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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq - Fundação Araucária - UEM DEPARTAMENTO DE LETRAS ORIENTADOR: Prof. Dr. Renilson José Menegassi Bolsista: Débora Sodré Esper Caracterizando os processos de revisão e reescrita no Ensino Fundamental I Maringá, 31 de agosto de 2011.

Caracterizando os processos de revisão e reescrita no ... · no Ensino Fundamental I Maringá, ... como as propostas oferecidas pelos PCNs e DCEs- PR. ... 5 1. Introdução

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq - Fundação Araucária - UEM DEPARTAMENTO DE LETRAS ORIENTADOR: Prof. Dr. Renilson José Menegassi Bolsista: Débora Sodré Esper

Caracterizando os processos de revisão e reescrita

no Ensino Fundamental I

Maringá, 31 de agosto de 2011.

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PIBIC/CNPq - Fundação Araucária - UEM DEPARTAMENTO DE LETRAS ORIENTADOR: Prof. Dr. Renilson José Menegassi Bolsista: Débora Sodré Esper

Caracterizando os processos de revisão e reescrita

no Ensino Fundamental I

Relatório contendo os resultados finais do Projeto de Iniciação Científica vinculado ao PIBIC/CNPq- Fundação Araucária – UEM, desenvolvido no projeto de pesquisa “Manifestações de constituição da escrita na formação docente”.

Maringá, 31 de agosto de 2011.

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RESUMO

Neste trabalho, cujo desenvolvimento ocorre junto ao Grupo de Pesquisa “Interação e Escrita”

(UEM/CNPq), procuramos analisar como os processos de revisão e reescrita se constituem no

4º e 5º ano do Ensino Fundamental I, a fim de contribuir para a melhoria do ensino de

produção textual. Para isso, tivemos como base teórica de autores engajados no

desenvolvimento da aprendizagem de produção textual, dentro da visão interacionista, bem

como as propostas oferecidas pelos PCNs e DCEs- PR. Tivemos como objeto de análise

cinquenta e quatro textos produzidos por alunos de duas salas – 4º e 5º ano do Ensino

Fundamental I –, dos quais se investigou as intervenções efetuadas pelos professores durante

a revisão, bem como a reescrita realizada pelos alunos após os apontamentos, ou seja, a sua

resposta ao trabalho do professor. Os resultados mostraram que os processos de revisão e

reescrita mostram-se essenciais para o desenvolvimento da escrita e do aluno como

sujeito/escritor, consciente de sua participação no processo de aquisição e aprimoramento da

escrita. Dentre todos os tipos de revisão, percebeu-se que a textual-interativa destaca-se por

contribuir de forma mais efetiva para esses resultados.

Palavras chaves: escrita, revisão, reescrita, Ensino Fundamental.

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SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................05

2. REVISÃO TEÓRICA ........................................................................................... 07

2.1. As concepções de escrita..................................................................................06

2.1.1. A escrita como dom ..............................................................................08

2.1.2. A escrita como consequência...............................................................09

2.1.3. A escrita como trabalho....................................................................... 10

2.2. Os processos de revisão e reescrita................................................................. 14

2.2.1. A revisão e a reescrita na escola........................................................... 19

3. REGISTROS DE ANÁLISE.................................................................................. 29

3.1. Passos metodológicos...................................................................................... 31

3.2. Dados quantitativos......................................................................................... 32

3.3. Quanto ao local dos apontamentos.................................................................. 35

3.4. Quanto aos tipos revisão.................................................................................. 38

3.4.1. Revisão resolutiva................................................................................. 38

3.4.2. Revisão textual-interativa..................................................................... 43

3.4.3. Revisão indicativa................................................................................. 49

3.4.4. Revisão classificatória........................................................................... 51

3.5. Pontos não cobrados na 1ª versão e cobrados na reescrita.............................. 54

3.6. Revisões além da 1ª versão do texto................................................................ 55

3.7. Casos especiais............................................................................................... 56

3.8. Operações linguísticas.................................................................................... 59

3.8.1. Acréscimo............................................................................................. 59

3.8.2. Substituição........................................................................................... 62

3.8.3. Supressão............................................................................................... 64

3.8.4. Deslocamento........................................................................................ 66

3.9. Resultado das análises dos registros................................................................. 67

4. CONCLUSÃO......................................................................................................... 70

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 73

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1. Introdução

Os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (PCNs), documento que

serve como orientação para os professores de Língua Portuguesa no país, trazem, referente ao

ensino de produção textual, que esse trabalho deve ter como finalidade “formar escritores

competentes e capazes de produzir textos coerentes, coesos e eficazes” (BRASIL, 1997, p.

47). Para tanto, ainda segundo os PCNs, é necessário que o escritor saiba enquadrar seu texto

ao gênero adequado, conforme suas finalidades e que consiga entender o produto escrito

como algo passível de análise, sendo sujeito a revisões e reescritas, sempre que for necessário,

com o propósito de deixar seu texto mais inteligível para o seu leitor.

Dessa forma, a prática de produção de texto é compreendida como um trabalho

progressivo, na qual, em ambiente escolar, o professor assume um papel extremamente

importante, pois, por meio de diversos recursos, além de fornecer preparação prévia para a

atividade escrita, pode auxiliar o aluno durante o processo de revisão e rescrita, através de

intervenções realizadas no seu texto. Porém, esses comentários podem, ao invés de ajudar,

prejudicar o desenvolvimento do produto escrito, dependendo da metodologia utilizada pelo

docente. O que se percebe é que muitos professores não assumem a tarefa de revisão textual

com a responsabilidade necessária, efetuando revisões confusas e superficiais, além de não

incentivar a reescrita em todas as produções, o que acaba sendo extremamente preocupante,

tendo vista que essas são as etapas mais importantes no processo de produção, pois não só

conduz à melhoria do produto, mas, faz com que ele reflita mais profundamente a respeito da

sua escrita. Frente a essa situação, o aluno, não se sente chamado a tomar o texto como

processo. Cria-se, assim, um ciclo vicioso no qual o maior perdedor é o discente, que

permanece, muitas vezes, anos sem verdadeiramente aprimorar a linguagem escrita,

carregando a ideia de que não sabe escrever.

Em decorrência disso, essa pesquisa tem como objetivo geral compreender como os

processos de revisão e reescrita se constituem no trabalho de produção textual no Ensino

Fundamental I. Os objetivos específicos são: a) analisar e caracterizar as revisões efetuadas

pelos professores em textos de alunos de uma turma do 4º e outra do 5º ano do Ensino

Fundamental I; b) investigar qual é a influência que tais apontamentos tem e de que forma

refletem na reescrita do texto; c) analisar e caracterizar de que forma se constituiu a resposta

do aluno à revisão do professor; d) identificar quais comentários permitem um maior

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desenvolvimento da escrita do aluno; e) traçar um perfil sobre as etapas de revisão e reescrita

nas séries analisadas.

O material de análise é composto por 54 textos de alunos dos 4º e 5º anos do Ensino

Fundamental I de uma escola privada da cidade de Maringá.

Embora tenhamos utilizado dados quantitativos como forma de auxiliar na

interpretação dos registros, essa pesquisa adota a natureza qualitativa, uma vez que visa não

só a simples coleta e descrição dos registros, mas, principalmente, uma análise interpretativa.

Assim, após a escolha do material, o primeiro passo foi descrever e analisar os registros

levantando as suas características. Em seguida, foram investigadas as interferências feitas

pelos educadores nos textos durante a revisão e as influências que esses apontamentos tiveram

na reescrita realizada pelo estudante.

Com o término da pesquisa, podemos concluir que a escolha, por parte do professor,

do tipo de revisão e a forma como ela é aplicada interferem em muito nas reescritas dos textos

realizadas pelos alunos

Para uma melhor organização do relatório, ele foi dividido em três partes:

a) Na primeira parte encontra-se a revisão teórica que se fundamenta, entre outros

autores, em Bakhtin/Volochinov (2009) e Bakhtin (2003) no que refere ao

interacionismo; em Menegassi (1998), Garcez (1998), Grillo (1995) e Jesus (2001)

sobre os processos de revisão e reescrita, e em Ruiz (2010) e Serafini (1989) a respeito

dos tipos de revisão;

b) A segunda parte do relatório expõe os passos metodológicos tomados, a forma como

se deu a obtenção dos registros e as suas análises quantitativas e qualitativas;

c) Na terceira e última parte, temos os resultados encontrados e a conclusão a que se

chegou após a análise.

Pesquisas sobre a constituição dos processos de revisão e reescrita mostram-se

essencialmente importantes uma vez que servem como apoio para o trabalho dos professores

no ensino de produção textual. Espera-se, portanto, que possamos contribuir para a formação

de bons escritores, competentes e conscientes de seu processo de aprendizagem da linguagem

escrita.

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1. Revisão teórica

Mesmo tendo o domínio da língua falada, o que já permitia a comunicação entre os

indivíduos, foi o desenvolvimento da escrita que trouxe à humanidade a oportunidade de

diminuir as distâncias, transmitir e perpetuar todos os acontecimentos de cada época. Por

meio dela, o homem pode registrar sua história, seus sentimentos e tantas descobertas

importantes.

Essa linguagem, que no início era expressa por representações pictóricas e

ideogramas, aos poucos foi evoluindo e tornando-se cada vez mais essencial para o ser

humano. Hoje em dia, crianças que mal sabem falar já tentam expressar-se de forma escrita

por meio de rabiscos ou desenhos, na tentativa de também participarem desse universo, que

parece ser enigmático para os que não o dominam.

Porém, ainda que o desejo de aprender a escrever seja intrínseco a todos, percebemos

que, mesmo passado tantos séculos após seu surgimento, o ato de escrever, para muitas

pessoas, é visto como um dom destinado a poucos. Podemos pensar que essa ideia exista

devido ao acesso restrito que se tinha à educação até anos atrás. Mas, nos dias atuais,

praticamente todos os cidadãos têm a oportunidade de serem alfabetizados. Então, por que

muitos têm verdadeiro pavor quando precisam escrever um texto? Por que a palavra

“redação” faz com que estudantes, mesmo os que concluíram o Ensino Médio, sintam-se

despreparados? Sendo a escola grande responsável pelo ensino da escrita, só podemos

acreditar que o problema está nas metodologias utilizadas para a escrita ou no despreparo dos

educadores ou, até mesmo, que os dois aspectos devem ser revistos.

Preocupada também com essa realidade, Garcez (1998), após pesquisas referentes à

produção textual, constatou que cerca de sessenta por cento dos alunos entrevistados em suas

análises consideram a sua relação pessoal com a escrita péssima ou ruim, apontando como as

possíveis causas dessa situação, além dos problemas com a gramática, a falta de informação e

leitura, e a baixa experiência com esse trabalho devido a pouca solicitação de produção

textual na escola.

Esse índice tão elevado é uma das razões que levam vários autores, dentro da área de

Língua Portuguesa, a buscar alternativas para, se não resolver, pelo menos amenizar tal

dilema por meio de estudos a respeito de como o processo de aprendizagem da escrita é

concebido nas instituições de ensino, e qual a influência dessas metodologias sobre o

procedimento utilizado pelo aluno durante a produção escrita. Dentre os que se destacam, está

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Sercundes (1997), que após análises sobre as práticas de escrita realizadas em sala de aula,

explica que este processo pode ser concebido sob a perspectiva de três concepções de escrita

diferentes que, consequentemente, se determinam conforme a concepção de linguagem

adotada, são elas: a escrita como dom, como consequência e como trabalho.

2.1. As concepções de escrita

2.1.1. Escrita como dom

Para Sercundes, nesta concepção, “a produção textual é totalmente desvinculada do

trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor, sem nenhuma ligação com o trabalho

anterior ou posterior” (1997, p. 75). Em pesquisa sobre a metodologia escolar que leva os

estudantes à produção de texto, a autora traz um exemplo de atividade realizada, segundo essa

concepção:

A professora de Português da sétima série da escola L, estadual não padrão, solicitou aos alunos que elaborassem um texto sobre a “Eco 92 - O Planeta do Futuro”, a fim de participarem espontaneamente de um concurso. Recolhidos os trabalhos, ela escolheu alguns e os enviou aos responsáveis pelo evento. […]. Não houve orientações para o desenvolvimento desse trabalho ou discussão do tema. A escola, na verdade, supõe um conhecimento prévio do aluno, por estar o tema circulando no mundo social brasileiro, já que o evento foi sediado no Rio de Janeiro (SERCUNDES, 1997, p. 76).

Como se pode observar, a atividade proposta é realizada totalmente de forma isolada.

Não existe nenhuma atividade prévia, como leitura, discussões, ou até mesmo uma orientação,

a fim de preparar o aluno para o exercício, pressupondo que o escritor tenha um conhecimento

prévio a respeito do que será escrito. A atividade, proposta dessa forma, acaba contrariando o

que defende Antunes ao afirmar que “a escrita é uma atividade processual, isto é, uma

atividade durativa, um percurso que se vai fazendo pouco a pouco, ao longo de nossas

leituras, de nossas reflexões, de nosso acesso a diferentes fontes de informação” (2006,

p.168).

Nessa concepção, além de não receber qualquer preparação para a produção textual, o

educando não vê finalidade para o trabalho, pois não há continuidade, tornando-se totalmente

estagnado. Não existe um comprometimento por parte do professor ao utilizar esse tempo que

poderia ser tão produtivo simplesmente para ocupar o aprendiz ou para efetuar uma nota sem

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mesmo avaliar o texto e nem por parte do aluno que se sente desestimulado perante a falta de

incentivos e orientações.

Assim, podemos sintetizar a maneira como a produção textual é proposta na

concepção de escrita como dom:

a) Desvinculada do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor;

b) Não existe atividade prévia à produção, supondo um conhecimento prévio do aluno;

c) O trabalho não tem nenhuma finalidade;

d) Não há continuidade no trabalho.

2.1.2. A escrita como consequência

Esta concepção difere-se da anterior por trazer atividades prévias, o que é

extremamente importante, já que habilita o educando para a atividade escrita, expandindo

seus conhecimentos e preparando-o para o momento da produção textual, visto que “textos

escritos não surgem do nada […] atividades de leitura, discussões e debates sobre temas

variados e configurações textuais variadas são condição necessária para que os alunos tenham

efetivamente estratégias para dizer o que tem a dizer em seus textos [...]” (RUIZ, 2009, p.16).

