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CIRCO EM CONTEXTOS – DIÁLOGOS ENTRE A CULTURA E A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA CIRCUS IN CONTEXTS – DIALOGUES BETWEEN CULTURE AND UNIVERSITY OUTREACH PROJECTS

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CIRCO EM CONTEXTOS – DIÁLOGOS ENTRE A CULTURAE A EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Resumo: Este artigo tem por objetivos traçar a história e discutir as experiências do projeto deextensão “Circo em Contextos”, do Departamento de Educação Física da UniversidadeEstadual do Centro-Oeste / UNICENTRO, campus Irati, Paraná, desde as suas primeirasatividades, em 2010, até a data de hoje. O presente trabalho foi realizado por meio de pesquisadocumental e entrevistas com integrantes e ex-integrantes do projeto. Conta ainda com traçosde autobiografia, uma vez que suas autoras são também participantes desse projetoextensionista. O referido projeto alcançou proporções maiores do que sua proposta, pois setornou um dos poucos espaços para a experimentação de técnicas circenses e de conhecimentodo Circo como uma importante manifestação cultural da história da humanidade.

Palavras chave: Circo; extensão universitária; formação docente; cultura.

Abstract: This paper aims to trace the history and discuss the experiences of the projectCircus in Contexts (Circo em Contextos) from the Department of Physical Education at theIrati Campus, Paraná - State University of the Midwest, (UNICENTRO, in the Portugueseacronym) since its first activities in 2010. The study was carried out through a documentaryresearch in addition to interviews with current and former members of the project. It has alsoautobiographical features, since its authors are also members of the project. It is believed thatthe project has overcome its initial proposal, as it has become one of the few spaces for theexperimentation of circus techniques and knowledge about the circus as an important culturalmanifestation of the history of humanity.

Keywords: Circus; university outreach projects; teacher education; culture.

*Licenciada em Educação Física pela Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Campus de Irati - PR, Brasil.E-mail: [email protected]**Aluna de Graduação da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Campus de Irati - PR, Brasil. E-mail:[email protected]***Professora da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), Campus de Irati - PR, Brasil. E-mail: [email protected]

CIRCUS IN CONTEXTS – DIALOGUES BETWEEN CULTUREAND UNIVERSITY OUTREACH PROJECTS

Mayara Trevizan*Paula Izabella Chagas**

Gláucia Andreza Kronbauer***

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Do picadeiro à universidade – a democratizaçãodos conhecimentos circenses

A história do Circo tem suas origens, há mais de3.000 anos, na China, onde foram encontradas pinturasrupestres retratando acrobatas, equilibristas econtorcionistas. Segundo Mauclair, citado por Duprat(2007), a acrobacia foi a primeira manifestaçãoartística corporal do homem, além de uma forma detreinamento para os guerreiros de quem se exigiaagilidade, flexibilidade e força. Com o tempo, essasqualidades se somaram à graça, à beleza e à harmonia.

Comumente, a história do Circo écorrelacionada com os jogos na Roma Antiga, porém énecessário termos cautela, pois em vários outros paísese épocas foram encontradas pinturas milenares que dãoindícios de várias atividades que são encontradas hojenos circos, como malabarismo, dança, música eequilibrismo, sendo as apresentações realizadas tantoao ar livre quanto em locais fechados.

Por isso é importante diferenciarmos as artescircenses, como esse conjunto de práticas corporaisque aparecem em diversos tempos, espaços e comdistintos significados na história da humanidade, doCirco como espaço em que todas as artes circenses sãofinalmente congregadas em um espetáculo único. Esseúltimo é o que conhecemos por Circo Moderno, queteve sua origem na Inglaterra, no século XVIII, quandoum cavaleiro britânico, Philip Astley, inaugurou umaescola para atividades equestres. Em algum tempo, aescola se transformou no anfiteatro Astley, quepassaria a apresentar espetáculos integrando a arteequestre com as artes dos saltimbancos e funâmbulosdas feiras, praças e festas populares. (SILVA; ABREU,2009).

Astley é considerado o inventor da pista circular ecriador de um novo espetáculo. [. . . ] A uma equipe decavaleiros acrobatas, ao som de um tambor quemarcava o ritmo dos cavalos, associou dançarinos decorda (funâmbulos), saltadores, acrobatas, malabaristas,Hércules adestradores de animais. Esta associação deartistas ambulantes das feiras e praças públicas aosgrupos equestres de origem militar é considerada a basedo “circo moderno”. (SILVA, 2003, p.1 9).

Outro novo espetáculo surgiu nos EstadosUnidos e em outras partes do mundo onde não haviaespaços adequados. Com o estilo dos espetáculos deAstley, mas ao ar livre, posteriormente, sob uma lona,surgiu o “Circo americano” ou o “Circo de lona”.(CIRCONEWS, 2014). Da mesma forma, os grupos deambulantes adotaram a arquitetura nômade de tendasou barracas.

No Brasil, o Circo se desenvolveu,principalmente, a partir de artistas ambulantes,chamados também “mambembes”. De acordo comSilva (2003), a organização do trabalho e da produção

artística desse Circo brasileiro pode ser definida poralguns aspectos: o nomadismo; a contemporaneidade,por meio do diálogo tenso e constante com asmúltiplas linguagens artísticas de seu tempo; e, o quenos interessa nessa discussão, a forma familiar ecoletiva de constituição do profissional artista,implicando num processo deformação/socialização/aprendizagem, bases deestruturação e identidade.

