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CAMPUS UNIVERSITRIO EDVALDO DE SOUZA DO CAMPUS I CENTRO DE EDUCAO CEDUC
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA E CINCIAS SOCIAIS DFCS LICENCIATURA PLENA EM FILOSOFIA
MARLIA FREITAS DE ARAJO
LVINAS: FUNDAMENTOS PARA UMA FILOSOFIA DA ALTERIDADE
CAMPINA GRANDE PB
2014
MARLIA FREITAS DE ARAJO
LVINAS: FUNDAMENTOS PARA UMA FILOSOFIA DA ALTERIDADE
Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao Curso de Graduao de Licenciatura Plena em Filosofia da Universidade Estadual da Paraba - UEPB, em cumprimento exigncia para obteno do grau de Licenciado em Filosofia.
Orientador: Prof.Dr.Julio Cesar Kestering
CAMPINA GRANDE PB 2014
Somos todos culpados de tudo e de todos
perante todos, e eu mais do que os outros.
Dostoievsky
LVINAS: FUNDAMENTOS PARA UMA FILOSOFIA DA ALTERIDADE
ARAJO, Marlia Freitas de.1
RESUMO
Lvinas, nos seus escritos filosficos, questiona a tradio filosfica ocidental que esteve, na maioria das vezes, fundamentada numa ontologia da guerra e numa estrutura centralizada do sujeito autnomo, no havendo espao ali para um discurso sobre a alteridade, sobre a relao do sujeito com o outro ser humano. No nosso estudo apresentaremos, resumidamente, alm dessas tendncias constatadas na tradio filosfica, as bases/fundamentos para uma filosofia da alteridade presentes nas reflexes de Lvinas. Nosso objetivo analisar como se articulam as relaes ticas nos seus escritos filosficos a partir do encontro do Eu com o rosto o Outro; buscaremos esclarecer sobre a proposta lvinasiana de uma filosofia voltada para a alteridade, para o Outro. Este trabalho de tipo bibliogrfico com carter interpretativo; visa uma compreenso distinta do tema abordado. PALAVRAS-CHAVE: Lvinas. Filosofia. Alteridade.
1 Graduanda em Filosofia, pela Universidade Estadual da Paraba UEPB. E-mail: [email protected]
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INTRODUO
No pensamento filosfico contemporneo encontramos um pensador que props novos
fundamentos para uma filosofia da alteridade: Emmanuel Lvinas. O pensador se define como
pensador tico. Disso resulta uma das teses fundamentais de seu pensamento filosfico: A
moral preside a obra da verdade [...]. A moral no um ramo da filosofia, mas a filosofia
primeira (LVINAS, 1988, p. 284). Isso significa que todos os outros ramos do pensamento
deveriam adquirir seu sentido de ser a partir da tica.
Nas pginas que seguem buscaremos um esclarecimento luz dos escritos
lvinasianos, sobre as bases/fundamentos de um pensamento voltado a alteridade.
Assim, como base nos nossos estudos, dividimos a nossa pesquisa em trs partes.
Primeiramente contextualizaremos o pensamento de Lvinas, analisando resumidamente os
fatos histricos que nortearam sua vida e obra. Para isso, utilizamos sobremaneira a entrevista
concedida por Lvinas a Franois Poiri e a Phelippe Nemo, presente na obra tica e Infinito.
Assim, esse ponto pretende introduzir de forma basilar os aspectos fundamentais da vida de
Emmanuel Lvinas.
Posteriormente, no segundo tpico, apontaremos como Lvinas desenvolveu sua
crtica ao pensamento filosfico tradicional. A ontologia da guerra mostra-se, na histria do
pensamento ocidental, como caracterizao do Outro ao Mesmo, no havendo possibilidade
de transcendncia do outro como o outro. A tradio filosfica ocidental mostrou-se, tambm,
profundamente centrada no Eu.
No terceiro tpico abordaremos as bases/fundamentos apresentados por Lvinas para
uma filosofia da alteridade. O princpio da filosofia no seria mais um discurso sobre o ser,
mas um discurso sobre as relaes humanas, que surge a partir do contato com o rosto de
Outrem. A epifania do rosto rompe com a estrutura egosta da totalidade. Assim, o outro
respeitado com o outro. Atravs da responsabilidade concretiza-se uma relao
verdadeiramente tica. Esse tpico caracteriza a maturidade do pensamento filosfico de
Lvinas, exposto sobre maneira na obra Totalidade e Infinito, em que a tica alcana uma
posio definitiva, como filosofia primeira.
No nosso estudo, tomamos como obras bsicas Totalidade e Infinito e tica e Infinito;
no deixamos de lado, contudo, outros escritos de Lvinas como, por exemplo, Entre ns:
ensaios sobre a alteridade e Descobrindo a existncia em Heidegger e Husserl, que foram de
extrema importncia para conhecermos melhor as argumentaes do filsofo, quanto a
fundamentao de uma filosofia da alteridade.
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Para melhor fundamentarmos as argumentaes de nosso trabalho monogrfico,
ultilizamos tambm o livro O homem messinico de Luiz Carlos Susin. Outro livro
constantemente utilizado foi Sobre o dilogo: introduo a uma leitura filosfica de E.
