16
Em nossa sociedade, a produs;ao de cada objero envolve uma complexa rede de rrabalho e de rrabalhadores. Vamos romar como exemplo urn pro duro que faz parre do dia-a-dia de grande numero de pessoas: 0 paozinho Frances. as ingredientes basicos para fazer urn paozinho sao 0 rrigo, a agua, 0 sal e 0 fermento. Para que haja rrigo e necessario que alguem 0 plante e 0 colha; e preciso que hajamoinhos para moe-lo e comercializas;ao para que chegueare a padaria. Esse mesmo processo serve para 0 sa!, que deve ser rerirado do mar, processado e embalado. a fermento e produzido em outras empresas por ourros trabalhadores, com outras marerias-primas. A agua precisa ser caprada, rrarada e disrribuida, 0 que exige uma complexa infraesrrurura com grande numero de rrabalhadores. Sao necessarios equipamentos, como a maquina para preparar a massa e o Forno para assar 0 pao, fabricados em indusrfias que, por sua vez, empregam ourras marerias-primas e rrabalhadores. E necessario algum tipo de energia proporcionada pelo fogo (e isso exige madeira ou carvao)ou energia eletrica (que e gerada em hidroelerricas ou rermo- eletricas). As usinas de energia,por sua vez, precisam de equipamentos, linhas de transmissao e rrabalhadores para fazer rudo issoacontecer. Na ponta de rodo esse rrabalho, esrao as padarias, mercadinhos e super- mercados, onde 0 paozinho finalmente chega as maos do consumidor. Se para comer urn simples pao ha rantagente envolvida, direra e indirera- mente, voce pode imaginar quanto rrabalho e necessario para a fabricas;ao do onibus, da biciclera ou doauromovel, para a consrrus;ao da casa em que voce ~jve ou da escola onde esruda. Essacomplexidade das rarefas relacionadas a produs;ao e uma caracteris- rica da nossa sociedade. Outros ripos de sociedade, do presentee do passado, apresentam caracrerisricas bem diversas. Campode cultivo em Rajasthan. India.e panificadora em Sao Paulo, Brasil. Do trigo ao pao, dotijolo ao predio. cada produto em nossa sociedade resulta do trabalho entrela~adode uma infinidade de pessoas, cada qualespecializada em determinadas tarefas. As sociedades tribais diferenciam-se umas das outras em muitos aspectos, mas pode-se dizer, em termos gerais, que nao sao esrruturadas pela arividade que em nossa sociedade denominamos rrabalho. Nelas todos fazem quase tudo e as atividades relacionadas a obrens;ao do que as pessoas necessitam para se manter ,- cas;a, colera, agricultura e crias;ao - estao associadas aos ricos e micos,ao sisrema de parentesco, as festas e as acres, integrando-se, porranto, a todas as esferas davida social. A organizas;ao dessas atividades caracreriza-se Eela divisao das tamas por sexo e por idade. as equipamentos e insrrumentos utiJizados, comumente vistos pdo olhar esrrangeiro como muiro simples e rudimentares, sao eficazes para realizar tais tarefas. Guiados por esse olhar, varios analistas, durante muiro tempo, classificaram as sociedades rribais como de economia de subsistencia e de recnica rudimentar, passando a ideia de que elasviveriarn em estado de pobreza, 0 que e urn preconceito. Se hoje muitas delas dispoem de areas resrritas, enfrentando diffceis condis;oes de vida, em geral, antes do contato com 0 charnado "mundo civiJizado", a maioria vjvia em areas abundantes em cas;a, pesca e alimentos de varios tipos. Marshall Sahlins, antropologo estadunidense, chama essas sociedades de "sociedades de abundancia" ou "sociedades do lazer", destacando que seus'!!!:!!t bros nao so tinham todas as suas necessidades materiais e sociais plenamente §atisfeiras, como dedicavam urn minimo de horas diarias ao que nos chamaH10s ~ trabalho. as ianomamis, da Amazonia, dedicavarn pouco mais de tres horas diarias as tarefas relacionadas a produs;ao; os guayakis, do Paraguai, cerca de cinco horas, mas nao todos os dias; e os kungs, do deserto de Kalahari, no sui da Africa, em media quatro'horas por dia. a faro de se dedicar menos tempo a essas tarefas nao significa- va, noentanto, ter uma vida de privas;oes. Ao contr:irio, as socieda- des rribais viviam muiro bem alimentadas, e isso fica comprovado em relarosque sempre demonsrram a viralidade de rodos os seus membros. E claro que tais relatos referem-se a experiencia de povos que viviam antes do conrato com 0"mundo civilizado". A explicas;aopara 0 fato de os povos rribais trabalharem muito menos do que nos esca no modo como se relacionam com a natu- reza, tambem diferente do nosso. Por urn lado, para eles, a terrae t o espas;o em que vivem e tern valor cultural, pois da aos humanos seusfrutos: a fJoresta presenteia os cas;adores com osanimais deque necessiram para a sobrevivencia e os rios oferecern os peixes que ajudamnaaJimentas;ao. Tudo isso e urn presente da "mae natureza". Por ourro lado, os povos rribais rem uma profunda intimidade com 0 meioem que vivem. Conhecem os animais eas plantas, a forma como crescem e se reproduzem, 0 quee born e 0 quee ruim para comer e quando podem urilizar certas plantase dererminados animais para alimentas;ao, para a cura de seus males ou para seusritos. Jme radas ao meio ambieme e a rodas as demais arividades, as rarefas !::!acionadas a Erodus:ao nao compoem, assim, uma esfera espedfica a vida, ou seja, nao ha urn "mundo do trabalho" nas sociedades tribai~. Jovem yawalapity prepara foJhas de buriti para fazer artesanata (Xingu. 1995). Nas sociedades tribais. todos compartiiham os conhecimentos necessarias para a obten~ao de materias-primas e a elabora~ao de abjetos. Apenas a idade e a sexo definem a divisao das tarefas.

Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Em nossa sociedade, a produs;ao de cada objero envolve uma complexa redede rrabalho e de rrabalhadores. Vamos romar como exemplo urn pro duro quefaz parre do dia-a-dia de grande numero de pessoas: 0 paozinho Frances.

as ingredientes basicos para fazer urn paozinho sao 0 rrigo, a agua, 0 sal e 0fermento. Para que haja rrigo e necessario que alguem 0 plante e 0 colha; e precisoque haja moinhos para moe-lo e comercializas;ao para que chegue are a padaria.Esse mesmo processo serve para 0 sa!, que deve ser rerirado do mar, processado eembalado. a fermento e produzido em outras empresas por ourros trabalhadores,com outras marerias-primas. A agua precisa ser caprada, rrarada e disrribuida, 0que exige uma complexa infraesrrurura com grande numero de rrabalhadores.

Sao necessarios equipamentos, como a maquina para preparar a massa eo Forno para assar 0 pao, fabricados em indusrfias que, por sua vez, empregamourras marerias-primas e rrabalhadores.

E necessario algum tipo de energia proporcionada pelo fogo (e isso exigemadeira ou carvao) ou energia eletrica (que e gerada em hidroelerricas ou rermo-eletricas). As usinas de energia, por sua vez, precisam de equipamentos, linhasde transmissao e rrabalhadores para fazer rudo isso acontecer.

Na ponta de rodo esse rrabalho, esrao as padarias, mercadinhos e super-mercados, onde 0 paozinho finalmente chega as maos do consumidor.

Se para comer urn simples pao ha ranta gente envolvida, direra e indirera-mente, voce pode imaginar quanto rrabalho e necessario para a fabricas;ao doonibus, da biciclera ou do auromovel, para a consrrus;ao da casa em que voce~jve ou da escola onde esruda.

Essa complexidade das rarefas relacionadas a produs;ao e uma caracteris-rica da nossa sociedade. Outros ripos de sociedade, do presente e do passado,apresentam caracrerisricas bem diversas.

Campo de cultivo em Rajasthan. India. e panificadora em SaoPaulo, Brasil. Do trigo ao pao, do tijolo ao predio. cada produto emnossa sociedade resulta do trabalho entrela~ado de uma infinidadede pessoas, cada qual especializada em determinadas tarefas.

As sociedades tribais diferenciam-se umas das outras em muitos aspectos,mas pode-se dizer, em termos gerais, que nao sao esrruturadas pela arividadeque em nossa sociedade denominamos rrabalho. Nelas todos fazem quase tudoe as atividades relacionadas a obrens;ao do que as pessoas necessitam para semanter ,- cas;a, colera, agricultura e crias;ao - estao associadas aos ricos emicos, ao sisrema de parentesco, as festas e as acres, integrando-se, porranto, atodas as esferas da vida social.

A organizas;ao dessas atividades caracreriza-se Eela divisao das tamas por sexoe por idade. as equipamentos e insrrumentos utiJizados, comumente vistos pdoolhar esrrangeiro como muiro simples e rudimentares, sao eficazes para realizar taistarefas. Guiados por esse olhar, varios analistas, durante muiro tempo, classificaramas sociedades rribais como de economia de subsistencia e de recnica rudimentar,passando a ideia de que elasviveriarn em estado de pobreza, 0 que e urn preconceito.Se hoje muitas delas dispoem de areas resrritas, enfrentando diffceis condis;oes devida, em geral, antes do contato com 0 charnado "mundo civiJizado", a maioriavjvia em areas abundantes em cas;a, pesca e alimentos de varios tipos.

Marshall Sahlins, antropologo estadunidense, chama essas sociedades de"sociedades de abundancia" ou "sociedades do lazer", destacando que seus'!!!:!!tbros nao so tinham todas as suas necessidades materiais e sociais plenamente§atisfeiras, como dedicavam urn minimo de horas diarias ao que nos chamaH10s~ trabalho. as ianomamis, da Amazonia, dedicavarn pouco mais de tres horasdiarias as tarefas relacionadas a produs;ao; os guayakis, do Paraguai, cerca decinco horas, mas nao todos os dias; e os kungs, do deserto de Kalahari, no suida Africa, em media quatro'horas por dia.

a faro de se dedicar menos tempo a essas tarefas nao significa-va, no entanto, ter uma vida de privas;oes. Ao contr:irio, as socieda-des rribais viviam muiro bem alimentadas, e isso fica comprovadoem relaros que sempre demonsrram a viralidade de rodos os seusmembros. E claro que tais relatos referem-se a experiencia de povosque viviam antes do conrato com 0 "mundo civilizado".

A explicas;ao para 0 fato de os povos rribais trabalharem muitomenos do que nos esca no modo como se relacionam com a natu-reza, tambem diferente do nosso. Por urn lado, para eles, a terra e to espas;o em que vivem e tern valor cultural, pois da aos humanos seus frutos:a fJoresta presenteia os cas;adores com os animais de que necessiram para asobrevivencia e os rios ofere cern os peixes que ajudam na aJimentas;ao. Tudoisso e urn presente da "mae natureza". Por ourro lado, os povos rribais rem umaprofunda intimidade com 0 meio em que vivem. Conhecem os animais e asplantas, a forma como crescem e se reproduzem, 0 que e born e 0 que e ruimpara comer e quando podem urilizar certas plantas e dererminados animaispara alimentas;ao, para a cura de seus males ou para seus ritos.