[. . . ] ser tradicional, para o circense, não significava enão significa apenas representação do passado emrelação ao presente. Ser tradicional significa pertencer auma forma particular de fazer circo, significa terpassado pelo ritual de aprendizagem total do circo, nãoapenas de seu número, mas de todos os aspectos queenvolvem a sua manutenção. Ser tradicional é, portanto,ter recebido e ter transmitido, através das gerações, osvalores, conhecimentos e práticas, resgatando o sabercircense de seus antepassados. Não apenas lembranças,mas uma memória das relações sociais e de trabalho,sendo a família o mastro central que sustenta toda estaestrutura. (SILVA, 2003, p. 65-66).

Ou seja, o Circo tradicional manteve osconhecimentos relativos às técnicas circenses e aosmodos de fazer Circo sob os cuidados daqueles queviviam no Circo. Esses conhecimentos eramrepassados no convívio intergeracional e no dia-a-diados circenses. Mas esse processo começou a semodificar a partir da criação da primeira escola deCirco que temos notícias: a escola de Moscou, fundadaem 1927, acompanhou o movimento de estatização doCirco na União Soviética para atender à necessidade deconscientização do proletariado revolucionário.(TITOV, 1975).

A partir da segunda metade do século XX, asescolas de Circo se espalharam pela Europa e América.A Escola Nacional de Circo Annie Fratellini foi aprimeira a ser inaugurada na Europa Ocidental, em1974, seguida pelo CNAC (Centre National des Artsdu Cirque – Centro Nacional das Artes Circenses), em1984, ambos na França.

A partir dos anos 1970, ampliando-se aspossibilidades de acesso aos conhecimentos dastécnicas circenses, pessoas que não pertenciamtradicionalmente ao Circo formaram diversos gruposde espetáculos como, por exemplo: Cirque Nu, CircoZingaro, Cirque Baroque; o Circus Oz, entre outros.Em 1984, surgia em Quebec o famoso Cirque duSoleil, companhia milionária que hoje ilustra aspectosde um novo Circo que não tem mais seus aspectosfundamentais no nomadismo e na organizaçãofamiliar, mas mantem a contemporaneidade dalinguagem circense.

No Brasil, a primeira Escola de Circo iniciousuas atividades em 1978, na cidade de Salvador.(SILVA; ABREU, 2009). Em 1982, foi criada a EscolaNacional do Circo, mantida integralmente peloGoverno Federal, via FUNARTE (Fundação Nacional

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entrevistas com integrantes e ex-integrantes do Circoem Contextos, no sentido de verificar os motivos queos levaram a procurar o projeto, qual a suaimportância, bem como as contribuições para a suaformação. Para fins de diferenciação, os relatos dasentrevistas estão destacados em itálico e os nomes dosentrevistados foram modificados, utilizando os nomesde personagens do livro “O Circo”, de Gary Jennings.(JENNINGS, 1987). Esta pesquisa também apontatraços da autobiografia, uma vez que suas autorasassumem papel privilegiado no processo deinvestigação, pois integram a equipe do Circo emContextos, sendo elas duas acadêmicas do curso deEducação Física e bolsistas do projeto, e a idealizadorae coordenadora do projeto.

Pressupostos teóricos

Com o intuito de apresentar as bases teóricasque fundamentam essa ação extensionista, partimos daperspectiva de que o corpo e o movimento são amaterialidade da nossa existência, meio de interrelaçãocom o ambiente e com os outros seres. É por meio docorpo que o ser humano transforma a natureza paraproduzir sua existência e, ao mesmo tempo, nesseprocesso o corpo em si é transformado. Se, noprincípio, o corpo se constituiu como dimensãounicamente biológica, o aspecto natural do homem,compreendemos que a partir do trabalho esse corpo sereelabora socialmente, como meio (instrumento) detransformação da natureza e, ao mesmo tempo, comoresultado do trabalho, em sua própria transformação.Na Ideologia Alemã, Marx e Engels abordam omaterialismo de Feuerbach e apontam para a limitadacompreensão do autor quando se refere ao homemcomo objeto do mundo sensível. Para eles, a relação doser humano com o mundo sensível não é unidirecional,mas dialética; ele é objeto, mas também agente domundo sensível. (MARX; ENGEL, 2007). Surge entãouma nova realidade que deixa de ser natural, passandoa ser social. Ou seja, se o corpo é meio de trabalho,mas também um fim em si mesmo, ele deixa de ser umorganismo biológico e se torna uma realidade social –humana.

O segundo aspecto a se considerar é o Circocomo uma forma de arte, uma construção histórica ecultural com fins de atendimento às necessidadesestéticas de cada sociedade. Como afirma Fischer(1983), o ser humano busca constantemente aplenitude que transcende o ser individual e, para isso,ele precisa se apoderar de tudo aquilo de que ahumanidade é capaz, ou seja, todas as experiências queele potencialmente pode realizar como indivíduo.Nesse caso, a “arte é o meio indispensável para essaunião do indivíduo com o todo; reflete a infinitacapacidade humana para a associação, para acirculação de experiências e idéias”. (FISCHER, 1983,p. 1 3).

das Artes). Hoje há muitas escolas espalhadas peloterritório brasileiro, algumas específicas de formaçãoprofissional, outras associadas a projetos sociais queatendem populações em situação de vulnerabilidade ouainda outras que oferecem as atividades circenses paracondicionamento físico. (KRONBAUER, 2016).