Entretanto, toda preparação anterior à escrita serve apenas como pretexto para este exercício,

ou seja, o estudante assiste a filmes, palestras ou faz leituras, sabendo que a sequência disso

será a redação. Ademais, “a organização desses recursos didáticos é prevista e controlável,

definindo as ações dos professores e dos estudantes, pois todo o material é formulado para

que o professor o siga” (SERCUNDES, 1997, p. 80).

Após as atividades prévias, os alunos redigem os textos, que são corrigidos pelo

professor e entregues como o resultado final desse processo. Em alguns casos é feita uma

análise dos textos pelos colegas, mas os comentários não são considerados, uma vez que não

se realiza a reescrita. Dessa forma, o texto, na concepção que entende a escrita como

consequência, não progride, pois há a falta de “revisão e reescrita, ações que caminham

paralelamente, permitindo uma melhor produção do texto em construção, são

desconsideradas” (MENEGASSI, 1998, p. 40).

Ohuschi & Menegassi trazem como exemplo dessa concepção um relato de uma aula

ministrada por estagiárias do curso de Letras da Universidade Estadual de Maringá, em que o

aluno faz uma atividade que termina sempre com uma produção escrita como consequência:

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A equipe 3 propôs a produção de parágrafos argumentativos, os quais também tiveram as atividades prévias como pretexto: Solicitaram aos alunos que copiassem os registros do quadro (a respeito de ficar, namorar e casar), que escolhessem um tópico frasal sobre cada assunto e que o desenvolvessem. Posteriormente, a equipe solicitou a produção de um texto dissertativo, a partir de esquemas com os argumentos levantados durante as aulas anteriores: Produza uma dissertação argumentativa de 20 a 30 linhas sobre o tema relacionamento amoroso, respondendo à seguinte questão: “Qual o melhor tipo de relacionamento atual?” (2006, p. 06).

Percebemos, com esses exemplos, que a produção de texto nessa concepção é vista

apenas como a finalização de um trabalho. A falta de continuidade da atividade desmotiva o

aluno, pois não encontra uma razão significativa para escrever. Haja vista que, conforme

Geraldi, esse trabalho “somente se sustenta quando os envolvidos [...] encontram motivação

interna ao próprio trabalho a executar. Não fosse assim, não haveria um trabalho, mas tarefa a

cumprir” (1993, p. 162-163).

Assim sendo, podemos afirmar, resumidamente, sobre essa concepção de escrita que:

a) as atividades prévias são realizadas apenas como um pretexto para a escrita;

b) a escrita é a consequência de um trabalho;

c) o texto é tido como o resultado final do trabalho, não progride, pois não existe revisão,

tão pouco a sua reescrita;

2.1.3. A escrita como trabalho

Apoiada à visão interacionista de linguagem, na qual esta passa a ser vista como a

ação entre sujeitos, e não como um ato individual, logo, uma atividade social (TRAVAGLIA,

1996; GERALDI; 1997b; PERFEITO, 2005), surge uma nova forma de se conceber a escrita:

como um trabalho.

Para esta concepção, a escrita é vista como um processo contínuo e não mais como

algo estanque. Portanto, a escrita do texto é “um momento no percurso desse processo,

sempre possível de ser continuado” (FIAD & MAYRINK-SABINSON, 1991, p. 55). Desta

forma, está aberta a comentários, revisões e a quantas reescritas forem necessárias, com o

intuito de melhorar o texto produzido.

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No entanto, não é preciso ter um dom especial ou receber uma inspiração divina para

se fazer uma boa produção, mas sim, entender que esse trabalho envolve algumas etapas que

precisam ser levadas em conta para que o autor atinja seus objetivos: planejamento, revisão e

reescrita.

O momento do planejamento, conforme acentua Menegassi, apoiado em

Bakhtin/Volochinov (2003), é quando o autor “considera a finalidade, o interlocutor eleito e o

gênero textual escolhido para trabalhar sobre o tema, a organização composicional e o estilo

de língua na produção textual” (2010, p. 79).

Após essa organização, é imprescindível que o autor tenha o que dizer, e esse ter o que

dizer depende das atividades prévias, como leituras, debates, filmes, entre outros, que

funcionarão como o ponto de partida para a escrita. Todavia, nessa concepção, diferente da

anterior, não são utilizadas apenas como uma desculpa para a produção, mas, como um

embasamento, a fim de auxiliar e preparar o estudante durante a escrita e consequentemente

em trabalhos posteriores, visto que juntando as novas informações as que já possui, amplia

cada vez mais seu repertório. Tendo em vista que é importante que os alunos não fiquem

limitados ao seu mundo, ao contrário, é preciso interagir criando uma rede de troca de

informações mais variada possível. Pois, “da heterogeneidade de vozes pode emergir o novo,

o desconhecido a fim de enriquecer todo o processo de aprendizagem” (SERCUNDES, 1997,

p. 86). No entanto,

Para que a escola possa incorporar essa proposta é necessário que se construa uma nova escola que dê condições aos alunos de expressarem as próprias experiências de vida, e partindo dessas se desenvolva um processo de aprendizagem que apresente novos conhecimentos, mas que estes não imponham certas categorias como as únicas válidas (SERCUNDES,1997, p. 93).

O envolvimento mais responsável com a escrita, cujo trabalho é seguido de forma

processual, tem uma razão maior de ser, pois ao entender a linguagem como forma de

interação, o foco passa a ser o interlocutor, já que, conforme Antunes, a escrita “é uma

atividade de expressão, (ex-, 'para fora'), de manifestação verbal das ideias [...] que queremos

partilhar com alguém, para, de algum modo, interagir com ele” (2003, p. 45). Koch & Elias

(2009) contribuem afirmando que, assim como em outros tipos de linguagem, a escrita não é

realizada por uma só pessoa; o escritor não escreve para si, mas em função daquele que irá

receber a sua fala. Daí a importância de se planejar o texto dentro das características próprias

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do gênero textual escolhido para, assim, adequá-lo à situação sociocomunicativa em que será

inserido e ao leitor previsto.

Levando-se em conta o interlocutor, e sendo, nessa concepção, a escrita vista como

um trabalho passível de ser continuado, os processos de revisão e reescrita podem ser

considerados etapas fundamentais. É a partir delas que o escritor revê seu texto, reflete sobre a

sua escrita, vendo se seus objetivos como autor foram atingidos, se o texto está adequado ao

gênero textual escolhido, enfim, todos aqueles pontos programados no momento do

planejamento. “O texto, portanto, nunca é visto como um produto acabado, perfeito, mas que

sempre se oferece para várias versões” (SERCUNDES, 1997, p. 95). Ademais, segundo

Ohuschi & Menegassi (2006), a visão do leitor sobre o texto, em conjunto com as suas

críticas, podem acabar motivando o autor para reformulações. E é esse fazer e refazer em

função de alguém que provoca o crescimento do sujeito como autor.

Durante esse processo, tanto o professor quanto os outros alunos têm um papel

extremamente importante. São as observações feitas pelos colegas que levam o escritor,

muitas vezes, a refletir a respeito de seu texto e, se preciso, a modificá-lo. Já o docente, além

de servir como um mediador entre aquele que escreve e os colegas, pode auxiliar o produtor,

efetuando comentários e incentivando para que “a produção do estudante passe a ser um

suporte para novas produções” (SERCUNDES, 1997, p. 96). Sob o mesmo ponto de vista,

Geraldi completa:

As contradições internas deste mundo social, os diferentes acentos apreciativos que nele circulam estão a mostrar diferentes nuanças nas compreensões que produzimos dos mesmos fatos […]. É por isso que na “minha” palavra me (re)velo na contra-palavra do outro que me constitui como sujeito (GERALDI, 1996, p. 139).

Fora professor e colega, o próprio autor, ao ler o texto produzido, torna-se crítico do

seu produto. Pois, ainda segundo Geraldi, “o próprio autor é leitor de si mesmo, e é enquanto

leitor – um outro de si mesmo – que o autor se corrige” (idem, p. 141).

Como podemos notar, diferente das outras concepções, nessa, o texto escrito serve

como lançamento para novas produções, podendo apresentar-se sob a estrutura de outros

gêneros, como percebemos em exemplo de atividade produzida sob a concepção de escrita

como trabalho trazida por Sercundes:

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Na escola A, os alunos da sétima série estavam estudando, na aula de português, os processos de comunicação veicular no interior da escola. A partir da análise e escritas de textos emergentes do cotidiano escolar, foi feito um projeto para a organização de um mural contendo esses textos. Dando continuidade ao trabalho, a elaboração de convites para peças teatrais deu origem à discussão e à escrita de textos teatrais cuja confecção e dramatização sintetizaram o estudo sobre os processos de comunicação (SERCUNDES, 1997, p. 84).

A continuação do trabalho configurada em diferentes gêneros textuais, como no

exemplo, faz com que os alunos percebam que a atividade realizada tem continuidade,

fazendo com que se sintam muito mais estimulados para futuros trabalhos, “observando as

funções sociais da leitura e da escrita nos mais variados contextos” (HILA, 2009, p. 159).

Entretanto, faz-se necessário também que os textos produzidos tenham um suporte textual e

circulem em um ambiente social específico já conhecido pelos alunos antes do trabalho de

produção, seja na escola como, por exemplo, no mural da escola ou em outro local da

sociedade como em jornal da comunidade.

Portanto, feitas todas as explanações sobre a concepção de escrita como trabalho,

podemos resumir suas características:

a) a escrita é processual;

b) as atividades prévias servem como suporte para o trabalho;

c) a produção textual tem uma finalidade social definida;

d) existe um planejamento antes da escrita;

e) durante o planejamento o gênero textual também é considerado;

f) o leitor é levado em conta;

g) a revisão é feita durante todo o processo de produção e, se necessário, o texto é

reescrito;

h) o texto circula em um ambiente sociocomunicativo em determinado suporte;

Todas as características dessa concepção estão de acordo com as condições de

produção de texto, apontadas em Menegassi (2011), que tem como apoio Bakhtin. Para o

autor, é preciso que o escritor seja conhecedor de tais condições para produzir “um texto mais

completo dentro de um contexto sociocomunicativo determinado” (MENEGASSI, 2010, p.

81). Em sala de aula, o professor deve apresentar, no próprio comando de produção de texto,

todas essas condições para direcionar o aluno durante todas as etapas de escrita.

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Apresentadas as três concepções de escrita, percebemos que, na concepção que

entende a escrita como trabalho, o processo de produção textual é muito mais completo que as

demais, pois, todas suas características se mostram essenciais para o desenvolvimento da

produção escrita do aluno.

Por isso, se pretendemos alcançar os objetivos evidenciados pelos Parâmetros

Curriculares Nacionais da Língua Portuguesa, como “expandir o uso da linguagem em

instâncias privadas e utilizá-las com eficácia em instâncias públicas, sabendo assumir a

palavra e produzir textos [...] coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos objetivos

a que se propõem e aos assuntos tratados” (BRASIL, 1997, p. 33), é preciso que as

instituições de ensino e os professores se conscientizem da importância do papel que

assumem como mediadores no processo de aprendizagem da escrita.

Cabe às escolas e aos educadores adequar as propostas da concepção enfatizada a sua

realidade, encaixando-as às necessidades de seus estudantes, para que, dessa forma, tornem-

se não só mais um número nas listas de pessoas alfabetizadas, mas sim, cidadãos letrados e

críticos, capazes de questionar por meio da fala e da escrita o meio social do qual participam,

exercendo verdadeiramente sua cidadania.

2.2. Os processos de revisão e reescrita

Antes de aprofundarmos os estudos sobre os processos de revisão e reescrita, é

fundamental pensarmos em uma das características da linguagem escrita que a difere da

falada: a questão temporal. É esse tempo maior que existe entre o pensar e o escrever que dá

ao locutor a oportunidade de refletir sobre o que vai escrever e como irá fazê-lo, ou seja,

como distribuirá as palavras e ideias em seu texto, com o objetivo de torná-lo mais claro para

o seu leitor, a fim de, com isso, atingir suas finalidades como autor.

Afinal, “embora o sujeito com que interagimos pela escrita não esteja presente à

circunstância da produção textual, é inegável que tal sujeito existe e é imprescindível que ele

seja levado em conta em cada momento” (ANTUNES, 2003, p. 46). Koch & Elias, em

consonância com esse pensamento, acrescentam expondo que

A escrita é um trabalho no qual o sujeito tem algo a dizer e o faz sempre em relação a um outro (o seu interlocutor/leitor) com um certo propósito. Em razão do objetivo pretendido (pra quem escrever?), do quadro espacio-temporal (onde? quando?) e do suporte de veiculação, o produtor elabora um projeto de dizer e desenvolve esse projeto, recorrendo a estratégias

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linguísticas, textuais, pragmáticas, cognitivas, discursivas e interacionais, vendo e revendo, no próprio percurso da atividade, a sua produção (2009, p. 36).

Tendo em vista que, como ressalta Geraldi (1996), embora a linguagem escrita seja

realizada por um só indivíduo, o locutor realiza um trabalho conjunto, visto que “a enunciação

é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja

um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social a qual

pertence o locutor” (BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p. 116). Com efeito, torna-se o

locutor interlocutor do próprio texto, já que, conforme cita Garcez, para que o enunciador1

seja bem sucedido,

deve apropriar-se de habilidades de estruturação do discurso, principalmente quando se trata de discurso escrito formal, que levem em conta que o seu objetivo é estabelecer um elo na cadeia dialógica das relações sócio-históricas. Entre essas habilidades está a capacidade de distanciamento do próprio texto para observá-lo e analisá-lo quanto ao seu funcionamento junto a um leitor virtual, isto é, a capacidade de dirigir e controlar a atenção sobre o pontos críticos do processo enunciativo – a habilidade de deslocamento do papel de enunciador para o papel de leitor (1998, p. 156).

