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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE COMUNICAÇÃO CESAR DE OLIVEIRA FRANCA INDÚSTRIAS CRIATIVAS E CLASSE CRIATIVA: UM ESTUDO DE CASO DOS OCUPADOS EM ATIVIDADES CRIATIVAS NA REGIÃO METROPOLITANA DE SALVADOR EM 2005. SALVADOR 2007

CESAR DE OLIVEIRA FRANCA - Ufba...LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Figura 1. Círculos concêntricos de Throsby 47 Figura 2 - Figura 2. Indústrias criativas por Hartley 49 Figura 3 -

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE COMUNICAÇÃO

CESAR DE OLIVEIRA FRANCA

INDÚSTRIAS CRIATIVAS E CLASSE CRIATIVA: UM ESTUDO DE CASO

DOS OCUPADOS EM ATIVIDADES CRIATIVAS NA REGIÃO METR OPOLITANA DE

SALVADOR EM 2005.

SALVADOR

2007

CESAR DE OLIVEIRA FRANCA

INDÚSTRIAS CRIATIVAS E CLASSE CRIATIVA: UM ESTUDO DE CASO

DOS OCUPADOS EM ATIVIDADES CRIATIVAS NA REGIÃO METR OPOLITANA DE

SALVADOR EM 2005.

Dissertação apresentada ao Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade da Universidade Federal da Bahia. Orientador: Professor-Doutor Paulo Henrique de Almeida.

Salvador

2007

Biblioteca Central Reitor Macêdo Costa - UFBA

F814 Franca, Cesar de Oliveira. Indústrias criativas e classe criativa : um estudo de caso dos ocupados em atividades criativas na Região Metropolitana de Salvador em 2005 / Cesar de Oliveira Franca. - 2008. 163 f. Inclui anexos.

Orientador : Prof. Dr. Paulo Henrique de Almeida. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Comunicação, 2007. 1. Indústria cultural - Estudo de casos - Salvador, Região Metropolitana de (BA). 2. Pessoal da área da cultura - Estudo de casos. 3. Criatividade. 4. Propriedade intelectual. 5. Desenvolvimento econômico - Salvador, Região Metropolitana de (BA). I. Almeida, Paulo Henrique de. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Comunicação. III.Título.

CDD - 306.4098142 CDU - 316.7(813.8)

i

Márcia, obrigado pelo companheirismo, compreensão, participação e incentivo,

principalmente, nos momentos mais difíceis dessa caminhada.

ii

Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás para atravessar o rio da vida,

ninguém exceto tu, somente tu. Existem por certo, inúmeras veredas, e pontes, e semi-deuses

que se oferecerão para levar-te do outro lado do rio; mas isto te custaria a tua própria pessoa;

tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho, por onde só tu podes

passar. Para onde leva? Não perguntes, segue-o.

Friedrich Nietzsche.

iii

AGRADECIMENTOS

Aos colegas do GEPEC - Grupo de Estudos e Pesquisa em Economia da Cultura – pelo apoio

e incentivo; notadamente nas pessoas de Carmen Lima, com suas importantes sugestões que

muito contribuíram para o desenvolvimento da pesquisa; a João Matta pelas palavras de

encorajamento; a Carol Petitinga e Mércia Queiroz pelo acompanhamento no exame de

qualificação e críticas construtivas. E a Luciano Damasseno, pelo levantamento e tabulação

dos dados utilizados na pesquisa.

Ao meu orientador, prof. Paulo Henrique por ter identificado meu potencial para desenvolver

este trabalho. Aos membros da banca do exame de qualificação, Profª. Elaine Norberto e Prof.

Marcos Palacios, que de forma sincera e criteriosa colaboraram na delimitação do projeto

inicial. Ao prof. Paulo Miguez pela atenção e colaboração no desenvolvimento do trabalho.

À profª. Antonietta, minha sogra, pelo apoio, incentivo e por ter dedicado seu tempo na leitura

e correção do texto; a Silvio, meu cunhado, pela redação do abstract do trabalho; e a

Francisco, meu sogro, pelo apoio irrestrito.

Às amigas, Liana Mascarenhas e Larissa Mega Rocha, pela colaboração e pelas palavras

incentivadoras.

Aos meus pais, Eronildes e Maria Helena, e a minhas irmãs, Aline e Karina pelas orações e

por sempre acreditarem em mim. Aos meus avós, Adeodato (in memorian) e Helenita (in

memorian), exemplos de dignidade, esforço, e superação diante da vida. Obrigado pelos

ensinamentos e por todo o carinho; eu sempre terei um imenso orgulho de vocês.

A minha esposa, Márcia, pelo irrestrito apoio, participação, leitura de todas as versões do

texto, sugestões, carinho, e paciência durante esse ritual de passagem.

A todos os amigos e familiares que, pacientemente, compreenderam minha ausência nesse

período. E finalmente, ao meu anjo da guarda e ao espírito de luz que sempre me

acompanham, refúgio e fortaleza nos momentos de desespero e desorientação.

iv

RESUMO

Esta pesquisa apresenta informações sobre as indústrias criativas, um conjunto de atividades

econômicas relacionadas com o segmento cultural, que evidenciam a crescente imbricação

entre a esfera da economia e da cultura. A investigação se concentra na identificação das

principais características dos ocupados em indústrias criativas na Região Metropolitana de

Salvador (RMS), no sentido de se formatar um perfil dos mesmos e compará-los com os

demais ocupados em atividades econômicas na região. No primeiro momento, realiza-se uma

revisão da literatura que trata da relação entre cultura e economia. Apresentando o processo

de submissão da cultura à lógica mercantil no início do século XX, e a incorporação de

insumos intangíveis, inclusive culturais, no processo produtivo, vale dizer, nas mercadorias

carregadas de atributos simbólicos. Entre esses insumos, destaca-se a criatividade. O termo

indústrias criativas surge no final dos anos 1990, concebido como instrumento de políticas

públicas voltadas à promoção do desenvolvimento econômico regional, articulado com a

economia global. Do conceito indústrias “criativas” se desenvolve a idéia de cidades criativas,

que designa a aplicação de políticas dessa natureza à regeneração de antigas cidades vítimas

do processo de desindustrialização. Neste contexto, ganha centralidade a controversa teoria da

classe criativa, que vincula o desenvolvimento regional à presença de um grupo de

profissionais do setor de serviços intensivos em conhecimento. Esses seriam atraídos para

locais que desenvolvessem os 3T´s - talento, tecnologia e tolerância. Nessa dissertação, busca-

se, através de uma ótica multidisplinar, identificar, a partir de fontes de dados secundários

disponíveis, quem são e como se caracterizam os trabalhadores do segmento criativo da RMS,

região que se destaca no contexto cultural do país.

Palavras-chave: Indústria criativa, economia da cultura, classe criativa e cidade criativa.

v

ABSTRACT

This work concerns on the creative industries, a set of related economic activities with the

cultural segment and their increasing relationship between economic and cultural activities

The goal of this research is the identification of the main characteristics of labors in creative

industries in the metropolitan region of Salvador to get their profile and compare them with

other ones in the same region. First, a review of literature is presented to show the relation

between culture and economy and to point out the major aspects of the process of culture

submission to the mercantile logic of century XX with the gradual incorporation of intangible

inputs, also cultural ones, in the production process, that is, in the outputs enriched by

symbolic attributes. Among these inputs, creativity gets a major role. The concept of “creative

industries” appears in the end of 90’s, related to public policy in order to promote regional

economic development, articulated with the global economy. From the concept of creative

industries is developed the idea of creative cities that assigns the application of public policy

to recover old industrial cities victims of the process of degradation. In this context central

attention is given to the controversial theory of the creative class, that ties regional

development with the presence of a group of labors from services sector intensive in

knowledge. They would be attracted to the places that develop 3T´s - talent, technology and

tolerance. In this dissertation it is looked for, based on a multidisciplinary point of view and

using available sources of secondary data, who are the labors and their characteristics, of the

creative segment in the metropolitan region of Salvador, that stands out in the cultural context

of Brazil.

Keywords: Creative industry, economy of the culture, creative class, creative city.

vi

LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Figura 1. Círculos concêntricos de Throsby 47 Figura 2 - Figura 2. Indústrias criativas por Hartley 49 Figura 3 - Figura 3. Os 3 T’s e o desenvolvimento econômico 104 Figura 4 - Distribuição dos ocupados no segmento criativo da RMS 120

vii

LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Características das Indústrias Criativas no Reino Unido 59 Quadro 2 - Contribuição do setor criativo para as economias européias 68 Quadro 3 - Grandes Grupos de Ocupação – CBO 2002 112 Quadro 4 - Principais características e variáveis fornecidas pela PNAD 113

viii

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Estrutura de classes, como proposta por Richard Florida 103

Tabela 2 - CBO, Profissionais das ciências e das Artes 114

Tabela 3 - Ocupações da classe criativa na RMS 117

Tabela 4 - Ocupações das indústrias criativas na RMS 119

Tabela 5 - Distribuição das ocupações criativas na RMS, 2005 (%) 121

Tabela 6 - Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo segundo atributos pessoais, RMS, 2005 (%) 124

Tabela 7 - Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo conforme algumas características do mercado de trabalho, RMS, 2005 (%) 126

Tabela 8 - Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo conforme rendimentos, condição na família e número de trabalho, RMS, 2005 (%) 128

Tabela 9 - Proporção dos ocupados nos segmentos selecionados e a distribuição setorial dos ocupados na RMS (%) 130

Tabela 10 - Distribuição dos ocupados em indústrias criativas por classes de atividades econômicas da CNAE na RMS (%) 131

Tabela 11 - Amostra dos ocupados em indústrias criativas na RMS em suas respectivas classes de atividades da CNAE e equivalentes da DCMS (%) 133

Tabela 12 - Detalhamento de algumas participações dos ocupados em indústrias criativas por classe de atividades na RMS (%) 134

ix

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABS Australian Bureau of Statistics BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CBO Clasificação Brasileira de Ocupações CIIU Código Industrial Internacional Uniforme CIUO Classificación Internacional Uniforme de Ocupaciones CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas CRECE Centro de Estúdios Regionales Cafeteros y Empresariales DANE Departamento Administrativo Nacional de Estadística DCITA Department for Communications, Information Technologies and the

Arts DCMS Department for Culture, Media and Sport GATT General Agreement on Tariffs and Trade GLC Greater London Council GREFFE Registre du Commerce et dés Sociétés IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística ICT’s Tecnologias da Comunicação e Informação IIPA Aliança Internacional de Propriedade Industrial INS Instituto Nacional de Estatística do Chile IPTV Internet Protocol Television ISIC International Standard Industrial Classification ISTA Instituto Nacional de Estatística da Itália MIDEM The World´s Music Market

x

MTE Ministério do Trabalho e Emprego OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico OIT Organização Internacional do Trabalho OMC Organização Mundial do Comércio OMT Organização Mundial do Turismo OMPI Organização Mundial da Propriedade Intelectual PI Propriedade Intelectual PIB Produto Interno Bruto PNAD Pesquisa Nacional de Amostras Domiciliares PRODEC Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura RCA Radio Corporation of America RMS Região Metropolitana de Salvador SECTUR Secretaria de Turismo do Governo do México SME’s Pequenas e médias Empresas TAB Tabela TRIPS Trade Related Aspects of Intellectual Property UCPT Unidade de Coordenação do Plano Tecnológico UNCTAD Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura URBAN Urban Pilot Projects

xi

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 12 2. A RELAÇÃO ENTRE ECONOMIA E CULTURA 14 2.1 A mercantilização da cultura 16 2.2 A culturalização da mercadoria 24 2.3 A criatividade como insumo produtivo 34 3. INDÚSTRIAS E CIDADES CRIATIVAS E O ESPAÇO “GLOCAL” 40 3.1 Conceitos de indústrias criativas e o papel da propriedade intelectual 42 3.1.1 Discussão conceitual sobre indústrias criativas 44 3.1.2 As indústrias criativas e a propriedade intelectual 51 3.1.3 Contexto internacional das indústrias criativas 56 3.2 Características da expansão das indústrias criativas 64 3.2.1 Na Europa e EUA 66 3.2.2 Na Ásia e Oceania 71 3.2.3 Na América Latina 76 3.2.4 As indústrias criativas no Brasil e a política do Ministério da Cultura 82 3.3 Indústrias criativas e desenvolvimento glocal 90 3.3.1 Cidades, distritos criativos e regeneração urbana 92 3.3.2 Classe criativa e ocupações criativas? 101 4. UMA ANÁLISE APROXIMADA DAS OCUPAÇÕES CRIATIVAS NA RMS 110 4.1 Os ocupados no segmento criativo na RMS 114 4.2 Especificidades das ocupações criativas da RMS 121 4.3 Detalhamento dos ocupados em indústrias criativas na RMS 130 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 137 6. REFERÊNCIAS 143 7. ANEXOS 155

12

1. INTRODUÇÃO

As transformações implementadas pela revolução tecnológica, iniciada no final da década de

1970, provocaram uma progressiva desmaterialização do valor do produto industrial, na

medida em que cresceu a participação de conhecimento, informatização e serviços no

processo produtivo. Entre as conseqüências desse processo, a criatividade se torna o principal

insumo da produção material.

No final dos anos 1990, as indústrias “criativas” surgem como objeto de políticas públicas,

que abrem novas perspectivas para o desenvolvimento econômico. Elas representam uma

convergência entre os setores das artes tradicionais, as indústrias culturais e as novas

tecnologias digitais. Esta fusão vem sendo objeto de estudo em diversas regiões do mundo,

inclusive na América Latina. São atividades econômicas baseadas na criatividade e talento das

pessoas, que geram emprego e renda, predominantemente através da exploração dos direitos

de propriedade intelectual.

A pesquisa aqui proposta está centrada na análise da dimensão do segmento criativo da

Região Metropolitana de Salvador (RMS), a partir dos dados de ocupação. Esta dimensão é

uma das características da RMS que garante sua projeção no cenário nacional.

Os dados de ocupação permitem construir um perfil dos ocupados em indústrias criativas na

RMS, evidenciando a dimensão e as características dos mesmos em relação aos demais

ocupados em outros segmentos econômicos.

Além das indústrias criativas, um outro conceito utilizado na pesquisa é o de classe criativa,

desenvolvido por Richard Florida (2002). Esse conceito controverso designa um grupo de

pessoas que têm em comum a capacidade de utilizar a criatividade no desenvolvimento de

suas atividades profissionais.

A metodologia proposta identifica os códigos existentes na Classificação Brasileira das

Ocupações (CBO) que têm relação com o conceito de classe criativa de Florida (2002). Em

seguida, para obter as ocupações que fazem parte das indústrias criativas da RMS, realiza uma

nova seleção de alguns códigos da CBO, que foram considerados pelo Sistema de Indicadores

Culturais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

13

Os dados sobre essas ocupações são coletados da Pesquisa Nacional por Amostra de

Domicílios (PNAD), que abrange a população residente em domicílios particulares

permanentes e unidades de habitação em domicílios coletivos e fornece diversas

características socioeconômicas dessa população.

No primeiro capítulo, analisa-se a crescente aproximação dos campos da cultura e da

economia que tem como marco o desenvolvimento das indústrias culturais no inicio do século

XX, bem como, as características atuais dessa convergência, provocadas pela terceira

revolução tecnológica, que ampliou a participação da cultura na economia e instaurou uma

nova dinâmica sócio-econômica.

A segunda parte do trabalho apresenta uma discussão conceitual sobre as indústrias criativas,

o contexto internacional em que surgem, aspectos relativos à sua expansão por diversos

países, incluindo o Brasil, e a relação da temática com os conceitos de cidades criativas e de

classe criativa. Esses que permitem visualizá-las como instrumento de políticas públicas

destinadas ao desenvolvimento regional.

O capítulo final expõe uma análise sobre o perfil dos ocupados no segmento criativo da RMS,

realizada a partir dos conceitos utilizados. A investigação pretende apresentar as principais

características desses ocupados, seus atributos pessoais e as condições de mercado em que

estão inseridos, comparando-as com os demais ocupados na RMS.

14

2. A RELAÇÃO ENTRE CULTURA E ECONOMIA

Nesse capítulo, aborda-se a crescente aproximação dos campos da cultura e da economia, que

ocorre no intervalo entre o início do desenvolvimento das indústrias culturais no século XX, e

a atual revolução tecnológica. De um lado, uma maior participação da cultura na economia;

de outro, uma nova dinâmica sócio-econômica marcada pela centralidade da cultura.

No final do século XVIII, a economia passa a ser reconhecida como uma disciplina do

pensamento. O cenário de uma revolução industrial fez com que as análises econômicas

priorizassem os impactos da industrialização na sociedade. Este aspecto contribuiu para que a

economia nesse período não considerasse as atividades artísticas e culturais como produtivas.

Porém, os fenômenos culturais não deixaram de ser observados por vários economistas, ainda

que, de forma pontual.

A análise da relação entre a cultura e a economia sempre esteve caracterizada por um

ceticismo, uma impossibilidade, originado pelo processo de significação da cultura na Europa

e pela deturpação da teoria crítica da escola de Frankfurt. Esta posição foi reproduzida ao

longo da história derivando num consenso sobre a existência de interesses opostos entre a

função de consumo das obras e o ato de criação artístico e cultural. Porém, com a

consolidação das indústrias culturais, a cultura foi submetida à lógica de exploração mercantil

e passou a ser produzida para camadas mais numerosas da população. Isto demandou novas

reflexões sobre a relação entre cultura e economia (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1988).

A mercantilização da cultura representa esse conjunto de transformações na produção e

distribuição dos produtos culturais que destacaram o potencial econômico da cultura na

primeira metade do século XX. Nesse período, a implantação das novas mídias - rádio,

cinema, televisão, long-plays, etc – ao mesmo tempo em que, permitiu às camadas mais

numerosas da população o acesso à cultura, foi fundamental para construção de grandes

conglomerados econômicos (HESMONDHALGH, 2002).

15

A revolução tecnológica desencadeada durante a década de 1970 viabilizou a crescente

incorporação de insumos intangíveis na cadeia produtiva industrial. E a cultura, que antes

estava submetida à lógica de exploração mercantil, passou a ser demandada como insumo

industrial com a finalidade de atender a crescente demanda por bens duráveis ou não duráveis

carregados de valores culturais - simbólicos, estéticos, sociais -, um novo fluxo denominado

como culturalização da mercadoria (ALMEIDA, 2006).

Esta tendência é comprovada pela expressiva produção de bens simbólicos, detentores de uma

dupla face, mercadorias e significações. Segundo Bourdieu (1998), o sistema de produção de

bens simbólicos e a sua própria estrutura estão intimamente associados à constituição

progressiva de um campo intelectual e artístico, ou seja, a autonomização progressiva do

sistema de relações de produção, circulação e consumo dos mesmos1.

Dessa forma, aspectos relacionados ao gosto, estilo, costumes, prestígio e tradição passam

para centralidade da expressão econômica da vida social (FENOLLAR; MAYA, 2004). A

demanda em diversos quadros sociais por novidade, diferenciação, etc vem fazendo da

criatividade, objeto de estudo de psicólogos, sociólogos, teóricos de artes entre outros

segmentos científicos, um valorado insumo intangível que gradativamente é submetido a

investigações econômicas.

1 A autonomia do campo intelectual e artístico se dá em relação aos campos econômico, político e religioso, ou seja, em relação a todas aquelas instâncias que pretendem legislar na esfera cultural em nome de um poder e/ou uma autoridade que não é propriamente cultural. De acordo com Pierre Bourdieu, o processo de autonomização do campo artístico liga-se a uma série de outras transformações: a constituição de um público de consumidores cada vez mais amplo e socialmente diversificado, a constituição de um corpo igualmente numeroso e diferenciado de produtores e empresários de bens simbólicos e, por fim, a multiplicação das instâncias de consagração (Bourdieu, 1998).

16

2.1 MERCANTILIZAÇÃO DA CULTURA

Na primeira metade do século XX, a cultura é submetida à lógica da exploração mercantil em

escala. Este fenômeno foi uma das conseqüências da segunda revolução industrial, que

propiciou inovações tecnológicas aplicadas no aperfeiçoamento da fotografia e na criação de

novos meios de comunicação, como o rádio, o cinema e mais tarde a televisão. O fenômeno

foi analisado por teóricos da escola de Frankfurt, que cunharam o conceito de indústria

cultural como resultado de uma reflexão sobre as características da prática social do consumo

de bens e serviços culturais através do mercado.

Conforme Adorno (1947), a indústria cultural é a integração deliberada, a partir do alto de

seus consumidores, impondo a união de domínios separados há milênios, da arte “superior” e

da arte “inferior”, por meio do aumento da produtividade econômica. Esse processo, que por

um lado permitiu um maior acesso à cultura, por outro conferiu ao aparelho técnico e aos

grupos sociais que o controlavam uma superioridade sobre o resto da população. Para Adorno,

a indústria cultural era uma organização econômica e política cujos interesses sistêmicos

enganavam seus consumidores, fazendo-os crer que estes eram sujeitos do processo, quando

na realidade esses eram seus objetos (ADORNO; HORKHEIMER, 1947).

Entretanto, para Kracauer e Benjamin, o progresso técnico traduzido pela indústria cultural

viabilizou, ainda que acidentalmente, as condições para uma democratização da cultura, ao

transformar os bens culturais em objeto de produção industrial. No entanto, apesar de Adorno

não negar que os meios técnicos possuíssem um potencial democrático e progressista, a sua

leitura crítica o fez sustentar que não seria nessa direção que se desenvolveriam (RÜDIGER,

2001).

O termo indústria cultural deriva de uma tendência filosófica de crítica social, que evidenciou

a crescente importância dos fenômenos de mídia e da cultura de mercado na formação do

modo de vida da sociedade. A lógica implementada pelo conceito da indústria cultural era

uma maneira de esclarecer as transformações sociais produzidas com o desenvolvimento do

capitalismo, designando uma prática social pela qual a produção cultural/ intelectual passou a

ser orientada em função de sua possibilidade de consumo de mercado. Na concepção do

termo, destaca-se a conversão da cultura em mercadoria e ao processo de subordinação da

17

consciência à racionalidade capitalista, ocorrido nas primeiras décadas do século XX. Em

essência, o conceito, no singular, não se refere às empresas produtoras e às técnicas de

comunicação (RÜDIGER, 2001).

Existem divergências no debate sobre a função e importância do fenômeno da cultura de

massa no capitalismo, seja do ponto de vista estético-literário ou sociológico; mas as análises

convergem para o mesmo lugar: o momento em que o fato cultural torna-se ao mesmo tempo

um fato industrial. Foi nesse instante que a noção de cultura de massa e, conseqüentemente, a

de indústria cultural, foram formuladas (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1988).

Segundo Edgar Morin (1967), a cultura de massa não se define como “cultura inferior” ou

“superior”, mas como uma “terceira cultura”, que tem sua origem no rádio, cinema, televisão

e na imprensa e que se desenvolve em paralelo às culturas clássicas - humanísticas e religiosas

- nacionais. Porém, dois elementos são importantes e comumente fazem parte das definições

da indústria cultural. Primeiro, trata-se de uma produção cultural conforme as normas de

mercado; segundo, esta produção destina-se a uma massa social aquém e além das estruturas

internas da sociedade – classes, famílias etc... – e que pode ser propagada pelas técnicas de

difusão maciça ou mass media (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1988).

Embora a construção do conceito indústria cultural não possua uma contribuição de

economistas, sua crescente utilização na literatura acadêmica e política permitiram novas

análises sobre a relação entre cultura e economia. Segers e Huijgh (2005) apresentam uma

proposta cronológica sobre as fases das indústrias culturais desde o final da segunda guerra

mundial, quando um contexto de mudanças culturais, econômicas, políticas e sociais

corroboraram para o desenvolvimento das mesmas.

A primeira fase, de 1945 a 1975, resulta das novas possibilidades oferecidas pelas inovações

tecnológicas para o campo da comunicação, favorecendo o desenvolvimento de corporações

profissionais de radiodifusão e conseqüentemente a expansão de um novo mercado. Como

será abordado a seguir, essas inovações foram derivadas de um contexto de guerra. A partir de

1947, pode ser observada uma distinção entre os EUA e a Europa quanto à filosofia, natureza

e o grau de intervenção do Estado no campo das indústrias do audiovisual e nos campos das

artes e cultura (SEGERS; HUIJGH, 2005).

18

Na Europa, se estabelece a intervenção estatal com elaboração de sistemas de subsídios para

favorecer os setores culturais nacionais detentores de prestígio, deixando para o mercado, por

meio dos monopólios de radiodifusão, a oferta de produtos culturais em escala. Esta posição é

justificada devido ao desenvolvimento do conceito cultura na Europa através do debate

franco-alemão, em que a palavra estabeleceu relações diretas com o poder e a significação dos

estados nacionais2 (CUCHE, 2002).

Nos EUA, que não sofreram tão radicalmente os efeitos econômicos e sociais da guerra e não

tinham que competir no mercado em expansão com concorrentes estrangeiros, foi defendido o

princípio do livre fluxo das informações. Com base no mercado americano, a hegemonia das

corporações transnacionais Yankees impôs as regras do mercado cultural mundial no após-

guerra. Uma ilustração desse domínio pode ser constatada pelo acordo de Blum-Byrnes entre

os EUA e a França sobre as cotas de importações de filmes americanos e o período de

exibição dos mesmos nas salas francesas (MATTERLART; 2005). O processo de

internacionalização do mercado cultural, que já havia se iniciado antes da segunda guerra

mundial, se acelerou com o advento da televisão nos anos sessenta3 (SEGERS; HUIJGH,

2005).

Ainda durante a primeira fase, em 1966, William Baumol e William Bowen publicam

Performing Arts: the Economic Dilemma, que se transforma no marco histórico do

pensamento econômico no campo da cultura. Trata-se do primeiro trabalho sistematizado

sobre a economia da cultura, que teve como objeto as artes de representações ao vivo. No

estudo, eles constataram a seguinte particularidade nas atividades artísticas: a tendência para o

aumento incontrolável dos custos de produção. Essa constatação ficou conhecida como

“doenças dos custos”.

2 O debate franco-alemão do século XVIII ao século XX é arquétipo de duas concepções de cultura, uma particularista e outra universalista, que contribuem para a definição do conceito nas ciências sociais contemporâneas (CUCHE, 2002). 3 Processo de produção capitalista que teve seu início no final do século XIX quando o capitalismo superou sua fase tipicamente concorrencial e evoluiu para formação de monopólios, trustes e cartéis. O fenômeno resulta da concentração de capital associada a estruturas empresariais centralizadas que desenvolveram estratégias internacionais para ampliação de mercados. (SANDORNI, 2005) A primeira corporação global de mídia surge no século XIX, através de agências imperiais de notícias - Reuters e Havas - da França e da Inglaterra (HESMONDHALGH, 2002).

19

Dessa forma, o setor cultural, normalmente intensivo em trabalho, diferia da maior parte dos

setores econômicos, pois, não era sensível aos ganhos de produtividade tecnológicos;

conseqüentemente, seus custos relativos se mantinham elevados. Concomitantemente,

verificaram que os salários dos artistas e técnicos não tendiam à estagnação e acompanhavam

os níveis de remuneração dos demais setores. Instaurado o dilema, a única solução sugerida

era que parte dos custos dos espetáculos fosse assumida pelo Estado ou por fomentadores, por

uma questão de viabilidade econômica (FLORISSI; VALIATI 2005).

A maioria das companhias como a RCA (Radio Corporation of America), dos EUA, formava

imensos conglomerados, em cujos interiores coexistiam indústrias com características e

formas de funcionamento diferentes (HESMONDHALGH, 2002). No caso da RCA, seus

interesses alcançavam ao mesmo tempo a produção de bens eletrônicos de consumo, a

exploração de canais de televisão e a produção de programas. Essa característica era resultado

da concentração de capital vigente no próprio setor, concentração tanto horizontal quanto

vertical em países desenvolvidos.

Na concentração horizontal, a empresa participa de vários empreendimentos, mas sempre num

mesmo ramo de produção. Na vertical, a empresa procura controlar as diversas fases de

produção de um mesmo produto. Caparelli (1982), observa também na produção cultural de

massa, a existência da concentração diagonal, que seria a associação entre capitais de outros

ramos de produção e aqueles direta ou indiretamente relacionados à indústria cultural. Alguns

exemplos desse tipo de concentração são visualizados com multinacionais da informação

norte-americanas, cujos capitais se associam a redes hoteleiras, agências de viagens e locação

de carros; ou com a Fiat italiana, proprietária da Editora Rizzoli, do Corrie dela Sera e La

Stamp (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1988).

Dessa forma, observa-se que as corporações do setor além de serem proprietárias de jornais,

rádios, televisão, também controlavam agências de informação, de publicidade e redes de

distribuição. Outra característica, já visível nesta primeira fase das indústrias culturais (1945-

1975), era a grande dificuldade de penetração de novos concorrentes no mercado. Essa

situação conhecida economicamente como elevada barreira à entrada no mercado, era

justificada pelos altos custos de produção, distribuição e pela própria natureza perecível de

seus produtos.

20

Em resumo, a primeira fase de desenvolvimento das indústrias culturais apresenta relações

com os trinta “gloriosos” anos do capitalismo, período caracterizado pelo bem-estar social

utilizado para reconstrução da Europa. Sob a perspectiva política, observa-se uma crescente

oposição entre a Europa e os EUA, uma vez que os americanos defendem a ampla

liberalização do setor audiovisual junto às negociações do GATT (Acordo Geral de Tarifas e

Comércio), enquanto os europeus suspendem as negociações e adotam medidas protecionistas

para o setor (SEGERS; HUIJGH, 2005).

Segundo Segers e Huijgh (2005), na segunda fase, de 1975 a 1995, aparecem os primeiros

sinais de midiatização da cultura e a expansão do princípio tradicional das artes sob o rótulo

de “cultura popular”. Também nesse período, as políticas culturais ganham visibilidade com a

França, Inglaterra e Holanda. Nos demais países europeus, os setores culturais e audiovisuais

se desenvolvem dentro de um mercado competitivo com agentes públicos e privados. Com

relação às indústrias culturais, observa-se a crescente participação das mesmas em setores até

então exclusivos de políticas públicas governamentais, e a sua expressiva expansão nos

setores tradicionais como música gravada e publicações impressas.

O processo de marketização da cultura se destaca no período como resultante de outros quatro

movimentos (MURDOCK, 2003; HESMONDHALGH, 2002, apud SEGERS e HUIJGH,

2005). Primeiro, a ascensão do neoliberalismo nos EUA e Reino Unido através das gestões

Reagan e Tatcher, que passaram a defender os interesses de suas corporações transnacionais,

deslocando o debate “cultural” da órbita Unesco (Organização das Nações Unidas para a

educação, a ciência e a cultura), instituição criada em 1946 (TUNSTALL, 1986; SCHILLER,

1989 apud SEGERS; HUIJGH, 2005). Segundo, a privatização das organizações de mídia

estatais, que criou condições para o desenvolvimento do mercado audiovisual europeu.

Terceiro, as alterações nas legislações que regulamentavam o setor, propiciando maior

flexibilidade no âmbito da mídia e telecomunicações, ou seja, novas regras e novos

mecanismos de controle estatais (MURDOCK, 2003; HESMONDHALGH, 2002,

TUNSTALL, 1986 apud SEGERS; HUIJGH, 2005), e por fim, a expansão de sociedades

anônimas como resultado da profissionalização do setor e do crescimento do mercado. Tudo

isso impactou as políticas públicas para organizações não lucrativas.

21

As mudanças acima mencionadas estimularam as instituições governamentais a adotarem, na

medida do possível, estratégias administrativas presentes em organizações comerciais, como

indicadores de desempenho e de rendimento (MURDOCK, 2003; FLIGSTEIN, 1990 apud

SEGERS; HUIJGH, 2005). Esse conjunto de fatos confirma o processo de mercantilização da

cultura, e sua crescente importância nos campos econômico, político e social, ratificando sua

dimensão transversal e a complexidade dos fenômenos a ela relacionados.

Ao analisar a cultura como mercadoria, observa-se que no princípio o fenômeno consistia na

produção de obras de arte segundo um padrão de gosto bem-sucedido, e no desenvolvimento

de técnicas para colocá-las no mercado. A colonização pela publicidade gradativamente o

tornou mecanismo de mediação estética integrado à produção mercantil, momento em que a

produção cultural é obrigada a passar pelo filtro da mídia enquanto máquina de publicidade. A

produção estética foi amplamente integrada à produção mercantil, influenciando no

comportamento das pessoas fazendo-as crer numa existência dependente de sua capacidade de

consumo e dos modelos de conduta veiculados pelos meios de comunicação (RÜDIGER,

2001).

A consciência específica desses setores só se mantém agora, no entanto, em certas reservas, pois as leis de mercado já penetraram na substância das obras, tornando-se imanente a elas como leis estruturais. Não mais apenas a difusão e a escolha, a apresentação e a embalagem das obras, mas a própria criação delas enquanto tais, se orienta, nos setores amplos da cultura de consumo, conforme os pontos de vista da estratégia de vendas no mercado (HABERMAS, 1962 apud RÜDIGER, 2001, p.139).

O processo de mercantilização da cultura está relacionado ao desenvolvimento e afirmação de

uma sociedade de consumo, derivada das próprias transformações do capitalismo. Nesse

sentido, foram estabelecidos novos padrões de comportamento que passaram a ser

significantes para as pessoas. E essa lógica do consumo, segundo Baudrillard (1995),

enalteceu o mundo dos objetos através de conotações diferenciais de estatuto dos mesmos, de

forma que essa nova sociedade lhes atribuísse um sentido, obedecendo um código de

significações.

Qualquer indivíduo ou grupo, antes mesmo de assegurar a sobrevivência, encontra-se na urgência vital de ter de produzir-se como sentido num sistema de trocas e de relações. Simultaneamente com a produção de bens, há urgência em produzir significações, sentido, em fazer com que exista o um-para-o-outro antes que o um e o outro existam para si (BAUDRILLARD, 1995 p.64).

22

A cultura, ao ser submetida à lógica mercantil e midiática, característica de uma sociedade de

consumo sob o estereótipo de “cultura popular”, fez com que fossem engendrados

mecanismos de publicidade para sua viabilidade. Este movimento retrata o avanço do

capitalismo sobre os bens simbólicos, questão fundamental já apontada por Adorno e

Horkheimer, através do esclarecimento de uma lógica de produção que ameaçava suas

características originais no momento em que os submetiam ao capital. Em outras palavras, a

indústria cultural consentiu que, durante o próprio instante da concepção dos bens simbólicos,

esses já se apresentassem como mercadoria, impedindo-os que aguardassem a esfera da

circulação para tal transformação. Segundo Featherstone (1999), a indústria da cultura

ofereceria a perspectiva de uma cultura manufaturada, na qual a discriminação e o

conhecimento da cultura seriam inundados e substituídos por uma cultura de massa, em que a

recepção seria imposta pelo valor de troca (seu valor instrumental de mercado ou de moeda

corrente).

A mercantilização da cultura potencializa a tecnologização da cultura com a proliferação das mídias e das “indústrias culturais”. Neste último caso, o termo passa a ter um sentido radicalmente distinto da noção oriunda da Teoria Crítica, significando apenas indústrias que produzem cultura, ou melhor, cultura produzida industrialmente, mesmo que não submetida à lógica mercantil. A tecnologização da cultura, por fim, faz aparecer a cultura midiatizada, componente vital da circunstância cultural, em especial dos séculos XX e XXI (RUBIM, 2005, p.4).

Nesse contexto, ao se analisar a “cultura industrializada” sob uma ótica econômica, a questão

central reside na submissão da produção cultural às leis gerais da produção e circulação de

mercadorias. Segundo Goldenstein (1987), há uma diferença entre os bens culturais e os

produtos culturais. Os primeiros podem ser também mercadorias, enquanto que os produtos

são mercadorias integralmente. Na categoria dos bens culturais estão contempladas as obras

culturais e artísticas, cujas regras de concepção e elaboração distinguem-se da lógica do

sistema social, embora sejam eventualmente passíveis de comercialização. Já a segunda

categoria contempla os produtos típicos das indústrias culturais, uma vez que esses são

concebidos como mercadorias e destinados ao mercado com o objetivo de lucro

(FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 1988).

Apesar das diferenças, o desenvolvimento das indústrias culturais permitiu a irreversível

imbricação entre os campos da cultura e da economia no final do século XX e início do século

XXI. A representativa produção de bens simbólicos e a sua importância para a economia

contemporânea são resultantes de um processo que se iniciou com a segunda revolução

23

industrial. Segundo Bourdieu (2005), o desenvolvimento do sistema de produção desses bens

é paralelo a um processo de diferenciação cujo princípio reside na diversidade dos públicos

aos quais as diferentes categorias de produtores destinam os seus produtos, e cujas condições

de possibilidade residem na própria natureza dos bens simbólicos.

Conforme Bourdieu (2005), os bens simbólicos constituem realidades com dupla face,

mercadorias e significações, cujos valores propriamente cultural e mercantil subsistem

independentes, mesmo nos casos em que a aprovação econômica reafirma a consagração

cultural. Talvez este processo possa ser ironicamente uma armadilha do próprio código

simbólico da sociedade capitalista, uma vez que, enquanto cultura, potencializa resultantes

mais complexas de si mesma.

Estabelecendo um diálogo com essas idéias, pode-se contemplar a significância de um novo

fenômeno nos dias atuais: a culturalização da mercadoria, isto é, a crescente relevância que

valores culturais passam a incorporar aos bens de consumo, fazendo-os transformarem-se

numa das principais instâncias globais que legitimam condutas e valores sociais, e que

engendram o comportamento social contemporâneo.

24

2.2 CULTURALIZAÇÃO DA MERCADORIA

A premissa de que a cultura, costume e tradição não eram pertinentes à análise econômica foi

introduzida por Jeremy Bentham (1789), o precursor do utilitarismo. Para ele, essas questões

representavam um conjunto de atividades irracionais que interferiam na aplicação da razão

pura, na maximização da felicidade. Os economistas, nesse período, consideravam que essas

atividades artísticas e culturais não produziam riqueza, embora reconhecessem que

colaboravam para atenuar a melancolia e a tristeza das pessoas4.

Com base nessas idéias, questões relativas ao gosto e estilo para ele eram irrelevantes à

análise econômica. No seu trabalho, observa-se uma influência da moral protestante e uma

conseqüente preocupação com o valor moral do trabalho. Além disso, constata-se um

desprezo referente às formas de consumo conspícuo, ou seja, atos de consumo como meio de

aquisição, manutenção e ou exibição de status social praticados pela classe ociosa, um grupo

de pessoas que exploravam a natureza pecuniária de suas propriedades. Dessa maneira, o

legado de Bentham corroborou para um maior distanciamento da economia em relação às

questões das artes e manifestações culturais (CHARTRAND, 1990).

Entre o final do século XIX e o início do século XX, Thorstein Veblem (1887) critica a

economia neoclássica - escola do pensamento econômico predominante entre 1870 e a

primeira guerra mundial, baseada na teoria do valor-utilidade - por adotar um comportamento

racional, egoísta e maximizador para traduzir a natureza humana e as instituições sociais. Ele

elaborou a teoria do instinto, na qual insiste em que a produção é um fenômeno social e

cultural. Nela considerou a produção um processo social em que os seres humanos

compartilhavam conhecimentos e habilidades, passavam-nos de uma geração à outra e

cooperavam socialmente para transformação da natureza, a fim de adaptá-la às necessidades e

aos usos do homem5 (HUNT, 1989).

4 Embora a expressão seja encontrada na Grécia antiga, Jeremy Bentham a estruturou como um sistema filosófico, em que toda felicidade estaria na obtenção do útil, ou seja, na aproximação máxima do prazer e afastamento da dor (SANDRONI, 2005). 5 O termo “instinto” refere-se a padrões comuns de comportamento humano, não se encontra associado a um comportamento animal, e sim, aos modos habituais de atividades e relacionamentos humanos, que, por convenção, foram transformados numa trama institucional. Essas características também estavam presentes na vida econômica, e em outras áreas de conduta humana (HUNT, 1989).

25

Desse modo, Veblen destacou a existência e importância da cultura nas questões econômicas,

uma vez que, apenas num quadro histórico de referência institucional específica é que os

padrões comuns do comportamento humano adquiriam características concretas e

particulares. Ele apresentou noções sobre a importância do processo de significação,

desenvolvido pelo homem ao se relacionar com seus semelhantes e com os objetos.

Como toda cultura humana, esta civilização material é um esquema de instituições – trama institucional e crescimento institucional...O desenvolvimento da cultura é uma seqüência cumulativa de hábitos, e suas maneiras e meios são a reação habitual da natureza humana às exigências que variam incessante e cumulativamente, mas com uma seqüência coerente nas variações cumulativas em andamento – incessantemente, porque cada novo movimento cria uma nova situação que induz a mais uma variação da maneira habitual de reagir; cumulativamente, porque cada nova situação é uma variação do que foi antes e incorpora como fatores causais tudo o que tenha sido provocado pelo que tenha vindo antes; em seqüência coerente, porque os traços subjacentes da natureza humana (propensões, aptidões etc.) que provocam a reação e que servem de base para a formação dos hábitos permanecem substancialmente inalterados (Veblen,1961 apud HUNT, 1989, p.347).

