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CAPA - Pesquisa academica - Temática · Livro didático - Libras. I. Alves, Edneia de Oliveira ... Os trabalhos realizados com a criação do livro di-dático de Libras têm aprimorado

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A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIAFONTE DE CONHECIMENTO PARA ÁREA DE LIBRAS

EdnEia dE OlivEira alvEs

(OrganizadOra)

idEia

JOãO PEssOa 2015

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LIVRO PRODUZIDO PELO PROJETOPara Ler o Digital: reconfiguração do livro na Cibercultura – PIBIC/UFPB

Departamento de Mídias Digitais – DEMID / Núcleo de Artes Midiáticas – NAMIDGrupo de Pesquisa em Processos e Linguagens Midiáticas – Gmid/PPGC/UFPB

Coordenador do ProjetoMarcos Nicolau

CapaGabriel Jardim

Editoração DigitalBruno Gomes

Alunos IntegrantesBruno GomesGabriel Jardim

atEnçãO: as imagEns usadas nEstE trabalhO O sãO Para EfEitO dE EstudO,dE acOrdO cOm O artigO 46 da lEi 9610, sEndO garantida a PrOPriEdadE

das mEsmas aOs sEus criadOrEs Ou dEtEntOrEs dE dirEitOs autOrais.

E96 A extensão universitária: fonte de conhecimento para área de Libras [recurso eletrônico] / Organizadora: Edneia de Oliveira Alves.-- João Pessoa: Ideia, 2015.

1CD-ROM; 43/4pol.(3.38mb) ISBN: 978-85-463-0043-3 1. Extensão universitária. 2. Ensino de Libras. 3. Escrita com sinais -

experiência. 4. Livro didático - Libras. I. Alves, Edneia de Oliveira.

CDU: 378

EDITORA

av. nOssa sEnhOra dE fátima, 1357, bairrO tOrrE cEP.58.040-380 - JOãO PEssOa, Pb

www.idEiaEditOra.cOm.br

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SUMÁRIO

Apresentação.................................................................................................................................................................05

Contribuições da Extensão e da Área de Libras Para a Formação Crítico-ReflexivaEdneia de Oliveira Alves...............................................................................................................................................07

O Diálogo Como Estratégia Didática Para o Ensino de LibrasAna Claudia Nunes do Nascimento e Edneia de oliveira Alves....................................................................48

Cultura Surda no Livro Didático de LibrasJanilson Nóbrega de Moura e Edneia de Oliveira Alves..................................................................................77

Uma Experiência Com a Escrita de SinaisEdneia de Oliveira Alves, Ezequiel Adney Lima da Paixão, Janilson Nóbrega de Moura, Marianne Rossi Stumpf e Willames Pontes de Souza......................................................................................99

A Diferença Estrutural Entre a Frase do Português e da LibrasIsadora de Carvalho Correia e Edneia de Oliveira Alves.................................................................................123

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APRESENTAÇÃO

A área de Libras vem se constituindo enquanto acadêmica a partir de tra-balhos de orientações com temáticas voltadas para a questão da surdez e da linguística da Libras em programas de pós-graduação. Entretanto, é recen-te o ingresso de professores de Libras nas universidades brasileiras. Esses professores, ao ingressarem nas universidades assumem turmas de Libras e executam trabalhos extra-classe de várias formas. Na Uiversidade Federal da Paraíba(UFPB) esses trabalhos iniciaram através da criação e implementação de projetos de extensão que tem sido fonte de conhecimento sistematizado e tem apontado para a demanda de pesquisa.

Portanto, este livro relata a experiência de atividades de extensão reali-zadas por meio do projeto “Produção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2”, que em 2013 fora vinculado ao do Probex1 da UFPB e em 2014 além do Probext fora vin-culado ao Proext2 também em formato de Programa “Libras (Língua Brasi-

1 Programa de Bolsas de Extensão2 Programa de Extensão Universitária

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leira de Sinais): ensino, pesquisa e tradução em questão” cujo financiamento foi fornecido pelo MEC. Os trabalhos realizados com a criação do livro di-dático de Libras têm aprimorado os conhecimentos acerca da cultura surda, elaboração de atividades de compreensão de texto em Libras e gramática de Libras. Por outro lado, as atividades realizadas junto aos alunos de gradu-ação têm enriquecido o conhecimento sobre recursos visuais didáticos para surdos.

No intuito de compartilhar as experiências e as reflexões que surgiram a partir delas abordamos neste livro a importância que a extensão univer-sitária possui para a constituição da área de Libras e como motivação para produção de conhecimento de extensão, de estudos teóricos e de pesquisa, sobre estratégias de criação de atividades de compreensão do gênero diá-logo, o tratamento da cultura surda no livro didático, sobre a importância da escrita de sinais e da gramática da língua de sinais.

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CONTRIBUIÇÕES DA EXTENSÃO E DA ÁREA DE LIBRAS PARA A FORMAÇÃO CRÍTICO-REFLEXIVA.

Edneia de Oliveira Alves3

Introdução

Neste capítulo, partilharei minhas experiências com a extensão realiza-da na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), por intermédio do projeto “Produção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2”, que fora vinculado ao probex do ano de 2013 e 2014. Além do Probex fora incorporado ao Programa “Libras (Língua Brasileira de Sinais): ensino, pesquisa e tradução em questão” que foi apro-vado no proext 2014.

Este projeto surgiu da necessidade de contribuir com a área de educa-ção dos surdos no que diz respeito ao ensino ao surdo e à difusão da Libras na sociedade por meio do ensino de Libras. Assim, traçou-se como objetivo 3 Professora Doutoranda de Libras do DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected]

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geral: oferecer recursos didáticos que possam atender às necessidades edu-cacionais do surdo e dos profissionais ao tempo em que oferece livros de Libras traduzidos para que estes sujeitos possam utilizá-los na sala de aula com segurança.

Como pressupõe a extensão universitária, este projeto foi criado para atender a uma necessidade de um grupo social específico: o surdo. As ne-cessidades que cercam este grupo estão vinculadas à necessidade de ga-rantira de seus direitos sociais, estes que têm sido violados à medida que não garantem-lhe a comunicação em Libras em todos os espaços públicos e o respeito à sua cultura. No que se refere à educação, este público neces-sita que sua língua e sua forma de aprender seja respeitada. Partindo deste viés, percebe-se que há uma grande demanda a ser atendida, pois, ainda há muito a se descobrir e há muitos serviços que precisam ser prestados a esta comunidade.

Neste contexto, a Universidade tem o potencial e a capacidade de, por intermédio da área de Libras, contribuir para dirimir as barreiras enfrenta-das pela comunidade surda em todos os âmbitos sociais, sobretudo, no se-tor educacional. Ao adotarmos a filosofia educacional de ensino bilíngue para surdos, descobrimos que tudo ainda está por ser construído, assim, as expectativas da comunidade surda e dos profissionais que trabalham com surdez é muito grande sobre os resultados do trabalho dos professores de

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Libras da universidade. Sendo assim, neste capítulo, compartilho os impactos iniciais sobre o uso

da extensão universitária como um instrumento de intervenção nas proble-máticas vivenciadas pelos surdos no que se refere a sua educação. Entende-mos que a extensão, através da sua dupla função – complementar a forma-ção inicial e dar um retorno dos conhecimentos produzidos ou criados junto à comunidade dos novos conhecimentos à sociedade – tem o potencial de dirimir problemas sociais enfrentados por grupos que passam por proces-so de exclusão. Ainda entende-se que, através da formação inicial, pode-se contribuir para a mudança da cultura e disseminar novos saberes sobre a educação do surdo no intuito de transformar comportamentos e crenças de futuros profissionais que em algum momento poderão entrar em contato com esse sujeito.

A extensão universitária como instrumento de formação inicial e continuada

A extensão como um dos tripés da universidade possui seu valor singu-lar: campo de difusão e aquisição de saber, campo de formação do aluno de formação inicial e campo de amadurecimento dos conhecimentos produzi-

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dos no meio acadêmico. Todos esses fatores torna a produção da extensão universitária relevante para a academia e para a sociedade. É justamente essa possibilidade de diálogo entre a parte interna e externa aos muros uni-versitários que a torna um fator de destaque na academia.

Algumas considerações da extensão universitária importantes a serem destacadas são as que Serrano (2013, p. 12) aponta como função: “acadê-mica – fundamentada em bases teórico-metodológicas; função social – pro-move a construção social e a construção da cidadania e função articuladora – do saber e do fazer da universidade com a sociedade”. Essas funções são possíveis de serem assumidas através de projetos ou programas de exten-são universitária porque ao se propor algum tipo de intervenção é exigido do proponente e dos respectivos orientandos a aplicação do conhecimen-to teórico de forma que gere transformação em uma determinada realida-de, porém, antes é necessário conhecer as reais demandas desse meio sob pena de não obter os resultados esperados. Por esse motivo, Serrano (2013) chama atenção para um olhar para o outro compreendendo sua condição sócio-histórica respeitando seus valores e cultura. Sendo assim, o diálogo com a comunidade não se estabelece em uma relação de imposição, nem subjulgamento, mas, pela interação que gera reciprocidade entre os saberes de cada segmento.

Outros aspectos sobre a extensão universitária são as características en-

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contradas por Castro (2004, p. 12):

a) impacto positivo nas relações entre professores e alunos. Deslocamento da centralidade do saber da figura do professor para alunos e professor. O Professor tende a ser mais um orientador do que um profeta. b) o conheci-mento produzido pelos grupos, circula por várias áreas do saber, é menos disciplinar e mais contextualizado. Se constrói no embate, na articulação entre outras formas de conhecimento; c) a visão obrista da extensão não se apresentou em nenhuma atividade analisada. É certo que algumas de-las utilizam os espaços de reflexão de forma mais ampliada do que outras. d) nenhuma das atividades estudadas nasceu para preencher o vazio das cargas horárias docentes. Todas elas surgem num determinado contexto histórico, seja da unidade acadêmica onde se instalaram, seja da premência de uma discussão que o tema impunha; e) todas as atividades desenvolvem seus trabalhos com recursos esparsos. Não existe financiamento específico para a extensão universitária.

Essas características são bem pertinentes e reveladoras das experiências vivenciadas durante a aplicação do projeto. Com relação à primeira, o fazer e o aprender na extensão movimentam-se de maneira horizontal. Durante o enfrentamento dos desafios de colocar em prática um saber teórico em uma determinada realidade social torna atores todos os membros envolvidos e realmente a centralidade do professor é relativizada. Esta realidade cria uma

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dinamicidade diferente dos modos tradicionais de atuação do professor, pois, o professor é posto à prova, mas, ao mesmo tempo ele põe em prova os membros da equipe e em conjunto constrói e reconstrói conhecimento. A centralidade é deslocada para os desafios a serem vencidos em posição de companheirismo e os professores e os alunos se esforçam para vencê-los. Assim, estabelece-se uma relação de parceria entre os membros da equipe.

É nessa dinâmica acompanhada de reflexão que se compreende a segun-da característica apontada acima (item b), pois, o conhecimento é recons-truído mediante demandas da realidade social. Assim, a reflexão assume centralidade desfazendo os padrões de ensino/aprendizagem que se pauta na memorização e normatização.

É a observação do vínculo que se estabelece na extensão entre academia e sociedade que se pode compreender a característica apontada por Castro, em que a extensão surge da necessidade de algum tipo de intervenção de-tectada a partir do conhecimento sócio-histórico da comunidade. Com re-lação ao financiamento, a extensão já avançou e hoje temos financiamento específico, embora com alguns entraves e a burocratização para seu usufru-to é um deles.

Essa relação dialógica assumida na implementação das ações propostas em projetos e programas, a extensão é um elemento enriquecedor do fazer universitário devido às potencialidades que o contato entre a universidade e

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a comunidade traz para o fazer e saber científico, sobretudo, para a forma-ção profissional dos graduandos. Ela traz a possibilidade da construção de um saber não de domínio de alguém, mas, em benefício da sociedade. Pois, através da extensão, conforme Serrano (2013), a universidade assume a pos-tura transcendente possibilitando a transformação de seu saber ao dialogar com a realidade social da comunidade com a qual trabalha e, de acordo com Sughara (2012), possibilita o engajamento com a vida social e contribui para a transformação social. A universidade tem como missão contribuir para o crescimento social de seu entorno, então, é o diálogo com a realidade que a circunda que possibilita a colaboração com essa comunidade.

Serrano (2013) chama atenção para o fato de que a relação estabelecida com a comunidade não deve ser baseada em hierarquias, mas, respeitando a cultura local e assumindo um compromisso de mudança. Assumir esse tipo de concepção faz com que os objetivos dos projetos ou programas estejam abertos às modificações demandadas pela realidade social e isto acontece no estabelecimento contato com os membros das comunidades.

Dessa forma, a extensão pode ser uma fonte de informação sobre a ne-cessidade da comunidade e não apenas um meio de difusão dos resultados da pesquisa. A extensão é mais uma possibilidade de construção do co-nhecimento, além da pesquisa científica. A dialogicidade estabelecida en-tre a universidade e a comunidade possibilita o despertar para a produção

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de conhecimento, no entanto, este é construído para atender às demandas imediatas, porém, não menos necessário que o conhecimento científico. A percepção de novas nuances de acontecimentos sociais só é possível me-diante contato sistematizado com a realidade social. Para Serrano (2013), é na comunidade que se elabora o conhecimento produzido academicamente encontrado na prática. Assim, a extensão é mais uma fonte de conhecimento, porém, não sobrepõe o conhecimento científico ao conhecimento comum, mas, tendo em sua base o respeito aos valores da comunidade e contribuin-do para seu amadurecimento. Nessa dinâmica da relação estabelecida entre universidade e comunidade por meio da extensão, criam-se conhecimentos novos e aponta as necessidades de aprofundamento em uma instância em que só os moldes da pesquisa podem fornecer. Assim, o tripé universitário precisa ser cíclico e horizontal ao invés de estabelecer hierarquias com níveis de importância, seria uma relação como a representada na figura 1.

A atuação da universidade nas comunidades precisa ser em prol da, con-forme Jezine (2004) promoção de uma consciência crítica capaz de intervir na realidade com o fim de transformar e libertar para a promoção da au-tonomia do indivíduo. Nessa relação dialógica, entre universidade com seu corpo docente e discente e a comunidade externa, assumindo uma postura horizontal de negociações para o entendimento recíproco, traz transforma-ções para o meio acadêmico ao possibilitar compreender a sociedade em sua

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estrutura real. Na comunidade essa transformação contribui para a tomada de consciência de si e para a compreensão do lugar que ocupa na sociedade como um todo. É nesse trânsito de ir e vir de saberes que a extensão ocupa lugar de valor de transformação de si e do outro.

É na extensão que os conhecimentos adquiridos na universidade são perpassados pela realidade, Castro (2004) ressalta que a forma de explo-ração das características da extensão pode modificar a forma de ensinar e aprender, que o encontro entre professor, aluno e comunidade cria um novo senso comum e amplia a capacidade de refletir sobre a práti-ca. Complementando este entendimento, Sughara (2012) afirma que a extensão é um espaço de produção de novos conhecimentos e Santos (2012) a considera uma fonte e espaço de alimentação de conhecimento por meio da interdisciplinaridade.

Esses fatores são extremamente importantes para a formação do gra-duando que se vê, ainda nos dias de hoje, com dificuldade de atrelar a te-oria à prática. É no campo que os alunos compreendem a importância do saber científico e teórico e a extensão se torna esse campo, porém, com a vantagem de estar apoiada pela presença do professor. De acordo com Su-ghara (2012), a extensão é voltada para a qualificação profissional por dar a possibilidade da participação ativa do agente em processo de formação, por estimular a reflexão sobre a práxis e ser um espaço de colaboração e

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respeito entre os participantes. Conforme Serrano (2013), a extensão é um processo educativo e cien-

tífico porque em sua prática se produz conhecimento que produz mudança da comunidade e da universidade e vice-versa. Na comunidade se põe em prática o conhecimento acadêmico, mas, se submetendo à transformação. A equipe – professor, aluno e comunidade – por sua vez põe em prática um conhecimento acadêmico que é permeado pelo valor do saber científico, porém, com a predisposição de ressignificá-lo mediante situações viven-ciadas na prática. Santos (2012) afirma que um trabalho em parceria permi-te a reconstrução de conhecimento pelo aluno, que por meio da vivência com os problemas sociais a extensão se torna um trabalho que promove a associação entre ensino, pesquisa e extensão. Para Santos é um espaço privilegiado de formação e aprendizado profissional, tem o objetivo de por o aluno em contato com a realidade social aplicando os conhecimentos adquiridos em sala de aula: o agir profissionalmente, proporcionando mu-dança social e política.

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Figura 1 – Plano do tripé da Universidade

Fonte: A autora

Serrano (2013) chama a atenção para a necessidade de

elaborar um novo pensar sobre o fazer universitário, com redefinição de conceitos e práticas e a efetiva mobilização da comunidade acadêmica na direção de uma práxis que se apresente integrada, interdisciplinar, sintoni-zada com o conhecimento novo e com a realidade e demanda social.

A experiência vivenciada em sala de aula na disciplina Libras, conforme será relatado em seguida, demonstra que é perfeitamente possível a exten-são estar integrada no currículo da universidade. Além disso, estando inte-grada ao currículo ela contribui para a valorização do conhecimento teórico

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e para a formação crítica do aluno. Essa experiência demonstra que é possí-vel subverter a ordem comum na universidade – a extensão estar atrelada a algum projeto de pesquisa. Ao invés dessa ordem, a experiência tem impul-sionado à criação de linhas de pesquisa para responder a algumas questões sobre a qual não temos resposta para dar à comunidade que trabalhamos, também para ser suporte para continuidade das ações implementadas.

A aplicação da vertente recurso visual na formação inicial

A partir do objetivo geral: Produzir material didático para o ensino ao surdo e para o ensino de Libras, percebe-se que este projeto tinha a pro-dução de material didático como aspecto norteador das ações, porém, com duas vertentes: criação de recurso didático para surdos e criação de livros didáticos de Libras. No entanto, no que diz respeito à formação inicial o eixo que tem norteado as ações do projeto é a reflexão-crítica. Pois, o desafio de construir recurso visual para surdos faz com que necessariamente haja a re-flexão sobre a realidade desse aluno.

Embora, sejam assumidas duas vertentes no próprio objetivo, ele teve como foco contribuir com a melhora da qualidade da educação dos surdos. Essa vertente teve como objetivo promover aprendizagem significativa dos

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alunos de graduação matriculados na disciplina Libras ao mesmo tempo em que fornece recurso visual para ser utilizado como material de apoio nas di-versas aulas do ensino básico.

Assim, a primeira vertente trouxe como ação a criação de recurso visu-al para o ensino ao surdo e a segunda vertente resultou na criação de livro didático de Libras. A necessidade de criação de recurso didático surgiu da experiência que tenho com o ensino ao surdo e por encontrar nas narrativas surdas a sua afinidade com a percepção visual. Este tipo de recurso é impor-tante porque é um dos aspectos que afetam a metodologia de ensino ao surdo. Com relação à criação de livros didáticos de Libras (Língua de Sinais Brasileira), há a necessidade de promover maior possibilidade de contato social pelo surdo em Libras, o que demanda ensino de Libras para maior quantidade de pessoas que, consequentemente, demanda a necessidade de material de apoio para a sala de aula.

A vertente da construção do recurso didático para ensino ao surdo

A vertente do projeto que trata da criação de recurso visual é posta no objetivo de maneira ampla ao abordar o ensino ao surdo. Embora se tenha como base o ensino e este vocábulo nos leve às infinitas possibilidades de

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atuação, houve recortes para a construção do recurso. A necessidade de se manter um objetivo amplo se deve ao fato de se ter como pano de fundo o objetivo de promover a formação de licenciandos para o atendimento às necessidades educacionais específicas do surdo.

Dessa forma, esta vertente do projeto foi pensada para ser aplicada em sala de aula na disciplina de Libras ministrada por mim na UFPB. Assim, a proposta é trazer para o currículo da disciplina a extensão como atividade de sala de aula para promover um momento diferenciado de aprendizado com os alunos de graduação que pagam a disciplina comigo. A justificativa para a implementação da extensão na sala de aula se deve à compreensão de que no processo de formação inicial de alunos é necessário promover um trabalho que atrele a teoria à prática para que o conhecimento teórico se torne relevante para o aluno.

Essa inciativa também foi motivada pelo anseio de que a sala de aula se torne um ambiente de produção de saber e não apenas de reprodução. A proposta é provocar no aluno uma reflexão crítica sobre as teorias lidas na disciplina e no próprio campo de atuação, pois, as salas tinham alunos oriundos de cursos diferentes. Com ajuda da extensão, pude tirar os alu-nos do lugar de receptor e de indução, que por vezes se torna obrigação, de leitura dos textos teóricos para promover o que Imbert (2003) chama de abertura da clausura. Pois, conforme Imbert a práxis é uma produção de

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novos sentidos, assim, compreendo que o desafio posto aos alunos contri-bui para a construção de novos sentidos para a educação dos surdos, so-bretudo a compreensão de que o ensino ao surdo não pode ter como base os princípios metodológicos de ensino ao ouvinte. Sobre a relação ensino x aprendizagem do surdo, é pensar que a sua relação com o mundo acontece por meio do contato visual, portanto, sua maneira de perceber e vivenciar o mundo e de raciocinar sobre si mesmo acontece primordialmente pelo sen-tido da visão. Este é um aspecto relevante a ser considerado no processo de educação, sobretudo, nos aspectos metodológicos.

Ao levar o desafio da produção de recursos visual para o surdo, preten-de-se trabalhar a habilidade de aquisição e aplicação de conhecimento te-órico. Assim, de posse das noções básicas do conteúdo e da capacidade de produção do saber autônomo, o aluno pode enfrentar um desafio que é al-gum tipo de contribuição com a comunidade público-alvo dessa disciplina: o surdo.

As turmas de Libras que tenho assumido na UFPB possuem alunos dos mais diversos cursos, assim, é corriqueiro ter alunos de licenciatura e de ba-charelado na mesma sala de aula. Dentre as licenciaturas, já tive alunos de história, pedagogia, letras, música, teatro e educação física em uma mesma sala. Dentre os bacharelados, já tive alunos de fonoaudiologia, terapia ocu-pacional, engenharia civil e fisioterapia. Assim como também tive alunos

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de ciências sociais, ciências das religiões, psicopedagogia e relações inter-nacionais. Esta realidade demonstra, então, que as turmas eram compostas de alunos oriundos dos mais diversos cursos de graduação da UFPB. Sendo assim, para encontrar um ponto em comum de interesse entre os alunos, foram solicitados para os alunos de licenciatura um recurso didático visual e para os alunos de bacharelado cartilhas explicativas. Todos tinham como público alvo o surdo e o objetivo de criar um recurso visual com cunho ins-trutivo ou informativo.

Esse desafio compõe um dos tipos de trabalho avaliativo, porém, antes é explicado aos alunos a condição de aprendizagem do surdo e seu envol-vimento com o mundo por meio da experiência visual. Também é explicado para o aluno a importância de elaboração de um trabalho a partir da criação e não da reprodução e que a extensão é uma possibilidade desse tipo de trabalho. Além desses argumentos, o aluno tem a possibilidade de não fazer o trabalho solicitado, mas, uma prova para repor a nota do trabalho. Com essas explicações consigo um comportamento de parceria com os alunos e o reconhecimento da importância deste trabalho. Essa preocupação em dialogar com os alunos se deve ao que Freire (2003) chama de respeito à autonomia dos alunos enquanto indivíduos e que a autonomia se constrói nas várias tomadas de decisões. Para que se possa formar um professor ou outro profissional que ensine e respeite a autonomia dos sujeitos, é neces-

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sário que na academia durante o processo formador os alunos vivenciem situações de construção da própria autonomia.

