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CÉLIA BELGAMASCO CAVALCANTI DA SILVA - Operação de …€¦ · de estudos de contos do escritor Dalton Trevisan. Buscou-se suporte teórico na Teoria da Estética da Recepção

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CÉLIA BELGAMASCO CAVALCANTI DA SILVA

Conto contemporâneo: a

convivência humana em contos de

Dalton Trevisan

Maringá – Paraná

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO

SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO

EDUCACIONAL - PDE

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2012

CÉLIA BELGAMASCO CAVALCANTI DA SILVA

UINIDADE DIDÁTICA

Conto contemporâneo: a

convivência humana em contos de

Dalton Trevisan

Professor PDE: Célia Belgamasco Cavalcanti da Silva

Professora Orientadora IES: Luzia Aparecida Berloffa Tofalini

Área PDE: Letras

NRE: Maringá

Maringá – Paraná

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2012

01. Ficha para identificação da Produção Didático-Pedagógica

Título: CONTO CONTEMPORÂNEO: a convivência humana na obra de Dalton Trevisan

Autor

Célia Belgamasco Cavalcanti da Silva

Disciplina/Área

Língua Portuguesa

Escola de Implementação do projeto e sua localização

CEEBJA – Prof. Manoel Rodrigues da Silva Rua Paranaguá, nº 430, Zona 7, CEP

87020190 – Maringá-Paraná

Município da escola

Maringá

Núcleo Regional de Educação

Maringá

Professor orientador

Profª Drª Luzia Aparecida Berloffa Tofalini

Instituição de ensino superior

Universidade Estadual de Maringá – UEM

Resumo

O referido documento foi idealizado a partir de experiências realizadas com prática da leitura em sala de aula e sua elaboração

segue orientações das Diretrizes Curriculares (DCEs) cuja concepção teórica se refere ao

ensino da literatura voltada para o entorno do leitor, não mais para o autor ou a obra como era conduzida nas práticas pedagógicas

tradicionais. Assim, objetiva oferecer ao aluno do Ensino Médio de EJA condições de

ampliar seu universo cultural e social a partir de estudos de contos do escritor Dalton Trevisan. Buscou-se suporte teórico na

Teoria da Estética da Recepção concebida por Hans Robert Jauss e aplicação segue

orientações do Método Recepcional elaborado por Bordini e Aguiar.

Palavras-chave Estética da Recepção; Dalton Trevisan; Conto; Leitor

Formato do material didático

Unidade Didática

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Público alvo Alunos de EJA (Ensino Médio) 2. Apresentação

Um dos constantes desafios da educação é formar leitores competentes

pois, geralmente, quem não lê, ou lê mal, também escreve com dificuldade e

apreende o mundo de maneira menos expressiva. A escola mostra que, cada

vez mais, os alunos têm dificuldade para expressar seu pensamento de forma

clara e objetiva, quer via interação verbal oral ou escrita. Além disso, a falta do

hábito da leitura empobrece o universo social e intelectual do indivíduo.

Considerando esses aspectos, isso nos leva a crer que a proficiência na

leitura é o alicerce para a construção do saber e um instrumento necessário

para o educando interagir com certas garantias na multiplicidade de situações

nas sociedades letradas. A leitura e, principalmente quando o objetivo é a

leitura literária, além de prática escolarizada deve ser estendida vida afora,

uma vez que ela constitui-se como excelente meio de conhecimento do mundo

e de si mesmo. Segundo Bordini e Aguiar (1993, p.13), “Todos os livros

favorecem a descoberta de sentidos, mas são os literários que o fazem de

modo mais abrangente.”

Para Zilberman (2004, p. 110), a “literatura quando age sobre o leitor,

convida-o a participar de um horizonte que não é o dele, portanto diferente do

seu. A literatura é solidária e diferente ao mesmo tempo sintetizando nesse

aspecto o significado das relações sociais”. Desenvolver o hábito da leitura de

textos literários em estudantes do Ensino Médio exige empenho, persistência e

criatividade do professor, haja vista enorme concorrência com o mundo

tecnológico que tanto os seduz. As facilidades e atividades prazerosas, como

jogos interativos e bate papos, aliadas às informações rápidas que esse mundo

oferece, promove no discente uma resistência que o impede de desenvolver o

interesse e o hábito pela leitura literária, pois esta exige reflexão. Somado a

isso, realizar esse intento com o jovem ou adulto trabalhador da EJA torna o

desafio ainda maior, uma vez que estes, na sua maioria, do período noturno,

enfrentam jornada de trabalho pesado durante o dia e chegam cansados à sala

de aula, sem muita disposição para ler, escrever, refle tir, interpretar, raciocinar.

Tais motivos concorrem para dificultar a ampliação dos horizontes de

expectativas deles enquanto seres pensantes e cidadãos atuantes.

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Não se pode negar, porém, as contribuições dos recursos tecnológicos

como suporte que, se bem utilizados pelo professor, podem ser grandes

aliados no estudo de textos literários. De acordo com Marcuschi (2003) a atual

fase da denominada cultura eletrônica, com o tele fone, o gravador, o rádio, a

TV e, principalmente, o computador pessoal e sua aplicação mais notável, a

internet, segundo ele provocou uma explosão de novos gêneros e novas

formas de comunicação, tanto na oralidade como na escrita. Contudo, não se

faz necessário eleger um em detrimento de outro, mas integralizar a prática da

leitura literária a novas tecnologias, como a internet, onde se é possível ler

bons e variados textos que colaboram para o aprimoramento do conhecimento

do mundo dele e da realidade que o cerca.

As Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa (2008),

visando ao desenvolvimento de competências para a leitura , propõem que os

profissionais da educação tenham novos posicionamentos em relação às

práticas de ensino-aprendizagem. Assim, o ensino de Literatura nas escolas

públicas do estado do Paraná, segundo as orientações desse documento,

sugere pensá-lo a partir da Estética da Recepção.

Nesse sentido, esta Unidade de trabalho tendo como suporte teórico a

Estética da Recepção de Hans Robert Jauss e a Teoria do Efeito de Wolfgang

Iser propõe, de forma prática e diferente, estimular a leitura reflexiva no

educando, organizando, para isso, momentos de leitura e escrita junto aos

alunos trabalhadores do Ensino Médio da Educação de Jovens e Adultos

(EJA). Entendendo e acreditando que a cultura contribui para a aprendizagem,

intenciona-se viabilizar o acesso a obras literárias utilizando, para isso, contos

contemporâneos do escritor paranaense Dalton Trevisan. Pretende-se também,

instigá-lo a conhecer mais a relevância desse autor dentro da arte literária.

Dalton Trevisan possui um estilo de linguagem resumido, depurado e

inconfundível. Seus contos são construídos a partir de cenas breves, mas

intensas. São flagrantes do cotidiano de gente comum que vive os dramas

sociais captados pelo olho implacável de um narrador que enxerga muito além

das circunstâncias exteriores. Esse olhar cruel sobre a condição humana é o

principal traço da originalidade desse autor de destaque na literatura brasileira

contemporânea.

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O conto, gênero literário aqui eleito para trabalhar a literatura, é um tipo

de texto atraente, receptivo, reflexivo e capaz de dialogar com outros gêneros

textuais. Além de pertencer a um gênero cuja narrativa é curta, com um único

conflito e envolvendo poucas personagens permite leitura rápida e eficaz,

despertando no leitor um interesse prazeroso pela leitura. Ao ler, de acordo

com as DCEs (2008, p.56), “o indivíduo busca suas experiências, os seus

conhecimentos prévios, a sua formação familiar, religiosa, cultural, enfim, as

várias vozes que o constituem”. Por isso, a temática selecionada foi pensada

para que os leitores possam perceber no decorrer da leitura das narrativas,

situações que podem ser vivenciadas por eles no seu cotidiano.