Lvinas e H. U. Balthasar de Julio Cesar Kestering, que aborda, sobre tudo, nos trs primeiros
captulos, os conceitos lvinasianos de uma filosofia da alteridade de forma coerente.
Tambm utilizamos o livro Lvinas: uma introduo de M.L. Costa e a introduo ao
pensamento de Lvinas Compreender Lvinas de B. C. Hutchens. Utilizamos igualmente,
como obras de apoio, o Dicionrio Filosfico de Nicola Abbagnano, Ser e Tempo de
Heidegger e Do dilogo do dilogo de Buber, que foram muito importantes na compreenso
dos conceitos em questo.
Nossa abordagem primeiramente filosfica tendo como caracterstica um tipo de
pesquisa bibliogrfica, com carter interpretativo; visa compreenso do pensamento do
filsofo quanto ao tema abordado.
CONTEXTUALIZAO DO PENSAMENTO FILOSFICO LVINASIANO
O filsofo Emmanuel Lvinas pertence a um grupo de pensadores do sculo passado
de tradio judaica; podemos destacar entre esses Martin Buber, Franz Rosenweig, Walter
Benjamin, Ernest Bloch, Emil Fackenheim (Cf. HUCHENS, 2007, p. 24). Nas obras da
maioria desses pensadores acontece um paralelo reflexivo entre as noes filosficas
tradicionais do ocidente e a sabedoria religiosa judaica. Em Buber e Lvinas, o elemento que
caracteriza sobremaneira suas reflexes filosficas o dilogo. A despeito da temtica, Buber
fala na obra O dilogo ao dilogo da seguinte forma:
[...] homens de diferentes espcies e tradies puseram-se nestes tempos a procurar o tesouro errado. [...] esta [...] a transformao decisiva que se deu numa srie de espritos na poca da Primeira Guerra Mundial. Ela manifestou-se em sentidos e mbitos mltiplos, mas a comunho fundamental e originria da reveladora transformao da ao humana fundamental (1982, p. 164-165).
Lvinas nasceu em Kaunas, na Litunia, em 1906. Em 1923 imigrou com sua famlia
Frana, adotando logo em seguida a cidadania deste pas. At 1930 teve contato srio com a
filosofia na Universidade de Estrasburgo: O contato srio com a literatura especificamente
filosfica e com os filsofos, foi em Estrasburgo (LVINAS, 1982, p. 19). Durante este
perodo estudou os grandes filsofos: Plato, Aristteles, Descartes e Kant. Nos anos de 1928
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e 1929 participou de seminrios na Alemanha sobre a filosofia de dois pensadores que
exerceriam posteriormente grande influncia na constituio de seu pensamento: Husserl e
Heidegger.
Com Husserl, Lvinas descobriu O sentido concreto da prpria possibilidade de
trabalhar em filosofia (LVINAS, 1982, p. 22); e tambm, em 1930, conclui seu doutorado,
abordando temtica da filosofia husserliana, intitulado A teoria da intuio na fenomenologia
de Husserl. Anos mais tarde, Lvinas tambm participou da traduo das Meditaes
cartesianas para o francs. O filsofo pe em destaque sobremaneira a metodologia do
trabalho fenomenolgico husserliano.
Evocao das intenes ofuscadas do pensamento; a metodologia do trabalho fenomenolgico est tambm na origem de algumas ideias que me parecem indispensveis a toda a anlise filosfica. o novo vigor dado ideia medieval da intencionalidade da conscincia: toda a conscincia conscincia de alguma coisa, no descritvel sem referncia ao objeto que ela pretende. Focagem intencional que no um saber, mas que, nos sentimentos ou aspiraes, , com o seu prprio dinamismo, efectivamente qualificada (LVINAS, 1982, p. 24).
Em Heidegger, como se pronuncia em seu livro Entre ns, composio de ensaios
sobre a alteridade, Lvinas reconhece O maior filsofo do sculo, talvez um dos maiores do
milnio (LVINAS, 2005, p. 158). Mesmo no esquecendo e nem desculpando sua
participao no nacional-socialismo (LVINAS, 1982, p. 33) o pensador judeu reconhece a
importncia da obra Ser e Tempo na formao de seu prprio pensamento: Muito cedo tive
grande admirao por este livro. um dos mais belos livros da filosofia (LVINAS, 1982,
p.19). explicita as razes dessa admirao:
Nas anlises da angstia, da preocupao, do ser-para-a-morte do SeinundZeit, assistimos a um exerccio soberano da fenomenologia. Este exerccio extremamente brilhante e convincente. Visa descrever o ser ou o existir do homem no a sua natureza. O que se chamou o existencialismo foi, certamente, determinado pelo SeinundZeit. Heidegger no gostava que se desse ao seu livro este significado existencialista; a existncia humana interessava-lhe enquanto lugar da ontologia fundamental; mas a anlise da existncia feita no livro marcou e determinou as anlises ulteriormente chamadas existencialistas (LVINAS, 1982, p. 31-32).
