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O Caminho da Graça www.caiofabio.net | www.vemevetv.com.br Página1 Oração... é vida vivida! Caio Fábio Vamos ler Mateus 6:9-13; 7:7-12 “Portanto, orai vós deste modo: Pai nosso que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dá hoje; e perdoa- nos as nossas dívidas, assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores; e não nos deixes entrar em tentação; mas livra-nos do mal. {Porque teu é o reino e o poder, e a glória, para sempre, Amém.} Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede recebe; o que busca encontra; e, a quem bate, abrir-se-lhe-á. Ou qual dentre vós é o homem que, se porventura o filho lhe pedir pão, lhe dará pedra? Ou, se lhe pedir um peixe, lhe dará uma cobra? Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos que lhe pedirem? Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles; porque esta é a Lei e os Profetas.” Aqui há um princípio universal, que na nossa cultura brasileira foi cunhado pelo Chacrinha como sendo o ditado que diz que quem não chora não mama. Essa é uma lei universal: um indivíduo que fica quieto no seu lugar, cheio de desejos ou de vontades, mas não os expressa, não terá, muito provavelmente, aquilo que deseja, pede, ambiciona, ou queira; porque não expressa, porque não se comunica – é outro ditado do Chacrinha: Quem não se comunica se trumbica. E o que Jesus está inicialmente anunciando aqui é um princípio que se pode observar nas relações universais dos seres humanos: gente que pede tem infinitas chances de receber o que está pedindo. Porque às vezes a coisa está ali disponível e só precisa que alguém tenha coragem de dizer: Escuta, será que eu posso ter isto aqui? Ou até mesmo numa mesa, a pessoa assentada que quer sal pede sal; não fica, como algumas pessoas tímidas demais, que se sentam numa mesa onde elas não tenham nenhuma intimidade, olhando para o sal, para o açúcar, para uma faca maior que melhor cortaria um bife, sem pedir nada, até que, quem sabe, uma dona de casa superatenta diga: Escute, estou vendo que os seus olhos varrem a mesa, você está sentindo falta de alguma coisa? Seria o sal? Seria o açúcar? Seria a faca? Seria água? (quase que vai por seleção, com aquela quantidade enorme de itens, para que a pessoa diga: É o sal). Existem pessoas assim; tamanha é a introversão, tamanha é a timidez, que elas não se expressam. É como aquele rapaz que aprecia, que gosta, que tem interesse em uma menina e é capaz de passar por ela todo dia e cumprimentá-la, é capaz de vendo o carro dela com o pneu furado, na rua, oferecer-se para trocar, é capaz de, toda vez que ela vai passando,

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Oração... é vida vivida! Caio Fábio

Vamos ler Mateus 6:9-13; 7:7-12

“Portanto, orai vós deste modo: Pai nosso que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu

reino, seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dá hoje; e perdoa-

nos as nossas dívidas, assim como nós também temos perdoado aos nossos devedores; e não nos deixes

entrar em tentação; mas livra-nos do mal. {Porque teu é o reino e o poder, e a glória, para sempre,

Amém.}

Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e achareis; batei, e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede recebe; o que busca

encontra; e, a quem bate, abrir-se-lhe-á. Ou qual dentre vós é o homem que, se porventura o filho lhe

pedir pão, lhe dará pedra? Ou, se lhe pedir um peixe, lhe dará uma cobra? Ora, se vós, que sois maus,

sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos

que lhe pedirem? Tudo quanto, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles;

porque esta é a Lei e os Profetas.”

Aqui há um princípio universal, que na

nossa cultura brasileira foi cunhado pelo

Chacrinha como sendo o ditado que diz

que quem não chora não mama. Essa é

uma lei universal: um indivíduo que fica

quieto no seu lugar, cheio de desejos ou de

vontades, mas não os expressa, não terá,

muito provavelmente, aquilo que deseja,

pede, ambiciona, ou queira; porque não

expressa, porque não se comunica – é

outro ditado do Chacrinha: Quem não se

comunica se trumbica.

