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Teoria da Fraqueza Relativa dos Gigantes Extraído de: Carneiro, F. L., "Análise Dimensional e Teoria da Semelhança e dos Modelos Físicos", 2 a Edição, Editora UFRJ, pp. 158-160, 1996. Para que o comportamento de um protótipo seja semelhante ao de um modelo reduzido, é necessário portanto que ou o peso específico do material do protótipo seja menor do que o do material do modelo, ou que a resistência característica do material do protótipo seja maior que a do material do modelo. A essa conclusão chegou Galileu, em sua teoria da fraqueza relativa dos gigantes, exposta em sua obra derradeira, e a de mais alto valor científico, Discorsi e Dimostrazioni Matematiche intorno a Due Nuove Scienze. Galileu mostra que quando se comparam dois corpos geometricamente semelhantes, as forças resistentes estão entre si como o quadrado da escala geométrica, ao passo que os pesos próprios se relacionam com o cubo dessa escala. Quando se passa de um modelo reduzido ao protótipo, a importância relativa do peso próprio cresce de tal maneira que ao ser atingido um tamanho limite o protótipo gigante rui pela ação exclusiva de seu peso próprio, ao passo que o pequeno modelo é capaz de suportar cargas adicionais, além do seu peso próprio. Com essa constatação, de que não basta a simples semelhança geométrica para que dois processos ou sistemas físicos tenham comportamento semelhante, Galileu colocou-se claramente como pioneiro da teoria da semelhança física, já pressentida pelo arquiteto Vitruvius ao afirmar, no início da era cristã, que "há algumas coisas que, quando aumentadas, imitando pequenos modelos, são efetivas; outras coisas não admitem modelos" (39). É interessante transcrever aqui trechos da obra citada (40) de Galileu, onde, além das duas alternativas, citadas anteriormente, é também sugerida uma terceira que será tratada mais adiante: a da distorção geométrica: "Podeis ver claramente, pelo que foi demonstrado, a impossibilidade de aumentar as estruturas até grandes dimensões, seja na arte, seja na natureza; seria impossível fabricar barcos, palácios ou templos excessivamente grandes, cujos remos, antenas, vigas, correntes de ferro, e, em suma, todas as demais partes, se mantivessem unidas; nem a natureza pode produzir árvores de tamanho desmesurado, porque os seus galhos se romperiam sob o seu próprio peso; e seria igualmente impossível fazer estruturas ósseas para homens, cavalos e outros animais, capazes de subsistir e exercer suas funções normalmente, se tais animais alcançassem tamanhos imensos, a menos que se empregasse um material muito mais duro e resistente que o usual, ou se deformassem os ossos, aumentando desproporcionalmente sua espessura, de tal maneira que se tornariam monstruosos. Está claro portanto, que se quiséssemos manter num gigante as mesmas proporções do homem normal, seria necessário encontrar um material mais duro e resistente para fabricar seus ossos, ou então admitir que sua robustez fosse muito menor proporcionalmente à de um homem de pequeno porte; e se crescesse desmesuradamente vê-lo-íamos cair sob seu peso próprio. Por outro lado observa-se que quando o tamanho diminui, a força não diminui, mas cresce proporcionalmente: creio que um pequeno cão poderia suportar

CARNEIRO, F. L. - Teoria Da Fraqueza Relativa Dos Gigantes

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CARNEIRO, F. L. - Teoria Da Fraqueza Relativa Dos Gigantes

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  • Teoria da Fraqueza Relativa dos Gigantes

    Extrado de:Carneiro, F. L., "Anlise Dimensional e Teoria da Semelhana e dos ModelosFsicos", 2a Edio, Editora UFRJ, pp. 158-160, 1996.

