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Castelo Branco Científica - Ano IV - Nº 08 - julho/dezembro de 2015 - www.castelobrancocientifica.com.br 1 Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255 CIDADANIA EM TEMPOS DE CRISE: A CLASSE POLÍTICA É O REFLEXO DA DEGRADAÇÃO MORAL E ÉTICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA? Ivan Carlos De Lorenci Matheus Belei Silva De Lorenci RESUMO A sociedade brasileira tem presenciado casos e mais casos de corrupção envolvendo os diversos níveis da política nacional. Isso nos faz refletir sobre o cerne da questão. Até onde a má formação do cidadão tem contribuído para que a sociedade política represente tão mal o eleitorado brasileiro? Os princípios éticos e morais que deveríamos aprender no seio familiar estão desaparecendo? As pessoas ao assumirem cargos e posições de poder por não terem uma formação moral adequada acabam cedendo às mais diversas oportunidades e facilidades que o poder oferece? São muitas as variáveis, e nesse sentido, por obrigação moral com nossas futuras gerações, devemos contribuir de alguma forma para que eventos negativos e nocivos à sociedade não voltem a acontecer. PALAVRAS-CHAVE: Cidadania, Moral, Ética, Valores, Política. ABSTRACT The Brazilian society has seen cases and more cases of corruption involving many levels of national politic. This makes us reflect about the matter. Until where does the bad formation of citizen have Possui Graduação e Pós-Graduação em nível de Especialização em Direito Penal e Processual Penal pelo Centro Universitário do Espírito Santo - UNESC. É servidor Técnico Administrativo efetivo do Instituto Federal do Espírito Santo - IFES/Campus/Colatina e professor de Direito Trabalhista e Administrativo dos Cursos do PRONATEC do mesmo Instituto Federal. Graduando em Direito pela UFES – Universidade Federal do Espírito Santo.

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Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255

CIDADANIA EM TEMPOS DE CRISE: A CLASSE POLÍTICA É O REFLEXO DA

DEGRADAÇÃO MORAL E ÉTICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA?

Ivan Carlos De Lorenci�

Matheus Belei Silva De Lorenci�

RESUMO

A sociedade brasileira tem presenciado casos e mais casos de corrupção envolvendo os diversos níveis

da política nacional. Isso nos faz refletir sobre o cerne da questão. Até onde a má formação do cidadão

tem contribuído para que a sociedade política represente tão mal o eleitorado brasileiro? Os princípios

éticos e morais que deveríamos aprender no seio familiar estão desaparecendo? As pessoas ao

assumirem cargos e posições de poder por não terem uma formação moral adequada acabam cedendo

às mais diversas oportunidades e facilidades que o poder oferece?

São muitas as variáveis, e nesse sentido, por obrigação moral com nossas futuras gerações, devemos

contribuir de alguma forma para que eventos negativos e nocivos à sociedade não voltem a acontecer.

PALAVRAS-CHAVE: Cidadania, Moral, Ética, Valores, Política.

ABSTRACT

The Brazilian society has seen cases and more cases of corruption involving many levels of national

politic. This makes us reflect about the matter. Until where does the bad formation of citizen have

�Possui Graduação e Pós-Graduação em nível de Especialização em Direito Penal e Processual Penal pelo Centro

Universitário do Espírito Santo - UNESC. É servidor Técnico Administrativo efetivo do Instituto Federal do Espírito

Santo - IFES/Campus/Colatina e professor de Direito Trabalhista e Administrativo dos Cursos do PRONATEC do

mesmo Instituto Federal.

�Graduando em Direito pela UFES – Universidade Federal do Espírito Santo.

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contributed to that politic society represents the Brazilian voters badly? Are the ethical and moral

principles weshold learn in our families disappearing? Do people give way to the many opportunities

and facilities the power offers, because those people don't have an adequate moral formation?

The varieties are so many, and acoording to the moral obligation with our future generation, we should

contribute in any way, to the negative and harmful events tosociety don't happen anymore.

KEYWORDS: Citizenship, moral, ethic, values, politic.

INTRODUÇÃO

A sociedade cidadã se sustenta pelos princípios éticos e morais que são formadores do caráter de cada

pessoa, da valoração subjetiva do que ela entende por moral e ética.

Neste sentido, podemos dizer que a moral incorpora as regras que temos de seguir para vivermos em

sociedade, regras estas determinadas pela própria sociedade. A ética por sua vez é a parte da filosofia

que explica e se ocupa com a reflexão a respeito das noções e princípios que fundamentam a vida moral

de cada um.

É fato que estamos vivendo uma crise moral e ética sem precedentes na história política e social do

Estado brasileiro. O cidadão honrado, consciente de suas obrigações e, movido por princípios éticos e

morais, deve estar horrorizado com o atual estágio da sociedade e da política brasileira.