E o que Jesus está inicialmente anunciando

aqui é um princípio que se pode observar

nas relações universais dos seres humanos:

gente que pede tem infinitas chances de

receber o que está pedindo. Porque às

vezes a coisa está ali disponível e só precisa

que alguém tenha coragem de dizer:

Escuta, será que eu posso ter isto aqui? Ou

até mesmo numa mesa, a pessoa assentada

que quer sal pede sal; não fica, como

algumas pessoas tímidas demais, que se

sentam numa mesa onde elas não tenham

nenhuma intimidade, olhando para o sal,

para o açúcar, para uma faca maior que

melhor cortaria um bife, sem pedir nada,

até que, quem sabe, uma dona de casa

superatenta diga: Escute, estou vendo que

os seus olhos varrem a mesa, você está

sentindo falta de alguma coisa? Seria o sal?

Seria o açúcar? Seria a faca? Seria água?

(quase que vai por seleção, com aquela

quantidade enorme de itens, para que a

pessoa diga: É o sal). Existem pessoas assim;

tamanha é a introversão, tamanha é a

timidez, que elas não se expressam. É como

aquele rapaz que aprecia, que gosta, que

tem interesse em uma menina e é capaz de

passar por ela todo dia e cumprimentá-la, é

capaz de vendo o carro dela com o pneu

furado, na rua, oferecer-se para trocar, é

capaz de, toda vez que ela vai passando,

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chegar numa posição em que possa lhe dar

um adeusinho, mas sem nunca se

aproximar, sem nunca se expressar. No

curso da minha vida eu vejo em todas essas

áreas – especialmente nessa segunda –

moças dizendo: Ah, me dá a impressão de

que ele gostaria de ter alguma coisa

comigo, mas ele nunca disse nada...! E você,

que conhece o indivíduo lá do outro lado,

sabe que ele nem dorme direito, de tanta

paixão, de tanto amor, de tanta vontade de

que aquela pessoa se relacionasse com ele;

mas ele nunca fala. Até que um dia ele fica

chocado quando vê a moça passando com

outro, que chegou bem depois mas teve a

coragem de dizer o que queria, teve a

coragem de pedir, teve a coragem de ir

atrás e, aí, levou.

Esse é um princípio em todas as áreas, nas

empresas, no trabalho. Eu já tive mais de

cinco mil pessoas trabalhando comigo, no

curso da minha vida. A gente percebe,

nitidamente, a diferença: o funcionário que

tem a coragem de pedir – pedir uma

oportunidade de trabalho, pedir para fazer

uma determinada coisa que está ali na mão

de um, na mão de outro, não bem

realizada, e o indivíduo chega e diz: Deixa

eu tocar esse projeto? Então a gente olha

para ele e vê que está pedindo com

firmeza, com vontade, com veemência, e

lhe diz: Pronto, é seu, vá e faça. Essas

pessoas vão em frente, na vida, porque têm

a ousadia de pedir.

Jesus também referia-se ao buscar. Quem

busca acha sempre. O indivíduo que

imagina que exista uma oportunidade, que

exista uma situação aberta, que exista algo

que possa ser útil à vida dele, e que busca,

esse vai achar. Porque raramente a mente

humana imagina alguma coisa que não

exista no Planeta; e quando não existe

porque não tenha sido feita ainda, o

simples fato de imaginar e começar a

buscar aquilo vai fazer com que ou o

próprio indivíduo acabe desenvolvendo

aquilo que ele busca, ou que, de algum

modo, o inconsciente coletivo já o esteja

conectando a uma solução, porque já

existe alguém fazendo aquilo. O fato é que

imaginação e encontro são coisas que

acontecem com muita regularidade

quando existe objetividade nessa busca.

Quem busca acha.

E Jesus disse, ainda, que ao que bate abrir-

se-lhe-á, mais cedo ou mais tarde. Não

adianta ficar sentado à frente de uma porta,

dizendo: Quem me dera que essa porta se

abrisse para mim, quem me dera que essa

porta se abrisse; e nem ficar dizendo: Abre-

te, Sésamo. Mas se você tiver coragem de

bater pode ser que a abram para você. Até

Jesus, quando se refere ao desejo dele de

entrar em um lugar (falando à igreja de

Laodiceia, lá no Apocalipse) diz: “Eis que

estou à porta e bato; se alguém ouvir a

minha voz e abrir a porta, eu entrarei...”. A

parte de cá está sendo feita, o desejo está

sendo expresso, a comunicação do toc, toc,

toc está acontecendo.

Esse é um fenômeno humano; quem

aprende esse fenômeno tende a ser mais

bem sucedido nas coisas que almeje nesta

vida.