Mas preciso ressaltar que, ainda que a obra de Husserl e Heidegger tenham
influenciado profundamente a prpria formao intelectual e as reflexes filosficas
lvinasianas, elas contm do mesmo modo profundas crticas mesma, demonstrando a
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necessidade de uma filosofia autrementqutre ou au-del de lessence e alm de uma
conscincia intencional na predominncia da estrutura noema-noesis.
Ver, saber, ter e poder so tambm, segundo a concepo filosfica de Lvinas, categorias fundamentais da fenomenologia de Husserl e da ontologia de Heidegger. A encontramos e imperialismo subjetivo do conhecimento terico da filosofia tradicional [...]. A primazia da relao sujeito-objeto no superada na relao com o Outro. Essas filosofias tendem totalidade da compreenso do ser e da conscincia intencional em sua estrutura noesis-noema e que confirma a dominao tradicional do Outro pelo Mesmo (KESTERING, 2008, p. 44).
Na formao intelectual de Lvinas, no somente os filsofos citados exerceram um
papel fundamental; tambm a literatura, especialmente os clssicos russos, a Bblia e o
Talmude, no podem, neste sentido, deixar de serem levados em considerao. Sobremaneira
a reflexo bblica destacar-se- posteriormente de modo essencial nas suas reflexes
filosficas. Podemos afirmar com Kestering (Cf. 2008, p. 29-30) que ela constitui uma das
chaves de interpretao fundamentais do pensamento filosfico lvinasiano. Neste sentido, a
despeito da relao entre filosofia e religio, Lvinas se expressa da seguinte forma:
O sentimento religioso, tal como o recebi, consistia no mais respeito pelos livros a Bblia e seus comentrios tradicionais, que remontam s origens do pensamento dos antigos rabinos do que em determinadas crenas. O sentimento de que a Bblia o Livro dos livros em que se dizem as coisas primeiras, as que se deviam dizer para que a vida humana tenha um sentido, e se dizem sob uma forma que abre aos comentadores as prprias dimenses da profundidade, no era uma simples substituio de um juzo literrio conscincia do sagrado. a extraordinria presena das suas personagens, esta plenitude de tica e as misteriosas possibilidades da exegese que significam originalmente, para mim, a transcendncia. E o mnimo. No era pouco entrever e sentir a hermenutica, com todas as suas ousadias, como vida religiosa e como liturgia. Os textos dos grandes filsofos, como o lugar que a interpretao tem na sua leitura, pareceram-me mais prximos da Bblia do que opostos a ela, ainda que a concretizao dos temas bblicos no se refletisse imediatamente nas pginas filosficas. Mas no tinha a impresso, quando principiante na matria, de que a filosofia era essencialmente ateia, e hoje tambm no penso assim. E se, em filosofia, o versculo no pode substituir a prova, o Deus do versculo, apesar de todas as metforas antropomrficas do texto, pode permanecer a medida do Esprito para o filsofo (LVINAS, 1982, p. 17).
A histria pessoal do pensador e neste sentido, como o parecer de muitos
estudiosos, no se deveria separar biografia e bibliografia lvinasianas foi marcada tambm
pela perseguio e pela guerra. Vtima dos nazistas oi prisioneiro durante o perodo da
Segunda Guerra Mundial (1939-1945). A guerra tambm dizimou grande parte de sua famlia
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nos campos de concentrao. Neste sentido poderamos afirmar que sua filosofia teve incio
no pasmo diante das possibilidades inerentes liberdade humana, no horror do dio que um
homem capaz de sentirdiante do outro (KESTERING, 2008, p.18).
Aps a guerra, Lvinas lecionou nas universidades francesas de Poitiers, Paris-
Nanterre e Sorbona. Suas principais obras filosficas so: Descobrindo a existncia com
Husserl e Heidegger, Totalidade e Infinito,Autrementquetre ou ou-del de lessence, Entre
ns. Lvinas faleceu no dia 24 de dezembro de 1995 em Paris.
CRTICA LVINASIANA TRADIO FILOSFICA OCIDENTAL
Segundo Lvinas, a tradio filosfica ocidental caracteriza-se sob dois modos muito
particulares de pensar: ou defende uma ontologia totalitria da guerra ou mostra-se como
tendncia constante ao centralismo do eu.
Primeiramente Lvinas percebe que o pensamento ocidental fundamenta-se
preferencialmente em princpios ontolgicos deriva da uma ontologia do poder ou da guerra:
A filosofia ocidental foi, na maioria das vezes, uma ontologia: uma reduo do outro ao
Mesmo, pela interveno do termo mdio e neutro que assegura a inteligncia do ser
(LVINAS, 1988, p. 31). O pensamento ocidental possui a tendncia de querer dar conta de
tudo, de tudo entender, dominar de modo que as coisas percam definitivamente seus segredos.
Dispensa-se desta forma de pensamento toda diferena ou transcendncia, tudo deve ser
reduzido a uma totalidade.
O ser apresenta sua face no horror aquilo a tudo que diferente. A ordem da totalidade no deixa espao para aquilo que diferente. A guerra nega o reconhecimento do outro como o outro. Ela apresenta o ser. Destri, contudo, a pessoa humana. A dinmica da guerra resume-se a fora que destri o outro em seu ser-diferente (KESTERING, 2008, p. 39).
