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Capítulo 6 – Métodos Numéricos de Integração de Órbita
Os métodos de propagação de órbita podem ser classificados em: analítico,
semi-analítico, numérico, e de multi-revolução.
O método analítico é o método mais rápido de propagação de órbita; porém,
oferece poucas opções que possam torná-lo mais genérico. Neste método a derivação
da teoria envolve o uso de aproximações, expansões em séries e integração analítica.
Algumas características para o método analítico são: manipulação algébrica laboriosa
na dedução; modelos simples de forças perturbadoras; fácil visualização dos efeitos
perturbadores, o que permite a compreensão da tendência de evolução dos elementos
orbitais; pouco gasto de tempo computacional; e a órbita propagada num único passo
indiferente ao intervalo de propagação.
O método semi-analítico tenta fazer uso da rapidez computacional da teoria
analítica em conjunto com a precisão e flexibilidade de modelagem no método
numérico. Ele é baseado normalmente na formulação analítica em conjunto com a
assistência de métodos numéricos. Usualmente separa-se o movimento orbital de
longo período e secular pelo método das médias, para perturbações de origem
conservativa; e realiza-se média numérica para outras perturbações, normalmente
dissipativas, através de quadratura.
O método numérico, também chamado de método de perturbação especial, tem
a capacidade de lidar com qualquer tipo de situação com uma precisão arbitrária,
utilizando procedimentos de cálculo passo a passo. Este método é bastante utilizado
quando se requer precisão ou o número de revoluções da órbita a ser integrada é
limitado, porque sua maior desvantagem reside na lentidão do método devido à
sequência de cálculos passo a passo. Basicamente tais métodos tentam fazer
aproximações polinomiais da trajetória e, portanto, integram exatamente um
polinômio de certo grau a menos de erros de discretização.
Os métodos de multi-revolução essencialmente possuem a mesma forma dos
métodos numéricos clássicos; entretanto, devido à natureza periódica do movimento
- 2 -
orbital, consegue- se extrapolar muitas revoluções no processo de integração. Estes
métodos são baseados em aproximações polinomiais e, consequentemente, funções
polinomiais de variável independente discreta são integradas exatamente, a menos dos
erros de truncamento/arredondamento. Este método melhora a precisão para certos
problemas de órbita de satélites.
Existem duas metodologias consagradas entre o método numéricos: o método de
Cowell e o método de Encke que serão descritos brevemente a seguir.
6.1 - Método de Cowell
Uma das grandes vantagens deste método é a rapidez com que a técnica pode
ser usada. A sua vantagem é a simplicidade de formulação e implementação. Consiste
em escrever as equações do movimento do objeto a ser estudado, incluindo todas as
perturbações e então integrá-las passo-a-passo numericamente. As perturbações podem
ser incluídas todas ao mesmo tempo. Este método não requer espaço de
armazenamento nos computadores em relação aos outros métodos.
Entretanto, quando o movimento estiver próximo do corpo central, passos de
integração menores devem ser tomados o que afeta o tempo e erro acumulado do
processo. Quando as perturbações se tomam mais severas, exigem-se passos de
integração menores e mais cálculos, o que implica a provável ocorrência de maior erro
acumulado de discretização. Este método é várias vezes mais lento que o método de
Encke.
Para o problema de 2-corpos com perturbações, as equações seriam:
Pr
r =+ r3
µ&& (6.1)
onde r e v são os vetores posição e velocidade de um satélite com respeito ao corpo
central, µ a constante geo-gravitacional, e P o vetor de acelerações perturbadoras.
Para a integração numérica, a equação (1) pode ser reduzida a equações
diferenciais de 1a ordem:
- 3 -
rPv
vr
3r
µ−=
=
&
&
(6.2)
onde r e v são os vetores posição e velocidade de um satélite com respeito ao corpo
central. Para a equação de integração numérica, elas podem ser expressadas nas
componentes dos vetores:
−=
−=
−=
=
=
=
zr
Pv
yr
Pv
xr
Pv
vz
vy
vx
zz
yy
xx
z
y
x
3
3
3
,
µ
µ
µ
&
&
&
&
&
&
(6.3)
onde 222zyxr ++= .
