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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR UNIDADE CIENTÍFICA E PEDAGÓGICA DE CIÊNCIAS DE ENGENHARIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELECTROMECÂNICA CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS EM SISTEMAS BIOFÍSICOS EPIDEMIOLOGIA E NORMAS DE SEGURANÇA CARLOS MANUEL PEREIRA CABRITA LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOMÉDICAS 2008

CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS EM SISTEMAS BIOFÍSICOSwebx.ubi.pt/~catalao/livro3.pdf · eléctrico e do campo magnético, estudam-se as quatro equações de Maxwell na forma integral,

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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

UNIDADE CIENTÍFICA E PEDAGÓGICA

DE CIÊNCIAS DE ENGENHARIA

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA ELECTROMECÂNICA

CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS EM SISTEMAS BIOFÍSICOS

EPIDEMIOLOGIA E NORMAS DE SEGURANÇA

CARLOS MANUEL PEREIRA CABRITA

LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOMÉDICAS

2008

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Dedicado à memória de James Clerk Maxwell (Edimburgo, 13

de Junho de 1831 – Cambridge, 5 de Novembro de 1879) e a

Nikola Tesla (Similjan, Sérvia, 10 de Julho de 1856 – New

York, 7 de Janeiro de 1943). Ao primeiro, porque representa

um dos expoentes máximos da capacidade intelectual da

humanidade e, ao deduzir as suas equações, fez confluir entre

si os fenómenos eléctricos e magnéticos, dando origem ao

electromagnetismo, que, por sua vez, permitiu o nascimento

no seio da ciência da indústria determinante da nossa civili-

zação – exactamente a indústria electrotécnica. Ao segundo,

porque, ao inventar o motor trifásico de indução e o transfor-

mador, e ao prever as comunicações sem fios, é muito justa-

mente considerado o fundador da indústria electrotécnica.

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PREFÁCIO

Assim como o carvão representou a base energética da Primeira Revolução

Industrial, a Electricidade é o combustível invisível da vida moderna. O aumen-

to descomunal da utilização da electricidade prova, indubitavelmente, que a

energia eléctrica tem um papel essencial na nossa sociedade, ao ponto de ser

impensável imaginar-se o quotidiano actual sem se ter acesso a essa fonte

energética. Sem dúvida que as tecnologias associadas ao electromagnetismo

têm vindo a tornar a nossa vida bastante mais fácil, podendo afirmar-se que,

por exemplo, a vida familiar e pessoal seria impossível sem a existência de

electrodomésticos e dos equipamentos multimédia de lazer. Por outro lado, o

desenvolvimento das telecomunicações e dos sistemas informáticos tem vindo

a permitir a comunicação fácil e directa entre pessoas individuais, grupos e

colectividades, sejam elas citadinas ou rurais.

Todavia, a par de todas estas vantagens e benefícios altamente significativos,

a electricidade apresenta os seus próprios riscos, muitos deles de extrema

gravidade, como sucede com as electrocussões por contacto directo ou

indirecto com condutores ou cabos eléctricos. Adicionalmente, a utilização da

energia eléctrica resulta na geração de campos eléctricos e de campos

electromagnéticos, ou seja, de campos electromagnéticos, que, ao cabo e ao

resto, representam forças naturais invisíveis e encontram-se presentes sempre

que exista electricidade.

Contudo, os campos electromagnéticos são parte integrante e essencial da

nossa vida, devido à sua presença em numerosas aplicações, o que obriga a

uma exposição permanente que poderá conduzir ao aparecimento de efeitos

biológicos nocivos e adversos, como se verá nos diversos capítulos deste livro.

Poder-se-á afirmar que, desde o nascimento da indústria electrotécnica, nos

finais do Século XIX, os seres vivos encontram-se rodeados de campos

electromagnéticos criados pela própria humanidade, devido ao rápido

desenvolvimento das centrais e redes de transporte de energia eléctrica, da

rádio e da televisão, do radar, das comunicações celulares, dos electro-

domésticos, dos equipamentos multimédia, e dos computadores, entre toda

uma panóplia de sistemas que seria exaustivo descrever.

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A influência dos campos electromagnéticos em sistemas biológicos nasceu

praticamente com Hipócrates, e tem vindo a ser estudada através da história,

com muito mais realce, como não poderia deixar de ser, nos tempos modernos,

devido aos efeitos nocivos eventualmente causados pelas antenas de comuni-

cações e pelas linhas de alta tensão de transporte de energia eléctrica. Estes

estudos continuarão a ser realizados e, por serem bastante complexos,

obrigarão à constituição de equipas multi e inter-disciplinares, onde participarão

médicos, biomédicos, engenheiros, biólogos, técnicos de saúde pública,

técnicos de ambiente, e gestores de avaliação de situações de risco.

A unidade curricular a que se destina este livro de apoio, representa

exactamente um bom exemplo da miscigenação entre medicina, biomedicina e

engenharia electrotécnica, e apresenta os seguintes objectivos, a seguir discri-

minados:

• Descrição e compreensão dos fenómenos inerentes ao espaço

electromagnético, através das quatro equações de Maxwell, que

englobam em si todas as leis relacionadas com a electrostática, a

corrente eléctrica, o campo magnético variável, e a indução electro-

magnética.

• Descrição sucinta das fontes geradoras de campos eléctricos, de

campos magnéticos, e de radiação de rádio-frequência.

• Descrição e compreensão dos mecanismos de acção dos campos

electroma-gnéticos sobre os sistemas biológicos.

• Descrição e compreensão das bases para a modelização matemática

relacionada com a absorção da energia dos campos electromagnéticos

por parte dos sistemas biológicos.

• Descrição e compreensão dos efeitos biológicos dos campos electro-

magnéticos de extremamente reduzida frequência e das rádio-fre-

quências.

• Descrição e análise dos efeitos terapêuticos dos campos electro-

magnéticos.

• Descrição das medidas a adoptar, como prevenção das acções nocivas

dos campos electromagnéticos.

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• Enumeração da regulamentação de segurança e de protecção,

internacional assim como de diversos países, contra a exposição a

radiações.

Por outro lado, com a aprovação na unidade curricular em questão, os alunos

adquirirão as seguintes competências profissionais, técnicas e científicas:

• Capacidade para descrever os fenómenos inerentes ao campo electro-

magnético, através da recorrência às equações de Maxwell.

• Capacidade para definir as vias a seguir conducentes à modelização

matemática relacionada com a absorção da energia da rádio-frequência

e dos campos ele-ctromagnéticos de muito baixa frequência por parte

dos sistemas biológicos.

• Capacidade para enumerar e discernir os tipos de equipamentos,

industriais, domésticos, e utilizados em electromedicina, geradores de

radiação electro-magnética.

• Capacidade para descrever e enumerar os mecanismos e os efeitos da

radiação electromagnética nos sistemas biofísicos.

• Conhecimento das publicações internacionais – livros e revistas cientí-

ficas e técnicas –, que expõem e divulgam os mais recentes resultados

de investigação sobre este tema.

• Conhecimento das regras e linhas de acção internacionais, de protec-

ção contra os efeitos nocivos da exposição às radiações electro-

magnéticas.

• Capacidade para formar e integrar equipas multidisciplinares com

médicos e engenheiros electrotécnicos, com a finalidade de procurarem

soluções técnicas com vista à protecção contra a exposição a

radiações.

• Capacidade para promover e desenvolver estudos, individualmente e

em equipa, que procurem relacionar determinados tipos de doenças e

anomalias com a exposição a radiações.

• Capacidade para elaborar relatórios técnicos, que descrevam e

explicitem os modos de assinalar os equipamentos potencialmente

perigosos, assim como as medidas preventivas a adoptar.

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• Capacidade para integrar equipas de projecto de unidades hospitalares,

onde existam equipamentos de electromedicina, com a finalidade de

melhor localizar esses equipamentos.

• Capacidade para participar em equipas de projecto e manutenção de

equipamento electromédico.

No que respeita à estrutura organizativa deste livro, ele contém cinco capí-

tulos, onde se abordam, de uma forma aprofundada, os seguintes assuntos:

Capítulo 1. Electromagnetismo Define-se campo eléctrico e apresentam-se alguns aspectos relacionados com

a electrostática. Define-se igualmente campo magnético e, da mesma forma,

apresentam-se alguns aspectos do estudo da magnetostática. Como base da

origem dos campos electromagnéticos, expõe-se ainda o fenómeno da indução

electromagnética, descoberto e comprovado praticamente em simultâneo pelo

americano Joseph Henry e pelo inglês Michael Faraday, no Século XIX. Por

outro lado, na medida em que reúnem em si todos os fenómenos do campo

eléctrico e do campo magnético, estudam-se as quatro equações de Maxwell

na forma integral, que é a de mais simples compreensão e, na sua sequência,

cita-se a energia electromagnética, definindo-se e apresentando-se o vector de

Poynting. Continuando com a teoria do electromagnetismo, estabelece-se a

relação entre os campos electromagnéticos e a radiação, apresentando-se o

espectro das frequências, expondo ao mesmo tempo os conceitos de radiação

não-ionizante e de radiação ionizante. A terminar, descrevem-se as interacções

entre os campos electromagnéticos e os materiais biológicos mais importantes

– as células e os tecidos humanos.

Capítulo 2. Campos Electromagnéticos de Frequências Extremamente Reduzidas Descrevem-se as fontes geradoras de campos eléctricos e magnéticos, em

corrente contínua (magnetosfera, imagiologia através de ressonância mag-

nética, linhas eléctricas em corrente contínua, como é o caso das catenárias

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ferroviárias), e em corrente alternada (condutores em instalações eléctricas,

geradores eléctricos). Assinala-se e descrevem-se igualmente quais as origens

dos campos electromagnéticos no meio ambiente – linhas aéreas de trans-

porte de energia eléctrica, cabos subterrâneos de transporte e distribuição de

energia eléctrica, subestações, transformadores, instalações eléctricas de

baixa tensão, veículos rodoviários e ferroviários, fornos de indução industriais,

electrodomésticos, terminais de vídeo.

Atendendo a que, na maioria das situações, coexistem diversos equipamentos

geradores de campos electro-magnéticos, apresenta-se, em termos de

compatibilidade electromagnética, as interferências que surgem

frequentemente, como por exemplo a acção dos telemóveis sobre os

pacemakers cardíacos assim como sobre outros equipamentos médicos de

apoio à vida.

Descrevem-se igualmente os efeitos biológicos dos campos electromagnéticos

– interacção com os sistemas biológicos, relação com o cancro, estudos em

animais, e estudos em humanos (sistema nervoso, sistema cardiovascular,

síndroma da fadiga crónica, sensibilidade à electricidade, alterações visuais,

consequências de choques eléctricos directos e indirectos). Como conse-

quência, apresentam-se os resultados de estudos epidemiológicos –

epidemiologia, leucemia infantil, leucemia em adultos, tumores cerebrais,

cancro mamário, cancro pulmonar, cancro da pele, cancro da próstata, doença

de Alzheimer, demência, esclerose múltipla, depressão.

A terminar, apresenta-se um subcapítulo que descreve em pormenor os

aspectos relacionados com a protecção e segurança contra os efeitos nocivos

dos campos electromagnéticos, assim como a regulamentação e as normas de

segurança, que estabelecem os limites máximos de protecção aconselháveis,

no que respeita ao campo eléctrico, ao campo magnético, e às correntes

induzidas nos tecidos biológicos.

Capítulo 3. Radiação de Rádio-Frequência Inicia-se este capítulo através da indicação do espectro das frequências de

radiação, para os diversos equipamentos actuais, e descrevem-se e

enumeram-se as fontes geradoras de radiação – geradores, linhas de

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transmissão de sinal, antenas, estações de transmissão de rádio e televisão,

sistemas de radar, estações de recepção e rastreio de satélites, comunicações

na banda das micro-ondas, equipamento de transmissão rádio-móvel, comu-

nicações celulares móveis, comunicações multimédia sem fios, fornos micro-

ondas.

Apresentam-se os resultados obtidos através de estudos epidemiológicos

realizados em humanos, cobrindo aspectos como a percepção auditiva, a

actividade cerebral, o sistema cardiovascular, o sistema imunitário, os níveis de

melatonina, e o aparecimento de cataratas, descrevendo-se igualmente os

riscos a que se encontram expostas determinadas classes profissionais, como

por exemplo os operadores de radar, os militares, o pessoal de teleco-

municações e de radiodifusão, abordando-se ainda os riscos inerentes à

exposição a transmissores de rádio e televisão, e a telefones celulares.

Dada a sua importância, dedica-se um subcapítulo integralmente à descrição e

análise das normas de protecção e segurança contra os efeitos nocivos das

radiações de rádio-frequência, apresentando-se os regulamentos norte-

-americanos e os organismos legisladores, os regulamentos canadianos, os de

alguns países europeus (Áustria, Bélgica, Finlândia, Alemanha, Itália, Holanda,

Suécia, Suíça, Reino Unido, e Rússia), os de alguns países asiáticos (Austrália

e Nova Zelândia, China, e Japão). Adicionalmente, apresentam-se os níveis de

exposição considerados seguros, recomendados por dois importantes orga-

nismos internacionais – The International Radiation Protection Association, e

The International Commission on Non-Ionizing Radiation Protection.

Bibliografia Este livro parece-nos, devido à elevada quantidade e variedade de temas

abordados e expostos, ser suficiente para que os alunos compreendam toda a

problemática relacionada com os efeitos biofísicos dos campos electro-

magnéticos. Quanto aos restantes livros citados, contêm uma enorme varie-

dade de assuntos interessantíssimos, apresentados na maioria das situações

com uma profundidade científica notável, e poderão pontualmente contribuir

para a formação especializada dos alunos, daí que se aconselhe que, no seu

processo de auto-aprendizagem complementar, sejam consultados, na medida

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em que poderão esclarecer dúvidas e, ao mesmo tempo, indicar linhas

orientadores de investigação futura.

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ÍNDICE

CAPÍTULO 1. ELECTROMAGNETISMO 11.1. GRANDEZAS E UNIDADES 1

1.1.1. Grandezas Escalares e Vectoriais 1 1.1.2. Sistema de Unidades 2

1.2. CAMPO ELECTROMAGNÉTICO 3 1.2.1. Grandezas do Campo 3 1.2.2. Campo Eléctrico 5 1.2.3. Campo Magnético 12

1.3. INDUÇÃO ELECTROMAGNÉTICA 161.4. EQUAÇÕES DE MAXWELL 181.5. ENERGIA ELECTROMAGNÉTICA 231.6. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS E RADIAÇÕES 261.7. ESPECTRO DAS FREQUÊNCIAS ELECTROMAGNÉTICOS 28

1.7.1. Radiação Não-Ionizante 28 a) Campos Electromagnéticos de Frequência

Extremamente Reduzida 30 b) Radiação de Rádio-Frequência 30 c) Radiação Óptica Não Coerente 31 1.7.2. Radiação Ionizante 32 a) Raios X 33 b) Raios Gama 34

1.8. MATERIAIS BIOLÓGICOS 34 1.8.1. Células 34 1.8.2. Tecidos 37

1.9. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS E RISCOS PARA A SAÚDE 37

CAPÍTULO 2. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS DE FREQUÊNCIAS EXTREMAMENTE REDUZIDAS 44

2.1. FONTES GERADORAS DE CAMPOS ELÉCTRICOS E MAGNÉTICOS 44

2.1.1. Fontes de Corrente Contínua 45 a) Magnetosfera 46 b) Linhas de Transporte de Energia Eléctrica 47

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c) Imagiologia de Ressonância Magnética 47 2.1.2. Fontes de Corrente Alternada 48 a) Condutor Simples 52 b) Dois Condutores Paralelos 53 c) Enrolamentos (Bobinas) 54 d) Linhas de Transporte Trifásicas 55 2.1.3. Electrodomésticos 60 2.1.4. Monitores de Computadores 62 2.1.5. Incompatibilidade Electromagnética 64

2.2. EFEITOS BIOFÍSICOS DOS CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS 65 2.2.1. Mecanismos de Interacção 67 a) Correntes Induzidas 68 b) Biomaterias Magnéticos 69 c) Radicais Livres 70 d) Membrana Celular e Ligação Química 71 2.2.2. Campos Electromagnéticos e Cancro 72 a) Mecanismos do Cancro 72 b) Carcinogénese 73 c) Hipótese da Melatonina 74 2.2.3. Estudos Celulares 76 a) Efeitos Relevantes para o Cancro 76 Material Genético 76 Transporte de Cálcio 77 Proliferação e Diferenciação de Células 78 Actividade Enzimática 78 Hormonas 79 Sistema Imunitário 79 Comunicações Intercelulares 79 b) Efeitos não Cancerígenos 80 2.2.4. Estudos em Humanos 80 a) Sistema Cardiovascular 81 b) Síndroma da Fadiga Crónica 81 c) Sensibilidade Eléctrica 82 d) Choques e Microchoques Eléctricos 82 e) Sensações Visuais 84

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2.3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS 84 2.3.1. Epidemiologia 85 a) Rácio de Possibilidades 85 b) Locais de Exposição 87 Locais de Trabalho (Locais Ocupacionais) 87 Locais Públicos 88 2.3.2. Estudos Epidemiológicos do Cancro 88 a) Leucemia Infantil 89 b) Leucemia em Adultos 92 c) Cancro Cerebral 94 d) Cancro Mamário 95 e) Cancro Pulmonar 96 f) Cancro da Pele 97 g) Cancro da Próstata 97 2.3.3. Estudos Epidemiológicos de Doenças não Cancerosas 99 a) Doença de Alzheimer e Demência 99 b) Esclerose 99 c) Depressão e Suicídio 100 d) Doenças Cardíacas 100 2.3.4. Estudos Relevantes sobre Terminais de Computador e

Outros Electrodomésticos 101

2.4. NORMAS DE SEGURANÇA E REGULAMENTAÇÃO 103 2.4.1. Institute of Electrical and Electronics Engineers IEEE 107 2.4.2. National Radiological Protection Board NRPB 108 2.4.3. International Commission on Nonionizing Radiation

Protection ICNIRP 109 2.4.4. Normas Suecas 110 2.4.5. Normas Alemãs 111 2.4.6. American Conference of Governmental Industrial

Hygienists ACGIH 112 2.4.7. Restrições 114

CAPÍTULO 3. RADIAÇÃO DE RÁDIO-FREQUÊNCIA 116

3.1. FONTES DE RADIAÇÃO DE RÁDIO-FREQUÊNCIA 116 3.1.1. Definições e Conceitos 116

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3.1.2. Elementos de um Sistema de RFR 118 a) Geradores 119 b) Linhas de Transmissão 119 c) Antenas 121 3.1.3. Transmissores de Rádio e Televisão 126 a) Estações de Rádio AM 127 b) Estações de Rádio FM 127 c) Estações de Televisão FM 127 3.1.4. Sistemas de Radar 128 a) Radares Estacionários 128 b) Radares de Controlo do Tráfego 129 3.1.5. Estações Terrestres de Rastreio de Satélites 130 3.1.6. Comunicações por Microondas 131 3.1.7. Equipamento Móvel de Rádio 132 3.1.8. Comunicações Celulares 133 a) Generalidades 133 b) Tecnologias Celulares 135 3.1.9. Comunicações Multimédia sem Fios 136 3.1.10. Fornos Microondas 137

3.2. ESTUDOS HUMANOS E EPIDEMIOLÓGICOS 138 3.2.1. Generalidades 138 3.2.2. Estudos Humanos 138 a) Percepção Auditiva 138 b) Actividade Cerebral 139 c) Sistema Cardiovascular 140 d) Sistema Imunitário 141 e) Melatonina 141 f) Cataratas 141 3.2.3. Estudos Epidemiológicos 142 a) Exposição Ocupacional 142 b) Exposição em Locais Públicos 145 3.2.4. Casos Pessoais 147

3.3. NORMAS DE SEGURANÇA E REGULAMENTAÇÃO 148 3.3.1. Norma ANSI/IEEE C95.1 150 3.3.2. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1966 150

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3.3.3. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1974 151 3.3.4. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1982 151 3.3.5. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1992 152 3.3.6. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 2005 153 3.3.7. Relatório NCRP nº 86 – 1986 154 3.3.8. Relatório NCRP nº 86 – 1993 154 3.3.9. Normas ACGIH 155 3.3.10. Normas FCC 156 3.3.11. Normas Canadianas 157 3.3.12. Normas Japonesas 158 3.3.13. Normas Chinesas 158 3.3.14. Normas Australianas e Neo-Zelandezas 159 3.3.15. Normas Russas e da Europa de Leste 160 3.3.16. Normas IRPA 161 3.3.17. Normas ICNIRP 162 3.3.18. Norma CENELEC EN 50392 : 2004 163 3.3.19. Regulamentação na União Europeia 164 3.3.20. Factores de Segurança 166 3.3.21. Taxa de Absorção Específica 167

BIBLIOGRAFIA 172

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CAPÍTULO 1. ELECTROMAGNETISMO

1.1. GRANDEZAS E UNIDADES Ao longo deste livro de apoio, utilizam-se frequentemente as expressões

Campo Electromagnético e Radiação, que convém explicitar em termos dos

seus significados físicos. Assim sendo, o Espaço Electromagnético, definido

pela primeira vez pelo cientista escocês James Clerk Maxwell, representa todo

o espaço físico onde, por sua vez, em todos os seus pontos se manifestam

fenómenos eléctricos e magnéticos, quantificados essencialmente através dos

vectores intensidade do campo eléctrico e intensidade do campo magnético,

sendo o Campo Electromagnético a interacção entre esses dois vectores.

Como exemplo pode-se citar o caso de um simples motor eléctrico que equipa

um electrodoméstico em que, no interior dos seus condutores, existe um

campo eléctrico e, no seu circuito magnético nos troços no ferro e no ar,

manifesta-se a existência de um campo magnético.

Por outro lado, sob determinadas circunstâncias que serão descritas ao longo

do texto, os campos electromagnéticos produzem ondas, que radiam a partir

das suas fontes, daí a existência do vocábulo Radiação Electromagnética ou

simplesmente Radiação. Como exemplo evidente, tem-se a radiação provo-

cada pelas antenas de comunicações móveis e de rádio e televisão.

Como se verá um pouco mais à frente, a interacção entre os campos eléctrico

e magnético é descrita através das denominadas Equações de Maxwell, que

permitem estudar e analisar todos os fenómenos, estáticos e variáveis no

tempo, que se manifestam no espaço electromagnético.

1.1.1. Grandezas Escalares e Vectoriais Como é sabido da matemática e da física, uma grandeza que tem apenas

magnitude e sinal algébrico, é designada por grandeza escalar ou simples-

mente por escalar, como sucede por exemplo com o tempo t, a massa m, a

potência P, e a energia W. Por outro lado, as grandezas que, além de

possuírem magnitude, são ainda caracterizadas por apresentarem uma

direcção e um sentido, são designadas por grandezas vectoriais ou simples-

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mente por vectores. É o caso, por exemplo, da velocidade Vr

, da força Fr

, e do

vector densidade de fluxo eléctrico Dr

. Como é habitual e do conhecimento

geral, os vectores serão sempre representados em itálico encimados por um

pequeno segmento com uma seta na sua extremidade direita, enquanto que o

seu módulo, ou magnitude, será sempre representada pelo mesmo símbolo,

mas sem o segmento superior – por exemplo, Br

representa o vector densidade

de fluxo magnético, enquanto que B é o seu módulo. Saliente-se que, no

estudo do campo electromagnético, utilizam-se diversas grandezas escalares e

vectoriais, como se verá de seguida.

1.1.2. Sistema de Unidades Na prática, a medição de qualquer grandeza física deverá sempre ser expressa

através de um número seguido por uma unidade, unidade essa que é uma

normalização através da qual uma dimensão pode ser expressa numeri-

camente. Os sistemas de unidades são usualmente definidos através de siglas,

que têm como significado as iniciais das unidades das suas grandezas funda-

mentais, tendo coexistido até há relativamente poucos anos, três sistemas de

unidades:

• Sistema CGS:

grandezas fundamentais – comprimento, massa, tempo

unidades – centímetro, grama-massa, segundo

• Sistema prático ou gravitatório MKpS:

grandezas fundamentais – comprimento, peso, tempo

unidades – metro, kilograma-peso, segundo

• Sistema Giorgi ou MKS:

grandezas fundamentais – comprimento, massa, tempo

unidades – metro, kilograma-massa, segundo

Note-se que o sistema MKS, introduzido por Giorgi em 1901, representa

exactamente o Sistema Internacional de Unidades SI, adoptado universalmente

com as siglas MKSA, devido à introdução da sigla A que representa a unidade

Ampére da grandeza fundamental intensidade da corrente eléctrica. Este

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sistema recomenda ainda que os múltiplos e os submúltiplos de todas as

unidades sejam escritos em passos (steps) de 103 e de 10-3.

1.2. CAMPO ELECTROMAGNÉTICO 1.2.1. Grandezas do Campo Como o seu próprio nome indica, o campo electromagnético é um espaço físico

onde coexistem, em interacção, campos eléctricos e campos magnéticos,

podendo ser criados artificialmente, por exemplo, em sistemas de produção,

transporte e utilização de energia eléctrica, através dos geradores, dos trans-

formadores, das linhas aéreas ou dos cabos subterrâneos de transporte, das

instalações eléctricas de baixa tensão domésticas e industriais, e por todos os

receptores que utilizam essa energia, tendo esses campos origem na

existência e no movimento de cargas eléctricas. Convém igualmente salientar

que os campos electromagnéticos criados artificialmente encontram-se sempre

presentes onde quer que existam equipamentos eléctricos, sejam electrodo-

mésticos, motores eléctricos, antenas, ou equipamentos médicos. No nosso

meio ambiente, existem igualmente campos electromagnéticos, de origem

natural, como o próprio campo magnético terrestre, as tempestades com

trovoadas, e as conhecidas auroras boreais, provocadas pela interacção entre

o vento solar e o campo magnético do planeta.

Apesar do campo electromagnético existir, não é possível ver nem sentir de

forma directa a existência de campos eléctricos e de campos magnéticos,

sendo no entanto possível medi-los e avaliá-los. Por exemplo, um simples

condutor de uma instalação eléctrica doméstica em baixa tensão, sujeito a uma

diferença de potencial que origine um movimento de cargas eléctricas no seu

interior, será sede não só de um campo eléctrico devido ao movimento das

cargas mas também de um campo magnético concêntrico – ou seja, este

condutor, assim como todo o espaço envolvente, representam um espaço

electromagnético.

A energia electromagnética, artificialmente gerada por equipamentos e que se

propaga através de ondas, interage não só com outros equipamentos

geradores de ondas similares, podendo provocar anomalias – daí a importância

crescente dos estudos sobre incompatibilidades electromagnéticas (veja-se a

influência dos telefones celulares sobre os pacemakers cardíacos) –, mas

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4

também sobre os sistemas biológicos, daí que seja essencial a compreensão

de alguns conceitos físicos, que se apresentam seguidamente, para que se

possa analisar e entender os mecanismos de interacção entre os campos

electromagnéticos e os materiais biológicos.

Apesar das investigações iniciais dessa interacção se terem centrado essen-

cialmente nos efeitos resultantes das exposições a campos de elevada

intensidade, os estudos actuais debruçam-se cada vez mais sobre todas as

possibilidades, incluindo a influência de campos electromagnéticos muito

reduzidos. Apesar de, no espaço electromagnético, coexistirem campos

eléctricos e campos magnéticos, muito provavelmente os efeitos biofísicos

provocados por estes dois tipos de campos serão bastante diferenciados.

Quanto às grandezas que caracterizam o campo electromagnético, elas são as

seguintes, tanto vectoriais como escalares:

• Vector densidade de fluxo eléctrico ou vector deslocamento eléctricoDr

,

de módulo densidade de fluxo eléctrico ou deslocamento eléctrico D.

• Vector densidade de corrente Jr, de módulo densidade de corrente J.

• Vector densidade de fluxo magnético Br

, de módulo densidade de fluxo

B.

• Vector intensidade do campo eléctrico Er

, de módulo intensidade do

campo eléctrico E.

• Vector intensidade do campo magnético Hr

, de módulo intensidade do

campo magnético H.

• Constante dieléctrica, ou permitividade, do meio (material) dieléctrico ε.

O seu valor no vazio é ε0 = 8,854 x 10-12 farads/metro (F/m).

• Condutividade eléctrica do meio (material) condutor σ.

• Permeabilidade magnética do meio (material) magnético μ. O seu valor

no vazio é μ0 = 4 π x 10-7 henries/metro (H/m).

Outra constante importante utilizada em electromagnetismo, é a velocidade de

propagação das ondas electromagnéticas no vazio (velocidade da luz no

vazio), c = 3 x 108 metros/segundo (m/s). Na disciplina científica electroma-

gnetismo, é canónico efectuar-se o estudo da electrostática (cargas eléctricas e

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campo eléctrico invariantes no tempo), da corrente eléctrica estacionária

(corrente contínua, em que as grandezas intervenientes são invariantes no

tempo), da magnetostática (campo magnético gerado por corrente contínua,

sendo as grandezas intervenientes igualmente invariantes no tempo), e dos

campos eléctricos e magnéticos variáveis no tempo. Como se verá um pouco

mais à frente, estes estudos têm todos eles como base as 4 Equações de

Maxwell, que serão apresentadas de uma forma generalizada, mas que, para

cada estudo concreto, são particularizadas. Um outro aspecto importante, para

que se fique com a noção clara de que existem similaridades entre a

electrostática, a corrente eléctrica estacionária e a magnetostática, consiste

exactamente na apresentação dessas similaridades não só entre grandezas

vectoriais mas também entre grandezas escalares, como se mostra no quadro

1.1.

Estudo Grandezas vectoriais Grandezas escalares

Electrostática E D ε

Corrente Estacionária E J σ

Magnetostática H B µ

Quadro 1.1 – Grandezas características do campo electromagnético

e similaridades entre elas.

1.2.2. Campo Eléctrico Como é sabido, o átomo é electricamente neutro, sendo constituído por um

núcleo com protões, isto é, cargas eléctricas positivas, e por electrões, ou seja

cargas eléctricas negativas, que, em número igual aos protões, giram em

órbitas em torno do núcleo. Estas cargas eléctricas encontram-se presentes no

vácuo, no ar e no interior de condutores – quando os electrões se movimentam

no interior dos condutores e cabos eléctricos, tem-se a conhecida corrente

eléctrica; porém essas cargas podem-se movimentar no espaço de um local

para outro, criando assim a denominada electricidade estática, cujos efeitos

são por nós conhecidos, como por exemplo quando os nossos cabelos se

dispõem de uma forma erecta perante um objecto electrizado ou quando se

“apanha” um pequeno choque eléctrico ao tocar-se na estrutura metálica de um

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automóvel. Outro exemplo típico, natural, consiste nas trovoadas, em que as

nuvens, ao movimentarem-se na atmosfera, ficam carregadas fortemente com

cargas eléctricas, devido ao atrito com o ar.

Sempre que existam cargas eléctricas em movimento no interior de um condu-

tor, ou quando há cargas eléctricas de sinal contrário, separadas entre si,

existirá um vector intensidade do campo eléctrico E, que permite definir e

avaliar a diferença de potencial, ou tensão eléctrica, U, devida a essa

separação de cargas. Esta tensão, entre dois pontos do espaço ou entre dois

pontos de um condutor, pontos esses que se encontram, genericamente, aos

potencias eléctricos absolutos V1 e V2, é definida matematicamente como

sendo a circulação do vector intensidade do campo eléctrico Er

entre esses

dois pontos, ou seja:

∫ •=−= s sdEVVUrr

21

sendo ds o vector de definição do caminho de circulação do vector campo

eléctrico. Se estes dois vectores forem colineares, isto é, se tiverem a mesma

direcção e o mesmo sentido, como sucede entre as armaduras paralelas de um

condensador plano ou no interior de um condutor eléctrico, ao resolver-se o

integral obtém-se:

sEVVU =−= 21

sendo s, em metros (m), a distância entre os pontos 1 e 2. Esta tensão

eléctrica, expressa em joules/coulomb (J/C), equivalente em termos

dimensionais ao volt (V), representa o trabalho necessário para mover uma

unidade de carga eléctrica entre aqueles dois pontos 1 e 2. Como se constata,

através da última expressão, quanto mais elevada for a tensão eléctrica ou

quanto mais próximas estiverem as cargas entre si, mais intenso será o campo

eléctrico, cuja intensidade tem como unidade o newton/coulomb (N/C),

dimensionalmente equivalente ao volt/metro (V/m).

Basicamente, os campos eléctricos podem ser representados de uma forma

gráfica, como se mostra na figura 1.1, considerando apenas uma única carga

(a), em que as linhas de força do vector campo eléctrico são radiais, ou então

considerando duas armaduras planas, paralelas, carregadas com cargas

eléctricas de sinais contrários (b).

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Figura 1.1 – Linhas de força do vector intensidade do campo eléctrico:

(a) – devidas a uma única carga eléctrica

(b) – devidas a duas armaduras paralelas (condensador).

Por sua vez, na figura 1.2 mostra-se o campo eléctrico na zona envolvente do

coração humano, destacando-se as linhas de força do vector intensidade do

campo eléctrico assim como as linhas equipotenciais, isto é, as linhas cujos

pontos se encontram todas elas ao mesmo potencial. Note-se que se têm duas

cargas eléctricas iguais, mas de sinal contrário, constituindo o que se designa

por dipolo eléctrico.

Figura 1.2 – Linhas de força do campo eléctrico e linhas equipotenciais

no coração humano.

Por outro lado, observa-se ainda que as linhas equipotenciais são perpendi-

culares às linhas de força do vector intensidade do campo eléctrico e, além

disso, quanto mais próximas essas linhas equipotenciais se encontram das

respectivas cargas mais elevado é o valor do potencial eléctrico.

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Este facto deve-se à seguinte expressão:

VE ∇−=r

em que ∇ é um operador vectorial diferencial, conhecido da análise mate-

mática, representando ∇V o gradiente do potencial eléctrico V. Por conse-

guinte, esta expressão diz-nos, por um lado, que as linhas equipotenciais são

perpendiculares às linhas de força do vector intensidade do campo eléctrico, e,

por outro, que o vector intensidade do campo eléctrico tem o sentido dos

potenciais eléctricos decrescentes. Nas figuras 1.3 e 1.4 são visíveis estas

constatações.

Figura 1.3 – Linhas de força do vector intensidade do campo eléctrico e linhas

equipotenciais, entre duas cargas iguais (140 pC), mas de sinais contrários.

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Figura 1.4 – Linhas de força do vector intensidade do campo eléctrico e linhas

equipotenciais, entre duas cargas iguais (140 pC), e com o mesmo sinal.

Relativamente à figura 1.3, conclui-se que cargas eléctricas com sinais contrá-

rios repelem-se, enquanto que, como se pode ver na figura 1.4, cargas com o

mesmo sinal atraem-se. Se, em lugar de cargas eléctricas, se tivessem por

exemplo condutores eléctricos rectilíneos percorridos por correntes eléctricas

invariantes no tempo, com a mesma intensidade, circulando com sentidos con-

trários ou com o mesmo sentido, os mapas apresentados seriam rigorosamente

iguais, com a única diferença de que, em lugar da carga eléctrica Q, expressa

em coulombs (C), se teria a intensidade de corrente eléctrica I, cuja unidade é

o ampere (A), dimensionalmente idêntica ao coulomb por segundo (C/s).

Saliente-se que este fenómeno, de atracção ou de repulsão entre condutores

percorridos por correntes eléctricas, foi pela primeira vez descoberto e

explicado pelo físico e matemático francês André-Marie Ampére, em 1820.

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Do exposto anteriormente, constata-se assim que, quanto mais próximo nos

encontrarmos de linhas áreas de transporte de energia eléctrica, de alta e

muito alta tensão, por exemplo 110 – 220 – 400 – 500 – 750 kV, mais intensos

são os campos eléctricos, daí os eventuais riscos inerentes da exposição a

esses campos eléctricos.

Na figura 1.5 mostram-se as linhas de força do vector intensidade do campo

eléctrico electrostático, bem como as respectivas linhas equipotenciais, no

espaço abaixo de uma nuvem de trovoada, carregada de cargas eléctricas.

Nesta mesma figura desenhou-se uma figura humana assim como uma trin-

cheira no solo, constatando-se, por um lado, que o campo eléctrico no fundo da

trincheira é inferior a 2000 V/m, enquanto que, na cabeça do humano, é

sensivelmente igual a 100000 V/m. Por conseguinte, durante a trovoada, o

risco de electrocussão do humano, ao manter-se em pé, é elevadíssimo, ao

passo que, se se deitar no chão da trincheira, é praticamente nulo (veja-se o

conselho que se encontra escrito na filactera). Este desenho comprova cien-

tificamente os sábios conselhos populares, a adoptar em campo aberto durante

as trovoadas, adquiridos empiricamente mas contudo correctos, de que nunca

se deve ficar em pé ou abrigarmo-nos debaixo de árvores, durante aquele tipo

de intempéries.

Figura 1.5 – Mapa das linhas de força do campo eléctrico electrostático (verticais),

e das equipotenciais (horizontais, na perpendicular), debaixo de uma nuvem de

trovoada.

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Por sua vez, na figura 1.6 mostram-se os campos eléctricos e as equipotenciais

electrostáticas da atmosfera, numa situação de céu pouco nublado e com

condições propícias ao aparecimento de trovoadas, sendo de salientar que o

solo e a electroesfera constituem um enorme condensador de armaduras para-

lelas. As nuvens mais carregadas (cumulo-nimbus), propícias ao desencadear

de trovoadas, comportam-se como um potente gerador de cargas eléctricas,

que vão carregando aquele condensador, deslocando-se as cargas eléctricas

positivas para a electroesfera e as cargas negativas para a parte inferior

dessas nuvens, concluindo-se que o campo eléctrico é bastante intenso. Em

contra-partida, quando as condições climatéricas são amenas (céu limpo,

nuvens fracto-cumulus), os campos eléctricos são bastante reduzidos, e

dirigem-se exclusivamente para o solo.

Figura 1.6 – Campo eléctrico e equipotencias na atmosfera, em condições

de céu pouco nublado e de aparecimento de trovoadas.

Em electrostática, se se tiver um meio dieléctrico com uma constante die-

léctrica, ou permitividade, ε, em F/m, onde existam cargas eléctricas estáticas,

a relação entre a intensidade do campo eléctrico E (V/m) e a densidade de

fluxo eléctrico, ou deslocamento eléctrico, D (C/m2), é dada pela seguinte

expressão vectorial:

EDrr

ε=

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Note-se que D representa uma medida do campo eléctrico em termos da carga

eléctrica equivalente por unidade de superfície. Por outro lado, na prática, os

materiais dieléctricos são os materiais isolantes utilizados em electrotecnia.

Nas situações em que os vectores densidade de fluxo eléctrico e intensidade

do campo eléctrico são colineares, pode-se escrever:

ED ε=

Quanto à constante dieléctrica, é ainda usual definir-se a constante eléctrica

relativa εr, adimensional, tomando como referência a constante dieléctrica do

vazio, ou seja:

0εεε =r

Para a maioria dos materiais biológicos, os valores desta constante relativa

situa-se entre 1 (como para o vácuo) e cerca de 80.

Conforme se salientou anteriormente, o movimento de cargas eléctricas no

interior de um condutor, origina o aparecimento de uma corrente eléctrica.

Assim sendo, a relação entre a intensidade do campo eléctrico e a densidade

de corrente no interior do meio condutor, é expressa através da seguinte

expressão:

EJrr

σ=

sendo a condutividade eléctrica do meio (material) condutor σ expressa em

amperes/volt/metro (A/V/m), dimensionalmente equivalente a 1/ohm/metro

(1/Ω/m). Havendo colinearidade entre os dois vectores, pode-se ainda

escrever:

EJ σ=

1.2.3. Campo Magnético No subcapítulo anterior, o campo eléctrico foi estudado por meio de uma força

de carácter eléctrico entre cargas, que actua sobre uma linha estabelecida

entre essas cargas. Com o movimento de cargas eléctricas, outro tipo de força

é exercida ao longo dessa linha entre cargas.

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Esta força é representada através do vector intensidade do campo magnético

Hr

, o qual é devido às cargas eléctricas em movimento no espaço ou no interior

de condutores. Este vector, cujo módulo é H, expresso em amperes/metro

(A/m), é perpendicular à direcção da corrente eléctrica, e descreve círculos

concêntricos em torno do eixo longitudinal do condutor, como se esquematiza

na figura 1.7. Por conseguinte, sempre que existam condutores percorridos por

correntes eléctricas, estacionárias ou variáveis no tempo, existirão igualmente

campos magnéticos no espaço envolvente, também estacionários ou variáveis

no tempo. Ou seja, quem estiver próximo de linhas aéreas ou subterrâneas de

transporte de energia, ou mesmo em instalações domésticas ou industriais,

estará exposto a campos magnéticos e, consequentemente, aos seus

possíveis efeitos adversos.

Figura 1.7 – Linhas de força circulares do vector intensidade do campo magnético,

originadas pela corrente eléctrica que circula no interior do condutor.

Por conseguinte, existem campos magnéticos significativos gerados por cen-

trais eléctricas, linhas de transporte de energia, subestações eléctricas, trans-

formadores, catenárias de linhas ferroviárias eléctricas, painéis e anúncios

eléctricos, motores, e electrodomésticos, campos esses que facilmente pene-

tram noutros materiais, incluindo os tecidos humanos. Em geral, os campos

electromagnéticos são bastante intensos junto às fontes que lhes dão origem, e

diminuem bastante à medida que nos afastamos dessas fontes. Por outro lado,

as pessoas não sentem directamente a presença dos campos electroma-

gnéticos, todavia, quando a sua intensidade é elevada, podem causar uma

sensação visual tremeluzente, temporária, denominada magnetophosphenes,

que desaparece assim que a fonte do campo magnético é removida.