A guerra retrata um conjunto de interesses egostas, nela os indivduos so movidos
por um sentimento de conquista e de vitria. A ordem da guerra abarca tudo, ningum
responde nela por si mesmo. Para Lvinas, a guerra se situa alm do fato militar, do fato
blico; encontra-se na histria do desenvolvimento do espirito filosfico. A ontologia da
guerra [...] est presente na tradio milenar da filosofia (KESTERING, 2008, p. 42).
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Para Lvinas, a guerra no destri somente os bens materiais, mas limita ou elimina
toda estrutura pessoal2. Lvinas chama nossa ateno para os princpios que sustentam e
mantm a guerra: O outro aquele com quem se est em guerra (KESTERING, 2008,
p.43), e em guerra permanente. E issoresume nossa civilizao: civilizao ocidental da
propriedade, de explorao, de tirania poltica e de guerra (LVINAS, 1997, p.208). O
exerccio da razo oferece possibilidades de conquistas; mas o que impera a tendncia ao
ter, ser e saber. O outro, o diferente deve ser superado, vencido. Uma civilizao pirata o
resultado do movimento centripetal e narcisista deste tipo de pensamento.
A tendncia totalizante da metafisica ocidental surge da forma de uma teoria de poder de duplo aspecto. Por um lado, quando nosso conhecimento adequado realidade, tudo reduzido uniformidade, o que d uma misso epistemolgica realidade. Por outro lado, quando descobrimos o princpio metafisico da diferena que nos permite compreender o incompreendido, reduzimos a diferena a uniformidade por outros meios; isso fortalece os princpios do conhecimento, que do um objetivo a metafisica (HUTCHENS, 2007, p.32).
Lvinas no quer negar de modo algum que a condio humana no seja moldada pela
racionalidade, especialmente nos modos da tecnologia e da poltica, mesmo assim no
concorda que tal projeto totalizante na tradio filosfica ocidental seja a nica resposta
possvel com relao aquilo que se apresenta como diferente de ns. Segundo ele, ns no
estamos atados, presos ao modo ontolgico de ver o mundo. Nem sempre o ser que determina
quem se e que algo seria primordial; consequentemente necessrio abrir na ontologia
uma porta de sada para um mais alm tico que ainda dever ser precisado (COSTA, 2000,
p. 75).
A segunda tendncia no pensamento filosfico ocidental identificada por Lvinas
como centralismo do eu. Neste sentido fala-se de filosofia da autonomia, filosofia da
liberdade, filosofia da identidade do sujeito, ou seja, filosofias chamadas pelo pensador de
filosofia do Mesmo; nelas cada indivduo conhece [...] somente responsabilidade para
consigo mesmo (KESTERING, 2008, p.30).
Para Lvinas essa postura de pensamento possui suas razes desde tempos longnquos,
ou seja, desde a Grcia antiga, por exemplo, nas figuras de Odisseu e de Narciso, passando
pela modernidade na confiana desmedida e prometeica da Deusa-razo at no sculo
2A violncia no consiste tanto em ferir e em aniquilar como interromper a continuidade das pessoas, em faz-las desempenhar papis em que j se no encontram, em faz-las trair, no apenas compromissos, mas a sua prpria substncias, em leva-las a cometer atos que vo destruir toda a possibilidade de ato (LVINAS, 1988, p. 9).
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passado, sobremaneira nas filosofias de Husserl e Heidegger. Tal posicionamento filosfico
egosta, preocupa-se com a defesa da prpria existncia, do prprio ser, o interesse maior est
voltado ao suprimento das prprias necessidades, existe uma luta contra tudo e contra todos
para se garantir a prpria autonomia, a prpria liberdade. Resultado dessa tendncia o
retorno a si, liberdade que gera isolamento, solido. A escolha da filosofia ocidental pendeu
a maior parte das vezes para o lado da liberdade e do Mesmo[...]. Tambm o pensamento
ocidental pareceu excluir frequentemente o transcendente, englobar todo Outro ao Mesmo, e
proclamar o direito da primogenitura filosfica da autonomia (LVINAS, 1997, p.202-203).
Ou dito de outro modo:
A relao pacifica, antialrgica com o outro, esteve raramente no centro das consideraes filosficas. Por isso, Lvinas no poupa crticas a uma tradio filosfica que no considera o Outro como outro [...]. A relao entre o eu e o Outro uma relao de ameaa, conflito, inimizade. O outro aquele com quem se est em guerra. Na tradio filosfica, encontra-se constantemente a tendncia da reduo do outro ao mesmo. Lvinas chama-a de pensamento do mesmo (KESTERING, 2008, p. 42-43).
Como foi dito anteriormente na parte da contextualizao do pensamento lvinasiano,
ainda que Lvinas esteja consciente da importncia das filosofias de Husserl e de Heidegger
para a nossa poca e tambm a sua formao intelectual, v nelas, contudo, filosofias
diretamente comprometidas com a ontologia tradicional da guerra e com o centralismo do eu.
