Trabalho Infantil. In: LISBOA, M.B.; MENEZES‐FILHO, N.A. (Orgs).MicroeconomiaesociedadenoBrasil.SãoPaulo:Contra‐capa,2001.p.117‐150.

______________.O efeito do trabalho infantil para os rendimentos dos jovens,controlando o background familiar. 2002. Disponível em: <http://www.cepea.esalq.usp.br/pdf/paper.pdf>.Acessoem:18dejun.2008.

______________. (Coord.)O trabalhode crianças eadolescentesnoNordestedoBrasil.Brasília:OIT,2004.

____________. Trabalho Infantil: causas e conseqüências. 2005. Disponível em:<http://www.cepea.esalq.usp.br/pdf/texto.pdf>.Acessoem:18dejun.2008.

KRUGER, D.; BERTHELON, M. Work and schooling: the role of householdactivities among girls in Brazil, 2007. Disponível em: <http://www.webmeets.com/files/papers/LACEA‐LAMES/2007/236/KB_chlabor_girls.pdf>.Acessoem:3dejan.2011.

LOTTA G.; MARTINS R. Estudo de continuidade dos projetos educacionais nomunicípiodeIcapuí.CadernosGestãoPúblicaeCidadania,SãoPaulo,v.26,p.1‐55,julho,2003.

MINISTERIODODESENVOLVIMENTOSOCIAL.2010.ProgramadeErradicaçãodoTrabalho Infantil (PETI). Disponível em:<http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/peti>.Acessoem:18demar.2011.

ROCHA, S. Trabalho precoce: realidade social e desafio de política pública.NovaEconomia.BeloHorizonte,v.13,n.2,p.61‐80,julho/dezembro.2003.

SCHULTZ, T.W.OCapitalHumano: Investimentos em educação e empesquisa.RiodeJaneiro:Zahar,1973.

SCHWARTZMAN,S.Ascausasdapobreza.RiodeJaneiro:EditoraFGV,2007.

SILVA JUNIOR, L. H.Pobrezana população ruralnordestina: análise de suascaracterísticasduranteosanosnoventa.RevistadoBNDES,v.13,p.275‐290,2006.

WAHBA, J. The influence of market wages and parental history on childlabour and schooling in Egypt, 2005. Disponível em: <http://www.economics.soton.ac.uk/staff/wahba/iza%20dp1771.pdf>Acessoem:4dejan2011.

Page 122: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

 

Cadernos do Logepa v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 ISSN: 2237‐7522 

 

TÉCNICASDESEGMENTAÇÃONÃO‐SUPERVISIONADA:análise comparativa de mapeamentos do uso eocupaçãodosolo

 Artigo recebido em: 16/05/12  Revisado em: 25/06/12 Aprovado em: 05/07/12 

    

Eduardo Freire Santana¹ 

Leonardo V. Batista¹ 

Richarde Marques da Silva² 

              

¹

²

Universidade Federal da Paraíba Departamento de Computação [email protected] 

 Universidade Federal da Paraíba [email protected]  

      Correspondência:  Eduardo Freire Santana Departamento de Informática Cidade Universitária João Pessoa‐PB, Brasil CEP 58051‐900 

RESUMOTécnicas de sensoriamento remoto são fundamentais para omonitoramentodasmudançasdeusodaterra,principalmenteemáreasextensas. Omapeamento de uso da terra, geralmente é realizado pormétodos de classificação manual ou digital pixel a pixel, os quaisconsomem muito tempo. Este trabalho busca desenvolver um novométodo para segmentação não‐supervisionada de imagens desensoriamento remoto baseado na minimização da entropia cruzadaentre a distribuição de probabilidade da imagem e um modeloestatístico. Para os testes realizados, foram utilizadas quinze imagenscapturadaspelosensorTM(ThematicMapper)dosatéliteLandsat5apartirdobancodedadosdoprojetodemapeamentodousodosolodaregiãoamazônica.Osresultadosindicamqueaminimizaçãodaentropiacruzadaestárelacionadacomumasegmentaçãocoerentedasimagens.Aconcordânciamédiaentreoclassificadoreogabaritofoide85%paraasquinzeimagensselecionadasede92%paraquatropequenasregiõesquerepresentamdetalhesdeumadasimagens.Palavras‐chave: Segmentação não‐supervisionada, modelosestatísticos,sensoriamentoremoto.