Da mesma forma Jesus se referiu à oração

usando um exemplo também de

comunicação insistente e perseverante,

quando ele falou daquela viúva que queria

que a sua causa fosse julgada por um juiz

iníquo: um juiz que não temia a Deus e

nem aos homens e não dava a mínima para

ninguém, mas a viúva, apesar disso, todos

os dias estava na porta dele, dizendo: Sr.

Juiz, por favor, julgue a minha causa, Sr.

Juiz, por favor, julgue a minha causa, Sr.

Juiz, olhe a minha causa, está lá, Sr. Juiz, por

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favor, julgue a minha causa... E Jesus disse:

Em verdade, em verdade vos digo que

aquele juiz iníquo julgará a causa daquela

mulher, até para não ser mais importunado.

E acrescentou: Quanto mais o Pai celeste,

que não é iníquo, que é pura equidade,

amor, justiça, bondade, solidariedade, não

terá esse ânimo de atender àquele que lho

pede? – a essa viúva, a esse ser frágil de

alma, de vida, mas que não tem fragilidade

espiritual quanto a admitir a sua

fragilidade, e a expressar, como uma

demanda humilde, todo dia, a sua

necessidade, pedindo que lha atendam.

Esse é outro fenômeno de comunicação.

E aqui nos primeiros versos nós estamos

vendo Jesus lidar com esse fenômeno, que

é amplamente demonstrável em todo o

espectro da vida humana: quem pede, a

esse dar-se-á; o que busca achará; a quem

bate, abrir-se-lhe-á – “Pois todo o que pede

recebe, o que busca encontra, a quem bate,

abrir-se-lhe-á”. No mundo absolutamente

horizontal é assim, quem chora mama,

quem não chora não mama – ou só mama

se a mãe, desconfiadíssima do silêncio do

bebezinho, o procurar para forçá-lo a

mamar; do contrário, a natureza manda

que até a mãe mais dedicada perceba e

sinta o sinal da necessidade do bebê (que

não sabe falar mas sabe chorar, sabe

expressar, pelo choro, a sua dor e a sua

fome) quando a criança chora, ou se

contorce, ou se espreme, ou começa a

sugar a boca desesperadamente, como

quem quer alguma coisa. Aí, então, a mãe

diz: Ah, está na hora, agora ele está com

fome, eu não preciso forçar o leite antes da

hora. Esse é um fenômeno humano, é

assim que a sobrevivência humana

acontece, é assim que o ser bem-sucedido

na vida se realiza, é assim, por esses

processos de comunicação, dos mais

rudimentares aos mais sofisticados, que as

pessoas vão conseguindo o que desejam, o

que pretendem.

Aí, Jesus sai desse plano imediato e aplica

esse fenômeno universal a uma dimensão

superior, transforma-o isso numa ilustração

sublime, e diz: Ou qual dentre vós é o

homem que, se porventura o filho lhe pedir

pão, vai lhe dar uma pedra? Se no mundo

da horizontalidade quem pede recebe,

quem busca encontra, e a quem bate abrir-

se-lhe-á, no mundo espiritual cheguem, no

mínimo, com essa confiança, sabendo que

não haverá boicote. Aqui na

horizontalidade quem pede algo recebe o

equivalente, quem busca uma coisa

encontra o equivalente, quem bate na

intenção de alguma coisa vai achar o

equivalente, por que, então, vocês têm

medo de orar? Por que vocês têm medo de

orar, por que vocês têm medo de pedir, por

que vocês têm medo de buscar, por que

vocês têm medo de bater?

Medo de orar, medo de buscar, medo de

bater na porta de Deus. Muita gente tem

esse medo. Medo, porque não creem no

amor de Deus. Medo, porque tiveram

traumas parentais – pais perversos ou mães

descuidadas – ou traumas religiosos,

porque se lhes prometeu que se eles

pedissem um Mercedes eles ganhariam um

Mercedes, que se eles pedissem um Jaguar

eles ganhariam um Jaguar, que se eles

pedissem um hipercapricho divino, eles

receberiam um hipercapricho divino; mas

eles não receberam, então foram para o

polo oposto e desenvolveram um medo de

se frustrarem na oração; e se tornaram

tímidos e já não pedem nada, já não

buscam nada, já não batem na porta do

Santo dos Santos para nada. Porque por

tais exageros vieram tão grandes

frustrações, e instalaram-se timidez tão

profunda e desânimo tão grande, que tem

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gente que ficou com medo de orar. Tem

gente que ficou com aquela suspeição de

que Deus é um Deus envenetado, é um

Deus que pode nos surpreender com

alguma maldade, justamente por causa

dos seus traumas interiores. Raramente é

por uma incredulidade nascida e

desenvolvida desde a mais tenra infância

no coração da criança; em geral, o que

deixa a pessoa nesse estado de ficar com

medo de orar e se frustrar de novo são os

traumas da vida, das relações humanas, das

relações parentais, das relações com as

falácias religiosas, com as promessas

fantasiosas que não se cumprem.

