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CAMILA FURUKAVA - core.ac.uk · aprofundamento do macrozoneamento - saindo da dimensão da cidade e adentrando a dimensão de uma fração reduzida do urbano - facilitando a gestão

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CAMILA FURUKAVA

PLANO SETORIAL:

A CONSTRUÇÃO DE ESTRATÉGIAS PARA IMPLEMENTAÇÃO DO PLANO

DIRETOR DE NATAL

Versão final apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo

do Centro de Tecnologia da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, como

requisito parcial à obtenção do título de

Mestre em Arquitetura e Urbanismo, sob

orientação da professora doutora Maria

Dulce Picanço Bentes Sobrinha.

NATAL/RN

2012

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Catalogação na fonte:

Furukava. Camila.

Plano Setorial: A construção de estratégias para implementação do Plano Diretor de Natal / Camila Furukava. – Natal,

2012.

154f.:Il.

Orientadora: Professsora Doutora Maria Dulce Picanço Bentes Sobrinha.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Programa de Pós-

Graduação em Arquitetura e Urbanismo

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CAMILA FURUKAVA

PLANO SETORIAL: A CONSTRUÇÃO DE ESTRATÉGIAS PARA

IMPLEMENTAÇÃO DO PLANO DIRETOR DE NATAL

Versão final apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo

do Centro de Tecnologia da Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, como

requisito à obtenção do título de Mestre em

Arquitetura e Urbanismo, sob orientação da

Professora Doutora Maria Dulce Picanço

Bentes Sobrinha

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________

Prof.a Dr.

a Maria Dulce Picanço Bentes Sobrinha.

(Orientadora)

Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo/UFRN

___________________________________________________________

Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo Tinôco

Departamento de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Norte

_____________________________________________________

Prof. Dr. Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva

Departamento de Políticas Públicas da UFRN

___________________________________________________________

Dr.a Marise Costa de Souza Duarte

Procuradora do Município do Natal

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AGRADECIMENTOS

Ao CNPq pelo apoio financeiro desta pesquisa.

Ao PPGAU/UFRN, Professores e funcionários pela oportunidade de desenvolver este estudo e

pelos espaços de discussão proporcionados ao longo deste período.

À minha orientadora pelas construções científicas, pelos aconselhamentos e pelo apoio nos

momentos cruciais desta jornada.

Aos membros da minha banca de defesa e qualificação, Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo

Tinôco, Prof. Dr. Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva, Dr.a Procuradora Marise Costa de

Souza Duarte e à Prof.a Dra. Heloisa Soares de Moura Costa, pelo profissionalismo e

comprometimento na formação do conhecimento científico.

Aos profissionais e aos amigos que me prestaram apoio na construção desta dissertação:

Marciano Furukava, Marise Costa, Yuri Simonini, Maria das Neves Valentim, Heitor Andrade,

Rosa Pinheiro e Eugenio Mariano. Ana Cláudia Lima, Flavia Laranjeira, Raissa Salviano,

Debora Nogueira, Hassan Elsangedy, aos bolsistas e colaboradores do GEHAU e aos

professores e amigos do mestrado.

Aos meus alunos que me ensinaram a aprender.

A Deus que orienta meus passos e me dá os dons do Espírito Santo, espero sempre decidir por

aplicá-los na construção de Sua obra.

Às minhas avós que marcaram histórias inesquecíveis em minha vida.

À minha família: pai, mãe, namorado, irmão, cunhada, meus queridos sobrinhos Márcio e Maria

Rita Furukava, cujo carinho, respeito, alegria e amor têm me construído como pessoa. Marciano

e Rita, vocês são o reflexo do amor de Deus, obrigada pelas orientações intelectuais e de vida,

sempre com disciplina e alegria.

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RESUMO

O Plano Setorial inserido como instrumento urbanístico no Plano Diretor de Natal (LC82/07),

vem sendo aprofundado desde 2007, e é norteado para a distribuição equitativa dos benefícios

da urbanização, visando à efetivação do direito à cidade e da função socioambiental da

propriedade no contexto do planejamento urbano. Assim, o Plano Setorial foi inserido na

perspectiva de promover um campo propício para aplicação articulada dos instrumentos

definidos no Plano Diretor e destes como intervenções urbanísticas, por meio do

aprofundamento do macrozoneamento - saindo da dimensão da cidade e adentrando a dimensão

de uma fração reduzida do urbano - facilitando a gestão democrática, nos termos do Estatuto da

Cidade. Contudo, a ausência de regulamentação e, principalmente, a fragilidade conceitual e

operacional do instrumento, que o aproxima de outras experiências e instrumentos existentes,

limitaram sobremaneira a sua aplicação e avaliação. Considerando o caráter inovador do

instrumento e a intensa participação social que se constitui pela sua inserção no planejamento

local, em 2007, indagamos sobre quais elementos conceituais e operacionais poderiam dar

maior efetividade à construção do Plano Setorial? Orientada por essa questão, a presente

dissertação busca compreender a natureza e os procedimentos operacionais do Plano Setorial,

visando formular apontamentos sobre os aspectos conceituais e operacionais de aplicação de um

Plano Setorial. Delimita-se o bairro de Ponta Negra como universo empírico, uma vez que foi o

primeiro setor de aplicação definido no Plano Diretor. Do ponto de vista teórico-conceitual a

pesquisa toma como referência autores que apresentam reflexão e aprofundamentos sobre a

matriz da Reforma Urbana, cujos princípios embasam a trajetória de revisão do planejamento

urbano no Brasil a partir dos anos de 1980, com destaque para Raquel Rolnik, Nelson Saule

Júnior e Orlando Alves dos Santos Júnior. Para acompanhamento local foram observados os

autores Alexsandro Ferreira Cardoso Silva, Rosa Maria Pinheiro Oliveira e Marise Costa da

Souza Duarte, para compreender a dinâmica do crescimento de Natal, legal e urbanisticamente.

Palavras-chave: Plano Setorial, Instrumentos de Planejamento Urbano, Direito à Cidade,

Função Socioambiental da Propriedade.

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ABSTRACT

The Sectoral Plan was inserted as an urban instrument in Master Plan of Natal (LC82/07), since

then it has been deepened. It is guided to the equitable distribution of the benefits of

urbanization, aimed the efetivation of the Right to the City and the Environmental function of

property in the context of urban planning. Thereby, the Sectoral Plan was inserted into the

perspective of promoting a favorable field for applying articulated of instruments defined in the

Master Plan, and them with urban interventions, through the deepening of macrozoning -

coming out of dimension of the city and going to a small fraction of the urban by reducing

scaling - facilitating democratic management in accordance with the City Statute. However, the

absence of regulation and the conceptual and operational fragility of the instrument, approached

it of other existent experiences and instruments, limiting its application and evaluation.

Considering the innovative nature of the instrument and the intense social participation, we

inquire about conceptual and operational elements which could give greater effectiveness to

Sector Plan in construction? Guided by that question, this dissertation aim to understand the

nature and operational procedures of Sectoral Plan, seeking to do indications about the

conceptual and operational aspects of implementing a Sector Plan. The neighborhood of Ponta

Negra was selected as empirical universe because it was the first sector defined in the Master

Plan. This research adopts reference authors who´s make reflection and insights about the

matrix of Urban Reform, whose principles constitute the basis of the trajectory of revision of

urban planning in Brazil since the 1980s, highlighting Raquel Rolnik, Nelson Saule Júnior and

Orlando Alves dos Santos Júnior. For the local monitoring, we use the authors Alexsandro

Ferreira Cardoso Silva, Rosa Maria Pinheiro Oliveira e Marise Costa da Souza Duarte, in order

to understand the growth dynamics of Natal, lawfully and urbanistically.

Key words: Sectorial Plan, instruments of urban planning, Right to the City, the Environmental

Role of Property.

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LISTA DE FIGURA

Figura 1. Delimitação do bairro de Ponta Negra, em vermelho. Recorte espacial da pesquisa. 16

Figura 2. Indicação da composição por bairros, da Região Sul 1, em Natal. ............................. 31

Figura 3. Morro do Careca. ........................................................................................................ 32

Figura 4. Vista aérea do Parque das Dunas. ............................................................................... 32

Figura 5. Divisões dos Planos de Pormenor, em Lisboa. ........................................................... 44

Figura 6. Limites da ZAC Évangile. .......................................................................................... 44

Figura 7. Esquema do Plano Setorial e elementos de integração operativos ............................. 61

Figura 8. Jornal Entre Bairros, em edição especial sobre a aprovação do Plano Diretor de 2007.

..................................................................................................................................................... 73

Figura 9. Proibição da entrada da sociedade civil na Câmara Municipal por ocasião da votação

do Plano Diretor. ......................................................................................................................... 74

Figura 10. Reportagem sobre a aprovação do Plano Diretor com indicações de vetos de

algumas emendas pela Prefeitura, Ministério Público e sociedade civil. .................................... 75

Figura 11. Manifestações sociais contrárias à derrubada dos vetos no Plano Diretor. .............. 75

Figura 12. Limites do Plano Setorial de Ponta Negra, segundo o artigo 119. ........................... 86

Figura 13. Limites e Macrozoneamento do Bairro de Ponta Negra, com base no Plano Diretor

de 2007. ....................................................................................................................................... 88

Figura 14. Morro do Careca e dunas adjacentes. Vista da praia de Ponta Negra. ...................... 89

Figura 15. Composição do bairro de Ponta Negra. .................................................................... 89

Figura 16. Vista da verticalização no bairro de Ponta Negra, a partir da area non aedificandi. 90

Figura 17. Vista da verticalização em Ponta Negra, sentido Alagamar – Via Costeira. ............ 90

Figura 18. Comparação entre as Zonas de Proteção Ambiental do Plano Diretor de 1984 e de

1994. ............................................................................................................................................ 93

Figura 19. Área de abrangência da lei complementar 27/2000. ................................................. 94

Figura 20. Duplicação da Estrada de Ponta Negra, atual Eng. Roberto Freire, década de 1980*

..................................................................................................................................................... 95

Figura 21. Vista aérea da Av. Eng. Roberto Freire, década de 1990 ......................................... 96

Figura 22. "Paredão" de edifícios em Ponta Negra, cruzamento da Av. Roberto Freire com a

Rota do Sol. ................................................................................................................................. 96

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Figura 23. Licenciamento por bairro em Natal, 2006. ............................................................... 99

Figura 24. Licenciamento por bairro em Natal, 2007. ............................................................. 100

Figura 25. Muro que separa o condomínio fechado da Vila de Ponta Negra. .......................... 101

Figura 26. Zoneamento da Legislação em Ponta Negra. .......................................................... 102

Figura 27. Licença de instalação de um empreendimento em Ponta Negra, licenciado no Plano

Diretor de 1994, com proposta de inicio de construção em 2013. ............................................ 104

Figura 28. Grandes lotes vazios em um trecho da Vila de Ponta Negra. ................................. 107

Figura 29. Novo momento da construção civil no bairro de Ponta Negra, após a crise

internacional de 2008. ............................................................................................................... 109

Figura 30. Concentração de uso e sistema viário. Identificação dos eixos de comércio e serviço

em Ponta Negra. ........................................................................................................................ 110

Figura 31. Primeira proposta de zoneamento do Plano Setorial: bairros de Ponta Negra, Capim

Macio e Neópolis, Zona Sul de Natal/RN. ................................................................................ 115

Figura 32. Prioridades de intervenção do Plano Setorial da Região Sul 1. .............................. 117

Figura 33. Área non aedificandi de Ponta Negra. .................................................................... 120

Figura 34. Bloqueio visual na área non aedificandi de Ponta Negra. ...................................... 120

Figura 35. Registro da audiência pública de 15 de fevereiro de 2012. .................................... 121

Figura 36. Anexo III da proposta de Plano Setorial da Região Sul 1, contendo as prescrições

urbanísticas para a área. ............................................................................................................ 126

Figura 37. Verticalização em Ponta Negra, na parte posterior da Vila de Ponta Negra e do

Parque Residencial de Alagamar. .............................................................................................. 131

Figura 38. Relação entre o detalhamento do Plano Diretor com projetos previstos para a área.

................................................................................................................................................... 135

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LISTA DE TABELA E QUADROS

Tabela 1. Resumo do Laudo Técnico sobre o Projeto de Lei SEMURB/IBAM para o Plano

Setorial da Região Sul 1. ........................................................................................................... 127

Quadro 1. Síntese do Plano Setorial, segundo o Plano Diretor de Natal. .................................. 41

Quadro 2. Síntese do documento: Termos de Referência do proposto Plano de Pormenor ...... 46

Quadro 3. Constituição do Plano de Pormenor da Artilharia Um, Praça de Espanha e Av. José

Malhoa......................................................................................................................................... 47

Quadro 4. Síntese das experiências similares ao Plano Setorial. ............................................... 49

Quadro 5. Dados básicos sobre o sistema de projeto urbanístico e projetos arquitetônicos. ..... 56

Quadro 6. Propostas para o Plano Setorial de Natal. ................................................................. 84

Quadro 7. Síntese e aproximações de procedimentos de implementação do Plano Setorial ... 138

Quadro 8. Função Social da Propriedade segundo o Estatuto da Cidade ................................ 152

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AEIS – Áreas Especiais de Interesse Social

AMPA – Associação de Moradores dos Conjuntos Ponta Negra e Alagamar

ANAE – Areas non aedificandi

CAAU – Centro Acadêmico de Arquitetura e Urbanismo

CAERN – Companhia de Águas e Esgoto do Rio Grande do Norte

CF – Constituição Federal

CT – Comissão Técnica

CG – Comitê Gestor

DARQ – Departamento de Arquitetura e Urbanismo

FNRU – Fórum Nacional da Reforma Urbana

GEHAU – Grupo de Estudos em Habitação, Arquitetura e Urbanismo

IAB/RN – Instituto dos Arquitetos do Brasil/Departamento do Rio Grande do Norte

IBAM – Instituto Brasileiro de Administração Municipal

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano

MNRU – Movimento Nacional pela Reforma Urbana

ONG – Organização Não Governamental

OUC - Operação Urbana Consorciada

PD – Plano Diretor

PDDI – Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado

PDN – Plano Diretor de Natal

PL – Projeto de Lei

PP – Plano de Pormenor

PS – Plano Setorial

SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo

UEP – Unidade Especial de Planejamento

UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte

ZAC - Zone d’Amenagement Concerté

ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social

ZET – Zonas Especiais de Interesse Turístico

ZPA – Zonas de Proteção Ambiental

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SUMÁRIO

RESUMO ..................................................................................................................................... 6

ABSTRACT ................................................................................................................................. 7

LISTA DE FIGURA ................................................................................................................... 8

LISTA DE TABELA E QUADROS ........................................................................................ 10

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS .............................................................................. 11

SUMÁRIO ................................................................................................................................. 12

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 14

CAPÍTULO I. A INSERÇÃO DO PLANO SETORIAL NO CONTEXTO DE

PLANEJAMENTO URBANO PÓS CONSTITUIÇÃO FEDERAL .................................... 21

CAPÍTULO II. PLANO SETORIAL: DEFINIÇÕES NO PLANO DIRETOR DE NATAL

E REFERÊNCIAS DE EXPERIÊNCIAS SIMILARES ....................................................... 29

2.1 DEFINIÇÕES DO PLANO SETORIAL NO PLANO DIRETOR DE NATAL ........... 30

2.1.1 Artigo 90 – Conceituação do Plano Setorial, objetivos e delimitação do setor .............. 34

2.1.2 Artigo 91 – Objetivos e delimitação do setor ................................................................. 36

2.1.3 Artigo 92 – Produtos do Plano Setorial .......................................................................... 39

2.2 LEITURAS DE EXPERIÊNCIAS SIMILARES: BASES PARA COMPREENSÃO DO

PLANO SETORIAL ................................................................................................................... 42

2.3 PLANO SETORIAL E A DIMENSÃO URBANÍSTICA: OS PROJETOS NAS

EXPERIÊNCIAS SIMILARES .................................................................................................. 53

2.4 AS EXPERIÊNCIAS DE CONSTRUÇÃO DO PLANO SETORIAL NO PLANO

DIRETOR DE NATAL: PRIMEIRAS ABORDAGENS METODOLÓGICAS ........................ 59

CAPÍTULO III. PLANO SETORIAL E A EXPERIÊNCIA DE CONSTRUÇÃO DO

INSTRUMENTO EM NATAL/RN ......................................................................................... 64

3.1 MOMENTO LEGAL E URBANÍSTICO ANTERIOR AO PLANO SETORIAL ........ 65

3.1.1 Leis Complementares que alteraram o Plano Diretor de 1994: LC n.22 de 18 de agosto

de 1999 e LC n. 27 de 03 de novembro de 2000 ......................................................................... 69

3.2 A INSERÇÃO DO PLANO SETORIAL: PLANO DIRETOR DE NATAL - LEI

COMPLEMENTAR 82/07 - DA FORMULAÇÃO À APLICAÇÃO. ....................................... 73

CAPÍTULO IV. PLANO SETORIAL: FORMULAÇÃO, APROVAÇÃO NO PLANO

DIRETOR DE NATAL, ANÁLISES E ATUALIZAÇÕES .................................................. 81

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4.2 PONTA NEGRA COMO PRIMEIRO SETOR INSTITUÍDO NO PLANO SETORIAL:

PRAZO E PARÂMETROS URBANÍSTICOS .......................................................................... 85

4.3 ANÁLISE DO PLANO SETORIAL DE PONTA NEGRA (2007-2012) .................... 87

4.3.1 Caracterização do Bairro de Ponta Negra (1970-2007) .................................................. 87

4.3.2 Análise do Plano Setorial de Ponta Negra (2007-2012) .............................................. 101

4.4 ATUALIZAÇÕES DO PLANO SETORIAL .............................................................. 110

4.4.1 Projeto de Lei da Região Sul 1. Documento do IBAM/SEMURB .............................. 110

4.4.2 Laudo requerido pelo Ministério Público, audiência pública, encaminhamentos e

posicionamento da SEMURB. .................................................................................................. 121

4.5 DISCUSSÕES E APROXIMAÇÕES SOBRE O PLANO SETORIAL DE NATAL . 129

CONCLUSÃO. PLANO SETORIAL: APONTAMENTOS CONCEITUAIS E

OPERACIONAIS .................................................................................................................... 139

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................... 146

APÊNDICE 1: Função Social da Propriedade segundo o Estatuto da Cidade .................. 152

ANEXO 1: Lei Complementar 82/07 ..................................................................................... 154

ANEXO 2: Proposta de Lei IBAM/SEMURB para o Plano Setorial da Região Sul 1 ...... 155

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14

INTRODUÇÃO

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15

O Plano Setorial foi instituído como instrumento do Plano Diretor de 2007, Lei Complementar

82/07, mas foi apresentado durante a revisão da Lei Complementar 07/94. Nesse contexto, a

gestão pública identificou dificuldades em aplicar os instrumentos urbanísticos e tributários, a

exemplo da Outorga Onerosa, Áreas Especiais de Interesse Social – AEIS –, entre outros, que

haviam sido definidos em 1994, antecipando o Estatuto da Cidade, que veio a ser aprovado em

2001. Além desta questão, o município de Natal apresentava um adensamento construtivo, com

intenso processo de verticalização e com efeitos sobre a paisagem. Com a falta de infraestrutura

urbana e de um planejamento voltado à coletividade, agravaram-se os problemas como a

segregação socioespacial, com a redução da qualidade ambiental, comprometendo um

crescimento sustentável e democrático.

Os técnicos da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo de Natal -

SEMURB1 buscaram, assim, ferramentas e estratégias que facilitassem a aplicação dos

instrumentos previstos no Plano Diretor, visando reduzir os problemas existentes pela não

implementação e pela não compatibilização do adensamento à infraestrutura de suporte.

Segundo relatos da Chefe do Departamento de Planejamento Urbanístico e Ambiental

da SEMURB, Maria Florésia Silva de Sousa e Silva2, em 2006 não foi encontrado na legislação

nenhum instrumento que potencializasse esta aplicação. Assim, respaldados pela Constituição

Federal, formularam o Plano Setorial – PS, como uma possível solução para o enfrentamento da

realidade local. Embora o PS tenha sido inserido inicialmente sem uma discussão pública, a

sociedade, com destaque aos moradores do bairro de Ponta Negra, observou neste uma

estratégia potencial para reverter o crescente adensamento e a redução da qualidade de vida no

bairro e, por isso, buscou participar de sua formulação.

Neste sentido, foi instituído o Plano Setorial de Natal, no Plano Diretor de 2007, Lei

Complementar 82/07, como instrumento de planejamento urbano e ambiental, com o objetivo

de “detalhar o ordenamento do uso e ocupação do solo urbano [...] com vistas a otimizar a

função socioambiental da propriedade e compatibilizar o seu adensamento à respectiva

infraestrutura de suporte” (NATAL, 2007 s.p.). Estes objetivos ressaltam o vínculo do Plano

Setorial com os princípios da Constituição Federal e com o Plano Diretor, na medida em que o

PS buscou detalhar o ordenamento do uso e ocupação do solo urbano instituído no PD, não

caracterizando conteúdos concorrentes a este.

1 Órgão coordenador do processo de revisão e implementação do Plano Diretor de Natal (2004-2012).

2 Em entrevista concedida à autora, em setembro de 2009. Convém apontar que a mesma participou da

equipe técnica que formulou o Plano Setorial de Natal como instrumento no Plano Diretor de Natal.

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16

Os grupos e as organizações sociais3, principalmente do bairro de Ponta Negra, por

meio de reuniões de bairro, consulta pública e mobilizações sociais, conseguiram alterar o

projeto inicial durante a discussão na revisão do Plano Diretor, na Câmara dos Vereadores

(2006-2007), resultando na inserção do primeiro setor do Plano Setorial no bairro de Ponta

Negra, Zona Sul da cidade.4 (Figura 1).

Figura 1. Delimitação do bairro de Ponta Negra, em vermelho. Recorte espacial da pesquisa.

Fonte: SEMURB, 2012.

Nota: Alterado para destaque do recorte espacial desta pesquisa: o bairro de Ponta Negra.

Nos fóruns de discussão pública, foram evidenciadas diversas inquietações por parte

dos técnicos e da sociedade sobre os aspectos conceituais e operacionais do Plano Setorial, tais

3 Orientados pelo arquiteto e urbanista, Heitor de Andrade Silva, Professor da UFPB e morador do Bairro

de Ponta Negra. 4 Em entrevista concedida a autora deste trabalho em setembro de 2009. Vale destacar que se trata de um

dos autores da emenda do Plano Setorial em Ponta Negra, durante a revisão do PDN, na fase de discussão

do Legislativo.

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como: (i) o Plano Setorial se constituía em um plano diretor de bairro; (ii) tratava-se de

instrumento que resultaria em uma lei concorrente ao Plano Diretor; (iii) como o Plano Setorial

se diferenciava de outros instrumentos existentes, a exemplo da operação urbana consorciada;

(iv) quais os procedimentos operacionais a serem adotadas para implementação do Plano

Setorial. (v) quais são os produtos resultantes de um Plano Setorial. Estas respostas ficaram para

ser respondidas na regulamentação do primeiro setor instituído.

O artigo 118 da LC 82/07, instituiu o prazo de um ano para a regulamentação do Plano

Setorial, o que não chegou a ocorrer. Grupos e organizações sociais do bairro mantiveram as

reuniões de discussão. Porém, sem a perspectiva de regulamentação, houve uma desarticulação

desta mobilização social.

Em 2008, a SEMURB anunciou, via jornais de circulação local, a contratação do

Instituto Brasileiro de Administração Municipal - IBAM, para desenvolver estudos, propostas

de regulamentação e revisão para as dez Zonas de Proteção Ambiental – ZPA, e outros cinco

instrumentos urbanísticos, dentre eles o Plano Setorial.

O contexto de inquietações da fase de formulação do Plano Setorial (2006-2007), a

pesquisa sobre a avaliação dos Planos Diretores vinculada ao Grupo de Estudos em Habitação,

Arquitetura e Urbanismo – GEHAU5, e a não regulamentação do PS (2007-2009) mesmo com a

contratação do IBAM, incitou em 2009 o desenvolvimento do Trabalho Final de Graduação –

TFG, intitulado Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como instrumento do Plano

Diretor6. Este TFG trouxe um quadro de experiências similares nacionais e internacionais que

apontavam caminhos para a compreensão do Plano Setorial (FURUKAVA, 2009). Em 2010,

ainda sem a regulamentação do Plano Setorial, iniciou-se o aprofundamento deste estudo

conceitual e operacional, no âmbito desta dissertação de mestrado.

Em 2011, houve a primeira apresentação dos resultados do estudo SEMURB/IBAM à

sociedade, em audiência pública no dia 3 de junho. Neste momento, o IBAM indicou o final de

sua participação, passando à SEMURB as responsabilidades sobre as próximas etapas. Nessa

audiência, a sociedade questionou o Poder Público sobre a falta de informações, de

transparência e de participação social na construção da proposta e requereu, por meio do

Ministério Público - MP, a divulgação dos documentos e um prazo de 90 dias para estudá-los.

5

BANCO DE EXPERIÊNCIAS SOBRE PLANOS DIRETORES: avaliação e acompanhamento do

processo de elaboração de Planos Diretores no Rio Grande do Norte (1990-2004) - (2005-2007). 6

FURUKAVA, Camila. Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como instrumento do Plano Diretor.

2009. Trabalho Final de Graduação (Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Departamento de

Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009.

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18

Este foi aceito pela Secretaria. Após esta audiência, o MP contratou um laudo técnico7 à UFRN

para analisar o documento da SEMURB. Para a construção do laudo tomamos como base esta

pesquisa, no período de 2009 a 2011. O MP, em posse do laudo, apresentou suas contribuições

na audiência do dia 15 de fevereiro de 2012. Após esta audiência, nenhuma outra atividade

relacionada ao Plano foi realizada, estando este sem regulamentação até o presente momento

(segundo semestre de 2012).

Vale destacar que, durante a construção do laudo técnico, as reuniões realizadas entre a

SEMURB, os técnicos e o MP, retomaram questionamentos da fase de formulação do Plano

Setorial e indicaram novos, tais como: (i) o contexto urbanístico atual ainda demanda um Plano

Setorial para Ponta Negra; (ii) o que a sociedade pode cobrar e a que instituição, quando se trata

de um Plano Setorial. Nas audiências, percebeu-se que uma parcela da sociedade também tem

diferentes visões e aproximações ao Plano, não sabendo ao certo quais produtos finais são

possíveis, mas cobrando uma maior participação social na construção deste.

Ao refletir sobre as questões apontadas no período de formulação e nos fóruns de

discussão do Plano Setorial, percebeu-se que tanto a esfera pública, quanto os grupos e

organizações sociais, identificaram indefinições e lacunas conceituais e operacionais do Plano

Setorial que constituíam fatores para a morosidade da regulamentação. Contudo, estes

apontaram também, no Plano Setorial um campo propício para o debate sobre diferentes

intervenções na cidade: projetos urbanísticos, regulamentação de áreas especiais e

implementação dos instrumentos previstos no Plano Diretor. Isso concorreu para que fosse

continuamente requerida a regulamentação do Plano Setorial no Plano Diretor, visto como

elemento importante para o enfrentamento das questões socioambientais identificadas,

sobretudo no bairro de Ponta Negra, onde a discussão se deu de forma mais continuada.

Ao considerar que nesta trajetória de discussão do Plano Setorial, observamos lacunas

quanto à compreensão do instrumento proposto e suas modalidades de aplicação, questionamos:

quais os elementos conceituais e operacionais que poderiam dar maior efetividade à

construção do Plano Setorial?

Ao se ter como objeto de estudo a relação instrumentos urbanísticos e as estratégias

de planejamento, esta dissertação tem como objetivo geral compreender a natureza e os

procedimentos operacionais do Plano Setorial, visando formular apontamentos sobre os

7 Contrato via FUNPEC – 10 de setembro a 24 de outubro de 2011 - sob coordenação do Dr. Alexsandro

Ferreira Cardoso da Silva, do Departamento de Políticas Públicas e do Dr. Marcelo Bezerra de Melo

Tinoco, do Departamento de Arquitetura – ambos da UFRN –, tendo como colaboradora a Arquiteta e

Urbanista Camila Furukava, na etapa referente aos Planos Setoriais.

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aspectos conceituais e operacionais de aplicação do Plano Setorial proposto para a Cidade

do Natal. Como objetivos específicos busca-se: 1) compreender a inserção do Plano Setorial no

contexto de planejamento urbano de Natal, pós Constituição Federal; 2) identificar

procedimentos de operacionalização a partir das experiências de planejamento similares ao

Plano Setorial; 3) analisar o Plano Setorial a partir de sua trajetória de proposição no Plano

Diretor de Natal; 4) formular apontamentos sobre os aspectos conceituais e operacionais de

aplicação de um Plano Setorial.

Para o aprofundamento desta pesquisa foi adotado o recorte espacial no bairro de Ponta

Negra, primeiro setor estabelecido do Plano Setorial e um recorte temporal que contempla o

período de 1994 a 2012. Este recorte foi estabelecido pela inserção do Plano Setorial ter

acontecido na revisão do Plano Diretor de Natal de 1994 e pelo término da pesquisa em

dezembro de 2012.

Os procedimentos metodológicos adotados se fundamentam em estudos de Milton

Santos (2008), Raquel Rolnik (2005), Nelson Saule Júnior (1997), Jupira Mendonça (2001),

Luiz de Pinedo Quito Jr (2011) e Lígia Melo (2010). Estes discutiram principalmente sobre a

efetivação dos direitos e princípios da Constituição Federal e do Estatuto da Cidade.

Consideraram-se também as teses relativas à realidade local, a exemplo de Marise Duarte

(2011) que versou sobre áreas especiais ambientais e habitacionais e Alexsandro Ferreira

(2010), que tratou da dinâmica imobiliária turística da Região Metropolitana de Natal. Ambos

adentraram a realidade do bairro de Ponta Negra e somaram contribuições às leituras dos Planos

Diretores Municipais.

Realizaram-se revisões bibliográficas sobre experiências de planejamento similares8 ao

Plano Setorial, conforme definido no Plano Diretor de Natal, no plano internacional e nacional,

visando embasamento conceitual e operacional. Estas experiências foram o Plano de Pormenor,

em Portugal (PORTUGAL, 2003), a Zone d’Amenagement Concerté (ZAC) na França (APUR,

s.d.); o Plano de Bairro (CAMPOS FILHO, 2003) e a Unidade Especial de Planejamento (RIO

DE JANEIRO, 1992), no Brasil, em São Paulo e no Rio de Janeiro, respectivamente.

8 FURUKAVA, Camila. Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como instrumento do Plano

Diretor. Trabalho Final de Graduação (Graduação em Arquitetura e Urbanismo) – Departamento de

Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2009. Trabalho vinculado à pesquisa

do GEHAU sobre avaliação dos Planos Diretores. Cabe enfatizar que neste trabalho foi realizada uma

revisão bibliográfica sobre o Plano Setorial, conforme instituído no Plano Diretor de Natal, no campo

nacional e internacional, identificando experiências similares que foram sintetizadas e discutidas. Dentre

estas, essas quatro experiências foram adotadas para análises aprofundadas nesta dissertação, pela

aproximação conceitual e por operar em escalas reduzidas de planejamento.

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Com relação ao estudo empírico, priorizou-se a participação presencial nas discussões

públicas do Plano Setorial, com enfoque ao período de 2011, audiência pública de apresentação

da proposta de Plano Setorial IBAM/SEMURB, até fevereiro de 2012, última audiência pública

vinculada diretamente com o tema, contemplando as audiências públicas, construção do laudo

técnico e as discussões com os técnicos e a sociedade. O monitoramento sobre este período e

outros momentos (2006-2010) foi realizado a partir de reportagens veiculadas em jornais de

circulação local, de registros fotográficos e de entrevistas abertas com os já citados Maria

Florésia Silva de Sousa e Silva - uma das idealizadoras do Plano Setorial; com Heitor de

Andrade e Silva9, organizador da proposta social para a inserção do primeiro setor, o de Ponta

Negra; e com Maria das Neves Valentim10

(Nevinha), moradora que teve importante destaque11

na fase de formulação deste.

A dissertação está estruturada em quatro capítulos. O primeiro apresenta a discussão

sobre a inserção do Plano Setorial no sistema de planejamento urbano, face à efetivação da

política urbana. O segundo capítulo versa sobre o Plano Setorial, conforme definido no Plano

Diretor de Natal e as experiências de planejamento similares, resultando em um quadro síntese

conceitual e operacional que embasam as discussões de construção do Plano Setorial. Em

seguida, apresenta a inserção e discussão do Plano dentro de uma contextualização da legislação

local, com foco ao Plano Diretor de 1994 e de 2007. O quarto capítulo desenvolve a avaliação

sobre o bairro de Ponta Negra (1990-2012), o primeiro setor instituído, e os desdobramentos do

Plano Setorial após a aprovação na Lei Complementar 82/07, finalizando com sínteses e

aproximações ao Plano, a partir das análises da realidade local. Por fim, a pesquisa traz

apontamentos conceituais e operacionais ao Plano Setorial, respondendo às inquietações sobre o

tema, na tentativa de contribuir para sua aplicação e a construção de cidades mais justas e

democráticas.

9 Em entrevista concedida à autora deste trabalho em setembro de 2009.

10 Maria das Neves Valentim, mais conhecida como Nevinha, moradora do bairro de Ponta Negra, agente

ativa nos momentos participativos de construção do Plano Setorial. Em entrevista concedida à autora,

set.2009. 11

Um dos agentes que foram constantemente entrevistados sobre o Plano Setorial em jornais de

circulação local e uma referência sobre os momentos participativos do bairro.

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CAPÍTULO I.

A INSERÇÃO DO PLANO SETORIAL NO CONTEXTO DE

PLANEJAMENTO URBANO PÓS CONSTITUIÇÃO FEDERAL

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Durante a revisão do Plano Diretor de Natal (Lei Complementar 07/94), ocorrida no

período 2004-2007 verificou-se a formulação, como instrumento, do Plano Setorial, visando

potencializar a aplicação dos demais instrumentos previstos no Plano Diretor e a gestão

democrática. A proposta foi incentivada tanto por parte da esfera técnica do Município, que

percebeu no Plano Setorial a possibilidade de implementar o Plano Diretor de forma integrada,

quanto por parte dos grupos e organizações sociais do bairro Ponta Negra, que identificaram

nessa proposta uma alternativa para fomentar o debate local e promover a qualidade de vida no

bairro.

O Plano Diretor objeto de revisão (Lei Complementar 07/94), já havia instituído

diversos instrumentos de planejamento municipal integrantes da agenda técnica e política

encaminhada pelo Movimento Nacional de Reforma Urbana - MNRU, a partir da década de

1980, inseridos na Constituição Federal de 1988 e confirmados pelo Estatuto da Cidade em

2001. Consonante com Orlando Alves Santos Júnior (1995), Raquel Rolnik (2005), o MNRU

constitui um movimento nacional e multissetorial que buscou a inclusão de instrumentos na

Carta Constitucional que possibilitassem a efetivação do direito à cidade, da função social da

cidade e da propriedade. O MNRU retomou a luta pela Reforma Urbana e atualizou a

plataforma que vinha sendo construída desde a década de 1960: “As tentativas de construção de

um marco regulatório a nível federal para a política urbana remontam às propostas de lei de

desenvolvimento urbano elaboradas pelo então Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano

nos anos 70 [...]” (ROLNIK, 2005: 21).

Esse contexto contribuiu para a inserção de novos instrumentos na revisão do Plano

Diretor (2004-2007), a exemplo do Plano Setorial, face à necessidade e a possibilidade de

implementação e articulação dos instrumentos instituídos a partir dos princípios estabelecidos

na Constituição Federal de 1988, artigos 182 e 183, principalmente o da função social da

propriedade. Ressalta-se, porém, que a possibilidade de efetivação desse princípio foi

condicionada à elaboração dos Planos Diretores.

Assim, os PDs identificados com os princípios de Reforma Urbana formularam e

aprovaram instrumentos urbanísticos e jurídicos voltados para o exercício da função social da

propriedade a exemplo do Plano Diretor de Natal (1994). Estes tiveram uma concepção de

instrumento normativo, visando à regulamentação da política de planejamento municipal.

Anterior a isto, segundo Jupira Mendonça (2001), os planos tinham como objetivo construir

documentos para a solicitação dos recursos para investimentos e implementação de programas

setoriais dos municípios, centralizados anteriormente no Governo Federal. “De fato os Planos

constituíam programas de ação dos governos municipais, que poderiam ser ou não executados,

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pois se configuram como instrumentos para negociação” (MENDONÇA, 2001: 151). Segundo a

minuta de lei do plano,

A nova Constituição brasileira, ao tratar da política urbana, introduz uma

nova dimensão ao Plano Diretor, cujo campo de intervenção é bem diferente

daqueles considerados nos Planos Diretores / de Desenvolvimento Integrado

– PDDI, dos anos 60 e 70. Este novo Plano Diretor tem por campo de

intervenção o espaço urbano concreto real, sendo o instrumento básico de

política de desenvolvimento urbano de expansão urbana do município e tem

como objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da

cidade e garantir o bem estar de seus habitantes (NATAL, 1993).

Segundo o artigo 5° da Constituição Federal (1988) ficou garantido como direito

fundamental, o direito à propriedade, sendo estabelecido que a propriedade atenderá à sua

função social (princípio instituído na Constituição de 1967, que teve sua ênfase com o MNRU).

Assim, no Capítulo da Política Urbana, observou-se o artigo 182 que trata sobre a função social

da cidade e da propriedade,

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder

Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por

objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e

garantir o bem- estar de seus habitantes.

§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para

cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política

de desenvolvimento e de expansão urbana.

§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às

exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

§ 3º - As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa

indenização em dinheiro.

§ 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para

área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do

proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que

promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I -

parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade

predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com

pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente

aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em

parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e

os juros legais (BRASIL, 1988).

O artigo 183 assegurou o direito à moradia da população carente, instituindo o

usucapião urbano. O artigo 182 tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento da função

social e garantir o bem estar dos habitantes da cidade. Para Nelson Saule Júnior (1997), isto se

deu através do exercício do direito à cidade, no combate às causas da pobreza e na efetivação

dos direitos humanos e ambientais, balizando a política de desenvolvimento urbano e a

construção de formatos de gestão pública que incorporassem setores excluídos da sociedade.

