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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE FaC CURSO DE SERVIÇO SOCIAL MARCIA MARIA DA SILVA TRAJETÓRIA DE VIDA DOS VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE JORGE FORTALEZA CEARÁ 2014

CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE … DE... · simples e aplicação de entrevista semiestruturada. As ... 3.2 Trajetória de vida dos velhos moradores antigos do bairro

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE – FaC

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

MARCIA MARIA DA SILVA

TRAJETÓRIA DE VIDA DOS VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE

JORGE

FORTALEZA – CEARÁ

2014

MARCIA MARIA DA SILVA

TRAJETÓRIA DE VIDA DOS VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE

JORGE.

Monografia submetida à aprovação do

Curso de Bacharelado em Serviço Social

da Faculdade Cearense, FaC, como

requisito parcial para obtenção de título

de Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Prof.ª Ms. Valney Rocha

Maciel

FORTALEZA – CEARÁ

2014

MARCIA MARIA DA SILVA

TRAJETÓRIA DE VIDA DOS VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE

JORGE.

Monografia como pré-requisito para

obtenção do título de Bacharelado em

Serviço Social, outorgado pela Faculdade

Cearense, FaC, tendo sido aprovada pela

banca examinadora composta pelos

professores

Fortaleza, ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________

Prof.ª Ms. Valney Rocha Maciel (Orientadora) Faculdade Cearense - FaC

___________________________________________________________________

Prof.ª Ms Sandra Maria de Carvalho Brito

___________________________________________________________________

Profª. Esp. Elainne Cristianne Andrade Ferreira

A Deus, por ter-me dado auxílio e graça

para chegar até aqui, e a meus pais,

velhos e moradores antigos do bairro

Henrique Jorge.

AGRADECIMENTOS

Meus agradecimentos primeiramente a Deus, que me deu graças para

chegar até aqui com saúde e forças para superar as dificuldades, e a meus pais,

Oneida e Valdete, porque me apoiaram em todos os momentos. Amo vocês. À

minha família, que de várias formas me ajudou muito, faço parte de vocês, meu

sucesso é o seu.

Agradeço muito à minha orientadora, prof.a Valney Rocha, pelo apoio e

suporte que me tem dado nessa última etapa de minha graduação, porém

imprescindíveis para continuar como profissional de Serviço Social; pelo tempo que

me dedicou, em outros horários, nas correções e nos incentivos.

Aos velhos e moradores antigos do bairro do Henrique Jorge, que

participaram da pesquisa e contribuíram para que a mesma fosse concretizada, meu

muito obrigada.

À Faculdade Cearense, que me proporcionou uma vida acadêmica de

conhecimentos profissionais e pessoais durante esse período, oportunizando-me

voar e conhecer novos horizontes de forma confiante com mérito e ética.

A todos os professores que fizeram parte da minha vida, como estudante de

Serviço Social e como pessoa, por terem me proporcionado conhecimento e

profissionalismo, pela pessoa que cada um demonstrou ao dialogarem e pelas

amizades construídas.

Às professoras Flaubênia e Eliane, que estão atualmente na coordenação do

Curso de Serviço Social da FAC; à administração, pelo profissionalismo; aos

bibliotecários, pela contribuição na busca de literaturas e pelas amizades que foram

construídas ao longo desse tempo.

Às acadêmicas Lucilene Siqueira, Renata Viviam, dentre as demais, que

além desse processo de aprendizagem, dos estudos em grupo, das apresentações,

dos trabalhos externos, também compartilharam amizades.

À Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), que me

proporcionou os estágios para uma melhor qualificação profissional e às Assistentes

Sociais que foram minhas coordenadoras de estágio. Ao Serviço Social do Comércio

(SESC), pelo apoio que dá aos profissionais que ali se engradam como servidores.

Enfim, a todos que direta ou indiretamente contribuíram de alguma forma

para que este trabalho fosse realizado, através de incentivos, de palavras de ânimo,

no agir profissional. Meus sinceros agradecimentos.

Tudo tem o seu tempo determinado

e há tempo para todo o propósito debaixo

do céu:

há tempo de nascer, e tempo de morrer;

tempo de plantar, e tempo de arrancar o

que se plantou;

tempo de matar, e tempo de curar;

tempo de derrubar, e tempo de edificar;

tempo de chorar, e tempo de rir;

tempo de prantear, e tempo de dançar;

tempo de espalhar pedras, e tempo de

ajuntar pedras;

tempo de abraçar, e tempo de afastar-se

de abraçar;

tempo de buscar, e tempo de perder;

tempo de guardar, e tempo de lançar fora;

tempo de rasgar, e tempo de coser;

tempo de estar calado, e tempo de falar;

tempo de amar, e tempo de odiar,

tempo de guerra, e tempo de paz.

(BÍBLIA. Eclesiastes. cap. 3, vers. 1)

RESUMO

O fenômeno do envelhecimento da população do mundo é o que mais se evidencia

nesse tempo. Isso se deve a vários fatores e não ocorre de forma isolada. Por se

tratar do número de pessoas que está envelhecendo, isso é um fato cada vez mais

visível na sociedade e tem implicações contextuais no Brasil e no mundo. O

envelhecimento humano é um processo biológico, natural e universal, e a velhice é

uma convenção sociocultural representada diferentemente pela cultura em que está

inserida. Nessa perspectiva, a premissa maior como objetivo geral é conhecer a

trajetória de vida dos velhos moradores do bairro Henrique Jorge, e como objetivos

específicos apresentar o perfil dos sujeitos da pesquisa, mostrar a trajetória e o

processo de envelhecimento, a história do bairro Henrique Jorge e entender a

sociabilidade dos indivíduos entrevistados no que se refere à vida comunitária no

bairro. Para tanto, foi necessário um trabalho conjunto da pesquisa de campo,

subsidiada pela pesquisa bibliográfica e documental. Dessa forma, utilizou-se o

método hermenêutico-dialético para análise dos dados colhidos, compreendendo

que o mesmo nos favorece uma aproximação da realidade pesquisada, através da

pesquisa da vida cotidiana e do senso comum e do diálogo com a realidade de cada

um. Quanto à forma de abordagem a pesquisa é de natureza qualitativa e a mostra

da pesquisa foi realizada por acessibilidade. Levaram-se em consideração os

objetivos propostos, pesquisados com idade superior a 65 anos, que residam há

mais de 35 anos no bairro, com boa saúde mental e que tenham desejo e

disponibilidade para serem entrevistados. Na coleta de dados utilizou-se observação

simples e aplicação de entrevista semiestruturada. As categorias centrais que

embasaram este trabalho foram envelhecimento, velhice e memória. Nos achados

da pesquisa observou-se que o envelhecimento faz parte da vida e se apresenta

mundialmente, porém a velhice pode ter várias representações, dependendo da

classe social. Por fim, ressaltou-se a importância da memória para se resgatar a

história dos velhos moradores.

Palavras-chave: Trajetória de vida. Processo de envelhecimento. Velho. Memória.

RESUMEN

El fenómeno del envejecimiento de la población del mundo es lo que más se

evidencia en ese tiempo. Ello se debe a varios condicionantes y no ocurre de

manera aislada. Como se trata del número de personas que envejecen, eso es un

determinante cada vez más visible en la sociedad y lleva consecuencias

contextuales en Brasil y en el mundo. El envejecimiento humano es un proceso

biológico, natural y universal, y la vejez es una convención sociocultural

representada distintamente por la cultura en la que está insertada. En esta

perspectiva, la premisa mayor como objetivo general es conocer la trayectoria de

vida de los viejos habitantes del barrio Henrique Jorge, y como objetivos específicos

presentar el perfil de los sujetos de la pesquisa, enseñar la trayectoria y el proceso

de envejecimiento, la historia del barrio Henrique Jorge y entender la sociabilidad de

los individuos entrevistados en lo que se refiere a la vida comunitaria en el barrio.

Para conseguirlo, fue necesario un trabajo conjunto de la investigación, subsidiada

por la pesquisa bibliográfica y documental. De esa forma, se utilizó el método

hermenéutico-dialéctico para análisis de los datos obtenidos, comprendiendo que lo

mismo nos favorece una aproximación de la realidad pesquisada, mediante la

averiguación de la vida cotidiana y del sentido común y del diálogo con la realidad de

cada uno. En lo que atañe al modo de abordaje, la investigación es de naturaleza

cualitativa y el corpus de la misma se dio por accesibilidad. Se consideraron los

objetivos propuestos, investigados con edad superior a 65 años, que vivan un tiempo

superior a 35 años, con buena salud mental y que tengan deseo y disponibilidad

para contestar a las preguntas del sondeo. En el recogimiento de los datos se utilizó

observación simple y aplicación de entrevista semiestructurada. Las categorías

centrales que basaron este trabajo fueron envejecimiento, vejez y memoria. En las

descubiertas de la pesquisa se observó que el envejecimiento hace parte de la vida

y se presenta en todo el mundo, pero la vejez puede tener muchas

representaciones, depende de la clase social. Finalmente se hizo hincapié a la

importancia de la memoria para se rescatar la historia de los viejos moradores.

Palabras-clave: Trayectoria de vida. Proceso de envejecimiento. Viejo. Memoria.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

TABELA 1 – Comparação entre países ............................................................. 21

GRÁFICO 1 – Proporção de idosos de 60 anos ou mais, de 65 anos ou mais de

idade – Brasil – 1999/2009 .......................................................... 22

TABELA 2 – Indicadores demográficos implícitos na projeção da população

1991/2030 ..................................................................................... 24

GRÁFICO 2 – Pirâmide etária (2012) ................................................................. 27

TABELA 3 – População residente, por situação domicílio, sexo e idade, segundo a

condição no domicílio e compartilhamento da responsabilidade pelo

domicílio ........................................................................................ 28

TABELA 4 – População residente total e pessoas de 60 anos ou mais de idade, total

e respectiva distribuição percentual por grupos de idade, segundo as

Grandes Regiões, as Unidades da Federação e as Regiões

Metropolitanas – 2009 ................................................................... 28

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BPC Benefício de Prestação Continuada

COABE Companhia de Habitação Popular

FAC Faculdade Cearense

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

LOAS Lei Orgânica da Assistência Social

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliares

PNI Política Nacional do Idoso

SESC Serviço Social do Comércio

TCC Trabalho de conclusão do curso

TCLE Termo de consentimento livre e esclarecido

UECE Universidade Estadual do Ceará

UFC Universidade Estadual do Ceará

UMCP União dos Moradores da Casa Popular

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÂO ......................................................................................... 13

2 O FENÔMENO DO ENVELHECIMENTO: ENTENDENDO ESSE PROCESSO

NOS SEUS ASPECTOS CONTEXTUAIS........................................................ 20

2.1 Aspectos contextuais: um convite à reflexão sobre o processo do

envelhecimento ................................................................................................ 20

2.2 Envelhecimento brasileiro e as conquistas políticas: um breve histórico . 22

2.3 O envelhecimento no contexto cearense: como ele é apresentado nesse

espaço .............................................................................................................. 26

3 TRAJETÓRIAS DE VIDA E O PROCESSO DE ENVELHECIMENTO DOS

VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE JORGE ........................... 30

3.1 Perfis dos velhos e moradores que vivem há décadas no bairro Henrique Jorge

................................................................................................................. 30

3.2 Trajetória de vida dos velhos moradores antigos do bairro Henrique Jorge e o

processo do envelhecimento ............................................................................ 31

3.2.1 Senhora Ana, 92 anos ............................................................................. 33

3.2.2 Senhora Sara, 74 anos ............................................................................ 36

3.2.3 Senhora Laura, 73 anos .......................................................................... 40

3.2.4 Senhor João, 70 anos .............................................................................. 44

3.3 Narrando os encontros: vivenciando emoções ........................................ 47

3.3.1 Senhora Ana, 92 anos ............................................................................. 47

3.3.2 Senhora Sara, 74 anos ............................................................................ 49

3.3.3Senhora Laura, 73 anos ........................................................................... 50

3.3.4 Senhor João ............................................................................................ 52

3.4 Bairro Henrique Jorge: experiência dos velhos que vivem há décadas ... 53

3.5 Conhecendo a sociabilidade dos velhos e moradores antigos do bairro . 57

4 O VELHO E A MEMÓRIA: PENSANDO A QUESTÃO DA VELHICE E O

SIGNIFICADO DA MEMÓRIA PARA OS VELHOS E MORADORES DO BAIRRO

HENRIQUE JORGE ......................................................................................... 61

4.1 A velhice no contexto histórico-social ...................................................... 61

4.1.1 Imagens percebidas pela velhice ............................................................. 64

4.2 A memória como uma construção humana ............................................. 67

5 Considerações Finais ............................................................................ 70

SUMÁRIO

REFERÊNCIAS ....................................................................................... 72

APÊNDICES ............................................................................................ 79

ANEXOS .................................................................................................. 82

13

1 INTRODUÇÃO

O envelhecimento é um fato real que se reflete mundialmente e implica

mudanças democráticas, econômicas, políticas e sociais. O fato de se estar vivendo

mais não significa que somente a idade cronológica deva ser tomada como

referência da passagem do tempo, porquanto existem vários fatores que determinam

o processo do envelhecimento. Velhice significa mais que uma fase da vida, ela está

sob condições culturais do homem e se revela diferentemente em seus aspectos

cronológicos, biológicos, psicológicos e sociais, sendo que a cultura é formada pelas

condições históricas, políticas, econômicas e geográficas e produz diferenças no

modo de vida de cada indivíduo, caracterizando-o como velho ou não.

A história tem um papel fundamental na sociedade, porque é uma ciência que

dialoga com a vida através dos tempos, na investigação e na compreensão do

homem quanto ser que se constrói. Nessa perspectiva, o objetivo geral desse estudo

é conhecer a trajetória de vida dos velhos moradores do Bairro Henrique Jorge,

resgatando sua história desde a infância até a vida adulta, observando como ocorreu

o processo do envelhecimento, que é um dos objetivos específicos. Traçamos um

perfil dos sujeitos da pesquisa para uma melhor identificação dos mesmos e

resgatamos a história do bairro Henrique Jorge, onde vivem há décadas, para

entender como eles se sociabilizam no que se refere à vida comunitária no bairro.

“Nesta pesquisa fomos ao mesmo tempo sujeito e objeto. Sujeito enquanto

indagávamos, procurávamos saber. Objeto quando ouvíamos, registrávamos, sendo

como que um instrumento de receber e transmitir a memória de alguém, [...]” (BOSI,

2007, p.38).

O interesse pela temática passou por todo um processo de construção de

conhecimento e descobrimento dos fatos; nas minhas experiências pessoais do meu

cotidiano, da minha origem (o bairro) e com familiares; na vida acadêmica na

Faculdade Cearense (FAC), principalmente nas disciplinas em Pesquisa Social

II(2011.1) e Gerontologia (2012.2), que abriram um leque sobre essas questões, me

possibilitando ter uma visão mais aprofundada; na experiência de estágio no abrigo

de idosos do Olavo Bilac (2013), que contribuiu de forma peculiar e única. Ao

desenvolver a prática profissional pude conhecer outra realidade e os diversos

campos de atuação da profissão e, dessa forma, foi aflorando o desejo de conhecer

mais sobre a área.

14

Esse trabalho passou pela etapa da pesquisa de campo, subsidiada

anteriormente pela pesquisa bibliográfica e documental, realizada no período de

fevereiro a abril de 2014. A pesquisa faz parte de um processo de construção de

conhecimento que mostra a realidade pesquisada. Há tempos a ciência vem

apresentando uma outra visão de mundo, a evolução da sociedade em novos

conceitos e, nesse contexto, as relações entre as pessoas vêm adquirindo novas

formas. “Pesquisa como o procedimento racional e sistemático que tem como

objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos.” (GIL, 2002,

p.17).

As pesquisas bibliográficas realizadas foram baseadas em teóricos da

ciência, autores de relevância para as categorias Envelhecimento, Velho e Memória.

Norteadas por tais categorias e baseadas nos objetivos, segue as fases da

pesquisa: “escolha do tema; elaboração do plano de trabalho; identificação;

localização; compilação; fichamento; análise e interpretação e redação.” (MARCONI;

LAKATOS, 2003, p.44). Na pesquisa documental,

A pesquisa documental assemelha-se muito à pesquisa bibliográfica. A diferença essencial entre ambas está na natureza das fontes. Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza fundamentalmente das contribuições dos diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que não recebem ainda um tratamento analítico, ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa. (GIL, 2002, p.45)

A pesquisa de campo foi realizada no bairro do Henrique Jorge, um dos bairros

de Fortaleza que se delimita ao norte pelo bairro Dom Lustosa; ao sul, João XXIII; ao

leste, Jóquei Clube; e a Oeste, pelo bairro Autran Nunes. “Assim, o trabalho de

campo deve estar ligado a uma vontade e uma identificação com o tema a ser

estudado, permitindo uma melhor realização da pesquisa proposta.” (DESLANDES,

2003, p.52). Há em cada campo sua especificidade, nesse sentido é preciso

compreender a particularidade que se apresenta diferentemente expressa na

realidade, “consiste na observação de fatos e fenômenos tal como ocorrem

espontaneamente, na coleta de dados a eles referentes e no registro de variáveis

que se presumem relevantes, para analisá-los.” (LAKATOS; MARCONI, 2003,

p.186).

Determinado o campo da pesquisa, foram realizadas visitas nas residências dos

entrevistados. Iniciamos a pesquisa com dez idosos, a qual foi realizada por

acessibilidade, levando em consideração a idade superior a 65 anos, residência

15

superior a 35 anos no bairro, boa saúde mental e desejo e disponibilidade para

serem entrevistados. Dentre esses dez que preenchiam os pré-requisitos, quatro

foram selecionados por também recordarem e falarem dos fatos sobre sua trajetória

de vida. A pesquisa de campo realizou-se nos meses de maio e junho do ano

corrente, nas residências dos próprios pesquisados, nos dias e horários previstos

por eles. Os nomes reais foram substituídos por nomes fictícios, a fim de conservar

suas identidades, senhora Ana (92 anos), senhora Sara (74 anos), senhora Laura

(73 anos), e senhor João (70 anos).

Na elaboração dos dados, após a coleta, antes das análises e da interpretação,

foi realizada a “seleção - exame minucioso dos dados”. (MARCONI; LAKATOS,

2003, p.166,167). Para tal foram utilizados alguns procedimentos para a execução

da pesquisa. Após definidos os objetivos, na coleta de dados, apliquei observação

simples em que os fatos espontaneamente se mostram naquele lugar (GIL, 2011).

Também foi utilizado o diário de campo, que foi importante meio de registro do qual

pude lançar mão nos encontros, assim verificando, no momento da interlocução, o

que era importante para a temática (SANTOS, 2005).

Na entrevista foi utilizada a semiestruturada, através de um roteiro com 32

perguntas abertas. Dessa forma propusemos maior liberdade nos discursos

dialógicos entre os entrevistados, conforme eles foram recordando dos fatos durante

as várias visitas realizadas. Devemos considerar a importância do uso do gravador

nesse momento, pois múltiplas respostas puderam ser solucionadas na transcrição

das entrevistas, assim como pode ser assegurada a informação formal dos diálogos.

Ao concordarem participar da pesquisa, os entrevistados assinaram o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido – TCLE (ANEXO B) –, em duas vias, das quais

uma era para a pesquisadora e a outra para o pesquisado, com utilização de

carimbo nos casos de analfabetismo do pesquisado. Todas as informações dadas

que não aceitaram revelar e a identificação dos participantes foram mantidas em

anonimato, pois assim é possível garantir o sigilo dos mesmos assim como a

fidedignidade dos dados obtidos.

