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1 Capítulo 1 Assimetria intermanual em ações de velocidade-precisão: Uma perspectiva desenvolvimentista Autora: Ana Paula Kogake Claudio Orientador: Luis Augusto Teixeira Resumo O objetivo do presente estudo foi comparar os perfis cinemáticos, tempo de movimento (TM) e tempo relativo pós-pico de velocidade (TPPV), de movimentos orientados a um alvo espacial (tarefa de Fitts) realizados com a mão preferida ou não-preferida entre crianças de 5-6 anos (n=5) e de 9-10 anos (n=5) com adultos (n=7). Os sujeitos realizaram tarefas com diferentes índices de dificuldade (IDs = 2, 3, 4, 5 e 6), que consistiram em contatar alternadamente dois alvos espaciais eqüidistantes do centro da tela de um monitor de computador com o cursor do mouse, o mais rapidamente possível, e com o mínimo de erros espaciais. Os movimentos foram registrados pelo software Fitts Discrete Aiming Task e a partir destes dados foi calculado o TM e o TPPV. Os resultados mostraram que não houve diferença significativa no TM entre as crianças mais novas em relação às mais velhas, e estas últimas se equipararam aos adultos com a mão preferida. Nos IDs 5 e 6 houve um aumento significativo do TM com a mão não- preferida nas crianças, mostrando que a maior demanda de precisão com a mão esquerda representa uma dificuldade extra para a criança. Os grupos tenderam a ter TPPVs similares em todos os IDs para ambas as mãos, enquanto que verificou-se comportamentos diferentes entre as mãos e entre os IDs. Esses resultados indicam um aumento da assimetria intermanual nas crianças, mas não em adultos, em função do aumento do ID em tarefas requisitando velocidade e precisão. Termos-chave: tarefa de Fitts, assimetria de desempenho, desenvolvimento motor. Introdução Um princípio muito bem conhecido e fundamental do controle motor é a relação encontrada entre velocidade e precisão durante um movimento. O primeiro autor relatado na literatura a estudar esta relação foi Woodworth em 1899 (citado em Rival, Olivier & Ceyte, 2003), mas foi o matemático Paul Fitts em 1954 que deu a maior contribuição para a ciência ao descrever o princípio através de uma equação matemática. Nesta equação, foi proposto que o tempo de movimento (TM) é uma função linear do logaritmo (na base 2) do dobro da amplitude de movimento dividido pela largura do alvo, conhecido como índice de dificuldade (ID; Fitts, 1954). A partir das pesquisas iniciais, diversos estudos foram realizados para testar a Lei de Fitts e foi constatado que a relação inversamente proporcional entre velocidade e precisão não

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Capítulo 1

Assimetria intermanual em ações de velocidade-precisão:

Uma perspectiva desenvolvimentista

Autora: Ana Paula Kogake Claudio

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O objetivo do presente estudo foi comparar os perfis cinemáticos, tempo de movimento (TM) e tempo relativo pós-pico de velocidade (TPPV), de movimentos orientados a um alvo espacial (tarefa de Fitts) realizados com a mão preferida ou não-preferida entre crianças de 5-6 anos (n=5) e de 9-10 anos (n=5) com adultos (n=7). Os sujeitos realizaram tarefas com diferentes índices de dificuldade (IDs = 2, 3, 4, 5 e 6), que consistiram em contatar alternadamente dois alvos espaciais eqüidistantes do centro da tela de um monitor de computador com o cursor do mouse, o mais rapidamente possível, e com o mínimo de erros espaciais. Os movimentos foram registrados pelo software Fitts Discrete Aiming Task e a partir destes dados foi calculado o TM e o TPPV. Os resultados mostraram que não houve diferença significativa no TM entre as crianças mais novas em relação às mais velhas, e estas últimas se equipararam aos adultos com a mão preferida. Nos IDs 5 e 6 houve um aumento significativo do TM com a mão não-preferida nas crianças, mostrando que a maior demanda de precisão com a mão esquerda representa uma dificuldade extra para a criança. Os grupos tenderam a ter TPPVs similares em todos os IDs para ambas as mãos, enquanto que verificou-se comportamentos diferentes entre as mãos e entre os IDs. Esses resultados indicam um aumento da assimetria intermanual nas crianças, mas não em adultos, em função do aumento do ID em tarefas requisitando velocidade e precisão.

Termos-chave: tarefa de Fitts, assimetria de desempenho, desenvolvimento motor.

Introdução

Um princípio muito bem conhecido e fundamental do controle motor é a relação

encontrada entre velocidade e precisão durante um movimento. O primeiro autor relatado na

literatura a estudar esta relação foi Woodworth em 1899 (citado em Rival, Olivier & Ceyte,

2003), mas foi o matemático Paul Fitts em 1954 que deu a maior contribuição para a ciência ao

descrever o princípio através de uma equação matemática. Nesta equação, foi proposto que o

tempo de movimento (TM) é uma função linear do logaritmo (na base 2) do dobro da

amplitude de movimento dividido pela largura do alvo, conhecido como índice de dificuldade

(ID; Fitts, 1954).

A partir das pesquisas iniciais, diversos estudos foram realizados para testar a Lei de

Fitts e foi constatado que a relação inversamente proporcional entre velocidade e precisão não

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aparecia somente em tarefas de contatar um alvo fixo com a mão ou estilete (MacKenzie et al.,

1987; Thomas, Yan & Stelmach, 2000), mas também em tarefas de arremessar uma bola em

um alvo fixo (Teixeira, 1997), bem como em atingir um alvo virtual através de um mouse

(Lambert & Bard, 2005).

De acordo com Teixeira (2000), a explicação que tem sido dada para a relação desse

princípio é que o aumento da demanda de precisão, em virtude da diminuição da largura do

alvo, leva o indivíduo a processar mais feedback para correções e, com isso, a aumentar o

tempo de movimento. Assim, só o tempo de movimento não consegue predizer os fatores que

estão relacionados com o aumento do tempo para completar a tarefa, em virtude de uma maior

demanda de precisão. Por isso, alguns estudos começaram a analisar o efeito da interação entre

velocidade e precisão a partir de dados cinemáticos, como pico de velocidade, fase de

aceleração, fase de desaceleração (tempo pós-pico de velocidade), erro espacial e variabilidade

do erro.

MacKenzie et al. (1987) mostraram que a largura do alvo afeta a fase de desaceleração

do movimento. Assim, alvos menores levam à antecipação do pico de velocidade e, com isso,

aumentam o tempo pós-pico de velocidade, fazendo com que o sujeito alcance o alvo com

velocidade reduzida. De acordo com Meyer et al. (1988), a diminuição da velocidade produz

menor ruído neural, responsável pela variabilidade de resposta, e o tempo mais longo

possibilita a utilização de mais correções, tanto visual quanto proprioceptiva, durante a

execução da tarefa. Os mesmos autores sugeriram que o movimento realizado entre dois

pontos, como a tarefa de Fitts, pode ser dividido em dois momentos: o primeiro submovimento

é a fase balística do movimento e está sob controle central; e o segundo submovimento é a fase

da correção e utiliza o feedback para atingir o alvo com precisão.

Assim, a variável cinemática do tempo pós-pico de velocidade é utilizada como um

indicador de ajustes via feedback. De acordo com MacKenzie et al. (1987), esta fase

corresponde de 60% a 70% do tempo total do movimento e sua porcentagem é afetada pela

dificuldade imposta pela largura do alvo. Segundo Crossman e Goodeve (1983), o perfil da

curva de velocidade é afetado pelo ID. Quando o ID aumenta a curva tende a ter a cauda mais a

direita, ou seja, alvos menores levam a uma proporção maior do tempo na fase de

desaceleração do movimento.

A relação entre velocidade e precisão foi investigada levando em conta outros fatores,

como o efeito durante o desenvolvimento motor realizado por Olivier e Bard (2000), através da

tarefa manual com ou sem pistas, por Rival, Olivier e Ceyte (2003) na tarefa de contatação de

um botão com o dedo da mão, bem como por Ferrel, Bard, Fleury (2001), Hay e Redon (1997),

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Lhuisset e Proteau (2002), Pellizer e Hauert (1996), e Thomas, Yan e Stelmach (2000). Todos

os estudos mostraram que as crianças também seguem a Lei de Fitts, quanto maior a demanda

de precisão maior o tempo de movimento para tarefas que requerem velocidade e precisão, e o

tempo para completar a tarefa diminui conforme aumenta a idade.

Segundo Thomas, Yan e Stelmach (2000) e Lambert e Bard (2005), uma explicação

para o fato das crianças demorarem mais tempo do que os adultos para completar a mesma

tarefa é em função de sua experiência limitada com determinados movimentos. Isto é, as

crianças não possuiriam total controle sobre o programa motor, e em função de serem menos

eficientes no processo de feedback visual do que os adultos, ambos os fatores levariam as

crianças a terem maior necessidade de fazer várias correções para conseguir acertar o alvo. Por

outro lado, Thomas, Yan e Stelmach (2000) também colocam que as crianças demoram mais

tempo, simplesmente, pelo fato de serem cautelosas por saberem que não são tão precisas

quando executam as tarefas em velocidades mais altas.

Diversos estudos comprovaram que o movimento da mão fica mais suave e menos

variável com a idade (Thomas, Yan & Stelmach, 2000), precisão e tempo de resposta evolui

com a idade (Lambert & Bard, 2005; Lhuisset & Proteau, 2002; Rival, Olivier & Ceyte, 2003)

e a capacidade de utilizar as informações visuais também evolui com a idade (Favilla, 2006;

Lambert & Bard, 2005; Thomas, Yan & Stelmach, 2000).

Apesar do desenvolvimento perceptivo-motor ocorrer com o avanço da idade, alguns

autores colocam que isto ocorre de forma não-monotônica. Uma hipótese para tal fato seria em

decorrência do desenvolvimento cerebral, no hemisfério cerebral esquerdo responsável pela

coordenação visuomotora (Pellizzer & Hauert, 1996). Assim, aos 8 anos as crianças tendem a

ter um decréscimo no desempenho, que segundo Manoel e Connolly (1995) é devido ao fato de

as crianças menores (6 anos) terem apenas um plano rudimentar de ação. Assim, elas ficariam

limitadas às suas estratégias flexíveis resultando em um comportamento mais rígido, com

menos erro, e pelas crianças de 8 anos começarem a utilizar a representação visuomotora

bidirecional, dificultando o acerto (Ferrel, Bard & Fleury, 2001). Por isso, a literatura aponta a

idade de 8 anos como marco no desenvolvimento infantil.

Outra abordagem estudada levando em conta a relação inversa entre velocidade e

precisão foi o controle do movimento com a mão preferida e não-preferida (Annett et al.,

1979). De acordo com este estudo, o aumento do índice de dificuldade acarreta um tempo de

movimento mais longo e isso é mais acentuado na mão não-preferida, devido ao fato do

controle de movimentos finos precisar de maior controle de feedback. Assim, a mão preferida

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está mais bem adaptada para este tipo de controle do que a mão não-preferida, que produz

maior número de erros e, conseqüentemente, necessita de mais correções.

Pelo exposto, o presente trabalho tem como objetivo comparar os perfis cinemáticos,

tempo de movimento e tempo pós-pico de velocidade, de movimentos orientados a um alvo

espacial realizados com a mão preferida ou não-preferida entre crianças de 5 a 6 anos e de 9 a

10 anos com adultos.

Método

Participantes

Os participantes foram divididos em 3 grupos de acordo com a idade, o primeiro grupo

(CS) foi composto por 5 crianças com idade entre 5 e 6 anos (M=6,6 ± 0,55 anos), sendo duas

do sexo masculino e 3 do sexo feminino; o segundo grupo (ND) foi composto por 5 crianças

com idade entre 9 e 10 anos (M=9,6 ± 0,55 anos), destas 3 eram do sexo feminino e duas do

sexo masculino; e o terceiro grupo (AD) por 7 adultos com idades entre 20 e 30 anos (M=25,86

± 2,41 anos), sendo 3 mulheres e 4 homens. Todos os sujeitos se declararam destros para a

escrita e para desenho e assinaram um formulário de consentimento antes do início dos testes.

No caso das crianças, o formulário foi assinado por um responsável.

Equipamento e tarefas

A tarefa motora consistiu em tocar duas barras verticais na tela de um monitor de

computador com uma ponteira controlada por mouse. O objetivo na tarefa era obter o menor

tempo de movimento (TM) entre os toques sem cometer erros espaciais no contato com o alvo.

Assim, a primeira barra correspondia ao ponto de início do movimento e a segunda barra

correspondia ao alvo a ser atingido com rapidez e precisão, no paradigma de Fitts (1954). O

movimento era iniciado e encerrado com o acionamento do botão esquerdo do mouse sobre as

barras. As barras eram eqüidistantes do centro da tela, e tinham sua largura e distância variada

em função do ID avaliado. Movimentos realizados com a mão direita eram feitos no sentido

esquerda-direita e movimentos realizados com a mão esquerda eram feitos no sentido contrário.

Veja a Figura 1 para uma representação esquemática da tarefa. Para a aplicação da tarefa foi

utilizado o software Fitts Discrete Aiming Task (v.2.0), um laptop da marca Toshiba e um

mouse óptico da marca clone na velocidade normal. Os dados foram adquiridos com freqüência

de 100 Hz.

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Figura 1 – Representação dos movimentos feitos com a mão direita e a mão esquerda (a) e posicionamento do sujeito em relação à tela do computador (b). Os participantes realizaram o teste em cinco IDs, envolvendo diferentes combinações de largura e distância dos alvos. As tarefas realizadas são descritas a seguir: Tarefa 1: ID = 2

Distância = 4 cm; largura = 2 cm; cálculo de ID: Log2 [(2x4)/2] = Log2 4 = 2

Tarefa 2: ID = 3

Distância = 8 cm; largura = 2 cm; cálculo de ID: Log2 [(2x8)/2] = Log2 8 = 3

Tarefa 3: ID = 4

Distância = 8 cm; largura = 1 cm; cálculo de ID: Log2 [(2x8)/1] = Log2 16 = 4

Tarefa 4: ID = 5

Distância = 8 cm; largura = 0,5 cm; cálculo de ID: Log2 [(2x8)/0,5] = Log2 32 = 5

Tarefa 5: ID = 6

Distância = 8 cm; largura = 0,25 cm; cálculo de ID: Log2 [(2x8)/0,25] = Log2 64 = 6

Procedimentos

Antes do início da sessão de testes, cada sujeito recebeu um formulário de

consentimento sobre os procedimentos experimentais. No caso das crianças o formulário foi

entregue ao responsável e foi perguntado às crianças se participariam das atividades por

vontade própria. Após esta etapa, os avaliados receberam informações pertinentes à tarefa e

tiveram um período de familiarização, sendo realizadas 20 tentativas de prática com ambas as

mãos nas cinco tarefas realizadas. Em cada tentativa foi fornecido feedback sobre o tempo de

movimento. Logo em seguida à prática, foi realizada a avaliação de desempenho nas tarefas,

com contrabalançamento na ordem das mãos e das tarefas entre os participantes.

A posição inicial para execução das tarefas foi com o participante sentado, com os pés

apoiados no chão, tendo o eixo sagital do sujeito alinhado com um ponto intermediário entre os

dois alvos, com o centro da tela na altura dos olhos e distando 50 cm. O mouse ficou disposto

do lado do teclado da mão ativa e o cursor do mouse no centro da tela, os movimentos foram

realizados do centro para o alvo oposto à mão ativa e após o toque em direção ao alvo da mão

ativa.

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Foram realizadas cinco tentativas com cada mão para cada tarefa, com um intervalo de

10 s entre tentativas e de, aproximadamente, 1 min. entre tarefas e entre as mãos. Para cada

tentativa, o experimentador apresentava um sinal preparatório e, em seguida, um sinal para o

início da tentativa. Em caso de erro no contato com o alvo, a tentativa era anulada e realizada

novamente em seguida à tentativa falha.

Análise

Inicialmente foi calculada a média de TM das cinco tentativas individuais para cada

mão e cada tarefa. A outra variável cinemática analisada foi o tempo relativo pós-pico de

velocidade (TPPV), determinado pelo período proporcional entre o tempo correspondente ao

pico de velocidade (Tpv) até o tempo final (Tf) do movimento, normalizado pelo tempo total de

movimento [(Tf-Tpv)/TM].

Para a análise do TPPV os dados do eixo x (referente ao deslocamento do cursor na

horizontal entre o primeiro e o segundo toque no alvo) foram submetidos à análise residual

para a determinação da freqüência de corte para filtros digitais passa-baixa do tipo Butterworth

de segunda ordem recursivos, através do programa Dr.Residual Analysis (v.1.0) e os dados

foram filtrados através do programa Dr.Filter (v.1.0). A partir dos dados filtrados do

deslocamento durante cada instante do tempo decorrido para completar a tarefa foi calculada a

velocidade para cada instante. Assim, foi encontrado o tempo referente ao pico da velocidade e

verificado o tempo gasto entre o pico da velocidade e o final do movimento (fase de

desaceleração). Para cada tentativa, o tempo da fase de desaceleração foi dividido pelo TM

originando o TPPV e foi realizada a média para cada mão e para cada tarefa.

A análise estatística empregada para cada variável foi uma análise de variância de três

fatores, 3 (grupo) X 2 (mão) X 5 (ID), com medidas repetidas nos dois últimos fatores. O nível

de significância adotado foi de p<0,05. Os contrastes subseqüentes foram realizados através do

teste de Newman-Keuls.

Resultados

A análise de erros antes e após o alvo mostrou que 3,53% das tentativas foram

espacialmente imprecisas e, por isso, rejeitadas para as análises subseqüentes. A Figura 2

mostra exemplos individuais típicos de curvas de velocidade, selecionadas por se aproximar de

valores médios do respectivo grupo etário.

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Tempo de movimento

A análise de tempo de movimento mostrou diferenças significativas em todos os fatores

principais: grupo, F(2,14) = 9,24, p<0,005; mão, F(1,14) = 201,87, p<0,0001; e ID, F(4,56) =

37,72, p<0,001. Foram detectadas também interações significativas entre grupo e mão, F(2,14)

= 22,19, p<0,001; grupo e ID, F(8,56) = 3,84, p<0,005; mão e ID, F(4,56) = 10,81, p<0,001; e

grupo, mão e ID, F(8,56) = 3,70, p<0,005.

-20

020406080

Tempo (s)Vel

ocid

ade

(cm

/s)

-20

020406080

Tempo (s)Vel

ocid

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(cm

/s)

-20

020406080

Tempo (s)Vel

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(cm

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-20

020406080

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020406080

Tempo (s)Vel

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(cm

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-20

020406080

Tempo (s)Vel

ocid

ade

(cm

/s)

Figura 2 – Curvas de velocidade representativas com a mão esquerda e a mão direita no ID 2 e 6 para cada grupo etário.

Para o efeito principal de grupo, verificou-se que o grupo dos adultos teve TM

menor do que os grupos de crianças, que não diferiram entre si. O efeito principal do fator mão

foi devido aos TMs menores obtidos com a mão direita (M = 0,96 s) em comparação com mão

Adultos Direita ID = 2

ID = 6

9-10 anos

5-6 anos

Esquerda

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esquerda (M = 1,63 s); e o efeito principal do fator ID foi devido ao TM mais elevado no ID 6

em relação ao ID 5, que por sua vez foi mais elevado do que os IDs 2, 3 e 4, que não diferiram

entre si (relação entre IDs: 2 = 3 = 4 < 5 < 6).

Os contrastes para a interação entre grupo e mão indicaram diferenças significativas em todas

as comparações, exceto que as crianças mais velhas não diferiram dos adultos no TM realizado

com a mão direita. A interação entre grupo e ID é devida ao aumento da diferença entre o

grupo dos adultos e os grupos de crianças nos IDs 5 e 6 em comparação aos IDs menores. A

interação entre mão e ID é devida ao fato de que com a mão esquerda só houve aumento

significativo do TM nos IDs superiores a 4 (2 = 3 = 4 < 5 < 6), enquanto que com a mão direita

o TM aumenta progressivamente com o ID.

0,5

1,0

1,5

2,0

2,5

3,0

E D E D E D E D E D

Tem

po d

e m

ovim

ento

(s)

AD ND CS

Figura 3 – Tempo de movimento (s) para os três grupos em função da mão (E: esquerda, D: direita) e ID: a, ID = 2; b, ID = 3; c, ID = 4; d, ID = 5; e e, ID = 6.

O efeito mais importante a ser destacado é a interação entre os três fatores, como

representado na Figura 3. Primeiramente, verifica-se um aumento significativo dos TMs com a

mão esquerda nos IDs 5 e 6, enquanto que com a mão direita o aumento de TM em função de

ID é menos evidente. Isso fez com que a assimetria intermanual fosse aumentada nos IDs 5 e 6

nas crianças, enquanto que nos adultos se manteve relativamente estável, mostrando que a

maior demanda da precisão é uma dificuldade extra para o desempenho com a mão esquerda

nas crianças. Podemos visualizar também que com a mão direita todos os grupos tiveram

praticamente o mesmo desempenho no ID 2, enquanto no ID 6 o grupo CS teve desempenho

inferior. Outro dado relevante é a comparação entre o grupo dos adultos com o grupo das

crianças mais velhas. Essa comparação revela que com a mão direita não foi detectada

a b c d e

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diferença significativa entre estes dois grupos em todos os IDs. Por outro lado, com a mão

esquerda aconteceu o oposto, com diferença entre os adultos e o grupo ND em todos os IDs.

Tempo pós-pico de velocidade

A análise do tempo pós-pico de velocidade relativo indicou dois efeitos significativos.

O primeiro foi para o fator principal ID, F(4,56) = 5,80, p<0,001, e o segundo para a interação

entre mão e ID, F(4,56) = 10,86, p<0,001. Nas comparações posteriores para o efeito de ID,

verificou-se que o ID 6 levou a valores maiores em comparação aos demais IDs, que não

diferiram entre si. A decomposição da interação mão x ID mostrou que a mão direita diferiu da

mão esquerda somente nos IDs 2 e 3. Na comparação intra-mão entre os IDs, foi detectado que

na mão esquerda o TPPV não diferiu entre os IDs 2 e 3, porém estes foram inferiores aos

outros IDs e o ID 4 foi inferior ao ID 6, enquanto que uma tendência oposta foi observada na

mão direita, com TPPV superior no ID2 em comparação com os IDs 3, 4 e 5 (Figura 4).

A interação entre os três fatores não mostrou diferenças significativas, F(8,56) = 1,15,

p > 0,05, como podemos verificar na Figura 5. Os grupos tenderam a ter tempos pós-pico de

velocidade similares durante todos os IDs para ambas as mão, com exceção do grupo dos

adultos nos IDs 2 e 3, como foi comentado anteriormente.

60%

65%

70%

75%

80%

2 3 4 5 6Índice de Dificuldade

Tem

po p

ós-p

ico

de v

eloc

idad

e (%

) Esquerda Direita

Figura 4 – Tempo pós-pico de velocidade relativo (%) para a interação entre os fatores mão e ID.

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55%

60%

65%

70%

75%

80%

85%

E D E D E D E D E D

Tem

po p

ós-p

ico

de v

eloc

idad

e (%

)

AD ND CS

Figura 5 – Tempo pós-pico de velocidade relativo (%) para os três grupos em função da mão (E: esquerda, D: direita) e ID: a, ID = 2; b, ID = 3; c, ID = 4; d, ID = 5; e e, ID = 6.

Discussão

O tempo de movimento, em uma análise geral, mostrou estar de acordo com a literatura

com relação ao fator idade. Os resultados mostraram que o tempo de movimento para

completar a tarefa de Fitts pelos adultos é menor do que o tempo gasto pelas crianças (Ferrel,

Bard, Fleury, 2001; Hay & Redon, 1997; Lhuisset & Proteau, 2002; Pellizer & Hauert, 1996;

Olivier & Bard, 2000; Rival, Olivier & Ceyte, 2003; Thomas, Yan & Stelmach, 2000). Em

relação ao fator mão, foi mostrado que ao utilizar a mão direita para completar a tarefa os

sujeitos precisam de um intervalo de tempo menor do que para realizá-la com a mão esquerda

(Annett et al., 1979). Para o fator ID, os resultados apontam que com o aumento da dificuldade

imposta pela tarefa aumenta-se o tempo gasto para completá-la (MacKenzie et al., 1987;

Thomas, Yan & Stelmach, 2000).

Por outro lado, os resultados do tempo de movimento nas análises subseqüentes não

corroboram a literatura em relação ao fator idade quando analisada a diferença entre crianças,

pois a literatura aponta que existe uma diferença no desempenho entre as crianças de 5-6 anos

para as crianças de 9-10 anos, com as últimas tendendo a ser mais rápidas (Ferrel, Bard &

Fleury, 2001; Olivier & Bard, 2000; Thomas, Yan & Stelmach, 2000), por já terem integrado o

sistema de programação com o sistema de orientação (Ferrel, Bard & Fleury, 2001). Porém, tal

característica não foi encontrada no presente estudo. Em relação ao fator ID, o aspecto

discordante com resultados prévios foi que nos três IDs menores (2, 3 e 4) o tempo para

completar a tarefa foi praticamente o mesmo, enquanto que Fitts (1954) e MacKenzie et al.

a b c d e

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(1987) observaram diferenças no tempo de movimento com o aumento do ID aparentemente

em virtude da maior utilização de feedback para correções decorrentes da restrição espacial

imposta pela tarefa.

Ferrel, Bard e Fleury (2001) e Hay e Redon (1997) apontam que o desenvolvimento

visuomotor ocorre de forma mais visível dos 5 aos 11 anos. Por esta proposição, as crianças a

partir de 11 anos já se equiparariam aos adultos com relação ao tempo de movimento em

tarefas que requerem velocidade e precisão. Os resultados mostram que tal fato ocorre já em

crianças de 9-10 anos para a mão direita, porém com a mão esquerda as crianças mais velhas

estão aquém dos adultos, provavelmente pela sua fase de desenvolvimento, que ainda requer o

uso demasiado da mão preferida para a realização de tarefas manuais. A interação entre os

fatores principais grupo, mão e ID, aponta ainda um aumento da assimetria intermanual durante

os IDs nas crianças, e foi mais acentuado nos IDs 5 e 6, devido à dificuldade extra para a mão

esquerda das crianças em virtude da maior demanda de precisão. Enquanto que os adultos

apresentaram uma relação estável de assimetria intermanual durante o aumento do ID. De

acordo com Teixeira (2001), a capacidade de controle de velocidade é similar entre o membro

preferido e não-preferido em adultos e a assimetria tende a se estabilizar durante o processo de

envelhecimento.

Os resultados levando em conta a interação entre grupo e ID está em consonância com

os achados por Lambert e Bard (2005), em que o aumento do ID parece ter maior influência no

tempo de movimento em crianças do que em adultos. Podemos constatar na interação entre os

três fatores principais (grupo, mão e ID), que com a mão direita no primeiro ID o tempo de

movimento foi praticamente o mesmo entre os três grupos, enquanto que no último ID o grupo

mais novo teve desempenho inferior.

Crossman e Goodeve (1983) e MacKenzie et al. (1987) evidenciaram que a dificuldade

imposta pela tarefa antecipa o pico de velocidade e, com isso, o tempo pós-pico de velocidade

fica maior em função da restrição espacial do alvo. Porém, os dados do presente trabalho só

apresentam tal característica com a mão esquerda e, mesmo assim, o TPPV fica mais acentuado

apenas nos IDs maiores. Por outro lado, a mão direita apresenta o maior TPPV no menor ID e

apresenta um tempo maior apenas na comparação entre o ID 5 com o ID 6.

De acordo com Meyer et al. (1988), no segundo submovimento acontecem as correções

via feedback e, de acordo com Annett et al. (1979), a mão não-preferida necessita de mais

correções em função do maior número de erros produzidos durante o movimento. Assim, era de

se esperar que a mão não-preferida tivesse o TPPV maior do que a mão preferida. No entanto,

no presente estudo foi constatado que a mão direita diferiu da mão esquerda apenas nos dois

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primeiros IDs e que essa diferença foi o oposto ao esperado, com a mão direita gastando mais

tempo durante a fase de correção do que a mão esquerda e esta relação só tende a ter uma

inversão a partir do ID 5.

Outro fator a ser levantado é com relação ao grupo, pois a literatura aponta que as

crianças são menos eficientes no processo de feedback visual do que os adultos (Lambert &

Bard, 2005; Thomas, Yan & Stelmach, 2000). Assim, esperava-se que as crianças tivessem um

TPPV maior do que os adultos. Porém, os dados mostram que todos os grupos etários do

presente estudo tiveram características semelhantes para o TPPV, reforçando a idéia de

Thomas, Yan e Stelmach (2000) de que as crianças têm um TM maior apenas por serem mais

cautelosas em virtude de saberem que são mais precisas quando executam o movimento com

menor velocidade. Aparentemente, o uso desta estratégia gera menor variabilidade e possibilita

mais ajustes via feedback visual.

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Capítulo 2

Preferência podal: Uma comparação em função da

idade e da prática específica do futebol

Autora: Andréa Messias Machado

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O presente estudo teve como objetivo comparar a preferência podal de jogadores de futebol (n=51) com escolares/universitários (n=50), com idade entre 5 e 30 anos, do gênero masculino, em diferentes tarefas, em função da idade e em função da modalidade praticada. Os participantes foram avaliados em tarefas de estabilização, mobilização geral e mobilização específica, em 4 tentativas cada, atribuindo-se escores específicos, de acordo com a freqüência de utilização dos pés nas tarefas. Os resultados relatam uma preferência podal inconsistente para as tarefas de estabilização e predominante preferência podal direita consistente nas tarefas de mobilização (94%). Ao comparar as faixas etárias em cada grupo foi constatado que para o grupo controle houve uma tendência geral de aumento de preferência pela perna esquerda com o avanço da idade, enquanto que o oposto ocorreu para os jogadores de futebol. Na comparação entre os grupos controle e experimental, detectou-se diferença entre os grupos de 5/6 anos e 18-30 anos, em que o grupo controle de 5/6 anos apresentou índice de preferência podal mais elevado em relação ao grupo experimental. Para o grupo de 18-30 anos, foi identificada uma relação oposta. Os resultados revelaram que a prática do futebol não reforçou a preferência podal esquerda nas tarefas de estabilização, e que não houve diferença entre os grupos em função da idade e da prática em relação às tarefas de mobilização, corroborando a necessidade de novas investigações para aprimorar os conhecimentos referentes à podalidade humana.

Termos-chave: preferência lateral, podalidade, lateralidade, futebol

Agradecimentos a todos os professores e técnicos que cederam suas aulas/treinos para realização dos testes e a todos que colaboraram na coleta dos dados.

Introdução

A lateralidade é um termo comumente usado para descrever o comportamento

assimétrico no uso do lado direito e esquerdo do corpo, que pode se referir à preferência, isto é,

à escolha de um dos lados para executar a maioria das tarefas, ou ao desempenho, que está

relacionado à proficiência entre os lados do corpo. A distinção entre essas duas dimensões é de

importância, pois a preferência manual é um comportamento assimétrico facilmente

observável, com aproximadamente 90% da população apresentando uma tendência para o lado

direito, de forma que muitas vezes acredita-se que o desempenho motor em geral é melhor com

o membro preferido (Teixeira, 2006, 2007).

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No entanto, é importante ressaltar que as assimetrias de desempenho motor e

preferência lateral são componentes distintos da lateralidade humana, e que a associação entre

essas duas dimensões da lateralidade humana dependem de inúmeros fatores, tais como: tipo de

tarefa e sua complexidade, fase de desenvolvimento, experiência, aprendizagem e contexto.

Essa afirmação se deve ao fato de que em primeiro lugar, a preferência do lado esquerdo ou

direito não é uniforme entre as diferentes funções sensoriomotoras, de forma que um indivíduo

que tem preferência pela mão direita para executar determinada tarefa motora, não tem

necessariamente a preferência pelo uso do pé direito, do olho direito e do ouvido direito,

podendo o mesmo ocorrer em indivíduos canhotos. Assim, justifica-se a distinção de pelo

menos quatro dimensões da lateralidade humana: manualidade, podalidade, ocularidade e

auricularidade, que correspondem, respectivamente às preferências de mãos, pés, olhos e

ouvidos. Em segundo lugar, a classificação em destro ou canhoto é feita usualmente a partir de

um número reduzido de tarefas manuais, entre as quais a escrita é predominantemente mais

utilizada. No entanto, a preferência pelo uso das mãos, pode variar de acordo com a

especificidade da tarefa, em que o indivíduo pode apresentar preferência por uma das mãos em

determinada tarefa, enquanto que para outra prefere utilizar a mão contrária, ou ainda

dependendo da tarefa, pode não ter preferência definida por uma das mãos. E, por fim, o

terceiro aspecto a ser ressaltado é que a preferência não está associada à assimetria de

desempenho, já que o individuo pode apresentar clara preferência lateral em uma tarefa e não

ter seu desempenho melhor com este lado preferido (Leconte & Fagard, 2006; Teixeira, 2006,

2007; Teixeira & Paroli, 2000).

Embora, existam afirmações de que a lateralidade tenha origem genética, atualmente,

existem evidências de que esta por si só não é responsável pela definição da lateralidade, mas

que as influências ambientais e sócio culturais que levam às experiência do indivíduo possuem

uma importante participação no estabelecimento de preferência laterais e assimetrias de

desempenho, de forma que à medida que a idade aumenta, os indivíduos tendem a ser mais

lateralizados. Além disso, um indivíduo pode vir a mudar sua preferência lateral, depois de

submetido à prática unilateral do membro não preferido, o que caracteriza a lateralidade como

um componente multidimensional e dinâmico do comportamento motor humano (Gentry

&Gabbard, 1995; Greenwood et al., 2007; Martin, Machado & Paixão, 2004; Martin & Porac,

2007; Mikheev et al., 2002; Singh, Majary & Dellatolas, 2001; Teixeira & Okazaki, 2007;

Zverev 2006). Desta forma, supõe-se que indivíduos que praticam tarefas unilaterais tendam a

ter preferência e desempenho melhores com o membro mais praticado. No entanto, alguns

estudos apontam para um paradoxo no desenvolvimento da lateralidade humana, pois ao

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mesmo tempo em que os seres humanos são caracterizados por possuir assimetrias laterais de

preferência bem-definidas, o que leva ao uso mais freqüente dos membros preferidos, existem

mecanismos que previnem assimetrias crescentes de desempenho motor.

Segundo Grouois et al. (2002) e Teixeira (2007), muitas destas afirmações são baseadas

em diversos estudos que são realizados, em especial com tarefas manuais, porém as questões

relacionadas à preferência de membros inferiores têm sido negligenciadas, de forma que existe

pouca literatura científica para definir se a lateralidade podal segue o mesmo perfil da

manualidade. Sabe-se, no entanto que segundo Gentry e Gabbard e Bell e Gabbard (2000)

existem duas diferenças importantes entre estas dimensões da lateralidade. Uma se refere à

demanda de controle postural, que está apenas relacionada à podalidade, e consiste em uma

tarefa menos complexa, a outra é que esta é menos influenciada por fatores ambientais, do que

a manualidade, já que são menos praticadas. Além disso, já que a inervação, o uso de

desempenho motor e a preferência lateral das pernas são expressivamente distintos em relação

aos das mãos, é possível que a lateralidade podal tenha um curso particular de

desenvolvimento. Assim o objetivo do presente trabalho foi comparar a preferência podal de

jogadores de futebol com escolares/universitários, com idade entre 5 e 30 anos, do gênero

masculino, em tarefas de estabilização e de mobilização, analisando-se a variação desta

preferência em função da idade e em função da modalidade praticada.

Método

Participantes

Participaram do estudo 101 indivíduos do gênero masculino, sendo 51 praticantes de

futsal ou futebol society de uma associação esportiva do município de São Paulo (grupo

experimental) e 50 escolares e universitários, não-praticantes de futebol (grupo controle). Os

participantes de cada grupo foram divididos em 4 grupos distintos de acordo com a faixa etária

da seguinte forma: Grupo Experimental 1 (GE1): 5/6 anos (n=13); Grupo Experimental 2

(GE2): 9/10 anos (n=13); Grupo Experimental 3 (GE3): 13-15 anos (n=12); e Grupo

Experimental 4 (GE4): 18-30 anos (n=11); Grupo Controle 1 (GC1): 5/6 anos (n=12); Grupo

Controle 2 (GC2) 9/10 anos (n=12); Grupo Controle 3 (GC3): 13-15 anos (n=12); e Grupo

Controle 4 (GC4): 18-30 anos (n=14).

O critério de inclusão no estudo para os praticantes de futebol foi de prática ou

treinamento regular da modalidade na escola de esportes ou na equipe competitiva da

instituição, e o tempo acumulado de treinamento, de no mínimo 2 anos, com exceção dos

participantes que constituirão GE1. O responsável por cada criança ou o próprio atleta, no caso

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dos maiores de 18 anos, assinou um termo de consentimento livre e esclarecido, autorizando a

participação do mesmo no estudo.

Equipamento e tarefas

As tarefas selecionadas para a avaliação da preferência podal foram aquelas que

pudessem caracterizar bem as condições de estabilização e mobilização. Assim, para

estabilização foram utilizadas as seguintes tarefas: TE1, equilibrar-se em um dos pés; TE2,

saltar uma distância de 1m, estabelecida por duas cordas paralelas, com curta corrida de

aproximação para impulso; e TE3, ultrapassar um obstáculo fixo de 30 cm de altura. As tarefas

de mobilização geral foram as seguintes: TMG1, desenhar um círculo no chão com a ponta de

um dos pés; TMG2, esmagar um inseto fictício com um dos pés; e TMG3, trazer uma bola de

tênis para junto de si com um dos pés. E, por fim, as tarefas de mobilização específicas ao

futebol foram as seguintes: TME1, conduzir uma bola de futebol utilizando-se apenas um dos

pés para toca-la por uma distância de 5 m; TME2, amortecer uma bola lançada em sua direção

empregando apenas um dos pés; e TME3, chutar uma bola na direção do experimentador, que

ficou posicionado a 5 m de distância do participante. Cada tarefa foi executada quatro vezes,

registrando-se a perna empregada em cada tentativa de cada tarefa.

Procedimentos

Os participantes foram avaliados separadamente por grupos etários, de acordo com os

horários de aula ou treinamento de cada grupo. A avaliação foi feita em pequenos grupos

formados por 4 participantes, que realizaram as tarefas em forma de circuito, simultaneamente.

Neste circuito, um grupo iniciava na estação de tarefas de estabilização, outro na estação de

mobilização geral e o outro na estação de mobilização específica ao futebol. Dessa forma, 12

participantes eram avaliados simultaneamente, por um avaliador em cada estação. Uma estação

foi dada como completa, quando cada indivíduo completava uma tentativa de cada tarefa da

estação, e logo em seguida, era realizada a troca de estação. Para que cada participante

realizasse quatro tentativas em cada tarefa, eles repetiam o circuito por quatro vezes.

Análise

Para a análise dos dados de preferência podal foi feita uma estimativa, em que foi

atribuída para cada uma das nove tarefas uma pontuação de 1 a 5, de acordo com escores

atribuídos, conforme apresentado no Quadro 1.

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Resultados

A Figura 1 mostra os valores médios dos índices de preferência podal obtidos em cada

categoria de tarefas nos grupos controle e experimental, de acordo com a faixa etária. Os dados

foram analisados por meio de uma análise de variância de 3 fatores, 2 (grupo) x 4 (idade) x 3

(tarefa), com medidas repetidas no último fator. Os resultados indicaram efeitos significativos

para o fator principal tarefa [F(2,186)=292,57, p<0,0001] e para a interação entre os 3 fatores

[F(6,186)=6,87, p<0,0001].

Quadro1. Categorias para classificação de preferência podal para execução de quatro tentativas em uma tarefa motora.

Escore Execução Classificação

1 Quatro execuções com a perna esquerda Preferência podal esquerda consistente

2 Três execuções com a perna esquerda e

uma com a direita

Preferência podal esquerda

inconsistente

3 Duas execuções com cada perna Preferência podal indefinida

4 Três execuções com a perna direita e

uma com a esquerda

Preferência podal direita inconsistente

5 Quatro execuções com a perna direita Preferência podal direita consistente

Figura 2. Distribuição das médias dos índices de preferência podal dos grupos controle e experimental, por idade, para as tarefas de estabilização (TE), mobilização geral (TMG) e mobilização específica (TME).

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De acordo com os contrastes pela prova de Newman-Keuls, as três categorias de tarefa

levaram a índices de preferência diferentes entre si. Nas tarefas de estabilização, foram

detectados os índices mais baixos, em comparação às tarefas de mobilização geral e de

mobilização específica. A diferença significativa entre as duas últimas categorias revela

preferência podal direita mais forte para tarefas relacionadas ao futebol em relação a outros

tipos de tarefa podal.

A interação entre os 3 fatores é devida ao fato de que os grupos são diferentes apenas

nas tarefas de estabilização e em idades particulares. No grupo controle foi encontrado um

índice de preferência podal mais baixo em tarefas de estabilização no grupo 5/6 anos em

comparação aos grupos de 9/10 e de 18-30 anos, e mais baixo no grupo de 13-15 anos em

comparação ao grupo de 18-30 anos. Esses resultados indicam uma tendência geral de aumento

de preferência pela perna esquerda com o avanço da idade. No grupo experimental, por outro

lado, foram encontrados índices de preferência podal mais altos no grupo de 5/6 anos em

comparação ao grupo de 18-30 anos e mais altos no grupo de 13-15 anos em comparação ao

grupo de 18-30 anos. Isto é, uma tendência de maior preferência pela perna direita em idades

mais elevadas.

Na comparação entre os grupos controle e experimental, detectou-se diferença

significante nas tarefas de estabilização entre os grupos de 5/6 e 18-30 anos. O grupo controle

de 5/6 anos apresentou índice de preferência podal mais elevado (M=3,56±1,35) em relação ao

grupo experimental da mesma faixa etária (M=2,38±1,27), enquanto que para a idade de 18-30

anos, uma relação oposta foi observada, com índices de preferência mais baixos para o grupo

controle (M = 2,17±1,18) em comparação ao grupo experimental (M = 3,47±0,94).

Discussão

Segundo Carey et al. (2001) e Grouios et al. (2002) a inconsistência na podalidade, isto

é, a capacidade de utilizar ambos os pés com a mesma consistência e precisão é uma vantagem

para aqueles que querem se profissionalizar no futebol. Todavia, este padrão de comportamento

não foi encontrado no grupo de jogadores de futebol avaliados neste estudo, assim como no

trabalho de Teixeira (2007), possivelmente, por não se tratar de jogadores de elite, embora a

baixa freqüência de ambidestria tenha sido observada por Carey et al. (2001) em jogadores de

países participantes da Copa do Mundo de 98.

