Colonização Política e Imprensa Mato-grossense o Caso Da Revista Brasil-oeste

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    COLONIZAO, POLTICA E IMPRENSA MATO-GROSSENSE: O CASO DA

    REVISTA BRASIL-OESTE*

    SALGUEIRO, Eduardo de Melo**

    1) Introduo

    A revista Brasil-Oeste1 foi criada pelo jornalista Fausto Vieira de Campos e

    produzida na cidade de So Paulo-SP, pela Brasil-Oeste Editra Ltda.2 Seu perodo de

    circulao se estendeu entre janeiro de 1956 e agosto de 1967, totalizando a publicao de

    123 edies. Campos dedicou boa parte de sua carreira jornalstica a escrever sobre o estado

    de Mato Grosso, interesse despertado nos anos iniciais da dcada de 1950 em decorrncia de

    sua passagem por Cceres e Cuiab,3 sobretudo aps ter assumido o cargo de assessor de

    imprensa (1954) do ento governador mato-grossense Fernando Corra da Costa (UDN).4

    Adquiriu prestgio e destaque no Centro-Oeste do pas, especialmente aps a publicao de

    sua obra Retrato de Mato Grosso, no ano de 1955, na qual realizou uma abordagem

    geoeconmica da regio. Seu livro, que mereceu duas outras publicaes, nos anos de 1960 e

    1969, foi o primeiro passo para a editorao da RBO.

    Fausto Vieira de Campos reuniu em torno de si e de seu projeto uma gama de

    colaboradores e correspondentes. A linha editorial da RBO se dava em duas frentes

    principais, sendo que a primeira procurava dar conta de tornar visveis as potencialidades

    existentes no estado de Mato Grosso, com especial relevncia para as oportunidades

    existentes na agropecuria. Para tal objetivo, seu segundo tpico principal consistia em

    reclamar frente ao poder pblico, sobretudo da esfera Federal, um plano concreto que

    acelerasse o desenvolvimento daquela regio, encarada como atrasada to somente por falta

    de vontade poltica.

    Levando isso em considerao, Campos acreditava que sua revista poderia ser um

    canal de divulgao dos anseios mato-grossenses. O momento era especial para tal tarefa,

    * Este artigo uma parte do terceiro captulo da dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao emHistria da Universidade Federal da Grande Dourados, sob orientao do Prof. Dr. Paulo Roberto CimQueiroz e financiada pela Capes (Conselho de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior) intitulada Omaior projeto em prol de Mato Grosso: uma anlise da RBO (1956-1967). 183f. Dourados/MS, 2011.

    **Doutorando em Histria pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Bolsista Capes.1Doravante, RBO.2Essa editora contava com dois scios, Fausto Vieira de Campos (scio-majoritrio) e seu filho, Fausto M. G. V.

    de Campos (scio-minoritrio). Informaes retiradas da Certido Simplificada. Contrato Social de Brasil-Oeste Editra. Ano de 1957, Junta Comercial do Estado de So Paulo.

    3Fausto Vieira de Campos trabalhou para o jornal Folha da Manh entre os anos de 1953-1955. Nesse perodo,

    o jornalista ficava encarregado de fazer reportagens exclusivamente sobre o estado de Mato Grosso.4Fernando Corra da Costa governou o estado de Mato Grosso por duas vezes, entre os anos de 1951-1956 e1961-1965. Em ambas as situaes representando o partido da Unio Democrtica Nacional (UDN).

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    uma vez que a imprensa passava por modificaes impressionantes, tanto no que diz respeito

    s novas possibilidades de produo e distribuio, aumento de publicidade, barateamento de

    custo, mas tambm o papel de reformulao da profisso jornalstica. No Brasil, pelo menos

    em tese, o jornalista buscava se desfazer da imagem de mero reprodutor da fala poltica. Para

    tanto, almejava-se a mtica da objetividade [...] fundamental para dar ao campo lugar

    autnomo e reconhecido, construindo o jornalismo como a nica atividade capaz de decifrar o

    mundo para o leitor(BARBOSA, 2007, p. 150). Esse era um dos passos necessrios para a

    atividade jornalstica ganhar mais respeito e representatividade junto sociedade, sendo capaz

    de reproduzir os acontecimentos da melhor maneira para o seu leitor, de modo que esse

    compreendesse os fatos da realidadepor meiodapalavra do jornalista.

    Por conta disso, o discurso jornalstico passou a se revestir de uma aura de

    fidelidade aos fatos, que lhe conferiu um considervel poder social(RIBEIRO, 2007, p. 14).

    Assim, no ser apenas no campo poltico que exercer sua fora, mas, sobretudo,

    conseguir mobilizao maior do pblico. Quanto maior a sua audincia, maior sua

    divulgao e a lgica da conquista do prprio poder, poiso momento social da dcada de

    1950 se faz crucial para uma imprensa que quer se transformar em porta-voz da

    modernizao (BARBOSA, 2007, p. 153). Fausto Vieira de Campos discursava como se

    fosse aquele cuja missoera fazer ecoar as vozes do esquecidoestado de Mato Grosso,

    valendo-se do poder e da credibilidade de sua profisso, para tornar mais respeitada e

    reconhecida aquela regiodo pas.

    Nesse sentido, a RBO, tal como qualquer veculo de informao,deve ser concebida

    no apenas como um peridico depositrio de acontecimentos nos diversos processos e

    conjunturas, mas especialmente como uma fora ativa da histria (CRUZ; PEIXOTO,

    2007, p. 257). Tal constatao no se d ao lu, pois quando do surgimento de sua primeira

    edio, uma espcie de manifesto-programa foi publicado e estabelecia os principais

    objetivos desse peridico. Vejamos:

    Nossa revista tem uma finalidade precpua: tornar mais conhecida e melhorcompreendida a vasta regio do Centro-Oeste brasileiro, compreendida pelosEstados de Mato Grosso e Gois [...].No temos ligaes com grupos polticos nem econmicos. Nossa atuaoobedecer a um roteiro superior, tendo em vista difundir a maior soma deconhecimentos sbre as regies brasileiras que estabelecemos como quadronatural de nossa atividade jornalstica.Todos os problemas geoeconmicos que digam respeito aos Estados de MatoGrosso e de Gois e aos Territrios do Guapor e do Acre sero

    gradativamente examinados em nossas colunas, de modo que se esboce,atravs de uma honesta difuso de opinies, uma soluo adequada e justapara les.

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    Particular intersse merecero de nossa parte os assuntos agropecurios, poisque nesse ramo de atividades se fundamenta a parcela mais pondervel daeconomia dos Estados do Centro-Oeste.5

    Como pode ser percebido, buscava-se estabelecer um roteiro superior, que estava

    isento de ligaes com grupos polticos e econmicos. Pretendia-se difundir

    conhecimentos sobre o Oeste do pas, na inteno de que fossem esboadas e lavradas

    opinies e solues para os problemas daquela regio. Esse manifesto no foi o nico

    desenvolvido pela a revista. Em diversas oportunidades, foi publicado um tipo de programa

    de metas, em que constavam 10 tpicos especiais, cujo primeiro objetivo era fazer uma

    colonizao intensiva nos estados de Mato Grosso e Gois. Por esta razo, resolvemos

    analisar este tpico em especial, por meio de alguns textos publicados por essa revista entre os

    anos de 1956-1961, que enfatizaram a questo da colonizao como uma das possibilidades

    encaradas pelo seu grupo dirigente, como ideal para o desenvolvimento do estado de Mato

    Grosso. Tal tema foi muito debatido na esfera poltica nos anos de 1950 e, conforme

    ressaltam alguns autores que se debruaram a estudar sobre o assunto, essa dcada foi um

    perodo de capital importncia para intensificar a colonizao em Mato Grosso (MORENO

    [2007] ; LENHARO [1986]; VASCONCELOS [1986]).