Na referente pesquisa, optamos pela aproximação com o método

hermenêutico-dialético, compreendendo que o mesmo nos favorece uma

aproximação com a dinamicidade e o movimento do real, permitindo uma reflexão

em que diversos elementos dialogam entre si, numa perspectiva de totalidade. “[...] a

busca de compreensão de sentido que se dá na comunicação entre seres humanos,

16

tendo na linguagem seu núcleo central, [...] a hermenêutica trabalha com a

comunicação da vida cotidiana e do senso comum [...]” (MINAYO, 2010, p.166). Na

dialética “fornece as bases para uma interpretação dinâmica e totalizante da

realidade, já que estabelece que os fatos sociais não podem ser entendidos quando

considerados isoladamente [...].” (GIL, 2011, p.14), levando em consideração que

essa fornece suporte suficiente e de modo satisfatório para compreender a realidade

sob seus vários aspectos e traz uma concepção da objetividade apresentada, numa

visão crítica que vai além das aparências, o que permite uma reflexão sobre o

assunto proposto. Na visão de Minayo (2010, p.167,168), “a dialética é a ciência e a

arte do diálogo, da pergunta e da controvérsia. Na sua articulação, a hermenêutico-

dialética constitui um importante caminho do pensamento para fundamentar

pesquisas qualitativas [...]”. Nesse sentido, a pesquisa de natureza qualitativa,

“adentra o campo do universo de significações, no campo das aspirações, valores e

crenças, como também de atitudes, dessa forma pode-se perceber e compreender

os fenômenos sociais subjetivamente, [...]” (MINAYO, 2000, p.21), entendendo

nessa um desafio e uma maneira própria de interpretar a realidade junto a dados

que comprovem e interajam com a teoria.

Os estudos qualitativos podem descrever a complexidade de determinado problema e a interação de certas variáveis, compreender e classificar os processos dinâmicos vividos por grupos sociais, contribuir no processo de mudança de dado grupo e possibilitar, [...] o entendimento das particularidades do comportamento dos indivíduos. (DIEHL, 2004, p.52)

Assim, utilizaram-se os “[...] meios técnicos para garantir a objetividade e a

precisão no estudo dos fatos sociais.” (Gil, 2011, p.15). Utilizamos o método

comparativo, no sentido de que ele, “procede pela investigação de indivíduos,

classes, fenômenos ou fatos, com vistas a ressaltar as diferenças e similaridades

entre eles.” (Gil, 2011, p.16). Iremos trabalhar com representações sociais, pois é

importante para enriquecer as falas porque traz um significado em cada uma delas.

Apesar de sua complexidade conceitual, há um consenso nas Ciências Sociais de que as representações sociais revelam as ideias, as concepções, percepções e visões de mundo que os atores sociais possuem sobre a realidade social, favorecendo a interação social e a prática social dos indivíduos em uma determinada realidade. (ANDRADE, 2010.p.31)

Em O fenômeno do envelhecimento: entendendo esse processo nos seus

aspectos contextuais discutimos os aspectos gerais no Brasil e no Mundo, e

também no Ceará, sobre o processo do envelhecimento e as conquistas adquiridas

pelas pessoas com mais de 60 anos e essa representatividade no Ceará,

17

empregando como principais autores Rodrigo Helenio de Barros Edmundo de Paulo

Junior e Cristiane Leite Fernandes.

No tópico Trajetória de vida dos velhos moradores do bairro Henrique

Jorge, abordamos o perfil dos pesquisados, a trajetória de vida e o processo de

envelhecimento e narramos os encontros com os entrevistados, a história do bairro

Henrique Jorge e como é a sociabilidade dos velhos nesse lugar.

No terceiro Capitulo O velho e a memória: pensando a questão da velhice e

o significado da memória para os velhos moradores do bairro Henrique Jorge

fazemos referência à velhice no contexto histórico-social, como também às imagens

percebidas pela velhice. Por fim, falamos sobre a memória como construção

humana, trazendo uma abordagem geral e sua importância na vida dos velhos

moradores do bairro Henrique Jorge.

Em relação ao percurso para a realização desse trabalho, pode-se dizer que

deu-se de forma não linear, e demandou tempo, compromisso, paciência e

disposição para encaixar todas as peças que estavam soltas e dispersas. A

princípio, era apenas um projeto de Fundamentos de TCC com os velhos do abrigo

Olavo Bilac, nosso campo de estágio. Ao iniciar o novo semestre, 2014, começamos

uma nova caminha sob orientação da professora Valney Rocha, a partir da qual foi

traçado um novo objetivo e, após alguns encontros, finalmente os objetivos foram

concretizados.

Em março de 2014, apresentamos nossas experiências de estágio, ideias e

observações, assim como nossas dificuldades, dúvidas e questionamentos, pois

tempos anteriores observamos a diferença entre idosos institucionalizados e idosos

do bairro Henrique Jorge, tendo em vista que somos moradores do bairro e

conhecemos alguns idosos. Por outro lado a Prof. Valney apresentou vários

trabalhos realizados e suas experiências com outras orientações. Nessa

oportunidade foram analisados os que se tinham em mãos e alguns outros foram

sugeridos. Dialogamos e, a partir de diferentes pontos de vista, a professora propôs

que o bairro Henrique Jorge fosse o campo de pesquisa, e seu objeto de pesquisa

os velhos que vivem há muitas décadas no Bairro. Foi importante o dialogo sincero

para se chegar a uma compreensão recíproca, e foi aceito o desafio.

Nas buscas bibliográficas e documentais, saímos à procura de algumas

bibliotecas de Fortaleza, porém o objetivo da pesquisa não foi prontamente decidido,

levando dias de encontros com a orientadora e pesquisas bibliográficas. Fomos à

18

Biblioteca Central imaginando encontrar muitos materiais relacionados aos assuntos,

mas ao chegarmos lá, após enfrentarmos a distância e o trânsito que

impossibilitavam um acesso rápido a nosso destino, nos deparamos com a biblioteca

fechada para reforma. Posteriormente procuramos a biblioteca da FAC, da UFC, da

UECE e do SESC.

Também realizamos pesquisas no Arquivo Público, localizado na Rua

Guilherme Rocha, Centro de Fortaleza, na esperança de encontrarmos documentos

que falassem sobre a história do bairro, porém sem sucesso. Nossa maior

dificuldade foi a falta de funcionários para que melhor nos orientássemos na busca

por material, só havia um funcionário novato, pois o outro não estava presente.

Seguidamente fomos ao Instituto do Ceará, Histórico, Geográfico e

Antropológico, que fica também no Centro de Fortaleza, realizar pesquisas e adquirir

documentos sobre Casa Popular e a história do bairro Henrique Jorge, porém não

encontramos registro algum que pudesse acrescentar ao trabalho. Fomos também

ao Jornal o POVO, em dia e hora marcadas para pesquisar nos jornais antigos

digitalizados. A intenção era encontrar registros sobre as décadas de 50 e 60 que

falassem sobre o bairro, porém não encontramos. Depois seguimos para o IBGE em

nova busca. O objetivo era adquirir mapas do bairro de décadas passadas e fazer

outras investigações, contudo alguns funcionários não demonstraram atitude positiva

muito menos interesse em auxiliar-nos em nossas pesquisas acadêmicas, que a

princípio seriam as categorias pertencimento, idoso e lugar.

Ao iniciar as pesquisas bibliográficas nos deparamos com dificuldades de

acesso a autores para formar uma boa base literária, o que, de início, obstaculizou a

realização do trabalho. Após revisto com a orientadora, percebemos que a memória

do idoso está ligada a sua trajetória de vida e, a partir de então, pudemos afirmar e

estruturar o trabalho nas categorias Envelhecimento, Velho e Memória e nos

objetivos específicos referidos anteriormente.

Inúmeros passos foram dados para a realização desse trabalho, pois o trabalho

de pesquisa requer, não só encontrar os materiais de que se precisa, mas também

ter o propósito de realizar a pesquisa superando os obstáculos e as dificuldades

apresentadas durante o processo, que é de crescimento pessoal e profissional.

O contato por acessibilidade com os pesquisados – pois ou foram indicações

de pessoas próximas ou eram conhecidos nossos -, auxiliou na realização dessa

pesquisa. No campo da pesquisa fizemos uma busca geral, realizamos algumas

19

visitas para saber onde poderíamos encontrar os pesquisados, para um primeiro

contato com eles.

Realizamos pesquisas no bairro em pontos considerados importantes para a

pesquisa: Centro de saúde Fernandes Távora, Rua Antônio Ivo, na qual se localiza,

segundo informações jornalísticas e comentários de vizinhos, a antiga casa onde

residiu, por um curto período de tempo, a escritora Raquel de Queiroz. Foram feitas

também algumas visitas a um grupo de idosas que são acompanhadas por

voluntárias da Igreja Matriz do Imaculado Coração de Maria, do Bairro Henrique

Jorge, e a Associação Nova Era, também no mesmo bairro.

Nas visitas de campo e também aos entrevistados, sempre havia a expectativa

como surpresa. Deparamo-nos com muitas dificuldades embora fosse um local

conhecido. Aproximar-se dos velhos e moradores que vivem há décadas não é fácil

pois é preciso alguém mais íntimo ou conhecido deles para fazer a conexão.

Tivemos que demonstrar empatia e ter paciência para a construção de certo vínculo.

Após isso puderam se sentir seguros e demostraram alegria com nossa presença

nas várias visitas realizadas. Dessa forma a memória dos idosos foi aflorada e

consequentemente, resgatada sua trajetória de vida. O desconhecido de certa forma

causa surpresa e ansiedade e isso foi um dos pontos mais difíceis que encontramos

antes das visitas. Depois as visitas se tornaram mais descontraídas e emocionantes

nos relatórios, pois, ao se resgatar as trajetórias de vida, há uma sobrecarga de

emoções que também nos emocionam.

A pesquisa realizada será o início de um futuro trabalho mais aprofundado, pois

o campo e o objeto de estudo, os velhos e moradores antigos são mais uma

referência de estudo para serem explorados na pesquisa acadêmica e no estudo da

ciência. Nesse sentido traz novos conhecimentos, novas reflexões, pois a realidade

é dinâmica e está em constantes mudanças. “[...] a partir das palavras e ações,

iluminar a docência e a pesquisa, e assim, refletir sobre o que é, e como se constrói

o saber, e sobre as possibilidades que indicam para um processo de autoformação,

em vários níveis [...]” (BRANDRÃO, 2008, p.6). Buscaremos nos aproximar e

participar de estudos, eventos, conferências e pesquisadores sociais, realizar novas

pesquisas e, com certeza, relacionar esses conhecimentos para poder realizar

futuramente o que será de grande relevância tanto pessoal e social como para o

meio acadêmico, já que trará novas reflexões e novas descobertas.

20

2 CAPÍTULO I – O FENÔMENO DO ENVELHECIMENTO: ENTENDENDO ESSE

PROCESSO NOS SEUS ASPECTOS CONTEXTUAIS

2.1 Aspectos contextuais: um convite à reflexão sobre o processo do

envelhecimento

A questão do envelhecimento é debatida mundialmente, “[...] é um processo

complexo que abriga não só o aspecto biológico, mas uma grande diversidade de

situações. A expectativa de envelhecer é diversificada porque depende da classe

social a que o indivíduo pertence, [...]” (LOPES, 2011, p.22). Esse fato se refere a

vários motivos que foram sendo estudados em todo o mundo sobre o

envelhecimento da população implicando mudanças nos seus aspectos econômicos,

políticos, sociais e culturais. Como discorre Barros e Junior,

A expectativa de vida aumentou vertiginosamente e provavelmente aumentará ainda mais nos próximos anos. Segundo dados da ONU (2002, p.11,13) de 1950 a 2000, a população com mais de 60 anos cresceu três vezes e, até a metade do século atual aumentará mais três vezes. Fato novo desse fenômeno também diz respeito à amplitude. Se antes somente os países desenvolvidos tais como Estados Unidos, França, Itália e outros países da Europa contribuíram de forma mais significativa para o aumento de pessoas idosas no mundo, na atualidade são os países em desenvolvimento que mais contribuem para o aumento dessa parcela da população. (BARROS E JUNIOR, 2013, p.76).

Sob este ponto de vista, podemos refletir que o envelhecimento populacional,

uma vez que era dominante nos países industrializados, começou a ser evidenciado

nos países considerados em desenvolvimento; isso também se deve ao mundo

globalizado. “Isso denota que o processo de envelhecimento não tem explicação em

si mesmo. Sua ocorrência se deve a várias determinações, principalmente à queda

da fecundidade e ao aumento da longevidade.” (MENDONÇA; PEREIRA, 2013,

p.143). Com o desenvolvimento industrial, a inserção da mulher no mercado de

trabalho e a revolução da pílula anticoncepcional há uma diminuição da taxa de

natalidade e fecundidade 1 e um aumento da expectativa de vida, avanço da

medicina, melhora nas políticas de saúde e, consequentemente, uma melhor

qualidade de vida, nisso o número de pessoas envelhecendo se torna bem evidente

nas transições demográficas, imigrações e emigrações. Segundo Fernandes,

1A natalidade refere-se à relação entre nascimentos vivos e população total. A fecundidade refere-se

à relação entre nascimentos vivos e mulheres em idade reprodutiva. ( CARVALHO,1994, p20)

21

Essa evolução do envelhecimento de uma população pode ser explicada através do aumento quantitativo da população idosa e seu peso relativo em comparação a outros grupos etários, além das maiores probabilidades de sobrevivência e das tendências da mortalidade. No entanto, outro fator que incide na dinâmica do envelhecimento populacional são as migrações e imigrações, que se caracterizam como fenômenos de mobilidade social, transformando o perfil da sociedade e modificando a estrutura demográfica, tanto da sociedade de origem como da sociedade de destino. (FERNANDES, 2009, p.10)

A tabela abaixo ilustra de forma comparativa o número de velhos em países

com população superior a 100 milhões, em relação ao ano de 2002, e como se

apresentará até 2025.

TABELA 1 – Comparação entre países

2002 2025

CHINA-134,2 CHINA-287,5

INDIA-81,0 INDIA-168,5

ESTADOS UNIDOS-46,1 ESTADOS UNIDOS-86,1

JAPÃO-31,0 JAPÃO-43,5

RÚSSIA-26,2 INDONÉSIA-35,0

INDONÉSIA-17,1 BRASIL-35,5

BRASIL-14,5 RUSSIA-32,7

PAQUISTÃO-8,6 PAQUISTÃO-18,3

MEXICO-7,3 BANGLADESH-17,7

BANGLADESH-7,2 MEXICO-17,6

NIGÉRIA-5,7 NIGERIA-11,4

(Fonte: Nações Unidas, 2002, apud Berzins, 2003, p.23).

Nesse sentido, se compreende o processo de envelhecimento como algo

universal, irreversível, individual, não patológico, de deterioração de um organismo.

“Cada vez mais as pesquisas revelam que o processo de envelhecimento é uma

experiência heterogênea vivida como uma experiência individual” (SCHNEIDER;

IRIGARAY, 2008, p.586).

As conclusões aqui expostas pelos autores nos sugerem um exercício de

reflexão com capacidade de compreensão e de ação diante da realidade que é

22

complexa e dinâmica. O gráfico 7.1 abaixo mostra a evolução do peso relativo das

pessoas com 65 anos ou mais de idade, faixa etária considerada para fins de

estudos demográficos e, também, como limite da condição de velhice nos países

mais desenvolvidos. (IBGE, 2010).

GRÁFICO 1 – Proporção de idosos de 60 anos ou mais e de 65 anos ou mais de idade – Brasil – 1999 / 2009

Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, (2010)

2.2 O envelhecimento brasileiro e as conquistas políticas: Um breve histórico.

O cenário atual, comprovado pelas pesquisas, é que a expectativa de vida

aumentou tornando-se marcante nas políticas mundiais e não foi diferente nos

países considerados em desenvolvimento, no caso o Brasil.

Compreender esse processo é conhecê-lo em um forte impacto de mudanças

estruturais. “Tal rapidez com que se processam as mudanças, o Brasil deverá

passar, entre 1996 e 2025, da 11ª para 7ª posição mundial em termos de número

absoluto de indivíduos com 60 anos ou mais.” (Chaimawiez, 1998, p.41). Segundo

pesquisas, atualmente há em 26% dos lares brasileiros uma pessoa idosa, e

pessoas com mais de 100 anos, há pelo menos 130 mil. (MINAYO, 2005).

23

No cenário brasileiro a longevidade se apresentou em poucas décadas e o

que se espera do governo é que as ações possam ser eficazes no enfrentamento

dos problemas que poderá se apresentar (FERNANDES, 2009). É um fato cada vez

mais desafiador, porque “não há nada de novo em afirmarmos que no Brasil as

pessoas estão vivendo mais, embora em condições desiguais de envelhecimento,

que decorrem da expressiva desigualdade socioeconômica que há muito tempo

predomina no país. [...]” (FERNANDES, 2009, p.10).

Assim sendo, outros aspectos são relevantes, pois não é só conhecermos

que a população está envelhecendo, mas é preciso refletir como essa população

está sendo acompanhada pelo Governo Brasileiro. Sob esse ponto de vista, Minayo

afirmar:

Tal fenômeno coloca vários dilemas para todas as sociedades e para seus governos. Entre eles, ressalta-se a necessidade de se rever: [...] os limites de idade para a aposentadoria; [...]; a formação de pessoas para lidar com as necessidades próprias dessa população; [...]; mudanças culturais relativas à visão do envelhecimento e a inclusão dos idosos como atores sociais. (MINAYO, 2005, p.8)

A partir daí é necessário o investimento em todas as áreas que o indivíduo

necessita e o engajamento de toda a sociedade. O envelhecimento com qualidade

de vida depende de o indivíduo ter acesso e usufruir de boas condições em saúde,

educação, trabalho, urbanização, habitação, não só na velhice, mas em todo o

percurso da vida. (MASCARO, 1997)

Não podemos deixar de refletir sobre o aspecto negativo do envelhecimento

que é mostrado, em um país em que há muitos problemas sociais, principalmente

nas camadas sociais de baixa renda que correspondem a 77 milhões de pessoas

em estado de miséria e de fome, consequentemente a imagem do envelhecimento é

mostrado de forma bem mais cruel. (MAGALHÃES, 1987)

Diante das considerações apresentadas abaixo podemos entender que no

Brasil, considerado um país em desenvolvimento, sua população está envelhecendo

e a cada ano vem se evidenciando no cotidiano como também através das

pesquisas e estudos científicos. Esse crescimento se reflete na sociedade trazendo

grandes desafios em relação aos direitos sociais e políticos, no sentido de garanti-

los a esse seguimento da população que é diversificada, principalmente no que diz

respeito à saúde e a previdência.

Segundo dados do IBGE, a tabela 2 vem mostrando os indicadores

Demográficos na Projeção da População, entendendo que:

24

Assim, a julgar pelo conjunto de indicadores correntes e prospectivos para o Brasil, ilustrados na Tabela 2. A, verifica-se a progressividade do processo de envelhecimento pelo qual atravessa a sociedade brasileira, conjuntamente às possíveis oportunidades demográficas que a década de 2000 estaria proporcionando ao País e, de modo agregado, às suas Grandes Regiões. (IBGE, 2006, p. 40 e 42)

TABELA 2 – Indicadores demográficos implícitos na projeção da população – 1991/2030

Fonte: IBGE

25

A Constituição Brasileira, lei maior do país, passou por um processo de

mudanças no que diz respeito a garantir os direitos que envolvem todo o cidadão

brasileiro. Desde 1988, com a nova Constituição, os direitos passaram a ser

universal, desse modo abrangendo algumas políticas públicas.