Jme radas ao meio ambieme e a rodas as demais arividades, as rarefas!::!acionadas a Erodus:ao nao compoem, assim, uma esfera espedfica a vida,ou seja, nao ha urn "mundo do trabalho" nas sociedades tribai~.

Jovem yawalapity prepara foJhasde buriti para fazer artesanata(Xingu. 1995). Nas sociedadestribais. todos compartiiham osconhecimentos necessarias paraa obten~ao de materias-primase a elabora~ao de abjetos.Apenas a idade e a sexodefinem a divisao das tarefas.

Page 2: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Escravidao e servidao

. ..9,,~ermo trabalho pode re~ nascido d~vodbulo latino tripallium, que sig-nI.fj~a lnstrumento de tortura I e por mUlto tempo esreve associado a ideia d;arJVldade penosa e tonurante. Nas sociedades grega e romana era a mao-de-obra escrava que garamia a produs:ao necessaria para suprir as necessid;des dapopu1as:ao. Existiam ourros trabalhad9res alem dos escravos, como os meeirosos anesaos e os camponeses. No emamo, mesmo os trabalhadores livres era~explorados e o~r~midos pelos senhores e proprierarios. Estes eram desobrigadosde qu.alqu~r atJVldade, exceto a de discurir os assumos da cidade e 0 bem-estardos .cldadaos ..Para que nao dependessem do pr6prio trabalho e pudessem sededlCar excluslvameme a essa atividade, 0 rrabalho escravo era fundamentaL

Representa,ao do trabalho naRama antiga: um trabalhador

possivelmente escravo. transPor1~a uva em carro de bois, enquanto

outros pisam 0 fruto no lagar.Detalhe de mural da igreja SantaCostanza. em Roma (seculo IV).

·"~';:.;r.:~/..•u~~,~o~;~;,~!li~¥~~~~~t1I!~j!,g :.,..,., ' " mum tempo.Q:.eperrnanenc.lamalor que 0 de seu produto·r·. a trab Ih": d .-COD· . d'" , . ·I•...~· .. . . . .. . . . a 0 oartesao'ou ).~§cy~or' e e?~uadraria neSsn~.e.R~ao: .- . . .· ~p'raxts a atlvldade que tern; '. ala;;&; mo rmci . '. '. . .' ..com~'''-- . ~. . &L""".P_...p,<l,'!"~nmumepto 15t9¢ .UtIllZa 0 dlscurso

,,9 u'ln. . eJO_,ara encontrar solus:oes voltadas para 0 bem-estar dos cidada-o '" .~/~.If' 'd 'bl' . s. J:.0 esparo a 0-.._~l':'~~,..a VI a pu Ica.) .)' __

.•..- " ":,_ .. _.__ .~-"

Nas sociedades feudais, como no mundo greco-romano, havia tambem aque-les que trabalhavam - os servos, os camponeses livres e os aldeaos - eaqueles que viviam do trabalho dos ourros - os senhores feudais e os mem-bros do c1ero. A terra era 0 principal meio de prodw;:ao, e os trabalhadorestinham direito a seu usufruto e ocupas:ao, mas nunca a propriedade. Muitostrabalhavam em regime de servidao, no qual nao gozavam de plena liberdade,mas tambem nao eram escravos. Prevalecia urn sistema de deveres do servopara com 0 senhor e deste para com aqude.

Alem de cultivar as terras a e1edestinadas, 0 servo era obrigado a trabalharnas terras do senhor, bem como na construs:ao e manutens:ao de esuadas e pontes.Essa obrigas:ao se chamava corotia. Devia tambem ao senhor a talha, uma taxaque se pagava sobre rudo 0 que se produzia na terra e atingia todas as categoriasdependentes. autra obrigas:ao devida ao senhor pelo servo eram as banalidades,pagas pdo uso do mciinho, do forno, dos toneis de cerveja e pelo fato de, sim-plesmente, residir na aldeia. Essa obrigas:ao era extensiva aos camponeses.

Examinando a ilustras:ao ao lado pode-se ter umaideia da organizas:ao do espas:o e do trabalho na proprie-dade feudal.

Embora 0 trabalho ligado a terra fosse 0 preponde-rante nas sociedades medievais, outras formas de traba-lho merecem destaque, como as atividades artesanais,desenvolvidas nas cidades e me.smo nos feudos, e as ati-vidades comerciais.

Nas cida~es, ~ artes.<ln;lIQ.!.i!1ha_~a organizas:aorigida baseada ~~s corl'~s:~es de..~g~~jNo topo da es-cala dessas corpor~s:oes, havia urn mestre que controlavao trabalho de rodos. Esse mestre encarregava-se de pagaros direitos ao rei ou ao senhor feudal e de fazer respeitartodos os compromissos com a corporas:ao. Abaixo delevinha 0 oficial, que ocupava uma posis:ao intermediariaentre a do aprendiz e a do mestre. Cabia ao oficial fixara jornada de trabalho e a remuneras:ao, sendo tambem 0

responsavd por transmitir os ensinamentos do mestre aosaprendizes. a aprendiz, que ficava na base dessa hierar-quia, devia ter entre 12 e 15 anos e era subordinado a urns6 mestre. Seu tempo de aprendizado era predetermina-do, bem como os seus deveres e as sans:oes a que estavasujeito, conforme 0 estatuto da corporas:ao.

Nas sociedades que vimos neste t6pico, da Antiguidade ate 0 fim daIdade Media, as conceps:oes do que denominamos trabalho apresentamvarias:oes, mas poucas alteras:oes. Sempre muiro desvalorizado, 0 trabalhonao era 0 demento central, 0 nucleo que orientava as rdas:oes sQciais. Estasse definiam pda hereditariedade, pda religiao, pda honra, pda lealdade epela posis:ao em relas:ao as questoes publicas. Eram esses os elementos quepermitiam que alguns vivessem do trabalho dos outros.

Esquema do uso do solo emuma propriedade feudal lipica.

Page 3: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Com 0 fim do periodo medieval e a emergencia do mercantilismo e docapitalismo, 0 trabalho "mudou de figura". Se antes ele er~visto como umaatividade penosa e torturante, £assou.E,Q.$..p-0uC;;_Q~.ilEU;QD$jg.er.ad.o_.~!goRQ~itivo.Isso aconteceu porque, nao sendo mais possivel contar com 0 servis:ocompul-s6rio, foi preciso convencer as pessoas de que trabalhar ara os outros era born;dizia-se que s6 assim todos sairiam eneficiado~:-P~~a';;';;-;d~~-;'~;~ceps:aoetrabalho - de atividade vii para atividade que dignifica 0 homem - algumasinstituis:6es, como veremos adiante, deram sua colaboras:ao.

Vejamos agora as mudans:as que ocorreram na estrutura do trabalho.Como a estrutura anterior foi-se desagregando? Como os artesaos e pequenosprodutores se transformaram em assalariados?

Primeiro, casa e local de trabalho foram separados; depois, separaramo trab~ih;d~r d~'se~s in;t~~m~n~~s;-po~ fi~,~;;~ram,d.eki\.p-~;;iliilidade... -.......... .... .. - --de'conseguir a pr6pria materia-prima. Tudo passou a ser dos comerciantes ei;;-J~;tiiais que haviam a~~~~iad~~iq~~zas. Eles financiavam, organizavame coordenavam a produs:ao de mercadorias, definiam 0 que produzir e emque quantidade. Afinal, 0 dinheiro era deles.

Trabalhoartesanal. emi1uminurado seculo XVI, etrabalho em manufatura,em fotografia do seculoXIX. Na passagem de umaforma de organiza~aopara outra, 0 trabalhadorperdeu a posse dosinstrumentos e 0 controledo p,ocesso de trabalho.

Essa transformas:ao aconteceu por meio de dois processos de organizas:aodo trabalho:. a .caopeJils:aosimples e a manufatura (ou cooperas:ao avans:ada).

N~rafiio sim!3J!era ll1al}tiq~~_~ieE!.~i~<!.a.p~0<!.':l5!~a!~e~!~alentre 0 mestre e 0 aprendiz, e 0 artesao ainda desenvolvia, ele pr6prio, todoo'processo piocf~tl~o0!o--~old~-;~;;-b;~-;~t~:-A dif~;~~~~Tque el~~s-tava

......... -, .. ..._-._ _. '---~.".. -._." . -----~a'servis:o de quem Ihe financiava nao s6 a'materia~piirna;-comoatemesmoaig~;s i~strumentos 'de trabalho,'e tamb~rridefjnTao T6Ca:fe-asliO'rasa sertrab.a.1.hadas.Esse tipo de organizas:ao do trabalho abrlii"cami~hop~ra~;;vasf~;~as de produs:ao!.que..com~<;~rama se definir como trabalho coletivo.

No processo~d~manufatu~~'(oacooperas:ao avans:ada),0 trabalhador atecontinuava a ser art~sIo, mas nao fazia tudo, do comes:o aof;~~-O-;apat6,por exemplo, era feito a muitas maos, como numa linh~ de lTlont;gem. Cada

_ ..':"'.;--_.--' . -.

(uin cuidava de uma parte, como hoje acontece com os carros e tantos outros

produtos fabricados. . /"--'" -""-'-'". '. manufatura foi 0 ~f!1:md<.>..Eass(~.J)~~_~~.!!!.ffito 4Q~~ co-'.l ;.: u seJ'a n arresao' tornou-se urn trabalhador sem enrendimento cia to-

e"VO, ' Y d't idade do processo de trabalho e p:&eu tambem seu co.n.tlQ!5:.S~ enten la,por exemplo, da cola do saltodo sapato, p~i~era isso 0 q~e ele fazla 0 tempo

d A Produto tornou-se resultado das atIVIdadesde mUItoStrabalhadores. E 'to~ . ~o trabalho, por sua vez, se transformou em mercadoria que podIa ser ven a

e comprada, como qualquer outra. I""----:--~Surgiu, entao, uma terceira forma de trabalho: a 7&!quz~ofat~~0m.

ela, 0 espa<;:ode trabalho, definitivamente, passou a ser a fabnca, pOlSera laque estavam as miquinas que "comandavam" 0 processo de produ<;:ao..Todo 0conhecimento que 0 trabalhador usava para produzir suas pe<rasfoi dispensado,ou seja, sua destreza manual foi substitufda pela miquina.

Com esse processo ocorreu 0 convencimemo do trabalhador de. que asirua<raopresente era melhor do que a anterior. Diversos setores da socledade

colaboraram para essa mudans:a:

• As igrejas procuraram passar a ideia de~.u.-=~.tr.~~~~o_:~~u~-be;;;'-cli~fl).~q;:iem n:lo traDalnassenao seria aben<r0a-do: N~o'tr;b~ih~(ter preguis:a) passou a ser pecado.

• as governan.tes passaram a criar uIIla serie d~ leis.~Aecre-toSqu~penalizavam quem nao rrabalhasse. O~des~mpre-gados wiffi considerados vagabundos e podIafn If paraa prisao. Inclui-se aqui 0 auxilio da:policia, encarregadade prender esses "vagabundos". .

• Q~empresdrios desenvolveram uma disciplina rig~c!.anotr!,-b<ilh2!principalmente com horarios de entrada e saidados estabelecimentos.

