Coletivo BioWit Eloisa Beling LOOSE Thaís Cristina ... · PDF file1 Mídia, Cidadania e Meio Ambiente: Reflexões a partir das práticas comunicativas do Coletivo BioWit1 Eloisa Beling

  • Upload
    vannhu

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • 1

    Mdia, Cidadania e Meio Ambiente: Reflexes a partir das prticas comunicativas do Coletivo BioWit1

    Eloisa Beling LOOSE2 Thas Cristina SCHNEIDER3

    Valeria Sousa DUARTE4

    Resumo

    O objetivo deste trabalho discutir a relao entre a cidadania e o uso da mdia (em um sentido amplo) por um grupo de jovens interessados em disseminar ideias a favor de um outro modo de cultivar e de se relacionar com o meio ambiente (diferente da chamada agricultura convencional), o Coletivo BioWit. Para tanto, realiza-se uma breve reviso de literatura sobre questes referentes cidadania, mdia cidad e modos alternativos de produo alimentar, e uma anlise das formaes e estratgias discursivas acionadas pelo grupo no seu principal canal de divulgao, o Facebook. Os resultados de tal anlise indicam que o Coletivo aposta em duas principais maneiras de difundir suas mensagens, caracterizadas como o choque (incorporando imagens e palavras impactantes) e a inspirao (que faz uso de sutilezas). Apesar das diferenas reveladas, a partir de ambas as estratgias possvel identificar o exerccio da cidadania ambiental pelo grupo por meio das mensagens divulgadas, j que chamam a ateno para as responsabilidades das pessoas quanto ao meio ambiente e promovem um estilo de vida com base numa relao mais prxima e respeitosa com a natureza. Palavras-chave: mdia cidad; cidadania; meio ambiente; Coletivo BioWit; estratgias discursivas. 1. Introduo

    A proposta deste trabalho refletir sobre os desafios existentes na comunicao de

    perspectivas alternativas por meio de informaes que pouco circulam na mdia hegemnica,

    o que constitui, sob a perspectiva destas autoras, um exerccio de cidadania. A partir das

    discusses sobre os conceitos de cidadania e mdia cidad, analisam-se as estratgias

    discursivas5 utilizadas pelo Coletivo BioWit, que rene jovens interessados em fazer com que

    as pessoas adotem outros modos de vida, de produo alimentar e de relacionamento com o

    meio ambiente, diferentes daqueles consolidados pelo sistema poltico-econmico dominante.

    1 Trabalho apresentado na modalidade Artigo Cientfico na IV Conferncia Sul-Americana e IX Conferncia Brasileira de Mdia Cidad. 2 Jornalista, mestre em Comunicao e Informao pelo PPGCOM/UFRGS e doutoranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento pelo PPGMADE/UFPR. Bolsista CNPq. Integrante do Grupo de Pesquisa Comunicao e educao em diversas interfaces com nfase em meio ambiente. E-mail: [email protected]. 3 Graduada em Comunicao Social (Jornalismo) pela UFPR e mestranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento pelo PPGMADE/UFPR. Bolsista Capes. Integrante do grupo de pesquisa j citado. E-mail: [email protected]. 4 Graduada em Jornalismo pela USJT e mestranda em Meio Ambiente e Desenvolvimento pelo PPGMADE/UFPR. Bolsista CAPES. Bolsista Capes. Integrante do grupo de pesquisa j citado. E-mail: [email protected]. 5 Estratgias discursivas so, segundo Eliseo Vern (2004), variaes declaradas dentro de um mesmo tipo de discurso. Podem ser compreendidas como os modos de dizer encontrados em um dado discurso.

  • 2

    A escolha deste grupo para anlise se deu pelo fato de estar inserido em uma

    comunidade cuja principal atividade econmica a agropecuria convencional. Com

    mensagens em defesa da agroecologia e da permacultura6, o Coletivo BioWit instigou as

    autoras a buscar compreender tal paradoxo, a viso de mundo desses jovens e como eles

    entendem seu papel na sociedade atual, identificando suas estratgias de ao e comunicao

    e os meios pelos quais eles escolheram expor seus ideais. Para estudar os discursos presentes

    nas mensagens divulgadas pelo grupo, utilizou-se a Anlise de Discurso (AD) de linha

    francesa.

    O texto foi estruturado em quatro partes: a discusso sobre as relaes entre cidadania

    e comunicao, especialmente levando-se em conta as transformaes ocorridas a partir da

    modernidade; a compreenso do que seria uma mdia, de fato, cidad neste contexto; a

    apresentao do Coletivo BioWit e de sua atuao enquanto grupo que defende prticas

    alternativas; e, por fim, a anlise de quais so as estratgias discursivas acionadas no canal de

    comunicao mais utilizado pelo grupo, o Facebook. As informaes sobre o Coletivo foram

    obtidas por meio de entrevistas feitas com quatro integrantes, em maio de 20137, com o

    objetivo de compreender a dinmica e os interesses que movem estes jovens.

