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Meio: Imprensa País: Portugal Period.: Bimestral Âmbito: Ambiente e Ciência Pág: 6 Cores: Cor Área: 19,00 x 27,70 cm² Corte: 1 de 7 ID: 89424303 31-10-2020 ENTREVISTA Entrevista por CÁTIA VILAÇA | Fotografia D.R. CARLOS COSTA Especialista em consultoria geoambiental, Carlos Costa ajuda-nos a perceber o (longo) caminho que Portugal ainda tem a percorrer no sentido de uma efetiva proteção dos solos, a começar pela legislação em matéria de contaminação. Para o também presidente da recém-formada Associação Técnica para o Estudo de Contaminação de Solo e Água Subterrânea, que promete trazer estes temas para a agenda, esse quadro legislativo seria fundamental para alavancar o conhecimento e o desenvolvimento tecnológico nesta área.

CARLOS COSTA - Universidade NOVA de Lisboa

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Corte: 1 de 7ID: 89424303 31-10-2020ENTREVISTA

Entrevista por CÁTIA VILAÇA | Fotografia D.R.

CARLOS COSTA

Especialista em consultoria geoambiental, Carlos Costa ajuda-nos a perceber o (longo) caminho que Portugal ainda tem a percorrer no sentido de uma efetiva proteção dos solos, a começar pela legislação em matéria de contaminação. Para o também presidente da recém-formada Associação Técnica para o Estudo de Contaminação de Solo e Água Subterrânea, que promete trazer estes temas para a agenda, esse quadro legislativo seria fundamental para alavancar o conhecimento e o desenvolvimento tecnológico nesta área.

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Corte: 2 de 7ID: 89424303 31-10-2020Indústria e Ambiente (IA): Neste momento, quais as principais ameaças à saúde dos so-los em Portugal? As práticas agrícolas, a ur-banização, a exploração de recursos, a sobre-carga do litoral, eventualmente insuficiência em matéria de legislação?Carlos Costa (CC): Todas essas questões es-tão interligadas e têm a sua contribuição re-levante, mas eu naturalmente começaria pela última que referiu, a insuficiência em matéria de legislação. Portugal é um dos poucos paí-ses na Europa sem legislação própria em ma-téria de proteção do solo, em particular nos aspetos relacionados com a contaminação, e paga caro por isso. Fazendo um pouco o his-torial dessa situação, desde o fim do século passado que, por diversos caminhos, várias pessoas e entidades têm vindo a exigir uma legislação de proteção dos solos no que se refere às questões da contaminação e, por um motivo ou por outro, essas situações têm vindo a ser bloqueadas. Como marcos mais relevantes nesse bloqueio podemos referir o facto de não ter ido para a frente a proposta de diretiva comunitária de 2006, que cairia 10 anos depois, precisamente por não ter sido implementada nesse prazo. As razões para isso prendem-se com o facto de a maior par-te dos países desenvolvidos já ter legislação específica, e querer evitar comunitária que os obrigasse eventualmente a responsabilidades complementares. Assim, todos os países sem legislação, como Portugal, ficaram incumbi-dos, se quisessem, de desenvolver os seus próprios diplomas nesta matéria. Em 2016 foi apresentada uma proposta de legislação co-nhecida pela sigla PRoSolos, que tem estado na gaveta, apesar de ter havido uma consul-ta pública, um resultado da consulta pública, uma revisão com base nos resultados dessa consulta e promessas dos sucessivos secre-tários de Estado de que essa legislação seria aprovada ou apresentada no Parlamento. Não ocorreu até ao momento e isso tem conse-quências muito graves.IA: A que se deve este descaso com a legisla-ção e tudo o que isso implica?CC: Do meu ponto de vista, deve-se ao facto de uma parte dos agentes económicos não estar interessada na implementação desta legislação. Outra parte está, nomeadamente aqueles que estão ligados ao ambiente, e em