• As escolaspassaram as crians:asa ideia d~1u.e.~.~:~b.~1.I:.o~afunClanl"eiirarpai:1Casociel:!aae:Tsseconceito era ensinado,por exe~pl~, n;~ ~ar~fase Ii<roese tambem por meio d~scontos infamis. Quem nao se lembra, por exemplo, da lus-t6ria da Cigarra e da Formiga ou da dos Tres Porquinhos?b,uem nao trabalhava "Ievava sempre a pior".

\ Na vida real, a hist6ria era bem outra. a trabalhador estava livre, quer di-zer nao era mais escravo nem servo, mas trabalhava mais horas do que antes., .

"....,i:~~~I,;.~~9..·.~.lanig;:hl.•a·..Ot'er;:ad~tr~~~~11~;~:f~~fha:.~.,.,,~.i/:,' .',. ;:~-";~~.,».~.,:.- ,~:\_;.-...;.. -

;;16Sci~175b:;<; ",' AS'a·S5horas ."" '.. "'",.:,>;sOa60horas\+.'."·i':':r~,5bif~~&~;;:iiX':':'51tif80:h;';a5::;"J::;';;~r~:i::~~~ti1~bii~W;j>.'.;;<~':4k~d~Y937'<~,' ,,'.;' "SSi60h'oras "/:""aif ~~~'hBi~~::·i..'.'.'..Fo;te: ~UNHA,~e~ton. A feli~i~ade imagi~ada: a nega,ao do traba/ho e do /azer. Sao Paulo:Brasiliense, 19B7. p. 37.

Cena da fabula 'A cigarra e aformiga', em gravura criada porGustave Dore em 1867 para umIivro de fabulas de La Fontaine.Criah~as de varias gera~5esouviram e internalizaram afala da laboriosa formiga emresposta ao pedido de ajuda dacigarra, ao chegar 0 inverno:'Voce cantava7 Que belezalPois, entao, dance agora! ".

Page 4: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Max Weber, em seu livro Hist6ria economica, publicado em 1923, afirma

que isso era necessario para que 0 capitalismo existisse. 0 trabalhador era livre

apenas legalmente porque, na realidade, via-se for~ado, pela necessidade e para

nao passar fome, a fazer 0 que the impunham.

Ainda assim, nao foi faci! submeter 0 trabalhador as longas jornadas e aos

rfgidos horarios, pois a maioria nao estava acosrumada a isso. A maior parte da

popula~ao que foi para as cidades trabalhava anreriormente no campo, onde 0

l1nico "parrao" era 0 ritmo da natureza, que definia quanto e quando trabalhar.

Cada semeadura e cada coJheita tinham seu tempo certo, de acordo com 0 clima

e a epoca. Alem disso, 0 mesmo individuo fazia varias coisas, nao era urn operario .

especializado em uma s6 tarefa. Ele podia plantar, colher, construlr uma mesa

ou urn banco e trabalhar num tear; enfim, desenvolvia varias habilidades.

Em seu livro Costumes em comum, 0 historiador britanico Edward P. Thompson comenraum .

costume arraigado em varios paises da Europa desde 0 seculo XVI ate 0 infcio do secul~ XX: <>

de nao trabalhar na chamada santa segunda-feira. Essa tradi~ao, diz ele, parece ter sido encontrada

nos lugares onde existiam indusrrias de pequena escala, em minas e nas. manufaturas ou mesmo

na indus.tria pesada. Nao se trabalhava nesse dia por varias razoes, mas principal mente porquenos

ou~ros dlas da seman a a jornada era de 12 a 18 horas diarias. Assim, os rrabalhadores procuravam

compensar 0 excesso de horas rrabalhadas. Havia ainda a dificuldade de desenvolver 0 trabalho na

segunda-feira por causa do abuso de bebidas alc06licas, comum nos fins de seIilana. Nas siderurgi-

cas, estabeleceu-se que as segundas-feiras seriam urilizadas para consertos de maquinas, mas 0 que

prevalecia era 0 nao-trabalho, que as vezes se estendia as ter~as-feiras.

Foram nec<~ssarios alguns seculos para disciplinar e preparar os trabalhadores para 0 trabalhoindustrial diario e regular. .'

C I·

enarlOS DO MUNDO DO TRABALHO

Trabalho e necessidades nas socil~dadesprimitivas

.... .SOded~~~s'comd estas qu¢ e~tamos considkrilnd~ n~o terri a:snossas razoes para trabalhar~se e que".. " •.entre elasse encontrealgo pareddo com ague fazQ our6crata na reparti~ao QU 0 oper~ri6 naf~hrica,C?rranda~~ ~el6s administradqres, pelali~ha d.erriontagem, p~io rel6gio de ponto, pelo sal~riono fim domeso "Trabalham" para viver,para prove~as'fe5tas, para p~esentear. Mas nunca mais que 0 estritamente

, necessario: a labuta nao e urn valor em si, nao ealgo que tern pre~o, que se oferece num mercado; naose opoe ao lazer, dele nao se separando cronologicamente ("hora de trabalhar, trabalhai"); nao aconteceem lugar especial, nem se desvincula das demais a~ividadessociais (parentesco, magia, religiao, politica,educa~ao ...). Sempre que se pare~am com 0 que chamamos "trabalho", tais atividades sac imediatamente

. detestadas. Alias, no fundo, no fundo, nao 0 saGtambem entre n6s? .[...]

:~zern quando setr~balha um pouco mais qu~ 0 hete~ario '~s~iisf~~aodo'~COI)SutnO"Je9.\lla,r..'.'mai~rfreqdenci~, .dentrodo tempo horrnaide "trabalho'\,se·p'rbduzalgo~quetransQorde.o: ..,

~.Esta ~, e'm g~ral; a parte das solenid~d~si~~;f~~~$:d6sritG%is; W~~re~ebt~s:~~~'~,~stiPk.. . .f~Yhcit6ria~,d~s manifesta~oes politita~; daho$pitalidad~\e 0;s1gnifit~aod~s~al¥;nais oJill:a' "_ular, irivestir.Ha ar;portanto, uma grandediferen~a emrela~aoa nossaatitudeoficial par~'c~,rJ;l{!</Iho;> Masnaoha,' aomesmo tempo,algo que intima'mente invejamos7AIgo comcolora~a~ de' .

'(para' n6s/qu~ mals(ju menos reservadamerite trabalhamos de olhona hbra da sarda, no fim de .'~;Ji(neri~do prolongado, rias ferias, naaposeritadoria? . .£5, jos!? Carlos, Antropologia e eomuliiear;ao: prindpios radieais .. Rio.de Janeiroi Espaw e Tempo, 1989. p. 101.

Troque ideias com seus colegas: como seria a vida de voces sem os equipamentos eletrOnicosque existem hoje?

C'mAtenas, naepoca c1assica,quando os poetascOmicosqualificavam um homem por seu offcio:J:'(Eucrates, 0 comerciante de estopa; Lisicles,0 comerciante de carneiros), nao,era precisamente'p~ra honra~los; s6 e homem por inteiro quem vive no 6cio; Segundo Platao; uma cidade bem feita seria'aqiJela na qual os cidadaos fossemalimentadospelotrabalhoruraldeseusescravosE!.deixassem os'of/dos para' a gentalha: a vida "virtuosa", de um homemde qualidade, deve ~er"()ci6sa" {...].?:;." Para Arist6teles"escravos, camponeses enegociantes naG poderiam ter urnaVida ';feliz", querdi~~r;ao mesmo teinpopr6spera e cheia odenobreza: podem-no'somente aqueies que tem os meios''d~organizarapr6pdaexistencia efixar para si mesmos Um objetivoidE!aLApenas esses homens ocio-'~'qs'cbrresporidem moralmente a~ideal humane e merecemsercidadaosporinteiro: "A perfei~aodbcidadaoriaoqualificab homE!mlivre, mas 56 aquelequeeisehtdcJastarefa~ hecessarias dasquais", :i'h~~rnbemservos~arte~aos e' operarlos nao especializados; estes"ultimos nab serao cidadaos,.se. a '

:', i.tui~ao co.nceder os ~argospublicos a virtude e,'aO,merito, poisnao 's~pode praticara virtude ...'d~~~~Jm:a:"'id~:d~,?pei~ri~ ou de trabalhador bra~al,".Ari~t6teles ~ao qy~r dizer que urn pqbrE!..¢n/ia'~eiQscill'opo~tli~idadesde praticar certas~irtudes,mas,sim,:que a pobreza.e.um.cJeteit~;· "..,,'~~P.~Si~;d~Y!~[?,'. '.' '., ..> ';' -/,:;:'

I:Jrabaihoe6do;Ir\:ARlls, P.,'DUBY,G: Hist6ria da .vida piivada. S<'loPau\o:c¢mpanhiad;jsl~tras; 19,90. v: t;po''oni~noaoanci"!!Cp:·i24:5.. '.' .. ..:,: .. ,,.::;;~,.).,::/;,,.,,,: ':.:'; ..': " ,.:.

1. A antiga concep~ao de que as atividades do pensamento vinculadas a ociosidade (liberdade)tem mais valor que as vinculadas as necessidades esta presente em nossa sociedade? Comoela aparece nos jornais e na televisao?

2. Para voce, a concep~ao de que a pobreza e uma especie de vido, ou algo que torna as pessoasinferiores, existe ainda hoje7

3. Desde a Antiguidade se observa a divisao entre trabalho intelectual e trabalho manual. Comoela aparece em outros momentos hist6ricos e, principalmente, hoje7

Page 5: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Como ja vimos, a crescente divisao do trabalho e uma das caracteristicasdas sociedades modemas. as autores classicos Emile Durkheim e Karl Marx,ja conhecidos nossos, rem vis6es diferentes sobre essaquestao, e'o pensamentode ambos marca perspectivas de analise diversas ainda hoje. Assim, e impor-tante conhecer essasduas vis6es para entender melhor a questao do trabalhona vida social modema.

Para Karl Marx, a divisao social do trabalho e realizada no processo de de-senvolvimento das sociedades. Ele quer dizer que, conforme buscamos atendera nossas necessidades, estabelecemos rela~6esde trabalho e maneiras de dividiras atividades. Por exemplo: nas sociedades tribais, a divisao era feita com basenos criterios de sexo e idade; quando a ag'ricultura e 0 pastoreio come~arama ser praticados, as fun~6es se dividiram entre quem plantava, quem cuidavados animais e quem ca~ava ou pescava.

Com a forma~iio das cidades, houve uma divisiio entre 0 trabalho rural(agricultura) eo trabalho urbano (comercio e industria). 0 desenvolvimentoda produ~ao e seus excedentes deram lugar a uma nova divisiio entre quemadministrava - 0 direror ou gerente - e quem executava'- 0 operario. Ai estaa semente da divisao em classes, que existe em todas as sociedades modemas.

Para Marx, portanto, a divisiio social do trabalho numa sociedade gera adivisiio em classes.

Com 0 surgimento das fabricas, apareceu tambem 0 proprierario das ma-quinas e, conseqUentemente, quem pagava 0 salario do operador das maquinas.A mecaniza~ao revolucionou 0 modo de produzir mercadorias, mas tambem

colocou 0 trabalhador debaixo de suas ordens.Ele come~ou a servir 11 maquina, pois 0 trabalbopassou a ser feito somente com ela. E nao erapreciso ter muiros conhecimentos; bastava saberopera-Ia. Sendo urn operador de maquinas efi-ciente, 0 trabalhador seria born e produtivo.