Para Veblen, a cultura e as instituições sociais é que diferenciavam os seres humanos dos

outros animais. Os traços humanos comuns a todos os seres humanos, que eram muito mais

maleáveis do que os dos animais, só podiam ser encontrados, em sua expressão concreta e

real, num contexto cultural (HUNT, 1989). Sob este aspecto, o domínio cultural e social dos

costumes por uma determinada classe seria fundamental para a perpetuação de uma lógica de

acumulação e ostentação.

Para conseguir e conservar a estima dos homens, não basta a simples posse da riqueza ou poder. A riqueza e o poder têm que ser mostrados claramente, pois a estima só é conseguida diante da evidência. E a evidência da riqueza serve para impressionar os outros quanto à importância de quem a tem, e para manter vivo e alerta este senso de importância, mas pouco valor tem para criar e manter a auto-satisfação (VEBLEN, 1965 apud HUNT, 1989, p.368).

Subsidiado nessas reflexões, Veblen apresenta, em seu livro The Theory of the Leisure Class

(1899), uma descrição detalhada da classe ociosa responsável pelo direcionamento da

sociedade que ostentava sua proeza predatória, através de um consumo conspícuo e do uso

conspícuo do lazer. Conforme Veblen, em todas as sociedades divididas em classes, os

poderes predatórios de um homem ou de um grupo eram tidos na mais alta estima. Numa

sociedade capitalista, as pessoas que aperfeiçoavam tal capacidade possuíam o status mais

honroso na estratificação social e faziam questão de exibir ornamentos sofisticados e caros,

que condiziam com uma conduta pródiga a ser cultuada, e essencial para inspirar respeito

(VEBLEN, 1899).

26

As reflexões de Veblen subsidiam a compreensão sobre a relevância social do consumo na

sociedade capitalista, no momento em que ele o relaciona a crescente significância das

questões culturais. Para isso, ele evidencia um processo de emulação em que, a posse da

riqueza e sua ostentação, por uma determinada classe, lhe confere honrarias. Trata-se da

distinção adquirida com o “culto da inveja” num contexto de competição social que se

desenvolveu junto com a propriedade privada (TASCHNER, 2000).

Apesar dos hábitos de consumo da classe ociosa não estarem relacionados com o lazer tal

como é entendido no sentido contemporâneo, eles corroboraram para a instauração de uma

busca incessante das pessoas para alcançar um determinado padrão de acumulação, que,

quando atingido, transformava-se em estágio inicial de um novo nível de riqueza a ser

perseguido (TASCHNER, 2000). Desse modo, as idéias desse economista divergiam da

concepção de Bentham, a partir do momento em que considerava um complexo conjunto de

relações sociais inseridas no ato do consumo, as quais não poderiam ser restringidas à

concepção abstrata de uma utilidade.

As questões relacionadas ao gosto, estilo, costume, prestígio e tradição, ou seja, questões,

anteriormente consideradas irracionais, passaram gradativamente à centralidade da expressão

econômica da vida social, através de uma prática social de consumo simbólico. As pessoas

compram produtos não apenas pelo que eles são, mas também pelo que significam, elas

imprimem um significado social aos produtos, sentenciando o valor das coisas pelo prisma

das relações interpessoais. Isto implica que uma porção significativa do consumo tem

eminentemente um caráter social (LEVY, 1959; MCGRAW et al, 2003; SOLOMON, 1983

apud FENOLLAR; MAYA, 2004).

A investigação do caráter social no ato do consumo evidencia a influência do estilo de vida,

um conjunto unitário de preferências distintivas que exprimem, na lógica específica de cada

um dos subespaços simbólicos - mobília, vestimentas, linguagem - a mesma intenção

expressiva, princípio da unidade de estilo que se entrega diretamente à intuição e que a

análise destrói ao recortar em universos separados (BOURDIEU, 1994). Dessa maneira, o

princípio do estilo de vida reside na propensão e aptidão à apropriação - material e/ou

simbólica – de uma determinada categoria de objetos ou práticas classificatórias que pode ser

definida como gosto.

27

Segundo Bourdieu (1984), determinadas constelações de gosto, preferências de consumo e

práticas de estilo de vida são associadas com ocupações específicas e frações de classe, que,

de certa forma, viabilizam mapear o universo do gosto e os estilos de vida com todas as suas

oposições estruturadas e as suas distinções finamente nuançadas, que operam num ponto

específico da história. Porém, no interior das sociedades capitalistas, o volume da produção de

novos bens resulta numa luta infindável com a finalidade de obtenção do que Hirsch (1976)

denominou de “bens posicionais”, ou seja, bens que definem status social

(FEATHERSTONE, 1999).

A constante oferta de novos bens, desejáveis e da moda, ou usurpação de bens requintados por

um estrato mais baixo, conduz àqueles que pertencem a um estrato superior a necessidade de

investir em novos bens (informacionais), a fim de restabelecer a distância social original e

assegurar características distintivas entre as classes. Segundo Featherstone (1999), nosso

emprego no tempo, em relação às práticas de consumo, nos conforma a nossos hábitos de

classe e, portanto, transmite uma idéia precisa de nosso status de classe.

Os argumentos apresentados pelos cientistas sociais auxiliam no esclarecimento da dimensão

social do consumo nas sociedades capitalistas contemporâneas e a sua centralidade, uma vez

que nota-se uma tendência à superprodução de bens simbólicos. Esses bens que possuem uma

dupla realidade, mercadorias e significações, traduzem a crescente transversalidade da cultura

na esfera da economia, e expressa novas complexidades inerentes à realidade em permanente

construção. Estes novos elementos denotam uma impossibilidade em se obter uma leitura

definitiva ou coerente do desnorteante fluxo de signos, imagens, informação, modas e estilos,

conforme observado por Baudrillard (FEATHERSTONE, 1999).

Nesse cenário, há uma crescente incorporação de diferentes estilos de vida, moda e tendências

estéticas nos bens ofertados para o consumo na contemporaneidade. Esses bens simbólicos,

repletos de significação, passam a ser utilizados na construção de uma identidade social,

diferente do que ocorria em períodos históricos anteriores, quando as identidades eram

engendradas por grandes ideologias. Hoje, são materializadas pela participação num

progressivo consumo globalizado de objetos simbólicos e pela organização de identidades em

comunidades transnacionalizadas de consumidores (CANCLINI, 1995 apud BERMÚDEZ,

2002). Ao considerar a natureza simbólica desses bens que são ofertados no mercado,

constata-se a direta incorporação da cultura nos atos de produção e consumo, não apenas do

28

ponto de vista da variedade e quantidade da oferta, mas também do ângulo de como e porquê

eles são consumidos.

Considerando a existência de um consumo cultural, a sua demanda não é meramente

determinada pela oferta, mas precisa ser compreendida no contexto de um quadro social, em

que a prática do consumo é eminentemente relacional e ativa (APPADURAI, 1986 apud

FEATHERSTONE, 1999). Nesse sentido, a atitude de consumir uma mercadoria não reside

apenas na seleção, aquisição ou uso do produto, mas, na significação social que as pessoas

passam a atribuir aos bens simbólicos auferidos, e à forma que serão utilizados.

Na contemporaneidade, esta tendência é observada pela expressiva e crescente produção de

bens simbólicos, efetivando uma irreversível imbricação entre a cultura e a economia. Este

fato passa a ser caracterizado como um novo fenômeno: a culturalização da mercadoria.

Segundo Almeida (2006), trata-se da incorporação de valores culturais - simbólicos, estéticos,

espirituais ou sociais - aos bens duráveis e não duráveis de consumo. Esses valores passam a

determinar o valor de mercado dessas mercadorias, uma vez que, no ato de consumo há um

destaque para o significado social que as mesmas podem fornecer aos consumidores.

A influência da natureza simbólica nessas mercadorias leva os indivíduos a buscarem formas

diferentes de afiliação social, através do consumo. Esses indivíduos se transformam em atores

sociais que fazem do uso dessas mercadorias uma forma de reconstruir projetos de identidade,

a partir do momento em que passam seu próprio estilo de vida para uma esfera de difusão

pública (HOLBROOK, 2001 apud FENOLLAR; MAYA, 2004), através do uso desses

produtos, e criando limites sociais de distinção (FEATHERSTONE, 1998 apud FENOLLAR

e MAYA, 2004). Exemplificando o processo, Featherstone (1999) observa a relevância de

novos intermediários culturais como: o design, a marca, as artes gráficas, a publicidade, a

moda, o estilo etc, na concepção das mercadorias que são consumidas.

Os intermediários culturais se originam de um conceito geral de mediação. Estes

protagonistas traduzem-se especificamente nas funções de intermediação, aliando ao conceito

de origem o prefixo “-inter-”, para circunscrever as realidades nas quais se processa, com o

sufixo “-ção-”, de ação (HENNION, 1993 apud MADEIRA, 2002). Portanto, a definição de

intermediário cultural, conforme a palavra indica, baseia-se na pressuposição clássica de um

processo de criação artística dividido entre produção, intermediação e recepção. Desta forma,

29

o intermediário cultural é aquele que serve de canal, de facilitador da ligação entre dois

mundos (produção e consumo, princípio e fim) que, estando separados, são conectados e

passam a ter sentido num determinado contexto (MADEIRA, 2002).

...a cultura é o próprio elemento da sociedade do consumo; sociedade alguma jamais

foi saturada com signos e mensagens como esta... existe uma onipresença da

imagem, no capitalismo do consumo, as prioridades do real tornam-se revertidas e

tudo é mediado pela cultura (JAMESON, 1979 apud FEATHERSTONE, 1999).

Atualmente, um bem de consumo tangível como o automóvel possui cada vez mais, na

composição do seu valor de mercado, insumos intangíveis como o design, o estilo e a sua

marca como principais componentes que assegurarão a distinção e o prestígio social a quem

adquiri-lo. De certa forma, com a culturalização da mercadoria, o culto ao aspecto conspícuo

do consumo é potencializado por agregar componentes ainda mais simbólicos e esses, por sua

vez, são responsáveis por viabilizar distinção aos indivíduos que fazem parte de determinado

contexto cultural. Através dessa análise, constata-se que o automóvel não pode ser restringido

à sua função elementar de transporte, uma vez que passa a representar um determinado estilo

de vida que poderá ser evidenciado pela sociedade (FEATHERSTONE, 1999).

A reflexão permite observar que, além de um estilo de vida baseado no consumo, acontece um

consumo motivado pelos insumos imateriais agregados a certos bens disponibilizados no

mercado e que, de certa maneira, auxiliam na própria construção de uma identidade social.

Consome-se cada vez mais moda através das concepções de Prada, Armani, Christian Dior,

Ives Saint Laurent, Gucci etc. e de suas tendências, do que simplesmente roupas. E essa

atitude favorece a própria lógica de acumulação de capital cultural. Segundo Throsby (2001),

o capital cultural é definido como um recurso que pode ser incorporado a bens materiais, ou

adicionado a qualquer bem valorado economicamente capaz de fornecer aos mesmos valores

culturais.

O capital cultural pode existir sob as formas tangível e intangível. A primeira é apresentada

pelas construções, locações, lugar, arredores, trabalhos artísticos como: pinturas e esculturas,

artefatos entre outros. A segunda, pelo capital intelectual sob forma de idéias, práticas,

convicções e valores que são compartilhados pelo grupo. Essa forma de capital também existe

em trabalhos artísticos como a música e a literatura que vêm à mente como bens públicos. A

utilização desse estoque de capitais, existente em determinado período de tempo, pode

30

originar fluxos de serviços importantes que farão parte diretamente do consumo final ou que

poderão ser combinados com outras contribuições para produzir futuros bens e serviços que

possuirão valores econômicos e culturais, que modificarão o nível de capital cultural estocado

(THROSBY, 2001).

O conceito de capital cultural cunhado por Bourdieu (1986) aplica-se às relações sociais

efetuadas num sistema de trocas, e que se estendem pela demanda por bens materiais e

simbólicos numa determinada conjuntura social. Esta noção é importante, pois viabiliza uma

articulação entre a cultura e a economia, ao considerar características que enaltecem o aspecto

intangível incorporado ao processo de produção de vários bens.

Outra questão a ser considerada são as mudanças sócio-políticas e econômicas ocorridas

durante o século XX. Elas viabilizaram o crescimento do tempo de lazer, a disponibilidade de

renda e o grau de educação dos indivíduos, e corroboraram para a transição dos hábitos de

consumo de massa dos anos cinqüenta e sessenta para os mercados de nicho dos anos setenta

e oitenta. O crescimento da demanda por bens e serviços simbólicos, em outras palavras,

engendrou não apenas a expansão desse mercado, mas também a sua proliferação e

fragmentação. Devido a esta tendência, as companhias tiveram que reestruturar radicalmente

suas operações para serem capazes de detectar e atender múltiplos nichos e volatilidade

crescente dos mercados.

Um clássico exemplo desse processo foi observado no desenvolvimento da empresa Benetton.

Ela utilizou uma sofisticada estratégia de marketing, baseada em profundo conhecimento de

mercado, para atender essas diversificadas áreas de consumo. Um consumo material

exercitado cada vez mais pelos atributos culturais das mercadorias, que auxiliam na

construção de uma identidade social. Um traço reflexivo do consumo contemporâneo que

passa a representar uma tendência à estetização da própria vida cotidiana (O`CONNOR,

2002).

Estas novas formas de consumo - dinâmico, altamente segmentado, crescentemente cultural -

colocaram o componente cultural de muitos bens de consumo na vanguarda do seu valor

econômico. A incorporação do design nos bens fabricados é cada vez mais importante.

Porém, esta vocação não se restringe às indústrias de design – nas quais habilidades de

artesãos e conhecimento do negócio começam a se articular mais rapidamente aos voláteis

31

circuitos de valores culturais - ela é pontencializada para eletrônica, computação, e outros

equipamentos utilizados no processo de produção cultural (O`CONNOR, 2002).

Os fatos resumidos demonstram a centralidade dos bens simbólicos, e nesse cenário observa-

se que a evolução das próprias indústrias culturais, conforme destaca Almeida (2006), adquire

um significado inédito, uma vez que, produtos culturais como a música, cinema, TV, rádio,

Internet, games, moda, desenhos, artesanato e o turismo cultural ganham relevância e se

tornam áreas de excelência. Progressivamente, não se consomem mais os aparelhos, mas o

que eles oferecem: o simbólico, as sensações, o conteúdo e as emoções. Na realidade, a

cultura potencializa sua dimensão simbólica que confere sentido à realidade ao se incorporar

aos bens, aos produtos, aos serviços, aos comportamentos, ao estilo de vida e a toda trama de

relações humanas.

A relevância da cultura na economia também é observada na evolução das indústrias

culturais. Recorrendo à cronologia de Segers e Huijgh (2005), a primeira fase caracterizou-se

pelo processo de mercantilização da cultura; a segunda, de 1975 a 1995, pela continuidade e

expansão do processo de comercialização da cultura. E no final desse período, os fenômenos

proporcionados pela terceira revolução tecnológica como a digitalização e as novas mídias

tecnológicas permitiram a integração das indústrias culturais, telecomunicações e multimídias,

originando novas indústrias como: vídeo, jogos de computador, softwares e a Internet. Essas

transformações intensificaram a marketização da cultura e viabilizaram um novo mercado

global (BAGDIKIAN, 2000; MURDOCK 2003; MOSCO 1996 apud SEGERS; HUIJGH,

2005).

A diversificação dos produtos e a intensificação da convergência tecnológica ampliaram o

poder dos conglomerados culturais, implicando no desaparecimento das pequenas

companhias. Porém, essas mudanças também propiciaram a participação de novos atores

nesse mercado; pequenas companhias locais passaram a participar do núcleo produtivo desses

conglomerados como espaços estratégicos de independência criativa. Elas se especializaram

nos aspectos estruturais da criação, em vez da simples produção seriada de produtos culturais

(SEGERS; HUIJGH, 2005)6.

6 A convergência tecnológica pode ser definida como a capacidade do uso de uma mesma plataforma de rede de telecomunicações para transporte de diferentes serviços: telefonia, vídeo, música e internet. Uma tendência

32

Na terceira fase, a partir de 1995, visualiza-se um cenário mais híbrido, uma vez que,

tendências que se originaram na primeira fase, resultando na mercantilização da cultura, e se

desenvolveram na segunda, atualmente atingem uma espécie de auge cíclico com a

culturalização da mercadoria. Segundo Segers e Huijgh (2005), complexidade se tornou a

palavra chave para descrever a contemporaneidade do campo cultural do qual as indústrias

culturais fazem parte.

A revolução do uso das mercadorias, incluindo as culturais, pode ser observada sob a ótica

dos consumidores, pela ascensão de uma economia da experiência. Essa representa um

estágio avançado da economia de serviços, derivado do processo da "customização de massa".

A experiência é uma distinta oferta de serviços, caracterizada por fornecer memoráveis

sensações que permanecerão por muito tempo na memória dos indivíduos que as vivenciarem.

Isto exige uma participação ativa dos mesmos durante o consumo, um atributo inerente numa

gama de produtos culturais (GILMORE; PINE, 1999 apud SEGERS; HUIJGH, 2005).

O crescimento do consumo cultural apresenta um caráter aparentemente contraditório. Por um

lado, há um crescimento do tempo gasto com as novas mídias, especialmente como parte da

assim chamada “cultura de apartamento” (CONSELHO DA EUROPA 1995 apud SEGERS;

HUIJGH, 2005). Por outro, o consumidor vem se afeiçoando às experiências coletivas através

da participação massiva em eventos ao vivo de todos os tipos como festivais, jogos

esportivos, parques temáticos, concertos, entre outros. Assim, diferentes atividades culturais

ofertadas disputam a atenção do consumidor construindo um cenário no qual o processo de

sedução se torna ainda mais complexo e difícil de ser efetivado7 (MOMMAAS, 2000 apud

SEGERS; HUIJGH, 2005).

Em resumo, constata-se que os movimentos de mercantilização da cultura e de culturalização

da mercadoria explicam a transversalidade da cultura, bem como a sua crescente importância

na economia. A terceira revolução tecnológica viabilizou a digitalização, e com ela a

utilização de novas mídias, o que vem permitindo a expansão do fenômeno da convergência e crescente é o desenvolvimento de produtos e serviços cruzados entre empresas de diferentes setores da indústria de comunicação e entretenimento (QUINTELLA; CUNHA, 2004). 7 A cultura de apartamento é uma conseqüência das novas tecnologias através do desenvolvimento das indústrias de entretenimento caseiro - DVD, games, computadores, etc - que proporcionam a difusão de uma cultura de massa individualizada (VOGEL, 2004, FARCHY, 1999, GARNHAM, 1990, RUTTEN; SMEETS, 1997, KING; SAYRE, 2003 apud SEGERS; HUIJGH, 2005).

33

uma crescente oferta de bens e serviços simbólicos. Bens que constituem realidades com

dupla face, mercadorias e significações, cujos valores cultural e mercantil subsistem

independentes.

Concomitantemente, o ato de consumo passou a ser central, uma vez que hábitos, estilos de

vida, comportamentos sociais, entre outros elementos intangíveis são incorporados às

mercadorias, interferindo na construção da própria personalidade dos usuários. Além dessas

questões, estudos recentes focalizam a criatividade como um princípio axial das

transformações econômicas e sociais do início do século XXI. Todos estes fatores estão inter-

relacionados, expressando a conjuntura atual da relação entre cultura e economia.

34

2.3 A CRIATIVIDADE COMO INSUMO PRODUTIVO

No início do século XXI, os objetos e serviços consumidos demandam cada vez mais insumos

culturais, entre eles a criatividade. O termo está relacionado à habilidade para criar algo novo,

derivando do verbo criar, inicialmente utilizado para designar algo divino, sendo aplicado

para descrever as atividades artísticas e seu processo genuíno, a dotação de um talento

concedido por Deus (THROSBY, 2001).

Recorrendo às teorias da criatividade, observa-se a contribuição de William Duff (1767). Para

ele, o processo de inspiração do artista ocorria devido a três elementos principais: a

imaginação, que buscava nas idéias existentes condições para inventar novas idéias, através

de associações entre elas; o julgamento, que regulava e controlava a imaginação e classificava

as idéias geradas; e por fim, o gosto, que se referia à sensibilidade interna do artista que

arbitrava entre o que era majestoso ou intermediário, bonito ou feio, decente ou ridículo. Esta

espécie de intuitividade para mensurar o trabalho intelectual vem sendo reproduzida até os

dias atuais8 (THROSBY, 2001).

Segundo Throsby (2001), esta noção de gênio criativo vem sendo desafiada pela crítica pós-

moderna através de dois pontos fundamentais: primeiro, a criatividade não pode ser definida

apenas por termos especificamente individuais, pois não há nenhum modo absoluto para

identificação de um padrão de gênio, pois nessa instância, qualquer julgamento é um

problema de relatividade, inconstante e instável. Segundo, a valorização da criação artística

acontece num determinado contexto político-social que destina assuntos de gosto e

julgamento às classes poderosas da sociedade9.

Há algum tempo, o conceito de criatividade como uma força dinâmica do comportamento

humano vem sendo objeto de estudo entre psicólogos, sociólogos, teóricos de artes, entre

outros campos que variam do comportamento infantil à administração empresarial. Porém, a

8 Durante os séculos XVII e XVIII, a palavra gênio não abarcava a superioridade de um indivíduo em relação aos demais, um status social como atualmente é compreendida, mas era utilizada como forma de pensamento – gênio como uma fonte de inspiração criativa. Havia uma associação religiosa ou pelo menos espiritual com esta noção: o artista como um canal de um poder superior, criatividade como um presente de Deus, a imaginação como uma centelha divina (THROSBY, 2001, p. 94). 9 Segundo Karl Marx, a ideologia dominante numa sociedade é a ideologia da classe dominante. Dessa forma, a manipulação e legitimação do campo simbólico são fundamentais. Portanto, o gosto da classe dominante tende a prevalecer (MARTINS, J. S.; FORACCHI, M., 1977).

35

criatividade só entrou no discurso da economia como geradora de inovação e precursora de

mudanças tecnológicas. Mesmo assim, o pensamento criativo foi sempre considerado uma

variável exógena ao processo de produção (THROSBY, 2001).

Atualmente, a culturalização da mercadoria impele análises econômicas sobre a importância

da criatividade como variável endógena ao processo de produção, principalmente o cultural,

que, por si mesmo, é um processo criativo que incorpora valores culturais e econômicos às

mercadorias.

Nesse cenário, Rothauer (2004) observa uma transferência do valor criativo das artes para

diversos negócios. Esse movimento não é inédito na produção de design, moda, cinema e

novas mídias, que embora sejam tecnologicamente avançadas, possuem uma criatividade

tradicionalmente incorporada em sua concepção. A novidade é o modo como o emblema da

criatividade viabiliza uma alteração dentro dos valores. O que era uma característica estrutural

do trabalho artístico – individualidade, autonomia, independência, flexibilidade, ingenuidade,

imaginação, inovação, subversividade – agora cria uma nova forma de comércio cultural que

admite muito mais reconhecimento do que a motivação meramente artística.

Rothauer efetua as seguintes ponderações: primeiro, os governos estão utilizando estes

valores pela primeira vez como pilares de uma nova política social e econômica; segundo, a

economia promove criatividade e conteúdo como importantes fatores para a competição no

mercado; terceiro, a sociedade focaliza o debate na geração de uma mudança do valor da

estabilidade e segurança para a independência, a flexibilidade, a diversidade; e por fim, a

ciência estimula uma rede móvel e inovadora do conhecimento da sociedade.

Associadas às transformações apresentadas por Rothauer (2004), Tepper (2002) salienta que

alterações na economia, como a globalização, a digitalização, a explosão da propriedade

intelectual e as mudanças no consumo de lazer, estão fomentando um efeito catalizador nos

campos de arte e cultura. Essa reação pode ser observada pela crescente representatividade do

valor econômico gerado pela cultura e sua capacidade de promoção do desenvolvimento local.

Uma característica dessa disposição pode ser notada no processo de customização em massa,

engendrado pelas indústrias culturais, e ratificado pela prática de consumo com a finalidade

de identificação social.

36

Apesar dos diferentes modelos de negócio das atividades culturais, existem especificidades

identificadas pela economia da cultura. Seus produtos são freqüentemente perecíveis e

possuem um alto risco de fracasso. São comercializados para audiências locais em diferentes

linguagens, mas competem com produtos internacionais de apelo global, caracterizando a

complexa estrutura dos mercados. Esses são voláteis, pois dependem diretamente da moda,

tendências e incertezas de consumo, sendo que alguns dos setores são normalmente

conduzidos por sucessos (cinema e música são alguns exemplos); e por fim, deve-se levar em

conta o papel social que essas atividades possuem como ferramentas de comunicação.

(STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE, 2006).

As novas tecnologias potencializam as dimensões econômicas das atividades culturais e

criativas e, ao mesmo tempo, demandam e dependem de conteúdo diversificado e com

qualidade para a sua expansão. A necessidade de conteúdos culturais para abastecer os

espaços digitais proporcionados pelas novas mídias e suas convergências pode ser ilustrada

pelos seguintes exemplos (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE,

2006):

- O número de plataformas de distribuição de canais se multiplicou e, ao mesmo

tempo, acontece um aumento da demanda de conteúdo atraente para alimentá-las.

Por exemplo, o setor de televisão não está mais restrito às faixas de freqüência

livremente disponibilizadas, pois os canais digitais estão se expandindo por cabo,

satélite e Internet.

- Devido ao alcance global da Internet, modelos econômicos tradicionais de

distribuição em massa são suplantados por novos modelos econômicos de

customização. Esta demanda por conteúdo representa uma oportunidade para

novos empreendimentos e novos atores.

- A tecnologia digital habilitou o advento de novas aplicações e serviços ricos em

conteúdo como, vídeo-sob-demanda, IPTV, downloads de música e vídeo,

podcasting etc10.

10 São as iniciais de Internet Protocol Television; é um sistema no qual o serviço de televisão digital é disponibilizado aos assinantes através da Internet, usando o seu protocolo através de uma conexão de banda larga. Ela representa um sistema de televisão de perfil fechado, com distribuição sobre uma rede não pública, ao

37

Nesse panorama, a criatividade exerce um papel central na disponibilização de conteúdo para

este volátil mercado cultural e demais seguimentos da economia. Para isso, ela desencadeia

um processo de inovação, combinando diversas dimensões: idéias, habilidades, tecnologia,

administração e produção. Dessa forma, a transversalidade da cultura não é apenas analisada

como uma fonte de consumo final (como no caso de filmes, livros, música, cultural, turismo

etc.), mas como uma fonte de consumo intermediário no processo de produção. (STUDY ON

THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE, 2006).

O tempo e o espaço, que caracterizam o fundamento teórico e a dinâmica da criatividade,

apresentam uma característica de subordinação. A criatividade por si só pode ser considerada

um produto original e específico de uma geração. A pintura artística, o design industrial, o

cinema, a moda, e até mesmo os modelos e objetos cerâmicos de decoração podem estar

marcados por ondas de criatividade de um determinado período de uma geração. Porém, a

renovação da criatividade se estabelece por influências cultivadas pelas gerações

subseqüentes que instituirão novas imbricações entre o tempo e o espaço. Além disso, o

conflito dinâmico desenvolvido na sucessão de uma geração para outra deve considerar a

oposição entre atores da geração emergente e os atores da geração dominante que

controlavam as instâncias e critérios da produção cultural em busca do sucesso e realização

pessoal (SANTAGATA, 2004).

Na realidade, as ondas de criatividade consideradas por uma geração resultam do caráter

idiossincrático dos bens baseados na cultura. E o sentido entre as pessoas, cultuado na relação

entre o tempo e o espaço, possui uma força para criar a imagem e marcar toda uma geração. A

qualidade essencial da cerâmica que foi produzida em Caltagirone durante os anos cinqüenta,

não pode ser reproduzida numa feira nos anos dois mil. As idéias, a cultura, as tecnologias de

comunicação, a prática de marketing e o estilo mudaram. Dessa forma, toda geração tem sua

própria identidade, características, e sua própria essência criativa (SANTAGATA, 2004).

Um exemplo da importância do valor econômico agregado pela criatividade pode ser

representado pelo design aplicado na produção de bens e serviços, nem sempre relacionados à

finalidade cultural. Ele adiciona um valor estético e ergonômico para produtos funcionais. Por

contrário do que acontece com a Internet. Podcasting é uma forma de publicação de programas de áudio, vídeo e/ou fotos pela Internet que permite aos utilizadores acompanhar a sua atualização. A palavra podcasting é uma junção de iPod - um aparelho que toca arquivos digitais em MP3 - e broadcasting - transmissão de rádio ou televisão - (WIKIPEDIA, 2006).

38

exemplo, quando o designer Robin Sheppard (1989) projetou uma embalagem para o produto

da empresa Ty Nant, ele incorporou um conjunto de valores simbólicos que permitiu que essa

mercadoria chegasse às mesas dos restaurantes diferenciados, estabelecendo uma significação

social para a água mineral11 (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE,

2006).

Nesse caso, a criatividade permitiu que o produto incorporasse atributos simbólicos

demandados por uma determinada camada da social. Esta diferenciação fortaleceu o capital

cultural da marca registrada Ty Nant e posicionou a empresa no mercado. Para Norberto

(2004), as marcas são inscrições num produto que têm o poder de levar o observador a um

processo de reenvio e de associação; são signos que fazem o indivíduo pensar em determinada

característica dos bens, produtos e serviços; numa região de origem, num mestre artesão ou

numa ocasião de uso.

A centralidade da marca e das leis de propriedade intelectual refletem a importância dos

insumos intangíveis, como a criatividade para a economia contemporânea. O conceito de

rendimento monopólico de Harvey (2003) pode ser utilizado para esclarecer esta nova

configuração. A abstração designa que todo rendimento baseia-se no poder monopólico de

proprietários privados de certas partes do globo. Ele surge, pois os atores sociais podem

perceber um fluxo ampliado de renda num tempo extenso em virtude de seu controle

exclusivo sobre algum item, direta ou indiretamente comercializável que é, em alguns

aspectos fundamentais, único e não duplicável.

Realizando uma analogia com as indústrias culturais observa-se que, em meados dos anos

1990, a companhia Disney havia estabelecido uma sociedade com a empresa de animação

Pixar, para a produção conjunta de películas de animação tridimensional. Todos os produtos

foram sucessos de bilheteria, como Toy Story, Procurando Nemo e Os Incríveis. Para garantia

11 Ty Nant é uma marca de água mineral que aplicou design ao recipiente de seu produto. Sua inovação consistiu na utilização de uma garrafa azul-cobalto bem projetada, diferenciada em sua forma e cor das garrafas tradicionais. Em 1989, a marca foi lançada no luxuoso hotel Savoy em Londres e ganhou o “First Glass” , o primeiro de uma longa lista de prêmios pelo design (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE, 2006).

39

da continuidade desse rendimento monopólico, a Disney comprou a Pixar impedindo que seus

concorrentes explorassem os recursos criativos existentes na mesma12.

Segundo Ronald Grover, jornalista da revista BusinessWeek (2006), essa negociação foi

estrategicamente importante para a Apple Computer Inc, pois a consolidou como a principal

fornecedora online de conteúdo de vídeo digital, tal como já era de música para a Disney.

Conseqüentemente, a Intel foi também beneficiada com o sucesso da Apple, por ser a

fornecedora dos processadores para os computadores que permitirão o funcionamento desse

novo sistema de conteúdo digital. Conforme Harvey (2003), quanto maior a competitividade,

maior é a tendência para o oligopólio, portanto não é por acaso que a liberalização e

competitividade dos mercados, nos últimos anos, produziram concentração do capital. Desse

modo, observa-se uma cadeia de rendimentos monopólicos derivados da criatividade.

Os exemplos demonstram que a criatividade, singularidade, autenticidade, entre outras

dimensões da vida social, são determinantes para a apropriação dos rendimentos monopólicos

e o fortalecimento da lógica de acumulação do capital. Segundo Banaji (2005), a criatividade,

outrora considerada variável exógena ao processo de produção, passa a ser identificada como

uma resposta potencialmente próspera para negociar ou viabilizar transformações

econômicas.

A qualidade singular da sociedade capitalista: não que ela deixe de trabalhar com um código simbólico, mas que o código trabalha como um conjunto aberto, respondendo a eventos que comanda e assimila ao mesmo tempo para produzir versões mais amplas de si mesmo (SAHLINS, 2003, p.184).

Os argumentos apresentados sobre a culturalização da mercadoria e o papel da criatividade,

enquanto insumo econômico, refletem a imbricação entre cultura e economia. Segundo Kong

(2000), um outro aspecto que consolida essa relação é a crescente significação das atividades

culturais e criativas em políticas destinadas a fomentar dinamismo econômico. Entre essas

ações governamentais são destacadas as indústrias criativas.

12 GROVER, Ronald. Disney-Pixar: It´s a wrap:The deal would make Steve Jobs the Mouse House's biggest shareholder, and it could shake up the industry. Businessweek Ed. The McGraw-Hill Companies, 24 Jan. 2006. Disponível em: <http://www.businessweek.com/technology/content/jan2006/tc20060124_959402.htm> Acesso em: 20 dez. 2006.

40

3. INDÚSTRIAS E CIDADES CRIATIVAS E O ESPAÇO “GLOCA L”

As indústrias criativas e sua difusão estão relacionadas com a articulação entre os campos da

economia, da cultura e da política na contemporaneidade. Esta relação foi dinamizada pela

terceira revolução industrial que viabilizou a ascensão de uma economia com a crescente

agregação de insumos intangíveis aos produtos e serviços disponibilizados pelo mercado. O

termo surge no início da década de noventa, mas foi desenvolvido pelo governo de Tony Blair

(1997) através do Departamento de Cultura Mídia e Esportes (DCMS, 1998) como proposta

política para revitalização da economia do Reino Unido.

A política implementada pelo Departamento de Cultura Mídia e Esportes (DCMS, 2001)

enfatizou as indústrias criativas como atividades baseadas na criatividade individual, com o

potencial de gerar emprego e renda, por meio da exploração dos direitos de propriedade

intelectual. Dessa forma, o conceito foi concebido e os resultados econômicos obtidos foram

os responsáveis pela sua popularização.

Entretanto, isto não significa que exista um consenso sobre a proposta. Um exemplo são os

questionamentos de estudiosos sobre a carência do componente simbólico na proposta, frente

ao destaque dado à propriedade intelectual. Outra questão refere-se à natureza variada das

atividades classificadas como indústrias criativas pelo DCMS, que suscita críticas quanto aos

critérios estabelecidos, uma vez que atividades relacionadas com o patrimônio foram

desprezadas, face à inclusão de outras menos representativas (CUNNIGHAM, 2002).

Apesar das divergências, a idéia remete a uma convergência conceitual e prática entre os

setores relacionados às artes tradicionais, às indústrias culturais e às novas tecnologias

(HARTLEY, 2005). Talvez isso contribua para dificuldades de distinção entre as indústrias

criativas e outros termos como: indústrias de conteúdo, indústrias do copyright e as indústrias

culturais. Porém, a proposta fomenta um resgate do papel da cultura como um fator a ser

considerado para o desenvolvimento econômico, ainda que articulada por um discurso

neoliberal.

A presença das ambigüidades não impede que a expansão da proposta para diversos países

aconteça. Isto ocorre por meio de iniciativas políticas dos formuladores, gestores,

organizações e ministérios com o objetivo de promover o desenvolvimento. E nesse cenário

41

se observa a apropriação da idéia por variados países, ora privilegiando setores já pré-

estabelecidos, ora, no sentido de fortalecer atividades emergentes (CUNNIGHAM, 2003).

Outro desdobramento das indústrias criativas está relacionado à revitalização de cidades

degradadas pela antiga lógica de desenvolvimento industrial. Cidades como, Manchester,

Liverpool, Bilbao entre outras, vêm sendo cenário de políticas pró-indústrias criativas com o

intuito de fornecer novas alternativas de trabalho para suas populações e a renovação urbana

desses locais. Esta articulação permite o aparecimento do termo cidades criativas, ou seja,

espaços urbanos que buscam utilizar as novas tecnologias e a cultura articulando-as com uma

economia global, embora, nem sempre de forma simultânea (SCOTTI, 1997).

Para Richard Florida (2002), esses espaços urbanos também seriam o habitat da classe

criativa. Esta seria caracterizada pela combinação de três fatores, o talento, a tolerância e a

tecnologia, os 3(T´s) que deveriam ser desenvolvidos para garantir o fluxo de novas pessoas

que agregariam esta classe, porém esta teoria vem sendo questionada por inúmeros

estudiosos.

Este é o cenário das indústrias criativas, termo que, apesar de ser afirmado por seu potencial

econômico na geração de emprego e renda, não negligencia a sua relação com a cultura. E

esta aproximação remete, por outro lado, a sua atuação como veículo de transmissão de

identidade cultural. São estas as características que refletem nos desafios colocados por este

novo conceito ainda em formação.

42

3.1 Conceitos de indústrias criativas e o papel da propriedade intelectual

O termo indústrias criativas emerge, no contexto da economia do conhecimento, caracterizado

pela intensificação das relações entre a informação, o conhecimento e a criatividade. Este

processo foi fomentado por novas formas de tecnologias de comunicação e informação

(ICT’s). Dessa forma, Leadbeater (1999) defende que os ativos intangíveis, como marcas e

know-how, passam a ser, ainda mais, reconhecidos como vantagens competitivas,

fundamentais para expansão de mercados destinados a atender uma crescente demanda por

inovação13. (FLEW, 2002).

Esta nova configuração também passa a afetar diversos setores da economia, principalmente

as atividades relacionadas aos serviços. Segundo Handke (2004), o setor de serviços era

ignorado pelas pesquisas relacionadas à inovação, mas, atualmente ele vem se confirmando

como um dos mais dinâmicos em inovação, e as indústrias criativas representam uma das

vanguardas desse movimento. Alguns economistas culturais discutem que a referida

criatividade seria uma analogia da palavra inovação, que passou a ser utilizada por atividades

econômicas ligadas à cultura para minimizar uma vinculação com o setor industrial

tradicional.

Nesse cenário, surge a discussão sobre um conceito de indústrias criativas frente à emersão de

diversas terminologias, indústrias do copyright, indústrias de conteúdo e conteúdo digital,

bem como, as já constituídas indústrias culturais. Para Cunnigham (2002), a convergência

digital permite uma melhor compreensão das relações contemporâneas entre a comunicação,

as novas mídias, e as indústrias criativas, por ser uma das principais responsáveis por esta

dinâmica. A convergência digital estaria presente, em menor ou maior grau, em expressões

utilizadas para caracterizar atividades econômicas relacionadas à produção de bens

simbólicos, sob focos diferentes14.

13 O termo economia do conhecimento foi cunhado para identificar a tendência das economias avançadas em reconhecerem a crescente importância da informação, da tecnologia e do aprendizado no desempenho econômico(OCDE, 1996; apud FLEW, 2002). 14 Convergência digital está relacionada às possibilidades viabilizadas pelo processo de digitalização das mídias tradicionais (WIKIPEDIA, 2007). Disponível em:<http://en.wikipedia.org/wiki/Digital_convergence> Acesso em 15.06.07.

43

Desse modo, as indústrias criativas seriam caracterizadas pela natureza do trabalho

incorporado com ênfase para os indivíduos criativos; as indústrias do copyright seriam

definidas pela natureza do ativo e do produto industrial; as indústrias de conteúdo estariam

relacionadas com o foco da sua produção industrial; as indústrias culturais seriam associadas

em função de políticas públicas e financiamentos; e as aplicações de conteúdo digital estariam

definidas pela combinação da tecnologia com foco na produção industrial (HARTLEY, 2005).

A utilização de cada uma das expressões acima estaria justificada pelo foco desejado, e talvez

a convergência digital explicasse a presença simultânea de algumas atividades como música,

artes performáticas, audiovisual, nas diferentes categorizações, estabelecendo, assim, as áreas

de sombra. Apesar dessa incerteza, Cunningham (2002) considera que as indústrias criativas e

as indústrias culturais estariam no topo da cadeia das indústrias de serviços, devido às

características do direito autoral, da inovação e do risco envolvidos em seu processo de

produção.

Para Towse (2003), as indústrias criativas seriam uma projeção das indústrias culturais, que

produzem bens e serviços com um conteúdo artístico suficiente para ser considerado criativo e

culturalmente significante. As suas características básicas são a produção em escala industrial

combinada com o conteúdo cultural. Esse conteúdo seria originário do trabalho de artistas, e

também estaria associado à significação social estabelecida no consumo dos bens (HANDKE,

2004).

O problema da delimitação setorial que envolve as indústrias criativas alimenta a querela

conceitual sobre as mesmas. Além disso, o aspecto político, a expressividade dos resultados

econômicos auferidos, e a questão da propriedade intelectual caracterizam o hibridismo da

proposta. Esse hibridismo pode, de certa forma, explicar a inexistência de um consenso sobre

elas, mas se observa que, no momento, o que existe de fato são desafios diante de uma

influência conceitual britânica.

44

3.1.1 Discussão conceitual sobre indústrias criativas

A articulação entre economia, cultura e política assume um novo estágio com o surgimento do

termo indústrias criativas. Ele foi utilizado pela primeira vez no início da década de noventa,

pelo documento do governo Australiano, chamado Nação Criativa, porém foi desenvolvido e

difundido pelo governo Britânico em 1997 através do Departamento de Cultura Mídia e

Esportes (DCMS) com o projeto intitulado Creative Industries Taskforce (UCPT, 2005).