    Em meio mensagem de modernizao e desenvolvimento em Mato Grosso, a

    questo da colonizao foi pea importante nas disputas polticas da regio, e a RBO noficou neutra naquele debate. Por conta disso, levantamos a possibilidade de que havia uma

    consonncia de ideias entre o grupo que se aglutinou em torno daquele mensrio a uma

    parcela dos polticos mato-grossenses, sob a liderana do governador Corra da Costa, pelo

    menos no que tange ao tema em apreo.

    2 A colonizao e a poltica no estado de Mato Grosso na dcada de 1950

    No perodo da dcada de 1950, no Brasil havia uma corrente de pensamento poltico

    (que tinha como seus maiores cones Getlio Vargas e Juscelino Kubitschek), que acreditava

    na necessidade de uma ocupao efetiva e imediata do Extremo-Oeste do pas, pois ali seria

    a terra da Promisso, com grandes reservas de terras frteis, que substituiriam as

    esgotadas e devastadas do Leste(RODRIGUES, 1970, p. 84, grifo nosso) do pas, isto , o

    osisdo desenvolvimento. O incio desse projeto se deu com a Marcha para Oeste, que

    5RBO,ano I, n. 1, jan. 1956, p. 2. Resolvemos manter a ortografia da poca sem fazer qualquer alterao. Issovale para todas as citaes de documentos ou de bibliografia feitas neste artigo. Grifo nosso.

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    incentivava a ocupao das regies vazias6do Brasil, sob a inteno de nacionalizar as

    fronteiras e fortalecer a ideia de construo da Nao por todos os brasileiros (OLIVEIRA,

    1999, p. 88), e que acabou desencadeando a criao dos projetos de Colnias Agrcolas

    Nacionais, tais como a de Gois e a de Dourados na dcada de 1940.

    Nesse sentido, o governo Vargas visava alargar o espao de produo e ocupao

    nacional para localidades distantes, como Amazonas, Gois e Mato Grosso. Em resumo,

    havia uma poltica de colonizao dirigida pelo Estado a fim de fazer com que trabalhadores

    de outras regies pudessem se estabelecer em reas ainda pouco habitadas e, para isso, as

    Colnias Agrcolas foram pensadas e colocadas em prtica. Ali, o Governo distribua terras

    gratuitamente para quem quisesse nelas se estabelecer (LENHARO, 1986a, p. 50).

    No estado de Mato Grosso, desde o governo de Arnaldo Estevo de Figueiredo

    (PSD, 1947-1950), intensificava-se um plano de reorganizao da colonizao para acelerar o

    desenvolvimento, contudo, a partir da posse de Figueiredo, houve um forte discurso

    contrrio poltica de colonizao dirigida exclusivamente pelo Estado (LENHARO, 1986a).

    O projeto estatal de colonizao lanado pelo Estado Novo foi reformulado pela associao

    entre o poder pblico e as companhias privadas e, tal como afirma Lenharo, aps a queda de

    Vargas, quando o intervencionismo estatal foi afastado [...] o tratamento da terra como

    mercadoria implementou a expanso especulativa da colonizao do pas (1986b, p. 46).

    Deste modo, o governadorplanejou uma ampla estratgia de ocupao do oeste brasileiro.

    Esse modelo consistia na implantao de projetos oficiais de colonizao, por meio de

    empresas particulares, o qual se revelou um projeto lucrativo, tanto em termos econmicos

    quanto partidrio e eleitoral(MORENO, 2007, p. 103, grifo nosso).

    A partir de ento, a cada novo governo que iniciava um mandato em Mato Grosso,

    uma questo era colocada em pauta: a legislao de terras era sempre obsoleta para o

    perodo, havendo, nesse sentido, urgncia em modific-la para facilitar o processo de

    colonizao associado iniciativa privada. Na opinio de Figueiredo, a legislao seencontrava divorciada da realidade,pois a modalidade antiga de colonizar terrascerceava

    os grandes empreendimentos particulares, capazes depromover a efetiva ocupao do Estado

    em moldes empresariais (MORENO, 2007, p. 103, grifo nosso). Buscava-se, ento,

    6 importante ressaltar que a regio de Mato Grosso era ocupada por povos indgenas muito antes da Marchapara Oeste varguista. Nesse sentido, povoar as regies vazias, naquela altura, significava que se buscavaajustar ali uma populao no indgena, ou, como ressalta Alcir Lenharo, assentar trabalhadoresdisciplinados e produtivos, mostrando toda a carga de excluso que tal empreendimento exerceu. O mesmo

    autor, no entanto, informa que alm dos indgenas, outros segmentos da sociedade j estavam ali presentes.Nas palavras do autor, os espaos vazios no se encontravam to vazios assim. Sobre o tema: LENHARO(1986b).

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    solucionar os problemas e entraves que dificultavam a aquisio de terras por empresas

    particulares.

    No governo seguinte, foi acentuado o plano de colonizao privada em Mato Grosso.

    Conforme ressalta Gardin, no incio dos anos de 1950, quando comeava o seu primeiro

    mandato (1951-1956), o governador Fernando Corra da Costa (UDN) apoiou-se em em trs

    eixos de ao para o desenvolvimento do estado: energia, transporte e povoamento. No que

    diz respeito ao que pertinente para a presente anlise, o governo tomou a deciso de

    povoar-se o Mato Grosso por colonizao racional [entenda-se, por empreendimento

    empresarial](GARDIN, 2009, p. 116). Nesse sentido, foi sob o mandato de Corra da Costa

    que a poltica de colonizao particular foi intensificada e uma das primeiras medidas

    tomadas pelo ento novo governador, tal como seu antecessor, foi introduzir modificaes no

    Cdigo de Terras estadual. Nas palavras de Moreno, o udenista implementou no Estado a

    poltica de colonizao, entregando esta tarefa a empresas particulares de colonizao

    (MORENO, 2007, p. 113).

    Para a execuo desse projeto, o governo do Estado colocou, disposio deempresas colonizadoras, grande parte de seu territrio para que as mesmas,atravs de Contrato de Colonizao, organizassem os ncleos coloniais eefetuassem a venda da terra. O governo fez esse tipo de contrato, comparticulares, individualmente, ou com empresas organizadas, desde que osmesmos assumissem certas condies especficas relacionadas sdisposies de leis federais e estaduais (VASCONCELOS, 1986, p. 24).

