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CAPÍTULO 10 Verde e Competitivo Acabando com o Impasse Michael E. Porter Claas van der Linde r, A NECESSIDADE DE UMA REGULAMENTAÇÃO que proteja o ambiente tem sido objeto de aceitação ampla, mas relutante: am- pla, porque todos querem um planeta habitável; relutante, em razão da crença persistente de que a regulamentação ambiental solapa a cornpetitivi- dade. A visão predominante é no sentido da existência de um dilema in- trínseco e inevitável: ecolo ia versus.economia. De um lado do dilema, situ- am-se os benefícios sociais decorrentes das normas ambientais rigorosas. Do ------ ~ outro lado, encontram-se os custos privados da indústria para a prevenção e limpeza - custos mle acarretam au~nto de reços e redução da competi- tividade. Com a questão assim estruturada, o progresso em termos de quali- dade ambiental se tornou uma espécie de queda-de-braço. Um lado se empenhapor norm~ severas; o outro peleja ~lo retrocesso na regula- mentação. O equilíbrio do poder pende para um lado ou para o outro, de- pendendo da direção dos ventos políticos. Essa visão-estática da regulamentação arnbiental, na qual tudo é cons- tante, exceto a regulamentação, é incorreta. Se a tecnologia, os produtos, os processos e as necessidades dos clientes fossem fixas, a conclusão de que a Setembro-outubro de 1995. Os autores agradecem a Benjamin C. Bonifant, Daniel C. Esry, Donald B. Marron, Jan Rivkin, Nicolaj Siggelkow e R. David Simpson pelos comentários extremamente úteis; ao Management Institute for Environment and Business pela pesquisa conjunta; e a Reed Hundt pelas discussões constantes que trouxeram grandes benefícios para o pensamento subjacente a esse artigo.

Cap. 10 - Competição - Michael Porter

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CAPÍTULO 10

Verde e Competitivo

Acabando com o Impasse

Michael E. Porter

Claas van der Linder ,

A NECESSIDADE DE UMA REGULAMENTAÇÃO queproteja o ambiente tem sido objeto de aceitação ampla, mas relutante: am-pla, porque todos querem um planeta habitável; relutante, em razão dacrença persistente de que a regulamentação ambiental solapa a cornpetitivi-dade. A visão predominante é no sentido da existência de um dilema in-trínseco e inevitável: ecolo ia versus.economia. De um lado do dilema, situ-am-se os benefícios sociais decorrentes das normas ambientais rigorosas. Do------ ~outro lado, encontram-se os custos privados da indústria para a prevenção elimpeza - custos mle acarretam au~nto de reços e redução da competi-tividade. Com a questão assim estruturada, o progresso em termos de quali-dade ambiental se tornou uma espécie de queda-de-braço. Um lado seempenhapor norm~ severas; o outro peleja ~lo retrocesso na regula-mentação. O equilíbrio do poder pende para um lado ou para o outro, de-pendendo da direção dos ventos políticos.

Essa visão-estática da regulamentação arnbiental, na qual tudo é cons-tante, exceto a regulamentação, é incorreta. Se a tecnologia, os produtos, osprocessos e as necessidades dos clientes fossem fixas, a conclusão de que a

Setembro-outubro de 1995.

Os autores agradecem a Benjamin C. Bonifant, Daniel C. Esry, Donald B. Marron, JanRivkin, Nicolaj Siggelkow e R. David Simpson pelos comentários extremamente úteis; aoManagement Institute for Environment and Business pela pesquisa conjunta; e a ReedHundt pelas discussões constantes que trouxeram grandes benefícios para o pensamentosubjacente a esse artigo.

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regulamentação eleva os custos seria inevitável. Mas as e~resas operam nomundo real da competição dinâmica, não no mundo estático da teoria eco-nômica. Continuamente descobrem soluções inovadoras para pressões detodos os tipos - impostas pelos concorrentes, pelos clientes, pelos regula-dores.

As normas ambientais elaboradas de forma adequada são capazes de de-sencadear inovações que reduzem os custos totais de um produto ou au-mentam seu valor. Essas inovações E-ermitem que as empresas utilizem umagama de insumos de~aneira mais produtiva - abrangendo matéria-prima,energia e mão-de-obra - compensando, assim, os custos da melhoria ~oimpactoambiental e resolvendo o impasse. Em última instância, o aumen-to da produtividade dos recursosfavorece, em vez de comprometer, a compe-titividade das empresas.

Considere a maneira como o setor de floricultura holandês reagiu aosproblemas ambientais. A cultura intensiva de flores em pequenas áreas esta-va contaminando o solo e os lençóis freáticos com pesticidas, herbicidas efertilizantes. Ameaçados por uma regulamentação cada vez mais severa so-bre a utilização de produtos químicos, os holandeses compreenderam que aúnica maneira eficaz de enfrentar o problema consistiria em desenvolverum sistema de ciclo fechado. Atualmente, as flores são cultivadas em sofisti-cadas estufas, em água e lã mineral, e não no solo. Essa alternativa reduz orisco de contaminação, diminuindo a necessidade de.fertilizantes e pestici-das, que já são incluídos na água em circulação e reutilização.

O sistema de ciclo fechado, rigorosamente monitorado, também reduzas variações nas condições de cultivo, melhorando, dessa forma, a qualidadedo produto. Os custos de manuseio também caíram, pois as flores são culti-vadas em plataformas especialmente projetadas para essa finalidade. Assim,ao enfrentar o problema ambiental, os holandeses introduziram inovaçõesque aumentaram a produtividade na utilização de muitos dos recursos en-volvidos no cultivo de flores. O resultado líquido consistiu não apenas naredução drástica do impacto ambiental, mas também na diminuição dos

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custos, na melhoria da qualidade dos produtos e na ampliação da competi-tividade global. (Ver, a seguir, "Inovando para Ser Competitivo: O Setor deFloricultura Holandês".)

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Inovando para Ser Competitivo:O Setor de Floricultura Holandês

o setor de floricultura holandês é responsável por cerca de 65 por cento dasexportações mundiais de flores cortadas - um número estarrecedor, conside-rando-se que os insumos de produção mais importantes do negócio seriam, aprincípio, a terra e o clima. Alguém que tenha estado na Holanda conhece asdesvantagens do país em ambos os fatores. Os holandeses são forçados a recu-perar a terra do mar e o clima é notoriamente problemático.

r" Como os holandeses conseguem ser os líderes mundiais em floricultura..-'quando carecem de vantagens competitivas no sentido tradicional? A resposta,

entre outros motivos, t.gue inovaram em todos os estágios da cadeia de xalo-res, criando tecnologia e insumos altamente eS.Eecializ~os, que aumentam aprodutividade dos recursos e com en~ as desvantagens naturais do país. ~

N as atividades de venda e distribuição, por exemplo, a Holandããrspõe decinco unidades alfandegárias de leilão, destinadas ao negócio florista. Carrinhoscarregados de flores percorrem trilhas computadorizadas na sala de leilão. Oprocesso de compra ocorre em poucos segundos. Os compradores ficam numanfiteatro e o preço de oferta se desloca para baixo no mostrador, até que oprimeiro comprador emita um sinal eletrônico. O código do comprador é afi-xado no carrinho, que é encaminhado para a área de embarque e manuseio daempresa. Em poucos minutos, as flores estão num caminhão, em direção aosmercados regionais, ou em contêineres especiais, pré-resfriados, a caminho doaeroporto Schiphol, situado nas imediações. Bons aeroportos e redes ferroviá-rias talvez também sejam abundantes em outros lugares. Mas a infra-estruturainovadora e especializada da Holanda é uma vantagem competitiva que possi-bilita uma produtividade muito elevada. É um sistema tão bem-sucedido que,na verdade, floricultores de outros países enviam suas flores para a Holanda,por avião, para processamento, venda e reexportação.

Paradoxalmente, a escassez de insumos gerais ou mais elementares às vezesse converte em vantagem. Caso houvesse uma grande disponibilidade de terrae o clima fosse mais favorável, os holandeses competiriam da mesma maneiracomo os demais países. Ao contrário, foram forçados a inovar, desenvolvendoum sistema de alta tecnologia de cultivo em estufas durante todo o ano. Osholandeses aprimoram continuamente a tecnologia exclusiva e especializadaque assegura a alta produtividade dos recursos e sustenta a competitividade.