Ao incorporar esse papel, o de “leitor de si mesmo”, conforme já citado em Geraldi

(1996, p. 141), que o autor consegue perceber possíveis problemas em seu texto, escolhas

erradas que impedem, ou pelo menos dificultam a compreensão do que está sendo lido, algo

muito mais complicado se o escritor assumir apenas a posição intransigente de locutor. Uma

vez que, “Toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que

procede de alguém como pelo fato de que se dirige para alguém”

(BAKHTIN/VOLOCHINOV, 2009, p.117). Logo, a língua não teria razão de existir senão

pela interação. Assim, utilizando a linguagem, os sujeitos expressam suas ideologias, e

conjuntamente são afetados pelas ideologias do grupo social ao qual pertence. A língua, então,

serviria como um instrumento de comunicação dinâmico, numa troca de informações

constante. Portanto, quanto mais o sujeito estiver consciente da importância e da necessidade

de considerar o interlocutor ao produzir o seu texto, melhor o fará. Essa consciência,

associada ao desenvolvimento da escrita, traria um amadurecimento do sujeito como autor,

favorecendo a sua atividade de transformação do signo ideológico em signo linguístico, dando

1 Enunciador é entendido como aquele que, por meio da língua e em conjunto dos signos, enuncia o seu discurso em função de um outro, conforme defende Bakhtin/VOLOCHINOV (2009).

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a linguagem escrita seu verdadeiro valor dialético, pois, recorrendo mais uma vez a

Bakhtin/Volochinov,

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constituiu assim a realidade fundamental da língua (2009, p. 127).

Nesse sentido, por ser a língua escrita, assim como as demais, uma atividade

interativa, onde o autor afeta e é afetado por um outro, a preocupação com o que se escreve e

o modo como é transmitida a mensagem torna-se fundamental. Daí, aproveitarmos o tempo

maior que ela nos oferece para trabalhar a produção textual, tomando-a como um processo e

não mais como um produto, cientes que nesse processo devem ser incorporados vários passos,

haja vista que produzir um texto de qualidade

é uma tarefa cujo processo não se completa, simplesmente, pela codificação das ideias ou das informações, através de sinais gráficos. Ou seja, produzir um texto escrito não é uma tarefa que implica apenas o ato de escrever. Não começa, portanto, quando tomamos nas mãos papel e lápis. Supõe ao contrário, várias etapas, interdependentes e inter-complementares, que vão desde o planejamento, passando pela escrita propriamente, até o momento posterior da revisão e reescrita (ANTUNES, 2003, p. 54).

Todas essas reflexões, anteriores, conjuntas e posteriores à escrita, fazem com que o

escritor conceba-a como um projeto seu, um instrumento do seu dizer e não apenas como

palavras ou frases soltas sem sentido algum, tomando então consciência da própria escrita e

percebendo o quanto é primordial o seu comprometimento com esse trabalho.

Essa perspectiva de linguagem escrita, ainda pouco considerada pelos professores, é

apresentada e orientada, em contexto escolar, por dois documentos: os Parâmetros

Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 1997) e as Diretrizes Curriculares da

Educação: Língua Portuguesa (PARANÁ, 2008). Esses documentos, norteadores do ensino de

Língua Portuguesa e que, segundo os PCNs, procuram “apontar metas de qualidade que

ajudem o aluno a enfrentar o mundo atual como cidadão participativo, reflexivo e autônomo,

conhecedor de seus direitos e deveres” (1997, p. 04), referem-se também à escrita como uma

atividade processual e defendem a revisão textual como forma de aprimorar o texto para,

17

assim, melhor atingir os objetivos pretendidos e consequentemente chegar ao leitor ou, sob o

olhar de Bakhtin, ao outro, permitindo a continuidade do diálogo e estabelecendo a interação.

A respeito dos dois processos aqui discutidos, os documentos ainda afirmam:

[...] a revisão do texto assume um papel fundamental na prática de produção. É preciso ser sistematicamente ensinada, de modo que, cada vez mais, assuma sua real função: monitorar todo o processo de produção textual desde o planejamento, de tal maneira que o escritor possa coordenar eficientemente os papéis de produtor, leitor e avaliador do seu próprio texto. Isso significa deslocar a ênfase da intervenção, no produto final, para o processo de produção, ou seja, revisar, desde o planejamento, ao longo de todo o processo: antes, durante e depois. A melhor qualidade do produto, nesse caso, depende de o escritor, progressivamente, tomar nas mãos o seu próprio processo de planejamento, escrita e revisão dos textos (BRASIL, 1997, p. 51). […] nessa etapa o aluno irá rever o que escreveu, refletir sobre seus argumentos, suas ideias, verificar se os objetivos foram alcançados; observar a continuidade temática, analisar se o texto está claro, se atende a finalidade, ao gênero e ao contexto de circulação; avaliar se a linguagem está adequada as condições de produção, aos interlocutores, rever as normas de sintaxe, bem como a pontuação, ortografia, paragrafação (PARANÁ, 2008, p. 69-70).

Como os próprios Parâmetros Curriculares Nacionais confirmam, não é comum, na

escola, o texto ganhar mais de uma versão, o normal é que ele permaneça como da primeira

vez, o que impossibilita o seu aprimoramento, além de não contribuir “para o texto ser

entendido como processo ou para desenvolver a habilidade de revisar” (BRASIL, 1997, p.

51). Como apoio para uma possível mudança, ainda de acordo com os PCNs, o uso de

rascunhos seria um auxílio para que o escritor, ao revisar, entenda que o texto é algo

provisório.

Dessa maneira, ao se conceber o produto da escrita como um objeto não concluído,

possibilitaríamos um distanciamento entre criador e criatura. Assim, do mesmo modo que um

artista observa sua obra em busca de imperfeições, de espaços que precisam ser preenchidos

ou melhorados, o escritor lê, relê, procura as lacunas presentes e reformula o texto, mostrando

ser ele o primeiro leitor e avaliador de sua obra.

De acordo com Menegassi, sendo a “revisão um processo recursivo, mostrando a ideia

do texto em progressão, observa-se a reescrita como oriunda dessa configuração. Na verdade,

é um produto que dá origem a um novo tipo de processo, permitindo uma nova fase na

construção do texto” (1998, p. 40). Ruiz (2010) a cita como uma das principais fases que

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envolvem a produção textual, tendo em vista que é a etapa que mostra de forma mais evidente

a escrita como um processo.

Portanto, podemos afirmar que a revisão e a reescrita são processos complementares,

pois, juntas auxiliam numa melhor construção do texto. Por meio da revisão, o autor analisa

seu produto, reflete a respeito dos elementos escolhidos, observando se suas escolhas

colaboram para que seus objetivos sejam atingidos e, se julgar necessário, reescreve seu texto,

a fim de torná-lo mais claro. Dessa maneira, fazendo e refazendo, quantas vezes for preciso, o

autor, melhora a qualidade do seu texto e, por conseguinte, amplia o seu desempenho em

escrever. Logo, “partindo do próprio texto, o aluno terá melhores condições de perceber que

escrever é trabalho, é construção de conhecimento; estará, portanto, mais capacitado para

compreender a linguagem” (SERCUNDES, 1997, p. 89).

No bojo dessas questões, Antunes declara que o momento de análise da escrita serve

para o escritor

confirmar se os objetivos foram cumpridos, se conseguiu a concentração temática desejada, se há coerência e clareza no desenvolvimento das ideias, se há encadeamento entre os vários segmentos do texto, se há fidelidade as normas da sintaxe e da semântica- conforme preveem as regras de estrutura da língua- se respeitou, enfim, aspectos da superfície do texto, como a ortografia, a pontuação e a divisão do texto em parágrafos. [...], para decidir o que fica, o que sai, o que se reformula (2003, p. 55-56).

Como podemos notar, em praticamente todas as definições, fundem-se os processos de

revisão e reescrita; e não poderia ser diferente. Pois, como reformular o texto sem antes

refletir sobre o objeto de análise? E, da mesma forma, qual o objetivo de se revisar a escrita se

não for para melhorá-la? Não há como separar esses dois processos, e são eles que,

conjuntamente, irão aperfeiçoar, não só a escrita analisada, mas toda a forma como o autor

escreve. Por isso, como assevera Cabral,

Sensibilizar o aluno para a necessidade de objetivar o texto e de tomar distância face ao que escreveu, fornecer-lhe instrumentos que ajudem a análise de sua própria escrita e facultar-lhe, na aula, momentos especificamente dedicados à revisão, é, pois, um percurso que se impõem, se queremos que as aquisições relativas à escrita sejam efetivas e contribuam para uma progressão do aluno nesse domínio (1994, p.118).

19

Visto que é durante a revisão que o autor torna-se crítico do seu produto, pois, nesse

momento, apropria-se do papel de leitor do texto que produziu, percebendo problemas não

vistos antes, notando que o texto está sempre aberto às modificações, podendo ser melhorado

a cada re-escritura. A revisão e a reescrita, portanto, têm, “uma função retrospectiva, que

sinaliza os 'achados feitos', e uma função prospectiva, no sentido de que nos aponta 'como

devemos prosseguir', o que fazer 'daqui em diante', por 'onde ir', 'a que ponto voltar' etc.”

(ANTUNES, 2006, p.166).

2.2.1. A revisão e a reescrita na escola

Em sala de aula, além de leitor e avaliador do texto do aluno, o professor assume o

papel de colaborador no processo de revisão e por meio de seus comentários ajuda o discente

a buscar os possíveis equívocos, preparando-o para a reescrita. Para isso, professor e aluno,

“precisam aprender a detectar os pontos onde o que está dito não é o que se pretendia, isto é,

identificar os problemas do texto e aplicar os conhecimentos sobre a língua para resolvê-los

[…]” (BRASIL, 1997, p. 55). Contudo,

[…] o trabalho de retextualização realizado pelo aluno que revisa em função de uma correção pelo professor não é um trabalho solitário, como a princípio pode parecer (muito embora a solitude da tarefa de escrita lhe seja imanente). Esse seu trabalho é, necessariamente, e pela própria natureza, um trabalho a quatro mãos. De modo que toda e qualquer consideração que se faça a respeito do maior ou menor sucesso do aluno na tarefa de revisão (retextualização) deve inalienavelmente levar em conta a participação efetiva do mediador (o professor) no processo como um todo (RUIZ, 2010, p. 26).

Após os comentários do professor, o estudante pode ter duas atitudes: a de

desconsiderar as propostas feitas, ou a de aproveitá-las para aprimorar seu produto, indo,

muitas vezes, como cita Menegassi, “além das sugestões oferecidas” (1998, p. 60). Por isso, é

muito importante que o revisor atente para os seus apontamentos, pois “os comentários com

sugestões de revisão oferecidos pelo professor aos alunos têm papel relevante e influenciam

na revisão e reescrita” (MENEGASSI, 2000, p. 83). O autor ainda esclarece que tais

comentários precisam, para se tornarem claros e eficazes, apresentarem quatro componentes

básicos: “1) Apresentação do problema a ser revisado; 2) Identificação da localização do

problema [...]; 3) Apresentação do contexto em se encontra o problema; 4) Oferecimento de

diretrizes para a reformulação do problema levantado” (Idem, p. 92).

20

Ruiz (2010) reforça que é importante que o professor perceba que tipo de leitura faz

do texto do aluno, já que é a partir dela que ele fará, ou não, a reestruturação de seu texto.

Nesse sentido, o docente deve lembrar que, assim como o texto do aluno pode ter diferentes

interpretações, os seus comentários, expressos na revisão, também podem causar um efeito

contrário ao pretendido. A esse respeito, Garcez colabora confirmando que,

A língua é um produto de um trabalho coletivo e histórico, de uma experiência que se multiplica de forma contínua e duradoura, assegurando intrinsecamente uma margem de flexibilidade e indeterminação. Essa indeterminação provém do fato de que nenhum enunciado tem em si mesmo, isoladamente, condições necessárias e suficientes para permitir uma interpretação unívoca […] (1998, p. 48).

Em quase todos os casos, o professor até “tem boas intenções sobre o seu trabalho e

sobre a escrita, mas não tem clareza teórica e metodológica sobre como explicitá-las ao aluno

[...]” (EVANGELISTA, 1998, p. 120).

Na tentativa de ajudar o educador no momento da revisão, Serafini apontou seis

princípios que devem ser levados em consideração durante a revisão:

1- A correção não deve ser ambígua - é preciso mostrar o erro de forma precisa. 2- Os erros devem ser reagrupados e catalogados 3- O aluno deve ser estimulado a rever as correções feitas, compreendê-las e trabalhar sobre elas. 4- Devem-se corrigir poucos erros em cada texto. 5- O professor deve estar pré-disposto a aceitar o texto do aluno - É muito importante que o professor tenha uma postura aberta e receptiva em relação ao texto, aceitando sem preconceitos o enfoque, as ideias, o estilo e a linguagem escolhidos pelo estudante. 6- A correção deve ser adequada à capacidade do aluno - O estudante muito criticado, cujos textos vem cheios de correções, sente-se mal a ponto de se tornar incapaz de escrever (SERAFINI, 1988, p. 108-112).

Cabe enfatizar, conforme ressalta Cabral, que “[…] o professor não deverá pretender,

[…] resolver todos os problemas levantados pelos textos” (1994, p.122), pois, se assim o

fizer, correrá um grande risco de desmotivar o aluno, ou até confundi-lo com tantas

advertências.

21

Após a avaliação e intervenção do professor, o aluno pode adotar diferentes operações

na reestruturação do texto. Fabre (1986), apontado por Menegassi (1998), sistematizou quatro

operações linguísticas usadas na reescrita:

Adição ou acréscimo - pode tratar-se do acréscimo de um elemento gráfico, acento, sinal de pontuação, grafema [...], mas também de uma palavra, de um sintagma, de uma ou de várias frases; Supressão - supressão sem substituição do elemento suprimido. Ela pode ser aplicada sobre unidades diversas, acentos, grafemas, sílabas, palavras sintagmáticas, uma ou diversas frases; Substituição - supressão, seguida por substituição por um termo novo. Ela se aplica sobre um grafema, uma palavra, um sintagma, ou sobre conjuntos generalizados; Deslocamento - permutação de elementos, que acaba por modificar sua ordem no processo do encadeamento (FABRE, 1986, apud MENEGASSI, 1998, p. 44, 45).

Para melhor entendermos as operações que envolvem a reescrita, Menegassi (1998)

nos traz alguns exemplos coletados em textos de alunos do curso de Letras, investigados em

sua pesquisa sobre reescrita:

Acréscimo:

“É um fator imprescindível na minha carreira como na minha vida pessoal.”

“É um fator imprescindível na minha carreira, pois lido com a comunicação oral, e

também na minha vida pessoal, pois a comunicação é a base do relacionamento humano.”

