Castells,M. A sociedade em rede. Cap 7

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  • 5/14/2018 Castells,M. A sociedade em rede. Cap 7

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    I f

    Manuel Castells

    A SOCIEDADE EM REDEV olu me I

    2~EdicaoTraduciio: Roneide Venancio Majer

    com a colab ora cso d e K lauss B ran din i G erh ard t

    ffiPAZ E TER RA.' .

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    M an ue l C a st el lsT ra d uz id o d o o ri gi na l: T he r is e o f t he n et wo rk s oc ie ty Para Emma Kiselyova-Castells,

    cujo amor, trabalho e apoio foram decisivosp ar a a c xi st en ci a d cs tc li vr o.

    e lP - B ra s il . C a t aJ o ga c ; :a o -N a -Fo n te( Si nd ic ar o N ac io na l d os E di ro re s d e L iv ro s, R ], B r as il)

    C as te lls , M a nu el , 1 94 2-A sociedade em rede/Manuel Casrell s; t r adu c ;: ao : Rone ide Venancio M a je r .

    . - (A era ci a inforrnacao: economia, sociedade e cultura, v. I)S ao P au lo : P az e T er ra , 1 99 9.

    I SBN 85 -219 -0329 - 4

    I n c lu i b i b li o gr a fi a

    99-0358 CDD-303.483CDU-316.422,44

    C344s

    I. Tecncl ogi a da i nf ormacao - Aspectos sociais, 2. Tecnologia da infor-macae - Aspectos econornicos. 3. Sociedade d a i n fo rma c ; :a o . 4. Redes de

    informacao. 5. Te c no lo g ia e c i v il i za c a o.1. Titulo .I l. S e ri c ,

    E DITO RA P AZ E T ER RA S AR ua d o T r iu n fo , 17 70 121 2-010 - S ao Pa ulo-S PTel.: (all) 223-6522Fax: (0 11) 223-6290

    1999Impresso n o B r a si l I P ri nt ed i n B ra zi l

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    Sumario

    Ilustracoes 12Tabelas 14Agradecimentos. ' .. , , .. ' . .. 17Prologo: A Rede e 0Ser , . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21Tecnologia , soc ied ad e e tran sforma c ao h is t6r ic a , , 24Informacionalismo, industrialismo, capitalismo, es ta tis mo: m od os d ed es envo lv im en to e modos d e prod ucao 31o in fonnac iona l is rno e e perestroyka cap i ta l i s ta 36o Ser n a soc ied ad e in fon n ac ion a l. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38A lg um as p ala vr as s ob re 0metodo .. , , , . , , 41Notas 431, A Revolucao da Tecnologia da Informacao . . . . . . . . . . . . . . . .. 49Que revolucao? 49Licc es d a Revolucao In dus tr ia l , , 53A sequen c ia h is t6r ic a d a Revolucao d a Tecnologia d a In fo rm ac ao 57

    M ac ro mu du nc as d a m ic ro cu gc nb ur in : c lc tr en ic u c in fo rm ll< ,: i1 o , , . . . . , 58o d iv iso r tecnologico d os a no s 70 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. .. 64Tecno logias d a vid a . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65o contexte social e a dinamica da transformacao tecnologic a 68

    M od elos , a tores e loc ais d a R evoluc ao d a Tec nologia d a In form ac ao . . . . 70o pa ra d igma d a tecnologia d a in forma c ao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77Nota s , , . , 812. A economia informacional eo processo de globalizacao, . . . . . . 87Introducao 87

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    a Sumario

    Produtividade, competitividade e a economia infonnacional. . . . . . . . . .. 88o enigma da produtividade _ __ . 88A produtividade baseada em conhecimentos e especifica da economiainformacional? _ '.' __ _ __ . 90In formacionalismo e cap italismo , pr odu tiv idade e lu cratividade __ 100

    107109

    A rep ol i ti z a c ao do capitaJismo infonnacional .. _ _ . _.A especificidade his tor ica do informacionalismo _ .

    A economia global: genese, estrutura e dinamica .Os limites da globalizacao _. _ . _ .A diferenciacao regional da economia global .A segmentacao da economia global _ . _ . __ .As fontes de competitividade na econornia global .

    A mais nova divisao internacional do trabalho _.. _ .Mudanca dos modelos da div is ao intemac iona1 do t raba1ho naeconomia informacionallglobal: 0 poder da triade, a a scensao daregiao do Pacifico C 0 fim do Tcrcciro Mundo _.. _ __ 12 4Fontes de c resc imento e est agnacao na div isao internacional dotrabalbo: amudanca do destino da America Latina _ .. _ ..... _ . _ .. __ 131A dinarnica de exc lusao da nova economia globa l;o destino da Africa? _. _ .. _ _ 14 8A ult ima f rontei ra da economia globa l: a incorpora cao segmentada daRussia e das ex-republicas sovieticas .... _. .. . . .. _ ..... _ .... _ _ 15]

    A arquitetura e a geometria d a economia infonnacional/globaL . . . .. .. 159Apendice: Alguns comen tarios metodologicos sab re as politicas de ajuste daAf rica e sua ava lia cao _ .. _ .. _ . . _ . . . _ . . _ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161Notas._ .. _ _ _ .. _.. _ _ 164

    11111511 7120121123

    3. A empresa em rede: a cultura, as instituicces e as organizacoes daeconomia informacional .. _ .. _ 173In troduc ao _ . __ .. _ _ .. _ _ _ __ . _. 173Trajetorias organizacionais n a r e es t ru t ur a c a o do cap italismo e na t r ans i cao doindustrialismo para 0 in form a c ion a lismo _ _ . _ 17 4

    Da p roducao em massa a p roduca o flexivel _ _ . . . . . .. 175A empresa depequeno porte e a crise da ernp resa de grande porte:mito e rea1idade _ _ 176"Toyotismo": cooperacao gerentes-trabalhadores, mao-de-obramul ti func iona l, controle de qua lidade tot al e reducao de incer tezas .. _ 178

    Sumario 9

    Formacao de redes entre empresas . . . . . . . . . . . . . . . _ .. _ 181Aliancas corporativas estrategicas . _. . . . . . .. 183A empresa horizontal e as redes globais de empresas _ " 184A crise do modele de empr esas ver ticais e 0 desenvolvimento dasredes de empresas _ . __ _ __ _ __ . .. 187

    A t ecnologia da informacao e a empresa em rede. 18 8Cultura, inst i tuicoes e o r ga n i z a c ao e conom i c a : redes d e empresas doLeste asiatico .. _ .. __ , _ . _ .. _ . 192Tipologia das redes de empresas do Leste asiatica _ . _ . _ _ 193Cultura, organizacoes e ins ti ru icoes: redes de empresas asi at icas e 0Estado d esen volv imen tis ta .. _ _ . __ _ . _ . _ . _ . .. 199

    Empresas mul tinacionais , empresas t ransnacionai s e redesinternacionais . __ _ _ _. . . . . ... . . . 208o espirito do infonnacionalismo __ .. __ 213Notas. __ _ _ _ _ __ 218

    .4. A transformacao do trabalho e do mercado de trabalho: trabalhadoresa tivos na rede, desempregados e trabalhadores comjornadaflexivel. _ _. 223

    A e vo lu c a o h i st or ic a da estr utur a ocupacionaJ e do emprego nospaises capitalistas avancados: 0G-7, 1920-2005 _ _. . . . . 224o pos -indus tr ia li smo, a economia de services e a sociedade

    in form ac ion a l, _ _ . _ _ _ . _ . . . . . .. 225A t r a ns formacao da estrutura do emprego, 1920-70 e 1970-90 _ . . . .. 230A nova estrutura ocupacional _ . _. __ _. _. . . . . . . . . 23 8o amadurecimento da sociedade informacional: projecoes de empregopara 0 seculo XXI. _ _. ~ _ _. _ . _ 243Resume: a evolucfio da estrutura do emprego e suas conseqiienciaspar a uma analise comparativa da sociedade in formacional __ . . . . . .. 249

    Hi uma forca de trabalho global? _ __ . __ . _ 254o processo de trabalho no paradigma infonnacional . . . . . . . . . . . . . . . . . 262Os efeitos da t ecnologia c ia informacao sobre 0mercado de trabaIho: rumo auma sociedade sem empregos? .. _ __ __ . . . . . . . . . 273 .o trabalbo e a div isao info rmacional: trabalh ador es de j ornada flexivel .. 285A tecnologia da informacao e a reest ru turacao das relacoes capita l- trabalho:dualismo social ou sociedades fragmentadas? __ 293

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    Netas 0000 0 0 000000 0 0 O 0 0 0 0 0 0 O 0 0 0 0 0 0 O 0 0 0 O '0 299Apendice A: Tabelas de dados esta tfsticos referentes ao capftulo 4 . 0 O 305Apendice B: Observacoes metodol6gicas e dados estatisticos ... 0 0 335Nota 0 00000000 .000 0 0 0 0 o 0 000 ' 0 0 o 3525. A c ultura d a v ir tua lid ad e rea l: a in tegra ca o d a c orn un ic ac ao eletron ic a,o fun d a a ud ien cia d e m as sa eo s urgim en to d e red es in tera tiva s 0 353Introducao .. 0 0 0 ' 0 . 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 353Da galaxia de Gutenberg a galaxia de McLuhan: 0 surgimento da cultura damidia de massa .. '. 0 0 0 . 0 0 0 0 , 0 0 ' 0 0 0 0 c 0 0 0 o. 355A nova midia e a diversificacao da audiencia de massa, 0 , 0 0 0 0 o. 362Comunicacao mediada por computadores, controle instituciona l, redes sociais ecomunidades virtuais , 0 0 0 0 0 0 ' 0 o . 366

    A hist6ria do Minitel: I 'etat et l'amour . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 367A constelacao da Internet 0 , , 369A sociedade intera tiva . 0 0 0 o , , 0 0 0 , , , 0 , '0 o 382

    A grande fusao: a multimidia como ambiente simb61ico .. , 0 387A cultura da virtualidade rea l o 0 0 0 00 0 0 0 , 0 , 0 0 '0 0 0 000 394Notas , , 3986.0 espaco de fluxos 0 0 0 0 00 0 0 0 0 0 , 0 , , 000 0 '0 0 O 0 0 0 0 0 000 403Introducao .. 0 0 0 0 0 0 0 0 0 00 000 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 403Services avancados, fluxos da informacao e a cidade global. 0 0 0 o . 405o novo espar;o industr ia l .. 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 . 412o cotidiano do dornicilio eletr6nico: 0 fun das cidades? 419A transformacao da forma urbana: a cidade informacional . 0 0 0 423

    A u lt im a f ro n te ir a s u b ur b a n a dos Estados Unidos . , 0 0 , 0 o . 424o charme evanescente das cidades europeias , . , , .. . . .... .... 425Urbanizacao do terceiro milenio: megacidades 0 . , 0 , , , 428

    A teoria soc ia l de cspa90 e n tcoria d o e sp ny O d e fluxos , .. '".. 0 0 435A arquitetura do firn da historia, , ... 0 0 44'2Espaco de fluxos e espayo de lugares ... 0 0 0 0 . 447Notas .. ... 0 0 , 0 '" 0 , , 0 0 , , 0 , 4527. a limiar do etemo: tempo intemporal '" 0 457In tr od uc ao , 0 0 0 0 , 0 0 , 0 0 0 , 457

    Sumario II

    Tempo, historia e sociedade. 0 0 0 , , , , , 457Tempo como fonte de valo r: 0 cassino global. , .. , .... 0 , 461A flexibilidade dajomada de trabalho e a empresa em rede .. 0 , 0 , 464o encolhimento e a a lt er ac a o do tempo de serv ice 0 0 466A indeterrninacao dos limites do cicIo de vida: tendencia para a arritmiasocial? . o 0 '" 0 0 , 0 0 , 472Neg a c ao d a morte 0 , , 47 7Guerras instantaneas , 0 0 , , , 0 481Tempo v i rt u a l . . 0 , 0 486Tempo, espa

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    o limiar do etemo: tempo intemporal

    IntroducaoSomas tempo incorporado, e tarnbem 0 sa o nossas soeiedades, formadas

    pela his toria. Mas a simplicidade. dessa afirmacao esconde a complexidade doconceito de tempo, uma das categorias mais controversas em ciencias naturais etarnbem em ciencias sociais, cuja centralidade e salientada pelos debates atuaisde teoria socia!. I De fato, a transformacao do tempo sob 0 paradigma da tee-noJogia da inforrnacao, delineado pelas praticas sociais, e urn dos fundamentosde nossa nova sociedade, irremediavelmente Iigada ao surgirnento do espaco def luxes. Alem disso, de acordo com 0 ensaio elucidative de Barbara Adam sobretempo e teoria social, pesquisas recentes em fisica e biologia parecem convergirpa ra as ciencias sociais na adocso de urn conceito contextual do tempo hu-mano.? Todo tempo, na natureza como na sociedade, parece ser especif ico a urndeterminado contexto: 0 tempo e local. Enfocando a estrutura social emergente,afirmo, baseado em Harold I nn i s , que "a mente da atual idade e a mente quenega 0 tempo", ' e que esse novo "sistema temporal" esta l igado ao desenvol-virn cnto das tccno logias de comun icacao . Assim , pam avaliar a transforrnacfio dotempo humane no novo contexte social sociotecnico talvez seja util apresentar Limabreve perspectiva hist6rica dasmudancas da relacao entre tempo e sociedade.