Casos de corrupção, de conchavos, de todo tipo de malefícios estão corroendo a alma do povo

brasileiro, excluindo logicamente, aqueles elementos que vivem na banda podre da sociedade e da

política nacional, porque estes vivem muito bem à custa do verdadeiro cidadão, daquelas pessoas que

contribuem com seu trabalho honesto, que pagam seus impostos e sustentam por obrigação legal, direta

e indiretamente os “oportunistas de plantão” que ora são corruptos, ora são corruptores.

A questão não é tão simples, e merece no mínimo uma reflexão. Os princípios morais e éticos que

sempre pautaram o comportamento da sociedade não estão sendo observados e com isso, fica cada vez

mais fácil atingir o indivíduo com toda forma de corrupção.

É necessário resgatar os valores que se perderam pelo caminho, trabalhar a família e exercer a

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cidadania com determinação, com contundência, exigindo do Estado e de seus representantes (eleitos

pelo povo), o respeito à coisa pública e o compromisso com os princípios constitucionais fundamentais

da dignidade da pessoa humana e da cidadania, previstos no artigo 1º da Constituição Federal de 1988.

POLÍTICA E SOCIEDADE

A Política tem sua origem na Grécia antiga e foi idealizada tendo base na ideia de liberdade, na

pluralidade de ideais e na própria razão de viver.

Para os gregos não havia diferença entre política e liberdade e as duas estavam intrinsecamente ligadas

à capacidade do homem de agir, de como se portar em público que era o local principal do político.

Atualmente, este ideal de liberdade e pluralidade de ideias passa muito longe do homem, pois ele não

consegue pensar e agir senão em proveito próprio e em seus objetivos claramente individualistas.

Aristóteles dizia que o homem é um animal político, pois somente ele possui a capacidade de falar e esta

é o fundamento da comunicação entre os seres humanos. Segundo seu ponto de vista, os demais

animais só exprimem dor e prazer, mas o homem utiliza a palavra e com isso sua capacidade de

julgamento entre o bem e o mal, o certo e o errado.

O problema é que o homem moderno tem deixado de lado as questões filosóficas e com isso se abstendo

de conceitos que poderiam acrescentar positivamente em sua formação ética e moral.

O que tem se ramificado erroneamente no seio da sociedade brasileira e principalmente pelos políticos

profissionais é a expressão: os fins justificam os meios, ou seja, pode-se mentir, enganar, corromper, ser

corrompido, desde que alguma coisa de útil seja feita em prol da coletividade. Acreditamos que não é

desta forma que se faz política. É fato que a maioria da população brasileira não tem cultura política de

base filosófica, não conhece o verdadeiro sentido da palavra política e por que ela existe. Desta forma,

fica muito fácil para os “espertos” que detêm o poder intelectual e financeiro, corromperem a população

com sonhos mirabolantes e promessas impraticáveis.

O ANIMAL CÍVICO

O homem é animal cívico, nas palavras de Aristóteles. O Filósofo chega a afirmar que “aquele que não

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precisa dos outros homens, ou não pode resolver-se a ficar com eles, ou é um deus, ou um bruto”�. O ser

humano é uma criatura inclinada à vida em sociedade, não suporta a solidão e tem limitações físicas e

psicológicas que impedem que a vida solitária lhe seja aprazível. É da natureza humana a necessidade

de convivência com os semelhantes.

É só por meio da vida em comunidade que o homem pode atingir os bens que almeja, como a família, a

amizade, a espiritualidade, a paz e a felicidade, bem maior e fim supremo do homem. À procura desses

bens o ser humano se organiza em sociedade e, para garanti-los, constitui a comunidade política.

Aristóteles acertou ao descrever o homem como animal cívico, pois da vida em sociedade emana a vida

política, sendo o Estado a forma mais vantajosa de organização social do gênero humano.

Contudo, o exercício dos direitos e deveres cívicos como necessidade humana não pode vir apartado da

moral. Propõe-se aqui uma postura (por que não?) idealista, de que a práxis política deve estar sujeita a

premissas morais, em oposição ao realismo político maquiavélico e ao pragmatismo insensível.

Mas que moral? Podemos falar aqui em justiça distributiva, em justiça comutativa, em lei natural, em

direitos naturais, direitos humanos, etc. É uma discussão muito longa, impossível de ser

adequadamente apresentada neste artigo. Porém, pode-se falar em uma principiologia simples,

fundamental, evidente e necessária para a ação política e o exercício da cidadania, tão necessária para a

recuperação (ou começo) da boa prática política no Brasil de nosso tempo. São conceitos como

solidariedade, bem comum, boa-fé, justiça social, representatividade política, responsabilidade com a

coisa pública, dignidade humana e outros tantos que devem guiar nossa sociedade rumo à superação de

seus problemas tradicionais e das novas questões.