UNSUPERVISED SEGMENTATION TECHNIQUES:comparativeanalyzeoflanduseandcovermappingABSTRACTRemote sensing techniques are mandatory for monitoring land usechangesinlargeareas.Landusemappingisusuallyperformedbybothmanual and digital pixel based classificationmethodswhich are costand time‐consuming. In this paper, a new method for imageunsupervised segmentation based on cross‐entropy minimizationbetween probability distribution of image and one statistical model.For testing15 imagescapturedby thesensorTM(ThematicMapper)of the Landsat 5 satellite from the databasemappingproject of landuse in the Amazon region were used. The results indicate that thecross‐entropy minimization relates to a consistent segmentation ofimages. The average agreement between the classifier and thefeedbackwas85%forthe15selectedimagesand92%forfoursmallregionsthatrepresentdetailsoftheimages.Keywords: Unsupervised segmentation, statistical models, remotesensing.

    

Page 123: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

Cadernos do Logepa, João Pessoa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012. ISSN: 2237‐7522 DGEOC/CCEN/UFPB – www.geociencias.ufpb.br/cadernosdologepa

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

122

INTRODUÇÃO

Processamento digital de imagens refere‐se a operações realizadas sobre

imagens digitais por meio de computadores. O interesse nessa disciplina deve‐se

principalmente a duas aplicações: melhorias para interpretação visual humana e

processamentoparaarmazenamento,transmissãoerepresentaçãodainformaçãocontida

em uma imagem para percepção por máquinas (GONZALEZ e WOODS, 2002). O

processamento digital de imagens está correlacionado com outras áreas, como

computaçãográficaevisãocomputacional,efazamplousodereconhecimentodepadrões

para atingir seus objetivos. Reconhecimento de padrões é a disciplina da ciência cujo

objetivo é a classificação de objetos em categorias (THEODORIDIS e KOUTROUMBAS,

2009).Essesobjetospodemser,entreoutros,sinaisemformatodeonda,textoseimagens.

A classificação de imagens consiste em agrupar imagens com conteúdo semelhante de

acordo com algum critério, já a segmentação de imagens tem por objetivo a criação de

regiõeshomogêneas,demodoqueauniãoentreregiõesadjacentesnãosejahomogênea

(PALePAL,1993).Oníveldesegmentaçãodeumaimagemdependedoproblemaqueestá

sendoresolvidoedevepararquandoosobjetosdeinteressetiveremsidoisolados.

Uma das abordagens para segmentação de imagens é a utilização de modelos

estatísticos. A Teoria da Informação considera a comunicação como um problema

matemático embasado na estatística, e possui grande importância para a ciência

principalmentepor fornecerasdefiniçõesde informaçãoeentropiaeapossibilidadede

quantificar estes conceitos a partir de probabilidades estimadas (SALOMON, 2007).

UtilizandoconceitosdaTeoriadaInformação,épossívelmedircomumvalornuméricoa

surpresacausadapelaobservaçãodeumamensagematravésdaóticadeumdeterminado

modelo estatístico. Esta medida de surpresa é a entropia cruzada entre o modelo

estatístico e a distribuição de probabilidade da mensgaem, e pode ser utilizada, por

exemplo,comomedidadedissimilaridadeparadividirumaimagememregiões.

O problema de segmentar imagens aparece com frequência em sensoriamento

remotosobaformadedetecçãodemudançadepaisagenseclassificaçãodousodosolo.