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Conforme mencionado, o artigo 182 remeteu ainda aos Planos Diretores a condição para

se delinear as funções sociais da cidade e a execução da política urbana, balizados pelo direito à

cidade e pelas diretrizes gerais que norteiam a promoção do desenvolvimento urbano

sustentável. Neste contexto foi dada maior autonomia legal, econômica e administrativa aos

municípios, que através dos planos diretores passam a legislar sobre as especificidades locais e a

aplicar os instrumentos urbanísticos e jurídicos, mais adequados a cada realidade. Entretanto, a

maioria dos municípios brasileiros não apresentava estrutura física, cultural, financeira e

administrativa para realizar tais funções a partir de 1988, dificultando a gestão democrática, a

inclusão social e a implementação dos instrumentos previstos nos Planos Diretores. Em que

pese os avanços de estruturação e capacitação da gestão municipal, sobretudo a partir da

retomada da Política Urbana no país com a criação do Ministério das Cidades em 2003, esse

problema persiste até os dias atuais.

Contudo, os princípios da função social da propriedade e os seus instrumentos de

aplicação passaram a ser trabalhados sob a ideia de planejamento contínuo, inserido como

normativa em um contexto político administrativo (MONTE-MOR, 2008:43). Assim,

instrumentos previstos e a serem inseridos nos Planos Diretores, a exemplo do Plano Setorial de

Natal, devem ser norteados pela garantia do direito à cidade, sob os princípios de soberania e

participação popular, desenvolvimento urbano sustentável e meio ambiente, função social da

propriedade e da cidade (SAULE JÚNIOR, 1997), no âmbito de uma gestão que objetiva:

a) Assegurar o respeito e tornar efetivo os direitos humanos;

b) Promover medidas para proteger o meio ambiente natural e construído, de

modo a garantir a função social ambiental da propriedade na cidade;

c) incentivar atividades econômicas que resultem na melhoria da qualidade

de vida, mediante um sistema produtivo gerador de trabalho e de distribuição

justa da renda e riqueza;

d) Combater as causas da pobreza, priorizando os investimentos e recursos

para as políticas sociais (saúde, educação, habitação);

e) Democratizar o Estado, de modo a assegurar o direito à informação e à

participação popular no processo de tomada de decisão (SAULE JÚNIOR,

1997: 70).

Para Luiz de Pinedo Quito Jr. (2011) com a função social da propriedade,

incorporou-se,

[...] a organização do espaço físico como fruto da regulação social, isto é, a

cidade deve contemplar todos os seus moradores e não somente aqueles que

estão no mercado formal da produção capitalista da cidade. A tradição dos

códigos de edificação, uso e ocupação do solo urbano no Brasil sempre

partiram do pressuposto de que a cidade não tem divisões entre os incluídos e

os excluídos socialmente, de modo que nossa legislação edilícia por si só

normatizaria todos os preços de custo (QUINTO JR, 2011).

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Para auxiliar no cumprimento dos princípios e direitos da Constituição foi instituído o

Estatuto da Cidade – EC, em 2001, após 10 anos de discussões, em um quadro de investimento

na municipalidade, que visava solucionar os problemas urbanos, ao buscar a efetivação do

direito à cidade por meio da regulamentação dos artigos 182 e 183, da Política Urbana da Carta

Magna. Este instrumento trouxe ferramentas para os municípios atuarem e possibilitou que o

direito à cidade fosse reconhecido no campo jurídico e não apenas no campo da política,

transformando-o em um direito fundamental no direito brasileiro (SAULE JÚNIOR, 2007).

O Congresso Nacional aprovou, depois de quase onze anos de tramitação, a

Lei nº 10.257, mais conhecida como Estatuto da Cidade. Esta Lei, que está

em vigor desde 10 de outubro de 2001, estabelece as diretrizes gerais da

política urbana objetivando principalmente o pleno desenvolvimento das

funções sociais da cidade e a garantia ao direito a cidades sustentáveis.

Graças a um dos seus princípios básicos: a justa distribuição dos benefícios e

ônus decorrentes do processo de urbanização, o poder público passa a ter a

prerrogativa de, no interesse coletivo, recuperar parcela da valorização

imobiliária, decorrente dos investimentos em infra-estrutura física e social,

pagos pelos impostos de todos. Poucas leis na história do Brasil foram

construídas com tanto esforço coletivo e legitimidade social. A aprovação do

Estatuto da Cidade, é uma conquista dos movimentos populares, que se

mobilizaram por mais de uma década na luta por sua aprovação. Esta luta foi

conduzida a partir da ativa participação de entidades civis e de movimentos

sociais em defesa do direito à cidade e à habitação e de lutas cotidianas por

melhores serviços públicos e oportunidades de uma vida digna (ROLNIK,

2005: 9).

Para Nelson Saule Júnior (2007) e Lígia Melo (2010), o Estatuto da Cidade delineou o

direito à cidade, como direito à cidade sustentável, condicionado ao direito à terra urbana, à

moradia, ao saneamento ambiental e à infraestrutura urbana, na promoção da cidadania e da

justiça social, além de outros já apresentados. Para se atingir estes objetivos, condicionou-se o

direito à cidade sustentável à função social da propriedade, limitando o direito de propriedade,

gerando deveres e não apenas direitos aos donos de terra12

.

O Estatuto possibilitou, para tanto, essa nova concepção de planejamento, tendo a

proteção humana e seus direitos como balizas, em harmonia com o meio ambiente (MELO,

2010). Prescreve também como formas de garantia do direito à “cidade sustentável”, o direito ao

saneamento ambiental, protegendo constitucionalmente o meio ambiente equilibrado. “Em

outras palavras, é possível dizer que existe, ao lado da “função social”, a “função

socioambiental” da propriedade” (DOMINGUES, 2010: 32).

O Estatuto da Cidade trouxe ainda uma série de instrumentos de indução do

desenvolvimento urbano sustentável, de financiamento da política urbana, de regularização

12

Ver Quadro 8 nos apêndices deste trabalho.

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fundiária e de instrumentos de democratização da gestão urbana, que objetivaram construir

cidades voltadas à coletividade em detrimento do interesse privado. Seus instrumentos foram e

são instituídos nos Planos Diretores e aplicados a cada realidade.

No caso de Natal, conforme visto anteriormente, diversos instrumentos já haviam sido

inseridos no Plano Diretor de 1994. Porém, com a condição de obrigatoriedade para a adoção de

tais instrumentos posta pelo Estatuto da Cidade, verificou-se no Plano Diretor de 2007 o

aprofundamento dos instrumentos já definidos e a inserção de outras estratégias para o

cumprimento da função social da propriedade, conforme se deu com o Plano Setorial, que não

está definido no Estatuto da Cidade.

Entretanto, a aplicação de tais instrumentos depende de uma estrutura de

gerenciamento, e a avaliação de experiências no Brasil indicou que algumas aplicações ocorrem

sob um prisma exclusivamente econômico em detrimento das questões sociais e ambientais,

mascarando muitas vezes a participação social. Em outros momentos, estes não foram

regulamentados, fragilizando o alcance de seus objetivos (BENTES SOBRINHA, 2011).

Milton Santos (2008) destaca que, embora exista o princípio da função social da

propriedade, “o mercado é cego” para fins intrínsecos das coisas, portanto, o espaço assim

construído é, igualmente, um espaço cego para os fins intrínsecos dos homens. Ou seja, as ações

econômicas refletidas no espaço não incorporam a questão social, não inserem a função social

da propriedade. Neste sentido, os cidadãos e os gestores devem estar atuantes na construção do

espaço, permitindo a efetivação do direito do cidadão e da gestão democrática. Não obstante a

isto, o Plano Setorial, por sua vez, também está condicionado a um sistema de gestão e controle

social para que sua aplicação signifique a construção de cidades justas.

Outro princípio relacionado à garantia do princípio da função social da propriedade é o

direito a cidades sustentáveis, estabelecido no artigo 2º do Estatuto da Cidade (BRASIL, 2001),

entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura

urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer; aplicação de instrumentos

urbanísticos; atendimento ao princípio da gestão democrática; adoção de padrões de produção e

consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da

sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de

influência; controle e ordenamento do solo urbano; parcerias público-privadas; gestões locais e

globais. Correlações complexas que demandam um estudo detalhado sobre o território e um

ativismo social contemplado pela gestão, onde o Plano Setorial pode ser potencial, quando traz

a redução da escala de planejamento, aproximando a gestão dos cidadãos.

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Norteado pelo direito à cidade, entendeu-se que o direito do cidadão pode ser atingido

por meio do acesso: à moradia, ao transporte público, saneamento, energia, iluminação pública,

comunicações, educação, saúde, lazer, segurança, assim como a preservação do patrimônio

ambiental e cultural; à gestão democrática da cidade; a condições de vida urbana digna, o

exercício pleno da cidadania e os direitos humanos (SAULE JÚNIOR, 2007).

A noção política e cultural do direito à cidade como o carro chefe da reforma

urbana, desde o processo da elaboração da Constituição brasileira, tem sido

um marco referencial para as experiências existentes em nossas cidades, de

edição das legislações urbanas e implementação de política, programas de

desenvolvimento urbano, planos e projetos urbanísticos. O direito à cidade

retrata a defesa da construção de uma ética urbana fundamentada na justiça

social e cidadania, ao afirmar prevalência dos direitos urbanos e precisar os

preceitos, instrumentos e procedimentos para viabilizar as transformações

necessárias para a cidade exercer sua função social (SAULE JÚNIOR, 2007:

50).

Sendo as funções sociais da cidade, interesses difusos, estes buscam atender interesses

da população e não de grupos específicos, na obtenção de um meio ambiente sadio e condições

dignas de vida. Isto dentro de uma lógica que não se contrapôs ao sistema econômico capitalista

vigente, mas que trouxe uma nova inserção socioambiental à propriedade e ao cidadão, na busca

da efetivação de direitos e na construção de cidades justas e equilibradas.

Compreende-se, para tanto, que o Plano Setorial, inserido na lógica de formulação de

instrumentos de planejamento, pós Constituição e Estatuto da Cidade, foi direcionado à

perspectiva de efetivação do direito à cidade, na perspectiva de cumprimento da função

socioambiental da propriedade, do desenvolvimento sustentável e da efetivação dos direitos

humanos.

Assim, o Plano Setorial se identifica com esses objetivos quando busca cumprir por

meio das ações de planejamento urbano a redução das desigualdades sociais, a promoção da

justiça social, a melhoria da qualidade de vida e o desenvolvimento sustentável13

e o direito ao

desenvolvimento14

. Cabe ao Estado tomar medidas que assegurem a igualdade de oportunidade

e o acesso a recursos básicos, educação, saúde, habitação, emprego, entre outros, como a

distribuição equitativa de renda (SAULE JÚNIOR, 1997). Além de orientar a elaboração de

13

“O princípio do desenvolvimento sustentável fundamenta o atendimento das necessidades e aspirações

do presente sem comprometer a habilidade das gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”

(SAULE JÚNIOR, 1997:65). 14

“A declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986), em seu artigo I, reconhece o direito ao

desenvolvimento como um direito humano inalienável, em virtude do qual toda pessoa humana e todos os

povos estão habilitados a participar do desenvolvimento econômico, social, cultural e político, a ele

contribuir e dele desfrutar, no qual todos os direitos humanos e liberdades possam ser plenamente

realizados. De acordo com o artigo 2º, a pessoa humana é considerada como sujeito central do

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planos, projetos, instrumentos urbanísticos e decisões de planejamento e gestão, que objetivam a

diminuição da pobreza; redistribuição de renda; acesso a todos aos benefícios da urbanização;

meio ambiente sadio; condições dignas de vida; exercício pleno da cidadania e os direitos

humanos em geral.

No que se refere ao Poder Público, é preciso estar atento à obrigatoriedade de

observância a estes princípios, à gestão democrática e à garantia do direito à cidade. Assim, os

Planos Diretores se constituem em instrumentos de inclusão social e urbana e de redistribuição

de renda, possibilitando a igualdade de oportunidade e o direito à moradia em terra urbana, com

acesso a serviços básicos, como saúde, emprego, infraestrutura, saneamento ambiental e

transporte público.

Cabe ressaltar, porém, que a realização dos princípios e objetivos voltados para a

efetivação do direito à cidade se desenvolve em um campo de conflitos de interesses, lutas e

disputa de projetos de cidade. O projeto de Reforma Urbana constrói caminhos para e realização

de cidades justas, democráticas e sustentáveis em disputa com os projetos que têm na cidade o

espaço privilegiado e prioritário de reprodução do capital. Assim, os instrumentos urbanísticos

postos pelo Estatuto da Cidade, além de cumprirem papel relevante na afirmação dos princípios

de efetivação do direito à cidade, constituem fortes desafios para sua concretização no âmbito

do planejamento urbano.

Concluiu-se que, embora o Plano Setorial, tal como foi inserido na experiência do

planejamento urbano de Natal, se apresente como ferramenta de gestão, com potencial

democrático, instituído dentro do princípio da função social da propriedade, coloca-se

claramente a necessidade de aprofundamento sobre os seus objetivos e procedimentos de

operacionalização visando à ampliação das conquistas efetivadas e o aproveitamento de suas

potencialidades para a efetivação de direitos.

Considerando o pouco aprofundamento e a restrita aplicação que o Plano Setorial teve

no exercício do planejamento urbano em Natal, desde que foi instituído em 2007, colocou-se a

necessidade de investigar experiências de instrumentos similares desenvolvidas em outras

cidades, conforme se apresenta a seguir.

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CAPÍTULO II.

PLANO SETORIAL: DEFINIÇÕES NO PLANO DIRETOR DE

NATAL E REFERÊNCIAS DE EXPERIÊNCIAS SIMILARES

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No presente capítulo desenvolvem-se dois eixos de análise principais: (i) o primeiro,

que contextualiza o Plano Setorial no âmbito do planejamento urbano de Natal, considerando a

formulação, a aprovação e as questões postas pela ausência de regulamentação; (ii) o segundo

eixo, que situa experiências similares ao Plano Setorial de natal realizadas em outras cidades15

.

2.1 DEFINIÇÕES DO PLANO SETORIAL NO PLANO DIRETOR DE

NATAL16

O Plano Setorial foi formulado pela equipe técnica da Prefeitura do Natal, que

coordenou a revisão do Plano Diretor de 1994 (LC 7/94), entre os anos de 2004 e 2007.

Segundo relatos de Maria Florésia17

, naquele momento a proposta não se baseou em outro

instrumento existente ou em outra experiência de gestão conhecida, mas foi inserido como uma

possível solução para as dificuldades locais de implementar o Plano Diretor, com foco na

redução da escala de planejamento e na democratização do processo de implementação dos

instrumentos urbanísticos e jurídicos instituídos no Plano.

Nessa trajetória, o instrumento criado não apresentou embasamento teórico e nem

referencias aprofundadas, o que gerou diversas apropriações conceituais por parte dos técnicos e

da sociedade, principalmente no âmbito das audiências públicas verificadas na Câmara dos

Vereadores. Assim, o Plano Setorial foi associado aos planos administrativos de políticas

setoriais como transporte, saúde, outros, e a outros instrumentos conhecidos como o Plano de

Pormenor, em Portugal e o Plano de Bairro, em São Paulo.

Foi, também, amplamente discutido a relação entre o Plano Setorial e o Plano Diretor de

bairro, o que remeteria à possibilidade de criação de uma lei complementar e à alteração de

índices e parâmetros do Plano Diretor Municipal. Neste quesito os técnicos se opuseram,

retratando que ele era um instrumento de aplicação do Plano Diretor e não outro Plano, mas

restringiram na minuta de lei, apenas o respeito aos índices máximos estabelecidos e o respeito

às legislações menos pontuais, como o Plano de Saneamento Municipal.

O primeiro setor sugerido durante a formulação do Plano Setorial foi o de Ponta Negra,

Capim Macio e Neópolis (Figura 2), na compreensão de que este passava por profundas

transformações socioeconômicas e espaciais, que alteraram a qualidade de vida, os usos, a

15

Baseado na pesquisa realizada no Âmbito do Trabalho Final de Graduação “Parâmetros de aplicação do

Plano Setorial no Plano Diretor de Natal” (FURUKAVA, 2009) 16

A Lei Complementar 82/07 segue em apêndice. 17

Maria Florésia Silva de Sousa e Silva. Servidora pública da Secretaria Municipal do Meio Ambiente e

Urbanismo. Participou da equipe técnica que formulou o Plano Setorial de Natal como instrumento no

Plano Diretor de Natal. Em entrevista concedida a autora, set.2009.

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população e a cultura local. Além de ser uma área dinâmica, com potencial empreendedor

(turismo, serviços, mercado imobiliário); por ter características naturais marcantes, como o

Morro do Careca, na ZPA 6 e o Parque das Dunas, na ZPA 2, cartões postais e identidade da

cidade; e, por ser uma área de conexão entre três municípios (Parnamirim, Natal e Extremoz) e

entre os corredores turísticos dos litorais Sul e Norte. Entretanto, nesta fase de discussão o

objetivo inicial era que toda a Natal fosse setorizada, contudo segundo relatos da mesma

técnica, isto não foi possível, pois demandavam estudos maiores e dados detalhados sobre a

cidade, que não estavam formulados naquele momento e que não teriam como ser

desenvolvidos até a aprovação da lei.

Figura 2. Indicação da composição por bairros, da Região Sul 1, em Natal.

Fonte: SEMURB, 2010.

Nota: Alterado para ampliação das legendas.

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Figura 3. Morro do Careca.

Fonte: FURUKAVA, 2012 Figura 4. Vista aérea do Parque das Dunas.

Fonte: Google images. In: http://carlospedrop5natal.blogspot.com.br/2008/06/parque-das-dunas-natal-

rn.html. Acesso em: 26 de Outubro de 2012.

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Ao ser apresentado este setor, moradores do bairro de Ponta Negra, por meio dos relatos

de Heitor de Andrade e Silva18

, observaram no Plano Setorial a potencialidade de conter a

especulação imobiliária, o processo de verticalização e de garantir a qualidade de vida no bairro.

Como Capim Macio e Neópolis não estavam no mesmo momento urbanístico de transformação

e não demonstraram esse mesmo intuito, em especial o de conter a verticalização, não se

manifestaram nas participações sociais, o que resultou que setor estabelecido foi,

exclusivamente, Ponta Negra. Neste quadro, a contribuição social trouxe para a minuta de lei a

alteração dos critérios de delimitação do setor, passando de duas ou mais unidades contíguas

para uma, dependendo da complexidade local. Além disto, através de debates e consulta

pública19

, foram definidos alguns parâmetros urbanísticos aos parques residenciais de Ponta

Negra e Alagamar, com a inserção dos artigos 118 e 119. Esses artigos estabeleceram que

construções nos parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar, teriam limite de gabarito de 4

pavimentos, além da proibição de remembramentos. Estes foram fortemente questionados na

Câmara dos Vereadores, mas que teve posterior aceitação, sem alterações na minuta para a

aprovação20

.

Com a aprovação do Plano Diretor de Natal em 2007, instituiu-se o Plano Setorial, que

como um instrumento de planejamento e gestão, inserido no contexto pós Constituição Federal

e Estatuto da Cidade, trazia em seus fundamentos a gestão democrática e aplicação de

ferramentas redistributivas como o IPTU Progressivo no Tempo e o direito de preempção.

Conforme apresentado no capítulo anterior, esse quadro de princípios e direitos para a

construção de cidades justas e equitativas depende diretamente da participação social e das

estruturas de gestão, não sendo autoaplicável e finalizada no momento da aprovação da lei.

Assim, a construção de princípios e direitos, por meio da aplicação dos instrumentos,

demandam um monitoramento e uma complementação constante tanto teórica quanto

operacional.

O Plano Setorial foi então definido no Capítulo VIII, no artigo 90 que informou o que é

o instrumento, seu objetivo geral, e iniciou o procedimento de delimitação do setor. No art. 91

foram instituídos os objetivos específicos, a legislação e política às quais o instrumento se

18

Heitor de Andrade Silva. Arquiteto Urbanista, Professor da UFPB,morador do Bairro de Ponta Negra e

um dos autores da emenda do Plano Setorial em Ponta Negra,durante a revisão do PDN, na fase de

discussão do Legislativo. Em entrevista concedida a autora deste trabalho em setembro de 2009. 19

Pesquisa de Opinião Pública desenvolvida pela CONSULT pesquisa em parceria com o Curso de

Arquitetura e Urbanismo da UNP e a Associação dos moradores dos conjuntos de Ponta Negra e

Alagamar. Com enfoque na Imagem socioambiental dos moradores dos Parques Residenciais Ponta

Negra e Alagamar, Fevereiro de 2007. 20

Foi constatado que esta aceitação dos artigos 118 e 119, que se deram pela crise internacional de 2008,

que reduziram os investimentos na área, alterando o quadro propício para empreendimentos

(FURUKAVA, 2009).

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vincula, hierarquicamente. O art. 92 informou os produtos esperados de um plano setorial. O

Plano Setorial de Ponta Negra foi definido no artigo 118 e alguns parâmetros até sua

regulamentação no artigo 119.

2.1.1 Artigo 90 – Conceituação do Plano Setorial, objetivos e delimitação do setor

Art. 90 - Os Planos Setoriais (PS) são instrumentos legais de

planejamento urbano e ambiental que têm como objetivo detalhar o

ordenamento do uso e ocupação do solo urbano de duas ou mais

unidades territoriais contíguas da cidade, podendo ser de uma unidade

territorial dependendo da área, densidade populacional e

complexidade do lugar, com vistas a otimizar a função socioambiental

da propriedade e compatibilizar o seu adensamento à respectiva

infraestrutura de suporte (NATAL, 2007 s.p.).

Localizado no Plano Diretor no Título V – dos instrumentos de gestão urbana, o artigo

90 conceitua os Planos Setoriais, definidos e instituídos como instrumentos legais de

planejamento e gestão urbana, que construídos dentro da esfera de planejamento atual, pós

Constituição e Estatuto da Cidade, caracterizam-se como ferramentas potenciais para efetivação

de direitos e princípios relacionados à função social da propriedade. Neste sentido, o artigo

supracitado apresentou como objetivos específicos: (i) detalhar o ordenamento do uso e

ocupação do solo urbano; (ii) otimizar a função social da propriedade e compatibilizar o

adensamento à respectiva infraestrutura de suporte.

A Constituição Federal indicou quanto ao ordenamento do uso e ocupação do solo, que

compete aos municípios “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante

planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano” (BRASIL,

1988, s.p.). O Estatuto da Cidade direciona ao âmbito municipal, por meio dos Planos Diretores,

a aplicação de seus instrumentos de ordenamento e uso - ferramentas que potencializam e

direcionam a efetivação de direitos e princípios da Carta. Um destes princípios é a função social

da propriedade e da cidade, instituído no Estatuto como o ordenamento e o controle do uso e da

ocupação do solo, de forma a evitar a utilização inadequada de imóveis urbanos, do

parcelamento do solo, da edificação ou do uso excessivo ou inadequado em relação à

infraestrutura urbana (BRASIL, 2001 s.p.).

O Plano Diretor de Natal, por sua vez, ao atuar em uma escala local, definiu, delimitou e

tratou do ordenamento do uso do solo no macrozoneamento, nos zoneamentos específicos de

controle de gabarito e áreas especiais, nos índices e parâmetros estabelecidos e na utilização de

instrumentos como a outorga onerosa do direito de construir, além do Plano Setorial, nos artigos

transitórios. Traz também, no artigo 4º que o “o uso e ocupação do solo serão submetidos à

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capacidade da infraestrutura urbana instalada, compatibilizando as condições do meio ambiente,

considerando-se áreas onde a ocupação pode ser intensificada e, outras, onde deve ser limitada;

[...]” (NATAL, 2007 s.p.).

Quanto ao objetivo do Plano Setorial, no artigo 90, “detalhar o ordenamento do uso do

solo”, o termo “detalhar” permite dupla interpretação: se o instrumento pode ou não ordenar o

uso e ocupação do solo. O alerta foi aqui emitido, pois isto pode gerar um conflito com o

ordenamento estabelecido pelo Plano Diretor e gerar e aprofundar a construção de uma cidade

fragmentada, já que cada setor teria seu ordenamento. Isto porque, com o debate em menor

escala, pode haver uma concentração de interesses particulares em determinadas áreas,

alterando índices e parâmetros estabelecidos no Plano Diretor e debatidos com a sociedade em

geral, não apenas os interessados e moradores da área. Ao entender que os setores devem ter

uma conexão entre estes para não promoverem atividades conflituosas, que impeçam a garantia

do direito coletivo e difuso sobre o direito individual, a qualidade de vida dos moradores, e o

cumprimento da função socioambiental da propriedade.

Assim, segundo a Constituição Federal e o Estatuto da Cidade, quem define parâmetros

e índices em um município é o Plano Diretor. Portanto, compreende-se que como ferramenta

delineada no Plano Diretor de Natal (LC82/07) o ordenamento deve ser espacializado e não

definido pelo Plano Setorial (NATAL, 2007). Assim, o Plano Setorial, apenas operacionaliza

em menor escala espacial, o cumprimento e a aplicação destes e de outros instrumentos

estabelecidos no Plano Diretor. Como reduz a escala, este detalhamento tende a ser mais

completo, chegando em nível do lote, diferente do macrozoneamento do PD, que abrange zonas

sem detalhamento dos terrenos. Isto permite um maior monitoramento, a espacialização lote a

lote do ordenamento e instrumentos que serão aplicados, transparência para as atividades de

mercado, a capacidade de avaliação, prospecção de soluções e cenários, e a realização de

revisões embasadas sobre índices estabelecidos para o setor. Além disto, o Plano Setorial

condicionou o ordenamento ao suporte das redes de infraestrutura, direcionando-o à efetivação

da função social da propriedade.

Tratando do segundo objetivo, otimizar a função social da propriedade, convém

lembrar que este é um princípio, assim, existe ou não e, portanto, não se pode otimizá -lo e

sim, garanti-lo e promovê-lo. Ao se observar a Constituição, identificou-se no artigo 182 que

“A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público Municipal, conforme

diretrizes gerais fixadas em lei tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções

sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes” (BRASIL, 1988 s.p.).

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36

O Estatuto da Cidade, no artigo 39, trouxe que a propriedade urbana cumpre sua função

social quando “atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano

diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à

justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas” (BRASIL, 2001 s.p.). Instituiu

ainda, diretrizes gerais para o desenvolvimento da função social da cidade e da propriedade,

como a “garantia dos direitos à terra urbana, à moradia, ao transporte e aos serviços públicos, ao

trabalho, ao lazer, para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 2001 s.p.).

Para Natal, segundo o Plano Diretor, no artigo 5°, a propriedade urbana atende sua

função social e ambiental quando os direitos decorrentes da propriedade individual não

suplantarem ou subordinarem os interesses coletivos e difusos (NATAL, 2007 s.p.). Além disto,

deve cumprir as normas do próprio Plano Diretor, quanto ao ordenamento do solo. Vale lembrar

que o Plano Setorial teve como motivação a formulação de um instrumento que potencializa o

cumprimento deste objetivo, visando à efetivação de direitos e que fosse atendido o

ordenamento da cidade, compatibilizando a capacidade das redes de infraestrutura.

O Plano Diretor de Natal considerou como infraestrutura os sistemas de abastecimento

de água e esgotamento sanitário, drenagem de águas pluviais, energia elétrica e sistema viário.

Para haver a compatibilização destas redes com o adensamento, ordenamento e crescimento da

cidade, as concessionárias e órgãos públicos responsáveis devem informar relatórios e dados

detalhados, anualmente, sobre a situação existente e a provisão de melhorias e ampliações, além

da indicação da tendência de saturação (quando utilizado 80% do sistema instalado), para cada

bairro. Cabe ao município compatibilizar esses dados aos emitidos pelos novos licenciamentos.

Isto permite evitar ou destinar recursos a áreas que terão maior crescimento, antes da saturação

dos sistemas (NATAL, 2007).

Compreendeu-se, portanto, que para garantir a função socioambiental da propriedade

buscou-se compatibilizar o adensamento com a infraestrutura; atender as normas de

ordenamento expressos no Plano Diretor; evitar a não utilização ou subutilização de

propriedades urbanas. Também por meio da promoção dos usos e projetos que potencializem a

qualidade de vida local, garantam os direitos coletivos e difusos e que estes sejam resguardados

em relação ao direito individual, gerado pela propriedade privada (NATAL, 2007).

2.1.2 Artigo 91 – Objetivos e delimitação do setor

Art. 91 - Os PS deverão ser elaborados e propostos com base em estudos

aprofundados das condições existentes na sua área de abrangência,

observando a inserção na bacia hidrográfica e no entorno e o papel desses

espaços na funcionalidade da cidade, devendo:

I - definir o perímetro das áreas que abrange;

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II - definir os mecanismos de estímulo ou de inibição do adensamento;

III - respeitar necessariamente, o Plano Diretor de Mobilidade Urbana e a

Politica Habitacional de Interesse Social do Município do Natal;

IV - considerar infraestrutura existente;

V - respeitar os índices máximos e prescrições estabelecidas nesta Lei e

demais regulamentações específicas que incidam na área.

VI - Os Planos Setoriais - PS - deverão ser elaborados de forma participativa

respeitando as determinações da Lei 10.25712001 - Estatuto da Cidade

(NATAL, 2007. s.p.).

Este artigo aproximou do Plano Setorial da dimensão ambiental, quando os estudos

aprofundados relacionaram as condições existentes na área, com a inserção destas na bacia

hidrográfica e ao considerar que as questões espaciais, o adensamento e a infraestrutura

impactam diretamente nestas, ou por consumo ou por poluição21

. Além disso, apresentou

critérios de delimitação do setor, dependendo da funcionalidade deste para a cidade e por meio

de estudos detalhados, complementando o artigo 90, que trouxe como unidade de planejamento,

o bairro.

Partiu-se do princípio que para haver uma compatibilização entre esses elementos

requeridos, necessita-se de aprofundamento e dados claros, quantitativos e qualitativos, e dos

projetos urbanísticos e arquitetônicos já propostos para a cidade, com foco no setor. Em posse

desses dados, iniciou-se a identificação dos pontos comuns e de conflitos, delimitando a unidade

de planejamento. No caso do Plano Setorial de Ponta Negra, como visto na formulação do

instrumento, a delimitação do setor percorreu também uma consulta pública e respeitou a

unidade de planejamento do bairro22

.

Segundo o artigo 91, os setores que apresentam crescente demanda sobre o sistema de

infraestrutura e questões ambientais envolvidas, em especial as que se referem às águas, detêm a

prioridade de regulamentação. Ao levantar prioridades quanto à questão das águas, ligada

diretamente à infraestrutura (sistema de águas e sistema viário), este instrumento se torna

facilitador em garantir a função socioambiental da propriedade urbana, estabelecida no Plano

Diretor.

Tal qual o bairro de Ponta Negra, outros bairros na cidade atravessam um intenso

aumento no adensamento espacial e populacional. Esse aumento demanda detalhamento sobre o

ordenamento do solo e um maior debate sobre o que se quer para este bairro e como se ter

crescimento e qualidade de vida integradamente. A exemplo do bairro do Planalto, Zona Oeste

21

Heitor de Andrade Silva. Em entrevista concedida a autora deste trabalho em setembro de 2009. 22

Idem.

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38

de Natal, com um crescimento de 213,14%23

no número de domicílios em 10 anos e o bairro,

108% aproximadamente na Redinha24

e 86,9% no bairro de Nossa Senhora da Apresentação25

,

ambos na Zona Norte da cidade (CRESCIMENTO...,2011). Isto indicou, que nem todos os

bairros precisam, necessariamente ser setorizado, ao contrário do que se observou inicialmente

na formulação do Plano Setorial, ao ser possível delimitá-lo segundo uma demanda local.

Constata-se com as diferentes dinâmicas de crescimento urbano que nem todos os

bairros da cidade precisam necessariamente ser setorizados. A delimitação de um setor depende,

portanto, da realidade local - especialmente as que requerem uma compatibilização do

adensamento com as redes de infraestrutura (áreas em expansão e reestruturação urbana) - e

pode ser requisitada tanto pela sociedade quanto pelos gestores. Demarca-se, então, que um

setor pode se constituir de uma ou mais unidades contíguas, a depender da relação entre dados

técnicos (sistema de águas, adensamento, crescimento do número de domicílios, sistema viário e

a questão ambiental) e dados obtidos através de consulta popular. Outra constatação foi sobre a

unidade de planejamento, constantemente mencionada pela sociedade e pelos técnicos como o

bairro.

Esta pesquisa, consonante com o artigo 91, no inciso V do Plano Diretor, identificou

uma divergência entre este e o artigo 90, quando aquele remeteu o cumprimento dos objetivos

específicos do Plano Setorial à submissão à Lei Orgânica do Município e às prescrições,

parâmetros e índices máximos estabelecidos no Plano Diretor. E este não especificou se é

possível alterá-los, o que abre margem a diversas possibilidades operacionais ao instrumento.

O artigo 91 trouxe ainda, procedimentos ligados à gestão democrática definida no

Estatuto da Cidade, inserindo o Plano Setorial na política nacional. Em esfera municipal o

inciso III, deste mesmo artigo, vinculou o Plano Setorial ao Plano Diretor de Mobilidade

Urbana e à Política Habitacional de Interesse Social do Município do Natal. Isto trouxe ao Plano

Setorial diálogo e respeito às legislações em diferentes escalas de intervenção, não se tornando

uma lei fragmentada no território. Assim, atua como potencializador da aplicação do Plano

Diretor, não como um concorrente em escala reduzida. Isto indica que o Plano Setorial não

altera prescrições e parâmetros do PD, apenas atua como facilitador na aplicação dos

instrumentos definidos neste.

23

Em 2000 o bairro tinha 3.418 domicílios particulares. Em 2010, este número aumenta para 10.703

unidades (CRESCIMENTO...,2011). 24

Em 2000 a Redinha era composta por 2.610 domicílios, em 2010, 5.431 (CRESCIMENTO...,2011). 25

Esta porcentagem equivale a 1.409 domicílios particulares a mais de 2000 a

2010(CRESCIMENTO...,2011).

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2.1.3 Artigo 92 – Produtos do Plano Setorial

Art. 92 - A partir dos estudos realizados na área, os PS devem indicar

soluções urbanas, viárias, de transporte e trânsito, de infraestrutura,

localização e dimensionamento de equipamentos e serviços, levando em

conta a população residente e usuária, a paisagem, o conforto ambiental

urbano, a dinâmica do mercado, a implantação de grandes projetos públicos

ou privados já previstos, além de indicar, quando possível, as fontes de

recursos disponíveis.

§1° - A norma destinada à instituição dos PS deve incluir as propostas de

regulamentação e atualização das legislações específicas quando incluírem

áreas especiais de interesse social e zonas de interesse turístico ou de

proteção ambiental.

§2° - Também deverão ser indicados na elaboração dos PS os imóveis

passíveis de parcelamento, edificação ou utilização compulsório de direito de

preempção, de IPTU Progressivo e de consórcios imobiliários (NATAL,

2007 s.p.).

O artigo 92 inseriu a variável dos projetos urbanísticos e arquitetônicos de impacto,

além da questão locacional do setor, da dinâmica do mercado, a questão orçamentária, a

população residente, o conforto ambiental e a paisagem. Indicou também a necessidade de

especificar imóveis para aplicação de instrumentos previstos no Plano Diretor. Tal quais os

demais artigos, este foi amplo e de difícil compreensão sobre os produtos que o Plano Setorial

deve gerar, dificultando a elaboração deste pelo corpo técnico e o acompanhamento, a cobrança

e a participação social.

Ao se tratar de um plano que se destinou à operacionalização do Plano Diretor,

articulando regulamentos, instrumentos e políticas predefinidas, o sentido de indicar soluções

urbanas assumiu o caráter de clarificar e apresentar os procedimentos de aplicação. Assim,

gerou-se a demanda pela explicitação das dimensões espaciais, qualitativas e quantitativas dos

projetos, infraestrutura e instrumentos propostos para a área e sua prospecção de suporte para

médio e longo prazo. Isto para servir de orientação e programação de recursos, em um

determinado tempo, para gestores, planejadores e investidores, antes que sejam instaladas as

demandas.

Com estes objetivos o Plano Setorial foi diversas vezes aproximado da Operação

Urbana Consorciada26

(OUC). Entretanto, entende-se que o Plano Setorial se diferencia em face

26

“Entende-se por Operação Urbana Consorciada (OUC) o conjunto integrado de intervenções e medidas

urbanísticas que definem um projeto urbano para determinadas áreas da cidade, indicadas pelo Plano

Diretor, coordenadas pelo Poder Público e definidas, através de lei municipal, em parceria com a

iniciativa privada, instituições financeiras, agentes governamentais, proprietários, moradores e usuários

permanentes, com a finalidade de alcançar transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e

valorização ambiental, levando em consideração a singularidade das áreas envolvidas.

n - Também podem ser realizadas Operações Urbanas Consorciadas com objetivo de promover melhorias

urbanas, incentivar a função sócio ambiental da propriedade, promover a justiça social, gerar

habitabilidade digna, preservar valores históricos culturais, cênico paisagístico e ambientais significativos

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à possibilidade de aplicação em qualquer dinâmica urbana, independente do interesse público

em atrair capital privado para investimentos na área o que é próprio da OUC.

O Plano Setorial, ao possibilitar o procedimento de espacialização e debate entre

técnicos, grupos e organizações sociais acerca dos impactos e benefícios gerados ao setor,

permitiu a proposição de outras soluções, inclusões ou complementação dos planos, projetos e

políticas inicialmente tecnocráticas. As propostas construídas conjuntamente e, com dados

claros sobre o setor, possibilitam projetos mais compatíveis com a “cidade que se deseja

construir ou preservar” (MINISTÉRIO..., 2005).

O Parágrafo primeiro do artigo 92 gera questionamentos quanto a: (i) o Plano Setorial

deve regulamentar em um mesmo momento as áreas especiais integradamente, inserindo-as na

norma que institui o setor. Ou; (ii) ele deve considerar as áreas especiais em sua norma,

propondo medidas de inclusão destas áreas no entorno, sem quebrar seus limites e legislações

específicas, como por exemplo, os corredores ecológicos.

Ambas as compreensões são complexas no ponto de vista da execução deste objetivo

específico, uma vez que ao considerar a primeira possibilidade, o Plano Setorial pode vir a

fragilizar áreas já protegidas no Plano Diretor ou em lei específica. A exemplo de áreas de

preservação ambiental, que o Plano Setorial pode ter como motivação a indução do

adensamento ao invés da contenção deste.