Além do cuidado com os argumentos e explicações, o aluno tem um espaço de tomadas de decisões que são de sua total responsabilidade ao criar o recurso solicitado, tais como: escolha da temática a ser trabalhada e da abordagem de revisão de litertura, os tipos de imagens a serem postas, assim como outras atividades inerentes à construção do recurso visual e do trabalho em equipe.

Outro esclarecimento necessário diz respeito ao público-alvo, nesse caso, o público que se pretende beneficiar é o surdo porque demanda metodolo-gias específicas que considere a peculiaridade da sua percepção de mundo. Ströbel (2009) chama atenção para o fato de que a pedagogia surda deve considerar o aspecto visual, pois, o surdo percebe e apreende o mundo através da visão. Em um estudo sobre avaliação de habilidades de raciocí-nio simbólico e não simbólico, Borges, Lopes e Lopes (2010) destacam que há ambientes que podem não estar adaptados, o que impede o desenvol-vimento das habilidades de raciocínio do surdo. É importante salientar que essa constatação tira a culpabilização da vítima e cobra do sistema o cum-primento de suas responsabilidades. A preocupação em ter um projeto de construção de recurso visual se apoia na preocupação em dar atenção às queixas dos surdos quando afirmam que o uso da percepção visual facilita

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sua aprendizagem, o que corrobora com as afirmações dos autores acima. Para além do respeito às reclamações dos surdos, pode-se basear o ar-

gumento na concepção de cultura porque para os surdos a percepção visual é o embasamento de sua cultura e sua identidade, assim, Perlin e Miranda (2013, p. 218) afirmam:

Se vocês nos perguntarem aqui: o que é ser surdo? Temos uma resposta: ser surdo é uma questão de vida. Não se trata de uma deficiência, mas de uma experiência visual. Experiência visual significa a utilização da visão, (em substituição total a audição), como meio de comunicação. Desta experi-ência visual surge a cultura surda representada pela língua de sinais, pelo modo diferente de ser, de se expressar, de conhecer o mundo, de entrar nas artes, no conhecimento científico e acadêmico. A cultura surda comporta a língua de sinais, a necessidade do intérprete, de tecnologia de leitura.

Compreende-se, então, que a relação do surdo com mundo é por in-termédio da percepção visual e que ela molda sua forma de depreender o mundo e de significa-lo no mundo. Sendo assim, não se pode ter em sala de aula a perspectiva ouvinte de aprendizagem para o surdo porque o estímu-lo auditivo para o surdo não tem o mesmo significado e feedback que tem para o ouvinte, é neste ponto que se sustenta a importância e relevância do projeto para a comunidade acadêmica, para a formação dos profissionais e

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para a educação do surdo usuário de Libras. Como dito anteriormente, o objetivo de criar recurso para o ensino ao

surdo foi amplo, porém, não por acaso. Este objetivo foi criado desta forma para que pudesse, a partir dele, serem criados outros objetivos. Assim, cada grupo de alunos precisava antes de criar o recurso didático planejar seus trabalhos a partir da delimitação de um objetivo específico e percurso meto-dológico. Porém, a equipe deveria construir um objetivo de criar um recur-so visual para o ensino de um determinado conteúdo disciplinar da própria área de formação. Por exemplo, o aluno de história construiria um recurso que abordasse um conteúdo escolar de história. Neste momento, foi im-posto para o aluno o trabalho interdisciplinar, pois, embora ele pudesse es-colher trabalhar com um conteúdo de domínio de sua área específica, mas, que precisava pensá-lo sob a ótica do seu público-alvo – o surdo – e essa implicação o levara a necessidade de se apropriar de um saber diferente de sua área e correlacioná-lo à demanda educacional do surdo. Assim, o aluno se vê desafiado a produzir um novo conhecimento que é o objetivo da dis-ciplina Libras: além de ensinar sinais básicos, ensinar os aspectos culturais e educacionais do aluno surdo. A preocupação central foi trazer para o aluno a compreensão da sua responsabilidade enquanto educador na construção e reconstrução do social, assim, trabalhar com grupos em processo de ex-clusão deve imperar no profissional a percepção das demandas reais e um

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esforço em atendê-las. Através da extensão, é perfeitamente possível traba-lhar o conhecimento emancipador nos preceitos de Castro (2004) quando afirma que este considera que a união entre a produção e a ideologia pos-sibilita a construção de um novo conhecimento em prol da formação cidadã e humana. As exigências sobre o formato do trabalho provocava no aluno a reflexão sobre o material que deveria produzir e a preocupação de que esse material fosse um eficaz instrumento mediador de aprendizagem. Este aspecto aponta para os achados de Castro (2004), nos quais foi percebido que as atividades de extensão geravam aprofundamento do conhecimento pouco desenvolvido no curso de graduação. Foi o fazer e refletir sobre o re-curso visuo-didático para surdos que provocou inquietação nos alunos de graduação. Diante deles havia um novo desafio: a construção de um recurso visual que pudesse favorecer a aprendizagem do surdo que tem como pe-culiaridade o uso exclusivo da percepção visual para sua construção de co-nhecimento. Este desafio possibilitou empregar as ideias de Freire (1996) no que se trata da ação do professor não como detentor de saber, mas, como um mediador que olha para seu aluno como um indivíduo autônomo e pro-dutor de novos saberes.

O estabelecimento de uma relação dialógica com os alunos e os colabo-radores do projeto de extensão contribuiu para uma produção que não foi apenas de responsabilidade do professor. Cada membro do projeto tinha sua

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parcela de responsabilidade com a garantia da qualidade de sua produção. Foi preciso confiar no saber adquirido pelos alunos em sua área específica para que pudessem produzir um material apoiado em uma literatura de sua área específica e pela qual eles eram os responsáveis.

A proposta é que os novos conhecimentos adquiridos possam dialogar com o momento de sua aplicação, tornando o novo conhecimento objeto de sua práxis para que possa oferecer um instrumento de aprendizagem como meio diferenciado de acesso ao saber para, ao mesmo tempo, con-tribuir com aqueles que pouca disponibilidade de recursos adaptados tem para acessar.

A extensão é um momento em que o aluno tem a liberdade de discutir, repensar e reinterpretar a teoria que lhe é apresentada e buscar novas teo-rias para o desenvolvimento de um trabalho tornando cada aluno um sujeito participativo ativo no trabalho em e isto grupo faz com que ele possa cons-truir e moldar seu próprio conhecimento a partir de valores e necessidades do outro. Dessa forma, estamos diante de uma tarefa que exige reflexão e desprendimento dos próprios valores, da própria maneira de avaliar a reali-dade e do emolduramento da educação bancária, que mesmo no século XXI ainda encontram-se alunos e professores presos nessas amarras, conforme Freire (1987, p. 33) é a “concepção bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depó-

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sitos, guardá-los e arquivá-los”A extensão enquanto projeto que envolve os alunos da sala de aula no

desenvolvimento de suas ações tem o potencial de promover a aplicação do conhecimento produzido na academia e de aliar teoria e prática, tornando--se um espaço para o aluno produzir conhecimento com autonomia, mesmo que servindo a um propósito pré-estabelecido. Isto faz do aluno um crítico do seu próprio fazer e do conhecimento que o professor lhe apresenta que-enriquece a sua formação enquanto aluno.

Como resultado do trabalho, no que se refere à contribuição da discipli-na Libras para a formação inicial, conforme relato dos alunos, entendemos que ao propor ao aluno de graduação a criação de um recurso visual para a educação de surdos, promove-se um momento de reflexão porque o fato novo faz com que ele precise refletir sobre a necessidade desse sujeito. A proposta induz o aluno a deslocar o olhar sobre a realidade a partir da sua vivência para exercitar o olhar do outro. Assim, se trata de produzir saber a partir e para o outro. O desafio é partir da ótica do surdo para que o material tenha o potencial de gerar o impacto desejado: promover aprendizagem ou possibilitar acesso do surdo à determinado conteúdo. É esse tipo de deslo-camento que a educação carece para que deixe de ser uma educação ban-cária e atinja seu objetivo de formação humana.

No que se refere à contribuição na formação inicial dos alunos pode ser

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considerada positiva, porém, a meta de termos pesquisas surgidas a partir deste trabalho contamos com o início da realização de um trabalho de con-clusão do curso. Com relação à meta de termos o material produzido dispo-nibilizados na internet não foi possível realizar por falta de parceria com o curso de mídias digitais ou outro curso especificamente para criar e manter páginas. No que se refere à construção do recurso visual, encontramos difi-culdade em produzir materiais com todas as informações que se pretendia para cada recurso. A dificuldade, que às vezes se tornava um entrave, foi em encontrar imagens adequadas para o nível e tipo de informação que se pre-tendia encontrar para expor imageticamente determinadas informações.

A vertente da construção do livro didático de Libras

A ação da construção do livro didático de Libras foi realizada na maneira convencional de realização das ações em local especifico para tal. Ela foi pos-ta em prática fora de sala de aula, porém, não fora da universidade, embora na equipe tenha havido a parceria com professores de fora da Universidade e com alunos da UFPB, pois, a equipe foi composta por parceiros externos e por alunos da UFPB. Os parceiros externos foram: um professor surdo atu-ante no ensino fundamental, uma professora surda doutora da Universida-de Federal de Santa Catarina (UFSC) – ambos responsáveis pela qualidade

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das lições e atividades referentes à escrita de sinais e um assistente social da Secretaria de Assistência Social da cidade de Guarabira – PB ex-aluno do curso de Letras-Libras da UFPB. Os alunos foram surdos e ouvintes estudan-tes do curso de Letras-Libras, Letras-Português e Comunicação em Mídias Digitais. Esse fazer envolveu toda a equipe e aqui não falo de qualquer equi-pe, porque ela foi formada por sujeitos que hora eram assujeitados e hora eram sujeitos pelo reconhecimento de que este momento foi um momento de construção e reconstrução do saber pela troca de saberes, como afirma Castro (2004), a extensão é um lugar onde o fazer considera além do profes-sor e aluno um outro. Esse outro que não necessariamente um acadêmico, porém, conhecedor das especificidades da sua realidade, pois, apenas este o sabe de fato. Este outro que está fora da academia é o elemento que com-plementa ou embasa o saber científico, sua intervenção desestrutura o saber científico produzido e alicerçado que não dá conta da realidade mostrando que há outras realidades ou nuances que não tenham sido consideradas des-pertando para a investigação que busca compreender os fatos sociais sem uma imagem pré-estabelecida, mas, pela demanda real. Assim, a participa-ção de colaboradores externos enriqueceu a produção dos livros didáticos ao apontar as demandas reais durante o processo de criação do livro. Foram essas intervenções que moldaram a estrutura do livro para que este possa atender às necessidades dos alunos em sala de aula de Libras. Dessa forma,

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estabeleceu-se o que Castro chama de difusão do conhecimento inspirado na narrativa do outro.

A parceria com o curso de Comunicação em Mídias Digitais foi um im-portante passo para o melhoramento da qualidade do material produzido. Esta experiência demonstrou a importância do trabalho multidisciplinar, co-adunando com a ideia de Castro (2004) quando chamara atenção para a necessidade de aproximar áreas diferentes do saber. Essa experiência tornou o trabalho mais rico e de melhor qualidade, sendo assim, as parcerias são sempre a melhor opção, especialmente neste momento em que vivemos na era da informática sendo ela um instrumento que perpassa muitas das ativi-dades humanas. Porém, essa predisposição a produzir saber intercruzando áreas precisa estar acompanhada do entendimento de que não há domínio de todos os saberes e ter a disposição de estar aberto a novos conhecimen-tos. É nesse âmbito que se fortalece o trabalho em equipe e torna a extensão um espaço rico na construção e reconstrução do saber, fazendo ressaltar os valores humanos e a valorização do saber do outro.

Partindo do ponto de vista da necessidade, consideramos a importância da presença dos alunos surdos na equipe porque os consideramos conhece-dores e sinalizadores fieis da Libras. Dito isto, porque para os surdos a língua de sinais é a sua língua natural (ZYCH, 2003, SANTANA e BERGAMO, 2005, GESUELI, 2008, STRÖBEL, 2009, FERRETTI; CSALI, 2012, OLIVEIRA; OLIVEIRA,

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2012). Por outro lado, a língua de sinais se torna uma segunda língua para os ouvintes à medida que eles a adquirem, porém, o que é preciso chamar atenção é para a necessidade de se ter na equipe a presença do ouvinte dos cursos de Letras, pois, foram eles que deram o suporte na produção escrita em língua portuguesa que consta no livro. Quanto à necessidade de serem incluídos na equipe os alunos de Mídia, foi pela habilitação no trabalho com imagens e diagramação de livros.

Partindo do olhar sobre a inclusão, ter alunos surdos na equipe foi uma das ações mais positivas tendo em vista esses alunos não dispõem de mui-tas oportunidades de participação nos projetos de pesquisa ou extensão na UFPB. Com a atuação da área de Libras e o ingresso dos alunos surdos em maior quantidade no curso de Letras-Libras, se comparado aos outros cursos da UFPB, essas oportunidades de participação de surdos em proje-tos tem se ampliado, seja como alunos ou como colaboradores externos. Porém, é importante ressaltar que essa referência às oportunidades dadas aos surdos, se explica pela competência que os professores de Libras têm na comunicação em Libras. O trabalho realizado pela equipe foi basicamente a criação de lições e atividades e coleta de registro e organização dos sinais. Assim, foram elaborados dois livros de Libras básico e intermediário. Cada livro continha dois módulos: Libras básico um e dois e Libras intermediário um e dois correspondentemente.

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É importante salientar também que essa estruturação foi resultado do amadurecimento das ideias surgidas no processo de construção dos livros, pois, no início não se tinha uma ideia muito clara sobre o formato do livro porque há pouquíssima quantidade de livro didático de Libras que pudes-sem ser utilizados como parâmetro de comparação ou modelo. Assim, mui-tas etapas dos livros são ideias completamente inovadoras. Esse amadure-cimento foi induzindo a sistematização das ações e foi um processo que foi sendo construído à medida que a equipe experienciava e avaliava os resulta-dos. O interessante nessa experiência é que a equipe não parte de modelos prontos e emoldurados, mas, o conhecimento vai sendo adquirido e busca-do de acordo com as necessidades do trabalho. Isso faz com que a extensão seja um espaço de construção de conhecimento em prol de uma demanda e não se fecha em si mesmo, tão pouco, usa o conhecimento como instru-mento normalizador.

Foram criados dois livros de Libras com a seguinte estrutura: Libras I com módulo I e II. Este trabalha as habilidades básicas da comunicação em Libras e de gramática e introduz a escrita de sinais. Libras II com módulo I e II que contém conteúdos de Libras em nível intermediário. Em termos de conteúdo são explorados a Libras nas modalidades sinalizada e escrita, a gramática e o vocabulário. Sobre o trabalho com a escrita de sinais, é importante explicitar que no nível básico ela foi trabalhada em nível mais fonológico e morfológi-

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co do que na perspectiva do letramento. A escolha em trabalhar dessa forma se deve ao fato de que ela tem sofrido muita resistência quanto à sua acei-tação e valorização, porém, no nível intermediário o trabalho assume mais a perspectiva do letramento por ser este um nível mais avançado.

Cada módulo foi composto por quatro unidades e cada uma inicia com um diálogo como lição introdutória para o trabalho com vocabulário, gramá-tica e escrita de sinais. Assim, para cada diálogo há um conjunto de questões que vão desde reconhecimentos de sinais às inferenciais, a gramática é explo-rada a partir de estruturas apresentadas nos diálogos ou após apresentação de lição explicativa, o trabalho com o vocabulário parte do reconhecimento do vocábulo que intencionalmente aparece no diálogo e em atividades de memorização. A escrita de sinais é trabalhada a partir de apresentação de lições para seguir para atividades que contenham questões de associação com o sinal sinalizado, de reconhecimento e reprodução e produção escrita a depender do nível em que ela esteja imersa.

Todo o processo de criação dos livros envolveu o aluno participante de forma que, os desafios eram lançados e eles venceram todos eles, uns com mais dificuldades para uma determinada tarefa e outros para outras. Assim, à medida que as dificuldades e adversidades iam aparecendo, a equipe en-contrava novas soluções. Nesse entrelaçamento entre os desafios e solu-ções, os trabalhos foram sendo moldados ao longo do processo e a equipe

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foi amadurecendo os conhecimentos obtidos nas salas de aula e no próprio envolvimento com as atividades dos projetos.

Cada etapa das unidades foi criada por participantes do projeto, inclusi-ve da orientadora. Esse processo de criação partira sempre de uma temática pré-determinada. Estas temáticas foram pensadas para que em cada lição fosse trabalhado um vocabulário específico, também foram escolhidas a par-tir das situações cotidianas para que o estudante ao ter acesso ao conteúdo trabalhado desenvolvesse a capacidade de travar uma comunicação real ao estar de frente ao surdo. A criação dos diálogos foi inicialmente, delegada ao surdo usuário de Libras por ele ter todas as ferramentas necessárias: flu-ência de comunicação em Libras, conhecimento – mesmo que intuitivo – so-bre a gramática da Libras e capacidade de criação. Com o amadurecimento da equipe, todos os alunos – surdos e ouvintes – foram envolvidos nesse e nos outros tipos de tarefa.

A dificuldade enfrentada na atividade de criação de diálogo foi sobre o entendimento do fim pedagógico que ela tinha. Por ser este um material criado para o desenvolvimento da aprendizagem de outrem, todo o material precisa ser pensado com o foco no aprendiz. Esta concepção determinou o tamanho dos diálogos, a forma de sinalização, o conteúdo gramatical pre-sente nele e toda a sequência didática, além da forma de a atuação dos ato-res que representaram os diálogos.

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Esta falta de compreensão das implicações pedagógicas no trabalho de ensino de língua e a falta dos conhecimentos específicos sobre gramática da língua de sinais motivaram a criação do grupo de estudo para que pu-déssemos discutir com bases teóricas as perspectivas de ensino de língua. Dessa forma, a teoria estudada passou a permear e justificar as escolhas na produção dos livros didáticos. Assim, os diálogos foram todos acompanha-dos de uma sequência de questões que foram pensadas na perspectiva da sequência didática porque essas questões precisavam promover um desen-volvimento gradativo de aprendizagem.

As questões precisavam cobrar habilidades que exigiam pouco esforço – reconhecimento de sinais conhecidos no diálogo – até habilidades mais complexas – as inferências. Nesse caso, houve a necessidade do entendi-mento do que se propõe a sequência didática. Barros e Nascimento (2007, apud DOLZ, NOVERRAZ; SCHNEUWLY, 2004) assumem que é um conjunto de atividades sistematizadas. Partimos dessa concepção para assumir que as atividades propostas deveriam ter uma sequência que desenvolvesse a aqui-sição de língua, assim, como a aprendizagem das habilidades comunicativas e culturais na/da Libras.

Logo após as questões de interpretação, quando possível, era trabalha-do o conteúdo gramatical a partir das construções gramaticais que estavam presentes no próprio diálogo introdutório. Este trabalho exigia da equipe

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do projeto um conhecimento aprofundado sobre gramática de Libras e o entendimento da proposta do trabalho com gramática reflexiva, cuja função é compreender a estruturação da língua mediante observação e reflexão (TRAVAGLIA, 2009).

Em seguida, era trabalhado o vocabulário porque a proposta destes livros é de ensino de Libras para ouvintes. Como a Libras é uma língua que ocupa o lugar de segunda língua para este público, faz-se necessário trabalhar o vocabulário para que ele possa construir, também através de memorização, seu repertório linguístico. Com isto, o aluno poderá gradativamente cons-truir e ampliar o repertório lexical da Libras, pois, afirma Cardoso (2012), o cérebro faz a recuperação do lexo mental através de associação.

A escrita de sinais passou a constituir uma das lições de cada unidade porque ainda não se encontra difundida na comunidade surda, nem acadê-mica como uma modalidade da língua de sinais. Espera-se que no futuro essa modalidade seja a forma de registro da língua de sinais nos livros, ou seja, que a modalidade escrita a mediação do saber nos livros de língua de sinais, pois, é por demais estranho estudar uma língua tendo como instru-mento mediador a escrita de outra língua. Apenas para refletirmos, coloco a seguinte questão: os professores adotam livros escritos em português para ministrar suas aulas de língua estrangeira? Evidentemente, a resposta é não. Então, continuemos refletindo: por que as pessoas querem ensinar e estu-

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dar Libras por meio de livros cujo código escrito é o português? Bom, esse é um assunto para pesquisas futuras. Enfim, o que pretendo argumentar aqui é que o ideal é que os livros didáticos de Libras sejam escritos em escrita de sinais para que os estudantes desde sua iniciação à língua já o faça em contato com estruturas linguísticas da Libras, e a escrita de sinais é a melhor forma de registro escrito das línguas de sinais.

Retomando, o conteúdo de escrita de sinais foi apresentado em forma de lição seguido de atividades com questões que inicialmente exploravam a associação entre sinal escrito e sinal sinalizado à produção de sinais, no caso da Libras básica. No nível intermediário, as questões partiam do reconheci-mento do sinal à leitura e escrita em escrita de sinais. Porém, é importante ressaltar que houve o cuidado para que todas as atividades e lições de es-crita de sinais contivessem sinais referentes à temática estudada na unidade da qual elas faziam parte.

A orientação para a equipe, necessária nesta etapa da unidade, era sobre a compreensão da importância da escrita de sinais para a comunidade surda e para a valorização do status linguístico da Libras, sobre a importância do contexto cognitivo para facilitar a aprendizagem de uma nova modalidade escrita e sobre a necessidade da sequência didática também na exploração desse conteúdo.

A realidade mostrou ao grupo a necessidade do conhecimento teórico-

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-pedagógico, assim, o pensar sobre o próprio fazer pedagógico e as neces-sidades de domínio desse saber trouxe a teoria para as discussões do grupo. Dessa forma, a extensão tornou-se o que Santos (2012) chama de um meio de intervir a partir do domínio teórico e crítico-reflexivo sobre a realidade na qual se insere apreendendo o objeto particular no qual se deve intervir. A partir das duas vertentes do projeto foi visível o crescimento intelectual dos alunos em formação, como afirma Castro (2004), o projeto de extensão promove a consciência crítica na relação dialógica entre teoria e prática.

O grupo de estudo se tornou de fundamental importância para que os alunos e participantes externos compreendessem o processo independente-mente da visão particular do orientador e para a descentralização do traba-lho. Nesse momento, os alunos adquiriam novos conhecimentos científicos, compreendiam a importância do trabalho e amadureciam sua relação com a prática compreendendo-a como permeada pela teoria.

Neste contexto, a professora-orientadora passou atuar a como mediado-ra do saber, que através de sua experiência pôde instigar o aluno a produzir conhecimento e aplica-lo através da construção de livros didáticos de Libras. Isto porque a extensão é um diálogo entre conhecimentos, como afirma Freire (1983); é um espaço de comunicação. Sendo assim, pode-se por em prática uma educação emancipadora.

A extensão como um todo tem o potencial de formar o profissional crí-

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tico-reflexivo, a partir do enfrentamento do trabalho a ser desenvolvido na extensão, este que requer aplicação de conhecimento científico, tem o po-tencial de promover “o pensamento reflexivo, como uma forma e um es-forço de pensar consciente e voluntário que leva à inquirição, à ação, à in-vestigação, à descoberta” (CARVALHO, 2002). Esta ação provocadora que causa desconforto no aluno e que lhe traz um desafio o provoca a pensar de maneira que ele é induzido a produzir novos saberes a partir da reflexão e alertando-lhe que há sempre novos saberes a ser produzidos. É a busca da formação crítico reflexiva, um dos objetivos da universidade e que Carvalho (2002, p. 54) chama atenção ao afirmar que:

A prática pedagógica reflexiva, pelo seu alto grau de consciência carac-teriza-se por ser uma opção madura, consciente, do sujeito consciente do conhecimento que constrói à luz da reflexão-ação- reflexão, reiterada e constante. Como uma dimensão da prática social mais ampla, a prática pedagógica reflexiva caracteriza-se, sobremaneira, pelo trabalho coletivo entre sujeitos curiosos, inquietos e insatisfeitos com os resultados do seu próprio trabalho e que suspeitam que a diversidade do grupo é um ponto a se explorar para enriquecerem a própria individualidade.