Supressão:

“… um vazio no meu coração, que ao mesmo tempo dizia...”

“... um vazio no meu coração. Ao mesmo tempo dizia...”

Substituição:

“A opção pelo curso de Letras geralmente atrai pessoas vindas do magistério...”

“O curso de Letras geralmente trás pessoas vindas do magistério...”

Deslocamento:

“... retorna às aulas na Pré-Escola Monsenhor Kimura todas as crianças...”

“... todas as crianças retornam às aulas na Pré-Escola Monsenhor Kimura...”

22

O uso, ou não, das quatro operações linguísticas depende muito do tipo de correção

que o professor faz – de que forma se materializa, qual é o estímulo que transmite – uma vez

que as revisões feitas pelos docentes nos textos dos alunos podem ocorrer de diversas formas.

Serafini (1988), a esse respeito, esclarece que as intervenções podem se apresentar de

três maneiras:

a) Indicativa: o professor se limita a apenas apontar os erros por um risco, círculo, ponto de

interrogação, sublinhado, enfim, algum sinal que, na maioria das vezes, só mostra o equívoco,

sem alterá-lo; normalmente relaciona-se a problemas ortográficos.

b) Resolutiva: o revisor, além de sinalizar o erro, o soluciona, reescrevendo-o da forma

correta, nem que para isso mude, até mesmo, orações inteiras;

c) Classificatória: se caracteriza por apontar, usando como recurso sinais pré-estabelecidos,

com o que e aonde o aluno deve rever seu texto. Dessa forma, um triângulo pode referir-se à

falta de parágrafo, um círculo à falta de pontuação e assim por diante, fazendo com que o

aluno, após identificar os símbolos, reescreva seu texto, considerando-os.

Além dos três tipos de revisão trazidos por Serafini, Ruiz acrescenta a revisão textual-

interativa. “Tratam-se de comentários mais longos do que os que fazem na margem, razão

pelo qual são geralmente escrito em sequência do texto do aluno [...]. Tais comentários

realizam-se na forma de pequenos 'bilhetes' […]” (RUIZ, 2010, p. 47).

Se fizermos uma comparação breve entre os princípios que o professor deve

considerar mostrados por Serafini e os tipos de correção apontados por ela e por Ruiz,

notaremos que alguns desses princípios podem não se em determinadas revisões. A

ambiguidade, por exemplo, pode aparecer na correção indicativa, já que a indicação, por si só,

não deixa claro para o aluno o que deve ser revisto, podendo acarretar no descaso com o

apontamento. Algumas vezes, tentando mostrar que a palavra está acentuada

equivocadamente, o revisor apenas a sublinha, sem dar esclarecimentos. O escritor, sem

entender o que está errado, acaba deixando-a do mesmo modo ou até mesmo substituindo-a

por outra.

De forma similar, na correção classificatória, um símbolo, se não for do conhecimento

do aluno, acabará confundindo o escritor. Isso acontece, por exemplo, quando o professor

coloca um símbolo no início da frase para marcar a falta de parágrafo, sem explicar o que ele

significa; o resultado dessa atitude é que, em muitos casos, sem compreender, o aluno acaba

ignorando o pedido do revisor. Para Ruiz (2010), as revisões feitas no corpo do texto,

23

apontando somente os erros, como nos casos apresentados, passam a impressão de

comodidade do professor, visto que são mais rápidas e menos trabalhosas.

A correção resolutiva, por sua vez, não permite, em nenhum momento, que o aluno

reflita ou trabalhe sobre seu erro (SERAFINI, 1998). A atitude mais provável é de apenas

substituir o seu deslize pelo acerto oferecido, sem nenhum esforço. “Assim, ao corrigir

resolutivamente, o professor assume ou uma atitude de alterar a forma de dizer do aluno, ou

uma atitude de alterar o próprio dizer do aluno” (RUIZ, 2010, p.78), impondo a sua certeza e

ignorando o dizer do aluno. Em virtude disso, a correção “pode produzir resultados

inadequados, pois, nessa situação, não há como ter acesso total às intenções do autor, o que,

em muitos casos é a única forma de se adequar um texto” (LUCENA, 1997, p. 06). Portanto,

esse método de correção não incentivaria o aluno a refletir sobre a escrita e a revisão do

professor.

Algumas vezes, o que pode ocorrer também é a mistura de duas ou mais correções, por

exemplo, quando o professor usa sempre o mesmo símbolo para um determinado equívoco na

revisão classificatória, o aluno acaba acostumando de tal forma com esse sinal e com a

resposta esperada que se entrega à comodidade de apenas repetir a resposta que deu nas vezes

anteriores, sem analisar as possibilidades de ultrapassar a marcação do professor, tornando-se,

na verdade, uma correção resolutiva.

Quanto à distribuição espacial dos comentários, apontamentos e bilhetes feitos nas

revisões interventivas, Ruiz (2010) percebeu que podem ocorrer junto ao texto original com

várias configurações. Porém, na maior parte dos casos, encontram-se no corpo do texto, na

margem ou lateral, ou na sequência dele, local em que, quase sempre, se posiciona a revisão

textual-interativa.

Além de Ruiz, outros autores reconhecem a eficácia da correção apoiadas nos bilhetes.

Para Nascimento, esse recurso inova por construir um espaço interativo entre professor e

aluno. “Através deles, a professora-pesquisadora deixou de ocupar a posição de alguém que lê

para apontar os erros gramaticais e ortográficos dos alunos, tornando-se uma 'interlocutora

interessada' no que os alunos têm a dizer em seus textos” (NASCIMENTO, 2009, p. 77). Fora

essa vantagem, os bilhetes também permitem a abordagem de “aspectos mais amplos

relacionados à macroestrutura textual e aos modos de circulação do gênero, que dificilmente

poderiam ser apontados através de marcações ou símbolos” (NASCIMENTO, 2009, p. 66),

por tratarem de assuntos mais abrangentes e pessoais não estabelecidas por regras gramaticais.

24

Outra vantagem desse tipo de revisão é a possibilidade de intimidade entre escritor e

revisor, uma vez que, utilizando o recurso interativo, os bilhetes, o professor pode elogiar

aquilo que o aluno fez de melhor e incentivá-lo ao crescimento textual; levando-o a refletir

sobre seu texto por meio de um diálogo escrito, diminuindo a distância e proporcionando mais

envolvimento entre discente e aprendiz. Assim, ao mesmo tempo em que o professor “explica,

esclarece, instrui, define regras que asseguram a competência mínima esperada, modela,

monitora, estimula e elogia o progresso, sempre com um papel crítico e positivo” (GARCEZ,

1998, p. 42).

Para Ruiz a principal diferença entre os tipos de intervenção “está no caráter altamente

dialógico da correção indicativa, classificatória e textual-interativa, de um lado e, de outro, no

caráter marcadamente monológico da correção resolutiva” (RUIZ, 2010, p. 79), pois ao tomar

só para si a responsabilidade da reestruturação do texto, o professor transmite uma ideia de

que não faz parte do papel do escritor ler e revisar o seu texto, dando a entender que isso é

tarefa do professor. Além disso, a interação propiciada nas revisões de caráter dialógico,

principalmente na textual-interativa faz com que se desloque

a noção do processo de ensino como transmissão, concebendo-se a sala de aula como lugar de interação verbal e por isso mesmo de diálogo entre sujeitos, ambos portadores de diferentes saberes. São os saberes do vivido trazidos por ambos – alunos e professores – que se confrontam com outros saberes, historicamente sistematizados e denominados “conhecimentos” que dialogam em sala de aula (GERALDI, 1997a, p. 21).

Gonçalves (2009), a respeito dos diferentes modos de se fazer a revisão textual,

defende a revisão interativa que se assemelha muito com a textual-interativa de Ruiz (2010),

porém, apoiada pelas listas de controles ou constatações e considerando o gênero textual

escolhido, a partir de um trabalho feito com Sequências Didáticas. Para ele, esse método de

revisão “pode oferecer importante caminho para o educando operar qualificações com e sobre

a linguagem […]” (GONÇALVES, 2009, p. 21), pois, de posse da lista de constatações,

refletiria de maneira crítica sobre vários pontos que envolvem seu texto, desde a sua

adequação ao gênero textual, a construção do texto, a coerência, a coesão, os desvios

gramaticais entre outros. Em resumo, as listas de constatações seriam construídas com

perguntas guiadoras que ajudariam os alunos na sua revisão, como: “Você selecionou as

informações prioritárias, de modo que o professor possa avaliar sua compreensão global do

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texto? Não existem desvios gramaticais, tais como pontuação, frases truncadas/incompletas?”

(GONÇALVES, 2009, p. 24).

O autor esclarece que esse recurso não é uma receita pronta, nem a solução para todas

as dificuldades enfrentadas pelo professor no momento da revisão, haja vista que esta é

apenas uma das etapas da produção textual, mas nos lembra que as mensagens interativas

fazem com que o docente mantenha o exercício dialógico da linguagem, por meio da

interação que mantêm com seu aluno.

Seja qual for o tipo de revisão, os critérios de avaliação levados em conta devem estar

bem claros para o professor, para que possa transpô-los ao aluno, caso contrário, o escritor

terá “apenas como referência de qualidade aquilo de que são portadores de forma mais ou

menos implícita e que virá não tanto de uma aprendizagem escolar, mas de aquisições bebidas

na sua experiência leitora, tantas vezes diminuta” (CABRAL, 1994, p.114).

O educador deve prestar atenção na necessidade real do aluno, tentando não cair no

erro de favorecer, com maior dedicação, aqueles que correspondem mais ao seu trabalho,

pois, de acordo com Grillo (1995), são os que menos respondem que, quase sempre,

necessitam de mais atenção. Com base em suas pesquisas, a autora constatou que os alunos

considerados mais fracos, com menos embasamento teórico e prático da escrita,

correspondem em menor proporção às suas revisões do que aqueles com maior familiaridade.

Isso, se explica pelo fato de os alunos não terem o conhecimento necessário para a

reestruturação, necessitando de, além das instruções via bilhetes, de orientações pessoais.

Entretanto, o professor não precisa ser necessariamente o único avaliador do texto do

aluno. Antes mesmo dele, o próprio escritor deveria fazer a autoavaliação. Conforme Cabral,

essa tarefa será facilitada

[…] se for acompanhada de instrumentos de apoio e se for pedido ao aluno que se avalie mediante parâmetros por ele conhecidos. Daí a necessidade de se construir grelhas de avaliação, de preferência com a colaboração dos alunos que, ao participarem nessa construção, reforçam e investem o que aprenderam anteriormente. Assim se associará a avaliação à aprendizagem (CABRAL, 1994, p.119).

Outra maneira de promover a revisão interativa seria a avaliação em par ou em grupo.

Trata-se de uma troca de material, onde cada um, após a leitura do texto do colega, levanta

considerações que lhe parecerem pertinentes. Esses apontamentos não precisam aparecer

somente por escrito. Seria importante que se fizessem também diretamente para o aprendiz.

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Garcez (1998), após análises de diálogos estabelecidos nas revisões em pares, percebeu que,

durante a conversa, o escritor, ao notar que em certos pontos levantados pelo colega realmente

não deixou clara as suas intenções no texto, procura, muitas vezes, explicar por que fez

daquela forma. O que se conclui nessa interação é que, tanto o leitor quanto o autor, tentam

defender o seu ponto de vista, mostrando uma postura crítica. Todavia, em outras vezes, o

escritor se convence, após as considerações do par, que realmente precisa adequar seu texto.

De acordo com Antunes, a revisão em par ou em grupo traz duas vantagens:

Primeiro, se aguçaria esse olhar avaliador, no sentido, claro, construtivo de perceber o que está bem e o que poderia estar melhor na atividade do outro. Segundo, se estimularia a abertura da aprendizagem social que se pode fazer, em relação à crítica saudável, às observações do outro, à pluralidade de visão, dimensões tão relevantes para a madura e plural convivência social (ANTUNES, 2006, p. 164).

Garcez (1998), por meio de suas análises sobre os diferentes leitores/avaliadores do

texto do aluno, incluindo o produtor, concluiu que, de modo geral, professor, colega e escritor

se estruturam de forma parecida em suas revisões.

Entretanto, a assimetria natural e inevitável entre o par mais desenvolvido e o estudante em processo de formação apresenta-se, por meio de suas características principais: a) há um espectro maior de participação do professor-pesquisador que do leitor-crítico colega; b) o professor pesquisador evita a instrução direta, colocando questões ao estudante, que orientam, dirigem, provocam sua reflexão sobre um determinado aspecto que detectou, e percebe que o estudante, voltando ao ponto para releitura, pode solucioná-lo. […] O professor não só sustenta o percurso do estudante, mas o impulsiona, movimenta-o, encoraja-o para um avanço mais significativo (GARCEZ, 1998, p. 136).

Por outro lado, também existem aqueles que acabam focando somente em aspectos

pontuais, desconsiderando outros elementos tão ou mais relevantes para a produção.

Jesus (2001), ao pesquisar a forma como os professores trabalhavam a escrita em sala

de aula, especialmente a metodologia utilizada durante a revisão e a resposta dada pelos

alunos na reescrita dos textos analisados, concluiu que preponderavam as observações

baseadas em critérios gramaticais. Para a autora, o revisor acredita que fazendo a

“higienização da escrita”, ou seja, limpando os erros gramaticais, o texto tornar-se-ia claro. E

afirma ainda que, com esse tipo de avaliação,

27

A reescrita transforma-se numa espécie de “operação limpeza”, em que o objetivo principal consiste em eliminar as impurezas pela profilaxia linguística, ou seja, os textos são analisados apenas no nível da transgressão ao estabelecido pelas regras de ortografia, concordância e pontuação, sem se dar a devida importância às relações de sentido emergentes na interlocução. […] Como resultado temos um texto, quando muito, “linguisticamente correto”, mas prejudicado na sua potencialidade de realização (JESUS, 2001, p. 102).

Conforme a pesquisadora, uma revisão apoiada somente em regras de pontuação,

ortografia e concordância, faz com que o discente não compreenda a importância de se refletir

sobre a escrita e muito menos sobre seu papel como autor, haja vista que esses dois pontos

parecem não serem considerados quando a revisão é feita dessa forma.