Por outro lado, a regulamentação conjunta possibilita uma maior interação destas áreas.

Porém, como se observa historicamente na cidade e no próprio Plano Diretor, as

regulamentações de áreas especiais demandaram prazos diferentes e, muitas vezes, a construção

de métodos voltados à realidade do local e entorno para serem aplicados. A complexidade do

tema também dificultou um debate integrado, como proposto.

A segunda compreensão sobre o 1º parágrafo é que o Plano Setorial é condicionado à

regulamentação das áreas especiais e da revisão do Plano Diretor, para a integração de áreas, ao

considerar que o Plano não pode alterar índices e parâmetros estabelecidos no PD. Por exemplo

– e, bastante frequente no Brasil – se houver a indicação de uma zona de amortecimento no

entorno de uma Zona de Proteção Ambiental, e esta se encontrar contígua a uma Zona de

Interesse Social, caso não haja a regulamentação de ambas, uma legislação poderia se sobrepor

e se contrariar, diminuindo a eficiência uma da outra.

para o patrimônio da cidade, promover adequação viária, produção ou melhoramentos na infraestrutura,

dos equipamentos coletivos e dos espaços públicos” (NATAL, 2007, s.p.).

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Ou seja, para se atingir o objetivo de integrar áreas especiais, levanta-se duas

possibilidades: o Plano Setorial poderia alterar parâmetros do Plano Diretor, remetendo aqui ao

alerta emitido sobre o artigo 90; ou indicar soluções para quando o Plano Diretor for revisado,

ao ser possível legalizar e instituir os parâmetros da zona de amortecimento. Nesta pesquisa foi

observado que esta última facilita a aplicação do Plano Diretor. Outras soluções como os

corredores ecológicos, não demandariam tais procedimentos para aprovação.

Como uma síntese do que foi aqui exposto nos artigos do Plano Diretor, observa-se o

Quadro 1.

Quadro 1. Síntese do Plano Setorial, segundo o Plano Diretor de Natal.

Referência Plano Diretor de Natal, Lei 82/07

Escala Territorial Municipal – local

Legislação Base LC 082/07 (PDN), Constituição Federal (1988) e Estatuto da Cidade,

2001

Definição Instrumento legal de planejamento urbano e ambiental

Objetivo Geral

Detalhar o ordenamento do uso e ocupação do solo urbano, com vistas a

otimizar a função socioambiental da propriedade e compatibilizar o seu

adensamento à respectiva infraestrutura de suporte

UP Bairro

Critérios de

delimitação da UP

Dois ou mais bairros contíguos da cidade, podendo ser um, dependendo

da área, da densidade populacional e complexidade do lugar,

considerando a inserção destes na Bacia Hidrográfica

O que consta

Identificação e definição do perímetro; mecanismos de estímulo e

inibição ao adensamento; norma de instituição do Plano Setorial;

identificação e indicação, durante a elaboração do Plano Setorial, dos

imóveis passíveis à aplicação instrumentos previstos no Plano Diretor.

Etapas Elaboração; aprovação; regulamentação; soluções urbanas (projeto

urbano) com participação, segundo Estatuto da Cidade, 2001

Responsabilidade

Administrativa SEMURB

Gestão Não há menções sobre a gestão do PS no PD de 2007.

Participação

Popular Baseado no Estatuto da Cidade

Instrumentos

Relacionados

Parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, de direito de

preempção, IPTU progressivo e consórcios imobiliários.

Parceria Público/Privada/Público-Privada

Fonte: Produzido pela autora, 2012. Baseado na LC82/07.

Durante a elaboração do trabalho “Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como

instrumento do Plano Diretor”, observou-se a falta de experiências de aplicação do Plano

Setorial, conforme indicado no Plano Diretor de Natal (Lei Complementar 82/07) e a falta de

referências e estudos diretos sobre o instrumento. Como caminho metodológico,

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42

identificaram-se outros instrumentos por meio de experiências nacionais27

e internacionais28

,

com princípios de aplicação similares ao Plano Setorial, quanto a objetivos e procedimentos.

Na continuidade da pesquisa, esta dissertação se apropria de quatro destas experiências

similares analisadas no TFG da autora. Estas experiências embasam a construção de novos

apontamentos ao Plano Setorial e aos procedimentos de avaliação deste na realidade de Natal.

Logo, foram analisadas segundo os seguintes parâmetros conceituais: a escala de intervenção;

legislação base; definição do instrumento; o objetivo geral; a unidade territorial adotada; o

critério principal de delimitação da unidade de planejamento; o que deve constar em cada

instrumento e o setor.

Os parâmetros operacionais observados são: localização das experiências e etapas

destas; responsabilidade administrativa; sistema de gestão; participação popular; instrumentos

relacionados para se atingir aos objetivos; e parceria. Por fim, a relação desses procedimentos

com os projetos urbanísticos.

2.2 LEITURAS DE EXPERIÊNCIAS SIMILARES: BASES PARA

COMPREENSÃO DO PLANO SETORIAL

Os instrumentos similares estão inseridos em uma diferente lógica urbanística, mas

todos visam atuar em escala reduzida à da cidade, com o objetivo de aproximar o debate da

sociedade e permitir um maior detalhamento das etapas, não apenas indicando parâmetros e

índices, mas também propondo e especializando um projeto urbanístico e intervindo em nível

do lote. Ou seja, espacializando os resultados esperados com a lei. Outro elemento, é que estas

experiências são vinculadas a uma legislação base, de escala mais ampla à do setor, buscando a

redução da fragmentação da cidade.

A unidade territorial que cada instrumento adotou depende da configuração político

administrativa. No caso de Portugal, este adota uma Unidade Operativa de Planejamento e

Gestão, a partir de uma freguesia. Na França, a ZAC utiliza os arrondissements – divisão

administrativa do município. Ambas as experiências internacionais delimitam setores

obedecendo a uma demanda urbanística e se realizam independente dos limites administrativos.

27

Plano de Bairro em São Paulo, Unidade Especial de Planejamento (UEP) no Rio de Janeiro e Operação

Urbana Consorciada em Natal. 28

Plano Sectorial, Planos de Urbanização, Planos de Pormenor em Portugal; Zone d’Amenagement

Concerté (ZAC) na França.

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43

As experiências brasileiras têm como unidade territorial o bairro e se apropriam dos

limites desta para cumprir os objetivos propostos. Nestas experiências nem todos os projetos

urbanísticos se apropriaram de toda a dimensão da unidade territorial, mas esta foi mantida para

auxiliar o planejamento e o ordenamento de uso.

Os critérios de definição dos limites de cada setor ou unidade territorial foram

principalmente áreas que demandam alterações urbanísticas. A Unidade Especial de

Planejamento – UEP, tem como critério de delimitação, “um ou mais bairros em continuidade

geográfica e definida por analogias físicas ou urbanísticas, sendo indicadores de integração e

compartimentação” (RIO DE JANEIRO, 1992 Art.42).

A UEP, assim como o Plano Setorial, traz também a dimensão ambiental como critério

de definição do limite dos setores, através das bacias hidrográficas. A importância deste critério

se vincula à garantia do direito à cidade e do cumprimento da função socioambiental da

propriedade.

Todas as experiências analisadas foram aplicadas em áreas ocupadas com intuito de

recuperar ou desenvolver transformações urbanísticas. O Plano de Pormenor e o Plano de bairro

têm clara a demanda por compatibilizar a infraestrutura ao que já existe e ao que está sendo

planejado de crescimento para o espaço.

Quanto às etapas e procedimentos observa-se uma demanda por um relatório que

informará sobre as fases da experiência – ZAC, (Figura 6); um termo de elaboração (plano de

bairro) que contém normas, princípios para elaborar o setor e a metodologia: o que deve constar

e como se deve executar. As experiências internacionais adicionam a cobrança pela

espacialização da proposta (Figura 5).

As experiências brasileiras demandam quadro de obras, orçamento, mas nem sempre

vinculados à lei (Quadro 2).

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Figura 5. Divisões dos Planos de Pormenor, em Lisboa.

Fonte: ZARAGOZA, 2007.

Figura 6. Limites da ZAC Évangile.

Fonte: APUR, s/data. 155p

Quanto a desenhar a proposta, o Plano de Pormenor em Lisboa tem exigência de um

conteúdo material que consta: da definição e caracterização da área de intervenção,

identificando, quando se justifique, os valores culturais e naturais a proteger; a situação

fundiária da área de intervenção, procedendo, quando necessário, à sua transformação; o

desenho urbano, exprimindo a definição dos espaços públicos, de circulação viária e pedonal,

de estacionamento, bem como do respectivo tratamento, alinhamentos, implantações,

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modelação do terreno, distribuição volumétrica, bem como a localização dos equipamentos e

zonas verdes; a distribuição de funções e a definição de parâmetros urbanísticos,

designadamente índices, densidade de fogos, número de pisos e cérceas; indicadores relativos às

cores e materiais a utilizar; as operações de demolição, conservação e reabilitação das

construções existentes; a estruturação das ações de adequação compensatória a desenvolver na

área de intervenção; a identificação do sistema de execução a utilizar na área de intervenção

(PORTUGAL, 2003. Grifo próprio).

Como conteúdo documental o plano de Pormenor é constituído pelo regulamento, pela

planta de implantação e, pelas plantas de condicionantes. Acompanhados do relatório

fundamentando as soluções adotadas, de textos e representações gráficas que apresentem as

transformações fundiárias previstas, para efeitos de registro predial. Assim como do

programa de execução das ações previstas e de seus planos de financiamento. Os demais

elementos que acompanham o plano de Pormenor são fixados por Portaria do Ministério das

Cidades, Ordenamento e Território e Ambiente. Para os espaços rurais são fixados por portaria

conjunta com a Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas (PORTUGAL, 2003. Grifo

próprio).

Esse conteúdo, seja ele documental ou material, é orientado pelo Termo de Referência,

inserido no Quadro 2. Observa-se neste grupo de exigências que a espacialização é importante

em todas as etapas, fomentando o debate, e também para atualização do registro predial. Ou

seja, desenha-se o cenário que será composto com a proposta, quais são os lotes que serão

utilizados, modificados ou retirados. Neste sentido, a proposta chega ao nível de detalhamento

do lote, não apenas à indicação de quadras ou zoneamento.

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Quadro 2. Síntese do documento: Termos de Referência do proposto Plano de Pormenor

Título Descrição

Enquadramento legal do Plano Legislações às quais se remete o Termo

Enquadramento territorial da área de

intervenção Legislação incidente na área e seus limites

Oportunidade da elaboração do Plano Justificativas e Problemática

Antecedentes Propostas e estudos na área

Enquadramento nos instrumentos de gestão

territorial

Refere-se aos instrumentos apresentados no

PDML na Classificação do Espaço Urbano, aos

componentes ambientais urbanos, as unidades

operativas de planejamento, ao Inventário do

Patrimônio, à Planta de Condicionantes e Outras

Servidões e Restrições de Utilidade pública.

Condicionantes legais

O Plano deverá atender aos traçados da linha de

Metropolitano e do caneiro de Alcântara e às

respectivas condicionantes bem como à servidão

militar e aeronáutica a que está sujeito por ser

abrangido pela Zona 6 de proteção ao aeroporto.

Base programática para o desenvolvimento

da solução urbanística Objetivo principal e objetivos específicos

Conteúdo material e documental do plano O que deve apresentar

Fases e prazos para a elaboração do plano Fases e prazos

Constituição da equipe técnica do plano e

equipe de acompanhamento interno

Coordenação e Acompanhamento interno do

PP, cabendo ao Departamento de Planejamento

Urbano, no âmbito da DCIP – Divisão de

Coordenação dos Instrumentos de

Planejamento, além de consultores externos,

caso necessário e de uma equipe técnica

multidisciplinar.

Planta de localização, extratos das plantas do

PDML e ortofotomapa Não aparecem anexas ao documento

Fonte: Produzido pela autora com base no Plano de Pormenor: Termos de Referência da Praça

Espanha e Av. José Malhoa, 2004

O Plano de Pormenor permite a divisão de peças escritas e peças desenhadas, conforme

indica o Quadro 3. As peças necessárias variam segundo o local e a demanda, entretanto, as

experiências já executadas permitem um banco de possibilidades e ferramentas possíveis de

serem aplicadas e adaptadas às realidades de cada localidade. O pedido de animação

tridimensional auxilia na apresentação e divulgação da proposta, entretanto, deve-se ter o

cuidado de o plano apresentar um quadro de impactos e de custos-benefícios da proposta em

uma perspectiva de anos e para os moradores locais.

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Quadro 3. Constituição do Plano de Pormenor da Artilharia Um, Praça de Espanha e Av.

José Malhoa

Peças escritas Regulamento;

Relatório do Plano;

Programa de execução e financiamento;

Relatório do estudo de circulação e rede viária;

Relatório do estudo de condições ambientais e acústicas.

Peças desenhadas / Plantas

Planta de Implantação com delimitação da área de intervenção,

com definição da estrutura do parcelamento fundiário a

realizar, com a locação dos equipamentos existentes ou

propostos e indicação dos edifícios a demolir;

Planta de condicionantes;

Planta do existente;

Ortofotomapa;

Planta de classificação do espaço urbano;

Planta de proposta de alteração da classificação do espaço

urbano;

Componentes ambientais;

Planta do inventário do patrimônio municipal;

Planta de enquadramento;

Planta do cadastro existente;

Planta de conforto e segurança urbana;

Carta de ruído;

Planta de transformação cadastral;

Planta de distribuição de usos;

Cortes – seções transversais mais significativas;

Esquema de piso;

Planta da rede viária e circulação; planta de estacionamento;

Acessos de emergência;

Planta de apresentação;

Plantas de infraestruturas;

Animação tridimensional, em suporte digital, dos percursos e

sítios principais;

Maquete (LISBOA, 2005)

Fonte: base de dados de Lisboa, 2005

A documentação da Unidade Especial de Planejamento, no Rio de Janeiro, demanda

mais uma questão legal existente no local:

I - a delimitação das Zonas e Áreas de Especial Interesse, definido os

usos permitidos;

II - a fixação de índices de Aproveitamento do Terreno e seus

parâmetros urbanísticos;

III - a fixação de índices e parâmetros urbanísticos para as edificações,

compreendendo, entre outros:

a) altura máxima das edificações;

b) área mínima útil de unidade edificável;

c) taxa de ocupação;

d) número máximo de pavimentos das edificações;

e) área total edificável, entre outros;

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IV - restrições que incidam sobre as edificações ou atividades

existentes que não mais satisfaçam as condições da Zona ou Área de

Especial Interesse em que se situam;

V - a relação dos bens tombados ou preservados, com suas respectivas

áreas de entorno;

VI - o quadro de atividades relativo aos usos permitidos para as

diversas zonas, número de vagas de garagem e a área mínima

destinada à recreação. (RIO DE JANEIRO, 1992 Art.74)

A participação popular é identificada em todas as experiências, com exceção da ZAC,

por não constar essa informação nas referências utilizadas. Os instrumentos que deram mais

ênfase a este elemento são os Planos de Pormenor, o Plano de Bairro e a UEP, que tem escalas

em nível microlocal. A maior parte das experiências tem etapas de concertação, entretanto, não

demandaram nos documentos a leitura social, conforme observado nas exigências pela leitura

técnica.

A união dos procedimentos observados nestas experiências similares resulta na seguinte

composição: conceitos, leituras da área, mapas, limites – como estabelecê-los e quais foram

definidos, sistema de gestão, sistema de parcerias, quadro estratégico, projetos e cenários para a

área; Termos de elaboração, leis, índices e parâmetros, relatórios, regulamentações, contratos,

avaliação de impacto, programas de atendimento econômico, social e ambiental, sistema de

avaliação. Além disso, observa-se a indicação de princípios de elaboração, subordinação do

instrumento (inserção na política atual de cada localidade – Plano Diretor), acompanhamento e

conciliação (conciliação de conflitos identificados na área e da leitura técnico/social),

participação da sociedade em todas as etapas, incluindo aprovação e revisão da lei. Como

síntese destas experiências similares ao Plano Setorial observa-se o Quadro 4.

Vistas essas experiências, colocam-se a seguir reflexões sobre a inserção de projetos

urbanísticos no Plano Setorial.

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Quadro 4. Síntese das experiências similares ao Plano Setorial.

Experiências/

Parâmetros

Experiências Internacionais Experiências Nacionais

Plano de Pormenor Zone d’Amenagement

Concerté Plano de Bairro Unidade Especial de Planejamento

Localização Portugal/Lisboa França/Paris Brasil / São Paulo Brasil / Rio de Janeiro

Siglas PP ZAC - UEP

Escala de

intervenção Local a nível microlocal Local a nível microlocal Local a nível microlocal

Local a nível microlocal, podendo atingir

nível mesolocal

Legislação

Base

Decreto-Lei 380/99 e Decreto-

Lei 310/2003 / Plano Diretor

Municipal de Lisboa e Normas

de Procedimento da Comissão

de Coordenação e

Desenvolvimento Regional de

Lisboa e Vale do Tejo

Plan d´Amenagement de Zone

e na Política urbana de Paris

Plano Diretor Estratégico de São

Paulo, Lei nº 13.430 e LEI nº

13.885

Plano Diretor do Rio de Janeiro, Lei

Complementar nº16/1992

Definição

Plano de ordenamento do

território

Zonas de operação urbanística

em conjuntos urbanos de

pequenas e médias dimensões.

Instrumento da política urbana

brasileira. Identificadas e apontadas

como soluções frequentes a

questões urbanísticas em escala de

bairro, trazendo a aproximação

destas com a comunidade leiga.

Unidade de Planejamento urbano

municipal. UEP e o PEU, compõem uma

solução de integração do projeto urbano,

com o planejamento e implementação de

parâmetros urbanísticos.

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50

Continuação do Quadro 4. Síntese das experiências similares ao Plano Setorial.

Experiências/

Parâmetros Plano de Pormenor

Zone d’Amenagement

Concerté Plano de Bairro Unidade Especial de Planejamento

Objetivo

Geral

Desenvolver e concretizar

propostas de organização

espacial, definindo a concepção

da forma de ocupação e servir de

base aos projetos de execução de

infraestrutura, arquitetura e

espaços exteriores.

Recuperar espaços públicos,

construir habitações e novos

equipamentos.

Alcançar transformações

urbanísticas de controle a expansão

de novas edificações e a saturação

da infraestrutura existente.

Controlar os uso e ocupação do solo e as

ações administrativas para as UEP.

Unidade

Territorial

adotada

Unidade Operativa de

Planejamento e Gestão.

Freguesia

Subdivisões do município

(commune) de Paris,

arrondissements.

Bairro Bairro

Critério

principal de

delimitação

do setor

Qualquer parte do território

municipal em estado de

transformação urbanística

relacionada a uso, salubridade e

áreas verdes da cidade. Exigindo

área de intervenção mínima por

quantidade de hectare.

Áreas predefinidas no PAZ,

com usos diversos, sobre os

tecidos constituídos em áreas

degradadas.

Macroárea de Urbanização

Consolidada, Macroárea de

Urbanização em Consolidação,

bairros com origem em loteamentos

ilegais, áreas públicas apropriadas

indevidamente.

Um ou mais bairros em continuidade

geográfica e definida por analogias físicas

ou urbanísticas, sendo indicadores de

integração e compartimentação e pela

inserção na bacia hidrográfica.

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Continuação do Quadro 4. Síntese das experiências similares ao Plano Setorial.

Experiências/

Parâmetros Plano de Pormenor

Zone d’Amenagement

Concerté Plano de Bairro Unidade Especial de Planejamento

O que consta

Conteúdo Material;

Conteúdo Documental;

Princípios de Elaboração;

Acompanhamento e

conciliação;

Participação;

Aprovação e Revisão

Relatório (projeto e um

regulamento)

Planta local

Mapa dos limites ou

perímetros da área de

intervenção

Avaliação de impacto

Termo de elaboração, participação

da comunidade, aprovação, revisão

Projeto de Estruturação Urbanística e um

o quadro de atividades relativo aos usos

permitidos para as diversas zonas, número

de vagas de garagem e a área mínima

destinada à recreação.

Etapas

Procedimento de

deliberação, seguindo do

acompanhamento de

técnicos, fase de

Concertação,

Participação/Discussão

Pública, fase do Parecer

final, seguido pela

aprovação, finalizando

com a ratificação ou

Registro e Publicação.

Gestão

Elaboração, aprovação,

implantação

Elaboração, Aprovação,

implantação

Elaboração, Aprovação, implantação

Responsabilidade

Administrativa

Câmara Municipal e

comissão de coordenação

e desenvolvimento

regional

Conselho de Paris e Prefeitura Subprefeitura Prefeitura

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Continuação do Quadro 4. Síntese das experiências similares ao Plano Setorial.

Experiências/

Parâmetros Plano de Pormenor

Zone d’Amenagement

Concerté Plano de Bairro Unidade Especial de Planejamento

Gestão Grupo técnico e Comissão

mista de coordenação Pública e Privada (ex. SAGI) Subprefeitura Prefeitura

Participação

Popular

Segundo Decreto-Lei 380/99 e

Decreto-Lei 310/2003 –

Da elaboração até a gestão

Nada consta Devem ser elaborados com a

participação da sociedade local

Assegurada pela representação de

entidades e associações comunitárias em

grupos de trabalho, comissões e órgãos

colegiados, em todas as etapas.

Instrumentos

Relacionados

Equilíbrio e repartição de usos

(em porcentagem),

alinhamentos e cérceas,

profundidade de empenas,

cedências e compensações,

IUB – Índice de Utilização

Bruto, Índice de Utilização

Liquido – IUL, alínea ou

alinhamento, Índice de

Ocupação – IO, Superfície

impermeabilizada, Cota de

Soleira. Registro predial.

Zoneamento e inst. de

regularização fundiária.

Zoneamento, desapropriação,

concessão de uso de solo

criado.

Outorga onerosa do direito de

construir, zoneamento restritivo,

projetos estratégicos de

requalificação, IPTU Progressivo

no Tempo e outros instrumentos

previstos na Lei Federal nº

10.257/01

Índices de Aproveitamento do Terreno e

seus parâmetros urbanísticos; Zonas

Especiais; parâmetros urbanísticos para as

edificações; zoneamento e controle de

usos.

Parceria Público e Privado Público e Privado Público e Privado Público e Privado

Fonte: FURUKAVA, 2009.

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2.3 PLANO SETORIAL E A DIMENSÃO URBANÍSTICA: OS

PROJETOS NAS EXPERIÊNCIAS SIMILARES

No Plano Diretor de Natal, o Plano Setorial indica soluções urbanas, compatibilizando o

adensamento e infraestrutura de suporte à dinâmica do mercado e à implantação de grandes

projetos públicos e privados previstos (NATAL, 2007). Neste sentido, e em consonância com os

estudos desenvolvidos em 200929

, foram realizadas aproximações ao Plano Setorial na dimensão

de projeto urbanístico vinculado a um planejamento a curto e médio prazo. Além disso, foi

observado um desafio de gestão de integração de planos, projetos e instrumentos e na

compatibilização deste ao adensamento.

A verticalização30

dos projetos e leis foi um procedimento apresentado, identificado

como elemento fundamental segundo as experiências similares e que permite aos atores

envolvidos se precaverem de possíveis impactos e tomadas de decisão, como compatibilizar os

sistemas de infraestrutura aos projetos urbanísticos, aos planos e programas e ao crescimento do

setor e da cidade. Possibilitou também aos gestores desenvolverem medidas de conciliação e

parâmetros que minimizassem os impactos que caminham em direção oposta aos princípios

estabelecidos na Carta Magna.

O planejamento e a gestão são elementos fundamentais para se orientar as práticas de

construção das cidades, mas que, por si sós, não são capazes de resolver todos os problemas

urbanos. Esses novos formatos, pós Constituição Federal (1988), não excluem dados e deveres

antigos por parte do ente público, e cobram a atualização constante, informatizada e

transparente, principalmente para monitorar e gerenciar as práticas do mercado nas cidades,

permitindo que os projetos urbanísticos e o solo sejam voltados aos interesses da coletividade.

Em consonância com o entendimento de Silva e Bastos (2011),

[...] se ratifica a afirmação de Cladera (2001), quanto à necessidade das

avaliações não só econômica, financeira, urbanística, ambiental, mas também

do valor social dos projetos e planos urbanísticos e imobiliários, mesmo

levando-se em consideração as inúmeras limitações teóricas e práticas que

essa atividade apresenta. Tais estudos de viabilidade devem ser realizados,

não só para maximizar o valor social da cidade, mas também devem buscar

novas concepções de viabilidade que permitam a agregação de outros

valores. As novas concepções devem enfatizar a natureza complexa do valor

social dos espaços urbanos, públicos e privados, reproblematizar o

29

FURUKAVA, Camila. Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como instrumento do Plano Diretor.

Trabalho apresentado como atividade final de graduação no curso de Arquitetura e Urbanismo.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2009. 30

Verticalização compreendida aqui como uma espacialização do que está sendo sugerido em lei, em

formato de desenho ou projeto arquitetônico e urbanístico em três dimensões.

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significado dos valores tradicionais e, principalmente, a viabilidade de

utilização de instrumentos de recuperação das mais-valias que o

planejamento gera (SILVA E BASTOS,2011:5).

A transparência da prática de estudo prévio - atualização dos dados existentes no setor,

proposição de possíveis cenários, prospecção de adensamento e a verticalização das propostas -

orienta debates mais claros com a sociedade. Aos gestores, orientam a emissão de licenças, a

aplicação de planos e projetos e o estabelecimento de índices urbanísticos.

As experiências similares remetem a intervenções urbanísticas, em especial sobre a rede

de infraestrutura. Para Juan Luis Mascaró infraestrutura urbana é

[...] um sistema integrado com as edificações; sistema que não é estático, mas

evolutivo através do tempo. Quando compreendidas essas características, é

possível escolher a tecnologia que mais se adéquam para a construção das

redes, inclusive progressivamente, o que é muito diferente de abaular

simplesmente uma rua e deixar as sarjetas funcionarem como esgoto a céu

aberto. A tecnologia de implantação progressiva da infraestrutura implica na

solução, dentro de seus limites, de todos os serviços que uma área urbanizada

precisa ter para funcionar como tal (MASCARÓ, 1991:22).

Ainda segundo o autor, para uma área urbanizada funcionar como tal, a infraestrutura

básica deve proporcionar acesso permanente de pedestre e veículos desde e até as habitações;

abastecimento de água potável e para higiene; evacuação de água usada de forma não

contaminante; abastecimento de energia elétrica (MASCARÓ, 1992).

Três elementos são notórios à instalação de projetos urbanísticos de infraestrutura: (i)

valorização do solo; (ii) uma maior atração de adensamento na área (tanto espacial quanto

demográfico); (iii) a complexidade na ampliação do suporte destas redes, em especial o sistema

viário (OLIVEIRA, 2010; MASCARÓ, 1992).

Estes elementos demandam dos gestores públicos a aplicação de instrumentos

redistributivos, de regularização fundiária e de combate à especulação imobiliária, orientados

pelo princípio da função social da propriedade e o direito à cidade, e compatibilizados com as

perspectivas de crescimento para a área.

Na prática, os projetos urbanos não são aplicados em toda a cidade, acentuando os

problemas sociais existentes - a fragmentação e a diferença de valorização do solo. A exemplo

disto: “a ocupação irracional do solo urbano, que deixa áreas vazias ou pouco adensadas nas

áreas mais centrais e ocupa periferias mais distantes é resultado da dissociação entre o

planejamento do transporte, a ocupação do solo e a especulação fundiária não controlada” -

(MINISTÉRIO ..., 2004: 22).

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Portanto, são elementos dos planos e projetos urbanos, relevantes ao Plano Setorial, à

verticalização da lei e das propostas, a composição de cenários e a prospecções para a área, a

transparência na gestão dos planos e projetos e a compatibilização destes com instrumentos do

Plano Diretor e com o suporte e a atualização das redes de infraestrutura urbana, tendo como

referência a capacidade deste setor em absorver o adensamento proposto com a intervenção.

Ao buscar ter uma melhor visualização das etapas dos projetos urbanísticos e

arquitetônicos, com foco na operacionalização do Plano Setorial, observa-se o Quadro 5, que

contempla, assim como os quadros sobre infraestrutura, etapas básicas desse sistema.

As experiências similares, através da instituição de planos, projetos e instrumentos,

colocam em evidencia a discussão sobre a escala, a unidade de planejamento e o sistema de

gestão. Nesse sentido, apresentam-se a seguir referências para o projeto urbanístico no âmbito

do Plano Setorial.

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Quadro 5. Dados básicos sobre o sistema de projeto urbanístico e projetos arquitetônicos.

Rede de

infraestrutura

Etapas simplificadas do

sistema:

Etapas urbanísticas: Dados e relações básicas sobre o

sistema:

Informações que se obtêm com este dado

Projetos

urbanísticos

Identificação do problema;

Discussão com a sociedade;

Proposta de projeto

urbanístico e legal

(legislação, orçamento e

parcerias);

Discussão com a sociedade;

Alterações no projeto;

Discussão com a sociedade;

Realização das obras;

Acompanhamento e

monitoramento;

Manutenção;

Avaliação

Impacto no sistema

viário; quantitativos:

vagas de

estacionamento; tipo de

usos que serão

incentivados;

acessibilidade e

mobilidade;

Coeficientes e

parâmetros urbanísticos;

Incentivos e restrições;

Instituição de

instrumentos

urbanísticos.

Projeto;

Histórico do projeto;

Banco de dados;

Orçamento;

Contratos – público-privado;

Custos despendidos;

Tempo de obra;

Histórico dos entraves;

Demandas sociais atingidas;

Avaliação da experiência à luz do

Estatuto da Cidade;

A demanda sobre os sistemas de

infraestrutura.

O histórico dos entraves das experiências

permite evitar que os erros de um projeto se

repitam em outros e identifica falhas ou

etapas em que pode haver redução de custo;

Nesse quesito a compreensão dos dados

permite uma interoperabilidade com

programas e projetos pensados para a cidade

– habitação, transporte, entre outros.

Esse é o principal item de negociação entre o

público e o privado, deve ser considerado se

os princípios constitucionais estão sendo

atendidos e se está sendo capturada, pelo

Poder Público, a mais valia gerada.

Projetos

arquitetônicos

Desenvolvimento do

projeto segundo

condicionantes legais;

Licenciamento;

Alvará;

Construção;

Habite-se;

Reformas;

Ampliações;

Mudanças de uso.

Impacto no sistema

viário; quantitativos:

vagas de

estacionamento; tipo de

usos que serão

incentivados;

acessibilidade e

mobilidade; demanda

sobre o sistema de

infraestrutura –

quantitativamente e

qualitativamente.

Tipo de uso;

Densidade que gerará;

Impactos de vizinhança;

Numero de vagas de estacionamento;

Estudo dos fluxos;

Contrapartidas geradas;

A demanda sobre os sistemas de

infraestrutura.

Crescimento dos setores e da cidade;

Projeção das redes de infraestrutura;

Impactos de vizinhança e de conforto da

cidade;

Fonte: elaborado pela autora, 2011.

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57

Durante o desenvolvimento do estudo, foram identificados três parâmetros fortemente

presentes nas discussões sobre o Plano Setorial em Natal/RN (2006-2009), que tem incidência

direta sobre projetos urbanísticos e o planejamento das cidades: escala, unidade de planejamento

e gestão.

Sobre escala foi observado nas experiências que há escalas em nível de investigação dos

fenômenos e processos (CORRÊA, 2011), escala de intervenção projetual (FURUKAVA,2009)

e escala voltada ao planejamento e à gestão (SOUZA, 2008). São diferentes tipologias de

escalas que atuam em mesmo nível e que devem ser tratadas concomitantemente nos setores,

cidades, países, visando à totalidade das relações e variando segundo o foco desejado. Todas as

tipologias de escala apresentam variações internas de níveis que se relacionam.

Nada pode ser explicado apenas numa escala, mesmo que estejamos nos

referindo à escala internacional. Toda a compreensão requer a articulação

entre as escalas, ou seja, a avalição dos modos, intensidades e arranjos,

segundo os quais os movimentos se realizam e as dinâmicas e processos se

desenvolvem, combinado interesses e administrando conflitos que não se

restringem a uma parcela do espaço, mesmo quando os sujeitos sociais, que

têm menor poder aquisitivo, parecem atados a territórios relativamente

restritos. (SPOSITO, 2011:130)

Um ponto de fragilidade desse sistema de redução da escala de planejamento é a

dificuldade de integração dos setores, dos elementos identificados em cada um, reconstruindo a

visão global da cidade, do Plano Diretor. Pontos positivos são a aproximação da sociedade no

debate, o que permite um maior monitoramento das atividades desenvolvidas pelo poder público

e a leitura integrada das áreas especiais.

Mediante a complexa discussão sobre escalas, identificou-se que a escala de intervenção

ou de investigação, vai além do estabelecimento de limites territoriais, o que leva a compreender

que são necessários outros critérios para a delimitação de setores, além da unidade de

planejamento do bairro (limite administrativo estabelecido pelo município). Neste sentido,

observou-se a inserção dos bairros nas bacias hidrográficas na experiência do Rio de Janeiro

(UEP) e a demanda por projetos de reestruturação urbanística (ZAC, PP e PB).

As bacias hidrográficas são um conjunto de terra que fazem a drenagem da água das

precipitações para o curso das águas e seus afluentes. Sendo assim, se não compatibilizado com

as redes de infraestrutura pode gerar infiltrações que atingem diretamente o lençol freático, rios,

lagos e mares comprometendo a questão ambiental e a qualidade de vida da população, não

mantendo a sustentabilidade das cidades.

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Compreender a capacidade de suporte das bacias em relação ao adensamento, à

localização geográfica e aos tipos de uso e ocupação do solo, gera elementos para gestão e

planejamento das cidades e para o estabelecimento de incentivos ou restrições de ocupação e

morforlogia, tanto das habitações quanto das obras e projetos de infraestrutura, assim como das

tecnologias adotadas. Entretanto, este critério, se adotado com exclusividade, sem considerar os

limites dos bairros, pode trazer dificuldades de apropriação do espaço pela sociedade,

dificultando o debate (FURUKAVA, 2009).

Nas experiências internacionais apresentadas no quadro 4 – Plano de Pormenor e Zone

d’Amenagement, cada setor tem um comitê gestor continuado e trabalham através de parceria

público-privada ou com investimentos privados, seguindo algumas regulamentações públicas.

Os investimentos são alocados por setor, segundo orçamento próprio e podem ou não ter

participação pública. Trabalhar neste sentido exige um texto regulatório que demonstre etapa

por etapa do que deve ser realizado e uma fiscalização pública e social sobre os procedimentos e

resultados, buscando a construção da cidade justa e sustentável. Assim, estes cobram peças

escritas – normas, cronograma de obras e orçamentos – e representações gráficas que vão do

nível urbano ao arquitetônico: projetos e volumetrias.

Nas experiências nacionais – Plano de Bairro e Unidade Especial de Planejamento,

foram observadas parcerias público-privadas. Nestas, os municípios de São Paulo e Rio de

Janeiro respectivamente trabalharam com altos investimentos e foram responsáveis diretos por

prover infraestrutura básica.

Como o sistema de infraestrutura é precário e defasado na maioria dos municípios

brasileiros esses investimentos se tornam ainda maiores, sendo necessários procedimentos de

regulamentação que auxiliem na captura dos recursos aplicados na área e o estabelecimento de

estratégias que evitem que os altos custos sejam repassados para a população menos favorecida

financeiramente (ROLNIK, 2005).

No quadro nacional, as escalas administrativas se comunicam para executar os

procedimentos básicos, elevar a eficácia das ações e explorar as possibilidades de

complementariedade,

A gravidade desse quadro pode ser percebida quando se constata que 83.4%

dos municípios tem até 30mil habitantes e possuem baixa ou nenhuma

capacidade de investimento em saneamento. Não restam duvidas de que o

papel da União é de fundamental importância para atribuir efetividade aos

investimentos visando à universalização dos serviços de saneamento, isto é,

alocando os recursos de forma eficaz onde realmente se encontra a demanda

(MINISTÉRIO .... 2004b: 22).

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Nacionalmente as etapas que serão desenvolvidas para cada setor ainda são frágeis, pois

este não está inserido na legislação como parte obrigatória desta, diferente das experiências

internacionais analisadas, onde cada setor é condicionado a uma base de projeto, cronograma e

orçamento específico.

Foi identificado que, uma forma de minimizar a fragmentação provinda da separação da

cidade em setores era a vinculação da lei com o desenho e a verticalização do que está sendo

proposto, facilitando assim a transparência, a integração e compatibilização com o global, o

municipal.

Portanto, são parâmetros de leitura de projetos urbanísticos, com aproximação do Plano

Setorial: uma escala que mesmo variável dialogue e seja subordinada ao Plano Diretor,

possibilitando uma leitura totalitária da cidade e não fragmentada; a unidade de planejamento

como bairro, observando critérios morfológicos e ambientais; uma gestão democrática segundo

o Estatuto da Cidade (2001), com participação popular e transparência, em todas as etapas,

incluindo a orçamentária e de parcerias.

2.4 AS EXPERIÊNCIAS DE CONSTRUÇÃO DO PLANO SETORIAL

NO PLANO DIRETOR DE NATAL: PRIMEIRAS ABORDAGENS

METODOLÓGICAS

A interação entre setores e dados é um desafio na elaboração de planos, programas e

projetos e no exercício da gestão pública, visando conferir maior grau de adequação entre

propostas e a realidade na qual se quer intervir. Um fator relevante desta interação é que ela é

necessária para a redução do quadro brasileiro de desigualdade social e da falta de infraestrutura

na ocupação do território, na medida em que isto onera os custos de urbanização, aumenta os

prejuízos sociais e ambientais e cobra do Poder Público uma urgência na execução dos

programas e projetos para garantir a condições de vida dos cidadãos.