Aí, Jesus disse: Olha, para com isso, porque

na normalidade da vida não é assim, na

natureza simples e horizontal das coisas

não é assim. Se na natureza relacional entre

humanos normais, que não sejam

sociopatas, ou adoecidos, acontece de

maneira consequencial – quem pede, a

esse se dá, quem busca, esse acha, quem

bate, a esse se abre – por que, então, em

relação ao Pai celeste seria diferente? Pois

qual dentre vós, não sendo um psicopata,

um sociopata, um desafeiçoado, um

doente, sendo um ser humano que

carregue o mínimo de normalidade

instintual em relação aos filhos, qual dentre

vós é o homem ou a mulher que, se

porventura o filho lhe pedir um pão, vai

dizer: Olha, você está com fome? Pega essa

pedra aqui pra você comer, é uma delícia,

morde, é bom para deixar os dentes bem

gastos; qual dentre vós é o pai que faz isso

com o filho? Ou se o filho lhe pedir um

peixe: pai, será que eu posso comer esse

peixinho aqui? vai dizer: Não, não, eu

guardei aqui uma coisa muito legal, pra

você; e vem de lá com uma cascavel? Qual

é o pai ou a mãe que faz isso, a não ser

aquele que seja absolutamente doente,

fora de toda norma instintual e natural da

vida?

E Jesus completa: “Ora, se vós que sois

maus...”. Porque todos nós somos maus. O

melhor de nós é mauzinho, é egoísta. O

melhor de nós, às vezes, dá uma brigadinha

com o filho por um pedaço de doce: eu

separei isso aqui para mim, por que é que

você só quer comer essa parte que eu já

separei para mim? O melhor de nós tem

suas próprias preferências e advoga suas

próprias causas, até mesmo em relação aos

filhos; e quando não seja em relação aos

filhos, as advoga em relação a muitas

outras pessoas. E como disse o Alexander

Soljenítsin, em O Arquipélago Gulag, o

mundo tem tantos centros quantos

homens nele exista. Os centros do Planeta

são cada indivíduo neste planeta, porque o

egoísmo de cada um de nós determina

qual é o Greenwich do horário supremo

planetário: é a minha hora, é o meu tempo,

é o meu ser, é a minha vontade, é meu

capricho, é o meu ego. E isso faz de todos

nós gente a ser classificada como Jesus

classificou, como gente ruinzinha.

“Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas

dádivas aos vossos filhos...”. De modo que

quando eu oro ao Pai eu oro pensando na

minha maldade; e digo: Eu não tenho sido

capaz de dar aos meus filhos coisas ruins

quando eles me pedem coisas razoáveis,

quando não estão me pedindo nada para

um capricho de playboy, quando não estão

me pedindo nada que lhes seja viciante,

adoecedor, que demande de mim tornar-

me um adulador deles, um indivíduo que

colabora com a preguiça, com a doença,

com o descuido, com o descaso deles. Me

pedindo uma coisa que seja razoável, que

seja boa para a vida, que tenha significado,

que não seja um capricho, eu, que sou mau,

sei dar coisas boas, equivalentes,

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necessárias; eu considero a proporção e as

relações de equivalência no que se refere

àquele filho, ao que ele pode receber, à

qualidade do caráter dele – se vai ser

estragada ou não com aquilo; e em se

tratando de coisas essenciais, então, nem

se discute (não se está falando de roupa de

grife, nem de cinturões caríssimos, nem de

sapatos especiais, nem de um luxo

advogado por um filho. Se está falando,

aqui, de coisas pertinentes à vida). Então, a

julgar por mim, que sou mau e sei dar boas

dádivas aos meus filhos, quando elas são

de fato coisas boas porque realizarão o

bem a eles e não o capricho deles; a partir

de mim, que sou egocêntrico e que carrego

essa natureza má e ainda assim transcendo

a mim mesmo e identifico necessidades

essenciais e dou a eles o que seja bom,

como, também, pela mesma bondade –

apesar de eu ser mau – não dou a eles

aquilo que possa lhes fazer mal somente

porque lhes seja um capricho; a julgar por

mim, que sei fazer uma medida mínima de

equivalência e proporcionalidade, e exercer

discernimento para avaliar o que seja bem

para eles, e não apenas gostoso, eu olho

para os céus sem culpas, sem medos, sem

dúvidas. Porque se eu sou assim é

impossível que o Pai que está nos céus não

seja bondade de discernimento absoluto,

sendo ele amor, e não mal.