    Tempo, hist6ria e sociedadeEm uma obra classica, Whitrow mostrou como as concepcoes de tempo

    tern var iado consideravelmente ao longo da histor ia , indo da determinacao dodestino humane n os horoscopes babi16nios irevolucao newtoniana do tempoabsolute como principio organizador da natureza." E Nigel Thrift lembrou-nosde que tempo nas sociedades medievais era uma ideia sol ta , com alguns eventos

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    458 o l imiar do eterno

    importantes (comemoracoes religiosas, feiras, chegada das estacoes) no papelde marcadores temporais, enquanto a maior par te da vida diaria passava des Ii-gada da nocao exata de tempo.' Como ilustracao da imensa variacao contextualdesse fato cotidiano aparentemente ta.osimples, usemos alguns paragrafos paranos lembrar da transformacao do conceito de tempo na cultura russa, em doisperiodos hist6ricos cruciais: as refonnas de Pedro, 0 Grande, e a ascensao equeda da Uniao Sovietica."

    A cultura popular tradicional russa achava que 0 t empo era ete rno, semcomeco nem fim. Na decada de 20, Andrey Platonov enfat izou essa ideia arrai-gada daRussia como uma sociedade internporal. No entanto, a Russia era perio-dicamente sacudida por.esforcos estatistas de modernizacao com 0 objetivo deorganizar a vida em tome do tempo. A primeira tentativa del iberada de ajuste davida ao tempo originou-se com Pedro, 0 Grande . Ao voltar de uma longa via-gem ao exterior para instruir-se sobre modos e meios dos paises mais desen-volvidos, 0 czar decidiu levar a Russia, literalmente, a urn novo inicio, mudandopara o calendario europeu ocidental (juliano) e cornecando 0 novo ana em ja-ne iro em vez de setembro, como fora ate entao. Nos dias 19 e 20 de dezembrode 1699, Pedro, 0Grande, emitiu dois decretos que iniciariam 0 seculo XVIII n aRussia alguns dias depois. Foram prescritas instrucoes minuciosas sobre a cele-bracao do ana novo, inclusive com a adocao c ia arvore de Natal e acrescimo deurn novo feriado para seduzir os tradicionalistas. Embora urn grande numero depessoas estivesse maravilhado com 0 poder do czar de al terar 0 curso do sol,muitas outras preocupavarn-se com a ofensa a Deus: afinal lOde setembro naoera 0 dia daCriacao no ano 5508 a.C.? E nao deveria ser assim porque 0 ousadoa te da Criacao t inha de ocorrer em epoca de ca lor, fato muito i rnprovavel naRussia em janeiro? Pedro, 0 Grande, respondeu pessoalmente aos criticos, emseu modo pedag6gico habitual, ensinando-lhes a geografia do tempo global. Suateimosia fundarnentava-se na rnotivacao refonnista para igualar a Russia a Eu-ropa e enfat izar as obr igacoes das pessoas em relacao ao Estado sob a perspec-tiva do tempo. Ernbora esses decretos se concentrassem rigorosamente nas mu-dancas do calendario, as reformas de Pedro, 0 Grande, em tennos mais amplosintroduziram a distincao entre 0 tempo do dever rel ig ioso e 0 tempo secular aser dedicado ao Estado. Medindo e tributando 0 tempo das pessoas , bern comodando seu exemplo pessoal com intenso cronograma de trabalho baseado notempo, esse czar inaugurou uma tradicao secular de associacao de service para 0pais, submissao ao Estado e ajuste da vida ao tempo.

    No primeiro estagio da Uniao Sovietica, Lenin cornpar ti lhou com HenryFord a admiracao pelo taylorismo e pela "organizacao cientifica do trabalho",com base na medicao do tempo de trabalho para 0 menor rnovirnento da linha

    o limiar do etemo 4 5 9

    de montagern. Mas a compressao do tempo sob 0 comunismo suraiu com umaguinada ideoJ6gica decisiva.? Enquanto no fordismo a aceleracao do trabalhoestava associada a dinheiro com aurnento de pagamento, no stalinisrno nao 56 0dinheiro era urn mal segundo a tradicao russa, mas 0 tempo dever ia ser aceIe-rado por rnotivacao ideol6gica. Portanto, "stakhanovismo" significava trabalharmais por unidade de tempo como um service para a pais, e pIanos de cinco anoseram cumpridos em quatro como prova da capacidade da nova sociedade para arevolucao tempora l. Em maio de 1929, no Quinto Congresso dos Sovietes daUniao, que rnarcou 0 triunfo de Stalin, tentou-se urna acelerayiio ainda maior dotempo: jornada de trabalho sem direi to a descanso sernanal Inepreryukay. Em-bora 0 objetivo expIicito da reforma fosse 0 aumento da producao na tradicao daRevolucao Francesa, _adestruicao do ritmo semanal da pratica religiosa repre-sentava uma motiv acao ainda mawr. Entao, em novembro de 1931, introduziu-se urn dia de descanso a cada seis dias, mas 0 ciclo tradicional de sete dias aindaera negado. Protestos de familias separadas por diferencas de horarios entre seusmembros motivararn a volta da sernana de sete dias em 1940, par ticularmenteap6s ter-se percebido que as cidades adotavam 0 modelo de seis dias mas amaior parte do inter ior ainda seguia a sernana tradicional , introduzindo umadivisao cultural perigosa entre os camponeses e os trabalhadores industriais. Naverda~e, embora a coletivizacao forcada da agricultura visasse a eliminacao doconcerto comunal de tempo em ri tmo lento, enraizado na natureza famili a ehistoria, difundiu-se uma resistencia social e cultural a essa imposicao demos-trando a profundidade do fundamento temporal da vida social. Mas , embora 0tempo fosse reduzido no local de trabalho, 0 horizonte temporal do cornunismosempre era considerado no longo prazo e, em certa medida, et erno, como foiexpresso na imortalidade personificada de Lenin e na tentativa de Stalin tornar-,se um Idolo em vida. Assim, na decada de 90, a queda do cornunisrno deslocouos russos, em especia l a s novas classes profissiona is, do horizonte de longoprazo do tempo hist6rico para 0 curto prazo do tempo monetizado caracteristicodo capital ismo, dessa forma pondo urn f im it separacao estatista secular entretempo e dinhei ro. Com isso, a Russia uniu-se ao Ocidente no exato momentaem que 0 capitalismo desenvolvido revolucionava sua estrutura temporal,

    As sociedades conternporaneas ainda estao em grande par te dominadaspelo conceito do tempo cronologico, descoberta categorica/rnecanica que E. P.Th.omps?n, 8 en~re outros, considera importantissimapara a constituicao do capi-talismo industrial, Em termos materiais, a modemidade pode ser concebida co-mo 0 dominio do tempo cronol6gico sobre 0 espaco e a sociedade tema desen-volvido por Giddens, Lash e Urry, e Harvey. 0 tempo - como' repeticao darotina diana, de acordo com Giddens," ou como "0 dorninio da natureza, quando

    ,I :I II' I1'1II' J ' ~I I I ; ,i

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    46 0 o l ir n ia r d o e te rn o

    todos os tipos de fenomenos, praticas e lugares ficam sujeitos a marcha centrali-zadora e unive rsal izante do tempo", nas palavras de Lash e U r ry ,' ? - esta noamago do capitalismo industrial e do estatismo. 0 maquinismo industrial trouxeo cronometro pa ra as linhas de montagem das fabricas fordistas e leninistasquase ao mesrno tempo. I I As viagens para lugares distantes do Ocidente no finaldo seculo XIX passaram a ser organizadas com base no Horatio Medic de Green-wich, como materializacao da hegemonia do Imperio Britanico, No entanto, urnseculo depois, a const ituicao da Uniao Soviet ica foi marcada pela organizacaode urn imenso terr itor io com base na hora de Moscou e fusos horarios decididosde forma arbitraria pela conveniencia dos burocratas, ignorando a distancia geo-grafica, E importante notar que 0 primeiro ato de rebe!dia das Republicas Balti-cas durante a perestroyka de Gorbachov foi votar pela adocao do fuso horar iofinlandes para a hora oficial de seus territories.

    Esse tempo linear, i rreverslvel, mensuravel e previsivel esta sendo frag-mentado na sociedade em rede, em um movimento de extraordinaria importan-cia historica. No entanto, nao estamos apenas testemunhando uma relativizacaodo tempo de acordo com os contextos sociais ou, de forma altemativa, 0 retornoa reversibilidade temporal. como se a realidade pudesse ser inteirarnente captadaem mitos ciclicos. A transforrnacao e mais profunda: e a mis tura de tempos paracriar um universo eterno que nao se expande sozinho, mas que se mantem por siso, nao ciclico , mas aleator ic , nao recursivo, mas incursor: tempo intemporal,u ti lizando a tecnologia para fugir dos contextos de sua existencia e para apro-priar , de maneira seletiva, qualquer valor que cada contexto possa oferecer aopresente etemo. Afirmo que isso esta acontecendo agora nao apenas porque 0capital ismo se esforca para l iber tar-se de todas as restricces , ja que, apesar denao conseguir rnaterial iza-Ia total mente, essa tern s ido a tendencia do s is temacapitalista.'? Nem e suficiente rnencionar as revoltas culturais e sociais contra 0'tempo cronologico, vi sto que ca racteri zaram a hist6ria do ul timo seculo semrealmente reverter seu dominio, na verdade desenvolvendo sua logica mediantea inclusao da dist ribuicao da vida no contrato social com base no tempo ere-nologico.!' A libe rt acao do capita l em re lacao ao tempo e a fuga da cultura aorelogio sao decisivamente facil itadas pelas novas tecnologias da informacao eernbutidas na estrutura da sociedade em rede.