Data deste período também as primeirasproduções acadêmicas que pautam o tema. ErmíniaSilva cita dois importantes trabalhos da década de1970, publicados em revistas da época, que analisam oCirco, a cultura popular e a cultura de massa, um deJosé Barriguelli, de 1974, e outro de Pedro DellaPaschoa, de 1978. (SILVA E., 1 996). Ao procurar nosprogramas de Pós-Graduação, encontramos a primeiradissertação de mestrado sobre o Circo produzida noano de 1978 por Maria Augusta Fonseca (FONSECA,1978), na área de Letras. Esses dados apontam parauma aproximação entre Circo e universidade aindaincipiente. Quando consideramos, especificamente,estudos que abordam a inserção do Circo na EducaçãoBásica, em projetos sociais, em instituições deatendimento à saúde, ou mesmo em academias deginástica, as aproximações são ainda mais recentes.(KRONBAUER; NASCIMENTO, 2013).

No entanto, não podemos ignorar que as escolasde Circo e a abertura dos conhecimentos sobre asdiversas técnicas circenses têm possibilitado ademocratização daquilo que as dinastias circensesconstruíram ao longo de sua história. Conformedestacam Bortoleto e Machado (2003), atualmente,observam-se propostas que pretendem atender adiferentes objetivos, dentre os quais se destacam os delazer, recreativos, sociais, artísticos e, principalmente,educacionais.

O trabalho que aqui iniciamos discutirá asexperiências do projeto de extensão “Circo emContextos”, do Departamento de Educação Física daUniversidade Estadual do Centro-Oeste/UNICENTRO,campus Irati, Paraná. Esse projeto iniciou suas açõesno ano de 2010, como um projeto piloto, e mantém-seativo até hoje, consolidando um importante espaço deexperimentação de práticas corporais diversificadas,fundamentadas numa perspectiva artística.

Nesse período, passaram por sua históriaacadêmicos dos cursos do Setor de Ciências da Saúdeda UNICENTRO, alunos do Ensino Médio do InstitutoFederal do Paraná/IFPR, campus Irati, professores daUNICENTRO e do IFPR, além de centenas de pessoasatendidas pelo projeto nas oficinas em instituições deensino e de saúde do Município de Irati eproximidades.

Este trabalho foi realizado por meio de pesquisadocumental com análise dos projetos inscritos na Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Estadual doCentro-Oeste (UNICENTRO), e dos relatórios finaisde cada ano em que o projeto aconteceu, os relatóriosde bolsistas, os trabalhos acadêmicos produzidos e osite do projeto. Além disso, foram realizadas

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Contudo, segundo o autor, a arte como umaconstrução que toma forma na objetividade, naexistência material, não está isenta das contradiçõesinerentes à sociedade na qual surge. Como apontaLukács, “nem a ciência, nem os seus diversos ramos,nem a arte, possuem uma história autônoma, imanente,que resulte exclusivamente de sua dialética interior”.(LUKÁCS, 2012, p. 1 2).

Numa sociedade dividida em classes, portanto,a arte pode assumir funções distintas: se, por um lado,ela pode embriagar sua plateia de magia e experiênciasirreais para disfarçar as desigualdades sociaisexistentes e desmobilizar, por outro lado, ela poderevelar a realidade social “no seu mecanismo deaprisionamento posta sob uma luz que devasse a“alienação” do tema e dos personagens. A obra de artedeve apoderar-se da plateia não através daidentificação passiva, mas através de um apelo à razãoque requeira ação e decisão”. (FISCHER, 1983, p.1 5).Nesse caso, ela se torna uma importante mediadorapara a tomada de consciência, aspecto indissociável datransformação.

A terceira definição imprescindível para essaproposta extensionista está relacionada à função daeducação, em suas mais diversas formas. Acreditamosno conceito de educação como processo que consisteem “produzir em cada indivíduo singular, ahumanidade que é produzida histórica e coletivamentepelo conjunto dos homens”. (SAVIANI, 1995, p. 1 1 ).Uma proposta de educação crítica e transformadoratrata da possibilidade de acesso aos conhecimentos,habilidades, comportamentos, valores, etc. quepermitam ao ser humano se constituir como ser sociale produzir suas condições materiais de existência(Ibidem).

Nesse cenário, a Educação Física surge como aárea de estudos e atuação que tem como objeto asmanifestações da cultura corporal em suas diversasdimensões: histórica, cultural, econômica, biológica,social, artística, entre outras. No entanto, parece queainda mantemos parte dos fundamentos da educaçãoinstitucionalizada do corpo, quando, no século XIX, osaspectos artísticos foram abolidos em favor daeficiência técnica e da funcionalidade para o trabalhofabril. O corpo – enquanto meio e produto dehumanização pelo trabalho – se tornou apenas forçamotriz para o sistema produtivo. (SOARES, 2002).

Muitas rotinas escolares apresentam umconjunto de normas extremamente limitantes de açãocorporal: em sala de aula os alunos sentam, depreferência com uma “postura correta”, em cadeiraspadronizadas, apoiam os braços e escrevem sobremesas padronizadas, olhando para frente em silêncio.(STRAZZACAPPA, 2001 ). Fora da escola, a educaçãodo corpo assume o discurso midiático para atender aosinteresses do mercado que, há cada dia, cria novasnecessidades corporais e novos padrões a seremreproduzidos e, com eles, um conjunto de produtos e

serviços para suprir tais necessidades e alcançar osreferidos padrões. (SILVA; 2001 ). Ou seja, ao invés depotência, o que se percebe são formas de coerção docorpo.

A partir das bases teóricas apresentadas,acreditamos que: sendo o corpo a materialização danossa existência, nosso meio de humanização; sendo oCirco uma construção humana para o atendimento àsnossas necessidades estéticas e importante agente dedisseminação cultural; sendo a educação o processo desocialização de conhecimentos construídosculturalmente pela humanidade ao longo de suahistória, que ensina o ser humano a ser humano; aspráticas corporais circenses têm importante papel naformação de seres humanos que reconheçam em si apotência para a formação e a transformação de suasformas de existência.