Subordinado 11 maquina e ao proprierariodela, 0 trabalhador s6 tern, segundo Marx,sua for~a de trabalho para vender, mas, se naovende-Ia, 0 empresario tambem nao tera quemopere as maquinas. E 0 que Marx chama derela~iioentre dois iguais. au seja, uma rela~aoentre proprietarios de mercadorias, mediante acompra e a venda da for~a de trabalho.

Oficina de manuten\aode maquinas nosEstados Unidos, emfotografia de 1965.Ferramenteiros trabalhamem suas bancadas,sob a vigilancia de umsupervisor. Na visaode Marx, a divisao dotrabalho gerou a divisaoda sociedade em classes.

Vejamos como isso acontece. Ao assinar 0 contrato, 0 trabalhador aceita'rrabalhar, por exemplo, oito horas diarias, ou quarenta horas semanais, por

determinado salario. 0 capitalista passa, a partir da!, a ter 0 direito de utilizaressafor~a de trabalho no interior da fabrica. 0 que ocorre, na realidade, e que° trabalhador, em quatro ou cinco horas de trabalho diarias, por exemplo, ja

.produz 0 referente ao valor de seu salario total; as horas restantes sao apropria-das pelo capitalista. Isso significa que, diariamente, 0 empregado trabalha tresa quatro horas para 0 dono da empresa, sem receber pdo que produz. a quese produz nessashoras a mais e ° que Marx chama de mais-valia.

As horas trabalhadas e nao pagas, acumuladas e reaplicadas no processoprodutivo, viio fazer com que 0 capitalista enrique~a rapidamente. E assim,todos os dias, isso acontece nos mais variados POntOSdo mundo: uma parcelasignificativado valor-trabalhoproduzido pelos trabalhadores e apropriada peloscapitalistas. Esse processo chama-se acumulafiio de capital.

Para obter mais lueras, os capitalistas aumentam as horas de trabalho,gerando a mais-valia absoluta, ou, entaO, passam a utilizar equipamentos ediversas tecnologias para tomar 0 trabalho mais produtivo, decorrendo daia mais-valia relativa, ou seja, mais produ~iio e aumento de mais-valia com 0

mesmo numero de trabalhadores (ou ate menos), cujos salarios continuamsendo os mesmos.

\i~~~r:;~j~t:~~;~lf~~f~l[!i~~~Set p;O-lo~g~daajo;naciil de t~ab'aih-o~i~rridOt~r1iPQd~t;abaih~;'ec~~;~~i6:a

..--;:".-,:.:.~.:.;..-~:;.~~:.>:;.;: ~, ,.,,~.,,;.. ~'~',':".: :~:: .'>.' ,.."<":, . i:?.'·o;.-·:-;~··:·:~::;:.~,:·~~·~;·'<}} ;.' :_~-!-;-:'-r\' ,:~u~a9tles_safTi~smaJQr~a_d~traPillh.6.?Mssils.perg(Jf.lta?;.viu,"se que,Q ~~P!t~1

."?e;fjgr,~~Q~~~:t:~b:~I,hO5R~p[eJ~9r?i~~i~.~frieh~s\~~~i~f~S?~'\~J~~',i.~,1:11#:"

Page 6: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

A produc;ao capitalista, que e essencialmente produc;aode mai~~vai[a,absorc;aode mai~-trabalho, produz, portanto; com 0 prQlongame,~to'9ajbr~~?~ d~ir~b~-ihbnao apenas a atrofia da forc;a de trabalho, aquale.roubada de:si.ias;cOndi~6es,'normais, moraise ffsicas,de desenvolvimentoeatividade. Ela PiOq~t'~exaustaoprematura e 0 aniquilamento da pr6pria forc;ade trapalho.Elap[plqrg,aoter;npode produc;aodo trabalhadornum prazo determinado mediariteq~nq.lrtamentode seu tempo de vida. '" ' 'MARX, Karl. 0 capital: critica da economia politica .•SaoPa,ul():.Abril,Cultural,l~~~.vc 1., p': 2).1·2.

Os conflitos entre os capitalistas e os openirios aparecem a partir do mo-mento em que estes percebem que trabalham muito e estao cada dia maismiseraveis. Assim, varios tipos de enfrentamento ocorreram ao longo do desen-volvimento do capitalismo, desde 0 movimento dos destruidores de maquinasno inicio do seculo XIX (ludismo) ate as greves registradas durante todo 0

seculo XX (voltaremos a esse assumo na unidade III).

Emile Durkheim analisa as relalf6es de trabalho na sociedade moderna deforma diferente da de Marx. Em seu Iivro Da divisiio do trabalho social, escritono final do seculo XIX, procura demonstrar que a crescente especializalfaodo trabalho promovida pela produlfiio industrial moderna trouxe uma formasuperior de solidariedade, e nao de conflito.

Para Durkheim, ha duas formas de solidariedade: a mecanica e a organica.A solidariedade mecanica e mais comum nas sociedades menos complexas, nasquais cada urn sabe fazer quase todas as coisas de que necessita para viver. Nessecaso, 0 que une as pessoas nao e 0 faro de uma depender do trabalho da outra,mas a aceitalfao de urn conjumo de crenlfas, tradilfoes e costumes comuns.

Ja a solidariedade organica e fruto da div,ersidade emre os in-dividuos, e nao da identidade nas crenlfas e alfoes. 0 que os unee a interdependencia das funlfoes sociais, ou seja, a necessidadeque uma pessoa tern da outra, em virtude da divisao do trabalhosocial existente na sociedade. E 0 que exemplificamos no capituloanterior descrevendo 0 trabalho e os trabalhadores envolvidos naprodulfao do pao.

Com base nessa visao, na sociedade moderna, a coesao socialseria dad a pela divisao crescente do trabalho. E isso e facil deobservar em nosso cotidiano. Tomamos urn onibus que tern mo-torista e cobrador, compramos alimentos e roupas que sao produ-zidas por outros trabalhadores. Tambem podemos ir ao posto desaude, ao p,entista, ao medico ou 11 farmacia quando temos a1gumproblema de saude, e la encontramos outras tarltas pessoas quetrabalham para resolver essas questoes. Enfim, poderiamos citaruma quamidade enorme de situalfoes que nos fazem dependentes,

Centro de atendimento aoclienle em Bangalore. India.Para Durkheim, a especializa,aQe divisao do trabalho gerama coesao social.

de outras pessoas. Durkheim afirma que a interdependencia provocada pelacrescente divisao do trabalho cria solidariedade, pois faz a sociedade funcionare Ihe dol coesao.

Segundo esse autor, toda a ebulilfao no final do seculo XIX, resultante'ciarelalfao entre 0 capital e 0 trabalho, nao passava de uma questao moral. 0que fez surgir tantos conflitos foi a falta de instituilf6es e normas integradoras(anomia) que permitissem que a solidariedade dos diversos setores da sociedade,nascida da divisao do trabalho, se expressasse e, assim, pusesse fim aos conflitos.Para Durkheim, se a divisao do trabalho nao produz a solidariedade, e porqueas relalf6es entre os diversos setores da sociedade nao sao regulamentadas pelasinstituilf6es existentes.

. . .',.,A divisao do trabalho social cria a solidariedade,

&~rTldi'verso Ida solidariedade mecanica] e 0 caso da sOlidadedade produzida'pela divisaodo trabalho. Enquanto a precedeote implica que,os indivfduos, se-~semelham, esta sup6e que eles diferem uns dos outros. A prirlJeira56 e possf"':ramedida em que a'persorialidade individual e absorvidahfpersQnalidaqe, tiya;i1 segunda s6 ~'posslvelse cada um tiver'uma esfera deac;ao pr6pria, por

seguiptei ~ma personalida~e. E necessario,pois, :que~. coJ)scienciacole,tivae.descoberta uma parteda'~onscienciaindiviqu(ll, para qu.enela see~tabel~~.'is.;gs·func;6esespeciais~q~e ela nao p'ode reg~l~mentar; '~quant~ rii,ai~esk-~;:(j~e~terisa,;';;ais:forte e a ,coesao que resultadessa solid9rieda.de. De fatb, ''!tlladO,cadalim dej:Jenaetanto maisestrEiitamente dasoeiedadeq~anto:;:'aii,trdidofo~otrabalhonel~~; de oJtro, aatividade de cada um ~tanto~mais< '"'." :. . '-'.c. '," .'" ",,'. '._, . . -,' -." .. --.,-. ,,>.','"

~oal quanta mais for espe<:ializa'da.Sem dUVida,por mais~ircunscritaque,~eja;"~ir1unca ,e completam~nteoriginal; mesmo rioexercfcio denQssa profissaoi ';ilf6rh,am6~nbs a:usos, a praticas quesao comuns a n6s e atodaa ness,acor"6·ta~iie.Mas, ~esrno nessecaso:Ojugo que sohemos emuitome~os p~s~do-'-qy~ quando a sociedade iriteira pesa sobre n65, eele proporciona' muito tTlais

'~~9p.~raol!v;ej6goder1qss~ inidativa, Aqui, poi~, airidividualidade d~ todd'~~'rita'~o1nes~otempoquea'daspartes; asociedadetorna-se ~ais capazde. ';' ,r,erDS3hj~nto,a0tl1e~rn()tempoTm que cadaum de seus elerT\entostern

vi.~entospr6pXio~, ,.'~~~.~'sQli~(lriedade se, assemelhaa', que o~s~rV(lrnqs9~.1riim(lisslipe~i9.res,D~ fato,:~ada 6rgao af,tern' sua fisionomiaf!spedal"

a~t~;'orTIia;e contudo 'a\midade do organismo e tanto maior quanto m~is, '" acentuada essa individuac;aodas partes. Devidoa eSsa analogia, propomos diamar

~~i~;;~~~,6~ganiCaa solidariedadedevidaa divisao do trabalho., ' ,;ii,:';,' ff>;'ouRKHEIM,tmile. Da divisao do trabalho social. Sao Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 108.~q).:.,·?t»·)·,· '.,. .

As duas diferentes formas de analisar as relalf6es na sociedade modernae capitalista, apresentadas por Marx e Durkheim, acabaram influenciandooutras ideias no seculo XX, mesmo quando a sirualfao do trabalho parecia termudado. Vamos ver como isso aconteceu.

Page 7: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Fordismo-taylorismo: uma novaforma de organiza~ao do trabafho

No secuJoXX 0 11.

;.rigemdauma di.Vis~od~::a~~~::~:t: ~::f~~:l~:~:i:t~::~~:~:~~::sn deuorma e orgamza<;aotornou-se conhecida como ford' . ova

a Henry Ford (1863-1947) F . 1 . Ismo, numa referenciafabrica de autom6veis urn ~o~e~ e quem,.a part1: de 1914,impJantou em suatrias a ponto de 0 que sena seguldo por muitas Outras indus-

~ d r~presentar uma nova etapa da produ<;ao industrials mu an<;asIntroduzidas por Ford visavam it d _ , '.

produro (0 Ford m d j T) pro u<;aoem sene de urno e 0 para 0 consumo em El b

nada de oiro horas por 5 d6l d' massa. e esta eleceu a jor-, ares ao la 0 que n e "fitempo de lazer fi' " a poca, slgm Icava renda esu lClentespara 0 t b Ih d' '

basicas e ate adquirir urn d ra ,a .a or supnr todas as suas necessidadesassim, 0 que veio a se cha os automovdelsproduz~dos na empresa. Iniciava-se,

mar a era 0 consumlsm' d-em larga escaJa.Esse processo disseminou-se e atin ;. pro u<;aoe consumoprodutivos das sociedades I' d " g u quase todos os setoresn UstnalS.r~:·---~rr----"":~..