    Feitas essas consideracoes, prosseguirei com a especificacao de seu signi-ficado, de forma que no fim deste capitulo a analise sociolcgica possa substituiras afirmacfies metaforicas. Para faze-lo sem uma repeticao aborrecida, contareicom as observacoes empir icas apresentadas em outros capitulos deste l ivro so-bre a transformacao dos var ies dominies da estrutura social e acrescentarei asilustracoes ou analises necessarias para completar nosso entendimento. Dessa

    o l im ia r do e te rno 461

    forma, examinarei seqiiencialmente os efeitos que as transformacdes em anda-mento nas esferas econornica, polit ica, cul tural e social tern sobre 0 tempo eterminarei com uma tentativa de reintegracao do tempo e doespaco em sua novarelacao contraditor ia . No estudo da atua! transformacao do tempo em esferassociais muito diversas , serei urn tanto esquematico em rninhas afirmacces, jaque e rnaterialmente impossivel apresentar, em poucas paginas, um desenvol-vimento total da analise de dominies tao complexos e diversos como sistemafinanceira global, tempo de service, ciclo vital, morte, praticas de guerra e midia.Contudo, ao lidar com tantos assuntos diferentes, tento extrair, alem dessa diver-sidade, a logica compartilhada da nova temporalidade que se manifesta em todaa garna da experiencia humana, Portanto, 0 objetivo deste capitulo nao e resumira transformacao da vida social em todas as suas dimensi5es, mas, ao contrario,mostrar a consistencia dos padr5es no surgimento de um novo conceito.de tem-poralidade, que chama de tempo intemporal.

    Devo fazer outro alerta. A transformacao do tempo, conforme .foi pesqui-sada neste capitulo nao diz respeito a todos os processos, agrupamentos sociaise territories de nossas sociedades, embora, sem duvida, afete todo 0 planeta. 0que chamo de t em p o i n tem p o ra l e apenas a forma dominante emergente do temposocial na sociedade em rede porque 0 espaco de fluxos nfioanula a existencia delugares. Afirmo que a dominacao social e exercida por meio ciainclusao seletivae da exc lusao de funcces e pessoas em di ferentes est ruturas tempora ise es-paciais . Voltarei a esse tema no final do capitulo, apes ter analisado 0 perfil dotempo em sua nova forma dominante.

    Tempo como fonte de valor: 0 cassino globalDa'vid Harvey representa de forma apropriada as transformacoes atuais do

    capitalismo sob a formula de "cornpressao temporal e espacial''." Em nenhumlugar essa 16gica e mais evidente que na c irculacao globa l de capit al. Comoanalisamos no capitulo 2, durante a decada de 80 a convergencia da desregula-mentacao global do sistema financeiro e a disponibilidade de novas tecnologiasda informacao e novas tecnicas de gerenciamento transformaram a natureza dosmercados de capitais. Pela primeira vez na historia, surgiu urn mercado de capi-tais global unificado, funcionando em tempo real.t? A explicacao do volumefenomenal de f luxos f inanceiros transnacionais , como foi demonstrado no ca-pitulo 2, esta na velocidade das transacoes." 0 mesmo capital e transportado deurn lado para outro entre as economias em questao de horas, minutos e, as ve-zes, segundos.'? Beneficiados pela desregularnentacao, desintermediacao e abet-

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    1200 19861 0 0 0 J990'" 1992'" 8 0 010.c:E 6 0 0!ACIl:: > 4 0 0

    2 0 00 Reina Uuido EUA Japao Total

    Figura 7.1 Transacoes diarias medias nas balsas de valores, 1986-92 (US$ bilhoes)Fonte: Chesnais e Serfati (1994), citado em Chesnais (1994); baseado nos rclatorios

    trienais do Bank for Iruernauonul Seulement.

    tura dos mercados f inancei ros internos , poderosos prograrnas cornputacionais ehabi lidosos especial is tas em computadores/anali stas financei ros sentados nos n6sglobais de uma rede seletiva de telecornunicacoes literalmente participam dejogcs com bilhocs de d6Ifll'CS.IH A principal su lu de curtcudo dcsxc cusxiuu de-tr6nico e 0 mercado rnonetar io , que expJodiu na ultima d ec a da , t ir an d o van-tagem das taxas de carnbio flutuantes. Em 1995 , US$ 1,2 trilhfies foram rno-vimentados todos os d ias no mercado monetario (ver f igura 7 .1 ) . 1 9 Essesjogadoresglobais nao sao especuladores deseonhecidos, mas gran des ban cos de investi-mentos, fundos de pensao , empresas mul tinacionais ( claro, inclus ive indus trias ) efundos mutuos organizados exatarnente para manipulacao financeira.P FrancoisChesnais identificou cerea de 50 grandes jogadores nos mercados financeirosglobais." No entanto, como afirmei anterionnente, uma vez que se gerem tur-bulencias no mercado, os fluxos assumem, lir;ao que os bancos centrais apren-deram a cus ta de repetidas grandes perdas. 0 tempo e crucial para a geracao delucros em todo 0 sistema. E a velocidade da transacao, a s vezes com prograrnacaocomputacional automatica para tomadas de decisao quase ins tantaneas, que gerao ganho - ou a perda. Mas tambern e a cir cularidade temporal do proeesso,urna sequencia implacavel de compras e vendas, que caracteriza 0 sistema. Aarqui te tur a do s is tema financei ro global de fa to e construida com base em fusoshorarios, com Londres, Nova York e T6quio, ancorando as tres transferencias decapi ta l, e van os cen tros financei ros nao-ortcdoxos , inf luenciando as pequenas d is-

    o limiar do ererno 463

    crepancias entre os valores de mercado na hora da abertura e do f echa rnen to . "A lc m d is so , u rn n um cr o significativo c c rc sc en te d e t ra ns ac oc s fi na nc ci ra s b as cia -se em obtencao de valor a partir da captacao do tempo futuro nas transacoespresentes , como nos mercados de futuros , o pc oes e outros mercados de capitaisde derivativos.P Juntos, esses novos produtos financeiros aumentam drastica-mente a massa de capital nominal vis-a-vis os dep6sitos e ativos bancarios, deforma que e apropriado dizer que tempo gera d inhe i ro , a medida que todosapostam Dole com 0 dinheiro futuro previsto nas projecoes dos computadores."o pr6pr io processo de negoc i acao do desenvolvimento futuro afeta esses desen-volvimentos, de maneira que a estrutura temporal do capital e constantemented issolvida em sua manipulacao presente ap6s receber urn valor f ict icio para mo-netariza-lo. Portanto, 0 cap ital nao s6 compr ime 0 tempo: absorve-o e vive da(isto e , gera renda econornica) digestao de seus segundos e anos. As consequen-cias materiais dessa digressao aparentemeote abstrata sobre tempo e capital saocada vcz mars scnt idas nas cconorn ias C lin vida diaria ern todo 0 mundo: crisesmoneta r ia s recorrentes, in t roduzindo l ima era d e in sta bi lid ad e ec on or nic a es rr u-tural e, sem duvida, pondo em risco a integracao europeia; a inabilidade de 0invest imento de capi ta l prever a futuro, 0 que prejudica os incent ives para inves-timento prcdutivo; a destruicao de empresas e sells empregos - independen-temente do desempenho - em virtude de rnudancas repentinas irnprevistas noccnririo f inancciro ern que opcrnrn: ;t l acuna progrcss iva entr e os lucrns 11[1]11'0-d uca o d e bens e services e as rendas geradas na esfera d e circulacao, dcssaforma transferindo uma parcela cada vez maior da poupanca mundial para 0jogo financeiro; os riscos crescentes para os fund os de pensao e passivos deseguros privados, assim introduzindo um ponto de interrogacao na seguranca(adqui rida com sacri ficios ) dos t rabalhadores de todo 0 mundo; a dependencia deeconomias inteiras - e particularmente as dos paises em desenvolvimento -de 'movimentos de capital em grande parte determinados por percepcao sub-jetiva e turbulencia especulativa; a destruicao, na experiencia coletiva das 80-ciedades, do padrao de comportamento de satisfacao adiada, em beneficia daideolog ia cornum do "dinheiro facil" que enfatiza 0 j ogo individual com a vida ea economia; e 0 prejuizo basilar a percepcao social da correspondencia entreproducao e recompensa, trabalho e significado, etica e riqueza. Parece que 0puritanismo foi enterrado em Cingapura em 1995 junto com 0 veneravel Barin-gs Bank." E 0 confucion isrno perdurara na nova economia apenas enquanto "0sangue for mais grosse que a agua"," ou seja, enquanto os la905 familiarescontinuarem promovendo a coesao social alem da pura especulacao no admi-ravel mundo novo do sistema de jogos financeiros. A invalidacao do conceito detempo e a rnanipulacao do tempo por mercados de capitais globais gerenciados

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    eletronicamente sao urn componente da fonte de novas formas de devastadorascrises economicas que adentram 0 seculo XXI.

    A flexibilidade dajomada de trabalho e a empresa em redeA suplantacao do tempo tarnbem esta no amago das novas formas organi-

    zaciona is de at ividade economica por mim ident ificadas como a empresa emrede. Formas flexiveis de gerenciamento, utilizacao continua de capital fixo, de-sempenho intensificado de trabalhadores, aliancas estrategicas e conexoes interor-ganizacionais, tudo isso promove a cornpressao do tempo de cada operacao e aaceleracao da movirnentacao de recursos. Na verdade, 0 sistema de gerencia-mento de estoque just in time foi 0 s imbolo da prcducao enxuta, mesmo, comomencionei anteriormente, pertencendo a era pre-eletronica da tecnologia indus-trial. Mas, na economia informacional, esta cornpressao temporal nao dependeprincipalmente de extrair mais tempo dos trabalhadores ou mais trabalho do temposob 0 imperativo do relogio, Como 0 potencial de realizacao de valor do trabalho edas organizacbes e muito dependente da autonomia de profissionais esclarecidospara tomadas de decisao em tempo real, 0 gerenciamento disciplinar tradicionalde trabalhadores nao se adapta ao novo si st ema produtivo." Em vez disso, Mnecess idade de mao-de-obra qualif icada para gerenciar seu tempo de maneiraflexivel, algumas vezes acrescentando mais horas de trabalho, outras adaptando-se a cronogramas f lexiveis , em alguns casos com reducao de horas de trabalhoe, consequenternente, de salario, Esse novo gerenciamento de trabalho com en-foque no tempo poder ia ser chamado, como sugere John Urry, "trabalhojust intime".

    Para.a empresa em rede 0 periodo de adaptabilidade a dernanda do mer-cado e a s transformacoes tecnologicas tambern e fundamental a sua cornpetitivi-dade. Por isso, a vitrina da producao em rede, a rnultinacional italiana de artigosde malha Benetton, foi superada em 1995 pela concorrente norte-americana Gap,principalmente devido a sua incapacidade de acompanhar 0 ritmo da Gap naapresentacao de model os novos , segundo a evolucao do gos to do consumidor: acada dois meses, em comparacao com as duas vezes por ano da Benetton."Outro exernplo: no setor de software em meados dos anos 90, as empresas co-mecaram a distribuir seus produtos gratuitos on-line para atrair clientes em rit-mo mais acelerado.'? 0 fundamento Icgico atras dessa desmateriaJizac,;ao finaldos produtos de software e que lucros devem ser obtidos a longo prazo, princi-palmente a parti r de relacionarnentos personalizados com os usuarios sobre 0desenvolvimento e as rnelhorias de urn determinado programa. Mas a adocaoinicial desse program a depende das vantagens das solucces oferecidas por um

    I

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    produto em relacao aos outros produtos do mercado, 0 que valoriza a dispo-nibilidade rapids de novas descobertas logo que sao criadas por uma empresa aupessoa fisica. 0 si st ema de gerenciamento flexivel da producao em rede de-pende da temporalidade f lexivel, da capacidade de acelerar ou desacelerar 0produto e os ciclos de lueros, do tempo compart ilhado por equipamentos e pes-soal e do controle das defasagens de tempo da teenalogia disponivel em relacaoa concor renc i a , 0 tempo e gerenciado como urn recurso, nao da maneira cro-nologica l inear da producao em massa, mas como urn fatal ' d iferencial em re-lacao a temporaJidade de outras ernpresas, redes, processos ou produtos. Apenasa forma de organizacao em rede e as maquinas de processamento de informacaocada vez rnais poderosas e m6veis podem assegurar 0 gerenciarnento flexivel dotempo como a nova fronteira das empresas de alto desempenho." Sob essascondicoes, 0 tempo nao e apenas comprimido: e processado. .

    o encolhimento e a alteracao do tempo de serviceo trabalho e , e sera. em urn futuro previsivel, 0 nucleo da vida das pessoas.