Sob os aspetos apresentados, na história brasileira em que relata sobre as

leis constitucionais, essa questão vem desde a Constituição de 19342, que fazia

menção apenas dentro da “Ordem Econômica Nacional e Social” (Título IV, artigos

115 a 143). Outros direitos também foram formados na Carta Constitucional de

1937, que instituiu os “seguros de velhice, de invalidez, dentre outros”. Já na

Constituição de 1946, tratava da aposentadoria por idade, “primeira a prever a

aposentadoria voluntária por tempo de serviço como verdadeiro direito subjetivo e a

estabelecer a regra de paridade ativo-inativos.” (CASTRO, 2011). Em meados da

década de 60, em 1967, assegurou aos trabalhadores previdência social nos casos

de doença, velhice, invalidez e morte, dentre outros benefícios. Diante de todos os

acontecimentos ocorridos, somente na Constituição Federal de 1988 foi possível

assegurar os direitos aos cidadãos brasileiros, incluindo as pessoas idosas nas

áreas de assistência social, saúde e previdência. Esse propósito foi também de

proteger o que foi garantido aos brasileiros diante das políticas econômicas

neoliberais que defendem o capital e desregulariza os direitos sociais.

(MENDONÇA; PEREIRA, 2013). Rosatti, ressalta:

Apenas com a Constituição Federal de 1988 o legislador consolidou direitos do “idoso”, em seus artigos, 203, incisos I e V, 229 e 230 e parágrafos, 1º e 2º. Consignou de forma expressa seus direitos e proteções dentre as quais o dever da família de amparar seus idosos conjuntamente com a sociedade e o Estado na preservação de sua cidadania, dignidade, bem estar e direito à vida (ROSATTI, 2007, p.21).

Desse modo, a pessoa considerada idosa passa a ter uma legislação própria,

surgindo o Estatuto do idoso3 , “destinado a regular os direitos assegurados às

2 Assim surgiu a primeira Constituição verdadeiramente social do Brasil, de caráter democrático e interventiva. Elaborado o texto da Carta Política de 1934, a Constituição modificou, principalmente, os seguintes aspectos do sistema até então vigente: 1. Tornou o voto secreto e conferiu direito de voto às mulheres (art. 52, §1º); 2. Instituiu a Justiça Militar e Eleitoral como órgãos do Poder Judiciário (art. 63); 3. Criou normas reguladoras da ordem econômica e social (Título IV), da família, educação e cultura (Título V) e da segurança nacional (Título VI); 4. Reforçou a tripartição dos poderes (art. 3º); 5. Instituiu a responsabilidade pessoal e solidária dos ministros de Estado juntamente com o Presidente da República (art. 61) (Revista Brasileira de Direito Constitucional – RBDC n. 16 – jul./dez. 2010, p.172) 3 Somente em 1994, o Brasil passou a ter uma Política Nacional do Idoso (Lei 8.842) e apenas cinco anos depois foi editada a Política Nacional de Saúde do Idoso – Portaria MS 1.395/99. (ESTATUTO DO IDOSO. Série E. Legislação de Saúde 1.ª edição2.ª reimpressão. Brasília, 2003)

26

pessoas com idade igual ou superior a 60(sessenta anos).” (ESTATUTO DO IDOSO,

2011, p11).

Como já foi mostrado, vários foram os benefícios assegurados aos idosos. A

LOAS, de lei 8.742/93 surgiu também como uma forma de proteção. “[.... Seu

objetivo principal é prover os mínimos sociais às pessoas excluídas e em situação

de vulnerabilidade social. Entre os benefícios mais importantes proporcionados por

esta Lei, constitui-se o Benefício de Prestação Continuada – BPC [...].”

(FERNANDES, 2009, p.10). A esse respeito a Política Nacional do Idoso (PNI), Lei

Federal 8.842, também é incumbida de beneficiar as pessoas idosas no que se

refere a sua autonomia, independência, dentro de suas necessidades de saúde,

moradia e segurança. Também prevendo a responsabilidade, participação na

comunidade defender sua dignidade, bem estar e direito à vida, à família, à

sociedade e ao Estado. (OLIVEIRA, et al, 2007)

Nesse sentido, é necessário discutir o impacto do envelhecimento na

sociedade referente às leis brasileiras, principalmente nesse contexto de

globalização, de implicações políticas, econômicas, sociais, culturais e ambientais

que o mundo está vivenciando e que interfere na vida das pessoas. Um dos

impactos que se reflete na política do país, afim de não ser visto como um problema

no rápido envelhecimento da população, é em relação ao sistema de proteção social

que requererão medidas mais urgentes de prevenção e proteção às pessoas idosas.

(MENDONÇA; PEREIRA, 2013).

2.3 O envelhecimento no contexto cearense: como ele é apresentado nesse

espaço.

Refletido o contexto mundial e brasileiro sobre o envelhecimento, refiro-me

agora ao Estado do Ceará e à cidade de Fortaleza. No Ceará, como aponta Feijó e

Medeiros

Dados levantados pelo PNAD, no ano de 2008, o número de idosos eram de 914.514, o que representa 10,8% da população residente do Estado, [...]. Os dados utilizados neste estudo são da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliares (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o período contemplado vão de 1998 a 2008 e abrange o Brasil, Nordeste

e Ceará. (FEIJÓ; MEDEIROS, 2010, p.43)

Diante disso, “[...] a evolução da população velha de 1998 a 2008, no Ceará,

apresentou uma população de 914.514, em 2008, contra 618.917, em 1998, de

27

velhos.” (FEIJÓ; MEDEIROS, 2010, p.46). No que se refere à pirâmide etária,

segundo os mesmos autores:

Diversos estudos têm sido realizados para identificar as implicações desses fatores no formato da pirâmide etária, pois já se veria a que ela tem se alterado, apresentando uma base menos larga e um topo mais robusto, assumindo uma forma retangular. Essa nova estrutura é caracterizada por um aumento absoluto da população mais idosa e diminuição da população com menos de 15 anos. Essas mudanças precisam ser acompanhadas de perto, pois têm implicações diretas no desempenho das economias e particularmente no funcionamento das grandes cidades, como é o caso de Fortaleza. (FEIJÓ; MEDEIROS 2012, p.9).

GRÁFICO 2 – Pirâmide etária.

Fonte: FEIJÓ; MEDEIROS, 2012, p.9

Dessa forma, conhecer o processo do envelhecimento “como fenômeno

universal que revela de forma real na diminuição da fecundidade e mortalidade e o

aumento da longevidade é visibilizado através da pirâmide etária.” (FERNANDES,

2009, p10).

No censo demográfico do IBGE, segundo a tabela 3 na Região Metropolitana

de Fortaleza o número de pessoas com mais de 60 anos é de 3.580 pessoas. Em

relação ao bairro Henrique Jorge, a população residente de 60 a 69 anos ou de 70

anos ou mais soma um total de 2.885 pessoas.

28

TABELA 3– População residente, por situação do domicílio, sexo e idade, segundo a condição no domicílio e compartilhamento da responsabilidade pelo domicílio

Fonte: IBGE – Censo Demográfico

Segundo dados do IBGE (2010, p.197), a tabela 4 abaixo representa o

número de pessoas de 60 anos ou mais de idade em todas as Unidades da

Federação Brasileira e Regiões Metropolitanas – 2009. A Informação é de que haja

54.020 pessoas com 60 ou mais no Nordeste e 8.569, no Ceará.

TABELA 4 – População residente total e pessoas de 60 anos ou mais de idade, total e respectiva distribuição percentual, por grupos de idade, segundo as Grandes Regiões, as Unidades da Federação e as Regiões Metropolitanas – 2009

29

TABELA 4 – População residente total e pessoas de 60 anos ou mais de idade, total e respectiva distribuição percentual, por grupos de idade, segundo as Grandes Regiões, as Unidades da Federação e as Regiões Metropolitanas – 2009

Fonte: IBGE. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2009

30

3 CAPÍTULO II – TRAJETÓRIAS DE VIDA E O PROCESSO DE

ENVELHECIMENTO DOS VELHOS MORADORES DO BAIRRO

HENRIQUE JORGE

3.1 Perfis dos velhos e moradores que vivem há muitas décadas no bairro

Henrique Jorge

Como um dos objetivos específicos proposto, ressaltamos o perfil do sujeito

da pesquisa para uma melhor compreensão dos leitores. Informamos que a

sequência dos entrevistados foi de acordo com a idade dos mesmos.

Senhora Ana, 92 anos, solteira e residente no bairro desde o ano de 1964.

Nasceu no distrito de Boa Viagem, interior do Ceará. Filha de pais agricultores

começou a trabalhar na roça aos nove nos de idade com as irmãs. Acompanhou os

pais nas missas e exerceu um papel de compromisso com a Igreja Católica desde a

sua meninice, no interior, até seus dias atuais no bairro, sendo uma das precursoras

da construção da Igreja Matriz do bairro Henrique Jorge, desde o ano em que

chegou. Foi alfabetizada no grupo de idosos da igreja Católica, pois até então não

havia estudado em escolas regulares. Atualmente mora em casa própria com uma

cuidadora e se mantém com a aposentadoria que recebe.

Senhora Sara, 74 anos, casada e mãe de dezoito filhos (três in memorian),

mora no bairro desde o ano de 1969. Nasceu no município de Ocara, interior do

Ceará. A mãe tivera vários filhos. Sara, aos nove meses de nascida, foi doada para

um casal que residia na mesma cidade, passando a ser cuidada por eles a partir de

então. Os pais adotivos eram agricultores, mas sua mãe fazia chapéu para

completar a renda. Foi alfabetizada em casa por seu pai, através de cartilha.

Posteriormente passou a ser solicitada pelos moradores e amigos da região para

fazer cartas para parentes. Aos 18 anos casou-se vindo morar em Fortaleza, no

bairro Henrique Jorge, com o esposo e oito filhos; na cidade nasceram dez filhos.

Atualmente mora em casa própria com três filhos. A renda é proveniente do

benefício que ela e o esposo recebem.

Senhora Laura, 73 anos, casada e mãe de seis filhos. Nasceu no distrito de

Quixadá, interior do Ceará. Filha de agricultores, é a primeira de nove irmãos. Desde

a idade de 10 anos começou a ajudar a mãe nos trabalhos domésticos e na criação

dos irmãos mais novos. Estudou até o 4ª ano primário em uma única escola, onde

31

morava. Com a idade de 26 anos se casou e teve um filho. Em 1968 chegou a

Fortaleza, no bairro Henrique Jorge, e aqui teve mais cinco filhos. Ela, dona de casa

e o esposo conseguiu exercer a profissão de metalúrgico. Atualmente reside em

casa própria com o esposo e dois filhos. A renda é pelo benefício.

Senhor João, 70 anos, casado e pai de quatro filhos, nasceu em Fortaleza,

no Centro da cidade. Sua mãe era dona de casa e seu pai, Guarda Civil. Viveu sua

infância no bairro Otávio Bonfim e, aos 14 anos, veio com sua família morar no

bairro Henrique Jorge, nas Casas Populares, residindo aí por alguns anos.

Posteriormente mudou-se para o bairro Antônio Bezerra. Aos 19 anos ingressou na

polícia e aos 21 anos casou-se no religioso. Passaram mais alguns anos até sair

como estudante da polícia para poder casar no cartório. No ano de 1969 retornou a

morar no bairro Henrique Jorge, agora com a esposa e os filhos. É aposentado e

reside em casa própria com a esposa e duas filhas.

3.2 Trajetória de vida dos velhos moradores do bairro Henrique Jorge e o

processo de envelhecimento

Nesta seção fazemos referência às trajetórias de vida dos velhos, resgatando

os principais acontecimentos durante a infância, juventude, vida adulta e como se

deu o processo do envelhecimento. Tudo isso só foi possível através da memória,

que é um instrumento que se utiliza para resgatar a história e que, nesse sentido,

utilizou-se para conhecer a trajetória de vida de forma particular e individual dos

entrevistados. Merece consideração as discussões teóricas nas análises propostas

pelos autores de modo a relacionar as teorias aos objetivos da pesquisa.

As percepções que cada velho viveu e vive são diferentes em cada contexto

histórico, cultural e social. São homens e mulheres que nasceram em épocas

passadas e se inseriram no mundo onde já havia uma cultura e costumes

estabelecidos. Cada velho e morador antigo trazem diferentes percepções,

experiências pois, embora morem em um lugar comum, no caso o bairro Henrique

Jorge, onde moram há décadas, é possuidor de conhecimentos e saberes diversos.

As percepções de cada entrevistado relacionam-se com a visão de mundo que lhe é

real, aquilo que o cerca (ASSIS; MARTIN, 2010). As representações da fala dos

entrevistados nas percepções, reações e emoções no resgate da trajetória de vida

que puderam transmitir durante as entrevistas realizadas foi um momento único.

Nesse sentido, acrescentamos algo trazendo as palavras de Bossi:

32

O passado ainda é bem vivo na memória desses idosos quando relata seu cotidiano, as dificuldades enfrentadas, suas realizações e se ver no presente sentem-se realizados. O presente e o passado estão andando juntos na memória dos entrevistados, percebe-se nas falas que traz suas experiências de vida, em que é parte integrante das mudanças do lugar, em que puderam relatar. O passado conserva-se e, além de conservar-se, atua no presente, mas não de forma homogênea. De um lado, o corpo guarda esquemas de comportamento de que se vale muitas vezes automaticamente na ação sobre as coisas: Trata-se da memória-hábito, a memória dos mecanismos motores. De outro lado, ocorrem lembranças independentes de quaisquer hábitos: Lembranças isoladas, singulares, que constituiriam autenticas ressurreições do passado. (BOSI, 2007, p.48)

Nas visitas nas quais pudemos dialogar com os velhos moradores, utilizamos a

linguagem que “é um instrumento de socialização da memória na redução,

unificação e aproximação no espaço histórico, na imagem, na lembrança.” (BOSI,

2007, p.56). Enfatizamos as palavras de Bosi, trazendo uma reflexão através de

uma pequena historia

Uma lenda balinesa fala de um longínquo lugar, nas montanhas, onde outrora se sacrificavam os velhos. Com o tempo não restou nenhum avô que contasse as tradições para os netos. A lembrança das tradições se perdeu. Um dia quiseram construir um salão de paredes de troncos para a sede do conselho. Diante dos troncos abatidos e já desgalhados os construtores viam-se perplexos. Quem diria onde estava à base para ser enterrada e o alto que serviria de apoio para o teto? Nenhum deles poderia responder: há muitos anos não se levavam construções de grande porte, e eles tinham perdido a experiência. Um velho, que havia sido escondido pelo neto, aparece e ensina a comunidade a distinguir a base e o cimo dos troncos. Nunca mais um velho foi sacrificado. (BOSI, 2007, p. 76,77)

Os velhos moradores em suas narrações expõem episódios em suas vidas que

trazem significado pessoal e comunitário; são relatos de aprendizagem, lutas e

conquistas que ao chegar no tempo da velhice, lutar já não é mais o foco, mas sim,

fruição. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (2012).

A pessoa idosa de hoje tem em sua história de vida experiências de uma realidade cujos fatos compõem a história social do país, cujos principais referenciais de suas vidas relacionados aos períodos de infância, juventude e de vida adulta produziram valores e formas de estar-no-mundo relacionados a esses tempos, definindo identidades para as gerações às quais pertencem e marcando modos distintos de perceber e vivenciar a atualidade. (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2012, p.16)

Quem deve lutar pelos velhos pra que eles sejam vistos, reconhecendo-os?

“O velho não tem armas. Nós é que temos de lutar por Ele. [...]. Porque temos que

lutar pelos velhos? Porque é a fonte de onde jorra a essência da cultura, ponto onde

o passado se conserva e o presente se prepara, [...]” (BOSI, 2007, p.18).

Expomos aqui a trajetória de vida propriamente dita dos longevos que vivem

há décadas no bairro. Ressaltamos que o nome é fictício para conservar a

33

identidade dos mesmos e a sequência se deu conforme a idade do entrevistado:

senhora Ana, 92 anos; senhora Sara, 74 anos; senhora Laura, 73 anos e o senhor

João, 70 anos.

3.2.1 Senhora Ana, 92 anos

Nasceu em Outubro de 1924, em um domingo, às 7 horas da manhã na

localidade de Boa Viagem, sertão de Quixeramobim, interior do Ceará. A sua mãe,

Ester, veio de Palmácia e o pai, Arão, era de Boa Viagem mesmo, onde

permaneceram depois de casados, em uma fazenda. A renda da família provinha da

agricultura. O senhor Arão trabalhava fora, nas plantações, mas no verão retirava o

gado para ir à Palmácia, onde passava o dia e só retornava quando anoitecia,

trazendo a alimentação para a família. Dona Ester, dona de casa, cuidava dos

afazeres domésticos e dos filhos; dentre os nove filhos que nasceram houve vários

abortos.

Era comum às pessoas que moravam no interior se tratarem de doenças com

uso de plantas medicinais, por não haver na comunidade meios de acesso à saúde.

Exemplo dessa inacessibilidade se vê nos nascimentos que aconteciam e eram

acompanhados por parteiras. Em Boa Viagem só havia algumas casas e uma igreja

católica que a família frequentava. A diversão nessa localidade era o forró e a família

chegou a conhecer o cantador Luiz Gonzaga 4 , que divertia a todos com suas

músicas.

Ana, na idade de 11 anos, já ia para roça com as irmãs mais velhas

acompanhar o pai. O desejo dela era ajudar o pai e não deixa-lo só, preferia ficar na

roça ajudando-o com o machado, capinando, limpando, plantando e colhendo o que

produziam, cortava mandacaru e fazia tudo que precisava. Os irmãos mais novos

ficavam com a mãe em casa. O pai a considerava o homem e a mulher da casa, pois

resolvia as tudo.

Suas irmãs mais velhas, ainda bem jovens, se casaram. Um dos moradores,

amigo da família, tinha um filho de 15 anos, a mesma idade que Ana, que saía de

cavalo junto com ela em suas. Em um desses passeios ambos se declararam

apaixonados e o namoro foi aprovado pela família dela. Ao falar sobre casamento,

4 Importante compositor brasileiro, conhecido também como o Rei do Baião, nasceu em Recife, em 1912.

34

ele impôs algumas condições, dentre elas a de que ela só iria à igreja de 15 em 15

dias e com ele. Foi quando ela pegou o anel que havia recebido e o jogou dizendo

que não queria ficar sem liberdade de ir à igreja por causa de ninguém e que não

sairia da casa de seus pais. Sua mãe ficou triste porque aquele rapaz era de boa

família e da mesma localidade e também porque suas irmãs mais velhas estavam se

casando. Ana respondeu à mãe que não deixaria seus pais nem a igreja por causa

dele. Essa foi a última vez que ela se relacionou para um futuro casamento. Os

cuidados de Ana foram para a família e para os trabalhos na igreja católica. Quando

havia festa, os padres a chamavam para organizar os trabalhos da paróquia. Ela se

deslocava para outras localidades e passava três dias na festa da igreja. Depois de

algum tempo, recebeu a notícia de que seu ex-pretendente havia casado com sua

prima.

Em relação aos estudos, seus pais pagaram uma professora particular para

ensinar os filhos. Os irmãos mais novos estudaram em casa e ela, como tomou para

si muitas responsabilidades, não estudou, o tempo era para a roça, para os

trabalhos domésticos e para a igreja católica.

O tempo foi passando e um dos irmãos de Ana vendeu um terreno da família

sem ninguém saber, até os compradores chegarem lá. Ela, quando soube, ficou tão

chateada que quis agredir os novos proprietários com machado. Seus pais

aconselharam-na ter calma, pois tudo iria se resolver. O irmão que vendeu o terreno

comprou, em Fortaleza, no bairro Henrique Jorge, uma propriedade. Depois de

alguns anos seus irmãos começaram a vir morar em Fortaleza, depois ela e seus

pais vieram também. Na casa só havia dois cômodos.

Quando ela chegou ao bairro Henrique Jorge, em 1964, havia poucas casas e

muitas terras com mato e árvores. A água era da Cagece, porém muito salgada,

então dona Ana lavava roupa na lagoa da Parangaba. Em certa ocasião, viu uma

mão na lagoa e percebeu que era o corpo de uma pessoa morta. Ficou apavorada.

Algumas pessoas que estavam lá retiraram o corpo dali.