    Conforme conclamava Corra da Costa, os capitalistas seriam os novos

    bandeirantes que saberiam fazer progredir esta parte da nao, sempre tendo o estado de

    So Paulo como modelo a ser seguido. No trecho a seguir, fica ntido esse anseio por parte do

    governador, ao fazer referncia aos colonizadores como novos pioneiros, [que] j

    penetraram, [e] se instalam na nossa terra e comeam a trabalhar, procurando anular os

    sculos de evoluo que separam S. Paulo de Mato-Grosso[...] espera de novos

    bandeirantes dotados de esprito de iniciativa aparelhados de capitais e mtodos modernos.7

    Nota-se que o clima de otimismo fazia-se presente naquela gesto, sobretudo se for

    levado em considerao o sucesso nas vendas de terras, influenciando diretamente no

    aumento de arrecadao de recursos financeiros por parte do estado de Mato Grosso, que j

    vinha numa crescente desde o ano de 1952. Fernando Corra da Costa orgulhava-se desse

    suposto sucesso e enfatizava que finalmente as vistas do Brasil litorneo se volviam para o

    interior do pas. Alm disso, o governador de Mato Grosso justificava que no dispondo o

    7Mensagens Governamentais do Governador Fernando Corra da Costa, 1953, p. 4. Grifo nosso.

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    Estado de recursos financeiros capazes de manterem o servio de colonizao, achamos que o

    povoamento das nossas [...] terras, em pleno desconhecido, somente se poder realizar

    mediante o concurso da iniciativa privada.8Nas Mensagens Governamentais do ano de 1954,

    dizia ele,

    [...] a colaborao da iniciativa privada com a estatal objetivando uma dastarefas mais alvissareiras, que a de tornar produtivas regies at agoradesconhecidas. No dispondo o Estado de recursos para essa obra, no hcomo repelir a cooperao de empresas credenciadas para realiz-las.9

    No entanto, muitas das obrigaes contratuais a que se comprometiam as empresas

    no foram devidamente respeitadas, e diversas irregularidades foram encontradas no

    cumprimento das clusulas dos contratos de colonizao de terras. Iniciava-se, ento, um

    escndalo na gesto de Fernando Corra da Costa, pois foi acusado de ter vendido terras

    acima da rea permitida pela Constituio Federal.

    Para elucidar o caso, trata-se da ocasio em que 22 empresas firmaram contrato com

    o governo estadual, sob a gesto de Fernando Corra da Costa, equivalentes a uma rea

    prxima de 3,5 milhes de hectares em Mato Grosso para colonizao. Gislaene Moreno

    informa que cada uma delas adquiriu em mdia 200.000 hectares [...] cujos lotes de 10.000

    hectares eram contguos e de pessoas de um mesmo grupo, o que por si s violava o

    prescrito na Constituio Federal (1946) que vedava a alienao de reas superiores a 10.000hectares, sem prvia autorizao do Senado (MORENO, 2007, p. 116). De modo

    semelhante, Lenharo ressalta que a ilegalidade das concesses incidia sobre as

    determinaes do artigo 156 da Constituio Federal de 1946 [...] Acresce terem sido as

    enormes concesses todas desviadas para posterior revenda especulativa de lotes menores

    (1986a, p. 56).10

    Aproveitando-se desse clima tenso, no que diz respeito s vendas e contratos com as

    colonizadoras de terras em Mato Grosso, quando Joo Ponce de Arruda (PSD) assumiu ogoverno mato-grossense (1956), ele fez duras crticas ao seu antecessor, Fernando Corra da

    Costa. Mais uma vez um governante que assumia o poder no estado de Mato Grosso

    encontrava irregularidades no Departamento de Terras e Colonizao. Como ressalta

    Gislaene Moreno, a crtica do governador [Joo Ponce de Arruda] em nada diferencia da que

    fizera o prprio Fernando Corra da Costa ao seu antecessor, em 1951(2007, p. 122). Ainda

    8Mensagens Governamentais do Governador Fernando Corra da Costa, 1954, p. 78-79.9Mensagens Governamentais do Governador Fernando Corra da Costa, 1954, p. 6.10

    Recentemente o Supremo Tribunal Federal julgou que efetivamente os contratos de terras com ascolonizadoras de terras efetuados na dcada de 1950 pelo ento governo de Fernando Corra da Costa infringiua Constituio de 1946.http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1424856.

    http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1424856http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1424856http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1424856http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1424856
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    nas palavras da autora, o governo Fernando Corra da Costa foi acusado de facilitar esses

    contratos, especialmente, porque tais acordos teriam sido feitos em anos pr-eleitorais

    (MORENO, 2007, p. 116), o que significa dizer que, no final das contas, teria sido uma

    jogada poltico-eleitoreira, intentando angariar apoio desse setor do segmento privado nas

    eleies que estavam por vir, em 1955, pois evidentemente a UDN planejava fazer um

    sucessor.

    Entre o interregno que compreende os anos de 1956-1961, sob o mandato de Joo

    Ponce de Arruda, o estado de Mato Grosso tambm arrecadou uma grande monta em razo da

    titulao de terras. O fato que, ainda que aparentemente tentando diminuir as irregularidades

    envolvendo as terras de Mato Grosso, o governo Joo Ponce de Arruda no ficou imune s

    irregularidades tambm sob sua gesto.Em resumo, a dcada de 1950 foi um perodo em que

    os que mais lucraram foram os negociantes de terras e os grandes empresrios, pois s eles

    poderiam cumprir com os requisitos bsicos exigidos pelo governo para a aquisio de terras

    para a colonizao(VASCONCELOS, 1986, p. 30).

    O que apresentaremos a seguir ser mostrar como a RBO se posicionou em relao

    quele debate travado entre o Governador Joo Ponce de Arruda (PSD), com os partidrios do

    ex-governador Fernando Corra da Costa (UDN), e quais possveis interesses polticos e

    econmicos estavam envolvidos nos textos ali publicados, pois um peridico impresso deve

    ser entendido como lugares especiais de articulao de pessoas e ideias que precisam de

    suportes materiais e simblicos para fazer circular projetos (GOMES, 1999, p. 58, grifo

    nosso). Da a importncia dos estudos que pretendem fazer uma aproximao com a histria

    poltica e suas implicaes na modalidade de fonte peridica ao fazer uma leitura do objeto

    (imprensa) como aquela que entende que nas pginas de jornais e revistas, por exemplo, so

    disseminadas e travadas lutas simblicas, isto , os dirios, semanrios e mensrios so

    lugares que emitem representaes, por determinados grupos, e que devem ser concebidas

    como entidades que vo construindo as prprias vises do mundo social (CHARTIER,1990), e que, no caso em apreo, so acionadaspor um meiode comunicao.

    3 A colonizao e as disputas polticas na revista

    Quando o governador Joo Ponce de Arruda (PSD) assumia seu mandato em 1956, o

    segundo editorial da RBO foi dedicado especialmente para tecer comentrios sobre a posse do

    novo governador. Sob o ttulo deNovo Govrno de Mato Grosso, o texto iniciava da seguintemaneira:

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    O Dr. Joo Ponce de Arruda assume o Govrno de Mato Grosso emcondies excepcionalmente favorveis [...] Fora das fronteiras, v o seuEstadomelhor compreendido e mais respeitado, merc da conduta corretaque pautou a administrao anterior, fazendo-se cumprir os compromissosassumidos pelo Govrno.11

    Esse primeiro trecho do editorial deixa claro que, na viso do editorialista (que muito

    provavelmente era Fausto Vieira de Campos), a vitria de Ponce de Arruda significava que

    ele tinha em suas mos grande responsabilidade, sobretudo porque o estado de Mato Grosso

    encontrava-se em condies excepcionalmente favorveis, deixadas pelo governador

    Fernando Corra da Costa (UDN). A postura da revista em relao ao novo governo

    evidencia-se no decorrer do editorial e fica tensionada entre a presso e o aconselhamento

    ao recm-eleito.