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Quando um campo magnético, caracterizado pelo vector intensidade do campo

magnético, penetra através de uma superfície seccional de um meio (material)

magnético, de permeabilidade μ, como se esquematiza na figura 1.8, o vector

densidade de fluxo magnético através dessa superfície é dado pela seguinte

expressão:

HBrr

μ=

em que a densidade de fluxo é expressa em webers/metro quadrado (Wb/m2),

unidade esta que é equivalente ao tesla (T), em homenagem ao físico e enge-

nheiro Nikola Tesla. Existindo colinearidade entre os dois vectores, pode-se

ainda escrever:

HB μ=

Tal como em relação à constante dieléctrica, é usual definir-se a permea-

bilidade magnética relativa, tomando como base a permeabilidade magnética

absoluta do vazio, ou seja:

0μμμ =r

Do ponto de vista do seu comportamento face aos campos magnéticos, os

materiais são classificados em 3 categorias distintas:

• Materiais diamagnéticos: A sua permeabilidade relativa é ligeiramente

inferior à unidade, como é o caso do bismuto (0,99983), da prata

(0,99998), e do cobre (0,999991).

• Materiais paramagnéticos: A sua permeabilidade relativa é ligeiramente

superior à unidade, como é o caso do ar (1,0000004), do alumínio

(1,00002), e do palladium (1,0008).

• Materiais ferromagnéticos: A sua permeabilidade relativa é bastante

elevada, como é o caso do níquel (600), do ferro (5000), e do

supermalloy (1000000).

Na prática, os materiais são classificados em não-ferromagnéticos (diamagné-

ticos e paramagnéticos), uma vez que a sua permeabilidade relativa se pode

considerar igual à unidade, isto é, μr = 1, e em ferromagnéticos, com μr >> 1.

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O fluxo magnético φ, expresso em webers (Wb), através de uma superfície de

área S, expressa em metros quadrados (m2), conforme se representa na figura

1.8, é definido como sendo a totalidade da densidade de fluxo magnético

através dessa superfície S. Supondo que as linhas de força do vector

densidade de fluxo magnético são perpendiculares à superfície, tem-se:

SHSB μφ ==

Figura 1.8 – Linhas de força do vector densidade de fluxo magnético B

através de uma superfície de área S.

Como exemplificação, esquematiza-se na figura 1.9 o espectro das linhas de

força do campo magnético gerado por um magneto permanente rectilíneo.

Figura 1.9 – Distribuição de linhas de força do campo magnético,

de um magneto permanente.

área S

B

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1.3. INDUÇÃO ELECTROMAGNÉTICA A magnetostática, como se compreende, representa o estudo do campo ma-

gnético com origem na corrente eléctrica estacionária, isto é, na corrente

contínua. Como tal, todas as grandezas intervenientes, eléctricas e magné-

ticas, são invariantes no tempo. A magnetostática abrange igualmente o estudo

dos materiais magnéticos permanentes, que possuem um campo magnético

também ele invariante no tempo, não havendo a presença de correntes

eléctricas estacionárias.

Todavia, quando um condutor ou um enrolamento eléctrico se encontram sob a

acção de um campo magnético estacionário no tempo, esse condutor ou esse

enrolamento permanecerão inertes, isto é, não será gerada qualquer força

electromotriz e, consequentemente, corrente eléctrica estacionária. Contudo,

em 1831, em Londres, o físico inglês Michael Faraday descobriu que os

campos magnéticos variáveis no tempo geram correntes eléctricas em circuitos

fechados, também variáveis no tempo, desde que esses circuitos se

encontrassem sujeitos à acção desses campos magnéticos. Este mesmo

fenómeno, conhecido por indução electromagnética, foi igualmente constatado,

quase em simultâneo mas de uma forma independente, pelo físico americano

Joseph Henry, em Albany, no Estado de New York. Na prática, esse fenómeno

é conhecido universalmente por Lei de Indução de Faraday, lei esta que é

considerada como das mais importantes da história da humanidade, na medida

em que representa a base teórica e científica para a construção, por exemplo,

de geradores, motores, transformadores, e fornos de indução.

Faraday, na sua investigação, concluiu que a intensidade da corrente induzida

no circuito fechado é proporcional não ao fluxo que abraça, mas sim à taxa de

variação negativa desse mesmo fluxo em ordem ao tempo. Para melhor com-

preensão, considere-se uma espira de condutor eléctrico, de forma rectangular,

com um comprimento total s e com uma área total S, conforme se esquematiza

na figura 1.10, sujeita à acção de um campo magnético variável no tempo,

caracterizado pelo fluxo φ, perpendicular à superfície. Atendendo a que o

campo magnético é variável no tempo, gera-se um vector intensidade do

campo eléctrico no interior do condutor da espira, de módulo E também

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variável no tempo, sendo assim a força electromotriz induzida na espira, f.e.m.,

variável no tempo, dada pela expressão:

sEsdEE sind =∫ •=rr

Figura 1.10 – Esquematização da Lei de Indução de Faraday.

Por outro lado, o valor instantâneo desta f.e.m. é também dado pela seguinte

expressão, que traduz, na sua forma original, a Lei de Indução de Faraday:

tddEindφ

−=

Como o valor instantâneo do fluxo magnético φ, através da totalidade da super-

fície S da espira, é dado por:

SB=φ

ter-se-á, finalmente:

)( SBtd

dEind −=

Analisando esta expressão geral da lei de indução, conclui-se o seguinte:

• Se B for invariante no tempo, e se a espira for mecanicamente inde-

formável (S constante), a f.e.m. induzida é nula.

S

φ

Eind

s

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• Se B for variável no tempo e se a espira não se deformar, existe f.e.m.

induzida, que tem a designação de f.e.m. estática ou de transformação,

e é característica dos transformadores eléctricos.

tdBdSEind −=

• Se B for invariante no tempo, mas se a superfície da espira for variável

ou se rodar em torno do seu eixo de simetria longitudinal, existe f.e.m.

induzida, que se designa por f.e.m. dinâmica ou de rotação, e representa

a base da existência de geradores e motores eléctricos de corrente

contínua e de corrente alternada.

tdSdBEind −=

• Se B for variável no tempo e, em simultâneo, se a superfície da espira

for variável ou se rodar em torno do seu eixo de simetria longitudinal,

existe f.e.m. induzida, com as duas parcelas anteriores – estática e

dinâmica. É característica dos motores de corrente contínua a trabalha-

rem em corrente alternada, como é o caso dos pequenos motores que

equipam diversos electrodomésticos.

tdSdB

tdBdSEind −−=

1.4. EQUAÇÕES DE MAXWELL Como se estudou anteriormente, um campo eléctrico produz sempre um campo

magnético e, inversamente, um campo magnético variável no tempo produz

sempre um campo eléctrico.

Esta interacção entre os campos eléctricos e os campos magnéticos dá origem

a uma região do espaço físico designada por campo electromagnético, em que

todos os seus fenómenos são traduzidos matematicamente pelas 4 Equações

de Maxwell que, na forma diferencial, apresentam o seguinte aspecto,

considerando os campos variáveis no tempo:

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tBE∂∂

−=×∇

rr

tDJH∂∂

+=×∇

rrr

0=•∇ Br

ρ=•∇ Dr

Nestas equações, e como já se salientou anteriormente, ∇ é um operador

vectorial, representando ∇ • um produto interno ou escalar (divergência), e ∇ x

um produto externo ou vectorial (rotacional). Por outro lado, ρ representa a

densidade de cargas eléctricas estáticas em volume, expressa em coulombs

por metro cúbico (C/m3).

A primeira destas equações relaciona o rotacional do campo eléctrico num

ponto do espaço com a variação da densidade de fluxo nesse mesmo ponto do

espaço. Fisicamente, esta equação mais não é que a forma diferencial da lei de

indução de Faraday. A segunda equação relaciona o rotacional do vector

intensidade do campo magnético num ponto do espaço, com a densidade de

corrente nesse mesmo ponto, compreendendo o segundo membro duas par-

celas, representando a primeira o vector densidade de corrente de condução

num meio condutor, e a segunda, a densidade de corrente de deslocamento

num meio dieléctrico (lei de Ampére). As correntes de deslocamento surgem

em qualquer dieléctrico desde que exista uma variação com o tempo do campo

eléctrico.

Note-se que as cargas eléctricas que se movimentam livremente no interior de

um material sob a acção de um campo eléctrico designam-se por cargas livres,

e que, sob a acção desse campo, deslocam-se livremente nos condutores,

dando origem às correntes eléctricas de condução. Por outro lado, as cargas

ligadas são cargas eléctricas que fazem parte da estrutura de alguns materiais

e que são mantidas em determinadas posições por acção das forças de coesão

moleculares, sendo o número de cargas ligadas positivas igual ao número de

cargas ligadas negativas. Os materiais assim caracterizados são designados

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por dieléctricos, ou materiais isolantes. Deste modo, quando um material iso-

lante fica sujeito à acção de um campo eléctrico, as cargas ligadas positivas

deslocar-se-ão no sentido dos potenciais decrescentes, enquanto que as

cargas ligadas negativas se deslocarão no sentido contrário, isto é, dos

potenciais crescentes, gerando assim as correntes de deslocamento eléctrico.

Por conseguinte, devido à acção do campo eléctrico as cargas ficarão

distribuídas à superfície do material, como sucede nos condensadores.

Quanto à terceira equação, ela exprime a continuidade do fluxo magnético, isto

é, diz-nos que as linhas de força do campo magnético fecham-se sobre si pró-

prias (lei de Gauss para o campo magnético).

Finalmente, a quarta equação relaciona a divergência do vector densidade de

fluxo eléctrico com a densidade volumétrica de cargas estáticas (lei de Gauss

para o campo eléctrico).

Adicionalmente, existem ainda mais 3 expressões, já expostas e analisadas

anteriormente, e que representam as denominadas equações de constituição

dos meios (materiais), respectivamente isolantes, condutores e magnéticos:

EDrr

ε=

EJrr

σ=

HBrr

μ=

sendo de salientar que a segunda das equações representa a Lei de Ohm na

forma diferencial. Se se particularizarem as Equações de Maxwell para a

electrostática, para a corrente eléctrica estacionária, e para a magnetostática,

obtêm-se, respecti-vamente, as seguintes equações:

• Electrostática – como não existem correntes de condução e campos ma-

gnéticos, tem-se:

0=×∇ Er

ρ=•∇ Dr

EDrr

ε=

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• Corrente Eléctrica Estacionária – como não existem correntes eléctricas

de deslocamento nem campos magnéticos, tem-se:

0=×∇ Er

EJrr

σ=

• Magnetostática – como não existem correntes de deslocamento nem

campos eléctricos, e a densidade de fluxo é invariante no tempo, tem-se:

JHrr

=×∇

0=•∇ Br

HBrr

μ=

No estudo da corrente eléctrica estacionária, isto é, da corrente contínua, existe

uma outra equação vectorial afim,

0=•∇ Jr

que explicita que as linhas de força do vector densidade de corrente são

contínuas, fechando-se sobre si próprias. Ou seja, num circuito eléctrico não se

verificam perdas na intensidade de corrente – por exemplo, se um determinado

receptor necessitar de uma intensidade de corrente de 10 A para poder

funcionar, quando se aplica aos terminais desse receptor a respectiva tensão

eléctrica, a corrente que circulará nos condutores de ligação terá sempre a

mesma intensidade, quer seja medida no condutor a montante ou no condutor

a jusante desse receptor.

Nas suas investigações, Maxwell concluiu que a luz mais não era que uma

onda de propagação, composta de electricidade e magnetismo, predizendo

assim a existência de ondas electromagnéticas a propagarem-se à velocidade

da luz. O próprio Albert Einstein baseou-se nos trabalhos de Maxwell,

prematuramente desaparecido, e que poderia ter desenvolvido a teoria da

relatividade. Sem dúvida que o seu trabalho foi, a todos os títulos, notável e

merecedor do Prémio Nobel, se tal prémio já existisse no seu tempo.

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22

Como informação complementar, que consideramos importante, na figura 1.11

mostra-se o campo magnético terrestre, simétrico, enquanto que, na figura

1.12, se pode observar a deformação causada pela radiação solar (vento

solar).

Figura 1.11 – Campo magnético terrestre, simétrico.

Figura 1.12 – Deformação do campo magnético terrestre,

devido à acção da radiação solar.

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23

1.5. ENERGIA ELECTROMAGNÉTICA

É sabido, da teoria dos circuitos eléctricos, que a potência P, expressa em

watts (W), é igual ao produto da tensão eléctrica U, em volts (V), pela inten-

sidade da corrente eléctrica I, em ampéres (A). Como a potência representa a

taxa de variação da energia em jogo na unidade de tempo, a sua unidade (W)

corresponde ao joule por segundo (J/s). Na prática, é também usual

considerar-se a densidade de potência, isto é, a densidade de fluxo de potên-

cia, expressa em watts por metro quadrado (W/m2), e que representa a distri-

buição de potência por uma determinada área.

O fenómeno da energia electromagnética poder ser transmitida através do

espaço sem se recorrer a meios materiais condutores, é uma das ferramentas

de progresso mais importantes das modernas sociedades. Por conseguinte, há

que contabilizar a potência tendo em atenção esse fenómeno, o que é feito

através do vector de Poynting Pr

, definido através do produto externo ou

vectorial dos vectores intensidade do campo eléctrico e intensidade do campo

magnético, associados a uma onda de energia electromagnética:

HEPrrr

×=

A sua unidade é o (V/m) x (A/m) = (W/m2), sendo a sua direcção a da onda ele-

ctromagnética. Este vector, perpendicular ao plano definido pelos vectores

campo eléctrico e campo magnético, representa a densidade de potência

vectorial instantânea associada aos campos electromagnéticos num deter-

minado ponto, sendo função do tempo na medida em que o campo eléctrico e o

campo magnético são igualmente variáveis no tempo. Por outro lado, a inte-

gração do vector de Poynting ao longo de uma superfície fechada conduz à

potência total que flui através dessa superfície (teorema de Poynting).

Atendendo a que a energia electromagnética está associada directamente aos

vectores Er

e Hr

, existe um efeito sobre as partículas atómicas carregadas

electricamente, sobretudo os electrões, devido às suas massas serem reduzi-

díssimas. Adicionalmente, todas as partículas carregadas, que estejam em

movimento, possuem um campo eléctrico e um campo magnético a elas

associados. Por conseguinte, existe uma interacção entre os campos electro-

magnéticos exteriores e os campos electromagnéticos associados a essas par-

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ticulas em movimento, resultando não só na alteração do campo eléctrico e do

campo magnético das partículas, mas também no aumento da sua energia

cinética.

A absorção de energia por um meio (material) é definida como sendo a taxa

específica de absorção, conhecida universalmente por specific absorption rate

SAR, e que é igual ao quociente entre a taxa de energia transferida e a massa

do material, sendo a sua unidade o watt por kilograma (W/kg). Este parâmetro

representa assim a medida da taxa à qual a energia é absorvida pelo corpo,

podendo assim ser definida como a derivada em ordem ao tempo da absorção

específica (SA), que corresponde ao incremento da energia dW absorvida por

uma massa incremental dm inserida no interior de um volume elementar dV,

cujo material tem uma densidade ρ, ou seja:

dVdW

dmdWSA

ρ==

sendo esta grandeza expressa em joules por kilograma (J/kg). Por conseguinte,

a taxa de absorção específica SAR, em W/kg ou em mW/g, é dada pela

seguinte derivada:

dVdW

dtd

dtSAdSAR

ρ==

Esta taxa de absorção pode igualmente ser definida como a potência absorvida

por unidade de massa de um sistema biológico, e ser representada em termos

da intensidade do campo eléctrico E, expresso em V/m, da condutividade

eléctrica σ, expressa em S/m, e da densidade do tecido, expressa em kg/m3,

através da seguinte expressão:

ρσ 2ESAR =

A integração da SAR sobre um volume de tecido que contenha uma deter-

minada massa, corresponde assim à potência absorvida por esse mesmo

volume de tecido, sendo esta grandeza, para um dado tecido biológico,

expressa em mW/g médios para 1 g ou 10 g, dependendo do que se encontra

estipulado na norma de segurança adoptada.

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Adicionalmente, a taxa inicial de aumento de temperatura no corpo, despre-

zando as perdas de calor, é directamente proporcional à SAR, ou seja:

CSAR

dtdT

=

em que T (oC) representa a temperatura, t (s) o tempo, e C (J/kg/oC) a capa-

cidade calorífica do corpo.

Note-se que esta capacidade calorífica é definida como sendo a energia em

joules que é necessária para elevar de 1 oC a temperatura de 1 kilograma de

massa do corpo.

Por conseguinte, como se tem, respectivamente:

ρσ 2ESAR =

dtTdCSAR =

conclui-se assim que existem duas alternativas para o cálculo da SAR, ou seja,

através da medição do valor da intensidade do campo eléctrico, ou da medição

do valor da temperatura dos tecidos biológicos, cálculo esse que tem em

consideração as propriedades electromagnéticas dos tecidos biológicos, como

é o caso das suas constantes dieléctricas e das suas condutividades eléctricas,

sendo de salientar que a fiabilidade dos valores obtidos, maioritariamente in

vivo, depende das técnicas de medição utilizadas.

Atendendo a que o vector de Poynting resulta do produto vectorial entre os

vectores campo eléctrico e campo magnético, constata-se que, para que esse

vector não seja nulo, ou seja, para que a potência transmitida através do

campo electromagnético exista, as direcções dos campos eléctrico e magnético

não podem ser paralelas, sendo essa potência máxima quando os campos

forem perpendiculares.

Na prática, a potência transmitida é igualmente nula quando um dos campos

não existe, como sucede na vizinhança de cargas eléctricas estáticas, devido à

não existência de campo magnético. Outra situação acontece, por exemplo, no

caso das instalações eléctricas e dos equipamentos em baixa tensão, a 50 Hz

ou a 60 Hz, quando não circula corrente, isto é, quando se encontram fora de

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serviço mas sob tensão – existe campo eléctrico devido à tensão eléctrica,

contudo não existe campo magnético na medida em que há circulação de

corrente eléctrica. Consequentemente, como o vector de Poynting é nulo, a

energia electromagnética radiada é também nula.

1.6. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS E RADIAÇÕES

Para campos electromagnéticos variáveis no tempo, os vectores Er

e Hr

são

dependentes entre si, podendo contudo ser independentes em determinadas

situações. Na prática, para frequências de 20 - 30 kHz e superiores, os campos

eléctricos e magnéticos não podem ser entendidos separadamente, ou seja,

deverão ser estudados como um todo, que é a onda electromagnética. Estas

ondas, previstas por Maxwell, através das suas equações, e tendo sido pela

primeira vez investigadas pelo físico alemão Heinrich Hertz, podem propagar-

-se livremente no espaço e com perdas através dos materiais biológicos.

As ondas electromagnéticas de baixa frequência (tempo de período e compri-

mento de onda elevados) são usualmente referidas como sendo campos

electromagnéticos, enquanto que as ondas electromagnéticas de muito alta

frequência (tempo de período e comprimento de onda muito reduzidos) são

designadas por radiação electromagnética ou simplesmente por radiação.

Como se salientou anteriormente, as ondas electromagnéticas contêm um

campo eléctrico E e um campo magnético H, perpendiculares à direcção de

propagação das ondas, como se esquematiza na figura 1.13, propagação essa

que, no vácuo e aproximadamente no ar, se faz à velocidade da luz, isto é, a

c = 300 000 000 m/s, sendo a velocidade de propagação mais reduzida noutros

materiais como por exemplo os tecidos biológicos. Quanto mais reduzido é o

comprimento de onda, mais elevada é a quantidade de energia que é trans-

ferida para objectos similares em dimensão ao comprimento de onda.

Todas estas ondas são caracterizadas pelo tempo de período T, em segundos,

pela frequência f, em hertzs, e pelo comprimento de onda λ, em metros, sendo

usual exprimir a frequência apenas em hertzs para as ondas de muito reduzida

frequência, como por exemplo na produção, distribuição e utilização de energia

eléctrica, enquanto que, para as ondas de radiação electromagnética, ou seja,

de muito alta frequência, se utilizam os múltiplos kilohertz (1 kHz = 103 Hz),

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Megahertz (1 MHz = 106 Hz), e Gigahertz (1 GHz = 109 Hz). Por exemplo, as

ondas de rádio AM (modulação de amplitude, Amplitude Modulation) têm uma

frequência de 1 MHz e um comprimento de onda de cerca de 300 metros,

enquanto os microondas utilizam frequências de 2,45 GHz e comprimentos de

onda de 12 cm.

Figura 1.13 – Onda electromagnética, com os seus campos eléctrico

e magnético, a deslocar-se ao longo do eixo z.

A frequência e o tempo de período encontram-se relacionados através da

seguinte expressão:

fT 1=

enquanto que o comprimento de onda no vazio (e, aproximadamente, no ar),

está relacionado com a frequência por meio da seguinte expressão:

fc

As ondas electromagnéticas consistem em minúsculos corpúsculos de energia,

que são os fotões, sendo a energia de cada fotão proporcional à frequência da

onda, de acordo com a seguinte expressão:

fh=Ve

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representando o primeiro membro essa energia, em electrões volts (eV), e h a

constante de Planck, com o valor de 4,135667 x 10-15 eVs. Recorde-se que o

electrão volt é a variação de energia potencial a que fica sujeito um electrão

quando se movimenta de um ponto ao potencial V para outro ponto ao

potencial V+1 volt. Por outro lado, a quantidade de energia de um fotão por

vezes torna-o como que uma onda, enquanto que noutras, mais como uma

partícula – é um fenómeno que, na física, tem a designação de dualidade onda-

-partícula da luz. Como exemplo desta dualidade, os fotões de baixa energia

das ondas de rádio-frequência comportam-se mais como se fossem ondas,

enquanto que os fotões de alta energia dos raios X parecem-se mais com

partículas.

1.7. ESPECTRO DAS FREQUÊNCIAS ELECTROMAGNÉTICAS A evolução do espectro das frequências electromagnéticas nasceu com as

descobertas de Maxwell, Hertz e Marconi, espectro esse que, actualmente, tem

a configuração classificativa que se expõe na figura 1.14.

Este espectro, que exemplifica para cada gama alguns equipamentos e sis-

temas típicos, estende-se das frequências extremamente reduzidas (extremely

low-frequency ELF) e das frequências muito reduzidas (very-low frequency

VLF), à radiação de rádio-frequência (radio frequency radiation RFR), à

radiação infra-vermelha (infrared radiation IR), à luz visível, à radiação

ultravioleta (ultraviolet UV), aos raios X, e aos raios gama de frequências que

excedem 1024 Hz. Por outro lado, este espectro é ainda dividido em duas zonas

– radiação não-ionizante, e radiação ionizante, encontrando-se a separação na

zona da radiação ultravioleta.

1.7.1. Radiação Não-Ionizante Esta radiação é caracterizada pelo facto de não possuir energia suficiente para

causar a ionização em sistemas vivos. As fontes naturais – sol, radiação das

estrelas, outras fontes cósmicas –, são muito poucas e extremamente fracas.

Em contrapartida, com a explosão do desenvolvimento da engenharia electro-

técnica, a densidade de energia electromagnética criada pelo homem é

incomensuravelmente mais elevada que a energia electromagnética prove-

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niente daquelas fontes naturais. Em geral, o sector não-ionizante do espectro

das frequências electromagnéticas encontra-se dividido em três gamas

principais: a) campos electromagnéticos de frequência extremamente reduzida,

b) radiação de rádio-frequência, c) radiação óptica não coerente.

Figura 1.14 – Espectro das frequências electromagnéticas.

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a) Campos Electromagnéticos de Frequência Extremamente Reduzida Estes campos englobam todos aqueles cujas frequências não ultrapassam 3

kHz. Para esta gama de frequências, os comprimentos de onda no ar são

bastante elevados – 6000 km a 50 Hz e 5000 km a 60 Hz – e, além disso, os

campos eléctricos e magnéticos são independentes uns dos outros, sendo

igualmente medidos separadamente.

Estes campos são normalmente gerados por equipamentos de produção, trans-

porte e distribuição de energia eléctrica, por equipamentos de comunicações

estratégicas globais com submarinos imersos na água condutora, por toda a

variedade de electrodomésticos e de equipamentos de escritório, por comboios

eléctricos, por equipamento informático, e por motores eléctricos. Saliente-se

que esta gama de frequências não é propícia para ser utilizada em

telecomunicações, devido à severa limitação de largura de banda e às difi-

culdades de se gerar energia através de antenas de dimensões razoáveis.

b) Radiação de Rádio-Frequência Esta radiação, que é constituída por ondas electromagnéticas que se propa-

gam no ar e no vácuo, e cujas frequências se situam entre 3 kHz e 300 GHz,

são utilizadas em radar, comunicações por satélite, em rádio e televisão, em

navegação aérea e marítima, em comunicações móveis sem fios, e em

comunicações móveis celulares.

A banda de frequências compreendida entre 30 kHz e 500 kHz, é designada

por banda de baixa frequência (low-frequency LF), sendo utilizada essencial-

mente nas comunicações aéreas e marítimas.

A banda de médias frequências (medium frequency MF), com comprimentos de

onda inferiores a 200 metros, é normalmente utilizada por rádio-amadores,

sendo a banda de altas frequências (high-frequency HF), entre 3 MHz e 30

MHz, aplicada nas comunicações internacionais tradicionais, por satélite.

As bandas VHF e UHF, situadas entre 30 MHz e 3GHz, são especialmente

utilizadas nas comunicações móveis sem fios, nas comunicações móveis

celulares, e nas comunicações por satélite, encontrando-se as frequências das

comunicações móveis celulares situadas nas gamas 800-900 MHz e 1700-

-2200 MHz.

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A frequência de 2,45 GHz é reservada para aplicações industriais, médicas e

científicas, e para fornos microondas. Por outro lado, as frequências acima de

3 GHz são divididas em duas categorias – super altas frequências (3 GHz a 30

GHz) e extra altas frequências (30 GHz a 300 GHz) –, sendo utilizadas em

radar, comunicações por rádio, e em serviços baseados em satélites.

c) Radiação Óptica Não Coerente Conforme se pode constatar do espectro da figura 1.14, a fronteira entre este

tipo de radiação e a radiação de rádio-frequência situa-se na zona dos com-

primentos de onda de aproximadamente 1 mm. A radiação óptica é outra com-

ponente do espectro de frequências electromagnéticas em relação à qual os

olhos humanos são bastante sensíveis, e compreende a radiação ultravioleta

(UV) e a radiação infra-vermelha (IV).

Os raios ultravioletas (comprimentos de onda entre 5 nm e 380-400 nm), como

é sabido, encontram-se presentes na luz solar, sendo igualmente gerados por

diversas fontes artificiais, como por exemplo as lâmpadas e os monitores de TV

e de computadores e, como é do domínio público, podem originar reacções

fotoquímicas que conduzem a queimaduras graves e mesmo a cancros de pele

(melanomas), quando a exposição é prolongada como sucede com os

banhistas nas praias, com os trabalhadores rurais e com os trabalhadores da

construção civil. Contudo, em doses de exposição muito reduzidas, têm efeitos

benéficos na medida em que são responsáveis pela produção de vitamina D3,

essencial à vida humana para se evitar o raquitismo. Por outro lado, estes

raios, na sua maior parte, são retidos pela camada de ozono, que constitui uma

protecção natural essencial contra os raios ultra-violetas, daí a grande

preocupação com a sua redução, vulgo “buracos de ozono” em linguagem

popular.

A região da radiação ultravioleta compreende, por sua vez, três sub-regiões

classificadas em função dos valores dos comprimentos de onda e dos

respectivos efeitos biológicos:

• Ultravioletas A (UVA), com comprimentos de onda entre 400 nm e 315

nm, que originam fenómenos de fluorescência em diversas substâncias.

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• Ultravioletas B (UVB), com comprimentos de onda entre 315 nm e 280

nm, que são os mais perigosos que atingem a terra através dos raios

solares.

• Ultravioletas C (UVC), com comprimentos de onda inferiores a 280 nm, e

que ocorrem na radiação emitida por arcos eléctricos de soldadura, não

existindo contudo na luz solar que atinge a terra na medida em que são

absorvidos pelo ar.

Quanto à luz visível, recebida pelos olhos, que a transformam em impulsos

interpretados pelo cérebro, abrange uma gama muito estreita de frequências,

estando o seu comprimento de onda compreendido entre 400 nm e 740 nm.

Por exemplo, o arco-íris, que tanta beleza nos transmite, representa uma parte

da luz visível.

Finalmente, a radiação infravermelha (IV), com comprimentos de onda situados

entre 750 nm e 1mm, inclui a radiação térmica, como sucede com o carvão em

combustão, que não emite luz mas sim IVs, os quais são sentidos como calor.

Saliente-se que muitas das fontes emissoras de ultravioletas ou de luz visível,

emitem também, provavelmente, infravermelhos. Estas fontes podem ser

classificadas em naturais, como é o caso do sol, e em artificiais, caso das

lâmpadas de descarga, as chamas, as lareiras, e os aquecedores eléctricos. A

radiação infravermelha, tal como a ultravioleta, é subdividida em três bandas de

acordo com os seus efeitos biológicos:

• Infravermelhos A (IVA), com comprimentos de onda entre 0,78 μm e 1,4

μm.

• Infravermelhos B (IVB), com comprimentos de onda entre 1,4 μm e 3

μm.

• Infravermelhos C (IVC), com comprimentos de onda entre 3 μm e 1000

μm.

1.7.2. Radiação Ionizante Esta radiação comporta uma energia suficiente para conseguir remover ele-

ctrões das suas órbitas atómicas, transformando os átomos em iões, daí a sua

designação. Como exemplo de fonte de radiação ionizante, têm-se os núcleos

de átomos instáveis que, para se tornarem mais estáveis, esses núcleos

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emitem partículas sub-atómicas e fotões de alta energia. Incluídos neste tipo de

radiação, têm-se os raios X, os raios gama, e os raios cósmicos. Esta radiação

de alta frequência, superior a 1015 Hz, é caracterizada por apresentar compri-

mentos de onda reduzidos e elevada energia, e pode causar alterações no

equilíbrio químico das células, com consequências graves para os materiais

genéticos.

A radiação ionizante contém taxas elevadas de energia nos seus quanta de

energia individuais – por exemplo, 12 eV ou mais –, tendo assim a capacidade

de expelir electrões das órbitas atómicas, daí que seja extremamente perigosa

para os seres vivos – cria radicais livres, aumentando assim os riscos de ano-

malias cromossómicas que poderão conduzir ao aparecimento de cancros.

Note-se que, quando um átomo possui um número de electrões (cargas

eléctricas negativas) nas suas órbitas, igual ao número de protões (cargas

eléctricas positivas) do seu núcleo, a sua carga eléctrica total é nula, sendo

assim electricamente neutro. Todavia, quando adquire electrões a sua carga

eléctrica total será negativa, tendo-se assim iões negativos e, no caso de

perder electrões, ter-se-ão iões positivos, na medida em que a sua carga

eléctrica total será positiva. Além disso, enquanto que os átomos, por serem

electricamente neutros, não são nocivos, os iões, devido ao seu desequilíbrio

eléctrico, são muito mais activos quimicamente que os átomos, daí que a

radiação dita atómica – raios alfa, beta e gama –, é extremamente perigosa,

podendo causar gravíssimos problemas de saúde a médio e longo prazo, em

várias gerações, e causar a morte ao fim de muito pouco tempo. Veja-se as

consequências das explosões atómicas em Hiroshima e Nagasaki, assim como

do grave acidente na central atómica de Chernobyl.

a) Raios X Estes raios, também designados por raios Roentgen, em homenagem ao seu

descobridor, têm um comprimento de onda situado entre 10-9 m e 10-11 m,

possuem energia elevada, e têm um largo poder de penetração, sendo

produzidos quando os electrões situados num tubo de vácuo reagem com os

átomos de metais pesados, usualmente o tungsténio. Os raios X possuem a

capacidade de penetrarem nos tecidos vivos, assim como em diversos metais,

daí as suas aplicações em electromedicina (radiografias), e em engenharia na

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inspecção de fendas superficiais em veios e em cordões de soldadura. Como

fontes naturais, tem-se o sol assim como as restantes estrelas.

b) Raios Gama Possuem os comprimentos de onda mais reduzidos do espectro das fre-

quências electromagnéticas, situados entre 10-10 m e 10-14 m e, simulta-

neamente, são os que têm mais energia, sendo gerados por átomos radio-

activos e em explosões nucleares, apresentando um poder de penetração

bastante superior ao dos raios X. Todos os elementos radioactivos criados pelo

homem, como por exemplo o césio 137 e o plutónio 239, são fontes artificiais

de raios gama. Estes raios conseguem atravessar totalmente o corpo humano

ou serem absorvidos pelos tecidos, causando por conseguinte a morte de

células em todo o corpo. Contudo, o facto de possuírem a capacidade de

matarem células vivas, é aproveitado pela medicina oncológica para, em doses

muito reduzidas, eliminarem as células cancerosas – quimioterapia e radio-

terapia.

1.8. MATERIAIS BIOLÓGICOS Para que se possa não só analisar os mecanismos de interacção entre os

campos electromagnéticos e o corpo humano, mas também compreender

todos os efeitos indesejáveis desses campos, efeitos esses que, espora-

dicamente, também se designam por “poluição eléctrica ou electromagnética”,

é fundamental conhecerem-se as características, ainda que de forma sucinta,

das células e dos tecidos que compõem o nosso corpo.

1.8.1. Células Todos os seres humanos são formados por um conjunto de biliões de células

vivas, que se agrupam entre si originando os nossos diversos órgãos, com a

finalidade de desempenharem as funções vitais da vida humana. Como se

sabe, existem células de diversas formas e tamanhos – por exemplo, as células

musculares podem ter alguns milímetros de comprimento, enquanto que as

células nervosas podem ter um comprimento superior a um metro –, tendo

comummente apenas alguns mícrons de diâmetro.

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As células são constituídas, de uma forma geral, por uma fina membrana, que

envolve toda a célula, pelo citoplasma, que é como que uma matéria gelatinosa

encerrada na célula, e pelo núcleo. Contudo, nem todas as células possuem

um núcleo. Por exemplo, algumas células musculares possuem vários,

enquanto que as células que constituem os glóbulos vermelhos do sangue não

possuem nenhum. No interior do citoplasma existem diversos tipos de

pequenas estruturas designadas por organelos (organelles), com uma

dimensão que varia de algumas fracções do mícron até um mícron,

consequentemente com uma dimensão similar aos comprimentos de onda de

determinadas ondas electromagnéticas, e que são responsáveis por

determinadas funções metabólicas.

As células biológicas, além de serem estruturas muito complexas, possuem

ainda cargas eléctricas de elevada energia, que podem alterar a sua orientação

e o seu movimento, quando sujeitas à acção de campos eléctricos exteriores,

como se ilustra na figura 1.15, onde se constata que, devido ao campo eléctrico

E, as cargas eléctricas positivas alteram a sua distribuição, concentrando-se

fortemente na zona da célula mais próxima da acção desse campo. Por

conseguinte, as interacções entre os campos electromagnéticos e os sistemas

biológicos são analisadas através das células, mais concretamente através das

interacções com a membrana celular, com o citoplasma, e com o núcleo.

Figura 1.15 – Estrutura eléctrica da célula humana, e influência da acção

de um campo eléctrico exterior

(a) – distribuição de cargas eléctricas, em situação normal

(b) – redistribuição de cargas eléctricas, devido ao campo eléctrico E.

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O núcleo das células contém a maioria da informação hereditária contida nos

genes e nos cromossomas, sendo os genes, como é sabido, constituídos pelo

ácido desoxiribonucleico ADN (deoxyribonucleic acid DNA), que apresenta a

forma de uma hélice. Quando uma célula se reproduz, utiliza toda a informação

armazenada no material genético do núcleo, sendo este material codificado

como uma longa sequência de diferentes moléculas orgânicas existentes no

ADN que, por sua vez, controla muitas das actividades celulares através da

sintetização de proteína, que, por sua vez, recorrendo às moléculas de ácido

ribonucleico ARN (ribonucleic acid RNA), sintetizadas pelo ADN, transfere

informação através do citoplasma das células, em três fases:

• Transcrição: Formação do “mensageiro” ARN a partir do ADN.

• Translação: Síntese da proteína, através do “mensageiro” ARN.

• Replicação: Duplicação do ADN.

As células crescem, alteram-se e reproduzem-se através de um processo

contínuo, denominado mitose (mitosis), que começa no núcleo através da

duplicação e igual distribuição de cromossomas, e apresenta quatro fases:

• Profase (prophase): Os cromossomas aparecem fora do ADN, desa-

parecendo a membrana à volta do núcleo.

• Metafase (metaphase): Os cromossomas alinham-se ao longo do

plano equatorial.

• Anafase (anaphase): Os cromossomas separam-se.

• Telofase (telophase): As células dão origem a duas novas células.

As células sem núcleo não se conseguem dividir, enquanto que outras dão

origem aos embriões. Uma vez que a mitose compreende diversos processos

que podem ser afectados pela exposição a campos electromagnéticos, é dada

uma grande importância no que respeita aos cuidados a ter pelas grávidas,

relativamente a essa exposição. O estudo dos efeitos dos campos electro-

magnéticos sobre as diversas actividades dos cromossomas durante as quatro

fases da mitose, deverá representar uma área muito importante de inves-

tigação, na medida em que, conhecendo-se os mecanismos de interacção,

será possível combater os efeitos nocivos daqueles campos sobre o organismo

humano.

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37

1.8.2. Tecidos Os tecidos humanos são materiais biológicos que resultam do agrupamento de

células entre si, ou da sua combinação com outros materiais, havendo quatro

tipos básicos:

• Tecidos epiteliais (epithelial tissues): Consistem em células com mem-

branas simples ou múltiplas, e desempenham as funções de protecção e

de regulação das secreções e absorções de materiais.

• Tecidos conectivos (connective tissues): Consistem em células de

materiais não vivos, tais como fibras e substâncias gelatinosas, e

suportam e ligam os tecidos celulares ao esqueleto. Compreendem

muitas das substâncias que asseguram a importante tarefa de

transportar materiais entre células. Como exemplos têm-se os ossos e

as cartilagens.

• Tecidos musculares (muscular tissues): Consistem em células com 1

mm a 40 mm de comprimento e até 40 μm de diâmetro.

• Tecidos nervosos (nervous tissues): São utilizados para as actividades

sensoriais, de controlo e de governo do corpo humano, consistindo em

células nervosas com longas projecções, análogas a linhas de

transmissão, que enviam toda a informação não só ao sistema nervoso

central, oriunda dos receptores dispostos ao longo do corpo humano,

mas também do sistema nervoso central aos músculos, órgãos, e

glândulas.

1.9. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS E RISCOS PARA A SAÚDE Será que a exposição a campos electromagnéticos acarreta riscos mais ou

menos graves para a saúde? Apesar das evidências cada vez em maior

número e cada vez mais baseadas em investigações científicas credíveis,

parece não existir uma resposta concisa e concreta a essa pergunta, talvez por

representar uma questão que tem levantado alguma controvérsia, técnica e

científica, e mesmo pública. Os campos electromagnéticos são o exemplo

flagrante de um produto criado e desenvolvido pela tecnologia, e que é utilizado

diariamente por ser essencial e imprescindível à vida quotidiana actual, apesar

dos eventuais riscos que possam acarretar. A discussão pública deve-se não

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38

só ao aumento de conhecimentos por parte do público em geral e da sua

consciencialização para os problemas ambientais, mas também ao papel que

os meios de comunicação social têm vindo a assumir, tendendo essa

discussão para a seguinte questão crucial, que consiste em avaliar se os riscos

que se correm compensam todos os benefícios colhidos.

Sem dúvida que a utilização da energia eléctrica significa haver campos

electromagnéticos criados pelo homem, desde as residências particulares, os

locais de trabalho quer sejam escritórios ou fábricas, os meios de transporte

quer sejam rodoviários ou ferroviários, e o próprio meio ambiente devido às

telecomunicações e a antenas de outros sistemas, tendo os níveis de radiação

vindo a ser considerados como normais. Todavia, a controvérsia que tem vindo

a ser gerada assenta no pressuposto de que esses níveis são perigosos,

podendo causar um sem número de doenças e anomalias, mais ou menos

graves, incluindo o cancro.

Durante bastante tempo, em épocas já ultrapassadas, as grandes preocu-

pações da opinião pública diziam respeito aos riscos inerentes aos operadores

de radar e à utilização de fornos microondas em ambientes residenciais e,

presentemente, as grandes preocupações e discussões situam-se nas teleco-

municações, mais concretamente, nas comunicações celulares. Presente-

mente, aceita-se que os modernos fornos microondas são inofensivos,

enquanto que, em relação aos radares, foram identificados alguns efeitos

térmicos tendo sido adoptadas medidas de precaução.

À medida que a tecnologia das comunicações celulares se tem vindo a

desenvolver, popularizando a utilização de telemóveis, a ideia dos efeitos

nocivos sobre a saúde está a constituir um foco de investigação, na medida em

que não existem muitos estudos científicos sobre a incidência na saúde pública

deste novo equipamento, e a informação existente é relativamente escassa.

Para muitos investigadores, os resultados obtidos confirmam as observações

realizadas durante anos acerca dos efeitos das radiações de baixa energia

sobre os sistemas vivos – acreditam que a exposição a pequenas quantidades

de energia de radiação tem o mesmo efeito que uma dose massiva de

químicos.

O problema permanente nesta controvérsia sobre os riscos da exposição a

campos electromagnéticos, consiste no conhecimento limitado acerca do facto

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39

que campos muito específicos interagindo com o corpo humano possam ter

efeitos nocivos sobre a saúde. Estes efeitos variam de pessoa para pessoa,

havendo umas bastante mais afectadas que outras, devido às suas diferenças

naturais físicas e bioquímicas. Esta controvérsia tem sido polarizada

essencialmente por dois grandes grupos – o primeiro é constituído por todos

aqueles que protestam, muitas vezes sem quaisquer bases científicas, porque

acreditam que os efeitos dos campos e da radiação electromagnética é nociva

para a saúde, enquanto que o segundo engloba os industriais e os investi-

gadores de novos equipamentos, que não acreditam na existência daqueles

efeitos nocivos. À parte destes dois grupos, encontram-se os investigadores

científicos que, de boa fé, têm vindo a desenvolver trabalho honesto e sério

com a finalidade de se comprovar ou não a nocividade para a saúde humana

da exposição a campos electromagnéticos. Presentemente, os resultados

obtidos não só através da modelização de determinados efeitos biofísicos mas

também de resultados epidemiológicos, permitem concluir que, de facto, há

riscos, uns maiores que outros, assim como consequências gravosas para os

seres vivos.