Em contraste, a abundância de mão-de-obra e de recursos naturais ou afalta de pressões ambientais às vezes induz as empresas do país a gastar de for-ma improdutiva os recursos naturais. A competição baseada em insumos ba-ratos, suscetíveis de utilização com menor produtividade, era suficiente emeconomias mais estanques e menos -globais. Hoje, quando os países emergen-tes, com mão-de-obra e matérias-primas ainda mais baratas, participam daeconomia global, a velha estratégia se tornou insustentável.

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I Este exemplo ilustra por que o debate sobre a relação entre cornpetitivi-dade e ambiente tem sido conduzido da forma incorreta. Os formuladoresdepolíticas, os .líderes empresariais e 0S ambientalistas tê-m focalizado oefeito estático dos custos decorrentes da regulamentação ambiental, igno-rando os beneficios compensadores mais importantes, em termos de produtivi-dade, resultantes da inovação. Por conseguinte, com muita freqüencia, suaforma de atuação aumenta os custos e retarda o progresso nas questões am-bientais. Assim, a atitude mental estática criou uma profecia auto-realizávelque acarreta normas ambientais ainda mais custosas. Os reguladores ten-dem a impor exigências que tolhem a inovação. As empresas, por sua vez,combatem e obstruem a regulamentação, em vez de inovar na sua obser-

I vância. Todo o processo disseminou uma indústria de chicaneiros e consul-~ tores que drenam os recursos das soluções efetivas.

Poluição = Ineficiência

Será que casos como o setor de floricultura da Holanda são a exceção,em vez da regra? Seria ingênuo esperar que a redução da poluição au-mente a competitividade? Achamos que não, e a razão é que a poluiçãogeralmente é uma forma de desperdício econômico. A poluição do am-biente com sucatas, substâncias nocivas ou formas de energia é um sinalde que os recursos foram utilizados de forma incompleta, ineficiente ouineficaz. Além disso, nessas circunstâncias, as empresas são obrigadas aexecutar outras atividades que adicionam custos mas não criam valorpara os clientes: por exemplo, o manuseio, o armazenamento e o descar-te de efluentes.

O conceito de produtividade dos recursos proporciona uma nova ma-neira de abordar os custos totais dos sistemas e o valor associado a qualquerproduto. As ineficiências dos recursos são mais evidentes na forma de utili-zação incompleta dos materiais e de controles deficientes dos processos, queresultam em. desperdícios, em defeitos e no armazenamento de materiaisdesnecessários. Mas também há muitos outros custos ocultos, encobertosno ciclo de vida do produto. As embalagens descartadas pelos distribuido-res e clientes, por exemplo, desbaratam recursos e aumentam os custos. Osclientes suportam custos adicionais quando utilizam produtos que poluemou desperdiçam energia. Esbanjam-se recursos quando se descartam produ-tos que contêm materiais utilizáveis e quando os clientes pagam - de for-ma direta ou indireta - pelo descarte do produto.

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Os esforços de melhoria ambiental tradicionalmente ignoram esses cus-tos dos sistemas. No entanto, se concentram no controle da poluição atra-vés da melhor identificação, processamento e descarte de efluentes ouresíduos - uma abordagem dispendiosa. Nos últimos anos, as empresas eos reguladores mais avançados adotaram o conceito de prevenção da polui-ção, às vezes chamado de redução das fontes, que recorre a métodos comosubstituição de materiais e processos de ciclo fechado, para limitar a polui-ção antes da sua ocorrência.

No entanto, embora a prevenção da poluição seja um passo importantena direção correta; as empresas, em última instância, precisam aprender aabordar a melhoria ambiental em termos de produtividade dos recursos. 1

Atualmente, os gerentes e os reguladores se concentram no custo efetivo deeliminar ou tratar a poluição. Ambos devem ampliar o enfoque, de modo aincluir os custos de oportunidade da poluição - o esbanjamento de recur-sos, o desperdício de esforços e o comprometimento do valor do produtopara o cliente. Sob a abordagem da produtividade dos recurscsça.melhoriaambiental e a competitividade andam juntas.

Essa nova visão da poluição como ineficiência dos recursos evoca a re-volução da qualidade dos anos 80 e seus ensinamentos mais poderosos.Hoje, temos pouca dificuldade em apreender a idéia de que a inovação é ca-Raz de melhorar a qualidade e, ao mesmo tempo, reduzir os custos de formaefetiva. Mas há apenas quinze anos, os gerentes acreditavam tratar-se deuma opção excludente inexorável. A melhoria da qualidade era dispendio-sa, pois seria atingida apenas através da inspeção e do retrabalho dos defei-tos "inevitáveis", que sempre ocorriam no processo. Subjacente à antigavisão, encontrava-se a premissa de que tanto o projeto do produto como oprocesso de produção eram inalteráveis. Todavia, à medida que repensaramas questões de qualidade, os gerentes abandonaram a velha atitude mental.A visualização da ineficiência como indício de deficiência no projeto doproduto e do processo - e não como subproduto necessário da fabricação- representou um marco revolucionário. As empresas agora se esforçampara incorporar a qualidade na totalidade do processo. A~ atitude men-tal liberou o poder da inovação para atenuar ou elimi ar o gQe as empresasde início aceitavam como opções excludentes implacáveis. --- Como defeitos, a poluição freqüentemente revela falhas no projeto do

produto ou no processo de produção. Assim, os esforços para eliminá-Ia po-dem adotar os mesmos princípios básicos de ampla utilização dos progra-mas de qualidade: utilização mais eficiente dos insumos, eliminação danecessidade de materiais perigosos e de difícil manuseio, supressão das ati-

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vidades prescindíveis. Num estudo recente sobre grandes mudanças de pro-cessos de dez fabricantes de placas de circuitos impressos, por exemplo,constatou-se que o pessoal da área de controle da poluição iniciou treze dastrinta e três principais alterações. Das trinta e três mudanças, doze resulta-ram em redução de custo; oito, em melhoria da qualidade e cinco, na am-pliação da capacidade de produção.é Assim, não é surpreendente que agestão da qualidade total (GQT) se transforme em fonte de idéias para ocontrole da poluição capazes de redundar em benefícios compensadores.

A Dow Chemical Company, por exemplo, identificou de forma explí-cita o vínculo entre melhoria da qualidade e desempenho ambiental, atra-vés da utilização do controle estatístico do processo para reduzir a variaçãonos processos e diminuir os desperdícios.

Inovação e Produtividade dos Recursos

Na exploração do papel central da inovação e da ligação entre a melhoriaambiental e a produtividade dos recursos, temos atuado em cooperaçãocom o Management Institute for Environment and Business - MEB(Instituto de Gestão Ambiental e Empresarial) numa série de estudos de ca-sos internacionais de setores e subsetores afetados de forma significativapela regulamentação ambiental: papel e celulose, tintas e revestimentos,produtos eletrônicos, baterias de célula seca e tintas de impressão (ver Qua-dro 10.1). Os dados mostram com nitidez que o~ustos da observância daregulamentação ambiental são suscetíveis de minimização, se não de elimi-nação, através de inovações que proporcionem outros benefícios competiti-vos. De início, observamos o fenômeno no curso das nossas pesquisas paraum estudo da competitividade nacional, A Vantagem Competitiva das Na-ções (Campus, 1993).

Considere o setor químico, no qual muitos acreditam que a opção ex-cludente ecologia-economia é sobremodo aguda. O estudo das atividadespara prevenir a geração de resíduos em vinte e nove fábricas de produtosquímicos descobriu inovações derivadas do esforço preventivo que aumen-taram a produtividade dos recursos. Dentre 181 dessas atividades preventi-vas de desperdício, apenas uma resultou em aumento líquido dos custos.Das setenta atividades com mudanças documentadas no rendimento doproduto, sessenta e oito relatavam aumentos; a média para vinte iniciativasdocumentadas com dados específicos foi de sete por cento. Essas inovaçõesforam atingidas com investimentos surpreendentemente baixos e períodos

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de retorno muito reduzidos. Um quarto das quarenta e oito iniciativas cominformações detalhadas sobre o custo de capital não exigiram qualquer in-vestimento de capital; das trinta e oito iniciativas com dados sobre o perío-do de retorno, cerca de dois terços recuperaram os investimentos iniciaisem seis meses ou menos. As economias anuais por dólar gasto na reduçãodas fontes chegaram à média de três dólares e quarenta e nove centavos paraas vinte e sete atividades em que foi possível esse cálculo. O estudo tambémconstatou que os dois dos principais fatores motivadores das atividades deredução das fontes eram os custos do descarte de resíduos e a regulamenta-ção ambiental.