Circo em Contextos – como tudo começou...

O projeto de extensão “O Circo em Contextos”se realizou entre os anos de 2010 e 2013, retomandosuas atividades no ano de 2016, vinculado aoDepartamento de Educação Física da UniversidadeEstadual do Centro-Oeste, Campus Irati, Paraná.

Inicialmente, no ano de 2010, o projeto foiintitulado “Manifestações Artísticas do Movimento –O Circo”, com a duração de apenas cinco meses. Seusobjetivos se concentravam em oferecer espaços deexperimentação das práticas corporais circenses paracomunidade universitária e crianças em idade escolardo Município de Irati, bem como se tornar umaoportunidade de integração entre teoria e prática paraalunos do curso de Licenciatura em Educação Física.

As atividades realizadas em 2010 foramdesenvolvidas em diferentes segmentos, inicialmentecom o grupo de estudos, espaço para apresentação deartigos relacionados ao tema, com discussão e reflexãosobre os mesmos, seminários sobre atividadespedagógicas alternativas e a programação das oficinas.Posteriormente, foram ofertadas oficinas de técnicas deacrobacias de solo, acrobacia aérea em tecido,expressão corporal e malabares e dança. Essas oficinaseram abertas aos funcionários, professores e alunos dasescolas do Município de Irati-PR.

Destacamos que, em parceria com o projeto“Intervenção com práticas corporais no programaSaúde da Família”, foram realizadas oficinas circensescom as crianças participantes do Programa Saúde daFamília. Foram as primeiras oficinas nas quaisacadêmicos colaboradores do projeto “ManifestaçõesArtísticas do Movimento – O Circo” assumiram aresponsabilidade docente com crianças em idadeescolar, o que demandou amplo planejamento e oestudo da pedagogia das práticas corporais circenses.

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Nesse mesmo ano, a coordenadora do projetoministrava as disciplinas de AtividadesComplementares (segundo e terceiro períodos) eExtensão em Esporte e Lazer (terceiro período) nocurso de Educação Física. Ao aliar as atividades deensino e extensão, integrou as práticas corporaiscircenses como conteúdo da primeira disciplina, epropôs um projeto piloto com palhaços no hospital, nasegunda disciplina.

Segundo o relatório anual do projeto“Manifestações Artísticas do Movimento – O Circo”(2010), quando iniciaram as aulas, os alunos semostraram bastante receptivos, praticando osexercícios propostos. Em apenas duas semanas, asdiversificação das experiências corporais dosacadêmicos foi perceptível, cada um direcionado àstécnicas com as quais mais se identificava, além deauxiliarem uns aos outros. Em pouco tempo, osacadêmicos se tornaram protagonistas nas aulas econseguiram criar/experimentar movimentos própriosque ainda não haviam sido trabalhados pela professora.As experiências da disciplina culminaram com umaapresentação criada e executada coletivamente pelaturma, na abertura dos Jogos da ComunidadeAcadêmica (JACUs).

Em relação às atividades no hospital,inicialmente, a professora propôs um trabalho dediscussão sobre o tema na disciplina de Extensão emEsporte e Lazer, terceiro ano do curso de EducaçãoFísica da UNICENTRO. Os acadêmicos sugeriram queas discussões de sala de aula se transformassem emexperiências formativas no campo. A direção doHospital Santa Casa de Irati foi contatada paraverificar a viabilidade da proposta. A partir doconsentimento da direção do hospital, a equipe daSegurança do Trabalho organizou uma reunião com osacadêmicos para fornecer algumas orientações eauxiliar no planejamento das atividades.

Os acadêmicos se distribuíram em grupos paraatender todos os setores do hospital: clínica médica,clínica cirúrgica, pediatria, psiquiatria, hemodiálise eas mães da UTI neonatal. Foram elaboradosalongamentos, atividades manuais e jogos adaptados àcondição dos pacientes, além de esquetes e contaçãode “causos”. Em todas as atividades havia oacompanhamento da professora responsável e daassistente social do hospital.

Por fim, houve o “encontro de trocas”, no qualos grupos compartilharam as experiências nosdiferentes setores do hospital e puderam tambémavaliar as atividades propostas e as possibilidades deatuação em um ambiente que não costumamfrequentar.

Circo em Contextos – novas propostas...

A partir das experiências e demandasobservadas do ano de 2010, o projeto foi reformuladoem 2011 , assumindo o nome de “O Circo emContextos”. A mudança no nome representou tambéma ampliação do foco de atuação do projeto paradiversos contextos, tanto da educação quanto da saúde.Além das atividades propostas no ano anterior,também oferecemos oficinas de atividades circensesaos idosos da Universidade Aberta da Terceira Idade(UATI) e em instituições de saúde do Município deIrati. O projeto esteve presente em diversos eventoscomo a Feira de Profissões da UNICENTRO, o Dia doCirco, junto à disciplina de Recreação do curso deEducação Física e também à semana cultural da escolaNossa Senhora de Fátima, do distrito de Guamirim. (OCIRCO EM CONTEXTOS, 201 1 ).

As oficinas para crianças em idade escolar eramorganizadas com o objetivo de oferecer a possibilidadede experimentação das práticas corporais circenses,bem como a oportunidade de prática pedagógica paraos alunos do curso de Licenciatura em EducaçãoFísica. Aconteceram não apenas em escolas, mastambém com grupos do Programa Saúde da Família,do Centro de Atenção Psicossocial, e na Feira dasProfissões, onde os visitantes puderam vivenciaralgumas técnicas circenses. (O CIRCO EMCONTEXTOS, 201 1 , 2012, 2013).