A avaliação da podalidade indicou que a preferência podal foi estável entre os

indivíduos de diferentes idades, de ambos os grupos, com aproximadamente 94% dos

indivíduos apresentando preferência podal direita nas tarefas de mobilização. Resultados

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semelhantes a este foram encontrados em estudos que avaliaram a preferência podal nessa

categoria de tarefa com jogadores e não-jogadores de futebol adultos (Teixeira et al.

submetido), com jogadores profissionais de futebol (Carey et al., 2001), com escolares indianos

(Singh, Manjary & Dallatolas, 2001), com indivíduos de ambos os sexos de diferentes idades

(Martin & Porac, 2007) e com meninos praticantes de futebol (Teixeira, 2007). No entanto,

resultados contraditórios foram encontrados em trabalhos que avaliaram a preferência podal na

transição da infância e idade adulta, nos quais se constatou preferência inconsistente nas idades

menores e preferência podal direita mais bem definida nas idades mais avançadas (Gabbard &

Iteya, 1996; Gentry &Gabbard, 1995; Greenwood et al., 2007).

Embora Gentry e Gabbard (1995) sugiram que a dominância podal seja estabelecida por

volta dos 11 anos, os dados do presente trabalho apontam para uma estabilidade na preferência

podal, em tarefas de mobilidade, a partir dos 5 anos de idade, que no caso dos jogadores de

futebol pode ser explicada pelo início precoce da experiência na modalidade, que reforçaria a

preferência lateral pré-determinada (Carey et al., 2001; Teixeira et al., submetido; Teixeira,

2007). Por outro lado, a consistência na preferência podal direita também foi constatada no

grupo controle, que por sua vez não sustenta a hipótese de mudança para a direita de Annett

citada por Gentry e Gabbard (1995), nem a hipótese do envelhecimento do hemisfério direito,

citada por Martin, Machado e Paixão (2004), apesar desta ser sugerida para indivíduos a partir

de 45 anos.

Com relação à tarefa de estabilização, enquanto o grupo controle indicou uma tendência

geral de aumento da preferência pela perna esquerda com o avanço da idade, os jogadores de

futebol apresentaram uma tendência de maior preferência pela perna direita em idades mais

elevadas, em especial no menor (5/6 anos) e maior grupo (18-30 anos) etário. Apesar destas

constatações, as médias dos índices demonstraram uma preferência podal indefinida, assim

como observado por (Teixeira et al., submetido), Greenwood et al. (2007) e Teixeira (2007).

Estes achados sugerem alguma relação entre a podalidade e a manualidade, uma vez que,

segundo Leconte e Fagard (2006), a preferência manual é específica ao tipo e à complexidade

da tarefa. O mesmo parece ocorrer com os pés, pois embora os grupos avaliados tenham

apresentado preferência podal consistentemente direita nas tarefas de mobilização, a mesma

consistência esperada pela perna oposta nas tarefas de estabilização não ocorreu (Gentry &

Gabbard, 1995; Grouios et al., 2002). Teixeira (2007) relata a possibilidade das tarefas de

mobilização serem mais complexas em relação às tarefas de estabilização, considerando a

maior exigência de precisão no contato com o objeto mobilizado, reforçando a preferência pela

qual os sujeitos têm mais segurança e que utilizam mais na prática, isto é, a perna preferida

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para o chute. Nas tarefas de estabilização, por outro lado, a demanda atencional é menor, pois

não existe a manipulação de nenhum objeto. Além disso, no controle do equilíbrio, por haver o

envolvimento de praticamente todo o corpo, há a participação de ambos hemisférios cerebrais.

Desta forma, estes fatos poderiam explicar a inconsistência da preferência podal encontrada

nos sujeitos do presente estudo, bem como na de estudos semelhantes.

A avaliação da preferência podal neste estudo teve a finalidade de analisar a variação

desta em função da idade e da prática. Os resultados revelaram que a prática do futebol não

reforçou a preferência podal esquerda para as tarefas de estabilização, obtendo-se, inclusive um

resultado inesperado, no qual o maior grupo etário de jogadores apresentou uma tendência de

maior preferência pela perna direita. Em relação às tarefas de mobilização, foi observado o

mesmo comportamento entre os grupos tanto em relação à idade quanto à prática, apontando

para uma predominante preferência podal direita. Os achados deste estudo corroboram a

necessidade de novos estudos para aprimorar os conhecimentos sobre a podalidade humana.

Além disso, pelo futebol ser considerado um esporte assimétrico, torna-se necessário que

técnicos e professores de futebol estimulem a utilização de ambos os pés, desde a iniciação, a

fim de prover segurança na utilização de ambos os pés nas habilidades específicas ao futebol.

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Capítulo 3

A preferência manual e podal para meninos e meninas da 1ª e 4ª série

de uma escola Estadual na cidade de São Paulo-SP

Autora: Cibele Teixeira da Silva

Orientadora: Elke dos Santos Lima

Resumo

A lateralidade é um conceito abrangente que envolve diferentes aspectos dos seres vivos relativos aos hemisférios direito e esquerdo do corpo humano. É comum nos seres humanos que haja preferência definida por um lado do corpo (mão, pé, olho, ouvido), que são associadas a assimetrias de desempenho (performance superior de um lado do corpo sobre o outro). O objetivo deste trabalho foi verificar alterações de preferência manual e podal em crianças no início da vida escolar 1ª série, e após quatro anos da mesma, 4ª série, além de investigar a relação entre estas duas preferências em meninos e meninas. Participaram do estudo 20 crianças (11 meninos e 9 meninas). Eles responderam o inventário adaptado de preferência manual de Edimburgo (Oldfield, 1971; in Teixeira, 2006) e realizaram 9 tarefas podais (divididas em estabilização, mobilização geral e mobilização específica) para definir preferências laterais. O teste de Mann-Whitney mostrou diferenças significativas entre 1ª e 4ª série, para preferência manual e preferência podal a 1ª série tem maior tendência destra em relação a 4ªsérie (T(1,96)= 1,97, p < 0,05). Ao comparar somente a preferência manual a 1ª série também tem maior tendência à destreza comparada com a 4ª série (T(1,96)= 2,00, p < 0,05). Nas tarefas podais, também houve diferença significativa (T(1,96)= 1,97, p < 0,05). Com base nos resultados pode-se afirmar que a 1ª série tem a preferência lateral destra mais forte que a 4ª série. Em relação ao sexo, os meninos têm maior tendência à preferência manual esquerda em relação às meninas.

Palavras-chave: preferência podal, preferência manual, lateralidade.

Agradecimentos: Daisy Tu, a minha família, amigos e a minha tutora Elke Lima pela

colaboração e incentivo.

Introdução

A lateralidade, segundo Teixeira (2006), é um conceito abrangente que envolve

diferentes aspectos dos seres vivos relativos aos hemisférios direito e esquerdo do corpo

humano. Ou ainda pode ser concebida como reflexo de percepção do predomínio motor nos

segmentos direito ou esquerdo do corpo, e da atividade desigual em cada um destes lados visto

que tal diferença será manifestada ao longo do desenvolvimento da criança e de suas

experiências vivenciadas (Gusman et al., 2003 in Souza, 2005). É comum nos seres humanos

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que haja preferência definida por um lado do corpo (mão, pé, olho, ouvido), que são

associadas, segundo Magill (2000), a assimetrias de desempenho (performance superior de um

lado do corpo sobre o outro). A dominância lateral é manifestada com movimentos das mãos,

pés e olhos (Gusman et al., 2003 in Souza, 2005). Guardiola (1988) in Souza (2005) afirma que

por um lado à lateralidade é um substrato cortical inato, mas por outro lado, é uma dominância

espacial adquirida, visto que influências ambientais podem alterar a manifestação

predominante da criança. Este predomínio lateral é conseqüência de uma assimetria funcional

dos hemisférios cerebrais.

A dominância lateral diz respeito ao lado do corpo que tem primazia em determinada

atividade. O hemisfério dominante do cérebro é oposto ao lado dominante do corpo. Negrine

(1983) in Torrezan et al.(2004) acredita que a lateralidade refere-se ao espaço interno enquanto

a noção de direita e esquerda refere-se ao espaço externo.

Gazzaniga et al.(2006), diz que há indicações através de testes que, o processo de

linguagem esta localizado, preferencialmente, no hemisfério esquerdo, não estando este

correlacionado com a preferência manual. Grande parte da população possui o lobo temporal

maior no hemisfério esquerdo que no direito, e isto se estende para as áreas subcorticais

também. Tudo isso remete a uma assimetria funcional bem definida.

Segundo Purves et al.(2005), o controle motor a maioria dos motoneurônios que

partem de um dos hemisférios cerebrais terminam em músculos do lado contrario do corpo

(contralateral), e poucos vão inervar músculos do mesmo lado corporal (ipsilateral). Isso

também se estende aos sinais aferentes, que tem maior parte dos neurônios originários de

receptores sensoriais cruzando para o outro lado no seu trajeto para o córtex cerebral. A

maturação do córtex promove melhora nas funções motoras, porém o desenvolvimento está

intimamente ligado às estimulações que a criança recebe do ambiente em que está inserida. O

ritmo próprio de cada criança varia conforme a qualidade dos estímulos recebidos do meio em

que se desenvolve.

O corpo caloso conecta os hemisférios cerebrais direito e esquerdo, a maior parte das

projeções calosas liga áreas homotópicas entre si, áreas em locais correspondentes nos dois

hemisférios. Em virtude de uma peculiaridade anatômica as fibras de saída e de entrada de um

hemisfério cruzam a linha mediana na altura do tronco cerebral, o hemisfério direito comanda o

lado esquerdo do corpo e o hemisfério esquerdo comanda a o lado direito do corpo.

Os hemisférios cerebrais não representam à informação de maneira idêntica, como

evidenciado pelo fato de que cada hemisfério tem desenvolvido seu próprio conjunto de

capacidades especializadas. Na vasta maioria dos indivíduos, o hemisfério esquerdo é

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claramente dominante para a linguagem e para a fala e parece possuir uma capacidade

unicamente humana de interpretar comportamentos e de construir teorias sobre a relação entre

eventos percebidos e sentimentos. A superioridade do hemisfério direito, por outro lado, pode

ser observada em tarefas como reconhecimento facial e o monitoramento da atenção. Ambos

hemisférios parecem estar envolvidos no desempenho de qualquer tarefa complexa, mas cada

um contribuindo de uma maneira especializada.

O cerebelo, assim como o cérebro, está dividido em dois hemisférios, onde o controle

é ipsilateral, e vai colaborar na coordenação intersegmentar, da locomoção e de ações

automatizadas. Ainda temos a interação intrincada de fontes de controle ipsilateral (cerebelo) e

contralateral (córtex cerebral). A preferência pelo lado direito ou esquerdo do corpo não é

uniforme, sendo que se o indivíduo usa a mão direita numa tarefa, não quer dizer que ele

também terá que usar o pé direito em outra tarefa e vice-versa.

Existem pessoas que possuem preferência por um lado do corpo para tarefas manuais

e o outro para tarefas podais, isto é chamado de preferência cruzada (designa preferências

laterais opostas entre segmentos laterais superiores e inferiores, mas também para membros

efetores e órgãos sensoriais). Armitage e Larkin (1993) in Teixeira (2006), relacionam a

preferência cruzada com a baixa capacidade de coordenação motora associada com alguma

forma de congruência de preferências laterais, já que indivíduos adultos normais com

preferência cruzada (mão-pé) são aproximadamente 4% para destros e 36% para canhotos

(Plato, Fox & Garruto, 1985 in Teixeira, 2006).

O corpo humano é bilateralmente simétrico apenas na aparência, pois os membros e os

órgãos do sentido são usados assimetricamente. Para a preferência lateral existem umas séries

de hipóteses como o modelo genético (Annett, 1978; Levy, 1976) citado por Teixeira (2007),

culturais, sociais e ou ambientais (Collins, 1975) in Teixeira (2007) ou na experiência e

aprendizagem (Provins, 1997) in Teixeira (2007). Segundo Porac et al.(1980) in Teixeira

(2007) a lateralidade humana é um fenômeno multifatorial e o comportamento da preferência

lateral surge de uma variedade de mecanismos.

A preferência manual é definida pelo uso preferido ou escolha de uma mão em

situações em que apenas uma delas pode ser utilizada para determinada tarefa, segundo Porac

& Coren, (1981), citados por Vasconcelos (2006).

Segundo Teixeira (2006), a lateralidade é um componente multidimensional

(caracterizada na variação de direção e força da preferência lateral – manuais, podais, oculares

e auriculares) e dinâmico (mudança na magnitude e da congruência entre as diferentes

dimensões) do comportamento motor.

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As assimetrias laterais se manifestam durante o desenvolvimento motor, e são

identificadas através dos movimentos mais freqüentes (para um dos lados do corpo) realizados

pelos bebês. A preferência lateral vai se diferenciando ao longo do desenvolvimento

gradualmente para todos os aspectos (podal, manual, auricular e ocular).

Na análise do comportamento motor o foco é a qualidade de controle dos

movimentos, e neste também têm sido encontradas assimetrias laterais de desempenho no

desenvolvimento precocemente no desenvolvimento motor. Os estudos feitos por Teixeira e

Gasparetto (2002) in Teixeira (2006), sobre analise de precisão apontam um paradoxo no

desenvolvimento da lateralidade humana, pois temos assimetrias laterais de preferência bem

definidas (levando ao uso mais freqüente dos membros bem definidos), existem mecanismos

que previnem um desenvolvimento motor estritamente assimétrico (unilateral) conforme as

habilidades motoras são praticadas apenas com o lado preferido. Ao se adquirir proficiência em

uma tarefa motora particular com um segmento corporal, o desempenho com o membro

contralateral homólogo melhora também. Essa parece ser uma propriedade geral de

desenvolvimento da lateralidade humana que é válida tanto para as habilidades motoras finas

quanto padrões globais de movimentos.

Assim podemos verificar que existem diferenças entre formas de assimetria lateral nas

várias tarefas motoras que alguém é capaz de realizar. Essa diversidade pode ser manifestada

pela variabilidade na magnitude das diferenças de desempenho entre os lados preferidos e não-

preferidos consistência na direção da assimetria e padrão de desenvolvimento durante o ciclo

da vida.

Porac, Coren & Searleman (1986) in Teixeira (2006) realizou um estudo onde 11%

dos participantes experimentaram uma mudança de preferência lateral esquerda para a direita,

esta ocorrendo antes dos oito anos de idade e foi mais evidente na escrita. Os fatores

ambientais também colaboram na formação ou na reversão de preferências laterais.

Contudo pode se dizer que não um único fator que é responsável pela lateralidade,

para cada dimensão dela existe uma força específica de preferência lateral, por isso que pode

ser considerado um aspecto multidimensional da motricidade humana.

Assim o objetivo deste trabalho foi verificar alterações de preferência manual e podal

em crianças no início da vida escolar 1ª série, e após quatro anos da mesma, 4ª série, além de

investigar a relação entre estes duas preferências em meninos e meninas.

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Método

Sujeitos

Participaram da pesquisa 20 crianças de ambos os sexos, de uma escola pública da

cidade de São Paulo, com idades entre 06 e 10 anos, sendo 10 crianças da 1ª série do ensino

fundamental (com média de idade de 7,3 anos e DP= 0,48) sendo cinco meninas e cinco

meninos e 10 crianças da 4ª série do ensino fundamental (com média de idade de 10,5 anos e

DP= 0,53) sendo quatro meninas e seis meninos.

Instrumentos e tarefas

Foi verificada a preferência manual através da escrita e de um inventário adaptado de

preferência manual de Edimburgo (Oldfield, 1971; in Teixeira, 2006). Para preferência podal

as tarefas selecionadas para avaliação foram aquelas que pudessem caracterizar bem as

condições de estabilização e mobilização realizada por Teixeira (2007). As tarefas de

estabilização foram as seguintes: equilibrar-se em um dos pés sobre uma medicine-ball de 3 kg,

saltar o mais distante possível a partir de uma marca pré-estabelecida (salto em distância) e

ultrapassar um obstáculo fixo de 30 cm de altura. As tarefas de mobilização geral foram as

seguintes: desenhar um circulo no chão com a ponta de um dos pés, esmagar um inseto fictício

com um dos pés e trazer uma bola-de-gude para junto de si com um dos pés. As tarefas de

mobilização específicas do futebol foram as seguintes: conduzir a bola de futebol empregando-

se apenas um dos pés para tocá-la através de uma distância de 2 m, amortecer uma bola lançada

em sua direção empregando apenas um dos pés e chutar a bola de futebol na direção do

experimentador, que ficará posicionado a 5m de distância da criança. Cada tarefa será

executada quatro vezes, registrando-se a perna empregada em cada tentativa.

Procedimentos

A pesquisa só foi iniciada após a entrega do termo de consentimento livre e

esclarecido assinado pelo responsável das crianças que participaram da pesquisa. Os sujeitos

inicialmente responderam o Inventário de Dominância Lateral de Edimburgo adaptado, e em

seguida foi iniciado o teste nas tarefas podais. A execução de cada tarefa foi precedida por

explicações e demonstração por parte do experimentador, sem tentativas para familiarização

com a tarefa, e sem tempo de descanso entre as tentativas.

Inicialmente foi avaliada a preferência podal nas tarefas selecionadas exigindo o uso de um dos

pés para a execução. As crianças foram avaliadas uma a uma e realizavam as tarefas em forma

de circuito, que foi iniciado com a execução das seguintes tarefas: (1) estabilização, (2)

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mobilização geral e (3) mobilização específica do futebol. As crianças repetiram 4 vezes o

circuito, sem qualquer orientação sobre a perna a ser empregada, e o experimentador registrou

a perna usada em cada tentativa.

Análise de resultado

Para análise dos dados de preferência, inicialmente foi feita a estimativa de

preferência podal. Foi atribuída para cada uma das nove tarefas uma pontuação de 1 a 5, sendo

atribuído escore 1 para quatro execuções com a perna esquerda, indicando preferência podal

esquerda consistente; escore 2 para três execuções com a perna esquerda e uma com a direita,

indicando preferência podal esquerda inconsistente; escore 3 para duas execuções com cada

perna, indicando preferência podal indefinida; escore 4 para três execuções com a perna direita

e uma com a esquerda, indicando preferência podal direita inconsistente; e escore 5 para quatro

execuções com a perna direita, indicando preferência podal direita consistente. A análise da

preferência podal foi conduzida com base nas médias dos escores obtidos nas quatro execuções

em cada uma das três tarefas de que era composta cada uma das categorias de tarefas podais

selecionadas, isto é, estabilização, mobilização geral e específica. Para a comparação dos

resultados, usou-se o teste de Mann-Whitney, que segundo Conover (1980), abrange as

necessidades características desta amostragem, como o baixo número de participantes, o grande

volume de repetições de resultados e por serem amostras independentes.

Resultados

Na Figura 1 indica que para tarefas podais tanto alunos da 1ª quanto da 4ª série tem

preferência destra, apesar da preferência da 1ª série ser mais forte pelo escore apresentado. O

grupo da 4ª série obteve valores mais baixos nas tarefas pelo uso inconsistente da perna de

preferência, o que não ocorreu muito na 1ª série, onde o uso da perna preferida foi mais

constante, no caso a perna direita. A 1ª série também apresentou uma preferência mais forte

destra do que a 4ª série. Isso pode ser melhor visualizado através da figura abaixo, onde a

preferência manual apresenta uma grande diferença entre as séries. Já a preferência podal

apresenta uma diferença, porém menor, em relação à preferência manual.

O teste de Mann-Whitney mostrou diferenças significativas entre a 1ª e 4ª série, onde

para preferência manual e preferência podal a 1ª série tem maior tendência destra em relação a

4ª série (T(1,96)= 1,97, p < 0,05). Ao comparar somente a preferência manual a 1ª série

também tem maior tendência à destreza comparada com a 4ª série (T(1,96)= 2,00, p < 0,05).

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Nas tarefas podais, sendo analisadas juntas, também houve diferença significativa (T(1,96)=

1,97, p < 0,05).

Analisado os testes podais isolados, estes apresentaram as maiores diferenças

significativas entre a 1ª série e a 4ª série, na tarefa de estabilização (T(1,96)= 1,99, p < 0,05),

para mobilização geral (T(1,96)= 2,10, p < 0,05) e para mobilização específica (T(1,96)= 2,19,

p < 0,05). Sendo a 1ª série mais destra que a 4ª série nas três tarefas podais.

0

1

2

3

4

5

manual podal

Esco

re m

édio

das

tare

fas d

e pr

efer

ênci

a la

tera

l (m

anua

l+po

dal )

1ª série

4ª série

Figura 1 - Comparação das médias dos escores de preferência lateral (manual e podal) da

amostra entre as classes de 1ª e 4ª série.

0%

20%

40%

60%

80%

100%

1 2 3 4 5

Escores de preferência lateral (manual+podal)

Freq

uênc

ia R

elat

iva

1ª série4ª série

Figura 2 - Comparação da distribuição de freqüência das amostras dos alunos de 1ª e 4ª série

segundo o nível de preferência lateral.

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A freqüência relativa de distribuição da amostra pelos escores de classificação de

preferência lateral mostra a maior distribuição de indivíduos da 4ª série pelas categorias. 30%

dos indivíduos da 4ª série estão divididos nas categorias 1, 2 e 3 (10% em cada), 40% na

categoria 4 e 30% na categoria 5. Já a 1ª série não tem indivíduos nas categorias 1, 2 e 3, na

categoria 4 30% dos indivíduos e na categoria 5 70% dos indivíduos, como apontado Na Figura

2. Assim é possível verificar os baixos valores escores nas médias gerais de preferências

manual e podal.

Em sua maioria, como é possível verificar Na Figura 3, a amostra apresenta um grande

número de destros (90% da 1ª série e 70% da 4ª série), apenas 10% de canhotos na 4ª série e

nenhum na 1ª série. Nesta amostra temos dois casos de preferência cruzada, onde é

representado por 10% na 4ª série (uso da mão esquerda e perna direita) e 10% na 1ª série (uso

da mão direita e perna esquerda), e apenas 1 caso de preferência indefinida, representando 10%

da amostra da 4ª série.

É possível também fazer comparações entre os sexos. Nesta amostra havia 11 meninos

(cinco da 1ª série e 6 da 4ª série) e 9 meninas (cinco da 1ª série e quatro da 4ª série).

0%

20%

40%

60%

80%

100%

PreferênciaD

PreferênciaE

PreferênciaCruzada

PreferênciaIndefinida

Freq

uênc

ia R

elat

iva

1ª série4ª série

Figura 3 - Comparação distribuição de freqüências relativas na amostra dos alunos da 1ª série e

a distribuição de freqüências relativas na amostra dos alunos da 4ª série segundo a preferência

lateral (média dos escores de preferência manual e podal).

Apesar da diferença não significativa, as meninas tanto da 1ª quanto da 4ª série tem

escores maiores do que os meninos da mesma série, mostrando uma maior tendência de

destreza por parte das meninas em relação aos meninos apontada no na Figura 5. Na 1ª série as

meninas têm um escore médio de 4,71, enquanto os meninos têm um escore médio de 4,13.

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Para a 4ª série os escores são menores, mas mesmo assim as meninas têm um escore de 3,91,

maior que o dos meninos 3,55.

1

2

3

4

5

masculino femininoEsco

re m

édio

das

tare

fas

de

pref

erên

cia

late

ral (

man

ual +

pod

a

1 série4 série

Figura 4 - Comparação de preferência lateral (preferência manual e podal) entre as séries com

relação aos sexos (média dos escores de meninas e meninos).

0%

20%

40%

60%

80%

100%

1 2 3 4 5Escores de preferência lateral (manual+podal)

Freq

uênc

ia R

elat

iva

Mascilino

Feminino

Figura 5 - Comparação distribuição de freqüências relativas na amostra dos alunos do sexo

masculino e feminino segundo a categoria de preferência lateral (média dos escores de

preferência manual e podal).

Na Figura 5 nota-se que a maior distribuição dos meninos pelas categorias de escores

explicando o baixo valor do escore médio dos meninos em relação às meninas que estão mais

concentradas em poucas categorias. Dentre os meninos 9% estão na categoria 1; nenhum na

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categoria 2; 9% na categoria 3; 46% na categoria 4; e 36% na categoria 5. As meninas

nenhuma na categoria 1; 11% na categoria 2; nenhuma na categoria 3; 22% na categoria 4 e

67% na categoria 5.

0%

20%

40%

60%

80%

100%

PreferênciaD

PreferênciaE

PreferênciaCruzada

PreferênciaIndefinida

Freq

uênc

ia R

elat

iva

MasculinoFeminino

Figura 6 - Comparação distribuição de freqüências relativas na amostra combinada (1ª e 4ª

série) dos meninos e meninas segundo a preferência lateral (média dos escores de preferência

manual e podal).

Como na Figura 3, a Figura 6 tem a maior concentração dos indivíduos para a

preferência destra (73% dos meninos e 89% das meninas), na preferência esquerda apenas 9%

dos meninos e nenhuma das meninas; para preferência cruzada 9%dos meninos e 11%das

meninas; e para preferência indefinida apenas 9% dos meninos.

Discussão

Como mostrou os resultados acima os participantes desta pesquisa apresentam, em sua

maioria uma tendência destra. Essa tendência é maior nas meninas do que nos meninos. Os

resultados também indicaram que as crianças da 1ª série apresentam maior destreza comparada

com a 4ª série, ou seja, quanto menor a idade maior a destreza.

Na pesquisa de Bobbio et al.(2005), a maioria das crianças apresentou maior tendência

à preferência direita tanto manual como podal, poucos casos de preferência esquerda e

inconstante, eles atribuem isso ao fato pode ser explicado pela influência cultural, pois durante

anos os canhotos foram considerados menos capazes e habilidosos por serem diferentes da

maioria. A pouca habilidade deve-se ao fato de que o sistema de letras e outros aspectos da

escrita foram criados para pessoas destras. A dominância à direita é mais fortemente

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estabelecida que à esquerda. Quando comparadas às preferências de manual e podal, Bobbio et

al.(2005) verificou que os indivíduos manualmente destros têm maior incidência de

dominância lateral homogênea, sendo assim com preferência destra também podal. A

freqüência de indivíduos com dominância cruzada é maior entre aqueles com preferência

manual esquerda.

Pode-se constatar a semelhança dos resultados encontrados nesta pesquisa com a de

Bobbio et al., já que a maior parte da amostra apresentou preferência destra (90% na 1ª série e

70% na 4ª série), e poucos casos de preferência esquerda (nenhuma na 1ª série e 10% na 4ª

série), indefinida (nenhuma na 1ª série e 10% na 4ª série) e cruzada (10% na 1ª série e 10% na

4ª série). Essa preferência é apresentada tanto paro o uso da mão como o do pé.

Pacher e Fischer (2003) citam que pesquisas apontam que, aproximadamente, 98% da

população, incluindo nessa percentagem pelo menos a metade dos sinistros, têm dominância do

hemisfério esquerdo. Como conseqüência, são poucos os casos de sinistros ou de dominância

cerebral direita.

A determinação da lateralidade com preferência canhota no sexo masculino é baseada

em duas teorias vigentes: a primeira é a genética, inicialmente defendida por Annett (1978) in

Bobbio et al.(2005), que diz existir uma estruturação inata e hereditária do sistema nervoso, o

que sugere uma assimetria funcional já estabelecida ao nascimento e que se manifesta em

determinada idade, mantendo-se constante por toda a vida. A outra teoria é comportamental,

que explica a determinação da preferência por influência do meio em que o indivíduo vive e

por imitação social. A preferência parece ser determinada no início geneticamente, porém mais

tarde essa assimetria aumenta consistentemente, sofrendo influências do meio, o que sugere

que a lateralidade é multicausal e se desenvolve por mecanismos variados. Aspectos religiosos,

pressões culturais e escolares e influências sociais estabelecidas no passado parecem contribuir

para o grande número de indivíduos adultos destros, uma vez que os canhotos seriam

considerados inferiormente capazes.

Para Bueno (1998) in Torrezan et al.(2004), com relação a esta preferência ser direito

ou esquerdo, algum trabalho, como os divulgados pela Academia Nacional de Ciências dos

Estados Unidos, concluíram que a testosterona, o hormônio que produz a maior diferença entre

os sexos, pode ser uma das causas da preferência lateral esquerda. Talvez este seja o motivo de

haver maior número de homens sinistros que mulheres, e também estudos citados por Eckert

(1993) in Torrezan et al.(2004), em que os meninos podem ser mais freqüentemente sinistros

que o sexo oposto por serem menos responsáveis e/ou menos sujeitos ao treinamento social. No

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estudo realizado por Torrezan et al.(2004), verificou-se que entre os 47 sujeitos, 44 são destros

e 3 sinistros, sendo os sinistros especificamente do sexo masculino.

Talvez por esses indícios citados no trabalho de Torrezan et a, meninos apresentaram

maior tendência canhota (9%) e cruzada (11%) em relação às meninas que não apresentaram

preferência canhota e menor incidência de preferência cruzada(9%).

Quando se fala em lateralidade cruzada, refere-se aos indivíduos que nascem com

potencial para ser sinistro, Pacher e Fischer (2003), consideram que em virtude da pressão

exercida sobre ele, acaba utilizando a mão direita. Assim, esse indivíduo sinistro contrariado

acaba tendo sua lateralidade cruzada.

Estudos científicos mostram que o cérebro humano está continuamente fortificando ou

enfraquecendo suas conexões conforme a experiência, graças a uma propriedade que está

permanentemente ativa em cada neurônio. É a plasticidade neural que confere ao cérebro a

habilidade para assumir funções específicas como resultado da experiência, ou seja, os

neurônios podem modificar suas conexões conforme o uso ou o desuso de determinados

circuitos neurais. Assim, é possível testemunhar a recuperação de funções corticais após uma

lesão em determinada área do cérebro pela utilização de áreas corticais adjacentes (Thomas et

al. apud Foz et al., 2001 in Pacher e Fischer, 2003).

Pouco tem se relacionado a preferência manual com a transferência bilateral de

aprendizagem. Parece que, nos indivíduos que tem preferência manual esquerda e nos

indivíduos de preferência mista, adultos, o corpo caloso apresenta um maior número de fibras

conectando os dois hemisférios, relativamente à preferência manual direita. Assim, os dois

primeiros grupos, segundo Dimond e Beaumont (1972) in Vasconcelos (2006), possuem uma

integração sensorial inter-hemisférica superior relativamente ao último grupo, traduzindo-se

numa maior capacidade de transferência bilateral de aprendizagem (Moffat et al.1998 in

Vasconcelos 2006).

A plasticidade cerebral pode explicar a variação de preferência lateral entre a 1ª e a 4ª

série, já que o aumento da idade indicaria uma preferência destra mais forte. Essa mudança

pode ter ocorrido em função da imposição cultural, ambiental e/ou social.

Com o avanço da idade, há um acréscimo em favor do lado direito no grau de

preferência manual e podálica somente em destros. Nos estudos de Paixão (2002), houve um

decréscimo nas diferenças entre as mãos ao longo da idade e essa tendência foi restrita aos

destros. Entre os canhotos, não foi encontrada qualquer tendência unilinear através das idades

nos padrões de preferência laterais nem no desempenho no teste de proficiência. Além disso,

mais de 50% dos canhotos idosos sofreram pressões contra suas preferências esquerdas e

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destes, quase 35% adotaram a mão direita para escrever. Seria plausível atribuir o aumento no

grau de preferências destras à teoria de desenvolvimento enfatizando os efeitos cumulativos

decorrentes da convivência num mundo orientado para o lado direito.

Simões, Moreira, e Gobbi (2004), os resultados revelaram que as maiorias das

crianças têm preferência lateral direita para grande parte das tarefas em todas as idades, com

percentuais maiores nas idades mais avançadas. No total, as crianças evidenciaram tendências

para a direita sendo 60% para preferência de olho, 97% para preferência de mão e 87,5% para

preferência de pé. Observando a grande quantidade de crianças com preferência manual direita,

pode-se ressaltar a influência de fatores sociais, como a escola, na definição da lateralidade

nessa faixa etária, considerando a realização de tarefas como desenhar e escrever. Para as

demais modalidades, fatores genéticos e evolutivos apresentam-se relevantes.

Existem influências que hoje não são mais freqüentes, por exemplo, na escola não há a

imposição do uso da mão direita, pelo contrário, o PCN (Parâmetros Curriculares Nacional)

coloca que deve ser a lateralidade nas crianças, possibilitando o maior número de vivencias

possíveis e sempre respeitando as preferências da criança. Mas na sociedade ainda existe

instrumentos e objetos criados apenas para destros.

Teixeira & Okazaki (2007) acreditam que um componente importante que define a

preferência manual é uma confiança aumentada numa única mão desenvolvida pela história

recente de uso diferencial dos membros numa tarefa motora. Nesta conceitualização, um

indivíduo torna-se mais confiante nessa mão usada mais freqüentemente em oportunidades

prévias de executar uma tarefa motora. Esta confiança aumentada influenciaria a escolha da

mão executar as tarefas práticas e tarefas motoras relacionadas em exemplos futuros.

Conclusão

Com base nos resultados pode-se afirmar que houve alteração da preferência lateral da

1ª para a 4ª série, 1ª série tem a preferência lateral destra mais forte que a 4ª série, este

acontecimento vai contra os estudos que dizem que o aumento da idade faz com que os

indivíduos tenham maior preferência destra. Isto pode ter ocorrido pelo fato da amostra não ser

uma parte representativa da população, ou ao fato de se ter poucos indivíduos. Apesar de a

amostra apresentar um grande número de destros, assim como acontece na população em geral.

Em relação ao sexo, os meninos têm maior tendência à preferência manual esquerda,

cruzada e indefinida em relação às meninas, provavelmente por influência dos níveis de

testosterona, como sugere alguns estudos citados na pesquisa. Com tudo, é necessário que se

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realize estudos longitudinais com amostras representativas da população para averiguar mais

profundamente estes resultados.

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Capítulo 4

Multidimensionalidade das preferências laterais na infância

Autor: Ricardo Costa de Cerqueira

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O objetivo do presente estudo foi descrever preferências laterais sensoriais e motoras em crianças, comparando as medidas entre idades e gêneros. Participaram do estudo 46 crianças, sendo 20 do sexo masculino e 26 do sexo feminino, com idades compreendidas entre 4 a 6 anos. O experimento foi conduzido por meio de tarefas que envolvem os aspectos multidimensionais da preferência lateral em que pudessem ser apurados os seguintes aspectos: auricularidade, ocularidade, podalidade, manualidade. Para cada dimensão da lateralidade foram realizadas tarefas específicas (auricular 2 tarefas, manual 4 tarefas, ocular 2 tarefas e podal 4 tarefas), para verificar a preferência lateral em cada uma delas. A análise dos dados foi realizada por meio do cálculo das médias obtidas pelos indivíduos descrevendo a preferência lateral de acordo com a pontuação obtida em 4 tentativas. Os resultados indicaram o seguinte: a) preferências são consistentes apenas para a dimensão manual, enquanto que nas outras dimensões, são demonstrados aumentos gradativos em direção a congruência entre pelo menos dois aspectos dimensionais da lateralidade; b) similaridade entre meninos e meninas aos 6 anos de idade apesar de flutuações nas idades anteriores; c) ausência de preferência podal para ambos os sexos. Esses resultados sugerem que os aspectos multidimensionais podem ser identificados e variados por fatores relacionados ao desenvolvimento motor, que promove diferentes linearidades direcionais devido a aspectos ambientais relacionados à tarefa, ao indivíduo e a prática.

Termos-chave: preferência lateral, crianças, dimensões da lateralidade.

Introdução

Preferências laterais e assimetrias de desempenho apresentam-se claramente nos seres

vivos aos quais diferentes parâmetros são instituídos para a explanação destes conceitos. Se por

um lado a preferência lateral corresponde à predisposição em escolher membros ou órgãos

sensoriais de um lado ou de outro do corpo em diferentes tarefas, a qual pode ser quantificada

através de observação comportamental ou de inventários. Por outro lado, as assimetrias de

desempenho são específicas à tarefa motora.

Há baixa correlação entre os índices de preferência lateral e o índice de assimetria de

desempenho através das idades. Esse achado é consistente com resultados de pesquisas prévias

com adultos (Teixeira & Paroli, 2000), e indica que assimetrias de desempenho e de

preferência constituem dois fatores independentes da lateralidade humana. Provins (1997)

sugeriu que o aumento de confiança no uso de uma das mãos devido ao seu uso mais freqüente

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em tarefas cotidianas pode ter um efeito generalizante. Quanto mais proficiência é adquirida

com a mão preferida em habilidades motoras familiares, pode-se ter maior confiança na

capacidade de desempenho superior com essa mão em qualquer outra tarefa motora,

independentemente da similaridade entre a nova tarefa e aquelas já praticadas. Quando o

desempenho em tarefas motoras novas é considerado, entretanto, a maior confiança no lado

preferido não é acompanhada por correspondente superioridade de desempenho com aquele

lado. A conseqüência desse processo é o estabelecimento de uma preferência lateral bem

definida, ao menos para tarefas manuais, enquanto assimetrias de desempenho são específicas à

tarefa e possivelmente resultantes da quantidade diferencial de prática entre os dois lados do

corpo (Teixeira & Gasparetto, 2002)

Sobre a assimetria lateral temos que a associação e o estabelecimento da dominância de

um hemisfério cerebral sobre o outro foi estudada por Segalowitz e Berge (1995), que

agruparam alguns modelos conceituais em categorias: dominância simples, dominância

exclusiva e dominância complementar. A dominância simples implica que um dos hemisférios

cerebrais é mais competente para realizar uma dada função, e essa vantagem faz com que esse

hemisfério melhor qualificado assuma a responsabilidade de controle, inibindo as unidades

neurais homólogas no hemisfério contrário. Isso não significa, entretanto, que o hemisfério

não-dominante seja incapaz de desempenhar tal função.

Na dominância exclusiva assume-se que apenas um dos hemisférios cerebrais possui as

informações necessárias para o desempenho de uma função, de maneira que esse hemisfério

necessita assumir obrigatoriamente as responsabilidades de controle. E na dominância

complementar é proposto que ambos os hemisférios cerebrais possuem papeis críticos, porém

altamente diferenciados no gerenciamento de funções de controle. Enquanto um hemisfério

desempenha determinada função o hemisfério contralateral processa em paralelo, informações

relacionadas a outras funções também igualmente importantes para se alcançar o objetivo.

Baseando-se nestes modelos conceituais e nas evidências empíricas, podemos estabelecer

nos seres humanos é comum que exista preferência definida por um dos olhos, um dos ouvidos,

uma das mãos e um dos pés (funções sensório-motoras). Essas preferências são identificadas na

área do comportamento motor como aspectos multidimensionais das preferências laterais

humana que são respectivamente: ocularidade, auricularidade, manualidade e podalidade

(Teixeira, 2006).

Como citado anteriormente, assimetrias laterais no comportamento motor humano estão

presentes tanto na preferência quanto no nível de desempenho apresentado com segmentos

corporais de ambos os lados (Teixeira, 2000). Tais assimetrias podem ser observadas logo nas

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primeiras semanas de vida, através de movimentos direcionais da cabeça orientados

predominantemente para o lado direito do corpo em crianças descendentes de pais com

preferência lateral direita (Cioni & Pellegrinetti; Liederman & Kinsbourne, citados por

Teixeira, 2000), assim como no maior uso da mão direita em movimentos habituais após 6

meses de vida (Provins, Dalziel, & Higginbottom, citados por Teixeira 2000).

Uma possível explicação para a origem da assimetria de desempenho é que ela é o

resultado de disposições genéticas que se manifestam ao longo do processo de

desenvolvimento. Dominância lateral é uma propriedade que está inserida no código genético,

a qual é transmitida de geração a geração. A lateralidade, assim, seria muito pouco influenciada

por fatores ambientais, a menos que lesões sérias e de longa duração ocorressem no sistema

neuromuscular dominante (Bryden, 1990). Uma explicação alternativa é que as assimetrias

laterais são produzidas como resultado da história de vida de um indivíduo. Se existem

influências genéticas sobre este fator elas não são fortes o suficiente para superar a força dos

eventos ambientais. O estabelecimento precoce de preferência lateral leva o indivíduo a ter

quantidades diferentes de experiências entre os dois lados do corpo, gerando ganhos

diferenciais de competência no uso dos sistemas sensorial, motor e muscular. Em outras

palavras, assimetrias laterais de desempenho têm sido concebidas como específicas à tarefa

(Provins, 1997). Resultados de pesquisa têm dado suporte à segunda proposição (Teixeira &

Gasparetto, 2002).

Assimetrias de desempenho, entretanto, parecem ser específicas à tarefa, ou talvez a

categorias ainda não identificadas de habilidades motoras. Tal especificidade pode ser devida a

diferentes fatores, como quantidade de prática prévia com cada segmento corporal, funções de

controle exigidas no desempenho da ação motora, assim como a complexidade de movimentos

(Teixeira & Gasparetto, 2002).

Assimetrias laterais de preferência manifestam-se precocemente durante o

desenvolvimento motor e são identificadas em bebês por meio de movimentos mais freqüentes

para um dos lados do corpo ou com um dos segmentos corporais. Este comportamento motor

assimétrico tem sido detectado já com poucos dias de vida em movimentos de orientação da

cabeça (Teixeira, 2006).

Ao mesmo tempo em que seres humanos são caracterizados por possuir assimetrias

laterais de preferência bem-definidas, o que leva ao uso mais freqüente dos 17 membros

preferidos, existem mecanismos que previnem um desenvolvimento motor estritamente

assimétrico (unilateral) conforme as habilidades motoras são praticadas apenas com o lado

preferido do corpo. Quando se adquire proficiência em uma tarefa motora particular com um

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segmento corporal o desempenho com o membro contralateral homólogo melhora também.

Essa parece ser uma propriedade geral de desenvolvimento motor, a qual é válida tanto para

habilidades motoras simples quanto para padrões globais de movimento (Teixeira &

Gasparetto, 2002).

Desde a psicologia atual e mais concretamente desde o modelo comportamental do

âmbito do controle e da aprendizagem motora (Bilbao & Oña, 2000), se considera que a

dominância lateral é fundamentalmente, um produto da aprendizagem. Porém, cada

comportamento tem suas características próprias e se movem em diferentes dimensões,

ocorrendo prevalência lateral em apenas uma delas. Por conta disso, a lateralização é um

processo complexo, não é única e nem fixa, que se define por distintas dimensões segundo o

comportamento estudado.

Outro ponto a ser destacado é a congruência de preferência lateral entre as dimensões,

ou seja, a preferência pelo mesmo lado do corpo para diferentes dimensões da lateralidade,

como, por exemplo, quando há preferência geral pelo lado direito do corpo para realizar tarefas

manuais e podais. Por outro lado, são bastante conhecidos, em particular, os casos de pessoas

com preferência por um lado para tarefas manuais e por outro lado para tarefas podais, o que é

denominada de preferência cruzada. Estudos têm indicado que a proporção de indivíduos

adultos normais com preferência mão-pé cruzada é de aproximadamente 4% para destros e de

36% para canhotos conforme resultados do estudo de Plato et al. (citado por Teixeira, 2006).

Esses achados sugerem que a lateralidade é um aspecto multidimensional da

motricidade humana, não apenas devido as suas muitas dimensões (auricular, manual, ocular e

podal) e incongruências entre elas, mas também devido à inconsistência de preferência lateral

dentro de cada dimensão.

Baseando-se principalmente em estudos longitudinais sobre preferência lateral e nas

discussões acerca da assimetria lateral, propomos como objetivo deste estudo: a) verificar a

relação dos aspectos multidimensionais das preferências laterais; e b) averiguar a existência de

congruência entre as dimensões das preferências laterais.