    Mais especificarnente nas sociedades modernas, a jornada de trabalho remu-nerado estrutura 0 tempo social. 0 tempo de service nos paises industrializadostern passado par uma queda secular nos ult irnos 100 anos, medido em horasanuais de trabalho par individuo, conforme 0 estudo de Maddison" (ver tabela7.1) . Devo lernbrar ao lei tor que essa reducao do tempo de service, na verdade,esconde urn aumento substancial de rnao-de-obra, em consequencia do cres-cimento do nurnero de empregos, visto que, como mostrei no capitulo 4, 0 em-prego agregado e menos uma funcao da tecnologia que da expansao de inves ti-mento e demanda que depende da organizacao institucional e social. Os calculossabre as horas potenciais de trabalho durante a vida de um individuo tambernmostram uma reducao s ignificative nas ult imas quatro decadas , embora comimportantes variacoes no numero de horas entre os paises'? (ver tabela 7.2).o mimero de horas de trabalho e sua distribuicao no ciclo vital enos ciclosanuais, mensais e sernanais da vida das pessoas constituem uma caracteristicacentral de como elas se sentem, se divertem e sofrem. Sua evolucao diferencialem varies paises e periodos hist6ricos reflete a organizacao economica, 0 estadoda tecnologia, a intensidade das lutas sociais e os resultados de contratos sociaise reformas ins ti tucionais." Os trabalhadores franceses foram os primeiros eu-ropeus a conquistar a semana de 40 horas de t rabalho e 0 direito a ferias remu-neradas , apes amargas lutas sociais e a eleicao do govemo da Frente Popular em1936. 0 Reina Unido, os EUA e 0 Japao foram os baluartes do "stakhano-vismo" imposto pelos negocios, com as trabalhadores tendo metade ou urn terce

    o Iim iar do etemo; C ; ~ O O 8 ~ N : = - v ) V ; 0 \ : : : : -- - . _ . - - - . . _ ~ - . . . _ . . - ~

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    a menos do periodo de ferias em comparacao aos trabalhadores da Alernanha,Franca ou Espanha, sem nenhum efeito aparente na produtividade (na verdade,em terrnos de crescirnento de produtividade nos ultimos 30 anos, se excluirmoso Japao, 0 tempo de ferias parece manter relacao pos it iva com 0 crescimento daprcdutividade dos trabalhadores). Entretanto, no geral, por mais de urn seeulo,entre 1870 e 1980, pudemos observar duas tendencias conexas nas econorniasindustrializadas: diminuicao do tempo de service par individuo e por trabalha-dor e aumento da hornogeneizac f io e regulamenta c f io do tempo d e service comoparte do contrato socia l que tundarnenta 0 estado de bem-estar social . Con tudo ,recentemente essas tendencies foram rnodificadas pa ra urn padrao cada vez maiscomplexo e variavel'" (ver tabela 7.3). a principal fen6rneno parece ser a cres-cente diversificacao do tempo e dos horarios de trabalho que reflete a tendenciaii. desagregacao do trabalho no process a de trabalho, como ja fO J anali sado nocapi tu lo 4. Dessa maneira, a sintese do estudo conduzido pela O!'T, em 1994,sobre a evolucao do tempo de service em 14 paises industrializados e a seguinte:

    No longo prazo, a reducao do tempo de service e obviarnente a tendenciapredominante . .Tambern, nos ultirnos 20 anos a numero de horas de trabalhofo i diminuido na maioria dos paises , mas par di ferentes cornb inacoes: au-menta do t rabalho de rneio-expediente, r educao das horas de t rabalho se-mana is e anuais acordadas e reais e reducao do total de hams do tempo deservice. Contudo, ao analisar essa grande tendencia, e facil descuidar decer tas tendencias manif estas para a extensao das hams, pelo menos em al-guns pulses e para detenninados grupos de trabalhadores dos diferentes pal-ses. Essas tendencias podem indicar a crescente diferenciaciio do niimerode horas de traba lho entre pa ises e dentro deles, apos um longo per iodo depadronizaciio e harmonizaciio das horas de trabalho.t?Quais sao as fontes de tal diversidade? Por um lado, as di f erencas insti-

    tucionais na regularnentacao dos mercados de trabalho, com os EUA, 0 Japao ea Uniao Europeia exibindo logicas nitidamente contrastantes. Por outro, nos pai-ses, as jornadas de trabalho mais longas estao concentradas em dois grupos: .profissiona is de alto nivel e trabalhadores nao-qualificados do setor de serv ices,Os prirneiros, dcvido a sua contribuicao para a realizacao de valor, e os ultimos,em consequencia de seu fraco poder de barganha, freqiientemente associado ii.condicao de irnigrantes ou a esquemas de trabalho informal. Por sua vez, ajornada de trabalho rnais curta e as horarios atipicos estao ligados ao trabalho demeio-expediente e ao temporario, envolvendo principal mente jovens corn baixoHive I de instrucao e mulheres. A entrada rna c ic a das rnulheres na forca de tra-balho, ern certa medida, esta associ ada a diversificacao das categorias e doshorarios de trabalho. Consequenremente, como foi dernonstrado no capitulo 4,

    o limiar do eterno 46 '

    entre urn quarto e u rn t er c e da populacao empregada nos p ri n ci pa i s p a is es industrializados (inclusive au tonornos ) nilo segue 0 m ode lo c la s si c o de empregrde horario integral e regular. 0 numero de pessoas que trabalha em projetovariaveis esta crescendo rapidamente em todos os lugares. Alem disso, uma proporcao consideravel de trabalhadores em horarios integrais (provavelmente ;maioria da forca de trabalho liberal) esta tendendo a adotar horarios flexiveisem gera! com aumento de carga de t ra b a lh o . A capacidade tecnologica de reinregracjio das contribuicoe s de varies trabalhadores em horar ios diversos em urnrede de informacao armazenada ocasiona a variacao constante do tempo real ddesernpenho do trabalho, abalando a capacidade de estruturacao do tempo dtrabalho na vida cotidiana. Assim, em sua otima analise da transformacao drnercado de trabalho e das empresas na Franca, Frederick de Conninck sal iento fate de que "a empresa e afetada por ternporalidades multiplas e divergentes '"a econornia e cada vez mais dominada pe la busca da flexibilidade, 011 organizada com base no curto prazo" e conseqiientemente "hoje, 0 individuo edominado pelas var ia s t emporalidades que tem de e nf re nt ar "; a s si m, e mb o ra 0 t raba lhcontinue integrado, a sociedade tende a sua fragmentacao em conseqiiencia ddesenvolvimento incon trolavel de temporalidades cont radi t6rias dent ro da mesrna estrutura."Portanto, a questao real de nossas sociedades n1l.0 e tanto 0 fato .de a telnologia nos permitir trabalhar menos para a mesma unidade de producso: i~SOlverdade, mas seu imp acto no tempo real de trabalho enos horarios e indetermnado. a que esta em jogo e parece set a tendencia predominante na maioria d(setores avancados da maior parte das sociedades desenvolvidas e a : diversi~cacao geral do tempo de trabalho, dependendo das empresas, redes, emp~egoocupacfies e caracteri st icas dos t rabalhadores. Na verdade, essa diversidad~. aeba sendo medida em termos da capacidade diferencial de cada trabalhador e ~eada emprego para a administracao do tempo. Sem antecipar minha analise sbre a evolucao da familia (no volume II), parece que a heterogeneidade de hrarios, em urna sociedade com participacao sernelhante dos sexos na forcatrabalho, imp5e um reajuste drastico dos esquemas familiares. Nao necessarmente para pier, urna vez que, de fato, a flexibilidade adicional do tempotrabalho poderia propiciar a base para 0 t empo cornpart ilhado em fami lia. 1 1 . 1novas parcerias familiares teriam que ser construidas sobre as ruinas das nompatriarcais." Ja que 0 horario flexivel e 0 nao-integral penetraram nas estrunncontratuais do tempo de trabalho com base no trabalho feminino, em granparte para acomodar as necessidades das mulheres de combinarem os esfor;para a criacao des mhos com sua vida profissional, a extensao dessa logica p:os hornens e outros dominios da vida social alem da criacao de filhos realmeipoderia introduzir (de fato ja esta introduzindo em rnuitos ca508)38 uma ne

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    art iculacao do tempo de vida e de service em diferentes idades e sob condicdesdiversas, tanto para homens como para mulheres. Dessa forma, sob esses novasesquemas, 0 tempo de service podera perde r sua centra lidade tradicional aolongo do ciclo de vida.

    U m a t en d en c ia convergente que aponta para a m es rn a d i re ca o vern da di-minuicao drastica dos anos de service reais nos principais palses indus tr iali -zados, exatamente no momenta de ur n aument.o substancial da expectativa devida. Isso ocorre, por urn lade, porque aidade de entrada na forca de trabalho,tanto para homens como para mulheres, esta cada vez maior it medida que umaproporcao maior da populacao freqiienta universidades: tendencia que resultadas expectativas cul turais. 00 apcrto dos mcrcndos de trnbnlho l' dn crcxccntccxigencia, por parte des cmpregudores, de rorca de trubalho COI11 credcnciais dein str uc ao s up er ior ." P or ou tr o, A nn e M ar ie G ui llc ma rd c on du ziu c stud os c om -parativos que mostram a queda drastica do numero real de empregos para traba-lhadores com idade acima de 50 anos e especialmente acima de 55.40 Como afigura 7. 2 most ra, a t axa de at ividade de ho r nen s entre 55 e 65 baixou comrapidez nos u lt ir no s 2 0 anos, nas principais economias indus t r ia l izadas e, em1991, havia caido para 65 % nos EUA, 64 % no Reino Unido, 54 % na Alemanhae 43 % na F ra n ca . N es se s p ai se s, seja por aposentadoria preeoce, inv a l idez, de-semprego perrnanente, desgaste ou desanimo, entre urn terce e mais da metadeda forc a de trabalbo mascuIina abandona 0 mereado de trabalho para sempre noin ic io de seus c i n qu e n ta . G u i ll em a r d apresenta argumentos s61idos no sentido d eque essa te nd en cia n ao e te rnpora r ia , mas esta enraizada nas politicas rn iopes degovernos e empresarics e na crenca na incapacidade de adaptacao do trabalha-dar idose a velocidade arualdas inovacoes tecnologica e organizacional." Nes-sas circunstancias, 0 tempo real de service poder ia ser diminuido para cerca de30 anos (dos 24 aos 54), para uma duracao rea l de vida de aproxirnadamente75-80 anos. Entao, nao apenas 0 tempo de service perde sua central idade emre la c ao a vida em geral , mas 0 sistema de contabilidade que calcula as aposen-tadorias e a a s s i s tenc ia medica entra em colapso, n ao porque haja excesso depessoas idosas, mas porque a p roporcao entre os contribuintes ativos e os bene-ficiarios inativos torna-se insustentavel, a rnenos que os aumentos de produtivi-dade sejam enorrnes, e a sociedade aceite uma redis tr ibuicao intergeracionalmacica."