A partir da divulgação do projeto, por meio dorádio e de uma carta encaminhada a todas as escolas, adireção e equipe pedagógica faziam contato com acoordenação do projeto. A coordenadora entãoverificava a disponibilidade de horários dosacadêmicos participantes do projeto para realizarem asoficinas e agendava com a escola. Após esse contato,elaborávamos uma programação de atividades e a listade materiais necessários. Os acadêmicos eramdivididos em grupos nos quais planejavam asatividades propostas como: expressão corporal,acrobacia aérea em tecido, acrobacias de soloindividual, malabares, diabolô, bandeira, devil stick,atividades de criatividade e experimentação demovimentos distintos daqueles movimentos feitos nodia a dia. As atividades eram planejadas a partir domaterial produzido por Marco Antonio Bortoleto e seugrupo de estudos sobre a pedagogia das práticascorporais circenses (BORTOLETO, 2008;BORTOLETO, 2010; BORTOLETO, PINHEIRO EPRODÓCIMO, 201 1 ) e de informações queencontrávamos em sites da internet. Aprendemos abuscar referências e construir nossas própriasestratégias de ensino.

Cada oficina realizada era um aprendizadodiferente. O fato de trabalhar com crianças carentes,por exemplo, fazia-nos refletir sobre muitos aspectosque não nos atentávamos no nosso cotidiano. Em umadas visitas às escolas, entre uma oficina e outra, ascrianças nos convidaram para jogar futebol no recreio.Esse fato nos fez perceber o quanto pequenos gestos

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geram sorrisos sinceros.

No ano de 201 1 , também começamos a realizarvisitas semanais aos internos do Hospital Santa Casa.Para fundamentar esse trabalho, assistimos o filme dos“Doutores da Alegria” (Doutores da Alegria, 2005) ediscutimos sobre o livro “Boas Misturas”, de MorganaMasetti. (MASETTI, 2003). Os acadêmicos eramdivididos em grupos e atuavam como palhaços, pormeio de pequenas encenações, histórias, dinâmicas,demonstração de algumas técnicas do Circo, todaspermeadas por conversas e risos. Em 2013-2014,somaram-se à equipe alunos do curso Técnico emInformática Integrado ao Ensino Médio do InstitutoFederal do Paraná, Campus Irati, por meio de parceriacom o projeto de extensão “Circo sem Lona”, daquelainstituição.

Eram atendidos os seguintes setores:

• Clínica médica: pacientes adultos em tratamentopara alguma doença. Nesse setor, encontrávamos,com frequência, idosos deixados por semanas nohospital sem receber visitas. A nossa presença eraum dos poucos momentos em que tinham alguémpara conversar, contar suas histórias e ouvir outrastantas.• Clínica cirúrgica: pacientes adultos em recuperaçãopós-cirúrgica, geralmente por fraturas ósseas.Alguns se encontravam muito debilitados, outroscom fraturas imobilizadas, mas em fase avançadade recuperação.• UTI Neonatal: local onde as atividades eramrealizadas com as mães dos bebês que estavam hádias internados. Em algumas ocasiões, asenfermeiras permitiam que entrássemos para ver osbebês, momento sempre esperado por nós comentusiasmo.• Pediatria: crianças internadas que tinham que ficarhospitalizadas alguns dias até sua recuperação.Nessas ocasiões, por vezes era possível tirar ascrianças do leito ou fazer algumas brincadeiras comelas na cama. O fato de ver palhaços chegando aseus quartos, trazendo bexigas, fazendo palhaçadas,brincando, já deixava o clima do hospitaltotalmente diferente.• Hemodiálise: pacientes adultos em hemodiálise,que vinham ao hospital duas ou três vezes porsemana. Nesse caso, eram realizadas atividadescomo dobraduras, manipulação de objetos,alongamentos e alguns jogos adaptados ao espaço.• Psiquiatria: pacientes com distúrbios neurológicos epacientes em tratamento para alcoolismo e uso dedrogas ilícitas. Realizávamos jogos, brincadeiras,rodas de música, enfim, atividades queenvolvessem a participação dos pacientes.

Nossa atuação no hospital não envolvia apenasos pacientes, mas também seus acompanhantes e aequipe profissional do hospital. Todas as visitas feitaspelo grupo eram realizadas a caráter, para sermosdiferentes das outras pessoas que frequentavam e

trabalhavam no hospital, ou seja, a construção de ummundo diferente começava pela roupa e pelamaquiagem. Em muitas ocasiões, elaborávamos visitastemáticas como festa junina, visita do pijama, entreoutros. Era divertido quando os pacientes,acompanhantes, enfermeiros e médicos passavampelos corredores e nos enxergavam com roupasenfeitadas que nós mesmos decorávamos, ou depijama, vestidos de palhaços, perucas coloridas,chapéus malucos e caras pintadas, com brinquedospendurados, andando de cadeiras de rodas fazendo deconta que era o nosso carro. Segundo Masetti (2003), opaciente tem sua existência limitada à rotina hospitalar,quando é tratado como incapaz e reduzido a um objetosendo manipulado. Por isso, além de fazer rir, nossotrabalho era também fazer com que o paciente fossecapaz de construir outra existência para além dasparedes do seu quarto.

Foram muitas as experiências. Às vezes eradifícil presenciar tantas situações de sofrimento, aspessoas debilitadas, tristes, mas certamente issocontribuiu para que fôssemos capazes de enfrentar adiversidade da existência humana. Nós, com o narizvermelho, rosto pintado, conseguíamos superar aslimitações daquele lugar e levar sorrisos sinceros epossibilidades de vida para as pessoas.

