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1 CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA: CAMINHOS E TRILHAS EM CONSTRUÇÃO Sonia Maria Batista da Silva 2004

CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA: … · CTA/HESFA/UFRJ evidenciou a relevância do aconselhamento voltado para as DST/Aids, a humanização do serviço, o respeito aos

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CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA:

CAMINHOS E TRILHAS EM CONSTRUÇÃO

Sonia Maria Batista da Silva

2004

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Silva, Sonia Maria Batista da. Centro de Testagem e Aconselhamento – CTA: caminhos e trilhas em

construção. – Rio de Janeiro: UFRJ/ NESC, 2004. xii, 130 f Orientador: Kátia Sanches Dissertação (mestrado) – UFRJ / Núcleo de Estudos de Saúde

Coletiva/ Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, 2004. Referências Bibliográficas: f. 118 – 123 1. AIDS. 2. HIV/Aids. 3. Aconselhamento. 4. Prevenção e Promoção

da Saúde. I. Sanches, Katia. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva. III. Título.

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CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA:

CAMINHOS E TRILHAS EM CONSTRUÇÃO

Sonia Maria Batista da Silva

Orientadora: Profª Drª Kátia Sanches

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva, Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.

Aprovada por: .............................................................................. Presidente, Prof. ................................................................................................. Prof. ................................................................................................. Prof. ................................................................................................. Prof. ................................................................................................. Prof. ................................................................................................. Prof.

Rio de Janeiro

Setembro, 2004

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DEDICATÓRIA

À minha mãe, Joanita (in memorian),

cuja ausência física não impediu que sua

lembrança se mantivesse viva em meu

coração, durante essa caminhada. Em toda

minha vida, foi a maior lição de força e luta

na construção de valores realmente humanos

e solidários.

À Camila, minha filha tão querida,

a quem tento ensinar a preparar o caminho

da amizade entre as pessoas e a manter

uma eterna luta pela liberdade por um mundo

melhor.

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AGRADECIMENTOS ESPECIAIS

Aos membros da equipe do CTA/HESFA/UFRJ,

por me concederem apoio incondicional,

compreendendo minhas ausências, sendo

solidários e mantendo a qualidade do trabalho

desenvolvido.

Aos entrevistados, por concordarem em

participar da pesquisa, partilhando suas idéias e

o “olhar” sobre o CTA.

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AGRADECIMENTOS

À Katia Sanches, minha orientadora, que me ensinou o “caminho das

pedras”. Sua paciência e confiança me ajudaram a seguir em frente.

À Carla Araújo, pela amistosa acolhida e críticas construtivas em vários

momentos da elaboração deste trabalho.

Aos Coordenadores do Projeto Praça Onze, pela “liberação” da minha

carga horária, que tornou possível o sucesso desta caminhada.

Aos professores do NESC/UFRJ, da ENSP/FIOCRUZ e do IMS/UERJ,

cujos ensinamentos e valiosas contribuições impulsionaram o meu crescimento

pessoal e profissional.

À Ana Szapiro, pelas valiosas indicações bibliográficas e pelos

pertinentes comentários que teceu.

Ao Álvaro Matida e à Lílian Lauria, cujas contribuições e articulações

políticas foram decisivas para a implantação do CTA/HESFA/UFRJ.

Aos companheiros da Coordenação de DST/AIDS da Secretaria de

Estado de Saúde do Rio de Janeiro, pela credibilidade e apoio neste momento

da minha vida profissional.

À Margarete, Louise, Kiki, Diva, Débora Fontenelle, Claudia Santos,

Rosane Griep, Angela Abreu, Raquel Figueiró e Marilurde Donato, pelo

constante apoio e incentivo.

À Vera, Lisete e Ziléia, irmãs e amigas sempre presentes, que me

‘ancoraram’ com irrestrita amizade e incondicional torcida .

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À Sandra Telles, que compartilha dos meus sonhos no sentido de

construir uma Saúde digna para o nosso País. Suas contribuições permitiram

uma reflexão melhor sobre o CTA.

Ao amigo Antonio Cardoso, eterno cúmplice e encorajador nos meus

momentos mais difíceis.

Aos colegas de turma do Mestrado, pelo companheirismo.

À Jane Nogueira e à Beatriz Sá Leitão, pela atenção, crédito e escuta,

nos momentos em que eu achava que não ia dar conta de tantas atribuições.

À Marisa Medeiros, Kelly Martins e Juliana Pontes, cada uma com sua

tarefa, atuando nos bastidores, colaboraram para a concretização desta

dissertação.

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CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA: CAMINHOS E TRILHAS EM CONSTRUÇÃO

Sonia Maria Batista da Silva

Orientadora: Profª Drª Katia Sanches

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-

graduação em Saúde Coletiva, Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.

Este estudo descreveu a construção de políticas de saúde voltadas para

a epidemia de Aids abordando a construção e as diretrizes dos Centros de

Testagem e Aconselhamento – CTA, com foco no CTA/HESFA/UFRJ. Dentro

dessa premissa, apontou a coexistência e o entrelaçamento da prevenção e da

promoção à saúde frente ao HIV/Aids; permitiu a imersão no real pelo teor das

entrevistas a partir do “olhar” dos usuários sobre o Serviço. A pesquisa foi do

tipo descritivo, com abordagem qualitativa, tendo como cenário o

CTA/HESFA/UFRJ. Os dados foram obtidos por entrevistas semi-estruturadas,

realizadas com onze usuários, sujeitos do estudo, considerados representativos

de parte do universo real do Serviço. Para tanto, utilizou-se como instrumento

de coleta de dados um roteiro com perguntas previamente elaboradas. Os

relatos oportunizaram a percepção de como as etapas de atenção são

vivenciadas diante da pluralidade de questões observadas, ensejando

indagações e reflexões que apontaram para a necessidade de revisão do

processo de atendimento neste CTA, de modo a garantir sua sustentabilidade

enquanto serviço de saúde do Sistema Único de Saúde. A experiência do

CTA/HESFA/UFRJ evidenciou a relevância do aconselhamento voltado para as

DST/Aids, a humanização do serviço, o respeito aos direitos de cidadania e a

busca de estratégias adequadas que contribuam para a melhoria do acesso e

da qualidade do atendimento.

Palavras-chave : AIDS. HIV/Aids. Aconselhamento. Prevenção e Promoção da

Saúde.

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CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO – CTA: CAMINHOS E TRILHAS EM CONSTRUÇÃO

Sonia Maria Batista da Silva

Orientadora: Profª Drª Katia Sanches

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-

graduação em Saúde Coletiva, Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.

This study has described the constructions of politics of health about the AIDS epidemic approaching the construction and the policies of the Counceling and Testing Center of the São Francisco de Assis School Hospital of the Federal University of Rio de Janeiro. In this premiss, it was pointed the coexistence and the interlacement of the prevention and the promotion to health face to HIV/Aids; it allowed the imertion in the true trough the content of the interviews since of the “look” of the user about the Service. It was a descrive research, with qualitative approach and the scenario was the Counceling and Testint Center of the São Francisco de Assis School Hospital of the Federal University of Rio de Janeiro. The data was collected by interviews half-structured, with eleven users, study’s subjects, that was consider representative about part of the true universe of the Service. Therefor, it was used as data collection instrument a script that was previously elaborated. The reports made possible the perception of how the stages of attention are lived face many question observed, making possible questions and reflexions that point to the necessity of a revision of the atendance process in this Counceling and Testing Center, in a way to assure its sustentability as service of health in the Nos System of Health. The experience of Counceling and Testing Center of the São Francisco de Assis School Hospital of the Federal University of Rio de Janeiro made evident the importance of the counceling faced to the STD / AIDS, the humanization of the service, the respect to the rights as citizen and the search of a right strategy that contributes to the improvement of the access and the quality in the atendance. Keywords : AIDS. HIV/Aids. Counceling. Prevention and Promotion of Health.

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S U M Á R I O

Resumo Abstract Lista de siglas

Viii IX Xii

1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Objeto de Estudo Questão Norteadora Objetivos Justificativa do Estudo Organização do Estudo

1 5 5 6 6 7

2 – A CONTEXTUALIZAÇÃO DA EPIDEMIA DE AIDS

2.1. Aids: a evolução da epidemia 2.2. As Organizações não-Governamentais (ONG) no Enfrentamento da Epidemia do HIV/Aids 2.3. Políticas Públicas e Aids: ações governamentais 2.4.Estratégias de Promoção de Saúde e Prevenção do HIV/Aids 2.5.Políticas de Prevenção do HIV/Aids e Promoção da Saúde

9 9

15 19 24 36

3 − OS CENTROS DE ORIENTAÇÃO E APOIO SOROLÓGICO

(COAS) E O CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO (CTA) NO BRASIL 3.1. Reconstruindo a História 3.2. CTA/HESFA/UFRJ - Breve Histórico

47 47 60

4 – CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

4.1. Natureza do Estudo 4.2. Cenário do Estudo 4.3. Sujeitos do Estudo 4.4. Coleta dos Dados 4.5. Instrumento de Coleta de Dados 4.6. Plano de Análise dos Dados

67 67 69 69 70 72 74

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5 – O OLHAR DOS USUÁRIOS ACERCA DO CTA/HESFA/UFRJ

5.1. Caracterização dos Usuários 5.2. Análise dos Dados

� O CTA/HESFA/UFRJ como Serviço de Saúde do SUS � O Objetivo do CTA/HESFA/UFRJ � A Chegada ao HESFA e a Recepção no CTA:

um local de acolhimento? � Aconselhamento Coletivo � Aconselhamento Individual Pré-Teste � A Coleta de Sangue � Aconselhamento Individual Pós-Teste � Lições Aprendidas � Instalações do CTA/HESFA/UFRJ

76 77 78 78 80

83 88 94 99

100 104 107

CONSIDERAÇÕES FINAIS

109

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

120

ANEXOS

126

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LISTA DE SIGLAS

AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

CDC Centro de Controle e Prevenção de Doenças

CN-DST/Aids Coordenação Nacional de Doenças Sexualmente

Transmissíveis / Aids

HESFA Hospital-Escola São Francisco de Assis

HIV Vírus da Imunodeficiência Humana

COAS Centro de Orientação e Apoio Sorológico

CTA Centro de Testagem e Aconselhamento

LACEN Laboratório Central do Estado do Rio de Janeiro

OMS Organização Mundial de Saúde

ONG Organizações não-Governamentais

OPAS Organização Panamericana da Saúde

OSC Organização da Sociedade Civil

PN-DST/Aids Programa Nacional de Doenças Sexualmente

Transmissíveis / Aids

PRD Projeto de Redução de Danos

SUS Sistema Único de Saúde

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

UNAIDS Programa das Nações Unidas para a Aids

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“A AIDS É UMA EPIDEMIA QUE ATINGE UMA

MULTIDÃO. VIVEMOS UMA HISTÓRIA DESTE

TEMPO.”

HERBERT DANIEL

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1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS

É objetivo dessa dissertação é refletir sobre as políticas públicas

emanadas pelo Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis /

Aids (PN-DST/Aids) para os Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA)

com foco no Centro de Testagem e Aconselhamento do Hospital Escola São

Francisco de Assis da Universidade Federal do Rio de Janeiro

(CTA/HESFA/UFRJ) quanto ao atendimento das demandas dos usuários que

procuram este serviço.

O aparecimento e o crescimento da epidemia no HIV, no Brasil,

determinaram a necessidade de respostas não só em termos de políticas

públicas e ações governamentais, mas também de organização da sociedade

civil, atenta à epidemia que estava provocando um sério impacto social.

Em 1986, a VIII Conferência Nacional de Saúde propôs o

equacionamento do modelo de saúde através da adoção de metas e estratégias

nacionais que colocassem os serviços de saúde ao alcance de toda a

população, em bases igualitárias e de acordo com o ideário de “saúde como

direito de todos”.

Sob a influência dessas idéias, o Ministério da Saúde em 1988 realiza

um treinamento em aconselhamento para o HIV/Aids, do qual participei, visando

qualificar profissionais de saúde para atuar no campo da Aids, dentro de uma

abordagem multidisciplinar, já que a epidemia prenunciava transformações na

área de saúde.

Em 1992, como membro da direção do Hospital-Escola São Francisco de

Assis, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (HESFA/UFRJ), participei da

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implantação do CTA/HESFA/UFRJ, o primeiro do Estado do Rio de Janeiro,

cujo surgimento ocorreu quatro anos após as diretrizes emanadas daquela

Conferência que, embora insípidas, respondiam aos propósitos de demanda

voluntária, livre acesso, gratuidade e universalidade de atenção à saúde.

Os Centros de Orientação e Apoio Sorológico (COAS) surgem em 1988,

no bojo das modificações decorrentes da Reforma Sanitária, para atender as

diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), dentre as quais: capacitar

recursos humanos para a prestação de assistência médica e psicossocial,

organizar serviços de saúde para atender a população, entre eles os que

demandavam a realização dos testes anti-HIV e, ao mesmo tempo, minimizar

os problemas vivenciados na época, a exemplo da discriminação e da exclusão

social. Esses serviços teriam como finalidade oferecer testes sorológicos,

prover educação e aconselhamento, além de desviar a demanda por testes

anti-HIV nos bancos de sangue.

A partir de 1993, assumi a coordenação do CTA/HESFA/UFRJ e, nestes

onze anos, exercendo as funções de coordenadora e aconselhadora, tenho

vivenciado a construção e a consolidação das mudanças ocorridas nesse

serviço, que hoje serve como referência para diferentes níveis hierárquicos do

sistema de saúde vigente, sejam em nível ambulatorial e hospitalar. Esta

trajetória tem sido marcada pelo sentimento e pela certeza de que a Aids ainda

representa um desafio para a saúde pública, reafirmando o meu interesse pelo

enfrentamento da epidemia. Daí a motivação de implantar e estruturar um

serviço de saúde de caráter diferenciado, comprometido com uma doença que,

para além de saberes biológicos, envolve questões de sexualidade, concepções

de prevenção, direitos sociais, luta contra estigmas, enfim, uma diversidade de

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questões sociais, econômicas e culturais que, de fato, eram e ainda são muito

inquietantes e desafiadoras para mim.

Este trabalho expressa minhas preocupações políticas desde o final da

década de 70, época em que os princípios com o público e com o atendimento

à população emolduraram o meu projeto ideológico, consolidando o

entrelaçamento das minhas histórias individual e profissional voltadas para a

construção de um serviço de saúde que consolidasse o modo de pensar e fazer

neste projeto de ideais, sempre presentes em meu cotidiano.

Foi a partir do meu envolvimento no processo de implantação do CTA no

HESFA que pude incorporar o meu compromisso com a Saúde Coletiva, uma

experiência que se tornou um desafio na minha vida, fonte de energia e paixão

permanentes, não só frente às formas de enfrentamento à Aids mas,

especificamente, à organização e ao constante movimento de renovação do

CTA.

Pensar o processo de criação dos COAS/CTA e em particular no

CTA/HESFA/UFRJ não foi tarefa fácil diante do meu envolvimento pessoal, das

motivações ideológica e profissional e da minha implicação direta no serviço

desde a sua fundação, passando também pelo desempenho das funções de

coordenadora.

Escrever sobre este tema implicou na necessidade de distanciamento

emocional e isenção para poder ‘olhar’ e ‘investigar’ as diretrizes

governamentais elaboradas para os CTA, levando em consideração a

percepção dos usuários atendidos pelo serviço. Sendo assim, trata-se de uma

reaproximação, no sentido de conhecer melhor o funcionamento do CTA com

duplo direcionamento, por um lado replanejar concretamente o próprio CTA e,

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por outro, na medida do possível contribuir, futuramente, para o aprimoramento

das diretrizes. Logo, não há pretensão de esgotar o tema.

Durante este percurso, sempre houve uma preocupação constante com

o campo teórico do aconselhamento em DST/HIV/Aids, prática ainda incipiente,

o que levou à necessidade de capacitação da equipe multiprofissional do CTA,

já consolidada, possibilitando melhor qualidade no atendimento cotidiano e no

desenvolvimento dos serviços oferecidos aos usuários.

Mas o sentido prático conferido à prevenção e à política do CTA

modificou-se, de acordo com o perfil da epidemia. Foi uma travessia demarcada

pelas dificuldades dos usuários em relação à prevenção e à possibilidade de

mudança de comportamentos. Nesse sentido, os profissionais do CTA sempre

estiveram presentes, garantindo a interlocução como estratégia de abordagem

pessoal e direta, a fim de identificar fatores que contribuíam para levá-los a

adotar determinadas condutas, e as possibilidades reais de mudá-las.

Tornava-se cada vez mais claro que os desafios impostos pela epidemia

de Aids requeriam da equipe multiprofissional que atuava no CTA um

aprofundamento das questões relacionadas com a prática assistencial, além de

outras questões de igual relevância, como a organização e o planejamento do

serviço, as relações inter-institucionais, profissionais-usuário, e entre os

profissionais e as articulações político-institucionais que envolviam o Ministério

da Saúde através da PN-DST/Aids, Programas Estaduais e Municipais de

DST/Aids do Rio de Janeiro, ONG e outros Programas de Saúde que

garantiam a intersetorialidade.

É pertinente lembrar a importância do percurso vivenciado para o

entendimento da prevenção da doença, como função prioritária do CTA,

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considerada um marco na estrutura do mesmo, a ponto dos profissionais

afirmarem que, na verdade, “o teste era o brinde ao usuário, e que a âncora do

CTA era a estratégia de prevenção, através do aconselhamento”, embora

continuasse como referência para a assistência.

Ademais, é importante resgatar o quanto o trabalho desenvolvido no

CTA/HESFA/UFRJ em relação à cidadania, à dignidade, aos direitos das

pessoas com HIV/Aids e a motivação ao tratamento, evidencia que as questões

culturais, econômicas e políticas são fundamentais para a promoção da saúde,

como será enfatizado no decorrer deste trabalho.

No Brasil, nestes vinte anos de epidemia de Aids, o que já foi construído

através das políticas públicas teve como base os princípios do SUS. Quanto à

concepção de promoção de saúde, vem se consolidando na prática, imprimindo

qualidade ao atendimento aos portadores do HIV/Aids, marcando novos

caminhos nas políticas públicas de saúde.

Assim, a associação entre prevenção e assistência aponta para a

integração das ações de saúde coletiva; também a articulação entre saúde e

direitos humanos e a visão do indivíduo como um ser integral, dentro do

atendimento do CTA/HESFA/UFRJ, expressam a noção de integralidade

preconizada no SUS. O acesso ao diagnóstico e a integralidade de atendimento

são princípios que norteiam a atenção à saúde naquele serviço.

O acolhimento no CTA das pessoas que buscam o teste anti-HIV, das

pessoas que vivem com HIV/Aids e dos grupos mais vulneráveis para a

infecção do HIV/Aids possibilita a inclusão no sistema de saúde dos

continuamente excluídos. Esse processo de inclusão aponta para o

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aperfeiçoamento do exercício, ainda incipiente, do controle social preconizado

pelo SUS, imbricando os sujeitos com a saúde pública.

Sabe-se que há muito o que fazer, mas uma vez que as respostas à

epidemia pautam-se numa perspectiva intersetorial, ainda em construção. Mas,

sem dúvida, existem caminhos e trilhas a percorrer no CTA/HESFA/UFRJ e na

luta por uma saúde digna para a população brasileira.

A partir da premissa de que os serviços oferecidos aos usuários devem

se adequar às suas necessidades, estas por sua vez, respaldadas pelas

políticas de saúde propostas pelo Estado para o controle e prevenção da

epidemia de Aids, surgiu a questão norteadora do estudo: Como os usuários

vivenciam e percebem a assistência desenvolvida pelo CTA/HESFA/UFRJ,

preconizada para os Centros de Testagem e Aconselhamento nas diretrizes

emanadas pelo PN-DTS/Aids?

Foram então traçados os seguintes objetivos:

� Descrever o processo de implantação e funcionamento do

CTA/HESFA/UFRJ.

� Relacionar a atuação do CTA/HESFA/UFRJ dentro da política de

saúde do PN/DST/Aids direcionada aos CTA.

� Discutir, como ocorreu as etapas de assistência prestada pelo

CTA/HESFA/UFRJ, na visão dos usuários.

A escolha do CTA/HESFA/UFRJ para realização deste estudo justificou-

se por ser ele uma unidade de saúde de um Hospital-Escola que, há doze anos,

desenvolve a prática de saúde em relação à Aids, segundo as diretrizes do

Programa Nacional de DST/Aids – (PN/DST/Aids) do Ministério da Saúde.

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Clarear, através da visão dos usuários, se o serviço vem desenvolvendo

a com tempo a complexa missão de acolhimento e aconselhamento, com vistas

à prevenção para a epidemia do HIV, justifica-se na medida em que o

CTA/HESFA/UFRJ atende a cerca de 700/usuários/mês, quantitativo

expressivo, que aponta para a legitimação dos serviços de saúde. Resta saber,

todavia, como ele é compreendido e percebido por essa população que dele

usufrui em diferentes etapas de assistência.

Rever a história e a contextualização das políticas públicas voltadas para

os Centros de Testagem e Aconselhamento foi necessário para evidenciar

como surgem as diretrizes e como o CTA/HESFA/UFRJ se estruturou para

respondê-las, já que tantas diretrizes como as ações de saúde desenvolvidas

no serviço estão voltadas para atender as necessidades da população. Estes

são os propósitos dessa dissertação de mestrado, além destas Considerações

Iniciais (Capítulo 1), abordando os seguintes assuntos.

São apresentadas no Capítulo 2 a abordagem teórica sobre a

“Contextualização da Epidemia de Aids“, com seus desdobramentos: 2.1) Aids;

a evolução da epidemia, 2.2) As Organizações não-Governamentais (ONG) no

Enfretamento da Epidemia do HIV/AIDS, 2.3) Políticas Públicas e Aids: ações

governamentais, 2.4) Estratégias de Promoção de Saúde e Prevenção do

HIV/Aids, 2.5) Políticas de Prevenção do HIV/Aids e Promoção da Saúde, para

tecer bases com intuito de contextualizar políticas voltadas para a epidemia de

Aids. Neste contexto teórico, a intenção é subsidiar as reflexões de políticas de

saúde que contribuíram para as diretrizes dos Centros de Testagem e

Aconselhamento.

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A trajetória da criação dos COAS/CTA, em especial a criação do

CTA/HESFA/UFRJ, foi enfocada no terceiro Capítulo sob o título “Os Centros

de Orientação e Apoio Sorológico (COAS) e o Centro de Testagem e

Aconselhamento (CTA) no Brasil” sendo este subdividido em: 3.1) reconstruindo

a história e 3.2)CTA/HESFA/UFRJ.

As “Considerações Metodológicas” integram o quarto Capítulo, e

descrevem o processo de construção do trabalho, segundo a metodologia

adotada;

A análise central do trabalho é discutida no Capítulo 5 – “Análise dos

Dados – O Olhar dos Usuários acerca do CTA” – a partir das entrevistas

realizadas com os usuários acerca das etapas de atendimento no

CTA/HESFAUFRJ;

Nas “Considerações Finais”, são pontuados os resultados obtidos pela

pesquisadora a partir das entrevistas realizadas com os sujeitos do estudo,

evidenciando sugestões para a melhoria do atendimento no Serviço.

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2- A CONTEXTUALIZAÇÃO DA EPIDEMIA DE AIDS

2.1- Aids: a evolução da epidemia

A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) tornou-se uma

realidade mundial a partir da década de 80. Em junho de 1981, o Centro de

Controle e Prevenção de Doenças (CDC) de Atlanta, nos Estados Unidos,

relatou o primeiro caso de Aids, uma doença que viria a se tornar uma

pandemia. Nos últimos tempos, poucos agravos à saúde geraram tamanho grau

de interesse dos profissionais de saúde, de atividade científica, de enigma e de

preconceito como a Aids. O número de pessoas infectadas pelo vírus da

imunodeficiência humana (HIV), seu modo de transmissão e seu impacto na

sociedade levaram a Aids a adquirir uma grande relevância social (SANCHES,

1999).

Inicialmente, a Aids foi caracterizada como uma doença que acometia,

através da sua transmissão, um grupo social específico – os homossexuais

masculinos. A grande maioria de casos diagnosticados revelava que a principal

categoria de transmissão estava relacionada com o contacto entre os homens

que faziam sexo com homens e, somando-se a esses o “grupo” das prostitutas,

dos usuários de drogas (UDI) e dos indivíduos transfundidos por sangue e

hemoderivados. Portanto, a infecção pelo HIV nasceu vinculada ao campo da

sexualidade, ferindo escolhas e orientações sexuais, abarcando temas

polêmicos como diferenças sexuais, desejos e prazer sexual.

A ênfase em determinados grupos propiciou mobilização, visibilidade e

reivindicações sociais, sobretudo da mídia e das Organizações não-

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Governamentais (ONG), que começaram a se estruturar, apontando para a

dimensão social da epidemia (PARKER, 2003). Com ênfase nesta organização,

ocorreu um avanço de segmentos sociais que lutavam contra o preconceito que

provocou a desconstrução do conceito de “grupos de risco”, gradativamente

substituído pelo conceito de “comportamento de risco”. Esta mudança

apresentou um avanço e maior abertura para se pensar a epidemia, gerando

propostas de ações preventivas e intervenções em saúde relevantes na área de

saúde pública.