A concluir este capítulo e como curiosidade bastante significativa, apresentam-

-se de seguida os resultados obtidos pelo Engº José Manuel Santos,

publicados na Revista Electricidade 157/158, de Novembro/Dezembro de 1980,

com o sugestivo título “alguns dados sobre campos electromagnéticos e suas

implicações biológicas”, respeitando esse estudo a técnicos envolvidos

directamente em linhas aéreas e equipamentos de transporte de energia

eléctrica em alta e muito alta tensão.

Devido à procura, sempre crescente, de energia eléctrica, o transporte de

grandes potências tem vindo a ser realizado com níveis de tensão cada vez

mais elevados (Alta Tensão e Muito Alta Tensão), da ordem de 700 kV, 1500

kV e 2000 kV, por questões do ponto de vista económico no sentido de se

minimizarem as perdas no transporte. Por outro lado, desde a década de 1970,

do século passado, que os estudos sobre os efeitos biofísicos dos campos

electromagnéticos relacionados com o aparecimento dessas linhas de

transporte, foram intensificados nos Estados Unidos e na então ainda União

Soviética, tendo sido identificados três efeitos qualitativos:

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40

• Efeitos neurofisiológicos produzidos pelas correntes eléctricas, como

consequência da variação no tempo (sinusoidal com uma frequência de

50 Hz) da indução electromagnética.

• Influência directa nos processos biológicos do organismo humano, tais

como a acção nos processos das hormonas e dos enzimas, e a acção

no desenvolvimento ósseo.

• Efeitos fisiológicos e psicológicos produzidos por pequenas descargas

que se verificam quando as pessoas, sujeitas a determinado potencial

eléctrico, tocam objectos a potenciais diferentes.

Parece não haver dúvidas quanto aos efeitos nocivos dos campos electro-

magnéticos sobre as funções cerebrais. Nos anos 70, o Brain Research

Institute of the University of Califórnia Los Angeles, procedeu a ensaios

utilizando campos eléctricos compreendidos entre 7 V/m e 100 V/m, tendo

obtido os seguintes resultados:

• Para um campo de 7 V/m, à frequência de 7 Hz, o tempo de resposta

variou de 0,4 s para animais previamente condicionados à resposta em

intervalos de tempo de 5 s.

• Para um campo de 7 V/m, à frequência de 10 Hz, curiosamente não se

detectaram variações no tempo de resposta.

• Para campos de 100 V/m obtiveram-se tempos de resposta variáveis,

permanecendo os efeitos por intervalos de tempo significativos.

Ainda nos anos 70, concluiu-se laboratorialmente através de ensaios realizados

nos Estados Unidos e na União Soviética, que as capacidades cognitivas são

afectadas após uma exposição contínua de 24 horas a um campo magnético

de 10-4 T à frequência de 50 Hz, tendo-se verificado ainda que, em testes de

rapidez de resposta, as pessoas apresentaram um desempenho muito fraco.

Entre 1966 e 1970 foram realizados estudos bastante importantes e completos,

na União Soviética, com a finalidade de investigar e quantificar os efeitos dos

campos electromagnéticos das linhas de muito alta tensão, no que respeita à

fisiologia e comportamento humano. Nessa linha, foram examinados 45 traba-

lhadores de uma subestação de 500 kV, devido a queixas e reclamações

frequentes, motivadas pelos seguintes sintomas:

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41

• Dor de cabeça permanente.

• Apatia.

• Sonolência.

• Disrupção nos sistemas digestivo e cardiovascular.

Além disso, um terço desses trabalhadores, com idades compreendidas entre

30 e 40 anos, queixaram-se de fraqueza sexual verificada 8 meses após o

início do seu trabalho naquela subestação. Os exames médicos resultaram no

seguinte diagnóstico:

• Patologia neurológica em 28 trabalhadores.

• Descontrolo funcional do sistema nervoso central em 26 trabalhadores.

• Deficiências na tensão arterial em 11 trabalhadores.

• A intensidade máxima dos campos eléctricos na subestação era de 27

kV/m.

As conclusões gerais deste diagnóstico foram as seguintes:

1. Dados estatísticos

• Número total de trabalhadores da subestação: 45 (41 homens e 4

mulheres).

• Distribuição de idades:

menos de 30 anos – 10

entre 30 e 40 anos – 29

mais de 40 anos – 6

• Experiência profissional na subestação:

menos de 1 ano – 9

entre 1 e 3 anos – 25

mais de 5 anos – 11

• Tempos de exposição aos campos electromagnéticos:

pessoal da manutenção – mais de 5 horas por dia

pessoal de serviço – menos de 2 horas por dia

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2. Potenciais eléctricos, campos e correntes medidos na subestação

• Próximo do equipamento em serviço, ligado à linha de transporte de

energia:

Tensão (kV)

Campo eléctrico (kV/m)

Corrente (µA)

Valor máximo 26 14,5 230 Valor médio 14 - 18 7,8 - 10 115 - 125

• Próximo do equipamento fora de serviço, desligado para intervenções de

manutenção:

Tensão (kV)

Campo eléctrico (kV/m)

Corrente (µA)

Valor máximo 4 2,2 35 Valor médio 2 1,1 15

3. Sintomas clínicos

• Dores de cabeça, sonolência e sensação de fadiga: 41 trabalhadores.

• Descontrolo na actividade dos sistemas digestivo e cardiovascular: 4

trabalhadores.

• Fraqueza sexual: 1/3 dos homens com idades compreendidas entre 30 e

40 anos.

4. Resultados dos exames médicos

• Distúrbios neuro-patológicos: 28 trabalhadores.

• Descontrolo funcional do sistema nervoso central: 6 trabalhadores.

• Doenças cardiovasculares:

arteriosclerose – 3 trabalhadores

bradicardia – 12 trabalhadores

taquicardia – 5 trabalhadores

hipotensão – 7 trabalhadores

hipertensão – 4 trabalhadores

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5. Resultados dos electrocardiogramas

• Sinus-bradicardia: 14 trabalhadores.

• Actividade anormal do sistema circulatório e ventricular: 10 traba-

lhadores.

• Variações difusas do miocárdio: 5 trabalhadores.

Como consequência destes resultados, sem dúvida altamente significativos

apesar de terem já cerca de 40 anos, a União Soviética elaborou os seus

regulamentos de segurança e protecção nessa matéria, sendo de destacar os

seguintes artigos:

• Ninguém poderá estar exposto a campos eléctricos de intensidade

superior a 25 kV/m, sem que existam barras de protecção para isola-

mento ou atenuação desses mesmos campos para um limite máximo de

5 kV/m.

• Para um campo eléctrico de intensidade 25 kV/m, o tempo máximo

consecutivo de exposição é de 5 minutos.

• Para um campo eléctrico de 10 kV/m, a permissão de permanência

máxima consecutiva é de 180 minutos.

• Para campos com intensidades inferiores a 5 kV/m, não existe limite

máximo de tempo de exposição.

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CAPÍTULO 2. CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS DE FREQUÊNCIAS EXTREMAMENTE REDUZIDAS

2.1. FONTES GERADORAS DE CAMPOS ELÉCTRICOS E MAGNÉTICOS Como é do conhecimento geral, a electricidade é a fonte de potência mais

comum do planeta, devido à facilidade da sua geração e do seu transporte a

qualquer distância. Desde o início do século XX que as indústrias baseadas na

energia eléctrica assim como as tecnologias afins são parte integrante da

nossa sociedade, e, consequentemente, a geração de campos eléctricos e de

campos electromagnéticos ocorre sempre que exista produção, transporte,

distribuição e utilização dessa energia. Com o aumento da oferta de energia

eléctrica, em todas as actividades humanas, como não poderia deixar de ser,

aumentaram os riscos e, evidentemente, os acidentes, sendo o mais conhe-

cido a electrocussão, mais conhecida em termos populares por “choque

eléctrico”, cujas consequências estão directamente ligadas com o nível da

tensão de contacto e com a frequência da corrente eléctrica, podendo causar a

morte por fibrilação ventricular (baixa tensão) ou por queimaduras irreversíveis

(média e alta tensão).

Em habitações, as fontes de campos electromagnéticos mais comuns são os

cobertores eléctricos, os aquecedores de camas com colchões de água quente,

os secadores de cabelo, as máquinas de barbear, as escovas de dentes

eléctricas, os televisores, as aparelhagens de rádio, os ares condicionados, os

aquecedores portáteis, as lâmpadas de descarga, os frigoríficos e as arcas

frigoríficas, as batedeiras e trituradoras, as máquinas de sumos, as varinhas

mágicas, as serras eléctricas de carne e pão, as máquinas de lavar e secar

roupa, as máquinas de lavar loiça, as máquinas de café, os aspiradores, os

desumidificadores, as torradeiras, as tosteiras, os exaustores de fumos, os

sistemas informáticos, os fogões e fornos eléctricos, os microondas, os

sistemas de alarme, os sistemas de accionamento de estores eléctricos, e os

sistemas de accionamento de portões e cancelas de garagens. Por outro lado,

nos locais de trabalho as fontes geradoras de campos electromagnéticos

incluem os sistemas informáticos e seus periféricos (computadores,

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impressoras, scanners), as máquinas de fax, as centrais telefónicas, as fotoco-

piadoras, as lâmpadas de descarga, os equipamentos de produção, transporte

e distribuição de energia eléctrica, os motores eléctricos, assim como muitos

dos receptores utilizados em habitações – por exemplo, os refeitórios onde

existe toda uma panóplia de equipamentos eléctricos de cozinha, os hotéis, e

as salas de convívio e de café nos escritórios. Saliente-se, curiosamente, que

todas estas fontes de campos electromagnéticos foram desenvolvidas apenas

de há um século para cá.

A atenção da opinião pública relativamente a possíveis efeitos nocivos da

exposição a campos electromagnéticos, focaliza-se nas situações em que

áreas residenciais, locais de trabalho e escolas se encontram nas proximidades

de linhas aéreas de transporte de energia eléctrica, devido ao receio de

desenvolvimento de doenças cancerígenas. Estas preocupações, em bastantes

casos, baseiam--se nos resultados obtidos em estudos epidemiológicos

realizados em amostras significativas de pessoas. Todavia, apesar do elevado

número de estudos científicos realizados, nos planos físico e biológico, não

corroborarem incondicionalmente a interacção entre os campos electro-

magnéticos e determinadas doenças, o interesse do público assim como a

investigação científica internacional têm vindo a aumentar de forma signi-

ficativa. Estes esforços, mesmo por vezes perante resultados contraditórios,

têm conduzido à elaboração de normas e procedimentos de segurança, como

se exemplificou no final do capítulo anterior, com o objectivo da protecção em

relação aos efeitos nocivos dos campos electromagnéticos.

2.1.1. Fontes de Corrente Contínua Como é sabido, as grandezas intervenientes no estudo da corrente contínua

são estacionárias, isto é, invariantes no tempo. Por conseguinte, atendendo a

que a frequência é igual a zero, ou seja, o comprimento de onda é infinito, a

corrente contínua figuraria na base do espectro das frequências electro-

magnéticas. Consequentemente, apesar de existirem campos eléctricos e

campos magnéticos, não há radiação, ou seja, não se verifica a excitação de

moléculas que se encontrem próximas de instalações e equipamentos de

corrente contínua, nem os consequentes aquecimentos. Os únicos sintomas

palpáveis relacionados com a existência de corrente contínua ocorrem nas

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proximidades de linhas e de equipamentos de muito alta tensão, e manifestam-

-se através da electrização dos cabelos, que ficam ligeiramente em pé, e pela

sensação de formigueiro no corpo. Outra manifestação de fontes de campos

eléctricos estacionários (DC fields) são as descargas eléctricas que acontecem

entre nuvens e entre estas e a terra, quando da existência de tempestades e

trovoadas. Atendendo aos extremamente elevados valores dos campos

eléctricos em acção, as suas consequências para os seres vivos, em caso de

descarga directa, são usualmente fatais, devido às elevadíssimas intensidades

de corrente de condução.

a) Magnetosfera O planeta Terra, como é do conhecimento geral, é constituído por quatro cama-

das: núcleo interior, núcleo exterior, manto, e crosta. O núcleo interior é sólido

e é composto essencialmente por ferro, e encontra-se a uma temperatura tão

elevada que o núcleo exterior é uma massa fundida, pastosa, com cerca de

10 % de enxofre. A grande concentração de massa encontra-se no manto, que

é constituído por ferro, magnésio, alumínio, silício, e silicatos, a temperaturas

superiores a 1000 oC. Quanto à crosta, tem uma espessura reduzida e é

relativamente fria, sendo constituída essencialmente por silicatos de cálcio,

sódio e alumínio.

A Terra é uma fonte de campos eléctricos e magnéticos estáticos, tendo o

campo eléctrico uma intensidade de cerca de 120 V/m junto ao solo, enquanto

que a densidade de fluxo magnético tem um valor de cerca de 50 μT, tendo as

linhas de força uma distribuição teoricamente simétrica, mas na prática com

uma deformação provocada pelas partículas das radiações solares (vento

solar, que comprime as linhas de força do lado do sol, e expande as que se

encontram no lado contrário), como se mostrou no capítulo anterior, sendo

esse espectro designado por magnetosfera, que se estende no espaço entre

80 km e 60000 km do lado do sol, e mais de 300000 km do lado contrário. No

espaço compreendido pela magnetosfera encontra-se plasma frio oriundo da

ionosfera terrestre, plasma quente com origem na atmosfera solar, e ainda

plasma muito quente acelerado até altas velocidades e que se pode comportar

como uma lâmpada de néon acesa, nas altas camadas da atmosfera,

originando as misteriosas auroras austrais e boreais.

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A actividade solar, através das forças electromotrizes induzidas pela corrente

ionosférica e pela corrente da terra, origina as denominadas correntes

induzidas geomagnéticas, as quais podem circular nas linhas de transporte de

energia eléctrica, através das ligações à terra, sendo essas correntes quasi-

-estacionárias, uma vez que a sua frequência é de apenas 1 Hz. A sua

influência poderá ser significativa – em neutros de transformadores de potência

na América do Norte e na Finlândia, foram medidas correntes de 184 A e 200

A, respectivamente.

b) Linhas de Transporte de Energia Eléctrica A produção e o transporte de energia eléctrica em corrente contínua pratica-

mente não existe, de uma forma generalizada, salvo algumas excepções, como

sucede com a linha de alta tensão por cabo entre o Reino Unido e a França,

algumas linhas estabelecidas através de cabos submarinos entre os Países

Nórdicos e entre a Suécia, a Alemanha, e a Polónia, e a linha aérea que liga

Cabora-Bassa à África do Sul, por questões técnicas e económicas muito

particulares. Em ambas as situações, a geração é feita em corrente alternada

trifásica, à saída da central essa corrente é rectificada para corrente contínua,

e, no final das linhas de transporte, a corrente contínua é convertida para

corrente alternada.

Um sector de actividade onde a corrente contínua ainda apresenta um grande

peso, é a tracção eléctrica ferroviária. Nos centros urbanos, devido a questões

de segurança, os níveis de tensão são bastante reduzidos, tendo-se 550 V a

650 V nos fios de contacto de carros eléctricos e de trolley-buses, e 750 V no

terceiro carril de metropolitanos, enquanto que na tracção suburbana e

interurbana, as catenárias de alimentação possuem uma tensão nominal de

1500 V ou 3000 V.

c) Imagiologia de Ressonância Magnética A obtenção de imagens através de ressonância magnética é, actualmente, um

meio de diagnóstico médico de elevada importância, devido à alta resolução

conseguida na obtenção de imagens do interior do corpo humano. Os

equipamentos utilizados podem sujeitar o corpo humano a densidades de fluxo

estacionários, isto é, obtidos a partir da excitação em corrente contínua, de

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2000 mT durante curtos períodos de tempo. Acredita-se que esta exposição é

inofensiva para os humanos, todavia valores superiores àquele são conside-

rados críticos porque podem afectar a actividade eléctrica do coração.

2.1.2. Fontes de Corrente Alternada Os campos electromagnéticos gerados por corrente alternada (AC fields)

resultam da produção, transporte, distribuição e utilização da energia eléctrica

sob a forma alternada sinusoidal, com uma frequência de 50 Hz, exceptuando

os Estados Unidos, Canadá, Coreia, e Japão, que utilizam 60 Hz. Se bem que

a frequência fundamental seja 50 Hz ou 60 Hz, o corpo humano encontra-se

quase permanentemente sujeito a frequências bastante mais elevadas, que

podem atingir 50 kHz, originadas por equipamentos electrónicos como por

exemplo as televisões e os terminais de vídeo. Adicionalmente, os

accionamentos eléctricos controlados por variadores electrónicos de

velocidade, assim como os regimes transitórios que se manifestam nas

operações de ligação e de desligação de equipamentos, são também fontes

geradoras de campos electromagnéticos de frequências muito elevadas, que

podem atingir os MHz, isto é a gama das radiações de rádio-frequência.

Saliente-se que, quando se utilizam aparelhos electrónicos, devido à sua não

linearidade e aos regimes transitórios que são característicos do seu

funcionamento, a forma de onda da corrente não é alternada sinusoidal, mas

sim deformada face à sinusóide. Nestas situações, que são a maioria, essa

forma de onda é composta pela soma da sinusóide de 50 Hz, com outras

sinusóides de frequências múltiplas e que podem atingir valores muito

elevados.

Como se tem vindo a assistir publicamente, a problemática dos potenciais

efeitos nocivos causados pela exposição a campos eléctricos e magnéticos

emitidos por linhas aéreas de transporte de energia em alta e muito alta tensão,

encontra-se na ordem do dia, apesar de, por um lado, se citarem de facto

estudos epidemiológicos concretos, que indiciam a existência causa-efeito

relativamente a determinadas anomalias na saúde, e por outro, se especular

sem quaisquer argumentos técnicos e científicos, à boa maneira do “diz que

disse”, muito característico da nossa população.

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O caso das radiações emitidas por equipamentos informáticos e por telefones

celulares é, na maioria das situações, mais gravoso, todavia ninguém quer ou

pensa deixar de utilizar esses equipamentos, na medida em que colhem

directamente, no dia a dia, os seus benefícios – veja-se a situação para-

digmática das antenas celulares, ou seja, ninguém as quer ver instaladas por

perto, contudo todos querem comunicar por telemóvel com o melhor sinal

possível, berrando raios e coriscos quando tal não acontece. Por outro lado, as

figuras 2.1 e 2.2 são bastante elucidativas no que respeita aos electro-

domésticos, contudo, alguém pensa em deixar de os utilizar? Quanto às linhas

aéreas, uma vez que apenas transitam ao longo dos espaços urbanos e rurais,

do ponto de vista psicológico representam o bode expiatório na medida em que

não conferem in situ um benefício directo às populações que se manifestam

contra a sua instalação.

Figura 2.1 – Valor eficaz da intensidade do campo eléctrico em função

da distância, para linhas de alta tensão, instalações de distribuição

em baixa tensão, e electrodomésticos.

Para uma melhor elucidação, mostra-se na figura 2.3 os valores medidos da

densidade de fluxo magnético em função da distância, para uma linha de

transporte de energia eléctrica de alta tensão em corrente contínua, constituída

por dois cabos submarinos afastados entre si de 20 metros, no norte da

Europa. Saliente-se que o interesse da utilização do transporte de energia

eléctrica em corrente contínua de alta e muito alta tensão, tem vindo a

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aumentar de forma significativa, devido não só ao desenvolvimento dos

conversores electrónicos de potência, mas também por serem necessários

apenas dois condutores em lugar de três, como sucede no transporte trifásico.

Este sistema, designado por HVDC (High Voltage Direct Current), com tensões

de ± 1100 kV é utilizado já na Europa, Ásia e América do Norte, sendo de

realçar que o transporte de energia é realizado através de cabos submarinos

entre a Suécia, Finlândia, Dinamarca, Alemanha e Polónia.

Figura 2.2 – Valor eficaz da densidade de fluxo magnético em função

da distância, para linhas de alta tensão, instalações de distribuição

em baixa tensão, e electrodomésticos.

Como se constata da figura 2.3, a densidade de fluxo é mais elevada a 2 m

acima dos cabos, sendo o máximo atingido, como é natural, junto aos dois

cabos. Por outro lado, a 10 m acima, as densidades de fluxo são bastante

inferiores às do campo magnético terrestre.

Por sua vez, na figura 2.4 mostram-se os valores da intensidade do campo

eléctrico em função da distância, para linhas de transporte trifásicas de 400 kV,

220 kV, e 130 kV, indicando-se esquematicamente a configuração dos postes

assim como os valores das distâncias entre condutores e entre condutores e o

solo. Como se pode observar, o valor máximo da intensidade do campo

eléctrico situa-se junto aos condutores e, como não poderia deixar de ser,

quanto mais alto é o nível da tensão nominal, mais elevadas são as

intensidades do campo eléctrico, para a mesma distância dos condutores.

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Figura 2.3 – Densidades de fluxo em função da distância, para uma linha HVDC

estabelecida nos países nórdicos, constituída por dois cabos submarinos,

e para uma corrente de 1333 A.

Figura 2.4 – Intensidade do campo eléctrico em função da distância, para linhas

aéreas trifásicas de transporte de energia a 400 kV, 220 kV, e 130 kV.

Na figura 2.5 mostram-se os valores da densidade de fluxo em função da

distância, para quatro linhas trifásicas de transporte de energia eléctrica,

constatando-se, para a linha de tensão mais elevada, 400 kV e 1200 A, que a

200 m de distância a densidade de fluxo tem o valor de 0,1 μT, bastante inferior

ao que se verifica, em termos médios, em incubadoras.

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Figura 2.5 – Densidade de fluxo magnético em função da distância, para linhas aéreas

trifásicas de transporte de energia a 400 kV, 220 kV, 130 kV, e 20 kV, para

intensidades de corrente respectivamente de 1200 A, 500 A, 350 A, e 300 A.

Na prática, a influência dos campos magnéticos enfraquece à medida que

aumenta a distância da fonte geradora. Por exemplo, para um condutor

rectilíneo linear percorrido por uma corrente eléctrica, a densidade de fluxo é

inversamente proporcional à distância r desse condutor, para dois condutores

rectilíneos paralelos é inversamente proporcional a r2, enquanto que, para uma

espira ou para um enrolamento, será proporcional a r3. Estas relações, que

serão quantificadas seguidamente através das respectivas expressões de

cálculo das densidades de fluxo, são importantes na medida em que permitem

implementar esquemas de redução das acções dos campos electromagnéticos.

Por conseguinte, tem-se assim, para os quatro tipos de fontes de campos

electromagnéticos através de correntes alternadas sinusoidais:

a) Condutor Simples Um simples condutor eléctrico rectilíneo percorrido por corrente eléctrica,

representa a fonte mais simples de geração de um campo magnético, cujas

linhas de força são circulares com centro no eixo longitudinal do condutor.

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53

Deste modo, sendo I a intensidade da corrente eléctrica, µ a permeabilidade

magnética do meio envolvente (normalmente o ar), e r o raio de cada círculo

descrito pelas linhas de força do campo, a densidade de fluxo B ao longo desse

círculo é calculada através da seguinte expressão:

HrIB μ

πμ

==2

Na prática, esta situação encontra-se nos cabos de transporte de energia

eléctrica, nos fios aéreos de contacto em tracção eléctrica urbana, no terceiro

carril em metropolitanos, e nas catenárias em tracção eléctrica de médio e

longo curso, concluindo-se, através da expressão anterior, que a densidade de

fluxo e, consequentemente a exposição ao campo magnético, varia inversa-

mente com o afastamento do condutor. Por exemplo, em relação ao fio de

contacto de uma catenária de tracção eléctrica monofásica a 25 kV e 50 Hz,

percorrida num determinado instante por uma corrente com uma intensidade de

400 A, a densidade de fluxo magnético a 4 metros (aproximadamente a

distância a que se encontram as cabeças dos passageiros situados na gare,

junto aos comboios), e a 6 metros (aproximadamente junto à plataforma da

gare), tem os seguintes valores, respectivamente:

μT2,0 T10242

400104 57

=×=×××

= −−

ππ

cabeçaB

μT310, T103,162

400104 57

=×=×××

= −−

ππ

pésB

Atendendo a que a densidade de fluxo varia inversamente com a distância ao

fio de contacto, a diferença que se verifica não é muito significativa.

b) Dois Condutores Paralelos A densidade de fluxo magnético B, a uma distância r dos dois condutores

rectilíneos paralelos, afastados entre si de d e percorridos por uma corrente de

intensidade I, em sentidos contrários, como se esquematiza na figura 2.6, varia

inversamente com o quadrado daquela distância, de acordo com a seguinte

expressão:

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54

22r

dIB=

Figura 2.6 – Campo magnético gerado por dois condutores paralelos,

percorridos por correntes em sentidos contrários.

Esta configuração encontra-se essencialmente em linhas de transporte de

energia eléctrica e em condutores das instalações eléctricas convencionais,

domésticas, públicas, e industriais.

c) Enrolamentos (Bobinas) Os enrolamentos, existentes em máquinas eléctricas rotativas e lineares,

transformadores, computadores e periféricos, microondas, fontes de alimen-

tação e em muitos electrodomésticos, são fontes de campos magnéticos impor-

tantes.

Na figura 2.7 ilustra-se uma espira de uma bobina (loop), percorrida por

corrente eléctrica, e um dipolo magnético, que representa as linhas de força do

campo magnético, que é gerado e abraçado pelas espiras, tendo um trajecto

interior rectilíneo.

O momento magnético do dipolo M, é igual ao produto da intensidade da

corrente que circula nas espiras da bobina pela área S da superfície limitada

por cada espira, ou seja:

SIM =

Por outro lado, a densidade de fluxo é dada pela seguinte expressão:

HrM

B 030

πμ

==

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Figura 2.7 – Espira de uma bobina, e dipolo magnético gerado

pela corrente que circula na bobina.

d) Linhas de Transporte Trifásicas Para esta situação, em que os três condutores se encontram afastados entre si

de uma distância d, a densidade de fluxo do campo magnético gerado pela

linha, varia inversamente com o quadrado da distância r, através da seguinte

relação:

246,3r

dIB=

Na figura 2.8 ilustra-se, através de um esquema unifilar, os vários andares de

um sistema de produção e transporte de energia eléctrica em que os diversos

níveis de tensão são os utilizados nos Estados Unidos e no Canadá e, na figura

2.9, mostra-se esse mesmo esquema, mas de uma forma mais compreensível,

desde a central eléctrica de produção aos centros de consumo.

Na Europa, de uma forma geral, as linhas aéreas trifásicas de transporte de

energia, em alta tensão, são dimensionadas com valores nominais de tensão

de 400 kV, 220 kV e 150 kV, havendo ainda linhas de 500 kV, 750 kV e 1500

kV, sobretudo na ex-União Soviética, devido às grandes distâncias a que é

necessário efectuar o transporte. Quanto às linhas trifásicas de distribuição, em

média tensão, as tensões nominais normalizadas são de 60 kV, 30 kV e 15 kV

e, no que respeita à rede de utilização em baixa tensão, tem-se 230 V (tensão

entre fases e neutro) e 400 V (tensão entre fases).

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Figura 2.8 – Esquema unifilar de um sistema de produção, transporte

e distribuição de energia eléctrica.

Figura 2.9 – Esquema tecnológico de um sistema de produção, transporte

e distribuição de energia eléctrica.

Por sua vez, nas figuras 2.10 e 2.11 esquematizam-se as configurações

electromecânicas dos postes de linhas aéreas de alta tensão, assim como a

distribuição dos respectivos cabos eléctricos. Relativamente à segunda figura,

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a configuração (a) – uma só linha, do mesmo lado dos postes, é a que origina

maiores campos magnéticos, a configuração (b) produz campos magnéticos

reduzidos, enquanto que a configuração (c) – uma só linha, em delta, é a mais

benéfica para a redução dos campos magnéticos.

Figura 2.10 – Configurações electromecânicas dos postes

de linhas aéreas de alta tensão.

Figura 2.11. – Distribuição dos cabos eléctricos em postes

de linhas aéreas de alta tensão

(a) – uma só linha, configuração simples

(b) – duas linhas, de cada lado dos postes

(c) – uma só linha, configuração em delta

Por sua vez, mostra-se ainda na figura 2.12 as linhas de força dos campos

magnéticos gerados pelos condutores em linhas aéreas de alta tensão. Apesar

dos campos magnéticos mais intensos serem gerados pelas linhas de muito

alta tensão, esses campos dependem igualmente das intensidades de corrente

nos cabos. Para tensões entre 400 kV e 415 V, as densidades de fluxo imedia-

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tamente abaixo dos cabos aéreos, na vertical, podem atingir, respectivamente,

40 µT e 1 µT. Alguns estudos experimentais estimam que as densidades de

fluxo no solo, nas proximidades de linhas de transmissão, em termos médios

situam-se entre 0,09 µT e 0,38 µT, podendo estes valores, com configurações

de instalação dos cabos mais favoráveis, reduzirem-se para valores entre 0,01

µT e 0,02 µT.

Figura 2.12 – Distribuição dos campos magnéticos em diferentes configurações

de linhas aéreas de transporte de energia eléctrica.

Finalmente, e para melhor compreensão, na figura 2.13 mostra-se, para uma

linha trifásica de 220 kV, como se consegue reduzir drasticamente a densidade

de fluxo magnético em função da distância, utilizando-se diferentes configu-

rações de postes, ou seja, de instalação e disposição dos condutores.

A configuração (A), que é aquela que conduz a densidades de fluxo mais

elevadas, em contrapartida é a mais económica, o mesmo sucedendo um

pouco com a configuração (B), que apresenta custos todavia mais elevados

devido à maior altura dos postes. Quanto à configuração (C), que é significati-

vamente a melhor em termos da emissão de campos magnéticos representa,

contudo, a solução mais cara, na medida em que duas das fases são

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repartidas por dois condutores, obrigando ainda à utilização de um maior

número de isoladores por poste (11 contra 3).

Figura 2.13 – Exemplos de redução da densidade de fluxo magnético em função da

distância, para uma linha aérea trifásica de transporte de energia, utilizando

diferentes configurações de instalação.

Analisando ainda as expressões anteriores, que relacionam a densidade de

fluxo dos campos magnéticos com a distância às fontes emissoras, conclui-se

que a maior das atenuações acontece com os enrolamentos eléctricos

(variação com 1/r3), e a menor com cabos eléctricos simples (variação com 1/r).

No caso das catenárias monofásicas em tracção eléctrica a 50 Hz, 25 Hz e 16

2/3 Hz, os campos magnéticos gerados podem atingir densidades de fluxo da

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ordem de 0,5x10-4 T, valor este que se pode considerar relativamente elevado.

A presença de cabos eléctricos subterrâneos de transporte de energia situados

nas proximidades das habitações, contribui para a exposição dos seus mora-

dores aos efeitos dos campos magnéticos gerados por esses cabos, tendo-se

medido no chão em habitações nessas circunstâncias, densidades de fluxo

médias da ordem de 0,03 µT, e valores máximos superiores a 0,13 µT.

No espaço envolvente de subestações em redes de transporte de energia elé-

ctrica, as densidades de fluxo, como é evidente, dependem dos níveis de

tensão, tendo-se, em termos médios e de uma forma geral, 10 µT para

subestações entre 275 kV e 400 kV, e 1,6 µT para 11 kV.

No que respeita a habitações particulares, situadas longe de linhas de trans-

porte de energia, o valor médio das densidades de fluxo em grandes cidades é

aproximadamente de 0,1 µT e, em cidades de pequena dimensão assim como

nos meios rurais, esse valor desce sensivelmente para metade. Contudo, nas

regiões metropolitanas cerca de 10 % das habitações possuem pelo menos

uma divisão com valores excedendo 0,2 µT. Por outro lado, estima-se que, à

volta de 0,5 % de habitações, a densidade de fluxo ultrapasse 0,2 µT devido à

sua proximidade de linhas de transporte de energia.

Relativamente aos edifícios públicos, é usual, por questões de aproveitamento

de espaço, instalar subestações e postos de transformação no seu interior,

originando, devido às intensidades de corrente elevadas, campos magnéticos

bastante intensos. Usualmente, nas áreas circundantes muito próximas desses

equipamentos as densidades de fluxo são muito elevadas – 1 µT a 100 µT –,

ou mesmo extremamente elevadas – 100 µT a 10000 µT.

No interior dos compartimentos de comboios eléctricos, e dependendo das

tecnologias e dos equipamentos utilizados, ao nível do chão têm-se densidades

de fluxo que podem atingir 0,2 mT, e algumas dezenas de µT nos assentos,

enquanto que a intensidade dos campos eléctricos pode alcançar 300 V/m.

2.1.3. Electrodomésticos Como se constata no dia a dia, a vida actual seria impossível sem a existência

de electrodomésticos, dos mais variados tipos, desde a máquina de barbear

até à máquina de lavar roupa. Estes equipamentos, como não poderia deixar

de ser, geram campos electromagnéticos cujas densidades de fluxo variam

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inversamente com o cubo da distância, daí que a sua reduzida influência seja

atenuada ou praticamente inexistente em locais ligeiramente afastados,

apresentando-se no quadro 2.1 os valores das densidades de fluxo associadas

aos campos electromagnéticos gerados pelos electrodomésticos.

Electrodomésticos Densidades de fluxo (μT)

Distância = 30 cm Distância = 90 cm

Monitor de computador 0,02 – 13,00 0,001 – 0,9

Máquina de fotocópias 0,005 – 1,80 0,00 – 0,20

Máquina de fax 0,00 – 0,016 0,00 – 0,003

Lâmpada fluorescente 0,50 – 2,00 0,02 – 0,25

Impressora 0,07 – 4,30 0,02 – 0,25

Scanner 0,20 – 2,60 0,009 – 0,30

Máquina de café 0,009 – 0,70 0,00 – 0,06

Máquina de lavar loiça 0,50 – 0,80 0,08 – 0,16

Fogão eléctrico 0,15 – 0,50 0,01 – 0,04

Forno microondas 0,05 – 5,00 0,011 – 0,45

Trituradora 0,05 – 4,00 0,009 – 0,40

Frigorífico 0,01 – 0,30 0,001 – 0,06

Torradeira 0,03 – 0,45 0,001 – 0,05

Relógio analógico 0,18 – 4,10 0,003 – 0,32

Relógio digital 0,03 – 0,57 0,00 – 0,13

Rádio portátil 0,04 – 0,40 0,003 – 0,10

Aspirador 0,70 – 2,20 0,05 – 0,13

Máquina de barbear 0,01 – 10,00 0,01 – 0,30

Secador de cabelo 0,01 – 7,00 0,01 – 0,03

Ventilador 0,04 – 8,50 0,03 – 0,30

Televisão a cores 0,02 – 1,20 0,007 – 0,11

Ferro de engomar 0,15 – 0,30 0,025 – 0,035

Aquecedor portátil 0,011 – 1,90 0,00 – 0,14

Máquina de lavar roupa 0,15 – 3,00 0,01 – 0,15

Quadro 2.1 – Densidades de fluxo associadas aos electrodomésticos.

Conforme se constata dos valores expostos, os níveis das densidades de fluxo

reduzem-se significativamente à medida que a distância aumenta. Apesar dos

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valores apresentados serem insignificantes, sucede que, usualmente, o corpo

humano encontra-se exposto a diversos equipamentos em simultâneo, por

exemplo computadores, impressoras, scanners, faxs, lâmpadas fluorescentes,

televisão a cores, fogões e fornos eléctricos, daí que as densidades de fluxo

aumentem bastante.

2.1.4. Monitores de Computadores O monitor (Vídeo Display Terminal VDT) é parte integrante de um sistema de

computadores, sejam fixos ou portáteis. Presentemente, as tecnologias utili-

zadas estão a conduzir à generalização de monitores, tanto em computadores

como em jogos de vídeo e ecrãns de televisão, de plasma e de cristal líquido

(Liquid Crystal Display LCD), em relação aos quais não existe ainda informação

concreta e desenvolvida no que respeita aos níveis de exposição da radição

electromagnética. Apesar dessa generalização acelerada, existem ainda moni-

tores de raios catódicos, de muito maior dimensão devido ao tubo de raios

catódicos, que ilumina o ecrã através de um bombardeamento de electrões.

Estes monitores podem emitir campos electromagnéticos que cobrem todo o

espectro de frequências, além de emitirem em todas as direcções, como se

mostra na figura 2.14.

Figura 2.14 – Radiação produzida por monitores de computador com tubo

de raios catódicos

(a) – campo magnético

(b) – campo eléctrico

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Devido a essas particularidades, e atendendo a que a exposição aos monitores

acontece durante várias horas diárias, dia após dia como actividade laboral e

como actividade de lazer, as investigações sobre os efeitos das radiações

emitidas por monitores com tubo de raios catódicos têm incidido nos seguintes

parâmetros:

• Emissão de radiação ultravioleta e de raios X (comprimentos de onda

inferiores a 400 nm).

• Radiação visível devido à luz visível na gama de frequências entre 4,3 x

1014 Hz e 7,5 x 1014 Hz, gerada devido à interacção entre os electrões

que bombardeiam o ecrã do tubo de raios catódicos e o fósforo existente

na face interior do ecrã.

• Radiação infravermelha gerada pelo aquecimento dos componentes

electrónicos.

• Radiação de rádio-frequência gerada pelos sinais electrónicos, pelo os-

cilador, e pelos circuitos electrónicos digitais.

• Campos eléctricos e campos magnéticos de reduzidíssima frequência

gerados pelo sistema de deflexão horizontal do tubo de raios catódicos e

pelo transformador de alta tensão. Saliente-se que este sistema de

deflexão opera entre 15 kHz e 100 kHz.

• Campos eléctricos e magnéticos gerados pelo sistema de deflexão

vertical do tubo de raios catódicos, pelo transformador, e pelos electrões

que chocam com a parede interior do ecrã. Este sistema de deflexão

opera entre 50 Hz e 80 Hz.

• Campos eléctricos estáticos, associados às altas tensões aplicadas à

superfície interna do ecrã.

• Ionização do ar envolvente.

• Gases químicos gerados pela degradação progressiva dos componentes

electrónicos.

Como o vidro dos tubos de raios catódicos contém chumbo, o próprio vidro

absorve a baixa energia dos raios X assim como dos raios ultravioletas, sendo

assim a luz visível a única radiação emitida. Por outro lado, a radiação infra-

vermelha provoca um aumento de temperatura no local de trabalho envolvente.

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Na prática, contudo, os níveis de raios X, ultravioletas, luz visível, e infraver-

melhos, são consideravelmente inferiores aos valores consignados nas normas

de segurança relativas aos tubos de raios catódicos normais.

Contrariamente às crenças populares, a maior parte dos campos electro-

magnéticos não radiam a partir directamente da superfície do ecrã do monitor,

mas sim do equipamento existente no interior do monitor, campos esses que

resultam de fenómenos de indução electromagnética, sendo atenuados pelos

construtores quando da fabricação dos transformadores de alta tensão, através

da colocação de uma malha absorvente desses campos.

Quanto aos modernos monitores LCD e de plasma, não emitem campos ele-

ctrostáticos nem raios X, na medida em que consomem muito pouca energia, o

que implica que a emissão de campos electromagnéticos seja muito reduzida.

Adicionalmente, devido à fonte de alimentação e ao tipo de iluminação do ecrã,

os campos electromagnéticos de frequência reduzidíssima são bastante

baixos.

2.1.5. Incompatibilidade Electromagnética Adicionalmente aos seus efeitos sobre os sistemas biofísicos, os campos ele-

ctromagnéticos gerados pelos equipamentos podem provocar interferências

entre si, afectando por vezes de forma grave e significativa, o seu funciona-

mento. Basta recordar as proibições actualmente em vigor, no que respeita à

utilização de telefones celulares, computadores portáteis e jogos de vídeo no

interior dos aviões, devido à sua interferência nos sistemas electrónicos de

bordo, vitais para o bom funcionamento e segurança das aeronaves.

Os sistemas de armazenamento de informação através de fita magnética são

susceptíveis à exposição a campos electromagnéticos da ordem de 10 mT,

podendo essa informação armazenada ser afectada. Apesar desses campos

não se manifestarem a frequências de 50/60 Hz, o problema também existe

devido à influência de campos eléctricos electrostáticos.

Os equipamentos electrónicos utilizados nos sistemas de controlo de veículos

são sensíveis a campos electromagnéticos da ordem de 2 mT, agravando-se a

influência a frequências elevadas.

Os relógios electrónicos analógicos, que utilizam um motor passo a passo para

o accionamento dos ponteiros, são bastante sensíveis à acção de campos

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magnéticos externos, da ordem de 1 mT, na medida em que esses campos são

capazes de promover o accionamento do motor a velocidades superiores à

correspondente a 60 impulsos por minuto. Quanto aos relógios electrónicos

digitais, são igualmente sensíveis aos campos electromagnéticos, podendo

adiantar-se, atrasar-se ou mesmo parar.

As imagens mostradas em ecrãs de computadores podem tornar-se instáveis,

movimentando-se, especialmente em zonas onde existam campos electro-

magnéticos, devido à interferência desses campos na trajectória dos electrões

que são projectados contra a parede interior do ecrã. Este fenómeno começa a

ser notado para interferências de 1 μT e será bastante sério a 10 μT.

Finalmente, campos magnéticos relativamente intensos, da ordem de 20 μT a

50 Hz, originam interferências electromagnéticas em pacemakers cardíacos e

noutros equipamentos electrónicos implantados no corpo humano, assim como

em equipamentos utilizados em electromedicina.