Por isso Jesus diz: Se vocês que são assim

conseguem exercer esse juízo, quanto mais

o vosso Pai que está nos céus não dará

boas coisas àqueles que lho pedirem? Boas

coisas, não coisas ruins. O Pai não dá coisas

ruins, o Pai não atende a caprichos, o Pai

não é um promotor de luxos. O Pai é um

patrocinador de essências, daquilo que faz

a vida viável, possível, para que esse filho

não adoeça, não se torne um ser

enfraquecido pelas dadivosidades

desproporcionais (pois aí, nesse caso, o pai

não estaria sendo bom, estaria sendo mau,

estaria introjetando fraqueza na

consciência do filho). Portanto – Jesus diz –,

a julgar por vós mesmos, que sois maus,

como é que vocês não imaginariam que o

Pai celeste os transcenderá de maneira

infinita quanto a dar boas coisas aos que

lho pedirem?

Então, peça sem medo. Nós temos que

perder esse medo de pedir. Mas não peça

segundo o seu capricho, a sua veneta, a sua

vontade de que as suas preguiças sejam

realizadas. Peça de acordo com o que seja

bom, de acordo com aquilo que já está

definido como um bem que Deus tem o

prazer de realizar na vida da gente; pois

Deus não atende as orações do nosso

capricho, ele atende às orações da nossa

real necessidade. Então, peça e você vai ver

que se lhe dará. Busque; busque

destemidamente, e você vai achar. Bata

sem susto, e vai abrir-se a porta para você –

desde que não seja a porta dos seus

desejos envenetados, mas seja a porta da

necessidade, a porta do que é legítimo, a

porta do que é genuíno, a porta do que é

bom. É isso que Jesus está me estimulando

a fazer sem medo, com fé, deixando de

lado os traumas. Porque tem gente que

não ora com medo de não ser ouvida. E aí,

com medo de não ser ouvida, essa pessoa

não tem fé. E não tendo fé, não será ouvida.

Por isso, tire do coração o medo.

Tem gente que não ora até para não perder

a reputação diante de Deus, para não ficar

com uma crise de identidade,

perguntando: Será que ele é meu Pai? Será

que eu sou filho? Pois eu pedi e ele não me

deu, eu busquei e não achei, eu bati e não

se abriu para mim. Então, até para não ter

de fazer essas perguntas, que são

perguntas tolas, tem gente que desistiu da

oração, e que vai ao Deus dará; e prefere

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pedir que outros peçam por elas, que

outros busquem por elas, que outros

batam por elas, mas elas mesmas não têm

essa confiança no amor do Pai.

Ou, então, guardam no coração apenas as

orações do capricho, as orações do luxo, as

orações do conforto. E lá no fundo da alma

sabem que Deus não mantém a preguiça, o

capricho, a veneta e o luxo como

prioridades na sua agenda de resposta a

ninguém, pois ele nos ama, ele não está

aqui para nos adular e nos fazer mal. Mas o

fato é que tem muita gente que, por uma

razão ou por outra, não pede, não busca,

não bate. E, portanto, não recebe. Não

recebe nunca, não acha nunca, não vê nada

abrir-se para ele, para ela, nunca.

E há aqueles também que não fazem isso

por causa de uma avaliação interior. Esses,

eles próprios sabem o quão egoístas são na

vida, e transferem e projetam esse egoísmo

pessoal para o valor do infinito. E aí dizem:

Bom... eu não daria, eu não terei, eu não

daria, eu não terei; por isso não vou pedir,

não vou buscar, não vou bater.