À medida que a equipe ia amadurecendo o conhecimento teórico e en-frentando novos desafios, descobriu-se que o conhecimento que trata das

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peculiaridades que envolvem o ensino de Libras, tais como: gramática de Libras, metodologia de ensino e relação entre representação visual e pen-samento linguístico do surdo não está pronto. Neste momento percebemos claramente que a ordem foi subvertida, pois, em geral se parte de uma teo-ria pronta para aplicá-la, mas, como a área de Libras está por ser constituída há uma imensa carência de conhecimentos científicos na área. Neste caso, por emergência construção científica do conhecimento da área de Libras, há a previsão de em 2015 criar as linhas de pesquisa para atender a demanda de conhecimentos linguísticos, de relação ensino aprendizagem de Libras e literatura, tradução e aspectos da surdez. Assim, a origem das linhas de pes-quisa partirá da experiência com a extensão. Esta realidade demonstra que a extensão não pode apenas ser condicionada a atender à necessidade de divulgação dos conhecimentos acadêmicos, nem tão pouco existe apenas para ser um campo de aquisição de experiência dos futuros profissionais. Esta realidade é uma demonstração clara de que a extensão é um campo rico de produção e reprodução de conhecimento a serviço de comunidades excluídas e que sua estrutura permite impactar fortemente na relação uni-versidade sociedade. Assim, defende-se que a extensão co-exista com os demais pontos do tripé da Universidade para que esses pontos estabeleçam uma relação horizontal que permeia o fazer da universidade.

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Conclusão

Apesar das dificuldades enfrentadas, como: falta de estrutura adequada, falta de experiência com o lidar com questões de Proext e com a própria criação do material e a falta de conhecimento dentro da universidade para os encaminhamentos de parcerias, o ganho com a realização do projeto tem sido positivo. Este projeto contribuiu com a melhora da qualidade de forma-ção de graduandos e graduados, por complementar a formação de alguns colaboradores externos, por fornecer um material didático de apoio que ge-rará impacto positivo na comunidade surda no que diz respeito à difusão da Libras e na atuação dos professores de Libras – sobretudo dos professores surdos – e por ter sido um fundamental elemento delineador na criação de linhas de pesquisa que contribuam para atender às reais demandas da área. Aos meus alunos e colaboradores, possibilitou-lhes compreender e apro-fundar os conhecimentos sobre a relação professor x aluno, a importância da mediação do saber, sobre a preocupação em ter o aluno como foco do trabalho do professor, compreender as questões de aprendizagem do aluno surdo, compreender o papel da universidade e do professor diante da socie-dade e aprender os conteúdos relacionados à didática do ensino de Língua

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e demais conteúdos e sobre gramática de Libras.Como o professor está em constante processo de formação por preci-

sar estar sempre acompanhando a dinâmica social, este projeto de exten-são promoveu grande crescimento no meu desempenho acadêmico. Ele me possibilitou desenvolver estratégias de orientação e trabalho em equipe, en-riquecendo minha capacidade de atuação como mediadora do saber. Alar-gou minha visão sobre o trabalho do docente acadêmico e me possibilitou questionar e compreender a importância da extensão na universidade. Ao surdo possibilitou sair do papel de assujeitamento para se tornar ator no processo, o fez se ver como co-responsável no desenvolvimento dos traba-lhos e romper com a visão assistencialista vivenciado durante todo o proces-so de formação,

A extensão universitária tem múltipla função porque o aluno de gradua-ção ao participar de um projeto de extensão pode, ao tempo em que constrói e reconstrói conhecimento, contribuir com a comunidade externa. Os traba-lhos desenvolvidos neste projeto tem o potencial de impactar na educação de surdos à medida que oferece materiais de suporte para o ensino ao surdo e ensino de Libras. No que se refere ao ensino ao surdo, quando os materiais visuais forem disponibilizados ao público os professores das mais diversas disciplinas escolares poderão contar com materiais prontos para ministrar suas aulas de maneira que o aluno surdo seja beneficiado. Ou ainda, o pró-

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prio surdo poderá utilizá-lo como material de apoio aos seus estudos. Com relação aos livros didáticos, ao serem distribuídos, os professores

poderão contar com um material pronto para facilitar sua preparação de aula de criação de recursos que possam ser utilizados em sala para a facili-tação da aprendizagem do aluno, até porque o trabalho do professor não pode se esgotar no uso do livro didático. Sendo o livro didático do trabalho do professor e um material que pode ser utilizado para o estudo da Libras, ele será um material de apoio para o uso e difusão da língua de sinais. Enfim, a extensão enriqueceu os conhecimentos da equipe como um todo, contri-buiu para a inserção de colaboradores e alunos no mercado de trabalho e possui um forte potencial de impacto social.

Referências

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O DIÁLOGO COMO ESTRATÉGIA DIDÁTICA PARA O ENSINO DE LIBRAS

Ana Claudia Nunes do Nascimento4

Edneia de Oliveira Alves5

Introdução

A temática abordada neste capítulo trata-se do relato de experiência ad-quirida sobre o uso do gênero diálogo no livro didático de ensino de Libras. Ele foi utilizado como estratégia de ensino porque esse tipo de gênero é o mais conhecido por todos por ser o meio cotidiano de comunicação entre as pessoas. Assim, ele é o Suporte aquisição de habilidade de desenvolver atividade autonomamente utilizado para introdução do conhecimento de uma nova língua.

O livro didático, referido no parágrafo anterior, foi uma das produções 4 Graduanda de Letras/Português DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected] Professora Doutoranda de Libras do DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected]

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vinculada às atividades desenvolvidas pelo projeto extensionista da Univer-sidade Federal da Paraíba (UFPB), intitulado “Produção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2” com vínculo ao Programa Libras (Língua Brasileira de Sinais): ensino, pes-quisa e tradução em questão. Este foi aprovado em concorrência nacional e possuía financiamento do MEC pelo Proext 2014.

O objetivo geral do nosso projeto foi de produzir material didático para o ensino ao surdo e ao ensino da Libras, dessa maneira, buscamos expandir a Libras e a escrita de sinais através da distribuição dos livros didáticos de Libras, assim como, promover a qualidade da educação de surdos, coope-rar com a difusão e valorização da Libras e estimular a valorização da cul-tura surda. Estes aspectos são de extrema importância para que os surdos venham a possuir mais autonomia em sua vivência linguística e cultural em uma comunidade nacional cuja língua majoritária não é sua língua natural. Com o ensino de Libras, a cultura surda tende á alcançar a sociedade ouvin-te, portanto, amplia as possibilidades de interação e comunicação no meio social. Esta abrangência traz como consequência positiva a redução do pre-conceito que, lamentavelmente, ainda é perceptível em nosso meio.

A utilização de diálogos no ensino de Libras como L2 será discutida com base na teoria de Bakhtin que nos dá a base das motivações para a escolha em trabalhar com esse elemento discursivo. Embora tenha sido um material,

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inicialmente, pensado para um público-alvo ouvinte, nas lições há a explo-ração ao máximo possível dos recursos visuais. Com isto, o livro didático passou a ter o potencial de ser favorável também no aprendizado de Libras como L1. Em nossa metodologia, apresentaremos recortes de experiências de produção do material do projeto, nela analisaremos estas atividades bus-cando demonstrar o potencial do ensino através de diálogos.

Em se tratando do processo de alfabetização/letramento e ensino/apren-dizagem de Libras, nosso aprendizado passa por um processo gradual, em que, aprendemos letras, sinalização de letras, palavras, sinalização de pala-vras, mas não basta sabermos unir apenas letras ou palavras, e sim, nos situ-armos no contexto para que possamos compreender a mensagem que nos foi dita, por conta disto, Travaglia (2009) remete que o objetivo do ensino de língua materna é de desenvolver a competência comunicativa dos usuários da língua. Convenhamos que ela é indispensável na vida de cada um de nós. Travaglia nos diz que a competência comunicativa tem a capacidade de ge-rar outras duas competências que é a gramatical ou linguística –habilidade de gerar frases gramaticais- e a textual –habilidade de durante uma intera-ção produzir e compreender textos. Da mesma forma que acontece com a aprendizagem da língua materna, esta competência comunicativa também pode ser adquirida no aprendizado de uma L2 e para propiciar ao aluno a formação dela. Outro ponto que o autor também nos fala é na importância

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do contato do aluno com variedades de interação comunicativa.Neste texto, focaremos o ensino da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS)

como abordagem histórico-cultural, temática esta que ainda carece de pes-quisa e produção de material para apoiar discentes e docentes da Língua de sinais, porque esta língua é resultado de uma construção cultural da comu-nidade surda e sua legitimação é resultado de lutas dessa comunidade. O ganho do reconhecimento linguístico da comunidade surda e de sua cultura é bastante recente no Brasil, assim, perpassaram-se gerações sem que hou-vesse pesquisa científica sobre o sistema linguístico da língua de sinais. Com base em poucas produções científicas, a exemplo de Quadros (1997), a lín-gua surgiu da necessidade comunicativa dos surdos e que ela não se deriva das línguas orais.

A temática a ser apresentada neste capítulo terá como ponto fundamen-tal a teoria bakhtiniana no que tange a sua exposição sobre a dialogia, por ter como foco a apresentação da experiência de construção de atividades com base em diálogos criados para o aprendizado da Libras.

O diálogo

Como já falamos, temos como objetivo demonstrar sobre a maneira em

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que o diálogo é favorável ao ensino, mas, de quais tipos de diálogo estamos falando? Afinal, o que é diálogo? Para nos situarmos, precisamos entender um pouco sobre sua conceituação.

De uma maneira simples e sintética, poderíamos dizer que o diálogo é uma conversa espontânea entre duas ou mais pessoas, ele está presente em nosso dia-a-dia e é algo indispensável para as interações sociais. Bakhtin (2011, p. 275) nos diz que:

Por sua precisão e simplicidade, diálogo é a forma clássica da comunicação discursiva. Cada réplica, por mais breve e fragmentária que seja, possui uma conclusibilidade específica ao exprimir certa posição do falante que suscita resposta, em relação a qual se pode assumir uma posição responsiva.

Diariamente, necessitamos nos comunicar com diversas pessoas e nos utilizamos dos gêneros discursivos para tal fim. Em se tratando de comu-nicação face a face utilizamos o diálogo como meio de interação de forma que, por meio dele, podemos trocar ideias, e é dessa forma que o diálogo possibilita a interrelação discursiva entre indivíduos. Bakhtin (2011) nos diz que a comunicação discursiva (verbal) que há entre nós e o outro é o diá-logo, pontuemos que esta comunicação verbal está diretamente ligada à alternância de vozes e à reciprocidade. Esta é uma norma do diálogo: sem-

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pre que exprimimos ideias para outros esperamos e nos esforçamos para sermos compreendidos. Na interação com o outro nos utilizamos da palavra como convenção social cujo significado e sentido permite-nos estabelecer comunicação com o outro. Já em fase de aquisição, esse processo comuni-cativo com uso da palavra é empregado no diálogo, assim, ele é a primei-ra instância interacional verbal entre indivíduos, influenciando inclusive na cognição do sujeito. Conforme Bubnova (2011), o eu que se constitui verbal-mente passa primeiro pelo diálogo como forma primária de pensamento e de comunicação.

Uma das condições do diálogo é a réplica que pode ser compreendida por Ferreira (1989) como uma contestação. E replicar, ainda segundo o di-cionário, é o dizer em resposta ao que disse outrem, para negar, opor ou ex-plicar. Exemplificando quando é dito que a réplica mesmo sendo breve pode expressar uma conclusibilidade específica, ou seja, expressar a posição do falante ou uma posição responsiva.

O diálogo permite que a palavra do outro participe direta ou indireta-mente do discurso do eu, mas, um eu com o comportamento responsivo e ativo. Na troca estabelecida no momento de comunicação traz para si a pa-lavra do outro ora apenas compreendendo-a ora introduzindo-a em seu dis-curso. Há de se considerar que a realidade do diálogo acontece na réplica de forma que, nas palavras de Bakhtin (2013), há a palavra e a contrapalavra. Há

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nele uma dinâmica própria de realização da língua em que prevê a interação. Conforme Bakhtin (2011), há o jogo de pergunta-resposta, afirmação-ob-jeção, proposta-aceitação, ordem-execução no qual há a enunciação plena no processo comunicacional. É um acontecimento caracteristicamente vivo em que a enunciação concreta está completamente submissa à condição comunicacional promovida pelo interesse recíproco de entendimento entre interlocutores. O diálogo exerce influência tão importante que, para Bezerra (2013), o autor ao escrever uma narrativa deixa que os personagens se de-finam através dos diálogos. Assim, o sujeito ao dialogar revela seu contexto situacional ao mesmo tempo que revela a si porque seu discurso é carrega-do de tom valorativo e apreciativo.

Essa responsividade, na prática, pode ocorrer por meio de uma única palavra, com atenção mantida no discurso do outro. A enunciação do in-terlocutor não precisa ser necessariamente através da verbalização de uma frase complexa. Como exemplo de responsividade nos diálogos trabalhados nos livros didáticos, podemos citar um uso cotidiano de responsividade nos diálogos em Libras: o vocábulo LEGAL. Esse sinal é sempre utilizado em res-posta positiva a uma enunciação, uma palavra/sinal sucinta que em contex-to comunicativo possui uma significação, portanto, considerado enunciado. Esta é uma réplica que foi introduzida nos diálogos para que os estudantes de Libras possam já compreender as formas de réplicas próprias da cultura

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linguística da comunidade surda. Vale ressaltar que a réplica é e já provém de um enunciado e que seu

sentido está diretamente dependente do enunciado anterior, característica típica dos diálogos. Brait (2013) afirma que há diversas teorias elucidadoras do termo enunciado. Brait nos diz que uma delas é baseada nas diferentes correntes da pragmática e que dessas correntes foi depreendido que o enun-ciado é dotado de caraterísticas extralinguísticas, são baseadas em concei-tuação de inferência e de contexto e que estes são como fundamentais para o entendimento do enunciado. Assim, para que a palavra/sinal LEGAL possa representar uma posição do interlocutor, se faz necessário que saibamos todo o contexto suscitado pelo diálogo.

Quando estamos dialogando/conversando com alguém, estamos a todo momento produzindo réplicas e enunciados, segundo Brait (2012) estes dois conceitos são interdependentes, pois, na comunicação do nosso cotidiano é constituída uma interação entre locutor e interlocutor de forma que um enunciado provoca outro enunciado com tom de pergunta e resposta, com sentido de afirmação ou negação.

Para além dessa questão, a palavra ao ser tomada para si ganha um tom apreciativo tornando-se diferenciada em aspecto ou perspectiva da palavra do outro. Como afirma Bakhtin (2013), ao tomarmos a palavra do outro a compreendemos de maneira diferente. Esses são dados importantes para

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justificar o trabalho com ensino de língua a partir dos diálogos porque Bakh-tin (2013, p. 223) afirma: “o nosso discurso na vida prática está cheio das palavras dos outros. [...] a palavra em contexto de reciprocidade tem caráter dinâmico, por ser mutável e passar de boca em boca”.

O diálogo do cotidiano entendido como aquele que ocorre na rotina ba-nal em contextos familiares e entre amigos tem o potencial de trazer para o aluno um contexto que lhe é familiar. Além disso, o contato com o discurso que têm em sua base as situações reais de comunicação apresenta um con-texto de vivência para o indivíduo. Sendo assim, o trabalho parte do conhe-cimento prévio do aluno possibilitando-lhe agregar novos conhecimentos.

A Libras é uma língua se se apresenta como estranha em sua forma de produção verbal para o ouvinte, no entanto, o processo de aquisição dela não precisa ser de todo estranho. O aluno ao se dispor a adquirir um novo conhecimento, o faz por meio de associação e ele não vai encontrar essa associação com a produção verbal da língua oral, porém, o contexto ordiná-rio é um importante facilitador. Isto porque esse tipo de diálogo se associa a sua vivência, ou como queira, a sua experiência com o mundo. Martelota (2013 p. 179) nos diz que, segundo os cognitivistas, “há uma relação siste-mática entre linguagem, pensamento e experiência”. Tendo como base que as características do diálogo é uma habilidade do processo comunicativo por um falante de uma língua qualquer, podemos afirmar que esse gênero é

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um importante scharfold para a aprendizagem de uma segunda língua. Foi com base nessa premissa que o trabalho com diálogos foi introdutório de todos os novos conhecimentos nos livros didáticos de Libras em nível básico e intermediário. Assim, apresentaremos a seguir uma análise das atividades elaboradas a partir de diálogos em Libras para que possamos refletir sobre a contribuição que o uso de diálogo pode oferecer no processo promoção de aquisição de uma nova língua.

Diálogo em Libras como proposta didática

Os livros didáticos de Libras criados no projeto têm como elemento intro-dutório das lições o diálogo, assim, pretende-se provocar o interesse dos alu-nos para a temática a ser estudada e a partir dele foram trabalhadas todas as questões de compreensão e linguísticas, quando possível. Assim, a partir das construções apresentadas em diálogos, propomos atividades que tratam dos diversos aspectos da Libras: vocabulário, gramática e escrita de sinais.

Todos os diálogos introdutórios das unidades foram produzidos em Lín-gua de Sinais sinalizada e gravados em vídeo e sem legenda. Ao iniciar-se uma temática nova, é apresentado o diálogo em Libras e o objetivo deste momento é propor que o aluno obtenha uma percepção dos sinais que ele

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conhece, estimulá-lo a aprender novos sinais, conduzi-lo a identificação da temática a ser tratada e observar a maneira em que os surdos se comunicam. A intensão é, já desde o primeiro contato com a Libras, induzir os alunos a terem contato com a produção da língua por meio de seus falantes natu-rais e ter acesso ao vocabulário e à sua gramática a partir de um contexto. A opção em trabalhar com os vídeos é porque a única forma de receber essa língua é a partir da sua visualização, pois, sua forma de expressão é visuo--gestual (FERNANDES, 2003).

Cada unidade inicia com uma lista de questionamentos, assim, espera-se que o professor exiba o diálogo antes de iniciar qualquer tipo de atividade de língua em sala de aula. Assim, após ver o diálogo entre os surdos o aluno deve responder as atividades referentes a ele. As questões destes exercícios vão desde o nível de decodificação até as questões inferenciais. A diversi-ficação de exercícios e atividades é algo defendido por Dolz e Schneuwly (2004), pois, postulam que através da diversificação o aluno poderá se apro-priar de noções e instrumentos que lhes são propostos. E é por este viés que nos fundamentamos, tendo em vista que o material produzido para um cur-so de língua atenderá aos alunos dos mais diversos níveis de ensino. E ainda, os alunos são estimulados a exercitar os conhecimentos como os apontados por Koch (2011): linguísticos, enciclopédico e conhecimento interacional.

Logo abaixo, apresentaremos um diálogo e analisaremos as questões

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desenvolvidas a partir dele para que possamos melhor compreender sobre a forma de exploração didática do gênero diálogo. Porém, antes é importante esclarecer que no final de todas as unidades possuem as transcrições e suas respectivas traduções. A transcrição dos diálogos em forma de glosas, que é uma forma de transcrever textos de Libras utilizando o código alfabético. Existem protocolos elaborados por linguísticas da área, porém, não segui-mos nenhum deles por termos evidências que nos indicam que a melhor forma de transcrição da Libras seria com o uso do sistema de transcrição SignWriting. No entanto, este sistema é pouco conhecido no Brasil e raras são as pessoas que dominam esse tipo de transcrição. Diante disso, opta-mos por transcrever em glosa procurando ser fiel à estrutura gramática da Libras e mantendo em código alfabético para facilitar a compreensão dos estudantes. Essas glosas são apenas auxiliares para que se possa tirar dúvi-das, sendo assim, elas foram postas na parte final do livro. O objetivo é que, num primeiro momento, o aluno possa ver apenas o diálogo sinalizado em vídeo e possa perceber como acontece a interação nesta língua.

A análise a ser realizada será com base no diálogo intitulado “Xiii... COMPLICADO”, que é referente à temática família, do livro 1, Libras 1. Esse diálogo foi escolhido porque, através dele, podemos demonstrar o potencial presente no diálogo para o ensino de Libras.

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Veja:Xiii... Complicado

Bruna - HEI EU PROBLEMA. Ei, eu tenho um problema.Alan - ACONTECER O QUE? O que aconteceu?Bruna - CASA MINHA ANIMAL MUITO. Na minha casa tem muitos animais.Alan - MUITO? QUAL? Muitos? Quais?Bruna - GATO 2, CACHORRO 3, PASSARINHO 5, TARTARUGA 1.Dois ga-

tos, três cachorros, cinco passarinhos e um cágado.Alan - COITADA TRABALHAR CUIDAR ANIMAL. Coitada, da trabalho cui-

dar de animais.Bruna - VERDADE. É verdade.

Este é um diálogo pequeno e com poucas informações. Ele foi criado desta forma porque é uma lição para iniciantes de nível básico. Assim, além de já apresentar um discurso do cotidiano, traz informações vocabulares também da vida cotidiana das pessoas. Com isso, estamos introduzindo um conhecimento linguístico tendo como base um discurso e um contexto cog-nitivo já conhecido pelas pessoas. Compreendemos que na formação dos

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diálogos são introduzidos enunciados que estão presentes no dia-a-dia ou pelo menos no campo das ideias dos alunos, este é um dos pontos de an-coragem adotados para que o aluno possa assimilar os sinais e aprendê-los de maneira a proporcionar a internalização do vocabulário e da gramática da Libras, pois, segundo Bock (2003 p.118) “os pontos de ancoragem são formados com a incorporação, à estrutura cognitiva, de elementos (infor-mações ou ideias) relevantes para a aquisição de novos conhecimentos”. Ou seja, os conhecimentos prévios do aluno não são deixados para trás, e sim, aproveitados para que através deles seja possível conduzir o aluno a agregar novos conhecimentos.

Após a visualização do diálogo, são apresentadas ao aluno algumas questões de interpretação do diálogo, aqui, apresentaremos uma a uma e discutiremos sobre seus objetivos. As questões referentes ao diálogo são de modo geral de um caráter interpretativo e reflexivo. Como já foi dito, para que possa oferecer ao aluno um aprendizado significativo, usamos como ponto de ancoragem diálogos que apresentam situações não distantes do cotidiano dos alunos, para que possamos proporcionar-lhes uma ampliação no seu conhecimento linguístico e do seu desenvolvimento cognitivo.

As questões referentes aos diálogos sempre iniciaram com a exploração do entendimento da mensagem, assim, a compreensão foi o foco da estimu-lação de aprendizagem da Libras, isto porque nas interações comunicativas

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a preocupação maior é com a compreensão da mensagem. Assim, as ques-tões iniciavam com a solicitação de compreensão das informações explícitas ou implícitas presentes nas falas das personagens. Veja a primeira questão abaixo referente ao diálogo apresentado:

Questão 1Qual o problema que a personagem Bruna relata estar acontecendo?

Esse é um tipo de questão que solicita informação explícita no diálogo, requerendo um esforço no conhecimento da língua e abstração de informa-ção presente na fala da personagem no decorrer do diálogo. As questões apresentadas em nosso material sofrem uma alternância de níveis, visto que, o material atenderá pessoas dos mais diversos níveis de conhecimento. As-sim, devemos considerar a heterogeneidade apresentada por cada turma de sala de aula. A partir desse cuidado, a expectativa é que os alunos possam aprender Libras através de uma maneira gradativa e reflexiva. Para que o aluno responda esta questão é preciso atentar para o contexto significativo e para as réplicas do diálogo.