A implementação do projeto na escola será por meio de uma Unidade

Didática que seguirá como encaminhamento metodológico, o Método

Recepcional elaborado e organizado pelas autoras e professoras Maria da

Glória Bordini e Vera Teixeira Aguiar com base na teoria da Estética da

Recepção. As atividades propostas seguirão as etapas determinadas pelas

autoras do método.

A escolha do tema “convivência humana” se justifica porque há na

história de vida dos educandos ( jovens e adultos trabalhadores, aposentados,

portadores de deficiência, entre outros) situações de abandono, exclusão

social, velhice, relacionamentos afetivos mal sucedidos. Além disso, a

experiência e a consciência dessas situações se estendem a todos os seres

humanos em diferentes estágios da vida e em diferentes meios sociais.

Trabalhar as diversas situações que envolvem a convivência humana por meio

da literatura ativa a imaginação e a fantasia do leitor, além disso, é uma forma

de proporcionar identificação ou estranhamento do leitor com as experiências

vivenciadas pelas personagens, vindo a se questionar, sem contar da catarse

que a obra pode proporcionar. Dentro do contexto acima descrito, acreditamos

que esse trabalho poderá despertar nos alunos o gosto pela leitura de contos,

já que as temáticas estão muito próximas de suas vivências.

Por meio das estratégias do Método Recepcional planeja-se discutir e

analisar as inquietações pertinentes ao educando que estão fundamentadas

nos textos e na experiência pessoal de cada leitor para ampliar seu horizonte

de expectativas, pois se sabe que a leitura produz nele à aquisição de cultura

e, consequentemente, também o educa.

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Assim, esta unidade de trabalho está estruturada com base em

aspectos teóricos sobre o texto literário e o fazer literário da obra do autor

selecionado, que implementam a proposta de atividades segundo o método

recepcional embasado na teoria da Estética da Recepção.

Espera-se que o material possa contribuir para o ensino da literatura e

propiciar ao professor novas possibilidades de promover a leitura em sala de

aula além de proporcionar ao educando, maior contado com textos da alta

literatura.

3. Método Recepcional

Maria da Glória Bordini e Vera Teixeira de Aguiar, tendo como

pressuposto teórico as teorias da Estética da Recepção, de Hans Robert

Jauss, e a do Efeito, de Wolfgang Iser, elaboraram um método de abordagem

textual voltado para o ensino da literatura: o Método Recepcional. O método é

fundamentado na reflexão sobre o fenômeno literário não mais sob a ótica do

autor, mas do leitor como elemento atuante do processo de leitura.

Somado a isso, o método chama a atenção, pois não limita o leitor a

leituras pré- determinadas pelo professor ou pelo sistema, que não refletem

suas reais expectativas e interesses. Tampouco os textos servem de pretexto

para outras atividades pedagógicas, como, por exemplo, ensinar gramática de

forma descontextualizada. Além disso, se o leitor não lê o que gosta e não tem

liberdade de expressar o que sente, acredita ou pensa, fica relegada a segundo

plano a tarefa de formar leitores e usuários competentes da língua. De acordo

com Bordini e Aguiar (1993, p.15), “o texto literário é plurissignificativo,

permitindo leituras diversas justamente por seus aspectos em aberto”. Dessa

maneira, possibilita que, motivado a debater, analisar, criticar, comparar e

expor suas ideias, seja um sujeito ativo no processo de leitura interagindo com

a obra e com o autor num movimento de co-autoria do texto.

O Método Recepcional, elaborado por Bordini e Aguiar (1993),

desenvolve-se por meio das seguintes etapas: 1ª Determinação do horizonte

de expectativas; 2ª Atendimento do horizonte de expectativas; 3ª Ruptura do

horizonte de expectativas; 4ª Questionamento do horizonte de expectativas; 5ª

Ampliação do horizonte de expectativas.

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O método parte do horizonte de expectativas do público em relação

aos interesses literários determinados por suas vivências anteriores. Num

primeiro momento, o professor satisfaz a esses interesses para, em seguida,

introduzir situações que provoquem o questionamento e consequente ruptura

desse horizonte, exigindo cada vez mais do aluno um aprimoramento de leitura

visando a ampliação de seu horizonte de expectativas . Dessa forma, o aluno

torna-se um agente de aprendizagem, responsável pela continuidade do

processo, num constante alargamento cultural e social.

A aplicabilidade dessas etapas deve ser respeitada, pois conduz a um

resultado que pode ser avaliado tanto pelo professor como pelo aluno. O

método evolui em espiral, sempre permitindo aos alunos uma postura mais

consciente com relação à literatura e à vida.

O escopo desta Unidade Didática coaduna-se com o objetivo geral

formulado anteriormente no projeto, a saber, Incentivar alunos de EJA a

participar efetivamente da transformação social a partir de leitura de textos

literários contemporâneos de Dalton Trevisan. Para viabilizar a intervenção

pedagógica na escola, formularam-se os objetivos específicos, também

constantes do projeto: Ler, analisar e interpretar contos por meio de leituras,

discussões e atividades escritas; adentrar o universo da arte de Dalton

Trevisan; conhecer a história e evolução do conto brasileiro; conhecer a

estrutura do gênero textual: conto tradicional/contemporâneo; analisar contos

daltonianos; ampliar os horizontes de conhecimento do aluno; e produzir

contos.

Assim, a unidade didática a seguir apresenta um exemplo de como

desenvolver o Método Recepcional utilizando contos contemporâneos do

escritor Dalton Trevisan para promover a leitura em sala de aula.

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4. Unidade Didática

Unidade Didática

Conto contemporâneo: a convivência

humana em contos de Dalton Trevisan PRÁTICA PASSO A PASSO

Conceitos sobre o “Ato de Ler”

A habilidade que se deve ter de leitura não é somente traduzir sílabas ou

palavras (signos lingüísticos), em sons, isoladamente (a decodificação), é muito

mais que isso, a boa leitura deve passar pelas seguintes etapas:

1º - Decodificar 2º - Compreender 3º - Interpretar 4º - Reter

Mas afinal, por que lemos?

“Dê-me uma meada de lã e eu teço um agasalho

Dê-me uma palavra e eu formulo uma frase

Dê-me uma frase e eu escrevo um texto

Dê-me um texto e eu componho um livro”

ALMEIDA, Inajá Martins de

v

Lemos porque temos a necessidade de

desvendar caracteres, letreiros, números, e isso

faz com que paremos para olhar, questionar,

buscar e decifrar o desconhecido. Antes mesmo

de ler a palavra, já lemos o universo que nos

permeia: um cartaz, uma imagem, um som, um

olhar, um gesto...

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São muitas as razões para a leitura. Cada leitor tem a sua maneira de

perceber e de atribuir significado ao que lê. Essa particularização da leitura é

que estimula, por meio de um processo artístico, emoções e vivências

diferentes no leitor permitindo-lhe o conhecimento de si mesmo; o

reconhecimento do outro, a descoberta do mundo

Contudo, para muitos, a leitura é um passatempo, para outros um

aprendizado incessante; ou apenas uma tarefa, muitas vezes imposta. Muito

embora transformar a leitura num dever, numa obrigação curricular, pode ser

impróprio, mas se pararmos para pensar que a leitura é muito mais do que uma

simples relação dos olhos com os livros, iremos perceber que é um espaço, um

lugar predileto, uma luz escolhida, um ritual em que importa até a época do ano

Há, também, quem diga que a leitura é essencial, embora, não mata a fome ou

a leitura torna o homem completo, a conversação torna-o ágil e o escrever dá-

lhe precisão. O que podemos entender é que somente através da leitura

podemos desvendar o deslindável – o conhecimento. Por meio dele, temos

segurança para dialogar e até para expressar idéias, opiniões, interagir na

sociedade, além de nos expressar através da escrita.