O conceito de vulnerabilidade, especialmente aplicado em saúde pública,

resultou de um processo entre ativismo frente à epidemia de Aids e do

movimento de direitos humanos. O discurso da vulnerabilidade na saúde

pública permite entender mais amplamente questões relacionadas a

desigualdades, estigma, discriminação e violência (PARKER, 2000). No plano

individual, relaciona-se a comportamentos e atributos pessoais que

condicionam a possibilidade de prevenção da infecção. Estes comportamentos

estão necessariamente relacionados ao meio social em que emergem e se

reproduzem, ao grau de consciência que os indivíduos têm sobre eles e ao

potencial poder de transformação que estes indivíduos tenham sobre sua

conduta (BRASIL, 2003a).

Estimativas publicadas pelo Programa de HIV/Aids das Nações Unidas

indicam que, até 2003, 38 milhões de indivíduos viviam com HIV/Aids, e que

aproximadamente 95% das pessoas infectadas vivem em países

subdesenvolvidos, onde a pobreza, a precariedade do sistema de saúde e os

parcos recursos para prevenção e assistência obstaculizam o controle da

epidemia.

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No Brasil, os primeiros casos de Aids foram identificados em 1982. Até

31 de dezembro de 2003 foram notificados 310.310 casos sendo que, desse

total, 220.783 em homens e 89.527 em mulheres (BRASIL, 2003b). Nos

homens, a faixa etária mais acometida encontrava-se entre 25 e 49 anos; nas

mulheres, entre 20 e 49 anos, período considerado de grande fertilidade.

Nestes vinte anos, a epidemia de Aids no Brasil assumiu diferentes faces que

apontam para uma dinâmica complexa, conjugando determinantes relacionados

a: saúde, condições de vida, desigualdades sociais, questões de gênero,

étnicas, etárias e de comportamento, entre outras (PARKER, 2003).

Como resultado das profundas desigualdades da sociedade brasileira, a

propagação da infecção pelo HIV revela uma epidemia de múltiplas dimensões

que vem, ao longo do tempo, sofrendo transformações significativas em seu

perfil epidemiológico (BRITO et al, 2001). Hoje assistimos a uma progressão da

doença que vem atingindo, de forma crescente, setores econômicos e

socialmente desprivilegiados, com tendência a se disseminar entre a dita

“população geral”, principalmente entre aqueles com menor renda e/ou nível

educacional, não se restringindo mais aos grupos de riscos.

Atualmente, a principal forma de expansão desta epidemia se dá através

das relações heterossexuais desprotegidas, pelo contato íntimo entre as

pessoas (mediado pelo sangue, sêmen e líquido vaginal) (PARKER, 1997).

Outros fatores que favorecem a disseminação da epidemia de Aids são:

migração populacional, urbanização, dificuldade de acesso aos serviços de

saúde, declínio da economia, uso injetável de drogas, situação de

vulnerabilidade das mulheres e doenças sexualmente transmissíveis (DST)

(LIMA, 1996).

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Além destes aspectos, a epidemia segue com tendências de

interiorização e regionalização, observando-se que sua expansão já atinge

inúmeros municípios brasileiros. Inicialmente restritos a São Paulo e Rio de

Janeiro, expandiram-se rapidamente para as regiões Nordeste, Centro-Oeste,

Norte e Sul (CASTILHO e CHEQUER, 1997) e, a partir de 1992, chama a

atenção o crescimento acentuado da doença nas regiões Norte e Sul do País

(BARREIRA, 2002, p. 23).

Em conseqüência da expansão da infecção em mulheres, novas

discussões acerca das tendências epidemiológicas, bem como de respostas de

políticas públicas, passaram a ser necessárias. A razão homem:mulher que no

período de 1984/86 era de 25:1, em 2000 passou para 2:1 (BRASIL, 2001).

Com isso, aumentou a complexidade dos aspectos relacionados à transmissão

do HIV nas mulheres.

O crescente aumento de casos em mulheres levantou surpreendentes

aspectos da vulnerabilidade frente à Aids. O perfil epidemiológico da epidemia

que, anteriormente, vinculava a transmissão feminina a parcerias com usuários

de drogas, bissexuais, homens HIV positivos e parceiros com múltiplas

parceiras remeteu, também, à evidência de que muitas mulheres infectadas

pelo HIV eram donas de casa ou domésticas, geralmente monogâmicas,

infectadas por seus parceiros fixos, não se reconhendo no contexto epidêmico

(PARKER, 2003).

Estudos realizados em São Paulo e no Rio de Janeiro evidenciaram o

grande número de mortes por Aids ou doenças relacionadas em mulheres com

idade entre 20 e 49 anos, sugerindo que o diagnóstico da Aids em mulheres era

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realizado tardiamente, se comparado ao dos homens, e que os sintomas

relatados por elas não eram atribuídos à infecção pelo HIV (PARKER, 2003).

Devido à complexidade de alguns fatores sociais e culturais responsáveis

pelo aumento de caso de Aids neste segmento, programas voltados para as

mulheres tiveram prioridade e o desenvolvimento de estratégias para prevenção

do HIV tornou-se urgente. Observa-se a instituição do exame anti-HIV na

rotina do pré-natal, que diz respeito à transmissão perinatal (transmissão do

HIV da mãe para o bebê, durante a gestação, parto e/ou amamentação)

registrada inicialmente em 1995, encaminhando a outras medidas, inclusive o

uso da terapia anti-retroviral, esquema de tratamento garantido pelo Ministério

da Saúde, especialmente preconizado para diminuir a chance de infecção de

conceptos.

Essas diretrizes oficiais informam a mulher sobre a decisão de ter ou não

filhos, orientam sobre reprodução assistida, exames que monitoram a chance

de engravidar, aconselhamento para o teste anti-HIV, uso dos preservativos

feminino e masculino e uso de medidas para as gestantes e seus filhos,

iniciativas que permitiram a redução desta forma de transmissão, estimulando

a interrelação entre programas de saúde governamentais e incentivando a

indissociabilidade entre ações preventivas e assistenciais.

Há um crescimento significativo de casos de Aids diagnosticados na

população mais pobre, que sofre com desemprego, violência, baixa renda ou

má remuneração. Esses fatores aumentam a vulnerabilidade frente à epidemia,

comprometendo as estratégias de prevenção e o entendimento dos cidadãos

quanto à adesão ao tratamento. Estes processos socioeconômicos e culturais

produzem desigualdade e discriminação, expondo mais os cidadãos a vários

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agravos de saúde, inclusive ao HIV. Nesse sentido, as mazelas de uma

sociedade se espelham nos mais frágeis, marginalizados e desassistidos,

limitando a eficácia das políticas públicas, trazendo a necessidade de repensar

os problemas da população brasileira, buscando estratégias de integração

intersetorial com outras políticas públicas e a interface entre prevenção e

assistência (MATIDA, 2003).

Mann (1993) ressalta que a exclusão social e/ou a discriminação com

base em raça/etnia, nacionalidade, religião, sexo e/ou orientações sexuais,

também contribuem significativamente para o aumento do risco da infecção

pelo HIV. Do ponto de vista prático, a discriminação foi considerada uma

ameaça à saúde pública devido ao rápido crescimento do número de casos da

doença. Atualmente, os casos não se limitam a grupos ou pacientes com

comportamentos “diferenciados”, inicialmente estigmatizados como grupos de

risco; hoje a epidemia representa um risco real para toda a população (THULER

et al, 1998).

Neste cenário, destacam-se os esforços realizados para controlar o

crescimento dos casos de Aids. A conjugação das análises epidemiológicas,

dos avanços no campo da assistência e do monitoramento da epidemia, das

políticas preventivas, das pesquisas científicas, das lutas contra estigmas

desenvolvem, através de uma relação dialética, renovados compromissos em

defesa da promoção e do direito à saúde voltados, sobretudo, para a resolução

de um dos maiores problemas de saúde da população brasileira.

A dinâmica da epidemia acentuou os aspectos relacionados à

deterioração da economia e da qualidade de vida, ao crescente movimento

migratório, à ascensão do mercado de drogas e da criminalidade, à

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feminilização, à estrutura da relação de poder entre gêneros, à dificuldade de

negociação de práticas seguras em todas as relações sexuais, permeada pela

subjetividade que envolve os relacionamentos entre pares e seres humanos.

Essa realidade faz emergir o entendimento de que homens e mulheres sejam

vistos como sujeitos históricos, inseridos na vida social, sublinhando-se a

relação de poder entre gêneros e as questões socioeconômicas.

Essas considerações sobre o perfil epidemiológico levam a reflexões e

desafios, conforme referido por Barreira (2002, p. 24):

Tal como no século XIX, quando profundas transformações sociais tiveram nas epidemias emergentes da época seu espelho e imagem, as epidemias de Aids e de outras DST, por estarem referidas a práticas, concepções e valores sociais relativos à saúde, ao corpo e à sexualidade, colocam para nós o desafio (e a necessidade) de, a um só tempo, com o nosso conhecimento, experiência e criatividade, enfrentar fragilidades e conflitos inerentes às formas de sociabilidade contemporânea.

2.2- As Organizações não-Governamentais (ONG) no Enfrentamento da Epidemia do HIV/Aids

Para entender a dinâmica da epidemia da Aids, é relevante observar as

tendências da política brasileira, das políticas públicas de saúde, da influência

da sociedade civil e das Organizações não-Governamentais (ONG), algumas

denominadas Organizações da Sociedade Civil (OSC), associadas ao contexto

social e às respostas à Aids.

No Brasil, a prática do aconselhamento surgiu voltada para o HIV/Aids,

inicialmente no âmbito das ONG, a partir de trabalhos voluntários isolados e de

grupos de apoio entre pares e pessoas infectadas pelo HIV/Aids (MIRIM e

PASSARELLI, 1998, p. 7).

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A identificação dos primeiros casos de HIV/Aids, a partir do diagnóstico

sorológico, das doenças oportunistas, das mortes física e civil vinculadas

inicialmente à sexualidade, em especial à homossexualidade, trouxe cenas e

representações sociais que apontavam para a necessidade de enfocar a

epidemia pela ótica dos Direitos Humanos. Nessa linha de pensamento,

salienta-se a preocupação com o conceito de solidariedade e a importância

dada a atitudes de inclusão social dos cidadãos, que se tornaram princípios

norteadores e identitários no enfrentamento da epidemia da Aids.

Entendidos como violação dos Direitos Humanos, a discriminação, o

preconceito e o estigma relacionados ao HIV/Aids ampliaram a dimensão da

epidemia, voltando o olhar para os cidadãos como sujeitos de direitos. Mas, o

cenário imposto por ela envolveu diferentes atores sociais, que cumpriram um

papel relevante na formulação de políticas públicas para o seu enfrentamento.

É neste contexto que surgem as primeiras ONG voltadas diretamente para

o enfrentamento da Aids (ONG/Aids) com a finalidade de discutir os papéis do

Estado e da sociedade frente à doença, desenvolvendo, assim, um campo

privilegiado de questionamento do sistema de saúde e acarretando,

conseqüentemente, novas formas de atuação frente ao fenômeno endêmico.

Marcadas pela grande importância de mobilização da opinião pública em torno

de questões vitais para o combate e assistência à epidemia, as ONG/Aids

visavam assegurar interlocuções com instâncias governamentais,

especialmente na área da saúde, colocando uma série de desafios entre os

quais organizar, planejar e implementar ações de saúde, articulando assistência

médica, prevenção e direitos humanos e, desta forma, conferindo à saúde o

estatuto universal sustentado pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.

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No período de 1985 a 1989, surgiram ONG/Aids que assumiram a

epidemia como fenômeno político-social, descentralizando o enfoque que a

circunscrevia somente como questão de saúde pública. As ONG/Aids

apresentavam características diferenciadas, pois eram formadas por segmentos

da sociedade civil, tendo em seus quadros, inicialmente, pessoas que

trabalhavam voluntariamente, objetivando o bem-estar dos cidadãos e a

promoção de justiça social. Também desencadearam uma diversidade de

iniciativas, dentre as quais campanhas voltadas para a consciência pública,

desenvolvimento de projetos de inclusão dos cidadãos no sistema de saúde

reivindicando melhores condições de tratamento, implantação e implementação

de políticas de prevenção, marcando um dos períodos mais significativos da

história da Aids no Brasil (GALVÃO, 2000).

O ativismo das ONG/Aids foi decisivo nas negociações entre os setores

governamentais e as organizações da sociedade civil, que acabaram por

impulsionar a revisão das políticas públicas em saúde, conferindo um sentido

ampliado à epidemia em que prevaleceram eixos fundamentais como resgate

da ética, da dignidade e dos direitos dos portadores do HIV.

As ONG/Aids propiciaram respostas ao nível da assistência, do

tratamento e da prevenção, desencadeando o exercício de políticas inovadoras

em que determinantes sociais, como as desigualdades entre as classes,

passaram a ser vistos como fatores que interferiam na vulnerabilidade frente à

infecção do HIV/Aids. Neste enfoque, a Aids ganha uma dimensão ampliada,

aproximando-se de questões socioculturais, políticas, econômicas e de justiça.

O entrelaçamento desses aspectos imprimiu novos compromissos e

diretrizes à epidemia, favoreceram ações intersetoriais e fortaleceram o caráter

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social e integrador das políticas de controle da Aids, reafirmando a defesa do

direito à saúde e à vida.

Ressalta-se que, na trajetória da epidemia do HIV/Aids, as ONG/Aids no

Brasil consagraram sua importância e multiplicaram-se dentro de diversas

linhas de atuação, com destaque para projetos de intervenção e

sustentabilidade, colocando em pauta novos atores e formas de ação,

estabelecendo novas ordens de relacionamento e cooperação e

circunscrevendo a atuação e o campo de trabalho das ONG civis frente à

epidemia (GALVÃO, 2000).

O crescimento da epidemia do HIV/Aids no Brasil vem acompanhando

mudanças significativas das ONG/Aids, no tocante à atuação e

institucionalização destas entidades na prestação de serviços e projetos de

intervenção diversificados. A expansão da epidemia acarreta agendas de

trabalho em cooperação com as organizações governamentais estabelecendo,

então, estratégias de diminuição da infecção pelo HIV e políticas gerais para a

epidemia.

É fundamental assinalar que, neste inevitável processo de acertos e

desacertos, a criatividade, a mobilização social e a experiência exitosa das

ONG contribuíram para o amadurecimento das políticas relacionadas à Aids, ao

longo do percurso. Assim, em parcerias, viabilizaram políticas públicas

assertivas, a despeito de algumas dificuldades naturais evidentes, traçando

compromissos inovadores numa visão ampliada de respostas sociais,

assistenciais, de tratamento, prevenção e controle da epidemia.

Neste aspecto, é preciso lembrar que a sustentabilidade da resposta

brasileira frente à Aids depende da política e da pressão constante da

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sociedade civil e de ações, sejam de prevenção ou de assistência ao

tratamento, além do aprofundamento constante da conscientização da

cidadania e da democracia (PARKER, 1997, p.9).

2.3- Políticas Públicas e Aids: ações governamenta is

Conforme referido anteriormente, a década de 80 foi marcada por

significativas modificações na sociedade brasileira. O período de transição

social vivido era carregado de esperanças no processo de redemocratização,

quando o diálogo e a possibilidade de responder as preocupações da

sociedade começavam a ser tecidos.

As políticas públicas encaminhavam proposições que visavam atender os

interesses sociais coletivos, transformando os impasses sociopolíticos em

ações institucionalizadas, e implementando essas ações através de traços

democráticos.

As propostas para uma nova política de saúde no cenário nacional, na

primeira metade dos anos 80, evidenciavam mudanças estruturais através do

movimento da Reforma Sanitária, que enfatizava a importância da atenção e da

participação comunitária na saúde.

Essa questão contribuiu para transformar a política de saúde num

elemento inaugural e fundamental no novo contexto sociopolítico no Brasil. Foi

considerado um tema prioritário na discussão das políticas públicas que

abordaram questões relevantes quanto à finalidades, diretrizes, métodos e

ações de saúde, culminando com a realização da VIII Conferência Nacional de

Saúde, em 1986, e com a proposta de criação do Sistema Único de Saúde

(SUS), cujos objetivos eram alterar a situação de desigualdade na assistência à

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saúde da população, universalizando o acesso ao atendimento, tornando-o

obrigatório e gratuito a qualquer cidadão brasileiro.

A epidemia de Aids surge neste contexto e aproxima o tema e a doença

ao desenvolvimento de política e direitos sociais e cidadania, associando-os

aos princípios do SUS.

A notificação dos casos de Aids, no início da década de 80, apontava

para a evidência do crescimento da epidemia no País. E seu confrontamento

implicou na mobilização de grupos afetados pela detecção dos casos

diagnosticados, por setores da sociedade civil e pela competência e

responsabilidade das instituições governamentais e dos profissionais de saúde,

que buscaram construir um modelo em saúde mais adequado para assistir,

prevenir e tratar a epidemia que se alastrava.

Refletindo o momento histórico e a dimensão da epidemia na

sociedade brasileira, em 1983 foi criado em São Paulo, o primeiro Programa de

Aids no Brasil, “um exemplo da combinação de um governo democrático com a

crescente mobilização de setores da sociedade civil e com o efetivo aumento do

número de casos de pessoas HIV positivas em São Paulo” (GALVÃO, 2000, p.

58). A esse respeito, assim se pronunciou Teixeira (1997, p.44):

Em 1983, um grupo de militantes do Movimento pelos

Direitos dos Homossexuais do Estado de São Paulo procurou a

Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo (SES) para cobrar

uma posição diante de um problema novo e inquietante, detectado

em nosso meio e já então veiculado pelos meios de comunicação: a

ocorrência de casos de Aids. A resposta da Secretaria veio através

da constituição de um grupo de trabalho composto por técnicos de

diversas áreas da instituição.

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O estabelecimento da notificação compulsória, a criação de um serviço de

informações por telefone e a participação da comunidade foram medidas

propostas e implementadas. O período ficou marcado pela mobilização de

militantes da luta contra a Aids, pela criação de ONG voltadas para essa

questão e pela pressão social exercida sobre os setores governamentais. O

trabalho de informação sobre transmissão e prevenção à doença começou a

tomar corpo, assim como o redirecionamento das abordagens médico-

terapêuticas ampliando, então, o diálogo para outras categorias profissionais e

possibilitando uma diversidade de iniciativas, composições e questionamentos

importantes para o enfrentamento da doença.

Com o avanço da epidemia, diversos estados brasileiros construíram

Programas de Aids em suas respectivas Secretarias de Saúde e, em 02 maio

de 1985, através da Portaria 236 do Ministério da Saúde, o então Ministro

Carlos Correa de Menezes Sant'Anna estabeleceu as diretrizes do Programa

Nacional de Aids (PN-DST/Aids) a nível federal, vinculando a sua coordenação

à Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária da Secretaria Nacional de

Programas Especiais de Saúde (TEIXEIRA, 1997).

Na justificativa do Programa, o então Ministro referiu-se ao significativo

aumento do número de casos, à alta taxa de mortalidade, à escassez de recur-

sos terapêuticos e à necessidade de hospitalização dos pacientes com Aids,

por longo tempo.

A responsabilidade do PN-DST/Aids envolveu, inicialmente, ações de

vigilância epidemiológica e medidas de prevenção. Aos serviços de saúde

coube a responsabilidade de implementar medidas de educação sanitária junto

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aos grupos de riscos. As orientações deveriam seguir princípios que

preconizavam: abandono do uso de drogas, atividade sexual restrita a um único

parceiro, controle da doação de sangue dos grupos de risco e oferecimento de

assistência pelos Serviços de Saúde em caso de suspeita da doença.

O Ministério da Saúde assume a organização institucional das atividades

de controle e prevenção da Aids e, ainda em 1985, o Estado do Rio de Janeiro

passa a ter uma instância dentro da Secretaria de Estado de Saúde,

responsável pela Vigilância Epidemiológica dos casos de DST/Aids. Este setor

vai adquirindo, aos poucos, a identidade de Programa, mesmo sem qualquer

formalização no seu organograma, o que só ocorrerá em 1991, ensejando a

institucionalização do Programa também no Município do Rio de Janeiro

(ROCHA, 1999).

Os serviços estaduais para o tratamento da Aids, em especial os do Rio

de Janeiro e os de São Paulo, foram designados como Centros de Referência

Regional através da Portaria 726, de 5/11/1995, do Ministério da Saúde

(TEIXEIRA, 1997, p.56). Esses centros formadores desenvolveram inúmeros

treinamentos para equipes multidisciplinares nos Estados que ainda não tinham

estruturado os Programas de DST/Aids, e para aqueles que iniciavam as

atividades de controle e assistência à Aids. Com isso, o PN-DST/Aids do

Ministério da Saúde passa a ter expressão pública e legitimação.

Os primeiros anos de funcionamento do PN-DST/Aids também

asseguraram direitos e garantias aos portadores de Aids e seus familiares,

dentro de referenciais éticos, sócio-políticos e trabalhistas, conforme referido

por Teixeira (1997, p.58):

Destaca-se a garantia do acesso à informação adequada sobre

medidas de prevenção, a criação de locais para orientação

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diagnóstica ou sorológica e o tratamento dos casos de Aids. O teste

anti-HIV só seria efetivado sob orientação médica e mediante sigilo

laboratorial e consentimento individual.

Segundo o autor, havia garantia de atendimento aos portadores do HIV,

a nível médico, social, de assistência judicial gratuita e a indicação de serviços

de orientação diagnóstica.

Essas diretrizes do PN-DST/Aids configuravam a Aids como um

problema coletivo e de abrangência nacional, com ênfase na prevenção

primária, no aconselhamento, na referência para assistência integrada, no

diagnóstico sorológico, sobretudo com investimentos para suporte laboratorial,

capacitação profissional e controle do sangue, além de programas e projetos de

prevenção.

O PN-DST/Aids, através do seu fortalecimento institucional, da

cooperação com as ONG e de diversas parcerias com instituições nacionais e

internacionais, entre elas as agências da Organização Mundial de Saúde

(OMS), da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e do Banco Mundial,

recebeu recursos financeiros destinados a linhas de atuação significativas de

sustentabilidade às ações de saúde, dinamizando as respostas brasileiras à

epidemia. Estes financiamentos expressavam as preocupações mais urgentes

acerca da questão, principalmente as dificuldades de infra-estrutura do sistema

de saúde pública relacionados a assistência, diagnóstico e prevenção.

É importante assinalar que os debates científicos produzidos em Confe-

rências Internacionais influenciaram a expansão dessas respostas, contribuindo

assertivamente para a distribuição de antiretrovirais na rede pública, também

conhecidos como “coquetel”, fazendo com que a Aids passasse a ser vista

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como uma doença “tratável”, revitalizando e dando credibilidade ao cenário

nacional em relação à mesma.

Assim, a resposta brasileira à epidemia, a partir de uma percepção

integrada do Governo, da mobilização das ONG, da divulgação e/ou denúncias

da mídia, da pressão e do compromisso dos profissionais de saúde, formalizou

a necessidade da compra de medicamentos antiretrovirais, disponibilizando-os

para os serviços públicos de saúde. Esta medida de acesso universal aos

medicamentos pelos pacientes portadores de HIV/Aids resultou na evidente

queda de mortalidade pela doença.

Cabe ressaltar que o acesso aos medicamentos e, posteriormente, a

produção local dos genéricos, a negociação de preços e a quebra de patentes,

associados à intensa política de prevenção nos serviços de saúde e nas

comunidades, traz novamente a foco a questão dos direitos humanos à saúde,

garantindo melhoria na qualidade de assistência.

Também é notório o papel executado pelos indivíduos afetados pelo

HIV/Aids e seus familiares, que aproximaram o entendimento da saúde coletiva

à questão da solidariedade, construindo um movimento em prol do acesso

universal aos serviços de saúde e aos direitos trabalhistas, evitando a

discriminação dos cidadãos e favorecendo a prevenção contínua.

Essas ações e a política de cooperação e interlocução

internacional, acrescidas de ações intersetoriais, fizeram com que o Brasil

assumisse responsabilidades e adotasse atitudes exemplares, contribuindo

para o fortalecimento e a sustentabilidade do programa brasileiro frente à

epidemia da Aids.

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É importante sublinhar que a integralidade das ações de saúde, ao lado

da gestão descentralizada, do controle social e da articulação entre saúde e

direitos humanos, são princípios norteadores das políticas de Aids no País.

Para atendê-los, é fundamental formular uma agenda política dinâmica que

discuta o papel do Estado, o desenvolvimento do SUS, a qualidade e a garantia

do que construímos.

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2.4- ESTRATÉGIAS DE PROMOÇÃO DE SAÚDE E PREVENÇÃO DO HIV /Aids

O campo da saúde pública teve sua origem no final do século XVIII,

marcado por uma ação política da medicina, bem como por uma dimensão

social das enfermidades.