Método

Participantes

Participaram do estudo 46 crianças na faixa etária de 4 a 6 anos de idade de ambos os

sexos, sendo 20 participantes do sexo masculino e 26 participantes do sexo feminino, todos

matriculados no Colégio Ítalo Brasileiro localizado na cidade de São Paulo. Os responsáveis

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pelas crianças assinaram um formulário de consentimento, no qual foram descritos os

procedimentos experimentais.

Instrumento e tarefa

Para verificação da preferência lateral foram realizadas tarefas em cada uma das

dimensões de lateralidade: auricular, manual, ocular e podal. Cada tarefa foi executada 4 vezes,

sendo que antes da primeira tentativa ocorreu a apresentação e o detalhamento da tarefa aos

indivíduos separadamente, registrando-se então a preferência do membro na execução da

tarefa.

A seqüência da realização da tarefa era a mesma para todos os indivíduos, divididas em

4 dias, sendo que cada dia era reservado para uma variável. As tarefas foram organizadas da

seguinte forma: 1º dia (tarefas auriculares), 2º dia (tarefas manipulativas), 3º dia (tarefas

oculares) e 4 º dia (tarefas podais). Sendo respectivamente:

AT1 – atender o celular, registrando-se o lado preferido para ouvir;

AT2 – ouvir um som atrás de uma porta com a utilização de um copo, registrando-se a orelha

preferida;

MT1 – desenhar em uma folha de papel, registrando-se o seguimento utilizado para a execução

da tarefa;

MT2 – arremessar uma bola o mais longe possível, registrando o segmento utilizado para o

arremesso;

MT3 – recortar uma figura utilizando uma tesoura sem ponta, registrando-se o segmento

utilizado no manuseio da tesoura;

MT4 – rebater uma bola de tênis utilizando uma raquete, registrando-se o segmento utilizado

para manuseio da raquete.

OT1 – olhar pelo orifício de uma fechadura com um dos olhos, registrando-se o olho utilizado

para a tarefa;

OT2 – focar um objeto com um dos olhos utilizando uma luneta, registrando-se o olho utilizado

para focar o objeto;

PT1 – realizar um chute o mais forte possível com apenas um dos pés, registrando-se o pé que

realizou o chute;

PT2 – equilibrar-se com apenas um dos pés o maior tempo possível, registrando-se o pé de

suporte para o equilíbrio;

PT3 – realização de saltos em um tanque de areia, anotando o pé de apoio para o salto;

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PT4 – simular o “esmagamento” de um inseto (desenhado no chão), anotando qual pé foi

utilizado na tarefa.

Procedimentos

Os participantes receberam instruções sobre as tarefas do dia. As tarefas foram realizadas

em quatro dias, um dia para verificar cada dimensão, no primeiro dia foram realizadas as duas

tarefas de auricularidade, no segundo dia foram realizadas as quatro tarefas de manualidade, no

terceiro dia foram realizadas as duas tarefas de ocularidade e no quarto dia foram realizadas as

quatro tarefas de podalidade. As coletas foram feitas no período da manha e da tarde em cada

dia de coleta visto que os estudantes estão divididos nos dois períodos.

Cada participante realizava quatro tentativas em cada tarefa, sendo que o intervalo entre

as tentativas era de aproximadamente 10s. O registro foi realizado por meio da observação da

freqüência efetiva de uso do segmento utilizado para a execução da tarefa, e quando foi exigida

a manipulação de um material por parte do participante, este se encontrava disposto

inicialmente em linha com o eixo sagital mediano, e oferecido ao indivíduo avaliado à mesma

distância entre as mãos ou pés direito e esquerdo.

Análise dos dados

Para avaliar a preferência lateral em cada tarefa e em todas as dimensões da lateralidade

foi elaborado o seguinte escore: 4d = 5; 3d = 4; 2d/2e = 3; 3e = 2; 4e = 1, onde 4d as quatro

tentativas foram realizadas com o membro direito; 3d das quatro tentativas três foram

realizadas com o membro direito e apenas uma com o membro esquerdo; 2d/2e das quatro

tentativas foram realizadas duas com cada um dos membros; 3e das quatro tentativas três foram

realizadas com o membro esquerdo e apenas uma com o membro direito e 4e as quatro

tentativas foram realizadas com o membro esquerdo. Depois foram calculadas as médias

individuais para cada dimensão da lateralidade, ou seja, médias próximas de cinco preferência

lateral direta, médias próximas de três não há preferência lateral e médias próximas de 1

significa preferência lateral esquerda.

Resultados

A análise das preferências laterais foi realizada por meio das médias dos grupos,

comparando idade e sexo em cada dimensão da lateralidade que são apresentados na Figura 1.

A seguir, apresentamos os resultados obtidos para cada dimensão de preferência lateral:

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Auricular: os resultados apontam que os meninos de 4 e 5 anos de idade apresentam

preferência pelo ouvido direito na tarefa de ouvir, enquanto que os meninos de 6 anos de idade,

não apresentam preferência lateral para esta dimensão, apesar dos escores se apresentarem na

mediana entre a preferência lateral direita e a não preferência por um dos lados. Por outro lado,

meninas apresentam graduação crescente que dos 4 a 5 anos indicam não apresentar

preferências laterais na tarefa de ouvir, porém com 6 anos existe uma tendência para a

preferência auricular direita. Quando comparados meninos e meninas, observamos que aos 6

anos de idade para ambos certa tendência na aproximação dos escores sugerindo que apesar da

crescente preferência auricular direita aos 5 anos de idade, ocorre um nivelamento aos 6 anos

para ambos.

Manual: de forma geral, a comparação entre meninos e meninas nas diferentes faixas

etárias sugere forte preferência manual direita, principalmente para os meninos de 4 anos e

meninas de 6 anos de idade, demonstrando preferência direita nas tarefas propostas. Algo

curioso é que a preferência direita nestas tarefas é decrescente para os meninos na medida em

que se aumenta a faixa etária, ocorrendo o inverso para as meninas.

Ocular: Para os meninos da faixa etária de 5 a 6 anos, foi verificado a inexistência de

preferência lateral para esta dimensão, o que curiosamente não ocorreu para os meninos de 4

anos de idade que já apresentaram preferência ocular direita para as tarefas. Por outro lado,

meninas de 4 a 5 anos de idade não apresentam preferência ocular, mas aos 6 anos apresentam

escores elevando-se a preferência ocular direita para estas tarefas. A comparação entre os dois

gêneros sugere que apesar da diferença significante aos 4 anos de idade, escores similares

apresentaram-se aos 6 anos de idade para ambos destacando decréscimo de preferência para os

meninos e estabilidade para as meninas.

Podal: Os resultados para a dimensão podal sugerem que em ambos os sexos é notável

certa ausência de preferência podal, porém a mesma se apresenta tendenciosamente para a

direita em ambos o sexo. Vale destacar que ocorre diferença significante principalmente aos 5

anos de idade, quando comparados meninos e meninas, com preferência podal direita para os

meninos e ausência de preferência lateral para as meninas com tendência a preferência direita

nessa faixa etária.

A análise da congruência entre as dimensões da lateralidade são apresentadas na Figura

2. Os resultados indicaram que para esta faixa etária, a amostra em geral não tem preferência

lateral definida. Apenas a dimensão manual encontra-se definida para a direita, enquanto que as

demais dimensões estão próximas do escore 3, o que ausência de preferência lateral. No geral,

os indivíduos não apresentam preferência lateral esquerda para as dimensões avaliadas.

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A análise dos dados nos permite inferir que os aspectos relacionados à preferência lateral

comportam-se de diferentes maneiras, de acordo com o sexo e a idade apesar de serem

consideradas suas associações em detrimento às assimetrias para os diferentes aspectos

dimensionais das preferências laterais na infância.

Figura 1. Médias dos grupos em cada dimensão da lateralidade, M6 (masculino 6 anos); F6 (Feminino 6 anos); M5 (masculino 5 anos); F5 (Feminino 5 anos); M4 (masculino 4 anos) e F4 (Feminino 4 anos).

Um estudo realizado por Porac et al. (citado por Teixeira, 2006), teve como objetivo

identificar as preferências nas diferentes dimensões ao longo da vida, utilizando indivíduos de

diferentes faixas etárias. Os resultados apontaram que as preferências manual e podal, assim

como as preferências oculares e auriculares, são bastante semelhantes aos 10 anos de idade e

que durante o processo de desenvolvimento vão se diferenciando de forma gradual.

Discussão

Os resultados encontrados neste estudo são semelhantes aos de Porac, visto que, apesar

da faixa etária ser compreendida durante a fase pré-escolar, as preferências são consistentes

apenas para a dimensão manual, enquanto que nas outras dimensões, são demonstrados

aumentos gradativos em direção a congruência entre pelo menos dois a três aspectos

dimensionais da lateralidade, que normalmente são decorrentes de ausência de preferência

lateral.

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Figura 2. Média geral para cada dimensão de preferência lateral.

O estudo realizado por Porac identificou ainda que no início da idade adulta já existe uma

clara diferença entre as quatro dimensões, com quase 90% dos indivíduos usando

preferencialmente a mão direita, em contraste com índices de aproximadamente 80%, 70% e

60% de preferência direita, respectivamente para o uso dos pés, dos olhos e dos ouvidos. De

forma geral, a proporção de pessoas com preferência direita aumenta com o passar dos anos

para o uso das mãos, pés e olhos, enquanto para o uso dos ouvidos há aumento da proporção de

indivíduos com preferência pelo lado esquerdo.

Outro estudo que investigou a relação da congruência entre as dimensões da preferência

lateral foi realizado por Longoni e Orsini (1988), em que se aplicaram uma bateria de

desempenho para identificar a preferência da mão, do pé, do olho e da orelha através de uma

amostra de 271 crianças com idade de 4 a 6 anos. A análise da congruência entre os índices

mostrou uma concordância significativa entre o mão-pé e olho-orelha. Nenhuma diferença da

idade ou do sexo foi obtida, indicando que as preferências laterais estão estabelecidas bem na

idade de 6 e que nenhuma associação entre a preferência, o sexo e a lateralidade foram

encontrados. Os achados do presente estudo são similares aos encontrados por Longoni e

Orsini (1988), pois quando realizamos a análise entre as quatro dimensões avaliadas,

percebemos que apesar de não existirem similaridades entre elas, as mesmas seguem uma

tendência pela preferência lateral direita.

O estudo de Ingram (citado por Teixeira, 2001), situa-se entre os achados do presente

estudo, pois ao verificar os mesmos componentes, o autor constatou: a) a existência de

preferência lateral bem definida para movimentos manuais, enquanto as preferências pedais e

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oculares mostraram ser mais fracas; (b) as diferenças entre os índices de preferência lateral

estão estabelecidas já aos quatro anos de idade, e existem apenas flutuações não-significativas

nesses índices até a idade de dez anos; (c) baixa correlação entre os índices de preferência

lateral; e (d) baixa correlação entre o índice de preferência manual e o índice de assimetria

lateral de desempenho. Em suma, esses resultados podem ser identificados por aspectos do

desenvolvimento motor que são conduzidos a diferentes direções devido a aspectos ambientais

relacionados à tarefa.

Além disso, tais assimetrias são estáveis pelo menos durante a segunda metade da

infância (Rigal, 1992). Similar estabilidade de preferência lateral foi observada nos presentes

resultados. Particularmente para o índice de preferência manual, o alto índice de assimetria

lateral observado na idade de quatro anos não deixou muito espaço para incremento nas idades

subseqüentes. Para os índices de preferência ocular e pedal, por outro lado, os baixos valores

observados para a maioria do período infantil sugere que as experiências sensório-motoras

durante essa época não contribuem para gerar uma definição mais nítida da preferência lateral.

Ainda, as baixas correlações entre os índices de preferência lateral indicam que esse é um

componente multidimensional da lateralidade humana, ao invés da expressão de um fator único

(Porac, Coren, Steiger & Duncan, citados por Teixeira, 2002).

Todas as formas de assimetria funcional cometem um baixo grau de correlação.

Entretanto, as duas maiores teorias de desenvolvimento da função lateral lidam com todos os

tipos como sendo relatadas, mas por diferentes significados. A mais popular “teoria invariante

de lateralidade” (ILT) propõe que o funcionamento da lateralidade não desenvolve em grau ou

natureza. Ao invés disso, o hemisfério cerebral é programado (talvez geneticamente) para

funcionar de forma assimétrica, e todas as funções de lateralidade simples refletem a

asssimetria. Esse programa de lateralidade mantem por si mesmo as funções assim como se

inicia para emergir durante o desenvolvimento (Hinojosa, Sheu, Michel, 2003).

A consistência entre tarefas é a análise das preferências laterais para várias tarefas

dentro de uma dimensão particular. Esta variável foi estudada para tarefas manuais por Healey

et al. (citado por Teixeira, 2006). Neste estudo foi identificado grupo de tarefas caracterizadas

por um determinado padrão de preferência lateral. Os resultados indicaram que mesmo em uma

única dimensão da preferência lateral (manualidade) há variação de preferência de acordo com

a particularidade de cada tarefa.

Em suma, esses resultados mostram uma parte do caráter multidimensional da

lateralidade humana e implicam uma propriedade do desenvolvimento motor que promove o

crescimento da assimetria de preferência por causa de aspectos relacionados ao ambiente e a

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tarefa. Porém, parece que cada dimensão lateral deve ser tratada como objetivos independentes

da aprendizagem, pois se torna necessário o pensamento de que existe uma tendência genética-

biológica generalizada para todas as condutas humanas que exigem uma escolha de uma parte

do corpo, com preferência de um lado sobre o outro.

Referências

Longoni A. M. & Orsini L. (1988). Lateral preferences in preschool children: A research note. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 29(4), 533–539.

Bilbao, A. & Oña, A. (2000). La lateralidad motora como habilidad entrenable: Efectos del aprendizaje sobre el cambio de tendencia lateral. Revista Motricidad, 6, 7-27.

Bryden, M.P. (1990). Choosing sides: The left and right of the normal brain. Canadian Psychology, 31(4), 297-309.

Provins, K.A. (1997). Handedness and speech: A critical reappraisal of the role of genetic and environmental factors in the cerebral lateralization of function. Psychological Review, 104(3), 554-571.

Rigal, R. (1992). Which handedness: Preference or performance? Perceptual and Motor Skills, 75, 851-866.

Segalowitz, S.J. & Berge, B.E. (1995). Functional asymmetries in infancy and early childhood: A review of electrophysiologic studies and their implications. In: Davidson, R.J. & Hugdahl, K. (Eds.), Brain asymmetry. Cambridge, MIT Press.

Teixeira, L.A. (2001). Avanços em comportamento motor. Movimento: Rio Claro. Teixeira, L.A. (2006). Controle Motor. Barueri, Manole. Teixeira, L.A. & Gasparetto, E.R. (2002). Lateral asymmetries in the development of the

overarm throw. Journal of Motor Behavior, 34(2), 151-160. Teixeira, L.A. & Paroli, R. (2000) Assimetrias laterais em ações motoras: Preferência versus

desempenho. Motriz, 6(2), 1-8.

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Capítulo 5

Comportamento da coordenação bimanual simultânea em

uma tarefa discreta de controle de força

Autor: Rodrigo Pojar Paiva

Orientadora: Elke dos Santos Lima

Resumo

Coordenar com precisão o movimento voluntário em tarefas bimanuais é uma tarefa complexa, especialmente quando considerado o número de estruturas envolvidas em cada ação. O principal recurso utilizado pelo sistema sensoriomotor para diminuir o excessivo número dos graus de liberdade de cada movimento é a formação de estruturas coordenativas entre músculos e articulações para que se comportem como elemento único. Outro ponto importante a ser observado em tarefas intersegmentares são as assimetrias de desempenho ocasionadas, freqüentemente, pela preferência lateral. Buscando investigar o comportamento da coordenação bimanual simultânea em uma tarefa discreta de controle de força com diferentes demandas de precisão para as mãos dominante e não-dominante, foram avaliados 15 indivíduos de ambos os gêneros com média de 18,5 anos executando a tarefa de controle de força em precisão de lançamentos de uma bola em uma canaleta numerada, de -10 a 10. Os indivíduos foram separados em 3 grupos: Simétrico (GS) realizando força idêntica em ambas as mãos; Assimétrico Lado Preferencial (GALP) realizando mais força com a mão dominante; Assimétrico Lado Não Preferencial (GALNP) realizando mais força com a mão não-dominante. O teste controle, unilateral, não evidenciou assimetria de desempenho entre as mãos, conforme sugerido pela literatura. Os resultados apontaram a formação de estruturas coordenativas no pré-teste e melhora significativa de ambas as mãos em todos os grupos no pós-teste. Valores menores de erro absoluto das mãos não-dominante no GALP e dominante no GALNP no pós-teste sugerem a aniquilação da coalizão como resultado de prática.

Termos-chave: coordenação bimanual, controle de força, estruturas coordenativas, lateralidade.

Agradecimentos eternos a Rachel Rodrigues da Silva Paiva

Introdução

Diariamente, crianças, jovens e adultos realizam centenas de tarefas cotidianas que

embora aparentemente sejam simples, quando observadas do ponto de vista estrutural

complexas interações no sistema nervoso central são necessárias para que possam ser

realizadas. Pesquisas no campo da neurociência sugerem que o movimento voluntário surge de

esforços cooperativos de diversas estruturas cerebrais organizadas de forma hierárquica e

paralela e que, tomar consciência destas ações tornaria a realização de qualquer movimento

uma tarefa impossível (Manoel, 1999; Shumway-Cook & Woollacott, 2003).

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Diante desse complexo sistema de interações estruturais, diversas questões podem ser

levantadas: O que faz com que sejamos capazes de controlar nossa força no momento de abrir

parcialmente uma torneira? Como conseguimos controlar precisamente a força exercida para

quebrarmos a casca de um ovo sem danificar seu conteúdo? De que maneira uma pianista, ou

qualquer outro músico é capaz de controlar precisa e independentemente a força de ambas as

mãos quando toca um instrumento musical? Perguntas como estas surgem da dificuldade de

entendermos claramente os mecanismos envolvidos no controle de força em tarefas cotidianas

e, mais precisamente, em tarefas que envolvem coordenação bimanual, definida por Teixeira

(2006, p.349) como “controle das duas mãos de forma integrada no desempenho de uma ação

motora”.

Para discutir estas questões além de compreendermos os mecanismos estruturais

envolvidos na capacidade de controle de força, outro importante aspecto que chama atenção na

realização simultânea de tarefas bimanuais é a tendência dos dois membros fazerem

movimentos idênticos simultaneamente (Magill, 2000). Essa tendência foi amplamente

estudada nas últimas décadas, e alguns exemplos podem ser encontrados em Kelso et al.(1979)

in Magill (2000), inicialmente analisando características espaciais de movimentos discretos e,

posteriormente avaliando fatores temporais de movimentos cíclicos. A análise da coordenação

bimanual em movimentos discretos foi feita por meio de uma tarefa de direcionamento rápido

das mãos (direita / esquerda / ambas) em alvos com diferentes demandas de precisão.

Esperava-se um achado baseado na lei de FITTS1 onde a mão direcionada ao alvo maior

apresentasse tempos de movimento proporcionalmente menores, o que foi evidenciado apenas

com a realização unimanual. Quando o movimento foi realizado com simultaneidade, os

tempos de movimento foram maiores, inclusive para alvos fáceis e o toque no alvo ocorreu ao

mesmo tempo com as duas mãos.

Para compreender os mecanismos envolvidos no controle bimanual em tarefas

cíclicas, Klaiman e Karniel (2006) realizaram um experimento onde os sujeitos deveriam

realizar movimentos polirítmicos / não-harmônicos com os dedos. Seus resultados confirmaram

a tendência de combinação temporal de membros homólogos.

Buscando testar a hipótese de preferência por um modo preferencial acoplado de

controle nas fases iniciais de aprendizagem, Walter e Swinnem2 (1992) in Teixeira (2006) e

Lee, Swinnen e Verschuerem (1995) in Magill (2000) submeteram alguns indivíduos à

1 Lei de fitts: o tempo de movimento aumenta linearmente em função do índice de dificuldade em tarefas de

acertar um alvo espacial com exigência de rapidez e precisão de movimentos (Teixeira, 2006) 2 Walter, C.B. & Swinnen, S.P. Adaptative tuning of interlimb attraction to facilitate bimanual decoupling.In:

Journal of Motor Behavior. v.24,n.1,1992.p.95-104

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realização de tarefas bimanuais de deslocamento simultâneo de uma alavanca onde os

movimentos para cada mão eram diferentes, mas com o objetivo que fossem realizados

temporalmente juntos. Os resultados indicaram que inicialmente houve a tendência de

acoplamento dos movimentos, seguida por aniquilação da coalizão como resultado da extensa

prática.

Outro importante estudo foi conduzido por Konzem3 (1987) in Schimidt (2001), onde

os indivíduos deveriam escrever uma letra com a mão direita (y) e outra com a mão esquerda

(v). Enquanto a tarefa era realizada de forma unimanual, não houve nenhuma dificuldade por

parte dos sujeitos do estudo. Quando solicitado que escrevessem simultaneamente as letras com

as duas mãos, o que se verificou foi uma forte tendência de realização da mesma figura com

ambas as mãos, evidenciando, também, a formação de unidades funcionais de controle.

Experimentos como esses evidenciam a maneira como em tarefas de coordenação

intersegmentar os membros são funcionalmente vinculados, agindo como uma única unidade

funcional.

Diversos termos têm sido empregados na discussão sobre este tipo de integração

sensoriomotora: estruturas coordenativas; unidades funcionais; sinergia funcional; unidades de

ação entre outros. Para Petersen e Catuzzo (1995) essas variações refletem apenas diferentes

referencias teóricos utilizados ao longo do tempo, que em essência Teixeira (2006, p.351 define

como: “coalizões de um número variável de músculos para agir de forma integrada e

cooperativa, a fim de alcançar um objetivo comportamental”.

Segundo Pellegrini (2000) e Teixeira (2006) os primeiros estudos relacionados ao

tema foram desenvolvidos por Kelso (1979) em busca de uma maior compreensão sobre o

problema dos graus de liberdade.

Petersen e Catuzzo (1995, p. 44) corroboram com esta idéia ao afirmarem que

pesquisas neste campo surgiram para:

“entender como o sistema motor humano se organiza, coordenada e controladamente, frente à sua enorme quantidade de possibilidades de movimento, ou seja, como os muitos graus de liberdade desse sistema são coordenados e controlados”.

Estudos como os de Kelso (1979), Konsem (1987) e Walter e Swinnem (1992)

contribuíram para elucidar a questão da formação das estruturas coordenativas, comprovando a

formação de coalizões transitórias e condicionadas ao contexto diminuindo o número de gruas

de liberdade à uma quantidade razoável que o sistema seja capaz de controlar.

3 Konzem,P.B. (1987). Extended practice and patterns of bimanual interference. Dissertarção de Doutorado não-

publicada, University of Southern Califórnia, Los Angeles.

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Historicamente estes estudos têm gerado esforços em compreender de que maneira o

sistema sensoriomotor se organiza na realização de tarefas cíclicas, rítmicas (tempo) e/ ou de

posicionamentos (espaço) que, têm em comum o uso de feedback visual como modulador da

ação. Resta ainda investigar de que forma este sistema se organizaria diante de tarefas de

curtíssimo tempo de duração (menor do que 200 ms), onde não houvesse tempo de

processamento e uso de feedback em tempo real.

Há ainda um outro aspecto a ser discutido no que diz respeito a realização de tarefas

bimanuais: as assimetrias de desempenho ocasionadas pela preferência lateral. Assimetrias são

as diferenças na capacidade de controle entre membros homólogos do lado direito e esquerdo

do corpo, enquanto a preferência lateral é definida como uso preferido ou escolha de um

membro em situações em que apenas um deles pode ser utilizado para determinada tarefa

(Teixeira, 2006; Vasconcelos, 2006).

Diante destas evidências surgem alguns questionamentos: A formação de unidades

funcionais ocorre em termos de espaço, tempo e também de força? Poderia uma tarefa de

controle de força e coordenação bimanual apresentar a formação de estruturas coordenativas

assim como tarefas temporais? Haveria a possibilidade destas estruturas serem aniquiladas pelo

efeito de prática? Poderiam as estruturas coordenativas influenciar o desempenho bilateral

diante de comparações dos lados dominante e não-dominante? Para tentar compreender

aspectos relacionados a estas questões, o objetivo deste trabalho foi investigar o

comportamento da coordenação bimanual em uma tarefa discreta de controle de força com

diferentes demandas de precisão.

Método

Participantes

Participaram deste estudo 15 indivíduos de ambos os gêneros com idade entre 15 e 25

anos (M=18,53; DP=3,42), residentes na zona sul da cidade de São Paulo, alunos de um projeto

esportivo educacional de voleibol há pelo menos 3 meses. Os indivíduos foram separados

aleatoriamente em 3 grupos. Todos os indivíduos declararam ter preferência manual direita

para a escrita, sendo classificados neste estudo como destros. Antes do ingresso no estudo os

sujeitos ou seus responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Materiais

Foram utilizadas 2 bolas de borracha de 10 centímetros de diâmetro pesando

aproximadamente 100 gramas cada; 2 canaletas cilíndricas medindo 1.61m, demarcadas em 23

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espaços de 7 centímetros; O primeiro espaço demarcado das canaletas servia como ponto de

início de lançamento das bolas, e o ultimo espaço demarcado das canaletas servia como área de

escape. As canaletas foram mantidas a 0,30 m de distancia uma da outra, fixas por pedaços

idênticos de madeira parafusados nas extremidades da canaleta, sem que atrapalhassem os

lançamentos. Na parte anterior da canaleta, mais próxima do ponto de lançamento da bola,

foram colocados 2 suportes de madeira com 0,1m de altura que impediam o contato da canaleta

com o chão. Da mesma forma, na parte posterior da canaleta foram colocados 2 suportes de

madeira com 0,25m mantendo uma inclinação de aproximadamente 35º, garantindo assim que

as bolas retornassem as mãos dos participantes após cada tentativa. Um colchonete de ginástica

era colocado para que os participantes tivessem maior conforto e não tivessem o desempenho

alterado pelo incomodo do contato do joelho com o chão.

A Figura 1 abaixo é uma representação esquemática da vista superior das canaletas, do

sentido de lançamento da bola e dos alvos demarcados de acordo com cada grupo. O ângulo

aproximado de inclinação da canaleta é apresentado na Figura 1.2 que representa a vista lateral

da canaleta.

-

10

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09

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08

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07

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06

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05

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04

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09

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08

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09

+

10

Figura 2 - Representação esquemática da vista lateral da canaleta e do ângulo de lançamento.

Procedimentos

Após o preenchimento do termo de consentimento e de serem informados sobre os

objetivos do estudo, os participantes foram posicionados de joelhos sobre o colchonete diante

Figura 1 - Representação esquemática da vista superior das canaletas, do sentido de lançamento da bola e dos alvos demarcados de acordo com cada grupo – GS (0;0), GALP(0;5) e GALNP (5;0).

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das canaletas e instruídos a realizarem um lançamento simultâneo das duas bolas, uma com

cada mão, buscando atingir o alvo pré-determinado de acordo com o grupo em que estavam

sublocados. Após 3 tentativas de familiarização com a tarefa e com os implementos, todos os

indivíduos realizaram 10 lançamentos unilaterais para obtenção de dados de controle, sendo 05

com a mão dominante seguidos de 05 com a mão não-dominante. Todos os participantes foram

submetidos 30 tentativas na fase de aquisição. Após 1 dia sem prática, realizaram mais 3

tentativas caracterizando a fase de retenção. No 3º e último dia, todos os indivíduos foram

testados na tarefa de transferência realizando 5 tentativas sob nova demanda de precisão.

Os indivíduos foram divididos em 3 grupos da seguinte maneira:

Grupo Simétrico (GS) submetido a práticas simétricas, tendo como objetivo na fase de

aquisição os pontos centrais da canaleta (0;0) e na fase de transferência (+5;+5).

Grupo Assimétrico Lado Preferencial (GALP) submetido a práticas assimétricas, tendo como

objetivo na fase de aquisição os pontos (0;+5) da canaleta e na fase de transferência (+5;0).

Este grupo foi assim caracterizado por ter realizado a tarefa de maior controle com a mão

dominante, direita.

Grupo Assimétrico Lado Não Preferencial (GALNP) submetido a práticas assimétricas, tendo

como objetivo na fase de aquisição os pontos (+5; 0) da canaleta e na fase de transferência

(0;+5). Este grupo foi assim caracterizado por ter realizado a tarefa de maior controle com a

mão não-dominante, esquerda.

Durante todas as tentativas, três pessoas classificadas como anotadores, ficaram

posicionadas próximas às canaletas para registrarem os valores de lançamento de cada

participante. A primeira situada ao lado esquerdo das canaletas, a segunda, ao lado direito e

uma terceira pessoa, em pé, atrás dos indivíduos avaliados.

Para facilitar a visualização dos pontos a serem atingidos, foram colocadas marcações

coloridas nos alvos de acordo com o objetivo dos grupos.

Análise Após serem anotados os escores de lançamentos de todos os indivíduos foi calculado o

erro absoluto (EA), interpretado como a diferença absoluta entre o desempenho real (DR) em

cada tentativa e a meta(Mt).

EA = DR – Mt

Os resultados das fases de aquisição, retenção e transferência, assim como os

resultados obtidos no pré-teste e pós-teste foram analisados em 2 situações de comparação:

dentro dos grupos e entre os grupos.

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Para a análise estatística dos resultados foi utilizado o teste t de Student, comparando

diferenças entre médias para grupos independentes e diferenças entre médias para duas

medições da mesma amostra (Levin & Fox, 2004).

Resultados e Discussão As primeiras análises buscaram identificar diferenças significativas em 0,05 dentro

dos grupos. Posteriormente foram cruzados os dados para a identificação de diferenças

significativas em 0,05 para medições de grupos independentes. O Quadro 1 apresenta os

valores médios dos resultados de cada grupo.

Quadro 1 - Média de valores para as mãos dominante e não-dominante obtidos em cada grupo.

GRUPOS

UNILATERAL

PRÉ-TESTE

AQUISIÇÃO

PÓS-TESTE

RETENÇÃO

TRANSFERÊNCIA

E D E D E D E D E D E D GS 2,98 2,30 3,04 2,68 2,85 2,42 1,04 0,92 1,64 1,16 1,92 2,56 GALP 2,83 2,08 5,12 2,34 3,72 1,28 3,36 1,62 3,28 1,24 3,36 1,3 GALNP 2,26 2,11, 2,04 3,96 1,66 3,66 1,04 2,24 1,78 3,48 4,06 2,22

Os primeiros testes, unilaterais, buscavam identificar a capacidade de controle de

força com as mãos preferida x não-preferida em tarefas isoladas unilaterais. Neste teste não

foram encontradas diferenças que pudessem caracterizar assimetrias significativas de

desempenho entre as mãos esquerda e direita em nenhum grupo e entre os grupos.

Nas análises do pré-teste em condições bimanuais apresentadas na Figura 2, não foram

identificadas diferenças significativas em 0,05 entre as mãos dominante e não-dominante

apenas no GS. Esses dados de pré-teste indicaram, também, que as mãos não-dominante no

GALP e dominante no GALNP obtiveram baixo desempenho comparado à sua meta específica,

o ponto “0” da canaleta, e que ambas apresentaram valores de força superiores ao necessário

para atingirem o alvo. Esses resultados contribuem fortemente como indicativos de coalizão

funcional com o membro homólogo gerando forças maiores do que a exigida pela tarefa para

que uma das mãos pudesse atingir um alvo mais distante, evidenciando a formação de

estruturas coordenativas que elevaram os resultados dos grupos assimétricos. Os resultados de

pós-teste indicaram que apenas a mão não-dominante no GALP não apresentou melhora

significativa em 0,05 comparada ao pré-teste. Os GS e GALNP apresentaram melhora

significativa em ambas as mãos na comparação pré e pós-teste (Figura 2).

Dentro dos grupos também foram feitas análises nas fases de Aquisição (A), Retenção

(R) e Transferência (T), seguidas de análises comparativas entre os grupos (FIGURA 3).

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Grupo Simétrico(GS): não foram encontradas diferenças significativas em 0,05 neste

grupo na análise bilateral das fases A, R e T. Na transição entre as fases A e R houve melhora

bilateral, embora apenas a mão dominante tenha obtido significância 0,05.

Grupo Assimétrico Lado Preferencial(GALP): foram identificadas diferenças

significativas em 0,05 entre as mãos em todas as fases A,R e T, mas não nas transições.

Grupo Assimétrico Lado Não-Preferencial(GALNP): apenas em A pôde-se verificar

significância 0,05 na diferença de desempenho entre as mãos e assim como em GALP não nas

transições.

0

1

2

3

4

5

6

Pré e Pós Teste Mão Esquerda

Pré e Pós Teste Mão Direita

ERR

O A

BSO

LUTO GS (0;0)

GALP (0;5)

Figura 2 - Resultados de pré-teste e pós-teste.

Nas análises comparativas dos resultados cruzados entre os grupos, foram encontradas

diferenças significativas no pré-teste entre as mãos não-dominantes do GS e GALNP, onde o

primeiro grupo obteve melhor desempenho do que o segundo. O mesmo ocorreu com as mãos

dominantes do GALP e GALNP. Um resultado interessante foi encontrado na análise cruzada

entre as mãos que buscavam o ponto “5” da canaleta (direita GALP / esquerda GALNP) dos

grupos assimétricos, onde a mão-dominante (GALP) obteve desempenho significativamente

melhor em relação à mão não-dominante (GALNP).

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Nos resultados cruzados do pós-teste só não puderam ser evidenciadas diferenças com

significância em 0,05 na comparação das mãos esquerda (E) e direita (D), dos GA (E) e

GALNP (E). No mesmo teste foram encontradas diferenças significativas nos seguintes

cruzamentos (ordenados por melhor desempenho): GS e GALP (E); G e GALP (D); GS e

GALNP (D); GALP e GALNP (E); GALP e GALNP (D); GALP (E) e GALNP (D); GALP (D)

e GALNP (E).

Dados semelhantes foram encontrados nas análises da fase T: GS e GALP (E); GS e

GALNP (E); GS e GALP (D); GALP e GALNP (D); GALP (E) e GALNP (D); GALP (D) e

GALNP (E) demonstraram diferenças significativas em 0,05.

Figura 3 - Resultados de Aquisição Esquerda e Direita (AE/AD); Retenção Esquerda e Direita (RE/RD);Transferência Esquerda e Direita (TE/TD).

Buscando investigar o comportamento da coordenação bimanual simultânea em uma

tarefa discreta de controle de força com diferentes demandas de precisão para as mãos

dominante e não-dominante, o presente estudo apresentou aspectos da lateralidade e

coordenação humana. Os resultados encontrados no pré-teste corroboram com achados prévios

da literatura, indicando um desempenho similar com os dois lados do corpo em tarefas novas

de controle de força (Teixeira e Paroli; 2000), e contribuiu para refutar a idéia equivocada de

assimetria de desempenho universal favorecendo a mão preferida.

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Os resultados de pós-teste, igualmente, reproduziram semelhança com pesquisas

anteriores (Teixeira e Paroli; 2000) indicando a melhora bilateral em todos os grupos e

desempenho superior da mão não-preferida sobre a mão-preferida após a aquisição.

Durante a fase de aquisição nenhum grupo apresentou diferença significativa entre as

mãos. No caso dos grupos assimétricos verificou-se a realização de força extrema com o

membro que buscava o menor valor da canaleta (“0”).

Esses resultados vão ao encontro dos achados de Walter e Swinnem (1992 apud

Teixeira 2006) e Lee, Swinnen e Verschuerem (1995 apud Magill; 2000) indicando a formação

de estruturas coordenativas durante um recurso do sistema sensoriomotor para controlar o

excessivo número de graus de liberdade de movimentos. Os mesmos autores demonstram

evidências de aniquilação das estruturas coordenativas como resultado da prática, em

concordância, os resultados deste estudo indicaram diferenças significativas entre as mãos

dominante e não-dominante após a fase de aquisição.

Outro interessante aspecto para discussão foi o desempenho dos grupos assimétricos

na fase de transferência. O GALP que praticou com a mão preferida buscando um alvo mais

longe durante a fase de aquisição, na fase de transferência, quando buscou um alvo longe com a

mão não-preferida, teve queda significativa de desempenho. Inversamente proporcional, o

GALNP que buscava o alvo longe com a mão não-preferida na fase de aquisição, na fase de

transferência, ao buscar um alvo mais próximo com a mão preferida obteve um resultado

significativamente melhor. Esses resultados trazem complexas questões sobre lateralidade,

coordenação e também, transferência bilateral de aprendizagem. Vasconcelos (2006)

demonstra semelhante incerteza sobre o fenômeno que envolve a prática uni e bilateral e a

direção da transferência de aprendizagem. O que podemos perceber neste estudo foi a

acentuação uma maior preferência de controle do membro dominante para pontos de maior

exigência de força (ponto “5” da caneleta).

Embora este estudo tenha apresentado evidências, semelhantes aos achados anteriores,

de que a formação de estruturas coordenativas ocorra na realização de tarefas bimanuais

discretas de controle de força, assim como em tarefas de temporização e posicionamento e que,

o principal efeito da prática foi a aniquilação da coalizão funcional destas estruturas, faz-se

necessário ressaltar dois aspectos: 1) a interpretação da formação de estruturas coordenativas

deu-se por meio da análise do EA entre as mãos; 2) os escores de controle de força

apresentavam variabilidade de –10 a 10, no entanto, a tarefa solicitava uma variabilidade

máxima de controle de 0 a 5, deixando portanto, a inquietação de quanto a

formação/aniquilação de estruturas coordenativas pode ser influenciada pela manipulação da

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amplitude de controle, aumentando a variabilidade dos parâmetros variantes dos movimentos

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Capítulo 6

Informação visual do controle do agarrar

Autora: Sylvia Lúcia de Freitas

Orientador: Elke dos Santos Lima

Resumo

A visão desempenha papel fundamental na preensão, que é o ato de alcançar e agarrar um objeto, esteja ele parado ou em movimento. A principal vantagem da aferência visual por meio dos dois olhos é a obtenção de imagens ligeiramente diferentes com cada um deles, e essa combinação de imagens proporciona a percepção de profundidade, permitindo ver o mundo em três dimensões. A visão monocular caracteriza-se pela oclusão de um dos olhos e passa-se a enxergar como se tudo estivesse em um só plano. O objetivo deste estudo foi comparar e correlacionar a preferência lateral manual e visual com os índices de assimetria lateral no desempenho do agarrar em diferentes condições: com visão binocular e mão preferida; com visão binocular e mão não-preferida; olho preferido e mão preferida; olho preferido e mão não-preferida; olho não-preferido e mão preferida; olho não-preferido e mão não-preferida. Participaram do experimento 20 alunos do gênero masculino (M = 8,95 anos) e a tarefa motora consistiu em agarrar uma bola de tênis suspensa por um barbante e lançada em movimento de pêndulo. A análise principal indicou diferença significativa só para o fator principal visão, ou seja, a condição com visão total é superior às demais (p<0,01). Os resultados encontrados demonstram que o olho preferido não apresentou diferença em relação ao olho não-preferido, assim como a mão preferida não apresentou diferença em relação à mão não-preferida. A visão binocular foi fator decisivo para sucesso na tarefa de preensão de uma bola em pêndulo.

Termos-chave: preensão, preferência visual, preferência manual.

Agradecimentos às educadoras de práticas desportivas, Regina e Valquíria, pela facilitação da coleta de dados; ao Luis e Elke, pela dedicação.

Introdução

Embora os dois hemisférios cerebrais pareçam simétricos, eles são bastante diferentes

em termos funcionais. O hemisfério esquerdo está associado à linguagem, à lógica e ao

processamento seqüencial, controla a atividade muscular e recebe informações do lado direito

do corpo. Enquanto o hemisfério direito é especializado em atividades não-verbais e função

visuo-espacial, tendo consciência do lado esquerdo do corpo. Uma das mais evidentes

manifestações de lateralização cerebral são as assimetrias motoras, pois, embora o corpo

humano pareça simétrico na aparência geral, os membros superiores e inferiores e os órgãos

sensoriais (olhos e ouvidos) são usados assimetricamente (Bobbio et al., 2006).

De todos os sistemas sensoriais, os seres humanos tendem a utilizar e confiar

principalmente na visão, predominante no desempenho de habilidades motoras (Magill, 2000;

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Sinnett et al., 2007). O sistema visual humano é extraordinário quanto à quantidade e à

qualidade da informação (Purves et al., 2005). Por meio da visão é que se obtém informações

relevantes do ambiente e características do objeto, ou seja, este sistema nos informa sobre a

forma, tamanho, cor, posição e movimento de tudo o que está em volta. (Teixeira, 2006;

Magill, 2000)

Durante um movimento da mão dirigido a um alvo o sistema nervoso de controle

depende da informação proporcionada pelo sistema visual, o que sugere que o entrosamento

entre esses dois sistemas é crucial (Horstmann & Hoffmann, 2005). A visão desempenha papel

fundamental na preensão, que é o ato de alcançar e agarrar um objeto, esteja ele parado ou em

movimento. A visão fornece informações antecipadas para capacitar o sistema de controle

motor a posicionar, espacial e temporalmente os braços, as mãos e os dedos antes que a bola

chegue, para que o indivíduo possa agarrá-la. (Magill, 2000). A preensão de um objeto em

movimento é caracterizada por três estágios: a) a pessoa precisa mover o braço e a mão na

direção do objeto que está se aproximando; b) depois precisa dar à mão a forma adequada para

apanhar o objeto; e c) finalmente os dedos precisam segurar o objeto. O executante procura

perseguir visualmente o deslocamento da bola antes de interceptá-la (Teixeira, 2006).

É interessante notar que a pessoa baseia a ação de agarrar na informação obtida antes

de a bola realmente fazer contato com a mão. O feedback tátil e o proprioceptivo são

envolvidos depois do contato, porque a pessoa que vai agarrar a bola precisa fazer ajustes para

agarrá-la. Torna-se evidente, então, que quando a pessoa capta a informação crítica para agarrar

um objeto, tanto a visão central quanto a visão periférica estão agindo (Magill, 2001). Ao

alcançar um objeto no ar, ação comum ao esportista, este deve predizer onde o objeto estará em

determinado instante (Regan et al., 1998).

A principal vantagem de se receber aferência visual por meio dos dois olhos é a

obtenção de imagens ligeiramente diferentes com cada um deles, e essa combinação de

imagens proporciona a percepção de profundidade, permitindo ver o mundo em três dimensões.

A visão monocular caracteriza-se pela oclusão de um dos olhos, perdendo assim ver em três

dimensões e passa-se a enxergar como se tudo estivesse em um só plano. Nesse caso, a

estimativa de profundidade é fornecida por outras pistas, como a) tamanho da imagem –

imagens maiores de um objeto indicam que ele está mais próximo; b) sobreposição parcial de

imagens – a imagem de objetos mais próximos ocluem parcialmente a visão de objetos que

estão atrás deles; c) sombra produzida pelo objeto; d) textura – textura da superfície torna-se

mais densa conforme aumenta a distância do observador; e e) perspectiva linear – tendências de

objetos paralelos convergirem quando se afastam do observador (Teixeira, 2006).