    [...] S. Excia. tem diante de si vasto plano de colonizao em plenodesenvolvimento e dever definir a sse respeito a poltica que melhoratendaaos imperativos de Mato Grosso. de crer-se que agircom a devidaprudncia, neste particular, pois que no poder prescindir o Estado dacooperao das emprsas de colonizao para um maior aceleramento doprogresso.[...] As inovaes, muitas vezes ditadas por motivos egostas ou partidrios,so geralmente fatais para os Estados que dispem de recursos bastantelimitados para a realizao de obras de grande envergadura.12

    perceptvel que havia uma preocupao especial em relao s questes de

    colonizao e terras que, na concepo do editorialista, progrediram no governo Corra da

    Costa. Esse editorial intentava pautar as tarefas e medidas que deviam ser tomadas pelo novo

    governante, para que o interesse pblico fosse atendido. Assim, a RBO antecipava-se e

    pretendia dirigir as atividades do aparelho estatal para que as consequncias das atitudes

    governamentais fossem favorveis a Mato Grosso.

    Se inicialmente havia uma cordialidade no discurso, durante boa parte do mandato de

    Ponce de Arruda, as crticas em relao ao seu governo estiveram muito presentes nos textos

    da revista. A maior parte das opinies emitidas (velada ou explicitamente) nos artigos e

    reportagens era desfavorvel ao governo de Arruda, e mais; em nenhum dos textos analisados

    encontramos menes elogiosas em relao s polticas pblicas do ento chefe do executivo

    mato-grossense.

    A primeira das crticas mais cidas datada do ms de setembro de 1956. Trata-se de

    um texto publicado comentando o primeiro pronunciamento feito por Ponce de Arruda

    11RBO, ano I, n. 2, fevereiro de 1956, So Paulo (SP), p. 1. Grifo nosso.12RBO, ano I, n. 2, fevereiro de 1956, So Paulo (SP), p. 1. Grifo nosso.

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    Assembleia Legislativa, intitulado de Um Documento Desalentador, escrito pelo

    pseudnimo De um observador econmico originalmentepublicado na RBO. Nesse texto,

    foi feita uma severa crtica mensagemdo governador, considerada, na sua totalidade, um

    documento vazio de contedo.

    A crtica que se fez residia no fato de que Joo Ponce no havia apresentado um

    programa de governo embasado e slido, sob o ponto de vista do articulista, que constri seus

    argumentos fazendo uma relao entre o novo governante e o seu predecessor, que, por sua

    vez, quando citado, foi elogiado sobremaneira:

    A leitura da Mensagem do Governador Joo Ponce de Arruda, dirigida Assemblia Legislativa de Mato Grosso, deixa, a quem a conclui, aimpresso de um documento vazio de contedo [...]Sucedendo em 31 de Janeiro passado a um Govrno do Sr. FernandoCorreia da Costatido como o mais construtivoque houve em Mato Grossoe que deixou em to edificante situao financeira e econmica o Estado,cuja renda fz triplicar em cinco anos, sem aumento nos impostos, era deesperar-se que o Sr. Joo Ponce de Arruda trouxesse, na sua primeira fala Assemblia, o programa de sua ao governamental, capaz de sobrepor-se obra administrativa de seu antecessor e de atrair a ateno do pas para oportentoso Estado. [...]A sua orientao, refletida na primeira Mensagem aos representantes dopovo no abona a objetividade do engenheiro, que S. Excia.: no revela oadministrador experimentado em vrias funes, que se aguardava, e nem oestadista que a hora atual reclama para Mato Grosso, o que desalentador.13

    O que se pode abstrair desse texto que no foi colocado em pauta nenhum dos

    problemas de ingerncia na questo dos contratos de terras envolvendo a administrao

    anterior. Tampouco foi feita meno s crticas apontadas pelo governador Joo Ponce de

    Arruda ao seu antecessor. Muito pelo contrrio, o articulista s fez elogios ao governador

    Fernando Corra da Costa, que deixou edificante situao financeira e econmica o Estado.

    Esse artigo foi publicado no quinto nmero da RBO, e um indicativo de como se

    posicionariam os articulistas do peridico em relao ao novo governante.

    Um ano antes, na primeira edio da obra Retrato de Mato Grosso, o diretor-proprietrio da revista, Fausto Vieira de Campos, dedicou um captulo especial para debater

    sobre a colonizao no estado e, tal como o articulista da RBO, fez elogios ao ento

    governador Fernando Corra da Costa. O autor consagrou algumas pginas para mostrar uma

    srie de dados que evidenciavam os avanos conquistados pelo modelo de gesto dos

    negcios envolvendo as terras de Mato Grosso naquela gesto administrativa. Iniciava o

    captulo dissertando sobre a legalidade daquele plano governamental que visava ampliar o

    13RBO, ano I, n. 5, setembro de 1956, So Paulo (SP), p. 12.

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    territrio civilizado, criando assim a oportunidade que possibilita ao homem a

    concretizao de um desejo justo de progresso e de bem-estar. Ressaltou ainda a questo da

    segurana que o estado tinha na elaborao desses contratos, uma vez que as empresas deviam

    cumprir com condies especficas e oferecer garantias, que se estendem desde o rgido

    respeito das disposies de leis federais e estaduais, at o requisito bsico da capacidade

    financeira(CAMPOS, 1995, p. 94).

    Ao que tudo indica, a maioria desses contratos demonstrava que houve

    irregularidades e garantias no cumpridas. Contudo, Fausto Vieira de Campos evidenciava

    muito otimismo, pois, sob seu ponto de vista, a colonizao particular, se fosse feita dentro

    das normas, era o melhor caminho para fazer progredir o estado de Mato Grosso, por duas

    razes principais. Nas palavras do autor, a venda de terras devolutas, alm de forar a receita

    do Estado, favoreceu perspectivas melhores para Mato Grosso, em virtude do afluxo de

    colonos para as novas reas [...] A poltica de terras do Governador Fernando Corra da Costa

    a que melhor atende aos interesses de Mato Grosso(CAMPOS, 1995, p. 96-97).

    Campos argumentava em favor de suas ideias, mostrando elementos que

    confirmavam sua tese de que a colonizao por meio de particulares era o melhor caminho,

    uma vez que, apesar de toda a imensido e riqueza do territrio mato-grossense, cinco vezes

    maior do que a rea total do Estado de So Paulo existia, no ano de 1953, apenas 558.000

    habitantes. Ainda em comparao com os paulistas, ressaltava que nsse mesmo ano de

    1953 a populao do Estado de So Paulo era estimada em 9.837.000 habitantes (CAMPOS,

    1955, p. 97). importante frisar, mais uma vez, que o lugar idealde desenvolvimento para

    o jornalista era tambm o estado de So Paulo, assim como para os governantes de Mato

    Grosso.