A concepção de saúde coletiva constituiu-se a partir de uma crítica ao

caráter pretensamente universalista e naturalista do saber médico. Para ela, a

problemática da saúde é mais abrangente e complexa que a leitura realizada

pela medicina, considerando que categorias como “normal”, “anormal” e

“patológico”, dentre outras, estão imbuídas de valores. Conforme observou

Birman (1991, p.9),

A saúde é marcada num corpo que é simbólico, onde está

inscrita uma regulação cultural sobre o prazer e a dor, bem como ideais estéticos e religiosos. Destacando assim, nas diversas sociedades, o corpo simbólico, as representações da vida e da morte, do normal e do anormal, as práticas sanitárias não podem silenciar sobre o tecido social, marcado pelas diferenças. O reconhecimento do caráter simbólico do corpo impede a sua representação como apenas uma máquina anátomo-funcional, constituída por mecanismos bioquímicos e imunológicos.

É devido a isso que a construção de um discurso teórico da saúde

coletiva precisa, necessariamente, conter elementos teóricos das Ciências

Humanas. É o que se tem observado no mais recente discurso da

epidemiologia, considerando tanto os saberes biológicos quanto os sociais,

sobretudo no que diz respeito à sexualidade humana. Em função dessa nova

dimensão da saúde, no discurso da saúde coletiva é que se realizou uma

verdadeira inflexão no conceito de saúde.

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Face à consideração de que o conceito de saúde implica não apenas

aspectos biológicos, mas também humanos simbólicos, históricos e sociais, o

discurso da saúde coletiva adotou um caráter multidisciplinar que, por sua vez,

levou a uma mudança da própria problemática da saúde, de apenas “boas

condições biológicas” para a saúde em relação com a natureza e a cultura

(BIRMAN, op cit., p.10).

A idéia de saúde coletiva constituiu-se num processo histórico, desde as

campanhas sanitárias do final do século XIX e início do século XX, quando se

registrou uma expansão das doenças infecto-contagiosas, levando ao

desenvolvimento de esforços no sentido de uma sistematização teórica do

conceito de “risco”. Das campanhas sanitárias da época aos sistemas de

vigilância epidemiológica propostos em meados dos anos 70, chegou-se à

atualidade, com o debate sobre a “integração” entre vigilância epidemiológica e

vigilância sanitária.

Nos anos 80, com o Sistema Único Descentralizado de Saúde (SUDS), o

debate sobre a ampliação do objeto da vigilância epidemiológica sofreu uma

intensificação a partir de uma reflexão sobre a fragilidade dos órgãos federais e

estaduais nessa ação. A Constituição de 1988 incorporou mudanças quanto ao

papel do Estado na questão da saúde, estabelecendo nos Artigos 196 e 200

que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, instituindo, a seguir, o

Sistema Único de Saúde (SUS).

Na seqüência, discute-se uma das diretrizes básicas do SUS, a

integralidade, caracterizada como uma forma de atendimento que deve ser

incorporada ao cotidiano dos serviços de saúde. A esse respeito, resgata-se o

pensamento de Mattos (2003, p.41):

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Em uma perspectiva mais teórica, pode-se dizer que integralidade não é apenas uma diretriz do SUS definida constitucionalmente. Ela é uma “bandeira de luta”, parte de uma “imagem objetivo”, um enunciado de certas características do sistema de saúde, de suas instituições e de suas práticas. A integralidade tenta falar de um conjunto de valores pelos quais vale lutar, por se relacionarem ao ideal de uma sociedade mais justa e mais solidária.

Segundo Mattos (2003), quando se compara a integralidade com uma

imagem objetiva, tem-se em mente a direção que se quer imprimir à

transformação da realidade, que parte de um pensamento crítico que se recusa

a reduzir a realidade ao que ‘existe’, que se indigna com algumas

características do que ‘existe’, e almeja superá-las não sendo, no entanto,

nunca detalhada, pois não se trata de um projeto especificado a priori.

Um primeiro aspecto de integralidade relaciona-se com a idéia de

medicina integral. Segundo esta, o conhecimento médico deve evitar a

especialização ao extremo, que leva a uma prática tanto fragmentária quanto

reducionista. É nesse sentido que o movimento de medicina integral tem

procurado propor reformas curriculares, transformar o aprendizado em sua

acepção do que é básico, seja na introdução de conhecimentos relativos ao

adoecimento, seja na relação médico-paciente, bem como os relativos à

sociedade e aos contextos culturais.

Mattos (2003, p.46) afirma:

Portanto, para a medicina integral, integralidade teria a ver com uma atitude dos médicos que seria desejável, que se caracterizaria pela recusa em reduzir o paciente ao aparelho ou sistema biológico que supostamente produz o sofrimento e, portanto, a queixa desse paciente.

No entanto, no Brasil, a medicina integral associou-se ao movimento da

medicina preventiva, locus privilegiado de resistência à ditadura militar,

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concomitante com o nascimento da Saúde Coletiva, propiciando uma

significativa renovação teórica. De fato, em sua crítica à saúde pública

tradicional, acabou “reconfigurando o eixo de interpretação típico da medicina

integral” (op cit, p. 46). O autor (op.cit., p.49) complementa afirmando que:

A atitude do médico que, diante de um encontro com o paciente motivado por algum sofrimento, aproveita o encontro para apreciar fatores de risco de outras doenças que não as envolvidas no sofrimento concreto daquele paciente, e/ou investigar a presença de doenças que ainda não se expressaram em sofrimento, ilustra um dos sentidos de integralidade.

Um segundo aspecto da integralidade está associado à organização dos

serviços de saúde. A integralidade realiza uma crítica à forma dicotomizada do

sistema de saúde anterior ao SUS, em que os técnicos da Previdência

processavam a demanda por atendimento médico, buscando viabilizá-lo, e o

Ministério da Saúde definia as estratégias de enfrentamento dos problemas

relativos à saúde pública. Da crítica à organização do sistema de saúde surgiu

uma concepção de programação dos serviços de saúde de forma horizontal.

Nesse sentido, integralidade também consiste num “modo de organizar o

processo de trabalho de modo a otimizar o seu impacto epidemiológico”

(MATTOS, 2003, p.56). Nessa linha de raciocínio, e de acordo com o autor,

a equipe de serviços definia para segmentos da população (geralmente divididos em faixas etárias) quais seriam as atividades a serem programadas, priorizando algumas doenças e agravos freqüentes na população e passíveis de ações preventivas e/ou de controle. As diretrizes deveriam guiar o trabalho dos diversos profissionais e incidiam sobre a recepção da unidade, sobre o agendamento de atividades, sobre o elenco das atividades realizadas e sobre o protocolo de realização de atividades.

Um outro aspecto da integralidade está relacionado ao que se denomina

“políticas especiais”. Tais políticas consistem em ações visando a solução de

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um problema específico de saúde que atinge um grupo populacional. Um

exemplo desse tipo de política pode ser observado na saúde da mulher,

pensada dentro de sua perspectiva de vida: passou a haver uma preocupação

com a sua saúde, tendo em vista um útero grávido ou não, desprendendo a

figura da mulher de sua imagem maternal uma vez que, na sociedade

contemporânea, segundo Mattos (2003), a maternidade não é prioritária para a

mulher e, sendo assim, cada vez mais tem decrescido o índice de natalidade.

No Brasil, a política que mais se aproximou do princípio de integralidade

foi a de combate à Aids e, nesse sentido, conforme observou o autor (op.cit.,

p.60),

a resposta governamental brasileira destoou de uma série de recomendações emanadas das agências internacionais, como o Banco Mundial, sobre as políticas frente à Aids. Em geral, tais recomendações defendiam que os governos deveriam se empenhar na oferta de intervenções preventivas, consideradas altamente eficazes em termos de custo, deixando de financiar ou prover algumas intervenções como o uso de antiretrovirais. A resposta brasileira, entretanto, norteou-se pelo princípio da integralidade, de modo que o governo assumiu a responsabilidade de distribuir gratuitamente os antiretrovirais aos pacientes com a doença, sem descuidar das práticas preventivas.

O acolhimento é também uma forma de atenção à saúde do usuário nos

sistemas públicos de saúde, entendido como uma abertura para a demanda, e

de responsabilidade por todos os problemas de saúde de uma dada região.

Segundo Merhy (1994, p. 141), o acolhimento prevê:

1. Atender a todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, garantindo-lhes acessibilidade universal; 2. Reorganizar o processo de trabalho, de forma a que equipe multidisciplinar se encarregue de escutar o usuário, comprometendo-se a resolver o seu problema de saúde; 3. Qualificar a relação do profissional-usuário, que deve se pautar por parâmetros humanitários, de solidariedade e de cidadania.

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Nesse sentido, o acolhimento apresenta-se como possibilidade de

verificar como se desenvolve a relação usuário / serviço no que diz respeito à

acessibilidade, considerando que o acolhimento somente é possível numa

gestão participativa, onde vigorem princípios democráticos e interativos,

indispensáveis para que o usuário adquira confiança e respeito pela equipe de

saúde e pelo serviço. Eis as palavras de Campos (1994, p.50-51) alusivas ao

exposto:

As instituições de saúde deveriam existir tanto para ajudar cada cliente a melhor utilizar os recursos próprios, partindo sempre do reconhecimento da vontade e desejo de cura de cada um, como par oferecer recursos instituicionais também voltados par melhorar as condições individuais e coletivas de resistência a doença. Desse sentido todo esforço voltado para aumentar a capacidade da autonomia do paciente para melhorar seu entendimento do próprio corpo, da sua doença, das suas relações com o meio social e, em consequência, da capacidade de cada um instituir normas que lhe ampliem as possibilidades de sobrevivência e a qualidade de vida ... urgiria trazer par o rotineiro espaço da prática clínica a valorização da fala e da escuta.

O acolhimento leva diretamente ao aconselhamento, entendido como um

diálogo centrado no usuário, baseado numa relação dinâmica de ‘estar com’

(ROGERS, 1942). Visa proporcionar à pessoa, através de um processo de

escuta e reflexão, a capacidade de percepção e avaliação dos próprios riscos e,

nesse processo, resgatar os recursos internos que lhe possibilitem reconhecer-

se como sujeito da própria saúde e da sua transformação. Para tanto, torna-se

importante que ela reflita e adote maneiras realistas de enfrentar seus

problemas relacionados ao HIV/Aids.

A epidemia do HIV/Aids propiciou um terreno fértil para a aplicação da

técnica do aconselhamento, determinando modos de intervenção pautados na

reflexão individual e na responsabilidade individual e coletiva, tornando-se uma

estratégia relevante na prevenção e no tratamento da doença. No início, países

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como a Inglaterra e os Estados Unidos já dispunham de serviços de

aconselhamento destinados a grupos minoritários, dentre os quais homens que

faziam sexo com homens e usuários de drogas. Com a expansão da epidemia,

essas ações ampliaram-se, incorporando o apoio psicológico às pessoas

afetadas pelo HIV/Aids como suporte emocional para o diagnóstico,

manifestações de doenças oportunistas e adesão às terapias medicamentosas,

além de atendimento aos seus familiares.

O aconselhamento está embasado em teorias e técnicas da Psicologia,

compreendendo-se que os indivíduos possuem capacidades e potencialidades

passíveis de serem desenvolvidas mediante processo reflexivo e dialógico.

Segundo Rogers (1942, p. 5), objetiva “oferecer assistência [ao usuário] na

modificação de suas atitudes e comportamento”, numa relação de ajuda.

No Brasil, o aconselhamento ganhou força dentro da prática de

psicologia clínica. Na proposta de Rogers, o aconselhamento é um processo

que necessita de uma duração certa, de várias sessões, podendo ocorrer tanto

individualmente como em grupos (MIRIM e PASSARELLI, 1998, p.7).

Consultando Scheffer (1986, p. 14), verificamos que a autora define o

aconselhamento como “uma relação face a face de duas pessoas, na qual uma

delas é ajudada a resolver dificuldades de ordem educacional, profissional, vital,

e a utilizar melhor os seus recursos pessoais”.

O Ministério da Saúde (BRASIL, 1997, p. 41) utiliza a seguinte definição

para aconselhamento:

É um processo de escuta ativa, individualizado e centrado no cliente. Pressupõe a capacidade de estabelecer uma relação de confiança entre os interlocutores, visando o resgate interno do cliente, para que ele mesmo tenha possibilidade de reconhecer-se como sujeito da sua própria saúde e transformação.

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Segundo Freire (1999, p. 145), “escutar o Outro não é só ouvir os sons

emitidos. É ouvir a voz de dor e das necessidades, recolhê-la, entendê-la,

comparti-la, e devolvê-la”.

Em se tratando de aconselhamento em HIV/Aids, trata-se de um

processo dinâmico entre profissional e usuário, em que a escuta é privilegiada,

servindo para identificar, refletir e analisar situações de exposição ao risco de

adquirir o HIV, buscando soluções para a redução de riscos.

Na fase da testagem realizada no CTA, o aconselhamento é visto como

uma oportunidade de atuar junto a indivíduos e/ou grupos, divulgando as

informações contextuais e circunscritas à transmissão e prevenção do HIV/Aids.

É evidente que a prática do aconselhamento no CTA não pode ser

compreendida como psicoterapia, já que a composição das equipes desses

serviços é multiprofissional, embora se reconheça a relevância da atuação do

psicólogo junto ao portador da infecção pelo HIV.

Na rotina do CTA, a decisão de submeter-se a um exame anti-HIV

mobiliza diversos conteúdos da história do indivíduo, trazendo à tona seus

medos relacionados a comportamentos e atitudes adotados ao longo da vida,

agora considerados como de risco.

Assim sendo, incluir o aconselhamento como estratégia de percepção,

avaliação, prevenção e redução de risco leva a compreendê-lo como

possibilidade de encontro do sujeito com a sua história e de resignificação de

comportamentos. E o papel do profissional no aconselhamento é o de ouvir as

preocupações do indivíduo, propor questões que facilitem a sua reflexão e a

superação de bloqueios, prover informação, apoio emocional e ajudá-lo a se

decidir por medidas preventivas na busca de melhor qualidade de vida

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(BRASIL, 2003). Neste processo educativo e reflexivo, o indivíduo passa a ser

entendido como sujeito promotor da própria saúde.

Estão descritas, a seguir, as diversas etapas de aconselhamento previs-

tas para os CTA, segundo o Manual de Aconselhamento do PN-DST/HIV/Aids.

� Aconselhamento Coletivo

Trata-se de um momento predominantemente informativo, que também

deve ser considerado como uma oportunidade de acolhimento e

estabelecimento de vínculo entre o cliente e o serviço de saúde. Sempre será

garantido o espaço do usuário para que ele exponha seus conhecimentos e

dúvidas. Durante a realização do aconselhamento coletivo (BRASIL, 1997,

p.15), o profissional de saúde deverá:

� Resguardar a privacidade de cada membro do grupo;

� Identificar e acolher a demanda do grupo;

� Utilizar linguagem compatível com a cultura dos participantes;

� Trocar informações sobre o sistema de teste e janela imunológica;

� Trocar com o grupo informações sobre o significado dos possíveis

resultados do teste;

� Considerar com o grupo o impacto dos possíveis resultados do teste;

� Reforçar a diferença entre HIV e Aids;

� Reforçar a necessidade de adoção de práticas seguras frente ao HIV

e outras DST;

� Estimular o grupo a ponderar a realização ou não do teste;

� Considerar com o grupo possíveis reações emocionais que venham a

ocorrer durante o período de espera do resultado do teste;

� Explicar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para o

consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de

limpeza e desinfecção de seringas e agulhas.

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� Aconselhamento Individual

Este tipo de aconselhamento pode ocorrer em dois momentos distintos:

antes da realização do teste anti-HIV, ou após, quando o cliente retorna ao

serviço para receber o resultado do exame. Muitas vezes, entre a incerteza de

fazer ou não o teste e frente à dúvida da condição sorológica, emergem

sentimentos e questionamentos sobre situações e experiências sexuais

vivenciadas.

De acordo com o atual Manual de Aconselhamento (BRASIL, 1997, p. 14-

18), os conteúdos dividem-se em: procedimentos gerais, pré-teste e pós-teste

diante de resultados negativo, positivo ou indeterminado. A seguir, a descrição

de cada conteúdo:

� Procedimentos Gerais

� Reafirmar o caráter confidencial e o sigilo das informações

prestadas;

� Identificar com certeza a demanda do cliente;

� Prestar apoio emocional ao cliente;

� Facilitar ao cliente a expressão de sentimentos;

� Identificar as crenças e valores do cliente acerca de DST/HIV/Aids;

� Utilizar linguagem compatível com a cultura do cliente;

� Trocar informações sobre DST e HIV/Aids, suas formas de

transmissão, prevenção e tratamento, com ênfase para as situações

de risco do cliente;

� Ajudar o cliente avaliar e a perceber seus riscos de infecção pelo HIV

e outras DST;

� Identificar barreiras para a mudança das situações de risco;

� Contribuir para a elaboração de um plano viável de redução de

riscos;

� Explicar o benefício do uso correto do preservativo e demonstra-lo;

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� Avaliar possíveis dificuldades quanto ao uso do preservativo e sua

superação;

� Avaliar e recomendar a possibilidade de outras práticas sexuais

seguras;

� Ajudar o cliente a reconhecer suas responsabilidades e

possibilidades de lidar com seu problema;

� Lembrar que o consumo de álcool e outras drogas, lícitas e ilícitas,

pode alterar a percepção de risco;

� Estimular a auto-estima e a auto confiança do cliente;

� Favorecer o fim de estigmas, mitos e preconceitos relacionados com

DST e HIV/Aids;

� Estimular a disseminação das orientações recebidas;

� Encaminhar o cliente para outros serviços de assistência, incluindo

grupos comunitários de apoio, quando necessário.

� Pré-teste

� Reafirmar o caráter voluntário e confidencial da testagem;

� Identificar o motivo da testagem;

� Verificar histórico anterior de testagem e riscos;

� Trocar informações sobre o sistema de teste e janela

imunológica;

� Trocar com o cliente informações sobre o significado dos

possíveis resultados do teste;

� Reforçar para o cliente a diferença entre HIV e Aids;

� Considerar com o cliente o impacto em sua vida dos

possíveis resultados do teste;

� Sondar qual o apoio emocional e social disponível ao

cliente (família, parceiros, amigos, trabalho e outros);

� Avaliar com o cliente a realização ou não do teste;

� Considerar com o cliente possíveis reações emocionais

que venham a ocorrer durante de espera do resultado do teste;

� Reforçar a necessidade de adoção de práticas seguras frente ao

HIV, também nesse período.

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� Pós-teste

Diante de Resultado Negativo

� Lembrar que um resultado negativo significa que a pessoa não está

infectada ou está infectada tão recentemente que não produziu

anticorpos necessários para a detecção do teste;

� Lembrar que um resultado negativo não significa imunidade;

� Avaliar a possibilidade de o cliente estar em janela imunológica e a

necessidade de retestagem;

� Reforçar as práticas seguras já dotadas ou a serem adotadas pelo

cliente frente ao HIV;

� Reforçar o benefício do uso correto do preservativo e demonstrá-lo;

� Reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para o

consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correta de

limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário.

Diante de Resultado Positivo

� Permitir ao cliente o tempo necessário para assimilar o impacto do

diagnóstico e expressar seus sentimentos;

� Conversar sobre sentimentos e dúvidas, prestando o apoio

emocional necessário; estar atento para o manejo adequado de

sentimentos comuns, tais como raiva, ansiedade, depressão, medo,

negação e outros;

� Desmistificar sentimentos que associam HIV/Aids à culpa, à punição,

à degenerescência, à morte e a outros;

� Lembrar que um resultado positivo significa que a pessoa é

portadora do vírus, podendo ou não estar com a doença

desenvolvida;

� Enfatizar que, mesmo sendo um portador assintomático, o cliente

pode transmitir o vírus para outros;

� Reforçar a importância de acompanhamento médico, ressaltando

que a infecção é tratável;

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� Reforçar a necessidade de adoção de práticas seguras para a

redução de riscos de reinfecção pelo HIV e por outras DST;

� Reforçar o benefício do uso correto do preservativo e demonstra-lo;

� Reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para

o consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de

limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário;

� Enfatizar a necessidade de o resultado ser comunicado ao(s)

parceiro(s) atual (is), oferecendo ajuda, caso seja solicitada;

� Orientar quanto à necessidade de o(s) parceiro(s) atual(is)

realizar(em) teste anti-HIV;

� Definir com o cliente os serviços de assistência necessários,

incluindo grupos comunitários de apoio.

Diante de Resultado Indeterminado

� Lembrar que o resultado indeterminado significa (1) um falso positivo

devido a razões biológicas ou (2) um verdadeiro positivo infectado

recentemente, cujos anticorpos não estão plenamente

desenvolvidos.

� Reforçar a adoção de práticas seguras de riscos de infecção

pelo HIV e por outras DST.

� Reforçar o benefício do uso correto do preservativo e

demonstrá-lo.

� Reforçar os benefícios do uso exclusivo de equipamentos para

o consumo de drogas injetáveis e demonstrar o método correto de

limpeza e desinfecção de seringas e agulhas, caso seja necessário.

� Orientar a realização de nova coleta para retestagem, no

período definido pelo laboratório.

� Considerar com o cliente possíveis reações emocionais que venham

a ocorrer durante o período de espera do resultado do teste e

encaminhá-lo par apoio psicológico, se necessário.

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Importa destacar situações específicas como o aconselhamento e a

prevenção das DST para usuários de drogas injetáveis; para mulheres, acerca

da saúde sexual e reprodutiva; para mulheres que fazem sexo com mulheres;

para mulheres soropositivas visando a prevenção da transmissão vertical; para

homens com questões específicas, para homens que fazem sexo com homens;

para homens e mulheres em situação de parceria fixa; para parcerias fixas com

parceiros eventuais e multiplicidade de parceria; para casais sorodiscordantes;

para situações de qualquer tipo de violência e outras questões que permeiam o

ciclo de vida das pessoas.

2.5 - Políticas de Prevenção do HIV/Aids

e Promoção da Saúde

O ideal da saúde pública de redirecionar as práticas de saúde, nas duas

últimas décadas, articula-se em torno da idéia de prevenção e promoção da

saúde. Sabe-se que a promoção da saúde é um dos elementos primários em

medicina preventiva; visa resgatar, com um novo discurso, o pensamento

médico-social do século XIX, expresso nas obras de autores como Virchow,

Villermée e Chardwick, dentre outros, que afirmam a relação entre saúde e

condições de vida (BUSS apud CZERESNIA, 2003, p.39).

Atualmente, dentro do contexto das sociedades capitalistas neoliberais,

surge o discurso de promoção da saúde pública, cujo eixo básico é o

fortalecimento da idéia de autonomia dos sujeitos e dos grupos sociais em

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relação à própria saúde com qualidade de vida. A perspectiva conservadora da

promoção da saúde reforça a tendência de diminuição do papel do Estado,

delegando aos sujeitos a responsabilidade sobre si mesmos.

Outra dimensão do discurso de promoção de saúde é ressaltar a

elaboração de políticas públicas intersetoriais, enfatizando as condições de vida

e de trabalho que conformam a estrutura subjacente aos problemas de saúde

(CZERESNIA, 2003). Com isso, a promoção da saúde alcança uma

abrangência muito maior do que a que circunscreve o campo específico da

saúde, incorporando para além das questões biológicas, as psicológicas e as

sociais.

Segundo Sabrosa apud Czeresnia (2003, p.40), a saúde pública é

definida como campo de conhecimento e de práticas institucionais orientadas à

promoção da saúde das populações. São práticas que se organizam em torno

de conceitos de doença, mas não levam em conta que esses são uma

construção mental do adoecer como experiência de vida. As palavras de

Czeresnia (2003, p.42), transcritas abaixo, confirmam o que foi dito:

A saúde e o adoecer são formas pelas quais a vida se manifesta. Correspondem a experiências singulares e subjetivas impossíveis de serem reconhecidas e significadas integralmente pela palavra. Contudo, é pela palavra que o doente expressa seu mal- estar, da mesma forma que o médico dá significação às queixas do paciente. É na relação entre a ocorrência do fenômeno concreto do adoecer ,a palavra do paciente e a do profissional de saúde, que ocorre a tensão remetida à questão que se destaca aqui. Esta situa-se entre a subjetividade da experiência da doença e a objetividade dos conceitos que lhe dão sentido e propõe intervenções para lidar com semelhante vivência.

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Para saber o que diferencia a promoção da prevenção de saúde, é

preciso conhecer o contexto de transformações contemporâneas do discurso

da saúde pública. Estas transformações, internas à lógica do discurso, também

repensam os limites e os sentidos do conhecimento produzido nas práticas de

saúde.

O termo “prevenir” significa “preparar, chegar antes de” (FERREIRA,

1985, p.1133). Sendo assim, e de acordo com Leavell & Clarck apud Buss

(2003, p. 17-18), a prevenção em saúde exige uma ação antecipada, baseada

no conhecimento da história natural do paciente, a fim de tornar improvável o

progresso da doença. Daí serem as ações preventivas definidas como

intervenções orientadas para evitar o surgimento de doenças específicas, ao

reduzir sua incidência e prevalência nas populações.