2.2. EFEITOS BIOFÍSICOS DOS CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS Em termos de conceito, ocorre um efeito biológico quando a exposição a

campos electromagnéticos provoca alterações detectáveis ou visíveis em

sistemas vivos. Esse efeito pode, por vezes, mas não sempre, causar pro-

blemas de saúde adversos, o que significa que existirá uma mudança que

excede os parâmetros normais, ocorrendo esta situação quando os meca-

nismos naturais de defesa do próprio sistema de vida perdem a sua capa-

cidade de reacção e de compensação da agressão externa. Quanto à forma

como se manifestam, os efeitos biológicos podem causar alterações gravís-

simas de saúde num curto espaço de tempo – por exemplo, as consequências

de uma exposição a raios gama de grande amplitude –, ou então originar

alterações cujas consequências se manifestarão apenas passados bastantes

anos – por exemplo, os problemas de saúde derivados da excessiva exposição

aos raios ultravioletas, durante anos e anos. Por conseguinte, é fundamental

conhecer-se os efeitos biológicos, no sentido de se poder compreender de

forma concisa os riscos inerentes à saúde.

Um exemplo bastante elucidativo, e que ocorre no dia a dia, diz respeito à

exposição aos raios solares, que representam uma das formas mais familiares

de radiação não ionizante. A protecção do corpo humano a esta radiação é

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assegurada pela melanina, que é um pigmento que confere à pele a sua cor

mais escura e providencia a sua protecção contra a radiação ultravioleta e a luz

visível.

Os efeitos da luz solar são também controlados por nós, utilizando protectores

de pele, assim como óculos escuros para se reduzir os riscos de aparecimento

de cataratas anos mais tarde.

Como consequências nocivas de uma exposição prolongada, têm-se ainda os

riscos de queimaduras graves e do aparecimento de malanomas (cancros da

pele). Todavia, quando as exposições são moderadas, existe o efeito benéfico

que consiste na produção de vitamina D pelo corpo humano, que ajuda à

absorção de cálcio pelos tecidos ósseos.

No dia a dia, os sistemas vivos encontram-se expostos a campos electroma-

gnéticos de frequências extremamente reduzidas, emanados de diversas

fontes, já citadas anteriormente, como por exemplo as centrais eléctricas, os

transformadores, as linhas de transporte de energia, e toda a panóplia de

electrodomésticos do nosso quotidiano.

Normalmente, a exposição a estes campos ocorre a distâncias muito inferiores

ao seu comprimento de onda, daí que os campos eléctricos e os campos

electromagnéticos sejam tratados separadamente (note-se que o comprimento

de onda no vácuo e, aproximadamente, no ar, é igual ao quociente entre a

velocidade da luz e a frequência das ondas electromagnéticas).

Por exemplo, numa instalação eléctrica sob tensão, mas sem receptores

ligados, existe campo eléctrico mas o campo magnético é nulo devido à não

existência de corrente eléctrica, enquanto que, num magneto permanente,

existe campo magnético mas não há campo eléctrico devido a não existir

enrolamento de excitação. Contrariamente, na radiação de rádio-frequência os

campos eléctricos e magnéticos são indissociáveis.

Por conseguinte, os efeitos biofísicos destes dois tipos de ondas

electromagnéticas são, necessariamente, diferenciados.

Por outro lado, apesar dos campos eléctricos e magnéticos ocorrerem, na

maioria das situações, em conjunto, tem sido dada maior importância à análise

dos efeitos nocivos dos campos magnéticos na medida em que são mais

difíceis de anular e têm um maior poder de penetração em edifícios e em seres

vivos, que os campos eléctricos.

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2.2.1. Mecanismos de Interacção Tem vindo a ser estudado o modo como os campos electromagnéticos

interagem com os sistemas biológicos, sobretudo quando a energia associada

a esses campos não é suficiente para causar estragos em biomoléculas ou

aquecimento por indução, residindo a explicação talvez nas propriedades

electromagnéticas das células e dos tecidos humanos.

A interacção electromagnética entre materiais encontra-se plenamente eluci-

dada e estudada, através das Equações de Maxwell, expostas e analisadas no

capítulo anterior. Apesar da sua aplicação aos materiais isolantes, condutores

e magnéticos ser relativamente fácil, na medida em que se consideram, na

prática, como sendo meios homogéneos, isto é, em que as suas propriedades

são iguais em todos os seus pontos, o mesmo não sucede com a sua aplicação

aos sistemas biológicos, devido à elevada complexidade e aos múltiplos níveis

de organização dos organismos vivos, complexidade essa que, uma vez

integralmente resolvida, permitirá o completo conhecimento dos mecanismos

de interacção biológica entre os campos electromagnéticos e os sistemas

biofísicos.

Os tecidos biológicos são materiais não magnéticos, daí que os campos ma-

néticos no interior do corpo humano sejam os mesmos que existem no seu

exterior, o que torna ainda o problema mais complexo uma vez que os efeitos

nocivos que se têm vindo a verificar são causados exactamente pela exposição

a campos magnéticos. Em relação à influência dos campos eléctricos, a situa-

ção é bastante diferente, como se ilustra na figura 2.15, em que se tem um

corpo humano sujeito à acção de um campo eléctrico externo paralelo à sua

maior dimensão – a altura –, com uma intensidade de 1 kV/m a 60 Hz.

Conforme se constata, a ligação entre o campo eléctrico aplicado exterior-

mente (1 kV/m), e os valores a que o corpo fica sujeito (de 0,3 mV/m na cabeça

até 10 mV/m nas pernas) é extremamente fraca, sendo estes últimos campos

inferiores ao campo exterior em cerca de 10-7, raramente excedendo 10-4, e,

adicionalmente, são também bastante mais fracos que os campos eléctricos

induzidos naturalmente pelo coração, nervos, cérebro, e músculos. Ou seja, as

correntes que circularão no corpo humano induzidas pelo campo eléctrico

externo, têm intensidades significativamente inferiores às correntes naturais,

permanentes, existentes naqueles sistemas biológicos.

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Figura 2.15 – Campos eléctricos no corpo humano, exposto a um campo

eléctrico exterior de intensidade 1 kV/m a 60 Hz. Têm sido propostos diversos mecanismos de interacção, todavia não comple-

tamente estabelecidos, que se descrevem seguidamente:

a) Correntes Induzidas Na gama dos campos electromagnéticos de frequências reduzidíssimas, os

materiais biológicos comportam-se como sendo meios condutores. A nível

microscópico, todos os tecidos são constituídos por células e fluídos inter-

celulares, sendo de salientar que estes fluídos possuem uma elevada

condutividade eléctrica. Por outro lado, devido à sua membrana, as células

comportam-se como meios isolantes, daí que as correntes induzidas nos

tecidos devido à acção de campos eléctricos de frequência reduzida circulem

apenas nos espaços circundantes das células. Por conseguinte, atendendo a

que o citoplasma das células é condutor e que a sua membrana é isolante, em

termos eléctricos as células são equivalentes a um circuito eléctrico constituído

por uma resistência (o citoplasma) ligada em série com um condensador (a

membrana). Uma vez que a espessura da membrana é inferior a 10 nm, a

capacidade do condensador equivalente é bastante elevada. Usualmente, para

frequências inferiores a 100 Hz a impedância dos materiais biológicos é

resistiva, devido ao reduzido valor da capacidade da membrana, que se pode

desprezar, na medida em que não ultrapassa 10 % do valor da impedância

daquele circuito equivalente. Contudo, esta sua contribuição aumenta com a

frequência das correntes induzidas.

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69

Deste modo, a influência dos campos electromagnéticos em sistemas bio-

lógicos traduz-se pela sua capacidade em induzir correntes nas membranas

das células e nos fluídos intercelulares. Por sua vez, como essas correntes são

correntes de curto-circuito, elas próprias irão gerar campos magnéticos

concêntricos a esses circuitos, cujas intensidades são baixíssimas daí que

possam ser negligenciados na medida em que os seus efeitos são nulos.

Atendendo a que os circuitos por onde circulam as correntes induzidas são

constituídos por diferentes materiais biológicos, não homogéneos e com

condutividades anisotrópicas, essas correntes apenas poderão ser determi-

nadas através de modelos computacionais numéricos. Contudo, se se

considerar o corpo humano como um meio homogéneo e isotrópico, a

densidade de corrente J, em A/m2, poderá ser calculada analiticamente através

da seguinte expressão:

fBrJ σπ=

sendo σ (S/m) a condutividade eléctrica do corpo, r (m) o raio médio do trajecto

circular do campo magnético em torno da corrente induzida, B (T) a densidade

de fluxo, e f (Hz) a frequência do campo magnético e das correntes induzidas.

Alguns trabalhos de investigação apresentam os seguintes valores para essa

densidade de corrente: 2 mA/m2 para um campo de 100 μT a 60 Hz, e 30

μA/m2 para um campo de 1,41 μT.

O aquecimento dos tecidos devido às correntes induzidas por campos electro-

magnéticos de reduzidíssima frequência não constitui problema, excepto se

essas correntes forem bastante intensas, correndo-se o risco da estimulação

de células electricamente excitáveis, tais como os neurónios.

b) Biomateriais Magnéticos Todos os organismos vivos são essencialmente constituídos por compostos

orgânicos diamagnéticos, todavia contêm igualmente algumas moléculas

paramagnéticas – o oxigénio – assim como microestruturas ferromagnéticas –

o núcleo da hemoglobina e a magnetite –, estando estas magnetites biológicas

cobertas por finas membranas denominadas magnetosomas (magnetosomes),

que são um óxido de ferro com a composição Fe3O4. Atendendo a que estas

microestruturas magnéticas podem ser entendidas como sendo pequenos

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magnetos permanentes, ficarão sujeitas à acção de campos magnéticos

exteriores, tendendo a movimentar-se devido à acção das forças magnéticas

de atracção majoradas exactamente pela acção desses campos externos,

podendo esse movimento, que tende a orientar as magneto-somas segundo a

direcção dos campos externos, causar perturbações bio-físicas, que só

acontecerão para campos magnéticos entre 2 μT e 5 μT.

c) Radicais Livres Os radicais livres são átomos ou moléculas que possuem pelo menos um

electrão sem par, que é antinatural, instável e perigoso, na medida em que

estes electrões fazem com que os radicais livres colidam com outras

moléculas, que ficarão com a sua estrutura alterada transformando-se por sua

vez noutros radicais livres. Este fenómeno pode originar uma reacção em

cadeia que se auto-perpetua e na qual a estrutura de milhões de moléculas é

alterada numa questão de nanosegundos, destruindo o DNA, as moléculas das

proteínas, os enzimas e as células.

Estes radicais livres são marcadamente reactivos, existindo apenas por perío-

dos muito reduzidos, inferiores a 1 ns, porém o seu efeito é devastador devido

aos diversos tipos de cancro que provocam, motivados pelos estragos que

esses radicais originam no DNA, nas células e nos tecidos.

Os campos magnéticos estacionários podem influenciar a taxa de resposta de

reacções químicas envolvendo pares de radicais livres. Atendendo a que o

tempo de vida dos radicais livres é extremamente reduzido face ao tempo de

período das ondas dos campos electromagnéticos em geral, e das ondas

geradas por sistemas de energia (50 Hz) em particular, os campos electro-

magnéticos actuam praticamente não como ondas periódicas variáveis no

tempo mas sim como grandezas estacionárias durante a ocorrência daquelas

reacções provocadas pelos radicais livres. Além disso, os efeitos biofísicos

originados por campos inferiores a 50 µT são insignificantes.

Há também a considerar os efeitos do campo magnético terrestre sobre as

reacções dos radicais livres, tudo levando a crer, com base em estudos teórico-

-práticos, que tais efeitos são teoricamente concebíveis para campos geo-

magnéticos da ordem de 0,1 mT. Contudo, esses efeitos são muito reduzidos –

provocam um aumento de apenas 1 % nas concentrações de radicais livres.

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71

Além disso, o organismo humano possui defesas altamente sofisticadas que

combatem os radicais sob condições normais de vida.

d) Membrana Celular e Ligação Química Acredita-se cada vez mais que a membrana celular tem um papel principal nos

mecanismos de interacção entre os campos electromagnéticos e os sistemas

biológicos, julgando-se que os receptores situados nas membranas são, prova-

velmente, o local onde têm início as interacções entre os tecidos e os campos

electromagnéticos, em relação a muitos neurotransmissores, enzimas, e reac-

ções químicas que desenvolvem carcinomas. Por assim dizer, as células

biológicas são estruturas bioelectroquímicas, que interagem com o seu meio

ambiente através de vários caminhos, incluído os fenómenos físicos, químicos,

bioquímicos e eléctricos.

Outra teoria interessante afirma que os iões, especialmente os iões de cálcio,

podem jogar o papel de ligação química entre os campos electromagnéticos e

os processos de vida, na medida em que as propriedades eléctricas e a

distribuição dos iões à volta das células são condições perfeitas para o

estabelecimento de interacções com campos electromagnéticos exteriores.

Outras investigações afirmam que os campos eléctricos de baixa frequência

podem excitar as membranas das células, causando choques eléctricos ou

outros efeitos.

Para as frequências comerciais de 50 Hz e 60 Hz, a densidade de corrente

necessária para provocar esses choques situa-se sensivelmente em 10 A/m2, à

qual corresponde um campo eléctrico com uma intensidade de 100 V/m nos

tecidos.

Além disso, os campos eléctricos podem ainda criar poros (furos) nas

membranas celulares devido às correntes eléctricas induzidas, o que sucede

para diferenças de potencial entre as membranas de 0,1 V a 1 V, tensões estas

que requerem campos eléctricos na vizinhança das células de pelo menos 105

V/m. Note-se que estes valores são elevadíssimos se se pensar

exclusivamente na exposição a ondas electromagnéticas de fraca energia,

todavia acontecem na situação de choques eléctricos em média e alta tensão,

daí a inevitável electrocussão com queimaduras gravíssimas ou mesmo a

morte biológica.

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2.2.2. Campos Electromagnéticos e Cancro Apesar de existirem em grande número estudos teórico-práticos relacionados

com os mecanismos de interacção entre os campos electromagnéticos e os

sistemas biofísicos, assim como em relação a diversos efeitos nocivos, tem

vindo a ser dada uma atenção muito especial às possíveis interacções que

promovam o aparecimento e o desenvolvimento de carcinomas, devido a ser

uma doença particularmente grave. Essa atenção recai não só em aspectos de

investigação biomédica mas também nos resultados obtidos a partir de estudos

epidemiológicos, como se exemplificou em detalhe no capítulo 1, sobre o caso

dos trabalhadores de uma subestação de 500 kV na ex-União Soviética.

a) Mecanismos do Cancro O termo médico “cancro” é utilizado para descrever cerca de 200 doenças dife-

rentes, todas elas caracterizadas pela destruição incontrolada de células. Esta

doença representa o caso de uma mitose incontrolável, em que as células se

dividem aleatoriamente, escapando às condições naturais de controlo exis-

tentes no corpo humano, ou seja, é essencialmente uma desordem genética ao

nível celular.

As causas de muitas doenças cancerosas são desconhecidas, todavia existem

factores de risco que induzem alguns tipos de cancro, como sejam o tabaco, o

álcool, a alimentação, e a exposição a campos electroma-gnéticos e a

radiações, como sucede com os ultravioletas.

A radiação ionizante possui energia suficiente para provocar cancros de uma

forma rápida e fulminante, como sucede com a radiação atómica gama,

todavia, apesar da luz visível originar a fotossíntese, não se suspeita,

habitualmente, que induza o aparecimento desta doença. Por outro lado, a

radiação solar ultravioleta, especialmente a UVB, está cada vez mais asso-

ciada ao aparecimento de cancros de pele (melanomas), enquanto que a

energia dos fotões em campos electromagnéticos a 50 Hz e a 60 Hz (2,5x10-13

eV) é insuficiente para induzir reacções químicas celulares conducentes ao

cancro.

Em geral, as doenças cancerígenas directamente associadas com a exposição

a campos electromagnéticos são a leucemia, o cancro cerebral, e o cancro da

mama.

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b) Carcinogénese A transformação de células sãs em células cancerígenas é um processo

complexo, que comporta três fases diferenciadas, caracterizadas por um

conjunto de injúrias que afectam o material genético das células, sendo este

processo de produção de cancro, exposto na figura 2.16, designado por

carcinogénese multipassos ou multiníveis (multistep carcinogenesis).

Este modelo inicia-se nas células sãs, isto é, em bom estado, seguidamente

processa-se a conversão de algumas células sãs em células pré-can-

cerígenas, o passo seguinte consiste na conversão de algumas células pré-

cancerígenas em células cancerígenas, consistindo o último passo no desen-

volvimento de um tumor a partir das células cancerígenas.

Figura 2.16 – Modelo de carcinogénese multipassos.

O cancro humano é o resultado de uma acumulação de várias alterações gené-

ticas e epigenéticas que ocorrem numa determinada população de células, e

inicia-se através de danos no ADN, danos estes que usualmente são provo-

cados por um agente denominado genotoxina (genotoxin).

Este agente pode afectar vários tipos de células, dando origem a diversos tipos

de cancro.

Por outro lado, um agente epigenético é alguma coisa que aumenta a

probabilidade de se contrair cancro através de um agente genotóxico.

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Alguns estudos permitem concluir que não existem efeitos genotóxicos celu-

lares significativos, isto é, danos no ADN, aberrações cromossómicas,

mutações, e transformações celulares, originados pela exposição a campos

electromagnéticos de frequências reduzidíssimas, enquanto que outros

concluem que, de facto, existe alguma interacção epigenética.

De um modo geral, a exposição a campos electromagnéticos até 0,1 mT não

resulta em efeitos biofísicos celulares, como a actividade genotóxica e epige-

nética. Todavia, para campos superiores a 0,1 mT é possível haver já alguns

efeitos adversos.

c) Hipótese da Melatonina Outra hipótese possível de interacção, sob investigação, diz respeito ao facto a

provar ou não, das exposições a campos eléctricos e magnéticos provocarem a

supressão de melatonina, que é uma hormona produzida pela glândula pineal,

localizada próxima do centro do cérebro. Esta hormona é produzida principal-

mente durante a noite e é introduzida na corrente sanguínea para se dispersar

através do corpo, encontrando-se presente nas células e contribui para a

destruição dos radicais livres, ajundado a reparar o ADN. A melatonina é

responsável pela regulação dos ciclos menstruais e dos ritmos circadianos. A

sua secreção decresce à medida que a idade avança, atingindo o seu máximo

na idade infantil e diminuindo gradualmente após a puberdade e, após os 60

anos, a secreção é inferior à da juventude.

A melatonina tem a propriedade de reduzir as secreções de hormonas que

promovem o desenvolvimento de tumores, e contribui ainda para aumentar a

citotoxicidade dos linfócitos destruidores do sistema imunitário. Por conse-

guinte, a sua produção é essencial para o sistema imunitário, o qual protege o

organismo das infecções e das células cancerígenas, daí que determinados

tipos de cancro proliferem quando os níveis de melatonina são baixos. É o caso

do cancro da mama, do cancro da próstata, e dos tumores malignos nos

ovários. Para melhor compreensão, na figura 2.17 ilustra-se as consequências

da redução dos níveis de melatonina.

Seguidamente expõem-se algumas conclusões interessantes, relacionadas

com a interacção entre os campos electromagnéticos e a produção de mela-

tonina:

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Figura 2.17 – Consequências biológicas da redução dos níveis de melatonina.

• Existe supressão de melatonina com a exposição a campos electro-

magnéticos e, consequentemente, aumento dos riscos de desenvol-

vimento de carcinomas.

• A melatonina reduz as taxas de desenvolvimento de células cance-

rígenas relacionadas com o cancro da mama, todavia a exposição a

campos magnéticos de 1,2 µT a 60 Hz inibe a acção da melatonina.

• Estudos em ratos expostos a campos de 60 Hz e com densidades de

fluxo de 1 µT, 10 µT e 100 µT durante 12 horas ou durante 30 dias com

18 horas por dia de exposição, permitiram concluir que o nível de mela-

tonina desceu cerca de 40 % para a exposição durante os 30 dias com

campos de 10 µT e 100 µT, e cerca de 20 % para a exposição a 100 µT

durante 12 horas consecutivas. Em contrapartida, não se observaram

quaisquer efeitos para a exposição a campos de 1 µT.

• Experiências realizadas com babuínos, expostos a campos eléctricos de

6 kV/m e campos magnéticos de 50 µT, ambos a 60 Hz, e a campos de

30 kV/m e 100 µT, igualmente a 60 Hz, durante 12 horas por dia em 6

semanas, não conduziram a quaisquer efeitos nos níveis de melatonina.

• A exposição nocturna a campos magnéticos de 100 µT e 50 Hz, por

períodos compreendidos entre 1 dia e 13 semanas, não conduziram a

quaisquer efeitos na redução do nível de produção de melatonina.

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• Não se detectaram efeitos biológicos, isto é, redução do nível de mela-

tonina em jovens voluntários do sexo masculino, após uma exposição

durante 4 noites consecutivas a um campo magnético de 28,3 µT a 60

Hz, em experiências realizadas em 2000.

2.2.3. Estudos Celulares Conforme se salientou anteriormente, parece existir alguma relação directa

entre a exposição a campos electromagnéticos e o desenvolvimento de cancro,

de acordo com o processo sequencial que se esquematiza na figura 2.18. Para

uma melhor compreensão do fenómeno, apresentam-se seguidamente alguns

dados obtidos por observação experimental.

Figura 2.18 – Efeitos dos campos electromagnéticos relacionados

com o desenvolvimento de doenças cancerígenas.

a) Efeitos Relevantes para o Cancro Material Genético O genoma humano representa a sequência química que contém a informação

básica para construir e desenvolver o corpo humano, e consiste em ADN e

moléculas de proteína associadas, sendo, além disso, organizado em estru-

turas designadas por cromossomas. Por seu turno, cada molécula de ADN

contém um número elevado de genes, que são a unidade física e funcional

fundamental da hereditariedade. Os genes podem ser entendidos como a infor-

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mação armazenada na memória de um computador, sendo assim unidades de

informação no ADN que são utilizadas para fabricar as proteínas, entre outras

substâncias do corpo humano.

Estima-se que o genoma humano compreenda pelo menos 100000 genes. O

núcleo de cada célula contém 2 conjuntos de cromossomas, sendo um deles

dado pelo pai e o outro pela mãe, possuindo assim as células as características

dos pais biológicos. Por sua vez, cada conjunto possui 23 cromossomas

simples, um dos quais é o cromossoma do sexo, X ou Y – os indivíduos do

sexo masculino possuem um par de cromossomas X e um par Y, enquanto que

os do sexo feminino possuem apenas um par de cromossomas X.

Quanto à influência dos campos electromagnéticos sobre o ADN, é possível

que os campos com intensidades superiores à do campo magnético terrestre,

natural, podem originar problemas na síntese do ADN, e, consequentemente,

aberrações nos cromossomas. Vejam-se, de seguida, os resultados de alguns

estudos realizados recentemente:

• Detectaram-se efeitos nocivos na síntese do ADN no cérebro de ratos

sujeitos a campos magnéticos de 0,1 µT, 0,25 µT, e 0,5 µT, a 60 Hz.

Esses efeitos nocivos afectam as funções celulares, podendo causar a

morte das células e o aparecimento de carcinomas.

• Foram detectados efeitos cancerígenos e alterações em grávidas –

danos no DNA de células amnióticas –, sujeitas a campos magnéticos

de 50 Hz e de 15,6 kHz.

• Exposições a campos magnéticos de 400 mT e 50 Hz, podem originar

mutações genéticas e, consequentemente, carcinomas.

Transporte de Cálcio Os iões de cálcio são partículas carregadas electricamente, e que desem-

penham um papel fundamental em diversos processos celulares, sendo um dos

mensageiros das comunicações intercelulares do corpo e, também, um regu-

lador do crescimento celular. Estes iões são essenciais para muitas das

funções celulares, especialmente para a transmissão de sinais extra-celulares,

para a regulação do transporte intracelular de compostos, para a libertação de

secreções, para o metabolismo dos ossos, e para as contracções musculares,

daí que seja muito importante manter um nível óptimo de cálcio no organismo.

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O fenómeno da libertação de iões Ca++ das células devido à acção de campos

electromagnéticos é bem conhecido, especialmente no que respeita às células

linfáticas e cerebrais, podendo o seu excesso provocar distúrbios nas activi-

dades hormonais, conduzindo a leucemias e a outros tipos de cancro.

Proliferação e Diferenciação de Células A biologia da divisão e diferenciação celular é similar quer em células normais

quer em células cancerígenas, contendo estas últimas o complemento total de

biomoléculas que são essenciais à sobrevivência, proliferação, diferenciação, e

expressão de muitas funções de células de tipos específicos. Consequen-

temente, falhas na regulação destas funções conduzem a doenças

cancerígenas.

O fenómeno da proliferação de células é bastante complexo, sendo um

processo regulado geneticamente e, por sua vez, a diferenciação é também um

processo complexo, no qual é induzida a expressão dos genes específicos das

células. Através de ensaios realizados in vitro, constatou-se haver uma

proliferação de células expostas à acção de campos electromagnéticos.

Actividade Enzimática Tal como outras proteínas, as enzimas consistem em longas cadeias de amino-

ácidos, estando presentes em todas as células vivas e sendo responsáveis

pelo desempenho da importante função de controlar os processos metabólicos

do corpo humano.

Uma enzima especial, a ornitina descarboxilase (ornithine decarboxylase ODC)

é bastante importante pelo papel que possui na regulação da multiplicação de

células através da síntese das poliaminas necessárias para a síntese das

proteínas e do ADN, e é, simultaneamente, uma enzima activada durante o

processo de carcinogénese, ou seja, um aumento da actividade da ODC

representa um sintoma de cancro.

Veja-se, seguidamente, quais os resultados de vários estudos sobre a

influência dos campos electromagnéticos sobre a enzima ODC:

• Existe um aumento da actividade das ODCs sob a acção de um campo

eléctrico alternado sinusoidal a 60 Hz e de intensidade 10 mV/m.

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• Ensaios realizados em ratos, expostos a campos magnéticos de 10 μT

e 60 Hz, indiciaram um aumento da actividade dos linfomas.

• Mais de 10 anos de ensaios permitiram concluir que a exposição a

campos electromagnéticos aumenta a actividade das enzimas ODC,

tendo sido encontradas mudanças na actividade das ODCs devido a

campos magnéticos induzidos, assim como um aumento na taxa de

anormalidades fetais em embriões de galinhas em desenvolvimento.

• Encontrada uma redução na actividade de leucócitos humanos, quando

expostos a campos de 450 MHz modulados a 16 Hz.

Hormonas

As hormonas são substâncias químicas formadas num órgão ou parte do

corpo, sendo transportadas através do sangue para outro órgão, alterando a

actividade funcional e, por vezes, a estrutura de um ou mais órgãos de uma

maneira específica. Na prática, existem diversos estudos que demonstram que

a diminuição do nível da síntese da melatonina assim como da sua secreção

pela glândula pineal, devido à exposição a campos electromagnéticos, está

associada ao aumento do risco de contracção de doenças cancerígenas.

Sistema Imunitário Este sistema mais não é que um mecanismo de protecção composto de um

número elevado de células interdependentes que, em conjunto, defendem e

protegem os seres vivos dos ataques de bactérias, micróbios, toxinas, para-

sitas, fungos, infecções virais, assim como da proliferação de células cance-

rígenas. Este sistema não é afectado por campos magnéticos de baixa energia,

como se concluiu através de estudos realizados em populações de ratos,

todavia, ainda em experiências feitas com ratos, detectaram-se alguns efeitos

visíveis sobre o sistema imunitário após 6 semanas de exposição a campos

magnéticos entre 200 µT e 2000 µT, e efeitos insignificantes para campos entre

2 µT e 20 µT.

Comunicações Intercelulares As interacções entre células e as transduções de sinais têm um papel de

primeira importância no desenvolvimento do sistema nervoso, sendo os sinais

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eléctricos e químicos que circulam através das membranas celulares, os res-

ponsáveis pelas comunicações entre células.

Acredita-se que os campos electromagnéticos em geral, e os campos

electromagnéticos de frequência extremamente reduzida em particular, podem

alterar as propriedades das membranas, modificar as funções celulares, e

interferir com a transferência de informação entre células.

b) Efeitos não Cancerígenos A par das investigações relativas aos efeitos cancerígenos dos campos electro-

magnéticos, têm igualmente vindo a realizar-se diversos estudos sobre os

efeitos não cancerígenos desses campos.

Efeitos que têm como consequência a divisão das células e a sua proliferação

surgem com a exposição a campos eléctricos e magnéticos de intensidades da

ordem das dezenas de V/m e de mT, surgindo a rotação eléctrica das células,

assim como a sua fusão, sob a acção de campos eléctricos entre 10 kV/m e

100 kV/m, como é o caso das electrocussões a 50 Hz e a 60 Hz.

Um outro estudo internacional, realizado em seis países, submeteu os ovos de

duas incubadoras iguais a um campo magnético de 1 µT, sob a forma de

impulsos de 500 ms, com uma frequência de 100 Hz, tendo os resultados

globais constatado um aumento de cerca de 6 % no número de embriões

defeituosos.

2.2.4. Estudos em Humanos São vários os efeitos nocivos que a opinião pública clama, por vezes sem

quaisquer bases científicas, devido às exposições a campos electroma-

gnéticos, sobretudo no que respeita às linhas aéreas de transporte de energia

eléctrica em alta e muito alta tensão.

Esses efeitos incluem normalmente dores de cabeça, alterações

cardiovasculares, alterações neurológicas, confusão mental, depressão,

dificuldade de concentração, perturbação do sono, diminuição da líbido, e

perturbações no aparelho digestivo, sendo as principais fontes de informação

as pessoas e os trabalhadores que habitam ou trabalham muito próximo de

fontes de campos electromagnéticos, os resultados laboratoriais, e os dados

epidemiológicos.

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a) Sistema Cardiovascular Como é sabido, o coração é um órgão muscular bioeléctrico, daí que o seu

funcionamento seja analisado através dos sinais eléctricos emitidos – electro-

cardiograma e ecografia cardíaca. Na prática, densidades de corrente da

ordem de 0,1 A/m2 podem estimular os tecidos electricamente excitáveis,

enquanto que, valores superiores a 1 A/m2, interferem com a acção eléctrica do

músculo cardíaco, causando fibrilação ventricular e aquecimentos eléctricos

por efeito de Joule, que, usualmente, são as causas de morte por

electrocussão, quando da ocorrência de choques eléctricos por contacto

directo. Seguidamente, explicitam-se os resultados observados resultantes da

interacção entre campos electromagnéticos e o funcionamento do coração:

• Em trabalhadores expostos a campos eléctricos de intensidade com-

preendida entre 12 kV/m e 16 kV/m, durante mais de 5 horas por dia,

constatou-se que a sua pulsação no final do dia de trabalho era, em

média, 2 a 5 pulsações por minuto mais baixa que no início do dia.

• A exposição de voluntárias do sexo feminino a campos electroma-

gnéticos de 20 µT e 60 Hz, permitiu concluir estatisticamente, com uma

margem significativa, que o número de pulsações cardíacas diminuiu.

• Um estudo intensivo sobre os efeitos dos campos electromagnéticos

sobre a alteração das pulsações de trabalhadores expostos a campos

gerados por linhas aéreas de alta tensão de 110 kV a 400 kV, estudo

esse que utilizou técnicas de registo ambulatório, constatou não se ter

verificado quaisquer alterações do ritmo cardíaco.

b) Síndroma da Fadiga Crónica Este síndroma (Chronic Fatigue Syndrome CFS), também conhecido como

Síndroma da Fadiga Crónica e Disfunção Imunológica (Chronic Fatigue and

Immune Dysfunction Syndrome CFIDS), é um termo clínico geral utilizado para

descrever uma doença emergente, que se caracteriza pela existência de fadiga

debilitante, problemas do foro neurológico, e uma variedade de outros sintomas

debilitantes. Esta doença deprime ainda o sistema imunológico, e afecta

adultos, crianças e adolescentes. Nos últimos anos, detectaram-se diversas

anomalias no sistema imunitário de pacientes com CFS, que incluem altera-

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ções na actividade e na estrutura superficial celular em dois importantes tipos

de glóbulos brancos do sangue: células assassinas naturais e T-linfócitos.

Adicionalmente, a exposição a campos electromagnéticos afecta negativa-

mente o sistema imunitário, podendo causar uma disfunção hormonal e

mudanças ao nível das células. Ou seja, a exposição a campos electroma-

gnéticos constitui um risco potencial para os pacientes que padecem de

anomalias associadas à inexplicável fadiga crónica.

c) Sensibilidade Eléctrica A sensibilidade eléctrica (electrical sensitivity ES), igualmente conhecida por

hipersensibilidade electromagnética ou electrosensibilidade, é uma doença com

sintomas neurológicos e alérgicos, activados perante a exposição a campos

electromagnéticos, sendo um problema de saúde pública, em crescimento. As

pessoas afectadas pela ES são particularmente sensíveis a determinadas

frequências eléctricas, reagindo de uma forma exarcebada quando expostas à

acção de campos electromagnéticos. Os sintomas desta doença incluem dores

de cabeça, irritação ocular, náuseas, vertigens, borbulhagem na pele, inchaços

faciais, fraqueza, fadiga, perturbações na concentração, dores nos tendões e

nos músculos, zumbidos nos ouvidos, dormências, dores e pressão abdo-

minais, dificuldades respiratórias, ritmo cardíaco alterado, paralisia, confusão

mental, alterações no equilíbrio, depressão, perturbações do sono, e alterações

na memória.

Por conseguinte, os pacientes que sofrem de sensibilidade eléctrica apre-

sentam uma hipersensibilidade à acção de campos electromagnéticos insen-

síveis ao público em geral, não existindo actualmente qualquer tipo de

tratamento.

d) Choques e Microchoques Eléctricos Um dos mecanismos de interacção entre os campos eléctricos de reduzi-

díssima frequência e os tecidos vivos, consiste na estimulação directa das

células e membranas excitáveis, o que demonstra a capacidade do corpo

humano para absorver correntes eléctricas e desenvolver choques ou micro-

choques, dependendo da intensidade dos campos eléctricos.

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Saliente-se que o termo choque eléctrico é utilizado para descrever todas as

injúrias graves, provocadas pelas elevadas intensidades de corrente, e que

compreendem desde a perda de consciência à electrocussão mortal, passando

pelas queimaduras graves, enquanto que o termo microchoque eléctrico se

refere às arritmias cardíacas produzidas por correntes de intensidades muito

reduzidas, ao percorrerem o músculo cardíaco, normalmente através de um

cateter intravascular ou intracardíaco.

Para melhor compreensão dos efeitos térmicos causados por um choque

eléctrico, considere-se o exemplo de um trabalhador, electricista, que sofre um

contacto acidental, directo, numa mão, de um condutor eléctrico de média

tensão, a 60 kV.

Considerando que os seus pés se encontram apoiados directamente no solo,

ao potencial zero, e sem qualquer protecção isolante, pela lei de Ohm a

intensidade da corrente que percorrerá o seu corpo, com um trajecto “mão –

braço – peito – órgãos genitais – pernas”, será, tendo ainda em atenção que a

resistência eléctrica média do corpo humano se pode considerar igual a 2000

ohms (Ω):

amperes30ohms2000

volts1060 3=

×==

RUI

valor este que é extremamente elevado, como se prova através da determi-

nação da potência calorífica desenvolvida por efeito de Joule no corpo do

trabalhador:

kilowatts1800watts1800000)amperes30()ohms2000( 22 ==×== IRP

Por sua vez, se o choque eléctrico tiver uma duração de 5 segundos, a energia

calorífica desenvolvida pelo corpo da vítima terá o seguinte valor:

horakilowatts5,2segundo)(wattsjoules9000000

)segundos5()watts1800000(

×==×==×== tPW

Ou seja, nos 5 segundos de duração do choque eléctrico, o corpo da vítima

desenvolveria uma quantidade de energia calorífica equivalente à que seria

libertada por uma resistência de aquecimento de 2,5 kW durante 1 hora!

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Evidentemente que, nestas circunstâncias, os danos térmicos causados nos

tecidos e órgãos do corpo com toda a certeza que conduziriam a uma morte

inevitável.

Em termos quantitativos, estima-se que a densidade de corrente suficiente para

estimular a excitação das células situa-se em 1 A/m2, enquanto que, valores da

ordem de 10 A/m2, aos quais correspondem campos eléctricos de intensidade

100 V/m no interior do corpo humano, situam-se no limiar dos choques

eléctricos.

e) Sensações Visuais A acção dos campos electromagnéticos, que se reflecte através das correntes

eléctricas induzidas na retina, dá origem a tremuras nos olhos que, contudo,

não têm quaisquer efeitos degenerativos. O limiar do início dessas tremuras,

para uma frequência de 20 Hz, acontece com densidades de corrente da

ordem de 20 mA/m2, ocorrendo a máxima sensibilidade entre 20 Hz e 30 Hz.

Esta sensação ocorre igualmente, sob a influência de campos magnéticos, a

partir de valores da ordem de 10 mT a 50 Hz e 60 Hz.

2.3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS A maioria dos resultados respeitantes aos efeitos dos campos electroma-

gnéticos sobre os sistemas biofísicos, são largamente baseados em conjuntos

de estudos de determinação epidemiológica, sendo o objectivo desses estudos

identificar as associações entre doenças e características ambientais particu-

lares, de modo a ser possível estabelecer uma relação do tipo “causa-efeito”.

Os estudos epidemiológicos permitem ainda estabelecer uma correlação histó-

rica de dados biológicos, para grandes amostras populacionais, ou seja, no

caso dos efeitos dos campos electromagnéticos os resultados obtidos podem

mostrar apenas a associação das pessoas com um determinado estímulo – a

exposição a esses campos –, desde que existam bastantes factores envolvidos

em cada uma dessas pessoas – por exemplo, os sintomas resultantes da

exposição. Contudo, o facto de se desconhecerem concretamente os meca-

nismos de interacção entre os campos e os sistemas biológicos, confere a

estes estudos uma certa margem de incerteza.

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2.3.1. Epidemiologia A epidemiologia constitui uma ferramenta poderosa, utilizada para se deter-

minar se existe algum risco para a saúde, derivado de uma causa desço-

nhecida, ou seja, a epidemiologia pode ser entendida como o estudo da

ocorrência e da distribuição de doenças numa determinada população.

A primeira vantagem destes estudos para a população humana ocorreu em

1885, quando o médico inglês John Snow observou que a morte de ratos

devido à cólera, em Londres, era particularmente significativa em áreas onde a

água potável tinha sido extraída do rio Tamisa em locais muito próximos de

embocaduras de esgotos. Esses resultados permitiram concluir que a cólera

era transmitida por meio de um agente desconhecido existente nos esgotos,

tendo essa constatação conduzido posteriormente a um programa de

tratamento das águas dos esgotos.

a) Rácio de Possibilidades Os estudos epidemiológicos são, de uma forma consistente, “estudos de caso-

-controlo” (case-control studies), sendo identificados dois grupos de pessoas de

uma determinada população:

• Os casos (cases), que representam as pessoas com uma determinada

doença, encontrando-se em estudo.

• Os controlos (controls), que representam as pessoas seleccionadas da

mesma população à qual pertencem os casos, sendo similares em tudo

excepto no facto de não possuírem a doença.

É de salientar ainda que a exposição destes dois grupos de pessoas a um

determinado agente, por exemplo os campos electromagnéticos de reduzi-

díssima frequência, encontra-se em estudo, sendo igualmente realizadas

medições de parâmetros característicos.

O resultado do estudo epidemiológico é expresso através da seguinte relação,

denominada rácio de possibilidades ou de probabilidades (odds ratio OR), que

representa uma estimativa:

controloscasosOR

grupodoexpostaspessoasdeadepossibilidgrupodoexpostaspessoasdeadepossibilid

=

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86

Este rácio é assim uma medida de associação, medida essa que quantifica a

relação entre exposição e saúde, resultante de um estudo comparativo.

Se o valor de OR é igual a 1, não se encontrou nenhuma diferença entre a

exposição de pessoas com a doença e as pessoas sem a doença, o que

significa que existe uma associação negativa entre a doença e a exposição.

Contrariamente, se OR é superior a 1, as pessoas casos estiveram prova-

velmente mais expostas que as pessoas controlo, havendo assim uma asso-

ciação positiva entre a doença e a exposição.

Por exemplo, para se estudar o caso da associação entre a exposição a

campos electromagnéticos de reduzidíssima frequência e o cancro, deverão

ser comparados dois grupos de pessoas: um grupo (casos), o qual tem sido

exposto a esses campos electromagnéticos, e o segundo (controlos), que

nunca esteve exposto.

O grupo exposto deverá ser constituído por pessoas que vivem próximo de

fontes identificadas dos campos electromagnéticos, como por exemplo linhas

aéreas de transporte de energia e subestações, enquanto que o segundo

deverá ser composto por pessoas que habitam longe dessas fontes, ou seja,

sem se encontrarem expostas aos efeitos dos campos electromagnéticos

Para melhor compreensão, considerem-se os seguintes exemplos numéricos:

Exemplo 1:

• Estudo de 500 cancros (casos), e 500 controlos.

• Se 130 casos estiveram expostos aos campos electromagnéticos, e os

restantes 500 – 130 = 370 casos não estiveram expostos, então a

possibilidade de pessoas expostas do grupo casos será 130/370 = 0,35.

• Se 130 controlos estiveram também expostos, os controlos não expos-

tos são 500 – 130 = 370, daí que a possibilidade de pessoas expostas

do grupo controlos será 130/370 = 0,35.

• Por conseguinte, tem-se OR = 0,35/0,35 = 1, ou seja, existe uma

associação negativa entre a exposição e o cancro.

Exemplo 2:

• Estudo de 500 cancros (casos), e 500 controlos.

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• Se 200 casos estiveram expostos aos campos electromagnéticos, e os

restantes 500 – 200 = 300 casos não estiveram expostos, então a

possibilidade de pessoas expostas do grupo casos será 200/300 = 0,66.