    Assim, 0 desafio real da nova relacao entre trabalho e tecnologia nao dizrespei to ao desemprego em massa, como tentei discut ir no capi tulo 4, mas adiminuicao geral do tempo de service para uma proporcao substancial da popu-la

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    'i:I i,iII

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    Iacelerada obsolescencia da rnao-de-obra decretarao 0 fim das insti tuicces desolidariedade social e a introducao das guerras etarias,

    A indeterrninacao dos limites do cicIo de vida: tendencia paraa arritmia social?

    Parece que todos os seres humanos, inc lusive nos, sao relogios biologi-cos." Ritmos biologicos, sejam individuais, relacionados as especies, ou mesmocosrnicos, sao essenciais na vida humana. As pessoas e a sociedade os ignorampor sua conta e risco." Ha seculos construiu-se 0 r itmo humano em estreitarelacao com os ritmos da natureza, geralmente com pouco poder de barganhacontra as forcas naturais hostis ..Portanto, parecia razoavel acompanhar 0 fluxo emodelar 0 ciclo de vida com base em uma sociedade em que a maior parte dascriancas morria ainda bebe; em que a energia reprodutiva das mulheres t inha deser usada cedo; em que a juventude era efernera (Ronsard) ; em que f icar velhoera urn privi legio tao grande que trazia consigo 0 respeito devido a uma ra rafonte de experiencia e sabedoria; e em que as pragas pericdicamente devas-tavarn boa par te da populacao." No mundo desenvolvido, a Revolucao Indus-trial , a const iruicao da ciencia medica, 0 triunfo da Razao e a afirmacao dosdirei tos sociais alteraram esse padrao nos ult imos dois seculos, prolongando avida, superando doencas, controlando os nascimentos, diminuindo os 6bitos, ques-tionando a determinacao biol6gica dos papeis sociais e construindo 0 ciclo vitalem tome de categorias sociais, entre as quais a educacao, 0 tempo de service, ospadr6es de carreiras e 0 direito a aposentadoria adquiriram extrema irnportancia.Contudo, embora 0 principio de uma vida sequencia! tenha mudado de biosso-c ial para soc iobiol6gico, havia (na verdade, ainda ha) urn padrao de c icIo devida que as soc iedades desenvolvidas tendem a segui r, e que os pai ses em de-senvolvirnento tentam alcancar, Agora os avances organizacionais, tecnologicose culturais caracteristicos da nova sociedade emergente estao abalando definiti-varnente esse ciclo de vida regular sem subs ti tu i- lo por uma sequencia alterna-tiva, Proponho a hipotese de que a sociedade em rede caracteriza-se pela rup-tura do ritmo, au biologico ou social, associado ao conceito de um ciclo devida.

    13 examinei uma das razoes dessa nova tendencia, ou seja , a cronologiavariavel do tempo de service, Mas urn desenvolvimento ainda mais importante ea crescente capacidade de controle, dentro dos l imites 6bvios , da reproducao denossa especie e da duracao media da vida dos individuos (ver capitulo 1). Em-

    o l im i ar d o e te rn o 4 7 3

    bora 0 maior l imite de longevidade tenha uma fronteira biologica, 0 prolon-gamento da duracao media da vida para 0 f inal da faixa dos setenta ( inicio dafaixa dos oitenta para mulheres) e a crescente parcela da populacao que ultra-passa a media e a tinge a faixa e taria dos oitenta trazem conseqi ienc ias con-sideraveis para nossas sociedades e nossa concepcao de nos rnesmos. Emborano passado fosse considerada urn ultimo estagio homogeneo da vida, dominadopela "morte social", como foi demonstrado no estudo frances que Anne MarieGuillemard conduziu muitos anos atras com minha colaboracao," a velhice agorae urn universe altamente diverse composto de aposentados precoces e medics,idosos capazes e idosos com varies graus e formas de I imitacao. Entao, de re-pente, a terceira idade se estende na direcao de grupos maisjovens e mais velhos eredefine de forma substancial 0 cicio de vida de tres modos : contesta a saida domercado de trabalho como cri terio def inidor, visto que, para uma grande' pro-porcao da populacao, cerca de urn terce da vida pode ocorrer depois dis s o ;diferencia os idosos fundamental mente em termos de seu nivel de I imitacao,nern sempre relacionado a idade, portanto, de certa forma assimilando sua con-dicao de invalidos a outros grupos de deficientes mais jovens, consequentemen-te produzindo urna nova categoria social; e obriga a distincao entre varias faixasetarias, cuja diferenciacao real depended muito do capital social, cul tural e re-lacional acumulado durante a vida." Dependendo de cada uma das variaveis, osatributos sociais dessas diferentes terceiras idades apresentarao discrepanciasconsideraveis, derrubando, portanto, a relacao entre condicao social e estagiobiologico que fundamenta 0 cicio de vida, '

    Ao mesmo tempo, essa relacao e questionada na outra ponta: a reproducaoesta sendo cada vez mais controlada em todo 0 mundo. Nas sociedades desen-volvidas , a norma e 0 controle de natalidade, embora a marginalidadesocial e ascrencas religiosas constituam areas de resistencia a maternidade planejada. Emestreita interacao com a ernancipacao cultural e profissional das mulheres, 0desenvolvimento dos direitos reprodutivos alterou a estrutura dernografica e osritmos biologicos de nossas sociedades em apenas duas decadas (ver tabela 7.4),No geral , os paises mais indus tr ializados entraram na era da baixa natal idade(abaixo da taxa de reproducao da populacao nativa), do adiamento do casamentoe reproducao, bern como dos estagios variaveis para as mulheres terem filhosdurante seu cicio de vida. Tudo isso em consequencia do esforco feminino nosentido de cornbinar educacao, trabalho, vida pessoal e f ilhos em urn padraodecis6rio cada vez mais individualizado (ver tabela 7.5). Junto com a transfor-macae da familia e a crescente diversificacao dos estilos de vida (ver volume II),observamos uma modif icacao subs tant iva da epoca e das formas de homens emulheres serem pais durante 0 cicio de vida, em que cada vez mais a nova regra

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    e que h aja p ouc as regr as . S om an do-s e a is so, a s n ov as tec nologi as r ep rod ut iv ase os n ova s m od elos c ultura is , em gra nd e pa rte, poss ib ilitam a desassociacao daid a d e e con d ica o b iol6gic a d a reproduc ao e d a pa tern id ad e e m atem id a d e. Emt en n os e st ri ta m en t e t e cn i cos , h oje e pa ss iv e] d iferen cia r as pa is lega is d e um acrianca; d e quem eo esperma ; d e quem e 0 ovule; onde e como a fertilizacao er ea liza da , em tem po r ea l ou a di ad o, m es mo apos a morte d o pa i; e d e quem eov en tr e q ue da a luz a c r i anca . Todas as combinacoes sa o posslveis e socialmentedecididas. N os sa soc ied ad e ja a lca nc ou a ca pa cid ad e tecn ologic a para sepa ra r areprod uc ao soc ia l e a reprod uca o b iologics d a espec ie. O bvia men te, es tou m er ef er in d o a s e xc ec oe s a regra , m as que som am d ezen as d e m ilh ares d e excec oesem todo 0 m un do. A lgum as rep res en ta m ex em plos d a possibilidade d e mu lh e re si do sa s ( na f ai xa en vo lv en do 0 f in al d os cinquenta e i nic io d os s es sen ta ) d ar em aluz. O utra s sa o c en as d e n ovela s sa bre a lgum a ma nte m orto c ujo es perrn a c on -gela do e d is puta do p or h er deir os i ra dos . M uita s s ao a con tec im en to s s eg rega dos ,fr equen tern en te s us sur ra dos em ja nta res n as ro da s "h igh tec h" c ali for ni an as a ud ain disc reta M ad ri. U ln a vez que ess es fa tos estao r el ac io na d os a t ec n ol og ia sr ep rod uti va s m ui to s im ples s em 0 en volv im en to d e en gen ha ria gen et ic a, e 1'a -zoa vel im agin ar um a ab ra ngen cia m uito m aior pa ra a poss ivel m an ipu la ca o d asid a d es reprodutiva s e d a s con d ic oes d e reproduc ao, qua n do a engen har ia ge-ne t ica ' humana a ca ba r en co ntr an do um a acornodacao lega l e et ica n a s o ci ed a d e,como, a longo prazo, a co nt ec e c om t od as a s t ecno log ia s .. l e i . qu e n ao es tou es pec ula nd o s ob re f u tu r a s p r oj ec o e s, m a s t ra b al ha n doc om fa tos c on hec id os d e n oss o co t i d i ano , a cr ed it o s er leg i t imo pen sa r sob re a sconsequencias a tua is d a r n a r c h a d esses a con tec imen tos pa ra a v id a h uman a e,emespecial, para 0 c ielo d e v id a. E m uito s im ples : ca min ha mos pa ra a elim i-n ac ao d efin itiva d os n itid os lim ites d o fun da men to b iologico con tid o n o c on -c ei to d e c ic lo d e v id a. Pessoas d e 60 a nos com filh os b eb es ; fi lh os d e d iferen tesc as am en tos c om irmaos 30 an o s m ais velh os sem fa ixa etaria intermediaria;h om en s e m ulh eres que d ec id em proc ria r c om all s em c opula , em qua lquer id a-d e; a vos d a n do a luz 0 beb e or igi na do n o ovule d e s ua filh a ( t a rnb em ca sos d av id a r ea l); b eb es p os tum os ; e um a la cu na er es cen te en tre a s i ns ti tuic des s oc ia ise as prat icas rep rod ut iv as (fi lh os fora d o ca samen to represen ta m c erc a d e 25%d e tod os os n asc im en tos n a Suec ia e, a prox im ad am en te, 50% d os afro-am er i-canes). E f un da me nt al q ue n ao incluamos julgamento d e v al or n es ta observacao,o que pa ra os t ra d ic ion a lis ta s c h ega a d esafia r a ira d iv in a , pa ra as revolu-c io na ri os c ult ur ai s, e 0 tr iun fo d o d es ejo in div id ua l e, n a verd ad e, a afirmacaof in a l d os d ir ei to s fernininos ao corpo e a v id a. N o en ta nt o, 0 q ue e f un d am en t ale que n ao estarnos a margem da sociedade, mesmo que esses a i n d a sejam em -b rioes d e um a n ova relac ao en tre n ossa con dic ao s oc ia l e biologica, S a o t en d en -c ia s s oc ia is c res cen tes , c uja d ifus ao tec nolc gi ca e c ult ura l p ar ec e ir rep rim iv el,

    v;: : : ,0-0--

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    476 o l im ia r do e te rno

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    o tempo n a soc ied a d e e n a v id a e med id o pela morte, A morte e e foi 0t em a c en tr al d as c ultur as a D l on go d a h is to ri a, s eja r ev er en cia da c om o a v on ta ded e D eus , s eja a fron ta da c om o a ultim o d es afio h um an e."? Tem sid o exorc iza dano s rites para ucalmnr os vivos, nccirn com a rcsi~ll a~' fil l dll,~ SCJ"l'IHlS,suuvizndnnas comemoracoes des s imple s , combatida co m 0 desespero des rornanticos,m as n un ca c on rc st ad a ." E um a c ara ctc rls tic a d is tiutiv a d e n os sa n ov a c ulture , Uten ta t iva d e b an ir a morte d e n os sa v id a. Em bora a m atr iz d es sa tentativa ad -venha da crenca racionalista n o progres so tod o pod eros o, sao a s d escob erta sex tr aor din ar ia s d a t ec nologia m ed ic a e d a p es qui sa biologics n as d ua s ultim asdecadas que fom ecem ba se m ateria l pa ra a m ais antiga aspiracao da humani-d a d e: v iver com o se a m orte n ao ex is ti s se, apesa r d e s er n oss a un ic a cer teza ,C om i ss o, real iza-se a subversao fin a l d o c ic lo d e v id a , e a v id a toma -se es tapaisagem m on 6ton a en tr ec or ta da p ar selecionados mom en tos d e experienciasficas e p ob res n a et em a b uti que d os s en ti men to s p er son aliza do s. E nt ao, qua nd orealmente ocorre, a morte e a pen as m ais uma mudanca temporaria n a tela d eespectadores d is t ra id os . Se for verd ad e que, c om o d isse Ionesco, "cada um denos e 0 pr im eiro a m orrer",5J a s m ec an ism os soc ia is a ssegura m que ta rn bernsom as a s ultimos, a u s eja , que as mortos estao verdadeiramente s ozin hos e naoleva m a en ergia d os v ivos , M as ess a a ntiga e s aud avel a sp ira ca o a sobrev iven-c ia , que Ph ilippe A ries d oc um en tou es ta r p res en te n a c ultura oc id en ta l d esd e aId ad e M ed ia ," tom a n ova d irec ao c om a rev oluc ao b io logica , Com o es ta mos taop ert o d e d es ven da r a s s egr ed os d a v id a, d ua s gr an des ten den cia s d ifun di ra m-s edas ciencias medicas pa ra a resto da sociedade: a prevencao obsessiva e a lu taat e 0 f im.