A inovação em resposta à regulamentação ambiental é passível de en-quadramento em duas grandes categorias. A primeira é a das novas tecnolo-gias e abordagens que minimizam o custo do tratamento da poluição,quando existente. A chave para essas abordagens geralmente reside na cap-tação dos recursos incorporados na poluição e na sua conversão em algo devalor. As~resas estão ficando.mais inteljgentes.na.reciclggem da sucata,na melhoria dos tratamentos secundários e na conversão de materiais eemissões tóxicas em recursos utilizáveis. Por exemplo, na fábrica da Rhô-ne-Poulenc em Chalampe, França, os subprodutos de nylon, conhecidoscomo diácidos, costumavam ser incinerados. A Rhône-Poulenc investiu 76milhões de francos e instalou novos equipamentos para recuperar e venderesses diácidos como aditivos para tinturas e curtimento e como agentes decoagulação. O novo processo de recuperação gerou receitas anuais de 20,1milhões de francos. As recentes tecnologias de retirada de tintura, desenvol-vidas pela Thermo Electron Corporation, situada em Massachusetts, entreoutras, estão possibilitando o uso mais amplo de papel reciclado. A MoltenMetal Technology, de Waltham, Massachusetts, desenvolveu um métodode extração catalítica que reduz custos no processamento de muitos tipos deresíduos perigosos.

O segundo tipo de inovação, muito mais interessante e importante, atacaas causas básicas da poluição a partir da melhoria da produtividade dos recur-sos. Suas conseqüências assumem muitas formas, incluindo a utilização maiseficiente de insumos específicos e o aumento do rendimento e a melhoria dosprodutos. (Ver, a seguir, "A Melhoria Ambiental É Capaz de Beneficiar aProdutividade dos Recursos".) Considere os seguintes exemplos.

A produtividade dos recursos aumenta quando se empregam materiaismenos dispendiosos como substitutos ou quando os existentes são melhorutilizados. O complexo da Dow Chemical, na Califórnia, remove as impu-rezas de gases hidroclóricos com substâncias cáusticas para fabricar uma

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QUADRO 10.1 • A Regulamentação Ambiental Apresenta ImplicaçõesCompetitivas

Setor/Subsetor Questão Ambiental Soluções Inovadoras Conseqüênciasda Inovação

Papel e Celulose Dioxina liberada pelo Melhoria dos processos de Redução dos custosbranqueamento com cozimento e lavagem. operacionais através dacloro. Eliminação do cloro, pelo maior utilização de fontes de

uso de oxigênio, ozônio ou energia secundárias.peróxido na lavagem. Adicional de preço inicial deProcessos de ciclo fechado 25% para papéis sem cloro.(ainda problemáticos).

Tintas e Compostos orgânicos Novas formulações das Adicional de preço paraRevestimentos voláteis (COVs) nos tintas (tintas com baixo tintas sem solventes.

solventes. conteúdo de solventes, tintas Melhoria da qualidade dosà base de água). revestimentos em algunsMelhoria das técnicas de segmentos.aplicação. Benefícios para a segurançaRevestimentos tratados por do trabalho.radiação ou pulverização. Maior eficiência na

transferência derevestimentos.Redução dos custos dosrevestimentos através deeconomias de materiais.

Fabricação de Compostos orgânicos Agentes de limpeza Melhoria na qualidadeprodutos eletrônicos voláteis (COVs) nos semi-aquosos, à base de da limpeza e, portanto, na

agentes de limpeza. terpeno. qualidade do produto.Sistemas de ciclo fechado. Redução de 30% a 80% nosSoldagem sem limpeza, custos de limpeza, comquando possível. período de retorno

geralmente de um ano.Eliminação de um passo deprodução desnecessário.

Refrigeradores Uso de Resfriadores alternativos 10% de melhoria naclorofluorcarbonos (mistura eficiência energética, com(CFCs) como propano-isoburano). mesmo custo.resfriadores. Isolamento mais espesso. 5% a 10% de adicional de

Melhores gaxetas. preço inicial paraAprimoramento dos refrigeradores "verdes".compressores.

Baterias de célula Vazamentos de cádmio, Baterias recarregáveis de Quase duas vezes maisseca mercúrio, chumbo, níquel-hidreto (para eficientes, ao mesmo custo.

níquel, cobalto, lírio e algumas aplicações). Maior eficiência energética.zinco em aterros ou na Baterias recarregáveis de lítio Expectativa deatmosfera (após a (em desenvolvimento). competitividade no preço,incineração) . no futuro próximo.

Tintas para COVs em tintas de Tintas à base de água e à Maior eficiência, cores maisimpressão petróleo. base de soja. brilhantes e aumento da

rentabilidade (dependendo.das aplicações).

Fontes: Benjamin C. Bonifant, lan Ratcliffe e Claas van der Linde.

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ampla variedade de produtos químicos. A empresa costumava armazenar aságuas usadas em bacias de evaporação. A regulamentação exigiu que a Dowfechasse as bacias de evaporação até 1988. Em 1987, sob pressãopara cum-prir a nova legislação, a empresa reprojetou o processo de produção. Redu-ziu o uso de soda cáustica, diminuindo os resíduos cáusticos em cerca de6.000 toneladas por ano e os resíduos de ácido hidroclórico em oitenta to-neladas por ano. A Dow também descobriu que seria capaz de captar partedo fluxo de resíduos para reutilização como matéria-prima em outras partesda fábrica. Embora sua implementação tenha custado apenas US$250.000,o processo proporcionou economias anuais de US$2,4 milhões.3

A 3M também aumentou a produtividade dos recursos. Forçada acumprir novas normas que exigiam a redução das emissões de solventes em90 por cento, a 3M descobriu um modo de evitar completamente o seu uso,através do revestimento dos produtos com soluções mais seguras, à base deágua. A empresa conquistou a vantagem do pioneirismo no desenvolvi-mento de produtos em relação aos concorrentes, muitos dos quais só adota-ram o novo processo bem mais tarde. A empresa também abreviou o prazode lançamento dos produtos no mercado, pois os itens à base de água nãoestavam sujeitos à necessidade de aprovação prévia, obrigatória para os re-vestimentos a base de solventes.Í

A 3~scobri~ue as inovações são capazes de melhorar a consistên-cia dos processos, reduzir as paralisações e . . uir substancialmente oscustos. A empresa costumava produzir adesivos em lotes, que eram entãotransferidos para os tanques de armazenagem. Um lote ruim era capaz decomprometer todo o conteúdo do tanque. As conseqüências eram perdasdo produto, paralisações e maiores riscos no descarte dos resíduos. A 3Mdesenvolveu uma nova técnica para a execução de testes de qualidade rápi-dos nos novos lotes. O resultado foi a redução dos resíduos perigosos em110 toneladas por ano, quase sem custo, proporcionando uma economiaanual superior a US$200.000.5

Muitos processos de produção química exigem um período inicial departida, após interrupções da produção, de modo a estabilizar o produto etrazê-lo para dentro das especificações. Durante esse tempo, a produção seresume a sucata. A elevação dos custos de descarte dos resíduos, em decor-rência da nova regulamentação, motivou a DuPont a instalar equipamen-tos de monitoração de melhor qualidade, que, por sua vez, reduziram asinterrupções na produção e os conseqüentes períodos de partida. Assim,não apenas diminuiu a geração de resíduos, como ainda abreviou o tempoem que não produzia nada.6

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A Melhoria.Ambiental É Capaz de Beneficiar--a Produtividade dos Recursos

Benefícios para o processo:

• Economias de materiais, resultantes do processamento mais completo, dasubstituição, da reutilização ou da reciclagem dos insumos de produção.

• Aumentos nos rendimentos do processo.

• Menos paralisações, através do maior cuidado na monitoração e na manu-tenção.

• Melhor utilização dos subprodutos.

• Conversão dos desperdícios em formas de valor.

• Menor consumo de energia durante o processo de produção.

• Redução dos custos de armazenamento e manuseio de materiais.

• Economia em razão de um ambiente de trabalho mais seguro.

• Eliminação ou redução do custo das atividades envolvidas nas descargas ouno manuseio, transporte e descarte de resíduos.

• Melhorias no produto como resultado indireto das mudanças nos proces-sos (como melhorias nos controles dos processos).

Benefícios para o produto:

• Produtos com melhor qualidade e mais uniformidade.