CIDADANIA

A cidadania deve ser entendida como uma conduta positiva de participação das pessoas na sociedade

em que convive. Não basta conviver e não participar, ser passivo, todo cidadão deve se manifestar e

exigir que seus representantes trabalhem em prol da coletividade. A cidadania deve ser efetiva, presente

�ARISTÓTELES, Política. Tradução de Roberto Leal Ferreira. �ª edição. Editora Martins Fontes. São Paulo, ����, p. �.

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e colaborativa.

Para construirmos uma sociedade unida, precisamos construir uma cidadania forte, calcada nas

relações sociais e na consciência geral do que seja moral e ético. A cidadania deve ser exercida na

convivência social e pública. A cidadania tem que ter por objetivo a solidariedade, o respeito aos

direitos humanos, o respeito à coisa pública, e principalmente, aos valores morais e éticos, pois assim

faremos uma sociedade bem organizada, mais justa e civilizada.

Segundo Dalmo de Abreu Dallari:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente

da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida

social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social.

Nesse sentido, cidadania, na concepção do Professor José Afonso da Silva, é assim entendida:

“Consiste na consciência de pertinência à sociedade estatal como titular dos direitos fundamentais, da

dignidade como pessoa humana, dos deveres de respeito à dignidade do outro e de contribuir para o

aperfeiçoamento de todos”�.

VALORES MORAIS E ÉTICOS

A sociedade brasileira tem passado por uma profunda crise ética e moral, principalmente a classe

política, isso em grande parte porque não são aplicadas as virtudes e valores morais necessários à boa

convivência e à boa política. Sócrates já afirmava que apenas o ignorante é vicioso ou incapaz de

virtude, pois quem sabe o que é o bem não poderá deixar de agir virtuosamente.

Os hábitos, os conceitos, a conduta, as relações sociais e os limites éticos foram sensivelmente

reestruturados no decorrer do desenvolvimento da sociedade moderna por assim dizer, pois esta

reestruturação tem modificado a todo o momento os aspectos sociais e éticos, e influenciado

fortemente o próprio estilo de vida das pessoas em seu convívio social.

�SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, ��.ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, ����.

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Devemos levar em consideração que os valores morais e éticos são de extrema importância na

estruturação da sociedade. Eles são os responsáveis pela manutenção da disciplina e da ordem entre as

pessoas que compõem a sociedade. Se não fosse desta forma, o mundo estaria em total anarquia, isto se

ainda existisse algum mundo.

É sob a égide dos valores éticos e morais que a sociedade dita seus rumos, fazendo com que os cidadãos

façam suas escolhas e trilhem seus caminhos. Se na sua formação o homem não tiver conhecimento e

comprometimento com os corretos valores e princípios de convivência, ele fatalmente irá trilhar por

caminhos obscuros e passíveis de atos pautados pela ilegalidade.

É nesse ínterim que a classe política brasileira se perdeu. Podemos dizer que os políticos de hoje, em

algum momento de sua formação, preferiram passar por um atalho para chegar mais rápido aos seus

objetivos. Desta forma, por não terem passado por todos os obstáculos e dificuldades que a vida

oferece, não conseguiram incorporar em seu comportamento e em seu caráter os valores éticos e

morais necessários para que um cidadão possa ser também um bom político. Lógico que existem as

exceções, os políticos realmente comprometidos com o bem comum, mas de fato, são poucos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Lógico que este pequeno trabalho não vai resolver as questões que envolvem a crise de comportamento

ético e moral que assola a sociedade brasileira, sobretudo tendo como parâmetro e reflexo a atuação

dos operadores da política nacional, que tanto nos têm envergonhado. Temos que lembrar que hoje

essas pessoas que pertencem a uma classe desprestigiada e desacreditada, também saíram do nosso

convívio, do convívio da sociedade. Saíram do seio de uma família, estudaram, cresceram e se

formaram como cidadãos.

Nossa intenção é deixar um alerta, chamar a devida atenção para que as pessoas foquem seus objetivos

e revejam seu comportamento social no sentido de agirem sempre com correção, com ética e com

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princípios morais. Assim, e só assim, poderemos construir uma sociedade mais justa, mais honesta e

compromissada com o bem comum.

A resposta de tudo está e sempre estará na base da formação ética e moral do cidadão, no conhecimento

puro e simples do que é certo e errado que deveríamos aprender em casa e na escola. Principalmente em

casa, com a família, pois ali é formado o caráter do indivíduo, este mesmo caráter que vai determinar o

perfil de cidadão que estará ativo na sociedade e na política, e que ditará os rumos das futuras gerações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARISTÓTELES. A Política.2ª ed.. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1998.

BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

CHAUÍ, Marilena, Convite à Filosofia, São Paulo, Editora Ática, 2000.

COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva,

2003.

DALLARI D.A. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998.

IHERING, Rudolf Von. A Luta pelo Direito. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 13.ª ed. São Paulo: Malheiros

Editores, 1997.