6.2 - Método de Encke
Mais complexo do que o método de Cowell, o método de Encke realiza uma
integração de Equações Diferenciais Ordinárias (EDO) que é a diferença entre a
aceleração do problema dos 2-corpos, ou da referência adotada, e a aceleração de todas
as perturbações. O método tenta integrar as acelerações menores e, por isso, retem mais
algarismos significativos, enquanto cresce o tamanho do passo de integração.
Esquematicamente as EDOs ficariam na forma:
3
com ,
r
rrr
Pr
µ+≡∆
=∆
&&&&
&&
A vantagem do método de Encke reside no fato de que, como as perturbações
são em geral pequenas, r&&∆ e suas derivadas resultam igualmente pequenas e, em
consequência, é possível o uso de um intervalo (passo) de integração mais amplo do que
no método de Cowell. Nas vizinhanças do pericentro onde os intervalos de integração
têm de ser diminuídos quando se emprega o método de Cowell, o método de Encke
permanece invariável. Porém, cada etapa do método de Encke gasta mais tempo. Da
- 4 -
mesma forma, quando as perturbações se acumulam, r&&∆ contínua crescendo e as
equações podem tomar-se pouco manejáveis, caso em que se deve encontrar um novo
conjunto de elementos mais atualizados, com os quais se deve dar prosseguimento à
integração. Este processo é chamado de retificação. Logo, outro problema é a escolha
do(s) instante(s) de retificação, isto é, quando um novo r&&∆ deve ser inicializado para
recomeçar a integração.
6.3 - Métodos para resolução de Equações diferenciais ordinárias
O método de integração numérica é um dos mais poderosos métodos
conhecidos em mecânica celeste para calcular o movimento de qualquer corpo no
sistema solar em torno do corpo primário.
Os métodos de integração numérica podem ser divididos em métodos de passo
fixo, passos múltiplos (ou multi-passos), e extrapolação. Os métodos de passo fixo não
necessitam informações além das condições iniciais e das derivadas. Os métodos de
passos múltiplos exigem um procedimento de inicialização. Alguns dos métodos de
passo fixo conhecidos são Runge-Kutta, Gill, Euler-Cauchy e Bowie. Alguns dos
métodos de multi-passo são Milne, Adams-Moulton, Gauss-Jackson, Obrechkoff e
Adams-Bashforth.
As equações a serem integradas são Equações Diferenciais Ordinárias (EDOs)
de 1a ordem, com a condição inicial xo em to, ou seja,
),( xfx
tdt
d=
onde x e f são vetores, e f é uma função vetorial de t e x.
6.3.1 - Método de passo fixo “Runge-Kutta”
A técnica aproxima a função de derivadas em série de Taylor para cálculos das
primeiras derivadas em pontos dentro do intervalo de extrapolação. A ordem de um
- 5 -
membro particular da família é a ordem da potência mais alta do tamanho do passo, h,
na expansão da série de Taylor equivalente. A forma genérica do RK é dada por:
∑=
+ +=R
i
iinn w1
1 kxx
onde wi são pesos, R o número de avaliações, de f, e ki são funções dadas por:
++= ∑
−
=
1
1
,i
j
jijnii ahcth kxfk n
com Ric ,,2,1,01 K== . Logo:
( )( )( )
M
23213133
12122
1
,
,
,
kkxfk
kxfk
xfk
aahcth
ahcth
th
nn
nn
nn
+++=
++=
=
Para obter os valores para os parâmetros desconhecidos, expande-se 1+nx em potências
de h de forma a concordar com a solução das EDs até uma ordem específica da série de
Taylor. Assim, nota-se que o número de equações (não-lineares) de condição é menor
que o número de parâmetros desconhecidos. Esta é a razão pela qual existem diferentes
parâmetros para um Runge-Kutta de mesma ordem. Nota-se que os RKs fornecem a
EDO integrada em um passo, sem conhecimento prévio do tipo do problema, e com
avaliações sucessivas da função f dentro do passo de integração. O número de
avaliações depende da ordem do método; em geral, ordens maiores implicam maior
precisão às custas de maior tempo de processamento. Dentre os RKs utilizados em
problemas de mecânica orbital destacam-se os de Fehlberg (1968) e Shanks (1966).