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Considerações teóricas sugerem que a informação binocular apresenta mais vantagens

quando comparado à visão monocular (Watt & Bradshaw, 2000), no planejamento e execução

natural de alcançar e agarrar (Melmoth & Grant, 2006). A visão binocular tem um importante

papel na preensão, principalmente em objetos estáticos (Servos & Goodale, 1998), pois se esta

for removida afetará negativamente o planejamento e o controle em tempo real da preensão. O

impacto adverso da remoção da visão binocular é porque a visão monocular, em tarefas

visomotoras, resulta em uma subestimação da distância do objeto (Loftus et al., 2004) e como

conseqüência seu tamanho (Servos, 2000).

Visto isto, este estudo teve como objetivo comparar e correlacionar a preferência

lateral manual e visual com os índices de assimetria lateral no desempenho do agarrar em

diferentes condições visuais.

Método

Participantes

Participaram do experimento 20 alunos do gênero masculino, com idade de 8 a 10

anos (M = 8,95 anos; DP = 0,89), participantes do curso comunitário de natação “Aprendendo

a nadar” da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo.

Os pais ou responsáveis preencheram o termo de consentimento para participação no

estudo (Anexo 1) e foram informados sobre o objetivo da tarefa por meio de instruções escritas

e verbais.

Equipamento e tarefa

Para determinar o índice de preferência lateral foi empregado um Inventário de

Dominância Lateral adaptado para o estudo, baseado no Inventário Lateral de Edimburgo

(Oldfield, 1971, apud Teixeira, 2006), constituído por 08 questões sobre preferência lateral na

execução de 08 tarefas motoras realizadas usualmente pela maioria das pessoas, (Quadro 1).

Para cada item assinalado foi computado um ponto, cuja somatória foi utilizada para cálculo do

Índice de Preferência Lateral (ver descrição do cálculo dos índices de assimetria lateral em

Resultados).

Para determinar a preferência ocular, foi empregado o teste de estender os braços à

frente, sobrepondo as mãos de modo a formar um pequeno triângulo entre elas. Pediu-se que o

executante fixasse nesse triângulo a bola de tênis suspensa olhando com os dois olhos. Sem a

mudança da posição pediu-se que fechasse alternadamente os olhos e respondesse com qual

dos olhos a bola era vista.

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Quadro 1 - Inventário de Dominância Lateral (adaptado de Oldfield, 1971)

Direita Esquerda

1 Escrever

2 Desenhar

3 Arremessar

4 Uso da tesoura

5 Escovar os dentes

6 Uso de colher

7 Uso da borracha

8 Receber bola

Os sujeitos inicialmente respondiam ao Inventário de dominância lateral, realizavam o

teste para determinar a preferência ocular e em seguida foi iniciada a tarefa motora do agarrar.

A execução da tarefa foi precedida por explicação pela pesquisadora. O participante executava

três tentativas de familiarização com o equipamento sempre no início de cada condição visual.

Tarefa

A tarefa motora consistiu em agarrar uma bola de tênis suspensa por um barbante e

lançada em movimento de pêndulo. Foram realizadas sete tentativas sucessivas em 6

condições: a) com visão binocular e mão preferida; b) com visão binocular e mão não-

preferida; c) com o olho preferido e mão preferida; c) com o olho preferido e mão não-

preferida; d) com o olho não-preferido e mão preferida; e e) com o olho não-preferido e mão

não-preferida.

Não houve intervalo entre as tentativas nem entre as condições. A ordem das condições

foi realizada pseudo-aleatoriamente entre os sujeitos.

Delineamento experimental e procedimentos

O executante permanecia atrás de uma marca no chão a 1m da bola estacionária,

suspensa por um fio, atado a uma barra fixa que tem de altura 2,5m. Os pés paralelos, na

largura dos ombros. Após o ajuste da altura da bola para a altura da mão de cada executante, a

bola era lançada pela pesquisadora, que também permanecia a 1m da bola estacionária.

O executante deveria permanecer com os braços repousando ao longo do corpo e

conforme a bola era lançada, elevar o antebraço e agarrar a bola com a palma da mão voltada

para a bola, na altura do ombro, ou seja, realizar a flexão do cotovelo e a pronação da mão. Na

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visão monocular foi utilizado uma venda, semelhante a um tapa-olho. Foram realizadas três

tentativas de familiarização em cada condição.

Análise

As interceptações realizadas com sucesso receberam a pontuação 3, as bolas que

foram interceptadas, mas não agarradas, receberam a pontuação 2, aquelas que foram

interceptadas apenas com um esbarrão receberam a pontuação 1 e as bolas que não foram

interceptadas receberam a pontuação 0.

A análise estatística do desempenho na tarefa foi realizada por meio de uma

análise de variância de dois fatores (3) visão x (2) mãos, os contrastes posteriores foram

executados através da prova de Newman-Keuls, com nível mínimo de significância de 0,05.

Resultados

Para avaliar a preferência manual foi feito inicialmente a somatória das marcas

indicativas da preferência manual direita, assim como a somatória da preferência esquerda. Em

seguida, calcula-se a diferença entre elas e divide-se pela soma total de marcas. Por fim, o valor

encontrado é multiplicado por 100, obtendo-se um índice percentual, a saber: Índice de

preferência manual = [(ΣD-ΣE)/ [(ΣD+ΣE)] x 100 (Teixeira, 2006). Neste estudo, o valor

encontrado foi de 72,5, indicando a preferência pelo lado direito e a magnitude em valor

proporcional (Tabela 1).

Tabela 1 - Número de integrantes, índice de preferência manual médio geral e desvio-padrão

geral.

Idade Sujeitos

8 anos 8 (40%)

9 anos 5 (25%)

10 anos 7 (35%)

Total 20

Média 72, 5

DP 61,7

A preferência manual direita pode ser visualizada na Figura 1, nas tarefas realizadas

no inventário, em comparação com a preferência manual esquerda.

A análise do desempenho na tarefa de agarrar indicou efeito significativo apenas para

o fator principal visão [F(2, 38) = 4,64, p < 0,05]. Os contrastes posteriores indicaram que o

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desempenho na condição com visão binocular foi melhor do que nas demais condições visuais

que não apresentaram diferenças entre si. O desempenho entre as mãos não apresentou

diferença e nem a interação visão x mão. Nem sempre a preferência manual coincidiu com a

preferência ocular (Tabela 2 e Figura 2).

Preferência manual

02468

101214161820

Escrev

er

Desenha

r

Arremess

ar

Uso te

soura

Escov

ar den

tes

Uso co

lher

Uso bo

rrach

a

Receber

bola

Freq

üênc

ia a

bsol

uta

DireitaEsquerda

Figura 1 – Comparativo entre mão preferencial direita (D) e mão preferencial esquerda (E) nos itens utilizados no inventário adaptado do Inventário de Dominância Lateral de Edimburgo (Oldfield, 1971).

Tabela 2 - Índice de preferência

Preferência manual Preferência ocular

Direita 17 (85%) 14 (70%)

Esquerda 3 (15%) 6 (30%)

Total 20 20

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67

0

5

10

15

20

Freq

üênc

ia

Preferênciamanual

Preferênciaocular

Preferências

DireitaEsquerda

Figura 2 – Comparativo entre mão preferencial direita e esquerda e olho preferencial direito e

esquerdo.

Tarefa de preensão

2,62,62,72,72,82,82,92,93,0

VTMP VTMNP OPMP OPMNP ONPMP ONPMNP

Freq

üênc

ia

Figura 3 – Comparativo entre as condições visuais e manuais na tarefa de preensão de uma bola em pêndulo, com visão total e mão preferencial (VTMP), com visão total e mão não preferencial (VTMNP), olho preferencial e mão preferencial (OPMP), olho preferencial e mão não preferencial (OPMNP), olho não preferencial e mão preferencial (ONPMP), olho não preferencial e mão não preferencial (ONPMNP).

Outro fator que pode ser considerado é a congruência de preferências laterais entre as

dimensões, ou seja, em que medida pessoas com preferência lateral por determinada mão

também apresenta preferência pelo mesmo lado para o uso de um dos olhos (Teixeira, 2006).

Neste estudo 17 alunos apresentaram congruência de preferência lateral mão/olho,

representando 85% da amostra (Figura 4).

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0

5

10

15

20

Freq

üênc

ia

Concordantes Discordantes

Congruência de preferência lateral mão/olho

Figura 4 – Congruência de preferência lateral manual e a visual; concordante, quando a mão preferencial coincide com o olho preferencial e discordante quando isso não ocorre.

Discussão

Em relação aos estudos pesquisados, não foi possível levantar nenhum que

relacionasse condições visuais e manuais com a tarefa de agarrar uma bola em pêndulo como

este estudo.

A análise principal deste trabalho indicou diferença significativa só para o fator

principal visão, ou seja, a condição com visão total é diferente das demais. A visão binocular

foi fator decisivo na tarefa de preensão de uma bola. Em relação à visão monocular, o olho

preferido não apresentou diferença em relação ao olho não-preferido, assim como a mão

preferida não apresentou diferença em relação à mão não-preferida.

Encontram-se na literatura diversos estudos focalizados na habilidade de agarrar.

Enquanto Buekers e Helsen (2000) abordaram em seu estudo assimetrias manuais e preensão

em condições visuais de distâncias diferentes, Rymar e colaboradores (1984) concluíram em

seu estudo que meninos tinham menos preferência manual destra em relação às meninas, mas

quanto à preferência ocular não houve diferença.

O estudo de Lavrysen e colaboradores (2007) abordou se indivíduos aplicavam

estratégias diferentes de movimento de acordo com as habilidades da mão e do sistema de

hemisfério usado na realização da tarefa.

Alguns estudos abordam a tarefa de agarrar objetos iluminados em um quarto escuro

(Loftus et al., 2004; Watt & Bradshaw, 2002) e outros sobre o uso de óculos especiais com

lente de cristal líquido, que permitem alterar o tipo da lente na tarefa de agarrar um objeto

(Bennett et al., 2003).

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Watt e colaboradores (2003) demonstraram que os índices cinemáticos do agarrar

objetos de diferentes tamanhos e a distâncias diferentes não foram afetados na remoção da

informação binocular.

Mahone, Wodka e Hiemenz, (2006) concluíram que escolares após serem avaliados

por testes neuropsicológicos e tarefas motoras, não apresentou diferenças significativas de

desempenho daqueles com preferência manual esquerda versus direita, de desempenho

daqueles com preferência ocular esquerda versus direita, ou preferência olho-mão concordante

ou discordante.

Horstmann e Hoffmann (2005) apresentaram um estudo com um questionamento

interessante. Em uma situação de escolha com dois ou mais objetos equivalentes presentes ao

mesmo tempo a questão que se apresenta é se: a) pegamos o objeto que selecionamos com o

olhar ou b) olhamos para o objeto que selecionamos pegar? Concluíram que olhamos para onde

já havíamos selecionado pegar. Esses achados proporcionam a evidência que, em um

movimento coordenado dos olhos e braço, o controle do olhar fixo é um significado para um

fim, chamado de uma ferramenta para conduzir o movimento do braço apropriadamente.

Seguindo as considerações teóricas que sugerem que a informação binocular

apresenta mais vantagens quando comparado à visão monocular (Watt & Bradshaw, 2000), este

estudo confirma essa tendência, pois apresentou diferença significativa na informação

binocular na tarefa motora de agarrar uma bola em pêndulo.

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Capítulo 7

Estrutura de prática na aquisição da habilidade rebater com crianças

Autora: Luana Vieira Rosas

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O objetivo do presente trabalho foi verificar o efeito do tipo de prática na aquisição da habilidade de rebater com um taco. Participaram desse experimento 39 crianças, de ambos os sexos com média de idade de 10,6 anos. As crianças foram divididas em dois grupos: constante aleatório (CA) e aleatório (AL). O grupo CA praticou a habilidade de rebater nas cinco sessões iniciais de forma constante e nas cinco sessões finais de forma aleatória enquanto que o grupo aleatório AL praticou em todas as 10 sessões a habilidade de forma aleatória. Os sujeitos foram avaliados no pré-teste, pós-teste, retenção e transferência intertarefas com base em parâmetros do rebater através de uma lista de checagem. A análise dos dados foi realizada por meio de uma análise de variância de 2 fatores, 2 (Grupo) x 4 (Fase), com medidas repetidas no segundo fator. Os resultados indicaram que não houve diferença significativa entre os grupos, os quais obtiveram resultados superiores no pós-teste em comparação ao pré-teste e mantiveram o nível de desempenho nos testes de retenção e de transferência. Estes resultados sugerem que o efeito da interferência contextual pode ser obtido aleatorizando-se a ordem das tentativas apenas para a porção final das tentativas de prática.

Termos chave: estrutura de prática, aquisição de habilidades motoras, interferência contextual.

Introdução

Os temas mais presentes em aprendizagem motora são aqueles que se apóiam nas

explicações sobre aprendizagem, e têm uma abordagem motora, com o objetivo de aumento de

estratégias para beneficiar o processamento de informação. Há ainda os que se baseiam na ação

motora e buscam investigar os fatores que afetam a aquisição de habilidades.

As estratégias utilizadas em aulas de habilidades motoras têm uma relação estreita com

a variabilidade de prática e esta pode ser explicada através do princípio da interferência

contextual, segundo o qual a prática variada-aleatória pode ser estruturada em blocos, seriada e

combinada.

Como resultado da prática, o fenômeno da interferência contextual pode ser verificado

quando a prática com baixa interferência contextual (prática variada em blocos), provoca

melhores performances de aquisição e a prática com alta interferência contextual (prática

variada-aleatória), resulta em melhor retenção e transferência (Magill, 2000). Neste momento

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ocorre o paradoxo do efeito da interferência contextual (EIC), que leva ao cruzamento das

curvas de desempenho entre as fases (Meira Júnior, 1999).

Em habilidades do voleibol em crianças, o efeito da interferência contextual não foi

encontrado. A prática variada será somente eficiente dentro de uma mesma classe de

movimentos, quando as variações da prática forem apenas de parâmetros de um mesmo

programa motor generalizado (PMG) (Meira Júnior, 1999).

O PMG é formado por representações abstratas em níveis elevados do SNC sobre

normas para geração de movimentos. Ao executar um movimento armazenam-se na memória

do indivíduo aspectos como posição do corpo, peso do objeto, parâmetros utilizados no PMG,

efeito dos movimentos no ambiente e conseqüências sensoriais do mesmo. Estes aspectos são

armazenados através de esquemas de resposta motora, que podem ser esquema de lembrança

(motor) e esquema de reconhecimento (sensorial). Portanto, quando são praticadas variações de

uma tarefa da mesma classe de movimentos, os benefícios da aprendizagem são mais

influenciados por fatores relacionados ao fortalecimento de esquemas do que por fatores de

interferência contextual (Schmidt & Wrisberg, 2001).

Para a interferência contextual a prática variada-aleatória possibilita distinção e

elaboração melhores na memória, e como possibilita sua constante reconstrução, fortalece o

plano de ação.

Através da manipulação do PMG ou de parâmetros de uma habilidade, Lage,

Gonçalves, Ugrinowitsch e Benda (2006), explicam a ocorrência do EIC, em que ressaltam que

o grupo de prática aleatória com manipulação de parâmetros apresentou melhor desempenho

nos testes de transferência e retenção.

Quando há manipulação não só da estrutura de prática, como também aspectos

invariáveis, Ugrinowitsch e Manoel (1996) notaram que em todas as fases do experimento o

grupo aleatório foi superior ao grupo em blocos, ressaltando que indivíduos mais experientes

respondem melhor a prática aleatória. Afirmam ainda que o EIC é mais observado em tarefas

de laboratório e destacam a não ocorrência do fenômeno em crianças.

A prática variada permite que os aprendizes desenvolvam competências, pois tentando

diferentes versões da ação podem produzir uma variedade de versões de uma classe de

movimentos. Com a variabilidade da prática é possível modificar o programa motor

generalizado e as sessões de prática devem ser estruturadas de tal forma que as condições de

treinamento sejam semelhantes ao seu contexto-alvo, ou seja, à sua tarefa original (Schimidt &

Wrisberg, 2001).

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Questionando a estrutura de prática, Tani et al. (2004), afirmam ser a prática aleatória

superior à prática constante, pois com base em experiências há o fortalecimento de esquemas.

A prática variada tem grande interferência contextual e promove um melhor desempenho em

testes de retenção e transferência de aprendizagem. O mérito das pesquisas com a variabilidade

está na utilização de tarefas motoras do mundo real, e a limitação das pesquisas está na

utilização de tarefas predominantemente fechadas e discretas.

Comparando os grupos de prática aleatória, prática constante, prática constante-

aleatória e prática aleatória-constante, Corrêa (2001), verificou que apesar de não haver

diferenças de desempenho, a prática constante-aleatória mostrou uma forma de adaptação

diferente das demais. Portanto há a ocorrência do fenômeno do EIC, o “paradoxo” de

desempenho, o grupo que não teve melhoras em precisão e consistência na fase de

estabilização obteve melhor desempenho na fase de adaptação.

A especificidade das tarefas tem seu fator de relevância a se considerar na manipulação

da variabilidade, os efeitos da estruturação de prática para, Barros (2006), foram favorecidos

pela prática constante-aleatória em dois experimentos e pela prática aleatória-constante em

outro, acrescentando assim que existem especificidades como também generalidades,

reafirmando o sistema organizado hierarquicamente, onde ao mesmo tempo em que suas partes

interagem formando um todo, também são dotadas de autonomia.

A prática constante apresenta-se como ideal no aspecto de formação do programa motor

generalizado. É preferível que a criança atinja o programa motor generalizado antes com a

prática constante, para a partir de então se utilizar a prática variada, que atuaria para o

aperfeiçoamento de uma habilidade. Em um primeiro estágio é necessária a relação meio-fim

conseguida pela prática constante, e só depois para o fortalecimento do esquema motor seria

usada a prática variada (Marinovic & Freudenheim 2001).

A variabilidade tem seu papel importante no processo adaptativo pelas variáveis que

sofrem a aprendizagem, porém a prática variada não altera o padrão de adaptação, não cria uma

instabilidade no sistema como resposta às perturbações do ambiente. E ainda por meio da

prática constante obteve-se melhor desempenho na adaptação às tarefas (Tani, 2000).

Para a aquisição de habilidades motoras primeiramente há necessidade da prática

constante para se formar a estrutura da habilidade e posteriormente da prática aleatória para

promover a diversificação. Isso possibilita flexibilidade à habilidade e, portanto, adaptação

(Corrêa & Tani 2005).

A variabilidade de prática pode ser explicada pelo processo adaptativo onde a formação

de novas estruturas implica uma desestabilização para posterior estabilização, destaca-se então

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o ciclo de estabilidade-instabilidade-estabilidade, onde a aprendizagem não é finita e o

indivíduo continua a aprender uma habilidade que já domina, em direção a estados

crescentemente mais complexos. Utilizando variáveis como padrão de movimento e

variabilidade de resultado, Benda (2001) verificou que a baixa variabilidade relacionada à

macroestrutura é uma das características que permitem melhor adaptação a novas exigências e

a variabilidade relacionada à microestrutura caracterizou uma flexibilidade que permite

adaptação a novas exigências. Afirmou ainda que a variabilidade observada em diferentes

estados do sistema é de natureza distinta.

Através de modelos multidimensionais para classificação de habilidades de movimento

o rebater consiste de uma habilidade que exige coordenação motora grossa sobre aspectos de

seleção de músculos e é um movimento discreto com base em aspectos temporais, pois

apresenta início e fim definidos. Trata-se de uma tarefa motora aberta, pois exige modificações

para se ajustar ao ambiente, com características de instabilidade. A fase em que se encontram

as crianças do presente estudo corresponde à fase motora especializada onde habilidades

motoras já podem ser refinadas (Gallahue, 2002).

Segundo Gentile (apud Magill, 2000) na aprendizagem de habilidades motoras abertas,

obtida a idéia do movimento o aprendiz necessita de experiências variadas durante a prática no

que tange aos estímulos regulatórios do ambiente, ou seja, necessita de diversificação, para o

autor a prática em blocos é recomendável no início do processo de prática e logo após são

introduzidas as variações para responder às demandas do ambiente imprevisível com

exigências de variabilidade e flexibilidade, salientando que para habilidades abertas faz-se

necessário a utilização da prática variada-aleatória.

Em tarefas abertas, a prática aleatória fornece mais benefícios do que a prática em

blocos e parece ser mais importante para as tarefas que são executadas em questões variáveis,

ao ponto que tarefas que exigem variações mínimas, podem ser submetidas a uma prática

constante (Herrero et al., 2005; Shumway-Cook & Woollacott, 2003).

A partir do exposto até aqui, estabeleceu-se como objetivo deste trabalho comparar os

efeitos da inclusão de programação aleatorizada de prática durante a aprendizagem de um

padrão de movimento em crianças em duas etapas, desde o início da prática ou na metade final

das tentativas. A hipótese testada foi a de que a introdução da prática constante no início da

aprendizagem seguida da prática aleatória proporcionaria maiores escores de pontuação para a

habilidade do que em comparação à introdução da prática variada desde o início do período de

prática.

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Método

Participantes

Participaram desse experimento 39 crianças, de ambos os sexos, com média de idade de

10,6 anos (dp = 0,87) correspondentes ao 2º ciclo do Ensino Fundamental (4ª série), alunos da

EMEIF Eva Cordula Hauer Vallejo, da cidade de Atibaia. O consentimento foi dado pela

diretora da escola e autorização por escrito do professor responsável pela disciplina de

Educação Física.

Instrumentos e Tarefa

Os instrumentos utilizados foram 18 tacos de madeira, adaptados para crianças, de

formato menor e mais leve, semelhante ao implemento de tacobol e 30 bolinhas de frescobol.

A tarefa utilizada nas fases de pré-teste, pós-teste e retenção de aprendizagem consistiu

em rebater uma bola fixa com fio de nylon no aro do basquete, a bolinha encontrava-se

suspensa e estática para a rebatida.

Delineamento experimental e procedimentos

As crianças foram divididas em dois grupos, o grupo de prática constante-aletaória

(CA) realizou a tarefa de rebater com o taco a bola lançada por outro executante de semelhante

posição, altura e velocidade até completar 5 sessões de prática, as outras 5 sessões finais foram

destinadas a prática aleatória onde o rebatedor deveria interceptar a bola lançada por outro

executante, com variações de direção, velocidade, altura como, por exemplo, rebater com as

duas mãos do lado direito, esquerdo, apenas com o braço direito, braço esquerdo, rebater de

cima para baixo e debaixo para cima, rebater a bola lançada mais alto e mais baixo. O grupo de

prática aleatória (AL) rebateu as bolas lançadas por outro executante de forma alternada como

citado anteriormente, porém este grupo realizou a prática aleatória durante todas as 10 sessões

de prática.

Após o período de prática a avaliação do pós-teste e retenção consistiu da mesma tarefa

utilizada no pré-teste, com a bolinha em posição fixa. A avaliação de transferência consistiu na

tarefa de rebater a bolinha em movimento. Os testes foram feitos em três tentativas

consecutivas. A pontuação foi dada com referência a parâmetros do movimento do rebater que

se aproximassem de aspectos como economia de energia e graus de liberdade. Cada aspecto do

padrão motor avaliado possuía três níveis de pontuação respectivamente 1, 2 e 3, por exemplo,

durante a ação de rebater quando a criança realizava uma grande rotação do tronco, recebia a

pontuação máxima 3. Se porventura a criança não realizasse a rotação do tronco ou realizasse

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uma flexão do mesmo, enquadrava-se na categoria sem rotação com pontuação mínima 1. Se

ao rebater a criança realizasse um movimento de rotação com baixa amplitude enquadrava-se

na categoria rotação moderada, com pontuação 2. Este critério foi utilizado para os 6

parâmetros selecionados da habilidade rebater.

Para o teste de transferência foi utilizado um cano de PVC de 1,5m, cortado ao meio

que foi fixado em uma superfície elevada de aproximadamente 2,2m em relação ao solo. Este

instrumento encontrava-se levemente inclinando para que a bolinha deslizasse sobre o mesmo.

Um lançador previamente treinado, não participante do experimento, lançou três bolinhas

seguidamente, soltando as bolinhas na extremidade do cano a cada 3 s. O rebatedor encontrava-

se logo abaixo do instrumento, de forma que pudesse visualizar o trajeto da bolinha, e então

realizou as três rebatidas consecutivas que foram filmadas para posterior avaliação.

As crianças praticaram a tarefa em aulas de educação física de 50 minutos, 2 vezes por

semana, durante 10 sessões de prática. A aula iniciou-se com um aquecimento geral de 5

minutos. Os alunos foram divididos em 3 colunas que se situavam na extremidade da quadra,

havia 3 lançadores que foram padronizados quanto à altura, direção, velocidade do lançamento

e distância do rebatedor. Cada rebatedor tinha um taco em suas mãos, este realizava a rebatida

e retornava ao último lugar da fila. Quando o lançador esgotava suas bolinhas, a sessão era

paralisada e todos ajudavam a reunir as bolinhas novamente, para retornar a prática. Esta tarefa

era realizada durante 30 minutos, descontando 10 minutos aproximadamente para apanhar as

bolinhas, efetivando um total de 20 minutos de prática.

Na sessão seguinte à última sessão prática, os alunos foram reavaliados no pós-teste.

Após uma semana sem prática desta habilidade foi realizado o teste de retenção com a mesma

lista de verificação de parâmetros dos movimentos e tarefa utilizadas no pré-teste e com base

nos mesmos critérios e pontuações. O teste de transferência foi realizado com uma mudança no

contexto, ou seja, em uma situação em que a bola encontrava-se em movimento.

O pré-teste foi filmado em uma posição diagonal do rebatedor, entre os planos frontal e

latero-lateral. Os resultados foram avaliados em função da qualidade de execução do padrão de

rebater descrito no quadro 1. Nesta avaliação, o escore correspondente à análise do padrão de

movimento foi calculado pela somatória dos pontos obtidos pelo sujeito em cada uma das três

tentativas. Foi calculada a média das três tentativas individuais, para obtenção da média geral

individual.

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Resultados

Para verificar se houve diferença significativa entre os grupos foi realizada uma análise de

variância de 2 fatores, 2 (Grupo) x 4 (Fase), com medidas repetidas no segundo fator. Os

contrastes subseqüentes foram feitos com o teste de Newman-Keuls, adotando-se nível mínimo

de significância igual a 5%. Os resultados indicam efeito significativo do fator principal fase,

F(3,11) = 5,8 p< 0,005, porém nenhum efeito associado ao fator grupo foi detectado, com

valores p para o fator principal e interação ficaram acima de 0,8. Os contrastes para o efeito de

fase indicaram diferenças significativas entre o pré-teste e pós-teste caracterizando a

estabilização da aprendizagem da habilidade em questão.

Quadro 1 – Critério de pontuação (valores entre parênteses) da habilidade rebater com bastão uma bola suspensa em posição estática.

A - O executante segura o taco: (1) com apenas uma das mãos (2) com as duas mãos com pouca sustentação do implemento (3) com as duas mãos com firmeza na sustentação do implemento

B - Realiza movimento preparatório para o rebater: (1) estático, não levando o taco para trás (2) levando o taco para trás com baixa amplitude de movimento (3) levando o taco para trás com alta amplitude de movimento C - Realiza rotação do tronco durante o movimento: (1) sem rotação (2) rotação moderada (3) grande rotação D - Executa flexão e extensão do cotovelo para rebater: (1) não executa, o movimento parte da articulação dos ombros (2) executa pequena flexão e extensão do cotovelo (3) executa grande flexão e extensão do cotovelo E - O posicionamento das pernas encontra-se: (1) em posição latero-lateral (pés paralelos) (2) em posição antero-posterior com a mesma perna do braço de rebatida à frente (3) em posição antero-posterior com a perna contrária ao braço de rebatida à frente F - O executante acerta a bolinha: (1) não acerta a bolinha (2) acerta a bolinha no centro do taco (3) acerta a bolinha com a extremidade do taco

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Pré-teste Pós-teste Retenção Transferência

Fases

Pont

uaçã

oCAAL

Figura 1 – Pontuação dos grupos (CA e AL) em cada fase experimental. Desvio padrão indicado por traços verticais.

Discussão

Não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos experimentais. Apesar

de apresentar uma tendência favorável à prática aleatória em comparação a prática constante-

aleatória, os resultados não foram suficientes para que se apontasse a superioridade entre elas.

Diferentemente das propostas que apontam para a superioridade da prática aleatória

(Ugrinowitsch & Manoel, 2006; Tani et al., 2001) e das que afirmam ser a prática constante

superior à prática aleatória (Marinovic & Freudenheim, 2001; Tani, 2000), como vimos no

presente estudo isto não ocorreu, ou seja, não houve o EIC e os desempenhos se mantiveram

em toda as fases do experimento.

No presente estudo foram manipulados os parâmetros do programa motor generalizado

da habilidade de rebater, isto é, foram introduzidas modificações como rebater por cima, por

baixo, de um lado e de outro, semelhante ao grupo de prática-aleatória parâmetros da pesquisa

de Silva et al. (2006), o qual apresentou melhor desempenho. O presente estudo também não

sustentou esta afirmação, pois o desempenho foi semelhante em comparação ao grupo

constante. Uma possível explicação sobre isto consiste em que os efeitos de IC são mais

visíveis quando as tarefas implicam não somente a variação de parâmetros dentro de um

mesmo programa regulador como também quando as tarefas implicam diversas categorias de

ação (Barreiros, 2006). No presente estudo não foram manipuladas tais variáveis para alguma

afirmação.

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A superioridade da prática constante-aleatória em comparação a prática aleatória-

constante, constante e aleatória sustentada por Corrêa (2001) e Corrêa e Tani (2005), a qual

também referenciou a hipótese da presente pesquisa, como constatado na comparação da

prática constante-aleatória com a prática aleatória, para a presente tarefa de rebater com um

taco, não houve diferenças suficientes que fossem ao encontro destas afirmações, portanto a

hipótese de pesquisa foi rejeitada.

E ainda, partindo da afirmação que para uma habilidade aberta faz-se necessária a

prática aleatória e para uma habilidade fechada é preferível que se introduza a prática constante

para um melhor desempenho (Herrero et al., 2005) e que prática em blocos é recomendável no

início do processo de prática onde inicialmente o indivíduo obtem a idéia do movimento e em

seguida necessita de experiências variadas durante a prática para promover a diversificação

(Gentile apud Magill, 2000) notamos no presente estudo que ambos os grupos, para a tarefa

aberta, não obtiveram diferenças significativas contrariando as propostas citadas.

O EIC parece não ocorrer com crianças confirmando as afirmações de Ugrinowitsch e

Manoel (1996) e Meira Junior (1999) onde o fenômeno também não foi verificado. Apesar te

ter sido verificado que na fase de aquisição a prática variada parece fornecer uma melhor

aprendizagem do padrão, no entanto esta melhora também não foi significativa.

Entretanto o autor afirma que a prática variada somente é eficiente dentro de uma

mesma classe de movimentos, quando as variações da prática forem apenas de parâmetros de

um mesmo PMG. Como citado anteriormente, no presente estudo houve variações de padrões

dos grupos CA e AL, no entanto estes não apresentaram superioridade entre si. Quanto às

afirmações de Meira Junior (1999), de que as crianças por apresentarem baixos níveis de

habilidade e por demorarem mais para decifrar diferenças e similaridades entre habilidades

relacionadas devem ter grande quantidade de prática em blocos antes da prática aleatória, como

vimos, o presente estudo, vai de encontro também a esta afirmação.

Contudo, por não apresentarem diferenças significativas entre os grupos e entre as fases

do experimento, podemos concluir que a inserção de alta IC tarde durante a prática levou aos

mesmos resultados de inseri-la desde o início. Isto indica que as proposições acima citadas

podem estar equivocadas, assim como um número menor de tentativas com alta IC parece ser

tão efetivo para a aprendizagem quanto quando ela é aplicada desde o início da prática.

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Capítulo 8

O efeito da interferência contextual na aprendizagem de

habilidades da ginástica artística

Autor: Vander de Carvalho

Orientador: Victor Hugo Alves Okazaki

Resumo

O objetivo do estudo foi analisar o efeito da interferência contextual na aprendizagem de três habilidades da ginástica artística: reversão, mortal para frente grupado e arco para trás. Quatorze crianças entre 9 e 16 anos iniciantes em ginástica artística, com pouca experiência nas habilidades utilizadas, foram divididas em dois grupos de prática: blocos e variada. Foram realizadas 10 sessões com 20 tentativas de prática para cada habilidade analisada, totalizando 200 tentativas na fase de aquisição. A retenção foi realizada após sete dias do pós-teste. O teste de ANOVA de dois fatores foi utilizado para analisar o efeito da organização da prática (blocos x variada) em função das fases de teste (pré-teste, pós-teste e retenção), com medidas repetidas no último fator. Não foram encontradas diferenças entre os dois tipos de prática realizados (p>0.05). Apenas foram encontradas diferenças no fator fase, indicando melhora na performance dos dois grupos através da prática realizada (p<0.05). Assim, não foi verificado o efeito da interferência contextual nas habilidades da ginástica artística analisadas. A quantidade de prática fornecida e o nível de habilidade dos sujeitos foram utilizados para explicar a ausência do efeito da interferência contextual. Foi sugerido que em habilidades motoras complexas, quando o programa motor generalizado ainda esta em desenvolvimento/aquisição o efeito da interferência contextual não ocorre. Desta forma, o efeito da interferência contextual não se constituiu em um fenômeno global de aprendizagem de habilidades motoras para todas as dimensões de desempenho (nível de experiência, tipos de tarefa, etc.). Termos-chave: Interferência Contextual, Aprendizagem Motora, Ginástica Artística.

Agradecimentos aos membros da ACM de São Paulo, que concordaram com a realização desse estudo em suas dependências, principalmente à Ângela e ao Gabriel; aos meus alunos que são a fonte inspiradora de todo o meu trabalho; ao Prof. Victor Hugo Alves Okazaki, pelo acompanhamento, paciência e orientação segura; e à minha família: Dorali e Beatriz pelo apoio e compreensão incondicionais em todas as horas.

Introdução

A interferência contextual pode ser definida como o efeito que resulta da forma de

prática na aquisição de uma tarefa, em função do contexto de prática realizada. Pode ocorrer

um alto grau de interferência contextual quando habilidades/contextos diferentes, mas auto-

correlacionadas entre si, são praticadas na mesma sessão de prática. Por outro lado, quando

apenas uma habilidade é realizada, ou o contexto não é modificado, durante uma sessão de

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prática, surge uma condição com baixa interferência contextual (Bortoli et al. 1992, Graça &

Mesquita, 2002; Shea & Morgan, 1979).

Sustentação teórica para o efeito da interferência contextual é encontrada na teoria do

esquema motor (Schmidt, 1975). Essa teoria propõe que um programa motor generalizado

(PMG), ou seja, uma representação de uma classe de ações possui aspectos invariáveis do

movimento que são armazenados centralmente e não mudariam durante repetições do

movimento (por exemplo: seqüência, força relativa, tempo relativo, etc.). Estes PMG

utilizariam esquemas motores, ou conjunto de regras abstratas, como um sistema de

conhecimento que é fortalecido através da relação das informações das experiências anteriores.

Assim, o esquema de lembrança é adicionado ao PMG selecionado para uma determinada ação,

determinando os parâmetros de controle do movimento (força absoluta, velocidade absoluta,

direção da ação, etc.). Este esquema de reconhecimento compara a ação planejada e a natureza

das condições iniciais, comparando com o feedback da ação realizada. Por exemplo, ao

planejar um arremesso, a pessoa seleciona o PMG do arremesso e o esquema de lembrança

especifica os parâmetros dessa ação. Após a sua execução, o esquema de reconhecimento

compara o que foi planejado com o executado com as informações do feedback. Como o

esquema é fortalecido através das relações das execuções anteriores, Moxley (1979) propôs a

hipótese da variabilidade de prática, pois através da variação de um mesmo PMG haveria a

possibilidade de relação de um número maior de informações. Essa hipótese possibilitou meios

de testar essa teoria. Então uma das principais contribuições desse modelo é a proposta do

reforço do esquema motor a partir da variabilidade da prática (Martín, 2005).

Quando tarefas são realizadas através de alta interferência contextual, ou também

conhecida como prática variada, a fase de aquisição tende a produzir pior performance, mas

com superior performance na retenção e na transferência. Ao passo que, as tarefas praticadas

com baixa interferência contextual, ou também chamada de prática em bloco, permitem

alcançar melhores níveis de rendimento durante e imediatamente depois da fase de aquisição,

mas, com um rendimento inferior na retenção e na transferência (Bortoli et al., 1992; Francisco

et al., 2006; Landin & Hebert, 1997). Sustentação para a hipótese do efeito da interferência

contextual tem sido verificada em diversos estudos em tarefas laboratoriais, como: mover um

dos braços através de uma série de pequenas barreiras de madeira o mais rápido possível (Shea

& Morgan, 1979), tarefas de timing antecipatório (Del Rey et al., 1983b), pressionar botões em

uma seqüência de percurso pré-determinada (Wulf & Schmidt, 1988), posicionamento do

mouse de computador com a mão preferida (Sekiya, Magill & Anderson, 1996),

posicionamento de alavancas em diferentes ângulos (Sherwood, 1996), lançar uma barra de

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madeira com o dedo médio através de um elástico em direção a um alvo (Pollock & Lee,

1997), etc. Contudo, nos estudos com habilidades motoras mais complexas (esportivas ou

tarefas do cotidiano), os efeitos da interferência contextual não têm encontrado um respaldo

unânime, observando-se grandes oscilações nos resultados obtidos (Figueiredo, 2004;

Francisco et al., 2006; Meira Jr, Tani & Manoel, 2001).

Em estudos que analisando o saque no badminton (Goode & Magill, 1986), rebatidas no

beisebol (Hall, Domingues & Cavazos, 1994), habilidades do voleibol (Bortoli et al., 1992),

habilidades do futebol (Corrêa & Pellegrini, 1996), o efeito da interferência contextual foi

verificado. Contudo, em estudos que analisaram diferentes tipos de lançamento e recepção de

bolas de tênis (Francisco, et al., 2006), estrela na ginástica (Smith, Gregory & Davies, 2003),

arremessos de dardos de salão (Meira Junior, Tani, & Manoel, 2001), tacada do golfe

(Guadagnoli, Holcomb, & Weber, 1999), habilidades do futebol (Santos, 1997), habilidades do

tênis de campo (Hebert, Landin & Solmon, 1996), fundamentos do voleibol (French, Rink &

Werner, 1990), demonstraram que este efeito da interferência contextual pode ser questionado

ao menos em termos de seu poder de generalização (Rossum, 1990; Ugrinowitsch & Manoel,

1999). Por conseguinte, é necessário maior número de estudos que investigue o efeito da

interferência contextual em habilidades motoras mais complexas.

O presente estudo objetivou analisar o efeito da interferência contextual na

aprendizagem de três habilidades da Ginástica Artística. Como em habilidades ginásticas a

evolução da performance se torna cada vez mais complexa (considerando a coordenação,

demanda física e performance técnica), uma nova lacuna se abre para investigar o efeito da

interferência contextual. Tal investigação também contribui nos processos de ensino-

aprendizagem para estruturação da prática e otimização da performance na Ginástica Artística.

Método

Participantes

A amostra foi constituída por 14 crianças de ambos os sexos, divididos em dois grupos

em função do tipo de prática: prática variada (1 menino e 6 meninas; M = 11,7 anos e DP =

2,14) e prática em blocos (2 meninos e 5 meninas; M = 11,29 anos e DP = 2,06). Foram

selecionadas crianças que possuíam um nível mínimo de familiaridade com atividades

específicas de ginástica artística, porém, sem experiência prévia com as habilidades

selecionadas.

Antes do início da avaliação, todas as crianças e seus respectivos responsáveis foram

informados dos procedimentos necessários para o estudo e assinaram um termo livre e

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esclarecido de participação e consentimento. Nenhum dos sujeitos relatou qualquer tipo de

lesão ou incapacidade que pudesse interferir na prática das habilidades.

Equipamento e tarefas

Para a aprendizagem de todas as habilidades foram utilizados colchões de proteção,

plintos, trampolins tipo Reuther, e trampolim acrobático. Por se tratarem de movimentos

complexos com pequeno risco de lesão, os participantes receberam proteção em todos os

momentos e, quando necessário, ajuda na execução.

As imagens filmadas das habilidades foram gravadas em fita, utilizando-se uma câmera

Panasonic VHS, posicionada lateralmente ao sentido do deslocamento dos participantes. Para

que os participantes não fossem intimidados com a presença da filmadora, filmagens de aulas

anteriores ao pré-teste foram realizadas.

Três habilidades da Ginástica Artística foram utilizadas no estudo: reversão, mortal para

frente grupado e arco para trás. As reversões caracterizam-se por serem rotações de 360º,

ligadas com uma translação em plano vertical ou inclinado. Elas ocorrem nas fases apoiadas, ao

redor dos eixos transversal e ântero-posterior temporariamente fixo, nos pontos de apoio e nas

fases não apoiadas, ao redor de eixos livres (Dieckert & Koch, 1981). Nos mortais o corpo é

impulsionado com os pés para o salto, após o corpo gira livremente no ar, para frente ou para

trás, com, no mínimo 360 graus de rotação sobre seu eixo transversal, ou ântero-posterior

finalizando de pé sobre o solo. A postura do corpo durante a fase de vôo dos mortais pode

variar, desde grupada (joelhos flexionados, coxa junto ao tronco, pés junto aos glúteos, cabeça

flexionada à frente, mãos segurando os joelhos) a estendida (segmentos corporais em

alinhamento). O arco ou ponte para trás é o nome dado à reversão para trás, lenta, sem fase de

vôo. Ou seja, partindo da posição em pé, com os braços elevados, uma das pernas à frente,

flexiona-se o tronco para trás, até alcançar a posição de ponte. O movimento de rotação para

trás continua, passando pela parada de mãos até chegar à posição de pé, com afastamento

ântero-posterior das pernas (Brochado & Brochado, 2005).

Por se tratarem de movimentos não muito simples para serem desempenhados por

iniciantes, foram utilizadas progressões pedagógicas no ensino das habilidades propostas (cf.

Araújo, 2003). Quando houve necessidade, algumas progressões pedagógicas foram repetidas

em mais de uma sessão de prática buscando a fixação dos movimentos fundamentais na

performance das habilidades utilizadas. Ambos os grupos realizaram a mesma quantidade de

tentativas em cada progressão pedagógica utilizada.