Em função da velocidade da expansão urbana, no despreparo das

administrações públicas, e da falta de recursos para investimentos nos

últimos anos, as ocupações urbanas ocorreram até hoje de forma

desordenada, na maioria das vezes em desacordo com os padrões urbanísticos

e ambientais, de maneira que as intervenções em infraestrutura urbana

acabam sendo implantadas com grande atraso e executadas de forma

inadequada. A rigor, as estruturas administrativas e organizacionais

vinculadas à gestão da política urbana foram criadas de acordo com as

contingências de cada momento, ajustando-se da melhor forma à conjuntura,

sem, contudo, dar-se por um planejamento adequado, ou de maneira

otimizada, como requer a boa prática da administração. Consequentemente,

os registros de informação de infraestruturas urbanas se organizam de forma

segmentada, na maioria das vezes armazenando burocraticamente, apenas

para o cumprimento de uma rotina. A consciência de que a informação

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padronizada e interligada favorece a organização urbana, o planejamento e a

racionalização dos custos é uma visão ainda a ser adquirida (CADERNO

MCIDADES, 2004: 17).

Com o princípio do direito à cidade e da função socioambiental da propriedade,

observa-se uma nova lógica de formatação do projeto de Política Urbana, estruturada na

habitação e no acesso universal ao serviço público, como elementos fundamentais à cidadania.

Isto se dá, por meio da integração de setores como habitação, saneamento ambiental, trânsito,

transporte, mobilidade urbana, planejamento, gestão territorial e fundiária. (MINISTÉRIO...,

2004b).

Assim, compreende-se que alguns elementos podem facilitar a interação das diversas

dimensões que envolvem o planejamento, destacando-se no nível do Plano Setorial, os

seguintes: a) os dados e projetos atualizados sobre cada setor, atuando em uma mesma

linguagem computacional; b) a compatibilização dos dados e projetos de cada setor

internamente e a integração dos setores, na produção de dados gerais sobre a cidade; c) uma

legislação clara e espacializada; d) a gestão integrada nas diversas escalas, à luz do Estatuto da

Cidade; e) a participação, o controle e o ativismo social; f) políticas públicas integradas ao

orçamento urbano; g) uma leitura socioambiental, econômica, política e cultural, transversal e

interdisciplinar dos setores; h) a transparência e publicização dos dados produzidos, com fácil

interface.

A demanda de integração entre as variáveis aqui analisadas foram evidenciadas no

relatório de saneamento ambiental, do caderno do Ministério das Cidades, quando este

apresentou uma leitura transversal sobre saneamento e impactos da urbanização.

A proposta da política de saneamento ambiental se orienta por uma nova

forma de conceituar a política urbana e sua intersetorialidade. A noção de

salubridade ambiental que deve orientar o planejamento, a organização, os

novos investimentos e a prestação dos serviços de saneamento básico, traz

implícita a promoção da saúde pública e a integridade do meio ambiente e

estabelece a interface necessária com o desenvolvimento urbano, em

particular, com a gestão do uso e da ocupação do solo. A existência ou não

de infraestrutura de saneamento, o padrão dos serviços de abastecimento de

água e de esgotamento sanitário, assim como a capacidade de resolução dos

problemas relacionados com os resíduos sólidos e o manejo de águas

pluviais, incidem diretamente no nível de desenvolvimento de uma cidade e

ou mesmo regiões. (MINISTÉRIO ..., 2004b: 22)

Assim, compreende-se que esta demanda extrapola o âmbito do Plano Setorial, mas o

insere em uma ferramenta que apresenta a potencialidade de diminuição do abismo de

integração entre as diversas escalas administrativas. No entendimento de que o Plano Setorial

trabalha com a articulação entre setores, de projetos e planos urbanísticos, de políticas

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habitacionais e de mobilidade, ao compatibilizar o adensamento à infraestrutura de suporte e

respeitando a inserção nas bacias hidrográficas, observa-se o seguinte esquema, que abrange um

resumo dessa relação.

Figura 7. Esquema do Plano Setorial e elementos de integração operativos

Fonte: Elaborado pela autora, 2011.

Esse esquema visa demonstrar a relação direta que os bancos de dados assinalados e os

que podem participar têm em formular uma leitura integrada da cidade; um compondo o outro

em mesmo nível. Assim, esses bancos alimentam e são alimentados pela gestão e pela vida

cotidiana. O desafio do Plano Setorial é operar com dados (planos existentes, projetos, políticas

e programas) em uma leitura transversal, visando otimizar a função socioambiental da

propriedade e aproximar a gestão da sociedade, no campo intersetorial e interno ao setor.

As experiências similares, com base em diferentes realidades, trazem uma série de

procedimentos comuns para serem observados na elaboração de um Plano Setorial, tanto como

instrumento, quanto na regulamentação dos setores (Quadro 4). Na criação do instrumento, as

experiências similares indicam elementos que transpassam a construção de um Plano Setorial:

a) A definição do conceito e dos objetivos do instrumento – todas as experiências

analisadas buscam a relação com diferentes planos, projetos e instrumentos previstos para a

área, inseridos em diversas escalas políticas e de planejamento. Além disso, indica claramente,

nestes itens, quais produtos se deseja atingir com o estabelecimento do setor;

b) A escala de intervenção – a maioria das experiências reduziu a escala de

planejamento com propósito de detalhar as estruturas existentes e embasar as decisões,

chegando a atingir, na regulamentação, representações espaciais e ordenamento do espaço. O

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Plano de Pormenor de Portugal, por exemplo, chegou a indicar, inclusive, proposições sobre

edificações;

c) Uma legislação base – embora haja uma redução na escala de planejamento das

experiências similares analisadas, todas elas se vinculam a uma legislação com escala ampliada,

para orientar, a partir de princípios e diretrizes, as propostas, buscando a não fragmentação da

construção da cidade.

São procedimentos necessários em uma regulamentação dos setores:

a) Indicação da unidade territorial adotada e o critério de delimitação do setor – as

experiências internacionais desvinculam a delimitação do setor de uma unidade territorial

política ou administrativa do município. As experiências nacionais vinculam a unidade

territorial do bairro, mesmo que a área, a receber intervenções físicas, não se configure no setor

em sua totalidade. Para a delimitação do setor leva-se em consideração: a questão ambiental

(bacias hidrográficas e suporte das redes de infraestrutura), a questão socioeconômica

(agrupamento de estruturas sociais e econômicas comuns), a reestruturação de uma área e a

concentração de habitações que necessitam de regularização fundiária.

Ter como critério de delimitação de um setor as bacias hidrográficas, associadas à

capacidade de suporte destas quanto ao adensamento, traz ao Plano Setorial uma diretriz

ambiental, eixo a ser seguido nas práticas e leituras dos setores. Além disso, a preocupação com

os recursos hídricos evita a poluição de mananciais; a sobrecarga do sistema evita alagamentos;

reduz custos da saúde pública; entre outros.

b) Geração de produtos, etapas e instrumentos utilizados – Todas as experiências

resultaram em uma lei que apresentou os efeitos esperados em cada intervenção e resultaram em

intervenção física, com proposta específica para o setor. Além da formulação de uma lei como

uma etapa, observou-se a elaboração de um relatório que tratava sobre cada fase, composto por

peças gráficas (quadros, tabelas, croquis de cenários, cenários, espacialização dos planos,

projetos e instrumentos em nível do lote) e peças escritas (termos de referências, leis,

documentos, relatórios das etapas). Ou seja, um banco de dados de construção do instrumento.

Alguns procedimentos foram identificados como comuns às experiências analisadas,

podendo aproximar o Plano Setorial ao Plano de Pormenor, com a etapa de deliberação, seguido

do acompanhamento de técnicos, fase de Concertação, Participação/Discussão Pública, fase do

parecer final e aprovação desse documento, finalizando com a ratificação ou Registro e

Publicação e gestão da área.

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Quanto aos instrumentos, todas as experiências direcionaram a aplicação dos

instrumentos especificados na legislação base, dentre eles o zoneamento de áreas (especiais ou

com características comuns), instrumentos de regularização fundiária e de recuperação e

distribuição da mais valia gerada pela instalação de infraestrutura (IPTU progressivo no tempo,

Outorga Onerosa do Direito de Construir). Experiências como Zone d’Amenagement Concerté

vislumbraram instrumentos de concessão de uso de Solo Criado e a Unidade Especial de

Planejamento, assim como a Operação Urbana Consorciada, apresentam a possibilidade de

definição de índices e parâmetros específicos para o setor, ao utilizar a legislação base e os

dados do setor para determiná-los.

c) Gestão democrática indicando responsabilidade administrativa, gestão, participação

social e parcerias – Todas as experiências definiram um grupo gestor para o setor. O Plano de

Pormenor apresentou a definição de Grupos Técnicos e Comissões Mistas de Coordenação. A

Operação Urbana Consorciada expôs a criação de um Conselho Gestor. Embora haja a

constituição desse grupo gestor de acompanhamento, nas experiências nacionais o poder

municipal é o responsável administrativo do setor.

Cada experiência definiu uma equipe de participação social inserida na construção da

regulamentação e procedimentos participativos. Todas as experiências utilizaram parceria

público-privada. Assim, conclui-se que as experiências similares, cada uma em seu nível de

observação, apresentaram elementos comuns, que indicam importância na observância desses

procedimentos para a construção do Plano Setorial. Possibilitou verificar que instrumentos

como Operação Urbana Consorciada podem fazer parte do escopo do Plano Setorial inserindo-

se nos objetivos de buscar implementar o conjunto dos instrumentos definidos no Plano Diretor

de forma articulada.

Considerando a revisão de experiências similares de Plano Setorial em outras

realidades, apresenta-se a seguir a experiência específica de construção do Plano Setorial em

NATAL/RN.

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CAPÍTULO III.

PLANO SETORIAL E A EXPERIÊNCIA DE

CONSTRUÇÃO DO INSTRUMENTO EM NATAL/RN

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65

3.1 MOMENTO LEGAL E URBANÍSTICO ANTERIOR AO PLANO

SETORIAL

Inicialmente, busca-se aqui situar brevemente a trajetória das experiências de

planejamento urbano em Natal, visando situar a fase em que se inseriu o Plano Diretor de Natal

de 2007 no qual o Plano Setorial, objeto do presente estudo, foi inserido.

Natal apresenta relatos de expansão planejada desde 1901, com o bairro Cidade Nova31

,

que representava “de fato, um espaço criado e planejado para atender aos anseios da elite

potiguar” (FERREIRA. et al, 2008:63). Em sequência a isto, as medidas de saneamento da

Administração de Omar O’Gray (1924-1929) e o Plano Geral de Sistematização de 1924,

propunham obras de arruamento, na pretensão de expansão da malha viária do bairro Cidade

Nova e apresentavam soluções aos problemas de drenagem do bairro da Ribeira (FERREIRA. et

al, 2008).

O Plano Geral de Obras (1935-1939) proposto pelo escritório Saturnino de Brito,

contemplava melhoramentos urbanos, abastecimento de água e esgotos sanitários. Grande parte

das intervenções foi executada e esta foi a principal ação de esgotamento sanitário, em relação à

porção que abarcou da cidade existente, até fins do século XX. Sobre o Plano Geral de Obras

destaca-se que,

A questão do saneamento não se restringia apenas ao aspecto sanitário, mas

abrangia a organização do espaço urbano, articulando as varias partes da

cidade e pensando a reforma, expansão e embelezamento, a partir da

racionalidade das redes do projeto de saneamento. Resultou, portanto, em um

plano geral que acabaria por influenciar até mesmo na educação da

população, ensejando novos hábitos de vida (FERREIRA. et al, 2008:151).

Em 1968, o Plano Serete fez um diagnóstico técnico da cidade e as proposições

consistiam no zoneamento e no estabelecimento de densidades para os bairros. Este Plano não

foi implementado, mas foi utilizado de base para a construção do primeiro Plano Diretor de

Natal. A partir de 1974 registrou-se o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI),

essencialmente tecnocrático, a exemplo dos Planos Diretores elaborados no País nesse período.

Nesta transição, e considerando as concepções modernistas sobre a cidade, predominam o

zoneamento de uso, com ênfase nas funções urbanas. Visualiza-se de forma muito restrita os

efeitos dos parâmetros urbanísticos definidos na lei sobre o espaço. Ou seja, há profunda

dificuldade de se compreender os efeitos da legislação sobre espaço. As indicações do PDDI de

1974 e o de 1984, assim como os planos anteriores, foram pouco aplicados nas cidades e o

31

Atualmente, consiste nos bairros de Tirol e Petrópolis.

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modelo segregacionista foi sendo mantido na expansão de Natal e, assim como no Brasil, isto

gerou uma demanda por Planos Diretores participativos.

Em 1988, com a retomada das discussões sobre a Reforma Urbana no País, foi realizada

a reforma constitucional de 1988. Após o período de reforma constitucional, entre 1988 e 1990

(Constituição Federal em 1988, Constituições Estaduais em 1989 e elaboração de Leis

Orgânicas em 1990), teve inicio a revisão dos Planos Diretores que naquele momento foram

identificados como “Planos Diretores de Reforma Urbana”. Neste período muitas prefeituras

não conseguiram atualizar seus Planos, diferentemente de Natal, que aprovou em 1994 um

Plano Diretor que inseriu novos instrumentos, tal como as áreas especiais de interesse

social - AEIS -, e utilizou a participação de grupos e organizações sociais, sendo um

marco para o país (DUARTE, 2011).

Mesmo nesta nova estrutura dos Planos Diretores, o crescimento de Natal continuou

gerando resultados sociais e espaciais segregacionistas, com algumas poucas ressalvas, como o

caso das AEIS e em particular a AEIS de Mãe Luiza, que teve a lei de uso e ocupação do solo

do bairro aprovada em 1995 (Lei n.4663). Em decorrência, permitiu, assim, a permanência da

população residente no local (DUARTE, 2011).

Com o Estatuto da Cidade – EC, 2001, os Planos Diretores tendem a incorporar uma

série de ferramentas e orientações para cumprir os princípios da função social da propriedade e

da gestão democrática estabelecidos na Constituição Federal (1988). Isto significa uma gama de

instrumentos de indução do desenvolvimento urbano, de financiamento da política urbana, de

regularização fundiária e de democratização da gestão urbana – que visavam possibilitar o

fortalecimento e a multiplicação de práticas de inclusão social e espacial. Neste sentido, os

Planos Diretores foram revisados e construídos segundo os instrumentos do EC.

Natal, em 2004, entrou na revisão do Plano Diretor de 1994 verificando-se a inserção do

Plano Setorial, instrumento não existente no Estatuto da Cidade, que foi legitimado na

aprovação do Plano Diretor de Natal (Lei Complementar 82/07) e no artigo 3032

da Constituição

Federal.

Considerando essa trajetória, delimitou-se o ano de 1994 como marco inicial da análise

do Plano Setorial no presente capítulo. Assim, referencia-se inicialmente o Plano Diretor de

Natal - Lei Complementar 07/94. Cabe lembrar que a proposta do Plano Setorial foi colocada

32

O art. 30 da Constituição Federal trata das competências dos municípios, sendo uma delas “legislar

sobre assuntos de interesse local” (BRASIL, 1988)

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apenas no período de revisão desse Plano, ou seja, entre 2004 e 2007, sendo inserido no Plano

Diretor aprovado em 2007 - Lei Complementar 82/2007.

O Plano Diretor aprovado em 2007 foi elaborado e aprovado dentro de procedimentos

participativos, entretanto, constata-se que ainda é muito frágil a inclusão na lei das demandas

identificadas pela sociedade.

Em período mais recente (2011-2012), durante as revisões e regulamentações de áreas

especiais contidas no Plano Diretor vigente, Lei Complementar 82/2007, identificou-se a

necessidade de melhor compreensão e visualização dos efeitos gerados pelos parâmetros

instituídos na Lei sobre o território. Ou seja, a produção de uma base de informações gráficas

tridimensionais que facilitassem a compreensão dos produtos propostos pela lei e a participação

social nos debates.

Observou-se também que apesar dos avanços verificados quanto à inserção de novos

instrumentos, voltados para o enfrentamento da segregação socioespacial e de exclusão nas

cidades, muitos desses persistiram e em alguns casos agravaram esta realidade, evidenciando o

grande desafio que se coloca para o planejamento da cidade 33

.

Na elaboração do Plano Diretor de 1994 foi formulada uma minuta de Lei do Plano

Diretor com participação dos diferentes segmentos sociais, sob coordenação da arquiteta e

urbanista Josenita Dantas. Esta minuta, e sucessivamente o Plano, buscaram garantir a função

social da propriedade, com foco nos instrumentos urbanísticos e jurídicos como ferramentas

reais de condução da política urbana local. De acordo com a minuta de lei,

Partindo de um compromisso assumido pelo Poder Executivo Municipal, em

consonância com as recomendações constitucionais, que garantem a

participação da população através de seus segmentos organizados, em todas

as fases do processo de elaboração e concepção do Novo Plano Diretor,

adotou-se uma metodologia de trabalho que utilizou o intercambio, como

parâmetro para subsidiar a análise das questões que envolvem o planejamento

e a definição de uma política urbana para Natal (NATAL, 1993 s.p.).

O Plano de 1994, aprovado na gestão do Prefeito Aldo Tinoco, teve como um dos

objetivos criar um sistema de planejamento de forma a incorporar as especificidades locais na

gestão da cidade. Contempla, portanto, em seus procedimentos, a apresentação e discussão dos

problemas e objetivos com a comunidade local, a fim de identificar problemas pontuais e

conferir medidas específicas em forma de lei.

33

Estudos como LIMA, 2001; ROLNIK, 2005; DUARTE, 2011.

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Em que pese o esforço de mobilização social na elaboração e aprovação do Plano

Diretor, não se verificaram desdobramentos dessa participação após a aprovação do Plano,

conforme analisa Dulce Bentes:

Apesar de ter havido momento de discussão pública no qual se verificou a

participação de seguimentos populares organizados, como foi o caso do

Seminário do Auditório da CAERN, avalia-se que esse processo de discussão

sobre o Plano não foi suficiente para despertar nesses setores o interesse pela

sua implementação. Observa-se que não houve nenhuma manifestação

posterior reivindicando regulamentações importantes como é o caso das

Áreas de Interesse Social, até hoje não verificada. Da mesma forma, os

problemas de implementação que o Plano apresenta atualmente não faz parte

da agenda política de nenhum segmento do movimento popular em Natal, até

o momento (BENTES SOBRINHA, 1997).

Após a aprovação do Plano Diretor de Natal de 1994 verificaram-se também diversas

discussões sobre o aspecto constitucional dos instrumentos aprovados. Registraram-se reações

no campo jurídico, em geral promovidas pelos setores empresariais, fato verificado em diversas

cidades do país. De certa forma esses debates foram estimulados pela ausência de

regulamentação dos instrumentos por lei federal, o que veio a ocorrer apenas em 2001 com a

aprovação do Estatuto da Cidade (2001). O Plano Diretor de Natal teve destaque dentre as

experiências de elaboração de Planos Diretores no País, por ter inserido já em 1994 parte dos

instrumentos regulamentados pelo Estatuto.

Esse destaque, segundo a professora Ruth Athaíde, deveu-se à rápida aprovação do

Plano na cidade - quando outras cidades do País, como São Paulo, não conseguiam aprovar seus

planos, e à auto-aplicabilidade do Plano Diretor de 1994- enquanto outros, como o do Rio de

Janeiro, apresentava, de maneira geral, apenas diretrizes.

Os parâmetros e instrumentos de gestão urbana, propostos para incidir sobre a

desigualdade gerada na ocupação do espaço da cidade foram: a densidade básica, o coeficiente

de aproveitamento, a outorga onerosa, o estoque de área, a transferência do potencial

construtivo, o imposto territorial progressivo e o consórcio imobiliário.

Observou-se que no prazo de transição do Plano houve o aumento nos registros de

licenciamento com base na legislação anterior, mais permissiva em termos de potencial

construtivo. "Nos seis meses de transição do Plano, registrou-se o licenciamento de

aproximadamente 300 projetos” (BENTES SOBRINHA, 1997).

A seguir apresentam-se as alterações verificadas no Plano Diretor de 1994, situando o

conteúdo do Plano que foi objeto de revisão em 2007, quando da inserção do Plano Setorial.

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3.1.1 Leis Complementares que alteraram o Plano Diretor de 1994: LC n.22 de 18 de

agosto de 1999 e LC n. 27 de 03 de novembro de 2000

No período da década de 1990 a 2000 houve um crescente investimento em turismo,

que resultou em expressivas transformações no espaço urbano de Natal e no quadro de políticas

públicas do Estado do Rio Grande do Norte. Havendo, além de investimentos e obras voltadas a

atender este setor, alterações na legislação, tornando a cidade do Natal mais atrativa a

investimentos concorrentes no litoral nordestino.

Segundo a Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico no

Nordeste Brasileiro – ADIT (apud OLIVEIRA, 2006), a aquisição de imóveis

por turistas no Nordeste cresceu 200% e imóveis alugados por turistas

cresceu 64,52%. O chamado “turismo residencial”, incluindo aqueles que se

hospedam em residências de amigos ou parentes, corresponde hoje por 34,5%

das formas de alojamento, enquanto a rede hoteleira “convencional” atende

63,7%. A tendência de aumento nesses números é reforçada pela quantidade

de novos investimentos em hotelaria e complexos residenciais, em especial

no litoral de Fortaleza e Natal, principalmente motivadas pelo investimento

realizado pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo – NE, no final dos

anos 90 (SILVA, 2007:113)

A Lei Complementar nº 22 foi resultado da alteração do Plano Diretor de 1994, dentro

da dinâmica de tornar a cidade mais atrativa a investimentos, onde, segundo Ruth Athaíde34

,

aquela foi aprovada com muitas pendências. A alteração teve como impulsionadores os

empresários do setor imobiliário que apresentaram à SEMURB, órgão que desenvolveu a

proposta de lei inicial, as modificações pretendidas com foco em incrementar a ocupação do

solo urbano (DUARTE, 2011).

A proposta de alteração se deu conjuntamente com a mudança de governo no nível

municipal e da presidência do órgão gestor responsável pela elaboração e implementação do

Plano Diretor, que, na época, era o Instituto de Planejamento Urbano de Natal - IPLANAT35

.

Nessa fase, desencadearam-se divergências quanto ao Plano Diretor, pois parte do corpo

técnico rejeitava o Plano devido à descrença nos instrumentos de controle que ele propunha36

.

Descrença essa gerada, principalmente, devido à necessidade de monitoramento constante de

alguns instrumentos pelo órgão, por exemplo, a outorga onerosa. A mudança na gestão, aliada à

pressão do setor imobiliário com os novos instrumentos e consequentes limitações na sua

34

Em entrevista realizada no dia 28 de novembro de 2008 a Camila Furukava e Karen Alvares Pinto. 35

Instituto de Planejamento Urbano de Natal. 36

Lembrando que até o atual momento ainda não havia sido instituído o Estatuto da Cidade, legislação

Federal que veio, em 2001, reforçar a importância de alguns dos instrumentos já definidos no Plano

Diretor de Natal de 1994, como a Área Especial de Interesse Social (AEIS) estabelecida federalmente

como Zona Especial de Interesse Social (ZEIS).

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atividade em algumas áreas de interesse na cidade, levaram à aprovação da Lei Complementar

22, em 18 de agosto de 1999.

O debate teve ampla divulgação na imprensa e discussões junto com outras entidades da

sociedade,

Contudo, as discussões sobre a proposta apresentada pelo IPLANAT foram

travadas no CONPLAM sob forte embate político entre o grupo progressista,

representado pelos representantes do IAB/RN, Conselhos Comunitários e o

representante da Câmara Municipal e o grupo conservador, que tinha como

principais representantes a FIERN e o SINDUSCON/RN. Destacam-se,

ainda, conforme Nobre, alguns agravantes nesse processo, como o fato de

que algumas deliberações daquele Conselho não foram contempladas na

versão final da proposta remetida à Câmara Municipal (como a retirada da

prescrição que abolia o controle de gabarito do Parque das Dunas), como

também a inclusão, naquela versão final, de proposta não discutida no

CONPLAM (como a possibilidade de ocupação de 20% da área total das

zonas de proteção ambiental). (DUARTE, 2011:245)

Durante a votação na Câmara Municipal as áreas de controle de gabarito e as Zonas de

Proteção Ambiental tiveram mantida sua proteção estabelecida no Plano Diretor de 1994,

reforçando a importância das áreas, em especial o Parque das Dunas, como elementos de

identidade da cidade, patrimônio paisagístico-ambiental da sociedade e do turismo local.

Segundo Duarte (2011) “a visão do Parque das Duas continua sendo um dos atrativos para a

venda de unidades em condomínios de alto luxo” (DUARTE, 2011:250).

A Lei, portanto, instituiu um aumento na densidade37

, na taxa de ocupação e de

impermeabilização, e no coeficiente de aproveitamento de algumas áreas, além da ampliação

dos limites das Zonas Adensáveis, desconsiderando, inclusive, o suporte da infraestrutura desses

espaços e os estudos técnicos apresentados nos debates (DUARTE, 2011).

Embora não tenha alterado a proteção de áreas ambientais, a Lei Complementar 22/99

trouxe prejuízos em relação ao incentivo do adensamento e crescimento de Natal, sem estar

compatibilizado ao sistema de infraestrutura e velocidade de implantação e atualização deste na

cidade, beneficiando interesses e grupos específicos, em detrimento de um crescimento

sustentável e equilibrado do município.

Conforme observado na evolução histórica da cidade do Natal, esse tipo de legislação e

gestão planejada, visando o interesse individual e, não o comum, gera segregação e não inclusão

social, levando à ampliação de problemas existentes na cidade, como os observados nas redes de

37

A densidade básica de todos os terrenos da Zona Urbana passou de 180hab/ha para 225 hab/ha -

líquida.

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infraestrutura. Isto aumenta a complexidade dos problemas urbanos, além de fragilizar a

credibilidade do sistema de planejamento municipal e da gestão participativa, estabelecida no

artigo 2º do Estatuto da Cidade.

A aprovação da Lei Complementar nº 22, em 1999, segundo Athaíde38

, abriu caminho

para que, no ano seguinte (2000), “sem qualquer discussão com a população”, houvesse a

aprovação da Lei Complementar n° 27, que objetivava um maior adensamento do Bairro de

Ponta Negra39

, como resposta aos investimentos realizados na infraestrutura local. A discussão

foi feita sem participação de organizações sociais e o projeto foi encaminhado diretamente ao

Legislativo. Não há relatos de dados quantitativos e qualitativos divulgados quanto à

compatibilização deste incentivo legal com as redes de infraestrutura instalada e sua projeção de

crescimento, para embasar estas decisões.

Reforçando este momento não democrático, Duarte afirma que “Logo após a primeira

revisão do Plano Diretor de 1994, a SEMURB passou a elaborar alterações pontuais, a partir de

interesses administrativos específicos” (DUARTE, 2011:252). O que levou às mudanças nos

parâmetros estabelecidos para Ponta Negra, e ao incremento do turismo na Via Costeira, sem

estudos técnicos sobre a capacidade de infraestrutura local.

Duarte relata ainda que na proposta de lei emitida pela Administração Municipal

constava a eliminação da área de controle de gabarito na orla marítima (ZET-1) e a inclusão da

Vila de Ponta Negra na área onde se permite um maior adensamento local. “[...] o que somente

não ocorreu em razão da emenda ao Projeto de Lei do Executivo, no momento de sua transição

na Câmara Municipal” (DUARTE, 2011:254). Mesmo com a proteção da área garantida, os

impactos da modificação dos parâmetros e do incentivo ao adensamento, assim como em 1999,

foram prejudiciais à cidade (DUARTE, 2011).

Estas duas alterações, mais uma conjuntura de fatores como os investimentos, políticas

e projetos públicos, especialmente em mobilidade, redução de juros, alteração na legislação

local e algumas obras de infraestrutura (nem sempre condizentes com demanda de crescimento

para o bairro), somados aos investimentos internacionais (casas de veraneio e investimentos

pelos baixos juros imobiliários, valorização do Dólar sobre o Real) resultaram em um boom

imobiliário na cidade. Segundo Alexsandro Silva “Logo se percebe que o boom imobiliário nas

38

Em entrevista realizada no dia 28 de novembro de 2008 a esta autora e Karen Alvares Pinto. 39

As prescrições urbanísticas não são aplicadas a todo o bairro, mas a algumas frações deste. Nas áreas

que se aplicam as prescrições passaram a ser: densidade demográfica de 350 hab./ha líquido; coeficiente

de aproveitamento máximo de 3.5; as demais prescrições urbanísticas são as que constam nas leis

complementares nº7/94 e 22/99 de 18/8/99.

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áreas litorâneas não está relacionado com o crescimento demográfico ou com o giro de capital

da economia local, mas sim conseguiu estender sua demanda no sentido de atrair capitais

nacionais e estrangeiros, acoplados à lógica do turismo” (SILVA, 2011:112).

Esta conjuntura de fatores resultou em uma crescente expansão horizontal da cidade,

sem que as obras de infraestrutura básica consigam acompanhar, na criação de vazios urbanos,

na especulação imobiliária, e no aumento do preço do metro quadrado40

. Ou seja, no não

cumprimento do princípio da função social da propriedade e no reforço de um planejamento que

gera a segregação socioespacial.

A expansão urbana desordenada é uma realidade das cidades brasileiras. De

acordo com o censo 2000 do IBGE, mais de 80% da população brasileira

vivem nas cidades. Em Natal, essa realidade não é diferente. A aglomeração

urbana natalense acabou se expandindo por áreas de difícil acesso e

desaconselháveis para a ocupação, como os leitos de rios, lagoas naturais,

regiões de dunas, manguezais, trazendo sérios riscos para a qualidade da água

do nosso município, pois o progresso do empreendedorismo não vem

acompanhado pela melhoria no saneamento básico, em estações de

tratamento de água e esgotos, fazendo com que ocorra uma alta

contaminação, principalmente por nitrato. Em 1969, devido às construções

dos conjuntos habitacionais, a área urbanizada no município abrangia 12,89%

ou 22,06 Km2 de sua área total (171,1Km2). Essa urbanização se concentrou

nos bairros mais centrais e antigos da cidade como os de Petrópolis, Tirol e

Alecrim, em 2002, a cidade passou a ter 98,81 Km2, ou 57,75% de sua área

total, com espaços construídos ou em franca urbanização, isso sem contar as

áreas já loteadas e não urbanizadas como os bairros de Guarapes e Lagoa

Azul (MESQUITA; BEZERRA; FERNANDES, 2007)

Em 2004 foi iniciada a revisão do Plano Diretor de 7/94, 10 anos após a aprovação da

lei, que culminou na aprovação da Lei Complementar 82/07. Segundo Duarte a revisão foi

impulsionada pela edição do Estatuto da Cidade (2001), que visava adaptar o Plano às novas

normas de planejamento e de crescimento da cidade (DUARTE, 2011). A partir das discussões

havidas nos três anos de revisão, analisa-se a seguir a inserção do Plano Setorial, objeto desta

pesquisa como instrumento de planejamento urbano e ambiental.

40

Há registro de valores como R$6.000 o metro quadrado construído no bairro de Ponta Negra, segundo

jornais de circulação local. Quanto ao metro quadrado do terreno Rodrigues (2007) aponta que “O custo

do metro quadrado de terreno na área seguiu a tendência da verticalização [...] em 2006 o metro quadrado

dos terrenos nos bairros de Lagoa Nova e Tirol (áreas nobres e também adensáveis da cidade) estava

estimado na faixa de R$300 (trezentos reais) o que é metade do preço na área mais barata da Zona

Adensável de Ponta Negra” (RODRIGUES, 2007:37). O autor apresenta ainda um valor de R$ 1000 (mil

reais) para os terrenos próximos a Av. Engenheiro Roberto Freire, excetuando a área da ZET 1.

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73

3.2 A INSERÇÃO DO PLANO SETORIAL: PLANO DIRETOR DE

NATAL - LEI COMPLEMENTAR 82/07 - DA FORMULAÇÃO À

APLICAÇÃO.

A aprovação da Lei Complementar 82/07 contou com intensa participação social, que

foi desenvolvida a partir das estratégias e espaços de discussão pública apresentadas pela

SEMURB, órgão gestor e responsável pela revisão e implementação do Plano Diretor, tais

como: Grupos de Trabalho Temáticos, Seminários por Região Administrativa, Conferência,

Audiências Públicas na fase do Legislativo. Estes momentos possibilitaram não apenas o

acompanhamento social, mas também o monitoramento social evidenciando com mais força os

conflitos e disputas de interesses (Figura 8). A exemplo disto, a “Operação Impacto” 41

marcou a

revisão do Plano conforme se identifica em diversas matérias da época42

e na Figura 9.

Figura 8. Jornal Entre Bairros, em edição especial sobre a aprovação do Plano Diretor de 2007.

Fonte: Arquivo pessoal, 2007.

41

Operação policial iniciada a partir da atuação do Ministério Público cujo 21 vereadores foram

apresentados à Justiça para serem julgados pelo crime de Corrupção Ativa e Passiva na votação do Plano

Diretor de 2007. Em 2012, 16 desses réus foram condenados à perda de mandato, pagamento de salários

mínimos e anos de prisão. 42

Ocorriam no momento discussões acerca da aprovação do Plano Diretor com as emendas vetadas; o

processo de investigação dos vereadores réus pelo envolvimento de venda de votos do Plano Diretor; e as

mobilizações sociais (JORNAL ENTRE BAIRROS, 2007, p.1).

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Figura 9. Proibição da entrada da sociedade civil na Câmara Municipal por ocasião da votação do Plano

Diretor.

Fonte: Duarte, 2011.

No período (2006-2007) de transição do Plano Diretor de 1994 para o Plano de 2007,

neste contexto tumultuado e legalmente instável (Figura 10 e Figura 11), destacou-se o excesso

de pedidos para aprovação de licenciamento junto à SEMURB, visando à utilização de

parâmetros e prescrições da Lei 07/9443

. Grande parte desses empreendimentos foi executada

após 200744

, por meio da renovação anual de licenças, dificultando a aplicação do Plano Diretor

de 200745

. Vale lembrar que este quadro também ocorreu em Natal na revisão da Lei

Complementar 3175/1984, entre 1993 e 1994, o que causou a fragilidade na implementação dos

novos índices da lei aprovada (BENTES SOBRINHA, 1997).

43

Segundo Heitor Andrade em entrevista a Tribuna do Norte, sobre a ordenação no crescimento de Ponta

Negra, que não saiu do papel, em 10 de Julho de 2008, há mais de 100 projetos aprovados para o bairro,

com a legislação anterior. 44

Como será observado mais a frente no caso de Ponta Negra. 45

“Até a aprovação do Plano Setorial, como determinado no PDN, ficam valendo para os conjuntos Ponta

Negra e Alagamar as regras aplicadas às áreas de adensamento básico, as mais rígidas, com proibição de

remembramento dos lotes e de construções acima de quatro pavimentos. Contudo, essas regras

transitórias não tranquilizam de todo os representantes da comunidade. “Temos notícia de que há mais de

100 projetos já aprovados, ainda pelas regras do plano antigo, a serem erguidos no bairro. Isso tem de ser

avaliado, porque pode vir a dobrar a população atual (estimada em 35 mil pessoas) em menos de cinco

anos”, teme Heitor Andrade” (ORDENAÇÃO..., 2008, s.p.).

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Figura 10. Reportagem sobre a aprovação do Plano Diretor com indicações de vetos de algumas emendas

pela Prefeitura, Ministério Público e sociedade civil.

Fonte: Câmara termina..., 2007.

Nota: Recorte da imagem e montagem para apresentar os títulos desta.

Figura 11. Manifestações sociais contrárias à derrubada dos vetos no Plano Diretor.

Fonte: Câmara derruba, 2007.

Para Duarte (2011) a revisão em si foi um momento de mobilização sobre o viver nas

cidades e um dos momentos mais marcantes na elaboração da legislação urbana de Natal,

Isto ocorreu não apenas pela participação da população no processo de

elaboração da minuta do Projeto de Lei que foi encaminhada à Câmara

Municipal, mas também em razão da conturbada fase de tramitação daquele

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Projeto no âmbito do Poder legislativo, que veio renovar as evidências do

processo de fragilização dos direitos que envolvem os momentos da

construção e modificação da legislação urbana (DUARTE,2011:361).

Neste contexto de revisão observaram-se procedimentos ora participativos, ora

antidemocráticos e imperativos por parte tanto de órgãos como o CONPLAM, quanto da

Câmara dos Vereadores (Figura 9). Entretanto, o controle social e o respaldo deste pelo

Ministério Público Estadual e, por vezes da administração municipal, geraram conquistas ao

processo participativo, como a preservação do veto por ordem judicial que foi derrubado pelos

vereadores, e que manteve, por exemplo, a Zona Norte como área de adensamento básico.

Foi nesse contexto que se realizou a discussão e inserção do Plano Setorial no Plano

Diretor de Natal. A formulação e o debate sobre o Plano Setorial, como instrumento de gestão,

ocorreu em duas fases: (i) A inserção do Plano Setorial nas proposições do Plano Diretor, pelos

técnicos da SEMURB e; (ii) A emenda modificativa à estrutura inicial do Plano Diretor, para a

inclusão das alterações apresentadas pelos moradores de Ponta Negra, sob coordenação do

arquiteto Heitor Andrade. Vale destacar que esta foi a única emenda de iniciativa popular

inserida no Plano.

O Conselho Municipal de Saneamento Básico - COMSAB apresentou parecer favorável

à criação do Plano Setorial ao levar em consideração que "este Conselho defende a adoção de

medidas preventivas, como desestimular o adensamento de determinados bairros da cidade,

enquanto estes não dispuserem de infraestrutura de saneamento básico adequado e suficiente

(COMSAB..., 2007). "Consonante a isto, a sociedade inferiu que [...] a votação imposta pelos

vereadores para Ponta Negra agradou a comunidade. [...] se isso não fosse feito nosso bairro iria

sofrer com a especulação imobiliária. “Só nesse mês de abril, 50 imóveis estão à venda,

comentou o arquiteto Heitor Andrade” (PLANO DIRETOR TERÁ..., 2007 s.p.).

Criado em uma perspectiva de implementação do Plano Diretor e para a contenção do

adensamento e da compatibilização deste com a capacidade da rede de infraestrutura, a emenda

que definiu o Plano Setorial foi aprovada com unanimidade dos votos. Entretanto, os debates

percorreram as discussões sobre a rede de infraestrutura ser limitante do adensamento e do

crescimento da cidade. Assim, questionou-se sobre as responsabilidades: do Poder Público em

ampliar políticas, projetos e investimentos na área; e a corresponsabilidade das empresas

privadas envolvidas em ampliar essas redes e possibilitar futuros investimentos no setor.