Segundo o DCMS (2001), as indústrias criativas são atividades que têm sua origem na

criatividade, habilidade e talento individual, com potencial para geração de emprego e renda

através da exploração da propriedade intelectual. O DCMS considerou como indústrias as

seguintes atividades: publicidade, arquitetura, mercado de artes e antiguidades, design, moda,

filmes, vídeos e outras produções audiovisuais, design gráfico, software educacional e de

lazer, música, artes performáticas e entretenimento, difusão através da televisão, rádio e

internet, escrita e publicação.

A natureza variada das atividades vem suscitando questionamentos e debates sobre a

categorização adotada. Conforme críticos, um exemplo é a omissão do setor de patrimônio da

lista, apesar dele possuir características econômicas, criativas e culturais mais representativas

do que alguns dos setores considerados (CUNNIGHAM, 2002). Questões como essa

caracterizam a querela conceitual sobre as indústrias criativas contudo, a proposta do DCMS

foi internalizada pelo governo como economicamente estratégica, devido ao foco na geração

de emprego e renda. E os direitos de propriedade intelectual (PI) justificariam a assimetria

entre as atividades incluídas (REIS, 2007).

Dessa forma, constata-se que o termo surgiu como uma proposta política porém, não há um

consenso sobre sua definição, nem no campo político nem no acadêmico. Existe controvérsia

inclusive ao se propor uma diferenciação entre as indústrias criativas e as indústrias culturais.

Enquanto a proposta do DCMS inclui diversos setores - inclusive não culturais - capazes de

gerar direitos de PI, existem conceitos de indústrias culturais que não incorporam

restritamente setores que geram PI. Nesse caso, não há uma sobreposição das indústrias

criativas junto as culturais, e sim áreas de interseção (REIS, 2007).

45

Para a UNESCO (2006), o termo indústrias culturais refere-se às indústrias que combinam a

criação, a produção e a comercialização de conteúdos criativos que são intangíveis e de

natureza cultural. Normalmente esses são protegidos por copyright e podem se transformar

em bens e serviços. Já as indústrias criativas supõem um conjunto mais amplo de atividades

que incluem, além das indústrias culturais, toda a produção artística e cultural. São àquelas

nas quais os produtos e serviços contêm um elemento criativo substancial.

No campo literário, o primeiro autor a abordar as indústrias criativas foi Richard Caves (2000)

em seu livro intitulado, Indústrias Criativas: Contratos entre Artes e Comércio, e publicado

no ano de 2000. Neste, foram enfatizadas as propriedades econômicas e contratuais das

indústrias criativas, em detrimento das posições favoráveis e contrárias ao subsídio para as

artes (FLEW, 2000).

“Creative” industries supply goods and services that we broadly associate with cultural, artistic, or simply entertainment value. They include book and magazine publishing, the visual arts (painting and sculpture), the performing arts (theatre, opera, concerts, dance), sound recordings, cinema and TV films, even fashion and toys and games (CAVES, 2000 apud FLEW, 2002, p.6).

As Indústrias Criativas provêem bens e serviços que nós amplamente associamos ao valor cultural, artístico, ou simplesmente valor de entretenimento. Eles incluem publicação de livros e revistas, as artes visuais (pinturas e esculturas), as artes performáticas (teatro, ópera, concertos, dança), gravações de músicas, filmes e televisão e, até mesmo moda, brinquedos e jogos (CAVES, 2000, apud FLEW, 2002, p. 6).

Conforme Flew (2000), Caves se preocupou em identificar elementos comuns

economicamente entre as atividades criativas subsidiadas e não subsidiadas. Entre eles

destacam-se:

a) incerteza sobre a provável demanda para os produtos criativos, pelo fato deles serem “bens de experiência”, ou seja, bens que carecem de informações para os compradores antes do ato do seu consumo, e onde a satisfação derivada é largamente subjetiva e intangível; b) o modo como os produtores criativos extraem formas de satisfação não econômicas no exercício de seu trabalho, diferenciando de atividades economicamente mais viáveis e consideradas por eles mais monótonas e comuns; c) a habitual natureza coletiva da produção criativa, e a necessidade para desenvolver e manter grupos criativos com diversas habilidades, formados por pessoas com interesses diversos mas com expectativas similares sobre o produto final; d) a quase infinita variedade de produtos criativos disponíveis, e em diversos formatos (filmes, livros, peça teatral);

46

e) a maneira como o empresariado e produtores classificam e avaliam as pessoas criativas, categorizando verticalmente habilidades diferenciadas, que nos termos de Caves trata-se de uma lista “A” e de uma lista “B” de fenômenos criativos; f) a necessidade de coordenar diversas atividades criativas dentro de um prazo relativamente curto de tempo e freqüentemente finito; g) a durabilidade de muitos produtos culturais, e a capacidade de seus produtores em continuar extraindo vantagens econômicas por um longo período após a etapa de produção (ex: pagamentos de direitos autorais).

Segundo Flew (2002), os problemas na análise de Caves residem na aplicação de ferramentas

comuns a uma diversa gama de atividades criativas, e por assumir uma posição relutante

quanto à diferenciação de novas formas de indústrias criativas - jogos de computador e

multimídias interativas -, das indústrias culturais mais tradicionais como o cinema e a

televisão. No livro, ele restringiu sua análise aos elementos comerciais, evidenciando a

necessidade de se minimizar o risco e a incerteza que caracterizam as atividades criativas, por

meio dos contratos estabelecidos entre empresários e criadores.

Para Cunnigham (2002), Caves, como um precursor de uma análise oriunda do mercado, se

interessou em construir atributos comuns entre o espectro das artes e da mídia, e não se

aprofundou numa definição além desses atributos. Ele utilizou o termo na investigação de

dinâmicas econômicas e contratuais que relacionassem as artes com a mídia, e não agregou

novos subsídios que colaborassem na compreensão do conceito.

Charles Leadbeater em 1999 publica A Nova Economia e na obra ele relaciona as indústrias

criativas com a dinâmica da “a nova economia”. Na abordagem ele defende que elas podem

representar uma oportunidade para um nivelamento entre as micro, pequenas e médias

empresas na área de criação de conteúdo, redutos de criatividade, com as grandes

organizações culturais públicas e privadas, uma vez que essas podem fornecer distribuição em

rede nacional e internacional como um reconhecimento do valor comercial dessa criatividade

(FLEW, 2002).

Ainda sob uma perspectiva econômica, John Howkins (2001) apresenta o livro A Economia

Criativa: Como as pessoas ganham dinheiro a partir de idéias, o qual fornece uma definição

que, embora seja ampla, apresenta maiores subsídios conceituais para as indústrias criativas.

Ele elege quatro categorias de direitos de PI, os direitos autorais, as patentes, a marca

registrada e design, que seriam comuns às indústrias criativas e a conseqüente economia

47

criativa. Observa-se que o critério é semelhante ao adotado pelo DCMS, com uma diferença,

no Reino Unido o setor de patentes não foi selecionado (CUNNIGHAM, 2002).

A contribuição de David Throsby (2001) se diferencia das anteriores por resgatar a cultura aos

debates que buscam associar as atividades criativas ao termo indústrias. Para ele, os produtos

e serviços culturais que demandam criatividade em sua produção incorporam certo grau de

propriedade intelectual e transmitem significado simbólico.

A definição dos produtos e serviços culturais de Throsby permite que as indústrias passem a

ser reconhecidas por um produto cultural específico (indústria da música), ou pelas

características estruturais do seu funcionamento. Por exemplo, a criatividade poderia ser

enfatizada através do termo indústrias criativas utilizado pelo DCMS, para descrever a

dinâmica do setor artístico e sua contribuição para o desempenho da economia britânica.

Similarmente, a geração de propriedade intelectual poderia ser um critério suficiente para

viabilizar o termo “indústrias do copyright”, e as “indústrias culturais” poderiam ser também

ser justificadas pela mesma lógica (THROSBY, 2001).

Figura 1. Círculos concêntricos de Throsby.

Baseado na definição cunhada sobre os produtos e serviços culturais, Throsby (2001) propõe

um modelo de círculos concêntricos para representar as indústrias culturais. No primeiro

círculo estaria o núcleo, formado pelas atividades fonte de idéias criativas, atividades

tradicionais - música, dança, teatro, literatura, artes visuais, artesanato - e as novas formas de

expressão criativa fomentadas pela tecnologia - vídeo, software e práticas de multimídia -. No

Fonte de Idéias Criativas: atividades tradicionais (música,

dança, teatro, literatura) e novas

formas proporcionadas pela tecnologia (vídeo, software e multimídia)

Revistas

Edição Jornais

Rádio Cinema

Televisão

Publicidade

Serviços de Arquitetura

Alguns Segmentos do Turismo

48

círculo seguinte estariam as indústrias culturais propriamente ditas, cujos produtos e serviços

disponibilizados podem ser, ou não, considerados culturais - publicações de livros e revistas,

cinema, televisão e rádio, e jornais. E por fim, um grupo de indústrias que, a depender de

interpretações, captura um certo conteúdo cultural, mas se caracteriza por sua expansão para

setores não culturais - propaganda, serviços de arquitetura e segmentos do turismo - .

Segundo Drake (2003), a definição do DCMS remete a uma criatividade individual

vagamente definida, pois direta ou indiretamente ela está também presente em outros setores

produtivos da economia. Recorrendo a Banks et al. (2000), ele considera que as indústrias

criativas produzem bens e serviços cujo valor primário deriva de seus atributos estéticos. Esta

posição ratifica os argumentos de Lash e Urry (1994), de que crescentemente são produzidos

símbolos em detrimento de objetos materiais, e que bens e serviços gradativamente são

valorados pela incorporação de atributos estéticos e harmônicos, originários de uma natureza

simbólica (DRAKE, 2003).

Também para Scott (1997), as indústrias criativas ofertam artefatos saturados por um

conteúdo estético e sematológico, produzido por setores do capitalismo moderno com o

intuito de satisfazerem a demanda dos consumidores por diversão, ornamentação, auto-

afirmação, exibição-social entre outras. Estas definições se destinguem da proposta do

DCMS, pois realçam a importância do valor simbólico presente nos produtos tangíveis (jóias)

e intangíveis (softwares), disponibilizados pelas indústrias criativas. Além disso, as definições

buscam enfatizar a ótica da demanda do mercado, no momento em que focalizam aspectos da

reflexividade do consumidor, da sua individualidade e da composição de sua identidade

(DRAKE, 2003).

Já Hartley (2005) considera que a idéia sobre as indústrias criativas emerge de uma

combinação que explora os limites entre as “artes criativas” e as “indústrias culturais”, entre

público e privado, cidadãos e consumidores, políticas e pessoas. Esta combinação pode ser

representada, no contexto da economia do conhecimento, por uma convergência conceitual e

prática do setor de artes criativas tradicionais, baseadas no talento individual, das indústrias

culturais e das novas tecnologias digitais de mídia.

49

Figura 2. Indústrias criativas por Hartley.

No XI seminário da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento

(UNCTAD, 2004), uma das definições apresentadas para as indústrias criativas é que seria um

conjunto de atividades que têm a criatividade como componente essencial, estão inseridas no

processo industrial e são passíveis de proteção por direitos autorais, ratificando seu caráter de

reprodutibilidade técnica e a importância dos direitos autorais como fomentadores de

crescimento econômico (REIS, 2007).

Segundo Jaguaribe (2004), trata-se de uma reunião de atividades econômicas baseadas na

criatividade, submetidas ao processo industrial e à proteção dos direitos autorais. São

indústrias produtoras de bens e serviços que utilizam imagens, textos e símbolos como meio e

ou conteúdo. Ainda para ela, embora exista um grupo central de indústrias criativas composto

pelas atividades de música, audiovisual, multimídia, software, broadcasting e os processos

editoração, constata-se a ascensão de atividades secundárias como artesanato e folclore que

estão se transformando através das novas tecnologias e da logística em bens, produtos e

serviços de grande distribuição (JAGUARIBE, 2006).

Conforme Drake (2003), estabelecer uma definição genérica sobre as indústrias criativas

assumiria um caráter duvidoso. A ambigüidade presente na proposta permite que definições

diferentes possam ser aplicadas a circunstâncias diferentes. No momento, seria mais útil

visualizá-las como uma definição em processo, que possui a capacidade de englobar uma

gama variada de atividades econômicas anteriormente desprezadas (PRATT, 1997 apud

DRAKE, 2003).

Indústrias Culturais

Novas tecnologias de Mídia

Artes Culturais Tradicionais

INDÚSTRIAS CRIATIVAS

50

A apresentação dos conceitos revela que o termo indústrias criativas ainda não é passível de

uma definição, talvez por englobar um conjunto de atividades diversas. A proposta do DCMS

vem se afirmando como uma referência, por ter alcançado um sucesso econômico, porém ela

não considera o componente simbólico ao conceito, talvez por este limitar o escopo da

política fomentada de geração de emprego e renda. Apesar disso, uma rede de economistas

escoceses que representam doze universidades - Scotecon - reivindica a presença do

componente simbólico no conceito do DCMS (REIS, 2007).

Ratificando este entendimento, O´Connor (2000) considera que a diferença das indústrias

criativas para as indústrias culturais estaria no maior enfoque daquelas ao valor econômico

dos seus produtos e serviços, em relação aos atributos culturais. Apesar da ausência do

elemento simbólico, reivindicado por diversos teóricos, na definição DCMS, há uma

tendência em se reconhecer que elas, de certa forma, ampliam os limites das indústrias

culturais por incorporarem em sua taxonomia as novas atividades viabilizadas pelas

tecnologias digitais.

51

3.1.2 As indústrias criativas e a propriedade intelectual

As indústrias criativas foram responsáveis por 8,2% do PIB em 2001 e cresceram em média

8% ao ano, entre 1997 e 2001. No Reino Unido, em 2002, contribuíram com US$ 18,4 bilhões

na pauta de exportações da balança comercial, o que representou 4,2% do total de produtos e

serviços exportados. Elas cresceram em média 11% ao ano, no período entre 1997 a 2002,

frente à taxa de 3% das demais atividades. Em 2003, o setor gerou 1,9 milhão de postos de

trabalho, sendo 0,8 milhão em setores relacionados, e apresentou uma taxa de crescimento de

3% ao ano, durante os seis anos, enquanto os demais setores da economia cresceram 1%

(DCMS, 2004 apud REIS, 20007).

A propriedade intelectual é um dos principais componentes responsáveis pelo desempenho

econômico citado acima. A expressão abrange vasto campo de direitos relativos às invenções

humanas, às descobertas científicas, aos desenhos industriais, às marcas industriais, de

comércio e de serviços, aos nomes e denominações comerciais, à proteção contra

concorrência desleal às obras literárias, artísticas e científicas, às interpretações dos artistas

interpretes, às execuções dos artistas executantes, aos fonogramas e às transmissões de

radiodifusão, entre outros direitos relacionados à atividade intelectual nos campos industrial,

científico, literário e artístico (HOWKINS, 2004).

Ela atribui aos produtos e serviços ofertados pelas indústrias criativas uma valoração

econômica, pois legitima o princípio da escassez aos mesmos. Frey (2000), ao desenvolver o

conceito de criatividade institucional, caracterizado pela existência de uma recompensa

extrínseca ao processo criativo – uma motivação oferecida pelo mercado e o estado -,

considera a propriedade intelectual uma espécie desse tipo de recompensa15 (TOWSE, 2004).

Este instrumento de proteção legal é composto por duas categorias: a propriedade industrial

representada por patentes, trademarks, desenhos industriais e indicações geográficas de

origem e os direitos autorais, que estão relacionados com as criações de natureza estética

expressadas em suportes físicos ou digitais (REIS, 2007). Além disso, existem os direitos

conexos, que diferem dos autorais por serem atribuídos a determinadas pessoas ou sociedades

que auxiliam na criação, produção e difusão de uma obra. Entre os titulares dos mesmos estão

15 Criatividade institucional é um termo desenvolvido por Frey em seu livro - State Support and Creativity in the Arts – publicado em 2000 (TOWSE, 2004).

52

os intérpretes, músicos acompanhantes, produtores fonográficos, empresas de radiodifusão,

atores, produtores de espetáculos, entre outros (MORAES, 2007).

As características apresentadas explicam a presença do termo propriedade intelectual no

conceito de indústrias criativas, uma vez que as atividades que elas abrangem vão desde

música, direitos autorais, até softwares interativos submetidos à propriedade industrial.

Apesar disso, Handke (2004) observa que a propriedade intelectual não representa uma

estabilidade para o conceito, pois ela mesma vem sendo submetida aos impactos da revolução

digital.

Um exemplo disso é a ampliação das possibilidades de cópia de um conteúdo e seu

armazenamento, a baixo custo, em dispositivos magnéticos e óticos. Esta nova alternativa

vem estabelecendo prejuízos crescentes às indústrias culturais. Se no século XVIII a

facilidade em se produzir cópias viabilizou a instituição da lei do direito de cópia (Copyright),

atualmente, esta mesma especificidade impõe adaptações, ou até mesmo, rejeições a esse tipo

de privatização da criatividade16 (TOWSE, 2000).

Segundo Vianna (2005), a invenção da propriedade intelectual se relaciona com as origens do

capitalismo, quando, por pressão dos autores de obras intelectuais, adotou-se o direito de

propriedade a um ente incorpóreo que a rigor é trabalho intelectual. Com o desenvolvimento

da imprensa, estes autores foram obrigados a alienar esse trabalho aos detentores dos meios de

produção que, em contrapartida, exigiram-lhes a concessão do monopólio da distribuição de

suas obras17.

Para ocultar a venda do trabalho intelectual do autor, os detentores dos meios de produção

transferiram a propriedade intelectual para as obras intelectuais. Esta atitude contrariou a

própria função da propriedade, pois esta não poderia ser mais utilizada por quem um dia a

possuiu. Dessa forma, a lei assegurou a escassez das obras intelectuais e permitiu a

16 Na Inglaterra, em 1709, o advento da imprensa instituiu o estatuto Anne. Estima-se que tenha sido a primeira lei de direito autoral a ser criada garantindo ao autor - trabalhador criativo - auferir rendimentos de sua obra, durante sete anos, renováveis por mais sete em vida, protegendo-a de cópias não autorizadas. Após esse período seu trabalho era considerado de interesse público (TOWSE, 2000). 17 A propriedade é e sempre foi um instituto jurídico caracterizado fundamentalmente pelo direito de usar, gozar e dispor com exclusividade da coisa (art. 1228 do código Civil apud Vianna, 2005).

53

exploração pelos editores do valor de troca das mesmas, deixando os autores em plano

secundário (VIANNA, 2005).

Atualmente, esta ideologia da propriedade intelectual, vinculada às cópias da obra intelectual,

se depara com uma nova realidade: seu valor de troca explorado pelos editores passou a ser

insignificante. A digitalização reduziu o custo marginal da cópia a praticamente zero e

permitiu às pessoas interessadas o acesso direto às obras. Isto afetou a cadeia de distribuição

das indústrias culturais que era sua fonte de lucro. Em outras palavras, o valor de troca da

obra intelectual deixou de ser associado à escassez determinada pela sua distribuição em

suporte físico (VIANNA, 2005).

A ausência de escassez das obras em meio digital não impossibilitou a continuidade da venda

da obra intelectual em suporte físico. No momento, observa-se uma convivência na

distribuição de produtos intelectuais em meios digitais e convencionais. Por outro lado, nesta

sociedade capitalista digital o trabalho intelectual continua possuindo valor de troca enquanto

permanecer inédito, só que não serão apenas as patentes que assegurarão aos capitalistas

vantagens e lucros em relação a seus concorrentes, mas o pioneirismo em sua exploração,

mesmo assim durante um período (VIANNA, 2005).

A relação das indústrias criativas com a propriedade intelectual se demonstra interessante por

representarem parte desse trabalho intelectual, submetido à lei da propriedade ao mesmo

tempo em que elas também fomentam novas formas de distribuição das obras intelectuais.

Formas de distribuições estas que suscitam o desenvolvimento de novos tipos de licenças

legais que venham a remunerar o trabalho intelectual.

Neste novo paradigma, a remuneração do trabalho intelectual é repensada e surgem novas

propostas pra sua tutela jurídica. Entre elas destaca-se o Copyleft, um instrumento legal que

garante a distribuição e a modificação das obras, mas que vincula as novas distribuições à

mesma licença. Antagonicamente, ele não impede que empresas explorem comercialmente a

obra, desde que a livre distribuição e modificação sejam permitidas. A proposta visa impedir

ações monopolistas praticadas no mercado (VIANNA, 2005).

O Creative Commons é uma outra forma de se pensar a propriedade intelectual. Trata-se do

licenciamento de direitos autorais que permite aos autores concederem alguns ou todos os

54

direitos de sua obra, como também a restrição parcial ou total ao seu acesso. Para isso, são

disponibilizados diversos tipos de licenças, contratos, cláusulas que permitem flexibilizar o

direito autoral, contornando os atuais problemas criados pela lei do Copyright, a

democratização da informação, ao mesmo tempo em que facilita que o autor promova a

circulação de sua obra (CREATIVE COMMONS, 2007).

Ambas as alternativas valorizam o princípio da utilidade marginal crescente presente nas

obras intelectuais, identificado por Marshal em seu livro Princípios de Economia (1890), uma

vez que amplia a sua aplicabilidade. Quanto mais conhecido o trabalho do artista, mais

oportunidades ele terá de ser convidado para palestras, shows, exposições, participar de

publicações entre outras atividades (BONJOUR; CORSINI, 2007).

No campo de desenvolvimento de softwares, o open source supera estas novas propostas de

tutela jurídica do trabalho intelectual, pois permite o livre acesso dos usuários ao código fonte

dos mesmos. Sua principal característica é não impor qualquer restrição sobre o uso e

distribuição dos softwares. Nesse caso, os usuários passam a ter o direito gratuito de

manipulá-los podendo agregar trabalho intelectual, mas abdicando de seus direitos de

propriedade (ISKOLD, 2007).

Reis (2007) propõe a adoção de um modelo híbrido à propriedade intelectual (PI),

congregando três elementos: os direitos de PI vinculados às técnicas de reprodução e às altas

tecnologias, mas revertendo parte desses direitos para eliminar as barreiras de acesso aos

produtos e serviços criativos; aqueles direitos que ainda não receberam o mesmo

reconhecimento, e que estariam relacionados aos modos de fazer, as expressões culturais e

conhecimentos das comunidades locais; e por fim, a inclusão no conceito de indústrias

criativas de setores capazes de promover desenvolvimento via inclusão socioeconômica, ainda

que não sem a garantia de direitos de PI.

As indústrias criativas estão diante da transição de um sistema baseado na produção industrial

para um sistema de produção cultural, em que o importante não é a propriedade do bem, mas

o acesso a ele. As próprias leis da esfera comercial vêm sendo revisadas com a crescente

produção e o consumo de bens simbólicos. E esta configuração vem estabelecendo uma nova

disputa entre a esfera cultural e a esfera comercial; a cultura se posicionando em defesa da

55

liberdade de acesso e o mercado buscando controlar o acesso e o conteúdo dessa produção

cultural (ROVER, 2002 Apud VIANNA, 2005).

Alguns aspectos dessa disputa já podem ser observados pela discussão entre a Organização

Mundial do Comércio (OMC) e a Organização das Nações Unidas para Educação, a Ciência e

a Cultura (UNESCO). A primeira inseriu, via o acordo Trips (Trade Related Aspects of

Intelectual Property) aprovado em 1994, as questões de propriedade intelectual no âmbito do

regime internacional de comércio de bens e serviços, e possui os EUA como um dos

principais interessados. A segunda defende que os produtos e bens culturais não podem ser

tratados como uma mercadoria qualquer, uma vez que estão relacionados à soberania e à

identidade nacionais. Essa posição, assumida pela França e Canadá, defende que os países não

são obrigados a liberalizar o comércio de seus produtos e serviços culturais, e ficou conhecida

como exceção cultural (REIS, 2007).

A interatividade é um outro elemento que vem transformando a própria concepção do

processo de criação, e conseqüentemente, tende a influenciar as leis de propriedade

intelectual. Para Leadbeater (2005), a produção em massa vem sendo substituída pela

inovação em massa. As comunidades inovadoras possibilitam o compartilhamento entre

especialistas e usuários na criação de produtos e serviços. A designer Hillary Cottam ganhou

o prêmio de designer Do ano do London Designer Museum por ter entendido esta mudança:

ela não cria seus produtos para as pessoas, ela cria com as pessoas18.

Neste sentido, nota-se que a relação das indústrias criativas com a propriedade intelectual

fomenta mudanças nos instrumentos legais que garantem seu desempenho econômico. Para

Howkins (2004), a propriedade intelectual se consolida como moeda corrente (REIS, 2007),

mas segundo Bentley (2004) a criatividade é um elemento básico da existência humana, todo

ser humano, de alguma maneira, é criativo. E isto deriva de um processo social estimulado

pela troca de conhecimentos, engendrados e cultivados em comunidades e lugares reais.

Trata-se de mais um paradoxo entre o infinito potencial criativo humano e os limites

legalmente impostos para satisfazerem uma lógica de acumulação do capital.

18 Um exemplo de comunidade inovadora é a comunidade de aproximadamente 140 mil usuários de computadores, e mais 2 mil programadores que aplicam, sem remuneração, parte do seu tempo e suas idéias no desenvolvimento do sistema operacional, Linux (código fonte aberto para alterações), que se destaca como o maior concorrente da Microsoft em sua dominação do mercado (LEABDEATER, Charles. Somos todos inventores. Carta Capital, São Paulo, nº 349, ano XI, jul de 2005).

56

3.1.3 Contexto internacional das indústrias criativas

O termo indústrias criativas está associado a um conjunto de transformações que aconteceram

na economia ao longo do século XX, denominado terceira revolução industrial. Nesse cenário,

alguns aspectos podem ser destacados: primeiro, a crescente importância socioeconômica das

indústrias culturais e sua utilização como objeto de políticas públicas; segundo, a ascensão da

economia informacional, e terceiro, porém não menos importante, a mudança de uma

economia baseada no setor industrial para uma economia com a crescente participação do

setor de serviços (FLEW, 2002).

Existe uma dificuldade em se localizar a origem do conceito de indústrias criativas. Suspeita-

se que tenha relação com o lançamento, pelo governo Keating, da política cultural australiana,

em 1994, denominada Nação Criativa. O projeto foi desenvolvido para auxiliar o país a

enfrentar os desafios da revolução da tecnologia da informação. Revolução que instaurou uma

onda global de cultura de massa. No documento Nação Criativa foi declarado que a política

cultural também deveria ser considerada como uma política econômica, dimensão que não

mais poderia ser desprezada (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE,

2006).

O próprio capitalismo está passando para uma fase na qual as formas culturais e os significados de seus produtos tornam-se decisivos, se não elementos dominantes da estratégia produtiva, na qual o reino da cultura humana está como um todo crescentemente sujeito ao mercado, ex: produtos e serviços ofertados por instituições com fins lucrativos em mercados descentralizados. Em outras palavras, uma escala abrangente de atividades econômicas está relacionada com a produção e comercialização de bens e serviços que, por sua vez, estão de uma maneira ou de outra, imersos dentro de atributos amplamente estéticos ou semióticos (SCOTT, 1997, p.323). … capitalism itself is moving into a phase in which the cultural forms and meanings of its outputs become critical if not dominating elements of productive strategy, and in which the realm of human culture as a whole is increasingly subject to commodification, i.e. supplied through profit-making institutions in decentralized markets. In other words, an ever-widening range of economic activity is concerned with producing and marketing goods and services that are infused in one way or another with broadly aesthetic or semiotic attributes (SCOTT, 1997, p. 323).

Antes de abordar a articulação das indústrias criativas no campo de políticas culturais,

observa-se que, no Reino Unido, o termo indústria, atualmente, encontra-se mais desprendido

da conotação restrita aos tradicionais processos de fabricação de manufaturas. Ele pode ser

empregado em qualquer conjunto de atividades cujo produto venha a apresentar maior ou

menor similaridade com tal concepção. Na realidade, a utilização de indústrias criativas foi

57

associada às atividades tímidas que demandavam apoio governamental, ou, às atividades que

foram ironicamente depreciadas por políticos e jornalistas devido ao seu caráter informal, e

que agora foram regulamentadas e passaram a ter reconhecimento (O`CONNOR, 1999). Esta

informação colabora para que a compreensão das indústrias criativas não esteja estritamente

relacionada a uma estrutura industrial tangível.

Na Alemanha, a conotação da palavra indústria está limitada às atividades responsáveis por

fornecerem produtos para o consumo massivo. Tal entendimento é adquirido devido a

digressões históricas que a sedimentaram quase como uma antítese do significado expresso

pela cultura. Devido a isso, o termo Kulturwirtschaft passou a ser utilizado para englobar as

atividades e processos de produção compreendidos no Reino Unido como indústrias culturais.

Segundo Hofecker e Söndermann (1999) o termo Kulturwirtschaft (economia da cultura) diz

respeito a uma combinação de setores referentes às empresas culturais privadas, setores de

mídia e companhias (MKW, 2001).

Ainda considerando os contextos conceituais, ocorre, entre o final da década de noventa e

início do século XXI, o aparecimento de várias terminologias que, de certa forma,

legitimaram a inexistência de um consenso ou acordo sobre a definição das atividades

criativas do ponto de vista econômico. Existem diversas publicações sobre economia da

cultura cujas terminologias adotadas encontram-se além do núcleo das atividades artísticas em

sentido estrito como: indústrias culturais, indústrias do copyright, indústrias de conteúdo,

economia da experiência, setor de negócios criativos, negócios baseados nas artes, indústrias

culturais e de comunicação, indústrias da mídia, e a economia do conhecimento; cada uma

delas contendo especificidades e similaridades (STUDY ON THE ECONOMY OF

CULTURE IN EUROPE, 2006).

Além das questões acima, verifica-se um representativo interesse de estudiosos pela relação

entre a acepção das indústrias criativas e o conceito de desenvolvimento de clusters. Esta

articulação resulta em políticas destinadas à revitalização de cidades e regiões degradadas

pela antiga lógica de desenvolvimento industrial. Políticas que engendram o conceito de

cidades criativas (FLEW, 2002). No início do século XXI, todas essas mudanças

possibilitaram uma imbricação mais nítida entre os campos da cultura e economia, que pode

58

ser observada pela crescente produção, circulação e consumo de bens e serviços simbólicos e

sua representatividade econômica19.

Nesse contexto, a idéia sobre as indústrias criativas é propagada em conjunto com os impactos

das novas tecnologias de mídias interativas, e de uma nova lógica econômica global. A

terminologia passa a ser utilizada durante a década de 90 como um objeto de política urbana

ou regional, em países onde o termo criativo foi capturado pela retórica e práxis política, na

intenção de promover emprego e renda para habitantes de cidades e localidades e,

conseqüentemente, o desenvolvimento socioeconômico de regiões (HARTLEY, 2005).

O surgimento das indústrias criativas está relacionado à ascensão das indústrias culturais, à significação do conhecimento em todos os aspectos da economia como produção, distribuição e consumo, e pela crescente importância do setor de serviços. Além dessas questões, o termo agrega-se à nova dinâmica econômica cujo formato é crescentemente informacional, global e crescentemente conectada por redes (CASTELLS 2000 apud FLEW 2002, p.2). The emergence of creative industries is related to the rise of cultural industries, the significance of knowledge to all aspects of economic production, distribution and consumption, and the growing importance of the services sector. It is linked to the dynamics of the ‘new economy’, whose form is increasingly informational, global and networked (CASTELLS 2000 apud FLEW, 2002, p.2).

Efetivamente, as origens do conceito de indústrias criativas são encontradas no Reino Unido,

em 1997, com a primeira administração do governo Tonny Blair, através do projeto Força

Tarefa para as Indústrias Criativas. O objetivo do mesmo foi implementar um conjunto de

ações para delinear e fomentar as indústrias criativas, considerando-as centrais para a

economia. Dessa forma, o Departamento de Cultura, Mídia e Esporte (DCMS), criado no

mesmo ano, considerou-as como aquelas atividades econômicas baseadas na criatividade

individual, habilidade e talento e que têm um potencial para gerar emprego e renda através da

exploração da propriedade intelectual (DCMS, 2001).

Após a adoção do conceito, foram realizados mapeamentos, em 1998 e em 2001, sobre essas

atividades. Os mapeamentos são estudos orientados para diagnosticar uma determinada

situação, identificando seus elementos constitutivos e as relações entre eles e os resultados

dessa interação. No caso do DCMS, o objetivo do trabalho era identificar as características

das indústrias criativas e aplicar políticas públicas para o desenvolvimento desse setor. Nesse

19 Clusters é um termo cunhado pelo economista Michael Porter da Harvard Business School, e que representa concentrações geográficas de associações e instituições interconectadas por um campo particular (PORTER 1998, apud FLEW, 2002).

59

aspecto, os mapeamentos não foram apenas considerados como simples descrições de dados,

mas incorporaram uma dimensão interpretativa, com o objetivo de contribuir para a solução

dos problemas apresentados pelo diagnóstico (CRECE, 2005). Sendo assim, o Ministro da

Cultura e Patrimônio, Chris Smith, citou a importância das indústrias criativas em seu

discurso:

O papel do empreendimento criativo e a contribuição cultural... são fundamentais para a questão econômica… O valor que se origina da criação de capital intelectual vem sendo crescentemente importante como um componente econômico da riqueza nacional... As novas indústrias baseadas na criatividade, imaginação e propriedade intelectual estão crescendo e se tornando rapidamente parte importante da nossa economia nacional. No futuro, serão elas que gerarão emprego e a renda (SMITH, 1998, apud FLEW 2002, p.3). The role of creative enterprise and cultural contribution ... is a key economic issue … The value stemming from the creation of intellectual capital is becoming increasingly important as an economic component of national wealth ... Industries, many of them new, that rely on creativity and imaginative intellectual property, are becoming the most rapidly growing and important part of our national economy. They are where the jobs and the wealth of the future are going to be generated (SMITH, 1998 apud FLEW, 2002 p. 3).

Na classificação realizada pelo DCMS (2001), fazem parte das indústrias criativas as

seguintes atividades: publicidade, design, arquitetura, arte e mercado de antiguidades,

artesanato, design de moda, cinema e vídeo, software livre interativo, música, artes de

representação, indústria editorial, softwares e serviços de computador, e os setores de rádio e

televisão. A propriedade intelectual é o elemento central no conceito o que, de certa forma,

justifica a aglutinação de atividades tão heterogêneas.

Quadro 1. Características das Indústrias Criativas no Reino Unido

Aproximação: Econômica

Definição: Aquelas indústrias que possuem sua origem na criatividade, habilidade e talento e com o potencial de gerar emprego e renda através da geração e exploração da propriedade intelectual.

Critérios: Criatividade como insumo principal para o processo de produção. Propriedade Intelectual (e não apenas o copyright) como uma das características de

seus produtos.

Extensão: propaganda, arquitetura, mercado de artes e antiguidades, artesanato, design, design de moda, cinema e vídeo, softwares interativos de lazer, música, artes de representação, publicações, softwares e serviços de computadores, televisão e rádio. Atividades incluídas: criação, produção, distribuição, exibição, promoção, atividades relacionadas a treinamento, atividades relacionadas a imprensa.

Fonte: (CRECE, 2005)

60

Além do importante papel da propriedade intelectual utilizado no conceito de indústrias

criativas no Reino Unido, outro aspecto fundamental que faz parte da proposta é sua dimensão

política. Dimensão que viabilizou a integração entre cultura e economia na formulação das

políticas públicas. Segundo O`Connor (1999), o governo Blair instaurou uma espécie de

política econômica alternativa, através de políticas públicas destinadas ao campo cultural.

Nesta disposição, foram consideradas as argumentações defendidas pelo extinto G.L.C

(Greater London Council), sobre o potencial do setor cultural para geração de emprego e

renda, ratificando a sua promoção do ponto de vista econômico.

O setor comercial gera renda e emprego (como fazem as artes), mas também é um principal local de consumo cultural para a vasta maioria da população. O papel das “artes” nesta configuração precisa ser repensado e não apenas ‘defendido' do mercado vulgar. Com relação às indústrias culturais perguntas sobre a definição de artes e “cultura” são respondidas por elas mesmas. Novas formas de produção, novas compreensões de “cultura”, novas formas de distribuição e consumo têm superado as cômodas separações entre “arte” e cultura (massiva ou “folk/ethnic”) geradas e consolidadas pelos sistemas estatais europeus (O'CONNOR, 1999, apud FLEW, 2002, p.6). The commercial sector provides wealth and employment (as do the arts), but it is also a prime site of cultural consumption for the vast majority of the population. The role of ‘arts’ in this configuration needs to be rethought not just ‘defended’ against the vulgar market. For the cultural industries have asked questions about the definition of arts and ‘culture’ itself. New forms of production, new understandings of ‘culture’, new forms of consumption and distribution have over-run the cosy separations of ‘art’ and (mass or ‘folk/ethnic’) culture set up by the European state funding systems (O’CONNOR, 1999 apud FLEW, 2002 p.6).

Na realidade, a adoção de uma política de fomento do setor cultural, pelo governo Blair, era

estratégica para atenuar as insatisfações acumuladas por um longo período de cortes e

coerções deliberadas para o setor, pelas gestões dos conservadores Margarett Thatcher e John

Major. Por esse ponto de vista, também se justifica que tal estratégia deveria englobar uma

esfera nacional. Esta característica é explicitada pelas treze diferentes atividades, que já eram

pré-eminentes no Reino Unido e que foram incorporadas ao conceito, com o objetivo de

reposicioná-las e capacitá-las para o comércio, ao mesmo tempo legitimando-as como fonte

de energia das indústrias criativas e referência para o mundo. Esta característica difere do

cenário observado em outros países que apropriaram o conceito, uma vez que nesses observa-

se um exercício de desenvolvimento de setores emergentes (CUNNINGHAM, 2003).

Segundo Oakley (2004), a iniciativa do DCMS não foi associada ao declínio da base

industrial do Reino Unido. Este processo atingiu a economia de cidades e regiões que

abrigavam complexos industriais desativados gerando desemprego para a população. E por

61

uma questão de nova meritocracia do partido trabalhista foi agregada a economia do

conhecimento. Esta iniciativa ratifica a concepção política da proposta e sua preocupação em

articular cultura e economia. Oakley (2004) ainda observa que a maior importância do

mapeamento do DCMS sobre as indústrias criativas não foi apenas sua definição, mas

também o fato de planejar e mensurar o seu desenvolvimento.

Uma outra questão verificada é o sucesso alcançado pelos dois relatórios produzidos em 1998

e em 2001 pelo DCMS. Eles foram os responsáveis pela popularização das indústrias criativas

e foram determinantes para evidenciar o perfil das atividades selecionadas. Atividades que

foram estabelecidas como uma das partes mais crescentes e dinâmicas da economia do Reino

Unido. O feito, definitivamente, inseriu o campo das artes e das indústrias culturais no mapa

político Britânico e, conseqüentemente, despertou interesse de outros países (OAKLEY,

2004).

Para Segers e Huijgh (2005), ao se comparar o contexto histórico das indústrias culturais com

as indústrias criativas, observa-se que o primeiro carrega uma herança, interpretada como

negativa, das concepções de Horkheimer e Adorno. Enquanto que no segundo, a presença da

adjetivação criativa aufere uma conotação positiva junto às esferas, política e econômica,

assim como uma certa aceitação do setor cultural pela sociedade.

Na realidade, o contexto em que surge, durante a década de noventa, o termo indústrias

criativas também está associado às iniciativas de gestores políticos para legitimar, de forma

mais harmônica, a associação dos campos cultural e econômico, embora isso não esteja isento

de críticas. Uma constatação dessa tendência está na utilização do termo por publicações

associadas a políticas de desenvolvimento locais, e em pesquisas acadêmicas sobre economia

local e regeneração urbana. (COMEDIA 1992, 1997; DCMS 1998, 1999 apud SEGERS;

HUIJGH, 2005).

O cenário apresentado revela que, embora recente, o termo indústrias criativas, está cada vez

mais presente em discussões internacionais sobre cultura e políticas públicas relacionadas ao

mercado de trabalho, devido aos resultados alcançados pelo programa do governo trabalhista

Britânico. As ações, que resultaram nos mapeamentos do DCMS, passaram a estar articuladas

com a crescente procura por ocupações que integravam o setor cultural, e que por sua vez,

62

também faziam parte de um contexto proporcionado pelas novas atividades de mídia e

tecnologia (MKW, 2001).

Segundo o DCMS (1998), as indústrias criativas sinalizam uma continuidade ampliada das

indústrias culturais pois consideram possibilidades viabilizadas pelas novas tecnologias.

Transformações que permitem a oferta de novos produtos como: games, suportes digitais de

música (MP3), ring-tones, animações digitais, livros digitais, entre outros produtos e serviços

derivados da revolução digital, que passaram a pertencer ao setor da indústria do lazer. Na

realidade, o termo mescla setores de artes tradicionais e indústrias culturais, com as

telecomunicações, e também está associado a novas formas de produção, distribuição e

consumo. Na verdade, no Reino Unido, o conceito representa o movimento da cultura em

direção à indústria diferindo do estágio anterior das indústrias culturais, em que a indústria se

deslocava em direção à cultura (CUNNINGHAM, 2003).