Para que lemos?

O que lemos?

Lemos para nos comunicar; para resolver uma

questão proposta por nós ou por alguém; para

nos aperfeiçoar; para nos informar; para adquirir

mais conhecimento; para saciar nossa sede do

saber; para recreação, quem sabe: cada um sabe

para que lê. Leonardo Boff nos diz que cada um

lê com os olhos que tem.

No dicionário pode-se ler a seguinte definição de leitura: “Leitura. S.F.1.ato ou efeito de ler. 2. Arte

ou hábito de ler.3.aquilo que se lê. 4. O que se lê, considerado em conjunto. 5. Arte de decifrar e fixar um texto de um autor, segundo determinado

critério... ”( Aurélio,1988: 390 ).

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4.1 DESENVOLVIMENTO DO MÉTODO RECEPCIONAL

A determinação do horizonte de expectativas contempla a possibilidade

de observar os valores que estão presentes no pensar dos educandos, como

crenças, modismos, estilos de vida. Quais são suas perspectivas com relação a

trabalho e lazer. Qual é a postura deles diante de preconceitos de ordem moral

ou social, além de investigar as preferências de leituras, gênero e outros. Esta

atividade ocorre identificando obras anteriormente lidas pelos educandos e

observando-os na participação de debates, discussões, respostas, entrevistas,

questionários e dramatizações.

Objetivos: Apresentar o projeto para os alunos; extrair do educando

informações que mostram sua realidade sociocultural; sondar possibilidade de

estudo sobre o tema convivência humana.

Estratégias

O professor, nesse momento, poderá levantar questionamentos sobre o

que os educandos entendem como “Convivência humana”. Explicar aos alunos

que em todos os setores da vida encontramos problemas de convivência

humana, quer seja na família, na escola, no trabalho, no relacionamento afetivo

ou até mesmo no lazer. Onde há duas pessoas, há problemas de relações

humanas. Para vivermos em grupos são estabelecidas regras de organização

social. Há vínculos que unem as relações entre os indivíduos e é preciso saber

diferenciar e respeitar os papéis que cada um exerce no decorrer dos

relacionamentos principalmente quando o objetivo é o bem do outro. É preciso

aprender a ouvir, aprender a expressar pensamentos e sentimentos, perceber

os limites do outro e respeitar as diferenças a fim de melhorar a convivência.

As participações deles devem ser listadas no quadro para que

visualizem seus pensamentos. Conceituar o tema contribui para que haja

provocações no vocabulário, levando-os a ampliar as interpretações. As

questões são um começo desse primeiro contato com o tema.

1ª ETAPA - DETERMINAÇÃO DO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS

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Atividades

Apresentar questionamentos para o grupo e desenvolver por meio das

participações, conceitos, interpretações sobre o que eles conseguem construir

mediante a prática de leitura deles.

Questionamentos:

Você gosta de ler?

Você lê com frequência?

Que tipo de leitura está presente em seu cotidiano?

Que gênero literário mais o agrada? (romance, conto, crônica, fábula,

poema, lenda, canção, entre outros)

Que categoria de texto mais o atrai? (humor, terror, aventura, ficção

científica, drama, romance, comédia, entre outros)

É possível compreender a vida por meio dos textos que lemos?

Você considera a leitura importante?

Você sabe identificar a estrutura composicional de um texto? (poema,

carta, conto, notícia, crônica, fábula, etc.)

Você já leu contos?

Você conhece contos de escritores contemporâneos?

Explorando outras possibilidades

Conceituando - CONVIVÊNCIA

con-vi-vên-cia - s. f. Ato ou efeito de conviver. Trato diário; familiaridade, intimidade.

Familiaridade. Relações íntimas. (http://www.dicio.com.br/convivencia/ )

Convivência Pacífica

A paz não é um estado primitivo paradisíaco, nem uma forma de

convivência regulada pelo acordo. A paz é algo que não conhecemos, que

apenas buscamos e imaginamos. A paz é um ideal. (Hermann Hesse)

Convivência marital

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Convívio marital é um termo em desuso, mas significa o mesmo que

sociedade ou vínculo conjugal (termos utilizados pelo Código Civil).

Convivência familiar e comunitária

Por convivência familiar e comunitária, entende-se a possibilidade da

criança permanecer no meio a que pertence. De preferência junto à sua família,

ou seja, seus pais e/ou outros familiares. Ou, caso isso não seja possível, em

outra família que a possa acolher. Assim, para os casos em que há

necessidade das crianças serem afastadas provisoriamente de seu meio,

qualquer que seja a forma de acolhimento possível, deve ser priorizada a

reintegração ou reinserção familiar – mesmo que este acolhimento tenha que

ser institucional. (RIZZINI, Irene et al 2006, p. 22)

Propondo leitura

Ao apresentar o texto para o grupo o professor já tem um primeiro

parecer deles sobre o assunto. Neste momento pode ser feito dinâmicas para a

leitura: em grupos, em voz alta, silenciosamente e até mesmo declamando .

Prado, Adélia - Poesia Reunida. Ed. Siciliano, São Paulo, 1991. p.252. Também

disponível no site<http://pensador.uol.com.br/frase/NTU5NDI5/ >

Casamento

Há mulheres que dizem:

Meu marido, se quiser pescar, pesque,

mas que limpe os peixes.

Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,

ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.

É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,

de vez em quando os cotovelos se esbarram,

ele fala coisas como "este foi difícil"

"prateou no ar dando rabanadas"

e faz o gesto com a mão.

O silêncio de quando nos vimos a primeira vez

atravessa a cozinha como um rio profundo.

Por fim, os peixes na travessa,

vamos dormir.

Coisas prateadas espocam:

somos noivo e noiva.

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Questionamentos

O que significa convivência para você?

Com quem você mora?

Qual a maior prioridade para sua família?

Você acredita na paz entre as pessoas?

Em sua opinião, quais os problemas que mais interferem nas

relações humanas?

Você se relaciona bem com as pessoas?

Que tipo de convivência está presente no texto apresentado?

Como são realizadas as uniões nos dias atuais?

Seus pais se casaram? Moram juntos?

Em sua opinião, qual é o segredo para um casamento feliz?

É comum nos dias de hoje um relacionamento como sugere o texto?

O atendimento do horizonte de expectativas é a etapa em que o professor

pode apresentar o tema utilizando-se de outros tipos de textos que podem

variar desde um poema, uma letra de música, e não necessariamente, o conto

como é a proposta do projeto. Por isso, ao selecionar o material literário, dê

preferência aos textos que abordem temas ou composições procurados por

eles, na própria literatura ou em outros meios de expressão, seja televisão,

quadrinhos, folclore, espetáculos, filmes, entre outros.

Objetivo

Despertar no educando a curiosidade pela leitura e análise sobre o tema

proposto por meio do gênero canção.

Estratégia

Distribuir a letra da música “Garota Nacional”. Proceder à leitura e

deixar que eles percebam do que se trata a letra e se reconhecem a melodia.