particular os operadores da gestão de resí-duos, que obviamente querem saber com que linhas se cosem. Também é verdade que se a legislação avançasse o mercado ampliaria, é uma consequência lógica do seu funciona-mento. Outra parte muito relevante tem a ver com as atividades potencialmente poluidoras. Essas entidades, de alguma forma, temem o efeito da internalização dos custos no proces-so produtivo. Nós temos vindo a sofrer uma quantidade de vicissitudes em termos econó-micos: primeiro as questões relacionadas com a presença da troika, depois uma recuperação difícil e não muito consolidada e agora final-mente a situação da pandemia, e tudo isso são argumentos, razoáveis ou não, que levam a que parte substancial dos agentes económi-cos, e mais especificamente ainda das indús-trias ligadas a setores mais poluidores, como é o caso das petrolíferas, procurem dilatar o mais possível a aprovação destes instrumen-tos legislativos.IA: Os temas ambientais têm merecido muita atenção da opinião pública mas isto acontece um pouco por fases. Agora estamos na fase do plástico e toda a atenção é dominada por esse tema, mas dos solos pouco se tem fala-do. Qual tem sido a estratégia da associação para sensibilizar e informar os cidadãos acer-

ca destas problemáticas?CC: A AECSAS é uma associação muito re-cente, não tem sequer um ano de existência. Surgiu por vontade de um grupo de pessoas que se juntaram para debater mais intensa-mente estes temas na sociedade portuguesa, primeiro em torno de uma conferência inter-nacional que está a ser preparada mas que, como todas as iniciativas do mesmo tipo, foi bloqueada agora por esta situação [pandé-mica], e depois eventos remotos, que temos vindo a desenvolver com bastante regulari-dade. Amanhã [15 de setembro] haverá outro webinar exatamente sobre a temática que es-tamos a referir. A associação, neste momento, não pode apresentar, para além destas inicia-tivas, um grande currículo. Mas temos vindo a tentar sensibilizar o setor, em particular algumas associações empresariais e também ONG, com quem temos vindo a realizar pro-tocolos de colaboração na área da formação, divulgação e sensibilização. Esperamos que estas temáticas possam alcançar uma di-mensão que permita, sem nos substituirmos ao Estado, desenvolver, de forma suplemen-tar, legislação, orientações e recomendações. É um tema extremamente complexo, que tem a ver essencialmente com a proteção do solo mas que depois se liga com todos os outros

”(...) TEMOS VINDO A TENTAR SENSIBILIZAR

O SETOR, EM PARTICULAR ALGUMAS

ASSOCIAÇÕES EMPRESARIAIS

E TAMBÉM ONG, COM QUEM TEMOS VINDO A REALIZAR

PROTOCOLOS DE COLABORAÇÃO

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Corte: 3 de 7ID: 89424303 31-10-2020fatores ambientais que dependem, de alguma forma, da saúde do solo, desde logo as águas subterrâneas, que no fundo acabam por rece-ber todo o impacto daquilo que nós produzir-mos sobre o solo.IA: Entre os contactos preliminares que a associação possa estar a desenvolver neste momento, têm encetado algum tipo de rela-ção com as autarquias? O desenvolvimento das cidades impacta muito diretamente na saúde dos solos, o que levanta questões como a alteração do uso do solo e a impermeabili-zação. Existe algum contacto no sentido de se abordar estas questões?CC: De facto as autarquias deviam ter um pa-pel primordial nestas matérias. Curiosamente, são muito fechadas a este tipo de iniciativas. Queria por exemplo sublinhar que o SEPNA [Serviço de Proteção da Natureza e do Am-biente], um organismo que depende da GNR, mostrou-se desde logo extremamente inte-ressado em trabalhar connosco nas questões da sensibilização e divulgação destas temáti-cas. Já as autarquias, por exemplo a Câmara de Lisboa, primam pela ausência, mesmo com sessões de esclarecimento – e existiram algu-mas antes do início da pandemia, como foi o caso de uma no Fórum Lisboa em janeiro ou fevereiro deste ano. Embora estejam na sua casa, acabam por receber as pessoas para os debates e, por uma razão ou por outra, não estão, o que é manifestamente preocupan-te. Isto demonstra a incipiência da temática e do desenvolvimento de todos os agentes que para ela devem contribuir. Referiu as autar-quias, que eu penso que é um agente maior, junto com a administração central do Estado, mas na verdade é um tema que atravessa toda a sociedade no aparente desconheci-mento das consequências da contaminação. Isto verifica-se na indústria, promotores imo-biliários e empresas de construção civil, e re-feri aqui três entidades que têm de ter muita atenção às questões da contaminação do solo porque lidam com elas todos os dias. Há um desconhecimento muito grande que também é potenciado pela ausência de legislação, pela ausência de normas e de regulamentos, pela ausência de metodologias harmonizadas. Existem efetivamente algumas guidelines, mas não foram, do meu ponto de vista, sufi-cientemente divulgadas e apresentadas junto