Sensoriamentoremotoéa tecnologiaparaaquisiçãode informaçõessobreumobjetode

estudosemquehajacontatodiretocomesteobjeto,sendoousomaiscomumdessetermo

osensoriamentoóticodasuperfícieterrestrepormeiodesatélites.Imagensdasuperfície

terrestre capturadas do espaço estão disponíveis desde a década de 1960, embora

possuíssembaixaresoluçãoefossemfrequentementeregistradasemângulosoblíquos.A

partir da década de 1970, com o lançamento do programa de satélites Landsat, e

Page 124: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

123

posteriormentecomo lançamentodoprogramaSPOT,nadécadade1980, foipossívela

captura de imagens com ângulos quase verticais e resolução capaz demapear recursos

terrestres de forma útil (LILLESAND e KIEFER, 1999). Aplicações modernas de

sensoriamento remoto envolvem a análise multiespectral de objetos localizados na

superfíciedaTerrapormeiodesatélites,aeronaveseestaçõesespaciais.Ainformaçãoé

obtidaatravésdesensoresquecaptamaenergiaeletromagnéticaemitidapelasuperfície

terrestre emdeterminadasbandasde comprimentodeonda. Superfícies compostaspor

diferentes materiais, como vegetação, água e solo, em geral, refletem diferentes

proporções de energia nas faixas do espectro eletromagnético (azul, verde, vermelho,

infravermelhopróximo,etc.)(JENSEN,2007).

Umdosproblemas enfrentadosnomapeamentode recursos eusodo solopor

imagens de sensoriamento remoto é o gerenciamento de grande quantidade de dados.

Para a análise quantitativa de imagens de sensoriamento remoto, a classificação

supervisionadaéoprocedimentomaisfrequentementeutilizado(RICHARDSeJIA,2006).

Autilizaçãodetécnicasdesegmentaçãopresentesemsistemasdeinformaçãogeográfica

ajudaareduzirotrabalhomanualdeinterpretaçãodasimagens,emboraaindasejatarefa

do especialista a construção de um conjunto de treinamento no caso da classificação

supervisionada.Segmentaçãode imagensnão triviaiséumadas tarefasmaisdifíceisem

processamento digital de imagens, além de ser um fator crucial para o sucesso de uma

análise feitaporcomputador(GONZALEZeWOODS,2002).Emborahajamuitosestudos

sobresegmentaçãodeimagensesegmentaçãodeimagensdesensoriamentoremoto,este

problemapermaneceemaberto,atémesmoporsuanaturezasubjetiva.Ainvestigaçãode

um método de segmentação não‐supervisionada que utiliza conceitos da Teoria da

Informação pode contribuir com os avanços na área. Este trabalho tem como objetivo

geral o desenvolvimento de um novométodo para segmentação não‐supervisionada de

imagens de sensoriamento remoto por minimização da entropia cruzada entre a

distribuiçãodeprobabilidadedaimagemeummodeloestatístico.

MATERIAISEMÉTODOS

EstimaçãodeumaFunçãoDensidadedeProbabilidade

ClassificadoresbaseadosnaTeoriaBayesianadeDecisãocalculamaprobabilidade

deumobjetopertenceracadaumadaspossíveisclasseseatribuiesseobjetoàclassemais

provável.Quandonãohá conhecimentoapriori sobre aprobabilidadedeocorrênciade

cadaclasse,adecisãotomadapeloclassificadorédefinidapor:

Page 125: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

124

Decida se ,i i j j c p x|c p x|c i (1)

ondep(x|ci)éafunçãodensidadedeprobabilidadedaclasseci.

Essa regradedecisão éumcaso especial deuma regra geral, ondepodehaver

diferentespenalidadesatribuídasadiferentesclassificaçõesincorretas.Nessascondições,

odesempenhodoclassificadordependedeboasestimaçõesparaasfunçõesdensidadede

probabilidade, pois a tomada de decisão fica condicionada apenas à distribuição dos

vetoresdecadaclasse.