• Redução dos custos do produto (por exemplo, com a substituição de mate-riais).

• Redução nos custos de embalagem.

• Utilização mais eficiente dos recursos pelos produtos.

• Aumento da segurança dos produtos.

• Redução do custo líquido do descarte do produto pelo cliente.

• Maior valor de revenda e de sucata do produto.

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As mudanças nos processos para reduzir as emissões e utilizar os recur-sos de forma mais eficiente geralmente proporcionam rendimentos maiselevados. Em conseqüência de novas normas ambientais, a Ciba-GeigyCorporation reexaminou os fluxos de água já usada na fábrica de tinturas deTorri's River, Nova Jersey. Os engenheiros introduziram duas mudançasnos proce~sos de produção. Primeiro, substituíram o ferro gerador de lamapor um agente de conversão química menos prejudicial. Segundo, elimina-ram o despejo de um produto potencialmente tóxico nos fluxos de águausada. Assim, não apenas reduziram a poluição, mas também aumentaramo rendimento do processo em 40 por cento, proporcionando uma econo-mia de custo anual de US$740.000. Embora essa área da fábrica tenha sidofechada, o exemplo ilustra o papel da pressão regulamentária no processode inovação.

A~~ões nos processos para..a observância da re ulamenta ão ani-_biental são até capazes de melhorar a uniformidade e a gualidade dos pro-duros. Em 1990, o Protocolo de Montreal (Montreal Protocol) e a Lei daAtmosfera Limpa (Clean Air Act) dos Estados Unidos exigiram que as em-presas de produtos eletrônicos eliminassem os clorofluorcarbonos (CFCs)destruidores do ozônio. Muitas delas utilizavam essa substância comoagente de limpeza para a remoção de resíduos na fabricação de placas de cir-cuitos impressos. Os cientistas da Raytheon afrontaram o desafio. De iní-cio, acharam que a completa eliminação dos CFCs seria impossível. Após aspesquisas, contudo, descobriram um agente de limpeza alternativo, suscetí-vel de reutilização em sistemas de ciclo fechado. O novo método melhoroua qualidade média do produto - às vezes comprometida pelo velho agentede limpeza à base de CFC - ao mesmo tempo em que reduziu os custosoperacionais. Reagindo à mesma regulamentação, outros pesquisadoresidentificaram aplicações que não exigiam qualquer tipo de limpeza e desen-volveram as chamadas tecnologias de soldagem sem limpeza, que reduzi-ram os custos operacionais, sem comprometimento da qualidade. Sem aregulamentação ambiental, essa inovação não teria ocorrido.

As inovações destinadas a atender à regulamentação àmbiental tambémsão capazes de reduzir os custos de produção e impulsionar a produtividadedos re~ursos através da diminuição das embalagens desnecessárias ou dasimplificação dos projetos. No Japão, uma lei de 1991 estabeleceu normaspara facilitar a reciclagêm dos produtos. A Hitachi, juntamente com outrosprodutores de eletrodomésticos japoneses, reagiu com o redesenho dos pro-dutos, de modo a reduzir o tempo de desmontagem. Nesse processo, cortouem 16 por cento o número de componentes de uma lavadora de roupa e em

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30 por cento o número de componentes de um aspirador de pó. A menorquantidade de componentes facilitou não apenas a desmontagem dos pro-dutos, mas, sobretudo, a própria montagem. ~ regulamenta.ç:ácLQue exige areciclagem dos produtos tem condições de reduzir os custos de descarte dosprodutos pelos usuários e estimular projetos que permitam à-empresa a.re-.cuperação de materiais valiosos com maior facilidade. O~~e ou o fab '-cante que recebe produtos !illI-doS-Obtém-maior valor.--Embora essas inovações nos produtos tenham sido provocadas pelos re-

guladores e não pelos clientes, a demanda mundial está atribuindo maiorvalor aos produtos mais eficientes na utilização dos recursos. Muitas em-presas estão recorrendo às inovações para impor adicionais de preços aosprodutos "verdes" e para desbravar novos segmentos de mercado. Como aAlemanha adotou as normas de reciclagem antes da maioria dos demaispaíses, as empresas alemãs desfrutaram das vantagens do pioneirismo riodesenvolvimento de produtos com menos embalagem, que envolvem cus-tos mais baixos e que são mais procurados no mercado. Nos Estados Uni-dos, o desenvolvimento, pela Cummins Engine Company, de motores adiesel menos poluidores para caminhões e ônibus - inovação estimuladapela regulamentação ambiental do1Estados Unidos - está proporcionandoganho de posições nos mercados internacionais, onde estão aumentando asexigências no mesmo sentido.

Esses exemplos e muitos outros não demons.tram que as empresas sem-pre são capazes de inovar com baixo custo no processo de redução do im-pacto ambiental. Todavia, eles mostram que são muitas as oportunidadesde redução da poluição através de inovações que reprojetem os produtos,processos e métodos de operação. Esses exemplos são comuns, apesar da re-sistência das empresas à regulamentação ambiental e não obstante a fre-qüente hostilidade das próprias normas ambientais às soluções inovadoras eprodutivas em termos de recursos. O próprio fato da freqüência dos exem-plos contém uma mensagem importante: atualmente, necessita-se com ur-gência de um novo referencial para o pensamento sobre as melhoriasambientais.

Será que de Fato Precisamos de Regulamentação?

Se a inovação em resposta à regulamentação ambienta] tem condições deser lucrativa - se as empresas são de fato capazes de compensar o custo daconformidade através do aumento da produtividade dos recursos - qual a -

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necessidade da regulamentação? Se existem essas oportunidades, será que asempresas não as uscari~aturalmente, tornando desnecessária a regula-mentação? Isso equivale a afirmar que raramente se encontram no chão no-tas de dez dólares, pois alguém já as terá recolhido.

Sem dúvida, algumas empresas perseguem essas inovações sem a neces-sidade de regulamentação ou a elas se antecipando. Na Alemanha e naEscandinávia, onde as empresas e os consumidores estão muito sintoniza-dos com as questões ambientais, a inovação não é incomum. Nos EstadosUnidos, à medida que as empresas e os clientes assumirem a atitude mentalda produtividade dos recursos e à proporção que aumentar o conhecimentosobre as tecnologias inovadoras, talvez a regulamentação se torne menos ne-cessária.

Mas a crença de que as empresas aproveitarão as oportunidades lucrati-vas sem o impulso regulamentário parte de premissas falsas sobre a realida-de competitiva - ou seja, de que todas as boas oportunidades de inovaçãojá foram descobertas, de que todos os gerentes dispõem de informações per-feitas sobre essas oportunidades e de que os incentivos organizacionais estãoalinhados com a inovação. De fato, no mundo real, os gerentes freqüente-mente dispõem de informações muito incompletas, além das limitações detempo e da falta de atenção. As barreiras à mudança são inúmeras. O pro-grama Luz Verde (Green Lights) da Agência de Proteção Ambiental (Envi-ronment Protection Agency), que trabalha com as empresas na promoçãode formas de iluminação poupadoras de energia,' mostra que muitas notasde dez dólares ainda estão à espera de que alguém as apanhe no chão. Se-gundo uma auditoria, quase 80 por cento dos projetos ofereceram períodosde retorno de dois anos ou menos, e mesmo assim as empresas que os anali-savam ainda não haviam partido para a ação? Esses projetos altamente lu-crativos só foram implementados depois que as empresas aderiram aoprograma e se beneficiaram das informações e da persuasão da EPA.

Estamos a ora numa fase de transição da história industrial.em que asempresas ainda são inexperientes no gerenciamento criativo das questõesambientais. Os clientes também não estão cientes de que a ineficiência nautlIlzãção dos recursos implica que terão que arcar com custos da polui-ção. Por exemplo, os consumidores tendem a ver a embalagem descartadac~ algo gratuito, pois não é cobrada em separado, e hoje inexistem al-ternativas de baixo custo. Como não dispõem de um meio direto para re-cuperar o valor dos recursos desperdiçados, pelos quais já pagaram, osclientes imaginam que o descarte de produtos usados não gera para elescustos adicionais.

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A regulamentação, ainda que em modalidade diferente da atualmentepraticada, é necessária por seis principais razões:

• Para criar pressões que motivem a inovação.pelas.ernpresas. Nossapesquisa mais abrangente sobreacornpetitividade destaca a impor-tância do papel das pressões externas na superação da inércia organi-zacional e na instigação do pensamento criativo.