No bairro, começou a se reunir com outras pessoas que faziam missa. Dentre

esses estava o tenente Frazão, que morava no bairro e era dono de algumas terras.

Ele decidiu doar terras para construção de casa ou igreja.

Dona Ana, como uma mulher que sempre se dedicava em auxiliar a Igreja

Católica desde que era adolescente no interior, não fez diferente aqui, na cidade,

desde que chegou em 64. Quando aqui chegou não havia igreja e as missas eram

35

realizadas onde havia mangueiras e cajueiros, no local onde hoje se situa a Praça

Afonso Pena. Levava e organizava tudo para começar a missa, mesas, cadeiras e

altar. Aconteceu de muitas vezes ir à Parangaba buscar padres que vinham de

outras localidades celebrarem missa na comunidade. Com o passar dos anos os

grupos da igreja começaram a se organizar para construir a Paróquia Imaculada

Coração de Maria que ainda não existia. Dona Ana pediu uma carta ao padre

autorizando-a pedir doações de material para a construção da capela. Ela conseguiu

bastante material de construção e isso aconteceu no mesmo ano que chegou ao

bairro. O primeiro registro oficial da igreja data de 1981, e refere-se à Ana como a

segunda Zeladora e uma das primeiras participantes da caminhada pastoral.

Certo dia, com as atividades realizadas na comunidade católica do bairro, o

padre falou com Ana para que cuidasse de umas crianças que viviam na calçada

perto da capela, pois passavam fome e não tinham onde ficar. Foi então que as

levou para sua casa e lá passaram um bom tempo morando com ela. Quando eles

cresceram tomaram um rumo: casaram e foram embora. Certo dia, depois de muitos

anos, um deles apareceu para visitá-la e ela ficou muito emocionada.

Com o passar dos anos seus irmãos casaram, saíram de casa e foram morar

em outros bairros. Por fim, ficaram apenas Ana e seus pais morando na mesma

casa. Durante esses anos não se casou, não teve filhos e nem exerceu nenhuma

atividade remunerativa fora de casa. Sua manutenção vinha da ajuda da igreja,

passou um tempo com a carteira assinada e em outro tempo não assinava mais.

Certo dia, ao fazer a limpeza da igreja, caiu da escada e teve que ser

internada. Durante sua recuperação domiciliar passou a usar cadeiras de rodas, pois

estava sem possibilidade de andar e, consequentemente, parou de realizar

atividades junto aos padres e de participar das reuniões, necessitando ser levada de

carro por membros da igreja. Desde então começou a ter problemas no joelho. Seus

pais faleceram e ela ficou morando em casa só, passando a morar com uma

cuidadora que é paga mensalmente.

A senhora Ana está passando pelo processo do ciclo natural da vida que é

nascer, crescer e hoje, com 92 anos, passa pelo processo do envelhecimento, pois

são vários os fatores que influenciam esse processo, que dependem das condições

de vida de cada pessoa como também do meio em que vivem. Na idade cronológica,

segundo literaturas estudadas, ela é considerada uma idosa mais velha (85 e mais),

e há tendência maior para a fraqueza e para enfermidade podendo ter dificuldades

36

para desempenhar algumas atividades diárias. Relata não ter pressão alta nem

diabetes, portanto não faz uso de remédios. Sua maior dificuldade é andar, por isso

utiliza cadeira de rodas, porém isso não a impede de realizar trabalhos manuais em

seu cotidiano. Sua incapacidade maior é a física, ou seja, algumas perdas

biológicas. Mas não se queixa de sentir-se velha pela idade que tem, pois, como ela

mesma declara, não representa suas atitudes diante da vida, no que sente e deseja

realizar. Diante disso, a literatura revela que a velhice aparece nos olhos de outros

mais do que nos olhos deles mesmos.

Ana não exerceu trabalhos laborais fora de casa e sua renda provinha de

suas funções como auxiliar dos trabalhos igreja Católica. Pela idade cronológica se

aposentou aos 67 anos e com isso se mantém para pagar uma cuidadora para

morar com ela, um plano de saúde e as despesas da casa. Para a senhora Ana foi

um ganho receber a aposentadoria, porque foi um direito que recebeu conforme as

leis e o Estatuto do idoso quando regula os direitos da pessoa com idade igual ou

superior a 60 anos melhorando suas condições de vida. Assim, declaro a visão de

Fernandes (2009) quando diz que o envelhecimento é fortemente influenciado pelas

condições de saúde, alimentação, moradia, lazer, educação.

Declarou que pela impossibilidade de se locomover teve perdas sociais, pois

reduziu o contato que tinha anteriormente com as pessoas da comunidade e, sem

poder participar de grupos assiduamente e como é, os outros a veem como velha

que não produz para o mercado e não consome. Nesse sentido e para a nossa

sociedade, ser velho representa aspecto negativo e isso leva muitas vezes a

exclusão e traz também o preconceito numa sociedade onde ser importante é ter

como consumir. Na visão de Beauvoir (1990), na sua obra A Velhice, não são os

fatores biológicos os determinantes principais de a pessoa ser velha, mas,

sobretudo, os fatores culturais em que aquela pessoa está inserida, na classe social

em que vive. Simone de Beauvoir considera que quem vai definir o lugar dos idosos

é a sociedade a qual pertencem, com suas ideologias e relações de poder.

3.2.2 Senhora Sara, 74 anos

Nasceu em Outubro de 1939, numa casa de taipa no município de Ocara. Sua

mãe, Marta, e seu pai, José eram primos legítimos. Tiveram muitos filhos, dos quais

cinco ainda vivem, e vários abortos. Sara é a quarta filha do casal. Marta cuidava de

casa e dos filhos, enquanto José trabalhava na roça.

37

No interior, a rotina do nordestino era de muito trabalho e poucas atrações. A

sociabilidade era com a família e a assistência à saúde provinha da cultura do povo

com remédios da terra, como as plantas medicinais. As mulheres grávidas eram

acompanhadas pelas parteiras, porém muitas morriam pelas complicações na hora

do parto.

Marta e família, no decorrer do tempo e passando por muitas dificuldades

familiares e financeiras e de saúde resolveram deixar os filhos na casa de parentes

e amigos próximos enquanto melhorava a situação. Dois filhos de Marta ficaram com

a avó materna e Sara, ainda com nove meses, foi para a casa de um casal, Maria e

Martins, passar alguns dias com eles. Grávida de outra criança, esse filho ficou com

ela. Depois de seis meses quando a situação melhorou um pouco, José foi à casa

do casal buscar Sara, e por ela estar muito acostumada com Maria e Martins,

resolveu deixá-la. Já os outros filhos retornaram a casa.

Com o passar dos anos, seus pais biológicos se mudaram daquele local à

procura de melhores condições de vida. Desde então Sara nunca mais teve notícias,

porém em sua velhice os reencontrou, depois de muitos anos que não os via.

Os pais adotivos de Sara já tinham um filho adolescente, depois tiveram uma

menina e, assim, ficaram morando cinco pessoas dentro de casa. A renda da família

era proveniente da agricultura, da casa de farinha em que seu pai trabalhava e da

confecção de chapéus que sua mãe fazia para vender. Assim, na idade de cinco

anos, Sara começou a ajudar sua mãe na confecção dos chapéus. Aprendeu a ler e

escrever em casa, seu pai a ensinava utilizando cartilha, e era sempre solicitada

para escrever cartas que os moradores queriam mandar para familiares distantes.

Aos dezesseis anos conheceu um jovem na casa de um tio e, a partir daí,

começaram a se relacionar. Ao completar dezoito anos se casaram na Igreja

Católica e foram morar em sua própria casa, próximo a de seus pais. Começou uma

nova etapa em sua vida, cuidava da casa e dos filhos – pois tivera oito, por parto

normal e em casa aos cuidados de uma parteira. Já o esposo trabalhava na roça.

Certo dia, Sara e esposo conversando com um sobrinho foram convidados a

vir a Fortaleza morar numa casa que pertencia a ele e estava desocupada no bairro

Casa Popular. Resolveram vir com os filhos. Eles chegaram de trem no ano de 1969

e foram morar na Rua Teresina. Na época havia poucas casas, algumas escolas,

tais como o Colégio Mariano Martins e o Centro Educacional Demócrito Rocha, e o

posto de saúde que se localizava próximo à praça do bairro. Passados alguns

38

meses, conseguiram comprar um terreno e fazer uma casa de barro, ficando muito

felizes pela conquista. As ruas eram de terra e, quando chovia, fazia lama

aparecendo muitos sapos. A oeste da casa, há alguns quilômetros, se localiza o rio

Maranguapinho e as pessoas que queriam passar para o outro lado tinha que usar

cama de ar e balsa.

Na cidade, diferentemente de quem trabalha na roça, no campo, o esposo de

Sara, Antônio, teve que procurar algum trabalho para sustentar a família. Ele

começou a trabalhar como auxiliar de pedreiro e a fazer bicos nos finais de semana

para completar a renda e ela, por sua vez, fazia algumas vendas de produtos que

compravam no centro e, às vezes, engomava e lavava roupas para fora a fim de

receber o dinheiro e comprar alimentação nos botequins que havia próximo a sua

casa, como seu Chiquinho e Manoel Matuto. Com certo tempo, através de

conhecidos, ela conseguiu emprego na Secretaria de Educação, porém acabou não

aceitando devido ao fato de ter filhos e não ter com quem deixá-los. Em Fortaleza,

nasceram mais dez filhos, uns na Maternidade Escola e outros na Maternidade

Argentina Castelo Branco, no Bairro Henrique Jorge. Ao total foram 18 filhos, mas

morreram três. Fez pré-natal nas gravidezes dos filhos que tivera aqui e, nesses

acompanhamentos recebera anticoncepcional que o hospital dava, porém, por causa

de alguns efeitos colaterais, o médico que a acompanhava a aconselhou parar de

usar e não teve acesso a outros meios que a impedisse de engravidar.

A convivência social, além de família e familiares, era com as pessoas que

faziam parte de uma igreja evangélica do bairro e com vizinhos que moravam

próximo a sua residência. No ano de 1995, com mais idade, Sara começou sentir

problemas de saúde. Certo dia seu olho direito se fechou e procuraram o hospital

público, ao fazer vários exames diagnosticou um caroço e o médico falou que com

ou sem cirurgia haveria um risco de falecimento, então ela decidiu não se operar.

Com seus 60 anos constatou diabetes e começou a se tratar no Centro dos

Diabéticos. Aos 67 anos começou a receber o benefício, porém relembra que se

tivesse trabalhado na Secretaria da Educação naquela época em que recebera a

proposta teria se aposentado antes para ajudar nas despesas. Seu esposo recebe

pelo Funrural, aposentadoria concedida a quem trabalhou na roça.

Atualmente, com 74 anos, está passando por todo um processo de

envelhecimento que é lento e gradativo. Através desse processo vêm as

debilidades do corpo, as limitações fisicas, e muitas coisas que sempre fez na

39

juventude, agora não pode mais fazer. Embora seja portadora de algumas doenças,

elas são acompanhadas e tratadas no hospital público. Não paga plano de saúde e

leva uma vida mais em repouso. Atualmente, não tem mais aquela capacidade que

anteriormente tinha em determinar e executar algo no seu cotidiano. Passa seu

tempo em casa com a família e não lê mais, pois se queixa de dificuldades de visão,

mas antes leu a bíblia 20 vezes. Mora com esposo (85 anos) e três filhos solteiros,

recebe muita atenção da família, parentes e amigos que estão sempre presentes em

sua residência. Os quinze filhos moram próximos e tem 27 netos. Há convívio

familiar e troca de experiências entre gerações.

Sara percebe a idade como sendo avançada e com ela sente a fragilidade de

sua constituição física. Se vê como velha pelas debilidades do corpo e, ao ver suas

rugas e cabelos brancos no espelho, percebe que o tempo tem passado e que a

idade chegou. Sente ainda disposição para fazer seus trabalhos domésticos, porém

o corpo não corresponde aos desejos de realizá-los. Atualmente constatou cirrose e

está em tratamento. Diante disso podemos ver que o processo no envelhecimento,

as perdas biológicas começam a aparecer. A literatura vem dizer que o processo de

envelhecimento é diversificado e depende das chances de o indivíduo usufruir de

condições adequadas de saúde, alimentação, lazer, moradia, saneamento básico,

em todo o percurso da vida. Nesse sentido Sara, durante sua trajetória de vida, não

usufruiu de tudo isso.

Segundo Fernandes (2009), embora as pessoas estejam vivendo mais, as

condições desiguais são fortemente predominantes no país e reflete na vida dos

velhos, em relação a usufruir de condições adequadas durante todo seu curso de

vida. A idade cronológica foi vista como um fator positivo pelo fato de receber o

benefício, a fim de melhorar as condições financeiras. Nos aspectos biológicos,

sendo um idoso velho, com tendência de maior fraqueza, o que mais pesou foi a

fragilidade do corpo por conta das doenças que a atingiram. Para ela isso é que é

torna-se velha e não a idade que possui. Com a falta de saúde, o corpo fica

incapacitado de realizar trabalhos do cotidiano, a aparência fica mais envelhecida e

a vida social também é afetada, pois a velhice, na nossa sociedade, é carregada de

preconceitos, de imagens negativas.

Diante da incapacidade e muitas vezes da exclusão no que se refere à

sociedade, a família é um fator a considerar de suma importância em que a senhora

Sara está inserida pois, como a própria Política Nacional do Idoso prevê (PNI), a

40

família, a sociedade e o Estado devem assegurar ao idoso todos os direitos de

cidadania, defendendo sua dignidade, bem estar e direito à vida.

3.2.3 Senhora Laura, 73 anos

A mãe de Laura, Rosa, nascera em 1915. A família morava no distrito de

Riacho do Sangue, Jaguaribe, e, dentre muitos irmãos, ela era a mais nova. Já seu

pai, José, nascera em 1912 e a sua família residia em Caiçarinha, distrito de

Quixadá. Era o caçula da família, morava com a mãe, viúva dos dois maridos, e com

seis irmãos. Sua mãe os criara só, pois não quis doar para ninguém e não casou

novamente. Naquele tempo e naquela localidade, o que mais impactou dos

acontecimentos ocorridos fora a presença dos cangaceiros de Lampião, que

apareciam na cidade para roubar ouro e dinheiro que os velhos guardavam

enterrado no chão. Eles chegavam de repente a cavalos para atacar as casas e

eram violentos.

Rosa e José se conheceram e se casaram no ano de 1939, construíram uma

casa feita de taipa e passaram a morar próximo aos familiares. Ele trabalhava na

roça com seu irmão e Rosa cuidava de casa e dos filhos que iam nascendo. Laura

nasceu em 1940, no Distrito Quixadá, foi a primeira filha do casal de um total de dez

filhos. Desde cedo, Laura, como a filha mais velha, acompanhou a mãe nos

trabalhos domésticos e na criação dos irmãos.

Nos partos da mãe presenciava o sofrimento da mesma e o trabalho das

parteiras. A cultura local e a Saúde precária faziam com que as gestantes tivessem

acesso somente às caximbeiras (parteiras), que imprensavam a barriga da mãe na

hora do parto, puxavam e cortavam o cordão umbilical do bebê. Se o parto

complicasse teriam que ser levadas ao hospital na cidade de Quixeramobim, o que

também era complicado, já que o único meio de transporte da localidade era o

cavalo. O distrito onde Laura morava se chamava Rinaré e era muito distante da

cidade de Quixadá. Considerava Fortaleza “o fim do mundo”. Se alguém fosse

mordido por um cachorro com raiva e tivesse que ir a Fortaleza para ser medicado,

dificilmente seria salvo.

Laura tinha uma vida simples, porém de muito trabalho. Para manter o

sustento da família, seu pai arrendava terras de seu Narciso, dono de muitas terras.

Eles plantavam mandioca para fazer farinha, milho, feijão e fumo, uma vez que por

41

lá muita gente fumava cachimbo. Próximo ao rio Banabuiú criavam gado, bode,

porco, galinha; havia uma fartura de leite, queijo, manteiga da terra. Seu José saía

cedo para a roça e só retornava à tardinha. O relógio era o sol, não havia noção de

tempo e espaço. Como filha mais velha, Laura ajudava em tudo e ainda apreendeu a

costurar. Quando os irmãos mais novos cresciam, o pai levava os homens para roça

e as mulheres ficavam em casa ajudando a mãe. Ela também levava a comida até a

roça onde trabalhavam o pai e outros homens. Em um desses dias levou uma queda

e fraturou o joelho passando muitos dias doente. Os remédios eram a compressa e

o uso de plantas e pomada que comprava de comerciante.

O lazer eram as festas de forró e, quando havia, também as cantorias e o

bumba meu boi e ainda comemoravam uma vez ao ano a festa de São Pedro.

Muitas mulheres passavam o ano colhendo algodão a fim de comprarem tecido e

pagarem Rosa para fazer seus vestidos de festas. As músicas que tocavam eram de

Luiz Gonzaga, os tocadores tocavam sanfona, pandeiro e também cantavam. Quem

organizava as missas, festejos e trazia parques de diversão naquela localidade era a

Igreja Católica, única religião e igreja que existia. A vida era aquela, ninguém ouvia

rádio, tv, não sabiam de outra coisa a não ser a vida no Sertão. Sara era apaixonada

pelo sertão e pelas músicas. As casas eram próximas ao rio Banabuiú e, quando o

rio transbordava, as pessoas ficavam com medo das águas invadirem suas casas.

Os povos que apareciam pelo distrito eram os ciganos que chegavam a cavalos:

homens, mulheres com crianças e velhos com muita bugiganga. Seu pai dava

muitas coisas a eles e as mulheres liam a mão, mas a mãe de Laura não gostava,

pois eles pediam muito, além de que ela tinha medo deles.

Naquela localidade, havia a casa de tijolo do pai de Laura e algumas casas

feitas de taipa. Dentre alguns moradores, o que tinha melhores condições era seu

Cunha, único comerciante da região que morava numa casa grande com a família.

Ele vendia cereais, tecidos e ainda fazia remédio para vender. As crianças

estudavam na única escola pública que existia na localidade até o quinto ano

primário, se quisessem continuar teriam que ir para a cidade.

A escola era do lado da casa da professora, que viera de outra localidade

somente para ensinar as crianças do interior e morava com o esposo e dois filhos.

Na escola, antes de começar a aula, as crianças ficavam de pé para cantar o Hino

Nacional Brasileiro; eles apreendiam a tabuada e a cartilha e se alguém

desobedecesse era utilizada a palmatória. Porém Laura estudou somente até o

42

quarto ano primário, porque a professora teve que ir embora e não tinha outra

professora para substituir. Nesse período, quando foram embora, a escola e a casa

que eram de boa estrutura, ficaram abandonadas. Laura sentiu tristeza pelo

acontecido.

Laura foi crescendo e aprendendo outras atividades, além de costurar roupas

femininas sua mãe pagou uma pessoa para ensinar a costurar roupas masculinas.

Quando criança pensava que em cada canto do mundo existia um sol, não tinha

noção de outros lugares, nem de acontecimentos, a vida era o interior, o cotidiano

do sertão. Vendo seu pai ir ao curral cedo pela manhã para ordenhar as vacas,

ouvia-o conversar com o gado, enquanto ela e a mãe na cozinha preparavam o

lanche dele para ir trabalhar na roça.

Certo dia houve um forró na localidade e, em meio à diversão, Laura

conheceu um jovem, Mariano. Mariano era de boa família, tinha muitos irmãos e

morava em uma fazenda de portugueses, um pouco distante Depois de alguns anos

de namoro se casaram com a idade de vinte e seis anos. Após o casamento foram

morar em uma casa que ele havia construído nas terras de seu pai, pois lá havia

suas plantações.