Para Cunningham (2003), as indústrias criativas expressam uma tendência à ampliação de

uma antiga imagem da esfera cultural, refletida pelos subsídios ou conglomerados de

radiodifusão, uma vez que consideram novas aplicações para criatividade. Aplicações que,

embora absorvam vantagens da economia do conhecimento, não estão restritas à mesma. As

novas tecnologias e inovações instauram relações virtuais entre clientes e consumidores, que

não são mais dependentes de modelos centralizados de produção de mídia e do consumo de

arte em tempo real pelo público.

A interatividade, a convergência, a customização e as colaborações em redes são

fundamentais para o desenvolvimento das indústrias criativas. Essas características fazem

com que as mesmas sejam menos nacionais e mais globais. Apesar de serem globais,

demandam mais atributos locais e regionais, do que os sistemas públicos de radiodifusão e as

principais companhias de arte, isto porque em seu modelo organizacional destacam-se as

pequenas e médias empresas, conectadas a abrangentes modelos de distribuição e circulação

de seus produtos e serviços. Muitos empreendimentos criativos se localizam no setor de arte e

mídia, porém visualiza-se a crescente importância de insumos criativos por toda parte da

cadeia de serviços. Da mesma maneira que empresas em geral tornam-se intensivas em

informação, o setor de serviços se torna mais intensivo em criatividade (CUNNINGHAM,

2003).

63

Apesar das divergências existentes sobre o conceito do DCMS, ele se tornou uma espécie de

benchmark. As indústrias criativas permitiram, através de ações políticas, uma associação

entre cultura e economia, ainda que, com o objetivo de garantir maior visibilidade para o seu

potencial econômico em geração de emprego e renda. Segundo Cunningham (2001), elas

também deslocaram algumas atividades da periferia para o centro das questões políticas e

econômicas. Isto não apenas está relacionado às articulações entre esferas artísticas e as

indústrias culturais, como também compreendem o desenvolvimento de novos

empreendimentos que estão preservados pelos direitos autorais, vinculados à economia do

conhecimento, e à ascensão das indústrias de serviços. Por fim, elas se apresentam como um

conceito e instrumento estratégico de políticas públicas em processo de construção.

Nesse contexto, observa-se a expansão dessas idéias para outros países, porém sem a

existência de padrões conceituais e metodológicos para sua mensuração. Apesar disso, Segers

e Huijgh (2005) defendem que os motivos políticos são características basilares em diversas

iniciativas no sentido favorável às indústrias criativas, uma vez que há uma ênfase sobre as

mesmas, relacionando-as ao desenvolvimento local, revitalizações de regiões e cidades

degradadas, por meio de implantações de clusters (FLEW, 2002).

Existe uma tendência dos países em seguir o conceito referencial desenvolvido e aplicado

pelo DCMS, porém de forma flexível e reflexiva considerando as especificidades locais. Sob

a perspectiva acadêmica, os debates foram iniciados, e numa ótica de políticas públicas para o

desenvolvimento as indústrias criativas podem constituir oportunidades, principalmente para

os países em desenvolvimento. Nesse cenário, a transversalidade da cultura se faz presente, e

uma ótica multidisciplinar é requerida na tentativa de se compreender aspectos de uma

realidade conforme Canclini (2003), dinamicamente fragmentada, e sob determinados

aspectos, globalmente unificada, da qual fazem partes as indústrias criativas.

64

3.2 Características da expansão das indústrias criativas

Os conceitos sobre indústrias criativas passam a ser flexibilizados com a sua expansão, uma

vez que a idéia sobre as mesmas é apropriada pela associação do escopo da proposta às

potencialidades de cada país. Apesar disso, existem características além da vertente política

que as nivelam. Entre elas, o fato da criatividade ser incorporada ao núcleo das diferentes

atividades selecionadas em diversos países e submetidas à propriedade intelectual. Dessa

forma, as indústrias criativas podem assumir um perfil composto por atribuições simultâneas

das artes, das ciências e dos negócios. Efetuando uma analogia das mesmas com o campo da

cultura, evidencia-se, na sua difusão, um caráter comum que ratifica a transversalidade

presente em ambas (UCPT, 2005).

Segundo Kong (2000), gradativamente, os governos nacionais e locais vêm reconhecendo a

importância da conexão entre a cultura e a economia, o que os conduzem a elaborar

estratégias para colher os benefícios dessa conjuntura. Assim, passam a ser formuladas e

implementadas políticas que contemplem esse acoplamento. A política econômica cultural,

como é denominada, vem sendo objeto de pesquisas, embora nem sempre se observe um

consenso sobre o que constitui uma economia cultural, ou uma política econômica cultural.

Neste panorama, a idéia sobre as indústrias criativas avança, se consagra como um conectivo

entre cultura e economia, e passa a ser adaptada por realidades distintas.

As políticas econômicas culturais procuram analisar a cultura sob uma perspectiva

econômica, e para isso são utilizadas variáveis mensuráveis como investimento, nível de

emprego, efeitos diretos e indiretos da renda, com o objetivo de auxiliarem no

desenvolvimento das análises e na própria gestão das políticas. A adoção dessas ferramentas

destina-se à promoção do desenvolvimento social e regional, entre outros benefícios, de forma

que a teoria econômica passe, de certa forma, a corroborar com a própria transversalidade da

cultura (BOOTH; BOYLE, 1993 apud KONG, 2000).

A experiência do Reino Unido com as indústrias criativas é uma espécie de política

econômica cultural, pois, apesar de enfatizar as variáveis emprego e renda sob a proteção da

propriedade intelectual, ela congregou diversos departamentos do governo – do comércio a

educação, do trabalho à cultura – e influentes indústrias para uma discussão conjunta sobre a

65

política adotada, bem como a busca de alternativas que impulsionassem o desenvolvimento do

próprio setor que passou a ser reconhecido nacionalmente (REIS, 2007).

A urgência de uma ação pró-indústrias criativas era justificada pelo seguinte contexto: o

modelo anterior de desenvolvimento econômico do Reino Unido, baseado na manufatura, já

estava estrangulado; o mundo tentava absorver os impactos da crise asiática (e prever a

ocorrência das próximas crises financeiras); a Europa apresentava crescentes índices de

desemprego e eram aparentes as incertezas do processo de unificação dos países; e, por fim,

existia todo um ambiente de maior visibilidade da conexão entre objetivos econômicos e

simbólicos na sociedade, aspecto ratificado por um culto à criatividade. Esta situação exigia

buscar novas estratégias que conduzissem à recuperação econômica do país e o

transformassem em um novo pólo de atração de negócios e capitais, em perspectivas locais e

internacionais (REIS, 2007).

Esta conjunção de fatores permitiu que o termo indústrias criativas não fosse muito utilizado

no restante da Europa, por sua arraigada relação ao Reino Unido, e por isso a legitimou como

uma espécie de marca registrada britânica. Paralelo a isso, na literatura política européia se

observa uma abordagem ainda mais ampla para criatividade, por exemplo, sua contribuição

como insumo para sistemas de inovação. Nesse cenário, utiliza-se o termo indústrias de

conteúdo, entre outros neologismos como: digi-cult, indústrias culturais digitais e siglas que

remetem às áreas de telecomunicações, informação, mídia, entretenimento e software, enfim,

setores relacionados com a criatividade, porém com um menor espectro cultural do que a

concepção britânica das indústrias criativas. Na literatura e nas discussões políticas são

encontradas diversas terminologias que ratificam a crescente importância da criatividade,

independente do foco do Reino Unido (CUNNINGHAM, 2003).

Segundo Cunnigham (2003), no próprio Reino Unido ocorreu, ao longo dos seis primeiros

anos, um deslocamento da política pró-indústrias criativas de um nível nacional para um nível

regional. Apesar dessas tendências, a idéia e o trabalho britânicos sobre as indústrias criativas

se consolidaram como referencial. Na realidade, foi essa proposta a responsável pela

popularização e expansão das mesmas. O Instituto de Cultura Popular de Manchester

identificou iniciativas nesse sentido nas cidades de Barcelona-Espanha, Goteburg- Dinamarca,

Milão-Itália, Jamtland-Suécia, Tilburg-Países Baixos, Berlim-Alemanha, Helsinki-Finlândia,

e Dublin-Irlanda (FLEW, 2002).

66

3.2.1 Na Europa e EUA

Na Europa, são observadas diversas ações criativas que fazem uso de tradições culturais

locais e habilidades dos habitantes, em particular, representadas por produtos que remetem

aos seus pontos de origem, como é o caso da moda em Paris, do teatro em Londres, da música

de Nashiville, das cerâmicas de Caltagirone na Itália, e o distrito audiovisual de Babelsberg

em Berlim. Nesse caso, os produtos, além de possuírem qualidade, são dotados de uma

autenticidade simbólica que passa a ser agregada ao seu valor econômico. Essas

características são refletidas pelo uso de proteções legais como marcas registradas ou

certificados de origem geográfica (SANTAGATA, 2002; apud SCOTT, 2006).

Na Itália, o fomento das indústrias criativas ratificou as práticas de desenvolvimento regional

já consolidadas. Entre elas, os distritos culturais construídos durante a década de 1970. Um

conjunto de ações políticas que viabilizaram a presença de redes de pequenas e médias

empresas locais, especializadas na produção de mercadorias carregadas de atributos

simbólicos. Além de essas empresas renovarem as tradições do lugar, incorporando novos

intermediários culturais como o design, são responsáveis pela oferta de trabalho para a

população local (BECATTINI, 1989; STORPER; HARRISON, 1991; BAGNASCO, 1988,

1999 apud SANTAGATA 2004).

Segundo a agência de estatística nacional italiana, aproximadamente 200 distritos industriais

pesquisados foram responsáveis por 40% do emprego da mão-de-obra total, alguns deles

caracterizados pela produção de bens baseados no design cultural. As pequenas e médias

empresas (SMEs) em Sassuolo eram responsáveis por 39.2% das exportações mundiais de

projetos de designs para azulejos e cerâmica; as SMEs de Biella e Prato são responsáveis por

cerca de 35% das vendas de roupas de lã e vestuário; os distritos de Vicenza e Arezzo

participam com cerca de 27% da exportação mundial de jóias, de qualidade estética

reconhecida mundialmente (SANTAGATA, 2004).

Conforme Capone (2006), com a análise dos dados do Instituto Nacional de Estatística (ISTA,

2001), observa-se que o setor criativo italiano de 1991 até 2001 apresenta uma taxa de

crescimento de 68% de ocupados, enquanto a taxa das demais ocupações foi de 7% para o

mesmo período. A quantidade de empregados em indústrias criativas cresceu de 600.000

67

pessoas em 1991 para 1.170.000 em 2001. Além disso, ele nota um crescimento de 235% dos

empregados no setor de serviços da Itália na última década.

Na Europa, foram criados quase 3,5 milhões de empregos relacionados ao setor cultural e

criativo, e mais que 2% da mão-de-obra européia em 1995 foi alocada em campos

relacionados ao setor (COMISSÃO EUROPÉIA, 1998; GREFFE, 1999 apud SANTAGATA,

2004). Em uma escala menor, a arte e cultura podem ser mais significantes. Como exemplo

nota-se a indústria de cinema em Los Angeles, que respondeu por 5.3% dos postos de trabalho

ocupados na cidade em 199720 (SANTAGATA, 2004).

Estas informações demonstram a crescente incorporação de insumos intangíveis como valores

culturais, trabalho intelectual e a criatividade no processo produtivo. Esses insumos passam a

ser determinantes na concepção e funcionalidade dos produtos. Na realidade, se no passado

era necessária a construção física de uma indústria para transformação de matérias-primas em

objetos, atualmente, as empresas são construídas em torno de uma idéia, de um conceito

(SANTAGATA, 2004).

Considerando estas tendências, constata-se que a natureza idiossincrática e simbólica dos bens

culturais, que foi por muito tempo negligenciada, passou a representar um diferencial no

mercado global. Mercado esse, em que a valorização da competição, a produção em massa

com escopo, e o paradigma da soberania do consumidor, engendraram vantagens econômicas,

tecnológicas e sociais para indústrias locais e de distritos culturais. Nesse cenário, as

características econômicas - valorização do trabalho intelectual e criativo, lucros crescentes e

especialização flexível – e as características sociais – riqueza de conteúdo simbólico e alto

poder de identificação – da cultura se tornaram evidentes no campo da economia, viabilizando

oportunidades como as indústrias criativas, tanto para países desenvolvidos, como para os em

desenvolvimento (BECATTINI, 1987, 1989; BAGNASCO, 1977; PYKE, BECATTINI;

SENGENBERG, 1992; SALAIS; STORPER, 1993, apud SANTAGATA, 2004).

O setor cultural e criativo na Europa registrou um movimento de aproximadamente € 654

bilhões em 2003, contribuindo com cerca de 2,6% para o produto interno bruto (PIB).

20 GREFFE é a Corporação das sociedades de registro e de foro comercial de Paris (Registre du commerce et des sociétés du tribunal de commerce de Paris) (WIKIPEDIA, 2007).

68

Também foi registrada uma taxa de crescimento para o setor de 12,3% superior, em relação ao

restante da economia. Sob esse aspecto, observa-se que as atividades de bens imóveis

(incluindo o desenvolvimento, compras, vendas e aluguéis de imóveis), um dos setores

motrizes da economia européia nos últimos anos, agregaram cerca de 2,1% ao PIB europeu. A

participação econômica do setor cultural e criativo também se apresenta superior à dos setores

alimentícios, de bebidas e de produção de cigarros que contribuíram com 1,9%, da indústria

têxtil 0,5%; e da indústria química de produtos plásticos e de borracha que agregaram cerca

de 2,3% ao PIB (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN EUROPE, 2006).

Quadro 2. Contribuição do setor criativo para as economias européias.

Países Valores comercializados em 2003 (€milhões)

Valor agregado ao PIB (%)

Reino Unido 132,682 3,0 Alemanha 126,060 2,5

Itália 84,359 2,3 França 79,424 3,4

Espanha 61,333 2,3 Países Baixos 33,372 2,7

Bélgica 22,174 2,6 Suécia 18,155 2,4

Noruega 14,841 3,2 Áustria 14,603 1,8

Finlândia 10,677 3,1 Fonte: Eurostat and Amadeus apud Study on the economy of culture in Europe, 2006.

As informações acima traduzem a ascensão do setor criativo e cultural na Europa, apesar da

inexistência de um consenso conceitual sobre as indústrias criativas. Alguns países adotaram

o conceito do Reino Unido com adequações mínimas, no sentido de evidenciar determinados

setores de acordo com suas vantagens competitivas. Na Noruega, foi mantido o termo

indústrias culturais devido a uma maior ênfase na integração cultural na indústria do que

numa definição mais ampla de criatividade. Apesar disso, muitos dos setores considerados

foram similares aos do Reino Unido, sendo responsáveis por cerca de US$ 4,7 bilhões em

negócios, e por 3,4% dos postos de trabalho (REIS, 2007).

Na Áustria, o governo priorizou em 2004 três setores econômicos: biotecnologia, tecnologia

da informação e indústrias criativas. Esta seleção não restringiu a esfera cultural ao seu

potencial de crescimento e desenvolvimento econômico, e considerou efeitos positivos que

vão além desses aspectos. Em média, as empresas criativas vienenses, metade delas fundadas

69

na última década, possuem 6,7 mais funcionários do que as demais empresas. O setor

emprega aproximadamente 120mil pessoas – cerca de 14% da força de trabalho local – e

apresenta uma taxa de crescimento de empregos de 6% ao ano, enquanto que a taxa para o

restante da economia é de 4%, considerando o período de 1998 a 200221 (REIS, 2007).

Em 2004, estima-se que no mínimo 4.714 milhões de pessoas trabalhavam nos setores criativo

e cultural, o equivalente a 2,5% da população economicamente ativa da União Européia.

Dessas, aproximadamente 1.171 milhões estavam alocadas no setor de turismo cultural.

Outras características são observadas: 46,8% dos trabalhadores do setor criativo e cultural têm

grau universitário enquanto o percentual dos trabalhadores dos demais setores é de 25,7%. A

quantidade de trabalhadores independentes no setor é o dobro ou superior aos dos outros

setores, e em 2004 se registrava 17% de trabalhadores temporários quando comparado ao total

dos empregados em outras atividades, que representa 13,3%. E a quantidade de trabalhadores

ocupados em tempo parcial, porém participando de diversos projetos, é maior que dos

trabalhadores em outras atividades (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE IN

EUROPE, 2006).

A comparação das performances das indústrias criativas entre países ainda é difícil de ser

efetuada, devido às diferentes definições e à incompatibilidade dos sistemas estatísticos,

dados e indicadores. De acordo com o relatório norte americano da “Americans for the Arts” o

número dos assim denominados negócios baseados nas artes aumentou cerca de 5,5%

(548,281 para 578,281) quando comparado com a taxa de crescimento de apenas 3,83% de

todos os negócios (12,8 milhões para 13,2 milhões). Nos Estados Unidos, os negócios

baseados nas artes incluem os seguintes setores: museus e coleções; artes performáticas; artes

visuais e fotografia; cinema, rádio e TV; design e publicidade; bem como todas as escolas de

arte e serviços. A seleção dos setores foi realizada conforme o código padrão de classificação

industrial do governo dos Estados Unidos22 (STUDY ON THE ECONOMY OF CULTURE

IN EUROPE, 2006).

21 Na Áustria, as realizações artísticas, culturais e criativas são em grande parte geradas e consumidas localmente, propiciando um efeito de identidade para as cidades e regiões. Sob esta ótica, investir em indústrias criativas pode favorecer a qualidade de vida, a identificação com a cidade ou região e a atividade para o turismo internacional (KULTURDOKUMENTATION, MEDIACULT E WIFO. “An analysis of the economic potential of creative industries in Vienna” apud REIS, 2007). 22 Nos Estados Unidos, os gastos com entretenimento consomem 5,4% do orçamento doméstico, à frente dos itens vestuário (5,2%) e saúde (5,25%). E em 2008 estima-se que o negócio chegará a 1,8 trilhão de dólares.

70

Em 2002, o relatório da Aliança de Propriedade Industrial sobre as Indústrias do Copyright da

economia norte americana (IIPA) apresentou os seguintes números sobre essas indústrias em

2001: elas agregaram cerca de 5,24% ao PIB ou US$ 535 bilhões. Nos últimos 24 anos – 1977

a 2001 – o que elas agregaram ao PIB representou cerca de duas vezes mais do que o restante

das indústrias (7% contra 3%). Porém, a definição usada neste relatório difere da usada no

estudo citado no parágrafo anterior, pois esse já inclui as empresas representadas pela Aliança

Internacional de Propriedade Intelectual Internacional (IIPA). Este exemplo comprova os

obstáculos e desafios existentes para mensuração econômica do setor criativo e cultural23.

Projeta-se uma taxa de crescimento anual de 6,3% superior ao esperado para a economia como um todo (EXAME. São Paulo, Ano 39, n. 4, mar 2005). 23 A Aliança Internacional de Propriedade Intelectual (IIPA) é uma organização não governamental criada em 1984, que inclui associações de comerciais das indústrias baseadas em direitos autorais dos Estados Unidos. Estas associações representam mais de 1.300 companhias americanas. (WIKIPEDIA, 2007).

71

3.2.2 Na Ásia e Oceania

No leste da Ásia, o conceito de indústrias criativas também vem se expandindo em diversos

países. Na Coréia do Sul, as articulações entre governo e grandes empresas passaram a

canalizar investimentos que fomentassem a cidade criativa de Seul. Tratam-se de clusters de

pequenas e médias indústrias criativas, ligados às grandes corporações da Coréia que, a

principio, divergem do modelo de desenvolvimento econômico restritamente baseado em

grandes corporações. Esta ação possui também o intuito de minimizar os impactos de crises

financeiras como a ocorrida na Ásia no final de 1997 e início 1998 (CUNNIGHAM, 2003).

Uma outra característica observada na Coréia é sua liderança mundial em conectividade por

banda-larga, nível estimado em 70% das residências, empresas e serviços públicos. Esse

diferencial favorece a renovação da criatividade e reflete no desenvolvimento da sua

economia. Uma aplicação disso está no desenvolvimento de games on-line - jogos que

permitem que diversos jogadores se divirtam simultaneamente - um entretenimento popular

no país. Outro exemplo da renovação é sua indústria de animação, inicialmente organizada e

configurada para atender as demandas de Hollywood e atualmente se desenvolve produzindo

conteúdos próprios, referendando a cultura local. Além da animação, também existe uma

indústria cinematográfica em crescimento, dotada de políticas de cotas de exibição que a

favorece (CUNNIGHAM, 2003).

Em Hong-Kong foi adotada a concepção britânica inclusive quanto à seleção das atividades

criativas. Observa-se uma ênfase para os setores de propaganda, edição e serviços de

tecnologia da informação, devido a sua importância para a economia do país. As indústrias

criativas contribuem com 2% do PIB, 3,1% das exportações de serviços e alocam 3,7% da

mão-de-obra da cidade. Paralelo a isso, o governo definiu um programa de investimentos em

educação e treinamento, promoção de exportações, acesso a finanças e convergência digital

com o objetivo de fornecer um ambiente propício ao desenvolvimento do setor (REIS, 2007).

Analisando Cingapura, Cunnigham (2003) evidencia o investimento em informação e

tecnologia de comunicações, e sua relação num ambiente político que valoriza a cultura e o

conteúdo audiovisual. Existe um destaque na educação como sendo um veículo responsável

pelo aumento da criatividade. Há um reconhecimento de que os investimentos de longo prazo

são necessários para o incremento da criatividade, e que esta também pode ser gradativamente

72

aplicada à educação. Enfim, a instauração de uma troca que poderá assegurar efeitos positivos

ao desenvolvimento das indústrias criativas no país.

Em Taiwan, observa-se uma realidade econômica distinta da coreana, por se caracterizar

fundamentalmente pela presença de empreendimentos de pequeno e médio porte. As

indústrias criativas estão sendo pensadas como uma oportunidade de diversificar sua pauta de

exportações, basicamente representada pelas indústrias de semicondutores, localizadas em

uma determinada área da cidade, além disso, representam uma ampliação das possibilidades

de afirmação cultural no país. Isto é traduzido no desenvolvimento do setor de artes e

artesanato através de um incremento do turismo cultural, como também do setor de games em

âmbito de altas tecnologias e ICT. Outro ponto positivo é o alto nível de coordenação das

políticas públicas, porém as suas universidades assumem uma postura conservadora frente à

idéia das indústrias criativas (CUNNIGHAM, 2003).

No Japão, também se nota a influência da proposta conceitual do Reino Unido. Com

adaptações, foram mantidos diversos setores da classificação do DCMS, como propaganda,

edição, radiodifusão e entretenimento, e agregados outros, como serviços de engenharia e

arquitetura. O escopo de outras atividades foi reduzido, como mercado de antiguidades e

antiguidades para mercados de antiguidades, e outras foram reconhecidas como fonte de

criatividade, como organizações artísticas, acadêmicas e culturais, ainda que não gerassem

direitos de propriedade intelectual. Com base na pesquisa de serviços industriais de 1999, as

indústrias criativas eram responsáveis por cerca de US$ 340 milhões, e, nos últimos dez anos,

enquanto a taxa de crescimento da indústria era de 69,1% a das indústrias criativas japonesas

era de 85,5%24 (REIS, 2007).

A Nova Zelândia incluiu as indústrias criativas como uma das áreas prioritárias de sua política

macroeconômica, com ênfase para produção e pós-produção de filmes e materiais televisivos,

moda e design e articulou as iniciativas com a diretriz da sustentabilidade (REIS, 2007).

Segundo Cunningham (2003), na Nova Zelândia as iniciativas políticas se concentram em

maior grau nos campos da produção de filmes e no design – esse como insumo para outros

setores como saúde e serviços e não propriamente o design como um setor de atividade fim -,

24 YOSHIMOTO, Mitsuhiro. Status of the creative industries in Japan and policy recommendations for their promotion apud REIS, 2007.

73

e algumas considerações sobre a inclusão do campo da música e mídias interativas na política.

Esta concentração inicial tem dois objetivos: incrementar as exportações e impedir que o país

perca posições na classificação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico (OCDE)25.

Na Austrália, observa-se uma tendência em associar as indústrias criativas com a produção de

conteúdo digital e aplicações com maior amplitude, coordenadas por políticas nacionais que

as relacionam como insumos para indústrias de serviços, tais como: saúde, educação, serviços

públicos e privados. No momento, o principal projeto fomentado pelo campo político para o

setor é o de Conectividade em Banda Larga do Departamento de Comunicação e Tecnologia

da Informação e das Artes do Governo Australiano (DCITA). Existe também um estudo sobre

um cluster de indústrias criativas composto por três estágios com um foco mais específico

para o aspecto tecnológico (CUNNIGHAM, 2003).

O primeiro estágio do estudo tem o objetivo de fornecer uma análise preliminar do setor, e um

mapeamento das indústrias produtoras de conteúdos e aplicações digitais. O segundo, visa o

desenvolvimento de uma análise detalhada sobre a riqueza produzida pelas atividades - firmas

e o contexto do cluster – de forma que sejam identificados os fluxos produtivo e comercial

relacionados a essas atividades. Nesse caso, foram selecionados quatro sub-setores chave:

jogos interativos, multimídias interativas, publicidade e produção de conteúdo direcionado ao

setor educacional (DCITA, 2006)26.

Em relação ao setor cultural da Austrália, o censo populacional realizado em 2001 já obteve

algumas informações sobre o número e características de pessoas com 15 anos ou mais cujo

trabalho possuía uma relação com o setor. Desse modo, foi identificado que cerca de 259.909

indivíduos - 3,1% de todos os empregados – trabalhavam numa ocupação cultural, desses

56,1% eram do sexo masculino e 43,9% do feminino. O número de ocupados em atividades

25 Trata-se de uma organização internacional dos países desenvolvidos e industrializados com os princípios da

democracia representativa e da economia de livre-mercado, com sede em Paris, e criada em 30 de setembro de 1961, e atualmente composta por 30 estados membros. Ela sucede a organização para cooperação econômica européia, criada em 16 de abril de 1948 (WIKIPEDIA, 2007).

26 DCITA, Australia`s broadband connectivity of Department of Communications, Information Technology and the Art Disponível em:<http://www.dcita.gov.au>. Acesso em: 14 jun. 2007.

74

culturais teve um aumento de 13,3% em relação ao ano de 1996, enquanto que nos demais

setores o incremento foi de 8,7% (ABS, 2005)27.

As informações citadas são importantes para o planejamento e as intervenções políticas para

os setores criativo e cultural australiano. Segundo Flew (2002), o governo do estado de

Queensland investiu num segmento de indústrias criativas e desenvolveu - com colaboração

da Universidade de Tecnologia de Queensland - uma espécie de aldeia urbana de alta

tecnologia em Brisbane, e o Governo Federal implementou uma força tarefa para avaliar

estratégias a serem aplicadas para o fomento de empresas australianas produtoras de conteúdo

digital.

Apesar disso, Gibson e Klocker (2005) apresentam novas questões sobre o uso da criatividade

pelo discurso neoliberal de desenvolvimento econômico australiano. A aplicação de técnicas

estatísticas para mensuração de variações regionais da criatividade, e a subseqüente narrativa

política que pressionam, sem criatividade, os lugares a melhorarem seu desempenho

econômico, deve ser filtrada, principalmente, em determinadas regiões não metropolitanas da

Austrália. Isto porque vários conselhos municipais e departamentos governamentais estaduais

estão simplesmente explorando os benefícios econômicos da cultura, outrora desprezados,

como a única solução para atenuar os desempenhos econômicos desiguais entre cidades e

regiões.

Na realidade, as análises sobre a ausência de criatividade em regiões pobres da Austrália

inferem numa compreensão distorcida da criatividade, debilitando ainda mais esses locais,

uma vez que as causas das disparidades não são consideradas (distribuição desigual de

recursos, os modelos de produção capitalista, os impactos de reestruturação, etc.). Dessa

forma, as áreas centrais de cidades importantes possuem índices elevados de criatividade

como Sydney e Melbourne, enquanto as regiões agrícolas com baixos índices educacionais,

altas taxas de desemprego e com grande quantidade de aborígines, apresentam baixos índices

de criatividade, que caracterizariam o problema como pontual e não como processual

(GIBSON; KLOCKER, 2005).

27 Australian Bureau of Statistics (2005 ). Disponível em: < http://www.abs.gov.au/Ausstats/[email protected] /94713ad 445ff142 5ca25682000192af2/17b405cb3adcb41bca256f7200832fe9!OpenDocument>. Acesso em: 10 jun 2006.

75

No contexto, a observação é importante, pois a conjunção do discurso cultural e do

desenvolvimento econômico vêm sendo crescentemente utilizados por políticas

governamentais locais, apesar da política cultural, nunca ter sido, no passado, uma questão

central, especialmente na Austrália rural. E, de forma repentina, governos de comunidades

locais como, New South Wales, começam a desenvolver iniciativas de planejamento cultural

para cumprir diretrizes de uma circular do departamento do governo local, que incentiva a

inclusão das indústrias criativas como um dos componentes a serem fomentados (GIBSON;

KLOCKER, 2005).

76

3.2.3 Na América Latina

Na América Latina, as indústrias criativas começam a integrar iniciativas governamentais no

sentido de promover o desenvolvimento de regiões. No México existem estudos sobre as

atividades protegidas pelo direito do autor, baseados no guia da Organização Mundial da

Propriedade Intelectual (OMPI) destinado à mensuração dessas atividades. Observando o

desempenho das indústrias de base, aquelas diretamente relacionadas à criação, produção,

fabricação, difusão, comunicação, exposição e distribuição do material protegido pelos

direitos autorais – imprensa e literatura, música, filmes e vídeos, rádio e televisão, fotografia,

artes gráficas e visuais, serviços de publicidade e sociedades de gestão coletiva – nota-se que

elas agregaram 3,27% ao PIB em 199828 (PIEDRAS, 2004).

Ao considerar as demais indústrias relacionadas com os setores criativo e cultural, o

percentual agregado ao PIB é de 6,7%. O resultado supera o desempenho de setores

fundamentais da economia mexicana, como a indústria da construção civil, que agregou 4,3%,

e os setores agropecuário, silvicultura e pesca que agregaram 4,8% ao PIB do país no mesmo

período. Além disso, destaca-se a influência da cultura sobre o turismo como uma atividade

econômica. A Secretaria de Turismo do governo (SECTUR) reconhece que todo

deslocamento turístico tem uma implicação cultural: sem a cultura não se explicaria a

atividade turística que se consolida como um dos setores mais importantes do país,

colaborando com 8% do PIB. (PIEDRAS, 2004).

Na Argentina, as iniciativas envolvendo as indústrias criativas estão relacionadas ao

desenvolvimento de clusters criativos de estúdios de cinema e televisão, moda e desenho, na

cidade de Buenos Aires. As ações foram iniciadas nos finais dos anos 90 concentrando-se em

áreas do bairro de Palermo e adjacências como Colegiales, Chacarita e Villa Crespo. A partir

de 2002, elas foram intensificadas e relacionadas às atividades cobertas pelo conceito de

indústrias criativas do Reino Unido. Salienta-se que o comportamento expansivo também foi

justificado por uma política cambial que favoreceu um novo processo de substituição de

importações através de condições vantajosas para o comércio internacional (MIGNAQUI;

SZAJNBERG; CICCOLELLA, 2005).

28 A Organização Mundial da Propriedade Intelectual - OMPI, criada em 1967, é um dos 16 (dezesseis) organismos especializados do sistema das Nações Unidas, de caráter intergovernamental, com sede em Genebra, Suíça.

77

Nos últimos anos, as atividades relacionadas ao setor criativo e cultural foram responsáveis

por 6% do PIB da cidade, sendo que o setor de audiovisual agregou a maior porcentagem

(35,2%), seguido pelo setor editorial (26,8%), publicidade (10,2%), insumos (9,7%), outras

atividades conexas (9,5%) e atividades culturais (8,6%). Agregando o turismo cultural e o

design a estas indústrias, o setor representa 10% do PIB da cidade, e contribui com 8% dos

postos de trabalho gerados, o equivalente a 90.000 ocupados no setor (MIGNAQUI,

SZAJNBERG; CICCOLELLA, 2005).

O fomento das atividades das indústrias culturais fez com que elas se transformassem em

objeto de políticas do governo da cidade de Buenos Aires. As políticas foram direcionadas ao

fortalecimento dos clusters criativos em formação no bairro de Palermo. Na Secretaria de

Cultura, foi criada a subsecretaria de gestão e indústrias culturais com o objetivo de

acompanhar, promover e otimizar os processos existentes vinculados às atividades de design,

moda, audiovisual, publicação entre outras atividades relacionadas. Em 2002 foi constituído

um Fórum para defesa e promoção das indústrias culturais de Buenos Aires, com o objetivo

de promover políticas para preservação e valorização do patrimônio cultural e em defesa da

criação e trabalho dos artistas, jornalistas, técnicos e produtores, bem como, o

desenvolvimento e crescimento de empresas nacionais produtoras de bens culturais e

informativos (MIGNAQUI, SZAJNBERG; CICCOLELLA, 2005).

Além das ações citadas, foi criado um observatório de indústrias culturais, uma unidade de

estudos, constituído por uma equipe interdisciplinar dedicada à obtenção, processamento e

elaboração de informações relativas às atividades culturais em geral, para ampliar o

conhecimento e desenvolvimento do setor. O observatório analisa os efeitos econômicos e

sociais dessas atividades na cidade, as demandas e consumo dos bens e serviços culturais, as

experiências e potenciais em âmbito local e internacional, assim como os problemas de cada

um dos setores: música, cinema, televisão, livros e publicações periódicas, vídeo, publicidade,

rádio, design e setores relacionados (Turismo cultural, artesanato, artes cênicas, artes visuais,

etc.), indústrias auxiliares (fornecedoras de máquinas e insumos para as indústrias culturais) e

indústrias conexas (tecnologias da informação e comunicações, informática e

telecomunicações).

E, complementando as intervenções públicas, foi implementado o programa Cultura Exporta,

com o objetivo de desenvolver uma estratégia de exportação para as pequenas e médias

78

empresas culturais da cidade. E o programa de fomento metropolitano da cultura, artes e

ciências da cidade de Buenos Ares, destinado a contribuir econômica e financeiramente,

através de subsídios, na concretização e manutenção de projetos, incubadoras de empresas,

programas e atividades vinculadas à produção e difusão de bens culturais intangíveis e

tangíveis (MIGNAQUI, SZAJNBERG; CICCOLELLA, 2005).

No Chile, as atividades relacionadas aos setores criativo e cultural têm sua importância para a

economia reconhecida, ainda que, sem a adoção da terminologia de indústrias criativas. O

estudo realizado pelo Conselho Nacional da Cultura e das Artes, em conjunto com convênio

Andrés Bello e a Universidade ARCIS em Santiago, denominado impacto da cultura na

economia em 2003, com base em informações do Instituto Nacional de Estatísticas (INS),

demonstrou que em 1990 o setor agregava 0,9% ao PIB e em 2000 sua participação já

representava 1,8%. Em termos relativos, a participação dessas atividades foi duplicada em 10

anos. Isto traduz o potencial de crescimento do setor com relação à dinamização econômica e

à criação de riqueza e empregos (INS, 2003).

Em 2005, foi divulgado um informe anual denominado Cultura e Tempo Livre contendo

diversas informações sobre os setores cultural e criativo do país e visando proporcionar

maiores oportunidades de análises sobre os mesmos. Tratam-se de dados sobre oferta,

demanda, propriedade intelectual e emprego disponibilizados pelo (INS) referentes aos

seguintes setores: criação, patrimônio, recreação e meios de comunicações. O estudo

identificou uma média mensal de 39.567 pessoas ocupadas no setor de criação que inclui

atividades de artes visuais, artesanato, cinema e teatro, música e publicações29.

A Colômbia concluiu recentemente um guia para mapeamento de indústrias criativas. Para

facilitar a identificação das atividades criativas e culturais que foram objeto do mapeamento,

foi realizada uma compilação de definições funcionais. Foram adotados como referenciais o

conceito de indústrias criativas do Reino Unido (DCMS); a classificação sobre as atividades e

indústrias culturais da UNESCO; e considerada uma discussão sobre a importância da conta

satélite para o setor, com intuito de facilitar a mensuração. O projeto foi liderado pelo grupo

29 Informação extraída do documento Cultura e Tempo Livre: Informe Anual 2005, disponibilizado pelo Conselho Nacional da Cultura e das Artes do governo do Chile. Disponível em <http://www.cnca.cl/Detalle Noticia .php?Id=1991 >Acesso em 01 mar de 2007.

79

de políticas culturais e assuntos internacionais do Ministério da Cultura da Colômbia através

de um convênio de colaboração firmado com o British Council30 (CRECE, 2005).

O conteúdo do guia para elaboração de mapeamentos regionais de indústrias criativas

pretende fornecer condições para que as regiões desenvolvam estudos similares que

identifiquem o seu potencial econômico e social, e forneça uma maior visibilidade para o

setor criativo. Dessa forma, espera-se que as ferramentas disponibilizadas auxiliem na

elaboração de projetos, programas e políticas de apoio para o setor, bem como na tomada de

decisões que dinamizem o seu desenvolvimento (CRECE, 2005).

Segundo Taylor (2002), o estudo é uma série de atividades piloto que representam um novo

campo de trabalho para o British Council. Entre os objetivos do projeto, pretende-se valorizar

a definição do DCMS sobre as indústrias criativas com a finalidade de consolidá-la como um

modelo internacional, além de evidenciar o Reino Unido como um centro internacional para o

debate intelectual e prático sobre a natureza das mesmas.

No caso da Colômbia, foi adotado um modelo de mapeamento regional do Reino Unido

desenvolvido por Calvin Taylor (2002), da universidade de Leeds. A escolha foi justificada

por ele já ter sido aplicado duas vezes na respectiva região, e por possuir um processo de

pesquisa mais adequado para Bogotá, uma vez que se pretendia obter informações mais

detalhadas de aspectos econômicos, impacto social, infra-estrutura disponível e as vocações

locais. Após isso, seriam aplicados os treinamentos necessários para que a equipe executasse

o projeto, que foi coordenado pelo próprio Taylor, e que contou com um intercâmbio de

pesquisadores da universidade dos Andes e de Leeds.

Durante o desenvolvimento do projeto, notou-se incompatibilidades junto a setores

considerados criativos nos padrões do Reino Unido como artes e mercados de antiguidades,

que não eram representativos à realidade da Colômbia. Apesar disso, foram identificados

dezesseis setores, propaganda e publicidade, arquitetura, design de moda, cinema e vídeo,

design gráfico, artesanato, patrimônio, design industrial, design de interface, música, artes

30 É uma organização internacional do Reino Unido que busca, com projetos ligados às suas áreas de atuação – cultura, ciências, educação e governança – estabelecer a troca de experiências e laços que gerem benefícios mútuos entre o Reino Unido e os 109 países onde estão presentes. Disponível em: <http://www.britishcouncil. org/br/brasil-about-us-what-we-do.htm>. Acesso em 22 abr de 2007.

80

performáticas, fotografia, editoração, rádio e televisão, design têxtil e artes visuais, que

fizeram parte do estudo (TAYLOR, 2002).

Outras questões pontuadas foram o grau de agregação dos códigos da CIIU (código industrial

de padrão internacional) relacionados às atividades criativas que foram utilizados para

pesquisa no país, e a dificuldade de se encontrar bancos de dados apropriados, fazendo com

que as informações dos dezesseis setores fossem extraídas, ora de fontes primárias de dados,

ora de fontes secundárias.

Os dados primários foram obtidos através de questionários compatíveis com a metodologia do

Departamento Administrativo Nacional de Estatística (DANE), e se referiram a sete setores -

cinema e vídeo, design gráfico, música, artes performáticas, fotografia, rádio e televisão, artes

visuais – que não dispunham de dados secundários representativos. Estes foram utilizados

para análise dos demais, porém obtidos por diferentes agências do Departamento

Administrativo Nacional de Estatística (DANE), do registro de câmera e comércio de Bogotá

e do banco da Colômbia.

Segundo Taylor (2002), esta peculiaridade impediu a realização de comparações setoriais,

mas, apesar disso, as informações econômicas dos dezesseis setores foram colhidas e

sistematizadas. Elas foram classificadas pelo nível de organização do setor, perfil dos

empregados, pelas características do mercado e dos investimentos, e, por fim, por

perspectivas de desenvolvimento do setor.

Na análise do setor de artesanato se constatou que as micro-empresas representam 89,3% do

setor e dessas, 2,3% exportam seus produtos. Além disso, é responsável por 2% dos postos de

trabalho em indústrias criativas, e suas vendas atingem US$ 56 milhões, porém 63% dos

negócios não utilizam práticas contábeis adequadas. Trata-se de um setor que passou a ter um

maior reconhecimento e organização com a criação da Associação Colombiana de

Artesanatos que pode ser utilizada como modelo internacional (TAYLOR, 2002).

No caso do setor de rádio e televisão, observa-se que o tipo de organização é basicamente

comercial. Composto por 92,6% de estações comerciais, que empregam cerca de 53,6% dos

trabalhadores em indústrias criativas. Desses, 36,4% são técnicos e 32,2% são profissionais

formados. Com relação às características financeiras dos negócios, 83,3% são iniciados com

81

recursos privados familiares, e sua importância nas exportações é limitada. Cerca de 90% do

mercado está concentrado em Bogotá e seus principais clientes são importantes companhias

que veiculam publicidade. Por fim, o estudo sugere que a disponibilidade de informações seja

melhorada permitindo, futuramente, análises mais substanciais (TAYLOR, 2002).