Ver o clipe ou ouvir a música em CD. É necessário tornar o momento

descontraído para eles, embora, atentos aos objetivos a que se espera atingir,

ou seja, estamos atendendo ao horizonte de expectativas. Proporcionar

2ª ETAPA – ATENDIMENTO AO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS

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questionamentos orais. Usar o mesmo procedimento para a outra música:

“João de Barro”. Em seguida, propor questionamentos por escrito. Por fim,

dividir a sala em grupos e propor desafio de criar paródia utilizando o texto de

uma das músicas.

Atividades

Propor questionamentos para a turma após a metodologia sugerida

acima. Nesta etapa a turma terá a oportunidade de perceber a presença do

tema proposto em outros gêneros textuais, neste caso duas letras de músicas

de gêneros distintos e compostas em épocas diferentes. Isso dá ao educando

uma ampliação de seus conceitos e leituras já realizadas.

1- Garota Nacional – Skank

Compositor: Samuel Rosa e Chico Amaral

Extraída do Álbum Multishow Ao Vivo - Skank no Mineirão. Gravadora: Sony Music ,( 2010)

Aqui!

Nesse mundinho fechado

Ela é incrível

Com seu vestidinho preto

Indefectível

Eu detesto o jeito dela

Mas pensando bem

Ela fecha com meus sonhos

Como ninguém... (...)

A letra, na íntegra, está disponível no link <http://skank.musicas.mus.br/letras/ >

Acesso em 22/ nov/ 2012.

2-João de Barro-Sérgio Reis

João de Barro (1907-2006) Compositor brasileiro- conhecido por Braguinha

O João de Barro pra ser feliz como eu

Certo dia resolveu

Arranjar uma companheira (...)

Extraída do Álbum MAXXIMUM: Sérgio Reis (2005) Sony/ BMG

O texto completo está disponível no link < http://letras.mus.br/sergio-reis/103199/>

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Questionamentos

1- Quanto ao estilo (gênero) musical como podemos classificar cada

uma das músicas? (clássico, MPB, sertanejo, rock, pop rock, gospel,

eletrônica, regional, axé, entre outros).

2- Faça uma comparação entre as duas músicas, observando o ritmo, a

composição das estrofes, versos, etc.

3- Qual a temática abordada em cada uma das músicas?

4- Como a mulher é retratada na primeira música? E na segunda?

5- Analisando a primeira estrofe de “Garota Nacional” pelo viés da

convivência humana, como podemos explicar esses versos?

6- Como foi o desfecho do romance do narrador da música: “João de

Barro”. Em sua opinião, ele agiu corretamente?

7- Na música “Garota Nacional”, explique os versos: “eu quero te

provar/ sem medo sem amor”.

8- Há presença de duas classes sociais nos textos. Comente-as.

9- Em que época e contexto as músicas foram compostas?

Explorando outras possibilidades

Produzir uma paródia utilizando a melodia de uma das músicas sobre a

temática: Convivência Humana.

A etapa da ruptura do horizonte consiste em introduzir textos para

leitura que “quebrem” as certezas e os costumes dos leitores, que saiam do

lugar comum, seja na literatura ou na vivência cultural. Isso deve ser feito com

textos que se assemelham aos anteriores apenas em um aspecto: tema,

tratamento, estrutura ou linguagem. No caso, escolhemos o tema. O aluno

deve perceber que está ingressando num campo desconhecido, mas não a

ponto de rejeitar a nova experiência.

3ª ETAPA - RUPTURA DO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS

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Objetivo

Introduzir contos de Dalton Trevisan em que a temática se assemelha

aos textos apresentados nas etapas anteriores.

Metodologia

Nessa fase o professor deverá promover o rompimento nas certezas e

nos costumes dos alunos por meio de contos, previamente selecionados, em

que a leitura dos mesmos possa estimular a participação mais profunda no

tema em questão. Perceber que a estrutura do conto promove esse

aprofundamento do tema.

Atividades

Para cada conto elaborou-se questões de análise estrutural e

interpretativa. A turma será dividida de acordo com o número de contos

selecionados nesta etapa. Inicialmente, todos os grupos receberão os contos, e

realizarão as atividades de leitura, discussão e análise. Esse processo deve

seguir do primeiro ao ultimo texto. Dessa forma todos receberão o material e

participarão das atividades elaboradas. Na sequência, o professor faz um

sorteio de qual conto cada grupo repassará as respostas discutidas e

analisadas por eles, à turma, que poderá concordar ou não com as

possibilidades de respostas. O professor deverá mediar esse momento.

Mas, antes disso...

Conheça a diferença entre texto literário e não literário

Você já se perguntou o que é um texto literário? Como se lê um

texto literário? O texto literário distingue-se do não literário (técnico, científico,

didático, jornalístico) porque ele é ficcional, isto é, representa um universo

imaginário e não a realidade como ela é. Além disso, a linguagem utilizada tem

todas as licenças para ser subjetiva, criativa, original, conotativa (ter sentidos

não literais) e plurissignificativa (ter vários sentidos possíveis).

Em decorrência disso, a leitura do texto literário difere da leitura do

texto jornalístico ou didático, por exemplo. Enquanto no texto jornalístico o leitor

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procura informação e no didático apropriar-se de conhecimento, no texto

literário, o leitor busca prazer estético, entretenimento, emoções. Por meio da

leitura literária desenvolve-se a sensibilidade, a imaginação, a criatividade,

aspectos estes normalmente não tratados nos textos mais objetivos.

Muitos escritores transformam por meio da arte literária os fatos do

cotidiano em contos, retratando a problemática sociocultural de seu povo.

Dentre eles, o escritor paranaense Dalton Trevisan usa destes recursos

explorando os subúrbios curitibanos como cenário para as personagens de

suas histórias.

Em nosso cotidiano interagimos com outras pessoas por meio da

linguagem, seja esta oral ou escrita. Segundo Marcuschi (2003, p.22) “(...) a

comunicação verbal só é possível por meio de algum gênero textual.” São eles

que estabelecem a forma de organizar a produção verbal adequada a cada

contexto.

Dependendo da situação de comunicação e da finalidade específica

de interação, utilizamos determinada produção verbal levando em

consideração alguns parâmetros que nos permitem classificá-la. Os principais

aspectos são: o tema ( aquilo de que se fala), a estruturação textual (o formato

do texto) e a seleção de elementos linguísticos para obter os efeitos desejados.

Sobretudo importantes os fatores do contexto de produção (quem se dirige a

quem, quando, onde e com que objetivo).

De acordo com Bakhtin (1992), o gênero se define como “tipos

relativamente estáveis de enunciados” elaborados pelas diferentes esferas de

comunicação, como: jornalística, literária, televisiva, digital, jurídica, midiática,

cotidiana, escolar, dentre outras. Assim, na esfera televisiva, por exemplo, são

comuns gêneros como telejornal, novela, entrevista, documentário, etc. Na

esfera digital há os gêneros e-mail, bate- papo virtual, chat, blog, e na esfera

literária são comuns gêneros como romance, conto, crônica, lenda, poema,

fábula, história em quadrinhos, entre outros.

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Nesta unidade vamos ampliar os conhecimentos sobre o gênero

CONTO e CONTO CONTEMPORÂNEO.

O CONTO é um gênero literário que acompanha a história de vida de

cada um e é um instrumento muito rico de trabalho em sala de aula. Suas

narrativas podem ser buscadas tanto na fantasia quanto nos fatos do nosso dia

a dia. Assim, ficção e realidade podem ser somadas para a produção de um

conto. Observe na tabela abaixo, informações de como se constitui um conto.