Laura teve seu primeiro filho em 1967, em Quixadá. Quando engravidou fora

acompanhada pela parteira, porém, ao chegar o tempo para a criança nascer, Laura

não conseguia parir nem a parteira conseguia auxiliá-la. Nesse momento seu pai

lembrou que iria passar um caminhão que se deslocaria para a cidade e então

decidiram levar Laura a um Hospital Maternidade em Quixadá. Ao chegarem à

cidade, foram a um hospital particular e, feitos todos os procedimentos, o bebê já

estava roxo. Passado um dia na cidade retornam a casa no mesmo caminhão, ela, a

criança e sua mãe na boleia do caminhão, e algumas pessoas e o esposo em cima,

junto às mercadorias. Na volta, a caminho de casa o caminhão escorregou na pista

e se direcionava a um precipício, contudo o motorista conseguiu retomar o controle

da direção. Foi um momento de susto e desespero, mas retornaram para casa.

Ao passar dos anos, Mariano foi convidado pela irmã, que já morava na

cidade, a morar em Fortaleza. Foi então que em 1968 decidiram vir à Fortaleza à

procura de melhores condições. Eles saíram de Banabuiú em caminhão até a

cidade, levando mercadoria para o mercado São Sebastião. Chegando aqui saíram

à procura da casa da irmã de Mariano e passaram alguns meses morando com ela,

no bairro Henrique Jorge, depois compraram um terreno e construíram dois

43

compartimentos para abrigar a família. Nesse período, no bairro, havia poucas casas

e muito mato. Onde residiam não havia energia, portanto usavam lamparina, e as

ruas eram de carroçal5 Na época ainda existia o rio Maranguapinho e as pessoas

atravessavam em balsa para o outro lado do rio. No bairro Henrique Jorge havia um

posto de saúde que era bem distante de sua casa, o transporte era o coletivo, porém

de difícil acesso. Seu esposo era agricultor e, ao chegar aqui, começou a procurar

fazer algo para ganhar dinheiro e sustentar a família que estava crescendo.

Trabalhou em muitas coisas até que um dia, em suas andanças pelo centro de

Fortaleza, viu alguns homens trabalhando com solda e começou a observar como

trabalhar com grades, foi então que, com a pouca renda que possuía, foi comprando

os materiais para iniciar na profissão que até hoje exerce.

O cotidiano de Laura eram os trabalhos domésticos, costuras e cuidados com

as crianças. Aqui tivera cinco filhos, três nasceram na Maternidade Escola e dois

nasceram na Maternidade Argentina Castelo Branco, no próprio bairro. Laura tinha

38 anos quando seu último filho nasceu e fez uma histerectomia, conseguida com

um político. Passou por muitas dificuldades financeiras e de saúde junto com os

filhos pequenos. Aos dois anos, seu filho mais novo adoeceu de pneumonia e ela

teve que passar as noites no hospital com a criança e os dias cuidando das outras

crianças e dos afazeres domésticos. Acompanhava os filhos que estudavam nas

escolas do bairro, 4 de Outubro, Mariano Martins, Demócrito Rocha e Felipe dos

Santos. A família participava de grupos da igreja evangélica do bairro e, depois de

alguns anos, suas irmãs começaram a vir também à Fortaleza.

Aos 40 anos começou a sentir debilidade física e sintomas da menopausa;

aos 50 anos e após exames, constatou artrose e osteoporose, tendo mais cuidado

ao andar fora de casa, nas ruas. Aos 68 anos constatou glaucoma e faz

acompanhamento médico através de plano de saúde. Começou a receber benefício

aos 67 anos e, atualmente com seus 73 anos, reside com o esposo e dois filhos em

casa própria e tem apoio da família que está sempre presente em sua residência.

Apesar dos problemas de saúde não se limita a eles e leva uma vida normal e

dinâmica. Tem autonomia e é bem independente, pois toma decisões em assuntos

domésticos, conversa com os filhos e netos, aconselha-os e muitas vezes reclama

daquilo que não concorda, é ouvida e assistida pela família, ainda realiza tarefas

5 Ruas de piçarra onde só passavam carroças

44

caseiras, costura à máquina, frequenta grupos da igreja evangélica e faz

hidroginástica numa academia do bairro.

Podemos refletir sobre o processo de envelhecimento, que é influenciado pelo

contexto social e pelas condições externas a ele, em relação à idade biológica e

dizer que a senhora Laura foi a que mais refletiu negativamente esse processo, mais

que a idade cronológica. Para ela, ter 73 anos de idade não a faz ver-se ou sentir-se

velha, mas as doenças que causam debilidade física e dificultam a realização das

atividades do cotidiano, sim.

Segundo autores, para que o velho tenha qualidade de vida é preciso usufruir

de condições adequadas de educação, urbanização, habitação, saúde e trabalho

durante todo seu curso da vida. Então sob esse aspecto podemos ver que a senhora

Laura não usufruiu sempre dessas boas condições, porque a renda era pouca e não

tinha acesso aos benefícios do Estado. Com 73 anos, segundo a literatura, é

considerada idosa velha, com tendência a maior fragilidade e enfermidade.

Já em relação à idade funcional, ela não é considerada velha por ter uma vida

dinâmica ao cuidar da casa, realizar tarefas no cotidiano, participar de grupos, fazer

hidroginástica e ter uma vida social ativa. Declarou não ter sofrido desprezo, solidão

ou violência por estar com mais idade. Envelhecer significou para ela mudanças e

experiências de vida e não sofrimento pela idade que tem ou pela aparência que

mostra.

3.2.4 Senhor João, 70 anos

Nasceu em Fortaleza, no ano de 1944. Sua mãe, Marisinha, é de Fortaleza e

seu pai, Mariano, veio de Santana do Cariri. Casaram-se no ano de 1936. Ela, dona

de casa e ele, Guarda Civil. Marisinha tivera sete filhos, quatro morreram, ficaram os

mais velhos e os que iam nascendo morriam antes de completar um ano. João

nasceu de parto normal, em casa e com o auxílio da parteira. A cultura do povo era

procurar as parteiras e não os hospitais. Apenas em casos mais críticos procurava-

se o hospital e, mesmo assim, o traslado era complicado. Naquele tempo eles não

tinham assistência quando uma pessoa estava muito doente. Na época havia muita

mortalidade infantil e as crianças morriam até por uma catapora. O costume da

época era utilizar plantas medicinais para curarem os doentes, por exemplo as

crianças que sentiam dor na barrida tomavam chá de macela, óleo de ricino e leite

45

magnésio. Quando alguém ficava em estado grave de saúde uma vela era posta na

mão para sinalizar que a pessoa não sobreviveria. João passou por essa

experiência, mas sobreviveu.

Onde moravam não havia saneamento básico e a rua era areia, portanto não

havia calçamento. A década era de 40. O sustento da família provinha dos bordados

que mãe fazia e do salário de seu pai. Mariano sempre viajava para o interior a

trabalho e quando ainda criança, todos passavam um tempo no interior com ele

depois retornavam. Viveu praticamente sua adolescência na casa de sua avó

materna, no Otávio Bonfim, chamado antigamente de Cercado do Zé Padre. Quanto

a seus avós paternos, não os conheceu. Na adolescência, a vida social era brincar

de bola no campo, naquela época havia muito campo para as crianças brincarem e

também era sacristão da igreja católica. Televisão era coisa rara e computador era

inexistente. Costumava ir ao cinema vizinho à igreja católica dos franciscanos de

onde morava.

“Tudo é de acordo com a época, talvez se tivesse outra coisa de diversão boa teria frequentado, mas mesmo que tivesse não tinha o estímulo, não tinha a atração, influência como hoje que tem as mensagens na televisão, internet e os meios de comunicação.” (sic). (Informação verbal)6

Nos primeiros anos, seus pais pagaram uma professora que morava no bairro

para ensiná-lo em casa. Depois ele começou a ir a uma escola pública de bairro,

Presidente Russel, localizada na Av. Bezerra de Menezes, depois estudou no

Colégio Joaquim Nogueira e no Liceu do Ceará. Interessante observar que

anteriormente as etapas em uma escola eram conhecidas como Primário, Admissão,

Ginásio e Científico, essa última hoje conhecida como Ensino Médio.

Com a idade de quatorze anos veio morar no bairro Henrique Jorge em uma

das casas que seu pai havia comprado pela antiga COHABE, conhecida como Casa

Popular. As Casas Populares eram um conjunto de casas que, juntas, formavam um

quadrado. Localizavam-se desde a Rua Heribaldo Costa até a Rua Audizio Pinheiro,

e da Rua Paissandu, hoje Rua Perto Alegre, até a Rua Paulo Lopes, o que se via ao

redor era muito mato. Na época havia a União dos Moradores, não existia ainda a

Igreja Católica.

A casa era pequena, e o transporte só chegava até o Jóquei Clube, bairro

vizinho. Portanto quem quisesse ir ao Henrique Jorge teria que descer nesse bairro

6 Informação dada por seu João quando o entrevistamos.

46

e caminhar para chegar ao destino. Após um ano foram morar no bairro Antônio

Bezerra, e lá ficaram morando de 1958 a 1968.

Aos dezenove anos ingressou na Polícia, no internato, depois fez a Escola de

Oficiais. Na época de estudante conheceu uma jovem que morava no colégio de

freiras e passaram a namorar, ele tinha o sonho de ser padre e ela freira, porém se

casaram no ano de 1965; ele, aos 21 anos e ela, 27. O casamento passou por duas

etapas. O primeiro foi o religioso, em que ele continuou no internato da polícia e a

esposa retornou à casa da mãe no interior, somente vendo-a aos finais de semana

quando ele a visitava. Nesse tempo nasceram-lhe três filhas. Depois de alguns anos

saiu como oficial da polícia, encerrando seu curso em 68. Nesse período casou-se

no cartório e foram morar juntos. Alugou uma casa no bairro Antônio Bezerra onde

passou alguns anos. No ano de 1969 alugaram uma casa no bairro Henrique Jorge,

onde passaram a residir, e posteriormente a compraram pela Caixa Econômica, lá

morando até os dias atuais.

Ao completar quarenta e sete anos aposentou-se. É formado em Matemática

pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). O cotidiano para seu João após a

aposentadoria é realizar tarefas da casa, trabalhos sociais e religiosos na

comunidade católica e nas atividades físicas (Hidroginástica), ler livros, escrever,

ensinar os netos. Aos sessenta e nove anos constatou problemas de pressão alta e

colesterol.

A trajetória de vida do senhor João foi construída com muito trabalho e muitas

conquistas. O contexto em que viveu foi praticamente na cidade, logo a vida urbana

traz forte influência no processo de mudanças sociais, culturais e no trabalho.

Segundo a literatura, na nossa sociedade é considerada idosa aquela pessoa que

está se retirando do mundo do trabalho e está se aposentando. Seu João, após

aposentar-se ainda leva uma vida dinâmica e de qualidade, não se limitou à idade e

exerce novo papel social na família e na comunidade. Antes provedor da família pelo

trabalho que exercia, ainda hoje exerce autonomia e independência.

“Antes não sentia nada, e por ter tido uma vida simples, sem beber, nem fumar nem ficar se estragando quando era mais novo, se senti mais seguro hoje na velhice. No internato na polícia o cotidiano era estudar, fazer educação física e outras atividades.” (sic). (Informação verbal)7

Hoje, aos 70 anos, declara estar velho, porém quer fazer mais, quer

acompanhar a tecnologia dentre outras novidades que antes não tinha acesso ou

7 Informação dada por seu João quando o entrevistamos.

47

não havia e hoje se oferece, se sente capaz de apreender. Atualmente mora com a

esposa e duas filhas. Trata a questão da idade, quando relembra que viveu sua

infância, juventude e agora a velhice, com muita naturalidade e maturidade e declara

sentir-se feliz.

“Antigamente se via principalmente no interior o velho sentado na cadeira, se balançando, de pijama, hoje a gente vê o velho com 80 anos ainda administrando uma empresa. Por isso as coisas foram mudando, nisso até as expressões, velho, idoso, terceira idade, hoje melhor idade. No dicionário é a mesma coisa. Quando vai envelhecendo a pessoa pode perder alguns papéis que exercia na vida, como trabalhador reconhecido, como uma pessoa que era mais jovem, as percas desses papéis não implica perder a vontade de viver, de ser uma pessoa ainda ativa na sociedade, mas ele pode reverter isso demonstrando que aquela idade não e uma idade de morte” (sic). (Informação verbal)8

3.3 Narrando os encontros: vivenciando emoções.

3.3.1Senhora Ana, 92 anos

Nosso primeiro contato com a senhora Ana foi em uma tarde de segunda feira

de muito sol em Fortaleza, em abril de 2014. Estávamos acompanhadas de uma

senhora do grupo da igreja católica, que me levou a sua residência. Antes

combinamos para nos encontrar na Praça Afonso Pena, sempre movimentada. Era

uma tarde de fluxo tranquilo de transportes e de movimento de pessoas na rua.

Quando nos encontramos na praça fomos em direção à rua de sua

residência. Ao chegar a casa, não poderíamos imaginar que ali residia uma pessoa

que tanto fez por um ideal de fé. Chamamos, porém, sem sucesso, insistimos em

chamar e uma jovem senhora nos atendeu. Adentramos a casa, ao encontro de Ana,

uma senhora que apesar da idade tem poucos cabelos brancos, é robusta, alegre e

gosta muito de falar. Ela se encontrava na sacada, perto do quintal, onde poderia

contemplar a luz do sol e as plantas, em companhia de seu animal de estimação, um

papagaio. É cadeirante e transparece um corpo muito debilitado. Relata que passou

a ser cadeirante quando sofreu uma queda que prejudicou o joelho não conseguiu

mais andar. Ela recebeu-nos com alegria, pois também ali se encontrava a senhora

Maria, sua amiga de muitos anos, que me acompanhava para uma boa visita e um

bom diálogo. Passamos a conversar em um clima de descontração e falamos sobre

o trabalho que iríamos realizar, sobre sua história aqui no bairro.

8 Informação dada por seu João quando o entrevistamos.

48

Como foi o primeiro contato passamos poucas horas conversando e nos

contou sobre quando chegou ao bairro e sua atuação na igreja católica do bairro. Foi

contando vários episódios que acontecera naquela época em sua vida, falando e

lembrado das pessoas. Quando passou algumas horas tivemos que ir embora,

prometi um próximo encontro.

Um dia de clima agradável, pela manhã, fomos a casa dela sem avisar porque

estávamos sem o número de seu telefone. Quando chegamos, ela estava na área

de sua casa, na cadeira de rodas e fazendo lindas flores de fuxico com sua

cuidadora de lado, o papagaio no portão e com algumas plantinhas à vista. Ela

transpareceu felicidade pela visita, então explicamos novamente o objetivo, pedimos

autorização para gravar e começamos a conversar. Ao relatar sua trajetória de vida,

vez outra ficava emocionada, porque ao se referir aos irmãos que tinha falava os

nomes e dizia “esse está vivo, esse não”, portanto ela estava muito comovida e isso

era evidente em sua fala e em seus olhos marejados. Igualmente nos emocionamos

porque víamos nas suas palavras forte sentimento por seus pais e irmãos, dor ao

relatar tristezas que passou e alegrias por se declarar uma mulher forte e

determinada, que superou muitos problemas e que ainda supera. O passado e o

presente estão entrelaçados em sua vida, na sua memória. Percebemos que

resgatar o passado e falar do presente está tão entrelaçado que na sua fala não

dava continuação do passado vindo o presente. Continuamos, porém. Em alguns

momentos parávamos sendo interrompidos por algumas pessoas. Então quando

chegou a hora próxima ao meio dia me despedi e prometi retornar para um novo

diálogo.

Retornamos a sua casa e novamente a encontramos como da outra vez, com

sua cuidadora e seu papagaio do lado. Novamente fomos bem recebidos e ficamos

à vontade como se fosse uma visita sem. Começamos a conversar sobre fatos

recentes, mas, à medida que o tempo passava, assuntos sobre acontecimentos

remotos surgiam. Sobre episódios recentes relatou sobre um dia que saiu com uma

amiga da igreja e percebeu que as ruas não dão boas condições de movimentação

para um cadeirante; falou sobre coisas das quais discordava, sobre suas

preocupações. Informou gostar de ficar na calçada de sua casa observando o

movimento da rua, mas que não o faz mais por causa da insegurança, dos roubos e

do tráfico de drogas. Retornou ao passado falou sobre os trabalhos da igreja

Católica. Perguntada sobre os motivos de ela não ter se tornado freira, respondeu

49

que o motivo foi não querer deixar seus pais sozinhos. Chegou a recusar convites e

disse ao padre que a deixasse como estava, auxiliando a igreja como podia. A

conversa foi espontânea, mesclada de acontecimentos presentes e passados..

3.3.2 Senhora Sara, 74 anos

Terça feira, abril de 2014, luz intensa em Fortaleza e um compromisso: visitar

a Sr.ª Sara. Apesar de enferma, um dia pôde nos receber. Sara tem 74 anos, é mãe

de dezoito filhos, dentre os quais apenas quinze estão vivos, e é uma mulher de

muita fé e coragem. Ainda vive com o marido, hoje com 84 anos de idade.

Não houve intermediários para a realização da entrevista com Sara, porque

já a conhecíamos e isso possibilitou um melhor diálogo e confiança em relação à

idosa. Quando chegamos a sua residência, falamos sobre o trabalho que iríamos

realizar e o objetivo, que a princípio seria trazer a história desde quando chegou ao

bairro. Conversamos sobre a sua chegada ao bairro, como aconteceu, pois é

moradora desde 1969. É uma senhora bem tranquila na sua narração, pouco

emotiva, linear no seu raciocino. Porém, pela sua debilidade física, não lhe permitia

muito tempo, foi então que chegou a hora de.ela lanchar, Paramos para

continuarmos em outro dia.

No segundo encontro, 26 de abril, ela estava na sacada de sua casa sentada

na cadeira de balanço com um lençol, e seu esposo a seu lado em outra cadeira, em

um clima agradável, porém se via e ouvia o movimento dos transportes na rua.

Entramos e passamos a conversar sobre sua trajetória de vida, desde sua infância

até os dias atuais. Informou estar com cirrose e diabetes. Não costuma usar óculos,

pouco anda e quem faz os trabalhos domésticos são os três filhos que moram com

ela em uma casa simples, mas aconchegante. Ela foi lembrando-se de muitas coisas

e relatando com muita tranquilidade, não transmitiu nenhuma emoção ao relatar os

fatos passados, é uma mulher serena, tranquila e linear nas suas palavras. Diante

das falas demostrou o desejo de se recuperar para cuidar do seu lar. Foi um

momento muito gratificante poder conhecer, através do diálogo aberto um pouco de

sua trajetória de vida. Continuamos a conversa, mas por alguns instantes era

interrompida pela movimentação da Avenida barulhenta. Depois chegou a filha e

familiares para visitá-la. A casa está sempre cheia de gente, são filhos, netos e

bisnetos, parentes e amigos, sempre presente dialogando com os velhos. Esse dia

50

foi importante para colaborar com o propósito da pesquisa e da ciência, que sempre

está à procura conhecimentos.

Em um sábado do mês de maio, retornei novamente para uma nova visita,

primeiro para saber se ela estava bem e para dialogarmos um pouco. Estavam

presentes alguns familiares, na sala assistindo tv e ela, na área, vendo a

movimentação na rua, a luz do sol e sentindo o vento. O dia estava agradável e

ficamos dialogando.

Por ter uma família extensa e ainda morarem três filhos com ela, de uma

maneira ou de outra, isso cria condições para que participe dos acontecimentos nas

festinhas que são realizadas em casa, nas discussões do cotidiano e resulta o não

isolamento dos velhos. Em junho, no mês da Copa, várias casas ficam enfeitadas e

todos se reúnem para assistir ao jogo. Depois do jogo procuramos saber como havia

sido o feriado para ela, e soubemos que família e amigos se reuniram para assistir

ao jogo na área de sua casa juntamente com eles. Interpretamos esse fato como

uma participação social e familiar, eles não ficaram isolados do que estava

acontecendo.