    Na reedio deRetrato de Mato Grosso (1960),Campos foi obrigado a acrescentar e

    comentar os escndalos, envolvendo a gesto do ento ex-governador Fernando Corra da

    Costa, acusado por parte da imprensa e pelo seu sucessor, Joo Ponce de Arruda. Contudo, oautor no dedicou muito espao ao tema, resumindo seus comentrios apenas para descrever

    os acontecimentos, sem qualquer detalhamento. Sobre os contratos com as colonizadoras de

    terras, dizia ele que a validade daqueles contratos de colonizao foi contestada por

    dirigentes do PSD-MT, originando-se demanda, que culminou com o reconhecimento pelo

    Congresso Nacional de uma situaosub judice(CAMPOS, 1960, p. 194, grifo nosso).

    O autor cita a Mensagem Governamental de junho de 1959, quando Joo Ponce de

    Arruda tornava pblico o julgamento feito pelo Senado e as medidas que seriam tomadas,conforme citado anteriormente, ou seja, que de todas as 22 empresas particulares envolvidas

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    naquele escndalo, apenas cinco delas cumpriram parte dos contratos e houve uma

    renegociao entre elas e o estado.

    Fausto Vieira de Campos emitiu sua opinio, demonstrando insatisfao com as

    atitudes do novo governador. Dizia ele:

    As declaraes do Governador Ponce de Arruda expressam, de maneirainiludvel, recuo do Govrno de Mato Grosso, que abandona formalmente oplano de colonizao desenvolvido na administrao do GovernadorFernando Corra da Costa, para forar a venda das terras comprometidas porcontratos.Se os intersses do Estado coincidem com os intersses do povo, de ver-seque os contratos de colonizao somente beneficiavam ao Estado de MatoGrosso, pois visavam a promover o progresso em reas despovoadas eimprodutivas e evitavam que elas fssem vendidas, pura e simplesmente, aosque no assumiam outras obrigaes, alm de fazer medir e demarcar as

    terras.As emprsas que esto operando nesse domnio fazem-no com o prprioesforo e com os prprios riscos (1960, p. 194).

    No trecho citado, nota-se que, mesmo aps os escndalos envolvendo o governo de

    Fernando Corra da Costa, Fausto Vieira de Campos ainda considerava aquele modelo como

    ideal para a colonizao do Estado. O autor achava que as companhias colonizadoras ficariam

    demasiadamente prejudicadas com a nova modalidade implantada por Joo Ponce de Arruda,

    pois afastaria novos investidores, uma vez que as terras pertinentes aos contratos no

    cumpridos daquelas empresas deviam ser adquiridas somente mediante a compra direta por

    parte das colonizadoras, sem a interveno do estado no processo de colonizao.

    Anos antes, em 1956, na sexta edio da RBO, um artigo foi escrito sob o ttulo

    Desestmulo Colonizao no Estado de Mato Grosso. Nesse texto, assinado somente pelas

    iniciais A.M.T, comentava-se uma entrevista dada por Joo Ponce de Arruda ao jornal

    Folha da Manh,14de So Paulo, em que o governador dizia que havia a necessidade de se

    distinguir os bons e maus colonizadores de terras em Mato Grosso e, por essa razo, diversas

    concesses estavam em investigao, em decorrncia das irregularidades da administrao

    anterior. Assim, o autor do artigo da RBO no poupou as crticas, dizia ele que Arruda estaria

    sustentando atitude dbia com respeito s emprsas colonizadoras, criando em torno delas

    um ambiente de preveno que no se justifica[va] de maneira alguma,15ou seja, colocando

    as concesses de terras sob investigao, o novo governador estaria, na viso do articulista,

    afugentando novos investidores, receosos e temerosos com essa deciso.

    14

    Jornal Folha da Manh, quinta-feira, 13 de setembro de 1956, So Paulo (SP). Disponvel em: Banco de DadosFolha: . Acesso em: 24 mar. 2011.15RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23.

    http://bd.folha.uol.com.br/http://bd.folha.uol.com.br/
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    Contudo, o trecho mais emblemtico desse texto inicia-se sob o seguinte

    questionamento: Concesso ou Contrato?. Dizia ele, na tentativa de defender a

    administrao anterior que:

    Fernando Corra da Costa no fz nenhuma concesso de terras com reassuperiores a 10.000 hectares, mas, to smente, firmou contratos comdiversas companhias visando colonizao de glebas de terras no Norte doEstado, os quais acautelam os intersses de Mato Grosso, pois que asemprsas atuariam como meros agentes do Estado e venderiam lotes (comreas nunca superior a 2.000 hectares a uma mesma pessoa) depois deaprovados os preos pelo prprio Estado.16

    Continua o autor ressaltando que, se houvesse qualquer tipo de irregularidade, o que

    tinha de ser feito era exigir das companhias o cumprimento das clusulas contratuais e

    aplicar-lhes, no caso de inobservncia das mesmas, no prazo estipulado, as sanescabveis.17O que merece ser destacado a tentativa do autor em defender, a todo custo, o

    processo de colonizao do governo Fernando Corra da Costa, e, inegavelmente preocupado

    com os rumos que foram tomados durante a gesto de Ponce de Arruda, que estaria fazendo

    ruir todo o processo de desenvolvimento supostamente alcanado nos anos da gesto de

    Corra da Costa.

    O articulista incisivo ao dizer que o governador Ponce de Arruda conseguiu fazer

    foi confundir o povo e dar-lhe a falsa impresso de que o ento Governador do Estado estavainfringindo os dispositivos constitucionais com a celebrao de contratos de colonizao. Se

    no bastasse isso, prossegue, dizendo: claro que, agora, depois de haver sido a questo

    apresentada na Cmara Alta, de forma to inquinada de vcios, nada poder fazer o Govrno

    de Mato Grosso, sem o pronunciamento daquela Casa do Legislativo.18 Vale lembrar que,

    naquela ocasio, ainda se esperava pela deciso final do Senado Federal.

    Para finalizar, A.M.T escrevia que, em decorrncia dessa atitude do PSD,

    representado particularmente pelo Senador Filinto Mller19e o Governador Joo Ponce de

    Arruda, havia sido criado no estado de Mato Grosso uma situao deveras lamentvel [...]

    aventando dvidas sbre os negcios de terras que esto fazendo as emprsas

    colonizadoras.20Conclui o autor ressaltando que essas dvidas tm reflexos perniciosos em

    16RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23.17RBO, ano I, n. 06, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23.18

    RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23. Grifo nosso.19Filinto Mller foi senador em 1947-1951 e 1955-1973.20RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23.

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    todos os negcios de terras, o que est criando desconfianas e incertezas com respeito s

    transaes dsse gnero em Mato Grosso.21

    Os problemas envolvendo a investigao sobre o processo de colonizao de terras e

    as crticas que foram feitas pela revista se estendiam a outras esferas da administrao de Joo

    Ponce de Arruda. Em artigo publicado no ms de outubro de 1958, sob o ttulo Ausncia do

    Govrno de Mato Grosso, foram colocadas em pauta as razes que afastavam o

    direcionamento editorial da RBO (e aquilo que eles acreditavam ser o ideal para

    desenvolvimento para o estado) daquela gesto estadual. No h assinatura no artigo, mas o

    articulista falava em nome da revista, o que significa dizer que muito provvel que tenha

    sido escrito por Fausto Vieira de Campos. Iniciava sua explicao do seguinte modo:

    Amigos e leitores escrevem-nos, com freqncia, comentando a ausncia do Govrno de

    Mato Grosso na cruzada que estamos sustentando. Devemo-lhes, portanto, uma

    explicao.22

    Quando o autor se refere ausncia do Govrno na cruzada empreendida pela

    revista, isso significa dizer que os ideais de cada uma dessas esferas estavam em caminhos

    distintos, ou at mesmo, opostos. Ao que nos parece, as constantes crticas feitas ao

    governador Joo Ponce de Arruda renderam acusaes contra a RBO, pois possvel observar

    que nesse artigo o articulista fez de tudo para se defender de possveis ataques, que podem ter

    sido feitos por partidrios do PSD ou at mesmo por leitores comuns, que pediam por

    respostas, uma vez que era inegvel a inclinao favorvel s polticas adotadas por Fernando

    Corra da Costa, da UDN.