CONTO

Classificação Gênero textual/ literário

O que é

CONTO é uma narrativa breve, concisa, contendo um só conflito, uma só ação (com espaço geralmente limitado a um ambiente), unidade de tempo e número

restrito de personagens.

Quem produz /escreve Escritor contista, autor ficcionista

Propósito / finalidade

Apresentar uma narrativa de forma a captar a atenção estética e a emoção do leitor.

Onde circula

Ambientes escolares e residenciais, principalmente via

revistas literárias ou sites voltados para a produção/divulgação de literatura.

Quando

Em situações formais na escola; em horários de lazer.

Quem lê

Leitor, em geral; interessados em literatura; estudantes, etc.

Por que lê

Para divertir-se/refletir sobre o tema abordado; analisar/admirar a utilidade da linguagem e o enredo

de narrativas curtas.

Estrutura textual

- Apresenta um narrador, que pode participar da história (personagem) ou ser apenas um observador

(onisciente); - Apresenta personagens inseridos no espaço e no tempo;

- Apresenta um enredo, cuja estrutura se compõe de: apresentação, complicação, clímax e desfecho; - Possibilidades de classificação dos contos: conto de

fadas/infantil, conto maravilhoso ou fantástico; psicológico; policial; de suspense; de mistério; de terror; de amor; de ficção científica, entre outras

formas.

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Mecanismos linguísticos

- Linguagem expressiva, criativa, cuidada, culta,

ocorrendo também em que a linguagem é coloquial, para produzir a fala de um personagem (discurso direto em diálogos);

- A linguagem geralmente faz apelos à fantasia, ao jogo verbal, à invenção temática Pelo fato de mais sugerir do que dizer explicitamente, a linguagem é

conotativa, plurissignificativa; - Texto narrado: os tempos verbais utilizados geralmente são o pretérito perfeito e o imperfeito.

*Tabela adaptada do livro Práticas de Linguagem: gêneros discursivos e interação p. 143

as, afinal, qual é a diferença entre CONTO E CONTO CONTEMPORÂNEO?

O CONTO, como já sabemos, é uma narrativa de ficção curta, que

apresenta um só conflito e seu enredo possui uma estrutura composicional fixa

(apresentação, complicação, clímax e desfecho).

O conto contemporâneo, segundo Reis (1987) é reflexo de uma

narrativa que se foi construindo nas últimas décadas, substitui a estrutura

clássica pela construção de um texto curto, com o objetivo de conduzir o leitor

para além do dito, para a descoberta de um sentido do não-dito. A ação se

torna ainda mais reduzida. Surgem monólogos, destaca-se a exploração de um

tempo interior, psicológico e a linguagem pode, muitas vezes, chocar pela

rudeza, pela denúncia do que não se quer ver. Desaparece a construção

dramática tradicional que exigia um desenvolvimento, um clímax e um

desenlace. Em contrapartida, cobra a participação do leitor, para que os

aspectos constitutivos da narrativa possam ser por ele encontrados e

apreciados. Exige uma leitura que descortine não só o que é contado, mas,

principalmente, a forma como o fato é contado, a forma como o texto se realiza.

O perfil de pessoas que lêem contos são leitores que procuram nas

narrativas ficcionais um espaço para reflexão sobre a realidade, que

buscam os cenários criados pela imaginação alheia como modo de escapar da realidade estressante em que vivem?

M

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No século XIX as narrativas longas reinaram absolutas na preferência

dos leitores? No século XXI, em plena era da informação e em um mundo no qual a

imagem representa o apelo mais sedutor, o conto conquistou a preferência do leitor? Sua estrutura mais enxuta e sua capacidade de apresentar, desenvolver e solucionar um conflito em tempo

relativamente curto parece ser as principais razões do sucesso dos contos entre os leitores contemporâneos.

Algumas características do Conto Contemporâneo:

O conto contemporâneo interage com o leitor, fazendo-o ir além do que não

está escrito;

Concisão, brevidade, economia de palavras, profundidade, unidade de tempo e

ação, narração de um episódio (início, meio e fim), poucas personagens;

A história é apresentada em parágrafos, geralmente curtos, com uma dimensão

muito ampla;

O narrador passa a ter preocupações estéticas e criativas;

Poucas personagens intervêm na narrativa;

Cenário limitado, espaço restrito;

Diálogos sugestivos que permitem mostrar os conflitos entre as personagens;

A ação é reduzida ao essencial, há um só conflito;

A narrativa é objetiva. Por vezes, a descrição não aparece.

ONTOS

TEXTO 01

Dois velhinhos

Dois pobres inválidos, bem velhinhos, esquecidos numa cela de asilo.

C

Você também se encaixa no perfil de leitor contemporâneo??? Acesse www.dominiopublico.gov.br/ Neste site você

pode baixar livros. Outra opção é: http://recantodaspalavras.wordpress.com/conto

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Ao lado da janela, retorcendo os aleijões e esticando a cabeça, apenas

um podia olhar lá fora. Junto à porta, no fundo da cama, o outro espiava a parede úmida, o

crucifixo negro, as moscas no fio de luz. Com inveja, perguntava o que acontecia. Deslumbrado, anunciava o primeiro: — Um cachorro ergue a perninha no poste.

Mais tarde: — Uma menina de vestido branco pulando corda.

Ou ainda: — Agora é um enterro de luxo. Sem nada ver, o amigo remordia-se no seu canto. O mais velho acabou

morrendo, para alegria do segundo, instalado afinal debaixo da janela. Não dormiu, antegozando a manhã. Bem desconfiava que o outro não revelava

tudo. Cochilou um instante — era dia. Sentou-se na cama, com dores espichou o pescoço: entre os muros em ruína, ali no beco, um monte de lixo.

Texto extraído do livro "Mistérios de Curitiba", Editora Record - Rio de Janeiro,1979, pág. 110.

Imagem<http://www.google.com.br/janelas+abertas+dominio+publco.> acesso em

29/11/12

TEXTO 02

92

<http://www.dominiopublico.gov.br/> Acesso em 27/11/2012

“Tarde de verão, é levado ao jardim na cadeira de braços – sobre a palhinha dura a capa de plástico e, apesar do calor, manta xadrez no joelho. Cabeça

caída no peito, um fio de baba no queixo. Sozinho, regala-se com o trino da corruíra, um cacho dourado de giesta e, ao arrepio da brisa, as folhinhas do

chorão faiscando – verde verde! Primeira vez depois do insulto cerebral aquela ânsia de viver. De novo um homem, não barata leprosa com caspa na sobrancelha – e, a sombra das folhas na cabecinha trêmula, adormece. Gritos:

Recolha a roupa. Maria, feche a janela. Prendeu o Nero? Rebenta com fúria o temporal. Aos trancos, João ergue o rosto, a chuva escorre na boca torta.

Revira em agonia o olho vermelho – é uma coisa, que a família esquece na confusão de recolher a roupa, fechar as janelas?

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TREVISAN, Dalton. Ah é?.Rio de Janeiro: Record, 2 edição, 1996.

ATIVIDADES

1-Podemos classificar os textos 1 e 2 como contos contemporâneos. Por quê?

2-Considerando sua comunidade quais os serviços prestados a pessoa idosa

que você conhece? Se possível, faça uma entrevista com os responsáveis e

adicione fotos que possam comprovar o trabalho oferecido.

3- Os dois textos possuem a mesma temática? Quais as semelhanças e

diferenças entre as personagens principais dos contos 1 e 2?

4-Qual texto lhe causou mais impressão? Comente.

5-Você convive com pessoa idosa em sua família ou outra situação?