Em muitos problemas, a função densidade de probabilidade é desconhecida e

precisa ser estimada a partir dos dados disponíveis. Em alguns casos, o tipo de

distribuição é conhecido (distribuição normal, distribuição de Poisson, etc.), sendo

necessário estimar apenas os parâmetros da função, como média ou desvio‐padrão.

Quandootipodedistribuiçãoédesconhecido,éprecisoutilizartécnicasparaestimaçãode

formanão‐paramétrica(THEODORIDISeKOUTROUMBAS,2009).

Estimaçõesnão‐paramétricassãobasicamentevariaçõesdeaproximaçõesfeitas

por histograma de uma função densidade de probabilidade desconhecida. Nenhuma

suposiçãoéfeitaapriorisobreotipodedistribuiçãoemquestão.Afunçãodedistribuição

éestimadaapartirdasobservaçõesrealizadas,recebendomaiorprobabilidadeasregiões

ondeosdadosobservadosestãomaisconcentrados.AFigura1ilustraaestimaçãoporum

método não‐paramétrico, aplicado a dois diferentes tipos de distribuições. Essa figura

mostra a estimação não‐paramétrica por histograma de uma distribuição normal (a) e

uma distribuição bimodal (b). Nos dois casos a distribuição estimada conseguiu se

aproximar da distribuição real, embora tenha sido necessário um número elevado de

amostras.

Figura1–Exemplosdeestimaçãonão‐paramétrica

Fonte:Yoneyama(2009).

Page 126: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

125

Abordagensnão‐paramétricaspossuemmaiorflexibilidade,poisseadaptamaos

diferentes tipos de distribuição. Em contrapartida, precisam de um número maior de

amostras para que se possa atingir uma estimação próxima à distribuição real

(YONEYAMA,2009).

EntropiaeModelosEstatísticos

ATeoriadaInformaçãofornececonceitosimportantesparaoreconhecimentode

padrões,comoinformaçãoeentropia,alémdepossibilitartratamentonuméricoparatais

conceitos. Existe uma relação entre reconhecimento de padrões para compressão de

dados e modelagem de uma densidade de probabilidade desconhecida. Um modelo

estatístico que se aproxima da distribuição real desconhecida consegue comprimir os

dadosdeumamensagemreduzindoainformaçãomédiaporsímbolo.

A informação de uma variável aleatória x está relacionada com a surpresa

causadapelaobservaçãodeseuvalor(BISHOP,2006).AEquação2apresentaocálculoda

informaçãoh(x)emfunçãodaprobabilidadedeocorrênciap(x):

2( ) log ( )h x = p x (2)

Afunçãoh(x)decrescemonotonicamenteemrelaçãoap(x),i.e.,quantomaiorfor

aprobabilidadedeocorrênciadex,menor será a informação.Caso sejautilizada abase

logarítmicadois,ainformaçãoseráquantificadaembits.

Aentropiadeumadistribuiçãorefere‐seaograudeincertezadeumasequência

de símbolos retirados desta distribuição (DUDA et al., 2001). A entropia de uma

distribuiçãodeprobabilidadediscretap(x)sobreumalfabetoXé:

2( ) log ( )x X

H p = p(x) p x

(3)

Emumprocessodecomunicação,ainformaçãopresenteemumamensagemestá

associada às expectativas do receptor. Entropia cruzada entre duas densidades de

probabilidade é a informação média necessária para representar um símbolo, quando

utilizadaumadistribuiçãoestimadaporummodeloestatísticoq(x)emvezdadistribuição

realp(x)(BISHOP,2006).