~r .

r:"1" i- ~.~

___ '. _.:I:';"'"-----_:.- ".

linhas de produ~ao da Ford ~m'1928 e 1996, ambas nos Estados Unidos. a que mudou?

Mas isso por si s6 nao explica 0 fordismo E amais aparente.];i no final do seculo XIX F d' . kP~asJurn de seus aspectos, 0

J. . , re enc lay or (1865 1915)IVroPrmdpios de administr: _ . , - , em seuClfaoClentifica propunha r - d .cientificos na organiza<;aodo t b lh b' . a ap Ica<;ao e pnndpioscessoprodurivo. Com as mud ra a . 0, dusc~ndomaJOrracionaliza<;aodo pro-

ans;asIntro uZldaspar H F dca, as expressoesflrdismo e t. t. . enry or em sua fabri-mesmo processo: aumento d~;~::~i~:~:a:a ser usadas.para identificar urnde horas trabalhadas' om 0 usa mals adequado possiveldivisao e parcelamen::~:~eJO :0 cOntrol~ da~atividades dos trabalhadores,

. arelas, mecanJza<;aode pd' 'd da introdurao da ll'nh d arre as atlVI a es comy a e montagem e . d

conforme 0 com urn sistema e recompensas e punis;oesE _ portamento dos operarios no interior da fabrica.

m razao dessas medldas, foi desenvolvido urn . .para aprimorar coridianamente as formas d Sistema de planepmentoque resultou na crias;aod d e ~o~trolee execu<;aodas tarefas, 0

e urn setor e especlaltstas na administra<;ao da em-

:presa. A hierarquia, bem como a impessoalidade das normas, foi introduzida'119 processo produrivo, sempre comandado por administradores treinados para·isso. A capacidade e a especializa<;aodos operarios tinham valor secundario,

.. pais 0 essencial eram as tarefas de planejamemo e supervisao..' Por incrfvel que pares;a, essas diretrizes nao foram utilizadas apenas

unlve.rso capitalista; 0 modelo fordista-taylorista foi adotado tambem,algumas adapta<;6es, na entao Uniao Sovietica. 0 pr6prio Lenin

aconselhava sua utilizas;ao como uma alternativa para elevar a produ<;aoindustrial sovietica.

Com Ford e Taylor, a divisao do trabalho passou pelo planejamentovindo de cima, nao levando em conta os operarios. Para corrigir isso, EltonMayo (1880-1949), professor da Universidade de Harvard (Estados Unidos),buscou medidas que evirassem 0 conflito e promovessem 0 equillbrio e acolabora<;ao no interior das empresas. Suas ideias de concilias:ao, desenvol-vidas na Escola de Rela<;oesHumanas a partir dos anos 1930, procuravamrevalorizar os grupos de referencia dos trabalhadores, principal mente 0 fa-miliar, evirando assim urn desenraizamento dos operarios.

r:•.....N, m;"~ ~d, d,"~,J:~:~o~~t~~~,~:~!~~rj~~tl~:;~!~i~~~ijJicou ° trabalho na fabrica. Mostro~ que ~d.9.d~9Smotivos. ext~Ji(Jres(queahtes ~~.J419ilY~Ziot~·d9r¢st;p'.;sobre 9S quais, para mim, se apoiava 0 sen.tfrnenWde dignioade,o resgE!itqpor rni.rri0esm~,emdu~s~~~:.}~,,<outres semanasficaramradicalrngnteanasa~6s'p~l~ golpe deuma pr~s;ao br\lt~le '~oticiia~a.E~~;J~:'r:'":-:': '. - . - '. , . /;-:;:'. :'-.: .. "":~ ".-:.... ': ' :'.: ' . ':". '. - .~ -", <'" ~ : . ....~;creio que tenham nascido em mim seotimentQsderevolta:-Naoi muitoaQ contrario. Veio oque era'

~;'~~;i~~~:~~~W~0~;:~:;~':~;'~i~;'~~f~lt:'r~~i~~~il

"4.' ,>••,,::::II~.; qualquer. .......................•. ' .••.' Aofderri:podeset;diffciloypgrigosa)1~~td~t;:~~~~~·r.:;~f~8t~~1i;~·~·~~t~\~~~{t~~f~1~~,~:~~i~~1?~?~rB~~:iW:~;r~~::~t;:'~~~~:~:::·:. :delesem palavras,hem' erngestos; pois oS'geStosestao determinadbs, minuto a minuto, pelo trabalho,;:~~~h~sjw~~aof~Z S?~,'?iC,~:'o..~.~~s~~en}2f~~;d~;~:\e.:Wre·~i,.~~.reir~i~,'~o00a carnese retrai debalxo I.

,de urn bisturi. Naose pode. ser "conscie.nJe", . '" ...,", '~.,'. ", . . :',": .; ... '. '" . , . _: '.. .,., -' .

.•. WEll, Simone. Carta aAlberline Thevenon (1934-~). In: BOSI, Edea (org.). A condir;ao operaria e outros escudos sobr a"'i:>presSao. RiodeJaneiro;PazeTerri(j979: pe6·S.': '. ." '.. ,.

Page 8: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

A visao de Taylor, a de Ford e, depois, a de Elton Mayo revelam a influen-cia das formula<;:6es de Durkheim sobre a consciencia coletiva. Durkheimafirmou que ha uma consciencia coletiva que define as a<;:6esindividuais, sub-metendo todos 11 norma, 11 regra, 11 disciplina, a moral e a ordem estabelecidas.As empresas devem dar continuidade a isso, definindo c1aramente 0 Jugal eas atividades de cada urn, para que nao haja duvida sobre 0 que cada membrodeve fazer. Se existir conflito, diz ele, deve haver uma coesao social, baseadanuma ideia de consenso, orientada pela existencia de uma consciencia coletivaque paira acima de todos na sociedade.

Em seu livro Trabalho e capital monopolista: a degradafiio do trabalho noseculo XX, 0 soci610go estadunidense Harry Bravermann critica essa visao.Ele afirma que 0 taylorismo foi somente 0 coroamento e a sintese de varias

ideias, que germinaram durante todo 0seculo XIX na Inglaterra e nos EstadosUnidos, cujo objetivo era transferir para~s maos das gerencias 0 controle de todo.0 processo produtivo. 0 taylorismo ti-rava do trabalhador 0 ultimo resquicio

: ide saber sobre a produ<;:ao: a capacidadei: de operar uma maquina. Agora ele tinha:'!que opera-la do modo como os adminis~_i ~tradores definiam. Estava concluida a!exproprias:ao em todos os niveis da au"

\ \tonomia dos trabalhadores, que ficavam'total mente dependentes dos gerentes eadministradores.

A critica marxista a Elton Mayo destaca que as formas de regulamenta<;:aoda for<;:ade rrabalho por ele propostas seriam indiretas, pela manipula<;:aodo operario por intermedio de especialistas em resolver conflitos. Assim,psic610gos e soci610gos, assistentes sociais e adminisrradores procuraram devarias formas cooptar os rrabalhadores para que eles nao criassem situa<;:6esde conflito no interior das empresas. A empresa lhes daria seguran<;:a e apoioe, portamo, deveriam trabalhar coesos, como se fizessem parte de uma comu-nidade de imeresses. Talvez a expressao "la na minha empresa", que ouvimosde muitos trabalhadores, seja urn exemplo de quanto essa perspectiva atingiuos cora<;:6ese mentes.

Foi com esses procedimentos que 0 fordismo-taylorismo se desenvolveue tornou-se a ideologia dominante em todo tipo de empresa, ate mesmo nascomerciais e de servi<;:os.E ficou tao forte na sociedade capitalista que suasconcep<;:6esacabaram chegando as escolas, as familias, aos c1ubes, as igrejas eas institui<;:6es estatais; enfim, penetraram em todas as organizas:6es sociais quebuscam, de uma forma 0!l de outra, 0 controle e a eficiencia das pessoas.

Essa forma de organizar 0 trabalho foi marcame ate a decada de 1970 eainda prevalece em muitos locais, com multiplas varia<;:6es.Enrretamo, novasformas de produ<;:ao e de trabalho foram surgindo desde entao.

Transfigura,ao dotrabalhador em maquina,um efeito do taylorismo.

Novas transforma<;:6esaconteceram na sociedade capitalista, principalmente:·depois da decada de 1970, e todas elas rem a ver com a busca desenfreada pormais lucro. Como a recessao aumemou por causa da crise do petr6leo. os capita-listas inventaram novas formas de elevar a produtividade do trabalho e expandir

.' os lucros. Comes:aram. entao, a surgir formas de flexibiIizas:ao do trabalho edo mercado. Em seu livro Condifiio pos-moderna, 0 soci610go estadunidenseDavid Harvey chamou essa fase de p6s-fordismo, ou fase da acumula~o flex!- ,:

Iivel. Outros autores tambem estudaram essa nova fase do capitalismo, como 0 ;!!i

ptadunidense Richard Sennett, em seu livro A cultura do novo capitalismo. ::Existem duas formas de flexibiliza~o pr6prias desse processo que merecem

ser lembradas aqui: a flexibilizafiio dos processosde trabalho e de produfiio e a :1

flexibilizafiio e mobilidade dos mercados de trabalho. IA primeira forma ocorre com a automas:ao e a conseqiiente eliminas:ao ,I

do comroIe manual por parte do trabalhador. Desse modo, 0 engenheiro que J

entende de programa<;:ao eletronica, de supervisao ou analise de sistemas passa I

a ter uma imponancia estrategica nas novas instala<;:6es industria is.Com 0 processo de automa<;:ao,nao existe mais urn trabalhador espedfico

para uma tarefa espedfica. 0 trabalhador deve estar disponivel para adaptar-seas diversas fun<;:6esexistentes na empresa. Os que nao se adaptam normalmentesac despedidos. A nova configuras:ao mundial do trabalho cria, assim, muitaincerteza e inseguran<;:a; por isso, a situa<;:aodos trabalhadores no mundo dehoje e bastante sombria.

Interior de fabricaautomatizada na Alemanha.Onde vao se empregar ostrabalhadores manuals?

A flexibiliza<;:aoe mobiIidade dos mercados de trabalho ocoere quando os L•empregadores passam a utiIizar as mais diferentes formas de trabalho: domesti- !ca e familiar, autonoma, temporaria, por hora ou por curto prazo, terceirizada, 'entre outras. Elas substituem a forma cIasslca do emprego regular, sob contrato,sindicalizado, permitindo alta rotatividade da mao-de-obra e, conseqiiente-mente. baixo nivel de especializa<;:ao e forte retrocesso da a~o dos sindicatosna defesa dos direitos trabalhistas.