A progressão pedagógica aplicada para a habilidade de reversão foi: (1) apoio invertido

em frente de um colchão na parede; (2) saltito no trampolim aterrissando em rolamento para a

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frente no colchão; (3) reversão de cima de um plinto com ajuda; (4) em cima do plinto,

desempenhar a reversão apoiando as mãos no minitrampolim e finalizando no colchão; (5)

reversão com apoio das mãos em um trampolim finalizando com ajuda; (6) reversão com ajuda;

(7) reversão propriamente dita, sem ajuda (performance completa). Para a progressão

pedagógica durante a aprendizagem da habilidade de mortal para frente grupado foi realizada a

seguinte seqüência: (1) corrida, impulsão com os pés no minitrampolim, movimento de

mergulho, cair e rolar para frente em três colchões; (2) corrida, impulsão com os pés no

minitrampolim, movimento de mergulho, e queda sentado em três colchões; (3) corrida,

impulsão com os pés no trampolim, execução de um mergulho, e queda sentado em três

colchões; (4) Movimento de mortal para frente na cama elástica com ajuda.; (5) Movimento de

mortal para frente utilizando um trampolim com ajuda; (6) Movimento de mortal para frente

utilizando um trampolim sem ajuda. A progressão pedagógica utilizada na habilidade de arco

para trás seguiu-se com: (1) realização de ponte com ajuda; (2) apoiando no plinto, levantar

para ponte estendendo membros superiores e inferiores (movimentando os ombros para trás);

(3) elevação do membro inferior e fazer ponte de cima com ajuda; (4) fazer a ponte descendo

sem ajuda; (5) fazer a ponte e subir com os pés no plinto até conseguir empurrar até “passar”

(fazer arco); (6) fazer arco com ajuda.

Delineamento experimental e procedimentos

O delineamento experimental compreendeu as seguintes fases: pré-teste, aquisição, pós-

teste e retenção. No pré-teste cada sujeito realizou cinco tentativas seguidas de cada habilidade

que foram filmadas para análise posterior. Na fase de aquisição, os sujeitos praticaram 200

tentativas de cada uma das habilidades organizadas em 10 sessões consecutivas, sendo

realizadas 20 tentativas de cada habilidade em cada sessão. O grupo de prática em blocos

realizou todas as tentativas de uma habilidade, antes de passar para a outra. Exemplo: 20

reversões, 20 mortais, 20 arcos para trás. O grupo de prática variada realizou cada habilidade

de forma randomizada, sendo 5 tentativas de cada uma das habilidades antes passar para outra.

Exemplo: 5 reversões, 5 mortais, 5 arcos, 5 mortais, 5 reversões, 5 arcos, e assim

sucessivamente até completarem 20 tentativas de cada tarefa. Um dia após e uma semana após

o término da fase de aquisição, foram realizados, respectivamente o pós-teste e a retenção.

Nessas duas últimas fases cada sujeito realizou cinco tentativas de cada habilidade filmadas

para a análise. Durante o período compreendido entre o término da fase de aquisição, o pós-

teste e a retenção nenhum individuo praticou as habilidades selecionadas para o estudo.

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À chegada ao local de prática cada participante realizou, em cada uma das sessões, um

aquecimento de 20 minutos composto por exercícios generalizados, específicos e

alongamentos. O aquecimento foi controlado pelo professor de forma a não proporcionar

fadiga. Em seguida os sujeitos foram orientados sobre a progressão pedagógica utilizada em

cada sessão, através de explicações verbais, apresentação de figuras, e utilização de modelos

experientes executando a tarefa. Após, cada participante iniciou sua prática de acordo com o

grupo em que estivesse pré-determinado: em blocos ou variada. O intervalo inter-tentativas foi

de aproximadamente 08 segundos. O conhecimento de resultados (CR) sobre os aspectos

técnicos importantes foi fornecido a cada execução. Entretanto, durante o pré-teste, o pós-teste

e a retenção o CR não foi fornecido. O CR foi necessário durante as sessões de prática por se

tratarem de iniciantes nas tarefas solicitadas, e objetivou garantir um padrão de movimento o

mais próximo ao desejado. O experimento contou com a participação de dois monitores,

estudantes do terceiro ano do curso de bacharelado de Educação Física.

Análise

Cada habilidade foi filmada no pré-teste, no pós-teste, e na retenção. Estas filmagens

proporcionaram a análise das habilidades através de um scout específico, elaborado a partir das

indicações de aspectos técnicos determinantes no movimento (Araújo, 2003). Para cada aspecto

técnico analisado foi atribuída uma pontuação de acordo com a performance de movimento:

não realiza o movimento (1 ponto); realiza parcialmente o movimento (2 pontos); realiza o

movimento (3 pontos). A tabela 1 apresenta os indicadores utilizados na análise de cada uma

das três habilidades.

Um único avaliador experiente realizou as análises dos vídeos para atribuir os escores

de pontuação de cada habilidade. O teste de reprodutibilidade intra-avaliador apresentou um

erro padrão de 0,33 pontos na análise de um vídeo, nas condições experimentais, analisado três

vezes pelo mesmo avaliador (intervalo de 24 horas entre as medidas). O teste de

reprodutibilidade intra-avaliador apresentou um erro padrão de 0,33 na análise do mesmo vídeo

por meio de três avaliadores diferentes (com mais de 4 anos de experiência com a ginástica

artística).

Resultados

A comparação entre dos resultados obtidos pelos dois grupos: prática variada e prática

em blocos, foi efetuada através de análises de variância de dois fatores 2 (prática) x 3 (fases)

com medidas repetidas no segundo fator; as comparações posteriores foram realizadas através

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do teste Tukey. Em todas as análises o nível mínimo de significância foi estabelecido em p =

0,05.

Não foi verificada diferença significante na habilidade de reversão para o fator Grupo

(F1,12 = 2,21; p<0,05), indicando equidade de desempenho entre os grupos. Apenas o fator Fase

(F2,12 = 18,11; p<0,05) demonstrou efeito significante para a habilidade de reversão,

confirmando a melhora do desempenho em função da prática. As comparações posteriores

revelaram maior escore do pós-teste e retenção, em comparação ao pré-teste (p<0,05).

Tabela 1 – Aspectos técnicos observados na performance das habilidades analisadas.

Habilidade: Reversão

Apoio das mãos longe do último apoio do pé

Forte lançamento do membro inferior

Cabeça levantada e olhar dirigido para frente dos apoios

Boa impulsão de membros superiores

Junção dos membros inferiores depois da passagem pela vertical

Corpo flexionado para trás durante todo o vôo Habilidade: Mortal para Frente Grupado Chamada com os pés unidos

Membros elevados acima da cabeça

Forte impulso de membros inferiores

Elevação do corpo mantendo peito “dentro” Elevação dos quadris iniciando o rolamento para frente, fechando o tronco sobre os membros inferiores Abertura do ângulo tronco/membros inferiores no momento apropriado

Forte contração nos membros inferiores no momento da recepção ao solo Habilidade: Arco para Trás (Ponte dinâmica para trás) Elevação de um membro inferior antes de iniciar a flexão de tronco para trás

Olhar em frente

Manutenção do corpo em “tonicidade” elevada

Incidência da flexão para trás na cintura escapular mais do que na coluna lombar

Passagem pelo apoio invertido com membros inferiores bem afastados

Forte impulsão no solo com as mãos na passagem (impulsão de membros superiores)

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No mortal para trás grupado, também não foi verificada diferença entre a prática variada

e a prática em blocos (F1,12 = 3,20; p<0,05). Entretanto, houve evolução do desempenho nos

grupos através das fases do pré-teste em relação ao pós-teste e retenção (F2,12 = 42; p<0,05).

Também foi verificado efeito de interação entre o fator Grupo e Fase (F2,24 = 7,71; p<0,05), no

qual houve melhora da performance no grupo de prática variada do pré-teste em relação ao

pós-teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05); e melhora na performance do grupo de prática em

bloco do pré-teste em relação ao pós-teste (p<0,05). Assim, a prática fornecida durante a fase

de aquisição demonstrou melhoria da performance para ambos os grupos, mas apenas

aprendizagem para o grupo de prática variada.

Figura 1 – Escores da habilidade de reversão dos grupos em função da prática (média e desvio

padrão).

Na habilidade de Arco para trás (figura 3) não foi verificado efeito do fator grupo (F1,12

= 0,80; p>0,05) indicando que o tipo de prática utilizada não foi capaz de distinguir a

performance dos grupos. Apenas foi verificado efeito no fator Fase (F2,12 = 27,50; p<0,05), no

qual houve melhora de desempenho do pré-teste em relação ao pós-teste (p<0,05) e retenção

(p<0,05).

Discussão

O efeito da interferência contextual afirma uma superioridade na prática variada para a

aprendizagem mais efetiva, ou seja, melhores retenção e transferência, em comparação à

pratica em bloco; porém, com detrimento na performance durante a fase de aquisição

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(Figueiredo, 2004; Francisco, et al. 2006; Moxley, 1979; Shea & Morgan, 1979). Isto, pois,

segundo a teoria dos programas motores generalizados, a informação centralmente armazenada

são aspectos invariáveis do movimento (Schmidt, 1975). Se, porventura, a informação

armazenada para controlar os movimentos tivesse que determinar todas as especificações dos

parâmetros de controle, sob a forma de programas motores específicos para cada ação, a prática

em blocos possuiria melhor retenção que a prática variada (Magill & Hall, 1990; Moxley,

1979).

Figura 2 – Escores da habilidade de mortal dos grupos em função da prática (média e desvio padrão).

Figura 3 – Escores da habilidade de arco para trás mortal dos grupos em função da prática (média e desvio padrão).

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No presente estudo, os grupos de prática variada e em bloco não demonstraram

performances diferenciadas durante o pré-teste, pós-teste e retenção, independentemente da

habilidade ginástica analisada (reversão, mortal e arco). Assim, não foi confirmado o efeito da

interferência contextual. Outros autores corroboram com a idéia de que em habilidades mais

complexas, como as esportivas, podem não serem encontrados os efeitos esperados da

interferência contextual. Por exemplo, Lai e Shea (1998), diferenciaram a aprendizagem de

programas motores e parâmetros, sugerindo que o efeito da prática variável para aquisição de

habilidades que necessitem de diferentes programas motores não é marcante em habilidades de

“timing relativo” (formação do programa motor generalizado), apesar de verificarem melhor

transferência para outras tarefas como as de “timing absoluto” (parâmetros de controle)

(Marinovic & Freudenheim, 2001).

Lai e colaboradores (2000) explicam a ausência no efeito da interferência contextual

através da quantidade de prática necessária para que um programa motor generalizado possa

ser desenvolvido e estabilizado. Por exemplo, em uma fase inicial da aprendizagem seria

aconselhada uma prática constante para desenvolver um programa motor generalizado mais

estável para, posteriormente, melhorar a aquisição deste programa motor generalizado através

da prática variada (Lai et al., 2000). Os resultados do presente estudo estão em consonância

com as inferências de Lai e colaboradores, sugerindo que os indivíduos não foram capazes de

desenvolver um programa motor generalizado estável através da quantidade de prática

proporcionada. Isto explica o fato de que em habilidades complexas fechadas, ou seja, aquelas

em que o sujeito determina o início e final do movimento sem interferência do meio, o efeito da

interferência contextual pode não ser encontrado (Eidson & Stadulis, 1991). Pois, segundo

Eidson e Stadulis (1991) o efeito da interferência contextual para tarefas complexas, em termos

de melhor aprendizagem, seria apenas reduzido em habilidades abertas, no qual há

características imprescindíveis do meio que interferem na performance (por exemplo: a

rebatida de uma bola lançada por alguém). Contudo, esta vantagem da prática variada seria

marcante em habilidades fechadas, ou seja, aquelas em que o sujeito determina o início e final

do movimento sem interferência do meio (Eidson & Stadulis, 1991).

A ausência da melhor aprendizagem em função da prática variada, e da melhor

performance durante a aquisição em função da pratica em blocos, sugere também que o efeito

da interferência contextual em habilidades complexas apenas seria encontrado em tarefas já

estabilizadas (Martín, 2005). Tal inferência está em congruência com os estudos de Del Rey e

colaboradores (1982, 1987) que compararam o efeito da interferência contextual em sujeitos

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experientes e novatos nas tarefas de timing antecipatório. Em função dos habilidosos já

possuírem as tarefas inicialmente estabilizadas, foi demonstrado maior aquisição, transferência

e retenção, em comparação ao grupo dos iniciantes (Del Rey et al., 1982, 1987). Por

conseguinte, o nível de habilidade parece ser uma variável interveniente, em habilidades

motoras complexas, para que o efeito da interferência contextual seja verificado (Marinovic &

Freudenheim 2001).

Conclusão

Não foi verificado o efeito da interferência contextual na aprendizagem das habilidades

de ginástica artística de reversão, mortal e arco. A quantidade de prática fornecida e o nível de

habilidade dos sujeitos foram utilizados para explicar a ausência do efeito da interferência

contextual nas três habilidades. Foi sugerido que em habilidades motoras complexas, quando o

programa motor generalizado ainda esta em desenvolvimento/aquisição o efeito da

interferência contextual não acontece. Desta forma, o efeito da interferência contextual não se

constituiu em um fenômeno global de aprendizagem de habilidades motoras para todas as

dimensões de desempenho (nível de experiência, tipos de tarefa, etc).

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Capítulo 9

Efeito da freqüência de conhecimento de desempenho na

aprendizagem de uma habilidade motora do voleibol

Autor: Rodrigo Mendes

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O objetivo do presente estudo foi verificar os efeitos da freqüência relativa do conhecimento de desempenho (CD) na aprendizagem da habilidade motora saque-viagem do voleibol. Participaram da pesquisa 30 sujeitos do sexo feminino com idades entre 15 e 16 anos, que foram organizados em três grupos experimentais: CD-33% (n=10) CD-66% (n=10) CD-100% (n=10). O delineamento experimental abrangeu três fases: pré-teste, pós-teste e retenção, sendo que a fase de retenção foi realizada 5 dias após a fase de aquisição. Os sujeitos executaram 324 tentativas na fase de aquisição e 5 tentativas em cada etapa de avaliação, recebendo CD verbal e prescritivo. O desempenho foi avaliado no que se refere ao padrão de movimento. Os resultados obtidos foram: vantagem de desempenho na fase de retenção para o grupo CD-66%; e resultados semelhantes para os grupos CD-33% e CD-100%, com manutenção de desempenho dos indivíduos de ambos os grupos. Os resultados obtidos sugeriram que: a) o desempenho dos grupos que receberam 100% e 33% de CD assemelham-se devido à quantidade de informação fornecida, sugerindo para o primeiro muita informação a ser assimilada e para o segundo informação insuficiente para a execução da tarefa (mecanismos de feedback); b) a superioridade de desempenho do grupo 66% assemelha-se ao que sugere as teorias atencionais, em que é necessário um intervalo para a assimilação da informação obtida durante a execução da tarefa; e c) possivelmente exista um intervalo ideal entre 33% e 100% que possa promover a aprendizagem efetiva de habilidades complexas na utilização do feedback aumentado como estratégia de aprendizagem.

Termos-chave: aprendizagem motora, feedback, conhecimento de desempenho, saque-viagem

do voleibol.

Introdução

A busca por estratégias com o objetivo de promover e facilitar a aprendizagem de

movimentos tem sido constante. Isso é decorrente das várias incógnitas que norteiam o ensino

de habilidades motoras com o objetivo de solucionar problemas motores, adequando-a para fins

eficientes nas áreas da reabilitação de movimentos, na área pedagógica e no aperfeiçoamento

de habilidades (esporte rendimento). Essa busca pela retenção da aprendizagem buscando

qualidade na realização do movimento é evidenciada em estudos que apresentam como

variáveis de manipulação a metodologia, as práticas, os aspectos atencionais, dentre outros que

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fornecem subsídios para a intervenção do profissional atuante na área da aprendizagem motora

e do comportamento motor.

Na tentativa de propor soluções para melhor eficiência na aprendizagem de

movimentos, alguns fatores intrínsecos ao aprendiz como as sensações e percepções, detecções,

comparações e reconhecimento, o “timing” antecipatório, estado de alerta e a capacidade de

processamento são imprescindíveis. Em suma, outro aspecto que tem sido relevante nas

descobertas sobre a aprendizagem, são os fatores relacionados à memória, voltados

principalmente para a área do controle motor, que realiza abordagens a respeito da estrutura da

memória, dos processos de controle motor, da retenção de informações seriais até os aspectos

que levam ao “esquecimento” na demonstração de uma habilidade motora.

O ser humano é capaz de realizar movimentos habilidosos independente de a tarefa ser

executada em uma situação competitiva, em ambientes industriais ou em situação da vida

cotidiana. Contudo, a capacidade de adquirir novos conhecimentos e habilidades tem

despertado grande interesse em pesquisadores que procuram desvendar como as pessoas

aprendem, assim como identificar as variáveis que influenciam o melhor aproveitamento das

experiências de aprendizagem (Chiviacowsky & Tani, 1997).

Segundo Magill (2000), aprendizagem é uma alteração da pessoa em desempenhar

uma habilidade que deve ser inferida como uma melhoria relativamente permanente de

desempenho, devido à prática ou à experiência, sendo assim a aprendizagem motora se

caracteriza por uma mudança na capacidade em desempenhar uma habilidade. Por caracterizar-

se como uma mudança interna no domínio motor do indivíduo como resultado da prática, a

aprendizagem é influenciada por aspectos psicológicos, fisiológicos e ambientais.

Sabe-se que a prática, por si só, é capaz de produzir melhora na capacidade de

executar habilidades motoras, mas para tornar o processo de aprendizagem o mais eficiente

possível é fundamental que essa prática seja otimizada (Chiviacowsky & Tani, 1997). Por isso,

em aprendizagem motora, é necessário não só estudos que procuram compreender os

mecanismos e processos subjacentes ao desempenho de habilidades motoras, mas também

estudos que pesquisem quais são e como atuam as variáveis que afetam a otimização da

aprendizagem.

Os estudos sobre a aquisição de habilidades motoras apresentam basicamente dois

modelos de aprendizagem motora, o modelo de circuito aberto e circuito fechado que em geral

discordam, sobre a influência do feedback (informação ambiental) na composição do

movimento (Tani et al., 2004).

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Para a teoria de circuito fechado (periferialista), a informação sensorial durante a

execução do movimento é crucial, uma vez que ela é comparada com uma referência de

avaliação armazenada na memória, e caso haja discrepância, essa informação é levada em

conta na correção do movimento subseqüente. Já na teoria de circuito aberto (centralista), o

feedback não desempenha papel importante, uma vez que o movimento é controlado por um

programa motor, o qual age em nível central e, uma vez acionado, especifica a seqüência e o

timing do movimento, sem necessidade de informação sensorial. Esta controvérsia foi resolvida

pela aceitação de que cada teoria explicava uma determinada categoria de movimentos. Sabe-se

hoje que há fatores tanto centrais quanto periféricos no controle de movimentos, interferindo

em menor ou maior grau dependendo do tipo de movimento – lento ou balístico (Tani, 1989).

A mudança mais significante que ocorre durante as fases de aprendizagem é que a

performance se torna cada vez mais independente das demandas da atenção. Em outras

palavras, o movimento se torna menos sujeito ao controle cognitivo às interferências do meio

ambiente. Existe a transferência de controle dos movimentos dos centros mais elevados do

sistema nervoso central para os centros mais baixos, libertando o sistema de processamento

central, para permitir ao executante ocupar-se com outros aspectos da performance ou mesmo

com outras atividades paralelas (Tani, 1989).

A aprendizagem motora pode ocorrer através de dois principais tipos de feedback:

intrínseco ou inerente e extrínseco ou aumentado (Konttinen, Metz & Lyytinen, 2002; Magill,

2000; Sage, 1984; Schmidt & Wrisberg, 2001). A definição contemporânea de feedback, de

forma mais ampla, significa qualquer tipo de informação sensorial sobre o movimento, não

exatamente com referência a erros, mas são informações que aparecem (ou estão disponíveis)

como resultado do movimento e que são repassadas ao executante (Magill, 2000).

Dentro da divisão proposta por Magill (2000), existem duas classificações de feedback

aumentado: conhecimento de resultados (CR) e conhecimento de desempenho (CD). O

conhecimento de resultados (CR) é uma forma de feedback que informa sobre o resultado do

movimento em termos do seu objetivo ambiental e possui algumas funções importantes na

aprendizagem de habilidades motoras, como a motivacional (Magill, 2000), a de orientar o

aprendiz em direção à resposta apropriada (Adams, 1971), assim como a relacional, que

possibilita estabelecer relações entre os comandos motores e a resposta que levam ao

fortalecimento de esquemas para a produção de novos movimentos (Schmidt, & Wrisberg,

2001).

A freqüência de CR refere-se, fundamentalmente, à quantidade de CRs fornecidos e,

também, à forma de distribuição desta informação durante uma sessão de prática. As pesquisas

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sobre esta variável contemplam desde estudos sobre a freqüência relativa de CR (Teixeira,

1993), oferecimento de feedback sumário, faixa de amplitude de CR (Sherwood, 1988), até

freqüência controlada de CR (Chiviacowsky et al., 2006).

Apesar da utilização freqüente de CR por estudiosos, outro tipo de feedback

aumentado tem sido aplicado de forma a aprofundar os conhecimentos sobre as informações

obtidas sobre o próprio movimento: conhecimento de desempenho. A dificuldade encontrada

em estudos com essa característica está na complexidade em selecionar e manipular as

informações de tarefas que envolvem, por exemplo, a coordenação de vários segmentos

corporais. De acordo com Schmidt e Young (1991), as preocupações sobre feedback em

situações reais de aprendizagem estão relacionadas a quais informações sobre padrões de

movimentos complexos são mais ou menos relevantes e, ainda, quando fornecê-las, portanto,

sobre CP. Apesar da diferenciação dos conceitos entre CR e CP, as hipóteses empíricas que

suportam tais condições são as mesmas para ambos: hipótese da orientação, hipótese da

consistência e a hipótese da especificidade.

A hipótese de orientação sustenta que a apresentação freqüente de CR poderia ter

efeitos positivo e negativo sobre a aprendizagem de acordo com as seguintes condições: se o

aprendiz recebesse CR em todas tentativas (freqüência de 100%), o CR efetivamente orientaria

o aprendiz a desempenhar o movimento corretamente, porém levaria o indivíduo a dependência

de feedback para execuções posteriores; e se o aprendiz receber CR com freqüência menor

durante a prática, o mesmo seria estimulado a utilizar mais o feedback intrínseco e, portanto,

não se tornaria dependente da disponibilidade do feedback extrínseco, conseqüentemente,

poderia desempenhar bem a habilidade, mesmo que o feedback estivesse ausente (Salmoni,

Schmidt, Walter, 1984).

A hipótese da consistência sugere que fornecimento de alta freqüência relativa de CR

permitiria que os aprendizes ajustassem seus desempenhos continuamente sobre a base de cada

nova peça de informação fornecida para eles. Acredita-se que essas constantes correções do

desempenho, em curto prazo, impediriam que o aprendiz desenvolvesse um plano de ação

estável, denominado de correções mal adaptadas em curto prazo (Schmidt, 1991). Por fim, a

hipótese de especificidade propõe que quanto mais similares forem as condições de aquisição e

retenção, melhor seja o desempenho na retenção, ou seja, condições similares (aquisição-

retenção) induziriam a melhor aprendizagem do que condições não similares (Winstein &

Schmidt, 1990).

Em síntese, os estudos sobre os efeitos da freqüência relativa de CP na aprendizagem

motora apontam para superioridade das freqüências reduzidas em relação àquela de 100%.

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Nesse sentido, torna-se incessante determinar o quanto é essencial para a aprendizagem de uma

habilidade motora, a freqüência com a qual o feedback aumentado deve ser dado para a

otimização da aprendizagem. Este estudo se justifica pela necessidade de compreensão da

capacidade informacional de CD para guiar ou orientar a performance quando presente na

aquisição de uma habilidade motora, devido a escassez deste tema na literatura.

O objetivo desse estudo é verificar os efeitos da freqüência relativa do conhecimento

de desempenho (CD) no padrão motor da habilidade saque-viagem do voleibol. Considerando

o efeito de dependência causado por freqüências elevadas de CD, a hipótese testada é de que

freqüências de CD inferiores a 100% são benéficas à aprendizagem da habilidade avaliada.

Método

Participantes

A amostra foi constituída por 30 adolescentes do sexo feminino, com idade média de

15,2 anos, que estão em fase de transição de aprendizagem do saque por cima, para o saque

viagem. As participantes eram membros da equipe de vôlei feminino da cidade de Cambe-PR.

Todas as participantes, segundo seu técnico, não apresentavam experiência motora na

habilidade em questão. As mesmas foram consideradas participantes do estudo somente após a

entrega do termo de consentimento concebido pelos pais ou responsável.

Equipamentos e Tarefa

A tarefa consistiu em realizar o saque-viagem do voleibol considerado de alta

complexidade e alta organização. Essa habilidade é descrita em partes para melhor

compreensão das principais ações dos membros utilizados na realização do movimento, este de

forma simplificada consiste em lançar a bola para cima e a frente do corpo, deslocar-se até a

bola com duas ou três passadas, saltar verticalmente para o alcance da bola, orientar a mão de

domínio para o alcance no ponto mais alto do alvo, realização da batida na bola, e por fim a

queda.

Em uma apresentação relacionada à biodinâmica, ou seja, ao padrão do movimento

produzido, o desempenho na execução dessa tarefa pode ser identificado pelas seguintes

etapas:

a) Lenta caminhada ou passadas caracterizadas por três momentos: impulsão, oscilação e

apoio;

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b) Salto vertical caracterizado pela projeção do corpo verticalmente no ar, com o impulso dado

por um ou dois pés, sendo esta pontuada por: agachamento preparatório do joelho; extensão

dos quadris, joelhos e tornozelos; e extensão total do corpo;

c) movimento da realização do saque: elevação simultânea dos braços; inclinação da cabeça

para o alvo (bola); hiper-extensão da coluna vertebral simultaneamente com rotação da mesma;

e elevação do braço de alcance com inclinação do ombro combinada com o abaixamento do

braço contralateral ao movimento no auge do vôo; flexão do ombro da mão de saque vindo a

praticar abdução de aproximadamente 90 graus, estendendo-se horizontalmente; cotovelos

flexionados e acima do ombro;

d) a batida na bola que é caracterizada pela extensão do braço em direção a bola finalizando o

movimento com flexão de punho e finalizando o movimento do braço oposto ao de ação

próximo ao abdômen;

e) a queda identificada pelo toque no solo com a ponta dos pés proporcionando o

amortecimento da queda; toque seqüencial de todas as plantas dos pés tocando no solo, e os

tornozelos praticando dorsiflexão.

A tarefa era realizada na área de saque de acordo com as regras de voleibol,

permitindo à participante utilizar 5 m para a realização do saque após os 9 m finais da quadra.

As imagens foram coletadas a aproximadamente 35º graus em relação à linha lateral da quadra

focando a execução completa do movimento, utilizando-se uma câmera digital JVC modelo

GRAX-710, montada sobre um tripé com 1,80 m de altura. O posicionamento da câmera, bem

como as alturas do tripé foram definidas num estudo piloto.

Além desses instrumentos, foram utilizadas: nove fitas de vídeo, para a filmagem dos

sujeitos realizando a tarefa; uma TV (20 polegadas) e um aparelho de vídeo-cassete, utilizado

para demonstração da tarefa por meio de uma gravação em videoteipe de um modelo

executante e também para posterior análise dos resultados; 30 bolas de voleibol penalty 6.0

calibradas para a execução do saque-viagem; fichas de controle de execução das tentativas em

todas as fases do estudo, para controlar o número de execuções em cada sessão, no pré-teste, no

pós-teste e no teste de retenção; e fichas de pontuação para posterior análise do padrão de

movimento em cada tentativa.

Delineamento experimental e Procedimentos

Os sujeitos foram distribuídos aleatoriamente para um dos três grupos experimentais:

Grupo 33%, formado por 10 indivíduos. Este grupo recebeu CD a cada três execuções do

saque;

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Grupo 66%, formado por 10 indivíduos. Este grupo recebeu CD a cada dois saques realizados;

Grupo 100%, formado por 10 indivíduos. Este grupo recebeu CD depois de cada tentativa.

Inicialmente, os participantes assistiam a um vídeo, de acordo com o grupo de CD a

que pertencia. No vídeo era demonstrado o desempenho de uma atleta de alto-rendimento

executando o saque-viagem, para familiarização com a tarefa e visualização dos pontos

principais da habilidade, direcionando o foco atencional do indivíduo para os aspectos

primordiais para a execução da tarefa. As imagens foram apresentadas por três vezes e com a

demonstração por meio do vídeo, as participantes tiravam dúvidas sobre os principais

movimentos realizados durante a execução da tarefa, estabelecidos como primordiais para a

aquisição da mesma.

A coleta de dados foi realizada em 3,5 semanas: o primeiro dia foi destinado à

realização do pré-teste (verificação antecipada dos efeitos que a variável estabelecida

produziria nos participantes do estudo) e a primeira das nove sessões, que foram distribuídas

em 3 sessões por semana. A fase de aquisição foi realizada em 9 sessões. Em cada sessão eram

feitas 36 tentativas, (divididas em 3 séries de 12 tentativas com intervalo de 1 minuto entre as

séries). O pós-teste foi realizado imediatamente após o final da fase de aquisição.

Como meio de avaliar a persistência do desempenho atingido durante a prática e de

controlar variáveis que possam ter ocorrido durante a prática superestimando ou subestimando

a aprendizagem, foi aplicado um teste de retenção cinco dias após a realização do pós-teste.

Esse teste consistiu na execução de 3 tentativas preparatórias e 5 execuções para a avaliação da

retenção da aprendizagem.

Considerando que os participantes do estudo eram principiantes na habilidade, e que

eles deveriam dividir sua atenção entre lembrar-se das instruções e desempenhar a habilidade

efetivamente, uma quantidade mínima de informação verbal foi estabelecida destacando os

pontos principais da habilidade, enfocando a cada instante um aspecto diferente da mesma,

realizando as correções com pistas verbais estabelecidas diante do seguinte critério:

declarações curtas relacionadas com os aspectos da habilidade que elas deveriam auxiliar

informando somente os elementos mais críticos do desempenho da habilidade, ou seja, uma

informação reguladora relevante para a execução próxima às particularidades da habilidade.

Análise dos dados

O desempenho de cada indivíduo foi analisado com base nas 4 fases pré-definidas do

saque-viagem e para cada subitem dentro de uma fase foram estabelecidos 3 níveis de

pontuação de acordo com a execução do movimento, sendo que o escore total é a soma dos

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pontos de cada item: 1 ponto, para ausência do componente; 2 pontos, para execução incorreta

do componente; e 3 pontos, para execução correta do componente.

Com base na lista de checagem estabelecido no estudo piloto, foi proposta uma

pontuação total de desempenho para cada de execução, que foram assim divididas: 1) fase de

solo; 2) fase aérea; 3) fase de ação principal; e 4) fase de apoio (retomada ao solo). A fase 1

consiste de 5 subitens, de acordo com as características dos movimentos (componentes da

habilidade) realizados com pontuação variando de 5 a 15 pontos. A fase 2 consiste em 7

subitens relacionados às ações observáveis da habilidade com variação de pontuação entre 7 a

21 pontos. A fase 3 consiste em 5 subitens, com pontuação variando entre 5 e 15 pontos. Por

fim, a fase 4 foi dividida em 3 subitens, em que a pontuação total obtida foi de um mínimo de 3

ao máximo de 9 pontos. Com base na somatória dos pontos de cada fase, o escore total mínimo

foi de 20 pontos, enquanto que o escore máximo foi de 60 pontos.

A análise da fidedignidade das medidas foi realizada com a comparação das diversas

aplicações da medida obtida dentro dos diferentes grupos, considerando-se a significância da

diferença absoluta entre os escores. Como meio de fornecer maiores subsídios sobre a

consistência interna dos procedimentos adotados no experimento, as imagens foram assistidas

por 3 vezes em diferentes semanas (1 vez por semana).

Os dados foram analisados estatisticamente com a aplicação da análise de variância de

dois fatores, 3 (grupo) x 3 (fase) com medidas repetidas no segundo fator. Os contrastes

posteriores foram feitos por meio da prova de Newman-Keuls. O nível mínimo de significância

foi estabelecido em 5%.

Resultados

Os resultados da análise indicaram efeito significativo do fator principal teste, F(2,54)

= 155,74, p < 0,0001, e interação grupo x teste, F(2, 54) = 3,10, p < 0,05 (Figura 1). Os dados

obtidos indicam que: a) não houve diferença significativa entre os grupos no pré-teste; b)

vantagem do grupo 66% no pós-teste e retenção em relação aos demais grupos, que não

diferiram entre si; e c) todos os grupos melhoraram de desempenho do pré para o pós-teste e

não alteraram significativamente seus desempenhos na comparação entre pós-teste e retenção.

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Pré-teste Pós-teste Retenção

Fases

Esc

ore 33%

66%100%

Figura 1. Escore de avaliação qualitativa do saque (pontuação máxima = 60 pontos) dos grupos

em cada fase do experimento.

Discussão

O objetivo do presente estudo foi investigar os efeitos da freqüência relativa de

conhecimento de desempenho - CD - na aprendizagem da habilidade motora saque-viagem do

voleibol. Com a obtenção dos dados notamos que houve semelhança dos grupos CD-33% e

CD-100% na fase de retenção, e o desempenho do grupo CD-66% foi superior aos citados

anteriormente. Considerando que a hipótese desse trabalho foi elaborada a partir daquelas dos

estudos sobre CR - consistência, especificidade e orientação - podemos afirmar que as mesmas

foram consideravelmente suportadas. Esta conclusão é sustentada por estudos clássicos que

revelaram que fornecer o feedback aumentado após todas as tentativas faz o aprendiz se

envolver em um tipo de processo de aprendizagem totalmente diferente do que ele vivenciaria

se não tivesse recebido feedback aumentado em todas as tentativas. Estes estudos sustentam

que o feedback em todas as tentativas, efetivamente orientará o aprendiz a desempenhar o

movimento corretamente (Salmoni, Schmidt & Walter, 1984; Winstein & Schmidt, 1990).

Porém, este fator desenvolve certa dependência devido à disponibilidade constante de feedback

aumentado, de modo que quando precisar desempenhar a atividade sem ele, o desempenho será

pior do que seria se o feedback aumentado tivesse sido fornecido.

A hipótese da consistência considera que o provimento de alta freqüência relativa de

CD permite que os aprendizes ajustem seus desempenhos continuamente sobre a base de cada

nova informação fornecida para eles. Acredita-se que essas constantes correções do

desempenho, em curto prazo, impeçam que o aprendiz desenvolva um plano de ação estável.

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Em relação aos arranjos sumários de CR e média de CR, as pesquisas têm demonstrado que os

mesmos promovem consistência do desempenho (Rose, 1997 apud Correa et al., 2005).

A hipótese da especificidade sugere que quanto mais parecidas forem as condições de

aquisição e de retenção de habilidades motoras, mais efetiva seria a aprendizagem. Por essa

visão era esperado que a condição freqüência relativa de CD 33% tivesse um desempenho

superior sobre aquela de 66% e de 100%, o que não ocorreu.

A hipótese da orientação sugere que a apresentação freqüente de CR pode ter dois

efeitos sobre a aprendizagem: um positivo e outro negativo. O efeito positivo ocorre quando o

aprendiz recebe feedback aumentado em todas as tentativas e esse feedback tem função de

orientação, isto é, ele orienta o aprendiz a desempenhar o movimento corretamente. O efeito

negativo refere-se ao processo de orientação levar o aprendiz a uma dependência do CR. Desse

modo, se o CR é fornecido com freqüência relativa de 100%, os sujeitos passam a confiar nessa

fonte de informação para manter o desempenho, conseqüentemente, não aprendem a lidar com

as outras informações como aquelas de fontes intrínsecas. A hipótese de orientação propõe,

ainda, que o fornecimento de freqüências reduzidas de CR (menos do que 100%) estimula o

aprendiz a utilizar mais do feedback intrínseco e, dessa forma, ele não se torna dependente do

feedback extrínseco. Isso faz com que o desempenho do aprendiz não piore numa situação em

que o feedback esteja ausente, o que não ocorreu no presente estudo (Salmoni, Schmidt &

Walter, 1984).

Em síntese, os resultados do presente estudo dão suporte à hipótese de superioridade

da freqüência relativa de CR reduzida [66% > 100%!], tampouco vão ao encontro das

proposições sobre a eficácia da aprendizagem sob freqüências relativas de CR de 100%. Com

relação ao desempenho, por todas as hipóteses citadas anteriormente, deveria haver diferença

de desempenho na fase de aquisição em favor do grupo CD-100%. Contudo, escores maiores

foram obtidos para o grupo CD-66% no pós-teste e na retenção em relação aos grupos 33% e

100% que apresentaram escores semelhantes. É importante lembrar que, apesar dos diferentes

efeitos sobre os grupos deste estudo, as categorias de CDs foram as mesmas para os três grupos

(direção espacial do corpo, localização espacial e tempo de bola, e fluência do movimento),

diferenciando apenas as freqüências relativas de CD caracterizadas neste trabalho.

Os resultados obtidos são semelhantes aos encontrados na literatura em que os

experimentos mostraram que freqüências relativas de CR variando entre 20 a 75% são mais

efetivas para a aprendizagem de habilidades do que o CR fornecido após cada tentativa

(Schmidt, 1989; Winstein & Schmidt, 1990). Cabe ressaltar que apesar destes autores

colocarem o valor de 20% em condições semelhantes dentro do intervalo de 20-75%, no

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105

presente estudo com uma habilidade de alta complexidade foi verificado semelhança entre as

condições CD-33% e CD-100%, mostrando que o intervalo sugerido no estudo em discussão

pode ser retratado apenas para tarefas laboratoriais, e não para aplicação prática.

Os resultados encontrados para o grupo CD-33% podem ser baseados na idéia de que

os sujeitos podem não ter conseguido lidar com o feedback intrínseco como esperado, e

conseqüentemente, não tenham desenvolvido um mecanismo de detecção e correção de erro

superior ao grupo CD-100%. Por outro lado, inferimos que os sujeitos que praticaram a

habilidade com 100% de CD não tenham se tornado dependentes da informação extrínseca a

ponto de ter seu desempenho prejudicado durante a retenção (Chiviacowsky & Godinho, 2004).

Correa et al. (2005) propuseram que o feedback extrínseco quando atua como função

informacional após todas as tentativas, não seja tão requerido durante a aprendizagem de

movimentos simples. Porém, a utilização de uma tarefa de alta complexidade e alta

organização também não mostrou diferença nos resultados para as condições CD-100% e CD-

33%. Isso ainda fornece apenas uma base para o estudo de habilidades motoras complexas,

visto que são poucos os estudos que investigam tarefas em ambientes aplicados. Nesse sentido,

Swinnen (1996) sugere que a hipótese de orientação necessita de mais investigação, justamente

por ela ter sido elaborada com pesquisas envolvendo a aquisição de tarefas simples.

As características da tarefa também podem ser relacionadas aos argumentos acima,

pois podem existir tarefas cuja execução possibilita a utilização de feedback intrínseco

suficiente para que os aprendizes melhorem sua performance até um certo nível (Chen, 2001;

Magill, 1994; Swinnen, 1996).

Considerando que neste estudo foram comparadas três freqüências relativas de

conhecimento de desempenho e que a retenção foi obtida 5 dias após o término da fase de

aquisição (prática) da tarefa, chegamos à conclusão de que existe melhor retenção de

aprendizagem para esta habilidade quando utiliza-se o CD 66%, o que denota certa relação com

o tempo de programação do movimento em denotação a seus aspectos atencionais, pois o

tempo entre duas tentativas para esta habilidade demonstra que existe melhor desempenho e

melhor retenção do que para os indivíduos que receberam CD esporadicamente (33%) e os que

receberam CD a cada execução (100%), reforçando a hipótese de que a quantidade de

informação deve ser regulada em função da capacidade limitada de atenção, pois os indivíduos

necessitam de um certo tempo para assimilação da informação e escolha da estratégia

necessária para atingir a meta nas próximas tentativas.

Hipotetizamos também que, por se tratar de uma tarefa de alta complexidade, sua

aprendizagem exige CD mais freqüente do que 33%, fato este que pode ser utilizado para

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explicar a vantagem do grupo 66% em relação aos demais. Isto sugere que possivelmente

exista um intervalo ideal entre 33% e 100% que possa promover a aprendizagem efetiva de

habilidades complexas. Neste sentido, propomos para futuros estudos a averiguação de um

intervalo “ideal” de CD, na tentativa de solucionar vieses para tarefas motoras de alta

complexidade.

Referências

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ANEXO 1: Itens pontuados

1) Fase de solo (corrida e preparação inicial para o salto):

Passadas com amplitude de média a longa respectivamente com semi-flexão de

joelhos

Extensão completa da perna de apoio

Tronco ligeiramente inclinado à frente

Extensão dos braços em direção dorsal

Pé contrário à mão de golpe à frente, no momento de transição de fase (corrida-salto).

2) Fase aérea (salto com o objetivo de golpear a bola):

Transferência de apoio dos calcanhares para a ponta dos pés com flexão dos joelhos

Impulsão realizada com ambos os pés, realizando extensão dos joelhos

Lançamento dos braços simultaneamente na vertical

Tronco movimenta-se para frente projetando o quadril para trás

Braços estendidos paralelamente acima da cabeça

Hiper-extensão da coluna simultaneamente com a rotação da mesma

Inclinação da cabeça com foco no objeto (bola)

3) Fase de ação principal (o golpe):

Abdução do ombro de ação com ângulo de aproximadamente 90 graus entre braço e antebraço estendendo-se horizontalmente Elevação e extensão do braço de alcance ao objetivo (bola) Inclinação do ombro combinada com o abaixamento do braço contralateral ao movimento no auge do vôo Braço oposto ao de ação realiza extensão simultaneamente com o braço de ação, finalizando próximo ao abdômen Flexão de pulso na finalização da ação

4) Fase de apoio:

Pouso realizado com os dois pés simultaneamente Flexão de joelhos, tornozelo e quadril são realizadas simultaneamente Ponta, plantar e calcanhar tocam o solo respectivamente

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Capítulo 10

Efeito da freqüência de conhecimento de resultados na

aprendizagem de habilidade gráfica em crianças

Autora: Vivian Carvalho Nery Ramalho

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

O presente estudo teve como objetivo verificar o efeito da freqüência de conhecimento de resultados (CR), na aprendizagem da habilidade motora de desenhar uma estrela durante 5 s, por crianças com idade entre 8 e 10 anos de idade. Participaram do experimento 14 crianças, distribuídas igualmente em dois grupos. Os dois grupos receberam CR terminal e verbal. Na fase de aquisição um dos grupos recebeu CR em 100% das tentativas e o outro grupo recebeu CR em 50% das tentativas. Durante a fase de aquisição ambos os grupos realizaram 100 tentativas, que foram divididas em dois dias de prática. Na fase de aquisição não foram detectados efeitos significativos para os fatores principais freqüência, indicando que ambos os grupos melhoraram igualmente com a prática oferecida em todos os blocos de tentativas e que houve uma redução temporal entre os blocos. Na fase de testes, a ausência de efeitos significativos na análise do erro absoluto indica que o comportamento entre os testes foi estável entre os dois grupos. Esses resultados indicaram que as duas freqüências de feedback tiveram o mesmo efeito de aprendizagem nas crianças.

Termos-chave: habilidade motora, freqüência de conhecimento de resultados, feedback extrínseco, crianças.

Agradecimentos aos alunos do colégio Liceu Carvalho Pinto, que colaboraram para a coleta de dados, e ao meu marido, Fábio, pelo carinho e compreensão durante a realização da pesquisa.