Page 127: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

126

2( ) log ( )x X

H p,q = p(x) q x

(4)

Emmuitassituações,adensidaderealédesconhecidaeaentropiacruzadanão

pode ser calculada diretamente pela Equação 4. Uma aproximação é feita a partir da

informaçãoobservadasobredeterminadamensagemretiradadadensidadereal.Parauma

mensagemde tamanhoN e umdensidade estimadaq(x), a entropia cruzada é calculada

pelainformaçãomédiadamensagem:

N

2i 1

1( ) log ( )

N iH p = q x

(5)

A entropia cruzada pode ser utilizada para a classificação de padrões como

medidadedissimilaridadeentredistribuições.AFigura2contémarepresentaçãográfica

de duas distribuições de probabilidade, modeladas por histograma a partir de uma

segmentaçãodeáreaurbanaehidrografia.

Figura2–Distribuiçõesestimadasparaáreaurbanaehidrografia.

Éesperadoqueadistribuiçãodeumaregiãopossuabaixaentropiacruzadacom

adistribuiçãodeoutraregiãodemesma classe,enquantoasdistribuiçõesderegiõesde

classesdiferentespossuamaltaentropiacruzadaentresi.

Page 128: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

127

Inicializaçãodesementesatravésdométodomax‐min

Umdosproblemasencontradosemmétodosdeclassificaçãonão–supervisionada

é a escolha de sementes para inicialização dos clusters. Várias abordagens para

inicialização foram propostas para os algoritmos de classificação não supervisionada,

muitasdelasnão‐determinísticas (MAITRAetal., 2010).Ométododamáximadistância

mínima (max‐min), poroutro lado, éumaabordagemdeterminísticaquedefine alguma

amostra observada como semente e que procura sementes distantes entre si (MIRKIN,

2005).OAlgoritmo1descreveoprocessodeseleçãodassementes.

ALGORITMO1‐MAX‐MIN

Calculartodasasdistânciasentreparesdevetoresnoconjuntodedados.

Selecionarcomosementesosdoisvetorescommaiordistânciaentresi.

Atéonúmerodesejadodesementes,repetir:

Selecionar como nova semente o vetor cuja distância mínima para as atuais

sementessejaamaiorpossível.

Fonte:Maitraetal.(2010).

Caso o conjunto de dados seja muito grande, esse método pode tornar‐se

computacionalmente custoso, pois apresenta complexidade O(n2). Para contornar esse

problemaéprecisosubstituiramaneiracomoasduasprimeirassementessãoescolhidas,

eliminandoocálculodasdistânciasentretodososparesdevetores.Nocasodeimagens,

pode‐seescolheraprimeirasementeporalgumcritériocomoregiãomaishomogênea,e

asdemaissementespormáximadistânciamínima.

TransformadaWATERSHED

ATransformadaWatershed éumaabordagemdesegmentaçãode imagensque

geraregiõescombaseemumasituaçãorealdeinundação(BEUCHER,1992).Aprimeira

etapa dessa transformada é o cálculo da imagem gradiente através de um operador de

diferenciação.Aimagemgradienteindicaavariaçãodosvaloresdaimagememcadapixel

(Figura3).

Page 129: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

128

Figura 3 – Detalhe de imagem capturada pelo satélite Landsat‐5, banda 4 (a); ImagemgradientecalculadapelooperadordeSobel(b).

Aimagemgradienteétratadacomoumasuperfícietopográfica,ondeovalorem

cadapixelsignificaaelevaçãodasuperfícienaquelelocal(Figura3).

Figura 3 – Visualização topográfica da imagem gradiente da Figura 3.

O processo de inundação é então iniciado e a água começa a fluir a partir dos

mínimos locais. Quando a água que parte de doismínimos converge, é construída uma

Page 130: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

129

represa delimitando as duas regiões. A Figura 4 ilustra o processo de inundação e a

construçãodasrepresas.

Figura5–Mínimoslocaisidentificadosporpontosvermelhos(a).Quandoaáguaencontraum ponto onde pode transbordar, uma represa é construída (b). A inundação acaba aoatingir o ponto mais alto (c). As regiões delimitadas pelas represas determinam asegmentaçãodaimagem(d).Fonte:adaptadadeBeucher(1992).