•• Paramelhorar a qualidade ambiental, nos casos em CUK-ainovação eo conseqüente aprimoramento na produtividade dos recursos nãocompensam o custo total da conformidade; ou nas situações em queos efeitos do aprendizado levam algum tempo para reduzir o custototal das soluções inovadoras.

• Para alertar e educar as empresas a respeito de ineficiências l'rQyá.YejsnQD:eCillsos e deáreaspojenciais ~ara aprimoramentos tecnoló icQ.s(embora os governos não disponham de melhores condições do queas empresas para tratar de ambas as questões).

• Para aumentaLa..probabilidage de quea inova ão nos rodutos e nosprocessosseia.mais.amisrcsa em relação ao ~mbienreJ

• Para-ffi.a..t:.-demar:lda--p~G-aprimoramento ambiental até que as em-presas e os clientes sejam capazes de melhor perceber e mensurar aineficiência dos recursos como fonte da poluição. .

• Para nivelar o campo-de-joge-durante-o período dê-triiftS·i~e àssoluções ambientais baseadas na inovação, assegurando que nenhu-ma empresa será capaz de ganhar posição por não efetuar os investi-mentos ambientais. A regulamentação proporciona um amortecedorpara as empresas inovadoras, até a validação das novas tecnologias e aredução de seus custos através dos efeitos do aprendizado.

Os que acreditam que apenas as forças do mercado instigarão a inova-ção talvez argumentem que os programas de gestão de qualidade total fo-ram iniciados sem a intervenção regulamentária. No entanto, a GQTatingiu os Estados Unidos e a Europa através de diferentes tipos de pressão.Décadas antes, a GQT se difundira por todo o Japão - como resultado deum grande esforço governamental para transformar a qualidade do produtoem objetivo nacional, inclusive com a criação do Prêmio beming. Apenasapós serem devastadas pelas empresas japonesas no mercado, as empresasamericanas e japonesas aderiram à GQT.

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COMPETIÇÃO 385

o Custo da Atitude Mental Estática

Assim, o~eguladores ~as empresas devem concentrar-se na atenuaçãoda opção excludente entre.proteção ambieatal-e-competitividade, atra-vés do estímulo à inovação e à produtividade dos recursos. No entanto,o atual clima de rivalidade impulsiona o custo da conformidade comnormas ambientais e restringe os benefícios da inovação, agravando ain-da mais o dilema.

Para começar, a luta por poder subjacente ao estabelecimento e apli-cação das normas ambientais consome uma enorme quantidade de recur-sos. Um estudo de 1992 do Rand Institute for Civil Justice, por exemplo,descobriu que 88 por cento do dinheiro pago pelas seguradoras, entre1986 e 1989, aos pedidos de indenização pelo Superfund se destinaramao reembolso de despesas legais e administrativas, enquanto apenas 1'2por cento foram utilizados para a efetiva recuperação das Iocalidades.f A leido Superfund talvez seja a mais ineficiente legislação ambiental dos Esta-dos Unidos, mas não é a única causa de ineficiência. Acreditamos queuma parcela substancial das despesas com o meio ambiente e que umagrande proporção das receitas das empresas de produtos e serviços ambi-entais se relacione com o contencioso regulamentário em si e não com amelhoria do meio ambiente.

Um problema do processo de rivalidade é o.fato de confinar as empre-sas aope~nto estático e de inflar de forma sistemática as estimativas se-t~riais do custo da regulamentação. Um exemplo clássico ocorreu nosEstados Unidos, durante os debates sobre a Lei da Atmosfera Limpa, de1970. Lee Iacocca, então vice-presidente executivo da Ford Motor Com-pany, previu que a observância da nova regulamentação imporia enormesaumentos nos preços dos automóveis, forçaria a paralisação da produçãoamericana em 1975 e provocaria sérios danos à economia. A gova legislaçãoacabou sendo promulgada e as previsões sombrias de Iacocca se revelaramerrôneas. Histórias semelhantes são comuns.

O pensamento estático induz as empresas a combater normas ambien-tais que, na realidade, seriam capazes de reforçar a sua competitividade. A'maioria dos destiladores de alcatrão de hulha dos Estados Unidos, porexemplo, se opuseram à regulamentação de 199}, que exigia reduções subs-tanciais nas emissões de benzeno. Na época, a única solução consistia emcobrir os tanques de armazenamento de alcatrão com dispendiosos cober-tores de gás. Mas as novas normas incitaram a Aristech Chemical Corpora-tion, de Pittsburgh, Pensilvânia, a desenvolver um meio de remover o

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benzeno do alcatrão de hulha no primeiro passo do processamento, elimi-nando, assim, a necessidade dos cobertores de gás. Em vez de sofrer um au-mento de custo, a Aristech economizou US$5,3 milhões.

Ademais, a atitude mental das empresas faz com que o custo do trata-mento dos problemas ambientais pareçam mais elevados do que são na rea-lidade. Muitas empresas não levam em conta a curva de aprendizagem,embora os custos efetivos da conformidade tendam a declinar com o tem-po. Um estudo recente no setor de papel e celulose, por exemplo, descobriuque o custo efetivo da conformidade era de quatro dólares a cinco dólares ecinqüenta centavos por tonelada, ao passo que as estimativas iniciais ti-nham sido de até dezesseis dólares e quarenta centavos.l' Do mesmo modo,o custo da observância da regulamentação de 1990, controlando as emis-sões de dióxido sulfúrico, correspondem hoje a apenas metade das previsõesiniciais dos analistas, ainda com tendência declinante. Com o foco na ino-vação e na produtividade dos recursos, os atuais custos da conformidade re-presentam o limite superior.

Há uma controvérsia legítima sobre os benefícios decorrentes das nor-mas ambientais específicas para a sociedade. A mensuração dos efeitos daatmosfera limpa, em termos de saúde e de segurança, tem sido objeto de umconstante debate científico. Alguns acreditam que os riscos da poluição fo-ram superestimados. Mas quaisquer que sejam os níveis comprovados dosbenefícios sociais, os custos privados para as empresas ainda são muito maiselevados do que o necessário.

Regulamentações Boas e Más

Além do alto custo, o atual sistema de regulamentação arnbiental dos Esta-dos Unidos freqüentemente frustra ou inviabiliza as soluções inovadoras.Seu problema não está no rigorismo. É a maneira pela qual as normas sãoredigidas e a pura ineficiência com que são administradas. Normas severaspodem e devem promover a produtividade dos recursos. No entanto, oprocesso regulamentário americano malbaratou esse potencial por concen-trar-se na recuperação, e não na prevenção, impondo tecnologias específi-cas, estabelecendo prazos de conformidade irrealisticamente curtos e subme-tendo as empresas a níveis de incerteza desnecessariamente elevados.

O atual sistema desencoraja a assunção de riscos e a experimentação. Aexposição a contingências passivas e a inflexibilidade do governo na aplica-ção da legislação, entre outros fatores, contribuem para o problema. Por

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exemplo, uma empresa que inova e atinge 95 por cento do objetivo de re-dução das emissões, ao mesmo tempo em que registra compensatóriassubstanciais reduções de custo, ainda se encontra 5 por cento abaixo da con-formidade e sujeita a penalidades. Por outro lado, os reguladores a recom-pensariam pela adoção de tratamentos secundários seguros, mas baratos.(Ver, a seguir, "A Regulamentação Favorável à Inovação".)

A Regulamentação Favorável à Inovação

A regulamentação, conduzida de forma adequada, não precisa aumentar oscustos. Os seguintes princípios da elaboração regulamentária promovem ainovação, a produtividade dos recursos e a competitividade:

-ifFocalizar osresultados, e não a tecnologia. As regulamentações do passado ge-ralmente prescreviam soluções específicas, como catalisadores ou purificadorespara a poluição do ar. Expressões como "melhor tecnologia disponíveis" e "me-lhor tecnologia de controle disponível" têm raízes profundas na prática ameri-cana e implicam que uma tecnologia é a melhor, desencorajando a inovação.

Estabelecer uma regulamentação severa, em vez de leniente. As empresas tra-tarão da regulamentação leniente de forma incremental, geralmente com so-luções improvisadas ou secundárias. Assim, a regulamentação deve serbastante rigorosa para promover a efetiva inovação.