    S egun do a p rim eir a ten den cia , t od os a s es tud os b iologic os e in ves tiga coesm ed ica s que relac ion am a s aud e h um an a c om 0 m eio a mb ien te logo s e tr an sfor -m am em guia s d e s aud e au rec ei ta ob r iga tor ia (per exem plo, a c ruza d a a n t i-ta ba gism o n os EU A, 0 mesm o pa is on de submetra lh a dora s pod em ser com-pra d a s pelo correio) a que, com a p len a coopera c ao d a m id i a , t ra n sfon na c a d avez m ais a soc ied ad e em urn am bien te s im bolica men te s an ea do. N a verd ad e, osapresen ta d ores d e telejorn a is en con tra ram na c ruzad a d a saud e uma fon te in -fi nd av el d e a ten ca o p ub li ca , p ri nc ip alm en te p or que os r es ulta dos d e es tud os s aop er iod ic am en te r efu ta dos e s ub stit uid os p ar n ov as in st ruc ces es pec ifi ca s. T od aum a in dus tr ia d a "v id a s aud avel" es ta d iretam en te relac ion ad a a essa c rn za da ev ai d e c om id a h igi en iza da , p as sa nd o p or r oup as es por tiv as d a m od a e c hega nd o,pr in cipa lm en te, a v itam in as in uteis . Esse uso d eturpa do d a pesquisa m ed ica epa tetic o, em es pec ia l, quan do c orn pa rad o c om a in diferen ca d as s egura dora s d osetor d e s aud e e d e gra nd e pa rte d as em presa s em rela9lIo a a s si st en c ia p ri m ar iae a seguranca ocupacional." D es sa for ma , um a p rop or ca o c res cen te d as p es soa sn a s soc ied ad es d es en volv id a s e a s c las ses d e profis s ion ais lib era is em todo a

    o Iimiar do ererno 47 9

    m un do ga sta m b as ta nte tem po, d in heiro e en erg ia ps ic olog ic a a o Ion go d a v id a,p er se gu in d o m o di sm o s relacionados a saude, utilizando-se d e meios - e comresulta dos- pouc o diferentes d os t ra di ci on ai s r it ua is xamanisticos. Po r exem-plo, cmhora esllHlns rcccntcs rlcmonstrcrn que o peso CSI {L muito ligadu :LO 11Il'la-bolismo prognunudo pela gene i ica e que as pessoas oscilam em uma taixa de10%-15% em torno de sun media de idade c tamanho icdcpendemcmcn tc deseus esforcos;" a d ie ta e um a obsessao s oc ia l, s eja r ea l, s eja m an ip uJa da . C on -co rd o que a es tetica pessoa l e a rela c ion amen to com 0 corpo tambem es ta ol igados a cultura do in d iv id ua lismo e do n a rc is is rn o, m as a v isa o h ig ien is ta d en os sa s s oc ied ad es in fluen cia d e fo rm a d ec is iv a (n a v er da de, fr equen tem en te es taI igada it rejeic ao d a t ra n sform ac ao do corpo d a mulh er em ob jeto). A meta ea d ia r e com ba ter a morte e a envelh ec imen to em cad a m in uto d a v id a , c om aa poio d a c ien cia m ed ic a, d o setor d e sa ud e e d as in fo rm acoes v ia m id ia ,

    M as a ofen siva rea l c on tra a m orte e a b oa -fe, a in ca nsa vel b ata lh a m ed icapara afastar a inevi tavel t an t o q ua n ta possa 0 s er h um a no . Sherwin R Nuland ,c ir ur gi ao e h i st or ia d or d e rnedic ina , esc reve em s en livro imp res s ionante How wedie:

    Todo medico especialista deve admitir que, as vezes, convenceu pacientes apassarern par procedimentos diagnosticos au terapeuticos em alguma faseda doenca tao irracionalrnente, que ser ia melhor que 0 Enigma tivesse per-manecido sern solucao, Muitas vezes pr6x imo do f i rn , se 0 medico fossecapaz de lancar urn olhar profunda para dentro de si mesmo, reconheceriaque suas decisoes e orientacces sao motivadas pela incapacidade de desistirdo Enigma e admitir a derrota enquanto houver qualquer chance de decifra-lo,Embora seja bondoso e atencioso com Sell paciente, de se perrnite esquecersua bondade, pois 3. seducao do Enigma e tao for te, e sua incapacidade dedecifra-lo torna-o t a o f r ac o .55E ss e im puls e m ed ic o de repelir a m orte n ad a tern a ver c om 0 cap i ta l i smo.

    D e fa to, a lgum as segura dora s a colh er ia m a eutan as ia d e b am gra de e gos ta ria md e en via r as pa cien tes pa ra c as a a m ais b rev e poss ivel, u rn a v isa o c ep tic a c om -b atid a d ia ria men te pelos m ed ic os . Sem ess a v on ta de im plac avel d e rejeita r 0i nev ita vel, s eri am p erd id as lic ces v alios as , e n os sa c ap ac id ad e c olet iv a d e s ob re-v iv en ci a e s up er ac ao d o s ofr im en to s er ia p rejud ic ad a. M as 0 i mp ac to s oc iet al d eta is es for cos , jun ta men te c om i nic ia ti va s rn en os n ob res d e us ar p ac ien tes t erm i-n ai s c om o c ob ai as e xp er ir nen ta is , e eq ui va le nt e a n ega c ao d a morte a te s eu ul-tim o a to , 0 con fin am en to tem pora l e espa cia l d a m orte e ta o for te, que a gra nd em aioria d os ob i tos (80% nos Esta dos Un idos e uma proporcao cresc en te emtod os as p aises : v er a figura 7,3 p ara 0 Ja pa o, um a s oc ied ad e com for te c ulturafa milia r) oc or re n o h os pit al, r nui ta s v ezes em u nid ad es d e tera pi a i nten si va es pe-

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    100908070

    E 60Ill)3c: 50v2v 40Q.,30201001947 1952 1957 1962 1967

    Ana1972 1977 1982 1987

    Figura 7.3 Indice dos obi tos ocorr idos em hospit ai s em relacao ao total de obi tos (%) ,por ana, 1947-87Fonte : Koichiri Kuroda, "Medicalization of Death: Changes in Site of Death inJapan

    after World War Two," Hyogo: Faculdade de Kobe, Departamento de EstudosInterculturais, 1990, trabalho de pesquisa nao-publicado.

    ci ai s, com os corpos j , ' 1 r c rnov idos de seus ambientes sociais e c rnoc iona i s . Ape-sar de alguns poucos rnovimentos em defesa de instituicoes hurnanitarias parapacientes terminais e de tendencies, ainda mais limitadas, para trazer os mo-ribundos de volta para casa, 0 ultimo ato de nossas vidas esta cada vez maissaneado, e nossos entes queridos nao tern a coragem de fazer objecao: e muitocornplicado, muito sujo, muito penoso, muito desumano, muito degradante, defato. A vida e interrompida no limiar do ultimo sorriso possivel, e a morte setoma visivel apenas par urn breve momenta cerimonial, apes a mise-en-sceneamenizadora dos maquiadores. Alem disso, 0 luto esta saindo de moda em nos-sas sociedades, tanto como reacao contra a h ipocrisia social trad icional quantacomo filo sof ia r ealista de sob revivencia, No entanto, psicanalisras e antropolo-gos demonstraram as funcoes sociais e as beneficios individuais do ritual e do 'sentimento de luto.56 Mas a privacao do lute e a preco a pagar para alcancar aeternidade em nossa existencia mediante a rejeicao da morte. .

    A tendencia predominante nas sociedades, como expressao de nossa am-bicao tecnol6gica e em concordancia com nossa comernoracao do efernero, eapagar a morte da vida ou torna-la inexp ressiv a pela sua represen tacao repetidana midia, sempre como a morte do outro, de forma que a nossa propria seja

    o l irniar do eterno 481

    recebida com a surpresa do inesperado. Separando a morte da vida e criando 0sistema tecnologico para fazer que esta crenca dure 0 sufi ci en te , const ru imos ae te rn id a d e d u ra n te nossa exis tenc ia , Assirn, t omamo-nos e temos exce to poraquele breve momento quando somes rodeados peJa luz.

    Gu e rr a s i n st a n ta n e a sA morte, a guerra e 0 tempo sao socios historicos seculares, e uma das

    carac te ri st icas mai s surpreendentes do paradigma tecnoJ6gico emergente e queessa as soc ia ca o seja fun da men ta lm en te a ltera da , peIo m en os pa ra a guerra d aspotenc ias dominantes. Na verdade , 0 advento da tecno logia nuclear e da po ssi-bilidade do hoJocausto planetario teve 0 efei to paradoxal de cancelar confl it osannados globais de grande escala entre as maiores potenc i a s , afastando urnacondicao que rnarcou a primeira metade do seculo XX como 0 per iodo maisdes trut ivo e let al da his tori a.F' Contudo, int eresses geopolf ti cos e confronta90essocietais continuam a fortalecer a hostilidade intemacional, inter etnica e ideo-logica ao limite de objetivar-se a destruicao fisica:" as raizes da guerra, de-vemos reconhecer, estao na natur eza humana, pelo menos segundo a experienciahistor ica." Mas, nas duas u ltimas decadas, as sociedades democraticas tecno lo -g icamente desenvolvid as da America do Norte, Eu ropa Ocidental, Japao e Ocea-nia passaram a rejeitar a guerra e a opor extraordinaria r esistencia a convocacaogovemamental de cidadaos para 0 sacrificio final. A guer ra argelina na Fr anca, aguerra do Vietna nos Estados Unidos e a do Afegani stao na Russ ia '" representa rammementos cruciais da capacidade de Estados errviarem suas sociedades a de-struicao por razoes nao tao forcosas, Urn vez que a luta annada e a provavelarneaca de recorrer a ela continua no centro do poder estatal, desde 0 fim daguerra do Vietna os estrategistas tern se esforcado para encontrar meios de aindafazer guerra. Apenas nessas condicfies a poder economico, tecnologico e de-mcgrafico pode ser transfonnado em dominacao de outro s Estado s, 0 j ogo mai santigo da humanidade. Os paises democraticos desenvolvidos chegaram a tresconclusoes em relacao a s condicoes necessarias para tamar a guerra de certaforma aceitavel a sociedade.!'

    Nao deve envo lver cidadao s comuns, por tanto dever ser feita por urn exer-cito pr ofissional, de modo que a convocacao ob rigato ria fique reservadapara circunstancias realmente excepcionais,julgadas irnprovaveis.