82

3.2.4 As Indústrias criativas no Brasil e a política do Ministério da Cultura

No Brasil, o marco sobre as indústrias criativas é a XI UNCTAD (Conferência das Nações

Unidas para o Comércio e Desenvolvimento), realizada entre 13 e 18 de junho de 2004 na

cidade de São Paulo. Nessa conferência foi reconhecida a importância das mesmas e de seu

potencial, enquanto fonte de valor agregado, de geração de emprego e de criação de

oportunidades comerciais para países desenvolvidos e em desenvolvimento.

As indústrias criativas podem ajudar a fomentar externalidades positivas ao mesmo tempo em que preservam e promovem o patrimônio e a diversidade culturais. Aumentar a participação dos países em desenvolvimento nessas novas e dinâmicas oportunidades de crescimento do comércio mundial e nos benefícios delas decorrentes é algo importante para que se possa obter ganhos em termos de desenvolvimento. Elas podem representar um jogo de soma positiva para países desenvolvidos e em desenvolvimento31 (UNCTAD, 2004).

Na realidade, a relevância das indústrias criativas no Brasil também faz parte de um processo

de reestruturação do Ministério da Cultura. Na proposta, buscou-se um resgate do órgão como

o responsável pela formulação, gestão e aplicação de políticas públicas de cultura no país.

Este papel, conforme Castello (2002), foi destituído pelas duas gestões consecutivas de

Francisco Weffort pela intensificação de políticas de incentivos fiscais, utilizadas, no período,

como a única forma de política cultural. Este comportamento transferiu para a iniciativa

privada a gestão das atividades culturais do país, e atribuiu ao Ministério - que dispunha de

apenas 0,14% do orçamento - um papel secundário.

Neste cenário, segundo Miguez (2006), a equipe do Ministério da Cultura sob a gestão de

Gilberto Gil deveria perseguir três eixos fundamentais: primeiro, realizar uma reforma

administrativa interna; segundo, a busca de recursos; e terceiro, o desafio maior, voltar a ser o

órgão federal responsável pela elaboração e implementação de Políticas Públicas de Cultura.

Desse modo, além da reconhecida relevância do potencial econômico das indústrias criativas,

elas contribuiriam para a visibilidade do Ministério perante outras pastas ministeriais, a mídia

e a sociedade. Além disso, elas sintonizavam com a proposta maior do próprio Ministério em

considerar a cultura como uma estratégia central para o desenvolvimento do país (MEIRA,

2004).

31 Externalidades são benefícios ou prejuízos auferidos por agentes que estão à margem da atividade produtiva que é desenvolvida (SANDORNI, 2005).

83

A valorização da Economia da Cultura é internalizada como um dos elementos a serem

desenvolvidos na nova política cultural, porém, a disponibilidade de dados padronizados

sobre cultura era um obstáculo a ser superado. Os dados e informações utilizados pela nova

gestão do Ministério da Cultura eram provenientes de uma pesquisa encomendada à Fundação

João Pinheiro32, e divulgada em 1998 com base em dados de 1994. Apesar da defasagem as

informações foram determinantes para o reconhecimento do potencial do setor.

Com base nas informações do Ministério da Cultura do Brasil (1998), havia em 1994 510 mil

pessoas empregadas na produção cultural brasileira, considerando-se todos os setores e áreas.

Elas se distribuíam da seguinte forma: 391 mil empregados no setor privado do mercado

cultural (76,7% do total), 69 mil como trabalhadores autônomos (13,6%) e 49 mil ocupados

nas administrações públicas, englobando-se união, estados e municípios.

Os setores culturais brasileiros empregavam 90% mais pessoas que os setores de fabricação

de equipamentos e material elétrico e eletrônico, 53% mais que o setor da indústria de

material de transportes (incluída a automobilística, de autopeças e de fabricação de outros

veículos); 78% acima dos serviços industriais e de utilidade pública (energia elétrica e

distribuição de água e esgotamento sanitário) e com relação ao setor de telecomunicações e

correios, o total de empregados em cultura era 2,8 vezes superior (MINISTÉRIO DA

CULTURA, 1998).

Segundo o Ministério da Cultura (1998), a produção cultural Brasileira movimentou em 1997

cerca de 6,5 bilhões de reais, o equivalente a 1% do PIB brasileiro. Para cada milhão de reais

gasto em cultura, o país gerava 160 postos de trabalho diretos e indiretos. É esta dimensão da

cultura que também passa a ser explorada pela nova gestão do Ministério, no sentido de

sensibilizar outras pastas governamentais sobre a importância sócio-econômica da cultura.

Todas as informações citadas estavam presentes nos discursos programáticos do ministro da

cultura, Gilberto Gil, ratificando a relevância da economia da cultura e das indústrias criativas

como instrumentos de políticas públicas. Esta consideração foi possível por causa da própria

32 A Fundação João Pinheiro é uma entidade do governo de Minas Gerais, voltada para a realização de projetos de pesquisa aplicada, consultorias, desenvolvimento de recursos humanos e ações de apoio técnico ao Sistema Estadual de Planejamento e demais sistemas operacionais de Minas, nas áreas da administração pública e privada, economia, estudos históricos, culturais, municipais e político-sociais. Disponível em: <http://www.fjp.gov.br/historia.php> acesso em 10 abr de 2007>.

84

concepção de cultura adotada pelo Ministério, entendendo-a como um exercício de

antropologia aplicada, como tudo aquilo que no uso de qualquer coisa se manifesta além do

valor de uso, incorporando os conhecimentos acumulados na produção de objetos e

compreendendo a cultura como um conjunto de signos de cada comunidade e de toda a nação

(GIL, 2003).

No discurso realizado em 20 de março de 2003, Gil considera a cultura como um bem

simbólico, um produto cultural, político e econômico. Destaca a economia da cultura, por

entender que para o bem ser obtido existem custos de criação, planejamento e produção.

Sendo assim, ele deve ser também considerado como uma fonte de geração de emprego e

renda, de lucro para empresas e de captação de divisas para os países exportadores desses

bens. Dessa maneira, o Brasil, enquanto exportador dos mesmos, necessita desenvolver

estratégias que ampliem sua participação no mercado internacional33.

Ainda neste discurso, nota-se uma posição favorável ao controle e proteção do mercado

cultural interno pelo Estado, uma vez que é considerada a dimensão estratégica da produção

dos bens e serviços simbólicos. A dimensão se justifica, pois, apesar de fazerem parte de um

mercado financeiramente representativo, não podem ser tratados como meras mercadorias,

por se reconhecer o valor cultural neles agregados, valores que representam a cultura e a

identidade de um povo. Esta compreensão permitiu que o Ministério viesse assumir uma

posição contrária à submissão da matéria às regras da Organização Mundial do Comércio -

OMC34 (GIL, 2003).

Para Miguez (2006), a inclusão da economia da cultura como instrumento de política cultural

compreendeu a própria noção do ministério de que era impossível pensar um projeto de

desenvolvimento, de nação, onde a cultura não aparecesse como um dos eixos organizadores.

Isto porque ela contempla três aspectos importantes: primeiro, de lidar com o universo

33 Divisas são letras, cheques, ordens de pagamentos etc., que sejam conversíveis em moedas estrangeiras, e a própria quantidade de moeda estrangeira que uma nação dispõe em poder de suas entidades públicas ou privadas (SANDRONI, 2005). 34 A Organização Mundial do Comércio (OMC) é uma organização internacional que supervisiona um grande número de acordos sobre as "regras do comércio" entre os seus estados-membros. Foi criada em 1995, sob a forma de um secretariado para administrar o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), um tratado comercial que viabilizou condições para fundação da OMC. Disponível em:< http://pt.wikipedia.org/wiki/OMC > Acesso em 10 abr de 2007.

85

simbólico brasileiro; segundo, por ser um caminho efetivo para a construção da cidadania; e

terceiro, por afirmar, cada vez mais, possibilidades do ponto de vista econômico.

Nesse cenário, a XI UCNTAD representou uma oportunidade de se ter uma organização

internacional apoiada pela ONU para fortalecer a idéia das indústrias criativas e a estratégia

da política ministerial. Outra ação que foi fundamental para o desenvolvimento dessa política

foi o acordo de cooperação técnica firmado pela Secretaria de formulação e avaliação de

políticas culturais durante a gestão de Paulo Miguez com o Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística (IBGE), em dezembro de 2004, visando criar e atualizar as estatísticas

padronizadas e sistematizadas - qualitativas e quantitativas - sobre cultura (MINISTÉRIO DA

CULTURA, 2004).

Embora já existissem pesquisas sobre os setores culturais no Brasil, principalmente

investigações relacionadas às cadeias produtivas do audiovisual e da música, elas não

assumiam o caráter da continuidade e padronizações das informações. Ora efetuadas por

órgãos públicos ou empresas privadas, ora conseqüência da inquietação acadêmica de alguns

centros universitários, elas possuíam um caráter pontual e construíram um diagnóstico

fragmentado do setor. Reconhecendo todas essas contribuições, o convênio possui a primazia

em buscar a objetividade na formulação, no desenvolvimento e no acompanhamento de

políticas públicas (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2006).

Em novembro de 2006, os primeiros resultados desse trabalho, baseado em dados de 2003,

foram divulgados pelo IBGE através do Sistema de Informações e Indicadores Culturais.

Trata-se de um sistema oficial e permanente de informações sobre economia da cultura, que

passa a permitir uma visualização temporal sobre os setores culturais e relacionados. A

obtenção das informações e indicadores se deu a partir de pesquisas regulares já realizadas

pelo IBGE. Esta especificidade acarretou em limitações típicas a esse tipo de estudo, como as

dificuldades de desagregação das atividades de forma a separar atividades culturais de outras

que não correspondiam ao escopo desejado35 (IBGE, 2006).

35 As principais informações sobre a oferta de bens e serviços culturais foram obtidas nas Estatísticas do Cadastro Central de Empresas e nas pesquisas estruturais econômicas (Pesquisa Industrial Anual - Empresa - PIA-Empresa, Pesquisa Anual de Comércio - PAC e Pesquisa Anual de Serviços - PAS). Para identificar os gastos das famílias e do governo, foram utilizadas a Pesquisa de Orçamentos Familiares - POF e as Estatísticas Econômicas das Administrações Públicas - APU. E a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD foi utilizada como fonte de informação sobre as características das ocupações e atividades culturais realizadas pela população brasileira (SISTEMA DE INFORMAÇÕES E INDICADORES CULTURAIS, 2006).

86

As informações contemplam as perspectivas da produção de bens e serviços culturais - oferta

- e dos gastos das famílias e do governo - demanda -. Com base nos novos dados, existiam em

2003, cerca de 290 mil empresas responsáveis por uma massa salarial de R$ 17,8 bilhões de

reais. O setor cultural e criativo respondia por 5,7% dos empregos formais - 1,055 milhão de

pessoas -, 6,2% do número de empresas, 6% do valor adicionado geral e por 4,4% das

despesas médias das famílias (IBGE, 2006).

A participação da cultura na oferta de empregos por setor econômico ocorria da seguinte

forma: 55,3% em serviços, 25,6% na indústria e 19% no comércio. Sobre os empregados de

cultura no país, a pesquisa indicou que eles recebiam em média, 5,1 salários mínimos,

enquanto a remuneração dos demais setores corresponde a 3,3 salários. Ainda se observa que

o custo do trabalho no setor estava abaixo da média dos demais setores, e que os trabalhadores

em cultura possuiam qualificação, alto grau de especialização e um nível de escolaridade

maior que do mercado de trabalho em geral (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2006).

As atividades culturais movimentaram, em 2003, uma receita líquida de R$ 156 bilhões de

reais e custos de R$ 114 bilhões. Isto indica uma participação do setor cultural de 6,5% dos

custos totais e de 7,9% na receita líquida total. O trabalho também informa que a cultura foi o

quarto item de consumo das famílias brasileiras, abaixo apenas da habitação, alimentação e

transporte. Com relação à participação da cultura no Produto Interno Bruto brasileiro (PIB), o

IBGE ainda não disponibilizou informações, pois depende da elaboração da conta satélite da

cultura que se encontra em andamento36 (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2006).

Realizando um exercício de aproximação com os dados do IBGE (2006) para o conceito de

indústrias criativas do Departamento de Cultura Mídia e Esportes - DCMS - do Reino Unido,

observa-se que das 290.000 empresas, direta ou indiretamente, relacionadas ao setor cultural

brasileiro, cerca de 150.084 se enquadrariam como indústrias criativas. E seriam responsáveis

por 859.440 das pessoas ocupadas no setor. Dessas, 610.039 seriam assalariadas.

36 A conta satélite é uma metodologia, desenvolvida pela Comissão de Estatística da Organização das Nações Unidas (ONU) e pela OMT, que permite mensurar a dimensão de setores econômicos que possuem um impacto representativo e difuso na economia, mas que não se enquadram como indústrias nos Sistemas de Contas Nacionais. As atividades relacionadas direta ou indiretamente à cultura possuem estas características. Disponível em: < http://www.unb.br/cet/noticias/not_contasatelite.htm > Acesso em 11 de abr de 2007.

87

Uma outra iniciativa do Ministério, que fortaleceu a posição da economia da cultura em sua

política, foi o comprometimento com a criação de um centro internacional de economia

criativa, inicialmente a ser sediado na cidade de Salvador. O centro deverá funcionar como

um local de conhecimento e de informações sobre políticas e trocas de experiências nacionais

e internacionais sobre o assunto. A proposta surgiu na XI UNCTAD durante um painel sobre

indústrias criativas, com a participação de autoridades governamentais nacionais e

internacionais, estudiosos da temática e representantes de agências do sistema ONU.

(UNCTAD, 2005).

Para Miguez (2006), existiam dois motivos para o fortalecimento dessa idéia primeiro, a

posição estratégica da cultura para os países em desenvolvimento, em sua maioria

exportadores e dependentes de commodities - mercadorias em estado bruto - no mercado

internacional, que poderiam passar a utilizar a base imaterial, diversidade cultural como

instrumentos de desenvolvimento; segundo, a inexistência de uma organização no cenário

internacional responsável exclusivamente sobre a matéria. Atualmente o observatório

internacional ainda não existe, mas o Ministério da Cultura vem se esforçando para abrigá-lo

no Centro Internacional Celso Furtado de políticas para o Desenvolvimento, localizado no Rio

de Janeiro37.

Sob uma ótica geral, as ações do ministério vêm sensibilizando o Estado e a sociedade para a

importância da dimensão econômica da cultura. E novos resultados podem ser observados,

como a criação, em 2005, do programa de desenvolvimento da economia da cultura

(PRODEC), que em 2006 passou a integrar o plano plurianual. Segundo Leitão (2006), entre

as ações implementadas pelo PRODEC destaca-se o apoio aos programas de Exportação de

Música, Cinema e Produção Independente de TV, realizados em parceria com a Apex-Brasil,

o Sebrae e entidades setoriais38.

37 Trata-se de uma associação civil de direito privado, de interesse público, sem fins lucrativos e sem vinculação político-partidária ou religiosa. Sua vocação é promover atividades acadêmicas nas áreas de interesse previstas em seus estatutos, tendo como linha-mestra o estudo do desenvolvimento em suas múltiplas facetas econômica, social, regional e urbana, infra-estrutural, ambiental, internacional. Disponível em: <http://www. Centrocelsofurtado.org.br/interno.php?cat=1&lg=pt&it=4&TpPag=1&mat=2 > Acesso em: 30 mai de 2007.

38 Sérgio Sá Leitão é assessor da presidência do BNDES desde de maio de 2006. Foi um dos responsáveis pela criação do Departamento de Economia da Cultura e do Programa de apoio à cadeia produtiva do Audiovisual.

88

Outra conseqüência do trabalho do Ministério da Cultura foi à criação, pelo Banco Nacional

de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em junho de 2006, do Departamento de

Economia da Cultura. Ele está estruturado sob três linhas de ação: informação, capacitação e

promoção de negócios, visando fortalecer as empresas que atuam no setor. Nesse sentido, o

fomento de parcerias institucionais com outros órgãos governamentais e internacionais, e com

associações setoriais serão essenciais (BNDES, 2007).

Conforme a responsável pelo departamento, Luciene Gorgulho, destacam-se quatro

mecanismos de financiamento: o crédito de longo prazo a juros baixos, a participação no

capital de empresas, o investimento de risco por meio de fundos, como os Funcines, e o

crédito de curto e médio prazo para aquisição de bens de produção via cartão BNDES. Além

disso, Leitão informa que o BNDES possui uma linha de crédito de R$ 175 milhões, a serem

investidos até o final de 2008 no programa de apoio à cadeia produtiva do audiovisual39.

Segundo Paula Porta, assessora do ministro da cultura e coordenadora do PRODEC, ele terá

um orçamento de R$ 13 milhões em 2007. A Feira de Música Brasil realizada em fevereiro na

cidade de Recife foi um dos projetos apoiados pelo programa. O evento foi inspirado no

Midem e contou com a participação de gravadoras, editoras, estúdios, sites, fabricantes de

instrumentos e lojistas. A idéia é que ele passe a fazer parte do calendário cultural. O foco na

música foi justificado pela representatividade do setor para o país, pelo processo de transição

a que está submetido seu modelo de negócio, e por fazer parte de uma das áreas consideradas

economicamente mais dinâmicas juntamente com o segmento do audiovisual - games,

internet e TV - e das festas populares40 (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2007).

Disponível em: <http://www.culturaemercado.com.br/setor.php?setor=4&pid=2895>. Acesso em 30 mai de 2007. 39 O cartão do BNDES disponibiliza um crédito rotativo pré-aprovado para micro, pequenas e médias empresas, com taxa de juros de 1,14% ao mês, e com o limite de R$ 250 mil para esse tipo de operação. Disponível em: http://www.bndes.gov.br/noticias/2007/not014_07.asp>. Acesso em 30 mai de 2007. 40 Midem é a maior feira mundial da indústria da música realizada em Cannes na França (42º edição). O evento permite aos atores-chave do segmento realizarem transações comerciais, articulações em redes de negócios e o acesso a novas tendências do setor. Disponível em: < http://www.midem. Com /App/ homepage.cfm? appname= 100508&moduleid=442&campaignid=11659&iUserCampaignID=38292345> Acesso em 31 mai de 2007.

89

Diante das informações apresentadas, percebe-se que o fator político foi decisivo para o

avanço da economia da cultura no Brasil. A valorização dessa dimensão faz parte de um

projeto maior, de posicionar a cultura como um dos elementos centrais para o

desenvolvimento do país. Nesse cenário, o conceito de indústrias criativas é agregado ao eixo

econômico da política ministerial. Adicionado a isso estão os pilares simbólico e de cidadania

que compõem a proposta, objetivando restituir o papel do órgão como o formulador e gestor

de políticas públicas de Cultura no país.

No caso das indústrias criativas, observa-se que se trata de um conceito em construção

diretamente relacionado às políticas desenvolvidas em cada país e à questão da propriedade

intelectual. Elas proporcionam novas articulações entre os campos cultural, político e

econômico, mas possuem especificidades que as sintonizam a um viés flexível, fragmentado,

que é típico da modernidade. Portanto, existem diversos modelos e experiências

internacionais a serem analisados, porém cada país, cada região necessitará desenvolver suas

próprias políticas para um setor com grande potencial de desenvolvimento.

90

3.3 Indústrias criativas e desenvolvimento “glocal”

A relação das indústrias criativas com o desenvolvimento econômico pode ser representada

nas estratégias políticas de revitalização de espaços urbanos. A intensificação dessas

iniciativas e a popularização de seus resultados engendraram a temática das cidades criativas.

O tema remete ao fomento e à descoberta de valores regionais, que possam ser manifestados

em atividades econômicas, produtos e serviços com potencial para serem comercializados

globalmente (BRITSH COUCNIL, 2007).

Na Europa e nos EUA, várias cidades desenvolveram projetos para combater os problemas

gerados pelo processo de desindustrialização, como a crescente exclusão econômica e social

da população, degradação de antigos bairros industriais e portuários, entre outras questões. E

durante a década de noventa, muitas cidades intensificaram o uso de políticas de preservação

e revitalização de centros históricos, por meio da atração de novos investimentos. As

iniciativas buscaram vincular novos usos para esses espaços e divulgaram o termo cidades

criativas (FERREIRA; COSTA, 2005).

Os quarteirões culturais e os clusters de indústrias criativas foram as principais estratégias

políticas responsáveis por atribuir novas funcionalidades para esses locais. Os quarteirões se

relacionam com fomento de atividades culturais em determinadas áreas da cidade e a

disponibilização de uma infra-estrutura de entretenimento (bares, restaurantes, lojas e

cinemas). E os clusters criativos remetem à implantação de atividades econômicas baseadas

em insumos intangíveis com o potencial de gerar emprego e renda (LANDRY, 2000).

A aliança dessas funcionalidades com as tecnologias de informação tende a intensificar a

relação entre a cultura local e a economia global. A presença dessas condições nas cidades

ampliou as possibilidades de geração de espaços glocais, espaços que podem viabilizar o

renascimento de formas autônomas de administração, de política, e de uma economia de base

local, mas globalmente conectada (BONINK; HITTERS, 2001 apud FERREIRA; COSTA,

2005).

91

Segundo Florida (2002), ações como essas seriam responsáveis por atrair um grupo de

pessoas com habilidades criativas distintivas. Essas pessoas formariam a classe criativa, um

grupo de profissionais que compartilham um “etos criativo”, e seriam determinantes para

promover novos ciclos de desenvolvimento nas cidades.

A classe criativa é composta por trabalhadores de setor de serviços, que deveriam ser atraídos

por locais que promovessem a tecnologia, o talento e a tolerância. A partir dos “3T’s”, Florida

(2002) compõe o índice da criatividade, um indicador capaz de traduzir o potencial

econômico de cidades e regiões na “nova economia”. Estas idéias estão contidas no best

seller, The Rise of Creative Class (2002), e vêm sendo promovidas e aplicadas por políticos e

consultores em planejamento urbano como modelo de desenvolvimento econômico.

92

3.3.1 Cidades, distritos criativos e regeneração urbana

As cidades, historicamente, se destacaram como centros de atividades cultural e econômica,

exibindo uma capacidade tanto para gerar cultura na forma de artes, idéias, estilos e

comportamentos, como para induzir inovações e crescimento econômico, embora, nem

sempre obrigatoriamente, de forma simultânea (SCOTT, 1997). Com as transformações

proporcionadas pelas novas tecnologias, os custos das telecomunicações e dos transportes

foram reduzidos, e os espaços urbanos se afirmaram economicamente, passando a concentrar

habitantes, oportunidades e desigualdades.

No século XXI, alguns espaços urbanos vêm apresentando uma imbricação maior entre o seu

desenvolvimento econômico e o cultural. Porém, esta tendência não surge por acaso, ela

decorre da própria evolução do capitalismo, no qual as atividades econômicas, em escala

ampliada, passaram a se relacionar com a produção, a comercialização e o consumo de bens e

serviços carregados de atributos simbólicos (BAUDRILLARD, 1968; LASH; URRY, 1994;

MOLOTCH, 1996 apud SCOTT, 1997).

Nas últimas três décadas, observa-se nos EUA e na Europa ocidental o crescente significado

das atividades relacionadas com a cultura, em estratégias políticas aplicadas na regeneração

urbana de diversas cidades (KONG, 2000). As iniciativas políticas priorizaram o fomento de

atividades econômicas que substituíssem as extintas atividades industriais tradicionais -

mineração, siderurgia, manufaturas, produção de bens duráveis, entre outras - praticadas

nestas cidades, com o objetivo de oferecer novos meios de sobrevivência aos seus

habitantes41.

A noção de cidades criativas emerge, nesse cenário, como uma proposta política que visa

articular a economia, a cultura e a paisagem urbana. Apesar do termo ser promovido por

consultores em planejamento urbano, ele constitui um objeto de estudo da geografia urbana,

pois esta passou a considerar a influência da cultura no desenvolvimento econômico, e o

modo como as forças econômicas são culturalmente codificadas, refletindo na organização do

41 A união Européia apoiou o desenvolvimento dessas iniciativas através de fundos estruturais de desenvolvimento econômico regional. Entre as ações destacam-se os projetos-piloto urbanos (Urban Pilot Projects, URBAN I e URBAN II) destinados a enfrentar os problemas das cidades (exclusão econômica e social, a recuperação de centros históricos, a falta de ligação entre a pesquisa e o desenvolvimento com as atividades das pequenas e médias empresas), via estratégias locais integradas, que permitam maximizar o impacto físico e gerar investimento público e privado. (REGIONAL POLICY, INFORREGIO, 2002 apud FERREIRA; COSTA, 2005).

93

espaço (COSGROVE; JACKSON, 1987; KONG, 1997; LEY, 1996; THRIFT; OLDS, 1996

apud KONG, 2000).

A precursora nas pesquisas contemporâneas sobre o tema foi a urbanista canadense Jane

Jacobs (1984), ao denominar cidades prósperas que se destacavam pelo uso de inovação

industrial e improvisação como cidades criativas. Atualmente, os pesquisadores Charles

Landry e Franco Bianchini (1995), influenciados por suas idéias, promovem o termo,

considerando a criatividade como um elemento de articulação entre arte e cultura, e entre a

indústria e a tecnologia (SASAKI, 2004).

No momento, Landry e Bianchini (1995) desenvolvem uma pesquisa comparativa entre

cidades, na tentativa de definir o papel da “cultura criativa” na reconstrução de suas bases

econômicas urbanas. Para eles, as cidades, que fazem uso da criatividade oriunda de

atividades artísticas e que procuram ter um volume de trabalhadores criativos, tendem a atrair

indústrias especializadas em inovação. Tal qualidade habilitaria as cidades para uma

capacidade administrativa de negociação com as mudanças nas áreas da economia e cultura

(LANDRY, 2000 apud SASAKI, 2004).

A cidade criativa também vem se popularizando através das políticas de quarteirões culturais

aplicadas em diversas cidades da Europa na década de noventa. Estas políticas foram fundidas

com estratégias de desenvolvimento do turismo, com a promoção de projetos culturais,

capitaneados por festivais de artes e música, e com planos urbanísticos que enfatizam a

qualidade de vida (LANDRY & BIANCHINI 1995; LANDRY 2000). Em determinados

casos, as estratégias políticas foram destinadas à reconfiguração de alguns locais das cidades,

vinculando-os a centros de cultura e criatividade42 (HESMODHALGH; PRATT, 2005).

Desse modo, determinados lugares passaram a se evidenciar como pontos onde os artefatos e

imagens derivados da sua cultura são transmitidos para o mundo. Porém, neste processo são

observados fluxos bidirecionais de informações, que propiciam articulações entre o local e o

42 A idéia de “cultural quarter” se relaciona à revitalização de determinadas áreas da cidade, vinculando-as a usos culturais. Em muitos casos, as artes são utilizadas em conjunto com uma infra-estrutura (acessibilidade, galerias, bares, restaurantes, lojas, teatros, museus...), objetivando a promoção da imagem do lugar e o incremento da identidade local. Esta idéia se populariza nos anos 2000, e também resulta de uma ramificação do conceito de “cultural cluster” (JAYNE, 2004 apud HESMODHALGH; PRATT, 2005).

94

global. Estas ligações, por sua vez, podem transformar a realidade cultural, econômica, social

e política dos locais envolvidos de forma positiva ou negativa (SCOTT, 1997).

As relações glocais se distinguem pela justaposição entre a esfera global e a esfera local, a

partir de um meio de comunicação, operando em tempo real. Este suporte comunicacional

intensifica trocas comerciais e experiências em escala global, superando as fronteiras físicas

que dificultavam a circulação de produtos, serviços, formas políticas e idéias (TRIVINHO,

2001 apud CAZEOLOTO, 2005).

Para Bonink e Hitters (2001), as novas tecnologias da informação intensificam a articulação

da economia global com uma sociedade e cultura locais. Este processo dual denominado

glocalização viabiliza o renascimento de formas autônomas de administração, de políticas e

de economias de base locais. O espaço glocal passa a favorecer os produtores no fomento de

redes alternativas de promoção e comercialização de seus produtos, e representa novas

oportunidades de desenvolvimento para as cidades e desafios para seus políticos43 (BONINK;

HITTERS ,2001; apud FERREIRA; COSTA, 2005).

O fenômeno glocal permite a conexão da cidade-região com redes globais, sem a necessidade

de intermediários tradicionais como grandes firmas ou representantes do estado. Para Castells

(1994), estas redes globais, por sua vez, habilitam fluxos instáveis de capitais, pessoas, bens,

produtos e serviços característicos do modo de produção informacional. Além disso, Lash e

Urry (1994) consideram que estes fluxos também seriam compostos por símbolos, imagens,

textos, sons e estilos de vida que possuem uma significação no meio cultural onde são

produzidos (O´CONNOR, 1999).

Na realidade, se estabelece de forma dialética um espaço de fluxos sobre o espaço de lugares,

no qual o espaço de fluxos subordina o espaço de lugares, mas é, ao mesmo tempo, por este

condicionado ou determinado, possibilitando a instituição de uma economia ou sociedade em

rede: rede de informações, insumos, equipamentos, serviços, produção, distribuição, consumo

etc. (CASTELLS, 1991, 1999, VELTZ, 1996, LASTRES et al 1999 apud DINIZ, 2001).

43 O sucesso econômico de cada cidade passa a depender mais das iniciativas locais, públicas e privadas. O fenômeno glocal potencializa os agentes locais, através de seus ambientes sociais de inovação, representado pela cultura, ação pública, base empresarial e sua capacidade empreendedora, base acadêmico-universitária e de pesquisa, etc (DINZ, 2001).

95

A glocalização seria um traço distintivo das cidades criativas e as atividades que fazem parte

das indústrias criativas como designer, música, cinema e software, entre outras. Elas denotam

esta tendência glocal e um exemplo são as articulações de pequenos e grandes

empreendimentos (O`CONNOR, 2000; O’CONNOR, 2006). Tais propriedades permitem que

essas indústrias auxiliem no desenvolvimento das cidades, por meio de redes de empresas e de

trabalhadores, que exploram seus atributos locais, fazendo com que as imagens e a cultura do

lugar se comportem como catalisadores de criatividade44 (DRAKE, 2003).

No Reino Unido, a aplicação de um conjunto de políticas para promover as cidades criativas

pode ser observada em diversas cidades. Manchester, Liverpool, Sheffield, Rotterdam,

Glasgow e Dublin foram submetidas a um processo de desindustrialização, e para combater os

problemas gerados, elas fomentaram iniciativas como os quarteirões culturais, os clusters

culturais e as indústrias criativas com o objetivo de gerar empregos e impulsionar a

regeneração urbana (KONG, 2000; DRAKE, 2003; LAVANGA, 2006; FERREIRA, 2005,

SHAW; EVANS, 2006).

Em Manchester, Liverpool e Sheffield foram aplicadas políticas para promover a

concentração de atividades culturais em áreas degradadas do centro da cidade. Além de serem

promovidos festivais e eventos nos quarteirões culturais, neles também são abrigadas

empresas do setor de áudio-visual, do setor de música, design e web-design, rádio

comunitária, escolas de mídia, cinemas, teatros, galerias, entre outras atividades relacionadas.

Em Manchester existem mais de trezentas micro e pequenas empresas desses setores que

criaram um site na Internet para divulgar e promover os seus produtos (BROWN et al’s,

1998).

Na cidade de Glasgow a estratégia de regeneração urbana se concentrou na promoção de

eventos culturais, e foi tão eficiente, que culminou em sua nomeação em 1990 como a cidade

européia da cultura. Em Rotterdam, antigo centro portuário, industrial e petroquímico, foram

realizados investimentos no setor cultural com objetivo de se criar uma nova imagem para a

cidade. Entre as ações destacam-se as realizações de festivais, o fomento de clusters culturais, 44 O tema Cidade Criativa está relacionado à geração e descoberta de valores regionais, que possam ser traduzidos em atividades econômicas, produtos e serviços tangíveis e ou intangíveis, dotados de potencial para serem comercializados globalmente. Seriam valores baseados em expressões artísticas, cultura, especificidades locais que venham a constituir aglomerados de novas empresas e indústrias. Tais atividades assegurariam dinamismo econômico e desenvolvimento aos ambientes urbanos (BRITSH COUNCIL, 2007).

96

com destaque para o do audiovisual, e intervenções de design arquitetônico como a

construção da ponte de Erasmusbrug (LAVANGA, 2004).

Em Dublin foram realizadas intervenções na região central e histórica da cidade denominada

Temple Bar. A revitalização decorreu da especulação de imóveis, realizada pela companhia

estatal de transportes, com o objetivo de valorizar a área. A exploração do componente

cultural foi o destaque no conjunto de intervenções, e atraiu artistas, empresas, instituições e

trabalhadores do setor. No final de 1996 o número das pessoas empregadas no Temple Bar

cresceu mais de 300%45 (MONTGOMERY, 2004 apud ADAMS; MURRAY, 2007).

Na Itália, as políticas de fomento às indústrias criativas valorizaram o modelo de

desenvolvimento regional iniciado na década de 1970 que ficou conhecido como terceira

Itália. O termo representa sessenta distritos culturais distribuídos em localidades da

Lombardia oriental, Emíglia Romana, Venetto, Toscana e Marcha. Essas regiões são

caracterizadas pelas redes de pequenas empresas locais que incorporam valores simbólicos,

principalmente culturais, na produção de mercadorias de qualidade, estilo e design

diferenciados, destinadas a atender nichos de mercado. Alguns exemplos são as malhas de

Capri, as cerâmicas de Sassuolo e de Caltagirone, e as mobílias de Pasaro (BECATINI, 1994;

apud SANTAGATA, 2004; SCOTT, 2000).

Segundo Santagata (2004), diversos elementos devem ser combinados para construir os

distritos criativos e culturais. Entre eles, comunidades locais que valorizem insumos

intangíveis como a cultura; financiamento público ao longo da cadeia de criação de valor; alto

grau de empreendedorismo; capacidade de competir no mercado internacional; retorno

crescente de escala e de escopo; uma habilidade para incorporar novos intermediários

culturais como design; capacidade de criar novos produtos; uso de tecnologia;

desenvolvimento de redes de empresas e conhecimento de logística.

Os estudos sobre as aglutinações de pequenas e médias empresas foram iniciados pelo

economista Alfred Marshall. Ele observou, em 1920, que concentrações de empresas desse

porte, especializadas em atividades específicas, viabilizavam o desenvolvimento econômico

da região onde estavam localizadas. Com esta contribuição, o termo distritos culturais

45 O local abriga o centro de fotografia da Irlanda, o instituto de cinema da Irlanda, galerias e estúdios fotográficos, lojas, bares, restaurantes entre outros empreendimentos criativos (ADAMS; MURRAY, 2006).

97

industriais passou à centralidade na configuração de sistemas locais de produção na Itália

(BECATTINI, 1979; 2004 apud CAPONE, 2006). As políticas de incentivo às indústrias

criativas, ao mesmo tempo em que ratificam a utilização desses sistemas, apresentam novas

alternativas para áreas economicamente degradadas 46.

Em Milão, nota-se a revitalização por meio do quarteirão cultural implantado no bairro de

Ticinese, centro histórico da cidade. Um espaço caracterizado por prédios e ruínas históricas,

e com uma localização geográfica que permitiu, ao longo dos anos, fluxos de pessoas de

diferentes culturas. Pessoas que engendraram um estilo de vida simples, uma organização do

trabalho artesanal, e que, a partir da diversidade cultural, forneceram uma identidade para o

local. Todo esse legado não foi suficiente para conter sua degradação, e em 1990 os primeiros

projetos de regeneração buscaram resgatar estas especificidades (BOVONE, 2005).

Atualmente, Ticinese demonstra vários tipos de renovações funcionais e estéticas como as

pequenas e médias empresas de artesanato que passaram a incorporar o design para valorizar

seus produtos, ateliês de artes, estúdios fotográficos e lojas, a transformação de velhos abrigos

industriais em lofts, e de antigas barcaças em restaurantes. As novas pessoas, que passaram a

ocupar o local, fazem uso do mesmo e constituem sistemas complexos onde todos são, ao

mesmo tempo, produtores e consumidores não apenas de mercadorias, mas de estilo de vida, e

das imagens reais e artificiais ali produzidas (BOVONE, 2005).

Bovone (2006) compreende que as mudanças em Ticinese criaram fashionable Quarters. O

termo foi cunhado por ela para designar uma área submetida a profundas transformações e ao

mesmo tempo rica em muitos componentes culturais, onde se fomenta uma cadeia de bens

intensivos em insumos intangíveis. Nesta cadeia estão simultaneamente presentes: produção,

comunicação, consumo e uma imagem relacionada às empresas e aos serviços encontrados no

local47.

46 Marshall, economista e matemático inglês (1842-1924), principal representante da segunda geração da escola marginalista inglesa ou escola de Cambridge, apresentou um tratamento mais científico à economia, analisando as relações entre a oferta, a procura e o valor, de forma a caracterizar o comportamento econômico humano sob uma perspectiva hedonista, como um delicado equilíbrio entre a busca da satisfação e a negação do sacrifício (SANDRONI, 2005). Na obra Princípios de Economia foi o primeiro economista a utilizar exemplos de atividades culturais divergindo dos modelos marginalistas hegemônicos. Ele identificou que, na maioria dos produtos culturais, a utilidade marginal era crescente, ou seja, quanto mais se consumia mais eram desejados (SALADRIGUES; SOLÉ, 2003). 47 O termo reporta-se à fusão de palavras que remetem a um espaço desejável e que se caracteriza por empresas de design e de moda (BOVONE, 2006).

98

Nos EUA, o estudo de Kotkin e Devol (2000) menciona dez iniciativas criativas para a

melhoria urbana, porém, não existe um modelo a ser seguido. Cada cidade deverá identificar

as oportunidades e desenvolver um conjunto de políticas que as viabilizem. As iniciativas são

as seguintes: desenvolver centros comerciais 24h; promover cyber distritos; atrair

comodidades; criar destinos; atualizar as empresas do ciclo econômico anterior, capitalizar

conjuntos produtivos; alimentar as redes de negócios; atrair investimentos de alta tecnologia;

captar subprodutos da nova economia e investir em capital humano.

Outro exemplo de modelo econômico criativo pode ser observado em Hay-on-Wye, uma

pequena cidade do País de Gales conhecida como a “cidade dos livros”. Tudo começou com a

iniciativa de Richard Booth ao abrir uma livraria dentro do histórico castelo Rocked em 1971.

Ele estava convencido de que a presença de sebos especializados em gêneros literários

poderia viabilizar um fluxo turístico capaz de gerar alternativas de emprego e renda para a

população de Hay-on-Wye (JAHNKE, 2006).

Atualmente, a cidade possui 41 livrarias para cerca de 1500 habitantes e recebe 500 mil

visitantes por ano. A maior concentração de turistas, 80 mil, ocorre durante a feira literária

anual conhecida como “Hay festival”, idealizada por Peter Florence em 1988. O principal

objetivo do evento é aproximar leitores e escritores, além de contar também com shows,

espetáculos teatrais e exposições artísticas que ratificam o viés cultural da proposta. O sucesso

da idéia permitiu sua expansão para outras cidades do mundo, inclusive, inspirando a Festa

Literária Internacional de Parati realizada no Rio de Janeiro (JAHNKE, 2006).

No Brasil, a cidade do Recife torna-se uma referência em iniciativas de valorização das

indústrias criativas e das cidades criativas, por meio do “porto digital”. Um projeto de

desenvolvimento econômico e social que agrega investimentos públicos, iniciativa privada e

universidades. Sua principal característica é o desenvolvimento, no histórico bairro do Recife,

de um arranjo produtivo local de tecnologia da informação e comunicação, focado na

elaboração de softwares (PORTO DIGITAL, 2007).

O “porto digital” integra as ações de revitalização do antigo bairro do Recife e demonstra que

é possível ajustar o desenvolvimento tecnológico com a preservação da história e cultura do

99

lugar. Nessa oportunidade, diversos edifícios tombados pelo IPHAN48 foram recuperados e

incorporaram a infra-estrutura urbana e tecnológica demandadas pelo projeto, mas

mantiveram suas características arquitetônicas (PORTO DIGITAL, 2007).

Os dados a seguir comprovam o êxito do “porto digital”, que colabora com,

aproximadamente, 3,5% do PIB de Pernanbuco, e foi responsável por gerar 3.000 postos de

trabalho, viabilizando a implantação de 8 Km de fibra ótica. Atualmente, abriga 102

instituições entre empresas de tecnologia, serviços especializados e órgão de fomento, sendo

quatro multinacionais, quatro centros de tecnologia e 2 incubadoras. Tudo isso, aproveitando

o legado do Bairro do Recife e em sintonia com uma economia de serviços de alto valor

agregado (PORTO DIGITAL, 2007).

Apesar das cidades criativas serem objeto de intervenções políticas, constata-se que seu

sucesso depende das novas relações instauradas entre esses locais e as pessoas que neles

habitam, trabalham, visitam e se divertem. As pessoas, o lugar e a diversidade cultural são

compreendidos como recursos de uma cidade que desafia qualquer retrato sintético. Talvez

dividi-la em blocos, quarteirões, e vilas fosse uma tentativa de fundir suas tradições, novas

vocações, e outros elementos pós-indústriais para propiciar novas formas de “encantamento”

(MAFFESOLI, 1990 apud BOVONE, 2006).