Logo, um trabalho fragmentado, no qual pontuação e enunciação são tratadas de maneira desarticulada, como se fossem instâncias excludentes, desencadeia uma reescrita formal e mecânica, destituída de significado e reflexão, que não faculta ao aluno a apropriação dos recursos linguísticos necessários a uma melhor contextualização da pluralidade imanente ao seu enunciado (JESUS, 2001, p. 109).

Desse modo, o aluno passa a entender a revisão não como um momento de análise,

mas como algo imposto pelo professor que deve ser seguido de forma rígida, deixando de

lado a sua idiossincrasia e se apropriando do modo de dizer do professor. Além disso,

permanece a noção de revisão apoiada somente em fragmentos do texto, em palavras isoladas,

como se o sentido do texto não estivesse no seu todo. A esse respeito, Geraldi assevera que o

texto “é precisamente o lugar das correlações. Construído materialmente com palavras (que

portam significados), organiza essas palavras em unidades maiores para construir informações

cujo sentido/orientação somente é compreensível na unidade global do texto” (GERALDI,

1997a, p.22).

Dividindo os mesmos pensamentos, Grillo explana que a revisão apoiada apenas em

erros ortográficos, acentuação e de sintaxe, ocorre, entre outras coisas, porque “a formação da

maioria dos professores de português ainda é fortemente baseada no estudo da gramática

normativa, mas muito deficientes em termos de estudos linguísticos” (GRILLO, 1995, p. 60).

Antunes defende a busca por novos caminhos na revisão textual, esclarecendo que “se

existe uma gramática (da qual deriva uma determinada norma gramatical eleita como padrão)

também existe uma situação interativa (da qual derivam as normas sociais de uso da língua)”

(ANTUNES, 2006, p.170). Portanto, ao avaliarmos um texto de forma resolutiva, levando em

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consideração apenas regras estruturais, estaríamos desconsiderando a função básica da língua

levantada por Bakhtin/Volochinov (2009), a interação.

É claro que precisamos considerar as dificuldades enfrentadas pelos educadores para

realizarem um trabalho mais eficaz em relação à revisão dos textos de seus discentes, pois,

além de assumirem uma carga horária elevada de trabalho, são responsáveis por turmas de

alunos numerosas e, muitas vezes, nem foram preparados para esse processo. O que se nota

nas instituições de ensino é que o professor, quando corrige o texto, o faz de maneira

superficial e o entrega ao educando, tomando o trabalho por encerrado. Porém, como cita

Menegassi, no momento em que o professor compreende “a importância de seus comentários

na construção textual dos alunos, conscientiza-se de que deve melhorar a qualidade de suas

observações, o que invariavelmente é refletido na avaliação do texto, tanto por parte do aluno,

como por parte do professor” (1998, p. 61). Para Antunes, a consciência da responsabilidade e

a competência do avaliador no processo de revisão do texto são reflexos de sua própria

formação. A autora enfatiza ainda que

É inadiável, ainda, que se ponha como ponto de estudo, nos cursos de graduação, o processo da avaliação e seus múltiplos procedimentos didáticos. Além disso, não se pode ter grandes expectativas de sucesso escolar, se os professores não demonstram ser leitores assíduos, não são capazes de escrever, com coerência e relevância um texto formal, se os professores, enfim, não têm uma visão mais relevante e interativa do funcionamento social da língua (ANTUNES, 2006, p.177).

Fiad & Mayrink-Sabinson, após realizarem experiências de reescritas com graduandos

do primeiro ano do curso de Letras/Linguística do IEL/UNICAMP – futuros professores de

Língua Portuguesa –, perceberam que, na grande maioria das vezes, o momento da escritura

causa estranheza a muitos. Para alguns, a “reescrita tornaria o texto frio, sem emoção”, já para

outros, “a reescrita só deve ser feita se o primeiro texto for ruim” (FIAD & MAYRINK-

SABINSON, 1991, p. 57).

Este resultado nos mostra que o ato de revisar os textos e, principalmente de

reescrever, ainda precisa ser muito explorado e trabalhado nas salas de aula, inclusive nos

cursos de Letras, para que, dessa forma, a escrita deixe de ser vista como um dom, ou como

uma inspiração e passe a ser entendida realmente como um trabalho, e, como tal, precisa ser

aprimorada a cada dia, pois, “não acontece gratuitamente, por acaso, sem ensino, sem esforço,

sem persistência. Supõe orientação, vontade, determinação, exercício, prática, tentativas”

29

(ANTUNES, 2003, p. 60). Entendendo que, assim como os outros processos de escritura,

segundo a concepção de escrita como trabalho, o uso da revisão e a reescrita melhoram

profundamente o texto produzido, “os alunos passam a considerar o texto escrito como

resultado de um trabalho consciente, deliberado, planejado, repensado” (FIAD & MAYRINK-

SABINSON, 1991, p.63), passando a entender que todos são capazes de aprender a arte de

escrever, basta apenas ter vontade, persistência e dedicação.

2. Registros de análise

Ao se iniciar uma pesquisa sobre escrita, em que o material de análise são textos

produzidos num ambiente escolar, é preciso que tenhamos muita determinação,

principalmente se dependermos da colaboração de uma escola para a obtenção desses

registros.

Durante a leitura de Ruiz (2010), questionou-se muito até que ponto se consegue

manter a imparcialidade ao analisarmos produções textuais que foram revisadas pelo próprio

pesquisador. Mas logo que os primeiros contatos com a escola, que supostamente iria fornecer

os registros desta pesquisa se iniciou, ficou claro o porquê de a autora fazer tal escolha.

Mesmo tendo sido explicado à diretora dessa instituição, várias vezes, todos os objetivos e o

modo como o trabalho iria ser encaminhado, esclarecendo que em nenhum momento a

intenção seria avaliar os professores ou a escola e deixando sempre claro que não

divulgaríamos os nomes dos envolvidos, fomos vencidos pelos obstáculos que,

aparentemente, foram colocados de forma intencionais numa tentativa de provocar a nossa

desistência em recolher materiais da escola, o que acabou ocorrendo.

Por mais que todos saibam que o ensino de Língua Materna esteja enfrentando uma

grave crise, especialmente no que se refere à produção textual, as escolas, quando procuradas

para fazerem parte de pesquisas que buscam a melhoria desse problema, sentem-se acuadas

por medo de serem avaliadas. Sabemos que a grande maioria dos professores ainda não está

preparada para realizar um trabalho construtor e edificador com a escrita, talvez, por isso,

sintam-se tão inseguros. Mas, essa insegurança não justifica o boicote às pesquisas, mesmo

porque, é o elo entre as universidades e as escolas de Ensino Fundamental e Médio que

propicia um maior desenvolvimento do ensino. Além disso, todos ganham com essa união:

professores, alunos, pesquisadores e as instituições de educação.

30

Felizmente, ainda podemos contar com educadores e escolas que entendem as

pesquisas científicas como tentativa de buscar soluções para, se não acabar, pelo menos

amenizar os problemas que existem em relação à educação. Assim, após a frustração de não

conseguir as produções necessárias para a análise em uma das maiores escolas privadas de

ensino de Maringá, recebemos apoio em outra, também particular.

O primeiro contato com a segunda escola – feito no mês de outubro de 2010 – não foi

muito diferente da primeira, explicações de como seria encaminhado o trabalho, a qual

instituição estava vinculado, os objetivos, enfim, o momento em que tentamos mostrar a

relevância da pesquisa. O diferencial é que todas essas explicações não foram à toa. Estava

aberto um caminho, que seria longo, mas que traria resultados positivos.

Após algumas idas e vindas e passada toda a etapa burocrática, fomos apresentados às

professoras das turmas que produziriam os textos para análise. Para essa pesquisa, foram

selecionadas duas salas, sendo uma do 4º ano e a outra do 5º ano:

Da turma do 4º ano, composta por 20 alunos, 11 meninos e 9 meninas, tivemos acesso

a 19 produções, sendo que dessas, 8 tiveram uma segunda reescrita, totalizando 27 textos para

análise. Vale ressaltar que, antes mesmo do início da atividade de produção textual, a

professora já tinha o conhecimento sobre a sua utilização como registro de pesquisa. O gênero

textual para o trabalho foi a biografia, trabalhado anteriormente à produção, por diferentes

meios. Em primeiro lugar, a professora apresentou às crianças um filme biográfico e, em

seguida, teve início o trabalho com o livro didático “Coleção mais cores- 4º ano” 2, no

capítulo 7, intitulado “Quem escreve história também tem história”.

O capítulo começa mostrando a importância de se conhecer um pouco mais sobre a

vida de outras pessoas, especialmente a dos autores. Para melhor explicar, traz a biografia da

autora Ruth Rocha e uma entrevista com Ziraldo, seguido, de forma separada, por exercícios

de interpretação e identificação dos pontos que caracterizam os dois gêneros. Na sequência,

apresenta um exercício propondo aos alunos que escolham um adulto e façam uma entrevista

sugerida. As perguntas pré-estabelecidas no livro foram: “Qual é o seu nome completo? Onde

e quando você nasceu? Em que cidade você mora atualmente? Você é casado? Com quem?

Você tem filhos? Quem são eles? Qual a sua idade? Qual é a sua profissão? Onde trabalha?

Há quanto tempo? Qual é a importância de seu trabalho para as outras pessoas? O que gosta

de fazer quando não está trabalhando? Cite um ou mais fatos marcantes em sua vida”. Por

2 Márcia Cristina Knopik. Coleção mais cores- 4º ano. Língua Portuguesa e inglesa. 1ª ed. Curitiba: Positivo, 2009.

31

fim, como proposta de produção textual, é solicitada que, apoiado na entrevista realizada, o

aluno faça uma biografia da pessoa. Como ajuda, o livro traz alguns pontos relevantes para a

produção do gênero, como a necessidade de se colocar um título, de usar todas as informações

levantadas na entrevista e de se usar os verbos na terceira pessoa, diferente da entrevista em

que se usa a primeira.

É claro que, fora a apresentação do filme, bem como o trabalho com o livro didático,

houve a intervenção da professora, explicando melhor os gêneros textuais e auxiliando

durante o processo de produção textual.

Nessa turma, além da primeira, alguns alunos – aqueles que a professora julgou

necessário – produziram uma segunda reescrita. Cabe salientar que as três produções foram

revisadas, embora a última não tenha sido reescrita.

Em relação à turma do 5º ano, formada por 26 alunos, a professora disponibilizou para

fotocópia 21 cadernos da disciplina de Língua Portuguesa. Desses, foram escolhidos 27

produções, usando como argumento para a escolha aquelas que possuíam reescritas, tendo em

vista que alguns textos do caderno não apresentavam essa etapa. Diferente do 4º ano, as

produções textuais dessa turma foram solicitadas sem o conhecimento da pesquisa que as

utilizaria como registros, já que foram produzidas nos meses anteriores ao contato com a

instituição de ensino.

Como não obtivemos maiores detalhes sobre o modo como foram encaminhados os

trabalhos escritos e devido ao pouco tempo de contato com a professora da sala, não podemos

detalhar as atividades que antecederam as produções. O que conseguimos perceber, por meio

dos comandos de produção, é que não há um gênero estabelecido, mas o tipo textual narração,

no qual os alunos deveriam narrar sobre um determinado fato vivenciado ou criado por eles.

3.1. Passos metodológicos

Para auxiliar a leitura da análise, esclareceremos alguns pontos importantes:

a) Como os alunos não são identificados, numeramos os textos de 01 a 46;

b) Os textos que vão de 01 a 27 referem-se aos do 5º ano. Assim, temos texto 01 (1ª

versão) e texto 01 (2ª versão);

c) Os textos 28 a 46 foram produzidos pelo 4º ano. Como estes, em alguns casos, tiveram

mais de uma reescrita, numeramos da seguinte forma: texto 28 (1ª versão), 28 (2ª

versão) e 28 (3ª versão); sendo 11 produções com uma reescrita – totalizando 11

objetos de análise –, e 08 com duas reescritas – totalizando 16 objetos de análise;

32

d) O primeiro passo dado foi analisar as intervenções efetuadas na primeira versão do

texto: local em que se deram os tipos de revisão, pontos problemáticos que não

receberam revisão, resposta do aluno junto aos comentários do professor;

e) Feito o estudo a respeito das revisões na primeira versão, fizemos uma análise das

revisões nas segundas e terceiras versões, com o objetivo de comparar as revisões em

todas as versões dos textos;

f) O passo seguinte foi o de analisar as respostas dos alunos concretizadas nas reescritas,

por meio das operações linguísticas, atentando para quais intervenções receberam, ou

não, resposta; quais os tipos de operações utilizadas; quais trouxeram mais progressão

ao texto; quais levaram a maior reflexão e quais as que pareceram ser mais um

processo mecânico. O mesmo fizemos com as segundas reescritas;

g) Após essas análises, procuramos levantar todas as características recorrentes nos

textos, buscando, além de descrevê-las, interpretá-las, buscando entender todo o

processo, desde a produção textual, a revisão até a reescrita, para compreender quais

caminhos escolhidos levam a uma revisão mais eficaz;

h) Alguns textos apresentam palavras sublinhadas ou circuladas. Trata-se de um

exercício de identificação de substantivos, adjetivos e verbos proposto pela professora.

3.2. Dados quantitativos

Embora a quantidade de textos analisados de cada turma tenha sido a mesma – 27,

somando-se com as duas turmas, 54 produções – o número de apontamentos feitos pelas duas

professoras teve uma grande diferença. Porém, mesmo havendo essa diferença quantitativa3

tão elevada, podemos perceber que o número de alterações realizadas nas reescritas, por meio

das operações linguísticas, não houve praticamente nenhuma discrepância. Para maior clareza

dos dados, segue uma tabela demonstrativa.

Tabela 1- Comparação quantitativa entre o número de apontamentos no 4º e 5º anos e as alterações na reescrita.

3 Neste trabalho não faremos uma comparação qualitativa entre os dados das duas turmas analisadas, pois ambas são analisadas em conjunto.

4º ano 5º ano Apontamentos na 1ª versão 486 363

Alterações na reescrita – 2ª ou 3ª versão – 464 463

33

Em relação ao número de apontamentos efetuados em cada texto, notou-se uma grande

variação. Encontramos, nas duas turmas, textos que apresentavam apenas 03 pontos para

reflexão, até outros que tiveram 65 observações, o que acabava deixando o trabalho confuso

devido ao número elevado de interferências das professoras.