Após solicitar que o aluno encontre uma informação explicita, foi solici-tada uma informação implícita. Veja:

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Questão 2Como a personagem Bruna se sente diante desta situação?

Nesta questão é dada ao aluno a possibilidade de inferir, pois, apesar de ser apresentada a situação o sentimento produzido pela personagem pode-rá ser definido pelo aluno. Para a resposta dessa pergunta, é necessário que o aluno compreenda as trocas de turnos entre as personagens, pois, como afirma Bakhtin (2013) há a palavra e contraplavra em um jogo de pergunta e resposta em um diálogo. Ele poderá fazer o “balanceamento entre infor-mações explicitas e implícitas” (KOCH; ELIAS, 2011, p. 34). O aluno poderia dizer, por exemplo, que Bruna se sente angustiada porque já no início apon-ta sua situação como problema e no final do enunciado a personagem Alan em sua atitude responsiva traz a réplica dizendo que ela é coitada, assim, seu enunciado traz para o contexto da conversa o sentido de sentimento de dó da colega. Esse enunciado se torna o responsável pelo tom do diálogo: o tom de reciprocidade de sentimento de angústia sofrido por um dos perso-nagens. E ainda, se o aluno observar bem, após a fala de Alan, Bruna produz o seguinte enunciado: VERDADE. Este enunciado, apesar de ser apenas uma palavra, expressa uma concordância da personagem em relação ao que foi replicado por Alan dando valor de verdade para a enunciação. Embora seja apenas um sinal: VERDADE produz sentido tendo em vista que o observador

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utiliza-se do contexto discursivo do diálogo para compreender que real-mente Bruna estaria concordando com a fala de Alan.

Logo após as questões de interpretação, foi introduzida a questão de vo-cabulário. Como se trata de ensino de língua não materna, o trabalho com vocabulário se faz necessário, assim, eles foram explorados através dos diá-logos e através de atividades mais pontuais, estas nãos serão aqui apresen-tadas porque o foco é o diálogo. Assim, veja:

Questão 3Em Libras, cite quais e quantos animais há na casa da personagem Bruna.

Esta questão tem como objetivo proporcionar ao aluno o aprendizado de vocábulos referentes aos animais através da produção de um enunciado, pois ele irá rever o diálogo para sinalizar a resposta, então, sinalizará os ani-mais e suas respectivas quantidades. Para realização desta questão o aluno deve ter a habilidade de compreender todo o diálogo para identificar dentre as falas os vocábulos que se pede. Nessa identificação, é trabalhada a habili-dade de leitura scanning, através da qual se procura informações específicas em um texto. A partir dela, o aluno poderá praticar a língua e memorizar os vocábulos. Porém, o interessante a se observar é que o trabalho com o

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vocabulário nesta questão exige do aluno as seguintes habilidades: compre-ensão e identificação das informações solicitadas no diálogo e observação da forma de sinalização das quantidades expressas, isso, com o intuito que o aluno apreenda a norma gramatical ao mesmo tempo em que aprende novos sinais.

Marchezan (2012) nos fala que os diálogos também são veículos para o ensino das formas gramaticais, no nosso material não é diferente, porquan-to, as seguintes questões estão fundamentadas neste mesmo diálogo cuja exploração de interpretação já fora realizada. Em seguida, foram solicitadas informações sobre a estrutura gramatical utilizada no texto.

Esse tipo de questão é solicitada geralmente no final da atividade porque já se pode contar com o contato do aluno com o texto e com isso ele já tem familiaridade com a estrutura que se pretende trabalhar. Feito desta forma, garantimos que mesmo em uma língua não materna haja a possibilidade de trabalho com a gramática contextualizada e reflexiva.

Esta foi uma preocupação constante na construção do material porque Antunes (2007) nos traz a seguinte indagação: Que gramáticas existem? As respostas a esta pergunta é de extrema importância, pois, muitas vezes ouve-se tanto falar-se em gramática, mas, muitos não sabem que não se trata apenas de regras de escrita, ela possui diversas definições e funções. A autora nos diz que em nós há uma “gramática interiorizada”, ou seja, so-

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mos possuidores de conhecimentos inatos e como prova disto, nos dá um exemplo de uma resposta dita por uma criança de 2 anos e quatro meses que ao ser indagada se queria ou não atender a um telefonema, emite a resposta com uma palavra: Quero. A autora nos faz ver que mesmo sem saber ou estudar gramática a menina já a utilizou, fazendo a flexão do verbo em tempo, modo, número e pessoa, omitiu o pronome sujeito e o complemento do verbo, pois, estes elementos já estavam inseridos no contexto da interação. Se temos um contexto, uma interação, logo, temos enunciados e diálogo. Este exemplo é dado a uma situação de ouvintes e com uma criança, mas em Libras e com adultos não é diferente, pois, se-gundo Quadros (1997) o processo de aquisição das línguas faladas e das Línguas de sinais são análogas. Além do mais, a todo momento estamos a desenvolver situações comunicativas e à adquirir novas palavras seja em que língua for. Sigamos para mais uma questão.

Questão 1 (gramática)Reveja o vídeo intitulado “Xiii... Complicado” e com base no vocabulá-

rio referente aos Pronomes interrogativos e quantificadores, liste abaixo os pronomes que aparecem no diálogo.

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Mais uma vez o aluno terá a opção de rever o diálogo, mas, neste mo-mento haverá outro foco que é a identificação dos pronomes. O objetivo deste quesito é atrair a visão do aluno para os pronomes, para a maneira de sua sinalização e preparar o aluno para questão seguinte. Como já foi dito, em nosso material buscamos fazer uma diversificação de atividades, para isto, tomamos por base a proposta de sequência didática postulada por Dolz e Schneuwly (2004) em que as atividades vão tomando movimentações do complexo ao simples, isto de uma maneira sistemática e gradual, atendendo assim a capacidade de cada aluno.

Questão 2 (gramática)Agora, observe em que posição ele se encontra. Você acha que tem dife-

rença com relação ao português? Qual?

Esta questão leva o aluno, em primeiro momento a perceber a posição ocupada pelo pronome na frase. É uma questão que induz o aluno a iniciar uma reflexão sobre a estrutura frasal e um pensamento metalinguístico so-bre a nova língua que está aprendendo. O intuito é fazer com que o aluno tome consciência da estrutura gramatical por meio da reflexão. De acordo com Travaglia (2009), a gramática reflexiva é um trabalho de reflexão sobre

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um recurso linguístico dominado ou não pelo falante de uma língua com o fim de ensinar produtivamente. A partir dessa concepção, adotamos a ideia de que mesmo o aluno que não domina a língua de sinais deve aprender sua gramática de forma reflexiva compreendendo também o contexto em que é empregado. É claro que, no caso dessa atividade, essa ocorrência gra-matical é apenas uma possibilidade de significação e de arranjo estrutural, no entanto, o aluno na sequência dos estudos terá outras oportunidades de contato com a estrutura em outros contextos. Antunes (2007) nos fala que redigir um texto e ler uma literatura é algo que não se faz fora da gramática e que a gramática não tem utilidade se estiver fora das atividades comuni-cativas. Logo, identificar classificações gramaticais através de frases soltas e fora de um contexto é algo que deve ser evitado, porém, é algo bastante visto nas escolas.

Após a observação da organização frasal, uma vez que o aluno seja falan-te de português, o objetivo de levar o aluno a uma percepção comparativa entre Libras e Língua Portuguesa em que ele utilizará um dos conhecimentos denominados por Koch e Elias (2011) como linguístico, o aluno se utilizará dos conhecimentos linguísticos de sua própria língua para compreender a estrutura da nova língua. Este é um recurso utilizado recorrentemente por alunos que estão aprendendo uma língua não materna, porém, o intuito de induzir a reflexão comparativa é para quebrar o mito da comunidade ouvin-

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te de que a língua de sinais é o emprego de sinais em lugar de palavras do português, o que originou o chamado português sinalizado. Para esclarecer esse mito, Gesser (2009, p. 33) esclarece da seguinte forma:

A língua de sinais não é datilologia ou mímica (como muitos podem pensar), também não é universal (igual em todos os países), muito menos artificial (uma língua inventada). Ligada a essas crenças, vem a seguinte indagação: então, seria a língua de sinais “adaptação” das línguas orais? Ou, dito de outra forma, seria a LIBRAS um português sinalizado, por exemplo? Não. A língua de sinais tem estrutura própria, e é autônoma, ou seja, independente de qualquer língua oral em sua concepção linguística.

No caso de se ter um público alvo falante de língua portuguesa é preciso um trabalho reflexivo para que se respeite e compreenda a autonomia lin-guística da Libras. No caso desta atividade, o aluno precisará compreender a ordem frasal da língua portuguesa para poder perceber e compreender como a ordem frasal da Língua de sinais se diferencia das línguas orais. Se-gundo Koch e Elias (2011), os conhecimentos de ortografia, gramática e lé-xico de língua são adquiridos através de práticas comunicativas ao longo da vida, assim como, na escola. Assim, o ensino de Libras escolarizado e siste-matizado é um meio de aprendizagem da língua de sinais, porém, sem que seja de forma tradicionalmente mecânica.

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É importante que ao longo do curso de Libras os alunos possam se apro-priar da gramática da Libras com eficiência porque ela é bem diferente da língua portuguesa. Quadros e Karnopp (2004) nos fala sobre a flexibilidade na ordem das palavras em Libras e nos evidencia isto nos mostrando frases na ordem sujeito, verbo e objeto (SVO), e as ordens SOV, OSV e OSV como possibilidades de construção frasal na Libras. Estas alterações na ordem das palavras resultam de diversos fatores, por exemplo, a presença de tópicos, que ocorre quando um elemento tema é dado ênfase no início e há um co-mentário a respeito deste tema.

Com base na concepção de que o ensino deve ser reflexivo e que se deve unir as práticas comunicativas do cotidiano às práticas escolares que propo-mos ao aluno. Vejamos a seguinte questão:

Questão 3 (gramática)Agora, reconstrua o diálogo utilizando dados da sua própria vida e apre-

sente para seu professor em Libras.

Neste quesito, o aluno poderá remontar o diálogo utilizando situações de sua própria vivência, poderá utilizar-se do momento que a personagem fala de um problema referente a sua situação e falar de algo que também

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não lhe é agradável. Nesta atividade, é cobrado todo o novo conhecimento adquirido, sobretudo, o conhecimento vocabular e gramatical. Para executar esta atividade faz-se necessário a presença de outro colega, visto que tra-ta-se de um diálogo e, necessita de uma interação social por ser real. Sobre à interação vemos em Martelotta (2013), se trata de um dos aspectos da proposta cognitivista e então, nesta questão o aluno tomará o diálogo inicial como base temática e é livre para a construção sequencial dele, visto que utilizará enunciados de acordo com a interação com seu colega. Desta ma-neira, o aluno estará utilizando-se de sinais que aprendeu durante o vídeo e sinais que ele conheça. Assim como, poderá trazer situações de seu cotidia-no, para que possa aprender a língua como algo real e não fantasioso.

Além deste aspecto, através desta construção a proposta é que o aluno venha a se familiarizar com o gênero diálogo e tenha estímulo para aprender sinais de seu dia-a-dia, dessa maneira, ele estará buscando um conhecimen-to que tenha uma significação para si. Esse é um momento de construção do saber, pois, ao estimular o aluno a empregar um novo conhecimento ao seu cotidiano ele precisará adaptar porque não é uma aplicação automática. É um momento que, embora ocorra em uma situação de controle, o aluno terá certa liberdade para inovar e reconstruir o conhecimento com automia. Na sequência, o aluno é motivado a criar uma situação comunicativa nova. Veja a questão:

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Questão 4 de gramáticaCrie também um diálogo com os interrogativos: quanto, quem e muito

para apresentar ao seu professor em Libras.

Nesta questão, o aluno criará também um diálogo, mas, uma das condi-ções impostas a ele é a utilização de pronomes interrogativos, assim, lhe é exigida a aplicação dos novos conhecimentos adquiridos. O aluno neste mo-mento poderá tomar como base o diálogo visto na unidade e o diálogo do quesito anterior para que possa acrescentar os pronomes. O objetivo desta atividade é que o aluno possa aprender os sinais dos pronomes em Libras dentro de um contexto que seja de seu interesse, visto que, a única condição imposta nesta atividade é a inclusão dos pronomes durante a interação. As-sim, espera-se que uma situação real de interação comunicativa com uso da língua de sinais o aluno possa iniciar uma conversação com sentido, com-preendendo e sendo compreendido por seu interlocutor.

Esse é um momento de construção significativa de conhecimento, pois, o aluno empregará seus conhecimentos adquiridos de forma autônoma. Feito desta forma porque, conforme Freire (1996), o professor que trabalha em prol da autonomia provoca o aluno a reconhecer-se como sujeito sócio-his-tórico-cultural e volta-se para a formação humana. A própria preocupação

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em oferecer um material pedagógico que contribua com um fazer pedagó-gico que incentive a reflexão e a produção autônoma do saber pelo aluno, se adequa aos preceitos freireanos. Portanto, espera-se que o incentivo à criação e à recriação de diálogos com base na própria vivência contribua para que o aluno tome consciência de si e do outro que é o falante natural da língua de sinais: o surdo. Se assim for, o ensino de Libras contribuirá para o fortalecimento, respeito e valorização da cultura surda para que seja res-peitada como mais uma cultura brasileira.

Conclusão

O ensino de Língua de sinais é algo que tem se intensificado ao longo dos anos, e com isso, tem surgido cada vez mais à necessidade de um ma-terial de apoio aos docentes e discentes, visto que, é necessário aos profes-sores um material didático para que ele possa ter um domínio do conteúdo ministrado em sala de aula, assim como, é necessário aos alunos o material didático para que obtenha a oportunidade de ter um auxílio dentro e fora da sala de aula.

Ao tomarmos a responsabilidade em produzir um material que venha a atender a esta demanda e frente a um ensino que vem sendo implementado

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largamente no sistema educacional brasileiro, ouve a preocupação em pro-duzir um material com um nível de qualidade que contribuísse com a me-lhoria de qualidade no ensino da Libras. Optar por diálogos foi uma escolha que tinha como objetivo levar o aluno a compreender os contextos comuni-cativos sociais para que não viesse a aprender os sinais sem uma significa-ção e sem nexo.

A realização do trabalho com o projeto trouxe uma experiência que pos-sibilitou ter um aprendizado bastante amplo, pois, fez-se necessário a elabo-ração de relatórios, apresentações de trabalhos em grupo de estudo, assim como, pesquisas de fundamentações teóricas. As produções textuais pro-porcionaram um maior aprendizado e a concretização desse aprendizado através da prática. Tudo isto proporciona ao aluno um estímulo, por exem-plo, à leitura, que é algo essencial para prosseguir na vida acadêmica.

O momento de encontros de equipe do projeto é um momento em que se pode amadurecer profissionalmente, socialmente e psicologicamente. Pois, a partir da convivência com novas pessoas há a possibilidade de ver que cada um possui limitações específicas e que elas podem ser superadas através do esforço. Sabemos o quão proveitoso é o valor da vitória, de superar limites e desafios e sabemos mais ainda que para alcançá-las é preciso batalhar, por isso, é preciso que prossigamos sempre em busca de nossos alvos.

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Referências

ANTUNES, Irandé. Muito além da gramática: Por um ensino sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.BAKHTIN, Michael. Estética da criação verbal. São Paulo : Martins Fontes, 2011.BAKHTIN, Michael. Problemas da poética de Dostoévski. Rio de Janeiro: Forense Uni-versitária, 2013. BOCK, Ana. Merces. Psicologias: uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Saraiva, 2003.BRAIT, Beth; MELO, Rosineide. Enunciado/enunciado concreto/enunciação. In: BRAIT, Beth. Bakhtin: conceitos-chaves. 5 .ed. São Paulo : Contexto, 2013.BUBNOVA, Tatiana. Voz, sentido e diálogo em Bakhtin. Bakhtiniana, Revista de Estudos do Discurso, v. 6, n. 1, pp. 268-280. 2011. Retirado de: http://www.scielo.br/pdf/ bak/v6n1/v6n1a16.pdf. Acesso em: 25 de ago. 2014.FERREIRA, A. B. H. Miniaurélio século XXI escolar: o minidicionário da língua portu-guesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989. FERNANDES, E. linguagem e surdez. Porto Alegre: Artmed, 2003.FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

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GESSER, Audrei. Libras? Que língua é essa?: crenças e preconceitos em torno da língua de Sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.KOCH, Ingedore Villaça; Elias, Vanda Maria. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3ª. Ed., 5ª impressão. São Paulo: Editora Contexto, 2011.MARCHEZAN, Renata Coelho. Diálogo. In: BRAIT, Beth. Bakhtin: outros conceitos-cha-ves. 2.ed. São Paulo : Contexto, 2012.MARTELOTTA, Mario. Eduardo. (Org.). Manual de linguística. 2. ed. São Paulo: Contex-to, 2013. QUADROS, Ronice. Muller. Educação de surdos: a aquisição da linguagem. Porto Ale-gre: Artes Médicas, 1997.QUADROS, Ronice Muller.; KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguís-ticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização de: Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas (SP): Mercado das Letras, 2004.TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de gramá-tica. 14ª. Ed. São Paulo: Editora Cortez, 2009.

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CULTURA SURDA NO LIVRO DIDÁTICO DE LIBRAS

Janilson Nóbrega de Moura6 Edneia de Oliveira Alves7

Introdução

O presente capítulo visa apresentar uma explanação sobre a cultura sur-da, ressaltando a cultura em geral e as minorias culturais, como forma de desmistificar pensamentos e esclarecer a respeito da comunidade surda, in-cluindo seus valores, costumes e tradições que ainda não são compreendi-dos ou conhecidos por muitos.

O aspecto cultural relatado neste capítulo, trata-se de uma das atividades realizadas no desenvolvimento do projeto “Produção de recurso didático para

6 Professor de Libras da rede municipal de ensino da cidade de João Pessoa-PB e Assistente Social na Cidade de Guarabira-PB. E-mail: [email protected] Professora Doutoranda de Libras do DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected]

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o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2”, co-ordenado pela Professora Edneia Alves, sendo integrado ao “Programa Libras (Língua Brasileira de Sinais): ensino, pesquisa e tradução em questão”, ganho em concorrência nacional, o que gerou o financiamento dos custos dos tra-balhos. Esse programa mostrou-se como uma porta aberta para incentivar as pesquisas e produções no meio acadêmico que favorecem e colaboram com a comunidade surda em geral, ao mesmo tempo em que tem atraído estudan-tes e colaboradores que se identificam e se dedicam à causa.

Assim, o conteúdo deste trabalho fará algumas reflexões teóricas a res-peito de cultura e em particular da cultura surda na tentativa de disseminar uma cultura legítima, porém, diferente e contribuir na formação de identi-dade da mesma, baseando-se em autores como Johnson, Ströbel, Sá e Ber-nadino, que abordam o tema proposto.

Para contemplar o assunto abordado, será feita uma análise de um vídeo sobre cultura surda, que é uma das partes que integra o livro didático de Li-bras, no qual houve o cuidado com os direitos autorais de uso de imagens para esta produção.

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A cultura surda

A cultura é algo que caracteriza um conjunto de hábitos de um sistema social ou um grupo, possui uma dinâmica que leva em consideração seus atos relevantes historicamente construídos, podendo ser materiais ou não--materiais, conforme é colocado por Johnson (1997). Podemos percebê-la quando dirigimos nosso olhar ao contexto de vida externo a nós e sempre estamos ou temos que estar atrelados a algum costume que transcende ao nosso controle individual.

Por muito tempo, as pessoas surdas, à medida que sofriam as fortes in-fluências hegemônicas de uma sociedade ouvinte/oralista, tiveram um gran-de problema na construção da identidade cultural de seu grupo. Sá (2006) afirma que a cultura surda ainda se faz desconhecida ou incompreendida pela sociedade, não sendo vista ou compreendida como uma cultura legíti-ma, carregada de valores e significados, classificando-a nesse sentido como uma cultura apenas patológica e inferior à cultura dominante, nesse caso, a cultura dos ouvintes. Essa incompreensão ou desconhecimento tem gerado, de acordo Ströbel (2007), receio em muitas pessoas em estabelecer uma re-lação com os surdos devido ao fato do não entendimento do sujeito surdo, de sua língua, dos seus costumes, valores e suas relações sociais. Assim, per-cebe-se que o impedimento da construção da cultura surda é um dos fato-

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res que justifica a exclusão social porque passa. A influência da cultura ouvintista acabou levando a uma hierarquização

cultural que de certa forma acabava classificando os surdos como possui-dores e não possuidores de aspectos culturais característicos de seu grupo. A hegemonia da cultura ouvintista induziu a prática de que considerava-se cultural apenas a cultura desse grupo, e desconsiderava a dos outros. Este aspecto é uma representação da visão etnocêntrica, como ressalta John-son (1997), o etnocentrismo impede que as diferenças culturais sejam vistas e entendidas, centralizando as qualidades sociais existentes apenas a um determinado grupo, resultando, portanto, em “julgamentos negativos que membros de uma cultura tendem a fazer sobre todas as demais” (JOHNSON, 1997, p. 101).

Ao falar sobre a cultura surda, ainda a situamos em contraposição à cul-tura ouvinte porque o respeito e o reconhecimento da cultura surda ainda é pauta de luta de sua comunidade. Lopes (2007) afirma que a diferença surda está no fato de conviverem em uma comunidade e compartilhar uma língua visuo-gestual, forma de viver e organizar o tempo e o espaço e esses fatores situa o surdo historicamente. A cultura hegemônica do ouvinte ainda se sobrepõe à cultura surda assim como acontece com as demais culturas minoritárias existentes no Brasil e essa hegemonia pode ser explicada pela afirmação de Souza (2013) quando diz que há no Brasil uma única etnia, lín-

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gua, identidade e cultura imposta pela política de Estado. Não há como falar sobre uma determinada cultura sem que haja conhe-

cimento sobre os indivíduos que a cultiva e sobre seus elementos constituin-tes. Enquadrada entre as minorias culturais, a cultura surda pode abranger um conjunto de subjetividades construídas sobre diferentes aspectos que classificam e definem a comunidade surda.

Há várias diferenças que podem ser apresentadas e elencadas entre a cultura dos surdos e a dos ouvintes. Kelman (2005) afirma que a surdez é tra-tada como particularidade cultural dentro de um contexto cultural. Fatores como língua e identidade, podem ser considerados umas destas diferenças culturais existentes que distinguem uma cultura da outra, afinal a língua car-rega em si um histórico de significados da sociedade e suas relações e revela a identidade que representa a auto-identificação do sujeito. Portanto, não existe uma língua, uma identidade ou uma cultura uniforme, pois a língua de acordo com Leite (2010) é algo constitutivo e utilizado por uma comuni-dade/grupo linguística(o) que compartilha de uma mesma cultura carregada de sentidos, logo a língua se torna um elemento de identidade para o sujeito que dela se apropria para a sua comunicação como afirma Bernadino (2008).

Para entender sobre a existência e legitimidade da cultura surda é pre-ciso acima de tudo compreender que os surdos possuem uma comunidade que, segundo Lopes (2007), é a base para se pensar na cultura surda e sua

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história, pois, nela são produzidas as narrativas surdas sobre pertença, par-tilha, sociedade, identidade, segurança entre outros. É na comunidade surda que o surdo prefere estar e é nela que ele divulga e recebe informações e instruções, se sente acolhido e amado e ainda se organiza para lutar pelos seus direitos. É preciso também refletir sobre as suas peculiaridades apre-sentadas por Ströbel (2009) através dos artefatos culturais. Ströbel evidencia que eles estão relacionados a todas as produções materiais e visuais dentro de uma cultura, a maneira de se comunicar, os modos dos sujeitos em suas relações sociais, os valores, as tradições, entre outros. Assim, nessa menção, a autora destaca oito artefatos culturais existentes na cultura surda: experi-ência visual, linguístico, familiar, literatura surda, vida social e esportiva, artes visuais, política e materiais.