Oresultadodoprocessotendeaserumasupersegmentaçãodaimagem,devidoà

presençaderuídooupadrõesdetexturas(BEUCHER,1992).Ospassosparaarealização

daTransformadaWatershedsãodescritosnoAlgoritmo2.

ALGORITMO2‐TRANSFORMADAWATERSHED

Calcularaimagemgradiente.

Localizarosmínimoslocaisdaimagemgradiente.

Paracadamínimolocal:

Criarumaregiãoapartirdomínimolocal.

Repetir:

Adicionaràregiãoospixelsdavizinhançacujovalornaimagemgradienteé

maiorqueovalordaregiãonafronteira.

Enquantohouverpixelsparaseremadicionadosnafronteiradaregião.Fonte:Beucher(1992).

Page 131: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

130

Imagensutilizadosnesteestudo

Paratestarodesempenhodoalgoritmodesegmentaçãoproposto,foramutilizadas

imagens de sensoriamento remoto da região amazônica, capturadas pelo sensor TM do

satéliteLandsat‐5noanode2008,disponíveisnositedoInstitutoNacionaldePesquisas

Espaciais (INPE). A escolha por esse banco de dados se deve ao fato de se encontrar,

também no site do INPE, a classificação do uso do solo para essa região, gerada pelo

projetoTerraClass.

Em 1988, o Programa de Monitoramento do Desflorestamento na

AmazôniaLegal (PRODES),desenvolvidoeexecutadopelo INPE,surgiucomo intuitode

produzir a estimativa da taxa anual do desflorestamento, a partir de levantamentos

sistemáticos utilizando imagens de satélite. Vinte anos após o início do PRODES, para

atender as novas necessidades de qualificação das áreas desflorestadas da Amazônia, a

Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias (Embrapa) e o INPE executaram um

projeto em parceria, chamado TerraClass (EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISAS

AGROPECUÁRIAS; INSTITUTONACIONALDE PESQUISAS ESPACIAIS, 2011). A execução

desseprojetoresultounaelaboraçãodeummapaquedescreveasituaçãodousodosolo

na Amazônia durante o ano de 2008. Os dados digitais resultantes do mapeamento

encontram‐sedisponíveisnositedoINPE(www.inpe.br).

Para a avaliação dométodo de segmentação proposto, foram utilizadas imagens

classificadasdoprojetoTerraClass.Essasimagensestãodivididasporcenaeencontram‐se

noformatovetorialshapefile.Asclassestemáticasconsideradasnostestesrealizadossão

três:hidrografia,vegetaçãoenãofloresta,derivadasdasclassesconsideradaspeloprojeto

TerraClass.OTabela1exibedescriçãoe legendadecorparaasclassesconsideradas.Os

pixels marcados na imagem temática como área não observada não participam do

processodeclassificação.

Tabela1–Legendaedescriçãodasclassestemáticas

Cor Classe Descrição

Hidrografia Rios

Vegetação Floresta,vegetaçãosecundáriaeagricultura

NãoFloresta

Áreaurbana,pastos,áreasdesmatadaseáreascomsoloexposto

Área nãoObservada

Áreas que tiveram sua interpretação impossibilitada pelapresençadenuvensousombradenuvens

Page 132: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

131

Ataxadeacertosdoclassificadoré aferidapixel apixele,portanto, foipreciso

converter a imagem temática disponível em formato vetorial para uma imagem em

formatoraster.Paraesta tarefa,umconversor foi desenvolvidocombasenodocumento

deespecificaçõestécnicasdaempresaEnvironmentalSystemsResearchInstitute(1998).

Paraostestesrealizados,foramutilizadasquinzeimagensdedimensões500x500

pixelsequatroimagensdedimensões50x50,querepresentamdetalhescomoatransição

entre rio e vegetaçãoou entre vegetação e solo exposto.O gabaritoparaosdetalhesde

imagemfoifeitomanualmenteporumespecialista.