Por exemplo, a formulação para o Runge-Kutta padrão de ordem 4 (RK4) é:
( )43211 226
kkkkxx ++++=+
hnn (6.4)
onde
- 6 -
( )
( )3
2
1
22
22
kxfk
kxfk
kxfk
xfk
4
3
2
1
h,ht
h,h
t
h,h
t
,t
nn
nn
nn
nn
++=
++=
++=
=
O método de Runge-Kutta é estável e não exige um procedimento de
inicialização. Ele é relativamente simples, fácil de implementar, produz um pequeno
erro de truncamento, e o tamanho do passo é fácil de ser mudado. Uma das
desvantagens é que não existe um caminho simples para determinar o erro de
truncamento, logo, é tarefa difícil determinar o tamanho do passo adequado. Uma
característica óbvia é que as informações usadas se referem somente ao passo de
integração atual. A idéia de usar informações de passos anteriores conduz ao método
de multi-passos ou preditor-corretor.
6.3.2 - Método de multi-passos
Os métodos de multi-passos usam informações de intervalos xk, xk-l, xk-2, ... para
calcular xk+1 em tk + h. A interpolação polinomial de Lagrange é utilizada para ajustar
os pontos aos valores correspondentes da função f, e o polinômio resultante é integrado
exatamente, a menos de erros de truncamento e arredondamento. Em geral, eles são
mais rápidos do que o método de passo fixo, embora à custa de maior complexidade e
uma necessidade de um procedimento de inicialização.
6.3.2.1 – Fórmulas de Adams-Bashforth
Alguns métodos calculam um valor predito para 1nx + e então substituem 1nx +
na equação diferencial para obter 1nx +& que é por sua vez usado para calcular uma
valor corrigido de 1nx + . Estes são naturalmente chamados de métodos do tipo
- 7 -
"preditor-corretor". As fórmulas de Adams são as mais utilizadas tradicionalmente em
métodos de multi-passos, principalmente quando a avaliação da função de derivadas f
é dispendiosa. Por exemplo, a fórmula de Adams-Bashforth, para integração de
EDOs, de ordem N em xn usando polinômios de grau k-1, interpolando via Lagrange a
função f calculado nos k pontos precedentes, é:
∑=
+ ∇+=N
k
n
k
knn h0
1 fxx α (6.5)
onde N é o número de termos desejados, h é o tamanho do passo, n é o número do passo
atual, α = 1, 1/2, 5/12, 3/8, 251/720, 95/288, 5,0 K=k , e
),(
0
111
nnn
nn
n
k
n
k
n
k
t xff
ff
fff
≡
≡∇
∇−∇≡∇ −−−
Os poucos primeiros passos são dados por:
nnn h fxx
∇+∇+∇+∇+∇++=+
54321 288
95
720
251
8
3
12
5
2
11
O método permite diminuir ou dobrar o tamanho do passo sem uma reinicialização
completa. Também o erro de truncamento pode ser avaliado.
6.3.2.2 – Fórmulas de Adams-Moulton
As fórmulas de Adams-Bashforth são um esquema de predição do método de
multipassos. Moulton adicionou uma fórmula de correção para o método. As fórmulas
de ordem k em xk usam o polinômio de grau k-1 , que interpola até a k-ésima derivada.
A fórmula em geral é dada por:
- 8 -
∑=
−++ ∇+=N
k
kn
k
knn h0
1*
1 fxx α (6.6)
Nota-se que é necessário uma estimativa de 1+nx para poder calcular o
polinômio interpolante, uma vez que 1+nf é também função de 1+nx . Poder-se-ia então
iterar 1+nx sucessivamente até se obter a convergência desta equação não-linear. A
maior complexidade computacional é tolerada porque estas fórmulas levam a
resultados mais precisos devido ao uso de um polinômio interpolante mais adequado.