Vale destacar que o bairro de Ponta Negra era foco de grandes investimentos em

construção (2001-2006), o que sobrecarregou a rede de infraestrutura e impulsionou as

manifestações sociais. Para Heitor Andrade existem duas possíveis explicações para esta

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votação unânime, mesmo contrariando o crescente pedido de licenciamento na área: (i) a

diminuição do lucro e aumento do risco do investimento no bairro, já que os terrenos ficaram

mais caros, “[...] Ninguém investe em um lugar para não lucrar ou ganhar pouco. Aí não sei até

que ponto estava ficando inviável para o setor imobiliário. Talvez tenha sido bom pra eles esse

freio”46

; (ii) Existência de outros focos na cidade como o debate sobre a Zona Norte, o entorno

do Parque das Dunas e instrumentos como a outorga onerosa e a emenda que viabilizava ou que

prorrogava por mais três meses, depois que o PD fosse aprovado, a possibilidade de se aprovar

um projeto pelo Plano anterior. Sobre esta emenda, o arquiteto contestou47

,

Aí, imagine o que isso pode significar? Um plano que já vinha sendo

discutido há três anos, começou a ser discutido em 2004, e o Plano Diretor

ele foi regulamentado no meio de 2007. Ou seja, com três anos e meio de

debate. E pra quê ainda mais três meses? Alguma coisa tinha aí. E esse

interesse nessa possibilidade tinha questões muito importantes por trás48

.

Sobre isto, o engenheiro de uma construtora atuante na região, em entrevista concedida

relembra,

Ponta Negra cresceu muito rápido, deu até o problema de saturação do

esgoto, se perdeu “n” licenciamentos em Ponta negra, inclusive nós fomos

afetados, que deu problema no licenciamento da obra, já regularizado, mas

acredito que Ponta Negra já saturou nesse aspecto. Em dezembro de 2006

houve uma alteração de legislação e foi solicitado que todo licenciamento

tivesse autorização da CAERN e Idema se posicionando quanto ao

atendimento de água e esgoto e a CAERN não tinha como atender, até que

fossem aplicadas melhorias, o bairro cresceu mais rápido que a infraestrutura.

Foi um fato complicador, o problema de falta de infraestrutura e o

licenciamento do empreendimento49

.

Com a aprovação do Plano Diretor de 2007, foi observada a inclusão de instrumentos,

como a Transferência do Potencial Construtivo e o Plano Setorial (que acrescentou as

modificações requeridas pela sociedade). Além disto, houve a inserção da função ambiental à

função social da propriedade, diferente do Plano Diretor de 1994 que considerava apenas a

46

Heitor de Andrade Silva. Em entrevista concedida a autora, set.2009. 47

Esta contestação veio a ser confirmada na avaliação do Plano Setorial em Ponta Negra, onde edifícios

aprovados na legislação antiga, com gabaritos maiores que os permitidos, continuaram recebendo alvarás

de construção e renovação de licenças, sendo construídos até o fevereiro de 2012, final da coleta de dados

desta pesquisa. 48

Heitor de Andrade Silva. Em entrevista concedida a autora, set.2009. 49

Entrevista com o Engenheiro Civil Wescley Gomes Magalhães, coordenador Programa de

Licenciamento, coordenador do Programa de Qualidade, Gerente de Obras, da Colmeia Natal/RN,

concedida à autora desta pesquisa. Data: 19 de Novembro de 2008

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dimensão social desta. No campo ambiental houve ainda a inserção de um título exclusivamente

direcionado ao sistema de áreas verdes e arborização urbana.

Cabe ainda destacar sobre o Plano Diretor aprovado, que o artigo 2º apresentou como

objetivo o pleno desenvolvimento das funções sociais e ambientais da cidade e da propriedade,

garantindo um uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado, de forma a garantir

condições de qualidade de vida, isto condicionado ao cumprimento do artigo 3º com a

preservação, proteção e recuperação do meio ambiente e da paisagem urbana; a distribuição

equânime de custos e benefícios das obras e serviços de infraestrutura urbana e a recuperação,

para a coletividade, da valorização imobiliária; a racionalização e adequação do uso da

infraestrutura urbana instalada; a criação de condições para o estabelecimento de política

habitacional; a redução da necessidade de deslocamento entre moradia e trabalho; a adequação

dos espaços coletivos à acessibilidade urbana; condições para a participação da sociedade em

programas e projetos de interesse coletivo; além da harmonização do uso da cidade com a

qualidade de vida e desenvolvimento sustentável (NATAL, 2007).

Para se atingir tais objetivos inseriu-se o artigo 4º, que condicionou o uso e a ocupação

do solo à capacidade de infraestrutura instalada e às condições de meio ambiente. A dinâmica

dessa ocupação está condicionada à instalação e ampliação da rede de infraestrutura. Além

disso, direcionam-se para a definição de áreas de tratamento especial, incentivos especiais à

produção de habitação de interesse social; a adoção do bairro como unidade territorial de

planejamento urbano; a criação de um sistema de planejamento, de modo a tornar participativa e

democrática a gestão e aplicação desse Plano; e a criação de procedimentos operacionais que

garantam o controle e a revisão sistemática deste plano e da Política de Desenvolvimento

Urbano e Ambiental (NATAL, 2007). Esses elementos foram motivadores para a criação do

Plano Setorial.

Quanto à função social da propriedade o artigo 5º do Capítulo II do Plano Diretor de

Natal definiu que a propriedade atende à função socioambiental quando os direitos decorrentes

da propriedade individual não suplantarem os interesses coletivos e difusos, devendo atender ao

uso para atividades urbanas, em razão compatível com a capacidade da infraestrutura instalada e

suprimento de serviços públicos. Destaca-se aqui a demanda por instalação antes da ocupação e

suprimento das áreas já ocupadas. Além disso, para cumprir a função socioambiental deve-se

observar:

II - aproveitamento e utilizaçãoo compatíveis com a qualidade do

meio - ambiente, segurança e saúde dos usuários e propriedades

vizinhas; III - atendimento às normas fundamentais destinadas ao

ordenamento da cidade expressa neste Plano Diretor e leis correlatas;

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IV - preservação, de conformidade com o estabelecido em lei especial,

da flora, da fauna, das belezas naturais, do equilíbrio ecológico e do

patrimônio histórico e artístico, bem como proteção do ar e das águas

de modo à manutenção da qualidade ambiental.

Paragrafo Único. São atividades de interesse urbano aquelas inerentes

as funções sociais da cidade, ao bem - estar da coletividade e a

preservação da qualidade do meio ambiente, tais como: habitação,

produção de bens e serviços, preservação do patrimônio histórico,

cultural, ambiental e paisagístico, circulação de pessoas e bens,

preservação, conservação e utilização racional dos recursos

necessários a vida e dos recursos naturais em geral (NATAL, 2007)

Neste sentido, e na observância ao artigo 12, a infraestrutura abarca o sistema de

abastecimento de água e esgotamento sanitário, sistema de drenagem de águas pluviais, sistema

de energia elétrica e sistema viário, sendo estes considerados saturados quando atingirem 80%

de sua capacidade. O artigo 13 ressalta que cabe ao Município monitorar os dados dos novos

licenciamentos para que, conjuntamente com os dados obtidos pelas concessionárias (relatórios

e mapas detalhados, digitalizados e georreferenciados, anualmente, por bairro), sejam

identificadas as tendências de saturação da infraestrutura, futuras ampliações e melhorias,

disponibilizando estes dados à sociedade. Em caso de tendência de saturação deve haver

divulgação e informativos à sociedade, monitoramento semestral do número de licenças

expedidas e a suspensão de concessão de outorga onerosa e transferência de potencial

construtivo, assim como indicações orçamentárias para evitar a saturação e adoção de medidas

pelas concessionárias (NATAL, 2007).

Vale aqui ressaltar estudos realizados pela UFRN (2006) e dados do Censo (IBGE,

2010), que comprovam que o sistema de infraestrutura da cidade encontra-se ineficiente quando

apenas aproximadamente 31% do território municipal são saneados. Tal sistema é essencial para

qualidade de vida e o cumprimento da função socioambiental da propriedade, conforme

estabelecido no Plano Diretor de 2007. Segundo dados do IBGE 2010, existem 235.522

domicílios particulares permanentes em Natal e apenas 74.213 são estruturados com coleta de

esgoto da rede, sendo 82.818 domicílios com fossa rudimentar e 1.159 que utilizam a vala como

sistema de esgoto e 1.302 jogam direto no rio, lago ou mar.

Os resultados do estudo realizado pela UFRN (2006) trouxeram que 45 poços na cidade

do Natal estão contaminados por nitrato, com níveis acima do permitido pela resolução 518/04.

Segundo o mesmo estudo, esta contaminação é causada principalmente pela falta de uma rede

de esgotamento sanitário, gerando problemas de saúde pública, já que o nitrato torna a água

imprópria e gera risco de câncer.

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[...]Na zona sul, a diluição se dá com a água que vem da Lagoa que

contribui com 25% do abastecimento de água da região sul) e na zona

norte, a diluição é realizada com a água que vem da Lagoa de

Extremoz (que contribui com 75% da água de abastecimento da região

norte). Ocorre que, pelas análises realizadas pela UFRN, essa diluição

não tem sido realizada de modo eficiente, uma vez que foi detectada a

existência de nitrato em alguns reservatórios (como é o caso dos

Reservatórios R-5 (que recebe água dos poços de Lagoa Nova e

Capim Macio); R-9 (que recebe água dos poços de Felipe Camarão,

Jiqui, Candelária e San Valle); R-16 - Zona Norte). Ressalta-se que foi

encontrado nitrato até mesmo na rede de distribuição, situação que

pode ser reputada como gravíssima (MESQUITA, T.P.N, 2007:2)

A gestão democrática estabelecida no Plano Diretor foi baseada no Estatuto da Cidade

(2001), contudo, o seu exercício encontrou obstáculos, entre outros, pela falta de credibilidade

da aplicação das soluções encontradas em debates, na prática. Ao analisar o Plano Diretor de

2007 a 2012, observou-se que não houve regulamentação das áreas especiais (como a AEIS da

Vila de Ponta Negra) até o atual momento da pesquisa50

. Além disto, o relatório sobre o Plano

Diretor de Natal da Rede de Avaliação e Capacitação para a Implementação dos Planos

Diretores Participativos, quanto às diretrizes do Estatuto da Cidade incorporadas no Plano

Diretor, concluiu que ao se tratar dos objetivos e das diretrizes da gestão democrática, “o PD de

Natal aborda o tema de forma bastante genérica e pautada na criação de um sistema de

planejamento, não explicitando a forma para garantir a participação popular como está

estabelecido no Estatuto da Cidade” (BENTES SOBRINHA, Maria Dulce P. anexo - estudo,

caso RN, p.8 in SANTOS JUNIOR; MONTANDON, 2001).

Quanto ao Plano Setorial, inserido no grupo dos instrumentos urbanísticos instituídos

no Plano Diretor de 2007, não houve por meio deste modificações no cenário espacial da

cidade, já que, até o atual momento não se teve a regulamentação do setor de Ponta Negra. Vale

lembrar que o Plano Setorial é apenas uma ferramenta que, como qualquer outra legislação,

necessita de um sistema de gestão e ativismo social que respalde e direcione a aplicação no

princípio da função socioambiental da propriedade. Neste sentido, o Capítulo seguinte traz uma

análise mais aprofundada do Plano Setorial na Lei Complementar 82/07 e na realidade de Natal.

50

Segundo semestre de 2012.

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81

CAPÍTULO IV.

PLANO SETORIAL: FORMULAÇÃO, APROVAÇÃO NO PLANO

DIRETOR DE NATAL, ANÁLISES E ATUALIZAÇÕES

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82

Ao considerar a discussão que norteou a concepção e a inserção do Plano Setorial de Natal no

Plano Diretor, período de 2004 a 2007, conforme visto anteriormente, verificou-se que o Plano

Setorial teve como motivação principal a implementação integrada dos instrumentos do Plano

Diretor, a articulação desses instrumentos com as intervenções urbanísticas e a contenção do

adensamento em curso no bairro de Ponta Negra. Em face à dificuldade de implementação dos

instrumentos previstos no Plano Diretor de Natal e a saturação dos sistemas de infraestrutura

viária, saneamento e drenagem, além dos impactos socioespaciais gerados no bairro de Ponta

Negra, única unidade de planejamento delimitada. Neste capítulo apresenta-se a análise do

Plano Setorial de Ponta Negra, tal como foi inserido no Plano Diretor de Natal em 2007 e das

propostas de regulamentação que se sucederam até 2012.

A formulação do Plano Setorial foi orientada inicialmente pela apresentação do projeto

de lei pelos técnicos da SEMURB51

e pela apresentação de contribuições elaboradas por grupos

e organizações sociais do Bairro de Ponta Negra. Essas iniciativas fundamentaram o conteúdo

que veio a ser aprovado em 200752

.

Ressalta-se que na proposta inicial da SEMURB colocava-se a definição de setores para

a aplicação do Plano Setorial em toda a cidade. Entretanto, os estudos realizados para

aprofundar esta proposta indicaram não haver base de dados e informações suficientes para sua

fundamentação. Assim, a indicação do primeiro setor se restringiu aos bairros de Ponta Negra,

Neópolis e Capim Macio. Concomitante a isto, durante a fase de discussão pública na Câmara

de Vereadores (2006-2007), representações sociais de Ponta Negra53

buscaram ampliar a

discussão para os demais bairros, não obtendo, contudo, adesão das representações sociais de

Capim Macio e Neópolis à referida proposta. Heitor Andrade menciona que,

Queria se incluir Capim Macio e Neópolis, pois estes bairros estavam dentro

de uma mesma bacia hidrográfica e também, tinha uma implicação viária

engrenada. Pois de certo modo, um problema de adensamento em Ponta

Negra iria refletir em Capim Macio e vice-versa. O adensamento em Capim

Macio compromete o sistema viário de Ponta Negra. Para proposta do Plano

Setorial nesta época, já se achava isto melhor, mas não se conseguiu na

ocasião mobilizar os bairros de Capim Macio e Neópolis, e esta é uma

questão política, por mais que se tenham argumentos técnicos. Os bairros

ficaram fora. Então, foi preciso mudar o argumento que para ser Plano

51

Órgão coordenador da revisão e implementação do Plano Diretor de Natal (2004-2012). 52

Heitor de Andrade Silva. Arquiteto Urbanista, Professor da UFPB, morador do Bairro de Ponta Negra e

um dos autores da emenda do Plano Setorial em Ponta Negra, durante a revisão do PDN, na fase de

discussão do Legislativo. Em entrevista concedida a autora deste trabalho em setembro de 2009. 53

Representados por Heitor Silva e Maria das Neves Valentim.

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Setorial tinha de ser em duas ou mais unidades territoriais, para possibilidade

de uma unidade territorial. 54

De acordo com Nevinha55

as representações sociais do bairro de Ponta Negra se

organizaram em dois grupos: um que se debruçou sobre o estudo e elaboração da proposta do

Plano Setorial, com reuniões realizadas na Associação dos Moradores dos Parques Residenciais

de Ponta Negra e Alagamar - AMPA; e outro, que se encarregou de mobilizar e articular os

demais bairros (Neópolis e Capim Macio).

Nessas reuniões foi demarcada a importância de se constituir o setor, abrangendo os

bairros de Capim Macio, Ponta Negra e Neópolis. Entretanto, apenas o bairro de Ponta Negra

apresentou mobilização social consistente para conduzir a discussão de inserção do bairro na

proposta de Plano Setorial. Segundo Heitor Silva56

, este foi um fator decisivo para que Ponta

Negra fosse contemplada na revisão do PDN. Essa discussão se desenvolveu durante seis meses,

definindo um dos momentos históricos marcantes na discussão de instrumentos urbanísticos na

Cidade do Natal, quando os moradores de um bairro se mobilizaram para discutir a influência

do Plano Diretor em suas vidas57

.

Neste contexto, grupos e organizações sociais de Ponta Negra elaboraram uma proposta,

que foi apresentada como Emenda ao debate na Câmara Municipal de Natal. Nesta emenda

foram verificadas contribuições, com modificação da proposta da SEMURB58

, no sentido de

definir apenas um bairro como setor, ao invés de duas ou mais unidades territoriais contíguas59

,

possibilitando a definição do Plano Setorial de Ponta Negra. Conforme mencionando, para

formulação desta emenda, houve mobilização social no bairro de Ponta Negra no sentido de

discussão e difusão do tema, que foram orientados pelo trabalho de comissões, que produziram

um relatório técnico, baseado em pesquisa de opinião, junto aos moradores de Ponta Negra60

.

54

Heitor de Andrade Silva. Em entrevista concedida a autora, set.2009. 55

Maria das Neves Valentim, mais conhecida como Nevinha, moradora do bairro de Ponta Negra, agente

ativa nos momentos participativos de construção do Plano Setorial. Em entrevista concedida à autora,

set.2009. 56

Idem. 57

Cabe destacar que após a aprovação do Plano a comunidade continuou se reunindo, entretanto, com o

não cumprimento dos prazos de regulamentação, estes encontros foram sendo reduzidos, por não ter

repercussão prática. 58

Em discussão na Câmara dos Vereadores. 59

Tal proposta foi apresentada durante a discussão na Câmara dos Vereadores, por meio do vereador

Júlio Protásio. 60

Pesquisa de Opinião Pública desenvolvida pela CONSULT pesquisa em parceria com o Curso de

Arquitetura e Urbanismo da UNP e a Associação dos moradores dos conjuntos de Ponta Negra e

Alagamar. Com enfoque na Imagem socioambiental dos moradores dos Parques Residenciais Ponta

Negra e Alagamar, Fevereiro de 2007.

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A proposta de Emenda formulada pelos grupos sociais de Ponta Negra modificou o

artigo 9061

definindo o recorte territorial do Plano Setorial como sendo “uma unidade territorial

dependendo da área, densidade populacional e complexidade do lugar” (NATAL, 2007).

Adicionou, ainda, os artigos 118 e 119, que instituíram os prazos e as prescrições urbanísticas

para os parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar62

até a regulamentação do setor. Tais

proposições foram baseadas na pesquisa de opinião pública63

, adotando-se assim, um dos

formatos participativos do Estatuto da Cidade.

Segundo Heitor Andrade em entrevista para um jornal local, a experiência do Plano

Setorial de Ponta Negra (...) é uma referência para a cidade e pode ser seguida por outras

regiões. A Prefeitura ainda vai definir critérios de como Natal vai ser dividida com relação a

esses planos, mas as comunidades podem requerer seus planos específicos [...]” (PDN..., 2007

s.p.). Assim, com participação social foi definido o primeiro setor, colocando importante

referência sobre a participação social na formulação e aprovação de instrumentos urbanísticos

no Planejamento Urbano de Natal.

Como síntese das propostas formuladas pela SEMURB e por grupos e organizações

sociais do bairro de Ponta Negra para o Plano Setorial, tem-se o Quadro 6.

Quadro 6. Propostas para o Plano Setorial de Natal.

EIXOS SEMURB GRUPOS E ORGANIZAÇÕES

SOCIAIS DE PONTA NEGRA

Gestão Implantação integrada dos instrumentos

propostos no Plano Diretor

Controle do gabarito, da valorização

imobiliária, redução da “expulsão branca”,

contenção da especulação imobiliária.

Infraestrutura Integração entre os instrumentos

proposto no Plano Diretor e os projetos

urbanísticos ou arquitetônicos de grande

escala e a infraestrutura.

Controle do adensamento, controle do

crescimento, saneamento básico e

verticalização.

Redução da

escala de

planejamento

Estratégia de implantação do

planejamento definido no Plano Diretor

e PD em menor escala.

Maior controle social e possibilidade de

mais diálogo entre as esferas pública e

social.

UP* Bacia hidrográfica e sistema viário O bairro

Qualidade de

vida

Proteção dos recursos hídricos: bacias e

esgotamento sanitário no centro dos

debates

Proteção da paisagem; manutenção da

qualidade de vida: questões ligadas a

turismo, infraestrutura, conforto ambiental,

verticalização e segurança.

Propostas Primeiro setor: Ponta Negra, Capim

Macio e Neópolis.

Primeiro setor: Ponta Negra

Fonte: Elaborado pela autora, 2011. * Unidade de Planejamento

61

Artigo que define o Plano Setorial no Plano Diretor (NATAL, 2007). 62

Como são comumente chamados os espaços dos conjuntos habitacionais iniciais do BNH. O conjunto

virou sinônimo de toda área habitacional, inclusive as áreas de expansão, voltadas a este uso. 63

Pesquisa de Opinião Pública desenvolvida pela CONSULT em parceria com o Curso de Arquitetura e

Urbanismo da UNP e a AMPA. Com enfoque na Imagem socioambiental dos moradores dos Parques

Residenciais Ponta Negra e Alagamar, Fevereiro de 2007.

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Destacando a expressiva participação social e a proposta pactuada entre SEMURB e as

organizações sociais que foi aprovada na Câmara dos Vereadores, o Plano Setorial foi instituído

no Plano Diretor de Natal, LC 82/07. No item seguinte desta dissertação será aprofundada a

discussão sobre os artigos 118 e 119, apresentados pelas representações e grupos sociais do

bairro de Ponta Negra e que estabeleceu o Plano Setorial na localidade.

4.2 PONTA NEGRA COMO PRIMEIRO SETOR INSTITUÍDO NO

PLANO SETORIAL: PRAZO E PARÂMETROS URBANÍSTICOS

Com a aprovação da LC 82/07 foram confirmados prazos e parâmetros urbanísticos

definidos nos artigos 118 e 119,

Art. 118 - Deverá ser elaborado em um prazo de 12 (doze) meses o Plano

Setorial de Ponta Negra.

Art. 119 - Até a regulamentação do Plano Setorial de Ponta Negra fica

estabelecido o seguinte:

I - Os parâmetros urbanísticos para todo o perímetro de que trata o caput

deste artigo, sejam os referentes às áreas de adensamento básico, salvo as

áreas especiais;

II - Fica proibido o remembramento e gabaritos superiores a quatro

pavimentos, para os parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar;

III - Os índices urbanísticos regulamentados do Plano Setorial referido no

caput deste artigo deverão considerar as condições de conforto ambiental e a

disponibilidade de infraestrutura e manutenção (NATAL, 2007 s.p.).

O prazo de um ano estabelecido no artigo 118, não foi cumprido. Entretanto, em 2008 o

Instituto Brasileiro de Administração Municipal - IBAM foi contratado para desenvolver um

estudo para a regulamentação do Plano Setorial de Ponta Negra. Em 2011 a SEMURB/IBAM

apresentaram os estudos e uma proposta técnica que resultou em um anteprojeto de Lei64

e que

deu início ao processo participativo por meio de Audiências Públicas.

Embora o Plano Setorial viesse sendo objeto de discussão na SEMURB durante o

estudo, decorreram quatro anos para que o Plano Setorial viesse a ser apresentado e discutido

com a sociedade. Essa dificuldade de regulamentação já era percebida por técnicos da

SEMURB em razão de outras experiências verificadas no Plano Diretor de Natal. Maria Florésia

menciona, por exemplo,

A ideia era articular e fazer a regulamentação, porque a gente sabia que era

humanamente impossível regulamentar, nem em 6 meses, nem em um ano,

nem em dois anos. Olha pra você ver, em 10 anos regulamentou 3 AEIS, só

64 SEMURB. PL 23: Versões finais dos Planos Setoriais. Projeto de Modernização da Gestão

Administrativa e Fiscal do Município do Natal. Relatório Fase II, Módulo 3, Urbanístico. Produto 9.

Subprojeto 2: atualização e consolidação da legislação. Natal: IBAM, SEMURB, 2010. Disponível em:

<http://www.natal.rn.gov.br/semurb/paginas/ctd-229.html>. Acesso em: 10 jul. 2012.

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de favela tinha 70, fora as milhões de vilas, como você vai regulamentar

isso? A gente que tá lá dentro, a gente sabe que isso não ia acontecer 65

.

Observa-se que não há penalidade para o não cumprimento do prazo estabelecido no

Plano Diretor, muito embora haja uma sinalização de prioridades para regulamentação das áreas

especiais e de determinados instrumentos.

O artigo 119 instituiu índices e parâmetros para os parques residenciais de Ponta Negra

e Alagamar, cuja área de abrangência está representada na Figura 12. Nessa área estão previstos

a proibição de remembramento e o limite de quatro pavimentos para as edificações. As demais

áreas, excetuando as áreas especiais, foram instituídas como Zona de Adensamento Básico,

sendo definido coeficiente de aproveitamento de 1.2. O artigo 119 estabeleceu esses parâmetros,

enquanto não houvesse regulamentação do setor.

Figura 12. Limites do Plano Setorial de Ponta Negra, segundo o artigo 119.

Fonte: Elaborado pela autora, 2012, com base nos dados da LC82/07.

65

Maria Florésia Silva de Sousa e Silva, servidora pública da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e

Urbanismo, participou da equipe técnica que formulou o Plano Setorial de Natal como instrumento no

Plano Diretor de Natal. Em entrevista concedida à autora, set.2009.

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Tal como definido no Plano Diretor de Natal, o inciso III66

do artigo 119 indica que

pode haver proposição de outros índices urbanísticos no Plano Setorial, cabendo aqui o alerta já

apresentado na discussão sobre o artigo 90, de que indicações dessa natureza podem fazer com

que o Plano Setorial defina parâmetros concorrentes àqueles estabelecidos no Plano Diretor ao

qual ele está vinculado.

4.3 ANÁLISE DO PLANO SETORIAL DE PONTA NEGRA (2007-

2012)

4.3.1 Caracterização do Bairro de Ponta Negra (1970-2007)

Para compreender a inserção do Bairro de Ponta Negra no Plano Diretor de Natal, como

setor do Plano Setorial, apresentam-se aqui aspectos da sua dinâmica urbana. Localizado na

Zona Administrativa Sul da cidade, o bairro de Ponta Negra é formado pelo Conjunto Ponta

Negra, Alagamar, a orla marítima – onde se destaca o Morro do Careca e dunas adjacentes, ZPA

6 (cartão postal da cidade) e pela Vila de Ponta Negra, além de uma área adjacente que engloba

a ZPA 5, da Lagoinha. Observar Figura 13, Figura 14 e Figura 15. Está situado a 15 km do

núcleo original de Natal (bairro de Cidade Alta e Ribeira), e possui os seguintes limites: ao

norte – o bairro de Capim Macio e o Parque das Dunas, ao sul – o município de Parnamirim, a

oeste – o bairro de Neópolis, e a leste o oceano atlântico (SEMURB, 2008).

A Vila de Ponta Negra apresenta potencialidades de se tornar um espaço de turismo

ecológico e artesanal, apresentando frações urbanas com traçado orgânico, ruas estreitas e um

sistema de pequenos lotes, e outras frações com lotes em formato de granjas. Quanto ao uso do

solo, além do habitacional e dos serviços voltados ao atendimento das necessidades da

população local, instaurou-se um polo de atendimento ao turista, com serviços de bares,

restaurantes e pousadas (SEMURB, 2008).

O conjunto habitacional de Ponta Negra, construído pelo BNH, na década de 1970,

trouxe ao bairro um parcelamento retangular, com grandes áreas de praças e lotes de no mínimo

360m². As ocupações atuais são em formato vertical (Figura 16) e em condomínios fechados

horizontais. Estes foram organizados nos lotes existentes do conjunto habitacional (conhecidos

66

“III - Os índices urbanísticos regulamentados do Plano Setorial referido no caput deste artigo deverão

considerar as condições de conforto ambiental e a disponibilidade de infraestrutura e manutenção”

(NATAL, 2007 s.p.).

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atualmente como parques residenciais) de Ponta Negra e Alagamar e Vila de Ponta Negra, ou

ocupando novas áreas na extensão da Rota do Sol (Figura 17).

Figura 13. Limites e Macrozoneamento do Bairro de Ponta Negra, com base no Plano Diretor de 2007.

Fonte: Base da SEMURB, 2009.

Nota: Alterado para destaque do bairro de Ponta Negra

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Figura 14. Morro do Careca e dunas adjacentes. Vista da praia de Ponta Negra.

Fonte: FURUKAVA, 2011.

Figura 15. Composição do bairro de Ponta Negra.

Fonte: NEVEROVSKY, 2005

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Figura 16. Vista da verticalização no bairro de Ponta Negra, a partir da area non aedificandi.

Fonte: FURUKAVA, 2012.

Figura 17. Vista da verticalização em Ponta Negra, sentido Alagamar – Via Costeira.

Fonte: FURUKAVA, Camila, 2009.

O bairro tem uma localidade privilegiada na cidade, tanto pelas belezas naturais

existentes, quanto por ser uma área de interseção entre os municípios de Natal, Extremoz e

Parnamirim. É passagem litorânea das praias do Norte e do Sul, ou seja, uma rota turística,

servida pela Av. Eng. Roberto Freire (interligação direta com a BR101, e consequentemente

com o Aeroporto Internacional Augusto Severo), Rota do Sol e Via Costeira. A localidade

gerou ao bairro uma valorização imobiliária e um espaço atraente para os investimentos

públicos e privados.

A valorização imobiliária intensificou a especulação imobiliária no bairro de Ponta

Negra. Ao compreender que há uma conjuntura de fatores que atuam sobre a qualidade de vida,

buscou-se analisar alguns destes no contexto histórico, que resultaram na motivação para a

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inserção do Plano Setorial de Ponta Negra. O crescimento do bairro se aproximou de uma

realidade brasileira, conforme identificado por Raquel Rolnik,

Esse modelo de crescimento e expansão urbana, que atravessa as cidades de

Norte a Sul do país, tem sido identificado, no senso comum, como “falta de

planejamento”. Segundo esta acepção, as cidades não são planejadas e, por

esta razão, são “desequilibradas” e “caóticas”. Entretanto, [...] trata-se não da

ausência do planejamento, mas sim de uma interação bastante perversa entre

processos socioeconômicos, opções de planejamento e de política urbana, e

práticas políticas, que construíram um modelo excludente, em que muitos

perdem e pouquíssimos ganham (ROLNIK, 2005:24).

Embora haja um momento econômico de intensa especulação imobiliária, a participação

ativa da sociedade na proteção desta área, especialmente contra o processo de verticalização e

em defesa da proteção da paisagem, que datam da década de 1970 aos dias atuais, é um

diferencial na estrutura local de participação, que cobra a gestão democrática e o direito à

cidade. Como foi observado nas,

[...] duas manifestações populares contra os investimentos públicos e

privados no bairro de Ponta Negra, a luta contra os espigões, em 1985, e o

Movimento SOS Ponta Negra, em 1987, apesar da área não apresentar ainda

nenhum edifício acima de 4 pavimentos. Essas manifestações, segundo

entrevista realizada com a professora Ruth Athaíde, estavam associadas à

proteção da paisagem e do meio ambiente, e é continuação de um debate que

tem início ainda em 70, como um dos desdobramentos do movimento que

houve contra a construção da Via Costeira (FURUKAVA; PINTO, 2008:44).

Assim como visto no Brasil, em Natal, a partir de 1970, foi iniciada a elaboração dos

planos diretores, que passam a ser mais voltados ao zoneamento e à indicação de parâmetros e

índices, sem espacializar a localização das intervenções propostas, dificultando os debates com

a sociedade. Mesmo assim, existem registros da participação ativa dos moradores do bairro de

Ponta Negra. Na década de 1980,

segundo Costa (2000), o crescimento da cidade do Natal, se justifica pelos

planos econômicos impostos pelo governo federal, que tiveram como

objetivo frear as taxas inflacionárias e os problemas financeiros que

acentuavam o problema de desemprego. Os agentes imobiliários começam a

investir maciçamente na construção civil, principalmente nas construções

verticalizadas na região leste e sul da cidade, mesmo em locais sem

infraestrutura, como Lagoa Nova, e Capim Macio. Em 1981 é construído o

Conjunto Natal Sul, e em 1989 o Serrambi em Ponta Negra. Nesse período

surgiram na Vila novos moradores, de outros bairros ou do interior, que

passaram a se dedicar às atividades turísticas. A Vila recebeu ainda alguns

imigrantes. Em 1983, apresentava 500 casas e 2 mil habitantes, dos quais

25% correspondiam a moradores de outras localidades (FURUKAVA;

PINTO, 2008: 42-43).

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Observou-se então, no final da década de 1970 e na década de 1980, as primeiras

modificações no bairro, com investimentos na orla e no turismo local, assim como na

mobilidade, com a construção da Via Costeira e a duplicação da Estrada de Ponta Negra (atual

Av. Engenheiro Roberto Freire). Em 1994, com a aprovação do Plano Diretor, Lei

Complementar 7/94, estabeleceu-se que o Bairro de Ponta Negra era uma Zona de Adensamento

Básico, com potencial construtivo de 1.8. Quanto à densidade esta era de 180 hab/ha (NATAL,

1994).

Todos os usos são permitidos na Zona Urbana exceto os passíveis de autorização

especial do CONPLAM, conforme o estabelecido no art.31 e 33 da Lei Municipal 4.100/92. O

tamanho do lote mínimo passou a ser de 280m² e a taxa de ocupação máxima deixa de ser 50%

para ser 70%, com taxa de impermeabilização máxima de 80% da área do lote. Não há limite

máximo de gabarito, com exceção das áreas especiais de gabarito específico. Ou seja,

legalmente começava-se o incentivo de ocupação da área (NATAL, 1994). Foram reafirmadas

no Plano Diretor de 1994, a Zona Especial Turística (ZET)-1, a area non aedificandi de Ponta

Negra e a Zona de Proteção Ambiental (ZPA) do Morro do Careca. Além disto, na Lei

Complementar 07/94 foi retirada parte da Zona de Proteção Moderada (Figura 18) existente no

Plano Diretor de 1984 e foi estabelecida a ZPA da Lagoinha, regulamentada em 2005.

Na década de 1990 identificou-se um momento favorável a investimentos econômicos

internacionais e nacionais que influenciaram diretamente a formulação e a instituição de

parâmetros legais no bairro. Esses resultaram em uma transformação na configuração espacial

de Ponta Negra, por meio do direcionamento dos investimentos públicos e, caminharam muitas

vezes, em contraposto às requisições e manifestos sociais. Neste período foi definida a Política

Nacional de Turismo por meio do Programa de Desenvolvimento do Nordeste –

PRODETUR/NE, com o objetivo de investir no desenvolvimento turístico a partir da

implantação de infraestrutura urbana. Ponta Negra era uma área potencial e foi beneficiada com

obras financiadas pelo (PRODETUR/RN). Tais obras foram a construção da Avenida Rota do

Sol, a pavimentação das ruas, o saneamento básico (que não atingiu todo o bairro), a iluminação

pública e as obras de urbanização da orla, finalizadas em 2000 - estes deram mais acessibilidade

e localidade ao Bairro, segundo Catarina Neverovsky (2000).

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Figura 18. Comparação entre as Zonas de Proteção Ambiental do Plano Diretor de 1984 e de 1994.

Fonte: DUARTE, 2011

Nota: Alterado pela autora, para destaque de Ponta Negra.

Convergente a Alexsandro Ferreira Cardoso da Silva (2010), coube citar Raquel Rolnik,

que mesmo ao tratar do Brasil, se aplicou ao caso de Ponta Negra,

[...] as partes mais qualificadas sob o ponto de vista da localização,

infraestrutura e qualidade urbanística, por serem escassas, tornam-se objeto

de cobiça e disputa por parte de empreendedores, gerando também muito

conflito em relação a usos e potenciais permitidos e, muitas vezes, gerando

sobrecarga nas infraestruturas instaladas. Historicamente são estas áreas que

recebem mais investimentos públicos, o que acaba por valorizar o preço da

terra e aumentar ainda mais o fosso existente entre as partes rica e pobre das

cidades. A sobreposição de investimentos públicos e privados acaba por

valorizar o preço da terra, o que incentiva a retenção especulativa das terras e

premia com a valorização aqueles que esperam por utilizar seus terrenos. Este

sistema, francamente apoiado por processos que geram sobreoferta de terra e

espaço construído para as classes médias e pelo imenso valor estratégico da

propriedade imobiliária do país, tem provocado grandes distorções na

estrutura das cidades brasileiras, com áreas centrais ociosas, em contraste

com periferias superadensadas e precárias. Além de representar uma

distribuição extremamente injusta dos recursos territoriais e investimentos

públicos, esse tipo de urbanização é prejudicial a toda a cidade. O

espraiamento e a expulsão dos pobres rumo à periferia provocam sobrecarga

nos sistemas viários e de transporte público e requer infindáveis aplicações

da rede de infraestrutura (ROLNIK, 2005: 62).

Em 1999, por meio da Lei Complementar 22/99 e, em 2000, pela Lei Complementar

27/00, houve alterações no Plano Diretor de 1994. Em 1999 existiu o aumento na densidade do

Bairro de Ponta Negra para 225 hab/ha e a Lei inseriu parte do bairro em Zona adensável.

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Contudo, isto não se aplicou aos terrenos lindeiros à Av. Roberto Freire, segundo o dispositivo

anunciado no art3º da Lei Complementar n° 22/99. A partir disto, os empreendimentos

edificados na zona definida pelo art. 1º, só passariam a receber o habite-se após a devida ligação

à rede de esgotamento sanitário implantada nesta Zona. Na Lei Complementar de 2000, o bairro

tornou-se Zona Adensável, com densidade de 350 hab/ha e coeficiente de aproveitamento

máximo de 3.5, na área indicada na Figura 19. As Leis 22/99 e 27/00, aliadas a uma conjuntura

de fatores, tais como os investimentos internacionais no bairro, tiveram como consequências o

intenso adensamento espacial e a acentuada verticalização de uma faixa do perímetro delimitado

na lei, formando um “paredão” de edifícios, conforme mostra a Figura 22. Para Ruth Ataíde67

,

esse aumento na densidade permitiu a construção de unidades habitacionais com áreas

reduzidas, o que significou mais unidades por empreendimento e passou de uso unifamiliar para

multifamiliar, gerando um impacto sobre as redes de infraestrutura.

Figura 19. Área de abrangência da lei complementar 27/2000.

Fonte: DUARTE, 2011.