• Se 130 controlos estiveram também expostos, os controlos não expos-

tos são 500 – 130 = 370, daí que a possibilidade de pessoas expostas

do grupo controlos será 130/370 = 0,35.

• Por conseguinte, tem-se OR = 0,66/0,35 = 1,88, ou seja, existe uma as-

sociação positiva entre a exposição e o cancro.

b) Locais de Exposição Atendendo a que os regulamentos de segurança assim como as linhas dire-

ctivas de protecção contra as exposições a campos electromagnéticos, fazem

uma diferenciação entre ambientes ocupacionais, isto é, locais de trabalho, e

ambientes ou locais públicos, apresenta-se de seguida, respeitando essa sepa-

ração, algumas características típicas desses locais, no que respeita aos tipos

de fontes geradoras de campos electromagnéticos.

Locais de Trabalho (Locais Ocupacionais) Estes locais são estudados no contexto de indústrias específicas e de postos

de trabalho, particularmente nos casos de fábricas de equipamentos eléctricos

e electrónicos, onde a probabilidade dos trabalhadores estarem expostos à

acção de campos eléctricos e magnéticos de reduzidíssima frequência é

bastante elevada, campos esses gerados não só pelas instalações eléctricas

mas também pelas próprias ferramentas com que operam.

Os recursos humanos que trabalham nas proximidades de transformadores,

subestações, quadros eléctricos e outros equipamentos e instalações onde as

intensidades de corrente são elevadas, podem ficar igualmente expostos a

campos de elevada densidade de fluxo, superior a 10 μT. Quanto a escritórios

e a outros edifícios de serviços, as densidades de fluxo são similares às

existentes nas habitações particulares, podendo variar entre 0,05 μT e 0,4 μT.

Saliente-se que, em ambas as situações, a exposição continuada assim como

a exposição a diversas gamas de frequências, mesmo com níveis inferiores

aos recomendados, poderá originar efeitos adversos a médio e longo prazo.

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Locais Públicos Os locais públicos onde existem exposições a campos electromagnéticos de

reduzidíssima frequência, compreendem as residências, escolas, hotéis, e vias

de comunicação rodoviárias e ferroviárias, sendo as fontes que afectam as

residências, escolas e hotéis os cabos e as linhas eléctricas de transporte de

energia, as subestações e postos de transformação, e diversos equipamentos

de escritório e electrodomésticos, havendo vários estudos que comprovam que

os campos magnéticos de elevada densidade de fluxo existentes em habi-

tações devem-se à sua localização muito próxima de linhas de transporte. Por

outro lado, as fontes de campos em comboios e transportes ferroviários

urbanos são devidas às linhas de contacto e às catenárias de alimentação.

2.3.2. Estudos Epidemiológicos do Cancro Nas últimas décadas, são diversos os estudos epidemiológicos que corroboram

a existência de uma associação positiva entre a exposição a campos electro-

magnéticos de frequências reduzidíssimas e as doenças cancerígenas, como a

leucemia em crianças e em adultos, os cancros no cérebro, os cancros da

mama, e os cancros pulmonares, havendo, todavia, outro grupo de estudos

que concluíram existir uma associação negativa.

Os primeiros estudos epidemiológicos que relacionam a exposição a campos

electromagnéticos gerados por linhas de transporte de energia e o cancro,

datam dos anos 70 do século passado, tendo de facto concluído que essa

exposição é directamente responsável pelo aparecimento e desenvolvimento

de doenças cancerígenas. Nos anos seguintes, foram realizados mais estudos

de carácter epidemiológico, não só na Europa mas também nos Estados

Unidos e na Austrália, apontando para uma clara associação entre os campos

electromagnéticos e o desenvolvimento de cancros, apesar de, por outro lado,

ser bastante difícil estabelecer qual a correlação mais clara e evidente entre os

efeitos das linhas de transporte de energia e as doenças cancerígenas.

Um dos trabalhos mais importantes, teve início em 1990 nos Estados Unidos, e

constituiu uma parte significativa do Research and Public Information

Dissemination (RAPID) Program, mandatado pelo Congresso e incluído no

Energy Policy Act de 1992, no sentido de investigar a associação entre a

exposição a campos electromagnéticos de baixa frequência e a degradação da

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saúde humana. Este programa RAPID, que durou cerca de cinco anos, foi

liderado pelo National Institute of Environmental Health Sciences (NIEHS) e

pelo Department of Energy (DOE), tendo, em Junho de 1998, havido uma

reunião internacional entre 30 cientistas, que, utilizando os critérios desen-

volvidos pela International Agency for Reseaech on Cancer, concluíram não

existir provas concludentes de que a exposição a campos electromagnéticos de

reduzidíssima frequência possa desenvolver “carcinomas humanos conhe-

cidos” ou “prováveis carcinomas humanos”. Contudo, a maioria dos membros

desse grupo de trabalho concluiu que a exposição a campos magnéticos

emanados de linhas aéreas de transporte de energia pode conduzir a

“possíveis carcinomas humanos”. Entretanto, em 15 de Junho de 1999, o

NIEHS concluiu que os campos electromagnéticos de reduzidíssimas

frequências podem causar cancro, baseados em estudos epidemiológicos que

mostraram haver uma associação entre alguns tipos de leucemia e a exposição

a campos magnéticos. Num estudo realizado em 2001, na Nova Zelândia, o

seu autor concluiu haver evidências, suportadas por bastantes estudos

epidemiológicos, de que os campos electromagnéticos de frequências

reduzidíssimas são perigosos para a saúde humana, especialmente em

crianças, havendo uma ligação forte ao aparecimento de leucemias.

Seguidamente, apresentam-se alguns aspectos quantitativos da exposição a

campos electromagnéticos e as incidências de determinados tipos de doenças

cancerígenas.

a) Leucemia Infantil Como é sabido, a infância é um período onde se verifica um enorme cres-

cimento de células, associado ao normal crescimento e desenvolvimento das

crianças, daí que seja de todo o interesse para a sua saúde adoptar cuidados

especiais no que respeita à sua exposição a campos electromagnéticos

gerados por linhas de transporte de energia, por computadores e seus

periféricos em casa e nas escolas, por televisores, e por telefones celulares.

A palavra “leucemia”, que significa literalmente “sangue branco”, descreve uma

variedade de cancro que é conhecida pela criação anormal de glóbulos

brancos no sangue – os leucócitos –, afectando não só a existência de glóbulos

brancos saudáveis, que são essenciais para o combate a bactérias, vírus e

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outras infecções, mas também os glóbulos vermelhos, que são os respon-

sáveis pelo transporte do oxigénio a todos os pontos do corpo.

Esta doença representa menos de 4 % do universo de todos os tipos de cancro

que afectam os adultos, todavia é o tipo mais comum dos cancros que afectam

as crianças.

Vejam-se de seguida diversos resultados e constatações consideradas impor-

tantes, no que respeita a esta doença:

• As crianças com o Síndroma de Down têm um risco acrescido (10 a 40

vezes superior) de contraírem leucemia, em relação às crianças consi-

deradas normais.

• As crianças cujas mães, durante a gravidez, foram sujeitas a dia-

gnósticos através de raios X, apresentam igualmente um risco

acrescido.

• Um dos primeiros estudos epidemiológicos realizados sobre este

assunto, em 1979, chegou a um OR de 2,35, o que permitiu concluir da

existência de elevados riscos na contracção de leucemia infantil por

parte de crianças sujeitas à acção de campos electromagnéticos.

• Em 1976-1977, um estudo conduzido por dois investigadores da Univer-

sidade do Colorado, nos Estados Unidos, constatou que, crianças que

viviam muito próximo de grandes instalações eléctricas, contraíram

cancro, contrariamente àquelas que habitavam em zonas bastante mais

afastadas. Como resultado, os autores do estudo salientaram que as

crianças que habitam casas muito próximas de linhas de transporte de

energia eléctrica em alta tensão, apresentam um risco duas a três vezes

superior de contraírem leucemia ou tumores no sistema nervoso, que as

restantes crianças.

• Foram detectados, através de estudos realizados em 1980, casos de

leucemia e outros cancros infantis, associados à exposição a campos

magnéticos de 0,25 μT.

• Um estudo epidemiológico americano, realizado em 1991, em Los

Angeles, Califórnia, conduziu a um OR de 2,15, ou seja, à confirmação

da associação positiva entre o desenvolvimento de leucemia infantil e a

exposição a campos electromagnéticos.

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• Em estudos bastante completos, realizado na Suécia, Dinamarca e

Finlândia, foi considerada, para a Suécia, uma população base

constituída por todas as crianças suecas com 15 anos de idade ou mais

jovens, que viveram dentro de um perímetro de 800 m relativamente a

linhas de transporte de energia, durante o período 1960-1985, tendo

identificado 142 casos – 39 de leucemia, e 33 de cancro no sistema

nervoso. O estudo realizado na Dinamarca considerou crianças de

residências situadas entre 25 m e 50 m de linhas de transporte de

energia, cabos subterrâneos e subestações, tendo demonstrado um

aumento significativo do risco de contracção de linfomas entre crianças

sujeitas a campos magnéticos iguais ou superiores a 0,1 μT. Quanto ao

estudo realizado na Finlândia, envolveu 68300 rapazes e 66500

raparigas, com idades até aos 19 anos, que viveram, entre 1970 e

1989, em habitações distanciadas de 500 m ou menos de linhas aéreas

de 100 kV a 400 kV, não se tendo detectado estatisticamente um

aumento significativo no número de leucemias e linfomas. Ainda estatis-

ticamente, notou-se um excesso significativo de tumores no sistema

nervoso, mas apenas em rapazes, que estiveram expostos a campos

magnéticos iguais ou superiores a 0,2 μT.

• De acordo com um estudo realizado em Taiwan, publicado em 1998, foi

concluído que as crianças que vivem em três distritos do norte do país,

próximo de linhas de transporte de energia, apresentam elevados riscos

de contraírem leucemia. Foram detectados 28 casos de leucemia entre

120696 crianças e, além disso, as crianças que vivem em áreas dentro

dos 100 m a partir das linhas aéreas apresentam um risco 2,7 vezes

superior às restantes crianças.

• Num estudo científico publicado em 2003, foi reportado que os filhos de

mães grávidas expostas a campos electromagnéticos emanados de

equipamentos de energia, isto é, a campos de frequência 50 Hz e 60

Hz, terão um risco acrescido de contraírem leucemia.

• Outro estudo científico, publicado em 2005, propõe que a hipótese da

melatonina, na qual os campos magnéticos de 50 Hz e de 60 Hz

funcionam como supressores da produção nocturna de melatonina na

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glândula pineal, deve ser levada em linha de conta como contribuindo

para o aumento dos riscos das crianças contraírem leucemia.

b) Leucemia em Adultos

• Um estudo conduzido pela Southern California Edison Company, entre

36221 trabalhadores que se encontravam directamente envolvidos com

equipamentos eléctricos, detectou um ligeiro aumento do risco de cancro

em algumas situações, todavia sem significado acima dos níveis

normais.

• Investigadores da Johns Hopkins University e da empresa norte-

americana AT&T, estudaram a ocorrência de leucemias entre os traba-

lhadores expostos a campos electromagnéticos de reduzidíssimas fre-

quências, tendo constatado que, de todos aqueles que exerceram

funções pelo menos durante dois anos e que faleceram entre 1975 e

1980, a 124 deles foi-lhes diagnosticado leucemia como causa de morte.

Foi também concluído que os trabalhadores que estiveram sempre

expostos a campos magnéticos acima do normal, durante toda a sua

carreira laboral, apresentaram uma taxa de incidência de leucemia 2,5

vezes superior à dos outros trabalhadores.

• Um estudo realizado por investigadores franceses e canadianos, numa

população de 223292 trabalhadores de duas grandes empresas indus-

triais canadianas e de uma empresa pública francesa, mostrou que os

trabalhadores que contraíram leucemia pertenciam aos recursos

humanos que se encontravam expostos cumulativamente a campos

magnéticos. Todavia, os resultados globais obtidos não encontraram

qualquer associação positiva entre os casos de cancro estudados e a

exposição a campos electromagnéticos.

• Outro estudo, realizado em 1995 por um grupo da University of North

Carolina, que envolveu 138000 trabalhadores da indústria electrotécnica

americana, no período 1950-1986, não suporta igualmente qualquer

associação positiva entre leucemia e exposição a campos electro-

magnéticos.

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• Um estudo, também bastante completo, realizado na Suécia, incluiu a

análise da exposição a campos eléctricos e magnéticos em 1015 postos

de trabalho diferentes, e envolveu mais de 1600 pessoas de 169

profissões diferentes. Foi encontrada uma associação positiva entre a

exposição a campos electromagnéticos e a leucemia, tendo igualmente

sido concluído que aumenta o risco de desenvolvimento de tumores

cerebrais em indivíduos do sexo masculino abaixo dos 40 anos, quando

expostos a campos iguais ou superiores a 0,2 μT.

• Um outro estudo, também realizado na Suécia, e que incluiu aproxi-

madamente 400000 pessoas que viveram a 300 m ou menos de linhas

aéreas de transporte de energia pelo menos durante um ano, entre 1960

e 1985, permitiu afirmar que as pessoas expostas a campos magnéticos,

em casa ou no posto de trabalho, apresentavam uma probabilidade de

contrair leucemia 4 vezes superior à das outras pessoas, habitando em

zonas afastadas.

• Um estudo realizado no Canadá, que apresentou como objectivo

analisar a acção cumulativa dos efeitos dos campos eléctricos e dos

campos magnéticos sobre o desenvolvimento de cancros, e cujo grupo

de análise era constituído por trabalhadores electrotécnicos da empresa

Canadian Power Company Ontario Hydro, mostrou haver um risco

acrescido de contracção de leucemia, na medida em que, para os níveis

mais elevados de exposição simultânea a campos eléctricos e magné-

ticos, os valores da OR situavam-se entre 3,51 e 11,2.

Saliente-se que, apesar da maioria dos estudos epidemiológicos dizerem

respeito à associação entre a leucemia e a exposição a campos

magnéticos de reduzidíssima frequência, os efeitos dos campos

eléctricos são igualmente bastante importantes, talvez mesmo ainda

mais, na medida em que, naquele último estudo, assim como noutro

mais recente, realizado nos Estados Unidos em 2000, constatou-se

igualmente que a exposição a campos eléctricos de intensidades entre

10 V/m e 40 V/m aumenta consideravelmente o risco de desenvol-

vimento de leucemia.

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• Num estudo epidemiológico realizado nos Estados Unidos, entre 1991 e

1996, envolvendo 764 adultos sujeitos à exposição a campos electroma-

gnéticos em locais ocupacionais, e publicado em 2003, os resultados

obtidos permitiram concluir da existência de uma associação muito

ténue entre a exposição a campos electromagnéticos e o aparecimento

de leucemia aguda.

c) Cancro Cerebral O cancro do cérebro, que é o órgão principal do nosso sistema nervoso central,

não é muito frequente, sendo as causas desta doença primariamente desco-

nhecidas, apesar dos factores que estão na origem de outros tipos de cancro,

tais como a exposição a radiações químicas e electromagnéticas, o tabaco, a

alimentação, e o consumo excessivo de álcool, estejam igualmente associadas

ao desenvolvimento deste tipo de cancro.

Vejam-se os resultados dos estudos epidemiológicos relativos à associação

entre o cancro do cérebro e a exposição a campos electromagnéticos:

• Num estudo realizado na Suécia, e publicado em 1994, incidindo sobre

trabalhadores dos caminhos de ferro, concluiu-se haver um aumento

não significativo de leucemias, cancro do cérebro, cancro da glândula

pituitária, e de linfomas.

• Num estudo publicado em 1994, e realizado no Canadá e em França,

tendo incidido em trabalhadores de três grandes empresas do sector

eléctrico produtor, e que incluiu 250 casos de cancro do cérebro,

constatou-se também não haver um aumento significativo da doença em

trabalhadores sujeitos a campos magnéticos mesmo superiores a 3,15

μT.

• Outro estudo, realizado entre trabalhadores de empresas produtoras de

energia eléctrica, estimou que o risco de desenvolvimento de cancro no

cérebro aumenta 1,94 por μT-ano de exposição a campos magnéticos.

• Os resultados de um estudo levado a cabo com a finalidade de reportar

uma possível associação entre o desenvolvimento de cancros cerebrais

em crianças, e a exposição a campos electromagnéticos por parte dos

progenitores durante o ano imediatamente anterior à concepção,

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encontrou um OR entre 1,12 e 1,31, o que significa que não existe uma

associação positiva significativa.

• Concluiu-se haver uma associação positiva entre a exposição a campos

eléctricos e magnéticos e o desenvolvimento de cancros em trabalha-

dores de empresas produtoras de energia eléctrica.

De um modo geral, com base na grande maioria dos estudos epidemiológicos

efectuados em vários países, não se poderá dizer que existe uma associação

positiva significativa entre o desenvolvimento de cancro cerebral e a exposição

a campos electromagnéticos de frequências reduzidíssimas.

d) Cancro Mamário O cancro da mama, bastante característico dos indivíduos do sexo feminino, é

uma anomalia que se refere ao desenvolvimento e proliferação errática de

células dos tecidos mamários, originando tumores que, na maioria das situa-

ções, degeneram em malignidades.

• Foram reportados casos de ocorrência de cancro da mama, na

Noruega, entre trabalhadores ligados ao sector das indústrias eléctricas.

• De acordo com um estudo realizado na Suécia, incidindo em

trabalhadores dos caminhos de ferro, com idades entre 20 e 64 anos,

concluiu-se que o risco de contrair cancro na mama é bastante elevado

no grupo de indivíduos do sexo masculino sujeito a uma maior e mais

duradoura exposição, caso dos maquinistas e dos técnicos de via.

• Outro estudo epidemiológico sueco, concluiu não haver uma associação

significativa entre o cancro da mama e a exposição a campos electro-

magnéticos gerados nas residências particulares, tendo esta conclusão

sido corroborada por um outro estudo, realizado na Finlândia.

• Num estudo dinamarquês, não foi encontrada qualquer associação

entre a incidência de cancro da mama (96 casos) em indivíduos do sexo

feminino ligados ao sector das indústrias eléctricas, com base no

número insignificante de casos encontrados: dois na gama de

exposições reduzidas (0,1 μT a 0,29 μT), e apenas um na gama das

exposições muito elevadas (> 1,0 μT).

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• Não existe incremento do risco de desenvolvimento de cancro mamário

em mulheres, devido às exposições dos campos eléctricos e magné-

ticos originados por cobertores eléctricos.

Devido às investigações relativas aos efeitos dos campos electromagnéticos de

reduzidíssima frequência sobre os níveis de melatonina, levantou-se a hipótese

de que a exposição a esses campos poderia ser um risco para o desen-

volvimento deste tipo de carcinoma, com base no facto de que tais exposições

fazem diminuir a produção de melatonina, que é uma hormona protectora

contra determinados tipos de cancro. Contudo, os resultados obtidos a partir

dos estudos epidemiológicos realizados, parecem indiciar que, na prática, a

exposição a campos electromagnéticos não incrementa de forma significativa o

risco de desenvolvimento do cancro da mama, como foi salientado num

trabalho científico tornado público em 2003.

e) Cancro Pulmonar Presentemente, não se encontrou ainda qualquer explicação científica para

justificar a relação entre a exposição a campos electromagnéticos e o desen-

volvimento do cancro do pulmão, tendo essa associação sido analisada em

diversos estudos, que confirmam de facto haver uma associação positiva,

como se discrimina seguidamente:

• A exposição a campos electromagnéticos de reduzidíssima frequência,

não só em locais residenciais mas nos locais de trabalho, conduz a um

excesso de ocorrências de cancro pulmonar.

• A exposição a campos electromagnéticos transitórios de elevada fre-

quência, em instalações de produção e transporte de energia, aumenta

de forma significativa o risco de se contrair cancro do pulmão, como o

demonstra um estudo epidemiológico realizado no Canadá e em França,

que obteve para o OR um valor bastante elevado – 3,1. Outro estudo

realizado igualmente no Canadá concluiu que o aumento do risco,

também para trabalhadores expostos a linhas de transporte de energia,

se situa em 1,84.

• Um interessante estudo realizado pelo Medical Physics Research Centre

da Bristol University, no Reino Unido, concluiu que a exposição a

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97

campos magnéticos representa uma possibilidade de aumento de casos

de cancro do pulmão. Esta conclusão baseia-se no facto, demonstrado

nesse estudo, da aptidão que os campos eléctricos gerados por linhas

eléctricas de transporte de energia possuem para atrair e concentrar

átomos de radão, que é um gás radioactivo, na vizinhança dessas

linhas. Por sua vez, quando os átomos de radão são gerados de uma

forma rápida atraem moléculas de água presentes no ar, desenvolvendo

nelas aerosóis ultrafinos, com uma dimensão de 10 nm.

f) Cancro da Pele Este tipo de cancro, infelizmente em rápida expansão, representa já cerca de

metade do universo dos novos tipos de cancro na Europa e nos Estados

Unidos. Apesar de todos os tipos humanos o poderem contrair, os grupos de

maior risco são constituídos por pessoas de pele muito clara, ruivos, louros, e

com olhos claros.

Os estudos epidemiológicos realizados até agora, permitiram constatar da exis-

tência de uma associação francamente positiva entre o desenvolvimento de

cancros de pele e a exposição a campos electromagnéticos de reduzidíssima

frequência, sendo de salientar o estudo realizado pelo grupo citado na alínea

anterior, sediado na Bristol University, e que examinou a incidência de cancros

na pele em pessoas que residem a cerca de 20 m ou menos de linhas de

transporte de energia, em Devon e na Cornualha, tendo concluído haver um

aumento significativo de casos. Além disso, a população alvo desse estudo foi

catalogada em dois grupos, em função da sua proximidade das linhas de trans-

porte – o primeiro grupo compreendia as pessoas que residiam muito próximo

das linhas, por conseguinte sujeitas a elevados níveis de radão, enquanto que

o segundo grupo era constituído pelas restantes pessoas, mais afastadas, e

portanto sujeitas aos níveis mais baixos de radão. Como conclusão, constatou-

-se que o risco inerente às pessoas do primeiro grupo aumentou ainda mais.

g) Cancro da Próstata Este tipo de cancro é bastante comum nos indivíduos do sexo masculino,

sobretudo acima dos 55 anos de idade, uma vez que o risco aumenta com a

idade. As células cancerígenas são primeiramente formadas na próstata,

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podendo seguidamente transformar-se em metástases que irão afectar outras

partes do corpo, sobretudo os ossos e outras estruturas selectivas.

Um estudo publicado em 1998, envolvendo utilizadores de cobertores eléctri-

cos e camas com colchões de água aquecida, não encontrou qualquer

associação positiva entre a incidência deste tipo de cancro e a exposição,

mesmo por períodos continuados, a campos electromagnéticos de reduzida

energia.

Relativamente aos estudos epidemiológicos realizados com a finalidade de se

estabelecer uma relação entre a exposição a campos electromagnéticos de 50

Hz e de 60 Hz, e a incidência de diversos tipos de cancro em adultos,

sobretudo em locais ocupacionais, existem dois tipos de resultados:

• Não existência de qualquer associação entre exposição e doença,

encontrada nos trabalhadores da empresa americana de produção e

transporte de energia eléctrica Califórnia Edison (1993), nos traba-

lhadores dos caminhos de ferro noruegueses (1994), e em trabalhadores

do sector das indústrias de equipamentos eléctricos na Dinamarca

(1998).

• Existência de uma associação positiva entre o desenvolvimento de

doenças cancerígenas e a exposição não só a campos eléctricos,

encontrada em trabalhadores do sector dos equipamentos eléctricos no

Canadá (1996, 2000), numa amostra populacional igualmente no

Canadá (2002), e em trabalhadores das indústrias eléctricas em França

(1996), mas também a campos magnéticos, em trabalhadores do sector

eléctrico canadianos (1994) e americanos (1995), em áreas residenciais

e ocupacionais (1997), em trabalhadores suecos (1999), em funcionários

dos caminhos de ferro suíços (2001), e em trabalhadores suecos que

operavam com máquinas de soldar (2002).

Todavia, é de salientar que os riscos relativos associados às amostras

populacionais onde se encontrou uma associação positiva entre exposição

e cancro, situam-se em 2,0 para os níveis de exposição mais elevados, e

entre 1,1 e 1,3 para níveis um pouco mais reduzidos. Por conseguinte,

estes valores do factor de risco são insuficientes para se poder afirmar, sem

quaisquer dúvidas, que existe uma forte e inequívoca associação positiva.

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2.3.3. Estudos Epidemiológicos de Doenças Não Cancerosas Além dos estudos epidemiológicos relevantes associados à incidência de doen-

ças cancerosas, têm igualmente vindo a ser realizados outros estudos não

menos importantes, relativos à associação entre a incidência de doenças não

cancerosas e a exposição a campos electromagnéticos de reduzidíssima fre-

quência, como se discrimina seguidamente.

a) Doença de Alzheimer e Demência Esta doença, descrita pelo médico alemão Alois Alzheimer em 1906, é a mais

comum das doenças da terceira idade, afectando actualmente mais de 20

milhões de pessoas em todo o mundo, com tendência para aumentar devido ao

incremento do número de idosos com mais de 65 anos, sobretudo nos países

desenvolvidos, motivado pelo aumento da esperança média de vida. É uma

doença do foro neurodegenerativo, progressiva e irreversível, afectando áreas

específicas do cérebro normalmente em idosos com mais de 65 anos de idade.

O seu diagnóstico inclui sintomas de demência – perdas de memória e das

funções mentais –, e exclui outras causas como a doença de Parkinson, os

traumas na cabeça, o alcoolismo, e os derrames cerebrais.

Quanto às suas causas, existem diversas possibilidades, incluindo alterações

genéticas indirectas iniciadas e induzidas pela acção de campos electro-

magnéticos, tendo diversos estudos de incidência epidemiológica permitido

chegar às seguintes conclusões:

• Pessoas expostas a campos de elevada intensidade, nos seus locais de

trabalho, como por exemplo os operadores de máquinas de costura,

apresentam um risco de contrair a doença três a cinco vezes mais alto.

• O risco é igualmente elevado em carpinteiros, electricistas, e em

montadores de equipamentos eléctricos e electrónicos, assim como em

operadores de máquinas ferramentas portáteis.

• A exposição a campos electromagnéticos nos locais de trabalho poderá,

possivelmente, influenciar o desenvolvimento de demência.

b) Esclerose A esclerose lateral amiotrófica (amyotrophic lateral sclerosis) é uma doença

neurológica progressiva e fatal. É uma degeneração avançada das células

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100

cerebrais que comandam os nervos motores (neurónios motores superiores), e

da espinal medula (neurónios motores inferiores) – quando os neurónios moto-

res superiores deixam de enviar impulsos aos músculos, estes começam a

atrofiar originando fraqueza que se transformará gradualmente em paralisia.

Por outro lado, esta doença não afecta as capacidades intelectuais, a visão, a

audição, o paladar, o cheiro, a actividade sexual, os intestinos, e o aparelho

urinário. Quanto à associação entre o desenvolvimento desta doença e a

exposição a campos electromagnéticos, os poucos estudos realizados indiciam

que, de facto, existe alguma relação directa, sobretudo em pessoas expostas a

esses campos nos seus locais de trabalho – exposição ocupacional.

c) Depressão e Suicídio A depressão é uma doença cada vez mais comum, que pode afectar qualquer

pessoa, indiscriminadamente. Caracteriza-se por um desinteresse pela vida, e

afecta pensamentos, sentidos, saúde física, e a vida privada e profissional,

sendo um factor de risco conducente ao suicídio. Como conclusão dos estudos

realizados, é possível haver uma reduzida associação entre a exposição a

campos electromagnéticos e a depressão, contudo entre a exposição e a

tendência para o suicídio, nada indica que exista qualquer relação, como ficou

patente num estudo epidemiológico realizado numa população de 138905

trabalhadores de empresas americanas do sector eléctrico, e publicado em

2000, tendo outro estudo anterior, publicado em 1996, chegado à mesma

conclusão.

d) Doenças Cardíacas Na prática, parece não existir uma associação positiva entre a exposição a

campos electromagnéticos de reduzidíssimas frequências e anomalias car-

díacas, como se concluiu através de alguns estudos realizados, numa

população de 139000 indivíduos do sexo masculino, trabalhadores em

empresas do sector eléctrico (1999), em 35391 trabalhadores do sexo

masculino da empresa americana Southern Califórnia Edison Company, no

período compreendido entre 1960 e 1992 (2002), e igualmente num grupo de

trabalhadores dinamarqueses do mesmo sector de actividade (2002), tendo

esses estudos tido em conta os níveis de exposição e a sua duração.

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2.3.4. Estudos Relevantes sobre Terminais de Computador e Outros Electrodomésticos Ao longo dos anos, não só as instituições de investigação mas também os pró-

prios fabricantes têm vindo a realizar estudos intensivos com a finalidade de

determinar quais os riscos para a saúde derivados da exposição aos écrãns

dos monitores (vídeo display terminals VDTs) utilizados nos computadores.

Apesar de serem construídos de acordo com todas as normas de segurança

em vigor, e com a garantia dos próprios fabricantes de que não existem perigos

que coloquem em risco a saúde dos utilizadores, há ainda bastantes dúvidas e

opiniões contrárias.

De facto, existem diversos mecanismos físicos e biofísicos associados à utili-

zação e exposição aos VDTs, tais como dores de cabeça, náuseas, fadiga

ocular, manchas na vista, tensão nos músculos oculares, ardor e irritação nos

olhos. Se bem que as alterações visuais sejam passageiras e não tenham

consequências sérias, quando a vista se encontra bastante cansada diminui o

ritmo de trabalho e podem suceder-se erros. Por outro lado, os utilizadores

intensivos de computadores podem vir a sofrer de dores posicionais no

pescoço e nas costas, assim como no punho que manipula o rato e nos

ombros, sendo estas anomalias classificadas pelos médicos de saúde ocupa-

cional como sendo “danos de esforço repetitivo”, sendo também possível que

surja alguma tensão psicológica. Eis os resultados de diversos estudos epide-

miológicos levados a cabo:

• Não há qualquer relação entre os efeitos dos campos electromagnéticos

emanados dos monitores e doenças oftalmológicas, incluindo cataratas.

• O trabalho feminino com computadores, consequentemente com a utili-

zação, mesmo intensiva, de VDTs, não aumenta o risco de deficiências

nos fetos nem de abortos espontâneos

Quanto à influência dos campos electromagnéticos com origem em electrodo-

mésticos, constata-se o seguinte, com base nos estudos epidemiológicos

realizados:

• Um estudo realizado no Colorado, Estados Unidos, no sentido de inves-

tigar a relação entre a utilização de camas de água aquecidas e de

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cobertores eléctricos, e o desenvolvimento da gravidez, especialmente o

tempo de gestação, o peso dos recém-nascidos, o desenvolvimento de

anormalidades, e as perdas de fetos por aborto espontâneo, e que

envolveu uma população de 1806 famílias em relação às quais ocorreu

um nascimento, em 1982, em dois hospitais de Denver, permitiu concluir

que a utilização daqueles dois equipamentos durante o tempo de

gravidez poderá causar efeitos adversos na saúde dos fetos.

• Um outro estudo, mais recente, publicado em 1992, e realizado no

Estado de New York, constatou que as progenitoras de fetos defeituosos

não estiveram nem mais nem menos tempo expostas aos campos

electromagnéticos gerados por camas aquecidas, que a generalidade de

outras mães.

• Um estudo desenvolvido na Finlândia e publicado em 1993, realizado

numa população de 443 mulheres saudáveis, voluntárias, que tentaram

engravidar no período 1984-1986, concluiu que não existe qualquer

associação positiva entre o desenvolvimento de abortos espontâneos e

a exposição a campos magnéticos gerados por cobertores eléctricos.

• Outros estudos publicados respectivamente em 2002, 2003 e 2005,

afirmam que os resultados obtidos permitem concluir que o risco total de

defeitos em recém nascidos não se encontra associado com a

exposição dos pais a campos electromagnéticos de 50 Hz.

• Como excepção, existem três estudos, publicados em 2002, que afir-

mam que a exposição intensa a campos electromagnéticos de fre-

quência comercial está associada ao aumento de risco de aborto.

Os estudos epidemiológicos apresentam a vantagem de permitirem a obtenção

de informação valiosa relativamente aos seres humanos, mais do que aquela

que é possível obter através de estudos em células humanas ou em animais.

Todavia, convém salientar que estes últimos estudos têm um carácter estrita-

mente científico, com o objectivo de determinar, por exemplo, quais são os

mecanismos físicos e biológicos da interacção entre a exposição a campos

electromagnéticos e o desenvolvimento de determinadas doenças, enquanto

que os primeiros são estudos essencialmente estatísticos, mas que permitem

avaliar da existência ou não daquela interacção, através do processamento dos

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dados obtidos por amostragem. Considerando todas as evidências acerca dos

efeitos nocivos da exposição a campos electromagnéticos, obtidas através dos

estudos epidemiológicos, parece não haver uma ligação sólida com o desen-

volvimento de cancro e outras anomalias, que possam satisfazer as dúvidas

que se levantam na opinião pública se, de facto, existem ou não efeitos nocivos

para os sistemas biofísicos.

Todavia, na medida em que as evidências mostram haver algumas situações

fora do que é normal e esperado, a atitude correcta a adoptar consistirá em

admitir a existência de riscos possíveis. Adicionalmente, apesar de não haver

bases científicas teóricas e experimentais que, de uma forma concisa e

consistente, possam justificar essa existência de riscos, o carácter penetrante

dos campos electromagnéticos de reduzidíssima frequência em relação ao

ambiente que nos rodeia e a nós próprios, fará igualmente com que aquela

atitude passe por não ignorar não só a existência desses campos mas também

a mais remota das sugestões de risco para a saúde humana.

Ou seja, deverá estar sempre presente a seguinte questão: “Poderão os

campos eléctricos e magnéticos gerados por toda a panóplia de equipamentos

utilizados na produção, transporte, distribuição e utilização de energia eléctrica,

desde os grandes geradores das centrais até às utilitárias máquinas de barbear

e escovas eléctricas de lavagem dos dentes, causar problemas de saúde?”

2.4. NORMAS DE SEGURANÇA E REGULAMENTAÇÃO De acordo com o espectro de frequências, existem dois tipos de campos

electromagnéticos, classificados em função da gama de frequências. O

primeiro tipo compreende as frequências extremamente reduzidas, situadas

entre 0 (corrente contínua) e 3 kHz, e é designado usualmente na literatura

técnica de expressão anglófona por ELF field, isto é, Extremely Low Frequency

field. Quanto ao segundo tipo, compreende as frequências reduzidas, situadas

entre 3 kHz e 30 kHz, e é comummente denominapo de VLF field, ou seja, Very

Low Frequency field.

Neste nível de frequências, o campo eléctrico e o campo magnético podem-se

manifestar em simultâneo ou então separadamente, como se ilustra nos

seguintes exemplos, tendo em atenção que o vector intensidade do campo

eléctrico se encontra associado à tensão eléctrica, enquanto que o vector

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intensidade do campo magnético está directamente relacionado com a inten-

sidade da corrente eléctrica e com os materiais magnéticos:

• No caso de uma catenária em tracção eléctrica ferroviária, se se

encontrar sob uma tensão de 25 kV, mas em vazio, isto é, sem corrente

eléctrica a circular, nas suas imediações existirá unicamente campo

eléctrico.

• Na presença de uma máquina eléctrica a funcionar em vazio, isto é,

praticamente sem corrente eléctrica, tem-se apenas, na sua vizinhança,

um campo magnético, devido à influência do fluxo magnético gerado no

seu circuito ferromagnético.

• Nas imediações de um magneto permanente, uma vez que não existe

corrente eléctrica, tem-se igualmente apenas a influência de um campo

magnético.

• Na vizinhança de linhas áreas de alta tensão, por exemplo a 400 kV, em

que os seus cabos se encontram em carga, isto é, percorridos por

correntes eléctricas, por exemplo 1500 A, existe a influência simultânea

de um campo eléctrico e de um campo magnético. O mesmo sucede

com os condutores em instalações eléctricas de baixa tensão.

Por conseguinte, o ser humano encontra-se quase permanentemente exposto

à influência de campos electromagnéticos, devidos não só aos próprios electro-

domésticos existentes nas zonas residenciais mas também às linhas de

transporte de energia em alta e muito alta tensão. Nesta última situação,

sucede que, por um lado, os campos eléctricos apresentam uma intensidade

reduzida, mas, por outro, devido às elevadas intensidades de corrente, os

campos magnéticos são já significativos. Adicionalmente, se bem que os

campos eléctrico e magnético se possam manifestar em simultâneo, os

potenciais efeitos nefastos para os tecidos biológicos encontram-se bastante

mais relacionados com a exposição aos campos magnéticos que aos campos

eléctricos, daí que, na prática, a atenção esteja muito mais concentrada para a

influência associada aos campos magnéticos. Esta situação deve-se a que a

blindagem aos campos magnéticos seja difícil de obter, e à sua facilidade em

penetrarem facilmente nos tecidos biológicos e no interior de edifícios e

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habitações, contrariamente aos campos eléctricos, que apresentam uma

elevada dificuldade de penetração na pele humana.

Uma norma de segurança é um documento normalmente elaborado por um

grupo de reconhecidos especialistas na área, oriundos não só do tecido

industrial mas também do sector académico, com investigação desenvolvida e

reconhecida na área de elaboração dessa norma. Esse documento deverá

explicitar, relativamente ao assunto a que diz respeito, determinados níveis,

designados por níveis de segurança, que têm como objectivo assinalar que, por

exemplo, acima desses níveis existe risco para a saúde humana. É o caso da

exposição a campos electromagnéticos, em que as normas, os regulamentos, e

as linhas orientadores de segurança indicam os níveis máximos de exposição,

acima dos quais poderão ocorrer riscos para a saúde. Como tal, a elaboração

deste tipo de documentação pressupõe os seguintes passos:

• Identificação dos perigos.

• Leitura e análise sistemática e exaustiva de toda a documentação cien-

tífica existente.

• Selecção do nível de exposição mais adequado, abaixo do qual o meio

envolvente se poderá considerar seguro, isto é, isento dos perigos iden-

tificados.

No caso da exposição a campos electromagnéticos, note-se que o nível

máximo de exposição representa não uma linha exacta de separação entre

perigo e segurança, mas sim um possível risco para a saúde humana, que é

tanto mais elevado quanto maior for o afastamento por excesso em relação

àquele nível. Saliente-se que as incertezas e indefinições inerentes à activi-

dade das agências de normalização para conseguirem, de uma forma o mais

consensual e segura possível, definir os níveis máximos de exposição mais

aconselháveis em locais ocupacionais (locais de trabalho) e em locais

residenciais, têm sido devidas à ausência de mecanismos de interacção,

reconhecidos cientificamente, entre saúde humana e campos electro-

magnéticos. Por conseguinte, atendendo a que não existe uma linha exacta de

separação entre risco e segurança, é usual na prática associar os níveis

máximos de exposição recomendados, a um factor de segurança, também

designado por factor de incerteza.

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Os primeiros regulamentos foram elaborados na União Soviética, em 1975,

contudo a norma que conseguiu reunir um consenso mais alargado foi

composta pelo Institute of Electrical and Electronic Engineers (IEEE), em 1991,

norma essa aprovada em 1992 pelo American National Standards Institute

(ANSI), com a referência ANSI C95.1-1992.

Esta norma de segurança recomenda que a exposição média para cada

período de seis minutos e para cada secção do corpo humano não deverá

exceder 0,614 kV/m para campos eléctricos e 163 A/m (205 μT) para campos

magnéticos.

O objectivo destes níveis consiste em manter as intensidades das correntes

induzidas no corpo humano bastante inferiores ao valor mais baixo

correspondente à corrente de excitação das células electricamente excitáveis.

Além desta norma, outras instituições de outros países têm vindo a trabalhar,

há já bastante tempo, no sentido de estabelecerem a sua própria regulamen-

tação de segurança.

É o caso da Austrália, através do Australian Radiation Laboratory (ARL) e do

National Health and Medical Research Council (NH & MRC), do Canadá, da

Commonwealth of Massachusetts, da República Federal Alemã (FRG), da

North Atlantic Treaty Organization (NATO), da United States Air Force (USAF),

e da União Soviética (USSR).

No quadro 2.2, para todos estes regulamentos, mostram-se os níveis de

segurança relativos à exposição a campos magnéticos em áreas ocupacionais

(locais de trabalho) e em áreas públicas, indicando-se, dentro de parêntesis, as

datas de publicação e entrada em vigor dos regulamentos de segurança

discriminados.

Como se constata, ao observar-se este quadro, os valores diferem

significativamente de país para país – por exemplo, 1760 µT na União Soviética

contra apenas 1,99 µT no Massachusetts, nos Estados Unidos –, devendo-se

essas disparidades exactamente à situação de não existir ainda uma

justificação científica universalmente comprovada e aceite no que respeita aos

mecanismos de interacção entre os campos electromagnéticos e os sistemas

biofísicos. Contudo, a maioria da regulamentação existente foi elaborada com

base no que é actualmente reconhecido como válido cientificamente, no que

respeita a esses mecanismos de interacção.

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Instituição / País Níveis de exposição (μT)

Locais ocupacionais

Locais públicos

ANSI/IEEE (1992/1991) 205 205

Austrália: NH & MRC (1989) 500 100

Canadá (1989) 5,01 2,26

Com. of Massachusetts (1986) 1,99 -----

FRG (1986) 314 314

NATO (1979) 3,27 -----

USAF (1987) 1,99 1,99

USSR (1985) 1760 -----

Quadro 2.2 – Normas de segurança e limites de exposição para campos magnéticos,

adoptados por diferentes organismos e países.

Além dos organismos referidos anteriormente, outros mais têm vindo a encarar

a elaboração de regulamentação nesta área, como é o caso da American

Conference of Governmental Industrial Hygienists (ACGIH), do National

Radiological Protection Board (NRPB) no Reino Unido, da International

Commission on Nonionizing Radiation Protection (ICNIRP), do Swedish

Radiation Protection Institute, da Health Canada, e da Australian Radiation

Protection and Nuclear Safety Agency (ARPANSA), mostrando-se no quadro

2.3 diversos valores de níveis máximos recomendados para o campo magné-

tico, em locais públicos e ocupacionais.