A base do discurso preventivo é o conhecimento epidemiológico

moderno, e seus objetivos são controlar a transmissão de doenças infecciosas

e reduzir o risco de doenças degenerativas ou outros agravos específicos. A

prevenção e a educação em saúde estruturam-se mediante a divulgação de

informações científicas e recomendações normativas de mudanças de hábitos.

“Promover” tem o significado de “dar impulso, fomentar, originar, gerar”

(FERREIRA, 1985, p. 1145). Promoção em saúde diz respeito a medidas para

aumentar e garantir plena saúde e bem-estar aos indivíduos, articuladas à

qualidade de vida e ao direito à saúde, além de solidariedade e eqüidade,

dentro de uma lógica que envolva questões econômicas, sociais e políticas,

demandando uma abordagem intersetorial. A amplitude da saúde assumiu

destaque na VIII Conferência Nacional de Saúde (BRASIL, 1988), como se vê a

seguir:

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Direito à Saúde significa a garantia pelo Estado de condições dignas de vida e de acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção proteção e recuperação de saúde, em todos os seus níveis a todos os habitantes do território nacional levando ao desenvolvimento pleno do ser humano em sua individualidade.

Infere-se que promover a saúde em suas múltiplas esferas envolve tanto

as ações de âmbito global do Estado, como a singularidade e a autonomia dos

sujeitos, o que não pode ser atribuído somente à responsabilidade de uma área

de conhecimento ou prática. O conhecimento científico e a possibilidade

operativa das técnicas, nas práticas de saúde, precisam ser empregados sem

provocar a desconexão da sensibilidade em relação aos corpos doentes.

Os projetos de promoção de saúde usam conceitos clássicos que

orientam a produção do conhecimento específico em saúde (doença,

transmissão e risco), cuja racionalidade é a mesma do discurso preventivo.

A idéia de promoção envolve o fortalecimento das capacidades

individual e coletiva para lidar com a multiplicidade dos condicionantes da

saúde. A promoção vai além da aplicação técnica e normativa, mas é preciso

aceitar o fato de que não basta conhecer o funcionamento das doenças e

encontrar mecanismos para seu controle.

A expressão “promoção da saúde” surgiu na metade dos anos 40, com

Sigerist, ao definir as quatro tarefas maiores da medicina: promoção da saúde,

prevenção da doença, recuperação do enfermo e reabilitação (BUSS apud

CZERESNIA, 2003, p. 17). Quanto ao movimento de promoção da saúde,

surgiu no Canadá, em 1974, com a divulgação do Informe Lafonde (BUSS apud

CZERESNIA, 2003, p.22), cuja motivação central

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parece ter sido política, técnica e econômica pois visava enfrentar os custos crescentes da assistência médica ao mesmo tempo em que se apoiava no questionamento da abordagem exclusivamente médica para as doenças crônicas devido aos resultados pouco significativos que aquela apresentava, tendo como motivação central o enfrentamento dos custos crescentes da assistência médica.

Na década de 80, com a crise da saúde pública, a promoção da saúde

passou a se constituir na espinha dorsal da nova saúde pública. Esta crise

surgiu, por um lado, das limitações financeiras de um Estado provedor, e do

fato de a sociedade precisar suportar, por tempo indefinido, o aumento dos

custos da atenção médica; e por outro lado, diante da constatação de que este

tipo de atendimento seria incapaz de prover as necessidades individuais e

coletivas, de modo a resultar em maior bem-estar e aumento da produtividade

social.

Para um grupo de estudiosos, a promoção da saúde restringe-se às

atividades direcionadas à transformação do comportamento e do estilo de vida

dos indivíduos, concentrando-se em programas cujo enfoque é evitar riscos que

estejam, mesmo que parcialmente, sob controle dos próprios indivíduos. Nessa

ótica, a saúde é vista como um recurso para o cotidiano, cabendo à promoção

da saúde contribuir para que eles possam desenvolver habilidades que lhes

permitam alcançar seu potencial e responder positivamente aos desafios da

vida.

Para outro grupo, a promoção da saúde não apenas possibilita o

desenvolvimento de habilidades individuais e comunitárias, mas também uma

intervenção ambiental através de um amplo conjunto de meios políticos,

legislativos, fiscais e administrativos, os quais devem ser intersetorialmente

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mais integrados, focando uma articulação maior da saúde com vários outros

domínios de conhecimento, mediante constante diálogo entre eles.

Nesta conceituação, a promoção da saúde está ligada ao coletivo e aos

indivíduos, em uma perspectiva ampla, incluindo não só o físico, o social, mas

também o político, o econômico e o cultural. Quanto às estratégias de

promoção da saúde, devem ser adotadas de acordo com as políticas públicas

vigentes, e dentro de condições favoráveis ao desenvolvimento da saúde

(BUSS, 2000, p.33). Modernamente, o que vem a qualificar a promoção da

saúde é a constatação do papel protagônico dos determinantes gerais sobre as

condições de saúde.

Ainda segundo Buss (op.cit.), o enfoque à promoção à saúde é mais

amplo e abrangente, procurando identificar e enfrentar os macrodeterminantes

do processo saúde-doença, buscando transformá-los favoravelmente. Assim,

fortalece-se a saúde por meio da construção de capacidades de escolha, a

partir do conhecimento sobre riscos e doenças, atentando para as diferenças e

singularidades dos indivíduos. A esse respeito, transcreve-se a opinião de

Czeresnia (2003, p.50):

O desenvolvimento dos estudos de risco esteve vinculado a um processo cultural construtor de um homem individualista, que enfrentou a necessidade de lidar com as forças desagregadoras da natureza e da sociedade por intermédio da lógica da ordem e da proteção, ao passo que pouco investiu no amadurecimento das relações com o outro mediante o fortalecimento de sua vitalidade e autonomia.

Promover saúde envolve uma escolha que não está só na esfera do

conhecimento, e termos como vulnerabilidade vêm sendo desenvolvidos e

utilizados, com freqüência, no contexto de propostas de promoção de saúde.

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Vulnerabilidade engloba a articulação de três componentes: o individual, que

envolve a qualidade de informação que os indivíduos dispõem sobre o

problema; o social, que se refere à obtenção de informações, possibilidades de

metabolizá-las e poder de incorporá-las a mudanças práticas, o que não

depende só dos indivíduos, mas de aspectos como acesso aos meios de

comunicação, escolarização, disponibilidade de recursos materiais, poder de

influenciar decisões políticas, possibilidade de enfrentar barreiras culturais,

estar livre de coerções ou poder defender-se delas; e o programático, que se

refere aos recursos disponíveis destinados aos indivíduos, de forma efetiva e

democrática, ajudando-os a não se exporem às doenças. Portanto, quanto

maiores o grau e a qualidade do compromisso, dos recursos, da gerência e do

monitoramento de programas nacionais, regionais ou locais de promoção e

cuidado com a saúde, maiores serão as chances de otimizar o seu uso e de

identificar a necessidade de novos recursos e, desta maneira, ajudar os

indivíduos a ficarem menos vulneráveis diante da epidemia (AIRES et al. apud

CZERESNIA, 2003, p.122).

O surgimento da epidemia de Aids, no início da década de 80, como

descrito anteriormente, tem características culturais e sociodemográficas que

assumem diferentes faces nas diversas populações. As atividades de

prevenção do HIV/Aids envolvem não somente evitar o surgimento de novos

casos de infecção pelo vírus, mas também a reinfecção de soropositivos, o

impedimento da ocorrência de infecções oportunistas, o retardamento do

desenvolvimento da imunodeficiência e o combate à discriminação e à restrição

dos direitos humanos e de cidadania.

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As formas de transmissão do HIV com maior importância epidemiológica,

tais como relações sexuais não protegidas ou compartilhamento de seringas,

dependem de ações de indivíduos para que se concretizem. Porém, não é fácil

reduzir essas modalidades de transmissão, por falta de uma educação

conscientizadora da população.

Sendo assim, um programa de prevenção que não seja acompanhado de

medidas de cuidado direcionadas aos portadores de HIV/Aids para evitar o

crescimento da epidemia, corre o risco de ineficácia e, neste caso, o programa

de prevenção brasileiro é modelar.

As propostas de educação em saúde para a prevenção do HIV/Aids

que devem orientar as práticas, permanecem sujeitas a algumas premissas

da psicologia comportamentalista. Teorias de comportamento disponíveis

para educadores e profissionais de saúde, incluindo os aconselhadores para

o HIV/Aids, enfocam constantemente o processo de mudança. No Brasil,

essa tendência tem embasado as práticas de prevenção e aconselhamento,

tornando-se visível nos movimentos sociais e de saúde. Trata-se de uma

atividade dinâmica, sempre discutida à luz das recomendações da PN-

DST/Aids.

Caminhos que responsabilizam os indivíduos em relação ao cuidar da

própria saúde têm sido considerados, a exemplo do uso do preservativo nas

relações sexuais, das negociações com as parcerias, do uso não

compartilhado de drogas injetáveis, sempre entendendo o contexto pessoal e

social de cada um, além da experiência viva das pessoas. Portanto, o seu

desenvolvimento para tornar-se sujeito da própria saúde, mantendo relações

conscientes e negociadas, considerando valores individuais, familiares e

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sociais, é percurso imprescindível para alcançar a cidadania, a prevenção e a

promoção da saúde (PAIVA, 1998).

No caso específico da epidemia do HIV, onde as pessoas têm que se

tornar não só sujeitos da sua saúde, mas garantir a sua cidadania, foram

necessárias mudanças no âmbito das pesquisas sociais, como afirma Parker

(1996, p.529):

Houve mudanças nos paradigmas das pesquisas sociais e comportamentais voltadas para o controle da epidemia com a ênfase nas dimensões sociais, política e econômica na análise das causas relacionadas à transmissão do HIV. Gradualmente, as abordagens educativas centradas na informação e na responsabilidade social foram sendo substituídas por modelos multidimensionais, orientados pela concepção de mobilização comunitária e empoderamento coletivo.

Torna-se claro que para as pessoas responderem à transformação das

práticas, é preciso que ajam como sujeitos sociais, agentes da esfera pública da

vida social. Assim sendo, intervenção estrutural, organização comunitária,

construção de cidadania, ativismo político, ação jurídica, direitos humanos,

passam a ser entendidos como partes indissociáveis das ações de educação e

prevenção. Isto porque a exposição ao vírus não é homogênea na população

em geral, e as possibilidades de mudança de práticas sociais não dependem

apenas da vontade individual, mas do contexto em que essas individualidades

se manifestam.

As políticas formuladas de controle do HIV/Aids sempre atribuíram ao

campo da prevenção um papel de destaque, justificando-se esta medida pelo

fato de inexistirem possibilidades mágicas na área biológica capazes de conter

o avanço desta epidemia.

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A questão do impacto sócio-econômico da epidemia constituiu-se em

outro argumento utilizado durante muito tempo no sentido de priorizar a

prevenção que, nesta área, teria um custo bem inferior aos demandados pelo

setor assistencial. Em outras palavras, representaria um gasto menor, se

comparada com os custos indiretos da doença – redução do potencial de anos

de vida com qualidade, e a perda de vidas humanas para as Nações. Logo, o

investimento em prevenção se justifica não somente por razões humanitárias,

mas também por ser um atributo da racionalidade econômica e da elevação da

produtividade sistêmica de um país.

Dentro desta perspectiva, foi gestada a política de prevenção à Aids no

Brasil, como elemento central da estratégia delineada, cujos objetivos para a

implantação de programas nacionais de Aids foram: prevenir a transmissão do

vírus, reduzir o impacto social e pessoal relativo ao HIV/Aids e unificar esforços

nacionais e internacionais contra a doença.

Para uma aproximação à análise do programa de prevenção, utilizaremos

a proposta concebida por Mann (1993), que foi um dos primeiros esforços para

o entendimento dos programas de prevenção, contemplando a existência de

três eixos na estruturação de programas de prevenção ao HIV/Aids, a saber:

- a informação, que ocupa um lugar privilegiado no processo de

desenvolvimento do Programa, tendo como fontes básicas para a

disseminação dessa estratégia os meios de comunicação de massa,

através das campanhas de caráter nacional com ênfase na questão

comportamental;

- a questão do comportamento individual, reforçada através da inclusão

de estratégias de abordagens do tipo ‘corpo a corpo’ identificando,

neste processo, os fatores que levariam à adoção de determinados

comportamentos, com a preocupação de integrar os esforços de

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outras instituições, além do setor da saúde, para melhor sustentar a

mudança de comportamento desejada.

- o modelo de redução de risco utilizado na política de prevenção da

Aids, que enfoca as vulnerabilidades, a percepção de risco, o

compromisso com a mudança e a realização e manutenção da ação

protetora.

Deste modo, as políticas preventivas relativizam a responsabilidade

individual, apontando que diferentes grupos sociais compartilhem valores

culturais e tenham, para isto, condições materiais de existência, o que implica

em propostas de saúde e educação. Assim, é fundamental a integração

intersetorial com outras políticas públicas.

A prevenção da saúde parte de uma concepção do processo saúde-

doença e de seus determinantes, refletindo uma reação à crescente

medicalização da vida social. Como resposta setorial articuladora de diversos

recursos técnicos e de posições ideológicas, a prevenção da saúde busca

integrar saberes técnicos e populares, além de mobilizar recursos institucionais

e comunitários, públicos e privados, para o enfrentamento do HIV/Aids.

Em relação à promoção da saúde na epidemia da Aids, a idéia é

fortalecer a autonomia dos sujeitos e dos grupos sociais, visando a conquista

dos direitos básicos de cidadania e oportunizando aos variados segmentos

sociais a diminuição de doenças, e com isso, gerando melhoria da qualidade de

vida.

Todos os esforços no sentido da prevenção da doença e da promoção da

saúde estão relacionados com a superação das desigualdades e das injustiças

sociais por meio de ações intersetoriais. Portanto, devem priorizar a formulação

de políticas públicas, reorientando os serviços para ampliarem suas ações e

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parcerias com outros programas de saúde, setores governamentais e da

sociedade civil.

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3 - OS CENTROS DE ORIENTAÇÃO E APOIO

SOROLÓGICO (COAS) E O CENTRO DE TESTAGEM E

ACONSELHAMENTO (CTA) NO BRASIL

3.1- Reconstruindo a História

Os COAS/CTA foram implantados no País no final da década de 80, pelo

Ministério da Saúde, através do Programa Nacional de DST/Aids, em resposta

ao avanço da epidemia e à indisponibilidade, na época, de serviços de saúde

preparados para receber a população que buscava realizar o teste anti-HIV.

Estes serviços têm papel fundamental na promoção da saúde, na prevenção e

no diagnóstico precoce do HIV/Aids.

Seguindo a construção da políticas para o enfrentamento da epidemia do

HIV/Aids, as primeiras recomendações técnicas e políticas necessárias à

implantação de um sistema de controle de qualidade do sangue transfundido

vêm de São Paulo, e datam de 1986, caracterizando uma medida de triagem

sorológica para o HIV. A propósito, resgata-se o relato de Teixeira (1997, p. 53):

Em junho de 1986, a Assembléia Legislativa de São Paulo

aprovou a Lei n.º 5/90 de 20/06/1986 que tornava obrigatória a

Triagem Sorológica para o HIV, de todo o sangue a ser transfundido,

no estado de São Paulo. A partir de 1997, a Secretaria de Vigilância

Sanitária da Secretaria de Saúde de São Paulo, propõe ações efetivas

de fiscalização dos procedimentos à triagem sorológica nos bancos

de sangue.

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Ressalta-se que, naquela época, as ações governamentais tinham como

foco apenas a vigilância epidemiológica, a assistência médica, as ações de não

discriminação e as de inclusão social dos indivíduos afetados pela infecção do

HIV. Mas, diante do crescimento da epidemia, consolidaram-se as diretrizes

implementadas no País, no sentido da obrigatoriedade da triagem sorológica

previstas na Lei nº 7.649, de 25/01/88 (TEIXEIRA, 1987, p.59).

As dimensões sociais, éticas e políticas da doença acentuavam-se,

alcançando a magnitude de uma epidemia. As questões da exclusão social, da

violação dos direitos humanos dos cidadãos e da moralidade tornavam-se cada

vez mais agudas, causando sério impacto na sociedade brasileira, exigindo do

Estado desdobramento assistenciais, jurídicos e psicossociais. É neste contexto

epidêmico que se desenvolvem ações judiciais em defesa da vida, já que a Aids

estava socialmente relacionada à população marginalizada e à morte civil. Este

cenário confirmou a necessidade da criação de políticas públicas e sociais

voltadas para o controle e prevenção da epidemia, em consonância com o

compromisso de promoção e de defesa do direito à saúde.

Um dos principais desafios na política de prevenção era rever os

conceitos e preconceitos da sociedade quanto à sexualidade humana. Todavia,

com base em evidências epidemiológicas, a partir da notificação oficial dos

casos de Aids, houve a imperiosa necessidade de adoção de medidas

preventivas como parte das inúmeras medidas de enfrentamento da epidemia,

a exemplo da difusão de informações sobre os modos de transmissão do HIV,

sobre o estímulo à adoção de práticas sexuais seguras e a realização de testes

sorológicos acompanhados de aconselhamento, estratégias que mereceram

grande destaque. Mesmo assim, a complexidade e a diversidade dos

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problemas desencadeados pela epidemia da Aids tornou obrigatória a oferta de

testes sorológicos para detecção da infecção pelo HIV, com aconselhamento

pré e pós-teste como medidas de prevenção e controle, realizados nos serviços

púbicos de saúde e clínicas de DST (BRASIL, 1993).

Nesse sentido, a materialização do referencial técnico para a

implantação de Centro de Orientação e Apoio Sorológico – COAS, em 1988,

através do 10º Boletim Epidemiológico do PN-DST/Aids do Ministério da Saúde,

ratificou tais iniciativas, em especial no caso dos indivíduos sob risco de

infecção pelo HIV e segundo a realidade de cada estado da Federação.

Estes serviços de saúde, designados e conhecidos inicialmente pela

sigla COAS, constituíram-se em modalidade alternativa de atenção primária à

saúde, oferecendo a possibilidade de realização gratuita da sorologia para o

HIV, garantindo a confidencialidade, o sigilo e o anonimato do teste. A

realização do teste anti-HIV, nestes serviços de saúde relacionava-se à questão

de direitos humanos.

Na organização do serviço, o processo de educação para a saúde,

através de informações relacionadas à infecção pelo HIV e do aconselhamento,

foi destacado como importante e compatível com as necessidades da

população. Era urgente a indicação da adoção de práticas sexuais e de

comportamentos sociais mais seguros, no sentido de evitar a infecção e o

crescimento da epidemia. Com a implantação dos COAS pretendia-se, também,

redirecionar a demanda de indivíduos que buscavam os bancos de sangue para

conhecer a sua sorologia.

Os COAS foram estruturados nos serviços de saúde já existentes,

preferencialmente nos que dispunham de ambulatórios ou clínicas de DST,

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desde que fornecessem aos usuários uma entrada especial e um espaço nas

instalações físicas que lhes assegurasse ao máximo o anonimato.

A existência desses serviços de saúde constituiu-se numa modalidade de

atenção simplificada, em que o oferecimento gratuito da sorologia anti-HIV

visava o esclarecimento precoce de indivíduos infectados ou não, prestando

também informações a respeito das formas de transmissão e prevenção da

doença, mediante auto-avaliação sobre o risco de infecção.

As etapas de atendimento propostas para os COAS preconizavam que o

primeiro contato com os usuários ocorresse numa sala de recepção acolhedora,

com a inclusão dos sujeitos sem discriminação e com base em informações

precisas, aplacando o medo e a ansiedade frente ao diagnóstico do HIV,

seguido de um atendimento em grupo, denominado aconselhamento coletivo.

Essa sessão poderia ser desenvolvida através da apresentação de um vídeo

educativo, monitorado por profissional de saúde de nível superior ou

aconselhador treinado em dinâmica coletiva, abordando aspectos de

transmissão/prevenção e do significado do teste sorológico e de suas

implicações. Neste aconselhamento coletivo, os profissionais problematizavam

informações relevantes sobre a epidemia, esclarecendo dúvidas e estimulando

o compartilhamento de experiências cotidianas entre os usuários.

Em salas de entrevistas individuais, ocorria o aconselhamento individual

pré-teste, personalizado, após o usuário decidir-se pela realização do teste

anti-HIV. Esta etapa consistia na percepção e avaliação de risco, mediante

obtenção de informações sobre as condições de exposição ao risco,

compreensão e promoção de práticas sexuais mais seguras relacionadas à

infecção pelo HIV, configurando-se como um espaço reflexivo, favorável à

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percepção dos usuários em relação à prevenção do HIV. Cada usuário recebia

um código numérico que lhe assegurava o anonimato.

O procedimento de coleta de sangue também recebia um código

numérico, e a amostra sangüínea era enviada a um laboratório previamente

definido. Os testes ELISA e de Imunofluorescência direta eram utilizados,

respectivamente, para triagem e confirmação diagnóstica, mas o teste Western

Blot também poderia ser realizado.

Finalmente, após trinta dias, o indivíduo retornava aos COAS para o

aconselhamento pós-teste. Os resultados do exame, sempre fornecidos

individualmente, eram seguidos de aconselhamento pós-teste, base para

reforçar e problematizar aspectos culturais e intersubjetivos, recuperando o

enfoque preventivo articulado com a proposta de comportamentos sexuais mais

seguros e de um plano viável para redução de riscos. Este aconselhamento

pós-teste também incluía o encaminhamento aos serviços de referência para

tratamento, quando necessário.

O aconselhamento pós-teste era visto como possibilidade de construção

de uma nova mentalidade, voltada para a adesão aos programas de tratamento,

confirmando que prevenção e promoção deviam caminhar juntas em todas as

etapas do tratamento, assegurando a preservação da vida do usuário e da

qualidade da mesma.

Mediante esta proposta organizacional, em 1988, funda-se em Porto

Alegre (RS), o primeiro Centro de Orientação e Apoio Sorológico - COAS (hoje

denominado CTA), um serviço de saúde voltado para a orientação, acesso a

informações sobre transmissão, medidas de prevenção, diagnóstico e

referência para tratamento do HIV.

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Em 1993, com estas diretrizes, e a partir da liberação de recursos do

Banco Mundial para o controle da epidemia da Aids, foram implantados no país

dez COAS. O PN/DST/Aids indicou alguns deles como referência nacional,

assegurando-lhes competência técnica para treinar profissionais oriundos de

diversos estados brasileiros com a missão de implantar estes serviços nas suas

regiões de origem, pela importância dos serviços que poderiam prestar às

respectivas populações locais.

O PN-DST/Aids, preocupado também com a sistematização da prática

desenvolvida pelos COAS, publica o primeiro Manual sobre o assunto, intitulado

"Normas de Organização e Funcionamento dos Centros de Orientação e Apoio

Sorológico" (BRASIL, 1993), e institui um grupo técnico formado pelos

coordenadores dos primeiros COAS (Porto Alegre, RS; Rio de Janeiro, RJ; São

Paulo, SP; Curitiba, PR; Recife, PE) com o objetivo de elaborar um currículo

mínimo para o treinamento daqueles multiplicadores (BRASIL, 1996a).

A partir desta experiência, outros estados brasileiros optaram por

implantar COAS, principalmente nos municípios mais importantes do ponto de

vista epidemiológico, seguindo orientação da então PN-DST/Aids, que

estimulou a realização de parcerias com as Secretarias Estaduais e Municipais

de Saúde nesse sentido, atendendo a diretriz de descentralização preconizada

pelo SUS, uma forma de organização que daria aos municípios o direito de

administrar os serviços de saúde locais. Neste processo, os estados, por meio

das respectivas Secretarias de Saúde, coordenavam a prestação da assistência

na sua área de abrangência, e prestavam cooperação técnica aos seus

municípios, a fim de garantir o bom desempenho destes serviços.

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Em 1996, o PN-DST/Aids mudou a sigla e o enfoque do Serviço: de

COAS para CTA - CENTRO DE TESTAGEM E ACONSELHAMENTO. Este fato

determinou o agendamento de reuniões regionais com os coordenadores de

todos os CTA que funcionavam no País, com o objetivo de rediscutir e reavaliar

estes serviços. A partir deste acontecimento, foram formuladas diversas

propostas de mudanças nos serviços prestados, dentre as quais o indicativo de

flexibilização do anonimato, considerada uma questão relevante, visto que

possibilitar a identificação do sujeito que buscava o diagnóstico, significava

acolher sua condição e disposição ao enfrentamento, tratamento e a

ressignificação da representação social da doença.

A flexibilização do anonimato e da extensão do aconselhamento com

conteúdos mais subjetivos evidenciou uma ampla variedade de possibilidades

de intervenções do CTA que, se por um lado redimensionavam sua atenção de

forma a garantir a orientação para reduzir o risco da transmissão materno-

infantil, prevenir as DST, estimular o diagnóstico das parcerias sexuais e a

adesão aos tratamentos antiretrovirais, por outro lado, extrapolava seus limites

físicos, apontando para o desenvolvimento de novas ações de prevenção com

base nos direitos humanos, de cidadania e de inclusão social junto aos sujeitos

com situações de risco acrescido (BRASIL, 1996b).