Texto 37 (1ª versão):

O trecho do texto 37 nos parece ser um exemplo bem claro de uma verdadeira

higienização do texto do aluno, conforme nomeou Jesus (2001), em que as revisões são

focadas principalmente em desvios ortográficos. Em apenas 08 linhas da produção,

encontramos 25 alterações da professora junto à escrita do aluno, todas feitas de forma

resolutiva, com exceção da revisão indicativa, apontando para a falta de parágrafo na primeira

linha, indicada por um traço. Essa atitude, além de desconfigurar totalmente a produção do

aluno, não o leva a nenhuma reflexão a respeito dos seus desvios, já que encontra o trabalho

pronto, precisando somente substituir seu texto pelo da professora.

De forma geral, os textos que trouxeram mais sugestões de mudança, se é que

podemos chamar as revisões resolutivas de sugestão, visto que impõem a resposta esperada,

foram os que mais apresentaram mudanças na sua reescrita:

Tabela 02- Comparação entre o número de apontamentos e de alterações a partir das sugestões das professoras.

Textos 08 13 22 27 29 30 32 37 42 Apontamentos 21 27 26 22 30 30 26 65 39 Alterações 25 30 37 24 32 26 35 58 38

34

Percebemos que, na maioria dos casos, os alunos vão, numericamente, além dos

apontamentos da professora. Isso se deve, principalmente, aos comentários das revisões

interativas, já que abrem caminhos para várias modificações que ultrapassam as sugeridas

pelo revisor. Como forma de exemplificar esse dado, destacamos o texto 10, que obteve 08

observações e 21 alterações realizadas.

Texto 10 (1ª versão):

Texto 10 (2ª versão):

Mesmo sem oferecer comentários mais consistentes a respeito de como “caprichar

mais no desfecho”, o registro da docente fez com que o autor do texto 10 enriquecesse de

maneira significativa o final da história, fazendo, a partir de 08 apontamentos na 1ª versão, 21

alterações na reescrita do texto, sendo dessas, 12 só de acréscimos.

Discutiremos mais sobre os resultados dos tipos de correção, sejam eles positivos ou

negativos, em outro momento deste trabalho, assim que comentarmos sobre os tipos de

revisões.

35

3.3. Quanto ao local dos apontamentos

Em relação à localização dos apontamentos feitos pelas revisoras que podem ser

encontrados à margem, no corpo ou na sequência do texto, constatou-se que, dos 849

apontamentos efetuados, 88,6% ocorreram junto à produção do aluno, isto é, no corpo do

texto, 8,5% na sequência e 2,9% na margem.

A distância entre o número de registros no corpo e nos demais locais explica-se pelo

alto número de revisões resolutivas, principalmente por erros de grafia:

Texto 42 (1ª versão):

No entanto, nem todas as observações realizadas no corpo do texto foram resolutivas.

Diferente de Ruiz (2010) que percebeu em sua pesquisa que as revisões textual-interativas

aparecem na sequência do texto do aluno, encontramos vários exemplos desse tipo de

intervenção também diretamente no corpo do texto.

Texto 23 (1ª versão):

36

Texto 23 (2ª versão):

Apesar das indagações “quem?”, “nome?”, “onde viu?” e “e o que mais?” serem

questionamentos curtos, podemos considerá-los interativos, pois, a professora, colocando-se

no papel de leitora e avaliadora, consegue, com os seus apontamentos, manter um elo entre

ela e o autor, auxiliando no desenvolvimento de pontos que não parecem estar bem claros.

Quanto às revisões presentes à margem dos textos, local menos utilizado pelos

revisores, o que se constatou é que os professores, na tentativa de fazerem comentários mais

localizados, e sem ter espaço junto ao texto, ocupam-no, quase sempre com revisões

interativas ou indicativas.

Texto 28:

37

Tanto o uso das revisões no corpo do texto quanto à margem nos parece ser uma

tentativa de chamar a atenção dos alunos sobre os problemas textuais, no próprio local em que

se encontram. Uma escolha muito pertinente, levando-se em conta a idade dos escritores –

cerca de 9 anos. Sobre os resultados dessas estratégias, discutiremos mais durante análise das

revisões textual-interativas.

Já sobre os comentários fixados na sequência do texto, praticamente em sua

unanimidade, são interativos. Sendo, em alguns casos, bem concisos, dando a impressão de

serem apenas uma forma de demonstrar algum tipo de resposta à produção e, em outros,

verdadeiras cartas, bem mais detalhadas. Veja nos textos destacados:

Texto 44:

Texto 34:

38

O que chama a atenção é que, em muitos casos, o texto requer mais considerações,

mas, a professora não o faz, e em outros a revisora parece estar mais disposta a levantar

questões que, se revisadas, proporcionaram um grande progresso textual, sem haver uma

explicação visível para essa atitude.

3.4. Quanto aos tipos de revisão

Durante a análise das revisões feitas pelas professoras, encontraram-se, assim como já

citado por Serafini (1998) e Ruiz (2010), quatro tipos de revisão: a classificatória, a

indicativa, a resolutiva e a interativa. Antes de examinarmos as características encontradas de

cada tipo de revisão, vejamos a tabela com os números totais de revisões:

Tabela 03- Quantidades de cada tipo de revisão

Tipos de revisão Quantidade Porcentagem aproximada Resolutiva 666 78,5% Interativa 118 13,9% Indicativa 57 6,7%

Classificatória 08 0,9%

3.4.1. Revisão resolutiva

Como já era esperado, tendo em vista que esse foi o resultado de tantas outras

pesquisas, dentre elas a de Ruiz (2010), o tipo de revisão mais encontrado nos textos foi a

resolutiva, atingindo a porcentagem de quase 80%. Se retomarmos o número de pontos de

revisão dos 54 textos, ou seja, 849, desses 666 foram resolutivos, ficando claro que a noção de

revisão textual para o professor ainda é a de eliminar todos os erros; e a maneira mais fácil

para esse trabalho de limpeza é a anulação do erro e a inclusão da resposta certa.

Como já dito no início da análise dos registros, a maioria absoluta das revisões

resolutivas se deu no corpo da produção escrita, com exceção do texto 34, no qual a

professora marcou o equívoco no local e complementou na sequência do texto com a palavra

escrita adequadamente:

39

Texto 34 (1ª versão):

Em outro exemplo, da mesma turma, observou-se a correção resolutiva da mesma

palavra – nasceu –, porém de maneira adversa:

Texto 29:

Os textos 29 e 34 nos mostram que não existe por parte das docentes uma

padronização, quando se trata no momento da revisão. No decorrer da análise, podemos

perceber várias manifestações diferentes dos mesmos tipos de apontamentos.

1. Palavras, letras ou trechos escritos equivocadamente:

1.1. Erro sublinhado com o modo correto escrito acima:

Texto 31:

40

1.2. Correção sobre ou sob o erro:

Texto 32:

1.3. Correção junto ao texto do aluno:

Texto 19:

2. Pedidos de exclusão:

2.1. Dois riscos:

Texto 27:

2.2. Risco:

Texto 22:

2.3. X em cima:

Texto 03:

2.4. Rabisco:

Texto 20:

41

Todos os exemplos mostrados no item 2 tratam-se da turma do 5º ano. Isso significa

que a professora, dependendo de sua escolha, pode solicitar a exclusão de um vocábulo, letra

ou até sequência de quatro formas distintas. O problema de não se manter uma estabilidade no

momento da revisão é o de confundir o discente, que pode ficar sem saber qual atitude tomar

por não saber o que o símbolo usado na revisão significa, dada tanta variedade. Nos textos

analisados, as revisões resolutivas sempre receberam resposta positiva dos alunos, ou seja, os

autores readequavam seu texto de acordo com a solicitação da revisora. Porém, esse fato não

prova que tenha havido qualquer reflexão sobre o problema, ao contrário, o que podemos

constatar é que, em certas vezes, o aluno até reescreve da forma que a professora marcou, mas

acaba repetindo o equívoco mais a frente, provando que não houve o aprendizado. Além do

mais, temos que levar em consideração que, em sala de aula, o aluno pode, ao não entender

alguma intervenção, tirar suas dúvidas diretamente com a docente. Mas, quando não é

possível esse diálogo, como ele fará?

O texto 30 é um exemplo dessa falta de conscientização provocada pela revisão

resolutiva. Nela, a professora revisa a palavra “informações” escrita com “m”, o aluno a

corrige na primeira reescrita do texto, mas repete o erro na segunda reescrita.

Texto 30 (revisão):

Texto 30 (1ª reescrita):

42

Texto 30 (2ª reescrita):

Durante todo o processo de análise dos registros, dois pontos problemáticos revisados

pelas professoras pareceram ser recorrentes em quase todos os textos. No entanto, as formas

como foram encaminhadas as revisões a respeito desses assuntos seguiram caminhos nem

sempre parecidos. O uso do verbo haver parece ser um conteúdo ainda não dominado pelos

alunos, algo natural para turmas do 4º e 5º anos, pois não é previsto para as séries citadas. A

escolha de revisão em todos os textos que apresentaram erros com o verbo haver foi de apenas

acrescentar a letra “h” no seu devido lugar, ou seja, resolutiva, sem qualquer explicação. É

claro que, na reescrita do texto, o verbo apareceu redigido da forma correta, pois bastava,

durante a releitura da primeira versão, observar o acréscimo da letra faltosa colocada pela

revisora e incluí-la na segunda versão do texto, como podemos notar no exemplo:

Texto 27 (1ª versão):

Texto 27 (reescrita):

A outra dificuldade apresentada várias vezes pelos alunos no texto foi o uso excessivo

do pronome pessoal “ela” ou “ele”, que seguiu uma linha de revisão diferenciada do problema

com o verbo haver, isto é, as professoras preferiram utilizar, nesse caso, a revisão interativa,

que será vista em seguida.

43

3.4.2. Revisão textual-interativa

Se quiséssemos manter um paradoxo com a revisão resolutiva, certamente seria

comparando-a com a revisão textual-interativa. Somente pelo fato desta ser altamente

dialógica, como afirma Ruiz (2010), e aquela ser monológica, por demonstrar e impor

somente a visão do revisor, já poderíamos estabelecer esse contraste. Entretanto, fora isso,

todos os acarretamentos dos dois tipos de revisões são muito diferentes. Se por um lado a

resolutiva não leva a uma reflexão significativa sobre a produção textual, visto que só gera um

processo mecânico de cópia, a textual-interativa provoca uma reflexão mais profunda a

respeito da escrita do texto, pois faz com que o aluno pare para analisar o comentário do

professor, e procure, por meio das pistas ali deixadas, uma maneira de melhor adequar seu

texto.

O levantamento das revisões interativas dos registros de análise nos mostrou algumas

peculiaridades. Assim como ressaltamos na análise da localização das revisões nos textos –

item 6.2 – encontramos revisões textual-interativas não só na sequência das produções, mas,

muitas vezes, junto ao texto do aluno. Essa atitude tomada pelas professoras nos parece ser

uma forma de levar o discente à reflexão sobre os problemas no próprio local da ocorrência

deles. Levando em consideração a idade dos alunos e analisando os resultados dessas revisões

na reescrita, essa parece ter sido uma escolha muito coerente, como podemos constatar no

texto 01:

Texto 01 (1ª versão):

Texto 01 (2ª versão):

Perceba como comentários simples, mas localizados, fizeram com que a aluna

enriquecesse a situação narrada com mais detalhes, dando mais consistência ao seu texto. O

44

mesmo ocorreu no texto 18, em que o questionamento sobre onde o menino estava andando

mostrou ao escritor que ele poderia especificar o acidente que estava relatando. Com isso, o

aluno não só colocou o lugar onde aconteceu o fato, com também porque ocorreu.

Texto 18 (1ª versão):

Texto 18 (2ª versão):

No entanto, não encontramos revisões interativas só curtas e locais. Observamos

comentários interativos com várias extensões e de todas as formas: com mais informações,

com menos detalhes, relacionados a questões gramaticais ou à temática do texto.

Em relação aos problemas de utilização dos pronomes pessoais “ele” e “ela”, uma das

maiores ocorrências, assim como a dificuldade com o uso do verbo haver, notou-se que a

escolha das professoras, especialmente a do 4º ano, turma em que houve maior ocorrência, foi

a de trabalhar com a revisão textual-interativa, por meio de bilhetes pós-textos. Comparando

os dois problemas e as diferentes formas como foram tratados, constatou-se que, quando a

dificuldade é relacionado à ortografia – aspecto mais pontual – as docentes preferem usar a

revisão indicativa ou resolutiva, e quando a dificuldade tem a ver com o texto no seu todo elas

costumam usar a textual-interativa. A nosso ver, uma escolha correta, visto que apenas uma

indicação ou a substituição realizada pela professora no texto do aluno apenas resolveria

provisoriamente o problema, não levando à reflexão sobre ele. Sobre a revisão relacionada ao

uso dos pronomes “ele” ou “ela”, segue exemplo:

45

Texto 39 (1ª versão):

Texto 39 (revisão):

Texto 39 (reescrita):

Fazendo uma comparação entre as duas versões, podemos perceber que o comentário

da professora chamou a atenção da autora sobre o uso exagerado do pronome “ele”, ajudando-

a na supressão deles. O exemplo é apenas um dos vários em que a professora orientou a

solução desse problema com o auxílio de comentários. Em outros casos, ela nem mesmo

apresentou de forma tão explícita como substituir os pronomes, apenas destacou o uso

excessivo, auxiliando no caminho para sua solução, como podemos notar no texto 31:

Texto 31(revisão):

46

Texto 31 (1ª versão):

Texto 31 (2ª versão):

Essa interação entre professor e aluno trouxe resultados extremamente interessantes.

Os textos 23 e 39 trazem, junto à revisão textual-interativa, manifestações dos alunos a cerca

dos comentários realizados pelas professoras. Neles, os autores procuram, mesmo com modos

distintos, deixar sua palavra ao lado daquela que, supostamente, teria um direito maior à fala

em sala de aula.

A professora escreve ao final do texto do aluno:

“Reescreva seu texto caprichando mais nos detalhes”.

E o autor responde logo abaixo:

“Mudei o final da história”.

Texto 23:

47

No texto 23, temos um diálogo entre professora e aluno mais sintético, mas nem por

isso menos importante que o do texto 39. Já o texto 39 traz um diálogo um pouco maior entre autor e revisor, mesmo porque,

nesse caso, a professora faz apontamentos textual-interativos sobre várias informações e em

diversos locais: no corpo, pós-texto e à margem.