    Continua ele ressaltando que o projeto da revista estaria assentado em bases

    prprias, isto , no apio do Comrcio e da Indstria, que se utilizam dos bons veculos de

    propaganda para fazer a cobertura de seus produtos. Estamos situados, portanto, no lugar

    certo, como rgo deImprensa livre.23Nota-se que h uma notvel tentativa de responder a

    qualquer tipo de acusao que insinuasse que a revista recebia ajuda financeira de quaisquersetores oposicionistas ao governador Ponce de Arruda ou que os apoiasse politicamente.

    o discurso da objetividade jornalstica. Apesar de parecer que de fato havia

    afinidades com o ento ex-governador Fernando Corra da Costa em oposio ao governo

    Ponce de Arruda, os responsveis pelo peridico faziam questo de frisar a sua independncia

    frente a grupos polticos ou econmicos. Continua o autor: no sofremos presso de fraes

    21

    RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 23.22RBO, ano II, n. 18, outubro de 1957,So Paulo (SP), p. 32.Grifo nosso.23RBO, ano II, n. 18, outubro de 1957, So Paulo (SP), p. 32. Grifo nosso.

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    poltico-partidrias, nem ingerncia de grupos econmicos [...] A poltica que sustentamos

    [...] situa-se num plano muito altoe, por isso mesmo, s realizvel por homens capazes e

    independentes.24

    O maior problema contido nessas afirmaes reside no fato de que alguns artigos

    (quando assinados) que criticavam o governador Joo Ponce de Arruda vinham de partidrios

    de Fernando Corra da Costa, como foi o caso de Demstenes Martins que, em algumas

    ocasies, utilizou o espao da revista para expor seu posicionamento de defesa do governo

    anterior e de ataque ao seu sucessor.

    Vale a pena dizer que Fausto Vieira de Campos tornou-se assessor de imprensa de

    Fernando Corra da Costa com indicao feita por Demstenes Martins (Secretrio de

    Agricultura Estadual da poca). Antes disso, contudo, o ento correspondente da Folha da

    Manh em Mato Grosso teve fortes laos de amizade com Dormevil Faria, outro mato-

    grossense que fez carreira poltica pela UDN, o que sugere, portanto, que foi por intermdio

    deste ltimo que Fausto iniciou seu contato com Martins e depois, com outras personagens

    influentes da regio.

    Mais um importante colaborador da RBO tambm teve participao crucial no

    governo da UDN. Tratava-se do engenheiro agrnomo Jos Bardauil, designado pelo ento

    governador, no ano de 1951, para reorganizar o Departamento de Terras e Colonizao.

    Fernando Corra da Costa disse naquela ocasio que tal indicao foi feita a fim de serem

    atendidos satisfatriamente pela administrao os problemas de terras, colonizao e

    cooperativismo.25Entenda-se como problemas, a m administrao do governo anterior

    (de Arnaldo Estevo de Figueiredo) em relao aos negcios envolvendo as terras de Mato

    Grosso.

    Diversos foram os colaboradores da RBO que estavam associados base do governo

    de Fernando Corra da Costa, tais como, Dolor de Andrade, Paulo Jorge Simes Corra,

    Wilson Barbosa Martins, Yttrio Corra da Costa, Ren Barbour, Lenine de CamposPovoas eEdson Brito Garcia. Essas evidncias provocaram especulaes na poca em que a revista

    circulou, uma vez que foi acusada de ser udenista. Como mostramos h pouco, foi preciso

    Fausto Vieira de Campos publicar um texto, mostrando que [aquele projeto] estava alheio s

    presses partidrias.

    O texto em que o diretor da RBO d explicaes perante o seu leitor sobre essas

    presses foi publicado na edio de nmero 18. Porm, anos mais tarde, no nmero 49, ou

    24RBO, ano II, n. 18, outubro de 1957,So Paulo (SP), p. 32. Grifo nosso.25Mensagens Governamentais do Governador Fernando Corra da Costa, 1952, p. 41.

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    seja, j no final do mandato de Joo Ponce de Arruda, outra vez o diretor tentou se justificar e

    negar qualquer inclinao poltica por parte do projeto em que estava empenhado.

    Esse pronunciamento aconteceu na oportunidade em que a revista RBO foi

    homenageada pela Cmara Municipal de Campo Grande, no ms de maio de 1960, quando

    Fausto Vieira de Campos foi ao estado de Mato Grosso para cobrir uma feira agropecuria.

    Naquela ocasio, os lderes dos trs partidos que se faziam representados naquele municpio

    (PSD, PTB e UDN) manifestaram o apoio ao empreendimento jornalstico capitaneado por

    Campos. Aproveitando-se disso, o diretor da RBO fez um discurso, reproduzido em partes na

    edio de junho de 1960, que dizia o seguinte:

    A revista BRASIL-OESTE tem um programa definido. Acontece, porm,que a UDN fra o primeiro agrupamento partidrio que apoiou sse

    programa, prestigiando a revista sem fazer-lhe a menor solicitao dereciprocidade. Os demais partidos polticos retardaram sse apio. Dissoresultou o falso conceito de que a BRASIL-OESTE uma revistaudenista... [Fausto] Esclareceu que todos os partidos foram convidados amanter na BRASIL-OESTE uma tribuna livre, apenas condicionados aoestrito respeito da Lei de Imprensa. A UDN e o PSD aceitaram ooferecimento e o PSP e o PTB estavam cientificados. Com essa deciso, aBRASIL-OESTE visa a forar o intercmbio das idias, a congraareleitores, a romper as barreiras da intolerncia poltica, a proporcionar aopovo o ensejo de cotejar as diretrizes dos partidos e dos seus candidatos aospostos eletivos, possibilitando-o, assim, de fazer melhores escolhas.26

    Apesar do discurso defensivo, emitido por meio da tribuna da Cmara Municipal de

    Campo Grande, somado queles que eram transmitidos nas pginas da RBO, em que se

    destacavam objetividade, independncia poltica e econmica, seus textos do possibilidades

    ao leitor de interpret-los de forma inversa. Alm das crticas, envolvendo as questes

    relacionadas s terras e colonizao de Mato Grosso, outras tantas foram feitas no mbito da

    prpria organizao administrativa do governo Ponce de Arruda, sempre fazendo oposio

    entre esse mau governo e a viso administrativa de Fernando Corra da Costa.