Jesus conclui essa palavra dele dizendo

algo extraordinário: “Tudo quanto, pois,

quereis que os homens vos façam, assim

fazei-o vós também a eles”. Tudo quanto,

pois... E esse “pois” é um evocativo de tudo

quanto ele tinha dito anteriormente: Pedi e

dar-se-vos-á, buscai e achareis, batei e

abrir-se-vos-á, pois todo o que pede

recebe, o que busca encontra, e ao que

bate abrir-se-á; ou qual dentre vós é o

homem que se o filho lhe pedir um pão lhe

dará uma pedra, ou se lhe pedir um peixe

lhe dará uma cobra? Ora, se vós que sois

maus sabeis dar boas dádivas aos vossos

filhos, quanto mais o Pai que está nos céus

não dará boas coisas aos que lhe pedirem?

Tudo quanto, pois – por causa disso, tendo

isso em mente, consequencialmente a tudo

que ele vinha falando a esse respeito. Tudo

quanto, pois, quereis que os homens vos

façam, assim fazei-o vós também a eles.

E aí você pergunta: E qual a relação que há

entre oração e relação humana, que se

conclui com esse “pois” vinculante ao pai

que olha para si mesmo e sabe que apesar

da sua natureza corrompida ele é capaz de

bondades para com o filho (bondades

consequentes, e não inconsequentes)? Que

relação tem esse “tudo quanto, pois,

quereis que os homens vos façam, fazei vós

a eles”, com esse pensamento de Jesus nos

estimulando a pedir, a buscar, a bater, e

tudo isso pela via da oração?

Ora, na oração do Pai Nosso o que se diz é

o seguinte: “Perdoa as nossas dívidas assim

como nós perdoamos os nossos

devedores”. E essa frase é o eixo, é o

elemento pivotal a liberar ou a amarrar

todas as nossas orações. O que Jesus está

dizendo aqui (tudo quanto, pois quereis

que os homens vos façam, assim fazei-o vós

a eles) é a mesma coisa. Se você vai orar, se

você vai pedir na intenção de receber, se

você vai buscar na intenção de achar, se

você vai bater na intenção de que se lhe

abra, primeiro, antes de tudo, tenha na sua

vida o espírito encarnado da oração que

você vai fazer ao Pai. Tenha esse espírito

encarnado em você, como se você fosse o

Deus do seu próximo. E, mais do que isso,

faça de maneira antecipada, como o Pai

celeste faz conosco. Pois o Pai celeste não

existe para responder as nossas orações.

Ele existe de si mesmo, ele é bom de si

mesmo, ele ama por si mesmo, ele ama de

si mesmo. Por isso é que ele faz nascer o sol

sobre maus e bons, vir chuvas sobre justos

e injustos. Por isso ele abençoa a casa de

quem crê, a casa de quem não crê, a casa

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de quem não sabe se crê, a casa do que diz

que não crê, a casa do que diz que nunca

crerá, a casa daquele que se empenha pela

bondade, e, também, a casa daquele que

frequentemente vive de maldade (mas o

filho daquele que vive de maldade vai

sofrer, eventualmente, com a má educação

que receba, com as consequências dos atos

do pai, como trauma, como mau

ensinamento, como qualquer coisa assim).

Porque no que diz respeito ao Pai que está

nos céus, ele faz vir à casa do cara mais

desgraçado deste planeta as mesmas

graças que caem na vida, na existência e na

casa de um homem piedoso, pois é a

bondade de Deus que, de um lado, nos

conduz ao arrependimento, tanto quanto é

a bondade de Deus que vindica sobre nós a

gravidade do nosso juízo. Porque Deus não

cessa de manifestar o bem

indiscriminadamente a todos os homens.

Bem-aventurado é aquele que, recebendo

o bem, muda de mente, se arrepende e se

torna grato; e infeliz e desgraçado é aquele

que, recebendo o mesmo bem, continua

empedernido no seu coração, cada vez

mais ingrato, cada vez mais cego. Mas é a

bondade de Deus que, de um lado, nos

salva, e é a bondade de Deus que nos

abisma nas nossas próprias desgraças

quando a gente não muda e não é um ser

reconhecido. Aí, vem Jesus, falando de

oração, de pedir, de buscar, de bater, de

receber, de achar, de que se abra para nós,

e diz: Antecipem-se.