Page 9: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

deficit de lugares. Nao ha postos de trabalho para todos, nem para os'ue estao envelhecendo, nem para os mais novos que procuram empregoela primeira vez. Isso sem falar naqueles que escao desempregados h.1

.muiro tempo e ate participam de programas de requalificac;:ao.,A qualificac;:ao do emprego. Ha tantas exigencias para a formac;:ao do traba-i1hador que se cria uma siruac;:aoaparentemente sem soluc;:ao.E 0 caso dosjovens, que nao sao contratados porque nao tern exp('riencia, mas nunca po-derao ter experiencia se nao forem contratados. Pessoas em tomo de 20 anos

. ficam vagando de est.1gio em estagio ou de programas de estagio para outros. programas. Ha, ainda, jovens com boa qualificac;:ao que ocupam empregosinferiores, tirando 0 trabalho dos que tern pouca qualificac;:ao.

Todas essas situac;:6es criam individuos como que estranhos a sociedade,.pois nao conseguem se integrar nela, desqualificando-se tambem do ponto':'devista dvico e politico. Eles pr6prios consideram-se inuteis sociais. Ocorretpraticamente uma perda de identidade, ja que 0 trabalho e uma especie de"passaporte" para alguem fazer parte da sociedade. No Brasil, tudo issoacontece, principal mente nos grandes centros urbanos.

HARVEY. qavid: (Qiidit;a;P6S-mod/iina:}:'iid, Sao Paulo: lOY~J~;'~~93.p.14O:e:14a~;c;,:,':', '.; ~.'-,',: .'. :.7",:~,;·>·:

Ate ha pouco tempo, 0 trabalhador podia entrar numa empresa, trabalharanos seguidos e aposentar-se nela. Era 0 chamado posro fixo de trabalho. Hoje,isso esta desaparecendo, conforme explica 0 soci610go Frances Robert Castel, emseu livro A metamoifose da questiio social: uma cro;ica do saldrio. 0 soci610gomostra que, na Franc;:a,essa situac;:aoesta dando lugar a uma nova sociedade,na qual 0 trabalho e a previdencia ja nao significam seguranc;:a, 0 que causatranstornos terriveis em termos sociais e individuais. Ele destaca quatro aspectos'que parecem estar se generalizando no mundo:

• A desestabilizac;:ao dos estaveis. As pessoas quetern emprego estao sendo "invalidadas" porvarios motivos. Algumas porque sao conside-radas "velhas" (em tomo de 50 anos); outrasporque nao tern formac;:aosuficiente para 0 quese quer; ha ainda aquelas que sao consideradasjovens demais para se aposentar.A precariedade do trabalho. Ha urn desempre-

, go consrante nos ultimos anos, e a maioria dos, trabalhadores desempregados normal mente s6

encontra postos de trabalho instaveis, de curtadurac;:aoou em perfodos alternados.

..~~1~:~:!::!I~~f::~1~;JE·.·Jt'·.C»~:~~::·~:a~~~:~:~:~~:~:;~,~~~~~~~~n(1::~:;'~':~:~::e~::b:~;f~X~d~~tb- "

. 'IhlUidodo trabalho sao quantitativas e qualitati~as,e afetama estn~turasocialnasmais difet~~es·.··.~icat1; Entr~ essa~ mudanc;:~s, ele aponta 0 rotnpim~~~o do~qu~dros sociaise ritent~sq¥e:~~t~~ain .'

vinrulidos aum~ base nacionaL Ele querdiielque h~je,'com 6-trabatho flex/vel e vQI~te 'hpmundotodoi p~s6asiriigram para o~trosrai$es·eni:bilsfape.:tr~batho.E, assim, nos paises a que chegam, .'ger~linenfeyivemem slruac;:aod,iffcil, deseny()l~e:n~o'trabalhos insatubres e em. condic;:9<;spr~car,ias.·

, -:,'0:':>

A escassez de postos de traba/ho,em charge de Jean Galvao.

Page 10: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

"1'1 hi dificuJdades de adaptas:ao, com freqiiencia enfrentam problemas de preconceito ,racial,Ilgi so e cultural. " '"

.0 fenomeno dos decassegui~, os brasileiros descendentes de japonises~que se desloc~m paratrabalhar no Ja~ao por curtas?u longas temporadas; e·a exPtessaob~~yis!vel desseprgces~o.Trabalham mats de 12 horas por dia e saoexploradosa:?maj{i~0.;AI~uns;~alsqualiflc~d6s;conseguem bo~s e.mpregos, mas a maioria J1ao. A esta resta.m as op~6~~' 4~.voltacbu"de'l.fper-manecer margma1Jzada. . .

[...] todos os assalariados de uma empresa, nao impcirta qual seja 0 selinrvel hierarquico; naosabem nunca se serao mantidos ou nao no er:nprego, porque nao e a riqueza econ6mica

da em.presa que vai impedir que exista reduC;aode efetivo. Vou dar 0 exemp!o[ ...] da PeugeR(e daCitroen, que conhec;o bem. na Franc;a. t uma empresa que esta funcionando~uito bem. Eia pa~~aseu tempo a despedir as pessoas de maneira regular. 1550e perversao, mas a perversao est~ !i'gadaa.pslCologlzac;ao.·a que quero dizer com isso? Poderao permanecer na empresa apenas aqueles ques~o conslderados de excelente performance. [...] 1550e psicologizac;ao, na medida em que, se alguemnao consegLie conservar 0 seu trabalho. fala-se tranqOilamente: "mas e sua culpa, voce nao soube seadaptar. voce nao soube fazer esforc;os necessarios, voce n~o teve uma alma de vencedor vote nao eum her6i." [...] quer dizer: "voce e culpado e n~o a organizac;ao da empresaouda socied~de: A culpae 56 sua." 1550culpabiliza as pessoas de modo quase total, pessoasque, alem disso,'ficam submetidasa um estresse profissionalextremamente forte. Entao as empresas exigem daqueles que perrTi;lnec~m~m devotamento, lealdade e fidelidade. mas ela nao da nada em troca, Eli! vai dizer simplesmente:voce tem a chance de continuar, mas talvez vocetambemnao permanec;a!' .

ENRb'OUEZ,Eugene. Pe~da de trabalho •.perda de identidade. In·: NABuco, Maria Regina; CARVAlHONero, Antonio. RelariJes detra a/ho conremporaneas. Belo Honzonte: IRT, 1999. p. ZZ. . .,

1. Qual e a principal relaC;aoentre os dois textos?

2. a emprego e uma questao pessoal, social ou ambas?

Quando analisamos 0 trabalho no Brasil, nao podemos nos esquecer deque ele esca ligado ao envolvimento do pafs na trama internacional, desde que~s portugueses aqui chegaram no seculo XVI. Basta lembrar que a "descober-ai' do Brasil aconteceu porque havia na Europa 0 movimento das expans6es':'~ltramarinas, em que os europeus esquadrinhavam os oceanos em busca denovas terras para explorar e de novos produtos para incorporar ao processo

· de desenvolvimento mercantilista. A produs:ao agrfcola para a exportas:ao e a'.,presens;a da escravidao no Brasil tambem estao vinculados 11 vinda dos euro-·peus e, e claro, todo 0 processo de industrializas:ao-urbanizas:ao a partir de

....·1930 ate hoje.No final do seculo XIX, com a abolis:ao da escravidao no Brasil, encer-

rou-se urn per/odo de mais de 350 anos de predomfnio do trabalho escravo.Porranto, nos sO convivemos com a liberdade formal de trabalho ha pouco maisde cern anos. Esse passado "deescravidao continua pesando.

Mesmo antes do fim da escravidao os grandes proprietarios de terras, prin-cipalmente os fazendeiros paulistas, procuraramltrazer imigrantes para traba-lhar em suas terras. A primeira experiencia de utilizas:ao da fors:a de trabalholegalmenre livre e estrangeira foi realizada pelo senador Vergueiro, grandefazendeiro da regiao oeste de Sao Paulo que, em 1846, trouxe 364 famfliasda Alemanha e da Sufs:a. Em 1852, importou mais 1,5 mil colonos e, pos-teriormenre, propos-se trazer mais mil colonos por ano. Isso era feito coma ajuda financeira do governo da provfncia de Sao Paulo, que arcava com

·os custos da importas:ao e ainda subvencionava as empresas agenciadoras demao-de-obra estrangeira.

o sistema de trabalho entao adotado ficou conhecido como colonato, poisasfamflias que aqui chegavam assinavam urn conuato nosseguintes termos: 0

,; fuzendeiro adiantava uma quantia necessaria ao transporte e aos gastos iniciaisde instalas:ao e sobrevivencia dos colonos e de sua familia. Estes, por sua vez,deviam plantar e cuidar de urn ndmero deterrninado de pes de cafe. No final dacolheita. seria feita uma divisao com 0 proprieiliio. Os colonos cram obrigadosa pagar juros pelo adianramento e nao podiam sair da fazenda enquanro naohouvessem saldado sua dfvida, 0 que demorava muito, uma vez que 0 adianta-mento era sempre maior que os lucros advindos do cafe. Assim se criava 0 quepassou a ser conhecido como "parceria de endividamento", porque 0 colononao conseguia pagar a dfvida conrrafda com 0 fazendeiro. Essa dlvida, muitasvezes, passava de pai para filho, de tal modo que os filhos ficavam.hipotecadosdesde 0 infcio do conrrato.

Page 11: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

As experiencias iniciais nao foram bem-sucedidas, pois os colonos naoaceitavam tamanha explora~ao e muitas vezes fugiam da fazenda ou se re-voltavam contra esse sistema, como foi 0 caso da revolta na fazenda Ibicaba,de propriedade do proprio senador Vergueiro, em 1857. Acresceme-se a issoa pressao dos governos estrangeiros para minorar os males infligidos a seuscidadaos no Brasil. A imigra~ao ficou estagnada ate os anos 80 daquele seculo,quando foi retomada com novo vigor. Isso pode ser verificado pelos seguintesdados: no periodo de 1820 a 1890, emigraram para 0 Brasil 987461 pessoas.Nos dez anos seguimes, de 1891 a 1900, 0 totalfoi de 1 129315 pessoas. Nostrima anos seguinces, esse movimenro prosseguiu, com uma media de quase1 milhao de pessoas a cada dez anos.

A maioria dessas pessoas foi trabalhar no campo, mas outra~ se estabele-ceram nas cidades, como Sao Paulo e Rio de Janeiro, onde trabalhavam nasindustrias nascences, no pequeno comercio e como vendedores ambulances detodo tipo de mercadorias. As condi~6es de vida desses trabalhadores nao eramdas melhores e 0 nlvel de explora~ao nas fabricas era muito grande, de tal ma-neira que os operarios trataram de se organizar em associa~6es e sindicatos.

A partir dos primeiros anos do seculo XX, os trabalhadores urbanos passa-ram a reivindicar melhores condi~6es de trabalho, diminui~ao da carga horariaseman aI, melhorias salariais e, ainda, normatiza~ao do trabalho de mulherese crian~as, que eram empregadas em grande numero e ainda mais exploradasdo que os homens.