Este foi também um momento de consolidação das parcerias entre ONG,

Serviços de Saúde e Programas Estaduais e Municipais de DST/Aids, visando a

implementação dos princípios do SUS, reafirmando o ideal de Integralidade de

que este atendimento era uma forma de assistência que privilegiava a saúde, e

não a doença, e sendo assim, os serviços de saúde deviam funcionar

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atendendo ao indivíduo como ser humano integral, submetido às mais

diferentes situações de vida e trabalho que o levavam a adoecer e morrer.

Em 13 de novembro de 1996, foi promulgada a Lei Federal nº 9.313,

dispondo sobre a obrigatoriedade de acesso universal e gratuito aos

medicamentos antiretrovirais no sistema público de saúde (BRASIL, 1996),

medida que evidenciou o real impacto da epidemia, uma vez que a

possibilidade de aumento da expectativa e da qualidade de vida dos portadores

do HIV repercutiu no imaginário social como motivação para buscar

esclarecimento diagnóstico e enfrentamento de problemas dele decorrentes.

Em 1997 o PN-DST/Aids, agora com o nome de Coordenação Nacional

de DST/Aids (CN-DST/Aids), elaborou e publicou o “Manual de

Aconselhamento em DST/HIV/Aids – Diretrizes e Procedimentos Básicos”,

considerando o aconselhamento como uma prática em saúde a ser utilizada em

todos os serviços que desenvolvessem estratégias de prevenção para o

HIV/Aids. Em 2003, a CN-DST/Aids retoma a denominação de PN-DST/Aids.

O documento visava efetivar a implementação da prática do

aconselhamento nos serviços de saúde que prestavam assistência a pessoas

portadoras de DST e HIV/Aids, nos Centros de Testagem e Aconselhamento,

nos serviços de pré-natal, nas Organizações não-Governamentais e nos

projetos de prevenção junto a populações específicas. Os CTA passaram a

utilizar o “Manual de Aconselhamento em DST/HIV/Aids” com a finalidade de

auxiliar os trabalhadores de saúde que atuavam neste contexto.

A PN-DST/Aids propôs, então, a avaliação das ações de

aconselhamento em alguns serviços de saúde: Centros de Testagem e

Aconselhamento (CTA), Serviços de Assistência Especializada em HIV/Aids

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(SAE) e Serviços de Saúde que atendiam indivíduos portadores de Doenças

Sexualmente Transmissíveis (DST). O objetivo de tal avaliação pressupunha a

análise qualitativa do desenvolvimento prático, da definição de limites e

possibilidades, da qualificação da percepção de profissionais e usuários sobre o

aconselhamento, bem como das condições institucionais para a sua realização

e a proposição do redirecionamento de ações, se necessário. Neste contexto,

como conclusão do processo de avaliação, o PN-DST/Aids lançou uma

publicação intitulada "Aconselhamento: Um Desafio para a Prática em Saúde"

(BRASIL, 1999b).

A trajetória de construção dos CTA leva o PN-DST/Aids à demarcação

de novas normas de organização e funcionamento com a elaboração do Manual

"Diretrizes dos Centros de Testagem e Aconselhamento", editado em 1999

(BRASIL, 1999a), que estabeleceu para os CTA os seguintes objetivos:

� Expandir o acesso ao diagnóstico da infecção pelo HIV.

� Contribuir para a redução dos riscos de transmissão do HIV.

� Estimular a adoção de práticas seguras.

� Encaminhar as pessoas HIV-positivas para os serviços de referência,

auxiliando os usuários no processo de adesão aos tratamentos

antiretrovirais.

� Absorver a demanda por testes sorológicos nos bancos de sangue.

� Estimular o diagnóstico das parcerias sexuais.

� Auxiliar os serviços de pré-natal para a testagem sorológica de

mulheres gestantes.

� Levar informações sobre prevenção das DST/HIV/aids e do uso

indevido de drogas para grupos específicos.

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Quanto às normas organizacionais, vistas neste Manual de “Diretrizes

dos Centros de Testagem e Aconselhamento” alguns princípios foram

ratificados e outros, reformulados:

� Acessibilidade e Gratuidade: serviços com localização acessível para a

população em geral, de base gratuita, respondendo à demanda espontânea e

encaminhada.

� Anonimato flexível e Confidencialidade: testes realizados de forma anônima ou

identificados (a confidencialidade é um princípio assegurado pelos Códigos de

Ética profissionais).

� Agilidade e Resolutividade: encaminhamento interno rápido e redução do prazo

para entrega de resultado.

� Aconselhamento adequado e não pontual: processo de escuta ativa levando o

sujeito à reflexão de sua história frente aos riscos de exposição à infecção pelo

HIV/DST, com vistas à busca de alternativas de mudanças comportamentais. A

partir daí, o aconselhamento não se restringe mais aos atendimentos pontuais

pré e pós-teste.

� Referência e contra-referência: garantia de encaminhamento aos serviços de

assistência especializada, oferecendo acesso ao tratamento e monitoramento

da infecção pelo HIV (uma rede de referência assistencial deverá dar suporte à

demanda gerada).

� Equipe Interdisciplinar: tendo o CTA a missão de compreender o processo de

saúde e doença, a interface, a parceria, a cumplicidade e a

complementariedade estão presentes, compartilhando diversos saberes

profissionais para o enfrentamento da assistência no cotidiano da prática de

saúde.

Neste documento, define-se o trabalho em comunidades (inclusive o

teste anti-HIV e o aconselhamento) como "Atividades Extra-Muros", a serem

desenvolvidas pelo CTA com o propósito de expandir o acesso ao diagnóstico

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da infecção pelo HIV, mediante capacitação técnica e recursos humanos

específicos.

Também o desenvolvimento das estratégias de redução de danos em

áreas com cenas de uso de drogas injetáveis têm sido destacadas e

implementadas objetivando, através da orientação, distribuição de insumos e

troca de seringas em situações de risco direto, a redução da transmissão do

HIV e de hepatites, além da prevenção às DST, considerando o risco indireto a

que estão submetidos os usuários de drogas.

Compreende-se que a ampliação destas ações de saúde impõe uma

atenção continuada aos diversos grupos populacionais com maior

vulnerabilidade, e propõe maior poder de alcance na articulação com a

sociedade civil, englobando outros programas de saúde e permitindo maior

visibilidade em relação à atuação do CTA.

Seguindo as orientações do “Manual de Diretrizes dos Centros de

Testagem e Aconselhamento”, o PN-DST/Aids oficializou o fluxograma para o

diagnóstico do HIV (Anexo 1), nos termos da Portaria n.º 488, de 17 de junho de

1988, da Secretaria de Saúde de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde,

como forma de garantir a uniformidade e a confiabilidade dos procedimentos

para emissão de laudos dos testes para detecção anti-HIV.

A partir do segundo semestre de 1999, o PN/DST/Aids impulsionou a

realização de reuniões dos profissionais de saúde dos CTA, organizadas por

regiões do País, com vistas a assegurar discussões para implementar ações

concernentes à ampliação das estratégias de redução de risco, no sentido de

intervir na cadeia de transmissão do HIV, reforçando a atuação do CTA como

um serviço mediador entre prevenção e assistência.E foi nesse universo de

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intervenções diversificadas e enfrentamentos desafiadores que ocorreu, em

2000, a segunda reunião dos profissionais de saúde dos CTA, por regiões, com

o objetivo de sistematizar as atividades contínuas de prevenção. Nestas

reuniões, a PN-DST/Aids, a partir de uma experiência de informatização do

CTA municipal de Curitiba (PR), iniciada em 1996, lançou a proposta de um

Sistema de Informação Unificado (SI/CTA) para a totalidade dos CTA

brasileiros.

Em 2001, a proposta do SI-CTA foi implantada apenas por alguns CTA

que dispunham de equipamentos e de recursos materiais e humanos. Somente

em 2002, após a terceira etapa de reuniões regionais, a PN-DST/Aids

instrumentalizou técnicos, gestores destes serviços e representantes das

Coordenações Estaduais e Municipais de DST/Aids para utilização do SI/CTA

(SI-CTA, Manual 2002), com os seguintes objetivos:

� facilitar a organização do processo de trabalho nos CTA;

� facilitar a produção de indicadores da disponibilidade e distribuição

dos recursos de saúde (perfil da oferta de serviços), de produção /

produtividade e sua cobertura populacional;

� facilitar a produção de indicadores do perfil da demanda atendida

(espontânea e identificada por busca ativa, mediante atividades extra-

muros);

� compor o sistema de vigilância epidemiológica do HIV e propiciar a

realização de investigações científicas especiais.

Deve-se ressaltar que, desde a construção das políticas públicas que

originaram os COAS/CTA, esses serviços vêm desenvolvendo suas atividades,

durante mais de duas décadas, segundo as diretrizes preconizadas, sempre

observando as diferenças regionais.

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Sendo o CTA um espaço onde o aconselhamento privilegia as premissas

do acolhimento, as ações educativas e o compromisso ético-político, sua

importância é reconhecida pelos diversos setores institucionais, levando a

novos desafios que estimulam o repensar das ações de saúde para responder

suas demandas e contribuir no combate na epidemia do HIV.

Nestes doze anos de funcionamento do CTA/HESFA/UFRJ, o diálogo, a

ética, a transparência das ações de saúde desenvolvidas legitimou seus

serviços junto à população brasileira, mas é necessário continuar a combater a

epidemia de Aids, reduzindo sua incidência em segmentos populacionais de

risco e maior vulnerabilidade, com destaque para a população de baixa renda;

implantar o acesso ao diagnóstico das Hepatites Virais (B e C); garantir os

direitos de cidadania e melhorar a qualidade de vida dos sujeitos afetados pelo

HIV/Aids e seus familiares, além de preparar os usuários que se consideram em

risco de contrair a infecção pelo HIV informando-os, permanentemente, sobre

cuidados e promoção da saúde e da cidadania, sempre em consonância com

os princípios do SUS.

A orientação do Ministério da Saúde aponta para algumas prioridades, a

exemplo da garantia do acesso às ações de saúde na atenção básica, mediante

atendimento embasado na promoção à saúde e na perspectiva da integralidade

do SUS, medidas que devem continuar a ser potencializadas. Dentro das

políticas públicas vigentes, essas propostas reafirmam o compromisso com a

população e, conseqüentemente, com o controle da epidemia da Aids, tendo

como desafio a manutenção da qualidade da assistência que vem sendo

desenvolvida pelos CTA. Portanto, o momento atual deve ser visto como

oportunidade de criar estratégias para descentralizar o acesso à testagem anti-

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HIV e articular ações de saúde com gestores, com múltiplos Programas das

Unidades Básicas de Saúde (UBS), com profissionais de Saúde e técnicos de

laboratórios e da vigilância epidemiológicas das Secretarias de Saúde

Estaduais e Municipais.

A inclusão do aconselhamento e do diagnóstico do HIV nas rotinas dos

serviços da rede básica de saúde vai contribuir, de forma significativa, para

redimensionar o perfil social e epidemiológico do HIV/Aids, inserindo o usuário

no processo de promoção, prevenção e assistência à saúde. Para tanto,

produzir um guia de recomendações para aconselhar em HIV/Aids no contexto

da atenção básica, capacitar os profissionais e desencadear uma campanha de

comunicação de massa sobre a importância da ampliação da testagem e

implementar a Portaria nº 59, de 28 de janeiro de 2003, que objetiva normatizar

a rede de laboratórios do Programa Nacional de DST/Aids, são propostas

fundamentais (Anexo 2).

3.2- CTA/HESFA/UFRJ – Breve Histórico

O Hospital-Escola São Francisco de Assis (HESFA) é um órgão

suplementar do Centro de Ciências de Saúde (CCS), integrando-se ao

complexo hospitalar da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),

prestando assistência primária e secundária à saúde. Tem como visão

estratégica ser um centro de referência na assistência primária, viabilizando a

qualidade de vida de seus usuários, envolvendo sua família e criando condições

para o auto-cuidado.

O HESFA desenvolve programas de ensino, pesquisa e extensão no

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âmbito da reabilitação biopsicossocial. Integra-se ao Sistema Nacional de

Saúde prestando assistência de excelência de baixa e média complexidade,

funcionando de forma articulada com as demais Unidades da UFRJ,

observando a nova filosofia das gestões atuais do Hospital e da Universidade.

Esta filosofia prioriza as atividades de Extensão, fortalecendo os eixos de

Ensino e Pesquisa para alcançar eficiência e efetividade na assistência

prestada à população, reforçando o conceito de interdisciplinaridade, tanto na

elaboração quanto na execução dos Programas e Projetos.

O HESFA tem como objetivos principais o Ensino, a Pesquisa e a

Assistência na área de reabilitação biopsicossocial, em consonância com a

função social da Universidade; e como diretriz, o fortalecimento do SUS, de

modo a garantir a saúde como direito de todos e dever do Estado.

A interdisciplinaridade, marco de referência para o desenvolvimento dos

trabalhos realizados no HESFA, permite que Programas e Projetos elaborados

por profissionais de várias áreas de atuação ofereçam abordagens diversas a

um dado problema, juntando-se à comunidade num esforço comum de

organização, a partir da intercomunicação contínua. Esta proposta de trabalho

inclui o desenvolvimento de novas modalidades assistenciais que contemplem

variadas possibilidades de acesso a serviços preventivos e curativos, bem

como facilidades de informação sobre questões de saúde e de educação em

geral.

Considerando a Aids como um problema de Saúde Coletiva e

colocando-a na agenda das políticas de saúde, surgiu a proposta pioneira de

criação e implantação do COAS/CTA/HESFA/UFRJ, elaborada no final da

década de 80 por um grupo de técnicos do Núcleo de Estudos em Saúde

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Coletiva (NESC) com a participação da Faculdade de Medicina, ambos da

UFRJ, em cumprimento às diretrizes traçadas pelo PN-DST/Aids, com os

objetivos de oferecer diagnóstico sorológico para o HIV/Aids e desenvolver um

programa de educação em saúde com foco na epidemia de Aids, na prevenção

e no controle epidemiológico da doença.

Entretanto, essa primeira iniciativa foi obstaculizada por interesses

políticos vigentes à época, no Estado do Rio de Janeiro, fazendo com que este

serviço só fosse efetivamente criado em 1992, contando com a parceria da

UFRJ através de recursos humanos e espaço físico, com representantes da

Secretaria Estadual de Saúde, através do Laboratório Central do Estado

(LACEN), e com a Secretaria Municipal de Saúde, que cederam recursos

materiais e equipamentos necessários ao funcionamento do serviço.

Este serviço de saúde, na época denominado COAS, estruturou-se para

ser ‘porta de entrada’ para as questões biológicas e psicossociais da epidemia,

tornando-se uma das unidades de saúde do HESFA. Hoje atende a população

do Grande Rio através de ações de saúde, diagnóstico, prevenção e referência.

O serviço está estruturado em convênio firmado entre as Secretarias de Saúde

do Estado e do Município do Rio de Janeiro, UFRJ e HESFA, e vem se

desenvolvendo de acordo com as fundamentações teórico-técnicas e políticas

da PN-DST/Aids.

Implantado em abril de 1992 no referido Hospital-Escola, foi o primeiro

CTA do Rio de Janeiro, instalado em local de fácil acesso à população carioca,

por onde circulam linhas de ônibus de diferentes localidades do Rio de Janeiro

e dos municípios da Baixada Fluminense. Situa-se no bairro denominado Praça

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Onze, próximo à Central do Brasil, estação ferroviária que liga vários bairros da

cidade, e também das estações Praça Onze e Estácio do Metrô.

O CTA, definido como um serviço de saúde de atenção primária que faz

uma intermediação significativa entre a prevenção e a assistência, desempenha

um importante papel nos processos de controle e prevenção do HIV/Aids. É

porta de entrada no sistema público de saúde, responsabilizando-se pelo

diagnóstico da infecção pelo HIV dos sujeitos que se percebem mais

vulneráveis, e também referência para assistência aos diagnosticados como

soropositivos. Utiliza como abordagem o aconselhamento pré e pós-teste, a

partir de uma relação dialógica de troca e acolhimento, em que o aprendizado

fundamental é apenas uma das dimensões do processo educativo. Nesta visão

do aconselhamento, estão presentes questões que envolvem cidadania,

direitos, subjetividade, afetividade, relações amorosas, humanas e culturais.

Os princípios e objetivos organizacionais dos CTA definem seu perfil de

acordo com as orientações da PN-DST/Aids (BRASIL, 1999a):

� Oferecimento de diagnóstico sorológico para o HIV, com base gratuita,

confidencial e anônima;

� Aconselhamento e educação em saúde como estratégia de prevenção, para

propor mudanças nos comportamentos de risco;

� Unidades de saúde com demandas voluntárias, estruturadas a partir de

parcerias com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde.

O CTA/HESFA/UFRJ promove sua rotina de atendimento realizando o

aconselhamento pré-teste coletivo e individual, e o pós-teste individual,

vivenciados pela população como uma relação profissional-usuário

humanizada, garantindo o acolhimento diante do estresse de saber o

diagnóstico sorológico para o HIV.

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O primeiro turno de atendimento ocorre pela manhã, a partir das 08:00

horas, mas, devido à crescente demanda, em 1997 foi instalado o turno da noite

visando acolher a população que trabalha até 17:00 horas. Em 1998 foi criado o

turno da tarde, passando o serviço a funcionar das 08:00 às 20:00 horas, e

sempre com atendimento multiprofissional.

Em 1993, em parceria com o CTA Municipal Rocha Maia, situado na

zona sul do município do Rio de Janeiro, tornou-se Centro Treinador para

capacitação de profissionais visando a implantação de serviços similares no

País. Esse fato constituiu uma alavanca para disseminar a ampliação da rede

de COAS / CTA no território brasileiro. Estes dois CTA realizaram doze

treinamentos até 1998, com a participação de 121 profissionais atuantes em 54

municípios. Deve-se ressaltar que, nesses treinamentos, foram capacitados

profissionais africanos de Cabo Verde e de São Tomé e Príncipe.

Como resultado, os profissionais implantaram os serviços de saúde em

53 municípios. No total, o CTA / HESFA / UFRJ foi protagonista da capacitação

de 35% dos serviços implantados no País naquele período, e continua

desenvolvendo junto às Secretarias de Saúde Estadual e Municipal do Rio de

Janeiro, através das respectivas Coordenações de DST/Aids, inúmeros

treinamentos para equipes multiprofissionais que atuarão em aconselhamento e

testagem anti-HIV.

Os exames anti-HIV que, anteriormente, eram realizados no Laboratório

Central do Estado do Rio de Janeiro (LACEN), a partir de julho de 1998

passaram a ser feitos no laboratório do próprio hospital, uma medida pioneira

na época, adotada por outros CTA para facilitar a resolutividade dos serviços.

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Como já foi dito ao longo do trabalho, o CTA/HESFA/UFRJ dispõe de

uma equipe multiprofissional para atender aos usuários do serviço, o que

permite a troca de saberes e experiências e possibilita dispensar melhor

atenção ao público. Como resultado dessa composição profissional, foi

possível uma aproximação maior às demais instituições de saúde de formação

superior, tornando-se também um campo de estágio.

Hoje, na UFRJ, esse estágio tem característica de estágio curricular,

permitindo aos estudantes que nele se inscrevem, contabilizar as horas

prestadas na assistência, de acordo com as exigências formais das respectivas

Instituições de Ensino Superior, para fins de colação de grau. Além disso, o

estágio fortalece, no Rio de Janeiro, a capacitação de profissionais habilitados a

respeito de questões de políticas públicas para o HIV/Aids e do tratamento das

pessoas afetadas pelo vírus, possibilitando-lhes o desenvolvimento de ações de

saúde comprometidas com um processo de acolhimento mais humanizado aos

usuários.

Já no âmbito universitário, o CTA/HESFA/UFRJ consolida sua dimensão

extensionista através de diversos projetos, ressaltando-se o Projeto Extra-

Muros e o Projeto de Redução de Danos. O primeiro inclui o atendimento à

comunidade, ONG, escolas, cursos de graduação, associações de moradores,

clubes esportistas, empresas (através das Comissões Internas de Prevenção

de Acidentes – CIPA) e a participação em outros eventos que solicitam a

participação do CTA em ações educativas e no incentivo à testagem.

Estas experiências têm caráter preventivo, visando tanto o entendimento

da vulnerabilidade face à epidemia da Aids, como a motivação das pessoas

para o processo de educação em saúde, face à infecção pelo HIV e outras

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DST. São intervenções pontuais que ocorrem fora do espaço físico do CTA,

ampliando os níveis de entendimento coletivo e individual em relação ao

assunto, através de informações, discussões sobre transmissão, prevenção e

diagnóstico do HIV/Aids. Essas intervenções têm sido realizadas com o objetivo

de capacitar agentes de saúde entre lideranças comunitárias, estudantes,

trabalhadores e outros interessados na busca de soluções coletivas e

individuais para a epidemia, valendo-se de procedimentos como palestras,

discussões em grupo, aconselhamento coletivo e individual, distribuição de

preservativos masculinos e femininos, material informativo, cartazes e folhetos

ilustrativos.

O segundo projeto, que se inscreve no âmbito das políticas públicas

voltadas à promoção e prevenção à saúde, é o Projeto de Redução de Danos

(PRD), desenvolvido no CTA/HESFA/UFRJ desde 2001. Sua inclusão neste

CTA justifica-se na medida em que se sabe que uma das formas de infecção

pelo HIV é o compartilhamento de seringas e agulhas, quando do uso de

drogas injetáveis. Esse projeto é desenvolvido internamente e nas comunidades

circunvizinhas ao CTA. Objetiva ações para o auto-cuidado e redução da

transmissão do HIV pelo uso de drogas, em especial as injetáveis. Há

distribuição de insumos, tais como preservativos, seringas descartáveis,

canudos individuais e materiais educativos. Associados a estes, tem-se o

aconselhamento e a referência para serviços especializados para tratamento de

dependência química, disponibilizados para os sujeitos que demonstrem

interesse em diminuir o consumo de drogas ou abster-se do seu uso.

Outra característica deste CTA é estar em parceria permanente com

Projetos de pesquisa, enquanto campo de investigação e recrutamento. As

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ações já desenvolvidas têm sempre contemplado o livre consentimento dos

usuários, através de informações sobre pesquisas científicas e do recrutamento

para a participação nos diversos estudos científicos empreendidos, em especial

pelo Projeto Praça Onze, que desenvolve pesquisas relacionadas à infecção

pelo HIV/Aids.

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4 - CONSIDERAÇÕES METODOLÓGICAS

4.1 – Natureza do Estudo

É uma pesquisa de natureza social, do tipo exploratório-descritivo com

abordagem qualitativa.

Minayo (1996, p.21-22) afirma que a natureza social de uma

pesquisa baseia-se no fato de o sujeito ser considerado “gente, em determinada

condição social, pertencente a determinado grupo social ou classe, com suas

crenças, valores e significados”.

Em relação ao seu caráter exploratório, Ruiz (1980, p.50)

esclarece que “existem diversas espécies de pesquisa científica”, e que o

objetivo da pesquisa exploratória é a caracterização inicial, do problema; logo, é

o “primeiro estágio de toda pesquisa científica”.

No entendimento de Minayo (1996, p.89), a fase exploratória da pesquisa

compreende “a etapa de escolha do tópico de investigação, de delimitação do

problema, de definição do objeto e dos objetivos, de construção do marco

teórico conceitual, dos instrumentos de coleta de dados e da exploração do

campo”. Esta fase acaba com a entrada do pesquisador no campo onde o

estudo será realizado.

A propósito, Minayo (2000, p.55-56) alerta para o fato de que “às vezes,

o pesquisador entra em campo considerando que tudo que vai encontrar serve

para confirmar o que ele considera já saber, ao invés de compreender o campo

como possibilidade de novas revelações”. Para a autora, trata-se de um

comportamento que pode dificultar um diálogo efetivo com os envolvidos na

pesquisa, como conseqüência de “posicionamentos de superioridade e de

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inferioridade frente ao saber que se busca entender". Ao evitá-lo, o pesquisador

garantirá que não surjam falsos depoimentos e defesa de idéias e valores do

grupo pesquisado, o que poderia prejudicar os resultados do seu estudo,

porque “os fenômenos referentes à Saúde são complexos e o reconhecimento

da sua complexidade dinâmica é requisito indispensável para pensá-los

cientificamente” (MINAYO, 1996, p.251).

A pesquisa descritiva “está interessada em descobrir e observar

fenômenos, procurando descrevê-los, classificá-los e interpretá-los” (RUDIO,

1986, p.56). O autor complementa seu pensamento lembrando que uma de

suas formas é a pesquisa para análise de trabalho, cuja finalidade é “identificar

deficiências, elaborar programas de capacitação, distribuir tarefas, determinar

normas, etc” (Op.cit., p.57).