2.4.1. Institute of Electrical and Electronics Engineers IEEE Como se referiu anteriormente, o Institute of Electrical and Electronic Engineers

(IEEE), estabeleceu uma norma em 1991, norma essa aprovada em 1992 pelo

American National Standards Institute (ANSI), com a referência ANSI C95.1-

-1992.

Esta norma de segurança recomenda que a exposição média para cada

período de seis minutos e para cada secção do corpo humano não deverá

exceder 0,614 kV/m para campos eléctricos e 163 A/m (205 μT) para campos

magnéticos. O objectivo destes níveis consiste em manter as intensidades das

correntes induzidas no corpo humano bastante inferiores ao valor mais baixo

correspondente à corrente de excitação das células electricamente excitáveis.

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Ano: Norma Limites de exposição

1992/1991: ANSI/ IEEE 205 μT ----------

1993: NRPB 1600 μT a 50 Hz 1330 μT a 60 Hz

----------

1998: ICNIRP 83,3 μT em locais públicos

420 μT em locais ocupacionais

1999: Suécia em terminais de computador

ELF (5 Hz – 2 kHz): ≤ 0,2 μT

VLF (2 kHz – 400 kHz): ≤ 0,025 μT

----------

1999: Safety Code 6 (USA) 2,75 μT em locais públicos

6,15 μT em locais ocupacionais

2002: ARPANSA 3 kHz – 100 kHz: 6,1 μT em locais públicos

3 kHz – 100 kHz: 31,4 μT em locais ocupacionais

Quadro 2.3 – Normas de segurança e limites de exposição para campos magnéticos,

adoptados por diferentes organismos.

2.4.2. National Radiological Protection Board NRPB Este organismo britânico estabeleceu recomendações acerca dos níveis

máximos do campo eléctrico e do campo magnético, para as frequências de 50

Hz e de 60 Hz, sem distinção entre locais ocupacionais e locais públicos em

geral, como se mostra no quadro 2.4. Os níveis aconselhados foram esta-

belecidos com base nas correntes induzidas no corpo humano, de elevadas

intensidades, não sendo relevantes para as preocupações da opinião pública

relativamente ao desenvolvimento de doenças cancerígenas e outras

anomalias de saúde. As limitações impostas resumem-se a uma densidade de

corrente de 10 mA/m2 induzida na cabeça e no tronco.

Gama de frequências Campo eléctrico (kV/m)

Campo magnético (µT)

50 Hz 12 1600

60 Hz 10 1330

Quadro 2.4 – Limites de exposição para campos eléctricos e campos magnéticos,

recomendados pela regulamentação do NRPB.

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2.4.3. International Commission on Nonionizing Radiation Protection ICNIRP Em 1989, o International Radiation Protection Association (IRPA) aprovou,

interinamente, as linhas de conduta relativas à exposição a campos electro-

magnéticos de reduzidíssima frequência, preparadas pela sua International

Commission on Nonionizing Radiation Protection (ICNIRP), estando os limites

recomendados expostos no quadro 2.5, para a frequência de 50 Hz.

Exposição Campo eléctrico (kV/m)

Campo magnético (µT)

Locais ocupacionais

Dia inteiro 10 0,5

Período curto (2 horas/dia) 30 5

Membros (braços/pernas) ----- 25

Locais públicos

Dia inteiro 5 0,1

Poucas horas diárias 10 1

Quadro 2.5 – Limites de exposição para campos eléctricos e campos magnéticos,

a 50 Hz, recomendados pelos organismos internacionais IRPA/ICNIRP.

Saliente-se que estas recomendações resultaram de um trabalho de

cooperação com a World Health Organization (WHO), assim como com o

United Nations Environment Program (UNEP), sendo o seu objectivo a

prevenção das correntes eléctricas induzidas nas células, assim como a

estimulação nervosa, que é sabido ocorrerem com níveis de campos eléctricos

e magnéticos tipicamente superiores aos que se verificam em áreas

residenciais e ocupacionais.

É de notar que os limites apresentados foram estipulados unicamente para se

evitarem riscos imediatos, não tendo sido considerados os riscos inerentes a

exposições prolongadas, mesmo de nível reduzido, daí que, em Abril de 1998,

o ICNIRP reviu as suas normas, passando a recomendar, para locais públicos

em geral, um limite de 100 μT para 50 Hz, e 84 μT para 60 Hz, enquanto que,

para os locais ocupacionais, os limites passaram a ser de 500 μT a 50 Hz e

420 μT a 60 Hz. Por sua vez, as normas australianas adoptaram as linhas de

conduta do ICNIRP, sendo de 0,5 μT o limite para locais ocupacionais, para

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110

uma exposição de 8 horas, e acima de 5 μT para 2 horas de exposição. Para

outros locais, o limite recomendado é de 0,1 μT.

2.4.4. Normas Suecas A Suécia tem sido um dos líderes no estudo e desenvolvimento de regula-

mentação respeitante à ergonomia visual e às emissões de campos electro-

magnéticos em relação aos monitores de computadores (VDTs). A Direcção

Nacional para a Saúde e Segurança Ocupacional e o Instituto Sueco de

Protecção contra Radiações, MPR – Mät-och Provningsrådet –, foram encarre-

gues da tarefa de investigar a necessidade da existência de regulamentação e

das consequências da introdução de ensaios obrigatórios de VDTs, tendo sido

introduzidos em 1987, de forma não obrigatória, procedimentos de ensaios. O

método imposto, designado por MPR-I, especificava um máximo de 0,05 µT

para campos magnéticos de muito baixa frequência, na gama entre 1 kHz e

400 kHz, a 50 cm de afastamento directo dos ecrãs.

Todavia, como esse método foi considerado como sendo embaraçoso e difícil

de avaliar, em Julho de 1991 foi criado um novo método, designado por

MPR-II, que especifica níveis máximos inferiores a 0,25 µT para as emissões

provenientes de campos magnéticos de reduzidíssima frequência na banda de

5 Hz a 2 kHz (banda 1), e máximos inferiores a 0,025 µT para as emissões de

campos magnéticos de muito baixa frequência na banda de 2 kHz a 400 kHz

(banda 2).

Este método engloba igualmente normativas relativas à ergonomia visual

(focagem, distorção de caracteres, tremura do ecrã), emissão de raios X,

potencial electrostático, descargas electrostáticas, e campos eléctricos sinu-

soidais.

Adicionalmente, a Confederação Sueca de Trabalhadores TCO, que representa

mais de um milhão de empregados, considera que deveriam ser adoptados

limites mais restritivos, da ordem de 0,2 µT para as emissões de campos

magnéticos extremamente reduzidos, a 30 cm da parte da frente dos ecrãs e a

50 cm das restantes estrutura dos monitores, sendo a justificação baseada no

facto de que níveis superiores a esse valor poderiam estar associados ao

aumento do risco de cancro, assim como de que os utilizadores de compu-

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111

tadores normalmente têm a sua cabeça, mãos e tórax a menos de 50 cm de

distância. Note-se que as normas TCO mais recentes incluem também linhas

de conduta relativas a consumos de energia, iluminância, tremura do ecrã, e

utilização do teclado. Em termos resumidos, no quadro 2.6 expõem-se os

limites recomendados pelo MPR-II assim como pelo TCO, não só no que

respeita a campos eléctricos mas também a campos magnéticos.

Gama de frequências MPR-II TCO

Campos eléctricos

Campos estacionários ± 500 V ± 500 V

ELF (5 Hz – 2 kHz) ≤ 25 V/m ≤ 10 V/m

VLF (2 kHz – 400 kHz) ≤ 2,5 V/m ≤ 1 V/m

Superiores a 400 kHz ----- -----

Campos magnéticos

ELF (5 Hz – 2 kHz) ≤ 0,25 µT ≤ 0,2 µT

VLF (2 kHz – 400 kHz) ≤ 0,025 µT ≤ 0,025 µT

Superiores a 400 kHz ----- ----- ELF – campos eléctricos e campos magnéticos de reduzidíssima frequência

VLF – campos eléctricos e magnéticos de muito baixa frequência

Quadro 2.6 – Normas de segurança e limites de exposição para campos eléctricos

e campos magnéticos, utilizados na Suécia.

É de salientar que alguns especialistas questionam a validade do limite de

0,025 µT para as emissões de campos magnéticos de muito baixa frequência,

justificando a sua posição no facto de que estes campos contêm muito mais

energia que as emissões de campos magnéticos de reduzidíssima frequência.

Esses especialistas mostram que, se os níveis de indução são utilizados para

medir a quantidade de energia da radiação, então o nível de 0,25 µT para

campos de reduzidíssima frequência corresponde a um nível de 0,001 µT para

campos de muito baixa frequência.

2.4.5. Normas Alemãs De acordo com a Lei Federal de Controlo da Poluição, os limites para os

campos eléctricos e magnéticos para sistemas de transporte de energia

eléctrica de tensão igual ou superior a 1000 V, são respectivamente 5 kV/m e

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112

100 μT, para a frequência de 50 Hz, e 10 kV/m e 300 μT para a frequência de

16 2/3 Hz, utilizada nas linhas ferroviárias electrificadas. Em determinadas

circunstâncias, especificadas nas normas, os limites para as densidades de

fluxo podem ser excedidos em 100 % em períodos de curta duração, o mesmo

sucedendo no que respeita aos limites dos campos eléctricos dentro de áreas

reduzidas.

2.4.6. American Conference of Governmental Industrial Hygienists ACGIH Nos Estados Unidos não existem ainda normas governamentais sobre a

exposição a campos eléctricos e magnéticos, contudo, alguns estados têm as

suas próprias linhas de conduta relativamente aos níveis de exposição a

campos eléctricos nos terrenos circundantes de linhas aéreas de transporte de

energia, a 60 Hz, em relação aos quais os proprietários dessas linhas aéreas

têm garantia de direitos de construção não só de linhas mas também de

centrais e de subestações (terrenos concessionados, designados como rights-

of-way ROW na literatura técnica americana).

Por outro lado, somente os estados de New York e da Florida fixaram os níveis

máximos para exposição a campos magnéticos entre 15 μT e 25 μT, nos

limites daqueles terrenos concessionados (edge of ROW), mostrando-se os

níveis adoptados nos quadros 2.7 e 2.8.

Estas recomendações tiveram como objectivo assegurar que as futuras linhas

de transporte de energia não excederiam esses limites. Quanto aos restantes

estados têm sido relutantes em estabelecer limites devido às incertezas

inerentes a esses próprios limites.

Um organismo independente norte-americano, a American Conference of

Governmental Industrial Hygienists (ACGIH), recomenda um limite de 614 V/m

para exposição a campos eléctricos nos locais ocupacionais, para uma gama

de frequências situada entre 30 kHz e 3000 kHz, e 205 μT para campos

magnéticos entre 30 kHz e 100 kHz.

Como complemento, expõe-se no quadro 2.9 os limites recomendados por

esse organismo, para campos eléctricos e magnéticos a 60 Hz, em locais

ocupacionais, sendo de destacar a preocupação com a saúde de trabalhadores

com pacemakers cardíacos.

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Estados Campo eléctrico (kV/m)

ROW Edge of ROW

Florida 8 (1) 10 (2)

2

Minnesota 8 -----

Montana 7 (3) 1

New Jersey ----- 3

New York 11,8 11 (4)

7 (3)

1,6

Oregon 9 -----

(1) – para linhas aéreas em duplo circuito (69 – 230 kV) (2) – para linhas aéreas com um único circuito (500 kV)

(3) – limite máximo para passagens aéreas superiores sobre as linhas (4) – para linhas de 500 kV, em determinados ROW

Quadro 2.7 – Limites de exposição para campos eléctricos, utilizados em alguns

estados dos Estados Unidos.

Estados Campo magnético (edge of ROW) (µT)

Florida 15 (1)

20 (2)

25 (3)

New York 20 (4)

(1) – para linhas aéreas em duplo circuito (69 – 230 kV) (2) – para linhas aéreas com um único circuito (500 kV)

(3) – para linhas de 500 kV, em determinados ROW (4) – para linhas de tensão superior a 230 kV

Quadro 2.8 – Limites de exposição para campos magnéticos, utilizados

nos estados da Florida e de New York.

Frequência de 60 Hz Campo eléctrico (kV/m)

Campo magnético (µT)

Limites máximos 25 1

Trabalhadores com pacemakers

≤ 1 0,1

Quadro 2.9 – Limites de exposição para campos eléctricos e campos magnéticos,

nos locais ocupacionais, recomendados

pelo organismo americano ACGIH.

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114

2.4.7. Restrições A maioria dos limites expostos nas normas, recomendações, e linhas de orien-

tação atrás apresentados são baseados nos mecanismos de interacção, já

estudados e reconhecidos cientificamente, entre os campos electromagnéticos

ELF e VLF e os tecidos biológicos, tendo os efeitos observados correspondido

à excitação de nervos e músculos, induzida por campos electromagnéticos.

Até à data, a restrição básica associada aos limites de exposição recomen-

dados como seguros tem sido especificada em termos dos valores respeitantes

às densidades de corrente induzidas como sendo a grandeza principal de

aferição da interacção entre os campos electromagnéticos e o corpo humano,

muito mais que os valores da intensidade dos campos eléctricos internos.

Este critério tem como fundamento o facto de se conseguir avaliar muito mais

facilmente as densidades de corrente que as intensidades dos campos

eléctricos. Todavia, alguns investigadores sugerem que devem ser os valores

das intensidades dos campos eléctricos internos a utilizar como factor restritivo

em futuras regulamentações a elaborar.

Note-se que os campos eléctricos internos, sejam estacionários ou variáveis no

tempo, originam a circulação de correntes nos tecidos, enquanto que, com a

exposição a campos magnéticos têm-se duas situações distintas: se os

campos forem estacionários, não haverá correntes induzidas, contudo se os

campos forem variáveis no tempo, então existirão essas correntes. Adicio-

nalmente, quer os campos eléctricos quer os campos magnéticos, sejam eles

estacionários ou variáveis no tempo, interagem directamente com os sistemas

eléctricos biológicos, como sucede com o cérebro, o coração, o sistema

nervoso, e os músculos.

Um aspecto interessante e actual, que tem vindo a atrair a atenção do público e

dos meios de comunicação social, diz respeito à exposição a linhas aéreas de

transporte de energia eléctrica, com a especulação habitual criada e

alimentada por quem desconhece inteiramente toda a problemática científica

da interacção entre campos eléctricos e magnéticos e os tecidos biológicos.

Como tal, no sentido de desmistificar todas as situações criadas, sem colocar

em causa os potenciais riscos inerentes à exposição a campos electro-

magnéticos, apresentam-se seguidamente alguns factos concretos:

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115

• A intensidade dos campos eléctricos internos é extremamente mais

reduzida, na ordem de 3 x 10-8 como se demonstrou nos nossos dois

livros anteriores, em relação à intensidade dos campos eléctricos

gerados directamente pelas linhas, daí que a sua influência, a curtas

distâncias das linhas, se possa considerar praticamente nula.

• Na vizinhança muito próxima das linhas, a densidade de fluxo pode

atingir 10 μT para linhas de 380 kV e 30 μT para linhas de 765 kV, e 40

μT junto a subestações e centrais eléctricas. Em termos comparativos, é

possível encontrar valores da ordem de 130000 μT em locais ocupa-

cionais, e 60 μT nos assentos de carruagens em comboios eléctricos.

• É possível encontrar densidades de fluxo de 24 μT em ROW de linhas

aéreas, e valores bastante mais elevados, superiores a 100 μT, nos

corredores situados no solo imediatamente acima de cabos enterrados.

• Todavia, como a propagação das ondas electromagnéticas é bastante

mais atenuada através do solo, a 30 m de linhas aéreas de alta tensão

podem-se encontrar valores de 4 μT, e de 1 μT ou menos de cabos

subterrâneos.

• Apesar dos cabos representarem-se um risco potencial muito inferior ao

das linhas aéreas, em zonas um pouco afastadas, não representa uma

boa solução alternativa. Ou seja, atendendo à diferença de custos – 2:1

a 11 kV e 20:1 ou mais para 400 kV – é preferível escolher convenien-

temente o traçado das linhas aéreas.

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116

CAPÍTULO 3. RADIAÇÃO DE RÁDIO-FREQUÊNCIA

3.1. FONTES DE RADIAÇÃO DE RÁDIO-FREQUÊNCIA 3.1.1. Definições e Conceitos A rádio teve início, em termos práticos, em 1909, quando o físico e empresário

italiano Guglielmo Marconi (1874-1937) deu utilização às invenções e inova-

ções dos seus predecessores, Heinrich Hertz e Nikola Tesla, ao enviar o

primeiro sinal sem fios através do Atlântico Norte, entre Poldhu (Cornualha,

Reino Unido) e St. John, na Terra Nova, Canadá.

Desde então, a rádio, como passou a ser conhecida a telegrafia sem fios,

tornou-se uma componente essencial da vida quotidiana, representando um

dos maiores negócios da actual economia global, como se pode constatar com

a dramática expansão dos telefones celulares.

O termo rádio-frequência (RF) refere-se a uma corrente alternada que, se for

fornecida por uma antena, gera campos electromagnéticos, campos esses

adequados para serem utilizados em comunicações sem fios, rádio, televisão,

e outras aplicações industriais, científicas e médicas. A rádio-frequência cobre

uma zona muito importante e significativa do espectro de radiação electro-

magnética, estendendo-se de poucos kilohertzs, dentro da gama de audição

humana, até aos milhares de gigahertz.

De acordo com a definição do Institute of Electrical and Electronic Engineers

(IEEE), a radiação de rádio-frequência (na terminologia normalizada anglo-

-saxónica, radio frequency radiation RFR) é uma banda do espectro

electromagnético que abrange uma gama de frequências entre 3 kHz e 300

GHz. Por outro lado, a radiação de microondas (microwave MW) é usualmente

considerada como um subconjunto da RFR, apesar de, em definições

alternativas, se considerar a RF e as MW como duas regiões espectrais

separadas. Note-se que as microondas ocupam a região espectral entre 300

GHz e 300 MHz, enquanto que a rádio-frequência se estende entre 300 MHz e

3 kHz. Atendendo a que possuem características similares, a RF e as MW

serão designadas apenas como sendo a RFR, ao longo deste capítulo.

No quadro 3.1 expõem-se as aplicações e as gamas de frequências da RFR.

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117

Aplicações Gama de frequências

Radiação de rádio-frequência RFR 3 kHz – 300 GHz

Gerais

Rádio AM (modulação de amplitude) 535 – 1705 kHz

Rádio FM (modulação de frequência) 88 – 108 MHz

Canais de TV 54 – 88 / 174 – 220 MHz

Televisão UHF 470 – 806 MHz

Pagers comerciais 35, 43, 152, 158, 454, 931 MHz

Rádio-amadorismo 10,1 – 10,15 / 14 – 14,35 / 18,068 – 18,168 / 21,0 – 21,45/ 24,89 – 24,99 / 28,0 – 29,7 MHz

Sistemas celulares

NMT 450 453 – 457,5 / 463 – 467,5 MHz

NMT 900 890 – 915 / 935 – 960 MHz

AMPS 825 – 845 / 870 – 890 MHz

TACS 890 – 915 / 935 – 960 MHz

ETACS 872 – 905 / 917 – 950 MHz

GSM 900 890 – 915 / 935 – 960 MHz

DCS 1800 1710 – 1785 / 1805 – 1880 MHz

Sistemas sem fios (rede telefónica fixa)

CT-2 864 – 868 MHz

DECT 1880 – 1900 MHz

PHS 1895 – 1918 MHz

PACS 1910 – 1930 MHz

PCS 1850 – 1990 MHz

Industriais, científicas, e médicas

ISM 433, 915, 2450 MHz

Aquecimento por RF 13,56; 27,12; 40,68; 100 MHz

Fornos microondas 2450 MHz

Quadro 3.1 – Aplicações e gamas de frequências da RFR.

A RFR é descrita como sendo uma série de ondas de energia electromagnética

constituídas por campos eléctricos e magnéticos oscilatórios, que se propagam

através do espaço à velocidade da luz c = 3 x 108 m/s, e que não carecem de

um meio material para que se verifique a transmissão. Note-se que a

velocidade de propagação destas ondas é atenuada em meios como o ar, a

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118

água, o vidro, e os tecidos biológicos, e radiam a partir da sua fonte de

transmissão em “pacotes” de energia que combinam as características de

ondas e de partículas. Por outro lado, são reflectidas, refractadas ou

absorvidas pelos seus receptores ou por qualquer outro objecto que se

encontre na sua trajectória.

As aplicações da energia de rádio-frequência RF incluem os seguintes campos

de aplicação e equipamentos:

• Estações de rádio e televisão.

• Comunicações via rádio em microondas ponto-a-ponto, comunicações

móveis de rádio (walky talks) e celulares, pagers, comunicações rádio

navios-terra.

• Rádio amadorismo, e rádio na banda do cidadão.

• Navegação aérea e marítima, e radar – militar e civil para vigilância e

indicação de rotas, controlo do espaço aéreo, controlo do tráfego

rodoviário, vigilância meteorológica e predição do clima.

• Processamento e confecção culinária, fornos de RF, soldadura a alta

frequência, equipamentos de secagem a microondas, fornos micro-

ondas.

• Amplificadores de potência utilizados em compatibilidade electroma-

gnética e em metrologia.

Saliente-se que os consumidores utilizam muitos dos equipamentos e aplica-

ções discriminadas, mais ou menos consoante o seu bem-estar pessoal, social

e económico, contudo a questão dos riscos inerentes à exposição a radiações

de rádio-frequência, como sucede de maneira similar com os riscos associados

à exposição a campos eléctricos e magnéticos de frequência reduzidíssima,

como se analisou pormenorizadamente no capítulo anterior, é um assunto de

extrema importância, que diz respeito a todos, indiferenciadamente.

3.1.2. Elementos de um Sistema de RFR A radiação de rádio-frequência RFR é emitida a partir de três elementos

básicos, de qualquer sistema sem fios – gerador, trajecto da transmissão, e

antena –, como se esquematiza na figura 3.1.

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Figura 3.1 – Elementos básicos de um sistema de transmissão sem fios.

a) Geradores Estes geradores, também designados por fontes de RF, convertem potência

eléctrica em radiação, utilizando determinadas tecnologias tais como os oscila-

dores ou os magnetrões. As necessidades de radiação do sistema determinam

o tipo de gerador ou fonte, sendo a potência de saída, o rendimento, a

dimensão, a largura de banda, a frequência, e a técnica de modulação os

parâmetros mais importantes de dimensionamento.

O oscilador representa a fonte mais básica de RF, e consiste num circuito

ressonante usualmente equipado com andares de amplificação e circuitos de

retroacção. Operam pelo princípio da modulação da velocidade e da corrente, e

o seu princípio de funcionamento consiste na injecção de uma corrente de

electrões num tubo de vácuo para, de uma forma alternada, acelerarem ou

retardarem essa corrente de electrões, consoante a frequência de saída

desejada.

Quanto ao magnetrão, é um gerador de pequena dimensão que comporta um

tubo de vácuo e cavidades de ressonância. Não requer um oscilador, e os

electrões deslocam-se do cátodo para o ânodo, através dessas cavidades,

induzindo correntes com as frequências pretendidas para a radiação.

b) Linhas de Transmissão O objectivo destas linhas consiste em guiar a energia, através das ondas ele-

ctromagnéticas geradas na fonte, até às antenas de recepção e de propa-

gação. Essa transmissão é conseguida através dos seguintes meios:

• Linhas com Dois Condutores. Estas linhas, constituídas por dois com-

dutores com a mesma secção, instalados no mesmo cabo, são uma das

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120

tecnologias mais antigas utilizadas em canais de comunicação, sendo

essencialmente aplicadas em redes telefónicas que operam em

frequências que não ultrapassam 100 MHz. Atendendo a que existe uma

ligação indutiva e capacitiva entre os vários condutores do mesmo cabo,

em termos de cálculo e análise, estas linhas são caracterizadas, como

se esquematiza na figura 3.2, através dos seus parâmetros distribuídos

R – resistência por unidade de comprimento, L – indutância por unidade

de comprimento, G – condutância por unidade de comprimento, e C –

capacidade por unidade de comprimento. Quanto mais próximos

estiverem os cabos entre si, mais elevadas serão aquelas ligações

indutivas e capacitivas, tendo como consequência o aparecimento de

conversações telefónicas cruzadas. Saliente-se que ambos os condu-

tores são entrançados, com o duplo objectivo de diminuir a emissão de

campos electromagnéticos, assim como de atenuar as interferências por

parte de campos eléctricos e magnéticos exteriores.

Figura 3.2 – Linha de transmissão com dois condutores,

e parâmetros distribuídos.

• Cabos Coaxiais. Estes cabos representam o modo mais comum para

as linhas de transmissão de alta frequência. Os dois condutores neces-

sários para a transmissão da energia são, respectivamente, o condutor

central e a baínha metálica condutora, estando isolados entre si através

de um material dieléctrico, normalmente o polietileno, como se mostra

esquematicamente na figura 3.3. Estes cabos são adequados para

transmissões de longa distância com um número elevado de dados, e

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121

apresentam uma baixa atenuação dos sinais e uma elevada imunidade

às interferências exteriores de campos eléctricos e magnéticos.

Figura 3.3 – Constituição de um cabo coaxial de transmissão de dados.

• Guias de Onda. Estes componentes metálicos, normalmente ocos,

como se mostra na figura 3.4, podem apresentar formas rectangulares

ou tubulares, sendo utilizados para a transferência de sinais de frequên-

cias muito elevadas, superiores a 2 GHz. Estes guias de onda

apresentam perdas muito reduzidas, o que significa que as ondas ao

percorrê-los não apresentam praticamente atenuação. Além disso,

podem ser agrupados em pares, sem que percam contacto com as res-

pectivas ondas, e sem gerarem reflexões.

Figura 3.4 – Guias de onda, de forma rectangular (a),

e de forma tubular (b).

c) Antenas Como se viu anteriormente, a antena é o último componente de um sistema de

transmissão sem fios, sendo uma estrutura que tem como funções assegurar a

transição de uma onda electromagnética guiada, proveniente de uma linha de

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122

transmissão, para uma onda electromagnética que se irá propagar no espaço,

podendo igualmente ser utilizadas como transdutores de sinal de linhas de

transmissão, para o meio envolvente. As antenas são equipamentos

recíprocos, isto é, funcionam nos dois sentidos, como emissores ou como

receptores: Como emissores, radiam as ondas electromagnéticas para o

espaço, e como receptores, fazem a recepção dessa radiação, encaminhando-

-a para transdutores e cabos de transmissão.

A selecção e o projecto de uma antena são directamente influenciados por

parâmetros como a dimensão, a gama de frequências, a potência de saída, a

directividade, o ganho, a técnica de propagação, a polarização, e a impedância

eléctrica, justificando-se a existência de uma larga gama de tipos de antenas.

Adicionalmente, as propriedades das antenas, que se discriminam seguida-

mente, são o aspecto mais importante associado à avaliação dos riscos da

radiação:

• Bel. É um termo utilizado para a medição do som, tendo em atenção

que o ouvido humano tem uma resposta logarítmica. Define-se como

sendo a razão entre a potência de saída Po e a potência de entrada Pi.

• Decibel. Com a finalidade de se trabalhar com a banda larguíssima de

frequências em telecomunicações, é conveniente utilizar-se uma escala

logarítmica, de base 10, para se comparar os níveis da potência de

saída, multiplicando-se ainda o resultado por 10, sendo a unidade o

decibel (dB). Por exemplo, o ganho de um amplificador é determinado

através da seguinte expressão:

dBlog10 ⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛=

i

oPP

G

• Directividade. É a capacidade da antena em concentrar a radiação na

direcção pretendida. Numericamente, é calculada como sendo a razão

entre a intensidade da radiação numa determinada direcção a partir da

antena, e a intensidade média da radiação em todas as direcções.

• Ganho. Representa o parâmetro mais importante no projecto e no

desempenho da antena, sendo definido como o produto do rendimento

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123

da antena pela sua directividade. É calculado através da seguinte

expressão, sendo Ae a área efectiva de abertura da antena (m2), e λ o

comprimento de onda da radiação (m):

24λπ eA

G=

• Polarização. A polarização de uma onda electromagnética representa a

orientação das linhas de força do vector campo eléctrico relativamente à

superfície da Terra, existindo dois tipos básicos de polarização: Linear

(vertical e horizontal), e elíptica (normalmente circular).

• Zona de proximidade do campo. É a região que se encontra muito

próxima da antena, e na qual os campos eléctrico e magnético não

exibem uma relação entre si de onda plana (perpendicularidade entre os

respectivos vectores), e a potência radiada por unidade de área não

diminui com o quadrado da distância à fonte, mas varia considera-

velmente de ponto para ponto.

• Zona de afastamento do campo. É a região que se encontra de tal

modo afastada da antena, onde a potência radiada por unidade de área

diminui com o quadrado da distância à fonte. A energia radiada é

armazenada alternadamente nos campos eléctrico e magnético da onda

electromagnética em propagação. Quanto aos vectores campo eléctrico

e campo magnético, são perpendiculares entre si e perpendiculares, por

sua vez, ao vector de Poynting, que tem a direcção e o sentido da onda

em propagação.

A distância RNF (m) entre a antena e a denominada zona de afastamento

do campo (zona longe do campo), é calculada através da seguinte

expressão:

λ

22 DRNF =

sendo D a maior das distâncias à estrutura radiante (m), e λ o compri-

mento de onda da radiação (m).

Na prática, quando se efectuam estudos de caracterização de riscos de

exposição às radiações, essa zona de afastamento do campo é marcada

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124

com uma distância 75 % mais curta, daí que se utilize na sua determi-

nação a seguinte expressão, adaptada da anterior:

λ

25,0 DRNF =

Como se salientou anteriormente, existem diversos tipos de antenas, como se

mostra na figura 3.5, utilizadas em transmissões de rádio e TV, sistemas de

radar, comunicações de rádio, comunicações celulares, e muitas outras

aplicações.

Figura 3.5 – Tipos de antenas de comunicações.

• Antena isotrópica (isotropic antenna). É uma antena hipotética que

radia potência igualmente em todas as direcções, sendo utilizada como

uma referência de base no estudo da radiação das antenas reais.

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125

• Antena em fio (wire antenna). Como é do conhecimento geral, um

simples fio metálico comporta-se como sendo uma antena, não tendo

necessariamente que ser rectilíneo. Estas antenas são projectadas para

operarem a frequências entre 2 MHz e 30 MHz, sendo o seu compri-

mento tanto maior quanto mais baixa for a frequência.

• Antena de meia-onda (half-wave antenna). É uma antena cujo compri-

mento eléctrico é igual a metade do comprimento de onda do sinal de

rádio.

• Antena de cabo (line antenna). É constituída por um simples cabo,

como sucede por exemplo nos navios, em que se encontrava estendida

entre as extremidades dos dois mastros. A velocidade de onda é muito

próxima da velocidade no vácuo, daí serem utilizadas para a transfe-

rência directa da radiação para o vácuo.

• Antena circular (loop antenna). É utilizada na transmissão de rádio AM

na banda das ondas longas, e são bastante direccionais podendo ser

dimensionada com mais de uma espira.

• Antena log-periódica (log-periodic antenna). É uma antena de banda

larga, constituída por dipolos de comprimento sucessivamente decres-

cente, e ligados em paralelo ao longo da fonte.

• Antena parabólica (dish antenna). Estas antenas são utilizadas para a

recepção e transmissão de ondas de rádio para satélites e estações

terrestres, recebendo as ondas e focalizando-as através da superfície

parabólica do reflector, para um transdutor, que conduzirá o sinal

através de uma linha de transmissão com fios. É o caso, por exemplo,

das antenas domésticas e industriais de recepção de sinais de televisão.

• Antena micro-pastilha (microstrip antenna). É uma antena tipo micro-

ship, de baixo perfil, em que uma área de material condutor é depositada

sobre um dieléctrico de pequena espessura, sendo utilizada em aplica-

ções de microondas, daí as suas reduzidíssimas dimensões.

• Antena helicoidal (helical antenna). É, basicamente, constituída por

um fio metálico enrolado sob a forma de hélice, sendo utilizadas numa

banda larga de frequências. Podem facilmente gerar ondas polarizadas

circulares.

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126

• Antena com orifício (slot antenna). É um elemento radiante (orifício),

criado por uma cava numa superfície condutora ou numa parede de um

guia de onda.

• Antena de painel (panel antenna). Esta antena, também denominada

de antena direccional, é uma antena ou um conjunto de antenas, de

forma rectangular e de espessura reduzida, projectadas para concentrar

a radiação numa determinada área. É utilizada em estações celulares

em cidades e em áreas suburbanas onde seja necessária uma grande

capacidade de resposta para elevadas concentrações populacionais.

• Antena Yagi-Uda (Yagi-Uda antenna). É uma das mais familiares

antenas, uma vez que é comummente utilizada na recepção de sinais de

televisão, representando uma matriz passiva, com um único elemento

principal que conduz a energia para os restantes elementos, parasitas.

• Matriz de antenas (antenna array). É constituída por um conjunto de

antenas, que, no seu todo, se comportam como uma só. Cada matriz

activa tem os seus elementos individuais alimentados pelas suas

próprias fontes, enquanto que as matrizes passivas possuem um

elemento principal que tem como função conduzir a energia radiante

para os elementos parasitas.

• Matriz de antenas direccionais (phased array antenna). É um

conjunto de antenas, semelhante ao anterior, mas em que os seus ele-

mentos podem ser electronicamente orientados, mantendo-se contudo

estática a estrutura da antena, com a finalidade de orientar a emissão de

ondas.

3.1.3. Transmissores de Rádio e Televisão As estações de rádio (telefonia) e de televisão transmitem os seus sinais

através de antenas de AM e de FM, podendo a gravidade desses sinais no que

respeita à exposição a que se encontram sujeitos quer trabalhadores quer o

público em geral, ser avaliada através das respectivas frequências da radiação

– 535 kHz a 1705 kHz para as transmissões de rádio em AM, e 2 MHz a 806

MHz para rádio em FM e para televisão em VHF (Very High Frequency) e UHF

(Ultra High Frequency).

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a) Estações de Rádio AM A modulação de amplitude constitui um processo simples e efectivo de trans-

mitir informação, e opera numa frequência específica, não havendo alterações

de potência do sinal transmitido. Um aspecto importante que interessa realçar

relativamente à existência de antenas de rádio de altas frequências, consiste

na existência de campos eléctricos polarizados com uma direcção vertical,

através da matriz de antenas, de dimensão considerável e com polarização

horizontal. Esses campos eléctricos polarizados verticalmente são devidos à

elevada diferença de potencial eléctrico de RF entre os elementos das antenas

e o solo, podendo induzir correntes de elevada intensidade no corpo de

pessoas que se encontrem muito próximas das antenas. Em alguns casos,

essas correntes induzidas poderão exceder os limites máximos de exposição

aconselháveis, muito antes dos campos eléctricos e magnéticos excederem os

seus correspondentes limites de exposição.

b) Estações de Rádio FM O conceito de frequência modulada foi introduzido como uma alternativa ao

sistema AM, em 1931, e consiste em “super-impor” um sinal inteligente de

áudio ou de vídeo sobre uma alta frequência. O sinal parte assim do seu valor

de referência, com um montante proporcional à amplitude do sinal inteligente.

As estações de rádio FM transmitem na banda de 88 MHz a 108 MHz,

consistindo as antenas numa matriz de elementos, por vezes em grande

número, instalados lateralmente nas respectivas torres, sendo o afastamento

entre os elementos de cerca de um comprimento de onda, isto é, de cerca de 3

metros. Estas antenas são omnidireccionais, produzindo assim um espectro de

cobertura com forma circular.

c) Estações de Televisão FM Os canais de televisão em FM operam nas bandas 54 – 88 / 174 – 220 MHz

em VHF, e na banda 470 – 806 MHz em UHF, consistindo as antenas numa

matriz de elementos radiantes instalados numa torre. Quando comparadas com

as antenas FM, os elementos são mais complexos de projectar e radiam

menos energia para o solo, sendo as torres bastante mais altas que as

utilizadas na transmissão de rádio em FM.

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3.1.4. Sistemas de Radar O termo radar é um acrónimo, utilizado pela marinha dos Estados Unidos

(United States Navy) em 1942, e significa radio detecting and raging, tendo sido

desenvolvido para fins militares em 1940. Após a segunda guerra mundial,

além das finalidades militares, este sistema passou também a ser utilizado para

fins civis, como por exemplo na navegação aérea, marítima e ferroviária

(comboios de grande velocidade TGV e ICE), em meteorologia, e no controlo

do tráfego rodoviário.

Basicamente, o radar emite sinais de RFR, através de uma antena rotativa de

forma a varrer todas as direcções, sinais esses que são constituídos por cerca

de 1500 impulsos por segundo de elevada potência, tendo cada impulso uma

duração entre 10 μs e 50 μs. Estes sinais são, por sua vez, reflectidos por um

objecto ou por uma superfície, sendo captados pela mesma antena, o que

permite determinar a distância a que os objectos se encontram. Ou seja, a

antena emite e recebe sinais alternadamente, com comprimentos de onda

entre 1 cm e 1 m, aos quais correspondem respectivamente as frequências de

300 MHz e 30 GHz.

a) Radares Estacionários Estes radares são fontes estacionárias de RFR, utilizadas para controlar,

assistir ou fornecer informações relativas a tráfego em terra, no mar e no ar,

como por exemplo os radares de controlo da navegação aérea, os radares de

controlo do espaço aéreo, os radares de profundidade, os sistemas de aterra-

gem de aeronaves por instrumentos, os radares de previsão meteorológica, e

os radares utilizados em investigação científica, sendo de realçar que todas

estas instalações se encontram montadas em terra ou ao longo da costa.

Como se mostra na figura 3.6, uma matriz de antenas direccionais de um

sistema de radar multifunções emite electronicamente vários feixes de ondas,

com funções diferenciadas. A intensidade da radiação depende de diversos

factores, como sejam a frequência da radiação, as características da fonte, a

potência a transmitir, a largura dos impulsos, a taxa de repetição, e a distância

da fonte. Saliente-se que os trabalhadores dos aeroportos incorrem amiuda-

damente no risco de sobre-exposição a radiações de RFR, se permanecerem

demasiado tempo próximo das instalações de radar, o mesmo sucedendo com

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passageiros frequentes, que são obrigados a permanecer também durante

bastante tempo nos aeroportos.

Figura 3.6 – Sistema de radar fixo, multifunções.

b) Radares de Controlo do Tráfego Actualmente, a utilização do radar por parte das autoridades policiais no

controlo do volume de tráfego rodoviário bem como das velocidades

praticadas, tornou-se usual e massificada, situação que teve o seu início

apenas a partir de 1970.

Os primeiros radares, em 1970, operavam com uma frequência de 10,525 GHz,

ou seja, na banda dos raios X e, em 1975, foi introduzida a segunda geração, a

operar a 24,15 GHz, tendo a terceira geração entrado em funcionamento na

década de 1990, utilizando a gama entre 33,7 GHz e 36 GHz.

Estes radares transmitem um sinal de baixa potência, de uma forma contínua,

detectam uma parte da energia reflectida por um objecto em movimento, por

exemplo a matrícula de uma viatura, e comparam a frequência do sinal

recebido com a frequência do sinal transmitido. A diferença entre essas

frequências é directamente proporcional à velocidade do veículo relativamente

à unidade de radar – efeito Doppler. Comparativamente com outros tipos de

radares estacionários, o nível de potência dos radares de controlo de tráfego é

muito reduzida, sendo igualmente mais baixa quando comparada com outras

fontes emissoras de RF, utilizadas muito próximo de pessoas, tais como os

telefones celulares.

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Os radares de tráfego podem ser estacionários ou móveis. Em relação aos

primeiros, são utilizados por um agente colocado numa posição fixa, enquanto

que os segundos (figura 3.7) são instalados numa viatura de patrulha em

movimento, podendo suceder duas situações opostas: Quando se controlam

viaturas que circulam em sentido contrário, as duas velocidades são somadas,

sendo a velocidade da viatura controlada obtida por subtracção da velocidade

do carro patrulha. Por outro lado, quando as duas viaturas circulam no mesmo

sentido, a velocidade da viatura é igual à subtracção entre as duas

velocidades.

Figura 3.7 – Radar móvel de controlo do tráfego.

Os níveis da radiação emitida por estes tipos de radares são inferiores aos

limites considerados de segurança, a alguns metros de distância da antena.

Todavia, no caso dos radares estacionários, o nível de radiação poderá ultra-

passar os limites de segurança na vizinhança da antena.

3.1.5. Estações Terrestres de Rastreio de Satélites Os satélites de comunicações em órbita terrestre têm como funções assegurar

as comunicações telefónicas globais, contribuir para a previsões meteoro-

lógicas através da recolha de imagens da evolução de fenómenos atmos-

féricos, recolher imagens da terra para se avaliar de situações de atentados

ambientais, assegurar transmissões televisivas, e servir de plataforma para o

sistema de posicionamento global (global positioning system GPS).

Quanto às estações de rastreio terrestres, do interesse público no que respeita

às emissões de radiação RFR, consistem em antenas parabólicas de grande

dimensão, utilizadas para transmitir ou receber sinais via satélite, figura 3.8.

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Figura 3.8 – Sistema de comunicações por satélite.

Devido às grandes distâncias envolvidas, por exemplo 36000 km para os saté-

lites geoestacionários, os níveis de potência necessários para a transmissão

dos sinais são relativamente mais elevados quando comparados com outros

sistemas de transmissão terrestres. Uma vez que o diâmetro dos feixes

hertzianos é muito reduzido e como estes feixes são altamente direccionais, é

praticamente impossível alguém do grande público ficar exposto a essa

radiação.