Como sabemos Husserl considerado o pai da fenomenologia, teoria que parte da
premissa de que toda conscincia conscincia de alguma coisa. Nicola Abbangnano, no seu
Dicionrio de filosofia, resume em quatro diferentes tpicos os resultados fundamentais da
investigao fenomenolgica husserliana.
1 O reconhecimento do carter intencional da conscincia, em virtude do qual a conscincia um movimento de transcendncia em direo ao objeto e o objeto se d ou se apresenta conscincia em carne e osso ou pessoalmente; 2 evidencia da viso (intuio) do objeto devida presena efetiva do objeto; 3 generalizao da noo de objeto, que compreende no somente as coisas matrias, mas tambm as formas de categorias, as essncias e os objetos ideais em geral. 4 carter privilegiado da percepo imanente, ou seja, da conscincia que o eu tem das suas prprias experincias, porquanto nessa percepo aparecer e ser coincidem perfeitamente, ao passo que no coincidem na intuio do objeto externo, que nunca se identifica com as aparies conscincia, mas permanece alm delas (ABBAGNANO, 2003, p. 438).
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Como podemos notar, a conscincia exerce na fenomenologia de Husserl uma funo
fundamental; aplicada na relao com as coisas ela responsvel por todo o processo de
objetivao. Aparecer e ser coincidem, ou seja, esse est percipere. A conscincia
objetivante, determinante. Toda percepo percepo do percebido, toda ideia, ideia de um
ideatum, todo desejo, desejo de um desejado, toda emoo, emoo de algo emocionante; mas
todo obscuro pensamento do nosso ser se orienta tambm para qualquer coisa (LVINAS,
1988, p.107). O objeto e s tem sentido na relao com uma conscincia. O objeto
determinado pela Sinngebung, ou seja, pela doao de sentido. O noema resultado da doao
de sentido por parte da conscincia, do sujeito: O acesso ao objeto faz parte do ser do objeto
(LVINAS, 1997, p.140). As coisas so dadas Sinngebung que se sobrepe na relao com
o ser externo; a intencionalidade constitutiva da representao do outro, mas o outro na sua
relao com o sujeito no constitutivo. Desta forma, percebemos que Husserl, no supera a
tendncia a totalidade da filosofia tradicional, sendo o outro sempre reduzido ao Mesmo. A
alteridade, a transcendncia de todo outro no significativa para o sujeito. O Eu permanece
medida\centro na relao com o outro (KETERING, 2008, p.48). Na fenomenologia de
Husserl nada est alm da conscincia; a conscincia se apropria daquilo que est ao seu
alcance.
Com efeito, o aparecimento de um objeto, a representao, sempre medida da conscincia. Ela adequao entre o eu e o no-eu, entre o Mesmo e o Outro. [...] aquilo que surge como ser surge e, por conseguinte encontra-se direta ou indiretamente nos limites de uma conscincia; aquilo que extravasa absolutamente os limites de uma conscincia no nada para essa conscincia (LVINAS, 1997, p. 172).
Para Lvinas, a ontologia de Heidegger3 aparece, mesmo que critique toda a filosofia
tradicional como esquecedora de ser, tambm unida a essa tradio. Desta forma, Heidegger
no destri, mas resume toda uma corrente filosfica ocidental (LVINAS, 1997, p. 231),
no superando, pois, o egosmo ou o imperialismo do sujeito em relao ao Outro. A relao
com o Outro est sob o domnio da compreenso e conquista do ser: A essncia ltima do
Homem e da verdade a compreenso do ser do ente (LVINAS, 1988, p. 32). Ser eu,
significa em Heidegger, querer a verdade do ser: O ser inseparvel da compreenso do ser
3A ontologia de Heidegger determina o sentido do ser a partir do ser do ente que faz as perguntas e dar as respostas: o Dasain. Heidegger reafirma o carter primrio ou privilegiado da ontologia (ABBAGNANO, 2003, p. 666). Neste sentido, diz Heidegger: A questo do ser no se dirige apenas as condies a priori de possibilidades das cincias que pesquisam os entes em suas entidades em que, ao faz-lo, sempre j se movem numa compreenso do ser. A questo do ser visa as condies de possibilidade das prprias ontologias que antecedem e fundem as cincias nticas (HEIDEGGER, 2012, p. 37).
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(que se desenrola no tempo), e ser j apelo a subjetividade (LVINAS, 1988, p. 32).
Consequente
A relao com o ser, que atua como ontologia, consiste em neutralizar o ente para compreend-lo ou captar. No , por tanto, uma relao com o outro como tal, mas a reduo do Outro ao Mesmo. [...] A tematizao e a conceptualizao, alis, inseparveis, no so paz com o Outro, mas supresso ou posse do Outro (LVINAS, 1988, p. 33).
A conscincia de culpa e a vergonha, na qual, segundo Lvinas, a liberdade se
descobre como mortfera no seu prprio exerccio e o eu como usurpador e assassino (Cf.