    2. Relaes entre cidadania e comunicao

    Em sua concepo clssica, cidadania o exerccio de direitos e deveres civis,

    polticos e sociais; participar no destino da sociedade e na riqueza coletiva, tendo acesso a

    instncias como educao, trabalho e sade (PINSKY e PINSKY, 2003, p.9). Nos regimes

    democrticos (como se entende hoje, com base em noes iluministas), a concepo da

    cidadania foi dada, durante muito tempo, pela participao coletiva no espao pblico e na

    poltica por meio de representaes como os partidos, os sindicatos e os movimentos sociais.

    Contudo, a partir da segunda metade do sculo XX, em meio s mudanas e transformaes

    que acompanham a modernidade (GIDDENS, 1991) vo emergindo novas compreenses

    sobre a cidadania, o espao pblico e a participao, fazendo necessrio rever tais conceitos.

    6 Adiante, apresentam-se os entendimentos de agropecuria convencional, agroecologia e permacultura utilizados neste trabalho. 7 Foram entrevistados os membros Martin Ewert, Rafaelle Mendes, Ricardo Philippsen e Tobias Thiessen. As entrevistas seguiram um roteiro semi-estruturado com perguntas abertas sobre a origem do grupo, suas atividades e as reflexes dos integrantes a respeito de sua atuao.

  • 3

    Como indicam Hall (2005), Castells (2010) e Canclini (2008), com o desenvolvimento

    das tecnologias de comunicao e a intensificao do fenmeno de globalizao,

    principalmente a partir da dcada de 1970, as identidades pelas quais os indivduos se

    reconhecem passam a ser menos determinadas por fatores como a nacionalidade e a tradio.

    rgos locais e nacionais perdem poder em relao aos conglomerados empresariais

    transnacionais. As dinmicas cotidianas de trnsito, vivncia e apropriao de espaos

    coletivos e interao entre as pessoas mudam. A vida se torna fragmentada.

    A noo de povo substituda pela de sociedade civil. Com isso, o senso de

    pertencimento a redes sociais comea a se dar mais pela participao em comunidades

    desterritorializadas de consumidores, principalmente de bens culturais e simblicos como

    o caso dos rockeiros, por exemplo. Para Canclini (2008), estamos vivendo um processo de

    perda e despolitizao em relao aos ideais da democracia liberal ou iluminista. Tudo isso

    vai se refletir em formas diferentes de fazer poltica e exercer a cidadania no mundo

    contemporneo.

    Neste cenrio, os meios de comunicao se tornam as grandes vias de informao

    sobre o mundo e de formao do imaginrio coletivo, transformando-se no principal espao

    pblico onde ocorrem as discusses, antes representado somente pelas ruas e praas.

    Desiludidos com as burocracias estatais, partidrias e sindicais, o pblico recorre rdio e

    televiso para conseguir o que as instituies cidads no proporcionam: servios, justia,

    reparaes ou simples ateno (CANCLINI, 2008, p.39). Logo, as novas formas de

    participao poltica passam tambm pela expresso em tais meios. Como frisa Sherer-

    Warren (2001, p.41): o exerccio da cidadania plena implica marcar presena na esfera

    pblica.

    Assim, para que exista uma construo continuada de cidadania, os sujeitos precisam

    participar, expressar-se e compreender o direito do outro se manifestar tambm. A emergncia

    de redes globais de comunicao contribui para que certas demandas antes isoladas por

    serem locais tornem-se visveis para alm do lugar onde se encontram.

    Com o advento das chamadas novas mdias, a comunicao passa a ser mais horizontal

    e os pblicos que antes eram majoritariamente receptores tornam-se tambm emissores de

    mensagens (LEMOS e LVY, 2010). Neste contexto, os cidados no esto restritos ao

    contedo dos meios de comunicao de massa, tendo possibilidades de ampliar suas

    perspectivas e obter conhecimentos que fogem ao interesse e pensamento hegemnicos. E,

  • 4

    mais que isso, tm a possibilidade de produzir seu prprio contedo e distribu-lo livremente

    com baixos custos e amplo alcance. Tais mecanismos tm sido muito utilizados pelos

    movimentos sociais ou grupos alternativos para disseminar ideias contra-hegemnicas, o que

    resulta em implicaes de dimenso poltica. As possibilidades oriundas da internet tendem a

    dar mais visibilidade e alcance s demandas especficas de grupos minoritrios.

    Castells (2010) tambm aborda a reformulao do fazer poltico e da expresso da

    cidadania a partir da comunicao eletrnica, pontuando que por meio dela h possibilidades

    de aprimorar a participao poltica e a comunicao horizontal entre os cidados, o que

    estimularia o surgimento de uma democracia informacional. Porm, deve-se considerar que

    o poder das mdias sociais tem suas limitaes, dependendo tambm de aes prticas

    concretas.

    3. Mdia cidad o que isso significa?

    A partir da ideia de que os meios de comunicao se tornaram tambm espao pblico,

    compreende-se o conceito de mdia cidad como aquela que permite o acesso e a participao

    do cidado na expresso de opinies diversas e de luta por direitos e deveres. Contudo, para

    alm deste entendimento, cabe apresentar neste momento alguns aspectos atrelados a e