Segundo Ströbel, a experiência visual está relacionada ao modo de per-cepção de mundo pelo surdo, que diferente de um ouvinte, utiliza a visão como principal fonte de captação de tudo que circunda em sua volta. No artefato cultural linguístico destaca-se como fator essencial a língua de si-nais, pois, é através dela que o surdo pode se comunicar e interagir em suas relações sociais, ter acesso e trocar informações, expressar sua subjetividade e consecutivamente construir sua identidade.

A língua de sinais é o artefato cultural mais perceptível na comunidade surda. Owen Wrigley (1996, apud SÁ, 2006) afirma que o uso da própria

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língua é uma característica que define a auto-identidade de alguém que pertence a uma minoria linguística. Com isso, entende-se que a língua de sinais se torna um elemento que define ou representa o sujeito surdo e sua auto-identidade.

Historicamente, os surdos sofreram grandes opressões pela cultura ora-lista, que os impedia de utilizar a língua de sinais como forma de comunica-ção, conduzindo os surdos ao fracasso escolar e inferioridade social. Porém, isto não foi suficiente para impedir que a língua de sinais progredisse, sendo ela reconhecida legalmente no Brasil como meio de comunicação e expres-são da comunidade surda brasileira, através da Lei 10.436/02, regulamenta-da pelo Decreto 5.626/05. De acordo com Oliveira e Oliveira (2012), a língua de sinais é necessária à comunidade surda para que sua cultura transcenda de geração em geração, molda a cosmovisão de mundo e o entendimento da realidade e possibilita a criação, o acesso e o entendimento da própria cultura. A partir dessas observações, percebe-se a centralidade da língua de sinais na vida do surdo e na sua forma de se relacionar com o mundo, de tal forma que há regras em sua cultura que não é possível existir na cultura oral como é o caso da criação de sinal para cada indivíduo como forma de nomeá-los, como será visto na análise apresentada mais abaixo. Bernadino (2008) afirma que o batismo por sinal é usado pelos surdos para referir-se a alguém ou algo e isso faz parte dos aspectos importantes da cultura surda,

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inserido dentro de seus costumes.Seguindo a apresentação dos artefatos culturais expostos por Ströbel,

a questão da relação familiar entre surdos e ouvintes ou surdos x surdos, a diferença de relação entre familiares surdos e ouvintes é bem marcada se comparada à relação estabelecida entre familiares ouvintes. Quando a lín-gua de sinais não está presente nessa relação, o surdo enfrenta limitação que, de acordo com o pensamento de Ströbel (2009) ocorre que nas famílias com membros ouvintes, não há informações e disseminação da cultura sur-da às crianças surdas, que são expostas a cultura ouvinte/oralista, distante da comunicação na língua de sinais e dos diálogos familiares.

Para que compreenda-se a amplitude dos elementos culturais surdos, é importante apontar que um sujeito produz uma literatura que revela uma cultura: a denominada literatura surda. Conforme Strobel (2009), a literatura surda pauta-se nas produções literárias produzidas pelos próprios surdos. Tais produções englobam: histórias, contos, piadas e poesias que fortalecem a cultura dos surdos. O reconhecimento desse artefato motivou vários regis-tros visuais gravados em CD-ROM e DVD que servem de recursos educacio-nais de surdos.

A vida social e esportiva do surdo é outro fator cultural que tem um modo surdo de por em prática e revela a forma surda de encarar as relações sociais. As festas promovidas por surdos são bem diferentes das festas dos

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ouvintes, de acordo com a afirmação Bernadino (2008) eles preferem am-bientes mais iluminados à meia luz, pois, assim podem se comunicar melhor. Além de preferirem em festas dançantes locais fechados acusticamente para que possam colocar sons muitos altos, pois, sua forma de curtir o som e por intermédio da vibração sonora percebida pela pele.

No que tange às artes visuais, Ströbel destaca como fruto as criações ar-tísticas produzidas por surdos onde nelas demonstram suas emoções, sen-timentos, histórias de vida, pensamentos e sua cultura. Entendendo que as artes visuais não se limitam apenas à pintura e à escultura, o cinema, con-siderado como a sétima arte, e o teatro também é um meio de atuação de atores surdos, como Marllen Matlin, Emanuelle Laborit, Nelson Pimenta, en-tre outros.

A política, ainda de acordo com a Ströbel (2009), representa os movimen-tos e a luta do povo surdo pela garantia de seus direitos de cidadania. Pode--se citar como produto desse artefato o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais que se deu através das lutas dos movimentos sociais organizados pelos surdos.

O último elemento cultural, ou seja, os materiais são marcados pelas tecnologias e recursos materiais que facilitam e auxiliam na acessibilidade e vida do surdo (STROBEL, 2009). Exemplo disso são as campainhas luminosas, os telefones para surdos (TDD), legendas na televisão, entre outros.

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Além dos artefatos culturais elencados e pertencentes à cultura surda, Bernadino (2008) chama a atenção ao apresentar aspectos dessa cultura que diferencia da cultura dos ouvintes, pois conforme a afirmação de Lane, Hof-fmeister e Bahan (1996 apud Bernadino 2008) os surdos são diretos naquilo que almejam dizer, ou seja, falam exatamente de acordo com o seu pensa-mento sem rodeios, no intuito de facilitar a comunicação.

As autoras ressaltam que os surdos podem fazer comentários negativos a alguém que ele conhece há algum tempo ou sobre algo sem pensar no cons-trangimento que isso pode causar. Ou ainda, para sair-se de uma determinada situação ou incômodo diante de outra pessoa, o surdo simplesmente diz o que precisa fazer, seja dormir ou trabalhar cedo, induzindo ao receptor a uma inferência do que exatamente o surdo quis dizer. Deste modo entende-se que na cultura surda a fala direta difere de ser rude ou falta de educação e, portan-to, isso é um aspecto cultural existente na comunidade surda.

Bernadino (2008) também aponta que na cultura surda existem regras dis-tintas que devem ser seguidas. A autora diz que para chamar a atenção de um surdo que esteja distante, o ideal é atrair a atenção de outra pessoa que esteja próximo a ele para que esta lhe dê um toque. Fazer com que as luzes pisquem em uma sala que contêm surdos também é muito útil para chamar atenção deles. É considerado falta de educação atravessar ou passar na frente de uma conversação entre surdos ou entre alguma tradução para eles.

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Além de tudo que fora exposto, é importante mencionar que apesar de alguns autores, como a própria Bernadino (2008), afirmarem que os surdos não possuem uma língua escrita, esse pensamento já pode ser desconsiderado, pois, de fato a escrita da língua de sinais já é possível, visto que, de acordo com Klimsa, Sampaio e Klimsa (2011) em 1974, na Dinamarca, Vallerie Sutton criou o sistema de escrita de língua de sinais denominado originalmente como SignWriting, capaz de registrar qual-quer língua de sinais no mundo inteiro, sendo que no Brasil a escrita de sinais começou a ser usada a partir de 1996 e tem sido divulgada pela Profª Marianne Stumpf.

A cultura surda é algo que vem sendo evidenciado por meio de estudos e publicações, mas apesar das conquistas do povo surdo, materializada atra-vés Lei 10.436/02 e o Decreto 5.626/05, ela precisa ser levada em considera-ção de fato no seio educacional, disseminada entre as questões de debates políticos e pedagógicos.

Assim, pode-se ver que a cultura surda carrega em si, grandes elementos e aspectos que definem, explicam e denotam o comportamento, pensamento e valores do povo surdo, representando deste modo uma cultura legítima e diferente, portanto não inferior ou inexistente como muitos pensam.

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Sinal-nome como traço cultural do surdo

Para refletir sobre características culturais e em particular a cultura surda, no intuito de observar aspectos e artefatos relacionados a ela, fora feito uma análise do vídeo “Sinais como nomes próprios”, que faz parte da primeira unidade do livro didático que está sendo construído pelo projeto: “Produção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o en-sino de Libras como L2”.

Como forma de informar sobre os aspectos culturais da comunidade sur-da através do ensino de Libras, foi decidido por ter vídeos no final de cada unidade, perfazendo um total de 16, sobre várias temáticas. Para o registro dessas temáticas, foram realizas entrevistas com surdos na comunidade sur-da, e esses assinaram termo de uso de imagem. Nas entrevistas, as pergun-tas foram sobre a temática da unidade: módulo Libras I – esporte, relação do surdo com a família, dia do surdo e associação dos surdos; módulo Libras II – pontos de contatos surdos, vida cotidiana do surdo, convívio do surdo com a igreja e valor cultural surdo ao corpo; módulo Libras III – direito à gratui-dade no transporte público, a experiência do surdo com viagens, educação de surdos e uso da tecnologia pelo surdo para se comunicar; módulo Libras IV – experiência no mercado de trabalho, profissões exercidas por surdos, dia da Libras e maneiras de comprar.

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Como as unidades foram montadas a partir de um contexto cognitivo, as temáticas dos elementos culturais surdos foram pensadas a partir da temática de cada unidade. É importante ressaltar que a preocupação com o contexto se deve à compreensão abordada por Silveira (2005) de que o contexto é

entendido como um conjunto de suposições (informações) que vêm à mente do indivíduo no processamento inferencial da informação. Tais suposições podem advir do ambiente físico, observável, através do código linguístico ou de estímulos perceptuais, da memória enciclopédica, que armazena as nossas crenças e conhecimentos, e de raciocínios dedutivos.

A proposta é apresentar para o aluno a possibilidade de construir co-nhecimento sobre a cultura surda a partir da temática discutida ao longo de cada unidade, pois, ao fim de cada unidade já se considera que ao longo da unidade o aluno tenha formado um novo repertório linguístico e que ele po-derá resgatá-lo ao assistir aos vídeos sobre cultura. Além disso, o aluno será exposto a uma informação cultural expressa em vídeo o que o fará recorrer às habilidades de percepção de imagem, uso da significação e da memória enciclopédica e reavaliação dos valores culturais próprios e dos surdos.

No entanto, dentre os vídeos que acompanham os livros, apenas, os ví-deos sobre culturas possuem legendas. Esta mudança de formato se deve

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ao objetivo da abordagem sobre cultura, pois, pretende-se levar ao aluno informações culturais que podem ser ou não melhor exploradas pelo pro-fessor através da apresentação de determinadas temáticas sobre cultura. Para além, da aprendizagem do vocabulário e da gramática de uma língua é necessário compreender a cultura de seu falante. Este é um aspecto muito importante porque muitos elementos linguísticos são explicados por inter-médio do valor e da prática cultural de seu falante. Um curso de língua além de habilitar para a fala e escrita precisa, sobretudo, contribuir para a valori-zação da cultura de seus falantes. Em se tratando de uma comunidade que é formada por conterrâneos e que sofre com a exclusão, o compromisso com a valorização de sua cultura se torna um imperativo ético e social da educação que nesse caso é promovido pelo curso de Libras. Para os surdos usuários de língua de sinais, a comunidade, cultura e a língua de sinais são seus maiores bens culturais, a manutenção deles é preponderante para sua vivência no mundo dos ouvintes. Regidos pelas normas dos ouvintes, os surdos tem lu-tado por respeito a sua diferença, portanto, para que haja a inclusão desses sujeitos no mundo é necessário respeitá-los como tal. Compreender a cul-tura surda significa compreender seus integrantes, suas características e sua forma de olhar, avaliar e inserir-se no mundo. Para Perlin e Miranda (2003), o surdo possui uma experiência visual que origina sua cultura envolvendo a língua de sinais, sua maneira de ser, de se expressar, de conhecer o mundo e

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de participar das artes, dos conhecimentos científicos e acadêmicos. Assim, é importante além de estudar a língua compreender as características des-ses nossos conterrâneos que por muito tempo foram relegados à margem da sociedade.

A temática escolhida para demonstrar nesse capítulo como traço cul-tural da comunidade surda foi a forma surda de nomear as pessoas. Ele foi elencado por demonstrar um traço cultural que só é possível nas línguas de sinais. Primeiro, porque esse nome é criado em sinais, segundo porque esse nome é utilizado em contextos formais e informais. Esse é um aspecto que se diferencia da cultura oral, sobretudo, porque não tem a mesma função de um apelido, assim, não pode ser comparado com ele, por isso, denomina-mos esse sinal de sinal-nome.

A apresentação da análise deste vídeo é uma forma de perceber que há diferenças culturais entres surdos e ouvintes para a mesma funcionalidade, pois, esta forma de denominação faz com que sejam criados nomes próprios em Libras para pessoas e lugares.

No vídeo analisado, o entrevistador pergunta ao entrevistado o motivo de referir-se aos nomes das pessoas pelos sinais e como eles são criados. O entrevistado por sua vez afirma que cada pessoa da comunidade surda ou um lugar específico possui um sinal que a/o representa, que é criado de acordo com uma característica física que pode ser juntada (não necessa-

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riamente) à primeira letra do nome da pessoa ou local referenciado. Nesta linha, ele exemplifica que o seu sinal originou-se através da junção de uma característica física dele, nesse caso “Alto” mais a primeira letra de seu nome “Fábio”, e sendo assim, transcrevendo o sinal na língua portuguesa, resultou em: “Alto F”.

É importante ressaltar que os surdos precisam do contato visual para a criação de um sinal. A criação de sinais é, em geral, atrelada às caracterís-ticas físicas marcadamente perceptíveis. Assim, o sinal de uma pessoa está sempre atrelado a uma característica do seu corpo que se sobressai ou a um cacoete da pessoa. Se uma pessoa tem o cacoete de mexer de determinada forma no cabelo, essa forma será a primeira proposta de criação do seu si-nal, primeira porque a pessoa é consultada quanto à aceitação deste sinal. Caso, ela não goste se procura em sua aparência ou outro jeito de portar-se um outro aspecto que possa ser representado em sinal para denominá-la.

Quanto aos lugares: bairros, cidades, Estados, países ou até mesmo em-presas, geralmente, há sinal-nome próprios para designá-los. Esses lugares são onde os surdos moram, frequentam, visitam ou visualizam cotidiana-mente. Assim, pontos turísticos que os surdos visitam possuem sinais carac-terísticos do ponto turístico, se é um farol o sinal será relacionado ao sinal de farol, em casos de empresas com logotipo aparente em sua fachada será a imagem inspiradora da criação do sinal-nome e assim sucessivamente. O

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importante a ressaltar é que a criação do sinal é motivada pela maneira do surdo vivenciar o mundo: através da percepção visual.

Essa necessidade de criar sinal-nome para pessoas e lugares é uma de-monstração clara de que a cultura surda se diferencia da cultura ouvinte. É norma, em estudos de línguas estrangeiras, manter os nomes próprios por respeito à cultura dos grupos falante da língua. Porém, essa regra não se aplica à língua de sinais porque é uma língua que tem um modo de produ-ção gestual e não oral, assim, cria-se maneiras de expressar o mundo que muitas vezes é diferente da maneira ouvintista. McIlroy e Storbeck (2011) afirma que a identidade surda é assumida como diferença, assim, ao anali-sar o vídeo sobre sinal-nome constata-se que realmente a marca do surdo se baseia na diferença e não na deficiência. O surdo ao criar sua maneira própria de produzir sinal-nome demonstra que há uma outra forma de de-nominar pessoas e lugares e que cumpre as mesmas funções que qualquer denominação em qualquer língua. McDonald (2010) e Sutton-Spence (2010) defendem a experiência visual como princípio da identidade surda em con-traposição ao princípio da perda auditiva. Essa questão da identidade explica a necessidade do surdo denominar-se em língua de sinais, porque é a língua de sinais que o representa e é essa mesma língua que pode autodenominar--se. O sinal-nome é uma representação fiel da afinidade que o surdo possui com a língua de sinais e o que ela representa para si e para sua comunidade.

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É realmente um elemento que está intrínseco ao seu modo de ser e de co-locar-se no mundo.

Desta forma, através do vídeo, vemos o artefato cultural linguístico em destaque, onde a comunicação em língua de sinais torna-se o diferencial da cultura surda, além do aspecto identificado pelo uso do sinal-nome. Assim, pode-se observar que isso é uma característica peculiar da cultura surda, no intuito de identificar as pessoas e os lugares e com isso facilitar a comunicação na língua de sinais.

Conclusão

Ensinar ou aprender Libras significa aprender sua gramática e forma de comunicação, sobretudo, aprender sobre um povo. É importante que a edu-cação, especialmente no que tange ao ensino de Libras, seja para surdos, seja para ouvintes, considere o trabalho com os elementos culturais da co-munidade surda. É importante que as pessoas ao lidarem com os surdos não estejam lidando com pessoas que possuem as mesmas necessidades e valores culturais dos ouvintes, pois, ser surdo não é uma outra forma de ser ouvinte. É preciso olhá-los e respeitá-los a partir de seus traços culturais. É nesse ponto que o curso de Libras e o material produzido no projeto “Pro-

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dução de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2” deve contribuir. Não se pode pretender valorizar a Libras sem valorizar a cultura de seus falantes, nem tão pouco ter a capacidade de comunicar-se com esses sujeitos, mas, lançar-lhes um olhar carregado de estereótipos e pré-conceitos.

Compreender a cultura surda é atentar às singularidades do povo surdo, respeitando sua forma de ver o mundo e de se expressar, entendendo suas necessidades como fatores fundamentais e reconhecendo-os como cida-dãos de direitos, com uma diferença cultural que os permite ter uma iden-tidade própria.

Sendo assim, não há como garantir uma inclusão sem observar os valores culturais dos surdos, a fim de lhe garantir o direito de uma edu-cação de qualidade, respeitando sua identidade e língua. Para isto, é pre-ciso observar e garantir o ensino da Libras nas instituições escolares, assegurar uma educação bilíngue, com profissionais qualificados, aten-tando aos diferentes níveis educacionais e aos sujeitos surdos que deles fazem partem.

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Referências

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SOUZA, Regina Maria. Educação de Surdos e questões de norma. In: LODI, Ana Claudia B.; HARRISON, Kathryn Marie P.; CAMPOS, Sandra Regina L.; TESKE, Ottmar. Letramento e minorias. Porto Alegre: Mediação, 2013STRÖBEL, Karin Lilian. História dos surdos: representações “mascaradas” das iden-tidades surdas. In: QUADROS, R. M.; PERLIN, G. Estudos Surdos II. Petrópolis, RJ: Arara Azul, 2007.STRÖBEL, Karin Lilian. As imagens do outro sobre a cultura surda. Editora UFSC, 2009.SUTTON-SPENCE, R. O papel das narrativas em língua de sinais no desenvolvimento da identidade para crianças surdas. Journal of Folklore Research, v.47, n. 3, p. 265-305, 2010.

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UMA EXPERIÊNCIA COM A ESCRITA DE SINAIS

Edneia de Oliveira Alves8

Ezequiel Adney Lima da Paixão9

Janilson Nóbrega de Moura10

Marianne Rossi Stumpf 11

Willames Pontes de Souza12

Introdução

O desejo de disseminar e contribuir com o fortalecimento da Escrita de Língua Brasileira de Sinais (Libras) tem despertado e atraído pesquisadores

8 Professora Doutoranda de Libras do DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected] Professor Especialista da UFRN10 Professor de Libras da rede municipal de ensino da cidade de João Pessoa-PB e Assistente Social na Cidade de Guarabira-PB. E-mail: [email protected] Professora Pós-Doutora da UFRSC E-mail: [email protected] 12 Graduando em Ciências Sociais pela UFPB. E-mail: [email protected]

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e professores que visam divulgar e esclarecer sobre essa modalidade da lín-gua, que é capaz de expressar todo e qualquer pensamento, ideia e produ-ção do surdo de forma escrita.

Deste modo, esse capítulo apresentará um relato de experiência gerado a partir de um minicurso de escrita de sinais, denominado de: “Alfabetização em escrita de sinais”, ministrado na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). A ação promovida esteve atrelada ao “Programa Libras (Língua Brasileira de Sinais): ensino, pesquisa e tradução em questão”, sob a coordenação da Pro-fessora Doutoranda Edneia Alves e a vice-coordenação da Professora Mestre Marie Gorett Dantas. Inclusive, a participação da Professora Doutora Marian-ne Stumpf foi possível devido ao financiamento do MEC em 2014. A inclusão desta professora se deve ao seu envolvimento com um dos projetos: “Produ-ção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2” que compõe o Programa, ao reconhecimento do seu pioneirismo ao trazer a escrita de sinais para o Brasil e da importância do seu conhecimento para a legitimação das atividades do projeto na produção de lições de escrita de sinais. Este projeto vem mobilizando, conscientizando e instigando seus participantes e a comunidade surda e ouvinte ao interesse pela escrita de sinais, proporcionando contribuições e aprimorando conhe-cimentos já existentes.

O evento contou com a participação da Profª Drª Marianne Stumpf, de-

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fensora, pesquisadora, disseminadora e referência da escrita de sinais no Brasil. Além da colaboração do Profº Ezequiel Adney Lima da Paixão, Espe-cialista em Libras e conhecedor da escrita de sinais na Paraíba e para execu-ção desta atividade contou com uma equipe de monitores para colaborar na organização de apostilas e do evento como um todo. Destinado aos alunos de Letras/Libras e professores de Libras, a ação teve em seu público, pessoas ouvintes e surdos, entres eles, professores e estudantes da cidade de João Pessoa e do interior da Paraíba e integrantes do referido projeto.

A oferta do minicurso teve como objetivo complementar as ações dos projetos de extensão da área de Libras, implementados em 2014, subme-tido e aprovado no edital do Probex e do Proext 2014 através do MEC. Outro objetivo foi disseminar o conhecimento no interior da Paraíba atra-vés dos alunos e ex-alunos do Letras-Libras da UFPB. Este trabalho foi um tipo de conhecimento de apoio às ações das extensões, que contribuem para o ensino à medida que capacita os professores de Libras e alunos do curso de Letras/Libras, subsidiando futuras pesquisas na área de Libras. Essa ação pretendeu naturalizar e fortalecer o ensino de Escrita de Sinais Brasileira, ao mesmo tempo difundi-la na sociedade como um todo, pois, respeitando sua língua em todas as modalidades respeita-se também sua cultura, autonomia e história.

Dessa forma, o objetivo geral da ação foi capacitar os alunos do curso de

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Letras Libras e os professores de Libras na leitura e escrita de sinais. Associa-do a isso, foram pensados em alguns objetivos específicos como: valoriza-ção da escrita de sinais no meio acadêmico; habilitação para compreender e ensinar as lições e atividades de escrita de sinais expostas nas lições dos livros do curso de Libras e habilitação para compreender e praticar a Escrita de Sinais no curso de Letras/Libras. Assim, nessa produção, procura-se apre-sentar uma breve reflexão e visão sobre a importância do ensino da escrita de sinais como forma de registro escrito e representação gráfica da Libras.