LVINAS, 1988, p. 71), so termo estranhos filosofia heideggeriana. O pensamento de
Heidegger exalta a vontade de poder; a liberdade heroica realiza-se sem limites e no prazer
sem qualquer culpabilidade a Outrem (LVINAS, 1997, p. 207). Em Heidegger, o ser na
diferena ontolgica destaca-se como absoluto; mas ele no nenhuma pessoa humana, o ser
no fala e nem escuta: O ser do ente um logos que no ver bode ningum (LVINAS,
1988, p. 279). Lvinas detecta, assim, na ontologia fundamental heideggeriana, uma
obedincia sega do sujeito perante um annimo (Cf. LVINAS, 1988, p. 34). Para o pensador
judeu, o Outro o ser Infinito ou a ordem do bem alm do ser, como ainda se ver no nosso
trabalho profundamente mais fundamental que o ser da diferena ontolgica. Em
Heidegger, pelo contrrio, impossvel se pensar o ente alm da ordem do ser, inclusive a
relao social est inclusa nesta estrutura de pensamento.
Heidegger coloca de antemo o fundo do ser como horizonte onde surge todo o ente, como se o horizonte e ainda de limite que ele inclui, e que peculiar da viso, fossem a trama ltima da relao. Alm disso, em Heidegger, a intersubjetividade coexistncia, umns anterior ao Eu e ao Outro, uma intersubjetividade neutra (LVINAS, 1988, p. 55).
Resumidamente poderamos dizer que, segundo Lvinas, tanto Husserl quanto
Heidegger se identificam com uma filosofia do Mesmo e com uma filosofia da totalidade. O
Outro tem, segundo a lgica reflexiva dessas filosofias, sua alteridade suprimida. O que
deveria permanecer na relao fora do eu assimilado, possudo, roubado pelo Eu.
FUNDAMENTOS PARA UMA FILOSOFIA DA ALTERIDADE
Passemos agora a tratar, ainda que de forma abreviada, a temtica das
bases/fundamentos que norteiam a filosofia lvinasiana da alteridade. Diferentemente da
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tradio filosfica da ontologia da guerra e aquela centrada constantemente no Eu, Lvinas
tenta partir de um ponto de vista inicial que possibilite estabelecer novos tipos de relaes
sobremaneira entre os humanos. Adentramos assim num dos temas mais recorrentes da sua
filosofia: do rosto. O rosto pe fim ordem da totalidade, abrindo espao para uma filosofia
da alteridade, para um pensamento no qual o Outro est no centro da ateno do Eu.
- Outrem rosto; mas outrem, igualmente, fala-me e eu falo-lhe. Ser que o discurso humano no tambm uma maneira de romper com o que chama de totalidade? Certamente. Rosto e discurso esto ligados. O rosto fala. Fala, porque ele que torna possvel e comea toda o discurso (LVINAS, 1982, p. 79).
Para Lvinas, pois, o rosto pe fim totalidade; ele desperta o eu para a ordem da
exterioridade, da transcendncia. O rosto d incio ordem tica, ou seja, a uma possibilidade
de um discurso filosfico no qual a alteridade do Outro possa ser respeitada. A filosofia como
tica define-se, assim, como responsabilidade para com o Outro, no-indiferena, sabedoria
do a servio do amo (KESTERING, 2008, p. 57).
O olhar que me ver pe fim minha solido, inaugura um novo reino. Dele vem a luz na qual se poder ver a luz do ser, a abertura puxa a exterioridade necessrias para que a realidade no se torne solido nem destino ou muito. este o sentido positivo de ser um buraco no meu mundo: O olhar por si mesmo [...] o mistrio de toda claridade, o segredo de toda abertura (SUSIN, 1984, p. 206).
Ainda, de acordo com Lvinas, o homem se define pelo olhar; sem o olhar ele seria o
absurdo de um homem sem humanidade; desta forma, parece que na guerra h uma recusa em
se olhar o rosto do outro e esta seria a tragdia maior de toda violncia, de toda guerra ou de
todo assassinato, pois isto, como diz Susin (1984, p. 136), s seria possvel onde houve
primeiro efetivamente o reconhecimento do outro, de sua transcendncia, mas onde o discurso
face-a-face foi substitudo por um ataque pelo flancos atravs de intermedirios.
A partir da manifestao do rosto do Outro o Eu pode sair de sua interioridade, de seu
egocentrismo e tornar-se responsvel pelo outro ser humano. Para Lvinas, o simples olhar
para o Outro j desperta nossa responsabilidade para com ele. Sendo o rosto expresso, fala,
linguagem, ele nos aproxima do Outro; ele rompe com a (nica) ordem do eterno retorno ao
Mesmo, das relaes de necessidade somente do Eu. O dilogo, a linguagem originria um
fundamento um tipo de relao na qual os termos permanecem desligados da relao, fala-se,
neste sentido, de uma multiplicidade, de uma associao, impossibilidade de qualquer
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conciliao no sujeito. Em sua presena-ausncia, o Outro est em sociedade comigo,
associao ao contrrio de desvelamento, compreenso e representao (KESTERING,
2008, p. 58). A linguagem apresenta-se como justia e acolhimento ao outro.4 Para Lvinas,
a essncia da linguagem bondade [...], a essncia da linguagem amizade e hospitalidade
(LVINAS, 1988, p. 285). Da sequncia desses pensamentos o que se segue o seguinte:
Esta inverso humana do em-si e do para-si, do cada um por si, em um eu tico, em prioridade do para-outro, esta substituio ao para-si da obstinao ontolgica de um eu doravante decerto nico, mas nico por sua eleio a uma responsabilidade pelo outro homem irrecusvel e inacessvel esta reviravolta radical produzir-se-ia no que chamo encontro do rosto de outrem (LVINAS, 2005, p. 269).