geotecnia não são as adequadas para reali-zar trabalhos de investigação em termos de contaminação, mas não havendo empresas para fazer esta investigação, recorre-se a empresas de geotecnia, que têm muito baixo nível de conhecimento, e inclusivamente aca-bam por deformar os próprios programas de investigação da contaminação aos interes-ses da geotecnia. Só para dar um exemplo: se nós estamos a realizar uma obra para as fundações de um edifício que se verificou es-tarem numa área de solos contaminados, em vez de se fazer um programa de investigação para saber onde está a contaminação com base no modelo conceptual de investigação da fonte do trajeto e dos recetores que po-dem ser afetados, vamos tirar amostras de sondagens feitas para fins geotécnicos. Se é necessário estudar a capacidade de carga da fundação de um edifício, é dali mesmo que vamos tirar a amostra, mas ninguém nos ga-rante que aquele ponto corresponde ao sítio onde a contaminação deve ser investigada. Há uma subordinação por parte de todos os protocolos de investigação da contaminação nestes locais, que vai levar a que os resulta-dos não sejam os mais fiáveis. Por outro lado,

”HÁ UM DESCONHECIMENTO

MUITO GRANDE QUE TAMBÉM É

POTENCIADO PELA AUSÊNCIA DE

LEGISLAÇÃO, PELA AUSÊNCIA DE NORMAS E DE REGULAMENTOS,

PELA AUSÊNCIA DE METODOLOGIAS

HARMONIZADAS.

dos agentes económicos. Todo o desconhe-cimento sobre a temática leva a consequên-cias nefastas para o desenvolvimento deste tema, nomeadamente o uso de tecnologias de descontaminação de baixo nível de desenvol-vimento. Em Portugal, muito mais de 90 por cento das descontaminações são conhecidas na gíria internacional como dig and dump, ou seja, cavar e depositar em algum lado, o que logicamente é uma tecnologia de baixo nível, comparável à deposição de resíduos em ater-ro, cada vez mais contrariada por abordagens de maior valor ambiental. As restantes tecno-logias, relativamente correntes na Europa e nos Estados Unidos, só para referir dois mun-dos que nos dizem respeito, são praticamente ignoradas. A par da ausência de tecnologias de ponta, também não há empresas capazes de desenvolver essas tecnologias, que possam fazer investigação in situ com o uso de tecno-logias próprias para investigação da contami-nação, sendo genericamente substituídas por empresas de sondagens, que fazem estudos para fundações, para necessidades que têm a ver com o mundo geotécnico, muito diferente do mundo geoambiental. As técnicas, meto-dologias, protocolos e normas utilizadas em

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ENTREVISTA

PERFILCarlos Nunes da Costa é professor aposentado da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, onde se doutorou em Geotecnia com uma dissertação sobre reabilitação ambiental de explorações mineiras a céu aberto. Após o exercício de cargos dirigentes em entidades públicas e privadas, em 1998 fundou a eGiamb-Consultoria Geoambiental, Lda., dedicada essencialmente à avaliação da contaminação de solos e águas subterrâneas e à resolução de passivos ambientais. Preside à Direção da Associação Técnica para o Estudo da Contaminação do Solo e Água Subterrânea (AECSAS).

tudo isto tem consequências também nas próprias empresas de consultoria, que não se desenvolvem porque não têm mercado para isso. Embora só haja meia dúzia de empresas consultoras nesta área em Portugal, a ativi-dade das grandes empresas internacionais de consultoria é quase residual, o que significa que o mercado não se desenvolveu ao ponto de as atrair. Por outro lado, as entidades ou os clientes deste mercado têm tão baixo grau de exigência que os trabalhos tendem a não interessar, do ponto de vista comercial, por-que são demasiado baratos. As operações são de baixo valor, não se investigam total-mente os processos que têm de ser investi-gados. É o caso das intrusões de vapores no solo e do solo para edifícios. É uma matéria extremamente importante e com elevado de-senvolvimento noutros países e pode-se di-zer que em Portugal isso praticamente não se investiga. No Parque das Nações [o assunto] devia estar na linha da frente da investigação: os contaminantes que existiam e porventu-ra ainda existem naquele sítio podem estar a afetar não só os edifícios que se pretende vir a construir como os que já existem. Muito pouco é monitorizado no sentido de saber se