Em relação à estrutura composicional, como os dois contos foram organizados? Preencha o quadro abaixo, ele sintetiza o que já aprendemos

sobre a estrutura da narrativa.

Categorias narrativas Conto 1 Conto 2 Título

Narrador ( ) participa da história

( )conta os fatos sem participar da história

( ) participa da história

( )conta os fatos sem participar da história

Personagens

Tempo

Espaço

Presença de Discurso ( )direto ( ) indireto( )indireto livre

( ) direto ( ) indireto ( ) indireto livre

Enredo

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TEXTO 03

Me responda, Sargento

Dez anos, sargento, apartada do João. Uma tarde, sem se despedir, montou no cavalinho pampa. Em dez anos de espera nunca deu notícia. Com a

morte do meu velho, que me deixou o sítio, quinze dias atrás lá estava eu, bem quieta, cuidando da casa e da criação, ajudada pelo meu afilhado José, esse

anjo de oito aninhos. Quem vai entrando sem bater palma nem pedir licença? Maltrapilho, chapéu na mão para fazer vida comigo. Mais de espanto que de saudade aceitei, bom ou mau, eu disse, é o meu João.

Nos primeiros dias foi bonzinho. Quem não gosta de uma cabeça de homem no travesseiro? Logo começou a beber não me valia em nada no sítio. Eu saía bem cedo com o menino a lidar na roça, o bichão ficava dormindo.

Bocejando de chinelos e desfrutando regalias. Não quer castigar o corpinho, não joga um punhado de milho para as galinhas. Só então, sargento, burra de mim, descobriu o mistério. Ele voltou por amor da herança. Na primeira

semana vendeu o leitão mais gordo do chiqueiro, não me deu satisfação. O sargento viu algum dinheiro? Nem eu.

Ontem, chegou bêbado e de óculo escuro. Espantou o menino para

o terreiro e, fechados no quarto, bradou que eu tinha um amante, o meu afilhado bem que era filho. Antes de contar três, eu disse o nome do pai. Mais

que, de joelhos e mão posta, negasse o outro homem, por mim o testemunho dos vizinhos, ele me cobriu de palavrão, murro, pontapé. Pegou da espingarda, me bateu com a coronha na cabeça. Obrigou a rezar na hora da morte e pedir

louvado. Que eu abrisse a boca encostou o cano, fez que apertava o gatilho. Não satisfeito, sacou da garrucha, apagou o lampião a bala. Disparou dois tiros

na minha, só não acertou porque me desviei. Uma bala se enterrou na porta, a outra furou a cortina, em três pedaços a cabeça do São Jorge.

Cansado de reinar deitou-se vestido e de sapato. Que a escrava servisse a janta na cama. Provou uma garfada e atirou o prato, manchando de

feijão toda a parede: Quero outra, esta não prestou . Deus me acudiu, ao voltar com a bandeja ele roncava espumando pelo dente de ouro. Agarrei meu filho,

chorando e rezando corri a noite inteira. Ficasse lá no sítio era dona morta. E agora, sargento, que vai ser da minha vida? Que é que eu faço?

Dalton Trevisan. In: O pássaro de cinco asas. Rio de Janeiro, Record, 1974

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Atividades

1-Quem são as personagens do conto “Me responda, sargento”?

2-É possível saber onde os fatos acontecem? Comprove com trechos do texto. 3-Como se dá o tempo na narrativa? Fale sobre seu caráter (cronológico /

psicológico).

4-O humor cáustico é uma característica da escrita de Dalton Trevisan. Retire do texto

um excerto no qual tal humor está presente.

5-Coloque-se no lugar do personagem sargento e observe todas as questões

que são feitas a ele no decorrer do texto, analise-as e responda a pergunta que

lhe é feita pelo narrador-personagem no final do texto.

6-É possível perceber a classe socioeconômica das personagens no decorrer da leitura. Comprove-a com trechos do texto.

7-Em muitos de seus contos, ao confrontar suas personagens, Dalton os

coloca em rígida oposição, estabelecendo entre eles uma relação quase

sempre de desamparo e crueldade. No conto que você acabou de ler, quem é

o agente cruel e o paciente em desamparo? Justifique.

TEXTO 04

GIGI

Não dê dinheiro ao Gigi. É um pedido de mãe aflita!— cada vez que Gigi

foge de casa o anúncio no jornal, ao lado do retrato 3x4 na farda de

soldadinho. Com o dinheiro, ele bebe e faz doidice. Dona Maria quer morrer

antes que enterrem o filho no asilo.

Gigi é manso, louco só nos olhos: sabem de coisas que a mãe não

suspeita. Dona Maria penteia-lhe o remoinho e põe-no à janela, vidraça

descida. Às vezes tem permissão de ficar na porta e, ao se ver só, pede

cigarrinho às pessoas. Depois quer fogo e, quando o outro risca o fósforo, ele

sopra. O outro acende o segundo fósforo, segura-o na concha das mãos. Sem

tirar o cigarro da boca, Gigi sopra o fósforo. Sopra-os todos, até que a pessoa

fuja de medo — e fuma o cigarro apagado.

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Mora na janela, atrás da vidraça, onde caça mosca. Guloso pelas

varejeiras, as mais gordas, azuis e verdes, com brilho de ouro; de uma arranca

as asas e escondida na mão, ouve deslumbrado o bzzz — nem pode brincar

com ela tão depressa que morre.

Embora dócil, resiste a cortar unha ou cabelo. Tanto crescem as unhas,

esgueira-se de sapato na mão, gato com seu pedaço de carne. É chamado o

enfermeiro que lhe amarra as mãos na cadeira. Depois apara as unhas,

barbeia, rapa a cabeça. Xinga-o de Louquinho, sem que ele se ofenda.

Dona Maria traz seu prato. Ele espalha a comida no chão, logo fervilha

de formiga preta. Estala formiguinha na unha — nem sai sangue.

Noite de lua aos berros na janela do sótão. É a serenata para a mulher do

vizinho. Ela pegou na mão de Gigi:

— Tadinho do meu bem!

Tanto bastou que a adorasse. O quarto de Gigi dá para o quintal do

vizinho. A mulher surge à porta, ele fica imediatamente nu, atrás da vidraça,

ronco feio na garganta. A moça não sai do lugar. Eis o marido que o ameaça

de revólver:

— Esse tarado eu arrebento! Só não avisa a polícia: Dona Maria sofre

do coração, morta a um grito do filho. O socorro da velha é o Bitu.

— Leve o Gigi passear. Os dois ganham pão-de-ló.

O menino gosta de Gigi e bate palminha de alegria — um doido só para

ele. Faz que Gigi peça dinheiro na rua. Bitu compra sorvete e não dá a Gigi. No

fim do sorvete, Gigi lambe os pingos na mão do menino.

Apostam corrida de besouro. Bitu prende-lhes um fio na carapaça e

enfia uma farpa no rabo. Gigi perde sempre — o menino quebra uma patinha

do corredor rival. Guardados na caixa de sapatos, por mais que lhes dê água e

pão-de-ló, morrem de tristeza.

A vizinha segurou-lhe a mão e ele, que era manso, começou a ter

ataque. Sobe ao quarto do sótão e, enquanto ela não aparece, engole a mosca

zumbindo na vidraça.

O relógio do louco é a inveja de Bitu, posto nem um dos dois saiba as

horas. Gigi aperta o relógio na orelha e ouve, um fio de baba no canto da boca:

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é doce como estalar formiguinha. O menino segredou-lhe — a mulher do

vizinho perdida de paixão. Gigi lhe desse o relógio, levá-lo-ia ao quarto dela.