Para Triviños (1995), o estudo descritivo pretende descrever fatos e

fenômenos acerca de uma determinada realidade. Então, retratar e descrever

uma experiência são etapas importantes para a modificação da realidade.

A pesquisa qualitativa, de acordo com Minayo et al. (2000, p.21),

“responde a questões muito particulares”, trabalhando com o universo de

significados, aspirações, crenças, valores e atitudes, preocupando-se com o

espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos de uma

realidade não quantificável.

Esta abordagem oferece a possibilidade de um estudo onde a

observação e a fala dos envolvidos sejam instrumentos de trabalho, permitindo

o aprofundamento e a compreensão do fenômeno que está sendo enfocado,

incorporando a questão do significado e da intencionalidade como inerentes aos

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atos, às relações e às estruturas sociais (MINAYO, 1996).

4.2 – Cenário do Estudo

O CTA/HESFA/UFRJ é o “ambiente político, socioeconômico e cultural”

(Rea & Parker, 2002, p.40) onde foi desenvolvido o estudo porque, para este

local se dirigem os usuários que desejam realizar o teste anti-HIV. A sua

localização geográfica facilita o acesso ao serviço de saúde, à esquerda da

porta de entrada principal do HESFA. É composto de uma sala de espera (onde

há um balcão para recepção e informações), uma sala para o aconselhamento

coletivo, seis salas para o aconselhamento individual, uma sala de coleta de

material, além de outras dependências que fazem parte do CTA, sendo estas:

uma sala de coordenação e uma sala de arquivo e de informática.

4.3 – Sujeitos do Estudo

Segundo Minayo (2000, p.57), são aqueles que “vivenciam uma

determinada realidade que está sendo focalizada”. São também designados

pelo termo “população”, representando “a totalidade de indivíduos que possuem

as mesmas características definidas para um determinado estudo” (RUDIO,

1986, p.49).

Nesta pesquisa, os sujeitos foram os usuários do CTA/HESFA/UFRJ.

Homens e mulheres na faixa etária entre 22 e 45 anos, independentemente de

raça, situação social, escolaridade e ocupação. Foram entrevistados onze

usuários durante 15 dias úteis do mês de junho do ano em curso, contados a

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partir do dia 07 daquele mês. No decorrer do processo das entrevistas,

observou-se que os conteúdos das respostas dos usuários passaram a ser

repetitivos. A discussão sobre a temática por sua vez, obteve as mesmas

respostas e significados, apontando que nesta investigação qualitativa, já havia

a consolidação das percepções e das opiniões.

Tal medida ratifica o pensamento de Minayo (1996, p.102) no sentido de

que, na abordagem qualitativa, deve-se buscar “um critério de

representatividade numérica que possibilite a generalização dos conceitos

teóricos que se quer testar”. Ainda segundo Minayo, “numa busca qualitativa

preocupamo-nos menos com a generalização e mais com o aprofundamento e

a abrangência da compreensão. Seu critério, portanto, não é numérico”.

Podemos considerar que uma amostra ideal é aquela capaz de refletir a

totalidade nas suas múltiplas dimensões.

4.4 – Coleta de dados

Os dados foram obtidos mediante entrevista com os usuários do

CTA/HESFA/UFRJ. De acordo com Minayo (op.cit., p.107), no sentido estrito,

entrevista é a “colheita de informações sobre determinado tema científico”. Para

viabilizar o procedimento, foi encaminhada ao Comitê de Ética em Pesquisa da

Escola de Enfermagem Anna Nery / HESFA / UFRJ, carta assinada pela

Professora responsável pela orientação do estudo, tendo em anexo a cópia do

projeto de pesquisa a ser realizada no âmbito da referida Instituição (Anexo 3),

para emissão de parecer atendendo a resolução 196/96, do Conselho Nacional

de Saúde.

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A coleta de dados observou as seguintes etapas:

- Os usuários do CTA/HESFA/UFRJ foram aleatoriamente abordados pela

pesquisadora, na sala de espera, depois do aconselhamento pós-teste

(recebimento do resultado do exame), etapa que o usuário já vivenciou todo

o processo de atendimento. A finalidade desta abordagem foi prestar

esclarecimentos sobre o assunto porque, segundo Rea & Parker (2002,

p.42), “é mais provável que os entrevistados em potencial participem

quando eles percebem que as constatações do estudo terão um impacto

direto sobre o seu bem-estar”.

- Caso algum usuário demonstrasse intenção de colaborar, de imediato era

encaminhado a outra sala onde, numa linguagem acessível, recebia novos

esclarecimentos da pesquisadora acerca dos objetivos e da finalidade do

estudo. Uma vez confirmado o seu interesse, a pesquisadora enfatizava que

sua participação seria valorizada e dava-lhe garantia de sigilo e anonimato

em relação ao que fosse dito durante a entrevista. Este procedimento

atendeu ao disposto na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde,

que trata de pesquisa envolvendo seres humanos.

- Não restando nenhuma dúvida sobre o assunto, o usuário assinava o Termo

de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo 4), cabendo à pesquisadora

ratificar a informação de que a participação dele não era obrigatória e que

ele poderia desistir a qualquer momento, sem nenhum prejuízo para a

pesquisa ou para a sua relação com o CTA/HESFA/UFRJ.

O encontro com os usuários para a realização das entrevistas foi privado,

informal e ocorreu em uma sala de entrevistas no CTA, local previamente

determinado para este fim. As entrevistas, realizadas pela pesquisadora com o

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apoio dos aconselhadores e da equipe técnica do CTA/HESFA/UFRJ, foram

gravadas em fita magnética, mediante prévia autorização dos entrevistados,

considerando que a gravação visava garantir a fidedignidade daquilo que fosse

dito. Para tanto, as fitas foram transcritas pela pesquisadora. Cada um deles

recebeu um nome fictício, objetivando preservar-lhe a identidade. O tempo

destinado à realização de cada entrevista foi de, no mínimo, 30 minutos;

todavia, não ultrapassou os 60 minutos.

4.5 – Instrumento de Coleta de dados

Foi adotada a técnica da entrevista para a obtenção dos dados que

viabilizaram o estudo. Tendo sido elaborado um roteiro de entrevista semi-

estruturada com questões abertas (Anexo 5) e perguntas fundamentais que, no

enfoque qualitativo, não nascem a priori, mas resultam da teoria que alimenta a

ação do pesquisador, e também de toda a informação já recolhida por ele sobre

o fenômeno social que interessa, não sendo menos importantes seus contatos,

inclusive os realizados na escolha das pessoas a serem entrevistadas.

Na entrevista, segundo Minayo (1996, p.108), o pesquisador pode

conseguir dados “que se referem diretamente ao indivíduo entrevistado, isto é,

suas atitudes valores e opiniões”. No caso da entrevista semi-estruturada, é

indispensável a elaboração de um roteiro contendo questões sobre o

atendimento oferecido no CTA, possibilitando que o entrevistado discorra mais

livremente sobre o tema enfocado. O pesquisador deve estar ciente, porém,

que nenhum roteiro poderá conter todas as informações necessárias a um

estudo (REA & PARKER, 2002, p.39). Portanto, na opinião dos autores, no

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processo de elaboração do roteiro, é preciso que o pesquisador use de

experiência e critério profissional na construção de uma série de perguntas que

maximizem as vantagens e minimizem as desvantagens em potencial do roteiro

que pretende utilizar.

Neste estudo, o instrumento de coleta de dados foi pré-testado pela

pesquisadora junto a uma usuária do CTA/HESFA/UFRJ que se dispôs

voluntariamente a colaborar nesse sentido, ensejando a validação e/ou o ajuste

do seu conteúdo ao contexto do estudo.

Após as primeiras entrevistas, foram necessárias algumas adequações

no modo de indagar e na seqüência das perguntas, já que algumas respostas

se mesclavam com outras. Basicamente, em algumas entrevistas as perguntas

foram reordenadas. A temática sobre acolhimento, que envolve a relação

profissional de saúde-usuário e a continência para escutar, aliviar,

compreender, dar suporte ao entrevistado diante da demanda de realizar o

teste anti-HIV, teve que ser inserida já que apareceram sentimentos de

ansiedade, tanto na decisão de fazer o teste no CTA, como em relação à

espera pelos Aconselhamentos coletivo e individual e pelo resultado sorológico

do HIV.

As entrevistas semi-estruturadas realizadas com os usuários do

CTA/HESFA/UFRJ levaram em consideração a abordagem qualitativa, e

tiveram como foco as vivências e/ou experiências das ações desenvolvidas

naquela unidade de saúde, ações estas preconizadas para os Centros de

Testagem e Aconselhamento, permitindo que suas respostas expressassem

suas opiniões sobre o processo de trabalho da mesma. O roteiro foi estruturado

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a partir de dados que favorecessem a caracterização dos sujeitos envolvidos no

estudo tais como faixa etária, sexo e profissão.

As entrevistas objetivaram alcançar a percepção dos usuários

envolvidos nas etapas de atendimento do serviço, a saber: objetivo do CTA;

atendimento na porta de entrada do Hospital e na recepção do CTA;

Aconselhamento Coletivo e/ou palestra; Aconselhamento Individual Pré- e Pós-

teste; Coleta de sangue; Tempo de espera para resultado; Lições aprendidas;

Instalações do CTA. Convém esclarecer que estas foram consideradas na

construção das categorias durante o instrumental de análise.

4.6 – Plano de Análise dos Dados

Concluída a fase de coleta de dados, teve início a análise temática dos

dados obtidos, para identificar os núcleos de sentido das falas que, por sua vez,

deram origem às Unidades de Significação ou Categorias, cuja freqüência ou

presença definiram o caráter do discurso. Antes, foi traçado o perfil dos

entrevistados com o objetivo de melhor caracterizá-los.

A análise de conteúdo foi realizada à luz dos conceitos de Bardin (1977).

Segundo a autora, consiste em organizar os indicadores a partir de recortes das

entrevistas dos usuários. Recorta-se de cada entrevista os registros a serem

referenciados por temas. Desses recortes, após a transcrição na íntegra, foram

subtraídos trechos que inevitavelmente implicaram em interpretação destes que

tem a denominação de ‘categorias’. Segundo Bardin (1977, p. 120), “uma

categoria é considerada pertinente quando está adaptada ao material de

análise escolhido e quando pertence ao quadro teórico definido”. A dimensão

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de conteúdo das categorias deve informar a vinculação do sujeito com a

realidade investigada. Certamente, a análise de algumas dimensões de

conteúdo servirão de contribuição e fundamento para a avaliação de

programas, propostas de planejamento, mudanças institucionais e outras

possibilidades, a serem implementadas no futuro.

As categorias refletiram as especificidades dos temas-perguntas,

ensejando o surgimento das seguintes categorias: CTA/HESFA no Serviço de

Saúde do SUS, O Objetivo do Centro de Testagem e Aconselhamento, A

Chegada ao HESFA, a Recepção do CTA – Um local de Acolhimento?,

Aconselhamento Coletivo, Aconselhamento Individual Pré-teste, A Coleta de

Sangue, Aconselhamento Individual Pós-teste, Lições Aprendidas, Instalações

do CTA/HESFA/UFRJ. A interpretação das falas teve o intuito de atender ao

objetivo do estudo, refletindo a intenção da investigação que foi verificar como

os usuários vivenciam o modelo assistencial do CTA.

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5 - O OLHAR DOS USUÁRIOS ACERCA DO CTA/HESFA/UFRJ

Este capítulo traz a discussão sobre atuação do CTA dentro da política

de saúde, ancorada na análise da visão dos usuários sobre as etapas da

assistência prestada pelo CTA/HESFA/UFRJ.

Mesclando as opiniões dos usuários acerca do CTA/HESFA/UFRJ com

os aspectos descritivos e organizacionais do serviço, tem-se a compreensão da

prática de saúde que os orienta.

Nessa linha de trabalho, foram abordadas dimensões do conteúdo das

entrevistas realizadas, de acordo com o tema-pergunta e, posteriormente,

selecionadas para análise dos dados, envolvendo reflexões sobre as respostas

obtidas. Esta análise forneceu elementos para a melhor compreensão do

modelo assistencial do CTA.

Segundo Buber apud Araújo (2003, p.149),

a finalidade da análise é extrair temas e obter um entendimento profundo dos valores e crenças que guiam as ações dos indivíduos. Isto envolve um pensar e re-pensar sobre o que as pessoas dizem e fazem e sobre a consistência entre aquilo que dizem e realmente fazem e o significado das ações no contexto, onde atividades e interações ocorrem.

Sendo assim, apresenta-se a seguir a caracterização do perfil dos

entrevistados, e alguns dados coletados nas entrevistas realizadas com os

sujeitos do estudo.

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5. 1 - Caracterização dos Usuários

No total, foram realizadas onze entrevistas, sendo sete com pessoas do

sexo masculino e quatro do sexo feminino.

Dos sete homens entrevistados, quatro (José, Fábio, André e Pedro) têm

nível de escolaridade correspondente ao ensino fundamental incompleto; um

(Paulo) não completou o ensino médio; um (Mauro) completou o ensino médio;

e um (Carlos) concluiu o nível superior. Todos estão na faixa etária entre 22 e

43 anos. Quanto à ocupação, José está desempregado, Fábio é autônomo,

André trabalha como despachante e Pedro atua como bordador; Paulo é

serigrafista, Mauro é patologista e professor do ensino médio, e Carlos é

professor e membro de uma ONG que trabalha com a temática Aids.

Do total das mulheres entrevistadas, uma (Carolina) tem o curso

fundamental incompleto, uma (Maria) não completou o ensino médio; uma

(Rosa) concluiu o ensino médio e uma (Eduarda) tem nível superior completo.

Todas estão na faixa etária entre 22 e 45 anos. Quanto à ocupação, Carolina

está desempregada, Maria é cobradora de ônibus, Rosa é dona de casa e

Eduarda é publicitária, mas não trabalha no momento.

Neste estudo, observou-se baixa renda e baixa escolaridade no grupo

entrevistado. Em razão disso, estes sujeitos buscaram os serviços públicos, em

especial o CTA/HESFA/UFRJ, quando perceberam a necessidade de cuidados

de saúde. Este interesse pelo atendimento foi confirmado pelas palavras de

dois entrevistados que, anteriormente, já tinham procurado um serviço privado

de cuidados de saúde:

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... Eu já tinha um teste anti-hiv em laboratório particular e deu a maior confusão com os resultados ... procurei aqui por ser justamente do Governo. É mais correto, mais garantido. (Eduarda)

Após esta breve caracterização dos sujeitos do estudo, dá-se início à

análise das categorias temáticas que emergiram das entrevistas.

5.2 - O CTA/HESFA/UFRJ como Serviço de Saúde do SUS

O serviço prestado pelo CTA/HESFA/UFRJ sendo ele uma unidade do

SUS, volta-se para a concepção de saúde como um direito de todos e de

cidadania, numa visão de saúde coletiva, percebendo os sujeitos como seres

humanos integrais; portanto, atendidos com o sentido da prática da

integralidade, na perspectiva do diagnóstico, da promoção, da prevenção e da

referência para o tratamento.

A organização desse Serviço visa atender a população, levando em

conta a sua localização geográfica e o acesso ao diagnóstico.

A garantia da demanda voluntária e/ou do encaminhamento ao

CTA/HESFA/UFRJ, como já citado, decorre de um preceito básico

constitucional no sentido de que ao Estado cabe garantir ao usuário o acesso

ao serviço de saúde e formular políticas públicas para viabilizá-lo.

O conceito de acesso ao CTA dentro do SUS está pautado na eqüidade

e na universalidade de atendimento para os cidadãos que, apesar do medo e

do estigma em relação ao HIV, têm necessidade de realizar o teste para fins de

diagnóstico, mediante orientações, aconselhamentos e referência para

unidades de tratamento, aos níveis de atenção secundária e terciária.

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A visão integral do indivíduo, mediante acesso ao atendimento igualitário

e gratuito, objetiva reconhecer a demanda dos usuários que buscam atenção e

cuidados à saúde, dentro de uma apreensão que se pauta no enfrentamento da

epidemia de Aids. Para viabilizar o acesso e garantir o atendimento do usuário,

o CTA/HESFA/UFRJ ampliou seus turnos de trabalho, e divulgou na mídia e

junto à população usuária o número do Disc-Aids, um serviço implantado em

1993, que funciona com atendentes e/ou secretária eletrônica no horário de 8 h

às 17 h , visando dar informações sobre o fluxo do atendimento, os resultados,

bem como questões relativas à doença, ao vírus, aos direitos sociais e

referências para tratamento.

Esta medida tem possibilitado o atendimento de um maior número de

pessoas, apesar de ainda ser longo o tempo de espera entre os turnos, para a

realização do exame. Este aspecto é relatado a seguir:

... eu cheguei às 8 da manhã. Não tinha mais número. Vou ter que esperar até as 11 para pegar a senha da tarde? De repente, eu tenho que trabalhar ... de repente, precisa de uma flexibilização das normas .... (Carlos)

... eu vim às 6 horas da manhã para conseguir pegar um número menor e ser atendido rápido... (André)

A propósito do Disc-Aids, Carlos falou que o atendimento via secretária

eletrônica não é ‘humanizado’, daí ele ser contrário a essa forma de atender,

como relatou:

... a questão do disque Aids é que ... não atende o problema das pessoas. A gente (os profissionais de saúde) se esconde do problema do usuário, do cliente ou da população .... O telefone existe para orientar as pessoas ....Que atendimento dá uma secretária eletrônica? Que acolhimento dá? O telefone existe para

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de dar uma satisfação. Você como pessoa não gosta de uma satisfação? (Carlos)

5.3 - O Objetivo do CTA/HESFA/UFRJ

Partindo das diretrizes do Ministério da Saúde, PN-DST/Aids, a missão

do CTA é oferecer o aconselhamento, incluindo o teste anti-HIV, como

importante estratégia para a prevenção do HIV/Aids. A prática de

aconselhamento no contexto da epidemia do HIV contempla o processo de

reflexão e educação, contribuindo para a promoção efetiva da saúde do Ser

humano a partir de avaliação e planejamento para redução de risco, apoio

emocional e adoção de práticas sexuais mais seguras.

A epidemia do HIV/Aids trouxe demandas da população, levando os

profissionais de saúde, inclusive os do CTA/HESFA/UFRJ, a se organizarem e

capacitarem-se para tentar respondê-las.

Mattos (1999, p. 27-28), em documento divulgado pela Associação

Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), esclarece que:

Os CTA se inscrevem dentro das perspectivas políticas complementárias: a primeira fala a respeito do acesso aos pacientes diagnosticados soropositivos, e, por conseguinte as instituições e serviços que possam assegurar apoio aos que necessitam, e a segunda é aquela diretamente ligada a redução da incidência, que se desdobra em ações que pretendem modificar comportamentos dos portadores do HIV e dos que não estão infectados pelo vírus.

Os recortes de depoimentos apresentados a seguir revelam a percepção

dos usuários acerca do serviço e de seus objetivos:

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... é orientar as pessoas, fazer com que tomem

cuidado, quer dizer, se prevenirem, né? (José)

... procurar fazer com que as pessoas estejam informadas se têm o vírus ou não, né? Se tiver, já é uma forma de vir se tratar ... as pessoas são orientadas sobre riscos que podem correr. Os profissionais passam tranqüilidade, segurança e informação . (André)

... o objetivo é identificar os portadores, chegar ao

número de portadores que não são reconhecidos, né? Também os que são ... quer dizer, a finalidade é essa: existe uma estatística de 600 milhões de portadores, 400 milhões são conhecidos e 200 não. É por aí ... pessoal a ser encaminhado para o tratamento, né? ... procurar fazer com que as pessoas estejam informadas e saber se é portador do vírus ou não, né? Se tiver, já é uma forma de vir se tratar. (Paulo)

... é a capacidade de tratar o ser humano, mesmo que o resultado seja positivo ou negativo. (Fábio)

... que todo mundo tem que se prevenir, fazer o teste e se tratar, se precisar .... (Eduarda)

Pressupõe-se que todos têm clara noção dos objetivos inerentes ao

serviço, identificando-se com o que lhes é oferecido.

Esses recortes de entrevistas destacam a importância do diagnóstico ao

nível de indicadores e da referência para tratamento que, atualmente, no País,

é uma ação afirmativa de direito com o acesso aos medicamentos anti-

retrovirais.

Com estas percepções, os usuários referem-se ao CTA/HESFA/UFRJ

observando uma concepção de direito social vinculado à saúde, que orienta os

portadores do vírus a buscarem tratamento antes da ocorrência de doenças

oportunistas e da Aids. A propósito dessa garantia, um entrevistado referiu-se à

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sua experiência anterior em relação ao diagnóstico anti-HIV, realizado em

caráter particular, cujo resultado causou-lhe desconforto e problemas

emocionais:

... Aqui no CTA eu fui bem orientado. Antes eu fiz o teste em laboratório particular, estava com medo e assustado, achava que as pessoas iam ficar me olhando. Não foi assim. Vou seguir todas as instruções em matéria de palestras, medicações, exames para ter uma vida normal. (Mauro)

Nesse sentido, confirma-se a necessidade de formulação de políticas

públicas corretas e eficazes, que levem à compreensão de que o Estado deve

responder as demandas da sociedade que anseia por credibilidade, gratuidade

de acesso a serviços de diagnóstico, tratamento e medicamentos, apesar do

sucateamento dos serviços públicos de saúde.

A maioria dos entrevistados entendeu que o CTA/HESFA/UFRJ tem um

atendimento humanizado, com uma relação profissional-usuário acolhedora.

Para ilustrar, seguem-se três recortes de depoimentos a respeito, considerados

expressivos:

... se uma pessoa se estiver desesperada, ela vai

poder chegar... ela vai poder conversar. (José)

... Aconteceu comigo, eu pedi para uma médica solicitar exames e fiz em laboratório particular ... você pede ao médico para te passar o exame, você vai fazer o exame, depois você mesmo pega o resultado e vai embora, quer dizer, se de repente tiver um problema, não tem um aconselhamento, não tem ninguém para conversar com você. (Mauro)

... Ela conversou comigo, conseguiu me aliviar e me acolher. (Rosa)

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... eu identifiquei sempre uma intenção da pessoa te escutar, de melhorar a atenção ... apesar de no serviço público, a primeira coisa que se vê é só o negativo, mas tem gente séria tentando melhorar o serviço, tentando te atender o mais rápido possível ... eu acho que isso humaniza, isso trás você para o serviço, esses pequenos detalhes. (Carlos)

Em contrapartida, a entrevistada Carolina alegou que

“... o atendimento não foi mau, ela não me tratou

com ignorância, mas também não me tratou às mil

maravilhas ...”,

levando a inferir que foi atendida de forma impessoal.

Essas falas expressam características do serviço observadas por

diferentes ângulos: para uns, o serviço apresentou-se de forma humanizada,

enquanto para uma pareceu impessoal. É importante considerar as opiniões

sobre a recepção no CTA/HESFAUFRJ, que podem contribuir para o

entendimento da análise desse serviço, que é o assunto abordado a seguir.

5.4 - A chegada ao HESFA e a recepção no CTA: um lo cal de acolhimento?

O cliente passa pela triagem do hospital, é atendido e depois é

encaminhado ao CTA, onde existe uma recepção.

O Manual de Diretrizes dos CTA (Brasil, 1999a, p. 11) prevê que

“todo CTA deve dispor de recepção acolhedora, encaminhamento interno rápido

e tempo mínimo de espera”. Eis a visão de três dos onze entrevistados a

respeito:

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... Acho que o atendimento na porta de entrada é o primeiro. Acho que esse atendimento é fundamental. Fui tratado com educação e orientado quanto aos turnos de atendimento no CTA. (Carlos)

... O primeiro atendimento é o do porteiro (atendido na recepção do HESFA) e dos seguranças ....Eles me orientaram, porque a gente fica meio perdido em todo o hospital. Eles foram amáveis e atenciosos. (Mauro)

... Eu fui bem recebida. Ela não me tratou mal (enfermeira da triagem do HESFA), não tenho reclamação de nada, ela me mostrou onde fica o CTA. (Carolina)

Para Teixeira (2003, p.103), “o acolhimento põe em relevo, antes de

tudo, o caráter de acolhimento moral do usuário do serviço e de suas demandas

(o que pode envolver, muitas vezes, um sofrimento importante)”.

A acolhida é a base da relação entre o usuário e o serviço de saúde.

Citando Fontenelle (1998, p.140), tem-se que:

o acolhimento pretende: melhorar o acesso dos usuários ao serviço de saúde; ... humanizar as relações entre profissionais de saúde e usuários em especial no que tange a forma de receber esses usuários e de escutar seus problemas e as demandas, numa abordagem que contemple não apenas a dimensão biológica, mas também a psicológica, a social e a cultural.

Ainda citando Merhy (1998, p.138) sobre acolhida e relações de vínculos,

eis o pensamento do autor:

Criar vínculos implica em ter relações tão próximas e tão claras que nós nos sensibilizamos com todo sofrimento daquele outro, daquela população. É permitir a constituição de um processo de transferência entre o usuário e o trabalhador que possa servir à construção da autonomia do próprio usuário. É sentir-se responsável pela vida e pela morte do paciente dentro de uma dada possibilidade de intervenção, nem burocratizada, nem impessoal. E ter relação, integrar-se com a comunidade

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em seu território, em seu serviço, no consultório, nos grupos, e se tornar referência para o usuário, individual ou coletiva.