Estas alterações abriram margem para um intensa verticalização e mudança de uso no

bairro, crescente valorização imobiliária e “expulsão branca” 68

dos moradores. Assim, uma

67

Em entrevista realizada no dia 28 de novembro de 2008 a Camila Furukava e Karen Alvares Pinto. 68

O termo “expulsão branca” refere-se à expulsão dos moradores mais antigos da Vila de Ponta Negra,

com destaque aos menos favorecidos, por meio da pressão da compra de terrenos, que o mercado

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95

mudança no cotidiano local, um crescimento econômico e de serviços que não se aplicaram a

todas as áreas do bairro e da sociedade. Segundo um morador local,

‘Tudo está disconforme’, dizia seu Piloto, antigo morador da Vila de Ponta

Negra. Com esta frase podemos resumir a concepção dos moradores mais

antigos da Vila. Tudo está fora do lugar, são novas formas de vida

construindo novos valores. A Vila está um ‘desmantelo’, um ‘desarranjo’.

Essas são expressões usadas pelos mais antigos para descrever a situação da

vila hoje. A diversidade de pessoas circulando nas ruas, a prostituição, os

jovens envolvidos com o tráfico de drogas, o grande numero de adolescentes

grávidas, o alcoolismo, os carros trafegam em alta velocidade nas estreitas

ruas, os estrangeiros tomando conta de tudo, (...) condomínios fechados e

fortificados pelos diversos sistemas de segurança. São essas e outras que

deixam antigos moradores perplexos (SILVA, 2006, p.106 apud SILVA,

2010:326)

Como impacto espacial resultante do incentivo legal, econômico e urbanístico, tem-se a

Figura 20, a Figura 21 e a Figura 22.

Figura 20. Duplicação da Estrada de Ponta Negra, atual Eng. Roberto Freire, década de 1980*

Fonte: FURUKAVA; PINTO, 2008 apud NEVEROVSKY, 2005.

Nota: Data aproximada.

imobiliário vem realizando, além do aumento do custo de vida local – alugueis, impostos, entre outros

(FURUKAVA; PINTO, 2009).

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Figura 21. Vista aérea da Av. Eng. Roberto Freire, década de 1990

Fonte: NEVEROVSKY, 2005

Figura 22. "Paredão" de edifícios em Ponta Negra, cruzamento da Av. Roberto Freire com a Rota do Sol.

Fonte: FURUKAVA, 2008.

Datas aproximadas

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97

Para Silva (2010), em 1999 começaram a surgir sinais da demanda internacional para o

mercado imobiliário, com público alvo composto por portugueses e espanhóis, no qual 75%

eram de investidores e 25%, de pessoas para morar. Entretanto, o mercado não estava preparado

para a demanda. Ao se basear nos dados da SEMURB, o autor identificou que em Ponta Negra,

entre 1997 e 1999, não ocorreu pagamento da outorga onerosa. Contudo, entre 2000 e 2004,

foram necessários 116 mil metros quadrados adicionais para atender a demanda. O autor

relacionou este fator à alteração na legislação urbana para o bairro, realizada a partir da

iniciativa da Administração Municipal, por meio da Lei Complementar 27/00, na ampliação do

coeficiente de aproveitamento, entre outros. Estes agentes correlacionados levaram o preço

médio do imóvel de 2003 a 2004 a crescer 52,8%, segundo dados do SINDUSCON e a receber

em 2004, 1.559 apartamentos e edifícios com mais de 10 andares. (SILVA, 2010).

Essa valorização do solo em Ponta Negra em 2006, fez o valor do metro quadrado

chegar a R$ 6.000 (seis mil reais), segundo registro da Tribuna do Norte (2008). A quantidade

de empreendimentos do tipo flat chegou a 48%, maior que os empreendimentos de uso

unifamiliar com 28%, isto pela conjuntura de fatores como os investimentos estrangeiros

(privados) e públicos no local, a legislação permissiva, a mudança de uso trocou os

apartamentos residenciais por flats, que tinham unidades de menor dimensão – com no máximo

45m², segundo a lei 4566/92 (ZUMBA et al,2008).

Em entrevista com o engenheiro civil Wescley Gomes Magalhães, do Programa de

Licenciamento e Qualidade e Gerente de Obras, da Construtora Colmeia, filial em Natal/RN a

concentração de empreendimentos verticais na faixa da Roberto Freire e da Rota do Sol, neste

período, justificou-se pelo fato de,

Assim que veio o turismo e a legislação, muita gente correu pra lá. A gente

viu esse crescimento, tanto que ali próximo ao Funchal, a gente tem duas

torres imensas, foi o primeiro empreendimento, vendemos em 40 dias 137

apartamentos, recorde para empresa. Isso encheu os olhos, colocamos a

primeira isca e colhemos um peixe daquele tamanho, vamos colocar mais. A

construtora viu que ali tinha muito interesse, muita demanda69

.

Além disto, o engenheiro reforçou que este trecho foi bastante procurado pela

valorização do solo, assim como Areia Preta. Contudo, há um diferencial, os empreendimentos

em Ponta Negra são do tipo Flat e não edifícios residenciais. Para ele, a escolha do tipo de

empreendimento e sua localização é uma questão estratégica, indicando o perfil dos

compradores de imóveis.

69

Em entrevista realizada com o engenheiro civil da Construtora Colmeia, filial em Natal/RN, em 2008.

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Neste perfil de comprador internacional, muitas das unidades construídas ficaram vazias

(imóvel como investimento) ou apenas tinham ocupação durante três meses do ano (período de

férias europeu). Isto modificou também o perfil social local. Com o inicio da ocupação dos

terrenos de outras áreas do bairro para a verticalização, do tipo flat, foi observada uma

sobrecarga nos sistemas de infraestrutura, especialmente o esgotamento sanitário. Isto porque

nem todo o bairro foi estruturado com a rede de saneamento básico, incluindo a parte do setor

residencial e as áreas do entorno da Rota do Sol.

Estas modificações socioambientais e espaciais no bairro mobilizaram novamente a

comunidade, que compôs grupos e ações sociais, especialmente de monitoramento e

publicização do que ocorre no bairro, como o SOS Ponta Negra e o fortalecimento das

associações de moradores e de conselhos de bairro. Isto objetivando a defesa da paisagem, a

busca de melhorias para a infraestrutura local e contra a perda de qualidade de vida no bairro.

Estas mobilizações sociais e a recomendação do Ministério Público resultaram no cancelamento

de licenças urbanísticas e ambientais de cinco prédios verticais no entorno do Morro do Careca,

dentro da Vila de Ponta Negra (SILVA, 2010).

Este caso da emissão das licenças e cancelamento destas, somado em 2006 aos

problemas de esgotamento sanitário, geraram várias disputas entre o poder público e o setor da

construção civil, representando para o setor privado, uma lerdeza na liberação do licenciamento.

Segundo reportagem da Tribuna do Norte, “O sistema foi elaborado em 1996 e executado em

2000 com projeção para manter-se até 2016. Não deu - o colapso chegou antes. E, no começo de

2005, não suportou a demanda gerada pelos hotéis” (PONTA NEGRA..., 2008).

Destaca-se que mesmo com este quadro houve um crescente número de pedidos de

licenciamento no ano de 2006, pois nos debates de revisão do Plano Diretor buscava-se diminuir

o potencial construtivo de áreas como Ponta Negra, retornando-o a uma Zona de Adensamento

Básico. Essa medida visava utilizar parâmetros mais permissivos para a área do que os que

estavam sendo debatidos na revisão do Plano Diretor ou em medidas de contenção do

adensamento. Segundo o estudo sobre a emissão de licenciamentos em Natal, em 2006 foram

abertos 86 processos para licenciamento na SEMURB, sendo 26% para o bairro de Ponta Negra.

Em 2007 foram 25 processos (ZUMBA et al, 2008).

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99

Figura 23. Licenciamento por bairro em Natal, 2006.

Fonte: ZUMBA et al, 2008

Segundo Alexsandro Silva (2010),

A tipologia dos empreendimentos imobiliários-turísticos em Ponta Negra é

marcada pelo uso intensivo do lote que, na sua maioria, variam entre 300m² e

400m² devido ao padrão anterior dos loteamentos. Isso exigiu prédios

esbeltos e com máximo aproveitamento de gabarito, principalmente quanto

mais próximos à orla marítima. Na parte posterior do bairro, mais afastados

na Av. Roberto Freire, alguns terrenos remanescentes passaram por

remembramento gerando lotes de até 1000m² o que permitiu construção de

torres com até 100 unidades (SILVA, 2010: 330).

Já em 2007, observou-se uma queda para 14% nos licenciamentos em Ponta Negra,

entretanto, ainda liderando quantitativamente os pedidos na cidade. O estudo deu destaque,

ainda, que dos licenciamentos emitidos em 2007, 22% têm entre 50 e 100 unidades

habitacionais e 17% têm mais de 100 unidades habitacionais. E 48% têm uso de flat (ZUMBA

et al, 2008).

Com a situação de saturação do esgotamento sanitário em Ponta Negra, da degradação

da praia e da poluição dos poços de água potável (MESQUITA; BEZERRA; FERNANDES,

2007), foi publicado o Decreto n° 8.090, onde houve uma suspensão provisória dos

licenciamentos em Ponta Negra, no ano de 2007. Segundo reportagem de um jornal local em

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100

2008, a CAERN afirmou que não havia mais como liberar construções na área antes da

ampliação do sistema (SANEAMENTO...,2008).

Figura 24. Licenciamento por bairro em Natal, 2007.

Fonte: ZUMBA et al, 2008

Outra área fragilizada foi a ZPA 5 – Lagoinha, que teve várias propostas de alteração da

legislação específica, algumas delas desconsiderando o bem comum e os dados técnicos,

favorecendo a poucos. Atualmente, a legislação que a regulamenta está em fase de revisão

(DUARTE, 2011).

Compreende-se que a pressão imobiliário-turística, econômica internacional e local

resultou na fragilização de áreas sociais e ambientais protegidas por lei, além disso, percebe-se:

(i) a modificação da legislação, possibilitando a segregação socioespacial, observado na Figura

25; (ii) o procedimento de “expulsão branca” da sociedade menos favorecida70

; (iii) a emissão

de licenças públicas em áreas protegidas, fragilizando a defesa da paisagem; (iv) o crescente

problema social da área, marcado pela prostituição infantil e tráfico de drogas; (v) a mobilização

social contra tendência do mercado, a favor da preservação e da qualidade de vida; (vi) a

emergência do debate sobre a necessidade de infraestrutura urbana e aplicação dos instrumentos

propostos no Estatuto da Cidade e no Plano Diretor para garantia do direito à cidade.

70

Onde o recebido pelo terreno vendido não permite comprar um empreendimento no mesmo local ou

sua renda, não permite que este se mantenha neste novo empreendimento, então esta população passa a

ocupar áreas da periferia não urbanizadas como Lago Azul, em Pium, região de Nísia Floresta e uma

porção do bairro Planalto – como observado na remoção da favela do Peão;

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101

Figura 25. Muro que separa o condomínio fechado da Vila de Ponta Negra.

Fonte: Arquivo pessoal, 2012

Essas pressões, a verticalização intensa, a modificação do cotidiano da população

residente, a sobrecarga na rede de infraestrutura, a ameaça a espaços ambientalmente

protegidos, entre outros fatores, foi o contexto que mobilizou a comunidade de Ponta Negra a

inserir e debater o Plano Setorial para o bairro. Conforme visto na fase de formulação do Plano

Setorial (2006-2007) este apresentou um formato potencial para conter a verticalização, trazer

uma nova dinâmica de planejamento e gestão menos segregadora, ao visar garantir a qualidade

de vida dos moradores. Cabe lembrar que esta avaliação foi fragilizada pela não regulamentação

do setor.

4.3.2 Análise do Plano Setorial de Ponta Negra (2007-2012)

O Plano Diretor de Natal (Lei Complementar 82/07) redefiniu Ponta Negra como Zona

de Adensamento Básico, com potencial construtivo de 1.2. Instituiu que até a provação do Plano

Setorial de Ponta Negra fica proibido o remembramento e as construções acima de quatro

pavimentos nos parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar (NATAL, 2007), tal como foi

demandado pelas organizações sociais de Ponta Negra, em 2007. Outra conquista foi a definição

da Vila de Ponta Negra como Área Especial de Interesse Social - AEIS, com restrição de

remembramento e de construções acima de 7,5m, visando a contenção da especulação

imobiliária e “expulsão branca” em curso nessa área.

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Figura 26. Zoneamento da Legislação em Ponta Negra.

Fonte: Elaborado pela autora, 2012. Com base de dados da LC82/07.

Para realização da análise do Plano Setorial de Ponta Negra no presente trabalho,

priorizou-se: (i) a verificação dos objetivos específicos definidos na Lei Complementar 82/07;

(ii) os elementos identificados na revisão de experiências similares no Brasil e em outros países;

(iii) o direcionamento para efetivação de direitos e princípios, como o princípio da função

socioambiental da propriedade estabelecido na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade de

2001; o direito à cidade estabelecido no Estatuto da Cidade e; o direito à moradia instituído no

art.6º da Constituição Federal de 1988. Buscou-se, portanto, observar: (i) a consideração aos

planos, projetos e instrumentos previstos no Plano Diretor; (ii) a compatibilização destes com a

capacidade das redes de infraestrutura; (iii) a consideração aos instrumentos e procedimentos de

gestão democrática; (iv) o atendimento às demandas sociais de criação de um instrumento que

atuasse sobre a contenção da verticalização e a melhoria na qualidade de vida do bairro.

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Ponta Negra consiste atualmente em um dos maiores bairros da cidade com população

de 24.681 habitantes, segundo censo demográfico realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE, 2010). Em relação ao censo de 2000 verifica-se um acréscimo de

1.081 habitantes em 10 anos, ou seja, um crescimento populacional de aproximadamente 5%.

Desses habitantes 74,4% têm entre 15 e 64 anos e 6,9% têm mais de 65 anos, sendo 11.582

homens e 13.099 mulheres (IBGE, 2010).

No quesito habitação, segundo dados do IBGE (2010), o bairro apresentou 34,3% dos

domicílios permanentes, desocupados, ou seja, aproximadamente 4.146 (quatro mil cento e

quarenta e seis) unidades de vacância habitacional. São tipos de domicílio: apartamento, casas e

cômodos. Os apartamentos totalizaram 2.528 unidades (IBGE, 2010), 1.346 unidades a mais

que no ano de 2000 (IBGE, 2000). Isto resultou em um crescimento de aproximadamente 113%

(IBGE, 2010). Estes valores não foram coerentes com aumento populacional local, o que

indicou uma intensa especulação imobiliária.

Este quadro de vacância das unidades habitacionais se apresentou pela construção

independente da demanda; pela diminuição dos investimentos e dos turistas estrangeiros; pela

renovação de licenças e alvarás emitidos sob a legislação anterior ao Plano Diretor de 2007,

renovadas anualmente. Isto se constatou, uma vez que os projetos encaminhados para avaliação

em 2006 e 2007 estão sendo construídos até 2012, repercutindo em um maior impacto sobre a

rede de infraestrutura do bairro e ao adensamento local.

Além disto, a renovação das licenças fragilizou e quebrou a proposta da sociedade,

identificada na pesquisa realizada pela CONSULT (2006), onde se pretendia limitar o gabarito

nos parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar a quatro pavimentos, visando uma melhor

qualidade de vida.

As áreas externas aos parques residenciais (Figura 26) foram fortemente adensadas

neste período, em desconformidade com o terceiro parágrafo do artigo 1371

do Plano Diretor,

conforme Figura 27. Essas construções geram forte impacto ao sistema de infraestrutura de

Ponta Negra e a bairros vizinhos.

71

Art. 13, “§3º - Considera - se configurada a tendência de saturação de um dos itens da infraestrutura

urbana, mencionada no artigo 12, quando utilizado 80% (oitenta por cento) da planta do sistema

instalado, devendo o Município: I - informar a população mediante publicação no Diário Oficial do

Município, em jornais de grande circulação e em outros meios de comunicação passando a monitorar

semestralmente o número de licenças expedidas na área tendente a saturação; II - suspender a concessão

de outorga onerosa e transferência do potencial construtivo na área tendente saturação; III - incluir na

previsão orçamentária os recursos necessários para evitar a saturação da infraestrutura urbana na área em

questão. IV - buscar junto às concessionarias de serviços públicos a adoção das medidas necessárias para

evitar a saturação de sua respectiva planta” (NATAL, 2007 s.p.).

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Quanto ao critério de compatibilização das licenças e alvarás de construção com a

capacidade de suporte da rede de infraestrutura, considerando o impacto cênico paisagístico,

este não ocorreu, havendo a liberação das licenças cassadas dos prédios no entorno da ZPA 6 e

em uma AEIS (Vila de Ponta Negra) em 2012 (OPERAÇÃO..., 2012) e pela construção de

outros edifícios no bairro sem que as concessionárias tenham ampliado à capacidade de

tratamento da rede de esgoto (CAERN, 2010).

Figura 27. Licença de instalação de um empreendimento em Ponta Negra, licenciado no Plano

Diretor de 1994, com proposta de inicio de construção em 2013.

Fonte: Imobiliária Caio Fernandes, 2011.

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Quanto à rede de infraestrutura, dos 12.182 domicílios particulares e coletivos, que

correspondem a 23,77% dos domicílios da Zona Sul, apenas 4.335 são atendidos pela rede de

esgoto e drenagem (captação das águas pluviais). Isto significa que 35,58% do bairro são

saneados em relação aos domicílios, ainda assim, corresponde a 5,84% do saneamento da cidade

do Natal, que é apenas 31% servida pela rede geral de esgoto (IBGE, 2010).

O abastecimento de água das Zonas Sul, Leste e Oeste de Natal, inclusive do Bairro de

Ponta Negra é realizado por meio da exploração de poços tubulares, “aproximadamente 78% e

pelo manancial da Lagoa do Jiqui, aproximadamente 22%, pertencente à Bacia Hidrográfica do

Rio Potengi” (CAERN, 2010 s.p.). Segundo relatório da UFRN, os poços de Ponta Negra e

Capim Macio, entre outros 45 poços na cidade, estão contaminados por nitrato acima do

permitido pela Resolução 518/0472

. Segundo o mesmo, esta contaminação é causada

principalmente - conforme os dados apresentados no parágrafo anterior - pela falta de uma rede

de esgotamento sanitário, gerando problemas de saúde pública, já que o nitrato torna a água

imprópria para beber e gera risco de câncer.

[...]Na zona sul, a diluição se dá com a água que vem da Lagoa que contribui

com 25% do abastecimento de água da região sul) e na zona norte, a diluição

é realizada com a água que vem da Lagoa de Extremoz (que contribui com

75% da água de abastecimento da região norte). Ocorre que, elas análises

realizadas pela UFRN, essa diluição não tem sido realizada de modo

eficiente, uma vez que foi detectada a existência de nitrato em alguns

reservatórios (como é o caso dos Reservatórios R-5 (que recebe água dos

poços de Lagoa Nova e Capim Macio); R-9 (que recebe água dos poços de

Felipe Camarão, Jiqui, Candelária e San Valle); R-16 - Zona Norte).

Ressalta-se que foi encontrado nitrato até mesmo na rede de distribuição,

situação que pode ser reputada como gravíssima (MESQUITA; BEZERRA;

FERNANDES, 2007:2).

Uma solução para isto foi a ampliação da Estação de Tratamento localizada na Rota do

Sol, sentido Nova Parnamirim. Segundo o site da CAERN, a Estação recebe atualmente, os

esgotos da Praia de Ponta Negra, Vila, de parte do Conjunto Ponta Negra, do Praia Shopping e

adjacências, bem como de toda a rede hoteleira da Via Costeira, com uma capacidade de

contribuição média de esgotos para a população de 33.514 habitantes. Sendo a rede hoteleira da

Via Costeira composta por aproximadamente 28 mil leitos e o Conjunto de Ponta Negra tendo

aproximadamente 24.681 mil habitantes, observa-se um sistema atualmente insuficiente. Outra

72

PORTARIA Nº 518/GM. Em 25 de março de 2004. Estabelece os procedimentos e responsabilidades

relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de

potabilidade, e dá outras providências.

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possível proposta foi a Estação de Tratamento em Guarapes, sem informações adicionais no site

da concessionária (CAERN, 2010).

Quanto ao sistema de energia, existem reclamações constantes dos moradores da Vila

de Ponta Negra quanto à estabilidade da rede, e não existe rede pública de gás. Isto demanda

dos empreendimentos em fase de construção e funcionamento, o uso de geradores, o que

aumenta o custo, além de não ser uma solução que se aplique à população residente. A coleta de

resíduos sólidos do bairro compreende toda a área de Ponta Negra, atendida no período

noturno, em dias ímpares, sendo a estação de transbordo no bairro de Guarapes, Zona Oeste da

Cidade. A coleta seletiva que ocorre no bairro é realizada pela cooperativa de catadores de lixo,

que recolhe aproximadamente 200 toneladas de resíduos, com potencial para 600 toneladas

(SANEAMENTO..., 2011). O trânsito intenso e os congestionamentos são problemas correntes

relacionados às condições da infraestrutura local, causados principalmente pelo crescente

adensamento, pela expressividade dos serviços que geram impacto viário – estacionamento e

aumento do fluxo - nesta área e a própria localização do bairro e sua conectividade com os

demais bairros da cidade.

Quanto à aplicação dos instrumentos do Plano Diretor, o Plano Setorial não foi

aplicado, face à ausência de regulamentação. Também não se verificou no período em estudo a

aplicação dos instrumentos definidos no Plano Diretor, a exemplo do Direito de Preempção e do

IPTU Progressivo no Tempo. Isto favoreceu a intensificação da especulação imobiliária,

perpetuando assim, “uma dinâmica altamente perversa sob o ponto de vista urbanístico,

conforme menciona Raquel Rolnik (2005:25) “[...] de um lado, nas áreas reguladas, são

produzidos “vazios” e áreas subutilizadas; de outro, reproduz-se ao infinito a precariedade dos

assentamentos populares”. Considerando a saturação da infraestrutura urbana, constatou-se a

necessidade de contenção de futuros adensamentos (emissão e renovação de licenças) na área

até a ampliação dos sistemas, conforme observado em 2005 e investimentos pontuais em

esgotamento sanitário.

Quanto ao processo participativo segundo os parâmetros do Estatuto da Cidade, na

formulação do instrumento (2006-2007) este foi ativo e culminou na aprovação do Plano

Setorial no Plano Diretor. Entretanto, destaca-se que esta conquista não foi apenas fruto das

mobilizações sociais, uma vez que a saturação das redes de infraestrutura, associada à crise

econômica internacional de 2008, promoveu a redução dos investimentos imobiliários

internacionais na área em questão (SILVA, 2010). Identificou-se que após a aprovação do Plano

Setorial houve desmobilização da participação social embora algumas reuniões da comunidade

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local tenham sido realizadas após 200773

. A falta de perspectiva quanto à sua regulamentação

contribuiu para que o Plano Setorial não fosse discutido com prioridade na agenda política das

organizações sociais locais. Outros temas foram pautados com maior ênfase como a

regulamentação da Zona de Proteção Ambiental - ZPA 674

, a obra de reestruturação do calçadão

da praia de Ponta Negra75

, a reestruturação viária da Via Costeira e da Av. Engenheiro Roberto

Freire76

e a defesa da paisagem do Morro do Careca contra as construções de “espigões”.

Destaca-se, portanto, a atuação permanente da Associação de Moradores dos parques

residenciais de Ponta Negra e Alagamar; do Movimento SOS Ponta Negra e do Conselho de

Bairro no monitoramento das políticas públicas e das intervenções no bairro.

Figura 28. Grandes lotes vazios em um trecho da Vila de Ponta Negra.

Fonte: Furukava, 2011. Alterada pela autora.

73

Segundo Nevinha, moradora do bairro de Ponta Negra. Em entrevista concedida à autora, set.2009. 74

Após apresentada pelo IBAM/SEMURB, em junho de 2011, a Associação dos Moradores dos Parques

Residenciais de Ponta Negra e Alagamar – AMPA requereu a discussão no bairro, que resultou na reunião

no dia 24 de abril de 2012, na AMPA, quando a SEMURB reapresentou a proposta de regulamentação da

ZPA 6. Vale destacar que após esta audiência no bairro, moradores realizaram reuniões na AMPA para

produzir um documento com contribuições à proposta da SEMURB. Este documento foi validado pela

comunidade na reunião do dia 3 de maio de 2012 e entregue à Prefeitura do Natal, pela AMPA (AMPA,

2006). Por meio da pesquisa aqui apresentada foi possível desenvolvermos apoio técnico à elaboração

desta proposta. 75

Audiência Pública do dia 16 de agosto de 2012, no auditório da sede da Procuradoria-Geral de Justiça,

em Candelária. 76

Registrado na carta de justificativa social contra o projeto de engenharia da ampliação da Av.

Engenheiro Roberto Freire / Natal-RN (AMPA, 2012), entregue e apresentado em audiência pública do

dia 06/09/2012 promovida pelo Governo do Estado, no Centro Administrativo de Natal.

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Conforme visto anteriormente, o início da regulamentação do Plano Setorial ocorreu em

2008, com a contratação do IBAM, cuja proposta técnica foi apresentada à sociedade pela

SEMURB em 2011. Esse trabalho resultou no Anteprojeto de Lei do Plano Setorial de Ponta

Negra, Capim Macio e Neópolis, marcado pela ausência de discussão pública e de consideração

às propostas e estudos desenvolvidos até então por outros setores da sociedade (ONGs, grupos e

organizações sociais, outros). Ressalta-se ainda que a proposta incluiu dois bairros não

considerados no Plano Diretor de 2007, ou seja, Capim Macio e Neópolis.

Em 2011 verificaram-se as primeiras iniciativas de debate público sobre a

regulamentação dos instrumentos urbanísticos do Plano Diretor em estudo pelo IBAM, dentre

os quais estava incluído o Plano Setorial77

. A Audiência Pública de apresentação do projeto

repercutiu em um novo esforço de mobilização, articulação social e retomada das reuniões de

bairro.

Do ponto de vista da dinâmica urbana, entre 2000 e 2008, constatou-se que o bairro de

Ponta Negra apresentou incremento nos investimentos imobiliários internacionais e nas

intervenções urbanas promovidas pelo Poder Público, que resultaram em um diferente cenário

socioespacial, com efeitos sobre o aumento do valor do solo e da especulação imobiliária

(décadas de 1990 e 2000). Com a crise econômica mundial de 2008, verificou-se a redução dos

investimentos internacionais no bairro, reduzindo a venda dos empreendimentos e do preço do

metro quadrado (de R$ 6.000,00 para R$ 2.800,00). Sobre estes momentos foi observado:

Em 2009 o cenário foi outro. A maioria das Imobiliárias existentes no bairro

fechou as portas e voltaram para locais tradicionais como Petrópolis e Tirol.

Uma vez que a crise (de 2008) diminuiu a presença de investidores

internacionais do estado, os escritórios diminuíram seus lançamentos

imobiliários. Uma das imobiliárias que encerraram suas atividades no bairro,

por exemplo, foi a Euro, instalada no inicio do boom estrangeiro, com quase

60% desse público. Entretanto, essa diminuição não significou o fim do

imobiliário-turístico no bairro (SILVA, 2010:331).

Além daqueles fatores, observou-se no período 2007-2012: (i) o aumento do

adensamento construtivo, pós-aprovação do Plano Diretor de 2007, fruto dos projetos

licenciados na legislação anterior e que foram construídos acima do gabarito (quatro

pavimentos) e acima do coeficiente de aproveitamento (1.2) estabelecido no macrozoneamento

da L.C. 82/07; (ii) baixos investimentos em infraestrutura local, especialmente pelas

concessionárias; (iii) a perspectiva de obras de infraestrutura relacionadas à realização da Copa

77

Em audiência pública convocada pela SEMURB, no dia 3 de junho de 2011, realizada no SEBRAE, em

Lagoa Nova, Natal.

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do Mundo de 2014, com tendências de agravamento dos problemas urbanos verificados no

bairro.

O bairro continua sendo servido por uma rede hoteleira (hotéis, pousadas, albergues e

flats), além de uma gama de serviços de bares, restaurantes, shopping, lojas de artesanato,

padarias, faculdades, entre outros, voltados ao turismo e à população residente. Tem como eixo

para estes serviços a Avenida Engenheiro Roberto Freire, Av. Praia de Ponta Negra, Av. Praia

de Búzios, Av. Praia de Genipabu, Rua Manoel Sátiro, como indicou o Mapa de Uso e Sistema

Viário do relatório SEMURB/IBAM (Figura 30) no documento produzido sobre o Plano

Setorial da Região Sul 1 (SEMURB, 2010).

Até 2012 nenhuma obra de infraestrutura urbana (esgotamento, viário, água, drenagem)

de grande porte foi realizada no bairro de Ponta Negra. Contudo, as licenças de instalação de

edifícios habitacionais, flats e outros serviços e comércios, continuaram a ser emitidas e

renovadas, aliando novos problemas a antigas questões não resolvidas na área (OLIVEIRA,

2010). Ou seja, definiram-se tendências de agravamento dos problemas ambientais e sociais que

se tornaram cada vez mais complexos e caros para serem resolvidos pelo Estado e pela

sociedade.

Figura 29. Novo momento da construção civil no bairro de Ponta Negra, após a crise internacional de

2008.

Fonte: Tribuna do Norte, 2011. Caderno: Imóveis e Construções. P.43

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Figura 30. Concentração de uso e sistema viário. Identificação dos eixos de comércio e serviço em

Ponta Negra.

Fonte: SEMURB, 2010.

Nota: Alterado pela autora para apresentar a área de Ponta Negra com destaque.

Concluímos que o fato do Plano setorial não ter sido regulamentado e nem as medidas

provisórias terem sido implementadas no nível do Plano Diretor, tornou difícil a sua avaliação

no presente estudo. Contudo, foi possível identificar, no período de 2007 a 2012 que: (i) o

crescimento do bairro de Ponta Negra não contemplou a compatibilização do adensamento com

o suporte da infraestrutura; (ii) a renovação de licenças na legislação anterior fragilizou o

planejamento e a prospecção do adensamento em bases sustentáveis; (iii) que os dados do IBGE

(2010) e a grande quantidade de terrenos vazios, frutos da especulação imobiliária, são fortes

indicadores de que a propriedade não cumpre sua função social (Figura 28). Além disso, a falta

de transparência sobre os desdobramentos do Plano Setorial durante os anos de 2007 a 2011

dificultaram a participação social, o que significou a fragilização da gestão democrática e da

efetivação dos direitos, com foco no direito à moradia e ao desenvolvimento sustentável.

4.4 ATUALIZAÇÕES DO PLANO SETORIAL

4.4.1 Projeto de Lei da Região Sul 1. Documento do IBAM/SEMURB

Em 2008, a SEMURB anunciou a contratação do Instituto Brasileiro de Administração

Municipal – IBAM, para dar assistência à regulamentação e revisão das dez zonas de proteção

ambiental e a revisão e regulamentação de cinco instrumentos urbanísticos e de gestão urbana,

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que tiveram como produto final relatórios e minutas de lei. Nesta demanda, contemplou-se o

Plano Setorial da Região Sul 1 (Ponta Negra, Capim Macio e Neópolis).

Cabe destacar que uma reportagem, em jornal de circulação local, registrou esse

momento e a ausência por parte da Prefeitura no debate ou transparência, sobre a formulação da

proposta entre os anos de 2008 a meados de 2011,

A SEMURB incluiu o Plano Setorial de Ponta Negra no convênio assinado

com o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM), que prevê a

elaboração não só desse estudo, mas de vários outros previstos no Plano

Diretor de Natal, até junho de 2009. Porém a população do bairro critica a

falta de informações a respeito. “Entramos em contato diversas vezes com a

Prefeitura e não recebemos nenhuma resposta sobre como estava a situação”,

lamenta Maria das Neves. Ela e outros habitantes do bairro se reúnem

semanalmente para discutir os problemas e soluções para Ponta Negra. O

grupo aguarda com ansiedade pelo momento de pôr no papel as propostas

que vêm sendo debatidas na comunidade. [...] lembrando que não será por

falta de análise técnica que o plano deixará de existir” (Plano ..., 2008. s.p.)

Apresentado em Audiência pública, no dia 3 de junho de 2011, três anos após a

contratação do estudo, em formato de minuta de lei, o produto gerado pela SEMURB/IBAM,

encontrou-se contido no PL 23 - versões finais dos Planos Setoriais prioritários. Retoma-se aqui

o tempo necessário para a regulamentação de um setor, já que até o atual momento (final de

2012), esse não está finalizado.

Tratou-se de um Plano Setorial prioritário, pois Ponta Negra foi uma área definida no

Plano Diretor que deveria ser regulamentada em um período de 12 meses após a sua aprovação

(art.118). Então, mesmo que instituídos outros setores do Plano Setorial pela cidade, esta teria

uma obrigatoriedade já definida em lei, e por isso, é uma região prioritária.

O relatório teve como objetivo expor o Anteprojeto de Lei para regulamentação dos

Planos Setoriais Prioritários, e servir de modelo aos demais planos que venham a ser

desenvolvidos posteriormente pela SEMURB. Um dos fatores de destaque do documento foi a

estruturação em formato explicativo-metodológico, tendo sua justificativa convergente ao

identificado nesta pesquisa: “[...] o tema Plano Setorial ainda é objeto de muitas especulações na

medida em que o Plano Diretor de 2007 (Lei Complementar n°82 de 2007), responsável por

criar o instrumento, permite diferentes interpretações quanto aos limites e alcances do mesmo”

(SEMURB, 2010:10).

Embora a proposta tenha se mostrado em alguns momentos como um ensaio técnico,

que demanda uma complementação no processo participativo, em outros, foi apresentada como

versão final, como minuta de lei. Isto se deu, por este ser o produto final apresentado pelo

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IBAM, mas que segundo o mesmo Instituto, demanda complementação por parte da SEMURB,

quanto à participação social “fruto de intenso trabalho de campo, pesquisas, diagnósticos e

debates com técnicos da Prefeitura” (SEMURB, 2010:10). Assim, um Plano Setorial de

formulação tecnocrática, até esta etapa.

Após a apresentação do Relatório, consta a minuta de lei complementar que definiu o

Plano Setorial da Região Sul 1. Neste formato de “lei complementar” há possibilidade de alterar

índices e parâmetros estabelecidos no Plano Diretor78

. Como na Lei Complementar 82/07 não

ficou estabelecido em que formato de lei será aprovado, subtende-se a possibilidade de defini-lo

como lei complementar ou como uma lei ordinária, a qual não altera nenhum parâmetro. Vale

retomar o artigo 91 que estabeleceu que se deve “respeitar os índices máximos e prescrições

estabelecidas nesta Lei” (NATAL, 2007 s.p.).

Durante as entrevistas realizadas em 200979

, constataram-se duas linhas de pensamento:

(i) os que eram favoráveis ao Plano Setorial como lei que permitisse o estabelecimento de

índices e parâmetros que alteram o Plano Diretor, sendo o instrumento apelidado de “Plano

Diretor de bairro”; (ii) e, os que defendiam que o Plano Setorial não viria para alterar esses

índices e sim para aplicar de maneira participativa os já estabelecidos no Plano Diretor.

A primeira vertente defendeu que com uma maior participação social e um maior

detalhamento do setor quanto à capacidade de infraestrutura e outros detalhamentos técnicos e

sociais, é possível observar elementos que não são pertinentes na discussão do Plano Diretor,

em sua escala macro. Defendeu também que a participação da sociedade deve permitir

“desenhar o bairro que desejam”, compatibilizando a capacidade de infraestrutura, mas gerando

maior autonomia e valor à participação social. Assim, para esta corrente, o Plano Setorial foi

pensado com o propósito de aproximar a sociedade das definições sobre a cidade e de ter um

olhar particular sobre esses espaços. Para esta linha de pensamento, a regulamentação vem em

formato de lei complementar.

A segunda vertente entendeu que o instrumento foi gerado a partir de uma demanda em

aplicar o Plano Diretor e seus instrumentos de maneira integrada, assim não necessita modificar

índices e parâmetros estabelecidos. Para esta corrente, a mobilização, a transparência, a

diversidade de representações (sejam elas sociais ou técnicas) e a publicização de momentos

78

Uma lei complementar pode vir a alterar outra lei complementar, pois ambas estão em mesma

hierarquia. 79

Entrevistas realizadas para o trabalho final de graduação “Parâmetros de Aplicação do Plano Setorial

como Instrumento do Plano Diretor” (FURUKAVA, 2009).

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como a revisão do Plano Diretor são difíceis de obter, o que poderia colocar em risco conquistas

sociais obtidas.

Além disso, para esta vertente, durante a revisão do Plano Diretor, é possível pensar a

cidade como um todo e o estabelecimento de índices e de parâmetros são observados em

conjunto, coisa que para um setor reduzido, poderia gerar uma visão limitada. Ou seja, um setor

poderia causar impacto negativo sobre outro e gerar conflitos para a cidade como um todo ou

até mesmo, colocar em risco áreas especiais já protegidas, como as áreas cênico-paisagísticas,

históricas e ambientais, que não pertencem a um setor, mas à cidade. Neste caso, a legislação

aprovada viria em formato de lei ordinária.

Ao visar um embasamento legal para a compreensão desse conflito, identificou-se a Lei

Orgânica do Município de Natal, que inspirada nos princípios da liberdade política, de justiça

social e de dignidade da pessoa humana, estabeleceu no artigo 38 que,

As leis complementares são aprovadas em dois turnos, por maioria absoluta

dos Vereadores, com intervalo de quarenta e oito horas, devendo ter

numeração distinta das leis ordinárias.

Parágrafo Único - São objeto de lei complementar, dentre outras matérias: I -

O Código Tributário do Município; II - a Organização da Procuradoria Geral

do Município; III - o Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais; IV - O

Plano Diretor da Cidade; V - o Código de Obras; VI - o Código de Meio

Ambiente e Turismo; VII - o Código de Posturas (NATAL, 1990).

Observou-se, portanto, que o Plano Setorial, definido na Lei Complementar 82/07, tem

como objetivo detalhar ordenamento do uso e ocupação do solo urbano (art.90), assim, não tem

como objetivo ordenar, mas sim, aprofundar o que já foi estabelecido. Compreende-se aqui, à

luz da Lei Orgânica e do Plano Diretor, que a delimitação do setor do Plano Setorial é definida

em uma lei ordinária, junto aos demais detalhamentos e desenhos do setor que indiquem

procedimentos para aplicação do Plano Diretor (lotes indicados para IPTU progressivo no

tempo, por exemplo). Ademais, defini-la assim é uma medida prevencionista, buscando

garantir a integração do Setor da Região Sul 1, ao que está proposto no Plano Diretor.