    Deve ser curta, ate mesmo instantanea, para que as consequencias naosubsi st am, consumindo os recursos humanos e economicos e susc it andoquesroes sobre just if icativas para a acao mili ta r.

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    Deve ser Iimpa, cirurgica, com destruicao ate mesmo do inimigo, man-t ida dentro de l imit es razoavei s e escondida 0 max imo possiv el da visaopublica, com a consequencia de ligar intimamente manuseio da infor-macae, fo rmacao de imagem e pr atica de guerra.

    Avances impress ionantes da tecnologia mil it ar nas duasul ti rnas decadasprop iciam as ferramen tas par a a imp lanta c ao dessa estra tegia sociomilitar. Forca sarmadas pro fissionais bem- tr ein adas, bem-equipadas e trabalhando em horariointegral nao requerem a envolvimento da populacao em geral no esforco daguerra, exceto sua participacao em suas salas de estar, como incentivadores eespectadores de urn show particularmente em oc io na nt e e marcado por profun-dos sentimentos patrioticos.P A adminis t r a c ao profiss ional de not ic ia r ios em umaforma inteligente que en tende as necessid ades da rn id ia, enquan to as mon ito ra,pode levar a guerra ao vivo as casas das pessoas com uma percepcao limitada esaneacla c ia mat anc a e do sofr imento , t ema exaus tivamente desenvolv ido par Bau-dr illard.f Mais importante: as comunicacees e a tecnologia das armas eletroni-cas permi tem ataques devas tadores contra 0 inimigo em per iodos de tempo ex-tremamente breves. E evidente que a Guerra do Golfo foi 0 en saio geral para urnnovo tipo de guerra, e se u desfecho em cern horas, contra u rn exer c it o i r a qu i anogrande e bem-equipado, foi uma demonstracao de finneza das novas potenciasmilitares, quando uma questao importante esta em jogo (0 fomecimento de pe-tr61eo para 0Ocidente, naquele caso)." Claro, esta analise e a propria Guerra doGo1f9 exigiriam consideracoes mais longas. Os EUA e seus aliados enviarammeio milhao de soldados por varies rneses para lancar urn ataque terrestre. En-t re tanto, mui tos espec ial is tas suspei tam que 0 verdadeiro motive desse env io detropas' foia politica interna do Departamento de Defesa, ainda nao preparadopara admi t i r a F or ca A er ea que guerras podem ser ganhas a partir do ar e domar. Sem duvida foi 0 que aconteceu, ja que as for cas terrestres, na pratica, naoencontraram muita res is tenc ia ap6s 0 castigo imposto a distancia aos iraquianos.Verdade, os aliados nao dirig ir am seus esforcos para Bagda, porem essa decisaonao foi tomada devido a grandes obstaculos militares, mas em razao de seuscalculos pol it icos com intencao de mante r 0 Iraque como forca militar na regiaopara deter 0 Ira e a Siria. A falta de apoio de urn Estado importante (Russia ouCh ina) tomou os iraquiano s particu larmente vulner aveis, de forma que, poten-cialmente, outras guerras de porte nao sao tao faceis para a coalizao das poten-cias oc identa i s , Potencias com tecnologias equivalentes teriam maior dificulclade dese a taca rem. Contudo, dado 0 cancelamen to mu tuo do intercambio nuclear en tr eas maiores potencies militares, suas guerras potenciais e as guerras entre seusr\S!lItillS (Heres provnvclmcnic dcpeudcrilo tillS n'lJlidlls (1II11.~1()I"IlHH;()I.:S

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    bacteriologico, bern como massacres indiscriminados e tomadas de refens, tendo amidia como foco de atencao, provavelmente se tornarao as expressoes dos conflitosarmados nas sociedades desenvolvidas. No entanto, ate esses atos violentos, sus-ceptiveis de afetar a psique de todos, sao vivenciados como instantes descontinuosno curso ci a normalidade pacifica. Com isso,M urn contraste surpreendente com ageneralizacao da violencia provocada pelo Estado em boa parte ~o planeta.~2 .

    As guerras instantaneas e sua temporalidade tecnologicamente induzidasao atributo das sociedades informacionais, mas, a exemplo de outras dirnensoesda nova temporalidade, caracterizam as fonnas de dominacao do novo sistema,a ponto de excluir os paises e acontecimentos nao centrais para a lcgica domi-nante emergente.

    Tempo virtualA cultura da virtualidade real associada a urn sistema multimidia eletroni-

    camente integrado, conforme foi exposto no capitulo 5, contribui para a trans-formacao do tempo em nossa sociedade de duas formas diferentes: simultanei-dade e intemporalidade.

    Por urn lado, a informacao instantanea em todo 0 globo, mesclada a re-portagens ao vivo de lugares vizinhos, oferece instantaneidade temporal semprecedentes aos acontecimentos sociais e expressoes culturais." 0 acompanha-rnento em tempo real de todos os minutos do colapso do Estado sovie tico emagosto de 1991, com traducao simultanea dos debates polit icos russos, intro-duziu urna nova era de comunicacao em que 0 "fazer" historia pode ser dire-tamente testemunhado, desde que seja considerado suficientemente interessantepelos controladores da informacao. Tambem, a comunicacao mediada por com-putadores possibilita 0 dialogo em tempo real, reunindo pessoas com os mesmosinteresses em conversa interativa multilateral, por escrito. Respostas adiadas pe-1 0 tempo podem ser superadas com facil idade, pois as novas tecnologias decornunicacao oferecem um sentido de instantaneidade que conquistaas barreirastemporais, como ocorreu com 0 telefone mas, agora, com maior flexibilidade,permitindo que as partes envolvidas na cornunicacao deixem passar alguns s~gundos ouminutos, para trazer outra informacao e expandir a esfera de cormmt-cacao sem a pressao do telefone, nao-adaptado a longos silencios.

    Par outro lado, a mistura de tempos na midia derrtro do mesmo canal decomunicacao, a escolha do espectador/interagente, cria uma colagern temporalem"quenao apenas se misturam generos, mas seus tempos tornam-se sincron~sem urn horizonte aberto sem corneco, nem fim, nem sequencia. A intemporali-dade do hipertexto de multimidia e uma caracteristica decisiva de nossa cultura,

    o limiar do eterno 4~7

    modelando as mentes e mem6rias das criancas educadas no novo contexto cul-tural. Primeiro, a historia e organizada de acordo com a disponibilidade de ma-terial visual, depois submetida a possibilidade computadorizada de selecao desegundos de quadros a serem unidos ou separados de acordo com .discursosespecificos. Educacao escolar, entretenimento na midia, noticiarios especiais oupublicidade organizam a temporalidade do melhor modo, para que a efeito gem!seja urn tempo nao-sequencia l dos produtos culturais disponiveis em todo 0dominic da experiencia humana. Se as enciclopedias organizaram 0 conheci-mento humane por ordem alfabetica, a midia eletronica fomece acesso a infor-macae, expressao e percepcao de acordo com os impulsos do consumidor oudecisoes do produtor. Com isso, toda a ordenaeao dos eventos signif icat ivosperde seu ritmo cronologico interne e fica organizada em sequencias temporaiscondicionadas ao contexte social de sua uti l izacao, Portanto, Ii simultaneamenteuma cultura do eterno e do efemero. E etema porque alcanca toda a sequenciapassada e furura das expressoes culturais. E efemera porque cada organizacfio,cada sequencia especi fica, depende do contexte e do obje tivo da const rucaocultural so lic itada. Nao estamos em uma cultura de circularidade, mas em urnuniverso de temporalidade nao-diferenciada de express6es culturais.

    Analisei a relacao entre a ideologia do fim da historia, as condicoes mate-riais criadas sob a logica do espaco de fluxos e 0 surgimento da arquiteturapos-modema, em que todos os codigos culturais podem ser misturados sem se-quencia nem ordenacao, ja que estamos em urn mundo de expressoes culturaisfinitas. 0 tempo eterno/efemero tambem se encaixa neste modo cultural espe-cifico, a medida que transcende qualquer sequencia especifica, David Harvey,usando tipos similares de argumento, mastrou de forma brilhante a in teracaoentre a cultura pos-moderna - seja na arquitetura, cinema, arte ou filosofia - eo que ele chama de "condicao pcs-moderna" motivada pela cornpressao tempo-ral/espacial. Embora acredite que Harvey atribua a lcgica capitalista mais res-ponsabilidade do que ela merece nos processos atuais de transforrnacao cultural,sua anali se revela as fontes sociais da convergencia repentina de expressoesculturais para a negacao do signif icado e a afirmacao da i ronia como 0 valorsupremo.r'D tempo e comprimido e, em ultima analise, negado na cultura comouma replica prirnitiva da rapida rnovimentacao de producao, consumo, ideologiae polit icas em que nossa sociedade e baseada. Uma velocidade s o possibilitadapelas novas tecnologias de comunicacao.

    Mas a cultura, em todas as suas rnanifestacoes, nao reproduz simplesmentea logica do sistema economico , A correspondencia historica entre a econorniapolit ica de sinais e os sinais da economia polit ica nao constitui argurnento sufi-ciente para caracterizar 0 surgimento do tempo intemporal no pos-modernismo.Acho que devemos acrescentar algo mais: a especificidade das novas expressoes

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    culturais, sua lib erdade ideo16gica e tecnol6gica de explorar 0 planeta e toda ahist6ria d a h um a ni d ad e e de integrar e mis tu ra r no s u pe rt ex t o q ua l qu c r sina l dequalquer lugar, d a cultura ra p dos guetos norte-americanos - imitadas ap6salgun s meses pel os grupos pop de Taipei ou Toquio - ao espiritualismo budistatran sf ormado em musica eletronica. 0 tempo eterno/efemero da nova culturaadapta-se a 16gica do capitalismo flexivel e a dinamica da sociedade em rede,mas acrcscenta sua camada poderosa, instalando snnhos inrlividunis c repre-senta coes coletivas em lim panorama mental atemporal .

    Talvez a musica New Age, tao car acter istica do gosto dos pro fissionaisliberals de hoje em todo 0 mundo , seja r epresentativa da dimensao intemporalda cultura emergente, reunindo rneditacao bud ista recon str uida, p roducao de somele tronico e composicao cal ifomiana sofi sti cada . A harpa e le tr ica de Hil la ry S taggs,rnodulando 0 alcance das no tas elementar es na variacao in finita de uma simplesrnelodia ou as longas pausas C altcr acocs r cpcntinas de volume da scr enidadeentristecedora de Ray Lynch combinarn no mesmo texto musical uma sensacaode distancia e repeticao com 0 sub ito surgimento de sentimento reprimido, co-mo ecos de vida no oceano da etemidade, urn sentimento freqiientemente acen-tuado por fundo sonoro de ondas oceanicas ou de vento no deserto em muitascomposicees New Age. Supondo, como imagine, que New Age e a musica clas-sica de nossa epoca e observando sua influ encia em tan tos con textos difer entes,mas sempr e entre os mesmos grupo s sociais, pode-se sugerir que a rnanipu lacao dotempo e 0 tema recorr ente das novas exp ressoes culrur ais. Uma man ipulacaopreocupada com a referencia binaria a instantaneidade e etemidade: eu e 0 uni-verso, 0 Ser e a Rede. Essa conciliacao, na verdade fund indo a individuo bio-16gieo no todo cosmologico, 56 pode ser alcancada com a fusao de todos ostempos, de nossa criacao ao fim do universo. A intemporalidade e 0 tern a recor-rente das expressoes culturais de nossa era, seja em flashes repentinos de video-c lipes, s ej a nas res sonanc ias e te rnas do espir it ua l i smo e le tronico.