A temática do acolhimento nos serviços de saúde, em especial no

CTA/HESFA/UFRJ, é uma proposta assistencial de fundamental importância. A

discussão do acolhimento perpassa pelo dispositivo organizacional do Serviço,

desde a chegada do usuário à recepção, migrando para as etapas e práticas de

atendimento que sinalizam um foco de tensão dele frente à perspectiva do

diagnóstico anti-HIV. Portanto, o acolhimento é uma atenção que põe em

relevo o sentido receptivo, estabelecendo com o(s) usuário(s) o diálogo e a

técnica de conversa desde a chegada, passando por eles mesmos, pelos

profissionais e até por outros usuários.

De acordo com as entrevistas, foi possível identificar que na chegada ao

CTA/HESFA/UFRJ os usuários, em sua maioria, encontram-se nervosos e

angustiados em relação ao diagnóstico. Então, enquanto esperam o

atendimento coletivo e/ou individual, costumam conversar com os outros que

também buscam o serviço, sendo esta iniciativa considerada uma ‘válvula de

escape’ para amenizar a ansiedade contida. A esse respeito, dos onze

entrevistados, pelo menos dois referiram-se a essa espera, ressaltando a

comunicação entre eles e a importância do acolhimento:

... ah!... foi legal! Enquanto eu esperava, eu

conversei e até tirei dúvidas. (Mauro)

... dependendo do dia, existe a demora e então, conversar com os outros é importante até mesmo para quando a gente vai fazer uma coisa, a gente lembra de um caso que ouvimos aqui dentro. (André)

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Sabe-se que a decisão de vir ao CTA para realizar o exame anti-HIV

gera expectativa, dúvida e medo. Um acolhimento adequado na recepção pode

minimizar este mosaico de sentimentos, de caráter sabidamente ansiogênicos.

Coloca-se a necessidade de repensar o atendimento da recepção aos usuários,

neste setor.

Esta postura de acolhimento, de bom senso e de boas normas, pauta-se

no atendimento às necessidades básicas do sujeito, significando um

encaminhamento assertivo, com observância dos horários / turnos de

atendimento do serviço e dos profissionais. Deve-se considerar as opiniões e

sugestões de quatro usuários, que apontaram a questão da operacionalidade

na recepção do CTA/HESFA/UFRJ, e a flexibilidade de atendimento nos turnos

conforme descrito a seguir:

... para pegar meu resultado hoje, não demorei nem 20

minutos. (André)

... eu conversei com as pessoas que pegaram o

resultado no período da tarde, e eles disseram que o

atendimento no período da tarde é muito mais rápido do que

no período da manhã. (Fábio)

... eu não tenho grande queixas, mas você vem de

manha, aí tem que voltar à tarde, e aí esgota os números e tem que voltar à noite ... eu acho que o porteiro tem que flexibilizar as normas ... cheguei de manhã, não poderia dar a senha pra tarde? Pra tarde, tem que ser depois de um determinado horário ... ‘o senhor pode voltar outro dia? O senhor tem outra coisa para fazer?’ E aí, conforme forem as respostas, por exemplo, eu não sei, oferece a senha já ... tentar flexibilizar de alguma forma. (Carlos)

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Nessa linha de raciocínio, o entrevistado sugeriu que ao sair, a

recepcionista deixasse alguém em seu lugar, ou seja, o serviço necessita de

mais recursos humanos:

... se ela é uma recepcionista, não pode deixar a recepção vazia; tem que deixar alguém responsável pelo setor ... alguém está chegando e tem que ser recebido ... ela não pode abandonar a recepção, é a mesma coisa que o médico abandonar uma cirurgia. (Mauro)

Carlos, a respeito do mesmo tema, disse que um maior envolvimento da

equipe poderia contribuir para a melhoria da recepção, e fez uma crítica:

... ninguém te pergunta nada, só vemos pessoas

passando prá lá e prá cá. E a gente pensa: tá todo mundo ocupado e não estão nem aí para nada! Dane-se, entendeu?

Carlos tem a mesma opinião e sugestão que Mauro, quanto ao aumento

do número de profissionais, sob a justificativa de possibilitar o atendimento de

dois grupos distintos de usuários: aqueles que vêm pela primeira vez, e os que

buscam o atendimento pós-teste.

Como foi verbalizado por alguns entrevistados, existem dificuldades no

CTA relativos a recepção, direcionadas ao não atendimento à campainha que

fica numa bancada, e à ausência da recepcionista no setor. Essas questões

foram relatadas da seguinte maneira por três entrevistados, ao passo que os

demais não deram tanta importância ao fato:

... a gente fica ‘p’ da vida por causa do tempo de demora aqui ... que acolhimento se dá? (Carlos)

... todas as vezes que eu cheguei, umas três vezes, não tinha ninguém na recepção ... tem que ter alguém para recepcionar isto não está acontecendo. (Fábio)

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... eu tocava a campainha, tocava, e ninguém respondia. (Paulo)

A questão da recepção no CTA trouxe, por parte dos entrevistados,

aspectos importantes relacionados à sala de espera, que valem mencionar,

ainda que nem todos tenham se referido àquele local. A esse respeito,

destacamos três depoimentos:

... Nesse momento que você espera pra ser

chamado é um momento de convívio social, onde são

conversadas coisas do serviço que traz algum

conhecimento. (Mauro)

... A espera aumenta a ansiedade, as pessoas do

meu lado também sentiram isso. (Rosa)

... Eu me constrangi um pouco por estar com outras

pessoas que às vezes falam de HIV/AIDS. (Maria)

A sala de espera é percebida como um local que favorece o intercâmbio

pessoal e a rede de conversas, embora não impeça a ansiedade frente ao

atendimento. Assim, o que se desenrola naquele local pode trazer alívio, mas

também constrangimento, e até medo de ser identificado pelo outro como

alguém que está ali por conta do risco a que se expôs. Esta situação cria

fantasias sobre estar ou não infectado pelo vírus, tais como medo do

diagnóstico e de ser reconhecido como quem tem o HIV. Uma vez ultrapassada

a fase inicial da recepção, o usuário é encaminhado para o aconselhamento

coletivo, assunto abordado em seqüência.

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5.5 - Aconselhamento Coletivo

Trata-se de proposta de trabalho que visa abrir um espaço de inclusão

da população no CTA, com o objetivo de estabelecer informações sobre a

epidemia e a troca de saberes entre usuários e profissionais responsáveis pelos

respectivos grupos de aconselhamento coletivo. Este partilhar de saberes pode

desencadear processos de reflexão, a partir da construção de conceitos e

desconstrução de pré-conceitos em relação ao HIV/Aids. Nessa linha de

pensamento, Schall et al. (1995, p. 85) afirmam que:

O processo de construção de um novo saber, reside, não apenas no conhecimento formal, mas na capacidade do indivíduo se reconhecer nos elementos da situação relacionadas à transmissão e/ou risco de adquirir o HIV, ou seja, na percepção de risco.

Sendo assim, na visão dos autores (op.cit., p.86 ),

o processo pedagógico pressupõe o relacionamento humano e o crescimento/desenvolvimento do indivíduo e, portanto, os elementos afetivos e cognitivos são inerentes à sua dinâmica – a dimensão humana.

A maioria dos entrevistados referiu-se ao aconselhamento coletivo, sem

maiores detalhes. Destes, cinco compreenderam o processo e o conteúdo de

informações discutidos na ocasião como muito importantes. A seguir, suas

considerações a respeito:

... achei a palestra muito importante para a gente

aprender a se cuidar. Do jeito que o mundo está, precisamos

nos cuidar mais, ter mais responsabilidade com a nossa

vida. (José)

... foi bem, foi uma coisa que deu muita

informação...orientou a todos. (Rosa)

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... assisti a palestra, foi muito boa. Foi

interessante porque orientou ... muita coisa que eu nem

tinha noção. (Eduarda)

... os esclarecimentos que são fornecidos na palestra coletiva são para pensar e botar em uso, com certeza] (Fábio)

... na palestra a moça orientou a todos. Ela conversou e esclareceu para a gente aprender a se cuidar. (Paulo)

Vale ressaltar que o aconselhamento coletivo fundamenta-se nas

informações necessárias à prevenção do HIV/Aids. Encoraja os indivíduos a

terem cuidado com a própria saúde. No contexto desta prática, a CN-DST/Aids

chama atenção para um processo de ações educacionais no campo das

DST/HIV/Aids que reside na praxis educativa, onde a troca de experiências e a

construção de um novo saber se destacam, contribuindo para a promoção

efetiva do Ser humano.

Dentre os componentes da ação educativa, trocar informações de

maneira dinâmica sobre DST/HIV/Aids entre os participantes do grupo e o

aconselhador; informar sobre a diferença entre HIV e Aids, suas formas de

transmissão, prevenção e tratamento, com ênfase nas situações de risco sexual

e uso de drogas; identificar maneiras e/ou dificuldades de negociação para o

uso do preservativo, demonstrando seu uso correto; evitar o compartilhamento

de seringas e outros, explicando os benefícios do uso exclusivo de

equipamentos para o consumo de drogas injetáveis; incentivar a percepção e a

avaliação de risco; trocar informações sobre os testes que serão realizados e o

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período da janela imunológica, são temas abordados durante o aconselhamento

coletivo.

Ademais, busca-se acessar aspectos culturais e coletivos diferenciados,

permitindo aos usuários reconhecerem suas dúvidas, compartilhando-as com

os outros e, assim, esclarecendo que todos estão numa situação de igualdade

em que a troca de saberes pode facilitar o entendimento coletivo sobre

prevenção e transmissão do HIV.

A propósito, a valorização de esclarecimentos coletivos para problemas

que são vividos no âmbito particular, pessoal, como importantes, perceber a

singularidade de cada um refletida nos outros e o envolvimento de todos no

contexto da prevenção e no controle do HIV/Aids. Por estas razões, o

aconselhamento coletivo é um espaço privilegiado para a compreensão de

novos conhecimentos, que implicam na construção de práticas sócio-culturais

mais solidárias e preventivas frente à epidemia do HIV/Aids.

Segundo Freire (1996, p.127),

Se na verdade, o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando aos outros, de cima para baixo, sobretudo, como se fossemos os portadores da verdade a ser transmitido aos demais, que aprendemos a escutar, mas é, escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente o outro fala com ele mesmo que em certas condições precise de falar a ele.

Quanto ao aconselhamento coletivo, quatro usuários, dentre os onze

entrevistados, relataram com detalhes suas experiências:

... uma palestra que algumas pessoas também deveriam escutar.Não é à toa que tem um montão de pessoas pegando doença. (Paulo)

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... as pessoas participaram, tiraram dúvidas, fizeram perguntas e ela (a aconselhadora) foi respondendo. ... foi uma escola pra gente aprender a se cuidar, a manter nossa vida, manter nosso valor da nossa vida porque devido ao mundo de hoje em dia, do jeito que está hoje em dia, a gente tem que ter mais cuidado, mais responsabilidade com a nossa vida. (José)

... puxa, eu vou pra lá e tudo que ela falar eu já vou

saber ... veio desmontar essa coisa de que eu já sabia

tudo... nossa, cada vez mais eu aprendo. Mesmo falando

de prevenção cada um fala do seu modo, a gente não fala

das mesmas coisas porque às vezes não dá tempo, mas

tá falando das mesmas coisas assim com palavras

diferentes que te dão reflexões diferentes, que te dão

caminhos de reflexões diferentes. (Carlos)

As frases relatadas mostram os benefícios que uma proposta de

aconselhamento coletivo podem promover na vida das pessoas.

Muitos relatos sobre aconselhamento coletivo valorizam esta etapa do

trabalho desenvolvido pelo CTA, considerando a possibilidade de informações

novas e esclarecimentos necessários pertinentes às dinâmicas dos grupos.

Podemos deduzir que a partir do aconselhamento coletivo os usuários podem

tornar-se mais questionadores e reflexivos. Todavia, a construção de uma

consciência sobre prevenção do HIV/Aids não deve e nem pode ser pontual.

Significa que os usuários precisam de um espaço que lhes permita compartilhar

seus conhecimentos, possibilitando mudanças no processo de cuidados com

sua saúde e com a dos outros.

Araújo apud Buber (2003, p.137), “as pessoas com quem interagimos no

exercício profissional, nunca podem ser colocadas na condição de objetos; ao

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contrário, o aconselhador deve estar aberto neste processo de ensinar e

aprender”.

Infere-se que as informações constantes sobre DST/HIV/Aids

(transmissão, prevenção e tratamento) veiculadas pela mídia, ou nas conversas

cotidianas, nos diversos serviços de saúde e no aconselhamento coletivo, são

relevantes para a promoção de mudanças significativas de comportamento.

Segundo Minayo (1999, p. 10) acerca da Avaliação dos COAS da Região

Nordeste do Brasil:

O aconselhamento coletivo foi considerado eficaz para tirar dúvidas e trazer informações até então desconhecidas e o uso de recursos visuais foi bastante valorizado pelos usuários. O constrangimento inicial em revelar aspectos da intimidade é parcialmente vencido quando o usuário percebe a segurança e profissionalismo do conselheiro .... Esta relação delicada por natureza precisa ser preservada e exige um trabalho constante de atualização. O nível de confiança que é depositado pelos usuários aos profissionais é imenso, e seu interesse nas informações também.

Considerando a informação como um dos aspectos mais importantes na

prevenção da epidemia do HIV/Aids, há que se levar em conta na ação

educativa do aconselhamento coletivo, a construção de conceitos que

conduzam à valorização da vida, à promoção da saúde e à responsabilidade

social. Nas palavras de Monteiro (2002, p.15):

... as políticas de prevenção ao HIV/Aids, dominantes nos anos que se seguiram à descoberta da doença, são orientadas pela ênfase na transmissão de informações, na responsabilidade individual e no enfoque epidemiológico de risco, modelos cognitivos de mudança de comportamento para explicar as ações individuais de risco. Priorizar o processo cognitivo, a decisão individual e o controle das ações pelo sujeito, estabelecendo uma relação direta entre o conhecimento e a prática nas situações percebidas como ameaçadoras.

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Concluída a etapa de aconselhamento coletivo, ocorre o aconselhamento

individual pré-teste, descrito abaixo.

5.6 - Aconselhamento Individual Pré-Teste

Neste aconselhamento, reafirma-se o caráter confidencial e o sigilo das

informações preconizados pela PN-DST/Aids, mediante apresentação do

significado dos possíveis resultados dos testes realizados, bem como o impacto

dos mesmos na vida de cada usuário; considera-se com o indivíduo as

possíveis reações emocionais que venham a ocorrer durante o período de

espera do resultado do teste, e pontuam-se as medidas de prevenção em

relação às DST/HIV/Aids; conversa-se sobre estilo de vida, percepção e

avaliação de risco diante de possibilidades de exposição ao HIV, explorando

aspectos íntimos da sexualidade e/ou uso de drogas, acidentes com fluidos

sanguíneo e/ou transfusão de sangue; leva-se em conta, também, as

estratégias para a redução de riscos, adoção de práticas sexuais mais seguras,

promoção da saúde e qualidade de vida, explorando o apoio emocional e social

disponível; enfatiza-se a relação entre DST/HIV/Aids e reforça-se a importância

do diagnóstico e do tratamento do(s) parceiro(s) sexual(ais).

É um espaço para a problematização da singularidade dos sujeitos

afetados direta ou indiretamente pela epidemia do HIV/Aids. No

aconselhamento individual destacam-se as vulnerabilidades dos gêneros

masculino e feminino, as orientações sexuais, a percepção e a avaliação de

risco, bem como a implicação dos sujeitos no processo de prevenção e

planejamento sobre alternativas para adoção de práticas sexuais mais seguras.

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O processo de aconselhamento pressupõe a visão da integralidade do

sujeito, o exercício do acolhimento, a facilitação da reflexão sobre os riscos e

redução de danos à saúde, expectativas quanto ao resultado do exame, apoio,

suporte emocional e orientação sobre prevenção, adoção de práticas

preventivas e adesão ao tratamento para a melhoria da qualidade de vida.

Em qualquer ação de aconselhamento é de fundamental importância o

acolhimento, a possibilidade de escutar o usuário, propiciando uma relação de

confiança e respeito. A relação de troca deve ser ancorada na conversa,

facilitando que aconselhador e usuário se olhem e falem sobre as angústias e

os medos deste último. A esse respeito, Buber (1982, p.27) cita que:

A conversação se realiza em sua essência, entre parceiros que verdadeiramente voltaram-se um-para-o-outro, que se expressam com franqueza e que estão livres de toda vontade de parecer, produz-se uma memorável e comum fecundidade que não é encontrada em nenhum outro lugar. A palavra nasce substancialmente, vez após vez, entre homens que, nas suas profundidades, são captados e abertos pela dinâmica de um elementar estar-juntos. O inter-humano propicia aqui uma abertura àquilo que de outra maneira permanece fechado.

Aconselhadores e usuários constróem juntos a comunicação dialógica, a

conversa, buscando integrar o sujeito àquela ação de saúde. Segundo Teixeira

apud Mattos (2003, p.90),

na relação trabalhador-usuário que se dá nos serviços, a integração é mais do que a construção de um vínculo/responsabilização, mas trata-se de uma efetiva ‘mudança na relação técnico-usuário’. No cotidiano do CTA e nas diretrizes emanadas para o diagnóstico do HIV/Aids, a integralidade do sujeito, entendendo-o como um ser ‘biopsicossocial’ é um conceito que deve ser seguido.

Esta temática ganha importância crescente nos CTA existentes, e é vista

como processo de humanização do serviço, sendo a base para o

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aconselhamento, pois a conversa permite enfocar o universo íntimo do usuário,

desde que o diálogo aconteça.

Neste sentido, promover um ambiente acolhedor e integrador favorece a

implementação do processo do aconselhamento, que não deve ocorrer de

forma inquisidora, deixando o usuário à vontade para falar de intimidades

sexuais com um profissional que ele não conhece.

Considerando o exposto, no CTA/HESFA/UFRJ procura-se, na medida

do possível, que os diferentes momentos do aconselhamento sejam conduzidos

pelo mesmo aconselhador, uma das formas de garantir a privacidade do

usuário, reforçando o vínculo com ele estabelecido.

Estes usuários, manifestaram-se sobre o aconselhamento individual pré-

teste:

... Fiquei com vergonha no começo ... porque são várias perguntas íntimas e eu não sabia que ela ia perguntar tanta coisa ... mas ao mesmo tempo que ela pergunta, ela é bem discreta. (Eduarda)

... Ela me levou a uma reflexão na hora que me fez essa pergunta ... eu até fiquei refletindo sozinha porque eu dei uma resposta que não era ... ela me perguntou quantos parceiros eu tinha tido ... eu menti um pouquinho. (Maria)

Falar sobre intimidade e sexualidade com quem não se conhece, sem

dúvida é constrangedor, visto que as orientações e as práticas sexuais são

componentes absolutamente pessoais e ainda cercados de julgamentos e

preconceitos.

Refletindo sobre a escuta durante a conversa, tem-se a concepção

freireana (Freire, 1996, p. 135 ) transcrita a seguir:

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Escutar é obviamente algo que vai mais além da possibilidade auditiva de cada um. Escutar, no sentido aqui discutido, significa disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro.

Segundo o Manual de Diretrizes para os CTA, da CN-DST/Aids, o

aconselhamento pré-teste tem caráter opcional; entretanto o CTA/HESFA/UFRJ

compreende que a sua realização faz parte das etapas do serviço, para os que

decidem saber seu diagnóstico para o HIV. Esta compreensão baseia-se na

argumentação de que é um espaço de preparação para um futuro resultado,

que pode aliviar tensões frente ao exame, que é um momento de se vincular ao

serviço, de refletir e conversar individualmente com o aconselhador sobre riscos

e medos, e de receber orientações quanto ao período da janela imunológica do

exame e às medidas de prevenção.

A esse respeito, assim se pronunciaram os entrevistados:

... ela me aconselhou que eu me prevenisse durante 3 meses pelo menos, né? E depois voltasse aqui para fazer o exame. (Mauro)

... eu acho fundamental. Os esclarecimentos sobre risco são importantes. Agora, mudar comportamento, fazer prevenção, isso eu não sei. É aquela coisa de beija-flor... jogar água numa floresta em chamas.(Carlos)

... eu acho que tem que explorar mais as dificuldades individuais na prevenção, saber identificar as dificuldades das pessoas. Cada relação com um ser humano é diferente. (André)

... passam que a Aids não é um bicho de sete cabeças, dizem assim: você tem que ser cuidar, as pessoas hoje não morrem rápido de Aids, tem tratamento e tem prevenção. Então, se der positivo, vou me cuidar. Se der negativo, não vou fazer mais. (Pedro)

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É durante o aconselhamento individual pré-teste que se conversa sobre

vulnerabilidades, levando o indivíduo à percepção e avaliação de risco frente ao

HIV; é também quando se pretende construir ações de prevenção e promoção à

saúde, buscando recursos pessoais e sociais para torná-las possíveis.

Segundo Czeresnia (2003, p.41), a prevenção em saúde

tem o significado de ‘preparar’, dispor de maneira que evite (danos ou mal). As ações preventivas definem-se como intervenções orientadas a evitar o surgimento de doenças específicas, reduzindo sua incidência e prevalência nas populações.

Ressalta-se outra característica do CTA, qual seja, a de que os usuários

enquanto cidadãos, podem optar pela identificação do exame ou pelo seu

anonimato no aconselhamento individual pré-teste. A esse respeito, seguem-se

as opiniões de dois usuários, os únicos dentre os onze entrevistados que se

manifestaram a respeito:

... as pessoas sempre procuram a tranqüilidade do anonimato. O CTA deixa a critério se a pessoa quer ou não se identificar. Então, nesse sentido, você fica mais tranqüilo. Porque na primeira vez que você vem, sempre vem com aquele fantasma do HIV. Tem toda essa coisa do preconceito. Nesse sentido, te dá uma tranqüilidade maior você vir buscar o exame aqui. Eu acho que ajuda a enfrentar o preconceito do próximo. (Fabio)

... eu vim fazer o teste porque meu parceiro é soropositivo. Eu fiquei meio assustado e resolvi procurar saber se eu tinha ou não. O fato de poder escolher se queria fazer anônimo ou não é importante. Ajuda, naquele momento de angústia. (Pedro)

Convém assinalar que o resultado de um exame identificado é essencial

para o acesso ao tratamento e às medicações, e também para pleitear direitos

sociais e trabalhistas. Os aconselhadores utilizam um formulário no qual fazem

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registros acerca do histórico do usuário. Estes registros ficam arquivados em

prontuários, que recebem um código numérico idêntico aos dos tubos para a

coleta de sangue, do cartão e da folha de resultado.

No aconselhamento, uma valiosa contribuição é oferecida ao usuário,

sobre a possibilidade de cuidar de si e do(s) outro(s) com quem mantém

relações sexuais. O depoimento de Maria, transcrito a seguir, foi considerado

relevante dentre os onze realizados:

... eu penso assim: desde o momento em que eu recebi um

“conselho” e gostei da idéia, eu fiquei bem mais leve, digamos

assim, bem mais descansada ... a gente fala bastante da questão

da negociação ... vou negociar sempre o preservativo com ele.

A próxima etapa é a que se refere à coleta de sangue.

5.7 - A Coleta de Sangue

Após o aconselhamento individual pré-teste, os indivíduos decidem se

querem fazer o teste; em caso positivo, são encaminhados à sala de coleta de

sangue. Dos onze entrevistados, destacam-se dois relatos significativos sobre o

momento da coleta, considerado uma etapa imprescindível da rotina:

... eu fiquei meio nervoso, apesar dela mostrar que o

instrumento é descartável, tudo esterilizado, tudo direitinho,

os números conferidos e os dados também. (Mauro)

... ela deixa a gente super à vontade, quando ela

espeta o braço da gente, a gente nem vê, e quando vê, ela já tirou o sangue. (André)

Porém, houve uma crítica a respeito do atendimento recebido:

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... eu acho que a gente precisa criticar a fim de

melhorar. Achei a coletadora um pouco calada, falou só

coisas técnicas, tipo fecha a mão ... dez minutos com o

braço assim ... pensando em humanizar mais, em dar mais

atenção, a técnica de conversa, de distrair puxando papo,

pode ajudar. (Carlos)

A etapa da coleta é importante, mas demanda cerca de vinte e

cinco dias para a divulgação do resultado, que ocorre durante o

aconselhamento individual pós-teste, cujo procedimento é descrito a seguir.

5.8 - Aconselhamento Individual Pós-teste

No aconselhamento individual pós-teste, os conteúdos já trabalhados são

resgatados e novamente enfatizados quanto às medidas de prevenção,

promoção à saúde e avaliação de recursos pessoais e sociais que contribuam

para a adesão ao tratamento, e na definição de planos de redução de riscos,

baseados nas questões de gênero, vulnerabilidade para o HIV, diversidade

sexual, uso de drogas e planejamento familiar.