Para discutir sobre a delimitação dos setores, adentrou-se em dois quesitos: a unidade de

planejamento e os critérios de definição da composição de um setor. Cabe destacar que se

compreende por unidade de planejamento a estrutura base administrativa que se utiliza para se

definir um setor, a exemplo da bacia hidrográfica e do bairro. A composição e a quantidade de

unidades de planejamento são variáveis para cada realidade; sendo assim, são orientadas por

diferentes critérios, como a acelerada modificação da paisagem local e de questões

socioambientais, além das alterações urbanísticas, contaminação do lençol freático, entre outros.

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O Plano Setorial buscou a redução da escala de gestão, mas não definiu no Plano

Diretor qual unidade de planejamento e quais os critérios seriam adotados para a definição do

setor. Por isto, o debate sobre a composição do primeiro setor adentrou questões técnicas,

políticas e sociais. Em sequência, o anteprojeto (SEMURB/IBAM) envolveu os bairros de Ponta

Negra, Capim Macio e Neópolis (Figura 31). Assim, como visto na formulação do Plano

Setorial, no ano de 2006, identificou-se a demanda técnica de integrar mais bairros a Ponta

Negra, sob a justificativa de,

A experiência de subdividir a área urbana em unidades espaciais de

planejamento e tratá-las a partir de suas particularidades é comum nas

cidades brasileiras, especialmente nas de maior porte e complexidade no que

diz respeito à estrutura interna, mas no caso de Natal esta será uma

experiência piloto. Definiu-se como Piloto o Plano Setorial Prioritário da

Região Sul 1 e, apesar de Ponta Negra ter sido definido como o bairro

prioritário para elaboração no PD de 2007, optou-se neste momento por

avaliar diversos aspectos da configuração municipal para definir a

abrangência de sua delimitação. Foram considerados: Divisão administrativa,

delimitação e características dos bairros [...]; Bacias Hidrográficas [...];

População residente e densidade demográfica, domicílios particulares

permanentes [...]; Macrozoneamento definido pelo Plano Diretor [...]; Déficit

Habitacional e Domicílios em coabitação ou improvisados [...]; Rede elétrica,

abastecimento de água, esgotamento sanitário [...]; Conjuntos Habitacionais e

Loteamentos [...] (SEMURB, 2010. p.12-13).

Cabe retomar que, no que tange ao histórico do Plano Setorial, foi observado que Capim

Macio e Neópolis não foram inseridos no Plano Diretor de 2007 pela não mobilização dos

moradores. (FURUKAVA, 2009). Isto levou à compreensão de que, para o estabelecimento de

um setor, fez-se necessária a integração da leitura técnica, política e social.

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Figura 31. Primeira proposta de zoneamento do Plano Setorial: bairros de Ponta Negra, Capim Macio e

Neópolis, Zona Sul de Natal/RN.

Fonte: Projeto de Lei do IBAM, 2010.

Observou-se também que “diferente do tratamento das ZPAs o Plano Diretor não

definiu qualquer padrão para enquadramento de zonas ou outras definições capazes de orientar o

entendimento do que se pretende com o detalhamento do item ‘Ordenamento do uso e ocupação

do solo urbano” (FUNPEC, UFRN, 2011). O Capítulo I, do PL 23, tratou da submissão do

Plano Setorial às diretrizes estabelecidas no Plano Diretor de 2007, reforçando a conclusão

sobre a regularização resultar em uma lei ordinária e não, em uma lei complementar. Assim, o

detalhamento significaria um olhar mais aprofundado sobre os dados, transparência sobre estes

e uma maior aproximação do debate com a sociedade, para a aplicação do Plano Diretor, seus

instrumentos e as perspectivas de obras de infraestrutura. Neste caminho, o relatório do IBAM

aqui definido se enquadraria na parte do aprofundamento dos dados existentes.

Segundo a pesquisa desenvolvida sobre as experiências similares ao Plano Setorial, o

cadastro edilício atualizado e um sistema computacional podem auxiliar no detalhamento do uso

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e ocupação do solo (FURUKAVA, 2009). Atualmente, o município de Natal passa pela

modernização desse cadastro, ainda não ativo na íntegra. Esse cadastro, atualizado em tempo

real, passa a dar mais agilidade à avaliação prévia dos empreendedores e do município sobre a

emissão de licenças de instalação para cada lote do setor. Assim que uma licença for requerida

no setor o sistema adiciona a carga que isto gerará sobre a infraestrutura e se o padrão do

edifício, quanto ao uso, localização, dimensão das unidades, recuos, gabarito, entre outros

parâmetros, encontra-se dentro da legislação e compatibilização com as redes de infraestrutura,

ou não e, logo, se a licença pode ser emitida ou não.

No momento em que as licenças emitidas atingirem a projeção de 80% de utilização da

rede de infraestrutura haverá uma suspensão das licenças de construção no setor (artigo 13 do

Plano Diretor de Natal) até a atualização das redes ou soluções privadas que contornem estas

questões, auxiliando a implantação do Plano Diretor, o ordenamento do uso e da ocupação. Isto

potencializa o detalhando do uso e da ocupação do solo, à luz da Lei Complementar, mas lote

por lote e não apenas pelo macrozoneamento.

Nos Planos de Pormernor em Portugal, esse detalhamento lote a lote chega a uma visão

de fachada e resulta em um desenho em três dimensões, maquete eletrônica e animação

tridimensional. Com a possibilidade de compreender os impactos visuais e espaciais do edifício,

é possível observar impactos, integrar a prospecção à paisagem e facilitar a publicização das

demandas que isto gerará (FURUKAVA, 2009).

Compreende-se que o aprofundamento do ordenamento de uso e ocupação do solo

desenvolvido pelo Plano Setorial é a etapa seguinte e pontual, terreno por terreno, do

ordenamento de uso e ocupação do solo determinado pelo e no Plano Diretor. Esta demanda

pelo detalhamento do macrozoneamento se observou também nas motivações de criação do

Plano Setorial como facilitador da aplicação do Plano Diretor, frente às dificuldades técnicas

apresentadas em Natal. Este olhar mais aprofundado do setor reforça a natureza do Plano

Setorial como estratégia de planejamento, por meio da redução da escala de intervenção e

aprofundamento dos dados do setor.

Quanto aos procedimentos foi observada, no relatório da SEMURB/IBAM, a confecção

de mapas de uso de solo, com observância às demandas e agrupamento de diferentes serviços,

para identificar espaços propícios aos polos especializados80

. Para isto, foi feito um mapeamento

80

“Art. 8°. Os Polos Especializados tem o objetivo de estimular a atividade econômica e consolidação de

espaços atraentes de convivência para moradores e turistas, além de promover a cooperação empresarial,

a geração de emprego e renda, e reforço de vestígios de centralidade nos bairros da Região Sul 1”

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do habite-se cedido e cruzamento com os dados da fiscalização sobre os estabelecimentos que

estavam funcionando de maneira regular, representando em mapa, as dinâmicas para a área. Ao

observar o processo de verticalização identificaram pontos de visualização obstruídos do Morro

do Careca e indicaram áreas de tratamento visual específico. Outra leitura feita foram os vazios

urbanos e o levantamento das dunas remanescentes com as massas vegetais existentes. Por fim,

foi realizado o mapeamento e o cruzamento das informações na área para a indicação de

soluções. Indicação, pois os polos não foram espacializados, nem demarcados seus limites,

sendo apenas indicadas as áreas de fortalecimento da dinâmica existente. O estudo, segundo a

SEMURB, gerou o plano de prioridade de intervenções. Vale destacar que estas prioridades são

abrangentes e ficaram em nível de texto (quadro), não sendo apresentadas no PL 23 e

espacializadas em mapa, dificultando a compreensão de quais pontos passariam a receber tais

intervenções no bairro e como estas foram construídas (Figura 32).

Figura 32. Prioridades de intervenção do Plano Setorial da Região Sul 1.

Fonte: SEMURB, 2010 p. 89.

(SEMURB, 2010 s.p.). Foram criados para a Região Sul 1 polos da Renda e Gastronômico em Ponta

Negra e de entretenimento, em Neopolis e Capim Macio.

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O artigo 3°, do Projeto de Lei da Região Sul 1, dispõe das diretrizes gerais do Plano

Setorial da Região Sul 181

. Foi este artigo que apresentou o reforço aos polos especializados, às

centralidades, às zonas de amortecimento e às áreas protegidas. Estas inserções visaram

potencializar usos de destaque dentro dos setores e foram aplicadas a diferentes contextos, ao

entender que a qualidade dos espaços, sua movimentação e atratividade, estão também

relacionadas à diversidade de usos no local.

Neste artigo emite-se um alerta, a uma possível violação à area non aedificandi de

Ponta Negra. Esta área tem como principal objetivo a defesa cênico-paisagística do Morro do

Careca, patrimônio estadual, permitindo que todos os moradores e visitantes possam ter direito a

este elemento de identidade natural da cidade. Para Duarte (2011, p.100) é um ganho ao

planejamento urbano de Natal a instituição em 1984 das zonas especiais de interesse turístico,

onde se localiza a area non aedificandi, em toda a extensão da orla e não apenas áreas especiais,

“compondo um especial capítulo na história da preservação do patrimônio ambiental (cênico-

paisagístico) da cidade e um marco da relação entre o direito à paisagem e sua concretização

legislativa (por meio da instituição de áreas especiais)”.

Além disso, Duarte (2011) trouxe à discussão a Lei Federal n° 6.513/1977, que

dispunha sobre a criação de Áreas Especiais e de Locais de Interesse Turístico, permitindo aos

municípios e estados, instituírem suas áreas especiais em legislação própria. Segundo a autora, o

município do Natal, por meio desta lei, assegurou a criação de áreas como as Zonas Especiais de

Interesse Turístico – ZET, ao longo da orla, que tinha como principal objetivo a preservação e a

valorização do patrimônio cultural e natural, além do incentivo ao turístico. Um destaque a isto

foi a criação da area non aedificandi de Ponta Negra (Decreto n°2.236/1979), integrada à área

de controle de gabarito da ZET-1 e localizada à margem da rodovia Natal-Ponta Negra (atual

Avenida Engenheiro Roberto Freire), em um total de 67 lotes, com objetivo direto de proteção à

paisagem e ao visual do Morro do Careca.

No histórico da área delineado por Duarte (2011), observa-se uma pressão durante os

anos, em se construir na área não edificante de Ponta Negra. Esta pressão se materializa quando

há um descaso por parte do Poder Público na manutenção local e na integração da área ao

81

Art. 3°. “São diretrizes gerais do Plano Setorial da Região Sul 1: I. reforçar a centralidade da região

incentivando o desenvolvimento das atividades turísticas através da requalificação da área da ZET-1 e da

implantação de equipamentos de lazer e de apoio ao turismo na área non aedificandi; II. proteger as ZPAs

criando zonas de amortecimento das interferências ambientais, paisagísticas e cênicas; III. criar condições

de convivência do uso residencial com aqueles voltados para a recreação e o lazer; IV. criar polos

especializados; V. preparar a área para o uso da bicicleta e caminhamento a pé definindo uma malha

cicloviária e um plano de criação e recuperação de passeios” (FUNPEC, UFRN, 2011 s.p.).

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entorno, gerando um aspecto de abandono, sendo esta uma justificativa para a contínua

ocupação privatizada da área. Relata ainda, impactos de legislações como a Lei Complementar

27/2000, onde o projeto de lei, consistia na liberação de nove lotes da área non aedificandi para

a construção de imóveis com até 7,5m de altura, entretanto, a emenda aceita pela Câmara não

englobou essas mudanças (DUARTE, 2011).

Em 2003, a SEMURB começou a notificar os ocupantes da area non aedificandi para

que as prescrições de não construção nesta área sejam preservadas, e assim, garantir a defesa à

paisagem natural. Em 2005, o Ministério Público Estadual promoveu uma ação82

que objetivou

a demolição das construções ilegais instaladas na área, além de ações penais contra os

ocupantes. Em 2009, o Juiz do feito julgou procedente a ação, determinando a demolição,

justificando como direito difuso à paisagem. Atualmente (2012) nenhuma construção foi

demolida.

Por parte do Poder Executivo municipal, no ano de 2006, houve a busca de soluções

aplicáveis para area non aedificandi, visando “orientar a Administração no sentido de

estabelecer ações efetivas para a preservação da função ambiental [...]” resultando em uma

minuta de projeto de lei propondo o reordenamento, onde haveria na área um uso sustentável

atrelado à proteção cênico-paisagística (DUARTE, 2011:120). Em 2008, há uma nova

apresentação de proposta para a área pela SEMURB, mas ambas necessitaram estudos mais

aprofundados e participação social, não sendo votados.

A partir da pesquisa de Duarte (2011) e de Oliveira (2010), destaca-se a constante

disputa e conflito pela defesa e ocupação desta área, sendo, portanto, um tema que demanda um

especial cuidado ao se propor alteração de parâmetros. Isso significa a alteração no Plano

Diretor e a ocupação de uma área protegida, fundamental no acesso visual e na identidade da

cidade (enseada da Praia de Ponta Negra e o Morro do Careca). A ocupação com equipamentos,

sem a participação da sociedade e sem estudos de impacto, conforme proposto no anteprojeto

(SEMURB/IBAM), quebram as conquistas definidas e podem tornar a ocupação

inconstitucional. A Figura 33 e a Figura 34 apresentam o impacto a visual da ocupação area non

aedificandi à paisagem do Morro do Careca.

Pode-se dizer que, para propor equipamentos ou a alteração de índices e parâmetros na

area non aedificandi deve haver um processo participativo, transparente, e que mantenha a

82

(Processo nº 001.05.011076-5 - 18ª Vara Cível desta Comarca) e ações penais baseadas no ilícito de

construção ilegal sem licença previsto na Lei Federal nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) DUARTE,

2011 p. 195.

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proteção conquistada em mais de trinta anos de vigência da legislação, nos parâmetros do

Estatuto da Cidade e da Constituição Federal.

Figura 33. Área non aedificandi de Ponta Negra.

Fonte: FURUKAVA, 2012.

Figura 34. Bloqueio visual na área non aedificandi de Ponta Negra.

Fonte: FURUKAVA, 2012.

Esta versão final em formato de relatório e anteprojeto de lei do Plano Setorial foi

apresentada em audiência pública para a aprovação do mesmo, juntamente com outros

instrumentos urbanísticos. Ao entender que a elaboração de uma lei passa pela participação

social e ao visar o respeito às legislações federais (Constituição Federal e Estatuto da Cidade), o

Ministério Público pediu um prazo de 90 dias à SEMURB para leitura, avaliação e publicização

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das propostas, indicando a necessidade de audiências públicas separadas por temas. Neste

contexto, o Ministério Público requereu à UFRN, através da Fundação Norte Rio-grandense de

Pesquisa e Cultura – FUNPEC, um Laudo sobre o Projeto de Lei do Plano Setorial da Região

Sul 1.

4.4.2 Laudo requerido pelo Ministério Público, audiência pública,

encaminhamentos e posicionamento da SEMURB.

O Ministério Público Estado do Rio Grande do Norte requereu, em 2011, à FUNPEC

um Laudo Técnico sobre a proposta de revisão de cinco dos instrumentos urbanísticos do Plano

Diretor de Natal. A FUNPEC encaminhou a formulação do Laudo aos professores doutores da

UFRN, nos Departamento de Políticas Públicas e do PPGAU, Alexsandro Ferreira Silva e

Marcelo Tinoco, respectivamente. A etapa sobre o Plano Setorial foi embasada nesta pesquisa e

elaborada por esta autora. Este Laudo foi apresentado em Audiência Pública no dia 15 de

fevereiro de 2012, que contemplou a fala da SEMURB83

, Ministério Público84

e da Professora

Rosana Mazaro85

, além de alguns agentes sociais.

Figura 35. Registro da audiência pública de 15 de fevereiro de 2012.

Fonte: Arquivo pessoal, 2012

83

Representada por Daniel Nicolau - Arquiteto Urbanista do Departamento de Planejamento Urbanístico

e Ambiental. 84

Na pessoa da Dra. Gilka da Mata. 85

Representa a Câmara de Meio Ambiente e Sustentabilidade – única Câmara instalada no município

para monitoramento das intervenções da Copa do Mundo, até o momento da audiência. Professora do

Departamento de Turismo da UFRN.

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Vale destacar que a SEMURB, nesta audiência, reapresentou o projeto de lei que o

laudo discutiu (SEMURB/IBAM), fazendo uma breve contextualização e histórico do Plano

Setorial. Este retratou que à época (2006) não foi encontrado na legislação um instrumento tão

amplo quanto o necessário, pois o que se buscava não se enquadraria como operação imobiliária

e nem como um consórcio imobiliário, ou em outros instrumentos existentes. Indicou, ainda,

como motivações de formulação do Plano Setorial: (i) identificar um instrumento entre o Plano

Diretor e o instrumento que atuará em uma zona; aplicar um instrumento intermediário entre o

Plano Diretor e a legislação específica; (ii) a dificuldade de estabelecer um cronograma com

metas para as legislações, aproximando as atividades da sociedade; (iii) o refinamento da

legislação em geral; e, (iv) a necessidade de agrupar em um mapa as diferentes demandas para a

área, nem que o mapa fosse em formato de diretrizes.

Estas motivações de formulação reforçaram e retomaram a discussão desta pesquisa

quanto à natureza de um Plano Setorial. As motivações apresentadas pela SEMURB, o

direcionam como uma estratégia de planejamento que gera um campo potencial para aplicação

dos instrumentos previstos no Plano Diretor. Uma vez instituído no Plano Diretor o Plano

Setorial não é autoaplicável como um instrumento urbanístico, a exemplo da Outorga Onerosa

do Direito de Construir. O laudo não adentrou na discussão sobre a natureza do Plano Setorial.

Este apontou que a minuta de lei complementar (SEMURB/IBAM) se constituía em um

estudo inicial, com diversas potencialidades, mas que ainda demandava complementação de

dados técnicos sobre o setor, e requeria a complementação da leitura da sociedade sobre a área.

Esta constatação posta no laudo reforçou a compreensão de que o Plano Setorial é facilitador do

debate social no planejamento de setores. Assim, em consonância com o Ministério Público86

, a

discussão social na construção de um Plano Setorial é um procedimento indispensável para a

aplicação deste, especialmente após a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Cidade.

Sendo assim, sua aplicação está condicionada ao sistema de gestão.

Conforme o laudo, o Projeto de Lei está coerente com o Plano Diretor, o Estatuto da

Cidade e com a função social da propriedade quando:

1) [...] Amplia o setor de Ponta Negra para Ponta Negra, Capim Macio e

Neópolis, compreendendo que o impacto gerado sobre um, influencia

diretamente no outro, tanto nas questões de infraestrutura quanto nas

questões de qualidade de vida, meio ambiente e conforto ambiental;

86

Informação coletada na audiência pública do dia 15 de fevereiro de 2012.

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123

2) Na definição do critério de delimitação do setor sendo o Bairro está, em

linhas gerais, coerente, entretanto, deve-se considerar a inserção na bacia

hidrográfica e as características de uso e ocupação do entorno;

3) A definição de zonas de amortecimento para as áreas ambientais, a

proposta de um corredor ecológico e os polos especializados são

elementos de destaque na proposta, coerentes com as questões de

proteção cênico-paisagística e de incentivo de diversidade de usos.

Entretanto, devem dialogar com as zonas especiais de interesse social e

com os interesses dos habitantes e comerciantes locais e com o que esta

sendo proposto para estas nos planos de mobilidade e habitação de

interesse social, além de buscar a compatibilização destes com as redes

de infraestrutura (FUNPEC; UFRN, 2011:80).

O laudo sugeriu, neste caso, um maior detalhamento sobre o corredor ecológico e os

polos especializados, em nível de projeto urbanístico e aproximações orçamentárias. Este

detalhamento margeia o campo da espacialização, verticalização da lei e do desenho do setor,

para embasar o debate com a sociedade e as discussões de planejamento e gestão. No Projeto de

Lei proposto, para justificar estas escolhas e os espaços que as receberiam, observou-se a

construção de mapas de uso e ocupação do solo. Entretanto, estes dados não foram considerados

suficientes pelo laudo, requerendo a participação social, prospecções de impacto na vizinhança

nas localidades e no setor, além da relação destes dados com outros, como os terrenos para

aplicação de instrumentos urbanísticos (a exemplo do Direito de Preempção e da Operação

Urbana Consorciada).

Na audiência pública, concordante com esta pesquisa, uma das falas sociais destacou

que o Plano Setorial tem em sua constituição o projeto urbanístico - que apresenta o desenho do

que está sendo previsto para o lugar. A moradora acredita ser a oportunidade de se ver o bairro

como um todo, não apenas na AEIS87

, mas, com as lagoas e a comunicação dessas áreas,

resultando em um projeto urbanístico local. Neste mesmo momento, a SEMURB apresentou a

dificuldade em compatibilizar informações da área e indicou o estabelecimento do Sistema de

Informação Georreferenciada – SIG, como solução para suprir a demanda existente. Este

sistema ainda não está 100% aplicado. Entende-se, entretanto, que o SIG traz informações sobre

a cidade, mas para desenhá-la futuramente são necessários mais elementos, que podem ser

fornecidos pela sociedade e técnicos, por meio de reuniões de bairro, oficinas, conferências da

cidade, entre outras estratégias de participação previstas no Estatuto da Cidade. Retoma-se que

estes relatos trouxeram ao Plano Setorial o uso de tecnologias de informação e comunicação

para a representação do que está sendo proposto ao setor.

O laudo não indicou critérios de delimitação da unidade de planejamento, apenas

identificou que a inserção de outros bairros além do de Ponta Negra, prioritário no Plano

87

A AEIS da Vila de Ponta Negra e sua regulamentação foram amplamente questionadas na audiência

pública sobre os Plano Setorial da Região Sul 1, de 15 de fevereiro de 2012.

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124

Diretor, devem adentrar o campo da discussão social. Neste quesito a SEMURB justificou a

inserção, pelos critérios das Zonas de Proteção Ambiental. No caso, os três bairros interagem

diretamente com as ZPAs 2,5 e 6. A Professora Rosana Mazaro questionou o setor ser composto

por três bairros, pois segundo ela, pelo viés do turismo (presente de maneira marcante no bairro

de Ponta Negra), estes apresentam contextos e apropriações muito diferentes. Com isto

destacam-se dois outros critérios possíveis para se estabelecer a composição de um setor: Zonas

de Proteção Ambiental e o turismo (a leitura pode vir a ser de uma atividade econômica

marcante na área, não apenas o turismo). Cabe destacar que todas as instâncias consideraram o

bairro como unidade de planejamento, o que leva à constatação de que a adoção deste facilita a

compreensão da sociedade sobre os limites que estão sendo propostos para o setor.

Independente dos critérios de delimitação, para a SEMURB, os produtos gerados por

um Plano Setorial são muito abrangentes. Um exemplo é que a sociedade pode vir a requerer

dentro de um Plano Setorial, uma área para drenagem que seja aplicada conjuntamente com o

saneamento e que não esteja contemplada na regulamentação. Este exemplo reforça no Plano

Setorial a participação social em todas as etapas, não apenas na fase da formulação da lei. A

Secretaria destacou, ainda, a necessidade de criação de uma norma que contenha possíveis

produtos gerados por um Plano Setorial e que indique os procedimentos para integração de

áreas especiais internas ao Plano Setorial, ao buscar evitar regulamentações já estabelecidas e a

fragilização de áreas defendidas. A esta norma, as experiências similares denominaram “termo

de referência” e esta pesquisa se encontra consonante a orientação sobre a necessidade de

definição de alguns procedimentos básicos para um Plano Setorial.

Quanto aos produtos de um Plano Setorial o laudo indicou que estes devem ser

aprovados como lei ordinária e seus limites definidos em decreto. Além de conter peças

escritas, tais como: estudos sobre a infraestrutura local (sistema de água, esgoto, viário,

comunicação); estudos sobre conforto ambiental (acústico e térmico); estudos de impacto

socioambiental e paisagístico; programa de prioridades de implantação; cronograma executivo e

orçamento; responsabilidades técnicas (construção, gestão, manutenção, orçamentos e

parcerias); relatórios das audiências públicas desenvolvidas; prazos de atualização dos dados e

da legislação. E como peças gráficas: projetos urbanísticos e arquitetônicos propostos para área

(localização, dimensionamento, orçamento) – por meio de mapas, volumetrias, entre outras

formas de representação gráfica; sobreposição dos limites das intervenções previstas; indicação

e espacialização dos terrenos passíveis de aplicação dos instrumentos previstos; apresentação de

mapas de conflitos; definição de etapas de implantação dos projetos integrados; e a participação

social segundo o Estatuto da Cidade (FUNPEC; UFRN, 2011).

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125

Esta pesquisa confirma que estes são possíveis produtos a serem definidos em um Plano

Setorial, somados a outros que sejam pertencentes à realidade de cada setor, sempre visando

gerar um campo favorável à aplicação do Plano Diretor e às intervenções urbanísticas, por meio

da gestão democrática e da relação entre eles. Soma-se a isto, o termo de referência proposto

anteriormente.

Além disso, segundo o laudo, o Projeto de Lei NÃO está coerente com o Plano Diretor,

o Estatuto da Cidade e com a função social da propriedade, quando:

1) assume o formato de Lei Complementar, conforme instituído pelo

projeto de lei SEMURB/IBAM, a contraposto do artigo 38 da Lei

Orgânica do Município de Natal. Deve ser apresentado em

formato de lei ordinária, não podendo assim alterar índices,

limites e prescrições estabelecidas no PD.

2) o artigo 3° altera os índices e parâmetros nas áreas não edificantes

de Ponta Negra, extrapolando os máximos estabelecidos no Plano

Diretor, diferente do instituído no art.91;

3) o artigo 6° exclui a AEIS da Vila de Ponta Negra e a ZPA da

Lagoinha, marcados no Plano Diretor de 2007.

4) na fração interna do bairro, passa a permitir remembramento e

verticalizações acima de 4 pavimentos, sem apresentar dados

sobre o conforto socioambiental, a demanda de infraestrutura e os

impactos gerados por esta modificação. Além disto, não houve

debate e audiências públicas com os moradores locais para a

modificação desses parâmetros, fragilizando uma conquista

popular, quando esses parâmetros foram acrescidos a lei, durante

o processo de revisão do Plano Diretor (LC7/94), pelos próprios

moradores em conjunto com os técnicos locais.

5) não apresenta dados sobre a capacidade de suporte das redes de

infraestrutura;

6) não apresenta os projetos urbanísticos propostos para a área,

apenas os lista;

7) apresenta apenas a listagem dos alvarás cedidos para a área, sem

considerar as licenças que são as projeções de crescimento;

8) não apresenta um sistema de operacionalização desse instrumento

para o cumprimento do Plano Diretor e uma listagem de

prioridades de intervenções;

9) não define o sistema de gestão do setor (FUNPEC; UFRN, 2011).

O laudo destacou a proposta de verticalização na area non aedificandi de Ponta Negra e

reforçou a discussão realizada nesta pesquisa e por Oliveira (2010), que identificou que esse

tipo de ocupação interfere na paisagem de uma área protegida: a vista cênico-paisagística do

Morro do Careca. O laudo trouxe, também, que o projeto da SEMURB, em formato de lei

complementar, alterou parâmetros e índices propostos no Plano Diretor. Segundo o artigo 92, a

modificação destes índices foi possível, pois eles são válidos apenas até o momento da

regulamentação. Entretanto, questionou-se a alteração destes, sem estudos (dados da

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126

infraestrutura) e discussões sociais que embasassem as decisões. Isto possibilita a fragilização

de conquistas como as medidas de contenção da verticalização.

As conclusões do laudo indicaram a impossibilidade de se analisar a proposta sem os

dados detalhados sobre as redes de infraestrutura e com a ausência dos projetos urbanísticos,

que nortearam as decisões de planejamento para o setor. Para o laudo, deve haver dados

quantitativos e qualitativos sobre o suporte da infraestrutura para determinação de elementos

norteadores do Plano Setorial. Isto, somado às experiências similares analisadas, indicou a

necessidade de se gerar um documento base anterior à proposta de regulamentação de um

setor, que apresente, qualifique e registre estes dados. Este documento é um dos que compõem o

relatório de formulação. Isto visa justificar e embasar as decisões de planejamento, gestão e

fomentar a discussão social. Estes dados e etapas muitas vezes se perdem quando se analisa

apenas o corpo da lei.

Nesta perspectiva, na audiência pública88

a sociedade questionou o Anexo III da

proposta da SEMURB, pois não havia dados no documento que justificassem a escolha das

prescrições urbanísticas para a área. Em especial quanto aos 20metros exigidos de recuo, o que

impossibilitaria construções, especialmente para terrenos de pequeno porte com destaque aos

que atendem à população de zero a três salários mínimos que residia na AEIS (Figura 36).

Quanto a isto a SEMURB justificou ser um erro de digitação, mas não informou quais seriam os

valores corrigidos.

Figura 36. Anexo III da proposta de Plano Setorial da Região Sul 1, contendo as prescrições urbanísticas

para a área.

Fonte: SEMURB, 2010 p.21.

88

Audiência realizada no dia 15 de fevereiro de 2012, com objetivo de apresentar as contribuições do

Ministério Público.

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127

Foi observada, também, nas falas da sociedade e de entidades, a requisição por mais voz

social na construção do Plano Setorial. Além disso, houve a apresentação de estudos que estão

sendo desenvolvidos na área, a exemplo do projeto “Encantos da Vila”, que abarcam a

participação da sociedade (moradores, ONGs e profissionais) para a elaboração de soluções de

turismo com esforços sustentáveis. A professora Rosana Mazaro reforçou a importância de se

observar os estudos e os projetos existentes na área para a regulamentação do Plano Setorial,

pois algumas das considerações e soluções encontradas podem ser inseridas a este, dando

agilidade à regulamentação e aplicação das medidas definidas no Plano Setorial.

Neste contexto, os encaminhamentos deste laudo foram quanto à complementação do

processo participativo na formulação e composição do setor, na fase de aplicação, de revisão e

de atualização deste. Mais precisamente indicou a realização da participação de grupos e

entidades sociais para acrescer à lei proposta a leitura da sociedade sobre o setor. Por fim, o

laudo recomendou superar as incoerências e irregularidades nos itens indicados na Tabela 1.

Tabela 1. Resumo do Laudo Técnico sobre o Projeto de Lei SEMURB/IBAM para o Plano

Setorial da Região Sul 189

.

Itens que necessitam de complemento normativo Artigo 2°, Artigo 3°, Artigos 9°,

10° e 11, Artigo 13 (anexos) e

Artigo 14.

Itens que necessitam de complemento gráfico Artigo 3°, Artigo 4°, 5°, Artigo 11,

Artigo 13 (anexos).

Itens que necessitam de estudos mais detalhados para

avaliação

Artigo 4°, Artigo 6°, Artigo 7°,

Artigo 8°, Artigo 9°, Artigo 13

(anexos).

Itens incompatíveis com a otimização da função

socioambiental da propriedade e compatibilização do

adensamento do solo à respectiva infraestrutura de

suporte da área.

Artigo 3°, Artigo 6°, Ser lei

orgânica e não lei complementar.

Itens compatíveis com a otimização da função

socioambiental da propriedade e compatibilização do

adensamento do solo à respectiva infraestrutura de

suporte da área.

Artigo 1°, Artigo 5°, Artigo 8°,

Artigo 9°, Artigo 12°.

Fonte: Laudo técnico do Plano Setorial, 2011.

Para o Ministério Público, embasado na leitura do laudo, a importância do Plano

Setorial é a reflexão do morador sobre “o que deseja para o bairro”, assim, o Plano, por meio da

sociedade, indica problemas e possíveis soluções, sendo adotadas as possíveis de serem

aplicadas pelo Poder Público e/ou setor privado. Neste sentido, requereu à SEMURB, ao final

da audiência pública, que a proposta da SEMURB seja complementada nos quesitos técnicos

levantados e pelas contribuições comunitárias. Isto porque, para o Ministério Público, a

89

Atenção às numerações incorretas do documento da SEMURB/IBAM. Neste quadro estão sendo

consideradas as numerações dos artigos, seguidas independente do documento.

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proposta apresentada foram apenas diretrizes (como os polos especializados), mas não compõe

um plano em si, dificultando identificar o que a população pode cobrar do Poder Público para a

área. No que tange aos procedimentos, indicou que deve haver uma leitura técnica e uma

comunitária para identificação de conflitos, potencialidades, formação de cenários e propostas

de ações transformadoras. Em seguida, foi proposta a definição dessas ações e a prioridade de

cada, ou seja, ações com obrigação e tempo de cumprimento.

De forma mais objetiva, o Ministério Público complementou o laudo, ao sugerir a

ampliação das discussões sobre o Plano Setorial nos bairros, além de considerar a proposta

apresentada pelo IBAM/SEMURB como preliminar. Para o Ministério Público, esta deve

apreciar as contribuições recebidas na audiência e observar as complementações e as

contribuições recebidas. Como etapas de regulamentação, indicou que após as discussões

comunitárias e a complementação técnica, deve-se apresentar e divulgar a proposta final em

audiência. Com a apreciação popular, a proposta seguiria aos conselhos e depois para votação.

Por fim, a SEMURB e a sociedade foram convergentes com os encaminhamentos do

Ministério Público. Entretanto, até o mês de dezembro de 2012, nenhum outro encontro foi

proposto para a formulação do Plano Setorial por parte do Poder Público.

Neste sentido, foram observadas contribuições importantes ao Plano Setorial: (i) a

delimitação do setor é uma escolha política, social e/ou do poder público, dependendo de cada

realidade, sendo os critérios observados em Natal - o impacto do adensamento sobre uma área,

unidades contíguas de planejamento, a inserção de zonas de proteção ambiental, a inserção nas

bacias hidrográficas e a atividade econômica principal; (ii) a unidade de planejamento comum a

todos os agentes é o bairro, mas pode vir a ser a fração urbana que impacta na bacia

hidrográfica; (iii) a redução da escala de planejamento pode aproximar do cidadão os assuntos

que estão sendo debatidos e fomentar tanto a discussão, quanto o controle social; (iv) a

transparência, o aprofundamento e fornecimento de dados sobre o setor são essenciais para se

utilizar o Plano Setorial; (v) este se apresenta com a natureza de uma estratégia do planejamento

e uma fase de operação democrática da gestão e não com características de instrumento

urbanístico. Neste sentido, é campo facilitador da aplicação e relação de planos, projetos, e

ferramentas no setor, assim como da compatibilização do adensamento com a infraestrutura de

suporte; (vi) é intrínseco ao Plano Setorial a dimensão urbanística e o desenho da área proposto,

assim como a projeção de cenários futuros; (vii) os procedimentos de formulação, aprovação e

acompanhamento cobram a participação e o controle social; (viii) sobre o prazo de

regulamentação, cada área deve ser analisada para então defini-lo, contudo, deve haver medidas

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129

que possibilitem a cobrança social sobre a regulamentação do setor, evitando a morosidade e a

desmobilização social.

4.5 DISCUSSÕES E APROXIMAÇÕES SOBRE O PLANO

SETORIAL DE NATAL

Considerando a análise desenvolvida sobre as definições do Plano Setorial no

Planejamento Urbano de Natal, apresentam-se aqui reflexões que visam discutir sobre as

aproximações conceituais e operacionais observadas na trajetória deste instrumento e das

experiências similares de planejamento analisadas.

Verificou-se que o Plano Setorial foi instituído no Plano Diretor de 2007 como

instrumento de planejamento urbano e ambiental, que tem como objetivo detalhar o uso e a

ocupação do solo de uma fração urbana. No contexto da sua formulação, a primeira proposta foi

apresentada pelos técnicos da SEMURB em 2006, durante a revisão do Plano Diretor de Natal

(LC07/94). Além disso, foi objeto de estudo, discussão e formulações para novas inserções e/ou

modificações do texto original pela sociedade, sobretudo pelos grupos e organizações sociais do

bairro de Ponta Negra, registrando-se um marco histórico de participação popular. A atuação

desses segmentos sociais colocou-se na perspectiva de atender diferentes, porém convergentes

objetivos: a) dos técnicos para aplicar os instrumentos, indicados no Plano Diretor, os planos e

os projetos urbanísticos, de maneira articulada, permitindo compatibilizá-los à capacidade da

infraestrutura local. E para permitir uma leitura mais detalhada do macrozoneamento e das áreas

especiais e; b) da sociedade, para conter a verticalização e exigir a compatibilização do sistema

de infraestrutura com os projetos de intervenção urbana para a área.

Os técnicos da Prefeitura indicaram que toda a cidade deveria ser setorizada, entretanto,

isto não foi desenvolvido. Contando com participação social, o primeiro e único setor definido

do Plano Setorial em Natal foi o bairro de Ponta Negra, Zona Sul da cidade. Bairro

caracterizado como área estratégica de atuação dos setores turístico e imobiliário e com fortes

atributos paisagísticos, evidenciando históricas mobilizações sociais contra o processo de

verticalização e a descaracterização da paisagem, principalmente aquela formada pelo Morro do

Careca e dunas associadas, definidas na ZPA - 6.

O presente estudo identificou entraves nos debates para a formulação do Plano Setorial,

destacando-se: (i) Dificuldades de compreensão conceitual e operacional; (ii) Falta de clareza

sobre o produto final gerado por um Plano Setorial.

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130

São exemplos desses entraves os questionamentos que se colocaram quanto aos

aspectos de distinção entre o Plano Setorial e a Operação Urbana Consorciada, quanto à sua

relação com o Plano Diretor, tendo em vista a mudança de parâmetros e quanto à sua natureza

como instrumento ou estratégia de gestão. Na prática, tal como posto no Plano Diretor de Natal,

o Plano Setorial é facilmente substituído por outros instrumentos, principalmente a Operação

Urbana Consorciada. Verificou-se, portanto, a ausência de definição das especificidades do

Plano Setorial no Plano Diretor, que foram identificadas na presente pesquisa.