Regulamentar tendo em vista, tanto quanto possível, o usuário final, ao mes-mo tempo em que estimula as soluções a montante. Essa abordagem geralmentepossibilitará maior flexibilidade para a inovação no produto final e em todosos estágios do processo de produção e distribuição. A completa prevenção dapoluição ou, como segunda melhor alternativa, sua ~tenuação nos primeiroselos da cadeia de valores, é quase sempre uma solução menos dispendiosa doque as correções ou recuperações nos últimos estágios.

Adotar fases de implantação. A previsão de fases de implantação amplas,mas bem definidas, vinculadas aos ciclos de investimentos de capital do setor,permitirão que as empresas desenvolvam tecnologias inovadoras de economiade recursos, em vez de forçá-Ias a implernentar apressadamente soluções dis-pendiosas que apenas remendam os problemas. A Califórnia impôs prazos deatendimento tão curtos ao setor de móveis de madeira, que muitos fabricantesoptaram por abandonar o estado, ao invés de adquirir custosos equipamentosde controle.

Utilizar os incentivos de mercado. Os incentivos de mercado, como a co-brança de encargos pela poluição ou os esquemas de depósitos reembolsáveis,chamam a atenção para a ineficiência dos recursos. Além disso, as licenças ne-gociáveis proporcionam incentivos contínuos à inovação e encorajam o usocriativo de tecnologias que superem as normas vigentes.

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ljarmonize ou alinhe as regula11!:entaçõesem campoS-.afins. A exposição acontingências passivas nos Estados Unidos leva as empresas a aderirem a abor-dagens seguras, do tipo "melhor tecnologia disponível", e as regulamentaçõesinconsistentes sobre tecnologias alternativas frustram as inovações benéficas.Por exemplo, um meio de eliminar os agentes de esfriarnenro de refrigerado-res, suspeitos de danificar a camada de ozônio, envolve sua substituição porpequenas quantidades de propano e butano. Mas algumas normas de seguran-ça de concepção estreita, que tratam desses gases, parecem ter impedido o de-senvolvimento da tecnologia nos Estados Unidos, enquanto muitas dasprincipais empresas européias já estão comercializando os novos produtos.

Desenvolver as regulamentações em sincronia com os outros países ou ligeira-mente àfrente deles. É importante minimizar possíveis desvantagens competi-tivas em relação a empresas estrangeiras que ainda não estejam sujeitas àsmesmas normas. O desenvolvimento das regulamentações ligeiramente àfrente dos demais países também maximizará o potencial de exportação do se-tor de controle da poluição através do aumento dos incentivos à inovação.Quando as normas nos Estados Unidos lideram as iniciativas mundiais, asempresas internas desfrutam de oportunidades para a conquista de valiosasvantagens decorrentes do pioneirismo. No entanto, se as normas forem muitoavançadas ou de natureza muito divergente, em comparação com as que pro-vavelmente serão aplicadas aos concorrentes estrangeiros, talvez o setor estejainovando na direção errada.

Torne oprocesso regulamentário mais estável eprevisível. O processo regu-lamentário é tão importante quanto as normas. Se as normas e os períodosde implantação forem estabelecidos e aceitos com suficiente antecipação e osreguladores se comprometerem a manter sua vigência por cinco anos, porexemplo, a empresa será capaz de aderir com firmeza e atacar o mal pela raiz,em vez de se proteger contra a própria reversão ou mudança na filosofia go-vernamental.

Exigir a participação do setor no estabelecimento das normas desde o começo.A regulamentação americana difere muito da européia por sua abordagem derivalidade. O setor deve ajudar na definição dos períodos de implantação, noconteúdo das normas e na determinação de um processo regulamentário maiseficaz. Um conjunto predeterminado de pedidos de informações e de intera-ções com os representantes setoriais deve ser um componente obrigatório des-se processo. O setor e os reguladores devem atuar com vistas ao desenvolvimentode um clima de confiança, pois o setor precisa proporcionar informações efe-tivamente úteis e os reguladores precisam levar a sério os insumos do setor.

Desenvolver fortes capacidades técnicas entre os reguladores. Os reguladoresdevem entender a economia do setor e o que impulsiona a sua competitivida-de. O melhor intercâmbio de informações evitará jogadas custosas, nas quaisempresas mal informadas recorrem a um aparato de advogados e consultoresna tentativa de protelar ou eliminar regulamentações mal concebidas por re-guladores mal informados.

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7't Minimizar O tempo e os recursos consumidos no processo regulamentário emsi. Os atrasos nas concessões de licenças são, em geral, custosos para as empre-sas. A auto-regulamentação, com inspeções periódicas, seria mais eficiente doque a exigência de aprovações formais. Os litígios potenciais ou reais geramincerteza e consomem recursos. A adoção de procedimentos obrigatórios dearbitragem ou de medidas rígidas de arbitragem antes do litígio reduziria oscustos e encorajaria a inovação.

Para uma análise mais ampla das propostas de mudança na regulamentação ambien-tal, ver Michael E. Porter e Claas van der Linde. "Toward a New Conception of theEnvironrnent-Cornpetitiveness Relationship",journaL ofEconomic Perspectives 9, n. 4(outono de 1995).

Assim como a má regulamentação é capaz d~rejudicar a cornpetitivi-dade, a.boa regulamentação.rem condições de reforçá-Ia. Considere as dife-renças entre os setores de papel e celulose dos Estados Unidos e daDinamarca. Nos Estados Unidos, uma rigorosa regulamentação foi impos-ta nos anos 70, sem fases de implantação adequadas, forçando as empresas aadotarem com rapidez as melhores tecnologias disponíveis. Na época, asexigências significavam, invariavelmente, a instalação no fim do processo,de sistemas de tratamento comprovados mas custosos. Na Escandinávia,por outro lado, a regulamentação permitia abordagens mais flexíveis, pro-porcionando condições para que as empresas focalizassem o processo deprodução em si, e não apenas o tratamento secundário dos resíduos. As em-presas escandinavas desenvolveram tecnologias inovadoras de polpação ebranqueamento que, não apenas cumpriam as especificações das emissões,como também reduziam os custos operacionais. Embora os Estados Uni-dos tenham sido os precursores da regulamentação, as empresas americanasforam incapazes de auferir qualquer vantagem do pioneirismo, pois os re-guladores ignoraram um princípio crítico da boa norma ambiental: criar omáximo de oportunidade para a inovação, permitindo que as empresas des-cubram como resolver os próprios problemas.

Infelizmente para o setor de celulose e papel dos Estados Unidos, umsegundo princípio da boa regulamentação também foi negligenciado: fo-mentar a melhoria contínua, não se trancar numa tecnologia específica ouna situação vigente. A agência reguladora sueca adotou uma abordagemmais eficaz. Enquanto os americanos impuseram rigorosas metas de emis-são e estabeleceram prazos de atendimento muito apertados, a Suécia co-

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meçou com normas mais complacentes, mas deixou claro que logo seriamsubstituídas por outras mais severas. Os resultados eram previsíveis. As em-presas americanas instalaram sistemas de tratamento secundários e se limi-taram a essa medida. Já os produtores suecos, antecipando normas maisrigorosas, incorporavam continuamente tecnologias ambientais inovadorasnos ciclos normais de substituição e inovação da capacidade.

~. favorável à inovação produziu o efeito colareral de au-mentar a competitividade do setor de equipamentos local. Estimuladospela demanda escandinava por sofisricatias'rnelhorias nos pro~e~s, os for-necedores locais de equipamentos para o setor de celulose e papel, comoSunds Defibrator e Kamyr, acabaram auferindo grandes ganhos no merca-do internacional com a venda de equipamentos inovadores.

Finalmente, o setor de celulose e papel da Escandinávia foi capaz de co-lher inovações compensatórias que iam além das que decorriam diretamen-te das pressões regulamentárias. Em princípios dos anos 90, os produtoresperceberam que a crescente conscientização pública quanto aos problemasambientais relativos aos efluentes das usinas de celulose estava criando ummercado de nicho. Durante algum tempo, as empresas escandinavas queproduziam papéis totalmente isentos de cloro dispunham de condições decobrar significativos adicionais de preços e de atender a um segmento demercado em rápido crescimento, composto de clientes ambientalistas.

Implicações para as Empresas

Com certeza as abordagens regulamentárias mal orientadas impuseram umpesado ônus p'ãra as empresas. Mas os gerentes que reagiram finc~"ndo o péna oposição a toda a regulamentação também demonstraram miopia. Nãoé segredo que os fabricantes de automóveis japoneses e alemães desenvolve-ram carros mais leves e com maior eficiência energética, em resposta às no-vas normas de consumo de combustível, enquanto a indústria automobilísticaamericana, menos competitiva, combateu essas normas, na esperança deque fossem abandonadas. A indústria automobilística americana acabou re-conhecendo que estava condenada à extinção se não aprendesse a competiratravés da inovação. A prolongada aderência à atitude mental estática cus-tou bilhões de dólares e muitos milhares de empregos.