    Esse foi o caso do texto intitulado Inoperncia administrativa, publicado na sexta

    edio da revista, novamente sob a assinatura De um Observador Econmico. Logo no

    primeiro pargrafo desse artigo, o autor indicava que o novo governo instalado no estado de

    Mato Grosso repetia vcios dos anteriores (com exceo de Fernando Corra da Costa),

    inflando as despesas com o funcionalismo pblico. Dizia ele:

    [...] a despeito das esperanas acalentadas, Mato Grosso est retornandoqules tempos de antanho em que a ao governamental se exprimia pela

    26RBO, ano V, n. 49, junho de 1960, So Paulo (SP), p. 65. Maisculas do original.

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    atividade nica de cobrar impostos e pagar funcionrios, em cujosestipndios se consumiram 80,60% da arrecadao do exerccio, em 1950.27

    Esse o tpico caso que acontece quando um novo grupo poltico assume o governo

    de uma determinada regio; contratam-se diversos aliados e demitem-se os oposicionistas,formando no interior dos governos aquilo que conhecido como cargo de confiana. O

    autor indicava que, com a subida de Joo Ponce de Arruda ao poder, essa situao se

    agravava, aumentando os estipndios e consumindo mais uma vez boa parte do dinheiro dos

    cofres pblicos.

    Abre-se um parntese para mostrar que, em editorial publicado na edio nmero 3

    da RBO, sob o ttulo Governos Punitivos, encontra-se um tipo de crtica velada aos

    governantes que, poca, quando assumem suas cadeiras, perseguem funcionrios de

    administraes anteriores, demitindo-os. O discurso presente nesse texto importante, pois se

    aproxima daquilo que Beltro chama de editorial preventivo, isto , aquele se antecipa

    realidade, apontando situaes(BELTRO, 1980, p. 56), que acontecem num determinado

    momento e, nesse caso especfico, iriam prejudicar o estado de Mato Grosso:

    Notcias que nos chegam de dois dos Estados onde se renovaram osGovernos, em 31 de Janeiro ltimo, adiantam que se desencadeou, neles,ofensiva em regra contra funcionrios pblicos que contem menos de cincoanos de exerccio no cargo.Ao mesmo tempo, iniciou-se, nos referidos Estados, uma sequncia deinquritos sbre as administraes passadas[...] [esto cometendo erros os]Governadores empossados em 31 de Janeiro, com a agravante de que nopodem justificar seus atos com pretextos de economia para o Errio Pblico,porquanto, medida que os preteridos so postos no lho da rua, o lugarvago preenchido com a nomeao do cidado eleito pelas preferncias dopartido dominante [...]Est evidente, por conseguinte, que a derrubada do funcionalismo temcarter estritamente poltico-partidrio, e essa diretiva dos novos governantess pode comprometer os intersses pblicos e avivar descontentamentos edesconfianas.28

    Nota-se que a oposio s novas medidas tomadas pelos governadores que iniciavam

    seus mandatos fica muito clara. Critica-se veladamente Ponce de Arruda, sem cit-lo

    diretamente, mas a aluso sua gesto visvel, sobretudo, quando so ressaltados os

    inquritos sbre as administraes passadas, o que remete diretamente s questes

    envolvendo os problemas de terras e colonizao do governo Fernando Corra da Costa.

    Voltando ao texto anterior, continua o Observador Econmico, fazendo seu

    balancete do governo Arruda, comparando-o com seu antecessor, Fernando Corra da Costa:

    27RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 18.28RBO, ano I, n. 3, maro de 1956, So Paulo (SP), p. 1. Grifo nosso.

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    Impulsionadaa administrao do Estadopela probidade, viso do conjuntoeoperosidade do ex-Governador Fernando Correia da Costa, a longnquaProvncia do Oeste ganhou relvo no panorama da ao construtiva dosnossos governos. Os dficits oramentrios foram banidos [e] a dvidapblica reduziu-se [...]

    Ao balancear-se o ativo do Govrno transato em relao aos que oprocederam, constata-se que le foi o mais operoso nesta meia centria deadministrao em Mato Grosso.29

    A partir da, o autor cita diversas aes feitas pelo governo de Corra da Costa,

    inclusive no mbito da colonizao, que foi feita atravs da cooperao de emprsas

    privadas. Construdos os seus argumentos em favor do representante da UDN, continua a

    tecer suas crticas ao governador do PSD e pergunta: Legatrio de to grande acervo de

    realizaese empreendimentos, que fz o atual Govrno do Sr. Joo Ponce de Arrruda, neste

    ano prestes a extinguir-se? Prossegue criticando a descontinuidade das aes iniciadas pela

    administrao anterior, enfatizando, mais uma vez, a questo das terras, ao salientar que as

    emprsas colonizadoras quedam-se estacionrias diante das ameaas de elementos do

    Govrno de que a orientao vai ser modificada completamente.30E completa seu raciocnio

    com durssimas crticas:

    A atividade governamental neste ano, at agora, tem-se cingido tarefa deexonerar funcionrios, cujos atos j ultrapassam de mais de 3.000, para

    colocar correligionrios do situacionismo e, quando les no existem, asvagas no se preenchem, deixando-se os cargos acfalos, como temacontecido com numerosas escolas rurais.O Governador [...] quando profere discursos em tom polmico para dizerque tudo estava errado, mas no mostra o rumo certo que vai perlustrar.Enquanto isso, modorram alguns milhes de cruzeiros no Tesouro o que vempositivar que estamos frente de uma inoperncia governamentalsacrificadora do desenvolvimento do grande Estado, repositrio de umextraordinrio potencial de riquezas naturais.31

    A partir da anlise de textos como esse, nota-se que o discurso de objetividade

    jornalstica fica enfraquecido, e a inclinao em favor das polticas pblicas empreendidas no

    governo de Fernando Corra da Costa apresenta-se muito claramente. Como se percebe,

    justamente nas crticas ao novo governante que as comparaes com o anterior ficam mais

    evidentes, pois o parmetro de ideal de governo era aquele representado por Corra da

    Costa: impecvel na administrao e que elevou Mato Grosso a um patamar jamais

    atingido anteriormente.

    29

    RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 18. Grifo nosso.30RBO,ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 18. Grifo nosso.31RBO, ano I, n. 6, outubro de 1956, So Paulo (SP), p. 18.

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    O tema envolvendo as terras e colonizao foi se esgotando com o decorrer dos anos.

    Ento, na edio nmero 42, do ms de novembro de 1959, estampava-se a seguinte

    manchete: Fim melanclico da COLONIZAO (OFICIAL) EM MATO GROSSO, Glebas

    compromissadas com as companhias postas venda como terra devolutas.32 O ttulo do

    principal artigo dessa edio era Tarefa exclusiva da iniciativa particular a colonizao no

    Estado de Mato Grosso. Esse texto no tinha assinatura, mas, ao que tudo indica, foi escrito

    por Fausto Vieira de Campos, pois alguns trechos de igual contedo tambm se encontravam

    na obraRetrato de Mato Grosso.

    Nesse artigo, h uma mistura de revolta em relao s medidas tomadas por Joo

    Ponce de Arruda, e forte apelo dirigido ao governador para que fossem tomadas medidas

    justas em relao ao problema das terras, pois as companhias colonizadoras e diversos

    investidores estariam sendo afugentados em decorrncia de tantas acusaes polticas,

    impasses e entraves envolvendo a colonizao.