Introdução

Durante a aquisição de uma habilidade motora, são necessários diversos fatores, dentre

esses fatores provavelmente inferior apenas à prática propriamente dita encontra-se o

conhecimento de resultados (CR), que é um tipo de feedback,e é um parâmetro indispensável

para a aprendizagem. Conhecimento de resultado é um tipo de informação, que pode tomar

muitas formas no ambiente de aprendizagem, capaz de informar o aprendiz sobre o resultado

ou eficiência de um movimento, durante ou após a sua execução (Chiviakowsky & Tani, 1993).

O feedback pode ser dividido em intrínseco e extrínseco. O feedback intrínseco,

segundo Schmidt (citado por Cunha, 2003) é a informação fornecida como uma conseqüência

natural da realização de uma ação. Todos os aspectos dos movimentos intrínsecos à tarefa

podem ser percebidos mais ou menos diretamente, sem métodos ou aparelhos, ou seja, através

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110

dos órgãos sensoriais e proprioceptivos. O feedback extrínseco é freqüentemente denominado

conhecimento de resultados (CR) e o seu efeito na aprendizagem motora tem sido intensamente

estudado desde o começo do século XX (Tani, Meira Junior & Gomes, 2005).

A variável freqüência de CR refere-se ao número de CRs fornecido em relação ao

número de tentativas executadas. São distinguidas duas medidas diferentes de freqüência de

CR: absoluta e relativa. Freqüência absoluta de CR é o número total de CRs fornecidos durante

a prática. Se 80 tentativas de prática são executadas e o sujeito recebe CR em metade das

tentativas, então a freqüência absoluta é 40. Freqüência relativa de CR refere-se à porcentagem

de tentativas em que é provido o CR. É o número de CRs dividido pelo total de tentativas,

multiplicado por 100. No exemplo anterior, 50%.

A pesquisa sobre esta variável comporta um amplo leque de manipulações, que engloba desde

estudos sobre a freqüência relativa propriamente dita, até estudos sobre sumário de CR, faixa

de amplitude de CR, CR médio, freqüência decrescente de CR, e mais recentemente freqüência

auto-controlada de CR (Chiviakowsky & Godinho, 2004).

Por muito tempo foi considerado que o fator realmente importante em termos de

feedback dado por uma fonte extrínseca era a quantidade absoluta de informação, não fazendo

muita diferença a freqüência em que ela era oferecida (Teixeira, 2004). No entanto, está visão

tem sido contrariada por estudos recentes.

Schmidt, Young, Swinnem e Shapiro (citados por Chiviakowsky & Tani, 1997), seguindo os

trabalhos pioneiros de Lavery (1962) e Lavery e Suddon (1962), examinaram uma variável

chamada CR sumário (fornecer feedback de forma sumária significa acumular uma série de

tentativas de prática antes de fornecer informações sobre elas ao executante de forma

concentrada), em que o feedback sobre um conjunto de tentativas é fornecido após o término da

última tentativa do conjunto. Os resultados mostraram que aumentando-se o número de

tentativas do conjunto, ou seja, diminuindo-se a freqüência com que o CR é fornecido, durante

a fase de aquisição, uma piora no desempenho era observada. Entretanto, tais condições

produziam um melhor resultado quando o desempenho era medido em testes de retenção e

transferência.

Em um estudo realizado por Wulf, Lee e Schmidt (1994), os grupos que tiveram uma

freqüência de CR de 100% não apresentaram diferença em relação ao grupo com CR de 50%

durante a prática e em um teste de retenção realizado imediatamente após a aprendizagem da

habilidade, mas em um teste de retenção realizado um dia após, onde os efeitos temporários já

teriam se dissipado e ficado apenas os efeitos permanentes da aprendizagem, o grupo que

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recebeu CR de 50% apresentou um efeito superior de aprendizagem em relação ao grupo de

100%.

Ugrinowitsh et al. (2003) investigou o papel da incerteza no processo adaptativo em

aprendizagem motora por meio de uma tarefa de preensão, e uma forma de manipular a

incerteza no processo de aprendizagem é controlar a freqüência de CR durante a aprendizagem

de uma habilidade motora, durante a aprendizagem o feedback era fornecido de três maneiras

diferentes, a cada execução, a cada duas execuções e a cada três execuções. O grupo que

obteve feedback a cada três execuções, apresentou um melhor desempenho tanto para o erro

absoluto como para o erro variável, levando a concluir que a incerteza foi benéfica para a

aprendizagem da tarefa de preensão.

Em um estudo com crianças de diferentes faixas etárias, Chiviakowsky e Tani (1993)

utilizaram quatro freqüências relativas de CR: 30%, 50%, 60% e 100%. Nos testes de

transferência, as crianças do grupo de 7 anos com 60% de CR apresentaram desempenho

significantemente superior aos demais e o grupo de 50% apresentou uma tendência de

superioridade em relação aos outros dois grupos.

Tomando por base o conjunto dos estudos supracitados, notamos efeitos contrários na

comparação entre a fase de prática e retenção. Quando analisados os efeitos transitórios da

prática, há clara vantagem em se oferecer o feedback ao final de cada tentativa. Quando

analisado os efeitos de longa duração, através de um teste de retenção de aprendizagem, a

relação de desempenho se inverte, apresentando melhor desempenho para condições de prática

com maior espaçamento temporal entre a ação e a informação de feedback.

A explicação para esses fatos pode ser que ao receber o feedback aumentado depois de

todas as tentativas de prática, aumenta a probabilidade de que o indivíduo se torne dependente

dela, e quando o feedback aumentado é fornecido com menor freqüência durante a prática,

estimula o indivíduo a se envolver em processos de aprendizagem mais benéficos durante a

prática (Magill, 2004). Segundo Wulf e Schmidt (1994), para o aprendiz o feedback representa

um erro que deve ser corrigido, portanto quando o feedback é fornecido em alta freqüência

produz uma variabilidade de movimento muito grande, interferindo no processo de

estabilização da memória em relação ao movimento correto e em uma boa performance em um

teste de retenção.

De acordo com Adams (citado por Chiviacowsky & Tani, 1993), para que ocorra

aprendizagem, em vez de repetir suas respostas passadas, o indivíduo deverá variar seu

comportamento e tornar sua próxima resposta diferente da anterior. Isto, para o autor, só poderá

acontecer com o auxílio da variável CR, que é a informação sobre a adequação do último

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movimento executado. O indivíduo utiliza o CR relacionando-o com seu traço perceptivo,

ajustando-o e tornando seu próximo movimento mais adequado que o anterior. O resultado,

através das tentativas é a melhora gradual chamada de aprendizagem e o fortalecimento do

traço perceptivo relacionado ao movimento correto.

Estudos utilizando um delineamento com fase de transferência, encontraram que

freqüências relativas menores do que 100% seriam melhores para a aprendizagem. Algumas

hipóteses foram levantadas para tentar explicar o fato de que tentativas sem CR, fornecidas em

um delineamento com freqüência relativa menor do que 100%, podem auxiliar o processo de

aprendizagem, contrariamente à noção prévia de que tais tentativas são praticamente sem

utilidade. Quando a informação extrínseca sobre o resultado do movimento realizado não é

fornecida ao aprendiz, o que ocorre em freqüências relativas menores do que 100%, suas

atividades de processamento tornam-se livres para serem direcionadas a outras informações

que se encontram disponíveis, as quais poderão formar a base para avaliação e possível

correção do seu desempenho. Esse procedimento pode tornar-se positivo quando o CR é

retirado posteriormente, o que pode tornar o aprendiz mais sensível a detectar e corrigir seus

erros.

As crianças não possuem a mesma capacidade dos adultos para processar informações,

manifestando maior dificuldade em aproveitar as informações intrínsecas disponíveis mais

importantes para detectar e corrigir seus erros. Em razão disto, podem necessitar de feedback

extrínseco mais do que os adultos para que o padrão de referência seja suficientemente

fortalecido. Em função da maioria dos estudos com freqüência de conhecimento de resultados

serem feitos com adultos, o presente estudo teve como objetivo verificar o efeito da freqüência

de conhecimento de resultados em crianças.

Método

Participantes

Participaram do estudo 14 crianças, alunos de uma escola da rede particular de ensino

situada na cidade de São Paulo, com idade entre 8 e 10 anos, inexperientes em experimentos de

aprendizagem motora. A participação na pesquisa foi voluntária e realizada após o

consentimento dos pais ou responsáveis.

Equipamentos e tarefas

Foram utilizadas folhas sulfite, caneta esferográfica e um cronômetro digital.

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A tarefa consistia em desenhar uma estrela de cinco pontas com 10 cm de comprimento em

cada ponta no tempo de 5 s. Para desenhar a estrela as crianças tinham um modelo base. Ao

final de cada tentativa era informado à criança quanto tempo ela excedeu ou adiantou em

relação aos 5 s predeterminados. Na tarefa de transferência a criança tinha que desenhar um

círculo em 5 s com 10 cm de diâmetro, recebendo também um modelo base.

Delineamento experimental e procedimentos

As crianças foram divididas em dois grupos de 7 e praticaram em diferentes condições

de freqüência de CR. Os dois grupos receberam CR verbal e terminal. Na fase de aquisição um

grupo recebeu CR em todas as tentativas (100%), e o outro grupo recebeu CR em tentativas

intercaladas (50%). Os dois grupos realizaram 2 blocos de 50 tentativas em dois dias de

prática. Foi realizado um teste de retenção 48h após a fase de aquisição, que consistiu de 5

tentativas sem CR. As crianças realizaram um teste de transferência logo após o teste de

retenção que consistiu de 5 tentativas sem CR na tarefa de desenhar um círculo em 5s. Foi

utilizado um cronômetro digital para controlar os intervalos de tempo. O intervalo

intertentativas foi de 10 s, com o CR sendo fornecido aos 5 s desse intervalo.

Ao chegar ao ambiente do experimento, cada criança recebia informações sobre a tarefa. O

experimentador fazia uma demonstração da tarefa para que a criança pudesse saber a duração

de 5 s. Após essa demonstração eram iniciadas as tentativas de prática.

Análise

Os dados utilizados para análise estatística correspondem aos resultados do tempo de

movimento obtidos na fase de aquisição e todo o conjunto de dados da fase de testes (retenção

e transferência). Os valores do tempo de movimento foram transformados em erro temporal

(algébrico e absoluto), e em seguida foi analisado se houve melhora durante a prática e a

relação entre os grupos nos testes de retenção e transferência. O modelo estatístico para a fase

de prática foi análise de variância de dois fatores, 2 (grupo) x 10 (bloco) com medidas repetidas

no segundo fator. Para os testes principais foram empregadas análises de variância de dois

fatores, 2 (grupo) x 2 (fase: retenção x transferência) com medidas repetidas no segundo fator.

Os contrastes foram realizados com a prova Newman-Keuls. Em todas as análises o nível

mínimo de significância foi de 5%.

Resultados

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A análise do erro algébrico na fase de aquisição, não detectou efeitos significativos para

os fatores principais grupo, F(1, 12)=1,079, e bloco, F(9, 108)=1,057, e nem interação entre

esses fatores, F(9, 108)=0,326, valores de p > 0,05 (ver Figura 1).

Figura 1 – Erro Algébrico (s) na fase de aquisição para os grupos de 50% e 100% de CR em cada bloco de tentativas em segundos.

Na análise do erro absoluto não foram detectados efeitos significativos para o fator

Grupo, F(1, 12)=1,64. Apesar de durante a prática a melhora no desempenho ter sido irregular,

atingiu significância entre os Blocos, F(9, 108)=1,93, p < 0,05. Não foi observada interação

entre os dois fatores, F(9, 108)=0,58, (ver Figura 2). Esses resultados indicam que ambos os

grupos melhoraram igualmente com a prática oferecida em todos os blocos de tentativas e que

houve uma redução do erro temporal entre os blocos.

Figura 2 – Erro absoluto (s) na fase de aquisição para os grupos de 50% e 100% de CR em cada bloco de tentativas em segundos.

A análise do erro algébrico nos testes detectou efeito significativo para o fator Teste

F(1, 12)=7,40, p < 0,01, mas nenhum efeito foi observado para o fator Grupo, F(1, 12)=0,039,

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nem interação entre os dois fatores, F(1, 12)=0,09. O efeito do fator Teste foi devido a

movimentos com tempos significativamente menores na transferência em relação à retenção

(Figura 3).

Figura 3 – Erro algébrico (s) nas fases de retenção e transferência para os grupos de 50% e 100% de CR.

A análise do erro absoluto não indicou qualquer diferença significativa para o fator

Grupo, F(1, 12)=0,26, fator Teste, F(1, 12)=1,39, ou interação entre fatores, F(1, 12)=1,40. A

ausência de significância na análise do erro absoluto mostra que o comportamento entre os

testes foi estável entre os dois grupos (ver Figura 4).

Discussão

O objetivo deste estudo foi investigar o efeito da freqüência relativa do conhecimento

de resultados na aprendizagem de uma habilidade motora em crianças com faixa etária entre 8

a 10 anos. Para verificar o efeito dessa variável na aprendizagem foi utilizado um delineamento

com fase de retenção e transferência, a qual possui a capacidade de separar os efeitos

passageiros de desempenho dos efeitos mais permanentes de aprendizagem.

Com relação aos resultados deste estudo, devemos levar em consideração que a maioria

dos estudos realizados sobre freqüência de CR foram realizadas com adultos, diferentemente

deste estudo que utilizou como amostra crianças com faixa etária entre 8 e 10 anos.

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Figura 4 – Erro absoluto (s) nas fases de retenção e transferência para os grupos de 50% e 100% de CR.

Com os resultados obtidos neste estudo, podemos inferir que para as crianças assim

como para os adultos, uma freqüência muito alta de CR (100% de freqüência relativa), pode

não ser tão efetiva para a aprendizagem. Por outro lado a falta de informação extrínseca (no

caso freqüência de 50%) para as crianças também pode não ser tão efetiva para a

aprendizagem, diferentemente dos adultos.

No caso de freqüências relativas muito baixas, as crianças podem não conseguir formar

um padrão de referência do movimento correto (traço perceptivo ou esquema de recordação).

Sem este padrão fortalecido, elas não conseguem detectar e corrigir erros utilizando-se somente

do feedback intrínseco (Chiviakowsky & Tani, 1993).

Os resultados de um estudo em crianças com diferentes faixas etárias realizado por

Chiviakowsky e Tani (1993), mostraram uma diferença significante a favor do grupo que

praticou com uma freqüência relativa de 66%, em relação ao grupo que praticou com uma

freqüência relativa de 100%, ou seja, que recebeu CR em todas as tentativas, concluindo que

uma freqüência menor que 100% foi mais eficiente para a aprendizagem da habilidade em

questão, por outro lado, os grupos que praticaram com freqüência relativa de 50% e 33% não

diferiram dos grupos que praticaram com 100% de freqüência. Este fato pode ser explicado

pela hipótese de que freqüências relativas muito baixas para as crianças faz que elas não

consigam formar um padrão de referência do movimento correto. Sem este padrão fortalecido,

elas não conseguem detectar e corrigir erros utilizando-se somente do feedback intrínseco.

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Em vista dos resultados obtidos, podemos concluir que a freqüência relativa de CR é

uma variável importante na aprendizagem de habilidades motoras. Para as crianças, tanto

freqüências muito altas de CR (100%), quanto freqüências muito baixas (50%) não favorecem

a aprendizagem, tanto por tornar a criança dependente dessa informação, no caso de alta

freqüência, como fazer com que não se desenvolva o padrão de referência necessário para a

aquisição da habilidade, quando a freqüência é baixa.

Os resultados obtidos neste estudo, possibilitam inferir que pode haver freqüências

relativas ótimas de CR para a aquisição de habilidades motoras, e mostraram não haver

diferença entre as freqüências de feedback para as crianças, levando-nos a acreditar que o

benefício da redução de freqüência de feedback observada em adultos não se aplica a elas, e

esse fato pode ser explicado devido diferença na capacidade de processar informações. As

crianças não possuem a mesma capacidade dos adultos de processar informações, manifestando

maior dificuldade em aproveitar as informações intrínsecas disponíveis mais importantes para

detectar e corrigir seus erros. Em razão disto, podem necessitar de feedback extrínseco mais do

que os adultos para que o padrão de referência seja suficientemente fortalecido.

Referências

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Capítulo 11

Efeito da freqüência de feedback aumentado na aprendizagem

de uma habilidade motora em crianças

Autora: Geovanna Bellucci Iori

Orientadora: Elke dos Santos Lima

Resumo

O presente estudo teve por objetivo verificar os efeitos causados por diferentes freqüências de feedback aumentado durante a aprendizagem de uma habilidade motora discreta por crianças no início de segunda infância. Para tanto, participaram do estudo 32 crianças de 7 a 8 anos de uma escola pública de São José dos Campos, São Paulo. O feedback aumentado oferecido durante a aprendizagem da habilidade motora foi o conhecimento de performance (CP) prescritivo e terminal. As crianças foram divididas em quatro grupos experimentais: CP 0 (sem nenhuma orientação via feedback aumentado), CP25 (feedback aumentado presente em 25% das tentativas), CP50 (feedback aumentado presente em 50% das tentativas) e CP 100 (feedback aumentado presente em 100% das tentativas). As diferenças encontradas entre os grupos no pós-teste foram estatisticamente insignificantes. No teste de retenção, houve diferença apenas entre CP 0 e CP25, com maiores resultados para este ultimo. No teste de transferência, o grupo CP25 foi estatisticamente superior aos demais. Conclui-se por estes resultados que freqüência de 25% de feedback aumentado para crianças as tornam mais eficazes na interpretação de seu feedback intrínseco, logo são capazes de adaptar seu plano de ação com mais facilidade do que as crianças que receberam outras freqüências de feedback aumentado.

Termos-chave: feedback aumentado, criança, freqüência.

Introdução

Feedback é qualquer informação que o indivíduo recebe sobre seu desempenho em

uma tarefa, durante ou depois de sua execução. Essa fonte de informação tem duas origens:

interna e externa. O feedback de origem interna, conhecido como feedback intrínseco, é

originário da captação de realização de movimentos ou de manutenção de posturas pelos

diferentes órgãos sensoriais. O segundo tipo de feedback, chamado de feedback extrínseco ou

aumentado, é a informação recebida pelo indivíduo sobre sua execução proveniente de fontes

externas.

O feedback aumentado é importante no ensino de habilidades motoras, tanto que é

uma das variáveis da aprendizagem motora que mais tem recebido atenção nas últimas décadas

(Corrêa et al., 2005). Através de informações bem orientadas, o indivíduo que o recebe pode ter

mais facilidade na obtenção da meta da habilidade e também continuar se esforçando em

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direção à ela (Magill, 2000). Corrêa et al.(2005) citam quatro funções possíveis do feedback

aumentado: motivação, reforço do feedback intrínseco, informação e orientação. Mas, para que

suas funções sejam atingidas, o professor, instrutor ou terapeuta deve fornecê-lo de maneira

adequada para cada indivíduo ou grupo específico, caso contrário, ele pode ter efeito negativo

sobre a aprendizagem.

Estudos atuais (Kernodle & Carlton, 1992; Magill & Wood, 1986; Ugrinowitsch et al.,

2003) esforçam-se em responder a várias questões relativas ao uso apropriado do feedback

aumentado, como conteúdo, momento para fornecê-lo, tipo e freqüência de apresentação. O

conteúdo diz respeito ao tipo de informação contida, o qual pode ser em relação aos erros ou

acertos, quantitativo (envolve qualquer valor numérico) ou qualitativo (envolve as

características do desempenho).

Em relação ao tipo de feedback aumentado, são dois: conhecimento de resultados

(CR), que é a “informação apresentada externamente sobre o resultado de desempenho de uma

habilidade ou sobre a obtenção da meta do desempenho” (Magill, 2000, p. 200); conhecimento

de desempenho (CD), o qual “trata-se de informação sobre as características de do movimento

responsáveis pelo resultado do desempenho” (Magill, 2000, p.200). O CD, por sua vez, pode

ser subdividido em dois tipos, descritivo e prescritivo. No primeiro tipo, descritivo, a

informação oferecida apenas refere-se ao erro cometido. Já no CD prescritivo, o professor ou

terapeuta informa ao praticante, além do erro, o que fazer para corrigi-lo. Nos estudos em

aprendizagem motora o CR é, sem dúvida, o mais explorado (Correa et al., 2005; Swinnen,

1996). Isso talvez se deva ao fato de que o CR é mais preciso do que o CD, o que favoreceria

as pesquisas. Porém, na prática profissional, o CR é bem menos usado do que o CD,

principalmente em programas de educação física voltados para o público infantil. Por este

motivo, foi escolhido o CD como tipo de feedback aumentado utilizado neste estudo.

São vários os estudos sobre a freqüência adequada de apresentação do feedback

aumentado (Badets & Blandin, 2004; Butki & Hoffman, 2003; Correa et al., 2005; Ho & Shea,

1978; Ugrinowitsch et al., 2003; Winstein & Schmidt, 1990;). Atualmente, a literatura diz que

baixas freqüências produzem melhores desempenhos em testes de retenção e de transferência

(Magill, 2005; Ugrinowitsch et al., 2003). Badets e Blandin (2004), testaram duas freqüências

de CR, 33% e 100%, em uma tarefa de timing, sendo que o grupo que recebeu 33% obteve

melhores resultados no teste de retenção. Vander Linder et al.(1993) testou indivíduos adultos

com apresentação de CP de 50% ou 100%; grupo de 50% apresentou os melhores resultados.

Weeks e Kordus (1998) testaram duas freqüências de CP, 33 e 100%, em uma habilidade

esportiva fechada com adolescente e concluíram que o CP não freqüente auxilia no

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desenvolvimento da capacidade do indivíduo em interpretar suas informações intrínsecas. Há

três hipóteses para isso. Uma diz respeito ao papel orientador do feedback, a qual pode ser

positiva ou negativa; excesso de apresentação de feedback aumentado levaria a uma melhora

imediata de desempenho, mas causaria dependência. A segunda é a hipótese da consistência,

correções não constantes favoreceriam o desenvolvimento de um programa motor e parâmetros

mais estáveis pelo executante. A terceira e última hipótese é a especificidade, que diz que

quanto mais similares forem as condições de aquisição e retenção, melhor o desempenho na

retenção. Logo, quanto menor a freqüência de feedback aumentado durante a aquisição, melhor

o desempenho na retenção, já que as condições são mais parecidas. Porém, Corrêa et al.(2005)

não encontraram diferenças significativas sobre a aprendizagem de uma habilidade motora em

mulheres adultas em seus dois grupos experimentais (33% e 100% de apresentação de CP).

Como a hipótese de seu estudo foi baseada nas três hipóteses descritas acima, as mesmas não

foram suportadas.

O problema dos estudos prévios é que a maioria investiga apenas duas freqüências de

feedback aumentado, o que torna difícil dizer com mais exatidão qual a quantidade mais

apropriada. E uma lacuna nos estudos sobre o tema é a falta de pesquisas envolvendo crianças.

Grande parte dos estudos é realizada com adultos, e algumas raras vezes com adolescentes.

Como saber se o que parece ser ideal para o fornecimento de feedback para um adulto é

também para uma criança? Afinal de contas, estes grupos encontram-se em estágios bastante

diferentes de desenvolvimento cognitivo e motor.

A criança no início segunda infância (entre 7 e 8 anos), em relação ao seu

desenvolvimento cognitivo ainda é muito diferente de um adulto. Nessa idade, ela está

entrando no estágio de operações concretas de Piaget (Newcombe, 1999). Este estágio

caracteriza-se pelo início da capacidade de utilizar as informações recebidas do ambiente em

operações mentais flexíveis e reversíveis. Porém, sua capacidade de abstração ainda é bastante

rudimentar, razão do termo “operações concretas”: a criança apresenta dificuldade em

compreender alguma coisa nova sem um exemplo concreto. De acordo com Newcombe (1999),

outras características cognitivas das crianças nesse estágio incluem: dificuldades em planejar os

passos necessários para atingir seu objetivo; não lidam com grandes quantidades de informação

ao mesmo tempo; não usam estratégias apropriadas para resolver problemas que não estão

acostumadas; a velocidade de processamento de informações é lenta; distraem-se de sua tarefa

principal com facilidade. Esta última característica está diretamente relacionada com a atenção

seletiva. A atenção seletiva não amadurece antes dos 12 anos (Andrade et al., 2004). Por este

motivo, muitas crianças nos seus primeiros anos escolares são chamadas de “distraídas”: seu

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sistema neurológico ainda não amadureceu o suficiente para que ela tenha total controle sobre a

alocação de sua atenção, logo ela é limitada nesse aspecto. Não é fácil para a criança manter

seu foco atencional em pontos críticos da tarefa (intenções momentâneas) e inibir sua atenção

para elementos no ambiente que a atraem naturalmente (disposições permanentes), mesmo eles

sendo prejudiciais ao seu desempenho. Essa característica infantil pode dificultar um pouco o

ensino e a aprendizagem de habilidades motoras, principalmente no início de período das

operações concretas, quando ela é ainda mais acentuada do que no final.

Em relação ao domínio motor, em comparação a um adulto, uma criança tem bem

menos experiências prévias, logo sua memória motora é menor. Baseado na Teoria do

Esquema de Schmidt (Magill, 2000), a prática em uma habilidade motora leva à formação, na

memória, dos esquemas de recordação e de reconhecimento, além dos programas motores

generalizados. O esquema de recordação é o responsável pela emissão de comandos motores e

pela seleção dos parâmetros do programa motor que será usado. Ele estrutura a formulação da

seleção de parâmetros através de três pontos principais: condições iniciais, especificações da

resposta e resultados da resposta. Graças a seu caráter abstrato, é possível a seleção de novas

especificações da resposta nunca realizadas antes, através de combinações diferentes dos três

pontos assinalados acima. O esquema de reconhecimento é responsável pela detecção de erros.

Também se baseia em condições iniciais e resultados da resposta para formular suas relações,

mas, diferentemente do esquema de recordação, utiliza-se também das conseqüências

sensoriais; o esquema de reconhecimento compara o resultado real com o esperado. O

programa motor generalizado consiste de informações gerais necessárias que particularizam

uma classe de movimento e a caracterizam como tal. Possui três características invariantes para

cada classe de movimento, as quais formam a representação do movimento no sistema nervoso

central (SNC). São elas: seqüenciamento, força relativa e tempo relativo. As características

variantes, ou parâmetros, que promovem a singularidade de cada movimento. Durante

movimentos rápidos, o controle motor é responsabilidade do esquema de recordação e o

programa motor generalizado é executado sem interferências de feedback (intrínseco ou

extrínseco). As informações do esquema de reconhecimento serão utilizadas apenas na

tentativa seguinte. A formação das regras abstratas que fazem parte dos esquemas é dependente

da experiência do indivíduo em determinada habilidade e suas variações. Uma criança de 7

anos não tem experiência prévia acumulada em diversas habilidades motoras o suficiente para

ter em sua memória de longa duração uma quantidade considerável de regras abstratas para

serem utilizadas nas mais diversas situações. Com isso em mente, crianças cometem mais erros

de seleção de parâmetros do que adultos. Elas também devem ter, provavelmente, mais

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dificuldades em usar o feedback intrínseco para correção de movimentos, já que parte da

informação sensorial não faz sentido, pois para uma informação sensorial tornar-se perceptiva,

ela deve antes passar pela memória do indivíduo.

O objetivo deste estudo foi verificar os efeitos causados por diferentes freqüências de

feedback aumentado durante a aprendizagem de uma habilidade motora discreta e fechada em

crianças no início de segunda infância.

Método

Sujeitos

Os sujeitos deste estudo foram 32 crianças de segunda infância (n=32), com idade

variando entre 7 anos e meio e 8 anos e meio (média: 7,9 anos, desvio padrão: 0,4). Todos eram

alunos de 1ª ou 2ª séries do ensino Fundamental I de uma escola da rede pública estadual do

município de São José dos Campos (SP). Os pais ou responsáveis assinaram um termo de

consentimento permitindo a participação das crianças no estudo.

Materiais

Foi utilizado um alvo do jogo de dardos infantil da marca “Brinquedos Cardoso”, com

33 cm de diâmetro, divididos em três zonas de arremesso: um círculo vermelho central, com

6,5cm de diâmetro; em volta desse, um círculo amarelo, com 5,5cm de largura; por último, um

círculo preto com 6,5cm de largura. O objeto a ser arremessado ao alvo pelos sujeitos foi um

saquinho de pano cheio de areia, com as dimensões 4 cm x 3,5cm x 1 cm.

Delineamento e Procedimentos

A tarefa consistiu em arremessar o saquinho de areia no alvo, que foi colocado no

chão, a uma distância de 171 cm. A pontuação foi dada de acordo com a proximidade do

saquinho ao centro do alvo, sendo que, quanto mais próximo a ele maior a pontuação.

Arremessos na zona vermelha valiam 20 pontos, na zona amarela valiam 10 e na zona preta

valiam 5 pontos.

Os sujeitos foram designados aleatoriamente a um dos quatro grupos, cada um

composto de oito sujeitos. Os grupos são o seguinte: conhecimento de performance 0 (CP 0);

conhecimento de performance 25 (CP25), o qual recebeu feedback aumentado em 25% das

tentativas; conhecimento de performance 50 (CP50), que recebeu feedback aumentado em

50%; e conhecimento de performance 100 (CP100), que recebeu feedback aumentado em

100% das tentativas.

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O feedback aumentado recebido pelos grupos experimentais foi o conhecimento de

performance prescritivo verbal e terminal. As informações foram dadas aos sujeitos com uma

linguagem bastante simples, de modo que qualquer criança de 7-8 anos pudesse entender. Por

exemplo: jogue o saquinho com mais força; jogue mais para o lado; não vire o braço na hora de

jogar; não precisa pular para jogar o saquinho; abaixe o corpo um pouquinho; etc. Todos os

grupos tiveram a mesma quantidade de prática, o que diferiu entre eles foi a freqüência de

feedback aumentado recebido.

No quadro 1 estão especificadas cada uma das fases de coleta de dados do estudo para

cada um dos quatro grupos.

Quadro 1 - Fases do experimento

Pré-teste Prática –

sessão 1

Prática –

sessão 2

Pós-teste Retenção Transfer

CP 0 A B B A A F

CP25 A C C A A F

CP50 A D D A A F

CP100 A E E A A F

1. Pré-teste (tarefa “A”, no Quadro 1)

O pré-teste consistiu de cinco tentativas de arremesso ao alvo para cada sujeito. Não

houve feedback aumentado para nenhum dos sujeitos durante essa fase.

2. Prática (tarefas “B, C, D, E”, no Quadro 1)

A fase de prática consistiu de 50 tentativas para cada sujeito, divididas em dois blocos

de 25. O primeiro bloco (sessão 1) foi realizado 5 minutos após o pré-teste. O segundo bloco

(sessão 2) foi realizado dois dias após a sessão 1.

Nessa fase, cada grupo recebeu uma quantidade de feedback aumentado diferente. O

CP0 não recebeu nenhum tipo de feedback aumentado. O CP25 recebeu feedback em 25% das

tentativas, ou três tentativas sem feedback apresentado seguidas de uma tentativa com

feedback. O CP50 recebeu 50% de feedback aumentado (uma tentativa sem apresentação de

feedback aumentado seguida de uma tentativa com apresentação). O CP 100 recebeu 100% de

feedback aumentado, o que equivale dizer que este grupo recebeu o feedback após cada uma

das tentativas.

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3. Pós-teste (tarefa “A”)

Realizado 5 minutos após o término da sessão 2 de prática. Foi idêntico ao pré-teste.

4. Retenção (tarefa “A”)

Foi realizada uma semana após o término da sessão de prática 2. Foram dez tentativas

para cada sujeito, sem apresentação de feedback aumentado, tal qual no pré-teste.

5. Transferência (tarefa F, no Quadro 1)

Consistiu de 10 tentativas de arremessar o saquinho no alvo sem feedback aumentado,

porém de uma distância maior do que nas fases anteriores e sem os olhos vendados. A distância

foi de 232 cm.

Resultados

A análise estatística foi feita a partir de uma medida de tendência central, a média, e

de uma medida de dispersão, o desvio padrão. Esses dados foram obtidos a partir das

pontuações dos sujeitos em blocos de cinco tentativas. Para verificar as diferenças entre os

grupos nas fases pós-teste, retenção e transferência foi utilizada uma análise de variância

através da razão F. O teste DHS de Tukey foi utilizado para detectar especificamente onde

ocorreram as diferenças obtidas pela razão F. O nível de significância adotado foi de 5%.

Análise intergrupos

0

2

4

6

8

10

12

pré-teste pós-teste retenção transferência

pont

uaçã

o m

édia

CP0CP25CP50CP100

Figura 1- pontuações médias dos grupos

Os resultados do pós-teste não apresentaram diferenças significativas entre os grupos

(F=0,45; gl: 3, 28). Já no teste de retenção houve diferenças significantes de desempenho (F =

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3,72; gl: 3, 28), mas apenas entre CP25 e CP0 (DHS = 2,73). Uma análise de variância de dois

fatores aplicado indicou aumento de desempenho do pré para o pós-teste, o qual foi mantido na

retenção. Porém na transferência houve queda de desempenho retornando os valores próximos

ao pré-teste.

No teste de transferência, todos os grupos apresentaram queda de desempenho, sendo

que a queda mais acentuada foi a de CP100. CP25, por sua vez, foi quem apresentou a menor

queda de desempenho. Pela Figura 1, observa-se que seu desempenho foi superior aos demais,

o que foi confirmado pela ANOVA (F = 19,73, gl: 3, 28, nível de significância: 0,05) e, mais

especificamente, pelo teste DHS de Tukey (DHS= 1,54). Pelo teste de Tukey, as diferenças

significativas estavam de CP25 para os grupos CP0, CP50 e CP100, o que equivale dizer que

CP25 foi estatisticamente superior aos demais.

Discussão e conclusão

O objetivo deste estudo foi verificar os efeitos de diferentes freqüências relativas de

feedback aumentado para crianças. Esperava-se que freqüências de 25% e 50% resultassem em

aprendizagem superior em relação a 100% e a nenhum feedback aumentado, hipótese esta

baseada em resultados de estudos anteriores realizados com adultos ou adolescentes, como os

trabalhos de Vander Linden et al. (1993) e Weeks e Kordus (1998). Freqüência de 100%

costuma causar dependência do praticante, já que ele aprende a confiar mais no que seu

instrutor diz do que no seu feedback intrínseco; no caso das crianças, elas não aprenderiam a

interpretar o feedback intrínseco, conseqüentemente teriam uma performance bastante pobre

após a retirada do feedback aumentado, o que comprovaria a não aprendizagem por parte delas.

O outro extremo, não oferecer o feedback aumentado, tornaria a aprendizagem de uma

habilidade pouco comum às crianças muito mais difícil, já que sua pouca ou nenhuma

experiência prévia dificultaria a escolha de parâmetros adequados para uma boa execução,

além de tal qual o seu oposto (freqüência de 100%), elas não saberiam interpretar seu feedback

intrínseco.

A hipótese foi parcialmente confirmada. O grupo que não recebeu feedback

aumentado (CP 0) apresentou o pior desempenho em todas as fases do estudo. As crianças

desse grupo cometiam os mesmos erros sistematicamente durante a fase de prática. Elas

pareciam incapazes de elaborar uma nova estratégia para tentar atingir o objetivo. Newcombe

(1999) diz que planejamento ineficiente das ações para tarefas desconhecidas é uma das

características de crianças da faixa etária testada. Essa “limitação” cognitiva somada à falta de

regras abstratas, na memória, para a escolha adequada de parâmetros dificultaram a

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aprendizagem da tarefa testada em apenas dois dias de prática. A falta de orientação fez

também que aparecesse no comportamento delas durante todas as fases outra de suas

características cognitivas citadas no início do estudo: a facilidade de distração. Qualquer

barulho externo fazia com que as crianças perdessem o foco na tarefa, mesmo quando estavam

prontas para arremessar o saquinho de areia. Em outras vezes, elas queriam terminar logo para

ver o que estava acontecendo, o que parece ter contribuído para o baixo desempenho e a

aprendizagem. As crianças dos demais grupos apresentaram melhoras no desempenho, o que

indica que o feedback extrínseco é uma variável necessária ao desenvolver programas para o

público infantil.

A comparação entre os quatro grupos no pós-teste e na retenção não confirmou a

hipótese de pesquisa. O pós-teste não mostrou diferenças significativas entre os grupos, apesar

de uma leve diferença entre 0% e 25%, sendo o grupo de 25% o de melhor desempenho.

Aparentemente, não faz diferença a freqüência de feedback aumentado durante a prática, pois

logo que este é retirado, os resultados são os mesmos tanto para quem o recebeu em todas as

tentativas quanto para quem não o recebeu. O teste de retenção indicou que os grupos que

receberam feedback aumentado tiveram melhor aprendizagem, já que seus resultados

permaneceram constantes com o pós-teste, não houve diferença significativa entre eles. A única

diferença significativa foi entre os grupos de 0% e 25% de freqüência. Apesar de não ter sido

encontrada diferença entre 0% e os demais grupos com feedback aumentado, o grupo de 0%

apresentou desempenho descritivamente inferior que os demais. Os resultados do pós-teste e da

retenção indicaram que o feedback aumentado é uma variável necessária na aprendizagem

motora em crianças, mas a sua freqüência parece não fazer diferença, o que contraria resultados

de experimentos realizados com adultos e adolescentes e também a hipótese da especificidade.

De acordo com as pesquisas citadas na introdução deste estudo (Badets & Blandin, 2004;

Vander Linden et al., 1993; Weeks & Kordus, 1998), o grupo que recebe 100% de feedback

aumentado deveria ter desempenho inferior na retenção. Mas está de acordo com os achados de

outros experimentos, como o de Corrêa et al.(2005), onde não há diferença entre os grupos.

Porém, ao levar em conta cada grupo separadamente, nota-se que CP100, o qual recebeu 100%

de feedback aumentado, obteve queda de desempenho no pós-teste, ao contrário dos demais

grupos que apresentaram resultados constantes com o que vinham apresentando ao final da

prática. A hipótese da orientação, proposta por Schmidt e colaboradores (Magill, 2000) parece

plausível também com crianças. O oferecimento de feedback aumentado constante orientou as

crianças para a meta da tarefa, mas não permitiu que elas a aprendessem efetivamente. Para a

aprendizagem ter ocorrido com mais eficiência, elas precisariam aprender a interpretar seus

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próprios sinais sensoriais e elaborar planos de ação que melhor se ajustassem à tarefa, mas isso

só seria possível se lhes fosse oferecida liberdade para tentar solucionar os problemas motores

impostos durante a prática. Elas “decoraram” o que precisavam fazer para atingir a meta.

Quando a tarefa foi modificada na transferência, elas não sabiam o que fazer e apresentaram o

pior desempenho juntamente com o GC.

Os efeitos das freqüências do feedback aumentado só apareceram, como pode ser

notado, no teste de transferência. O grupo que recebeu 25% foi estatisticamente superior aos

demais. Este foi o grupo com menos queda no desempenho quando comparado ao pós-teste e

retenção. Uma hipótese para a queda de desempenho dos grupos de 50% e 100% na

transferência e a manutenção dos valores de pós-teste na retenção seria que essas crianças

“decoraram” o caminho a percorrer para se atingir o alvo na primeira distância, devido ao

número elevado de informações que receberam via feedback aumentado. Crianças de 7 – 8

anos têm dificuldades em planejar estratégias, e o excesso de feedback aumentado não permitiu

que elas tentassem criar seus próprios caminhos para atingir a meta, logo elas continuam com a

mesma dificuldade para realizar a tarefa de precisão que lhes foi solicitada. Isso refletiu no

teste de transferência, quando a distância ao alvo foi modificada.

Já com 25% de freqüência de feedback aumentado, as crianças não receberam

informações extrínsecas o suficiente para deixá-las dependentes. Elas não tinham a informação

extrínseca na maior parte das tentativas. Logo, para ter êxito na tarefa elas precisaram

reelaborar sozinhas seu plano de ação a cada tentativa, utilizando-se das informações do

feedback aumentado e do feedback intrínseco, aumentando sua utilização, já que a informação

sobre o desempenho não lhes foi oferecida sempre. E o feedback aumentado influenciou

positivamente no desempenho dessas crianças porque, caso contrário, elas teriam apresentado o

mesmo desempenho do grupo sem feedback. A hipótese da consistência, a qual diz que menos

feedback aumentado favorece a consolidação do programa motor e dos parâmetros pelo

executante, também se aplica a crianças de início de segunda infância.

Com pouca freqüência de feedback aumentado, as crianças aprenderam a canalizar sua

atenção para os pontos importantes da tarefa e a executar os passos necessários para a obtenção

da meta, tal qual as crianças dos demais grupos com oferecimento de feedback aumentado.

Mas, diferentemente delas, as crianças de CP25 aprenderam a modificar seu plano de ação

quando as exigências da tarefa são outras, sem precisar de ajuda externa e mesmo com suas

limitações cognitivas e de memória motora, típicas da idade.

Conclui-se, pelos resultados do presente estudo, que freqüências elevadas de feedback

aumentado para crianças causam um efeito ilusório de melhora na aprendizagem, efeito este

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que é desfeito ao pedir às crianças uma pequena modificação na tarefa. O não oferecimento de

feedback aumentado torna mais lenta a aprendizagem de habilidades motoras, graças à pouca

experiência motora e à imaturidade cognitiva, que levam as crianças a escolhas equivocadas na

tentativa de solucionar o problema proposto. Freqüências próximas a 25%, por sua vez,

parecem surtir melhores resultados, já que oferecem a informação extrínseca tão necessária

para sua aprendizagem e também permitem que elas elaborem suas estratégias de ação,

tornando-as, com o passar do tempo, mais independentes.

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Capítulo 12

Efeito da aprendizagem no controle de movimentos rápidos e precisos

Autora: Carla Ferro Pereira

Orientador: Victor Hugo Alves Okazaki

Resumo

O presente estudo analisou o efeito da aprendizagem no controle de movimento rápido e preciso simulado por computador. Vinte homens (20-26 anos), divididos em grupo experimental (n = 10) e controle (n = 10), foram analisados em três blocos: pré-teste, pós-teste e retenção. O grupo experimental realizou uma prática com 108 tentativas (três blocos de 36 tentativas em dias distintos). Um software simulou a tarefa de Fitts (1954), adaptada para toques discretos, e forneceu a análise cinemática do mouse (deslocamento, velocidade e aceleração). Os sujeitos foram instruídos a realizar toques, em duas placas paralelas, o mais rápido e preciso possível com a mão direita. Quatros tamanhos de alvo (W = 2, 1, 0,5 e 2.5 polegadas) e três amplitudes de movimento (A = 2, 4 e 8 polegadas) foram utilizados para fornecer índices de dificuldade de 1 até 6. A associação TM x ID foi realizada por meio de Análise de Regressão Linear Simples através do software Statistica (v. 6.0) com um nível de significância de 0,05. O TM foi reduzido, principalmente, em função da diminuição do tempo do submovimento secundário, pois o tempo do submovimento primário aumentou com a prática. Houve uma antecipação do tempo da maior velocidade, além de um aumento na magnitude da velocidade, em função da prática. Esta estratégia permitiu menor tempo de movimento e menor variabilidade de resposta. Tais resultados sugerem que o aprimoramento na performance em função da prática ocorre através da melhora na interdependência entre os processos de programação e de feedback.