Segmentaçãoporminimizaçãodaentropiacruzada

A entropia cruzada é calculada pela informação média de uma mensagem de

acordocomummodeloestatístico.AEquação6apresentaocálculodaentropiacruzada

deacordocomamodelagemproposta:

N

2 2x X k 1 1

1 1log log ( )

| X |

B

k k bb

H= R x P xK

(6)

onde:

|X|éonúmerodepixelsdaimagemX.

xéumpixeldaimagem.

Kénúmerototaldeclusterspresentesnasegmentação.

Rk(x)éumafunçãoqueassumevalor‘1’casoopixelxpertençaaoclusterke‘0’caso

contrário.

Béonúmerodebandasquecompõemaimagem.

pk(xb) é a funçãodensidadedeprobabilidadedo clusterk para os valoresde x na

bandab.

O algoritmo desenvolvido tem por objetivominimizar a Equação 6 através da

manipulaçãodasfunçõesRk.OAlgoritmo3descreveasetapaspropostasparaaredução

iterativadaEquação6.

Page 133: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

132

ALGORITMO3‐MINIMIZAÇÃODAENTROPIACRUZADA

ExecutaraTransformadaWatershed.

Selecionarsementes(regiões)pelométodomax‐min.

Repetir:

Estimaradensidadedeprobabilidadedasclassesdeacordocomsuasregiões.

Atribuircadaregiãoàclassequeobtivermenorinformação.

Enquantohouverreduçãodaentropiacruzada.

RESULTADOS

Em cada iteração, as regiões que pertencem a um cluster têm seus pixels

utilizados como amostras para a construção do modelo estatístico daquele cluster por

meiode estimaçãonão‐paramétrica.Omodelo estatísticodeumcluster é construídode

modoquehajaestimativa(maiorquezero)paracadaumdos256possíveisvaloresque

umpixelpossaassumiremcadabandadaimagem.Dessaforma,cadaclusterkpossuiB

funções independentes para estimação de probabilidades, uma para cada banda,

construídas através de histogramas. A probabilidade estimada inicialmente para a

ocorrência de qualquer valor em qualquer banda é, portanto, 1/256. Ao final do

treinamento,aprobabilidadeestimadaparaumdeterminadovaloremumabandaseráa

frequênciarelativadessevalornaquelabanda.

A Figura 4 ilustra a escolha das sementes e o processo de minimização da

entropiacruzada.NoexemplodaFigura4,épossívelperceberquejáexistedistinçãoentre

asclasseshidrografia,vegetaçãoenão florestanaprimeira iteração,ondeasdensidades

deprobabilidadedecadaclustersãoestimadasapenascomasamostrasdecadasemente

selecionada.Asiteraçõesseguintesutilizamomodeloestatísticodaiteraçãoanteriorpara

obter um modelo mais preciso para a redução da entropia cruzada e uma esperada

melhoranasegmentaçãodaimagem.

Page 134: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

133

Figura 4 - Redução da entropia cruzada: seleção das sementes pelo método max-min (a). Primeira iteração: entropia=14,84 bits/símbolo; concordância observada=62,08% (b). Sexta iteração: entropia=10,58 bits/símbolo; concordância observada=76,64% (c). Fim do processo de redução da entropia (iteração 42): entropia=10,49 bits/símbolo; concordância observada=92,18% (d).

Page 135: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

134

Figura5–Segmentaçãodosdetalhesdeimagem

CONCLUSÕES

Osresultadosobtidosindicamqueométododesegmentaçãopropostoconsegue

classificarasimagensdeformacoerenteenquantobuscaareduçãodaentropiacruzada.A

operação sobre regiões, além de acelerar o processo, adiciona contexto espacial à

Page 136: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

SANTANA, BATISTA e SILVA

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

135

segmentação,algoquenãoexisteemmétodosbaseadospuramentenaclassificaçãopixela

pixel.