Antes Bitu foi ver o que Dona Maria estava fazendo: partia ervilha na

cozinha. O menino guiou o doidinho ao portão da outra casa.

— Entre, Gigi. Não tenha medo. A moça quer um beijo!

Gigi trazia a caixa de papelão com cinco besouros mortos — o presente

de noivado.

Não avançou o piá além do portão. A observar a janela do sótão, a moça

penteava os longos cabelos dourados. O marido azeitava o revólver no quarto.

Dona Maria debulhando a vagem, ó tarde tão quieta, escutava uma

ervilha cair no chão.

Gigi seguia pelo corredor na ponta do pé, a unha crescida. O coração do

menino, à sombra do muro, batia mais alto que o relógio na mão fechada.

TREVISAN, Dalton. In: Quem tem Medo de Vampiro?. São Paulo: Ática, 2004, p.31-33

ATIVIDADES

1. Faça a análise das categorias narrativas (narrador, personagem, tempo e espaço) no conto.

2. Comente o enredo do conto, quanto a sua linearidade ou não

linearidade. 3. A crueldade cotidiana compõe a realidade da narrativa de Trevisan. O

lúdico e o irônico mascaram as asperezas. Aponte no texto, passagens em que podemos observar esses elementos.

4. Uma das técnicas utilizadas por Dalton para tornar sua escrita

concisa, direta, precisa e enxuta é a elipse. Retire do conto fragmentos que a exemplifiquem.

5. Explique com suas palavras a última imagem que a narrativa apresenta.

6- Aponte marcas na narrativa que evidenciam o esti lo do autor.

TEXTO – 5

UM TÚMULO PARA CHORAR

Ela começou a depilar a perna, usar batom, pintar o olho – foi a prova

da traição. Se antes já desconfiava, daí não teve dúvida. Era bonita para mim,

como eu a conheci. Por que se embonecar? Não precisava que ninguém

olhasse para ela.

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A mulher que casa não pode ficar se pintando para os outros. Ela

raspava a perna mais branca e eu não gostava. Para quem iria se mostrar se

não para mim? Preferia como era quando a gente se conheceu.

Assim que se empregou de secretária já não me obedecia. Me

chamava de simples carpinteiro e prometia me deixar. Isso não está certo.

Casou comigo e só a morte pode nos apartar. Três anos vivemos felizes. Eu

trabalhando e nada deixando faltar em casa. Menino de calça curta saí pelo

mundo, ganhei sempre o meu sustento. De boa paz, só fico nervoso quando

provocado.

Até o maldito emprego de secretária, ela vivia para a casa e a família.

Começou a chegar tarde, era a desculpa do dentista, da costureira, da sortista.

Cada vez mais faceira, só me respondia com desprezo. Andava na companhia

de outros, deixada de carro ali na esquina – se eu falava, dizia que era serviço

da firma.

Voltando do trabalho, não tinha a janta na mesa. Ela me provocava,

ia morar com um bonitão e largaria as crianças com a vizinha. Me chamava de

caipira. Moça nova, queria aproveitar a vida. Com outro mais rico iria embora.

Antes era feliz na pequena casa de quarto, cozinha e banheiro. Eu

que fiz com estas minhas mãos. Agora não bastava: um senhor de óculo

oferecia apartamento se me abandonasse e fosse com ele.

Só queria saber de se pintar e se enfeitar. Com nojo de meus

dentes no copo, ela dormia na comadre Chiquinha. Soberba, mandava que eu

saísse de casa e aprontava a minha trouxa. Como eu podia,não eram quatro

bocas em volta da mesa?

Sempre fui louco pela Maria. Antes de ser secretária, era uma

santa. Passou a ganhar mais que eu e tudo mudou. Ela saía e deixava

chorando e trancados em casa os dois anjinhos. Cada dia usava uma saia mais

curta ou mais aberta no lado. Boquinha pintada e cílio postiço fiz que lavasse a

cara.

O patrão lhe daria um bangalô azul, eu não achava uma boa

proposta? Isso foi o fim para mim. Tiro sangue das mãos e um gordo com

dinheiro compra a minha mulher. Então me decidi. Se não for minha, de mais

ninguém.

Sem respeitar a menina de três aninhos e o garoto de sete meses,

queria sair de minissaia. Gostava de caipirinha e chegava cheirando a bebida

Aprendeu a fumar e soprou a fumaça na minha cara. Eu perdoava na

esperança que ela mudasse.

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Aquela noite havia pousado com os piás na vizinha. De manhã

entrou em casa, eu todo encolhido no sofá.

- Seu vagabundo. Por que não foi trabalhar?

E me atirou no rosto uma caneca d’água.

- É meu esse sofá. Eu que comprei e paguei.

Saí do sofá e fui para a cama. Ela sempre a me perseguir. Tentei

explicar que era sábado. Puxou a coberta e me empurrou da cama. Que eu

fosse embora – e enfiando na sacola amarela a minha roupa. Já não me queria

dentro de casa. Se eu ficasse, era um guapeca lazarento.

- É isso mesmo. Estou cheia de você. Já não te disse?

Eu dava tudo para ela e perguntei o que mais queria.

- Sabe de uma coisa? Tenho mesmo outro homem. Gosto dele e

você faz o quê? Não posso mais te ver

Sem ela, o meu único amor, que seria de mim?

- Cansei de viver com um grande manso. Pegue a tua sacola.

Suma-se daqui. Vá até o cemitério...

- Não fale assim, amor.

. -...e procure um túmulo para chorar. Já morri para você.

- Cuidado Maria.

Um arrocho de goela e, alcançando na mesa a chave de fenda,

arrastei-a para o banheiro. Tapei a boca e golpeei até cansar o braço. Ela ficou

no chão toda ensanguentada – a vida se foi com a água suja pelo ralo da pia.

Chorando, peguei os meninos pela mão. Sentadinhos na cama,

a tudo assistiam bem quietos..

- Não foi nada, meus filhos. A mãe já volta.

Bati na porta ao lado e os entreguei a dona Chiquinha.

- Matei a bandida. Era bonita e infiel. Agora a minha vez.

Mais tarde me acharam caído numa valeta. Bêbado e babando

na garrafa vazia de cachaça. Com os dois retratos no peito. Um da Maria, na

saia bem curtinha. Outro dos piás, que ela chamava de porquinhos.

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Dalton Trevisan. In: Quem tem medo de vampiro? Editora Ática. São Paulo, 2004, p.91 a

94.

Atividades

1-Provocação e reação são manifestações que compõem o círculo de aberrações elencados por Trevisan em muitas de suas obras. No texto, o

assassinato surge como resposta à provocação da esposa. Em que exato momento na narrativa se dá essa reação? Justifique com passagem do texto.

2-Maria conquistou a sua liberdade individual com trabalho fora de casa. A partir daí começou a desprezar o marido. Segundo o narrador, esse marido

agia “pacientemente” e dava oportunidades para que Maria desistisse da mudança de vida. Você concorda? Comente. Conhece algum caso parecido? Como o marido reagiu?

3-Um de seus recursos para economizar palavras é o uso de Elipses;

Economiza também adjetivos e advérbios, dando mais importância ao fato

narrado (as ações) do que a nomes ou características das personagens.

Retire de um dos textos de Dalton passagens que comprovem esse recurso.

1-Nos contos de Dalton geralmente há situações e personagens que se repetem. Em

vários textos, por exemplo, os conflitos familiares e amorosos são representados,

simplesmente, por Joões e Marias. Com que finalidade o autor repete esses nomes?