    Tempo, espaco e sociedade: 0 Iimiar do etemoEntao, afinal, 0 que e tempo, este conceito de cornpreensao dificil que

    confundiu San to Agostinho, desor ien tou Newton, in sp ir ou Ein stein, preocupouHeidegger ? E como 0 tempo esta sendo transfo rrn ado em nossa sociedade?

    Ellti! a rninha investigacao apelar a Leibniz, para quem tempo e a ordemde sucessao das "coisas", de forma que sem as "coisas" nao existiria tempo." 0conhecimento atu al sobre 0 conceito de tempo em fisica, biologia, historia esoeio logia nao parece ser contestado por essa conceitualizacao sintetica e clara.Alern disso , podemos entender melhor a transfor rnacao atu al da ternpor alid ade

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    recorrendo ao conceito leibniziano de tempo. Proponho a ideia de que 0 tempointemporal, como chama a temporalidade dominan te de nossa sociedade, ocorrequando as caracteristicas de urn dado contexto, ou seja, 0paradigma informa-cional e a sociedade em rede, causam confusi io s istemica na ordem seqiienciald o s f en om en o s sucedidos naquele contexto. Essa confusao pode tomar a forma decompressao da ocorrencia dos fenornenos, visando a i nst an tane idade, ou entaod e in trod ucflo d e d esc on tin uid ad e a lea ro ria n a s equen cia . A elim in ac fio da se-quencia eria tempo nao-diferenciado, 0 que equivale

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    assiste passivarnente a TV no final de dias extenuantes - a mente concentradaem imagens de seriados sabre milionarios texanos que, por estranho que pareca, saoigualrnente farniliares a jovens de Marrakech e a donas de casa de Barcelona, asquais, naturalrnente orgulhosas de sua identidade, as veem em catalao,o tempo intemporal pertence ao espaco defluxos, ao passo que a disciplinetempo, 0 tempo biologico e a sequencia socia/mente determinada caracterizam oslugares em todo 0 mundo, estruturando e desestruturando materialmente nossassociedades segmentadas. 0 espaco model a 0 tempo em nossa sociedade, assiminver tendo lima tendencia hist6rica: fluxes induzern tempo intcmporal, lugaresestao presos ao tempe." A ideia de progresso, nas raizes de nossa cultura e denossa soeiedade nos dois ult imos seculos, fundamentou-se no movirnento dahistor ia , de fato, na sequencia predetenninada da hist6r ia sob a lideranca darazl io e com 0 impulse das forcas produtivas, escapando das restricoes das 50-ciedadcs e culturas l igadas ao espaco. 0 dominic do tempo c a controle do r itmocolonizaram territ6rios e transforrnaram 0 espaco no vasto movimento de indus-trializacao e urbanizacao realizado pelos dois processos hist6ricos de formacaodo capitalismo e estatisrno. A transformacdo estruturou 0 set; 0 tempo moldou 0espa90.

    A tendencia predominante de nossa sociedade mostra a vinganca hist6ricado espaco, estruturando a temporalidade em l6gicas diferentes e ate contradito-r ias de acordo com a dinamica espacial. 0 espaco de f luxos, conforme a analisedo capitulo anterior, dissolve 0 tempo desordenando a sequencia dos eventos etornando-os sirnultaneos, dessa forma instalando a sociedade na efemeridadeeterna. 0 espaco de tugares multiples , espalhados, f ragmentados e desconec-tados exibe temporalidades diversas, desde 0 dominic mais primitivo dos ritrnosnaturais ate a estri ta t irania do tempo cronol6gico. Funcoes e individuos se-lecionados transcendem 0 tempo," ao passo que atividades depreciadas e pes-soas subordinadas suportam a vida enquanto 0 tempo passa. Embora a l6gicaemergente da nova estrutura social vise a continua suplantacao do tempo comouma sequencia ordenada de eventos, a maiori a da sociedade em urn sistemaglobal interdependente permanece a margem do novo universo. A intemporali-dade navega em urn oceano cercado por praias l igadas ao tempo, de onde aindase podem ouvir os lamentos de criaturas a ele acorrentadas.

    Alern disso, a logica da intemporalidade nao se apresenta sem resistenciada soc iedade, Como lugares e localidades visam recuperar 0 controle dos inte-resses sociais embutidos no espaco de fluxos, atores sociais preocupados com 0tempo tentarn controlar 0 dominio aist6rico da intemporalidade. Exatamente porquenossa sociedade chega ao entendimento de interacoes significativas para todo 0meio ambiente, a ciencia e a tecnologia fornecem-nos 0 potencial para prever

    o l im i ar d o e re rn o 491

    Tabela7.6 C or np ar ac oe s d e t ax as de r n or ta li d ad e i n fa n ti i, paises selecionadoses llm a tl v a s d e 1990-95 'Obitos por 1.000 nascidos vivos

    T ot al d os EUABr an cosOutrosNegrosCond a do s e c idadesCidade d e N or fo lk . V ir gi ni aC id ad e d e P or ts mo ut h, V ir gi ni aCidadc de Suffolk, Virg fn iaC id ad c d e N ova York. No va YorkB r on xO r le a ns , L o u is i an aC on da do d e L os A ng ele s. C ali f6 rn iaCondado de Wayne (Detrou), MichignnW as hi ng to n, D .C .Afr ic aAr~c l iaEgitoQueniaMarrocosNigeriaA fric a d o S uITanzan ia

    Za ir e

    981618

    201925121317816219S6157666896531029362104782221

    AsiaEuropaA m er ic a L a ti n aA meric a d o N orteOcean iaExURSSQUIros paisesBulga r iaCa n a d aChileCh i n aCosta RicaFrancaAlemanhaH on g K an gJama ic a

    JapaoCore iaMa la s iaPa lomaCinl ; l apur aTa . i l a nd iaUcran iaUrugua iR ei no U n id a

    14717271477614521141582614207

    Fontes: F un do P op ula cio na l d a O NU , The S ta te o f Wor ld Populat ion. 1994;U S Dep t. of Health an d Human Serv ices , Vital Statistics of the United Stales:1990. vol, I I, s e~ ao 2 . Tabe l a 2 .1 , 1 99 4.

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    urn novo tipo de temporalidade, tarnbem colocado na estrutura da etemidade,mas levando em consideracao as seqiiencias hist6ricas. E 0 que Lash e Urrychama de "tempo glacia l" , conceito em que "a relacao entre os seres hurnanos ea natureza e de longuissimo prazo e evolucionaria. Retrocede da historia hu-mana imediata e avanca para um futuro to talmente indeterminavel"." De fato,conforme analisarei mais detalhadamente no volume II, a oposicao entre 0 ge-renciamento do tempo glacial e a busca pela intemporal idade rnantem 0 mo-vimento ambienta li sta e as diferentes formas de poder em nossa sociedade emposicfies contradit6rias dentro da estrutura social. 0 que deve ser retido da dis-cussao neste ponto e a diferenciacao conflituosa de tempo, entendida como 0impacto de interesses sociais opostos sobre a sequencia dos f enomenos , Essadiferenciacao afeta, por urn lado, a 16gica contrastante entre a intemporalidadeestruturada pelo espaco de fluxos e as multiplas temporalidades subordinadas,associadas ao espaco de 1ugares . Par outro lado, a dinarnica cont radit6ria dasociedade estabelece uma oposicao entre a busca da etemidade humana, medi-ante a invalidacao do tempo da existencia terrena, e a percepcao da etemidadecosmol6gica, sob a 6tica do tempo glacial . Entre as temporalidades subjugadas ea natureza evolucionaria, surge a sociedade em rede no limiar do etemo.

    Notas1. A analis e de tempo ocupa pape l cen tra l no pensamento de An thony Giddens, um dosprincipal s teoricos de sociologia de nossa geracao intelectual . Ver , em especia l, Giddens(1981,1984) . Uma teorizacao ext remamente est imulante da relacao ent re tempo, espaco esociedade e 0 trabalho de Lash e Ur ry ( 1994); ver tambern Young (1988) . Para umaabordagem empir ica rnais t radicional da anali se socia l do tempo, ver Kirsch et al. (orgs.)(1988). Quante a debates recentes, ver Friedland e Boden (orgs .) (1994). Naturalmente,para sociologos, as referencias class icas sobre tempo socia l continuam sendo Durkheim(1912) e Sorokin e Mer ton (1937). Ver tambem 0 trabalho pioneiro de Innis (1950,1951,1952) sobre sistemas ternporais e espaciais, definindo epocas historicas.

    2. Adam (1990: 81,8790).3. Innis (1951: 89 e as seguintes); ver tarnbem Innis (1950).4. Whi trow (1988). Para urn bom exemplo da var iacao cul tural/hi stor ica de tempo e medidasde tempo, ver a obra fascinante de Zerubavel (1985).

    5. Thrift (1990).6 . A font e rnul ti pl a par a e st a ana li se da evo lucao do tempo na cul tu ra ru ssa e 0 conjunto deapre senta cces e d iscussoes nao -publi cadas da "Confe rence on Time and Money in theRussian Cul ture", organizada pela Univers idade da Cal ifornia no Centro de Estudos Esla-vos e Europeus Orienta is de Berkeley e pelo Centro de Estudos Russos e Europeus Orien-tais da Universidade de Stanford, realizado em Berkeley, no dia 17 de marco de 1995

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    (r esumo dos tr abalhos e nota s pessoais elaborados po r Emma G. Kis el yova) . Ent re a sv a r ia s c o n tr i b ui c c es significativas para esse congresso, u s ei Z h i v ov (1995). Alern disso,sabre a s c o n s eq u en c i a s do tempo resultantes das reforrnas de Pedro, 0 Grande, v er W a l-iszewski (1990); Kara-Murza e Polyakov (1994); Anisimov (1993).

    7. Para uma anali se dotempo na Uniao So v ie t ic a , v e r Hanson (1991); Castillo (1994); sobreos 'fatos relacionados a " jomada de t rabalho sem direi to a descanso semanal" de Stalin,ver Zerubavel (1985: 35-43).

    8. Thompson (1967).9. Giddens (1984).10. Lash e Urry (1994: 229).11. Castilho (1994).12. Como mostra Harvey (1990).13. Hinrichs el al. (orgs.) (1991); ver tambern Rifkin (1987).14. Ver Harvey (1990; 284-5).\ 5 . .Ch es na i s (1994); O'Brien (1992).16. Reynolds (1992); Javetski e Glasgall (1994).17. Shirreff(1994); Breeden (1993).18: Time (1994); Jones (1993). Para urna alegoria de "ficcao f inanceira" esclarecedora , leia

    Kimsey (1994).19. Economist (1995b).20. Heavey (1994).21. Chesnais (1994).22. Le e e SchmidlMarwede(!993).23. Le e e t a l. (1994); Asian Money. Asian Issuers & Capital Markets Supplement (1993-4);

    Fager (1994).24. Chesnais (1994).25. Economist (1995a).26. Hsing (1994).27. Ver a discussao do tema em Freeman (org. ) (1994).28. Business Week (1995d).29. Business Week (1995c).30. Benveniste (1994).31. Maddison (1982).32. K. Schuldt, Soziale und okonomische Gelstaltung der Elemenle der Lebensarbeitszelt der

    Werktatigen, Tese, Berlim (RDA), 1990; citado ern Bosch et al. (orgs.) (1994: 15).33. Hinrichs et al. (orgs.) (1991).34. Bosch et ot. (orgs.) (1994).35. lbid.: 19 (enfase minha).

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    36. De Conninck (1995); as ci ta co es sa o, em ordem s equen ci al , da s pp. 2 00 ,193 e 193 ( tr a-duzido para 0 inglss por Castel Is).

    . 37. Martin Camoy e eu, jun tos, desenvolvemos este lema em Carnoy e Cas re lls (J 996).'38. Hewitt (1993).39. Camoye Levin (1985).40. Guillemard (1993).41. Guillemard e