Uma breve introdução à escrita de sinais

A discussão acerca do desenvolvimento da escrita/leitura é algo que compõe o processo histórico social e, percorrendo essa trajetória é possível identificar que desde muito tempo as ações humanas já eram representadas através dos signos escritos em diversos lugares, que com a revolução da es-crita associaram sons a esses signos. No entanto, podemos perceber que a escrita de signos não é algo recente, desta forma, é com grande interesse de inserção social que a Comunidade Surda Brasileira vem ao longo dos tem-pos lutando na construção de suportes de um modelo educacional próprio, que utilize a língua sinalizada (Libras) e sua escrita (SignWriting), havendo assim, um processo de alfabetização natural das pessoas surdas, na qual elas

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possam interagir “normalmente” em um âmbito social. No Brasil, adota-se o SignWriting – considerado por Lodi, Harrison e

Campos (2013) como um sistema de transcrição gráfico das línguas de sinais – como modalidade escrita da Libras. Porém, ainda há muito a ser desenvol-vido nesse campo e a academia tem muito a contribuir nesse aspecto. No entanto, faz-se necessário reconhecer a importância e a necessidade de im-plementação da escrita de sinais no sistema escolar e o empenho da acade-mia nas pesquisas sobre o assunto, pois, a valorização social de uma língua em uma cultura do letramento perpassa pelo seu registro gráfico. Conforme Marcuschi (2001, p. 16),

a escrita enquanto manifestação formal dos diversos tipos do letramento, é mais do que uma tecnologia. Ela se tornou um bem social indispensável para enfrentar o dia-a-dia, seja nos centros urbanos ou na zona rural. Nesse sentido, pode ser vista como essencial à própria sobrevivência no mundo moderno.

A partir do entendimento do valor atribuído pela sociedade brasileira à escrita, cobra-se o desenvolvimento da escrita e a aquisição dessa modali-dade escrita de uma língua por seus falantes para o reconhecimento da va-loração do status de uma língua. O não respeito à escrita de sinais repercute

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no reconhecimento do status linguístico da Libras, que tem ocupado status de segunda ordem na sociedade brasileira. Outro argumento relevante para o uso e difusão da Escrita de Sinais se deve a fato de ser a escrita, conforme Marcuschi (2001), é uma modalidade complementar à fala, no caso da Libras: complementar à sinalização.

Até precário tempo atrás, as línguas de sinais foram consideradas ágra-fas, quer dizer, não existiam uma escrita para a língua de sinais. Esse fato impediu a formação de uma memória cultural do povo surdo. De acordo com Campos e Stumpf (2012), são poucos os fatos históricos e culturais do surdo relatados e os que existiam foram sempre registrados em uma língua diferente daquela da própria comunidade surda, na maioria das vezes, por pessoas que não faziam parte da cultura surda. Diante da necessidade de um código representativo das línguas de sinais, originou-se um sistema que evoluiu da própria língua de sinais, essa criação tem significado uma mu-dança cultural importante para o povo surdo e elevado seu status. Tendo em vista a concepção de Freire (1987) de que a cultura letrada surge da cultura de um povo e que a palavra escrita torna a realidade distante e ao mesmo tempo distante de si, a criação da escrita de sinais é um importante acon-tecimento cultural para o povo surdo, pois, com ela não só sua cultura será registrada, mas, permitirá aos seus usuários representar e modificar a si e a sua comunidade.

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É forte o impacto que a escrita de uma língua exerce na cultura de uma determinada comunidade e no desenvolvimento social de seus in-divíduos. A incorporação da escrita poderá trazer muitas vantagens aos usuários dessas línguas. Além das questões apontadas, ela ainda tem um forte potencial a impactar na qualidade educacional do surdo, sobretudo na legitimação de uma educação bilíngue que respeite e valorize a língua do surdo, é nesse ponto que ela gera polêmicas de perspectiva para Edu-cação Bilíngue. Como afirma Antunes (2009, p. 21), tratar sobre a língua envolve “questões políticas, históricas, sociais e culturais” sendo assim, o trabalho com a língua precisa considerar esses aspectos socio-culturais e com a Libras não é diferente. Falar sobre Libras significa abordar questões de valores culturais e em uma sociedade letrada o registro escrito eleva o status dos seus falantes, assim, como exige desse sujeito o letramento em sua língua. O valor atribuído pela sociedade ouvinte sobre um falante de outra língua parte da perspectiva da valorização cultural sobre o registro escrito e não é diferente com a língua de sinais.

Alguns pesquisadores da Língua de sinais tentaram desenvolver uma for-ma gráfica para representar essa língua visual, de modo que ela pudesse ser compreendida a partir de sua própria escrita, porém, de acordo com Klim-sa, Sampaio e Klimsa (2011) essa realidade só tornou-se possível através da criação de um sistema de escrita de língua de sinais (SignWriting) desen-

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volvido por Valerie Sutton, na Dinamarca em 1974. Klimsa, Sampaio e Klim-sa ainda destacam que o uso da escrita de sinais através desse sistema no Brasil, iniciou-se em 1996, sendo Marianne Stumpf a pioneira em divulgar e representar esse trabalho. Essa forma de escrita permite registrar a língua e todos os seus elementos constituintes, desde as configurações de mãos até os movimentos.

A Lei brasileira nº 10.436/02, documento legislativo de grande valor para a comunidade surda, além de trazer um reconhecimento legal de comunica-ção e expressão da Língua Brasileira de Sinais, deixa aberto claramente o uso de recursos a ela associados, nesse caso, entendemos que a escrita de sinais seja um desses recursos, visto que trata-se de uma forma de registro é capaz de expressar a língua visual, fortalecendo sua classificação enquanto língua.

O Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue: Língua Bra-sileira de Sinais e Língua Portuguesa, que foi elaborado por profissionais surdos e ouvintes no ano de 2014, por solicitação da Secretaria de Educa-ção Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) do Minis-tério da Educação (profissionais designados pelas Portarias nº1.060/2013 e nº91/2013), pondera sobre a educação bilíngue de surdos, seus objeti-vos também reconhece e incentiva o uso de metodologias específicas que atendam as reais necessidades dos alunos surdos. Este documento inclui nas adaptações necessárias à educação de surdos, o processo de alfabe-

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tização em Libras e letramento visual que faz parte da educação bilíngue. Considera que na educação bilíngue pode-se desenvolver e utilizar meto-dologias específicas, criar ambientes linguísticos favoráveis e indica o do-cumento em questão:

A Educação Bilíngue de surdos envolve a criação de ambientes linguísticos para a aquisição da Libras como primeira língua (L1) por crianças surdas, no tempo de desenvolvimento linguístico esperado e similar ao das crianças ouvintes, e a aquisição do português como segunda língua (L2). A Educação Bilíngue é regular, em Libras, integra as línguas envolvidas em seu currículo e não faz parte do atendimento educacional especializado. O objetivo é ga-rantir a aquisição e a aprendizagem das línguas envolvidas como condição necessária à educação do surdo, construindo sua identidade linguística e cultural em Libras e concluir a educação básica em situação de igualdade com as crianças ouvintes e falantes do português (THOMA ET. AL., 2014, p.6).

A proposta de educação bilíngue para surdos preconiza, sobretudo, o trabalho pedagógico na perspectiva de ensino de Língua e no caso do surdo esse trabalho se inicia com o desenvolvimento de ensino/aprendizagem da língua de sinais. O desenvolvimento linguístico da criança surda deve ser iniciado na educação infantil por meio do ensino e uso da língua de sinais e deve ser continuado em outros níveis da educação básica. Portanto, consi-

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derar e respeitar a língua de sinais preconiza o respeito ao seu status linguís-tico e as suas modalidades. O sistema de escola regular tem considerado essa língua apenas como sistema de comunicação, que é importante, mas, não suficiente. O sistema ao integrar essa língua no convívio escolar deve também lançar um olhar pedagógico sobre ela e incorporá-la ao currícu-lo pedagógico, assim, considerando suas modalidades: sinalizada e escrita. Partindo dessa premissa, é importante que o sistema de escrita de línguas de sinais - SignWriting – seja considerado nesse currículo, inclusive, já há escolas que o utilizam em práticas pedagógicas com alunos surdos. Este tra-balho é perfeitamente possível porque é imbuído da visualidade. De acordo com o documento:

O letramento visual das crianças surdas em escrita da língua de sinais en-volve leitura de textos em Libras, sinalizados e escritos. A escrita da Libras é uma forma de registro que utiliza grafemas (visemas) que representam constituintes da própria língua. A leitura e escrita da língua de sinais po-dem motivar os estudantes surdos a lerem e escreverem também na Língua Portuguesa. A leitura e escrita em Libras deve estar inserida no currículo escolar, considerando a importância da escrita para o desenvolvimento da cultura da humanidade (THOMA ET. AL, 2014, p. 10).

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Portanto, vê-se que a escrita de sinais simboliza algo contributivo em meio às conquistas de uma luta que já vinha sendo batalhada a longo prazo por um grupo da sociedade – comunidade Surda. Essa contribuição pode propiciar aos indivíduos surdos a alfabetização na escrita de sua língua des-de os seus primeiros momentos de socialização com o conhecimento propí-cio as suas habilidades e competências, ou seja, uma primeira língua ou uma língua materna.

Desenvolvimento das atividades

A partir da ação do referido projeto e da iniciativa de sua coordenadora foi possível registrarmos no Estado da Paraíba, especificamente, na cidade de João Pessoa, a contribuição para o conhecimento, aprofundamento e di-vulgação da Escrita de Sinais com professores, alunos e alguns seguimentos da sociedade local, tais como: Escolas Estaduais e Municipais, Fundação de Apoio ao Deficiente (Funad); Associação de Surdos de João Pessoa (ASJP); Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Paraíba (IFPB) e insti-tuições sociais que vem atualmente trabalhando a inclusão em seu dia a dia.

A iniciativa do minicurso contou com o planejamento dos responsáveis, elaboração do projeto, agendamento com as datas marcadas com todos os

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participantes e divulgação do período de inscrição. O processo de inscrição foi realizado de forma eletrônica pelo endereço de e-mail disponibilizado pela equipe organizadora no período de 28 de julho a 01 de agosto de 2014. Tendo em vista o grande número de públicos interessados na discussão, foi preciso o estabelecimento da quantidade de participantes, levando em con-sideração um maior aproveitamento e rendimento deles, visto que a pro-posta do minicurso era capacitar em escrita de sinais os(as) professores(as) de Libras e alunos(as) do curso de Letras/Libras, devido a esta delimitação, participaram em torno de vinte e seis pessoas.

A ação ocorreu de maneira presencial nas dependências da Universidade Federal da Paraíba, nos dias 06 e 07 de Agosto do ano de 2014, resultando em dois dias muito proveitosos, com discussões teóricas e práticas a partir do material didático desenvolvido, exclusivamente, para o curso pelos mi-nistrantes. Como previsto e divulgado antecipadamente a todos os inscritos, as aulas foram ministradas em Libras sem interpretação para a língua portu-guesa, com exposição do conteúdo e a avaliação foi realizada continuamen-te com a aplicação de atividades.

Durante a ação, foram apresentados os seguintes conteúdos programá-ticos: Alfabetização e Letramento; Psicogênese da língua escrita baseado em Ferreiro e Teberosky; Evolução do sistema de notação para escrita em língua de sinais; A proposta de Educação Bilíngue; Produções escritas e as leituras

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e Pesquisas sobre escrita de sinais no Brasil.No que tange a temática, a Profª Marianne expôs sobre a importância

da Escrita de Sinais para alfabetização e letramento do surdo e, de maneira introdutória e simples, ensinou a escrita de sinais, sendo possível o aperfei-çoamento prático a partir de um conhecimento mais nacional das pesquisas e trabalhos desenvolvidos pela mesma.

Desde o primeiro dia, ao turno da manhã, foi ofertada uma sessão te-órica, tendo à frente a Profª Drª Stumpf, com exposição de conhecimentos, tais como: o desenvolvimento de habilidades, formas e construção didática de ser trabalhada a alfabetização da infância ao adulto (surdo) na escrita de sinais como uma língua primária (L1) e com ouvintes como L2.

Consideramos que este trabalho pode contribuir e tornar-se uma referên-cia na Educação Bilíngue de Surdos àqueles que trabalham as duas línguas escritas. A metodologia utilizada possibilitou o desenvolvimento da escrita de sinais em momentos distintos de interação, inspirados no método de ex-ploração crítica das situações experimentais, objetivando explorar os conhe-cimentos das crianças nas atividades de aquisição do sistema SignWriting. Considerando que se propõe uma educação bilíngue para surdo, não pode-mos deixar esquecer a língua portuguesa, mas, é importante trabalhar com as duas línguas paralelamente. Porém, as crianças surdas deveriam conhecer as duas estruturas distintas: dos sinais e de português ao mesmo tempo no

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processo de aprendizagem. Isto porque as crianças surdas podem perceber as duas línguas distintas (L1 e L2) e não é difícil seria como aprender duas línguas orais ao mesmo tempo. A alfabetização em escrita de sinais possi-bilita a compreensão das formas de produção de textos escritos. Embora haja resistência dos surdos em aprenderem a escrita de sinais, alguns alunos adultos perceberam que a aprendizagem do SignWriting pode aperfeiçoar sua sinalização de sinais e reconheceram que o sistema auxilia a reconhecer as estruturas da Libras. Os pontos positivos da oferta do minicurso foram muitos, porém, pode-se aponta como ponto negativo a falta de tempo e de recursos para ler os sinais escritos e para se adaptar a leitura natural como outra língua.

A segunda sessão, que ocorrera ao turno da tarde e fora ministrada pelo Profº Ezequiel Paixão e esteve relacionada à introdução sobre a escrita de sinais propriamente dita, desenvolvendo as atividades que contavam com a participação individual e em grupo dos participantes. Foram vistos o registro dos aspectos fonológicos e morfológicos da Libras.

Essa escrita permite ao surdo enxergar no papel a língua que expressa com as mãos e permite um percurso metodológico de alfabetização que representa a língua que utiliza no cotidiano, isso permite ao surdo compre-ender a representação do código escrito a partir da produção da própria lín-gua. Assim, Stumpf tem desenvolvido o trabalho com a alfabetização em es-

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crita de sinais a partir da apropriação do código escrito através do estímulo da percepção de correlação entre sinais sinalizados e escritos. A apropriação das crianças às representações do sistema SignWriting inicia com o reconhe-cimento dos símbolos básicos de configurações das mãos: punho fechado, punho aberto e mão plana. É possível trabalhar essas configurações atra-vés de exposição em cartazes e estabelecimento de correspondência dos símbolos escritos com as próprias mãos sinalizando. Também é importante explicar como são adicionadas linhas para os dedos nos mesmos símbolos básicos de configurações das mãos. Sobre o ponto de vista, ou como ler o sinal escrito ou símbolo.

Com isto, se ensina que é preciso ler ou escrever os sinais, como se o sinalizador estivesse olhando para suas próprias mãos, da sua própria pers-pectiva. Cada aprendizagem das crianças que possam construir os sinais es-critos e, inclusive, as crianças já conhecem os símbolos, orientações e po-sições e podem começar a ler e construir os sinais escritos. Identificam e procuram associar o critério de fácil memorização do símbolo com o critério de significado para que o primeiro sinal possa ser aprendido de maneira fá-cil e prazerosa para as crianças também para os alunos maiores. Essa é uma experiência que tem dado certo em todos os locais que tem sido aplicado, apontando para a eficácia e que é possível alfabetizar em escrita de sinais. É de extrema importância, a alfabetização dos surdos em escrita de sinais,

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isto significa o respeito à sua língua e cultura em plenitude e favorece um desenvolvimento rápido e adequado à sua realidade linguística. Conforme Vigotsky (2008) a aquisição da escrita contribui para o uso consciente das habilidades linguísticas. Sendo assim, a aquisição da escrita de sinais deve ser estimulada logo na infância.

Publicamos o artigo sobre Analises lingüísticas do SignWriting: sintaxe e morfologia pelo Abralin 2015 cujo objetivo foi analisar as produções em sala de aula com os alunos do curso de Letras Libras presencial da UFSC. O que acontece por meio de distanciamento e de teorização que permite passar do conjuntural, gerado pelo oral, ao estruturado, expresso pelo texto. Escrever e ler em língua de sinais são habilidades distintas entre língua falada e língua escrita. Como Vigotsky (2008, p. 123) afirma:

o desenvolvimento da escrita não repete a história do desenvolvimento da fala. A escrita é uma função linguística distinta, que difere da fala oral tanto na estrutura como no funcionamento. Até mesmo o seu mínimo desenvol-vimento exige um alto nível de abstração. [...] a criança precisa se desligar do aspecto sensorial da fala e substituir palavras por imagens de palavras. [...] a escrita exige uma ação analítica deliberada por parte da criança. [...] a fala interior é condensada e abreviada. A escrita é desenvolvida em toda a sua plenitude...

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A partir da importância social da escrita e do desenvolvimento do pensa-mento que ela promove, percebe-se que a aquisição da escrita é fundamen-tal para o ser humano e, em se tratando de surdo, é fundamental o acesso à escrita de sinais.

Como sequência dos trabalhos no minicurso, além da apresentação e exercício da escrita de sinais foram trabalhados seus aspectos fonológicos e morfológicos. O início do ensino pelos elementos quirêmicos – elementos mínimos da escrita de sinais – se torna importante para despertar no aluno a percepção da relação da escrita com o sinal produzido pelas mãos. Nesse momento, faz-se uma analogia entre desenho e escrita de sinais, no entan-to, depois do estabelecimento de relação, desenho e escrita de sinais vão se dirimindo e a norma da escrita vai sendo inserida na produção escrita do si-nal. Nessa introdução, os elementos quirêmicos são apresentados em cores diferentes para despertar a atenção dos alunos e a montagem do sinal vai acontecendo conforme vai se juntando as unidades mínimas. A reação dos alunos é sempre de boa recepção com esse tipo de estratégia. Para o surdo, o ensino da escrita de sinais se torna pertinente devido ao fato dela expres-sar os significados e seguir as normas da sua própria língua, também porque ela explora o aspecto visual.

Em seguida, foi trabalhada a escrita de texto de modo contextualizado, assim, pode ser iniciado o processo de alfabetização e letramento ao mesmo

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tempo. A Professora Stumpf, ao escrever um pequeno texto no qual continha informações de autoapresentação promoveu uma prática social da escrita. Os alunos, por sua vez, reproduziram o texto inserindo as informações pes-soais. Esta prática demonstrou a possibilidade de desenvolver a alfabetiza-ção a partir da perspectiva do letramento. De acordo com Marcuschi (2001, p. 21), o letramento envolve “aprendizagem social e histórica da leitura e escrita em contextos informais e para fins utilitários” e a alfabetização “é um aprendizado mediante ensino e compreende o domínio ativo e sistemático das habilidades de ler e escrever”.

Outro aspecto a se pontuar é a necessidade de produzir um ensino que faça sentido para o aluno e toda prática que envolve o aspecto afetivo torna o momento de aprendizagem prazeroso. No ensino de escrita de sinais, tam-bém pode ser utilizado, contos de fada e histórias traduzidas para a escrita de sinais, assim, como possibilita ao surdo a criação e/ou recriação de textos literários, o registro de uso dessa escrita para fins utilitários no seu cotidiano. Portanto, a prática de ensino do código escrito da Língua de Sinais no curso de escrita de sua cultura sinais envolveu essas três perspectivas, gerando um sentimento – conforme relatado por alguns participantes – de compensação e prazer.

Este resultado é compreensível porque, conforme Vygotsky (2007), o ser humano se relaciona histórico-culturalmente com o meio. De acordo com

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Lodi, Harrison e Campos (2013, p. 44), a aquisição de escrita pode ser pro-movida “quando ela for tratada e concebida como prática social de lingua-gem, cultural, social, histórica e ideologicamente determinada”.

Com relação à escrita de sinais, toda discussão acaba sendo muito recen-te na medida em que o reconhecimento legal da Língua de Sinais é recente. Sanando dúvidas e operando e construindo conhecimento, o minicurso pro-porcionou oportunidades de aprendizado, treinamento e reflexão acerca da escrita de sinais, conduzindo à construção e fortalecimento da identidade surda na Paraíba. No ensejo, foi apresentado a todos, um programa de nível nacional e internacional denominado de SIGN PUDDLE ONLINE, no qual po-de-se consultar e contribuir no registro escrito de sinais regionais e alimen-tar o glossário das línguas de sinais do mundo, inclusive, do Brasil, pois, esse programa pode ser acessado em qualquer lugar por meio a internet, sendo possível a consulta de sinais nacionais e internacionais como já foi dito.

Sabendo que a escrita é uma modalidade gráfica e representativa de uma língua, e que desde a antiguidade é utilizada como forma de registro de um povo e de sua cultura, vê-se a importância da escrita de sinais para a comunidade surda, pois, trata-se de uma forma capaz de registrar qualquer língua de sinais no mundo, tornando-se indispensável e essencial na consti-tuição da língua visuo-espacial.

Assim, a temática abordada no minicurso pôde-se perceber a importân-

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cia que tem a escrita de sinais e que, infelizmente, muitos professores de Libras e até alguns surdos têm resistido em aprendê-la e/ou ensiná-la, seja por dificuldade, ignorância ou até por falta de oportunidade de entender a formação e o significado desse registro gráfico. A participação de pes-soas tidas como referências no curso foi de grande importância, pois, eles apresentaram sua trajetória social de estudos e pesquisas, tornando-se um elemento estimulador para cada descoberta e contribuição. A metodologia abordada tornou-se algo muito motivador, fazendo com que todos os parti-cipantes interagissem no decorrer das atividades desenvolvidas, além disso, o material desenvolvido conduziu a um aprendizado pela simplicidade enri-quecida, inibindo qualquer aversão a favor das possíveis dificuldades.

Em meio a isso, essa ação promovida, surgiu como forma de disse-minar de maneira simples e esclarecedora essa modalidade, através de surdos defensores e estudiosos brasileiros, que abraçam e reconhecem que a escrita de sinais é o melhor meio para alfabetização e letramento do surdo, tendo em vista que é a língua de sinais utilizada para sua co-municação cotidiana.

O marco das contribuições desse projeto pôde ser observado diante de conversas com alguns participantes e com isso percebeu-se o quanto vem sendo proveitoso cada ação desenvolvida que contribui com o avanço nos conhecimentos profissionais e estudantis de cada participante ou integran-

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te, fazendo com que seja despertado neles o interesse pela escrita de sinais e sua aplicação na construção de materiais didáticos e cotidianos que pro-ponham o acesso da pessoa surda a uma educação de qualidade, inclusive no interior da Paraíba.

Conclusão

Aceitar e conhecer a escrita de sinais é valorizá-la em suas diferentes modalidades, é entender que a forma gráfica dessa língua visual torna-se uma oportunidade e realidade do povo surdo poder construir, manifestar e registrar as suas histórias e ações. É permitir uma alfabetização igualitária onde o surdo tenha acesso ao aprendizado e letramento em sua primeira língua, assim como o ouvinte possui.

Considerando o grupo social hegemônico de ouvintes, a construção e perpetuação de sua história que sobressaem sobre as minorias culturais, po-demos nos posicionar no tocante do quanto a escrita de sinais é representa-tiva e importante para o fortalecimento da Comunidade Surda, que há tanto tempo foi excluída de toda a demanda deste social hegemônico. Muitas ve-zes ela foi considerada como uma patologia social e colocada à margem da sociedade, que desconsiderando a forma de pensar e de se comunicar dos

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surdos, impedindo que suas manifestações fossem registradas ou repassadas. Diante dessa exclusão e opressão, vê-se o quanto o quadro social da

comunidade surda tem se transformado, através das conquistas alcança-das e inserção no meio acadêmico. Assim, é preciso aproveitar o momento e o espaço para refletir sobre a importância da língua de sinais, que a par-tir da junção das modalidades: sinalizada e escrita, alcançam a plenitude, permitindo não só o registro escrito, como o acesso a educação e a cultura dos surdos.