Quanto à radiação ao nível do solo, depende do ângulo de inclinação da

antena, do seu formato, e da intensidade do sinal, podendo os trabalhadores

que tenham que estar presentes junto às antenas, temporariamente para inter-

venções de manutenção, poderão ser sujeitos a elevados níveis de radiação,

caso não sejam tomadas as devidas precauções. Por outro lado, algumas

antenas são apenas utilizadas como receptores de informação, como sucede

com as antenas domésticas de TV, e que não constituem qualquer risco para o

público.

3.1.6. Comunicações por Microondas Estas comunicações, ponto-por-ponto, permitem ligar com elevada eficiência,

via rádio, locais muito próximos, sem obstrução. As antenas de microondas

transmitem e recebem sinais de muito baixa potência através de curtas

distâncias, como se mostra na figura 3.9. Estas antenas são usualmente

rectangulares ou circulares, tendo uma grande variedade de aplicações, como

sejam a transmissão de mensagens via telefone ou telégrafo, e a ligação entre

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estúdios de rádio e de TV por cabo com as respectivas antenas de trans-

missão. Além da sua reduzida energia, atendendo ainda a que os feixes são

alinhados com grande precisão e que a dispersão é mínima ou insignificante,

não é expectável a existência de riscos para a saúde humana.

Figura 3.9 – Sistema de transmissão de microondas.

3.1.7. Equipamento Móvel de Rádio Este sistema móvel representa a forma mais antiga de comunicação sem fios,

tendo tido o seu início em 1921 nos Estados Unidos, operando a uma fre-

quência de 2 MHz. Permite a comunicação de pessoas entre si ou de pessoas

com uma central fixa, como sucede por exemplo com os serviços de

bombeiros, com as forças de segurança, com o pessoal dos aeroportos, com

as empresas de segurança, com os serviços de transportes, ou mesmo dentro

de empresas para que os trabalhadores de diversos sectores de actividade,

dependentes uns dos outros, possam comunicar entre si. Cite-se o caso de

uma unidade de manutenção de material circulante ferroviário, em que, com

grande frequência, as equipas que se encontram no parque de material

necessitam comunicar com os serviços que se encontram no interior do

edifício, bem como com outras brigadas em serviço.

Estes sistemas utilizam a polarização vertical, daí que as antenas utilizadas

sejam verticais, quer estejam instaladas em locais fixos ou em viaturas, tendo

estas últimas um comprimento que depende do comprimento de onda. Por

outro lado, os veículos representam um bom elemento de recepção, sendo no

entanto aconselhável instalar as antenas no centro do tejadilho, sempre que

possível, para se dispor de uma larga superfície metálica.

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3.1.8. Comunicações Celulares a) Generalidades O cenário celular é radicalmente diferente das comunicações móveis de rádio,

na medida em que é um tipo de transmissão, analógica ou digital, de banda

limitada, no qual um assinante dispõe de uma ligação sem fios, de um telefone

celular até uma estação de base relativamente próxima.

O primeiro sistema celular, que deu origem à primeira geração, surgiu em

1971, por iniciativa da empresa de telecomunicações americana AT&T Bell

Laboratories, com a designação de Advanced Mobile Phone System AMPS,

tendo o grande desenvolvimento começado na década de 1980, representando

actualmente as comunicações celulares o sector das telecomunicações em

mais rápida expansão, com uma taxa de crescimento de 40-50 % por ano, tudo

indiciando que serão, num futuro muito próximo, o meio preferido de

telecomunicação. O sistema AMPS foi instalado na América do Norte,

Austrália, e em alguns países da Ásia. Seguiram-se outros sistemas de

primeira geração, analógicos, como o NMT-450 e o NMT-900, na Escandinávia,

na restante Europa, e em partes da Ásia; o C-Netz na Alemanha, Áustria,

Portugal e África do Sul; o RC2000 em França; o TACS e o ETACS no Reino

Unido, na Irlanda, e em partes da Ásia; o RTMS em Itália; e o MCSL1 e o

JTACS no Japão.

Na década de 1990 surgem os sistemas celulares digitais, oferecendo um largo

número de serviços de valor acrescentado, como sucedeu com o Global

System for Mobile Communication GPS, tendo-se registado uma expansão

significativa no número de subscritores.

Presentemente, a normalização faz parte dos sistemas celulares de terceira

geração, sendo promovida pelo European Telecommunication Standardization

Institute ETSI, através de um projecto designado por Universal Mobile

Telecommunication System UMTS, e com a participação da International

Telecommunication Union ITU, onde é designado por IMT2000, tendo este

sistema sido adoptado já na década de 2000, sendo as bandas de frequência

1920-1980 MHz e 2110-2170 MHz. Esta terceira geração caracteriza-se por

apresentar uma plataforma com uma oferta variada de outros serviços

integrados, como a Internet sem fios, a transmissão de dados, o acesso à

informação noticiosa, e a captação de imagens fixas e em movimento.

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Como se esquematiza na figura 3.10, espera-se que, a partir de 2010, sejam

apresentados os sistemas da quarta geração e, a partir de 2020, os da quinta

geração. Saliente-se que os telefones sem fios (cordless phones), isto é, os

terminais que circulam livremente nas residências ou em escritórios e serviços

públicos, não devem ser considerados, no sentido estrito do termo, como

sendo um serviço, mas sim mais um produto de consumo, integrado na rede

telefónica fixa.

Figura 3. 10 – Evolução das comunicações celulares.

Por sua vez, na figura 3.11 mostra-se a estrutura de um sistema celular de

comunicações.

Figura 3.11 – Sistema celular de comunicações típico.

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A associação entre o equipamento electrónico e as respectivas antenas de

comunicações celulares, é comummente referida com Base Transceiver Station

BTS, tendo cada BTS um conjunto de antenas emissoras e receptoras. As

estruturas BTS possuem uma altura compreendida entre 10 m e 75 m, e

utilizam antenas omnidireccionais. A potência radiada efectiva (effective

radiated power ERP) de um sistema celular depende do número de canais

autorizados, sendo o seu valor, em zonas urbanas, de 100 W por canal,

potência esta à qual corresponde um verdadeiro valor de potência radiada

(actual radiated power) de 5 a 10 W.

Por outro lado, existem ainda as estações móveis e portáteis, que incluem os

aparatos utilizados em comunicações sem fios, em comunicações celulares, e

nos serviços de comunicação por satélite. Uma estação móvel é definida como

sendo um equipamento de transmissão/recepção, utilizado numa posição não

fixa, como é o caso dos telefones celulares, dos veículos com antenas

instaladas, e dos sistemas de computadores pessoais sem fios. Por outro lado,

uma estação portátil é definida como sendo um equipamento utilizado com a

sua estrutura radiante em contacto directo com o corpo humano, como é o

caso dos sistemas celulares de mãos livres, dos auriculares, e dos sistemas

telefónicos dos computadores pessoais. Quanto à potência máxima de RF

destas estações, os seus valores são de 0,8 W, 2 W e 5 W para os sistemas

celulares de mãos livres, e de 8 W e 20 W para as estações portáteis e para os

sistemas instalados em veículos.

b) Tecnologias Celulares Os telefones celulares transmitem sinais analógicos – os da primeira geração,

já retirados –, ou sinais digitais, tendo os sinais analógicos uma natureza

contínua, enquanto que os sinais digitais são discretos. As tecnologias que têm

vindo a ser utilizadas nas comunicações celulares são as seguintes:

• Frequency Division Multiple Acess FDMA. Consiste numa divisão da

banda de frequências utilizadas nas comunicações celulares, em vários

canais, cada um dos quais podendo assegurar uma conversação de voz,

ou então, no caso do serviço digital, transportar dados digitais. A FDMA

constitui a tecnologia básica dos sistemas celulares analógicos.

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• Time Division Multiple Acess TDMA. Foi utilizada pela primeira vez no

Japão em 1982, na medida em que permite a redução do custo das

estações de base, desde que existam bastantes utilizadores a partilhar o

mesmo transceiver. Esta tecnologia foi utilizada em todos os sistemas

de segunda geração, e, em 1987, a TDMA de banda estreita com 200

kHz foi escolhida como standard para o sistema GSM. Em 1989, foi

ainda seleccionada como a tecnologia digital standard para o sistema

AMPS, com uma largura de banda de 30 kHz.

• Code Division Multiple Acess CDMA. É uma alternativa às duas tecno-

logias anteriores, e utiliza todo o espectro da largura de banda, para

todos os utilizadores, ou seja, todas as transmissões partilham a mesma

largura de banda em simultâneo.

3.1.9. Comunicações Multimédia sem Fios Nos anos mais recentes, concentraram-se grandes esforços humanos e

materiais na investigação de sistemas sem fios, aptos a assegurar serviços

interactivos e de multimédia aos consumidores, de forma a poderem utilizá-los

onde quer que se encontrem, e em qualquer instante.

Os avanços nas redes de alta velocidade na transmissão de dados, nas

comunicações sem fios, na tecnologia dos circuitos integrados, e nas

aplicações de base multimédia, contribuíram decisivamente para a emergência

e consolidação dos sistemas de comunicações multimédia sem fios. Actual-

mente, os computadores portáteis permitem também a sua utilização como

ecrãs de cinema vídeo e de vídeo-telefone.

Um dos inconvenientes deste sistema encontra-se directamente relacionado

com os computadores portáteis, que funcionam como emissores/receptores de

informação, como é o caso da rede de Internet sem fios, devido à relativamente

reduzida autonomia das suas baterias (2 h a 4 h, dependendo do trabalho que

esteja a ser realizado).

Por outro lado, estas comunicações sem fios poderão representar algum risco

para os utilizadores, que se encontram expostos a radiação de RFR, devido à

sua utilização por longos períodos, risco esse acrescido ainda pelo facto do

aumento da exposição motivado pela posição dos portáteis muito próximo dos

órgãos genitais, como se mostra na figura 3.12.

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Figura 3.12 – Utilizador de sistema multimédia sem fios.

3.1.10. Fornos Microondas Estes fornos, inventados logo após o final da segunda guerra mundial, utilizam

directamente o princípio físico de que a energia de RF possui a aptidão para

penetrar profundamente, gerando calor quase instantaneamente, nos materiais

utilizados na alimentação humana. Na figura 3.13 esquematiza-se a consti-

tuição de um forno microondas, que contém essencialmente um magnetrão que

produz a energia em microondas, uma fonte de alimentação em corrente

contínua de alta tensão (transformador, rectificador, condensador), e um

sistema computorizado de controlo do funcionamento, sendo a energia dirigida

para os alimentos através de um guia de ondas.

Figura 3.13 – Configuração esquemática de um forno microondas.

A frequência de operação é de 2,45 GHz, escolhida pela sua capacidade de

penetração em toda a massa dos alimentos. Quanto à radiação, existem ondas

electromagnéticas geradas pelo magnetrão, e campos eléctricos e magnéticos

gerados pelo transformador. Contudo, para o exterior existe apenas a radiação

electromagnética emanada pelo magnetrão através do ecrã da porta, e os

campos magnéticos gerados pelo transformador.

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3.2. ESTUDOS HUMANOS E EPIDEMIOLÓGICOS 3.2.1. Generalidades Assiste-se presentemente, na opinião pública e nos meios de comunicação

social, a uma abordagem crescente no que respeita à discussão sobre os

potenciais riscos inerentes aos efeitos da radiação RFR, emanada de equipa-

mentos sem fios em geral, e de telefones celulares em particular, devido aos

riscos da absorção de energia pelo cérebro e outras partes do corpo humano.

No subcapítulo anterior, citaram-se os resultados de diversos estudos cien-

tíficos, obtidos através de experimentação laboratorial. Todavia, essas investi-

gações deverão sempre ser complementadas recorrendo-se a estudos

epidemiológicos, como aliás se tem vindo a fazer, salientando-se neste sub-

capítulo alguns dos resultados mais significativos e importantes obtidos

recentemente.

Interessa ainda referir que tem havido alguns casos de justiça, essencialmente

nos Estados Unidos, onde se alega que o desenvolvimento de tumores cere-

brais é o resultado da utilização de telefones celulares, não se tendo provado

contudo qualquer associação do foro científico entre a exposição às radiações

e o aparecimento desses tumores, não passando esses casos de histórias

anedóticas e doentias.

3.2.2. Estudos Humanos a) Percepção Auditiva Acredita-se que, quando as pessoas se encontram expostas a radiação RF de

muito baixo nível de energia, com determinadas características de frequência e

de modulação, poderão ocorrer fenómenos de audição, como por exemplo

ouvirem-se zumbidos, estalidos, e sinos, variando em função da modulação da

radiação. Este fenómeno data já da altura da segunda guerra mundial, quando

os operadores de radar reportaram a audição de sons de microondas.

Têm sido vários os estudos desenvolvidos sobre esta interacção, que se pensa

ser um dos efeitos de campos de reduzida energia. Por outro lado, se bem que

se tenha aventado a hipótese da estimulação directa do sistema nervoso, a

alternativa consiste no facto da audição de radiação RF não ocorrer de uma

interacção da RFR com os nervos auditivos ou com os neurónios. Em lugar

disso, os impulsos de RF, após a sua absorção por parte dos tecidos macios

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do cérebro, geram uma onda termoelástica de pressão acústica que se desloca

por condução através dos ossos da cabeça até ao ouvido interno, activando os

receptores do caracol do ouvido pelo mesmo processo fisiológico da audição

normal.

No que respeita às microondas, a percepção auditiva representa um dos seus

efeitos de baixo nível, que é considerado como sendo um mecanismo térmico

em si, apesar do aumento de temperatura ser insignificante – no limiar da

audição daquelas ondas, o aumento de temperatura correspondente a cada

impulso das microondas situa-se no milionésimo do grau Celsius. De acordo

com dois trabalhos publicados respectivamente em 2003 e em 2007, desde

que o ruído induzido pelas microondas seja similar ao ruído muito ligeiro de

origem acústica, não existe qualquer efeito adverso para o sistema auditivo.

b) Actividade Cerebral O facto de se colocarem fontes emissoras de RF muito próximas do corpo

humano, como sucede com a utilização de telefones celulares, encostados à

cabeça, potencia as possibilidades de interferência com as actividades cere-

brais, como foi explicitado num trabalho publicado em 1998, que concluiu que a

exposição a campos de RF emitidos por telefones celulares alteram aspectos

distintos da resposta eléctrica do cérebro a estímulos acústicos.

Outro estudo, efectuado com um grupo de 36 voluntários humanos, reportou

que a exposição à radiação emitida por telefones celulares, a 915 MHz, pode

afectar as funções cognitivas, particularmente a redução dos tempos de

reacção, em 15 ms.

Um estudo realizado na Finlândia, numa população de 48 voluntários sem

problemas de saúde, expostos a uma radiação RFR de 902 MHz, emitida por

telefones celulares, permitiu constatar a existência de um efeito facilitante no

funcionamento do cérebro, especialmente em tarefas que requerem atenção e

manipulação de informação.

Um outro estudo, igualmente realizado na Finlândia, consistiu na análise quan-

titativa da actividade electroencefalográfica de 19 voluntários, 10 do sexo

masculino, com idades compreendidas entre os 28 e os 48 anos, e 9 do sexo

feminino, entre os 32 e os 57 anos, tendo as fontes de emissão sido cinco

telefones celulares diferentes, operando a frequências entre 900 MHz e 1800

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140

MHz. Como conclusão, não foram encontrados efeitos anormais na actividade

eléctrica cerebral.

Como curiosidade, em literatura técnica oriunda da ex-União Soviética e de

outros países do bloco socialista, dos anos 60 e 70 do século passado, são

descritos alguns sintomas associados à exposição a radiação RFR, tais como

dores de cabeça, fraqueza, distúrbios do sono, impotência sexual, alterações

cardiovasculares, e stress nervoso, sintomas esses designados por doenças

das microondas, e catalogados através de queixas apresentadas.

c) Sistema Cardiovascular Muitos dos estudos realizados mostram não existirem efeitos agudos, resul-

tantes da exposição a campos electromagnéticos de reduzidíssima frequência,

estacionários ou variáveis no tempo, em relação à tensão arterial, às pulsações

cardíacas, e à actividade eléctrica do coração, enquanto que outros detectaram

algumas anomalias no ritmo cardíaco.

Um estudo publicado em 1997 na prestigiada revista de medicina Lancet, que

utilizou uma amostra voluntária de sete homens e três mulheres, com idades

compreendidas entre 26 e 36 anos, investigou a influência da radiação RFR

emitida por telefones celulares GSM 900 MHz, sobre a pressão arterial e o

ritmo cardíaco. Com a finalidade de se ter evitado quaisquer alterações fisio-

lógicas extemporâneas, induzidas por stress psicológico quando do atendi-

mento de chamadas telefónicas, os telefones foram colocados no lado direito

da cabeça e activados por controlo remoto, de modo a que as pessoas desco-

nheciam se os telefones estariam ou não a emitir radiações. Como resultado,

foi noticiado ter havido um ligeiro aumento da tensão arterial entre 5 mm e 10

mm de Hg.

Contudo, um outro estudo publicado em 1998 não encontrou quaisquer efeitos

no controlo autónomo da pulsação cardíaca, por exposição a radiação RFR

emitida por telefones celulares durante o sono, em indivíduos saudáveis.

Num estudo clínico publicado em 2003, concluiu-se que os tecidos cardio-

vasculares não são directamente afectados, de forma adversa, na presença de

radiação electromagnética pouco significativa, e a regulação da tensão

sanguínea não é influenciada por radiação na banda UHF, para os níveis

usualmente encontrados nos equipamentos de comunicações celulares.

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141

Um outro estudo, publicado em 2007, observou a existência de uma interacção

relativamente fraca entre as taxas de variação de alguns parâmetros cardíacos

e a exposição a radiação de 900 MHz, em telefones celulares, na sua máxima

potência.

d) Sistema Imunitário Análises e exames realizados numa população de dezoito fisioterapeutas,

ordenados por sexo e idade, como sejam as contagens de leucócitos e

linfócitos, não conduziu a diferenças estatísticas significativas em relação a

pessoas não expostas, no que respeita a todos os parâmetros do sistema

imunitário, que se encontravam dentro dos valores considerados clinicamente

normais.

e) Melatonina De acordo com um estudo publicado em 1997, alguns utilizadores ocasionais e

frequentes de telefones celulares apresentavam níveis médios de melatonina

na urina inferiores aos níveis verificados em utilizadores esporádicos, que

utilizavam o telefone uma vez por semana ou ainda menos.

Um outro estudo, com o objectivo de analisar os efeitos da radiação RFR

gerada por telefones celulares, sobre a secreção rítmica de melatonina, utilizou

dois grupos de 38 voluntários do sexo masculino, sem problemas de saúde e

com idades compreendidas entre 20 e 32 anos. Os períodos de exposição

foram de 2 horas por dia, 5 dias por semana, durante 4 semanas, e com o nível

máximo de potência. As análises ao sangue realizadas antes, durante e após a

exposição não revelaram qualquer evidência entre a radiação de RF e

alterações na secreção de melatonina.

f) Cataratas A indução de cataratas tem sido um dos cavalos de batalha daqueles que

acreditam nos efeitos perigosos da radiação RFR sobre a saúde humana,

devido ao facto da córnea e do cristalino serem as partes do olho mais

expostas às radiações, com níveis elevados por causa não só da sua locali-

zação superficial mas também pelo facto do calor produzido pela energia das

ondas ser mais facilmente removido das outras partes do olho através da

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142

circulação sanguínea. A primeira vez que se reportou a indução de cataratas

provavelmente devidas à exposição a microondas, foi num trabalho científico

publicado em 1952. Todavia, num outro trabalho publicado em 1966, os seus

autores não encontraram diferenças na formação de cataratas entre veteranos

do exército e da força aérea americana.

Todavia, a exposição a RFR em níveis bastante superiores aos limites má-

ximos aconselháveis poderá originar o aparecimento de cataratas e, por outro

lado, a exposição a níveis inferiores ao nível cataratogénico poderá, por sua

vez, induzir outros efeitos não só nos olhos mas também na face.

3.2.3. Estudos Epidemiológicos a) Exposição Ocupacional Como é sabido, entende-se como ambientes ocupacionais todas as áreas e

recintos nos quais as pessoas se poderão encontrar expostas a radiações, por

motivos profissionais ou então por motivos ocasionais, encontrando-se apenas

de passagem. Seguidamente, apresentam-se alguns resultados considerados

significativos, agrupados por locais e profissões, obtidos a partir de estudos

epidemiológicos.

• Pessoal das Forças Armadas. Os operadores de radar acusaram a

existência de anomalias oculares assim como de elevação da

temperatura em tecidos, com fraca irrigação sanguínea. Um estudo

conduzido em 226 trabalhadores, divididos em grupos, do sector de

radares numa indústria aeronáutica, sujeitos a frequências de 2,88 GHz

e 9,375 GHz, e a densidades de potência compreendidas no intervalo de

39 mW/m2 a 131 mW/m2, detectou algumas anomalias oculares contudo

com ausência de riscos graves para a saúde.

No ano 2000, foram observados pelo Aerospace Medicine Directorate,

da United States Air Force Research Laboratory, 34 pacientes sujeitos a

radiação RFR superior aos níveis de exposição permitidos, tendo-se

concluído pela existência de uma associação positiva entre a sensação

de aquecimento e o aumento da densidade de potência, e de uma asso-

ciação negativa entre a destruição anormal, superficial, de tecidos e a

densidade de potência.

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143

• Radares de Controlo de Tráfego. Num estudo publicado em 1993,

foram reportados seis casos de cancros testiculares em agentes de

segurança da polícia, que utilizaram radares de controlo do tráfego entre

1979 e 1991, numa população de 340 agentes afectos a dois departa-

mentos de polícia situados em condados vizinhos na região norte-central

dos Estados Unidos. O seu tempo médio de serviço antes do dia-

gnóstico de cancro foi de 14,7 anos, a sua idade média era de 39 anos,

e todos eles tinham utilizado radares pelo menos durante 4,5 anos antes

do diagnóstico.

Um outro estudo, canadiano, apresentou os resultados obtidos no

rastreio de cancro num grupo de 22197 agentes policiais de 83

departamentos de polícia da província de Ontário. A razão de incidência

normalizada (standardized incidence ratio SIR) relativa a todos os tipos

de tumores foi de 0,90, havendo um aumento na incidência de cancro

testicular (SIR = 1,3) e de cancro na pele (SIR = 1,45). Por outro lado,

neste estudo não foi disponibilizada informação relativamente a exposi-

ções individuais a radares

• Pessoal de Radiodifusão e Telecomunicações. Num trabalho publi-

cado em 1985 foi sugerida a possibilidade de um aumento significativo

do risco de desenvolvimento de leucemia em rádio-amadores. Esta

conclusão foi publicada num estudo de mortalidade em indivíduos do

sexo masculino, membros da American Radio Relay League, que é um

grupo de rádio-amadores, consequentemente expostos a radiação RFR.

No período 1971-1983, foram registados 296 falecimentos de homens

no estado de Washington, e 1642 na Califórnia. A taxa de mortalidade

relativa a leucemia aguda e crónica foi de 281 (16 mortes confirmadas

versus 5,7 mortes esperadas), sendo de 191 a taxa de mortalidade para

todas as leucemias (24 mortes confirmadas versus 12,6 mortes espe-

radas). Constatou-se que muitos dos membros daquela associação

tinham as suas actividades profissionais em sectores onde estavam

expostos a campos de RF, todavia essas profissões não conseguiram,

por si só, justificar aquele excesso de falecimentos.

Um estudo conduzido em 1997, com a finalidade de avaliar as funções

do sistema circulatório em trabalhadores expostos a radiação de média

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144

frequência, detectou alterações nos electroencefalogramas, mais fre-

quentes em indivíduos expostos a radiação RFR, que nos outros, não

expostos (75 % versus 25 %). A amostra consistiu em 71 trabalhadores

de quatro estações de radiodifusão em AM (0,738 MHz a 1,503 MHz),

com idades entre 20 e 68 anos e com exposições a RFR entre 2 e 40

anos, e 22 trabalhadores de estações de rádio, com idades entre 23 e 67

anos e sem historial de exposição a radiações.

Na Noruega, procedeu-se a um outro estudo de investigação sobre a

incidência do cancro da mama em 2619 mulheres operadoras de rádio e

telegrafia, com um potencial elevado de exposição à luz durante a noite,

a radiação RFR (405 kHz a 25 MHz), e a campos electromagnéticos de

reduzidíssima frequência (50 Hz). Constatou-se, por um lado, que a

incidência de todos os tipos de cancro não era significativa, e, por outro,

que o risco de desenvolvimento de cancro da mama era excessivo.

• Exposição em Locais Industriais. Num estudo publicado em 1988,

foram investigados os problemas de saúde em trabalhadores fabris na

Suécia, derivados da sua exposição a radiação RFR emitida por

máquinas de moldes de plástico de diversos tipos, tendo sido concluído

que a fertilidade encontrada nas trabalhadoras não diferia significa-

tivamente dos valores médios de partos e malformações registados no

país.

Num estudo publicado em 1997, e realizado em Itália em trabalhadores

da indústria de plásticos, no período 1962-1992, expostos a radiação

RFR emitida por máquinas de selagem, constatou haver uma taxa de

mortalidade ligeiramente mais elevada devido a neoplasmas malignos,

tendo igualmente detectado um aumento dos riscos de desenvolvimento

de leucemias.

Num outro estudo publicado em 1998, foram seleccionados 61 trabalha-

dores saudáveis, entre 30 e 50 anos de idade, que tinham estado

expostos a radiação RFR de frequências entre 0,738 MHz e 1,503 MHz,

e 42 trabalhadores de estações de rádio, igualmente saudáveis e com

idades entre 28 e 49 anos, não expostos profissionalmente àquele tipo

de radiação. Concluiu-se que, sobretudo entre trabalhadores expostos a

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níveis elevados de radiação, foi observada uma redução significativa nos

ritmos da tensão arterial e dos batimentos cardíacos.

b) Exposição em Locais Públicos No que respeita ao comportamento da opinião pública, é notória a ideia de que

a exposição a radiações de RF aumenta a incidência de alguns tipos de cancro

– particularmente a leucemia e os tumores cerebrais –, assim como de outros

problemas de saúde. Veja-se seguidamente os resultados obtidos a partir de

estudos epidemiológicos relativamente a esta questão:

• Transmissores de Rádio e Televisão. Num estudo realizado na Aus-

trália, foi encontrada uma associação entre a proximidade de antenas de

TV de residências e um aumento de leucemia infantil, não tendo contudo

sido encontrada qualquer associação similar, mas em adultos. Os

autores especificaram um determinado conjunto de agentes ambientais

que poderiam explicar a associação positiva encontrada nesse estudo,

sendo um desses agentes a radiação RFR emitida pelas torres de trans-

missão de TV. Porém, atendendo a que os níveis de radiação não foram

medidos directamente no terreno, mas sim calculados, não foi expli-

citada qualquer conclusão que justificasse aquela associação.

Em 1997 foram realizados dois estudos no Reino Unido, pelos mesmos

autores, sobre o mesmo tema. O primeiro foi conduzido numa zona

centrada numa torre de televisão, tendo utilizado como referência as

taxas de incidência de cancro, sendo a conclusão obtida que o risco de

leucemia adulta aumentava dentro de um raio de 2 km a partir da torre.

Quanto ao segundo, foi conduzido em 20 torres diferentes de TV e de

transmissão FM, com a finalidade de confirmar os resultados obtidos no

primeiro estudo, não tendo sido encontrado um excesso significativo de

leucemia adulta dentro de um raio também de 2 km a partir das torres.

Como resultado final, foi concluído que os resultados obtidos mostraram

não haver uma co-relação entre as taxas de leucemia infantil ou de

cancro cerebral com as distâncias aos transmissores.

Num estudo realizado em Itália, numa zona periférica de Roma situada

próximo de um transmissor de rádio de potência elevada, foi constatado

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146

que as mortes por leucemia eram mais elevadas que o esperado, e

ainda que o risco diminui significativamente com a distância ao

transmissor.

Um outro estudo desenvolvido na Letónia, em crianças em idade escolar

que residiam próximo de uma estação de rádio, confirmou a existência

de memória menos desenvolvida, deficiências na atenção, diminuição do

tempo de reacção, e diminuição do desempenho neuromuscular, sobre-

tudo em crianças vivendo em frente da estação.

• Telefones Celulares. Num estudo conjunto sueco e norueguês, foi

encontrada uma associação estatisticamente significativa entre a

duração e o número de chamadas diárias e a prevalência de aqueci-

mentos atrás e à volta dos ouvidos, tonturas, e fadiga. Curiosamente,

concluiu-se que os telefones digitais são menos “perigosos” que os

antigos telefones analógicos.

Um estudo epidemiológico “caso-controlo”, relacionado com o desen-

volvimento de cancros no cérebro, conduzido na Suécia, em indivíduos

de ambos os sexos, conduziu a valores de odds ratio OR de 0,97 para

telefones digitais e de 0,94 para telefones analógicos, não havendo uma

associação positiva entre esse tipo de cancro e a exposição a radiações

RFR.

Atendendo a que os níveis de radiação RFR na cabeça dos utilizadores

de telefones celulares é bastante mais elevada que em situações de não

exposição, podendo eventualmente potenciar os riscos de desenvol-

vimento de tumores cerebrais, tem-se vindo a assistir a um aumento

significativo da realização de estudos científicos e epidemiológicos, com

a finalidade de provar a existência ou não desses riscos.

Num estudo publicado em 2002 nos Estados Unidos, concluiu-se existir

um elevado risco de cancro derivado da utilização de telefones celulares

por 3 ou mais anos. Contudo, devido à aleatoriedade e à pouca

utilização dos telefones por parte dos utilizadores objecto do estudo, não

se pôde concluir da existência de uma associação entre o risco e o uso

continuado dos aparelhos.

Estudos epidemiológicos realizados na Suécia e publicados em 2002 e

2003, mostraram haver um aumento significativo do risco de desenvol-

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vimento de cancros em utilizadores de telefones celulares analógicos e

de telefones cordless (telefones portáteis sem fios, associados aos tele-

fones normais, com fios).

Os resultados de um estudo realizado nos Estados Unidos e publicado

em 2003, mostram não haver nenhuma associação entre a utilização de

telefones celulares e o desenvolvimento de tumores intratemporais

faciais.

Estudos realizados na Suécia e publicados em 2004 e em 2005,

mostram não existir um aumento dos riscos respectivamente de neu-

roma acústico e de glioma ou meningioma, com a utilização de telefones

celulares. Relativamente aos riscos de desenvolvimento de neuroma

acústico, um outro estudo, desenvolvido no Japão e tornado público em

2006, confirma a mesma conclusão.

Em finais de 2007, um estudo conduzido por uma equipa de investi-

gadores israelitas permitiu concluir que existe um elevado risco de

desenvolvimento de cancro nas glândulas salivares, em utilizadores de

telefones celulares com uma frequência média de utilização mínima de

22 horas mensais.

3.2.4. Casos Pessoais Seguidamente, expõem-se alguns casos pessoais relacionados com doenças

eventualmente associadas aos efeitos de radiações RFR:

• Em 1991, uma mulher de Oklahoma faleceu no hospital após uma

simples transfusão de sangue, porque a enfermeira aqueceu o sangue

num forno microondas, o que originou uma alteração na sua estrutura

celular.

• Um técnico de uma empresa industrial colocou a sua mão sob a acção

directa de um feixe de microondas, com a finalidade de sentir o calor

desenvolvido e, assim, confirmar que o gerador de microondas se

encontrava operacional. Sem o saber, esteve sujeito a uma densidade

de potência da ordem de 100 W/m2, e, após um ano, queixou-se de uma

perda súbita de visão, devido ao desenvolvimento de cataratas.

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• Um caso de tribunal envolveu a morte de uma mulher no estado da

Florida, devido a um tumor cerebral, localizado numa área do cérebro

acima da sua orelha, tendo a causa sido atribuída ao uso excessivo de

telemóveis. Apesar do seu esposo ter intentado uma acção judicial em

1992 alegando essa causa, um tribunal federal considerou, em 1995,

que não existia uma evidência directa entre os dois acontecimentos.

• Recentemente, um médico neurologista, com 41 anos de idade, do

estado de Maryland, intentou uma acção judicial de 800 milhões de

dólares contra a empresa Motorola e mais oito companhias de teleco-

municações, alegando que a utilização de telefones celulares lhe causou

um tumor cerebral. Na sequência deste processo, o tribunal acusou as

empresas de falharem, ao não informarem os consumidores que os

telefones celulares produzem níveis elevados de radiação RFR, os quais

poderão causar cancros ou outras doenças.

3.3. NORMAS DE SEGURANÇA E REGULAMENTAÇÃO

O conceito de segurança, assim como de norma de segurança, no que respeita

aos riscos à exposição de radiações electromagnéticas, requer uma análise

bastante aprofundada, devido ao facto, por um lado, de não se conhecerem

ainda em pormenor quais os mecanismos de interacção entre essas radiações

e os tecidos humanos e, por outro, por serem contraditórios, em muitas

situações, os resultados obtidos a partir de estudos humanos e epide-

miológicos.

Presentemente, existem já bastantes normas de segurança e linhas de conduta

quanto aos limites máximos de exposição a radiações de RF (rádio-frequência),

em ambientes industriais, todavia, a elaboração de regulamentação de

segurança para todos os tipos de exposição, e para todo o espectro de

frequências de RFR (radiação de rádio-frequência), não seria prático nem será

provável que alguma vez seja estabelecida. Além disso, existem ainda muitas

questões relacionadas com os parâmetros principais das radiações de RF, tais

como a intensidade do campo, a duração de exposição, os efeitos da pulsação

das ondas, a geometria das zonas expostas, e as técnicas de modulação, que

requerem respostas concretas para que se possam definir quais os níveis de

radiação acima dos quais poderão ocorrer riscos graves para a saúde. Por

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149

conseguinte, não é possível afirmar conclusivamente que a segurança à

exposição a radiações esteja assegurada através da regulamentação e das

normas existentes.

Devido a esta situação, todos os organismos de normalização têm em conta

uma margem relativamente larga de segurança, no sentido de, ao definirem os

limites máximos de exposição, seja considerada aquela incerteza quantitativa.

Os Estados Unidos, Canadá, União Europeia, Rússia, e a Ásia-Pacífico, assim

como algumas organizações internacionais, já elaboraram regulamentação e

normas de segurança em relação aos efeitos das radiações RF, em número

relativamente elevado, por contemplarem vários factores, como se verá segui-

damente, tais como a frequência, a duração da exposição, a massa do corpo, e

a periodicidade da exposição.

Por exemplo, nos Estados Unidos são vários os organismos governamentais e

não governamentais, que têm vindo a elaborar ou a participar na elaboração de

regulamentação, tais como a American National Standard Institute (ANSI), o

Institute of Electrical and Electronic Engineers (IEEE), o National Council on

Radiation Protection and Measurement (NCRP), a Occupational Safety and

Health Administration (OSHA), o National Institute of Occupational Safety and

Health (NIOSH), a American Conference of Governmental Industrial Hygienists

(ACGIH), a Food and Drug Administration (FDA), a Environmental Protection

Agency (EPA), a Federal Communications Commission (FCC), o Department of

Defense (DOD), e a National Telecommunications and Information

Administration (NTIA).

Saliente-se, por outro lado, que estas normas são constantemente revistas e

actualizadas, em função do aparecimento de novos dados, tornados públicos,

que resultam de estudos científicos e epidemiológicos.

As aplicações de rádio-frequência ocorrem numa vasta gama de frequências.

Por exemplo, a transmissão de radiodifusão em AM faz-se na banda 5 – 16

kHz, em FM na banda 76 – 109 kHz, enquanto que as bandas de 58 – 132 kHz

e 8,8 – 10,2 MHz são utilizadas em sistemas de identificação de rádio-frequên-

cia, de vigilância, e em outros dispositivos de segurança.

Por outro lado, as comunicações celulares e pessoais utilizam frequências

entre 800 MHz e 2 GHz, as comunicações sem fios funcionam até 5 GHz, e as

microondas a 2,45 GHz. Adicionalmente, as interacções entre as radiações de

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rádio-frequência e os sistemas biológicos manifestam-se nos níveis molecular,

sub-celular, celular, nos órgãos, assim como na totalidade do corpo humano.

Biologicamente, os efeitos da RFR são classificados em três níveis: 1) efeitos

de nível elevado (efeitos térmicos), 2) efeitos de nível intermédio (efeitos atér-

micos), e 3) efeitos de nível reduzido (efeitos não térmicos).

Ainda em relação à regulamentação que se apresenta, são utilizadas usual-

mente diversas grandezas para se explicitar os respectivos limites máximos de

exposição: densidade de fluxo magnético para campos estáticos e VLF,

densidade de corrente para frequências até 10 MHz, taxa de absorção

específica SAR para frequências até 10 GHz, e densidade de potência para

frequências entre 10 GHz e 300 GHz.

3.3.1. Norma ANSI/IEEE C95.1 Estas normas de segurança têm sido as mais utilizadas nos Estados Unidos,

tendo o seu historial remontado a 1940, quando das preocupações sentidas

relativamente aos membros das forças militares norte-americanos que ope-

ravam frequentemente com equipamentos de radar, durante a segunda guerra

mundial.

Na década de 1950, e de acordo com dados empíricos, os cientistas atribuíram

um factor de segurança com o valor 10, baseado numa exposição de 0,1

W/cm2, e tendo em conta um peso médio masculino de 70 kg e uma área de

exposição de 3000 cm2, tendo este último valor sido corrigido, mais tarde, para

20000 cm2, assim como o valor da taxa de exposição, para 10mW/cm2, valor

esse que representou a base para a recomendação C95.1, de 1966.

Saliente-se que, em 1954, a General Electric recomendava para a densidade

de potência de exposição o valor de 1 mW/cm2, enquanto que, em 1958, essa

mesma empresa subiu esse nível para 10 mW/cm2.

3.3.2. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1966 Esta norma fixou para a densidade de potência o limite de 10 mW/cm2, para a

protecção e segurança da saúde pública, sendo a gama de frequência de 10

MHz a 100 GHz. Quanto ao tempo médio de exposição contemplado, é de 6

minutos.

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3.3.3. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1974

Esta recomendação resultou da actualização da C95.1 – 1966, com alterações

mínimas, tendo o tempo médio de exposição para radiação contínua sido remo-

vido, e considerado apenas um tempo médio de exposição para campos modu-

lados, fixado nos mesmos 6 minutos. Os limites para o campo eléctrico e para

o campo magnético, na gama de frequência entre 10 MHz e 300 MHz são,

respectivamente, de 200 V/m e 0,5 A/m, sendo a densidade de potência corres-

pondente igual a 250 W/m2. Para frequências inferiores a 10 MHz, o limite de

exposição recomendado é de 10 mW/cm2.

3.3.4. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1982

Esta norma baseou-se integralmente nos efeitos térmicos das radiações, para

uma gama de frequências entre 10 MHz e 100 GHz, sendo os níveis de

exposição recomendados de 10 mW/cm2, para uma duração superior a 6

minutos, e de 100 mW/cm2, para uma duração de 6 minutos. O limite de 10

mW/cm2 foi reduzido, em 1981, para 1 mW/cm2, na gama de frequências entre

30 MHz e 300 MHz, sendo ainda recomendado que a taxa de absorção

específica não ultrapasse 8 W/kg, e a taxa de potência média depositada, para

todo o corpo, não seja superior a 0,42 W/kg. Estes valores baseiam-se nas

densidades de potência expostas no quadro 3.2, na gama entre 3 MHz e 100

GHz. Por outro lado, no que respeita à densidade de potência incidente, os

níveis permissíveis são 1 mW/cm2 a 150 MHz, 1,5 mW/cm2 a 450 MHz, e 2,75

– 2,83 mW/cm2 para frequências entre 824 MHz e 850 MHz (banda utilizada

em sistemas de telecomunicações celulares).

Frequência (MHz)

Campo eléctrico (V2/m2)

Campo magnético (A2/m2)

Densidade de potência (mW/cm2)

0,3 – 3,0 400000 2,5 100

3,0 – 30 4000 x (900/f 2) 0,025 x (900/f 2) 900/f 2

30 – 300 4000 0,025 1,0

300 – 1500 4000 x (f/300) 0,025 x (f/300) f/300

1500 - 100000 20000 0,125 5,0 f – frequência, em MHz

Quadro 3.2 – Níveis de segurança recomendados pela norma

ANSI/IEEE C95.1 – 1982.

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3.3.5. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 1992

De acordo com esta norma, os limites máximos permissíveis de exposição são

dependentes da frequência e do tipo de local, como se mostra no quadro 3.3.

Como se pode constatar, os níveis mais baixos de exposição a campos elé-

ctricos ocorrem a frequências entre 30 MHz e 300 MHz, e de exposição a

campos magnéticos, entre 100 MHz e 300 MHz. Por outro lado, em locais

ocupacionais, o campo eléctrico máximo ocorre entre 30 MHz e 300 MHz, com

uma densidade de potência de 1 mW/cm2, enquanto que, para locais públicos,

e para essa mesma gama de frequências, o seu valor é bastante mais reduzido

(27,5 V/m contra 61,4 V/m), sendo a densidade de potência igualmente mais

baixa (0,2 mW/cm2 contra 1,0 mW/cm2).

Adicionalmente, no quadro 3.4 mostram-se os níveis máximos recomendados

para correntes induzidas por radiação de RF, nos pés de pessoas imersas em

campos RF, ou em pessoas directamente em contacto com objectos carre-

gados electricamente, como por exemplo veículos ou grades metálicas, para

uma gama de frequências entre 3 kHz e 100 MHz, e para locais ocupacionais e

locais públicos, sendo de salientar que a corrente máxima de contacto é igual à

corrente máxima induzida em cada pé, para ambos os locais, o que, aliás, é

pertinente.