3.3.3 Senhora Laura, 73 anos

Em uma terça feira do mês de maio 2014 fui visitar Laura. Como a

conhecemos, não houve preocupação em procurar outra pessoa para entrar em

contato. O primeiro encontro se deu como havia combinado, após o almoço em sua

residência. Estava só em casa, um ambiente tranquilo, sem movimentação.

Começamos a dialogar sobre sua chegada ao bairro Henrique Jorge, que foi no ano

de 1968. Foi relembrando e falando de como era o bairro, os acontecimentos e o

cotidiano. A senhora Laura é metódica, linear no seu raciocino e muito emotiva. A

conversa foi proveitosa e fluiu de forma bem tranquila, a mesma tem boa memória e

relembra com emoção de alguns episódios. Depois de certo tempo paramos para

continuar em um próximo encontro.

Outro encontro aconteceu no dia 20 de maio, novamente naquele horário,

uma tarde bem iluminada pelo sol, com ventilação. Sentamos a passamos a

conversar, dessa vez relembrando sua infância, juventude, vida adulta e velhice. Ela

falou que precisava se concentrar para poder relembrar. Cada encontro era uma

51

emoção para ambas as partes e, dessa vez, chorou ao relembrar da voz de seu pai

e como era o cotidiano no Sertão com sua mãe.

Chegou a Fortaleza, nesse bairro, no ano de 1968 e garante que a vida que

levava no interior é totalmente diferente da vida aqui na cidade. Nesse sentido,

recordamos uma matéria transmitida na tv, quando mostrava um pôr do sol com

nuvens escuras:

Imagine que esse é um horizonte de sua vida e pra muita gente. As nuvens aí seriam um sinal de mal tempo, dias carregados de problemas; já outras pessoas, por algum motivo, olham para o mesmo cenário e veem algo completamente diferente, um horizonte ensolarado cheios de possibilidades. (Informação verbal)9

Esse era o olhar da senhora Laura por um forte amor pela família e pelo

sertão, onde havia fartura, mas veio para a cidade à procura de novas

possibilidades. Se orgulha em ser sertaneja, pois “muitas vezes pensamos nas

coisas consideradas ruins ao ser do sertão, mas eu nasci lá e vivi muitas coisas

boas que tem no sertão” (sic). Ela veio para a cidade sem conhecer como seria o

futuro, passou por sofrimentos e alegrias até chegar aos dias de hoje, e vê os bons

frutos que está colhendo.

Em uma tarde chuvosa de junho 2014 tivemos outro encontro. Nesse dia ela

sua relatou um pouco da trajetória de vida, isso somente depois das suas tarefas

diárias, pois, apesar de 73 anos, ainda tem uma rotina diária, arruma a casa, faz

comida, lava roupa na máquina, quando vem alguém para resolver algo ela resolve,

atende telefone, faz costura para casa e não perde uma notícia na tv. Vai ao médico

com o filho quando necessita, pois se trata dos problemas de artrose, osteoporose,

glaucoma. Sempre que possível almoça com esposo e filhos quando eles estão em

casa. Participa de reuniões do grupo de senhoras de uma igreja evangélica. O

esposo ainda trabalha como autônomo para complementar a renda, o mesmo

também tem 73 anos. A senhora Laura relata que o que mais a impede de fazer as

coisas é a artrose no joelho e a visão que já não é perfeita. Fora isso ainda sente

muita disposição para realizar as tarefas diárias. Conversamos pouco tempo porque

alguns de seus filhos começaram a chegar a sua casa. Foi uma tarde muito boa e

de muito proveito.

Em junho do corrente ano, mês de Copa do Mundo no Brasil – alguns jogos

acontecem em Fortaleza –, as notícias estão sempre evidenciando esse

9 Matéria veiculada pela TV Globo, transmitida pelo programa semanal Globo Repórter, intitulada “Envelhecimento nota 10”, exibida em 09 de novembro de 2012.

52

acontecimento global. Na casa da senhora Laura a informação é 24 horas e não foi

diferente com os jogos mundiais da copa. Em uma conversa ela relatou que alguns

da família e amigos se reuniram na sua casa junto aos velhos, interagindo nesse

contexto de globalização. Observamos isso como uma forma de interação

Intergeracional entre as famílias.

3.3.4 Senhor João, 70 anos

O primeiro encontro aconteceu no mês de maio de 2014, às 13h. Fomos

acompanhadas por uma senhora do grupo, dona Maria, da igreja católica, ela foi a

intermediária para conhecermos seu João e dialogarmos com ele. Era uma tarde de

sol, clima quente em Fortaleza, encontramo-nos na pracinha do bairro, Afonso Pena.

Uma tarde de muito movimento na praça, alguns taxistas e mototaxistas esperando

clientes, outras pessoas jogando no banco, outras na parada de ônibus. Passados

alguns minutos vem uma senhora com um guarda-chuva colorido para proteger-se

do sol. Mas o que chamava atenção eram as meias que usava devido a cor, meias

que melhoram a circulação para que, por ela andar muito, não sentisse peso ao

caminhar.

Atravessamos a avenida para entrarmos na rua da casa do Sr. João.

Caminhamos paulatinamente ao encontro de sua residência, nos protegendo do sol

abrasador com seu guarda-chuva colorido, que foi muito bem vindo naquele

momento. Chegando a casa chamamos fomos atendidos. Adentramos e

conversamos com a esposa dele esperando-o chegar. Elas foram tomar um café

enquanto entrevistávamos o Sr. João e falávamos sobre a pesquisa e os objetivos.

Ele foi respondendo às perguntas com tranquilidade e precisão. Passamos algumas

horas, dialogamos e combinamos um próximo encontro.

No mês de Junho o visitamos novamente. Agora como ela já éramos

conhecidos, poderíamos ir sozinhos realizar a pesquisa em sua casa. Uma tarde

tranquila e um clima bem agradável, um convite para uma boa caminhada. Quando

chego a sua casa, suas filhas me atendem e avisam que não está presente, pois,

havia saído para um velório de um membro da igreja

No dia 03 de junho, em uma manhã de sol agradável em Fortaleza, fui à casa

do senhor João dia e hora combinados. Chegando lá, sua esposa me atendeu e

fiquei esperando um pouco, pois ele tinha ido à mercearia. Com pouco tempo

53

retornou e sentamos nas cadeiras da sacada e passamos a conversar. Aquele dia

em sua casa estava sendo bem tranquilo, sem movimentos de pessoas, e sua

esposa estava fazendo o almoço. Ele nos recebeu com muita atenção e passamos a

dialogar. A entrevista foi de forma ao entrevistado pensar livremente, somente

pontuando algumas questões, foi sobre como foi sua trajetória de vida e como se

deu o processo de envelhecimento. Conversamos bastante e, à medida que o tempo

ia passando, íamos resgatando o passado. O senhor João foi narrando de forma

simples sua história, contando os altos e baixos pelo qual passou. Ele era firme nas

suas palavras, não aflorou por nenhum momento sentimento pelo passado, pois,

como ele mesmo falou, passou pelo nascimento, juventude, idade adulta e hoje, com

70 anos, “vê de forma natural esse processo, pois, todo ser vivo passa por isso, seja

o animal irracional, as plantas, enfim tudo” (sic), porém não é acomodado, pois vive

um cotidiano bem dinâmico na família e comunidade.

3.4 Bairro Henrique Jorge: experiência dos velhos que vivem há décadas.

A cidade de Fortaleza, capital do Ceará, é composta por 116 bairros, dentre

estes está o bairro Henrique Jorge, que fica a Oeste da cidade, e cinco distritos.

Fortaleza é uma cidade que tem passado por vários processos de mudanças

socioeconômicas, políticas e estruturais, “desde que Paula Ney a chamou de ‘loura

desposa de sol’, quando ainda era cidade–menina. Fortaleza evoluiu tanto no

aspecto físico quanto na mentalidade de seu povo, [...].” (GIRÃO, 2000, p.66).

Na cidade, diferentemente dos que moram no campo, a vida é bem agitada e

fragmentada, nem todos se conhecem, nem frequentam ambientes iguais e

vivenciam os diferentes lugares, consequentemente, cada lugar torna-se um

fragmento da cidade grande. (BIGOTTO, 2010), Fortaleza é assim. Para Girão

Com o tempo, e porque fosse extensa a denominação, passou o forte a chamar-se Fortaleza da Assunção e, também, Fortaleza do Ceará. E por fim, somente fortaleza ou, ás vezes, Ceará. Depois de criada a vila, em 1726, com a sede ai, usou-se Vila de Fortaleza, passando a Cidade de Fortaleza após a elevação a esta categoria. (GIRÃO, 2000, p.7)

O Bairro Henrique Jorge, atualmente assim chamado, conhecido, segundo a

história da década de 50, Casas Populares, passou por vários processos de

transformação estrutural, social e urbano. É importante compreender esse processo,

pois cada bairro teve sua história. Cada lugar é, à sua maneira, “compreender o

54

lugar, é considerá-lo não como uma soma de objetos, mas como um sistema de

relações (subjetivo-objetivo, aparência-essência, mediato-imediato, real e

simbólico).” (MOREIRA; HESPANHOL, 2007, p.49). Além disso, “cada lugar,

irrecusavelmente imerso numa comunhão com o mundo, torna-se exponencialmente

diferente dos demais.” (SANTOS, 2006, p.213).

Trazer a história do bairro é reconhecer a importância do espaço para seus

moradores. É importante refletir sobre como se deu esse desenvolvimento

geográfico, social e cultural a partir das mudanças ocorridas em Fortaleza. Segundo

Mendes (2012), a cidade de Fortaleza no século XIX se consolidou a liderança

urbana no Ceará, período em que a cultura do algodão predominava.

Entre o século XIX e os primeiros cinquenta anos do século XX, as transformações urbanísticas, na cidade, com inúmeras construções e o turbilhão de movimentos científicos, políticos, econômicos e literários, narrando os novos feitos, foram responsáveis por mudanças significativas, tanto no crescimento urbano da cidade quanto no próprio comportamento social dos citadinos de Fortaleza espraiando-se para espaços urbanos no interior da província do Ceará. (MENDES, 2012, p.27)

Neste mesmo século, o bairro, que até então não era definido

geograficamente, fazia parte da Parangaba, onde transitavam os rebanhos de

gado pela estrada Barro Vermelho. Nesse período, a estação da Parangaba

trouxe forte desenvolvimento econômico e social para o Estado, pois foi um local

em que transitavam tanto passageiros quanto mercadorias e animais. Deste

período da história, ainda é possível se ver o restante desta estrada, que

atualmente é conhecida como Estrada do Pici e que é um dos limites do bairro;

bem como a casa centenária que fica ao lado do Centro Social Urbano César

Cal´s, e o riacho Cachoeirinha.

Fortaleza no sec XX, nas primeiras décadas, “adquiria novos contornos,

uma nova feição sócio-urbana, marcada pela influência francesa presente em

tudo, desde vitrines, lojas à vestimenta, arquitetura à espaços de convívio a Bellé

Époque [...].” (LOPES, 2011, p. 2). Dessa forma, pelas várias transformações

urbanas, crescimento demográfico, foi considerado, no ano de 1910, a sétima

cidade do Brasil em população.

Segundo relata a história do bairro, nos anos vintes uma das ruas

(atualmente Rua Antonio Ivo) ficou conhecida por ter uma casa onde residiu a

escritora Raquel de Queiroz, na época chamada de Sitio do Pici ou Sitio do

Papai.

55

“Foi ai que escreveu parte do seu livro, obra-prima da sua lavra cultural, O Quinze, em seu quarto iluminado por uma lamparina e em refefencia à grande seca ocorrida naquele ano no Ceará e, sobretudo, ao drama vivido pelo povo do nosso setão nordestino.” (BRAGA, 2013, p.35)

Sitio do Papai onde residiu a Esritora Cearense Raquel de Queiroz, nos anos 20

Fonte: http://hjnoticias.blogspot.com.br/

Segundo historiadores, existia no bairro, na década de 50, o Núcleo

Residencial Getúlio Vargas destinado aos Srs. Sargentos do 23º Batalhão de

Caçadores do Exército em Fortaleza, conhecido como “Vila dos Sargentos”. No

ano de 1952, a Prefeitura Municipal de Fortaleza construiu casas populares.

Algum tempo depois, o bairro passou a ser chamado de “Casas Populares“,

devido ao grande número de casas de um mesmo estilo. Segundo Braga,

A UNIÃO DOS MORADORES DA CASA POPULAR (UMCP)- foi uma entidade criada na década de 50, provavelmente em condições de pleno uso a partir de 1955, segundo dados constantes de publicação do toblóide “O Povo nos bairros” datado de 11.11.1995 e da história da Paróquia do Imaculado Coração de Maria do Henrique Jorge. Foi fundada pelo Sr.Eurico Medina e demais primeiros moradores da Casa Popular, com endereço, na Rua Eurico Medina, n° 735, tendo dado os primeiros passos nas reivindicações por melhorias na região [...]. (BRAGA, 2013, p. 28)

A comunidade do bairro Henrique Jorge teve forte significado para os velhos e

moradores que vivem há décadas e que fizeram história na construção social e

familiar, cujos filhos e outros familiares moram e estão bem próximos a eles, nas

vivências, na cultura, nos hábitos e nos costumes adquiridos ao longo da vida.

Devemos considerar “que bairros que envolvem uma proximidade de parentesco e

de laços pessoais muitas vezes parecem ter sido efetivamente criados pela vida na

cidade [...].” (GIDDENS, 2005, p.459). Nesse sentido o bairro tem muito de

parentesco. A religião também foi um forte componente de desenvolvimento do

bairro, pois certas organizações de sociabilidade existem no bairro através de muitas

igrejas. Devo considerar as palavras de Braga

O terreno em que foi construída a Igreja, conforme os depoimentos ouvidos, fora doado pela “Família Gentil”, aos Padres Jesuítas, (...) mediante a intercessão de uma “comissão dos católicos residentes da Casa Popular, para que o mesmo ficasse à disposição daquela comunidade”. (...) 20 de

56

setembro de 1959, conforme convite público assinado pelo Sr. Pe. Eusébio de Oliveira Lima, foi lançada a “Pedra fundamental” da futura igreja do Imaculado Coração de Maria da Casa Popular. A cerimônia de benção, (...) foi oficializada pelo segundo Arcebispo Metropolitano de Fortaleza de 1941 a 1963, Dom Antônio de Almeida Lustosa, (...). Além do mais, foi um prenúncio claro da criação da futura Paróquia do Henrique Jorge, (..). (BRAGA, 2013, p.24, 25)

No ano de 1963, o bairro que se chamava Casas Populares mudou o nome

para bairro Henrique Jorge, nome do filho do Deputado Paulo Sarasate. O Vereador

Sebastião Praciano resolveu homenagear o então Deputado Federal, dando o nome

de seu filho ao bairro (BRAGA, 2013). Segundo a História, Henrique Jorge fora

músico, maestro e fundara a escola de música Alberto Nepomuceno, em Fortaleza.

Nesse sentido o lugar passa a ter sua própria história como as dos moradores

que ali ainda vivem. Queremos referenciar também a “alma do lugar” como sendo a

“personalidade” do lugar com suas características próprias. “Conjunto de identidades

do lugar, na vida cotidiana, tem sido entendido como relações sociais, instituições,

arquitetura, urbanismo e toda cultura material; costumes e vários outros itens que se

repetem em todas as partes, (...).” (YAZIGIY, 2001, p.30).

O bairro de Henrique Jorge, como é chamado atualmente, passou por vários

processos de transformação estruturais, sociais e urbanos, sendo mais valorizados

por seus moradores. É importante compreender esse processo histórico, pois cada

bairro teve sua história. Cada lugar é, à sua maneira, “Compreender o lugar é

considerá-lo não como uma soma de objetos, mas como um sistema de relações

(subjetivo-objetivo, aparência-essência, mediato-imediato, real e simbólico).”

(MOREIRA; HESPANHOL, 2007, p.49), “cada lugar, irrecusavelmente imerso numa

comunhão com o mundo, torna-se exponencialmente diferente dos demais.”

(SANTOS, 2006, p.213).

Hoje é um bairro valorizado e de boas vivências, compreender o lugar como

um espaço construído nas suas várias perspectivas é importante porque trata não só

de uma construção física como também de uma construção social, o lugar revela a

consciência do mundo. Na visão de Moreira e Hespanhol

O lugar pode ser compreendido como uma construção social, fundamentado nas relações espaciais diretas, no cotidiano e na articulação entre a cooperação e o conflito. Quando se utiliza o conceito de lugar, na maioria das vezes, se remete à Geografia Humanística, ou seja, associa-se o lugar apenas ao espaço vivido. Mas essa correlação não é por acaso, pois essa corrente encontrou no lugar a possibilidade de explicar a construção do mundo, já que o lugar é visto como o mundo da vida, marcado pela experiência e percepção. (MOREIRA; HESPANHOL, 20007, p.49, 50).

57

Fortaleza está dividida em regiões e o bairro está localizado naquela que é

conhecida como Regional III e, segundo IBGE, possui 26.994 habitantes. As ruas

são nomes de estado, Natal, Teresina, Belém, etc., também nome de pessoas,

Senador Fernandes Távora, Eurico Medina, que foi um líder comunitário do bairro,

Audizio Pinheiro, em homenagem ao proprietário da fábrica Unitextil. Desse modo,

além do lugar, que “é necessariamente histórico a partir do momento em que,

conjugando identidade e laços, ele se define por uma estabilidade mínima, (...)”

(AUGÉ, 2007, p.53), existe o não lugar, obras das mãos dos homens para certos fins

designados de não lugares que se complementam como transportes, comércio, lazer

em que o indivíduo mantém identidade e laços com esse espaço. (AUGÉ, 2007),

que com o tempo vivido, em cada época, os antigos moradores viram a construção e

o crescimento local, em que declara que o lugar é bom de morar.

Nos mecanismos de desenvolvimento social, como instituições sociais e

religiosas são bem presentes no bairro, dentre os mais variados comércios e

serviços oferecidos demostraremos o bairro através do mapa (APÊNDICE B) e

alguns equipamentos sociais que existem.

3.5 Conhecendo a sociabilidade dos velhos moradores que vivem há décadas

no bairro Henrique Jorge

O ser humano tem um desejo natural de estar sendo sociável e de interagir

como o meio e faz isso de muitas formas. Os velhos moradores do bairro

vivenciaram muitas formas de se sociabilizar, desde sua criancice até a vida adulta e

agora na sua velhice. O homem é um ser sociável que interage de acordo com seu

modo de vida, tempo e época. De acordo com Carvalho e Almeida

As relações com o outro é para o idoso muito importante, sendo isolamento social algo extremamente temido com o envelhecimento, as relações familiares, pessoais e sociais aparecem sendo de grande importância como fonte de alimentação, regulação e organização. (CARVALHO; ALMEIDA, 2012, p.100).

As formas comunitárias de sociabilidade podem ser na vida rural e na cidade,

dentro de casa, com família, familiares, na vizinhança, na vila. A vida rural é

diferente da vida urbana e moderna, nisso percebemos nas falas dos entrevistados

que viveram na vida rural em que as formas de comunicação e interação eram

presenciais e os trabalhos rurais eram compartilhados com toda a família e vizinhos.

58

Desse modo se tornava a vida social mais restrita àqueles mais próximos de si. No

meio urbano as formas de socialização são diferentes e muitas vezes há isolamento

social, mas também há a sociabilização com a família e no trabalho, através do

acesso à tecnologia que se estende a outros grupos por meio da internet, embora

seja acessível a qualquer pessoa e em qualquer lugar. Segundo Groth

Antes de a sociedade se tornar midiatizada, as pessoas se comunicavam presencialmente; hoje, porém, os meios de comunicação a distância são um paradoxo, ou seja, revolucionaram a forma com que as pessoas vinham se relacionando e se comunicando, alterando assim as formas de sociabilidade. Por comunicação interpessoal presencial se entende a interação entre duas ou mais pessoas cara a cara ou frente a frente, e por comunicação interpessoal à distância, entende-se as formas de comunicação virtuais, ou seja, a comunicação mediada pelo uso do computador para a interação entre duas ou mais pessoas. Em razão da infinidade de formas de se comunicar usando a internet, optou-se pela escolha dos meios de comunicação a distância: Orkut e Messenger (GROTH, 2011, p. 63).