    O autor iniciava o artigo tecendo os costumeiros elogios ao ex-governador Fernando

    Corra da Costa. Enfatiza que, entre os anos de 1951 e 1955, o Govrno de Mato Grosso ps

    em prtica vasto plano de colonizao [...] com o concurso de emprsas particulares.33

    Continuava o articulista ressaltando que havia garantias e confiana entre o estado e as

    companhias colonizadoras. Dizia ele, no entanto, numa tentativa de justificar os possveis

    descalabros daquela gesto, que tal empreendimento (a colonizao), traria resultado em

    longo prazo, sem a rapidez pretendida. Nas suas palavras, tarefa de tamanha envergadura no

    podia realizar-se, certamente de um dia para o outro, maxim considerando-se as dificuldades

    que se apresentam para a movimentao de cargas e gente, na regio [...] de Mato Grosso.34

    As acusaes feitas ao novo governador Joo Ponce de Arruda e seus

    correligionrios residiam no fato de que, na viso do articulista da RBO, esse grupo opositor

    ao governo de Fernando Corra da Costa formulou as denncias justamente para travar o

    sucesso que era o modelo de colonizao efetuado pelo governador da UDN. O autor criticavao estado pelo cancelamento dos contratos de colonizao, uma vez que isso afetaria

    diretamente na arrecadao para os cofres de Mato Grosso, afugentando as empresas

    colonizadoras. Assim, ele escreveu que [...] a paralisao das atividades das emprsas

    colonizadoras [...] gerou o desnimo, com os reflexos os mais desfavorveis nos negcios de

    terras devolutas.35Enfatizava ainda que diversos boatos circulavam em outros estados da

    32RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP). Capa. Maisculas do original.33

    RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP), p. 23.34RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP), p. 23.35RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP), p. 24. Grifo nosso.

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    nao, por conta dos processos judiciais que envolveram a questo da colonizao de terras e

    as acusaes que foram feitas contra o governo anterior:

    Essas verses, muitas vezes, continham significao maliciosa, que punhaem xeque a honorabilidade do Govrno de Cuiab pois se dizia, e ainda sediz, que requerimento de terra devoluta s tramita mediante pagamento detributao extra-legal.36

    Finaliza o autor fazendo um apelo ao governo de Mato Grosso, em prol de um

    bem maior, isto , o desenvolvimento do estado mediante atrao de capitais, e no o

    contrrio:

    [...] vimos favorecendo contactos com organizaes norte-americanasinteressadas em investir capitais no Estado de Mato Grosso. Temos,portanto, o maior empenho em manter a confiana nos negcios que seentabulam, e em desenvolver, cada vez mais as relaes entre as emprsasbrasileiras e os capitalistas dos Estados Unidos. preciso que no paire dvida sbre a legitimidade dos gravames queoneram as transaes com terras devolutas. preciso que se possa dizer queso legais TODOS os tributos que incidem sbre elas.37

    Essa citao deixa evidente que o investimento associado entre o capital privado

    (nacional e estrangeiro) e o pblico (por parte do Estado) era entendido como o melhor

    caminho a ser trilhado em benefcio de Mato Grosso . Tambm nos parece claro que as

    reportagens e artigos publicados na revista estavam em consonncia com as polticas pblicas

    do governo Fernando Corra da Costa, mesmo que essa harmonia de ideias fosse

    veementemente negada pelos diretores do mensrio.

    4 Consideraes finais

    Quando Joo Ponce de Arruda subiu ao poder, a dinmica de colonizao mudou

    bastante (ainda que carregasse os mesmos vcios) e tomou corpo uma onda de escndalos

    envolvendo o governo de Fernando Corra da Costa, no que tange aos negcios envolvendo

    as terras de Mato Grosso sendo que a posio poltica da RBO no ficou imune a essas

    disputas. A direo e o grupo de articulistas que participavam daquele projeto editorial no se

    conformavam com as acusaes dirigidas gesto anterior, pois entendiam que naquelas

    denncias havia muito mais interesses polticos do que uma tentativa de fazer o melhor para a

    regio. Do ponto de vista dos textos escritos na revista, as investigaes sobre alienao de

    terras teriam afastado sobremaneira os investidores para aquela regio. Ponce de Arruda foi

    36RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP), p. 24. Grifo nosso.37RBO, ano V, n. 42, novembro de 1959, So Paulo (SP), p. 24. Maisculas do original.

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    acusado de acabar com um tipo de projeto que tinha impulsionado Mato Grosso rumo ao

    desenvolvimento. Ele retirava a funo do estado como agente associado, e tambm

    fiscalizador, daquelas empresas particulares.

    Na opinio de Fausto Vieira de Campos, Joo Ponce acabou piorando a situao,

    pois a partir de ento qualquer um poderia colonizar como bem entendesse, desde que pagasse

    ao estado os valores pertinentes s reas compradas, o que gerava insegurana tambm para as

    empresas que ali se instalavam. Os partidos polticos, PSD e UDN, travavam, j h algum

    tempo, uma batalha pelo poder no estado de Mato Grosso. Na RBO, como foi demonstrado,

    havia uma parte dos colaboradores que eram ligados Unio Democrtica Nacional. No

    podemos afirmar com certeza que discusses estavam sendo feitas no interior ou nos

    corredores da redao da revista sobre tal tema, contudo, a julgar por aquilo que saa nas

    pginas do mensrio, a inclinao udenista era evidente, quer fossem os envolvidos

    conscientes ou no desse fato. Por mais que Fausto Vieira de Campos argumentasse que eles

    no tinham posies polticas, seu manifesto descontentamento com a gesto do PSD, a

    parceria com diversos filiados da UDN e seu histrico como assessor do governo Fernando

    Corra da Costa eram alguns dos aspectos que depunham contra a objetividade do jornalista

    que, certamente, recebia crticas dos pessedistas e, por essa razo, buscou se explicar frente ao

    seu pblico leitor por algumas vezes.

    A rigorosa neutralidade do discurso jornalstico enunciada pelos Campos no pde

    ser efetivamente praticada na sua ao, tanto do ponto de vista poltico, quanto do ponto de

    vista econmico, uma vez que entre os anos de 1956-1959 boa parte dos seus anunciantes

    estava ligada s empresas colonizadoras.38Certamente, houve uma forte defesa da gesto de

    Fernando Corra da Costa, muito em conta do histrico pessoal dos Campos, mas tambm

    pelo modelo de colonizao e desenvolvimento defendido pelos diretores da RBO e pelo

    governo da UDN. Diversas so as questes que ainda devem ser estudadas sobre essa revista.

    O tema aqui apresentado um resumo de apenas um tpico dentre diversos outros que podemser estudados nas pginas que fazem parte da longa histria desse peridico, que esteve em

    circulao por 12 anos e vendeu mais de 1.500.000 (um milho e meio de exemplares).

    38Tal tema no pde ser aqui analisado em razo das limitaes de espao que so comuns na modalidade depublicao acadmica do tipo artigo cientfico, no entanto, nos primeiros quatro anos de circulao da RBO,16% dos seus anunciantes eram empresas ligadas colonizao e ao setor imobilirio. Esse pode ser umindicativo de que a defesa feita pelo mensrio em relao s empresas no era gratuita, pois, segundo os textos

    da revista, tal segmento (colonizao) foi prejudicado depois do cancelamento dos contratos de terras feitos noperodo de gesto do governador Fernando Corra da Costa pelo Senado Federal, mas iniciado pelospartidrios do PSD regional de Mato Grosso.

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