6.3.2.3 – Preditor-Corretor
Uma fórmula que fornece a primeira aproximação para 1+nx é chamada de
preditor. Se o preditor é suficientemente acurado, pode ser desnecessário aplicar a
fórmula de correção de Moulton mais de uma vez. Por essa razão a fórmula de Adams-
Bashforth é recomendada para a composição de um preditor-corretor em conexão com
o método de Adams-Moulton. Neste caso, a fórmula para o preditor é
( )5321
)(
720
2519375955
24 dt
xdh
hnnnnn
ξ55p
1n ffffxx +−+−+= −−−+ (6.7)
e para o corretor é
( )5211
)(
720
195199
24 dt
xdh
hnnnnn
ξ55c
1n ffffxx ++−++= −−++ (6.8)
onde o último termo em cada uma das equações é o termo do erro truncamento. Na
equação (6.8), 1+nf é encontrado através do valor predito p
n 1+x :
( )p
nnn t 111 , +++ = xff
Para usar qualquer esquema de preditor-corretor, o valor predito é calculado
primeiro. Então, a derivada correspondente para o valor predito é encontrado e usado
para encontrar o valor corrigido usando a fórmula do corretor. É possível iterar a
- 9 -
fórmula do corretor até que não exista nenhuma mudança significativa em 1+nx nas
iterações sucessivas. O tamanho do passo pode ser mudado se o erro de truncamento
for maior do que o desejado. Este método, como outros métodos de multi-passos, exige
um método de passo fixo para iniciá-lo para obter K,, 1−nn ff etc. O método de Runge-
Kutta é normalmente sugerido como o inicializador. Desse modo, para métodos de
multi-passos de ordem N, requer-se uma tabela de N+1 avaliação das derivadas. Para
manter consistência, aplicam-se métodos de passo simples de ordem maior que ou igual
à ordem N, de modo que, se h é o passo, o erro local por passo ( )1+Ο Nh é o mesmo em
ambos os métodos.
A formulação Adams-Basforth-Moulton é geralmente o método de integração
multi-passos mais usado. Os métodos de multi-passos são frequentemente referidos
como métodos preditores-corretores.
6.3.2 - Método de extrapolação
Os métodos de extrapolação usam primeiramente um método de passo fixo com
vários comprimentos de passo para obter uma primeira aproximação e, em seguida,
através de uma extrapolação polinomial ou racional desses valores, calculam o estado
integrado. A essência do método é baseada na extrapolação de Richardson. A idéia é
simples; seja a expansão assintótica:
L+++= 221)( hAhAAhA o
Então as soluções para diversos passos h pode ser obtida por:
1/
)(11
111
−
−+=
=
+
−−+−
+
sms
m
s
m
sm
s
m
s
s
o
s
hh
xxxx
hAx
onde x é o valor extrapolado, o índice s se refere ao passo, e o índice superior m se
refere à extrapolação. Um exemplo simples seria:
)(2/)2/()(
)()(2
111
21
oooo
o
oooo
o
o
hhAAhAhAx
hhAAhAx
Ο++===
Ο++==
- 10 -
Nota-se que A( ho) e A(h1) contêm o erro de 1a ordem. Aplicando a equação de
extrapolação dada, fica:
[ ] [ ])(
)()(2/2
21/
)(
2
21
21
11
11
1
oo
oooooo
o
o
o
o
o
o
o
o
o
o
o
o
hA
hhAAhhAA
xxhh
xxxx
hAx
Ο+=
Ο++−Ο++=
−=−
−+=
=
e o termo de 1a ordem foi eliminado. Aplicando sucessivamente a fórmula de
extrapolação às várias sequências de passos hs, os termos principais de erros vão sendo
sucessivamente eliminados. Esta é a forma da extrapolação polinomial. Outra variante
se refere à chamada extrapolação racional, conforme descrita em Bulirsh e Stoer (1966).
Em geral, quando a avaliação das derivadas f não é muito dispendiosa, o melhor
método é o de extrapolação. Os custo de computação são menores para este método,
porém o método preditor-corretor requer, em geral, consideravelmente menor número
de avaliações das f.
6.4 - Formulações da equações diferenciais do movimento orbital
As equações que descrevem o movimento de um satélite sujeito ao campo
gravitacional terrestre são genericamente dadas por:
∂
∂−+=
rP
rr
3
U
r-µ&& (6.9)
onde P é o vetor que representa as perturbações orbitais dissipativas, e r∂∂ /U é o
gradiente dos potenciais perturbadores de origem conservativa.
Para um órbita puramente kepleriana, as equações do movimento seriam:
3
rr
r-µ=&& (6.10)
- 11 -
Quando a magnitude das perturbações é suficientemente forte para desviar
consideravelmente o movimento kepleriano ou as órbitas são muito excêntricas, as
equações diferenciais podem tornar-se difíceis de lidar devido à não-regularidade,
instabilidade e mesmo descontinuidades. Para contornar tais situações, pode-se utilizar
formulações das equações diferenciais que permitem adequar o tamanho do passo de
integração de forma analítica, por exemplo, no caso de se utilizar um sistema com o
tempo transformado, ou ainda, na utilização de sistemas estabilizados e regularizados ou
um sistema unificado, como se verá em seguida.