“De qualquer forma não podemos deixar de reconhecer que estamos vivendo

num contexto de mudanças vertiginosas, onde percebemos que novas formas de

sociabilidade estão emergindo neste final de século.” (QUARESMA, 2005, p.83). A

cada época existe diferentes meios de interação e sociabilidade e, atualmente,

vivemos na era da comunicação tecnológica e da globalização. “A junção entre os

meios de comunicação de massa e a microinformática, aliada ao crescimento das

redes comunicacionais, operam modificações não só no cotidiano, como também na

maneira como o homem percebe o mundo e o seu semelhante.” (QUARESMA,

2005, p.82).

Diante do que foi apresentado podemos dizer que a sociabilidade sempre

esteve presente na vida dos longevos, de diferentes maneiras, em cada época de

sua vida. A senhora Ana (92 anos) tinha forte laço no convívio familiar e no grupo

religioso institucionalizado do bairro. A família foi o seu espaço de maior

sociabilidade durante o percurso da vida, pois, como solteira, sempre viveu na

presença dos pais e dos irmãos; outro espaço foi a igreja católica com a qual

interagia junto à comunidade, com ações de caridade, trabalho com grupos

intergeracionais, dentre outros.

Com o passar dos anos, com a dinâmica da realidade, várias foram as

mudanças ocorridas pelo qual também vem passando no processo de

envelhecimento, que hoje estabelece novas relações e imprime no convívio social

outro significado. Diante das mudanças, a sociabilidade passou a ser mais aberta

59

às pessoas de longas datas, que lhe acompanhou em trabalhos sociais e religiosos

de muitos anos, vizinhos, que a consideram pelo tempo vivido no mesmo lugar

formando certo tipo de laço de convivência como de família. A família passou a

representar aquilo que conquistou durante toda a sua vida.

A senhora Sara (74 anos) é uma idosa dependente por causa do seu estado

de saúde atual, por isso é cuidada pelos filhos que moram com ela. Frequentadora

de igreja evangélica, a qual vai nos finais de semana, sociabiliza com grupos da

igreja. Sua maior interação e sociabilidade são com a grande família que possui, 15

filhos e 27 netos, dos quais alguns sempre estão presentes em sua casa por

ocasião de aniversários, festinhas, reuniões informais e também no cotidiano.

Sociabiliza com parentes, amigos e vizinhos que moram no bairro com quem, pelo

tempo vivido no bairro e na mesma casa, formou laços de amizade.

Senhora Laura (73 anos) vive com certa autonomia, é Independente e isso faz

com que possa se sociabilizar com outros grupos pela facilidade de locomoção a

esses lugares. A sociabilidade é compartilhada com as várias gerações existentes

na família que estão sempre presentes no seu cotidiano, dialogando e participando

dos acontecimentos; é compartilhada também com grupos religiosos que frequenta e

com os quais interage e se comunica; com as pessoas da comunidade, através de

atividades e encontros, como palestras e outros, grupos de atividades esportivas,

como a hidroginástica que frequenta duas vezes por semana, relacionando-se com

pessoas da mesma faixa etária em uma academia do bairro, com vizinhos. Ela

também interage através dos meios de comunicação, rádio, televisão, internet e

celular. Na velhice retrata outra realidade em que a comunicação a distância e

globalizada é uma realidade bem presente no seu cotidiano.

Senhor João (70 anos) possui independência e autonomia e isso lhe confere

uma maior liberdade para interagir e sociabilizar, dentro e fora da comunidade, com

outros grupos e não só com a família. Seu João interage no grupo religioso do qual

participa no bairro, faz hidroginástica, tem acesso aos meios de comunicação e

redes sociais. O seu cotidiano é sempre dinâmico na troca de informações e na

participação social. Nas palavras do senhor João, podemos perceber as diferenças

da sociabilidade de quem viveu décadas passadas e de quem vive hoje. Ele nasceu

na cidade e levou uma vida social urbana, à época mais sossegado. Quando

criança, vivia nas praças jogando futebol, brincando nas calçadas, na Igreja e na

escola. Na vida adulta a sociabilidade passou a ser com aqueles que faziam parte

60

do quartel, pois era estudante da polícia; havia toda uma rotina, porém eram com

aqueles que faziam parte do seu trabalho, da sua família, era com amigos próximos.

Diferente do que vive atualmente, com acesso a internet, celular até com meios de

transporte para se locomover. Na atualidade, a sociabilidade está interligada à

globalização, aos meios de comunicação de massa, à tecnologia, coisas que não

existiam ou era escasso. Poucos eram aqueles que tinham acesso, na época do

senhor João. Hoje, pela crescente modernização da tecnologia, são várias as formas

de sociabilizar, que antes era presencial e hoje, virtual.

Nas palavras da senhora Laura, que veio da zona rural, onde viveu até os 26

anos, a sociabilidade era uma vida modesta, não com muitas atrações, diversões e

contatos. No interior a vida era trabalhando na roça, cuidando de animais. A

interação estava restrita àquela comunidade familiar, em que se comunicava com as

mesmas pessoas que ali viviam, pois outros grupos viviam mais distantes, num

espaço limitado de vivência no campo. O primeiro rádio que possuiu foi em 1967, no

interior, foi quando começou a interagir conhecendo as notícias da época. A vida na

cidade teve outro sentido e a sociabilidade se estendeu para além da família, entre

as gerações de filhos e netos, na comunidade, com os vizinhos, em grupos e

também através de serviços, do comércio e da integração pelos meios de

comunicação, internet.

Atualmente podemos perceber que os velhos moradores, de uma maneira ou

de outra, interagem na sociedade, diferente de como era no passado. Ser idoso não

significa ser incapaz ou estar perto de morrer, se morre em qualquer idade, as

experiências são singulares, de cada um. Sobre o assunto, Carvalho e Almeida,

declaram

Para Erbolato (2001) os relacionamentos sociais são interações frequentes com certa durabilidade no tempo e certo padrão. Abrangem sentimentos positivos e negativos, percepções de si e do outro, de referente grau de envolvimento afetivo e interminável intercambiais. Segundo Nogueira (2001) relações sociais significativas permitem o desenvolvimento do self, dão sentido às experiências e podem oferecer apoio, importantes elementos no processo de adaptação, [...]. (CARVALHO; ALMEIDA, 2002, p.49).

O lugar, algo comum aos entrevistados, tal como é familiar a eles, ou seja, a

familiaridade entre a pessoa e o lugar, forma certo vínculo e afeição pelo muito

tempo vivido, ou desprezo. É um tempo em que se investe grande parte da vida no

lar, na comunidade Cada velho e morador antigo traz consigo aquilo que vivenciou

seu estilo de vida, com seus conhecimentos, tradições e costumes que podem ser

61

repassados às próximas gerações. O bairro Henrique Jorge é o lugar do seu

cotidiano da sua rotina diária, das suas vivencias de décadas. Segundo Bosi

O passado ainda é bem vivo na memória desses idosos quando relata seu cotidiano, as dificuldades enfrentadas, suas realizações e se ver no presente sentem-se realizados. O presente e o passado estão andando juntos na memória dos entrevistados, percebe-se nas falas que traz suas experiências de vida, em que é parte integrante das mudanças do lugar, em que puderam relatar. O passado conserva-se e, além de conserva-se, atua no presente, mas não de forma homogênea. [...]. (BOSI, 2007, p.48)

Recordar, ativar a memória é importante para a atividade mental. Trago as

palavras de Kandel, quando afirma

Podemos nos lembrar, por vontade própria, do nosso primeiro dia de aula na escola segundaria, [...] primeiro encontro, de nosso primeiro amor. Ao fazer isso, não nos recordamos somente do evento em si, mas experimentamos também a atmosfera em que ele ocorreu-os senários, os sons, os cheiros, o ambiente social, o momento do dia, as conversas e o clima emocional. Recordar o passado é uma forma de viagem mental no tempo. Ela nos liberta dos limites temporais e espaciais e permitem que nos movamos livremente ao longo de dimensões completamente outras. (KANDEL, 2009, p.17)

4 CAPÍTULO III – O VELHO E A MEMÓRIA: PENSANDO A QUESTÃO DA

VELHICE E O SIGNIFICADO DA MEM´RORIA PARA OS

VELHOS MORADORES DO BAIRRO HENRIQUE JORGE

4.1 A velhice no contexto histórico-social

Velhice significa mais que uma fase real e natural do ciclo da vida – nascimento,

crescimento, amadurecimento, envelhecimento e morte –, seu significado adentra ao

contexto histórico-social a que o homem pertence e se revela diferentemente em

cada sociedade, nas sociedades ocidentais os valores são diferentes das

sociedades orientais, por exemplo.

A humanidade está dividida em Idade Antiga, Idade Média 10 e, com o

Renascimento que marcou a Idade Moderna 11 , através da história podemos

conhecer o contexto e como era visto nas sociedades entre as culturas e costumes

da época.

10 Idade Antiga é o período que se estende desde a invenção da escrita (de 4000 a.C) até a queda do Império Romano do

Ocidente (476 d.C.). Idade Média, Invasões Bárbaras e Feudalismo (Alta Idade Média, séc. V a X e Baixa Idade Média séc. XI a XV). Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Antiga. Acesso em 22 de junho de 2014.

11 Idade Moderna - aconteceu entre os séculos XV até XVIII. Acontecimentos: As Grandes Navegações; O Renascimento; A Reforma Religiosa; O Absolutismo; O Iluminismo; Início da Revolução Francesa. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Antiga. Acesso em: 22 junho 2014.

62

Nas sociedades Antigas, a velhice começava cedo e a longevidade era rara, pois

as pessoas eram escolhidas conforme sua resistência de vida. Isso porque cuidar da

saúde era um privilégio de uma minoria abastada. O que relata a história, na Idade

Média, é que o número de pessoas com mais de 65 anos eram poucos, pois a

expectativa de vida era mínima, e os poucos que sobreviviam era chefe de família

com posse, ao qual todos davam respeito e obediência. Esse chefe também

transmitia a tradição aos familiares, pois sabiam ler e escrever (MASCAVO 1997).

Dessa forma, a velhice na antiguidade era vista como algo abonável, indesejável

e transparecia as várias expressões negativas do ser, era tido também como secreto

e de grande vergonha para a família e comunidade, falar sobre velhice era

indecente. “No século XVII, há numerosas obras sobre a velhice, mas despidas de

interesse.” (Beauvoir, 1990, p.26). De acordo com Santos

Na era pré-cristã, no Velho Egito, Grécia, Itália, Índia e Israel, a pobreza, a miséria, a velhice, a doença e as catástrofes eram consideradas castigo dos deuses aos que infringissem suas leis. As causas dos acontecimentos eram buscadas numa compreensão mítica da realidade. [...] algumas civilizações na antiguidade até comparavam o ciclo de vida humana às estações do ano. A velhice era descrita como inverno sombrio, frio e improdutivo. (SANTOS, 2005, p.54)

Podemos perceber que a longevidade da vida ultrapassa não só os campos

do saber, os tempos e as épocas, mas também os lugares. Há fontes de estudos e

documentação comprovados que cada época da história e em cada civilização, o

velho é abordado em uma visão diferenciada de valores. Essa visão diferenciada

que a ciência vem revelando era o espelho da sociedade da época, com suas

ideologias, crenças, costumes e tradições, “consideramos o homem idoso enquanto

objeto da ciência, da história, da sociedade: descrevemo-lo em exterioridade. Ele é,

também, um sujeito que interioriza sua situação e que reage a ela. Tentemos

entender como ele vive sua velhice.” (BEAUVOIR, 1990, p.345).

As literaturas brasileiras relatam que os velhos eram respeitados em certas

condições, “[...] no declínio do patriarcalismo brasileiro (Segundo Reinado12), quando

os velhos começavam a perder seu poder e os moços iniciaram sua escalada no

espaço social e político, a figura do velho patriarca ainda era um modelo a ser

seguido.” (MASCAVO, 1997, p.32).

O que estamos vivendo hoje, séc. XXI, é o que podemos chamar de

modernização, era da globalização e do consumo e, vejo que não há como esquivar-

12Segundo Reinado: do Período Regencial (1831-1840) ao Império do Brasil (1822-1889). Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Segundo reinado. Acesso em: 22 de junho de 2014.

63

se desse tempo, seja a criança, o jovem, o adulto ou o velho, todos estão inseridos

nesse novo contexto socioeconômico. Globalização é o “[...] conjunto de

transformações socioeconômicas que vem atravessando as sociedades

contemporâneas em todos os cantos do mundo. [...]. (CAMPOS; CANAVEZES,

2007, p.5). Atualmente estamos vivenciando um evento mundial, Copa do Mundo13

2014, que é reflexo da globalização, e todos os olhares estão focados nas ações da

FIFA14, nos jogos, também na valorização do corpo e da juventude, no consumo, o

que, de certa forma, influencia o comportamento e o cotidiano das pessoas, pois

todas estão inseridas nessa dinâmica. Se se falava que o velho está gasto, cansado

e doente ou na cadeira de balanço, de pijama, tricotando, hoje não é mais aquele

como era antes, mas está sendo um agente dessa geração, que vê novas

possibilidades de ação, interação, socialização e conhecimento, com outra visão de

mundo.

Outro fator de relevância são os avanços da medicina, da saúde e da

tecnologia, que são meios utilizados para tentar mudar os aspectos negativos da

velhice, que é uma fase da vida que muitas pessoas não desejam vivenciar e tentam

mudar de todas as formas, nos seus aspectos físicos, mudando sua imagem.

Segundo Giddens

Por conseguinte, os velhos atuais estão bem menos propensos a aceitar o envelhecimento como um processo inevitável de deterioração do corpo. Aqui se pode mais uma vez traçar o impacto da socialização da natureza. O processo de envelhecimento era geralmente aceito como uma fatal manifestação da devastação do tempo. Mas, cada vez mais, a velhice não tem sido encarada como algo natural; os avanços na medicina e na nutrição têm mostrado que muito do que um dia foi considerado inevitável sobre o envelhecimento pode ser contestado ou retardado. Em média, as pessoas atingem idades bem mais avançadas do que há um século, como resultado

de melhorias nos cuidados com nutrição, higiene, saúde, etc. (GIDDENS, 2005, p.11).

Ser velho é um desafio, pois o que define seu valor atribuído pelos homens na

modernidade15pode não ser medido pelo seu real valor, do tempo que se viveu, das

experiências e de tantas outras coisas que ultrapassa a objetividade.

13 Os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo de futebol são considerados megaeventos desportivos que

promovem impactos em escala nacional. (SEIXAS, 2010, p.3) 14A Federação Internacional de Futebol Associada (FIFA) é a instituição internacional que dirige as

associações de futsal, futebol de areia ou futebol de praia e futebol associado, o esporte coletivo mais popular do mundo. Disponível em: http://www.infoescola.com/esportes/federacao-internacional-de-futebol-ifa/. Acesso em: 22 junho 2014

15 A "modernidade!" refere-se às formações societárias do "nosso tempo", dos "tempos modernos". O início da "modernidade" está marcado por três eventos históricos ocorridos na Europa e cujos efeitos

64

Enfim, não podemos reduzir essa fase somente a fatores biológicos, a

diferença vai ocorrer também nas concepções, em seu tempo e época, ou seja, no

seu contexto histórico-social. “Dizer que há uma impossibilidade de se referir à

velhice generalizando-a nas sociedades tradicionais, pois ser velho varia na

sociedade a que pertence.” (Beauvoir, 1990, p.99), é a própria percepção da velhice

diante da sociedade, de si mesmo e do outro.

4.1.1 Imagens percebidas pela velhice

A imagem do velho representa tempo vivido, experiência e conhecimento,

páginas passadas, personagens com características próprias, diferenças

excepcionais em contextos variados na história. Podemos perceber que a situação

do velho é desfavorecida porque a condição do corpo também influencia nesse

processo, diante de uma sociedade que busca a eterna juventude, em que o corpo

enfraquecido torna-se objeto de desprezo e abandono. “No século II, os

conhecimentos da medicina grega, afirmaram que a velhice era o resultado do

enfraquecimento e da redução das funções fisiológicas do idoso.” (MASCARO, 1997

p.44). Em uma compreensão sobre o assunto, segundo Assis e Martin

No resultado de uma pesquisa realizada sobre a percepção da velhice declarou que, a percepção está relacionada com a visão de mundo que o indivíduo tem de si e do mundo que o cerca. O resultado revela que os idosos percebem a velhice quando ela apresenta limitações e incapacidades físicas que lhes impedem de realizar suas atividades diárias e laborais, [...] a velhice não é vista, mas sim sentida. Identificam-se como idosos ou “velhos” quando estão impossibilitados do movimento e da ação do corpo que lhes impedem de exercer seus papeis sociais efetivamente. (ASSIS; MARTINS, 2010, p.55).

A ciência vem estudando, desde os tempos mais remotos, e trazendo novos

conceitos e valores sobre o assunto. Como foi dito anteriormente em relação às

teorias e às interpretações antigas, o envelhecimento era visto como declínio e

fraqueza do organismo, significando a velhice como uma doença (MASCARO,

1997), porém essa imagem negativa da velhice não é representada em todo o

mundo. Segundo estudos “[...] sociedades não ocidentais apresentam imagens

positivas da velhice e do envelhecimento, ensinando que a representação de velhice

se propagaram pelo mundo: a Reforma Protestante, o Iluminismo ("die Aufkärung) e a Revolução Francesa (FREITAG, 1995, p.140)

65

[...] não é universal [...] ele é um fenômeno profundamente influenciado pela cultura”.

(SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008, p. 587).

Existem vários fatores que contribuem para se chegar a essa fase irreversível

e cheia de transformações da mente e do corpo, considerando seu contexto

histórico-social. Desse modo, refletir sobre como se desenvolve esse processo e

conhecê-lo é conseguir aproximar-se dessa realidade. Existem algumas

classificações para relacionar esses fatos. Nas palavras de Debert, quando analisa

A pesquisa Antropológica é rica em exemplos que servem para demonstrar que fases da vida como a infância, a adolescência e a velhice não se constituem em propriedades substanciais que o indivíduo adquirem com o avanço da idade cronológica. [...] o próprio da pesquisa Antropológica sobre os períodos da vida é mostrar como um processo biológico é elaborado simbolicamente com rituais que definem fronteiras entre idades pelas quais os indivíduos passam e que não são necessariamente as mesmas em todas as sociedades. (DEBERT, 2006, p.51)

Schneider e Irigaray (2008) vêm classificando as pessoas com mais de 65 anos

conforme sua idade.

O envelhecimento se refere a três grupos de pessoas, idosos jovens geralmente estar ativas, cheias de vida e vigorosas. Os idosos velhos, de 75 a 84 anos, e os idosos mais velhos, de 85 anos ou mais, são aqueles que têm maior tendência para a fraqueza e para a enfermidade, e podem ter dificuldade para desempenhar algumas atividades de vida diária. Outra classificação usada é por idade funcional, isto é, o quão bem uma pessoa funciona em ambiente físico e social em comparação a outras de mesma idade cronológica. Por exemplo, uma de 90 anos com boa saúde física pode ser funcionalmente mais jovem do que uma de 65 anos que não está.[...] o envelhecimento não é algo determinado pela idade cronológica , mas é consequência das experiências passadas, da forma como se vive e se administra a própria vida no presente e de expectativas futuras é, portanto, uma integração entre as vivencias pessoais e o contexto social e cultural em determinada época e nele estão envolvidos diferentes aspectos: biológicos, cronológicos, psicológicos e sociais.(SCHNEIDER; IRIGARAY, 2008, p.586).