Você quer que a sua oração já seja um

comunicar ouvido sempre? Transforme a

sua vida numa antecipação de resposta de

oração. É fácil saber isso, basta olhar para

nós mesmos. O que é que nós gostaríamos

de receber, não sendo nós doentes,

caprichosos, preguiçosos que adoram ser

adulados? Gostaríamos de ficar sem fazer

nada, com escravos nos abanando e a vida

nos colocando em água morna para o

nosso deleite o dia inteiro (sendo nós gente

de causa e efeito nas nossas relações no

mundo, gente que sabe que é preciso

plantar sementes de uvas para ter uma

videira frutífera, gente que sabe que não dá

para plantar espinhos e colher figos)? Se

nós temos essa consciência mínima da

saúde humana, é fácil, também, nós

olharmos para o próximo e dizer: Nessas

circunstâncias, o que é que de bom se

poderia fazer por mim? E, então, avaliar o

que de bom se poderia fazer por nós.

Se você está com uma perna quebrada e há

um barranco diante de você, que sozinho

você não consegue atravessar, o que de

bom se poderia fazer por você? Seria que

uma ou duas pessoas digam: Espera, deixa

a gente te agarrar aqui e te levar até lá. O

que de bom se poderia fazer por mim, se

sem uma muleta eu não consigo andar (e

se eu não sou um ser que abusa dos outros;

quando tenho uma muleta eu ando)? O

que se poderia fazer de bom por mim seria

dizer: Espera aí, pega no meu ombro,

vamos lá, eu te levo. É fácil nós avaliarmos.

Você vê uma mãe com uma criança numa

esquina, uma chuva torrencial caindo, e ela

desesperada, cobrindo um bebê com um

paninho, não é fácil se colocar no lugar

daquela pessoa e imaginar o que lhe seria

bom naquela hora? Não sendo um tarado

que venha oferecer uma carona, mas

alguém bem intencionado, seria bom que

alguém chegasse e dissesse: Minha

senhora, por favor entre aqui; se a senhora

não quiser que eu a deixe onde a senhora

precisa ir, eu pelo menos coloco a senhora

segura num lugar onde a senhora deseje

ficar.

Não é fácil saber o que nós gostaríamos

que a nós fosse feito? Se nós estamos com

fome não é difícil imaginar o bem que

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O Caminho da Graça

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gostaríamos que a nós fosse feito,

especialmente a nossa fome não sendo

porque não queiramos trabalhar, não

queiramos nos esforçar, não queiramos

fazer nada, mas apenas ficar como o

repreensível preguiçoso do livro de

Provérbios, aquele a quem Paulo diz que se

não trabalha porque, mesmo tendo

oportunidade, não deseja, que também

não coma – porque pode ser que não

comendo ele se anime a trabalhar.

Infelizmente tem gente que até nesses

casos acha que tem pretexto para roubar,

mas se um mínimo de saúde humana

estiver estabelecida, você sabe o que o

ronco da fome faz no estômago, no ser, a

tremedeira orgânica que causa, o

desespero psicológico que a fome traz.

Você pode imaginar. E você pode se

antecipar, não é preciso chegar para um

faminto e dizer: Escuta, você aceitaria que

eu lhe desse um prato de comida? Não

precisa fazer nenhuma apologia, basta

chegar com um prato de comida, que ele às

vezes vai agradecer só depois de comer,

porque antes está tão trêmulo que não tem

forças nem de dizer obrigado, na chegada,

de tão desesperado que está. É fácil saber.

E aqui não se está falando de atender os

desejos adoecidos dos nossos caprichos.

No Evangelho se está falando sempre

daquilo que é essencial à vida humana,

daquilo que mantém a vida, pulsante,

andando.

E Jesus diz: Olha, quem quiser pedir e ter a

certeza de que se lhe dará, buscar e ter a

certeza de que achará, bater e ter a certeza

de que lhe será aberto, faça o seguinte:

tudo quanto quereis que os homens vos

façam, assim fazei-o vós também a eles. E

aqui ele está dizendo: Não levem em

consideração a medida do Pai Eterno e

Infinito; tenham em referência e em

consideração as relações humanas. Porque

é pelas relações humanas que nós somos

abençoados nas relações celestiais: Pai,

perdoa as nossas dívidas para contigo,

assim como nós perdoamos aos nossos

devedores. Tudo que me vem dos céus está

sempre relacionado àquilo que eu

estabeleço como padrão na Terra – para o

bem e para o mal. Nesse caso, o que Jesus

diz aqui é: Se você quer ter essa certeza,

faça da sua vida uma resposta antecipada

de oração à necessidade humana. Tudo

quanto, pois, quereis que os homens vos

façam como atendimento de necessidades

essenciais (no dia da sua calamidade,

conforto; no dia do seu pecado,

misericórdia; no dia da sua fome, pão; no

dia da sua solidão, presença; no dia da sua

depressão, conforto, consolação, ânimo),

assim fazei-o vós a eles; antecipadamente.