Esta regulamentação de segurança também especifica uma intensidade do

campo eléctrico com o valor de 100 kV/m como sendo o limite máximo de

exposição permitido (LME), em locais ocupacionais, para radiação RFR por

impulsos, na gama de frequências situada entre 0,1 GHz e 300 GHz. Para um

impulso de duração inferior a 100 ms, nessa gama de frequências, o valor de

pico da LME é definido através da seguinte expressão:

( )(s) impulso do duração5

(s) exposição de médio tempo×

×=LMELME pico

Para séries de mais de 5 impulsos, ou para uma duração dos impulsos superior

a 100 ms, a expressão anterior tomará a forma:

( )5

(s) exposição de médio tempo(s) impulso do duração ×=∑ × LMELME pico

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153

Frequência (MHz)

Campo eléctrico

(V/m)

Campo magnético

(A/m)

Densidade de potência (mW/cm2)

Tempo médio de exposição

(min)

Locais ocupacionais

0,003 – 0,1 614 163 100 6

0,1 – 3,0 614 16,3/f 100 6

3,0 – 30 1824/f 16,3/f 900/f 2 6

30 – 100 61,4 16,3/f 1,0 6

100 – 300 61,4 0,163 1,0 6

300 – 3000 ----- ----- f/300 6

3000 – 15000 ----- ----- 10 6

15000 - 300000 ----- ----- 10 616000/f 1,2

Locais públicos

0,003 – 0,1 614 163 100 6

0,1 – 1,34 614 16,3/f 100 6

1,34 – 3,0 823,8/f 16,3/f 180/f 2 f 2/3

3,0 – 30 823,8/f 16,3/f 180/f 2 30

30 – 100 27,5 158,3/f 1,668 0,2 30

100 – 300 27,5 0,0729 0,2 30

300 – 3000 ----- ----- f/1500 30

3000 – 15000 ----- ----- f/1500 90000/f 2

15000 - 300000 ----- ----- 10 616000/f 1,2

f – frequência, em MHz

Quadro 3.3 – Níveis de segurança recomendados pela norma

ANSI/IEEE C95.1 – 1992.

3.3.6. Norma ANSI/IEEE C95.1 – 2005 Esta norma, que é a mais utilizada nos Estados Unidos da América, tem vindo

a sofrer alterações sucessivas, sendo a última versão datada de 2005. Nesta

última revisão, bastante completa, recomenda-se um limite máximo de 0,08

W/kg para a taxa de absorção específica média para a totalidade do corpo

humano, em locais públicos, e 2 W/kg a 4 W/kg para algumas partes do corpo,

como sejam os membros superiores e inferiores. Em termos de densidade de

potência, os limites recomendados são 2 W/m2 na banda 30 – 400 MHz, 2 a 10

W/m2 na banda 400 – 2000 MHz, e 10 W/m2 acima de 2000 MHz.

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154

Frequência (MHz)

Corrente máxima em ambos os pés

(mA)

Corrente máxima em cada pé

(mA)

Corrente máxima de contacto

(mA)

Locais ocupacionais

0,003 – 0,1 2000f 1000f 1000f

0,1 - 100 200 100 100

Locais públicos

0,003 – 0,1 900f 450f 450f

0,1 - 100 90 45 45

f – frequência, em MHz

Quadro 3.4 – Níveis de segurança recomendados pela norma

ANSI/IEEE C95.1 – 1992, para correntes RF induzidas

e de contacto, no corpo humano.

3.3.7. Relatório NCRP nº 86 – 1986 Este relatório, designado por Biological Effects and Exposure Criteria for Radio

Frequency Electromagnetic Fields, foi elaborado pelo National Council on

Radiation Protection and Measurements, que é um organismo suportado pelo

Congresso dos Estados Unidos, criado com a finalidade de desenvolver

documentação e recomendações de segurança, relativamente aos efeitos das

radiações ionizantes e não-ionizantes. Apresenta os resultados de uma

avaliação extensiva da literatura disponível sobre os efeitos biológicos dos

campos RF, apresentando-se no quadro 3.5 os respectivos limites

recomendados, baseados num valor máximo de SAR de 8 W/kg para

exposição ocupacional, e um quinto desse valor, ou seja, 1,6 W/kg, para o

público em geral. Este factor numérico, 1/5, é obtido considerando-se 168

horas por semana de exposição para o público em geral, e 40 horas por

semana de exposição em locais ocupacionais.

3.3.8. Relatório NCRP nº 86 – 1993 Este relatório, designado por A Practical Guide to the Determination of Human

Exposure to Radiofrequency Fields, foi desenvolvido como um guia para as

pessoas que são responsáveis pela determinação das exposições a radiação

RF, com menos conhecimentos sobre os seus princípios e práticas.

Comparando os limites de densidade de potência impostos pelas recomen-

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155

dações ANSI e NCRP, uma das poucas diferenças reside no facto dos limites

NCRP serem mais restritivos a altas frequências, por exemplo acima de 1,5

GHz. Por conseguinte, nas unidades industriais são seguidos os limites ANSI,

enquanto que o público favorece mais as recomendações NCRP.

Frequência (MHz)

Campo eléctrico

(V/m)

Campo magnético

(A/m)

Densidade de potência (mW/cm2)

Corrente de contacto

(min)

Locais ocupacionais

0,3 – 1,34 614 163 100 200

1,34 – 3,0 614 1,63 100 200

3,0 – 30 1824/f 4,89/f 900/f 2 200

100 – 300 61,4 0,163 1,0 -----

300 – 1500 f54,3 106/f f/300 -----

1500 - 100000 194 0,515 5,0 -----

Locais públicos

0,3 – 1,34 614 1,63 100 200

1,34 – 3,0 823,8/f 2,19/f 180/f 2 200

3,0 – 30 823,8/f 2,19/f 180/f 2 200

100 – 300 27,5 0,0729 0,2 -----

300 – 1500 f59,2 238/f f/1500 -----

1500 - 100000 106 0,23 1,0 -----

f – frequência, em MHz

Quadro 3.5 – Níveis de segurança recomendados pelo relatório NCRP nº 86.

3.3.9. Normas ACGIH Estas normas, elaboradas pelo organismo norte-americano American

Conference of Governmental Industrial Hygienists, recomendam, para locais

ocupacionais, que a SAR não seja superior a 0,4 W/kg, para um período de

exposição de 6 minutos, e para uma gama de frequências entre 10 kHz e 300

GHz, mostrando-se no quadro 3.6 os níveis de exposição recomendados.

Atendendo a que estes limites são destinados a locais ocupacionais, baseiam-

-se assim na assumpção de que não existem crianças ou jovens nesses locais,

permitindo uma densidade de potência incidente de 10 mW/cm2 para frequên-

cias superiores a 1 GHz, mantendo a mesma SAR de 0,4 W/kg para todo o

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156

corpo. Por outro lado, os 100 mW/cm2 recomendados na gama de 10 kHz a 3

MHz, é um nível que se poderá considerar seguro na base de que se refere

igualmente à totalidade do corpo humano, apesar de poder resultar de choques

eléctricos ou de queimaduras eléctricas de RF.

Frequência

Campo eléctrico (V2/m2)

Campo magnético (A2/m2)

Densidade de potência (mW/cm2)

10 kHz – 3 MHz 377000 2,65 100

3 – 30 MHz 3770 x (900/f 2) 900 / (37,7f 2) 900/f 2

30 – 100 MHz 3770 0,027 1,0

100 MHz – 1 GHz 3770 x (f/300) (f/37,7) x 100 f/100

1 – 300 GHz 37700 0,265 10

f – frequência, em MHz

Quadro 3.6 – Níveis de segurança recomendados pela associação ACGIH.

3.3.10. Normas FCC Este organismo norte-americano, Federal Communications Commission, foi

criado em 1934 como uma agência reguladora, com a finalidade de controlar e

regular as comunicações rádio e por fios, tendo vindo a ser a responsável pelo

licenciamento dos sistemas de comunicações nos Estados Unidos, daí estar

igualmente envolvida de uma forma directa na segurança associada à

utilização das tecnologias de comunicações.

No quadro 3.7 mostram-se os limites gerais recomendados, e no quadro 3.8 os

limites recomendados para a taxa específica de absorção SAR na totalidade do

corpo humano ou em parte, para uma gama de frequências entre 100 kHz e 6

GHz.A alteração mais significativa desta norma em relação às anteriores,

consiste no facto da SAR admissível para telefones celulares ser de 1,6 W/kg.

Previamente, os telefones celulares poderiam exceder o limite máximo de

exposição permitido (LME), se a sua potência radiante fosse inferior a

1,4 x 450/f, sendo f a frequência de operação em MHz. Para a maioria dos

telefones celulares comercializados, essa potência radiante corresponde apro-

ximadamente a um valor de 0,6 W. Relativamente aos limites recomendados

expostos no quadro 3.8 e, tal como em relação ao Relatório nº 86 – 1986 do

National Council on Radiation Protection and Measurements, ao compararem-

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157

se os valores aconselháveis para locais públicos com os valores homólogos

aconselháveis em locais ocupacionais, constata-se que a razão entre eles é

igual a 1/5, devido ao facto de se considerar que a exposição para o público em

geral é de 7 dias por semana x 24 horas por dia = 168 horas por semana, e

para os locais de trabalho, de 5 dias por semana x 8 horas de trabalho por dia

= 40 horas por semana, tendo-se assim a seguinte relação:

SAR (locais públicos) = (40 / 168) x SAR (locais ocupacionais)

Frequência (MHz)

Campo eléctrico

(V/m)

Campo magnético

(A/m)

Densidade de potência (mW/cm2)

Tempo médio de exposição

(min)

Locais ocupacionais

0,3 – 30 614 1,63/f 100 6

3 – 30 1824/f 4,89/f 900/f 2 6

30 – 300 61,4 0,163 1,0 6

300 – 1500 ----- ----- f/300 6

1500 - 100000 ----- ----- 5,0 6

Locais públicos

0,3 – 1,34 614 1,63 100 30

1,34 – 30 1824/f 2,19/f 180/f 2 30

30 – 300 27,5 0,073 0,2 30

300 – 1500 ----- ----- f/1500 30

1500 - 100000 ----- ----- 1,0 30

f – frequência, em MHz

Quadro 3.7 – Níveis de segurança recomendados pelo organismo FCC.

Locais ocupacionais Locais públicos

< 0,4 W/kg para todo o corpo < 0,08 W/kg para todo o corpo

≤ 8 W/kg para partes do corpo ≤ 1,6 W/kg para partes do corpo

Quadro 3.8 – Níveis de segurança recomendados pelo organismo FCC, para

exposição localizada do corpo humano, na gama de 100 kHz a 6 GHz.

3.3.11. Normas Canadianas O Ministério da Saúde Canadiano tem vindo a desenvolver diversas recomen-

dações e normas de segurança com o objectivo de proteger os seus cidadãos

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158

contra os efeitos das radiações RFR, na gama de frequências entre 3 kHz e

300 GHz, tendo, em 1979, publicado o primeiro Safety Code 6, alterado suces-

sivamente em 1991, 1994 e 1999, mostrando-se no quadro 3.9 os respectivos

limites recomendados, limites esses definidos com base numa análise

exaustiva realizada a todos os trabalhos de investigação realizados nos últimos

30 anos, relativos aos efeitos biofísicos dos campos electromagnéticos.

Adicionalmente, apresenta-se no quadro 3.10 os limites da SAR relativos a

locais ocupacionais e a locais públicos, verificando-se a existência do factor 1/5

entre valores homólogos, devido aos factos apontados anteriormente, e no

quadro 3.11 apresentam-se os limites recomendados para as correntes

induzidas e para as correntes de contacto, assim como os tempos médios de

exposição, também para locais ocupacionais e para locais públicos. Saliente-se

que os valores expostos nestes quadros referem-se ao Safety Code 6.

Os níveis de exposição relativos aos locais públicos, definidos neste código

normativo, são baseados em estudos inerentes aos efeitos térmicos, estudos

esses que demonstram uma tolerância às densidades de potência de

exposição, para diversas rádio-frequências, antes da temperatura do corpo

aumentar de 1 oC dentro de uma exposição de 30 minutos.

3.3.12. Normas Japonesas As suas normas baseiam-se em parâmetros biológicos tais como a SAR e as

correntes induzidas no corpo humano, sendo os limites para a SAR de 0,4

W/kg para 6 minutos de exposição relativa a todo o corpo, e de 8 W/kg

relativamente ao valor máximo local da SAR dentro de 1 g de tecido, excepto

extremidades e pele, onde a SAR limite é de 25 W/kg para 1 g de tecido

biológico.

3.3.13. Normas Chinesas Não existe muita informação relativa a trabalhos científicos publicados em

conferências ou em revistas internacionais, acerca das radiações de RF e seus

efeitos biofísicos, neste país. Contudo, pelo pouco que é divulgado, os limites

máximos aconselháveis para locais públicos são extremamente mais restritivos

que os recomendados nos Estados Unidos, tendo-se 5,0 V/m ou 6,6 µW/cm2, a

900 MHz.

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159

Frequência (MHz)

Campo eléctrico

(V/m)

Campo magnético

(A/m)

Densidade de potência (mW/cm2)

Tempo médio de exposição

(min)

Locais ocupacionais

0,003 – 1 600 4,9 ----- 6

1 – 10 600/f 4,9/f ----- 6

10 – 30 60 4,9/f ----- 6

30 – 300 60 0,163 10 6

300 – 1500 3,54 f 0,5 0,0094 f 0,5 f/30 6

1500 – 15000 137 0,364 50 6

15000 - 150000 137 0,364 50 616000/f 1,2 150000 - 300000 0,354 f 0,5 9,4 x 10-4 f 0,5 3,33 x 10-4 f 0,5 616000/f 1,2

Locais públicos

0,003 – 1 280 2,19 ----- 6

1 – 10 280/f 2,19/f ----- 6

10 – 30 28 2,19/f ----- 6

30 – 300 28 0,037 2 6

300 – 1500 1,585 f 0,5 0,0042 f 0,5 f/150 6

1500 – 15000 61,4 0,163 10 6

15000 - 150000 61,4 0,163 10 616000/f 1,2 150000 - 300000 0,1584 f 0,5 4,21 x 10-4 f 0,5 6,67 x 10-5 f 616000/f 1,2

f – frequência, em MHz

Quadro 3.9 – Níveis de segurança recomendados pela norma Safety Code 6.

Locais ocupacionais Locais públicos

0,4 W/kg para todo o corpo 0,08 W/kg para todo o corpo

8 W/kg para a cabeça, pescoço, tronco 1,6 W/kg para a cabeça, pescoço, tronco

20 W/kg para os membros 4 W/kg para os membros

Quadro 3.10 – Níveis de segurança recomendados pela norma Safety Code 6,

para exposição localizada do corpo humano.

3.3.14. Normas Australianas e Neo-Zelandezas Na Austrália, a sua regulamentação recomendava, para as frequências na

gama das comunicações celulares, e em locais públicos, um limite de 0,2

mW/cm2, valor este 2 a 6 vezes mais reduzido que os valores aconselháveis

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160

pelas normas americanas ANSI, ICNIRP e NCRP. Essa legislação foi revista,

sendo os actuais limites de 0,45 mW/cm2 para 900 MHz e 0,90 mW/cm2 para

1800 MHz.

Quanto à Nova Zelândia, em 1990 adoptou o limite máximo de exposição de

0,2 mW/cm2, sendo no entanto esse limite de 0,05 mW/cm2 nas cidades de

Auckland e de Christchurch.

Frequência (MHz)

Correntes induzidas (mA) Correntes de contacto (mA)

Tempo médio de exposição ambos os pés cada pé

Locais ocupacionais

0,003 – 0,1 2000 f 1000 f 1000 f 1 seg

0,1 - 110 200 100 210 6 min

Locais públicos

0,003 – 0,1 900 f 450 f 450 f 1 seg

0,1 - 110 90 45 45 6 min

f – frequência, em MHz

Quadro 3.11 – Níveis de segurança recomendados pela norma Safety Code 6,

para correntes RF induzidas e de contacto, no corpo humano.

3.3.15. Normas Russas e da Europa de Leste No quadro 3.12 mostram-se os limites para o campo eléctrico e para o campo

magnético, relativos a locais ocupacionais e a locais públicos, que se encon-

travam em vigor na União Soviética, antes da sua transformação política numa

confederação de repúblicas independentes, notando-se a não existência de

limites para o campo magnético em locais públicos.

Para locais ocupacionais, e para a gama de frequências entre 300 MHz e 300

GHz, o limite máximo para a densidade de potência era de 1 mW/cm2,

enquanto que, para locais públicos, era 100 vezes inferior, ou seja, 0,01

mW/cm2.

Por sua vez, no quadro 3.13 mostram-se os limites recomendados para locais

ocupacionais e para locais públicos, estabelecidos a partir de 1996 na Rússia,

continuando a não existir limites para o campo magnético em locais públicos.

Quanto aos limites admissíveis para o campo eléctrico relativo a frequências de

TV, tem-se:

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161

48,4 MHz 5 V/m

88,4 MHz 4 V/m

192 MHz 3 V/m

300 MHz 2,5 V/m

Para equipamentos de radar, na gama entre 150 MHz e 300 MHz, os limites

são de 10 µW/cm2 nas zonas muito próximas, e de 100 µW/cm2 em zonas mais

afastadas. Saliente-se que a ex-União Soviética foi dos primeiros países a

detectar e a desenvolver investigação relativamente aos efeitos nocivos

derivados da exposição a campos electromagnéticos, em todo o espectro de

frequências de radiação não-ionizante. Como se pode observar no capítulo 1

deste livro, desde muito cedo que os efeitos da exposição a linhas de muito alta

tensão concentraram a atenção das autoridades, no sentido de minimizarem os

potencias riscos, elaborando regulamentação adequada.

Frequência (MHz)

Campo eléctrico (V/m)

Campo magnético (A/m)

Locais ocupacionais

0,06 – 1,5 50 5

1,5 – 3 50 -----

3 – 30 20 -----

30 – 50 5 -----

300 - 300000 0,125 -----

Locais públicos

0,03 – 0,3 25 -----

0,3 – 3 15 -----

3 – 30 10 -----

30 - 300 3 -----

Quadro 3.12 – Níveis de segurança recomendados pelas normas da URSS.

3.3.16. Normas IRPA Este organismo internacional, International Radiation Protection Association,

iniciou as suas actividades em 1964, sendo o seu propósito principal

providenciar um meio de comunicação entre todos os países que se encontram

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162

a elaborar regulamentação e normas de segurança, para que possam trabalhar

mais facilmente a partir de uma base científica já estabelecida.

Em 1981 sugeriu que as densidades de potências não fossem superiores a 10

mW/cm2 em locais ocupacionais, ao longo de um dia completo de trabalho,

recomendando valores mais reduzidos para os níveis de exposição em locais

públicos. Em 1984, as suas recomendações foram revistas, sendo acon-

selhável, para esses locais e para frequências superiores a 10 MHz, não

ultrapassar 0,4 W/kg para uma exposição de corpo inteiro durante 6 minutos.

Quanto aos locais públicos, recomenda um limite 5 vezes inferior, isto é, de

0,08 W/kg, igualmente para uma exposição de corpo inteiro com uma duração

máxima de 6 minutos.

Locais ocupacionais

Frequência (MHz)

Campo eléctrico (V2/m2)

Campo magnético (A2/m2)

0,03 – 3 20000 200

3 – 30 7000 -----

30 – 50 800 0,72

50 - 300 800 -----

300 MHz – 300 GHz 200 μW/cm2

Locais públicos

Frequência Campo eléctrico (V/m)

Campo magnético (A/m)

30 kHz – 300 kHz 25 -----

300 kHz – 3 MHz 15 -----

3 MHz – 30 MHz 10 -----

30 MHz – 300 MHz 3 -----

300 MHz – 300 GHz 10 μW/cm2

Quadro 3.13 – Níveis de segurança recomendados pelas normas da Rússia.

3.3.17. Normas ICNIRP Este organismo internacional, criado em 1992, tem como missão coordenar os

conhecimentos sobre a protecção à exposição aos vários tipos de radiações

não-ionizantes, com a finalidade de desenvolver recomendações e normas de

segurança que sejam reconhecidas e aceites internacionalmente.

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163

Em Abril de 1998 publicou as suas recomendações acerca dos limites a

respeitar no que toca à exposição a radiações de RF numa gama de

frequências até 300 GHz, limites esses baseados num conjunto relativamente

alargado de estudos e relatórios científicos.

As suas recomendações incluem um factor de redução de 5, no máximo valor

da taxa de absorção específica SAR em locais públicos, comparativamente aos

valores máximos a observar em locais ocupacionais, como sucede com outros

regulamentos explicitados anteriormente. A razão desse factor de redução

prende-se com o facto da forte possibilidade de existirem pessoas bastante

sensíveis aos efeitos da radiação RFR, apesar de não haver provas científicas

conclusivas.

Para frequências até 1 kHz, em locais ocupacionais, a restrição relativa a

campos eléctricos e magnéticos corresponde a uma densidade de corrente de

10 mA/m2, densidade esta que depende da frequência para valores superiores

a 1 kHz.

Para locais ocupacionais, e para frequências entre 100 kHz e 10 GHz, o limite

recomendado é de 0,4 W/kg para uma exposição de corpo inteiro, sendo, para

locais públicos, 5 vezes inferior, ou seja, de 0,08 W/kg.

3.3.18. Norma CENELEC EN 50392 : 2004 Em Janeiro de 2004 o European Committee for Electrotechnical Standar-

dization (CENELEC) publicou esta norma, no sentido de demonstrar a

observância dos equipamentos eléctricos e electrónicos com as restrições

básicas relacionadas com a exposição humana a campos electromagnéticos

entre 0 Hz e 300 GHz.

Esta norma considera os níveis de exposição do público em geral a campos

eléctricos e magnéticos, assim como a correntes de contacto e a correntes

induzidas.

De um modo geral, aborda: 1) os critérios de observância, os métodos de

avaliação, e os relatórios a elaborar, 2) a avaliação da observância dos limites

aconselhados, 3) a definição das características dos equipamentos que devem

ser tidas em atenção, 4) as fontes de frequências múltiplas, 5) as informações

de segurança para o público, que deverão constar nos respectivos

equipamentos.

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164

3.3.19. Regulamentação na União Europeia Em 8 de Junho de 1999, o European Union Health Council, com o suporte do

governo do Reino Unido, estabeleceu recomendações com o objectivo de

limitar as exposições a campos electromagnéticos, especialmente à radiação

emitida por telefones celulares, propondo essas recomendações, para locais

públicos, uma SAR de 0,2 W por 10 g de tecido da cabeça e 0,08 W/kg para

todo o corpo.

Veja-se seguidamente as recomendações estabelecidas por alguns dos países

da União Europeia:

• Bélgica. As suas normas aconselham, para a intensidade do campo

eléctrico, limites de 21 V/m para 900 MHz e de 29 V/m para 1800 MHz.

• Itália. Neste país, as normas impõem, para as frequências dos telefones

celulares, uma densidade de potência de 0,10 mW/cm2 e, para as

situações onde a exposição exceda 4 horas por dia, esse limite deve ser

reduzido para 0,010 mW/cm2. Por outro lado, as administrações

regionais dispõem de poder para reduzir ainda mais aqueles limites,

havendo regiões onde os limites são 4 vezes inferiores (0,0025 mW/m2).

Por exemplo, o limite para as torres de transmissões celulares e de

radiodifusão, é de 6 V/m ou 10 μW/cm2; para outras exposições de RF e

de microondas é 100 μW/cm2 para frequências entre 3 MHz e 3 GHz e,

para a gama entre 3 GHz e 300 GHz, é 400 μW/cm2.

• Suécia. O nível permitido para a densidade de potência, a 900 MHz, e

para locais públicos, é de 4,5 W/m2 ou de 41 V/m para o campo elé-

ctrico, sendo os limites admissíveis para os locais ocupacionais cinco

vezes superiores, como sucede nas normas americanas e canadianas.

• Suíça. Para os transmissores de comunicações sem fios, o limite

admissível é de 4 V/m (0,0042 mW/cm2) a 900 MHz, e de 6 V/m (0,0095

mW/cm2) a 1800 MHz. Para transmissores de radiodifusão e de TV, o

limite de exposição está entre 3 V/m e 8,5 V/m (0,0024 mW/cm2 e 0,019

mW/cm2).

• Reino Unido. Os limites referentes à exposição a radiação RFR são de

112 V/m e 0,57 mW/cm2 para 900 MHz, e de 194 V/m e 1 mW/cm2 para

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165

1800 MHz, sendo os tempos médios de exposição de 15 minutos para

todo o corpo, e de 6 minutos para uma exposição parcial.

Em 29 de Abril de 2004, o Council of the European Parliament publicou a

Directiva Comunitária 2004/40/EC, que se baseia nas restrições básicas do

ICNIRP, e diz respeito fundamentalmente aos riscos potenciais, de curto prazo,

a que se encontram sujeitos os trabalhadores, não considerando os efeitos de

longa duração.

Esta directiva diferencia os limites máximos de exposição dos valores das

grandezas que são induzidas pelos efeitos da exposição. No quadro 3.14

mostram-se os limites máximos aconselháveis, enquanto que no quadro 3.15

encontram-se expostos os valores das grandezas induzidas. Esta diferenciação

resulta do facto dos valores destas últimas grandezas serem mais facilmente

calculáveis. Por conseguinte, se estes valores, expostos no quadro 3.15, não

forem excedidos, pode-se assumir que os limites do quadro 3.14 também não

foram excedidos.

Frequências Densidade de corrente na cabeça e no tronco (mA/m2)

SAR média em todo o

corpo (W/kg)

SAR localizada

na cabeça e no tronco

(W/kg)

SAR localizada

nos membros

(W/kg)

Densidade de potência

(W/m2)

≤ 1 Hz

40 ------ ------ ------ ------

1 – 4 Hz

40 / f ------ ------ ------ ------

4 – 1000 Hz

10 ------ ------ ------ ------

1000 Hz – 100 kHz

f / 100 ------ ------ ------ ------

100 kHz – 10 MHz

f / 100 0,4 10 20 ------

10 MHz – 10 GHz

------ 0,4 10 20 ------

10 GHz – 300 GHz

------ ------ ------ ------ 50

Quadro 3.14 – Níveis de segurança recomendados pela Directiva

Europeia 2004/40/EC.

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166

Frequências Intensidade do campo eléctrico

(V/m2)

Intensidade do campo magnético

(A/m2)

Densidade de potência para uma

onda plana equivalente

(W/m2)

Corrente de contacto

(mA)

Corrente induzida nos

membros (mA)

0,1 – 1 MHz

610 1,6 / f ------ 40 ------

1 – 10 MHz

610 / f 1,6 / f ------ 40 ------

10 – 110 MHz

61 0,16 10 40 100

110 – 400 MHz

61 0,16 10 ------ ------

400 – 2000 MHz

3 f 1/2 0,008 f 1/2 f / 40 ------ ------

2 – 300 GHz

137 0,36 50 ------ ------

Quadro 3.15 – Níveis de segurança das grandezas induzidas recomendados pela

Directiva Europeia 2004/40/EC.

3.3.20. Factores de Segurança Em termos científicos históricos, fixou-se inicialmente um factor de segurança

igual a 10, baseado numa exposição de 0,1 W/cm2, valor este obtido tendo em

atenção um indivíduo do sexo feminino com uma massa de 70 kg e com uma

área superficial total de 3000 cm2. Posteriormente, concluiu-se não só que esta

área superficial é bastante mais elevada, próxima de 20000 cm2, mas também

que o efeito da radiação, correspondente àquele valor inicial, era 20 vezes mais

elevado que o suportável pelo corpo humano, daí que o valor normalizado

tivesse sido reduzido para 10 mW/cm2, ou seja, 10 vezes inferior. Saliente-se

que este limite representou a base para a recomendação C95.1, de 1966.

De um modo geral, as regulamentações e normas em vigor incluem logo à

partida, na sua elaboração, um factor de segurança que conduz aos limites

máximos apresentados, de uma forma em que esses limites correspondem a

níveis de exposição bastante mais reduzidos que aqueles que efectivamente se

verificam na realidade, em locais onde poderão ocorrer efeitos perigosos para a

saúde humana. Como se compreende, os factores de segurança utilizados na

elaboração da regulamentação reflectem as incertezas existentes no que

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167

concerne não só ao desconhecimento científico dos mecanismos de interacção

entre a radiação electromagnética e os tecidos biológicos, mas também, como

consequência, ao desconhecimento dos níveis exactos de radiação acima dos

quais se manifestam efeitos potencialmente perigosos.

Além disso, estes factores de segurança, cujos valores se podem situar entre

10 e 1000, são igualmente introduzidos no sentido de se ter em linha de conta

a diferença de sensibilidade do organismo humano aos efeitos das radiações,

ou seja, são atribuídos também com o objectivo de proteger as pessoas mais

sensíveis aos campos electromagnéticos. Na prática, a maioria dos regula-

mentos e normas de segurança publicados adoptam, para o estabelecimento

dos limites máximos de segurança em locais públicos, um factor de segurança

com o valor 50.

3.3.21. Taxa de Absorção Específica Como se salientou no capítulo 1, a SAR relativa ao corpo humano não

consegue ser medida directamente. Na prática, contudo, pode ser determinada

empirica ou teoricamente, a despeito das limitações das metodologias utili-

zadas. Por conseguinte, como se tem, respectivamente:

ρσ 2ESAR =

dtTdCSAR =

conclui-se assim que existem duas alternativas para o cálculo da SAR, ou seja,

através da medição do valor da intensidade do campo eléctrico, ou da medição

do valor da temperatura dos tecidos biológicos, cálculo esse que tem em

consideração as propriedades electromagnéticas dos tecidos biológicos, como

é o caso das suas constantes dieléctricas e das suas condutividades eléctricas,

sendo de salientar que a fiabilidade dos valores obtidos, maioritariamente in

vivo, depende das técnicas de medição utilizadas.

Na prática, para melhor se caracterizar os potenciais efeitos térmicos da

radiação electromagnética, definem-se e avaliam-se dois tipos de SAR: 1) o

valor médio no corpo inteiro, e 2) o valor de pico local, quando a potência

absorvida se encontra confinada a uma determinada região do corpo, como

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168

sucede com a cabeça quando se utiliza um telefone celular. O valor máximo da

SAR no corpo inteiro ocorre para a frequência de ressonância, normalmente

situada entre 60 MHz e 80 MHz, e que depende da dimensão do corpo e da

sua orientação face aos campos eléctricos e magnéticos incidentes, ou seja, da

sua orientação relativamente às ondas electromagnéticas incidentes.

Ambos as variantes de SAR – corpo inteiro e partes localizadas –, são

calculadas em termos de valores médios, para um determinado intervalo de

tempo e para uma massa de tecido biológico, de forma cúbica, com 1 g ou com

10 g, sendo a SAR de 1 g a representação mais precisa da energia de RF

localizada assim como a melhor medida da sua distribuição.

Adicionalmente, a SAR localizada é baseada nas estimativas obtidas a partir da

SAR média de corpo inteiro, considerando um factor de segurança de 20.

Nos quadros 3.16 a 3.18 mostram-se, em termos comparativos, os níveis

máximos recomendados da SAR, relativos a diversas normas.

Normas Gama de frequências

SAR para o corpo inteiro

Locais públicos Locais ocupacionais

W/kg Tempo de exposição

(min)

W/kg Tempo de exposição

(min)

ARPANSA 100 kHz – 6 GHz

0,08 6 0,4 6

MCTJ (1) 100 kHz – 6 GHz

0,04 6 0,4 6

Safety Code 6

100 kHz – 10 GHz

0,08 6 0,4 6

ICNIRP 100 kHz – 6 GHz

0,08 6 0,4 6

FCC 100 kHz – 6 GHz

0,08 30 0,4 6

NRPB 100 kHz – 6 GHz

0,4 15 0,4 15

ANSI/IEEE 100 kHz – 6 GHz

0,08 30 0,4 6

(1) – Ministério dos Correios e Telecomunicações do Japão.

Quadro 3.16 – Valores da SAR para o corpo inteiro, para diversas normas de

segurança.

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169

Relativamente aos valores da SAR para o corpo inteiro, constata-se o seguinte:

• Para locais públicos, o valor predominante é 0,08 W/kg, exceptuando as

normas japonesas MCTJ (0,04 W/kg), que são as mais seguras, e as

inglesas NRPB que, com 0,4 W/kg, são as mais permissivas.

• Para locais ocupacionais, o limite máximo admissível é o mesmo, isto é,

0,4 W/kg.

• Para locais públicos, o tempo médio de exposição é de 6 minutos,

exceptuando as normas americanas FCC e ANSI/IEEE, com 30 minutos,

e as inglesas NRPB, com 15 minutos.

• Para locais ocupacionais, todas as normas impõem 6 minutos de

exposição, excepto as inglesas NRPB, com 15 minutos.

• As normas inglesas NRPB, além de recomendarem o nível de SAR mais

elevado, não diferenciam locais públicos de locais ocupacionais.

• Por exemplo, comparando as normas mais rigorosas com a norma

inglesa, tem-se, em termos comparativos, respectivamente:

(0,04 W/kg) x (6 minutos) = 0,24 W/kg x min (público)

(0,4 W/kg) x (15 minutos) = 6,00 W/kg x min (público e ocupacional)

(0,4 W/kg) x (6 minutos) = 2,40 W/kg x min (ocupacional)

• O limite aceite para a SAR relativa ao corpo inteiro é 0,08 W/kg para

locais públicos, e 0,4 W/kg para locais ocupacionais, valores esses

baseados numa SAR de 4 W/kg, considerada como sendo o nível acima

do qual se detectaram efeitos nocivos. Note-se que o factor de segu-

rança adoptado é igual a 50 para o público, e de 10 para os locais

ocupacionais. Note-se que, como foi salientado anteriormente, a razão

entre os limites da SAR para locais públicos e locais ocupacionais, é

igual a 1/5.

Relativamente aos quadros 3.17 e 3.18, relativos respectivamente aos limites

da SAR para a cabeça e para os membros, constata-se o seguinte:

• Para a SAR localizada na cabeça, o limite mínimo de 1,6 W/kg sobre 1 g

de tecido é aceite nos Estados Unidos, enquanto que o limite de 2 W/kg

para 10 g de tecido, desenvolvido pelo ICNIRP é comum na Europa,

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170

Austrália, Japão e noutros países. Todavia, dizer-se qual destes dois

limites é o mais seguro tem gerado alguma controvérsia.

• Para a SAR localizada nos membros, os limites recomendados são

iguais para todas as normas, exceptuando para a NRPB, que não

diferencia locais públicos de locais ocupacionais.

Saliente-se que, para frequências relativamente baixas, isto é, situadas entre

0,1 MHz e 10 MHz, a energia electromagnética absorvida é menos importante

que a densidade de corrente, ou a corrente total, induzidas nos tecidos

biológicos pelo campo eléctrico e pelo campo magnético, associados, e que

poderão afectar o sistema nervoso.

Normas Gama de

frequências

SAR localizada na cabeça

Locais públicos Locais ocupacionais

W/kg Tempo de expo-

sição (min)

Massa média

(g)

W/kg Tempo de expo-

sição (min)

Massa média

(g)

ARPANSA 100 kHz –

6 GHz

2 6 10 10 6 10

MCTJ (1) 100 kHz –

6 GHz

2 6 10 8 6 10

Safety Code

6

100 kHz –

10 GHz

1,6 6 1 8 6 1

ICNIRP 100 kHz –

6 GHz

2 6 10 10 6 10

FCC 100 kHz –

6 GHz

1,6 ------ 1 8 6 1

NRPB 100 kHz –

6 GHz

10 6 10 10 6 10

ANSI/ IEEE

100 kHz –

6 GHz

1,6 30 1 8 6 1

(1) – Ministério dos Correios e Telecomunicações do Japão.

Quadro 3.17 – Valores da SAR localizada na cabeça, para diversas normas de

segurança.

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Normas Gama de

frequências

SAR localizada nos membros

Locais públicos Locais ocupacionais

W/kg Tempo de expo-

sição (min)

Massa média

(g)

W/kg Tempo de expo-

sição (min)

Massa média

(g)

ARPANSA 100 kHz –

6 GHz

4 6 10 20 6 10

MCTJ (1) 100 kHz –

6 GHz

------ ------ ------ ------ ------ ------

Safety Code

6

100 kHz –

10 GHz

4 6 10 20 6 10

ICNIRP 100 kHz –

6 GHz

4 6 10 20 6 10

FCC 100 kHz –

6 GHz

4 ------ 10 20 6 10

NRPB 100 kHz –

6 GHz

20 6 100 20 6 100

ANSI/ IEEE

100 kHz –

6 GHz

4 30 10 20 6 10

(1) – Ministério dos Correios e Telecomunicações do Japão.

Quadro 3.18 – Valores da SAR localizada nos membros, para diversas normas de

segurança.

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172

BIBLIOGRAFIA

1. Livros

[1] – John D. Kraus, “Electromagnetics”. McGraw-Hill International Editions, Electrical Engineering Series, fourth edition, New York, USA, 1991.

[2] – Riadh W. Y. Habash, “Electromagnetic Fields and Radiation. Human Bioeffects and Safety”. Marcel Dekker, Inc., New York, USA, 2002.

[3] – Riadh W. Y. Habash, “Bioeffects and Therapeutic Applications of the Electromagnetic Energy”. CRC Press, Taylor & Francis Group, Boca Raton, Florida, USA, 2008.

[4] – Carlos M. P. Cabrita, “Efeitos Biológicos dos Campos Electroma-gnéticos e da Radiação”. Edição do autor, Universidade da Beira Interior, Covilhã, 2008.

[5] – Carlos M. P. Cabrita, “Efeitos Terapêuticos e Aplicações Médicas da Energia Electromagnética”. Edição do autor, Universidade da Beira Interior, Covilhã, 2008.

Como se pode constatar, esta bibliografia encontra-se ordenada por ordem

crescente do ano de publicação e, para o mesmo ano, por ordem alfabética do

primeiro nome dos autores. A estrutura deste nosso livro de apoio, no que

respeita aos conteúdos e às imagens e esquemas inerentes a todos os seus

capítulos baseia-se essencialmente nas referências [2] e [3], assim como nas

referências [4] e [5], complementando as obras do Professor Riadh Habash. A

referência [1], que constitui desde sempre uma obra clássica do

electromagnetismo, é bastante importante no que concerne ao estudo dos

campos electromagnéticos, incluindo o campo magnético terrestre e a

distribuição electromagnética na atmosfera, tendo contribuído para a escrita do

capítulo 1. Quanto aos restantes capítulos, isto é o 2 e o 3, a sua escrita

baseou-se nas referências [2] e [3], complementadas pelas referências [4] e [5]

relativamente a muitos dos assuntos abordados. Saliente-se que as referências

[2] e [3] repre-sentam obras de excelência na temática científica dos campos

electroma-gnéticos e sua influência sobre os sistemas biofísicos, e apresentam

um conjunto notável, e em grande quantidade, de referências bibliográficas que

incluem livros, artigos científicos, e relatórios médicos.

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173

Com base em Habash, [2] e [3], apresenta-se seguidamente uma listagem de

revistas científicas especializadas na investigação dos efeitos biofísicos dos

campos electromagnéticos, assim como uma relação de diversos organismos

estrangeiros, relacionados com este tema.

2. Revistas Científicas

Advances in Electromagnetic Fields in Living Systems

American Journal of Epidemiology

American Journal of Public Health

Annals of Biomedical Engineering

Bioelectromagnetics

Biomedical Radioelectronics

Biophysical Journal

British Medical Journal

Cancer Causes and Control

Compliance Engineering

Computers in Biology and Medicine

Electromagnetic Fórum

Epidemiology

EPRI Journal

Health Physics

IEEE Proceedings in Medicine and Biology Magazine

IEEE Transactions on Antenna and Propagation

IEEE Transactions on Biomedical Engineering

IEEE Transactions on Electromagnetic Compatibility

IEEE Transactions on Microwave Theory and Techniques

International Journal of Radiation Biology

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174

Journal of Biological Chemistry

Journal of Comparative Physiology

Journal of Microwave Power

Journal of the American Medical Association

Journal of Theoretical Biology

Nature

New England Journal of Medicine

Physical Review

Physics Today

Proceedings of the National Academy of Sciences

Public Health

Radiation Research

Science

The Cancer Journal

Transmission and Distribution World

Wirelesseurope

3. Organismos Estrangeiros

Organismos Países Endereços na internet

Califórnia EMF Program USA www.dnai.com/~emf/

Coghill Research Laboratories Ltd

UK www.congresslab.demon. co.uk/

Electric Words Australia www.electric-words.com/

EM Bioprotection USA www.emxgroup.com/

EM Facts Consultancy Austrália www.tassie.net.au/emfacts/

EMF Effects USA www.thwww.com/mrwizard/ wizardEMF.HTM

Page 190: CAMPOS ELECTROMAGNÉTICOS EM SISTEMAS BIOFÍSICOSwebx.ubi.pt/~catalao/livro3.pdf · eléctrico e do campo magnético, estudam-se as quatro equações de Maxwell na forma integral,

175

EMF Guru USA www.emfguru.com/

EMF/RFR Bioeffects and Public Policy

USA www.wave-guide.org/

F.A.C.T.S. USA www.flipag.net/nopoles/

FEB Suécia www.feb.se/

Frequently Asked Questions on Cell Phone Antennas and Human Health

USA www.mcw.edu/gcrc/cop/cell-phone-health-FAQ/toc.html

Frequently Asked Questions on Power Lines and Cancer

USA www.mcw.edu/gcrc/cop/powerlines-cancer-FAQ/toc.html

Frequently Asked Questions on Static Electromagnetic Fields and Cancer

USA www.mcw.edu/gcrc/cop/static-fields-cancer-FAQ/toc.html

International EMF Project Suíça www.who.ch/emf/

Less EMF USA www.lessemf.com/emf-news.html

Microwave News USA www.microwavenews.com/

NEFTA USA kato.theramp.net/nefta/

NRPB UK www.nrpb.org.uk/

OSHA USA www.osha-slc.gov/SLTC/ radiofrequencyradiation/

Powerwatch UK www.powerwatch.org.uk/

Radiation and Health Physics USA www.umich.edu/~radinfo/

RF Safe USA www.rfsafe.com/

RF Safety Program USA www.fcc.gov/oet/rfsafety/

SARData USA www.sardata.com/

SARTest UK www.sartest.com/