O Plano Setorial apresenta potencialidade quando desenvolvido como modalidade ou

estratégia de gestão, uma vez que pode ser norteador de intervenções urbanas em diversos

contextos. Tem potencialidades para facilitar as etapas de planejamento e de projeto urbano em

áreas novas ou consolidadas, com atrativos de investimentos imobiliários ou não. Nesse caso,

demarca-se um diferencial relevante em relação ao instrumento da OUC, uma vez que o Plano

Setorial poderá nortear intervenções urbanas em áreas que não exijam, necessariamente, a

atração de investimentos privados para realização de ações e projetos. Nessa perspectiva, é

fundamental que se compreenda o Plano Setorial no campo do sistema de planejamento e gestão

urbana do município, a partir do qual poderá auxiliar as iniciativas de articulação dos

instrumentos urbanísticos em uma fração urbana (inclusive a OUC), a proposição de projetos e a

facilitação dos processos participativos.

Inserido no Sistema de Planejamento o PS não é autoaplicável como um instrumento

urbanístico, isto indica que operacionalmente a regulamentação deste resulta em lei ordinária e

que as estratégias previstas devem facilitar a aplicação dos instrumentos e dos índices e

parâmetros previstos no macrozoneamento do Plano Diretor, isto por meio do sistema de gestão

pública e da redução da escala territorial do planejamento. Assim, compreende-se que Planos

Setoriais são estratégias de planejamento e gestão urbana, que potencializam a aplicação do

macrozoneamento e a integração das áreas especiais, de modo a garantir a melhoria na

qualidade de vida da população moradora, por meio da aplicação do ordenamento do uso do

solo, dos instrumentos e dos projetos urbanísticos, estabelecidos para a área e instituídos no

Plano Diretor. Cabe ressaltar que mesmo com estas inconsistências, a sociedade e os técnicos,

se apropriaram do Plano Setorial e o mencionaram em todos os debates realizados em Natal

(2006-2012) como ferramenta potencial para a participação mais ativa da sociedade no

planejamento e na construção de “que cidade queremos”.

Como uma avaliação parcial do primeiro setor instituído no Plano Diretor, observou-se

que este se limitou a restringir a verticalização acima de quatro pavimentos e o remembramento

em parte do bairro de Ponta Negra. Mesmo assim, identificou-se que esses parâmetros não

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foram adotados para orientar o crescimento do bairro, uma vez que muitas construções

utilizaram licenças anteriores à aprovação do instrumento, confirmando os antigos parâmetros,

que eram mais permissivos em termos de aproveitamento do potencial construtivo. Além disso,

a permissão para construção fora dos parques residenciais de Ponta Negra e Alagamar (áreas

sem limite de gabarito pelo Plano Diretor) promoveu intensa verticalização em outro setor do

bairro, o que comprometeu ainda mais a rede de infraestrutura, que já se encontrava saturada

(Figura 12 e Figura 37). Este momento evidenciou fragilidades na implementação do próprio

Plano Diretor, inviabilizando a aplicação das medidas propostas pelo Plano Setorial. Assim,

fragilizaram-se também os objetivos da sociedade de conter a verticalização no bairro de Ponta

Negra.

Figura 37. Verticalização em Ponta Negra, na parte posterior da Vila de Ponta Negra e do Parque

Residencial de Alagamar.

Fonte: FURUKAVA, 2012.

Nota: Av. Rota do Sol, sentido Ponta Negra – Parnamirim.

A falta de investimento na atualização da capacidade de tratamento e de coleta de

esgoto público suficientes para atender às demandas existentes e criadas no bairro, foi outro

fator crítico. Isto indicou que os objetivos do Plano Setorial não foram atingidos em face à

ausência de compatibilização do adensamento com a infraestrutura de suporte. Também não

foram aplicados os instrumentos previstos no Plano Diretor, como o IPTU progressivo no tempo

e o Direito de Preempção, além da não regulamentação ou revisão das áreas especiais. Ressalta-

se, assim, a dificuldade do Poder Público orientar o crescimento da cidade em bases

sustentáveis, num contexto em que os instrumentos de regulação do uso e ocupação do solo

apresentam formulações vagas e os procedimentos de gestão participativa se realizam de forma

pontual e profundamente setorizada, a exemplo do que identificamos com o Plano Setorial.

A falta de regulamentação do setor de Ponta Negra até junho de 2012, a não integração

do sistema de emissão e renovação de licenças, assim como de outros instrumentos do Plano

Diretor, não permitiram que fossem atingidos os objetivos de espacialização do ordenamento do

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uso e ocupação do solo urbano; de promover a função social da propriedade e de compatibilizar

o adensamento à respectiva infraestrutura de suporte.

A regulamentação do Plano Setorial iniciado em 2008 com a contratação do IBAM,

para desenvolver em conjunto com a SEMURB uma proposta para a área, foi marcado pela falta

de transparência por parte da Prefeitura que não disponibilizou informações sobre essa

regulamentação. Além disso, os estudos desenvolvidos não incorporaram as iniciativas que

estavam sendo desenvolvidos no bairro de Ponta Negra e que utilizavam metodologias

participativas com organizações sociais, trabalhadores e moradores locais.

Em 2011, o IBAM apresentou em audiência pública os resultados dos estudos técnicos

desenvolvidos, sinalizando a importância do debate público e de contribuições para o

aprofundamento do trabalho. Apesar do Poder Público municipal ter convocado a audiência

pública abrindo o espaço de discussão naquele momento, não havia clareza sobre a forma de

inserção das contribuições que seriam apresentadas e nem dos desdobramentos das atuações

participativas. Nesse sentido, o Ministério Público fez uma intervenção reivindicando que tal

proposta não fosse encaminhada diretamente à Câmara dos Vereadores para votação e que fosse

dado um prazo de 90 dias para publicização, discussão e contribuições da sociedade sobre os

estudos apresentados. Em sequência a isto, o Ministério Público contratou um laudo técnico

contendo análises sobre a proposta apresentada. O laudo indicou que o documento demandava

complementação técnica e social, além de alguns alertas às estruturas propostas: um destaque ao

formato de “lei complementar” que possibilitava alteração de parâmetros estabelecidos no Plano

Diretor e à ausência de participação social na formulação da proposta. Em 2012 foi

desenvolvida uma segunda audiência pública para apresentação das contribuições do Ministério

Público sobre a proposta. Este chegou à conclusão de que o documento se configurava como

estudo preliminar e sugeriu complementação democrática na condução dessa regulamentação,

utilizando-se instrumentos previstos no Estatuto da Cidade e no Plano Diretor de Natal

(Conselhos, audiências públicas, conferências, reuniões de bairro, etc..). Ressalta-se que após

esta fase de discussão, nenhum outro debate sobre o Plano Setorial foi realizado.

A falta de continuidade dos estudos para aprofundamento do Plano Setorial e as lacunas

geradas pela ausência da sua regulamentação contribuíram para que as intervenções urbanas no

bairro de Ponta Negra continuassem tendo uma percepção fragmentada do espaço, sobretudo

das Zonas de Proteção Ambiental. As discussões sobre a regulamentação da ZPA 6 (Morro do

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133

Careca)90

, por exemplo, foram realizadas de forma desconectada em relação às propostas de

reestruturação do calçadão de Ponta Negra91

e às obras de mobilidade previstas92

, com

influência direta no bairro. Nas audiências públicas que discutiram essas intervenções, a

população mencionou por diversas vezes o Plano Setorial como instância possível de

articulação dos projetos, de produção coletiva e de inserção das contribuições da sociedade.

Vale lembrar que os princípios fundamentais que orientam o Plano Setorial são os

mesmos do Plano Diretor: a função socioambiental da propriedade e a gestão democrática

conforme o Estatuto da Cidade. Constata-se que existem avanços na inserção desses princípios

nos instrumentos de planejamento urbano instituídos no Município de Natal. Contudo, a

aplicação desses princípios através dos instrumentos é complexa - articular os instrumentos,

planos e projetos, compatibilizar o adensamento à capacidade de suporte da infraestrutura

urbana, gerar espaços e métodos para uma efetiva participação social, garantir o debate aberto

para que se possa de fato explicitar e disputar democraticamente o projeto de cidade na qual

queremos viver. Esses são os desafios que estão postos para o planejamento das nossas cidades

e nas quais o Plano Setorial em estudo se insere.

Ressalta-se que a implementação desses instrumentos pressupõe a criação de novas

estruturas institucionais de planejamento capazes de gerar base técnica de estudos sobre a

cidade, avaliação e monitoramento das políticas públicas e de participação da sociedade. Neste

sentido, faz-se necessária a atualização da base institucional para a gestão do Plano Diretor e

dos seus instrumentos de aplicação (a exemplo de banco de dados edilício e urbano e estruturas

para realização de diferentes formatos de participação social – audiências públicas, seminários,

oficinas, conferências). São questões que estão referidas ao Plano Diretor, mas que têm

rebatimento direto no Plano Setorial, na perspectiva de se ter uma intervenção articulada no

território dos demais instrumentos do Plano Diretor e do debate social, em escalas que facilitem

o debate entre técnicos e sociedade.

Compreende-se, portanto, que o objetivo do Plano Setorial é gerar um campo facilitador

para aplicação dos instrumentos do Plano Diretor; detalhar o macrozoneamento do ordenamento

do uso e ocupação do solo urbano existente naquela lei complementar; gerar e compatibilizar o

90

Reunião promovida a convite da Associação dos Moradores dos Parques Residenciais de Ponta Negra e

Alagamar - AMPA, com a presença e a apresentação da proposta de regulamentação da ZPA 6 (Morro do

Careca e dunas adjacentes) pela SEMURB, no dia 3 de maio de 2012, na AMPA. 91

Audiência Pública realizada no dia 16 de Agosto de 2012, no auditório da sede da Procuradoria-Geral

de Justiça, em Candelária. 92

Registrado na carta de justificativa social contra o projeto de engenharia da ampliação da Av.

Engenheiro Roberto Freire / Natal-RN, entregue e apresentado em audiência pública do dia 06/09/2012,

promovida pelo governo do estado, no Centro Administrativo de Natal (AMPA, 2012).

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134

adensamento à respectiva infraestrutura de suporte; garantir a participação social, segundo os

parâmetros do Estatuto da Cidade, utilizando-se de outras ferramentas, além das audiências

públicas; preservar a qualidade de vida da população; promover a função social da propriedade;

e definir uma lei, vinculada à compatibilização dos projetos urbanísticos para a área.

Quanto aos produtos que geraria, a implementação do Plano Setorial visaria aplicar,

articuladamente, os instrumentos previstos no Plano Diretor e não alterá-los. Assim, detalharia o

que está proposto no Plano Diretor, lote a lote da fração. Quanto aos planos, projetos e licenças

(emitidas ou renovadas), o Plano Setorial permitiria a compatibilização com o sistema de

infraestrutura, baseando-se nos dados aprofundados do setor. Todas as etapas demandam a

transparência exigida nas normas federais. Esta aplicação articulada pode ser apresentada em

um mapa geral, conforme observado na Figura 38.

Para a construção de um mapa como este, pode ser utilizado o zoneamento do Plano

Diretor, o detalhamento do uso e ocupação do solo existente e a atualização do cadastro edilício.

Além disto, é possível espacializar a indicação das áreas atingidas por projetos urbanísticos ou

de infraestrutura. Este mapa é acompanhado de um quadro de diretrizes, prazos,

responsabilidades administrativas e custos de intervenção.

Outra possibilidade do Plano Setorial é aprofundar mecanismos que orientem a

ocupação do solo de forma compatível ao suporte da infraestrutura urbana. Mecanismos estes

aplicados constantemente, sendo relacionados ao crescimento populacional e ocupacional da

cidade, e de maneira mais efetiva e pontual, em casos de fragilização de áreas históricas, sociais

e cenário paisagístico, além da contaminação de áreas ambientais. No campo da gestão, isto

demanda exercer um maior controle sobre a emissão de licenças ou alvarás de construção,

podendo utilizar de ferramentas computacionais. Isto possibilita um monitoramento mais efetivo

por parte dos entes privados e públicos sobre as concessionárias, na instalação e na atualização

dos sistemas de infraestrutura.

Para os planos e projetos urbanos ou de grande impacto observou-se a obrigatoriedade

da participação social, conforme estabelecido no Estatuto da Cidade. O Plano Setorial aprofunda

o zoneamento de áreas, indicando lotes onde poderão ser aplicados os instrumentos previstos no

Plano Diretor e que serão impactados espacialmente pelos projetos urbanísticos. A

espacialização e verticalização da lei, assim como os dados atualizados, quantitativos e

qualitativos do setor, são elementos que alimentam o debate sobre o que se propõe para a área e

para a avaliação prévia de impactos espaciais no setor.

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135

Figura 38. Relação entre o detalhamento do Plano Diretor com projetos previstos para a área.

Fonte: Elaborado pela autora, sob a base da LC 82/07

Nota: os elementos estão sobre o mapa de Ponta Negra, mas são meramente representativos.

Como síntese dos procedimentos adotados em experiências similares que se aproximam

do Plano Setorial e da construção deste em Natal destaca-se:

1. construção de um termo de referência que contenha elementos gerais sobre um Plano

Setorial, sobre as experiências de aplicação e os resultados obtidos, além disso, dos custos e

responsabilidades administrativas e financeiras. Nesta etapa de formulação, pode-se optar

pelo modelo das Conferências e pelos Conselhos, para promover a participação social;

2. solicitação para a realização de um Plano Setorial em uma área urbana, por parte do

Poder Público ou da sociedade;

3. análise da estrutura administrativa municipal para realizar o Plano Setorial

4. definição de uma comissão técnica de coordenação dos setores;

5. composição de uma comissão técnica responsável pelas atividades no setor. Esta equipe

pode ser complementada, entretanto, previamente se direcionam técnicos para estruturar o

Plano. Cabe lembrar que o Plano Setorial, embora possa sugerir novos projetos, objetiva

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136

principalmente compatibilizar projetos existentes no setor e alterá-los, quando necessário,

por meio da participação social;

6. proposição de uma comissão de acompanhamento social;

7. análise da realidade urbana a partir do Plano Diretor visando identificar bairros contíguos

da cidade, integrados, em grande parte, nos sistemas de água (abastecimento de água,

saneamento básico e drenagem, atividade econômica, ou outros). Importante que essa análise

conte com a participação das comissões técnica e de acompanhamento social;

8. debate com a sociedade residente no setor delimitado ;

9. realização de discussão pública para definir os setores que utilizarão o Plano Setorial

como estratégia de planejamento e gestão, além de definir os limites e aprovar a comissão

técnica e da comissão social.

Os elementos dos itens 1 ao 9, podem compor a primeira etapa do relatório;

10. O apontamento dos dados base. Convém lembrar que estes são exemplos de dados base,

mas pode haver outros, que são acrescidos, segundo as especificidades de cada setor:

infraestrutura existente por setor;

sistema fundiário dos lotes;

uso e ocupação do solo e mapa de gabarito atual, mostrando a modificações dos

últimos anos;

identificação dos vazios urbanos ou subutilizados (lotes e unidades construídas);

licenças emitidas nos últimos cinco anos;

alvarás emitidos no ano;

propostas de planos e projetos (inclusive das concessionárias) apresentados nos

últimos cinco anos para a área e os que estão previstos;

evolução dos preços de mercado dos terrenos e imóveis da área (últimos cinco

anos – levantamento das tipologias arquitetônicas existentes), com objetivo de prever

custos das obras de infraestrutura no setor, especialmente ampliações da malha viária

e relocação de moradores em caso de reestruturação de alguma área, evitando que

estes saiam da localidade em que residem;

apontamento do patrimônio histórico/arquitetônico;

apontamento de áreas ambientais e usos de impacto a estas áreas no entorno;

análise da dinâmica demográfica

mapeamento de fluxos de circulação e população flutuante;

mapeamento dos equipamentos públicos;

mapeamento das áreas livres.

11. desenvolver a capacitação dos grupos técnicos e de representação social;

12. promover o debate com a sociedade para definir o que se deseja para a área, os

problemas apresentados pelos cidadãos e as prioridades de intervenção. Nesta etapa propõe-

se a realização de um quadro de diretrizes e intervenções;

13. o relatório sobre as demandas técnicas e sociais identificadas a partir destes dados locais e

debates;

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137

14. definir de um programa base a ser executado na área, a partir do estabelecido no Plano

Diretor: definição da futura ocupação em termos de usos, atividades e suas distribuições;

alterações espaciais previstas e pelas concessionárias; impactos dessas intervenções na

sociedade local e na rede de infraestrutura; provisões para a área e quadro de prioridades,

orçamentos e responsabilidades.

15. a elaboração de projetos e cenários resultantes, seguida da formulação de um anteprojeto

de lei. Estes elementos contemplam a segunda parte do relatório.

16. a divulgação e apresentação formal de todos os setores do Plano Setorial para a cidade;

17. a apresentação no setor do anteprojeto deste;

18. a coleta de contribuições e propostas de alteração para o anteprojeto de lei pela

comunidade e entidades específicas;

19. a conciliação das propostas;

20. discussão das alterações propostas ou das novas proposta de delimitação dos setores,

confirmação dos limites;

21. a apresentação, no setor, da proposta final de delimitação;

22. a pactuação e validação da proposta, compondo a terceira parte do relatório;

23. o encaminhamento para os Conselhos e para a aprovação da Câmara dos vereadores;

24. a fiscalização, acompanhamento e manutenção do setor – frequentes audiências, reuniões

e conferências, no setor;

25. a revisão e atualização do instrumento. Medidas transitórias e o tempo de duração da lei

para o setor, compondo a quarta parte do relatório93

.

Ao compreender que as informações das etapas de formulação, de implantação e de

revisão são fundamentais para avaliação do setor no âmbito do Plano Setorial, as quatro partes

compõem um documento único. Em sequência orienta-se a ampla publicização dos resultados

pelo Município e pelas concessionárias envolvidas, em sites oficiais e outros meios de

divulgação. Estes procedimentos não se afastam dos existentes para a aplicação de instrumentos

e projetos urbanísticos, entretanto, trazê-los aqui, norteia a utilizarão do Plano Setorial como

estratégia de planejamento. Neste caso, a realidade da cada setor deverá indicar novos

elementos e quais destes se aplicam ou não à localidade.

A seguir apresenta-se a síntese dos procedimentos referidos anteriormente - Quadro 7.

93

Dados sintetizados nesta pesquisa com base nas experiências similares e na experiência de Natal.

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138

Quadro 7. Síntese e aproximações de procedimentos de implementação do Plano Setorial

ETAPA RESPONSABILIDADE

DE GESTÃO OBJETIVOS ETAPA DO RELATÓRIO

01

Município

(CT)

Reorganizar a estrutura

administrativa

Composição de uma Comissão Técnica

por setor

Delimitar o setor Relatório sobre as oficinas, audiências e

dados técnicos e sociais para definição

do setor.

Levantar dados base do

setor

Relatório apresentando, especializando

e verticalizando estes dados. Aqui

contém as demandas que estes dados

apresentam.

Definir um comitê

gestor

Indicação de responsabilidades e

capacitação deste grupo por setor.

02

Município

(CT)

(CG)

Identificar demandas

técnicas e sociais

Capacitação e

discussão pública

(Oficinas, Seminários,

Grupos de trabalho,

conferencias, etc..)

Relatório com os pareceres, registros e

produtos gerados nas oficinas,

audiências e outros formatos de

manifestação para a composição destas

leituras.

Definir um programa

base para o setor

Relatório que contenha as

representações gráficas (quadros,

tabelas, imagens - cenários) que

indiquem o que será realizado no setor,

prazo de início, possíveis parcerias,

prioridades.

Elaborar um

Anteprojeto de lei

Anteprojeto de Lei.

03

Município

(CG)

(CT)

Discutir sobre o

Anteprojeto

Dossiê e relatórios que apresentem as

manifestações de cada grupo de atores

envolvidos.

Conciliar propostas e

Aprovar a lei

Lei ordinária.

04

Município

(CG)

(CT)

Monitorar e fiscalizar Dossiê e relatórios das etapas após a

aprovação da lei.

Revisar Dossiê e relatórios das etapas e dados

atualizados do setor para embasar

decisões (produto 1).

Fonte: Elaborado pela autora, 2012.

Nota: Comissão Técnica - CT; Comitê Gestor – CG.

Destaca-se, por fim, que o Plano Setorial tem potencialidade para orientar o

planejamento da cidade em bases sustentáveis na busca pela efetivação de direitos, a partir de

um escopo e escala de intervenção que facilitam a integração de ações e projetos; a

implementação relacionada dos instrumentos urbanísticos e destes com a democratização da

gestão da cidade. Isto por meio da aproximação dos atores sociais, a exemplo do Poder Público,

da população e das empresas, que participam da produção do espaço urbano.

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139

CONCLUSÃO.

PLANO SETORIAL: APONTAMENTOS CONCEITUAIS E

OPERACIONAIS

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140

Nesta pesquisa, buscou-se responder às inquietações sobre o Plano Setorial, com objetivo geral

de compreender a natureza e os procedimentos operacionais do Plano Setorial, visando

formular apontamentos sobre os aspectos conceituais e operacionais de aplicação do Plano

Setorial proposto para a cidade do Natal. O estudo realizado permitiu identificar que o Plano

Setorial - concebido durante a revisão do Plano Diretor de Natal (1994) e aprovado na Lei

Complementar 82/07 - foi formulado com a participação de dois segmentos: o Poder Público,

que o inseriu como instrumento de gestão, com o objetivo de potencializar a aplicação dos

instrumentos do Plano Diretor, considerando a possibilidade de redução da escala territorial; e

os grupos e organizações sociais, com destaque para os moradores do bairro de Ponta Negra,

que identificaram no Plano Setorial a possibilidade de conter a verticalização em curso e de

melhorar a qualidade de vida na localidade.

Com a aprovação do Plano Diretor, o Plano Setorial foi instituído no Título V, dos

instrumentos para a gestão urbana, como um instrumento legal de planejamento urbano e

ambiental, evidenciando as motivações da etapa de formulação e as possibilidades de

intervenções urbanas, tais como soluções viárias, de transporte, infraestrutura, entre outros.

Nesse contexto, foi definido o bairro de Ponta Negra como primeiro setor para aplicação do

Plano Setorial, com prazo de regulamentação de um ano.

Verificou-se que, após cinco anos (2007-2012), não houve regulamentação e aplicação

do instrumento. Entretanto, iniciativas foram formuladas, a exemplo de estudos acadêmicos,

como a atual pesquisa94

e, na esfera da gestão pública, com destaque para o estudo da

SEMURB/IBAM. Foram identificadas fragilidades conceituais e operacionais do Plano Setorial,

em face à falta de referências de sua aplicação no planejamento urbano brasileiro, que

dificultaram a aplicação e a avaliação desse Plano e do setor de Ponta Negra. Verificou-se,

ainda, a relação conceitual que os técnicos e os representantes de grupos sociais envolvidos,

fizeram do Plano Setorial com outros instrumentos do Plano Diretor de Natal, a exemplo da

Operação Urbana Consorciada e com outras experiências de planejamento aplicadas em

diferentes realidades, a exemplo do Plano de Bairro em São Paulo. Isto gerou visões divergentes

quanto à operacionalização, quanto aos produtos finais gerados e quanto à relevância do Plano

Setorial.

94

Não há relatos de aplicação do Plano Setorial, tal como posto no Plano Diretor de Natal, em outras

cidades brasileiras, trazendo poucos estudos e avaliações sobre o tema. Os únicos estudos acadêmicos

identificados foram o da autora desta pesquisa, iniciados em 2009 com o Trabalho Final de Graduação

“Parâmetros de aplicação do Plano Setorial como instrumento do Plano Diretor de Natal” e continuado,

com a atual dissertação (2012).

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Como avaliação do Plano Setorial de Ponta Negra, mesmo de forma limitada pela não

regulamentação do setor, foi possível aferir que o crescimento do bairro (2007-2012) não foi

compatibilizado com o suporte das redes de infraestrutura. Isto foi constatado a partir da

emissão de licenças sem considerar a capacidade destas redes, especialmente o esgotamento

sanitário que não abrange todo o bairro, e a renovação de licenças emitidas em legislação

anterior - que previa um maior coeficiente de aproveitamento para Ponta Negra. Esta

incompatibilidade intensificou problemas urbanos, ambientais e sociais observados em 2006 e

que motivaram a instituição deste Plano Setorial, tais como a intensa verticalização e

especulação imobiliária, a sobrecarga nos sistemas de infraestrutura, o grande número de vazios

urbanos e vacâncias habitacionais (IBGE, 2010). Quanto à aplicação do princípio da gestão

democrática e a falta de transparência sobre o que estava sendo proposto para o Plano Setorial

entre 2008, ano da contratação do estudo do IBAM, e 2011, ano de apresentação da proposta da

SEMURB/IBAM, foi observada a fragilização da participação social e da efetivação dos

direitos, com foco no direito à moradia e ao desenvolvimento sustentável. Ainda assim, grupos e

organizações sociais de Ponta Negra continuaram participativos e mencionando o Plano Setorial

em outros debates na cidade95

, especialmente os que tinham repercussão urbana no bairro96

.

Identificou-se, portanto, que durante estes cinco anos de vigência (2007-2012), mesmo

com as fragilidades apresentadas, o Plano Setorial permaneceu na agenda das discussões do

planejamento urbano de Natal, quer seja nas esferas do Poder Público ou dos grupos sociais,

sendo mencionado, principalmente, nos fóruns de discussão sobre as áreas especiais e de

projetos urbanísticos de infraestrutura, o que vem reforçando sua importância no campo legal e

do planejamento em Natal e no bairro.

Neste contexto, a presente pesquisa permitiu apontar elementos para o aprofundamento

conceitual e operacional do Plano Setorial, com vista a potencializar a efetivação deste, com

destaque as seguintes ideias e conclusões:

No campo conceitual identificou-se que a definição do Plano Setorial como

instrumento é inconsistente. Como instrumento, o Plano Setorial perde relevância quando seus

objetivos são concorrentes a demais instrumentos existentes e amplamente difundidos, tanto na

95

A exemplo da reunião promovida pela Associação dos Moradores dos Parques Residenciais de Ponta

Negra e Alagamar, com a presença e a apresentação da proposta de regulamentação da ZPA 6 (Morro do

Careca e dunas adjacentes) pela SEMURB, no dia 3 de maio de 2012, na AMPA. 96

A exemplo da reestruturação viária da Via Costeira e da Av. Engenheiro Roberto Freire (AMPA,

CAAU/UFRN, 2012), reestruturação do calçadão de Ponta Negra e regulamentação da ZPA 6 (AMPA,

2012).

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literatura, quanto na prática de gestão das cidades, a exemplo da Operação Urbana Consorciada

(OUC) e o Direito de Preempção97

.

Foi visto também que os grupos e organizações sociais de Ponta Negra e a gestão

pública confirmaram o Plano Setorial na agenda urbana em Natal, quando remeteram a este o

objetivo de facilitar a gestão democrática. Isto se materializou nas audiências públicas

promovidas pela administração municipal, no período de 2011 e 2012, cujos debates

contribuíram para o aprofundamento dos estudos no setor de Ponta Negra e possibilitaram a

transparência de informações e o controle social. Ressalta-se que houve um entendimento

comum a todas as discussões no sentindo de que o Plano Setorial: que este se definiu como

parte integrante do Plano Diretor e, portanto, está subordinado aos parâmetros estabelecidos

nesta lei municipal.

A partir destas constatações e tal como visto na trajetória de Natal, conclui-se que a

natureza do Plano Setorial se aproxima de uma estratégia de gestão territorial e urbana. Como

estratégia de gestão, tem a potencialidade de promover a discussão sobre o planejamento e a

implementação de ações capazes de articular intervenções urbanas nos diferentes níveis:

aplicação de instrumentos, projetos de execução de infraestrutura, urbanísticos e de arquitetura,

atendendo às prioridades e aos parâmetros estabelecidos no Plano Diretor. Esta compreensão

permitiu inferir e concluir que o Plano Setorial se enquadra de forma mais adequada no Título

VI, do Plano Diretor de Natal – referente ao sistema de planejamento e gestão urbana do

Município, do que no Título V – dos instrumentos de gestão urbana. Integrado ao Sistema de

Planejamento e de Gestão do Município, o Plano Setorial se articula aos órgãos, unidades ou

conselhos que viabilizam a gestão democrática da cidade, a partir de suas próprias estruturas de

gestão operacional e de participação social.

Ao partir deste entendimento, a pesquisa aqui desenvolvida não traz modelos ao Plano

Setorial, mas identifica ações de referência para a gestão de frações urbanas, por meio das

experiências similares observadas e na realidade de Natal. Assim, compreende-se que o Plano

Setorial está submetido ao Plano Diretor. Portanto, a delimitação do setor se configura em uma

lei ordinária, não sendo permitido alterar prescrições, parâmetros e limites estabelecidos na Lei

Complementar. Com isto, é possível estimular a elaboração de Planos Setoriais pautados nos

princípios constitucionais, evitando setores especializados que potencializem a construção de

uma cidade fragmentada. Vale lembrar que, submetido a um Plano Diretor, esse sistema de

97

Operacionalmente, estes instrumentos, assim como o Plano Setorial, delimitam um recorte territorial,

aprofundam os dados do setor em nível do lote e apresentam possíveis soluções urbanísticas.

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gestão do Plano Setorial tem a obrigatoriedade jurídica e legal de ser direcionado à aplicação do

benefício comum e da construção de cidades justas, democráticas e sustentáveis.

Isto posto, e trazendo os procedimentos observados nas experiências similares

analisadas, constatou-se que o Plano Setorial, uma vez vinculado ao sistema de gestão, passa a

requerer readequações na estrutura organizacional e administrativa do Poder Público Municipal,

para que cada setor criado constitua Conselhos Gestores, que por sua vez estariam articulados às

demais estruturas do Sistema de Gestão. Sugere-se que os Conselhos Gestores do Plano Setorial

sejam compostos pela diversidade de segmentos sociais e instâncias públicas, facilitando a

transparência e a compatibilização dos planos, dos projetos e das estruturas previstas para a

fração, além da comunicação entre esses setores.

Nesta perspectiva e na inserção do Plano Setorial no contexto do planejamento urbano,

observa-se que o PS se coloca como um sistema que potencializa a efetivação da gestão

democrática, contribuindo na redução da desigualdade, na promoção da justiça social e na

melhoria da qualidade de vida nas cidades. Assim como na redistribuição de renda; no acesso a

todos os benefícios da urbanização e no direito ao desenvolvimento sustentável; no

desenvolvimento de um meio ambiente sadio; em condições dignas de vida; e no exercício

pleno da cidadania e dos direitos humanos.

No campo operacional, identificou-se a importância de se definir critérios e delimitar

unidades de planejamento (bairro, bacia hidrográfica, entre outros) considerando especificidades

das realidades urbanas e ambientais locais. Conclui-se, portanto, que são inconsistentes as

delimitações de frações urbanas em toda a cidade e inscritas previamente no Plano Diretor,

conforme visto na fase de formulação e regulamentação, em andamento, do Plano Setorial

(2006-2012)98

, sem o devido aprofundamento técnico sobre a realidade de cada área e o

envolvimento dos agentes sociais mais diretamente a ela relacionados. Ressalta-se que a

proposição do Plano poderá partir tanto da esfera técnica quanto das organizações sociais,

reforçando o caráter dinâmico do planejamento.

Verificaram-se na trajetória do Plano Setorial de Natal e nas experiências similares

analisadas possíveis critérios para se delimitar uma fração urbana e territorial, como a

requalificação de áreas, o crescente adensamento espacial e populacional, obras de

98

Identificados na fala de Maria Florésia que apresentou a intenção dos técnicos idealizadores do Plano

Setorial em setorizar toda a cidade e demarcá-las na instituição do Plano Diretor de Natal (2006-2007); na

instituição do bairro de Ponta Negra como primeiro setor do Plano Setorial (2006-2007) e; na proposta do

Plano Setorial da Região Sul 1 da SEMURB, que reintegra a discussão os bairros de Capim Macio e

Neópolis, ao setor de Ponta Negra (2011-2012), em andamento (2012).

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infraestrutura e urbanística, ou os impactos ambientais, sociais e econômicos que fragilizam a

qualidade de vida dos cidadãos. Enfim, a realidade local determinaria esses critérios, que podem

adotar como unidade de planejamento um bairro ou mais unidades contíguas, a inserção na

bacia hidrográfica ou um setor da economia.

Observou-se, também, que este sistema de gestão tem a potencialidade de detalhar o

macrozoneamento estabelecido no Plano Diretor, trazendo-o para o nível do lote, indicando

quais terrenos receberão os instrumentos e quais deles passarão por uma transformação espacial,

por meio de planos e projetos no setor. Esta redução da escala territorial de planejamento e

gestão, a partir do Plano Setorial, contribui para a formação de uma base aprofundada sobre os

dados do setor, que facilita a formulação de propostas, a participação e o controle social e

explicitando para a diversidade dos agentes sociais (empresas, população, Poder Público) uma

clareza quanto à legislação e perspectivas de intervenções futuras na área.

Outra potencialidade identificada com relação ao Plano Setorial foi quanto à

possibilidade de se articular os instrumentos com a dimensão do projeto urbanístico. Nesse caso

identificou-se que o Plano Setorial se aproxima da Operação Urbana Consorciada quando

ambos propõem um projeto urbanístico, mas se diferencia quando o Plano Setorial não precisa

necessariamente, como é o caso da OUC, atrair investimentos privados para renovação ou

reestruturação de áreas. Como instrumento articulador de instrumentos urbanísticos, o Plano

Setorial poderá, em alguns casos, incorporar a OUC, mas não necessariamente em todas as

situações.

A dimensão do projeto urbanístico possibilita ao sistema de gestão, efetuar a

transposição entre os princípios mais gerais da regulação em um nível de desenho urbano, que

compreende a verticalização e a espacialização da lei e dos projetos urbanos e de infraestrutura

previstos no planejamento da cidade. Este desenho fomenta a participação e o controle social e

orienta claramente os gestores sobre as intervenções que devem ser garantidas a cada espaço. As

novas tecnologias gráficas e de informação e comunicação, conforme visto nas experiências

similares, contribuem fortemente para a construção de cenários para os debates, quando contêm

e apresentam informações precisas sobre os efeitos de cada proposta sobre o território.

Como todo desenho urbanístico vinculado a uma lei e na compreensão de que a cidade é

dinâmica e mutável, a lei ordinária do Plano Setorial contempla um prazo de execução dos

elementos, planos e projetos propostos, sendo possível ser renovado caso se avalie necessário,

ou finalizado, caso cumpra seus objetivos ou estes tenham se tornado obsoletos diante da

realidade local.

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Também no campo operacional, os estudos e experiências similares permitiram

relacionar procedimentos possíveis para potencializar a aplicação do Plano Setorial. Estes

procedimentos, que podem variar de acordo com a realidade local, são os seguintes: a) a

elaboração de termos de referência que expressem a trajetória das etapas de aplicação e que

direcionam novas formulações do Plano Setorial; b) proposições sobre a estrutura administrativa

e organizacional do município, gerando um formato de gestão que possibilite a integração de

planos, projetos e instrumentos urbanísticos; c) a definição de Comitês Gestores (técnicos e

sociais) para cada setor e de coordenação geral dos setores; d) Plano de participação social

(oficinas, grupos temáticos, seminários, conferências...); e) o aprofundamento da base de dados

acerca do setor, contemplando aspectos legais (indicações do Plano Diretor), fundiários, e

dimensões sociais, econômicas, ambientais e urbanísticas (a capacidade da infraestrutura local,

o uso do solo), e procedimentos de licenciamento (licenças, alvarás e projetos de infraestrutura

ou urbanísticos previstos para a área); f) a elaboração de diretrizes para o projeto da área; g) a

composição de cenários; h) a elaboração de lei ordinária vinculada a um projeto urbanístico, que

relacionem planos, projetos e instrumentos e estes com o suporte da infraestrutura e a provisão

de adensamento para a área; e j) a divulgação dos resultados e monitoramento.

Por fim, compreende-se que, embora o procedimento de integração de instrumentos,

planos e projetos, extrapole o âmbito do Plano Setorial, encontra-se, sobretudo, no campo da

gestão. Conclui-se, assim, que o Plano Setorial se justifica de forma mais adequada quando

concebido como estratégia de gestão no sistema de planejamento, inserido como uma das fases

da gestão democrática.

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146

REFERÊNCIAS

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APÊNDICE 1: Função Social da Propriedade segundo o

Estatuto da Cidade

Quadro 8. Função Social da Propriedade segundo o Estatuto da Cidade

EC Diretrizes

Capítulo I

Diretrizes

Gerais

Art. 2° A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das

funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes

gerais:

I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana,

à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos

serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações

representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e

acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da

sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;

IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da

população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de

influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus

efeitos negativos sobre o meio ambiente;

V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos

adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;

VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:

a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos; b) a proximidade de usos

incompatíveis ou inconvenientes; c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso

excessivos ou inadequados em relação à infraestrutura urbana; d) a instalação de

empreendimentos ou atividades que possam funcionar como polos geradores de

tráfego, sem a previsão da infraestrutura correspondente; e) a retenção especulativa de

imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização; f) a deterioração das

áreas urbanizadas; g) a poluição e a degradação ambiental; h) a exposição da

população a riscos de desastres naturais; (Incluído pela Medida Provisória nº 547, de

2011).

VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em

vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua área de

influência;

VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão

urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica

do Município e do território sob sua área de influência;

IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;

X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos

gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os

investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes

segmentos sociais;

XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a

valorização de imóveis urbanos;

XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do

patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;

XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos

de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente

negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da

população;

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de

baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e

ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população

e as normas ambientais;

XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das

normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos

lotes e unidades habitacionais;

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XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de

empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o

interesse social.

Art. 3° Compete à União, entre outras atribuições de interesse da política urbana:

I – legislar sobre normas gerais de direito urbanístico;

II – legislar sobre normas para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios em relação à política urbana, tendo em vista o equilíbrio do

desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional;

III – promover, por iniciativa própria e em conjunto com os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios, programas de construção de moradias e a melhoria das

condições habitacionais e de saneamento básico;

IV – instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,

saneamento básico e transportes urbanos;

V – elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de

desenvolvimento econômico e social.

Título II

Dos Direitos e

Garantias

Fundamentais

Capítulo I

Dos Direitos e

Deveres

Individuais e

Coletivos

Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências

fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o

atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social

e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no

art. 2° desta Lei.

Fonte: BRASIL, 2001.

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ANEXO 1: Lei Complementar 82/07

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ANEXO 2: Proposta de Lei IBAM/SEMURB para o Plano Setorial

da Região Sul 1