Este “encantamento” pode resultar em desenvolvimento, mas também pode representar novos

problemas. Um exemplo é a ênfase dada às intervenções físicas e à infra-estrutura, frente aos

fatores sociais intangíveis que são determinantes para nutrir as inovações artísticas e demais

produções simbólicas. Em determinados casos, criam-se logomarcas urbanas que acabam

desprezando os traços de alteridade das cidades, ou seja, realizam-se simplificações das

identidades urbanas, para favorecer a circulação e fixação de imagens tanto em escala local

quanto em escala mundial (SÁNCHEZ, 2001).

Os espaços revitalizados são transformados em cenários destinados ao exercício de uma

sociabilidade fictícia e uma conseqüente estetização das relações sociais. Em nome da

sustentabilidade e da competitividade são estabelecidas novas fronteiras urbanas e

desencadeados processos de gentrificação que dão origem a espaços vitrine dentro da cidade,

48 Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, órgão do Ministério da Cultura que tem o objetivo de preservar o patrimônio cultural brasileiro (IPHAN, 2007).

100

ou seja, armadilhas que as sintetizam para um consumo (SÁNCHEZ, 2001). As ações

políticas devem considerar o tecido social que favorece a produção da cultura, caso contrário,

as cidades perderão seu traços distintivos, e esses espaços estarão fadados a novas

intervenções49.

Por outro lado, não se pode desprezar a relação dos centros urbanos com a economia

contemporânea. Setores importantes para a economia, como indústrias de alta-tecnologia,

design, serviços financeiros, educacionais e de saúde, e indústrias fornecedoras de produtos

culturais - incluindo a mídia -, entre outras atividades econômicas, ofertam bens simbólicos e

basicamente se desenvolvem nas cidades (SCOTT, 2006).

Para Scott (2006), três atributos que engendram esses setores podem ser destacados: primeiro,

a produção do trabalho acontece em redes, normalmente dominadas por grandes empresas,

mas com a crescente presença de pequenas e médias empresas especializadas na produção

flexível; segundo, os mercados de trabalhos desses setores tendem a ser fluidos e competitivos

com muitas pessoas desenvolvendo atividades de meio período, ocupações temporárias,

autônomas, e vinculadas a equipes formadas por projetos. E por fim, a competitividade dos

produtos passa a ser composta pelos custos, e pela qualidade e a agregação de insumos

intangíveis50.

Apesar do termo cidades criativas representar a expansão de um modelo neoliberal de

promover intervenções políticas em espaços degradados, ele evidencia, à sua maneira, a

importância dos atributos mencionados por Scott (2006), para o desenvolvimento das cidades.

O desafio seria articular esses atributos com propostas alternativas que não reforcem a

segregação entre as pessoas, mas que reduzam as desigualdades sócio-econômicas desses

centros urbanos.

49 A gentrificação designa as práticas de reapropriação de espaços pelo mercado através de operações urbanas que lhes conferem novo valor econômico e simbólico, geralmente orientando-os para o consumo – residencial ou de serviços – das camadas médias. São apresentados, para fins mercadológicos, como espaços “revitalizados”, porém a população original vivencia esta nova realidade como desencadeadora de expulsão e segregação social (SMITH, 1996 apud SÁNCHEZ, 2001). 50 Produção flexível é um termo cunhado por Piore e Sabel (1984) no qual os produtores focam num determinado produto (ex. camisas, microprocessadores ou serviços) que constantemente demandam mudanças como especificações e design (SCOTT, 2006).

101

3.3.2 Classe criativa e ocupações criativas?

As cidades criativas de certa forma reforçam a relação entre os centros urbanos e o contexto

da terceira revolução industrial. Diversos termos buscaram evidenciar as transformações

sócio-econômicas, ainda em curso; sociedade pós-industrial (Bell, 1973), acumulação flexível

(Harvey, 1987), pós-fordismo (Albertsen, 1988) e economia informacional (Castells, 1994),

entre outros, mas uma das questões que caracteriza este processo é a migração das

oportunidades de trabalho das indústrias tradicionais para o setor de serviços51.

Estima-se que nos países da OECD mais de dois terços do emprego e mais de 50% da renda

estejam vinculados ao setor de serviços (Daniels, 1993). Entre 1970 e 1990 a agricultura

perdeu 12 milhões de postos de trabalho; a ampliação na indústria foi de apenas 1,7 milhões,

enquanto o setor de serviços criou mais de 89 milhões de novos postos (MARSHALL e

WOOD, 1995 apud DINIZ, 2000). Segundo Morris e Western (1999), houve uma retração de

15% da mão-de-obra industrial entre 1960 a 2000, e a oferta de trabalho no setor de serviços

cresceu 80% a mais que nos demais setores (HEALY, 2002).

Bentley (2004) informa que há cem anos atrás, menos de 10% das pessoas trabalhavam no

setor criativo da economia. Em 1950, menos de 15% dos empregados encontravam-se nesse

setor e hoje, cerca de 30% dos trabalhadores das nações mais desenvolvidas encontram-se no

setor criativo. Segundo Scott (2006), este setor reúne diversas atividades como: micro-

eletrônica, biotecnologia, indústria da moda, indústrias criativas e serviços empresariais.

O conceito de classe criativa de Richard Florida (2002) surge neste contexto. No seu livro,

The Rise of Creative Class - A ascensão da classe criativa -, ele defende a mudança de uma

economia baseada na indústria e nos serviços e gerida pelas leis convencionais do

desenvolvimento econômico para uma economia criativa. Florida é um economista

americano, professor de desenvolvimento regional da Carnegie Mellon University em

Pittsbourgh e também consultor do governo da Pensilvânia, estado com uma carência de

jovens para abastecer o seu tradicional setor industrial (ROTHAUER, 2004).

51 A classificação das atividades econômicas em primárias, secundárias e terciárias, estabelecidas por Fisher (1930) e Clark (1957) já não correspondem às características estruturais da economia contemporânea. Atualmente a diversidade do setor terciário ou de serviços e suas articulações com os demais setores dificultam sua separação da produção material (DINIZ, 2000).

102

A classe criativa seria um conjunto de pessoas com a capacidade de agregar valor econômico

às coisas através de sua criatividade. Nesta categoria estariam boa parte dos trabalhadores do

conhecimento (Drucker, 1960), e dos analistas simbólicos (Reich, 1991), mas conforme

Florida (2002), são os estudos de Paul Fussell (1983) sobre a denominada “X Class”- seria um

grupo de pessoas jovens das cidades interessado em “arte”, “pintura”, “trabalhos criativos”,

ou seja, atividades que não exigem a presença de um chefe ou superior, realizadas por

profissionais independentes -, e de David Brooks (2000) sobre os “BoBos” que forneceram os

parâmetros para que ele sintetizasse sua definição de classe criativa52.

Ao utilizar o termo classe, Florida (2002) salienta que a associação estabelecida refere-se à

função econômica de seus membros. Ele argumenta que seu critério está relacionado à

participação social, cultural, e à escolha das pessoas por um estilo de vida. A sua noção de

classe difere da tradição marxista que a vincula à propriedade de bens, capital ou meios de

produção, uma vez que, a maioria dos membros da classe criativa não possui, nem controla,

qualquer bem tangível. Eles possuem em comum uma capacidade criativa que é intangível.

Uma das características de sua teoria é o foco numa definição ocupacional, em lugar da

definição setorial (HEALY, 2002). A classe criativa é composta por dois grupos: o núcleo

super criativo e os profissionais criativos. No primeiro, estão os cientistas e engenheiros,

professores universitários, poetas e novelistas, humoristas, atores, designers e arquitetos,

assim como lideranças intelectuais da sociedade: escritores, editores, demais figuras da área

cultural, pesquisadores interdisciplinares, analistas e outros formadores de opinião;

trabalhadores que teriam em comum a capacidade de produzir novas idéias, modos e visões

(FLORIDA, 2002).

Os profissionais criativos formam o segundo grupo, incluindo trabalhadores das seguintes

áreas: financeira, jurídica, administrativa e saúde. Seriam pessoas que desempenham

atividades intensivas em conhecimento, ainda que, não vinculadas diretamente aos setores de

alta-tecnologia. Para Florida (2002), a inclusão desses profissionais deve-se à sua habilidade

52 Refere-se a um acrônimo de Bohemian-Bourgeois criado por Brooks e utilizado em seu livro “BoBos in Paradise (2000)” para definir os “herdeiros” dos yuppies (Young Urban Professionals). Com a expressão o autor satiriza o estilo de vida e os hábitos de consumo de uma nova classe, os emergentes, pessoas de classe média alta que migraram para classe alta. Eles raramente se opõem à corrente principal da sociedade, e reivindicam que os outros sejam tolerantes; compram artigos caros e exóticos e acreditam na meritocracia da sociedade americana. Segundo o autor, seriam politicamente representados pela união do idealismo liberal dos anos sessenta com o individualismo da era Reagan (FLORIDA, 2002; WITTSTOCK, 2000 apud MELLO, 2007)

103

em solucionar problemas de modo criativo, o que exige além de um alto grau de educação

formal, um nível elevado de capital humano.

Tabela 1. Estrutura de classes, como proposta por Richard Florida

Ocupações relacionadas à Computação e Matemática(Computer and mathematical occupations)

Ocupações relacionadas à Arquitetura e às Engenharias(Architecture and engineering occupations

Ocupações relacionadas às Ciências da Vida, Físicas e Sociais(Life, physical, and social science occupations)

Ocupações relacionadas à Educação, ao Treinamento e à Biblioteconomia(Education, training and library occupations)

Ocupações relacionadas às Artes. Ao Desing, ao entretenimento, aos Esportes e à Mídia(Arts, design, entertainment, sports and media occupations)

Ocupações relacionadas à Administração e à Gestão(Manegement occupations)

Ocupações relacionadas aos negócios e às Operações Financeiras(Business and financial operations occupations)

Ocupações relacionadas ao Sistema Legal(Legal occupations)

Ocupações relacionadas à Prática e à Técnica dos Cuidados com a Saúde(Healthcare practitioners and technical occupations)

Ocupações relacionadas à Gestão de Vendas e ao Atacado(High-end sales and sales management)

Ocupações relacionadas à Construção Civil e à Extração( Construction and extraction occupations)

Ocupações relacionadas à Instalação, à Manutenção e a Reparos( Installation, maintenance and repair occupations)

Ocupações relacionadas à Produção(Production occupations)

Ocupações relacionadas ao Transporte e Movimentação de Materiais(Transportation and material moving occupations)

Ocupações de apoio aos cuidados com a Saúde(Health care support occupations)

Ocupações relacionadas à Preparação e à Distribuição de Alimentos(Food preparation and food-service-related occupations)

Ocupações relacionadas à Limpeza e à Manutenção de edifícios e áreas(Building and grounds cleaning and maintenance occupations)

Ocupações relacionadas aos Cuidados e Serviços Pessoais(Personal care and service occupations)

Ocupações relacionadas às vendas no Varejo(Low-end sales and related occupations)

Ocupações de suporte às Atividades Administrativas e de Escritório(Office and administrative support occupations)

Ocupações relacionadas aos Serviços Comunitários e Sociais(Community and social services occupations)

Ocupações relacionadas aos Serviços de Proteção(Protective service occupations)

Agricultura(Agriculture)

Ocupações relacionadas à Agropecuária, à Pesca e à Exploração Florestal(Farming, fishing and forestry occupations)

Classe de Serviços

(Service Class)

Núcleo Supercriativo

(Supercreative Core)

Profissionais Criativos(Creative

Professionals)

Classe Criativa(Crative Class)

Classe Trabalhadora

(Working Class)

Fonte: FLORIDA 2002 apud MELLO 2007 p.46.

Florida (2002) argumenta que a classe criativa não corresponde a um único grupo social,

embora seus membros compartilhem escolhas, desejos e gostos similares. Para isso, ele

descreve um “etos criativo” que justificaria os critérios utilizados na seleção das ocupações.

Este conjunto de comportamentos supera o âmbito profissional, incluindo preferências

104

comuns que aglutinariam trabalhadores de diversas áreas na classe criativa, entre elas, a

escolha do tipo de trabalho realizado, o que gostam de comprar, como dividem o tempo de

trabalho e o tempo livre, e talvez o mais importante, onde eles gostariam de viver (HEALY,

2002).

Outra característica da sua teoria é buscar uma articulação da classe criativa com o espaço

urbano. A chave para compreender a “nova geografia econômica da criatividade” e seus

efeitos sobre a economia está nos 3 T’s do desenvolvimento econômico - tecnologia, talento e

tolerância -. Os locais que dispuserem desses atributos, ou que poderem fomentá-los,

atrairiam membros da classe criativa, pessoas capazes de gerar inovação e estimular o

desenvolvimento econômico (FLORIDA, 2002).

Figura 3. Os 3 T’s e o desenvolvimento econômico.

Os 3 T’s compõem o índice da criatividade que mensura e combina a influência de cada uma

dessas dimensões sobre áreas metropolitanas. Logo, a composição desse índice ocorre pela

fusão de três índices, o índice da tecnologia, o índice do talento e o índice da tolerância. O

índice da tecnologia é definido pela junção do índice de pesquisa e desenvolvimento, e do

índice de patentes com o índice baseado em inovação e tecnologia. O índice do talento é

obtido pela reunião do índice da classe criativa com os índices do capital humano e o índice

do talento científico; e o índice da tolerância é construído pelos índices de imigrantes, gays e

boêmios (FLORIDA, 2002).

A teoria de Florida (2002) é objeto de diversas críticas, uma delas sobre a sua noção de

criatividade, conceito que, por possuir muitos significados, vem sendo apropriado por vários

Inovação

Tecnologia

Talento

Tolerância

Classe Criastiva

Desenvolvimento Econômico

105

discursos (NEGUS; PICKERING, 2000 apud DRAKE, 2003). Oldham e Cummings (1996)

notam que a criatividade vem sendo associada ao uso de uma novidade, que pode agregar

valor aos produtos e serviços de organizações, mas para Smith (1998) ela remete a geração de

idéias, alternativas e possibilidades53 (HEERWAGEN, 2002).

Na psicologia, considera-se criatividade uma característica cognitiva adaptável dos seres

humanos que os auxiliam na resolução de problemas. Alguns psicólogos, ao defini-la como

novidade útil, a percebem como um resultado, mas admitem que sua manifestação ou

supressão depende de diferenças de personalidade e do cenário sócio-cultural. Outros

compreendem a criatividade como um processo, por ela estar intricada ao agir diante de

situações, e tal ação requer a interpretação dos eventos apresentados. Apesar das posições, há

um consenso de que ela deriva de sistemas sociais (HEERWAGEN, 2002).

Conforme Bourdieu (1993), a criatividade é um produto da reunião social, sob contexto

econômico e educacional ou ambiente do indivíduo (BOURDIEU, 1993 apud DRAKE,

2003). Por esse enfoque, as ações dos membros da classe criativa são limitadas por um

sistema simbólico da sociedade. Tais ações cognitivas representam uma capacidade de

perceber as tendências que já estão latentes na cultura, e de materializá-las em objetos que

podem ser bem aceitos pelo mercado (SHALINS, 2003 apud NORBERTO, 2004).

Florida (2002) leva em consideração o caráter difuso do significado de criatividade e utiliza

definições superficiais para relacioná-la com altos níveis de educação formal. A criatividade

humana não pode ser confinada a anos de estudos, tal condição é contrária a sua natureza

(MARKUSEN, 2006). Por outro lado, Healy (2002) nota que criatividade por si só não faz

ninguém acumular riqueza, enquanto as leis de propriedade intelectual o fazem, e esse

potencial muitos membros da classe criativa possuem54.

53 Embora criatividade e inovação estejam entrelaçadas, foram por muito tempo estudadas isoladamente por pesquisadores que utilizaram modelos e metodologias diferentes. A criatividade foi objeto da psicologia que a restringiu a indivíduos e pequenos grupos, enquanto que a inovação foi foco de sociólogos, economistas e outras disciplinas que a relacionaram aos sistemas sociais. Isto colaborou para existência de diversas interpretações sobre a criatividade, mas novos estudos buscam integrar essas óticas (HEERWANGEN, 2002). 54 Rotular as pessoas é perigoso, trabalhadores domésticos desenvolvem maneiras criativas de se relacionar com clientes nervosos, técnicos descobrem modos criativos de fixar máquinas e contribuem na melhoria do seu designer. Por outro lado, ocupações que demandam alto grau de estudos também podem submeter as pessoas à execução de trabalhos rotineiros (MARKUSEN, 2006).

106

Na composição da classe criativa observa-se que as ocupações selecionadas por Florida

(2002) representam a melhor parcela das ocupações do setor de serviços, pessoas bem

remuneradas. Baseado em suas pesquisas, ele afirma que a classe criativa representa 30% da

mão de obra nos EUA, sendo que 12% dos trabalhadores constituem o núcleo super criativo

(HEALY, 2002). Apesar das informações promoverem a teoria de Florida (2002) e serem

positivas para o discurso neoliberal, a metodologia adotada vem sendo alvo de críticas.

Florida (2002) utiliza os códigos da classificação padrão das ocupações (Standard

Occupational Classification, SOC) para criar a classe criativa. Porém, ele não utiliza critérios

mais elaborados para atenuar os efeitos das agregações. Por exemplo, o código 15-1041

refere-se aos especialistas de suporte de computador e faz parte do núcleo super criativo de

Florida, porém dentro desse código existem ocupações, como operador de telemarketing, que

não se enquadram na sua própria noção de criatividade (HEALY, 2002).

Sobre o índice da criatividade proveniente dos 3T’s - Tecnologia, Talento e Tolerância - e sua

vinculação com o desenvolvimento econômico de cidades, Florida (2002) estabelece uma

relação causal. Apesar de evidenciar as transformações do mercado de trabalho, a crescente

participação do setor de serviços na economia, e a importância das leis de propriedade

intelectual, ele parece desprezar uma série de articulações sócio-culturais, políticas e

econômicas, que devem estar presentes nas cidades para que se fomente um ambiente

criativo55 (HEALY, 2002; SCOTT, 2006).

Glaeser (2004) argumenta que a teoria do capital criativo de Florida não difere da teoria do

capital humano. Florida (2002) reconhece a importância dessa teoria, mas defende que um

ambiente aberto a pessoas diferentes interpretado como tolerância, é o que atrai capital

humano para o lugar. Este elemento seria o diferencial da sua teoria, porém ele não

compreende que a tolerância é um elemento cultural, e que apenas a presença de novas

pessoas não garante o desenvolvimento da cidade (RAUSH; NEGREY, 2006).

Para Scott (2006), a criatividade não é algo passível de ser importada para cidades mediante

fluxo de imigrantes, homossexuais e boêmios, mas que ela deve ser desenvolvida através de

um complexo entrelaçamento de relações de produção, trabalho, vida-social em contextos

55 Florida (2002) restringe o ambiente criativo da cidade, a disponibilização de uma infra-estrutura de entretenimento como: cafés, bares, lojas, galerias e atrações culturais. Esses elementos seriam responsáveis por manter vida nas ruas e atrair membros da classe criativa (GIBSON, 2004).

107

urbanos específicos. Isto significa que qualquer programa de desenvolvimento viável deve

estabelecer, no mínimo, um sistema de produção local, o treinamento ou atração de uma força

de trabalho adequada, um planejamento para o espaço urbano, e assegurar que todos os

demais elementos incorporados trabalhem em harmonia.

Gibson e Klocker (2005) analisam a aplicação do índice da criatividade de Florida (2002) na

Austrália. Eles salientam que sua crítica não se refere diretamente ao índice, mas a sua

apropriação pelo discurso neoliberal de desenvolvimento econômico regional. Nesse discurso,

a criatividade é articulada com mercados globais e passa a ser objeto de competição entre

regiões, pois a atração de capital e de migrantes da classe criativa seria a única alternativa de

desenvolvimento.

A imposição desse modelo ignora modos alternativos de se trabalhar com a própria

criatividade. Utilizando o índice de Florida (2002), foi realizado um mapeamento de sessenta

e quatro regiões da Austrália. As áreas centrais de capitais estaduais e predominantemente,

Sidney, Melbourne, apresentaram bons índices criativos. Enquanto as regiões agrícolas, e

aquelas com baixos índices de escolaridade, altos níveis de desemprego, grandes

concentrações de aborígines, e palco de uma competição selvagem por propriedade e por

trabalho apresentaram índices ruins (GIBSON; KLOCKER, 2005).

Embora o relatório reconhecesse que as diferenças entre os índices criativos refletiam

desigualdades sócio-econômicas, as recomendações políticas apontaram para o fomento de

soluções de mercado. Os problemas foram generalizados e suas causas estruturais desprezadas

como a distribuição desigual dos recursos, e os diferentes modos de produção capitalista

aplicados a cada região. Para reverter esses problemas, as regiões rotuladas como não

criativas deveriam desenvolver iniciativas que atraíssem os membros da classe criativa56.

Uma outra crítica é que Florida (2002) reivindica um ineditismo para sua teoria, mas Glasser

(2004), argumenta que Adam Smith (1789) já reconhecia a importância da criatividade para a

economia, e que Alfred Marshall (1920) foi o precursor da idéia de uma economia criativa

urbana. Em meados do século XX, Jane Jacobs (1961) já destacava que a presença da

56 The State of the Regions, National Economics and the Australian Local Government Association (2002).

108

criatividade e da diversidade cultural nas cidades colaborava na atração das indústrias de

inovação57 (HOSPERS; DALM, 2005).

Segundo Barbrook (2006), a classe criativa de Florida (2002) não se diferencia de diversas

teorias que buscaram identificar transições sócio-econômicas ao longo da história do

capitalismo: os trabalhadores do conhecimento (DRUCKER, 1966), a classe do conhecimento

(BELL, 1973), os analistas simbólicos (REICH, 1991), entre outros conceitos, possuem

características similares à proposta de Florida (2002). A questão é que a classe criativa se

tornou a locução da moda, adotada por consultores e políticos como alternativa de

desenvolvimento de cidades.

Routher (2004) sinaliza que a classe criativa de Florida (2002) também derivou de pesquisas

realizadas junto a estudantes da Pensilvânia. Aplicando questionários, Florida identificou que

eles preferiam trabalhar em locais que permitissem flexibilidade de horário, autonomia para se

vestirem e maior contato com os clientes, do que trabalhar numa indústria que oferecesse

garantias legais e maiores salários. Esses resultados foram utilizados na consultoria prestada

ao governo para o desenvolvimento de políticas urbanas que atenuassem a migração de jovens

para outros estados, e que atraíssem a classe criativa.

Outros autores argumentam que a promoção da agenda neoliberal é a função primária do seu

trabalho. Suas idéias reforçam a generalização do termo “criatividade” e passam a ser

reproduzidas por políticos, consultores, e jornalistas, como regra a ser aplicada em cidades

que desejam se desenvolver em sintonia com as tendências da “nova economia”. Apesar das

críticas, ele vem realizando várias palestras em cidades americanas e européias para

apresentar e comercializar suas idéias, e tem obtido sucesso (KOTKIM; SEIGEL, 2004;

MALANGA, 2004 apud RAUSH; NEGREY, 2006; PASQUINELLI, 2006).

A sua inovação está em caracterizar trabalhadores do setor de serviços de alto-fim com o

rótulo da “criatividade”, para então enfatizar os efeitos cumulativos das escolhas individuais

dos membros da classe criativa. Entre os efeitos, ele destaca a influência dessa classe na

economia, e na vitalidade cultural de cidades e regiões (HEALY, 2002). Por outro lado,

apesar de autores como, Jacobs (1961), Hall (1998), e Scott (2006) reconhecerem a

57 Algumas das principais obras de Jane Jacobs são: The Death and Life of Great American Cities (1961), The Economy of Cities (1969) e Cities and Wealth of Nations (1984).

109

importância da criatividade para o desenvolvimento econômico, eles não determinaram como

ela deveria se comportar (RAUSH; NEGREY, 2006).

A teoria de Florida (2002) vem sendo popularizada por orquestrações neoliberais que

destacam apenas um determinado potencial econômico da criatividade. Este potencial é

basicamente interpretado como leis de propriedade intelectual, e tem o objetivo de sustentar e

fortalecer um modelo de exploração dos insumos intangíveis, que passa a ser questionado

pelos impactos da digitalização. Talvez o sucesso da classe criativa represente a manifestação

de uma forma de explorar alguns elementos da cultura, e a preocupação em se defender esta

ótica.

110

4. Uma análise aproximada das ocupações criativas da RMS

Conforme apresentado, a imbricação das relações entre a cultura e a economia pode ser

representada pelos conceitos de indústrias criativas, cidades criativas e classe criativa. Os dois

primeiros surgiram de políticas públicas destinadas à revitalização econômica de cidades e

regiões e, apesar do conceito de Florida (2002) ser derivado da academia, sua popularização

resulta da crescente aplicação em consultorias de desenvolvimento regional prestadas a

governos, e de sua apropriação por gestores políticos.

O potencial das indústrias criativas na geração de emprego e renda é a principal característica

explorada pelas políticas de fomento dessas atividades porém, por se tratar de um conceito em

construção, não existem parâmetros uniformes que permitam comparações estatísticas entre

países e regiões. Entretanto, em 2004 durante a XI UNCTAD, foi estimado que em 2005 a

participação das indústrias criativas no PIB mundial seria de aproximadamente 7%. Isto

significava cerca de 1,3 trilhão de dólares.

Segundo O`Connor (2006), nas principais regiões metropolitanas, as indústrias criativas

podem representar aproximadamente entre 4% e 7% do total de postos de trabalho ofertados

pela economia. Com base nesse potencial, as características da força de trabalho que

compõem estas atividades passam a ser mais pesquisadas, e os resultados apresentados uma

comprovação do sucesso dessas iniciativas políticas.

No Brasil, apesar da carência de dados sobre a dimensão econômica da cultura, a pesquisa da

fundação João Pinheiro em 1998 já destacava o potencial do setor na geração de postos de

trabalho. Este aspecto foi confirmado pelos primeiros resultados do estudo do IBGE (2006),

com dados de 2003, no qual, o setor cultural respondia por 5,7% do pessoal ocupado, e

desses, 55,3% estavam em atividades vinculadas aos serviços.

Na Bahia, muitas manifestações culturais do estado e da região metropolitana de Salvador

(RMS) são nacional e internacionalmente conhecidas porém, a falta de dados sistematizados

sobre o papel sócio-econômico das atividades culturais se configura um obstáculo para a

realização de estudos dessa natureza. Com a proposta de análise do número de ocupados em

indústrias criativas na RMS busca-se, com base nos conceitos apresentados, aplicar uma

metodologia que contribua na mensuração desse indicador econômico.

111

A partir das ocupações da classe criativa de Florida (2002) e das ocupações selecionadas pelo

IBGE no Sistema de Informações e Indicadores Culturais (2006), pretende-se apresentar,

ainda que de forma experimental, informações sobre as ocupações criativas da RMS. Para

isso, foram selecionadas como fonte de dados a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO)

e a Pesquisa Nacional de Amostras Domiciliares (PNAD).

A CBO é um documento do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), atualizado conforme a

metodologia internacional CIUO 88, que reconhece, nomeia, descreve, codifica e ordena as

ocupações do mercado de trabalho brasileiro dentro de uma estrutura hierarquizada. Ela

agrega informações da força de trabalho, segundo características ocupacionais relativas à sua

natureza (funções, tarefas e obrigações que tipificam a ocupação) e ao conteúdo do trabalho

(conjunto de conhecimentos, habilidades, atributos pessoais e demais requisitos necessários

para o exercício da ocupação)58.

Sua estrutura básica é composta por quatro elementos, os grandes grupos, os subgrupos

principais, os subgrupos e as famílias.

Os grandes grupos: formam o nível mais agregado da classificação. São distribuídos em dez conjuntos agregados por nível de competência e similaridade nas atividades executadas, reúnem amplas áreas de emprego, mais do que tipos específicos de trabalho e são representados pelo 1º número do código das famílias. Os subgrupos principais: constituem agrupamentos mais restritos que os grandes grupos, e configuram grandes linhas do mercado de trabalho, são representados pelo 2º número do código das famílias. Os subgrupos: também denominado grupo primário. Reúnem ocupações que apresentam estreito parentesco tanto em relação à natureza de trabalho quanto aos níveis de qualificação exigidos, são representados pelos 3 primeiros números do código da família. As famílias: são unidades do sistema de classificação. Representam as ocupações propriamente ditas. Para efeitos práticos define-se ocupação como o conjunto de postos de trabalho substancialmente iguais quanto à sua natureza e às qualificações exigidas (o posto de trabalho corresponde a cada unidade de trabalho disponível ou satisfeita). Constitui-se de tarefas, obrigações e responsabilidades atribuídas a cada trabalhador. Também se pode conceituar a ocupação como o conjunto articulado de funções, tarefas e operações destinadas à obtenção de produtos ou serviços. Representadas pelo código total de 4 números. (BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, 2002).

58 A estrutura básica da CBO foi elaborada em 1977 e vinha sofrendo atualizações pontuais, sem modificações estruturais e metodológicas. Em 1988, a CBO foi adequada à nova metodologia internacional editada em espanhol como Classificação Internacional Uniforme de Ocupações - CIUO 88 -. Trata-se de um documento preparado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que ordena e sistematiza as ocupações desempenhadas pela população civil ativa, com o objetivo de funcionar como referência para elaboração de sistemas de classificação de ocupações, e para apresentação de dados nacionais sobre elas.

112

Portanto, a CBO é uma ferramenta fundamental para as estatísticas de emprego-desemprego,

estudos sobre o mercado de trabalho e para elaboração de políticas para área. Salienta-se que

será utilizada no estudo a versão provisória da CBO 2002, disponibilizada para realização do

Censo Demográfico de 2000, denominada de CBO Domiciliar. Desde 2002 esta versão é

utilizada nas demais pesquisas domiciliares do IBGE como a PNAD59.

Quadro 3. Grandes Grupos de Ocupação – CBO 2002.

Grande Grupo

Títulos

1 Membros Superiores do Poder Público, Dirigentes de Organizações de Interesse Público e de Empresas, Gerentes

2 Profissionais das Ciências e das Artes 3 Técnicos de Nível Médio 4 Trabalhadores de Serviços Administrativos 5 Trabalhadores dos Serviços, Vendedores do Comércio em Lojas e Mercados 6 Trabalhadores Agropecuários, Florestais, Caça e Pesca 7 Trabalhadores da Produção de Bens e Serviços Industriais 8 Trabalhadores da Produção de Bens e Serviços Industriais 9 Trabalhadores de Recuperação e Manutenção 0 Membros das Forças Armadas, Policiais e Bombeiros Militares

Fonte: Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, 2002

A PNAD é uma pesquisa realizada pelo IBGE com a finalidade de produzir informações

básicas para o estudo do desenvolvimento socioeconômico do país. Por possuir propósitos

múltiplos, esta pesquisa, por amostra de domicílios, investiga diversas características

socioeconômicas da sociedade, algumas de caráter permanente como educação, trabalho,

rendimento e habitação, e outras com periodicidade variável, como os aspectos ligados à

migração, fecundidade, nupcialidade, saúde, nutrição, entre outros temas passíveis de

inclusão, a depender da necessidade de informações para o Brasil. Para o estudo da RMS

serão utilizadas as informações da PNAD realizada em 2005.

A PNAD abrange a população residente em domicílios particulares permanentes e em

unidades de habitação em domicílios coletivos. A coleta das informações obedece a uma série

de conceitos e definições operacionais, iguais ou semelhantes aos utilizados em várias outras

59 A CBO 2002 não adotou o conceito de trabalho artesanal, presente CIUO 88, isto explica a existência de dois grandes grupos, 7 e 8, com a mesma denominação. Porém, existe a seguinte diferença entre eles: O grande grupo 7 reúne trabalhadores de produção extrativa, da construção civil e da produção industrial de processos discretos, que mobilizam habilidades psicomotoras e mentais voltadas primordialmente à forma dos produtos. Enquanto no grande grupo 8 concentram-se os trabalhadores que operam processos industrias contínuos, que demandam habilidades mentais de controle de variáveis físico-químicas de processos (BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria de Políticas Públicas de Emprego, 2002).

113

pesquisas domiciliares, inclusive o Censo Demográfico, facilitando a realização de futuras

comparações entre os indicadores produzidos por esse tipo de levantamento com os demais. A

questão da informalidade presente no mercado de trabalho é minimizada, pois os

questionários da PNAD consideram tanto as atividades formais quanto as informais.

Quadro 4. Principais características e variáveis fornecidas pela PNAD

Características Variáveis

Demográficas e sociais Sexo, cor, condição na unidade domiciliar, posição na família e no domicílio, número na família e data de nascimento dos moradores.

Educacionais Alfabetização, escolaridade (série e grau freqüentados) e nível de instrução das pessoas que não são estudantes (última série concluída e grau correspondente).

Mão-de-obra

Para as pessoas de 10 anos de idade ou mais: condição de atividade. Para as pessoas ocupadas: ocupação, atividade e posição na ocupação no trabalho principal, horas normalmente trabalhadas por semana no trabalho principal e nos outros trabalhos, e se é contribuinte de instituto de previdência pelo trabalho. Para as pessoas desocupadas: tempo de procura de trabalho, ocupação, atividade, posição na ocupação e motivo de saída, se recebeu fundo de garantia, e tempo de permanência em relação ao último trabalho remunerado.

Rendimento Rendimento mensal normalmente recebido do trabalho principal e dos outros trabalhos, aposentadoria, pensão, abono de permanência, aluguel e outros rendimentos.

Habitação

Espécie de domicílio. Para os domicílios particulares permanentes: tipo, estrutura, abastecimento de água, esgotamento sanitário, uso de instalação sanitária, destino do lixo, iluminação elétrica, número de cômodos, condição de ocupação, aluguel ou prestação mensal, filtro de água, fogão, geladeira, rádio e televisão.

Fonte: Brasil. Ministério da Educação (2004).

114

4.1 Os ocupados no segmento criativo na RMS

Para identificar os ocupados no segmento criativo na RMS, inicialmente foi adotado o

conceito de classe criativa de Florida (2002), uma vez que sua construção parte de uma

seleção ocupacional. Apesar das críticas direcionadas à sua teoria, esta característica

metodológica intrínseca ao seu trabalho (HEALY, 2002) pode ser utilizada como um

referencial para a experiência proposta para a RMS.

Ao se aplicar o critério de seleção das ocupações de Florida na CBO, serão obtidas as

ocupações que formarão a classe criativa da RMS, composta pelo núcleo super criativo e os

profissionais criativos. A partir da mesma, será aplicado um novo filtro na CBO, que excluirá

algumas ocupações sugeridas por Florida como criativas, e adicionará outras, provenientes do

Sistema de Informações e Indicadores Culturais do IBGE (2006), com a finalidade de se

identificar as ocupações que fazem parte das indústrias criativas na RMS.

As ocupações existentes na CBO Domiciliar relacionadas ao conceito de classe criativa de

Florida pertencem ao grande grupo 2 - intitulado como profissionais das ciências e das artes.

Este número refere-se ao nível de agregação mais elevado da classificação e dentro dele

existem sete subgrupos principais, vinte e três subgrupos e setenta e sete famílias ou grupos

de base. Esta estrutura pode ser visualizada na TAB 2.

Tabela 2 – CBO, Profissionais das ciências e das Artes

Grande Grupo

Titulação

2 Profissionais das Ciências e das Artes

Subgrupo Principal

Titulação

20 Profissionais Policientíficos 21 Profissionais das Ciências Exatas, Físicas e da Engenharia 22 Profissionais das Ciências Biológicas, da Saúde e afins 23 Profissionais do Ensino (com Formação de Nível Superior) 24 Profissionais das Ciências Jurídicas 25 Profissionais das Ciências Sociais e Humanas 26 Comunicadores, Artistas e Religiosos

Subgrupo Titulação

201 Profissionais da Bioengenharia, Biotecnologia e Engenharia Genética 202 Profissionais da Eletromecânica 211 Matemáticos, Estatísticos e afins 212 Profissionais da Informática 213 Físicos, Químicos e afins 214 Engenheiros, Arquitetos e afins

115

215 Profissionais em Navegação Aérea, Marítima e Fluvial 221 Biólogos e afins 222 Agrônomos e afins 223 Profissionais da Medicina, Saúde e afins 231 Professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental (Nível Superior)

232 Professores do Ensino Médio 233 Professores e Instrutores do Ensino Profissional 234 Professores do Ensino Superior 239 Outros Professores de Ensino Não Classificados Anteriormente 241 Advogados Autônomos e de Empresas 242 Advogados do Poder Judiciário e da Segurança Pública 251 Cientistas Sociais, Psicólogos e afins 252 Profissionais da Administração 253 Profissionais de Marketing, Publicidade e Comercialização 261 Profissionais da Comunicação 262 Profissionais de Espetáculos e das Artes 263 Membros de Cultos Religiosos e afins

Grupo de Base

Titulação

2011 Profissionais da Bioengenharia, Biotecnologia e Engenharia Genética 2012 Profissionais da Metrologia 2021 Engenheiros Mecatrônicos 2111 Profissionais da Matemática 2112 Profissionais da Estatística 2121 Especialista em computação 2122 Engenheiros de computação - desenvolvedores de software 2123 Especialista em Informática 2124 Analistas de sistemas 2125 Programadores de Informática 2131 Físicos 2132 Químicos 2133 Profissionais do Espaço e da Atmosfera 2134 Geólogos e Geofísicos 2140 Engenheiros de Materiais 2141 Arquitetos 2142 Engenheiros Civis e afins 2143 Engenheiro Eletroeletrônicos e afins 2144 Engenheiros Mecânicos 2145 Engenheiros Químicos 2146 Engenheiros Metalúrgicos 2147 Engenheiros de Minas 2148 Engenheiros Agrimensores e de Cartografia 2149 Outros Engenheiros, Arquitetos e afins 2151 Oficiais de Convés 2152 Oficiais de Máquinas 2153 Profissionais da Navegação Aérea 2211 Biólogos e afins 2221 Agrônomos e afins 2231 Médicos 2232 Cirurgiões-Dentistas 2233 Veterinários 2234 Farmacêuticos 2235 Enfermeiros de Nível Superior e afins

116

2236 Fisioterapeutas e afins 2237 Nutricionistas 2311 Professores da Educação Infantil (nível superior) 2312 Professores de Disciplinas da Educação Geral de 1º a 4º Séries do Ensino

Fundamental (Nível Superior)

2313 Professores de Disciplinas da Educação Geral de 5º a 8º Séries do Ensino Fundamental (Nível Superior)

2321 Professores de Disciplinas da Educação Geral do Ensino Médio (Nível Superior)

2330 Professores e Instrutores do Ensino Profissional (Nível Superior)

2340 Professores de Ensino Superior 2391 Professores de Educação Física 2392 Professores de Alunos com Deficiências Físicas e Mentais 2394 Programadores, Avaliadores e Orientadores de Ensino 2410 Advogados 2412 Procuradores de Empresas e Autarquias 2419 Outros Advogados Autônomos e de Empresas 2421 Juízes e Desembargadores 2422 Promotores, Defensores Públicos e afins 2423 Delegados de Polícia 2511 Profissionais em Pesquisa e Análise Antropológica e Sociológica 2512 Profissionais em Pesquisa e Análise Econômica 2513 Profissionais em Pesquisa e Análise Histórica e Geográfica 2514 Filósofos e Cientistas Políticos 2515 Psicólogos e Psicanalistas 2516 Assistentes Sociais e Economistas Domésticos 2521 Administradores 2522 Contadores e Auditores 2523 Secretárias Executivas e Bilíngues 2524 Profissionais de Recursos Humanos 2525 Profissionais da Administração Econômico-Financeira 2531 Profissionais de marketing, publicidade e comercialização 2611 Profissionais do jornalismo 2612 Profissionais da informação 2613 Arquivologistas e museólogos 2614 Filólogos, tradutores e intérpretes 2615 Escritores e redatores 2616 Especialistas em editoração 2617 Locutores e comentaristas 2621 Produtores de espetáculos 2622 Coreógrafos e bailarinos 2623 Atores, diretores de espetáculos e afins 2624 Compositores, músicos e cantores 2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins 2627 Decoradores de interiores e cenógrafos 2631 Ministros de Cultos Religiosos, Missionários e afins

Fonte: Brasil. Ministério do Trabalho e emprego, 2002. Os grupos de base (ou famílias ocupacionais) do grande grupo, profissionais das ciências e

das artes, que fornecerão as informações da classe criativa da RMS, podem ser visualizados

na TAB 3. Apesar desse grande grupo possuir setenta e sete famílias, os códigos, 2151-

117

oficiais de convés, 2152-oficiais de máquinas, 2153-profissionais da navegação aérea e 2631-

ministros de cultos religiosos, missionários e afins foram excluídos do estudo por não

apresentarem relação com a proposta. E das setenta e três famílias restantes, a PNAD de 2005

não forneceu dados para vinte delas na RMS.

Ainda na TAB 3, composta por cinqüenta e três grupos de base, são demonstradas as

categorias ocupacionais que integram a classe criativa ampliada de Florida na RMS, ou seja, o

núcleo supercriativo e os profissionais criativos. E outras duas colunas, uma representando as

categorias que fazem parte apenas do núcleo supercriativo de Florida, equivalente a uma

classe criativa restrita, e outra contendo aquelas que fazem parte desse núcleo e que

apresentam relações com a cultura.