Não porque eles tenham feito a vocês, mas

sejam antecipadores de bondade, ajam

com graça, amem primeiro, sempre. E

vocês terão certeza absoluta de que aquilo

que vocês pedirem, receberão; o que vocês

buscarem, acharão; e quando vocês

baterem, a vocês será aberto. Sejam uma

resposta humana antecipada de orações e

de necessidades verificáveis, essenciais,

óbvias, para com o próximo; e batam sem

medo.

Isso não é justiça própria, é a certeza da

graça de que você está agindo conforme o

princípio da graça. Não é perguntando se o

outro merece ou não merece o pão. Ele

está com fome? A fome merece pão – seja

gracioso. Ele está com sede? A sede merece

água – seja gracioso. Ele está desesperado?

O desespero precisa ser debelado pelo

conforto da consolação – seja consolador.

Ele está em miséria? Não pergunte a causa,

seja misericordioso; a miséria precisa ser

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transtornada pela solidariedade. Antecipe-

se.

Seja uma resposta antecipada de bondade

neste mundo. Pratique a graça, tenha fé

nessa graça que se antecipa. Não como

barganha, mas como uma pulsão que não

se controla porque ela deflagra e expressa

a natureza de quem você seja. E aí, quem é

oração respondida e antecipada a quem

nem pediu ainda nada, só por se enxergar e

verificar em si mesmo o que seria uma

necessidade que, existindo, se gostaria que

fosse atendida realmente, tendo esse

coração, não tenha medo de pedir. Porque

quem quer que se conheça diante de Deus

saberá que ele é infinitamente maior do

que tudo quanto nós somos, pedimos ou

pensamos, na graça dele. Quem consegue

agir com graça no mundo não tem por que

levantar a cabeça e duvidar da graça de

Deus. Não é barganha, é apenas a certeza

de que, se existe graça em mim, que sou

mau, quanto mais graça não haverá,

infinita, naquele que é todo bom? Por isso,

o que quereis que os homens vos façam,

fazei isso vós, antecipadamente, a eles. Essa

será uma expressão de graça.

E quem quer que tenha essa confiança na

graça e carregue essa natureza da graça no

coração, esse vai olhar para cima e pedir

sem medo, porque não tem barganha a

fazer, não tem trocas a realizar. A partir de

si mesmo, que é mau, ele já verificou que, a

despeito da sua natureza ambígua, ele é

capaz de se antecipar no bem. E ele vai

desenvolvendo prazer em atender o bem

essencial da necessidade humana à volta

dele, seja pessoa conhecida ou

desconhecida. Quanto mais aquele que me

conhece, quanto mais aquele que é todo

bom, quanto mais aquele que é todo graça,

quanto mais aquele que é todo amor,

quanto mais aquele que é todo bondade,

quanto mais aquele que é Pai, Pai, Pai, Pai

absoluto, mesmo, não dará boas coisas

àqueles que lho pedirem?

Afaste do seu coração esse medo. E vença

esse medo com o bem. Vença com o bem,

vá praticando o que é bom, porque a

prática do bem é uma oração crescente,

dentro de nós. Quanto mais nós vamos

gostando de nos darmos e de fazer o bem

aos outros, mais natural vai ficando pedir o

bem a Deus para a nossa vida. Quanto mais

nós, a partir da nossa própria ambiguidade,

vamos ganhando a certeza de que a

despeito de nós mesmos nós não vamos

fazer o mal ao outro, mais cresce no

coração a fé de que a graça absoluta e a

bondade absoluta estarão sempre

disponíveis para nós; para que nós

obtenhamos socorro, na graça, para

ocasião necessária e oportuna.

E ainda há um segundo elemento: nós

vamos logo, logo, descobrindo que quando

vamos nos antecipando em fazer o bem na

vida, aos homens, cumpre-se Isaías 58 em

nós: Nem chegarão a pedir e o Senhor já

lhes responderá; nem mesmo começarão a

gritar por socorro e o Senhor já lhes dirá:

Eis-me aqui.

Quanto mais eu me torno um antecipador

de graças na vida, mais a graça – favor

imerecido – se antecipa em meu favor,

nesta existência.

Mensagem ministrada em 30/10/2011

Estação do Caminho - DF