6.4.1 - Sistema convencional ou Newtoniano
As equações diferenciais para o sistema convencional são dadas pela Equação
6.9. As perturbações podem ser explicitadas via:
outrasalbedoprsdarrastomarésLuaSoltesseraiszonaisr
- PPPPPPPPr
r3
++++++++= −µ&&
como foi visto anteriormente, onde as 4 primeiras perturbações são de natureza
conservativa, e as 3 seguintes são dissipativas.
6.4.2 - Transformação do tempo
Em órbitas excêntricas, na região próxima ao perigeu a velocidade do satélite é
maior, e menor na região próxima ao apogeu; isto faz com que um comprimento fixo do
passo não divida a órbita em comprimentos iguais de arco quando a variável
independente é o tempo físico. Os diferentes comprimentos de arco tomados ao longo
de uma revolução elevam o nível dos erros obtidos ao término da propagação.
Entretanto, uma regulagem analítica do comprimento de arco pode ser feita, através de
uma transformação de tempo, ou seja, transforma-se a variável independente do sistema.
tempo fisico t, escrevendo-se um novo sistema equivalente ao primeiro com uma
- 12 -
variável independente s, conhecido como o tempo fictício. Esta transformação é
conhecida como transformação de Sundman; isto é:
dsgdt )(r= (6.11)
onde normalmente a função )(rg é da forma αrcg =)(r . A seguir é apresentada uma
tabela para várias transformações de tempo.
Tabela 6.1: Transformações do tempo
α c s corresponde a
0 1 tempo físico
1 µ/a anomalia excêntrica
3/2 ∫ −π
πµ0
2/1)cos1(/ dEEeanomalia intermediária
2 )1(/1 2ea −µ anomalia verdadeira
Assumiremos a transformação α = 1 e c = 1, ou seja, dsrdt = , onde s é
praticamente a anomalia excêntrica a menos de um fator de escala. Define-se então o
operador:
ds
d
rdt
d 1=
Logo, a transformação da formulação convencional nas equações diferenciais para uma
nova variável independente s é dada por:
=
=
ds
d
rdt
d
dt
d
ds
d
rdt
d
rr
rr
1
1
2
2
- 13 -
Aplicando o operador novamente, chega-se a:
−−=
=
2
2
22
2 '111
ds
d
ds
d
r
r
rds
d
rds
d
rdt
d rrrr
com ds
drr =' . Logo,
−−=
∂
∂−+−
2
2
23
'1
ds
d
ds
d
r
r
r
U
r
rr
rPr
µ
Reagrupando os termos, temos:
∂
∂−+
−==
rPr
rr
r Ur
ds
dr
rds
d 22
2
'1
" µ (6.12)
onde )",","(" zyx=r . O símbolo ' representa a derivada com respeito ao tempo fictício
s. Há entretanto a necessidade de se parar a integração em um determinado tempo
físico forçando assim o acréscimo de uma nova equação diferencial ao sistema:
rt =' (6.13)
As equações 6.12 e 6.13 mostram que, após a transformação de tempo, o sistema
passou a ser de sétima ordem, o que aumentará um pouco o tempo de processamento
na integração numérica. Porém, esse acréscimo no tempo de processamento é
compensado pelo expressivo ganho na precisão, devido à característica de regulagem
analítica de passo desse sistema de equações diferenciais.
6.4.3 - Estabilização
O sistema de equações diferenciais orbitais possui comportamento instável
segundo Liapunov. Tal instabilidade pode aumentar os erros globais em uma
propagação orbital, ou até tornar a solução divergente, quando se trabalha com órbitas
de alta excentricidade e com um tamanho de passo de integração considerado pequeno.
Para uma órbita circular de referência, tomando um raio, r2, levemente diferente
do raio de referência, r1, a diferença entre os ângulos polares formados pelos 2 raios ao
- 14 -
longo do tempo não se mantém limitada e tão pequena quanto se queria. De fato, pelas
leis de Kepler sobre a proporcionalidade entre períodos e áreas percorridos, uma vez
que os raios orbitais são diferentes é de esperar que em algum instante os ângulos
polares difiram de até 180°, ficando diametralmente opostos. Portanto não se mantém a
diferença entre ângulos tão pequena quando a desejada e em consequência, as equações
do movimento orbital são instáveis pelo conceito de Liapunov.