Diante das condi~6es de vida e de trabalho extremamenre predrias, ostrabalhadores iniciaram varios movimenros, por meio dos quais pretendiam

modificar essa situa~ao. Apoiados por uma .imprensa operaria, que crescia rapidamenre,

TrabalhadoreseurapeusemumadasfabricasdasIndustriasMatarazzoemSaoPaulo,cercade 1900, e lac-similedeexemplaresdaimprensaoperaria.Nasprimeirasdecadasdoseculo XX, multiplicaram·senoscentrasurbanososjornaiscriadosporimigrantesparamobilizarosoperariosnalutapormelhorescondi(oesdetrabalhoe divulgarideiasdecorrentesdiversas,sobretudoanarquistase socialistas.

rabalhadores passaram a organizar movimenros grevistas, que culminarama maior greve ate entao havida no pals, a de 1917,em Sao Paulo. Nesse

'lodo, que foi ate 1930, a questao social, principalmente no que se referia.~trabalhadores, era tratada como urn problema de policia... Com 0 desenvolvimenro industrial crescente, as preocupa~6es com 0 tra-'ih~dor rural continuaram a existir, mas a aten~ao maior das auroridadesItava-se para as condi~6es do trabalhador urbano, que determinaram a ne-". idade de uma regulamenta~ao das atividades trabalhistas no Brasil. Issoonteceu pela primeira vez no inicio da decada de 1930, com a ascensao de

'Cetulio Vargas ao poder.. No pedodo de 1929 ate 0 final da_~egunda Grande Guerra - em que as,hporta~6es foram fracas e houve for-ie investimenro do Estado em Fontes

?~rtergeticas, em siderurgia e em infra--'estrutura -, buscou-se uma amplia-~ao do processo de industrializa~ao noBrasil, 0 que significou urn aumentosubstancial do numero de trabalhado-res urban os.

fi d d G Comemora(aodo1~demaionaAte 0 1m a Segun a uerra, 0 capitalpaulista,nadecadade

Brasil cominuava a ser urn pals em ; 1940. liderando0 processodeque a maioria da popula~ao vivia na industrializa(aoimplementado

porVargas,SaoPaulorespondia. zona rural. Maminha-se, assim, uma , entaopormetadedaprodu(aoestrutura social, economica e polftica labrilbrasileira.~inculada a terra. As transforma~6es que ocorreram posteriormente muda-ram a face do pals, mas 0 passado continua influindo, principalmente nasconcep~6es de trabalho. Ainda hoje nao e dificil ouvir a expressao "trabalheiComo se Fosse urn escravo", ou perceber 0 desprezo pe/o trabalho manual epelas atividades rurais, que nos lembram urn passado do qual a maioria das

:,,:pessoas quer fugir.

, Nosultimos sessenta anos, convivemos no Brasil, simultaneamente, com. ~a~ias formas de produ~ao. Vejamos alguns exemplos da diversidade das situa-~6es de trabalho que se observam no Brasil de hoje:

• Trabalhadores, indlgenas ou nao, que tiram seu sustenro coletando alimenrosna mata, conhecidos como povos da floresta.

• Trabalhadores da agropecuaria, compreendendo os que ainda trabalhamcom enxada e facao e os que utilizam maquinas e equipamentos sofisticados,como, por exemplo, as colheitadeiras, muitas delas computadorizadas .

• Trabalhadores empregados em industrias de transforma~ao ou de produ~aode bens duraveis ou nao duraveis, seja em grandes empresas nacionais ouinternacionais, seja em pequenas fabricas "de fundo de quintal".

Page 12: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

Dos funcionarios doshipermercados aos ambulantesque oferecem seus produtosnos postos de pedagio. 05

trab"lhadores dos setores decomercio e de servi,os comp6emo grupo mais numeroso daPopula,ao EconomicamenteAtiva - um reflexo do rapidoe desordenado processo deurbaniza,ao no Brasil.

• Trabalhadores nos setores de servis:os e de comercio, que retillem a maioria daspessoas. Ha desde quem viva do comercio ambulante ate quem se empreguenos grandes supermercados e shopping centers; ha trabalhadores bras:ais, quefazem reparos em casas, e funcionarios de empresas de servis:os altamenteinformatizadas, nas quais os equipamentos e1etr6nicos fazem a maior partedas tarefas.

• Trabalhadores administrativos, em empresas e organizas:oes publicas e priva-das, desenvolvendo atividades das mais simples, como servir cafezinho, ateas mais compJexas, como gerenciar urn sistema computacional.

• Crians:as que trabalham em muitas das atividades descritas.• Trabalhadores submetidos a escravidao por dfvida.

Como ja vimos, em 1945, a maior parte da populas:ao brasileira vivia nazona rural. Em 2005, a maior parte da populas:ao vivia na zona urbana. Issosignifica que nesses sessenta anos houve uma transformas:ao radical no Brasil, ee1afoi feita por milhares de trabalhadores que, efetivamente, criaram condis:oesdiferentes para se realizar como cidadaos num pais tao rico e tao desigual.

Em 2004, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatfs-tica (lBGE), em torno de 15% da Populas:ao Economicamente Ariva (PEA)trabalhava na industria; dos 85% restantes, 60% a 65% dos trabalhadoresestavam nos setores do comercio e de servis:os e em atividades administrativas,e apenas 20 % na agropecuaria, na cas:a e na pesca. Ou seja, 0 processo de urba-nizas:ao, com rados os seus desdobramentos, criou uma situas:ao completamentenova no Brasil, a tal pOnto que nem a agropecuaria nem a industria sao hojeos setores que mais empregam. Portanto, 0 perfil de trabalho no Brasil mudoumuito e, com isso, as oportunidades de trabaJho tambem.

Emprego e qualificayao. Ouvimos a rado momento nas conversas informaise encontramos com freqii~ncia nos meios de comunicas:ao a afirmas:ao de ques6 tera emprego quem river qualificas:ao. A qualificas:ao em determinados ra-mos da produyao e necessaria e cada dia mais exigida, mas isso somente paraalguns poucos postos de trabalho. A maioria das ocupas:oes exige somente 0

'h1fnimo de informas:ao, que normalmente 0 trabalhador consegue adquirir no/pr6prio processo de trabalho..c'", A elevas:ao do nfvel de escolaridade nao significa necessanamente em-,prego no mesmo nlvel e boas condis:oes de trabalho. Quantos graduados em',Engenharia ou Arquitetura estao trabalhando como desenhistas? Quantos;f~rmados em Medicina sac assalariados em hospitais e servis:os medicos,• tendo uma jornada de trabalho excessiva? E os formados em Direito que~ao conseguem passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),

, muitos por ter uma formas:ao deficiente, e se empregam nos mais diversosramos de arividade, em geral muito abaixo daquilo que estao, em tese, ha-

" hilitados a desenvolver? Ou seja, a formas:ao universitaria, cada dia mais'precaria, na;>garante empregos aqueles que possuemdiploma universid,rio, seja pela precaria qualificas:ao,seja porque nao existe emprego para todos.

Encontram-se situas:oes exemplares nos dois p610sda qualificas:ao:

• Em muitas empresas de limpeza exige-se formayao noEnsino Medio para a atividade de varris:ao de ma, 0que demonstra que nao ha relas:ao entre 0 que se faz ea escolarizayao solicitada, pois nao e necessario ter nfve!medio para isso, mesmo que existam pessoas com atemais escolaridade que por necessidade 0 fazem.

• Jovens doutores (que conclufram ou estao fazendo 0doutorado) sac despedidos ou nao sac contratadospor universidades particulares porque recebem sala-rios maiores e as instituis:oes nao querem pagar mais.Nesse caso, nao importa a melhoria da qualidade doensino, e sim a lucratividade que as empresas educa-cionais podem obter.

A rela,ao entre escolaridade eemprego, em charge de RubensKiomura e Carlos Pereira.o trabalho informal. Ha no Brasil muitos trabalhadores que desenvolvem suas

,atividades no chamado setor informal, 0 qual, em perfodos de crise e recessao,cresce de modo assustador. Para ter uma ideia do que representa esse setor,vamos aos dados do IBGE. Em 2003,0 instituto pesquisou 10,525 milhoesde microempresas com ate cinco empregados e constatou que 98% delas seenquadravam no conceito de informalidade. Dessas empresas, 7,6 milhoes naotinham nenhum ripo de registro jurfdico e empregavam aproximadamente36 milhoes de pessoas.

o setor informal inclui tambem indivfduos que desenvolvem, por contapr6pria, atividades como 0 comercio ambulante, a execus:ao de reparos ou pe-quenos consertos, a prestas:ao de servis:os pessoais (de empregadas domesticas,baMs) e de servis:os de entrega (de entregadores, motoboys), a coleta de materiaisreciclaveis, etc. A lista e enorme. E ha ainda aqueles trabalhadores, normalmente

Page 13: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

mulheres, que em casa mesmo preparam paes, bolos e salgadinhos em busca deuma renda minima para sobreviver. Todos fazem a economia funcionar, masas condis:oes de trabalho a que se submetem normalmente sao predrias e naodao a minima segurans:a e permanencia na atividade.

Depois das grandes transformas:oes pe!as quais 0 Brasil passou nos ultimostrinta anos, a questao do desemprego continua sendo urn dos grandes proble-mas nacionais. Na agricultura houve a expansao da mecanizas:ao em todasas fases - preparo da terra, plantio e colheita -, ocasionand6 a expulsao demilhares de pessoas, que romaram 0 rumo das cidades. Na industria, a crescenteauromas:ao das linhas de produs:ao tambem colocou milhares de pessoas na rua.Par~ se ter uma ideia do que aconteceu nesse setor, basta dizer que, na decadade 1980, para produzir 1,5 milhao de veiculos, as montadoras empregavam140 mil operarios. Hoje, para produzir 3 milhoes de veiculos, as montadorasempregam apenas 90 mil trabalhadores. Nos servis:os, principalmente no serorfinanceiro, a auromas:ao tambem desempregou outros tantos. Enfim, se a cha-mada modernizas:ao dos setores produrivos e de servis:os conseguiu aumentar ariqueza nacional, nao provocou 0 aumento da quantidade de empregos _ aocontrario, a modernizas:ao tern aumentado 0 desemprego.

Esse quadro s6 podera ser mudado com mais desenvolvimento economico,afirmam alguns; ourros dizem que e impossive! resolver 0 problema na socie-dade capitalista, pois, por natureza, no estagio em que se encontra, eta gera 0

desemprego, e nao ha como reverter isso na presente esrrutura social; ha aindaos que consideram 0 desemprego uma questao de sorte, de re!as:oes pessoais,de ganancia das empresas, etc.

Todas as exp1icas:oespodem comer urn fundo de verdade, desde que se saibaa perspectiva de quem fala. Entretanto, esta faltando uma explicas:ao, que deixaraclaro que 0 desemprego nao e uma questao individual nem culpa do desemprega-do. Essa explicas:ao esta na politica economica desenvolvida no Brasil ha mais devinte anos. A inexistencia de postos de trabalho, alem das razoes anteriormenteapontadas, e 0 resuJtado de uma polltica monetaria de juros altos e, tam bern, deuma politica fiscal que reduz os gastos publicos. Somente sera possi,:,e!resolx~! aquestao do emprego e da renda no Brasil com a amplia,.ao da presens;a do Estadonos n:.~is diverso; set~;e;- -=- educas:ao, saude, s;g~rans:a, tra~sp~rt~, c~lt~;a,~spoi-te)i~ei- ~, o-q~e envolvera a contratas:ao de milhares de pessoas, a1em deinvestimentos macis:os em estradas, habitas:ao e obras publicas.