Texto 39:

48

Sobre a frase que encerra o texto “Eu também acho essa pessoa muito legal” a

professora questiona:

“Não entendi???”

E a aluna então responde.

“Minha mãe falou para mim”.

E o diálogo continua:

“Você acha que precisa escrever isso?” Se remetendo ao início do texto – “O nome

dele é Luís Fernando [...]” –.

Manifestando mais uma vez a sua opinião a autora do texto diz:

Sim.

A reescrita do texto mostrou que a aluna modificou os pontos levantados pela

professora, mas essa troca de dizeres mostra a importância dos bilhetes interativos. Em um

ambiente em que, normalmente, a professora tem um maior direito à fala, a discente expressa

sua opinião e defende seu ponto de vista mostrando-se crítica e autêntica.

Entretanto, nem todas as revisões textuais interativas mostraram-se tão positivas.

Notamos em muitos comentários certa superficialidade, dando a impressão de estarem ali sem

nenhum objetivo. Em alguns textos do 4º ano do gênero biografia, mesmo faltando

informações da entrevista que serviu com apoio para a produção, a professora não se refere às

lacunas presentes que poderiam ser preenchidas com uma revisão mais precisa.

Texto 28:

Nesse exemplo, a professora escreve “termine” sem oferecer maiores explicações.

Apenas pede que a autora complete a frase que iniciou e não concluiu, entretanto, não a ajuda

a incluir as informações que faltam, já que nem ressalta esse problema. Além disso, mesmo

com problemas de conteúdo, a docente deixa de comentar a respeito disso, dando preferência

49

ao uso do travessão, sem nem esclarecer porque não utilizá-lo nesse caso, e a letra que precisa

melhorar.

Não podemos esclarecer, somente com base no material analisado, qual é a razão de

alguns textos apresentarem a revisão textual-interativa mais promissora do que outros, mas

ficou clara essa variação de aprofundamento nos comentários e as respostas que, na maioria

das vezes, segue o nível da revisão.

3.4.3. Revisão indicativa

A revisão indicativa foi a segunda menos usada pelas professoras, representando

apenas 6,7%. Esse fato é positivo, pois mostra uma consciência por parte das revisoras que

parecem reconhecer que o uso apenas de um sinal não mostra de forma clara a sua intenção,

podendo confundir o aluno ao invés de ajudá-lo no processo de reescrita.

Fora o problema da ambiguidade comum a esse tipo de revisão, outra dificuldade

oferecida, assim como nos exemplos de revisão resolutiva, foi a sua falta de padronização.

Percebemos nos textos vários símbolos diferentes, marcando o mesmo problema.

1. Problemas de paragrafação:

1.1. Uso de flechas:

Texto 31:

1.2. Quadrado:

Texto 27:

1.3. Asterisco:

Texto 46:

50

1.4. Traço:

Texto 44:

O sinal usado nesse exemplo foi escolhido pela mesma professora para, além de

chamar a atenção sobre a falta de parágrafo, sinalizar o excesso de espaço no início da frase.

Caso o aluno tenha entendido que esse símbolo pede o parágrafo, é possível que, ao invés de

suprimir o espaço, ele acrescente ainda mais ou ao menos deixe como já está, o que acabou

acontecendo:

Texto 33 (1ª versão):

Texto 33 (2ª versão):

2. Problemas de grafia:

2.1. Círculo:

Texto 24:

2.2. Risco embaixo da palavra:

Texto 42:

51

3. Solicitação de exclusão:

3.1. Parêntese:

Texto 20:

3.2. Círculo:

Texto 27:

Ressalta-se que essa variação de sinais, apontando para o mesmo problema, aconteceu

inclusive com o mesmo aluno, ou seja, a professora escolhe símbolos distintos sem a

explicação sobre o que ele significa para mostrar, num único texto, o mesmo erro, como

podemos ver no texto 31 em que as palavras “tempo”, com a letra “m” escrita

inadequadamente, e “agora” com letra minúscula recebem marcações diferentes, referindo-se

a um problema idêntico, ou seja, de grafia.

Texto 31:

A nosso ver, na só a professora deveria criar um padrão de revisão, mas toda a escola,

já que o aluno de uma turma provavelmente passará para outra no próximo ano e terá que se

adaptar a uma nova forma de revisar com símbolos diferentes dos usados pela professora

desse ano. Ficaria mais claro se, desde o início, os discentes tivessem conhecimento das

regras usadas durante o processo de revisão, bem como a metodologia utilizada. As

intervenções realizadas no texto ficariam mais claras, independente da turma ou ano escolar.

4.3.4. Revisão classificatória

Em apenas dois textos constatamos o uso da revisão classificatória, sendo um caso em

cada turma.

52

No texto 13, a professora circulou todas as palavras que não conseguiu entender e

explicou o significado do sinal no final do texto.

Texto 13 (1ª versão):

Texto 13 (2ª versão):

Analisando a segunda versão, percebemos que, na verdade, o aluno apresenta

problemas de troca dos fonemas /t/ por /d/, além da omissão da primeira sílaba de “foram” e

a junção em “de repente”, questões totalmente diferentes e tratadas da mesma forma ou, na

verdade, nem tratadas, tanto que, mesmo trocando, na segunda versão, o /d/ em “tia” por /t/,

em “terrepente” o uso permanece. Esse fato mostra a ineficiência desse tipo de revisão, pelo

menos na série e no texto analisado, tendo em vista que as dificuldades enfrentadas pelo

discente – troca de fonemas – são questões mais sérias que não podem ser tratadas de maneira

tão superficial, resolutivamente.

Já no texto 37, a revisão classificatória teve um caráter resolutivo, tendo em vista que

o sinal colocado pela professora marcava a intenção pré-estabelecida de retirada do vocábulo,

como se não precisasse o julgamento do escritor sobre a questão.

53

Texto 37 (1ª versão):

Texto 37 (2ª versão):

Sobre esse texto do 4º ano, nota-se que em todas as outras produções, sempre que a

professora solicitava a retirada de uma palavra, o pedido era feito de maneira resolutiva ou

com a revisão interativa, por meio de reflexão a respeito do uso ou não do vocábulo. Esse foi

54

o único caso em que foi usada a revisão classificatória para que se excluísse um termo, ou

seja, um recurso incomum para o discente e como parece, para a toda a turma.

Além disso, embora tenha deixado claro que “as palavras marcadas com o sinal *

deviam ser retiradas do texto”, a professora marcou também com um círculo os vocábulos, o

que pode acabar confundindo o aluno, ainda mais por que usa também esse sinal para afirmar

que “UTI” é uma sigla. Como podemos constatar, o aluno até responde a solicitação de

exclusão da professora, mas não nos parece que essa atitude tenha sido tomada com

consciência do porquê da retirada do vocábulo; ele apenas fez o que a docente solicitou.

3.5. Pontos não revisados na 1ª versão e cobrados na reescrita

Em alguns casos, encontramos pontos não revisados na primeira versão do texto e que,

mesmo assim, foram cobrados na reescrita. Segue dois exemplos.

No texto 42, o nome da cidade “Barbosa Ferraz” escrito sem o “r” e com o “is” no

lugar do “z” passa em branco, mas, embora a revisora não tenha atentado para esse problema

no primeiro texto, cobra do aluno na revisão, escrevendo a maneira adequada em cima da

escrita do aluno.

Texto 42 (1º versão):

Texto 42 (reescrita):

A mesma situação ocorreu no texto 35, em que a aluna, na primeira versão, pluraliza

carvão de forma equivocada – “carvãos” – e o problema passa sem revisão. Já na reescrita, a

professora revisa de forma resolutiva.

Texto 35 (1º versão):

55

Texto 35 (reescrita):

Poderíamos pensar que isso possa ter ocorrido porque, como afirmou Cabral (1994), o

professor não precisa marcar todos os problemas do texto, para não deixar o autor confuso e

desmotivado. Mas sabemos que esse não é o caso, pois, como já salientamos, vários textos

tiveram um alto índice de apontamentos, independente da reação que isso pudesse ocasionar.

3.6. Revisões além da 1ª versão do texto

O que podemos observar sobre a revisão na segunda e na terceira versões dos textos é

que a qualidade delas mostrou-se muito inferior. Não estamos tratando aqui somente de

números, que também são menores que os da primeira versão, já que os problemas tendem a

diminuir, uma vez que já passou por uma avaliação, mas o que mais chamou a atenção foi

que, em praticamente todos os casos, a revisão se deu de forma resolutiva, apoiada somente

em problemas gramaticais. Não há, por parte dos professores, uma tentativa de melhorar o

texto sobre seu aspecto mais amplo. É como se a revisão sobre a reescrita já efetuada fosse

apenas um encerramento do processo: eliminam-se de maneira definitiva os poucos erros que

ainda ficaram e encerra-se o trabalho. Os poucos exemplos de revisão interativa encontrados

são concisos e pouco construtivos, inclusive nos casos em que a professora pede uma segunda

reescrita após a revisão. Veja exemplo:

Texto 34 (1ª revisão):

56

Texto 34 (2ª revisão):

O primeiro texto recebe uma revisão ampla, mostrando vários pontos que

apresentaram problemas, que vão desde ortográficos, de paragrafação até a falta de

informações importantes para a construção do texto. Por outro lado, a reescrita que ainda

apresenta problemas quanto a informações que deveriam aparecer e não foram inclusas nem

mesmo com a ajuda da revisão interativa da primeira versão, obtém uma revisão fraca. Ao

questionar “Cadê as informações da entrevista?”, sem dizer quais são as informações a que se

refere, a professora não auxilia o aluno, pois trata do problema de maneira aberta a diferentes

interpretações. Percebe-se alteração inclusive na grafia dos comentários que, no segundo

texto, parece ter sido registrada rapidamente, mostrando menor atenção que a primeira.

3.7. Casos especiais

Na análise dos registros, encontramos quatro casos especiais em que a segunda versão

dos textos apresentou uma grande mudança em comparação com o primeiro. Uma

transformação tão drástica do texto pode ocorrer por duas razões distintas: a) o aluno pode

tomar essa atitude por não entender os comentários da revisão e por isso ficar sem saber o que

fazer, preferindo modificar praticamente todo o texto, b) o aluno senti-se motivado pelos

apontamentos de tal forma que consigue melhorar significativamente seu texto, como o que

ocorreu no texto 05:

Texto 05 (1ª versão):

57

Texto 05 (2ª versão):

Embora os comentários da professora não sejam mais esclarecedores, o aluno mantém

a temática do primeiro texto – as atitudes de bondade da protagonista – e vai muito além da

primeira versão, dando mais detalhes sobre os personagens, mais ação à história, deixando o

desfecho mais claro. A seguir temos mais um exemplo:

58

Texto 02 (1ª versão):

Texto 02 (2ª versão):

59

Diferente do texto 05, no 02, a professora, além de fazer mais comentários, escolheu

perguntas mais pontuais, mostrando a autora quais pontos não ficaram tão claros. Ao ler o

apontamento da revisora – “Conte um pouco mais” –, temos a impressão de um real interesse,

ou até mesmo uma curiosidade em relação à história narrada. Provavelmente, essa também foi

a impressão do autor que sente-se incentivado a melhorar ainda mais seu texto.

Tanto esses quanto os demais casos parecem ser exemplos evidentes da suma

importância que tem o momento da revisão, seja ela feita pelo professor ou pelo próprio autor

e especialmente quando realizada de forma dialógica em que ambos trocam reflexões a

respeito do texto. Partindo dessas reflexões, em um momento de introspecção, os autores dos

textos 05, 21, 23 e 02 conseguiram ir muito além das sugestões do revisor, o que mostra uma

maturidade em relação à escrita.

Todas as modificações, não só nos casos especiais, são realizadas por meio das

operações linguísticas, ou seja, a materialização das respostas à revisão do professor.

3.8. Operações linguísticas

Para a análise da reescrita dos textos, levamos em consideração as operações

linguísticas levantadas por Fabre (1986, apud MENEGASSI, 1998): acréscimo, substituição,

supressão e deslocamento. A tabela 04 apresenta os números encontrados. Na segunda coluna,

temos o número de ocorrências, levando-se em consideração todos os textos dos registros, e

ao lado a porcentagem aproximada, trazendo uma noção mais clara a respeito desses valores.

Tabela 04- Operações linguísticas encontradas na reescrita

Operações linguísticas Ocorrências Porcentagem aproximada Acréscimo 411 44,4% Substituição 321 34,6% Supressão 190 20,5% Deslocamento 05 0,54% Total de operações 927 100%

3.8.1. Acréscimo

O ato de acrescentar alguma informação nova na reescrita do texto, a operação

linguística mais usada pelos alunos, aconteceu por diferentes motivações. A fim de melhor

sistematizar as manifestações dos acréscimos, destacamos uma tabela com os tipos de adições

encontradas nos textos:

60

Tabela 05- Tipos de acréscimo encontrados nos textos Informações 42,1% Conjunção, preposição, artigos ou pronomes 17,%% Letras 12,5% Outros (verbos, títulos, intensificadores...) 9,5% Pontuação 7,5% Acento 6,8% Sílabas 3,2% Parágrafos 0,9%

Total 100%

A adição de pontuação, acentos, letras, sílabas ou outras alterações relacionadas a

aspectos formais do texto se deu devido ao acréscimo já colocado pela professora na primeira

versão do texto, como esse, em que a aluna adiciona a vírgula após “atualmente” e

“trabalhando”, o hífen entre “Maringá” e “PR”, a letra “h” no verbo haver, o ponto final

depois de “casa” e o acento em “bíblia”.

Texto 44 (1ª versão):

Texto 44 (2ª versão):

De forma parecida, a adição de parágrafo se deu por apontamento resolutivo, como no

texto 46:

Texto 46 (1ª versão):

61

Texto 46 (2ª versão):

Entretanto, os acréscimos mais produtivos foram aqueles referentes à temática do

texto, como novas informações, visto que mexeram com o texto no seu geral, e não só em

aspectos pontuais gramaticais. Esses normalmente foram resultados de revisão textual-

interativa. Para entendermos melhor esse tipo de adição, trazemos alguns exemplos

analisados.