Termos-chave: aprendizagem motora, paradigma velocidade-precisão, controle motor.

Agradecimentos

Aos meus pais Moacir Pereira e Laura Terra Ferro Pereira, pela confiança, carinho e incentivo durante a realização do curso e, principalmente, ao meu tutor Victor H. A. Okazaki pelo ensino, incentivo, paciência, dedicação e orientação atribuída ao desenvolvimento da minha formação e realização deste trabalho.

Introdução

Movimentos balísticos manuais direcionados a contatar alvos espaciais estão

sujeitos a uma relação inversamente proporcional entre velocidade e precisão, de forma que

quanto maior a exigência de precisão em uma dada tarefa motora menor é a velocidade de

movimento observada (maior tempo de movimento). Esta proposição foi conhecida como Lei

de Fitts, isto é, a relação entre tempo de movimento (TM) e índice de dificuldade (ID) da tarefa

(determinado pela amplitude de movimento e largura do alvo), tanto para tarefas de

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movimentos repetitivos (Fitts, 1954) quanto para movimento discreto direcionados a alvos

(Fitts & Peterson, 1964; Mackenzie et al., 1987). A explicação que tem sido dada para esse

fenômeno é que o aumento do índice de dificuldade, principalmente pela diminuição da largura

do alvo, gera maior demanda de processamento de feedback em função da maior restrição

espacial colocada pela tarefa, fazendo com que o tempo de movimento seja aumentado como

conseqüência do maior número de ajustes necessários para obtenção de sucesso. Esse princípio

tem sido verificado em muitas situações diferentes, tais como em movimentos de agarrar

(Marteniuk et al., 1990; Boostsma et al., 1994), apontar em uma tela usando mouse (Mcguffin

& Balakrishnan, 2002; Accot & Zhai, 2003), interceptação de alvos móveis (Jagacinski et al.,

1980), a movimentos feitos com a cabeça (Andres & Hartung, 1989) e movimentos bimanuais

(Kelso et al., 1979; Mottet et al., 2001). Contudo, poucos estudos foram destinados a explicar o

efeito da aprendizagem sobre este paradigma da relação inversa velocidade-precisão. Também

ainda não são conhecidas as alterações nos parâmetros controlados no movimento em função

da prática.

Com a prática sistemática de uma tarefa motora um indivíduo torna-se

relativamente independente de informação de feedback, passando a regular seus movimentos

basicamente por meio de uma pré-programação antes do início da ação. A lógica dessa

suposição reside na argumentação de que com a aprendizagem o praticante adquire a

capacidade de especificar os parâmetros de controle de forma mais precisa, o que tornaria o

feedback com menor participação na regulação do movimento (Teixeira, 1997, 2000). Esta

hipótese teve suporte nos achados Pratt e Abrams (1996) que analisaram o efeito da informação

visual durante a aprendizagem de movimento rápido e preciso. Estes autores mostraram que,

após a prática, a duração e a distância percorrida do submovimento primário aumentaram

enquanto do submovimento secundário diminuíram. Por conseguinte, como o submovimento

primário é relativo à parte pré-programada do movimento e o submovimento secundário ao

controle dependente de feedback, as alterações da prática foram explicadas através da melhor

programação do movimento. Esta melhor programação foi a explicação para a diminuição no

tempo de movimento total e para a maior precisão de movimento em função da prática. Pois, a

informação visual não demonstrou ter efeito sobre as estratégias de controle adotadas. Contudo,

não se pode ignorar a participação da informação via feedback no controle dos movimentos,

mesmo os realizados em grande velocidade.

Alguns estudos sugerem que na aprendizagem de uma habilidade motora, mesmo

em simples tarefas como contatar alvos espaciais, o indivíduo adquire a capacidade de integrar

as informações de feedback sensorial de forma mais efetiva, acoplando funcionalmente o

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feedback aos comandos motores gerados centralmente (Proteau et al.1992; Abrams & Pratt,

1993). Neste contexto, Khan e Franks (2000) demonstraram a importância do feedback através

da retirada da informação visual durante a aprendizagem. O grupo que praticou com

informação visual apresentou maiores precisão e tempo de movimento em comparação ao

grupo sem prática com informação visual. Este maior tempo de movimento no grupo com

informação visual foi atribuído à possibilidade de realizar possíveis correções via feedback, o

que está em consonância com a maior precisão encontrada neste grupo. O tempo do impulso

inicial diminuiu para o grupo que praticou com informação visual e permaneceu relativamente

constante para o grupo sem informação visual. Por conseguinte, foi sugerido que a informação

visual teria papel tanto na fase de programação como na fase de correção via feedback durante

a regulação do movimento (Khan & Franks, 2000). Elliot e colaboradores (1995, 1997, 2004)

mostraram que a prática é capaz de aumentar a precisão e a velocidade no movimento. Uma

das estratégias observadas foi antecipar o instante e aumentar a magnitude dos maiores valores

de velocidade. Isto permitiu maior velocidade, menores tempo de movimento e variabilidade

do submovimento primário, além da diminuição no número de correções dos submovimentos

(Elliott et al., 1999, 2004). Sendo assim, foi sugerido o aprimoramento da performance em

função da prática através da interdependência entre programação e processamento de feedback.

Independente da explicação adotada para explicar o efeito da prática sobre a relação

inversa velocidade-precisão, melhor programação e/ou eficiência no uso do feedback, ainda

não são conhecidas as estratégias de controle que garantem maior precisão e velocidade. A

análise dos parâmetros cinemáticos que são alterados em função da prática pode justamente

auxiliar a entender os processos de controle e as variáveis que são moduladas para garantir um

movimento tanto rápido quanto preciso. Neste ínterim, o presente estudo objetivou analisar o

efeito da aprendizagem sobre as estratégias de controle em tarefa discreta com restrição

espacial simulada por computador.

Método

Participantes

Participaram do estudo 20 estudantes universitários, todos destros do sexo

masculino com idade entre 20 e 26 anos. Os participantes foram designados a dois grupos,

grupo experimental (n = 10) e grupo controle (n = 10).

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Instrumentos e Tarefa

A tarefa utilizada foi de toque discreto realizada em um ambiente virtual através de

um software desenvolvido para este estudo (Fitts’ Discrete Aiming Task; Okazaki, 2006)

simulando a tarefa Fitts (cf. Fitts, 1954). A tarefa consistiu em clicar em duas placas paralelas,

nas quais eram manipulados quatros tamanhos de alvo (A = 2, 1, 0,5 e 2.5 polegadas) e três

distâncias de movimento (D = 2, 4 e 8 polegadas) para fornecer índices de dificuldade de 1 até

6 ([ID = log2 (2D/ A)]). O software forneceu a análise cinemática do cursor do mouse

(deslocamento, velocidade e aceleração). Foi utilizado um mouse óptico (marca Knex) com o

nível de sensibilidade configurado para 50%. Como superfície para deslizamento do mouse foi

utilizado um “mouse pad” medindo 19cm x 23cm de cor preta.

Delineamento e procedimentos experimentais

Inicialmente os sujeitos serão informados dos procedimentos experimentais e

assinaram um termo de consentimento de participação livre e esclarecido. Para confirmar a

preferência manual para o lado direito (sujeitos destros) foi aplicado o Inventário de

Dominância Lateral de Edimburgo (Oldfield, 1971), constituído por 10 questões sobre

preferência lateral na execução de 10 tarefas motoras realizadas cotidianamente. Em seguida,

foi solicitado aos sujeitos para sentarem em uma posição confortável em frente ao computador

e realizaram três tentativas de adaptação praticando os movimentos específicos da tarefa nas

condições experimentais. Os sujeitos foram instruídos a desempenharem os movimentos com

maior velocidade e precisão possível. Após um sinal indicando que o movimento podia ser

iniciado, os sujeitos realizaram a tarefa logo em tempo determinado por eles mesmos. O início

do movimento foi determinado pelo instante de clique do mouse no primeiro alvo. O final do

movimento foi determinado no clique do mouse no segundo alvo. Foi padronizada a direção do

movimento sempre iniciando com o clique do mouse no lado esquerdo para o lado direito. As

tentativas foram descartadas quando: o mouse clicava fora do segundo alvo, quando o clique do

mouse não funcionou e, quando houve erro do mouse em ir e voltar sobre o segundo alvo.

O experimento foi constituído de quatro fases: (1) pré-teste, realizado

imediatamente antes da fase de prática; (2) fase de prática; (3) pós-teste, realizado

imediatamente após o término da fase de prática; e (4) retenção, realizada 24 horas após o

término da fase de prática. No pré-teste, pós-teste e retenção, os participantes realizaram 12

tentativas na tarefa com a mão direita. Durante a fase de prática, a tarefa foi praticada por três

sessões, dispostas em dias diferentes. Em cada sessão de prática foram realizadas 36 tentativas,

agrupadas em blocos de 12 tentativas consecutivas. Entre os blocos de tentativas houve um

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intervalo de repouso de 1 min. Nenhum dos sujeitos reportou qualquer tipo de fadiga ou

cansaço após os blocos de prática. As seqüências utilizadas do tamanho de alvo e distância

entre os alvos foram randomizadas entre os sujeitos através do quadrado de Williams adaptado.

Em cada tentativa, os participantes observaram o tempo de movimento (TM) de cada toque que

foi fornecido pelo software, o que serviu como feedback. Os participantes foram designados a

dois grupos, constituído por 10 sujeitos em cada grupo. O grupo experimental e controle

utilizaram apenas a mão direita para realizar os testes e/ou sessões de prática.

Variáveis Dependentes do Estudo

As variáveis cinemáticas selecionadas para a análise foram: tempo de

movimento, erro efetivo, pico de velocidade, tempo do pico de velocidade, tempo do

submovimento primário, pico de aceleração, tempo do pico de aceleração e índice de

dificuldade (ID = log2 [2D / A]). O submovimento foi definido pelo cruzamento “zero” do

negativo para o positivo no perfil da aceleração, representando um aumento na velocidade do

movimento uma vez que a velocidade de movimento está diminuindo (cf. Meyer et al., 1988).

Tratamento dos dados

O software forneceu a posição linear do cursor do mouse em função do tempo com

uma freqüência de amostragem de 100 Hz. Estes dados de posição foram filtrados com filtro

recursivo do tipo Butterworth de quarta ordem com intensidade de 10 Hz. Posteriormente

foram calculadas as derivadas de velocidade e aceleração do movimento, e as variáveis

dependentes desejadas foram extraídas.

Análise Estatística

Todas as variáveis dependentes foram analisadas por meio de uma análise de

variância de dois fatores, 2 (Grupo: experimental x controle) x 3 (Teste: pré x pós x retenção),

com medidas repetidas no último fator. Para contrastes posteriores foi utilizado o teste de

Tukey. O nível de significância foi estabelecido em 5%.

Resultados

Os valores médios e desvio padrão das variáveis dependentes, em função das fases

e grupos, foram apresentados na tabela 1. Para melhor organização, as variáveis dependentes

serão apresentadas separadamente a seguir.

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Tabela 1 – Média e desvio padrão das variáveis dependentes em função das fases e grupo.

Legenda: diferente de a grupo pref; b grupo controle; 1pré teste; 2 pós teste; 3 retenção;

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Tempo de Movimento (TM)

A variável TM apresentou efeito principal para o fator Grupo (F1,18 = 12,79;

p<0,05), indicando menor TM para o grupo que praticou em comparação ao grupo controle. O

efeito de Fase (F2,18 = 120,63; p<0,05) também sugere que a prática proporcionou melhor

performance através de menores TMs. Houve efeito de interação Fase x Grupo (F2,18 = 38,25;

p<0,05), no qual o grupo experimental obteve menor TM no pré-teste em comparação ao pós-

teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05) (figura 1).

A relação entre o tempo de movimento (TM) e o índice de dificuldade (ID) demonstrou que a

lei de Fitts não foi violada em função da prática (tabela 2 e figura 2). Foram encontradas

relações TM x ID com valores de r > 0,97 e r2 > 0,95 (p<0,05). O coeficiente “a” na equação de

reta demonstra que a prática aproxima mais o tempo de movimento a um valor de intersecção

com o eixo das abscissas mais próximo a um valor nulo para índices de dificuldade próximos

de zero (tabela 2).

Figura 1 – Média do tempo do submovimento primário (T1), submovimento secundário (T2) e movimento total (TM), em função dos grupos e das fases.

Erro Efetivo

A variável erro efetivo não apresentou efeito principal no fator Grupo (F1,18 = 0,78;

p>0,05) e no fator Fase (F2,18 = 0,001; p>0,05) nem no efeito principal de interação Grupo x

Fase (F2,18 = 0,031; p>0,05), indicando que os sujeitos foram capazes de manter sua precisão

de resposta.

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Pico de Velocidade

O pico de velocidade apresentou efeito principal para o fator Fase (F2,18 = 5,24;

p<0,05), indicando que a prática proporcionou uma maior magnitude da velocidade. Também

foi observado efeito de interação Fase x Grupo (F2,18 = 8,79; p<0,05), no qual o grupo

experimental obteve um aumento do pico de velocidade no pré-teste em comparação ao pós-

teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05).

Tempo do Pico de Velocidade

O tempo do pico de velocidade apresentou efeito principal para o fator Grupo (F1,18

= 13,87; p<0,05) e para o fator Fase (F2,18 = 32,24; p<0,05), indicando menor tempo para o

grupo que praticou em comparação ao grupo controle. Também houve efeito de interação Fase

x Grupo (F2,18 = 13,97; p<0,05), no qual o grupo experimental diminuiu o tempo do pico de

velocidade no pré-teste em comparação ao pós-teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05). O tempo

do pico de velocidade relativo apresentou efeito principal somente no fator Fase (F2,18 = 6,74;

p<0,05), indicando aumento no tempo do pico de velocidade relativo para o grupo

experimental no pré-teste em comparação à retenção (p<0,05).

Tabela 2 – Coeficientes e equação da relação TM x ID.

Grupo Fase R R2 Equação

Controle Pré-teste 0,984 0,969 y = 0,1019x + 0,2022

Controle Pós-teste 0,976 0,953 y = 0,1167x + 0,1476

Controle Retenção 0,985 0,972 y = 0,1156x + 0,0801

Experimental Pré-teste 0,990 0,981 y = 0,1216x + 0,0717

Experimental Pós-teste 0,996 0,994 y = 0,0918x + 0,0267

Experimental Retenção 0,991 0,984 y = 0,0926x + 0,0138

Tempo do Submovimento Primário (T1)

O tempo do submovimento primário apresentou efeito principal no fator Grupo

para o tempo absoluto (F1,18 = 7,16; p<0,05) e relativo (F1,18 = 27,24; p<0,05), indicando um

aumento no T1 para o grupo que praticou em comparação ao grupo controle. Este aumento no

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T1 também pode ser observado através do efeito de Fase para ambos, tempo absoluto (F2,18 =

19,64; p<0,05) e tempo relativo (F2,18 = 104,57; p<0,05)) em função da prática.

Tempo do Submovimento Secundário (T2)

O tempo do submovimento secundário apresentou efeito principal para o fator

Grupo no tempo absoluto (F1,18 = 16,38; p<0,05) e relativo (F1,18 = 27,24; p<0,05) indicando

menor T2 para o grupo experimental. O efeito Fase para o tempo absoluto (F2,18 = 114,33;

p<0,05) e para o tempo relativo (F2,18 = 104,58; p<0,05) também mostraram que a prática

proporciona melhor performance através de menores T2. E também houve efeito de interação

Fase x Grupo no tempo absoluto (F2,18 = 33,19; p<0,05) e tempo relativo (F2,18 = 32,75;

p<0,05), no qual o grupo experimental obteve uma diminuição no T2 no pré-teste em

comparação ao pós-teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05).

Figura 2 – Relação entre o tempo de movimento e o índice de dificuldade (ID) para o grupo com prática (experimental) e sem prática (controle), no pré-teste, no pós-teste e na retenção.

Pico de Aceleração

O pico de aceleração apresentou efeito principal para o fator Grupo (F1,18 = 7,50;

p<0,05), indicando maior pico de aceleração para o grupo que praticou em comparação ao

grupo controle. O efeito de Fase (F2,18 = 11,80; p<0,05) demonstrou um aumento no pico de

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aceleração com a prática. O efeito de interação Fase x Grupo (F2,18 = 16,49; p<0,05), indicou

para o grupo experimental um aumento no pico de aceleração no pré-teste em comparação ao

pós-teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05).

Tempo do Pico de Aceleração

O pico de aceleração apresentou efeito principal no fator Grupo (F1,18 = 12,64;

p<0,05), indicando menor tempo do pico de velocidade para o grupo que praticou em

comparação ao grupo controle. O efeito de Fase (F2,18 = 10,79; p<0,05) também demonstrou

uma antecipação/diminuição no tempo do pico de aceleração. Houve efeito de interação (F2,18 =

5,10; p<0,05), indicando uma diminuição no tempo do pico de velocidade do grupo

experimental no pré-teste em comparação ao pós-teste (p<0,05) e à retenção (p<0,05). Por

outro lado, o tempo do pico de velocidade relativo não apresentou efeito principal (Grupo e

Fase) e efeito de interação (Fase x Grupo), indicando que mesmo em função da prática os

sujeitos foram capazes de manter estável o tempo do pico de aceleração relativo.

Discussão

O presente estudo teve como objetivo analisar o efeito da aprendizagem sobre as

estratégias de controle em uma tarefa discreta com restrição espacial simulada por computador

requisitando simultaneamente grande velocidade e precisão.

A prática proporcionou a diminuição no tempo de movimento total, mas com a

manutenção na precisão da resposta. Outros estudos também verificaram esta capacidade do

sistema de aprimorar o movimento através do aumento na velocidade e manutenção da precisão

(Abrams & Pratt, 1993; Pratt & Abrams, 1996; Proteau et al., 1992). Contudo, mesmo com a

manutenção na precisão, analisada pela dispersão espacial da resposta, a lei de Fitts (1954) não

foi violada em função da prática. Ou seja, a predição do tempo de movimento em função do

índice de dificuldade (tabela 2) apresentou um coeficiente de R2> 0,95 para todas as condições

(pré-teste, pós-teste e retenção) e todos os grupos (experimental e controle). Por conseguinte, a

lei de Fitts demonstrou ser robusta suficiente para considerar também o efeito da aprendizagem

sobre a performance no movimento (figura 3).

Em se tratando das estratégias adotadas para explicar esta redução no tempo de

movimento, foram verificadas alterações nas fases do movimento consideradas

predominantemente pré-programada e regulada via feedback. A fase do movimento pré-

programada tem sido atribuída ao primeiro submovimento (cf. Meyer et al., 1988). Esta fase

demonstrou um pequeno aumento no tempo absoluto para o grupo que realizou a prática.

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Assim, foi sugerida uma melhor pré-programação do movimento, em função da prática. Este

melhor controle via feedfoward também foi verificado em outros estudos e foi demonstrado

também através de uma redução na variabilidade espacial e no aumento da distância percorrida

do submovimento primário (Abrams & Pratt, 1993; Pratt & Abrams, 1996). Por outro lado, a

fase de controle predominantemente via feedback demonstrou uma redução. Esta análise é

baseada no tempo do submovimento secundário. Apesar da melhor pré-programação, a

magnitude da diminuição verificada no tempo absoluto do sub-movimento secundário, em

comparação ao aumento do tempo absoluto do sub-movimento primário, sugere que a

eficiência na diminuição do tempo total ocorre principalmente em função da otimização dos

processos via feedback no movimento.

Os valores de tempo relativo dos submovimentos primário e secundário sugerem

que o movimento antes da prática o movimento é controlado prioritariamente através de

correções baseadas nas informações de feedback. Pois, maior tempo relativo foi verificado na

fase do submovimento secundário no pré-teste do grupo experimental e em todas as fases (pré-

teste, pós-teste e retenção) do grupo controle. Desta forma, após a prática houve uma menor

necessidade na utilização da informação via feedback (Schmid & McCabe, 1976; Pratt e

Abrams, 1996). Esta menor necessidade na regulação do movimento via informação do

feedback tem sido principalmente atribuída à melhor especificação dos parâmetros de controle

no movimento decorrente da prática. Assim, a aprendizagem parece proporcionar uma melhor

capacidade na integração das informações de feedback sensorial aos comandos motores

gerados centralmente (Abrams & Pratt, 1993; Proteau et al., 1992).

A estratégia observada para a diminuição do tempo total foi o aumento na

magnitude da velocidade e da aceleração no movimento. Segundo alguns modelos que

tentaram explicar a relação inversa velocidade-precisão, o aumento na velocidade e na

aceleração proporcionariam a diminuição da precisão no movimento. Por exemplo, os modelos

de variabilidade do impulso (Schmidt et al., 1978) e o modelo de submovimentos otimizados

(Meyer et al., 1988) apontam que o aumento na velocidade e aceleração demanda de maior

geração de força durante a realização do movimento. Esta maior geração de força foi

inversamente associada à variabilidade de resposta e, consequentemente, à menor precisão de

movimento (Schmidt et al., 1978). Estes modelos são baseados na idéia de que a maior

produção de força causaria maior ruído no sistema proporcionando esta variabilidade de

resposta e menor precisão. A diminuição do tempo de movimento, segundo o modelo de

correção repetitiva (Crossman & Goodeve, 1983), também resultaria maior variabilidade de

resposta em função da menor quantidade de tempo para a utilização do feedback na regulação

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do movimento. Entretanto, o presente estudo não verificou um aumento no erro efetivo (média

e desvio padrão), em função da prática, mesmo com o aumento na velocidade e aceleração do

movimento. Esta divergência nos resultados com os modelos apresentados foi explicada pelas

restrições espaciais de controle utilizadas no estudo e pelas estratégias utilizadas para controlar

a precisão no movimento.

Como a restrição espacial foi uma variável manipulada, através da combinação de

diferentes tamanhos e distâncias entre os alvos, era esperado que o movimento não

ultrapassasse determinados limites espaciais. Desta forma, a manutenção da precisão no

movimento demonstra que as restrições espaciais utilizadas foram asseguradas nas diferentes

condições analisadas. Contudo, isto não explica a capacidade da maior geração de velocidade e

aceleração sem detrimento na precisão. Alguns estudos que analisaram o chute no futebol

(Teixeira, 1999), o arremesso no basquetebol (Okazaki et al., 2006, 2008) e o arremesso de

beisebol (Teixeira, 1997), demonstraram a estratégia de manipular o instante em que a maior

velocidade ocorre para a manutenção da precisão no movimento. Tal estratégia permite maior

fase de desaceleração no movimento, normalmente relacionada aos processos de controle via

feedback; e menor aceleração no instante crítico da performance (lançamento, contato,

impacto, etc.), proporcionando menor variabilidade de resposta (Okazaki et al., 2006; Teixeira,

2000). Esta estratégia foi sugerida como explicação para o aumento na velocidade do

movimento sem detrimento na precisão, em função da aprendizagem.

Em síntese, o tempo de movimento foi reduzido, principalmente, em função da

diminuição no tempo do submovimento secundário. Esta redução no tempo de movimento,

entretanto, não teve efeito sobre a precisão no movimento compensada pela manipulação do

instante em que o maior valor de velocidade e de aceleração ocorreu. Apesar das alterações na

resposta e na performance do movimento, decorrentes da prática, a lei de Fitts demonstrou ser

robusta suficiente para predizer o tempo de movimento em função do índice de dificuldade. Foi

sugerido que o aprimoramento na performance em função da prática ocorreu através da

interdependência entre programação e processamento de feedback. Assim, à medida que a

tarefa foi praticada houve menor dependência do feedback devido a melhor programação no

submovimento primário e uma melhora na utilização do feedback sensorial.

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Capítulo 13

A eficácia de diferentes formas de instrução no processo

de aprendizagem do rolamento para frente

Autora: Silvia Letícia da Silva

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

Tendo em vista que o processo de aprendizagem de uma dada habilidade motora só acontece por meio de alguma forma de instrução, o presente estudo tem como finalidade comparar três modos de instrução: instrução por demonstração de um modelo perfeito, instrução por modelo aprendiz e instrução verbal. Em situação real de ensino aprendizagem do rolamento para frente. Participaram deste estudo 24 crianças que cursavam a 1ª. Série do Ensino Fundamental (todas com sete anos de idade), divididas em três grupos de oito alunos cada. Para realizarem tal experimento os alunos foram filmados, participando de dez aulas, compostas por doze tentativas cada, sendo que o rolamento foi executado uma única vez, tanto no pré quanto no pós-teste. A análise foi feita através dos seguintes itens: mãos apoiadas no solo com dedos voltados para frente, braços na largura dos ombros, colocar o queixo no peito, deixar o corpo grupado, provocar desequilíbrio para frente, tocar as costas no solo, rolar para frente em vez de desviar para lateral e finalizar com o corpo grupado. Estes itens foram avaliados da seguinte forma: (1) não executou (2) execução imperfeita e (3) execução perfeita. Ao compararmos os resultados do pré-teste com o pós-teste com relação às variáveis instrucionais verificamos que os resultados obtidos não mostraram diferença significativa entre os tipos de instrução, apenas uma melhora no desempenho dos alunos em todos os grupos indistintamente da forma como foram instruídos.

Termos-chave: demonstração, modelo perfeito, modelo aprendiz, instrução verbal, rolamento

para frente.

Introdução

Uma das maiores preocupações no âmbito educacional atual, consiste preliminarmente

à prática metodológica e a efetivação da aprendizagem. Para tanto é relevante enfatizar que a

instrução é o componente indispensável no processo de aprendizagem.

Desta forma para que a criança aprenda uma habilidade motora e forme uma

compreensão (ainda que simplificada) dos movimentos que ela deve realizar, a compreensão

deve estar alicerçada de respectiva observação, bem como de outras instruções que são dadas a

posteriori. A compreensão de como deve proceder em uma nova habilidade motora não é

suficiente para que o indivíduo possa realizar um determinado movimento. Por esta premissa,

torna-se premente que o aprendiz principie esta atividade, realizando movimentos

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correspondentes, o que ocorre por uma mistura de imitação e/ou através de alguma forma de

instrução dada por outros.

Ao deparar com uma habilidade motora nova, o iniciante traz à tona todo o seu

repertório de conhecimento (memória) e habilidades adquiridas até então. Conseqüentemente,

busca utilizá-los para elaborar o melhor programa de ação possível na tentativa de solucionar o

problema motor. Em sua teoria, Vygotsky (2001) enfatiza que é pela internalização que o

homem reconstrói as funções psicológicas superiores: pensamentos, linguagem, memória

voluntária, raciocínio e imaginação. Assim, a memória permite recordar e lembrar de objetos,

fatos, pessoas mesmo ausentes. E a formação da memória só acontece através da mediação,

processo que envolve uma ou mais pessoas como intermediárias entre o conhecimento e a

pessoa que se apropria. Para tanto, a linguagem é fundamental no desenvolvimento humano,

pois funciona como comunicação entre os indivíduos. Torna-se relevante destacar que o sujeito

precisa disponibilizar de um maior recurso de atenção para conseguir realizar o movimento

devido aos números de partes que a compõem ou das exigências de processamento da

informação. Segundo Teixeira (2006), a complexidade relativa de uma tarefa é definida em

função da quantidade de atenção necessária para desempenhar a habilidade a ser aprendida com

êxito. Tarefas complexas requerem uma alta demanda atencional ao contrário das simples.

Quando um indivíduo realiza uma tarefa nova as informações são processadas de modo

controlado. Este requer uma grande sobrecarga da capacidade de atenção, e é caracterizado

pela lentidão das operações de processamentos, pelo processamento seriado e pela

intencionalidade, sendo que a função mental pode ser iniciada e interrompida a qualquer

instante e a interferência pela execução de outras tarefas simultânea. Sempre que uma tarefa for

realmente nova para um indivíduo, sem que tenha havido prática prévia da tarefa ou

possibilidade de transferência de aprendizagem anterior, ela será relativamente complexa para

ele. Por outro lado, quanto mais prática específica em uma determinada tarefa motora, mais

simples (automática) ela se torna para o aprendiz. É neste contexto que entra a instrução, que

tem como função primordial o auxílio ao aprendiz no que concerne a resolução e otimização

das melhores soluções na execução de uma determinada tarefa.

O tempo que a criança leva para aprender um movimento depende da maneira como ela é

estimulada e orientada e de como responde aos estímulos e orientações. Luria (2001) explica

como ocorre o processo de aprendizagem de uma habilidade motora, para tanto, ele aborda o

sistema nervoso central e suas três unidades funcionais que agem ativamente no processo de

aprendizagem. A primeira unidade funcional é responsável pelo estado de atenção da pessoa,

sem a qual a aprendizagem fica difícil de acontecer. A segunda unidade funcional responde

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pela recepção, pela análise e pelo armazenamento de informações. Esta última inclui a

associação entre as informações proveniente de diferentes campos perceptuais (visão e audição,

dentre outros). A terceira unidade funcional tem a capacidade de receber as informações e

interpretá-las.

Sob a perspectiva de ensino, a instrução tem o papel de auxiliar tanto na orientação da

atenção às informações mais relevantes, como na elaboração do programa de ação e sua

subseqüente execução. A instrução pode se auxiliada pelo feedback extrínseco na forma de

conhecimento de resultados, podendo também auxiliar o aprendiz a detectar e corrigir seus

erros de execução. Sob a égide da aprendizagem, o importante é saber como estas instruções

contribuem efetivamente para a organização, execução e avaliação de ações motoras. Para que

esse processo de comunicação seja eficaz, torna-se necessário não apenas dominar o conteúdo a

ser transmitido, mas também conhecer as características do aprendiz que limitam a assimilação

dessas informações. Entretanto, para que a instrução atinja o seu objetivo, esta deve ser

remetida de acordo com o estágio de evolução do aprendiz numa determinada habilidade. Ao

analisarmos os estudos já realizados nessa área temos que os métodos mais comuns utilizados

para comunicar a respeito de como desempenhar uma habilidade consistem na demonstração e

na instrução verbal.

Um dos métodos mais populares utilizados no processo de aprendizagem motora é a

demonstração, que engloba informações sobre a meta da tarefa, a especificação da habilidade

(o que fazer) e o modo de execução (como fazer). Durante a exposição do modelo, os

observadores tendem a codificar, classificar e reorganizar os elementos da tarefa em esquemas

simplificados de forma que recordem mais facilmente. Assim, a instrução por modelo pode ser

freqüentemente utilizada como estratégia para a aprendizagem de novas habilidades motoras.

Estudos recentes denotam explicações para o efeito da demonstração. Isto porque os neurônios

espelhos, inicialmente, foram observados em pesquisas em macacos Rhesus por Galesse et al.

(1996). Desta forma, foi constatado que as células localizadas no lobo frontal do cérebro

disparavam toda vez que o macaco pegava ou movimentava um objeto com finalidade

especifica. Posteriormente, este tipo de neurônio foi encontrado em humanos e mostraram ser

capaz de compreender a ação de outra pessoa e também suas intenções e emoções (Iacoboni et

al., 2005). Além de compreender a ação, intenções e emoções de outras pessoas, esses

neurônios são extremamente eficazes e de tamanha importância para o aprendizado, devido à

enorme capacidade que engendram no que concerne ao ato de imitar a ação de outra pessoa

sem precisar do auxílio da memória (Fogassi, Galesse & Rizzolatti, 2006). Portanto, estão

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fortemente relacionados com a capacidade de aprender por observação de um modelo, uma vez

que quando o individuo vê a ação de outra pessoa e logo simula a ação no seu cérebro.

O uso da demonstração também encontra suporte na Teoria de Aprendizagem Social,

proposta por Bandura (1977). Bandura propõe quatro subprocessos que governam a

aprendizagem pela observação de um modelo. O primeiro processo é a atenção que determina

o que é observado e qual informação é extraída da ação do modelo. O segundo subprocesso diz

respeito à retenção, que envolve transformar e reestruturar o que é observado em códigos

simbólicos que são armazenados na memória como modelos internos de ação. O terceiro

subprocesso é o de reprodução do comportamento, que envolve a passagem da representação

na memória da ação modelada para a ação física. O quarto subprocesso é o da motivação e

envolve o incentivo ou motivo para desempenho da ação modelada. Sobre o efeito da

observação na aprendizagem Bandura (1977, 1986) propõe que dentro da concepção de

aprendizagem de um dado comportamento não ocorre sempre com base nas experiências

práticas ou na execução de respostas a serem aprendidas, mas também através da observação

das respostas de outros indivíduos. A teoria propõe basicamente que uma representação

cognitiva do comportamento observado (modelo) fornece um quadro de referência tanto para

produções como para a avaliação de ações subseqüentes. A respeito do processo de Modelação

temos a citação de dois autores na obra de Bandura (1969). Primeiro, é citado Piaget (1952),

que descreve o processo de modelação como sendo um processo em que os comportamentos

espontâneos do imitador servem inicialmente como estímulos para respostas semelhantes do

modelo em seqüências imitativas alternadas. Allport (1924), por outro lado, considerou os

fenômenos da modelação como exemplos de condicionamento clássico de verbalização,

respostas motoras ou emoções a determinados estímulos sociais com que foram associados por

contigüidade.

Em um trabalho de revisão bastante abrangente investigando o papel da demonstração

na aquisição de habilidades motoras, McCullagh, Ross e Weiss (citado por Magill, 2000),

concluíram que a demonstração é mais eficiente em determinada circunstância do que em

outra. Esta conclusão sugere que um professor deve utilizar a demonstração somente depois

que tiver a certeza que esta é a melhor forma de instrução a ser utilizada no processo de

aprendizagem. As características das habilidades resultam em contradições entre os

pesquisadores. Enquanto alguns concluíram que a demonstração leva à melhor aprendizagem

da habilidade que outras formas de instrução, outros descobriram que outras formas de

instrução são tão ou mais efetivas no tangente ao ensino de habilidades motoras. Magill e

Schoenfelderzorhdi (1996) mostraram que o efeito da demonstração na aquisição da habilidade

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depende da característica da habilidade que está sendo apreendida. A observação de um modelo

apropriado durante a prática de uma habilidade motora pode ser efetiva na medida em que o

aprendiz necessita ter uma idéia clara do objetivo a ser atingindo. A demonstração quando

observada corretamente possibilita que o sujeito capte as informações da coordenação e

também as estratégias usadas pelo modelo para resolver o problema do movimento, o que

ocorre com freqüência nas primeiras tentativas. Para Magill (1989), a aprendizagem de

qualquer habilidade motora pode ser facilitada desde que o modelo contenha todas as

informações que são críticas para a execução dessa mesma habilidade. Porém para Glencross

(1992), ainda não está claro que tipo de informação de extrema importância o aprendiz extrai

de uma observação.

A demonstração pode ser fornecida através da observação de um modelo perfeito

(excelência) e também pela observação do modelo aprendiz (não treinado). Estudos que

comparam a eficácia do modelo perfeito e modelos não treinados demonstram que o modelo

aprendiz não deve ser deixado de lado, já que este é tão eficaz quanto o modelo perfeito

(Leavitt & Weir, 1990; Lee & Pollock, 1992). Uma possível razão para isso é que ao contrário

do modelo perfeito, que apenas oferece uma representação precisa de como uma tarefa motora

deve ser executada, o modelo aprendiz apresenta muitos benefícios, uma vez que os

principiantes podem analisar tanto os erros cometidos pelo modelo quanto as estratégias

empregadas para corrigí-los. Partindo desta premissa, o aprendiz participa mais ativamente do

processo pelo qual os erros de execução sejam gradativamente corrigidos até que o problema

seja solucionado (Adams, 1986; Lee et al., 1994). Landers e Landers (1973) apresentaram

evidências ao fato de que o modelo perfeito é mais eficaz do que o modelo aprendiz, se

considerarmos que o modelo perfeito faz o movimento corretamente e o aprendiz deixa

algumas falhas. No entanto, pode causar a desmotivação que é tratada por Bandura (1969), o

qual propõe que se estímulos modeladores são apresentados numa freqüência ou nível de

complexidade que excedam as capacidades receptivas do observador, a aprendizagem

observacional será necessariamente limitada e fragmentária.

Até o presente momento nos restringimos à questão nevrálgica da demonstração

(modelo perfeito e modelo aprendiz) como variável instrucional. Por outro lado, torna-se tão

plausível o destaque ao papel da instrução verbal que pode agir como mediadora para a

melhora da representação cognitiva do modelo observado. Ainda em referência a instrução

verbal (McCullagh et al.1989), destaca duas categorias de instrução: aquela que informa o

aprendiz sobre a tarefa a ser executada e aquela que informa sobre aspectos relacionados com a

demonstração. Esse tipo de instrução orienta a atenção do aprendiz aos aspectos críticos da

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demonstração. A instrução verbal quando usada isoladamente é um tanto complexa para o

aprendiz por não fornecer o padrão exato do movimento a ser aprendido, ou seja, a informação

quando transmitida, não fica clara o suficiente como na demonstração visual, portanto, a

codificação do movimento é muito mais difícil do que quando a ação é observada.

A revisão da literatura também apontou estudos sobre a informação verbal e a

apresentação do modelo (Bandura & Carrol, 1990; Darido, 1991) as características e os

aspectos desenvolvimentistas do observador (McCullagh, Stiehl & Weiss, 1990; Klint &

Weiss, 1987; Weiss, 1983) e o modelo apresentado como feedback (Leavit & Weir, 1990;

Little & McCullagh, 1990).

Tendo em vista que a demonstração é o tipo de instrução mais utilizada na área de

comportamento motor e que a instrução verbal frequentemente auxilia na observação, o

presente estudo tem como propósito comparar o efeito dos seguintes modos de instrução sobre

a aprendizagem do rolamento para frente: demonstração por modelo perfeito, demonstração por

modelo aprendiz e instrução verbal.

Método

Participantes

Participaram deste estudo 24 crianças de 7 anos de idade de ambos os sexos, que

cursavam a 1ª série do ensino fundamental, ciclo I da unidade escolar EMEF Vereador Edegar

Simões, localizada em Carapicuíba, São Paulo, as quais foram divididas em três grupos iguais

de 8 participantes cada, que receberam diferentes instruções reais de aprendizagem. A

coordenadora pedagógica da Unidade Escolar responsabilizou-se por todos os alunos,

assinando o termo de consentimento.

Equipamentos e Tarefa

A tarefa em questão é o rolamento para frente sobre um colchão. Esta habilidade motora

necessariamente tem as seguintes características:

1. Mãos apoiadas no solo com dedos voltados para frente

2. Braços na largura dos ombros

3. Colocar o queixo no peito

4. Deixar o corpo grupado

5. Provocar desequilíbrio para frente

6. Tocar as costas no solo

7. Rolar para frente em vez de desviar para lateral

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8. Finalizar com o corpo grupado.

Foi utilizada uma câmera digital SONY modelo W30 com resolução de 6.0 mega pixels,

para filmar o pré-teste e o pós-testes, folhas de sulfites para confecção das planilhas para

coletas dos dados do pré-teste e pós-teste e um colchão grande, utilizado para executar o

rolamento para frente.

Delineamento experimental

Os participantes foram divididos em três grupos com 8 crianças em cada um, que

tiveram as seguintes características:

Grupo demonstração por um modelo perfeito (DMP). A demonstração foi feita ao vivo

pela própria pesquisadora, que realizava doze demonstrações completas da tarefa do rolamento

para frente, sendo uma a cada ciclo de tentativa. As crianças ficavam posicionadas uma ao lado

da outra em frente às sucessivas demonstrações.

Grupo demonstração por um modelo não-treinado em processo de aprendizagem

(DMN). A demonstração da tarefa foi executada por um aluno que demonstrou maior

habilidade motora no momento em que a docente solicitou ao grupo atividades de rolamentos

para frente. O aluno que se sobressaiu serviu de modelo aos demais, que o observaram e

tentaram reproduzir os movimentos executados a priori.

Grupo instrução verbal (IV). As instruções foram fornecidas pela pesquisadora de forma

concisa e clara, a fim de facilitar o entendimento e a compreensão da forma mais objetiva

possível. Dentre essas instruções destacamos as seguintes:

Mãos apoiadas no solo com dedos voltados para frente

Braços na largura dos ombros

Colocar o queixo no peito

Deixar o corpo grupado

Provocar desequilíbrio para frente

Tocar as costas no solo

Rolar para frente em vez de desviar para lateral

Finalizar com o corpo grupado.

O experimento foi realizado em 10 aulas e em cada aula o rolamento foi trabalhado

alternadamente em todas as condições de instrução, ou seja, depois que todos participantes

terem executado a primeira tentativa passava-se para a seguinte até que se completassem as

doze tentativas previstas. As instruções foram oferecidas 12 vezes, uma em cada ciclo de

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tentativa. Em nenhuma fase do experimento foi oferecido feedback aumentado. Os grupos

foram treinados em sessões separadas, não tendo acesso às instruções dos outros grupos.

Procedimentos

Antes de iniciarmos o experimento, todos os participantes se familiarizaram com tarefa

motora, só então foi efetuado o pré-teste. Tanto no pré-teste quanto no pós-teste foi realizado

um movimento por participante de cada condição experimental.

Antes de finalizar a avaliação com o pós-teste, foi realizada a avaliação da

fidedignidade das medidas logo após uma semana da realização da avaliação original pré-teste.

A amostragem foi feita por sorteio de 10% das tentativas do pré-teste, para se calcular a

porcentagem de coincidências nos pontos atribuídos.

Os itens analisados foram: Mãos apoiadas no solo com dedos voltados para frente;

braços na largura dos ombros; colocar o queixo no peito; deixar o corpo grupado; provocar

desequilíbrio para frente; tocar as costas no solo; rolar para frente em vez de desviar para

lateral e finalizar com o corpo grupado, estes itens foram preenchidos da seguinte forma: (1)

não executou (2) execução imperfeita e (3) execução perfeita.

Resultados

A pontuação média entre os itens avaliados obtida por cada grupo nos pré e pós-testes

está apresentados na Figura 1. A mudança de desempenho de um modo geral foi nitidamente

observada em todos os grupos no decorrer do experimento pelos valores apresentados no pré-

teste e pós-teste, indistintamente da forma de instrução.

A análise foi realizada através de uma análise de variância de dois fatores: 3 (grupo) x 2

(teste) com medidas repetidas no segundo fator. Os resultados desta análise não revelaram

diferença estatisticamente significativa entre os grupos F(2, 21) = 0,11, p > 0,05, enquanto que

no fator teste foi encontrada diferença significativa entre o pré-teste e o pós-teste F(1, 21) =

27,46, p < 0,0001, resultante de escores mais elevados no pós-teste. Não foi encontrada

interação entre os fatores principais, F(2, 21) = 0,74, p > 0,05.

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152

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

Modelo Perfeito Modelo Aprendiz Instrução Verbal

Esco

res

Pré-testePós-teste

Figura 1 – Escore médio dos itens avaliados e desvio padrão (traços verticais) de pré-teste e pós-teste para cada grupo experimental.

Discussão

A finalidade deste estudo foi verificar qual tipo de instrução (demonstração de um

modelo perfeito, demonstração de um modelo aprendiz e instrução verbal) se destaca como o

mais eficiente no processo de aprendizagem do rolamento para frente. É importante destacar

que neste experimento foram utilizadas apenas a demonstração e a instrução verbal (sem a

combinação entre si).