Tabela 3 - Ocupações da classe criativa na RMS

Ocupações de Florida na CBO Domiciliar

Códigos Descrição CBO

Classe Criativa ampliada (círculo 4)

Supercriativo (círculo 3)

Supercriativo cultural

(círculo 2)

2121 Especialista em computação * * 2124 Analistas de sistemas * * 2131 Físicos * * 2132 Químicos * * 2133 Profissionais do Espaço e da Atmosfera * * 2134 Geólogos e Geofísicos * * 2141 Arquitetos * * * 2142 Engenheiros Civis e afins * * 2143 Engenheiros Eletroeletrônicos e afins * * 2144 Engenheiros Mecânicos * * 2145 Engenheiros Químicos * * 2146 Engenheiros Metalúrgicos * * 2211 Biólogos e afins * * 2221 Agrônomos e afins * * 2231 Médicos * 2232 Cirurgiões-Dentistas * 2233 Veterinários * 2234 Farmacêuticos * 2235 Enfermeiros de Nível Superior e afins * 2236 Fisioterapeutas e afins * 2237 Nutricionistas *

2312 Professores de Disciplinas da Educação Geral de 1º a 4º Séries do Ensino Fundamental (Nível Superior)

*

118

2313 Professores de Disciplinas da Educação Geral de 5º a 8º Séries do Ensino Fundamental (Nível Superior)

*

2321 Professores de Disciplinas da Educação Geral do Ensino Médio (Nível Superior)

*

2330 Professores e Instrutores do Ensino Profissional (Nível Superior)

*

2340 Professores de Ensino Superior * * *

2394 Programadores, Avaliadores e Orientadores de Ensino

*

2410 Advogados * 2421 Juízes e Desembargadores * 2422 Promotores, Defensores Públicos e afins * 2423 Delegados de Polícia *

2511 Profissionais em Pesquisa e Análise Antropológica e Sociológica

* * *

2512 Profissionais em Pesquisa e Análise Econômica

* * *

2513 Profissionais em Pesquisa e Análise Histórica e Geográfica

* * *

2515 Psicólogos e Psicanalistas *

2516 Assistentes Sociais e Economistas Domésticos

*

2521 Administradores * 2522 Contadores e Auditores * 2523 Secretárias Executivas e Bilíngues * 2524 Profissionais de Recursos Humanos *

2531 Profissionais de Marketing, Publicidade e Comercialização

* * *

2611 Profissionais do jornalismo * * * 2612 Profissionais da informação * * * 2614 Filólogos, tradutores e intérpretes * * * 2615 Escritores e redatores * * * 2616 Especialistas em editoração * * * 2617 Locutores e comentaristas * * * 2621 Produtores de espetáculos * * * 2622 Coreógrafos e bailarinos * * * 2623 Atores, diretores de espetáculos e afins * * * 2624 Compositores, músicos e cantores * * *

2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins

* * *

2627 Decoradores de interiores e cenógrafos * * * Fonte: Brasil. Ministério do Trabalho e emprego, 2002.

Na realidade, as categorias ocupacionais da classe criativa de Florida, devido a sua ampla

noção de criatividade, abrangem atividades que não são consideradas pelo conceito de

indústrias criativas adotado pelo DCMS. Entretanto, o núcleo supercriativo cultural de

Florida, mostrado na TAB 3, demonstra algumas ocupações por ele consideradas que podem

ser relacionadas com o campo da cultura e das artes.

119

Desse modo, o próximo passo é identificar as ocupações que fazem parte das indústrias

criativas da RMS. Para isso, com base em critérios do DCMS e do IBGE, foram excluídas

algumas ocupações da classe criativa ampliada de Florida e incluídas novas categorias

ocupacionais que foram selecionadas a partir do Sistema de Indicadores Culturais do IBGE

(2006). Na TAB 4, estão as categorias ocupacionais das indústrias criativas na RMS,

considerando também alguns profissionais que não dispõem de nível superior.

O DCMS (2001), precursor das indústrias criativas, definiu as mesmas como atividades

econômicas baseadas na criatividade e no talento individual que possuem o potencial de gerar

emprego e renda, através da exploração da propriedade intelectual. As atividades selecionadas

na proposta de pesquisa da RMS foram as seguintes: publicidade; arquitetura; preservação e

patrimônio; artesanato; design; cinema; audiovisual e fotografia; softwares, jogos de

computador e edição eletrônica; música e artes performáticas e visuais; edição, publicação e

reprodução (livros, jornais e revistas); e rádio e televisão. E as categorias ocupacionais que

fornecerão as informações estão vinculadas a essas atividades.

Tabela 4. Ocupações das indústrias criativas na RMS

Ocupações de Florida e do IBGE na CBO Domiciliar

Códigos Descrição CBO

Ocupações das

Indústrias Criativas (círculo 1)

2121 Especialista em computação * 2124 Analistas de sistemas * 2141 Arquitetos * 2531 Profissionais de Marketing, Publicidade e Comercialização * 2611 Profissionais do jornalismo * 2612 Profissionais da informação * 2614 Filólogos, tradutores e intérpretes * 2615 Escritores e redatores * 2616 Especialistas em editoração * 2617 Locutores e comentaristas * 2621 Produtores de espetáculos * 2622 Coreógrafos e bailarinos * 2623 Atores, diretores de espetáculos e afins * 2624 Compositores, músicos e cantores * 2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins * 2627 Decoradores de interiores e cenógrafos * 3189 Desenhistas técnicos e modelistas * 3331 Instrutores professores de escolas livres * 3711 Técnicos em biblioteconomia * 3713 Técnicos em artes gráficas * 3722 Fotógrafos *

120

3741 Técnicos em operação de aparelhos de sonorização * 3742 Técnicos em operação de aparelhos de cenografia * 3761 Bailarinos de danças populares * 3762 Músicos e cantores populares * 3764 Apresentadores de espetáculos *

7606 Supervisores das artes gráficas *

7661 Trabalhadores da pré-impressão gráfica *

7662 Trabalhadores da impressão gráfica *

7663 Trabalhadores do acabamento gráfico *

7664 Trabalhadores de laboratório fotográfico * 7681 Trabalhadores artesanais da tecelagem * 7682 Trabalhadores artesanais da confecção de roupas * 7686 Trabalhadores tipográficos, linotipistas e afins *

Fonte: Brasil. Ministério do Trabalho e emprego, 2002.

Os conceitos de classe criativa e de indústrias criativas foram os critérios utilizados para a

seleção das ocupações. Isto permitiu a criação de quatro círculos ocupacionais que serão

objeto de análise das ocupações criativas da RMS. O círculo contendo a classe criativa

ampliada de Florida foi denominado como círculo 4. Aquele, contendo estritamente as

ocupações do núcleo super criativo de Florida, foi chamado de círculo 3. As ocupações

relacionadas com a cultura do núcleo criativo de Florida compuseram o círculo 2, chamado de

super criativo cultural, e por fim, o círculo 1 foi formado por ocupações que representam as

indústrias criativas. Esta configuração pode ser visualizada na FIG. 4, já com os respectivos

percentuais de ocupados no segmento criativo da RMS, conforme a PNAD de 2005.

Figura 4 Distribuição dos ocupados no segmento criativo da RMS.

4. Classe Criativa Ampliada (6,6%)

3. Super Criativo (3%)

2. Super Criativo Cultural (2%)

1. Ocupações das Indústrias Criativas (3,6%)

121

4.2 Especificidades das ocupações criativas da RMS

A metodologia construída para identificar os ocupados no segmento criativo na RMS permite

que sejam obtidas informações sob duas perspectivas: a da classe criativa de Florida e a das

indústrias criativas do DCMS. Esta característica, além de valorizar ambos os conceitos,

amplia as possibilidades de análises da economia da RMS. Segundo Florida, os profissionais

da classe criativa representavam 30% dos ocupados nos EUA em 2002, e apresentaram um

crescimento superior a 10% nas últimas décadas em relação aos demais profissionais.

Florida e Tinagli (2004) encontraram as seguintes concentrações de classe criativa para a

Europa: Bélgica (29,97%), Países Baixos (29,54%), Finlândia (28,61%), UK (26,73%),

Irlanda (26,01%), Grécia (22,08%), Suécia (21,18%), Dinamarca (21,05%), Espanha

(19,48%), Alemanha (18,17%), Áustria (16,92%), Itália (13,19%) e Portugal (13,14%). Para o

Brasil, Golgher (2006) estimou um índice de 10,9% para os trabalhadores criativos em 2004,

um percentual bem inferior ao dos EUA (30%) e da maioria dos países Europeus,

aproximando-se apenas dos valores encontrados em Portugal e na Itália.

Uma outra realidade é demonstrada na TAB 5; percebe-se que a classe criativa representa

6,6% do total de ocupados na RMS, mas, se considerado apenas o núcleo super criativo, este

percentual reduz para 3%. E quando o objetivo é identificar as ocupações desse núcleo

restritamente relacionadas ao setor cultural, o percentual apresentado é de 2% do total de

ocupados. Essa variação de 4,6% demonstra a abrangência do conceito de Florida.

Tabela 5. Distribuição das ocupações criativas na RMS, 2005 (%)

RMS

Características Círculo 1 - Ocupações da

Indústria Criativa

Círculo 2 - Supercriativo

cultural

Círculo 3 - Supercriativo

Círculo 4 - Classe

Criativa ampliada

Ocupados Total 1.511.910 1.511.910 1.511.910 1.511.910

Ocupados 54.183 30.630 45.635 99.603

Proporção dos ocupados nos segmentos selecionados

3,6 2,0 3,0 6,6

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

Na TAB 5 também pode ser observado que as pessoas ocupadas em indústrias criativas

respondem por 3,6% do total de ocupados na RMS. Nota-se que, apesar da investigação

122

possuir um caráter exploratório, o percentual de ocupados em indústrias criativas encontrado

para RMS se aproxima do parâmetro inferior de 4% citado por O´Connor (2006) para áreas

metropolitanas. Entretanto, salienta-se que, na composição desse círculo 1, não foram

considerados todos os códigos de ocupações utilizados pelo Sistema de Indicadores Culturais

do IBGE (2006), pois existiam ocupações que não se enquadravam ao conceito do DCMS60.

As adaptações metodológicas utilizadas nessa pesquisa não permitem a comparação direta dos

percentuais da classe criativa da RMS com os obtidos nos EUA e na Europa. Contudo, as

semelhanças existentes na natureza das atividades criativas empregadas tanto nos EUA e

Europa, quanto na RMS, possibilitam que sejam efetuadas comparações aproximadas das

informações. Esta condição também se aplica aos percentuais obtidos dos ocupados em

indústrias criativas na RMS, outra ótica explorada pelo trabalho.

No livro The Rise of Creative Class (2002), Florida apresenta uma classificação de 49 cidades

americanas, com mais de um milhão de pessoas, por percentual de concentração da classe

criativa. As dez cidades que lideram o ranking da chamada “geografia da criatividade” são:

Whashigton, D.C. (38,4%), Raleigh-Durham (38,2%), Boston (38%), Austin (36,4%), San

Francisco (34,8%), Minneapolis (33,9%), Hartford, CT (33,4%), Denver (33%), Seattle

(32,7%) e Houston (32,5%). Mesmo as últimas cidades relacionadas, Salt Lake City (26,8%),

Louisville (26,5%), Memphis (24,8%), Grand Rapids, MI (24,3%) e Las Vegas (18,5%)

apresentaram percentuais elevados em relação ao encontrado para RMS (6,6%).

Os índices citados acima demonstram o contraste das cidades americanas com a realidade

encontrada na RMS. Na conjuntura americana o desafio dessas cidades está em aprimorar o

grau de desenvolvimento econômico que já foi alcançado. Por exemplo, em Boston (38%), as

faculdades e universidades assumem um papel de destaque na economia, pois além de serem

as principais fontes de emprego da região, elas são responsáveis por atrair empresas de alta

tecnologia, indústrias de softwares e de biotecnologia (FLORIDA, 2002). Essas características

refletem numa economia mais sofisticada com relação à da RMS, principalmente pela

contribuição do setor de serviços de alto fim.

60 No texto Creative cities: The role creative industries in regeneration, o Dr. Justin O´Connor cita que em áreas metropolitanas, as indústrias criativas são responsáveis por gerar entre 4% e 7% dos empregos (2006).

123

Na RMS (6,6%), apesar do setor de serviços também assumir num papel de destaque na

economia, o predomínio de serviços de baixo fim difere completamente do cenário de Boston.

Logo, embora a concentração de membros da classe criativa se configure um elemento

comum na análise, o estágio de desenvolvimento em que se encontra cada uma das economias

é determinante para estabelecer panoramas tão díspares.

Abordando a realidade brasileira também são encontradas diferenças na performance da

classe criativa entre os estados do país. Os percentuais obtidos por Golgher (2006), a partir da

PNAD (2004), para os estados de São Paulo (14,7%), Rio de Janeiro (15,2%) e Minas Gerais

(10,6%) ratificam a tendência desses trabalhadores se concentrarem em regiões urbanas com

uma economia mais dinâmica e diversificada.

Salienta-se que estes valores não são totalmente comparáveis com o encontrado para RMS

(6,6%) pelos seguintes fatores: primeiro, eles são referentes a estados brasileiros; segundo há

uma diferença de um ano na coleta dos dados da PNAD, e, principalmente, devido à maior

abrangência na seleção dos códigos de ocupações da CBO realizado por Golgher (2006). A

compreensão de classe do autor, o fez considerar também como trabalhadores criativos as

categorias que compõem o grande grupo (1) da CBO - Membros Superiores do Poder Público,

Dirigentes de Organizações de Interesse Público e de Empresas, Gerentes -, enquanto que, na

presente pesquisa foram consideradas apenas as categorias que integram o grande grupo (2)

da CBO - Profissionais das Ciências e das Artes -.

Isto não significa dizer que uma proposta seja melhor que a outra, mas que demonstram

diferentes óticas de análise sobre a aplicação do conceito controverso de classe criativa de

Florida. Apenas ilustrando: quando aplicados os critérios dessa pesquisa para o estado da

Bahia, os trabalhadores do setor criativo representavam 3,2% do total de ocupados (PNAD,

2005), enquanto, nos parâmetros de Golgher, eles respondiam por 6,1% (PNAD 2004).

O próprio autor reconhece que a expressão “setor criativo apresenta limitações e

imperfeições” (Golgher, 2006, p.8 apud MELLO, 2007 p.75). A inexistência de um consenso

do que vem a ser classe criativa e o reconhecimento de sua crescente relevância para o

desenvolvimento regional instigam a explorar novos recortes metodológicos. Assumindo

esses riscos, o presente estudo visa oferecer subsídios para novas reflexões sobre o setor

criativo, tendo como objeto o perfil dos ocupados na RMS.

124

Para construir o perfil dos ocupados no segmento criativo da RMS, serão utilizadas algumas

variáveis fornecidas pela PNAD como sexo, cor, idade, escolaridade, renda, número de

trabalhos, faixa de horas trabalhadas, posição na ocupação, contribuição para previdência,

local onde funciona a empresa ou negócio e condição na família. Com o objetivo de facilitar a

compreensão das informações, estas variáveis serão agrupadas conforme os atributos pessoais

dos ocupados e aquelas características que são definidas pelo mercado (SANTANA; SOUZA,

2001).

Tabela 6. Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo segundo atributos pessoais, RMS, 2005 (%)

RMS

Características Círculo 1 - Ocupações da

Indústria Criativa

Círculo 2 - Supercriativo

cultural

Círculo 3 - Supercriativo

Círculo 4 - Classe

Criativa ampliada

Total dos Ocupados

Sexo

Masculino 57,7 50,3 57,5 43,9 55,3

Feminino 42,3 49,7 42,5 56,1 44,7

Idade

17 a 24 anos 26,2 19,7 16,0 12,5 21,5

25 a 39 anos 38,9 38,1 43,8 43,9 43,4

40 a 59 anos 31,5 36,0 36,1 39,5 31,6

60 anos e mais 3,5 6,1 4,1 4,0 3,5

Cor

Indígena 0,4 0,7 0,5 0,4 0,5

Branca 23,8 30,6 39,7 43,3 18,7

Preta 25,8 22,5 17,4 16,9 28,4

Amarela 0,0 0,0 0,9 0,4 0,3

Parda 50,0 46,2 41,5 38,9 52,1

Escolaridade

Sem instrução e menos de 1 ano 0,4 0,7 0,5 0,2 4,1

1 a 3 anos 2,3 2,7 1,8 0,8 9,1

4 a 7 anos 13,8 11,6 7,8 3,8 23,4

8 a 10 anos 13,9 8,2 5,5 3,8 17,7

11 a 14 anos 50,8 36,1 32,4 25,5 36,9

15 anos ou mais 18,1 40,1 51,6 65,7 8,6

Não determinados e sem declaração 0,8 0,7 0,5 0,2 0,2

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

125

Na TAB 6 nota-se o predomínio do sexo masculino (55,3%) em relação ao total dos ocupados

na RMS. Esta tendência se reproduz em três dos quatro círculos utilizados para a análise dos

ocupados no segmento criativo. Inclusive, na coluna referente às indústrias criativas o

percentual dos ocupados do sexo masculino (57,7%) é ligeiramente maior que o total. Porém,

na coluna que representa os ocupados na classe criativa ampliada esta característica se inverte,

43,9% são do sexo feminino e 39,5% do sexo masculino. O fato é justificado pela presença,

no grande grupo 2 da CBO - Profissionais das ciências e das artes -, de famílias com grande

concentração de ocupados do sexo feminino como saúde, secretariado e assistência social.

Os dados para a variável idade, representada por faixas etárias, apontam para o predomínio

dos ocupados na faixa de 25 a 39 anos, tanto nos quatro segmentos criativos (média 41,1%)

como no total de ocupados (43,4%). As diferenças são notadas nos extremos da distribuição.

Na faixa de 17 a 24 anos, a maior participação (26,2%) encontra-se na coluna das indústrias

criativas, e na faixa acima de 60 anos, o maior percentual de ocupados 6,1% está na coluna

dos super criativos culturais.

Na distribuição dos ocupados por cor, constata-se uma predominância dos pardos 52,1% na

coluna que representa o total de ocupados, e nos quatro segmentos criativos, 44,1% em média.

Na classe criativa ampliada, os brancos (43,3%) superam os pardos (38,9%). Os dados

também indicam que os percentuais de ocupados da cor preta são inferiores a brancos e

pardos em todas as colunas que representam a classe criativa. Esta situação não se reproduz

nas colunas da indústria criativa 25,8% e para o total de ocupados 28,4% cujos percentuais de

ocupados da cor preta só são inferiores aos de pardos.

A TAB 6 demonstra que a baixa escolaridade é uma característica predominante entre os

ocupados totais na RMS (54,3%). Desses, 4,1 % não possuem sequer instrução e 50,2%

dispõem de até 10 anos de estudo, ou seja, cursaram até o primeiro grau. No outro extremo da

distribuição por anos de estudo, constata-se que 36,9 % do total de ocupados possuem entre

11 a 14 anos de estudo, e apenas 8,6%, possuem mais de 15 anos.

Esta realidade é diferente para os ocupados no segmento criativo da RMS em todos os quatro

círculos. Para os ocupados nas indústrias criativas, 50,8% possuem no mínimo 14 anos de

estudo e 18,1% possuem 15 ou mais anos. Pela perspectiva da classe criativa, para os

ocupados na faixa dos 15 anos ou mais de escolaridade, os percentuais encontrados são os

126

maiores, 40,1% para os classificados como super criativos culturais, 51,6% para os super

criativos e 65,7% para aqueles que compõem a classe criativa ampliada de Florida.

Analisando o conjunto das três colunas que representam os ocupados na classe criativa, os

percentuais médios revelados de escolaridade para as faixas de 11 até 14 anos de estudos e de

15 ou mais anos são respectivamente 31,3% e 52,5%. Comparando esses resultados com os

percentuais dos ocupados nas indústrias criativas para as mesmas faixas de escolaridade são

encontrados 50,8% e de 18,1%. Isto destaca a relação que Florida estabelece ao considerar a

criatividade como sinônimo de altos níveis de educação formal.

Tabela 7 Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo conforme algumas características do mercado de trabalho, RMS, 2005 (%)

RMS

Características Círculo 1 - Ocupações

da Indústria Criativa

Círculo 2 - Supercriativo

cultural

Círculo 3 - Supercriativo

Círculo 4 - Classe

Criativa ampliada

Total dos Ocupados

Posição na Ocupação

Empregado 47,3 51,7 65,3 75,9 60,1

Conta própria 50,8 46,3 32,9 20,3 23,3

Empregador 1,5 1,4 1,4 2,9 3,9

Trabalhador não-remunerado membro da unidade domiciliar 0,4 0,7 0,5 0,2 1,6

Outros trabalhadores domésticos e não remunerados 0,0 0,0 0,0 0,6 11,2

Contribui p/ Inst. Previdência

Sim 33,8 38,8 57,1 69,2 51,3

Não 66,2 61,2 42,9 30,8 48,7

Faixa de horas trabalhadas

0 a 20 horas 33,8 29,9 21,0 23,4 15,3

21 a 40 horas 42,7 46,9 57,1 57,1 40,4

Mais de 40 horas 23,5 23,1 21,9 19,5 44,3

Local onde funciona a empresa ou negócio

Loja, oficina, fábrica, escritório, escola, repartição pública 51,2 55,1 68,9 84,1 63,6

No domicílio em que reside 30,4 31,3 21,0 10,7 7,5

Em domicílio de empregador, patrão, sócio ou freguês 3,5 2,7 1,8 1,0 12,2

Em local designado pelo empregador, cliente ou freguês 14,6 10,9 8,2 4,2 9,1

Outros (Fazenda, sítio, granja, chácara, etc.; em veículo automotor; em via ou área pública)

0,4 0,0 0,0 0,0 7,6

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

127

Sabe-se que os ocupados no segmento criativo possuem um nível de escolaridade superior ao

da população ocupada em geral, uma característica valorizada pelo mercado de trabalho. Mas,

quais são as especificidades desse segmento no que se refere à posição na ocupação,

contribuição para previdência, faixa de horas trabalhadas, local onde funciona a empresa? São

essas questões que os dados contidos na TAB 7 pretendem esclarecer.

Conforme a posição na ocupação, os dados apontam que 60,1% do total de ocupados são

empregados. No segmento criativo, os percentuais dos ocupados como empregados na classe

criativa ampliada 75,9%, e no núcleo super criativo 65,3%, superam os 60,1% do total de

ocupados. Cenário que ratifica a importância do grau de instrução e da qualificação

profissional para o mercado de trabalho. Para a categoria dos trabalhadores por conta própria,

um outro panorama é revelado, os maiores percentuais de ocupados nesta condição

encontram-se nas indústrias criativas (50,8%) e no super criativo cultural (46,3%).

Isto revela que, para as ocupações criativas diretamente relacionadas com a cultura, os

autônomos predominam. Esta especificidade pode ser comprovada pelos percentuais dos

ocupados em indústrias criativas (66,2%) e dos super criativos culturais (61,2%), que não

contribuem para o instituto de previdência social. A situação se inverte para os ocupados na

classe criativa ampliada e aqueles que representam apenas seu núcleo super criativo. Eles são

os que mais contribuem para a previdência, respectivamente com os percentuais 69,2% e

57,1%, inclusive, superando o percentual de 51,3% do total de ocupados.

Quanto à faixa de horas trabalhadas, 44,3% do total de ocupados trabalham mais de 40 horas

e a maioria dos ocupados nos segmentos criativos trabalha na faixa de 21 a 40 horas.

Entretanto, para a faixa de até 20 horas trabalhadas, os percentuais apontados para os quatro

segmentos criativos são: indústrias criativas (33,8%), super criativos culturais (29,9%), classe

criativa ampliada (23,4%) e núcleo criativo (21%), que excedem os 15,3% apresentados para

o total de ocupados, ou seja, os profissionais dos segmentos criativos também são os que mais

desempenham jornadas inferiores a 40 horas.

Segundo o local onde funciona a empresa ou negócio, 63,6% dos trabalhadores desempenham

suas funções fora de sua residência, percentuais ainda mais acentuados podem ser observados

para os ocupados na classe criativa ampliada (84,1%) e em seu núcleo super criativo (68,9%).

Mas, a variável também demonstra que, em relação ao total de ocupados (7,5%), aqueles dos

128

setores criativos relacionados com a cultura são os que mais trabalham em seus próprios

domicílios. Os ocupados em indústrias criativas representam 30,4% e os ocupados no núcleo

super criativo cultural 31,3%. Esses percentuais também sinalizam a concentração de

autônomos no setor.

Tabela 8 Distribuição da população ocupada total e dos ocupados no segmento criativo conforme rendimentos, condição na família e número de trabalho, RMS, 2005 (%)

RMS

Características Círculo 1 -

Ocupações da Indústria Criativa

Círculo 2 - Supercriativo

cultural

Círculo 3 - Supercriativo

Círculo 4 - Classe

Criativa ampliada

Total dos Ocupados

Condição na Família

Chefe 40,4 48,3 49,8 47,5 49,3

Cônjuge 17,7 18,4 17,8 24,3 22,6

Filho 32,7 27,2 27,4 23,8 21,1

Outro parente 8,1 5,4 4,1 3,6 4,8

Agregado 0,4 0,7 0,5 0,4 0,7

Pensionista 0,8 0,0 0,5 0,4 0,6

Empregado doméstico 0,0 0,0 0,0 0,0 0,9

Renda

Até 1 salário mínimo 42,7 32,7 22,4 15,5 45,3

Mais de 1 até 2 salários 23,1 17,0 13,7 13,4 29,3

Mais de 2 até 5 salários 18,1 26,5 22,8 29,7 16,4

Mais de 5 salários 16,1 23,8 41,1 41,4 9,1

Número de Trabalho

Um Trabalho 94,2 89,1 90,9 82,4 94,9

Dois Trabalhos 5,4 9,5 8,2 13,6 4,7

Três ou mais 0,4 1,4 0,9 4,0 0,4

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

A variável condição na família apresentada na tabela indica que a maioria dos ocupados na

RMS são chefes de família (49,3%), e que nos segmentos criativos esta tendência também se

faz presente. O percentual de ocupados no núcleo super criativo que se encontra nessa

condição (49,8%), inclusive, supera o de total de ocupados na RMS. Embora a concentração

de chefes de família entre os ocupados em indústrias criativas (40,4%) seja inferior ao total de

ocupados, a distribuição sinaliza que eles dispõem de um maior nível de remuneração.

Um reflexo dos baixos níveis de escolaridade entre os ocupados na RMS pode ser constatado

na TAB 8. Observa-se que 74,6% do total de ocupados são remunerados com até dois salários

mínimos, sendo que desses, 45,3% possuem uma renda de até um salário mínimo. Nota-se

que esse percentual se aproxima do apresentado na TAB 6 (50,2%) para o total de ocupados

que dispõe apenas do primeiro grau de instrução.

129

Para os ocupados nos quatro segmentos criativos, os dados apontam um cenário mais

promissor. Na faixa de mais de dois até cinco salários, os ocupados nos quatro segmentos,

indústria criativa (18,1%), super criativo cultural (26,5%), núcleo da classe criativa (22,8%) e

a classe criativa ampliada (29,7%), apresentam percentuais superiores a 16,4% do total de

ocupados. Este cenário reflete a correlação positiva entre anos de estudo e nível de renda

presente na distribuição.

Considerando-se a faixa de mais de cinco salários, as ocupações selecionadas por Florida

como classe criativa ampliada e seu núcleo super criativo apresentam os maiores percentuais

de toda a distribuição, respectivamente 41,4% e 41,1%. Apenas 9,1% do total de ocupados na

RMS encontram-se nessa mesma faixa de remuneração. Os resultados não surpreendem, pois

esses trabalhadores representam a melhor parcela das ocupações do setor de serviços,

profissionais com altos níveis de escolaridade, mais qualificados e melhor remunerados.

Os segmentos criativos relacionados com a cultura também apresentam uma tendência

semelhante. Para a faixa de renda de mais de cinco salários, nota-se que a participação dos

ocupados nas indústrias criativas (16,1%) e a daqueles classificados como super criativos

culturais (23,8%) é superior à apresentada pelo total de ocupados (9,1%). Considerando que,

entre os ocupados em indústrias criativas, existem profissionais de nível médio, ainda assim,

sua remuneração é melhor que a do total de ocupados na mesma condição.

Nota-se também, que a maioria dos ocupados na RMS possui apenas um trabalho (94,9%), e

aqueles da classe criativa ampliada são os que apresentam a maior participação, tanto na

categoria de dois trabalhos (13,6%) quanto na faixa de três trabalhos (4%). Para a categoria de

dois trabalhos, os percentuais dos ocupados nas indústrias criativas (5,4%) e dos enquadrados

como super criativos culturais (9,5%) são superiores ao do total de ocupados (4,7%).

130

4.3 Detalhamento dos ocupados em indústrias criativas na RMS

O perfil dos ocupados nos segmentos criativos selecionados pôde ser conhecido através dos

dados fornecidos pela PNAD. Entre outras características, as variáveis sinalizaram que esses

trabalhadores possuem maior grau de escolaridade e rendimento mais elevado quando

comparados ao total de ocupados na RMS. Apesar do caráter exploratório da investigação, foi

efetuado um detalhamento dos ocupados em indústrias criativas no sentido de se identificar, a

partir dos códigos de ocupações da CBO, as principais classes de atividades econômicas em

que eles estão alocados.

Estas classes ou grupos econômicos são disponibilizados pela Classificação Nacional de

Atividades Econômicas Domiciliar (CNAE). Ela possui como referência a International

Standard Industrial Classification – ISIC, equivalente à Clasificación Industrial Internacional

Uniforme – CIIU. Para o estudo dos ocupados em indústrias criativas da RMS será utilizada

uma classificação derivada da CNAE, a CNAE-Domiciliar, que é empregada no censo

demográfico e nas demais pesquisas domiciliares realizadas pelo IBGE, como a PNAD.

Tabela 9. Proporção dos ocupados nos segmentos selecionados e a distribuição setorial

dos ocupados na RMS (%)

RMS

Características Círculo 1 -

Ocupações da Indústria Criativa

Círculo 2 - Supercriativo

cultural

Círculo 3 - Supercriativo

Círculo 4 - Classe

Criativa ampliada

Total dos Ocupados

Proporção dos ocupados nos segmentos selecionados

3,6 2,0 3,0 6,6 84,8

Setor de Atividade

Agropecuária 0,0 0,0 0,0 0,0 2,2

Indústria 35,4 38,1 40,7 20,3 19,7

Serviços 64,6 61,9 59,3 79,7 77,8

Outras mal definidas 0,0 0,0 0,0 0,0 0,3

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

A TAB 9 apresenta a distribuição por setores econômicos tradicionais, agricultura, indústrias

e serviços dos ocupados nos quatro segmentos criativos selecionados da RMS. Ela indica que

dos 3,6% dos ocupados em indústrias criativas, 64,6% encontram-se no setor de serviços e

35,4% no setor industrial. Porém, quais são os principais ramos de atividades econômicas que

compõem estes setores onde se encontram os trabalhadores das indústrias criativas da RMS?

131

Tabela 10. Distribuição dos ocupados em indústrias criativas por classes de atividades econômicas da CNAE na RMS (%)

RMS

Classes de Atividades do CNAE Círculo 1 - Ocupações da Indústria Criativa

(3,6% do total de ocupados)

92015 Outras atividades artísticas e de espetáculos 17,7 80090 Outras atividades de ensino 13,8 36090 Fabricação de produtos diversos 13,5 74090 Outros serviços prestados às empresas 6,5 17002 Fabricação de artefatos têxteis a partir de tecidos – exclusive vestuário 5,8 22000 Edição, impressão e reprodução de gravações 5,8 74030 Publicidade 3,8 72010 Atividades de informática - exclusive manutenção e reparação 3,1 19012 Fabricação de artefatos de couro 2,3 20000 Fabricação de produtos de madeira 2,3 74021 Serviços de arquitetura e engenharia e de assessoramento técnico especializado 1,9 93092 Outras atividades de serviços pessoais 1,5 75012 Adm. do Estado e da política econômica e social - Estadual 1,5 64020 Telecomunicações 1,5 80012 Educação regular, supletiva e especial - particular 1,5 74040 Seleção, agenciamento e locação de mão-de-obra 1,2 80011 Educação regular, supletiva e especial - pública 1,2 92040 Atividades desportivas e outras relacionadas ao lazer 1,2 45999 Construção civil 0,8 92030 Bibliotecas, arquivos, museus e outras atividades culturais 0,8 26091 Fabricação de produtos cerâmicos 0,8 11000 Extração de petróleo e gás natural e serviços correlatos 0,8 18001 Confecção de artigos do vestuário e acessórios – exclusive peças interiores 0,8 28001 Fabricação de produtos de metal - exclusive máquinas e equipamentos 0,8 92011 Produção de filmes cinematográficos e fitas de vídeo 0,8 92013 Radiodifusão 0,8 17001 Beneficiamento de fibras, fiação e tecelagem 0,4 25020 Fabricação de produtos de plástico 0,4 53061 Comércio de eletrodomésticos, móveis e outros artigos 0,4 53068 Comércio de mercadorias em geral - inclusive utensílios de uso geral 0,4 55010 Alojamento 0,4 75011 Adm. do Estado e da política econômica e social - Federal 0,4 75015 Outros serv. coletivos prestados pela adm. pública - Federal 0,4 24090 Fabricação de produtos químicos diversos 0,4 28002 Forjaria, estamparia, metalurgia e serviços de tratamento 0,4 36010 Fabricação de artigos do mobiliário 0,4 50010 Comércio de veículos automotores 0,4 53064 Comércio de máquinas, aparelhos e equipamentos 0,4 55030 Outros serviços de alimentação - exclusive ambulantes 0,4 65000 Intermediação financeira 0,4 66000 Seguros e previdência privada 0,4 75013 Adm. do Estado e da política econômica e social - Municipal 0,4 85030 Serviços sociais 0,4 91010 Atividades de organizações sindicais 0,4 91091 Atividades de organizações religiosas e filosóficas 0,4 92014 Televisão 0,4

Total 100,0

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

132

Os 3,6% de ocupados em indústrias criativas na RMS estão distribuídos nas atividades

econômicas demonstradas na TAB 10. O detalhamento apresenta atividades que

aparentemente não possuem nenhuma relação com as indústrias criativas, segundo os critérios

adotados pelo DCMS, mas que podem ser justificados sob a ótica estatística e metodológica.

Não se dispõem de bases específicas de dados sobre as atividades econômicas culturais e

relacionadas, sendo necessário a realização de adaptações metodológicas das fontes de dados

disponíveis, e que possuem um alto grau de agregação.

As grandes transformações presentes na sociedade atual ainda não encontram contrapartida na realidade retratada pelas estatísticas oficiais, cujas categorias operacionais e classificações estáveis, harmônicas, refletem um corpo conceitual cujos pressupostos teóricos representam a sociedade industrial nacional. Assim fenômenos que ganham centralidade no contexto atual – cultural, de conhecimento da informação e de signos e imagens – ou não são contemplados pelo sistema de informação estatística ou são por ele apropriados a partir da lógica de representação da sociedade anterior, o que os desfoca (PORCARO, 2000 apud BARRETO, 2004).

Observa-se que 64,6% dos ocupados em indústrias criativas na RMS desenvolvem atividades

econômicas que são classificadas no setor de serviços. Um setor diversificado, com crescente

participação na economia e intensivo tanto em trabalho manual como em trabalho intelectual

e que, apesar das especificidades, ainda é nacionalmente mensurado segundo o paradigma de

Fisher e Clark dos anos 1930-1940 “primário, secundário e terciário” (ALMEIDA, 2000).

Associada a essas questões, existe a própria natureza transversal da cultura que se reproduz

nas atividades econômicas direta ou indiretamente vinculadas à mesma. Uma das faces desse

processo pode ser observada pela culturalização da mercadoria, abstração conceitual que

busca traduzir a crescente incorporação de valores culturais - simbólicos, estéticos e sociais –

aos bens de consumo. E por conceitos ora construídos, ora apropriados pelos modelos

políticos neoliberais como, indústrias, cidades e classe criativas, que também buscam traduzir

aspectos da relação entre cultura e economia.

Desse modo, as variadas atividades apresentadas na TAB 10 refletem a inexistência de fontes

de dados apropriadas para analisar questões que ganham centralidade na sociedade atual,

como a culturalização da mercadoria. Além disso, como a perspectiva da investigação das

indústrias criativas na RMS parte das ocupações em direção aos possíveis grupos de

atividades econômicas do CNAE-Domiciliar - passíveis de equivalência com as atividades do

DCMS -, os resultados tendem a se ampliar.

133

Caso a análise dos ocupados em indústrias criativas na RMS tivesse sido realizada partindo

dos grupos de atividades do CNAE-Domiciliar diretamente vinculados à proposta do DCMS,

a quantidade de ocupados em indústrias criativas na RMS reduziria de 3,6% do total de

ocupados para apenas 1,2%. Os grupos de atividades responsáveis por esse percentual restrito

seriam: 92015-outras atividades artísticas e de espetáculos, 22000-edição, impressão e

reprodução de gravações, 74030-publicidade, 72010-atividades de informática, 74021-

serviços de arquitetura, 92030-bibliotecas, arquivos, museus, etc..., 92011-produção de filmes

e vídeos, 92013-radiodifusão e 92014-televisão61.

Tabela 11. Amostra dos ocupados em indústrias criativas na RMS em suas respectivas classes de atividades da CNAE e equivalentes do DCMS (%)

RMS

Classes de atividades do CNAE Classificação Aproximada de Setores do DCMS

Círculo 1 - Ocupações da

Indústria Criativa (3,6% do total de

ocupados)

92015 Outras atividades artísticas e de espetáculos Artes performáticas 17,7 80090 Outras atividades de ensino 13,8 36090 Fabricação de produtos diversos 13,5 74090 Outros serviços prestados às empresas Fotografia 6,5 17002 Fabricação de artefatos têxteis a partir de tecidos - exclusive 5,8

22000 Edição, impressão e reprodução de gravações Edição, publicação e reprodução (livros, jornais, revistas, música)

5,8

74030 Publicidade Publicidade e Propaganda 3,8 72010 Atividades de informática - exclusive manutenção e reparação Programas e serviços de computador 3,1 19012 Fabricação de artefatos de couro 2,3 20000 Fabricação de produtos de madeira 2,3 74021 Serviços de arquitetura e engenharia e de assessoramento tec. Serviços de Arquitetura 1,9 92030 Bibliotecas, arquivos, museus e outras atividades culturais Preservação de patrimônio 0,8 92011 Produção de filmes cinematográficos e fitas de vídeo Filme e vídeo 0,8 92013 Radiodifusão 0,8

92014 Televisão Televisão e rádio

0,4

TOTAL 79,2

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

A TAB 11 apresenta uma seleção de alguns ocupados em indústrias criativas na RMS,

obedecendo basicamente a dois critérios. Primeiro, a equivalência direta de algumas classes

de atividades do CNAE-Domiciliar com atividades econômicas consideradas pelo conceito do

DCMS, e segundo, os valores percentuais mais representativos da distribuição dos ocupados,

61 As atividades consideradas pelo DCMS são: Publicidade; arquitetura; preservação e patrimônio; artesanato; design; cinema; audiovisual e fotografia; softwares, jogos de computador e edição eletrônica; música e artes performáticas e visuais; edição, publicação e reprodução (livros, jornais e revistas); e rádio e televisão (DCMS, 2001).

134

por CNAE-Domiciliar, que contribuem na composição do total de ocupados em indústrias

criativas na RMS (3,6%). O total apresentado pela tabela (79,2%) representa uma parte dos

3,6% do total de ocupados em indústrias criativas na RMS. Em outras palavras, este total

corresponde a 2,8% do total de ocupados em indústrias criativas na RMS.

Também pode ser observada na TAB 11 a presença de seis classes ou grupos de atividades do

CNAE-Domiciliar que não demonstram correlação direta com as indústrias criativas do

DCMS (80090-outras atividades de ensino, 36090-fabricação de produtos diversos, 74090-

outros serviços prestados às empresas, 17002-fabricação de artefatos têxteis a partir de

tecidos, 19012-fabricação de artefatos de couro e 20000-fabricação de produtos de madeira).

Estes grupos de atividades respondem por 1,6% do total de ocupados em indústrias criativas

na RMS, e os motivos que os justificam na distribuição podem ser esclarecidos pela próxima

tabela.

Tabela 12. Detalhamento de algumas participações dos ocupados em indústrias criativas por classe de atividades na RMS (%).