    Para que o comportamento de um prottipo seja semelhante ao de um modeloreduzido, necessrio portanto que ou o peso especfico do material do prottipo sejamenor do que o do material do modelo, ou que a resistncia caracterstica do materialdo prottipo seja maior que a do material do modelo. A essa concluso chegouGalileu, em sua teoria da fraqueza relativa dos gigantes, exposta em sua obraderradeira, e a de mais alto valor cientfico, Discorsi e Dimostrazioni Matematicheintorno a Due Nuove Scienze. Galileu mostra que quando se comparam dois corposgeometricamente semelhantes, as foras resistentes esto entre si como o quadradoda escala geomtrica, ao passo que os pesos prprios se relacionam com o cubodessa escala. Quando se passa de um modelo reduzido ao prottipo, a importnciarelativa do peso prprio cresce de tal maneira que ao ser atingido um tamanho limiteo prottipo gigante rui pela ao exclusiva de seu peso prprio, ao passo que opequeno modelo capaz de suportar cargas adicionais, alm do seu peso prprio.

    Com essa constatao, de que no basta a simples semelhana geomtrica para quedois processos ou sistemas fsicos tenham comportamento semelhante, Galileucolocou-se claramente como pioneiro da teoria da semelhana fsica, j pressentidapelo arquiteto Vitruvius ao afirmar, no incio da era crist, que "h algumas coisasque, quando aumentadas, imitando pequenos modelos, so efetivas; outras coisasno admitem modelos" (39).

    interessante transcrever aqui trechos da obra citada (40) de Galileu, onde, alm dasduas alternativas, citadas anteriormente, tambm sugerida uma terceira que sertratada mais adiante: a da distoro geomtrica:

    "Podeis ver claramente, pelo que foi demonstrado, a impossibilidade de aumentar asestruturas at grandes dimenses, seja na arte, seja na natureza; seria impossvelfabricar barcos, palcios ou templos excessivamente grandes, cujos remos, antenas,vigas, correntes de ferro, e, em suma, todas as demais partes, se mantivessemunidas; nem a natureza pode produzir rvores de tamanho desmesurado, porque osseus galhos se romperiam sob o seu prprio peso; e seria igualmente impossvel fazerestruturas sseas para homens, cavalos e outros animais, capazes de subsistir eexercer suas funes normalmente, se tais animais alcanassem tamanhos imensos,a menos que se empregasse um material muito mais duro e resistente que o usual,ou se deformassem os ossos, aumentando desproporcionalmente sua espessura, detal maneira que se tornariam monstruosos. Est claro portanto, que se quisssemosmanter num gigante as mesmas propores do homem normal, seria necessrioencontrar um material mais duro e resistente para fabricar seus ossos, ou entoadmitir que sua robustez fosse muito menor proporcionalmente de um homem depequeno porte; e se crescesse desmesuradamente v-lo-amos cair sob seu pesoprprio. Por outro lado observa-se que quando o tamanho diminui, a fora nodiminui, mas cresce proporcionalmente: creio que um pequeno co poderia suportar

  • sobre seu dorso dois outros ces iguais a ele, mas creio que um cavalo no poderiasuportar nem sequer o peso de outro cavalo".

    Em outro trecho Galileu observa que se uma baleia fosse tirada da gua, no seriacapaz de suportar seu peso prprio, e mostra "uma outra forma... para fazer com queos gigantes ou outros animais muito grandes pudessem subsistir e mover-se como osmenores: isso seria possvel no somente aumentando a resistncia dos ossos e dasoutras partes cuja funo a de suportar o peso prprio e as sobrecargas; mastambm mantendo as mesmas propores da estrutura ssea, esta resistiriaigualmente se reduzssemos o peso especfico do material dos ossos, assim como opeso especfico da carne e de tudo que se apoia sobre os ossos. E desse segundoartifcio serviu-se a natureza para produzir a estrutura dos peixes, fazendo seus ossose sua carne no somente mais leves, mas at mesmo sem peso algum".

    Referncias Bibliogrficas

    39. CARNEIRO, Fernando L. L. B. Galileo e a Teoria da Semelhana Fsica.Seminrio Internacional 350 Anos dos Discorsi Intorno a Due Nuove Scienze,de Galileu Galilei, So Paulo: Marco-Zero e COPPE/UFRJ, 1989.

    40. GALILEI, Galileo Discorsi e Dimostrazioni Matematiche intorno a Due NuoveScienze. Ed. Rig. Leida: Elzevirii, 1838; ed. a cargo di A. Carugo e L.Geymonat, Paolo Boringhieri, Torino, 1958.