país, em particular na área metropolitana de Lisboa, onde existem pedreiras a sul e a norte da capital, ou na zona de Sesimbra, os areeiros na zona de Coina, e a norte todas as extrações de calcário no Carregado. Como consequência drástica, as pedreiras, num processo dito de recuperação paisagística, muitas vezes admi-tem como materiais de reabilitação materiais que não foram estudados e inventariados em termos de concentrações de contaminantes. Muitas vezes estamos a trabalhar em áreas que apresentam elevadas permeabilidades no solo e na rocha. Nos calcários as permea-bilidades são muito grandes, o que significa que vamos colocar material em locais que já foram escavados e destituídos da camada de proteção superior, ou seja, dos solos mais impermeáveis, de cobertura. Entramos assim nas zonas com as fraturas mais profundas, que podem atingir o aquífero com facilidade – muitas vezes o aquífero já foi atingido e é essa a razão que leva as explorações a parar. Mas mesmo com o aquífero raso, muitas vezes es-ses materiais potencialmente contaminantes são colocados e raramente, tanto quanto é do meu conhecimento, existe um plano de reabi-litação paisagística que se debruce sobre este

existem efeitos sobre os contaminantes que porventura se mantêm no terreno e que pos-sam, por via da volatilização, ascender para as casas onde as pessoas habitam. Isto é todo um mundo de desconhecimento que nós pre-tendemos, enquanto associação e enquanto profissionais da área, despoletar, quer através desta via da realização de eventos, quer no dia a dia, com uma prática que é por vezes invi-sível, através de contactos pela rede de pro-fissionais, e também do que estamos a fazer convosco ao apresentar estes temas. IA: Apesar da mediatização da questão do lí-tio, naturalmente o tema da exploração de re-cursos não se esgota aqui. De uma forma ge-ral, considera que Portugal tem seguido uma política responsável de salvaguarda do solo e da água na exploração de recursos minerais?CC: Não, obviamente que não. Em muitos paí-ses, em particular do norte da Europa, como Inglaterra e Noruega, muitos dos materiais correntemente extraídos e que ocorrem em áreas vastas, com baixo valor unitário, viram a sua extração praticamente proibida. Ao invés, as pedreiras em Portugal continuam a ter o seu campo de expansão, mesmo (e principal-mente!) nas grandes áreas metropolitanas do

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Corte: 5 de 7ID: 89424303 31-10-2020tipo de material. Não é a primeira nem a se-gunda vez nem será a última que determina-do material contaminado sai de uma obra em Lisboa para ser colocado numa pedreira na zona de Vialonga, e a empresa de construção é obrigada a ir removê-lo. No entanto, o mal já está feito e a contaminação já está a ocorrer. No que se refere à questão do lítio, é um as-peto particular. Importa referir que ainda pouco se sabe sobre os projetos que se pre-tende desenvolver. Do pouco que se sabe so-bre o mais divulgado, na zona de Montalegre, pretende-se efetuar uma escavação de al-gumas centenas de metros de profundidade e com uma amplitude de vários hectares de desenvolvimento em área, e naturalmente que a engenharia consegue tudo. A engenha-ria pode mitigar, preservar, através de me-canismos de controlo, de monitorização, os seus efeitos mais nocivos. Mas não sejamos ingénuos: qualquer exploração a céu aberto, e mesmo as explorações subterrâneas, têm impactos muito importantes. Esses impactos verificam-se ao nível do solo, que neste caso até seria totalmente removido e praticamente deixaria de existir no local, e também a nível das águas subterrâneas. Para profundidades dessa natureza é necessário fazer rebaixa-mentos, altera-se os percursos da água esta-belecidos há milénios dentro dos maciços ro-chosos e sem o devido estudo hidrogeológico que garanta que os efeitos negativos produ-zidos sobre a rede previamente estabelecida e agora afetada sejam mitigados ao máximo.IA: Um estudo holandês publicado em setem-bro de 2018 sugere que serão necessários en-tre 3,2 e 4,5 milhões de toneladas de metais até 2030 para alcançar as metas com que o país se comprometeu em matéria de energia renovável, ou seja, para a produção de pai-néis. Naturalmente que continuar a explorar combustíveis fósseis não é uma opção. Como vamos conseguir cumprir esta necessidade da transição energética sem provocarmos um desequilíbrio noutro lado, neste caso com a exploração de recursos minerais?CC: A realidade holandesa não pode ser com-parada com Portugal ou outros países, até porque a Holanda, salvo um pequeno pedaço do seu território, não tem áreas onde possa fazer explorações mineiras…IA: Estaremos a falar de importação…