Em suma, a estabilidade segundo Liapunov é dada por:
Para algum 0>δ existe um 0>ε tal que:
εθθδ <−⇒<− )()( 2121 ttrr
para todo 0≥t .
Como a velocidade angular orbital depende do raio, o valor absoluto da
diferença dos ângulos tende a crescer no tempo, fato que caracteriza o sistema do
movimento kepleriano circular de Liapunov-instável.
Entretanto, a energia total é uma integral do movimento devido à natureza
conservativa do potencial gravitacional. Assim, imagina-se que um efeito estabilizante
poderia ser adicionado se a solução fosse vinculada para permanecer sobre a superfície
de energia constante. Isto pode ser simplesmente obtido ao introduzir um termo de
controle, em essência a energia, nas equações do movimento, as quais, em
consequência, tenderiam a manter a solução na vizinhança da integral do movimento.
Baumgarte (1972) retrata claramente em seu artigo os efeitos estabilizadores,
principalmente ao se trabalhar com órbitas altamente excêntricas (e > 0.8). Em seus
testes, Baumgarte usa a transformação de tempo dsrdt = em conjunto com o
procedimento de estabilização.
O princípio do método de estabilização caracteriza-se pela inclusão da equação
de energia total na equação da dinâmica do movimento perturbado tendo o tempo
fictício como variável independente.
- 15 -
A equação diferencial para transformação de tempo efetuada é dada pela Equação
6.12. A energia total do movimento é dada por:
02
1 2 =++− HUr
rµ
& (6.14)
sendo H o negativo da energia mecânica total. A equação da energia escrita em função
do tempo fictício s fica na forma:
0)'(
2
12
2
=++− HUrr
r µ(6.15)
Por ser nula, a Equação 6.15 multiplicada pelo vetor posição r e por uma constante w
pode ser introduzida na Equação 6.12 sem alterá-la:
( )
∂
∂−+
++−−−=
rPrrr'r
UrHU
rr
rwr
r
222
)'(2
1'
1"
µµ
Considerando 1=w (condição de estabilidade ), a Equação reduz-se a forma:
∂
∂−+
++−=
rPrr'r
UrHUr
rr
r
222
)'(2
1'
1" (6.16)
O sistema estabilizado possui o tempo fictício como variável independente e há
obviamente a necessidade de parar a integração em um tempo físico qualquer. Com
isso, toma-se necessária a integração da equação base da transformação do tempo:
rt ='
Observa-se também que a energia total do movimento passou a ser uma coordenada
generalizada do sistema, sendo variável no caso se existirem perturbações de natureza
não conservativa. Neste caso, há portanto a necessidade de se integrar a derivada da
equação da energia a fim de avaliá-la em cada passo de integração. A equação da
energia a ser integrada é dada por:
rP ⋅−='H (6.17)
Para se propagar o sistema estabilizado, é necessário que se integre as equações 6.16,
6.17 e 6.13. O sistema passa a ter 8 equações diferenciais de primeira ordem.
- 16 -
6.4.4 - Regularização
A regularização tem como objetivo tomar regular o sistema de equações
diferenciais do movimento orbital, eliminando a singularidade do mesmo na origem do
sistema de referência.
Basicamente tenta-se transformar o sistema em equações do tipo oscilador
harmônico cuja formulação é regular e se mantém válida mesmo para raios pequenos r
(colisão, ponto de singularidade). Desde que o conjunto de equações diferenciais do
oscilador harmônico é Liapunov-estável e apresenta, portanto, propriedades de
estabilidade e regularidade, algum tipo de transformação deve ser necessária para
alcançar formulação semelhante.