Embora o gabarito utilizado como referência nos testes não seja totalmente

preciso,aconcordânciamédiade84,55%sobreas imagensdobancoéum indicadorde

bom desempenho do classificador. Para os detalhes de imagem, cujos gabaritos foram

segmentados manualmente, a concordância média de 91,81% também é um bom

indicador.Namaioriadoscasos,oíndiceKappaestápróximodaconcordânciaobservada,

oquesugerebaixataxadeacertosporacaso.

Algoquepodeserexploradoparaaumentaropoderdeclassificaçãodométodo

proposto é autilizaçãodeumsistemahierárquicode classificação.Após a segmentação

inicial das classes épossível subdividir cada classe selecionandobandas específicasque

possam diferenciar, por exemplo, pastos de área urbana, ou vegetação secundária de

floresta.

REFERÊNCIAS

BEUCHER, S. TheWatershed Transformation Applied to Image Segmentation. ScanningMicroscopy,v.6,pp.299–314,1992.

BISHOP,C.M.PatternRecognitionandMachineLearning.NewYork:Springer,2006.

DUDA, R. O.; HART, P. E.; STORK, D. G. Pattern Classification. 2. ed. New York: WileyInterscience,2001.

ENVIRONMENTALSYSTEMSRESEARCHINSTITUTE.ESRIShapefileTechnicalDescription:AnESRIWhitePaper.Redlands,1998.

EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA; INSTITUTO NACIONAL DEPESQUISAS ESPACIAIS. Levantamento de Informações de Uso e Cobertura da Terra naAmazônia.SumárioexecutivodoprojetoTerraClass,set.2011.

GONZALEZ, R. C.; WOODS, R. E. Digital Image Processing. 2. ed. Upper Saddle River:Prentice‐Hall,2002.

LILLESAND, T.M.; KIEFER, R.W. Remote Sensing and Image Interpretation. 4. ed. NewYork:JonhWiley&Sons,1999.

JENSEN, J.R.RemoteSensingof theEnvironment:AnEarthResourcePerspective.2. ed.UpperSaddleRiver:Prentice‐Hall,2007.

MAITRA,R.;PETERSON,A.D.;GHOSH,A.P.ASystematicEvaluationofDifferentMethodsfor Initializing the K‐means Clustering Algorithm. IEEE Transactions on Knowledge andDataEngineering,2010.

Page 137: CADERNOS DO LOGEPA - Departamento de Geociências/CCEN/UFPB · VALLEJO Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 3‐24, jan./jun. 2012 5 pesquisadores e do público em geral, particularmente

TÉCNICAS DE SEGMENTAÇÃO NÃO‐SUPERVISIONADA: análise comparativa de mapeamentos do uso e ocupação do solo 

Cadernos do Logepa, v. 7, n. 1, p. 121‐136, jan./jun. 2012 

136

MIRKIN,B. Clustering forDataMining:ADataRecoveryApproach. London:Chapman&Hall,2005.

PAL,N.R.;PAL,S.K.AReviewonImageSegmentationTechniques.PatternRecognition,v.26,n.9,pp.1274‐1294,1993.

RICHARDS, J. A.; JIA, X. Remote Sensing Digital Image Analysis: An Introduction. 4. ed.Berlin:Springer,2006.

SALOMON, D. Data Compression: The Complete Reference, 3. ed. New York: Springer,2004.

THEODORIDIS,S.;KOUTROUMBAS,K.PatternRecognition.4.ed.London:AcademicPress,2009.

YONEYAMA,T.EstimaçãoNão‐Paramétrica.NotasdeauladadisciplinaControleTolerantea Falhas, Curso de Pós‐Graduação em Engenharia Eletrônica e Computação, InstitutoTecnológico de Aeronáutica, 2009. Disponível em:<http://www.ele.ita.br/~takashi/didatico.htm>.Acessoem:17jul.2012.