Os resultados obtidos nos mostram que houve uma diferença significativa no fator teste

em todos os grupos de instrução. Esse indicativo nos mostra que ocorreu aprendizagem da

habilidade comparando o pré-teste com o pós-teste. Porém, se compararmos o pré-teste e pós-

teste percebe-se que no pré-teste o desempenho geral de todos os grupos foi menor em relação

ao pós-teste, sendo então compreensível esses resultados do pré-teste devido ao alto grau de

dificuldade e do recurso atencional exigido para executar a tarefa. No pós-teste a tarefa em

questão já estava um tanto automatizada devido à quantidade de aulas e ao bloco de tentativas

realizada no experimento, assim, o desempenho foi naturalmente melhor. Esse resultado vai de

encontro à afirmação de Teixeira (2006) que enfatiza muito sobre a complexidade relativa da

tarefa. Esta exige uma alta demanda atencional quando a habilidade a ser aprendida é nova e

um tanto complexa. Tal afirmação justifica o pré-teste de todos os grupos, que apresentou

valores menores em relação ao pós-teste devido à complexidade da tarefa.

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O nível de desempenho de todos os grupos foi semelhante, inclusive o grupo da

instrução verbal. Esse resultado não segue a idéia proposta por McCullagh et al. (1989), que

destaca que a instrução verbal comparada à demonstração é mais complexa, que professores de

Educação Física preferem utilizar a instrução para auxiliar na demonstração e que é muito raro

utilizar-se apenas da instrução verbal, pois a criança apresenta dificuldade em interpretar a

tarefa e de focar a atenção aos aspectos mais relevantes da habilidade sem o uso do auxílio

visual.

Então, é correto afirmarmos que é raro o uso da instrução verbal sem o auxílio visual

por profissionais de Educação Física, principalmente numa tarefa tão complexa como o

rolamento para frente, que exige uma atenção especial devido ao risco que apresenta em

relação à posição do pescoço, esta que quando mal posicionada e executada pode causar sérias

lesões à criança e de acordo com os resultados do presente estudo apresenta a mesma eficácia e

desempenho que as demais formas de instrução (demonstração do modelo perfeito e aprendiz

no pré-teste).

Em relação aos tipos de instrução, os resultados foram surpreendentes, uma vez que não

houvera diferenças estatisticamente significativa entre os grupos. Esse indicativo não enaltece

nenhuma das formas de instrução avaliada. Logo esse resultado é um tanto curioso, pois se

considerarmos os aspectos relevantes da demonstração e a aprendizagem por imitação,

resultado como esse não seria possível.

Sendo assim, no presente trabalho é apropriado contestar a efetividade da função dos

neurônios espelhos, os quais estão intimamente ligados com a capacidade de aprender por

imitação, ou seja, esses neurônios espelhos apresentam uma enorme capacidade de imitar a

ação de outra pessoa, (Fogassi, Galesse & Rizzolatti, 2006). Portanto, não seria surpresa se a

demonstração tanto pelo modelo perfeito quanto pelo modelo aprendiz apresentasse

superioridade em relação à instrução verbal. Entretanto, a questão em voga apenas nos leva a

refutar a idéia de que os neurônios espelho sejam determinantes para a aprendizagem.

Temos também que ir contra Landers e Landers (1973), que afirma que o modelo

perfeito é mais eficaz do que o modelo aprendiz. Se levarmos em conta essa afirmação, o grupo

que obteve instrução através do modelo perfeito deveria ter se sobressaído sobre os demais.

Por outro lado, o modelo perfeito pode não ter se sobressaído por trazer consigo uma

leve idéia de desmotivação devido à alta complexidade da tarefa que pode exceder as

capacidades do aprendiz estabelecendo, desta forma, um desafio inalcançável, afetando assim

sua motivação. Bandura, por exemplo, (1969) acredita nessa hipótese.

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154

O grupo que teve a instrução utilizando-se de um modelo aprendiz, também não se

sobressaiu, mesmo sendo enfatizado por Adams (1986) e Lee et al. (1994) que a criança

participa mais ativamente quando envolvida no processo pelo qual ela pode perceber os erros e

as estratégias utilizadas na resolução do problema. Essa suposição não foi corroborada, pois os

resultados apresentados não dão suporte a esta idéia.

Além disso, também temos Magill e Schoenfelderzorhdi (1996) enfatizando que o efeito

da demonstração na aquisição de uma habilidade depende da característica da habilidade que

está sendo aprendida. Assim, o rolar para frente não é uma habilidade que necessita

exclusivamente da demonstração para ser ensinada efetivamente, pois os resultados nos

mostram que esta tarefa foi igualmente ensinada e assimilada até quando a instrução verbal foi

utilizada.

Segundo Bandura (1977), pela Teoria da Aprendizagem Social, a demonstração através

de um modelo facilita a aprendizagem motora, pois o aprendiz pode ter a idéia clara da tarefa a

ser executada. Apesar dessa idéia proposta por Bandura, neste experimento a demonstração não

se destacou em relação à instrução verbal, fato bastante curioso, pois quando a instrução verbal

é utilizada o aprendiz, ao contrário da demonstração, não tem a idéia exata da tarefa a ser

realizada, sendo então, mais difícil para o aprendiz executar a tarefa por não apresentar uma

definição apropriada do movimento proposto.

Finalmente é interessante ressaltar que todas as variáveis instrucionais apresentaram um

desempenho significativamente melhor no fator teste. Já no fator grupo nenhuma das três

variáveis instrucionais se destacou em relação à outra. No entanto, é surpreendente o

desempenho da instrução verbal, pois esta foi tão eficiente quanto às demais, fato raro por

quase nunca ser trabalhada de forma única. É relevante também enfatizar que em todos os

grupos apenas a instrução propriamente dita foi trabalhada e que a habilidade de rolar para

frente pode ser trabalhada de forma eficaz independente do tipo de instrução.

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Capítulo 14

Análise da aprendizagem do arremesso de handebol

em função do foco externo e foco interno

Autora: Elisete Soler Moreira

Orientador: Andréa Cristina de Lima

Resumo

O objetivo desta investigação foi avaliar as diferenças entre os tipos de foco de atenção na aprendizagem do arremesso de handebol. Participaram deste estudo 06 sujeitos do sexo feminino com idade 12 anos, praticantes amadoras e em nível iniciante de experiência. Todas tiveram seus arremessos na linha de 7m filmados antes e após a fase de aquisição. As participantes foram distribuídas aleatoriamente em dois grupos: foco externo e foco interno. O primeiro grupo recebeu instruções para prestar atenção no movimento das mãos e o segundo focalizar sua atenção em um alvo específico, neste caso a bola a ser arremessada. O desempenho das participantes foi avaliado qualitativamente, por meio de uma lista de componentes da tarefa. A avaliação do desempenho foi realizada por outro avaliador sem ser o responsável pela investigação – estudo cego. Os resultados sugerem não haver diferenças significativas na aprendizagem em relação ao foco de atenção utilizado. Entretanto, na análise descritiva foi observado um aumento discreto dos escores atribuídos ao segmento corporal braço/antebraço para o grupo com demanda atencional no foco externo. Os resultados obtidos foram discutidos em termos do nível de aprendizagem das participantes e da necessidade de mais estudos no campo do handebol.

Termos-chave: aprendizagem motora, foco interno, foco externo, arremesso de handebol.

Agradecimentos: Ao meu esposo Justo pelo incentivo dado ao longo do curso. À tutora Andréa, pela orientação, ao amigo Geraldo Black e às minhas alunas pela participação na realização deste experimento.

Introdução

Na prática esportiva o controle de atenção representa uma habilidade de grande

importância para se conseguir um bom desempenho. Para Abes (2004), a perda de atenção

pode ser um fator direto de influência no resultado final de um jogo ou competição. É consenso

entre muitos instrutores que o aprendiz precisa considerar o foco de atenção utilizado por ele

(Poolton, Maxwell, Marters & Raab; 2006). Consequentemente há um grande interesse e

necessidade na área esportiva, não só em conhecer melhor o processo de atenção, bem como a

maneira como esta influencia no desempenho do praticante e como pode ser treinada

facilitando o processo de aprendizagem (Abes, 2004).

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Segundo Guallar & Pons (1994); Martens (1987) e Samilski (2000), a atenção consiste

em um mecanismo de estimulação, tanto da percepção seletiva quanto a dirigida. É considerado

um processo direcionador de nossa vigília quando informações ambientais são captadas pelos

nossos sentidos. Magill (2000) considera foco de atenção a organização dos recursos

disponíveis a determinadas fontes de informações e que pode ser considerado em função de sua

direção. A focalização da atenção em pistas do ambiente ou em pensamentos interiores indica a

direção do foco que pode ser interna ou externa. O foco interno caracteriza-se pela capacidade

do indivíduo em analisar percepções, pensamentos e planejar suas ações. Explorar, perceber e

organizar vários estímulos externos representa o segundo tipo de foco - foco externo (Cervelló,

1999).

A relação entre o desempenho esportivo e o tipo de foco de atenção é tema de diversas

pesquisas em esportes. Radlo et al. (2002) analisaram o lançamento de dardos em alvo pré-

determinado na parede. Os participantes foram divididos em dois grupos, um com foco interno

e outro com foco externo. O grupo que recebeu orientação entre cada arremesso para manter o

foco externo praticou menos erros em relação ao grupo que recebeu instruções para manter o

foco interno no momento de executar a ação motora. Outro estudo realizado para avaliar a

influência do foco de atenção na aprendizagem, foi conduzido por Shea & Wulf (1999). Neste

estudo a tarefa realizada pelos participantes, divididos em grupo de foco externo e interno,

consistia em manterem-se equilibrados sobre um estabilômetro. Os integrantes que

compunham o grupo de foco externo foram orientados a manterem sua atenção em uma marca

fixada no aparelho e os do grupo interno foram orientados a prestarem atenção em seus pés. A

aprendizagem para o grupo de foco externo indicou um melhor resultado.

No voleibol Wulf, McConnel, Güartner & Schuarz (2002) realizaram um estudo com

dois grupos de participantes de níveis técnicos diferentes, iniciantes e avançados, os quais

foram subdivididos em um grupo que recebia feedback de foco interno e outro de foco externo.

Neste estudo, ambos os grupos foram instruídos a realizarem saques na direção de uma área

determinada ao mesmo tempo em que recebiam feedback de acordo ao grupo a que pertenciam.

Os resultados indicaram que o recebimento de feedback de foco externo em comparação ao

foco interno, influenciou mais positivamente a aquisição e melhora da tarefa motora tanto em

precisão como na mecânica do gesto tanto para o grupo de iniciantes quanto para o de novatos.

Na área do futebol de campo esses mesmos autores, realizaram um estudo comparando foco de

atenção. Os participantes do grupo de foco externo obtiveram melhores resultados em seu

desempenho.

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158

Como demonstrado, o tipo de instrução no momento da prática interfere no aprendizado

de habilidades motoras. Pelo o que foi exposto até o momento, o foco externo de atenção

parece trazer resultados mais satisfatórios durante algumas práticas esportivas. Estas

informações sobre fenômenos atencionais são úteis para o profissional envolvido no

treinamento desportivo, pois direcionam o planejamento da prática em busca de melhores

resultados. No caso do handebol, um dos esportes mais praticados entre os adolescentes nas

escolas, não foi encontrado estudos que considerem o foco de atenção durante o processo de

aprendizagem. Um estudo que não está relacionado diretamente com o foco de atenção no

handebol, mas que pode ajudar no entendimento das influências atencionais do ambiente no

padrão do arremesso é o de Barela e Barela (1997). Este estudo examinou as influências

ambientais no padrão arremessar em crianças na faixa etária dos 10 aos 12 anos. Para tanto,

foram realizados arremessos em três diferentes distâncias do alvo: 4, 6 e 8 m. Os resultados

deste estudo não indicaram diferença, estatisticamente significativa, no padrão de arremesso

em diferentes distâncias .

O estudo do foco de atenção é pertinente no handebol, tendo em vista que o movimento

fundamental deste esporte – o arremesso – necessita de muita precisão (Correa, 2004). Desta

forma, o ensino do arremesso ao gol, deve ocupar um lugar importante na preparação do

jogador (Martini, 1980). Portanto, uma investigação mais detalhada da influência do foco de

atenção neste padrão de movimento justifica-se pela contribuição no processo de aprendizagem

da fase de iniciação específica desta modalidade esportiva.

Método

Participantes

Participaram deste estudo 6 estudantes, destras, do sexo feminino com idade 12 anos de

uma escola particular da cidade de São Paulo. Os responsáveis pelas participantes assinaram

termo de consentimento informado antes de iniciar o estudo. Todas as participantes integravam

o curso de iniciação ao desporto handebol.

Equipamentos e tarefas

As avaliações (pré-teste e pós teste) e a prática dos arremessos foram realizadas em uma

quadra de handebol, estando as participantes posicionadas na linha de 7m de frente para o gol.

O remate à baliza utilizado foi o arremesso parado ao gol a partir do próprio local.

Foi utilizada uma bola de handebol Penalty HIL, além de cones, cordas e arcos como

alvos. Os cones foram posicionados nos cantos internos e meio da linha de fundo entre os

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postes da baliza. As cordas seguraram os arcos posicionados nos cantos internos e meio da

barra transversal. Em cada sessão de prática, as participantes realizaram arremesso em alvo

superior (arcos) e inferior (cones).

No pré-teste e pós-teste as alunas foram filmadas no plano sagital, hemicorpo direito

com uma câmara digital Sony Handycam Dcr-HC30 NTSC, três vezes não consecutivas

durante a ação de arremessar.

Delineamento experimental

As participantes foram distribuídas aleatoriamente em dois grupos com números iguais

para compor o grupo de foco interno (FI) e outro de foco externo (FE) de atenção. No primeiro

contato com as participantes foi demonstrado um arremesso parado de handebol por um

modelo treinado, na marca dos sete metros. Em seguida, sem qualquer instrução, todas foram

avaliadas (pré-teste) qualitativamente por meio de uma tabela que pontuava a performance dos

segmentos corporais durante o arremesso.

Durante o treinamento, posicionadas na quadra, as participantes realizavam três séries

de 20 tentativas de arremessos ao gol não consecutivos sendo instruídas de acordo com o grupo

a que pertenciam. O grupo de foco externo foi orientado a direcionar sua atenção a um ponto

pré-definido no gol (alvo) recebendo a dica verbal “concentre-se no alvo”.O grupo com atenção

no foco interno foi orientado a focalizar sua atenção na execução gestual do movimento, ou

seja, no posicionamento dos seus pés - que deveriam estar em posicionamento ântero-posterior

e em seu braço que deveria ser mantido em extensão vertical parcial ou total, recebendo para

tanto a dica “bola acima da cabeça”.

Instrumento de avaliação

Em cada tentativa de arremesso, dentro das fases específicas do padrão de movimento,

foram analisados os seguintes segmentos corporais divididos em: pés, quadril e

braço/antebraço. Para cada segmento corporal foram atribuídos escores com valor mínimo de

zero e máximo de cinco pontos. Escores baixos corresponderam há um movimento pouco

eficiente distante do ideal. Escores altos corresponderam a movimentos próximos ao padrão

e/ou corretos.

Na fase inicial o posicionamento correto dos pés deve ser em afastamento ântero-

posterior, sendo o pé à frente contrário a mão de arremesso (Maldonado et al., 1991). A

associação de movimentos entre quadril e tronco, também foi analisada devido o movimento de

balanço iniciar-se nesta fase. Este movimento inicia-se com a transferência do peso corporal

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para a perna que está atrás seguido de uma forte torção no tronco acompanhado de movimento

do quadril. Tanto o movimento de balanço quanto a torção do tronco é aumentado na fase

principal (Martini, 1980). O quadril apresenta um papel de estabilização do equilíbrio para os

movimentos do tronco e para os do braço, sendo uma estratégia de controle selecionada

objetivando manter o centro de gravidade sobre a base de apoio (Teixeira, 1997). Desta

maneira, é possível observar o movimento do quadril no sentido oposto ao da extensão do

braço.

Na avaliação o segmento corpóreo braço/antebraço deve formar ângulo reto com o

posicionamento do cotovelo à altura dos ombros para segurar a bola acima da cabeça. Na parte

principal, devido ao movimento de balanço ser aumentado, o braço de arremesso deve realizar

uma extensão total do cotovelo. Este conjunto de fatores torna a ação de alavanca do braço a

maior possível, imprimindo maior potência ao arremesso (Martini, 1980; Maldonado et al.,

1991).

O padrão de arremesso das participantes foi avaliado por um outro colaborador sem

qualquer envolvimento direto com a pesquisa e com as participantes.

Resultados

Para a análise dos dados foi empregado uma Anova 2 (foco) x 2 (momento), com nível

de significância P<0,05, por meio do programa Statistica 5.5 com medidas repetidas.

Os resultados encontrados indicaram que não houve diferenças significativas nos

escores obtidos no pré-teste em relação ao pós-teste. Também não houve diferença significante

em relação ao tipo de foco de atenção. Porém, uma análise descritiva dos dados mostra

algumas tendências entre as médias dos segmentos corporais avaliados apontando um pequeno

aumento nos escores do componente corporal braço/antebraço para o grupo orientado a utilizar

o foco externo na ação de arremessar.

Na avaliação do segmento corporal pé, o resultado para o teste obtido relativo à

mudança de foco foi F(1,2)=9,32 com p>0,05. Em relação ao momento foi obtido resultado

F(1,2)=0,076 com p>0,05; não indicando alteração estatística considerável. Resultados não

significativos foram encontrados na análise do componente corporal braço/antebraço em

relação ao foco utilizado e variação temporal com os seguintes valores respectivamente

F(1,2)=1,77, com p>0,05 e F(1,2)=12, com p>0,05 A análise do segmento corporal quadril

indicou ausência de significância para o fator foco, F(1,2)=3, com p>0,05 e nenhuma alteração

relacionada ao momento.

Para o segmento corporal pés a média dos escores obtida pelas participantes do grupo

do foco interno (figura 1) no pré-teste foi de 1,33 (DP=0) e a do grupo externo (figura 2) foi de

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2,33 (DP=0,47). No pós-teste as médias obtidas, respectivamente, foram 1,44 (DP=0,31) e 2,33

(DP=0,27). Em relação ao quadril a média do grupo do pré-teste focado na atenção interna foi

de 1,22 (DP=0,16) enquanto para o grupo focado na atenção externa foi de 2,33 (DP=0,54). No

pós-teste o grupo de foco interno apresentou média de 1,33 (DP=0,27) e o grupo de foco

externo apresentou média de 2,22 (DP=0,68). Para o segmento corporal braço/antebraço os

valores das médias encontrados para o grupo de pré-teste com foco interno foram de 1,56

(DP=0,31) e 1,89 (DP=0,63) para o grupo focado no foco externo. Na realização do pós-teste

os valores da média obtidos pelo grupo de foco interno foram de 1,89 (DP=0,52) e para o grupo

de foco externo de 2,89 (DP=0,59).

Figura 1. Médias e desvio padrão dos escores obtidos antes e depois da prática para os grupos

Foco Interno (FI) e Foco Externo (FE).

Discussão

Considerando os grupos de acordo com o tipo de foco atencional utilizado, não foram

observadas significâncias estatísticas consideráveis para a aquisição da habilidade. Entretanto

na análise dos dados do pós-teste, o grupo de foco externo apresentou uma pequena melhoria

no segmento corporal braço/antebraço de acordo com o aumento dos escores atribuídos. Este

fator pode ser explicado pelas vantagens associadas à utilização do foco externo de atenção que

tem como conseqüência a utilização de mecanismos mais naturais de controle e indicam que

tentativas conscientes de controlar movimentos interferem no processo automático do controle

motor (McNwen et al., 2003). Dessa maneira, em atividades fechadas (Lindor & Singer, 2003)

tais como cobrança de pênalti no handebol e futebol, saques no tênis entre outras, a

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manutenção da atenção em foco externo é a maneira mais eficaz de se preparar para a execução

da tarefa.

Nos estudos que investigaram os tipos de foco de atenção, as evidências demonstraram

benefícios da aprendizagem com um foco de atenção externo. Os resultados encontrados no

presente estudo vêm de encontro aos resultados obtidos por Liao e Masters (2002), em estudos

com atletas de hockey e de basquete, em situações de stress, onde verificou-se que os atletas

com piores resultados pertenciam ao grupo focado na atenção interna. Resultados semelhantes

foram encontrados nos estudos de arremesso de dardos, realizado por Radlo et al. (2002), os

participantes divididos em dois grupos, foco interno e foco externo, realizaram quatro séries

com dez tentativas de arremessos de dardo em um alvo, procurando obter a maior pontuação

possível, com desempenho superior do grupo de foco externo. Os efeitos do foco de atenção na

rebatida do baseball foram conduzidos por Castaneda e Gray (2007) com jogadores

universitários iniciantes e experientes. Neste estudo os jogadores participaram em quatro

condições de dupla-tarefa, em um movimento simulado de rebatida do beisebol. Duas tarefas

dirigiam a atenção à execução da habilidade movimento em função do tipo de foco interno

(movimento das mãos) e externo (movimento do bastão) e as outras duas consistiam em

focalizar a atenção no ambiente (sons do ambiente) e no movimento da bola após o golpe. Os

resultados encontrados indicaram que o desempenho dos batedores iniciantes foi

significativamente melhor na condição de conhecimento do movimento em relação a atenção

focada no ambiente, o que não foi evidenciado no presente estudo. Para os jogadores

experientes os resultados obtidos foram melhores na condição de atenção com foco no

ambiente.

Neste presente estudo é provável que o grau de aprendizagem em que se encontravam

as participantes tenha interferido nos resultados. Em estágios iniciais de aprendizagem os

indivíduos apresentam limitações de processamento atencional, com efetuação seqüenciada de

uma função cognitiva por vez (Schneider & Shiffrin apud Teixeira, 1997,). Wulf et al. (2003)

postula que indivíduos iniciantes não utilizam um único foco de atenção e que este varia de

acordo com as exigências da tarefa, apesar das instruções para manter a atenção em um foco de

atenção específico.Em relação à tarefa, o arremesso em direção ao gol com o jogador parado

não traz problemas de método, desde que se tenha o domínio correto do passe de ombro e o

segurar da bola (empunhadura). Para Martini (1980), a prática de fundamento específico como

passe de ombro a partir do próprio local e empunhadura podem ser considerados fatores

determinantes no grau de sucesso no ato de arremessar. Desta maneira, para o amplo

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desenvolvimento do ato de arremessar, evidencia-se especial atenção ao trabalho específico

destes fundamentos.

Outros dois fatores que podem ter contribuído para a não detecção de diferenças

estatísticas entre os grupos, referem-se ao número pequeno de participantes que integravam a

amostra e o curto período de prática realizado. Ambos os fatores devem ser considerados na

interpretação dos resultados. Devido à falta de evidências conclusivas neste tipo de tarefa,

torna-se necessário a realização de um número maior de pesquisas, para que sejam alcançados

resultados mais elucidativos em relação à aprendizagem específica do handebol.

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Capítulo 15

Facilitação do planejamento motor e da aprendizagem através da

prática mental em crianças com paralisia cerebral

Autora: Audrey Sartori Cabral

Orientador: Luis Augusto Teixeira

Resumo

A paralisia cerebral (PC) leva a uma deficiência e debilidade que resultam em incapacidades e limitações funcionais. Crianças com dificuldades motoras freqüentemente são mais lentas na execução dos movimentos, como resultado da sua dificuldade de organização e coordenação motora. Muitos estudos mostram os benefícios da prática mental na aquisição de habilidades motoras, nos processos de reabilitação, na preparação de uma tarefa e na aprendizagem motora O objetivo desse estudo foi verificar se o uso da prática mental leva à aprendizagem e à melhora do planejamento motor em crianças com PC. A amostra foi composta por 6 crianças com diagnóstico de PC do tipo diparesia espástica e coreoatetóide global, as quais foram divididas em dois grupos: experimental e controle. O grupo experimental realizou 8 sessões de prática mental. Foram realizados pré-teste, pós-teste e teste de retenção. Ambos os grupos foram avaliados na habilidade de subir uma escada com corrimão. Os resultados mostraram que no grupo experimental todos os participantes apresentaram uma diminuição do tempo gasto na realização da atividade, além de uma melhora qualitativa no padrão da habilidade. O grupo controle apresentou tempo semelhante ou maior entre os testes. O desempenho do pós-teste foi replicado no teste de retenção. Assim, concluímos que a prática mental auxiliou no planejamento e na aprendizagem de crianças com PC, colaborando no processo de reabilitação desses pacientes.

Termos-chave: paralisia cerebral, prática mental, planejamento motor

Introdução

Paralisia cerebral é o termo usado para designar um grupo de desordens motoras, não

progressivas, porém sujeitas as mudanças resultante de uma lesão no cérebro nos primeiros

estágios do seu desenvolvimento (Hagberg, 1989). A paralisia cerebral leva à alteração do tônus

e à persistência de reflexos primitivos e padrões primários, levando a uma deficiência e

debilidade que resultam em incapacidades e limitações funcionais (Galvão & Ozu, 2005).

A paralisia cerebral é classificada em: (a) espástica, caracterizado pela hipertonia

muscular, associado à fraqueza muscular, por lesão no sistema piramidal; (b) extrapiramidal,

caracterizada pela presença de movimentos involuntários, por lesão nos núcleos da base; e (c)

atáxica, em que a lesão ocorre no cerebelo e é caracterizada por uma incoordenação axial e

déficit de equilíbrio.

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Em relação à distribuição topográfica, temos a forma tetraparética, que apresentam

comprometimento dos quatro membros; diparética, onde o comprometimento dos membros

superiores é mais leve que dos membros inferiores e a forma hemiparética, em que ocorre

comprometimento de um hemicorpo apenas (Hagberg, 1989).

Recentemente foi criada uma escala chamada “Sistema de classificação da Função

Motora Grossa” (Gross motor Function Classification System – GMFCS), que define cinco

níveis de comprometimento motor em quatro faixas etárias. O GMFCSII, que estará presente na

amostra deste estudo, inclui pacientes que deambulam sem auxílio, mas com limitações na

marcha comunitária (Palisano et al.,1997).

Crianças com dificuldades motoras freqüentemente são mais lentas na execução dos

movimentos, como resultado da sua dificuldade de organização e coordenação (Galvão & Ozu,

2005).

O córtex motor, localizado no lobo frontal, consiste em diversas áreas de

processamento, incluindo o córtex motor primário, a área motora suplementar e o córtex pré-

motor. Essas áreas interagem com áreas de processamento sensorial no lobo parietal e com

gânglios da base e áreas cerebelares, a fim de identificar o espaço em que desejamos nos mover,

planejar o movimento e finalmente planejar as nossas ações (Shumway & Woollacott, 2003).

Um trabalho recente, conduzido por Mushiake e colaboradores (1991), sugeriu que a

área pré-motora e a motora suplementar podem estar envolvidas no desempenho de uma tarefa

seqüencial. Eles verificaram que os neurônios nessas duas áreas diferem em suas atividades,

dependendo de como esse movimento foi iniciado e orientado. Os neurônios pré-motores

tornam-se mais ativos quando a tarefa seqüencial é visualmente orientada, enquanto que os

neurônios da área motora suplementar tornam-se mais ativos quando a seqüência é lembrada e

determinada pelo próprio individuo (Inase, Mushiake & Tanji, 1991).

Roland et al. (1980) examinaram a função do córtex suplementar em seres humanos e

começaram a esclarecer suas funções. Em um estudo, pediram aos indivíduos que executassem

tarefas que variavam de movimentos simples a complexos e, enquanto eles estavam realizando

os movimentos, os investigadores avaliaram a quantidade de fluxo sanguíneo cerebral em

diferentes áreas do cérebro. Foi verificado que quando os pacientes eram instruídos a executar

uma tarefa simples (movimentos repetitivos simples do dedo indicador ou a pressão de uma

mola entre o dedo indicador e o polegar), o aumento do fluxo sanguíneo ocorria apenas nos

córtices motor primário e sensorial. Por outro lado, quando executavam uma tarefa complexa

(uma seqüência de movimentos que envolvia todos os quatro dedos, encostando-os no polegar

em diferentes ordens), os pacientes exibiram um aumento bilateral do fluxo sanguíneo na área

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motora suplementar e nas áreas sensorial e motora primária. Quando os indivíduos eram

instruídos a ensaiar a tarefa, sem executá-la (prática mental), o fluxo aumentava apenas na área

motora suplementar. Assim, Roland concluiu que a área motora suplementar torna-se ativa

quando uma seqüência de movimentos balísticos simples é planejada e propôs que esta área

participa na montagem de um programa motor central ou forma uma sub-rotina motora (Roland

et al., 1980).

Estudos de imagens, através de ressonância magnética funcional, mostraram que a

prática mental ativa a área motora suplementar do córtex cerebral. A prática mental, tema

central abordado nesse trabalho, se refere à recapitulação cognitiva de uma habilidade física na

ausência de movimentos físicos explícitos (Yáguez et al., 1998).

A aplicação dos princípios da prática mental na reabilitação teve inicio no final da

década de 80 e início dos anos 90 (Deutsch & Dickstein, 2007). As pessoas utilizam a prática

mental como uma ajuda para preparar-se para um desempenho futuro imediato e como um meio

para facilitar o armazenamento e recuperação da memória de uma ação bem sucedida. Muitos

estudos mostram os benefícios da prática mental na aquisição de habilidades motoras, nos

processos de reabilitação, na preparação de uma tarefa e na aprendizagem motora (Magill,

2000). A contribuição da prática mental na reabilitação tem sido estabelecido para indivíduos

pós acidente vascular encefálico (AVE), com lesão medular e doença de Parkinson (Deutsch &

Dickstein, 2007).

Para indivíduos com hemiparesia, estudos mostram aumento do movimento das mãos e

dos dedos, melhora no movimento do tornozelo, bem como da performance da passagem do

sentar para a posição em pé. Os efeitos adversos da negligência unilateral são igualmente

melhorados depois da prática mental (Deutsch & Dickstein, 2007).

Um estudo realizado em pacientes com AVE na fase crônica mostrou que a prática

mental associada à prática física, resultou em uma melhora significativa da movimentação do

membro superior afetado em relação ao grupo que realizou apenas prática física (Leonard,

Levine & Stephen, 2007).

Liu et al. (2005) investigaram a reaprendizagem de tarefas funcionais, como trabalho

doméstico, cozinhar e comprar, usando a prática mental. Depois de 15 sessões práticas,

significantes ganhos foram encontrados em domicílio e tarefas comunitárias, sendo estes

transferidos para 5 outras atividades não praticadas.

O objetivo desse estudo foi verificar se o uso da prática mental associado à realização

de uma habilidade motora leva à melhora do desempenho em uma tarefa motora global em

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crianças com paralisia cerebral, através da facilitação do planejamento motor, levando a uma

diminuição do tempo gasto na realização de uma atividade.

Método

Participantes

A amostra foi composta por 6 crianças portadoras de paralisia cerebral do tipo diparesia

espástica e coreoatetóide global, alunos do setor escolar da Associação de Assistência à Criança

Deficiente (AACD), com idades variando entre 11 e 13 anos (média de 11,8 anos), sendo 5 do

sexo masculino e uma do sexo feminino. Os responsáveis assinaram um termo de

consentimento, autorizando a participação da criança no estudo, antes do início do mesmo.

Delineamento experimental e procedimentos

Os critérios de inclusão foram os seguintes: alunos do setor escolar da AACD,

estudantes da 2º, 3º e 4º série do ensino fundamental, com diagnóstico de paralisia cerebral do

tipo diparesia espástica e coreoatetóide e que apresentam algum tipo de marcha, sendo esta

domiciliar ou comunitária, classificados em prontuário como GMFCS II.

As crianças foram dividas em dois grupos, experimental e controle. Para garantir a

homogeneidade entre os grupos, foi realizado um pareamento da amostra de forma aleatória.

Assim, cada grupo foi composto por 2 indivíduos com paralisia cerebral do tipo diparesia

espástica, GMFCSII e 1 coreoatetóide GMFCS II, totalizando 3 componentes em cada grupo.

Para avaliação, foram realizados pré-teste e pós-teste, sendo estes feitos antes do início

das sessões de prática mental e imediatamente ao término destas. A atividade dos testes

consistia em subir 6 degraus de uma escada com corrimão.

Para análise quantitativa, foi cronometrado o tempo gasto pelo participante na

realização da atividade. A criança era posicionada em frente a uma escada de 6 degraus e

orientada a segurar no corrimão com ambas as mãos, não soltando durante toda a atividade. O

tempo inicial foi cronometrado a partir do momento em que era dado o comando a criança para

iniciar a atividade. O parâmetro utilizado para considerar o fim da atividade foi a colocação dos

dois pés no último degrau.

Para análise qualitativa, foi feita filmagem em vista lateral. Nessa análise foram

avaliadas a alternância dos pés nos degraus, movimento dos tornozelos, joelhos, quadris e

retificação do tronco.

O grupo experimental realizou 8 sessões individuais de prática mental, com duração de

10 minutos cada, distribuídas em duas semanas consecutivas. Durante a prática, cada

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participante era instruído a imaginar-se subindo uma escada de 5 degraus com corrimão. No

início de cada sessão o participante assistia a um filme demonstrativo da habilidade com

duração de 1 minuto.

A fim de garantir que a criança realizasse a prática mental durante toda a sessão, foi

solicitado a ela um relato, comunicando o início e o fim de cada movimento. O grupo controle

assistiu ao filme demonstrativo da habilidade nos mesmos dias do grupo experimental, também

em sessões individuais, porém não realizou nenhum tipo de prática entre o pré-teste e pós-teste.

Dois dias após o pós-teste, ambos os grupos foram submetidos ao teste de retenção, utilizando a

mesma tarefa, para verificar o efeito de aprendizagem.

As variáveis dependentes foram o tempo de movimento para concluir a tarefa e a

avaliação qualitativa da execução da tarefa. Para avaliação do desempenho foi usado o teste de

Mann-Whitney, para análise entre os grupos e o teste ANOVA para análise entre as fases. O

nível mínimo de significância foi de 0,05.

Resultados

Através da análise dos resultados, verificamos que os participantes do grupo

experimental apresentaram uma diminuição do tempo gasto na realização da atividade, sendo

que um dos participantes, indivíduo 3, obteve um resultado significativamente menor no pós-

teste em relação ao pré-teste. Esse indivíduo apresenta como diagnóstico Paralisia cerebral do

tipo diparesia espástica e apraxia (dificuldade no planejamento motor). Os valores obtidos pelo

grupo experimental são apresentados na tabela 1.

Tabela 1 – Tempo de movimento (s) individual dos integrantes do grupo experimental.

No grupo controle houve um aumento do tempo gasto na realização da habilidade por

dois indivíduos. Um indivíduo manteve o tempo apresentado no pré teste. A tabela 2 apresenta

os dados obtidos nos testes do grupo controle.

No teste de retenção, realizado para verificar se houve aprendizagem, observamos que

no grupo experimental duas crianças apresentaram diminuição do tempo gasto na atividade. O

participante 3, obteve um pequeno aumento no tempo em relação ao pós teste, mas quando

Grupo Experimental Pré- teste Pós- teste Retenção

1 23 14 12

2 11 8 7

3 219 26 30

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comparado ao pré-teste, o tempo manteve-se significativamente menor. Para o grupo controle,

observamos que houve uma diminuição do tempo em relação ao pós-teste. No entanto, quando

comparamos os valores obtidos no teste de retenção com o pré-teste, esses se apresentaram

maior ou igual (indivíduos 4 e 6). Apenas um indivíduo apresentou um valor inferior ao pré-

teste.

Tabela 2 – Tempo de movimento (s) para cada participante de ambos os grupos nos testes.

Grupo Controle Pré- teste Pós- teste Retenção

4 17 24 23

5 12 12 10

6 6 7 6

Em análise estatística não houve diferença significante entre os grupos no pós-teste e

teste de retenção (p=0,51). Porém, a comparação entre o pré-teste e pós-teste do grupo

experimental teve forte tendência a uma diferença significativa (p< 0,09). Esses valores podem

ser devidos à grande variabilidade dos valores apresentados e ao n amostral pequeno.

Na análise dos vídeos foi verificada melhora qualitativa no grupo experimental. No pré-

teste, o participante 3, apresentava grande dificuldade de organização, permanecendo tempo

excessivo em cada degrau; pouca flexão de quadril, dificultando a liberação do pé na

ultrapassagem do degrau; lateralização e anteriorização de tronco na fase de balanço. No pós-

teste, a criança apresentou maior retificação do tronco; melhora significativa da flexão de

quadril, facilitando a liberação do pé na ultrapassagem; e maior organização dos movimentos, o

que levou a uma diminuição significativa do tempo em que permaneceu em cada degrau. Esse

padrão se manteve no teste de retenção.

A criança 1, no pré-teste, subiu a escada alternando os pés em apenas um dos degraus,

já no pós-teste, isso ocorreu em 5 dos 6 degraus. Não apresentou alteração do padrão motor em

relação à análise dos quadris, joelhos e tornozelos. Isso foi mantido no teste de retenção. A

criança 2 apresentou no pré-teste, alternância dos pés em 5 dos 6 degraus, porém foi verificado

dificuldade na ultrapassagem do pé no último degrau. No pós-teste, apresentou alternância dos

pés em todos os degraus avaliados e melhora da flexão de quadril, o que facilitou a liberação do

pé no balanço.

No grupo controle, nenhum dos participantes apresentou diferenças no padrão motor.

Apenas o participante 5 apresentou alternância dos pés maior no teste de retenção do que a

apresentada no pré-teste e pós-teste.

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Discussão

Nesse estudo verificamos que todos os participantes do grupo experimental,

apresentaram uma diminuição do tempo gasto na realização da habilidade de subir uma escada

com 5 degraus. Dickstein, Dunsky e Marcovitz, E. (2004); em um estudo de caso verificaram o

uso da prática mental na melhora da marcha em um indivíduo com hemiparesia, que treinou

através da prática mental. Após 6 semanas de intervenção, o paciente aumentou em 23% a

velocidade da marcha e reduziu em 13% o tempo de apoio duplo durante a mesma. Também foi

observado um aumento da movimentação do joelho.

A diferença mais significativa entre os tempos apresentados nas avaliações ocorreu em

um dos participantes do grupo experimental, o qual apresenta como diagnóstico Paralisia

cerebral do tipo diparesia espástica e apraxia.

Apraxia é a incapacidade de executar um movimento objetivado na presença da

sensação, do movimento e da coordenação intactos (Shumway, Woollacott, 2003). A apraxia

está relacionada à lesão do córtex associativo no hemisfério cerebral esquerdo. Há varias formas

de apraxia, uma delas é a ideativa, ou frontal. Essa é uma desordem da execução do movimento

que não pode ser atribuída à fraqueza, à descoordenação ou à perda sensorial, ou ainda à

compreensão ruim a linguagem ou à desatenção aos comandos.

As áreas de associação das regiões frontais são importantes para o planejamento motor

e outros comportamentos cognitivos. Foi formulada a hipótese de que essas áreas integram

informações sensoriais e depois selecionam uma resposta motora apropriada, dentre as diversas

respostas possíveis (Shumway & Woollacott, 2003).

Muitos estudos relatam que a prática mental esta predominantemente associada com

regiões corticais envolvidas no planejamento e preparação dos movimentos (Dechent, Dietmar

& Frahm, 2004). Estudos através de ressonância magnética comprovaram que a área motora

suplementar, localizada no lobo frontal e responsável pelo planejamento motor, é a principal

região ativada quando a prática mental é executada (Cicinelli et al., 2006). Assim, podemos

atribuir a significativa redução do tempo para realização da habilidade, nesse paciente, com

lesão na área motora suplementar, ao treino da prática mental.

No presente estudo, além da redução significativa de tempo entre o pré-teste e o pós-

teste, verificamos uma importante melhora na qualidade do movimento nesse mesmo indivíduo

do grupo experimental, resultando em uma melhor organização do movimento, maior flexão do

quadril para liberação do pé e melhora da retificação do tronco, o que demonstra que a real

dificuldade do paciente é no planejamento do movimento e não a um déficit de força muscular,

realçando o caráter limitante da apraxia na aprendizagem motora.

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Outro indivíduo do grupo experimental, com diagnóstico de PC do tipo diparesia

espástica apenas, também obteve benefícios em relação ao aumento da amplitude da flexão do

quadril, o que mostra que a prática mental auxiliou no ganho de amplitude de movimento nessa

articulação. Estudos em indivíduos saudáveis têm mostrado melhora de vários aspectos do

controle motor após o uso da prática mental. Essas melhoras incluem ganho de força, de

seletividade dos grupos musculares (Sidaway & Trzaska, 2005; Zijdewind et al., 2003) e

aumento da amplitude de movimento da articulação do quadril, quando a prática mental foi

associada à facilitação neuromuscular proprioceptiva (Williams, Odley & Callaghan, 2004).

Dois pacientes do grupo experimental e um participante do grupo controle

apresentaram aumento no número de degraus em que realizaram alternância dos pés. Isso pode

ser atribuído ao vídeo assistido por eles, em que o indivíduo que demonstrava a habilidade, o

fazia nesse mesmo padrão. Esse vídeo foi assistido por todos os participantes do estudo,

inclusive pelo grupo controle, no início de cada sessão. Isso foi baseado em um dos aspectos do

processo de aprendizagem, que é a necessidade de formar uma imagem mental da ação que deve

ser realizada. Freqüentemente, uma das maiores dificuldades para os iniciantes em habilidades

globais, é formular um plano de ação bem definido, contendo todos os detalhes do ato motor ou

mesmo de sua estrutura global. Os novatos em uma habilidade muitas vezes não conseguem

imaginar o que eles deverão tentar fazer quando tiverem oportunidade de se mover. Como a

formulação do plano de ação é uma passagem fundamental para a produção de movimentos bem

coordenados, é pouco provável que o aprendiz obtenha sucesso em sua prática se ele não tiver

informações suficientes para elaborar tal representação mental (Teixeira, 2004).

No teste de retenção, dois participantes do grupo experimental apresentaram uma

diminuição do tempo gasto na realização da atividade em relação ao pós-teste. Um terceiro

participante apresentou uma pequena variação, mas o tempo manteve-se significativamente

menor em relação ao pré-teste. Assim, através desses dados podemos afirmar que ocorreu

aprendizagem da tarefa avaliada.

A aprendizagem motora é definida como a aquisição de movimentos como resultado da

prática. A aprendizagem motora pode ser definida também, como a aquisição das características

temporais e espaciais do movimento. Durante a fase de aquisição, o programa motor de

execução dos movimentos é modificado e consolidado. Estudos através ressonância magnética

funcional suportam a idéia que as áreas corticais ativadas durante a imaginação do movimento

são muito similares aquelas ativadas durante a realização de uma atividade real. Yaguez,

mostrou que a prática mental pode melhorar a aquisição de padrões temporais e espaciais

durante o processo de aprendizagem (Yáguez, 1998).

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Assim, através desse estudo, verificamos que a prática mental auxiliou no planejamento

motor e na aprendizagem de crianças com paralisia cerebral na habilidade de subir uma escada.

Apesar de as diferenças não serem estatisticamente significantes, clinicamente os dados

encontrados apresentam grande significância no processo de reabilitação de crianças com esse

diagnóstico.

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