Um dos método de regularização é a chamada transformação KS
(Kustaanheimo-Stiefel). Este método propõe uma matriz de transformação em 4
dimensões, a matriz KS:
−−
−−
−−
=
1234
2143
3412
4321
)(
uuuu
uuuu
uuuu
uuuu
L u (6.18)
Com a transformação através da matriz KS, o espaço físico é mapeado para um espaço
de 4 dimensões, através da transformação:
=
4
3
2
1
3
2
1
)(
0 u
u
u
u
Lx
x
x
u (6.19)
Como consequência tem-se as equações:
- 17 -
)(2
)(2
42313
43212
24
23
22
211
uuuux
uuuux
uuuux
+=
−=
+−−=
(6.20)
As coordenadas dos espaços físico e paramétrico em 4 dimensões estão dispostas nos
respectivos vetores posições:
( )
( )T
T
uuuu
xxx
4321
321
=
=
u
r
A transformação possui então a forma compacta:
uur )(L=
É interessante observar que a matriz KS tem as seguintes propriedades:
1. Ortogonalidade: ( )[ ] [ ]11)()()()( rLLLL TT =⋅== uuuuuu
2. )()(' uu LL =
Após a regularização, o sistema de equações diferenciais orbitais assume a forma:
( )
( )rt
LH
)(LU
UH
T
T
=
⋅−=
+
∂
∂−++−=
'
')(2'
2
1
22
1"
2
uPu
Puu
uuu
(6.21)
onde H' é o negativo da energia total do movimento A energia total passou a ser uma
coordenada generalizada do sistema regularizado A variável independente do sistema
regularizado é o tempo fictício. A conhecida necessidade de se parar a integração em
um tempo físico final desejado obriga a integração da equação da derivada do tempo
físico em relação ao fictício, fazendo com que o tempo físico passe a ser uma
coordenada generalizada do sistema. Então, o sistema tem agora 10 equações
diferenciais de 1a ordem.
- 18 -
Considerando
+−
+−−
++−
++
=
322314
312413
342112
332211
)(
PuPuPu
PuPuPu
PuPuPu
PuPuPu
LT Pu
Os valores iniciais dos vetores u e u’ devem ser obtidos a partir dos vetores
posição e velocidade física r e r& no tempo físico inicial.
Das equações 6.20 e considerando que
24
23
22
21 uuuur +++=⋅== uur
pode-se escrever
( ) rxuu +=+ 124
212
uma vez que 1x e r são conhecidos, atribui-se um valor para 1u por exemplo,
encontrando-se consequentemente 4u .
As outras coordenadas do espaço paramétrico são obtidas de
rx
uxuxu
rx
uxuxu
+
−=
+
+=
1
42133
1
43122
Uma vez determinado o vetor posição inicial u, determina-se o vetor velocidade inicial
da seguinte forma:
')()(2')( uuuru LLL TT =
- 19 -
ou ainda,
')(Lr
')(L' TT ruruu
u2
1
2
12
==
Como 'r inicial é conhecido, 'u inicial também será conhecido .
6.4.5 – Sistema Unificado
O sistema unificado é um sistema regularizado mas não regulariza
analiticamente o tamanho do passo como os outros sistemas apresentados.
Os estudos de Altman (1972) sobe a teoria hodográfica (a hodógrafa de um vetor
é a trajetória produzida por sua derivada primeira; no espaço de velocidades, a
hodógrafa é um instrumento que facilita a visualização da aceleração) criaram um
método dinâmico que acoplou de forma genérica os dois tipos de movimento (dinâmica
de atitude e dinâmica de órbita). Este modelo unificado de estados, foi desenvolvido
para usar variáveis de estado e de coordenadas, cujas equações definem vínculos
dinâmicos que possuem propriedades atraentes para eficiência computacional. As
variáveis de estado são momentos (uma forma direta para a atitude e de forma
paramétrica para a órbita) e as variáveis de coordenadas são os parâmetros de Euler, que
representam as transformações de rotação dos eixos de referência. As variáveis de
estado e de coordenadas definem a dinâmica de trajetória e de atitude de forma simples,
comum e bem comportada, possibilitando o processamento separado de 2 conjuntos de
dados, um para a atitude e outro para a órbita, com o uso comum de várias funções
lógicas. No modelo unificado, os paramêtros utilizados são regularizados.
As equações da dinâmica da trajetória orbital são:
+
+−
−
=
3
2
1
2
1
0cos)1(sen
0sen)1(cos
00
e
e
e
f
f
a
a
a
p
p
p
R
R
C
dt
d
γγ
γγ
- 20 -
para os parâmetros hodográficos da órbita, onde a variável R foi decomposta em 2
componentes )( 21 ff RR no plano orbital instantâneo com 1fR ao longo do eixo x e
2fR normal a 1fR . Os parâmetros R e C representam, respectivamente, o raio e a
distância à origem. O significado físico dos parâmetros estão associados com o
momento angular e com a energia cinética. E para os quatérnions, tem-se
−−
−
−=
04
03
02
01
31
31
13
13
04
03
02
01
00
00
00
00
2
1
e
e
e
e
ww
ww
ww
ww
e
e
e
e
dt
d
Juntamente com as seguintes relações auxiliares:
2eV
Cp =
−+
=
2
1
2
1
cossen
sencos0
f
f
e
e
R
R
CV
V
γγ
γγ
−+=
203
204
0403
204
203
21
cos
sen
ee
ee
eeγ
γ
ωχγ +=
2
31
e
e
V
aw =
µ2
3eCV
w =
- 21 -
[ ] ∑=
= i
e
e
e
a
a
a
a
3
2
1
a
onde o vetor a representa o vetor aceleração e ∑ é o somatório das acelerações
perturbadoras. O sub-índices "0" signíficam orbital, os "ei" indicam as direções 1 radial,
2 transversal, e 3 normal. Os 1eV e 2eV são as velocidades radial e tangencial.