Se for mantida a polltica economica atual, que nao permite a expansao daeconomia e de empregos, a situas:ao permanecera a mesma, tendendo a piorarpara aque!es que estao pe{dendo 0 emprego ou querendo entrar no mercadode trabalho, ja que nao existe no Brasil urn sistema eficiente de protes:ao e as-sistencia ao trabalhador, uma estrutura que Ihe de seguran,.a. Parece que essesera 0 grande desafio para este seculo.

A esar elisso, continua a prevalecer aque!e antigo discurso de que 0 traba-\:nifica as pessoas. Chega-se, assim, a urn paradoxo: dizem que se deve;'Ihar, mas, se nao ha mais emprego para todos, 0 que se pode fazee?

'.;.;'

., -', ::',:,-;:\,;,~,,:. '" .. '~.':.~~:';>·r~~~~~:.:'

~\. . ..'..~'"

. lu~a~ d::~~I~riO.~fnlmo real ~.dO,.~IB~~~r:'eaPiJ~"7_1940/2~64," ,

i. ;,:' ,

:ii~6;1Ih<>inia~'til'"'.~<-,'~a do trab.ilho i~[;.antil podeserobse~ada em varios lug.ares do mundo. N..0 Brasil, e,presen,. . ... . . '" '. . . . (.. E d C anra e do",;',,'.-':.' ,.... , ... , .., '. '. ita. regioes.·e.mbo.i-a.'.existam ..leis. como 0 statuto anT.uma constante .em mUI. s . ~. ", .... . . ."I·'··· ...'t EC'A) e 'p'r··o·g'r-amasgovernamentais para toibir essa pratICa.oescen e---, . . . '. ,. , . . I d fe

:iCrians;as e adolescentes,trabalham naagricultura; e~ varios tipos de cultIvo: .avouras e ca ,':-::.:.i' '. " "'1 . °t' -fumo entre Qurras. Tambem trabalham em carvoanas, em pequenas'l-:ue-a<;ocar,.aranJ3, toma e, , '. .' . I d r{idlS; na produ,.ao de tijolos, em pedreiras! em casas, como empregadas domcstI.cas. ~ ~m. e esta

,. eotes rtos Iixoes e nas esqiiinas das gra~de~ cidades ve~d~do ~oces, balas.e qumqUllhana . a'~p·de~obrae explorada are por grandes:mpres;s m~tmaclOnals.

Page 14: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

1. No seculo XIX, a primeira luta dos trabalhadores foi pela extin~ao do trabalho infantil.Pro-curava-se assegurar 11 crian~a os direitos de brincar, estudar e nao ser explorada no trabalho.Por que a explora~ao do trabalho infantil persiste ate os dias de hoje? Sera que a pobrezaextrema obriga a crian~a a trabalhar? Sera que sac os pais que a fon;am a trabalhar. por agudanecessidade?

2. Voce tem alguma sugestao para acabar com 0 trabalho infantil nas diferentes situa~6es apon-tad as?

Em mu~tas p~tes do Br.asil pode-se. encon.trar, ainda, a explor~s:ao do trabalhb es.cr~vo,nas f~rmasas mals crut~ISpossivels. Em seu hvro Fuando fora cia propna sombra: a escravldiiiJpor dlvldd no

Brasil contemporaneo, 0 soci610go Ricardo Rezende Figueira tras:a urn detalhado panorama dessaforma de trabalho nos estados do Para, Piaui, Mato Grosso e Rondonia. Por meio de umapesquisaminuciosa, Figueira demonsrra as razoes que levam as pessoas a procurar rrabalho naqueles estados,o aliciamento pelos empreiteiros com suas promessas, aac;ao dos fiscais e dos fazendeiros, aviolencianormal mente envolvida nas ac;oes. De acordo com esse estudo, os trabalhadores sab mantidosemcativeiro pelo mecanismo da divida eterna, isto e, eles sac obrigados a comprar tudo de que neces~sitam nos barracoes das fazendas, de tal modo que estao sempre devendo ao proprierario no finaldo mes, num processo cumulativo que acaba tornando impossive! a quitac;ao da divida. E 0 que 0auror chama de escravidao por divida.

Apesar de haver legislac;ao espedfica e esforc;os governamentais para impedir esse tipo de siruac;aono pais, empresarios e fazendeiros inescrupulosos urilizam 0 trabalho escravo de modo continuo,principal mente nas regioes Norte e Nordeste do Brasil, contando com a impunidade de seus atos.

j

1. Como vimi's, 0 trabalho escravo prevaleceu no Brasil por mais de 350 anos. Quais sac assemelhan~as e as diferen~as entre 0 trabalho escravo no Brasilcolonial e imperial e 0 trabalhoescravo no Brasilde hoje?

2. Por que a explora~ao do trabalho escravo persiste, apesar de proibida por lei? Sera que osempresarios e fazendeiros que submetem os trabalhadores 11 escravidao por dfvidaainda temuma visao colonial do Brasil?

. . ~ - .'.... __ :.\';-~~.~:.:.

"~~;"'" ';;"';'~---""-'-"""-'-""-'-"-"-''''''''"''='","",-'-'-'~'-'-7~~... :..•<·'if;~;'~"';:~{;'.:i~. A i.ndustria.•fabrica ..mais·e· ..•!.•.....•...•s.pauIO,~Jan'.2006?g~i;ia9,):;A2 .•.......:..••..~.:•••.•.......'...........•......•.. ...:;;f:'.;:~.'-

~..:.(}~~~j~;~:.;./~: .",':.,. .

".':.' ·'.'0:··';'····:.... ;_.~.:..;..

" ~/~>:.:;~';;.. " :~.':".;:'(;;

" .. ,:.;J1.i;:

..,,',:'<~~~~f})~>: :.~.W;acJo~esmaisexpl;radosdo pars.t. ..~iJ1Pteg~ddr, "'':'''-,.

. ,:qb~~CU,.da;~rn9(i~0~aSO~i61?~~' 2,'C5~t~~;;;~ue~b¢~:I~~anteri6;meH¥ ~o~. . >,' .,i .':fp~recida de ~orae~ ~Uva,profes~ora.. '·den\~j~da~:a¢xpIiSci~~~itua:~a()d~scr.lta7' ..:'.:·.,tedaUSP e titular da Uhesp, quer saber '. , ,. .' ...'> ,', <, .•';~de;toc\aessa,p~jan~a,.de)odos esse? . 3.~embriln90-S~,~9,.~~~r:nplodapro:du~aodo

d~~r~~~~~,;~~~~~~~a;~r:,:f!41~?;~~e,30a~os,principalme~i~ na r~giao.Qe presel1te no seu .cpt'9Iano.Apo~~e.nessa:pf~to (SP). . '.' '. . . , .. r~de,,()~~r~bal~~~or~s8u~.P0ss'vel~e,~te,:e t;abalhad~r fica aver 6~~kisbOapart~ desenvoJvem suas a,ivi~ades ern C()n~I~6es'~e~~~faifa:d~~a~te;a':;Jf;~(abrli a[~~;-..'subumanas,cornQ, oScbrt(ld()[es9~~~~a~:, .

¥b)Rormig(jlhas, recebkntk)deR$-2;28~{ 4.Cbmootrabalh·odo c9rtador de~a~ae~~a. .....49ppnoneladadecanacortadaiE,4i~d>a, . relaSlohadd'aseG:cotidianO?' .... ".

" 'Pl\~kb~~i~~~~~:~()NHI!~'M~~ij~'0~!":!\'\.

.,.",:;:.;.'" -

". :~" .!', .'

;rr.:a:.·~..a.••'..,•..p.•.•.-.,d:.rs.•~af::b:.}.tee.•.•.•.'.·."0'.m.:.1.,q\."u~.de:.:.'.;.'.~.~7·.:.·.'.n..·A·,k..6....-.rp;.•.aj:rt.:I:r!.rd~.io.~.msd.la~.'.~n~.:.'o·.~s'.;.'.·,.·•.•.cten~itrt~htosL.):!aaprot~~ao e da~posi~Oe~

~~.maqJinasc~iheitadeir'as, 0 sujeiio. "sociais;'r~vei amilneiracomo se partilha 0 tra-

"d}aniirj~l~c~~:i~~r:b~!:~ar:::s:::;' •·..•··.~~~~~~rad:~e~:~:;o~::.e:a: ~::~~~~~~~~se; enfim, no corpo todo, Na verd~oe; . que 0 tiab~lho continue a exercer a fun 11 d, . d" t f [)' . distrib~i~ao 'das r.iq.LJ.ezasenquanto se r du,morre e es aa, ...

:':' :.: .• , 0 .• , ••• , ";. ::", • ''', "-,

Page 15: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein

de facto, enquanto n6s desejamos a sua re-c1Ul;aoie enquanto 0 progresso tecnico naopare de reduzir seu volume? Sera normalque. a sua fun~ao continue a ser a mesmaquando 0 processode entrada e de safda d?mercado de trabalho nao e nem controladonem regulado, mas resulta das op~6es deactores privados cujo imperativo nao e demaneira nenhuma 0 emprego, mas a pro-d:J'~a90uo seu pr6prio desenvolvimento?Sera legltimo que uma sociedade rica dei-xe assim a reparti~ao do conjunto dos benssociais operar-se de uma maneira "natura''',selvagem e aleat6ria? Esobretudo que se re-cuse a considerar 0 trabalho como um bemextrema mente particular, cuja reparti~ao eflutua~ao devemser reguladas, uma vez quese trata de um bem que da acessoa todos osdemais? Uma sociedade preocupada com 0

seu bem comum ecom a sua coesao socialprocederia, podemos estar certos, de outramaneira. Consideraria 0 trabalho, os rendi-mentos [...] e os beneffcios ate hoje ligadosao trabalho como outros tantos bens quedevem ser repartidos entre os seusmembrose cuja reparti~ao e constitutiva do pr6priobem comum. [...]

Vemos bem que.0 verdadeiro problemade nossas sociedades nao e de maneira ne-nhuma a penuria do trabalho, mas 0 factode nos faltar um "modo de partilha convin-(en!e. •...Esta efectua-se hoje [.,.] "natural-niente",atraves da exclusao do niercadode

')rcibJllho daspesso~smais iqosas ou mais

I \~.~~f':·:~:.

ili'. . .'-',e':fpntradit6riO, muitopelo coritrario; co~ 0

lr,eequiHbrio das nossasactividades entre es-!" feras diferentes, nem com uma redu~ao do

tempo detrabalho. [...] t precisamentepor ser

.fe~;~/~o,d~rTlose"um~l~~~icd'4aconie:dia 'satfrlca,Uintrabalhadpr sofiedentro

··~:t~~~~~~!~:s{veis.D~rititido~af:ibri~3}oprotagiinis~aencontt;l~~~tliraseO~i):g\l;itda~riQtUiJ:lo,.comogar~~m~cantor4l';JJ:i~icasserri~~tido.e c.?~gpr~§ldiario.Q,.fiJ.~~~~nl1rici~:~ihn

"~"dificuldi'dC:s'~rifr~iit~dii$~16 tCab:ilP~dqrna dec~dad~.19~OnosEstados Vniqqse,

"';"~r.~t~,~,~q,",·'~Pi~;.

Page 16: Capitulo 4 O Trabalho Nas Diferentes Sociedades Gilberto Dim en Stein