A referência para os serviços especializados para tratamento e

assistência, quando necessários, incluindo as ONG, ressaltam a importância do

acompanhamento jurídico, médico e psicossocial para a qualidade de vida. É

preciso ratificar que, no caso de um resultado negativo, este não significa que

haja imunidade total frente ao HIV, cabendo avaliar a janela imunológica e a

necessidade de retestagem. Diante de um resultado positivo, prestar apoio

emocional, ressaltando que a infecção é tratável, orientar e propor ajuda para

comunicação aos parceiros. A seguir, indicar o exame confirmatório e a

necessidade de uso do preservativo, do não compartilhamento de agulhas e

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seringas, lembrando a necessidade de redução de riscos de reinfecção e

transmissão para os outros e a importância da adesão ao tratamento.

No caso de um resultado indeterminado, considerar as reações

emocionais do usuário e agendar para uma nova amostra de sangue a ser

coletada após 30 dias da emissão do resultado da primeira amostra, reforçando

a adoção de práticas seguras para redução de risco de infecção pelo HIV e por

outras DST.

A maioria dos entrevistados não verbalizou seu pensamento sobre o

tempo destinado à entrega do resultado, em torno de 25 dias; entretanto, dos

onze entrevistados, dois falaram que a expectativa do resultado do exame foi

significativa:

... o dia do resultado causa muita ansiedade. É como se tivesse abandonado num baú, o dia do resultado, mas chega o dia e aí a gente fica nervoso e a espera para pegar o resultado é angustiante. (André)

... não sei se era porque era o meu resultado, mas demorou um pouco e foi uma ansiedade mesmo. (Maria)

Apenas um entrevistado comentou ter recebido seu resultado antes do

previsto:

... saí daqui com um cartão amarelinho, marcando para voltar em 25 dias, liguei para o disque Aids e soube que tinha chegado antes, e vim aqui buscar em 15 dias. (Paulo)

Os resultados dos exames geram tensão. Os dois relatos sobre a

expectativa do resultado revelam sentimentos de angústia e ansiedade, comuns

à maioria dos entrevistados, ainda que não verbalizados.

É preciso compreender a delicadeza do momento da entrega do

resultado e o sentimento de urgência individual de saber o resultado de um

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teste que pode mudar vidas, pois está associado a uma doença estigmatizante,

percebida ainda hoje como grave e mortal. Sendo assim, torna-se necessário

repensar algumas questões e abreviar ao máximo o tempo para entrega dos

resultados.

Vale ressaltar o sentimento referido por um entrevistado:

... eu senti muita angústia para saber meu resultado. Eu só queria ter uma resposta e achei que demorou muito. Eu fiquei numa ansiedade enorme naquele momento de espera. (Pedro)

Como já evidenciado, trata-se de um momento extremamente

peculiar na vida dos usuários no CTA, que os deixa estressados e ansiosos.

Isto acontece porque “receber um resultado de um exame coloca na mesa algo

que nem a própria pessoa é capaz de admitir”, como afirma Araújo (2003,

p.159).

Esta fase foi citada por grande número de usuários, sob diversos

aspectos. Destacam-se nove recortes de depoimentos que falam a respeito das

suas impressões sobre o pós-teste. Os dois primeiros revelam angústia e

interesse pelo resultado:

... fiquei um pouco ansioso, né? A gente está com a cabeça meio problemática. (Maria)

... fiz uma série de perguntas para saber se entendi. (Eduarda)

Quanto ao recorte de depoimento seguinte, revela alívio diante do

resultado recebido. Suas palavras remetem à idéia de promoção à saúde,

fortalecendo a autonomia dos sujeitos, a quem cabe a responsabilidade pela

melhoria da sua qualidade de vida:

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... eu fiquei tranqüilo, graças a Deus ... o resultado foi o

melhor para mim. Serviu de lição de vida, serviu para dar

mais valor à minha vida. (José)

Dois usuários disseram ainda que:

... o atendimento do CTA, especialmente no pós-teste,

tem a intenção de dar atenção ao indivíduo no momento do

diagnóstico. Isto humaniza o resultado, pois alivia a

confirmação do mesmo naquele momento. (Carlos)

... eu penso assim: desde o momento que eu recebi o

resultado, eu acho que vou estar me protegendo e

negociando o preservativo sempre. (Pedro)

Os entrevistados foram abordados após o recebimento do resultado do

exame. A maioria (09) confirmou ser soronegativo, o que certamente lhes

trouxe alívio. Porém, dois usuários tiveram resultados reativos para o HIV. Um

deles já conhecia esse resultado e veio ao CTA para obtê-lo por escrito, formali-

zado, com a finalidade de dar entrada no pedido de liberação do FGTS, e como

é membro de ONG, também quis participar da entrevista. Eis sua justificativa:

... hoje eu recebi meu resultado e faz quase três meses que estou aqui só esperando uma confirmação. Eu já sabia do resultado do meu teste. Só vim refazer para dar entrada no FGTS. (Carlos)

O outro foi encaminhado ao CTA para confirmação diagnóstica após ter

realizado um exame em laboratório particular e, ao participar da entrevista,

disse:

... Eu vim na esperança que meu exame não desse igual ao primeiro, que fosse negativo. Mas me preparei e vou fazer o terceiro exame aqui. Antes se morria logo de

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Aids. Hoje só morre de Aids quem quer. Uma pessoa por mais ignorante que seja, se ela procurar informações, é só cuidar, ela sobrevive um bom tempo. (Mauro)

Fica claro, então, que o momento da revelação diagnóstica no

aconselhamento pós-teste auxilia as pessoas, garante-lhes apoio emocional e

alivia a tensão frente ao resultado, propiciando uma reavaliação de riscos,

reflexão sobre atitudes e condutas de cuidados e de prevenção, incluindo

estratégias de redução de riscos e adesão ao tratamento, se for o caso. Para

incentivar as medidas de prevenção, o CTA fornece um cartão para distribuição

de preservativo que dá direito a obter seis preservativos por mês,

gratuitamente. Esta medida não foi referida pela maioria dos entrevistados.

Todavia, um usuário (Pedro) alegou que

“...não vale a pena pagar a passagem para ganhar apenas seis

preservativos ..."

, e sugeriu o aumento desse quantitativo.

Do exposto, percebe-se que os entrevistados entendem e acatam os

serviços oferecidos pelo CTA/HESFA/UFRJ, mesmo com certas reservas. Daí,

vale destacar algumas lições aprendidas por eles, a partir do seu olhar.

5.9 - Lições Aprendidas

Considerando que o processo de atendimento no CTA/HESFA/UFRJ é

ancorado na prevenção e no diagnóstico do HIV/Aids, os usuários foram

indagados acerca de eventuais “lições aprendidas” após a vivência das etapas

do atendimento. Dentre os entrevistados, três ressaltaram que as orientações

sobre prevenção e transmissão da infecção pelo HIV trouxeram maior

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responsabilidade individual e, conseqüentemente, reflexões sobre o risco de

contrair o HIV e de prevenir-se:

... eu acho que vou tentar explorar muito mais as possibilidades da prevenção. (José)

... agora eu vou ter mais responsabilidade, só não sei se vou me proteger com o atual, que é um homem extremamente ciumento, mas é um homem sério .... Eu penso que eu recebi um “conselho”, entendi e vou ficar mais descansada se eu puder usar o preservativo com ele também. Por que não? Vou tentar conversar com ele. (Rosa)

... aprendi que nunca mais transo sem camisinha na minha vida. Eu e meu namorado já usávamos, às vezes não, mas agora eu conversei com ele e nunca mais vamos deixar de usar. (Maria)

Estas reflexões desenvolvem-se em torno da prevenção baseada em

ações comportamentais e estilo de vida pessoal, contribuindo para evitar o

crescimento da epidemia. Algumas até contribuem para que eles se tornem

multiplicadores de informações em suas relações sociais, como foi o caso de

Pedro:

... o que eu fiquei sabendo aqui, eu comecei a passar para outras pessoas, para passar que não era nada daquilo que as pessoas acham, que não é um bicho de sete cabeças ... eu não levei as informações só para mim, mas para outras pessoas também . (Pedro)

A fala a seguir remete à idéia de promoção da saúde, que fortalece a

autonomia dos sujeitos e aponta para a melhora da qualidade de vida das

pessoas através do aconselhamento:

... no aconselhamento, eu vi que tenho uma chance de ter uma vida normal, e é muito importante com certeza ... então, não é porque de repente tem uma determinada doença que você vai se entregar para o mundo e acabou.

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Ao contrário, dali em diante, você vai tentar tudo da melhor forma possível porque enquanto tiver forças e esperança, há vida. (Mauro)

Trilhar caminhos para respostas de prevenção a Aids impõe uma série

de desafios; há que se conjugar aspectos individuais e subjetivos, culturais e de

gênero, econômicos e sociais para o desenvolvimento desse processo, a fim de

que se tenha uma perspectiva de consciência sobre possíveis riscos e

necessidade de mudanças de comportamento.

Esta pesquisa pretendeu obter informações também quanto às

instalações do CTA/HESFA/UFRJ, para saber se as condições ambientais eram

prejudiciais ao atendimento dos usuários. Eis as respostas obtidas:

5.10- Instalações do CTA/HESFA/UFRJ

O prédio do HESFA é tombado, encontrando-se em condições muito

precárias, necessitando de reforma especializada e bastante custosa do ponto

de vista financeiro e técnico.

Consultados acerca das instalações físicas do HESFA/UFRJ e, em

especial do CTA, todos emitiram opiniões que demonstraram surpresa em

relação a estas, pois acreditavam que estariam em condições inadequadas, tal

como a aparência externa do prédio. E exemplificaram:

... eu me surpreendi um pouco. Olhando aquela sacada, parece que está caindo. (Paulo)

... eu confesso que aqui dentro, entendeu? Aqui dentro tá bom, mas do lado de fora precisa de uma reforma, pintura, janelas e portas. (José)

... eu achei boa. Tem ventilador, bebedouro, é limpo, tem banco pra todo mundo. (Eduarda)

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Os depoimentos acima mostram que a visão dos usuários acerca

dessas instalações não acarreta nenhum prejuízo ao atendimento que lhes é

prestado.

Diante dos relatos obtidos, tem-se a certeza de que os usuários do

CTA/HESFA/UFRJ buscam o serviço por entenderam a importância do

diagnóstico anti-HIV/Aids em seu processo de vida, considerando o acolhimento

/ aconselhamento como cruciais para ajudá-los num momento especial de suas

vidas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Abordar questões relacionadas à Aids é sempre muito instigante,

especialmente quando a epidemia entra em sua terceira década. Durante este

período o Estado brasileiro vem se empenhando em estabelecer diretrizes para

estancar o avanço da epidemia, visando a saúde coletiva e o bem-estar social.

O Ministério da Saúde, através da PN-DST/Aids tem sido responsável pelo

desenvolvimento em diversas áreas de conhecimento técnico-científico em

HIV/Aids e na proposição e efetividade de ações de prevenção, assistência,

controle da infecção, na produção, distribuição e disponibilização universal e

gratuita de medicamentos antiretrovirais e profiláticos.

Com relação aos serviços de saúde, a epidemia evidenciou problemas,

especialmente nas condições de acesso, na assistência, na integração e

atenção ao usuário por parte dos profissionais, na referência e resolutividade,

entre tantos outros.

A Aids levou à revisão do cotidiano dos serviços de saúde, dos hábitos

culturais e ideológicos que perpassam a relação profissional com o usuário e a

definição de políticas públicas na área da saúde.

A política de prevenção ocupa um lugar relevante junto com a

promoção à saúde. A prevenção vem construindo e desenvolvendo estratégias

e tecnologias específicas afinadas com a promoção à saúde, que incorporam

diálogos interdisciplinares nas cenas do campo prático para atuarem em

testagem e aconselhamento, redução de risco, práticas de sexo mais seguro e

redução de danos, entre outros.

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Do ponto de vista das políticas públicas, as diretrizes para implantação

dos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) tiveram como propósito

facilitar o acesso da população ao diagnóstico sorológico para o HIV dentro de

critérios de sigilo, confidencialidade e anonimato, desenvolvendo no

aconselhamento o processo de prevenção e orientação aos usuários.

Nesta dissertação, procurei discutir como as políticas públicas em

relação a Aids emanadas das diretrizes do PN-DST/Aids para os CTA são

vivenciadas na visão dos usuários atendidos no CTA/HESFA/UFRJ.

Sintetizar a riqueza dessas experiências a partir do olhar dos usuários é

uma tarefa difícil e certamente incompleta. A abordagem qualitativa através das

entrevistas semi-estruturadas pareceu adequada, favorecendo as reflexões dos

usuários e a minha sobre a realidade do serviço.

A necessidade e os cuidados para implantar e organizar os CTA segundo

aquelas diretrizes parecem defensáveis e justificáveis, haja vista a grande

procura do CTA pela população legitimando, então, a importância do serviço de

saúde.

O serviço público de saúde, em geral, é desqualificado e desacreditado

pela população que o procura, salvo algumas exceções. O volume da procura

por atendimento que vem, ao longo dos anos, ocorrendo no CTA/HESFA/UFRJ

sinalizava que a população conferia uma credibilidae ao Serviço, o que parece

se confirmar nessa pesquisa qualitativa que foi desenvolvida.

Considerando a complexidade do sistema de saúde brasileiro e a

dificuldade de implantar o SUS como sistema de saúde que atenda aos nossos

anseios, temos que levar em conta a complexidade das políticas de saúde, as

relações sociais dominantes, as relações institucionalizadas envolvendo esferas

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das Secretarias de Saúde dos governos estadual e municipal, a UFRJ e o

HESFA dentro deste contexto.

A questão do acesso ao serviço e a integralidade enquanto parte dos

princípios que norteiam a atenção á saúde através do SUS, foram destacados

neste trabalho. O desafio de integrar o CTA de forma cada vez mais efetiva ao

SUS, garantindo mecanismos que valorizem suas ações, devem ser

acompanhados de compromissos federais, estaduais e municipais que

permitam a sustentabilidade e constante qualificação do atendimento.

O CTA tem sido reafirmado como serviço diferenciado e “porta de

entrada” da população nos serviços que tratam do HIV/Aids objetivando o

diagnóstico anti-HIV. Considerando a complexidade singular dos sujeitos que

vêm em busca do teste, o CTA oferece acolhida pautada na visão integrada do

Ser humano onde o biológico, o social, o psicológico se entrelaçam nos

aconselhamentos pré e pós-teste.

Nas entrevistas verificou-se que os usuários compreendem o que é o

objetivo do CTA. Percebem, também, que o serviço contribui através das

orientações fornecidas para reflexões e mudanças de estilo de vida nas

relações sócio-afetivas, na elaboração de planos de redução de riscos e danos

à saúde a quem está sujeito à infecção pelo HIV.

No cenário investigado, a chegada ao HESFA e a recepção do CTA,

deve ter a acolhida como base, pois o acolhimento delinea todo o processo de

diagnóstico no serviço. A forma como o usuário é recebido vai alicerçar as

relações de confiança, credibilidade que serão estabelecidas com os

profissionais que irão atendê-lo.

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Alguns entrevistados explicitaram críticas, que obstacularizaram o

acolhimento, em especial na recepção do CTA. A recepcionista, ora ausente,

ora indiferente segundo eles, não contribui para a humanização que se propõe

o CTA. É inegável que a percepção dessas atitudes por parte da recepção,

indica a necessidade de rever esta etapa do trabalho, entendendo-a enquanto

suporte social e comunicacional, importante para o processo de diagnóstico

anti-HIV.

O estudo aponta também para um maior envolvimento por parte da

equipe, desfazendo a impressão que todos estão ocupados e nem ligam para

quem espera. Este tempo para o atendimento, como foi verbalizado pelos

usuários, aumenta a ansiedade frente as etapas de assistência do CTA e

refletem sobre aspectos que necessitam ser reorganizados.

É possível falar de acolhimento, de humanização, quando existe uma

relação percebida pelos usuários como descaso no CTA? Diante disto, como

construir uma relação baseada nestes fatores que contribua para o processo de

inclusão no serviço de promoção a saúde dos usuários? Parece que é a partir

do acolhimento e do aconselhamento que o serviço dá suporte e ancora o

usuário que vem realizar o exame anti-HIV. Se queremos trabalhar com a

prevenção e promoção a saúde, com a construção da autonomia dos sujeitos, é

importante estabelecer relações neste território que dê referências individuais e

coletivas.

Também está implicada a questão da resolutividade do serviço e do

acolhimento, disponibilizando para os usuários informações necessárias para

atender as suas necessidades e desdobramentos cabíveis, a abordagem

integral e a humanização são fundamentais para o processo de criação de

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vínculo dos usuários com o CTA, pois é quando o usuário se percebe

respeitado em suas necessidades, podendo tornar-se autônomo e ativo no seu

processo de diagnóstico anti-HIV.

Tomando o ponto de vista dos usuários e o seu “olhar” sobre o

aconselhamento coletivo, de uma forma geral, esta etapa de atendimento,

importante elo entre o serviço e os usuários, já que é o primeiro momento de

contato que marca um momento informativo de troca e significa também o

primeiro encontro do profissional que deve minimizar a ansiedade dos usuários

frente ao teste anti-HIV e também a entrada efetiva no processo de diagnóstico.

Na fala dos entrevistados o aconselhamento coletivo foi percebido como

uma etapa de orientação e informação significativa porque para além do

conteúdo apresentado e dialogado propicia a escuta das pessoas que

compõem o grupo, oportunizando o esclarecimento de dúvidas.

O aconselhamento coletivo envolve o processo de prevenção à Aids e, a

partir da informação, sensibilizar os usuários a reflexão sobre a epidemia, os

testes, riscos e adoção de medidas preventivas diferenciadas e mais seguras.

Portanto, é necessário que os formuladores de políticas públicas

viabilizem constantes qualificações que contemplem a adequação e a

atualização dos conteúdos, assim como metodologias que apontem para a

construção da cidadania.

É interessante assinalar nos relatos dos usuários a importância do

encontro deles com os profissionais, durante os aconselhamentos pré e pós-

teste.

A comunicação dialógica que leva os usuários a um universo íntimo,

singular, implica-os num processo de percepção, reflexão, avaliação de riscos

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por vezes constrangedor. É notória a importância de uma relação acolhedora,

de troca, que traz no seu desenvolvimento a possibilidade do usuário tornar-se

sujeito de sua própria saúde.

Apesar do roteiro a ser seguido, o profissional torna-se referência para o

usuário, convidando-o a falar de suas questões individuais, estas carregadas de

sentimentos que às vezes se traduzem por angústia, medo e/ou culpa.

É pertinente observar que às vezes a pressão do fluxo do atendimento,

especialmente quando a sala de espera está cheia, pressiona os profissionais

naturalmente, interferindo nos aconselhamentos. Parece que o aconselhador

deve manter a delicadeza e a perspicácia no seu atendimento, privilegiando a

escuta, a acolhida e o tempo do usuário.

Fica a indagação: será que isso é possível? Isso acontece no dia-a-dia?

Devemos nos interrogar constantemente sobre esta prática complexa

que é o aconselhamento pré e pós-teste, um momento especial para os

usuários. É necessário agregar a peculiaridade dos profissionais

aconselhadores às necessidades específicas dos usuários e o fluxo de

atendimento do serviço. Sendo assim, tentando aproximar estas questões e

ampliando e interrogando sobre a atuação e organização do

CTA/HESFA/UFRJ.

Com relação à prática do aconselhamento pós-teste, cumpre ressaltar

que é um momento muito especial, tanto para o profissional como para o

usuário. Considerando a peculiaridade desta etapa de atendimento no CTA, e a

espera para o resultado de 25/30 dias, a orientação filosófica do serviço

preconiza minimizar a ansiedade frente ao resultado dentro de uma atitude

respeitosa, acolhedora e transparente. Essa etapa de rotina deve ser

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problematizada para os objetivos do serviço sejam garantidos.

A ética, a escuta, o reconhecimento do sofrimento do usuário frente ao

momento do resultado são fundamentais no aconselhamento pós-teste, pois no

imaginário dos sujeitos há a possibilidade de estarem infectados com o vírus

HIV e também pressões sociais em distintos níveis, desd0e a discriminação

social ao nível individual, quanto a transmissão do vírus para outras pessoas.

O oferecimento de suporte, apoio emocional e social (tanto para o soronegativo

quanto para o soropositivo), a referência para os serviços de tratamento são

imprescindíveis. Destaca-se críticas ao serviço quanto ao intervalo de tempo

entre a realização do exame e o resultado do mesmo.

O custo dos Kits para exame e a precariedade de recursos humanos e

materiais impedem o abreviamento da entrega dos resultados e interfere na

qualificação do CTA trazendo conseqüências para clientela. Ressalta-se que

nos primeiros anos deste CTA, os resultados eram fornecidos após 60 a 90 dias

da coleta de sangue. Desde 1998 houve um aperfeiçoamento na

operacionalização, contemplando as reivindicações dos usuários porém, o

tempo de espera do resultado ainda é considerado excessivo.

A questão da comunicação dos resultados aponta para a reflexão sobre

o cuidado e a proteção pessoal extensiva a quebra da cadeia de transmissão.

No momento do resultado, ou seja, no aconselhamento pós-teste, o indivíduo

percebe-se com maiores chances de aproximar as orientações recebidas no

aconselhamento à mudanças de atitude no seu estilo de vida. Assim, o

resultado em si pode ampliar as chances de proteção e de cuidado para

qualquer que seja o resultado. Diante disto, é de suma importância o

replanejamento das questões governamentais, utilizando não só novas

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tecnologias como a adoção do teste rápido, assim que cientificamente

comprovado, reduzindo o tempo de espera para o resultado, mas também

incorporando fatores humanos e materiais para a testagem na rede básica de

saúde.

Quanto a distribuição mensal de preservativos aos usuários houve

críticas em relação a quantidade disponibilizada destes insumos. Se há um

projeto do governo de proporcionar atitudes de prevenção, baseada no sexo

seguro, as unidades de saúde deveriam receber um quantitativo maior de

preservativos a serem disponibilizados aos usuários. Este CTA deverá se

estruturar melhor para incorporar ações educativas com flexibilização de cotas

de preservativo. Sabemos que as unidades de saúde não vão suprir todas as

necessidades das pessoas nem a cobertura total das ações protetoras quanto a

adoção de relações sexuais com maior segurança. A distribuição destes deve

ser previsto no planejamento do CTA e articulada junto as secretarias de saúde

do município e do estado, possibilitando o cuidado individual e contínuo.

No recorte das lições aprendidas, os usuários referem maior

responsabilidade individual e atitudes de prevenção e promoção à saúde que

apontam para melhor qualidade de vida.

O processo de aconselhamento, seja coletivo ou individual, implica na

construção de saberes, na reflexão e problematização de mudanças de

atitudes, fundamentadas numa proposta de atenção a uma vida mais saudável

e na tentativa de diminuir riscos de infecção pelo HIV.

É preciso trazer questões inovadoras para a prevenção que integrem as

dimensões da vulnerabilidade e subjetividade dos sujeitos, pois estas são

forças motrizes que devem ser acionadas nos usuários. Além disso, é

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necessário resgatar o processo de promoção à saúde que ocorre durante o

aconselhamento que, para além do risco do HIV, contempla uma complexidade

de questões que passam por fatores tais como emprego, relações de gênero,

educação, violência, planejamento familiar, entre outros.

A lógica da atenção do CTA trabalha com acolhimento, com a escuta

diferenciada, com a reflexão sobre riscos, com a autonomia, compreendendo os

sujeitos na sua integralidade, historicidade e no respeito às diferenças. Faz

parte da política do CTA trabalhar na perspectiva de saúde com a manutenção

da vida saudável, potencializando o compromisso com a vida.

Em síntese, o trabalho desenvolvido no CTA traz inúmeros desafios,

entre eles, o entrelaçamento indissociável da prevenção, promoção e

assistência. Também a capacitação constante dos profissionais do Serviço,

com especial atenção à educação em saúde, o acolhimento e o

aconselhamento que lidam com questões coletivas e individuais, tais como

sexualidade, preconceitos, direitos humanos e sociais. Também há que se

estabelecer caminhos de reorganização do Serviço frente à minimização e

resolutividade do tempo de espera do resultado. Chama atenção a ausência de

avaliação do serviço, com o intuito de manter a qualidade da assistência

prestada por este CTA.

A retomada do trabalho de redução de danos com distribuição de

insumos específicos é de vital importância, assim como o preparo dos

profissionais do CTA para o oferecimento de exames de Hepatite B e C, ora

preconizados pelo Ministério da Saúde através de políticas específicas para os

CTA.

Assim, para os caminhos futuros do CTA, serão necessárias novas

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estratégias em que as questões de prevenção e promoção da saúde,

envolvidas pela humanização, sejam rigorosamente observadas em todas as

etapas do Serviço, garantindo ao usuário autonomia e poder de decisão sobre a

própria saúde frente à epidemia do HIV/Aids.

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A N E X O S