As oficinas da UATI eram realizadas com ogrupo de idosos a cada quinze dias. Eram elaboradasatividades capazes de reconstruir as relações dosidosos com seu corpo por meio da experimentação e dacriatividade, buscando fazê-los relembrarem o seusmomentos de infância. (KRONBAUER, SCORSIN ETREVIZAN, 2013). O desafio foi proposto ao grupoque estava trabalhando com atividades circenses, natentativa de trabalhar com a memória, socialização dogrupo, manipulações de objetos, criatividade,comunicação, expressão corporal, entre outras.

A UATI oferecia um conjunto de oficinas paraque os idosos escolhessem. Para nossa surpresa, nossaoficina estava sempre cheia. As idosas relatavam quegostavam de ir naquela oficina pela alegria, disposição,carinho e pelo acolhimento nos corredores e na portada sala. Uma análise mais aprofundada desse trabalhopode ser encontrada no texto “Significados do Circo edas Atividades Circenses para os Idosos da UATI”,publicado por nós em 2013. A oportunidade deconhecer e trabalhar com outras pessoas proporcionouuma prática acadêmica enriquecedora no sentido desermos capazes de adaptar e criar estratégias paraatender a diversidade.

O projeto também ofereceu, e ainda oferece,oficinas para a comunidade universitária. Estasaconteciam duas vezes por semana, nas dependênciasda UNICENTRO, e contavam com a participação deacadêmicos de diversos cursos, funcionáriosterceirizados do setor de limpeza e cozinha, alunos darede pública de ensino e também professores dauniversidade. As atividades propostas eramsemelhantes àquelas das oficinas realizadas nas

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escolas. Atualmente, participam das oficinasacadêmicos do curso de Educação Física e umaprofessora do curso de Turismo. Cada participanteassume também, em determinados momentos, aresponsabilidade de planejar e ministrar algumaoficina.

Para integrar as atividades do projeto, foiorganizado um grupo de estudos com produçãoacadêmica, com propósito de discutir e proporcionarmomentos de reflexões sobre o Circo, suas diversasmodalidades e a história de suas relações com aspráticas corporais. Atendendo a um dos objetivos dasatividades extensionistas, o estímulo ao estudo e àpesquisa científica, a partir da relação universidadecomunidade, traz como resultado a produção deconhecimentos que podem ser convertidos embenefícios para toda a sociedade.

Atualmente, os trabalhos realizados pormembros do projeto de extensão dialogam com oGrupo de Estudos e Pesquisa “Educação, Cultura eContemporaneidade”, da UNICENTRO, bem comocom o Grupo “História, Sociedade e Educação nosCampos Gerais”, da UEPG. Desde sua criação, no anode 2010, são frutos das discussões e dos desafiospropostos pelo projeto de extensão as seguintesproduções: 1 7 resumos, resumos expandidos ou textoscompletos apresentados e publicados em anais deeventos; nove trabalhos de conclusão de curso, nocurso de Licenciatura em Educação Física daUNICENTRO; quatro artigos publicados emperiódicos e dois artigos aprovados para a publicação;um capítulo de livro com corpo editorial; uma tese dedoutorado na área da Educação.

A partir das entrevistas realizadas, buscamosencontrar aspectos que remetam às motivações quelevam os integrantes a procurarem o projeto Circo emContextos, e também suas contribuições para aformação dos professores de Educação Física, mastambém para a formação humana, uma vez que nemtodos os integrantes foram/são acadêmicos do curso deEducação Física. As perguntas apontam para astécnicas aprendidas, para as situações que enfrentaramna prática docente com as atividades circenses (queserão discutidas no próximo item do texto), e aindapara as experiências vivenciadas no que diz respeito aoconvívio social, à formação humana, ao respeito pelooutro, aos desafios, etc.

Entendo que a extensão é uma forma de interaçãoentre universitários e comunidade de uma formabenéfica para ambos. Os projetos de extensãopropiciam ao aluno a oportunidade de colocar emprática conhecimentos obtidos em sala de aula eem suas pesquisas. (Daphne)

Entre as motivações para a participação noprojeto, os entrevistados apontam questões como a

busca de novos conhecimentos, a superação dedesafios, mas principalmente o interesse despertadopor formas diversificadas de se movimentar.Destacamos que a abordagem de conteúdos circenses,em disciplinas do curso de Graduação em EducaçãoFísica, foi importante no sentido de despertar ointeresse dos acadêmicos para o projeto.

A atividade circense é uma vivência muito boaporque faz parte da cultura de alguns lugares e dealgumas pessoas, mas que nem todo mundovivencia. (Spyros).

Eu realmente sempre gostei muito de circo e acuriosidade de aprender um pouco,principalmente o tecido, que é o que acho maisbonito. (Agnete) .

A gente tinha a disciplina de atividades circenseque nos foi ofertada no segundo ano comodisciplina optativa e que me chamou muitaatenção. (Zachary).

A gente tem uma disciplina no curso de atividadescircenses e eu gostei muito dos conteúdos.(Autum).

Entre as técnicas aprendidas no projeto, osentrevistados citaram: malabares (bolinhas, diabolô,swing de fita, bandeira (flag) e outros objetosdiversos); acrobacias individuais (equilíbrios,rolamentos, reversões, perna de pau); acrobaciascoletivas (pirâmides e portagens); trabalho commateriais alternativos; expressão corporal e improviso(palhaço); acrobacias aéreas (trapézio, tecido e lira).Cabe mencionar que quando nos referimos às técnicasaprendidas, não significa que os integrantes do projetoadquirem a precisão de movimentos para a execuçãoperfeita dessas técnicas, mas que são oportunizadosmomentos para a sua experimentação, para oreconhecimento das potencialidades corporais de cadaum.