CC: Esse estudo estará nitidamente influencia-do pelo contexto da Holanda e outros países que não têm a possibilidade de fazer esse tipo de exploração. Agora, julgo que não podemos desprezar o facto de Portugal aparentemente possuir reservas interessantes que permitem, de alguma forma, uma política energética ca-paz de substituir, a médio prazo, a nossa de-pendência sobre os combustíveis fósseis, e julgo que essa questão é central e não deve ser desprezada. Nós vemos que outros países, até mais avançados do que nós, estão recor-rer novamente ao carvão, como é o caso da Alemanha. Do meu ponto de vista é um erro porque está-se a dar um passo atrás relativa-mente ao controlo das emissões atmosféricas. O regresso a essas políticas de consumo de combustíveis fósseis parece-me um retroces-so. Podemos pôr num dos pratos da balança a questão de termos recursos que nos permitem desenvolver as energias renováveis e afastar de vez uma economia baseada numa ener-gia com recurso a combustíveis fósseis, e no outro prato da balança a necessidade de con-trolar os impactes ambientais do uso destes novos recursos para as energias renováveis. Um dos aspetos que não pode ser esquecido, e que penso que normalmente é esquecido, é a qualidade de vida das populações onde esses recursos são explorados. Não é por serem 50 ou 100 pessoas com um fraco poder de com-pra que os seus interesses devem ser coloca-dos de lado, até porque certamente não está muito longe o momento em que teremos de olhar para o capital natural como um recurso

valiosíssimo para muitos países, em particular para nós, quer ao nível das questões do tu-rismo, quer ao nível das questões da susten-tabilidade ambiental no seu todo. Não estará muito longe o tempo em que vamos pagar aos nossos agricultores para manterem os modos tradicionais de vida no seu território, e não é colocando-lhes uma mina à porta que essa si-tuação se consegue desenvolver.IA: O novo programa quadro Horizonte Euro-pa, que irá arrancar agora em 2021, tem um conjunto de missões associado, e uma des-sas missões é precisamente relativa aos so-los, sendo que a meta europeia é termos um mínimo de 75 por cento de solos saudáveis em cada um dos estados membros até 2030. Alcançar isto significa articular a agricultura, a floresta, as cidades, uma multiplicidade de atores em torno de um objetivo comum. Como é que caminhamos para esse objetivo?CC: Caminhamos caso a caso. Os solos sau-dáveis serão uma componente fundamental de garantia da saúde pública e infelizmente, mesmo nas próprias cidades, não se tem em conta que não basta fazer algumas hortas em redor da cidade ou em zonas que já foram utilizadas para fins agrícolas, esquecendo que estamos noutro tempo, com muita contami-nação, e tráfego, inclusive aéreo – não nos esqueçamos das toneladas de contaminan-tes que são despejados sempre que os aviões passam a caminho do aeroporto Humberto Delgado ou do aeroporto Francisco Sá Carnei-ro, e que permanecem no solo, podendo acu-mular-se em cultivos que inadvertidamente pensamos serem saudáveis mas vêm trazer problemas para a saúde pública. Esta questão da contaminação dos solos é transversal às cidades e logicamente aos campos. Nos campos os problemas são de outra natureza. Têm a ver com o uso inten-sivo de pesticidas, de inseticidas, de produtos fitofarmacêuticos, que são utilizados de for-ma muito intensa em culturas. Hoje em dia está na moda o olival intensivo, e começa a entrar também o amendoal intensivo, que é três vezes mais prejudicial do que o olival. Existe um conjunto de culturas que, pela sua capacidade de penetração no mercado, exige um crescimento muito rápido e com base em substâncias químicas que muito dificilmente rastreamos. É normal, quando fazemos um

”NÃO ESTARÁ MUITO LONGE O TEMPO EM

QUE VAMOS PAGAR AOS NOSSOS AGRICULTORES

PARA MANTEREM OS MODOS TRADICIONAIS

DE VIDA NO SEU TERRITÓRIO (...)

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