Diante do rosto do Outro o Eu tanto convidado como tambm desafiado. Suprir
(escutar) as necessidades do Outro significa abandonar o prprio querer, ultrapassa os
limites do prprio egosmo. A filosofia lvinasiana no oferece consolo para o Mesmo; se
assim fosse, seria uma filosofia do egosmo; ela filosofia radical de responsabilidades
infinitas para com os outros seres humanos: um movimento do Mesmo que vai em direo
ao Outro e que jamais retorna ao mesmo (KESTERING, 2008, p. 61). Segundo Susin (1984,
p. 201), Lvinas ao relacionar linguagem e a questo da alteridade adentra uma problemtica
bblica dos excludos da sociedade, contempla, assim a situao do ente, do fraco, do
ignorante, do homem sem cultura e sem fama, o perseguido e o prisioneiro, o homem sem
capacidade e sem beleza, sem dotes, o homem perdido em relao ao mundo e a si
mesmo. Desta forma, a partir do rosto, percebemos que Lvinas inaugura um humanismo
filosfico decididamente centrado no Outro, chamado de humanismo do outro homem,
conforme ttulo de uma de suas obras. Lvinas contrrio a um humanismo que no
distingue as pessoas considerando-as todas ontologicamente iguais e com os mesmos
direitos.
A essncia da linguagem convite, exortao responsabilidade e ao bem do sujeito perante o Outro, em vez de ser-somente-para-si ser-para-o-outro, at os limites do morrer para o outro. [...] O rosto abre o discurso original, cuja primeira palavra obrigao que nenhuma interioridade permite evitar. Discurso que obriga a entrar no discurso (KESTERING, 2008, p. 59).
4Chamamos justia ao acolhimento de frente, no discurso. Se a verdade surge na experincia absoluta em que o ser brilha com a sua prpria luz, a verdade s se produz no verdadeiro discurso ou na justia (LVINAS, 1988, p. 58).
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Como podemos notar, a partir do rosto que fala fundamenta-se um novo tipo de
relao entre os termos, relao de superao do pensamento solitrio, monolgico que no
deixa espao algum para o diferente. A monologia (falar de si, de coisas, dos outros) cede o
seu lugar a ordem tica do dilogo, um saber, uma sabedoria de falar-com-o-outro. O que
impossvel numa ordem da viso torna-se possvel numa ordem do dilogo.
Com efeito, o ser que me fala e a quem respondo ou interrogo no se oferece a mim, no se d de maneira que eu possa assumir essa manifestao, p-la medida da minha interioridade e recebe-la como vinda de mim mesmo. A viso, por seu turno, opera dessa maneira totalmente impossvel no seu discurso. A viso , de facto, essencialmente uma adequao da exterioridade interioridade: a exterioridade funde-se na alma que contempla e, como ideia adequada, revela-se a priori resultante de uma Sinngebung. A peculiaridade do discurso no se converte em interioridade. O interlocutor no pode de modo algum encontrar lugar numa intimidade. Est de fora para sempre. A relao entre os seres separados no os totaliza; [...] o frente a frente do discurso no liga um sujeito a um objeto, difere da tematizao, essencialmente adequada, porque nenhum conceito se apodera da exterioridade (LVINAS, 1988, p. 275).
Lvinas relaciona o rosto com a Ideia do Infinito de Descartes e com a ordem do Bem
alm do ser de Plato. Com isso no quer nem simplesmente apresentar ou defender a
filosofia cartesiana ou a filosofia platnica; o que realmente lhe interessa nessas filosofias a
estrutura formal. Assim, trata, a seu modo, de concretizar a ideia platnica da Bem (Ordem do
Bem) e da Ideia do Infinito em mim, ideia que extrapola o mbito do sujeito (o Outro me
visita). Aquilo que realmente interessa a Lvinas a busca de uma concepo de
subjetividade onde no Outro que visto sob do Eu, conforme a lgica da reduo do Outro
ao Mesmo, mas o sujeito na tica do Outro. O movimento neste ltimo modo de pensar se
inverte. Somente assim poderemos encontrar realmente o Outro na sua alteridade,
fundamentando um novo modo de pensamento, chamado de pensamento tico. Assim
compreendemos quando Lvinas discorre a respeito do seu livro Totalidade e Infinito:
Este livro apresenta-se, pois, como uma defesa da subjetividade, mas no a capitar ao nvel do seu protesto puramente egosta contra a totalidade, nem na sua angstia perante a morte, mas como fundada na ideia de infinito [...] Este livro [apresenta] a subjetividade como acolhendo Outrem, como hospitalidade. Nela se consuma a ideia do infinito (LVINAS, 1988, p. 13-14)
No caso da Ideia do infinito em Descartes o eu encontra-se exposta passividade total,
ela independe dele, ela adentra-o de fora; assim, essa exposio possibilita ao sujeito
embrenhar-se numa nova ordem, numa ordem do Bem alm do ser (alm da ordem
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ontolgica), alm da ordem da totalidade e do centralismo do eu. A interpelao
responsabilidade precede a todas as escolhas egostas. A filosofia de Lvinas um convite a
estar a servio do Outro ser humano nas suas necessidades. Ainda que possamos mostrar-nos
escandalizados com essa concepo humanista de filosofia, ela apresenta-se como
possibilidade no utpica de servio da subjetividade aos outros.