Código CBO Classes de Atividades do CNAE Participação

92015 Outras atividades artísticas e de espetáculos (17,7%)

3762 Músicos e cantores populares 34,8

2621 Produtores de espetáculos 26,1

2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins 13,0

2624 Compositores, músicos e cantores 6,5

2622 Coreógrafos e bailarinos 4,4

2623 Atores, diretores de espetáculos e afins 4,3

3741 Técnicos em operação de aparelhos de sonorização 4,3

3742 Técnicos em operação de aparelhos de cenografia 2,2

3761 Bailarinos de danças populares 2,2

2615 Escritores e redatores 2,2

80090 Outras atividades de ensino (13,8%)

2121 Especialista em computação 2,8

3331 Instrutores e professores de escolas livres 97,2

36090 Fabricação de produtos diversos (13,5%)

2625 Desenhistas industriais (designer), escultores, pintores e afins 100,0

74090 Outros serviços prestados às empresas (6,5%)

3722 Fotógrafos 23,5

2627 Decoradores de interiores e cenógrafos 17,6

7664 Trabalhadores de laboratório fotográfico 11,8

7686 Trabalhadores tipográficos, linotipistas e afins 11,7

7661 Trabalhadores da pré-impressão gráfica 5,9

2615 Escritores e redatores 5,9

2141 Arquitetos 5,9

2124 Analistas de sistemas 5,9

2614 Filólogos, tradutores e intérpretes 5,9

3189 Desenhistas técnicos e modelistas 5,9

17002 Fabricação de artefatos têxteis a partir de tecidos (5,8%)

135

7681 Trabalhadores artesanais da tecelagem 60,0

7682 Trabalhadores artesanais da confecção de roupas 33,3

7662 Trabalhadores da impressão gráfica 6,6

19012 Fabricação de artefatos de couro (2,3%)

2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins 100,0

20000 Fabricação de produtos de madeira (2,3%)

2625 Desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins 100,0

Fonte: PNAD/ IBGE, 2005

A TAB 12 expõe o detalhamento de algumas classes de atividades econômicas (CNAE-

Domiciliar) selecionadas da TAB 11. Embora seis dessas classes não possuam vínculo direto

com o conjunto de atividades criativas do DCMS, nota-se que os códigos de ocupações

(CBO) apresentados justificam considerá-las integrantes das indústrias criativas da RMS.

Além disso, pode ser observada a participação de cada um desses códigos de ocupação nas

respectivas classes de atividades econômicas.

A classe 92015-outras atividades artísticas e de espetáculos possui relação direta com as

atividades criativas do DCMS. Os dados sinalizam que ela concentra o maior percentual de

participação (17,7%) do total de ocupados em indústrias criativas na RMS. Na decomposição

desse percentual de participação destacam-se os seguintes códigos de ocupações: 3762-

músicos e cantores populares (34,8%), 3621-produtores de espetáculo (26,1%), 2625-

desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins (13%), 2624-compositores,

músicos e cantores (6,5%). Este detalhamento sinaliza a importância desses trabalhadores no

cenário das indústrias criativas da RMS.

Observa-se que diversos ocupados como fotógrafos (23,5%), decoradores de interiores e

cenógrafos (17,6%), trabalhadores tipográficos, linotipistas e afins (11,7%), escritores e

redatores (5,9%), arquitetos (5,9%), entre outros, estão alocados na classe 74090-outros

serviços prestados às empresas. Esta característica, de certa forma, ratifica a predominância de

relações autônomas de trabalho entre os ocupados em indústrias criativas na RMS. Muitos

desses profissionais não dispõe de uma relação de emprego, fato apresentado pela variável

posição na ocupação da PNAD, demonstrada na TAB 7.

Os desenhistas industriais (designers), escultores, pintores e afins, identificados pelo código

de ocupação 2615 (CBO), estão presentes no grupo de atividades econômicas 92015- outras

atividades artísticas e de espetáculos. E, conforme os dados da TAB 12, eles também podem

ser visualizados em outras classes de atividades econômicas: 36090-fabricação de produtos

136

diversos, 19012-fabricação de artefatos de couro e no 20000-fabricação de produtos de

madeira. A questão pôde ser revelada devido ao critério metodológico aplicado na

investigação, partindo das ocupações criativas (CBO) em direção aos possíveis grupos de

atividades econômicas (CNAE).

Esta situação demonstra que profissionais das indústrias criativas podem desenvolver seu

trabalho em diversos grupos de atividades econômicas do CNAE-Domiciliar, inclusive

aquelas que não estão diretamente vinculadas à seleção do DCMS. Tal condição não

descaracteriza a natureza criativa da ocupação, pois cada vez mais as habilidades do

profissional de designer vêm sendo incorporadas a bens de consumo, como móveis, objetos

de decoração, roupas.

O detalhamento parcial das classes de atividades econômicas do CNAE, onde estão alocados

os ocupados em indústrias criativas, demonstrou o caráter transversal da cultura e os reflexos

de sua imbricação com a economia. As informações apresentadas pela tabela-12 representam

projeções aproximadas, pois derivam de adaptações metodológicas dos dados disponíveis.

Apesar disso, elas visam contribuir para a realização de futuras análises sobre o perfil dos

ocupados em indústrias criativas na RMS.

137

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme apresentado, a relação entre cultura e economia pôde ser visualizada sob duas

perspectivas: a mercantilização da cultura e a culturalização da mercadoria. A primeira foi

engendrada em meados do século XX pela consolidação das indústrias culturais e do

conseqüente consumo massivo de seus produtos. A outra representa um fenômeno observado

no atual contexto da sociedade, que é a crescente incorporação de valores culturais –

simbólicos, estéticos, sociais – aos bens duráveis e não duráveis de consumo.

Esta tendência vem sendo confirmada pela progressiva incorporação de insumos intangíveis

ao processo de produção industrial e pela crescente circulação de bens simbólicos na

economia. Bens que possuem uma dupla face, mercadorias e significações cujos valores

propriamente cultural e mercantil subsistem independentes (BOURDIEU, 2005). Esta nova

configuração reflete a imbricação entre a economia e a cultura observada nos dias atuais, e

tem demandado novos estudos no campo da economia da cultura para sua compreensão.

Nesse contexto, destacam-se novos termos como “indústrias criativas”. Elas representam um

conjunto de atividades que se originam da criatividade, que possuem um potencial para

geração de emprego e renda através da exploração dos direitos de propriedade intelectual.

Embora o conceito criado, em âmbito político, pelo Departamento de Cultura Mídia e

Esportes do Reino Unido (DCMS) despreze a dimensão cultural, vários autores defendem a

sua inclusão, pois a natureza das atividades consideradas como criativas possui a cultura

como principal componente.

A classe criativa de Florida (2002) é um outro conceito que, apesar de muito criticado, se

evidencia no campo da economia da cultura. Ela representa um grupo de pessoas que aplicam

a criatividade e o conhecimento em suas atividades profissionais. Trata-se da seleção das

melhores ocupações do setor de serviços, incluindo trabalhadores do segmento cultural. Para

Florida, eles compartilham de um etos criativo, um conjunto de comportamentos que inclui o

lugar que escolhem para viver. Desse modo, ele constrói sua teoria defendendo que essas

pessoas seriam atraídas para os locais que fomentassem os “3 T´s” - talento, tecnologia e

tolerância -, elementos centrais para o desenvolvimento econômico na atualidade.

138

Observa-se que a criatividade, enquanto insumo intangível, é apropriada nos dois conceitos.

Nas indústrias criativas ela pode ser compreendida como um meio de evidenciar a dimensão

econômica da cultura, pela valorização de setores de atividades direta ou indiretamente

relacionados e que geram direitos autorais. No conceito de Florida, a criatividade se resume a

profissionais com grau de escolaridade elevado, e com o potencial de produzir inovações

sujeitas à proteção das leis de propriedade intelectual.

Ambos os conceitos estão sendo apropriados por discursos neoliberais por destacarem o papel

estratégico das leis de propriedade intelectual. Atualmente, a aplicação dessas leis ainda

assegura a reprodução da lógica de acumulação capitalista em diversos setores da economia.

Os benefícios de uma valoração econômica da cultura expressos tanto na teoria da classe

criativa quanto no conceito de indústrias criativas vêm sendo amplamente divulgados por

políticos e consultores em desenvolvimento regional, e se fazem presentes em diversos países,

como objeto de políticas públicas.

No Brasil, o conceito de indústrias criativas foi apresentado durante a XI UNCTAD em 2004.

Durante a conferência, o Ministério da Cultura, com o objetivo de voltar a ser o órgão gestor

de políticas públicas de cultura, passou a visualizá-las como uma ferramenta para o

fortalecimento da dimensão econômica da cultura no país.

A Bahia, estado que se destaca no cenário nacional pela sua diversidade e manifestações

culturais, abrigou o primeiro Fórum Internacional de Indústrias Criativas em 2005, um evento

em Salvador, que contou com a participação de vários especialistas da área. Nessa

oportunidade, a cidade se ofereceu para sediar um Centro Internacional de Indústrias

Criativas, despertando, assim, interesses nesse campo tão escasso de informações e estudos.

Este conjunto de questões foi contemplado no presente estudo, com o destaque para os

conceitos de indústrias criativas e de classe criativa. Eles representam propostas atuais que, à

sua maneira, reconhecem a cultura como um fator estratégico para o desenvolvimento

regional. Porém, a abrangência das propostas e a inexistência de um consenso sobre as

mesmas fizeram com que fossem adotados critérios metodológicos que permitissem

operacionalizá-las, com o objetivo de se traçar um perfil dos ocupados em atividades criativas

na região metropolitana de Salvador (RMS).

139

As adaptações metodológicas aplicadas ao estudo para RMS foram baseadas nos conceitos de

indústrias criativas cunhado pelo DCMS, e de classe criativa desenvolvido por Richard

Florida. O conceito de classe criativa permitiu a identificação dos códigos de ocupações

existentes na CBO - Classificação Brasileira de Ocupações -, que apresentavam características

similares à proposta original de Florida. Porém, devido ao seu significado difuso de

criatividade foi aplicado o primeiro recorte de categorias ocupacionais, selecionando apenas

os códigos de ocupações que integram o grande grupo 2 - profissionais das ciências e das

artes - na CBO.

Isto possibilitou que fosse encontrada a proporção de ocupados no segmento criativo da RMS

(6,6%) que constitui a classe criativa formada por profissionais criativos e supercriativos. A

partir dessa informação, foi aplicado um novo filtro a fim de se encontrar apenas o percentual

de profissionais supercriativos (3%) que compõe o núcleo da classe criativa. E, realizando

uma experiência que comprovou a amplitude do conceito de Florida, selecionou-se apenas

aqueles supercriativos, que desempenhavam atividades relacionadas com o segmento cultural,

denominados pela pesquisa como os supercriativos culturais (2%).

Para aplicar o conceito de indústrias criativas do DCMS foi efetuado o segundo recorte de

categorias ocupacionais. Desta vez, eliminando vários códigos de ocupações que faziam parte

da classe criativa, mas que não apresentavam relações com o conceito do DCMS, e incluindo

novos códigos de ocupações utilizados pelo Sistema de Indicadores Culturais do IBGE

(2006). Com esta adaptação, alguns profissionais, que não possuíam nível educacional

superior, e outros, do núcleo supercriativo, compuseram a proporção dos ocupados em

indústrias criativas na RMS (3,6%).

Os recortes de categorias ocupacionais utilizados, por serem rigorosos e arbitrários, expõem a

alguns riscos a seleção dos códigos da CBO. Porém, por se tratar de conceitos novos, e por

uma conseqüente falta de consenso sobre quais as ocupações que podem ser consideradas

criativas, essas experiências são necessárias (MELLO, 2007). Além do mais, as crescentes

aplicações da classe criativa e das indústrias criativas em políticas públicas refletem a

importância de novos estudos. Desse modo, o trabalho apresenta a peculiaridade de não

representar um emprego mecânico dessas propostas.

140

Um outro fator que reforça o caráter experimental da proposta é a inexistência de fontes de

dados específicas sobre o assunto. As principais características dos ocupados foram obtidas

através dos microdados da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostras Domiciliares), porém o

alto grau de agregação dos códigos de ocupação da CBO impediu a realização de projeções

mais realistas sobre os profissionais criativos da RMS. Conforme Barreto (2004), fenômenos

que passam a ser centrais no contexto atual – cultural, de conhecimento da informação e de

signos e imagens – ou não são considerados pelo sistema de informação estatística ou são por

ele apropriados a partir da lógica de representação da sociedade anterior, o que os desfoca.

Apesar desse caráter exploratório, foram obtidas informações interessantes sobre o

comportamento dos ocupados em atividades criativas na RMS, em relação ao total de

ocupados nos demais setores econômicos. As informações foram agrupadas obedecendo à

coleta de dados relativos aos atributos pessoais dos ocupados, e de outros, relacionados às

características determinadas pelo mercado de trabalho. Isto permitiu a construção do perfil

dos profissionais criativos tanto sobre a perspectiva da classe criativa de Florida, quanto sobre

a das indústrias criativas do DCMS.

Na composição do perfil dos profissionais que constituem a classe criativa ampliada da RMS

(6,6%), entre os indicadores trabalhados, revela-se a predominância de ocupados do sexo

feminino (56,1%). Porém, quando observado apenas o seu núcleo supercriativo na RMS (2%)

ocorre uma inversão, 57,5% dos profissionais são do sexo masculino. Como esperado, os

ocupados nessas atividades apresentam uma correlação positiva entre anos de estudos e nível

de rendimentos. 65,7% da classe criativa possui 15 ou mais anos de estudos e 41,1% recebe

mais que 5 salários mínimos, enquanto, apenas 9,1% do total de ocupados consegue o mesmo

nível de renda. Além disso, nota-se que a maioria da classe criativa ampliada encontra-se no

setor de serviços (79,7%). Embora também se configure maioria, a proporção de profissionais

supercriativos no mesmo setor é menor (59,3%).

Uma questão a ser destacada, mesmo se tratando de um percentual aproximado sobre a classe

criativa na RMS (6,6%), é a impossibilidade de compará-la com as concentrações existentes

nas cidades americanas como: Seattle (32,7%), Houston (32,5%) e outras. O baixo nível de

educação formal e de qualificação profissional do total de ocupados da RMS se configura no

principal obstáculo para isso. As informações sobre a classe criativa sinalizam a carência de

141

capital humano na RMS. Um insumo diretamente relacionado ao desenvolvimento que cada

vez mais se baseia em cultura, conhecimento da informação e de signos e imagens.

Os profissionais das indústrias criativas na RMS representam 3,6% do total de ocupados.

Analisando o perfil dos mesmos, segundo alguns atributos pessoais, foi demonstrado que a

sua maioria pertence ao sexo masculino (57,7%), e com um maior grau de instrução, na faixa

de 15 anos ou mais (18,1%), do que o total dos ocupados (8,6%). O interessante é que, mesmo

incorporando profissionais que não possuem nível superior, a performance dos ocupados em

indústrias criativas, nesse indicador, é melhor que a do total de ocupados. A partir das

características de mercado, observa-se que a maioria deles encontra-se no setor de serviços

(64,6%), trabalha por conta própria (50,8%) e não contribue para a previdência (66,2%). Este

último percentual indica um alto grau de informalidade. Um outro fator a ser considerado é a

correlação positiva entre anos de estudo e rendimentos, porém em proporções bem inferiores

às obtidas pelos ocupados na classe criativa de Florida.

Mesmo diante das restrições operacionais impostas pelo alto grau de agregação dos códigos

de ocupações da CBO, da CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), a

construção metodológica apresentou uma distribuição dos ocupados em indústrias criativas da

RMS (3,6%), por setores de atividades econômicas considerados pelo DCMS. Os setores que

se destacaram foram: artes performáticas (17,7%), edição, publicação reprodução (5,8%) e

publicidade e propaganda (3,8%). Como a distribuição desses profissionais foi realizada a

partir dos códigos da CBO, revelou altas concentrações de profissionais criativos alocados em

setores que não se enquadram na pré-seleção do DCMS. Os principais foram: outras

atividades de ensino (13,8%), fabricação de produtos diversos (13,5%), outros serviços

prestados às empresas (6,5%), e fabricação de artefatos têxteis a partir de tecidos (5,8%).

Este diferencial denotou o caráter transversal das atividades criativas relacionadas com a

cultura, bem como, as limitações dos sistemas estatísticos oficiais nessa área. Apesar disso,

comparando a concentração de ocupados em indústrias criativas na RMS (3,6%), com o

estimado por O’Connor (2006), para áreas metropolitanas (entre 4 e 7%), nota-se que existe

um potencial a ser desenvolvido. Talvez a implementação de políticas públicas, que venham a

considerar esse conjunto de atividades econômicas criativas, possa contribuir para um melhor

aproveitamento da diversidade e autenticidade cultural da RMS.

142

A metodologia desenvolvida nesse estudo de caso da RMS procurou superar a deficiência das

fontes de dados e a carência de estudos sobre a temática. Ela permitiu que fosse construído

um perfil dos ocupados em atividades criativas que se aproximasse dos parâmetros definidos

pelos conceitos de indústrias criativas e de classe criativa. Apesar do experimentalismo da

proposta cogita-se, em estudos futuros, abranger outras regiões metropolitanas do Brasil e

extrair dados de anos anteriores da PNAD. Dessa maneira, será possível se obter novas

análises comparativas e uma melhor avaliação sobre a sua aplicação.

Adotando uma perspectiva multidisciplinar, a pesquisa ofereceu informações que podem

colaborar para uma melhor visualização do papel da cultura nas atividades econômicas. As

dificuldades de se identificar o comportamento dos ocupados em atividades criativas da RMS

refletem a necessidade de estudos mais detalhados e precisos, inclusive para que sejam

aplicadas políticas públicas que venham valorizar e desenvolver o potencial cultural existente

na RMS.

143

6. REFERÊNCIAS

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7. ANEXOS

Entrevista com Professor Paulo Miguez, da Universidade Federal do Recôncavo, ex Secretário de Políticas Culturais do Ministério da Cultura.

Realizada em 17/07/2006 na Faculdade de Administração - UFBA. 1 - O Ministério da Cultura retomou sua posição institucional de elaboração e gestão de políticas públicas para a cultura. Nesse processo, quando e porque foi introduzido o conceito de Ind. Criativas? Teve início, na realidade, desde a decisão inicial da equipe do Ministro Gil, pois ficou estabelecido que o Ministério deveria perseguir fundamentalmente uma orientação a partir de três eixos. Primeiro, uma reforma interna, urgente, imediata, e que capacitasse o Ministério para enfrentar o desafio maior, que era recuperar, resgatar a sua função fundamental de ser um órgão federal, republicano, encarregado da elaboração da implementação de políticas públicas de cultura. Segundo, o de lidar com o universo simbólico brasileiro e sua diversidade cultural, e por fim, ser um caminho efetivo para a construção da cidadania, por afirmar, cada vez mais, possibilidades do ponto de vista econômico.

Desde este momento, um traço de política foi rapidamente assumido como importante, que era exatamente a questão de não se utilizar o termo indústrias criativas, pelo menos no plano do Ministério, ainda que no exterior já estivesse presente. Nós iniciamos essa articulação propondo que o Ministério se concentrasse na idéia de pensar na economia da cultura também como uma dimensão de política cultural. E o enfrentamento disso passou a ser feito. No primeiro momento, na compreensão de que se tinha uma dificuldade básica que era a inexistência de números. Os dados, as informações não existiam e isso valia tanto no plano da economia e da cultura, quanto para qualquer outra área que você quisesse intervir. Por exemplo, se você pensasse na área do teatro, da biblioteca, não se tem dados sobre isso no Brasil. 2 - Como interage a política cultural do Ministério da Cultura com a importância das Indústrias Criativas como fonte de emprego, renda e divisas? Qual o diferencial do Brasil nessa área? Ao longo da preparação da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento – UNCTAD, surgiu a idéia de montar um grande painel sobre a questão das indústrias criativas. Diversas conversas aconteceram entre a chefe de Gabinete do Ministro da Cultura e o Embaixador Ricupero, que era o Secretário Geral, bem como com o Ministro Gilberto Gil. Esse painel foi muito interessante e muito rico. Recomendou à Conferência, que fosse adotado, no seu conjunto de resoluções finais, a criação de um instituto, de uma organização internacional, que se dedicasse ao assunto. A compreensão dessa recomendação, quer dizer, a base dessa recomendação, partiu de duas questões: primeiro, esse é um setor importante para os países em desenvolvimento, e pode representar um caminho no sentido estratégico, que é o de fugir da perversidade das commodites. A grande maioria dos países em desenvolvimento dependem de um ou dois produtos, normalmente commodites, no mercado internacional e não têm o menor controle sobre esse mercado, bem como não definem absolutamente nada nesses mercados. No caso das indústrias criativas, a compreensão é de que a base desse processo é a riqueza que cada um dos países tem, e que a riqueza potencial poderá ser transformada em

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riqueza material mesmo. Então, essa era a primeira compreensão. A segunda era que não havia no plano internacional nenhuma organização dedicada à questão. Essa era uma questão que existia um pouco na discussão sobre o comércio em desenvolvimento da UNCTAD, na perspectiva da questão cultural dentro da UNESCO. Então, saiu a recomendação e o Brasil rapidamente se ofereceu para acolher esse centro, e como primeira tarefa surgiu a idéia da realização do grande fórum internacional, que foi realizado aqui em abril de 2005. O conceito, a idéia e a materialização desse conceito e do que esse conceito poderia produzir em termos de institucionalidade, o marco histórico, assim, de referência é junho de 2004. A Conferência da UNCTAD dentro desse conjunto de idas e vindas, marchas e contramarchas que eu lhe relatei aqui. 3 - O Ministério da Cultura sofreu uma reestruturação administrativa, nesse contexto as Indústrias Criativas estão presentes em quais secretarias ou órgãos? Como houve um conjunto de embates ao longo da gestão do Ministro Welffort, com algumas instituições clássicas de Ministérios e, especialmente, o IPHAN, e a FUNART, o Ministro resolveu criar Secretarias temáticas dentro do Ministério, que sombrearam a ação dessas instituições. Essa briga terminou fazendo com que o Ministério criasse as Secretarias e essas instituições se enfraquecessem terrivelmente. Para sombrear o IPHAN ele criou a Secretaria de Museus e Artes Plásticas e Patrimônio, com um programa riquíssimo que era o Programa Monumento, que vivia cheio de dinheiro, milhões de dólares, financiado pelo BID, enquanto que o IPHAN morria à míngua. Para a FUNART ele criou a Secretaria de Músicas e Artes Cênicas, e isso fez com que durante oito anos essas instituições entrassem num processo acelerado de grande degradação. Com a reforma foram criadas a Secretaria de Políticas Culturais, a Secretaria de Fomento, para cuidar especificamente de toda política de fomento, a Lei Rouanet, fundamentalmente, a Secretaria de Identidade e Diversidade Cultural, a Secretaria de Articulação Institucional, a Secretaria do Áudio-visual, e a Secretaria de Programas e Projetos. Bom, em princípio todo processo de articulação deveria estar localizado na Secretaria de Articulação Institucional, mas é evidente que tem processos que você não pode repartir, então o assunto economia da cultura veio para a Secretaria de Políticas Culturais sob a minha gestão. Essa Secretaria foi designada pelo Ministro Gil para organizar todo o processo até o fórum, tomando conta do tema, o que nos obrigou, entre outras coisas, a produzir uma ação intensa de articulação. É evidente que nós procuramos trazer os companheiros da Secretaria de Articulação Institucional para o processo, mas essa Secretaria estava com uma missão, muito particular e grandiosa, que era a montagem do sistema nacional de cultura, do plano nacional de cultura, ocupando-a no plano interno de maneira muito forte. Assim, a área internacional toda terminava sendo uma tarefa formalmente, na mão deles mas executada pelo próprio Gabinete do Ministro, pela Assessoria Internacional. E o trabalho da Secretaria de Políticas Culturais para viabilizar articulações foi forte no primeiro momento, porém, foi mais em relação à área internacional do que a área local. Então nós terminamos sendo responsáveis por toda articulação internacional, que era basicamente uma articulação feita no plano dos órgãos das Nações Unidas, localizada em Genebra. Estivemos várias vezes lá e com vários órgãos: com a ONG, com a UNCTAD, especialmente com a UNCTAD, com quem trabalhamos diretamente na montagem, comandando os processos de organização dos seminários, os contatos internacionais com a UNESCO em Paris, com o G-77; com a OMPI, que é de propriedade intelectual; com a OMC, com projetos na área de artesanato; com a OIT, que também era uma parceria que já vinha diante do fórum, estava trabalhando em conjunto com relação a quatro,

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cinco estudos sobre a economia da cultura e música e áudio-visual, basicamente, no Brasil, que foi incorporado ao processo dos trabalhos que foram apresentados no fórum. O Ministério das Relações Exteriores foi muito importante nas articulações internacionais, porque não se dá um passo fora do país, pra falar em nome do país, se não tiver a representação diplomática ao seu lado. E internamente o Ministério do Desenvolvimento foi muito importante também. Temos alguns contatos com o Ministério do Trabalho, mas não foi algo assim tão presente, e o Ministério de Ciência e Tecnologia não chegou a se aproximar. Nós tentamos, mas as dificuldades são muitas pra se fazer um negócio desses. Há, também, instituições como BNDES, Banco do Nordeste, CEF, Banco do Brasil, SEBRAE, que nós conseguimos fazer articulações. Todo esse processo foi muito rico, muito interessante, pelos inúmeros contatos que pudemos estabelecer, bem como conhecer como é que essas coisas funcionam. E isso terminou resultando positivamente no encontro de abril aqui, que foi um sucesso. 4 - Quais as ações implementadas pelo Ministério da Cultura para viabilizar fontes de dados mais atualizados sobre a dimensão econômica da cultura no cenário nacional? O Ministério da Cultura não tinha dados para embasar negociações com outros Ministérios. Por exemplo, o Ministério Saúde pode sentar com o Ministério do Planejamento para negociar com base em números de leitos no Brasil; sabe-se quais são os indicadores básicos que a área de saúde precisa, número de leitos por habitante, etc. Isso ainda não ocorre com a cultura.

A Cultura não tem nenhum repertório de indicadores, não tem dados que são anteriores aos indicadores, que se faz a partir de dados brutos. Então, essa foi uma primeira preocupação. Isso começou a ser atacado desde cedo. No final de 2004 nós finalmente conseguimos produzir um fato alvissareiro, e que nós esperamos que venha a ter continuidade, e que não seja somente uma política de governo, mas sim uma política de estado. Com a parceria com o IPEC/IBGE parece que agora começa a dar resultados. Com a PNAD já vai sair o primeiro suplemento de dados. Ao lado disso, toda a ação internacional do Ministério terminou aproximando-o, no plano internacional, de Instituições e de muitos debates, e de muitas agendas. Uma dessas agendas foi facilitada pelo fato de que em 2004 se realizou no Brasil a 11 ª Conferência da UNCTAD – Conferência das Nações Unidas Para o Comércio e Desenvolvimento.

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Descrições das ocupações da CBO-Domiciliar utilizadas para compor o perfil dos

ocupados em indústrias criativas na RMS. 2121 – Especialista em computação Descrição sumária Administram ambientes computacionais, definindo parâmetros de utilização de sistemas, implantando e documentando rotinas e projetos e controlando os níveis de serviço de sistemas operacionais, banco de dados e redes. Fornecem suporte técnico no uso de equipamentos e programas computacionais e no desenvolvimento de ferramentas e aplicativos de apoio para usuários, orientam na criação de banco de dados de sistemas de informações geográficas, configuram e instalam recursos e sistemas computacionais, gerenciam a segurança do ambiente computacional. Podem aplicar geotecnologia em sistemas computacionais.

2124 - Analistas de sistemas Descrição sumária Desenvolvem e implantam sistemas informatizados dimensionando requisitos e funcionalidade do sistema, especificando sua arquitetura, escolhendo ferramentas de desenvolvimento, especificando programas, codificando aplicativos . Administram ambiente informatizado, prestam suporte técnico ao cliente e o treinam, elaboram documentação técnica. Estabelecem padrões, coordenam projetos e oferecem soluções para ambientes informatizados e pesquisam tecnologias em informática. 2141 - Arquitetos e Urbanistas Descrição sumária Elaboram planos e projetos associados à arquitetura em todas as suas etapas, definindo materiais, acabamentos, técnicas, metodologias, analisando dados e informações. Fiscalizam e executam obras e serviços, desenvolvem estudos de viabilidade financeira, econômica, ambiental. Podem prestar serviços de consultoria e assessoramento, bem como estabelecer políticas de gestão. 2531 - Profissionais de Marketing, Publicidade e Comercialização Descrição sumária Estruturam estratégias de projeto; pesquisam o quadro econômico, político, social e cultural; analisam mercado; desenvolvem propaganda e promoções; implantam ações de relações públicas e assessoria de imprensa; vendem produtos, serviços e conceitos. No desenvolvimento das atividades é mobilizado um conjunto de capacidades comunicativas. 2611 - Profissionais do jornalismo Descrição sumária Recolhem, redigem, registram através de imagens e de sons, interpretam e organizam informações e notícias a serem difundidas, expondo, analisando e comentando os acontecimentos. Fazem seleção, revisão e preparo definitivo das matérias jornalísticas a serem divulgadas em jornais, revistas, televisão, rádio, internet, assessorias de imprensa e quaisquer outros meios de comunicação com o público. 2612 - Profissionais da informação Descrição sumária Disponibilizam informação em qualquer suporte; gerenciam unidades como bibliotecas, centros de documentação, centros de informação e correlatos, além de redes e sistemas de

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informação. Tratam tecnicamente e desenvolvem recursos informacionais; disseminam informação com o objetivo de facilitar o acesso e geração do conhecimento; desenvolvem estudos e pesquisas; realizam difusão cultural; desenvolvem ações educativas. Podem prestar serviços de assessoria e consultoria. 2614 - Filólogos, intérpretes e tradutores Descrição sumária Traduzem, na forma escrita, textos de qualquer natureza, de um idioma para outro, considerando as variáveis culturais, bem como os aspectos terminológicos e estilísticos, tendo em vista um público-alvo específico. Interpretam oralmente, de forma simultânea ou consecutiva, de um idioma para outro, discursos, debates, textos, formas de comunicação eletrônica e linguagem de sinais, respeitando o respectivo contexto e as características culturais das partes. Tratam das características e do desenvolvimento de uma cultura, representados por sua linguagem; fazem a crítica dos textos. 2615 – Escritores e Redatores Descrição sumária Escrevem textos literários para publicação, representação e outras formas de veiculação e para tanto criam projetos líterários, pesquisando temas, elaborando esquemas preliminares. Podem buscar publicação ou encenação da obra literária bem como sua divulgação. 2616 – Especialistas em Editoração Descrição sumária Editam textos e imagens para publicação e, para tanto, selecionam o que publicar, definem pauta e planejamento editorial, coordenam o processo de edição, pesquisam novos projetos editoriais, gerenciam editoria e participam da divulgação da obra. Responsabilizam-se pela publicação. 2617 – Locutores e comentaristas Descrição sumária Apresentam programas de rádio e televisão, ancorando programas, nos quais interpretam o conteúdo da apresentação, noticiam fatos, lêem textos no ar, redigem a notícia, narram eventos esportivos e culturais, tecem comentários sobre os mesmos e fazem a locução de anúncios publicitários; entrevistam pessoas; anunciam programação; preparam conteúdo para apresentação, pautando o texto, checando as informações, adaptando-se aos padrões da emissora e do público – alvo; atuam em rádio, televisão e eventos, bem como em mídias alternativas como cinema e internet. 2621 - Produtores de espetáculos Descrição sumária Planejam, coordenam e geram recursos humanos, materiais, técnicos e financeiros para assegurar a realização de espetáculos cênicos (teatro, dança, ópera e outros) e audiovisuais (cinema, vídeo, televisão e rádio). 2622 – Coreógrafos e Bailarinos Descrição sumária Concebem e concretizam projeto cênico em dança, realizando montagens de obras coreográficas; executam apresentações públicas de dança e, para tanto, preparam o corpo, pesquisam movimentos, gestos, dança, e ensaiam coreografias. Podem ensinar dança.

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2623 – Atores, diretores de espetáculos e afins Descrição sumária Atores interpretam e representam um personagem, uma situação ou idéia, diante de um público ou diante das câmeras e microfones, a partir de improvisação ou de um suporte de criação ( texto, cenário, tema etc) e com o auxílio de técnicas de expressão gestual e vocal. Os diretores de cinema, teatro, televisão e rádio dirigem, criando, coordenando, supervisionando e avaliando aspectos artísticos, técnicos e financeiros referentes a realização de filmes, peças de teatro, espetáculos de dança, ópera e musicais, programas de televisão e rádio, vídeos, multimídia e peças publicitárias. 2624 – Compositores, músicos e cantores Descrição sumária Interpretam músicas por meio de instrumentos ou voz, em público ou em estúdios de gravação e para tanto aperfeiçoam e atualizam as qualidades técnicas de execução e interpretação, pesquisam e criam propostas no campo musical. 2625 – Desenhistas industriais (designer), escultores, pintores e afins Descrição sumária Criam e executam obras de arte ou a aplicam as artes visuais associadas ao conhecimento tecnológico para conceber a forma e a funcionalidade de produtos e serviços; pesquisam temas, elaboram propostas, realizam pesquisas e divulgam os produtos e as obras concebidas. 2627 – Decoradores de interiores e cenógrafos Descrição sumária Formulam conceito artístico da cenografia, pesquisando a obra artística, seu contexto histórico, perfil das personagens, autor e conteúdo possibilitando a compreensão do texto, dar corpo às palavras no espaço e no tempo e criar ambientes e atmosferas que valorizam e enfatizam a concepção cênica; elaboram projeto cenográfico a partir de estudos preliminares do espaço cênico, viabilidade na utilização de materiais e ajustes com equipes (artística, técnica e de produção) e acompanham sua concretização, coordenando e supervisionando equipes de cenotécnica, produção cenográfica e outras equipes envolvidas na montagem da cenografia; reelaboram projeto cenográfico para adaptar cenografia a novos lugares e espaços. 3189 – Desenhistas técnicos e modelistas Descrição sumária Confeccionam moldes para roupas e calçados; pesquisam segmentos de mercado, estudando estilos de design e avaliando pesquisas sobre tendências de mercado; avaliam materiais para aquisição e desenvolvem protótipos de roupas, calçados e móveis; projetam móveis, interpretando desenhos e modelos, analisando o local de instalação de móveis sob medida, elaborando desenhos de móveis e gabaritos em CAD e prancheta, dimensionando componentes, especificando madeiras, derivados de madeira e acessórios para móveis e materiais para acabamento, tais como tintas e vernizes, entre outros 3331 - Instrutores e professores de escolas livres Descrição sumária Os profissionais dessa família ocupacional devem ser capazes de criar e planejar cursos livres, elaborar programas para empresas e clientes, definir materiais didáticos, ministrar aulas, avaliar alunos e sugerir mudanças estruturais em cursos.

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3711 - Técnicos em biblioteconomia Descrição sumária Atuam no tratamento, recuperação e disseminação da informação e executam atividades especializadas e administrativas relacionadas à rotina de unidades ou centros de documentação ou informação, quer no atendimento ao usuário, quer na administração do acervo, ou na manutenção de bancos de dados. Participam da gestão administrativa, elaboração e realização de projetos de extensão cultural. Colaboram no controle e na conservação de equipamentos. Participam de treinamentos e programas de atualização. 3713 - Técnicos em artes gráficas Descrição sumária Realizam programações visuais gráficas, prestam serviços de assistência técnica a clientes, buscam alternativas para melhoria em tecnologias e matérias - primas e implantam novas tecnologias. Operam máquinas e equipamentos de pré-impressão de produtos gráficos, planejam e controlam o processo de produção, realizam controle de qualidade das matérias - primas e do produto final. Podem coordenar equipe de trabalho. 3722 - Fotógrafos Descrição sumária Criam imagens fotográficas de acontecimentos, pessoas, paisagens, objetos e outros temas, em branco e preto ou coloridas, utilizando câmeras fixas (de película ou digitais) e diversos acessórios. Escolhem tema ou assunto da fotografia ou atendem a demandas de clientes ou empregadores, segundo objetivos artísticos, jornalísticos, comerciais, industriais, científicos etc. Podem revelar e retocar negativos de filmes, tirar, ampliar e retocar cópias, criar efeitos gráficos em imagens obtidas por processos digitais e reproduzi-las sobre papel ou outro suporte. Podem dirigir estúdio fotográfico ou loja de material de fotografia. 3741 - Técnicos em operação de aparelhos de sonorização Descrição sumária Configuram, operam e monitoram sistemas de sonorização e gravação; editam, misturam, pré-masterizam e restauram registros sonoros de discos, fitas, vídeo, filmes etc. Criam projetos de sistemas de sonorização e gravação. Preparam, instalam e desinstalam equipamentos de áudio e acessórios. 3742 - Técnicos em operações de aparelhos de cenografia Descrição sumária Constroem cenários, adereços e mobiliários, a partir de análise de projeto cenográfico e pesquisa de objetos e materiais; executam técnicas afins, como trabalhos de carpintaria, serralheria, costura, pintura, modelagem e escultura; montam e adaptam peças de cenários e efeitos especiais ; operam maquinaria, como varas elétricas e cenográficas, cortinas, gruas, carrinhos sobre trilhos e mecanismos de efeitos especiais; supervisionam atividades relacionadas ao planejamento, orçamento e contratação de serviços e orientam equipes de trabalho. 3761 – Bailarinos de danças populares Descrição sumária Os dançarinos tradicionais e populares dançam, sozinhos, em pares ou em grupo com fins ritualísticos, performáticos e espetaculares, pesquisam e estudam, reinterpretam danças tradicionais e populares; criam espetáculos, ministram aulas e inserem seu acervo cultural em diferentes contextos (sociais, pedagógicos e terapêuticos).

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3762 – Músicos e cantores populares Descrição sumária Interpretam músicas por meio de instrumentos ou voz, em público ou em estúdios de gravação e para tanto aperfeiçoam e atualizam as qualidades técnicas de execução e interpretação, pesquisam e criam propostas no campo musical. 3764 – Apresentadores de espetáculos Descrição sumária Apresentam e/ou animam programas de rádio e televisão, festas populares, eventos, atrações circenses ou outros tipos de espetáculos; orientam-se por roteiros ou fazem improvisações para divertir, informar, instruir o público, telespectador ou ouvinte. 7606 - Supervisores das artes gráficas Descrição sumária Supervisionam diretamente uma equipe de trabalhadores das artes gráficas, orientando-a, treinando-a em conformidade aos procedimentos técnicos, normas de qualidade, de segurança, meio ambiente e saúde. Administram o processo de produção gráfica com respeito a custos, viabilidade de execução, fluxo de tarefas, estoque de matéria-prima e material de consumo, programação de máquinas e equipamentos, entre outros itens. Administram metas e resultados da produção gráfica e elaboram documentos técnicos. 7661 - Trabalhadores da pré-impressão gráfica Descrição sumária Planejam serviços de pré-impressão gráfica. Realizam programação visual gráfica e editoram textos e imagens. Operam processos de tratamento de imagem, montam fotolitos e imposição eletrônica. Operam sistemas de prova e copiam chapas. Gravam matrizes para rotogravura, flexografia, calcografia e serigrafia. Trabalham seguindo normas de segurança, higiene, qualidade e preservação ambiental. 7662 - Trabalhadores da impressão gráfica Descrição sumária Planejam serviços da impressão gráfica e ajustam máquinas para impressão. Realizam serviços da impressão gráfica, tais como impressão plana e rotativa, impressão digital, flexografia, litografia, tipografia, letterset, calcografia, tampografia, rotogragura e serigrafia (silkscreen). Trabalham seguindo normas e procedimentos técnicos e de qualidade, segurança, meio ambiente, higiene e saúde. 7663 - Trabalhadores do acabamento gráfico Descrição sumária Planejam a execução do serviço, ajustam e operam máquinas de acabamento gráfico e editorial. Preparam matrizes de corte e vinco, fazem gravações a máquina (hot-stamping) e realizam manutenção produtiva dos equipamentos. Trabalham em conformidade a estritas normas e procedimentos técnicos, de qualidade, segurança, meio ambiente e saúde. 7664 - Trabalhadores de laboratório fotográfico Descrição sumária Ampliam fotografias coloridas em preto e branco. Revelam filmes coloridos, preto e branco, dispositivos e negativos. Conferem fotos ampliadas e reproduzem fotografias. Preparam equipamentos e soluções químicas de reforço. Manipulam filmes radiológicos e revelam

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filmes radiográficos. Trabalham seguindo normas de qualidade, segurança, higiene, saúde e proteção ao meio ambiente. 7681 - Trabalhadores artesanais da tecelagem Descrição sumária Confeccionam fios, estirando, torcendo e fiando algodões; urdideiras que entrelaçam e esticam os fios. Operam tear manual, unindo, fixando e penteando fios; tecem tecidos, operando pedais e lançadeiras. Confeccionam peças de tricô, crochê, chapéus e redes, definindo tipos, selecionando modelos, confeccionando moldes e amostras e montando pontos na agulha. Preparam palhas, extraindo, selecionando e secando folhas. Comercializam produtos de tecelagem manual. 7682 - Trabalhadores artesanais da confecção de roupas Descrição sumária Criam e riscam o desenho para bordá-los. Prendem e cortam tecidos desenhados. Cerzem peças, bordam-nas e dão acabamento. Comercializam bordados e serviços de reparo em tecidos. 7686 - Trabalhadores tipográficos linotipistas e afins Descrição sumária Confeccionam matriz (chapas) para impressão; compõem textos para impressão manual ou por meio de máquinas tipográficas, linotipos, recorte e pintura a pincel. Imprimem trabalhos gráficos, artísticos e publicitários, tais como notas fiscais, outdoors, cartazes, letreiros etc. Confeccionam carimbos; preenchem ordens de serviço e comunicação interna.