Texto 25 (1ª versão):

Texto 25 (2ª versão):

62

Somente nesse trecho encontramos 13 informações acrescentadas ao texto. Algumas

dessas informações foram em resposta às perguntas mais específicas da professora – “Lutou

lutou, por quê?” “para não perder a fazenda” e “Por que devolver a fazenda, já que tinha

ganhado?” porque “não pagou o aluguel dos últimos dois meses”–; outras tentando melhorar

o desfecho. O comentário feito pela docente, embora muito amplo, impulsionou a autora a

explicar de forma mais detalhada o final da história. Isso também ocorreu no texto 27, em que

a revisão textual-interativa escrita bem no local da lacuna deixada no texto resultou num

desfecho mais completo.

Texto 27 (1ª versão):

Texto 27 (reescrita):

3.8.2. Substituição

Assim como o acréscimo, as substituições encontradas nas reescritas textuais se deram

em 81% dos casos pela imposição da professora e, quase sempre, com a revisão resolutiva,

substituindo pontuação, letras usadas incorretamente nas palavras, letras minúsculas em

inícios de frases por maiúsculas, enfim, detalhes pontuais, que quase sempre se remetiam a

problemas ortográficos. O texto 37 exemplifica essas substituições:

63

Texto 37 (1ª versão):

Texto 37 (2ª versão):

O exemplo 37 mostra a situação exposta anteriormente. O aluno substitui as letras

usadas incorretamente pelas adequadas marcadas pela professora: o “r” pelo “n” em

“ambulância”, “chegando”, “atendido”..., o “s” pelo “c” em “paciente” e “cirurgia”; as letras

minúsculas por maiúsculas em “Em seguida” e “chegando”, a grafia da palavra “U.T.I” e

“depois” no lugar de “enseguida”.

Apesar de ter sido a segunda operação linguística mais usada nas reescritas,

percebemos que essa escolha quase nunca partiu do escritor, mas sim, do próprio revisor. Em

um total de 321, apenas 19% das substituições foram tomadas por iniciativa do aluno e,

normalmente, não eram questões gramaticais, mas palavras ou expressões parecidas com as

do primeiro texto, como o ocorrido no texto 10, no qual a aluna substitui “Quer dar uma

voltinha?” por “Vamos dar uma volta?”. Desse total, 19%, 15% foram de textos do 5º ano,

talvez devido a uma maturidade maior desses alunos em relação aos do 4º ano.

64

Texto 10 (1ª versão):

Texto 10 (reescrita):

3.8.3. Supressão

Durante a análise das supressões, constatou-se que, quase em sua totalidade, elas se

dão quando a professora, de forma resolutiva, exclui algo na primeira versão do texto,

riscando, fazendo um “x”, ou colocando outra marcação na palavra a ser excluída, enfim, a

atitude de suprimir alguma informação quase não partiu do escritor, ele apenas respondeu a

imposição do revisor. Seguem dois exemplos.

Texto 45 (1ª versão): A professora marca as partes que devem ser excluídas com

parêntese e asterisco e o aluno as suprime na reescrita do texto.

Texto 45 (revisão):

65

Texto 45 (2ª versão):

Texto 24 (1ª versão): Todas as palavras riscadas são excluídas na 2ª versão.

Texto 24 (2ª versão):

Os casos de supressão, sem a imposição da professora, quase sempre são por distração,

como de vírgulas, acentos ou até palavras que no momento da reescrita passam

despercebidos, ou quando alguma palavra recebe uma revisão indicativa, e sem saber como

proceder, o aluno prefere deixá-la como está, substituí-la ou suprimi-la.

Já as revisões interativas, que levam o aluno a refletir a respeito de alguma escolha

desnecessária ou equivocada, fazem com que a supressão seja um trabalho mais consciente

para o aluno, como vimos na análise da revisão textual-interativa – item 4.3.2 – sobre o uso

66

dos pronomes pessoais “ele” e “ela”, em que conseguiam excluir os pronomes excessivos ou

substituí-los.

3.8.4. Deslocamento

O deslocamento foi a operação linguística menos utilizada pelos alunos, presente em

apenas 03 textos, 05 vezes num total de 927 operações. Esse fato pode ter ocorrido devido a

baixa idade dos autores – por volta de 09 a 10 anos – que concorre com o nível maior de

complexidade desse tipo de operação, já que o seu uso pode modificar completamente a

configuração da sequência textual. Talvez por isso, mesmo quando usado, as sequências

deslocadas foram mais simples, como percebemos no exemplo do texto 17, no qual a aluna

desloca a expressão “quatro gosmas”, sem com isso mudar o sentido da oração.

Texto 17 (1ª versão):

Texto 17 (2ª versão):

O único caso de deslocamento mais complexo foi o do texto 31, em que a operação foi

sugerida e praticamente imposta pela professora por meio da revisão textual-interativa com

caráter resolutivo, já que, embora a professora não resolva pelo aluno o deslocamento no local

encaminha a ação por meio de flechas.

Texto 31 (revisão):

67

Texto 31 (1ª versão):

Texto 31 (2ª versão):

4.8. Resultados das análises dos registros

Após a análise do material, chegamos a alguns resultados separados em um quadro.

Colocamos lado a lado os resultados sobre o trabalho de revisão do professor e os de reescrita

do aluno para que pudéssemos compará-los e, assim, entender melhor como essas duas etapas

se interligam, pois, não são trabalhos realizados isoladamente. A revisão textual tem reflexos

claros não só na reescrita do aluno, mas em todo o seu processo de aprendizagem e, do

mesmo modo, as manifestações dos alunos, seja nos textos ou em sala de aula, a respeito da

revisão refletem no trabalho do professor, que faz certas escolhas por já reconhecer de que

forma o aluno responde a cada tipo de intervenção sua. Assim, segue o Quadro I:

68

Quadro I- Resultados das análises Quanto ao professor Quanto ao aluno

As revisões localizadas no corpo do texto, local mais utilizado pelas professoras, foram, na maioria das vezes, resolutivas, embora outros tipos de revisão tenham sido usados também nesse local.

A revisão situada à margem, local menos utilizado pelas professoras, permite que os comentários sejam mais localizados.

Os comentários efetuados na sequência do texto não possuem uma configuração padrão, podendo aparecer de forma bem concisa ou mais prolixa.

A revisão resolutiva foi o tipo de revisão a qual os professores mais recorreram.

Não houve uma padronização na escolha dos recursos usados para efetuar a revisão resolutiva.

A falta de sistematização no momento da revisão pode fazer com que o aluno fique confuso com tanta variação e não saiba qual atitude tomar sobre determinado problema durante a reescrita.

As docentes utilizaram a revisão resolutiva no tratamento dos problemas com o verbo “haver”.

O uso do verbo “haver” é um conteúdo ainda não dominado pelos alunos do 4º e 5º ano.

As revisoras escolheram, para tratar o uso dos pronomes pessoais, a revisão textual-interativa, em alguns casos de forma mais explícita, em outros menos.

O uso excessivo dos pronomes pessoais “ele” e “ela” foi outra dificuldade enfrentada nas séries analisadas.

A revisão textual-interativa, além da sequência e à margem, localizou-se no corpo do texto.

As intervenções junto ao texto do aluno parece ter sido a melhor opção, tendo em vista a sua idade, pois chamam a atenção para os problemas textuais no próprio local da ocorrência.

Os comentários textual-interativos apresentaram diversas configurações: concisos, extensos, relacionados a questões gramaticais ou a temática do texto.

Algumas intervenções textual-interativas receberam resposta escrita do aluno junto ao texto da professora, mostrando a opinião do discente a respeito dos comentários.

A revisão indicativa foi a segunda menos usada pelas professoras.

O baixo uso da revisão indicativa beneficia o aluno, visto que essa é um tipo de revisão que pode confundir o autor devido a sua falta de clareza sobre o problema.

69

Houve uma falta de padronização na escolha dos sinais utilizados para indicar certo problema na revisão indicativa, inclusive em um só texto.

A revisão classificatória foi o tipo de revisão menos utilizado pelas revisoras.

Em alguns casos, as professoras deixaram pontos sem revisar na primeira versão do texto e, mesmo assim, cobraram na reescrita.

A segunda revisão do texto não recebeu a mesma atenção que a primeira e se prendeu mais a aspectos gramaticais;

Essa atitude passa para o aluno a impressão que a segunda revisão não é tão importante quanto a primeira.

O deslocamento foi a operação linguística menos usada pelos alunos, nas poucas ocorrências foram deslocamentos simples.

A supressão foi a segunda operação linguística menos escolhida pelos alunos, quase sempre se deu devido a pedido de exclusão da professora na primeira versão do texto.

As supressões efetuadas pelos alunos sem a imposição do professor foram de vírgulas, acentos ou até palavras excluídas por distração no momento da reescrita.

O acréscimo foi a operação linguística mais utilizada pelos autores.

A adição de elementos formais como acentos, letras, pontuação, sílabas e outros ocorreu devido ao acréscimo resolutivo da professora no primeiro texto.

A adição de informações ou aspectos relacionados à temática do texto, em sua totalidade, foi incentivada pela revisão textual-interativa.

A substituição foi a segunda operação linguística mais usada pelos alunos, assim como o acréscimo, quando relacionados a problemas gramaticais ocorreram devido a revisão resolutiva da professora, em 81% dos casos.

As substituições tomadas por iniciativa dos alunos – 19% dos casos – foram de palavras ou expressões sinônimas ou parecidas com as usadas no primeiro texto.

70

4. Conclusão

A partir do objetivo geral da pesquisa, que é entender como os processos de revisão e

reescrita se constituem no trabalho de produção textual no Ensino Fundamental I, passamos

por alguns objetivos mais específicos, dos quais, após análise, podemos concluir que a

escolha do tipo de revisão textual e a forma como ela é aplicada interferem na resposta do

aluno expressa na reescrita do texto. Junto a essa conclusão, chegamos às seguintes

constatações:

a) Em relação ao objetivo específico “d” que foi “Analisar e caracterizar as revisões

efetuadas pelos professores em textos de alunos do 4º e 5º anos do Ensino

Fundamental I”, concluímos que as revisões resolutiva, classificatória e indicativa não

permitem que a reescrita do aluno ultrapasse os limites dos apontamentos do

professor, pois não incentivam a reflexão sobre os problemas apresentados, fazendo

com que a segunda versão do texto se desenvolva somente sobre aspectos pontuais

como questões gramaticais ou informações breves e não tão significativas;

b) Ainda respondendo ao objetivo “a” e ao “d”, que foi “Identificar quais comentários

permitem um maior desenvolvimento da escrita do aluno”, verificamos que a revisão

textual-interativa, principalmente quando elaborada de maneira clara, possibilita ao

aluno um trabalho de reescrita mais promissor, já que faz com que o autor reflita a

respeito dos problemas do texto, ultrapassando, muitas vezes, até mesmo os

apontamentos do professor. Alguns textos que tiveram como tipo de revisão a textual-

interativa mostraram na reescrita, inclusive, verdadeiras transformações do primeiro

texto em versões muito mais aprimoradas;

c) Porém, não só esse tipo de revisão como as demais são pouco exploradas quando há

uma segunda revisão textual, o que pode causar uma ideia equivocada sobre o

processo de revisão textual por parte do aluno por entender que essa etapa é

importante somente na primeira versão do texto e não durante todo o processo que vai

até a finalização do produto; constatação ainda em resposta ao objetivo específico “a”:

analisar e caracterizar as revisões efetuadas pelos professores em textos de alunos do

4º e 5º anos do Ensino Fundamental I;

d) Por parte do aluno, podemos constatar que, em praticamente todos os casos, quando o

professor efetua a revisão de forma responsável, mostrando os problemas do texto,

identificando e auxiliando na sua resolução, o autor toma o texto produzido como seu

e responde positivamente ao trabalho do revisor. Em alguns casos, essa resposta pode

71

configurar-se além da superfície da reescrita como forma de resposta junto aos

apontamentos do próprio professor, o que mostra que as etapas de revisão e reescrita

permitem, fora a melhoria do texto, uma troca de opiniões e informações entre os

envolvidos nesse processo; o que responde aos objetivos específicos “b” e “c”:

investigar qual influência que tais apontamentos tem, e de que forma refletem na

reescrita do texto e analisar e caracterizar de que forma se constituiu a resposta do

aluno à revisão do professor;

e) Das quatro operações linguísticas utilizadas pelos discentes, o acréscimo foi a que

mostrou a presença da palavra do aluno de forma mais independente da do professor,

pois nela pode-se perceber informações agregadas ao texto que ultrapassaram os

apontamentos da revisão, o que responde ao objetivo “d”: identificar quais

comentários permitem um maior desenvolvimento da escrita do aluno. Já na

substituição, na supressão e no deslocamento o aluno, quase sempre, limitava-se a

trocar a sua palavra pela da docente.

Após todas as constatações chegamos ao objetivo específico “e”, ou seja, “Traçar um

perfil sobre as etapas de revisão e reescrita nas séries analisadas”. Assim, podemos afirmar

que os processos de revisão e reescrita mostram-se essenciais para o desenvolvimento da

escrita e do aluno como sujeito/escritor, consciente da sua participação no processo de

aquisição e o aprimoramento da escrita. Participação porque a produção de texto,

especialmente em sala de aula, é uma atividade na qual estão envolvidos aluno, professores,

colegas e escola, que juntos aprendem a repensar e reescrever, a cada atividade escrita, os

discursos, em função de um outro.

O trabalho de revisão e reescrita de texto nas séries analisadas ainda mostra muitas

falhas, o que é perfeitamente compreensível, tendo em vista que os professores não são

preparados para a sua realização. A revisão e principalmente a reescrita textual ainda não são

atividades recorrentes em sala de aula. Daí a importância de pesquisas que discutam esses

processos e mostrem caminhos possíveis e viáveis para a sua maior inclusão no ensino de

produção textual.

Sabemos que muitos pontos aqui discutidos podem ser ampliados, por isso, sugerimos

que novas pesquisas investiguem, talvez por meio de entrevista, como professor e aluno veem

os processos analisados no cotidiano escolar e porque fazem algumas escolhas durante esse

trabalho. Além disso, seria interessante pesquisar a interação oral entre revisor e autor durante

72

a produção, revisão e reescrita, pois esses dados mostrariam pontos que não ficam evidentes

somente pela interação escrita.

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6. Referências Bibliográficas

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