Para não incorrer nos mesmos erros, os gerentes devem começar a per-ceber as melhorias ambientais como uma oportunidade econôrnicge com-petitiva, e não como um custo embaraçoso ou uma ameaça inevitável. Em

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vez de se ate r a uma perspectiva focalizada na observância da regulamenta-ção, as empresas devem formular perguntas como "Q~e estamos desper-di ando?" e "Como seríamos capazes de reforçar o valor para o cliente?" Asempresas percursoras - aqllefas que são as primeiras a visualizar a oportu-nidade e a abraçar soluções inovadoras - colherão os maiores benefícioscompetitivos, do mesmo modo como os fabricantes de automóveis alemãese japoneses. (Ver, a seguir, "Os Novos Ambientalistas".)

No atual estágio, as questõesarnbienrais, para a maioria das empresas,ainda são assunto para profissionais e especialistas externos. O que não ésurpreendente. Qualquer novo tema gerencial tende a trilhar um ciclo devida previsível. Ao aparecef pelá t>rimeira vez, as empresas contratam espe-cialistas externos para ajudá-Ias na navegação. Quando a prática se tornamais desenvolvida, os especialistas internos assumem o controle. Apenasquando a área chega à fase de. maturidade, as....empresasa integram nas fun-ções contínuas da gestão de linha.

Muitas empresas ~garam a análise e a solução dos problemas arnbi-entais a advogados e consultores externos. Esses especialistas no processoregulamentário baseado na rivalidade, que não dispõem de grande familia-ridade com as operações e as tecnologias gerais da empresa, inevitavelmentese concentram na conformidade, e não na inovação. Eles sempre favorecemas soluções de fim de processo. Na realidade, muitos consultores estão asso-ciados a empresas que vendem essas tecnologias. Algumas empresas já seencontram na segunda fase, em que as questões ambientais são atribuídasaos especialistas internos. Mas esses especialistas - por exemplo, das áreasjurídica, de relações com o governo ou de assuntos ambientais - carecemde plena responsabilidade pelo lucro e estão isolados da organização de li-nha. Novamente, o resultado é, quase sempre, soluções estreitas e incre-mentais.

Os Novos Ambientalistas

Os ambientalistas têm condições de fomentar a inovação e a produtividadedos recursos ao reivindicarem as espécies corretas de normas regulamenta-res e ao educar o público no sentido de exigir soluções ambientais inovado-ras. A seção alemã do Greenpeace, por exemplo, descobriu, em 1992, queuma mistura de propano e butano era mais segura para o esfriamento de re-frigeradores do que as substâncias então predominantes - hidrofluorcar-bonos ou hidroclorofluorcarbonos - propostas como substitutos para os

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clorofluorcarbonos. Pela primeira vez na história, o Greenpeace começoua endossar um produto comercial. Na verdade, lançou uma campanha pu-blicitária de um refrigerador projetado pela Foron, um pequeno fabricanteà beira da falência. A ação foi fortemente alavancada pela ampla coberturada mídia e se constituiu numa das principais causas da subseqüente de-manda por refrigeradores de propano-butano fabricados pela empresa e daposterior conversão dos demais fabricantes de refrigeradores da Alemanhapara a mesma tecnologia.

As organizações ambientais são capazes de apoiar a indústria, ao se'tr~arem em-f~ntes-d.~ção sobre as melhores práticas, que tal-vez não sejam bem conhecidas fora do círculo de umas poucas empresaspioneiras. Ao constatar que os editores e os leitores das revistas alemãs nãoestavam cientes da qualidade muito superior do papel isento de cloro, oGreenpeace da Alemanha editou uma revista impressa com este tipo de pa-pel. Era grande a sua semelhança com o semanário político alemão Der Spie-gel, e o lançamento encorajou os leitores a exigirem que os editores passassema utilizar papel sem cloro. Em breve, o Der Spiegel e várias outras grandes revis-tas efetuaram a conversão. Outras organizações ambientais também poderiamdeslocar parte dos recursos hoje concentrados em litígios, direcionando-os parao financiamento e divulgação de pesquisas sobre inovações referentes aos pro-blemas ambientais.

Entre os grupos ambientalistas dos Estados Unidos, o Fundo deDefesa Arnbiental (Environmental Defense Fund - EDF) tem assumi-do uma postura inovadora na sua disposição de promover sistemas regu-lamentários baseados no, mercado e de trabalhar diretamente com asempresas. O grupo apoiou o sistema de intercâmbio enxofre-dióxido, peloqual as empresas reduzem as próprias emissões ou adquirem concessões deemissões de empresas que conseguiram superaram suas cotas de redução aum custo inferior. A Força-Tarefa para a Redução de ResíduosEDF-McDonald's, constituída em 1990, induziu a empresa a alterar deforma substancial as embalagens, eliminando inclusive os recipientes deespuma de polistireno. Atualmente, o EDF está trabalhando com a Gene-ral Motors, nos esforços para retirar das estradas os automóveis altamentepoluentes; e com a] ohnson & ] ohnson, MacDonald' s, N ationsBank, ThePrudential Insurance Company of America, Time Warner e Duke Univer-siry, para promover o uso de papel reciclado.

Fonte: Benjamin e. Bonifant e Ian Ratcliffe, "Cornperitive Implications of Environ-ment Regulation in the Pulp and Paper Industry", Managemeilt Institute for Envi-ronment and Business,Washington, D.e., 1994.

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Para que pelo menos se considerem os tipos de redesenho de produtos eprocessos imprescindíveis à verdadeira inovação, sem falar em implernenta-ção, as estratégias ambientais devem transformar-se em assunto da alta ge-rência. O _impacto ambiental precisa ser incorporado no processo maisamplo de melhoria da produtividade e da competitividade, O modelo daprodutividade dos recursos, ao invés do modelo do controle da poluição,deve nortear o processo decisório.

Çomo os gerentes serão capazes de acelerar o-progresso da empresarumo a ~ma abordagem ambiental mais competitiva? Primeiro, devem

cp~ensurar os impactos ambientais.diretos e indiretos. Uma das principaisrazões pelas quais as e~as não são muito inovadoras em relação aos pro-blemas ambientais é a ignorância. Um grande fabricante de produtos quí-micos orgânicos, por exemplo, contratou um consultor para explorar asoportunidades de redução dos seus 40 fluxos de resíduos. Uma auditoriacuidadosa revelou 497 diferentes fluxos de resíduos - a empresa errara emmais de dez por cento. 10 Nossas pesquisas indicam que a simples rnensura-ção induz a.enorrnes oportunidades de aumento da produtividade.

As empresas que adotam o referencial da.produtividade dos recursos evão além das áreas atualmente regulamentadas são as que auferem os maio-res benefícios. As empresas devem efetuar um levantamento de todos osr~s e embalagens não utilizados, liberados como emissões ou descarta-dos. Alguns recursos mal utilizados são mantidos nas fábricas, outros sãodescartados e outros ainda colocados em contêineres do tipo dumpsters. *Asineficiências indiretas dos recursos ocorrem no nível dos fornecedores, ca-nais de distribuição e' clientes. Quanto a estes últimos, as ineficiências apa-recem no uso do produto, na embalagem descartada e nos recursos remanes-centes no produto utilizado.

Segundo, QS gerentes deve ' aprender a reconhecer o custo de oportu-nidade dos recursos não utilizados, Poucas empresas analisaram o verdadei-ro custo da toxidade, dos resíduos c do material descartado, e muito menosos impactos de segunda ordem dos resíduos e despejos sobre outras ativida-des. Uma quantidade ainda menor de empresas vai além dos custos desern-bolsáveis do tratamento da poluição, para avaliar o custo de oportunidadedo desperdício de recursos e do não aproveitamento de oportunidades. Ra-ras são as que pensam em termos de valor para o.cliente e consideram o cus-to de oportunidade dos recursos desperdiçados por ele.

* Marca registrada de contêineres destinados ao armazenamento e transporte de resíduos,(N.T.)