Por mais que não sejam movimentos perfeitosainda, eu consigo repassar para os meusalunos, então eu posso dizer que tudo que nosé passado no Circo eu aprendi, a técnica decada um. (Gavrilla).

As experiências no projeto Circo emContextos também proporcionaram momentos deconvivência com pessoas em diferentes situações.Aprendemos a olhar para o outro a partir do seupotencial e não necessariamente de suas limitações.Para atuar com o Circo, seja em nossas oficinas naUniversidade, nas escolas ou no hospital, é necessáriodesenvolver a capacidade de ser afetado pelas pessoasque encontramos, adaptando nossa atuação àssituações singulares, aspecto importante também emnossa formação como seres humanos solidários aooutro.

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Todos os projetos têm grande importância paravocê que vai ser professor, porque você vai ter aexperiência de algo novo para sua vida, paralevar até a escola, para o hospital, ou seja, paratodas as idades. (Sunday).

Os projetos de extensão ajudam a gente a setornar um profissional mais completo, comvivênciasdiferenciadasediversificadas.(Meli).

Ao congregarmos as experiências e o trabalhocoletivo realizado, tanto nas oficinas na Universidadequanto nos demais contextos em que o projeto atuou,conseguimos também organizar alguns pequenosnúmeros para apresentação em eventos, como aabertura do Salão de Extensão da UNICENTRO, em2012 e 2016, a abertura do IV Colóquio EducaçãoFísica e Ciências Sociais em Diálogo, e atividadespropostas por disciplinas do curso de Educação Física,como os festivais de dança e o espetáculo circenseoferecido às crianças de escolas da rede pública daregião. Esses pequenos números, longe de representara performatividade de grandes espetáculos circenses,trouxeram para a cena a expressividade, o aprendizadoe as potencialidades de cada um dos integrantes doprojeto, juntamente com a criatividade que sedesenvolveu no processo de experimentação daspráticas corporais circenses.

Circo em Contextos e a formação docente

Atualmente a Educação Física é tratada comocomponente curricular obrigatório da Educação Básica– LDBEN (BRASIL, 1996), tendo como conteúdosestruturantes a Ginástica, o Esporte, a Dança, as Lutas,os Jogos e Brincadeiras.

De acordo com as Diretrizes Curriculares daEducação Básica (DCEB) do Estado do Paraná (2008),o conteúdo de ginástica tem como desdobramentoalguns conteúdos básicos, dentre eles, ginásticacircense (6º, 7º e 8º anos), ginástica geral/ginástica ecultura de rua – Circo, malabares e acrobacias – (9ºano). Na tabela de conteúdos específicos abordados apartir dos conteúdos básicos, dentre os quais oprofessor deverá “selecionar e/ou adicionar outrosconteúdos, de acordo com sua realidade regional”, sãocitados malabares, tecido, trapézio, acrobacias etrampolim. (PARANÁ, 2008, p. 89).

Percebemos, portanto, que conteúdosrelacionados ao Circo fazem parte das diretrizes queorientam o trabalho pedagógico da Educação Física naEducação Básica. No entanto, o que observamos nasaulas dessa disciplina é a prevalência de atividadescom o conteúdo de esporte. Essa realidade é reflexo,em grande medida, da tradição da área que por muito

tempo esteve vinculada quase que exclusivamente aoensino dos esportes, especificamente o Handebol, oFutebol, o Voleibol e o Basquetebol e, em algunscasos, o Atletismo. (BETTI, 1 993).

Essa tradição permeia também os cursos deformação de professores de Educação Física. Em setratando da nossa realidade – o curso de Licenciaturaem Educação Física da Universidade Estadual doCentro-Oeste – verificamos que a grade curricular, queformou sua última turma no ano de 2015, dedicava 374horas ao conteúdo Esporte, 1 36 horas aos Jogos eBrincadeiras e apenas 102 horas para a Ginástica, 68horas para Lutas e 68 horas para ManifestaçõesRítmicas e Expressivas. (UNICENTRO, 2010).Atualmente, após reformulação curricularimplementada em 2013, o curso destina 136 horas paraManifestações Rítmicas e Expressivas, 1 02 horas paraGinástica, 1 36 horas aos Jogos e Brincadeiras e aindaincluiu entre o rol de disciplinas optativas “AtividadesCircenses na Escola”, com carga horária de 68 horas.(UNICENTRO, 2013). Devido ao interesse dosacadêmicos, essa disciplina é ofertada para todas asturmas. A partir dessas modificações, podemos inferirque o trabalho do Circo em Contextos e de seusapoiadores contribuiu para ampliar as discussõesdestinadas às manifestações corporais artísticas nocurso de Licenciatura em Educação Física daUNICENTRO.

Em trabalho realizado por Sedor (2013) comprofessores da rede Estadual de Educação Básica, osmesmos apontaram como fatores limitantes aresistência dos alunos, a falta de materiais, mas,principalmente, a falta de conhecimento teórico epedagógico sobre as atividades circenses. No entanto,as disciplinas que compõem a grade curricular doscursos de formação inicial não são os únicos espaçosde construção de conhecimentos na Universidade,caracterizada pela indissociabilidade entre o ensino, apesquisa e a extensão. Os projetos de extensãouniversitária da UNICENTRO articulam-se de formaque os acadêmicos possam passar por diferentesexperiências no processo educativo, cultural ecientífico. Procuram estimular as atividadesmultidisciplinares e multiprofissionais, integrandosetores da Universidade e da sociedade. Nesse sentido,contribuem para melhorar o desenvolvimento dosacadêmicos, qualificando-os como professores quepossam atuar na elaboração de processos de produção,inovação e desenvolvimento científicos, tecnológicos eações voltadas ao desenvolvimento econômico,cultural, social e ambiental. (UNICENTRO, 2012).