CONSIDERAES FINAIS
No nosso estudo discutimos sobre os fundamentos da filosofia da alteridade de
Emmanuel Lvinas. Os questionamentos da filosofia lvinasiana desperta sobretudo, reflexes
referentes ao agir do intersubjetivo.
Lvinas prope novos modos de compreenso para a tica, que tomam caminhos
divergentes dos discursos, at ento, aceitos pela tradio filosfica. Sua reflexo filosfica
parte, pois, de uma crtica radical ao pensamento filosfico ocidental, que defendeu, na
maioria das vezes, uma ontologia da guerra e uma figura centralizada do Eu, no qual esto
fundamentados discursos violentos para com os outros seres humanos.
Embora a tica tenha se caracterizado ao longo da histria como uma cincia que
estuda o agir humano, no permitiu que seus fundamentos filosficos visassem o bem d outro,
mas admitiu o sujeito agir com intuito de buscar o seu prprio bem, centralizando seus
esforos para si Mesmo, reduzindo, portanto, tudo que lhe exterior a si mesmo,
desrespeitando, inclusive o outro ser humano. A filosofia da alteridade defendida por Lvinas
busca demonstrar esta estrutura egosta presente na tradio filosfica ocidental.
Primeiramente Lvinas aponta as razes que lhe serviram de motivo para desenvolver
uma filosofia voltada para alteridade: o pensador partiu, como visto na contextualizao, de
uma experincia trgica de desvalorizao da dignidade dos seres humanos que viveram
durante a Segunda Guerra mundial. Assim surgiu toda sua crtica totalidade da ontologia da
guerra presente nos discursos filosficos.
Verificou-se tambm que o primeiro momento tico nas relaes humanas surge do
encontro com o rosto do Outro. O rosto fala, expresso, linguagem permite um contato
profundo com a humanidade do outro ser humano. Eis um dos aspectos fundamentais
apontados por Lvinas nas relaes humanas, para que a humanidade (dignidade) do Outro
ser humano seja resgatada e respeitada. O fundamento tico no se encontra mais no eu, mas
no rosto do Outro. Para Lvinas, se o eu existisse s, no haveria tica.
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A tica da alteridade, apresentada por Lvinas, aponta novos paradigmas para a tica
contempornea: responsabilidade e respeito so conceitos que, para o filsofo, deveriam
orientar as relaes intersubjetivas. Notamos tambm que, para Lvinas, na relao tica no
existe reciprocidade, ela doao sem garantias. Ser-tico significa ser responsvel,
interessar-se pelas necessidades do Outro ser humano, sem esperar que haja retorno.
Em suma, o pensamento de Lvinas questiona, sobre tudo, a tese que defende a
ontologia como filosofia primeira. Defende-se, pois, a anterioridade da tica, compreendida a
partir do encontro com o rosto do Outro ser humano, o qual se concretiza como
responsabilidade por Outrem: o rosto seria o prprio comeo da filosofia (LVINAS, 1997,
p. 216).
ABSTRACT
Abstract, KEYWORDS:
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REFERNCIAS ABBAGNANO, N. Dicionrio de Filosofia. So Paulo: Martins Fontes, 2003. BUBER, M. Do dilogo e do dilogo. So Paulo: Perspectiva, 1982. COSTA, M. L. Lvinas: uma introduo. Petrpolis: Vozes, 2000. HEIDEGGER, M. Ser e Tempo. Petrpolis: Vozes, 2002. HUTCHENS, B. C. Compreender Lvinas. Petrpolis: Vozes, 2007. KESTERING J. C. Sobre o Dilogo: Introduo a uma leitura filosfica de E. Lvinas e H. U. v. Balthasar. Campina Grande: EDUEP, 2008. LVINAS, E. tica e Infinito. Dilogo com p. Nemo. Lisboa: Edies 70, 1982. ______. Totalidade de Infinito. Lisboa: Edies 70, 1988. ______. Descobrindo a existncia em Heidegger e Husserl. Lisboa: Instituto PIAGET, 1997. ______. Entre ns. Ensaio sobre a alteridade. Traduo de Pergentino Stefano Pivatto. 2. ed. Petrpolis: Vozes, 2005. SUSIN, L. C. O Homem Messinico: uma introduo ao pensamento de E. Lvinas. Petrpolis: Vozes, 1984.