Referências

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DALLAN, Maria Salomé Soares. Análise discursiva dos estudos surdos em educação: a questão da escrita de sinais. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2013.FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.KLIMSA, Severina Batista de Farias. SAMPAIO, Maria Janaína Alencar. KLIMSA, Bernardo Luís Torres. Escrita de Sinais I. In: FARIA, Evangelina Maria Brito; ASSIS, Maria Cristina. Língua Portuguesa e LIBRAS: teorias e práticas 4. – João Pessoa: Editora Universitária da UFPB, 2011.LODI, Ana Cláudia B., HARRISON, Kathryn Marie P.; CAMPOS, Sandra Regina L. Letra-mento e surdez: um olhar sobre as articularidades dentro do contexto educacional. In: LODI, Ana Cláudia B.; HARRISON, Kathryn Marie P., CAMPOS, Sandra Regina L; TESKE, Ottmar. Letramento e minorias. Porto Alegre: Mediação, 2013.MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo: Cortez, 2001.STUMPF, Marianne Rossi. Escrita de Sinais III. Apostila desenvolvida para uso na dis-ciplina de escrita de sinais, da Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópo-lis, 2008. Disponível em: http://www.signwriting.org/archive/docs6/sw0569-BR-2008-S-tumpf-ELSIII.pdf. Acessado em: 11 ago. 2014.THOMA, Adriana da S., et. al. Relatório sobre a Política Linguística de Educação Bilíngue – Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa. Disponível em: http://www.biblioteca-digital.unicamp.br/document/?down=56513. Acesso em: 20 de jul. de 2014

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VYGOTSKY, Levy Semenovich. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 2007.VYGOTSKY, Levy Semenovich. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2008.WANDERLEY, Débora Campos. A leitura e escrita de sinais de forma processual e lúdica. Curitiba: Prisma, 2015.

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A DIFERENÇA ESTRUTURAL ENTRE A FRASE DO PORTUGUÊS E DA LIBRAS

Isadora de Carvalho Correia13 Edneia de Oliveira Alves14

Introdução

A proposta deste capítulo é apontar a diferença da estrutura frasal entre a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e a Língua Portuguesa. A constatação dessa diferença tornou-se clara para nós a partir das atividades de tradução da Libras para o português de textos gravados por surdos sobre cultura sur-da. Esta seção compõe cada unidade do livro didático de Libras que é uma das atividades do projeto “Produção de recurso didático para o ensino ao surdo e de material didático para o ensino de Libras como L2”. Em 2014, este projeto fez parte do programa Libras (Língua Brasileira de Sinais): ensino, 13 Graduanda em Letras/Libras pela UFPB14 Professora Doutoranda de Libras do DLCV/CCHLA/UFPB E-mail: [email protected]

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pesquisa e tradução em questão, que contou com o apoio do MEC. O projeto visou elaborar recursos didáticos por meios digitais e oferecer

material impresso de apoio às aulas de Libras e ao ensino de conteúdos es-colares para o surdo. Neste capítulo de livro, abordaremos sobre uma das atividades desempenhadas durante a construção dos livros didáticos de Li-bras. O intuito em desenvolver o livro didático foi contribuir com a difusão da Libras por meio da oferta de material didático que possa auxiliar o pro-fessor de Libras em seu fazer pedagógico. Além desta preocupação, houve o compromisso em difundir a cultura e a escrita de sinais através da distri-buição dos livros didáticos de Libras. Com isso, havia o objetivo de melho-rar a qualidade do ensino de Libras por surdos e para surdos e valorizar sua cultura surda.

O público-alvo previsto para distribuição do material didático produzido são as instituições em que ocorre o ensino aos surdos e os professores de Libras, especialmente, professores surdos. Pensando nesse professor surdo, cada livro é acompanhado por um DVD contendo as lições gravadas em Li-bras e a tradução de todos os trechos do livro que estão escritos em língua portuguesa, para que o surdo estando de posse do material não sofra ne-nhum tipo de limitação induzida pelo uso da língua portuguesa.

O programa foi muito importante para viabilizar a participação de pro-fissionais surdos e ouvintes, que compartilharam ideias e experiências bus-

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cando produzir atividades e explorar o campo de estudo de Libras. Para os participantes, este programa e respectivo projeto contribuiu para a apren-dizagem sobre o ensino de língua de sinais e para o amadurecimento dos conhecimentos adquiridos em sala de aula. Também, contribuiu para a com-preensão de que trabalhar na área de Libras, até o momento, significa en-frentar a falta de produção resultante de pesquisa aprofundada sobre sua gramática e sobre a cultura surda. Assim, com este capítulo de livro preten-de-se contribuir com a reflexão sobre a sintaxe da Libras e despertar para a necessidade de maiores estudos nesse campo.

Aspectos teóricos e práticos da estruturação sintática em português e na Libras

A língua surge para fins comunicativos e no ato de comunicação ela é estruturada de maneira a produzir sentido possível de ser compreendido pelo outro. Em um contexto de discussão sobre a língua em que a forma é o objeto de interesse, compreende-se que a língua – conforme Silva (2011) – natural é composta de estrutura e sentido. A partir da perspectiva da fun-cionalidade da língua, a estrutura serve à produção de sentido, assim, cada língua dentro da cultura de seus falantes assume uma determinada forma de

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estruturar-se para atender ao objetivo de comunicar. Sendo assim, pode-se depreender que não existe uma forma universal de estruturação linguística de uma língua, mas, a premissa vigente é as possibilidades de organização dos vocábulos para se fazer compreender.

A concepção geral sobre a sintaxe é a de que se trata de olhar a estrutura frasal da língua observando os entrelaçamentos que as palavras são postas para produzir sentido. Nas palavras de Silva (2011, p. 106), a sintaxe é “a re-lação estabelecida entre os elementos linguísticos que atuam na formação dos enunciados”. Nas línguas orais, o encadeamento dos vocábulos acon-tece linearmente, de forma que os elementos são organizados e postos em determinado lugar da sentença para que na ordem escolhida se possa cons-truir sentido. Assim, um qualificador estará sempre próximo do nome que se quer qualificar. A expressão dessa forma indica que as palavras precisam necessariamente estarem postas em uma sequência que se possa permitir que sua proximidade, além de seus conectores, promovam sentido. Nesse contexto, a ordem é primordial para a construção de sentido porque o falar só lhe permite dizer uma palavra de cada vez criando a lógica da linearidade.

Já nas línguas de sinais, a lógica da estrutura frasal correlaciona-se a uma forma de produção visual-espacial, portanto, a lógica é diferente da utilizada nas línguas orais. Conforme Santos, Santos e Santos (2013, p. 504), as lín-guas de sinais “possuem na estrutura de suas sentenças, restrições e orde-

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nações complexas e específicas de uma língua visual”. A língua de sinais, por apresentar aspectos de simultaneidade, permite que os vocábulos em uma sentença sejam produzidos de forma simultânea. Essa é uma demonstração de que, conforme Santos, Santos e Santos (2013), a estrutura da sentença das línguas de sinais seja flexível. Como os vocábulos não precisam necessa-riamente aparecerem de forma sequenciada, cria-se a lógica que tem como base o aspecto viso-espacial. Essa lógica contraria a lógica temporal que expressa semanticamente uma ideia de sequencialidade. A lógica espacial não estabelece ordem, assim, um sujeito de uma oração pode livremente aparecer no início ou no final da oração da Libras.

Os falantes de língua oral dispõem do sentido da audição para apreen-der a língua oral-auditiva, isto lhes possibilita o usufruto da apreensão des-se sentido através da produção linear da língua que faz parte do repertório linguístico de sua gramática internalizada. Dessa forma, eles dispõem, se-gundo Correia (2013), de uma ordenação das palavras e dos mecanismos de concordância para abstrair o sentido de uma sentença. Portanto, na língua portuguesa a ordenação é extremamente importante para a compreensão do sentido. Vejamos que numa sentença simples como “O cachorro matou o gato” a relação sujeito predicado é estabelecida como causa e efeito, uma vez que, o agente é João. Sabe-se disso porque em língua portuguesa, no caso da oração na voz ativa, o agente que comete a ação é o sujeito da ora-

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ção e está no início da frase. Também no caso desse exemplo a concordância é primordial para a confirmação do sentido que se quer produzir.

Com relação à língua dos surdos, seu repertório linguístico é da língua de sinais e quando se comunicam nessa língua possuem como gramática internalizada a Libras e em sua gramática o elemento espacial é fundamen-tal. Segundo Quadros (2012), o espaço é utilizado para estabelecer funções gramaticais.

Brito aponta que na Libras há o verbo de concordância com o sujeito ou com o objeto como na frase EU-AVISAR-VOCÊ. Na forma de sinalização des-ta sentença, embora esteja na estrutura SVO, é importante perceber que o sinal AVISAR é realizado no espaço neutro e tem como referência o próprio corpo. Assim, o eu é indicado pela proximidade da configuração de mão do verbo avisar junto à própria boca. Esta localização da mão, possuindo a con-figuração de mão apropriada, indica o sujeito da oração: EU. A finalização da realização do sinal AVISAR em um tu que se tem como referência, não neces-sariamente presente, uma outra pessoa em frente ao próprio corpo indica o objeto da oração. Sendo assim, a espacialidade, o movimento e o referencial são aspectos sintáticos importantes para a compreensão do sentido que se quer produzir em uma frase da Libras.

De acordo com Quadros e Karnopp (2004) e Brito (1987), a estrutura sin-tática da frase na Libras pode seguir a estrutura comum das línguas orais em

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SVO, ou as estruturas em SOV, VSO e OSV. Para ilustrar essas possibilidades de estruturação frasal, Quadros e Karnopp apresentam os seguintes exemplos:

SVO: EL@ GOSTAR FUTEBOLSOV: EL@ FUTEBOL GOSTAR OSV: TV EL@ ASSISTIR

Na Libras é frequente o uso de topicalização, em que há o uso do verbo como nuclear, incorporação do complemento (BRITO, 1987), há concordân-cia verbal percebido através do estudo sobre verbo com concordância e construções de frase com foco (QUADROS; KARNOPP, 2004).

A topicalização é o emprego do objeto na ponta da sentença (BRITO, 1987). O verbo possui centralidade nas orações da Libras, pois, estes deter-minam a quantidade e os tipos de concordâncias e por topicalização a pon-ta o uso do objeto no tópico da sentença (BRITO, 1987). A incorporação da concordância ou do argumento é quando há incorporação de um elemento gramatical a outro, como é o caso da incorporação do objeto pelo verbo (BRITO, 1987). Em Libras as construções com foco são realizadas com o uso de repetição de termos e mantém elemento nuclear (QUADROS; KARNOPP, 2004). A concordância é estudada por intermédio do estudo de verbo com

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concordância em que este deve concordar com o sujeito ou com o objeto (QUADROS; KARNOPP, 2004).

Com relação à sintaxe da Libras não se tem muitos dados que possa ser explorados em uma análise sintática geral como propomos a seguir, assim, nas análises nos apoiaremos nesses aspectos apontados pelas gramáticas citadas e em gamáticas de língua portuguesa. Outra postura necessária a ser esclarecida aqui é que consideramos que a Libras já está legitimada pela linguística, sendo assim, o esforço será em ter uma visão geral da estrutura frasal da Libras tentando ao máximo respeitar sua originalidade de estrutu-ração. Os contrapontos realizados com a Língua portuguesa será apenas um apoio para a reflexão.

Reflexão a respeito da estrutura frasal da Libras

Como dito anteriormente, cada unidade dos livros didáticos de Libras foi acompanhada por um vídeo com temáticas sobre cultura cujo objetivo foi informar e provocar reflexões dos alunos dos prováveis cursos de Libras so-bre a cultura surda. Diante desse objetivo que se diferencia do objetivo do ensino/aprendizagem de Libras, como previsto na criação dos vídeos de di-álogos, houve a necessidade de traduzir as entrevistas realizadas por surdo,

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um surdo com outro em Libras para o português, porém, para a análise tam-bém foi utilizada frase de vídeo de diálogo para atividade de interpretação.

Esta tradução da Libras para o português das entrevistas fornecidas por surdos da cidade de João Pessoa foi uma das atividades no processo de cria-ção do livro didático e motivou diversas reflexões sobre a diferença entre a estrutura da língua portuguesa e da Libras. Esta foi uma atividade demasiada-mente difícil, tendo em vista que os textos produzidos por surdos em Libras sinalizada tinham uma estrutura gramatical muito característica da Libras e distante do português. As estruturas frasais mais difíceis eram as que não se aproximavam da estrutura frasal da língua portuguesa, portanto, considera-mos estas entrevistas como textos puros, sem recurso de interlíngua.

No desenvolvimento das traduções, conhecer os sinais, ou não conhe-cê-los, ou não ter uma palavra correlata em língua portuguesa e a falta de conhecimento gramatical aprofundado da língua portuguesa e/ou da língua de sinais e a não habilidade em escrever em escrita de sinais para realização das transcrições foram elementos que dificultaram o processo.

Havia momentos em que se conhecia o sinal, mas, não se sabia qual pa-lavra em língua portuguesa seria correlata. Muitas vezes, um sinal é conhe-cido e se tem um correlato em língua portuguesa para ele, porém, há sinais que não possuem. Nesse caso, a saída é explicar seu significado, assim, é introduzida na tradução uma explicação da significação do sinal na frase em

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português para que ele seja compreendido nessa língua, prezando pela fi-delidade ao sentido da frase.

Como o conhecimento da transcritora não tinha o nível de aprofunda-mento necessário em língua de sinais, nem em língua portuguesa para re-alização das traduções, foram sentidas muitas dificuldades. As dificuldades foram encontradas no momento em que era necessário perceber o movi-mento, a expressão facial e a direção do olhar. Esses aspectos gramaticais geravam muitas dúvidas e as indagações que surgiam eram: estão fazendo perguntas ou não? Esse olhar representa um aspecto gramatical ou não?

As dificuldades também foram sentidos com relação à compreensão de sentido a partir da ordem frasal. No caso de estruturas frasais muito especí-ficas da Língua de sinais, é necessária uma inversão da ordem dos vocábulos para que o mesmo sentido seja transmitido na estrutura da língua portu-guesa. Nesse aspecto, é necessário um conhecimento aprofundado da gra-mática das duas línguas para que se consiga ser fiel ao sentido do enuncia-do intencionalmente produzido pelo falante de Libras, o inverso também é verdadeiro. Essas dificuldades motivaram a produção deste capítulo de livro, no intuito de fomentar a discussão sobre a sintaxe da Libras tão necessária para o desenvolvimento do ensino de Libras e para os trabalho de tradução.

Para compreender melhor a motivação dessas dificuldades, é importan-te salientar que foram utilizadas Glosas para transcrever os textos em Libras

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sinalizada. Essa é uma forma de uso do português adaptado para transcre-ver as línguas de sinais, no entanto, não é eficiente tendo em vista que o olhar sobre um vocábulo escrito em escrita alfabética não revela as nuances próprias das línguas de sinais, tais como: movimentos repetidos, expressões faciais e corporais e uso de sinais com carga semântica própria. Porém, era o que se tinha no momento para seguir com os trabalhos porque na equipe não havia quantidade suficiente de pessoas com conhecimento da escrita de sinais para abarcar toda a carga de trabalho em que a escrita de sinais estava presente. No entanto, é preciso pontuar que o sistema de escrita de sinais SignWriting é o melhor transcritor para as línguas de sinais que dispomos no momento.

As dificuldades foram vencidas, por isso, propomos a reflexão sobre al-gumas estruturas frasais retiradas de um vídeo de diálogo e de algumas entrevistas sobre cultura surda. Os exemplos utilizados para a reflexão são frases retiradas de alguns textos em vídeos sobre cultura surda e de vídeos produzidos para atividades de interpretação. Os exemplos foram retirados das seguintes temáticas, na ordem seguinte: Copa do mundo; associação de surdos, o surdo e a família e o surdo e o esporte.

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Análise - Exemplo 1

Na análise seguinte temos um trecho de fala retirado do vídeo de diálo-go produzido para uma atividade do livro Libras I capítulo I – Libras básico – Unidade I – Esporte. É uma frase produzida por um surdo não oralizado, portanto, espera-se que em sua produção linguística em Libras haja pouca ou nenhuma interferência da língua portuguesa. A temática deste vídeo é sobre copa do mundo e copa das confederações.

LIBRAS – ENTÃO. TUDO-BEM? VOCÊ ENTENDER VER TODO-MUNDO--ASSISTIR, CERTO? EU EXPLICAR HISTÓRIA EXPLICAR MUNDO DOIS QUAL? UM EXPLICAR OUTRO EXPLICAR, LEGAL?

Tradução - Então, Tudo bem? Você vai entender porque vê todos estão assistindo, certo? Eu vou explicar sobre duas histórias de copas mundiais. Primeiro eu explicarei sobre uma e depois sobre a outra. Está certo?

Primeira frase

Análise da primeira frase do exemplo 1: VOCÊ ENTENDER VER TODO--MUNDO-ASSISTIR, CERTO?

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Ao analisar a frase, compreende-se que o locutor iniciou sua fala se diri-gindo aos seus interlocutores com o uso do pronome VOÇÊ, dando um tom informal ao texto, pois, este é um texto produzido em vídeo para qualquer tipo de pessoa assistir. Ele contextualiza a temática chamando a atenção para o fato de que todos acompanham a Copa do Mundo.

Como a Libras não possui flexão verbal, segundo Brito (1997), a forma encontrada para a transcrição em código alfabético do texto em Libras foi transcrever o verbo no infinitivo e dessa forma foi feita em todas as demais transcrições. Assim, percebe-se que, em Libras, a concordância entre verbo e sujeito acontece na perspectiva semântica. Diferente do que Silva (2011) põe sobre a língua portuguesa de que o verbo concorda em número e pes-soa com o sujeito. A ação de entender é desempenhada por VOCÊ tendo em vista que há a presença do pronome em função de sujeito próximo dos verbos ENTENDER VER na frase, assim, assume a estrutura SVO. De acordo com Quadros e Karnopp (2004) e Brito (1987) a estrutura SVO também é en-contrada na Libras e esta ocorrência analisada é um exemplo.

A ocorrência de dois verbos nos faz refletir se esse é um caso de orações coordenadas, uma vez que é possível traduzi-la como: “entender porque vê todos...”, essa tradução é possível devido à depreensão de que esse discurso foi produzido em momento de copa e porque a frase segue com o esclareci-mento do locutor de que irá explicar sobre duas copas. Pode-se aceitar essa

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explicação da sequência de dois verbos sem que nenhum assuma a função de auxiliar porque Brito (1987) afirma que não há conectores na Libras. Ca-sos de coordenadas explicativas na Libras muitas vezes são realizadas sem os conectores e para seu entendimento são utilizadas formas não lineares de produção, porém, essas são conjecturas o que, embora embasada teori-camente, é necessário um estudo aprofundado sobre.

Com relação ao verbo VER, ele aparece com sujeito elíptico. No entan-to, considerando que o sujeito do verbo assistir é TODO MUNDO conforme análise posterior. Percebe-se que ele encontra-se isolado, porém, o verbo ver aparece logo após o verbo ENTENDER cujo sujeito é VOCÊ. Essa sequ-ência aliada ao sentido produzido pelo locutor depreende-se que o sujeito do verbo VER é VOCÊ. Conforme Brito (1997), a Libras contém poucas con-junções. Assim, essa estrutura diferencia-se do português devido à ausência da conjunção “e”, porém, seu arranjo possibilita uma compreensão aditiva perfeita da intenção comunicativa do interlocutor.

No caso de TODO-MUNDO-ASSISTIR, podemos considerá-lo como ob-jeto do verbo VER. Porém, ele é um caso de verbo com incorporação de ar-gumento, como cita Brito (1987). O verbo assistir realizado com a sinalização de oito dedos, em forma de 4 x 4 dedos, com o mesmo movimento de VER indica que são várias pessoas realizando essa ação, como não há o sinal vá-rios na frase a compreensão é de TODO-MUNDO. Realizado dessa foram o

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argumento incorporado é o sujeito TODO-MUNDO. Neste caso a construção verbal TODO-MUNDO-ASSISTIR está subordinada ao verbo VER. Esse tipo de construção é bem diferente das normas gramaticais da língua portugue-sa, o que demonstra que a língua de sinais tem seus próprios meios de fazer sentido.

Até o momento, o locutor não definiu o objeto da oração, o que pode ser uma marca de produção de Libras informal. Nesse aspecto, pode-se perceber uma diferença entre a produção em português e em Libras. Em português é muito comum encontrar a estrutura SVO mesmo em produ-ção informal de texto.

No caso da análise do período como um todo, podemos refletir que este foi produzido em um período composto por coordenação e subordinação, em que ENTENDER VER são coordenadas e TODO-MUNDO-ASSISTIR é su-bordinada de VER. Não há na gramática da Libras essa preocupação com a classificação, porém, é importante pontuar para que possamos compreender que a Libras possui formas tão complexas quanto as línguas orais. É uma lín-gua rica, porém, sua sinalização provoca estranhamento naqueles ouvintes fluentes em Libras porque sua estruturação não responde às expectativas da língua oral.

Análise da segunda frase do exemplo 1: EU EXPLICAR HISTÓRIA EXPLI-CAR MUNDO DOIS QUAL? UM EXPLICAR E OUTRO EXPLICAR, LEGAL?

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Nesta frase, em EU EXPLICAR, não há a indicação de tempo verbal, po-rém a sequência com HISTÓRIA nos leva a compreender que essa estrutura equivale à seguinte estrutura do português: “eu vou explicar sobre a história”, portanto, remete a um futuro próximo. Esse entendimento é possível porque não há a presença de nenhum vocábulo indicador de tempo, por exemplo: depois, futuro, amanhã, ontem, passado ou datas específicas (BRITO, 1997). Quando não há nenhum desses itens lexicais, subtende-se que o locutor está se referindo ao presente ou ao futuro próximo.

O uso recorrente do verbo EXPLICAR é um exemplo de foco, como afir-ma Quadros e Karnopp (2004), de modo que o núcleo dessa sentença é EXPLICAR. Assim, ele é retomado várias vezes. A aparição do vocábulo UM e OUTRO é apenas uma adaptação para a explicação sobre dois aspectos sinalizados, com uma mãos o quantificador DOIS e com a outra realização de apontação para um dedo e para o outro dando a ideia de UM e OUTRO. Este é um recurso que possibilita as retomadas aos pontos específicos do discurso, utilizando-se do referencial não presente. O locutor diz que vai ex-plicar sobre dois temas referentes a campeonatos mundiais, quando ele diz que vai explicar UM ele aponta para o dedo indicador e faz a sinalização de EXPLICAR em seguida e quando diz que vai explicar o outro aponta para o dedo médio e faz o sinal de EXPLICAR em seguida. Este é um recurso dis-cursivo adotado em Libras para indicar que a fala será constituída por dois

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momentos de explicação, portanto, mantém-se o foco até o final da senten-ça. Essa também é uma estrutura bastante diferente da língua portuguesa tendo em vista que nessa língua evita-se as repetições e opta-se por cons-truções mais complexas.

Análise - Exemplo 2

Nesta análise, temos uma frase retirada do vídeo “Associação de surdos” produzido para a seção cultura surda do livro Libras I capítulo I – Libras bá-sico – Unidade IV – Estados do Brasil.

LIBRAS - ENTÃO SABER NÓS-DOIS EU-ENTREVISTAR-EL@ EU-ENTRE-VISTAR-EL@ ENTÃO COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO-DE-SURDO-DE-JOÃO--PESSOA HISTÓRIA O-QUE SURGIR EXPLICAR COMO EL@.

Tradução – Então, estamos aqui em uma entrevista. Então, ela vai expli-car a história do surgimento da associação de surdos de João Pessoa. Você pode me explicar como foi?

Para que possamos melhor compreender essa estrutura vamos apresentar a análise por partes e em seguida analisaremos sua estrutura como um todo.