Problemas
1 – Considere a transformação dsrdt = . Prove que 2/1)/(2 µπ as = , quando o tempocorresponde ao período orbital no movimento kepleriano; onde a é o semi-eixo maior, eµ é a constante geo-gravitacional.
2 – Considere os seguintes elementos orbitais:
a = 34869261me = 0.8i = 15°Ω = 45°ω = 30°M = 0°
e as constantes 2314 /sm109860064.3 ×=µ , raio da Terra R = 6378139m.
a) Achar a energia do movimento kepleriano,b) Achar as variáveis u e u’ da transformação KS correspondentes à posição e
velocidade,c) Achar a EDO da energia em termos das variáveis u,d) Achar o valor do passo s∆ correspondente a T/20, onde T é o período
orbital. Assuma movimento kepleriano puro.
3 - Escrever as EDOs de primeira ordem do movimento orbital para os sistemasconvencional, transformado, estabilizado e regularizado KS. Assuma transformação
dsrdt = . Em seguida, simplificá-las para o movimento kepleriano puro.
- 22 -
Dica: Para aqueles que não se lembram mais como realizar a transformação deelementos keplerianos para posição e velocidade, as coordenadas de posição evelocidade correspondentes aos elementos keplerianos acima são:
x = 1888980.04103698my = 6652209.67475597mz = 902482.883545056mvx = -9585.79511076297m/svy = 2413.57051166562m/svx = 2273.50409709003m/s
4 - Para os mesmos elementos orbitais anteriores, integrar numericamente a órbita, emprecisão dupla, para um período orbital T, considerando o movimento kepleriano. Usarum integrador Runge-Kutta de 4a ordem com passo fixo T/20, ou o equivalente notempo fictício, para os seguintes casos:
e) Sistema convencional,f) Sistema transformado,g) Sistema estabilizado,h) Sistema regularizado KS.
Montar uma tabela de erros comparativos de posição e velocidade em relação à soluçãoexata (analítica). Considere ),,( aaaa zyx=r e ),,( aaaa zyx &&&=v a solução analítica; e
),,( nnnn zyx=r e ),,( nnnn zyx &&&=v . Calcule os erros da seguinte forma:
Erro em posição = na rr −
Erro em velocidade = na vv −
Referências
Altman, S.P., “A unified state model of orbital trajectory and attitude dynamics,”
Celestial Mechanics, No. 6, 1972, pp. 425-446.
Fehlberg, E. Classical fifth, sixth, seventh, and eigth-order Runge-Kutta formulas with
stepsize control. Washington, DC, NASA 1968 (Nasa Technical Report R-287).
- 23 -
Shanks, E.B. Solutions of differential equations by evaluation of functions.
Mathematics of Computation, 20(93): 1-38, 1966.
Liu, 1974
Liu, 1983
Kolvalevsky, 1967
Kaula, 1966
Pines 1973
Cunningham, 1969
Heiskanen, W. A.; Moritz, H. Physical Geodesy, 1967
Silva, W. C. C.; Ferreira, L. D. D. Satélite artificial – movimento orbital. São José dos
Campos, INPE, XXXX (INPE-3163-RPE/458)
Kondapalli, R. R. Um estudo dos métodos de perturbação na determinação de órbita de
satélites artificiais de baixa altitude. São José dos Campos, INPE, XXXX (INPE-3781-
RPI/151).
Wylie, C. R. Advanced engineering mathematics. 1975.
Kuga, H. K.; Medeiros,V. M.; Carrara, V. Cálculo recursivo da aceleração do
geopotencial. São José dos Campos, INPE, maio de 1983 (INPE-2735-RPE/433).