3- Fazendo uma comparação com outros textos que já foram trabalhados, a partir do

ponto de vista da traição, em sua opinião, quem agiu com mais serenidade diante da

traição amorosa: o narrador do conto “Um Túmulo para Chorar”, o narrador da canção

“João de Barro” ou o próprio João de barro?

4-O perfil de esposa que vimos no poema “Casamento” de Adélia Prado comparado

ao perfil de esposa do conto “Um Túmulo para Chorar” de D. Trevisan são bem

diferentes. Qual se aproxima mais do perfil que você considera ideal? Por quê?

5-Uma marca inconfundível de seu estilo é o laconismo da linguagem, ou seja, a

ausência de explicação ou interpretação para as cenas que registra, sempre presente

em todas as suas obras. Seus contos são construídos a partir de cena breve, direta,

concisa. Comprove com passagens dos contos trabalhados.

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6-O principal traço da originalidade desse autor é o modo realista e impiedoso com

que trata assuntos sobre a condição humana. Você percebeu isso em algum texto?

Comente.

7-Que lição de vida podemos tirar dessas leituras?

Nessa fase os educandos fazem um autoexame. Posicionam-se,

analisando quais textos oferecidos nas etapas anteriores exigiram maior

reflexão e promoveram maior satisfação. Em seguida, fazem um debate sobre

os seus próprios comportamentos em relação aos textos lidos. O professor

deve promover reflexões se os conhecimentos escolares/ou vivências pessoais

os auxiliaram para maior compreensão dos textos apresentados até aqui.

Objetivo

Promover reflexões sobre os conhecimentos ou vivências pessoais que

os textos provocaram e verificar se as experiências de leitura os auxiliou para

uma maior compreensão da temática – Convivência Humana.

Estratégias

Formar grupos e eleger um redator para registrar as considerações do

grupo. As atividades devem abordar o resultado do que foi apreendido por cada

um durante a execução do método. Confrontar as linguagens artísticas dos

textos e verificar as possibilidades de análise de cada texto explorado.

Atividades

O professor deve considerar todas as leituras propostas desde o início

da unidade. Isso pode ser feito por meio dos questionamentos abaixo.

1- Qual texto lhe proporcionou maior satisfação? Por quê?

2- Considerando as leituras realizadas, quais desafios

foram encontrados? Houve superação?

4ª ETAPA - QUESTIONAMENTO DO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS

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3- Qual texto lhe causou mais alegria/ tristeza/ indignação/ revolta/

compaixão? Comente.

4- Qual dos textos trouxe maior complexidade de compreensão? Por quê?

5- A partir da temática “Convivência Humana” o que você conclui sobre os

assuntos abordados?

6- Levando em conta seu conhecimento de mundo e sua experiência de

vida, com qual dos textos você mais se identificou?

7- Com qual gênero textual você teve mais afinidade no decorrer dos

estudos?

Nesta etapa, sem mediação direta do professor é o momento de tomada

de consciência das mudanças e conquistas alcançadas por meio da

experiência com a literatura trabalhada. O aluno perceberá que a leitura

realizada nas etapas anteriores não foi somente uma tarefa escolar, mas a

maneira como ele participa do mundo. Isso leva-o a perceber se o horizonte

de expectativa inicial mais e o alcançado no final ajudou-o a aumentar seus

conhecimentos de mundo e de leitura.

Objetivo

Apresentar ao aluno novas possibilidades de ampliação do horizonte de

expectativas.

Estratégias

O professor deve trazer para a sala de aula textos que se relacionam

com o “tema” ou “estrutura” trabalhada anteriormente. No caso, trabalharemos

a mesma temática, só que em outro suporte e também produzirão um conto em

que apareça a solidariedade, a humanização. Assim, consciente das

possibilidades de leitura literária, busca novas expectativas estéticas e

ideológicas com composições mais complexas. E o método continua em outras

experiências de conteúdos.

5ª ETAPA - AMPLIAÇÃO DO HORIZONTE DE EXPECTATIVAS

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Atividade: Produzir conto a partir da temática trabalhada na unidade, só que

sob outro enfoque, não o conflituoso, degenerativo, mas o da humanização, da

solidariedade.

Outra Atividade: Literatura e cinema

O cinema é um campo que proporciona amplo diálogo com a literatura.

1-Assistir ao filme :

“ Gilbert Grape: Aprendiz de Sonhador"

Sinopse do Filme – Gilbert Grape: Aprendiz de Sonhador

O filme é de Lasse Hallstron . A história se passa numa cidadezinha do interior, onde vive

Gilbert Grape, um adolescente comum (John Depp) que sustenta a família desde a morte do

pai. A sua responsabilidade é grande: além de duas irmãs, do irmão deficiente mental

(Leonardo DiCaprio), tem uma mãe obesa, que não pára de comer desde a morte do marido.

Mas a chegada de uma jovem forasteira (Juliette Lewis) dará a Gilbert a possibilidade de pela

primeira vez fazer suas escolhas.

Outras possibilidades de filmes sobre o tema

QUERÔ – (criança, adolescente, pobreza, vínculos familiares e comunitários,

identidade, violência, drogas)

A CORRENTE DO BEM (solidariedade, vínculos sociais)

BILLY ELLIOT (Vínculos familiares)

BELLA ( valores familiares, gravidez, aborto)

À PROCURA DA FELICIDADE (família, guarda dos filhos, fragilidade

financeira, resiliência)

UMA LIÇÃO DE AMOR (família, guarda dos filhos, saúde mental,

potencialidade)

ONDE VIVEM OS MONSTROS (Conceitos de família, identidade)

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7. AVALIAÇÃO

A avaliação será contínua e realizada por meio de observações da

participação, interesse e envolvimento dos alunos ao longo do projeto. Outro

critério de avaliação será que os alunos escrevam um conto em que apareça a

solidariedade, a humanização.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGUIAR, Vera Teixeira de; BORDINI, Maria da Glória. Literatura: a formação

do leitor, alternativas metodológicas. 2 ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1993.

Disponível em <http://craspsicologia.wordpress.potencialidadesresiliencia/> Acesso em 18/11/2012

Disponível em <http://recantodaspalavras.wordpress.com/conto> Acesso em 28/11/2012

Disponível em <http://www.e-biografias.net/dalton_trevisan/> Acesso em 23/11/2012

FONTANA. Maria Niura. Org. Práticas de Linguagem: gêneros discursivos e

interação. Educs.p.143

BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

COSTA-HÜBES, Teresinha da Conceição (org.) Sequência didática: uma

proposta para o ensino da língua portuguesa no ensino fundamental. Cascavel:

Assoeste, 2009.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros Textuais : definição e funcionalidade. In

:DIONÍSIO, A. P. ; MACHADO, A. R. ; BEZERRA, Maria A. (org.). Gêneros

Textuais e Ensino. 2 ed. Rio de Janeiro. Lucerna, 2003.

PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares de

Língua Portuguesa do Estado do Paraná. Curitiba: SEED, 2008.

RIZZINI, Irene et al. Acolhendo crianças e adolescentes: experiências de

promoção do direito à convivência familiar e comunitária no Brasil. São Paulo:

Cortez, 2006, p. 22)

TREVISAN, Dalton. O pássaro de cinco asas, Rio de Janeiro: Record, 1974.

_________. Mistérios de Curitiba, Rio de Janeiro: Record,1979.

_________. Ah é?. 2 edição Rio de Janeiro: Record,1996.

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ZILBERMAN, Regina. Estética da Recepção e História da Literatura. 1 ed.

São Paulo: Ática, 2004.