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Primeira frase

Análise da primeira frase do exemplo 2: ENTÃO SABER NÓS-DOIS EU--ENTREVISTA-EL@ EU-ENTREVISTAR-EL@

A palavra ENTÃO SABER é um elemento introdutório para chamar a aten-ção da pessoa que está vendo o vídeo. Em seguida, há o elemento NÓS--DOIS que é o pronome dual em Libras equivalente a nós em português. Este pronome representa duas pessoas envolvidas no discurso: um EU e um EL@. Segundo Klimsa e Klimsa (2011), ele é utilizado pela comunidade lin-guística dos surdos para representar o dual (mão com o formato do numeral 2 com movimento direcionado para um EU e outro EL@ ambos envolvido no discurso). Este pronome é seguido da forma nominal EU-ENTREVISTA-EL@ que assume no exemplo a função de elemento nuclear no sintagma nomi-nal. Este sintagma não pode ser classificado como oração, pois, Silva (2011) afirma que a condição para existência de uma oração é a presença do verbo. Isto porque o elemento que segue o pronome não pode ser considerado um verbo, mesmo tendo em sua transcrição uma forma verbal no infinitivo. Vale relembrar que a transcrição da língua de sinais em código alfabético não dá conta das especificidades da produção de uma língua visuo-gestual e esse é um desses casos.

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Pois bem, ao termo ENTREVISTAR foram aglutinados os pronomes EU e ELA. A essa forma, Brito (1987) denomina de incorporação de argumento. O elemento EU-ENTREVISTA-EL@ é realizado com a sinalização repetida, seu sentido indica a situação em que os interlocutores estão inseridos, no caso, em uma entrevista. Sendo assim, a significação dessa construção se realiza denominando uma situação, o que o torna um elemento gramatical da clas-se dos substantivos, assim, consideramos que ele assume na frase a função de sintagma nominal. Como afirmam Silva, Batista e Arrais (2011) o núcleo do sintagma nominal é o nome. Concluindo, em NÓS-DOIS EU-ENTREVIS-TAR-EL@, o núcleo é EU-ENTREVISTAR-EL@ e estamos diante de um sintag-ma nominal constituído por NÓS-DOIS EU-ENTREVISTAR-EL@.

Depreende-se, nesta frase, a seguinte tradução: “estamos aqui em uma entrevista”. Em Libras não há em sua origem os verbos “ser” e “estar” que usamos em língua portuguesa como verbos de ligação. Sendo assim, per-cebe-se que mesmo sem o uso desse verbo é possível produzir sentido. O fato de colocarmos na tradução o verbo “ser” demonstra que essa é uma necessidade da língua portuguesa e não da Libras. Como consequência, a necessidade desse verbo para a produção de sentido é exclusivamente da cognição das pessoas que usam línguas orais que tem verbos “ser” e “estar” em sua estrutura, para o surdo esse sentido é produzido naturalmente e a comunicação flui normalmente sem a presença desse tipo de verbo. No caso

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da frase analisada, podemos dizer que é uma frase complexa e não uma oração e que em Libras há frases sem verbos que produzem sentido sem necessariamente haver um verbo.

Segunda frase

Análise da segunda frase do exemplo 2: ENTÃO COMO DAQUI ASSOCIA-ÇÃO-DE-SURDO-DE-JOÃO-PESSOA HISTÓRIA O-QUE SURGIR.

Antes de analisarmos esta frase com um todo é preciso esclarecer que o termo ASSOCIAÇÃO-DE-SURDO-DE-JOÃO PESSOA (ASJP) é apenas um si-nal em Libras, pois, na cultura linguística da Libras os nomes de associações são nomes próprios, diferente do português que tem o nome da instituição (associação) como base e utiliza-se de outras palavras para determiná-las. Dessa forma, é preciso conhecer o sinal para saber que se trata de uma de-terminada associação. Em transcrição com código alfabético optou-se por transcrever as palavras ligadas por hífen para dar a ideia de que se trata de um único sinal. Esse é mais um arranjo de transição que não dá conta de to-das as especificidades representação do sinal em língua de sinais.

A frase: COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO-DE-SURDO-DE-JOÃO-PESSOA HIS-

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TÓRIA O-QUE SURGIR é constituída por topicalização, o que não se estra-nha quando se analisa a estrutura frasal da Libras porque, como afirma Brito (1987), esse recurso é bastante comum nessa língua. Neste caso, a frase é topicalizada pela apresentação da circunstância do momento de produção do discurso, assim, o tópico está em: COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO-DE-SUR-DO-DE-JOÃO-PESSOA HISTÓRIA. A intensão é comunicar que a fala do lo-cutário versará sobre a história da associação de surdos. De acordo com Tra-vaglia (2009) o recurso de topicalização traz o efeito de envolver o locutário, que nesse caso serão as pessoas que assistirão ao vídeo, à circunstância da intensão comunicativa. Em se tratando de estruturação sintática, Silva (2012) afirma que a topicalização é um deslocamento de um elemento sintático para a esquerda. Tanto pela explicação sintática quanto pela semântica, en-tão, percebe-se que essa estrutura é um recurso de topicalização.

No caso dessa topicalização, observa-se que trata-se de objeto do verbo SURGIR, ligando-se ao verbo VER pelo elemento catafórico O-QUE. O recurso catafórico é muito comum no discurso em Libras e remete para um elemento posterior como forma de ligar o tópico ao restante da frase sobre a qual trata.

Agora, observando essa oração como um todo, percebe-se que ela ainda é remetida a uma oração posterior. A oração [COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO--DE-SURDO-DE-JOÃO-PESSOA HISTÓRIA O-QUE SURGIR] vincula-se a ora-ção [EXPLICAR COMO EL@]. Ao observar a relação entre estas duas orações

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percebemos que a primeira oração é completiva da segunda. Souza e Silva e Koch (2005) considera as orações completivas as equivalentes às denominadas pela gramática tradicional de subordinadas. Veja que em ordem relativamen-te direta ela ficaria da seguinte forma: EXPLICAR COMO EL@ COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO-DE-SURDO-DE-JOÃO-PESSOA HISTÓRIA O-QUE SURGIR. Essa é uma construção mais próxima da construção da língua portuguesa, porém, é importante ressaltar que devemos respeitar a estrutura original da Libras e analisá-la a partir de seus próprios elementos constituintes. Retomando, nes-ta frase estamos diante da oração completiva em posição de topicalização, porém assume a função sintática de completiva substantiva. Esta classificação se dá porque Souza e Silva e Koch (2005) afirmam que ela assume a função de sujeito, objeto direto ou indireto. Como em Libras não há muitas ocorrên-cia de uso de preposições e conjunções, não nos interessa aqui verificar se a relação de objeto assumida é de forma direta ou indireta, contudo, como em qualquer língua percebe-se que na Libras há a presença de objeto.

Em se tratando de ordem frasal, na oração COMO DAQUI ASSOCIAÇÃO--DE-SURDO-DE-JOÃO-PESSOA HISTÓRIA O-QUE SURGIR temos a estrutura OV, portanto, há uma alteração da ordem de forma que o verbo vem depois do seu objeto. Com relação à oração EXPLICAR COMO EL@, também temos uma alteração da ordem de forma que estamos diante de uma estrutura VS. Ao considerar que o tópico é seu objeto temos a seguinte ordem: OVS. Essa

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é um estrutura não indicada nas gramáticas de Libras existentes, assim, é passível de averiguação assim como qualquer outra análise realizada neste capítulo. É importante relembrar que este capítulo tem o intuito de demons-trar reflexões acerca da sintaxe encontrada que foram entraves no momen-to de tradução dos textos para composição do material didático. Quanto ao elemento COMO, dentro da construção: EXPLICAR COMO EL@, exerce a função anafórica do tópico. Essa também é uma construção muito comum em Libras, porém, também carente de investigação.

Além dessas questões, é importante pontuar que essa estrutura causa quebra de expectativa no usuário de língua portuguesa como L1, pois, a ex-pectativa de um interlocutor desse tipo é pela ordem linear. Cognitivamente falando, lidar com uma estrutura tão diferente da própria língua causa estra-nhamento e muitas vezes posicionamentos de rejeição à estrutura original da língua de sinais, buscando sempre adequá-la aos moldes da estrutura sintática da língua portuguesa.

Análise - Exemplo 3

A frase analisada neste exemplo também foi retirada do vídeo “Associa-ção de surdos” produzido para a seção cultura surda do livro Libras I capítulo

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I – Libras básico – Unidade IV – Estado do Brasil.

LIBRAS – COMO DIA CRIAR ONDE? ESTADO DIA ORIGINAR ONDE? UM ESTADO QUAL? QUEM?

Português – Onde foi criado? Em que dia se originou? Em qual Estado? Quem criou?

Primeira frase

Análise da primeira frase do exemplo 3: COMO DIA CRIAR ONDE?

Nessa passagem, a frase em Libras é bastante elíptica e só é bem com-preendida graças ao contexto semântico. O contexto semântico é o de que o locutor quer saber do seu locutário mais detalhes sobre a criação de associações de surdos, assim, eles faz uma série de perguntas. Nesta frase o locutor quer dois tipos de informação: dia e local de criação da associação. Assim ele introduz o questionamento com o advérbio COMO solicitando a informação sobre a maneira da criação da associação. Este é um recurso muito comum em Libras e pouco comum na língua portu-guesa. Em língua portuguesa opta-se pelo uso exclusivo do pronome in-

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terrogativo nos questionamentos diretos. Para conclusão da pergunta o advérbio interrogativo ONDE é introduzido no fim da frase. Para efeito de complementação da pergunta realizada em Libras sinalizada a pergunta é acompanhada de expressão facial com levantamento de sobrancelhas (BRITO, 1987; QUADROS; KARNOPP, 2004). A expressão facial em Libras é um recurso gramatical importante.

Segunda frase

Análise da segunda frase do exemplo 3: ESTADO DIA ORIGINAR ONDE?

Nesta frase, há o uso da topicalização ao introduzir a pregunta com o tema, que neste caso é: ESTADO DIA. Mais uma vez constata-se o uso da topicalização que é apontado por Brito como muito recorrente na Libras. Este tópico é seguido do verbo seguido do sujeito, demonstrando uma es-trutura de OSV. Esse sujeito na pergunta é o advérbio interrogativo, que no-vamente aparece no final da frase.

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Terceira frase

Análise da terceira frase do exemplo 3: UM ESTADO QUAL?

Nesta frase, novamente estamos diante de uma topicalização e uso do pronome interrogativo QUAL no final da frase. Como esta frase transcrita da Libras sinalizada tratava de uma pergunta, o ponto de interrogação foi co-locado, porém, esta interrogativa na Libras é indicada pela expressão facial utilizada durante a realização da pergunta. O que também mostra que existe indagação é o pronome interrogativo QUAL, exercendo a mesma função dos pronomes interrogativos O QUE, COMO, ONDE, POR QUE, QUEM apontados por Quadros e Karnopp (2004).

Quarta frase

Análise da quarta frase do exemplo 3: QUEM?

Nessa passagem há isolamento do pronome interrogativo, mas, refere--se à frase anterior retomando a questão que tem como núcleo o verbo criar.

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Análise - Exemplo 4

O exemplo 4 é composto por uma frase retirada do vídeo sobre cultura, cuja temática é “Comunicação do surdo com a família” do livro Libras I capí-tulo I – Libras básico – Unidade II – Família.

LIBRAS – COMO SABER SU@ ENSINAR LIBRAS MÃE LIBRAS DESENVOL-VER ONDE? ENSINAR Q-U-E-M?

Português – Eu gostaria de saber como foi ensinado Libras à sua mãe. Onde ela se desenvolveu. Quem a ensinou?

Na busca de informação detalhada, o locutor lança uma sequência de três perguntas para que o locutário organize seu discurso em torno delas. Para efeito de análise, temos quatro blocos de informação: [COMO SABER] [SU@ ENSINAR LIBRAS MÃE LIBRAS] [DESENVOLVER ONDE?] [ENSINAR Q-U-E--M?] e será analisada em dois momentos, como se pode ver a seguir.

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Primeira frase

Análise da primeira frase do exemplo 4: COMO SABER SU@ ENSINAR LI-BRAS MÃE LIBRAS DESENVOLVER ONDE?

Para efeito de compreensão da significação da mensagem analisada, esta frase foi retirada do meio da entrevista após ter sido realizada a contextu-alização da entrevista e após ter sido realizada duas perguntas. Assim, para que possamos compreender a análise posta aqui é preciso compreender que o assunto de interesse foi saber como era a comunicação entre o surdo entrevistado e sua família. Além disso, essa foi uma pergunta realizada pelo entrevistador posterior à informação de que a pessoa com quem o locutário mais se comunicava na família era sua mãe.

Da mesma forma que as frases anteriores, o que chama a atenção na fra-se é a não indicação de tempo que, segundo Brito (1987), é realizado atra-vés da sinalização dos termos passado, futuro ou por advérbios de tempo. Nesta frase, há os verbos SABER, ENSINAR e DESENVOLVER, porém nenhum é acompanhado de termo marcador de tempo. No entanto, o contexto se-mântico revela que o verbo SABER se trata de um tempo presente porque ele é o elemento que segue o advérbio COMO logo no início da frase que

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introduz a frase interrogativa do entrevistador. A observação da organização do discurso nos faz perceber que esse verbo SABER é utilizado para referir--se a si mesmo e que foi utilizado elipse do sujeito por não ter sido utilizado o pronome EU para que ficasse claro o sujeito deste verbo. É interessante observar que o contexto semântico do discurso é essencial para a revelação dos sujeitos falantes, pois, é muito comum em Libras haver a elipse de sujeito, assim, o interlocur que não tenha acompanhado a construção do contexto semântico do discurso não consegue reconhecer as falas e seus respectivos locutores o que impossibilita a compreensão do enunciado e este é um fator relevante para o intérprete de Libras.

O elemento COMO tem a função de introduzir a pergunta solicitando a informação sobre a forma como a mãe tinha desenvolvido sua aprendiza-gem de Libras. Mais uma vez esse advérbio é o elemento introdutório de uma questão que tem a intensão de obter informação de modo.

Na passagem: SU@ ENSINAR LIBRAS MÃE LIBRAS, percebe-se uma or-dem não linear, o que é comum em Libras. A frase inicia-se pelo pronome SU@ assumindo a função de elemento catafórico, afim de preparar o locu-tário para o elemento MÃE que só aparece após ENSINAR LIBRAS. O termo LIBRAS se repete assumindo a função de foco que Quadros e Karnop (2004) apontam como recorrência na Libras. É justificável que esse elemento se re-pita porque seu interesse maior é compreender como a mãe tornou-se capaz

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de comunicar-se em Libras com seu filho. No entanto, este trecho aparece como topicalização tendo em vista que o pronome interrogativo Q-U-E-M aparece como pergunta independente no final da fala.

Essa passagem é seguida da frase DESENVOLVER ONDE? Com sujeito elíptico e com uso de advérbio interrogativo no final. Essa é um estrutura recorrente da Libras, porém, carente de investigação científica como já foi alertado anteriormente.

A construção: SU@ ENSINAR LIBRAS MÃE LIBRAS DESENVOLVER ONDE? Assume a função de completiva substantiva porque assume a função sintá-tica de objeto do verbo SABER.

Segunda frase

Análise da segunda frase do exemplo 4: ENSINAR Q-U-E-M?

A aparição do verbo ENSINAR nesta frase, que surge como pergunta in-dependente, é uma forma de retomada da pergunta iniciada anteriormente sobre o ensino de Libras para a mãe do locutário. Mais uma vez, é necessário recorrer ao contexto semântico da fala para que se possa compreender ao que e a quem esta frase se refere. No entanto, é interessante observar que

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houve uma retomada de elementos de perguntas anteriores para concluir a pergunta. Essa retomada pode ser um caso de foco explicitado por Quadros e Karnop (2004), afim de esclarecer o foco da pergunta. Embora esses sejam elementos de retomada o pronome interrogativo aparece no final da frase, indicando mais uma vez a recorrência dessa forma de uso.

Análise - Exemplo 5

Nesta análise temos uma frase, com apenas um bloco, retirada do vídeo de fala retirado do vídeo produzido para a seção cultura com temática es-porte do livro Libras I capítulo I – Libras básico – Unidade I – Esporte.

LIBRAS – EU SABER COMO POSSÍVEL SURDO CAMPEONATO FUTEBOL POSSÍVEL VENCER OUVINTE QUALQUER POSSÍVEL? QUAL?

Tradução – Eu queria saber se é possível os surdos vencerem os ouvintes em um campeonato de futebol, eles podem vencer qualquer ouvinte? Qual?

Nesta frase, mantém-se a ordem frasal na perspectiva da gramática nor-

mativa da língua portuguesa em: SVO. Ocorre que o objeto do verbo saber é uma oração completiva substantiva. No caso da oração principal EU SABER,

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tem-se um sujeito explícito, o que não é muito comum na estrutura frasal da Libras. Com relação ao tempo verbal do verbo SABER, depreende-se que seja o tempo presente. O contexto de entrevista revela que esse verbo é uti-lizado pelo locutor/entrevistador para referir-se a si mesmo.

Na oração objetiva ou completiva substantiva, mantém-se a estrutura SVO mantendo-se na ordem esperada pela gramática normativa da língua portuguesa. No entanto, é importante fazer a observação de que em geral, nós ouvintes falantes de língua oral, tendemos a considerar normal a es-trutura da Libras que correspondente à norma da gramática normativa da língua portuguesa. A partir desta reflexão e da recorrência de estrutura em topicalização encontradas recorrentemente nas frases analisadas anterior-mente, podemos afirmar que essas estruturas de SVO não são as estruturas normais da Libras. Porém, mais uma vez frisamos que esta afirmação poderá ser confirmada ou não quando for resultante de uma investigação científi-ca específica para análise dessas ocorrências. Embora haja essa semelhança dessa estrutura com a língua portuguesa, que poderia ser justificado com a declaração de Santos, Santos e Santos (2013) de que as semelhanças entre a língua portuguesa e a língua de sinais são decorrentes dos princípios uni-versais, é necessário ter cuidado em realizar uma análise focada na estrutura de Libras, caso contrário, pode-se incorrer no erro de explicar essa estrutura sob as normas da LP.

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Essa oração completiva substantiva foi introduzida pelo advérbio de cir-cunstância, diferentemente das ocorrências anteriores nas quais o pronome ou advérbio interrogativo são postos no final. Outra ocorrência interessante de se observar nesta oração é a presença do foco repetido. O locutor no in-tuito de enfatizar sua intensão em saber sobre a possibilidade do surdo ven-cer o ouvinte, repete três vezes o sinal POSSÍVEL. De acordo com Quadros e Karnop (2004) esse é um caso de foco com construções duplas em que o foco é repetido, porém, neste caso a repetição acontece mais de duas vezes.

No caso da informação sobre a circunstância CAMPEONATO FUTEBOL, houve um deslocamento, não tão para a esquerda como aponta Silva (2012), mas, esse trecho poderia estar no início ou no final. Sendo assim, o recurso de topicalização aqui não ocorreu necessariamente com o deslocamento do objeto ou do sujeito, mas, em uma estrutura apositiva.

Outro caso distinto do uso recorrente da estrutura gramatical da língua portuguesa é o uso do determinante QUALQUER utilizado posteriormente ao substantivo que determina. Em geral, na língua portuguesa os pronomes indefinidos como função de determinante antecedem os substantivos que determina.

Com relação à pergunta QUAL?, este termo foi utilizado como retomada da pergunta anterior que foi introduzida com a intenção de saber sobre a possibilidade. Assim, este elemento pode ser compreendido recobrando o

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sentido do advérbio de circunstância COMO. É uma repetição com função de foco novamente, é comum a repetição do pronome interrogativo para realização da pergunta. Essa forma de utilização do foco é muito comum nas sentenças interrogativas. Como afirmam Quadros e Karnop (2004), o uso dos interrogativos, da negação e de advérbios como foco é recorrente. Neste caso em especial, não houve a repetição do mesmo pronome núcleo, mas, uso de dois pronomes com a mesma função: marcar a interrogação.

Conclusão

Os trabalhos desenvolvidos no projeto de construção do livro didático foi uma oportunidade de vivenciar novas experiências permitindo ampliar os conhecimentos acerca do ensino da Libras e sobre a Libras propriamente dita. Participar da equipe do projeto favoreceu o nosso amadurecimento e aumentou nossa habilidade no uso dos recursos necessários ao trabalho.

Através deste projeto, foi possível a produção do material adequado con-correndo para melhorar a relação entre os surdos e os ouvintes, assim como entre alunos e professores. O projeto nos permitiu enxergar novas possibili-dades na didática voltada para o ensino de Libras para as pessoas surdas e ouvintes. Aprendemos que é importante se adaptar aos conhecimentos da

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cultura, identidade, histórias dos surdos, porque a convivência dos ouvintes ou surdos oralizados com a comunidade surda ajuda muito e facilita a adap-tação à língua de sinais.

Parecia difícil fazer transcrições e traduções entre a Libras e o por-tuguês porque há muita diferença entre eles. Na pesquisa, aprendemos a comparar a estrutura da língua de sinais, que é utilizada pela comunidade surda, com a do português, que é usada pelo restante da sociedade. Com-preendemos que no processo de ensino/aprendizagem da Libras, é funda-mental para o aluno adquirir os tipos de frases da Libras; sem elas, não se produz ou compreende os enunciados. Por outro lado, foi uma experiência desafiadora, Percebeu-se também que as dificuldades comuns se davam por falta de recursos para a realização dos trabalhos.

A comparação entre as estruturas frasais entre português e Libras de-monstra que a língua de sinais tem uma estrutura complexa e regras pró-prias. As orações são organizadas de forma a produzir sentido, assim como o português, e para que seu significado possa ser compreendido tem uma forma de organização própria, além disso, percebemos que a Libras é autô-noma e isto quer dizer que é independente da língua oral.

Constatamos que a estruturação das sentenças em Libras difere da forma como são estruturadas em português. Observamos também que a sintaxe da Libras tem uma estruturação própria e que ela deve ser respeitada. Alertamos

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também para a necessidades de pesquisas em sintaxe da Libras: registro e aná-lise para a compreensão da sua estruturação sintática e semântico-pragmática.

As reflexões apontadas neste capítulo acerca da estruturação sintática da Libras, conhecimento tão importante para um eficiente trabalho de tradu-ção, são pontuais e não decorreram de um estudo científico. Esta apresenta-ção da análise se deve à necessidade de alertar para a necessidade de maior quantidade de pesquisa na área e da vontade de partilhar algumas obser-vações realizadas no decorrer do desenvolvimento do trabalho de tradução dos vídeos sobre cultura produzidos para o livro didático de Libras.

Como não podemos generalizar as ocorrências gramaticais encontradas nesta breve análise, indicamos como possibilidade de norma de estrutura-ção sintática da Libras as seguintes ocorrências: não preocupação de mar-cação de tempo verbal no discurso; uso de sujeito elíptico; posposição dos determinantes ao nome formado por pronome indeterminado; a estrutura SVO não é recorrente em Libras e há ocorrência de da ordem OVS; comum uso de topicalização e foco; pouco uso de conjunções, porém, com possibi-lidade de apreensão de seu sentido pela forma de estruturação da frase; não uso de preposições, porém, há alteração na estrutura da frase para que seu sentido surja; utilização de incorporação de argumento pelo verbo; alguns tipos de pronomes pessoais incorporam a noção de quantidade de pessoas envolvidas no discurso; incorporação de pronomes em alguns verbos com o

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uso do movimento; não uso de verbo ser e estar; nomes de instituição são nomes próprios em Libras; uso de elementos anafóricos e catafóricos; há estruturas complexa com formação de orações subordinadas e uso do pro-nome interrogativo no final da frase.

Algumas dessas ocorrências corroboram com as observações encontra-das nas gramáticas de Libras e outras se apresentam como novas. Essa é uma demonstração de que há a necessidade do aumento da quantidade de estudo sobre normas gramaticais da Libras e do aprofundamento do nível de conhecimento das estruturas linguísticas dessa língua.

Referências

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