Cumprindo com os princípios e diretrizes dasações extensionistas e reconhecendo a necessidade deampliar a formação docente, o Circo em Contextospassou a oferecer oficinas pedagógicas para o tratocom o Circo como conteúdo escolar. Junto aoPrograma de Desenvolvimento Educacional do Estadodo Paraná, programa de formação continuada paraprofessores da Rede Estadual de Educação Básica,

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foram oferecidas duas oficinas nos anos de 2010 e201 1 . Além disso, uma das professoras PDE realizouseu Projeto de Intervenção abordando esse conteúdo, oque resultou em um Caderno Pedagógico e um artigono qual relata suas experiências. (SIMON, 2013;SIMON E KRONBAUER, 2013).

Destacamos ainda nossa participação noseventos de estudos dos cursos de Pedagogia daUniversidade Federal do Paraná, em 201 1 , e daUniversidade Estadual de Ponta Grossa, em 2015.Nesses eventos, ofertamos oficinas de formação para otrato com as práticas corporais circenses nas aulas daEducação Infantil e Anos Iniciais do EnsinoFundamental, enfatizando a ludicidade e aexperimentação de movimentos.

Esse aprender a ensinar as atividades circensesse consolida quando, desde 2010, percebemos acrescente incorporação desses conteúdos nas aulas deEstágio Supervisionado e também nas intervençõesrealizadas por acadêmicos bolsistas do ProgramaInstitucional de Bolsas de Iniciação à Docência(PIBID-Capes), conforme consta nos relatos dosentrevistados:

[. . . ] eu pretendo utilizar quando me formar etambém já estou utilizando nos estágiossupervisionados e no PIBID que estou atuando.(Sunday).

Vou abordar as atividades circenses tanto noensino médio quanto agora no ensinofundamental, [. . . ] no ensino fundamental a gentejá tem preparado 4 h/a só de atividade circenses.(Jules).

Estamos começando o estágio agora, mas noplano de ensino pros anos finais do EnsinoFundamental, eu pretendo trabalhar a ginásticacircense, provavelmente vamos trabalhar mais otecido e as pirâmides. (Agnete).

�o Fundamental II a gente trabalhou a ginásticacircense, a ginástica normal e o tecido. E noEnsino Médio agora, a gente tá trabalhandopirâmides e segunda altura. (Zachary).

De acordo com os entrevistados, o projeto Circoem Contextos tem contribuído sobremaneira para queassumam a docência e abordem os conteúdos circensescom mais segurança. Ademais, a disciplina deAtividades Circenses na Escola tem sido espaço deconstrução de conhecimentos para o trato pedagógicodessas práticas corporais no contexto escolar.

[. . . ] eu acho que o projeto de extensão teproporciona vivenciar na prática o que é serprofessor, por exemplo, nas oficinas: eu nãoestava lá enquanto acadêmica, mas sim comoprofessora, ensinando alguma coisa para osalunos. (Meggy).

O projeto de extensão vai preparar ainda mais oacadêmico para a docência e eu acho que a gentecresce muito com esses projetos. (Autum).

A participação no projeto nos deixa mais aptos

para nossa atuação com os alunos, [. . . ] a gentetambém ministra algumas aulas, nos dando essaresponsabilidade que vai ajudar no nosso papelcomo professor. (Gravilla).

Os projeto de extensão são essenciais para que ouniversitário possa pôr em prática tudo aquiloque ele aprendeu, dá experiência ao universitárioe expõe situações que vão surgir na carreiraprofissional dele para que ele saiba comoresolver depois. (Jules).

Esses são apenas alguns resultados que apontampara a relevância das ações extensionistas natransformação da realidade local e na formaçãoampliada e continuada daqueles que participam dessasações.

Considerações Finais

O objetivo deste trabalho foi traçar a história eos desafios do projeto Circo em Contextos, doDepartamento de Educação Física da UNICENTRO,campus Irati, Paraná. A partir dos relatos e evidênciasaqui apresentados, acreditamos que esse projetoalcançou proporções maiores do que sua proposta, poisse tornou um dos poucos espaços para aexperimentação de técnicas circenses e deconhecimento do Circo como uma importantemanifestação cultural da história da humanidade.

As experiências e os conhecimentos construídosno projeto de extensão têm possibilitado a superaçãode diversos desafios no que diz respeito à elaboraçãode estratégias pedagógicas fundamentadas edisseminação de atividades circenses como conteúdoda Educação Física na escola. Ainda, proporcionam aampliação dos espaços de discussão sobre asmanifestações corporais artísticas no currículo docurso. Entretanto, para além da formação docente, oCirco em Contextos tem contribuído para a formaçãohumana e o reconhecimento das potencialidadescorporais de todos aqueles que participam de suasatividades.

O texto que apresentamos não é apenasresultado de um conjunto de relatos, dados coletadosem documentos ou entrevistas a fim de provar aeficiência de uma intervenção. Esse trabalho trouxetraços da nossa própria história e da história de umprojeto de extensão de Circo, idealizado por um desejoindividual, mas que se efetivou em virtude do esforçocoletivo e conquistou resultados efetivos em defesa doCirco como conteúdo escolar, assim como na suadisseminação como manifestação cultural epossibilidade de experimentação de práticas corporaisdiferenciadas.

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