Diante disso podemos considerar velho, pensando nessa lógica, nas palavras

de Camarano

[...]. A partir da noção biológica de velhice ou, mais precisamente, de senilidade, é possível, então, demarcar, através do padrão de declínio de determinadas características físicas, o momento a partir do qual o indivíduo pode ser, ou não, considerado como “velho”. Esse momento, quando semelhante em termos de tempo de vida entre diversos indivíduos, permite o uso da idade como critério de demarcação da velhice. Nesta lógica, idoso é aquele que tem a idade correspondente à idade típica de um “velho”. O problema de classificação torna-se aparentemente simples, demandando apenas que se estabeleça a idade-limite que separa a velhice da não velhice para separar os idosos dos não idosos. (CAMARANO, 1999, p.3)

66

A velhice é real e inevitável a qualquer pessoa, em qualquer tempo e lugar e é

condicionada a vários processos. As pessoas que a vivenciam sofrem, além das

perdas biológicas, perdas psíquicas e sociais. Fraiman explica que.

No caso do velho, as perdas físicas e afetivas são sofridas com maior intensidade e numa frequência maior do que em qualquer outra idade. A angustia, o medo do novo, o desejo de manter a situação antiga, já conhecida, o estigma da morte iminente e outros mitos povoam a mente do velho e o conduzem a um estado de maior insegurança. (FRAIMAN. 2004, p.20)

No cotidiano16 o que se ouve é que velho é aquele que fica prostrado, não faz

exercício, não trabalha a mente. Trazer a concepção de velho com um forte estigma

negativo, de que há mais coisas ruins que boas – sentimentos muitas vezes

inconscientes que as pessoas possuem associando-os a objetos –, é percebido no

senso comum como um sinal de algo que precisa ser posto de lado, algo antigo,

desusado e obsoleto. “Essa bolsa está velha demais vou jogar fora e comprar outra,

já usei muito esses óculos, estão velhos e não servem mais pra ser usado, vou

comprar outro”, trazendo a percepção de decadência, pobreza e incapacidade[...],

nisso é mostrado somente a nomenclatura, pois o termo velho, por essa dimensão, é

carregado de estereótipos negativos. Pensando assim, fala-se idoso para diferenciar

e dar um sentido de respeito (ALCÂNTARA, 2004). Dessa forma as ações externas

a ele (pessoa) podem também condicioná-lo a ficar velho por problemas ligados ao

social, por exemplo, quando se está numa situação de pobreza, faltando

alimentação, moradia e assistência à saúde, ou seja, cada indivíduo nessa fase da

vida reflete sua velhice de modo diversificado. De acordo com Alcântara (2004).

Pensar a categoria velho, apenas nos termos propostos pela sociedade de consumo é esquivar-se do debate sobre o papel exercido pelo velho em uma sociedade produtiva, onde estar e sentir-se inserido significa estar produzindo. Ser velho não está restrito à quantidade dos anos vividos. [...] dependendo da grande variedade de fatores como sexo, origem étnica e cultural e o fato de as pessoas viverem em países industrializados ou em desenvolvimento, em centros urbanos ou rurais, elas envelhecem de forma diversa, especialmente quando se analisa a sua situação na hierarquia social. (ALCÂNTARA, 2004, p.15)

Quando não interrompida, tem-se a certeza da velhice que é acompanhada de

ganhos e perdas. Refletindo o que foi dito, nas palavras de Bosi

A velhice, que é fator natural como a cor da pele, é tomada preconceituosamente pelo outro. Há, no transcorrer da vida, momentos de crise de identificação: [...]. O velho sente-se um indivíduo diminuído, que

16 “Questões do dia- a –dia, pelas questões mais rotineiras que compõe os acontecimentos diários da

vida e os significados que as pessoas vão construindo, nos seus hábitos, nos rituais em que celebram no recinto doméstico ou da sala “ ( DURAN, 2007, p.116)

67

luta para continuar sendo um homem. O coeficiente de adversidade das coisas cresce: as escadas ficam mais duras de subir, as distanciam mais longas a percorrer, as ruas mais perigosas de atravessar, os pacotes mais pesados de carregar. O mundo fica eriçado de ameaças, de ciladas. Uma falha, uma pequena distração é severamente castigada. Para a comunicação com seus semelhantes precisa de artefatos: prótese, lentes, aparelhos acústicos, cânulas. Os que não podem comprar esses aparelhos ficam privados de comunicação. É a impotência de transmitir a experiência, quando os meios de comunicação com o mundo falham. Ele não pode mais ensinar aquilo que sabe e que custou toda uma vida para aprender. (BOSI, 2007, p.79)

4.2 A memória como uma construção humana

Cada geração tem sua memória nos acontecimentos, sejam elas individuais

ou coletivas. “Não é a memória que se tranca em si mesma, mas a que partilha seus

conteúdos quando há um ouvido disponível e atento, e que os define, no próprio ato

de contar.” (BOSI, 2003, p.233). A memória está muito relacionada à história, isso é

comprovado desde os antepassados. O homem se preocupa em registrá-la para não

perder os acontecimentos, transmitir suas experiências, sentimentos, tudo isso

acompanhado da memória, transmitindo seja na escrita ou na falada. “Nas

sociedades sem escrita havia a figura dos homens- memória, depositários da

História “objetiva” e da História “ideológica”, atuando como guardiães dos códices

reais, os historiadores da corte, os genealogistas. [...]” (LUCAS, 1998, p.88)

O ser humano é um ser histórico que vive em processo de mudanças e a

memória é uma ferramenta para trazer o passado ao presente. Nessa perspectiva,

Cunha declara

Memória, por outro lado, é uma relação em que um sujeito se lembra de um conhecimento passado com um objeto específico, onde fica explícito que a sensação e a memória estabelecem relações temporais entre sujeito e objeto, enquanto a simultaneidade e a sucessão estabelecer relações temporais entre um objeto e outro objeto. (CUNHA, 2010, p.55)

A memória é importante como ferramenta fundamental que pode ser utilizado

pelo idoso. “[...] Não é só pensamento, imaginação e construção social; ela é

também uma determinada experiência de vida capaz de transformar outras

experiências, a partir de resíduos deixados anteriormente.” (SANTOS, 2003, p.25).

Eles vão reconstruindo seu mundo pela memória, “puxando pela memória”. A sua

importância para os sujeitos históricos implica na sua existência. Cunha (2010) vem

afirmar que é importante a memória para o sujeito cognoscente, sendo reconhecida

ao longo da história. Tomamos o exemplo de Santo Agostinho, que chegava a

68

igualar mente e memória, pois estão ligados ao funcionamento psicológico, que

depende da memória, dos hábitos, do conhecimento de se no tempo. É interessante

as palavras de Kandel

[...] a mente não possui conhecimento inato, mas é, ao contrário, uma tabula rasa, preenchida, por fim, pela experiência. Tudo que sabemos sobre o mundo é aprendido, de forma que, quanto mais encontramos uma ideia e mais eficientemente a associamos com outras, mais duradoura é seu impacto em nossas mentes [...] filósofo racionalista alemã, argumentava na direção oposta, afirmando que nascemos com alguns modelos pré-formados de conhecimento. [...]. (KANDEL, 2009, p226)

Os relatos vêm da história vivida, do cotidiano, dos sentimentos, das

percepções, das construções realizadas.

Tudo que é chamado hoje de memória não é, portanto memória, mas já história. Tudo é chamado de clarão da memória é a finalização de seu desaparecimento no fogo da história. A necessidade da memória é uma necessidade da história.” (NORA, 1981, p.14).

Os velhos trazem a conservação do passado pela memória, e esse

conhecimento é passado de geração a geração na convivência, no diálogo, ou seja,

no cotidiano. É nos relacionamentos, tanto familiar quanto social e comunitário,

como igreja, escola, grupos, que há uma relação de dependência da memória de

cada pessoa. (BOSI, 2007, p.54). Nesse sentido, para Cunha

A memória é contrastada com a recordação, sendo que a última é prerrogativa dos seres humanos. Ali se apresenta o que podemos entender como uma dissociação funcional entre manifestações da capacidade de lembrar, em duas classes: memória (mime) e recordação (anamneses). (CUNHA, 2010, p.48)

Outra questão que podemos refletir é sobre os malefícios que a modernidade

trouxe, formando relações, trazendo informação, no que podemos dizer, superficiais

e efêmeras. Com a velocidade das informações tudo fica tão passageiro que é

perdido todo o sentido e a memória já não funciona. “A perda da memória aparece,

portanto, tanto na Arte e na Literatura, quanto nas Ciências Sociais, como sendo

uma das grandes ameaças do mundo moderno. Podemos dizer que a memória

enquanto aprendizado se perde no mundo da informação.” (SANTOS, 2003, p.19).

Outra consequência que pode acarretar a perda da memória é a doença de

Alzheimer, que ataca o cérebro e, na grande maioria, os danos ficam na memória,

porém o avanço causa outras falhas, com o passar do tempo ataca os movimentos,

na verdade é o cérebro que se degrada bem rápido. Segundo Prado

Na idade muito avançada aumenta a incidência de doenças neurodegenerativas, dentre as quais as que se denominam demências (de: partícula privativa; mência: do latim mens, mente. Literalmente, “perda da mente”). As demências recebem esse nome porque comprometem de forma

69

significativa a memória e também outras funções cognitivas, com intensidade suficiente para produzir perda funcional, incluindo até, eventualmente, a realização de atividades da vida diária ou o reconhecimento de pessoas e lugares do entorno habitual [...]. (PRADO et al, 2007, p.44).

Diante disso podemos perceber que a memória é fundamental para o resgate

da história dos velhos moradores do bairro Henrique Jorge, resgatando o que viram,

ouviram, sentiram, ou seja, o que viveram durante esse percurso, no seu dia-a-dia e

sua relação espaço, tempo e contexto. Segundo Pollak

A priori, a memória parece ser um fenômeno individual, algo relativamente íntimo, próprio da pessoa. [...] memória deve ser entendida também, ou, sobretudo, como um fenômeno coletivo e social, ou seja, como um fenômeno construído coletivamente [...]. (POLLAK, 1992, p.2).

Dessa forma, resgatar os elementos que são fundamentais na vida do idoso é

resgatar ele próprio e o meio. “A memória dos velhos desdobra e alarga de tal

maneira os horizontes da cultura que faz crescer junto com ela o pesquisador e a

sociedade onde se insere” (BOSI, 2003, p.69).

Os velhos e moradores que vivem há décadas no bairro Henrique Jorge

transmitiram sua trajetória de vida pela memória traduzida em palavras que revelam

muito do velho, ao longo da vida nas suas experiências, nas suas lembranças

evidenciados no que cada um foi capaz de transmitir nas entrevistas, “O tempo do

curso de vida, do nascimento à morte; o tempo do passado elaborado pelas

lembranças; o do futuro vislumbrado na construção de projetos de vida, [...], é capaz

de se perceber como uma trajetória [...]” (BARROS, 2006).

Enfim, a memória dos velhos e moradores antigos do bairro Henrique Jorge

foi compartilhada pelo próprio ato de contar e não se trancou em si mesma.

70

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo do envelhecimento faz parte da vida e é considerada uma

conquista diante dos acontecimentos mundiais, pois muitas pessoas não chegavam

à fase da velhice. Na contemporaneidade as mudanças ocorrem para esse

crescimento e isso é uma conquista. Todavia há muitos desafios porque nem todos

os seguimentos da sociedade estão caminhando juntos e as diferenças vão

depender do contexto histórico-social a que se pertence, haja vista que a velhice não

é vista de forma a agradar as pessoas que vivem em uma sociedade em que se

prega a beleza, a juventude e o consumo.

Quando se é jovem há uma maior valorização pela sociedade e quando se é

velho? Refletindo sobre as palavras de Simone de Beauvoir (1990), que caracterizou

a velhice como uma instituição social e não simplesmente como uma condição

biológica, vemos que a velhice é vista como algo vergonhoso, feio e desprezível e

quem está passando por essa fase do envelhecimento acaba perdendo alguns

papéis sociais. Em sua maioria são excluídos da família, da comunidade, da

sociedade e aqueles que conseguem superar e manter alguma respeitabilidade do

outro ou pode desfrutar das vantagens são os que possuem status mais elevados.

Em relação ao Brasil esse seguimento da população avançou com muita

precisão, tendo um reconhecimento nacional, através das leis, como a Constituição

Federal, de 1988, a lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de 1993, a Política

Nacional do Idoso, de 1994 e o Estatuto do Idoso, de 2003, que asseguram seus

direitos como cidadão brasileiro, trazendo qualidade de vida.

Conhecer a trajetória de vida dos velhos moradores do bairro Henrique Jorge

é reconhecer que o envelhecimento é real e que é influenciado por fatores externos

a quem usufrui de moradia, educação, saúde, alimentação, lazer, e que o momento

que eles estão passando hoje, de certa forma, é consequência de quem viveu no

passado, na construção da vida, influências desses fatores internos e externos, ou

seja, a perspectiva de envelhecer é diversificada e depende da classe social a qual

pertence.

Diante do estudo realizado, dos fatos colhidos, das experiências vividas, das

reflexões, ter conhecido e dialogado com os velhos moradores do bairro Henrique

Jorge foi algo de grande significado pessoal e profissional. Dessa forma, o tempo

que se levou para a realização deste significou um dos primeiros passos na

71

formação profissional de Serviço Social e na contribuição de conhecimento da

própria área e áreas afins. Dessa forma, contribuir com a sociedade nos

descobrimentos de novos estudos, no aprofundamento daqueles que foram

propostos em estudos contínuos, será meu objetivo tanto para o crescimento

profissional como também para o compromisso com a questão dos idosos na

garantia e efetivação de seus diretos.

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REFERÊNCIAS

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__________________________________http://pt.wikipedia.org/wiki/Henrique_Jorge_(Fortaleza). Acesso em: 16 mar 2014 _________________________________hjnoticias.blogspot.com.br acesso em: 16 mar 2014. _________________________________http://diariodonordeste.verdesmares.com.b. Acesso em: 16 mar 2014. _________________________________www.apontador.com. Acesso em: 16 mar 2014. _________________________________História do Mundo. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Idade_Antiga. Acesso em: 22 juh 2014.

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APÊNDICE A

Roteiro de entrevista

1.Onde a senhora nasceu?

2.Você lembra de seus avôs?

3.O que você poderia nos contar de sua infância e adolescência?

4.Como era a vida em comunidade?

5.O que se faziam para a subsistência da família?

6. Como era a questão da assistência à saúde da época?

7. Quantos irmãos tem?

8.Como era a relação com seus pais e irmãos?

9. Como era o costume da época?

10.Como era a cultura de práticas de cura se alguém precisasse?

11. Em relação a escola, o que marcou nesse período?

12.E nos trabalhos dentro e fora de casa, o que realizou?

13.Como era a questão da religião na sua vida e na vida de sua família?

14.Você construiu família?

15.Casou-se com que idade e como foi que isso aconteceu em relação a filhos,

conquistas?

16.Em relação ao bairro Henrique Jorge, quando chegou aqui e como foi que tudo

aconteceu?

17.Participa de algum grupo?

18. Como é sua vida com os vizinhos, grupos, família, comunidade?

19.Com o envelhecimento o adulto começa a perder alguns papéis que exerciam na

vida pessoal e social. O que você pensa sobre isso?

20.Você acha que existe algum preconceito sobre a velhice?

21.Durante sua infância teve alguma doença?

22.Aconteceu algo na infância e adolescência que foi preciso tomar remédio por

toda sua vida?

23.No decorrer da sua vida o senhor(a) percebeu alguma debilidade atual

acarretada da juventude?

24.Quando sentiu as primeiras debilidades e aparecimento de doença no seu corpo?

24.Costumava praticar atividades físicas?

26.Você se sente velha(o)?

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27.Você sente diferença de outras pessoas com os amigos, vizinhança, familiares de

quando era mais jovem e quando está com essa idade?

28.Como se sente nessa idade?

29.Ainda almeja algo?

30.Com que idade recebeu a aposentadoria? E como se sentiu quando pensou que

já era um aposentado?

31.Sentiu-se mais dependente ou independente das pessoas? (Aspectos de

autonomia e decisão)

32. Apresentou alguma doença tipo diabetes, pressão alta, osteoporose e artrose

quando estava na faixa dos 60 anos?

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APÊNDICE B

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ANEXO A

FACULDADES CEARESES TERMO DE RESPONSABILIDADE DO PESQUISADOR

Eu, ____________________________________________aluno(a) do

_______________________________________, matricula nº ____________, curso _____________,

pesquisador(a) responsável pela pesquisa intitulada

"___________________________________________________________", na categoria de

_____________ (Trabalho de Conclusão de Curso - TCC), me comprometo a:

zelar pela privacidade e pelo sigilo das informações que serão obtidas e utilizadas no

desenvolvimento da presente pesquisa;

utilizar os materiais e as informações obtidas no desenvolvimento deste trabalho apenas para

fins de pesquisa e para atingir objetivo(s);

zelar pelos materiais e dados obtidos ao final da pesquisa os quais serão arquivados sob a

responsabilidade do(a) _______________________________ (prof. aluno, instituição);

tornar público os resultados da pesquisa (quer sejam favoráveis ou não) em periódicos

científicos e/ou em encontros, respeitando sempre a privacidade e os direitos individuais dos

sujeitos da pesquisa, não havendo qualquer acordo restritivo à divulgação;

comunicar a FAC da suspensão ou do encerramento da pesquisa, na ocasião da interrupção da

pesquisa;

suspender a pesquisa imediatamente ao perceber algum risco ou dano, previsto ou não no termo

de consentimento livre e esclarecido, decorrente à mesma, a qualquer um dos sujeitos

participantes.

Fortaleza,_____ de _______________ de 2014.

Nome:___________________________________

CPF: ____________________________________

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ANEXO B – Termo de consentimento livre e esclarecido

FACULDADE CEARENSE – FaC

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Convidamos a Senhora para participar da pesquisa “Conhecer as Histórias de vida dos velhos e moradores antigos do Bairro Henrique Jorge” sob a responsabilidade da seguinte pesquisadora: Marcia Maria da Silva (orientanda) e orientação da Prof.ª Ms. Valney Rocha Maciel, a qual se pretende pesquisar as múltiplas histórias de vida dos velhos que vivem há muitas décadas no bairro do Henrique Jorge.

Sua participação é voluntária e se dará por meio do preenchimento de uma entrevista contendo 30 questões subjetivas.

A presente pesquisa será norteada especificamente pelos seguintes objetivos: Conhecer a história do Bairro Henrique Jorge; Traçar o Perfil dos sujeitos pesquisados; pesquisar as trajetórias de vida e o processo de envelhecimento e entender a sociabilidade dos velhos no que se refere à vida comunitária do bairro. Desta forma esperamos contribuir para a importância do velho e morador antigo do bairro a fim de trazer novos conhecimentos e reflexões acerca dessa temática.

Se depois de consentir em sua participação a Senhor(a) desistir de continuar participando, tem o direito e a liberdade de retirar seu consentimento em qualquer fase da pesquisa, seja antes ou depois da coleta dos dados, independente do motivo e sem nenhum prejuízo a sua pessoa. A Senhor(a) não terá nenhuma despesa e também não receberá nenhuma remuneração. Os resultados da pesquisa serão analisados e publicados, mas sua identidade não será divulgada, sendo guardada em sigilo. Para qualquer outra informação, a Senhora poderá entrar em contato com o pesquisador pelo telefone: (85) XXXX-XXXX.

Eu, ________________________________, fui devidamente informada sobre o teor

desta pesquisa. Sendo assim, concordo com minha participação, assinando em

duas vias de igual teor.

Fortaleza, ______ de ____________ de 2014.

Assinatura do participante:____________________________________________

Assinatura do pesquisador:____________________________________________