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Muitas empresas sequer r3streiam de forma cuidadosa as despesas am-bientais e possuem sistemas contábeis convencionais mal equipados paramensurar a subutilização dos recursos. As empresas avaliam os projetos am-bientais como investimentos distintos e isolados. Os investimentos diretosna redução de resíduos ou de despejos são selecionados com base em taxasde corte elevadas que presumem seu risco - deixando as notas de dez dóla-res no chão. A adoção de melhores métodos de informação e avaliação aju-dará os gerentes a ~duzir o impacto ambiental e, ao mesmo tempo, amelhorar a produtividade dos recursos.~ Terceiro, as empresas precisam criar um viés em favor das solu ões ino-vaaoras e promotoras da produtividade. Devem esquadrinhar os despejos,as sucatas, as emissões e as atividades de descarte, próprias e dos clientes,monitorando-as do seu interior, de modo a facilitar os ínsíghts sobre mu-danças no projeto dos produtos, nas embalagens, nas matérias-primas e nosprocessos. Estamos impressionados com o poder de certas soluções sistêrni-cas: a reconfiguração de grupos de atividades ou a substituição de insumos eembalagens, que ampliam a utilização dos recursos e o potencial de recupe-ração. As abordagens que focalizam o tratamento de despejos isolados de-vem ser submetidas à reanálise.

Os atuais sistemas de recompensas são tão contrários às inovaçõesquanto as políticas regulamentárias. Em relação às fábricas, as empresasrecompensam a produção, mas ignoram os custos arnhientais e os desper-dícios de recursos. A...Qunição 120ruma solução inovadora e economicamen-te eficiente que fique aquém das expectativas é geralmente muito maior doque a recompensa por uma solução custosa, mas "bem-sucedida".~Finalmente, as ~mpresas devem tornar-se mais roativas na defini ão

de novos tipos de relacionamento com os re uladores e com os ambientalis-tas. Para tanto, necessitam de uma nova atitude mental. Como é possível~ proclamem de modo estrepitoso que a regulamentação compromete acompetitividade e esperem que os reguladores e ambientalistas sejam flexí-veis e confiantes, quando elas mesmas reivindicam prazos para a busca desoluções inovadoras?

A Economia Mundial em Transição

Já é hora de a realidade da moderna competição impregnar o nosso raciocí-nio sobre o relacionamento entre competitividade e meio ambiente. Tradi-cionalmente, os países eram competitivos se suas empresas tivessem acesso a

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insumos de custo mais baixo - capital, trabalho, energia e matérias-primas.Nos setores dependentes de recursos naturais, por exemplo, as empresas eos países competitivos eram aqueles com suprimentos locais abundantes.Como a tecnologia evoluía com lentidão, a vantagem competitiva nos insu-mos era suficiente para o sucesso.

Atualmente, a lobalização tornou obsoleto o conceito de vantagemcomparativa. As empresas dispõem de condições para adquirir.insumos debaixo custo em qualquer lugar e as novas tecnologias, em rápido desenvol-- ---vimento, são capazes de compensar as desvantagens no custo dos mesmos.

Ao enfrenWem, no país de origem, altos custos de mão-de-obra, por exem-plo, as empresas podem eliminar a necessidade de trabalhadores não quali-ficados, através da automação. Ao se depararem com a escassezde determinadamatéria-prima, as empresas são capazes de encontrar algum material alter-nativo ou de desenvolver um produto sintético. Para superar os altos custosdo espaço físico, as empresas japonesas foram precursoras na produçãojust-in-time e evitaram a manutenção de estoques no chão da fábrica.

Não é mais suficiente apenas dispor dos recursos. Hoje, a competitivi-~dade depende de sua produtiva utilização. As empresas têm condições demelhorar a produtividade dos recutsos através da fabricação dos produtosexistentes com maior eficiência ou do desenvolvimento de produtos que se-jam mais valiosos para os clientes - pelos.quais os clientes estejam dispos-tos a pagar preços mais elevados. Cada vez mais, os países e as empresas <l!:leapr~~ntam maior competitividade não são aqueles com acesso aos insumosde custo mais baixo, mas os que empregam a tecnologia e os métodos maisavançados na sua utilização. Como a tecnolQgLue encontra.em.consranreprocesso de mudança, o novo p-;radigrn.;da competitividade global exige acapacidade de inovar com rapidez.

;: Esse novo paradigma tem profundas implicações no debate sobre po-)ítica ambiental - sobre como abordá-Ia e regulamentá-Ia e sobre sua

ábrangêncja. O novo paradigma entrela ou a melhoria ambiental e a coml'eti-tividade. Eimportante utilizar os recursos de forma rodutiya, sejam elesnaturais e físicos ou humanos e de capital. O ~gr~sso ambiental exigeque as empresas sejam inovadoraspara aumentar a rodutividad~dos re-.cursos - e é exatamente nesse ponto que se situam os novos desafios dacornpetitividade global. A resistência às inovações que reduzem a polui-ção, como no caso da indústria automobilística americana nos anos 70,redundará não apenas em danos ambientais, mas também na perda dacompetitividade na economia global. Os países em desenvolvimento quese aferrarem a métodos esbanjadores de recursos e negligenciarem as nor-

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mas ambientais, por serem muito "dispendiosas", continuarão não com-petitivos e relegados à pobreza.

A maneira como as empresas res ondem aos problemas ambientais tal-vez seja, de fato, um indicador-chave ~a sua com etitividade geral. A regu-lamentação ambiental não induz, inevitavelmente, à inovação e à cornpetiti-vidade ou ao aumento da produtividade para todas as empresas. Apenasaquelas que inovarem com êxito serão vencedoras. Um setor competitivoapresenta maior probabilidade de encarar a nova norma como desafio e reagiratravés de inovações. Por outro lado, aquele não competitivo talvez não estejapropenso à inovação e se veja tentado a combater toda a regulamentação.

Não é surpreendente que o debate que lança o meio ambiente contra acornpetitividade tenha tomado tal rumo. Na realidade, os conflitos eco-nomicamente destrutivos a respeito da redistribuição prevalecem emmuitas áreas da política pública. Mas agora é o momento em que a mu-dança de paradigma nos impulsionará para a frente, rumo ao próximo sé-culo. A competição internacional mudou drasticamente nas últimasdécadas. Os gerentes seniores que cresceram na época em que a regula-mentação ambiental era sinônimo de litígio se depararão com evidênciascrescentes de que.a.rnelhoria ambiental é um bom n~ócio. Os ambienta-listas, as agências reguladoras e as empresas bem-sucedidas rejeitarão as ve-lhas opções excludentes e se desenvolverão com base na lógica econômicasubjacente, que interliga o meio ambiente, a produtividade dos recursos, ainovação e a cornpetitividade.

NOTAS

1. Um dos esforços pioneiros para a visualização das melhorias ambientais sob esse en-foque é The E-Factor: The Bottom-Line Approach to Environmentally Responsible Business,de Joel Makower (Nova York: Times Books, 1993).

2. Andrew King, "Improving Manufacturing Resulting from Learning from Waste:Causes, Importance, and Enabling Conditions", Stern School of Business, Nova YorkUniversiry, Nova York, 1994.

3. Mark H. Dorfman, Warren R. Muir e Carherine G. Miller, Environmental Divi-dends: Cutting More Chemical Wastes (Nova York: INFORM, 1992).

4. Don L: Boroughs e Betsy Carpenrer, "Helping the Planet and the Economy", U'S.News and World Report 11O, n. 11, 25 de março de 1991, p. 46.

5. John H. Sheridan, "Attacking Wastes and Saving Money ... Some of the Time",lndustry Week, 17 de fevereiro de 1992, p. 43.

6. Gerald Parkinson, "Reducing Wastes Can Be Cosr-Effective", Chemical Enginee-ring97, n. 7, julho de 1990, p. 30.

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7. Stephen J. OeCanio, "Why Do Profitable Energy-Saving Projects Languish?", Se-cond International Research Conference of the Greening ofIndustry Network, Cambrid-ge, Massachusetts, 1993.

8. Jan Paul Acton e Lloyd S. Oixon, "Superfund and Transaction Costs: The Experi-ences ofInsurers and Very Large Industrial Firrns", Rand Instirute for Civil justice, SantaMônica, Califórnia, 1992.

9. Norman Bonson, Neil McCubbin e John B. Sprague, "Kraft Mil! Effluents inOntario", relatório preparado para o Technical Advisory Committee, Pulp and Paper Sec-tor of MISA, Ontario Ministry of the Environment, Toronto, 29 de março de 1988, p.166.

10. Parkinson, p. 30.